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DESCRIÇÃO

Abordagem dos principais conceitos envolvidos na análise dos exames laboratoriais relativos à função renal, dos distúrbios hidroeletrolíticos e do
equilíbrio acidobásico.

PROPÓSITO
Compreender os conceitos teóricos para realização e interpretação dos exames bioquímicos que avaliam a função renal, os distúrbios
hidroeletrolíticos e distúrbios que afetam o equilíbrio acidobásico é importante para auxiliar o diagnóstico das principais patologias que envolvem o
sistema renal e os distúrbios no metabolismo.

PREPARAÇÃO
Tenha em mãos uma calculadora, papel e caneta para realizar alguns cálculos necessários durante a análise da função renal. Sugerimos ainda o
Dicionário Médico gratuito offline Edição: para estudantes de medicina e profissionais e o Glossário Médico elaborado pelo Laboratório de
Habilidades e Simulação da USP, ambos disponíveis gratuitamente na web.

OBJETIVOS

MÓDULO 1

Descrever os principais exames para avaliação laboratorial da função renal

MÓDULO 2

Reconhecer os principais distúrbios hidroeletrolíticos

MÓDULO 3

Descrever os principais distúrbios do equilíbrio acidobásico

INTRODUÇÃO
Os rins são órgãos essenciais ao organismo, pois estão envolvidos na manutenção do equilíbrio acidobásico, hidroeletrolítico e da homeostasia
interna. A maior parte das patologias que atingem esses órgãos comprometem não só a função renal, mas também atingem diretamente ou
indiretamente todos os órgãos do organismo.
A avaliação da função renal possibilita o diagnóstico precoce das doenças renais, como a insuficiência renal aguda ou crônica. Nesse contexto, a
participação do laboratório é de grande importância, visto que essas doenças só se manifestam clinicamente quando mais de 50% a 75% da
função renal está comprometida, ou seja, quando o paciente já evolui para um quadro grave que pode resultar na hemodiálise ou então transplante
renal.

Ao longo deste conteúdo, conheceremos os principais biomarcadores utilizados na avaliação da função renal. Veremos ainda os principais
distúrbios hidroeletrolíticos e do equilíbrio acidobásico que são frequentes no cotidiano de médicos, farmacêuticos, biomédicos, biólogos e demais
profissionais da saúde responsáveis pelo manejo de pacientes internados com distúrbios no metabolismo da água, ureia, glicose, sódio entre
outros.

AVISO: Orientações sobre unidades de medida.

AVISO

Em nosso material, unidades de medida e números são escritos juntos (ex.: 25km) por questões de tecnologia e didáticas. No entanto, o Inmetro
estabelece que deve existir um espaço entre o número e a unidade (ex.: 25 km). Logo, os relatórios técnicos e demais materiais escritos por você
devem seguir o padrão internacional de separação dos números e das unidades.

MÓDULO 1

 Descrever os principais exames para avaliação laboratorial da função renal

INTRODUÇÃO À FUNÇÃO RENAL


Anatomicamente, os rins são órgãos pares que possuem formato de grãos de feijão, medindo aproximadamente 6cm de largura, 11cm de
comprimento e 3cm de espessura e pesando cerca de 130g no ser humano adulto sadio. Eles estão localizados junto à parede posterior do
abdome, logo abaixo do diafragma, no espaço retroperitoneal, sendo o rim direito um pouco inferior ao rim esquerdo.

 Posição anatômica dos rins.

Tais órgãos possuem dois lados (um convexo e outro medial côncavo). No lado côncavo, chamado de hilo renal, se reúnem os vasos sanguíneos e
linfáticos. Macroscopicamente, o rim se divide em duas seções:

CÓRTEX RENAL
Parte externa do rim, onde estão localizados os glomérulos e túbulos contorcidos (distais e proximais).

MEDULA
Parte mais interna do rim, constituída pelas alças de Henle e pirâmides de Malpighi.
 Esquema mostrando as divisões macroscópicas do rim.

Os rins possuem múltiplas funções homeostáticas essenciais ao organismo, são elas:

Remoção de resíduos (como os produtos do metabolismo de proteínas e ácidos nucleicos).

Manutenção do equilíbrio de eletrólitos (Na+, K+, Cl-, Ca2+, Mg2+, SO42-, PO42-).
Manutenção do equilíbrio acidobásico (manutenção do pH sanguíneo).

Regulação da pressão arterial.

Função endócrina importante com a produção de hormônios ou substâncias vasoativas que atuam regulando diferentes funções no organismo,
como a eritropoietina, que estimula a medula óssea a produzir hemoglobina.
Convertem a vitamina D na sua forma ativa, aumentando a absorção intestinal de cálcio.

Além dessas funções, os rins ainda convertem a vitamina D na sua forma ativa, aumentando a absorção intestinal de cálcio.


 SAIBA MAIS

A função renal endócrina fica intacta até os estágios mais avançados da doença renal. Assim, um paciente
que faz hemodiálise não necessariamente precisa de reposição farmacológica de eritropoietina.

NÉFRON

O néfron é a unidade funcional do rim composto por um glomérulo (vários capilares sanguíneos recobertos por células epiteliais) e um complexo
sistema tubular que desempenham a maioria das funções renais.

Você sabia que cada rim apresenta mais de 2 milhões de néfrons?

Na imagem a seguir, note o néfron e os vasos sanguíneos renais.

 Corte transversal do rim.


Agora veja a seguir como é a estrutura e a função dos néfrons.

O glomérulo é envolvido por uma cápsula impermeável denominada cápsula de Bowman e apresenta um polo vascular, que é o local por onde
chegam os vasos sanguíneos provenientes da artéria renal; e um polo urinário, onde iniciará a excreção renal. O glomérulo filtra grande
quantidade de líquido proveniente do sangue que flui para dentro da cápsula de Bowman e deste para o sistema tubular, que converterá esse
líquido em urina.

Após sair da cápsula de Bowman, o líquido filtrado atinge o túbulo contorcido proximal. Esse túbulo é constituído por células que possuem
microvilosidades chamadas de borda em escova, projetadas para aumentar a superfície de contato com o filtrado glomerular com abundantes
mitocôndrias longas e finas, revestindo o polo basal da célula, e numerosas vesículas envolvidas no transporte transcelular. O túbulo contorcido
proximal é circundado por redes de capilares peritubulares que envolvem os túbulos renais e são essenciais para as etapas de excreção.

Posteriormente, o líquido deixa o córtex renal e penetra na medula renal, fluindo para a alça de Henle, que, por sua vez, possui um ramo
descendente apresentando células menores, com pequeno número de mitocôndrias e microvilosidades curtas, onde não há absorção de íons e
água. Contudo, apresenta em seu ramo ascendente células com mais microvilosidades e abundantes mitocôndrias com dobras extensas na
membrana basolateral, permitindo o processo de reabsorção de grandes quantidades de íons e água.

Na parte final do néfron encontramos o túbulo contorcido distal e o túbulo coletor. O túbulo contorcido distal possui células similares ao ramo
ascendente da alça de Henle e consequentemente um potencial de absorção parecido. Já o túbulo coletor é responsável pelo ajuste final da urina.

Como percebemos o néfron é composto pelo corpúsculo renal (glomérulo e cápsula de Bowman) e pelos túbulos renais (túbulo proximal, alça de
Henle, túbulo distal e o coletor). Observe com mais detalhe na imagem a seguir.

 Néfron: corpúsculo renal e túbulos renais.

Os néfrons podem ser classificados em:

CORTICAIS
Estão localizados nas regiões mais centrais do córtex e apresentam a alça de Henle mais curta.
JUSTAMEDULARES
Estão mais próximos da medula e apresentam um glomérulo e a alça de Henle maiores.

Na figura a seguir, conseguimos ver essas diferenças:

 Néfrons corticais e justamedulares.

FISIOLOGIA RENAL

A formação da urina depende:

Do fluxo sanguíneo renal

Da filtração glomerular
Da reabsorção tubular

Da concentração renal

Da secreção tubular

Na figura a seguir conseguimos observar as etapas da excreção urinária:

 Excreção urinária.


FISIOLOGIA RENAL: ETAPAS PARA A FORMAÇÃO DA URINA.
A especialista Jéssica Ribeiro Lima relembra sobre a fisiologia renal e a formação da urina, que são essenciais para a compreensão da
avaliação da função renal.

Após revermos tais conceitos, podemos agora estudar como é feita a avaliação da função renal nos laboratórios clínicos.

AVALIAÇÃO LABORATORIAL DA FUNÇÃO RENAL


A apresentação clínico-laboratorial das doenças renais depende do local e da extensão da lesão: uma quantidade elevada de proteínas na urina
indica lesão glomerular, pois, como você sabe, o filtrado glomerular é o ultrafiltrado do plasma sem as células e as proteínas plasmáticas.

Qualquer lesão renal pode apresentar uma manifestação aguda ou crônica e os exames de imagens (vias urinárias e rins) são grandes aliados
médicos para confirmar a presença de uma lesão renal.

Para facilitar seu entendimento, faremos a avaliação da função renal em duas etapas: avaliação da função glomerular e avaliação da função
tubular. Vamos conhecê-las?

