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Qualidade de um texto

informativo que procura


Objetividade fielmente os fatos, sem a
inferência de valores subjetivos e
opiniões pessoais no
processamento da informação.
(Rabaça, 2003, p. 626)

Objetividade é um valor do jornalismo, bem como a imparcialidade. A percepção do tempo, da


noticiabilidade dos acontecimentos também se encaixa como valor. Juntos, esses valores
formam aquilo que Traquina chama de ethos jornalístico [A1] Comentário: A ideologia
jornalística e a sociedade fornecem
igualmente um ethos que define para os
Ethos – Vem da retórica Aristotélica. Maingueneau conceitua que o ethos na cena discursiva é membros da comunidade jornalística que o
seu papel social é de informar os cidadãos e
uma maneira de dizer que estabelece modos de ser, dentro do discurso, do enunciador e do proteger a sociedade de eventuais abusos do
co-enunciador, garantindo a identificação entre esses e a eficácia do gênero. poder, ou seja, toda a concepção do
jornalismo enquanto “contra-poder”. O
“ethos jornalístico” tem sido determinante
na elaboração de toda uma mitologia que
encobre a atividade jornalística e que marca
não só os próprios profissionais do campo
TUCHMAN, Gaye. A objetividade como ritual estratégico: uma análise das noções jornalístico como também tem sido
projetado no imaginário coletivo da própria
de objetividade dos jornalistas. in TRAQUINA, Nelson (org.). Jornalismo: questões, sociedade.” (TRAQUINA, 2005, p. 202-
teorias e “estórias”. DIONÍSIO, Luís M. (trad.). Lisboa: Vega, 1999 203)
[A2] Comentário: Maingueneau fala
que há um acordo tácito. Receptores
esperam a verdade, os fatos. Jornalistas,
por meio de técnicas, procuram caminhos
„objetividade’ pode ser vista como um ritual estratégico, protegendo os jornalistas para que isso seja alcançado.
dos riscos da sua profissão.

“Para os jornalistas e os cientistas sociais o termo “objetividade” funciona como um


baluarte entre eles e os críticos. Atacados devido a uma controversa apresentação de
“fatos”, os jornalistas invocam a sua objetividade quase do mesmo modo que um
camponês mediterrânico põe um colar de alhos à volta do pescoço para afastar espíritos
malignos. Os jornalistas têm de ser capazes de invocar algum conceito de objetividade a
fim de trabalhar os fatos relativos à realidade social.” (p. 75)

Artigo analisa três fatores que influenciam a noção de objetividade dos jornalistas:
forma, relações interorganizacionais e conteúdo.

“Por forma, entendo aqueles atributos das notícias e dos jornais que exemplificam os
processos noticiosos, como o uso de aspas. Por conteúdo, entendo aquelas noções da
realidade social que os jornalistas consideram como adquiridas. O conteúdo é também
relacionado com as relações interorganizacionais do jornalista, pois as suas experiências
com essas organizações levam-no a tomar por certas algumas coisas acerca delas.
Finalmente, sou de opinião que o manuseio da “estória”, isto é, o uso de certos
procedimentos perceptíveis ao consumidor de notícia, protege o jornalista dos riscos de
sua atividade, incluindo os críticos.” (p. 75)

“Isto é, o cientista social tem que ocupar-se da análise epistemológica reflexiva (Shultz,
1962, p. 245); o jornalista não. Ele tem de tomar decisões imediatas relativamente à
validade, fiabilidade e “verdade” a fim de conhecer os problemas impostos pela
natureza de sua tarefa – o processamento de informação que dá pelo nome de notícia,
um produto de consumo depletivo feito diariamente. O processamento das notícias não [A3] Comentário: Ato de diminuir os
humores de um corpo vivo. Termo mais
deixa tempo disponível para a análise epistemológica reflexiva. Todavia, os jornalistas comum em Portugal. Muito utilizado na
necessitam de uma noção operativa de objetividade para minimizar os riscos impostos área médica. Vem do latim depletio

pelos prazos de entrega do material, pelos processos difamatórios e pelas reprimendas [A4] Comentário: Mais uma vez,
retoma-se a questão da fragmentação.
dos superiores.” (p. 76)

