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3.

OS PROCESSOS DE INSTITUCIONALIZAÇÃO DA SOCIOLOGIA


NO ENSINO MÉDIO (1996 - 2016)

SUELI GUADELUPE DE LIMA MENDONÇA

INTRODUÇÃO

Há dez anos, em 2006, a histórica Resolução n. 04 do Conselho Nacio-


nal de Educação estabeleceu a obrigatoriedade da Sociologia e Filosofia no
currículo do Ensino Médio, a partir de um parecer técnico enviado pelo
Ministério da Educação (MEC). Hoje, 2016, a Medida Provisória n. 746,
proposta pelo MEC, acaba com a obrigatoriedade da Sociologia nessa etapa
da escolarização, mas não só ela, aliás a perversidade da atual reforma do
Ensino Médio proposta por essa medida extrapola qualquer viés ideoló-
gico ao conferir obrigatoriedade somente às disciplinas de Português e
1
Matemática e ao/ estudo de Inglês. Mais uma vez, aqueles que defendem a
presença da Sociologia no Ensino Médio terão de retomar estratégias de
ação e de luta para evitar mais um retrocesso na educação brasileira e na
história da disciplina no currículo.
O.período de 1996 a 2016 permanece como palco de tensões permanentes
que corroboram a tese de intermitência da Sociologia no currículo do Ensino
~ o , marcado por importantes conquistas e atualmente com derrota, ainda
não definitiva. da perda de sua obrigatoriedade. Desde os primórdios de sua
mdusão na Educação Básica ao final do século XIX, a Sociologia encontra difi-
rnldade em permanecer no currículo, como demonstra a história da disciplina
rm educação básica caracterizada pela presença e ausência no Ensino Médio.

Qual o incômodo traz a Sociologia que a faz ser alvo permanente nas refor-
mas educacionais? Essa questão ainda precisa ser melhor investigada, pois
essa intermitência implica em consequências graves para sua instituciona-
lização como disciplina obrigatória no currículo.
Pensar a Sociologia no Ensino Médio, hoje, é constatar os avanços conquista- republicano de cunho positivista, a disciplina Sociologia no currículo na
dos nesses últimos dez anos frente a sua presença como disciplina obrigatória Educação Básica só foi implementada em 1925, no tradicional Colégio Pe-
nesse nível de ensino, já que, de início, padecia de uma base real de conteúdos dro II, no Rio de Janeiro, por proposta do sociólogo Fernando de Azevedo.
e metodologias na sala de aula, devido a sua trajetória tumultuada ao longo
Segundo Carvalho (2004), a ampliação da presença da Sociologia aconte-
da história republicana, com entradas e saídas nunca bem compreendidas
pela escola e seus sujeitos (professores e estudantes), e muito menos bem ex-
ceucom a Reforma Rocha Vaz, em 1928, que tornou a disciplina obrigató-
ria no currículo das Escolas Normais, e depois no Ensino Secundário, em
plicadas pelas políticas educacionais. Vale lembrar que a existência de poucas
nJvelnacional, por iniciativa do ministro da Educação Francisco Campos,
aulas destinadas à disciplina, na maioria dos casos uma aula semanal, em
um contexto extremamente desfavorável à área de conhecimento das Ciên-
em 1931. Contudo, em 1942, a Sociologia teve uma segunda interrupção
C0m a Reforma Capanema, que retirou a obrigatoriedade da disciplina no
cias Humanas, também se efetivou como uma barreira a ser vencida pelos
Rnslno Secundário, p ermanecendo apenas nas Escolas Normais. Tal atitu-
professores da disciplina. Esses dados objetivos, aliados a outros elementos
estruturais do ensino brasileiro, geraram uma especificidade, conferindo à
Je foi. corroborada e intensificada pelo Golpe Militar de 1964 que elimi-
D'(;'I\.L todos os resquícios da Sociologia com exceção novamente das Escolas
Sociologia o status de disciplina intermitente no currículo, pois ainda não
Normais, bem como das disciplinas de História, Geografia e Filosofia das
consolidada como conteúdo essencial na formação dos jovens.
Uscolas Secundárias. Não é demais lembrar as disciplinas que as substi-
Nessa perspectiva, o ensino da Sociologia no território nacional se insere tuh'nm a essas na área das Ciências Humanas: Estudos Sociais, Educação
em diferentes realidades escolares e ocorre mediante experiências pedagó- Moral e Cívica, Organização Social e Política do Brasil (OSPB), com forte
gicas diversas, decorrentes não apenas das condições objetivas das escolas urfontação tecnicista e extremamente conservadora.
de Ensino Médio, especialmenle as públicas, mas também da falta de um
Al'IJdemocratização do país, com a luta contra Ditadura Militar e pelas Li-
maior acúmulo pedagógico da própria disciplina. A atuação de profissionais
brmlndcs Democráticas, demarcou um novo contexto também à educação.
habilitados para a docência de Sociologia, isto é, do licenciado em Ciências
A \lfttrvescência política atingiu o debate educacional que viveu um período
Sociais, tem sido um dos problemas centrais da situação educacional bra-
fl~u de novas propostas e conquistas, expressas n a Assembleia Nacional
sileira. A disciplina é ministrada não apenas por professores de Sociologia,
,0l111tlt.uinte e, posteriormente, na nova Constituição Federal, em 1988.
