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Sobre a história e a teoria da forma escolar*

GuyVincent
Bernard Lahire
Daniel Thin

Professores da Université
Lumiêre Lyon 2- França

Resumo Abstract
O artigo, ao se interrogar se a crise atual da escola The article aims to discuss the concept of school
pode ser interpretada corno o fim de um modelo shape, through a social and historical approach,
escolar ou o fim de uma predominância, a forma focusing the constitution of primary school in
escolar, propõe-se a conceituar forma escolar, France. 11 questions the ides of unsuccessfulness
recorrendo a uma análise sócio-histórica da of school today as the end of a schooling model.
constituição da escola na França. Para tanto, To do so, it analysis oral and written societies,
debruça-se sobre sociedades orais e sociedades relating their knowledge to their exercise of
escritas, relacionando modos de conhecimento a power. Finally, the article claims that if the school
maneiras de exercício do poder. Concluí is at a turning point it's not because its end is
afirmando que se, a escola está em crise e pode dose, but because the school shape had spread
vir a desaparecer como instituição social, é all over the social institutions.
porque a for ma e scola r de so cia l iza çã o é
Key-words: school shape; history of education,
h oj e hegemônica.
sociology of education, turning point, school
Palavras-chave: forma escolar, história da
unsuccessfulness.
educação, sociologia da educação, crise, fracasso
escolar. évto extraído do original erufrancék da obra coordenada
por Guy Vincent, L'Education prisonnière tle la Forme
scoiaire? Scolarisation et socialisation dons les sociét•s
- industrielles, Lyon PU!., 2994: 11-48,
Tradução da Prof a. Dra. Diana Gonçalves Vidal docente da
Faculdade e do Prtera ma de Pós-Graduação em Educação
da (..,5Uversidr.fde de São Paulo, Vária Lik ia Gaspar da Sil ta,
Profa. da Universidade do 1...ktado de Santa Catarina e
doutoranda do Programa de Pás-Graduação em
Educação da Universidade de São Paulo; e Valdeniza
Maria da Barra, mostranda do Curso de pós-Graduação
em Educação— História, Politica, Sociedade ela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo.
Revisão de Guilherme João de Emitas Teixeira.

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ...................................................................... 7


Sobre a história e a teoria da forma escolar

A crise atual da escola, as críticas às aos candidatos à agregação em 1905; aliás,


vezes muito exacerbadas feitas aos em seguida, este curso foi publicado sob
sistemas escolares..., podem ser o titulo L'Evohstion pódagogique eu
interpretadas como o fim de um modelo France , que somente "o método das
-

(por exemplo, o "modelo republicano"), ciências históricas e sociais", mais


ou corno o fim de uma predominância - precisamente "a análise histórica",
ou seja, a forma escolar -, segundo o permitia "conhecer e compreender" o
modo de socialização peculiar às nossas sistema escolar. Conhecimento que,
sociedades européias, até mesmo como acrescentava ele, longe de responder a
o fim da forma escolar em si mesma urna simples curiosidade do erudito,
enquanto configuração sócio-histórica permitia chegar a "resultados práticos",
surgida no século XVI nessas sociedades? Unta vez que a presente obra se iiiteressa também peio
futuro da disciplina "Sociologia da Educação",
A questão assim posta, como toda lembremos que, nofinal dos anos 70, um certo nániero
questão de interpretação, faz intervir um de trabalhos do "Grupo depniisa sobre a socialização.;
conduzidos numa perspectiva de sociologia histórica,
conceito, o de forma escolar; deste modo, elaboraram o conceito deforma escolar a partir do uso
que dele fizeram alguns historiadores, tais como R.
importa definir de alguma maneira seu
Ghartier, U. firlúa e M.-At. ampère a:Education en 1-rente
sentido e seu uso, o (pie pede uma análise du XVI' au XVIII' siède, Sedes, 1970). Esses primeiros
trabalhos (ver, notadamente, Guie Vincent, 1,'Ecole
s ó c i o -h i s t ó r i c a , i r r ed u t í v e l a u m a primaire française, PUL, 1980; R. Bernard, 'Les petites
historiografia das instituições escolares, écoles nu-a les dAncien Régime• lectures et I.1..poth-eses.',
em Education, Fête et eulture, PIII., 19,s' I )destacan-iiii,
mesmo que acompanhada de urna história de um lado, a relação entre a firma escolar e a 7101•1
forma de dominação ligada a uma morganização do
das idéias pedagógicas' . Não se pode,
campo político-religioso 0, do outro, a relação estreita
portanto, fazer urna "história da forma entre processos de escolarização e processos de
urbanização.
escolar" independentemente de uma
Se evocamos, aqui, Um percurso de pesquisa é porque a teoria
teoria, a não ser na condição de da forma escolar, como toda teoria, foi-se constitt rindo
como tal medida em que seu poder de constniçáo dos
transformar a expressão "forma escolar"
Mos se afirmava mo trabalho sobre os fatos (P I
em urna fórmula pseudo-científica, icu.arcfieu e J.-C. Pa.sseron, La Reproduction: éléments
pour une theorie du système d'enseigne ment, Míniu t,
utilizada em lugar do termo corrente coe. 'Te s em co m 1 9 70) Est a obr a es tá

"escola". Depois de ter sublinhado a dis po n íve l em português sob o título Reprodução:
elementos puni um:1 teoria do sistema de ensino, com
"gravíssima crise" que atravessava o tradução de Mynahlo Baitãoe rvuiscio de Pedra Benjamin
Gaivia e Ana Maria Baeta, publicada na série 'Educação
ensi no s ecu nd ári o f ran cês d es d e a
em Questão 'pela. Editora Francisco Alves!.
s e g u n d a m e t a d e d o s é c u l o X V I I I,
I)urkheim afirmava - na primeira lição do
curso que foi encarregado de ministrar

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Sobre a história e a teoria da forma escolar
dirigir o futuro do ensino e, para os futuros obj etivismo durkheimian o como da
p ro f es s o res s em o s qu ais n enh u ma história positivista. Num texto que,
reforma pode ser feita, se situar em durante décadas, foi relegado ao
relação a essas reformas (Education et esquecimento em decorrência da
sociologie, p. 150 e seguintes ). E se a p red o mi n ân ci a c i o es t ru t u ra l i s mo ,

análise histórica apresenta tal importância Merleau-Ponty (Seus et Non-seres, Paris,


Nagel, 1948, p. 170 e seguintes)
é porque nossas instituições escolares
mostrava corno a noção de forma, tal qual
co rres p on d em "n ão a n eces s i d ad es
a teoria da Gestalt havia começado a
universais do homem que chegou a um
elaborá-la, poderia permitir às Ciências
certo grau de civilização, mas a causas
Humanas, e não somente à Psicologia,
d ef i n i d as , a es t ad o s s o c i ai s mu i t o
ultrapassar a alternativa objetivismo -
particulares".
subjetivismo repensando as relações do
Mas, qualquer que seja o interesse das subjetivo e do objetivo. A forma é, antes
análises apresentadas, a obra L Evolution de tudo, aquilo que não é coisa, nem idéia:
pédagogique era France não está isenta uma unidade que não é a da intenção
das ambigüidades que pesam sobre o consciente. A esta noção, Merleau-Ponty
método de I)urkheim: concepção ligava a de sentido e de história, definida
restritiva e positivista da causalidade, como busca "tateante" de sentido: há

noção de forma reduzida à forma somente formas históricas, remetendo à


"solução" que cada sociedade "inventa,
"exterior" e integrada à explicação causal
t a n t o n a s u a r e l i g i ã o co m o n a s u a
pela "morfologia", e, ao mesmo tempo,
economia ou sua política, para o problema
recurso à Funcionalidade e à analogia
das relações do homem com a natureza
biológica (aqui, as noções de "evolução",
e com o homem" (Merleau-Ponty,
de "germe", etc.), amb igüidades
p. 180).
colocadas em evidência por J. -M.
Berthelot no seu prefácio a Règles de Ia Falar de forma escolar é, portanto,

méthode sociologique (ed. Champs- pesquisar o que faz a unidade de urna

Flammarion ). configuração histórica particular, surgida


em determinadas formações sociais, em
A n o ç ão d e f o r m a es co l a r p o d e
certa épo ca, e ao mes mo te mp o qu e
responder a certas intenções do fundador
desta subdisciplina desde há muito tempo
chamada "sociologia da educação", mas
ao mesmo tempo escapa aos limites do

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Sobre a história e a teoria da forma escolar

outras transformações, através de um Vê-se, então, que uma teoria da forma

procedimento tanto descritivo quanto escolar permite, diferentemente da.s

"compreensivo". Este se opõe não só à teorias estruturalistas, pensar a mudança.

bus ca de rel açõ es ent re f enô menos Em primeiro lugar, o que se poderia

esmiuçados, tomados como elementos e chamar a recorrência através das

sempre concebidos como exteriores uns modificações: das escolas dos Irmãos' à
aos outros, quanto à busca de elementos escola mútua e à escola da República,
permanentes (Merieau-Ponty, op. cit., houve muitas mudanças que não
p.80), ou ainda ao inventário empírico c h e g a r a m a i n t e rf e r i r n a q u i l o q u e
dos traços característicos desta "realidade" d efin i mos co mo forma es co lar. Em
que seria, por exemplo, a escola. Já seguida, esta teoria permite compreender
definimos o que faz a unidade da a emergência de uma forma colocando-a
forma escolar - seu princípio de em relação com outras "transformações".
engendramento, quer dizer de É preciso ainda libertar-se do positivismo
inteligibilidade -, como a relação com e do causalismo: a aparição e o
regras impessoais. A partir daí tomam desenvolvimento da forma escolar podem
sentido, de um lado, os diversos aspectos ser colocados em relação com o
da forma (notadamente, corno espaço e d es en vol vi mento da fo rma po lí ti ca
como tempo específicos); de outro lado, historicamente singular que, desde a
a história, quer dizer a "formação", o época de Maquiavel e de Bodin, recebeu
processo pelo qual a forma se constitui e o nome de Estado; mas a natureza desta
tende a se impor (em instituições e relação (homologia? congruência?...) ainda
relações ao retomar e modificar certos está por definir. Sabe-se que, atualmente,
"elementos" de formas antigas, como será este é o objetivo de numerosos trabalhos
demonstrado pelo exemplo do epistemológicos sobre a "forma" na
"exercício"). E esta emergência da forma Matemática, Física, Biologia e Ciências
escolar não acontece sem dificuldades, Humanas. No que concerne à Sociologia,
conflitos e lutas, de tal sorte que a história a reflexão apresentada por R. Ledrut (em
da escola está repleta de polêmicas e L a Fo r m e e t l e s en s ) c o n v é m , n o
posições exacerbadas; por sua vez, o
N R.: Ao falarem de Irmãos, os autores rePrem-se aos
ensino encontra-se, talvez, sempre "em "Frères des &ales cbrõtiennes".
crise".

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Sobre a história e a teoria da forma escolar
essencial, às pesquisas que já tínhamos Antigüidade até nossos dias, o que obriga,
empreendido e que perseguimos. às vezes, a procurar a qualquer preço a
existência de escolas primárias,
Comecemos, então, pela "invenção"
secundárias e superiores em todos os
da forma escolar para compreender corno,
países e em todas as épocas. Esta pseudo-
n ão sem d ifi culd ad es, um modo de
gênese es t á con den ad a a reco rrer à
socialização escolar se impôs a outros
argumentação duvidosa da etimologia -
modos de socialização; e para discernir
por exemplo, tentando comprovar o
também quais são as suas principais
p aral el i s mo en t re o q u e ch amamo s
características e tudo o que faz parte desta
pedagogo e o paidagogos de Atenas do
configuração histórica singular, quando
século Ela recorre também, mais ou
nossa tendência é acreditar que tal modo,
menos sub-repticiamente, a metáforas
não sendo natural, é, pelo menos, eterno
biológicas, como a de filiação,
e universal: a "pedagogia", as
notadamente quando serve a operações
"disciplinas", etc. Para compreender,
hagiográfica&
enfim, como a hipótese de uma
3
"pedagogização das relações sociais" Ao criar divisões, tal historiografia as
poderá explicar, de maneira paradoxal, a estabelece também em função de
crise atual. interesses facilmente identificáveis: por
exemplo, opõe o "desenvolvimento de
um ensino organizado pela Igreja" (da
- A invenção da forma escolar
Idade Média ao Fim do século XVIII)

Existe urna historiografia corrente do "organização de um ensino público do

ensino ou da educação' que, antes de


cy.R. Bernard, Rapport scienti fique du G.R.S •, 11RA 893-
tudo, é continuísta e se expõe a CATES, Uniteníté LUMière 4,fin 2, junho de 1 W7 p. 159.
Ela é também uma história escolar: ver os manuais de
incessantes anacronismos: ela vincula o história das instituições escolares utilizados nas Escolas
que chamamos escola e sistema de ensino Normais de Professores Primários.
5
1-:' assim que, em 1895, duas instituições tão diiéruntes
às escolas da Idade Média ou, até mesmo, como a Escola Normal Superior e as Escolas Normais
Primárias proclamaram sua filiação em relação à Escola
para além da ocupação romana, à paidãia Normal do ano 111, durante a celehração do centenário
da Grécia antiga. Parte-se do pressuposto desta. Sobre o assunto, ver G. Vincent, "L. (:'cole nornufe
de l ene
de que tivesse existido urna espécie de de /a l'"" République Paedagogh...a
crescimento natural da escola desde a histories, International Joumal of. the E Eistory of Education,
X.V1111, 1991-1992, A 215-230.

