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Primeiras leituras
Coleção particular
O contato com a
produção artística
nos abre uma janela para o
passado e permite conhecer
um pouco pessoas que
viveram em diferentes CABANEL, A.
momentos. Os textos e as Ofélia. 1883.
Óleo sobre tela,
imagens desta seção foram 77 3 117,5 cm.
selecionados para que você ......................................................................
possa conversar com seus
colegas a respeito do que eles O poeta
revelam sobre o contexto Era uma noite — eu dormia Que divino pensamento,
em que foram produzidos. E nos meus sonhos revia Que vida num só momento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As ilusões que sonhei! Dentro do peito sentiu...
Quem eram seus autores?
E no meu lado senti... Não sei... dorme no passado
Como era o mundo em que Meu Deus! por que não morri? Meu pobre sonho doirado...
viviam? Tinham interesses e Por que do sono acordei? Esperança que mentiu!
preocupações semelhantes
No meu leito — adormecida, Sabem as noites do céu
aos nossos? Essas são
Palpitante e abatida, E as luas brancas sem véu
somente algumas das A amante de meu amor! As lágrimas que eu chorei!
questões que podem inspirar Os cabelos recendendo Contem do vale as florinhas
a conversa de vocês. Nas minhas faces correndo Esse amor das noites minhas!
Como o luar numa flor! Elas sim... eu não direi!
Ver, no Guia de recursos, algumas su-
gestões para o trabalho com os poemas Senti-lhe o colo cheiroso E se eu tremendo, senhora,
apresentados nesta seção. Arquejando sequioso; Viesse pálido agora
E nos lábios, que entr’abria Lembrar-vos o sonho meu,
Lânguida respiração, Com a fronte descorada
Um sonho do coração E com a voz sufocada
Que suspirando morria! Dizer-vos baixo — Sou eu!
Birmingham Museums and Art Gallery, Birmingham
Recendendo: exalando perfume. AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos.
Sequioso: desejoso. In: Obra completa. Organização de Alexei
Lânguida: sensual. Bueno. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000.
MILLAIS, J. Minha linda senhora. 1848. Enleio: arrebatamento, êxtase. p. 134-136.
Lápis e tinta. ......................................................................
52 Primeiras leituras
Era a virgem do mar! na escuma fria Se queres culto — como um crente adoro,
Pela maré das águas embalada! Se preito queres — eu te caio aos pés,
Era um anjo entre nuvens d’alvorada Se rires — rio, se chorares — choro,
Que em sonhos se banhava e se esquecia! E bebo o pranto que banhar-te a tez.
Era mais bela! o seio palpitando... Dá-me em teus lábios um sorrir fagueiro,
Negros olhos as pálpebras abrindo... E desses olhos um volver, um só,
Formas nuas no leito resvalando... E verás que meu estro, hoje rasteiro,
Cantando amores s’erguerá do pó!
Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti — as noites eu velei chorando, Vem reclinar-te, como a flor pendida,
Por ti — nos sonhos morrerei sorrindo! Sobre este peito cuja voz calei:
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Coleção particular
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo: insignificante.
Votei: dediquei.
Cândidos: inocentes, puros.
...................................................................... FRITH, W. Os amantes. s.d. Óleo sobre tela, 23 3 21 cm.
Primeiras leituras 53
Segunda geração:
idealização, paixão e morte
Objetivos
Coleção Particular
O que você deverá saber ao
final deste estudo.
1. Quais são as
características da
segunda geração
romântica.
• De que modo a temática
do amor e da morte
define o projeto literário
dessa geração.
2. Como o
Ultrarromantismo
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se manifesta na
literatura brasileira.
• De que forma a obra
de Casimiro de Abreu
traduz os princípios
ultrarromânticos em
versos singelos.
• Como Álvares de
Azevedo revela, em
sua obra, duas faces
da temática amorosa.
54 Capítulo 3
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Gustave Doré.
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> Essa cena pode ser descrita como dramática. Explique por quê.
lson/Corbis/
2. Nas obras românticas, a associação entre o belo e o feio sugere a apro-
ximação de forças opostas e complementares. De que modo o quadro
Nicho
de Gustave Doré representa essa concepção de beleza?