mas principalmente por professores não formados na área e até mesmo não
professores que atuam nas escolas como professores de Sociologia. Do ponto Vmn primeira mudança foi a Lei Federal nº. 7.044 d e 1982, que alterou
de vista pedagógico, esta é uma situação inaceitável, porém um fato que deve dJ1tpuNilivos da Lei nº 5.692/1971, referentes à profissionalização no ensino
ser considerado em um balanço mais geral que foge ao escopo deste artigo. '11 ~º grnu, tornando-os facultativos a cada instituição de ensino. Esta mu-
1bU1~1l possibilitou a volta da disciplina Sociologia ao currículo das escolas,
Nosso objetivo nesse texto é mostrar a intermitência que caracteriza his-
)Uul11mente com Filosofia e Psicologia, embora em caráter opcional, com o
toricamente a disciplina de Sociologia e os fatores a ela associados, bem
tlH çfftndo de São Paulo com a Resolução SE nº 236/83.
como as dificuldades pnrn sun consolidação como disciplina obrigatória 110
currículo do Ensino Médio. duHnlçi\o de percentual mínimo d e investimentos, por parte do Estado,.
Ih(-t1du1.:llçüo pública, e o forte e intenso debate, coordenado pelo Fórum
ri,tonnl cm Defesa da Escola Pública, marcaram positivamente a década
Os PHI Mi'llWlllll llA IN ' l'l(ltM l 'l'JiNCIA NO CURRÍCULO • 1~HO no que se refere à agenda educacional. Esse período se caracte-
JJtfü, IUtllbém, por proc.:csso de discussão d a nova LDB, com audiências
ftI11icuN, c.:oordcnadas pela <:onti1111fin de Educação d a Câm ara dos Deputa-
.O inít 10 da hlrilt'll'h\ d11 Sodologia 110 rurrkuln, 111,11 l 11110 pcln morte dt' 0~1 [WcNidldn pelo Dl•1 1 u111dn l 1cdcrnl lllorcstan Pcrnandes; elaboração de
Sl'll pr11p11111•11t1• l\1•11j11111l11 C :on1-1 lu11l, j.í podl' ~1· 1 11111 ~1d ,1111du um ind ício lrt1Ytlll p1·upost.1s lllrmtd.111"; 1'•t1ll 11d11s 11ns contrihuiçúcs dcntílicas mais
d,1•1dll1t 11hl.1d1•11 ,, 111•1't•fll t•111'1·tn1,1d,1s 110 l'lltt1111 1'111p11,1 l111 1111 11490 por t'\lr
avançadas nas diversas áreas do conhecimento; elaboração de estatuto do A, itprovação da LDB, Lei nº 9394/96, traz em seu conteúdo elementos afi-
magistério em alguns estados, dentre outras conquistas. rt:trdos com as ideias disseminadas pelo pensamento neoliberal, desconsi-
étotando princípios democráticos fundamentais que marcaram o debate
ff\1cacional na década de 80, como a gestão democrática da escola, criação
ANOS 90 - O ENFRENTAMENTO DIRETO
ode um sistema nacional de educação, entre outros.
Pílra a Sociologia, a nova LDB foi um retrocesso, pois, a sua situação frágil
As conquistas da década de 80 encontraram forte barreira para avanços no ilffll' t~ 11° 7.044/82, onde consta como parte opcional do currículo, tomou
período seguinte. A década de 90, paulatinamente, significou o início do 1 direção oposta ao perder, junto com a Filosofia, o status de disciplina. O
retrocesso dessa etapa histórica, já que as políticas governamentais passa- ~tUgo 36, Parágrafo 1º, inciso III dessa lei assim define o lugar da Sociolo-
ram a incorporar e implementar, com rigor assustador, as diretrizes neoli- f ln e da Filosofia no Ensino Médio.
berais caracterizadas sobretudo pela privatização do Estado, sucateamento
do setor público e o ideário das "competências" e "habilidades" que cada
Parágrafo 1° - Os Conteúdos, as metodologias e as formas de avalia-
indivíduo deve ter para ser reconhecido socialmente como cidadão com-
ção serão _organizadas de tal forma que ao final do ensino médio o
prometido com a nova ordem social, pautada na racionalidade e eficiência educando demonstre:
no uso dos recursos, especialmente os públicos.
[... ] III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e Sociologia ne-
Assim, o processo de tramitação da nova LDB - iniciado no auge do deba- cessários ao exercício da cidadania. (BRASIL, 1996).
te democrático dos anos 80 e da participação política da sociedade civil -
se constituirá num dos primeiros resultados concretos da inflexão das po-
O p.precer CNE/CEB 15/98, da Conselheira Guiomar Namo de Melo, re-
líticas governamentais. A tramitação do substitutivo Jorge Hage - projeto fll'OJ'íl das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DC-
da LDB aprovado na Câmara dos Deputados - teve o impacto da mudança NSM), tornou ainda mais clara a intencionalidade da política, ao atribuir a
radical do Governo, que abandonou o processo democrático e fez valer a of'Y!llS disciplinas caráter transversal, onde seus conhecimentos específicos
imposição de suas políticas.
dtW'li1l'ào ser abordados de maneira interdisciplinar pelas demais disciplinas.