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Sabre a histOria e a teoria da forma escolar

Es tado " (s ecu los X IX e X X )`'. Se forma social esta ligada a outras
acrescentarmos que uma das transformacOes; que a forma escolar estd
consequencias deste tipo de "historia" foi ligada a outras formas, notadamente
de nao fazer justica a novidade radical politicas; que certos apelos feitos hoje aos
representada pelas escolas urbanas prefeitos de suburbia lembram as
clesenvolvidas pelos himlos das Escolas "Advertencias para a instrucOta do povo

Cristas no fiat do seculo XVII, podernos pobre" enderegadas em 1668 ao Provo/

clizer quc o principal interesse cientifico [chefe da municipalidade] de Lyon; que,


enfim, o que esta hoje em jogo no que
de uma analise socio-historica das formas
consiste ern produzir cartes e
se cha ma a crise da escola e, tal ve z
principalmente, o futuro da democracia 7.
continuiclades inesperados. Uma descricao
portanto, a analise sOcio-histOrica da
e uma analise precisa das "Petites ecoles",
das escolas do abade Charles Demia em emergencia da forma escolar, clo modo

Lyon (1666), das "Escolas Cristas", das de socializacao que ela instaura, das

Escolas Mlituas, das escolas primarias da resistencias encontradas portal modo, que
4
3 Republica, sem esquecer as Colegios permite definir esta forma, quer diner,
do "Antigo Regime", as Escolas Centrals perceber sua unidade (a da forma) ou,
da Revo'Lica°, etc., levam a situar a rnais exatamente, pensar coma unidade
invencao da forma escolar nos seculos a que, de outro modo, somente poderia
XVI — XVII; a aproximar — a despeito do ser enumeraclo como caracteristicas
quc as separa e apesar da ideologia laica multiplas.
— a escola primaria reformada por Jules
Ferry, ern 1880, das escolas dos Irmaos; 6 Estes sclo as tftulos da prmeira e da segunda panes da
Eistoire des institutions scolaircs, par f. Lelfe G. Rustin,
a se interrogar sobre as pretensOes dos Delagmte, /954, ou seja, um dos manuals utillzadosat6
data Mina recente JU?S Escolas Norma is de Professores
republicanos, no fim do seculo XIX, de Primarias. A introducao (Les origines de rec. -ole")
realizar os projetos dos revolucionarios de aborda a Mesopotamia, o Egita, a China, u "Stundo
greco-mmano"... As ohms cientificas errs (peas Ina; ma is-
1789... jaram inspirados arm sempre cstiverane isentas dessas
falhas em retaceio ao metodo bistOrico.
Se clesej armos ver nesse estudo ' Cf. H Plenel, L'Etat et l'ecole en France, la Re.publique
somente o resultado de querelas entre inachevee, Payot, 1985

especialistas, sem qualquer importancia


para a solucao dos problemas
contemporaneos, estarfamos esquecendo o
seguinte: que tada aparicao de 11111'd

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Sobre a historia e a teoria da forma escolar
O que aparece em certa epoca, nas especifico, distinto dos lugares oncle se
sociedades europeitts, é uma forma inedita realizam as atividades socials: a escola.
cie relacao social entre urn "mestre" (num Este espaco é cuicladosamente concebiclo
sentido novo do termo) e um "aluno", e organizado como o testemunham,
relacao que chamamos pedagOgica. Ela particularmente, os escritos del B. de La
Salle que, por sinal, recusava que os novas
inedita, em primeiro lugar, no sentido "mestres de escola" se instalassem em
em que e distinta, se autonomiza em locals nao apropriados' . Da mesrna
relacao as outras relacOes sociais: o mestre maneira aparece urn tempo especifico,
nao e Mai S urn artesao "transniitindo" o o tempo escolar, simultaneamentc como
saber-fazer a um jovem; alias , durante periodo da villa , como tempo no ano e
muito tempo, nay cidades, os "mestres- coma emprego do tempo cotidiano.

escritores" resistiram zi intrusao dos Para prosseguir a analise e


mestres de escola. Esta autonomizacao compreender a especificidade das pniticas
pot referencia as outras relacbes escolares, e necessario evocar as
desapossa os grupos socials de seas transformacoes as quais esta ligacla a
competencias e prerrogativas. Por toda emergencia da forma escolar. Nas cidades,
parte, em relacao ao que, de agora em no fim do seculo XVII, sao criadas escolas
diante, sera consider ado como a antiga de urn tipo .novo clestinadas
sociedade, "aprender" se fazia "por ver-fazer explicitamente a "todas as criancas",
e ouvir-dizer": seja entre camponeses, inclusive, as do "povo" que, no entanto,

artesaos ou nobres, aquele que aprendia - pant exercerem os oficios que Hies seriam
isto e, em primeiro lugar, a crianca fazia a atribuidos, nao nece ssitavam dos
aquisicao do saber ao participar das "saberes" transmitidos pcla escola. Para
atividades de uma fanv7ia, de uma casa. Dito alem cfe explicacoes simplificadoras (us
de outra maneira, aprencler nao era distinto
Por se realizar, em primeiro lugar, na escola, a forma
de fazer. E esta retirada de poder que vai escolar pode tambOm terider u estruturar °taros
suscitar resistencias a escolarizacao, inclusive, espacos, do rnesmo ►nodo (plc toda relacno social pode
serpedagogizada. Neste aspecio, a observaceio du virtu
por parte de gnipos, como a nobreza, corn cotidiana ,fin - nece mrittiplos exemplos: posiciio
respectiva dos interlocutores, levantar a nub, tom
relacao a escolas concebidas especialmente
"sabido", etc.
pant ela.
Como toda relacao social se realiza no
espaco e no tempo, a autonomia da
reinao pedagogica instaura urn lugar

Educacao em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 13


Sabre a historia e a teoria da forma escolar

imperativos da Contra-Reforma, o terror escolar (manuals, licaes distintas, feitas de


das classes perigosas...), a precis❑, sem questej es-respostas a serem lidas c
dirvida, ver nessa ocorrencia a instauracao aprendidas de cor...).
d e u m a n o v a o r c l e m u rb a . n a, u m a 0 que aprende, p❑rtant❑, a crianca
redefinicao (e nao somente uma ao ler as Civilidades e, em seguida, ao
red i s t ri b u i ca ❑) d os p o cl eres ci vi s e copiar cuidadosamente ❑ grancle
religiosos, Aforma escolar nab e sornente ntimero de tipos de escrita, diante de urn
urn efeito, uma conseqiiencia, mas mestre que, na medida do possivel, nunca
participa dessa nova ordem. deve falar? Ela aprende a obedecer a
Colocar toclas as criancas — "ate determinadas rcgras — maneira de
mesmo as pobres" — em escolas, aparece corner, de assoar ❑ nariz, de escrever, etc.
como um vast❑ empreendimento que se — conforme regras que sao constitutivas
poderia chamar de ordem publica, corn a da ordem escolar, que se impoem a
condica❑ de nao reduzi-lo a simples t❑dos (a comecar pe]o proprio silencio
at° rte do min acao. Trata -s e d e ob t er dos mestres); alias , nas escolas dos
a submissao, a obediencia, ❑u uma Irmaos, algumas cielas estao inscritas em
nova forma de sujeicao; alem diss ❑, "Sentencas" sobre as Paredes da sala ("E
❑ aluno aprende a ler por meio de precis❑ se aplicar na escola a estudar sua
"Civilidades" e n ao nos textos licao"...). Para a malaria dos alunos, a
sagrados (ou nos documentos inutilidade de aprender nao sornente a
manuscritos que, porventura, ler, mas a escrever (caligrafar) urn
9
cstivessem em poder de sua famillia) . grande niimer❑ de escritas mostra
bias "escolas cristas ", ❑ catecismo bem que, contra•iamentc a ideia
ado e a materia principal; alem clisso, os frequentemente desenvolvida segundo a
Irmaos nao sa❑ sacerdotes e q u al a "f u n c ao d a e s co l a " s e r i a d e
f❑rmacao recebida p•epa•a-os para serem
(mica c inteiramente "novos mestres". E, 9
Neste sentido, embera .nao mereo:Im as descriceies
nil:sera bilistica.s- ore fi-equentemente lhes tern lido, eitas,
sobretudo, a introducao do catecismo"' as 'petites ecoles" rurais lambent nao [rodent ser
consideradas come participantes da "jerma escolar"
corn a Reforma e a Contra -Reforma
(q: H. Bernard, Is Petitcs -ec -oles rurales..., op. cit..).
carticipa de transformacOes profundas da t" Cf f.-C. Dhotei, Les ❑irigines du catekhisme rnoderne,
d'apres les premiers manuels imprims cn France, Paris-,
religiao: a catequese se faz doravante,
Aubier, 1967,.1. Hebrard, "La scolarisation des savoirs
correlativamente a uma clefinicao das elementaires i Velxique me.)derne", in E-Iistoi re de
l'etlucation, rr 38, mate de 1988.
Igrejas e do poder eclesiastic❑, sob forma

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Sabre a historia e a teoria da forma escolar
"transmitir saberes e saber-fazer" — sendo condiOes de urn estilo de villa a urn
que as "tne'todos pedagOgicos" garantem "regulamento de disciplina", fixando corn
a eficacia desta transmissao -, a invencaa rigor e detalhes cada ocupacdo da dia''
da forma escolar se realiza na producao R. Chartier mostrou corn clareza comb
das "disciplinas" escolaresii E estes esta "nova instituicao" - ou seja, o colegio,
m e s t r e s - q u e n a o en s i n a m n e m , a ja estava instalada, para ',dem das
fortiori, "pregam" - mastram Cie maneira clivagens religiosas, desde o urn do
clam o que é a "relacaa pedagogica": ' Com a e mina "simuidney", a F.scala dos 1rmnos in r e as
n a o m a i s u m a r e l a c ao d e p es s o a a manuais, concrviizando rnelbar esta jam« do quo a esc-
ola 'paroquial" ou a escola de De.:Mit.,1,1-B. de la Salk
pessoa, mas uma submissAo do mestre redige, assirn, ulna "Ciedidade Crfsta" a pa rtir dos
e dos alunos a regras impessoais". Num "Tratados de Cloilidade" que foram per blicados em silo
epoca.
espaco fechado e totalmente ordenado y termo "disciplinas" for inventmio corn este sentido no
pant a realizacao, por cada um, de seus inicio do secttio XX, coma indica A. Chem ,' (1.,'bisfaire
des disciplines scolaires", in I Eistoire do l'education, Homo
deveres, num tempo to cuidado - de 1988, rt' 38) (Amigo publicado emportugu6s sob o (auto
samente regulado que nao pode deixar "HistOria das di,c,pitnas escolenvs.. nylex-Oes sobre urn
cameo de pesquisa", in Tenth & Educacao (2)• 177-229,
nenhum espaco a um movirnento 1990). Este autor percebeu flue a bisic3ria clay "disciplinas"
caviares nil° pude ser/eita scan ser conStrlf (CIO o aniceito
imprevisto, cada urn submete sua
de disc iplina, ass ns como a 'pedagokia "
atividade aos "principias" au regras que "c o m p o n e n t e i n t e r n o d o c a s i n o " e d e c o s e r
comprvendida apartirdas ;finalidades" socials der escula;
a regem. no entanto, de nab utilizou suficfenternente os trribalbos
dos soricitogo s ix.sra erpru fiandarsr.ras antilises.
Tal e, no essential, a forma escolar.
Farr relacao Were de vaguer rulaccir.s de sujuiciii., ao dc.xio
Ela define, como demonstrada, as novas de umapessoa consideradaconto.-sagrada ou pank 'pante
do sagrado; no dosejo Ott no -bent (pow" de u ma pe.Ksoa
estabelecimentos criados nas cidades, quo se manifesta necessariamente em detorminado
mas e possivel identifica -la tambem instante e de maneira i ► previsivel• a tuna pessaal,
cujo sentido, inesgotavel, devera serdecifrado...
nas mudancas ocorridas nos o meshy obedece ias regras da "Conduta das escolas "e son
es t ab el eci m en t o s e xi s t en t es , p r i n - papeljunto no aluno se redi4Z a recordar-Ibe as regras,
aWnalando-lbe as/alias comet idas quando oeduccerido
cipaimente os Colegios. Sake-se que P. rata icitdo em vo. z (du-4, mostrandra-lbe por meio do "sinar
urea day sentencas inscritas sobre as pare.des„ etc. Como
AriLs foi urn dos primciros a sublinhar
se IA o ahino nu nca tem de se refer ir a manyestacaa
(sem, no entanta, analisar) as mudancas urn desejo do rnestre; akin disso, a autoridade deste su
prole vir de sua propria submissa o tas rBras.
q u e d e s e mb o c a r a m n a cr i a c a o d o s Ari6s, Enfant et la vie familiale sous i' Anders itOgime,
Colegios dos Jesuitas e fizeram passar Paris; Ed. du Scull, 197.3,.p. 18•