“A menos que o repórter tenha levado a cabo uma investigação prolongada, ele
geralmente tem menos de um dia de trabalho para se familiarizar com o background do
acontecimento, para recolher informações para escrever seu artigo. O repórter sabe que
ser trabalho escrito passará através de uma cadeia organizacional composta por uma
hierarquia de editores e respectivos assistentes. Como os jornalistas esclarecem
prontamente, o processamento de uma notícia envolve “conjecturas”. O repórter faz
“conjecturas” sobre as preferências do editor da seção local e os seus assistentes, que
fazem o mesmo gênero de conjecturas relação aos editores da seção política, e estes em
relação aos editores principais, que, por sai vez, fazem conjecturas sobre as preferências
do diretor, e todos eles “conjecturam” a vontade do proprietário. Todos criticarão a
notícia após a publicação” (p. 76-77)

TUCHMAN levanta a questão da venda dos jornais (p. 77).

Ricardo Noblat (2005), por sua vez, põe em cheque a sobrevivência de jornais
impressos e demonstra em números a queda nas vendas dos jornais. Isso ocorre de
forma sistemática e generalizada nos últimos anos. A escolha de um jornal impresso
como corpus do trabalho, não significa que acreditamos na permanência e na
preponderância desse meio sobre os demais. Especialmente na era da convergência
digital, meios eletrônicos ocupam cada vez mais a vida dos leitores. É cada vez mais
comum as pessoas se informarem por meio da internet (texto, áudio e vídeo). O
importante é a forma, a linguagem, que se mantém em todos os suportes de mídia.

“Em suma, cada notícia acarreta perigos para o corpo redatorial e para a organização
jornalística. Cada notícia afeta potencialmente a capacidade dos jornalistas no
cumprimento de suas tarefas diárias, afeta a sua reputação perante os seus superiores, e
tem influência nos lucros da organização. Dado que o jornal é composto de muitas
notícias, estes perigos são múltiplos e omnipresentes.” (p. 78)

ATRIBUTOS FORMAIS para conseguir a objetividade:

“ 1 – A apresentação de possibilidades conflituais – Os jornalistas tem de ser capazes


de identificar os “fatos”, muito embora algumas pretensões de verdade não sejam
facilmente verificáveis.” [...] Ao apresentar tanto a versão de “A”, [...] como a “B” [...]
o jornalista pode, então, reivindicar que está a ser “objetivo”, pois apresenta os “dois
lados da questão” sem favorecer qualquer indivíduo ou partido político. Al´[em disso,
ao apresentar ambas as versões, o repórter “objetivo” permite supostamente ao leitor
decidir se é o senador ou o ministro que “está a dizer a verdade”. (p. 79)

“Como um fórum a arejar a “política da realidade”, a definição dos jornalistas da


situação vai para além da apresentação dos dados suficientes para o leitor chegar a uma
conclusão. Um pântano de pretensões de verdades contraditórias [...] teriam mais
vantagens em ser encaradas como um convite aos leitores para exercitarem a percepção
seletiva, uma reação característica às notícias. De fato, o convite à percepção seletiva é
mais insistente, pois cada versão da realidade reclama a mesma validade potencial.
Visto que a “objetividade” pode ser definida como “prioridade aos objetivos externos ao
pensamento” e objetivo como “aquilo que pertence ao objeto de pensamento e não ao
sujeito que pensa” (ambas definição de dicionário), seria difícil afirmar – como os
jornalistas fazem – que a apresentação de possibilidades conflituais fomenta a
objetividade.” (p. 80)

“2 – Apresentação de provas auxiliares. – Naturalmente, há ocasiões que os jornalistas


conseguem obter provas que corroboram uma afirmação. A apresentação de provas
auxiliares consiste na localização e citação de “fatos” suplementares, que são
geralmente aceites como “verdadeiros”. Esta insistência na apresentação de “fatos”
auxiliares está frequentemente presente nas críticas dos editors aos repórteres assim
como na dos repórteres aos editors. [...] A asserção dos jornalistas de que “os fatos
falam por si” é esclarecedora. Esta expressão implica uma distinção quotidiana entre os
“fatos expressivos” e o repórter (orador, bisbilhoteiro, etc.) que fala pelos “fatos”. Se o
repórter decidir falar pelos “fatos”, ele não poderá afirmar-se objetivo, “impessoal”,
“imparcial”. Naturalmente, é assunto assente, do ponto de vista sociológico, de que os
“fatos” não falam por si. Por exemplo, Shibutani (1966) demonstra que a avaliação e a
aceitação dos “fatos” está extremamente dependente dos processos sociais.” (p. 80-81)