No Senado, foi nomeado como relator o senador Darci Ribeiro, que aderiu
à política neoliberal do governo Fernando Henrique Cardoso, inserindo Nesta área (Ciências Humanas) incluir-se-ão também os estudos
em seu parecer uma nova proposta de LDB, totalmente afinada ao proje- de Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da cidadania para
to neoliberal, desconsiderando na íntegra o projeto aprovado pela Câmara cumprimento do que manda a letra da lei. No entanto, é indispen-
dos Deputados. Este, se não era o mais avançado, expressava o esforço cole- Rável lembrar que o espírito da LDB é muito mais generoso com a
tivo e democrático para construção de uma lei no poder legislativo. constituição da cidadania e não a confina a nenhuma disciplina es-
A participação do deputado federal Florestan Fernandes, como presiden - pecífica, como poderia dar a entender uma interpretação literal da
te da Comissão de Educação da Câmara, foi histórica e importantíssima. recomendação do inciso III parágrafo primeiro do artigo 36. Nesse
Com audiências públicas com as diferentes entidades da sociedade civil, o sentido todos os conteúdos curriculares desta área, embora não ex-
substitutivo Jorge Hage é expressão de como podem ser construídas políti clusivamente dela, deverão contribuir para a constituição da identi-
cas públicas. Florestan Fernandes faleceu em 199:, , Ulll nno untes da apro- dndc dos alunos e para o desenvolvimento de um protagonismo so-
vação da nova LDB nº 9394/96, sem vivc11ci,1r, porhrnto, o processo que t'!ol solidúrio, respons,\vcl e pautado na igualdade política. (BRASIL,
consolidou o desmanche de seu trabalho. PARECER CNl·'./CI\B 15/98, grifos nossos).
O cenário desolador para a Sociologia ficou pior em 8 de outubro d e 2001, LI)B 9394/96, em seu Artigo :~(l. "§ l ". Os conteúdos, as metodologias e as
com o veto integral do presidente da República e sociólogo Fernando Hen- formas de avaliação scnio orgnnlindas de tal forma que ao final do en sino
rique Cardoso ao projeto do Deputado Federal Padre Roque, PLC n º 9/00, médio o educando demonstre: HI - domú1io dos conhecimentos de Filoso-
que alterava a LDB em seu Artigo 36, explicitando em sua redação a obri- fia e Sociologia necess,\rios ao exercicio da cidadania."
gatoriedade do ensino de Sociologia e Filosofia. Mesmo após o veto presi-
dencial a luta pela obrigatoriedade da Sociologia e da Filosofia no currículo ( ... ) parece contraditó rio que Sociologia não seja tomada pelas DC-
do ensino m édio continuou. Essa luta foi essencialmente liderada pelos sin- NEM como disciplina e que os PCNEM o façam. Como os PCNEM
dicatos de professores e dos sociólogos, ficando, à margem, as instituições vinham sendo elaborados desde 1996 - contemporaneamente à
formadoras de professores de Sociologia e Filosofia. tramitação d a LDB no Congresso Nacional-, conforme diz ames-
ma "Apresentação'; entende-se que os PCNEM "conservem mais" o
espírito original que levou o legislador a grafar explicitamente na
Novo SÉCULO, VELHA LUTA LDB 9394/96, que ao fim do ensino m édio o educando d emonstre
"domínio de conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários
ao exercício da cidadania': do que as DCNEM, que são de 1998 e
O in feio do século XXI não foi fácil à Sociologia. Durante um tempo, as
alteraram essa disposição, pois estas sofreram os reveses de mudan-
ll<;cnclaluras dos cursos de C iências Sociais realizaram um trabalho de for-
ças das equipes de elaboração e, consequentemente, de orientação,
llHI ÇílO de professores de Sociologia para uma disciplina que oficialmente
afastando-se claramente - inclusive no tempo - do "espírito da lei"
n~o ctttovu presente no currículo, ainda com o p eso político de ser veta-
(LDB 9394/96). (MORAES, 2007, p. 247).
ll1l pdv prci-ldcnlc sociólogo. A precariedade de sua presença só p_ode s,:r
~•1m1Jllll'nd t1 (\ do professor de Sociologia, possuidor de uma certI~~açao
))l'Ofüslonnl compulsória, que não lhe abria as portas para o exerc1c'.o da Contrapondo-se ainda mais diretamente às D CNEM, Moraes argumenta
dot:~nd11, ao conti'ário, o impelia a situações profissionais de desquahfica- como uma interpretação equivocada da lei pode levar ao descumprimento
çno do 8CLI trnbalho e menosprezo com sua formação específica. Uma nova da própria lei.
elRpa cstav;1 por vir, para romper com a realidade negativa para a Sociolo-
gia e trazer o seu retorno ao currículo da Educação Básica, agora favorecido Por fim, caberia p erguntar corno garantir que os "conhecimentos de
pela nova gestão do governo federal, Governo Lula, que abriu possibilida-
Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da cidadania" sejam
des para avaliação e mudanças na política educacional brasileira.
