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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.133.118


RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE: MANOEL FERREIRA DE SOUZA GASPAR
RECORRENTE: MUNICÍPIO DE TUPÃ
ADVOGADO: ALVARO PELEGRINO
RECORRIDO: PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
PARECER AJC/PGR Nº 25378/2019

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. LEI MUNICIPAL. AUTORIZAÇÃO
PARA NOMEAÇÃO DE PARENTES PARA CARGOS
POLÍTICOS. CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA.
NEPOTISMO. INOCORRÊNCIA. PROVIMENTO DO
RECURSO.
1. Recurso Extraordinário leading case do Tema 1000 da
sistemática da Repercussão Geral: “Discussão quanto à
constitucionalidade de norma que prevê a possibilidade de
nomeação de cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta,
colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da
autoridade nomeante, para o exercício de cargo político”.
2. Proposta de tese de repercussão geral: I - É constitucional
lei municipal que permite a nomeação de parentes do
Chefe do Poder Executivo para cargos públicos de
natureza política, por se tratar de ato administrativo
caracterizado pela discricionariedade efetuado por
agente dotado de legitimidade democrática. II - É infensa
à apreciação do Poder Judiciário a análise da
qualificação técnica do agente nomeado para o exercício
do cargo de natureza política, sob pena de violação dos
princípios da segurança jurídica (Estado de Direito) e da
separação de poderes.

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‒ Parecer pelo provimento do recurso e pela fixação da


tese sugerida.

Egrégio Plenário,

Trata-se de recurso extraordinário representativo do Tema 1000 da

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sistemática da Repercussão Geral, referente à constitucionalidade de norma

que prevê a possibilidade de nomeação de cônjuge, companheiro ou parente,

em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da

autoridade nomeante, para o exercício de cargo político.

Na origem, o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou

ação direta de inconstitucionalidade na qual requereu a declaração de

inconstitucionalidade da Lei 4.627/2013, do Município de Tupã, que foi

publicada com a seguinte redação:

Artigo 1º – Altera os artigos 1º e 2º da Lei nº 3.809 de 1999, passando a ter


as seguintes redações:
“Artigo 1º – É proibida a contratação de parentes até o terceiro grau,
consanguíneos ou afins, de Prefeito, Vice-Prefeito Municipal, Secretários
Municipais, Vereadores, e dos diretores de autarquias, empresas públicas e
fundações públicas, do Município de Tupã, para provimento de cargos em
comissão ou em caráter temporário, exceto para cargo de agente político de
Secretário Municipal.
Artigo 2º – Para a nomeação para o cargo de provimento em comissão ou
em caráter temporário, deverá o contratado anexar os documentos exigidos
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declaração de que não detém parentesco, por consanguinidade ou afinidade,


até o terceiro grau, com os agentes referidos no artigo anterior, exceto para
cargo de agente político de Secretário Municipal.”
Artigo 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo julgou parcialmente

procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão

“exceto para cargo de agente político de Secretário Municipal”, introduzida pelo

art. 1º da Lei Municipal 4.627/2013 nos arts. 1º e 2º da Lei 3.809/1999, sob o

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fundamento de que a autorização ampla e irrestrita de contratação de

parentes para o cargo de secretário municipal não atende o interesse público

e configura prática de nepotismo.

Daí o recurso extraordinário, interposto pelo Município de Tupã

com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal, em que se alega

ofensa aos arts. 2º, 18, 29, 30, I, 37, caput, 39 e 169, todos da Constituição

Federal.

O recorrente sustenta que a Lei Municipal 4.627/2013 apenas tornou

expresso o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, no

sentido de que o cargo de secretário municipal é enquadrado como de

natureza política, o que o exclui do âmbito de incidência da Súmula

Vinculante 13.

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Afirma que o objetivo da norma não é propiciar a contratação de

parentes, mas de permitir ao gestor público a contratação de auxiliares

diretos de confiança que cooperam na tomada de decisões políticas.

O Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou

seguimento ao recurso sob o fundamento de ausência de prequestionamento

dos dispositivos constitucionais apontados.

