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No Brasil, os doentes eram vítimas de internação compulsória. A


prática do isolamento continuou até 1976. Dos 101 antigos hospitais-
colônia do país, 33 ainda estão em atividade e abrigam antigos doentes
que passaram a vida nas colônias e hoje não têm para onde ir. O
aspecto humanista só passou a ter espaço recentemente.

A hanseníase é uma infecção crônica, granulomatosa, curável, que tem


como agente etiológico o Mycobacterium leprae ou bacilo de Hansen,
um micro-organismo de elevada infectividade, porém baixa
patogenicidade, isto é, poucos indivíduos infectados adoecem.

O Mycobacterium leprae foi descrito em 1873 pelo norueguês Amauer


Hansen, razão pela qual é chamado Bacilo de Hansen (BH) –
FIGURA 1. É um Bacilo Álcool Ácido Resistente (BAAR), parasita
intracelular obrigatório com predileção pelas células do sistema
reticuloendotelial, especialmente os histiócitos do sistema nervoso
periférico (célula de Schwann), células da pele e mucosa nasal. Uma
importante diferença morfológica com o bacilo da tuberculose (BK) é
que o BH, quando em grande quantidade nas lesões, forma
aglomerados bacilares, denominados globias (FIGURA 2). O BH ainda
não pode ser cultivado in vitro, um dos fatores que dificultam o estudo
de suas propriedades, embora saibamos que apresenta uma
multiplicação extremamente lenta (justificando a apresentação insidiosa
da doença e o período de incubação de anos) e também que possui
preferência para ambientes com temperatura mais baixa (inferiores a
36,5ºC)...

1
Cap. HANSENÍASE

INTRODUÇÃO

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Considerada o maior órgão do corpo humano, a pele encerra funções
sem as quais o corpo humano não poderia sobreviver. Além de possuir Fig. 1: Bacilo de Hansen – microscopia eletrônica.
fundamental papel na interface social e na impressão que temos de
nossos próprios corpos, podemos pensá-la como a principal barreira
entre o nosso organismo, e o ambiente externo. Ambiente este repleto de
agentes agressores tais como infecções, traumas, radiações Ultravioleta
(UV), etc. Nesse módulo, começaremos tratando das principais doenças
infecciosas que acometem a pele (também as condições mais cobradas
nos concursos!!!). E, sem dúvidas, a hanseníase é o carro chefe entre
elas. Conhecida também como lepra, ou mal de Lázaro, a doença surgiu
na Índia e na China e acredita-se que tenha sido levada para o
Mediterrâneo pelas conquistas de Alexandre, o Grande, rei da
Macedônia. Mas o número de doentes na Europa aumentou na época
das Cruzadas, no final do século XI. Foi nesse período também o início
da perseguição aos “leprosos”, que duraria três séculos. Na França,
milhares de doentes foram queimados nas fogueiras. O doente recebia
um par de luvas e uma espécie de sino para anunciar sua chegada a
lugares públicos. Milhares de pessoas foram expulsas das comunidades,
ingressando nas colônias de leprosos ou mendigando na periferia das
cidades.
Pode-se dizer que a prevalência da doença vem diminuindo em todo o
mundo nos últimos anos. Entretanto, esse declínio desacelerou mais
recentemente. A taxa global de incidência da hanseníase também parece
estar diminuindo, ainda que lentamente e que, em muitas áreas,
permaneça estática ou mesmo em crescimento. No mundo, foram
reportados à Organização Mundial da Saúde (OMS) 208.619 casos
novos da doença em 2018. Desses, 30.957 ocorreram na região das
Américas e 28.660 (92,6% do total das Américas) foram notificados no
Brasil. Do total de casos novos diagnosticados no país, 1.705 (5,9%)
ocorreram em menores de 15 anos. Quanto ao Grau de Incapacidade
Física (GIF), entre os 24.780 (86,5%) avaliados no diagnóstico, 2.109
(8,5%) apresentaram deformidades visíveis (GIF2). Diante desse

Fig. 2: Mycobacterium leprae (Ziehl-Neelsen). BAAR com formação


cenário, o Brasil é classificado como um país de alta carga para a
das globias. doença, ocupando o segundo lugar na relação de países com maior
número de casos no mundo, estando atrás apenas da Índia.

Por aqui, embora os compromissos internacionais não tenham sido


Classicamente, o acometimento cutâneo caracteriza-se por máculas
plenamente atingidos, observamos no período de 2000 a 2016 uma
hipocrômicas, hipo ou anestésicas. Entretanto, na dependência da forma
redução importante do coeficiente de prevalência de hanseníase – e o
clínica, placas, nódulos, tubérculos e mesmo infiltração sem lesões de
mesmo se deu para a incidência. Entretanto, a prevalência de hanseníase
pele aparentes podem ser observados. O bacilo, quando identificado à
ainda apresenta importantes variações regionais e estaduais. Nas regiões
histopatologia, localiza-se nas partes profundas da derme. Com a
Norte, Nordeste e Centro-Oeste (exceto Rio Grande do Norte e Distrito
evolução da doença não tratada, as manifestações dermatológicas e
Federal), ainda há coeficientes elevados, sobretudo nos estados de Mato
neurológicas associam-se a deformidades e mutilações, alterações que
Grosso, Tocantins e Maranhão.
tanto estigmatizam os pacientes.

Mais recentemente, o Ministério da Saúde elaborou a Estratégia


Desta forma, o diagnóstico precoce da doença, o tratamento com a
Nacional para Enfrentamento da Hanseníase 2019-2022 que tem como
poliquimioterapia e o reconhecimento imediato dos quadros reacionais
objetivo geral reduzir a carga da doença no país ao fim de 2022, e possui
garantem a interrupção da cadeia de transmissão e a prevenção das
as seguintes metas: 1) reduzir para 30 o número total de crianças com
incapacidades físicas. Tem notificação compulsória em todo o território
grau 2 de incapacidade física; 2) reduzir para 8,83/1 milhão de
nacional e é de investigação obrigatória. Após concluir o diagnóstico, o
habitantes a taxa de pessoas com grau 2 de incapacidade física; e 3)
caso deve ser notificado ao órgão de vigilância superior, através de uma
implantar em todas as Unidades da Federação canais para registro de
ficha de notificação do SINAN.
práticas discriminatórias às pessoas acometidas pela hanseníase e seus
familiares.
EPIDEMIOLOGIA
TRANSMISSÃO E PATOGÊNESE
Nos últimos anos, observou-se bastante sucesso com a implantação dos
programas de controle da hanseníase, apoiados pela OMS. O foco
O homem é considerado o único reservatório natural do bacilo, apesar
desses programas está na detecção precoce de casos novos, tratamento
do relato de animais selvagens naturalmente infectados (tatus e
gratuito com poliquimioterapia, sustentabilidade dos ganhos
macacos). Os pacientes portadores de formas multibacilares são a
alcançados e na redução da carga da doença nas comunidades
principal fonte de infecção (são capazes de eliminar grande quantidade
endêmicas. No Brasil, o Ministério da Saúde também tem dado
de bacilos para o meio exterior – carga de cerca de 10 milhões de bacilos
prioridade às ações para os casos em menores de 15 anos, a partir da
na mucosa nasal), embora o papel dos paucibacilares na cadeia de
“Campanha Nacional de Hanseníase, Geo-Helmintíases e Tracoma”.
transmissão tenha sido demonstrado. A existência de portadores sadios
tem sido relatada pelos estudos de DNA utilizando a técnica da reação
em cadeia da polimerase (PCR), entretanto o papel desses na
transmissão e o seu risco de adoecimento não estão definidos.