tratados efetivamente pelas demais disciplinas escolares, ou seja,
Assim, em 2005, o professor Amaury Cesar Moraes, a pedido do Ministério como dizem as DCNEM, com "tratamento interdisciplinar e con -
de Educação, emitiu um p arecer sobre a presença da Sociologia no Ensino textualizado"? Aqui valeria a pena discutir alguns aspectos da "rea-
Médio - a partir de uma r eflexão crítica das Diretrizes Curriculares Na- lidade" das escolas a fim de demonstrar que essa interpretação da lei
cionais para o Ensino Médio-, que apresentou uma nova interpretação da acaba por levar ao descumprimento efetivo da lei, ou seja, que não
LDB, propondo a obrigatoriedade da Sociologia e da Filosofia no currículo. fica assegurado que "ao fim do ensino m édio o educando demonstre
Pautado em argumentos de ordem legal e pedagógica, Moraes evidencia as do mínio de co 11hccimcntos de Filosofia e Sociologia necessários ao
contradiçõ es da própria legislação, corno a presente nos Parâmetros Cur- exercício da cidad nni n" ( IJH3 9394/96, art. 36, § l°, III). Primeira-
riculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), documento de 1996, mente, quais disd pll1111s Incorporariam aos seus conteúdos os "co-
que traz em sua Apresentação a Sociologia como disciplina curricular, nhccimt·n to.~" d t' l 111t11a1lt11 1.• Sociologia? Segundo, que domínio dos
· juntamente com as demais. As Diretrizes Curriculares para Ensino Médio rn11t cúdus d\' i:111111nJi11 (' Sodologin têm os professores d e outras
- D CNEM (Parecer CEN/CEBlS/98 e Resolução CEN/CEB 03/98) descon- d i:-.l'l11I i 11 ,11, '"' hc •111 lo d,,~111-111 ll'11 d 11s dl' f'orn HH,:fo específica que a
sideraram essa leitura dos PCNEM sobre a interpretação do que consta na
maioria dos professores tem ... - e em que 1rn.:dida isso é suficiente Outro ponto a considerar é a realidade, expressa na adoção crescente
para que eles transmitam os "necessários" conforme determina a lei? do ensino de Filosofia e de Sociologia pela maioria das redes de esco•
Que domínio de "metodologias de ensino inlerdisciplinares" têm os las públicas estaduais. Segundo informação do MEC, em 17 estados
professores para que possam dar o "tratamento interdisciplinar" que da Federação, a Filosofia e a Sociologia foram incluídas no currículo,
a lei derivada determina para que se contemple o estabelecido na sendo optativas em 2 deles. Muitas escolas particulares, em todo o
lei original? Assim como as demais disciplinas, cada vez menos se país, por seu lado, também, decidiram livremente a sua inclusão.
entende que esses "conhecimentos" sejam apenas informações, valo- Essa inclusão crescente não foi determinada por lei federal ou por
rizando-se em especial as metodologias de pesquisa e, na linguagem norma nacional, mas, sim, pelos próprios sistemas estaduais de ensi •
das próprias D CNEM, as "tecnologias" da Sociologia, então, que do- no para suas redes públicas escolares, seja por iniciativa própria, seja
mínio têm os professores de outras disciplinas dessas metodologias e por força de legislação estadual, em todos os casos como resultado
tecnologias para garantir que elas recebam tratamento interdiscipli- de uma persistente mobilização de amplos setores ligados à educa-
nar e contextualizado e contribuam para a formação plena do edu- ção, que defendem a Sociologia e a Filosofia no contexto dos esforços
cando? (MORAES, 2007, p. 247) de qualificação do Ensino Médio no Brasil.
Esses avanços, ocorridos na maioria dos Estados, acabaram por criar
uma situação desigual no acesso aos conhecimentos de Filosofia e
Esse parecer transformou-se em consulta do MEC junto ao Conselho Na- de Sociologia. Nos Estados que ainda não incluíram o ensino da Fi-
cional de Educação (CNE), analisada pelos conselheiros Cesar Callegari, losofia e da Sociologia no currículo do Ensino Médio, há toda uma
Murílio de Avellar Hingel e Adeum Hilário Sauer. O contexto histórico fa- população jovem posta à margem do acesso aos seus conhecimentos.
vorável à participação democrática foi destacado pelos relatores. Essa desigualdade ocorre, igualmente, na rede particular de ensino,
na qual, malgrado a iniciativa de inclusão por uma parte das escolas,
Antes de passar à análise da proposta, registra-se que, em 1° de feve- muitas outras não o fizeram.
reiro de 2006, a Câmara de Educação Básica promoveu reunião, para Essa reflexão impõe a manifestação deste Conselho, propiciadora de
a qual foram convidadas mais de 30 entidades e pessoas, para dis- uma equalização, visando à igualdade de direitos de acesso a esses
cussão do tema "Alteração das Diretrizes Curriculares Nacionais para conhecimentos no Ensino Médio do país. (BRASIL, 2006, p. 3).
o Ensino Médio/inclusão de componentes curriculares obrigatórios de
Filosofia e Sociologia", com base na proposta da Secretaria de Educa- Nota-se o empenho numa leitura progressista, no mínimo, frente as pos-
ção Básica do MEC. Participaram dessa audiência 20 pessoas, entre
sibilidades de uma interpretação em direção contrária à inclusão. Esse pa-
sociólogos, professores de Filosofia e de Sociologia, representantes J'CCcr foi aprovado por unanimidade pelo Conselho Nacional de Educação
de entidades, estudantes e outros profissionais. Foram apresentados (CNE), em 07 de julho de 2006, resultando na Resolução CNE n º 04/2006,
e discutidos os vários aspectos concernentes à reivindicação da in- publicada no Diário Oficial em 21 de agosto do mesmo ano. Esse novo
clusão obrigatória de disciplinas de Filosofia e Sociologia no currí- lmitrumento legal dava prazo de um ano para que os sistemas de ensino
culo do Ensino Médio, mediante alteração na Resolução CNE/CEB loduíssem essas disciplinas no currículo. Apesar de uma determinação le-
nº 3/98. (BRASIL, 2006, p. 2) M!II wmo essa Resolução, houve estado que, não só não a cumpriu, como
l'cllrou Sociologia do currículo, como ocorreu em São Paulo, em sua nova
Além desse destaque, vale registrar o modo acolhedor dos l'<:lulores e sua Pl'oposla Curricular, Resolução SE - 92, de 19 de dezembro de 2011.