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO GLOMERULAR


A função glomerular depende do fluxo sanguíneo renal e da pressão sanguínea no glomérulo. Assim, podemos imaginar que toda vez que tivermos
uma lesão glomerular ou uma diminuição do suprimento sanguíneo nesse órgão, teremos um comprometimento da formação desse ultrafiltrado,
com retenção plasmática de produtos de excreção do metabolismo celular, comprometimento do equilíbrio osmolar e perda de substâncias pela
urina e de eletrólitos.

Uma lesão glomerular, como ocorre na nefropatia diabética, pode levar à presença de proteínas, como a albumina, em altas concentrações na
urina.

Na imagem ao lado apresenta-se o esquema comparando um glomérulo normal e outro com lesão glomerular que leva à presença de proteínas na
urina.
O teste de filtração glomerular (FG) tem como objetivo avaliar a capacidade de filtração de uma substância a partir do método de depuração (ou
clearance).

A depuração (FG) é calculada por uma fórmula matemática que relaciona a quantidade excretada da concentração urinária (u) de uma substância
multiplicada pelo volume (v) urinário em determinado espaço de tempo (minutos) dividido pela concentração plasmática da mesma substância (P).

DEPURAÇÃO

Capacidade do rim de eliminar uma substância originada do metabolismo.

UXV
FG =
P

 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal

Como a velocidade de filtração glomerular depende da massa corpórea e do tamanho do rim, essa relação matemática pode ser corrigida pela
superfície corporal do adulto médio, considerando um fator 1,73/A, em que 1,73 corresponde à altura média de um indivíduo adulto e A é a
superfície corporal do paciente avaliado.

UXV
FG CORRIGIDA = P X 1,73 / A

 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal

É importante ressaltar que idosos, crianças e mulheres normalmente apresentam FG menor do que um homem adulto. Além disso, ocorre
variações também em relação a etnia.

Normalmente, essa avaliação é feita a partir da dosagem de creatinina urinária e sérica, mas também pode ser feita pela dosagem de inulina. No
entanto, esse procedimento não é muito preciso e é feito coletando amostras de urina durante 24 horas, o que o torna inconveniente para os
pacientes.

INULINA

Polímero de frutose é considerado o padrão-ouro para a medida da taxa de função glomerular (TFG), mas é um marcador exógeno de difícil
obtenção para infusão humana.
Assim, essa dosagem tem sido substituída pelas equações que estimam a taxa de função glomerular (TFG) baseadas em dados demográficos
(peso, sexo, etnia e altura) e a dosagem de um biomarcador, normalmente a creatinina, no plasma.

Vamos aprender a calcular a TFG no próximo tópico, mas agora é importante que você saiba que, a partir dessa estimativa, o médico pode ter uma
noção da função renal e avaliar o estágio da doença renal.

No quadro a seguir podemos ver esta classificação, segundo a National Kidney Foundation:

ESTADIAMENTO

Estadiamento é a forma de determinar o avanço de uma doença no organismo de um paciente. Muito utilizado no câncer para avaliar a extensão e
localização da neoplasia.

Estágio TFG (mL/min/1,73m2) Estadiamento

G1 ≥90 Normal ou alta

G2 60-89 Pequena diminuição

G3a 45-59 Pequena a moderada diminuição

G3b 30-44 Moderada a grave diminuição

G4 15-29 Grave diminuição

G5 < 15 (ou diálise) Falência renal

 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem horizontal

 Quadro: Valores de referência e estadiamento para indivíduos adultos.


Adaptado de: Kanaan, 2019, p. 84

CREATININA

A creatinina é o produto final do metabolismo da fosfocreatinina, utilizado na contração do músculo esquelético. Essa substância apresenta
concentração relativamente constante e estável no sangue, proporcional à massa muscular do indivíduo.

Atualmente, a creatinina é o biomarcador funcional do rim mais amplamente utilizado. Completamente excretado pelos rins, não é reabsorvido e
possui secreção pouco significativa, podendo assim estabelecer uma relação diretamente proporcional com a taxa de filtração glomerular (TFG).
Além disso, é facilmente dosada na urina e no plasma, sendo produzida pelo organismo, não precisando ser infundida, como é o caso da inulina.
 Creatinina é toda excretada na urina.

Entretanto, a concentração plasmática de creatinina sofre influências importantes, nos casos de:

USO DE MEDICAMENTOS

RABDOMIÓLISE
SECREÇÃO TUBULAR ALTERADA

EXCREÇÃO EXTRARRENAL
EXERCÍCIO FÍSICO

ALIMENTAÇÃO

SUPLEMENTAÇÃO DE CREATININA

Vejamos alguns exemplos a seguir!


Drogas como trimetoprim, probenecida, pirimetamina, salicilatos, cimetidina, medicamentos antirretrovirais e alguns agentes
quimioterápicos (olaparibe, rucaparibe, imatinibe, bosutinibe, sorafenibe, sunitinibe, crizotinibe, gefitinibe e pazopanibe) competem com a
creatinina pelos mecanismos de transporte no túbulo contornado proximal, podendo causar um aumento da creatinina sérica.

Em pacientes com doença renal em estágio avançado, a secreção tubular de creatinina passa a ser significativa, ocasionando uma diminuição da
concentração plasmática de creatinina e elevação da creatinina urinária.

Pacientes com uma maior massa muscular, que fazem uma dieta proteica ou suplementação da creatinina, também podem ter seus valores de
creatinina plasmática alterados. Você provavelmente conhece alguém que faz uma dieta rica em proteínas para emagrecer ou então ganhar massa
muscular, nesses indivíduos é normal um aumento da creatinina sérica e urinária!
A medida da depuração da creatinina é realizada em amostras de urina de 24 horas, sendo avaliado o volume urinário, a creatinina excretada em
miligramas por decilitro e a dosagem da creatinina sérica, pela fórmula:

( VOLUME URINÁRIO ) X CREATININA ( )MG


DL
NA URINA DE 24

ML HORAS
CLEARANCE DE CREATININA ( ) =
MIN CREATININA PLASMÁTICA

 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal


 ATENÇÃO

A coleta incompleta da urina de 24 horas pode resultar valores incorretos. Como já mencionado,
fisiologicamente a filtração glomerular diminui com o aumento da idade, igualmente, com a massa muscular e
a utilização de alguns medicamentos. Além disso, ela também muda em relação ao sexo e à etnia. Então,
fique atento no momento de avaliar o paciente na fase pré-analítica, pois esses dados serão importantes
para a interpretação do resultado!

CREATININA SÉRICA

A dosagem da creatinina sérica (sanguínea) isolada é utilizada para avaliação da função renal, sendo o aumento da sua concentração plasmática
um forte indicativo de falência renal.

Uma das vantagens da avaliação da creatinina sérica para estimativa da TFG é a sua disponibilidade mundial e baixo custo. Além disso, permite a
avaliação da depuração renal sem a necessidade da coleta da urina de 24 horas.

VALORES DE REFERÊNCIA
Creatina Sérica:

Homem: 0,6 a 1,2mg/dL


Mulher: 0,5 a 1,1mg/dL


Criança: 0,3 a 0,7mg/dL

Como já dito, a partir da dosagem de creatinina sérica, podemos estimar a TFG com base em fórmulas, como:
Cockcroft-Gault (C-G): Aplicada em adultos a partir dos 18 anos. É considerada, ainda, a fórmula mais indicada para o ajuste de doses de
fármacos em pacientes com insuficiência renal. A estimativa por essa fórmula tende a conferir resultados errôneos em pacientes obesos e
edemaciados, pois como veremos utiliza o peso do paciente. Assim, contabiliza também o tecido adiposo, que não produz creatinina.

MDRD: Não utilizada em crianças, mulheres grávidas e idosos (acima de 85 anos). É calculada levando em consideração a etnia (apenas
caucasianos e afro-caribenhos), idade, sexo e creatinina sérica.

CKD-EPI: Segundo a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica é a melhor para avaliação da TGF em adultos maiores de 18 anos. É calculada
levando em consideração a etnia, sexo e a dosagem de creatinina sérica.

Schwartz: Aplicável em recém-nascidos, crianças e adolescentes. Leva em consideração creatinina, sexo e altura.

Dentre as mais usadas está a fórmula de Cockcroft & Gault, que calcula o Clearance de creatinina, usando como parâmetros o sexo, a idade
(anos), creatinina plasmática (mg/dL) e o peso (kg) a partir da relação:

CLEARANCE DE CREATININA PARA HOMENS


( ) ML
MIN
=
( 140 - IDADE ) X KG
( 70 X CREATININA )

CLEARANCE DE CREATININA PARA MULHERES


( ) ML
MIN
=
( 140 - IDADE ) X KG
( 0,85 X CREATININA )

 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal

VAMOS PRATICAR?
TEORIA NA PRÁTICA
Paciente J. P. V, 81 anos, 78 kg, internado em unidade hospitalar com quadro de pneumonia bacteriana, apresentando resultado de creatinina
sérica de 2,0 mg/dL e ureia de 43 mg/dL. Utilizando a fórmula Cockcroft & Gault, calcule o Clearance de creatinina:

Com os dados aplicaremos a equação correspondente ao sexo e descobriremos o Clearance de creatinina do paciente:

CLEARANCE DE CREATININA PARA HOMENS


( )ML
MIN
=
( 140 - 81 ) X 78
( 70 X 2 )

RESOLUÇÃO
Clcr = 32,87 mL/min. Segundo a National Kidney Foundation, o resultado do Clearance de 32,87 mL/min indica que esse indivíduo está no estágio
G3b, ou seja, com uma diminuição e comprometimento moderado a grave da função renal.

