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TCC PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO E PROCESSO DO TRABALHO E DIREITO


PREVIDENCIÁRIO: "O FIM DA ESTABILIDADE DEFINITIVA (DECENAL) EM
DETRIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVI....

Article · November 2019

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Alexandre Vuckovic
Fundación Universitaria Iberoamericana
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1

O FIM DA ESTABILIDADE DEFINITIVA (DECENAL) EM DETRIMENTO DO


FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS): UMA ANÁLISE DAS
VANTAGENS E DESVANTAGENS PARA O TRABALHADOR BRASILEIRO

Alexandre Vuckovic 1

Resumo

Este artigo científico jurídico tem por objetivo realizar estudo metodológico através da análise
comparativa entre duas modelagens de garantias trabalhistas, quais sejam: a Estabilidade
Definitiva (Decenal) e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), de maneira a
vislumbrar a evolução destes direitos, procurando demonstrar as vantagens e desvantagens de
cada um deles para o trabalhador brasileiro. Temos como ponto de concentração de análise,
fazer um resgate histórico de forma objetiva e cronológica, buscando apresentar a situação
econômica, política e social no Brasil no período estudado, no contexto do cenário mundial. A
metodologia empregada foi a análise de dados governamentais e não governamentais,
evolução das leis, estudo da doutrina e jurisprudência, além do cruzamento de informações
para a fundamentação das próprias conclusões. Também foi realizada revisão bibliográfica
dos temas relacionados ao assunto como fundamentação teórica ao trabalho. Como resultados
decorrentes deste artigo, apresentamos uma avaliação destas mudanças no sentido de
demonstrar quem foi efetivamente o maior beneficiado pela mudança do regime, o
trabalhador ou o empregador.

Palavras-Chave: Estabilidade Decenal, FGTS, Direitos Trabalhistas.

1
Graduado em Economia (Universidade Tuiuti do Paraná), Graduado em Direito, Graduado em Investigação
Forense e Perícia Criminal, Graduado em Mediação (Universidade Estácio de Sá), Pós-Graduado em Direito
Penal (Uniasselvi), Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho e Previdenciário (Universidade Estácio de
Sá), Pós-Graduado em Direito Militar, Pós-Graduado em Análise Criminal (Faculdade São Braz), Pós-graduado
em Ciência Política e Desenvolvimento Estratégico (IMEC), Pós-Graduado em Altos Estudos de Política,
Planejamento e Estratégia (ESG), Mestrado em Direito e Negócios Internacionais (FUNIBER).
2

Introdução

Indubitavelmente, desde que o homem passou a ter que viver do seu trabalho como
forma de subsistência, seja na forma cativa ou remunerada, sempre houve uma relação
conflituosa entre o suserano e o vassalo, ou entre o capital e o trabalho, resultando numa
discussão entre direitos e deveres do trabalhador e do empregador.
Em que pese que a evolução da história do homem e desenvolvimento das relações de
trabalho, muito se conquistou, mesmo que a duras penas e nem sempre de forma proporcional
à necessidade do hipossuficiente.
Neste sentido, o poder constituído, utilizando sua prerrogativa de criar e alterar a
legislação se viu obrigado a estabelecer uma relação de equilíbrio entre capital e trabalho, por
pressão de diferentes classes de modo a manter as bases para o desenvolvimento econômico e
social.
Assim sendo, a questão da estabilidade no trabalho no Brasil, o qual era decenal,
passou por uma pequena mudança inicialmente com a introdução do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço (FGTS) em 1966 (mais precisamente no dia 13 de setembro), o qual foi
substituído com a Constituição Federal de 1988, sendo este o tema que iremos analisar nos
próximos tópicos deste artigo.
Se considerarmos a Teoria Criacionista em que o primeiro homem, o homo sapiens
sapiens, criado por Deus e colocado no Jardim do Éden vivia num lugar perfeito chamado de
“paraíso” onde nada lhe faltava e tinha de tudo para a sua sobrevivência em abundância, ao
ser expulso do mesmo por desobediência à uma ordem divina, passou a ter que viver do suor
do seu trabalho, podemos considerar que desde então, segundo esta interpretação religiosa
judaico-cristã, o trabalho é visto como uma maldição.
Com a multiplicação dos seres humanos pela face da Terra, começa-se a estabelecer
uma competição natural entre estes para se estabelecer uma relação de poder entre
comandantes e comandados, sendo que, mesmo que os comandados não fossem feitos
escravos, mesmo na condição de trabalhadores livres, ainda assim eram explorados em seus
trabalhos para que houvesse o fator gerador de acumulação para os comandantes no sentido
de torná-los cada vez mais poderosos e, consequentemente, houvesse a perpetuação no poder.
Através da análise e classificação dos historiadores, podemos identificar que
independentemente da idade histórica, sempre esteve configurada estas duas classes, a que
dominava e a que era dominada.
3

Ainda na idade contemporânea, com todos os avanços tecnológicos, culturais e sociais


presentes nas sociedades modernas, como a do Brasil, por exemplo, podemos não só
identificar que o trabalhador é tolhido em seus direitos em detrimento de uma classe que não
aceita avançar em termos de melhores condições de trabalho e renda dos seus trabalhadores,
chegando a situação absurda e insustentável de ainda haverem pontos isolados do território
nacional onde persiste a prática do trabalho escravo.
Diante deste cenário de lutas de classes onde o Governo Federal através do Ministério
da Economia2 é o intermediador e tutor das questões trabalhistas no Brasil, é que iremos
analisar se as medidas tomadas por este órgão veem efetivamente trazendo avanços para
aperfeiçoar as garantias de direitos do trabalhador brasileiro.
O objetivo geral deste artigo é demonstrar se o fim da Estabilidade Decenal
(Definitiva) e sua substituição pelo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS)
acabou por melhorar ou piorar as condições experienciadas pelo trabalhador brasileiro,
fazendo uma análise comparativa entre suas vantagens e desvantagens.
Este direcionamento será dado através de estudos teóricos, através da revisão
bibliográfica, análise de leis trabalhistas no âmbito da Consolidação das Leis de Trabalho
(CLT), da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da jurisprudência brasileira em
caso concreto julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).
De modo a atender plenamente ao objetivo geral proposto, os seguintes objetivos
específicos serão desenvolvidos no decorrer deste artigo:

i) Analisar a evolução histórica do trabalho em âmbito mundial.


ii) Analisar a evolução histórica do trabalho em âmbito nacional.
iii) Apresentar o modus operandi da modelagem de Estabilidade Definitiva (Decenal).
iv) Apresentar o modus operandi da modelagem do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS).
v) Realizar estudo comparativo sobre os dois modelos apresentando as vantagens e
desvantagens de cada um deles para o trabalhador brasileiro.

