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1 - Filtração glomerular................................................................................................ 2
3 – Proteinúria...............................................................................................................45
As estruturas que denominamos glomérulos foram descritas pela primeira vez por Marcello
Malpighi em 1662, sendo conhecidas durante muito tempo pelo nome de "corpúsculos de Malpighi". Já
no século XIX, Carl Ludwig formulou a teoria, que se provou correta, de que ocorre no glomérulo um
processo de ultrafiltração do plasma, no qual a água, os eletrólitos e as pequenas moléculas passam ao
espaço de Bowman, enquanto os elementos figurados do sangue e as proteínas dissolvidas no plasma
ficam retidos. A energia para essa ultrafiltração provém do trabalho cardíaco, conforme corretamente
intuído por Ludwig. À luz dos conhecimentos de que dispomos hoje, é notável que essa teoria tenha sido
proposta já naquela época, muito antes de que as pressões hidráulicas e os fluxos pudessem ser
determinados na microcirculação renal. No entanto, a necessária comprovação experimental dessa teoria
veio surgir apenas em 1924, quando se verificou que o fluido presente no espaço de Bowman continha
glicose e cloreto, mas não proteínas, o que comprovava a teoria de que aquele fluido era um ultrafiltrado
do plasma. Esse achado, amplamente confirmado mais tarde, estabeleceu em definitivo o conceito de
ultrafiltração glomerular como fenômeno físico e sua importância enquanto evento inicial no processo
de formação de urina.
A magnitude da filtração glomerular é impressionante: em um adulto normal do sexo masculino,
a taxa de filtração glomerular – mais conhecida por ritmo de filtração glomerular (RFG) – aproxima-se
de 120 ml/min (equivalente à somatória das taxas de filtração dos 2 milhões de glomérulos que
constituem o rim humano), o que corresponde a mais de 170 litros por dia. Isso significa que,
considerando um volume plasmático de 3 litros, a totalidade do plasma é filtrada mais de 50 vezes no
decorrer de um único dia. Essa imensa quantidade de fluido, depois retomada na sua quase totalidade
pelos túbulos, permite aos rins depurar continuamente o plasma de catabólitos indesejáveis, bem como
reagir prontamente a excesso ou carência de água e eletrólitos, tornando-se assim capazes de manter a
homeostase do meio interno. Tamanha é a importância da filtração glomerular que existem no rim
mecanismos precisos para mantê-la constante – autorregulação da taxa de filtração glomerular (ver
adiante). Além disso, cada néfron é capaz de aumentar de modo independente a sua taxa de filtração
caso ocorra uma redução da massa renal (ver adiante e também o Capítulo 15).
Enquanto o processo de filtração glomerular é indispensável à formação da urina e às múltiplas
funções reguladoras dos rins, a medida do RFG é essencial ao clínico como indicador básico da função
renal. A detecção de uma queda do RFG pode ser decisiva para a adoção imediata de medidas de
suporte como a diálise, ou simplesmente para indicar a existência de uma anomalia renal em progressão.
Já um aumento do RFG pode refletir a presença de uma alteração metabólica como a diabetes mellitus,
ou servir de indicador de recuperação de uma patologia renal primária, como uma glomerulonefrite
aguda.
1. a diferença de pressão hidráulica através das paredes glomerulares, ∆P. Essa diferença pode ser
expressa como ∆P= PCG-PEB, onde PCG representa a pressão hidráulica intraglomerular e PEB a
pressão hidráulica no espaço de Bowman. É um determinante bastante intuitivo, uma vez que o
próprio senso comum prevê que qualquer filtro doméstico necessita de uma “pressão” (na verdade
uma diferença de pressão entre o reservatório de água e a atmosfera) para que a água se movimente
de um lado a outro de sua parede.
PEB πEB PEUF= PCG - PEB-πEB
PCG πGC
Figura 1. 1 – Representação esquemática das duas forças que governam a ultrafiltração glomerular
(o glomérulo é aqui idealizado como um único capilar, de formato perfeitamente cilíndrico)
É evidente que, para que ocorra o processo de ultrafiltração, a PEUF deve ser superior a zero. Isso é o
que acontece ocorre ao longo da maior parte do capilar glomerular. No entanto, como a filtração é
um processo dinâmico, que ocorre continuamente à medida que o plasma percorre o capilar
glomerular, e como as proteínas são quase totalmente retidas, a concentração plasmática de
proteínas, CA (e conseqüentemente π), eleva-se continuamente com a distância. Essa situação é
melhor descrita na Figura 1.2. Pode-se observar que a PEUF, sempre representada pela distância entre
as duas curvas, diminui continuamente à medida em que nos afastamos da origem do capilar,
chegando a valores próximos de zero ao final do mesmo. Observe que nesta e em outras figuras a
distância x aparece normalizada, ou seja, varia de zero (origem do capilar) a 1 (fim do capilar). Em
conseqüência dessa variação contínua, a PEUF de cada glomérulo é sempre uma média,
matematicamente equivalente à área delimitada pelas duas curvas representadas na Figura 1.2.
60
50
40
mmHg
30
20
10
0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Distância
Figura 1.2 – Representação gráfica esquemática da variação da diferença de pressão hidráulica (∆P, linha reta) e da pressão
oncótica (π, linha curva) em função da distância em relação à origem do capilar
3. A variação de π com a distância, bem como a forma da curva que a descreve, ajudam a entender a
natureza do terceiro determinante da ultrafiltração glomerular, o fluxo plasmático glomerular,
representado por QA. A razão por que o QA influencia tão profundamente a FPN não é
60 60 imediatamente
óbvia, uma vez que
50 50 o QA é ele próprio
um fluxo, e não
40 40 uma força capaz de
mmHg
determinar um
mmHg
30
30 fluxo, como o são
∆π. Para entender
20 20
a influência do QA
10
sobre a FPN é
10
necessário
0 observar seu efeito
0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 sobre a curva que
Distância
Distância representa π em
Figura 1.3 – Representação gráfica esquemática da influência de um aumento (A) e de uma redução função de x
(B) do fluxo plasmático glomerular (QA) sobre o perfil de variação da pressão oncótica (Figura 1.3A). Um
intraglomerular (π).O perfil de π em condições normais é dado pela linha pontilhada, para efeito de aumento de QA
desvia essa curva para a direita, indicando uma elevação mais lenta da pressão oncótica com x. O
efeito inverso é observado com a redução de QA (Figura 1.3B). A razão para essa dependência é
simples: quanto maior o fluxo intracapilar, tanto menor, proporcionalmente, será a influência, sobre
o plasma, da filtração glomerular. Fica mais fácil entender essa relação se imaginarmos as situações
extremas: se QA chegasse a, por exemplo, 1000 vezes o valor normal, a taxa de filtração naquele
glomérulo não tenderia a infinito, mas atingiria um máximo, já que é impossível à PEUF atingir valor
maior do que o correspondente ao retângulo de lados ∆P e x=1. Nesse caso, mesmo esse FPN
máximo tenderia a tornar-se uma fração diminuta do QA, o que faria com que as proteínas
plasmáticas praticamente não fossem concentradas. Se, ao contrário, QA tender a zero, o mesmo
ocorrerá com a FPN, já que este evidentemente não pode exceder QA, levando então a concentração
plasmática de proteínas a valores muito altos.
1. ∆P
O efeito da variação do ∆P sobre a FPN é bastante previsível: uma elevação do ∆P faz aumentar em
cada ponto do capilar glomerular a diferença entre ∆P e π. Desse modo, ocorre um aumento da área
compreendida entre as duas curvas, a qual, como vimos, é proporcional à PEUF, levando portanto a um
aumento da FPN. A filtração glomerular é portanto um processo extremamente dependente de ∆P, ou
seja presso-dependente. Note observando a Figura 1.4A que a curva correspondente a π
60 60
50 50
40 40
mmHg
mmHg
30 30
20 20
10 10
0 0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Distância Distância
Figura 1.4 – Representação gráfica esquemática da influência de uma elevação (A) e de uma queda redução (B) da diferença de
pressão hidráulica através da parede glomerular (∆P) sobre o perfil de variação do próprio ∆P e da pressão oncótica intraglomerular
(π).Os perfis de ∆P e π em condições normais são dados pelas linhas pontilhadas, para efeito de comparação
também se desloca para cima, refletindo o aumento da filtração em cada ponto do glomérulo É evidente
ainda que ocorrerão alterações inversas se ∆P baixar. Há no entanto um limite inferior para o valor de
∆P (Figura 1.4B). Esse limite é representado pela pressão oncótica inicial do capilar glomerular, ou seja,
a pressão oncótica sistêmica. Quando ∆P baixa a esse ponto, a PEUF e a FPN vão a zero. É o que
acontece por exemplo em estados de hipotensão severa (ver adiante). Se ∆P pudesse cair abaixo da
pressão oncótica sistêmica, deveria em princípio ocorrer filtração reversa, ou seja, do espaço de
Bowman para o capilar glomerular. Esse movimento, no entanto, provocaria de imediato o colabamento
do folheto parietal da cápsula de Bowman, cuja parede flexível seria incapaz de sustentar o vácuo
resultante.
2. QA
Conforme discutido acima (Figuras 2.3A e 2.3B), o perfil de elevação da pressão oncótica
intraglomerular varia com a perfusão renal: quanto mais alto o QA, mais deslocada para a direita estará a
curva que descreve π, e tanto maior será a PEUF. Diminuindo-se QA, a curva de π se deslocará para a
esquerda, aproximando-se da curva de ∆P e diminuindo a PUF. É importante lembrar que a pressão e o
fluxo intraglomerulares freqüentemente variam de modo simultâneo, podendo somar seus efeitos,
conforme veremos adiante.
3. Kf
Previsivelmente, a FPN cai quando se diminui o Kf glomerular em relação ao normal. Essa
60 60
50 50
40 40
mmHg
mmHg
30 30
20 20
10 10
0 0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Distância Distância
Figura 1.5 – Representação gráfica esquemática da influência de uma redução (A) e de um aumento (B) do coeficiente de
ultrafiltração glomerular (Kf) sobre o perfil de variação do próprio ∆P e da pressão oncótica intraglomerular (π).Os perfis de
∆P e π em condições normais são dados pelas linhas pontilhadas, para efeito de comparação
queda é no entanto bastante atenuada pela intensa alteração que sofre o perfil da variação de π. Com
reduções progressivas do Kf (Figura 1.5A), essa curva desloca-se cada vez mais à direita, uma vez que a
filtração cai ao longo de todo o capilar e, em conseqüência, as proteínas são menos concentradas nesse
percurso. Devido a esse comportamento da curva de π, a PEUF aumenta. Como no entanto o Kf havia
diminuído, o resultado final é a redução da FPN. Quando o Kf aumenta em relação ao normal (Figura
1.5B), há uma pequena tendência à elevação da FPN. Esse aumento é no entanto acompanhado de um
deslocamento para a esquerda da curva de π, reduzindo assim, progressivamente a PEUF e praticamente
anulando o efeito que teria sobre a FPN a elevação do Kf. Esse comportamento tem uma implicação
fisiológica importante: embora o rim consiga reduzir a FPN diminuindo o Kf, não é possível aumentar
substancialmente a FPN através de um aumento do Kf: é necessário modificar ∆P e QA por meio de
variações das resistências pré e pós-glomerulares (ver adiante).
4. CA
Uma queda da CA e portanto de π tem sobre a FPN
60 um efeito análogo ao de uma elevação de ∆P, o que não
chega a surpreender, já que ∆P e π têm efeitos opostos sobre
50
a filtração. No entanto, o perfil de variação de π é
40 completamente diferente neste caso, sendo sua concavidade
mmHg
100
à PCG, é aproximadamente constante. Ocorre então uma
segunda queda, desta vez na arteríola eferente, atingindo
50 pressões pouco superiores à pressão venosa, que se
transmitem para os capilares pós-glomerulares (capilares
0 peritubulares e vasa recta). O valor do platô
Figura 1.7 – Perfil de variação da pressão hidráulica na correspondente à PCG depende de dois fatores básicos: a) o
microcirculação glomerular (PA=pressão arterial, PCG=
pressão capilar glomerular, PE= pressão na arteríola nível da pressão arterial. b) a relação entre RA e RE. Uma
eferente, PC=pressão nos capilares pós-glomerulares) elevação da pressão arterial, com RA e RE constantes, faz-
se acompanhar de uma elevação proporcional da PCG. Se
mantivermos constante a pressão arterial e diminuirmos RA, a queda de pressão na arteríola aferente será
menor. Com isso, a PCG se eleva, aproximando-se da pressão arterial. Podemos entender melhor essa
relação imaginando uma situação limite, em que RA é nula. Nesse caso, o capilar glomerular estaria em
contato direto com a circulação sistêmica, e portanto a PGC seria idêntica à pressão arterial. Se, ao
contrário, fizermos RA infinita, teremos uma situação equivalente a uma “ligadura” da arteríola aferente.
Com isso, a PCG tenderia a valores próximos aos dos capilares peritubulares, pouco superiores ao da
pressão venosa periférica. O efeito da RE é análogo, exceto pelo sentido da variação de PCG:
aumentos/diminuições na RE sempre levam a elevações/reduções da PGC.
As alterações das arteríolas pré e pós glomerulares não influenciam apenas a PCG. Tanto os
aumentos de RA quanto os de RE levam a uma diminuição de QA, uma vez que o aumento de qualquer
resistor sempre dificulta o fluxo em um sistema hidráulico. Ocorre o inverso quando RA e/ou RE
diminuem. Esse efeito simultâneo das variações de RA e RE sobre o fluxo plasmático e a pressão
glomerulares reflete-se diretamente sobre a FPN. Há no entanto diferenças fundamentais entre os efeitos
dos dois resistores. Um aumento de RA leva ao mesmo tempo a uma diminuição do QA e da PGC. Em
conseqüência disso, a PEUF reduz-se drasticamente, levando a uma queda igualmente intensa na FPN. O
contrário ocorre quando a RA diminui, mostrando que a FPN é extremamente sensível a variações da
RA., o que se torna
150 evidente ao exame
50
da Figura 1.8A. Já a
40 influência da RE
100
sobre a FPN,
30
FPN
representada na
FPN
50
20 Figura 1.8B, é bem
mais complexa,
10
uma vez que, em
0 0 virtude de sua
0.0 1.0 2.0 3.0 0.0 1.0 2.0 3.0
localização, a RE
Ra Re
exerce efeitos
Figura 1.8 – Efeito das resistências aferente (RA, A) e eferente (RE, B) sobre a taxa de filtração glomerular
por néfron (FPN) opostos sobre QA e
∆P. Quando RE é
muito baixa, a PGC desce a níveis próximos de zero, que corresponderiam a uma filtração negativa se tal
fenômeno fosse fisiologicamente possível. Com valores crescentes de RE, a FPN sobe rapidamente.
Nesse trecho, a FPN responde de modo extraordinariamente rápido a variações da RE. No entanto,
aumentos ulteriores da RE pouco influenciam a FPN e podem até mesmo reduzi-lo se exagerados. A
razão para isso são os efeitos conflitantes do aumento da RE sobre o QA e a PGC, os quais acabam por
compensar-se mutuamente. Fica claro assim que as resistências pré e pós glomerulares têm efeitos
fisiológicos distintos: enquanto a RA exerce uma influência consistente sobre a FPN (um aumento de RA
sempre faz diminuir a FPN e vice-versa), o efeito da RE é bifásico. Essas características podem ter
profundo significado fisiológico e fisiopatológico, como veremos adiante.
AUTORREGULAÇÃO DO RFG
Enfatizou-se acima a importância da filtração glomerular como evento inicial e imprescindível à
formação de urina. Essa importância é tamanha que é necessária a existência de um mecanismo ou de
um conjunto de mecanismos para manter relativamente constante o RFG mesmo em face de amplas
variações da pressão arterial sistêmica. Em outras palavras, há necessidade de uma autorregulação do
RFG. Esse comportamento do RFG está ilustrado esquematicamente na Figura 1.8. Se a microcirculação
glomerular não passasse de um conjunto de dutos passivos, sem qualquer capacidade reguladora, uma
variação da pressão arterial levaria a uma variação linear do RFG, conforme indica a curva A. Se no
entanto tivermos uma autorregulação perfeita do RFG, a variação deste será representada pela curva B.
No trecho que podemos denominar região de autorregulação, o RFG permanece imutável. Fora desses
limites, o RFG varia de modo semelhante ao representado na curva A. Na prática, a autorregulação do
RFG não chega a ser perfeita, sendo melhor representada pela curva C. Isso significa que ocorre alguma
variação do RFG com a pressão arterial, muito menor no entanto do que a que seria observada na
AUTORREGULAÇÃO
300
ausência total de autorregulação (curva A). Podemos
250
dizer que a eficiência da autoregulação é máxima (ou
seja, aproxima-se de 1) no caso da curva B
200 (autorregulação perfeita), nula no caso da curva A
A (ausência de autorregulação) e intermediária (pouco
RFG, ml/min
1. Hipertensão arterial
3. Diabetes mellitus
Quando ocorre a obstrução parcial da artéria renal por um ateroma, por exemplo, é comum a
elevação da pressão arterial sistêmica. No entanto, a pressão de perfusão renal, ou seja, a pressão que o
rim hipoperfundido efetivamente “enxerga”, pode estar normal ou até baixa. Muitas vezes, a estenose é
bilateral, ou o paciente possui apenas um único rim. Se se baixar rapidamente a pressão arterial por
meios farmacológicos nesses pacientes, a pressão de perfusão renal pode cair a níveis muito baixos.
Nesse caso, os mecanismos de autorregulação do RFG entram em ação através da dilatação da arteríola
aferente. Se no entanto a queda na pressão de perfusão for muito intensa, a autorregulação chega ao seu
limite e o RFG cai. Se além disso a resistência eferente for diminuída pelo agente antihipertensivo
empregado (como é o caso das drogas que deprimem o sistema renina-angiotensina), a autorregulação
fica comprometida pela queda na PCG e a redução no RFG pode ser catastrófica. Por essas razões, o
tratamento farmacológico da hipertensão arterial e a escolha dos medicamentos anti-hipertensivos deve
ser feita com extremo cuidado nesses pacientes.
5. Glomerulonefrites
6. Síndrome nefrótica
A síndrome nefrótica, discutida em maior detalhe nos capítulos 3 e 9, inicia-se a partir de uma
excreção exagerada de proteínas na urina. Em conseqüência dessa perda, cai a concentração plasmática
de proteínas, o que por sua vez provoca o aparecimento de edema (por redução da pressão oncótica do
plasma) e produção excessiva de lipoproteínas (relacionada ao excesso de atividade biossintética do
fígado, primariamente destinada a compensar a perda de proteínas plasmáticas). Com relação à dinâmica
da ultrafiltração glomerular, é evidente que, não havendo alteração de outros determinantes, a baixa
pressão oncótica sistêmica deve elevar a PEUF e a FPN (Figura 1.6), já que a força oncótica opõe-se ao
processo de ultrafiltração. Essa hiperfiltração ocorre realmente em uma certa porcentagem de pacientes
nefróticos. Pode haver no entanto uma redução associada do Kf glomerular, como uma manifestação da
própria glomerulopatia, conforme indicam vários estudos experimentais. Essa associação antagônica
entre alterações de Kf e π pode explicar por que o RFG pode estar normal ou até deprimido nesses
pacientes, mesmo em face de uma PEUF que sabemos extremamente elevada.
Pode parecer contraditório que o Kf, que mede a condutância hidráulica da parede glomerular,
esteja diminuído em uma situação em que a permeabilidade da parede glomerular a proteínas está
aumentada,. Como é possível à parede glomerular ficar mais permeável a proteínas e menos permeável à
água, cuja molécula é muito menor? Na verdade, a contradição é apenas aparente: normalmente, a
parede glomerular oferece muito poucas vias para a travessia de macromoléculas, em contraste com a
abundância de caminhos disponíveis à passagem de água e pequenos solutos. Quando se abem vias
anômalas para a passagem de moléculas maiores, a permeabilidade a proteínas aumenta centenas de
vezes, mas o Kf é muito pouco influenciado (as novas vias represntam muito pouco em relação às já
disponíveis à passagem de água). Mesmo que ocorra uma redução substancial do Kf (por exemplo, de
50%), a permeabilidade a proteínas permanecerá muito alta comparada ao normal.(ver o capítulo 3 para
uma discussão mais aprofundada acerca dos mecanismos de proteinúria).
7. Choque hemorrágico
Quando um organismo superior perde rapidamente uma parcela significativa de seu volume
sangüíneo, os rins podem ser afetados de duas maneiras: 1) a pressão arterial pode cair bastante. 2)
mesmo que a PA esteja relativamente preservada, a microcirculação renal pode sofrer um violento
processo de vasoconstrição, particularmente nas arteríolas aferentes, como parte da tentativa do
organismo de defender a sua volemia. A baixa pressão de perfusão renal, associada ao aumento
predominante de RA, leva a uma queda acentuada no fluxo plasmático renal. Ao mesmo tempo, como a
PGC depende, como vimos, da PA e da proporção entre RA e RE, ocorre uma hipotensão intraglomerular
muito grande. O resultado final desse processo é uma queda acentuada do RFG, que pode aproximar-se
de zero. Essas alterações funcionais fazem parte de um quadro genericamente denominado insuficiência
renal aguda, analisado em detalhe no Capítulo 14.
8. Obstrução urinária
Em certas situações, as vias urinárias podem ser bloqueadas mecanicamente por cálculos,
tumores ou outros processos patológicos. Como seria de se esperar intuitivamente, ocorre nesses casos,
ao menos em um primeiro momento, uma elevação muito acentuada da pressão hidráulica da via
urinária obstruída. Essa elevação transmite-se retrogradamente aos túbulos renais, até que todo o
sistema, incluindo o espaço de Bowman, esteja à mesma pressão. Nesse momento PGC≅PEB e portanto
∆P≅0. Desse modo, a dinâmica da ultrafiltração glomerular comporta-se aproximadamente como no
caso do choque hipovolêmico, conforme analisamos acima. No entanto, devemos lembrar que naquele
caso ∆P reduzia-se devido à queda da PGC, enquanto que na obstrução urinária ela se reduz em
conseqüência da elevação da PEB. Se a obstrução urinária persistir, a FPN continuará baixo. Muda no
entanto o mecanismo responsável pela depressão da FPN: nas obstruções prolongadas, a PGC cai, devido
à produção local de uma série de compostos vasoconstritores tais como a angiotensina II e o
tromboxane. Temos nesse caso um quadro semelhante àquele observado nos choques hipovolêmicos.
EXERCÍCIOS
Abra o programa “Determinantes da ultrafiltração glomerular”.
1. Varie o fluxo plasmático glomerular (QA) entre 50 e 500 nl/min e observe o comportamento da taxa de
filtração glomerular por néfron (FPN). Examine também a variação da PUF. Observe o esquema dos
determinantes da ultrafiltração glomerular, na poção central superior da tela. As setas representativas
(no alto da tela) são também dinâmicas. Clique em “EXERCÍCIOS” e construa um gráfico
descrevendo a relação entre FPN e QA baseando-se nos resultados obtidos para preencher o que falta na
tabela pré-existente. Como podemos descrever a relação entre QA e FPN?
2. Volte ao programa principal e pressione o botão “PADRÕES” a fm de atribuir a cada um dos
parâmetros seus respecivos valores de referência. Varie a seguir a diferença de pressão hidráulica
transglomerular (∆P) entre valores extremos e observe o comportamento da taxa de filtração
glomerular por néfron (FPN). Passe novamente à planilha "EXERCÍCIOS" e construa um gráfico
descrevendo a relação entre FPN e ∆P. Interprete. O que acontece com a FPN quando ∆P cai até
aproximar-se de 20 mmHg? Por que? Pode haver filtração reversa (do espaço de Bowman para o
capilar glomerular? Por que?)
3. De volta ao programa de ultrafiltração, varie o Kf e observe o efeito sobre o FPN. Há uma relação
linear entre FPN e Kf? Por que?
4. Simule uma síndrome nefrótica, fazendo baixar à metadedo normal a concentração plasmática de
proteínas (CA). O que acontece à FPN? Diminua agora o Kf glomerular. Como varia a FPN?
1. Varie a resistência aferente (RA), mantendo constante a eferente (RE) e observando seu efeito sobre ∆P,
QA e FPN. Qual é o comportamento do perfil de pressão hidráulica? Observe que a variação de RA e RE
está representada no alto da tela por uma construção gráfica que simula o efeito dos esfíncteres
arteriolares (as linhas cinzentas correspondem ao padrão de referência). Passe à planilha
“EXERCÍCIOS” e construa o gráfico FPN vs. RA preenchendo a tabela construída de antemão.
Interprete.
2. Volte ao programa principal e pressione “PADRÃO”. Varie a resistência eferente (RE), mantendo a
aferente (RA) constante, e observe seu efeito sobre ∆P, QA e FPN. Na planilha "EXERCíCIOS",
construa FPN vs.RE, da mesma maneira que nos casos anteriores. Qual dos dois resistores mais
consistentemente influencia o FPN? Qual a melhor estratégia de que o rim pode lançar mão para regular
a FPN?
3. Simule o processo de autorregulação renal. Varie a PA entre valores extremos do ponto de vista
fisiológico (70 a 150) e verifique o que acontece a cada um dos parâmetros representados na tela. Baixe
a PA para 70 e observe o que acontece à FPN. Procure agora variar RA e RE de modo a normalizar a
FPN e os demais parâmetros. Repita a operação com a PA em 150. Qual a maneira mais eficiente de
normalizar o RFG nessas circunstâncias?
4. No choque hemorrágico agudo, ocorre uma hipotensão severa, devido à perda de volume circulante. O
rim responde a essa situação com uma intensa vasoconstrição, principalmente da arteríola aferente.
Reproduza esquematicamente essa situação modificando adequadamente os parâmetros enumerados na
tela fazendo por exemplo PA=70, Ra=4 e Re=2 (modificar primeiro Re para evitar o aviso de filtração
reversa). O que acontece à FPN? E aos demais parâmetros?
5. Para encerrar, vamos simular o que acontece quando o rim perde parte de seus néfrons. Nesse caso, a
filtração por néfron aumenta para compensar a perda, apesar da inevitável queda na taxa de filtração
glomerular total (estudaremos esse processo em maior detalhe no capítulo de insuficiência renal
crônica). Eleve a PA para 130, coloque Ra em 1,0 e Re em 0,8 (vasodilatação predominantemente
aferente). Observe o que acontece à FPN e a seus determinantes.
organismo. Porém, além da manutenção homeostática, o rim também exerce importante papel
endócrino, sendo capaz de sintetizar diversos hormônios e substâncias vasoativas com efeitos
endócrinos, parácrinos e autócrinos. Assim, o rim sintetiza determinados hormônios que irão
atuar à distância, como por exemplo a eritropoietina, bem como substâncias que atuam dentro
do próprio rim (angiotensina II, endotelinas, cininas, prostaglandinas, óxido nítrico, etc).
Além disso, ele é alvo de outros hormônios produzidos à distância, incluindo o PTH, a
renina* - -
proliferação celular
calicreína*
A tabela 2 resume os hormônios que agem sobre o rim, salientando que vários
hormônios não têm local único de produção. Assim, a tabela apresenta os principais locais de
PRODUÇÃO NO RIM
mesangial,
↑ reabsorção de Na+
natriurese
noradrenalina) de Na+
sobre o substrato angiotensinogênio circulante libera angiotensina I, que por sua vez sofre
1).
angiotensinogênio
renina
angiotensina I
enzima conversora da
angiotensina I (ECA) = cininase II
angiotensina II
efeitos biológicos
aldosterona
Efeitos Biológicos
Angiotensinogênio
outros tecidos também sejam capazes de sintetizá-lo, incluindo o cérebro, rim, coração,
Renina
embora não exclusiva, fonte de renina ativa. Produzida inicialmente como pre-pró-renina,
renina determina não apenas a geração de AII na circulação sistêmica, mas também a local.
Como veremos adiante, várias são as ações da AII no rim, porém vale ressaltar que a
glomérulo, onde a renina é principalmente sintetizada e armazenada, e pela mácula densa que
inclui células do túbulo contorcido distal em uma região onde o túbulo distal se aproxima
mesângio
extraglomerular
AE
integrante do AJG.
autorregulação do ritmo de filtração glomerular (RFG) (ver Capítulo 1). Acredita-se que essa
função envolva a detecção, por parte das células da mácula densa, do fluxo de NaCl que
chega a esse segmento do néfron. De acordo com essa hipótese, um aumento do RFG leva a
Além de seu efeito sobre o processo de filtração glomerular, o AJG tem papel
causados por situações em que se requer um aumento da síntese de AII, como por exemplo
uma queda do volume sangüíneo efetivo, da pressão arterial ou do volume de fluido corporal
total. Os dois mecanismos principais que regulam a liberação de renina são a carga de sódio
que chega à mácula densa no túbulo distal e os barorreceptores situados na arteríola aferente.
fatores de crescimento: TNF, IL-1, IGF, TGFβ Peptídeos: ADH, ANF, endotelina
angiotensina II, também inativa a bradicina (hormônio vasodilatador), sendo por isso também
denominada cininase II. A enzima conversora distribui-se por todo o organismo, sendo mais
7
abundante no pulmão, rim, duodeno, íleo e útero. Sua molécula apresenta-se ligada às
membranas celulares, com seu sítio ativo exteriorizado. No rim a ECA localiza-se
AII. No entanto, como não estão ainda disponíveis inibidores específicos da renina, o
Angiotensina II
de laboratório eleva de imediato em 30-50 mmHg a pressão arterial sistêmica. Além desse
sede, conforme discutido acima. Evidências mais recentes indicam ainda que a angiotensina II
Capítulo 10).
Receptores de Angiotensina II
superfície celular e produz uma variedade de efeitos fisiológicos. São atualmente conhecidos
dois subtipos genéricos destes receptores, denominados AT1 e AT2. De acordo com as
8
fisiologia celular. Já a função do receptor AT2 é ainda obscura. Praticamente todos os tipos
celulares renais possuem receptores de AII, sendo a maior densidade desses receptores
observada nas células mesangiais. A densidade desses receptores varia inversamente com a
concentração local de AII: altas concentrações de AII levam a uma redução da densidade de
inverso (“upregulation”). Esse fenômeno, que permite a modulação dos efeitos da AII (ou
seja, torna menos bruscos esses efeitos) é descrito com relação a vários outros tipos de
celular.
Seguindo-se à ligação da AII com seu receptor, desencadeia-se uma cascata de eventos
comum à maioria dos tecidos-alvo. Há, primariamente, uma alteração na proteína G (proteína
reguladora associada ao receptor) que ativa a enzima de membrana fosfolipase C (PLC). Esta
(DAG), que agem dentro da célula na regulação de várias funções. O IP3 promove o aumento
Ca2+ dos estoques intracelulares, enquanto o DAG, juntamente com as altas concentrações de
Ca2+, ativa a proteína quinase C (PKC) ligada à membrana. Um dos principais efeitos
cadeia leve da miosina, passo necessário para contração do músculo liso. Uma vez cessado o
estímulo promovido pela AII, a [Ca2+]i retorna ao nível basal através de tamponamento
secreção, a aldosterona atinge o rim, via circulação, atuando principalmente sobre as células
5). O resultado desses efeitos é a retenção de Na+ e de água, o que tende a trazer o volume
componentes sistêmicos. Assim, a AII que atua no rim pode ser derivada tanto da circulação
sistêmica como da produção local. Além da vasoconstrição das artérias intra-renais, a AII
possui importantes efeitos sobre a contração da célula mesangial, sobre a absorção tubular de
prostaglandinas e o NO.
resulta com freqüência em uma marcante redução do RFG (ver Capítulo 1).
A AII eleva a resistência vascular renal, levando à diminuição do FPR, com redução
proporcionalmente menor do RFG. Isso ocorre porque a AII apresenta uma relativa
de ultrafiltração (PUF) (ver Capítulo 1). Esse aumento da PUF contrabalança o efeito do
decréscimo do FPR induzido pela AII, permitindo que o RFG se mantenha quase inalterada,
levando assim a um aumento da fração de filtração. Essa efeito seletivo da AII sobre a
arteríola eferente pode ser devido a uma diferença entre esses dois vasos com relação à
prostaciclina pela arteríola aferente e não pela eferente após estímulo com AII. Além disso, a
prostaglandinas.
