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Processos de formação de palavras

- Quadro comparativo: quais são os processos de formação de palavras indicados por três gramáticas normativas:
Bechara (1999) Cunha & Cintra (2008) Rocha Lima (1992)
Composição “principais”, Definição: “Chama-se formação de palavras
“processos gerais o conjunto de processos morfossintáticos Derivação “dois grandes
Derivação típicos” que permitem a criação de unidades novas processos”
com base em morfemas lexicais. Utilizam-se Composição
Formação regressiva assim, para formar as palavras, os afixos de
Abreviação derivação ou os procedimentos de Hibridismo
Reduplicação “outros” composição.”.
Conversão Abreviação “outros
Combinação processos Derivação Onomatopeia tipos”
(cruzamento vocabular) Composição Sigla
Recomposição Hipocorísticos
Intensificação (alargamento de sufixos) Hibridismo Braquissemia
Hibridismo Onomatopeia
Abreviação vocabular
Siglas

Obs.: Segundo o autor, a derivação e a


composição não são os únicos processos
(mas são os “mais comuns”); há outros de
uso restrito: oniônimos, acrônimos e
amálgamas.

- “O conhecimento que o falante tem do léxico de sua língua facultar-lhe-á fazer uma série de generalizações a
respeito desse léxico. A gramática subjacente de um indivíduo registrará, por exemplo, relações paradigmáticas do
tipo:
pescar pescador
criar criador
paquerar paquerador
Com base nessa relação paradigmática, o falante poderá criar palavras novas (...).” (ROCHA, 1998)

- Segundo Rocha (1998), baseado em Basílio (1987), a formação de palavras teria três funções:
- função de mudança categorial (por exigência do sistema linguístico; precisamos empregar um item lexical de uma
classe em outra);
- função expressiva de avaliação (por influência do sujeito-falante; surgem em função da necessidade de o falante
expressar a sua subjetividade);
- função de rotulação (relacionada com o aspecto semântico; a necessidade que tem o homem de dar nome às coisas,
às ações, aos lugares).

- Basicamente, distinguem-se dois processos de formação lexical: a derivação e a composição.


- Quando um vocábulo é formado de um só radical, a que se anexam afixos (prefixos e sufixos), tem-se a derivação:
repor (= re- (pref.) + pôr) felizmente (= feliz + -mente (suf.))
- A composição ocorre quando dois ou mais radicais se combinam: amor-perfeito guarda-chuva
- Certos prefixos têm uso autônomo, como se fossem preposições; é o caso de contra- e entre-:
contrapor/José está contra os colegas.
entreabrir/Ficou entre a cruz e a espada.
- Esse fato levou muitos gramáticos do passado e algumas correntes da Linguística moderna, como a gramática
gerativa, a classificar a prefixação como um caso de composição. No entanto, argumentou-se que essa autonomia não
é característica de todos os prefixos: alguns, como des- e re-, só figuram como formas presas (atreladas a um radical):
desigual, rever.
- Entre os sufixos, alguns também tiveram uso autônomo: a forma latina mente, “espírito”, aparecia combinada com
adjetivos adequados à sua significação, constituindo um exemplo de processo de composição: boamente. A partir do
momento em que mente pôde juntar-se a outros adjetivos, como em rapidamente, recentemente, adquiriu o caráter de
sufixo, portanto, de forma presa. Os prefixos não contribuem para a mudança da classe gramatical do radical a que se
ligam: rever é verbo, como ver; desigual é adjetivo, como igual. Os sufixos, pelo contrário, podem contribuir para a
mudança da classe gramatical do radical: civilizar é verbo, ao passo que civil é adjetivo.

1. Derivação
1.1. Derivação Prefixal ou Prefixação: é um processo extremamente produtivo no português contemporâneo. Ao
unir-se a uma base, o prefixo exerce a função de acrescentar-lhe variados significados: “grandeza, exagero, oposição,
pequenez, repetição...”; desrespeitoso, injustiça, reescrever, compor, sobreloja, pré-escola.

1.2. Derivação Sufixal ou Sufixação: por meio da derivação sufixal, o sufixo, elemento de caráter não autônomo e
recorrente, atribui à palavra-base a que se associa uma ideia acessória e, com frequência, altera-lhe a classe gramatical:
desrespeitoso, grandioso, vital, bruscamente, responsável, boiada.