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Interposto agravo, o Ministro Relator Luiz Fux consignou que a

matéria versada no art. 37, caput, da Constituição Federal foi devidamente

prequestionada, razão pela qual proveu o agravo e determinou sua conversão

em recurso extraordinário.

Submetido ao Plenário Virtual, a Suprema Corte decidiu reconhecer

a existência da repercussão geral da controvérsia e delimitar o tema a ser

examinado neste leading case, nos termos da ementa a seguir transcrita:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL.


ADMINISTRATIVO. LEI 4.627/2013, QUE MODIFICOU A LEI
3.809/1999 DO MUNICÍPIO DE TUPÃ SP. AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE EM ÂMBITO ESTADUAL.
PROVIMENTO DE CARGOS PÚBLICOS. GRAU DE PARENTESCO.
AGENTES POLÍTICOS. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE 13.
PRINCÍPIOS REPUBLICANOS DA MORALIDADE,
IMPESSOALIDADE, IGUALDADE E EFICIÊNCIA DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SEGURANÇA JURÍDICA.
MANIFESTAÇÃO PELA REPERCUSSÃO GERAL.

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Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão.


O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral
da questão constitucional suscitada.

Na sequência, vieram os autos à Procuradoria-Geral da República

para parecer.

Eis, em síntese, o relatório.

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O tema delimitado para exame sob a sistemática da repercussão

geral nestes autos se refere, em suma, à possibilidade de nomeação de

parente para cargo de natureza política.

Para que se possa entender o atual estágio da controvérsia, faz-se

necessária a análise da disciplina normativa da temática, bem como da

evolução jurisprudencial da matéria nas decisões do Supremo Tribunal

Federal.

Atualmente há diversos atos normativos1 que vedam a prática de

nepotismo, inclusive no Supremo Tribunal Federal. No plano

infraconstitucional, a questão foi regulada, no âmbito do Poder Executivo

Federal, no Decreto Federal 6.906/2009, tendo sido, inclusive, posteriormente

editado o Decreto 7.203/2010, que disciplina a matéria no âmbito federal,

1 Podem-se citar, como exemplos, as normas do art. 117, VIII, da Lei 8.112/1990, do art.
5º da Lei 13.316/2016 e do art. 6º da Lei 11.416/2006.
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vedando-se o nepotismo também nas contratações administrativas diretas ou

precedidas de licitação.

Contudo, tanto no âmbito da União quanto das demais entidades

federadas, ainda subsistem controvérsias em relação às hipóteses

configuradoras de nepotismo, o que originou, aliás, inúmeras lides que foram

dirimidas pelo Supremo Tribunal Federal nos últimos anos.

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No julgamento da medida cautelar na ADI 1.521 (Rel. Min. Marco

Aurélio, Plenário, DJe de 12 mar. 1997), na qual se questionava emenda à

Constituição do Estado do Rio Grande do Sul que vedava a nomeação para

cargos em comissão de parentes de agentes públicos, o Plenário da Suprema

Corte negou o pedido liminar para suspender as normas que vedavam a

nomeação de parentes para o exercício de cargos públicos.

Posteriormente, no mérito, a Corte julgou improcedente o pedido,

por entender que a norma que veda a prática do nepotismo concretiza os

princípios constitucionais da isonomia, impessoalidade e moralidade na

Administração Pública, decidindo, por conseguinte, pela constitucionalidade

da Lei 2.040/1990, do Município de Garibaldi/RS (Rel. Min. Ricardo

Lewandowski, Plenário, DJe de 19 jun. 2013).

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No julgamento do MS 23.780 (Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 3

mar. 2006), a Suprema Corte se deparou com a temática referente à nomeação

para cargo em comissão no Tribunal Regional Federal da 16ª Região de irmã

do Vice-Presidente da Corte, ocasião na qual consignou que “[a] proibição do

preenchimento de cargos em comissão por cônjuges e parentes de servidores públicos

é medida que homenageia e concretiza o princípio da moralidade administrativa, o

qual deve nortear a Administração Pública, em qualquer esfera de poder”.

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Posteriormente, em 2006, na ADC 12, a Suprema Corte, em medida

cautelar, reconheceu a constitucionalidade da Resolução 7/2005 do CNJ, que,

ao disciplinar o exercício de cargos, empregos e funções por parentes,

cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em

cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder

Judiciário, determinou diversas restrições para nomeações para cargos em

comissão e funções de confiança.