Segundo LAKATOS & MARCONI (2010), são apresentados os seguintes métodos de


aplicação particular, ditos métodos de procedimento: histórico, comparativo, estudo de caso,
estatístico, tipológico, funcionalista e etnográfico.
2
Prerrogativa atribuída ao extinto Ministério do Trabalho e Emprego, a qual foi absorvida por este ministério, a
partir do Governo Jair Bolsonaro (1º/01/2019).
4

Dentre os supracitados, o escolhido foi o método comparativo, sendo este realizado


pelo estudo através da comparação de informações e dados de maneira que permita amplo
detalhamento do estudo.
O estudo através do método comparativo permite grande flexibilidade, significando a
dificuldade de se estabelecer um roteiro rígido que determine como a pesquisa será
desenvolvida.
Todavia, segundo LAKATOS & MARCONI (2010), podem ser identificadas as
seguintes fases:

◆ Delimitação do estudo;
◆ Coleta de dados;
◆ Análise e interpretação de dados;
◆ Redação do trabalho.

Desenvolvimento

1. Breve evolução histórica

Fazendo uma análise histórica da humanidade de modo a procurar entender de forma


mais aprofundada a relação do homem com o trabalho, remontamos a passagem bíblica do
Livro de Gênesis, onde o homem, através da figura de Adão, pecou e, caindo em desgraça
perante o criador, foi expulso do Jardim do Éden, passando a ter que trabalhar arduamente
para sobreviver.

Gênesis 3:19 – No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra;
porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.

Gênesis 3:23 – O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a
terra de que fora tomado.

Analisando estas duas passagens bíblicas as quais mudaram o rumo do homem na


história da humanidade, um ponto nos chama a atenção: que o homem a partir deste momento
teria que trabalhar arduamente para se sustentar. Este repentinamente deixa de viver da
abundância dos alimentos a que outrora tivera, para passar a viver da agricultura, da caça e da
pesca.
5

De acordo com TOFFLER (1980), durante milhares de anos (aproximadamente três


mil anos), o homem viveu basicamente de formas primitivas de sobrevivência, caçando,
pescando, realizando coleta de frutas, raízes, brotos, entre outros, sempre vivendo em
pequenos grupos para garantir sua segurança e subsistência.
A partir do momento histórico em que uns começam a se desenvolver e a acumular
mais do que os outros, surgem as classes, onde, inevitavelmente, o mais forte prevalece sobre
o mais fraco, surgindo daí o conceito jurídico da hipossuficiência.
Na Idade Antiga ou Antiguidade3 (4.000 a.C a 476 d.C), período compreendido entre o
surgimento da escrita até a queda do Império Romano no Ocidente, surgem classes, como a de
trabalhadores livre remunerados, a dos senhores e a dos escravos, muitos deles escravos
brancos, outros escravos remunerados, os quais trabalhavam forçadamente para seus senhores,
para um dia comprarem suas liberdades.
Segundo HUNT & SHERMAN (2011), “a escravidão deu origem à noção de que
todo trabalho era indigno. Essa noção desestimulou a atividade inventiva e limitou o
progresso tecnológico, contribuindo assim, para a estagnação da economia”.
Na Idade Média4 (476 d.C. até 1453), com a consolidação da monarquia, as classes
passam a serem classificados em nobreza (os quais eram detentores de terras), os também
chamados suseranos e os vassalos, aqueles que arrendavam a terra para produzir para seus
senhores, tendo direito a uma pequena fração para a subsistência de suas famílias.
Com a ideologia econômica do escravismo colapsado, surge o feudalismo como novo
sistema social, no qual o servo, isto é, o camponês, recebia proteção do senhor feudal, que por
sua vez, devia lealdade e era protegido por outro senhor mais poderoso.
As instituições econômicas eram baseadas no cultivo das terras dos senhores feudais
pelos camponeses e nas corporações de artesãos que praticavam uma rudimentar produção
doméstica e familiar que perpetuava através de gerações, passando de pai para filho
(HUBERMAN, 2010).
No período conhecido como Idade Moderna5 (1453 até 1789), surgem os burgueses,
ou seja, pequenos comerciantes, os quais produziam para o sustento de suas famílias e

3
Segundo a classificação dos historiadores, Idade Antiga, na periodização das épocas históricas da humanidade,
é o período que se estende desde a invenção da escrita (de 4000 a.C. a 3500 a.C.) até a queda do Império
Romano do Ocidente (476 d.C.).
4
Embora não haja um consenso entre os historiadores de diferentes países, a classificação mais aceita
universalmente é que a Idade Média inicia-se com a queda do Império Romano do Ocidente em 476 a.C e vai até
1453 com a queda de Constantinopla.
5
A Idade Moderna, segundo os historiadores, é um período específico da História, o qual se destaca das demais
por ter sido um período de transição por excelência. Tradicionalmente se aceita o início estabelecido em 29 de
6

comercializavam o excedente para a nobreza e clero. Foi a burguesia a precursora do


capitalismo, o qual ganhou grande impulso com a Revolução Industrial6 ocorrida na Inglaterra
a partir de 1780.
Neste período, o economista clássico Adam Smith (1723 – 1790), retomou o Princípio
da Especialização de Platão, utilizando a aplicação deste aos trabalhadores manufatureiros das
fábricas inglesas. Em sua obra “A Riqueza das Nações: Investigação Sobre sua Natureza e
suas Causas” (1776), “analisou os efeitos da divisão do trabalho sobre a produtividade,
demonstrando que na medida em que o comércio aumenta a divisão do trabalho, todos se
beneficiam do conseqüente aumento da produtividade”, (SANDRONI, 1996).
Com a escassez nos campos e a falta de oportunidades de desenvolvimento, milhares
de pessoas migraram para os grandes centros urbanos da época em busca de renda. Passaram
então, a vender sua mão de obra para os industriais que estavam surgindo, aos capitalistas que
para levar a cabo a produção em escala, passaram a empregar exércitos de trabalhadores.
Neste período, estes trabalhadores representavam meros números, pessoas sem direitos
e garantias de qualquer espécie, os quais não tinham as mínimas condições de higiene e
segurança no local de trabalho. Homens, mulheres e crianças disputavam e mesmo ambiente
de trabalho, sendo que o índice de acidentes devido à falta de habilidade com as máquinas,
assim como a falta de proteção, lançavam às ruas centenas de mutilados, os quais sem poder
mais trabalhar, viravam mendigos, realidade esta muito bem retratada no filme Germinal7.
Com o surgimento das chamadas Doutrinas Sociais, dentre elas “O Capital”, do
economista alemão Karl Marx, resultado das precárias condições de vida e de trabalho da
época, preconizava que “o Estado deveria intervir como instrumento de justiça social, como
órgão de equilíbrio dos fatores produtivos, de forma que o interesse social se sobrepusesse
ao meramente individual”.
A própria igreja que, através da publicação da Encíclica Rerum Novarum8, editada em
1891, pelo Papa Leão XIII, apregoava que “não pode haver capital sem trabalho nem

