Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Psico http://dx.doi.org/10.15448/1980-8623.2017.4.25589
Resumo
Usar cartazes para promover comportamentos pró-ambientais é um recurso popular e de baixo custo, mas geralmente baseado em
senso comum. O objetivo desta pesquisa foi desenvolver um sistema de categorização para características persuasivas em cartazes
pró-ambientais, baseado em um método misto qualitativo/quantitativo. A partir de uma amostra pública e critérios de saturação,
foram selecionadas 75 peças publicitárias, identificando-se principalmente: estratégias persuasivas; tipo de ênfase sobre os impactos
dos problemas ambientais; e tipo de comportamento. A maior parte dos cartazes enfatizavam consequências para a natureza,
operacionalizavam comportamentos, apresentavam informações ou utilizavam framing positivo. Testes de associação mostraram
que framings positivos foram associados à indicação de comportamento e ênfase na natureza. O oposto ocorreu com os framings
negativos. Esses resultados são discutidos quanto às limitações na eficácia de cartazes pró-ambientais, assim como as vantagens
de utilizar sistemas de categorização, como o aqui desenvolvido, para orientar pesquisa e intervenção na área.
Palavras-chave: Comunicação pró-ambiental; Estratégias persuasivas; Framing.
Este artigo está licenciado sob forma de uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional,
que permite uso irrestrito, distribuição e reprodução em qualquer meio, desde que a publicação
original seja corretamente citada. http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR
Cruz, L. A. G.; Iglesias, F. | Comunicação pró-ambiental 307
do indivíduo, bem como a percepção individual de para promover comportamentos. Os apelos de medo,
controle, em modelos explicativos do comportamen- por sua vez, veiculam mensagens que anunciam con-
to pró-ambiental (Kollmus & Agyeman, 2002). sequências negativas relacionadas a não obediência de
Tradicionalmente, essa inclusão tem sido promovida recomendações, o que igualmente motiva a adoção do
pela teoria do comportamento planejado (Fishbein comportamento sugerido.
& Azjen, 2010). A variável controle comportamental
percebido (avaliação individual sobre a possibilidade As limitações do modelo de
de realizar um comportamento) influencia a ação tanto deficit da informação
direta, quanto indiretamente. Ela tem demonstrado
melhores correlações com o comportamento pró- Para além do tom da mensagem, existem várias
ambiental e detém lugar de destaque em meta-análises perspectivas sobre o conteúdo da mensagem a ser
da área (Bamberg & Moser, 2007). veiculado. O modelo explicativo mais antigo e popular
A percepção de controle sobre o comportamento para fundamentar campanhas pró-ambientais des-
pode ser em parte derivada da observação de caracte- creve uma causalidade linear (Kollmus & Agyeman,
rísticas da situação. Mas, de acordo com Cleveland, 2002): conhecimento sobre o meio ambiente leva
Kalamas e Laroche (2005), é preciso considerar também a atitudes ambientais, as quais causam mudança de
a porção disposicional dessa percepção, determinada comportamento. Assim, privilegia-se a informação
principalmente pelo lócus de controle de um indivíduo. como conteúdo das mensagens. Esse modelo, cha-
O lócus de controle é tradicionalmente entendido mado de modelo de déficit de informação, parte do
como um fator de personalidade. Para os autores, no pressuposto de que as pessoas não mudam porque elas
entanto, trata-se de um construto entre a transitorie- não sabem sobre o problema ou sobre como podem
dade situacional e o caráter disposicional, de forma agir (Ölander & Thøgersen, 2014, Steg, Van Den
que pode ser específico para cada domínio. No caso do Berg, & De Groot, 2012). A opção por disponibilizar
domínio ambiental, eles defendem até a existência de conhecimento como forma de encorajar comportamentos
um lócus de controle ambiental (environmental lócus é uma estratégia tradicional entre os elaboradores de
of control, ELOC), que representa o quanto uma pessoa peças de comunicação (Kollmus & Agyeman, 2002;
acredita que pode afetar resultados pró-ambientais Steg, Van Den Berg & De Groot, 2012) e é facilmente
por meio de suas ações. Um ELOC interno levaria o observável, pela presença de frases como “é preciso
indivíduo a se considerar responsável pela situação educar as pessoas”.
