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PSICOLOGIA

DE PERCEPÇÃO

autores
CLAUDIA BEHAR
FABIO PERIN

1ª edição
SESES
rio de janeiro  2015
Conselho editorial  sergio augusto cabral; roberto paes; gladis linhares

Autor do original  fabio perin e claudia behar

Projeto editorial  roberto paes

Coordenação de produção  gladis linhares

Projeto gráfico  paulo vitor bastos

Diagramação  bfs media

Revisão linguística  bfs media

Imagem de capa  koya79 | dreamstime.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

P445p Perin, Fabio


Psicologia da percepção / Fabio Perin ; Claudia Behar
Rio de Janeiro : SESES, 2015.
120 p. : il

isbn: 978-85-5548-149-9

1. Processos. 2. Conceitos da percepção. 3. Neurociência.


4. Processos visuais. I. SESES. II. Estácio
cdd 152.14

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário

1. Psicologia de Percepção 5

1.1  Psicologia de Percepção 6


1.2  Sensação e Percepção 7
1.3  Desenvolvimento do Estudo da Percepção 11

2. Conceitos Gerais em Neurociência 23

2.1  Conceitos Gerais em Neurociência 24


2.2  Aspectos Funcionais do Sistema Nervoso Central 34
2.3  Sensação e as Vias Sensoriais 39
2.4  Sensação e Seus Receptores 49
2.5  Os Receptores Somestésicos 50
2.6  A Audição e o Equilíbio 55
2.7 Equilíbrio 57
2.8  Olfação e Gustação 60

3. Processos Visuais Básicos 67

3.1  Adaptação ao Escuro 68


3.2 Acuidade 71
3.3  Controle de movimento dos olhos 72
3.4  Características da Informação Visual 74
3.5  Percepção de Cores 74
3.6  Cegueira para Cor 79
3.7  Percepção de Movimento 81
3.8  Percepção de Profundidade 81
3.9  Indicadores Binoculares de Percepção de Profundidade 85
3.10  Constância Perceptiva 88
3.11  Ilusões Perceptivas 91
3.12  Ilusão de Tamanho 91
3.13  Ilusão de Direção 92
3.14  Ilusão de Forma 94
3.15  Ilusão de Luminosidade 95
3.16  Ilusão de Movimento 97

4. Abordagens Teóricas da Percepção 99

4.1  Abordagens Teóricas da Percepção 100


4.1.1  Percepção Direta 100
4.1.2  Teorias Descendentes ou Bottom-up 101
4.2  Percepção de Forma 104
4.2.1  Principais Representantes 104
4.2.2  Conceitos Fundamentais da Teoria da Gestalt 104
4.2.3  Princípios de Organização Perceptiva 105
4.2.4  A Orientação da Figura e Percepção da Forma 106
4.3  Predisposição Perceptual ou Predisposição Perceptiva 110
4.4  O Surgimento da Consciência 111
4.5 Atenção 113
4.6  Efeito Stroop 115
1
Psicologia de
Percepção
1.1  Psicologia de Percepção
A psicologia da percepção é um campo de estudo vasto e com muitas impli-
cações teóricas e práticas tanto cotidianas como em contextos profissionais.
Sua gênese remonta o aparecimento da psicologia como ciência e seu desen-
volvimento seguem até os dias atuais envolvendo diferentes áreas de pesquisa
e diversas perspectivas epistemológicas. Além disso, o conhecimento dos pro-
cessos que envolvem a percepção é essencial para o entendimento do compor-
tamento dos organismos. A percepção é um fenômeno multifacetado, ou seja,
tem múltiplas relações e implicações com uma diversidade de áreas na psicolo-
gia além de outros campos do conhecimento.
Podemos definir a percepção como a capacidade dos organismos coletarem
informações no ambiente analisá-las em diversas etapas de processamento,
relacioná-las com informações já existentes no organismo e combiná-las com
outras funções cognitivas de maneira a permitir que o organismo opere no am-
biente. Neste sentido a percepção não é uma “coisa”, mas sim um processo.
Todos nós temos uma experiência! O leitor provavelmente está nesse mo-
mento tendo uma experiência visual ou tátil, além de uma experiência auditiva.
Todo momento estamos experimentando, quando dizemos que estamos cons-
ciente o que estamos dizemos é que estamos tendo uma experiência. Quando
dizemos que temos experiência sobre algum assunto ou coisa é por que nos
relacionamos inúmeras vezes com essa situação ou objeto.
Partindo dessa perspectiva podemos pensar que a experiência (o fenômeno)
pode ter um efeito cumulativo. A cada experiência estamos, de alguma manei-
ra, aprimorando a relação com o ambiente que é essencial para o futuro. Este
processo chama-se aprendizagem. Para que possamos lidar melhor com outras
experiências no futuro, armazenamos estas informações. Este armazenamento
de informações é chamado de memória. Neste sentido podemos dizer que a
experiência é o conjunto de dados que o organismo coleta no ambiente e a ma-
neira como ele transforma esses dados e armazena. Se pudermos considerar
esse processo como definição conceitual de experiência, temos elemento para
crer que o conceito está muito próximo do conceito de percepção.
Entender a maneira como os dados ambientais, bem como os corporais, são
coletados e analisados possibilitando a geração de planos de ações é de impor-
tância vital para quem pretende de alguma maneira fornecer subsídios para a
alteração da experiência humana. Neste contexto o estudo da percepção é es-
sencial para a edificação da psicologia bem como para seu desenvolvimento.

6• capítulo 1
A complexidade do tema faz com que a discussão de percepção possa ser
feita em muitos níveis e em diversas perspectivas epistemológicas. Devido à
proposta e às limitações deste material vamos nos ater aos aspectos físicos e
biológicos da percepção. Nosso objetivo é discutir os processos básicos da per-
cepção a partir dos conhecimentos das ciências como a física, a biologia e a
psicologia cognitiva. Mas não perdemos de vista que o tema tem uma amplitu-
de muito maior e que implicações culturais, políticas e filosóficas também são
necessárias para uma discussão mais ampla do assunto.
Dessa forma nos propomos a apresentar uma série de processos e conceitos
que nos permitem ter acesso ao conhecimento fundamental do que chamamos
de percepção permitido que o leitor reflita na implicação desses processos no
cotidiano.

1.2  Sensação e Percepção


Quando olhamos ao redor, quando respiramos, quando ouvimos os sons que
nos cercam ou quando passamos a mão em uma superfície, coletamos uma sé-
rie de dados do ambiente. Interagimos com uma série de formas de energia
e as transformamos em nossas vivências pessoais. Dizemos que percebemos
algo quando nos relacionamos com algum evento no ambiente ou alguma par-
te no nosso corpo. Desta forma, podemos dizer que a percepção tem duas limi-
tações: o tempo e o espaço. Isto é, não podemos perceber informações que não
atingem o nosso organismo,em razão da distância ou algum obstáculo; assim
como não podemos perceber eventos experiências que ocorreram no passado.
Ou seja, só podemos perceber aquilo que está acontecendo no presente e a uma
distância limitada.

COMENTÁRIO
A maioria dos cientistas que estuda a percepção distingue percepção do processo senso-
rial. Podemos considerar que sensação consiste na capacidade que os organismos têm de
reagir a certos aspectos das energias físicas e químicas do ambiente e criar um código para
processamento no sistema nervoso.

capítulo 1 •7
Sensação: “é a capacidade que os animais apresentam de codificar certos aspectos
da energia física e química que os circunda” (Lent, 2013).

Você já sabe que só vemos quando existe luz. Porque a luz chega aos nossos
olhos. Mas já se deu conta de que a luz atinge todo o nosso corpo mas apenas
através dos olhos conseguimos ver? Já se perguntou por quê? Já notou que a luz
do sol quando atinge a pele é interpretada como calor e no olho interpretamos
como imagem? Você sabe por quê? A resposta está no sistema nervoso. Na ver-
dade a visão depende do encéfalo ou cérebro. Somente no encéfalo a imagem
se forma e apenas nos olhos temos células específicas, chamadas receptores,
que são capazes de transformar a luz na linguagem que o sistema nervoso con-
segue entender. Depois que a luz é transformada em impulso nervoso, ela é
transmitida através das fibras nervosas até chegar ao córtex, parte do encéfalo
onde a imagem vai se formar. Este caminho que a informação percorre desde
o momento que atinge o receptor até chegar ao córtex é chamado sensação.
Assim, no olho existem receptores capazes de transformar a energia solar em
cor e forma; na pele temos receptores que transformam a mesma energia em
informação térmica.
Poderia se supor que a partir do momento que a imagem se formou, acaba
o processo mas na verdade é nesse instante que se inicia a percepção. Formar a
imagem é diferente de entender o que se está vendo. A interpretação da imagem
é exatamente o que entendemos como percepção. O olho só permite que te-
nhamos consciência das informações ambientais a distância, mas reconhecer
os objetos ou as pessoas ou o espaço físico é bem mais complexo. Para reconhe-
cer, precisamos acessar a nossa memória para lembrarmos que conhecemos
os dados visualizados e antes disso, para percebermos, precisamos direcionar
a nossa atenção.
A atenção é um recurso muito limitado. Vivemos constantemente expostos
a uma infinidade de informações sensórias: o barulho de ar refrigerado ou do
ventilador, ou o barulho vindo da janela, juntamente com as informações que
chegam constantemente ao corpo, tais como: a roupa, os adereços ou a cadei-
ra na qual estamos sentados. Estas informações estão sendo levadas ao córtex
incessantemente. Ao nosso redor, existem milhões de objetos. Se você olhar
para um quadro neste momento, no ambiente onde se encontra, é possível
que identifique determinados detalhes que nunca tinha percebido antes. Isto

8• capítulo 1
ocorre porque não perdemos tempo gastando a nossa limitada capacidade de
atenção com aquilo que tem pouca relevância para nós. Desta forma, diante de
tantas informações, a atenção é direcionada para uma informação de cada vez.
E ainda assim geralmente por um tempo insuficiente para percebermos todos
os detalhes. Desta forma, aquilo que não direcionamos a nossa atenção não é
percebido mesmo que esta informação esteja disponível aos nossos sentidos.
Não sei se já aconteceu com você? Estar na sala de aula e o professor a sua
frente falando sobre percepção mas a sua atenção está direcionada para o pró-
ximo final de semana ou o fim de semana anterior. Você é capaz de ouvir e de
ver o professor mas não seria capaz de reproduzir o que foi ensinado, algumas
vezes por vários minutos. Não se assuste, na realidade isso acontece com todo
mundo. Este fenômeno ocorre porque sua atenção estava voltada para outros
processos cognitivos. E como você não direcionou sua atenção para o ambien-
te, não percebeu as informações ambientais. Por isso podemos afirmar que a
percepção é seletiva. Em meio a uma diversidade de informações, apenas al-
gumas serão percebidas. Mas o que direciona a atenção? Você e dois amigos
estiveram, em momentos diferentes, folheando a mesma revista, ou estiveram
em uma mesma festa. Depois, ao conversarem sobre a revista ou a festa, é pro-
vável que cada um tenha percebido aspectos bastante diferenciados destes dois
eventos. Isto porque a motivação direciona a nossa atenção. Tendemos a olhar
para aquilo que nos motiva. Se estivermos com fome, provavelmente vamos
perceber o que está sendo servido e procuraremos identificar um lugar estra-
tégico para sermos bem servidos. Se estamos interessados em alguém, acom-
panharemos todos os passos desta pessoa. Por isso a percepção costuma variar
de uma pessoa para outra, mas pode acontecer que os mesmos elementos se-
jam percebidos por muitas pessoas. Isto acontece porque os amigos frequente-
mente têm interesses comuns. Além disso, as informações ambientais contras-
tantes no ambiente tendem a despertar a atenção da maior parte das pessoas.
Vamos explicar. Você percebeu quem estava usando calça jeans no último dia
de aula? Provavelmente não porque usar calça jeans é coisa muito comum e por
isso não vamos gastar nosso preciso tempo prestando atenção a informações
irrelevantes. Mas se alguém chega à praia de calça jeans, a maioria das pessoas
irá perceber porque usar calça na praia é absolutamente destoante do contexto.
Além da memória, atenção e motivação a emoção também influencia a per-
cepção. Podemos perceber com certa facilidade, principalmente em pessoas
com distúrbio bipolar, mas não só nestas pessoas, que a variação de humor

capítulo 1 •9
influencia significativamente na percepção em geral, incluindo a autoimagem
e autoestima. Quando a pessoa está bem emocionalmente, além de perceber
o mundo de forma mais favorável, também tende a se perceber de forma mais
positiva, seja a nível físico, cognitivo ou outros.
Nossa experiência também influencia a percepção. Uma pessoa que tra-
balha com costura, será capaz de perceber diferenças nas cores das linhas ou
defeitos nas roupas com muito mais precisão do que outras pessoas. Aqueles
que trabalham com comida terão muito mais facilidade em reconhecer os dife-
rentes temperos utilizados em um prato. De fato, nossa percepção vai se desen-
volvendo em função das nossas experiências. Isso explica como um somelier
é capaz de identificar o tipo da uva, o local e o ano da produção de um vinho
apenas pelo seu sabor e aroma.
Outro aspecto fundamental refere-se a influência das crenças na percepção.
Esta talvez seja uma das mais importantes. O fato é que muitas vezes das in-
formações ambientais, selecionamos aquelas que confirmam nossas crenças.
Por exemplo: se eu acho que uma reunião social será uma tragédia, mesmo que
ocorram vários acontecimentos satisfatórios, o fato de ter um aspecto que me
desagrada pode fazer com que eu foque a minha atenção naquela informação e
assim acabe confirmando a minha crença de que a reunião foi uma catástrofe.
O fato de eu achar que estou mal vestida pode fazer com que eu acredite que
todos que me olham estão achando o mesmo que eu. Esta costuma ser a causa
de muitos conflitos pessoais e interpessoais.
Desta forma, a percepção não depende exclusivamente dos dados do am-
biente, mas é influenciada por muitas variáveis. Assim, a percepção revela-se
como um processamento em um nível superior, agregando elementos de ou-
tras funções como memória, atenção, emoção e motivação.
Se você fosse questionado neste momento se podemos perceber todos os
estímulos existentes, talvez você respondesse que não porque já aprendeu
que nossa percepção é seletiva e só percebemos aquilo a que direcionamos a
atenção. E se você tivesse tempo para perceber todos os estímulos existentes
em uma sala sem pessoas ou móveis, acha que conseguiria perceber todos os
estímulos existentes? Não tendo muitas informações, certamente ficaria mais
fácil perceber os detalhes. Então poderíamos perceber todos os detalhes? A
resposta ainda é não. Como vimos, a percepção depende da sensação e nossa
sensação é limitada. Existem muitas informações no ambiente que nossos re-
ceptores não conseguem detectar; tais como as ondas emitidas pelo aparelho

10 • capítulo 1
de micro-ondas ou o som produzido durante a ultrassonografia; que se chama
ultrassom justamente porque é um som fora do alcance dos nossos receptores.
As limitações sensoriais variam de acordo com cada espécie, desta forma, al-
guns estímulos podem ser detectados por uma espécie mas não por outra.

COMENTÁRIO
Podemos dizer então, que a sensação é um processo exclusivamente fisiológico, ligada aos
sentidos enquanto a percepção é um processo psicológico porque refere-se à seleção,
organização e interpretação da informação sensorial; e para interpretar precisamos de dife-
rentes processos cognitivos.

Percepção: “trata-se da capacidade que alguns animais apresentam de veicular os


sentidos a outros aspectos da existência, como o comportamento no caso dos animais
em geral, e o pensamento, no caso dos seres humanos.” (Lente, 2010).

Agora que aprendemos como a percepção é influenciada por vários aspec-


tos, um cuidado importante para um psicólogo é não tomar a sua percepção
como verdade inquestionável. A percepção é um processo cognitivo e como tan-
tos outros está sujeito a falhas e equívocos. Este ponto de partida é fundamen-
tal para a prática profissional do psicólogo em qualquer área de atuação.

1.3  Desenvolvimento do Estudo da


Percepção

O interesse pela percepção remonta o início da filosofia, sendo mesmo abor-


dada por muitos pensadores pré-socráticos (METSI, 2012; CASTRO e LANDEI-
RA-FERNANDEZ, 2011). Além disso, foi tema de diversas escolas filosóficas in-
fluentes como os empiristas e a fenomenologia. Em especial a escola Empirista
nos séculos XVII e XVIII que se dedicaram a entender o conhecimento como
tendo única fonte a experiência sensorial. Contudo os primeiros estudos cien-
tíficos de percepção remontam os laboratórios de psicofísica.

capítulo 1 • 11
Psicofísica é o estudo da relação entre os processos físico e mentais, cujo principal
representante foi o cientista Gustav Fechener.