sensibilidade à necessidade e importância da prcs1'111;n du Sod11logh1 e Fi- A conjuntura favor,\wl l\ Snl'lologln continuou e a interpretação mais bu-
losofia no currículo, buscando na difícil rl'alldnd1• 1•du1 11111111111 hruslleirn 1on,~t kn l' autori1 ,í1i,1 ·,ollll' ,1 llc•'l, CNE n. 04/2006 foi derrotada pela Lei
elementos que justificassem a obrigatorkdadl' d, .. ,•11111 ,11 111 ~11il h11,, ll'' l l .<1H,l/.WOH, ,q11m·.1d,1 l lf'k• ( 1111111·1·!..so Nacional l' sa11cio11ada pelo prc-
sidente em exercício José Alencar, em 02 de junho de 2008. Com esta lei -nacional, ainda com questões em aberto, mas que precisam ser aprofunda-
fica estabelecida a obrigatoriedade das disciplinas Filosofia e Sociologia na das pelo coletivo antes de ter urna posição mais direcionada no currículo.
rede pública e privada de Ensino Médio em todo lerritório nacional. Para
'Todo o processo desencadeado a partir de 2006, com a Res. CNE nº 04/2006
tanto, o Congresso Nacional alterou o Artigo 36 dn LDB 9394/96, retirando
qualquer possibilidade de interpretação dúbia da lei, como a realizada pela e as OCNEM, e da Lei 11.684/2008 configurou-se em um cenário mais es-
tável e propício à Sociologia, que, com sua inclusão no Plano Nacional do
relatora das DCNEM, Guiomar Namo de Melo.
Livro Didático (PNLD), a partir de 2011, teve mais um elemento para seu
Altera o art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece processo de consolidação. Esses elementos constituíram as condições for-
as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir a Filosofia e a Socio- mais e políticas minimamente necessárias para que a disciplina pudesse
logia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio. avançar enquanto tal no Ensino Médio.
Na verdade, temos, nos fins da primeira década do século XXI, no campo
Art. 1.0 O art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa das políticas voltadas à formação de professores (inicial e/ou continuada),
a vigorar com as seguintes alterações: ·Iniciativas importantes por parte do MEC que impactaram diretamente a
"Art. 36. Sociologia na Educação Básica, como o Programa Institucional de Iniciação
V - serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obri- i\ Docência (PIBID), Plano Nacional para Formação de Professores (PAR-
gatórias em todas as séries do ensino médio. :POR), Programa de Consolidação das Licenciaturas (PRODOCÊNCIA), que
§lo.III - (revogado). 11.e ~ornaram às conquistas acima destacadas e criaram um novo patamar de
Art. 2o Fica revogado o inciso III do§ lo do art. 36 da Lei no 9.394, t~resença da Sociologia na Educação Básica. A criação, em 2007, da Diretoria
de 20 de dezembro de 1996. da Educação Básica (DEB), na Capes, constituiu-se como um forte impacto
Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, f}llmelhoria da escola pública, fortalecendo concepções mais críticas no âm-
Lei nº 11.684/2008) hlto educacional cujos impactos ainda estão por ser avaliados de modo mais
~lstcmático. A Sociologia se beneficiou diretamente dessas políticas, tendo
Esse cenário favorável da legislação à Sociologia expressa um compromisso Um esteio para sua consolidação como disciplina no Ensino Médio.
do governo Lula com antigas demandas sociais na educação, que embo- P'Ot'il culminar esse contexto, o Conselho Nacional de Educação aprova a
ra tenham suas especificidades, caracterizam um marco na luta por um Resolução CNE n. 02/2012 com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais
currículo de formação humanista para o Ensino Médio. A Res. CNE n . t1tll'tl o Ensino Médio, que, embora tenha passado despercebida do coti-
04/2006 e a Lei Federal n. 11.684/2008 marcam o final de uma etapa de luta dinno da escola e licenciaturas, traz como concepção um arrojo teórico e
pela obrigatoriedade da Sociologia e Filosofia no Ensino Médio, dando um t:rllko, não muito presente na legislação brasileira.
novo status a essas disciplinas no currículo, em especial, à Sociologia.
As Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (OCNEM) de Art. 5° O Ensino Médio em todas as suas formas de oferta e organi-
2006 são um marco para Sociologia nesse nível de ensino. Elaborado por 11.ação, baseia-se em:
Amaury Cesar Moraes, Elisabeth da Fonseca Guimarães e Nelson Dácio 1• formação integral do estudante;
Tomazi, participantes do grupo de trabalho (GT) Ensino de Sociologia da 11 • trabalho e pesquisa como princípios educativos e pedagógicos,
Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), o novo texto lqi;n l <.:ontemplou, respectivamente;
de modo singular, a discussão acumulada nesse CT, ('l\l'hllll'Cc ndo-a com 11 I • ed ucação em d i rt.'ltoil humanos como princípio nacional nor-
suas contribuições. As OCNEM/Sociologia estilo 1•111 Nl11lo11ln nnn (1pauta 1(:tldür;
mais ampla do grupo que luta pela obriga1oricda1k d,1Srn lnlol{ln, cm nível IV • suste11lahilíd,1dr ,1111hk 11t11J u 111111 meta universal;
V - indissociabilidade entre educação e pn\llc::n ROClnl, considerando- Art. 8° O currículo é orgunJzado em áreas de conhecimento, a saber:
-se a historicidade dos conhecimentos e dos suJeit()S do processo l - Linguagens;
educativo, bem como entre teoria e pnític.:a no pr,1ccsso de ensino- II - Matemática;
-aprendizagem; III - Ciências da Natureza;
VI - integração de conhecimentos gerais e, qLrnndo for o caso, técni- IV - Ciências Humanas.