ambiental e, para cada tipo de comportamento pró- Seja por meio de pesquisas ou pela observação
ambiental, existiria um ELOC específico, composto cotidiana, no entanto, é possível reconhecer a ine-
por múltiplas facetas: altruísmo-biosférico, ceticismo ficácia da mera apresentação de conhecimento como
corporativo, motivação econômica e esforços indivi- forma de promover mudança de comportamento. A
duais de reciclagem. disponibilidade de informação sobre os problemas
O framing negativo, por sua vez, pode ser rela- ambientais está cada vez maior, no entanto essa
cionado a um conjunto de estratégias, interpretáveis realidade não resultou em mudanças comportamentais
por modelos explicativos semelhantes, sob o nome de efetivas (Dolan et al., 2012). De acordo com Kaiser
apelos de medo e de culpa (Tannenbaum et al., 2015). e Fuhrer (2003), isso ocorre porque o otimismo do
Assim como na definição do framing negativo, re- senso comum com relação ao efeito da educação não
correm à manipulação de respostas emocionais é justificado, pois ainda que conhecimento componha
negativas. Mensagens em que uma pessoa experimenta um dos múltiplos fatores que influenciam o compor-
remorso por não cumprir algo que deveria ter feito tamento pró-ambiental, diversas pesquisas apontam
são chamadas de apelos de culpa. Seu objetivo é suas limitações. Os autores reportam a relação indi-
gerar empatia com outros ou com uma situação, o reta e, no máximo, moderada entre conhecimento
que, por consequência, ativará normas e regras sobre ambiental e comportamento pró-ambiental. O conhe-
comportamentos que deveriam ocorrer. Caso os cimento é apenas de uma influência distal, mediada
comportamentos esperados não estejam ocorrendo, por variáveis mais proximais. Como opção para
surge a culpa. De acordo com Bamberg e Moser viabilizar o uso do conhecimento, Kaiser e Fuhrer
(2007), a culpa é um sentimento doloroso que aparece indicam o aumento de sua eficácia por meio da
quando um indivíduo causa ou antecipa causar um convergência de diferentes tipos de conhecimento.
evento aversivo. Sua importância prática está no fato Informações sobre como o meio ambiente funciona
de que ela ocasiona a sensação de obrigação moral de e sobre os problemas ambientais compõem o
compensar o dano causado, o que pode ser utilizado conhecimento do tipo declarativo. Já o conhecimento
Com o auxílio das perguntas, as categorias cartaz apresentava características que permitiriam
foram inicialmente derivadas a partir do conteúdo sua classificação em duas ou mais opções. Para
da amostra. Utilizando-se o procedimento de classi- assegurar a classificação em apenas uma categoria, a
ficação postergada (Kreppner, 2010), a amostra foi preponderância de uma das características foi definida
repetidamente observada, suas características foram como critério de desempate. Apenas na pergunta
comparadas umas com as outras, até que a identificação sobre o impacto causado pelos problemas ambientais
de padrões permitiu elaborar categorias de acordo foi incluída a categoria “ambos”, pela recorrente
com a especificidade do próprio material. Buscou-se, dificuldade de consentimento entre juízes sobre a
assim, a adequação à ênfase indutiva do método de dominância de um dos tipos propostos. Assim, para a
análise qualitativo (Bauer & Gaskell, 2002; Berg, comparação da frequência “ênfase no homem” versus
1995). As categorias foram esgotadas à medida que “ênfase na natureza”, foram utilizados apenas os casos
deixaram de surgir ocorrências que justificassem novas em que não houve dupla categorização. Cada cartaz
classificações, ao mesmo tempo em que as categorias foi categorizado ao mesmo tempo, quanto ao framing
existentes pareciam compreender a totalidade do e à presença de conhecimento. Todos os cartazes
conteúdo. Em seguida, foram reorganizadas de forma foram analisados sob todas as categorias. Para a
dedutiva, conforme modelos teóricos da psicologia frequência final, organizada com objetivo exploratório
social da comunicação pró-ambiental, considerando- e descritivo, foram utilizadas estatísticas descritivas e
se que a qualidade da análise depende da relevância testes de associação. Em conjunto, os procedimentos
das categorias para o objetivo da pesquisa (Kreppner, combinaram estratégias analíticas qualitativas e
2010). quantitativas, configurando-se um método misto de
Esse processo foi balizado pelo critério de con- pesquisa (Guest, 2013).