UREIA

A ureia é formada pelo fígado como produto final do metabolismo e digestão de proteínas. No fígado, as proteínas são quebradas em aminoácidos
e esses em amônia livre. A amônia é tóxica ao organismo e, por isso, é metabolizada no ciclo da ornitina formando a ureia. A ureia, por sua vez, é
transportada pelo sangue até os rins, onde é excretada, mas também é eliminada pelos fluidos corporais, como sangue e saliva.

ALTA CONCENTRAÇÃO SÉRICA DE UREIA

Pode significar a necessidade de diálise (metabólito de referência para hemodiálise), além de outros possíveis fatores como depleção de água e
destruição do trato gastrointestinal.
BAIXA CONCENTRAÇÃO SÉRICA DE UREIA
Pode estar associada à gravidez, desnutrição, dieta inadequada de proteínas ou ao abuso de álcool.

Como a ureia é produzida no fígado, você pode imaginar que em pacientes com disfunção hepática grave a ureia não é produzida, o que gera
baixas concentrações plasmáticas. Logo, a dosagem de ureia para esses pacientes não deve ser o método de escolha para avaliação da função
renal isoladamente. No entanto, pacientes com disfunção renal apresentam alta concentração plasmática de ureia, pois não conseguem excretar
essa substância.

Ademais, a concentração sérica da ureia sofre variações decorrentes da ingestão proteica, sangramento no trato gastrointestinal, uso de
corticosteroides e volemia.

VALORES DE REFERÊNCIA
Ureia Sérica:

Adultos: 10 a 20mg/dL

Crianças: 5 a 18mg/dL


 ATENÇÃO

A ureia e a creatinina sérica são os biomarcadores mais frequentemente usados ​para monitoramento da
função renal. Suas medições concomitantes auxiliam no diagnóstico diferencial de hiperuremia pré-renal,
renal e pós-renal.

Quando a uremia é pré-renal, a ureia eleva sua concentração mais que a creatinina, pois, em situações como desidratação e hipovolemia, o rim
reabsorve mais ureia na tentativa de aumentar a retenção hídrica. Se a relação entre as concentrações plasmáticas da ureia/creatinina for maior
que 40, indica uma uremia pré-renal. No quadro a seguir vemos como é a relação ureia/creatinina plasmática em algumas condições patológicas:

Tipo de Relação
Condição patológica
Uremia ureia/creatinina

Uremia pré- > 42 Metabolismo excessivo das proteínas, perfusão glomerular reduzida (desidratação, choque
renal hipovolêmico, insuficiência cardíaca congestiva), reabsorção de proteínas após hemorragia
gastrointestinal.

Uremia renal Entre 20 - 41 Rim saudável.

Uremia pós- Obstrução renal por nefrolitíase ou por hipertrofia


Entre 20 - 41
renal (ex.: tumor da próstata).

Outras Dieta pobre em proteínas, jejum prolongado, doença hepática ou DRC após diálises repetidas
< 20
situações (a ureia é mais difusível que a creatinina).

 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem horizontal

 Quadro: Uremia renal, pré-renal ou pós-renal levando em conta a relação U/C.


Adaptado de: Barcelos; Aquino, 2018, p. 105

HEMATÚRIA GLOMERULAR

Por definição, hematúria glomerular caracteriza-se pela presença de mais que 3 e 5 hemácias por campo microscópio (observado com grande
aumento – 400x) em sedimento centrifugado de urina. Ela pode ser classificada como microscópica ou macroscópica de acordo com sua
intensidade. A hematúria é um achado frequente em muitas doenças renais, como as glomerulonefrites.

HEMATÚRIA MACROSCÓPICA

HEMATÚRIA MICROSCÓPICA

Como mencionado, hematúria pode ser decorrente de várias patologias, como processos inflamatórios (cistites, prostatites), infecções
(pielonefrites), presença de corpos estranhos, tumores e hiperplasia prostática benigna (HPB). No entanto, a hematúria glomerular deve ser
reconhecida durante a análise do sedimento microscópico pela presença de hemácias com dimorfismo ou fragmentadas, o que caracteriza a lesão
glomerular, a presença de proteinúria e cilindros hemáticos.

 Hemácias dimórficas (esquerda) e cilindro hemático (direita).


 ATENÇÃO

Nem sempre a presença de hemácias na urina é sinal de hematúria! Ela é considerada normal quando a
quantidade for inferior a 500 mil eritrócitos em 12 horas ou até 3 por campo. A presença de hemácias na urina
pode ser detectada após exercícios físicos extenuantes, ato sexual, traumas e, em mulheres, devido a
resíduos da menstruação.

PROTEINÚRIA

A proteinúria é definida como a presença de grandes quantidades (maior que 150mg em 24 horas) de proteínas na urina. Em condições
fisiológicas normais, uma pequena quantidade de proteínas pode ser detectada na urina, como albumina. Podemos encontrar também proteínas
de secreções prostáticas, seminais, vaginais e de proteína de Tamm-Horsfall, também chamada de uromodulina (proteína mais abundante
excretada na urina).

 Proteína de Uromodulina.


 DICA

Lembre-se de que proteínas de baixo peso molecular são normalmente filtradas e reabsorvidas no túbulo
proximal. No entanto, a proteinúria também pode estar relacionada a lesões tubulares.

Encontramos alterações na excreção de proteínas em estados patológicos como: Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES); neoplasias; infecções
bacterianas, fúngicas e virais; diabetes mellitus ; uso de medicamentos; mieloma múltiplo; e reações de hipersensibilidade. Também em estados
fisiológicos, como gravidez, após exercícios extenuantes, dietas ricas em proteínas, em crianças e adolescentes e até modificações de acordo
com a posição ortostática “de pé”.

Além disso, podemos encontrar a proteinúria em duas principais síndromes:

Síndrome nefrótica

Caracterizada pela perda de proteínas pela urina que apresentem valores superiores a 3 g em 24 horas, ou seja, perda de proteína maciça,
hipoalbuminemia e edema generalizado.


Síndrome nefrítica

Caracterizada pelo encontro de graus variáveis de proteinúria com a presença de hematúria (destruição de hemácias, principalmente disformes) e
cilindros hemáticos no exame microscópico do sedimento urinário.


 SAIBA MAIS

A dosagem de albumina na urina é um marcador precoce de lesão renal e um sinal de nefropatia. Caso seja
persistente, prediz a cronificação da doença. Uma das aplicações mais importantes desse exame é a
pesquisa de doença renal em pacientes com diabetes mellitus , visto que a maioria dos pacientes
desenvolve nefropatia com perda urinaria progressiva de albumina e redução da depuração da creatinina.
Esse exame pode ser realizado com urina de 24 horas ou amostra isolada. A concentração, na urina, de
valores superiores de albumina de 30mg/24 horas é indicativo de lesão renal.

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO TUBULAR

DENSIDADE URINÁRIA

A densidade urinária é uma medida da concentração de solutos presentes na urina. Essa avaliação está diretamente correlacionada à
osmolaridade, mas pela simplicidade dos métodos é bem mais empregada e vai auxiliar na avaliação da capacidade de concentração urinária e
excreção renal.
OSMOLARIDADE

É a medida de concentração de soluto, definida como o número de osmoles de soluto por litro de solução (Osm/L).

Ela pode ser medida com auxílio de um refratômetro manual específico, onde são necessárias apenas poucas gotas de urina (o que torna sua
utilização mais fácil), ou a partir da utilização de tiras reagentes (teste mais comum).

Para a análise utilizando fitas reagentes é recomendada a coleta da primeira urina da manhã após a privação hídrica ou de xenobióticos que
possam interferir na dosagem. O teste é baseado na mudança aparente da acidez de certos polieletrólitos em relação à concentração iônica. Na
presença de um indicador, as cores de fundo variam de azul-verde na urina de baixa concentração iônica, para verde e amarelo-verde na urina
com alta concentração iônica. É importante ressaltar que essa análise sofre influências do pH, quando alcalino, e da presença de proteínas,
glicose e de corpos cetônicos.

XENOBIÓTICOS

Compostos químicos estranhos ao organismo humano.

 Tiras reagentes utilizadas para exames de urina.

DENSIDADE URINÁRIA AUMENTADA

A urina encontra-se concentrada e esse resultado é observado nos casos de desidratação por restrição hídrica, quadros de diarreia, vômitos,
hemorragias, sudorese, febre, síndrome da secreção inapropriada de ADH, proteinúria, glicosúria e diminuição do fluxo sanguíneo renal sem
desidratação, como cirrose hepática e síndrome nefrótica.