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> Uma outra temática, característica da segunda geração românti-
ch
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Mi
ca, é a oposição entre beleza e feiura associada à oposição entre o
bem e o mal. A imagem também promove esse segundo confronto?
Explique. Retrato de Gustave
Doré. c. 1860-1870.
3. O fato de Andrômeda ser retratada nua contribui para provocar a im-
pressão de fragilidade da mulher diante do monstro que está prestes O francês Gustave Doré
a atacá-la. Por quê? (1832-1883) foi pintor, escultor
e ilustrador. Ganhou renome,
> Embora a situação retratada seja dramática, a obra apresenta traços
na França romântica, por sua
sensuais. Explique como a sensualidade é sugerida por Doré. extraordinária habilidade
para capturar, em ilustrações
Da imagem para o texto carregadas de drama, as
principais características de
uma obra literária. Até hoje,
4. Leia este poema de Álvares de Azevedo e veja como a literatura ultrarro-
as ilustrações mais conheci-
mântica representa a mulher.
das de livros como A divina
comédia e Dom Quixote são
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de sua autoria.
Sonhando
Na praia deserta que a lua branqueia,
Que mimo! que rosa! que filha de Deus!
Tão pálida — ao vê-la meu ser devaneia,
Sufoco nos lábios os hálitos meus!
Não corras na areia,
Não corras assim!
Maria Alice Camargo
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Teu colo, essas faces, e a gélida mão...
Não durmas no mar!
Não durmas assim.
Estátua sem vida,
Tem pena de mim!
[...]
E a imagem da virgem nas águas do mar
Brilhava tão branca no límpido véu!
Nem mais transparente luzia o luar
No ambiente sem nuvens da noite do céu!
Nas águas do mar
Fotografia de Álvares
de Azevedo. s.d. Não durmas assim!
Não morras, donzela,
Espera por mim!
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos. In: Obra completa.
Organização de Alexei Bueno. Rio de Janeiro:
Aquentar: aquecer. Nova Aguilar, 2000. p. 123-124. (Fragmento).
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Caso os alunos discutam se a donzela a) Álvares de Azevedo explora a apresentação sucessiva de imagens,
está mesmo morta, retome o poema e criando um efeito quase cinematográfico no texto. Quais as diferentes
mostre que, a partir da quarta estrofe, a
donzela não tem mais qualquer reação
imagens associadas à donzela?
(“Mas nem os seus olhos o sono fechou b) Qual é o cenário apresentado no texto?
/ E nem o seu colo de neve tremia.”). O
eu lírico, porém, reluta em aceitar o fato 5. As estrofes podem ser divididas em duas partes: uma narrativa e outra
de que ela já morreu.
em que o eu lírico estabelece uma interlocução com a donzela. Como
essas duas partes contribuem para a construção do poema?
6. Observe os vocativos utilizados pelo eu lírico em seus apelos à donzela.
“Ó pálida fria, “Estátua sem vida,
Tem pena de mim!” Tem pena de mim!”
56 Capítulo 3
1839 1818-1819
coração do que para os grandes temas que definiram a poesia da primeira
geração (a divulgação dos símbolos da identidade nacional e a criação de um Byron escreve Don Juan.
conceito de pátria).
Por esse motivo, incorporam a imagem de um herói romântico que defende
Chopin publica
valores incorruptíveis como a honestidade, o amor e o direito à liberdade. Em os Prelúdios, que
nome desses valores estão dispostos a sacrificar a própria vida. exemplificam a tendência
ultrarromântica na
música.
Tome A postura exagerada, associada ao arrebatamento sentimental,
1840
nota característica dos autores da segunda geração romântica, fez com D. Pedro II assume o trono,
aos 14 anos.
que ficassem conhecidos como ultrarromânticos.
coleção particular,
rio de janeiro
O projeto literário dos
ultrarromânticos Doré, G. Paolo e Francesca de Rimini.
RUGENDAS, J. Retrato
s.d. Óleo sobre tela, 280 3 195 cm.