Outra importante ação de AII com repercussão sobre o RFG ocorre na célula
receptores para AII e contraem-se quando estimuladas pela AII. A contração das células
1). Assim, o efeito final da AII sobre o RFG é resultado de múltiplos fatores, incluindo a
redução do FPR, o aumento da PUF e a redução do Kf. Portanto, o resultado final dependerá de
como e quanto esses fatores estão respondendo à AII. De modo geral, a administração aguda
de doses farmacológicas de AII em animais de laboratório tem pouco efeito sobre o RFG,
túbulo proximal, acredita-se que esse equilíbrio resulte de alterações nas forças de Starling
(ver Capítulo 9) peritubulares, por sua vez influenciadas pelos hormônios que agem sobre os
promovido pela AII leva ao aumento da reabsorção de fluido isotônico pelo túbulo proximal e
é responsável, pelo menos em parte, pela redução substancial na excreção renal de NaCl que
da pressão arterial sistêmica induzida pela AII pode aumentar a excreção de sódio. Essa
"natriurese pressórica" (ver Capítulo 10) pode estar relacionada, em parte, a alterações
mudanças nas forças de Starling peritubulares e no interstício renal, podendo funcionar como
aumenta diretamente o transporte tubular de sódio no túbulo proximal, cujas células possuem
receptores para AII. Este efeito é mediado principalmente por um aumento da atividade do
trocador Na-H, essencial à secreção tubular de íons H+ (ver Capítulo 12) e responsável por
cardíaca na hipertensão arterial. Atualmente sabe-se que o efeito proliferativo da AII também
extracelular.
Aldosterona
aldosterona, podendo haver ainda um efeito direto, estimulador, dos íons K+. Sua ação
ductos coletores cortical e medular. A célula envolvida na absorção de sódio mediada pela
aldosterona é a célula principal (ver Capítulo 5). Por agir nos segmentos finais do néfron, a
Capítulo 5).
um canal de sódio que é especificamente inibido por baixas doses do diurético amiloride (ver
gradiente elétrico favorável ao transporte de K+ da célula para a luz tubular. Por outro lado, a
através da membrana baso-lateral para o interior da célula. Por último, a aldosterona também
responsáveis pela via de secreção de K+. O resultado final desses efeitos é um aumento na
Diretamente, por sua ação na célula principal, promovendo a absorção de sódio e criando um
gradiente elétrico favorável para as células intercaladas α secretarem hidrogênio. Além disso,
Em resumo, a aldosterona, por sua ação nas células principais do túbulo coletor,
não só entre os seus próprios componentes, mas também com outros hormônios e sistemas. A
Hipertensão
ANGIOTENSINA II
retenção de Na+
volume extracelular
aparelho justaglomerular
catecolaminas
liberação de renina
feedback túbulo-glomerular
(mácula densa)
outras formas de hipertensão como na hipertensão arterial essencial também ocorre em uma
parcela dos pacientes (~20%), nos quais a atividade da renina plasmática encontra-se elevada.
• Nefropatia diabética
e proteinúria.
Há muito que se especula sobre um possível papel da AII na insuficiência renal aguda
(IRA) (ver Capítulo 14). Em muitos casos, a IRA evolui com hipertrofia do aparelho
vários modelos experimentais, incluindo a IRA nefrotóxica pelo glicerol, cloreto de mercúrio,
16
aminoglicosídeos e ciclosporina, bem como na obstrução ureteral, isquemia renal e nefrite por
soro nefrotóxico.
de ácidos graxos poliinsaturados, sendo o ácido aracdônico (AA) o principal substrato para a
um ácido graxo essencial, ou seja, tem na dieta sua única fonte. Após sua formação, ele é
principais são responsáveis pela metabolização do AA, com formação de produtos ativos: a
via da ciclooxigenase, que leva à formação das prostaglandinas (PGs), a via da lipooxigenase,
que resulta na síntese dos ácidos mono, di- e tri-hidroxi-eicosatetraenóico (HETEs) e dos
17
leucotrienos (LTs) e a oxigenação mediada pelo citocromo P-450 pelas epoxigenases, que
FOSFOLÍPIDES DE MEMBRANA
FOSFOLIPASES
A2 (PL2) e C (PLC)
DHETs LEUCOTRIENOS
ac. graxos ω-hidroxilados B4, C4, D4, E4
PROSTAGLANDINAS
TROMBOXANES
instáveis (PGG2 e PGH2), que são convertidos posteriormente em metabólitos ativos: a PGI2
túbulo coletor cortical. Com exceção da PGI2, a síntese de PGs é bem maior na medula renal,
sendo responsável em sua maior parte os túbulos coletores medulares, as células intersticiais e
talvez a porção espessa ascendente da alça de Henle. Nos humanos, o glomérulo e as células
18
tromboxano. A síntese das PGs pode ser estimulada pela suplementação dietética do ácido
linoléico, por agentes que reforçam a atividade das fosfolipases, como a bradicinina, a
mesangial e sobre a absorção de água e sódio. De forma geral, as prostaglandinas podem ser
condições normais, a ação vascular desses compostos quase não interfere com a regulação do
tônus vascular renal, como se pode inferir pelo fato de que o uso sistêmico de
de que vasoconstritores como a AII, vasopressina, norepinefrina, bem como as condições que
hepática, induzem o aumento da produção de PGs vasodilatadoras que, por sua vez,
FPR.
Além de sua influência sobre a resistência vascular, as PGs podem afetar o RFG
mediante sua ação sobre as células mesangiais. Essas células contraem-se em resposta a
plaquetas, levando a uma diminuição do Kf. Essa contração é antagonizada pela síntese e
liberação de PGE2 e PGI2, que ocorrem nas células mesangiais em resposta a esses agentes
excreção de sódio por uma série de efeitos, o principal dos quais parece ser uma inibição
direta de seu transporte tubular na porção espessa ascendente da alça de Henle, no túbulo
Henle (ver Capítulo 4). 2) aumento do fluxo sangüíneo medular, resultando em uma
atividade da PKC. Como a vasopressina promove a formação de PGs, ela acaba inibindo, num
uréia na porção final dos túbulos coletores, reduzindo portanto o gradiente osmótico medular.
20
ciclooxigenase, têm pouco efeito sobre a função renal normal, sendo porém de fundamental
tornam-se evidentes quando sua síntese é inibida na vigência desses distúrbios. As PGs
do néfron.
3) ENDOTELINA
Em 1988, foi isolada e purificada uma substância derivada do endotélio, cujo poder
vasoconstritor chegava a ser 10 vezes maior do que o da angiotensina II, o que a tornava o
mais potente vasoconstritor endógeno até então descoberto. Essa substância, demonstrou-se,
era um peptídeo formado por 21 aminoácidos, tendo sido denominada endotelina (ET). Sabe-
se atualmente que existe uma família de endotelinas, designadas ET-1, ET-2, ET-3 e
renal de íons, regula a síntese de eicosanóides e modula a liberação de renina e do fator atrial
A endotelina pode ser sintetizada em outros locais além das células endoteliais,
incluindo o rim, pulmão, baço, músculo esquelético e cérebro. No rim, a produção e liberação
diferentes animais. Dentre elas, merece destaque a síntese e liberação de ET pelas células
A endotelina age pela interação com receptores específicos (ETA e ETB), ligados à
proteína G e que, tal como outros vasoconstritores, utilizam como vias de transdução de sinais
estejam localizados tipicamente nas células do músculo liso vascular e os receptores ETB nas
células endoteliais, eles são distribuídos de forma abundante em todo o organismo. No rim,
verificou-se que o mRNA do receptor ETB é encontrado principalmente nos ductos coletores e
glomérulos, enquanto o mRNA do receptor ETA aparece no sistema vascular e também nos
glomérulos. O receptor ETA medeia a maior parte da vasoconstrição induzida pela ET-1,
4) SISTEMA CALICREÍNA-CININAS
cininase I e a cininase II (que também vem a ser a enzima conversora de angiotensina I, ECA)
caracterizados com base na enzima calicreína, que existe nas formas plasmática e tissular (ou
glandular).
peso molecular, do qual libera um nonapeptídeo, a bradicinina. A calicreína tissular, por sua
vez, age sobre cininogênios de alto ou baixo peso molecular, liberando o decapeptídeo lisil-
bradicinina ou calidina.
túbulos conectores e do ducto coletor cortical, cuja proximidade anatômica com o aparelho
justaglomerular tem sido observada de forma consistente, sugerindo que o sistema calicreína-
A ativação da calicreína tissular no ducto coletor cortical inicia uma cascata que gera
as cininas bioativas. Seus principais efeitos celulares são mediados pela ativação da PKC e
pela produção de PGE2. No rim, vários efeitos têm sido atribuídos às cininas, entre os quais o
inibição, no túbulo coletor, da absorção de sódio e do efeito do HAD. Este último é mediado
pela supressão da sintese de cAMP, seja diretamente, através da ativação da PKC, seja
produção de PGE2 por parte das células do interstício renal, aumentando a concentração desse
composto na medula renal. Esse aumento da produção de PGE2 pelas células intersticiais
23
reforça ainda mais a ação diurética e natriurética das cininas, podendo ainda influir na
vasodilatação renal promovida por esses compostos. Por outro lado, a ação vasodilatadora das
nítrico.
proximal, remove dipeptídeos carboxi-terminais das cininas. A encefalinase parece ser tão
II e manter constante a resistência vascular renal. Entretanto, apesar do grande progresso que
informações ainda são escassas com relação aos eventos fisiológicos e fisiopatológicos
hepática, na qual ocorre redução dos níveis de cininas circulantes, o que poderia interferir na
regulação do fluxo plasmático renal e na excreção renal de sódio. Outra situação em que esse
sistema parece influir é a hipertensão arterial, uma vez que a redução dos níveis de cininas
pode contribuir para a retenção de sódio e portanto para a elevação da pressão arterial. Além
disso, na vigência de tratamento com inibidores da enzima de conversão (ou cininase II),
Em resumo, o sistema das cininas influencia a hemodinâmica renal, por sua ação
vasodilatadora, bem como o transporte renal de sódio e água, com conseqüente ação diurética
e natriurétrica. Esses efeitos são, pelo menos em parte, mediados pela PGE2 (diurese e
natriurese) e pelo óxido nítrico (vasodilatação). Sua principal interação com o sistema renina-
angiotensina é determinada pela enzima conversora ou cininase II, que além de liberar
5) ÓXIDO NÍTRICO
endotélio (EDRF), é um radical livre com potente efeito vasodilatador. Sua síntese é iniciada
a partir a partir do substrato L-arginina, pela ação da enzima óxido nítrico sintase (NOS),
Sendo um radical livre, o NO reage rapidamente com o oxigênio tanto na fase gasosa
como em solução aquosa, formando o gás dióxido de nitrogênio na forma gasosa (NO2) ou
NO2- e NO3- em solução. Mais estáveis, o NO2- e o NO3-podem ser dosados e servem como
constitutiva (cNOS) e a outra induzível (iNOS). A cNOS é uma forma da enzima que, embora
esteja sempre presente em determinadas células, permanece quiescente até que algum
estímulo (acetilcolina, bradicinina, “sheer stress”, etc) a ative através da elevação do cálcio
(nNOS ou bNOS, sendo que a letra b refere-se a cérebro, brain em inglês). A forma induzível
(iNOS) por outro lado, é sintetizada “de novo” quando da ocorrência de um estímulo
incluindo endoxinas bacterianas, citocinas, etc. O estímulo para a síntese do mRNA da iNOS
menores àquelas necessárias à ativaçao das cNOS. A tabela 4 apresenta a distribuição da NOS
em células e tecidos.
adrenal endocárdio
endocárdio miocárdio
miocárdio hepatócitos
plaquetas linfócitos
cérebro fibroblastos
células mesangiais
NO, atuando tanto sobre a forma constitutiva como sobre a forma induzível da enzima.
26
Após sua síntese, o NO exerce seus efeitos através de diversas vias, sendo a mais
comum a ativação da enzima guanilato ciclase, responsável pela formação de GMP cíclico
(cGMP). O cGMP, por sua vez, induz modificações na concentração de cálcio intracelular
bem como na atividade de várias proteíno-quinases, resultando na maioria dos efeitos do NO,
transmissão.
facilmente comprovado pelo bloqueio, agudo ou crônico, da síntese de NO, que repercute
sobre a microcirculação renal ,com aumento das resistências arteriolares aferente e eferente e
São também verificados efeitos do NO sobre o transporte tubular de solutos, uma vez
que estímulos para a produção endógena de NO são acompanhados por aumentos do FPR e da
natureza dessa participação seja controversa. Além de sua ação vasodilatadora, o NO exerce
imunológicas, e um efeito citotóxico, que pode ter importância na defesa contra infecções e
células tumorais. Por apresentar múltiplas funções, o NO pode tanto exercer um papel protetor
como participar da patogênese de doenças renais, como por exemplo a nefropatia diabética.
inibição tenha papel importante em vários eventos caracterizados por vasoconstrição. Entre
27
esses eventos, destaca-se a pré-eclampsia, uma patologia causada primariamente por dano da
mostram que a inibição crônica do NO em ratos causa hipertensão sistêmica severa, enquanto
arterial (ratos Dahl sal-sensíveis), causou redução significante da pressão arterial. Por outro
choque séptico, uma vez que a infusão de endotoxina bacteriana promove um aumento
acentuado nos níveis séricos e urinários de NO2- e NO3-, um efeito provavelmente mediado
Em resumo, diversas células renais são capazes de sintetizar o óxido nítrico, tanto na
sua forma constitutiva como na induzível. Com potente ação vasodilatadora, o NO participa
Com ação endócrina, o ANF apresenta vários efeitos biológicos os quais dependem de
sua interação com receptores específicos, presentes no rim, glândula supra-renal, cérebro e
28
vasculatura. Três tipos de receptores para ANF são descritos, sendo que dois deles são
ações biológicas do ANF, mediadas pelo aumento do cGMP, após a interação hormônio-
efeitos biológicos, mas são receptores de “clearance”, ou seja, são responsáveis pela
No rim, após a interação com os receptores ANP-R1, o ANF induz um aumento rápido
secreção de renina, o que irá resultar em redução dos níveis de AII e consequentemente de
aldosterona, contribuindo para o efeito natriurético do ANF. Pode ainda haver um efeito
elucidado. Na síndrome nefrótica os níveis do ANF podem estar baixos, devido a uma
expansão da volemia (ver Capítulo 9). Em qualquer caso, a resposta renal ao ANF está
CAPÍTULO 3: PROTEINÚRIA
Roberto Zatz
O mecanismo pelo qual ocorre esse processo tão seletivo de ultrafiltração nos
glomérulos (e também na maioria dos demais capilares do organismo) não é imediatamente
óbvio e constituiu-se durante muito tempo em um mistério a desafiar os estudiosos da
microcirculação. Por que a parede capilar é capaz de discriminar entre moléculas de solvente
e pequenos solutos, de um lado, e macromoléculas, de outro? Uma das primeiras hipóteses
formuladas para tentar explicar essa discriminação foi a de que as macromoléculas não
conseguem, devido precisamente às suas dimensões, atravessar a parede glomerular. Essa
hipótese foi reforçada pelo achado experimental, já nos anos 30, de que proteínas de peso
molecular relativamente baixo, como a ovalbumina e fragmentos de imuniglobulinas
2
1 O clearance fracional CFx de uma substância x é definido como CFx=Cx/RFG., onde Cx representa o clearance de x. Sendo
este definido como Ux⋅V/Px, podemos escrever CFx=(Ux⋅V)/(Px⋅RFG). No caso de uma substância não reabsorvida ou
secretada pelos túbulos, Ux⋅V (carga excretada) é idêntico a Fx⋅RFG (carga filtrada), onde Fx representa a concentração de x
no filtrado glomerular. Substituindo, temos CFx=(Fx⋅RFG)/(Px⋅RFG) e portanto CFx=Fx/Px. Assim, o clearance fracional de
uma substância x, não reabsorvida ou secretrada nos túbulos, é idêntico à relação entre as concentrações de x no filtrado
glomerular e no plasma, o que é uma medida da permeabilidade glomerular a x.
3
1,00
0,80
DEXT RAN
NEUT RO
0,60
C D /RFG
DEXT RAN
SULFAT O
0,40
0,20
0,00
0 10 20 30 40 50 60
r, Å
Fig. 3.1 – Representação esquemática de uma curva de discriminação de moléculas de dextran neutro em um capilar. No eixo das
abscissas está representado o raio molecular em Å, e nas ordenadas o clearance fracional correspondente (Cd/RFG)
filtração de moléculas de albumina, cujo diâmetro é pouco inferior ao dos poros menores.
Influenciaria mais ainda a filtração de moléculas maiores, como as de imuniglobulinas, que
não têm como atravessar os poros pequenos.
É importante notar que, embora a teoria dos poros descreva de modo bastante
razoável a filtração de moléculas neutras através das paredes glomerulares, não se conseguiu
descrever até hoje, mesmo utilizando métodos sofisticados como a microscopia eletrônica,
quaisquer estruturas que pudessem ser identificadas a esses poros. É provável que os
“poros” não existam como as estruturas cilíndricas idealizadas nos anos 50, mas como
passagens entre as longas moléculas fibrosas de colágeno e proteoglicans que constituem a
membrana basal glomerular (ver adiante). Pode-se demonstrar que nesse caso o
comportamento de curvas teóricas como a representada na Fig 3.1 não seria essencialmente
modificado.
O conceito de que existe nas paredes capilares uma população heterogênea de poros
firmou-se e persiste até hoje, com pequenas modificações que não chegam a alterar sua
essência. No entanto, a teoria dos poros, tal como formulada nos anos 50, ainda não
conseguia explicar um achado experimental importante: a filtração de proteínas como a
4
albumina plasmática ocorria em magnitude muito inferior àquela observada para moléculas
sintéticas neutras, tais como o dextran, de peso molecular semelhante. Mais recentemente,
estudos realizados com moléculas modificadas de dextran vieram ajudar a compreender
melhor o significado daquelas observações. Quando à molécula de dextran se acrescentavam
radicais sulfato (dextran sulfato), conferindo-lhe uma densa carga negativa, a magnitude de
sua filtração através do glomérulo era sempre menor do que a de dextran neutro, o qual é
desprovido de cargas elétricas. Essas moléculas eletronegativas de dextran assemelham-se às
1,00
0,80
D EXT RAN
N EUT RO
0,60
C D /RFG
DEXT RAN
SULFAT O
0,40
0,20
0,00
0 10 20 30 40 50 60
r, Å
Figura 3.2 – Representação esquemática das curvas de discriminação de dextran neutro e dextran sulfato, mostrando maior restrição à
filtração deste último
BAIXO P M AL B IgG
100
1.00 6000
90 5500
80 5000
0.80
4500
70
4000
mg/dia
C d/RFG
50
3000
0.40 40 2500
2000
30
1500
0.20 20
1000
10
500
0.00 0 0
0 10 20 30 40 50 60 0 200 400 FILTR EXCRET
r, Å C arga filtrada, mg/min
A B C
Figura 3.3- A, Curva de discriminação (clearance fracional de dextrans, Cd/RFG, em função do raio molecular). B, Absorção tubular
de proteínas em função da carga filtrada. C, Cargas filtrada e excretada de proteínas em condições normais
MECANISMOS DE PROTEINÚRIA
5000
80
0.80 4500
70
Abs 4000
orç
ão
0.60 tub 60 3500
ular mg/
Cd/ , dia 3000
RF mg/ 50
G min
2500
0.40 40
2000
30
1500
0.20 20
1000
10
500
0.00 0 0
0 10 20 30 40 50 60 0 200 400 FILTR EXCRETFILTR EXCRET
r, Å Carga filtrada, mg/min
A B C
Figura 3.4- A, Curva de discriminação (clearance fracional de dextrans, Cd/RFG, em função do raio molecular). B, Absorção tubular
de proteínas em função da carga filtrada. C, Cargas filtrada e excretada de proteínas, após aumento na densidade dos poros “gigantes”
da parede glomerular. Os valores normais são representados em cinza para comparação.
9
70
4000
Absorção tubular, mg/min
60 3500
0.60
mg/dia
Cd/RFG
50 3000
2500
0.40 40
2000
30
1500
0.20 20
1000
10
500
0.00 0 0
0 10 20 30 40 50 60 0 200 400 FILTR EXCRET FILTR EXCRET
r, Å Carga filtrada, mg/min
A B C
Figura 3.5- A, Curva de discriminação (clearance fracional de dextrans, Cd/RFG, em função do raio molecular). B, Absorção tubular
de proteínas em função da carga filtrada. C, Cargas filtrada e excretada de proteínas, após perda de cargas eletronegativas da parede
glomerular. Os valores normais são representados em cinza para comparação
70
4000
Absorção tubular, mg/min
60 3500
0.60 mg/dia
Cd/RFG
50 3000
2500
0.40 40
2000
30
1500
0.20 20
1000
10
500
0.00 0 0
0 10 20 30 40 50 60 0 200 400 FILTR EXCRET FILTR EXCRET
r, Å Carga filtrada, mg/min
A B C
Figura 3.6.- A, Curva de discriminação (clearance fracional de dextrans, Cd/RFG, em função do raio molecular). B, Absorção tubular
de proteínas em função da carga filtrada. C, Cargas filtrada e excretada de proteínas. O exemplo ilustra a proteinúria decorrente de
uma diminuisões da capacidade do túbulo proximal de absorver as proteínas filtradas. Os valores normais são representados em cinza
para comparação.
pouco seletivo em relação às proteínas que foram filtradas, sua deficiência faz com que as
proteínas presentes no filtrado sejam rejeitadas de modo mais ou menos homogêneo.
Teremos então uma proteinúria constituída de albumina e de proteínas de baixo peso
molecular em proporções mais ou menos equivalentes (Fig. 3.6C), o que ajuda a discernir
essas proteinúrias daquelas provocadas por lesão glomerular. As proteinúrias tubulares são
de intensidade leve ou moderada, o que é fácil de entender considerando que a
permeabilidade glomerular está normal. Nesse caso, mesmo com uma rejeição total das
proteínas filtradas por parte dos túbulos, a proteinúria resultante será no máximo igual à
carga filtrada, que é baixa graças ao bom funcionamento da barreira glomerular.
EXERCÍCIOS
1. Varie a densidade de carga da parede glomerular desde o valor normal (100) até 0. O que
acontece à proteinúria? Que tipos de proteínas aparecem na urina? Abra a planilha
"EXERCÍCIOS" Faça um gráfico relacionando, ao mesmo tempo, a excreção urinária de
IgG, albumina e proteínas de baixo P.M. à densidade de carga, preenchendo a tabela já
existente. Qual a proteína mais fortemente influenciada pela redução da densidade de
carga? Por que?
13
2. Varie a área de poros grandes (nesse modelo assumimos um diâmetro de 250 Å), desde o
valor normal (2) até 500. O que acontece à proteinúria? Que tipos de proteínas aparecem
na urina? Como no ítem anterior, faça um gráfico relacionando, ao mesmo tempo, a
excreção urinária de IgG, albumina e proteínas de baixo P.M. à área de poros grandes,
preenchendo antes a tabela pré-existente na planilha "EXERCÍCIOS”. Quais as proteínas
mais fortemente influenciadas pelo aumento da área de poros grandes? Por que? Observe
ainda o terceiro gráfico, que aparece automaticamente e cujo eixo de ordenadas representa
a variação percentual da proteinúria em relação ao normal. E agora, qual a proteína mais
fortemente influenciada pelo aumento da área de poros grandes? Por que?
A - INTRODUÇÃO
marinho para a terra. Saindo de um meio aquático, onde não havia a preocupação de
como ele é hoje nos mamíferos, isto é, com uma disposição anatômica em alça e com
que o rim foi capaz de desenvolver um mecanismo para conservar a água - o mecanismo
Para que esta reabsorção aconteça dois eventos devem ocorrer: 1º) formação de uma
processo pelo qual o rim acumula solutos no interstício medular e o modo de ação do
HAD.
Um adulto normal ingere em média cerca de 2,5 litros de água por dia,
embora esse total varie muito em função de hábitos alimentares e sociais (ver Capítulo 5).
Como as perdas hídricas extrarrenais (fezes, suor e perdas insensíveis) totalizam cerca de
alcance um balanço zero de água. Por outro lado, esse indivíduo deve excretar cerca de
750 mOsm/dia de solutos, a maior parte dos quais é representada pela uréia, sintetizada
perdas extrarrenais de água forem altas (devido à exposição ao calor, por exemplo), o
osmolalidade urinária será de 750 mOsm/L. A mais alta osmolalidade urinária que pode
uma excreção urinária de solutos de 750 mOsm/dia, o volume urinário será pouco inferior
a 0,6 L (volume urinário mínimo). Se, ao contrário, a ingestão de líquidos for alta (por
exemplo, por consumo de refrigerantes, cerveja ou frutas) o volume urinário aumentará.
Para um volume urinário de 4 L/dia, a osmolalidade urinária cairá a 200 mOm/L. Com
solutos e água, ainda não totalmente esclarecidos. Há uma forte razão para que a Natureza
conforme os descritos acima. O custo termodinâmico de uma operação desse tipo seria
chega ao rim. Por essa razão, o rim utiliza-se de um engenhoso sistema de multiplicação
mecanismo pelo qual esses solutos se acumulam no interstício medular foi genialmente
progressivo da temperatura desse fluido, sem grande consumo de energia. Esse arranjo
faz com que o fluido corra em sentidos opostos em condutos vizinhos, proporcionando
uma troca de calor contínua a partir do ponto que recebe o calor, formando um gradiente
de temperatura ao longo dos dois tubos justapostos: o fluxo que se aproxima da fonte
na Natureza. Nos membros inferiores das aves pernaltas que ficam com os pés
dirige dos pés ao coração. Em certos teleósteos, o sistema de absorção de oxigênio tem
contracorrente.
intermédio desse arranjo, o transporte ativo de sódio ao longo de um dos ramos da alça
com isso promovendo o transporte osmótico de água do ramo descendente, cujo fluido
OSMOLALIDADE
Na
Efeito unitário
Na
Na
Na
Na
Na
torna-se em decorrência disso mais concentrado, conforme representado na Fig. 4-1 pelo
alça, permitindo que a osmolalidade da porção mais interna da medula renal chegue a
1.300 mOsm.
cloreto de sódio e uréia (Figura 4-2). De acordo com os conceitos atuais, a energia inicial
situado na membrana luminal, cuja molécula transporta 1 íon Na+, 1 íon K+ e dois íons
OSMOLALIDADE
CÓRTEX
HAD
HAD
MEDULAR EXTERNA
HAD
HAD
H2O
H2O
MEDULAR INTERNA
H2O
HAD
HAD
VASA RECTA
U ré ia
Cl- do lume tubular para o interior da célula. Esse transporte de Na+Cl-, aumentando a
sódio e uréia gerados pelo sistema, impedindo que o gradiente córtico-medular se dissipe
(ver também os Capítulos 5 e 11). No túbulo proximal, ocorre absorção ativa de sódio,
acompanhada de absorção passiva isotônica de água. Essa absorção equivale a 2/3 do que
medular. Esse processo é mais acentuado nas alças longas, que penetram mais
menor magnitude, não é suficiente para impedir que o fluido intratubular seja diluído
por transporte ativo. Como também esse segmento é impermeável à água, o fluido
(porção espessa).
um segmento diluidor adicional, uma vez que continuam a absorver sódio. Na presença
transportes de água e de sódio, agora modulada pela ação do HAD. Na porção final do
túbulo coletor, além da absorção de água e sódio, ocorre ainda absorção de uréia,
absorção de sódio na alça espessa, no túbulo distal e no túbulo coletor - a urina final
torna-se diluída.
CONTRACORRENTE MEDULAR
Descreveram-se, ao longo dos quase 60 anos que se seguiram à formulação
5). A passagem de Na+ da luz tubular para o interstício constitui, como vimos, o chamado
formados por um epitélio simples escamoso, que repousa sobre uma membrana basal, e é
O estudo funcional da porção fina descendente da alça de Henle mostra que este
sugerindo que o equilíbrio osmótico com o interstício medular ocorre à custa da absorção
de água e não de entrada de solutos. Esse equilíbrio, como vimos, reflete-se no aumento
da concentração intratubular de NaCl, uréia e outros solutos à medida que o fluido avança
porção fina ascendente. Neste, o equilíbrio osmótico com o interstício medular dá-se às
por um influxo de uréia, também passivo e mais lento (Fig. 4-2), o que resulta na
percorrer a porção espessa ascendente da alça de Henle, onde como vimos ocorre uma
grande absorção ativa de Na+Cl-, o fluido intratubular ficará cada vez mais hipotônico,
uma vez que este segmento é impermeável à água; sua osmolalidade pode cair abaixo de
100 mOsm/Kg H2O no início do túbulo distal. Por essa razão, a porção espessa da alça de
espessa da alça de Henle (efeito unitário), conforme esquematizado nas Figuras 4-1 e 4-2.
interstício das porções medulares mais profundas (interstício papilar). Entretanto, como
Na+Cl- como também de uréia. Por consegüinte, é necessário explicar como se forma o
conhecido desde longa data pelas observações de que animais submetidos a dieta pobre
interstício se faz às custas de uma saida rápida de NaCl e de uma entrada lenta de uréia.