DENSIDADE URINÁRIA DIMINUÍDA


Baixa concentração iônica na urina, ou seja, ela está diluída. Esse resultado é observado na hiper-hidratação (água em excesso), na diabetes
mellitus insípido, na doença renal crônica, no uso de diuréticos, aldosteronismo e nefropatias intersticiais.

VALORES DE REFERÊNCIA
Densidade Urinária:

Adultos: 1.005 a 1.030

GLICOSÚRIA

A glicosúria é observada em pacientes diagnosticados com diabetes mellitus , em gestantes (glicosúria fisiológica na gestação), pacientes
acometidos pela síndrome de Fanconi e intoxicação por metais pesados. Como substância de baixo peso molecular livremente filtrada no
glomérulo, a glicose, em amostras de urina de indivíduos sadios, varia de 1 a 15mg/dL, não sendo detectável, pois em quase toda a sua totalidade
é reabsorvida pelos túbulos renais. No entanto, quando seus níveis séricos ultrapassam 180mg/dL, conseguimos detectar a presença da glicose
na urina (glicosúria).

A análise de glicose na urina é semiquantitativa, pela utilização das mesmas tiras reagentes utilizadas para densidade urinária. Tal teste é baseado
na reação enzimática que ocorre entre glicose oxidase, peroxidase e cromogênio. A glicose oxidase converte a glicose em ácido glicônico e
peróxido de hidrogênio, e a peroxidase catalisa a reação do peróxido de hidrogênio com o iodeto de potássio, formando o cromógeno. Na reação
positiva, as cores variam de azul a marrom esverdeado e de marrom a marrom-escuro.

PH URINÁRIO

A medida do pH em uma amostra recém-emitida de urina indica o equilíbrio acidobásico no organismo, regulado pelos túbulos renais, pois são os

responsáveis por controlar a reabsorção/secreção de H+. Qualquer alteração do pH urinário pode ser reflexo de lesão nessa porção do néfron.

Ele também é medido pelas tiras reagentes e é baseado no sistema duplo de indicação, na qual o vermelho de metila e azul de bromotimol são
usados para dar uma vasta escala de cores, abrangendo todos os níveis de pH. As cores variam de laranja a amarelo-esverdeado e de verde a
azul.

Podemos encontrar o pH da seguinte forma:

VALORES ELEVADOS DO PH URINÁRIO

Decorrentes de processos que resultem em alcalose, como dieta vegetariana, infecções urinárias, vômitos, aspiração gástrica e acidose tubular
renal. Mas atenção, os valores podem estar aumentados em decorrência da contaminação da amostra, medicamentos (bicarbonato de sódio,
antiácidos) e demora para o processamento da amostra.

VALORES DIMINUÍDOS DO PH URINÁRIO

Em patologias que resultem em acidemia, como diabetes mellitus , pneumonia, medicamentos (diuréticos tiazídicos, por exemplo) dietas
cetogênicas, inanição e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).

VALORES DE REFERÊNCIA
pH Urinário:

4,6 a 8

VERIFICANDO O APRENDIZADO

MÓDULO 2

 Reconhecer os principais distúrbios hidroeletrolíticos

IMPORTÂNCIA DA ÁGUA EM NOSSO ORGANISMO


A água está presente em todos os processos fisiológicos de nosso organismo, participando principalmente da regulação da temperatura corporal,
manutenção do volume vascular, remoção de resíduos e xenobióticos, do meio de transporte de oxigênio e nutrientes.

Ela compreende cerca de 60% do peso de um adulto jovem, variando em função da idade, apresentando menor volume em idosos. Já em crianças
e recém-nascidos, compreende em média 70% do peso corporal.

 Proporção de água no corpo humano.

Em sua totalidade, a água pode ser segmentada em dois compartimentos, separados pela membrana plasmática das células, conforme
observamos no gráfico.

 Distribuição da água pelo corpo humano.


COMPOSIÇÃO DOS COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS DO CORPO
Os principais ânions e cátions presentes em nosso organismo são:


K+, CA2+


MG2+


CL-


HCO3-


LACTATO


ÁCIDOS ORGÂNICOS


PROTEÍNAS


OLIGOELEMENTOS

Dentre as várias funções dos eletrólitos, as que se destacam são a manutenção da pressão osmótica, do pH fisiológico, da homeostase da
água, funcionamento cardíaco, muscular e nervoso. Além disso, participam de várias reações funcionando como cofatores enzimáticos e
contribuem para a reação de oxirredução.

Entre os compartimentos do corpo há uma diferença significativa na concentração desses eletrólitos. Por exemplo, no LEC, o Na+, o Cl- e o HCO3-

são os principais determinantes da osmolalidade, mas temos outros constituintes presentes, conforme observamos no quadro a seguir:

OSMOLALIDADE

Refere-se ao número de partículas osmoticamente ativas de soluto presentes em um quilograma do solvente. Ela aumenta à medida que a
concentração de solutos na solução aumenta.

Cátion Concentração (mmol/L) Ânion Concentração (mmol/L)

Na+ 142 Cl- 103

K+ 4 HCO3- 27

Ca2+ 5 HPO42– 2

Mg2+ 2 SO42- 1

Outros (traços) 1 Ácidos orgânicos- 5

__ __ Proteínas- 16

Total 154 Total 154


 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem horizontal

 Quadro: Concentração de cátions e íons no LEC.


Adaptado de: Barcelos; Aquino, 2018, p. 105

Você percebeu que a soma da concentração dos ânions e cátions na tabela apresentam o mesmo valor? Imagina por quê?

Para a manutenção do equilíbrio hídrico, a soma das concentrações de ânions e cátions deve ser sempre igual, ou seja, o número de moléculas
osmoticamente ativas deve ser igual.


 SAIBA MAIS

A diferença principal entre a composição do fluido intersticial e do plasma é a maior concentração de


proteínas no plasma. A presença das proteínas impacta diretamente na distribuição de cátions e ânions, pois
as mesmas apresentam carga negativa assim como os ânions.

A determinação dos eletrólitos no espaço intracelular (LIC) é difícil, pois varia de acordo com o tipo celular. Diferente do LEC, nesse espaço, o
sódio e o cloreto estão em baixa concentração, e em maior concentração encontramos: o potássio (aproximadamente 150mEq/L), o cálcio e o
magnésio (juntos somam 40mEq/L), o fosfato, ânions orgânicos (aproximadamente 130mEq/L) e proteínas (55mEq/L).

Como estão separadas apenas pelo endotélio capilar, que atua como barreira semipermeável, a água é capaz de movimentar-se livremente entre
esses dois componentes como resultado das diferenças de pressões osmótica entre o LIC e o LEC e das concentrações dos íons, principalmente
sódio e cloreto. É importante ressaltar que, devido à fisiologia da movimentação da água, as concentrações ficam diferentes, mas o número de
moléculas osmoticamente ativas não!

OSMÓTICA

Ou oncótica, gerada pela presença de proteínas plasmáticas.

No entanto, a permeabilidade aos íons depende de transportadores. Podemos citar por exemplo, a bomba de Na+/K+ ATPase, que é responsável
por controlar as diferenças de concentrações de sódio e potássio entre o LIC e LEC.

BALANÇO HÍDRICO
A diferença entre o ganho (entrada) e a perda (saída) de líquido é denominada balanço hídrico, muito utilizado como controle e direcionamento da
dinâmica de líquidos de um paciente durante sua internação, podendo ser chamado de balanço cumulativo, quando se refere a vários dias de
avaliação.

Você sabia que existe uma perda hídrica obrigatória?

Sim, existe! Mesmo sem a ingestão hídrica, quase 2L de líquidos são perdidos pela urina, fezes, suor e pelo trato respiratório.
Como já dito aqui, a avaliação das perdas líquidas é importante para pacientes internados.

Mas como sabemos em qual compartimento ocorreu a perda de água?

EXPLICAÇÃO
Os sinais e sintomas de um paciente para a perda de LIC (compreende a destruição celular como ocorre na anemia hemolítica) e LEC (como em
hemorragias) são:

Perdas no LIC: Pode apresentar letargia, desorientação e até coma.


Perdas no LEC: Pode apresentar um colapso circulatório e até coma. Os mesmos sinais são observados em paciente com perda total
nos dois compartimentos (LIC e LEC).

Além disso, podemos observar a concentração plasmática de alguns íons, como sódio, cloreto, potássio e bicarbonato, que permitem predizer
como está a concentração de água nos compartimentos, LEC (sódio e cloreto) e LIC (potássio).

Vamos entender melhor esses eletrólitos nos próximos tópicos, mas antes devemos compreender a importância do hormônio antidiurético (HAD)
para a homeostasia da água. Vamos lá?

HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO (HAD)


O HAD também chamado de arginina vasopressina, argipressina ou vasopressina é um dos principais reguladores da osmolalidade plasmática.
Ele é sintetizado como um pró-hormônio no hipotálamo em resposta a estímulos de osmorreceptores e barorreceptores, sendo armazenado e
liberado na corrente sanguínea pela glândula pituitária posterior.