A idealização absoluta e o interesse por de D. Pedro II. 1846. Óleo
Coleção Particular
Inauguração da linha de
tação do artista à sociedade em que vive. A vapores do Rio de Janeiro
solidão, o culto a uma natureza mórbida para a Europa.
e soturna e, acima de tudo, a idealização
da mulher virginal e etérea são as formas
1855
Publicação de Noite na
poéticas encontradas para traduzir em taverna, de Álvares de
imagens os sentimentos arrebatados que Azevedo.
vivenciam.
a O poema “O corvo”, considerado uma obra-prima de Edgar Allan Poe, opõe o busto de Palas Atena, símbolo da sabedoria, à ave símbolo
do mau agouro. Por meio dessa oposição, ele recria o embate entre o lado racional e o irracional dos seres humanos. Em torno desse poema
criou-se uma espécie de reverência literária sempre associada ao macabro, ao sombrio, ao mórbido.
Segunda geração: idealização, paixão e morte 57
Os agentes do discurso
No Brasil do Segundo Império, os poetas eram em sua maioria jovens estu-
dantes que, longe da casa paterna, viviam em repúblicas. Muitos deles rumavam
para São Paulo, onde iam cursar a faculdade de Direito no Largo de São Francisco.
Havia muito pouco o que fazer na cidade, como conta Álvares de Azevedo em
carta para sua mãe.
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Nunca vi lugar tão insípido, como hoje está S. Paulo. Nunca vi coisa mais
tediosa e mais inspiradora de spleen. [...]
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Não há passeios que entretenham, nem bailes, nem sociedades, parece
isto uma cidade de mortos e o silêncio das ruas só é quebrado pelo ruído
das bestas sapateando no ladrilho das ruas.
Esse silêncio convida mais ao sono que ao estudo, enlanguesce, e entor-
pece a imaginação e pode-se dizer que a vida aqui é um sono perpétuo.
Spleen: tédio. AZEVEDO, Álvares de. Correspondência. In: Obra completa. Organização
de Alexei Bueno. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000. p. 811. (Fragmento).
Enlanguesce: entristece.
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Locus horrendus:
Coleção Particular
a natureza tempestuosa
O cenário preferido pelos poetas ultrarromânticos é tem-
pestuoso, soturno. As forças incontroláveis da natureza — raios,
chuva, ventos — simbolizam, de certo modo, os sentimentos
violentos que precisam ganhar expressão literária. Essa natureza
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A sedução da morte
Aivazovsky, I. O naufrágio. 1871.
Óleo sobre tela, 110 3 129,5 cm.
Tempestades são um dos temas
A ideia de morrer, para o ultrarromântico, tem sentido positivo, porque garante preferidos dos pintores românticos.
o término da agonia de viver. É no contexto das desilusões e da maneira pessimista
de encarar a própria existência que a morte surge como solução.
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Morte
(Hora de delírio) Maria Alice Camargo
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
[...]
Sem uma alma
Meu espírito dorme em algum lugar frio
até que você o encontre
e o leve de volta pra casa
(acorde-me)
Acorde-me por dentro
(Eu não consigo acordar)
Acorde-me por dentro
(salve-me)
Me chame e me salve da escuridão
(acorde-me)
Obrigue meu sangue a fluir
(eu não consigo acordar)
antes que eu me desfaça
(salve-me)
salve-me do nada em que eu me tornei
[...]
60 Capítulo 3
Pálida imagem
Lembrança de morrer
Neste poema, Álvares de Azevedo trata das questões que
moveram a segunda geração: a morte, o amor e o sonho.
Quando em meu peito rebentar-se a fibra, Só tu à mocidade sonhadora
Que o espírito enlaça à dor vivente, Do pálido poeta deste flores...
Não derramem por mim nem uma lágrima Se viveu, foi por ti! e de esperança
Em pálpebra demente. De na vida gozar de teus amores.
E nem desfolhem na matéria impura Beijarei a verdade santa e nua,
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Que se desfaz ao dobre de um sineiro; — Foi poeta — sonhou — e amou na vida. —
Como o desterro de minh’alma errante, Sombras do vale, noites da montanha,
Onde fogo insensato a consumia: Que minha alma cantou e amava tanto,
Só levo uma saudade — é desses tempos Protegei o meu corpo abandonado,
Que amorosa ilusão embelecia. [...] E no silêncio derramai-lhe canto! Preludia: anunciava,
prenunciava.