“3 – O uso judicioso das aspas – Os jornalistas vêem as citações de opiniões de outras


pessoas como uma forma de prova suplementar. Ao inserir a opinião de alguém, eles
acham que deixam de participar da notícia e deixam os “fatos” falar [...]” (p. 81)

“Ao acrescentar mais nomes e citações, o repórter pode tirar as suas opiniões da notícia,
conseguindo que outros digam o que ele pensa.” (p. 82)

“O uso de citações para fazer desaparecer a presença do repórter da notícia estende-se


ao uso de aspas como instrumento de sinalização. Elas podem ser usadas, como
acabamos de discutir, para informar: “esta afirmação pertence a uma qualquer pessoa,
menos ao repórter”. Também podem ser utilizadas para pôr em questão a designação
atribuída. Por exemplo, o termo Nova Esquerda (sem aspas) refere-se a um grupo de
pessoas com determinado posicionamento político. A “Nova Esquerda” (com aspas)
refere-se a um grupo que se intitula de Nova Esquerda: neste caso, a legitimidade do
grupo é posta em causa.” (p. 82)
“4 – A estruturação da informação numa sequência apropriada. - A estruturação da
informação numa sequência apropriada é também um procedimento destinado a indicar
a objetividade, procedimento esse que é um atributo formal das notícias. A informação
mais importante relativa a um acontecimento é suposta ser apresentada no primeiro
parágrafo, e cada parágrafo subsequente deve conter informação de menor importância.
A estrutura da notícia assemelha-se, do ponto de vista teórico, a uma pirâmide invertida.
Este é o aspecto formal mais problemático da objetividade para o jornalista.
Relativamente aos outros três atributos formais, o jornalista pode afirmar que
apresentou pontos de vista contraditórios; que existiam provas suplementares e que ele
se limitou a recolhê-las; que as citações e as informações entre aspas representam as
opiniões dos outros, não as suas. Todavia, mesmo que um repórter possa,
inconscientemente imiscuir-se, nas ideias dos seus editores ao escolher um lead,
submetendo-se assim à política da empresa, ele é que é a pessoa responsável pelo lead
da notícia. Não pode dizer que a escolha pertence a outra pessoa qualquer. O repórter só
pode invocar o profissionalismo e afirmar que o lead é validado pelo news judgement.”
(p. 83)

“A invocação do news judgement (perspicácia profissional) é uma atitude inerentemente


defensiva, pois os news judgement é a capacidade de escolher “objetivamente” de entre
“fatos” concorrentes para decidir quais os “fatos” que são mais “importantes” ou
“interessantes”. “Importantes” e “interessantes” denotam conteúdo. Por outras palavras,
ao discutir a estruturação da informação, o jornalista deve relatar as suas noções de
conteúdo “importante” ou “interessante”.” (p. 83)

“Pareceria que o news judgement é o conhecimento consagrado, a capacidade secreta do


jornalista que o diferencia das outras pessoas. A experiência do jornalista com as
relações interorganizacionais, as suas relações com a sua própria organização e outras
organizações permitem-lhe reivindicar este news judgement assim como a
“objetividade”. (p. 85)

Depois disso, o autor apresenta três generalizações feitas pelo jornalista. A questão
chave desta parte do artigo é a experiência do jornalista.

“Do ponto de vista dos jornalistas, as suas experiências com outras organizações
durante um período de tempo validam o seu news judgemente podem ser reduzidos ao
“senso comum”. Por “senso comum” os jornalistas entendem o que a maioria deles
considera verdadeiro, ou dado como adquirido” (87)

“O senso comum desempenha um papel importante na avaliação do conteúdo noticioso,


uma vez que o conteúdo de uma notícia é composto de numerosos “fatos”, e o senso
comum determina se uma informação pode ser aceite como “fato”.” (p. 87)
Explorando a noção de objetividade do jornalista, analisei até aqui 1) os procedimentos
noticiosos enquanto atributos formais de notícias e jornais, 2) as decisões baseadas nas
relações interorganizacionais, e 3) o senso comum enquanto base de avaliação do
conteúdo noticioso. Embora os atributos formais das notícias e jornais passaram a
apresentar problemas graves para o jornalista, permitem-lhe reivindicar a objetividade, e
as suas reivindicações podem ser avaliadas pelo leitor.” (p. 88)

