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UFRJ - Faculdade de Letras

Departamento de Letras Vernáculas


Morfologia da Língua Portuguesa (2019.2 – 9: 20)
Profª Eliete da Silveira
Aluno: Rafael Franco da Costa

- Com base nos critérios de Gonçalves (2019, p. 96-109), estabeleça o "continuum" para as
categorias flexionais nominais (gênero e número) e verbais (modo, tempo, aspecto e pessoa),
indicando se possuem traços derivacionais:

A categorização objetiva e isolante da linguística estruturalista quanto aos conceitos de


derivação e flexão é posta em debate ao observarmos certas exceções e nuances de determinadas
formas da língua comumente admitidas no português. Gonçalves (2019), propõe, portanto, a partir
da ótica gerativa, a não existência de condições morfológicas cristalizadas e inerentes às formas
verbais e nominais, mas sim, um continuum flexão- derivação no qual as formas compartilham
traços morfológicos entre si. O continuum se baseia em assumir parâmetros prototipicamente
derivacionais ou flexionais em torno dos quais as formas da língua orbitam e transpõem
significados, e então, a partir da perspectiva de análise desses parâmetros, identificar os traços
distintivos desses processos morfológicos.

"Evidências encontradas em diferentes línguas sugerem que


flexão e derivação apresentam tanto semelhanças quanto diferenças,
não havendo entre elas total identidade ou limite intransponível."1

Os parâmetros apresentados por Gonçalves (2019) são os seguintes2: como prototípicos da


morfologia flexional; “aplicabilidade”, “relevância sintática”, “estabilidade semântica” e
“excludência”. Como prototípicos da morfologia derivacional; “meios diversos de
materialização”, “lexicalização”, “posição da cabeça lexical” e “mudança de classe”.

Observando a categoria nominal de gênero, se percebe que os paradigmas flexionais da


"aplicabilidade" e da "estabilidade semântica"- isto seria, aplicar o morfe "-a" regularmente ao fim
de todos nomes - são apenas confirmados quando o processo ocorre em "substantivos de dois

1
GONÇALVES, Carlos Alexandre. Morfologia, p. 96. São Paulo, Parábola, 2019
2
Idem. p. 108
gêneros com flexão" 3 , como nos exemplos o menino/a menina. Quando o caso for de
"substantivos de gênero único" 4 , a distinção não se fará presente a partir de uma morfologia
flexional, mas sim, por exemplo; de uma heteronímia lexical, homem/mulher, boi/vaca, ou então,
a partir de um processo derivativo propriamente dito, como em imperador/imperatriz. Além
desses casos, quando se diz a respeito dos "substantivos de dois gêneros sem flexão"5, a marcação
é sintática e ocorre sem a necessidade de uma morfologia intrínseca a palavra, como nos casos; o
artista/a artista, o aprendiz/a aprendiz.

No caso da categoria numeral, existem substantivos que extrapolam a perspectiva


estruturalista de simples adição morfológica, ocorrências que colocam em risco os parâmetros de
“aplicabilidade”, “relevância sintática” e “estabilidade semântica” da flexão. “Alguns
substantivos com morfologia de plural não significam mais de uma unidade da referida espécie,
sendo plurais apenas na forma.”6 Diz Gonçalves (2019) referindo-se a substantivos denominados
pela expressão latina “pluralia tantum” 7 . São exemplos, palavras como “parabéns”, “ares” e
“óculos”. Além disso, a língua portuguesa possui ao lado dos substantivos contáveis e coletivos a
categoria dos não contáveis. Estes assumem o sentido de um todo “indivisível”, em que caso haja
a divisão ou pluralização, o processo implica em alteração semântica. A fim de exemplo, a adição
do morfe /-s/ a palavra “sangue” designa não a forma “diferente de um” do substantivo, mas sim a
sua qualificação em “tipos” diferentes.8

Em relação a categorização dos verbos, estes possuem suas noções morfológicas expressas no
tema – radical + vogal temática – e cumuladas em dois tipos de desinências; as desinências que
aglutinam noções de modo, tempo e aspecto (DMTA), e as que cumulam noções de número e
pessoa (DNP). É somente com a existência ordenada dessas categorias morfológicas na estrutura
do verbo que se constitui o processo de flexão. Entretanto, há no português verbos que não
participam dessa “fórmula morfológica” da qual as construções regulares fazem parte. “Os verbos
irregulares são aqueles que, ao serem conjugados, sofrem alterações em seu radical.” 9 Grande
parte dessas irregularidades podem ser explicadas pela atuação do mecanismo fonológico da

3
Idem. p. 109
4
Idem.
5
Idem.
6
Idem. p. (111-112)
7
Idem.
8
Idem. p. 113
9
Idem. p. 118
fusão 10 , que, a partir de diversos processos linguísticos 11 , rompe com a regularidade da
conjugação verbal. Vista a irregularidade da morfologia verbal, é necessário considerar o processo
derivacional de “lexicalização” pelo qual certas flexões verbais passam; seja ele formador de
adjetivo “Ela veio a festa com um vestido bem cheguei” , ou então modalizador discursivo
“Estarei aqui às nove, valeu?” Essas ocorrências inserem as categorias verbais no continuum
(mesmo que de forma mais conservadora com suas características flexionais) e contribuem para a
abordagem descritiva dos fenômenos derivacionais e flexionais da língua portuguesa.

BIBLIOGRAFIA:

GONÇALVES, Carlos Alexandre. Morfologia, p. 96. São Paulo, Parábola, 2019

10
Idem.
11
Idem.

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