Se uma lágrima as pálpebras me inunda, Mas quando preludia ave d’aurora Lousa: lápide de uma
Se um suspiro nos seios treme ainda, E quando à meia-noite o céu repousa, sepultura.
É pela virgem que sonhei... que nunca Arvoredos do bosque, abri os ramos...
Aos lábios me encostou a face linda! Deixai a lua prantear-me a lousa!
AZEVEDO, Álvares de. In: BANDEIRA, Manuel (Org.). Antologia dos poetas brasileiros:
fase romântica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. p. 175-177.
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1. No poema transcrito, o eu lírico fala de sua morte. tema da poesia da segunda geração: o amor.
Que imagem ele utiliza para se referir à vida e a seu Explique, a partir de elementos do texto, qual é
fim na primeira estrofe? a visão de amor presente no poema.
> Que expressão dessa estrofe sugere que o eu 4. No poema, o eu lírico faz referência à mulher amada.
lírico considera a vida um lugar de sofrimento? Ela tem existência real ou não? Justifique.
Explique por quê. > Qual é a imagem de mulher presente no poema?
2. Nas duas primeiras estrofes, o eu lírico se dirige àque- 5. Nas últimas estrofes, o eu lírico pede para ser enter-
les que o conhecem e faz um pedido. O que ele pede? rado com um epitáfio que pode ser entendido como
a) A justificativa para esse pedido aparece na ter- um lema ultrarromântico. Explique por quê.
ceira estrofe, em que o eu lírico compara a morte
> Nessas estrofes, o eu lírico estabelece uma relação
a duas situações. Quais são elas?
de proximidade e integração entre si mesmo e a
b) Considerando essas comparações, explique de natureza. Qual é ela?
que maneira o eu lírico vê a morte.
6. Compare as informações apresentadas na linha do
c) Essa visão da morte indica a filiação desse poema
tempo deste capítulo com as da linha do tempo do
à segunda geração romântica. Explique por quê.
Capítulo 2 e discuta as questões a seguir com seus colegas.
3. Releia. a) Qual é a diferença entre os acontecimentos apre-
“Só levo uma saudade — é desses tempos sentados nas duas linhas do tempo?
Que amorosa ilusão embelecia.”
b) De que maneira essa diferença determina, na se-
a) A que se refere o eu lírico nesses versos? gunda geração romântica, a produção de obras li-
b) Esses versos indicam a presença de outro grande terárias mais voltadas para questões individuais?
62 Capítulo 3
Leveza e suavidade
O olhar ingênuo para as questões de amor destaca-se em sua poesia e lhe dá identi-
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dade. Suas figuras femininas, por exemplo, não vêm associadas a imagens de morte.
Seus poemas falam de aspectos comuns da vida: a moça que vende as flores
colhidas no jardim é comparada aos pássaros que brincam entre as rosas. Alguns
críticos identificam, nessa evocação sentimental de pequenos objetos e cenas,
uma valorização dos elementos prosaicos e um uso da linguagem coloquial que só
reaparecerá, muito tempo depois, nos versos modernistas de Manuel Bandeira.
A idealização da pátria
Ao lado do olhar mais positivo para a vida, Casimiro também idealizou a
pátria, cantando o tema das saudades dos exilados inaugurado por Gonçalves
Dias. Um dos seus poemas mais conhecidos é um canto de louvor ao Brasil.
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Arthur Rackham
Estate/Bridgeman Art
Library – Stapleton
Collection/Corbis/
LatinStock
Minha terra
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá.
G. Dias
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Todos cantam sua terra, — É uma terra de amores
Também vou cantar a minha, Alcatifada de flores
Nas débeis cordas da lira Onde a brisa em seus rumores
Hei de fazê-la rainha; Murmura: — não tem rival!
— Hei de dar-lhe a realeza Lisboa – 1856.
Nesse trono de beleza
ABREU, Casimiro de. As primaveras.
rackham, a. Representação Em que a mão da natureza Organização e prefácio de Vagner Camilo.
de Ariel e Calibá. c. 1900. Esmerou-se enquanto tinha. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 19-23.
(Fragmento).
Ariel e Calibã [...]