maio de 1453 quando ocorreu a tomada de Constantinopla (atual Istambul, na Turquia) pelos turcos otomanos, e
o término com a Revolução Francesa, em 14 de julho de 1789.
6
A I Revolução Industrial, também conhecida como Revolução do Carvão e do Ferro, teve seu período
compreendido entre 1780 e 1860. A II Revolução Industrial ficou conhecida como Revolução do Aço e da
Eletricidade, a qual perdurou entre 1860 a 1914.
7
É um filme de romance francês, do escritor Émile Zola, produzido em 1993, cujo tema central aborda uma
greve de mineiros provocada pela redução dos salários. Além dos aspectos técnicos das extrações minerais e as
condições de vida nos agrupamentos dos mineiros, Zola também descreve o princípio da organização política e
sindical da classe operária, tais como as divisões já existentes entre marxistas e anarquistas.
8
Dentre os principais tópicos, abordava as causas do conflito de classes, a questão socialista, a propriedade
particular, a família e o Estado, a igreja e a questão social, direitos e deveres de patrões e trabalhadores, posse de
riquezas, a dignidade nas relações de trabalho, etc.
7

trabalho sem capital”, sendo esta a primeira vez na história da humanidade que se fala em
dignidade da pessoa humana nas relações de trabalho.
O poder dominante, temendo a luta de classes considerada através do materialismo
dialético9, tendo como objetivo último o fim da propriedade privada, passou a considerar
essas novas doutrinas como uma ameaça à sociedade da época, tendo que intervir
politicamente para evitar uma convulsão social.
Dentre todos os tópicos defendidos por esta encíclica, podemos citar aquela que trata
da dignidade no trabalho, a qual talvez tenha contribuído sobremaneira para que o Estado
passasse a exercer sua força cogente e seu jus puniendi para aqueles que descumprissem o
novo pacto social nas relações entre capital e trabalho.
Ao término da Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), a nova ordem mundial à luz
da Conferência de Paz no Palácio de Versalhes, cria a Organização Internacional do Trabalho
(OIT), órgão este subordinado a então Liga das Nações10, precursora da Organização das
Nações Unidas (ONU). A partir deste momento fica consagrado o Direito do Trabalho11 como
aquele que passa a defender o direito dos trabalhadores e como novo ramo das Ciências
Jurídicas.

2. A evolução histórica do trabalho no Brasil

No Brasil, em decorrência da Organização Internacional do Trabalho, podemos


considerar que o ordenamento jurídico trabalhista tal qual como o conhecemos atualmente,
teve sua origem em 1943 através da Consolidação das Leis do Trabalho12 (CLT), após a
criação da Justiça do Trabalho.
A Consolidação das Leis do Trabalho é norma legislativa referente ao Direito do
Trabalho e Direito Processual do Trabalho, criada através do Decreto-Lei Nº 5.542/43, a qual
contém 922 artigos distribuídos em oito capítulos os quais especificam os direitos dos
trabalhadores brasileiros.
Conforme interpretação de MARTINS FILHO (2010), sobre a CLT de 1943:

9
Concepção filosófica que se opõe ao Idealismo, defendendo que o ambiente, o organismo e fenômenos físicos
tanto modelam os animais e os seres humanos, sua sociedade e sua cultura quanto são modelados por eles.
10
Foi uma organização internacional, criada em 28 de abril de 1919, em Versalhes, França, onde as potências
vencedoras da Primeira Guerra Mundial se reuniram para negociar um acordo de paz. Foi extinta em 20 de abril
de 1946.
11
Conjunto de normas jurídicas que regem as relações entre empregados e empregadores, são os direitos
resultantes da condição jurídica dos trabalhadores.
12
Foi inspirada na Carta Del Lavoro, da Itália fascista de Benito Mussolini.
8

A CLT, em 1943, previu o instituto, mas sob a forma de indenização dissuasória da


dispensa, quando adquirido o direito aos 10 anos de casa. A jurisprudência
trabalhista, entendendo que a dispensa com 9 ou 8 anos de casa era impeditiva da
aquisição do direito, dando azo ao pagamento de indenização legal, levou à Lei Nº
5.107/66, que criou o FGTS, como sistema opcional, mas que na prática, foi imposto
pelo empresariado (MARTINS FILHO, 2010, p. 153).

Dentre os artigos da CLT, podemos destacar aquele que é objeto de nosso estudo neste
artigo científico o qual trata da estabilidade no emprego como garantia fundamental ao
trabalhador.
Podemos entender estabilidade no emprego como uma garantia contra a despedida
arbitrária do empregado.
Segundo a interpretação de VILLELA (2010), a estabilidade pode ser definida como:

Estabilidade é a vantagem jurídica de natureza permanente conferida ao empregado


em razão de circunstância tipificada de caráter geral, assegurando a manutenção do
vínculo de emprego, independentemente da vontade do empregador (VILLELA,
2010, p. 319).