As vias aéreas superiores provavelmente constituem a principal via de


inoculação e eliminação do bacilo. Soluções de continuidade na pele
eventualmente podem ser porta de entrada da infecção. Secreções
orgânicas como leite, esperma, suor e secreção vaginal podem eliminar
bacilos, mas não possuem importância na disseminação da hanseníase.
A hanseníase atinge pessoas de todas as idades, ambos os sexos, no A classificação de Madri (Congresso Internacional, 1953) é a mais
entanto raramente ocorre em crianças abaixo de cinco anos de idade. A utilizada no Brasil. Consideram-se dois polos estáveis e opostos
distribuição da doença em conglomerados, famílias ou comunidades (virchowiano e tuberculoide)) e dois grupos instáveis (indeterminado e
com antecedentes genéticos comuns sugere a possibilidade de uma dimorfo), que caminhariam para um dos polos, na evolução natural da
predisposição genética à infecção pelo BH. Existem marcadores doença.
imunológicos relacionados à capacidade dos macrófagos em destruir o
bacilo ou simplesmente deixá-lo se multiplicar. Os fenótipos HLA-DR2 A classificação proposta por Ridley e Jopling (1962), divide a
e HLA-DR3 estão relacionados à forma paucibacilar; e o fenótipo hanseníase em forma Tuberculoide (TT), casos borderline ou dimorfos
HLA-DQ-1, à forma multibacilar da doença. que são subdivididos em Dimorfo-Tuberculoide (DT), Dimorfo-
Dimorfo (DD) e Dimorfo-Virchowiano (DV), Virchowiano-Subpolar
O período de incubação é longo, em média de dois a cinco anos, (VVs) e Virchowiano (VV).
podendo ser de meses a mais de dez anos. Isso ocorre em virtude do M.
leprae ser um micro-organismo “lento”, que se reproduz por divisão A classificação operacional da OMS se dá pelo número de lesões;
binária simples a cada 14 dias, sendo necessários muitos anos para que quando até cinco lesões, é classificado como paucibacilar, e quando
o organismo possua uma carga bacilar capaz de expressar-se apresentar mais de cinco lesões, é classificado em multibacilar.
clinicamente.

Depois da sua entrada no organismo, não ocorrendo a sua destruição, o


CLÍNICA
bacilo de Hansen irá se localizar na célula de Schwann e na pele. Sua
disseminação para outros tecidos (linfonodos, olhos, testículos, fígado) Nesse momento, é importante que você pare por alguns segundos e faça
pode ocorrer nas formas mais graves da doença, nas quais o agente uma comparação! Que outra doença, que muitos que estão lendo este
infectante não encontra resistência contra a sua multiplicação. material e residem no Brasil podem ter sido infectados, mas não
adoeceram e que também é causada por uma micobactéria??? Exatamente
A imunidade humoral (dependente de anticorpos) é ineficaz contra o M. – a tuberculose! E é assim que a hanseníase deve ser lembrada – uma
leprae. A defesa é efetuada pela imunidade celular, capaz de fagocitar e doença semelhante à tuberculose. Inclusive a própria transmissão se dá
destruir os bacilos, mediada por citocinas (TNF-alfa, IFN-gama) e pela via respiratória! A diferença está basicamente no tipo de lugar que
mediadores da oxidação, fundamentais na destruição bacilar no interior esta bactéria “gosta” de fazer lesão! Podemos marcar a hanseníase como
dos macrófagos. uma doença de duplo acometimento: dermatoneurológica! E se tivermos
um sinal marcante para destacarmos na hanseníase, este é, sem dúvidas, a
perda de sensibilidade nas áreas afetadas pelas lesões (ou em outras áreas
Na forma paucibacilar (lesões tuberculoides), há predomínio de linfócitos
inervadas por nervos periféricos)! Ela é mais frequente nos pacientes
Th1, produzindo IL-2 e IFN-gama, enquanto que na forma multibacilar
paucibacilares, nos quais a imunidade celular está exacerbada e, com isso,
(lesões virchowianas ou lepromatosas), o predomínio é de linfócitos T
ao englobar o bacilo, acaba atingindo o nervo. Assim, os macrófagos são,
supressoras e Th2, produzindo IL-4, IL-5 e IL-10.
na realidade, os que têm papel fundamental na neurite. É importante
salientar, contudo, que, nos pacientes com o vírus HIV, o curso da
Na hanseníase tuberculoide, a exacerbação da imunidade celular e a
hanseníase não se altera. Eventualmente, outros achados sistêmicos podem
produção de citocinas pró-inflamatórias (IL-1 e TNF-alfa) impedem a
ocorrer em virtude do processo inflamatório associado, como uveíte ou
proliferação bacilar, mas podem se tornar lesivas ao organismo,
glomerulonefrite, ou da própria extensão da doença em quadros de baixa
causando lesões cutâneas e neurais, pela ausência de fatores reguladores.
resistência ao bacilo (linfonodomegalia e hepatoesplenomegalia). É o que
Na hanseníase virchowiana, a produção de substâncias pelo bacilo (ex.:
vamos detalhar a partir de agora....
PGL-1), no interior do macrófago, favorece seu escape à oxidação, pois
estes possuem função supressora da atividade do macrófago e
favorecem a sua disseminação. ■ HANSENÍASE INDETERMINADA (HI)