Na sistemática da repercussão geral (Tema 66), a questão do

nepotismo foi objeto de deliberação no RE 579.951, interposto da decisão do

Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte que entendeu pela

legalidade na nomeação de irmãos de vereador e do Vice-Prefeito do

Município de Água Nova para os cargos de secretário municipal de saúde e

de motorista.

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No julgamento do referido recurso extraordinário, a Suprema Corte

decidiu que a vedação ao nepotismo prescinde da elaboração de lei em

sentido formal, porquanto se trata de proibição que decorre diretamente da

Constituição Federal, consoante se verifica da ementa do julgado:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO. NEPOTISMO.


NECESSIDADE DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO
QUE DECORRE DO ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM
PARTE.

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I – Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do
Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é
ilícita.
II – A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a
prática.
III – Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37,
caput, da Constituição Federal.
IV – Precedentes.
V – RE conhecido e parcialmente provido para anular a nomeação do
servidor, aparentado com agente político, ocupante, de cargo em comissão.
(RE 579.951, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Plenário, DJe de 24
out. 2008.)

Na ocasião, declarou-se nulo o ato de nomeação do irmão do vice-

prefeito para o cargo de motorista, mantendo-se a nomeação do irmão do

vereador para o cargo de secretário municipal de saúde, em decorrência da

distinção entre cargo de natureza estritamente administrativa e cargos

políticos, conforme destacado pelo Ministro Ayres Brito em trecho de seu

voto:

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Senhor Presidente, quando introduzi essa discussão, a partir do voto do


Ministro Marco Aurélio, sobre a distinção entre cargo em comissão e
função de confiança, de um lado, e, do outro, cargo de Secretário
Municipal, Secretário de Estado, Ministro de Estado, portanto, cargos de
natureza política, claro que eu não quis dizer que esses princípios do artigo
37 – legalidade e moralidade – não se aplicam aos dirigentes superiores de
toda a Administração Pública. Agora, os cargos aqui referidos no inciso V
do artigo 37 são singelamente administrativos; são cargos criados por lei,
não são nominados pela Constituição. Os cargos de Secretário de Estado,
Secretário Municipal têm por êmulo ou paradigma federal os cargos de
Ministro de Estado cuja natureza é política, e não singelamente
administrativa. Diz a Constituição Federal sobre o Poder Executivo: o

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Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos
Ministros de Estado (art. 76). Ou seja, os Ministros de Estado são
ocupantes de cargos de existência necessária, política, porque componentes
do governo. Aonde eu quero chegar? O Chefe do Poder Executivo é livre
para escolher seus quadros de governo, mas não o é para escolher seus
quadros administrativos, porque dentre os quadros administrativos estão os
cargos em comissão, os cargos de provimento efetivo e as funções de
confiança. A própria Constituição, sentando praça desse caráter
constitucional, eminentemente político, dos Ministros de Estado – e isso
vale no plano dos Estados-membros e no plano dos municípios –, além de
dizer os requisitos deles – “os Ministros de Estado serão escolhidos dentre
brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos”
–, diz o que basicamente lhes compete. Então, o assento, o locus jurídico
dos auxiliares de governo é diretamente constitucional. A Constituição
Federal a atestar o caráter político do cargo e do agente.
Por isso, o que decidimos no plano da ADC nº 12, e agora servindo de
fundamento para a nova decisão, a proibição do nepotismo arranca, decola,
deriva diretamente dos princípios do artigo 37, que são princípios
extensíveis a toda a Administração Pública de qualquer dos Poderes, de
qualquer das pessoas federadas. Tudo isso na vertente, na perspectiva de
cargos em comissão e funções de confiança, que têm caráter apenas
administrativo, e não caráter político.

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No julgamento do referido recurso extraordinário, destacou-se que

o agente público nomeado para secretário de saúde tinha qualificação para o

cargo, especialmente se fosse considerado que se tratava de pequena cidade

do interior, e que não havia indícios de troca de favores.