Portanto, na porção fina ascendente da alça de Henle ocorre adição de uréia ao fluido
tubular. Por outro lado, no ramo espesso ascendente, túbulo distal e túbulo coletor
concentração luminal de uréia, até que o fluido alcance a porção terminal do néfron, que é
presença de HAD), o que permite que este soluto, mais concentrado na luz tubular, eflua
para o interstício papilar. A uréia adicionada ao interstício medular vai colaborar para
contracorrente. Além disso, parte dessa uréia atravessa, como vimos, a parede da porção
UT1, que é regulado pelo HAD. Pode-se demonstar a ocorrência de difusão facilitada de
uréia também nas hemácias. Nesse caso, o transportador envolvido é o UT3. A passagem
porções mais internas da medula, a uréia, altamente concentrada, penetra nos vasa recta e
nos glomérulos e completando esse processo mais longo de recirculação. Esse mecanismo
é intensificado quando o fluxo medular está reduzido, como ocorre nas hipovolemias,
Capítulo 7). É possível ainda que uma parte da uréia que chega ao cálice renal retorne à
de fundamental importância, pois deve existir uma troca intensa entre o interstício
medular e a luz dos vasos que nele penetram para que o gradiente estacionário de
para os vasos da região medular. Como o fluxo plasmático renal é alto, o fluxo
plasmático nos vasa recta (descendente e ascendente) é cerca de 10 vezes maior do que o
permeabilidade à água e a solutos das paredes desses vasos, associada à sua disposição
receptores para o HAD, tanto do tipo V1 como V2, sugerindo que esse hormônio pode
um hormônio capaz de modificar a membrana luminal das células principais dos túbulos
papilar, também à uréia (ver Capítulo 11). Sendo um peptídeo, o HAD não é capaz de
superficial. O HAD funciona assim como um “primeiro mensageiro”, sendo seu efeito
interação do hormônio com o seu receptor específico. Os dois mais significantes sistemas
AMP cíclico (AMPc) e o do Ca++. O HAD exerce seu efeito hormonal estimulando dois
intracelulares que por sua vez acarretam modificações na membrana luminal, alterando a
permeabilidade à água. O receptor V1 aparece também nas células musculares lisas dos
vasos, sendo responsável pelo efeito vasoconstritor do HAD (é por essa razão que o HAD
Esta enzima faz parte de um sistema regulador complexo, que consiste de três
adenilciclase propriamente dita (AC). Neste modelo, a atividade AC pode ser afetada por
dois receptores de naturezas opostas: um deles a estimula (Rs) enquanto o outro a inibe
(Ri). Esses efeitos são mediados por dois tipos distintos de porteína G, respectivamente
Gs e Gi. O receptor estimulador (Rs) é acionado pelo próprio HAD, enquanto o receptor
inibidor (Ri) pode ser ocupado pelos agentes α-2 adrenérgicos, que antagonizam a ação
AMPc representa o ínicio de uma reação em cascata, que termina com a incorporação de
canais de água à membrana apical: o AMPc ativa a proteino-quinase A (PKA) que por
sua vez fosforila uma proteina localizada em vesículas no citosol, vesículas essas que
contêm os canais de água. Estas vesículas são por sua vez transportadas por elementos do
HAD, esses canais são removidos da membrana apical por um processo de endocitose. A
membrana (ver Capítulo 2), que age sobre o ácido aracdônico (AA) e promove a
biossíntese de uma prostaglandina, a PGE2, que por sua vez inibe a AC, constituindo
HAD.
demonstrar a existência de vários tipos de canais de água no reino animal. Muitos são
proteínas de baixo peso molecular (25.000 a 30.000 Daltons) que pertencem a famílias de
canais de água chamadas MIP26 (Membrane Integral Protein com PM 26.000 Daltons).
túbulos distais e dos ductos coletores, foi já clonado e sequenciado, tendo recebido o
de água por essas células, permitindo a passagem para o interstício da água absorvida.
em vários segmentos que transportam água. Esses canais também são independentes do
HAD.
recirculação da uréia entre o duto papilar e a porção fina ascendente da alça de Henle,
do tipo UT1 (ver acima). A estimulação do HAD também promove a inserção de UT1 na
porção fina ascendente da alça de Henle. É importante lembrar que a uréia, produto final
do catabolismo das proteinas, é uma escória que necessita ser excretada pelos rins na
mesma medida em que é produzida (ou seja, os rins mantém constantemente um balanço
zero de uréia). A excreção de uréia ocorre em parte pela eliminação de uma parcela da
carga filtrada de uréia, embora ocorra também secreção de uréia no terço final do duto
coletor. Esse processo, que não depende da ação do HAD, envolve um mecanismo de
membrana apical.
arginina vasopressina. Nos suínos, o HAD é constituido pela lisina vasopressina. Ambos
estreita correlação entre o número desses grânulos nas células nervosas secretoras e o
estado de hidratação do animal. O HAD está como que “empacotado” nesses grânulos,
que percorrem o axoplasma dos nervos em direção à glândula pituitária posterior (neuro-
hipófise). Dentro desses grânulos, o HAD está ligado a uma proteina específica
grânulos nos quais esse hormônio está ligado a uma outra proteina carreadora, a
12
10
modulador da secreção hipotalâmica de HAD. Para
8
6 qualquer osmolalidade plasmática superior a 280
4
2 mOsm./Kg.H2O (limiar osmótico), os níveis
0
200 250 300 350 400 450 plasmáticos de HAD variam linearmente e de forma
Posm, mOsm /L
com grande precisão o volume exato de urina a ser excretado para manter o balanço
hídrico (ver Capítulo 11). O segundo fator a influenciar a secreção de HAD é a redução
volume circulante (em 10% ou mais), há um poderoso estímulo à secreção de HAD, cujas
mesmo que seja às expensas da regulação da tonicidade. É por essa razão que os
indivíduos desidratados apresentam-se freqüentemente em hiponatremia, mesmo que suas
interessante observar que os osmoceptores são estimulados apenas por variações “reais”
da tonicidade plasmática, ou seja, por solutos não permeantes através das membranas
celulares. Solutos que atravessam a membrana celular, como a uréia e, no caso de células
infusão de uréia não altera os níveis circulantes de HAD. O mesmo ocorre com relação à
desidratado em razão da diurese osmótica (ver Capítulo 7), caso em que o estímulo à
baixa pressão é mais sensível do que o de alta pressão, bastando ocorrer uma depleção de
volume de 10%, mesmo sem alterações da pressão arterial, para que se observe um
existe no plasma sob a forma livre, não ligada a proteinas. Devido a seu baixo peso
molecular, o HAD é filtrado livremente através dos capilares glomerulares. A extração
plasmática do HAD é feita principalmente pelo fígado e pelo rim, embora outros tecidos,
como o cérebro, possam também quebrar sua molécula. A excreção urinária é o segundo
nefrogênico familiar (nos quais o túbulo coletor é incapaz de responder ao HAD) ocorre
varia entre 2 a 4 ml/min., o que determina uma meia vida curta para esse hormônio (10 a
minutos.
PROXIMAL
de plasma filtrado nos glomérulos
ALÇA FINA
em um único dia, cerca de 170
DESCENDENTE
ALÇA FINA
litros, corresponde a quase 60 vezes
ASCENDENTE
o volume plasmático, o que reflete a
ALÇA
ESPESSA intensa perfusão sangüínea do
tecido renal (25% do débito
DISTAL
cardíaco, ou cerca de 1,25 L/min).
COLETOR No entanto, menos de 1% desse
Figura 5-1 – Representação esquemática do processo de volume chega às vias urinárias,
absorção de água ao longo dos vários segmentos do
néfron. A largura da região em amarelo representa o graças ao incessante processo de
fluxo de água remanescente no lume tubular, o qual vai
caindo progressivamente, de 170 L/dia no início do
túbulo proximal (correspondentes ao RFG) a 1,5 L/dia
reabsorção (da luz tubular para o
(urina final)
espaço intersticial) que sofre o
ultrafiltrado ao longo de todos os segmentos do néfron (Figura 5-1). Da mesma
forma, menos de 1% do sódio que acompanha o filtrado glomerular chega a ser
excretado na urina, em condições normais. Já o potássio, cuja concentração no
fluido extracelular e, em particular, no plasma e no filtrado glomerular, é muito
2
mais baixa que a de sódio, tem de ser secretado (do espaço intersticial para a luz
tubular) nas porções finais do néfron, para que sua taxa de excreção se iguale à de
ingestão. Esses exemplos vêm ilustrar os princípios básicos que governam a
formação da urina: 1) a composição da urina, tanto em termos de água como de
solutos, resulta da interação ininterrupta de três processos fundamentais: a filtração
glomerular, a reabsorção tubular e a secreção tubular. 2) para a água, assim como
para cada soluto excretado pelos rins, vale sempre o princípio do balanço: a
quantidade excretada de qualquer substância deve necessariamente igualar a que é
ingerida, ou teríamos um processo de acúmulo ou depleção da substância em
questão. Por exemplo, a carga excretada do sódio, cuja eliminação em condições
usuais ocorre quase exclusivamente pela urina, é praticamente idêntica à ingestão.
Já no caso do potássio a taxa de ingestão equivale à soma das excreções urinária
(95% da carga ingerida) e fecal (5% da carga ingerida) do íon. 3) a excreção renal
de qualquer substância é regulada de modo independente dos demais. Por exemplo,
se aumenta a ingestão de potássio, a excreção renal desse íon também aumenta até
que se restabeleça o balanço, sem que seja afetada a excreção de cálcio ou de sódio
.
No presente capítulo, estudaremos em detalhe os mecanismos de transporte
de água e eletrólitos através das paredes tubulares, especialmente com relação ao
sódio e ao potássio, e como esses processos resultam no controle fino da excreção
renal dessas substâncias.
A + B
+
+ +
+
+
+ +
+
+ -
Figura 5-2 – A, transporte passivo de um soluto a favor de seu gradiente de potencial químico (da região de
maior para a de menor concentração). B, transporte passivo de um cátion a favor de um gradiente elétrico
(da região de mais alto para a de mais baixo potencial elétrico).
simples, como por exemplo a diferença de pressão hidráulica entre a luz capilar e o
espaço de Bowman, indispensável à ultrafiltração glomerular (Capítulo 2). A
absorção de água através das paredes tubulares tende a seguir as diferenças de
pressão osmótica, como ocorre de modo mais evidente no túbulo proximal e nos
túbulo coletor (este último em presença de hormônio antidiurético) (ver Capítulos
4 e 11). Já o transporte passivo de solutos pode obedecer a três forças básicas: 1)
simples arraste em conjunto com o fluxo de água (“solvent drag”), como ocorre na
absorção de potássio no túbulo proximal. 2) diferenças de potencial químico (ou
seja, diferenças de concentração), como as que governam a reabsorção e a secreção
tubulares de uréia. 3) diferenças de potencial elétrico, como a que explica a
absorção paracelular de íons cloreto e outros íons no túbulo proximal. Como as
diferenças de potencial químico e elétrico freqüentemente variam de modo
4
A B
+
+ +
+ + +
+
+
+ +
ATP
ATP
ADP+P
ADP+P
- +
Figura 5-3 - A, transporte ativo de um soluto contra um gradiente de potencial químico (da região de menor
para a de maior concentração). B, transporte ativo de um cátion contra um gradiente elétrico (da região de
mais baixo para a de mais alto potencial elétrico).
desfavorável. A esse tipo de transporte ativo, que não utiliza energia metabólica a
não ser indiretamente, denomina-se transporte ativo secundário. Quando duas
substâncias são transportadas no mesmo sentido por uma molécula carregadora
comum, como no exemplo recém descrito, estamos diante de um cotransporte.
Quando os sentidos de transporte são opostos, como ocorre com o Na+ e o H+ em
vários segmentos do néfron, falamos de um contratransporte.
Um terceiro tipo de transporte ativo é aquele representado pela endocitose,
responsável pela absorção tubular de proteínas. Aqui, ocorre uma modificação da
própria membrana luminal, que sofre uma invaginação, formando vacúolos, por
meio dos quais as macromoléculas são hidrolisadas e seus componentes
transportados até a membrana basolateral, de onde ganham a circulação. É através
desse processo que os túbulos proximais são capazes de absorver as proteínas
filtradas através das paredes glomerulares (ver Capítulo 3).
Apesar de extremamente complexa, a maquinaria de transporte utilizada
pelas células tubulares é flexível o suficiente para ser modificada quando
necessário. Para atender a determinadas necessidades de transporte, a célula tem a
capacidade de inserir moléculas transportadoras na membrana apical ou
basolateral, e de retirá-las quando não mais necessárias. Por exemplo, ao detectar
uma acidificação de seu interior, as células do túbulo coletor inserem, em sua
borda luminal, moléculas de H+-ATPase, que vão promover a extrusão de íons H+
para a luz tubular e que serão retiradas quando a anomalia tiver sido corrigida. A
inserção de aquaporinas na membrana luminal das células do túbulo coletor, sob a
ação do hormônio antidiurético, é outro exemplo dessa enorme capacidade
reguladora dos epitélios de transporte.
Na +
Na
+ Na + celular da maioria das células é
muito mais permeável a K+ do
ATP ATP
POTENCIAL ELÉTRICO, mV
medirmos nessas
10
0
condições a
Na
-10
diferença de
Na +
Na
+
+ -20
-30
-40
potencial entre o
ATP
-50
-60
-70 lume tubular e o
-80
K
+ K
+ -90 L IC I interstício,
- +
-100
+ - 0
observaremos uma
L IC I -50 50
mV
diferença de
potencial
Figure 5-8 – Configuração básica de uma célula transportadora. A
Na+/K+/ATPase está confinada à membrana basolateral, enquanto a membrana transepitelial
luminal apresenta uma alta permeabilidade ao Na+. Ocorre em consequência um
transporte resultante do lume ao interstício. A membrana luminal é diferente de zero e
despolarizada pela entrada de Na+, provocando um aassimetria elétrica,
estabelecendo-se uma diferença de potencial transepitelial, com o lume negativo orientada no sentido
em relação ao interstício. L, lume; IC, meio intracelular; I, interstício
do transporte de
11
Na+, ou seja, no caso das células tubulares, com o lume negativo em relação ao
interstício (Fig. 5-8). Essa diferença de potencial pode atingir algumas dezenas de
mV se a passagem de eletrólitos através das junções intercelulares for restrita (ver
adiante). Todas as células transportadoras apresentam essa configuração
básica. No entanto, as células tubulares renais diferem bastante entre si, conforme
o segmento do néfron, no que diz respeito: 1) à natureza e magnitude dos sistemas
apicais de transporte de Na+; 2) à densidade da Na+/K+-ATPase basolateral; 3) às
propriedades das junções intercelulares e 4) à permeabilidade à água. É a variação
dessas propriedades o que confere a cada um desses segmentos suas principais
características fisiológicas, como a capacidade absortiva, a capacidade de gerar
gradientes, etc, conforme veremos mais adiante.
pode atravessar a membrana luminal em troca por íons H+ secretados para o lume
tubular, por meio de um contratransportador Na+/H+. Essa secreção H+ é também
importante no processo de acidificação urinária (Capítulo 12). Os íons Na+ podem
também ingressar à célula em associação com a glicose, por intermédio de um
cotransportador sódio-glicose,
com o que a célula também
atende à necessidade de
+
H absorver a glicose filtrada no
Na +
Na +
glomérulo. Através de
G mecanismos de cotransporte
ATP
AA semelhantes, o sódio pode ser
Cl- reabsorvido em conjunto com
aminoácidos, fosfato
inorgânico, sulfatos ou ácidos
orgânicos. O sódio pode ainda
L I cruzar a membrana luminal
Figura 5-9 – Transportadores envolvidos na absorção de sódio associado a íons Cl-, em um
no túbulo proximal. L, lume; I, interstício; G, glicose; AA,
aminoácidos complexo processo que também
envolve o transporte de bases orgânicas. Todos esses mecanismos de transporte de
sódio acoplado a outros solutos dependem, conforme discutido anteriormente, do
gradiente eletroquímico de Na+ entre o lume e o interior da célula, gerado pela
intensa atividade da Na+/K+-ATPase basolateral; constituem portanto exemplos de
transporte ativo secundário.
É importante lembrar que, ao descrever os processos de absorção de íons,
no túbulo proximal ou em qualquer epitélio transportador, devemos sempre
observar um princípio básico: o da eletroneutralidade, segundo o qual não se
podem acumular, em sistemas biológicos, cargas elétricas em quantidade
significativa, caso contrário estaríamos gerando altíssimas diferenças de potencial
13
elétrico ao longo dos tecidos (com exceção de animais como o peixe elétrico, que
desenvolve separação de cargas e altas diferenças de potencial elétrico exatamente
para eletrocutar seus inimigos). Isso significa que, para ocorrer a absorção de um
íon Na+, é necessária em última análise a absorção concomitante de um ânion ou a
secreção concomitante de um cátion. Essas considerações são importantes para
entendermos por que a absorção
proximal de Na+ se dá
principalmente em associação
-
H+ H+ + HCO3 com o HCO3- e o Cl-, conforme
+
HCO3
-
Na+ - verificaremos a seguir.
HCO3
A contínua secreção de
Na
A.C.
H2CO3 +
A.C.
H+ para a luz tubular, em troca
ATP
H2O H2O pela absorção de Na+, tem como
+ +
CO2 CO2 conseqüência a destruição de 1
íon HCO3- para cada íon H+
L I secretado, dando origem ao
ácido carbônico (H2CO3). (Fig.
Figura 5-10 – Absorção proximal de HCO3-. L, lume; 5-10). Essa reação se processa
I, interstício; AC, anidrase carbônica
rapidamente por duas razões: 1)
há uma enorme quantidade de íons HCO3- no fluido proximal, provenientes do
filtrado glomerular. 2) a borda em escova das células proximais possui grandes
quantidades da enzima anidrase carbônica, que cataliza a desidratação do H2CO3.
Como os íons H+ a serem secretados originam-se em última instância da
dissociação intracelular do H2CO3 em H+ e HCO3-, e como estes últimos acabam
deixando a célula através da membrana basolateral por cotransporte com o próprio
sódio (Fig. 5-10), o resultado final desse processo é a absorção de NaHCO3. Esta
absorção de HCO3- tende a reduzir, ao longo do túbulo proximal, a concentração
14
luminal desse íon e a elevar a de Cl-, o que tem grande importância na absorção
paracelular de NaCl, conforme veremos a seguir.
Para entendermos agora por que uma parte da absorção proximal de Na+
ocorre em associação com os íons Cl-, é necessário compreender o importante
papel que desempenham nesse segmento as junções intercelulares. No túbulo
proximal, os complexos juncionais, como são conhecidas as estruturas que
conectam uma célula a outra, oferecem muito pouca resistência à passagem de
eletrólitos. Seu efeito elétrico, portanto, é o de uma resistência muito baixa
disposta em paralelo com as células epiteliais, colocando o sistema em curto-
circuito. Esse efeito atenua fortemente a diferença de potencial transepitelial
gerada pelo transporte de sódio e
ilustrada na Figura 5-8: ao invés de
algumas dezenas de mV, a diferença
de potencial transepitelial no túbulo
Na + Na +
proximal não ultrapassa uns poucos
G
ATP
AA
mV. Há ainda uma conseqúência
fisiológica importante: por permitir
um fluxo iônico considerável através
- -
Cl Cl dos espaços intercelulares, os
complexos juncionais facilitam ainda
L I
mais a absorção de íons pelo epitélio
Figura 5-11 – Mecanismo de absorção proximal de NaCl.
L, lume; I, interstício do túbulo proximal. É graças a essa
propriedade que grandes quantidades de íons cloreto podem ser absorvidas,
facilitadas pela concentração de Cl- ao longo do túbulo proximal (Fig. 5-11). Sem
a existência da via paracelular, o fluxo de cloreto seria muito menor, já que a via
transcelular oferece grande resistência à passagem desse íon. Isso limitaria por sua
vez a absorção do próprio sódio, já que a entrada concomitante de um ânion é uma
das maneiras de garantir a eletroneutralidade do sistema, conforme discutido
15
Alça de Henle
+-
basolateral, enquanto na membrana
- +
+ + ++
Na , K , Ca , Mg
++ apical um sistema especializado
facilita o ingresso de íons à célula.
L I No caso da porção espessa da alça
Figura 5-13 - Estruturas transportadoras na porção de Henle, esse sistema é
espessa da alça de Henle. O cotransportador
Na+/K+/2Cl é peculiar a esse segmento. L, lume; I, representado por um
interstício
cotransportador bastante peculiar,
que promove o ingresso simultâneo à célula de 1 íon sódio, 1 íon potássio e 2 íons
cloreto. Esse cotransportador é sensível ao diurético furosemide (Capítulo 6). A
energia necessária a esse movimento é fornecida, como em outros epitélios
transportadores, pela Na+/K+-ATPase situada na membrana basolateral, a qual
mantém constantemente baixa a concentração intracelular de sódio. Graças a esse
21
Túbulo Distal
Na +
ATP
característica em comum com a
Cl-
+
Na
porção espessa da alça de Henle:
K +
sua permeabilidade à água é muito
baixa. No entanto, o
-
Cl cotransportador Na+/K+/2Cl- está
ausente desse segmento. Em seu
Túbulo coletor
+ -
+ - ser recuperada. Essa recuperação é
Figura 5-17 – Mecanismo de ação da aldosterona nas Ao menos parte desse transporte ativo
células principais do túbulo coletor e da porção final do
túbulo distal: aumento da atividade da Na+/K+-ATPase envolve a atividade de uma H+/K+-
basolateral, da permeabilidade da membrana luminal
ao Na+ e, possivelmente, ao K+. Ocorrem em ATPase nas células intercaladas, que
conseqüência retenção de Na+ e espoliação de K+. L,
lume; I, interstício. promove a entrada de um íon K+ em
troca por um íon H+ e que é semelhante à existente na mucosa gástrica. Enquanto
esta última tem por finalidade a acidificação do lume gástrico, a H+/K+-ATPase
renal é acionada principalmente em situações de carência de potássio (ver adiante).
É possível ainda à célula principal limitar a secreção de potássio, em situações de
carência, alterando a densidade de canais específicos na membrana apical e/ou na
membrana basolateral, embora o modo pelo qual a célula atua nesse sentido seja
ainda obscuro.
Por maior que seja, a capacidade dos túbulos distal e coletor de ajustar a
secreção e a absorção de potássio pode ser vencida se a quantidade de sódio e o
volume de fluido que chegam a esses segmentos forem excessivos, aumentando
drasticamente a taxa de secreção tubular de potássio. É o que ocorre por exemplo
na expansão do volume extracelular e nos pacientes tratados cronicamente com
28
EXERCÍCIOS
2- Observe atentamente os valores basais. Varie agora a ingestão de água. Observe que,
aumentando a ingestão de água total (água como tal + água de alimentos) de 2,2
(normal) até 10 litros/dia, o que é um tremendo exagero (equivalente a 50 copos d’água,
29 latas de refrigerante ou 16 garrafas de cerveja), o volume urinário sofre aumento
idêntico. Aumentando-se a ingestão total de água p/ 20 L/dia, o fluxo urinário não vai
33
além de 18,5 L/dia, indicando ser esse o máximo possível para um indivíduo normal
(vai ocorrer um acúmulo de água nesse caso, podendo chegar até uma intoxicação
hídrica em casos extremos). Reduza agora a ingestão de água a valores abaixo do
normal. O fluxo urinário vai- tendendo a 0,5 L/dia, que é o mínimo necessário para
acomodar a excreção diária de solutos (uréia, sódio, potássio). Tente agora descobrir em
quais segmentos do néfron ocorre retenção ou rejeição de água conforme necessário.
Repita todo o procedimento variando a concentração plasmática de ADH. Onde age esse
hormônio?
3- Varie agora a ingestão de sódio, tomando o valor de 150 mEq/dia como sendo o
“normal” (em nosso meio, essa é uma dieta “moderada” em termos de sal). Observe que,
entre 50 e 300 mEq, a excreção urinária de sódio sempre se iguala à ingestão. Se assim
não fosse, estaríamos acumulando ou perdendo sódio. Este é um conceito extremamente
importante: em uma situação estacionária (ou seja, com o paciente ou animal estável do
ponto de vista fisiológico), há sempre um balanço entre ingestão e excreção de sódio (o
que aliás é válido para qualquer outro íon ou composto). Observe ainda que, reduzindo-
se a zero a ingestão de sódio, excreta-se ainda 1 mmol/dia, que é a taxa mínima de
excreção urinária desse íon. Observe o que acontece em condições de expansão ou
retração do volume extracelular. Tente agora descobrir em quais segmentos do néfron
ocorre retenção ou rejeição de sódio conforme necessário. Repita todo o procedimento
variando a concentração plasmática de aldosterona. Onde e como age esse hormônio?
Diuréticos osmóticos
Conforme discutido no Capítulo 5, o túbulo proximal é um epitélio
de baixa resistência elétrica e alta condutância hidráulica, devido à facilidade com
que seus complexos juncionais intercelulares permitem a passagem de água e
eletrólitos. Essas propriedades
físicas facilitam ao túbulo
proximal o cumprimento de sua
tarefa básica: o transporte
Na +
ATP
maciço de água e de solutos, o
qual lhe permite absorver cerca
de 2/3 da carga filtrada de
Na+, Cl-, HCO3-, H2O
sódio. Ao mesmo tempo, no
entanto, tornam-no incapaz de
L I
manter através de suas paredes
Figura 6-1 – Mecanismo de ação dos diuréticos osmóticos. A
presença na luz do túbulo proximal de um soluto impermeante qualquer gradiente de
(representado pelos pontos vermelhos) retém água e dilui o
sódio e demais eletrólitos, fazendo com que haja um vazamento
de água e solutos através dos espaços intercelulares do
concentração, potencial elétrico
interstício para a luz tubular.
ou pressão osmótica. É
exatamente essa característica o que torna o túbulo proximal suscetível à ação dos
diuréticos osmóticos. Esses diuréticos, cujo maior representante é o manitol, são na
verdade solutos não absorvíveis pelo epitélio do túbulo proximal e que por essa
razão são progressivamente concentrados na luz tubular à medida que a água vai
sendo reabsorvida . Com o conseqüente aumento da pressão osmótica intratubular,
a absorção de água pelo túbulo fica limitada, já que depende de uma pequena
3
mmol/dia aos segmentos seguintes. Desse total, cerca de 6.000 mmol/dia (25% da
carga filtrada, ou 6.000/8.000 = 75% do aporte de sódio ao segmento) são
absorvidos na porção espessa da alça de Henle, enquanto 1.200 mmol/dia (5% da
carga filtrada) o são no túbulo distal. Cabe ao túbulo coletor o ajuste fino da
excreção de sódio, absorvendo, se necessário, a quase totalidade dos restantes 800
mmol/dia (~ 3 % da carga filtrada). Se agora administrarmos manitol a esse
indivíduo, de modo a que a absorção proximal de sódio caia a 40% da carga
filtrada, serão oferecidos aos segmentos seguintes 14.400 mmol/dia de Na+. A
porção espessa da alça de Henle, de alta capacidade absortiva, pode adaptar-se a
essa sobrecarga, absorvendo de novo 75% da carga de sódio que lhe chega,
correspondentes agora a 10.800 mmol/dia. Quanto aos 3.600 mmol/dia restantes,
deverão ser absorvidos pelos túbulos distal e coletor. Trata-se no entanto de uma
carga 80% superior à que chega habitualmente a esses segmentos, cuja capacidade
absortiva é limitada, conforme discutido acima. Se a absorção nesses segmentos
crescer, digamos, 30%, atingindo 2600 mmol/dia, a excreção de sódio aumentará,
chegando a 3.600-2.600 = 1.000 mmol/dia. Se a urina for isotônica em relação ao
plasma, essa excreção de Na+ corresponderá a um fluxo urinário de cerca de 7
L/dia. Portanto, os diuréticos osmóticos, por agir no túbulo proximal, permitindo a
ação compensatória do restante do néfron, promovem uma elevação apenas
mediana do fluxo urinário e da excreção de sódio, sendo assim considerados como
de média potência (Figura 6-2).
Como ocorre com a maioria dos diuréticos, o principal efeito colateral da
administração de diuréticos osmóticos é o desenvolvimento de hipopotassemia. É
fácil entender o mecanismo desse distúrbio relembrando o mecanismo de secreção
de K+ na porção final do túbulo distal e no túbulo coletor (Capítulos 5 e 8). Nesses
segmentos do néfron, ocorre um transporte passivo de K+ do interior das células
principais para o lume tubular, ou seja, uma secreção de K+. Esse movimento de
K+ é fortemente influenciado pelos seguintes fatores, discutidos em maior detalhe
5
bicarbonato filtrado, formando o ácido carbônico. Este por sua vez se decompõe
em água e gás carbônico, reação esta catalisada pela enzima anidrase carbônica,
abundante na borda em escova do túbulo proximal. Os inibidores da anidrase
carbônica, representados pela acetazolamida (Diamox), dificultam essa reação,
apresentando por isso um duplo efeito: de um lado, diminuem a taxa de secreção
de H+, provocando retenção de ácido; de outro, reduzem a taxa de absorção
proximal de sódio, apresentando portanto um efeito diurético. Como no entanto
essa droga inibe apenas uma parte dos mecanismos de absorção proximal de sódio,
e como existe a intervenção, descrita acima, do restante do néfron, seu efeito
diurético é apenas fraco, o que limita seu uso clínico. A acetazolamida é utilizada
principalmente no tratamento do glaucoma agudo, em cuja patogênese a anidrase
carbônica desempenha um papel fundamental, e em alguns casos de alcalemia
metabólica.
é suficiente para ilustrar a potência natriurética dos diuréticos de alça (Figura 6-4).
Suponhamos mais uma vez que a carga filtrada de Na+ seja de 24.000 mmol/dia,
com uma taxa de absorção proximal de 2/3 e, portanto, um aporte de ~8.000
mmol/dia à porção espessa da alça de Henle. Se esse transporte for totalmente
bloqueado por um diurético de alça, todo esse fluxo de sódio chegará intacto aos
túbulos distal e coletor. Esses segmentos absorvem até ~2.000 mmol/dia de Na+ em
condições normais. Sendo no entanto incapazes de alcançar as altas taxas de
transporte observadas no túbulo proximal e na própria porção espessa da alça de
Henle, sua adaptação a esse aumento do aporte de Na+ é apenas parcial. Mesmo
que a taxa de absorção desses segmentos aumentasse em, digamos, 30%, (sendo
pois de ~2.600 mmol/dia a taxa absoluta de absorçãode sódio), seriam ainda
excretados 5.400 mmol/dia, correspondentes a um fluxo urinário superior a 38
L/dia! Devido à localização estratégica da porção espessa da alça de Henle,
portanto, a natriurese e diurese provocadas pelos diuréticos de alça são
extremamente intensas, caracterizando-os como de alta potência. Por essa razão,
esse grupo de diuréticos é largamente utilizado na prática clínica em situações que
requeiram a perda de grande quantidade de sódio, tal como nos estados edematosos
resultantes de disfunção cardíaca (insuficiência cardíaca congestiva) ou renal
(síndrome nefrótica), ou quando é imperioso o “enxugamento” rápido de fluido
acumulado em áreas críticas, como no edema pulmonar agudo.
CARGA FILTRADA = 24000 mEq/dia
Conforme descrito no
Capítulo 5, o túbulo distal
apresenta em sua membrana
Na + luminal um cotransportador
Na+/Cl-, específico para esse
Na +
ATP
- segmento e que promove o
Cl
+
Na
NaCl existente nesse segmento leva a uma excreção urinária de sódio não superior
a 0.05×24.000=1.200 mmol/dia, correspondentes a um fluxo urinário de ~8 L/dia
(Figura 6-6). Os tiazídicos são portanto considerados como diuréticos de média
potência. Por essa razão, não são empregados atualmente na terapêutica do edema,
a qual freqüentemente exige o uso de duiréticos de alça. Os tiazídicos são no
entanto largamente utilizados no tratamento da hipertensão arterial sistêmica, para
o qual é necessário um aumento sutil na capacidade renal de excretar sódio
(Capítulo 10).
Por elevar a oferta de sódio ao túbulo coletor, os tiazídicos, tal como os
diuréticos de alça, aumentam a excreção de potássio nesse segmento. No entanto,
devido à menor intensidade de seu efeito diurético e ao fato de não inibirem a
absorção de potássio na alça de Henle, a magnitude da caliurese que os tiazídicos
provocam é bem menor do que a evocada pelos diuréticos de alça. Por essa razão,
é infreqüente o estabelecimento de hipopotassemia grave em pacientes tratados
cronicamente com tiazídicos. Contudo, é possível o desenvolvimento de
hipopotassemia mais intensa na presença de hiperaldosteronismo secundário,
comumente encontrado em estados edematosos tais como a insuficiência cardíaca
congestiva (ver Capítulos 5 e 9).
Na + bloqueadores do
luminal de sódio, como o
canal
Na +
Na
+
ATP
amiloride e o triamterene. 2) os
antagonistas da aldosterona,
K +
como a espironolactona.
+ - - + Conforme seria de se
EXERCÍCIOS
taxas de excreção urinária de água, sódio e potássio. Observe ainda o segmento do néfron
onde ocorre o efeito de cada um dos diuréticos estudados. Clique no botão “Ver célula” ,
quando for o caso, para uma representação aniamda do mecanismo celular de ação de cada
diurético, tanto no segmento em que cada um atua como naqueles que se seguem.
15
1. Qual o diurético mais potente? Por que esse diurético é tão potente? Qual o menos
potente? Por que?
EXTRACELULAR: DESIDRATAÇÕES
Essas perdas podem ou não se fazer acompanhar de perdas de sódio. A proporção de água e
sódio nessas perdas, determinará se vai ou não ocorrer uma alteração da concentração de
“desidratações hipotônicas”, deve-se lembrar que nem sempre uma hiponatremia está
desse total distribuem-se no espaço intracelular (Fig. 1), enquanto 1/3, ou cerca de 14 L,
VOLUME
VOUME INTRACELULAR INTERSTICIAL
corpóreo. O volume extracelular (VEC) divide-se, por sua vez, em dois outros
volume sangüíneo, que totaliza 5 L, é representado pelo volume das hemácias, que no
entanto são parte integrante do espaço intracelular) e o espaço intersticial, que corresponde
inferior a 100 ml, distribui-se por cavidades tais como a pleural, a pericárdica, a peritoneal e
também ser considerados como integrantes desse segmento. Ao conjunto desses fluidos
denominamos terceiro espaço. O volume desse compartimento é reduzido, mas pode crescer
muito em determinadas condições patológicas, como as obstruções intestinais e os grandes
derrames cavitários,
constituem mais de 90% dos solutos do VEC. Podemos então considerar o sódio como o
REGULAÇÃO DO VEC
agudo, ao passo que sua diminuição pode levar a um estado de hipoperfusão generalizada,
reter ao máximo água e sódio. Com esse objetivo, aumenta tremendamente o influxo
simpático aos rins, assim como os níveis circulantes de compostos que também promovem
fisiopatologia dos processos de transporte de água e eletrólitos pelo néfron, estão descritos
em detalhe nos Capítulos 5 e 14. Além do rim, a pele também contribui para minimizar as
não estão claros, sendo possível no entanto que a aldosterona desempenhe algum papel
nesse processo.
