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REFORÇO DE SOLOS E TALUDES

UNIDADE I
CONCEITOS BÁSICOS APLICADOS A PROJETOS DE
ESTABILIDADE DE REFORÇO
Elaboração
Giovanna Monique Alelvan

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO

UNIDADE I
CONCEITOS BÁSICOS APLICADOS A PROJETOS DE ESTABILIDADE DE REFORÇO..................................................... 5

CAPÍTULO 1
CONCEITO DE TENSÃO E DEFORMAÇÃO ............................................................................................................................ 5

CAPÍTULO 2
TEORIA DO EMPUXO E RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO ..................................................................................... 13

CAPÍTULO 3
CONCEPÇÃO DE PROJETOS DE ESTABILIDADE ........................................................................................................... 19

REFERÊNCIAS................................................................................................................................................24
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CONCEITOS BÁSICOS
APLICADOS A PROJETOS
DE ESTABILIDADE DE
UNIDADE I
REFORÇO
Para elaborar um projeto de reforço em encostas, é necessária a compreensão de diversos
outros temas paralelos. Neste capítulo, são apresentados alguns dos conceitos essenciais
para o entendimento e a elaboração de projetos geotécnicos, especificamente de reforço
de encostas.

Capítulo 1
CONCEITO DE TENSÃO E DEFORMAÇÃO

Entender o comportamento tensão deformação de uma massa de solo ou de rocha é


essencial para o dimensionamento de estruturas de reforço e contenção de encostas. Isso
porque é a partir do cálculo dos esforços atuantes e das tensões resistentes que se verifica
a estabilidade de uma estrutura e a necessidade de inserção de esforços de contenção.

Neste capítulo, serão apresentados os conceitos de tensão e de deformação, seguidos


pela apresentação de relações entre eles. Ao final, serão discutidos também os esforços
gerados pela água no solo e as formulações matemáticas que avaliam essas solicitações.

1.1. Tensão
Todos os pontos de um maciço de solo estão sujeitos a esforços. Esses esforços são
provenientes do peso próprio e de forças externas. Quando um ponto da massa é
solicitado por esses esforços, conforme Figura 1, eles podem ser representados pelas
suas resultantes, por meio de vetores nas direções normais e tangenciais.

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Figura 1. Tensões atuantes em um ponto de um maciço.

Fonte: elaborada pela autora.

Quando essa análise é feita sobre um plano qualquer de área A, definem-se os estados
de tensão normal ( σ α ) e tensão cisalhante ( τ α ) para um plano α, sendo:

σα =
A (1)


τα =
A (2)

Expandindo esse conceito para o caso tridimensional, podemos representar as novas


componentes de tensão que atuam em um ponto, conforme Figura 2.

Figura 2. Componentes de tensão tridimensional.

Fonte: elaborada pela autora.

Uma vez que se conhecem essas tensões, pode-se determinar as tensões atuantes em
qualquer outro plano (Figura 3) por meio das equações de equilíbrio de força. Para um
plano qualquer, elas são dadas por:

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 pnx  σ x τ yx τ zx   cos ( n, x ) 
    
 pny  = τ xy σ y τ zy  cos ( n, y ) 
   
 pnz  τ xz τ yz σ z   cos ( n, z )  (3)

Figura 3. Componentes de tensão em um ponto qualquer.

Fonte: elaborada pela autora.