Os estudos de psicofísica afirmavam que era possível estabelecer uma rela-


ção quantitativa entre o estímulo físico e sua produção subjetiva.
Em 1860, Hermann von Helmholtz (1821-1894) elabora uma teoria sobre as
representações psicológicas ou percepções. Junto com esta teoria, o autor propõe
o método da introspecção experimental. Esta tem o objetivo de neutralizar a in-
fluência da experiência passada. Para isso os sujeitos são treinados para reconhe-
cer o aspecto mais primitivo da experiência. Também em 1860, Gustav Fechner
(1801-1887) estabelece a primeira lei psicológica que estabelecia relação entre a
experiência psicológica e o estímulo material. Fechner media o limiar absoluto e
limiar diferencial. O limiar absoluto refere-se à menor intensidade do estímulo
que nossos sentidos conseguem detectar. O limiar diferencial, é compreendido
como a menor distância que conseguimos perceber dois pontos na pele como es-
tímulos separados. Isso porque se encostarmos na pele duas pontas de lápis mui-
to próximas não perceberemos como dois toques diferentes mas perceberemos
como apenas um toque na pele. Fechner concluiu que a relação entre a magnitu-
de da sensação e a magnitude do estímulo seria logarítimica, ou seja, enquanto
estímulo na sua propriedade física aumenta de forma aritmética, a sensação, au-
menta de forma geométrica. A lei torna-se conhecida como Lei Weber-Fechner
em função do trabalho semelhante que Ernest Weber (1795-1878) desenvolvia
alguns meses antes, na mesma Universidade de Leipzig embora com conclusões
diferentes. Weber tinha concluído que a diferença percebida do estímulo e o seu
valor absoluto eram diretamente proporcionais. Desta forma, Fechner propõem
a primeira medição em psicologia e a psicologia torna-se ciência graças à possi-
bilidade de ter um método de introspecção, uma Lei geral e a possibilidade de
quantificar seu objeto de estudo.
O limiar absoluto é utilizado até hoje nos exames de audiometria, para ava-
liar a capacidade auditiva das pessoas com suspeita de déficit auditivo. O limiar
diferencial pode ser experimentado de forma simples com o uso de um com-
passo e uma régua. O ideal é realizar a testagem umas dez vezes para reduzir
os erros. Um método muito utilizado é o método dos limites. Neste, a medição
é realizada por 5 vezes de forma crescente, isto é, começando com o compas-
so fechado e abrindo de centímetro em centímetro até que a pessoa perceba

12 • capítulo 1
os dois pontos do compasso, e 5 vezes de forma decrescente. Neste caso pode
começar com o compasso aberto e vai fechando, até que a pessoa não perce-
ba mais os dois pontos do compasso. Uma observação interessante que depois
será esclarecida refere-se ao fato de que na ponta do dedo o limiar diferencial
costuma variar em torno de 0,5 cm, já nas costas este varia de 2,0 cm a 10,00 cm.
Costuma ser muito divertido verificar este fato.

COMENTÁRIO
Os estudos psicofísicos influenciaram posteriormente os trabalhos de Wilhelm Wundt (1832-
1920), em Leipzig que através da criação do primeiro laboratório de psicologia, é o marco
do aparecimento da psicologia científica. Alunos de Wundt como G.Stanley Hall, J.M.Cattel
e Edward Bradford Tichener foram para universidades americanas e continuaram com seus
estudos, dando origem a uma perspectiva que ficou conhecida como Estruturalismo.

Estruturalismo: a ideia de Tichener era que se deveria analisar a experiência comple-


xa a partir de seus elementos mais simples, que seriam os elementos fundamentais, os
“átomos do pensamento (Morris e Maisto 2004).

Este, influenciado por ciências como a física e a química propunha que para
se compreender os padrões psíquicos complexos como a percepção, era neces-
sário decompô-la em seus elementos mais fundamentais: as sensações (Morris
e Maisto, 2004). Segundo o estruturalismo a percepção seria um somatório de
sensações elementares. Para estudar a percepção seria necessário identificar
sensações tais como cor, forma, textura e outros porque estes posteriormente
formariam a percepção.

COMENTÁRIO
Em oposição ao estruturalismo, um grupo de psicólogos alemães céticos à proposta atomista
do estruturalismo propõe que a percepção depende mais da disposição dos elementos do
que suas unidades decompostas. Psicólogos como Marx Wertheimer (1880-1943), Wol-
fgang köhler (1887-1967) e Kurt Kolffka (1886-1914) lideraram o movimento que ficou
conhecido como Psicologia da Gestalt.

capítulo 1 • 13
Psicologia da Gestalt: as estruturas da percepção dependem mais da relação dos
estímulos do que da junção das partes elementares.

Gestalt é uma palavra alemã e significa forma, estrutura ou silhueta e traz


grandes contribuições para o estudo da percepção.
Em contraste com o estruturalismo, a Psicologia da Gestalt surge na
Alemanha em 1912 e afirma que a relação entre os elementos ou parte é mais
importante que o conjunto das partes. Ao invés de uma perspectiva analítica,
o gestaltismo propõe uma perspectiva holística. Este movimento surge com o
“fenômeno phi”. Este fenômeno é simplesmente um exemplo de movimento
aparente. Foi identificado através de um experimento, onde duas lâmpadas
próximas acendiam e apagavam alternadamente em uma velocidade deter-
minada. Em função da velocidade desta alternância, ao invés de percebermos
duas lâmpadas, percebemos como se fosse apenas uma luz em movimento.
Esse fenômeno é comumente percebido nas lâmpadas que utilizamos nas ár-
vores de natal. A sequência luminosa na qual elas acendem e apagam criam
uma percepção de movimento. O gestaltismo trouxe importantes contribui-
ções para o estudo da percepção.

14 • capítulo 1
“O todo é diferente da soma das partes". Esta frase ficou famosa como re-
ferência do movimento gestaltista. Ela representa uma oposição nítida ao
princípio do estruturalismo de que a percepção é um somatório de sensações.
Segundo o gestaltismo, percebemos a relação entre os elementos e não os ele-
mentos em si. Podemos representar como uma equação matemática onde so-
mando A e B não teremos AB mas uma outra forma, como por exemplo um C.
Por exemplo, uma melodia é ouvida como uma totalidade, como um conjunto
e quando a escutamos, não temos consciência das notas que a compõem. Os
elementos constitutivos de uma figura são agrupados espontaneamente e esta
organização e, segundo os gestaltistas, é inata. Se quisermos, podemos alterar
o tom da melodia. Desde que se mantenha a relação entre as notas, a percepção
se mantém a mesma.
Duas linhas e e círculos separados serão percebidos como linhas e círculo,
mas organizados podem ser percebidos como um rosto, como na imagem abaixo:

Uma lei fundamental do gestaltismo é a lei da boa forma. Segundo esta te-
mos a tendência a dar uma boa forma àquilo que percebemos. Por este motivo,
muitas vezes temos dificuldade de percebermos erros no testo. Veja a figura
abaixo:

capítulo 1 • 15
NÃO
PARE NA
NA PISTA
Ou mesmo de compreender um texto mesmo quando ele é escrito de forma
errada, como no exemplo abaixo:

De aorcdo com uma peqsiusa de


uma uinrvesriddae ignlsea, não
ipomtra em qaul odrem as lteras de
uma plravaa etãso, a uncia csioa
iprotmatne é que a piremria e
útmlia lteras etejasm no lgaur crteo.

A boa forma é definida como a forma mais simples, estável e coerente. Esta
dependa muito das características do estímulo.

16 • capítulo 1
A imagem amterior é chamada de imagem ambígua ou reversível. Isto porque
pode ser percebida igualmente de duas formas: dois perfis ou um cálice. Se reti-
rarmos o contorno da imagem, muda completamente a configuração e a imagem
dos perfis torna-se mais pregnante porque sem o contorno os perfis se misturam
com o fundo branco e o que se destaca é o cálice. Veja o desenho abaixo:

A boa forma depende também do percebedor, em função de que a coerência


pode ser uma avaliação muito pessoal.
Outro fenômeno perceptivo apresentado pelo gestaltismo refere-se à rela-
ção figura e fundo. O gestaltismo mostrou que só conseguimos perceber uma
imagem de cada vez, ou seja, se estamos em sala de aula e olhando para uma
bolsa, a bolsa é a figura e o resto da sala passa a ser o fundo, mas as figuras
são reversíveis, isto é, a cada momento um elemento torna-se a minha figura
e todo o resto passa a ser o fundo. A imagem que é a figura num determinado
momento tem contorno e é nítida. O restante, naquele instante, não uma forma
claramente definida. Como na foto abaixo:
©© 2DAY929 | DREAMSTIME.COM

capítulo 1 • 17
O que define em um cenário o que será a figura? Além dos fatores citados an-
teriormente relacionados à atenção, segundo o gestaltismo a menor imagem é
percebida como figura. Por isso é difícil percebermos o que está escrito abaixo.

Na verdade, não conseguimos ler porque as letras acima se misturam com


o fundo e os espaços é que se destacam como figura. Se fecharmos o contorno
das letras, fica bem mais fácil perceber a palavra.

18 • capítulo 1
A psicologia da Gestalt contribuiu para o que hoje entendemos como per-
cepção de forma e gerou uma série pesquisas que mais tarde influenciaram o
aparecimento da Psicologia Cognitiva.
De acordo com Eysenck e Keane (2007), uma série de acontecimentos em
1956, como a apresentação de Noam Chomsky no MIT sobre desenvolvimento
da linguagem, os estudos de George Miller sobre memória de curta duração e o
modelo computacional de Newell e Simon, além do surgimento da inteligência
artificial na conferência de Dartmouth, são marcos do aparecimento de uma
nova perspectiva sobre a psicologia e a percepção, a Psicologia Cognitiva. A psi-
cologia cognitiva de uma maneira geral estava sustentada pela abordagem de
Processamento de Informações, que supunha que as informações coletadas
pelos sistemas sensoriais eram processadas em uma série de etapas em dife-
rentes sistemas que transforma a informação sistematicamente definindo os
processos e as estruturas constituintes do desempenho cognitivo. Essa aborda-
gem dominou os estudos de percepção por boa parte do século XX.
No seu surgimento a psicologia cognitiva estava quase que totalmente
apoiada em estudos de laboratório, porém os estudos de pacientes com lesões
neurológicas, além de modelos computacionais da cognição e o advento das
técnicas de neuroimagens impulsionaram o desenvolvimento da aplicação
prática da psicologia cognitiva e o surgimento de novas especialidades como a
neuropsicologia (Eysenck e Keane, 2007).

Neuropsicologia: especialidade que estuda a relação entre o funcionamento cerebral,


a cognição e o comportamento.

Além da Neuropsicologia que focava seus estudos nos déficits cognitivos


apresentados por pacientes com lesões cerebrais, o surgimento de equipamen-
to que permitiam visualizar a atividade encefálica pelo aumento do fluxo san-
guíneo ou consumo de glicose, permitiu um maior aprofundamento no enten-
dimento da relação entre o comportamento e o funcionamento neurológico em
indivíduos sadios.

capítulo 1 • 19
COMENTÁRIO
De acordo com Schiffman (2005) a psicologia cognitiva ainda contribuiu para o desenvolvi-
mento de propostas espistemológicas diversas, como o construtivismo.

Construtivismo: abordagem que sustenta que a percepção depende da organização


que o organismo faz para a construção da percepção onde o organismo participa ativa-
mente da construção da percepção e que esta não é uma mera “representação de uma
realidade exterior”. Ou ainda a abordagem direta de Gibson, que ao contrário enfatiza
que as informações do ambiente são suficientes para fornecer todos dados da percep-
ção sem a necessidade de um processamento adicional.
James Jerome Gibson, foi um importante psicólogo americano da universidade de
Princeton especializado na percepção visual.

20 • capítulo 1
A B

Exemplo de estímulos - A) Gradiente de perspectiva e ausência do horizonte. B) Gradiente


de compressão e perspectiva e presença do horizonte.

Todas essas escolas contribuíram ativamente para criar modelos explica-


tivos que foram incorporados à psicologia da percepção e hoje constitui uma
área transdisciplinar com desdobramentos técnicos e científicos em uma série
de campos do conhecimento. Por outro lado não podemos deixar de enfatizar
que nos últimos 20 anos o aperfeiçoamento das neurociências dominou os es-
tudos da percepção relacionando os fenômenos perceptivos com a atividade do
sistema nervoso central e suas unidades funcionais os neurônios.
Desta foram, é importante que para entender a visão contemporânea sobre
percepção conhecer as estruturas e os processos básicos de funcionamento do
sistema nervoso central.

capítulo 1 • 21
22 • capítulo 1
2
Conceitos Gerais
em Neurociência
2.1  Conceitos Gerais em Neurociência
O objetivo final de todo organismos é viver e para isso é preciso manter uma in-
finidade de cascatas de processos químicos que garantam a funcionalidade do
organismo. Para sustentar essa sequência de reações o organismo deve man-
ter intensas trocas com o ambiente, buscando nutrientes e evitando estímulos
aversivos. Para tanto, é necessário mapear o estado interno do organismo bem
como o ambiente externo. Alguns organismos como os vertebrados, desenvol-
veram um sistema centralizado para controle e ajustes que permitem otimizar
as interações com o meio, o sistema nervoso central.
O sistema nervoso central é um sistema composto por um conjunto de uni-
dades, altamente interconectados, que permitem uma intensa comunicação
química. Além disso, as células do sistema nervoso central tem a capacidade
de alterar as voltagens de suas membranas plasmáticas , característica que as
distingui das demais células do corpo. Essas duas características permitem que
o sistema nervoso mapeie o ambiente e o estado fisiológico e metabólico do
organismo.

Membrana plasmática: membrana semipermeável que envolve a célula, constituída


de fosfolipídios que isolam o meio interno do meio externo.

24 • capítulo 2
O Neurônio tem uma forma peculiar que está relacionada à sua função, em
geral, podemos separá-las em quatro regiões principais: soma, ou corpo celu-
lar, local que se encontra a maior parte de material genético da célula, e onde
ocorre também boa parte de síntese proteica, o lugar em que estão localizadas
também muitas organelas celulares.
Os dendritos uma região especializada em receber sinais de outros neurô-
nios ou de outros tipos celulares. O axônio um prolongamento que tem como
função conduzir o impulso nervoso ou potencial de ação, os botões sinápticos
constituintes da sinapses que é a região onde ocorrem a comunicação entre os
neurônios.

Síntese proteica: é a produção de proteína celulares organizada pelo DNA.


Organelas celulares: são os “pequenos órgãos” da célula, são compartimentos celula-
res limitados por membranas que desempenham papeis específicos no funcionamento
celular.
Dendritos: são prolongamentos que ramificam-se profusamente, formando uma estru-
tura semelhante a uma árvore com seus galhos.
Axônio: prolongamento principal de um neurônio, sua função principal é a condução
do impulso nervoso.
Potencial de ação: alteração transitória na voltagem da membrana plasmática do
neurônio, é conhecida como impulso nervos devido a sua característica de percorrer o
corpo e o axônio dos neurônios.
Botões sinápticos: no final dos axônios encontramos expansões que formam termi-
nais especializados em comunicação química.

capítulo 2 • 25
As sinapses são estruturas dos neurônios especializadas em comunicação
química, ou seja, em liberar substâncias que vão influenciar o funcionamento
das células seguintes. A sinapse pode ser separada em três elementos: a mem-
brana pré-sináptica, a qual é responsável pela liberação dos neurotransmis-
sores, a fenda sináptica, local onde os neurotransmissores são liberados, e a
membrana pós-sináptica, local onde encontramos uma série de estruturas pro-
teicas que funcionam como verdadeiros receptores moleculares.

Neurotransmissores: são substâncias químicas produzidas e liberadas pelos neurô-


nios. Em geral são peptídeos, aminas, aminoácidos, mas outras substâncias também
podem agir como neurotransmissores.