Caracteriza-se pelo aparecimento de mancha(s) hipocrômica(s),


A hanseníase é uma doença de ALTA infectividade e BAIXA anestésica e anidrótica, com bordas imprecisas. As lesões são únicas ou
patogenicidade. em pequeno número e podem se localizar em qualquer área da pele
(FIGURAS 3 e 4). Não há comprometimento de troncos nervosos nesta
forma clínica, apenas ramúsculos nervosos cutâneos. A baciloscopia é
negativa. A HI é considerada a primeira manifestação clínica da
CLASSIFICAÇÃO hanseníase; e, após período de tempo que varia de poucos meses até
anos, dependendo da imunidade, ocorre evolução para cura ou para
outra forma clínica, quer seja paucibacilar ou multibacilar. A sua
Existem três classificações diferentes para hanseníase: a classificação de
histopatologia apresenta infiltrado perivascular e perineural.
Madri, a de Ridley e Jopling e a operacional.
A HT surge a partir da HI não tratada, nos pacientes com boa
resistência. No polo de resistência, a hanseníase tuberculoide caracteriza
a forma clínica de contenção da multiplicação bacilar, dentro do
espectro da doença. As lesões são bem delimitadas, em número
reduzido, eritematosas, com perda total da sensibilidade e de
distribuição assimétrica. Descrevem-se inicialmente máculas, que
evoluem para lesões em placas com bordas papulosas, e áreas de pele
eritematosas (FIGURA 5) ou hipocrômicas. Seu crescimento centrífugo
lento leva à atrofia no interior da lesão, que pode, ainda, assumir
aspecto tricofitoide, com descamação das bordas. Observam-se, ainda, a
variedade infantil e a forma neural pura. A primeira manifesta-se em
crianças conviventes com portadores de formas bacilíferas e localiza-se
principalmente na face (FIGURA 6). Pode se manifestar como nódulos,
Fig. 3: Hanseníase indeterminada. placas, lesões tricofitoides ou sarcoídicas. Portanto, é uma forma
paucibacilar (a baciloscopia é tipicamente negativa), cujo foco foi um
paciente multibacilar.

Fig. 5

Fig. 4

Apresenta como diagnóstico diferencial: pitiríase alba, pitiríase


versicolor, vitiligo, pinta, leucodermia gutata, nevo acrômico, nevo
anêmico, hipomelanose idiopática do tronco, entre outros.

A principal diferença entre a lesão da hanseníase e de outras


doenças dermatológicas é a alteração de sensibilidade!!!

■ HANSENÍASE TUBERCULOIDE (HT)

Fig. 6
A neurite normalmente se apresenta com um quadro agudo de dor
intensa e edema, sem que haja, a princípio, comprometimento funcional Ulnar - mão em garra e atrofia de interósseos.

do nervo. Contudo, a lesão se torna crônica e passa a evidenciar o dano, Mediano - mão do pregador.
identificado por anidrose e ressecamento cutâneo; alopecia; alteração Ulnar + mediano - mão simiesca ou garra completa.
sensitiva (na ordem em que é perdida: térmica, dolorosa e tátil) e Radial - queda do punho.
motora, cursando com dormência e perda da força muscular. Se não
Ramo trigeminal do facial - lagoftalmo.
tratado, o acometimento neural pode provocar incapacidades e
deformidades. Em alguns casos, as alterações de sensibilidade e Fibular comum - queda do pé.

motricidade podem aparecer sem os sintomas agudos de neurite (neurite Tibial posterior - mal perfurante plantar (FIGURA 8),
silenciosa). Outra forma é a forma neural pura, quando não se deformidade em garra de artelhos.
encontram lesões cutâneas, mas encontramos espessamento do tronco
nervoso e dano neural precoce e grave.

Na hanseníase tuberculoide podemos ver emergindo da placa o


espessamento neural, o qual denominamos de sinal da raquete
(FIGURA 7).

Fig. 8

A forma tuberculoide (HT) e a forma indeterminada (HI) constituem as


formas paucibacilares da hanseníase. Apesar da possibilidade de cura
Fig. 7 espontânea na HT, a orientação é de que os casos sejam tratados para
reduzir o tempo de evolução da doença e o risco de dano neural.

Os principais troncos nervosos periféricos acometidos na hanseníase


■ HANSENÍASE VIRCHOWIANA (HV)
são:
Esta é a forma multibacilar da hanseníase (também chamada de lepra
Face – trigêmio e facial: podem causar alterações na face, nos olhos e no ou hanseníase lepromatosa), reconhecida por corresponder ao polo de
nariz; baixa resistência imunológica ao bacilo. Pode evoluir a partir da forma
indeterminada ou se apresentar como tal desde o início. Caracteriza-se
pela infiltração progressiva e difusa da pele, mucosas das vias aéreas
Braços – radial, ulnar e mediano: podem causar alterações nos braços e
superiores, olhos, testículos, nervos; podendo afetar, ainda, os
nas mãos;
linfonodos, o fígado e o baço (hepatoesplenomegalia).

Pernas – fibular e tibial: podem causar alterações nas pernas e nos pés.
Na pele, descrevem-se máculas, pápulas, nódulos e tubérculos
(FIGURAS 9A, 9B, 9C e 9D). A infiltração é difusa e mais acentuada
E as suas consequências estão descritas abaixo.
na face e nos membros. A pele torna-se luzidia, xerótica, com aspecto
apergaminhado e tonalidade semelhante ao cobre. Há rarefação dos
pelos nos membros, cílios e da cauda da sobrancelha (madarose –
Principais Síndromes de Nervo Periférico FIGURA 10).
Fig. 9A Fig. 9D*

Fig. 9B Fig. 10

A infiltração da face e pavilhões auriculares, com madarose sem queda


de cabelo, forma o quadro conhecido como fácies leonina (FIGURA 11).
O comprometimento nervoso ocorre nos ramúsculos da pele, na
inervação vascular e nos troncos nervosos. Estes últimos vão apresentar
deficiências funcionais e sequelas tardias. São sinais precoces de HV a
obstrução nasal, rinorreia serossanguinolenta e edema de membros
inferiores. Um subtipo de HV, com infiltração difusa da pele, mas sem
nódulos ou placas, é denominado lepromatose difusa ou “lepra bonita”.
Outra variedade é chamada de histoide (FIGURA 12), na qual
encontramos lesões nodulares que se assemelham com dermatofibromas
(caracterizado por histiócitos fusiformes).

Fig. 9C
O acometimento dos testículos pode levar à diminuição da produção de
testosterona, ocorrendo aumento do FSH e LH com queda da libido e
eventualmente ginecomastia. O acometimento da câmara anterior do
olho resulta em glaucoma e formação de catarata. A insensibilidade da
córnea pode levar ao trauma (triquíase) e infecção secundária. Na HV
avançada pode ocorrer perfuração do septo nasal e desabamento nasal.