A partir desses conceitos, convencionaram-se alguns planos e condições especiais, que


são:

» Planos Principais:

Os planos chamados de principais são aqueles em que as tensões cisalhantes são nulas,
e as tensões normais são dadas por σ 1 > σ 2 > σ 3

» Invariantes de tensão

Os invariantes de tensão são valores obtidos por meio do tensor de tensão que independem
da orientação dos eixos. Os três principais invariantes são designados por: ( I1 ; I 2 ; I 3 ) e
são calculados por:
I1 = σ x + σ Y + σ Z = σ 1 + σ 2 + σ 3 (4)

I 2 = σ 1σ 2 + σ 2σ 3 + σ 3σ 1
(5)
I 3 = σ 1σ 2σ 3
(6)

» Planos de tensão cisalhante máxima

Apresentam a máxima magnitude da tensão cisalhante, que é calculada por:


(σ 1 − σ 3)
τ max =
2 (7)

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» Plano octaédrico:

Apresenta inclinação constante com relação aos planos principais. As tensões normais
e cisalhantes aplicadas nesse plano são calculadas por:
(σ 1 + σ 2 + σ 3) I1
=σ oct =
3 3 (8)
1
1
(σ 1 − σ 2 ) + (σ 2 − σ 3 ) + (σ 3 − σ 1 )  2
2 2 2
τ oct=
3  (9)

1.1.1. Análises Bidimensionais

Muitas análises de estabilidade e de projeto de obras geotécnicas podem ser tratadas de


forma bidimensional. Isso acontece para os casos de deformação plana e axissimétrica.

1.1.1.1. Deformação Plana

A condição de deformação plana ocorre quando uma das dimensões é muito maior que
as demais. Por isso, na direção maior, as deformações são consideradas desprezíveis.
Um exemplo ocorre nos muros de contenção, em que se considera que as deformações
acontecem apenas no plano ortogonal a face do muro (Figura 4).

Figura 4. Solicitação de deformação plana.

Fonte: elaborada pela autora.

1.1.1.2. Axissimétrica

A condição axissimétrica acontece quando as deformações no plano horizontal são iguais.


Nesse caso, a análise pode ser feita considerando apenas os eixos radiais e verticais,
conforme Figura 5.

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Figura 5. Condição axissimétrica.

Fonte: elaborada pela autora.

Círculo de Mohr
O círculo de Mohr é uma representação gráfica dos estados de tensão que passam
por um ponto. Nesse modelo, o eixo das abscissas representa as tensões normais, e
as ordenadas as tensões cisalhantes.

Apesar de ter algumas limitações para representação do comportamento do solo,


o círculo de Mohr ainda é bastante utilizado e, em termos didáticos, é uma ótima
forma de representar as tensões atuantes em um ponto.

1.1.2. Trajetória de Tensões

Quando um maciço de solo é solicitado, pode ser importante verificar graficamente


em um único diagrama as variações nos estados de tensão. Isso também é possível
por meio dos círculos de Mohr, porém pode se tornar muito confuso caso sejam
vários pontos.

Dessa forma, recomenda-se representar graficamente a trajetória de tensões por meio


de um único gráfico que possui os eixos (p, q), invariantes que são relacionadas às
tensões principais, conforme:
(σ 1 + σ 3)
p=
2 (10)
(σ 1 − σ 3)
q=
2 (11)

A análise da trajetória de tensões é importante para avaliar o tipo de carregamento que


foi imposto. Pela análise dos invariantes p e q, é possível verificar se houve carregamento
ou descarregamento. É importante destacar ainda que todos os pontos em um maciço

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apresentam um estado de tensão inicial. Conforme apresentado anteriormente, todos


estão submetidos ao seu peso próprio e a outras sobrecargas.

1.2. Deformação
As deformações em volume representativo de solo podem ser duas origens: tensões
normais ou tensões cisalhantes. As deformações que são originadas exclusivamente pelas
tensões normais podem ser calculadas pelas relações entre o comprimento deformado
e o comprimento inicial, conforme:
∆x ∆y ∆z
=εx = ;ε y = ;ε z
x y z (12)

Quando se faz a soma de todas as parcelas de deformações geradas por forças normais,
determina-se a deformação volumétrica do corpo:
∆x ∆y ∆z
εv = + +
x y z (13)

Por outro lado, as deformações que são geradas devido às deformações cisalhantes
levam a uma distorção angular no corpo. Esse parâmetro é, então, calculado entre a
configuração do ângulo inicial e a final, conforme:
∆x
γ zx =
z * (14)
*(válido apenas para pequenas deformações) (14)

Você sabe a diferença entre deformações elásticas e deformações plásticas?