26 • capítulo 2
Esses receptores pós-sinápticos têm funções muito importantes na regula-
ção da célula tanto imediatamente quanto a longo prazo, mas disso falaremos
adiante. Por hora é importante saber que essa capacidade de se comunicar por
substâncias químicas garante que os neurônios possam processar informações
recebidas de outras células e mesmo do ambiente.
Para entender o funcionamento dos neurônios é preciso lembrar que eles
são polarizados, isto é, tem dois polos, um positivo e o outro negativo. Na ver-
dade essa polarização ocorre por conta da concentração de moléculas eletrica-
mente carregadas, essas moléculas chamadas de íons, se organizam de forma
que uma concentração maior de moléculas com carga negativa (ânions) ficam
no interior da célula e uma concentração maior de cargas positivas (cátions) na
face externa da membrana celular. Essa concentração é possível pela existência
de canais que permitem a passagem dos íons para dentro ou para fora das célu-
las, são os canais iônicos . Os canais iônicos podem ser de dois tipos: os aber-
tos, que permitem passagem livre de íons, e os controlados por comportas que
só permitem a passagem de íons em determinadas situações. Essas situações

capítulo 2 • 27
podem ser quando uma substância se liga neles, por esse motivo são chama-
dos de canais iônicos controlados por comporta dependente de ligante. Este
nome indica que ele seu funcionamento é semelhante a uma fechadura com
sua chave, quando a chave está na fechadura a porta pode ser aberta.

Íons: são átomos ou compostos que ganharam ou perderam elétrons e por isso apre-
sentam carga negativa ou positiva.
Ânions: quando o átomo ganha elétrons ele fica com carga negativa e se chama Ânion.
Cátions: quando o átomo perde elétrons ele fica com carga positiva então é chamado
de Cátion.
Canais iônicos: são estruturas proteicas integradas à membrana plasmática da célula,
geralmente possuem quatro subunidades em forma de um poro que permite o trânsito
de íons para dentro ou para fora da célula.

canais iônicos

Ac.

fechado aberto

canal dependente de ativador


canal simples
(sempre aberto)

A outra situação que permite a abertura de canais iônicos e quando a célula


sofre uma alteração de voltagem, nesse caso a comparação seria com um por-
teiro eletrônico, ou seja, uma alteração na voltagem abre a porta. Esses canais
iônicos por motivo óbvios são chamados de canais iônicos controlados por
comporta dependentes de voltagem. Veremos que a produção do potencial

28 • capítulo 2
de ação e sua propagação dependem do funcionamento desses canais, assim
como a diferença de potencial entre a face interna e a externa da membrana dos
neurônios que os torna polarizados depende dos canais abertos.

Além dos canais iônicos abertos, a polarização depende do equilíbrio de


três moléculas pela ação de duas forças físicas. As moléculas são os íons de só-
dio (Na+) carregada positivamente, as íons de potássio (K+) carregados positi-
vamente também e as moléculas de cloro (Cl-), carregadas negativamente. As
forças físicas que estão atuando são chamadas de gradiente químico, uma for-
ça de repulsão que age quando existe muita concentração de uma determinada
substância (lembrem do princípio da osmose) e um gradiente elétrico que atrai
moléculas com cargas diferentes e repele moléculas com cargas semelhantes.
Essas forças fazem com que as três moléculas encontrem um equilíbrio rela-
tivo, isto é, o potássio encontra seu ponto de equilíbrio aumentando suas con-
centrações no interior da célula, para o sódio as concentrações aumentam no
exterior da célula, por outro lado o cloro encontra seu equilíbrio no exterior da
célula.

Osmose: a osmose é um processo onde a água se movimento entre dois meios con-
forme a concentração de solutos.

capítulo 2 • 29
Esse equilíbrio relativo é chamado de potencial de repouso, neste caso di-
zemos que a célula está despolarizada ou inerte. Nessa condição os neurônios
podem ser estimulados pelos neurotransmissores e produzir uma atividade,
processo chamado de despolarização, quando dizemos que a célula está sen-
do estimulada. No processo de despolarização os canais iônicos controlados
por comporta são abertos permitindo um fluxo maior de íons para dento da
célula, em geral os íons de sódio que tem cargas positivas. Mas também pode
ocorrer de abrir canais de cloro, por exemplo, e permitir a saída deste da célu-
la, como ele tem carga negativa, sua saída da célula também deixa seu interior
mais positivo.
Se na despolarização a alteração de voltagem atingir uma determinada am-
plitude ele poderá abrir os canais controlados por comportas dependentes de
voltagem que permitem um fluxo muito intenso de sódio para dentro da célula,
gerando assim um potencial de ação.

30 • capítulo 2
Potencial de repouso: ocorre quando as células apresentam uma diferença de potên-
cias elétricas entre a face interna e externa da célula.
Despolarização: a entrada de íons positivos na célula ou a saída de íons negativos
desta diminuem a diferença de potências elétricas entre a face externa e interna.
Potencial de ação: é uma transição abrupta das voltagens da face interna e externa
da célula por um fluxo muito grande de íons sódio para dentro e uma subsequente
saída de íons potássio.

Uma vez gerado o potencial de ação ele vai abrindo outros canais dependen-
tes de voltagem até chegar na extremidade do botão sináptico.
O potencial de ação permite que o impulso percorra todo o corpo do neurô-
nio, mas não passa diretamente para o próximo neurônio. Como vimos antes,
ao chegar no botão sináptico o potencial de ação promove a liberação de neuro-
transmissores. A próxima célula pode ou não geral um novo potencial de ação,
vai depender da dinâmica dos receptores pós-sinápticos. Esse processo per-
mite que o neurônio “tome uma decisão” se irá produzir ou não um potencial
de ação, e é essa possibilidade que permite ao neurônio “processar”, ou seja,
modificar a informação. Para entender isso devemos estar cientes que os re-
ceptores moleculares podem ser classificados em duas famílias diferentes que
promovem também diferentes efeitos nas células.
Uma delas já foi falado anteriormente, são os canais iônicos controlados
por comporta dependentes de ligantes que a partir de agora chamaremos de
receptores ionotrópicos. São receptores que abrem diretamente canais iôni-
cos. Veremos adiante que alguns receptores sensoriais também são do tipo
ionotrópico.

Receptores ionotrópicos: são canais iônicos controlados por comportas dependen-


tes de ligantes.

capítulo 2 • 31
A outra família de receptores moleculares não abrem diretamente canais
iônicos, mas promove profundas modificações no metabolismo celular que po-
dem produzir desde expressão de genes e síntese proteica até inclusive abertu-
ra de canais iônicos. Por esse motivo são chamados de receptores metabotró-
picos. Os receptores metabotrópicos agem a partir de uma proteína conhecida
como proteína G, essa proteína é capaz de ativar enzimas no interior da célula
para promover diferentes reações celulares. Veremos que também alguns re-
ceptores sensoriais são receptores metabotrópicos, como, por exemplo, um
tipo de receptor molecular que existe em células do sistema visual chamado de
bastonete.

Expressão génica: é quando a informação armazenada no genes da célula são deco-


dificadas para produzir algum produto celular.
Síntese proteica: é a produção de proteínas a partir da tradução e da transcrição do
DNA e do RNA da célula.
Receptores metabotrópicos: é um receptor de membrana celular que produz suas
funções pela ativação de um segundo mensageiro intracelular.

32 • capítulo 2
Proteína G: é uma família de proteínas constituídas por três subunidades que atuam
como catalizadores de reações intracelulares.
Bastonete: bastonetes são células da retina dos vertebrados que respondem a baixos
níveis de iluminação e são responsáveis pela visão noturna.

capítulo 2 • 33
2.2  Aspectos Funcionais do Sistema
Nervoso Central

Podemos, para fins didáticos, dizer que o sistema nervoso central tem duas
estratégias de organização. Uma que chamarei de sedimentar, pois se trata de
uma organização em camadas, com diferentes níveis se sobrepondo, sendo que
a cada nível temos um aumento da complexidade no processamento das infor-
mações. Uma forma de organizar o SNC a partir dessa perspectiva seria separar
o encéfalo em três camadas gerais: o tronco cerebral, o diencéfalo e o telencéfa-
lo. Outras camadas podem ser diferenciadas também, mas no momento essas
três são suficientes.

34 • capítulo 2
A segunda estratégia é um sistema de rede com unidades interligadas que
processam diferentes características das informações sensoriais ou corporais.
Neste sentido podemos pensar que o sistema nervoso está organizado em vias
de processamento com algumas regiões processando diferentes estímulos ou
características desses estímulos. Um exemplo são as vias sensoriais que podem
ter diferentes neurônios ou conexões nas diferentes camadas, por exemplo, no
tronco cerebral, depois no tálamo no diencéfalo até que cheguem ao córtex.

capítulo 2 • 35
O córtex por sua vez é organizado em regiões relativamente especializadas, ou
seja, cada área cortical está implicada com o processamento de uma modalidade
sensorial, por exemplo, a região do córtex occipital é especializada no processa-
mento de informações visuais. Ou com a integração de informações para uma de-
terminada função, por exemplo, a junção do córtex parietal, temporal e occipital
que está relacionada à linguagem e também à leitura. Por esse motivo dizemos
que o sistema nervoso tem uma divisão Morfofuncional (morfo= forma).
O córtex pode ser dividido em dois hemisférios e cada hemisfério em Lobos.
Podemos usar acidentes anatômicos como referência. Da frente para trás te-
mos o lobo frontal que tem seu limite posterior no sulco central, depois temos o
lobo parietal que faz fronteira com o lobo occipital na extremidade posterior do
cérebro. Abaixo do lobo parietal e frontal a partir do sulco lateral temos o lobo
temporal. Afastando o lobo parietal do lobo temporal a partir do sulco lateral
encontraremos outra região cortical chamada de ínsula.

36 • capítulo 2
Cada região cortical pode ser especializada em funções sensoriais ou fun-
ções cognitivas de alta complexidade, assim teremos regiões de processamen-
to sensorial primário, que são as regiões que recebem as projeções sensoriais
como o sulco calacarino na superfície medial do lobo occipital que é conhecido
como córtex visual primário, ou ainda o giro pós-central no lobo parietal conhe-
cido como área somato sensorial primária.

capítulo 2 • 37
Outras regiões podem ser associativas, isto é, combinam informações de di-
ferentes fontes. Estas áreas associativas podem ser classificadas como unimo-
dais ou secundárias quando estão relacionadas a somente uma modalidade, a
audição por exemplo, ou ainda as regiões denominadas heteromodais, supra-
modais ou terciárias , quando não tem relação direta com uma única modali-
dade, como por exemplo o córtex pré-frontal.
Além disso, existem outras formas de classificação conforme a funcionali-
dade, nesta direção temos a classificação de Brodman que localizou 52 áreas
distintas no córtex. Estas classificações tem permitido entender as localizações
das funções cognitivas de ato nível como também entender a dinâmica de co-
municação entre as diferentes áreas e como elas se combinam para o funciona-
mento do organismo.

Região de projeções unimodais: são regiões do córtex cerebral que recebem proje-
ções de uma única modalidade sensorial.
Regiões de projeções terciárias: são áreas de processamento associativo de mais
de uma modalidade sensorial envolvida em atividade de processamento cognitivo su-
perior.
Korbianian Brodmam: Neurologista alemão responsável por mapear a superfície do
córtex cerebral em 52 regiões usando como referência suas características citoarqui-
tetônicas e funcionais.

38 • capítulo 2
Podemos então perceber que o sistema nervoso é uma estrutura altamente
conectada com capacidade de processar informações coletadas no organismo
e no ambiente, analisar as caraterísticas destas informações, associá-las de
maneira a constituir um mapa do ambiente e um mapa do estado fisiológico
e metabólico do organismo permitindo planejar ações no ambiente e produzir
modificações no organismo. Estes processos ocorrem a todo o momento e em
muitos casos ao mesmo tempo. As informações podem ser processadas etapas
sequenciais ou ao mesmo tempo em paralelo.

Processamento sequencial: forma de processamento que estabelece uma rotina de


operações em uma sequência de etapas que devem obedecer.
Processamento em paralelo: é um sistema de processamento que permite que uma
informação seja processada por várias vias ao mesmo tempo.

A percepção é dentro deste contexto a forma como dados do ambiente e do


corpo são coletados processados, associados a outras funções cognitivas para
produzir planos de ação e mudanças fisiológicas adaptativas. Portando para
entender a percepção devemos entender a natureza das informações ambien-
tais e como elas são captadas.

2.3  Sensação e as Vias Sensoriais


A primeira etapa do processo perceptivo é coletar informações do ambiente,
ou seja, interagir com o ambiente captando determinadas formas energéticas.
Para poder fazer isso é importante entender a natureza da informação do am-
biente e como elas afetam com o organismo. Quando falamos em informações
ambientais falamos de um conjunto de energias que podem produzir efeitos
em determinados grupos de células chamados de receptores sensoriais, essas
formas de energias químicas e físicas interagem com esses receptores de ma-
neira a extrair informações de intensidade, duração e frequência por exemplo.

Receptores sensoriais: são estruturas que reconhecem os estímulos externos do ambiente.

capítulo 2 • 39
As energias do ambiente podem ser de diferentes naturezas, a luz, por exem-
plo, corresponde a determinado intervalo do comprimento de onda eletromag-
nética. Já o tato corresponde a deformações na pele produzidas pela energia
mecânica dos objetos. Enquanto que o olfato depende de estimulação quími-
ca. Desta forma temos que saber quais as formas de energias interagem com os
organismos e quais são seus intervalos de limites.
Em relação à natureza do estímulo físico podemos classificá-los em
Estímulos Químicos, produzidos pela interação de moléculas e partículas. Em
estímulos físicos, que são energias mecânicas, como as ondas do som, e a ener-
gia mecânica dos objetos que deformam a pele no tato, ou ainda a energia me-
cânica da contração muscular. Energias eletromagnéticas, como a luz.
Por esse motivo receptores para estes estímulos energéticos são seletivos
para cada uma dessas formas de energias, por isso recebem o nome da energia
que apresentam a melhor resposta, dessa forma temos a seguinte classifica-
ção: os químioceptores, que são receptores para estímulos químicos, como os
receptores olfativos e gustativos. Os mecanoceptores receptores para estímulos
mecânicos, como as células ciliadas da cóclea no ouvido interno, ou os recepto-
res táteis. Os termoceptores que são receptores sensoriais sensíveis a variações
de temperatura. E os fotoceptores, que respondem a intervalo de frequência da
onda eletromagnética, a saber, a luz e nos permitem enxergar. Ainda temos de-
tectores especiais que só vão responder a partir de uma determinada intensidade
destes estímulos, que são responsáveis por proteger os tecidos de lesões, esses
receptores, que têm uma importância vital para manter os tecidos do corpo in-
tactos são chamados de nocirreceptores, e são responsáveis pelas sensações do-
lorosas ou nocivas.

Os químioceptores são receptores sensíveis à estimulação química.


Os mecanoceptores são receptores sensoriais sensíveis à estimulação mecânica.
Os termoceptores são receptores sensíveis a alterações de temperatura.
Os fotoceptorres são receptores sensíveis às partículas de luz os fótons.
Nociceptores: receptores responsáveis pelas sensações dolorosas.

40 • capítulo 2
Além dessa classificação mais genérica veremos que temos receptores mais
especializados para um aspecto específico da natureza da energia ao qual ele é
sensível. Também veremos que existem diferentes receptores táteis, diferentes
receptores visuais, diferentes receptores gustativos e assim por diante.
Um aspecto importante de lembrarmos e que esses receptores respondem a
um intervalo dos estímulos, isto é, não responde a todas as variações de inten-
sidade ou frequências. Neste sentido sabemos que os receptores têm limiar de
resposta, ou seja, a intensidade mínima de energia que pode ativar um receptor.
Isso ocorre porque ao longo do processo evolutivo os receptores sofreram pres-
sões ambientais e a seleção natural tornou-os seletivos para aquelas variações de
energia que eram importantes para a sobrevivência, ou seja, que facilitavam evi-
tar perigos como predadores, localizar alimento e possibilitar o acasalamento.

Limiar: o mínimo de energia necessário para ativar um receptor.