"d e u ma co mu n id acl e d e mes t res e


alunos ao governo severo dos alunos
pelos mestres", do cnunciado das

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Sobre a historia e a teoria da forma escolar

seculo XVI; como, na sua conquista dos p ret end e a es col a da 3 R epub li ca,
" m u n d o s u rb an o s " , a "n o v a f o r m a continua senclo urn aluno l6
escolar"" reencontrara a resistencia de Se e isso o que se passa e porque
uma parte das elites ligacias aos "modos emergencia da forma escolar
de formagao tradicionais"; como, enfim, contemporanea a uma mudanca em
no proprio arnago da pedagogia do politico (e no religiose) mais fundamental
Colegio, "as regras e a disciplina da arte que as rnudancas de regimes ou
retorica se constituem urn dos exercicios
instituicoes politicos que marcaram as
que mais severamente reprimem a
sociedades europeias a partir do seculo
espontaneidade"'s
XV II ( mo n a rq u i as p a r l a m en t a re s ,
A definicilo proposta em re!acao "repUblicas"...).P. notamos a preocupacao
forma escolar, a partir da qual se pode cum a ordem pUblica que presidiu a
co mp reend er as caract eris ti cas das desenvolvimento das escolas urbanas. 0
praticas escolares (principalmente dos caraterpablico da instrucao é lemhrado
"exercicios" que ja na.da tern a ver corn hem antes dos pianos de "educacao
os "exercicios" religiosos, apesar do que national" que precederam
foi afirmacla par Michel Foucault, uma acornpanharam a Revolucao' 7. E se, na
lenta progressao exigida pela primeira metade do seculo XVIII, os
conformidade corn a regra em cada Fisiocratas sao conhecidos par terem sick)
etapa...) permite, igualrnente, clefensores da instrucao do povo par
compreender suas variantes coma as
negacoes mais ou menos radicais, par " R. Chartier, M.-M. Compere e D. Julia, I:Education ell
France..., op. cit., p. 173.
exempla, no momenta d.a Revoluck) de ibicl.,p. 197.
1789 — tal como apareceram entre Os rr Se aconipanbas- •semos a hestoria das ideinspeda,q(5,i; ice's;
seria neces.cario estabelecerparaklismos entre rt maneint
seculos XVIII e XX. Corn efeito, para como.foi coclificaela a relacciol_.,eclagr.;gica ?to seculo X
171 a as tests de Kant a de Rousseau. bem conhec ace,
entender a pedagogia das Luzes hasta no Ora Emile, a suptvssao da relac-ao da au
conceher a regra nao mais coma toridadeIxNso(11; em Kant, a crianca se s•bmate [as lc is
con...Whirl:Jos do ordem escolar:, Ple10 porque, em sear
imposicao do exterior a todos, mas coma entender, elas sejaara loclaviuslificadas, mas porque ela totna
constienc Ea eta univcrsalicladc de tais leis.
man ifestacao, em cada um, de uma Razao
37 G. Vincent, "Plans d'education a Lyon entre 1 761 et
universal_ Do mesmo modo, a cidadao 1783", Comunicacdo fella na 12' Sessao clo 1.r.cC1 1E,
respeitoso e ohediente, conhececlor de PraRa, agosto cie 1990 (no Pre10).

s eus d i rcito s e, sob ret udo, d e se us


deveres, correspondendo ao que

76 Educacao em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a historia e a teoria da forma escolar
razoes econetmicas, urn doles, 'forgot, IJ-Formas sociais escriturais-
destacou o papel politico da escola, mais escolares e formas sociais orais:
cxatamente, seu lugar nas relay5es modos de conhecimento e formas
politicas, na instauraeao de uma nova d e exercicio do pod er
relaeao de clominaeao. C ❑nsiderado
A andlise sociogenetica da forma
(retrospectivamente) coma defensor da
escolar coma forma de relacaes sociais
separaeao entre ❑ Estado e a Igreja,
perrnite tornar estranha a nos mesmos
corn o objetivo de abolir a taxa a ser
esta realidade social, hoje onipresente,
gaga ao Rei e a major parte dos direitos
desnaturalizando certas nocbes
feudais, alem c.le suprimir as
co n s t i t u i d as f r eq u en t e rn en t e co r m
corporaeoes, o ministro que perdeu a
cat egari as gen eri cas : "ecl u caeao ",
protec10 de Luis XVI - deposirou uma
"pedagagia", etc." Segundo parece, a
confianca sem limites, coma sublinhou
forma escolar de relaeOes sociais .s6 se
Tocqueville, em "uma certa insulted°
capta completamente no ambito de uma
pdNica ministrada pelo Estado,
configuracao social de con:junto c,
segundo certos procedimentos e
p art i cu l armen t e, n a l i gaed o co rn a
corn certo espirito". "As crianeas que tern,
transformaedo das formas de exercfcio
atualmente 10 anon, escreveu ao Rei,
do poder Como modo de socializaed°
tornar-se-ao, entdo, h o men s
especifico, isto e, como espaco oncle se
p rep a r ad o s p a ra o Es t ad o , afeicoados
es t ah el ecem fo rmas es p eci f i cas d e
act seu pais, submissos - ado pclo terror,
relac.:Oes sociais, ao inesmo tempo que
Inas pela razao a autoridadc, soliclarios
transrnite saberes e conhecimentos,
corn sous cancicladdos, acostumados
escola esta fundamentalmente ligada a
a reconhecer e respeitar a justica."'
formas de exercicio do poder. Ista é
A saciogenese permite, portanto,
verdadeiro rid° so em relaedo ii escola:
estabelecer que existem relaeOes entre a
qualquer modo de socializaeao, qualquer
forma escolar c outras formas sociais,
principalmente, politicas. 0 de Tocqueville, 'Notes sur Turgor, in L'Ancien Hkglllle
et la R6volution, I. 2, Oeuvres comp1aes, 1.11. Galltinat.
aprofundamento fiestas relaeoes passa
1953, P. 4 / 8 '
pelo aprofundamento da questa° this " Digamos de moth. ■ mais clam clue, tvdazindo a anal ise
• soc lo-bistorica historiogreffia, rzao sena passimi capiar
culturas escritas. sea importd nci a para a analise do 'presenlo".

Educagao em Revista, Bela Horizonte, n° 33, jun/2001 ............................................................. 17


Sobre a historia e a teoria da forma escolar
forma de relacbes sociais, implica ao teoricamente, a oposicao entre formas
mesmo tempo na apropria0o de saberes socials escriturais/formas socials orals
(constituldos ou n'ao como tais, isto Clue permite tornar valid° um conjunto
coma saberes objetivados, explicitos, coerente de fenomenos. Num primeiro
momento, vamos operar a comparacf.to
s i s t e m at i zad o s , co d i f i ca d o s ) e n a .
(que sera brutal para nao alongar a
"aprendizagem" de relacOes de poder.
exposicao, para fazer aparccer melhor
A anali se p ermi t e evid enci ar as certas oposicOes e, por isso mesmo, a
ligacoes profundas que unem escola e especificidade da forma escritural-escolar
cultura escrita num todo sOcio-instOrico: de relacOes socials) entre a situ:ac.5o das
constituicAo do Estado moderno, a formacOes sociais dominalas pela lOgica
progressive autonomizacdo de campus de das formas socials orais e a situacdo das
formacOes socials "na escola". Em seguida,
praticas laeterogeneas, a generalizacdo da
destacaremos algumas implicacOes em
alfabetizacito e da forma escolar (lugar
materia de construcao do objeto.
especifico separado, baseado na
objetivacao-codificapi.o-acumulac,lo dos 1. Formes sociais orals
saberes), assim como a eonstrucilo de u ma a - Formas socials orals e formas de
relaciio c1istanciada da linguagem e do exercicio do poder
mundo (relaccio escritural-escolar coma

cc lingual ern e corn o mundo) clevern As sociedacles "primitivas" - sociedades


ser pensadas como modaliclades dominaclas quase inteiramente pela lOgica
especificas de uma realidade social de clas formas socials orais sac) definidas
conjunto, caracterizada pela generalizacao tambem como sociedades "acefalas",
de formas sociais escriturais, into é, de "sem Estado", "segmentarias" ou haseadas
formas de relacOes socials tramadas por
B. Labire, Formes sociales scripturale.s et formes soda les
praticas de escrita e/ou tornadas possiveis orales: uric analyse .5(..)ciologique de 1-ecliet: surl.rire" :r
primaire, Thse de doutotado em Soc. iologiar tne.01.-0
pelas praticas de escrita e pela relacao
de 1990, Universite LuntiOno lyon 2, 1016 p.
corn a linguagem e c o rn o mundo que 2/
Cf: Li. Labirc, "Sociologic des prcrtiques d'ocriturc..
contribution 13 l'analyse du. lion entre to social el lc
2
thes e indissociavel ". langagier; in Ethnologic francaise, 1990/3, p.262-273.

Se evitarmos, sistematicamente, as
armaciilhas classicas ass ociadas as
oposicOes entre oral/escrito, oralidade/
escrita 2 t, podemos entir.to construir,

18 Educacao em Revista, Belo Horizonte, no 33, jun/2001


Sobre a historia e a teoria da forma escolar
na "linhagem' , Da mesma maneira que, politico, podem existir separados do rest°
propriamente falando, ado se pode utilizer das atividades sociais.
o termo religiao para justificar certos
Do ponto de vista econatnico, esta
fenomenos mitico-rituais dessas
situacao impede qualquer acumulaca°
formagOes sociais ja que nao existe
primitiva de urn capital economic°. Do
nenhum corpo de saber, nenhuma
mesmo modo que nao existe religiao
doutrina ou instituicao religiosa, separados
separada, assim t ambem nao existe
claramente do conjunto das atividades
campo autonomo da cconomia. Eis o que
sociais, tambem nao se pode falar de
mostrou M. Sahlins ao falar de urn modo
politica no sentido de uma pOtica politica
de producao domestic° que nao estii
autOnoma, diferenciada das outras prjticas
voltacto para a producao de mais valia,
sociais.
nem afinal de contas para a troca
A ausencia (este termo marcado por c o m e r c i a l . E p o r e s t a r az a o q u e o
forte carga negativa nao Cleve ser lido economismo se engana a propOsito do
co ma u ma caren ci a) d e u ma fo rma universo por nao ter operado a clissociacao
qualquer de Estado, quer diner, de uma entre a economia e as outras esferas de
instituic.-ao de pocler separada de outras atividacle" .
instituicbes que viria a se impor a todos,
No entanto, estabelecer um vincula
esta ligada ao tipo de legitimidade que
entre a ausencia de um campo
constitui a especificidade miLico-ritual. A
economic° autonomo e a ausencia de urn
autoridade e colocada fora da comunidacie
p o d er po l i t i co s ep arado n ao C l eve
dos homens. Os homens sao
conduzir a criar uma relacao de causa e
desapossados (ou se desapossararn) das
efeito entre esses fenornenos: seja do
"normas" 23 que servern de fundament°,
economico na direc.!ao do politico (para
legitimam e organizam seas praticas
numerosos antropologos marxistas), ou
sociais. Nenhum homem da comuniclade
do politico para o econOmico".
pode pretender encarnar ou deter a
22G. Balandier, Anthropologic poiitique,1-Uh; 1967. 240p.
autoridade que lhe permitiria, segundo a :" As aspas sao iMpOreantes.
afirmacao de M. Weber, "ter uma chance =4 Via P. Liourdieu, Le Sens pratique, Menu it, 1980, 475p.
2 P Clasires ascrete 'A ir0-a-estrutura e o politico ( ....)
5

de se fazer obedecer". A medida que a enquanto a superestnitura eu (Z0116MICO.; iti La Soci6te


sociedade encontra seta fundament° "no contre Minuit, .1974, p. 172.

exterior" dela mesma, nenhum poder


human°, instituicao humana ou esfera do

Educacao em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ................................................................. 1 9


Sobre a histaria e a teoria da forma escolar

Ern definitivo, "é no grau is concretas e particulares, alern de estarem


objetivacila do capital que reside o indissociavelmente ligados a urn fazer, urn
f un d amen t° d e to d as as d i f eren cas agir, as "normas", os "saberes" e "saber-
portinentes entre us mocks de fazer", estao, portanto, fundidos neste
dominacao: Os universos sociais em que fazer, neste agir. Como as formas sociais
as relacoes se fazern, se dcsfazem c sc orais implicam uma villa incorporada ao
refazem na e pela interacao entre as estado de corpo dos "saberes", e sua
-
pessoas, opOem-se as formacc .5es sociais imanencia a situacOes sempre particulares,
em que, mediatizadas por mccanismos os sujeitos socials sa° tanto mais movidos
objetivos e institucionalizados - tais corno por seus "saberes", mitos, ritos, etc., na
o ` m e r c ad o a u t o - r e g u l av e l ' ( s e l f - mcd.ida em que niio as utilizain
regulating market) no sentido de Karl conscientemente•
Polanyi, o sistema de ensino ou o aparelho
A solucao - que poderia ser
j urid ico - el as tem a op acid ad e e a
considerada iOgica (Inas trata-so de uma
permanencia das coisas e cscapam as
logica totalmente social) -, para esta
tomadas do consciencia e do pocler
situacao do dcsapossamento em telacao
inclividuais"26. Nas Formacaes sociais em
aos saberes, saber-fazer,
clue tuclo estdligado ao estacia incoToraclo
dos saberes e saber-fazer, dos costumes, rituals, etc., consiste numa acllo de

tradicOes, mitos e ritos, isto e, a formas desapossamento (coletivamcnte)


assumido em relacao a urn passacio
sociais orais, locais, semprc contex-
fundador e a uma origem pft,'-humana (os
tualizadas, nada au muito pouco do que
cleuses, as ancestrais, us herdis culturais).
faz a grupo (as "raormas", us "saberes",
For nao poderem possuir vercladei -
etc.) aparece verdadeiramente coma tal
ramente os mitos e us ritos, as saberes e
para as sujeitos sociais". Eles proprios os
os saber-fazer - em sintese, tudo o que
possuern e procluzem, mas de tal maneira,
perrnite a perduracao de seu universo
segundo urn modo tal que orais ,

social -, objetivando-os, isto e, destacando-


possuidos por ales do quo os possuem
as nao somente de seus corpus, das
verdadeiramcnte. Sobre isso repousaria
P I3mirdfoo, de Sens pigigue, op. cit.,p. 224.
urn podcr separado, uma vez que
Esta fbi ca capressao quo considera mos mars
nenhum principio, rcgra ou lei aparecem adequadapara a traduce-it) do -61'ms sociaux"

como tais. Sendo imanentcs as praticas


sociais contextualizadas, sempre

20 Educagao em R e v i s t a , Belo H o r i z o n t e , n ° jun/2001


Sabre a historia e a teoria da forma escolar
pessoas cletentoras (testes saberus, etc., determinados mitos sempre cfctuados ern
mas t amb em d as s itu acoes p rati cas situacoes particulares. 0 aspect° local,
s emp re parti cul ares C ie s eus u sos, especifico, contextual dos ritos e rnitos
mobilizacOes e realizacoes, Os sujeitos esta indissociavelmente ligado it sua
socials deltas forrnacOes socials os iinanencia nas relacoes socials e a sua

colocam fora do alcance de tacos. Como invisibilidade do panto de vista dos atores
que, portanto, csta° despossuldos dos
a objetivaciio permite, entre outros
mesmos. Pam que possa existir urn poder
aspectos, conservar e acumular, su a
separado, sera necessario, ao mesmo
ausencia ou seu grail extremamente fragil
tempo, u inn objetivactio dos mitos
de clesenvolvimento Faz corn que certo
separados this pessoas (desincorporacao);
prestigio possa ser temporariamente
sua vistiedizacao e conscientizactio pot
adquirido, embora seja questionado
parte dos atores e, portanto, a
imediatamente apOs. As relac(7)es de
possibili.dade de ficarern ao alcance
dependencia que podem existir nessas (testes;seu desvincitictmento
formacoes socials que sc cxercem "de relativarnente a inviltiplas situacoes
pessoa para pessoe's c sac.) "o produto imediatas, a maiplas acOes nas quits eles
de uma verdadeira criacao continuada" 29, passim agir; e sua relativa e progressive
nao podem, portanto, desembocar na des-localizacao— outros tantos fatos que
constituicao de uma verdadeira rela0o supoem a escrita e a acumulacao escrita
d e do min aca° qu e i mp li cari a q ue a do capital cultural.
legitimidacle ja mio fosse remctida a urn Ndo 6, portanto, cspantoso que se
passaclo mitico, mas aparecesse como possa escrever, como fez G. Balandier,
relacionada (de uma mancira ou outra: que "nas sociedades dims segmentarias,
sob a forma de representantes do ou dos a villa politica difusa se revela Ma is pelas
deuses, ou sob a forma de representantes situacoes do que pelas instituicOes
this leis, do povo, etc.) a sujeitos sociais Trata-se, confoime expressao de
particulares (e diferentes dos outros).
" P Boiordieir, "Les modes- cle domination-, in AtIcs dt2 La
Alem do mais, urn pocler separaclo recherche en sciences sociales, rd" 2-3, t.k? 1976,
p. 126.
suporia uma especie de cuntralizaciio dos p. 128.
mitos e ritos, dos saberes c saber-fazer.
Ora, apesar do que os estruturalistas
deixaram entencler, tambem nao existem
variantes estruturais de urn Nlito, mas