(HAD) (ver Capítulo 11). Em condições normais, tanto a sede quanto a secreção de ADH
organismo perde fluido e se desidrata, ambos os mecanismos são acionados, mesmo que a
TIPOS DE DESIDRATAÇÃO
Desidratações isotônicas
Nas desidratações isotônicas, ou isonatrêmicas, como o nome indica, a concentração
extracelular de sódio não se altera, ou se altera muito pouco, em relação ao normal. Isso
ocorre porque as perdas de água e de sódio nesses casos seguem uma proporção aproximada
de 150 mEq de sódio para cada litro de água. O indivíduo está na realidade perdendo para o
exterior uma parcela de seu fluido extracelular (Fig. 9-2). Como a concentração de sódio no
espaço extracelular não se altera, não se estabelece uma força osmótica entre o espaço intra e
acordo com as vias através das quais essas perdas ocorrem: perdas extrarrenais e perdas
renais
Perdas extrarrenais
As perdas extrarrenais constituem a causa mais comum de desidratação isotônica.
diarréias, que podem chegar a vários litros por dia em formas graves como o cólera.
Juntamente com esse tipo de perdas, que poderíamos chamar de “espontâneas”, alinham-se
internados durante longos períodos. Sondas nasogástricas, bem como drenos torácicos e
abdominais, podem levar a uma depleção importante de fluido isotônico, caso as perdas
diárias correspondentes não sejam repostas de modo adequado. O mesmo pode ocorrer em
situação especial é representada pelas perdas para o terceiro espaço, como nos derrames
pleurais e nos íleos, em que cessa a movimentação intestinal, com conseqüente acúmulo de
grandes quantidades de fluido na luz entérica. Nesses casos, no entanto, não se trata de uma
desidratação propriamente dita, mas de uma redistribuição interna de fluidos corpóreos, que
normais ou até elevadas de sódio no plasma. Como no entanto a contração do VEC estimula
deficiência de água, mas não a de sódio, vindo portanto a desenvolver uma desidratação
íntegros, comportam-se de modo a reter a maior quantidade possível de água e sódio. Com
isso, o volume urinário cai a 500 ml/dia ou menos, enquanto a concentração urinária de
sódio torna-se inferior a 10 mmol/L. Em condições normais, o ajuste fino da excreção de
sódio é quase inteiramente executado no túbulo coletor (ver Capítulo 5). Durante uma
hipovolemia intensa, todo o néfron, e não apenas o túbulo coletor, passa a integrar o esforço
para reter o máximo possível de sódio, o que explica a baixíssima excreção urinária do íon.
coletor (ver Capítulo 4). Nas desidratações de origem extrarrenal, o ritmo de filtração
creatinina, esta última um marcador mais fiel do RFG (ver Capítulo 1). Já a uréia, absorvida
em grande quantidade no túbulo proximal, ávido por sódio, tem sua retenção agravada, o
que se reflete em um aumento ainda mais intenso de sua concentração sangüínea, elevando
ao diagnóstico clínico das contrações do VEC e da própria insuficiência renal aguda pré-
Todas essas características das desidratações isotônicas podem ser também observadas
Perdas renais
pelos rins, o que termina por levar à excreção urinária de uma grande quantidade de água e
oligúricas da insuficiência renal aguda (ver Capítulo 14), a insuficiência renal crônica (ver
Capítulo 15) e a poliúria que se segue ao alívio de uma obstrução das vias urinárias. Podem
também ocorrer perdas renais isotônicas de fluido devido a uma falta de ação da aldosterona,
seja por síntese deficiente, seja por ausência de resposta do túbulo coletor a esse hormônio.
Por fim, as perdas renais podem ter origem no uso abusivo de diuréticos, seja por prescrição
médica (iatrogenia), seja por automedicação, em geral com a finalidade (equivocada )de
emagrecer.
sinais evidentes de desidratação sugere a presença de uma perda renal primária. Na verdade,
é preferível, para discernir entre causas extrarrenais e renais, o uso da fração de excreção de
sódio, que é o quociente entre a taxa de excreção urinária e a carga filtrada de sódio,
expressa em porcentagem (ver Capítulo 5). Essa abordagem tem a vantagem de levar em
absorção tubular.
(hipotensão ortostática ) e, nos casos mais graves, choque circulatório. Outros sinais clínicos
Desidratações hipotônicas
clínica. A razão para isso é a necessidade imperiosa que tem o organismo de defender o
volume circulante, ainda que isso exija deixar de regular a tonicidade do meio extracelular.
Uma queda do volume circulante estimula não apenas a retenção de sódio, mas também os
condições, mas isso por si só não seria suficiente para causar hiponatremia, uma vez que o
efeito do HAD sobre o fluxo urinário já é máximo quando sua concentração é apenas duas
vezes superior à normal (ver Capítulo 11). Portanto, para que uma desidratação se torne
estímulo da sede, seja por administração de fluidos em ambiente hospitalar (é comum por
sistema venoso).
hipotônicas alteram não apenas o volume extracelular, mas também o intracelular. A queda
da concentrração de sódio faz com que apareça uma força osmótica que tende a deslocar
água do espaço extracelular para o intracelular (Fig. 9-3). Esse movimento traz duas
de fluido extracelular não apenas para o meio externo mas também para o espaço
intracelular. 2) o espaço intracelular pode aumentar de volume, o que pode trazer graves
Conforme discutido acima, qualquer desidratação pode tornar-se hipotônica mesmo que
de início as perdas de fluido tenham sido isotônicas. Isso significa que um processo iniciado
por qualquer das causas de desidratação isotônica enumeradas acima, renais ou extrarrenais,
que ocorre uma perda específica de sódio. É o caso das nefrites intersticiais crônicas, que
provocadas por exercícios físicos extremos, como a disputa de maratonas: a intensa sudorese
provocada por essa prática pode levar não apenas à perda de água mas também de grandes
hiponatremia. No entanto, a sudorese intensa pode também ser uma causa de hipernatremia,
intracelular, suas manifestações clínicas são mais complexas do que as das desidratações
isotônicas. Em primeiro lugar, a maior contração do volume extracelular torna mais intensos
que evoluem com maior freqüência ao estágio de choque circulatório. Mais importante, o
encéfalo, que acaba sendo submetido a pressões hidráulicas muito altas devido à baixíssima
complacência da caixa craniana. Esses pacientes podem apresentar uma série de distúrbios
(ver Capítulo 11). A probabilidade de que um evento desses venha a ocorrer é tanto mais
alta quanto mais rápida tiver sido a instalação da hiponatremia. Uma vez havendo tempo
Assim como nas desidratações isotônicas, também nas hipotônicas os rins comportam-
se de modo a concentrar ao máximo a urina. Isso quer dizer que, se examinarmos a urina de
conta outras situações que podem reduzir a tonicidade do meio extracelular sem redução da
bastante específicas, como o edema generalizado (ver Capítulo 9). No entanto, o diagnóstico
sobrecargas hídricas. Essa incapacidade é por sua vez decorrente de uma produção
descontrolada de HAD, seja por ativação anômala da neuro-hipófise, seja por produção
ectópica do hormônio (ver Capítulo 11). Ao se examinar a urina desses pacientes, também
iremos encontrar uma osmolalidade elevada. A concentração de sódio na urina tende a ser
normal ou alta, mas pode ser baixa em casos em que a baixa concentração plasmática de
sódio restrinja a excreção urinária do íon. O mesmo ocorre com a fração de excreção de
sódio. Isso quer dizer que uma hiponatremia associada a uma baixa concentração urinária de
plasmático de ácido úrico (que tende a ser elevado na hipovolemia e baixo na SIHAD).
sódio, que como vimos está baixa, pouco se alterar em resposta a essa infusão, isso estará
indicando que a retenção renal de sódio persistiu, sugerindo tratar-se de uma hiponatremia
acentuado, de várias vezes em relação ao valor inicial, é mais provável estarmos diante de
um caso de SIHAD. Deve-se ressaltar no entanto que essa técnica não está padronizada e
Desidratações hipertônicas
As desidratações hipertônicas são menos freqüentes do que as iso e hipotônicas.
extracelular. Neste caso, no entanto, a elevação da concentração plasmática de sódio faz com
portanto uma desidratação celular (Fig. 9-4). Essas alterações podem tornar-se clinicamente
evidentes, sendo a mais séria delas o aparecimento de sérios distúrbios neurológicos (ver
adiante). Já a contração do espaço extracelular tende a ser menos intensa do que nas outras
Não se trata evidentemente de uma perda primária de água, mas de um balanço negativo de
água motivado pela falta de ingestão e pela perda obrigatória de água através da urina, fezes,
Dessas, a causa mais comum é a sudorese excessiva, como na exposição a altas temperaturas
hiperventilação pulmonar usualmente associada a esses casos, e que acarreta grandes perdas
de vapor d’água.
Causas renais
O exemplo mais claro dessa condição é o diabetes insípido (DI) (ver Capítulo 11), que
consiste na excreção indevida de uma urina diluída em relação ao plasma. Essa anomalia
resulta de uma secreção deficiente de HAD (DI central ou hipotalâmico) ou de uma resposta
diabetes insipidus central (falta de produção de HAD) urinar 10 litros de água por dia, com o
centro da sede íntegro e pleno acesso a água, ele ingerirá 10 litros de água e não terá
desidratação hipertônica.
absorção desse composto pelo túbulo proximal. Em conseqüência, parte da glicose filtrada
osmótico (ver Capítulo 6). Como resultado desse efeito, a absorção proximal de sódio
diminui, levando a uma oferta aumentada de água e sódio aos segmentos subseqüentes do
néfron. Na porção espessa da alça de Henle, ocorre absorção intensa de cloreto de sódio,
diluidor (ver Capítulos 4 e 5). O fluido assim diluído chega ao túbulo coletor, onde, na
presença de HAD, deveria ser concentrado pela difusão osmótica de água em direção à
medula renal, onde a osmolalidade é mais alta (ver Capítulo 4). Esse movimento é no
entanto dificultado pela presença de glicose no fluido tubular. Além disso, o alto fluxo
intratubular imposto pela diurese osmótica deixa pouco tempo a que a osmolalidade do
hipernatremia..
É importante ressaltar que a existência de uma hipernatremia não significa
estar havendo até mesmo um balanço negativo do íon, como é o caso da diabetes mellitus
descompensada, descrito acima. O que vai determinar a concentração final de sódio no meio
extracelular é a diferença entre os balanços de água e sódio. Se ambos forem negativos, mas
volume intracelular, enquanto a perda de volume extracelular não é tão acentuada quanto
mais graves, incluindo sonolência, confusão mental, convulsão e coma. Pode ocorrer
hemorragia meníngea secundária à tração dos vasos meníngeos pela contração do tecido
considerável.
baixa nas desidratações hipertônicas. Mais uma vez, esse achado reflete a extrema
extracelular. Como basta uma elevação de 2 ou 3 mOsm/L para deflagrar a sensação de sede
(ver Capítulo 11), o indivíduo ingere água até anular essa variação, desenvolvendo expansão
associada em alguns casos a um genuíno excesso de ingestão de sal. Essa anomalia tem sido
observada em lactentes, os quais, por não ter acesso à água, não têm como diluir uma
eventual ingestão excessiva de sódio. A fração de excreção urinária de sódio pode ser
utilizada para distinguir os casos de oferta excessiva de sódio (em que a fração de excreção
de sódio está alta) dos de desidratação hipernatrêmica (em que a fração de excreção de sódio
está baixa).
Desidratações isonatrêmicas
solução salina isotônica (“fase rápida”), deve ter prioridade absoluta sobre o tratamento dos
pela restauração da volemia através da infusão de uma solução salina isotônica, antes mesmo
de sódio a níveis mais seguros. Nesses casos, a conduta consiste em administrar solução
estabilização dos sinais vitais, a hiponatremia deve ser definitivamente corrigida pela
não seja realizada muito rapidamente. As células cerebrais são capazes de diminuir a
osmolalidade do seu meio quando submetidas durante algum tempo a uma hipotonicidade
sódio hipertônico, as células cerebrais não terão tempo de se readaptar, e poderão sofrer um
efeito oposto àquele que se pretende evitar: ao invés de edema, poderemos ter uma
pontina. O risco de que essas complicações se desenvolvam é tanto maior quanto maior tiver
correção da natremia deve ser sempre lenta, admitindo-se como seguro um ritmo de
elevação de, no máximo, 1,5 mEq/L/hora.. Nos casos em que a hiponatremia se tiver
dessas complicações é menor, permitindo uma correção mais rápida da natremia com o
Após a restauração rápida da volemia e a estabilização dos sinais vitais, também aqui
a infusão de solução isotônica ou até mesmo antes dela caso a hipernatremia esteja
assim chamados osmóis idiogênicos. Essa adaptação será tanto mais completa quanto mais
excessivamente rápida, pode não haver tempo para que as células cerebrais reduzam sua
osmolalidade interna. Com isso, estabelece-se uma força osmótica que tende a levar
desenvolvimento de edema cerebral. Por essas razões, o ritmo de redução da natremia deve
água e sódio. Selecione cada um dos casos clicando na linha correspondente dentro do
clínicos do caso. Observe quais parâmetros de ingestão e/ou excreção estão alterados.
gráfico situado na parte inferior esquerda da tela e indicados pela direção em que a mão
está apontando. Anote qual o tipo de desidratação (hipertônica, isotônica) que ocorre em
cada caso. Clique em “CORRIGIR DEFICITS” para ter acesso aos meios de tratamento
K : Plasma + Interstício
150 mEq/l), enquanto cerca de 10% situam-se no espaço extracelular. Desses 10%, no
entanto, cerca de 8% situam-se no tecido ósseo, de onde apenas muito lentamente são
mobilizados, enquanto apenas cerca de 2% encontram-se verdadeiramente em solução
no plasma e no fluido intersticial, onde sua concentração é, como vimos, muito
inferior à do espaço intracelular. Para todos os efeitos práticos, portanto, temos no
organismo dois compartimentos de tamanhos extremamente desiguais em termos de
suas quantidades de K+, e que se encontram separados por uma extensa fronteira,
representada pelas membranas celulares. As dimensões relativas desses
compartimentos encontram-se representadas esquematicamente na Fig. 8-1. A
extrema disparidade dessa distribuição faz com que pequenos deslocamentos de K+
entre os compartimentos intra e extracelular exerçam um efeito avassalador sobre a
concentração extracelular do íon (ver adiante).
As células musculares constituem de longe o maior reservatório corpóreo de
K+, armazenando de 2.300 a 3.000 mEq do íon + (o que faz com que a massa muscular
influencie profundamente a quantidade corpórea de K+). Esse predomínio não chega a
surpreender, considerando o importante papel que o K+ desempenha no processo de
contração muscular. Já as células ósseas abrigam cerca de 300 mEq, os hepatócitos e
as hemácias em conjunto contribuem com cerca de 500 mEq, enquanto todo o restante
das células é responsável por 300 mEq.
Para manter os níveis de K+ entre 3,5 e 5,5 mEq/L, é necessário ao organismo
manter rigorosamente nulos dois tipos de balanço. O primeiro deles é o balanço
externo, ou seja, a diferença entre a quantidade de K+ ingerida com a alimentação e
aquela que é perdida para o meio externo. Normalmente, a maior parte dessa perda é
representada pela excreção urinária (aproximadamente 90%), enquanto a excreção
fecal responde pelos restantes 10%. A dieta ocidental contém entre 50 e 150 mEq/dia,
dependendo da quantidade de carnes, frutas e verduras que compõem o cardápio de
cada um. Isso corresponde a uma excreção urinária entre 45 e 135 mEq/dia e a uma
excreção fecal entre 5 e 15 mEq/dia. No entanto, a excreção fecal pode superar 100
mEq/dia em condições patológicas como as diarréias. Além disso, perdas inteiramente
anômalas de K+, como os vômitos, podem ocorrer. Nesses casos, poderemos ter um
balanço externo negativo de K+. Os próprios rins, se houver perda tubular excessiva,
podem provocar o aparecimento de um balanço negativo de K+. Por outro lado,
3
PROXIMAL
ALÇA FINA
DESCENDENTE
ALÇA FINA
ASCENDENTE
ALÇA
ESPESSA
DISTAL
COLETOR
+
H+ Na
Na+
ATPase
GL
AA ICOS Na+
,P
O E,
+
4
K
Na+
ATP
K + K+
Na +
Na +
+
ATP
Na
K +
+ -
-
-+
Cl Cl-
L I
Figura 8-4 – Representação esquemática do transporte
de Na+, K+ e Cl- no túbulo distal final e no túbulo
coletor. L, lume; I, interstício
(ver adiante). É possível que a absorção de K+ nesse segmento sirva para modular a
secreção desse íon, ajudando assim a estabelecer um ajuste fino de sua excreção. É
possível também que essa absorção de K+ nas porções finais do túbulo coletor
constitua a base da chamada recirculação de K+: várias evidências experimentais
sugerem que uma parte do K+ secretado nos túbulos distal final e coletor cortical
retorna ao néfron através da pars recta do túbulo proximal e da porção descendente
fina da alça de Henle (ou seja, acaba sendo secretado também nesses segmentos).
Esse fenômeno parece ocorrer principalmente nos néfrons justamedulares, cujas alças
finas alcançam a papila renal e, portanto, as regiões da medula onde é máxima a
concentração de solutos, inclusive a de K+. O significado fisiológico dessa
recirculação é também obscuro. É possível que o fenômeno sirva para facilitar a
absorção de Na+ nesses segmentos, sem que para isso seja necessário excretar grandes
quantidades de K+ (ver Capítulo 5). É possível ainda que a recirculação de K+
contribua para aumentar a concentração de solutos e, portanto, a osmolalidade do
interstício medular, participando assim do processo de concentração urinária.
BALANÇO INTERNO
Insulina
Catecolaminas
Aldosterona
Equilíbrio ácido-base
Tonicidade plasmática
a) Renal
Quando consideramos a resposta do néfron a variações na carga ingerida de
+
K , dois conceitos fundamentais devem ficar bem claros:
PROXIMAL PROXIMAL
ALÇA ALÇA
ESPESSA ESPESSA
DISTAL DISTAL
COLETOR A COLETOR B
Fig. 8-5 – Representação esquemática do processamento renal de potássio em condições de sobrecarga (A) e depleção (B) do íon
b) Extrarrenal
Além dos mecanismos renais descritos acima, outros processos de adaptação
podem contribuir para a regulação da excreção de K+. A excreção fecal de K+ pode
variar de acordo com a ingestão do íon, talvez devido à ação da aldosterona no
epitélio do cólon, de modo análogo ao observado nos túbulos distal e coletor. O
organismo pode ainda reagir a estados de retenção ou depleção de K+ deslocando o
15
HIPOCALEMIAS
P ER DA GANHO
10
9
8
7
[K] plasma, mmol/L
6
5
4
3
2
1
0
-1000 -800 -600 -400 -200 0 200
BALANÇO CUM ULATIVO DE K, m m o l
(inferiores a 2 mEq/L), uma pequena queda da calemia pode estar indicando um sério
agravamento da deficiência acumulada do íon.
As perdas externas de K+ podem envolver diretamente os rins (perdas renais)
ou outras estruturas (perdas extrarrenais).
16
Perdas extrarrenais.
1. Falta de ingestão
É muito rara a ocorrência de hipocalemia por falta de ingestão de
K+, uma vez que este é o cátion mais abundante nos alimentos de
origem animal ou vegetal. Entretanto, indivíduos portadores de
anorexia nervosa, cuja ingestão de K+ pode cair a níveis
baixíssimos, ocasionalmente desenvolvem hipocalemias graves e
potencialemnte fatais. A razão para isso é que sempre existe
alguma secreção de K+, por menor que seja, nos túbulos distal e
coletor, bem como no cólon. Mantido ao longo de semanas ou
meses, esse pequeno balanço negativo de K+ pode levar ao
acúmulo de uma grande deficiência do íon.
2. Diarréia
Em indivíduos normais, a concentração de K+ nas fezes é
relativamente elevada (~50-100 meq/L). No entanto, as perdas entéricas
diárias deste cátion são baixas, dado o baixo o volume de água excretado
com as fezes (~100-200 ml/dia). Já nas diarréias, o volume de água excretado
com as fezes pode estar 10 ou mais vezes aumentado em relação ao normal,
levando assim a perdas significativas de K+. Essa depleção pode ocorrer
muito rapidamente nas diarréias agudas muito intensas, como ocorre na
cólera. Nesses casos, pode não haver tempo para que o K+ saia do espaço
intracelular em quantidade suficiente para atenuar a queda na concentração
plasmática de K+, levando a hipocalemias bastante graves. No entanto, é mais
comum a ocorrência de hipocalemias profundas nas diarréias crônicas.
Nesses casos, embora o volume das fezes seja menor do que nas diarréias
agudas, o tempo durante o qual o problema persiste é longo o suficiente para
que se acumule uma grande deficiência de K+, que se reflete na concentração
plasmática do íon.
P ER DA GANHO
10
9
8 17
7
3. Vômitos-
18
Perdas renais.
Os rins, normalmente muito eficientes na manutenção do balanço de
K+, podem em certas circunstâncias constituir a causa primária de uma perda externa
de K+.
1. Abuso de diuréticos
O mecanismo mais freqüente de perda renal de K+ é o abuso de diuréticos, seja
por prescrição médica (hipocalemia de origem iatrogênica), seja por iniciativa do
próprio paciente, julgando erroneamente que assim conseguirá “emagrecer”. Todos os
diuréticos atualmente em uso, com exceção dos retentores de K+, provocam caliurese
por elevar o aporte de Na+Cl- e o fluxo intraluminal de fluido aos túbulos distal e
coletor, aumentando assim a secreção de K+ por esses segmentos. As maiores
19
2. Excesso de aldosterona
O hiperaldosteronismo, tanto o primário (tumores e hipertrofia da
suprarrenal) quanto o secundário (em conseqüência de hipovolemia ou de
hipoperfusão renal, como na insuficiência cardíaca congestiva e na cirrose
hepática) é também causa frequente de hipocalemia, tanto pelo aumento que
promove na secreção de K+ como pelo efeito da alcalose metabólica associada.
3. Anomalias genéticas
Há uma série de defeitos genéticos que, embora raros, são valiosos para
ajudar a compreender alguns mecanismos íntimos de transporte de eletrólitos
no néfron. Não consideraremos em detalhe as características clínicas
específicas, os tipos de herança ou os mecanismos gênicos envolvidos nessas
doenças, limitando-nos a abordar os aspectos diretamente ligados ao transporte
de eletrólitos e, em especial, ao transporte de K+.
A síndrome de Bartter caracteriza-se basicamente por uma perda renal
exagerada de Na+, Cl- e K+, levando a um quadro de desidratação e
hipocalemia persistentes. A razão para essa anomalia é um defeito no
transporte desses íons na porção espessa da alça de Henle, seja no
cotransportador Na+-K+-2 Cl- da membrana luminal, no canal de K+ situado na
mesma membrana, ou no canal de Cl- localizado na membrana basolateral (ver
Capítulo 5). Em qualquer dos casos, o indivíduo comporta-se como se
estivesse recebendo, de modo contínuo, um diurético de alça tal como o
furosemide (ver Capítulo 6). Além das perdas urinárias de Na+, Cl- e K+,
ocorre também hipercalciúria, o que pode levar a um quadro de
desmineralização óssea (ver Capítulo 13).
Na síndrome de Gitelman, o defeito situa-se no cotransportador Na+-
Cl- característico do túbulo distal inicial (ver Capítulo 5). Nesse caso, o
paciente comporta-se como se estivesse tomando cronicamente um diurético
do grupo dos tiazídicos (ver Capítulo 6), apresentando-se em hipovolemia e
20
5. Outras causas
O tratamento sistêmico com a anfotericina B, um potente
antifúngíco, tem como um de seus efeitos colaterais a hipocalemia. Essa
droga promove a formação de poros na membrana luminal das células
21
1. Alcalose metabólica
Nas alcaloses metabólicas, o alto pH do meio interno ativa a Na+,K+-
ATPase das membranas celulares, promovendo assim a entrada de K+ no
interior das células. Além disso, e em razão desse mesmo movimento, a
secreção de K+ pelas células principais é acelerada, aumentando a perda
renal do íon, o que contribui para agravar e perpetuar a hipocalemia. As
alcaloses respiratórias também se fazem acompanhar de hipocalemia. No
entanto, esta é menos intensa do que nas alcaloses metabólicas. A razão
para essa diferença é ainda obscura.
22
2. Excesso de catecolaminas.
O feocromocitoma é um tumor das células cromafins da medular da
suprarrenal, o qual pode produzir catecolaminas em grande quantidade. O
paciente desenvolve sintomas típicos de hiperatividade simpática, como
suores nas mãos e taquicardia, além de hipertensão grave. Esses casos
podem fazer-se acompanhar de hipocalemia intensa, devido ao efeito da
estimulação, pelo excesso de catecolaminas, dos receptores β2, e ao
conseqüente ingresso de K+ ao interior das células.
4. Hipertiroidismo
Em raros pacientes com excesso de função tiroideana observaram-se
episódios de hipocalemia bastante semelhantes aos descritos em indivíduos
com paralisia periódica familiar, tanto em suas manifestações clínicas quanto
em sua fisiopatologia. O mecanismo responsável por essa complicação é
também desconhecido, embora seja plausível uma participação da
hiperatividade simpática característica do hipertiroidismo.
Reposição de K+.
A administração exógena de K+ é uma óbvia medida a ser
tomada visando à correção das hipocalemias, até mesmo nos casos
em que estas decorrem de um deslocamento de K+ para o espaço
intracelular. No entanto, algumas medidas de cautela são necessárias
para evitar que se instale uma hipercalemia iatrogênica. Em
primeiro lugar, mesmo em pacientes com hipocalemia grave, a taxa
de administração de K+ não pode, em hipótese alguma. ultrapassar
40 mEq/hora (a uma concentração na solução infundida de até 100
25
Retentores de K+
A administração de diuréticos retentores de K+ é outra conduta
óbvia no tratamento das hipocalemias. No entanto, essa medida
serve principalmente à prevenção das perdas de K+, não podendo
substituir a administração do próprio íon quando essas perdas já se
estabeleceram. A prevenção da hipocalemia é especialmente
importante em pacientes recebendo simultaneamente digitálicos e
diuréticos para o tratamento da insuficiência cardíaca congestiva.
HIPERCALEMIAS
1. Acidoses
30
2. Deficiência insulínica
A cetoacidose diabética pode provocar hipercalemia por
transferência de K+ do espaço intra para o extracelular. Além da
própria hipoinsulinemia, colabora para esse efeito a
hiperosmolaridade que esses pacientes apresentam. Esta decorre,
por sua vez, da própria hiperglicemia (em estados de deficiência
insulínica, a glicose, cujo acesso às células é limitado, funciona
como um osmolito) e da hipernatremia que se desenvolve em razão
da perda urinária de água em desproporção à de sódio. Podem
contribuir ainda para o quadro o hipoaldosteronismo
hiporreninêmico, que freqüentemente se associa à diabetes
mellitus, e a própria acidose metabólica, embora o efeito desta
última seja modesto por se tratar de uma acidose orgânica. É
interessante observar que, em termos de balanço externo, a
cetoacidose diabética promove uma perda renal de K+, devido à
diurese osmótica provocada pela hiperglicemia, ao conseqüente
aumento do aporte de Na+ aos túbulos distal e coletor e ao aumento
do fluxo intraluminal de fluido a esses segmentos. O efeito dessa
perda é amplamente compensado pelo deslocamento de K+ desde o
espaço intracelular. Há aqui uma importante implicação
terapêutica: ao se corrigir a deficiência insulínica, bem como as
31
3. Administração de β-bloqueadores
Conforme discutido acima, o estímulo dos receptores β2
adrenérgicos tende a facilitar o ingresso de K+ às células. Não
chega a surpreender, portanto, que os β bloqueadores, amplamente
utilizados no tratamento da hipertensão arterial, tendam a elevar
modestamente a concentração plasmática de K+. Na presença de
outros fatores tendentes a elevar a calemia, como por exemplo uma
insuficiência renal, a hipercalemia resultante pode chegar a níveis
alarmantes, obrigando à suspensão da medicação ou à sua
substituição por antagonistas β1-específicos.
5. Hemólises
As hemólises maciças, tais como as associadas a transfusões de
sangue incompatível e às anemias hemolíticas graves, promovem
hipercalemia transitória por mecanismo análogo ao das
rabdomiólises, ou seja, destruição de um grande número de células,
com liberação de uma carga considerável de K+ para a circulação.
Também no caso das hemólises pode ocorrer uma insuficiência
renal aguda, devido à liberação de um pigmento, no caso a
hemoglobina. Neste caso, a hipercalemia será obviamente muito
mais acentuada.
6. Quimioterapia de neoplasias
O tratamento quimioterápico de neoplasias, especialmente
linfomas e leucemias, acarreta a rápida destruição de um grande
número de células, levando a uma liberação maciça de K+ para o
meio extracelular e podendo causar hipercalemia, especialmente
em pacientes com função renal reduzida.
7. Pseudo-hipercalemia
A concentração plasmática de K+ pode estar falsamente elevada
devido a procedimentos errôneos na coleta e/ou no manuseio das
amostras de sangue. O mais freqüente desses erros é a aplicação de
sucção excessiva à seringa, com formação de bolhas, hemólise
parcial da amostra e liberação de K+ para o soro. A aplicação
prolongada de um garrote para facilitar a coleta de sangue pode
também contribuir para elevar falsamente a concentração sérica de
K+. Em alguns pacientes, a permeabilidade da parede das hemácias
a K+ in vitro é alta, permitindo a rápida saída do íon após a coleta.
Finalmente, amostras de sangue contendo altas contagens de
leucócitos podem ser contaminadas com K+ egresso dessas células.
33
8. Outras causas
As hipercalemias podem ainda resultar de a) intoxicações
digitálicas, que causam uma inibição acentuada da Na+,K+-
ATPase, dificultando a entrada de K+ na célula. b) exercícios
exaustivos, como as maratonas, durante os quais quantidades
substanciais de K+ podem deixar as células musculares
esqueléticas. c) tratamento com relaxantes musculares
despolarizantes, tais como a succinilcolina, utilizada em cirurgias
extensas. d) paralisia periódica hipercalêmica, uma rara condição
familiar em que ocorrem crises de hipercalemia e paralisia
muscular, aparentemente associadas à despolarização da membrana
das células musculares e a um rápido efluxo de K+, talvez por uma
disfunção da Na+,K+-ATPase. Esse distúrbio não deve ser
confundido com a paralisia periódica familiar, descrita acima, na
qual ocorre hipocalemia. O fato de que tanto uma quanto outra
podem promover paralisia muscular reflete a complexidade do
efeito do K+ sobre a eletrofisiologia celular (ver adiante)
1. Gluconato de cálcio
35
3. Insulina
A administração endovenosa de insulina facilita, como vimos, a
entrada de K+ nas células, constituindo-se em uma maneira simples e
eficaz de reduzir em minutos a calemia. Ë necessária a administração
simultânea de glicose (4g para cada unidade de insulina) a fim de evitar o
desenvolvimento de uma hipoglicemia.
4. β-adrenérgicos
Assim como a insulina, os β-adrenérgicos promovem a entrada de K+
nas células. Devem ser utilizados com bastante cuidado, uma vez que
podem facilitar a instalação de arritmias cardíacas. Seu uso deve ser
evitado em pacientes com miocardiopatias ou com arritmias já instaladas
EXERCÍCIOS
1. . Logo que o programa é iniciado, a opção que está ativada é “Variação livre dos
parâmetros”. Varie a ingestão de potássio e a perda desse íon através da urina,
fezes ou vômitos. Observe o que acontece ao estoque de potássio intracelular
(barra rósea) e extracelular (barra verde). Observe a variação da concentração
plasmática de potássio e o caráter não linear da variação desse parâmetro em
relação ao balanço de potássio (concentrações plasmáticas de 2.0 mmol/L podem
ou não refletir uma grande perda acumulada de potássio. Já os balanços positivos
de potássio tendem a promover uma rápida elevação da [K] plasmática). É
possível variar o número de dias durante os quais a situação criada persiste. Pode-
se ainda variar o estado do equilíbrio ácido-base escolhendo “acidose” ou
“alcalose” no quadro correspondente. Observe o efeito dessas alterações sobre a
distribuição de K entre os compartimentos intra e extracelular.
