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SENSO INCOMUM

Papai Noel: não


esquece de falar com
Fux para pautar o juiz
das garantias
23 de dezembro de 2021, 8h00
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Por Lenio Luiz Streck

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Subtema: meus pedidos e perguntas ao


Pai Natal!

Ao
trabalho.
A cada
ano faço
meus
pedidos
para o
Papai
Noel.
Cada ano
a lista
fica
menor, talvez porque Papai Noel não lê
lista com mais de cinco pedidos. Antes
os livros; hoje, os resuminhos e os
emojis: eis a sina.

Por que a comunicação ficou assim,


Papai Noel?

Como diz meu professor Ernildo Stein,


parece que a linguagem toda foi
digitalizada. E o conhecimento virou
informação. Ela vem e passa. Não
"mora". Não "fica". Tudo é passagem,
como em um aeroporto — onde
ninguém mora, digo eu.

Platão foi o primeiro a denunciar fake


news. As sombras são sombras. Só que
hoje vivemos no mundo das sombras.
Ele detestava néscios. Mataram
Sócrates. Hoje, não seria necessário: já
teriam matado os pré-socráticos.
Afogariam Heráclito no rio, coitado. E
fariam piada de sua dialética.

Redes sociais são como rodoviárias.


Tudo é passageiro (desculpem pelo
trocadilho). Grupos de Whatsapp se
tornaram neocavernas. Comunicação
precária. E os emojis substituem a
linguagem — quem leu J. Swift e sua
ironia com os cientistas de Lagado sabe
do que estou falando (mas afinal, quem
leria um livro tão grande?).

Vivemos na era do atalho. Do viés de


confirmação. Do jogo de xadrez com
pombo. Do solipsismo. Do
empreendedor de si mesmo. Do Homo
Uber. Que mundo é esse?

1. Papai Noel: por que o repórter de


TV tem de entrar na água para
mostrar... a água?
Hoje em dia tudo é estandardizado.
Simplinho. Curtinho. Monossilábico.
Emojizado. Como dizia o filósofo
Tonto, em resposta ao mestre Zorro,
"são muitos". A malta já não lê textos
de mais de cinco linhas. Chegaremos
ao "puro emojismo". As redes serão
recheadas de quase-hieroglifos. Tudo
digitalizado. Perdemos o sentido
pragmático, isto é, a relação dos signos
com seus usuários.

O cientista de Lagado (do livro "As


Viagens de Gulliver") ganhou o Nobel
de 1728, com sua tese "substituamos as
frases por monossílabos ou
onomatopeias". Vamos chegar lá:
grunhiremos. Argh (é uma
onomatopeia). Nota: é sarcasmo. Não
existia Nobel em 1728.

A linguagem da TV — baseada na
isomorfia (o repórter, para mostrar a
enchente, tem de estar com água pela
cintura; falar de trigo? Repórter... no
meio do trigal; já notaram quão idiota é
o modelo de reportagem televisiva?) —
chegou no Direito. Sentenças e petições
começam a ser desenhadas.
Figurinizadas. E festejadas. Com
emojis. Nas redes. Ah, essas redes...
Em vez de prisão, a figura da prisão. É
o iso-antismo.

O Direito imitando a "metodologia" do


jornalismo. Para noticiar a crise dos
combustíveis, a reportagem sempre —
sempre — começa com o indutivo: um
frentista ou um taxista. E blá, blá. E
termina com um economista. Falando o
que o repórter acabou de dizer. Para
falar do aumento das mensalidades
escolares, repórter entra na casa de uma
família e mostra um carnê. Uma pessoa
representa todos? Trata-se de uma
pateto-epistemologia. Já imagino a
reportagem do primeiro bebê de 2022:
a repórter vestida de enfermeira, entra
na enfermaria e... adivinhem.

No direito não existe a disciplina


"epistemologia". Também não deve
existir disciplina de epistemologia nas
faculdades de jornalismo e
comunicação. A propósito: Como
alguém explicaria "epistemologia" por
emoji? Ou por visual law? A palavra
água é molhada?

2. Meus pedidos ao Papai Noel


O que eu quero, mesmo, Pai Natal?
Nada de especial. Apenas...

- quero que o juiz de garantias seja


pautado no STF.

- quero fundamentações fundadas nos


artigos 93, IX da CF, 926, 489 do CPC
e 315 do CPP.

- quero que a advocacia não seja um


exercício de humilhação e uma corrida
de obstáculos.

- que as garantias não sejam odiadas


por jornalistas, jornaleiros e, vejam só,
por professores de direito.