A lógica implícita nesse processo é otimizar a coleta de dados ambientais


para a sobrevivência e evitar gasto energético com dados irrelevantes. Isso pode
aumentar a sensibilidade do receptor para o intervalo de intensidade ou de
frequência do estímulo ambiental. Por esse motivo os sistemas sensoriais das
diferentes espécies podem se especializar em uma determinada sensibilidade
sensorial desenvolvendo-a mais do que outras. Por exemplo, os cachorros são
capazes de ouvir frequências sonoras que os humanos não, também a acuida-
de visual de muitas espécies de aves é muito maior que a humana. Cada siste-
ma está sensorial está adaptado ao estilo de vida dos organismos, ao ambiente
onde ele vive e o nicho que ele ocupa.

capítulo 2 • 41
Os receptores sensoriais vão se conectar com outros neurônios formando vias
exclusivas de processamento para cada modalidade sensorial, então temos, por
exemplo, as vias visuais, as vias auditivas, as vias somatosensoriais, vias olfativas
e gustativas, todas com caminhos específicos para chegar ao local do córtex onde
serão processadas . Essas são consideradas verdadeiras vias sensoriais. Assim as
modalidades sensórias permanecem isoladas umas das outras nas primeiras eta-
pas do processamento. Os receptores sensorias podem se agrupar em determina-
das regiões formando estruturas especializadas em uma determinada informa-
ção ambiental, como por exemplo, os olhos, ou estarem espalhadas por diversas
regiões do corpo como os receptores para dor os nociceptores.
Como já mencionamos anteriormente cada via sensorial vai conduzir as
informações para áreas corticais específicas, assim teremos no córtex áreas
modalidade específica. Por exemplo, as informações táteis que são produzidas
primeiramente por mecanoceptores nas camadas da pele depois seguem por
axónios das raiz dorsal da medula, ascendem até o núcleo grácil ou o núcleo
cuneiforme, dali cruzam contralateralmente, e seguem ascendendo pelo lem-
nisco medial até o núcleo ventral póstero-lateral do tálamo de lá para o giro
pós-central a área somestésica primária.

contralateralmente - ao lado oposto


lemnisco medial - feixe de fibras sensoriais
tálamo - região do diencéfalo, localizada acima do hipotálamo e faz parte do sistema
límbico (relativo às emoções)

42 • capítulo 2
Chegando ao córtex essas informações são analisadas por outras áreas es-
pecíficas que decompõem características especiais da informação sensorial,
como localização espacial, variações de frequências, áreas de contraste, tempo
de duração entre outras características. Cada sensação tem vias adequadas a
processar suas próprias características, além do mais as características desse
processamento são específicas para cada espécie e a importância destas infor-
mações no nicho que a espécie habita.
Para algumas espécies, como mencionamos anteriormente, ter um ou mais
sentidos especializados é adaptativo e por isso terão uma organização cortical
para mapear esse sentido que será diferente do que para os demais. Essa orga-
nização depende das informações genéticas, mas depende das informações do

capítulo 2 • 43
ambiente, por exemplo, em humanos e algumas espécies, sabemos que a per-
da de uma via sensorial, pode reorganizar as demais vias, mostrando que pelo
menos em parte essa organização depende também da estimulação ambiental.
Isso quer dizer que dependendo do sentido e da espécie essa via terá uma
análise diferenciada em relação aos demais sentidos. No caso dos seres huma-
nos a orientação visual parece ter um papel muito importante para sua sobrevi-
vência. Por isso mais tarde daremos um protagonismo para o processamento vi-
sual para podermos explicar algumas estratégias de processamento perceptivo.
Contudo a via somatosensorial é, na maioria dos vertebrados, bastante de-
senvolvida uma vez que colabora com informações para a programação motora
e por tanto para a produção dos comportamentos motores. Desta forma as in-
formações somatosenorias como tato, dor e principalmente a propriocepção
são importantes componentes perceptivos e motores em vertebrados.

S1 S1 Córtex Insula

Neurônio de
terceira ordem
Tálamo

VM e
VPL VPL
MD
encefálico
Tronco

Neurônio de
segunda ordem
Cerebelo
Medula

L.1
Neurônio
primário
Periferia

SISTEMA SISTEMA SISTEMA


PROPRIOCEPTIVO EXTEROCEPTIVO INTEROCEPTIVO

Para o processamento das informações ambientais temos que transformar


as informações do ambiente em uma linguagem compreensível para o sistema
nervoso central. Esse processo corresponde a traduzir as energias ambientais
em um código bioelétrico que será conduzido ao sistema nervoso central. Esse
processo foi chamado de transdução. Nesta etapa energias ambientais vão inte-
ragir com os receptores sensoriais (que podem se ionotrópics e metabotrópicos).
Dessa forma os receptores são ativados pelas formas energéticas do ambiente,

44 • capítulo 2
essa atividade, via de regra, abre canais iónicos. Com os canais iônicos abertos
vai ocorrer uma alteração na voltagem da membrana do receptor que pode des-
polarizar, como hiperpolarizar, essa alteração vai ser chamada de potencial do
receptor, nela o estímulo físico irá produzir uma atividade no receptor sensorial
proporcional as suas características, isto quer dizer que quanto mais intenso for
o estímulo maior será a magnitude da resposta do receptor. Da mesma forma a
atividade do receptor terá duração igual a apresentação do estímulo.

Transdução: função das células receptoras de transformação da informaçao sensorial


e impulso nervoso.
Despolarizar: processo pelo qual a diferença de voltagem na face interna da membra-
na com a face externa diminui.
Hiperpolarizar: neste caso os contrário da despolarização a diferença da face interna
e da face externa aumenta fazendo com que a atividade do neurônio seja inibida.
Potencial do receptor: é uma alteração da voltagem na membrana celular como res-
posta a um estímulo energético.

a) b)
Amplitude do potencial

Músculo 1,5
receptor (mV)

Fuso 1,0
muscular

0,5

0
Estiramento

200
(µm)

Fibras 100
nervosas 0
0 5 10 15 20
Tempo (ms)

c) 0 cm Hg
Correntes
iônicas
–3 cm Hg
5pA

–5 cm Hg

0 50 100 200
Tempo (ms)
capítulo 2 • 45
Além disso, o receptor irá também codificar essa informação, isto é, trans-
formar a informação sensorial em uma linguagem inteligível para os neurô-
nios. Mas antes de discutirmos a codificação é importante lembrarmos que o
sistema nervoso utiliza um código binário, a partir das frequências do poten-
cial de ação que podem ser enviadas para todo o sistema nervoso. Esse código
é caracterizado pela presença ou ausência de um potencial da ação. Assim o
receptor necessita transformar a variação de voltagem da sua membrana, que
estão associadas às características do estímulo energético, em uma sequência
de P.A. (potenciais de ação) com frequências específicas que representem essas
características ambientais.
Para fazer isso os receptores, ou neurônios associados a eles, têm no início
de seu axônio uma região chamada de zona de disparo, essa região tem uma
grande concentração canais iônicos dependentes de voltagem. Esses canais
são sensíveis às alterações do potencial do receptor abrindo assim uma gran-
de quantidade de canais iônicos dependentes de voltagem permitindo uma
abrupta entrada de íons e promovendo um P.A. Uma vez gerado o P.A. é enviado
através das vias sensoriais até o córtex. Dessa maneira as características do es-
tímulo ambiental são transformadas em uma salva de potenciais de ação, com
frequência que correspondente às características do estímulo.

Código binário: é um sistema de códigos baseados em dois elementos, na maioria


dos casos 0 e 1.
Zona de Disparo: são regiões dos neurônios com grande quantidade de receptores
dependente de voltagem, que são ativados quando o neurônio alcança o limiar de disparo.

a)

Estimulo Registro do Registro dos


mecânico potencial receptor potenciais de ação

46 • capítulo 2
b) F1
A1 A1

F2
A2 A2

A3 A3 F3

c)
D1 D1’
D1”

D2 D2’
D2”

D3 D3’
D3”

A transdução e a codificação garantem que variáveis do estímulo como in-


tensidade, duração sejam transformados em padrões neurais compatíveis. Mas
os receptores também podem fornecer dados sobre a localização espacial. Isto
é possível, pois, os receptores têm uma área delimitada à qual eles são sensí-
veis, estímulos que ocorrem dentro dessa área vão ativar um receptor específi-
co. Por causa dessas características essa área especifica de estimulação do re-
ceptor é chamada de campo receptor, a organização dos receptores com seus
campos receptores um ao lado do outro mais a organização das fibras nervosas
que trafegam juntas para o cérebro possibilitam ao SNC mapear no córtex áreas
específicas correspondentes aos conjuntos dos receptores. Essa maneira de or-
ganizar os estímulos no córtex é conhecida como organização topográfica, um
exemplo disso é o giro pós-central, que corresponde à área somatosensorial.
Nessa região teremos uma organização bem característica da representação do
nosso corpo. Cada área do giro pós-central recebe projeções específicas de de-
terminadas regiões do corpo, mão, rosto, tronco, etc. Essas áreas corticais não
são proporcionais às dimensões corporais, mas, sim à quantidade de recepto-
res em cada região. Por exemplo, os lábios têm uma grande quantidade de re-
ceptores táteis, já o tronco de receptores táteis tem uma concentração menor.
Dessa forma ocorre que no córtex as áreas que processam informações táteis
da região do lábio são maiores do que as áreas que processam informações das
costas. E por isso os lábios têm mais sensibilidade tátil que as costas.

capítulo 2 • 47
Campo receptor: região do corpo que estimulada produz uma atividade no receptor
sensorial.
Organização topográfica: é uma correspondência entre a concentração e posição
dos receptores.

Os receptores, além do mais, podem ser classificados pela forma como são
ativados ou desativados. Dessa maneira temos os receptores fásicos que geram
um pico de resposta no início da estimulação com uma diminuição abrupta e
rápida e um novo pico de resposta ao fim da estimulação. E os receptores tôni-
cos que apresentam uma atividade no receptor semelhante ao estímulo físico,
porém com uma lenta diminuição da resposta até que o estímulo seja inter-
rompido, são chamados também de receptores de adaptação lenta.

a) Estímulo b)

Decréscimo
Decréscimo acentuado
pequeno e lento e rápido

PR
Pico do início Pico do final
do estímulo do estímulo

PAs

48 • capítulo 2
Um aspecto importante também em relação às características da atividade
dos receptores sensoriais é o processo conhecido como dessensibilização ou
adaptação sensorial. Quando um receptor é ativado por uma forma de energia
do ambiente ele produz uma resposta que vai lentamente diminuindo. Como
falamos acima, se a estimulação persiste o receptor vai parar de produzir res-
postas. Esse processo pode ser chamado de habituação ou fadiga. Veremos
mais adiante que o organismo estabelece estratégias para evitar isso em algu-
mas vias sensoriais.

Dissensibilização ou adaptação sensorial: é a diminuição da resposta de um recep-


tor pela continuidade da exposição ao estímulo físico.

Agora temos uma visão básica de como os organismos captam dados dos
seus ambientes, de como as energias interagem com os receptores. Contudo te-
mos muitos tipos de receptores, mesmo para uma única modalidade sensorial.
Cada tipo de receptor é resultado de uma especialização para uma determinada
característica do estímulo. Teremos então, por exemplo, para o tato, uma das
modalidades somatosensorial (ou somestésico), mediada por mecanocepto-
res, cerca de sete receptores específicos, com funções e localizações especiais
para otimizar suas funções. Veremos a seguir alguns receptores sensoriais de
modalidades específicas.

2.4  Sensação e Seus Receptores


Geralmente atribuímos, no senso comum, cinco sentidos para o Ser Humano,
contudo essa quantidade pode variar de acordo com a lógica de classificação.
Isto na verdade ocorre porque existe uma série de receptores espalhados pelo
organismo coletando informações da mesma foram que os receptores senso-
riais. Muitas vezes algumas dessas informações não são consideradas sensa-
ções, pois nem sempre resultam em percepções diretas.
Existem muitos receptores para diversas tarefas no organismo. Muitos desses
receptores têm funções de controle, servem para coletar medidas de variáveis me-
tabólicas e fisiológicas e ajustar o organismo. Receptores que mapeiam o estado
interno do organismo também podem subsidiar informações para as respostas

capítulo 2 • 49
emocionais e estados motivacionais como fome e sono que também depende de
mapas sobre o estado do organismo bem como de mapas ambientais.
Essa diversidade de sistemas de coleta de informações sobre o ambiente e
o organismo propicia muitas possibilidades de classificações do que seriam as
sensações. De qualquer forma é importante delimitarmos o que estamos dizendo
quando falamos em sensações. Para fins didáticos consideraremos sensações as
seguintes modalidades: somatoestesia, incluindo o tato, a percepção térmica.
A propriocepção e a percepção de dor. A visão, a audição, a gustação e o olfato.

Somestesia: integra as diversas sensações corporais, são os sentidos do corpo.


Propriocepção: e a capacidade de identificar a posição do corpo, tanto em relação as
suas partes constituintes como também em relação ao espaço.

2.5  Os Receptores Somestésicos


Como falamos acima a somestesia são as sensações do corpo e dependem de
uma diversidade de receptores espalhados pelos tecidos corporais. Esses re-
ceptores têm adaptações morfofuncionais para os estímulos ou características
destes. Dessa forma teremos a seguinte classificação:

1. Terminações nervosas livres: espalhadas por todo o corpo podem res-


ponder a uma diversidade de estímulos como dor (estimulação intensa), tem-
peratura (variações de temperatura), e tato (nesse caso o tato conhecido como
protoprático, tato pouco discriminado por isso também conhecido como tato
grosseiro).
2. Os órgãos tendinosos de Golgi: estruturas associadas aos tendões que
são sensíveis a tensão destes, fazem parte da propriocepção.
3. Fusos musculares: receptores associados às fibras musculares que res-
pondem quando essas se contraem e também participam da propriocepção.
4. Bulbos de Krause: são terminações nervosas livres encapsuladas por
tecido conjuntivo, têm sido relacionados à transdução térmica, mas também
foi associado à transdução mecânica. Essa dificuldade de classificação ocorre
talvez, porque diferente das terminações nervosas livres, o estímulo sensorial
trafegue por axónios bem mielinizados, ou seja, que conduzem os impulsos
com mais velocidade assim como outras modalidades táteis.

50 • capítulo 2
Tecido conjuntivo: conjunto de células que têm por função ligar, proteger ou nutrir
outros tecidos.
A bainha de mielina: é constituída por células gliais que formam uma capa de lipídeos
isolando o axónio dos neurônios, este isolamento faz com que o impulso nervoso trafe-
gue com maior velocidade no axónio.

5. Discos de Merkel: são estruturas em forma de discos na extremidade


das fibras sensoriais e encontrados em toda a pele glabra e pilosa. Estão asso-
ciados à pressão.

A pele glabra: é uma camada epitelial mais grossa sem a presença de pelos, p.e. a
palma das mãos.
A pele pilosa: é a pele que contém pelos.

6. Corpúsculos de Pacini: são terminações nervosas envolvidas por uma


bolsa de tecido conjuntivo, estão presentes na parte inferior da derme, no teci-
do conjuntivo como o perióstio, nas vísceras e nas articulações.

Perióstio: é o tecido conjuntivo que envolve os ossos.

7. Corpúsculos de Meissner: estas estruturas têm uma distribuição seme-


lhante aos corpúsculos de Pacini. Também são terminações nervosas encapsu-
ladas por serem receptores de adaptação lenta. Acredita-se que estejam relacio-
nados à pressão rápida como estímulos vibratórios.
8. Corpúsculos de Ruffini: estão presentes em toda derme, mas localiza-
dos nas camadas mais profundas, parecem que estão relacionados transdução
de informações térmicas em especial as altas temperaturas, mas também tem
sido relacionados ao tato, em especial a indentação da pele.

capítulo 2 • 51
Esses receptores podem constituir vias diferentes para chegarem ao cór-
tex, como foi mencionado anteriormente, podendo constituir dois sistemas de
acordo com suas características morfofuncionais. Um relacionado com infor-
mações mais discriminadas e com maior acuidade chamado de epicrítico, e
outro que transmite informações sobre dor e temperatura, além de informa-
ções táteis menos desenvolvidas, chamado protoprático. O sistema epicrítico
tem fibras mais mielinizadas e com maior diâmetro que levam a informação
para o cérebro com maior velocidade. O caminho que percorre até o córtex en-
volve três estágios; o primeiro elemento é o neurônio ganglionar é o neurônio
que leva a informação para dentro do SNC. Essa informação vai subir até al-
guns núcleos do tronco cerebral (Núcleo do trigêmeo, Núcleo Grácil, Núcleo
Cuneiforme) e dali o neurônio de segunda ordem segue para o núcleo vento
-posterior do tálamo. De lá o neurônio de terceira ordem segue para o giro pós-
central no lobo parietal.

52 • capítulo 2
Sistema epicrítico: é responsável pelo tato fino, bem discriminado.
Sistema protoprático: é responsável pelo tato grosso, difícil de discriminar.
Neurônio: que leva a informação sensorial para dentro do sistema nervos central.
Tronco cerebral: estrutura basal do encéfalo.
Tálamo: massa cinzenta de formato oval no diencéfalo, estágio de transmissão da
maioria dos dados sensoriais.

capítulo 2 • 53
O sistema protoprático por sua vez tem fibras menos mielinizadas e com me-
nor velocidade de condução dos potenciais de ação. A rota até o giro pós-central
no lobo parietal também é diferente. O neurônio sensorial, a primeira unidade,
estabelece conexão com o neurônio de segunda ordem logo que entra na medula
espinhal em uma região chamada de corno dorsal da medula, depois o neurônio
de segunda ordem segue até os núcleos ventral-posterior e posterior do tálamo,
daí partem os neurônios de terceira ordem até o córtex, no giro pós-central.