Educacao em Revista, Reio Horizonte, no 33, junI2001 ...............................................................21


r'Et
o b— Formas sociais orais, "-saberes" e
G.-A. Almond, de sociedades em que
L) modos de apropriação de "saberes"
cu as estruturas políticas são as menos
E `visíveis' e as mais 'intermitentes - -' . É difícil compreender bem todas as
c3
1

Estas reflexões vêm de encontro às implicações cognitivas ligadas a um modo


advertências de P. Bourdieu sobre a de socialização oral, a formas sociais orais.
adequação do "olhar interacionista" em Da mes ma forma que se vê co mo o
relação às sociedades sem escrita. Num fundamento da legitimidade dos mitos,
artigo sobre os modos de dominação, o colocado no exterior das ações humanas,
autor observa que o olhar interacionista está logicamente ligado às formas sociais
ro
E que ignora "os mecanismos objetivos e orais que os caracterizam, também se
sua eficácia" e, deste modo, "se vincula pode mostrar como o modo de
ãs interações diretas entre os agentes, conhecimento (que se acha também nos
encontraria seu terreno de eleição" nas mitos, poesias orais, saberes e saber-fazer,
sociedades sem "mercado auto - etc.) destas formações sociais adquire toda
regulável", sem "sistema de ensino", sua coerência desde que não seja
sem "aparelho jurídico" e sem "Estado". separado das formas de relações sociais
Inversamente, o estruturalismo "como através das quais ele se constrói. É
ciência das estruturas objetivas do possível compreender, além disso, os
mundo social („.) nunca é tão vínculos íntimos que unem um tipo de
inadequado (ou menos fecundo) do que legitimidade, um modo de conhecimento
quando se aplica a sociedades em que e determinadas formas de relações sociais,
as relações de dominação e m o s t r an d o , co m o d i z i a m B e r g e r e
dependência são o produto de uma Luckmann, que "a legitimação não é
verdadeira criação continuada" 1 . Uma somente uma questão de 'valores', mas
vez que a "cultura", os "mitos", os
"saberes", etc., não estão separados dos '" G. Balaudier, Anthropologie politiquc, op. cit., p. 77.
3
' Liourdieu, "Les modes de domina/íon"; op. cit.. p. 122123.
corpos e das múltiplas situações de sua Nesta anotação, P Rourdicu (como G. L3Marmlier)delintita.
ap l i cação , as i n t eraçõ es d everi am o que tem sido designado por campos de pertinência
nbpectioos do uzteracéonismo e do estruturalismo. (!:
constituir os objetos privilegiados de falaire, 'Linguistique/écritore/pédaogie: champs de
análise por parte dos analistas destas • pertinence et transferis illégaux", ira Ioninie et la
société, 199/, n' especicd ' 1hüorie .socit..de et théorie cio
sociedades". sujet"..

22 Educação em Revista, Belo H or izonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
implica, igualmente, Econhecimento'," 33 quer dizer, de nosso ponto de vista, do
Nas formas sociais orais, os mitos e os ponto de vista daqueles que participam
ritos, os "saberes" e saber-fazer só existem, de universos sociais nos quais o saber (no
corno disse Bourdieu, no "estado caso, o saber cientifico) é objetivado,
incorporado"' . Isso significa que o grau separado, autonomizado, etc.; no entanto,
de objetivação dos "saberes" e saber-fazer a seu respeito, devemos dizer que ele é
35
se encontra a zero ou quase zero. imanente às situações e às pessoas que o
i n co rpo raram, al ém d e p erman ecer
Os "saberes" e saber-fazer não
invisível do ponto de vista nativo -"
existem senão acionados em situações
(endógeno). Ele não aparece corno tal
sempre particulares de uso. A
do ponto de vista daqueles que o detêm
aprendizagem se opera na e pela prática,
no estado incorporado.
de situação em situação, de geração em
Portanto, o processo de "aquisição"
geração; aprendizagem pelo fazer, pelo
supõe a mimese e a identificação: "o
ver fazer, que não necessita de explicações
p ro cesso d e aqu is ição, mi mese (ou
e não passa necessariamente pela
linguagem verbal. mimetismo), prática que, como
fingimento, implicando uma relação
Pode-se perguntar com G. Spindler se,
global de identificação, não tem nada de
neste caso concreto, a existe transmissão
u m a i m i t a çã o q u e s u p õ e o es f o r ço
de "cultura" 3 '. Questão fundamental na
consciente para reproduzir um ato, urna
medida ern que esse modo de transmissão
fala ou um objeto explicitamente
d o "s ab e r " d es af i a t o d as as n o s s as
constituído como modelo, e o processo
concepções do que podemos entender
por cultura ou por saber. As crianças são de reprodução que, corno reativação

colocadas no fluxo do fazer e do dizer e


P Berger e T Luckniann,la Conmruction sociale. de Ia
"aprendem" nesse próprio fluxo. Esta réaliié, 195'6, p. 129.
P. Bourdieu, "Les mode; de domination", op. cit.,/,. 121.
situação reforça a evidência das práticas •5 "Quase" porque ; ck! falo, existe urna pictorIcidade
efetuadas, Aprendizagem no decorrer da qual alguns pudetrom as premissas. da "escrita'.
G. Spindler, "'Ibe transmission gfculture'; inEducution
prática e não separada das práticas, and Cultural Process. Toward an anthropology ar
"saber" que não existe fora das situações education, Nova York, Holt, Rinebart & Winston, /974,
p. 281.
de sua efetivação, de sua mobilização e, ",V-k.: No oriinal, i ncligcne.
indissociavelmente, de sua
aprendizagem. Existe de fato um "saber",
uma "cultura" transmitidos, objetivamente,

Educação em Revista,. Belo Horizonte, n° 33, jun12001 ......................................................... 23


Sobre a história e a teoria da forma escolar

prática, se opõe tanto a urna lembrança o que seria da ordem de sua recitação. É
quanto a um saber, tendem a se realizar isso que nota C. Geertz a propósito da
aquém da consciência e da expressão, poesia oral que "não é, em primeiro lugar,
portanto, da distância reflexiva que elas co mp o s t a e d ep o i s r eci t ad a, mas é
supõem. O corpo acredita no que elaborada no decorrer da recitação,
representa: ele chora se imita a tristeza. construída enquanto é cantada num
Ele não representa aquilo que recinto público"" , De fato, esta partição
desempenha, não memoriza o passado, em momento da redação, momento da
aciona o passado, assim anulado como aprendizagem "de cor" e momento da
tal, ele ❑ revive. O que é aprendido pelo recitação, não tem nenhum sentido nas
corpo não é alguma coisa que se tem, formações sociais sem escrita, sem
como um saber que se pode segurar objetivação/desincorporação/
diante de si, mas alguma coisa que se é. desligamento/separação dos saberes.
Isso se vê especialmente nas sociedades Tudo isso explica que tenha sido
sem escrita em que o saber herdado só pos.3ível caracterizar o "pensamento
pode sobreviver no estado incorporado. mítico" pela ausência de "espirito crítico"
Nunca separado do corpo que o carrega, ou de "ceticismo'. O que se entende
só pode ser restituído mediante urna habitualmente por crítica, é a possibilidade
espécie de ginástica, destinada a evocá- de comparar, encontrar contradições ou,
lo, mimese que, segundo já fora observado ainda,
por Platão, implica um investimento total
P Botoslien, Le Sens priLtique, op. eit ., p 123. Compreende-
e uma profunda identificação se que a teoria construída por P. Brun-dica seja
emocional"' . particularmente actaptada para explicar as praticas
sociais em formas sociais orais. Quando R Bourdieu
Como não existe nenhum lugar cogita sobre a gênese da constrnçdo do conceito de
"habitus' e de sua teoria da prú rica, ele illdica que emes
s ep arad o d e aqu i s i ção d e u m s ab er dois aspectos foram constituídos para otostirtr certas
específico, é preciso sublinhar ❑ fato lógicas sociais de universos corri .fraca objetivação-
codificaçao (sem instauiçãojtuldica, estatal, escolar,
importante de que o tempo da prática é etc». P. Bourdieu., "Habitas, cnute et codification", iri
confundido com o tempo da Metes de la recherehe en sciences socialcs, o" 64, set. de
1986.
aprendizagem. Isso é válido tanto para
3
' C. Geena, Savoir local, savoir global, PtJI 1.986, p. 142.
aquele que entende, vê e se identifica at' Ver, em particular, H. Horton que cita e critica J. Good),
com aquele que pratica o ritual e enuncia eutl.:i Raison graphique, 1979,p. 96.

os mitos, provérbios, etc., como para este


último que não está sabendo da separação
entre o que seria da ordem da redação e

24 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
Interpretar, ou seja, outros tantos cont radi ção. Do pont o d e vis ta dos
d ispos it i vos p ecul iares a modo s de sujeitos sociais que participam destas
c o n h e ci m e n t o e s c ri t u r ai . C o m o as formas sociais orais, as categorias que eles
condições de produção/reprodução/ utilizam ou associam estão ligadas a cada
aquisição requerem a identificação e a contexto específico de uso. Para
mimese no decorrer de uma única e compreender isso, é preferível adotar
mesma prática, C. Lévi -Strauss pôde uma sociolingüística pragmática, em vez
escrever: "O pensamento selvagem não de uma lingüística estrutural formalista.
estabelece distinção entre o momento da Se o uso de urna categoria ou a associação
observação e o da interpretação, do de categorias (por exemplo, negro e
mesmo modo que não é pela observação mal, moça e esterilidade, etc») nem
que, em primeiro lugar, são registrados sempre estiveram ligados a contextos
os sinais emitidos por um interlocutor e esp ecífi cos e se vieram a se to rnar
só depois seria feita urna tentativa para evi d en t es p ara aq u el es qu e u s am e
compreendê-los: ele fala e a emissão asso ci am s em saberem e s em t erem
sensível traz com ela seu significado' . necessidade de saber que categorizam

A idéia segundo a qual os "primitivos" e associam, isso significa que se passa

seriam "quase sempre indiferentes à do uso prático para o uso reflexivo, da

contradição', se esclarece a partir das "analogia como esquema prático da

mesmas razões. O "mito" se adapta a cada ação ritual para a analogia como objeto

contexto de enunciação. Pode, portanto, de reflexão e como método racional

nas múltiplas enunciações e dentro das do pensamento"' .

necessárias variações aparecer do ponto A analogia prática, contextuai, produto

de vista de um modo de conhecimento de situações e sempre reempregada cm


escriturai como um discurso incoerente
"C. Lévi-Stranss.l.a Pcnséc sauvuge, Pkm, 196 2, p. 211-
que, ao mesmo tempo, diz branco e preto. 29 51NT; Obra disponível em portufflrês sob o títuto0
pensamento selvagem, traduçtio de Maria Celeste da
Ora, é justamente porque aquele que Costa e Souza e Alneirde Oliveira Aguiar, MA/ia/riu »chis
enuncia o mito ou aquele que o entende Editoras Nacieniol e da USPJ.
41
C. Wry-Bruhl, ivIentaIite primitive, PU.: 1960, ». 85.
não o diz e nem o entende "ao mesmo Goodv La Raison graphique, op. cit., p.131.
tempo", mas sucessivamente, em
44
P. Bourdieu, Le Sons pratique, op. cit., p. 42.5.

situações, com platéias e em momentos


diferentes, que eles podem ser
"insensíveis" ao que nos parece ser uma

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 .................................................................. 25


