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Mariana Martins

CULTURA SURDA
CONTRIBUTO PARA A SUA COMPREENSÃO

Pós-Graduação e Formação Especializada em Educação Especial,


Educação de Crianças e Jovens Surdos

UNIVERSIDADE MODERNA
Lisboa 2005
PROBLEMA DE PESQUISA

Será possível isolar e descrever elementos suficientes


que permitam fixar uma definição de Cultura Surda?

CULTURA

COMUNICAÇÃO IDENTIDADE

COMUNIDADE
HIPÓTESE DE TRABALHO:

A Cultura Surda possui aspectos fundamentais que permitem


delinear as características dos membros da Comunidade que a partilha.

OBJECTIVO GERAL:

Descrever a Cultura Surda para se compreender a essência da sua Identidade, o modo de


funcionamento da respectiva Comunidade e das suas formas de comunicar e de conceber o
mundo.

OBJECTIVOS ESPECÍFICOS:

1. Adaptar a teoria cultural proposta por Edward T. Hall no sentido de esquematizar


uniformemente os critérios que determinam o funcionamento do sistema cultural em questão,
isolando e descrevendo elementos característicos suficientes que permitam fixar uma
definição de Cultura Surda.

2. Destacar o papel da comunicação com o intuito de interpretar o sentimento de pertença nos


membros da Comunidade que partilham essa Cultura.

3. Facilitar a sua transmissão de forma acessível e estruturada.


METODOLOGIA

ENTREVISTAS, do tipo semi-estruturadas em tópicos e itens exploratórios, com relativa


profundidade, dirigidas a informantes qualificados.

Os surdos foram gravados em vídeo e os ouvintes em áudio.


As entrevistas foram transcritas e apresentadas aos pares para consolidar a resposta:

1. Líderes Surdos reconhecidos pela Comunidade, no sentido de a poderem representar, como


modelos de Identidade.
LIDER_A (2 informantes do sexo masculino)
LIDER_B (2 informantes do sexo feminino)

2. Filhos surdos de pais surdos, que se supõe adquirirem a Cultura Surda naturalmente.
SURDO (2 informantes, um do sexo masculino e outro do sexo feminino)

3. Intérpretes de LGP, com pais surdos e com filhos surdos, de forma a representarem a
perspectiva do ouvinte que está dentro da Comunidade.
INTERP_A (2 informantes com pais surdos),
INTERP_B (2 informantes com filhos surdos).
METODOLOGIA

# Área Temas Itens exploratórios


1 GERAL Cultura surda o que é, diferenças em relação à cultura ouvinte
2 Representações sociais como o surdo vê o ouvinte e como o ouvinte vê o surdo

3 ASSOCIAÇÃO Surdos aspectos comuns, forma de estar


4 Comunidade Surda membros, condições de pertença
5 Identidade surda o que é, do que depende
6 SUBSISTÊNCIA Hábitos quais são, diferenças em relação aos do ouvinte
7 Actividades preferências e desinteresses
8 BISSEXUALIDADE Sexualidade homem, mulher, homossexualidade
9 TERRITORIALIDADE Espaço referências ao longo da vida
10 TEMPORALIDADE História influência na vida presente
11 APRENDIZAGEM Experiências positivas e negativas ao longo da vida
12 DIVERSÃO Arte tipos de manifestações
13 DEFESA Política envolvimento, hierarquia
14 EXPLORAÇÃO Adaptações Ajudas técnicas
METODOLOGIA

15 INTERACÇÃO Comunicação influência da cultura, regras


com ouvintes e entre surdos
16 Língua abordagem, interrupção, final
Locais, tempo
temas, humor
RESULTADOS
GERAL

1 CULTURA SURDA Língua minoritária, história, identidade, maneira de viver e de encarar a


o que é vida, maneira de sentir, modo de estar, adaptações, regras, artes,
comunicação, costumes.
diferenças em relação à Silêncio, visão; escolas, associações de surdos; sofrer discriminação, ter
cultura ouvinte pais diferentes; procurar pares surdos, conviver em grupo; temas de
conversa e humor próprios ; noção de espaço.
Ser directo; tocar muito; nomes gestuais ; apontar; forma de chamar; bater
as palmas abanando as mãos; bater na mesa para dizer bom apetite...