1.3. Derivação Parassintética ou Parassíntese: processo não consignado pela NGB, mas comum em português,
consiste na adjunção simultânea de um prefixo e de um sufixo a um radical, de forma que a exclusão de um ou de
outro resulta numa forma inaceitável na língua. Por exemplo, tomemos o verbo esclarecer; não existe o adjetivo
*esclaro, nem o verbo *clarecer.
Geralmente os prefixos têm um sentido dinâmico: embarcar (em-: movimento para dentro); desfolhar (des-: ato de
separar). Os derivados parassintéticos são, em sua maioria, verbos, apesar de encontrarmos substantivos/adjetivos
parassintéticos: subterrâneo; desalmado. O prefixo de um parassintético é assemântico (vazio de significação): o
sufixo in- de infelicidade expressa negação, enquanto no verbo amortizar, o prefixo a- nada significa. Outros
exemplos: repatriar, abotoar, desossar, amanhecer.

1.4. Derivação regressiva: ocorre quando, a partir de um vocábulo com sufixo real ou suposto, forma-se um novo
vocábulo através da eliminação do referido sufixo: de aceiro (em que -eiro faz parte integrante do radical) formou-se
aço (pela falsa suposição de que –eiro fosse sufixo, levando-se em conta vocábulos como ferreiro, jardineiro,
pedreiro etc.); sarampo (com relação a sarampão); rosmano (com relação a rosmaninho), em que as terminações das
segundas formas foram interpretadas como sufixos de grau.
O maior número de derivados regressivos é constituído de substantivos deverbais: paga, de pagar; luta, de lutar.
Mário Barreto, em De gramática e de linguagem, apresenta uma solução prática para o assunto: “Para que o
consulente tire a dúvida de se a palavra primitiva é o verbo ou, antes, o nome, saiba que, se o substantivo denota
acção, será palavra derivada, e o verbo palavra primitiva, mas se o nome denota algum objeto ou substância, se
verificará o contrário.” (p. 331)
Esse critério tem sido adotado pelas gramáticas recentes.
Os deverbais regressivos são extraídos da primeira ou da terceira pessoa do singular do presente do indicativo; daí,
serem nomes de tema em –o (quando procedem da primeira pessoa) ou de tema em –a ou –e (quando procedem da
terceira pessoa): erro, de errar; caça, de caçar; abate, de abater. Os deverbais de tema em –o adquirem no português
moderno, grande vitalidade: o agito, o chego, o sufoco, o amasso.
.
1.5. Derivação imprópria ou conversão: designa um tipo de formação lexical pelo qual uma unidade léxica sofre
alterações em sua distribuição sem que haja manifestação de mudanças formais; um vocábulo também pode ser
formado quando passa de uma classe gramatical a outra, aparentemente sem alterações formais. Como exemplos de
conversão, temos a passagem de:
a) substantivo próprio a comum: quixote, macadame, champanha;
b) substantivo comum a próprio: Figueira, Ribeiro, Fontes;
c) adjetivo a substantivo: circular, brilhante, ouvinte;
d) substantivo a adjetivo: burro, (guerra)-relâmpago;
e) substantivo/adjetivo/verbo a interjeição: Silêncio!, Bravo!, Viva!
f) verbo a substantivo: afazer, pesar, andar, quebra, vale, pêsame1;
g) verbo e advérbio a conjunção: quer...quer, seja...seja, ora...ora;
h) de adjetivo a advérbio: (falar) alto; (custar) caro;
i) de particípio (presente/passado) a preposição: mediante; salvo; exceto;
j) de particípio passado a substantivo e adjetivo: resoluto; vista; ferida;
k) de palavras invariáveis a substantivos: (o) sim; (o) não; (o) porquê.
Com a mudança de classe, muitos desses vocábulos alteram seus sentidos. Por essa razão, vários autores observam que
esse processo pertence à área da semântica, e não à da morfologia.

2. Composição: é um processo de formação lexical que consiste na criação de palavras novas pela combinação de
vocábulos já existentes: amor-próprio; ganha-pão. Enquanto nos casos de derivação temos um só radical (ao qual se
atrelam prefixos ou sufixos), na composição são necessários pelo menos dois radicais. Alguns gramáticos e linguistas
tendem a considerar a prefixação como um caso de composição. Na palavra composta, os elementos primitivos
perdem a significação própria em benefício de um único conceito, novo, global. Pode-se distinguir dois tipos de
composição, conforme a fusão mais ou menos íntima das palavras componentes: justaposição e aglutinação.
Ocorre a justaposição quando os termos associados conservam a sua individualidade: passatempo, sempre-viva.

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Segundo Houaiss, lexicalização do sintagma verbal pesa-me.
Tem-se aglutinação quando os vocábulos ligados se fundem num todo fonético, com um único acento, e o primeiro
perde alguns elementos fonéticos (acento tônico, vogais ou consoantes): boquiaberto, pernalta. Muitos exemplos de
composição por aglutinação não passam de vocábulos simples no estágio atual da língua: embora, fidalgo, agrícola.
3. Outros processos:
3.1. Abreviação: fenômeno semelhante ao da derivação regressiva, mas caracterizado por outros traços específicos.
Embora alguns incluam a abreviação na derivação regressiva, convém distinguir os dois processos. De um modo
geral, a derivação regressiva se dá também através da mudança de classe gramatical (verbos que passam a
substantivos); na abreviação, embora ocorra a redução do vocábulo, ele permanece na mesma classe gramatical:
extra (adj.) – extraordinário/extrafino (adj.); cine (subst.) - cinema (subst..); foto (subst..) – fotografia (subst.); moto -
motocicleta; pneu – pneumático.