Ariel e Calibã são persona- Tem tantas belezas, tantas, Débeis: fracas, sem força.
gens da última peça escrita A minha terra natal, Esmerou-se: caprichou, realizou algo com
por Shakespeare, A Tempesta- Que nem as sonha um poeta cuidado e perfeição.
de. Espíritos que servem a um E nem as canta um mortal! Alcatifada: atapetada.
mesmo senhor, apresentam ......................................................................
comportamentos opostos.
Ariel é cordato e, ainda que às A pátria é a “rainha” a ser louvada. As joias da sua coroa são os elementos da
vezes conteste as ordens re- natureza sem igual com que foi agraciada por Deus.
cebidas, é obediente. Calibã
Ver, no Guia de recursos, uma atividade suplementar a respeito de Casimiro de Abreu.
é violento, tempestuoso mas,
embora eventualmente obe-
deça, não o faz sem protestar. Álvares de Azevedo:
ironia, amor e morte
Álvares de Azevedo se refere
ao contraste entre essas duas
naturezas no prefácio da
Lira dos vinte anos: “A razão
é simples. É que a unidade Em todos os textos que escreveu, Álvares de Azevedo sempre explorou o
deste livro funda-se numa tema dos desesperos passionais, tratados a partir de duas perspectivas: a séria e
binomia: — duas almas que a irônica. É o próprio autor quem define, no prefácio à segunda parte da Lira dos
moram nas cavernas de um vinte anos, as duas linhas da sua produção literária: “Nos mesmos lábios onde
cérebro pouco mais ou me- suspirava a monodia amorosa, vem a sátira que morde”. Monodia é a denomi-
nos de poeta escreveram este nação que se dá a um canto em uníssono. O sentido do termo é importante no
livro, verdadeira medalha de contexto, porque revela que o poeta percebia sua lírica amorosa como textos
duas faces”. Ele reconhece, que expressavam uma mesma visão idealizada do amor.
assim, sua capacidade de
Apresentando-se como Ariel e Calibã, anjo e demônio, Álvares de Azevedo
apaixonar-se perdidamente,
mas também de rir do pró-
prepara o leitor para poemas que exploram as angústias amorosas ou as ridicu-
prio arrebatamento. larizam. Desse conflito, nasce sua identidade literária, que o torna único entre
os ultrarromânticos, e que será definida pelo modo contrastante de tratar os
64 Capítulo 3
Namoro a cavalo
[…]
Mas eis que no passar pelo sobrado,
Ontem tinha chovido... Que desgraça! Onde habita nas lojas minha bela,
Eu ia a trote inglês ardendo em chama, Por ver-me tão lodoso ela irritada
Mas lá vai senão quando uma carroça Bateu-me sobre as ventas a janela...
Minhas roupas tafuis encheu de lama...
O cavalo ignorante de namoros
Eu não desanimei. Se Dom Quixote Entre dentes tomou a bofetada,
No Rocinante erguendo a larga espada Arrepia-se, pula, e dá-me um tombo
Nunca voltou de medo, eu, mais valente, Com pernas para o ar, sobre a calçada...
Fui mesmo sujo ver a namorada...
[...]
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos In: Obra completa.
Organização de Alexei Bueno. Rio de Janeiro:
Chris Hellier/Corbis/LatinStock–
Coleção Particular
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Podemos ver, na veia sarcástica e irônica de poemas como esse, um
aviso de que o poeta das virgens lânguidas é capaz de tratar de assuntos
mais mundanos e explícitos.
Noite na taverna:
histórias de amor e morte
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— Silêncio, moços! acabai com essas cantilenas horríveis! Não vedes
Doré, G. Dom Quixote e Sancho
que as mulheres dormem ébrias, macilentas como defuntos? Não sentis que
Pança. 1863. Gravura. Dom Quixote,
o intrépido cavaleiro que brandia sua o sono da embriaguez pesa negro naquelas pálpebras onde a beleza sigilou
espada contra terríveis monstros que os olhares da volúpia?
não passavam de moinhos de vento, é
mencionado neste poema por Álvares AZEVEDO, Álvares de. Noite na taverna. In: Obra completa.
de Azevedo para compor a triste Organização de Alexei Bueno. Rio de Janeiro:
figura do apaixonado que não mede Sigilou: selou. Nova Aguilar, 2000. p. 565. (Fragmento).
esforços para encontrar sua amada.