OSMORRECEPTORES

Receptores que estão no hipotálamo e que captam as mudanças nos níveis de osmolaridade presente no sangue que passa naquela região.

BARORRECEPTORES

Receptores sensíveis à variação de pressão arterial presentes nas paredes das artérias.

Tal hormônio apresenta a função de regular a permeabilidade da água nas porções cortical e medular dos túbulos renais, aumentando a
reabsorção de água pelo ducto coletor. Esse processo é mediado pela maior mobilização de aquaporinas do citoplasma para membranas dessas
células.

A ação do hormônio e o controle do equilíbrio hídrico pode ser observada no esquema a seguir:
 Ações do HAD.

Qualquer alteração na concentração desse hormônio pode resultar em múltiplas síndromes, como desidratação, edema, hipo e hipernatremia
(diminuição ou aumento de sódio plasmático).

SÓDIO
Como já aprendemos, o sódio é o principal cátion localizado no LEC e é importante para a manutenção do bom funcionamento tecidual.
Responsável por quase a metade da osmolalidade do plasma, desempenha um papel central na manutenção da distribuição de água e na pressão
osmótica desse compartimento. Além disso, tem grande importância para atividade neuromuscular e ação da bomba de sódio-potássio.

A quantidade de sódio ingerido e excretado é volúvel, seu consumo varia entre 100mmol/dia a 300mmol/dia e sua excreção está relacionada à sua
ingesta. O maior local de excreção é renal, mas há perda pelo suor (5mmol/dia) e fezes (5mmol/dia).

As concentrações de sódio plasmático dependem da ingestão/excreção de água e, em menor grau, da regulação renal de Na+. Essa, por sua vez,

é influenciada pelo hormônio aldosterona, que apresenta como função estimular a reabsorção de Na+ e a excreção de K+, diminuindo a excreção

urinária de Na+. Além da aldosterona, o NAP (peptídeo natriurético atrial) também regula o sódio, estimulando a sua excreção pela urina.


 ATENÇÃO

Um paciente com infecção no trato gastrointestinal, acompanhada de diarreia e vômito, terá perdas
significativas de água e sódio, diminuição do volume da LEC e concentração dos íons, que são estímulos
para a liberação da aldosterona. Após a reposição de água e sódio pela ingestão, a aldosterona é inibida com
o retorno do equilíbrio.
DISTÚRBIOS NA CONCENTRAÇÃO DE SÓDIO

Os distúrbios na concentração de Na+ (natremia) decorrem, na maioria das vezes, de anormalidades em sua homeostasia. A determinação de
sódio pode ser realizada na urina ou no plasma a partir do método de eletrodos íon-seletivos, sendo os valores de referência no plasma de 135 a
145mmol/L e na urina 40 a 220mmol/L.

HIPONATREMIA

A hiponatremia é definida como uma concentração de Na+ inferior a 135mEq/L e apresenta-se como uma das anormalidades mais comumente
encontradas em pacientes hospitalizados. Ela é associada a várias doenças, mas quase sempre é resultado de retenção hídrica, com aumento da
concentração de água no plasma. No entanto, pode ser resultado de uma diminuição plasmática de sódio.

Normalmente, a hiponatremia é resultado de alterações renais, como secreção contínua de HAD, que leva ao aumento da reabsorção de água,
insuficiência renal crônica (limita a excreção de água livre), defeitos nos transportadores renais de NaCl e diminuição da filtração glomerular. Além
disso, pode estar relacionada a causas extrarrenais, tal como hipovolemia, desidratação, cirrose hepática, etilismo/desnutrição etc.

Dentre os principais sintomas observados estão: vômitos, náuseas, confusão, letargia e desorientação. Os quadros graves, ou seja, valores
inferiores a 120mEq/L, podem resultar em convulsões, coma ou morte

A hiponatremia pode ser classificada das seguintes maneiras:

HIPONATREMIA HIPOVOLÊMICA
De etiologias renais e extrarrenais, encontramos aumento da perda de sódio, com a redução da água e do sódio sérico. O volume do líquido
extracelular está diminuído. Exemplos: uso de diuréticos, perda de líquido hipotônico (queimaduras, vômitos, diarreia), insuficiência de
mineralocorticoides e cetoacidose diabética.

HIPONATREMIA EUVOLÊMICA
A síndrome de HDA (Hormônio Antidiurético) caracteriza a maioria desses casos. Encontramos o aumento no volume de água corpórea com sódio
total normal. O volume do LEC está levemente diminuído sem a presença de edema. Exemplos: Doença pulmonar, patologias no SNC (tumor ou
meningite) e medicamentos (antidepressivos tricíclicos, nicotina e carbamazepina).

HIPONATREMIA HIPERVOLÊMICA
Encontramos em distúrbios edematosos. Nesse caso, temos um aumento do sódio sérico e do sódio total do corpo e do volume do líquido
corpóreo. Exemplos: Cirrose hepática, insuficiência renal e insuficiência cardíaca congestiva.

HIPONATREMIA REDISTRIBUTIVA
Encontramos desvio da água do compartimento intracelular para o extracelular e como resultante a diluição do sódio sérico. O volume total de
água corpórea e o sódio sérico estão estáveis. Exemplos: Administração de manitol e hiperglicemia.

O tratamento baseia-se na reposição eletrolítica. A salina hipertônica é usada para promover o rápido aumento do sódio sérico em pacientes com
hiponatremia aguda ou crônica.
HIPERNATREMIA

A hipernatremia, concentração de sódio superior 145mEq/L, é geralmente rara e de causa iatrogênica, mas tem maior prevalência em idosos e

crianças. Pode estar relacionada à depleção de água, ingestão ou retenção excessiva de Na+ no LEC e raramente insuficiência renal com

incapacidade de excretar Na+.

CAUSA IATROGÊNICA

Efeitos colaterais de medicamentos, complicações decorrentes de procedimentos médicos, infecções hospitalares ou erro médico.

Paciente com esse quadro apresenta sintomas como sede, desidratação, inquietação, irritabilidade, desorientação, boca seca e febre.

Dentre os fatores de risco estão:


IDADE ACIMA DE 65 ANOS


INCAPACIDADE FÍSICA E MENTAL


DEFEITOS NA CONCENTRAÇÃO DE URINA


DIURESE OSMÓTICA E MEDICAMENTOS DIURÉTICOS


RABDOMIÓLISE


HIPERALDOSTERONISMO


DIABETES INSÍPIDOS

O tratamento baseia-se na correção eletrolítica lentamente, evitando o comprometimento neurológico. Inicialmente, utilizam-se soluções salinas
hipotônicas.


 SAIBA MAIS

A determinação de sódio urinário é importante e essencial para avaliar a integridade da função de reabsorção
tubular. Essa dosagem é empregada para diferenciar os tipos de insuficiência renal e de hiponatremia.
Todavia, um aumento da concentração urinária pode ser indicativo de excesso de ingestão de sal,
insuficiência adrenal, nefropatia perdedora de sal, necrose tubular aguda, abuso de analgésicos (induzido por
nefrite intersticial), síndrome de secreção inapropriada do hormônio antidiurético (SSIHAD), vômito e
hipotireoidismo.

POTÁSSIO
Um homem de 70kg tem aproximadamente 3600mmol/L de potássio, sendo que a maior parte, como já aprendemos, encontra-se no ambiente
intracelular. O potássio é ingerido em alimentos e bebidas em quantidade que varia em relação à região geográfica onde se encontra o indivíduo.
Sua excreção é quase totalmente renal, mas também ocorre pelas fezes (5mmol/dia), pelo suor e pela pele. No LEC, sua concentração fica em
torno de 2%.
Esse cátion é responsável pela regulação de vários processos metabólicos celulares, participa da excitação neuromuscular, contração cardíaca e

regula a concentração de H+, que é muito importante para manutenção do pH sanguíneo.


 ATENÇÃO

Diferente do sódio, a concentração de íons potássio no meio extracelular não varia em relação à perda ou
ganho de água. Entretanto, qualquer alteração na concentração desse íon no meio intracelular, ou seja, uma
maior quantidade de potássio no meio intracelular, altera a sua concentração sérica.

No nosso organismo, os rins são os responsáveis por manter a concentração plasmática de K+. Nos túbulos proximais, quase todo o potássio é

reabsorvido, mas no túbulo distal e nos ductos coletores ele, após estímulo da aldosterona, é secretado na urina em troca da reabsorção de Na+.

Assim, qualquer alteração na bomba Na+/K+ATPase, como sua inibição (causada pela hipóxia ou digoxina) ou maior atividade (aumento da

concentração de insulina promove a entrada de K+ no músculo esquelético e fígado pelo aumento da atividade da bomba) e a utilização de

medicamentos (adrenalina que estimula a entrada de K+ na célula e propranolol que diminui), altera a concentração plasmática desse cátion.


 SAIBA MAIS

Pessoas que consomem potássio acima do valor necessário tem aumento da excreção urinária desse íon,
mas pode ocorrer seu acúmulo no interior das células e causar insuficiência renal e um aumento da
concentração de potássio no LEC.