No Brasil existem quatro formas de estabilidade no emprego, totais, ou parciais, sendo


duas públicas e duas privadas, a saber:

a) Nas Entidades Públicas:

i. Estabilidade Total: Aplicada aos servidores públicos os quais são regidos pelo
regime jurídico de estatutário federal. Aqui estão todos aqueles alocados na
administração direta, autarquias e fundações públicas. Todos aqueles empregados
nesta categoria só podem ser demitidos através de sentença judicial transitada em
julgado. A outra situação para demissão é em virtude de processo administrativo
disciplinar, assegurando-se a ampla defesa.

ii. Estabilidade Relativa: Aplicada aos empregados públicos regidos pela Consolidação
das Leis de Trabalho, ou seja, empregados por empresas públicas ou empresas de
economia mista. Conforme Recurso Extraordinário Nº 589.998/13 do Supremo
Tribunal Federal (STF), estes só podem ser demitidos nos casos em que a demissão
seja fundamentada e comprovada.
9

b) Nas Entidades Privadas:

i. Estabilidade Provisória: Aplicada a todos os empregados de empresas privadas que


são regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Aqueles que são membros
da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho (CIPA), representantes
de sindicado de classe, empregadas grávidas, diretores de cooperativas, aqueles
empregados que se acidentaram em decorrência do trabalho. Demais motivos além
desta relação devem ser previstos em acordo coletivo de cada categoria.

ii. Estabilidade Decenal: (Era) aplicada aos empregados de empresas privadas com mais
de dez anos de serviço ininterruptos na mesma empresa. Estes adquiriam estabilidade
decenal (10 anos), somente podendo ser demitidos por motivo de falta grave ou
motivo de forma maior.

A estabilidade decenal, objeto de nosso estudo, vigorou no Brasil desde 1943 até a
Constituição Federal de 1988, tendo sido tacitamente extinta a partir deste período para ser
substituída pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
O FGTS foi criado em 13 de setembro de 1966, através da Lei Nº 5.107, sendo
regulamentado pelo Decreto Nº 59.820, de 20 de dezembro de 1966, cuja vigência se deu
através da Lei Nº 5.107/66, a qual se iniciou em 1º de janeiro de 1967. Atualmente é regulado
pela Lei Nº 8.036/90 e pelo Decreto 99.684/90.
O que acontecia até a promulgação da Constituição Federal de 1988 era que, o
empregado por ocasião de sua contratação, optava pela estabilidade decenal ou pelo FGTS.
Através do gráfico a seguir, podemos entender de forma mais didática o que acontecia.

Figura 1: Demonstração cronológica da Estabilidade Decenal e do FGTS no Brasil entre 1943 e 1988.

Fonte: Representação esquemática elaborado pelo autor baseada nos eventos histórico-legais.
10

Conforme entendimento do gráfico acima, podemos verificar que havia três períodos
distintos. O primeiro que foi até 1966 o trabalhador só estava amparado pelo regime decenal.
Neste sistema, o empregado ao completar mais de dez anos de serviços tornava-se
automaticamente estavél e não poderia mais ser dispensado por motivo de justa causa
comprovada por meio de inquérito.
Conforme determinava o texto do artigo 492 da Consolidação das Leis de Trabalho
(CLT), Decreto-lei Nº 5.452 de 01 de maio de 1943:

Art. 492, CLT/43: O empregado que contar mais de 10 (dez) anos de serviço na
mesma empresa não poderá ser despedido senão por motivo de falta grave ou
circunstância de força maior, devidamente comprovadas.

Porém, na prática o que acontecia era que, antes deste chegar próximo da data de sua
estabilidade, era dispensando pelo empregador o qual não queria ter empregados na
estabilidade. Em caso da demissão partir por parte do empregado, seu pedido só seria válido
com a supervisão do sindicato, Ministério do Trabalho ou Justiça do Trabalho.
Entretanto, o panorama desta previsão legal mudar-se-ia com a edição da Lei Nº
5.107/66 que criaria o regime de FGTS como alternativa de indenização da CLT, o que seria
posteriormente consticionalizado.

A partir da lei que instituiu o regime do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço,
permitiu-se a opção pelo novo regime para aqueles empregados que já possuíam
vínculo empregatício, que a partir de então passariam a ser regidos por dois
regimes: o regime da Consolidação para o tempo anterior e o fundiário para o
tempo posterior (OLIVEIRA, 2005).

Per summa capita, a lei trabalhista fora criada para benefeciar o empregado caso este
viesse a perder o emprego de forma injustificada, todavia acabou tendo um viés contrário o
qual praticamente “condenava” o mesmo a perder o emprego ao completar dez anos de
serviços para seu empregador.
A partide de 1966, através da Lei Nº 5.107/66, passou a vigorar o regime de Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço. Este regime não estinguiria o anterior, mas daria uma
alternativa para o empregado poder optar em qual regime trabalhista queria ser contratado,
como uma forma de minimizar as injustiças que ocorriam com o regime decenal.
Conforme texto desta antiga lei, temos:
11

Art. 1º, Lei Nº 5.107/66: Para garantia do tempo de serviço ficam mantidos os
Capítulos V e VII do Título IV da Consolidação das Leis do Trabalho, assegurado,
porém, aos empregados o direito de optarem pelo regime instituído na presente Lei.

Nesta situação, caso o empregado mencionado deseja-se ser contratato no regime


decenal, o empregador deveria fazer uma anotação em sua Carteira de Trabalho por Tempo de
Serviço (CTPS), como “não optante do FGTS”.
À luz do texto da então Lei Nº 5.107 de 13 de setembro de 1966:

Art. 1º, §2º, Lei Nº 5.107/66: A preferência do empregado pelo regime desta Lei
deve ser manifestada em declaração escrita, e, em seguida anotada em sua Carteira
Profissional, bem como no respectivo livro ou ficha de registro.

Quanto ao percentual originalmente previsto em lei, podemos verificar à inteligência


da lei vigente à época, leia-se Lei Nº 5.107 de 13 de setembro de 1966:

Art. 2º, Lei Nº 5.107/66: Para os fins previstos nesta lei, todas as empresas sujeitas
à CLT ficam obrigadas a depositar, até o último dia de expediente bancário do
primeiro decêndio de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância
correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração paga ou devida no mês
anterior, a cada empregado, optante ou não, incluídas as parcelas de que tratam os
arts. 457 e 458 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Gratificação de
Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da
Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965. (Redação dada pela Lei nº 7.794, de 1989).

O FGTS diferenciava-se do Decenal pelo fato de esta prever a criação de um fundo de


recursos, o qual era depositado 8% sobre a remuneração do empregado durante toda a
validade do contrato de trabalho deste, sendo este depositado mensalmente pelo empregador,
em conta específica do FGTS na Caixa Econômica Federal.
Ambos os regimes coexistiram até a promulgação da Constituição Federal de 1988,
data esta em que o regime Decenal foi extinto, passando a existir somente o regime do FGTS,
obrigando todos os trabalhadores a optar por esta modalidade.
Conforme determinação legal prevista no artigo 11 da Lei Nº 5.107/66, temos:

Art. 11, Lei Nº 5.107/66: Fica criado o "Fundo de Garantia do Tempo de Serviço"
(FGTS), constituído pelo conjunto das contas vinculadas a que se refere esta Lei,
cujos recursos serão aplicados com correção monetária e juros, de modo a assegurar
cobertura de suas obrigações, cabendo sua gestão ao Banco Nacional de Habitação13.