A HV apresenta baciloscopia fortemente positiva (multibacilar) e


representa, nos casos virgens de tratamento, importante foco infeccioso
ou reservatório da doença. A histopatologia demonstra aglomerado de
bacilos nas camadas profundas da derme (globias). Na realidade, o
micro-organismo pode ser isolado de qualquer tecido ou órgão (fígado,
baço, medula óssea, etc.) com exceção do pulmão e sistema nervoso
central.

Fig. 11 ■ HANSENÍASE DIMORFA (HD) OU


BORDERLINE (HB)

Este grupo é marcado pela instabilidade imunológica, o que faz com


que haja grande variação em suas manifestações clínicas, seja na pele,
nos nervos, ou no comprometimento sistêmico. As lesões da pele
revelam-se numerosas e a sua morfologia mescla aspectos de HV e HT,
podendo haver predominância ora de um, ora de outro tipo. A
infiltração assimétrica da face e dos pavilhões auriculares, bem como a
presença de lesões no pescoço e nuca, é elemento sugestivo desta forma
clínica. As lesões neurais são precoces, assimétricas e, com frequência,
levam a incapacidades físicas.

Dependendo da morfologia, número de lesões e simetria, a hanseníase


dimorfa é subclassificada em:

● Borderline Tuberculoide (BT): placas ou manchas eritematosas, por


vezes anulares, de maior extensão, distribuição assimétrica, pouco
Fig. 12A
numerosas ou com lesões satélite. A baciloscopia é negativa ou
discretamente positiva.

● Borderline Borderline (BB): lesões bizarras, semelhantes ao “queijo


suíço” (“esburacadas”), também descritas como anulares ou
foveolares, com limite interno nítido e limites externos imprecisos,
com bordos de cor ferruginosa. As lesões são mais numerosas que a
BT, mas de distribuição assimétrica. A baciloscopia geralmente é
moderadamente positiva.

● Borderline Virchowiana (BV): múltiplas lesões elevadas


eritematoinfiltradas, algumas de aspecto anular (FIGURAS 13A e
13B). A baciloscopia é francamente positiva (tal como na hanseníase
virchowiana).

Fig. 12B
De uma forma resumida, podemos dizer que a hanseníase
indeterminada é a forma inicial da doença, com o
aparecimento da típica lesão hipocrômica (única ou em
número pequeno), sem comprometimento de troncos
nervosos. Após um período variável de meses a anos, pode
evoluir para a cura ou para um dos extremos da doença.

Nos pacientes com boa resistência, surge a hanseníase


tuberculoide. Como a resposta é “boa”, os bacilos estão
controlados e as lesões são bem delimitadas. Na parte
neurológica, encontramos espessamento do tronco nervoso e
dano neural precoce e grave. Podemos ver emergindo da
placa o espessamento neural (sinal da raquete). Apesar da
possibilidade de cura espontânea, o tratamento deve ser
indicado para reduzir o tempo de doença e o risco de dano
Fig. 13A neural.

No outro extremo, de pacientes com baixa resistência


imunológica, temos a hanseníase virchowiana. Nela
encontramos a infiltração progressiva e difusa da pele,
mucosas, olhos, testículos, nervos; podendo afetar ainda
linfonodos, fígado e baço. A infiltração da face e pavilhões
auriculares dá o típico aspecto de fácies leonina. Existe um
subtipo de HV, sem nódulos ou placas, denominado
lepromatose difusa ou “lepra bonita”. Os bacilos são
numerosos, constituindo o paciente um importante foco
infeccioso e estão aglomerados (formando globias) nas
camadas profundas da derme.

Em cima do muro, temos os pacientes caracterizados por


instabilidade imunológica – a hanseníase dimorfa ou
borderline. Há grande variação em suas manifestações
clínicas. Dependendo da morfologia, número de lesões e
simetria poderia ser ainda subclassificada em borderline-
tuberculoide, borderline e borderline-virchowiana.
Fig. 13B

■ HANSENÍASE REACIONAL

Os surtos reacionais são definidos como episódios inflamatórios que se


História da Doença intercalam no curso crônico da hanseníase. Muitas vezes podem chamar
mais atenção do que as próprias lesões primárias da hanseníase, pela
riqueza de sinais e sintomas. Ao contrário da apresentação esperada
para uma hanseníase, possuem evolução aguda. Os tipos de reação mais
importantes são a reação reversa ou reação do tipo 1 e a reação do tipo
2 ou Eritema Nodoso da Hanseníase (ENH) – ver Tabela 1. As reações
seguem-se a fatores desencadeantes, tais como: infecções intercorrentes,
vacinação, gravidez e puerpério, medicamentos iodados, estresse físico e
emocional. Os quadros reacionais, às vezes, antecedem o diagnóstico da
hanseníase, surgem durante o tratamento ou após a alta.
Fig. 14B

Reação tipo 1 (reversa): a reação do tipo 1 tende a surgir mais Reação tipo 2 (eritema nodoso hansênico): observada nas formas
precocemente no tratamento, entre o 2º e o 6º mês, caracteristicamente multibacilares (virchowianas ou dimorfas), em geral, após seis meses de
na hanseníase dimorfa. É considerada reação mediada pela imunidade tratamento. O eritema nodoso hansênico é uma paniculite (inflamação
celular. Caracteriza-se pela exacer-bação das lesões preexistentes, que se da hipoderme) lobular (predomina nos lóbulos), acompanhado de
tornam edemaciadas, eritematosas, brilhantes, semelhante à erisipela; vasculite.
podem surgir novas lesões, embora pouco numerosas (FIGURAS 14A e
14B). Os sintomas sistêmicos variam (geralmente uma febre baixa).
É uma síndrome desencadeada por depósito de imunocomplexos nos
Surgem lesões novas à distância e as neurites mostram-se frequentes e
tecidos e vasos, mas a imunidade celular possui importância em etapas
graves, podendo ser a única manifestação clínica. Se não tratadas
iniciais do processo. Há aumento de citocinas séricas, como o fator de
precocemente, deixam sequelas... As neurites podem ser silenciosas, ou
necrose tumoral alfa e o interferon gama sem, contudo, haver mudança
seja, o dano funcional do nervo se instala sem quadro clínico de dor e
definitiva da condição imunológica do paciente. As manifestações
espessamento do nervo. Os nervos mais comprometidos são os ulnares e
clínicas incluem:
medianos nos membros superiores, fibular comum e tibial posterior nos
membros inferiores e facial e grande auricular no segmento cefálico.
● Febre e linfadenopatia;

● Neurite – nervo ulnar é o mais comumente acometido;

● Uveíte;

● Orquite;

● Glomerulonefrite.

Na pele, a lesão típica (eritema nodoso – FIGURA 15A) se caracteriza


por lesões eritematosas, dolorosas, de tamanhos variados incluindo
pápulas e nódulos localizados em qualquer região da pele. Os nódulos
evoluem para ulceração, e é chamado de eritema nodoso necrotizante
(FIGURA 15B). O eritema poliforme também pode acompanhar a
reação tipo 2.