Sobre a história e a teoria da forma escolar

novas situações só poderia ser sistemática correspondência estreita entre a palavra


se os contextos estivessem congelados, e a coisa"' . R. Horton define o
sempre imutáveis. O variável, o pensamento mágico como um
contraditório, o parcial, ❑ ilógico, eis as p e n s a m e n t o n o q u al " as p a l a v r a s ,
fo rmas so ci ais o rais e o s modo s de as idéias e ❑ real estão
conhecimento que lhes estão vinculados, intrinsecamente ligados'. Por sua parte,
vistos através de determinadas formas B. E Whorf observou que no "universo
sociais escriturais. Não se deve atribuir mental dos hopi", o "pensamento" não
mais coerência aos modos de está isolado do "espaço real'''. Não será
conhecimento do que eles já são possível continuar a enumeração dos
portadores, como tem sido defendido autores que têm apresentado o
pelos estruturalistas' , nem conjeturar um pensamento mítico desta maneira. Alguns
espírito ilógico, incoerente, contraditório acrescentaram que a indistinção atinge
(no caso extremo, próximo do não somente "linguagem" e "real ",
comportamento do louco) como é "palavras" e "coisas", mas ainda, de modo
apontado por tantos antropólogos mais preciso, linguagem/pensamento/
(colocando desta maneira na cabeça dos sujeito falante/real_

sujeitos sociais o produto da relação entre Ora, uma vez mais, esta característica
dois universos sociais diferentes). As do pensamento mítico se compreende
contradições são perfeitamente coerentes perfeitamente se o considerarmos como
do ponto de vista da lógica social das sendo produzido em formas sociais orais,
formas sociais orais. no âmago das quais a linguagem e a fala

O "pensamento mítico" ("mágico",


g-, Ver./ Goody, La Raison waphique, op. cit., eevxciahriente
"selvagem", etc.) é definido, com o cap. "Ecriture et classiftcation ou l'art dejouersur
les tableaux”, p. 108-139.
freqüência, pelo fato de que ele não " E. Ciusítur Luigage et myt I ie, Mimiit, 1973, p. 75 ÍN.7::
1

d i s s o ci a as p al a vr as e a s co i s as , a Obra disponhvl em português sob o trtuloLinguagem e


mito, Paduçãodej. Guinsburge Miriam Schnaidermun,
linguagem e o real, E. Cassirer caracteriza revi.scio de Mary A mazonas Leite de Barros, publicada
o mito pela "relação de identidade, de pela Editora Perspectiva na col. 'Debates'],
47
E, Sapír,LinguisLique, M 'nu it, 1968, p. 35.
coincidência completa entre a 'imagem' -" Citado em J. Goody, I a Raison graphique, op. cit., o. 93,

e a 'coisa', entre ❑ nome e ❑ objeto'''. ' B. L i n gu i s t i qu e e t a n t l i r o p o l o gi e , no tt oê l f


4

Médiations/Gonthier, 1969, p. 97.


E. Sapir sublinha "o sentimento difuso -
em particular, nos primitivos - de uma
quase identidade ou de uma

26 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
só existem nas múltiplas relações sociais, es t a co mo t al . El e s n ão s ep a ra m a
complexas, circunstanciadas, imbricadas atividade diferenciante e sistematizante
em atos e ações particulares. A partir cio daquilo que ela diferencia e sistematiza.
momento em que se considera a Sem falar de ciência da linguagem, é um
imbricação da palavra na ação e nos retorno reflexivo sobre a fala que é
corpos daqueles que falam, se interdito por sua imbricação em cada
compreende a razão pela qual a situação e em cada operação sobre o
linguagem (à semelhança do que mundo e sobre os outros. Não é
dissemos a respeito do "saber" ou da surpreendente que, como relatou J. Goody
"cultura") é uma prática que se ignora a propósito das línguas Lo Dagaa e Gonja,
como tal, que se esquece no seu não haja "nenhuma palavra para dizer
funcionamento para se fundir em seus 'palavra''S". Não existe nenhuma
atos, ações, acontecimentos, situações... confusão, propriamente falando, entre as
Nada permite deslocar ou descolar o palavras e as coisas, mas uma lógica social
sujeito falante de sua fala para lhe fazer particular no cerne da qual a distinção

entrever seu Funcionamento interno. entre a "linguagem" e o "mundo" não é


pertinente. Distinguir entre as "palavras"
Se o nativo destas formações sociais
e as "coisas" supõe, de Fato, um conjunto
simboliza, produz sentido, classifica o
coerente de transformações sociais
universo, isto é, produz uma distância
logicamente ligadas, tais corno o
simbólica entre ele mesmo e o mundo
surgimento da escrita, de uma instituição
através de suas práticas de linguagem,
de poder separado, etc.
elo não pensa essas operações como
acabamos de enunciá-las. 2. Formas escriturais-escolares

Nas Formações sociais em que, em de relações sociais


nenhum momento, o saber é separado
• Entremos, agora, numa configuração
das práticas sociais do grupo, mas se
s o ci al d e co nj u nt o co mp l et amen t e
transmite na prática, no âmago cla prática,
distinta: a França urbana do fim do século
numa participação, numa mimese e numa
identificação, o que é feito (dizendo), o Goody,12 Raison graphique, op. cit., p. 202.
que existe e o que é dito (fazendo,
agindo) é absolutamente indissociável. Os
sujeitos sociais estão presos na linguagem e
não exercem nenhuma influência sobre

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ........................................................ 27


Sobre a história e a teoria da forma escolar
XVII à primeira metade do século XIX. de atividades e a posições sociais muito
Apesar das diferenças importantes entre diferentes.
Charles Démia que abre sua primeira Podemos tomar o exemplo das
escola para os meninos pobres da escolas lassaleanas. São lugares fechados
paróquia Saint-Georges, em Lyon, em específicos. Primeiramente, estas escolas
1667; J. B. de La Salle em torno de quem, são lugares fechados aos olhares
por volta de 1681, se constitui o grupo exteriores e, poderíamos dizer,
d o s Ir m ã o s d as E s c o l a s C r i s t ãs ; e heterônomos. Em segundo lugar, as
personalidades, tais como Laborde, de "escolas" estão socialmente separadas das
Gérando, de Lasteyre, Jomard e Gaultier, famílias'''. Enfim, as escolas não são
sob a responsabilidade dos quais as lugares "profissionais", nem "religiosos",
escolas ditas Mútuas foram criadas à partir mas lugares no âmbito dos quais a religião
de 1815, é possível assisti à constituição (entre outras coisas'') é escolarizada. O
de formas relativamente invariantes (isto
en s i no do s Irmão s n ão se red u z ao
é, recorrentes) de relações sociais: certas
catecismo e, sobretudo, este catecismo é
formas escolares de relações sociais.
escolarmente transmitido, submetido ã
Resumiremos em cinco pontos as
lógica escolar da transmissão dos saberes.
características destas formas:
2) A escola e a pedagogização das
1) A escola como espaço especifico,
relações sociais cie aprendizagem estão
separado das outras práticas sociais (em
ligadas à constituição de saberes
particular, as práticas de exercício do
escriturais formalizados, saberes
ofício), está vinculada à existência de
objetivados, delimitados, codificados,
s ab eres obj et i vad os . A es cri t a q u e
concernentes tanto ao que é ensinado
permite a acumulação da cultura até
quanto à maneira de ensinar, tanto às
então conservada no estado incorporado
práticas dos alunos quanto à prática dos
torna cada vez mais indispensável a
mestres. A pedagogia (no sentido restrito
aparição de um sistema escolar. Com a
generalização das culturas escritas em
" j. B. cie Lu Salle, Condintes des é.coles chrédennes,
campos de práticas heterogêneas, a [ n t r o du c t i on e t n o t e s c o m pa r a t iv o s a ve c l ' é c l i t io n
Kinceps de 1720, Pmet.cregérterule, 1951, p. 235-237.
escola torna-se o lugar cada vez mais
Hébrarcl, "Lu scolarisation...",op. cit., I,. 7-8.
central, o ponto de passagem obrigatório
para um número cada vez maior de
sujeitos sociais que se destinam a tipos

28 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, junI2007


Sobre a história e a teoria da forma escolar
da palavra) se articula a um modelo do ponto de vista da codificação do

explícito, objetivado e fixo de saber a conjunto das práticas escolares: dos

transmiti r. Os saberes o bj etivados, s a b e r es en s i n ad o s ao s mé t o d o s d e


explicitados, fixos, que se pretende ensino, passando pelos aspectos mais
transmitir colocam um problema insignificantes da organização cio espaço
historicamente inédito quanto ao modo e do tempo escolar, nada é deixado ao
de transmissão do saber. Trata-se de fazer acaso, tudo é objeto de escrita,
interiorizar, pelos alunos, determinados decomposição, fixação dos movimentos
saberes que conquistaram sua coerência e das seqüências, permitindo assim urna
na/pela escrita (através de um trabalho sistematização reforçada e um ensino
de classificação, divisão, articulação, simultâneo. E como tudo foi escrito,
estabelecimento de relações, comparação, previsto, controlado, codificado por
hierarquização, etc.); trata-se de fazer antecipação numa série fastidiosa de
reviver, por um trabalho vivo específico descrições-prescrições, certos mestres
(a prática pedagógica), os resultados cio
bem formados podem passar
trabalho passado. Historicamente, a
despercebidos em proveito de
pedagogização, a escolarização das
funcionamentos escolares mais estritos.
relações sociais de apren dizagem é
J. B. de La Salle sabia bem que - por
indissociável de uma escrituralização-
exemplo, para que em todos os lugares
codficação dos saberes e das práticas.
onde se instalassem as escolas fossem
Urna pedagogia cio desenho, da música,
uniformes as práticas (ou seja, que estas
da atividade física, da atividade militar, da
s e rep et i ss em s em vari açõ es ) - era
dança, etc. não se faz sem uma escrita do
necessário fixar regras escritas que cada
desenho, uma escrita musical, uma escrita
mestre deveria respeitar ao pé da letra,
esportiva, uma escrita militar, urna escrita
da dança. Escritas que exigem quase isto é, sem interpretação que pudesse

sempre a utilização de gramáticas e teorias introduzir modificações: "Foi necessário

das práticas''. O modo de socialização


"1. Dagognet, Ecriture et iconogmphie, Paris; Vrin, 1973;
escolar é, portanto, indissociável da Foucault, Surveiller et punir. Na issance de la prison,
Paris, Gallimard, 1975 N.T.: Obra disponível cm
natureza escriturai dos saberes a transmitir. português sob o título Vigiar e punir: Nascimento (1:r
As escolas lassaleanas - corno as de prisão, traduçào de Ligia M. Ponde Vassallo, publicada
pela Editora Vozes]; G. Vincou!, L'Eeolc prima ire op.
Démia e as escolas mútuas - são modelos Cit

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ................................................................... 29


Sobre a história e a teoria da forma escolar

instituir esta 'Conduta das escolas cristãs' (trata-se sobretudo, conforme a expressão
a fim de que tudo seja uniforme em todas de G. Delbos e P. Jorion, de uma
as escolas e em todos os lugares onde "transmissão de trabalho" ou de
existem Irmãos deste Instituto a fim de "experiências", já que nenhum saber
que, nessas escolas, as práticas sejam aparece verdadeiramente como tal') e
sempre as mesmas. O homem está tão à aprendizagem do "ler" e do "escrever"
sujeito à frouxidão - e, até mesmo, às não sistematizado, não formalizado, não
mudanças - que tem necessidade de regras durável.
por escrito, mantendo-o em seu dever e
impedindo-o de introduzir alguma coisa 4) A escola - como instituição na qual

de novo e, deste modo, destruir o que se fazem presentes formas de relações

foi sensatamente estabelecido' . Quando sociais baseadas em um enorme trabalho

os diferentes membros da comissão de de objetivação e de codificação - é o lugar


ensino se reuniram para criar uma Escola da aprendizagem deformas de exercício
Mútua modelo, em Paris, no ano de 1815, do poder Na escola, não se obedece mais
mmstraram preocupação em relação aos a uma pessoa, mas a regras supra-pessoais
materiais pedagógicos: preparação de que se impõem tanto aos alunos quanto
silabários, confecção de quadros de leitura, aos mestres. Aliás, o professor primário -
escrita e aritmética, quadros de sentenças enquanto detentor de uma competência
morais, redação de um manual de maneira específica, garantida pelo "título" ou
a difundir o método e seus "diploma" (reconhecimento formal de
procedimentos.
uma competência mensurável por ser
3) A codificação dos saberes e práticas objetivada) - é um agente intercambiável
escolares torna possível uma que entra em relações inst itucionais
sistematização do ensino e, deste modo, objetivadas. A forma de exercício do
p er mi t e a p ro d u çã o d e efe ito s d e
54 J. B. de Lu Salle, (onduites..., op. cá p. 5.
socialização duráveis, registrados por
5. Scribrier e M. Cole. "Ilie Ps-y-cliology cot Literm_y, Harvard
55

todos os estudos elaborados sobre os University Prrss, Cambridge, Ala£Çachtis.scrist.rnd Loriclon,

efeitos cognitivos da escola" . A forma 1981, 33519,


L) lhos eP.forion, LaTransiniNsion S a V O i r S,
escolar de aprendizagem se opõe então, 1984p. 310.
ao mesmo tempo, à aprendizagem no
âmago de formas sociais orais, pela e na
prática, sem nenhum recurso à escrita

30 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
poder que se instaura na escola, fundada não se permite insulta-los; quando castiga

na objetivação e na codificação das relações deve limitar-se a aplicar a lei e não

sociais, repousa sobre uma dominação legal responder a "nenhum desejo de vingança

no sentido em que foi definida por M. particular' . Não é o mestre como pessoa

Weber: "o detentor legal-tipo do poder, o particular que aplica o castigo, mas limita-

'superior', quando institui e, portanto, se a ser o representante de regras escritas

quando dá ordens, obedece, por sua vez, à gerais, supra-pessoais, Ele mesmo deve se

ordem impessoal pela qual ele orienta suas submeter às "sentenças", impondo-se o

disposições, (...)ao obedecerem ao detentor silêncio, mostrando em cada momento o

do podei; os membros do agrupamento não exemplo daquele que cumpre as "regras".

estão obedecendo à sua pessoa, mas a Aliás, J. B. de La Salte explica que "o mestre

regulamentos impessoais' . A relação entre fará com que os alunos entendam que

os alunos e o mestre no espaço escolar é devem guardar silêncio, não porque ele esta

mediatizacla pela regra geral, impessoal, do presente, mas porque Deus os vê, e esta é

mesmo modo que com o direito codificado. a sua Santa Vontade"'" . O aluno e o mestre