Firmou-se, então, o entendimento da Suprema Corte no sentido de

que, nas hipóteses de cargos de natureza política, a mera relação de

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parentesco não é suficiente, por si só, para que seja declarada a nulidade da

nomeação, de forma que a configuração de prática de nepotismo deveria

ocorrer caso a caso, a fim de ser averiguada a ocorrência de “nepotismo

cruzado”, fraude à lei ou descumprimento de princípios administrativos.

Com base nos referidos precedentes, a Suprema Corte editou a

Súmula Vinculante 13 (DJe de 21 ago. 2008), cujo enunciado foi redigido nos

seguintes termos:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta,


colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da
autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica
investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o
exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função
gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer
dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas,
viola a Constituição Federal.

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Apesar da literalidade do enunciado da súmula vinculante,

surgiram casos controvertidos acerca do provimento de diversos cargos

públicos comissionados e de funções de confiança que não requerem a

satisfação de determinados pressupostos de formação técnica, mas a

existência de relação de confiança entre o servidor e a autoridade nomeante,

conforme, inclusive, salientado pela Procuradoria-Geral da República nos

autos da RCL 6.838.2

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Em seu aspecto mais emblemático, discutiu-se a aplicação da

referida súmula vinculante para a investidura de candidatos a cargos de

natureza política, como secretários estaduais e secretários municipais, que

pressupõem relação de confiança entre o Chefe do Poder Executivo e os

ocupantes dos cargos.

No julgamento do agravo regimental na medida cautelar na

Reclamação 6.650 (Rel. Min. Ellen Gracie, Plenário, DJe de 20 nov. 2008), o

Plenário da Suprema Corte entendeu pela “impossibilidade de submissão do

reclamante, Secretário Estadual de Transporte, agente político, às hipóteses elencadas

no enunciado da Súmula Vinculante 13, por se tratar de cargo de natureza política”.

2 Nos autos da referida reclamação, o então Procurador-Geral da República Antônio


Fernandes Barros e Silva de Souza destacou a existência de múltiplas situações que
poderiam provocar dúvidas na aplicação do enunciado da Súmula Vinculante 13,
requerendo que a Suprema Corte definisse, de ofício, a precisa compreensão do
enunciado da referida súmula vinculante.
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Posteriormente, ao deferir o pedido de liminar na RCL 12.478 (DJe

de 7 nov. 2011), o Ministro Joaquim Barbosa destacou que, mesmo nos casos

de nomeação para cargo de natureza política, é necessária a análise casuística

da legitimidade da nomeação de parente, conforme se depreende de trecho

de seu voto a seguir transcrito:

Eu me permitiria fazer uma pequena observação. Por ocasião do julgamento


do leading case que levou à edição da Súmula 13 estabeleceu-se que o fato

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de a nomeação ser para um cargo político nem sempre, pelo menos a meu
ver, descaracteriza o nepotismo.
É preciso examinar caso a caso para verificar se houve fraude à lei ou
nepotismo cruzado, que poderia ensejar a anulação do ato.
(…)
Assim, em linha com o afirmado pelo reclamante, tenho que os acórdãos
proferidos por este Supremo Tribunal Federal no RE 579.951 e na medida
cautelar na RCL 6.650 não podem ser considerados representativos da
jurisprudência desta Corte e tampouco podem ser tomados como
reconhecimento definitivo da exceção à súmula vinculante 13 pretendida
pelo município reclamado.
Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção
mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação
colegiada da situação concreta descrita nos autos, não cabendo ao relator
antecipar-se em conclusão contrária ao previsto na redação da súmula,
ainda mais quando baseada em julgamento proferido em medida liminar.

Diante desse quadro, aqui sintetizado, a jurisprudência da Suprema

Corte consolidou-se3 no sentido de que cargos de natureza política

dependem, em essência, da escolha do Chefe do Poder Executivo, tornando,

3 Nesse sentido, destacam-se os seguintes precedentes: RE 825.682 AgR (Rel. Min. Teori
Zavascki, DJe de 2 mar. 2015); Rcl 34.057 AgR (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 6 ago.
2019); Rcl 29.317 AgR (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 4 abr. 2019), entre outros.
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como regra, insustentável o controle prévio da composição de agentes

integrantes dos escalões superiores da estrutura orgânica executiva, inclusive

para os fins de verificação da prática de nepotismo.