VOLUME
VOUME INTRACELULAR INTERSTICIAL
VOL. INTRACELULAR
VOL. INTRAVASCULAR
VOL. INTRACELULAR
VOL. INTRAVASCULAR
Volume intravascular
Natriurese pressórica
Inervação simpática
Catecolaminas
Sistema renina-angiotensina
Excreção de Na+ Hormônio antidiurético
Fator natriurético atrial
55
50
∆P ∆π
∆ PI
Difere nça de Pre ssã o (mmHg)
45
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distân cia
60
55
Delta P ∆πPI
Delta
50
45
Difer ença de Pres são (mmHg)
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distân cia
60
50
Volume intersticial, L
40
30
20
10
0
-6 -4 -2 0 2 4 6 8 10 12
Pressão intersticial, mmHg
EDEMA LOCALIZADO
∆ P Normal ∆P ∆π
60
55
50
45
Diferença de Pressão (mmHg)
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distância
Retenção
de Na+
40
35
30
DÉBITO CARDÍACO, L/min
25
20
15
B
10 A
5 C
0
-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
PRESSÃO ÁTRIO DIREITO, m m Hg
Fig. 9-9 –Curva de Starling para um coração normal. A linha
pontilhada representa a demanda tecidual .
da Fig. 9-9. Essa curva representa a lei de Starling para o coração (não confundir com as
forças de Starling descritas acima). De acordo com esse princípio, e dentro dos limites
fisiológicos, a força de contração do miocárdio durante a ejeção sistólica é tanto maior
quanto maior for o estiramento a que o miocárdio está submetido ao final da diástole. Isso
significa que, quanto maior o volume diastólico, maior o volume sistólico, ou, em outras
palavras, quanto maior o retorno venoso, maior o débito cardíaco. Como o volume
diastólico é proporcional à pressão do átrio direito, podemos representar o débito cardíaco
como uma função da pressão atrial direita, como na curva A da Fig. 9-9. Observe-se ainda
que o débito cardíaco tende a um máximo (representado pelo platô B) conforme a pressão
atrial direita (e portanto o retorno venoso) atinge valores exageradamente elevados (esse
débito cardíaco máximo pode ser aumentado com o treinamento do indivíduo). Se
representarmos agora as necessidades totais de perfusão dos tecidos (ou seja, a soma de
todos os fluxos sangüíneos requeridos pelo organismo) pela linha C da Fig. 9-9, o débito
cardíaco e a pressão atrial direita observadas em um determinado momento e em um
determinado indivíduo corresponderão à interseção entre a curva A e a linha C.
Normalmente, como se pode observar, esse ponto está longe do platô (B) que representa o
débito cardíaco máximo, indicando a existência de uma reserva cardíaca. Se a demanda
por parte dos tecidos aumentar, como ocorre durante a realização de um exercício (ou
seja, se a linha C for elevada), o coração ainda é capaz de atender a essas necessidades,
sendo agora o débito cardíaco determinado pela nova interseção entre A e C. Se a
demanda for tal que a interseção A×C fique na região do platô (B), a elevação da pressão
atrial direita será excessiva e o coração não conseguirá manter por muito tempo o débito
exigido: o indivíduo pára por estafa (em um indivíduo treinado esse limite é
evidentemente muito mais alto).
Na presença de uma lesão miocárdica, primária ou não, a curva A desloca-se para
a direita e para baixo. Em fases não muito avançadas, ainda é possível manter a demanda
dos tecidos, e até mesmo realizar algum esforço físico. O preço dessa adaptação, no
20
DÉBITO CARDÍACO, LITROS
15
10
5 C
A
0
-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
Sinusóides
Artéria hepática
Veia porta
Canalículo biliar
Veia centrolobular
Capilar comum ∆Ρ ∆π
60
55
50
DiferençadePressão(mmHg)
45
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distância
50
Diferença de Pressão (mmHg)
45
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distância
50
Diferença de Pressão (mmHg)
45
40
35
30
25
20
15
10
0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
Distância
Fig.9-14–Dinâmica dos capilares periféricos na síndrome nefrótica com retenção renal primária de
sódio. As linhas cinzentas representam as pressões hidráulica e oncótica normais
capilar, a qual, em associação com a queda da pressão oncótica, promove uma filtração
exagerada ao longo da maioria dos capilares do organismo (Fig. 9-14). Há inúmeras
evidências de que, em muitos pacientes nefróticos, os rins possuem uma tendência
intrínseca à retenção de sódio. É comum a presença, nesses pacientes, de
glomerulonefrites, usualmente da forma membranosa e membranoproliferativa
(raramente da forma difusa aguda mencionada acima) e de outras glomerulopatias, como
a glomerulosclerose focal e a glomerulosclerose diabética. Em todos esses casos, é
razoável supor que a lesão renal leva a uma redução intrínseca da capacidade renal de
excretar sódio e água, resultando na retenção de fluido e formação de edema por
“overflow” (ou seja, o processo adquire um caráter “nefrítico”). Várias evidências obtidas
em animais de laboratório, utilizando modelos experimentais de síndrome nefrótica por
lesão tóxica ou imunológica do glomérulo, vieram reforçar essa hipótese. Tomados em
conjunto, os dados hoje disponíveis sugerem que o edema da síndrome nefrótica resulta
de uma associação entre uma queda da pressão oncótica plasmática e uma elevação da
pressão hidráulica capilar devido a uma retenção renal primária de sal e água. Em alguns
casos, em que a perda proteica é muito intensa e a capacidade renal de excretar sódio está
conservada, é possível explicar o edema nefrótico por um mecanismo de “underfilling”.
Em outros, a retenção renal primária de sódio e água parece ser o mecanismo
predominante, levando à formação de edema por um mecanismo de “overflow”, embora o
processo seja certamente facilitado pela diminuição simultânea da pressão oncótica
plasmática.
TRATAMENTO DO EDEMA
Como é óbvio, a terapêutica de qualquer edema deve incluir, sempre que possível,
a remoção da causa primária do distúrbio: cardiotônicos na insuficiência cardíaca
congestiva, corticosteróides na síndrome nefrótica, etc, embora existam casos em que
essa abordagem é difícil ou impossível, como na cirrose hepática. Além de tratar a causa
primária do edema, é quase sempre necessário promover um balanço negativo de sódio,
para que o volume circulante se reduza, a pressão hidráulica capilar diminua e haja
movimentação de fluido do interstício para o espaço intravascular e daí à urina. É
possível conseguir essa perda de sódio restringindo-se severamente a ingestão de sal, ou
aumentando sua excreção através do uso de diuréticos. No entanto, como os diuréticos
espoliam inicialmente o espaço intravascular, o uso indiscriminado dessas drogas pode
provocar hipovolemias graves e até mesmo a insuficiência renal aguda em pacientes com
redução intensa do volume arterial efetivo, como por exemplo os cirróticos avançados.
Tais tratamentos devem ser acompanhados de perto, com medida diária do peso, volume
urinário e pressão arterial nas posições supina e ereta. O tratamento imediato com
indução de grande diurese só cabe em situações de emergência, como no edema agudo de
pulmão.
EXERCÍCIOS
1 – Observe inicialmente o gráfico no alto à direita, onde estão representadas as duas forças
de Starling: a diferença de pressão hidráulica (∆P) e a diferença de pressão oncótica
(∆π) entre o interior do capilar e o interstício. Note a semelhança com as forças que
governam a ultrafiltração no capilar glomerular. Observe também o gráfico situado
abaixo e à direita. Nele está representado o volume de fluido existente no interstício
(ordenadas) em função da pressão hidráulica intersticial (abscissas). Na condição
normal, existem cerca de 11 L no interstício, a uma pressão hidráulica de –3 mmHg.
(observe a localização do círculo vermelho). Aumentos no volume de fluido intersticial
corresponderão à formação de edema.
2 – Eleve agora a pressão hidráulica capilar. Note que o volume de fluido intersticial
(gráfico inferior à direita) não aumenta (ou seja, não se forma edema) de imediato,
mesmo com elevações consideráveis da pressão hidráulica capilar. Leia com atenção a
mensagem que agora aparece, discutindo as adaptações que previnem a formação de
edema nessas condições.
4 – Faça retornar o sistema à condição padrão. Diminua agora, lentamente (utilizando a seta
à esquerda da barra deslizante) a concentração plasmática de proteínas. Baseado nos
exercícios anteriores e nas mensagens que continuam a aparecer, procure entender por
que não se forma edema de imediato. Que adaptações ocorrem neste caso? (Observe
novamentre o fluxo linfático e a pressão oncótica intersticial). Quando a concentração
plasmática de proteínas for suficientemente baixa, há formação de edema. Observe
novamente a seqüência de eventos que acompanham a formação de edema e sua
cessação. Interprete.
I. INTRODUÇÃO:
físicas. Uma destas é a pressão que o sangue exerce sobre a parede das grandes artérias,
momento da vida, uma pressão arterial acima de certos valores aceitos como normais. A
fisiopatologia desta elevação crônica da pressão arterial é uma temática muito complexa,
até mesmo por não haver, ainda hoje, uma definição precisa de hipertensão arterial. Neste
capítulo será discutida uma parte do que é conhecido a respeito dos principais mecanismos
ARTERIAL:
A pressão arterial é uma variável cuja distribuição na população é gaussiana: os
mínimo e um valor máximo (Fig. 10-1), o que torna difícil estabelecer um ponto de corte
25
20
Freqüência, %
15
10
0
0 20 40 60 80 100 120 140
Pressão diastólica, mmHg
hipertensão arterial tem de certo modo uma natureza estatística: trata-se de um desvio da
atualmente adotado é o de 135 mmHg para a pressão sistólica e de 85 mmHg para a pressão
variabilidade da pressão arterial em cada indivíduo. A pressão arterial varia de acordo com
a hora do dia, com o grau de atividade física e com o estado emocional, podendo ser
influenciada até mesmo pela presença do médico (“hipertensão do jaleco branco”).. Essas
determinação da pressão arterial deve sempre ser feita por pessoal devidamente treinado,
mesmo horário, devendo-se medir a pressão arterial mais de uma vez em uma mesma
pressão arterial esteja alta em três consultas sucessivas, para evitar que uma elevação
condição permanenete.
masculino com idade superior a 40 anos, essa prevalência pode ultrapassar 50%. Fica fácil
assim entender o impacto social da hipertensão arterial, já que a agressão mecânica imposta
Dentre estas, as mais conhecidas pela população, por seu caráter dramático e por sua
exposição do tecido renal durante muitos anos a altas pressões de perfusão leva uma parte
dos pacientes a desenvolver uma fibrose crônica do parênquima renal, que termina
causando a perda irreversível da função desse órgão. Finalmente, uma pequena parcela dos
quando se consideram suas causas. Na verdade, apenas em cerca de 10% dos pacientes
hipertensos é possível identificar uma causa definida para a elevação da pressão arterial,
hipertensões, não se consegue encontrar uma causa definida para o distúrbio. Isso não
significa que a hipertensão arterial seja uma condição incompreensível para a Medicina. Na
cada vez maior que a hipertensão não pode ser considerada como o resultado de um único
primária resulta da interação entre fatores genéticos (ou seja a disfunção de um ou mais
genes) e fatores ambientais (consumo excessivo de sal, obesidade, fumo, entre outros).
do sistema circulatório.
F=(Pi-Pf)/R,
entre F, Pi, Pf e R, conhecida como equação de Pouiseille, pode ser transposta, com
DC=(PA-PV)/R
magnitude muito pequena, sendo possível retirá-la da fórmula sem incorrer em um erro
PA = DC×R (2)
O conceito contido na equação 2 pode ser melhor visualizado com o auxílio da Figura 10-2,
~ PA
DC
RP
PA = DC RP •
Fig. 10-2 – Representação esquemática e simplificada da circulação. A pressão arterial (PA) sempre pode
ser expressa como o produto do débito cardíaco (DC) e da resistência periférica (RP)
R= k/r4 (3)
DC=k×PA/r4 (4)
proporcional à quarta potência do raio dos condutos que formam o sistema circulatório, ou
seja, os vasos sangüíneos. A maior parte desse efeito é representada pelas arteríolas, que
principalmente nas arteríolas que agem os compostos vasoativos que ajudam a regular
momento a momento a pressão arterial. É também principalmente através das arteríolas que
os tecidos regulam o fluxo sangüíneo que os perfunde, num processo conhecido como
hipertenso. Sejam quais forem esses mecanismos, no entanto, seus efeitos sobre a pressão
periférica, ou de ambos.
aquecedor. É assim que funciona também o nosso termostato interno: sensores cutâneos e
ajuste. Sistemas semelhantes atuam na regulação do nível sérico de cálcio (ver Capítulo 13)
um processo bem mais complexo. Temos aqui a interação de vários mecanismos atuando
em paralelo, cada um com sua própria dinâmica e com seus próprios efetores. Há
supina (horizontal) para a ereta. Esses sistemas são também muito úteis em situações de
emergência, como em uma hemorragia, por exemplo. A médio prazo (horas ou dias),
adquire maior destaque a ação das propriedades mecânicas das paredes vasculares, capazes
A longo prazo, isto é, após um intervalo de alguns dias, entra em ação a capacidade
dos rins de controlar a excreção de sal e água. Essa capacidade baseia-se no fato de que a
pressão de perfusão renal exerce uma profunda influência sobre a excreção de sódio e água.
Esse fenômeno, denominado natriurese pressórica, transforma o rim num poderoso agente
efetor na regulação da pressão arterial. Quando a pressão arterial se eleva, a excreção renal
de água e sódio aumenta, reduzindo o volume sangüíneo. Com isso, cai o débito cardíaco,
baixando a pressão arterial (Equação 2 e Fig. 10-2) e trazendo de volta ao nível anterior a
aqueles que influenciam a excreção renal de sódio, tais como a angiotensina II, a
aldosterona, um retentor de sódio por excelência (ver Capítulo 2). É fácil perceber, tendo
em vista o esquema mostrado na Fig. 10-2, que esses compostos podem alterar a pressão
fator natriurético atrial e o óxido nítrico, atuam como espoliadores de sódio (natriuréticos).
estimulação de sistemas que liberam esses compostos, como o sistema nervoso simpático e
o sistema renina-angiotensina-aldosterona.
TEORIAS
consenso quanto à importância relativa de cada um, não chega a surpreender que também
quanto aos mecanismos que levam à hipertensão essencial haja uma grande dose de
pelo próprio SNC, está elevado em relação ao normal. De outro lado, temos os que
pelos rins. Vamos analisar separadamente cada uma dessas duas grandes hipóteses.
1) Teoria neurogênica:
Os proponentes da hipótese de que a hipertensão essencial é uma doença do sistema
nervoso central invocam série de evidências em apoio a sua tese. Salientam a importância
um aumento da resistência periférica. Mais do que isso, apresentam evidências de que esse
Na mesma linha, o grupo de Allyn Mark demonstrou que, em indivíduos com hipertensão
atividade nervosa, está aumentado. Além disso, a atividade parassimpática está reduzida
nesses pacientes.. Os indivíduos com hipertensão limítrofe são ainda, de acordo com
hipótese da origem nervosa da hipertensão, argumenta em favor desse ponto de vista que as
manobras que elevam a pressão arterial o fazem mesmo em face de profundas modificações
de um aumento no débito cardíaco. Baseado nesse tipo de evidência, Stevo Julius propõe
que o sistema nervoso central seja na verdade o grande controlador da pressão arterial,
mantendo-a constantemente ao redor de um valor previamente ajustado. Desarranjos desse
mecanismo central, de acordo com essa teoria, forçam a pressão arterial a elevar-se. Se se
tentar impedir essa elevação bloqueando por exemplo a vasoconstrição periférica, o sistema
ainda assim conseguirá trazer a pressão arterial a seu novo valor, aumentando o débito
aumenta nesse caso é a resistência periférica.. Portanto, o sistema nervoso central funciona,
de acordo com essa hipótese, como um regulador a longo prazo da pressão arterial. Nos
hipertensos, o ponto de ajuste está alterado, de modo análogo ao que ocorre com o centro
O sistema nervoso central exerce, sem sombra de dúvida, uma enorme influência
porção inferior da ponte, mantém através das fibras simpáticas um tônus contrátil na
situados no arco aórtico e no seio carotídeo. Através dos nervos vago, de Hering e
que dele emana. Quando a pressão arterial se eleva, o fluxo inibitório originado nos
baroceptores aumenta, fazendo-a retornar a seu valor inicial. É por essa razão que a
possibilidade parece hoje um tanto remota. O sinal proveniente dos baroceptores é de curta
como nova referência. Esta característica torna difícil imaginar como uma alteração do
componente sensor desse sistema de controle poderia originar uma hipertensão persistente.
Essa limitação fica evidente quando observamos o que ocorre quando os baroceptores são
sonolência, etc.), fortemente atenuadas pelo sistema nervoso central em animais intactos,
deixam de sê-lo nos animais intactos. No entanto, a pressão arterial mantém-se, na média
diária, em níveis semelhantes aos observados antes da denervação, ou seja, os animais com
formas através das quais o sistema nervoso central poderia perceber variações da pressão
arterial sistêmica, fica difícil entender como poderia funcionar o sistema de realimentação
negativa proposto por Stevo Julius. Existe no entanto a possibilidade de que uma disfunção
do sistema nervoso central eleve cronicamente a pressão arterial através de sua íntima
2) Teoria renal:
A teoria de que a hipertensão essencial é basicamente uma disfunção renal tem em
Arthur Guyton o seu defrensor mais destacado. De acordo com essa teoria, o rim, único
órgão a regular de modo significativo a excreção de sódio pelo organismo, é por essa
mesma razão o responsável último pelos níveis de pressão arterial sistêmica a longo prazo.
Ainda de acordo com essa teoria, além de constituir a única via de excreção de sódio de que
dispõe o organismo, os rins são também o único sistema capaz de responder diretamente a
alterações da pressão arterial com uma variação da excreção desse íon. Isso ocorre devido
rapidamente no interior do parênquima renal uma série de fenômenos ainda não muito bem
400 400
300 300
Ingestão/Excreção de Sódio (mEq/dia)
200 200
100 100
0 0
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
Pressão de perfusão renal (mmHg) Pressão de perfusão renal (mmHg)
A B
Fig. 10-3 – Natriurese pressórica. Variações da pressão arterial promovem um aumento da taxa de
excreção urinária de sódio ao longo da linha azul. O círculo vermelho, que marca a intersecção dessa
linha com a linha vermelha, representatrva da taxa de ingestão de sódio, é denominado ponto de
equilíbrio.A) - Em condições normais, esse ponto corresponde a uma pressão arterial média entre 90 e
95 mmHg . B) - Se a pressão arterial média se elevar a cerca de 100 mmHg, a taxa de excreção de sódio
dobrará, levando a um desequilíbrio entre ingestão e excreção de sódio.
compreendidos. Alguns desses processos são de natureza puramente física, como por
exemplo as alterações das pressões hidráulica e oncótica (forças de Starling) junto ao
túbulo proximal e o aumento do fluxo sanguíneo ao longo dos vasos retos medulares. Essas
alterações tendem a alterar a excreção renal de sódio no mesmo sentido do distúrbio inicial
dessa linha com a linha de ingestão de sódio é denominada ponto de equilíbrio. É esse
ponto de equilíbrio o que determina a longo prazo o valor da pressão arterial. Se por
natriurese pressórica. (Fig. 10-3b). Como a ingestão de sódio permanece constante, passa a
sódio (e conseqüentemente de água). Havendo tempo suficiente, essa perda de sódio e água
retorno da pressão arterial a seu valor original. Uma queda na pressão arterial tem um efeito
obrigatório, e não cessará enquanto a pressão arterial não houver retornado a seu valor
original. Dessa maneira, a pressão arterial será determinada, de um lado, pela taxa diária de
ingestão de sódio e de outro pela inclinação da linha de natriurese pressórica, que reflete em
última análise a sensibilidade do rim a variações de sua pressão de perfusão e, portanto, sua
capacidade de excretar sódio. Como essa linha é, em indivíduos normais, quase vertical, a
pressão arterial altera-se em geral muito pouco com a ingestão de sódio, mesmo que esta
varie amplamente.
permanentemente a pressão arterial sem que seja modificada a relação entre ingestão e
excreção renal de sódio. Uma maneira de se obter esse efeito poderia ser um aumento
substancial da ingestão de sódio. No entanto, um exame simples da linha azul na Fig. 10-3
indica que seria necessário aumentar extraordinariamente a ingestão de sódio para que
ocorresse uma elevação de uns poucos mmHg na pressão arterial média. Portanto, a única
Fig. 10-4a, a inclinação da linha azul diminuiu, ou seja, a linha de natriurese pressórica
deslocou-se para a direita, indicando uma menor capacidade renal de excretar sódio: são
400 400
300 300
Ingestão/Excreção de Sódio (mEq/dia)
200 200
100 100
0 0
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
Pressão de perfusão renal (mmHg) Pressão de perfusão renal (mmHg)
A B
Fig. 10-4 – Duas maneiras de se alterar a natriurese pressórica e provocar hipertensão arterial (deslocamento do ponto de
equilíbrio). A) diminuindo a declividade da linha de natriurese pressórica. Neste caso temos uma hipertensão sal-sensível. B)
deslocando a linha de natriurese pressórica para a direita, mantendo inalterada sua declividade. As linhas pontilhadas indicam
a natriurese pressórica normal.
agora necessárias pressões arteriais mais elevadas para que ocorra a excreção de uma
arterial eleva-se até que a excreção e a ingestão de sódio se igualem. estabilizando-se nesse
novo valor, necessariamente elevado em relação ao normal. Esse efeito pode ser obtido em
hipertensão essencial. Note-se que, em um indivíduo com esse tipo de anomalia, a pressão
arterial cai sensivelmente quando se reduz a ingestão de sal – o ponto de equilíbrio desloca-
se para a esquerda e para baixo, sendo possível até mesmo normalizar a pressão arterial.
Essas hipertensões são portanto sal-sensíveis. Uma outra maneira de se interferir com a
por exemplo um tiazídico (ver Capítulo 6). Nesse caso, a linha azul inclina-se para a
esquerda e a pressão arterial cai até que ingestão e excreção de sódio novamente se
ambos os casos, estaremos aumentando a capacidade renal de excretar sódio. Essa constitui
características da natriurese pressórica. Neste caso, a reta está deslocada para a direita,
será necessária uma pressão arterial mais elevada para uma mesma excreção de sódio,
pressão arterial neste caso seria pouco afetada retirando-se o sal da dieta, uma vez que a
inclinação da linha não se alterou em relação ao normal. Temos aqui portanto um exemplo
efeito, sendo necessário administrar drogas que tendam a trazer a natriurese pressórica a
suas características normais. É provável que uma parcela considerável dos hipertensos
reúna características comuns a esses dois modelos de disfunção. Por essa razão, a restrição
ainda que parcial à ingestão de sal e o uso de diuréticos integram de modo proeminente o
arsenal terapêutico utilizado no combate à hipertensão.
o hipertenso sempre apresenta uma relativa incapacidade de excretar sódio, não requer
capacidade de regular sua própria perfusão modificando a resistência das arteríolas que os
concentração local de catabólitos, como o O2, o CO2 e os íons H+, à medida que varia o
fluxo sangüíneo. Quando este é baixo, acumulam-se catabólitos dilatadores, como o CO2.
renal de excretar sódio e o indivíduo passa a reter o íon, esse processo ocorre de modo
Essa anomalia tende a elevar ainda mais a pressão arterial. No entanto, essa elevação é
autolimitada, porque promove um aumento da excreção de sódio, o que aos poucos reduz o
periférica. Quando finalmente o indivíduo chega à situação estacionária (ou seja, quando a
zero (ou seja, como seria de se esperar, a ingestão e a excreção de sal são exatamente iguais
positivo de sódio. O indivíduo só retém uma pequena quantidade de sódio durante um curto
A teoria defendida por Guyton e outros encontra apoio em uma série de evidências
experimentais produzidas por esse grupo. Em cães que tiveram 70% de sua massa renal
removida, esses investigadores demonstraram que, mesmo nessas condições, o tecido renal
era ainda capaz de manter uma pressão arterial relativamente normal, provavelmente por
adaptação dos néfrons remanescentes (ver Capítulo 15). No entanto, quando esses animais
bebiam salina a 0,9% ao invés de água, desenvolviam hipertensão acentuada, a qual era
revertida quando voltavam a receber água pura. Esses resultados sugeriam que o que
quando os rins, mesmo sem sofrer redução de sua massa, têm diminuída sua capacidade
caso, os rins exigem uma elevação persistente da pressão arterial a fim de chegar a uma
taxa de excreção de sódio idêntica à de ingestão, ou seja, para chegar a um balanço zero de
sódio. Segundo a teoria de Guyton, um mecanismo semelhante a esse atua na maior parte
da capacidade renal de excretar sódio , com desvio para a esquerda da linha de natriurese
Uma série de evidências clínicas e experimentais obtidas por diversos outros grupos
dão respaldo à teoria da origem renal da hipertensão essencial. Talvez as evidências mais
Em experimentos realizados com várias cepas de ratos com hipertensão de origem genética,
observou-se de modo bastante consistente que a hipertensão "segue o rim". Isso fica claro
um doador hipertenso. Nesse caso, o receptor torna-se hipertenso. Isso ocorre mesmo
que a anomalia que leva à hipertensão é intrínseca àquele rim . O experimento inverso
Em outro estudo, pacientes com nefropatia hipertensiva terminal tiveram sua pressão
Outras evidências menos diretas dão também respaldo à teoria da origem renal da
de aorta, da redução cirúrgica da massa renal e talvez até mesmo de modelos classicamente
com dois rins (com um clip em uma das artérias). Algumas formas hereditárias de
hipertensão experimental dependem nitidamente da retenção renal de sódio, como é caso do
rato Dahl sensível, que se torna hipertenso quando submetido a um regime de alta ingestão
de sal. Outra linha de evidência em apoio à hipótese da retenção de sal é representada por
arterial. Esses estudos, dos quais um dos mais conhecidos é o INTERSALT, mostraram
que, em populações onde o consumo de sal é baixo, o aumento da pressão com a idade é
a idade em populações afeitas dietas ricas em sal. Finalmente, deve-se lembrar que uma
ingestão de sal e ao uso de diuréticos, mostrando que a capacidade renal de excretar sódio
pressão arterial e o caráter transitório da atuação dos baroceptores não exclui a participação
fatores genéticos capazes de causar hipertensão, mas ignoramos quais são os produtos
gênicos envolvidos. Dada a íntima conexão entre os rins e o sistema nervoso, é possível que
os rins. Os vasos renais e o processo de transporte tubular de sódio respondem a uma série
de estímulos de origem nervosa, seja através da inervação direta do parênquima renal, seja
sistema calicreina-cinina, entre outros (ver Capítulo 2). Dentre todos esses, o sistema
é ainda hoje considerado por muitos como o mais importante, devido a três razões
aldosterona, passando por uma série de efeitos celulares que podem influenciar
extrarrenais. Por essa razão, o SRAA é considerado em detalhe neste capítulo (ver também
o Capítulo 2).
de uma artéria renal produz hipertensão arterial em animais. A contrapartida clínica desse
justaglomerulares denominado renina. A renina, por sua vez, age sobre um substrato
nos túbulos distais finais e coletores corticais promove reabsorção de sódio e água (ver
Capítulo 5). Esse efeito retentor de sódio contribui para a elevação da pressão arterial. A
tumor da supra-renal, produtor deste hormônio. Como vimos anteriormente, esta anomalia é
endotélio pulmonar) resultando na produção da substância ativa do sistema, a A II, que age
nos vários órgãos através da circulação. Este modelo é útil e consistente com o que se
renina, ECA, Ang I e A II na circulação. Com bases nestes dados tornou-se claro que o
fator limitante para a formação de A II no plasma é a atividade da renina. Sabemos hoje que
diminuição da concentração de cloreto de sódio que alcança a mácula densa (por exemplo,
relativa desses estímulos, ou seja, a hierarquização dos mesmos nas diferentes situações
fisiológicas e patológicas. O desenvolvimento de agentes farmacológicos que interferem
com o sistema, principalmente aqueles que o inibem, foi muito importante no tratamento de
ECA, a partir dos anos 70 tornou-se um marco importante na medicina, pois veio
Na mesma época a popularização das técnicas de biologia molecular fazia com que esta
abordagem de alto poder analítico começasse a ser amplamente utilizada. Isto propiciou a
cardiovascular (vasos, coração, rins, adrenais e sistema nervoso). Esses achados forçaram a
uma revisão do paradigma anterior. Considera-se hoje a existência, além do sistema SRAA
endócrino, de sistemas SRAA locais (ou seja, é possível a vários órgãos e tecidos produzir
ações parácrinas (sobre células de tecidos vizinhos) e autócrinas (sobre células do mesmo
tecido). Este novo paradigma permite explicar, portanto, a ausência de correlação entre a
sistema. A existência de uma produção local de A II sugere também que esse peptídeo, que
participar da seqüência de eventos que conduzem à perda progressiva da função renal (ver
Capítulo 15) e ajudam a explicar a eficácia dos supressores do SRAA na prevenção desses
processos.
EXERCÍCIOS
Abra o programa HIPERTENSÃO ARTERIAL”. Há nesta tela duas áreas para a entrada de
parâmetros, denominadas 0-45 dias e 45-90 dias. Os parâmetros que constam de cada área podem
ser variados de modo inteiramente independente.
1) Aumente a ingestão de sódio no dia zero para 200 mEq/dia (a ingestão aos 45 dias acompanha essa
variação). Observe que: a) a pressão arterial e o débito cardíaco praticamente não variam. b) a
excreção urinária de sódio aumenta gradativamentede modo a igualar a quantidade ingerida. c) as
linhas azuis que representam a natriurese pressórica nos gráficos situados nos cantos inferiores
direito (0-45 dias) e esquerdo (45-90 dias) da tela tornam-se um pouco mais verticais, indicando
um aumento da capacidade renal de excretar sódio. Observe que, neste exercício, esses dois
gráficos são idênticos. Observe ainda a movimentação do ponto de equilíbrio (representado nos
dois gráficos pelo pequeno círculo vermelho).
2) Mantendo a ingestão inicial de sódio em 200 mEq/dia, reduza a 100 mEq/dia o valor
correspondente ao período 45-90 dias. Verifique o retorno dos parâmetros aos valores basais
3) Pressione novamente “PADRÃO”. Imagine agora uma situação em que o sistema nervoso
autônomo conseguisse a façanha de aumentar a resistência periférica sem alterar a resistência renal
e, portanto, a capacidade renal de excretar sódio (isso na verdade não ocorre na prática). Para isso,
aumente a resistência periférica de 20 para 25 mmHg/ml/min. Observe que a pressão arterial eleva-
se a princípio, retornando porém rapidamente ao valor basal à custa de uma queda no débito
cardíaco, motivada por uma perda urinária de sódio (forçada pela própria elevação da pressão
arterial – natriurese pressórica).
4) Reduza agora a declividade da reta de natriurese pressórica movendo a barra deslizante
correspondente (“capacidade renal de excreção de sódio”). Observe que: a) as reta azuis nos
gráficos inferiores esquerdo (0-45 dias) e direito (45-90 dias) deslocam-se para a direita e para
baixo, indicando uma redução de sua declividade e, portanto, de sua capacidade renal de excretar
sódio. b) desta vez a pressão arterial eleva-se progressivamente, estabilizando-se em um valor
permanentemente elevado em relação ao basal. c) ocorre de início uma redução na excreção
urinária de sódio, refletindo a dificuldade dos rins em excretar sódio na vigência de uma pressão
arterial normal. Com o passar do tempo, a excreção urinária de sódio retorna ao valor basal,
refletindo a elevação da pressão arterial (natriurese pressórica). O preço dessa adaptação é no
entanto a hipertensão arterial. e) o débito cardíaco aumenta gradativamente, explicando neste caso
a elevação da pressão arterial. Refaça o exercício observando atentamente a movimentação do
ponto de equilíbrio.
6) Vamos tentar agora tratar a hipertensão desse paciente. Reduza para 20 mEq/dia, na seção 45-90
dias, a ingestão de sódio. Observe que há uma queda dos níveis pressóricos e da resistência
periférica. Portanto, quando a declividade da reta de natriurese pressórica está diminuída, a
hipertensão é extremamente sensível à ingestão de sal. Observe agora o efeito da administração de
um diurético (assinalando o círculo correspondente) sobre a declividade da reta de natriurese
pressórica no gráfico à direita (correspondente ao período 45-90 dias). Observe novamente o
deslocamento do ponto de equilíbrio. Observe o que acontece ao débito cardíaco. Por que ocorre
isso?