cordância entre juízes com relação a dois conjuntos
de perguntas, sobre o conteúdo implícito e sobre o Resultados
conteúdo explícito, que foram feitas para todos os
cartazes. As perguntas sobre a estratégia persuasiva e Para análise dos dados foi elaborado um sistema
ênfase dos cartazes objetivavam verificar o conteúdo para a categorização de cartazes pró-ambientais
implícito: conteúdo latente (intenção por trás do dado fundamentado na psicologia social. O sistema é
fisicamente observável, o significado transmitido) composto de perguntas e possíveis classificações em
conforme Berg (1995); estrutura em profundidade, resposta às perguntas, que permitem a classificação
conteúdo detrás da superfície (Kreppner, 2010). Três do conteúdo da mensagem persuasiva em tipos. As
pesquisadores, das áreas de psicologia ambiental, categorias, expostas conforme as perguntas que as
social e do consumidor, levantaram possíveis cate- orientaram, suas descrições e regras de inclusão, são
gorias por cartaz e, na ausência de unanimidade, descritas na Tabela 1.
discutiram os casos até atingir consenso, como nos A amostra dos 75 cartazes foi também categorizada
procedimentos descritos por Creswell (2010). Às quanto à motivação para sua elaboração: homenagem a
perguntas sobre motivação do cartaz, indicação e tipo uma data, campanha de conscientização e propaganda
do comportamento, foi atribuído o conteúdo explícito: da empresa. Como forma de caracterização da amostra,
manifesto (Kreppner, 2010); elementos concretos e foi observada uma proporção semelhante de motivações
contáveis, aparentes na superfície (Berg, 1995). Por do tipo homenagem a uma data (N = 32) e campanha
ser passível de verificação pela leitura dos cartazes, de conscientização (N = 33). Juntas, essas motivações
o conteúdo explícito foi investigado por uma única compuseram 87,8% dos cartazes.
pesquisadora (Kreppner, 2010). Por meio do sistema foi possível verificar empi-
Para a classificação do material de acordo com ricamente as seguintes características da tentativa de
tipos resultantes de categoria, cada cartaz foi consi- persuasão presente nos cartazes: tipo de estratégia
derado em sua totalidade: forma, conteúdo textual e persuasiva, tipo de ênfase, presença ou ausência de
imagens. Igualmente ao processo de elaboração de indicação de comportamento e tipo de comportamento
categorias, a classificação do material foi realizada indicado. Na análise da ênfase sobre o impacto dos
por meio de concordância entre juízes (para conteúdo problemas ambientais, 27 cartazes foram excluídos,
implícito) e por única pesquisadora (para conteúdo por não apresentar conteúdo sobre impactos ambientais
explícito). Grande parte das categorias foi definida ou por enfatizar igualmente as consequências para a
como mutuamente excludente, conforme a orientação vida humana e para o meio ambiente. A frequência de
de que uma categoria deve ser a representação de cartazes de acordo com o tipo de categoria está descrita
um evento único e não ambíguo. No entanto, cada na Tabela 2.
TABELA 1
Perguntas, categorias e descrição das categorias
Pergunta Categorias Descrição
1. Qual foi a estratégia persuasiva 1.1 Informacional Fornecer informações sobre os problemas e soluções ambientais.
utilizada?
1.2 Framing
1.2.1 Negativo Apresentar consequências aversivas associadas aos problemas
ambientais.
1.2.1.1 Amedrontamento Expor consequências aversivas dos problemas ambientais, com o
intuito de causar medo no leitor.
1.2.1.2 Culpabilização Causar sentimento de culpa no leitor, associado a uma indicação de
que o mesmo não está fazendo sua parte para reverter os problemas
ambientais.
1.2.2 Positivo Argumentar que o leitor pode e deve contribuir para a qualidade
ambiental.
1.2.2 Responsabilização Destacar o papel do leitor na solução dos problemas ambientais,
associado ao argumento de que isso é uma responsabilidade
individual.
1.2.2.2 Comparação Social Encorajar o leitor a seguir o exemplo de modelos que agem
pró-ambientalmente
2. O cartaz enfatiza o impacto dos 2.1 Nenhuma ênfase
problemas ambientais na própria
natureza, ou no homem? 2.2 Ênfase na natureza Enfatizar as consequências negativas dos problemas ambientais
para o meio ambiente (e.g.: O mar está secando; a espécie X está
em extinção)
2.3 Ênfase no homem Enfatizar as consequências negativas dos problemas ambientais para
a vida humana, a vida do leitor, ou de pessoas próximas ao mesmo
(e.g.: Milhões de pessoas estão morrendo de sede; Se a água do
planeta fosse dividida entre os habitantes, sua porção seria de apenas
5 litros; Que futuro você vai deixar para o seu filho?”).
2.4 As duas ênfases
3. Existe indicação do comportamento
que o leitor deve adotar?