DISTÚRBIOS NA CONCENTRAÇÃO DE POTÁSSIO


A avaliação do potássio é utilizada para o diagnóstico e tratamento de pacientes com hipertensão, insuficiência renal, arritmia cardíaca,
desorientação, desidratação, náusea e diarreia. Para mensurar o potássio plasmático são utilizadas amostras de sangue (soro ou plasma
heparinizado) pela metodologia de eletrodos íon-seletivos. Os valores de referência ficam entre 3,5 e 5,0mmol/L.

HIPOCALEMIA (HIPOPOTASSEMIA)

É definida quando os níveis de potássio estão abaixo de 3,5mmol/L. Como principais causas estão a menor ingestão (inanição), perdas
gastrointestinais (como vômito, diarreia, tumor que impede a absorção intestinal e utilização de laxantes), perdas renais (diuréticos tiazídicos e
mineralocorticoides, nefrite, acidose tubular renal, hiperaldosteronismo, síndrome de Cushing, hipomagnesemia e leucemia aguda) e
deslocamento do potássio do meio extracelular para o intracelular (alcalose e hiperglicemia).

Os principais sintomas são:


HIPOTENSÃO


ARRITMIAS VENTRICULARES


BRADICARDIA OU TAQUICARDIA

POLIÚRIA


NOCTÚRIA


HIPOVENTILAÇÃO


SOFRIMENTO RESPIRATÓRIO


INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA


LETARGIA OU OUTRAS ALTERAÇÕES MENTAIS

REDUÇÃO DA FORÇA MUSCULAR


REDUÇÃO DOS REFLEXOS DOS TENDÕES


EDEMA


ARRITMIAS CARDÍACAS (COMO CONSEQUÊNCIA GRAVE)

O tratamento baseia-se na correção eletrolítica de KCl, administrado em solução salina. Também deverão ser consideradas medidas que
minimizem a perda de potássio como suspensão de diuréticos.

HIPERCALEMIA (HIPERPOTASSEMIA)

A hipercalemia apresenta-se como um aumento da concentração sérica de potássio superior a 5,5mmol/L. Normalmente está relacionada à

excreção renal reduzida de K+, de caráter potencialmente letal, que pode ser difícil de diagnosticar devido à escassez de sinais e sintomas
específicos.

Os pacientes podem ser assintomáticos ou ter queixas, são elas: fadiga generalizada, fraqueza, parestesias, paralisia e palpitações, predominando
queixas cardíacas e neurológicas.

As causas podem estar relacionadas a (ao):

DESVIO DE POTÁSSIO DO MEIO INTRACELULAR PARA O EXTRACELULAR


EXCREÇÃO INADEQUADA
INGESTÃO
DESVIO DE POTÁSSIO DO MEIO INTRACELULAR PARA O EXTRACELULAR

Acidose, medicamentos (antagonistas β-adrenérgicos, digoxina e succinilcolina), dano músculo/celular, quimioterapia, leucemia e hemólise
(anemia hemolítica).

EXCREÇÃO INADEQUADA

Insuficiência renal aguda e crônica e hipoaldosteronismo.

INGESTÃO

Dieta e suplementos nutricionais.

A pseudo-hipercalemia, causada pelo falso aumento do K+, pode ser ocasionada pela perda de potássio nas células sanguíneas devido à
hemólise durante a coleta de sangue.

Como tratamento, é necessário estabilizar o potencial de membrana com a reposição de cálcio, promover a captação celular e remoção de K+.


 VOCÊ SABIA

O exercício físico exagerado pode aumentar a concentração plasmática de potássio em até 3mmol/L, mas
ocorre um retorno após alguns minutos de descanso.

CLORO

Como já aprendemos, o Cl- é o ânion mais abundante do LEC e com o sódio é essencial para a manutenção da distribuição de água, da pressão
osmótica do plasma e da neutralidade elétrica. No nosso organismo, a concentração plasmática de cloreto é regulada por dois mecanismos:
Regulação da concentração plasmática de cloreto


Reabsorção com o sódio nos túbulos proximais, lembre-se de que nessa região a reabsorção do Na+ é

acoplada à de Cl-. Assim, qualquer alteração na reabsorção de sódio afeta também a absorção de
cloreto.


Na alça de Henle, a reabsorção é regulada via transportador de membrana de um íon sódio/dois
Regulação renal
cloretos/um potássio, os diuréticos que atuam nessa região inibem esse mecanismo e excretam na urina
esses eletrólitos, associada a grandes quantidades de água.

No final dos túbulos renais (túbulo distal e ducto coletor), a reabsorção acontece a partir de um
transportador antiporte (cloreto/bicarbonato).

Nesse processo, o dióxido de carbono gerado pelo metabolismo forma ácido carbônico, que libera H+ e
Deslocamento de
bicarbonato. Quando o pH intracelular aumenta, o bicarbonato é trocado pelo cloreto extracelular,
cloretos
restabelecendo o pH celular.

 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem horizontal

Normalmente, as alterações plasmáticas de cloreto acompanham a de sódio, mas em algumas poucas condições isso não ocorre.


 EXEMPLO

As alterações/lesões que acometem o túbulo distal ou tubo coletor, geram excreção de cloreto e diminuição
do nível sérico desse ânion, mas sem alterar os níveis séricos de sódio.

DISTÚRBIOS NA CONCENTRAÇÃO DE CLORO

Para a determinação da concentração plasmática dos íons cloretos, são utilizadas amostras de sangue (soro ou plasma heparinizado) também
pela metodologia de eletrodos íon seletivos. Podem ser realizados também exames de urina de 24 horas.

VALORES DE REFERÊNCIA
Concentração plasmática do cloro no sangue:

entre 98 e 106mmol/L.

Depuração do cloro urinário:


entre 110 - 250mEq/24 horas.


HIPOCLOREMIA

A hipocloremia habitualmente está relacionada à perda gastrointestinal de bicarbonato, falta de ingestão ou reposição correta de cloreto, diarreia
intensa, acúmulos de ânions orgânicos (cetoacidose metabólica), alcalose metabólica e vômito. O tratamento é feito com reposição de cloreto.

HIPERCLOREMIA

O aumento de cloretos no plasma está geralmente associado com a hipernatremia. Entre as causas, encontradas estão a acidose metabólica por
redução de bicarbonato e outras condições, como desidratação, insuficiência renal aguda, diabetes, uso de esteroides, intoxicação por salicilatos.


IMPORTÂNCIA DA DOSAGEM DOS ELETRÓLITOS PARA
AVALIAÇÃO DOS DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS
A especialista Jéssica Ribeiro Lima fala sobre a importância da dosagem dos eletrólitos para avaliação dos distúrbios hidroeletrolíticos.

VERIFICANDO O APRENDIZADO

MÓDULO 3

 Descrever os principais distúrbios do equilíbrio acidobásico

INTRODUÇÃO AOS DISTÚRBIOS ACIDOBÁSICOS


Em condições fisiológicas normais, o organismo gera ácidos e bases, em menor concentração, que influenciam o pH dos fluidos corporais. Os
ácidos são produzidos durante o metabolismo de carboidratos, lipídeos, aminoácidos e durante a respiração celular, com a produção do dióxido de
carbono (CO2) - os ácidos voláteis.

Falamos de ácido e base, você se lembra desses conceitos?

Pela teoria ácido-base de Bronsted-Lowry, ácido é toda a substância que, em solução, é capaz de doar um H+; já a base é a substância que, em

solução, é capaz de receber um H+.


O pH é definido como a medida da concentração de H+ em uma dada solução.

 Escala de pH

A concentração de íons de hidrogênio nos fluidos corporais é mantida dentro de uma faixa estreita para fins de regulação dos processos
metabólicos e enzimáticos. O pH sanguíneo está compreendido entre 7,35 e 7,45 e dependente diretamente dos sistemas pulmonar e renal.

A manutenção do pH nessa faixa é essencial para a sobrevivência do organismo vivo. Valores de pH inferiores a essa faixa são classificados como
acidose, e superiores, como alcalose.


 ATENÇÃO

Valores de pH menores que 6,8 ou superiores a 7,8 são incompatíveis com a vida!

É essencial que a concentração de íons H+ seja mantida, pois afeta diretamente o funcionamento de proteínas.


 EXEMPLO

Um aumento da concentração de H+, durante a acidose, aumenta a ligação desse íon com as proteínas
plasmáticas que apresentam uma carga negativa e impede seu funcionamento normal.

Para manter o equilíbrio acidobásico dentro da faixa considerada ideal, alguns mecanismos são importantes.

Vamos entender agora cada um desses mecanismos:

TAMPONAMENTO QUÍMICO
Os sistemas tampões atuam impedindo grandes desvios de pH mesmo que ácido ou base seja adicionado à solução, tais sistemas estão
presentes no sangue, líquido intersticial e líquido intracelular. Eles são ácidos ou bases fracas capazes de minimizar alterações no pH por captar

ou liberar H+.