7) Retorne a capacidade renal de excretar sódio ao normal, mantendo ativada a autorregulação.
Aumente para 110 o intercepto da reta de natriurese pressórica em relação ao eixo das abscissas.
Observe a reta deslocar-se para a direita, sem alterar sua declividade (mantendo-se portanto
paralela à reta normal). Observe o deslocamento do ponto de equilíbrio. Verifique que a pressão
arterial, a excreção urinária de sódio e o balanço de sódio comportam-se de modo semelhante ao
observado no ítem 6. Reduza agora a ingestão de sódio da segunda fase (45-90 dias) para 20 como
no ítem 7. Observe que o efeito hipotensor dessa manobra é agora bem mais modesto. Observe
também o efeito da administração de um diurético nessa fase. Portanto, quando a reta da natriurese
pressórica é paralela à normal, a hipertensão é pouco sensível à ingestão de sal. O efeito da
administração de diuréticos é também relativamente modesto. Isso não significa que a restrição
salina e o uso de diuréticos sejam inúteis a esses pacientes, uma vez que alguma redução pressórica
sempre ocorre. No entanto, esses pacientes quase sempre necessitam de outros medicamentos anti-
hipertensivos.
8) Combine agora as duas anomalias renais, reduzindo a declividade e aumentando o intercepto para
100 (essa é provavelmente a situação mais freqüente). Verifique que a sensibilidade a sal é
intermediária. Isso quer dizer que, de modo geral, vale a pena tentar controlar a hipertensão
restringindo a ingestão de sal e administrando diuréticos, nem que seja como um tratamento
coadjuvante.
humano adulto transfere ao meio externo cerca de 2.500 ml de água por dia, sendo a maior
parte desse volume representada pela urina (1.500 ml), enquanto as perdas insensíveis
(eliminação de vapor d’água pela pele e pelas vias aéreas) chegam a 700 ml. Há também
perda de água pelas fezes (200 ml) e pela transpiração (100 ml). Uma pequena parte dessas
perdas (300 ml) é compensada pela geração endógena de água através do metabolismo. Para
repor inteiramente as perdas diárias, o indivíduo precisa ainda ingerir cerca de 2.200 ml de
água. Em um adulto normal, essa ingestão consiste em ~1.200 ml de água como tal (“pura”,
cozimento, frutas, verduras, etc.). É evidente que esses são valores médios, tanto com
relação às perdas como aos ganhos, ocorrendo enorme variação de indivíduo para indivíduo
retenção de água e a eliminação de uma urina hipertônica (ver também o Capítulo 4).
origina-se no hipotálamo, na região conhecida como centro da sede, localizado nas porções
plasma (Posm) e portanto a alterações do balanço hídrico do organismo. Para que a sensação
de sede se torne consciente, é ainda necessário que os sinais assim gerados sejam
entre a massa total de solutos (Msolutos) e a massa total de solvente (M solvente) ali presentes.
plasmática será de 12.000/42 ≅ 288 mOsm/L. Uma perda pequena, de 0,5 litro, por
exemplo, fará com que a Posm se eleve a 289 mOsm/L. Esse valor é ainda insuficiente para
deflagrar a sensação de sede, a qual vai aparecer somente quando a Posm ultrapassa ~291
mOsm/L. Esse valor é denominado limiar da sede (Fig. 11-1). Se no entanto ocorrer um
deficit 1 litro, correspondente a pouco mais de 2% do volume de água corpórea total, a P osm
chegará a 293 mOsm/L. Esse valor, apenas 5 mOsm/L superior ao normal, é já suficiente
subjetiva por definição, a sede é uma grandeza difícil de quantificar). Por forçar desse modo
o indivíduo à busca e ingestão de água, a sede permite que qualquer deficiência hídrica seja
rapidamente corrigida, desde que seja possível, evidentemente, o acesso a alguma fonte de
água, o que ocorre na maioria das situações. Por essa razão, a sede constitui-se em um
especialmente, dos dutos coletores. Dessa maneira, ocorre nesses segmentos uma absorção
fluxo urinário reduz-se drasticamente, permitindo uma grande economia de água por parte
equilibrar-se com a medula hipertônica, havendo pouca absorção de água nos túbulos distal
diluída. Essa relação inversa entre o fluxo urinário e a concentração plasmática de HAD
20
[HAD]p está representada na Fig. 11-2. É interessante
18
observar que, quando os níveis circulantes de HAD são
16
normais ou baixos, variações mínimas da [HAD]p provocam
Fluxo urinário, L/dia
14
12
grandes variações inversas do fluxo urinário. Quando a
10
8 [HAD]p ultrapassa o dobro do valor normal, no entanto,
6
4 aumentos ulteriores não mais conseguem reduzir o fluxo
2
urinário, que permanece em um valor mínimo (em humanos,
0
0 3 6 9 12 15 18 cerca de 600 ml em condições habituais). Isso ocorre porque o
HAD, pg/m l
sistema de contracorrente medular possui um limite físico,
Fig. 11-2 - Variação inversa do
fluxo urinário com a [HAD] p. O
não podendo aumentar a osmolaridade medular acima de um
círculo verm elho represent a a
condição norm al.
valor máximo, que no homem é de ~1.300 mOsm/L.
continuamente uma série de solutos, desde moléculas tóxicas como a uréia, até solutos
ingeridos em excesso e que precisam ser eliminados (p. ex, o sódio e o potássio). A
indivíduo. A ingestão de cloreto de sódio, por exemplo, pode variar desde quase zero até
uréia é extremamente sensível à taxa de ingestão de proteínas. Por essa razão, a excreção
urinária de solutos pode variar de 400 a 1500 mOsm/dia. Um homem adulto normal,
ingerindo uma quantidade “média” de sódio (100 mmol/dia) e potássio (50 mmol/dia),
necessita excretar solutos a uma taxa de cerca de ~650 mOsm/dia. Desse total, cerca de 200
mOsm/dia correspondem à excreção do sódio ingerido (100 mmol de sódio e 100 mmol do
equivalem à ingestão diária de potássio (50 mmol/dia de KCl). Os 350 mOsm/dia restantes
ml/dia), a osmolaridade urinária não chega ao dobro da plasmática, variando entre 400 e 450
mOsm/L. Para uma osmolaridade urinária de 430 mOsm/L, por exemplo, o volume urinário
será de 650/430 ≅ 1,5 L/dia. Se a ingestão de água for escassa, a absorção de água “pura”
nos segmentos finais do néfron aumenta graças à ação do HAD, podendo a osmolaridade
urinária chegar ao limite máximo de 1.300 mOsm/L. Nesse caso, o volume urinário será de
650/1.300 ≅ 0.5 L. Essa economia de 1.000 ml/dia de água “livre” pode revelar-se preciosa
essencial ao organismo ser capaz de diluir a urina, para eliminar excessos de água “livre”.
Essa propriedade torna-se especialmente importante tendo em vista ser corriqueiro, nas
civilizações modernas, ingerir líquidos “socialmente” (festas, reuniões, “happy hour”, etc.),
por hábito (às refeições, ao deitar-se, etc.) ou simplesmente por prazer (refrigerantes, sucos,
cerveja, etc.). Normalmente, os rins são capazes de eliminar integralmente até mesmo
eliminar adequadamente sobrecargas de água “livre” pode trazer como conseqüência uma
diluição do meio interno, com graves danos ao sistema nervoso central (ver adiante).
em suínos, etc.). Esse peptídeo é produzido pelos corpos celulares dos neurônios situados
sede, tanto assim que lesões do hipotálamo podem provocar deficiência da sede e diabetes
insipidus simultaneamente (ver adiante). Uma vez “empacotado” sob a forma de grânulos, o
HAD percorre o axoplasma dos neurônios que o produzem, em direção à hipófise posterior
1
Na verdade, é possível diminuir ainda mais o fluxo urinário, se levarmos em conta que a ingestão de alimentos
(e portanto de solutos) pode também reduzir-se substancialmente em situações de escassez de água.
(neuro-hipófise). No interior desses grânulos, o hormônio anti-diurético liga-se a uma
de HAD, um deles “rápido” e pronto a ser liberado, outro “lento” e destinado a servir de
na célula.
12
10 mOsm/L, denominado limiar osmótico, a [HAD]p aumenta
8
de modo praticamente linear com a Posm (Fig. 11-3). Essa
6
4 relação é de tal modo previsível em cada indivíduo que em
2
animais de laboratório é possível prever a Posm, com erro
0
200 250 300 350 400 450
inferior a 1%, a partir da [HAD]p. Há no entanto duas
Posm , m Os m /L
Fig. 11-3 - Variação linear da [HAD] p com diferenças importantes em relação à sede: 1) enquanto esta
a P osm. O círculo verm elho represent a a
condição norm al é totalmente suprimida quando a osmolaridade plasmática
está normal ou subnormal, o HAD tem sua taxa de secreção diminuída quando a
osmolaridade plasmática cai abaixo do normal, sendo suprimido apenas quando ela cai a
280 mOsm/L (ou seja, 8 mOsm/L abaixo do normal). É essa propriedade que permite ao
organismo eliminar grandes volumes de urina diluída quando necessário (ver adiante). 2)
enquanto existe um “limiar” para o surgimento da sensação de sede, pouco superior a 290
mOsm/L, a secreção de HAD varia continuamente com a Posm sempre que esta for superior a
2
Para que um determinado soluto exerça um efeito osmótico é necessário que a membrana celular
não lhe seja permeável. Solutos que penetram facilmente a membrana celular, como por exemplo a
uréia, são incapazes de estimular de modo contínuo quer a sensação de sede, quer a liberação de
HAD.
280 mOsm/L. Dessa maneira, mesmo uma alteração minúscula da Posm, de 1 mOsm ou
intravascular e/ou quedas da pressão arterial podem elevar os níveis plasmáticos de HAD a
valores dez ou mais vezes superiores aos normais. Nessas circunstâncias, o organismo tende
a perder a capacidade de regular a tonicidade do plasma (ou seja, vai ocorrer uma diluição
do meio interno). Por inadequada que possa parecer, tal resposta é lógica quando se
miocárdio. Sob o ponto de vista da conservação de água, é inútil, como vimos, elevar a
concentração plasmática de HAD acima de 5 pg/ml, uma vez que a osmolaridade urinária já
contribui para a manutenção dos níveis pressóricos até que a condição de emergência tenha
que essa via neural inicia-se nos baroceptores situados no arco aórtico e seios carotídeos
glossofaríngeo e vago, até o núcleo do trato solitário, situado no bulbo, de ondem partem
hipotálamo.
Em resumo, os organismos superiores, o humano em especial, conseguem manter o
Parte desses sensores faz variar a secreção de HAD e, em conseqüência, o volume urinário,
A palavra “diabetes” tem o significado de “sifão” em grego, tendo sido por isso
aplicado a estados crônicos de intensa poliúria e polidipsia (sede excessiva). A forma mais
insulina. O termo “mellitus” refere-se à presença de glicose na urina, o que lhe confere um
sabor adocicado (à época em que esse termo foi cunhado o exame do sabor da urina era um
dos poucos recursos diagnósticos disponíveis). Verificou-se mais tarde a existência de outra
modalidade de diabetes, também caracterizada por poliúria e polidipsia intensas, sem que a
urina apresentasse sabor adocicado. Por essa razão, denominou-se a esse distúrbio diabetes
insípido (sem sabor). Verificou-se mais tarde que na diabetes insípido o efeito do HAD
sobre os túbulos distal e coletor era deficiente ou ausente. Verificou-se ainda que essa
anomalia podia resultar de dois mecanismos básicos: 1) secreção insuficiente de HAD pela
nervoso central, sendo portanto quase sempre reversível (a menos, é claro, que tenha havido
ainda ser causada por edema cerebral conseqüente a uma hiponatremia (ver adiante). Outras
fluxo urinário pode exceder 10 L/dia (osmolaridade urinária <100 mOsm/L), chegando ao
limite fisiológico de 17-18 L/dia quando a concentração plasmática de HAD cai a zero (Fig.
11-2).
adequadamente, a única defesa que resta ao organismo contra uma maciça espoliação de
ingerir a quantidade de água necessária para trazer a Posm de volta ao normal ou a valores
ligeiramente superiores ao normal. Essa quantidade vai depender do grau de lesão imposta
HAD. Se no entanto houver algum tipo de lesão ao centro da sede (é comum ocorrer um
apropriadas. Embora seja possível o tratamento desses pacientes com drogas de ação
intoxicação hídrica (excesso de água com diluição do meio interno). Essa complicação pode
pacientes tratados com HAD e que ingerem excesso de líqüidos (sendo quase todo o HAD
Volum e Urinário
12 12
10 10
8 8
6 6
4 4
2 2
0 0
0 3 6 9 12 15 18 0 3 6 9 12 15 18
[HAD] p [HAD] p
A B
Fig. 11-5 – A relação inversa entre fluxo urinário e [HAD]p atenua-se ou mesmo deixa de
existir na diabetes insípida moderada (A) ou intensa (B). Se o mecanismo da sede estiver
intacto, a ingestão de água compensará a deficiência da resposta renal, mantendo a [HAD]p
em níveis apenas moderadeamente elevados (círculos vermelhos). As curvas cinzentas
representam a realção normal entre o fluxo urinário ea [HAD]p.
Diabetes insípido nefrogênico
e secretar HAD está intacta, mas a resposta tubular renal ao HAD é deficiente, o que faz
com que a permeabilidade à água desses segmentos seja baixa, levando a uma poliúria
intensa. A DI nefrogênica pode ter origem genética: nesses casos, a anomalia básica
correção do distúrbio.
para a direita e para cima (Fig. 11-5), o que significa que, para se obter um fluxo urinário
possível porque, neste caso, a neuro-hipófise é capaz de responder a elevações da P osm. Essa
ligeiramente superior ao normal. Por essa razão, a [HAD]p não se eleva muito nesses
pacientes. Se a resposta renal ao HAD não estiver muito deprimida, o fluxo urinário
correspondente a esse valor da [HAD]p não será muito elevado (curva A na Fig. 11-5); a
poliúria resultante pode não ser exagerada. Se no entanto a DI for muito intensa, a resposta
renal ao HAD será mínima (curva B na Fig. 11-5), desenvolvendo-se necessariamente uma
mas ainda discretamente elevados, já que, conforme discutido acima, existe um limiar para a
administração exógena de HAD ou de seus análogos, uma vez que o que está comprometido
estão elevadas. Nesses casos, o paciente deverá ser mantido hidratrado, por via oral ou não,
até que a condição que originou a DI seja superada. No caso das DIs hereditárias, que são
mellitus do Tipo II, estimulam a produção residual de HAD pelo hipotálamo e ao mesmo
nefrogênica. O mecanismo pelo qual ocorre esse efeito não foi ainda de todo esclarecido. É
possível que a depleção de sódio provocada pelos tiazídicos acarrete uma contração do
da taxa de filtração glomerular. Como a taxa de reabsorção de fluido pelo túbulo proximal
está normal ou até aumentada, diminuiria a quantidade de fluido oferecido à porção espessa
da alça de Henle (segmento diluidor) e aos demais segmentos, reduzindo a poliúria em cerca
de 50%.
anomalias incluem-se as formas não oligúricas da insuficiência renal aguda (Capítulo 14), a
insuficiência renal crônica (Capítulo 15), as nefrites intersticiais, as obstruções das vias
negativo de água e elevação da Posm. É mais comum, no entanto, reservar a designação “DI
nefrogênico” para aqeles casos em que tais desequilíbrios decorrem de um defeito específico
de HAD anormalmente elevados, mesmo diante de valores baixos de Posm. Esses pacientes
anomalia pode decorrer de dois tipos básicos de distúrbio: 1) uma disfunção do próprio
Uma série de afecções do sistema nervoso central pode conduzir a uma produção
excessiva de HAD pelo hipotálamo e a uma retenção de água. Entre as anomalias mais
náusea é um estímulo extremamente potente à secreção de HAD, mesmo que não venha a
bem como certos linfomas, podem também, eventualmente, funcionar como sítios de
ela relacionado.
caracteriza-se por uma Posm baixa, em presença de uma elevação da concentração plasmática
terapêuticas devem ser implementadas com grande cautela, para não agravar ainda mais o
invés de atenuá-la: sendo de 140 mmol a concentração de sódio nessa solução, o total de
osmoles administrado ao paciente (Na+ + Cl-) é de 140 2= 280 mmol. Como a urina está
concentrada ao máximo, ou seja, a 1.300 mOsm/L, esses 280 mmol de NaCl serão
excretados em apenas 280mOsm/1.300 mOsm/L ≅ 220 ml. Isso significa que, dos 1000 ml
de água que foram administrados, o organismo reteve 780 ml, os quais irão evidentemente
a esses pacientes deve ser feita utilizando soluções concentradas (hipertônicas) de NaCl,
Hipovolemia
Conforme discutido acima, a hipovolemia pode desviar para a direita a curva HAD
vs. Posm, deflagrando assim uma produção exagerada de HAD mesmo na ausência de
de uma série de distúrbios neurológicos (ver acima). Se o quadro se arrastar por vários dias
e o paciente receber quantidades consideráveis de água “pura”, por via oral ou sob a forma
necrose tubular aguda (ver Capítulo 14). Todo esse processo pode muitas vezes ser evitado
que os altos níveis circulantes de HAD, que na SIHAD decorrem de uma secreção
fisiológica, destinada a conservar água e combater a hipotensão. Por essa razão, ao contrário
Evidentemente, essa conduta deve ser instituída o mais rápido possivel, já que na ausência
Cirurgias
Pacientes submetidos a cirurgias extensas tendem a produzir quantidades
submetidos é sem dúvida um dos estímulos a essa produção excessiva de HAD, embora
Insuficiência adrenal
glândula, seja por baixa produção de ACTH pela hipófise (doença de Addison), pode haver
taxa de secreção do hormônio pode resultar da hipovolemia que caracteriza esses pacientes,
por sua vez conseqüente à produção insuficiente de aldosterona. No entanto, níveis elevados
em que não se observam sinais de hipovolemia. A retenção de água que acompanha esses
hipotálamo é desconhecido.
Hipotiroidismo
estão elevados em pacientes com hipotiroidismo. Ë possível que parte desse efeito tenha
origem hemodinâmica, uma vez que o fluxo sangüíneo renal e o próprio débito cardíaco
estão reduzidos nesses pacientes. É possível, no entanto, que uma alteração hipotalâmica
Uso de diuréticos
A administração crônica de diuréticos, especialmente se não for
e hiponatremia, através dos mecanismos descritos acima. O quadro pode tornar-se ainda
mais sério se o diurético utilizado for o furosemide ou outro diurético de alça (ver capítulo
6), uma vez que esses diuréticos agem sobre a porção espessa da alça de Henle, que é o
principal segmento diluidor do néfron, comprometendo assim ainda mais a capacidade renal
de diluir a urina.
Outras drogas
Ocorre que as prostaglandinas também modulam o efeito tubular do HAD, atenuando sua
esteroidais aumentam a sensibilidade dos túbulos distal e coletor ao HAD, podendo assim
como a hipovolemia.
a neuro-hipófise, de onde é liberado para a circulação. Apesar das nítidas semelhanças com
pelo lactente durante a amamentação, enquanto seus principais efeitos fisiológicos são 1) a
contração das células mioepiteliais das glândulas mamárias e conseqüente ejeção de leite e
efeito antidiurético nos túbulos distal e coletor. Embora de reduzida importância fisiológica,
farmacológicas para indução do parto. Nesses casos, a ação tubular da oxitocina pode levar
aumentando sua secreção pelo hipotálamo e sensibilizando os túbulos distal e coletor a sua
ação antidiurética. Esses efeitos constituem a base racional para o uso desses compostos no
DISTÚRBIOS DA SEDE
Hipodipsia e adipsia
enumeradas acima: são os traumas, infecções, tumores e acidentes vasculares que atingem o
sistema nervoso central e que podem lesar o hipotálamo, onde a sensação de sede é
originada. Outros pacientes têm dificuldade em reconhecer a sensação de sede, talvez por
lesão à própria córtex cerebral. Grande parte desse contingente é constituído de idosos,
A hipodipsia pode apresentar-se como um desvio para a direita do limiar da sede ou,
seja, a sensação de sede permanece ausente mesmo que a P osm se eleve bem acima do limiar
normal (pouco superior a 290 mOsm/L), chegando a, por exemplo, 300 mOsm/L (Fig. 11-
de sede, ou seja, para uma mesma variação da P osm, esses pacientes experimentam uma
sensação de sede muito menos intensa do que um indivíduo normal (Fig. 11-7).
necessário repor as perdas com fluido hipotônico, além de tratar as condições que levaram
ao aumento das perdas insensíveis. Mesmo após superado o episódio agudo, esses pacientes
necessitam de cuidados ininterruptos para garantir a ingestão adequada de líquidos e evitar
nova desidratação.
Polidipsia primária
enormes de água em face de uma Posm normal ou mesmo diminuída, resulta de uma
estimulação exagerada das estruturas do sistema nervoso central responsáveis pela sensação
de sede, podendo incluir o hipotálamo, onde ela se origina, e a própria região cortical que a
torna consciente. Tal estimulação pode originar-se de uma agressão (trauma craniano,
esquizofrenia.
O paciente com polidipsia primária comporta-se como se o limiar da sede estivesse
[HAD]p. reduz-se substancialmente, devido à extrema inclinação da curva [HAD]p vs. Posm
ingestão de água exceder ~16-18 L/dia, a capacidade máxima renal de excretar água “livre”
será ultrapassada. Nesse caso, não mais será possível manter o balanço de água, ocorrendo
com um quadro de intoxicação hídrica, com graves alterações neurológicas. Tal quadro é
quadro de intoxicação hídrica se o paciente estiver exposto a qualquer fator que dificulte a
diuréticos.
O quadro clínico apresentado por pacientes com polidipsia primária, com polúria e
em pacientes com diabetes insípido central. Na verdade, pode ser difícil distinguir entre
diferenças sutis podem facilitar essa tarefa. Em primeiro lugar a Posm, que como vimos tende
abaixo do normal em pacientes com polidipsia primária. Pode-se utilizar também uma
osmolaridade urinárias, assim como a Posm. Em pacientes com DI, a restrição hídrica não
afeta a [HAD]p, exercendo assim pouco efeito sobre o volume ou a osmolaridade urinárias,
enquanto a Posm pode elevar-se, distanciando-se ainda mais dos valores normais (é
necessário muito cuidado para não provocar desidratação grave durante esse procedimento).
Já em casos de polidipsia primária, a osmolaridade urinária tende a elevar-se à medida que
EXERCÍCIOS
está em balanço, com as perdas e ganhos de água equivalendo-se perfeitamente (ver gráfico
“Balanço hídrico”) (você verá que esse balanço será mantido na maior parte das situações a
serem estudadas). Observe que a osmolalidade urinária (Uosm, curva azul no gráfico da parte
Neste programa é necessário deslizar o cursor das barras de rolagem para fazer variar
cada um dos quatro parâmetros básicos (ingestão diária de água, ingestão diária de água com
1. Reduza agora a ingestão de água. Observe que a osmolalidade urinária sobe, enquanto o
volume urinário se reduz (gráfico na parte inferior da tela). Observe as curvas que
urinário cai, enquanto a osmolalidade urinária sobe. Note no entanto que o volume urinário
nunca se reduzirá a menos do que ~0.6 L/dia, mesmo que a concentração plasmática de
HAD se eleve a 5 ou 6 vezes o normal. A razão para isso é que a osmolalidade urinária
máxima que o rim humano consegue gerar é de cerca de 1300 mOsm (observe a curva
osmolalidade urinária vs. HAD). Como somos obrigados a excretar cerca de 750 mOsm por
dia (150×2 mEq/dia NaCl + 50×2 mEq/dia de potássio + ~350 mEq/dia de uréia), o volume
mínimo possível de urina é de 750/1300 = 0.57 L. Note ainda que redução da ingestão de
água levou a um aumento na concentração plasmática de HAD (na verdade essa elevação foi
2. Observe agora o gráfico situado na porção inferior esquerda da tela, que relaciona a
concentração plasmática de HAD à osmolalidade plasmática (Posm). É fácil constatar que esta
que indica que o organismo defende tenazmente a tonicidade do meio interno. Observe que a
falta de ingestão de água como tal durante apenas 1 dia elevou a P osm em apenas 2 mOsm/L.
3. Reduza agora também a ingestão de água com os alimentos, trazendo-a aos poucos até zero.
portanto uma hipernatremia. A osmolalidade urinária atinge seu valor máximo, o fluxo
Aparece agora um novo e importante elemento; a sede. Observe o gráfico situado no alto à
aproximadamante linear da Posm (na verdade, é muito difícil quantificar a sensação de sede,
embora todos saibamos por experiência própria que essa sensação varia diretamente com a
carência de água). Note que existe um limiar para o aparecimento da sede, que no ser
humano é ligeiramente superior a 290 mOsm. Note também que, ao se atingir esse limiar, a
4. Aumente agora gradativamente a perda hídrica por sudorese, até atingir o valor máximo de 5
L/dia (esta poderia ser a condição de alguém perdido no deserto, por exemplo). Observe que
5. Normalize a perda pelo suor e faça com que o distúrbio (falta de ingestão de água) perdure
por mais do que 1 dia (para isso você deve acionar o quadrinho correspondente). O efeito é
parecido com o da sudorese em um único dia, mas aqui é possível observar melhor a
plasmática de HAD cai a níveis quase indetectáveis. Mesmo com uma ingestão absurda de
mantidos. Leve a ingestão de água para 18 L/dia. Observe que agora instalou-se um balanço
hídrico positivo. A capacidade renal de eliminar “água livre”, ou seja, de diluir a urina,
cerebral (na verdade é improvável que isso ocorra, porque antes disso o indivíduo
você aumentar a taxa de ingestão hídrica para 26 L/dia, esse efeito será observado em um
7. Vamos estudar agora alguns dos mais comuns distúrbios da tonicidade do meio interno.
moderado e intenso. Observe o que acontece no gráfico situado no canto inferior direito da
tela. Note que a linha que representa a variação do HAD com a Posm está “quebrada”,
nível (é esse nível que determina a diferença entre DI “moderado” e “intenso”). Se a ingestão
de água não for mantida em níveis elevados (encontre os níveis mínimos necessários a cada
caso), o indivíduo entra em balanço hídrico negativo e morre em pouco tempo (no caso do
DI “intenso” basta 1 dia), como nos exercícios 5 e 6. Observe o que acontece ao fluxo e à
osmolalidade urinários.
8. Estude agora os casos de diabetes insípido nefrogênico. Observe que as alterações do fluxo e
HAD e Posm está normal. No entanto, a curva que descreve Uosm e Fluxo urinário em função
da [HAD] está deslocada para cima e para a direita enquanto o nível plasmático de HAD está
extremamente elevado, indicando que neste caso o problema reside na incapacidade renal de
responder ao efeito biológico do hormônio. Observe ainda que, tal como no caso anterior, o
indivíduo necessita ingerir grandes quantidades de água, sob pena de entrar em desidratação
hipernatrêmica grave.
antidiurético (SIADH). Nesses casos, uma produção anômala de ADH (por exmplo, por um
tumor) impede que os níveis plasmáticos de ADH caiam quando necessário, como nos
ingestão de água está muito reduzida. Se no entanto a ingestão de água estiver próxima ao
quadro de intoxicação hídrica que termina com a morte por edema cerebral. Por ser incapaz
10. Passemos agora aos distúrbios da sede. Selecione “hipodipsia moderada” e observe o que
acontece quando se priva o indivíduo de água por um período prolongado (reduzindo a zero
de diaas em que essa condição persiste). Note que a sensação de sede demora a aparecer, e
quando finalmente aparece sua progressão é mais lenta do que o normal (observe o gráfico
no alto à direita). Já na “hipodipsia intensa” a sensação de sede pode não se manifestar até as
neurológicos.
11. Finalmente, observe o que acontece na polidipsia primária “moderada” (selecione a opção e
estude novamente o gráfico no alto à direita). Acontece aqui o oposto do que se viu no
sempre com sede, mesmo que sua osmolalidade plasmática esteja abaixo do normal, e só
sede não chega a ser saciada. Apesar dessa ingestão maciça, o balanço de água está
começam a se manifestar.
CAPÍTULO 12: DISTÚRBIOS DO
EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE
Roberto Zatz e Gerhard Malnic
8.0
7.5
7.0
0 20 40 60 80
+
H , mmol/L
B) TAMPÕES
Quando confrontado com uma sobrecarga ácida (ou alcalina), o organismo
coloca em ação uma série de linhas de defesa. A primeira e mais simples delas
consiste no tamponamento químico desse ácido ou base adicionado ao sistema.
Vários tipos de moléculas e sistemas iônicos presentes no organismo são capazes
de reter prótons, podendo assim funcionar como tampões, ou seja, compostos que
atenuam a variação de pH provocada pela adição de ácido ou álcali forte a uma
solução. Esses tampões, que podemos denominar tampões fixos, são sempre
constituídos pela associação entre um ácido fraco (representado por HA) e o sal
correspondente (representado por Na+A- ou simplesmente por A-). São tampões
comuns no organismo dos mamíferos a hemoglobina, a albumina plasmática, o
sistema HPO4--/H2PO4- e os carbonatos ósseos, estes últimos especialmente em
situações de sobrecarga ácida prolongada. Podemos representar a reação básica de
dissociação de um sistema tampão como:
H+ + A- HA- (4)
14 pH
13
12
11
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
20 15 10 5 0
ÁCIDO ADICIONADO mmol
pCO2 = 10
8 (mmHg) 20
40 60 80
100
5
0 20 40 60 80
pH
7.7
queda de pCO2
7.6
7.5
7.4
7.3
elevação de pCO2
7.2
7.1
0 10 20 30 40 50
BASE ADICIONADA. mmol
Figura 12.4 – Curva de tamponamento do CO2 em uma solução contendo apenas bicarbonato
queda de pCO2
7.6
7.5
7.4
7.2
7.1
0 10 20 30 40 50
BASE ADICIONADA. mmol
Figura 12.5 – Curva de tamponamento do CO2 em uma solução contendo bicarbonato e tampões fixos
/CO2 puro, um sistema “misto” é capaz de gerar uma certa quantidade de HCO3-
quando submetido a uma elevação da pCO2. Essa quantidade é limitada pela
quantidade e pelo pK dos tampões “fixos” presentes. O efeito de uma variação da
pCO2 sobre o pH e a concentração de bicarbonato de um sistema como esse está
representado na Figura 12.5:
Note-se que um aumento da pCO2 em relação ao normal leva agora a um
pequeno aumento da concentração de bicarbonato, da ordem de uns poucos
mmol/L, enquanto uma redução na pCO2 produz o efeito contrário. Essa influência
da pCO2 sobre sistemas tamponados ao mesmo tempo pelo bicarbonato e por
tampões fixos (como por exemplo o sangue dos mamíferos) tem enorme
importância para uma correta compreensão dos distúrbios do equilíbrio ácido-base.
Uma vez que os efeitos da adição de ácido fixo (representado pela curva de
dissociação do bicarbonato – Figura 12.3) e da variação da pCO2 (representado
pela curva de tamponamento do CO2 – Figura 12.5) ocorrem no mesmo sistema,
podendo ser inclusive simultâneos, é conveniente representá-los em um único
gráfico, combinando as Figuras 12.3 e 12.5 (Fig. 12-6):
pH
7.7
queda de pCO2
7.6
7.4
7.2
7.1
0 10 20 30 40 50
BASE ADICIONADA. mmol
Figura 12.6 – Representação simultânea do efeito da variação da pCO2 e da adição de ácidos fixos em
uma solução tamponada por bicarbonato e tampões fixos
7.6 ALCALOSE
M ETABÓLICA
7.5 COM PENSADA
7.4
7.3
2
Figura 12.7 – Efeito de um excesso de ácido fixo (etapa 1) e de sua compensação por uma
hiperventilação (etapa 2)
pH intraluminal
7
PROXIM AL
5
DISTAL/COLETOR
+
A.C. Na
+
H2 O K
H2 O
+ + ATP
CO2 CO2 +
Na
muito longe de seu faixa ótima de trabalho, que fica, como vimos, nas imediações
de seu pK. Dessa forma, os tampões fixos presentes no filtrado glomerular
absorvem uma quantidade irrisória de prótons ao longo do túbulo proximal.