Contudo, ainda que não seja cabível o controle prévio da nomeação

pelo Poder Judiciário, a Suprema Corte, em diversos precedentes, entendeu

que, mesmo nos cargos de natureza política, a escolha do Poder Executivo

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não pode ser absoluta, sob pena de desvirtuar a contratação pública para fins

pessoais, de forma que a nomeação do agente não poderia ser baseada apenas

no grau de parentesco, sem que fosse levada em conta a capacidade técnica

do agente para o desempenho da função de forma eficiente.

Com base nesse entendimento, o Ministro Luiz Fux, na RCL 17.102

(DJe de 15 fev. 2016), julgou procedente o pedido para cassar a decisão

judicial que entendeu válida a nomeação de sobrinho e cunhado de prefeito

para os cargos de secretários municipais:

Nessa seara, tem-se que a nomeação de agente para exercício de cargo na


administração pública, em qualquer nível, fundada apenas e tão somente no
grau de parentesco com a autoridade nomeante, sem levar em conta a
capacidade técnica para o seu desempenho de forma eficiente, além de violar
o interesse público, mostra-se contrária ao princípio republicano.
(…)
Nesse contexto, quanto aos cargos políticos, deve-se analisar, ainda, se o
agente nomeado possui a qualificação técnica necessária ao seu desempenho
e se não há nada que desabone sua conduta. Nesse sentido, já se manifestou
o Min. Roberto Barroso ao apreciar a medida liminar na RCL nº 17.267/RJ:
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“Estou convencido de que, em linha de princípio, a restrição sumular não


se aplica à nomeação para cargos políticos. Ressalvaria apenas as situações
de inequívoca falta de razoabilidade, por ausência manifesta de qualificação
técnica ou de inidoneidade moral”.
Na mesma linha foi a decisão proferida pelo Min. Celso de Mello, nos autos
da RCL nº 11.605/SP, ocasião em que o Ministro acolheu os fundamentos
do parecer do Parquet federal como razões para decidir pela improcedência
da ação, entendendo pela prática de nepotismo em situação em que o
prefeito nomeou cônjuge e genro para cargos de Secretários Municipais,
sem que os nomeados comprovassem aptidão técnica para o exercício de tais
cargos.

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Nesse sentido, o Ministro Roberto Barroso, na apreciação do pedido

cautelar na Reclamação 12.478 (DJe de 16 mar. 2018) deferiu a medida liminar

para afastar o Secretário de Educação do Município de Queimados sob os

seguintes fundamentos:

Registro, ainda, que a apreciação indiciária dos fatos relatados, própria do


juízo cautelar, leva a conclusão desfavorável ao reclamado. É que não há,
em passagem alguma das informações prestadas pelo município, qualquer
justificativa de natureza profissional, curricular ou técnica para a
nomeação do parente ao cargo de secretário municipal de educação. Tudo
indica, portanto, que a nomeação impugnada não recaiu sobre reconhecido
profissional da área da educação que, por acaso, era parente do prefeito,
mas, pelo contrário, incidiu sobre parente do prefeito que, por essa
exclusiva razão, foi escolhido para integrar o secretariado municipal.
Ante o exposto, defiro a cautelar pleiteada pelo reclamante para determinar
o afastamento de Lenine Rodrigues Lima do cargo de secretário estadual de
educação do município de Queimados, até o julgamento final da presente
reclamação.

Em precedente recente, no julgamento da RCL 26.448 AgR, o

Plenário da Suprema Corte entendeu pela cassação de diversas portarias que


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nomearam parentes da Prefeita do Município de Saquarema, sob os seguintes

fundamentos:

Não se desconhece os casos em que este Tribunal restringiu o alcance da


Súmula Vinculante, retirando de seu âmbito de incidência não apenas os
cargos políticos, mas também os servidores que guardam vínculo efetivo.
Ocorre, no entanto, que os elementos trazidos nesta reclamação,
diferentemente do que se deu em outras hipóteses, denotam grave desvio em
relação ao que se fixou na Súmula Vinculante. Um total de sete cidadãos
guardando estreito vínculo de parentesco com a autoridade responsável pela

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fiscalização de sua atividade foram nomeados. A relação de parentesco,
disseminada de forma tão evidente, constitui verdadeiro desvio da
orientação sumulada e compromete a prestação moral e eficiente do serviço
público.
(Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe de 6 fev. 2020).