Corno dorsal: discrição morfológica da região que recebe as informações sensoriais


na medula espinhal.

Como falamos anteriormente a propriocepção é um conjunto de infor-


mações sobre à disposição do corpo em relação a si mesmo e também ao am-
biente. Parte do sistema proprioceptivo consciente está associado ao sistema
protoprático, uma vez que depende de informações dos receptores táteis, fu-
sos musculares e órgãos tendinosos de Golgi. Porém informações propriocep-
tivas inconscientes acendem para o cérebro por outras vias, elas seguem pelo
trato espinotalâmico anterior até o bulbo e de lá seguem para outras regiões
do cérebro. Além do mais algumas informações da propriocepção provem de
outras vias sensoriais. O sistema vestibular que veremos adiante contribui

54 • capítulo 2
significativamente para a propriocepção ao dar informações sobre a gravidade
e aceleração. Também a visão tem um papel importante na propriocepção.
Como vimos acima o estímulo sensorial percorre três etapas até atingir a
região cortical de processamento específica para cada modalidade, se alguma
dessas etapas for danificada ocorre uma perda sensorial. Veremos que o mes-
mo ocorre com outras modalidades sensoriais.

2.6  A Audição e o Equilíbio


A audição depende das vibrações do ar. Essas vibrações são chamadas de ondas
sonoras e são deformações nas camadas de ar que formam ondas que viajam
até nossos ouvidos. São separados em três partes, ouvido externo, ouvido mé-
dio e ouvido interno. Quando ele chega a uma região conhecida como ouvindo
médio ele encontrará uma membrana que vibrará na mesma frequência das
ondas. Essa membrana conhecida como tímpanos é a primeira etapa para a
transdução dos estímulos do que chamamos de som.

capítulo 2 • 55
Mas o tímpano não é o responsável pela transdução do som, quem vai trans-
duzir o estímulo sonoro são mecanoceptores que ficam no interior de uma es-
trutura conhecida como cóclea, que se assemelha a um caracol. O papel do
tímpano é fazer com que as ondas sonoras (onda que se propaga no ar) passem
para um meio líquido, pois a cóclea é oca, com três cavidades internas cheias
de líquidos. A membrana timpânica está associada a um conjunto de três estru-
turas ósseas minúsculas ligadas entre si e articuladas, Chamadas de martelo,
bigorna e estribo. O estribo por sua vez está ligado à outra membrana em um
orifício na cóclea chamado janela oval (a cóclea tem dois orifícios o outro se
chama janela redonda).

O som tem dificuldade de passar de um meio para outro, por exemplo, do ar para água.
Por isso quando se mergulha é difícil se escutar o que passa fora da água.

56 • capítulo 2
Assim quando o som, que são ondas aéreas, faz a membrana timpânica vi-
brar. Ela movimenta também o martelo que por sua vez movimenta a bigorna e
o estribo, que está ligada a uma membrana na janela oval, a qual transfere a sua
vibração para o líquido dentro da cóclea. Quando esse líquido vibra, ele faz vi-
brar os mecanoreceptores da cóclea que são chamados de células ciliadas. Seu
nome deve-se às estruturas na sua parte superior que se assemelham a cílios e
acompanham a vibração do líquido dentro da cóclea.
As vibrações das células ciliadas vão abrir e fechas canais iônicos na célula
que irá despolizar e hiperpolarizar o receptor enviando informações pelo ner-
vo vestíbulo cocleares para o cérebro até a área auditiva primária onde existem
áreas que representam diferentes tonalidades do som.

Retinotópico: referente a organização da área visual primária que tem correspondên-


cia com a organização dos fotoceptores na retina.

2.7  Equilíbrio
Quando somo crianças, em brincadeiras, rodamos muitas vezes no mesmo lu-
gar e após parar nos sentimos tontos. Além disso, mesmo depois de parar sen-
timos ainda como se tudo em volta estivesse girando. Isto ocorre por que junto
à cóclea encontramos uma estrutura que é muito importante para nossa orien-
tação espacial, equilíbrio, e motricidade. Esta estrutura que está na parte su-
perior da cóclea e conhecida como aparelho vestibular, o órgão do equilíbrio.

capítulo 2 • 57
Seu funcionamento é em parte parecido com as células ciliadas do córtex, são
também células ciliadas sensíveis ao movimento do líquido de suas estruturas
internas, mas, diferente da cóclea, o que faz as células ciliadas do órgão vestibu-
lar vibrar não é o som, mas sim movimentos da cabeça e obviamente do corpo.
O órgão vestibular tem duas regiões cada uma especializada em um tipo de
movimento retilíneo (para frente ou para trás) e rotacional (em curvas, também
chamado de aceleração angular). A região que detecta a aceleração retilínea é
conhecida como órgãos otolíticos e uma região especializada em movimento
em curva ou rotação chamada em canais semi-cirulares.

58 • capítulo 2
Quando iniciamos um movimento, ou paramos, o líquido dentro das estru-
turas vestibulares faz movimento em sentido inverso pela força inercial. Esse
movimento deforma as células ciliadas para o lado contrário do movimento da
cabeça abrindo canais iónicos que despolarizam ou hiperpolarizam as células
ciliadas que por sua vez produzem potenciais de ação as quais serão enviados
para o cérebro pelo nervo vestíbulo coclear e daí para áreas relacionadas ao con-
trole postural.

capítulo 2 • 59
2.8  Olfação e Gustação
Até agora vimos sentidos que utilizam a transdução mecanoelétrica, ou seja,
através dos mecanoceptores. Agora nos deteremos um pouco em outra moda-
lidade, a químiocepção, que como o próprio nome diz está relacionada à trans-
dução de estímulos químicos. Abordaremos o olfato e a gustação. Contudo não
podemos esquecer de mencionar que a maior parte dos parâmetros metabóli-
cos e fisiológicos do organismo dependem de comunicação química, e que nos-
sos estados motivacionais como fome e sono, por exemplo, estão relacionados
a esses parâmetros, bem como as respostas emocionais que também depen-
dem de um mapeamento do estado do organismo.
Pequenas moléculas que se desprendem das substâncias e dissolvem no ar
são chamados de odorantres, elas são aspiradas com o ar pelos pulmões, quan-
do passam pelo nariz entrarão em contato com projeções dendríticas de uma
estrutura chamada de bulbo olfatório. Na verdade o bulbo olfatório faz par-
te do sistema nervoso está dentro da caixa craniana e projeta seus dendritos
para dentro da cavidade nasal onde suas extremidades ficam em contato com
os odorantes que se prendem ao muco produzido na região. Dessa forma as
moléculas odorantes entram em contato com os químioceptores, que em re-
alidade são dendrítos de neurónios bipolares do bulbo olfativo, abrem canais
iônicos que por sua vez podem alterar a voltagem da célula, hiperpolarizando
ou despolarizando.

Neurônios bipolares: tipo de neurônio que possui somente um dendrito.

60 • capítulo 2
As vias olfativas são um pouco diferente das demais vias sensoriais, isto por
que vai direto para o córtex, enquanto os demais sentidos vão para o tálamo an-
tes de chegar ao córtex. Quando saem do bulbo olfatório, os neurônios vão para
uma área extensa na base do córtex conhecida como córtex periforme, além
de outras áreas como o córtex entorrinal e o tubérculo olfatório e núcleo olfa-
tório anterior e amígdala. Contudo apesar de não passar pelo tálamo antes de
chegar ao córtex, algumas dessas regiões irão projetar para o tálamo, que pos-
teriormente projetará para o neocórtex frontal e assim as sensações olfativas se
tornam conscientes.

Estrutura do córtex temporal envolvida com as emoções.

capítulo 2 • 61
Outra forma importante
de químiocepção é a gus-
tação, tanto ela quanto
a olfação, nos permitem
uma análise química das
substâncias que ingeri-
mos, para evitar substân-
cias que poderiam preju-
dicar nosso organismo.
As estruturas que fazem a
transdução química res-
ponsáveis pelo sabor são
os receptores gustativos.
Os receptores gustativos
são encontrados em sua
maioria na língua onde
tem grande concentração,
mas outras regiões da ca-

62 • capítulo 2
vidade oral também os possuem. Os receptores têm sido classificados em quatro
tipos básicos, salgado, doce, azedo e amargo. Contudo essa classificação pode
ser contestada por alguns pesquisadores.
Os receptores gustativos estão agrupados em protuberações na língua cha-
madas de papilas gustativas. Nestas regiões da língua encontramos estruturas
formadas por um conjunto de células chamados botões gustatórios, nele se en-
contram os químioceptores agrupados. Esses receptores são formados por cé-
lulas epiteliais que têm capacidade de estabelecer sinapses com os neurônios
que enviam a informação para o cérebro.
Cada sabor tem um
receptor específico com
mecanismos molecu-
lares específicos. Por
exemplo, os receptores
para o salgado e para o
azedo são receptores do
tipo ionotrópico, já para
o doce e para o amargo
são receptores do tipo
metabotrópico. De qual-
quer forma, o contato
das substâncias gusta-
tivas com esses recep-
tores permitem a mu-
dança de voltagem da
célula receptora. Essa
despolarização produzi-
rá potências de ação nos
neurônios, que então
codificarão a informa-
ção gustatória.
As vias gustativas de-
pendem da região que a
informação é coletada.
Como falamos ante-
riormente não existem

capítulo 2 • 63
receptores gustativos só na língua, eles estão presentes em toda cavidade bucal
e inclusive na faringe. Dessa forma cada região da face vai enviar as informa-
ções gustativas por um nervo craniano. Os três nervos que levam essas informa-
ções para o encéfalo são o nervo vago, o nervo glossofaríngeo e o nervo facial.
Todos eles enviam projeções para uma região específica do tronco cerebral
chamada de núcleo do trato solitário . E de lá para o tálamo (núcleo ventral me-
dial do tálamo) e então para uma região escondida no sulco central chamada
de insula. No córtex insular encontraremos a área gustativa primária. Pouco se
sabe como as informações serão processadas nessa região, imagina-se que elas
se combinam com informações olfativas e que também dependem muito das
influências ambientais, como por exemplo, a cultura.

Nervo craniano: doze pares de nervos que saem diretamente do crânio, em oposição
àqueles que saem da medula.
Núcleo do trato solitário: núcleo do tronco cerebral.

Como vimos até agora, o organismo tem uma série de estruturas organiza-
das para produzir mapas sobre as características do ambiente, e esses mapas
são produzidos pelos caminhos que eles percorrem até o cérebro, vimos que
nessa fase inicial de coleta de informações eles permanecem segregados em via
de processamento específica (via da dor, via do olfato, via da tato etc) sendo pro-
cessados etapa após etapa. Esse tipo de processamento é chamado de proces-
samento em série, mas depois de chegar ao córtex sensorial primário a forma
de processamento se modificará. O processamento ocorrerá em mais de uma
via ao mesmo tempo, por exemplo, a visão terá duas grandes vias de processa-
mento; uma para formas e outra para localização, que por sua vez se dividirão
em outras vias mais específicas. Esse tipo de processamento é conhecido como
processamento em paralelo. Essas diferentes estratégias de processamento
são utilizadas em todas as modalidades sensoriais. Contudo seria virtualmente
impossível e didaticamente inútil neste momento discriminar cada um desses
processos para cada via sensorial, faremos isso parcialmente e exclusivamente
para o processamento visual.

64 • capítulo 2
Processamento em série: processamento onde uma etapa deve ser terminada para
que a próxima possa ser executada.
Processamento em paralelo: processamento onde duas informações são processa-
das ao mesmo tempo.

Temos de conhecer pelo menos em parte como as informações que chegam


ao córtex serão processadas e como esse processamento se correlaciona com a
nossa experiência pessoal. Como falamos anteriormente não é possível abor-
dar aqui todas as vias sensoriais, mas a visão é uma profunda fonte de informa-
ções; uma imagem pode nos fornecer uma imensa quantidade de informações,
como intensidade, cores, movimento, localização espacial e forma.
Além do mais a visão foi muito mais explorada por investigações científicas
que muitas outras sensações e avolumam-se dados sobre detalhes do proces-
samento visual. Muitos desses dados são generalizáveis para as estratégias de
processamento de outras vias, apesar de cada uma conter suas especificidades.
Discutiremos a percepção através da percepção visual nos próximos capítulos.

capítulo 2 • 65
66 • capítulo 2
3
Processos Visuais
Básicos
3.1  Adaptação ao Escuro
Nosso ambiente está sujeito a variações na intensidade da luz, sejam as cícli-
cas (alteração do dia e da noite) ou eventuais (dias nublados, ambientes pou-
co iluminados). Portanto é importante que os olhos tenham um sistema para
compensar essas variações da intensidade da luz. Umas dessas estratégias de
adaptação, fácil de percebermos é a alteração da pupila.
O diâmetro da pupila pode ser alterado pela contração das fibras que com-
põe a íris aumentando ou diminuindo o diâmetro pupilar, assim quando o am-
biente está intensamente iluminado a íris relaxa e diminui o diâmetro pupilar,
diminuindo a quantidade de luz que atinge a retina. Por outro lado, se a ilumi-
nação ambiental é escassa, o diâmetro pupilar aumenta por contração da íris,
permitindo otimizar a quantidade de luz que incide sobre a retina.

Contudo o diâmetro pupilar não é o único ajuste que existe para as varia-
ções de intensidade de luz. Na verdade a própria retina vai atuar para controlar
as variações da luz. Como vimos anteriormente a retina tem duas regiões es-
pecializadas, a fóvea e a periferia da fóvea, cada uma delas está especializada
em uma tarefa visual específica. A fóvea está relacionada com a visão fotópica,
a visão diurna, com a acuidade e tem grande concentração de cones. A região
periférica com a visão noturna e alta concentração de bastonetes.

68 • capítulo 3
Cada uma dessas regiões irá ter características de adaptação diferente. A vi-
são fotópica se adapta mais rápido, cerca de cinco minutos, mas por outro lado
é menos sensível, ou seja,tem um limiar mais alto. Já a visão escotópica tem um
limiar mais baixo, é muito mais sensível, mas em uma velocidade de adaptação
mais lenta, cerca de trinta minutos. Essas diferenças no tempo de adaptação
da visão escotópica e fotópica podem ser contextualizadas pelas necessidades
ambientais.

Limiar é a quantidade mínima de energia para produzir uma resposta.

Para variações ambientais transitórias, como passar para um ambiente


pouco iluminado, a sensibilidade da visão fotópica é suficiente, mas pela tran-
sitoriedade da mudança essa adaptação tem de ser rápida. A visão escotópica
está melhor preparada para funcionar em situações de muita pouca ilumina-
ção no ambiente. Como essas situações são mais frequentes na passagem do
dia para a noite, seu período de adaptação é maior, pois está adequado ao perí-
odo crepuscular.

capítulo 3 • 69
Adaptação ao Escuro e ao Claro do Olho Humano
Adaptação ao Escuro Adaptação ao Claro
100000

10000

1000

100

10

0,1
1 11 21 31 41 51 61 71
Minuto

Um aspecto interessante de se ressaltar é que a luz é constituída de vários


comprimentos de ondas e os receptores não respondem da mesma forma para
cada frequência. Dessa forma, determinadas frequências precisam de mais
energia para responder. Dito de outra maneira, os receptores são mais sensí-
veis para algumas frequências do que outras.
Um efeito interessante ocorre com as ondas de grande comprimento, próxi-
mas ao vermelho, já que a sensibilidade da visão fotópica é baixa para essa fre-
quência e a visão escotópica não possui sensibilidade para as frequências mais
altas. Dessa forma o vermelho é a primeira “cor” que não produz mais respostas
durante o anoitecer, um fenômeno conhecido como desvio de purkinge.
Além da intensidade do estímulo visual existem outros fenômenos que po-
dem modificar a atividade do receptor e produzir efeitos perceptíveis, um deles
é a dissensibilização do receptor que falamos anteriormente e produzirá fenô-
menos com as pós-imagens que discutiremos posteriormente. Outro fenôme-
no que está ligado às pós-imagens também é a persistência visual, que é expli-
cada pela continuidade da atividade do receptor após a retirada do estímulo.
Mais tarde discutirmos as pós-imagens em relação a uma série de fenômenos
ligados à percepção de cores, de forma e inclusive de movimento.
Um fenômeno interessante que pode estar relacionado à persistência visual
é a frequência crítica de fusão e a frequência crítica de oscilação. A frequência
crítica de oscilação refere-se à velocidade necessária para perceber uma fonte
de luz oscilando entre apagada e acesa. Em relação à frequência crítica de fusão
ocorre o contrário; onde a velocidade é necessária para que a oscilação não seja
perceptível. Essa característica do sistema visual permite, por exemplo, que se
produza lâmpadas mais econômicas como as lâmpadas fluorescentes.