4. Que tipo de comportamento é 4.1 Abstrato Sugerir uma classe ampla de comportamentos (e.g.: Preserve;
indicado? Cuide; Recicle).
4.2 Operacional Sugerir ações específicas e concretas (e.g.: Traga sua sacola
retornável; Feche a torneira; Filie-se a uma OnG).
TABELA 2
Frequência das características previstas pelo sistema de categorização
Testes do qui-quadrado para essas variáveis ter veiculado conhecimento, assim como as discussões
mostraram associações entre tipos de framing e sobre a duvidosa eficácia desse tipo de estratégia,
indicação de comportamento, bem como entre tipos é possível argumentar que a informação sobre os
de framing e tipos de ênfase. Foi possível observar problemas ambientais deve ser uma recomendação,
que estratégias persuasivas, quando utilizam por combater a negação. Alguns estudos têm postulado
framing negativo, foram associadas à ausência de a existência de uma espécie de mecanismo de defesa
indicação de comportamento a ser adotado pelo em que as evidências de degradação ambiental são
público alvo. Em contrapartida, o framing positivo simplesmente negadas, pela influência de emoções
mostrou-se associado à indicação de comportamento, como o medo (Gifford, 2011). Esse fenômeno parece
χ²(1, N = 75) = 8.58, p = 0,003, V de Cramér = 0,34. ser uma das principais barreiras psicológicas ao
Além disso, uma associação foi verificada entre o comportamento pró-ambiental na cultura brasileira
uso de framing positivo e a ênfase no impacto dos (Iglesias, Caldas, & Rabelo, 2014).
problemas ambientais para a própria natureza. Já o O uso de framings, por sua vez, precisa ser
framing negativo foi associado ao enfoque do impacto avaliado de acordo com a valência manipulada.
que os problemas ambientais podem ter no ser humano, A maior parte dos cartazes empregou o framing
χ²(1, N = 75) = 4,81, p = 0,028, V de Cramér = 0,32. positivo, o que, de uma forma geral, encoraja a ação
do leitor, enfatizando que a mudança dos problemas
Discussão ambientais está em suas próprias mãos. Esse tipo de
apelo se relaciona com a manipulação da percepção de
Uma das principais características que viabilizaram controle comportamental, seja por meio de conceitos
a descrição científica dos cartazes foi a estratégia como controle comportamental percebido (De Leeuw,
persuasiva. A amostra indicou a existência de dois tipos Valois, Ajzen, & Schmidt, 2015) ou ELOC (Cleveland,
dominantes de estratégia: informacional e framing. A Kalamas, & Laroche, 2005). Por um lado, uma
estratégia de framing pôde ser dividida em framing porção desse fenômeno pode estar fundamentada na
negativo e positivo, subdivididos, respectivamente, em observação de situações concretas. Uma estratégia
amedrontamento e culpabilização, responsabilização persuasiva do tipo framing positivo poderia, então,
e comparação social. Framings do tipo positivo, apresentar informação que combate o viés cognitivo
especialmente por meio de responsabilização, foram e implementar mudanças estruturais concomitantes
os mais recorrentes. Igualmente, o fornecimento à mensagem, alterando os dados oferecidos pela
de conhecimento ambiental como estratégia foi situação. Por outro lado, discute-se na literatura que a
identificado na maioria dos cartazes. Além disso, a percepção do impacto de um comportamento também
indicação de comportamento e ênfase no impacto dos pode estar sujeita à influência das crenças gerais que
problemas ambientais na própria natureza compuseram um indivíduo tem sobre controle, sustentada em parte
as características predominantes nos cartazes. por traços de personalidade. Neste ponto, a eficácia
De acordo com a literatura, fica claro que o dos cartazes que utilizam framing positivo poderia ser
conhecimento ambiental não é suficiente para limitada, ou mesmo inviável.