Além do mais, corno escreveu P. Bourciieu, se colocam no plano exteriorizado,

"a codificação está vinculada à disciplina e objetivado das sentenças escritas; aliás,

à normalização das práticas. Quine diz, não é por acaso que, desde ❑ fim do

alhures, que os sistemas simbólicos século XVII, a palavra "regra" "assumiu o

'normalizam' o que codificam"" _ A sentido de instrução regulamentar,

codificação da organização das próprias deixando de designar a regra de vida' .

práticas e saberes escolares (por exemplo, 111. Weber, Econonlie et soeicté, Piam, 1971, p. 2.331/V.T.:
codificação gramatical) é correlativa de Obra disponível ent português sob o titulo Econoiiiiil e
Sociedade, publicwke peta Editora da (In it iersidacle de
processos extra-escolares — principalmente, Brasília].
estatais'`' -, de codificação e, deste modo, Bo•rdieu, "Habitas... ", op. cit., p. 4 1 .
' R. Chartier, "Les pratiques de l'éc.rit", inl-iistoire de la vie
5

está indissociavelmente ligada a um modo privc.e, torno 114 De Ia Rennuissance Lurnières, Paris,
Ed. da Seu fl, 1986 Obra disponível em português
particular de organização e de exercício do sob o título' Iístória da Vida Privada 3: da Renascença ao
poder, Século das Luzes, traduÇãO de Hildegard Fiest,, publicada
pela Editora Companhia das Letras]; M. Weber, hkonomie
A escola lassaleana - como a de C. et société, op. cit.
"'.1. B. de IA Salle, Co nduites..., op, cii. p. 1.55.
Démia - se caracteriza bem pela submissão a 51
Id., ihis3., p. 223.
regras impessoais. O mestre dirige-se aos G. Vincent, L'F.cc:ile primaire..., op. cit., p. 32.

alunos na 2 pessoa do plural 1"vós"e não


"tu"1 e

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, junl2001 ............................................................. 37


Sobre a história e a teoria da forma escolar

O mestre deve intervir o mínimo recepção, de mudanças de lição, da


possível: "Ele há de preocupar-se em ordem das lições, das qualidades dos
interrogar muito e falar pouco"'; . Em alunos, dos primeiros bancos, dos
todas as suas práticas, o mestre visitantes e ausentes), os educadores
testemunha o fato de que não é uma dessas escolas põem fim ao "improviso"
"pessoa". No universo fechado e que é a característica das aprendizagens
esquadrinhado pelo programa (plano que não institucionais, não sistematizadas, não
uma razão escrita se propõe a aplicar), o formalizadas, peculiares das formas sociais
mestre é despersonalizado. O mestre orais que colocam em cena determinadas
preserva, o mais freqüentemente pessoas que adaptam seu saber a
possível, o silêncio e, para isso, utiliza situações particulares. É a estabilização
determinados "sinais". Quando urna institucional da situação e a estabilização
"falta" é cometida por um educando, o escriturai do sentido (que, de fato, são
mestre indica, com seu "sinal", a apenas uma única e mesma coisa) que
"sentença" infringida que se encontra tornam o "sentido" fixo e impessoal.
afixada na parede; depois, manda-o Acontecimento sociolinguístico banal: ao
aproximar-se para castigá-lo com a férula congelarem os "contextos", os educadores
ou lhe mostrar, com a ponta de seu "sinal", congelam, estabilizam, fixam o sentido
o lugar onde será punido. dos enunciados produzidos que, às vezes,
nem chegam a ser "enunciados" pelos
Se essas escolas podem funcionar
mestres, mas simplesmente "designados"
com tão pouca intervenção "pessoal" do
(as "sentenças").
mestre, não é por efeito da crença na
presença de um Deus que veria e vigiaria Limitando o máximo p ossível

tudo" , mas pelo conjunto dos ❑ esquema de interação verbal dentro


"mecanismos" objetivados na escrita, da
preparados, codificados, regulados pelas
J. B. de [a Conduítes..., op.cit., p. 101.
codificações escritas. Com as sentenças "1 desta maneira (me certos historiadores explicam u que
torna possível a refaça - o peclagügfca. especialmente
afixadas, os cartões com o alfabeto ou as 1 Defforge, Les Petites écoles de Port-Royal, 1637-1660,
Paris, Les Editions du Cerf, 1985: ''O mundo em duas
sílabas, o quadro, as divisões e a sucessão
dimensões, onde tudo se reduz à aça° do honern sole m
das partes dos saberes, aperfeiçoados pela ufzi semelhante, da lugar ao mundo em três dimensões
onde o educando e o educador se colocam juntos na
"Conduta", o uso dos sinais, a fixação de
dependência de Deus" (p. 2691
um programa cotidiano, semanal e anual,
a ma nute nção d e " catálo go s" (d e

32 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
sala de aula à troca de perguntas, de onde o aluno não tem nada a procurar,
subperguntas e de respostas que devem nem a desejar, onde é servilmente
corresponder a quatro "condições": "-I.' acorrentado a uma imitação
que sejam curtas, -2" que tenham um Maquinar". O "adestramento" é,
sentido completo, -3" que sejam portanto, vivamente rej eit ado. Tudo
evidentes, -4" que as respostas sejam o que é ensinado deve ser explicado,
proporcionais ao entendimento dos a disciplina não deve ser suportada,
alunos, não dos mais capazes, nem dos mas compreendida e aceita. Trata -se
mais espertos, mas dos medíocres, de sempre de agir conforme as regras
sorte que a maior parte deles possam impessoais, independente da vontade
responder facilmente às perguntas que dos indivíduos (o mestre e os
lhes serão propostas" m , J. B. de La Salle monitores), mas sem as impor,
pretendeu despersonalizar as relações p a s s a n d o p o r c i m a d o
sociais, constituir o educando como aluno- "consentimento" dos alunos. Ao
disciplinado e limitar toda polissemia que co mp reen d er as regras , o alu no s e
impedisse o bom desenvolvimento das apropria delas por si mesmo e pratica
atividades escolares (como é o caso, por uma espécie de auto -disciplina, um
exemplo, em relação à ordem militar). "self-governement": "A razão é,
portanto, o poder sobre si mesmo que
Tal aprendizagem submetida a regras
substitui o poder de um outro,
impostas do exterior vai, rapidamente,
ex e rci d o a p a rt i r d o i n t er i o r '
sofrer uma crítica. Aprender conforme
determinadas regras sem as compreender Não é por acaso que a escola mútua

vai, em breve, ser rejeitado. A é, na própria época de seu

transformação do discente disciplinado funcionamento, comparada explici -

e "adestrado" em aluno "inteligente" tamente ao regime constitucional: "O


que supõe uma outra relação com ensino mútuo é o regime
regras impessoais irá operar -se, em constitucional introduzido na
primeiro lugar, no interior das Escolas
"'1. B. de Ia Salte, Conduites..., op.eit.,p. 102.
Mútuas. A correção corporal é ' Do Gérando Girado cai G, Vineentt. L'Ecole
op.m., p. 78.
condenada e, com ela, as Escolas dos
"7 G. Vincent. L'Ecole primaire..., op. cit.,p. 79.
Irmãos nas quais os alunos são
esmagados "sob o peso das fórmulas
áridas, das regras vazias de sentido,

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2007 ................................................................ 33


rG educação; é a carta que assegura à material de urna codificação rigorosa e

cri ança a p arcela de su a von tad e n a minuciosa. A maior parte deles incluem
E lei à qual obedece'. sbb forma de quadro — o detalhe integral

Se a relação com regras impessoais dos 'sinais' a utilizar e dos movimentos


o parecetrmudado,estaúltimas correspondentes a executar. Neste nível,
continuam onipresentes na organização a comunicação é toda mecânica e
cu daspráticasescolares.Maisquenunca,o inteiramente hierarquizada"
método mútuo organiza a relação com uma
5. Enfim, para ter acesso a qualquer
ris autoridade impessoal da qual, uma vez mais,
t ipo d e sab er es co lar, é n eces sário
mestres e monitores são apenas servidores.
dominar a "língua escrita" (do grafismo
Atrás do estrado sobrelevado onde se
redação e à gramática, introduzidos pela
encontra a escrivaninha do mestre, acha-se
um crucifixo, o busto do Rei, a inscrição Escola Mútua, passando pela leitura). O

"Luiz XVIII, Rei da França, Protetor das ensino de urna língua escrita codificada,
escolas elementares", além de toda uma fixa, normatizada, é possível somente
série de sentenças de ordem moral. pelo trabalho escritura] sobre as práticas
de linguagem operado por gerações de
Como a codificação da organização das
atividades escolares é esmiuçada ao gramáticos e professores. O objetivo da

extremo, os mestres podem empregar, em es co l a é en s in ar a f al ar e es crever

lugar da voz, os "sinais" das mãos e dos conforme as regras gramaticais,


braços, o apito, a campainha e o gesto para ortográficas, estilísticas, etc. Ora, é preciso
ordenar as atividades: "Para conduzir e voltar ao que se tornou uma evidência
aperfeiçoar corretamente dezenas ou cultural: a escola é o lugar de
centenas de alunos, os responsáveis do aprendizagem da língua. Assim é que os
ensino mútuo previam ordens precisas, pedagogos pretendem inculcar nos alunos
rápidas, imediatamente compreensíveis uma verdadeira relação com a linguagem
(...). Não é possível deixar-se levar pela
improvisação, pela iniciativa dos monitores c' P Grázot, Conseils de monile ou Essais sur l'homme, les
moeurs, les earactères, le monde, les femmes, l'édueation,
ou sequer por uma escolha mais ou menos tomo 2, 1828, ». 89. citado por P. Lesage, L'Enseignement
arbitrária do mestre. Assim, todos os mutue) de 1815 aux débuts de la Hépublique.
Cuntribution à l'étude de la ixklagogie de la leeture et
Tratados' ou 'Manuais' relativos ao ensino de lécriture dans les écoles mumelles, Tcw de doutoracio

mútuo insistiam sobre a necessidade ele # ciclo, Unéversité Paris V, 1972, ». 253.
P Lesage, L'Enseignement op.cit., p. 103.

34 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
e co m o mu n do : u m o u t ro d o mí ni o lembrar indica que é indispensável pensar
simbólico, secundário, que vem ordenar a articulação (e as ligações de homologia)
e julgar o que se refere ao simples hábito, entre formas de exercício do poder e
ao simples uso. É isso que L. S. Vygotski7" formas assumidas pelas relações sociais
de "aprendizagem". O que mostram as
(1985) tinha percebido perfeitamente_ A
análises apresentadas acima é que, ao
escola preconiza a retomada reflexiva, o
mesmo tempo em que se constroem
domínio explícito e consciente
saberes e relações com a linguagem e
conduzido, às vezes, por metalinguagens,
com o mundo, certas modalidades da
regras e definições. A forma escolar de relação com o outro se aprendem em
relações sociais é a forma social formas de relações sociais específicas que
constitutiva do que se pode chamar urna correspondem a modalidades do poder 72
rela çã o escritu ra l - esco la r co m a
Pensando a realidade escolar em
linguagem e com o mundo.
termos de forma escolar de relações
3. Fo rm a s so cia i s e sociais, apresenta-se a possibilidade de
construção do objeto questionar a relação entre grupos sociais
e formas sociais. Uma forma de relações
Procedendo a esta comparação e à
sociais, do mesmo modo que a relação
análise sociogenética cia Forma escolar das
com o mundo que lhe é Indissociável,
relações sociais como forma social
escritural-escolar constitutiva de uma " E. 5. Vygotski, Pensée et langage, Paris, Messidor/Ed.
.
sociales, 1985, 42 6pilv.T.: Obra disponível emportuguês
relação com a linguagem específica, e na sob o título Pensamento e Linguagem, tradução de
Jeferson Luiz Camargo e revisão técnica deJoséQpolla
sua articulação com formas de exercício
Neto, publicada pela Editora Martins Fontes/.
do poder, torna-se possível, em primeiro " B. Labire, Formes sociales scripturales,.., oii.cit.
Em Norbert par lui-même, •ayarC4 2990 Et/rum:neve
lugar, uma teoria do "fracasso escolar" que 'O parlamentarismo, entretanto, é essencialmente uma
s e r ef er e, ao mes mo t e m p o , a u ma maneira de resolver conflitos sem recorreraviolência:
ora, os alemães nunca chegaram a aprender isso. Ele
antropologia do poder e a uma exige um enorme domi"nio de sf. As técnicas necessarios
para isso não podem ser desenvolvidas sob una regime
antropologia do conhecimento'`
absolutista" (p. 78). Ele põe, assim, explicitamente em
paralelo certas firmas de exercício do poder e as
Parece-nos, com efeito, que a caracterikicas sociais-mentais dos "habitu.s".
sociologia da educação é indissociável de
uma sociologia do conhecimento (dos
modos de conhecimentos) e de uma
sociologia do poder (das formas de
exercício do poder). O que acabamos de

Educação em Revista, Belo Horizonte, nO 33, jun1.2007 ............................................................... 35


Sobre a história e a teoria da forma escolar

nunca é a propriedade exclusiva de um grupo Falar de forma de relações sociais

social: uma forma não é urna coisa que fosse desencadeia, também, urna reflexão
possível possuir como se possuem bens. Falar, antropológica fundamental sobre o vínculo entre
por exemplo, de "escola burguesa" ou o social, o cognitivo e a linguagenf3 - A forma
"capitalista" é operar a reificação de uma assumida pelos laços sociais é indissociável das
realidade relacional complexa. A escola não múltiplas práticas de linguagem que, aliás, são
é redutível a uma escola de grupo ou classe, urna dimensão constitutiva dessa forma.
mesmo se ela contribui para produzir e Como o vínculo social é, de saída, da
reproduzir as diferenças entre os grupos ou ordem do linguagem e a consciência
classes cia formação social. Os grupos não "individual" torna forma somente através da
existem independentemente das formas de linguagem (certas práticas de linguagem
relações sociais no âmago das quais eles se sempre específicas), o tipo de consciência, de
constituem. ilação de um indivíduo com o mundo e com os
Da mesma maneira, falar de forma de outros, varia com as formas estabelecidas
relações sociais permite evitar a confusão entre pelos vínculos sociais; a
instituição e Forma (instituição escolar e forma cognitiva não é senão a lógica das Formas
escolar). Corno Michel Fuucault pôde colocar de relações sociais.
a ênfase sobre os dispositivos transversais em
Amaneira como formulamos os problemas
relação às divisões institucionais (escola, prisão,
implica logicamente um recurso constante aos
hospital, caserna, etc.), pode-se perceber
problemas teõncas, esquemas de interrogação,
certas formas sociais que atravessam diversas
etc., de diferentes disciplinas científicas:
instituições. A forma escolar das relações
Antropologia, Lingüística, Psicologia, História,
sociais não se detém às portas da instituição
Sociologia. °trabalho de 13. Bemstein constitui
escolar e, inversamente, a instituição escolar
já um belo exemplo de st~dasjiunteiras
pode ser atravessada por formas de relações
disciplinares entre Lingüística, Psicologia e
sociais diferentes (que se pense,
Sociologia' . Este autor coloca em jogo uma
notadamente, nas formas sociais orais que
os alunos mais estranhos à lógica social cio 13. lab ire, `Sociologic des pnItique
74
Poderíamos também inferir-nos oro trabulbo de Pierry '
universo escolar tentam impor ao grupo 13ourdieu ou às tentativas metodológicas ent ri c kmlas por
quando se encontram em grande número k. CbarUer em Lis monde comine ,rprésentation", ira
A nnaies E .S noa.-dez. de 1989, p. 1505-1520
na mesma classe ou no mesmo Este último texto conta com verNciu cio português sob o
título -O inundo como representação", publicado em
estabelecimento).
Estudos Avançados, vol. 5, n" 11, 1991, com tradnçáo ele
Andréa liaberl.