70 • capítulo 3
3.2  Acuidade
Como vimos, a sensibilidade é mais desenvolvida na visão esctópica, por outro
lado a acuidade é muito mais desenvolvida na visão fotópica. A acuidade tem
uma relação direta com a percepção de formas, uma vez que requer capacida-
de discriminativa. Existem diferentes tipos de acuidade, cada tipo de acuidade
está relacionada à aptidão de detectar detalhes específicos da cena visual. Os
principais tipos de acuidade são:

•  Acuidade de localização ou vernie: está relacionada com a capacidade de


detectar pequenas diferenças de posição no espaço de um objeto. Em geral é
testada com duas retas posicionadas como se fosse somente uma só, deslocan-
do-se uma para o lado até que a pessoa consiga perceber a diferença.
•  Acuidade de detecção: que seria a capacidade de discriminar um estímu-
lo discreto no campo visual.
•  Acuidade de reconhecimento: capacidade de nomear estímulos alvos,
como as letras de Senllen.

•  Acuidade dinâmica: é aferida pela capacidade de detectar e localizar estí-


mulos em alvos móveis.
•  Acuidade de resolução: capacidade de destacar um estímulo visual dis-
creto de um padrão.

capítulo 3 • 71
3.3  Controle de movimento dos olhos
Apesar de não ser evidente o controle motor dos olhos é muito importante para
a percepção visual. Os olhos são estruturas móveis que têm como objetivo man-
ter a imagem centrada na fóvea, que é a região focal da retina. Dessa forma os
olhos são capazes de fazer uma série de manobras que permitem que a imagem
permaneça estável na fóvea.
Para isso cada olho está ligado em três pares de músculos, o reto superior,
inferior, lateral e medial, mas os oblíquos superiores e mediais. Os músculos
recebem informações motoras de diferentes nervos cranianos como o nervo
abducente, toclear, oculomotor. Esse sistema permite uma série de manobras
bastante complexas.

Além do mais existe no processo conhecido como acomodação que tam-


bém exige ações motoras, por exemplo, a modificação da curvatura do cristali-
no. Ainda junto com a acomodação existem outros dois mecanismos atuando;
a vergência dos olhos e alteração do diâmetro pupilar, que permitem a correta
formação da imagem na retina.

O cristalino é a lente do olho.

72 • capítulo 3
Por hora nos ateremos aos movimentos do globo ocular. Estes movimen-
tos, como citado anteriormente, permitem direcionar o olho para diversas di-
reções. Podemos então classificar os movimentos segundo sua trajetória ou
ainda de acordo com sua velocidade. Há ainda movimentos que estão relacio-
nados à funcionalidade do olho e podem ser imperceptíveis.
Um dos movimentos mais significativos dos olhos é conhecido como mo-
vimento sacádico. Trata-se de um movimento chamado balístico e por tanto
tem grande velocidade, como se fosse um salto de uma região da cena visual
para outra. É caracterizado pela rápida alteração de posição dos olhos quando
mudamos o alvo no ambiente. São movimentos voluntários apesar de ser auto-
matizados e parecerem reflexo. São usados para sondar e explorar a cena visual.
Movimentos bem mais lentos são os chamados de movimentos de persegui-
ção ou de seguimento. Eles têm como objetivo manter centralizados na fóvea a
imagem de objetos em movimento e sua velocidade está relacionada à veloci-
dade do objeto que se desloca no ambiente. Sua natureza é quase que comple-
tamente automática.
Na medida em que nos movimentamos e alteramos a posição do corpo e
da cabeça nosso organismo deve corrigir a posição dos olhos para que o obje-
to focal não saia da fóvea durante essa modificação postural. Um conjunto de
movimentos corretivos é produzido pelo olho levando em conta informações
do sistema vestibular e proprioceptivo. Por esse motivo são chamados de movi-
mentos vestíbulos oculares, às vezes chamados de reflexos vestíbulo oculares.

Sistema vestibular: sistema de orientação dinâmica presente no ouvido interno.

Como mencionamos anteriormente, manter a imagem projetada adequa-


damente na retina requer ajuste do cristalino, porém alguns movimentos do
globo ocular podem aumentar a eficiência desta função. Esses movimentos são
conhecidos como movimentos de vergência ou disjuntivos; neste caso os olhos
se movimentam em direções opostas (convergem ou divergem), bem diferen-
tes dos movimentos sacádicos que são classificados como movimentos con-
jugados. Tais movimentos são comuns em animais com visão frontal como os
primatas.

capítulo 3 • 73
Os últimos movimentos oculares que discutiremos estão relacionados a
características de funcionamento dos receptores sensoriais. Como já vimos
durante o processo de transdução existe a produção de um potencial no recep-
tor, contudo se a estimulação persiste por algum tempo, a resposta do recep-
tor vai enfraquecendo. Este processo é conhecido como dessensibilização. Se
os receptores persistirem ativados por muito tempo então a imagem visual se
degradaria.
Para evitar essa situação os olhos fazem pequenos movimentos, impercep-
tíveis e detectáveis apenas com técnicas especiais, para que um determinado
receptor não fique tempo demais recebendo a mesma estimulação visual. Com
essa estratégia de movimentos muito pequenos o olho cria uma descontinuida-
de na estimulação de receptores individuais evitando que eles dissensibilizem.

3.4  Características da Informação Visual


Quando olhamos ao redor podemos ter a impressão de que a imagem é um todo
integrado e que a natureza da informação visual representa o mundo como ele
realmente é. Contudo os neurocientistas têm uma impressão diferente do sis-
tema visual. Consideram que a cena visual surge do “mapeamento” de determi-
nados fenômenos que podem ser extraídos da informação visual.
Neste sentido podemos dizer que o sistema visual nos oferece uma série de
informações específicas como intensidade, localização espacial e profundida-
de, movimento, cor, forma. Analisaremos como o sistema de processamento vi-
sual extrai dados do ambiente para gerar esses mapas. Para isso iremos discutir
brevemente a percepção de cores, de formas e profundidade e de movimento.

3.5  Percepção de Cores


A capacidade de identificar cores foi uma estratégia adaptativa bem sucedida
em uma série de espécies. A capacidade de discriminar os comprimentos de
ondas refletidos dos objetos permitiu analisar algumas características dos ob-
jetos à distância. Identificar fêmeas de machos competidores, períodos mais
propícios para o acasalamento, frutas maturadas prontas para a ingestão, re-
conhecimento de substâncias tóxicas e identificação de predadores foram al-

74 • capítulo 3
gumas das vantagens adaptativas da capacidade de discriminar as frequências
que compõem a luz.
A tentativa de entender a natureza das cores é bastante antiga e já estava
presente nos primórdios da filosofia. Isaac Newton e René Descartes são refe-
rências do estudo racional das cores. Mas foi o Thomas Young no século XIX
que experimentando a combinação de feixes de luz coloridos afirmou que com
apenas três cores alterando suas intensidades e combinações seria possível
produzir todas as cores perceptíveis. Adicionalmente Hermann von Helmholtz
propôs que existiriam três receptores para cores, um para ondas curtas, um
para ondas médias, e um para ondas longas. Essa teoria ficou conhecida como
teoria tricromática do receptor de Young-Helmholtz.

Lembrando que quando a onda eletromagnética interage com os objetos


ela pode sofrer uma série de efeitos, dos quais um é a absorção e o outro, que
nos interessa, a reflexão. Essa reflexão na maioria das vezes não é de todas as
frequências do espectro-eletromagnético, mas apenas de algumas. Dessa for-
ma quando a luz incide sobre os objetos, ela reflete parte das ondas que são
captadas pelo olho. Como vimos anteriormente a córnea irá desviar esses raios
de luz para a fóvea, que é a região com predominância de receptores do tipo
cones. É na retina que tem início o processo de transdução seletiva que irá dis-
criminar as cores.

capítulo 3 • 75
Para entendermos a percepção de cores e todas as matizes que somos capa-
zes de discriminar devemos lembrar que a teoria tricromática sugere que temos
três tipos de cones, cada um com uma resposta para um intervalo de frequên-
cia, ou seja, apesar de ter uma resposta melhor a uma frequência específica res-
ponde de forma gradual para outras frequências. Por exemplo, o cone M, tem a
melhor resposta em comprimento de onda próximas de quinhentos e trinta e
um nanômetro, porém continua respondendo de forma menos intensa quan-
do as frequências se afastam desse valor aumentando ou diminuindo até os li-
mites de cerca de 430 e 620 nanometros. Esse processo ocorre também com os
cones S e cones L, porém com diferentes intervalos de frequência.

A frequência: é inversamente proporcional ao comprimento de onda, ou seja, quanto


maior a frequência menor o comprimento de onda e vice-versa.
Nanômetro: corresponde a um bilionésimo do metro.

Sendo assim a combinação de comprimentos de ondas (frequência) refleti-


dos pelos objetos ativarão de forma diferente os três receptores. Cada cor com-
posta por diferentes proporções de comprimentos de ondas poderá ativar de
forma seletiva e gradual cada um dos cones e assim criar milhões de combina-
ções, que refletem a quantidade de cores que podemos perceber.

76 • capítulo 3
Espectro Luz visível
eletromagnético
400 – 700nm

Radiofrequência
Raios Ultra- Infra-
Raios-X micro-ondas
Gama violeta vermelho
UHF, VHF, HF etc...

,01nm 1nm 100nm 1mm 1cm 1m 1km

Sabemos que existem canais específicos para as informações sobre cores


como por exemplo neurônios ganglionares do tipo P, que enviarão seus axônios
para as camadas parvocelulares de núcleo geniculado lateral do tálamo. Essas
vias vão continuar a seguir para o córtex visual primário segregadas. Os campos
receptores dos neurônios vão variar na medida em que se avança no proces-
samento da informação de cor. Em geral os campos receptores são circulares
classificados como coextensivos e concêntricos, sendo que no primeiro tipo
um estímulo em qualquer região da retina produz uma resposta do neurônio
enquanto nos concêntricos, o estímulo produzirá uma resposta na região peri-
férica do campo do receptor e uma resposta oposta na região central.

As informações sensoriais possuem em muitas situações vias neurais específicas para


características das informações sensoriais.
Campos receptores: área do ambiente estimulada que promove uma resposta no
neurônio.

Os campos receptores concêntrico revelam uma importante estratégia do


sistema sensorial em especial do sistema visual, que são as duplas inibições.
Estas estratégias são usadas em vários tipos de processamento como no de co-
res, de forma, movimento, entre outros. Na dupla inibição, a atividade de uma
via de processamento inibe a atividade de uma outra via. No caso da percepção
de cores isso acontecerá com pares de cores que são chamadas de cores opostas
ou complementares.

capítulo 3 • 77
Vermelho
Vermelho
Violeta Vermelho laranja

Violeta Laranja

Azul Amarelo
Violeta Laranja

Azul Amarelo

Azul Verde Amarelo Verde


Verde

Em 1878, Ewald Hering observou depois de olhar para uma cor e desviar
o olhar para uma superfície branca ou cinza, veremos outra cor específica na
mesma forma da cor vista inicialmente. Este fenômeno é chamado de pós-ima-
gem. Hering propôs que toda cor têm a sua cor oposta. Podemos utilizar como
referência os pares verdes opostos ao vermelho e o azul oposto ao amarelo e
branco oposto ao preto (intensidade). Ao olhar para uma cor e depois desviar os
olhos para uma superfície neutra, veremos a cor oposta ou complementar na
mesma forma da cor visualizada inicialmente.

a) b)
Fenômeno de pós-imagem. Olhe por uns 40 segundos para a bandeira colorida, fizando o
olhar na estrelinha solitária, na parte superior do círculo. Em seguida, fixe seu olhar no ponto
localizado no retângulo vazio. A percepção se deve à imagem gerada pela retirada do estí-
mulo (pós-imagem), envolvendo os mecanismos de oponência cromática responsáveis por
nossa visão de cores.

78 • capítulo 3
3.6  Cegueira para Cor
Cegueira para cor, caracteriza-se pela limitação da visão colorida. A cegueira
para a cor ficou conhecida como daltonismo em razão do fato de John Dalton
ter descrito pela primeira vez os efeitos deste fenômeno. Existem 3 tipos de ce-
gueira para cor. Como acabamos de ver, existem 3 tipos de cones para a cor e
embora a maioria das pessoas tenha os 3 tipos de cone, existem as exceções.
A visão é consequência da transmissão genética responsável pelos diferen-
tes tipos de cones. A maioria das pessoas recebe gens responsáveis pela visão
tricromática, mas existem variações genéticas em que a pessoa pode receber
apenas 1 tipo de cone, apenas 2 tipos ou nenhum. Segundo estudos esta seria
uma característica recessiva do cromossomo X, portanto se o cromossomo X do
homem tiver o gen da cegueira para a cor, ele será daltônico. A cegueira para a
cor é muito mais rara nas mulheres, isto porque para que a mulher manifeste
a cegueira para a cor, ela precisaria ter o gen recessivo do daltonismo nos dois
cromossomas. São os casos que veremos abaixo.
Tricromatismo anômala: a pessoa possui os 3 tipos de cones, mas eles exis-
tem em quantidades diferentes da maioria das pessoas. Disto resulta uma per-
cepção de cor diferente da maioria das pessoas.
Dicromatismo: a pessoa possui apenas dois tipos de receptores para cor.
Nesse caso, a percepção de cor revela-se bem mais limitada.
Monocromatismo: a pessoa possui apenas 1 tipo de cone, desta forma a vi-
são é
Acromatismo: quando a retina não possui qualquer tipo de cone. Neste
caso, o prejuízo visual refere-se somente à incapacidade total de perceber co-
res, mas a visão diurna fica completamente prejudicada. Considerando que
diante de muita luminosidade a retina se contrai e o feixe de luz incide na fóvia,
os acromatas apresentam muita dificuldade para ver quando tem muita luz,
isto porque na falta dos cones, sua visão depende exclusivamente dos basto-
netes. Neste caso diante de muita luz o acromata é praticamente cego mas na
penúmbra sua visão é perfeita.
Acromatopsia: quando a lesão ocorre na área cortical responsável pelo re-
conhecimento da cor, neste caso, existem os receptores para cor mas não existe
a percepção para cor.

capítulo 3 • 79
Teste de daltonismo para aviadores

Você consegue identificar todos os números a seguir.

Agnosia visual: significa ausência e gnosia, significa conhecimento em gre-


go. Portanto agnosia significa falta de conhecimento. Este é um déficit percep-
tivo porque a informação chega até o córtex de forma íntegra, ou seja, a pessoa
vê os objetos. O problema ocorre em consequência de uma incapacidade em
reconhecer os objetos vistos, geralmente provocada por uma lesão específica
na áreas do reconhecimento da informação visual. Foram identificadas várias
formas de agnosia.
Prosopagnosia: prosopon, significa face e gnosia, como foi dito, significa
conhecimento. Este é um tipo específico de agnosia, em que a pessoa apresenta
uma incapacidade específica de reconhecer faces. A pessoa vê o rosto e o déficit
é perceptivo, pois ocorre no processo de reconhecimento da imagem.

80 • capítulo 3
3.7  Percepção de Movimento
Acineptosoa: incapacidade de reconhecer movimento. As imagens são proje-
tadas como fotos imóveis na retina e posteriormente são levadas ao córtex. No
lobo parietal do córtex, existe uma área específica para que as imagens imóveis
sejam transformadas em movimento. Uma lesão específica nesta área cortical
faz com que a pessoa deixe de perceber movimento. Ela percebe apenas ima-
gens imóveis. É importante frisar que embora provocada por lesão cortical, tra-
ta-se de um déficit perceptivo.
Movimento aparente: percebemos o movimento em estímulos imóveis.
Podemos dizer que é uma ilusão de movimento.