13
O Banco Nacional de Habitação (BNH) foi uma empresa pública brasileira voltada ao financiamento e à
produção de empreendimentos imobiliários, assim como a Caixa Econômica Federal opera atualmente, sendo
seu sucessor. Foi a principal instituição federal de desenvolvimento urbano do Brasil, na qualidade de gestor do
FGTS e da formulação e implementação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e do Sistema Financeiro do
Saneamento (SFS). O Banco foi extinto através do Decreto-Lei Nº 2.291, de 21 de novembro de 1986, o qual foi
12

NASCIMENTO (2006) fundamenta: “Como as empresas passaram a admitir


empregados desde que como optantes do FGTS, automaticamente desapareceram os
estáveis, que hoje gradativamente não existem mais”.
Ainda sob a análise da Figura 1, há que se refletir sobre o caso concreto daquele
trabalhador que anterior a data de opção obrigatória do FGTS se encontrava como
beneficiário da estabilidade decenal.
Em que pese às divergências naturais de entendimento legal entre advogados dos
empregados e advogados dos empregadores, há que se lançar mão do recente entendimento
do Tribunal Superior do Trabalho (TST), de 21 de maio de 2014, através da seguinte
jurisprudência:

TST - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA: AIRR


17330820115150055

Processo: AIRR 17330820115150055


Relator (a): Lélio Bentes Corrêa
Julgamento: 21/05/2014
Órgão Julgador: 1ª Turma
Publicação: DEJT 23/05/2014

Ementa: INDENIZAÇÃO. ESTABILIDADE DECENAL. OPÇÃO POSTERIOR PELO


REGIME DO FGTS. DIREITO ADQUIRIDO. COMPATIBILIDADE COM O REGIME DO
FGTS.

À época da opção do reclamante pelo regime do FGTS encontrava-se em vigor a Lei


Nº 5.107/66, que, em seu artigo 16, dispunha que – os empregados que, na forma do
art. 1º, optarem pelo regime desta Lei terão, na ocorrência de rescisão do contrato de
trabalho, regulados os direitos relativos ao tempo de serviço anterior à opção, de
acordo com o sistema estabelecido no Capítulo V do Título IV da CLT, calculada,
porém, a indenização, para os que contem 10 (dez) ou mais anos de serviço, na base
prevista no artigo 497 da mesma CLT. Pelo tempo de serviço posterior à opção,
terão assegurados os direitos decorrentes desta Lei. Diante disso, o reclamante
estável à época da opção pelo regime do FGTS tem jus à indenização prevista no
artigo 497 da Consolidação das Leis do Trabalho, sem prejuízo da indenização de
40% sobre o FGTS depositado em sua conta vinculada em razão da extinção do
contrato de emprego sem justa causa. Afronta ao artigo 492 da Consolidação das
Leis do Trabalho que não se reconhece. Precedentes desta Corte superior. Agravo de
instrumento a que se nega provimento.

Apesar da condenação, a empresa discordou, alegando que “ao optar pelo FGTS,
com efeitos retroativos a 01/07/1975, antes da Constituição da República de 05 de outubro

incorporado à Caixa Econômica Federal, sucedendo em todos os seus direitos e obrigações, sobretudo, na gestão
do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
13

de 1988, o trabalhador renunciou tacitamente à estabilidade decenal, não fazendo jus à


indenização”. Para tanto, avocou o artigo 12 do Decreto 99.684/9014 e a Súmula 98 do
TST15.
Não obstante, os argumentos não surtiram efeito no convencimento da relatora do
recurso, pois segundo entendimento dado pela Desembargadora Maria Lúcia Cardoso de
Magalhães do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, “a estabilidade decenal
garantida pelo art. 492 da CLT vigeu até a promulgação da Constituição da República/88,
quando se tornou obrigatório o FGTS. Antes da Constituição de 1988, fazia jus a ela o
empregado com mais de 10 anos de serviço na mesma empresa que fosse dispensado sem
justa causa”.

3. Vantagens e Desvantagens

Através da demonstração do Quadro 1, podermos analisar os dois sistemas,


verificando as vantagens e desvantagens entre a Estabilidade Decenal e o Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço.
Enquanto que a Estabilidade Decenal remonta ao período pós I Guerra Mundial,
datando de 1923, o FGTS passa a vigorar, incialmente, durante o regime de exceção do
governo militar, cuja data remete a 1966, tendo sido aperfeiçoado em 1990 através de decreto-
lei.
Se no sistema da Estabilidade Decenal o empregado tinha estabilidade no emprego
após completar dez anos de trabalho ininterruptos para o mesmo empregador, sob o regime do
FGTS esta estabilidade deixa de existir.

14
Art. 12, Decreto 99.684/90: Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, para a qual não tenha o trabalhador
dado causa, fica assegurado, na forma do disposto nos artigos 477 a 486 e 497 da CLT, o direito à indenização
relativa ao tempo de serviço anterior a 5 de outubro de 1988, que não tenha sido objeto de opção.
15
Súmula nº 98 do TST: I - A equivalência entre os regimes do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e da
estabilidade prevista na CLT é meramente jurídica e não econômica, sendo indevidos valores a título de
reposição de diferenças. II - A estabilidade contratual ou a derivada de regulamento de empresa são compatíveis
com o regime do FGTS. Diversamente ocorre com a estabilidade legal (decenal, art. 492 da CLT), que é
renunciada com a opção pelo FGTS.
14

Quadro 1: Comparação entre a Estabilidade Decenal e o FGTS.


