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é seu e da audiência, eles deveriam adotar tal meio (como Alcibíades
argumentou ao conclamar a aprovação da expedição siciliana) ou que, -_,-*¿:_zf.-

dado que tais são os fins limitados que a audiência possui, deveriam
perseguir seu fim comum apenas em tal modo limitado (como os atenienses
foram forçados a argumentar depois de suas grandes perdas na Sicília). Capítulo V
A preocupação do próprio Tucídides com as questões humanas é,
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obviamente, uma preocupação que o leva a reforçar as diferenças entre


aquilo que o orador, assim como a audiência, tinha a intenção de realizar,
através da implementação de suas decisões deliberativas, e o que realmente PLATÃO E A PESQUISA RACIONAL
aconteceu. Aqui a fortuna (tyché) e especialmente a má-fortuna (dystychia)
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começam a fazer parte das questões humanas. Mas o que ele também ~

nos mostra é como uma compreensão particular do papel da deliberação


nos assuntos humanos pode oferecer uma explicação causal das ações
humanas e de seus resultados.
Atribuí a Tucídides três teses: areté é uma coisa e inteligência prática
Ao fazer isso, Tucídides propôs uma versão paradigmática da expli- outra bem diferente, e sua conjunção é mera coincidência; o grau e o j
cação da ordem social e das relações humanas, que deve ser pressuposta tipo de justiça que pode haver na ordem social são aqueles que os
por qualquer exposição e defesa racional do que está implicado na u fortes e poderosos permitem que haja; e a deliberação retórica, tal
adesão aos bens de eficácia cooperativa e à concepção correspondente ç f como praticada por aqueles que aprenderam com Górgias e seus discípulos,
de justiça. Defensores posteriores dessa adesão apelaram para outra P é o melhor modo para os seres humanos responderem às questões relativas
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versão, mais tarde historiadores e defensores modernos da mesma adesão ao que se deve fazer. O objetivo dominante da filosofia política madura
freqüentemente apelam para o que consideram ser as descobertas das de Platao é negar todas essas três teses através de uma teoria que
ciências sociais. Mas duvido que algum historiador posterior ou cientista ._

revele tanto as conexões entre elas como as conexões com as teses


social moderno tenha alguma contribuição substancial para acrescentar, P pelas quais deseja substitui-las. Oque liga as teses de Tucídides é uma
nesse domínio, àquilo que podemos aprender com Tucídides. Assim, a única pressuposição: os bens de eficácia devem prevalecer sobre os
visão de Tucídides da ordem social e das relações humanas deve ser ¿¿¡.= bens de excelência e esses serão valorizados apenas à medida que os
discutida por qualquer um que empreenda o questionamento das alegações j que valorizam os bens de eficácia permitirem que o sejam. Platão nega
implícitas na adesão aos bens de eficácia cooperativa. Portanto, não é u ' esse pressuposto, propondo pela primeira vez uma teoria bem-articulada
surpreendente que a extensa argumentação de Platão na República possa “re
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sobre o que realmente é a excelência humana, e porque é racional, à
tão facilmente ser lida como réplica a Tucídides. a
'=:¬~›-ne luz dessa teoria, sempre subordinar os bens de eficácia aos bens de
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excelencia.
¬ s A negação de Platão da primeira tese de Tucídides, que a areté é
§ ç i uma coisa e a inteligência prática outra bem diferente, baseia-se em
f argumentos concebidos para mostrar que sem areté não se pode ser
p i racional nem em termos teóricos nem em termos práticos, e que sem
ç ¿ I racionalidade não se pode ter areté. Portanto, a concepção que Tucídides
¿ ¡ tem de Nícias, como alguém que genuinamente possui areté, era
r simplesmente um erro, um erro identificado no Laques, quando Nícias
_. aparece em confusão, não apenas quanto rã virtude da coragem, mas
E. r i r quanto à natureza da virtude em geral. E uma parte fundamental da
Visao de .Platao é que não compreender 0 que é a virtude impede alguém
de ser virtuoso.
112 Aristóteles herdeiro de Platão Aristóteles herdeiro de Platão 113