9. Movimentos estroboscópio: a percepção de movimento, ocorre em


função da velocidade na qual as lâmpadas são acesas e apagadas alternada-
mente, o que cria a percepção de que elas estão em movimento.
10. Movimento de quadros e figuras: a velocidade na qual as diferentes
imagens imóveis são apresentadas cria a ilusão de movimento.
11. Movimento autocinético: ao olharmos fixamente para um ponto imó-
vel, em um ambiente completamente escuro, percebemos como se este ponto
estivesse se movimentando de forma irregular.
12. Movimento induzido: quando o fundo se desloca, tendemos a perceber
o objeto em movimento na direção contrária.
13. Movimento de pós efeito: ao olharmos para um movimento constante
e olharmos para outra superfície imóvel, percebemos como se ela estivesse em
movimento, no sentido contrário.

3.8  Percepção de Profundidade


A percepção de profundidade é a distância da pessoa que percebe até o percepto.
Utilizamos dois tipos de indicadores de percepção de profundidade: mono-
culares e binoculares. Os indicadores monoculares são utilizados para avaliar
profundidade em imagens bidimensionais. Com apenas um olho aberto pode-
mos utilizar as pistas binoculares. Os indicadores binoculares são utilizados
para identificar profundidade em imagens tridimensionais e para perceber
profundidade tridimensional precisamos dos dois olhos abertos direcionados
para a mesma informação.

capítulo 3 • 81
Indicadores monoculares de percepção de profundidade:

1. Tamanho relativo: se dois estímulos são de tamanhos diferentes, ten-


demos a perceber o maior como mais próximo e o menor como mais distante.

2. Altura relativa: ao percebermos estímulos em alturas diferentes, ten-


demos perceber o mais baixo como mais próximo e o mais alto como mais
distante.

82 • capítulo 3
© PORSELEN | DREAMSTIME.COM
Sendo que quando aparece a linha do infinito, acima dele o indicador se
inverte, ou seja, imagens mais baixas são percebidas como mais próximas e es-
tímulos mais altos são percebidos como mais distantes.

capítulo 3 • 83
3. Perspectiva linear: duas paralelas a distância parecem convergir no
infinito.

©© FRANCOIS LOUBSER | DREAMSTIME.COM


4. Gradiente de textura: estímulos mais distantes entre si são identifica-
dos como mais próximos do percebedor e estímulos mais próximos entre si são
interpretados como mais distantes daquele que percebe.

©© JEFFREY J. CONVILLE | DREAMSTIME.COM

5. Interposição, superposição, bloqueio ou sombra: aqueles estímulos


cujos contornos são parcialmente cobertos, são percebidos como mais próxi-
mos daquele que percebe.

84 • capítulo 3
©© CHOTTEEKUPT HONGPHAKAEW | DREAMSTIME.COM

6. Paralaxe de movimento ou movimento relativo: só existe este indica-


dor monocular quando a pessoa que percebem está em movimento. Neste caso,
as pessoas em movimento percebe como se os estímulos imóveis estivessem
em movimento na direção contrária ao percebedor, sendo que os estímulos que
passam com mais velocidade são percebidos como mais próximos e aqueles que
passam mais lentamente são percebidos como mais distantes. Isso explica por-
que quando nos movimentamos e vemos o sol próximo do horizonte, percebe-
mos como se este estivesse acompanhando o nosso movimento. O fato é que a
distância do sol é tão grande que todos os outros estímulos passam menos o sol.

3.9  Indicadores Binoculares de Percepção


de Profundidade

1. Disparidade Binocular: isto significa que ao olharmos para uma ima-


gem, com os dois olhos cada olho, registra uma imagem ligeiramente diferen-
te. Um simples experimento pode revelar a diferença de imagem dos olhos.
Ao focarmos em algum objeto distante com os dois olhos abertos, poderemos

capítulo 3 • 85
verificar, fechando um olho de cada vez que apenas um olho está na direção do
objeto, apenas o olho dominante. Isto ocorre em raszão da distância de 6,5 cm,
em média, entre os olhos. Quanto mais próximos do objeto, mais diferentes as
imagens de cada olho.

Visão
esquerda
Visão
direita B A

E
F

C G D

Você já ouviu alguém comentar que não viu nenhuma diferença nos filmes
3D? Como isso ocorre? Visto que cada retina é plana, a visão tridimensional
é uma criação cortical. E só é possível em função dos dois olhos conseguirem
ficar ao mesmo tempo em uma mesma imagem. Se a pessoa tem problemas de
convergência, isto é, não consegue ficar com os dois olhos na mesma imagem,
não terá visão tridimensional. Se o filme 3D é passado em uma tela plana, como
podemos ter visão tridimensional? Na verdade todo o filme é feito em dois ân-
gulos diferentes e projetados simultaneamente na tela por dois projetores dife-
rentes. Se olharmos a tela sem os óculos especiais.
A função dos óculos é justamente separar as projeções e assim cada olho
perceberá uma projeção diferente.

86 • capítulo 3
2. Convergência binocular: os olhos se voltam um na direção do outro à
medida que o estímulo se aproxima. Quanto mais próximos, maior a conver-
gência entre os olhos.

3. Estereogramas: os estereogramas que ficaram famosos na década de


70, são imagens bidimensionais que simulam a visão tridimensional. Para isso
é necessário forçar intencionalmente os músculos dos olhos para que realizem
uma convergência maior do que habitualmente fazem pois somente assim,
identificaremos as imagens ligeiramente diferentes preparadas especifica-
mente para que o cérebro realize a “mágica” da visão tridimensional. O objeti-
vo é tentar focar atrás do plano apresentado como na figura abaixo:

capítulo 3 • 87
©© YURY KUZMIN | DREAMSTIME.COM
Faça um esforço na convergência e veja se consegue perceber os golfinhos
passando por dentro de um arco. Ajuda a forçar a convengência se aproximar-
mos os olhos da imagem. Se a imagem estiver nítida, é porque não está con-
seguindo forçar a convergência. Cuidado porque este exercício com a muscu-
latura ocular pode provocar dor de cabeça. Se gostar, depois divirta-se com as
infinidades de estereogramas na internet.

3.10  Constância Perceptiva


Constância Perceptiva: refere-se ao fato de que a percepção se mantém cons-
tante apesar das alterações sensoriais. Podemos entender este fenômeno con-
siderando a aprendizagem. Isto é: você sabe que a banana é amarela, mesmo se
estivesse à noite em um local com pouca iluminação olhando para uma bana-
na, você ainda diria que a banana é amarela mesmo que ela estivesse bem escu-
ra. Neste caso, a cor que chegaria a sua retina, provavelmente seria um marrom
escuro, mas como você aprendeu que bananas são amarelas, ainda interpreta-
ria essa banana escura como amarela.

88 • capítulo 3
©© KONSTIK | DREAMSTIME.COM
Considerar três tipos de constância perceptiva.

1. Constância de ta-
manho: se estivermos na
portaria conversando com
um amigo, teria uma noção
da altura dele e se fosse para
o décimo andar e o olhásse-
mos pela janela, ainda que
ele tivesse um tamanho mui-
to reduzido na nossa retina
mas, não imaginaríamos que
ele encolheu. Neste caso a
percepção continua constan-
te apesar da alteração senso-
rial de tamanho. Isto é, muda
o tamanho de um objeto na
nossa retina, ainda assim
não muda a nossa percep-
ção de tamanho do estímulo.
Olhe a imagem ao lado. Você
acha que a torre Eifel original
é pequena e cabe na nossa
mão? Se respondeu que não, é em razão da constância perceptiva.
2. Constância percetiva de forma: ao olharmos para um objeto de frente,
teremos uma imagem na retina. Se alterarmos o ângulo, teremos outra imagem
retiniana, ainda assim, perceberíamos a mesma forma, entenderíamos que a
mudança de ângulo altera a imagem retiniana mas não a forma do objeto. Por
exemplo: por mais que as imagens da porta abaixo sejam diferentes na retina,
percebemos que a porta tem uma mesma forma, desta maneira podemos afir-
mar que a percepção continua constante apesar das diferenças sensoriais.

capítulo 3 • 89
3. Constância de cor ou luminosidade: conforme apresentado incial-
mente mesmo no escuro, ao vermos a neve escura, se uma criança nos pergun-
tar qual é a cor da neve apontando para um piso escuro, você dirá que a neve é
branca porque sua experiência anterior diz a você neve é branca, independente
das mudanças na luminosidade. Qual a cor da neve?
©© WELCOMIA | DREAMSTIME.COM

Vale a pena ressaltar portanto que embora a percepção humana, seja limita-
da, ainda assim, é muito mais capaz do que os robôs para representar informa-
ções imagéticas e dar sentido a elas. A superioridade humana está baseada no
seu conhecimento a respeito da regularidade do ambiente.

90 • capítulo 3
3.11  Ilusões Perceptivas
A ocorrência das ilusões perceptivas são muito curiosas e nos mostram mais uma
vez, como nossa percepção, muitas vezes se opõem às informações sensoriais.
Podemos organizar as ilusões em ilusões de tamanho, forma, direção, lumi-
nosidade e movimento.

3.12  Ilusão de Tamanho

Ilusão de Ebbinghaus

B
Ilusão de Myller Lier
A

Ilusão de Jastrow

Ilusão de Ponzo

capítulo 3 • 91
Qual linha é maior, a horizontal ou a vertical?

Conhecida como ilusão vertical horizontal, percebemos como se a linha


vertical fosse maior que a horizontal mas na verdade, as duas são do mesmo
tamanho.

3.13  Ilusão de Direção

Ilusão de Zollner

92 • capítulo 3
As duas linhas vermelhas são retas?

Embora sejam, elas parecem abauladas. Esta ilusão foi descoberta pelo psi-
cólogo alemão Ewald Hering, em 1861. A distorção é produzida pelo padrão das
linhas do fundo que simulam um desenho de perspectiva e criam a falsa im-
pressão de profundidade.

Ilusão de Poggendorff

Você consegue perceber quais linhas estão inclinadas?

capítulo 3 • 93
Esta ilusão foi descrita pelo Dr. Richard Gregory. Embora as linhas horizon-
tais pareçam inclinadas, elas são paralelas.

3.14  Ilusão de Forma


Você vê o espiral?

Essa ilusão é conhecida como falsa espiral. Embora pareça um espiral, são
círculos concêntricos.

94 • capítulo 3
3.15  Ilusão de Luminosidade

capítulo 3 • 95
Ilusão das Sombras do Tabuleiro de Adelson
Você consegue contar os círculos cinza?

Conhecida como pontos fantasma, esta ilusão foi descoberta por Ludimar
Hermann em 1870.

96 • capítulo 3
3.16  Ilusão de Movimento
Observe o movimento das figuras!

Olhe fixamente para o ponto vermelho no centro do círculo. O círculo azul


desaparece alguns segundos.

capítulo 3 • 97
98 • capítulo 3
4
Abordagens
Teóricas da
Percepção
4.1  Abordagens Teóricas da Percepção
4.1.1  Percepção Direta

De acordo com a percepção direta de James J. Gibson (1904-1980), as informa-


ções que chegam aos nossos receptores, incluindo o efeito do contexto, são su-
ficiente para explicar o processo perceptivo. Segundo Gibson, a cognição seria
irrelevante para a percepção.
Eleanor Gibson, em 1960, realizou experimentos sobre percepção de pro-
fundidade com bebês. Seu experimento consistia em criar um equipamento
que simulava um abismo, chamado de “abismo visual”. A pesquisadora coloca-
va sobre o equipamento, bebês que já engatinhavam, na faixa de 6 a 7 meses de
idade; e solicitava que as mães chamassem seus bebês. Ocorre que para chegar
à sua mãe, o bebê, precisaria atravessar o suposto abismo. Ela constatou que, a
grande parte dos bebês se recusava a atravessar o abismo. Desta forma, Gibson
afirmava que não é necessário cognição para perceber.

Teorias ascendentes (Bottom-up) e descendentes (Top-down): que a per-


cepção seja uma representação mental, não há dúvida. A dúvida reside no
fato de entender como ocorre este processo de representação mental. Estas
teorias levam em consideração praticamente todos os processos cognitivos.

100 • capítulo 4
A diferença reside no fato de que as teorias Bottom-up são aquelas que consi-
deram a percepção acionadas por dados, ou seja, pelos estímulos, enquanto
as teorias Top-Down são conduzidas por aspectos cognitivos elevados, ou seja,
pelo conhecimentos acumulados e expectativas anteriores. Neste caso, se duas
pessoas estão querendo comprar um computador, as duas querem um com-
putador rápido, mas uma delas sabe que a velocidade deste depende do mo-
delo do processador. Esta pessoa perceberá principalmente este aspecto nos
diferentes computadores em exposição, enquanto a outra poderá tomar a sua
decisão baseada em outros aspectos menos determinantes para a sua necessi-
dade. Ou seja, nossas expectativas e conhecimentos é que determinam nossas
percepções.

4.1.2  Teorias Descendentes ou Bottom-up

4. Teoria do padrão: esta afirma que as pessoas possuem uma grade de


padrões altamente elaborados armazenados na memória. A percepção ocorre
através da comparação do estímulo observado com os vários padrões arquiva-
dos na memória. Por exemplo, os vários padrões de luminárias pendentes:

capítulo 4 • 101
Porém, esta teoria não explica o efeito do contexto, explicada mais abaixo,
onde uma mesma informação pode ser percebida de formas diferentes em fun-
ção das variáveis do entorno.
5. Teoria dos protótipos: segundo esta, teríamos um modelo altamente
representativo de uma classe de objetos que integra todos os traços mais ca-
racterísticos de um determinado grupo de objetos. Neste não existiria uma
correspondência exata para cada objeto mas uma configuração geral para cada
classe. Exemplo: rosto

6. Teoria das características: segundo esta, não percebemos o protótipo


inteiro, mas as características em pequenas categorias. Hubel e Wiesel (1979)
medindo as respostas individuais dos neurônios do córtex visual, verificou
que as células do córtex visual são ativadas por linhas em direções específicas.
Posteriormente outros pesquisadores encontraram células que detectam ângu-
los e posteriormente as diferentes vias que atuam em paralelo.
7. Teoria da detecção estrutural: esta considera a representação de obje-
tos em 3 D com base na manipulação e algumas formas geométricas, decom-
pomos os objetos em geons (unidades simples). Segundo Biederman (1993).

102 • capítulo 4
Geons Objects
1 2 2
5 3 3
1 3
5
5
3 4 3 2

5
5 4
3 3

Processos descendentes (top-down) (conduzidos por aspectos cognitivos


elevados): como falamos no primeiro capítulo, estes envolvem níveis de análise
mais elevados, globais e abstratos. Enfatizam o conhecimento, a experiência, o
significado e a interpretação que o observador já possui, bem como expectati-
vas na formação da percepção. A seguir apresentaremos brevemente algumas
teorias construtivistas que dão suporte às organizações perceptivas top-down.
O efeito do contexto (Palmer 1975): o contexto pode influenciar na infor-
mação adquirida de objetos. Observe a imagem abaixo. O fato de ter um pássa-
ro, faz com que percebamos as folhas como um pássaro.

capítulo 4 • 103
O efeito das necessidades (McClelland & Atkinson, 1948): as necessidades
influenciam a percepção? Indivíduos com fome tendem a organizar informa-
ção a partir desta condição, ou seja, imagens disformes podem ser vistas como
formas que lembram alimento.
Efeito das motivações (Bruner & Goodman, 1947): as motivações influen-
ciam a percepção? Será que alguém pobre dá mais valor ao dinheiro e, nesse
sentido, organiza sua percepção por este viés?
Também segundo Schiffman (2005), a interpretação dos estímulos baseia-
se inicialmente nos aspectos globais e abstratos extraídos da experiência pas-
sada e da expectativa do observador, bem como o contexto e que o estímulo é
apresentado.

4.2  Percepção de Forma


Para falar de percepção de forma precisamos voltar às contribuições da psico-
logia da Gestalt:

4.2.1  Principais Representantes

Max Wertheimer (1880-1943) realizou o experimento do “fenômeno phi”:


ilusão perceptiva em que duas luzes estáticas, mas intermitentes, parecem ser
uma única luz que se movimenta de um lugar para outro com K. Koffka e W.
Köhler.
Wolfgang Köhler (1887-1967) responsável por pesquisas sobre aprendiza-
gem por “insight”, entendida como uma uma reorganização nas relações per-
ceptivas que levam a solução de um determinado problema de forma súbita ou
repentina em 1925.
Kurt Koffka (1886-1941) propôs os Princípios de Psicologia da Gestalt
(1935).