- quero que as sentenças e acórdãos não


sejam per relationem — essa praga que
veio para ficar (ah: e se advogado usar
perrelationem...valerá?).

- quero os livros de volta. Fora com


resumos, facilitadinhos e quejandos.

- quero falar com pessoas e não com


robôs. E não quero que os recursos
sejam fulminados por robôs.

- quero que quem venda telefones


atenda... telefone.

- quero que o direito do consumidor


funcione e que não tenhamos que ver
de novo decisões como a da juíza de
Brasília no caso da Aviação
Itapemirim.

É pedir muito, Pai Natal?

Papai Noel, não quero informação —


que qualquer imbecil tem a um clique;
eu quero conhecimento; e, como sou
esforçado, quero obter o saber; e, como
me comporto, Pai Natal, quero
sabedoria. E, para isso, tenho de ler.
Refletir. Matar dois leões (desculpem-
me os defensores dos animais, é força
de expressão da historicidade da
linguagem e do contexto — ainda não
mataram Wittgenstein, pois não?!!!)
por dia e... o mais difícil, desviar das
antas (também não quero fazer mal às
antas). É que, Papai Noel, não quero ser
cancelado. Um orientando já brincou
que minha estátua já nasceria
derrubada.

3. Minha pequena oração


Rezo, então, a pequena oração que fui
forçado a aprender na minha dura
infância: "Ich bin Klein, mein Herz ist
rein, Darf niemand drin wohnen als
Jesus allein" ("sou pequeno, meu
coração é puro, nele não deve morar
ninguém, a não ser Jesus"). Sempre me
emociono quando falo disso. No berço
de uma família lutero-evangélica,
rezava muito para que Papai Noel me
trouxesse brinquedos. Sim. Uma bola e
uma camiseta de goleiro. Pobre, achava
que, rezando, Papai Noel viria. Enfim,
deixa prá lá.

Feliz Natal para toda a equipe do


ConJur, que me aguenta todas as
semanas.

E Feliz Natal para todos os meus


leitores! Até para os que, mesmo sendo
da área jurídica, odeiam o direito! Natal
é esperança...!

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Lenio Luiz Streck é jurista, professor de


Direito Constitucional e pós-doutor em
Direito. Sócio do escritório Streck e
Trindade Advogados Associados:
www.streckadvogados.com.br.

Revista Consultor Jurídico, 23 de


dezembro de 2021, 8h00

COMENTÁRIOS DE
LEITORES
9 comentários

QUE PAPAI NOEL QUE NADA, MELHOR É PEDIR


À GLOBO
Joao Sergio Leal Pereira (Procurador da
República de 2ª. Instância)
23 de dezembro de 2021, 17h22

Caríssimo professor Lenio:


Se me permite a jocosidade, melhor
pedir à Globo para que o ministro Fux
paute o juiz das garantias. Não dá para
acreditar em Papai Noel, se é que me
entende. Feliz Natal!!!

Responder

O QUE É UM LIVRO NÃO LIDO?


André Pinheiro (Engenheiro)
23 de dezembro de 2021, 16h59

O que é uma Constituição não seguida?


O que é uma petição não lida? O que é
uma das partes não lida em um
processo? O que é um processo não
lido? Lassale diria uma folha de papel.
Mas atrás de cada processo há uma
vida, muitas vidas, muitas histórias,
muito sofrimento, algumas mentiras e
algumas verdades, algumas
perspectivas.
Algumas brechas da lei diria o
professor Moriarty.
Quando o processo se confunde com
um advogado uma vida se esvai.
Na era da Pantomima jurídica, vale a
melhor dramaturgia, leve as lágrimas
da vítima, filmada de frente, com
edição de imagem, com camisa surrada
e esclareça que o seu mundo acabou,
peça a pena máxima mas se diga
defensor dos direitos humanos. Leve
em seguida, o réu, demonstre
amadurecimento, se diga cidadão de
bem, diga que foi tirado de contexto e
peça desculpas para quem se sentiu
ofendido.
Enfim os fatos em si pouco importam,
o que vale é a receita de bolo, afinal,
contra argumento não há fatos!
P.S "E nesse exército, no exército de
um homem só, todos sabem que tanto
faz, ser culpado ou ser capaz, tanto
faz" (H.Gessinguer)

Responder

FALANDO EM FUX...
Proofreader (Outros)
23 de dezembro de 2021, 12h37

Por falar em Fux, conviria um artigo


sobre a suspensão de liminar no caso
Kiss.

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