Fig. 14A
Fenômeno de Lucio: ocorre antes do tratamento em poucos pacientes
com hanseníase virchowiana, especialmente naqueles com a forma
“lepra bonita” ou lepra de Lucio. Lesões maculares equimóticas
(necróticas) que se ulceram podem ocorrer em pequeno número ou por
uma área extensa da pele (FIGURA 16), sendo observada mais
comumente em extremidades inferiores. No caso de lesões
generalizadas, o paciente pode comportar-se como um grande
queimado, e a infecção secundária das lesões por Pseudomonas
aeruginosa é uma complicação temida. A histopatologia demonstra
necrose isquêmica da epiderme e derme superficial, parasitismo intenso
de células endoteliais, proliferação de células endoteliais e formação de
trombos em grandes vasos das porções profundas da derme. O
tratamento consiste na poliquimioterapia, medidas de suporte,
antibioticoterapia e transfusões de troca. Os glicocorticoides e a
talidomida não são úteis. Ainda se discute se pode ou não ser
considerada uma reação.
Fig. 15A

Fig. 16

Fig. 15B

Em alguns casos, o quadro reacional evolui com neurite, orquite, DIAGNÓSTICO


epididimite, irite, iridociclite, artralgia ou artrite, linfadenopatia
generalizada, proteinúria e dano hepático. Edema de membros Esta é uma etapa essencialmente clínica e epidemiológica, com base na
inferiores, pré-tibialgia e febre acompanham esta reação. Às vezes, a história e condições de vida do paciente, além do exame derma-
febre alta e prolongada domina o quadro clínico. Leucocitose (incluindo toneurológico. Tem-se como objetivo identificar lesões ou áreas de pele
reação leucemoide), com desvio para esquerda, anemia normocítica com alteração de sensibilidade e/ou comprometimento de nervos
normocrômica, VHS bastante elevado e proteína C-reativa aumentada periféricos (sensitivo, motor e/ou autonômico).
são achados frequentes. Títulos altos de fator reumatoide e FAN podem
ser encontrados, confundindo o diagnóstico com o das colagenoses. As No exame neurológico, a identificação das lesões deve ser feita pelas
reações do tipo 2 repetem-se e evoluem indefinidamente em surtos seguintes etapas no exame físico:
subentrantes.

1. Inspeção dos olhos, nariz, mãos e pés;

2. Palpação dos troncos nervosos periféricos;

3. Avaliação da mobilidade articular;

4. Avaliação da força muscular; e

5. Avaliação de sensibilidade nos olhos, membros superiores e


membros inferiores.
O exame dos nervos periféricos (FIGURAS 17A e 17B) é fundamental,
procurando-se deficit motores, sensitivos e espessamento dos troncos
nervosos pela palpação. O nervo deve ser palpado com as polpas
digitais do segundo e terceiro dedos, deslizando-os sobre a superfície
óssea, acompanhando o trajeto do nervo, no sentido de cima para
baixo. Deve-se verificar se há queixa de dor espontânea no trajeto do
nervo; de choque ou de dor; se há espessamento do nervo palpado
comparado com o nervo correspondente, no lado oposto; se há
alteração na consistência do nervo (endurecimento, amolecimento); se
há alteração na forma do nervo (abscessos e nódulos); se o nervo
apresenta aderências.

Fig. 17B

Os nervos comumente avaliados são: nos membros superiores, o nervo


ulnar, o mediano e o radial; nos membros inferiores, o tibial posterior e
o fibular comum; no segmento cefálico, o grande auricular e o nervo
facial que é motor e não é palpável. Sequelas bem definidas podem ser
encontradas já no período do diagnóstico, tais como: paralisia facial do
tipo periférico unilateral ou bilateral, ou paralisia do ramo orbicular do
nervo zigomático, provocando o lagoftalmo, epífora (escoamento de
lágrimas devido à obstrução do canal lacrimal) e exposição da córnea;
Fig. 17A mão em garra (garra do quarto e quinto quirodátilos ou garra
completa); mão caída; pé caído, garra de artelhos, que pode ser
acompanhada do mal perfurante plantar.
Para avaliação da sensibilidade, devemos explicar o teste que será ● Lesão(ões) e/ou área(s) da pele com alteração da sensibilidade
realizado e apresentá-lo numa área da pele com sensibilidade normal. térmica e/ou dolorosa e/ou tátil;
Em seguida, a sensibilidade (térmica, dolorosa e tátil) deve ser testada ● Comprometimento do nervo periférico, geralmente espessamento,
com o paciente de olhos fechados. Examina-se a sensibilidade térmica
associado a alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas; e
através de dois tubos de ensaio, um aquecido e outro frio. Pede-se para
o paciente não olhar o exame e encosta o tubo em uma área sadia e ● Presença de bacilos M. leprae, confirmada na baciloscopia de
outra com lesão, perguntando se ele acha que o tubo está quente ou esfregaço intradérmico ou na biópsia de pele.
frio. Para a sensibilidade dolorosa utilizamos uma agulha e tocamos
suavemente na pele do paciente, o suficiente para sentir a sensação Em caso de dúvida, pode-se lançar mão de provas complementares, que
álgica. A sensibilidade tátil é verificada através de um leve toque, são o teste da histamina (ausência do eritema secundário) e da
utilizando um tampão de algodão, cuja extremidade foi enrolada de pilocarpina (anidrose).
forma a ficar afunilada. Isso permite exercer sobre a pele uma pressão
muito leve. (Em caso de falta de algodão, pode-se utilizar o toque muito O teste de histamina é feito colocando-se uma gota de solução de
leve de uma pena de ave). Não se deve mexer o algodão nem fazê-lo cloridrato de histamina a 1:1.000 sob a pele. Com uma agulha fina faz-
escorregar sobre a pele: é mais fácil perceber a sensação de uma coisa se uma escoriação embaixo do líquido, de modo que não haja
que está em movimento. Dessa forma pode-se deixar de notar uma área sangramento. O esperado normalmente é que ocorra a tríplice reação de
onde a sensibilidade está diminuída, mas ainda não completamente Lewis: a) eritema inicial no local da picada, no máximo com 10 mm, 20
perdida. Dá-se o nome de anestesia à perda total de sensibilidade e de a 40 segundos após a picada; b) eritema pseudopódico com 30 a 50 mm
hipoestesia à sua diminuição. Grosseiramente, para analisar a após aproximadamente um minuto, devido à vasodilatação arteriolar
sensibilidade protetora, alguns textos sugerem a testagem em diferentes por ato reflexo axônico; e c) seropápula, dois a três minutos após a
pontos com a caneta esferográfica de ponta grossa perpendicularmente escarificação. É um exame útil para auxiliar no diagnóstico de manchas
à pele. No entanto, o melhor é que sejam utilizados os monofilamentos hipocrômicas hansenianas iniciais, pois nestas falta o eritema
de Semmes-Weinstein (monofilamentos de 0,05 g, 0,2 g, 2 g, 4 g, 10 g e pseudopódico. Não se realiza este exame na raça negra devido à
300 g) – aqueles mesmos do diabetes!!! Para os olhos, o fio dental (sem dificuldade de leitura. O teste é classificado em completo e incompleto.
sabor) é o indicado para avaliar a sensibilidade da córnea. Considera-se
como grau 1 de incapacidade a ausência de resposta ao filamento igual
No teste da pilocarpina utilizamos injeção intradérmica de cloridrato de
ou mais pesado que o de 2 g (cor violeta).
pilocarpina a 1%. Normalmente ocorre sudorese na área picada dois
minutos após. Nas lesões hansênicas ocorre anidrose. Os dois testes
A baciloscopia (FIGURA 18) é o exame complementar mais útil no acima devem ser feitos em áreas sadias e doentes, preferencialmente
diagnóstico; é de fácil execução e baixo custo. Deve ser feito com a linfa simétricas.
obtida em pelo menos quatro locais (lóbulos das orelhas direita e
esquerda, cotovelos direito e esquerdo) e em lesão cutânea suspeita. A
A reação de Mitsuda é um teste de aplicação intradérmica cuja leitura é
coloração é feita pelo método de Ziehl-Neelsen e apresenta-se o
tardia (28 dias). Utiliza-se na classificação da doença e na definição do
resultado sob a forma de Índice Baciloscópico (IB), numa escala que vai
prognóstico. Não possui valor para o diagnóstico, pois de um modo
de 0 a 6+. A baciloscopia mostra-se negativa (IB = 0) nas formas
geral é encontrado de forma positiva na população sã, que já teve
tuberculoide e indeterminada, fortemente positiva na forma
contato com o bacilo, porém não desenvolveu a doença por apresentar
virchowiana e revela resultado variável na forma dimorfa.
boa imunidade. O teste consiste na aplicação intradérmica – na
superfície extensora do antebraço direito – de 0,1 ml de um preparado
que contém 40 a 60 milhões de bacilos mortos por mililitro
(FIGURAS 19A e 19B).