promover o comportamento pró-ambiental, nem sequer A percepção de que o comportamento individual
um pré-requisito, já que pode ocorrer mesmo em sua não tem impacto, em comparação ao nível macro do
ausência (Kollmus & Agyeman, 2002). Entretanto, sua problema ambiental, funciona como uma barreira que
utilização como estratégia, após aprimoramento de seu impede a adoção de comportamentos pró-ambientais,
conteúdo, ainda pode ser defendida. Kaiser e Fuhrer mesmo quando há condições de realizá-lo. Essa
(2003) apontam que é preciso considerar o poder de limitação cognitiva na interpretação da realidade
predição de cada tipo de conhecimento. Conhecimento pode levar à ideia fatalista de que nada pode ser feito
declarativo (saber sobre os problemas ambientais), (Gifford, 2011). Por meio do conceito de ELOC,
por exemplo, não é considerado prerrogativa do no entanto, é possível caracterizar as dimensões da
comportamento pró-ambiental, mas é justamente o percepção de controle sobre um comportamento
tipo de conhecimento que caracteriza a estratégia pró-ambiental específico. Assim, pode-se ter como
identificada no presente estudo. A convergência de recomendação para elaboração de um framing positivo
diferentes tipos de conhecimento (i.e.: declarativo, mais eficaz a manipulação das variáveis que sustentam
procedural, de eficácia e social) é defendida pelos um ELOC interno, em sua porção contexto-dependente,
autores como alternativa e pode ser tomada como não apenas como medida de personalidade. O uso de
recomendação para a elaboração de cartazes. Além responsabilização como estratégia parece promissor,
disso, apesar da maioria dos cartazes analisados não inclusive, contando com a associação demonstrada nos
resultados entre esse tipo de estratégia e a indicação de ênfase, em oposição ao framing negativo, mais
de comportamento, em acordo com a recomendação associado à vida humana. O argumento parece lógico,
de apresentação de conhecimento procedural para visto que consequências aversivas são mais diretamente
promover o comportamento pró-ambiental (Kaiser relacionadas ao bem-estar do próprio indivíduo,
& Fuhrer, 2003). Por sua vez, o uso de mensagens ao passo que algumas perspectivas em psicologia
normativas é reconhecidamente eficaz na promoção ambiental argumentam que pessoas que atribuem um
de comportamento pró-ambiental (Cialdini, 2011). valor intrínseco ao meio ambiente são mais propícias a
No entanto, a combinação entre essas normas se responsabilizar e agir pró-ambientalmente (Corral,
também revelou a ocorrência do efeito bumerangue 2010). Considerando-se essa perspectiva, é possível
(consequência oposta ao objetivo) (Burchell, Rettie, & argumentar ser contraproducente persuadir as pessoas
Patel, 2013), nos casos em que a norma injuntiva perde a adotar uma visão de mundo em que o impacto dos
sua ação pela saliência de uma norma descritiva que a problemas ambientais sobre o homem é ressaltado. Isso
contraria. Assim, a estratégia de comparação social na reforçaria o baixo valor atribuído ao meio ambiente,
elaboração de cartazes deve considerar a relação de além de promover a separação entre homem e natureza,
dependência entre normas social e seu contexto. quando o objetivo final deveria ser promover uma
A despeito de qualquer limitação, é preciso integração de ambos. Assim, a dominância da ênfase na
ressaltar que a predominância do framing positivo nos natureza, identificada na amostra, seria uma estratégia
cartazes é um dado favorável ao sucesso das tentativas persuasiva adequada.
persuasivas pró-ambientais e deve ser promovida. A Desde os primeiros estudos para mapear as
opção oposta, o uso do framing negativo, ainda que dimensões da atitude ambiental, existe uma recorrência
reconhecidamente eficaz, inclui muitas ressalvas. No de dois fatores nos resultados de pesquisas. Em um
caso da manipulação de culpa ou medo, existe uma estudo dos mais citados na área, Thompson e Barton
clara limitação: uma alternativa precisa ser apresentada (1994) identificaram duas motivações ambientais:
em seguida ao evento aversivo e essa prática precisa antropocêntrica e ecocêntrica. A primeira seria movida
orientar a elaboração dos cartazes que utilizam framing pelo impacto que a destruição ambiental pode ter na vida
negativo. Conforme a recomendação de Witte (1998), dos seres humanos e a segunda pelo valor intrínseco
a mensagem deve conter informação que comprove a a plantas e animais. Sob essa perspectiva, não seria
eficácia de uma alternativa, bem como argumentos de inadequada a persuasão que manipulasse a dimensão
que o indivíduo é capaz de adotar o comportamento antropocêntrica do fenômeno, pois tanto essa quanto
sugerido. Se uma mensagem falhar em ressaltar tanto a dimensão ecocêntrica predizem comportamento
os meios, quanto a capacidade do indivíduo, a tentativa pró-ambiental. A eficácia da estratégia, no entanto, pode
produz justamente o contrário de seu objetivo. A teoria depender se este é o fator de maior importância para
do gerenciamento do terror (Greenberg & Arndt, 2012) o contexto em questão, ou seja, se existe congruência
é uma das teorias psicológicas que pode explicar esse entre a ênfase apresentada (no homem ou na natureza)
fenômeno. De acordo com seu modelo, a possibilidade e a dimensão dominante no público-alvo (antropo ou
iminente de morte, constante na vida humana, gera um ecocêntrica). Assim, uma recomendação básica ao uso
potencial de ansiedade, ou terror, a ser constantemente da estratégia de ênfase em algum impacto ambiental
gerenciado. O contato consciente e direto com o seria a verificação dessa dominância entre os indivíduos
terror é aliviado por meio da negação e da crença de que terão acesso aos cartazes, ou minimamente, a
que a ameaça se localiza em um futuro distante. Essa verificação do caráter dominante na cultura brasileira.