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66 Capítulo 3
Reprodução/AE
uma poesia de transição
Luís Nicolau Fagundes Varela (1841-1875) costuma ser associado aos autores da
segunda geração. Embora tenha aparecido tardiamente no mundo literário de São
Paulo, escreveu textos ultrarromânticos. O conjunto da sua obra, porém, traz alguns
poemas em que aparecem os primeiros sinais da preocupação com temas sociais.
Essa característica antecipa o traço fundamental que definirá os autores da terceira
geração romântica brasileira. Por esse motivo, é visto como um autor de transição.
Juiz de Direito, Fagundes Varela teve sua vida marcada por uma tragédia pessoal:
seu primeiro filho morreu com apenas três meses de vida. A dor provocada por essa
perda levou-o à vida boêmia e ao alcoolismo. Em homenagem ao filho, compôs um
de seus poemas mais conhecidos: “Cântico do calvário”. Leia a primeira estrofe.
...................................................................... Fagundes Varela. c. 1871.
Autor desconhecido.
Cântico do calvário
À memória de meu filho morto a l l de dezembro de 1863.
Eras na vida a pomba predileta
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Texto 1
Noite na taverna
Bertram, uma das personagens sentadas na taverna sombria em que
se ambienta a novela ultrarromântica de Álvares de Azevedo, conta a “perdição”
a que foi levado pelo amor de uma mulher.
Um outro conviva se levantou. [...] os lábios no ardor dos vinhos e na moleza de seus
Esvaziou o copo cheio de vinho, e com a barba nas beijos, quem me fez devassar pálido as longas
mãos alvas, com os olhos de verde-mar fixos, falou: noites de insônia nas mesas de jogo, e na doidice
— Sabeis, uma mulher levou-me à perdição. Foi ela dos abraços convulsos com que ela me apertava o
quem me queimou a fronte nas orgias, e desbotou-me seio! [...]
1. O que o narrador descreve como a “perdição” a que foi levado por uma
mulher?
2. Bertram atribui sua degradação moral a essa mulher. Quais expressões
se referem a ela e aos sentimentos do narrador?
> Que imagem de mulher é sugerida por essas expressões?
3. A construção dessa imagem de mulher contribui para ilustrar a visão
que os poetas da segunda geração têm do amor sexualizado. Qual é
essa visão?
Ilustração de Di Cavalcanti
> De que maneira o relato de Bertram deixa implícita a visão de amor
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
para a obra Noite na
taverna, edição de 1941. que será defendida pelos poetas ultrarromânticos?
Texto 2
68 Capítulo 3
Jogo de ideias
Byron: a morte
como libertação
No Ultrarromantismo, a morte exercerá um grande fascínio entre os poetas.
Byron será o primeiro a cantar a morte como o caminho que livra o indivíduo
da existência sem sentido, marcada pelo sofrimento. Em seus poemas, a morte é
apresentada como um anseio do sujeito. No trecho abaixo, o eu lírico afirma que
nascemos “para a dor”. A morte, portanto, é o momento do alívio.
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Eutanásia
Quando o Tempo trouxer, ou cedo ou tarde,
Esse sono sem sonhos para me embalar,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Sobre o meu leito de agonia possa, Olvido!
Tua asa langue levemente tremular.
[...]
70 Capítulo 3
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A esperança
[...]
Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Uma prece
No poema do modernista Manuel Bandeira, o pedido para a chegada do fim
derradeiro vem em forma de prece. Para uma vida sem alegrias, o eu lírico roga
que lhe seja dado o que sempre buscou: uma boa morte.
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Para navegar
Devido à natureza dinâmica da internet, com milhares de sites sendo criados ou desativados dia-
riamente, é possível que alguns não estejam mais disponíveis. Alertar seus alunos sobre isso.
http://www.ibiblio.org/wm
O Webmuseum está no ar desde 1994 e oferece acesso a obras de arte por períodos históricos e estilos,
separando-os por país de origem. Há boas imagens de William Blake (1757-1827), artista notável do Romantismo
inglês, que registrava em seus quadros e poemas o místico e a emoção. O site também apresenta obras de
Caspar David Friedrich (1774-1840), romântico alemão. Em inglês.