co-profissionais realizada na perspectiva da Interdisciplinaridade e § 1º O currículo deve contemplar as quatro áreas do conhecimento,
da contextualização; com tratamento metodológico que evidencie a contextualização e
VII - reconhecimento e aceitação da diversidade e da realidade con- a interdisciplinaridade ou outras formas de interação e articulação
creta dos sujeitos do processo educativo, das formas de produção, entre diferentes campos de saberes específicos.
dos processos de trabalho e das culturas a eles subjacentes; § 2° A organização por áreas de conhecimento não dilui nem exclui
VIII - integração entre educação e as dimensões do trabalho, da componentes curriculares com especificidades e saberes próprios
ciência, da tecnologia e da cultura como base da proposta e do de- construídos e sistematizados, mas implica no fortalecimento das re-
senvolvimento curricular. lações entre eles e a sua contextualização para apreensão e interven-
§ 1° O trabalho é conceituado na sua perspectiva ontológica de
ção na realidade, requerendo planejamento e execução conjugados e
transformação da natureza, como realização inerente ao ser humano cooperativos dos seus professores. (BRASIL, 2012)
e como mediação no processo de produção da sua existência.
§ 2º A ciência é conceituada como o conjunto de conhecimentos
sistematizados, produzidos socialmente ao longo da história, na Assim, ficam garantidos não só a Sociologia, mas também conteúdos caros
busca da compreensão e transformação da natureza e da sociedade. à formação do estudante brasileiro que passam por uma trajetória seme-
§ 3° A tecnologia é conceituada como a transformação da ciência lhante à da Sociologia, como é o caso da História e Cultura Afro-Brasileira
em força produtiva ou mediação do conhecimento científico e a e Indígena. A Resolução também fez questão de explicitar a presença da
produção, marcada, desde sua origem, pelas relações sociais que a Sociologia e Filosofia em todos os anos do Ensino Médio, bem como listar
levaram a ser produzida. todos os componentes curriculares, para que não restassem dúvidas ou in-
§ 4º A cultura é conceituada como o processo de produção de
terpretações enviesadas sobre o currículo em questão.
expressões materiais, símbolos, representações e significados que
correspondem a valores éticos, políticos e estéticos que orientam as Art. 9° A legislação nacional determina componentes obrigatórios
normas de conduta de uma sociedade. (BRASIL, 2012,) que devem ser tratados em uma ou mais das áreas de conhecimento
para compor o currículo:
Percebe-se, em rápida leitura, o novo enfoque proposto pela Res. CNE n. I - são definidos pela LDB: .
02/2012, numa interface direta com conteúdos da Sociologia, presentes nos a) o estudo da Língua Portuguesa e da Matemática, o conhecimento
objetivos do Ensino Médio. Nessa perspectiva, a Sociologia não é mais uma do mundo físico e nalural e da realidade social e política, especial-
mente do Brasil;
disciplina, mas aquela disciplina com possibilidades de contribuir de modo
especial na formação do estudante, bem como se consolidar e se tornar a) o ensino da Arlt', especialmente em suas expressões regionais, de
referência no currículo escolar. A resolução também garante uma inter- forma a promover o d1-.~t•nvolvJ111cnl'o cultural dos estudantes, com a
pretação da LDB que não exclui a presença das disciplinas, mesmo com a Música como Sl'LI ( olll t•1'1do ohri1{nté>rlo, mas não exclusivo;
organização do currículo pelas grandes áreas do conhecimento. b) a Edu1.:;1<)0 F(slt ;\, fn!vu1·,nln ~ propostn pedagógica da instituição
de ensino, ~l·11dn , un pr1\l kt1 lill llllu1lvn 110 estudante nos casos pre-
vl slos c1 ll I c,.
c) o ensino da História do Brasil, que leva cm conlll 1\8 çontribuições cias e habilidades, marca da Pcdf1gogia das Competências, matriz teórica
das diferentes culturas e etnias para a formnc,:f\n do povo brasileiro, norteadora de vários dornmcntos oficiais.
especialmente das matrizes indígena, africana e curnpeia;.
d) o estudo da História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, no âm-
bito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação tJú NOVO PESADELO: GOLPE DE ESTADO, GOLPE NA EDUCAÇÃO,
Artística e de Literatura e História brasileiras; GOLPE NO CURRÍCULO
e) a Filosofia e a Sociologia em todos os anos do curso;
f) uma língua estrangeira moderna na parte diversificada, escolhida
pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, den- O Brasil viveu nos últimos dois anos o processo de impeachment da presi-
tro das disponibilidades da instituição. <lente Dilma Rousseff, que se caracterizou como um golpe político na de-
Parágrafo único. Em termos operacionais, os componentes curricu- mocracia e no país. Não é nosso objetivo discutir esse fato histórico neste
lares obrigatórios decorrentes da LDB que integram as áreas de co- texto, porém a nova conjuntura já presente no processo de impeachment
nhecimento são os referentes a: -trouxe à educação a explicitação de projetos políticos para o país e para a
I - Linguagens: educação. A crise econômica, justificativa para os cortes no financiamento
a) Língua Portuguesa; d(ts áreas sociais como saúde e educação, não foi o único elemento de ata-
b) Língua Materna, para populações indígenas; que aos direitos sociais.