Estabilidade Decenal FGTS
Previsão Legal Lei Nº 8.036/90 e pelo
Previsão Legal Lei Nº 4.682/1923 (1).
Decreto 99.684/90.
Estável após 10 anos de trabalho Não há estabilidade
Dispensa por justa causa por falta grave a qualquer
Dispensa por justa causa somente por meio de momento, sendo que cabe ao empregador o ônus da
inquérito. prova caso haja reclamatória trabalhista ajuizada pelo
empregado.
Gera indenização para o empregado de 8% do seu
Gera indenização de um mês de salário para o
salário por mês trabalhado, atualizados mensalmente,
empregado dispensado que tenha mais de um ano de
onde o trabalhador só receberá esta verba rescisória
trabalho e menos de dez anos.
caso seja dispensando sem justa causa.
O empregador tinha que provisionar 1/12 do valor do O empregador tem que depositar mensalmente 8% do
salário do trabalhador para cobrir sua dispensa. salário do empregado em conta de FGTS na CEF.
Provisionamentos (alegados) elevados para o Provisionamento legal de 8% sobre o salário do
empregador. empregado.
Empregador acabava demitindo o empregado antes de
Empregador pode demitir a qualquer momento.
completar os dez anos para não pagar a indenização.
Encargo oneroso para a empresa. Encargo menos oneroso para a empresa.
Desfavorável ao empregado, pois na prática Empregado passa a receber o benefício fiduciário em
dificilmente desfrutava da estabilidade. detrimento da estabilidade.
Entre os anos de 1966 e 1988 o empregado tinha a
Regime de adesão único e obrigatório.
opção de ser celetista ou FGTS.
NOTA: (1) Esta lei, também conhecida como Eloy Chaves16, foi a criadora deste tipo de estabilidade no Brasil,
tendo sido aperfeiçoada pela Lei Nº 62/1935, sendo esta estendida aos empregados da indústria e comércio.

Em se tratando de dispensa por justa causa, o trabalhador só pode ser deminido através
da conclusão de inquérito, dando assim ao mesmo uma certa tranquilidade. Já no regime do
FGTS, a dispensa por falta grave pode acontecer a qualquer momento, sendo que cabe ao
empregador o ônus da prova, caso haja relamatória trabalhista ajuizada pelo empregado.
O sistema decenal gera indenização de um mês de salário para o empregado
dispensado que tenha mais de um ano de trabalho e menos de dez anos. No sistema do FGTS,
por sua vez, gera uma indenização para o empregado de 8% do seu salário por mês
trabalhado, atualizados mensalmente, onde o trabalhador só receberá esta verba recisória caso
seja dispensado sem jutsa causa.
Por ocasião da vigência da estabilidade decenal, o empregador tinha que provisionar
1/12 do valor do salário do trabalhador para cobrir sua despesa. No FGTS, o empregador tem
que depositar mensalmente 8% do salário do empregado em conta de FGTS na Caixa
Econômica Federal.
Na estabilidade decenal, os provisionamentos alegados eram elevados para o
trabalhador, enquanto que no FGTS, o provisionamento legal é de 8% sobre o salário do
empregado.

16
Criou, inicialmente, as caixas de previdência das várias categorias de trabalhadores (ferroviários, portuários,
bancários, etc.).
15

Na prática, o que acontecia efetivamente na estabilidade decenal era que o emregador


acabava demitindo o empregado antes deste completar os dez anos de serviços prestados para
não pagar a indenização. No FGTS o empregador pode demitir o empregado a qualquer
momento. Assim sendo, aquele passava a ser mais oneroso para a empresa, enquanto que este
era menos oneroso.
O regime decenal era desfavorável ao empregado, pois na prática dificilmente
desfrutava da estabilidade, sendo que com o FGTS, o mesmo passa a receber o benefício
fiduciário em detrimento da estabilidade.
Por um perído, entre os anos de 1966 e 1988, o empregado tinha a opção de ser
celetista ou FGTS, sendo que após o ano de 1988, o regime de adesão ao FGTS é único e
obrigatório.
Em suma, se o empregado “perdesse” sua estabilidade – algo que só tivera
teoricamente – com a entrada em vigor do FGTS, agora passou a gozar deste benefício de
forma mais imediata e compensadora, pois sabe que findado seu período de experiência se
tiver seu contrato de trabalho encerrado sem justa causa, receberá todos os benefícios17 a que
tem direito, o que seria correto dizer que sairia da empresa percebendo o direito de sacar o
saldo depositado de sua conta pelo período em que esteve empregado.

4. A questão da dispensa imotivada segundo a OIT

Como foi demonstrado inicialmente, o Direito Trabalhista brasileiro segue as políticas


trabalhistas recomendadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), órgão este
subordinado a Organização das Nações Unidas (ONU), o qual o Brasil é membro desde a sua
fundação.
Neste sentido, é necessário fazer referência ao conteúdo disposto na Convenção 15818
da OIT, cujo tema central do Direito Individual do Trabalho concerne à proteção contra a
dispensa do trabalhador e garantia no emprego, ou seja, encerra em si a garantia
constitucional19 de proteção contra a despedida arbitrária do trabalhador.
À luz do seu Art. 4, a Convenção 158 da OIT, dispõe que:

17
O empregado que tiver sido dispensado sem justa causa faz jus ao saldo de salário, aviso prévio indenizado,
férias proporcionais ou integrais, 13º salário proporcional ou integral, multa sobre o FGTS e saque do FGTS.
18
Aprovada pela OIT na 68ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra (1982), a
Convenção 158 entrou em vigor no plano internacional em 23 de novembro de 1985.
19
Garantia esta prevista no Art. 7º, I, CRFB/88: I. “Relação de emprego protegida contra despedida arbitrária
ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros
direitos”.
16

Art. 4º, Convenção 158, OIT/85: Não se dará término à relação de trabalho de um
trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua
capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento
da empresa, estabelecimento ou serviço.

Em que pese a práxis de que a garantia do emprego ao trabalhador ser objeto de


negociação coletiva viabilizada pelos sindicatos, esta é permeada de interesses conflitantes
ainda não pacificados, devido à organização de natureza política e social que, acaba
indubitavelmente, causando reflexos macroeconômicos que afetam a renda nacional.
Consoante a Convenção 158 da OIT, trata-se de um instrumento supragovernamental
que tem o objetivo trazer o equilíbrio para a mesa de negociações entre empregados e
empregadores, equilíbrio este idealizado pelo ilustre jurista, Ruy Barbosa, onde a verdadeira
igualdade consiste em “tratar-se igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na
medida da sua desigualdade”.
Em se tratando de norma alheia ao ordenamento jurídico brasileiro, há que se falar em
ratificação de tratados internacionais, sendo ato complexo o qual uma vez que a iniciativa
política do Presidente da República tem necessariamente que ser referendada pelo Congresso
Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), conforme disposto no Art. 84, inciso
VIII da Constituição Federal de 198820.
Apesar da Convenção 158 da OIT ter entrado em vigor em âmbito mundial em 1985, a
mesma só foi ratificada no Brasil através do Decreto-Lei Nº 68, de 16 de setembro de 1992,
sendo sua promulgação feita ainda mais tardiamente, através do Decreto-Lei Nº 1.855, de 10
de abril de 1996.
Como principais características da aplicabilidade concreta Convenção 158 da OIT no
Brasil, podemos fazer menção ao fato de haver uma maior fiscalização que proteja o
trabalhador da dispensa imotivada, verificando todas as homologações, até mesmo para
aqueles trabalhadores com menos de um ano de contrato de trabalho, deverão ser
formalizados através dos sindicatos ou do Ministério do Trabalho e Emprego, sendo que,
doravante, o empregador deve justificar por escrito a dispensa do trabalhador.
À inteligência do artigo 7º da Convenção 158 da OIT, temos que:

Art. 7º, Convenção 158, OIT/85: Não deverá ser terminada a relação de trabalho de
um trabalhador por motivos relacionados com seu comportamento ou seu
desempenho antes de se dar ao mesmo a possibilidade de se defender das acusações

20
Art. 84, CRFB/88: Compete privativamente ao Presidente da República: VIII - celebrar tratados, convenções e
atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.
17

feitas contra ele, a menos que não seja possível pedir ao empregador, razoavelmente,
que lhe conceda essa possibilidade.

Se analisarmos o artigo 7º, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil


de 1988 e o compararmos com o artigo 7º da Convenção 158 da OIT, podemos verificar que o
legislador brasileiro foi assertivo ao adotar a mesma linha por ocasião do estabelecimento da
Assembléia Nacional Constituinte de 1987, pois este praticamente se deu à luz daquela no
quesito “dispensa imotivada do trabalhador, pacificando assim, o entendimento jurídico
quanto a necessidade de proteção do trabalhador”.
Todavia, em 1996, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, através do Decreto
2.100/1996, formalizou a denúncia da norma internacional, tornando público que esta deixaria
de ser cumprida no Brasil a partir de novembro de 1997.
Através da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 1625, a Confederação
Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) questiona o Decreto 2.100/1996, que
trata do término da relação de trabalho por iniciativa do empregador e veda a dispensa
injustificada.
Na ADIN proposta pela Contag, esta alega violação ao artigo 49, inciso I, da
Constituição Federal, que atribui competência exclusiva ao Congresso Nacional para
“resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”. A argumentação se baseia no
fato que a Convenção 158 foi aprovada e promulgada pelo Congresso Nacional, não cabendo,
portanto, ao presidente da República editar decreto revogando a promulgação.
Somente em 11 de novembro de 2015, em seção do Tribunal Superior Federal, o
plenário deste retomou este julgamento e, em voto-vista dos ministros Rosa Weber e Teori
Zavascki, consideraram inconstitucional o decreto que revogou a convenção da OIT.
Conforme texto original da seção plenária do STF nesta data, podemos apreciar a
justificativa para a decisão:

Seu voto partiu da premissa de que, nos termos da Constituição, leis ordinárias não
podem ser revogadas pelo presidente da República, e o decreto que formaliza a
adesão do Brasil a um tratado internacional, aprovado e ratificado pelo Congresso,
equivale a lei ordinária. “A derrogação de norma incorporadora de tratado pela
vontade exclusiva do presidente da República, a meu juízo, é incompatível com o
equilíbrio necessário à preservação da independência e da harmonia entre os Poderes
(artigo 2º da Constituição da República), bem como com a exigência do devido
processo legal (artigo 5º, inciso LIV)”, afirmou. “Por isso, não se coaduna com o
Estado Democrático de Direito”. (Ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa
Weber).
18

Diante da decisão do STF e depois de quase uma década, houve o entendimento que a
Convenção 158 da OIT não poderia ter sido simplesmente revogada por ato unilateral do
Presidente da República, uma vez que o Congresso Nacional o ratificara na ocasião. Neste
sentido, o mesmo volta a fazer parte do ordenamento jurídico e considera-se perfeitamente
aplicável para a proteção do trabalhador contra dispensa imotivada.

Análise dos Resultados

Face aos dados, fatos, teorias, doutrinas, jurisprudência e argumentações apresentadas


no desenvolvimento deste artigo científico, conseguimos identificar que, indubitavelmente, ao
longo da história do homem, este sempre esteve indissociavelmente relacionado ao trabalho,
seja de forma autônoma, escrava ou remunerada.
Também identificamos que o trabalho, independentemente das distintas formas acima
apresentadas, sempre esteve presente a figura de divisão de forças na qual, onde há um
dominador e outro dominado e, consequentemente, a utilização da mão de obra do mais fraco
(hipossuficiente), pelo mais forte.
Nesse sentido, a história da luta de classes se dá pelo operariado ou trabalhador pela
melhora das condições de trabalho quanto às questões de insalubridade, redução da jornada de
trabalho e, sobretudo, da conquista de benefícios sociais.
No caso concreto específico das relações de trabalho no Brasil, é incontestável que
houve um constante aperfeiçoamento das leis trabalhistas, seja resultante da pressão dos
próprios trabalhadores, seja por força dos sindicatos, seja pela própria evolução da sociedade
ou até mesmo por medidas adotadas por governos populistas, os quais tomaram impulso a
partir da década de 1930.
Se por um lado havia a pressão desses grupos, por outro, de maneira não menos
contundente, havia a força do empresariado brasileiro e, mais tardiamente, do lobby das
grandes corporações internacionais cada um obviamente defendendo seus interesses.
Acreditando poder dar garantias reais de estabilidade no trabalho para os empregados,
o Governo, através da introdução da estabilidade decenal, garante mesmo que por um bom
período, fazer com que os empregadores proporcionassem garantias reais de trabalho e renda
para seus empregados. Independentemente da assertividade e das boas intenções dos atores
envolvidos no cenário de trabalho, o fato é que de certa forma as mudanças contribuíram
sempre para favorecer a classe trabalhadora.
19

Mesmo que o FGTS tenha substituído a estabilidade decenal com a promulgação da


Constituição Federal de 1988, deixando muitos descontentes e fomentando diversas críticas, é
inegável o benefício que este instituto traz ao trabalhador todos os meses quando o
empregador deposita o percentual legal em sua conta na Caixa Econômica Federal, mesmo
que este, de momento, não esteja sendo usufrutuário deste dinheiro.
Este instituto é uma conquista dos trabalhadores brasileiros, trazendo benefícios que
desencadeiam em outros que favorecem a sociedade como um todo, como por exemplo, o
consumo das famílias, mantendo a economia equilibrada e o trabalhador amparado, mesmo
que momentaneamente.
Prova desta afirmação, é o fato de que o Governo Federal, de forma inédita, dada a
recessão prolongada na economia brasileira, ter liberado aos trabalhadores o saque
programado das contas inativas do FGTS de modo a garantir a subsistência daqueles que se
encontram desempregados, e de forma paralela, evitar que o consumo continue em declínio.