As elásticas são aquelas recuperáveis. Isso quer dizer que, quando um corpo é
carregado, ele sofre uma quantidade de deformações. Essas deformações são
totalmente recuperáveis se o corpo for descarregado.

Por outro lado, as deformações plásticas são aquelas permanentes ao corpo. Isso quer
dizer que, após um ciclo de carregamento e descarregamento, existirão alterações
na configuração do corpo que não podem mais ser recuperadas.

1.3. Relação Tensão – Deformação


Uma vez entendidos os conceitos de tensão e deformação, é importante que sejam criadas
relações entre essas variáveis para que, a partir da aplicação de uma carga, conclua-se
qual será o impacto na configuração do corpo.

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A depender do material, essas relações podem ou não ser linear. No caso dos solos, já
se comprovou que essa relação é não linear, já que a inclinação da curva varia de acordo
com o nível de tensões e a trajetória de carregamento ou descarregamento feita.

Você sabe o que é uma relação linear e não linear?

Quando há uma relação linear entre duas variáveis, elas podem ser representadas por
uma reta. Já uma relação não linear, os pontos entre as variáveis não são compatíveis
com uma reta.

Na mecânica dos meios contínuos, na qual se enquadra a mecânica dos solos, são usados
módulos para definir a inclinação das curvas de tensão-deformação. Esses módulos, que
podem ser chamados de módulo de elasticidade, módulo de deformabilidade, módulo
de Young, são medidos para certo nível de tensão.

Na Figura 6, é apresentada uma curva tensão-deformação com um ciclo de carregamento


e descarregamento, que apresenta diversos pontos para obtenção dos módulos. Além
disso, observa-se também a criação de deformações elásticas e plásticas.

Figura 6. Curva tensão x deformação de um solo qualquer.

50% tensão
de ruptura Tensão de ruptura
Eur
Tensão

E50

Resposta elástica no
descarregamento

Plástica Elástica Deformação

Fonte: modificada de Gerscovich (2016).

Em que Ei é o módulo tangente inicial; E50 módulo secante, passando pela origem e a
50% da tensão na ruptura; Eur módulo de descarregamento.

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A partir de diversos resultados de ensaios de laboratório, é consenso entre os


pesquisadores que o comportamento da maioria dos solos no campo de tensões das
obras geotécnicas é não linear. Apesar disso, muitos métodos de dimensionamento
adotam o comportamento linear como uma hipótese simplificadora.

Nesse caso, é importante que o engenheiro adote um módulo de elasticidade


adequado para as tensões que serão mobilizadas pela estrutura.

Você saberia dizer de que forma os projetistas chegam a esses valores?

1.4. Tensões no solo


O solo é um meio multifásico, composto por: água, ar e sólidos. Esses materiais interagem
entre si formando a estrutura porosa dos solos. Quando se fala em estado de tensão
em um ponto, considera-se que esse “ponto” seja um volume representativo do meio
multifásico.

A interação entre essas três fases é que gera as respostas durante uma solicitação. A
partir dessa abstração, Terzaghi (1943) desenvolveu o Princípio das Tensões Efetivas.
Esse princípio busca representar o comportamento tensão-deformação dos solos: para
os solos saturados, uma parcela da tensão normal é transmitida pelos grãos e outra pela
água. A tensão de cisalhamento é apenas transmitida pelos grãos, já que se considera
que a água não resiste a tensões cisalhantes.

Desde o tópico anterior, quando falamos sobre deformação, usamos o termo “mudança
de configuração”. Nesse sentido, o princípio das tensões efetivas deixa isso ainda mais
claro. Isso porque, segundo Terzaghi, a compressibilidade dos solos está relacionada
a mudança de posição das partículas. Como o solo é um meio poroso, quando
carregado, as partículas mudam de local e ocupam os vazios. Segundo o autor, esse
deslocamento é muito mais significativo do que qualquer compressibilidade que
o grão possa apresentar.