2 REPRESENTAÇÕES O ouvinte provoca traumas, levanta obstáculos; discrimina ; domina; é


SOCIAIS superior; tem preconceitos...
como o surdo vê o ouvinte Protege; está mais sensibilizado; tem curiosidade; é amigo, é colega, é
família...
como o ouvinte vê o surdo O surdo parece um macaco; é um coitadinho; é pouco inteligente; é
inferior, limitado; é mudo, deve oralizar; é deficiente; é estranho; é
dependente; é desconfiado.
É digno de admiração; é um igual...
RESULTADOS
ASSOCIAÇÃO

3 SURDOS Identidade, língua; expressão; ter as mesmas barreiras e limitações e sofrer


aspectos comuns com isso; ter acuidade visual e facilidade de localização no espaço; ser
proibido de falar LGP; precisar das mesmas ajudas técnicas...
forma de estar Procurar os seus pares para conviver; recorrer a uma associação; lutar pelos
mesmos direitos, pela sua língua; estar isolado em família...

4 COMUNIDADE SURDA Surdos com língua gestual; surdos profundos, parciais; surdos sem
membros Identidade surda ou oralistas; deficientes auditivos, implantados;
intérpretes; familiares próximos; técnicos e professores; outros ouvintes.
condições de pertença Saber língua gestual ou ter vontade de aprender; respeitar a cultura; ter
sensibilidade e compreender; gostar de conviver e identificar-se; conhecer
vários surdos; participar, envolver-se; ter laços familiares...

5 IDENTIDADE SURDA Reconhecer-se e sentir-se bem com a condição de ser surdo, ter orgulho;
o que é saber quem é, onde pertence, de onde vem; pertencer à comunidade; ser um
S grande, médio ou pequeno, dependendo da escola e da opção
comunicativa...
do que depende Adquirir LGP naturalmente; ter a Cultura Surda, conhecer a comunidade e a
história dos surdos; ter acesso aos modelos surdos para receber a língua e a
cultura que se transmitem de geração em geração através dos seus pares;
partilhar as experiências...
RESULTADOS
SUBSISTÊNCIA

6 HÁBITOS Comunicação, estar em grupo regularmente, frequentar os mesmo sítios...


quais são

7 ACTIVIDADES Juntar-se para conversar, passear, fazer desporto, fazer jogos, ponto cruz, ver
preferências televisão, estar no computador, ir ao cinema, comer fora, ir à discoteca...
desinteresses Música, ler, escrever, o sistema educativo, ter responsabilidades, filmes e
programas sem legendas, encontros só com ouvintes...

BISSEXUALIDADE

8 SEXUALIDADE Igual aos ouvintes; preferem o par surdo por causa da comunicação, o
homem / mulher ouvinte tem de ser sensível e falar língua gestual; antigamente casavam
sobretudo com ouvintes para serem ajudados.
homossexualidade Há menos tabus, assumem-se sem complexos; são bem aceites, com respeito,
ser surdo é mais forte, estão habituados a lidar com a diferença; é mais visível
por ser um meio mais pequeno...

TERRITORIALIDADE

9 ESPAÇO Escola, associação, sítios onde haja outros surdos, os jovens estão mais
referências ao longo da independentes, frequentam vários espaços, desde que estejam juntos.
vida Não se sentem bem em casa.
RESULTADOS
TEMPORALIDADE
10 HISTÓRIA - marcos Congresso de Milão, modelos surdos, orgulho, sofrimento.
influência na vida Pouca, os jovens não a conhecem.
presente

APRENDIZAGEM
11 EXPERIÊNCIAS - Modelo surdo, contacto com a LGP.
positivas
negativas Atitude dos professores, rejeição, educação oralista.