3.2. Onomatopeias: assim se denominam os vocábulos criados com a preocupação de imitar o som ou a voz de coisas
ou de animais. Geralmente são monossílabos, frequentemente, com ou sem alternância vocálica: tique-taque; frufru;
zum-zum, miar, piar, teco-teco.
“Deve-se ressaltar, contudo, um certo traço convencional que caracteriza esse tipo de vocábulo, sobretudo quando uma
determinada onomatopeia é cotejada com as correspondentes em diferentes idiomas. Assim, o canto do galo, que nada
em português é expresso por cocoricó ou cocorocó, em inglês é cock-a-doodle-do e em alemão é kikeriki.” (KEHDI,
2007, p. 49)

3.3. Reduplicação (ou redobro): consiste na repetição da sílaba radical de um vocábulo. É utilizada na estruturação
das onomatopeias e, por apresentar conotação de carinho, figura nos nomes de parentesco na linguagem infantil e nos
hipocorísticos: papá (ou papai)/ mamã (ou mamãe)/ titio/ Lulu/ Zezé. A reduplicação apresenta forte valor expressivo,
integrando-se mais no campo da Estilística. É pouco produtiva no português contemporâneo: teco-teco, bla-bla-blá,
zum-zum-zum.

3.4. Hibridismo: é a designação dada aos vocábulos compostos ou derivados, cujos elementos provêm de línguas
diferentes. São comuns, em português, os compostos de elemento grego com elemento latino:
Grego e latim: automóvel
Latim e grego: sociologia
Contudo, outras combinações são possíveis:
Árabe e grego: alcaloide, alcoômetro Árabe e tupi: caferana
Francês e grego: burocracia Alemão e grego: zincografia
Latim e germânico: moscardo Tupi e grego: caiporismo
Africano e latim: bananal Tupi e português: goiabeira, capim-gordura
Como os elementos constitutivos das palavras formadas por hibridismo figuram em outros vocábulos e são, portanto,
recorrentes, podemos integrar esse processo na composição e na derivação.

3.5. Siglas: processo moderno e generalizado, em que longos títulos ficam reduzidos às letras iniciais das palavras que
os constituem:
IBGE = Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas
ONU = Organização das Nações Unidas
UERJ = Universidade do Estado do Rio de Janeiro;
VARIG = Viação Aérea Rio-Grandense
Pode-se ou não separar as iniciais das siglas por ponto: U. S. A./USA. Na leitura, as letras podem ser pronunciadas
isoladamente — USA (u-esse-a) — ou como um vocábulo, segundo as regras usuais de leitura da língua — ONU
(ônu). Como, atualmente, as instituições são menos conhecidas por suas denominações completas do que pelas siglas
correspondentes, estas passam a ser sentidas como palavras primitivas, das quais se formam derivados: petismo e
petista (de PT); CLT, celetista. Assinala-se, também, que as siglas constituem um caso específico de abreviação.

3.6. Truncação: constitui um tipo de abreviação em que uma parte da sequência lexical, geralmente a final, é
eliminada: euro (por europeu); su (por sucesso); portuga (por português); analfa (por analfabeto); balzaca (por
balzaquiana), niver (por aniversário).

3.7. Palavra-valise (ou cruzamento vocabular): por meio desse processo, em que também se manifesta um tipo de
redução, duas bases — ou apenas uma delas — são privadas de parte de seus elementos para constituírem um novo
item léxico: uma perde sua parte final e outra, sua parte inicial. Esse mecanismo tem recebido outras designações:
cruzamento vocabular, palavra portmanteau ou contaminação: brasiguaio, cantriz, showmício, portunhol, chafé,
namorido, gatosa, Nescau, Chocolícia, Grenal.

3.8. Recomposição: segundo J. Lemos Monteiro, é um processo associado à composição, praticamente omisso em
nossas gramáticas; ocorre quando apenas uma parte do composto passa a valer pelo todo e depois se liga a outra base,
produzindo uma nova composição: autódromo, telenovela, fotomontagem.
Fonte: ALVES, Ieda Maria. Neologismo: criação lexical. São Paulo: Ática, 2002. KEHDI, Valter. Formação de palavras em português. São
Paulo: Ática, 2007; MONTEIRO, J. L. Morfologia portuguesa. Campinas, SP: Pontes, 1991; ROCHA, L. C de Assis. Estruturas
morfológicas do português. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.

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