Outro ponto importante para refletir refere-se a mudanças na tensão efetiva. De


acordo com a equação proposta por Terzaghi, mudanças na tensão efetiva levam
a variações volumétricas (expansão ou recalque). Essas mudanças volumétricas
podem ocorrer devido a: mudanças na tensão total (carregamentos externos); ou
mudanças nas condições de água do solo, ou seja, alterações da poropressão. Por
isso, é importante pensar que alterações no nível d’água, por meio de elevação ou
rebaixamento do lençol freático, podem levar a recalques ou expansão nos solos.

Caso tenha dificuldades com esses conceitos ou precise relembrar aspectos da


mecânica dos solos, recomenda-se a leitura dos livros clássicos da geotecnia:

» Curso Básico de Mecânica dos Solos – Carlos Souza Pinto.

» Fundamentos da Engenharia Geotécnica – Braja M. Das.

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Capítulo 2
TEORIA DO EMPUXO E RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO

Neste capítulo, serão apresentados os principais conceitos relacionados à teoria do


empuxo e à resistência ao cisalhamento dos solos. Toda essa apresentação teórica é
essencial para aplicação em obras de taludes e reforço de solo.

Empuxo de terra são as ações horizontais que o maciço produz nas estruturas que estão
em contato com o solo/rocha. No caso de estruturas de contenção, é muito importante
que a distribuição desses empuxos seja conhecida em toda a extensão do elemento, para
que se avaliem as necessidades estruturais e os possíveis deslocamentos que possam
ocorrer.

Para melhor entender como o empuxo atua nas estruturas, serão apresentados três
conceitos: empuxo no repouso, empuxo ativo e empuxo passivo.

2.1. Teoria do empuxo

2.1.1. Empuxo no repouso

As tensões iniciais que existem em um maciço são aquelas originadas pelo peso próprio
dele. Geralmente, adotam-se algumas simplificações para o estabelecimento de um
padrão de distribuição mais simplificado, chamado de distribuição geostática, sendo elas:

» A superfície do terreno é horizontal.

» As subcamadas são horizontais.

» Existe pouca variação do solo na direção horizontal.

Essas simplificações fazem com que seja possível admitir os planos verticais e horizontais
como planos principais, já que não existem tensões cisalhantes atuando nessas direções.
Além disso, o cálculo da magnitude da tensão horizontal também passa a ser possível,
já que se considera que a deformação horizontal é nula. Veja na Figura 7 um esquema
de distribuição dessas tensões.

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Figura 7. Condição geostática.

Fonte: modificada de Gerscovich et al. (2016).

No caso de algumas das simplificações não serem verdade, como no caso de um talude
de face inclinada, as direções vertical e horizontal deixam de ser as direções principais
(em função do aparecimento de tensões cisalhantes), e a tensão horizontal se torna
indeterminada.

Conforme visto no capítulo anterior, o conceito de deformabilidade de um solo está


relacionado ao movimento entre as partículas. E, no caso da fase sólida dos solos, as
tensões transmitidas entre eles são chamadas de tensões efetivas. Dessa maneira, é
possível estimar as tensões horizontais para um semiespaço infinito em função das
características de deformabilidade de um solo, as quais são representadas pelo coeficiente
de empuxo no repouso (K0):


σ 'h = K 0σ 'v (15)

Dessa maneira, conforme o princípio das tensões efetivas, o empuxo total é obtido por
meio da soma da parcela efetiva mais a parcela de poropressão ( u ):


σ h K 0σ 'v + u
=
(16)

O valor de K0 pode ser obtido por meio de ensaios de campo e de laboratório. Contudo,
existem na literatura alguns valores típicos (Tabela 1):

Tabela 1. Valores típicos de K0.