http://www.musopen.com/music.php
Site em inglês com grande acervo de músicas organizadas por compositor, intérprete, instrumento, período
e formas musicais. Há composições de Beethoven que exemplificam o gosto ultrarromântico por sentimentos
melancólicos, como a Sonata patética (Sonata no 8 in C Minor “Pathétique”, Op. 13) e a Sonata ao luar (Sonata
no 14 in C Sharp Minor “Moonlight”, Op. 27). Também a Polonaise (Polonaise in A Flat Major, Op. 53), de Chopin,
ilustra bem o arrebatamento da segunda geração romântica. Além disso, Scenes from a Childhood (Scenes from
a Childhood, Op. 15), de Robert Schumann, compostas como resgastes de momentos da infância, permitem
uma interessante relação com o saudosismo de Casimiro de Abreu.
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O site Domínio Público disponibiliza, para aqueles que o consultam, uma biblioteca virtual que permite o
acesso à obra de Álvares de Azevedo, o principal autor da segunda geração romântica brasileira. Lá estão Lira
dos vinte anos, Macário, Noite na Taverna, Poemas malditos e Poemas irônicos, venenosos e sarcásticos.
reprodução
São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
Essa seleção de contos do século XIX, realizada pelo escritor Italo Calvino, reúne os
mais importantes nomes da narrativa curta em tempos românticos. Nessa obra, estão
os narradores e personagens que povoaram o imaginário literário de mistério, som-
bras, paixões avassaladoras, reações intempestivas, ciúmes, vinganças e toda a sorte
de pesadelos e desencantos amorosos. Hoffmann, Edgar Allan Poe, Christian Andersen,
Stevenson, Henry James, Walter Scott estão entre os nomes indicados por Calvino e que
tanto influenciaram a segunda geração romântica brasileira.
72 Capítulo 3
Para assistir
Crepúsculo, de Catherine Hardwicke.
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EUA, 2008.
Nessa versão moderna de uma história de amor impossível, vemos a idealização amorosa
personificada no sentimento que une um casal adolescente. Edward Cullen, um rapaz bas-
tante reservado, foi transformado em vampiro quando tinha 17 anos de idade. Misterioso
e distante, esconde o seu segredo de todos os que frequentam o colégio em que estuda.
Mas, quando a jovem Bella chega à escola, ele imediatamente se apaixona por ela e eles
acabam se aproximando. A garota corresponde e, indo contra todos os receios dele, não se
afasta quando descobre que seu amado é um vampiro. Ele, por outro lado, sabe que esse
relacionamento pode colocar a vida de Bella e de todos que ama em grave risco.
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Nesse filme, uma comovente história de amor revela a relação tão cara aos ul-
trarromânticos entre esse sentimento e a morte. Landon é um rapaz popular e
rebelde que, depois de uma brincadeira de mau gosto que termina com um sério
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
acidente com um jovem do colégio, é punido pela direção da escola. Seu castigo será
participar de uma peça teatral. Nos ensaios, ele conhece Jamie, uma garota estudio-
sa e tímida que jamais imaginou ter qualquer contato com Landon. A convivência
entre eles faz despertar um sentimento poderoso que transforma o rapaz. Mas Ja-
mie faz de tudo para não se render a esse amor. Landon não consegue compreendê-
-la até que descobre que sua amada está com uma doença fatal. Então, ele fará de tudo
para que esse amor “seja eterno enquanto durar”.
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EUA, 2001. O filme apresenta cenas de sexo.
Nesse filme, vemos a força transformadora do amor e a impossibilidade desse sentimento
durar para sempre em razão de uma fatalidade. O atarefado executivo Nelson Moss vê sua
vida se transformar radicalmente quando, ao renovar sua licença de motorista, conhece
Sara Deever. A moça, disposta a viver cada momento de sua vida intensamente, não se
conforma com o fato de Nelson só pensar em trabalho. Convence-o, então, a passar o mês
de novembro com ela, sem qualquer compromisso sério, para que ele perceba como a
vida tem muito mais a oferecer. O executivo, então, passa a ter seus dias preenchidos por
romantismo e se apaixona perdidamente por Sara. Mas esse amor não pode durar para
sempre, porque a sua amada tem uma doença terminal e, por isso, resolveu viver cada
momento como se fosse o último.
Para ouvir