Fig. 18

Considera-se um caso de hanseníase a pessoa que apresenta um ou mais


dos seguintes sinais cardinais:
Fig. 19C
Fig. 19A

Os casos com suspeita de comprometimento neural sem lesão cutânea


(suspeita de hanseníase neural pura) e aqueles que apresentam área com
alteração sensitiva e/ou autonômica duvidosa e sem lesão cutânea
evidente deverão ser encaminhados para unidades de saúde de maior
complexidade, para confirmação diagnóstica. Nessas unidades, serão
submetidos mais uma vez a um exame dermatoneurológico criterioso,
bem como à coleta de material para exames laboratoriais (baciloscopia
ou histopatologia cutânea ou de nervo periférico sensitivo), exames
eletrofisio-lógicos e/ou outros mais complexos. Em crianças, diante da
dificuldade de aplicação e interpretação dos testes de sensibilidade,
recomenda-se utilizar o Protocolo Complementar de Investigação
Diagnóstica de Casos de Hanseníase em Menores de 15 anos.

O antígeno glicolípide fenólico-1 (PGL-1) é específico do M. leprae e leva


à formação de anticorpos das classes IgG e IgM. Os títulos de IgM
Fig. 19B correlacionam-se com a forma clínica e a atividade da doença. Níveis
aumentados do anti-PGL-1 têm sido descritos na hanseníase
virchowiana e tendem a decrescer com o tratamento específico. Por
outro lado, na hanseníase tuberculoide não há resposta desses
Após cerca de 48 a 72 horas da injeção, observa-se uma reação anticorpos.
localizada (semelhante à reação tuberculínica), denominada reação de
Fernandez, de significado incerto. Depois de 28 a 30 dias pode ocorrer
A identificação do Mycobacterium leprae pela reação em cadeia da
uma segunda reação tardia à mitsudina ou lepromina: é a reação de
polimerase (PCR), que serve para detectar quantidades mínimas de
Mitsuda (FIGURA 19C). Esta consiste na presença de uma pápula ou
micobactérias, tem sido estudada em centros de pesquisa, mas não é
nódulo, que pode ou não ulcerar. Segundo a Organização Mundial de
realizada rotineiramente.
Saúde, reações até 5 mm chamamos de mitsuda negativo, e acima de 5
mm chamamos de mitsuda positivo. Na lepra de Lucio existe a leitura
da chamada reação de Medina, seis horas após a inoculação TRATAMENTO
intradérmica da lepromina.

Toda pessoa afetada pela hanseníase deverá ter fácil acesso ao


diagnóstico e ao tratamento gratuito com a poliquimioterapia.
Precisamos garantir que sejam realizadas atividades sus-tentáveis, e que
serviços de qualidade sejam oferecidos dentro de uma estrutura
integrada que inclua uma rede eficaz de referência para abordar de
forma eficiente as complicações relacionadas à hanseníase.
O tratamento da hanseníase com a PQT vem apresentando um sucesso As drogas usadas nos esquemas padronizados pela OMS e MS são a
contínuo; nem a questão da recidiva, nem a resistência a drogas têm rifampicina (única bactericida dos esquemas-padrão), dapsona e
sido problemas significativos e os esquemas são bem tolerados. Relatos clofazimina. Os esquemas poliquimioterápicos têm como princípio a
esporádicos de pacientes recidivantes com cepas de M. leprae resistentes associação de drogas. O fornecimento da medicação é gratuito em todo
às drogas anti-hansênicas foram divul-gados recentemente, ainda que o país. Veja o esquema padronizado nas Tabelas 3A, 3B e 4.
não de forma alarmante até momento. O risco potencial de surgimento
e transmissão de cepas resistentes à rifampicina deve ser contido
Tab. 3A Esquemas terapêuticos utilizados para Paucibacilar (PB): 6
assegurando a maior regularidade do tratamento e a rigorosa adesão cartelas.
aos esquemas da PQT. Além disso, é importante estabelecer uma rede de
Rifampicina (RFM): dose mensal de
vigilância mundial para monitorar a resistência a drogas na hanseníase,
600 mg (2 cápsulas de 300 mg) com
e promover pesquisas sobre esquemas de tratamento mais eficazes e
administração supervisionada.
breves contra a doença. Procedimentos claros são fornecidos para tratar
Adulto
pacientes que utilizaram a PQT de forma irregular. Dapsona (DDS): dose mensal de
100 mg supervisionada e dose
Para o Ministério da Saúde, o êxito do tratamento está diretamente diária de 100 mg autoadministrada.
ligado à compreensão e à assimilação do paciente sobre a sua
Rifampicina (RFM): dose mensal de
importância, tarefa que muitas vezes só é conseguida após exaustiva
450 mg (1 cápsula de 150 mg e 1
orientação quanto à tomada correta do medicamento, além é claro do
cápsula de 300 mg) com
acolhimento durante as consultas, principalmente no primeiro
administração supervisionada.
atendimento. Criança
Dapsona (DDS): dose mensal de 50
A definição do esquema antimicrobiano para hanseníase depende da mg supervisionada e dose diária de
classificação operacional do caso, baseada no número de lesões cutâneas 50 mg autoadministrada.
(Tabela 2): Duração: seis doses.
Seguimento dos casos: comparecimento mensal para dose
supervisionada.
Critério de alta: o tratamento estará concluído com seis (6) doses
supervisionadas em até nove meses;
na 6ª dose, os pacientes deverão ser submetidos ao exame
dermatológico, à avaliação neurológica simplificada e do grau de
incapacidade física, antes de receber alta por cura.

