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PME Cap Magalhaes
PME Cap Magalhaes
ABSTRACT
The Brazilian Army has implemented some specific policies in the New Republic that were demanded by the
Institution, without the direct participation of the federal government. These endogenous policies were
created by the military bureaucracy because of its political and administrative autonomy, preserved since the
beginning of New Republic. The Education Modernization Process (MEP), implemented by the Education
and Culture Department is an important example of the permanency, in New Republic, of the so-called
military prerogatives. So, this research will describe, using oral history, the most influential aspects of the
implementation of MEP, from 1995 until 2001, its ideology and modus operandi, to explain how the national
and international context and the internal situation of the military bureaucracy was connected with the
appearance and institutionalization of MEP, and to explain how education specialists have contributed to
MEP.
INTRODUÇÃO
∗
Diretoria de Especialização e Extensão (DEE)-Exército Brasileiro.
Apesar de sua relevância para o ensino militar atual e do fato de revelar aspectos
fundamentais da dinâmica institucional e ideológica do EB no contexto da
redemocratização do país, o PME não foi ainda analisado de forma satisfatória.
Este projeto considera que se deve analisar o PME devido a uma série de aspectos
resultantes desta reforma que foram detectados a partir de um contato cotidiano com um
conjunto de instituições importantes de ensino militar.
Em primeiro lugar, o PME é original, pois se apresenta com uma intenção explícita
de renovação – uma aspiração que não encontra eco normalmente numa instituição
conservadora que se caracteriza precisamente pela defesa da Ordem, como uma estratégia
para lidar com o risco e incerteza da guerra. Esta vocação inovadora do PME ainda se
revela mais surpreendente quando se considera que foi, de longe, a reforma de ensino mais
ampla, profunda e duradoura da Instituição.
1
O Departamento de Ensino e Pesquisa (DEP) foi transformado em Departamento de Educação e Cultura do
Exército (DECEx) em 2009
Desta forma, o PME teria contribuído para a suavização da tendência secular de
protagonismo missionário dos militares na vida política nacional2, uma vez que esmaeceu
as diferenças entre civis e militares, legitimando valores e conceitos democráticos vigentes
na Educação nacional e na sociedade brasileira como um todo.3
Não por acaso, apesar de plenamente institucionalizado, o PME foi e continua a ser
combatido no amplo organograma de ensino militar (departamentos, diretorias
subordinadas e escolas), contando com adversários e defensores, que ao fazê-lo,
evidenciam, na verdade, a opção por um modelo específico de organização militar.
2
Considera-se aqui que a socialização profissional dos militares do EB tem sido marcada, desde a o final da
Guerra do Paraguai, pelo sentimento de superioridade/isolamento em relação ao mundo civil, e pela pretensão
de intervenção salvadora nos destinos da Pátria.
3
Pesquisas recentes parecem sugerir uma inflexão desta tendência ao longo da Nova República, em especial a
partir do Governo Collor de Melo: “A atuação dos militares nesta conjuntura marcou um momento importante
nas relações entre a Instituição e um Estado democrático. Ao romper com uma tradição intervencionista de
longa duração, criaram um fato concreto que pode ser visto como momento fundador de uma nova fase no
comportamento político das Forças Armadas.” CASTRO, C; D'ARAUJO, M C. Militares e política na Nova
República. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2001, p.28.
4
Opõem-se aqui, à época do PME e mesmo nos dias atuais, os militares tarimbeiros e os militares
“científicos” que se confrontam desde o final do século XIX. A este respeito, ver: CASTRO, C. Os militares e
a República: um estudo sobre cultura e ação política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1995.
de implementação de uma reforma setorial endógena, modernizante, e o papel de novos
atores políticos - os especialistas de ensino - que passaram a atuar de forma mais expressiva
na Instituição a partir da década de 1990.
A IMPLEMENTAÇÃO DO PME
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O EB ainda funcionava como um espaço institucional relativamente autárquico, mantendo as chamadas
prerrogativas militares (os foros especiais de justiça, por exemplo) devido à natureza da transição democrática
no País, que foi realizada com a condução política dos militares. (WINAND, É; SAINT-PIERRE, H L . O
Legado da transição na Agenda Democrática para a Defesa: o caso brasileiro e argentino, in: SAINT-
PIERRE, H L. Controle civil sobre os militares e política de defesa na Argentina, no Brasil, no Chile e no
Uruguai, p. 39-41).
mais consistentes da Educação contemporânea, demonstrando um nível considerável de
abertura ideológica em relação às correntes pedagógicas vigentes na sociedade brasileira,
manifestadas na Lei 9376/96-Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-(LDB)/1996
e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), divulgados em 1997 e 1998.