Solo K0
Areia fofa 0,55
Areia densa 0,40
Argila de alta plasticidade 0,65
Argila de baixa plasticidade 0,50
Fonte: Gerscovich et al. (2016).

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A determinação de K0 em campo pode ser feita por ensaios pressiométricos


autoperfurante, ensaio dilatométrico e ensaio de piezocone sísmico. Contudo, sabe-
se que qualquer introdução de um elemento na massa de solo altera a distribuição
de tensões e, por conseguinte, o valor original de K0 (Gerscovich et al., 2016). Qual
é a melhor forma de minimizar essas incertezas?

2.1.2. Empuxo ativo

Em termos simples, em obras que são feitas estruturas para suportar o maciço de solo,
este tende a criar esforços horizontais no sentido de “empurrar” a estrutura, a qual
reage tentando afastar-se do maciço. Nesse caso, diz-se que o empuxo é de natureza
ativa (Figura 8).

Figura 8. Exemplos de obras de natureza ativa. (a) muro de proteção contra erosão superficial; (b)
muro de gravidade.

(a) (b)

Fonte: modificada de Gerscovich et al. (2016).

2.1.3. Empuxo passivo

O empuxo passivo é quando a estrutura é empurrada contra o solo. Nesse caso, diz-se
que a força exercida pela estrutura sobre o solo é de natureza passiva (Figura 9).

Figura 9. Exemplos de obras de natureza passiva: ponte em arco.

Fonte: Gerscovich et al. (2016).

Apesar de haver essa diferenciação entre a natureza do empuxo, é comum encontrar nas
obras geotécnicas situações em que ambos ocorrem, como é o caso de estacas pranchas
com parte enterradas, conforme Figura 10.

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Figura 10. Estacas pranchas.

Ativo

Passivo
Distribuição Real Distribuição
Simplificada

Fonte: modificada de Das (2014).

2.2. Teoria de Rankine


A teoria de Rankine utiliza equações de equilíbrio interno no maciço. Segundo essa
teoria, existem infinitas superfícies potenciais de ruptura plana. Toda formulação dessa
teoria baseia-se nos seguintes preceitos:

» O solo é homogêneo.

» O solo é isotrópico.

» A superfície do terreno é plana.

» A ruptura acontece em todos os pontos do maciço simultaneamente (não existe


ruptura progressiva).

» A ruptura ocorre sob o estado plano de deformações (conforme visto no capítulo


anterior).

» O contato da estrutura de contenção com o solo é perfeitamente liso, isto é, não


existe atrito no contato solo muro.

» A parede da estrutura de contenção é vertical.

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Conceitos Básicos Aplicados a Projetos de Estabilidade de Reforço | UNIDADE I

Quer saber mais sobre os conceitos de método do equilíbrio limite e superfícies de


ruptura? Veja na próxima unidade, na qual estudaremos os principais métodos para
análise de equilíbrio de taludes.

Segundo essa teoria, se houver um afastamento da parede com relação ao maciço, há


um decréscimo das tensões horizontais, sem alteração nas tensões verticais. Nessa
condição, a razão entre a tensão efetiva horizontal e a vertical é dada pelo coeficiente
de empuxo ativo Ka:

 θ '
=K a tan ²  45 − 
 2  (17)

Já se a parede for de encontro com o maciço, haverá um acréscimo de tensões horizontais,


levando a estrutura a um estado passivo. Nessa condição, a razão entre a tensão efetiva
horizontal e a tensão efetiva vertical é definida pelo coeficiente de empuxo passivo (Kp):

 θ '
=K p tan ²  45 + 
 2  (18)

Para saber mais sobre a Teoria de Rankine, consulte os livros:

» Fundamentos da Engenharia Geotécnica – Braja M. Das.

» Contenções: teoria e aplicações em obra – Denise Gerscovich; Bernadete Ragoni


Danziger e Robson Saramago.