Tab. 3B Esquemas terapêuticos utilizados para Multibacilar (MB): 12


cartelas.

Rifampicina (RFM): dose mensal de


600 mg (2 cápsulas de 300 mg) com
administração supervisionada.

Dapsona (DDS): dose mensal de


100 mg supervisionada e uma dose
Adulto diária de 100 mg autoadministrada.

Clofazimina (CFZ): dose mensal de


300 mg (3 cápsulas de 100 mg) com
● Paucibacilares (PB) – casos com até cinco lesões de pele;
administração supervisionada e
● Multibacilares (MB) – casos com mais de cinco lesões de pele (seis ou uma dose diária de 50 mg
mais). autoadministrada.

Rifampicina (RFM): dose mensal de


A baciloscopia positiva classifica o caso como multibacilar,
450 mg (1 cápsula de 150 mg e 1
independentemente do número de lesões.
cápsula de 300 mg) com
administração supervisionada.
As drogas são administradas por via oral. A PQT é distribuída em
blisteres convenientes com tratamento para quatro semanas (nessas Dapsona (DDS): dose mensal de 50
Diretrizes, refere-se ao período de quatro semanas como sendo um mg supervisionada e uma dose
“mês”). Existem blisteres para crianças, com as mesmas drogas em Criança diária de 50 mg autoadministrada.
dosagens menores.
Clofazimina (CFZ): dose mensal de
150 mg (3 cápsulas de 50 mg) com
administração supervisionada e
uma dose diária de 50 mg
autoadministrada em dias
alternados.
Duração: 12 doses.
Seguimento dos casos: comparecimento mensal para dose A dosagem adequada para crianças ou adultos com peso inferior
supervisionada. a 30 kg, deve ser ajustada com base no peso corporal
Critério de alta: o tratamento estará concluído com doze (12) doses
supervisionadas em até 18 meses. (Rifampicina: 10-20 mg/kg; Clofazimina: 1 mg/kg diariamente e 5
Na 12ª dose, os pacientes deverão ser submetidos ao exame mg/kg mensalmente; Dapsona: 1,5 mg/kg diariamente e
dermatológico, à avaliação neurológica simplificada e do grau de
incapacidade física, antes de receberem alta por cura. mensalmente).
Os pacientes MB que, excepcionalmente, não mostrarem melhora
clínica, apresentando lesões ativas da doença ao final do tratamento
preconizado de 12 doses (cartelas), deverão ser encaminhados para
avaliação em serviço de referência (municipal, regional, estadual ou Obs.: existem tratamentos substitutivos, disponíveis nos centros de
nacional), para se verificar a conduta mais adequada para o caso.
referência, para pacientes com impossibilidade de usar os esquemas
padronizados.

SITUAÇÕES ESPECIAIS

■ HANSENÍASE E INFECÇÃO POR HIV/AIDS

Deve ser mantido o esquema de PQT, de acordo com a classificação


operacional. A hanseníase não se modifica basicamente pela coinfecção
com o vírus HIV; entretanto existe a possibilidade de maior gravidade
nas reações hansênicas.

■ HANSENÍASE E TUBERCULOSE

Deve ser mantido o esquema terapêutico apropriado para a tuberculose


(lembrando que, nesse caso, a dose de rifampicina, de 600 mg, será
administrada diariamente), acrescido dos medicamentos específicos
para a hanseníase, nas doses e tempos previstos no esquema padrão de
PQT:

● Para os casos PB, acrescenta-se a dapsona;

● Para os casos MB, acrescenta-se a dapsona e a clofazimina até o


término do tratamento da tuberculose, quando deverá ser acrescida a
rifampicina do esquema padrão da hanseníase;

● Para os casos que não utilizam a rifampicina no tratamento da


tuberculose, por con-traindicação dessa droga, utiliza-se o esquema
substitutivo próprio para esses casos, no tratamento da hanseníase;

● Para os casos que não utilizam a rifampicina no tratamento da


tuberculose por resistência do Mycobacterium tuberculosis a essa
droga, utiliza-se o esquema padrão de PQT da hanseníase.

■ HANSENÍASE E GRAVIDEZ

As alterações hormonais da gravidez causam diminuição da imunidade


celular, fundamental na defesa contra o Mycobacterium leprae.
Portanto, é comum que os primeiros sinais de hanseníase, em uma
pessoa já infectada, apareçam durante a gravidez e puerpério, quando
também podem ocorrer os estados reacionais e os episódios de recidivas.