c) Língua Estrangeira moderna; Nesse processo, está em andamento uma mudança brutal de projeto de
d) Arte, em suas diferentes linguagens: cênicas, plásticas e, obrigato- pnís, com base na privatização do Estado; um projeto explícito e ousado
riamente, a musical; q~1e as elites brasileiras jamais tentaram, hoje materializado na Proposta
e) Educação Física. de Emenda Constitucional n. 241 (Câmara de Deputados) e PEC n. 55 em
II - Matemática. tramitação no Senado, que impõe, caso aprovada, o congelamento por 20
III - Ciências da Natureza: l\JlOS do orçamento do governo, só reajustado por índice de inflação do ano
a) Biologia; tlnterior, em especial na parte que se refere às políticas sociais. Em outra
b) Física; frente, há o Projeto de Lei Escola sem Partido, que propõe a lei da mordaça,
c) Química. 1.f. o pensamento único, com sérios prejuízos à formação do estudante e à
IV - Ciências Humanas: llberdade de manifestação e expressão de todos.
a) História;
M tlS o ataque mais direto ao Ensino Médio se faz hoje pela Medida Provi-
b) Geografia;
llÓl'ln n. 746, de 22 de setembro de 2016. São muitos os enfoques de debate
c) Filosofia;
d) Sociologia.
quu o assunto suscita, pois, como medida provisória, é um instrumento
IJOm força de lei, adotado pelo Presidente da República, em casos de rele-
(BRASIL, 2012, grifos nossos)
\11\ncia e urgência, com prazo de sessenta dias, prorrogáveis pelo mesmo
Jrnrlodo mais uma vez, porérn rnm efeitos imediatos até que seja votada em
Se os sistemas educacionais (federal, estaduais e municipais) não avança- definitivo pelo Congresso Nndo11nl. Não há justificativa plausível para essa
ram na discussão e implementação das novas Diretrizes Nacionais para o llJllHWi\<> uada pelo M EC, 1w1n mesmo o falo de já ter sido feita a discussão,
Ensino Médio, também não houve resistência declarada à nova resolução, t 11do t)m vista a tramita, iio do PLClM0/2013, que também trata de mu-
embora seja evidente o embate com diretrizes e conccp\:f>cs presentes em dtm1i:ns no Ensino Ml"tllo. < > q1.w 1{1 1\Hlll (: umn mudança radical de modelo
outros documentos, como o OCNEM, que, com cxCt\';1o d;I So l lologia, lra - ifo Ji11·nrn\:tio dt•sst· 111vl'I dr t'lll1lllo I n111 IH~l'iilH ltnplicaçõcs nilo só para os
duz as demais disciplinas das ciências huma11;1s l'lll 11·1 1111"1 ,k llllllpct ên \l~tudunks, 111M, .111" p11i11•r1~ lll l'~. 1\U 1 111·1111!10 (' ,,,, d isdplinns. O lcxto da
MP 746 de 2016, na seção IV, Capítulo II, art. 36 se rr i'c rc uos "itinerários No texto da Medida Provisúria, 11 precarização da formação se faz presente
nos estudantes, ao aulori;,.ar os sislemas de ensino a reconhecer conheci-
específicos" do currículo do Ensino Médio:
mentos, habilidades, compcl l!ncias por meio de demonstração prática, ex-
periência de trabalho supervisionado ou outra experiência adquirida fora
Art. 36. O currículo do ensino médio será composlo pela Base Na- do ambiente escolar; atividades de educação técnica oferecidas em outras
cional Comum Curricular e por itinerários formativos específicos, instituições de ensino; cursos oferecidos por centros ou programas ocupa-
a serem definidos pelos sistemas de ensino, com ênfase nas seguin- cionais; estudos realizados em instituições de ensino nacionais ou estran-
tes áreas de conhecimento ou de atuação profissional: geiras; e educação a distânci a ou educação presencial mediada por tecnolo-
I - linguagens; gias (§15, incisos I-VI). Longe de ser escolha, trata-se de imposição de per-
II - matemática; da de direitos, que limita o acesso do estudante ao conhecimento científico
III - ciências da n atureza; escolar, ou seja, trata-se da flexibilização de direitos.
IV - ciências humanas; e
V - formação técnica e profissional.
A precarização também se faz presente quando se refere à contratação de
professores, ao admitir contratação de professores sem a obrigatoriedade
(... )
§ 8º Os currículos de ensino médio incluirão, obrigatoriamente, o es- da licenciatura, com a mudança do Art. 61 da LDB.
tudo da língua inglesa e poderão ofertar outras línguas estrangeiras,
em caráter optativo, preferencialmente o espanhol, de acordo com a III - trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso
disponibilidade de oferta, locais e horários definidos pelos sistemas técnico ou superior em área pedagógica ou afim; e
de ensino. IV - profissionais com notório saber reconhecido pelos respectivos
§ 90 O ensino de língua portuguesa e matemática será obrigatório sistemas de ensino para ministrar conteúdos de áreas afins à sua
nos três anos do ensino médio. (BRASIL, 2016, grifos nossos) formação para atender o disposto no inciso V do caput do art. 36.