36 Educação em Revista, Belo Horizonte, n" 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
construção complexa do objeto que não que se evoque uma "crise" da escola. As
fica incomodado com as fronteiras reformas institucionais e pedagógicas se
acadêmicas clássicas e não reduz a sucedem, c o n t r i b u i n d o a s s i m para
sociologia da educação a uma sociologia da transformar os contornos da es col a, a
transmissão dos saberes. maneira como é percebida e as práticas

Enfim, a sociologia da educação é uma dos dif eren t es grupo s soci ai s a s eu

condição geral de toda Sociologia. Ela respeito. Nesta conjuntura, é permitido

permite não esquecer que os sujeitos sociais se perguntar em que medida o que está

têm urna história, uma gênese, e não são cm causa é a forma escolar e sua

agentes de interações anônimas, sem predominância no modo de socialização

passado, etc. Os sujeitos sociais não estão peculiar das nossas formações sociais. O

dotados "naturalmente" de processos estudo, hoje, das práticas socializadoras

interpretati vos mas de hi stória, de na escola e fora dela, situado na


s o c i a l i z a çã o ; o r a , é a an á l i s e d o s perspectiva sócio-histórica, permite
p ro ced i mento s só cio -h is tó ri cos de defender a idéia de urna predominância
interpretação que deve constituir um dos d a f o r ma es co l a r n o s p r o ces s o s d e
obj etos da Sociologia (e não a dos socialização e formular a hipótese de que
procedimentos interpretativos natura-lizados as transformações da instituição escolar e
e des-historicizados). De fato, deste ponto das relações dos diferentes grupos sociais
de vista, toda Sociologia - qualquer que seja com ela participam desta predominância.
seu objeto de pesquisa, seu terreno de
1-Predominância da forma
investigação - deveria ser também uma
sociologia da educação já que uma prática
escolar

não é compreensível sem uma relação com


A emergência cia forma escolar, forma
o modo de apropriação (ou modo de
que se caracteriza por um conj unto
aquisição) desta prática e por referência à
coerente de traços 7 - entre eles, deve-
história dos sujeitos sociais que a realizam.
se citar, em primeiro lugar, a constituição
II1 ESCOLA E FORMA ESCOLAR HOJE
-
de um universo separado para a infância;

As numerosas críticas - quase sempre, 75


Sobre esta questão, çf. G. Vincein,LF.cole prinI2iue op.•it.,
contraditórias - cujo alvo, há vários anos, assim como os panl,grajbs prececlente.s deste araigo.

tem sido a instituição escolar induzem a

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ..................................................................... 3 7


Sobre a história e a teoria da forma escolar

a importância das regras na obrigatória. A escolarização da quase

aprendizagem; a organização racional do totalidade das crianças de quatro anos

tempo; a multiplicação e a repetição de em maternais e o crescimento

exercícios, cuja única função consiste em espetacular dos efetivos nos liceus e
aprender e aprender conforme as regras nas universidades dão testemunho de
ou, dito de outro modo, tendo por fim uma escolaridade cada vez mais longa
seu próprio fim -, é a de um novo modo na França.
d e sociali zação, o modo es col ar d e A escola e a escolarização foram
socialização. Este não tem cessado de se desenvolvidas até se tornarem essenciais
estender e se generalizar para se tornar o n a p r odu ç ã o e r e p ro du ç ã o d e n o s s a s
modo de socialização dominante de formações sociais, das hierarquias, das
nossas formações sociais. classes._ que as constituem. Se, no
A predominância da forma escolar, do período anterior aos anos 60, "a origem
modo escolar de socialização é visível, social determinava diretamente o nivel
em primeiro lugar, no rápido de inserção profissional e social, sendo
desenvolvimento da própria que a escola desempenhava apenas um
escolarização. Tal desenvolvimento, papel anexo'', hoje, as trajetórias sociais
manifesto desde o século XIX, não tem e profissionais são fortemente tributrias
cessado de se ampliar ao longo de nosso das trajetórias escolares.
século e, em particular, acelerou-se após
As cl as s i f i ca çõ e s es co l a res s ão
a Segunda Grande Guerra e nos anos 60.
classificações sociais, cujos efeitos se
Não é inútil, certa mente, retomar fazem sentir em domínios da vida social
alguns dos elementos relevantes deste
a f as t ad o s d o d o m í n i o e s c o l a r e s e
"processo de escolarização"' :
prolongam bem além do fim cia
 escolarização das aprendizagens escolaridade. Se estas classificações
profissionais (LEP, IUT, BAC 7 7 escolares agem fortemente sobre a vida
profissionais);

 generalização cia passagem para ❑ 7 ' R. Bernard, "Quelques élan nas sur le procis
sociabsation et la socialisatio sculainf" in Les (losiers
secunclá rio; tir l'éducation, rr 5; 7984, p. 27-22.
Lk.:P Liceu de ErIsin()Prtfissondliwnte; 11:11'— instituto
- prolongamento cia escolaridade para Universitdho 'lécnico; BAC— conchrscio do 2' gral I.
aquém e além da escolaridade B. Cbarlot, L'Ecolc em mfflation, Payot, 1987 p. 10.5.

38 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, iLin/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
profissional, elas afetam de fato o conjunto uma abordagem, prioritariamente escolar,
das relações sociais e das práticas. A das realidades sociaissi .
"excelência escolar" é "consagrada Além da importância da escola e da
norma de excelência universal, escolarização nas nossas formações sociais,
reconhecida mesmo por aqueles que não
do papel das classificações, julgamentos
vão à escola ou nela não são bem
e percepções escolares fora da instituição
su cedido s ".
escolar, a predominância do modo escolar
S ab e -s e, s o b ret u d o a p a rt i r d o s de socialização se manifesta pelo fato da
trabalhos de Pierre Bourdietf", que as
forma escolar ter transbordado largamente
d i f e r en ç a s e m m a t é r i a d e p r á t i c a s
as fronteiras da escola e atravessado
culturais, como também esportivas ou
numerosas instituições e grupos sociais:
alimentares..., reenviam, cm parte, às
"(...) nossa sociedade está escolarizada,
diferenças de capital escolar e que as
incapaz de pensar a educação a não ser
classificações estabelecidas pelos sujeitos
segundo o modelo escolar, até mesmo
sociais entre eles têm relação de
homologia com as classificações escolares n o s d o m í n i o s a l h e i o s ao c u r r í cu l o

(isto é, ao menos parcialmente, são consagrado das escolas de cultura geral


fundadas sobre princípios análogos às ou de formação profissional""
classificações escolares).
E n c o n t r a m - s e , h o j e , numerosos
Enfim, numerosos problemas sociais elementos e traços da forma escolar
são construídos a partir de critérios (certamente, em graus diversos) nas
escolares de julgamento, como é por práticas socializadoras de uma fração
exemplo o caso do "iletrismo": "A escola crescente das famílias, nas atividades peri-
rep res en t o u e rep res en t a u m p ap e l
escolares'"3 , nos estágios de formação, etc.
determinante na construção social do
iletrismo, não tanto porque ela não saiba " P l'errenoud, La Fabrication de 1'cm:citem:e sednire,
Droz, 1984, p. 85.
responder às dificuldades de
" particular; P Bourdieu,La Distinction, Minn ir; 1978.
aprendizagem de um grande número de ' A.-M. Chartier e J. 1-fébrard, "Hôle rle Pécole dans Ta
construction sociale de 1 'illettrísme", in f. M. Besse,
jovens, mas porque a tomada de de Goulinyn„ D. Ginet e B. Lahire (sob a direção de),
questiona, /yon, 1-'111., 1992.
consciência do fenômeno do iletrismo, '° P. Pentmoud, LraFabrication...,op.cit..p. 73.
sua designação, suas interpretações e as " N.R.: O ptft.itv de ungem grea peri"significa -em torno
de".
iniciativas para superá-lo, dependem de

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, junI2001 ...........................................................39


Sobre a história e a teoria da forma escolar

A tendência de numerosas famílias respeito pelas regras... são essenciais.


(p r i n ci p al men t e n as cl as s es superiores
É, singularmente, o caso da musica e
ria dança (ao menos, cm suas formas
e médias) de multiplicar as atividades
m a i s " c l ás s i c a s " ) , cu j o s s ab e r e s e
"extra-escolares" para os Filhos é um
respectiva transmissão têm sido mais
exemplo de tal situação. Deve -se rapidamente codificados (solfejo, gamas,
sublinhar, de saída, o sentido dado a trabalho na barra... }' 6
estas atividades por urna série de pais: As atividades esportivas - cuja
eles procuram não somente uma percepção mais corrente as associa
ocupação do tempo livre para os filhos menos espontaneamente ao "escolar" -
e a aquisição de saberes específicos, mas não são, apesar disso, desprovidas de
também a "aprendizagem cia disciplina",
propriedades da Forma escolar. Além de
"o gosto pelo esforço", etc." ,
serem asseguradas por especialistas de
exprimindo assim suas preocupações
"educação esportiva", elas impõem um
"educativas".
mínimo de disciplina e regras na
As atividades organizadas, aquisição das técnicas (neste aspecto,
enquadradas por especialistas, regulam opõem-se aos jogos "livres", às partidas
e est rut uram o tempo d as cri an ças; de futebol perto cios prédios onde as
tendem a garantir sua ocupação crianças moram...) e tendem a organizar
incessante, ocupação cuja função esta aquisição conforme urna progressão
consiste não tanto em enquadrar e vigiar, programada sob forma de sequências
mas gerar disposições em relação à sucessivas que dão lugar a exercícios
regularidade, ao respeito pelo "emprego repetitivos. São ainda caracterizadas
do tempo"... "Submeter o pelo fato de que tendem a constituir
desenvolvimento de sua vida a uma
'" Cf D. 7bin, Pratiques et anitudes éducatives paren( ates,
divisão em seqüências temporais
Dissertação de DEA em Sociologia e Ciências Sociais,
previstas antecipadamente e fazer as Unieersité Lrr mière Lyon 2, 1988.
"' G. Vincent, L'Ecole primaire op.cit., p.
coisas somente na hora certa, não será " A proprietária de uma academia de dança lernbrc›u
esse o tipo de comportamento propício recentemente aos pais que ''a academia é coem uma
escola: a assiduidade, a pontualidade e a regularidade
a adquirir a forma de uma moralidade são indispensáveis para que os alunos possam tu:Nua -ir
que é a do dever?" bases sólidas e duradouras".

Uma parcela destas atividades


dependem de aprendizagens no
decorrer das quais a repetição, o

40 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
práticas corporais em práticas "para o e para os pais menos distantes do
co rpo ", is to é, não tend o out ro f im universo escolar.
s e n ão a ed u c a ç ão , a f o r m a ç ã o d o s A multiplicação das atividades afeta
corpos. Assim, estas atividades se de maneira diferente as crianças das
identificam com a educação física famílias populares mais dominadas:
ministrada na escola, tal como é trata-se não tanto de um procedimento
analisada por Pierre Bourdicu: "A escola, "educativo" por parte dos pais, mas da
lugar da skhole, do lazer, é o espaço e n t r e g a d a r e s p o n s a b i l i d a d e p el o s
em que certas práticas dotadas de filhos a um conjunto de "interventores
funções sociais e integradas no sociais". O desenvolvimento das
calendário coletivo são convertidas em atividades "peri-escolares" nos bairros
exercícios corporais, atividades cuja populares tende a garantir a ocupação
finalidade se encontra em si mesmas, sistemática das crianças e jovens, com
espécie de arte pela arte corporal, ❑ objetivo de tirá-los da rua e
submetidas a regras específicas cada preservá-los da influência das Famílias,
vez mais irredutíveis a qualquer cuja ação é freqüentemente
necessidade funcional e inseridas num considerada como nefasta. Aliás, tal
calendário específico' . opinião aparece com f r e q ü ê n c i a n o s
d e p o i m e n t o s d e assi st ent es so ciais
Enfim nas classes superiores e
médias, os pais — e, singularmente, as e do cent es: "As c r i an ça s d e R . .

mães - tendem a se tornarem (bairro popular da região de

verdadeiros pedagogos para transformar Lyon) vão mais precocemente

a relação com os filhos em relações para a rua e gramados onde aprendem


educativas, pedagógicas. maus hábitos" (Diretor de Centre
aéré"); " O p ro b l e ma d o s ritmos de
As classes populares — sobretudo, as
vida se põe toda semana e nos fins de
mais dominadas no plano cultural - estão
mais distantes do modo escolar de semana: em um dia e meio de

socialização. Para os pais destas crianças, liberdade, as crianças se destroem! São


separar práticas de cunho educativo de necessárias atividades aos sábados
outras práticas sociais não tem nenhum Botírdiers, "Comine' PCI it-être yjx)ftg?", in QUetit i0 11 ti
sentido: isso é impensável salvo, talvez, de socioiogic, Minnit , 1980, p. 177.
Cenhu de afividades ao ar livre, destinadas aa'ç ainnüs
para as práticas que se referem à escola ern,férias.