Conclusões

Em que pese o fato de que o trabalhador figurar como parte hipossuficiente nas
relações entre o capital e o trabalho, cabe ao Estado ocupar uma posição mais contundente,
servindo como agente regulador e fiscalizador entre empregados e empregadores.
Analisando o cenário brasileiro anterior a década de 1960, o populismo iniciado por
Getulio Vargas, considerado o “pai dos trabalhadores” brasileiros, foi responsável por
introduzir a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), a Carteira de Trabalho por Tempo de
Serviço (CTPS), Ministério do Trabalho, dentre outros, somente para citar suas principais
realizações quanto a proteção dos direitos dos trabalhadores.
Já no período do governo militar, temos a percepção de que os empresários se viram
aliviados de não mais serem governados por um governo cuja posição ideológica tendia mais
a proteger os direitos dos trabalhadores, passando estes a pressionar o governo militar, o qual,
por sua vez, dependia do empresariado para apoiar o estado de exceção.
Neste sentido, o governo resolve criar uma solução que não só desoneraria o capital,
como serviria de fonte captadora do Estado para financiar outros projetos nacionais, sobretudo
aqueles relacionados à construção civil, mais especificamente voltado para a habitação.
Estamos falando da criação do FGTS, cujos recursos passaram não somente a garantir uma
espécie de indenização para o trabalhador em caso de dispensa sem justa causa, cujos valores
20

garantiriam a sobrevivência do mesmo por algum tempo, até que este voltasse a se recolocar
no mercado de trabalho novamente.
Como o volume de recursos captados sempre seria maior do que os sacados, o governo
poderia aplicar estes em obras de infraestrutura, habitação e saneamento, somente para citar
os mais importantes.
À primeira vista nos parece, como o próprio nome sugere que o trabalhador tinha mais
vantagens no modelo de Estabilidade Decenal do que no FGTS, pois adquiria a estabilidade
no emprego ao completar dez anos de serviços, o que dificilmente acontecia na prática.
Conforme analisamos anteriormente, a mudança veio para melhor tem termos de vantagens
para o trabalhador.
Mudanças sempre trazem críticas e descontentamentos, sobretudo para aqueles que
têm que ceder para que outros possam alcançar o equilíbrio e à luz do que pudemos comparar,
numa primeira análise, tivemos a impressão de que o trabalhador fora lesado, todavia, não foi
isso que aconteceu efetivamente, pois se houve a perda de algum benfício por um lado,
também houve uma forma de compensação para este.
Considerando o fato de os assuntos relacionados às garantias trabalhistas serem
polêmicos e propiciarem debates acalorados entre o governo, empresários, sindicatos e
trabalhadores, temos no Direito Trabalhista e Previdenciário brasileiro um campo rico para se
analisar, de modo que possamos alcançar aqueles padrões difundidos pelo welfare state nos
países industrializados.
Desde 2016 acompanhamos diuturnamente através das mídias nacionais algumas
discussões de reformas trabalhistas no Congresso Nacional, sendo elas a das regras de
terceirização de mão de obra, da flexibilização dos contratos de trabalho e a da redução da
jornada semanal de trabalho.
Independentemente de ideologias políticas ou posicionamento de classe econômica, as
mudanças veem da necessidade recorrente da evolução da própria sociedade, sendo que
indubitavelmente, sempre haverá aqueles grupos que se posicionarão contra e outros a favor,
uns que sairão ganhando e outros perdendo, contrariando assim o Ótimo de Pareto, o qual
afirma que o ideal é que todos ganhem, sem que ninguém saia perdendo.
Portanto, recomenda-se como possíveis temas de pesquisa e análise, estes acima
citados, os quais estão em pauta sendo debatidos pela sociedade civil organizada e que, a
qualquer momento, o Congresso Nacional, possa aprovar novas mudanças nas relações de
trabalho brasileiras.
21

Referências

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 6ª ed. São Paulo: Rideel,
2013.

BRASIL. Decreto-lei Nº 62, de 5 de junho de 1935. Lex: Assegura ao empregado da industria


ou do commercio uma indemnização quando não exista prazo estipulado para a terminação do
respectivo contracto de trabalho e quando for despedido sem justa causa, e dá outras
providencias. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-
1949/L0062.htm>. Acesso em 26 set 2019.

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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 26 set
2019.

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Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8036consol.htm>. Acesso em 26 set 2019.

BRASIL. Decreto-lei Nº 99.684, de 8 de novembro de 1990. Lex: Consolida as normas


regulamentares do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D99684.htm>. Acesso em 26 set 2019.

BRASIL. Decreto-lei Nº 68, de 16 de setembro de 1992. Lex: Aprova o texto da Convenção


Nº 158, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre o Término da Relação
do Trabalho por Iniciativa do Empregador, adotada em Genebra em 1982, durante a 68ª
Sessão da Conferência Internacional do Trabalho. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/1992/decretolegislativo-68-16-setembro-1992-
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BRASIL. Decreto-Lei Nº 1.855, de 10 de abril de 1996. Lex: Promulga a Convenção 158


sobre o Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador, de 22 de junho
de 1982. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/D1855.htm>.
Acesso em 26 set 2019.

BRASIL. Súmula Nº 98 do TST, de 21 de novembro de 2003. Indenização. Equivalência.


Compatibilidade. (Incorporada a Orientação Jurisprudencial Nº 299 da SBDI-1) - Res.
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BRASIL. Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 1.625 de 11 de novembro de 2015.


Retirada unilateral do Brasil da Convenção 158 da OIT. Disponível em:
22

<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=109132&caixaBusca=
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HUBERMANN, Leo. História da Riqueza do Homem. 22a Ed. Rio de Janeiro: Guanabara,
2010.

HUNT & SHERMAN, História do Pensamento Econômico. 26a Ed. Rio de Janeiro: Vozes,
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