Verifica-se, portanto, que, em diversos precedentes, a Suprema

Corte entendeu caracterizada a prática de nepotismo na nomeação de

parentes para cargos de natureza política quando constatada a existência de

fraude à lei, nepotismo cruzado ou quando não forem apresentadas

justificativas de natureza profissional, curricular ou técnica para a indicação

de parente ao cargo público.

Inclusive tramita a Proposta de Revisão da Súmula Vinculante 13

no âmbito da Suprema Corte, com a sugestão de substituição do texto atual

pelo seguinte enunciado:

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PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

Nenhuma autoridade pode nomear para cargo em comissão, designar


para função de confiança, nem contratar cônjuge, companheiro ou
parente seu, até terceiro grau, inclusive, nem servidores podem ser
nomeados, designados ou contratados para cargos ou funções que
guardem relação funcional de subordinação direta entre si, ou que
sejam incompatíveis com a qualificação profissional do
pretendente. (Grifo nosso.)

Constata-se, portanto, que a Suprema Corte também relativiza a

aplicação da SV 13 às hipóteses de nomeação para cargos de natureza

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política, desde que não implique fraude à lei, nepotismo cruzado ou

manifesta ausência de qualificação técnica.4

A vedação da prática do nepotismo é questão de alta relevância,

representando um sinal de amadurecimento das instituições republicanas e

da efetividade dos princípios constitucionais que regem a Administração

Pública, destacando-se, aqui, não apenas os princípios da moralidade e da

impessoalidade, mas também o princípio da eficiência, razão pela qual é

necessário delimitar o alcance e o sentido dos comandos prescritos, em prol

da segurança jurídica e da estabilidade das instituições.

Assentadas referidas premissas, percebe-se que a lei municipal

questionada reproduziu o entendimento consolidado da Suprema Corte

acerca da possibilidade de nomeação de parentes para cargos políticos, de


4 Nesse sentido: RCL 34.413 AgR (Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 10 out. 2019) e
RCL 22.339 (Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 21 mar. 2019).
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forma que não há que se falar em inconstitucionalidade da norma sob o

argumento de que a referida previsão legal permitiria a contratação de

parentes em hipóteses nas quais a Suprema Corte o veda, como nas hipóteses

de ausência de qualificação técnica.

É que descabe a averiguação, pelo Poder Judiciário, da presença

de requisitos de qualificação técnica de agente nomeado para o exercício de

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cargo de natureza política.

No âmbito federal, a Constituição da República prevê,

expressamente que o Presidente da República exercerá o Poder Executivo,

com o auxílio dos Ministros de Estados, que devem ser brasileiros maiores de

vinte e um anos e no exercício de direitos políticos.

Por ter a Constituição Federal elencado apenas dois requisitos para

nomeação para o cargo de Ministro de Estado, não há que se falar em

necessidade de comprovação de formação técnica especializada ou de

restrições diversas para indicação do referido cargo de natureza política,

entendimento aplicável para a nomeação de outros cargos de natureza

política nas demais entidades federativas.

Com efeito, a escolha dos subordinados imediatos do Chefe do

Poder Executivo pressupõe naturalmente a existência de ampla

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discricionariedade, o que é legitimado, sob determinada perspectiva, no

mandato popular que lhe foi outorgado, o que lhe concede a prerrogativa de

escolher aqueles que o auxiliarão a organizar a estrutura administrativa e a

implementar as políticas públicas almejadas.

Dessa forma, para fins de averiguação da prática de nepotismo, é

necessária a distinção das relações ordinárias entre servidores e a

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Administração Pública, e as relações de ordem política, que implicam ampla

margem de discricionariedade em sua atuação.

Conforme assentado pela Suprema Corte nos precedentes referidos,

os cargos políticos são caracterizados não apenas por serem de livre

nomeação ou exoneração, fundados na fidúcia, mas também por seus

titulares serem detentores de munus governamental decorrente da

Constituição Federal, razão pela qual seus ocupantes não podem ser

enquadrados na classificação de agentes administrativos.