4.2.2  Conceitos Fundamentais da Teoria da Gestalt

Todo é mais que a soma das partes: o campo fenomenológico muda constan-
temente. Não há atividade puramente “intrapsíquica”. Logo, devemos aceitar
uma relação a qual foi nomeada de “isomorfismo”: doutrina que afirma existir

104 • capítulo 4
uma correspondência entre a experiência psicológica ou consciente e a expe-
riência cerebral latente. Segundo a Psicologia da Gestalt, nascemos com essa
capacidade inata de organização perceptiva.

4.2.3  Princípios de Organização Perceptiva

Pregnância da Forma - tendemos a ver uma figura tão boa quanto possível
sob as condições do estímulo. Os psicólogos da gestalt denominaram isto de
"boa forma" e uma boa forma é simétrica, simples e estável, não podendo se
tornar mais simples ou ordenada.

•  Só a figura possui forma, o contorno pertence à figura.


•  A figura parece estar mais próxima do que o fundo.
•  A figura é mais facilmente lembrada.
•  As figuras são reversíveis.
•  As figuras possuem áreas menores.

Ambiguidades nas relações figura-fundo: na imagem abaixo, o cálice é


muito mais facilmente percebido como figura, embora na figura da moça e da
senhora a probabilidade de ser uma das duas figuras é a mesma.

Em ambas as figuras observamos padrões ambíguos e reversíveis de figura-fundo

Em uma imagem existe mais de uma boa forma, o contorno é comum e elas
têm igual probabilidade de serem percebidas como figura.

capítulo 4 • 105
4.2.4  A Orientação da Figura e Percepção da Forma

A orientação aqui se refere à localização das partes superior, inferior e laterais da


figura. Logo, mudanças de orientação geralmente alteram a percepção do objeto.

Figura 4.1 – Observem nas figuras acima que sua posição é decisiva na organização da
informação. Na primeira observamos o mapa dos EUA e nas segunda a mesma figura mas
em uma posição não familiar.

106 • capítulo 4
Agrupamento: a percepção organiza as informações através de agrupamen-
to, ou seja, juntando e separando informações de acordo com os princípios
abaixo:

1. Similaridade: agrupamos em conjuntos elementos semelhantes.

Na imagem acima, embora só existam quadrados, organizamos segundo à


semelhança na cor e assim, podemos perceber uma cruz.

2. Proximidade: a percepção pode agrupar também em função da distân-


cia, percebendo elementos próximos como uma unidade e por isso percebe-
mos um quadrado abaixo:

Na imagem acima temos os mesmos 7 elementos mas como estão próxi-


mos, podemos identificar a tendência em perceber os elementos como partes
de um colar.

capítulo 4 • 107
3. Fechamento: tendemos a completar aquilo que está incompleto. O que
você vê na imagem abaixo?

Neste caso, nós completamos as linhas e criamos mentalmente um contorno,


por isso percebemos um triângulo. Chamamos este caso de contorno subjetivo.
O que você vê na figura abaixo?

Embora nós vejamos um triângulo, se prestar atenção, não existe ângulo na


figura. É mais um exemplo da nossa capacidade de completar o que está faltan-
do e fechar as formas.

4. Continuidade: outra forma de agruparmos a informação é através da


percepção dos movimentos e formas de maneira constante; desta forma, ten-
demos a perceber as formas como contínuas. Quando estas linhas se cruzam,
onde você diria que cada uma delas continua?

108 • capítulo 4
Mas essa é uma tendência da percepção que pode nos enganar. Veja bem:

5. Simetria: muito comum a percepção organizar as informações pelo


equilíbrio. Isso explica o fato de uma imagem assimétrica gerar um desconforto.

Da imagem acima, qual item você alteraria?

capítulo 4 • 109
4.3  Predisposição Perceptual ou
Predisposição Perceptiva

Segundo Schiffman (2005), a percepção também é influenciada por predispo-


sições que estão no observador. Trata-se da influência da experiência passada,
remota ou recente sobre a percepção, criando uma tendenciosidade para per-
ceber um estímulo de determinada forma. Exemplo: ao olharmos para uma
imagem bem definida, presente em uma imagem ambígua, e depois olharmos
para a imagem ambígua onde uma das possibilidades é ver a imagem anterior,
existe uma grande probabilidade de que a primeira imagem seja percebida. Se
a experiência for realizada com outra imagem bem definida presente na ima-
gem ambígua, o resultado provavelmente será a imagem vista anteriormente.
Faça essa experiência com seus familiares e provavelmente se surpreenderá.

No início desse livro delimitamos o conceito de percepção diferenciando


das sensações. Naquele momento afirmamos que a percepção está ligada à ca-
pacidade do sistema nervoso influenciar a formação de mapas ambientais le-
vando em conta informações armazenadas no organismo ou mesmo a partici-
pação de outras funções cognitivas. Neste capítulo discutiremos as influências
desses processos superiores sobre a percepção, em especial como os estados
motivacionais emocionais participam da construção da percepção. Além disso,
veremos como os processos sensoriais descritos anteriormente junto com as
respostas emocionais do organismo promovem o surgimento do que chama-
mos de consciência e seu direcionamento conhecido como atenção.

110 • capítulo 4
A relação entre os conceitos de percepção, atenção e consciência é signifi-
cativa, de maneira que é impossível especificar um sem se referir aos demais.
Muitas vezes dizer que percebeu algo significa que uma determinada informa-
ção se tornou consciente e por tanto foi selecionada pela atenção. Por esse mo-
tivo iremos apresentar inicialmente um modelo teórico que procura determi-
nar o aparecimento da consciência. Esse modelo organizado pelo neurologista
Antônio Damásio em uma obra intitulada “Os Mistérios da Consciência” não
especifica o que é a consciência, mas sim, como ela se torna possível a partir
das sensações e da emoção.
O modelo de Damásio leva em conta uma perspectiva adaptativa, ou seja,
que a consciência ou os processos cognitivos conscientes vão aumentar as
chances de sobrevivência do organismo em algum momento no processo evo-
lutivo. Discutiremos a seguir como surge a percepção a partir do modelo de
consciência proposto por Damásio.

4.4  O Surgimento da Consciência


Damásio propõe que a consciência é um processo relacional, ou seja, depen-
de da relação entre dois atores, o organismo e o ambiente. Nesse processo, o
organismo esforça-se para ajustar-se às variações ambientais e manter-se vivo.
Desta forma a consciência surge como um relato, isto é, uma estória imagética
de como o ambiente modifica o organismo que irá modificar o ambiente.
Um conceito importante para entender como esse processo se desenrola é
a ideia de homeostase. A homeostase é uma condição dinâmica do organismo
que promove uma série de ajustes para manter o meio interno e seus parâme-
tros físico-químicos dentro de um intervalo que permita o bom funcionamento
e a sobrevivência.
As variações ambientais podem influenciar nos processos fisiológicos que
são necessários para a manutenção da vida e os próprios processos fisiológicos
alteram os parâmetros internos do organismo. Dessa forma é preciso empre-
ender ações para corrigir essas alterações. Algumas são automáticas e normal-
mente não as percebemos, outras dependem de executar uma operação no am-
biente e por isso nos tornamos conscientes delas.
Um exemplo é a manutenção da temperatura corporal. Para que as re-
ações químicas do corpo ocorram é preciso uma temperatura específica. A

capítulo 4 • 111
temperatura corporal pode mudar por causa das variações de temperatura do
ambiente ou ainda por causas internas, por exemplo, atividade física. Se a tem-
peratura variar acima ou abaixo de determinados limites pode comprometer a
sobrevivência do organismo. Por isso o organismo tem uma série de dispositi-
vos para monitorar as variações de temperatura tanto do ambiente como inter-
nas do organismo, e uma série de recursos de ajuste fisiológico (tremor) e com-
portamentais (vestir um casaco) para manter a temperatura dentro do intervalo
necessário para a sobrevivência.
Então para manter a homeostase o organismo necessita criar mapas do am-
biente e mapas do estado do organismo, e precisa monitorar como variações
do ambiente afetam o estado do organismo. Além de serem necessários ajustes
para evitar ou corrigir variações homeostáticas drásticas.
Para Damásio essas ações dependeriam da produção de mapas na forma de
relatos não verbais das alterações dinâmicas do organismo enquanto se rela-
cionam com o ambiente. Esses relatos criariam como efeito disposições para
determinados ajustes fisiológicos e padrões comportamentais.
O que chamamos de sistema motivacional e emocional seriam produtos da
manutenção da homeostase. Sendo a necessidade de correção dos estados in-
ternos a base do sistema motivacional e as alterações em parâmetros metabó-
licos e fisiológicos produzidas pelo mapeamento de um objeto no ambiente a
base do sistema emocional.
A fome, por exemplo, estaria relacionada a uma série de parâmetros meta-
bólicos que seriam monitorados pelo sistema nervoso central. Assim como o
medo estaria relacionado ao mapeamento de um estímulo no ambiente (estí-
mulo aversivo) e as alterações fisiológicas (aumento da frequência cardíaca, au-
mento da frequência respiratória) e metabólicas (aumento da disponibilidade
energética na forma de glicogênio) para lutar ou fugir.
Dessa forma existiria uma sequência de processamentos em diferentes ní-
veis que levariam ao aparecimento da consciência e da percepção. Damásio vai
chamar o processo de monitoração do ambiente mais alterações fisiológicas e
metabólicas corretivas que ocorrem automaticamente de proto-self.
Este modelo teórico concebe a consciência como consciência de si, ou seja,
como uma estrutura de auto referência, centrada nas alterações dos processos
internos do organismo em oposição às mudanças do ambiente externo. Um
sentimento de protagonismo centrado na imagem produzida pelo mapeamen-
to dos parâmetros corporais. Por isso, Damásio, utiliza o conceito de Self, para
definir os processos conscientes.

112 • capítulo 4
Self: um termo que não encontra tradução literal para o português, mas para fins didá-
ticos pode ser considerado como “eu mesmo”.

O Self seria então, um segundo relato imagético não verbal feito pelo siste-
ma nervoso a estruturas de processamento superior que integrariam as infor-
mações em uma história de como eventos no ambiente modificaram o estado
interno do organismo. Nesse processo o objeto ambiental que está se relacio-
nando diretamente com o organismo terá suas características sensoriais me-
lhoradas, se destacando dos outros objetos sensoriais. Ao mesmo tempo esse
relato coloca o organismo no centro da cena, destacando-o como protagonista.
(INSERIR IMAGEM COM ESQUEMAS REPRESENTATIVOS DO PROT-SELF
E DO SELF)
Essas estruturas de processamento superior melhorariam a resolução dos da-
dos referentes à relação organismo ambiente, contudo teriam que se limitar em
parte ao objeto que interagem diretamente com o organismo. Acredita-se que isso
ocorra porque as estruturas de processamento superior tenham capacidade limi-
tada e selecionem do ambiente aquele estímulo que requer ações mais urgentes.

4.5  Atenção
Podemos pensar que a atenção surge nesse processo que destaca as caracterís-
ticas sensoriais dos objetos ambientais que se relacionam diretamente com o
organismo de forma a processá-los adicionalmente. Apesar de algumas vezes
a atenção ser chamada de direcionamento dos processos conscientes, existe
uma sobreposição dos conceitos de atenção e consciência.
Isto porque como destacamos acima, toda vez que o organismo se relaciona
com um aspecto do ambiente e este se torna consciente para o organismo, ou
seja, perceptível, automaticamente o sistema nervoso aperfeiçoa a resolução
sensorial do mesmo. Como o processamento consciente adicional é limitado
sempre ocorrerá uma seleção de determinado evento do ambiente. Ou seja, a
consciência é seletiva.
Em relação aos processos de atenção eles, tem sido classificados em pro-
cessos automáticos e voluntários. O primeiro seria direcionamento voluntário,
planejado para uma determinada fonte de informação relevante contextual-
mente. O segundo seria um processo automático independente da deliberação

capítulo 4 • 113
individual direcionados para estímulos inéditos e que surgem no campo senso-
rial de forma surpreendente.
Traiseman afirma que os estágios iniciais da atenção podem ocorrer ain-
da nas vias sensoriais a partir da organização de características básicas e dis-
tinguível dos elementos perceptíveis chamados de textons, que faria com que
determinados estímulos se destacassem de outros sem a necessidade de uma
análise mais detalhada da cena.
A atenção também tem sido classificada pelas suas características. Nesse
sentido, os testes que medem a atenção têm destacados três tipos de atenção:
atenção seletiva, capacidade de selecionar um estímulo do ambiente e melho-
rar sua resolução sensorial em detrimento dos demais estímulos. Atenção al-
ternada, capacidade de alternar o foco da atenção, mudando de estímulo sele-
cionado. Atenção sustentada, capacidade de manter o foco da atenção tempo
suficiente para terminar uma tarefa.
Existe muita ambiguidade em relação ao conceito de atenção, mas de uma for-
ma geral ele sempre está associado à ideia de seleção e de um processamento adi-
cional. Este aspecto fez com que se pensasse no sistema de atenção como um filtro.
Uma das teoria mais influentes sobre filtros atencionais foi desenvolvida
por Broadbent que propunha a existência de um filtro que permitiria selecio-
nar determinadas informações para o processamento adicional. Esta teoria foi
proposta com bases nos paradigmas de pesquisa conhecidos como escuta di-
ótica, no qual informações diferentes são apresentadas individualmente para
um ouvido e para outro.
Outras propostas sobre a forma como a atenção filtra as informações foram
criadas tendo em vista as características seletivas da atenção. Uma delas foi a
proposta do filtro atenuador de Treisman. Nesta proposta o sistema de proces-
samento atenuaria as informações irrelevantes que não seriam então processa-
das adicionalmente.
Um dos aspectos que dificultam o estabelecimento de um conceito único
para atenção é o fato dela depender de vários sistemas neurais subsidiários
para os processos atencionais. As estruturas cerebrais que estão envolvidas
com a atenção estão distribuídas por muitas regiões, provavelmente porque as
ações requerem o recrutamento de diferentes mecanismos neurofuncionais.
Sabemos que estruturas do tronco cerebral, do tálamo, córtex pré-frontal e cór-
tex parietal posterior têm participação significativa nos processos atencionais.
A atenção também está intimamente associada com outra função cogniti-
va conhecida entres os neuropsicólogos como funções executivas. As funções

114 • capítulo 4
executivas são operações cognitivas relacionadas à regulação do comporta-
mento. Estão tradicionalmente associadas ao planejamento, ou seja, a formu-
lação de planos de ação flexíveis e adaptativos de acordo com as demandas do
organismo e as contingências ambientais. Essas ações precisam ser monitora-
das e para serem flexíveis precisam ser inibidas quando inadequadas para um
determinado objetivo, para que outro plano possa ser posto em prática.
Dessa forma, fica claro que a atenção é multifuncional, participando de
várias atividades cognitivas e dependendo de diversas estruturas e processos
cognitivos. Sua característica principal seria sua relação condicional com a
consciência e a característica seletiva e limitada de processamento dos estímu-
los ambientais. Participa da regulação do comportamento e influenciada por
dados sensoriais emocionais e motivacionais.
Neste sentido a atenção tem uma relação íntima com a percepção, direcio-
nando os processos que irão determinar a construção da percepção. A atuação
da atenção e da percepção é sinérgica e integrada em um nível que fica difícil
saber quando se está falando de um ou de outro fenômeno.

4.6  Efeito Stroop


Teste de Stroop, pretende, entre outras coisas, avaliar o processo de automati-
zação de leitura, ou seja, verificar até que ponto é possível nomear a cor da pa-
lavra sem, no entanto, a ler. De um modo geral, as palavras exercem uma forte
interferência entre as diferentes informações (o que está escrito e a cor da pala-
vra) que são simultaneamente processadas pelo cérebro, causam um conflito.
Existem duas teorias que tentam explicar o “Efeito Stroop”. Temos então:

1. Teoria da Velocidade do Processamento

•  A interferência ocorre porque as palavras são lidas mais rapidamente do


que as cores são nomeadas.

2. Teoria da Atenção Selectiva

•  A interferência ocorre porque a nomeação de cores requer mais atenção


do que ler palavras.

capítulo 4 • 115
1. Leia esta lista de nomes de cores o mais rápido possível. Leia da direita para
a esquerda em cada linha.
Vermelho Amarelo Azul Verde
Azul Vermelho Verde Amarelo
Amarelo Verde Vermelho Azul

2. Nomeie estas etiquetas coloridas o mais rápido possível. Nomeie da esquer-


da para a direita em cada linha.

3. Nomeie o mais rápido possível a cor de tinta com a qual cada palavra foi im-
pressa. Nomeie da esquerda para a direita em cada linha.
Vermelho Azul Verde Amarelo
Amarelo Vermelho Azul Verde
Azul Amarelo Verde Vermelho

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118 • capítulo 4
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