defesa pode ser exacerbada, pela baixa percepção Ênfase no impacto dos problemas ambientais na
de eficácia em combater a ameaça. Contudo, apesar própria natureza, uso de framing positivo e estratégia
da obrigatoriedade em apresentar alternativas para o informacional foram as principais características
alívio da culpa, ou para evitar o medo, os framings encontradas na amostra de cartazes brasileiros. Sua
negativos foram associados à ausência de indicação do análise permitiu o apontamento de possíveis limitações
comportamento a ser adotado pelo leitor. na eficácia persuasiva, principalmente quando a
Por fim, foi igualmente possível caracterizar a informação sobre o comportamento a ser adotado pelo
persuasão dos cartazes por meio das ênfases sobre o leitor é falha. A caracterização da realidade brasileira,
impacto dos problemas ambientais. Na maioria dos no entanto, só foi possível devido ao procedimento
cartazes em que havia uma única ênfase, ocorreu a para a realização dessa análise. Considera-se que
opção por enfatizar as consequências dos problemas o procedimento de análise dos cartazes e o sistema
ambientais para a própria natureza. Nota-se, sobretudo, de categorização dele derivado podem contribuir
que o framing positivo foi associado a esse tipo para o desenvolvimento da comunicação pró-
ambiental, configurando-se como um exemplo, a ser possível que alguma característica que poderia derivar
aprimorado, de como investigar cientificamente peças novas categorias de classificação estejam por trás
de comunicação e como compreender as possíveis desse fenômeno, o que conduz a nova análise a ser
características a serem implementadas nas mesmas. realizada por juízes. Finalmente, para que o objetivo de
Em especial, o uso do método misto, a combinação de investigação científica da comunicação pró-ambiental
estratégias indutiva e dedutiva, bem como a avaliação no Brasil seja atingido como um todo, é necessária a
compartilhada entre juízes são encorajados. descrição de peças de comunicação que utilizam outros
No entanto, algumas limitações metodológicas meios, como o rádio ou a televisão. Obviamente a
precisam ser consideradas. Em primeiro lugar, é investigação da eficácia propriamente dita dos tipos
preciso ressaltar os problemas intrínsecos do método de cartazes ainda depende de estudos observacionais e
de amostragem pela busca na Internet, que não oferece experimentais que enfoquem no comportamento como
garantia que a mesma amostra será selecionada em variável de interesse.
um estudo posterior, mesmo que sejam apresentadas A caracterização de uma amostra brasileira de
informações como as datas nas quais a coleta foi cartazes pró-ambientais foi motivada pelas mesmas
realizada (Gosling & Mason, 2015). Para solucionar preocupações expostas por Nolan, Schultz e Knowles
esse problema, procurou-se conduzir a coleta até o (2009): as mensagens persuasivas serão mais
ponto de repetição das peças de comunicação e foi eficazes quando baseadas no entendimento de por
ponderado o fato de que o acesso ao tipo de material que o comportamento não está ocorrendo e quando
ambicionado não seria possível por outros meios. forem derivadas empiricamente. Acredita-se que
No entanto, é possível que uma segunda coleta e o as possibilidades da inspiração artística e intuitiva,
uso de palavras-chave diferentes gerem resultados já comumente aplicadas na elaboração de peças de
distintos. Ainda, utilizou-se a opção de classificar um comunicação, possam ser expandidas pela contribuição
cartaz conforme sua característica predominante, para científica. O apontamento das limitações encontradas
permitir análises estatísticas de associação. No entanto, nas características, de acordo com a literatura, fornece
é preciso reconhecer que a decisão de dominância elementos para que responsáveis por gestão ambiental,
entre características concorrentes é subjetiva e sujeita políticas públicas, campanhas publicitárias, educadores,
à vieses. Ainda que a concordância entre juízes dentre outros, possam refletir sobre a elaboração de
possa ser utilizada para minimizar eventuais vieses, mensagens pró-ambientais.