Ressalta-se, nesse sentido, que a nomeação para cargos de natureza

política são, por sua própria natureza, quantitativamente limitados e

sujeitos a amplo escrutínio público, o que dificulta sobremaneira as

indicações realizadas apenas com a finalidade de favorecimento pessoal.

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O mero fato de o agente público ter relação de parentesco com o

Chefe do Poder Executivo não tem o condão de, por si só, desqualificá-lo para

o cargo público, tampouco indica qualquer demérito ou ineficiência por parte

do agente, uma vez que, por se tratar de comando normativo de caráter geral,

a vedação ao nepotismo naturalmente abarca as hipóteses nas quais o agente

público age pautado na moralidade administrativa, 5 conforme destacado por

José dos Santos Carvalho Filho:6

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A Corte Suprema, todavia, não cingiu a sua orientação apenas ao Poder
Judiciário. E nem seria razoável que o fizesse: afinal não é o único
responsável por tal prática. Desse modo, considerou ofensiva à Constituição
qualquer nomeação – para cargos ou funções de confiança, ou ainda funções

5 Vale pontuar que, nos Estados Unidos, a Corte de Apelação do Distrito de Colúmbia
julgou lícita a indicação da esposa do Presidente Bill Clinton para liderar força-tarefa
para reforma do sistema de saúde, ocasião na qual foi destacado que a legislação
relativa ao nepotismo não seria aplicável aos assistentes especiais da Casa Branca:
“The President's implicit authority to enlist his spouse in aid of the discharge of his federal
duties also undermines appellees' claim that treating the President's spouse as an officer or
employee would violate the anti-nepotism provisions of 5 U.S.C. § 3110. That section
prohibits any ‘public official’ from appointing or employing a relative, such as a spouse, ‘in the
agency in which he is serving or over which he exercises jurisdiction or control’. Id. § 3110(b).
Although section 3110(a)(1)(A) defines agency as ‘an executive agency’, we doubt that
Congress intended to include the White House or the Executive Office of the President. Cf.
Franklin v. Massachusetts, --- U.S. ----, ----, 112 S.Ct. 2767, 2775, 120 L.Ed.2d 636 (1992)
(holding that President is not ‘agency’ for purposes of Administrative Procedure Act); Meyer,
981 F.2d at 1298 (President's advisers are not ‘agency’ under FOIA); Armstrong v. Bush, 924
F.2d 282, 289 (D.C.Cir.1991) (President not APA ’agency’). So, for example, a President
would be barred from appointing his brother as Attorney General, but perhaps not as a White
House  special  assistant”.  Disponível em: https://law.resource.org/pub/us/case/reporter/
F2/997/997.F2d.898.93-5092.93-5086.html. Acesso em: 12 fev. 2020.
6 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 31. ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017. p. 24.
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gratificadas – de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral


ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, do agente nomeante ou de
servidor que, na mesma pessoa jurídica, ocupe cargo de direção, chefia ou
assessoramento. A vedação estende-se à administração direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Nela se inclui, ainda, o nepotismo transverso (ou nepotismo cruzado), ou
seja, aquele resultante de ajuste mediante designações recíprocas.
A determinação guarda algum radicalismo e certamente provocará
injustiças, visto que existem parentes ocupando cargos e funções de
confiança dotados de eficiência, interesse administrativo e espírito
público. Não obstante, tantos foram os abusos cometidos e os
apadrinhamentos ocorridos, e tão densa se relevou a insatisfação

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social com esse estado de coisas, que a reação acabou por exceder os
limites em função dos quais foi oposta. Essa é a constatação que,
numa visão sociológica, frequentemente se encontra. Por outro
lado, a norma, tal como veiculada, provocará algumas
complexidades em sua aplicação.