2.3. Resistência ao Cisalhamento dos Solos


Sabe-se que para analisar a estabilidade de encostas e avaliar a resistência dos solos é
imprescindível o conhecimento da resistência ao cisalhamento deles. Os solos resistem
aos esforços cisalhantes devido à resistência entre os grãos, que é maior ou menos a
depender do arranjo estrutural e das condições de saturação que ele se encontra.

Gerscovich et al. (2016) apresenta os mecanismos de resistência dos solos, em que


divide a resistência ao cisalhamento em duas parcelas: resistência entre as partículas e
o imbricamento entre os grãos (Figura 11).

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Figura 11. Mecanismos de resistência dos solos.

Atrito
Resistência
entre partículas
Resistência ao
Coesão
cisalhamento
Imbricamento
(interlocking)

Fonte: modificada de Gerscovich et al. (2016).

a. Atrito: dentro da mecânica dos solos, o atrito entre duas partículas é simulado
de forma análoga ao deslizamento de um corpo rígido sobre uma superfície. A
tensão tangencial para promover o deslizamento depende da tensão normal e do
coeficiente de atrito entre o corpo e o plano.

b. Coesão: a coesão entre partículas é vista na mecânica dos solos como um aglutinador
(uma cola) entre elas. A coesão está, então, relacionada às ligações físico-químicas
entre as partículas, especialmente importantes nos solos argilosos e em solos
cimentados.

c. Imbricamento: o imbricamento está relacionado com a dificuldade que um grão


tem em se mover sobre o outro, quando é solicitado um deslocamento horizontal.
Nos solos fofos, os grãos se movimentam de forma linear, com facilidade. Já nos
solos mais densos, é necessário um movimento ascendente dos grãos para sobrepor
os adjacentes (Figura 12). Por isso, quanto mais densos, mais resistentes serão os
solos.

Figura 12. Imbricamento. (a) fofo; (b) denso.

(a) (b)

Fonte: modificada de Gerscovich (2016).

Veja nas videoaulas deste capítulo a apresentação dos modelos de ruptura dos solos.

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Capítulo 3
CONCEPÇÃO DE PROJETOS DE ESTABILIDADE

Para orientar os estudos de estabilidade, é proposta uma metodologia que, em geral, é


seguida para avaliação de estruturas, conforme Figura 13.

Figura 13. Metodologia para estudos de estabilidade.

Definição da topografia do talude

Identificação e definição de sobrecargas atuantes na estrutura

Execução de investigação de campo para identificar as características do maciço e definir o nível freático

Identificar as condições críticas de operação da estrutura, avaliando todas as etapas da vida útil

Definição dos locais de retirada de amostras indeformadas

Realização de ensaios de laboratório, como: caracterização, resistência ao cisalhamento e


deformabilidade

Análise dos resultados dos ensaios para definir parâmetros de projeto

Obtenção do fator de segurança da estrutura por meio de métodos de dimensionamento

Fonte: adaptada de Gerscovich (2016).

Você sabe o que são amostras indeformadas?

Esses tipos de amostras são aquelas retiradas em campo que mantêm a estrutura
original do solo. São utilizadas em ensaios de laboratório para identificar propriedades
de campo e em ensaios para análise tensão-deformação. Para saber mais sobre os
procedimentos de obtenção dessas amostras, veja a ABNT NBR 9604/2016.

3.1. Definição do fator de segurança


Todos esses passos são necessários para definir as tensões atuantes na estrutura e
comparar com a resistência dela. A comparação entre essas tensões gera o fator de
segurança, que é dado por:
τf
FS =
τ mob (19)

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Onde:

» FS > 1 – Obra estável

» FS = 1 – Ocorre ruptura

» FS < 1 não tem significado físico, pois as tensões mobilizadas são maiores que a
resistência e, por isso, a estrutura não suportaria.