Lembrando o conceito de titulação mencionado acima, podemos dizer que
praticamente não ocorre no túbulo proximal a titulação dos tampões fixos.
O mecanismo básico de acidificação no túbulo proximal, como nos demais
segmentos do néfron é a secreção de H+ para o lume tubular (Figura 12.9). Essa
secreção ocorre em sua maior parte através da permuta Na+/H+ na membrana
luminal, através de um trocador específico. Trata-se aqui de um mecanismo de
transporte ativo secundário, uma vez que o gradiente eletroquímico de Na+
necessário ao seu funcionamento provém da atividade da Na+/K+-ATPase da
membrana basolateral. Graças à elevada concentração do íon HCO3- no lume do
túbulo proximal, especialmente em suas porções iniciais, a secreção maciça de H+
nesse segmento resulta na rápida formação de ácido carbônico. Sendo o túbulo
proximal particularmente rico em anidrase carbônica, o ácido carbônico ali gerado
é rapidamente desidratado. O CO2 resultante dessa reação difunde para o interior
da célula, onde é reidratado e de novo dissociado em H+ e HCO3-. Este último
deixa a célula através da membrana basolateral, em grande parte através de um
processo de cotransporte com o Na+, enquanto o H+ é de novo secretado. O
resultado final desse processo é a adição de 1 íon HCO3- ao meio interno,
equivalente à reabsorção de um íon HCO3- da luz tubular. Deve ficar ficar claro
que a resultante de todo esse processo é rigorosamente zero: a cada íon HCO3-
filtrado corresponde exatamente um íon HCO3-reabsorvido.
2) Alça de Henle
HA H2O
+ ATP
CO2 +
Na
escova e no interior das células do túbulo proximal, é mais escassa nos túbulos
distal e coletor, aparecendo apenas no interior das células intercaladas. 4) A saída
de bicarbonato através da membrana basolateral, que no túbulo proximal se dá por
cotransporte com sódio, nas células intercaladas ocorre principalmente por
contratransporte com cloreto. A concentração luminal de bicarbonato, absorvido
intensamente no túbulo proximal e na porção espessa da alça de Henle, é muito
baixa nas porções finais do néfron. Portanto, os íons H+ secretados para o lume,
não sendo tamponados pelo HCO3-, fazem cair rapidamente o pH luminal, dada a
grande capacidade dessas células de gerar gradientes de H+, de 500 vezes ou mais
em relação ao interstício. É agora possível, portanto, a atuação dos tampões fixos,
cujo pK está, como vimos, bem abaixo do pH do meio interno. Esses tampões
absorvem o H+ secretado pelas células intercaladas, impedindo que o pH caia a
níveis muito baixos (dificilmente o pH urinário cai abaixo de 5, correspondente a
um gradiente de 500 vezes em relação à concentração hidrogeniônica do meio
interno) Em outras palavras, a secreção de ácido nos segmentos finais do néfron é
tamponada pelos tampões fixos intraluminais. Essa ação é extremamente
importante: se não existissem os tampões urinários, o pH luminal nos segmentos
finais do néfron cairia rapidamente a níveis muito baixos, o que funcionaria como
um obstáculo à secreção de ácido, uma vez que há um limite para o gradiente de
H+ que as células intercaladas podem manter.
A quantidade de ácido ligado aos tampões urinários representa uma parcela
substancial do ácido fixo excretado pelos rins. Podemos medir essa quantidade
adicionando quantidades conhecidas de base fixa à urina até trazer o pH urinário
de volta a 7,4, ou seja, titulando a urina com base forte. Por essa razão, essa
parcela do ácido excretado pelos rins é denominada acidez titulável.
Apesar das diferenças observadas entre os túbulos distal e coletor, esses
segmentos compartilham com o túbulo proximal uma importante característica: no
interior das células intercaladas, tal como nas células do túbulo proximal, ocorre
decomposição do ácido carbônico (somente assim é possível gerar um íon H+ para
ser secretado). O HCO3- resultante desse processo acaba difundindo através da
membrana basolateral, principalmente em troca por HCO3-, rumo à circulação.
Dessa forma, a secreção tubular de cada íon H+ faz-se acompanhar da adição de 1
íon HCO3- ao meio interno. Enquanto no túbulo proximal essa propriedade é
utilizada para a recuperação do HCO3- filtrado, nos túbulos distal e coletor a
secreção luminal de H+ vai acabar regenerando parte do HCO3- consumido para
neutralizar o ácido metabólico.
4) Secreção de amônia
N H3
N H3 + H+
+
N H4
+
H
N H3
+
N H4
Vemos assim que a secreção de ácido para os túbulos renais, e em última análise
para a urina final, pode ser dividida em três componentes: a) reabsorção de HCO3-,
esmagadoramente majoritária em termos numéricos, mas pouco visível em termos
7.6 ALCALOSE
METABÓLICA
7.5 COMPENSADA
7.4
7.3
2
7.2 ACIDOSE 1 ACIDOSE
METABÓLICA
RESPIRATÓRIA
COMPENSADA
COMPENSADA
7.1 ACIDOSE
M ISTA
7.0
0 10 20 30 40 50
HC HCO3, mmol/L
Figura 12.12 – Efeito da instalação de uma acidose metabólica (etapa 1) e de sua compensação por uma
hiperventilação (etapa 2)
desencadeia dois processos fisiológicos de compensação: o primeiro é a titulação
meramente química do bicarbonato e dos tampões fixos, a qual atenua bastante,
embora não impeça, a queda do pH do meio interno. A segunda linha de defesa,
conforme também já discutido, é representada pela compensação respiratória. O
centro respiratório é sensível a alterações no pH sangüíneo, variando
adequadamente o volume respiratório e consequentemente a ventilação alveolar.
No caso de uma acidose, a ventilação alveolar aumenta e a pCO2 cai, aumentando
o quociente [HCO3-]/pCO2 e elevando o pH, de acordo com a equação de
Henderson-Hasselbalch. A hiperventilação atenua, mas não reverte totalmente, a
queda do pH sanguíneo que resulta de uma acidose metabólica.
O efeito de uma acidose metabólica e de sua compensação respiratória
sobre o diagrama pH-bicarbonato pode ser observado examinando a Figura 12.12:
Numa acidose metabólica “pura”, o quadrado vermelho representando o status do
paciente (determinado em cada ponto pelo pH e pela [HCO3-]) desloca-se ao longo
da curva de dissociação de bicarbonato (primeira etapa na Figura 12.12). Tal
acidose jamais é observada na prática, uma vez que sempre ocorre alguma
compensação respiratória. No caso, a hiperventilação resultante deslocou o
quadrado vermelho ao longo da nova linha de tamponamento do CO2 (segunda
etapa na Figura 12.12). A área em que se situa agora o quadrado vermelho é a da
acidose metabólica compensada. Essa região é delimitada pela curva de
dissociação de bicarbonato à pCO2 de 40 mmHg e pela linha horizontal
correspondente ao pH 7,4. O simples exame desse diagrama pH-bicarbonato
permite portanto o diagnóstico instantâneo do tipo de perturbação do equilíbrio
ácido-base que está ocorrendo. A compensação respiratória, no entanto, nunca é
completa, ou seja, o quadrado vermelho jamais chega à linha horizontal, ou mesmo
próximo a ela. Se isso ocorrer, é provável que estejamos diante de um distúrbio
respiratório associado.
2) Alcalose metabólica
a) Causas
a1) Vômitos
a2) Hipopotassemias
a3) Hiperaldosteronismo
7.3
ACIDOSE
ACIDOSE RESPIRATÓRIA
METABÓLICA
7.2 COMPENSADA
COMPENSADA
ACIDOSE
7.1 MISTA
7.0
0 10 20 HCO3, mmol/L30 40 50
Figura 12.13 – Efeito da instalação de uma alcalose metabólica (etapa 1) e de sua compensação por uma
hipoventilação (etapa 2)
compensação respiratória nesses casos. Essa limitação é representada pelo
desenvolvimento de hipóxia, inevitável quando a ventilação alveolar cai em
demasia. Quando isso ocorre, a baixa pO2 passa a exercer no centro respiratório
uma influência contrária à da acidemia, impedindo que a ventilação alveolar
continue a cair. Por essa razão, a pCO2 dificilmente se eleva acima de 55 mmHg
para compensar uma alcalose metabólica. Quando isso chega a acontecer, o mais
provável é que se esteja desenvolvendo simultaneamente alguma complicação
respiratória.
O comportamento de uma alcalose metabólica em termos de diagrama pH-
bicarbonato está representado na Figura 12.13. Na alcalose metabólica “pura”, o
quadrado vermelho desloca-se ao longo da curva de dissociação de bicarbonato,
agora em direção aos pHs mais elevados. Tal como na Figura 12.12, a inevitável
compensação respiratória ocorre ao longo da nova linha de tamponamento do CO2,
limitada, conforme discutido acima, pelo desenvolvimento simultâneo de hipóxia.
A área para onde se desloca o quadrado vermelho após essa compensação é a da
alcalose metabólica compensada, delimitada pela curva de dissociação do
bicarbonato à pCO2 de 40 mmHg e pela linha horizontal correspondente ao pH 7,4.
3) Acidose respiratória
pH
7,8 ALCALOSE
ALCALOSE
RESPIRATÓRIA
MISTA
7,7 COMPENSADA
7,6
ALCALOSE
METABÓLICA
7,5 COMPENSADA
7,4
7,3 ACIDOSE
METABÓLICA ACIDOSE RESPIRATÓRIA
7,2 COMPENSADA COMPENSADA
ACIDOSE
MISTA
7,1
7,0
0 10 20 30 40 50
HCO3, mmol/L
Figura 12.14 – Efeito de uma acidose respiratória aguda sobre o diagrama pH-bicarbonato
vermelho desloca-se ao longo da linha de tamponamento de CO2, em direção aos
pHs mais ácidos. Devido à inclinação dessa linha, esse movimento é acompanhado
de um aumento na concentração de bicarbonato, o qual se explica pelos
mecanismos descritos nas Equações 11 a 13. É importante notar que a curva de
-
dissociação do HCO3 desloca-se acompanhando o quadrado vermelho (ou seja,
muda a isóbara de CO2). Na fase crônica, representada na Figura 12.15, o
pH
7,8 ALCALOSE
ALCALOSE
RESPIRATÓRIA
MISTA
7,7 COMPENSADA
7,6
ALCALOSE
METABÓLICA
7,5 COMPENSADA
7,4
7,3 ACIDOSE aguda
METABÓLICA ACIDOSE RESPIRATÓRIA
7,2 COMPENSADA COMPENSADA
ACIDOSE
MISTA crônica
7,1
7,0
0 10 20 30 40 50
HCO3, mmol/L
3) Alcalose respiratória:
a) Causas principais
Há três grupos principais de causas de alcalose respiratória:
deslocada para a esquerda. Com isso, a [H+] cai, fazendo aumentar o pH.Como na
acidose respiratória, a concentração de HCO3- não sofre alteração apreciável num
primeiro momento. Aos poucos, no entanto, a queda na [H+] leva à dissociação dos
tampões hemoglobina e albumina (representados por HA nas equações 14-16),
gerando íons H+. A cada íon H+ assim acrescentado ao meio, um íon HCO3- é
neutralizado, resultando na formação de CO2 e H2O. Conforme representado nas
equações 14-16, o processo como um todo equivale a uma reação entre os tampões
HA (albumina, hemoglobina) e o íon HCO3-, gerando CO2, H2O e íons A-. Temos
em conseqüência uma queda na [HCO3-] do meio interno (a qual dificilmente
ultrapassa 4-5 mmol/L) e uma elevação praticamente simétrica do anion gap. Esse
pH
7,8
7,7 ALCALOSE ALCALOSE
RESPIRATÓRIA MISTA
7,6 COMPENSADA
crônica aguda ALCALOSE
METABÓLICA
7,5 COMPENSADA
7,4
ACIDOSE ACIDOSE RESPIRATÓRIA
7,3 METABÓLICA COMPENSADA
COMPENSADA
ACIDOSE
7,2
MISTA
7,1
7,0
0 10 20 30 40 50
HCO3, mmol/L
Figura 12.16 – Efeito de uma alcalose respiratória aguda sobre o diagrama pH-bicarbonato
efeito está representado na Figura 12.16, na qual o quadrado vermelho percorre a
linha de tamponamento de CO2 em direção a pHs mais alcalinos. Se o processo
persiste por mais de um dia, os rins entram em ação excretando HCO3-
(bicarbonatúria) e limitando a secreção de H+, podendo reduzir em poucos dias a
[HCO3-] plasmática a 15 mEq/l ou menos.. Essa queda na [HCO3-] desloca a reação
representada pela equação 16 de volta para a direita, levando a uma recomposição
dos tampões albumina e hemoglobina. O quadrado vermelho fixa-se agora na área
correspondente à alcalose respiratória compensada (Figura 12.17). Tal como nos
demais distúrbios do equilíbrio ácido-base, a perturbação inicial nunca é
totalmente corrigida, mesmo após a compensação renal.
pH
7,8 ALCALOSE
ALCALOSE
RESPIRATÓRIA
MISTA
7,7 COMPENSADA
7,6
aguda ALCALOSE
METABÓLICA
7,5 crônica COMPENSADA
7,4
7,3 ACIDOSE
METABÓLICA ACIDOSE RESPIRATÓRIA
7,2 COMPENSADA COMPENSADA
ACIDOSE
MISTA
7,1
7,0
0 10 20 30 40 50
HCO3, mmol/L
5) Saia do programa e acione “Titulação com base forte”: Temos aqui uma
situação semelhante à do programa “Titulação com ácido forte”
(concentração de tampão fixo= 20 mmol/L; pK do tampão = 7), mas o pH
inicial da solução: é < 3 (conforme indicado pela seta vermelha à esquerda
da curva de dissociação do tampão). A equação que representa a reação de
dissociação do tampão (H+ + A- ⇔ HA) está inteiramente deslocada para
a direita, indicando que o tampão está totalmente na sua forma associada.
Esse deslocamento aparece também no gráfico intitulado “SAL vs.
ÄCIDO”, no qual a barra branca, que representa a forma associada (ácida)
do tampão (HA-), é a única presente
1 - Passe para o túbulo proximal clicando sobre o respectivo círculo. Observe como,
em todas as curvas, os discos vermelhos deslocam-se simultaneamente para o
ponto correspondente. Verifique as seguintes alterações: a) todos os discos
vermelhos seguem a linha pontilhada azul, a qual representa a condição normal;
b) o pH cai relativamente pouco no final do túbulo proximal, atingindo cerca de
6.8 no final desse segmento; c) apesar disso, apenas 10% da carga filtrada de
HCO3 ali permanecem, indicando um intenso processo de reabsorção proximal
de HCO3. Esse paradoxo é apenas aparente, sendo fácil entender o que acontece
observando a curva de dissociação de HCO3. Para uma variação de pH de 7.4 a
6.8, a concentração de HCO3 reduz-se de 24 a 5 mEq/l, ilustrando a extrema
eficiência tamponante do sistema CO2/HCO3; d) Os tampões fixos presentes no
fluido tubular modificam-se muito pouco, ainda em conseqência de seu baixo
pK. Gera-se portanto muito pouca acidez titulável nesse segmento. e) ocorre
geração de NH4. Na verdade, a maior parte do NH4 gerado no rim é produzida no
túbulo proximal..
2 - Passe para a alça fina (AF). Verifique que a situação não se modifica muito em
relação àquela observada no final do túbulo proximal. Há no entanto uma
importante diferença: a quantidade de NH4 presente ao final desse segmento é
menor do que a observada ao fim do túbulo proximal. A razão para isso é que
ocorre conversão de NH4 a NH3 na papila renal (devido à concentração de HCO3
pelo sistema de contracorrente). Sendo a NH3 um gás extremamente difusível, ela
abandona a alça fina e chega ao duto coletor, onde retorna à forma iônica. Esse
movimento é importante para permitir a excreção renal de quantidades adequadas
de amônia.
6 - Aumente agora a taxa de produção de ácido fixo pelo organismo. Note que a
excreção de ácido urinário acompanha exatamente a produção, fazendo com que
o balanço de ácido fixo seja zero. Essa adaptação consiste essencialmente em um
aumento na excreção de amônio, uma vez que a acidez titulável sobe muito
pouco (por que?). A partir de um certo ponto, no entanto, o rim não mais
consegue compensar a produção de ácido fixo. O balanço de ácido torna-se então
positivo e o indivíduo entra em acidose metabólica, conforme indicado pela
queda no pH sangüíneo. Reduza agora a produção de ácido (o que equivale à
perda de ácido pelo organismo). O rim novamente se adapta, reduzindo a
excreção tubular de ácido. A partir de um certo ponto, estabelece-se um balanço
negativo de ácido. O indivíduo entra em alcalose metabólica, o que se reflete em
uma elevação do pH sangüíneo. Nessas condições, pode ocorrer excreção de
bicarbonato, conforme indicado pela coluna vermelha no gráfico situado à direita
e no meio
2 - Simule uma acidose metabólica do mesmo modo que no ítem anterior, mas com
um ânion anômalo (p. ex° lactato) acompanhando o H+, assinalando para isso o
círculo correspondente (Essa opção só está disponível no caso de uma acidose
metabólica por aumento da produção de ácido fixo). Observe novamente o que
acontece ao pH e às concentrações de HCO3-, Cl, “anion gap”e à relação
sal/ácido dos tampões não-bicarbonato. Observe também a posição do círculo
vermelho. Discuta e procure explicar cada uma dessas variações.
13.1 INTRODUÇÃO
composição iônica é observada até hoje no meio intracelular da maioria dos seres
desses seres com relação aos minerais do meio ambiente. A regulação dessa
1
do peso corporal, ou seja de 1000 a 1500 g no indivíduo adulto. Aproximadamente
entanto, essa pequena parcela tem uma importância imensa: além de ser essencial a
cálcio no espaço extracelular podem levar a arritmias cardíacas graves, o que torna
2
Tabela 13.1- Distribuição, localização e principais funções do cálcio no
organismo
Homeostase do Cálcio
Os níveis séricos de cálcio são controlados por meio de uma resposta integrada de
dos níveis séricos desse íon dentro de uma faixa bastante estreita que vai de 8.8 a 10,5
mg/dl, já que fora dela é grande, como vimos, o risco de desenvolver arritmias
transporte e transmissão de sinais celulares. Outros 40% do cálcio sérico estão ligados
1g de albumina liga 0,8 mg/dl de cálcio e essa relação é utilizada para corrigir os
3
restantes do cálcio sérico formam complexos com outras substâncias, especialmente
citrato e fósforo. Tanto a fração iônica como a complexada são ultrafiltradas pelo rim,
um balanço constante entre a absorção intestinal de cálcio e sua excreção pelos rins.
Ingestão de cálcio
1000 mg/dia
Fezes
825 mg/dia Absorção
9.825 mg/dia
Urina
175 mg/dia
4
concentrações na luz intestinal. 2) a absorção transcelular, que é ativa e saturável, na
mg são absorvidos pelo intestino. Cerca de 125 mg de cálcio são secretadas de volta à
Fig. 13.2 Mecanismos de transporte de cálcio através do epitélio intestinal. O transporte passivo se dá pela via
paracelular. O transporte ativo ocorre por extrusão através de uma ATPase cálcio-dependente existente na
membrana basolateral. Graças ao gradiente eletroquímico favorável assim gerado, o cálcio atravessa a membrana
luminal através de canais específicos. Uma vez no interior da célula, o cálcio liga-se a uma proteína, a calbindina,
o que facilita sua movimentação.
fatores intraluminais que podem intervir na sua absorção estão descritos na tabela 13.2
e 13.3, respectivamente.
5
Tabela 13.2 - Moduladores sistêmicos da absorção de cálcio
AUMENTAM DIMINUEM
Vitamina D Idade
ingestão diminuída de cálcio ingestão elevada de cálcio
ingestão elevada de sódio ingestão diminuída de sódio
PTH glicocorticóides
ingestão diminuída de fosfato ingestão elevada fosfato
hormônio de crescimento hormônio tireoideano
estrógeno acidose metabólica
gravidez diuréticos (tiazídicos)
lactação depleção de Vitamina D
diuréticos (furosemidas)
Adaptado de Breslau NA, In: Favus MJ (ed.) Primer on the Metabolic Bone Diseases
and Disorders of Mineral Metabolism, 3rd ed. Raven Press, New York, p 43,1996.
AUMENTA DIMINUI
Lisina Ácidos graxos de cadeia longa
Arginina Fosfatos
Penicilina Oxalatos
Cloranfenicol Fitatos
Lactose Tetraciclina
Fibras
Adaptado de Breslau NA, In: Favus MJ (ed.) Primer on the Metabolic Bone
Diseases and Disorders of Mineral Metabolism, 3rd ed. Raven Press, New
York, p 45,1996.
Em um adulto normal, com um RFG de 120 ml/min (174 litros por dia) e
cálcio sérico filtrável (iônico + complexado) de 5.8 mg/100 ml (58 mg/L), a carga
6
desse total são reabsorvidos, ou seja, a fração de excreção de cálcio é de 2%. O perfil
canais específicos e saia com a ajuda de trocadores Na+ - Ca2+, e/ou através de bombas
Fig. 13.3 Representação esquemática de uma célula de túbulo renal mostrando a reabsorção de cálcio através das
vias paracelular e transcelular. (Adaptado de Breslau, NA In: Favus MJ (ed) Primer on the Metabolic Bone
Diseases and Disorders of Mineral Metabolism, 3rd ed. Raven Press, New York, 49-57, 1996).
por ativação dos canais da membrana luminal, permitindo que o cálcio penetre nas
células e saia através da membrana basolateral por co-transporte com sódio e/ou por
bombeamento ativo.
7
13.3 Papel fisiológico do fósforo
corporal), dos quais 85% são encontrados no esqueleto e 15% no fluído extracelular,
sob a forma de fosfato inorgânico, e nos tecidos moles, na forma de ésteres de fosfato.
do fósforo no organismo.
podendo variar com a idade, o sexo, a dieta e o pH, além de apresentar um ritmo
nictemeral, com valores mais baixos pela manhã, uma elevação à tarde e um pico à
8
Ingestão de fósforo
1.400 mg/dia
Fezes
500 mg/dia Absorção
6.100 mg/dia
Urina
900 mg/dia
Fig. 13.4 Representação esquemática do fluxo do fósforo num adulto normal com balanço mineral neutro. As
setas abertas representam o fluxo mineral em sentido unidirecional e as setas sólidas indicam o valor final desse
fluxo.
Fig. 13.5 Esquema da absorção intestinal do fósforo (P) (do lúmen para o sangue) e secreção (do sangue para o
lúmen), através do epitélio intestinal. As setas sólidas indicam a via transcelular e as pontilhadas indicam a via
paracelular. A 1,25(OH)2D3 estimula o influxo de Na acoplado ao P em pequenas vesículas da membrana. A saída
da célula ocorre a favor de um gradiente eletroquímico, .
9
A ingestão diária de fósforo é habitualmente de 800 a 1400 mg, dos quais 60% são
sérica de fósforo de 4.0 mg/dl (40 mg/L), a carga filtrada de fósforo é de 40mg/L x
174 L/dia ≅ 7000 mg/dia. Cerca de 88% do fósforo filtrado são reabsorvido pelos
carga filtrada, são essenciais à excreção de ácidos fixos sob a forma de acidez titulável
(ver Capítulo 12). A maior parte dessa absorção (60 a 70% da carga filtrada) ocorre no
10
túbulo proximal, sendo o restante (10 a 20% da carga filtrada) absorvido nos
absorção é no entanto rapidamente saturado, o que faz com que a carga excretada de
11
O transporte renal de fósforo também é regulado por vários fatores hormonais,
12
13.4 REGULAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DE CÁLCIO NO
MEIO INTERNO: MECANISMOS DE AÇÃO DO
PARATORMÔNIO, VITAMINA D E CALCITONINA
13.4.1 PARATORMÔNIO
As paratireóides são geralmente em número de quatro e seu peso total varia entre 120
Golgi e quando clivado, origina o PTH propriamente dito, com 84 aminoácidos e peso
[1,25(OH)2D3], que por sua vez aumenta a absorção intestinal de cálcio e fósforo.
13
A curva cálcio-PTH é obtida através de uma equação conhecida como “fórmula dos
quatro parâmetros”, cuja representação gráfica é dada na Fig. 13.7:
++
[PTH] = {(A - D)/ [1+([Ca ]/C)B]} + D, onde:
Fig. 13.7 Curva cálcio-PTH. A = PTH máximo; B = “slope”; C = “set point”; D = PTHmínimo.
14
É esse mecanismo assim sensível o que permite manter constante a
cálcio. Para obter esse resultado, o PTH age principalmente em dois órgãos alvo : 1) o
osteoclastos não expressam receptores para o PTH e não reagem ao hormônio quando
15
facilitado por proteínas como a calbindina, cuja síntese é estimulada pela
Além dessa ação sobre o cálcio, o PTH aumenta a excreção urinária de fósforo.
crônica, na qual pode ocorrer retenção de fósforo e elevação de seus níveis séricos
(ver Capítulo 15). Para aumentar a excreção urinária de fósforo, o PTH atua no túbulo
16
13.4.2 VITAMINA D
antes mesmo dos esteróides supra-renais e sexuais. Acredita-se que ela exista na
natureza há pelo menos 500 ou 700 milhões de anos. Pode ser encontrada no plâncton
reino vegetal e animal. Provavelmente sua existência decorre de uma ação específica
na seleção que isolou as várias etnias humanas cuja pele era mais ou menos
pele é o órgão responsável pela produção de vitamina D3. Durante exposição à luz
transforma na pré vitamina D3. Uma vez formada, essa pré vitamina sofre uma
17
Vários fatores podem alterar a produção cutânea de vitamina D3, entre eles a
melanina. Assim, indivíduos da raça negra necessitam de uma maior exposição à luz
solar do que indivíduos brancos para sintetizar a mesma quantidade de vitamina D3. O
70 anos produz uma quantidade 30% menor de vitamina D3 quando exposta à mesma
afetam a produção cutânea da vitamina D3. Sabe-se que indivíduos que habitam acima
durante a primavera e verão fornece estoques adequados, mesmo que reduzam sua
menor quantidade do precursor da vitamina D3, pode exigir suplementação para evitar
carências.
[25(OH)D3]. Essa reação ocorre nas células hepáticas, mediada pela enzima D-25-
hidroxilase (do grupo das enzimas citocromo P450). Essa enzima não é regulada e
18
A 25(OH)D3 é um metabólito pouco ativo que é transportado para o rim, onde
sofre uma segunda hidroxilação. Essa hidroxilação ocorre nos túbulos proximais, sob
embora vários outros órgãos, como os ossos, a pele e a placenta, possam também
anéfricos. Por essa razão, acredita-se que a produção de 1,25(OH)2D3 por outras
células que não as renais não esteja relacionada com a homeostase do cálcio
1,25(OH)2D3, seja por ação direta, seja indiretamente através da alteração dos níveis
parte sua capacidade de regular a produção renal de 1,25(OH)2D3, através do PTH. Tal
19
estimula determinados genes a produzir RNAm e portanto promover a síntese da
exemplo.
osteoclastos.
20
13.4.3 CALCITONINA
ambiente de água doce para salgada, em virtude das altas concentrações de cálcio nos
glândulas branquiais.
observamos que essas células reduzem seu tamanho, e tal fato é acompanhado de um
empregado na terapêutica clínica. Outros efeitos atribuídos a esse hormônio são o anti
21
sofrem exaustão diante de hipercalcemias prolongadas. Estudos têm demonstrado que
os níveis séricos de calcitonina são menores nas mulheres do que nos homens. O
adultos, e que esses níveis declinam com o avançar da idade. O significado fisiológico
A calcitonina é degradada na própria tireóide, no fígado, rins e tecido ósseo. Sua vida
EXERCÍCIOS
I – Cálcio
22
II – Fósforo
III – Hiperparatiroidismo
IV – Hipoparatiroidismo
23
V – Acidose
24
CAPÍTULO 14: INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA
Luís Yu, Emmanuel Burdmann, Antônio Carlos Seguro, Cláudia Maria de Barros Helou e
Roberto Zatz
Introdução
vitamina D.