Dentre os principais sistemas tampões encontrados no corpo humano temos: o bicarbonato/ácido carbônico, oxiemoglobina/hemoglobina reduzida,
proteinatos/proteínas, fosfato monossódico/fosfato dissódico e fosfato monopotássico/fosfato dipotássico. No entanto, destacam-se no meio
intracelular e extracelular os seguintes tampões:

Sistema tampão plasmático (intracelular)


Destaca-se a hemoglobina, em razão da presença de grupos ácidos fracos (-COOH) e bases fracas (-NH2). É importante ressaltar que quando a

hemoglobina está reduzida (perda da capacidade de transporte de oxigênio aos tecidos), ela possui caráter mais básico, absorvendo uma maior

quantidade de íons H+.

Sistema tampão plasmático (extracelular)

Destaca-se o bicarbonato (HCO3-)/ácido carbônico (H2CO3) que atua conforme a reação ilustrada a seguir:

H2O + CO2 ⇄ H2CO3 ⇄ H+ + HCO3–

Assim, qualquer aumento na concentração de íons hidrogênio desloca a reação para a esquerda, com o consumo de (HCO3-) e produção de

H2CO3, que é convertido a H2O + CO2.

O ácido carbônico é considerado a maior fonte do H+ do organismo, onde 70% de CO2 é transformado em bicarbonato nas hemácias.

VENTILAÇÃO PULMONAR QUE CONTROLA A PRESSÃO ARTERIAL DE CO2 (PACO2)


O aumento de dióxido de carbono altera a frequência respiratória, estimulando a liberação do CO2 acumulado, modulando assim a PaCO2. O

HCO3- consumido durante a reação é regenerado pelos rins.

EXCREÇÃO RENAL QUE CONTROLA O BICARBONATO PLASMÁTICO


Em condições normais, o néfron filtra 4.320mEq/L de bicarbonato que é reabsorvido, sendo 80% no túbulo proximal. Nas células do túbulo

proximal, as membranas têm um transportador antiporte Na+/H+, que ao mesmo tempo que reabsorve o Na+, disponibiliza na luz tubular o H+, que,
por sua vez, se combina ao bicarbonato formando ácido carbônico e água. O ácido carbônico é rapidamente absorvido e no interior da célula
tubular é convertido a bicarbonato que é reabsorvido pelo sangue.

 Esquema mostrando a conservação de bicarbonato no rim.

Além da reabsorção no túbulo proximal, 15% são reabsorvidos no ramo descendente e 5% no ducto coletor e túbulos distais.

É importante destacar que, no organismo, além da liberação do H+ via HCO3–, ele também é secretado pela bomba H+/ATPase localizada nos

tubos coletores, sendo eliminado na urina.

Em condições fisiológicas, a concentração de H+ nos líquidos do corpo é mantida em limites bastante estreitos, cerca de 40nEq/L, e o bicarbonato
está entre 22-24mEq/L.
Normalmente, as mudanças de pH sistêmico podem ocorrer a partir da mudança nos valores da PaCO2 e do HCO3-. Esses dois parâmetros são

resultados de distúrbios respiratórios e metabólicos, respectivamente. Os distúrbios podem ser encontrados separadamente ou conjuntamente,
sendo denominado distúrbio misto.

Os distúrbios respiratórios, metabólicos ou mistos causam no organismo:

ACIDOSE
Decorre de ganho de ácido ou perda de base, as causas podem ser metabólicas (queda no HCO3- sanguíneo) ou respiratórias (aumento de

PaCO2).

ALCALOSE
Deve-se à perda de ácido ou ganho de base, podendo ser metabólico (aumento de HCO3- sanguíneo) ou respiratório (perda de PaCO2).

O esquema a seguir mostra um resumo das alterações encontradas na alcalose e acidose respiratória e metabólica.

 Esquema mostrando os distúrbios acidobásicos.

Como forma de limitação da modulação do pH, os distúrbios metabólicos estimulam uma rápida resposta compensatória na ventilação (hiper ou

hipoventilação), já a compensação renal ocorre por um processo mais lento (eliminação de H+).

ACIDOSE RESPIRATÓRIA
A acidose respiratória ou hipercapnia primária caracteriza-se pelo acúmulo de CO2 devido à insuficiência ventilatória (diminuição da ventilação

alveolar), com aumento da PaCO2. O acúmulo desse gás aumenta a concentração de ácido carbônico, consequentemente liberando o H+ no

plasma, conforme demostrado na figura a seguir:

 O aumento de CO2 desloca a reação para a produção de H2CO3 e formação de H+.

No início, o aumento de H+ é compensando pelos tampões celulares (bicarbonato), proteínas e hemoglobinas. Por exemplo, na fase aguda,
durante os primeiros 10 minutos do aumento da PaCO2 sanguínea ocorre uma elevação de 2 a 4mmol/L no bicarbonato plasmático.
Se o aumento persistir (fase crônica), ocorre a compensação renal, que inicia liberando o H+ e retendo o bicarbonato. Nesse caso, se a PaCO2

permanece elevada em 70mmHg, o bicarbonato aumenta para 33mmol/L e o pH atinge 7,30.


 SAIBA MAIS

Entre dois e quatro dias do início do quadro, é observado o maior nível de bicarbonato.

ASTERIXE

Perda súbita da tonicidade dos músculos extensores da mão.

OBNUBILAÇÃO

Estado de perturbação da consciência, caracterizado por ofuscação da vista e obscurecimento do pensamento.

A acidose respiratória pode apresentar diferentes causas, dentre elas: o uso de medicamentos sedativos, narcóticos, tumores, acidente vascular
cerebral (AVC), doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), obstruções de vias aéreas, edema pulmonar, distúrbios neuromusculares e parada
cardiopulmonar.

Nos quadros de acidose respiratória, são comumente observados sintomas como: confusão, asterixe e obnubilação. O tratamento consiste na
melhora ventilatória. A intubação orotraqueal ou ventilação com pressão positiva não invasiva pode ser necessária.

ALCALOSE RESPIRATÓRIA
A alcalose respiratória ou hipocapnia primária caracteriza-se pela redução excessiva de CO2 pela respiração (ventilação excessiva), que causa

uma diminuição primária de CO2, com redução da PaCO2, que desloca a reação no sentido de consumo de H+ e HCO3-, aumentando assim o pH

plasmático, conforme observado no esquema a seguir:

 A diminuição da concentração de CO2 desloca a reação para a produção de CO2.

Na fase aguda, a diminuição da PaCO2 e o deslocamento do H+ do meio intracelular para o plasma, com a intenção de combinar com o ânion

bicarbonato presente no plasma, formando o bicarbonato de sódio, gera uma redução dos níveis plasmáticos de bicarbonato de 2mmol/L para
cada 10mmHg de PaCO2. Durante a fase aguda, a concentração de bicarbonato plasmático pode chegar a 18mmol/L.

Em casos crônicos, a compensação renal reduz a liberação de H+, o que permite a manutenção de valores do pH sanguíneo. Além disso, a
regeneração do bicarbonato é mais lenta do que o normal.

 SAIBA MAIS

Dentre as causas mais comuns estão: pneumonia, edema pulmonar, hiperventilação por ansiedade,
hipertermia, hipóxia, grandes altitudes, hiperventilação por ventilação mecânica, lesões encontradas no
sistema nervoso central (SNC), tumores, encefalites, hipertensão intracraniana, medicamentos (salicilatos e
sulfonamidas). A gravidez está associada à alcalose respiratória leve.

Esse quadro oferece pouco risco ao paciente e produz pouco ou nenhum sintoma. O tratamento deve ser guiado de acordo com a resolução dos
distúrbios desencadeadores.

ACIDOSE METABÓLICA
O distúrbio acidobásico mais observado na prática clínica consiste no aumento da acidez plasmática pelo acúmulo de ácidos não voláteis
(provenientes do metabolismo celular) que causam a redução dos níveis de bicarbonato plasmático ou então pela perda de bicarbonato para meio
extracelular.

O mecanismo de compensação da acidose metabólica é a hiperventilação. A redução do pH sanguíneo estimula os centros respiratórios, que
provocam aceleração dos movimentos respiratórios e a excreção de CO2 em excesso do organismo, restaurando o equilíbrio. Além disso,

pacientes com função renal normal aumentam a excreção urinária de ácido na forma de fosfato.


 SAIBA MAIS

A acidose metabólica está presente nos quadros de cetoacidose metabólica (comum em pacientes com
diabetes), inanição, consumo exacerbado de álcool, acidose lática, medicamentos (salicilatos), insuficiência

renal e em quadros que levam a perda de HCO3- pelo trato gastrointestinal, como ocorre na diarreia.

ÂNION GAP

Diferença entre os cátions e ânions presentes no sangue. Para que a eletroneutralidade do organismo seja mantida, a soma de todos os cátions
do nosso corpo deve ser igual à soma de todos os ânions. O valor considerado normal na maioria das referências abrange a faixa entre 3-
10mEq/L.

A acidose metabólica pode ser classificada de acordo como valor do ânion gap:
O tratamento da acidose metabólica depende da origem e da gravidade, relacionado ao tratamento da causa.