De acordo com a normativa existente, a cada tipo de estrutura é recomendado que se


tenha um fator de segurança mínimo a depender da criticidade e das consequências de
uma possível ruptura. A ABNT NBR 11682:2009 apresenta a Tabela 1, que relaciona
os níveis de segurança desejados contra a perda de vidas humanas, e a Tabela 2, que
apresenta os níveis de segurança desejados contra danos materiais e ambientais.

Tabela 1. Níveis de segurança desejado contra a perda de vidas humanas

Nível de segurança Critérios


Áreas com intensa movimentação e permanência de pessoas, como edificações públicas,
residenciais ou industriais, estádios, praças e demais locais, urbanos ou não, com possibilidade
Alto elevada de concentração de pessoas.
Ferrovias e rodovias de tráfego intenso
Áreas e edificações com movimentação e permanência restrita de pessoas.
Médio
Ferrovias e rodovias de tráfego moderado.
Áreas e edificações com movimentação e permanência eventual de pessoas.
Baixo
Ferrovias e rodovias de tráfego reduzido.
Fonte: ABNT NBR 11682:2009.

Tabela 2. Níveis de segurança desejado contra danos materiais e ambientais.

Nível de segurança Critérios


Danos materiais: locais próximos a propriedades de alto valor histórico, social ou patrimonial,
obras de grande porte e áreas que afetem serviços essenciais.
Alto
Danos ambientais: locais sujeitos a acidentes ambientais graves, tais como nas proximidades
de oleodutos, barragens de rejeito e fábricas de produtos tóxicos.
Danos materiais: locais próximos a propriedades de valor moderado.
Médio
Danos ambientais: locais sujeitos a acidentes ambientais moderados.
Danos materiais: locais próximos a propriedades de valor reduzido.
Baixo
Danos ambientais: locais sujeitos a acidentes ambientais reduzidos.
Fonte: ABNT NBR 11682:2009.

Uma vez que seja definido o nível de segurança associados à consequência do rompimento,
podem ser definidos fatores de segurança para deslizamentos, a partir da Tabela 3:

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Conceitos Básicos Aplicados a Projetos de Estabilidade de Reforço | UNIDADE I

Tabela 3. Níveis de segurança desejado contra danos materiais e ambientais.

Nível de segurança contra danos


materiais e ambientais
/ Alto Médio Baixo
Nível de segurança contra danos a
vidas humanas
Alto 1,5 1,5 1,4
Médio 1,5 1,4 1,3
Baixo 1,4 1,3 1,2
Fonte: ABNT NBR 11682:2009.

A norma destaca que, no caso de grande variabilidade dos ensaios geotécnicos, é


recomendado aumentar em 10% o fator de segurança encontrado. Além disso, destaca
também que esses fatores não se aplicam para rastejo, voçorocas, ravinas e quedas ou
rolamento de blocos.

A ABNT NBR 11682:2009 descreve “os requisitos exigíveis para o estudo e controle
da estabilidade de encostas e taludes resultantes de cortes e aterros realizados em
encostas”. Veja mais no site https://www.abntcatalogo.com.br/norma.aspx?ID=51490.

3.2. Avaliação da geometria de ruptura


Para analisar um projeto de estabilidade, é preciso que, a partir das investigações
geotécnicas, seja previsto o tipo mais provável de ruptura do maciço para que métodos
de análise adequados sejam utilizados. A ruptura pode se dar de forma planar, circular,
multiplanar, mista etc. Essa geometria irá depender dos materiais que compõem a massa
e as heterogeneidades existentes que podem formar planos de fragilidade.

3.3. Escolha do método de análise


Existem dois principais métodos para análise da estabilidade de encostas: método do
equilíbrio limite e métodos que analisam o comportamento tensão/deformação da massa.

3.3.1. Método do equilíbrio limite

Nos métodos de equilíbrio limite, é feito o cálculo do equilíbrio de uma massa ativa
do solo, isto é, da massa sobre uma superfície de ruptura que se deslocará em caso de
ruptura. Em suma, esse método assume as seguintes características:

» determina uma superfície de ruptura;

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» solo acima dessa superfície é considerado um corpo livre e é subdivido em pequenas


massas;

» considera-se que todos os pontos dessa superfície atinjam FS=1 ao mesmo tempo;

» calcula-se o equilíbrio entre as fatias por meio de equações da estática.