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ....................................................


Sobre a história e a teoria da forma escolar

e aos domingos" (Inspetor de Educação ref erên ci a (n ão con s ci ent e), co mo


Nacional). modo de socialização reconhecido por

As ações organizadas visam não todos, legítimo e dominante.

somente vigiar as crianças mas também Dizer que o modo escolar de


levá-las a adquirir "hábitos de vida socialização é dominante não significa
regular", assiduidade e pontualidade. que ele utilize as mesmas modalidades,
Além disso, hoje, a maior parte das em todos os lugares e circunstâncias,
ações de "apoio escolar" estão incluídas e que não existam resistências
nas atividades "geri-escolares", sendo "objetivas" por parte dos sujeitos
que as exigências e as práticas da escola sociais socializados em outras formas
são, assim, parcialmente retomadas pelos de relações sociais' ) . Deve-se contar,
animadores. em especial, com as diferentes
Enfim, paralelamente ao trabalho com apropriações operadas pelos diversos
as crianças, é freqüentemente examinada grupos sociais.
a necessidade de atuar junto aos pais
O modo es col ar de social i zação
"para educá-los", propondo-Lhes estágios
pode ser dito dominante não somente
ou reuniões de formação sobre temas, tais
porque a forma escolar está largamente
como alimentação, higiene, sono, trabalho
difundida nas diversas instâncias
escolar...
socializadoras, mas também (e estes
Assim, a forma escolar atravessa as dois aspectos estão associados) porque
múltiplas práticas socializadoras. Encontra- a relação com a infância que ele
se essa marca na socialização familiar (com implica, o tipo de práticas
certeza, nas classes superiores e médias, socializadoras que ele supõe, são Os
n as f raçõ es su p eri o res das cl as s es únicos a serem considerados corno
populares), nas atividades "peei-escolares" legítimos.
e, poderíamos acrescentar, nas formações
A maneira dominante de
de empresas, nos estágios de "inserção",
etc. Progressivamente, o modo escolar de considerar as crianças como sujeitos

socialização, quer dizer, a socialização


"? Sobre as resistências "objetivas" (isto é, não
pensada e praticada como "educação", necessan'arnenteintencionais)dosalunos rn is alheios
"p ed a go g i a ", e t c. , s e i mp ô s co mo à lógica escolar, ver B. Labire, Formes soci:M_s
scriptumies..., op.cit.

42 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jure/2007


Sobre a história e a teoria da forma escolar
sociais à parte, com direito a se educativas ou, mais exatamente, por
tornarem obj eto de ações específicas não terem outras funções sociais senão
e ad ap t ad as , res u l t a d a rel ação co m a de educar.
a criança, relação surgida com a forma Quando se observam, hoje, as
e s c o l a r " . E s t a f o r m a sui generis d e relações entre adultos e crianças nas
relações com a criança, com as nossas formações sociais, fica patente
crianças, passa pela constituição da a p r o p e n s ã o de t r a n s f o r m a r c a d a
infância como categoria particular de instante em um instante de educação,
sujeitos sociais separados, distintos cada atividade das crianças em uma
dos outros sujeitos sociais, suscetíveis atividade educativa, isto é, uma
de um tratamento particular: a atividade cuja finalidade é formá-las,
educação. Esta categoria é, aliás, formar seus corpos, formar seus
subdividida à medida que se processa conhecimentos, formar sua moral...,
a instauração de instâncias educativas sendo que todos esses aspectos são
específicas a cada idade... indissociáveis.
É neste sentido que estamos nos
ocupando de atividades separadas das 2. "Crise" e "abertura" da escola
outras atividades sociais e de práticas em q uestã o.
distintas de outras práticas. A separação
Podemos retornar agora à pergunta
é manifesta quando estas atividades se
formulada no início: como interpretar
desenvolvem em lugares específicos,
os questionamentos sobre o
separados de outros lugares da
funcionamento tradicional da escola,
atividade social e sob a autoridade de
especialistas, cuja ação é inteiramente assim como as críticas das quais ela é

orientada para a educação (situação objeto? Será que estas interrogações

tradicional da escola, mas que se tem são o sinal de um enfraquecimento da

en co n t rad o t a mb é m n as at i vi d ad es predominância da forma escolar? Será

"peri-escolares"). No entanto, hoje, o que estamos assistindo à passagem do

ess en ci al est á, t al vez, não t anto n a


"Sobre este. pon(o, cl P Ariès, L'Enram et
separação espacial, mas no fato de que Ia G. Víncent, L'Ecole

se trata de práticas distintas por serem


pensadas e pretendidas como

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 ................................................................... 43


Sobre a história e a teoria da forma escolar

modo escolar de socialização para um De nossa parte, nossos trabalhos nos


outro modo de socialização? convidam a formular uma outra hipótese que
A escola está no centro de numerosos é a seguinte: estas alterações dos limites da
debates sociais através das questões das instituição escolar, estas incursões no domínio
relações entre formação e desemprego, tradicionalmente reservado à escola por parte
as s i m co rno d aq u el as rel at i vas ao de agentes exteriores a ela ou mantidos
Desenvolvimento Social dos Bairros ou do afastados dela, esta "abertura" da escola para
Desenvolvimento Social Urbano. A recuperar esta expressão resultante da
questão do "fracasso escolar" é constituída prática, tudo isso é, pelo contrário e
como problema social em ligação com justamente, tornado possível pelo fato de
outros problemas sociais, tais como a que, em nossa formação social, o modo
" d e l i n q ü ên c i a ", a " i n t e gr a ç ã o " , a escolar de socialização é o modo de
"marginalização", o "iletrismo"... Entre as socialização largamente dominante e
críticas, uma das mais freqüentes é a que hegemônico. Dito de outro modo, o espaço
denuncia a escola estando muito separada escolar poderia se "abrir" porque esta
da realidade exterior, demasiadamente "abertura" não colocaria em causa a
"fechada". Aliás, os responsáveis pela predominância da forma escolar sobre a
escola no mais alto nível propõem o que socialização. O modo escolar cie
chamam de "abertura" cia escola, Assiste- socialização e a forma escolar não seriam,
se, assim, a um certo número de portanto, f u n d a m e n t a l m e n t e a f e t a d o s
transformações: intervenção nas escolas de p e l a s transformações institucionais.
agentes exteriores à instituição Detenhamo-nos um instante sobre este
(animadores, diversos interventores...), terna da "abertura" a propósito do qual deve-
abertura das salas, proposição de atividades se observar que ele abrange realidades muito
escolares mais "voltadas para o exterior", diferentes e que seu sentido varia em função
maior inserção de certas famílias na escola, dos sujeitos sociais ou grupos que dele se
etc. Existe uma relativa alteração dos limites apoderam.
entre a escola e seu entorno, alteração que
Se considerarmos as atividades dirigidas
leva ainda a se perguntar se a forma escolar pelos docentes para seus alunos fora da
não está prestes a explodir ou, até mesmo, escola por ocasião de saídas pontuais ou
ser ultrapassada, substituída por uma outra temporadas pedagógicas em estações de
forma. inverno ou no campo, etc., é necessário notar

44 Educação em Revista, Belo Horizonte, o' 33, jun/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
que o trabalho realizado consiste em reutilizar têm um capital escolar importante e cujas
o que é observado, vivido pelos alunos, práticas socializacloras não entram em
segundo parâmetros escolares: escrita, contradição, pelo contrário, com o modo
transformação das experiências em saberes escolar de socialização?
formalizados, objetivados, etc.
Quanto ã "abertura" às famílias mais
A respeito da intervenção de agentes populares, tudo indica que ela tem por
exteriores à instituição escolar na escola e objetivo tentar contornar as resistências à
ao trabalho dos docentes com trabalhadores escolarização. Através de contatos mais
da área social: de um lado, isso ainda estreitos com os pais, trata-se de transformar
permanece marginal nas atividades da escola suas práticas socializadoras a fim de que estas
e dos docentes; de outro lado, trata-se de correspondam melhor às expectativas da
sujeitos sociais que tiveram uma longa escola e reunam condições para uma
escolarização. Os trabalhadores da área social escolarização mais eficaz das crianças.
não empregam um outro modo de
Podemos, portanto, nos perguntar se a
socialização a não ser o modo escolar de
"abertura" da escola não é justamente
socialização, tal qual o definimos nestas
possibilitada pela dominação, em nossa
páginas (mesmo se eles propõem métodos
formação social, do modo escolar de
ou práticas pedagógicas diferentes daqueles
socialização. A "abertura" da escola poderia
aplicados pelos docentes,..). Além disso,
pôr em perigo o monopólio dos docentes,
tendem cada vez mais a reivindicar uma
como agentes detentores da competência
competência em =léria de luta contra o
pedagógica legítima, mas já não ameaçaria
"fracasso escolar" e transformam sua
os fundamentos da educação escolar, nem
intervenção no terreno do fracasso escolar e
seria a passagem do tnodo escolar de
da escolaridade das crianças em fator de
reconhecimento, de legitimação de suas socialização para um outro modo. Ela

ações e práticas, o que lhes permite poderia, ao contrário, contribuir para reforçar

acrescentar ou preservar seus lugares ou a dominância da forma escolar, favorecendo

posições... sua difusão fora da instituição escolar. A escola


poderia se abrir porque ela socializa menos
Também se afirma que a escola se abre
contra o "exterior" (as famílias, a rua...) e
para os pais. No entanto, corno será possível
porque o "exterior' socializa mais como ela...
não ver que os pais mais presentes nas
escolas, que se expressam sobre questões
pedagógicas, são, antes de tudo, aqueles que

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/2001 4


Sobre a história e a teoria da forma escolar

Se a escola teve de ser um mundo fechado, escolar. Tal confusão não permitiria

a rim de constituir a infância como um pensar as "revoluções pedagógicas" do


universo separado, não é necessário que ela século XIX9' (passagem da imposição de
mantenha tal postura depois que a separação regras de maneira mecânica, do exterior,
da infância e a constituição da infância como p ara a i mpo si ção de regras po r su a
categoria especifica — que exige e tem justificação e compreensão, ou seja, a
necessidade de uma ação próptia, ou seja, a adesão "refletida") no âmbito da forma
educação infantil — estabeleceu -se escolar, assim como de sua construção.
solidamente nas nossas formações sociais_ A forma escolar construiu-se e se constrói
Podemos nos perguntar se o que conduz nas lutas e transformações... Contudo, ao
a interpretar as transformações da instituição não situar o conjunto de acontecimentos
escolar e de suas margens como outras no quadro de um processo histórico,
tantas manifestações de desescolarização e torna-se impossível compreender as
desagregação da forma escolar não é uma invariantes da forma escolar, as lutas e
confusão entre forma e instituição. Aqui, os conflitos através dos quais ela se
precisamos reafirmar que a forma escolar constrói e perdura.
não é estritamente confundida com a
A situação atual pode parecer
instituição escolar, nem limitada por ela,
mas é transversal em relação a diversas paradoxal. A forma escolar, o modo

instituições e grupos sociais. es co l ar d e so ci al i zação d o mi n am a


socialização, mas a escola como
O sociólogo não deve deixar que lhe
instituição é contestada, seu monopólio
sejam impostas as categorias dos sujeitos
sociais em luta no campo edu cativo: pedagógico e o dos docentes são

"escolar" e "não escolar", escola "fechada" retalhados, ameaçados... Entretanto, tal


e escola "aberta", pedagogia "tradicional" Monopólio está' ameaçado em nome da
e pedagogia "nova"... eficácia pedagógica, isto é, em nome dos

Não se pode confundir lutas resultados escolares, assim como cm

pedagógicas, lutas entre pedagogos, com nome da "integração" das crianças e das
o questionamento da predominância da famílias "populares" às normas
forma escolar e do modo escolar de dominantes, enquanto os métodos e o
socialização ou com o fim da forma
Pi g. G. Vincent,U Ecole primaire..., op.cit., cap. 5.

46 Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jurt/2001


Sobre a história e a teoria da forma escolar
funcionamento da escola são contestados número de jovens e adultos acabam
e atacados pelos sujeitos sociais mais exigindo mais da escola"' .
escolarizados.
No momento em que a escolarização
A preocupação em remediar o que atingiu sua maior expansão, a escola
se designa como fracassos da escola leva tornou-se alvo de numerosas criticas
quase sempre a reproduzir as práticas porque a predominância da escola
escolares e prolongar a escolarização, acarreta exigências maiores e mais
como é demonstrado pela multiplicação diversificadas em relação à escolarização.
das ações de apoio escolar na periferia
De certa maneira, a instituição escolar
cia escola ou pelas ações de luta contra
paga o "sucesso" do modo de socialização
o " iletr i s mo " : " T o d as a s cr it ica s
do qual ela tem sido o principal vetor e
endereçadas à uma instituição que
do qual, pode-se dizer, não tem mais o
fracassou ao ensinar a ler a um grande
monopólio.

92 A.-M. Chdrrier e]. 1-1ébrard "Lerôle de Pecole... ", op. cit.

Educação em Revista, Belo Horizonte, n° 33, jun/200/ .................................................................. 47

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