DIVERSÃO

12 ARTE – tipos de Teatro e poesia em LGP, desenho e pintura.


manifestações
RESULTADOS
DEFESA
13 POLÍTICA - Devido à dificuldade em acompanhar, não ligam muito à política .
envolvimento
hierarquia Falta de movimento associativo, falta de líderes.

EXPLORAÇÃO
14 adaptações Aparelhos auditivos, implantes cocleares; comunicação oral
intérpretes de LGP, legendagem, teletexto, informação escrita.
ajudas técnicas Videoconferência, telefone de texto, telemóvel, despertador luminoso ou
vibratório, alarmes luminosos.
RESULTADOS
INTERACÇÃO
15 influência da cultura Língua gestual, visão, sentimentos, escolas com internato, histórias, humor.
regras Língua gestual, contacto visual constante e ao mesmo nível, proximidade,
COMUNICAÇÃO

evitar a luz de frente, evitar estar de costas para surdos, exigência com o
nível da língua gestual.
com ouvintes Ouvintes sem LGP: comunicação escrita, oral, com leitura labial, com
mímica; superficial, esforçada; integração.
Ouvintes com LGP: acesso, sensibilidade, esforço, interesse, aceitação.
entre surdos Língua gestual, contacto visual, expressões, partilha.

16 abordagem “És surdo?”, “Em que escola andaste?”; falam de imediato.


interrupção Sensíveis às distracções visuais.

final Raramente se despedem, e geralmente só se apresentam no fim.

locais Associação, no meio do passeio, em locais luminosos, preferencialmente


espaçosos; preferem mesas redondas, cantos, e estão sempre em círculo.
tempo Esquecem-se do tempo, prolongam a conversa ao máximo.
temas Visuais e naturais; o que os preocupa, como a política, a educação, o acesso à
LÍNGUA

informação, as barreiras...
humor Pormenores muito visuais, , invenções exageradas, gozo com os tiques das
pessoas, anedotas.
CONCLUSÃO

CULTURA INSTINTIVA e TRANSMITIDA


consciente ou inconscientemente

CULTURA
e

co
d
da

n
i

sc
ex


pl

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m

ia
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COMUNICAÇÃO IDENTIDADE
visual
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COMUNIDADE
grupos
CONTRIBUTO

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SUBSISTÊNCIA SEXUALIDADE TERRITORIALIDADE

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TEMPORALIDADE APRENDIZAGEM DIVERSÃO DEFESA EXPLORAÇÃO
ico
n
téc

al
INTERACÇÃO

TRANSMISSÃO

Informal
SURDOS OUVINTES
Formal
Técnica
ESTUDOS FUTUROS
Ø REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: utilizar uma amostra mais diversificada e mais critérios psico-emocionais.

Ø COMUNIDADE: analisar a motivação para o convívio entre pares, na era moderna.

Ø IDENTIDADE: estudar a heterogeneidade da população surda, de forma a encontrar padrões de identificação.

Ø HISTÓRIA: confirmar a sua importância na construção da Identidade.

Ø MODELOS SURDOS: observar a sua influência na construção da Identidade Surda e perante a sociedade.

Ø EXPERIÊNCIAS NEGATIVAS: examinar as suas causas nas perspectivas sincrónica e diacrónica.

Ø ARTE: averiguar acerca da natureza dos temas invocados.

Ø LÍDERES: analisar os traços individuais e suas motivações.

Ø ADAPTAÇÕES E AJUDAS TÉCNICAS: estudar a sua utilidade real.

Ø COMUNICAÇÃO: observar e identificar a sua variação, tanto individual como contextual.

Ø LÍNGUA: investigar a forma como o pensamento se reflecte na sua estrutura gramatical.

...
LIMITAÇÕES
Ø A complexidade do tema e a pouca consciencialização sobre o mesmo dificultaram a sua esquematização.
Ø A quantidade e a qualidade da informação recolhida inibiu a sua síntese.
Ø A importância de enumerar os vários exemplos impediu a elaboração de um único quadro.
Ø A interligação entre os vários sistemas primários de cultura obstruiu a linearidade dos resultados.

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