ALCALOSE METABÓLICA
A alcalose metabólica ocorre pelo aumento primário na concentração sanguínea de bicarbonato. Como compensação, ocorre uma hipoventilação,
que aumenta a concentração de CO2, aumenta a PaCO2 e reduz a elevação do pH.

A alcalose pode ser resultado de diferentes patologias, vamos conhecê-las?

Perda de íons hidrogênio pelos rins ou gastrointestinal (vômitos persistentes).

Deslocamento de íons hidrogênio para o espaço intracelular, como acontece nas hipocalcemias, com o deslocamento de K+ para fora da célula e
entrada de hidrogênios para o meio intracelular para manter a neutralidade.
Em pacientes com deficiência de potássio.

Administração de bicarbonato de sódio em quantidades que excedem a capacidade dos rins em excretar.

Perda de líquido extracelular pobre em bicarbonato e rico em cloretos, causada por medicamentos como tiazida ou diuréticos de alça, por
exemplo.

O tratamento deve ser dirigido à causa básica do distúrbio, sendo restritas as indicações de uso de ácidos.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
As origens dos distúrbios simples ficam evidenciadas a partir da história do paciente, do exame físico e dos exames laboratoriais. Para os
distúrbios metabólicos (acidose ou alcalose) são importantes as análises dos eletrólitos, ureia, creatinina, albumina e pH. Além disso, são
necessárias a avaliação de parâmetros como: volemia, pressão arterial, eletrólitos na urina e no soro, e em casos selecionados, do sistema renina-
angiotensina-aldosterona.

Para distúrbios acidobásicos complexos, incluindo a resposta compensatória, a avaliação da gasometria arterial ou venosa e os eletrólitos séricos
são extremamente necessários.

Mas o que é gasometria?

EXPLICAÇÃO
A gasometria é um exame que permite avaliar os gases presentes nas artérias ou veias. Para esse exame, as amostras devem ser coletadas com
seringas plásticas preparadas com anticoagulante apropriado, preferencialmente, a heparina liofilizada.

Após a coleta, qualquer bolha ou gás visível devem ser eliminados para não ocorrer interferências nas análises. O aparelho de gasometria mede o
pH e os gases sanguíneos sob a forma de pressão parcial do gás (pO2 e pCO2), mas os demais parâmetros são calculados.

No quadro a seguir, estão apresentados os valores de referência ao nível do mar dos parâmetros da gasometria arterial e venosa e sua
interpretação:

Sangue Sangue
Parâmetro Interpretação
arterial venoso

pH Mede a concentração de H+ 7.38 - 7.42 7.36 - 7.38

A pressão parcial de oxigênio indica a fração de oxigênio que está livre no


pO2 (mmHg) 80 - 100 30 - 50
sangue, o que reflete a hematose.

pCO2 (mmHg) Reflete a ventilação alveolar. Valores maiores indicam hipoventilação. 38 - 42 43 - 48

HCO3- (mmol/L) Indica a concentração de bicarbonato no plasma. 22 - 24 25 - 26

Saturação de oxigênio
Percentual de hemoglobina do sangue arterial que está ligada ao oxigênio. 94 -100 60 -75
(SaO2%)

Corresponde às outras bases presentes no plasma, esse valor é fixo.


Buffer Base (BE) -3 - +3 -2 - +2
Valores menores indicam redução das bases plasmáticas.

 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal

 Quadro: Valores de referência e interpretação.


Adaptado de: Hsu, Lakhani & Wilhelm, 2015, p. 362 e Barcelos & Aquino, 2018, p.38.

Agora que entendemos a gasometria, vamos entender como é feito o diagnóstico dos distúrbios acidobásicos. Mas antes precisamos lembrar que
a partir do distúrbio primário temos sempre as alterações compensatórias. No quadro a seguir vemos um resumo dessas alterações:

Distúrbio primário Alteração principal Alteração secundária


Acidose metabólica HCO3- pCO2

Alcalose metabólica HCO3- pCO2

Acidose respiratória pCO2 HCO3-

Alcalose respiratória pCO2 HCO3-

 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal

 Quadro: Compensação do distúrbio inicial.


Elaborado por: Edgard Vianna.

O esquema a seguir ilustra o diagnóstico dos distúrbios a partir da gasometria:

 Identificação do distúrbio acidobásico primário.


DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DOS DISTÚRBIOS ACIDOBÁSICOS
A especialista Jéssica Ribeiro Lima fala sobre os distúrbios acidobásicos, sua compensação e o diagnóstico desses distúrbios.
VERIFICANDO O APRENDIZADO

CONCLUSÃO

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste conteúdo, obtemos uma visão ampla dos métodos básicos de avaliação da função renal utilizados para diagnóstico, monitoramento e
tratamento das principais patologias renais. Além disso, conhecemos os mais relevantes biomarcadores de doença renal e entendemos a
importância do diagnóstico precoce de tais doenças.

Visitamos a composição dos compartimentos líquidos do corpo, compreendendo os principais eletrólitos e a importância do balanço
hidroeletrolítico, como também as principais classificações, etiologias e tratamentos dos distúrbios hidroeletrolíticos.

Por fim, aprendemos sobre os distúrbios do equilíbrio acidobásico, muito presentes em diversas patologias e na vivência hospitalar. Conhecemos
as causas, os tipos de distúrbios, os mecanismos de compensação gerados fisiologicamente por cada distúrbio específico, seus tratamentos e
diagnóstico laboratorial.

Agora você já pode colocar em prática os conhecimentos adquiridos. Lembre-se de que o conhecimento e a interpretação de cada exame são
extremamente úteis na prática clínica, impactando diretamente a vida do seu paciente!

 PODCAST
Agora, a especialista Jéssica Ribeiro Lima encerra o tema falando sobre os alguns conceitos da fisiologia renal e a avaliação laboratorial da função
renal.

AVALIAÇÃO DO TEMA:

REFERÊNCIAS
AYERS, P.; DIXON, C.; MAYS, A. Acid-base disorders: learning the basics. Nutr. Clin. Pract. PubMed. Publicado em: 22 de dez. 2014. Consultado
na internet em: 15 de jun. 2021

BARCELOS, L. F.; AQUINO, J. L. Tratado de análises clínicas. 1. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2018.

HSU, B. S.; LAKHANI, S. A.; WILHELM, M. Acid-Base Disorders. Pediatrics in Review. PubMed, 2016. Consultado na internet em: 15 de jun.
2021

Inker, L. A. et al. KDOQI US commentary on the 2012 KDIGO clinical practice guideline for the evaluation and management of CKD. Am J
Kidney Dis. PubMed. Publicado em: 16 de mar. 2014. Consultado na internet em: 15 de jun. 2021.
KANAAN, S.; GARCIA, M. A. T. Bioquímica Clínica. 1 ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2008.

KANAAN, S. Laboratório com interpretações clínicas. 1 ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019.

MCPHERSON, R. A.; PINCUS, M. R. Diagnósticos Clínicos e Tratamento por Métodos Laboratoriais de Henry. 21 ed. São Paulo: Manole,
2012.

NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de Bioquímica de Lehninger. 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

Robertson, G. L. Antidiuretic hormone. Normal and disordered function. Endocrinol Metab. Clin. North. Am. PubMed. Setembro de 2001.
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Robinson, P. G. et al. A large drawing of a nephron for teaching medical students renal physiology, histology, and pharmacology. Adv
Physiol Educ. PubMed. Publicado em: 01 de jun. 2018. Consultado na internet em: 15 de jun. 2021.

Rondon-Berrios, H.; Berl, T. Physiology and Pathophysiology of Water Homeostasis. Front. Horm. Res. PubMed. Publicado em: 15 de jan.
2019. Consultado na internet em: 15 de jun. 2021.

EXPLORE+
Para saber mais sobre os assuntos aqui explorados:

Visite o site National Kidney Foundation. Lá você encontra várias pesquisas, testes realizados, fisiologia renal, a fisiopatologia da doença,
tratamento e transplantes renais.

Encontre as calculadoras nefrológicas mais utilizadas para determinação da TFG no site da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN).

Leia mais sobre os biomarcadores da função renal no artigo Biomarcadores da função renal: do que dispomos atualmente? , de Luci Maria
SantAna Dusse e colaboradores, e o e-book da Sociedade Brasileira de Nefrologia Biomarcadores na Nefrologia .

Leia mais sobre os novos biomarcadores da doença renal aguda e crônica no artigo Biomarkers of Acute and Chronic Kidney Disease , de
Zhang e Parikh, 2019, disponível no site PubMed.

Leia mais sobre os distúrbios hidroeletrolíticos no artigo Distúrbios hidroeletrolíticos de Neto e Neto, 2003. Disponível no Portal de Revistas
da USP.

Visite o site MedicinaNet para entender mais sobre hipo e hipernatremias. Lá você encontra várias revisões sobre o assunto, algoritmos
interessantes sobre o diagnóstico e tratamento.

Leia novas perspectivas sobre os distúrbios acidobásicos no artigo Disorders of Acid-Base Balance: New Perspectives , de Seifter e Chang,
2016, disponível no site da Karger.

CONTEUDISTA
Edgard de Freitas Vianna

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