“Daria a impressão de que os procedimentos noticiosos exemplificados como atributos


formais das notícias e jornais são, efetivamente, estratégias através das quais os
jornalistas se protegem dos críticos e reivindicam, de forma profissional, a
objetividade, especialmente porque a sua experiência profissional não é suficientemente
respeitada pelos leitores e pode até ser alvo de críticas. Embora esses procedimentos
possam fornecer provas demonstráveis de uma tentativa de atingir a objetividade, não se
pode dizer que consigam alcançar. De fato, tem sido sugeridos esses procedimentos: 1)
constituem um convite à percepção seletiva, 2) insistem erradamente na idéia de que “os
fatos falam por si”, 3) são um instrumento descrédito e um meio de o jornalista fazer
passar a sua opinião, 4) são limitados pela política editorial de uma determinada
organização jornalística, e 5) iludem o leitor ao sugerir que a “análise” é covincente,
ponderada ou definitiva. Em suma, existe uma clara discrepância entre os objetivos
procurados (a objetividade) e os meios utilizados (os procedimentos noticiosos
descritos).” (p. 89)

“Esta interpretação tem várias implicações teóricas interessantes. Primeiro, defende o [A5] Comentário: É seqüência do
trecho anterior.
ponto de vista de Everett Hughes (1964, PP. 94-98) de que as profissões desenvolvem
procedimentos ritualizados para se protegerem das críticas. Ele afirma: “Ao ensinar”,
uma atividade como o jornalismo, “onde os objetivos estão muito mal definidos – o
mesmo acontecimento, consequentemente, com os erros – onde os leigos estão prontos
a criticar e culpar – a forma correta de tratar os problemas torna-se um ritual, tanto ou
mesmo mais que uma arte. Se um professor conseguir provar que seguiu o ritual, a [A6] Comentário: Interessante que o
livro de Noblat leva o título: “a arte de
culpa passa para a pobre criança ou estudante; e o fracasso pode-lhes ser, e é, imputado” fazer um jornal diário”.
(PP. 96-97) [...] os atributos formais das notícias e dos jornais parecem necessitar de
rituais estratégicos para se justificar o direito de se reivindicar objetivos. Eles permitem
a um jornalista dizer, apontando para as suas provas: “eu sou objetivo porque usei
aspas”. (p. 89)

“Segundo, estas conclusões podem ser relevantes para as noções de objetividade


utilizadas por outros profissionais. Como previamente se sugeriu, os cientistas sociais
fazem a distinção entre eles próprios e os outros, referindo a sua própria tendência para
o estudo reflexivo das suposições filosóficas. Contudo, Goldner (1970, p. 249),
juntando-se a Wright Mills ao falar da “replicabilidade transpessoal”, sugere: “Nesta
noção, a objetividade significa apenas que um sociólogo descreveu os seus
procedimentos de forma tão explícita que aqueles que os empregaram no mesmo
problema chegarão às mesmas conclusões. De fato, é uma noção de objetividade
enquanto rotinização da técnica e apoia-se, no fundo, na codificação dos procedimentos
que foram empregados. Quando muito, esta é uma definição operacional de
objetividade que presumivelmente nos diz o que devemos fazer para justificar se uma
asserção de uma determinada descoberta é objetiva. Não nos diz, todavia, muito acerca
do que a objetividade significa, dos pontos de vista conceptual e conotativo.” Em suma,
Gouldner acusa os sociólogos de se esquivarem dos problemas epistemológicos,
escondendo-se atrás de técnicas formais. Ele pinta um quadro da objetividade
sociológica enquanto ritual estratégico. Outras profissões e atividades equacionam a
objetividade com a capacidade de permanecer suficientemente impessoal para seguir os
procedimento de rotina adequados para um caso específico.” (p. 89-90)

Em todos estes exemplos, a objetividade refere-se a procedimentos de rotina que podem


ser exemplificados como atributos formais (aspas, níveis de significância, precedentes
legais, radiografias) e que protege o profissional dos erros e dos seus críticos. Dá a
sensação de que i termo “objetividade”

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