ignora uma das teses centrais de Platão, cuja força total só emerge nos prática, podem ser encontradas em formas de ordem social diferentes
livros VI e VII: apenas uma educação dentro de uma comunidade guiada, das da pólis, os argumentos que sustentam essa irrelevância deixam de
disciplinada e ensinada por filósofos dará o conhecimento das formas, ter sentido. E eu sugeri que na visão da comunidade filosófica
inclusive a forma da justiça, sem a qual não se pode ser virtuoso. Para iiistitucionalizada que Platão nos oferece na República -presumivelmente
o Platão da República, a comunidade filosófica tomou o lugar da pólis uma visão idealizada da Academia - temos exatamente um exemplo
como a sociedade dentro da qual alguém pode tomar-se justo e inteligente desse tipo de ordem social.
de modo prático, assim como na própria vida de Platão a liderança e Não há, portanto, nenhuma incompatibilidade entre dois dos meus
a participação na comunidade da Academia tinham sem dúvida conseguido propósitos ao propor uma compreensão daquilo que Aristóteles tem
suprir aquilo que, de outro modo, teria recebido através da participação para nos ensinar sobre justiça e raciocínio prático. Um desses objetivos
na atividade política. Mas a isso pode-se retrucar: e Sócrates? é insistir, na interpretação geral do pensamento de Aristóteles, na
importância de sua visão de que é dentro de um tipo específico de
Para Platão, Sócrates era, afinal de contas, o paradigma do ser humano contexto social que as virtudes intelectuais e morais dos seres humanos
justo e inteligente de modo prático. Entretanto, Sócrates certamente devem ser caracteristicamente exercidas e que, a não ser por certos
não aprendeu sua justiça e sua inteligência prática na pólis ateniense e aspectos desse tipo de contexto social, o conceito dessas virtudes deve
passou sua vida em desacordo com aqueles que representavam o que os na sua maior parte carecer de aplicação. O outro objetivo é alegar que
atenienses educados consideravam como justiça. Há duas respostas a as argumentações de Aristóteles são não apenas o resultado -- o resul-
essa objeção. Devemos, primeiramente, lembrar como, no Crítias, Sócrates tado final para ele, 0 resultado provisório para mim -- de uma seqüência
expressa seu senso de gratidão por uma dívida que é mais do que pode de pensamento que começa com Homero, mas que fomecem um esquema
ser pago à pólis e às suas leis, pela parte que tiveram na sua educação baseado no qual e através do qual pensadores posteriores podem estender
formal e informal. Mas mesmo que, diferentemente do próprio Sócrates, e continuar as pesquisas de Aristóteles de maneiras imprevisivelmente
o considerássemos como alguém cujas virtudes morais e intelectuais inovadoras e genuinamente aristotélicas.
não tivessem sido formadas através da participação na vida da pólis, não
precisamos tratá-lo como um contra-exemplo em relação ã tese de Minha tese é, obviamente, que os debates e conflitos pós-homéri-
Aristóteles no livro I da Política. cos, na sociedade ateniense dos século V e IV, geraram não apenas
uma tradição subseqüente, mas duas. Mas a tradição não-aristotélica,
Aristóteles, como a maioria dos gregos, reconhecia a existência de anti-aristotélica, cujos fundadores são os sofistas e Tucídides, deve
pessoas excepcionais que, elas próprias sendo habitantes de comunidades agora, para os propósitos de minha argumentação imediata, ser posta
num estado de relativa desordem, conseguiram exercer o papel de de lado. O que esta argumentação exige é que atentemos a dois outros
legisladores, oferecendo à sua pólis uma nova constituição e assim aspectos da filosofia de Aristóteles que mais tarde foram importantes
puderam ,estabelecer ou restabelecer possibilidades de virtude numa para que fosse capaz de gerar uma tradição de pensamento e pesquisa.
pólis que até então dela carecia. Assim tinham sido Sólon em Atenas O primeiro desses aspectos é uma característica da dialética tal como
e Licurgo em Esparta. E Sócrates pode ser considerado analogamente Aristóteles a compreendeu. Descrevi anteriormente como é que, através
como o fundador, em certo sentido, de uma comunidade filosófica cuja da argumentação dialética, chegamos à formulação dos primeiros
estrutura Platão institucionalizou na Academia. Reconhecer que a principios, as archái de toda pesquisa ou corpo de pensamento científico.
Academia ou o Liceu podiam, em certa medida pelo menos, cumprir as E é também através do uso da argumentação dialética que construímos
funções que Aristóteles atribui apenas ã pólis não é irrelevante. Pois, as estruturas dedutivas que ligam as archái às verdades subordinadas,
justamente porque a compreensão de Aristóteles da natureza da justiça derivadas delas, numa hierarquia explicativa.
e do raciocínio prático enraíza-os tão completamente no contexto das
práticas da pólis, seria demasiadamente fácil concluir que nas sociedades A estrutura acabada de uma ciência completa é, portanto, uma ar-
como as nossas, que não só não são organizadas na forma de uma gumentaçáo demonstrativa desenvolvida, que vai das primeiras verdades
pólis, mas para cujas culturas o conceito de uma pólis é bastante estranho, fundamentais, que devem sempre ser verdadeiras em relação ao as-
o que Aristóteles tem a dizer sobre justiça e raciocínio prático deve ser Sllnto da ciência particular, às suas últimas conseqüências no domínio
irrelevante. Mas se pelo menos as características da pólis, que são dos fenômenos. Os comentadores que não atribuíram importância
minimamente necessárias para o exercício da justiça e da racionalidade Suficiente ao fato de que a compreensão de Aristóteles desse tipo de

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