produtos do metabolismo nitrogenado, como a uréia, acumula líquidos sob forma de edema,
potássio, magnésio, cálcio e fósforo. Se a perda de função renal ocorrer lentamente devido
insuficiência renal crônica (ver Capítulo 15). Se no entanto a perda de função renal ocorrer
de modo abrupto, o indivíduo terá desenvolvido uma insuficiência renal aguda (IRA). O
desenvolver por exemplo edema pulmonar. Quando a perda da função renal é muito grave,
o paciente não chega a sobreviver mais do que alguns dias na ausência de tratamento
intensivo. A IRA é portanto definida como uma perda significativa e abrupta da função
saudáveis, que eram resgatados dos escombros e sobreviviam aos ferimentos iniciais,
realizadas nestes pacientes encontraram necroses focais em segmentos dos túbulos renais,
em contraste com os glomérulos, cujo aspecto era normal. Denominou-se esse quadro, que
dos indivíduos com IRA permanece elevada, ao redor de 50%, podendo atingir valores de
até 80% ou mais em subgrupos específicos, como pacientes idosos oligúricos ou pacientes
estudada. Por outro lado, é evidente que a IRA pode acometer pacientes em todas as áreas
O perfil epidemiológico dos pacientes com IRA sofreu profundas alterações desde
atuais um nítido predomínio de indivíduos mais idosos, com doenças crônicas prévias e
quadros clínicos graves, com insuficiências orgânicas múltiplas. Esse predomínio ajuda a
explicar por que a letalidade da IRA continua semelhante à observada durante a Segunda
Guerra, apesar dos recursos terapêuticos mais poderosos hoje disponíveis (ver adiante). Por
básicos que levam à disfunção renal: 1) IRA pré-renal. 2) IRA renal. 3) IRA pós renal. Uma
I. Causas pré-renais:
1. Cardiovasculares: diminuição do débito cardíaco
• agudas: Infarto agudo do miocárdio, trauma, arritmias, hipertensão maligna, tamponamento
pericárdico, doenças valvulares
• crônicas: miocardiopatias (isquêmicas, hipertensivas), disfunções valvulares
2. Hipovolemia:
• perdas gastrointestinais: vômitos, diarréia
• perdas renais: nefropatias perdedoras de sal, uso de diuréticos, diurese osmótica
2. Nefrites intersticiais:
• drogas: penicilinas, cefalosporinas, rifampicina, sulfonamidas, diuréticos (furosemida, tiazídicos,
clortalidona ), anti-inflamatórios não-hormonais
• infecções
• infiltração: linfomas, leucemias, sarcoidose
• imunológica: Sjoëgren, uveíte-nefrite intersticial
3. Doenças vasculares:
• inflamatórias (vasculites): glomerulonefrite necrotizante pauci-imune, poliarterite nodosa,
granulomatose de Wegener, doença do soro
• microangiopática: síndrome hemolítico-urêmica (SHU), púrpura trombocitopênica trombótica
(PTT), hipertensão maligna, esclerodermia
4. Glomerulopatias:
• pós-infecciosa: Streptococcus, vírus, endocardite, abscessos abdominais, shunts
• glomerulonefrite membranoproliferativa
• GN rapidamente progressiva: lupus eritematoso sistêmico (LES), idiopática, Goodpasture,
poliarterite, granulomatose de Wegener, púrpura de Henoch-Schönlein, SHU, esclerodermia
1. Ureteral e pélvica:
• obstrução intrínseca: coágulos, cálculos, infecções fúngica e bacteriana
• obstrução extrínseca: tumores, fibrose retroperitoneal, ligadura inadvertida de ureteres
2. Vesical:
• cálculos
• coágulos
• hipertrofia ou neoplasia prostática
• carcinoma de bexiga
• neuropatia
3. Uretral:
• estreitamentos
• fimose
Nos casos em que o rim está funcionalmente íntegro mas a perfusão sangüínea que a
ele chega está reduzida, a IRA é denominada pré-renal. Essa hipoperfusão renal é
geralmente causada por hipovolemia aguda, como por exemplo, em casos de desidratação
decorrer também de situações em que a volemia arterial efetiva está reduzida, como por
nefrótica por “underfilling” (ver Capítulo 9). Esse quadro é essencialmente reversível se o
hipoperfusão renal pode causar lesão e necrose de células tubulares, principalmente nos
segmentos renais localizados na medula externa (pars recta do túbulo proximal e porção
espessa da alça de Henle). Nesse caso, instala-se um quadro de IRA renal, caracterizado
principalmente por necrose tubular aguda (NTA), embora possam aparecer outras
dos casos de IRA renal decorrem de NTA, enquanto o restante é causado por vasculites,
caracterizado por perda quase total da função renal, o que exige tratamento em ambiente
hospitalar, muitas vezes de natureza intensiva com uso de métodos dialíticos. Apesar de sua
letalidade da IRA deve-se em grande parte ao fato de que esses pacientes freqüentemente
apresentam falência de outros órgãos e complicações graves como sangramentos e
obstrução mecânica das vias urinárias, devido por exemplo à presença de cálculos ou
realizada a desobstrução precoce das vias urinárias. No entanto, a recuperação pode ser
mais difícil ou evoluir para NTA se a duração do processo obstrutivo tiver sido demasiado
FISIOPATOLOGIA DA IRA
IRA pré-renal
Embora a IRA pré-renal seja menos freqüente do que a IRA renal, o estudo dos
primeiro lugar, uma parcela substancial dos casos de IRA pré-renal acaba evoluindo para a
forma renal. Em segundo lugar, a IRA pré-renal é uma condição reversível se tratada em
Para entender os mecanismos que levam à queda da função renal na IRA pré-renal é
diz respeito à regulação do volume vascular. Normalmente, os rins filtram por dia uma
(Capítulo 1). Para que essa tarefa seja cumprida, é necessário que 25% do débito cardíaco
sejam destinados aos rins, que representam apenas 5% da massa corpórea. Apesar das
constante o volume extracelular (Capítulos 5 e 9). Normalmente, esse ajuste envolve uma
parcela tão pequena da carga filtrada de sódio (inferior a 1%) que o túbulo coletor é
sódio (FENa%= carga excretada/carga filtrada×100, ver Capítulo 5) é muito baixa, inferior a
custo. Todos os segmentos do néfron são envolvidos nesse esforço. A FENa% cai a quase
zero. O próprio ritmo de filtração glomerular (RFG) diminui, devido à queda do fluxo
causadas por intensa vasoconstrição das arteríolas glomerulares, por sua vez mediada por
20
15
Pcreat, mg/100 ml
10
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
RFG, ml/min
função não linear (Fig. 14-1), enquanto a concentração sangüínea de uréia sofre aumento
desproporcional, devido à avida absorção de água e sódio no túbulo proximal (ver Capítulo
ml/dia e a concentração de sódio na urina torna-se muito baixa, assim como a FeNa%. A
potássio reduz-se menos que a de sódio, indicando a persistência da secreção desse íon no
túbulo coletor, possivelmente acelerada pela avidez com que aquele segmento está
absorvendo sódio (ver Capítulo 5). A osmolalidade urinária está alta, alcançando até cerca
medular (Capítulo 4). Portanto, o exame da urina na IRA pré-renal indica a preservação da
integridade renal: o rim está fazendo o que dele se espera, ou seja, busca tenazmente
conservar sódio e água. Um caso típico de IRA pré-renal, com seus achados laboratoriais
prioridade agora é garantir a perfusão dos tecidos cerebral e miocárdico e com isso a
sobrevivência imediata do indivíduo, ainda que para isso seja necessário promover a
RFG = 30 L/dia
PROXIMAL
ALÇA FINA
DESCENDENTE
ALÇA FINA
ASCENDENTE
ALÇA
ESPESSA
DISTAL
COLETOR
reduzindo a valores muito baixos o RFG e o fluxo sangüíneo renal. A absorção de água e
sódio se intensifica, reduzindo ainda mais o fluxo urinário (Fig. 14-2). É nesse momento
que a vulnerabilidade do rim à isquemia e à hipóxia se manifestam, podendo determinar a
Como é possível a um tecido que recebe uma fatia tão generosa do débito cardíaco
ser tão vulnerável à hipóxia? Para responder a essa questão é necessário examinar de perto
a relação entre a oferta e a demanda de oxigênio nas diversas regiões em que se divide o
90
80
70
60
ml/min/100g
50
40
30
20
10
0
CÉREBRO MIOCÁRDIO RIM MEDULAR
EXTERNA
parênquima renal. É útil para isso a comparação com outros tecidos (Fig. 14-3). Enquanto
apenas 10% do oxigênio que lhes chega. Isso ocorre porque a maior parte do fluxo
externa do rim, o quadro é outro: 80% do aporte de oxigênio são ali consumidos. A razão
para que essa relação entre oferta e demanda de oxigênio seja assim precária é que, de um
lado, a medular externa abriga dois segmentos do néfron onde o transporte ativo de NaCl é
muito intenso: a pars recta do túbulo proximal e a porção espessa da alça de Henle. De
outro, a tensão de oxigênio nessa região tende a ser mais baixa do que na córtex. A razão
para isso é a disposição em contracorrente dos vasa recta (ver Capítulo 4). Esse arranjo em
“U” é extremamente útil para que os vasa recta ajudem a manter a hipertonicidade
O2
medular. No entanto, esse mesmo arranjo faz com que a tensão de oxigênio se reduza
oxigênio é mais baixa em razão do consumo ocorrido nas regiões mais profundas (Fig. 14-
4). Na região medular interna, as baixas tensões de oxigênio decorrentes desse movimento
não chegam a representar um problema, uma vez que é relativamente pequena a magnitude
do transporte iônico ali realizado pelas porções finais do túbulo coletor e pelas porções
oxigênio torna-se crítica. Portanto, a região medular externa vive constantemente à beira
da hipóxia, sendo a primeira a ser afetada por um processo de isquemia renal grave. Essa
vulnerabilidade é ainda agravada pelo fato de que a isquemia renal decorrente de uma
hipovolemia não é homogênea: enquanto o fluxo sangüíneo diminui para 60% dos níveis
IRA renal
Enquanto o rim permanecer capaz de concentrar a urina e reduzir substancialmente
a excreção de sódio, a IRA pré-renal pode ainda ser revertida através da correção da
É importante notar que, embora a maior parte dos casos de IRA renal tenha
passado por uma fase de IRA pré-renal, isso nem sempre é verdadeiro: uma parte dos
rápido, sem tempo para uma fase pré-renal. Outros casos originam-se de um efeito
renal não mais ocorre. Na maior parte dos casos, o fluxo urinário cai a valores muito
baixos, inferiores a 100 ml/dia. Denominamos esses casos IRA renal oligúrica, em
contraposição à IRA renal não oligúrica, que analisaremos logo adiante. Em qualquer dos
IRA pré-renal: a concentração de sódio é muito mais alta, da ordem de dezenas de mmol/L,
Tabela 14-3
Valores típicos de exames laboratoriais na IRA renal oligúrica
suas funções: não estão ávidos por sódio, não parecem estar secretando potássio em
quantidade significativa, nem estão empenhados em concentrar a urina para reter água. Em
filtrado glomerular que ainda se forma. É importante notar que, na ausência de qualquer
absorção tubular, mesmo um RFG muito baixo, de por exemplo 5 ml/min, corresponderia a
uma poliúria de 5L/min×1440 min/dia = 7,2 L/dia. O baixíssimo fluxo urinário encontrado
nesses pacientes, inferior a 0,1 L/dia, indica que o escasso filtrado glomerular é de alguma
forma reclamado em sua quase totalidade, sem ser no entanto modificado substancialmente
CARGA FILTRADA = 17 L/dia CARGA FILTRADA = 2400 mEq/dia
PROXIMAL PROXIMAL
ALÇA ALÇA
ESPESSA ESPESSA
DISTAL DISTAL
COLETOR COLETOR
Fig. 14-5 – Representação esquemática da filtração, absorção e excreção de água ao longo dos vários
segmentos do néfron na IRA renal. A largura da região em amarelo representa o fluxo de água
remanescente no lume tubular. As linhas pontilhadas representam os valores normais. A).Na IRA renal
oligúrica o RFG é baixo e quase todo o filtrado abandona a luz tubular antes de chegar ao final do
néfron, em grande parte devido a retrovazamento. B) Na IRA renal não oligúrica, uma boa parte do
filtrado chega ao fim do néfron devido à baixa taxa de absorção tubular. Mesmo sendo muito pequena,
a magnitude do RFG garante um fluxo suficiente para causar poliúria
(Fig. 14-5A). Essa disfunção tubular tem uma base anatômica definida: em vários pontos
Uma vez instalada, a IRA renal não mais pode ser revertida, mesmo que seja
corrigido o distúrbio que a originou. O RFG e o fluxo urinário permanecem muito baixos e
provocar até mesmo a morte do paciente por edema pulmonar. O paciente passa a
diálise (ver adiante). Somente após a recuperação espontânea do tecido renal é que o
urinária são semelhantes àquelas encontradas na IRA renal oligúrica (Tabela 14-4). A única
Tabela 14-4
Valores típicos de exames laboratoriais na IRA renal não oligúrica
4,5
diferença entre as duas modalidades reside no fluxo urinário: enquanto na forma não
oligúrica o fluxo urinário é usualmente inferior a 100 ml/dia, é comum na forma não
que, nessa forma de IRA, a recuperação da pequena quantidade de filtrado que se forma é
apenas parcial (Fig. 14-5B). A distinção entre as duas formas de IRA é importante por duas
razões: em primeiro lugar, o prognóstico da IRA renal não oligúrica é melhor do que o da
forma oligúrica. Em segundo lugar, o controle do balanço hídrico é mais fácil na forma não
oligúrica do que na oligúrica, uma vez que é menor a tendência à retenção de volume.
Por que a hipóxia prolongada do tecido renal provoca uma depressão tão persistente
do RFG e das funções tubulares, que se mantém mesmo depois de corrigido o distúrbio
inicial? A resposta a esta questão permanece incompleta. Sabe-se no entanto que uma série
de alterações vasculares contribuem para manter baixos o fluxo sangüíneo renal e o RFG.
Essas alterações levam a uma intensa vasoconstrição das arteríolas glomerulares, o que
promove hipoperfusão, bem como a uma redução do Kf glomerular (ver Capítulo 1),
diminuindo o RFG. Essa vasoconstrição pode ser mediada pela disfunção de diversos
intensa; o óxido nítrico (NO), que desempenha um papel importante na regulação do fluxo
sangüíneo renal em condições normais, mas que pode também exercer um efeito tóxico
produzido pelos átrios, capaz de aumentar substancialmente o RFG. Apesar dessa riqueza
condição, como a necrose de células tubulares, além da óbvia disparidade entre as formas
efeitos deletérios da própria hipóxia sobre epitélios transportadores complexos como os que
constituem os túbulos renais. Esses epitélios são obrigados a consumir grandes quantidades
de ATP, utilizados como fonte de energia metabólica para a realização de transporte ativo.
também por intermédio do citoesqueleto que as células aderem umas às outras através da
Capítulo 5). Além dessas funções específicas de epitélios transportadores, essas células
celulares, tais como a manutenção de seu volume (tarefa ainda mais difícil quando as
células estão imersas em meio hipertônico como a medula renal), a extrusão de cálcio do
interior da célula, visando manter baixas concentrações desse íon no citosol, a biossíntese
de proteínas, etc.
período prolongado, todas essas funções podem ser comprometidas. A polarização das
células pode ser perdida, o que a faz por exemplo inserir moléculas de Na-K-ATPase em
ambas as membranas. Com isso, a célula deixa de realizar transporte resultante de sódio e
água, tornando-se portanto não transportadora (Fig. 14-6). A perda de polaridade estende-se
perdem sua fixação e desgarram-se do epitélio, invadindo a luz tubular (Fig. 14-7A). Como
Na +
Na+
Na +
ATP
K
ATP
+
K +
K +
as integrinas ainda estão localizadas ao longo da superfície das células, estas tendem a
aderir umas às outras, formando “cilindros” que entopem a luz tubular (Fig. 14-7B). A
aumentar ainda mais as dimensões desses “cilindros”. É provável que essa micro-obstrução
tubular reduza a zero o RFG do respectivo néfron, de modo análogo ao da obstrução das
vias urinárias. A repetição desse fenômeno em muitos outros néfrons deve contribuir para
reduzir ainda mais o RFG total. É importante lembrar que uma alteração desse porte não é
facilmente reversível, o que pode ajudar a entender a lentidão com que esses pacientes se
não chegarem a se desgarrar das estruturas adjacentes, podem até mesmo se recuperar logo
a célula, podendo levá-la à necrose ou, em outros casos, à apoptose, que é uma forma de
Fiig. 14-7 – A) Células submetidas a hipóxia durante longos períodos têm alteração de seu
citoesqueleto e enfraquecimento de suas ligaçõescom as estruturas vizinhas, desgarrando-se
do epitélio e invadindo a luz tubular. B) Células desgarradas e restos de células destruídas
formam “cilindros” que obstruem o túbulo e dificultam a filtração glomerular naquele
néfron. As lacunas deixadas pelas células que se desprenderam permitem o retrovazamento
de fluido em direção ao interstício
células no momento mesmo em que deixa de existir, ou seja, quando ocorre a reperfusão. A
ATP
ADP
AMP
Adenosina
Hipoxantina
Hipoxantina
-
SOD
OO
2 2
-
Xantina
H2HOO2 2 2
.
OH Ácido úrico
CAT
H2O + O2
rapidamente transformado em xantina e ácido úrico, que é o catabólito final. Essa reação
gera também o superóxido e a hidroxila (não confundir com o ânion hidroxila presente nas
bases fortes), radicais livres bastante citotóxicos. Em condições normais, esses compostos
são formados em quantidade pequena o suficiente para que a célula evite facilmente a
elevação de seus níveis através de enzimas que os removem. Nas condições especiais da
desses radicais livres que, embora existam durante um intervalo de tempo extremamente
curto, têm um efeito tóxico devastador. Outro radical livre que pode exercer um efeito
deletério na reperfusão é o óxido nítrico (NO), que é sintetizado pelas células renais e
também por macrófagos e outros leucócitos (ver Capítulo 2). Normalmente, o NO exerce
um importante papel fisiológico devido a seu efeito efeito vasodilatador, que ajuda a
presença de grandes quantidades de superóxido, com o qual se combina para gerar o ânion
Combinadas à micro-obstrução dos túbulos por células desgarradas e restos celulares, essas
14-7B). É evidente que esse movimento de fluido não constitui propriamente uma absorção
tubular, servindo apenas para promover edema intersticial, o que vai aumentar a pressão
processo. É evidente também que o retrovazamento ajuda a explicar por que o volume
evidentes: a falta de absorção faz com que o fluido intratubular que chega à célula seja
rejeição de uma parcela considerável do fluido filtrado. Os néfrons em que esse tipo de
lesão predomina contribuem à formação de urina com um fluido pouco alterado em relação
IRA renal oligúrica (Tabela 14-3). É razoável supor que, se esse distúrbio predominar em
um grande número de néfrons, a tendência do paciente será a de desenvolver uma forma
químicos podem causar uma queda abrupta do RFG promovendo diretamente uma
compostos promovem lesão do parênquima renal por uma agressão tóxica tubular direta,
capazes de causar IRA nefrotóxica podem ser divididos em três grandes grupos: 1)
Os mecanismos através dos quais cada um desses grupos de agentes provoca seus efeitos
tóxicos, sejam estes vasculares ou celulares, não foram ainda completamente estabelecidos.
Uma discussão detalhada sobre as hipóteses atualmente propostas para explicar esses
três razões básicas para essa vulnerabilidade. Em primeiro lugar, o rim recebe, conforme
mencionado no início deste capítulo, cerca de 25% do débito cardíaco, estando portanto
exposto mais rápida e diretamente a qualquer agente tóxico circulante. Em segundo lugar, o
Além de poder ser causada por hipovolemia e por agentes tóxicos, a IRA renal pode
também representar, com menor freqüência, uma complicação de outras patologias renais.
É o caso das glomerulonefrites, que em suas formas mais graves chega a provocar necrose
ou secundárias a doenças sistêmicas, como o lupus eritematoso. A IRA pode ser causada
alérgicos ou a infecções.
urinárias. Para que a IRA se estabeleça nesses casos, é necessário que a obstrução atinja
ambos os ureteres, ou que se estabeleça em um indivíduo com rim único. A causa mais
freqüente de obstrução renal são os cálculos ureterais. Outras causas comuns são os
coágulos decorrentes de sangramento renal ou das vias urinárias, os tumores das própria
fluxo urinário acarreta elevação da pressão hidráulica da via urinária, que se transmite aos
entram em ação, contribuindo para manter baixo o RFG. Nos casos de IRA pós-renal é
imperioso desfazer o mais rapidamente possível a obstrução do trato urinário, uma vez que
é possível reverter a queda do RFG. No entanto, se a obstrução persistir, pode haver lesão
do parênquima renal, com a instalação de necrose tubular aguda e/ou infecção renal e das
vias urinárias, que podem levar à perda do órgão. Essa complicação é mais freqüente em
intensos. Ao alívio da obstrução, segue-se uma fase de intensa diurese, denominada diurese
pós-obstrutiva, durante a qual o paciente pode até mesmo desenvolver desidratação iso ou
Diagnóstico da IRA
considerada oligúria. Esse limite foi assim definido por corresponder ao volume mínimo
necessário à excreção diária de solutos como a uréia, o sódio e o potássio (ver Capítulo 11).
No entanto, aproximadamente 50% dos casos de IRA observados atualmente são da forma
drogas nefrotóxicas. Além disso, os médicos tendem cada vez mais a intervir de modo
este é um método pouco sensível, pois a Pcreat só se elevará de forma inequívoca quando o
RFG for inferior a 50% do normal. Mais ainda, como a Pcreat depende da massa muscular,
pode apresentar níveis enganosamente baixos em indivíduos com massa muscular reduzida,
como idosos, pacientes desnutridos, crianças etc. Assim, níveis de creatinina plasmática
aguda. Anamnese e exame físico cuidadosos são fundamentais para este diagnóstico. A
história clínica de insuficiência renal crônica (IRC) costuma ser pobre, devido à natureza
remanescentes à perda progressiva de massa renal (ver Capítulo 15). Por outro lado, a IRA
pequenos e/ou com perda da delimitação córtico-medular são indicativos de IRC, enquanto
rins de tamanho normal com córtex preservada são fortemente sugestivos de IRA.
rápido e eficiente das formas reversíveis, como a IRA pré-renal, a IRA pós-renal, as
glomerulites, as vasculites e as nefrites intersticiais. O diagnóstico diferencial entre IRA
de uma urina com baixa concentração de sódio e alta osmolalidade. Por outro lado, na NTA
o dano tubular impede a reabsorção de sódio e a concentração urinária, fazendo com que os
rins produzam uma urina com alta concentração de sódio e osmolalidade próxima à do
plasma. Um parâmetro extremamente útil para se discernir entre uma IRA pré-renal e uma
excretada de sódio (UNa × V) pela carga filtrada de sódio (PNa × RFG) e multiplicando-se o
Quando a FENa% é inferior a 1%, é alta a probabilidade de se tratar de uma IRA pré-renal,
forma, a melhor maneira de distinguir entre uma IRA pré-renal e uma NTA é a realização
uma insuficiência cardíaca grave, reposição de volume em casos de hipovolemia por perdas
externas. Se essa correção resultar em uma rápida recuperação do fluxo urinário, impõe-se
o diagnóstico de IRA pré-renal. Por outro lado, se a oligúria e o baixo RFG persistirem
ser realizado com extremo cuidado, para evitar sobrecargas hídricas que coloquem em risco
A queda abrupta da filtração glomerular faz com que várias substâncias tóxicas
nitrogenados, como a uréia, passem a ser retidas. Essa retenção provoca disfunções em
vários órgãos e sistemas e origina o quadro clínico de uremia, que é a manifestação mais
dramática da insuficiência renal. Apesar do nome, sabe-se hoje que a uréia não é o principal
responsável pela síndrome urêmica, não havendo ainda consenso acerca de qual ou quais
são as principais toxinas causadoras desse quadro. Na IRA renal oligúrica, em que ocorre
lesão renal grave, os rins perdem, além de sua função de eliminar escórias, também a
eletrolítica potencialmente mais perigosa provocada pela IRA é a hipercalemia, que pode
causar arritmias graves e mesmo mortais (ver Capítulo 8). Quadros de acidose metabólica
com anion gap normal ou elevado são comuns (ver Capítulo 12). Finalmente, as funções
renais endócrinas também podem ser prejudicadas, o que pode gerar anemia e distúrbios do
metabolismo do cálcio. É freqüente a ocorrência de hipocalcemia, hiperfosfatemia e
principais sinais e sintomas da IRA renal, agrupados com base nos órgãos e sistemas
acometidos.
O quadro clínico da NTA persiste durante 2 a 4 semanas, até que ocorra a recuperação
se refaça completamente a anatomia dos túbulos e a polarização das células. Vale ressaltar
que essa regeneração nem sempre acontece: cerca de 1 a 5% dos pacientes com IRA jamais
dependentes de diálise.
Tabela 14-5
Principais manifestações clínicas da IRA renal
massa muscular
Cutâneo: prurido
IRA renal já estabelecida, deve-se manter o doente convenientemente hidratado para evitar
agressão isquêmica adicional ao rim (obviamente o excesso de volume deve ser evitado
com rigor ainda maior). Drogas e substâncias nefrotóxicas devem ser utilizadas
rapidez possível.
Por outro lado, uma vez instalado o quadro de NTA, não existe conduta capaz de
alça, numa tentativa de trazer o fluxo urinário a níveis mais próximos dos fisiológicos.
Com isso, busca-se tornar mais fácil a manutenção do balanço hídrico do paciente, sem
necessidade de diálise. Outros argumentam que esse procedimento pode transformar a IRA
renal oligúrica em uma não oligúrica, melhorando assim o prognóstico da doença. Não se
estabeleceu até o momento se essa conduta tem realmente um impacto benéfico sobre o
Também a hipercalemia e a acidose persistentes exigem essa indicação. A tabela 14-6 lista
Nos últimos anos diversos métodos dialíticos tem-se tornado disponíveis para o
que esta seja irrigada com soluções salinas balanceadas contendo dextrose. A remoção das
toxinas e fluidos se faz por difusão (transporte de solutos através de membrana semi-
solutos, a escolha poderá recair sobre a hemodiálise, na qual ocorre a remoção de fluido e
permitem a retirada rápida de fluido e também a remoção de moléculas maiores, como por
em uma artéria e termina em uma veia) ou veno-venoso (com início e término em uma veia
central). Esta última via de acesso vascular é mais utilizada atualmente, através da
tipos de IRA.
3-) Simule agora uma IRA pré-renal. O que acontece ao RFG? E às cargas
reposição de volume? Faz sentido administrar furosemide nessas circunstâncias? Por que?
Observe os comentários que aparecem no alto à direita. Eles vão aparecer outras vezes
4-) Repita os procedimentos acima após simular uma IRA renal. Observe o que
4-) Repita os procedimentos acima após simular uma IRA não oligúrica. Clique em
5-) Com base nessas observações: a) como se pode distinguir entre uma IRA pré-
renal e uma IRA renal? Qual o melhor tratamento para uma IRA pré-renal? O que fazer
100
80
FPN, nl/min
60
40
20
0
0 25 50 75 100
% ABLAÇÃO
Fig 15.1: Representação esquemática da elevação da taxa de filtração por néfron (FPN) em função da fração do parênquima renal retirado
cirurgicamente (% ablação)
(ablação) parcial da massa renal (Fig. 15.1). O exemplo mais óbvio dessa
adaptação é o da uninefrectomia, freqüentemente necessária por exemplo em casos
de tumores renais ou em doadores de rins para transplante entre vivos. O RFG
desses indivíduos pode chegar a 80% do observado antes da uninfrectomia,
indicando que a taxa de ultrafiltração dos néfrons remanescentes pode estar
aumentada em 60%. No rato, que pode ser submetido a vários níveis de ablação da
massa renal e no qual é possível medir diretamente a taxa de filtração glomerular,
essa adaptação progressiva é ainda mais evidente. Enquanto o RFG por néfron é de
cerca de 45 nl/min em ratos normais, observamos um aumento de cerca de 50% em
ratos submetidos a uninefrectomia, chegando ao triplo do normal quando mais de
80% do parênquima renal são removidos, uma situação que mimetiza o que ocorre
em pacientes com insuficiência renal crônica avançada. Conforme discutido no
Capítulo 1, esse
60
50
40
mmHg
30
20
10
0
0 .0 0 .2 0 .4 0 .6 0 .8 1 .0
D ist â n c ia
Fig. 15.2: Representação esquemática da dinâmica glomerular em condições normais (linhas cinzentas) e após retirada de 85% do
parênquima renal (linhas negras)
Sódio
150 15
FENa%
100 10
50 5
0 0
0 20 40 60 80 100 120 0 20 40 60 80 100 120
RFG, ml/min RFG, ml/min
A B
Fig. 15.3: Concentração plasmática (A) e fração de excreção (B) de sódio como função do RFG
FEcreat %
10
50
5
0 0
0 20 40 60 80 100 120 0 20 40 60 80 100 120
RFG, ml/min RFG, ml/min
Fig. 15.4: Concentração plasmática (A) e fração de excreção (B) de creatinina como função do RFG
POTÁSSIO
ÁGUA
EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE
Conforme discutido no Capítulo 12, a excreção renal de ácido fixo é
composta de duas parcelas aproximadamente iguais: a acidez titulável,
representada pelos prótons ligados aos tampões fixos urinários, especialmente os
fosfatos, e a excreção de amônio (NH4+), esta diretamente dependente da síntese
renal de amônia (NH3). Vimos também nesse capítulo que um aumento da
produção de ácido fixo pelo organismo é compensado principalmente pelo
aumento da síntese renal de NH3 e correspondente excreção de NH4+, uma vez que
a excreção de acidez titulável já está próxima ao máximo em condições normais.
Quando o número de néfrons diminui em decorrência de uma doença renal
crônica, os néfrons remanescentes são evidentemente obrigados a excretar uma
quantidade maior de prótons a fim de manter o balanço ácido do organismo. Para
isso, cada néfron deve aumentar tanto a acidez titulável quanto a excreção de
amônio. Seria impossível aos néfrons aumentar muito a acidez titulável em
condições normais. No indivíduo com doença renal crônica, no entanto, a taxa de
filtração glomerular por néfron está aumentada e, com isso, também a filtração de
tampões fixos. Por essa razão, a excreção de acidez titulável por néfron aumenta
em proporção à queda no RFG. Com isso, a excreção total de ácido titulável pelos
rins tende a permanecer relativamente estável até fases avançadas da insuficiência
renal crônica.
A excreção de NH4+ por néfron também aumenta na insuficiência renal
crônica, de modo a manter inalterada a excreção renal total desse íon. Essa
adaptação permite ao tecido renal remanescente manter por muito tempo,
juntamente com a excreção de ácido titulável, o balanço de ácidos fixos. No
entanto, há um limite, determinado pela capacidade de síntese dos túbulos, para a
produção renal de amônia. Esse limite é atingido em estágios mais avançados do
processo, quando o RFG cai abaixo de 20% do normal. Nessas condições, a
produção de NH3 por néfron atinge um máximo, enquanto o número de néfrons
continua a diminuir. Como resultado, a produção total de amônia pelos rins vai
diminuindo progressivamente, em proporção à redução do número de néfrons. Os
rins tornam-se assim incapazes de neutralizar totalmente os ácidos gerados pelo
organismo, desenvolvendo-se como resultado um quadro progressivo de acidose
metabólica.
O ácido metabólico que se vai acumulando aos poucos em decorrência da
insuficiência renal crônica é em parte neutralizado pelos carbonatos ósseos, um
sistema tampão que atua muito pouco em condições normais, mas acaba sendo
acionado quando a acidose torna-se persistente. Como os carbonatos formam
precipitados com o cálcio, os quais contribuem para conferir ao tecido ósseo parte
de suas propriedades físicas, essa reação de neutralização acaba desmineralizando
o osso, contribuindo para o enfraquecimento do esqueleto, uma das conseqüências
da insuficiência renal crônica a longo prazo (ver abaixo).
CÁLCIO/FÓSFORO
Embora os fosfatos sejam essenciais à manutenção de uma série de funções
no organismo, como o metabolismo energético e a própria mineralização do
esqueleto, inexiste um rígido sistema de controle de sua concentração plasmática,
como no caso do sódio, potássio e cálcio. O fosfato é livremente filtrado no
glomérulo e parcialmente absorvido no túbulo proximal, sendo portanto sua
excreção urinária aproximadamente proporcional à sua carga filtrada (Capítulo
13). Por essa razão, a concentração plasmática de fosfatos, tal como a de
creatinina, varia inversamente com o RFG. À medida que este vai declinando com
o progredir da insuficiência renal crônica, a concentração plasmática de fosfato
tende a se elevar. Ocorre que, em solução aquosa, as concentrações de cálcio e
fosfato variam reciprocamente de modo a manter constante o seu produto
(denominado produto de solubilidade). Dessa maneira, a elevação dos níveis
plasmáticos de fosfato acaba levando a uma queda na concentração plasmática de
cálcio e conseqüentemente a uma produção exagerada de paratormônio (PTH). O
aumento da concentração plasmática de PTH tende a trazer a concentração de
cálcio de volta a seus níveis normais através de dois efeitos básicos: 1)
aumentando a rejeição tubular de fosfato, elevando sua fração de excreção (Fig.
15.5) e reduzindo sua concentração plasmática e 2) mobilizando cálcio dos ossos,
que constituem uma reserva natural desse íon. A longo prazo, vai ocorrer uma
descalcificação óssea. Esse processo é ainda agravado pela retenção de ácidos
fixos, os quais são parcialmente tamponados pelos carbonatos ósseos, conforme
discutido acima, dando origem a um quadro distinto de desmineralização óssea
conhecido como osteomalácia.
Enquanto o número de néfrons estiver apenas moderadamente reduzido (30
a 50% de redução), os rins conseguem regular sem maior dificuldade o
metabolismo de cálcio e fósforo, mantendo normal a fosfatemia. No entanto, como
no caso do potássio, podem ocorrer surtos de hiperfosfatemia pós prandial, na
medida em que a resposta fosfatúrica renal é necessariamente mais lenta do que a
normal, o que ajuda a manter elevados os níveis de PTH. Além disso, há
evidências de que o transporte de grandes quantidades de fósforo através das
células do túbulo proximal acaba por elevar a concentração de fósforo nessas
células e que esse aumento inibe a 1-α-hidroxilase, que é a enzima responsável
pela transformação da 25(OH)-D3 em 1,25 (OH)2-D3. Como este último constitui,
conforme discutido no Capítulo 13, o metabólito realmente ativo da vitamina D, o
resultado é uma redução da absorção intestinal de cálcio, com conseqüente
tendência à hipocalcemia e estimulação do PTH, contribuindo para perpetuar o
processo.
O hiperparatiroidismo assim instalado tende a se agravar à medida que mais
e mais néfrons vão sendo destruídos, até que, nas etapas mais avançadas do
processo, a fosfatemia tende a aumentar persistentemente e o hiperparatireoidismo
se instala de forma definitiva. O resultado final dessas anomalias é o
desenvolvimento de uma doença óssea complexa, denominada osteíte fibrosa
cística. Já o conjunto de alterações ósseas que ocorrem na insuficiência renal
crônica, incluindo a osteomalácia consequente à acidose e a osteíte fibrosa cística,
recebe o nome de osteodistrofia renal. Tomadas como um todo, as alterações
ósseas observadas ao longo da evolução da insuficiência renal crônica representam
o preço a se pagar para que os néfrons remanescentes excretem uma quantidade
cada vez maior de fosfato, a fim de manter o balanço e os níveis circulantes desse
íon e, principalmente, do cálcio.
100
80
FE HP O4-
Concentrações
60
[P TH]
40
20
-
[HPO 4 ]
plasma
0
0 20 40 60 80 100 120
RFG, ml/min
Fig. 15.5: Representação esquemática do comportamento das concentrações plasmáticas de fosfato ([HPO4-]) e paratormônio ([PTH]) e da
fração de excreção urinária de fosfato (FEHPO4-), em função do RFG.
T=∆
∆P•R
∆P
∆P
EXERCÍCIOS