a possibilidade de classificação de um cartaz de Em conjunto, os resultados oferecem uma análise
acordo com todas as suas características, mesmo as científica de uma realidade comumente discutida apenas
mutuamente excludentes, deve ser uma alternativa a em teoria, ou com base em observações intuitivas e
ser desenvolvida. muitas vezes enviesadas da realidade. Essa análise
Novas formas de cruzar os dados podem ser pode contribuir no avanço teórico-metodológico da
exploradas, por exemplo, buscando a caracterização área, além de promover a investigação de pressupostos
específica dos cartazes que tem por motivação no contexto brasileiro. Ao mesmo tempo, permite a
promover uma empresa. Ainda, poderia ser utilizado discussão sobre características comuns na comunicação
um critério não explorado na presente pesquisa, como pró-ambiental brasileira, que podem trazer limitações
a caracterização de cartazes de OnGs pró-ambientais inerentes, já reconhecidas em literatura, e restringir
em comparação a cartazes de empresas privadas. A a eficácia das mensagens persuasivas. De maneira
dificuldade na definição de apenas duas opções de destacada, a elaboração de um sistema para a
categorização para a característica de ênfase sobre os categorização de cartazes pró-ambientais brasileiros
impactos dos problemas ambientais (i.e.: nenhum, na representa um avanço que pode ser aprimorado e
natureza, no homem, ambos) deve ser investigada. É orientar pesquisa e intervenção na área.
Referências
Bamberg, S. & Möser, G. (2007). Twenty years after Hines, Hungerford, and Tomera: a new meta-analysis of
psychosocial determinants of pro-environmental behavior. Journal of Environmental Psychology, 27(1), 14-25. https://
doi.org/10.1016/j.jenvp.2006.12.002
Bator, R. & Cialdini, R. B. (2000). The application of persuasion theory to the development of effective pro-environmental
public service announcements. Journal of Social Issues, 56, 527-541. https://doi.org/10.1111/0022-4537.00182
Bauer, M. & Gaskel, G. (2002). Pesquisa qualitativa com imagem, texto e som: um manual prático. Rio de Janeiro: Vozes.
Berg, B. L. (1995). Qualitative research methods for the social sciences. Boston: Allyn and Bacon.
Boomsma, C., Pahl, S., & Andrade, J. (2016). Imagining change: An integrative approach toward explaining the
motivational role of mental imagery in pro-environmental behavior. Frontiers in psychology, 7, 1780. https://doi.
org/10.3389/fpsyg.2016.01780
Burchell, K., Rettie, R., & Patel, K. (2013). Marketing social norms: social marketing and the ‘social norm approach’.
Journal of Consumer Behaviour, 12(1), 1-9. https://doi.org/10.1002/cb.1395
Chapanis, A. (1965). “Words, words, words”. Human Factors: The Journal of the Human Factors and Ergonomics
Society, 7(1), 1-17. https://doi.org/10.1177/001872086500700101
Cialdini, R. B. (2003). Crafting normative messages to protect the environment. Current Directions in Psychological
Science, 12(4), 105-109. https://doi.org/10.1111/1467-8721.01242
Cialdini, R. B. (2011). The focus theory of normative conduct. In P.A. Van Lange, A. W. Kruglanski, & E. T. Higgins
(Orgs.), Handbook of theories of social psychology (Vol. 2, pp. 295-312). New York: Sage.
Cleveland, M., Kalamas, M., & Laroche, M. (2005). Shades of green: Linking environmental locus of control and pro-
environmental behaviors. Journal of Consumer Marketing, 22(4), 198-212. https://doi.org/10.1108/07363760510605317
Corral, V. (2010). Psicología de la sustentabilidad: Un análisis de lo que nos hace proecológicos y prosociales. México:
Editorial Trillas.
Creswell, J. W. (2010). Projeto de pesquisa: Métodos qualitativo, quantitativo e misto. Porto Alegre: Artmed.
De Leeuw, A., Valois, P., Ajzen, I., & Schmidt, P. (2015). Using the theory of planned behavior to identify key beliefs
underlying pro-environmental behavior in high-school students: Implications for educational interventions. Journal
of Environmental Psychology, 42, 128-138. https://doi.org/10.1016/j.jenvp.2015.03.005
Dolan, P., Hallsworth, M., Halpern, D., King, D., Metcalfe, R., & Vlaev, I. (2012). Influencing behaviour: The mindspace
way. Journal of Economic Psychology, 33, 264-277. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.10.009
Gifford, R. (2011). The dragons of inaction: Psychological barriers that limit climate change mitigation and adaptation.