Na prática, a análise casuística pelo Poder Judiciário gera

insegurança jurídica e esvazia a prerrogativa de o Chefe do Poder Executivo

escolher, com ampla margem de liberdade, seus subordinados imediatos,

responsáveis pela concretização das políticas públicas, como se pode

perceber, inclusive, da decisão proferida pela Suprema Corte na RCL 17.102,

no âmbito da qual o Ministro Luiz Fux, ao julgar procedente a reclamação

para cassar a nomeação de secretário, expressamente consignou que “[c]abe

ao juízo reclamado, na hipótese, verificar a qualificação técnica dos agentes

para o desempenho eficiente dos cargos para os quais foram nomeados”.

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É certo que não há que se falar em insindicabilidade dos atos

administrativos discricionários quando contrários aos princípios norteadores

da Administração Pública, porém a adoção de critérios objetivos ou

subjetivos implicará a avaliação, pelo Poder Judiciário, da aptidão do agente

para cumprir as funções políticas que lhe foram designadas.

Ainda que seja legítima a preocupação com a moralidade

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administrativa, condicionar a nomeação de agente a cargo político ao

preenchimento da comprovação da aptidão técnica significa, na prática,

submeter ao Poder Judiciário a análise acerca da capacidade de o nomeado

exercer as funções que lhe foram incumbidas, o que vulnera o princípio da

separação de poderes e compromete a própria discricionariedade do ato

administrativo do Chefe do Poder Executivo.

Dessa forma, assim como nem todas as hipóteses de nepotismo se

encontram previstas no enunciado da Súmula Vinculante 13 7, nem todas as

indicações de parentes para exercício de cargo público são efetuadas para fins

de satisfação de interesses pessoais, razão pela qual há de ser afastada a

7 Nesse sentido, o voto do Ministro Dias Toffoli no julgamento do MS 31.697 (DJe de 2


abril 2014): “Ao editar a Súmula Vinculante nº 13, a Corte não pretendeu esgotar todas as
possibilidades de configuração de nepotismo na Administração Pública, dada a impossibilidade
de se preverem e de se inserirem, na redação do enunciado, todas as molduras fático-jurídicas
relevadas na pluralidade de entes da Federação (União, Estados, Distrito Federal, territórios e
municípios) e das esferas de Poder (Executivo, Legislativo e Judiciário), com as peculiaridades
de organização em cada caso”.
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incidência da Súmula Vinculante 13 nas hipóteses de cargo de natureza

política, seja pela ampla discricionariedade da escolha dos subordinados

diretos ao Chefe do Poder Executivo, seja pela ampla submissão da escolha

ao escrutínio público, não cabendo ao Poder Judiciário efetuar a análise da

qualificação técnica do candidato para o exercício do cargo.

Ressalta-se que, ainda que não seja cabível a análise da qualificação

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técnica do agente indicado para cargo de natureza política, subsistirá a

possibilidade de controle da licitude do ato de nomeação, que poderá ser

reputado ilegal quando as circunstâncias do caso concreto indicarem a

existência de fraude à lei ou a violação dos princípios que regem a

Administração Pública.

Ademais, cumpre consignar que a possibilidade de indicação de

parente para exercício de cargo de natureza política não se aplica às

nomeações de agentes para cargos de natureza judicante, porquanto, nessa

hipótese, não há que se falar em escolha dos subordinados imediatos do

Chefe do Poder Executivo, tampouco em necessidade de existência de

relação fundada na fidúcia para concretização de políticas públicas.

Em face do exposto, opina o PROCURADOR-GERAL DA

REPÚBLICA pelo provimento do recurso extraordinário e, considerados a

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sistemática da repercussão geral e os efeitos do julgamento deste recurso em

relação aos demais casos que tratem ou venham a tratar do Tema 1000, é

sugerida a fixação da seguinte tese:

I - É constitucional lei municipal que permite a nomeação de


parentes do Chefe do Poder Executivo para cargos públicos de
natureza política, por se tratar de ato administrativo dotado de
discricionariedade efetuado por agente dotado de legitimidade

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democrática.
II - É infensa à apreciação do Poder Judiciário a análise da
qualificação técnica do agente nomeado para o exercício do
cargo de natureza política, sob pena de violação dos princípios
da segurança jurídica (Estado de Direito) e da separação de
poderes.

Brasília, data da assinatura digital.

Augusto Aras
Procurador-Geral da República
Assinado digitalmente

[FLSM]

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