(BRASIL, 2016, grifos nossos)
A mudança do currículo é clara e cabe aos sistemas de ensino e não aos
jovens definir os seus itinerários formativos. A leitura mais atenta do do- H1i outros aspectos a serem explorados na MP n. 746/2016, mas aqui trata-
cumento faz ruir O argumento da escolha do estudante falácia camuflada , •Se de priorizar questões específicas que tragam consequência direta à pre-
impossível d e ser oferecida pelos sistemas pelas reais condições de funcio- 11onça da Sociologia no currículo. Traduz-se, enfim, numa nova ofensiva
namento e financiamento. Outro ponto preocupante é a forma pela qual a neoliberal pautada em três eixos: flexibilização do currículo, ao já modifi-
obrigatoriedade dos conteúdos foi expressa no texto legal: é obrigat_ório o lllll' a LDB e influenciar a Base Nacional Comum Curricular - BNCC, ainda
estudo de Inglês (não garantido como disciplina, portanto) e o ensmo de nfo definida pelo MEC; precarização de certificação da formação do estu-
Português e Matemática. Subtende-se que os demais conteúdos curricula- dmüe, com o reconhecimento de outras experiências práticas que passam a
res não serão tratados como disciplinas, uma vez que as ênfases em quatro compor seu itinerário formativo tanto para o Ensino Médio como Ensino
grandes áreas do conhecimento e a formação técnica profissional ~ã? il_1di- ,Superior (Art. 36, § l l ), e também do professor, ao admitir profissionais de
cam a presença obrigatória delas. Assim, a luta pela presença de ~1sc1plmas n,,tório saber, dcsqualiíican<lo a necessidade da licenciatura para a atua-
no currículo fica secundarizada frente à questão, pois com exceçao de Por- \\fiO profissional: e privalir.ll\:flo ao admitir a parceria público-privada, via
tuguês e Matemática as demais não serão obrigatórias e sim el~tivas, ain~a orgnnlzaçôcs sociais , vb.rndo a viabilizar a extensão da jornada do tempo
condicionadas à escolha dos sistemas de ensino, mostrando assim o que e a hlltigrnl, oul ro dxo d,1 MI', 1111 l~dl11 de professores.
flexibilização do currículo.
MAIS UMA VEZ A LUTA E À LUTA SEMPRE liberdade de expressão de pensamento. Mais uma vez a luta se faz necessá-
ria e à Juta sempre!

Esse contexto localiza, brevemente, a trajetória da Sociologia no currícu-


lo, apresentando as bases sobre as quais a presença dessa disciplina foi se REFERÊNCIAS
constituindo, em especial no que se refere à legislação, passando por difi-
culdades e conquistas que caracterizam a sua intermitência no currículo. O
período de 2006/2012 significou saltos qualitativos incomparáveis aos mo- BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.396 de 20 de
mentos anteriores na história da Sociologia no currículo, tanto que não se dezembro de 1996.
imaginou a possibilidade de retrocessos, ao contrário, nesse período houve · - -- Lei nº 11.684, 02 de junho de 2008.
avanços e ousadias em diferentes frentes de atuação da Sociologia na Edu-
cação Básica. Os principais programas da DEB/Capes voltados à Educação _ _ __ Conselho Nacional de Educação. Parecer CNEICEB 15/1998. Di-
Básica, seja de formação de professores, seja de produção de material pe- retrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Ministério da Educa-
dagógico e de interação universidade/escola básica tiveram a presença do Qi10 e do Desporto. Conselho Nacional de Educação, 1998.
grupo de Sociologia. Essa vivência de diferentes grupos, em nível nacional, - -- - - - - -- - - -- - - · Parecer CNE/CEB 38/2006. In -
propiciou uma qualificação da presença da Sociologia na Educação Básica, d usão obrigatória das disciplinas de Filosofia e Sociologia no currículo do
principalmente de seus professores de nível médio e superior. U11sl110 Médio. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional
A Sociologia no currículo, como disciplina obrigatória a partir de 2006, re- d~ Educação, 1998.
colocou, paulatinamente, uma agenda de discussão que perpassa questões _ __ _ . Medida Provisória n. 746, de 22 de setembro de 2016. Institui
centrais para a educação escolar de modo geral. Qual o objetivo da discipli- tt J?olítica de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em
na? O que ensinar e como ensinar? Com qual material didático trabalhar? ~~mpo Integral, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que esta -
Em que condições de trabalho? Com quais profissionais? Em que escola? {telcce as diretrizes e bases da educação nacional, e a Lei nº 11.494 de 20 de
Com quais estudantes? Estas questões, apesar de óbvias, são estratégicas Jltrl.ho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
para a organização do trabalho pedagógico na escola, logo para a conso- dn IZducação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, e d:\
lidação da disciplina no currículo. As respostas a elas já se encontram em ,UlJ'tlli providências.
outro patamar de complexidade, expressão de um acúmulo de vivências
pedagógicas e políticas, que foram moldando os novos passos na trilha so- (!AltVALHO, L. M. G. (org.). Sociologia e ensino em debate - experiências e
ciológica na escola de Educação Básica, como pode ser facilmente consta- lliíCIJSStlo de sociologia no ensino médio. Ijuí: Ed. Unijuí, 2004.
tado nos diversos eventos nacionais, estaduais e locais sobre o ensino de MOHABS, A. C. Parecer sobre o ensino de filosofia e sociologia. MEDIA -
Sociologia na Educação Básica, como os Encontros Nacionais sobre o En- fi(,1(8, Londrina, v. 12, n. 1, p. 239-248, jan/jun. 2007.
sino de Sociologia na Educação Básica (ENESEB), já em sua quarta edição,
o GT Ensino de Sociologia da SBS, entre outros.
Porém, a conjuntura nacional interrompeu, mais uma vez, um percurso
com novas possibilidades de caminhos e condutores. A inflexão impk
mentada pelo governo Temer, já em curso anteriorrnenle no processo do
impeachment, poderá impor seu projeto com veen1011d,1, onde nfo h,1Vl'r:1
lugar somente à Sociologia, mas também a projctm <'dlll ,ll in1rnis volladm
il . à formação de sujeitos hislúricos aulô11oi11C>',, 11 ,111t.1 d 11•, 11,1 d1·11H>n:1l'ia, 11,1
,1

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