American Psychologist, 66, 290-302. https://doi.org/10.1037/a0023566
Gosling, S. D. & Mason, W. (2015). Internet research in psychology. Annual Review of Psychology, 66, 877-902. https://
doi.org/10.1146/annurev-psych-010814-015321
Greenberg, J. & Arndt, J. (2012) Terror management theory. In P. A. Van Lange, A. W. Kruglanski, & E. T. Higgins
(Orgs.). Handbook of theories of social psychology (Vol. 1, pp. 398-415). London: Sage. https://doi.org/
10.4135/9781446249215.n20
Guest, G. (2013). Describing mixed methods research: An alternative to typologies. Journal of Mixed Methods Research,
7, 141-151. https://doi.org/10.1177/1558689812461179
Iglesias, F., Caldas, L. S., & Rabelo, L. A. T. (2014). Negando ou subestimando problemas ambientais: Barreiras
psicológicas ao consumo responsável. Psico, 45(3), 377-386. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2014.3
Kaiser, F. G., & Fuhrer, U. (2003). Ecological behavior’s dependency on different forms of knowledge. Applied
Psychology, 52(4), 598-613. https://doi.org/10.1111/1464-0597.00153
Klöckner, C. (2015). The psychology of pro-environmental communication: Going beyond standard information
strategies. London: Palgrave Macmillan. https://doi.org/10.1057/9781137348326
Kollmus, A. & Agyeman, J. (2002). Mind the gap: Why do people act environmentally and what are the barriers
to pro-environmental behavior? Environmental Education Research, 8(3), 239-260. https://doi.org/10.1080/
13504620220145401
Kreppner, K. (2010). Aplicando a metodologia de observação em psicologia do desenvolvimento e da família. Curitiba:
Juruá.
Levin, I. P., Schneider, S. L., & Gaeth, G. J. (1998). All frames are not created equal: A typology and critical analysis of
framing effects. Organizational Behavior and Human Decision Processes, 76(2), 149-188. https://doi.org/10.1006/
obhd.1998.2804
Nolan, J. M., Schultz, P., & Knowles, E. S. (2009). Using public service announcements to change behavior: No more
money and oil down the drain. Journal of Applied Social Psychology, 39(5), 1035-1056. https://doi.org/10.1111/
j.1559-1816.2009.00471.x
Ölander, F. & Thøgersen, J. (2014). Informing versus nudging in environmental policy. Journal of Consumer Policy,
37(3), 341-356. https://doi.org/10.1007/s10603-014-9256-2
Sapiains, R., Beeton, R. J., & Walker, I. A. (2016). Individual responses to climate change: Framing effects on
pro-environmental behaviors. Journal of Applied Social Psychology, 46(8), 483-493. https://doi.org/10.1111/
jasp.12378
Steg, L., Van Den Berg, A. E., & De Groot, J. I. (Orgs.). (2012). Environmental psychology: An introduction. New York:
Wiley & Sons.
Tannenbaum, M. B., Hepler, J., Zimmerman, R. S., Saul, L., Jacobs, S., Wilson, K., & Albarracín, D. (2015). Appealing
to fear: A meta-analysis of fear appeal effectiveness and theories. Psychological Bulletin, 141(6), 1178-1204. https://
doi.org/10.1037/a0039729
Thompson, S. C. G. & Barton, M. A. (1994). Ecocentric and anthropocentric attitudes toward the environment. Journal
of Environmental Psychology, 14(2), 149-157. https://doi.org/10.1016/S0272-4944(05)80168-9
Winter, P., Cialdini, R., Bator, R. J., Rhoads, K., & Sagarin, B. J. (1998). An analysis of normative messages in signs at
recreation settings. Journal of Interpretation Research, 3(1), 39-47.
Witte, K. (1998). Fear as motivator, fear as inhibitor: Using the extended parallel process model to explain fear appeal
successes and failures. In P. A. Andersen & L. K. Guerrero K. (Orgs.). Handbook of communication and emotion:
Research, theory, applications, and contexts (pp. 423-450). San Diego: Academic Press.
Autores:
Ligia Abreu Gomes Cruz – Mestre, Universidade de Brasília
Fabio Iglesias – Doutor, Universidade de Brasília