Na próxima unidade, uma visão mais detalhada desses métodos será apresentada.

Como veremos na próxima unidade, os métodos de equilíbrio limite são soluções


simples e com relativa precisão nos resultados. Contudo, alguns dos preceitos
considerados podem levar a respostas não compatíveis com a situação real.

3.3.2. Métodos tensão x deformação

Esse tipo de método é utilizado nas análises computacionais, sendo eles o método dos
elementos finitos (MEF) ou o método das diferenças finitas (MDF). Ele apresenta diversas
vantagens, das quais destacam-se:

» efeitos de não linearidade podem ser considerados na análise, de acordo com o


modelo constitutivo escolhido;

» anisotropia pode ser inserida;

» não homogeneidade;

» influência do estado inicial de tensões;

» possível simular as etapas construtivas e avaliar o desempenho da estrutura em


cada uma delas.

Gerscovich (2016) apresenta um exemplo de definição da superfície de ruptura por um


método de equilíbrio limite e um método de análise de tensões, Figura 14. Observa-se
que, por este último, a superfície de ruptura não é linear, pois analisa a situação de cada
um dos pontos da massa.

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Conceitos Básicos Aplicados a Projetos de Estabilidade de Reforço | UNIDADE I

Figura 14. Definição da superfície de ruptura – Comparação entre os métodos do equilíbrio limite e
o método de análise de tensões.

Aterro

Superfície de ruptura

Equilíbrio limite

Análise de tensões

Fonte: Gerscovich (2016).

Além dos tópicos aqui abordados, é muito importante para projeto que as propriedades
dos materiais sejam apropriadamente definidas. A norma ABNT NBR 11682:2009
estabelece quais as investigações geotécnicas devem ser feitas. A partir da definição
das propriedades, o projetista deve avaliar qual análise mais se aproxima das condições
reais (inclusive avaliando a influência da água).

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REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5629: Tirantes ancorados no terreno –


projeto e execução. Rio de Janeiro: ABNT, 2018.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9604: Abertura de poço e trincheira de


inspeção em solo, com retirada de amostras deformadas e indeformadas – Procedimento. Rio de Janeiro:
ABNT, 2016.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 11682: Estabilidade de encostas. Rio de


Janeiro: ABNT, 2009.

BRAJA, M. Das. Fundamentos de Engenharia Geotécnica. Thomson Learning. São Paulo: São
Paulo, 2016.

GERSCOVICH, DENISE M. S. Estabilidade de Taludes. 2. ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2016.

GERSCOVICH, D., DANZIGER, B. R., SARAMAGO, R. Contenções: teoria e aplicações em obras, 2.


ed. rev. e atual. São Paulo: Oficina de Textos, 2016.

GUIMARÃES, K. P. Cortinas atirantadas: estudo de patologias e suas causas. Porto Alegre: Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, 2015.

PALMEIRA, E. M. Utilização de geotêxteis como reforço de aterros sobre solos moles. 282 f.
Dissertação (Mestrado em Geotecnia) – COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, 1981.

PALMEIRA, E. M. Geossintéticos em geotecnia e meio ambiente. São Paulo: Oficina de Textos, 2018.

PINTO, C. S. Curso Básico de Mecânica dos Solos em 16 Aulas. 3. ed., São Paulo: Oficina de Textos, 2006.

TAYLOR, D. W. Fundamentals of soils mechanics. Nova York: John Wiley e Sons, 1948.

TERZAGHI, K. & PECK, R. B. Theoretical soil mechanics. Nova York: John Wiley e Sons, 1948.

UNSPLASH. The internet’s source. Disponível em: https://unsplash.com/. Acesso em: jun. 2020.

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