6
Compreende-se por Escolanova o paradigma pedagógico que enfatiza a adequação do currículo e da didática
às capacidades, necessidades e interesses dos alunos, valorizando as contribuições das Ciências da Educação,
e, em particular, da Psicologia, visando ao desenvolvimento pleno das capacidades e habilidades e atitudes
dos alunos em detrimento da aprendizagem estanque de conceitos.
como uma legenda de legitimação do status quo atual do sistema educacional militar.
Esta dimensão de “revolução permanente” é assumida no emprego da terminologia que o
define como um processo – um evento em movimento, jamais concluído - mas também no
plano das práticas institucionais, uma vez que o PME se prolonga até os dias atuais através
da implementação de uma miríade de normas e ações institucionais na Instituição que
alcançaram a esfera normativa nacional através de lobbies no Congresso Nacional.
Na verdade, este estudo pretende justamente verificar se o PME pode ser considerado
como um resultado de um período caracterizado pela tensão interna e externa, dividido
entre a busca de conservação dos valores militares tradicionais para evitar a perda de um
contexto de sentido, essencial para o desempenho das atividades militares, e a adequação
aos novos tempos, tanto no que se refere à nova realidade política interna, como também a
situação externa marcada pelas céleres mudanças do Leste Europeu.
Neste sentido, este estudo busca esclarecer as seguintes questões sobre os fatores
influentes na eclosão do PME, sua orientação ideológica e modus operandi:
7
Supõe-se que os seguintes fatores podem ter influenciado na eclosão do PME: a supressão do conflito
ideológico; a orientação do governo americano e a OTAN no sentido da redução de contingentes militares do
Terceiro Mundo e sua utilização no combate ao tráfico ilegal de drogas e em áreas como educação e saúde
pública.; o crescente desenvolvimento tecnológico demonstrado na Guerra do Golfo; a adoção de novas
hipóteses de emprego (guerrilha urbana; terrorismo; Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
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Este trabalho supõe que estes aspectos tenham influenciado na eclosão do PME: o contexto político e
ideológico da gestão de Fernando Henrique Cardoso, a situação do EB em face do projeto de viabilização do
Ministério da Defesa (MD) e da elaboração do Plano Nacional de Defesa (PND); a ambiência
pedagógica/ideológica no meio educacional brasileiro, marcado pela realização da LDB/96; a dinâmica
burocrática e política dos órgãos superiores de gestão do ensino – Departamento de Educação e Cultura,
diretorias subordinadas e Centro de Estudos de Pessoal (CEP).
Como estas injunções externas e internas foram percebidas pelos atores influentes
no PME?
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Foi introduzido o Sistema de Planejamento do Exército (SIPLEX) em 1985, o Sistema Integrado de
Administração Financeira (SIAFI), em 1987, o Sistema de Excelência Gerencial (SEG) em 2003.
brasileiro em face da crise fiscal e endividamento externo10. Este contexto era favorável à
introdução de novas comunidades epistêmicas de formação intelectual civil. Na área de
recursos humanos, foi criado o Quadro Complementar de Oficiais (QCO) em 1989 e o
Quadro de Oficiais Técnicos-Temporários (OTT) em 1996/97, envolvendo as áreas de
Administração, Direito, Magistério, Psicologia, dentre outras, com o intuito de incrementar
a eficiência das atividades-meio da burocracia militar, liberando os militares combatentes
para a realização de atividades-fim.
Qual foi a sua orientação ideológica? Teria sido marcada pelo ideário construtivista
e escolanovista, já hegemônico na Educação nacional?
Como a comunidade epistêmica dos especialistas de ensino do EB se relacionou
com os modelos tradicionais de socialização militar?Como se relacionou com as demandas
externas à Instituição Militar?
Supõe-se que a compreensão acurada das diversas dimensões do PME pode
favorecer o esclarecimento de aspectos importantes do EB, relativamente ignorados na
literatura especializada:
a. Compreender as percepções dos atores políticos diretamente envolvidos (civis e
militares) numa reforma endógena da Instituição;
10
Compreende-se modernização como uma consequência da racionalização social - a difusão de um ethos de
otimização dos meios para a obtenção de fins em diversos quadrantes da vida social. Neste sentido, o Exército
brasileiro desenvolveu, ao longo dos séculos XIX e XX, características próprias de uma burocracia racional.
(WEBER, M. A burocracia, In: ____. Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: LTC, 2002, p138-167). Um dos
eventos relevantes na modernização do EB foi a Missão Francesa (1918-1940). (DOMINGOS, M., 2004, p.7).
b A dinâmica interna, de cunho político-administrativo, das políticas efetivadas
numa Instituição refratária ao controle civil e que desfruta ainda de prerrogativas de
autonomia;
c. As formas de recodificação/refratação do EB das pressões e influências da
sociedade e do Estado brasileiro na Nova República;