A gestação nas mulheres portadoras de hanseníase tende a apresentar


poucas complicações, exceto pela anemia, comum em doenças crônicas.
A gravidez e o aleitamento materno não contraindicam a administração A clofazimina é geralmente bem tolerada e praticamente não tóxica nas
dos esquemas de tratamento poliquimioterápicos da hanseníase que são dosagens utilizadas. A sua eficácia é maior quando administrada
seguros tanto para a mãe como para a criança. Contudo, mulheres com diariamente.
diagnóstico de hanseníase e não grávidas devem receber
aconselhamento para planejar a gestação após a finalização do Atenção: quando houver dor abdominal e/ou diarreia crônica
tratamento de hanseníase. Algumas drogas são excretadas pelo leite, intermitente, deve-se evitar o uso da clofazimina.
mas não causam efeitos adversos. Os recém-nascidos, porém, podem
apresentar a pele hiperpigmentada pela clofazimina, ocorrendo a
Efeitos colaterais:
regressão gradual da pigmentação, após a parada da PQT. Em mulheres
na idade reprodutiva, deve-se atentar ao fato de que a rifampicina pode
1. Coloração escura, avermelhada da pele, das palmas das mãos, das
interagir com anticoncepcionais orais, diminuindo sua ação.
plantas dos pés, da esclerótica e das urinas (o sol agrava estes
efeitos). Coloração escura das lesões da pele. Não é um problema
EFEITOS ADVERSOS DOS MEDICAMENTOS sério. Após terminar o tratamento, a cor regressa lentamente ao
normal (em alguns meses);
■ DAPSONA (DDS) 2. Secura da pele especialmente na face anterior das coxas. Neste caso
devemos untar com óleo a pele seca e continuar com a clofazimina.
Nas dosagens utilizadas, o medicamento é muito seguro e os efeitos
adversos são raros. ■ RIFAMPICINA
Atenção: os doentes com anterior alergia às sulfonas não devem receber Não estão assinalados efeitos adversos importantes na administração
dapsona. Para doentes com anemia grave, o nível de hemoglobina deve mensal, com exclusão da síndrome semigripe. Atenção: os doentes com
ser elevado, mediante tratamento apropriado, antes de se iniciar a insuficiência hepática ou renal grave não devem tomar rifampicina. A
terapêutica com dapsona. Efeitos colaterais e medidas a serem tomadas: rifampicina funciona melhor quando é tomada com estômago vazio (se
possível, não comer durante as seis horas antes da tomada da
1. Perturbações no estômago - tomar a DDS após as refeições; rifampicina e durante a meia hora depois de ter tomado).
2. Insônia - tomar a DDS de manhã;
Efeitos colaterais:
3. Reações da pele (Stevens-Johnson) - parar com a DDS;

4. Urticária - se a alergia for grave, enviar o doente ao hospital e tratar 1. Urina avermelhada (no dia da tomada supervisionada, durante
com prednisolona; algumas horas); lágrimas e outras secreções avermelhadas.
5. Erupção fixa - se a alergia for leve, tratar com anti-histamínicos; Não é efeito negativo e é devido à eliminação do medicamento
após uma semana, pode-se reiniciar a DDS com doses baixas: 1/8 de através da urina. Explicar previamente ao doente e continuar com o
comprimido (= 12,5 mg), observar o doente por um dia; tratamento.
6. Dermatite (raramente esfoliativa) - parar com a DDS por uma 2. Prurido e pele avermelhada, particularmente na face e couro
semana e reiniciar com 50 mg (= ½ comprimido), controlando o cabeludo, com lacrimejamento e eritema dos olhos. É um efeito
doente semanalmente; transitório e leve: não interromper o tratamento.
7. Metaemoglobinemia (o doente aparece com a pele ligeiramente 3. Perturbações no estômago (dor, náusea, às vezes vômito, raramente
azulada) - parar com a DDS por uma semana e reiniciar com 50 mg diarreia; anorexia).
(= ½ comprimido), controlando o doente semanalmente;
Se o incômodo for grave, referir o doente ao hospital para consulta
8. Anemia - pode ter outras causas, que devem ser procuradas médica.
(parasitoses intestinais, dieta inadequada, malária). Se for grave,
suspender a DDS, administrar sulfato ferroso e controlar a
Hemoglobina (Hb); TRATAMENTO DAS FORMAS REACIONAIS
Quando houver melhoria (Hb > 10), reiniciar DDS controlando
semanalmente a Hb. O diagnóstico correto e o tratamento adequado e precoce das reações
são de grande valor para a prevenção de incapacidades, principalmente
9. Agranulocitose (poucas células brancas). Frequentemente associada para evitar o dano neural. A busca de fatores desencadeantes deve ser
com úlceras da garganta e febre alta - suspender DDS e enviar o rotineira, especialmente para infecções intercorrentes. Deve-se manter a
doente ao hospital. A DDS não pode ser utilizada mais (o supervisor poliquimioterapia, se o doente ainda estiver em tratamento específico;
provavelmente pode avaliar a possibilidade de utilizar clofazimina); imobilizar o membro afetado com tala gessada, em caso de neurite
10. Hepatite (escleróticas e pele amarelas) - suspender a DDS (e a associada; monitorizar a função neural sensitiva e motora e programar e
rifampicina) e enviar ao hospital. realizar ações de prevenção de incapacidades. Neurites refratárias aos
corticoides poderão necessitar de tratamento cirúrgico.


CLOFAZIMINA (LAMPRENE®)
Para a reação do tipo 1 ou reversa, recomenda-se iniciar prednisona na
dose de 1-1,5 mg/kg/dia (excepcionalmente de 1,5-2 mg/kg/dia),
conforme avaliação clínica, reduzindo a dose, conforme resposta
terapêutica.

Para a reação do tipo 2 ou eritema nodoso hansênico, a talidomida é a


droga de escolha na dose de 100 a 400 mg/dia, conforme a intensidade
do quadro. A corticoterapia pode ser indicada em determinadas
situações:

● Contraindicações à talidomida;

● Mulheres grávidas ou sob risco de engravidar;

● Presença de lesões oculares reacionais, com manifestações de


hiperemia conjuntival com ou sem dor, embaçamento visual,
acompanhadas ou não de manifestações cutâneas;

● Edema inflamatório de mãos e pés (mãos e pés reacionais);

● Glomerulonefrite; orquiepididimite; artrite; vasculites; eritema RECIDIVA


nodoso necrosante;

● Reações de tipo eritema polimorfo-símile e síndrome de Sweet-símile. No momento da alta, mesmo com tudo tendo sido feito
adequadamente, as lesões cutâneas nem sempre já terão desaparecido
Nos casos de reação crônica ou subintrante reação intermitente (surtos por completo. Ainda, a alteração da função neural pode persistir,
muito frequentes), que normalmente recrudescem tão logo a dose seja indefinidamente, se o dano neural ocorrer em mais de 1/3 do nervo. A
reduzida ou retirada, recomenda-se avaliar a coexistência de fatores baciloscopia pode necessitar de um tempo maior para negativar, uma
desencadeantes (parasitose intestinal, infecções concomitantes, cárie vez que o índice baciloscópico diminui em média 0,6 a 1,0 log/ano. E as
dentária, estresse emocional). Além disso, após excluir atividade de reações hansênicas podem ocorrer em até 30% dos casos! Ou seja, ao
doença (recidiva), utilizar a clofazimina, associada ao corticosteroide ou final do tratamento o paciente deve continuar sendo avaliado e é muito
talidomida (clofazimina em dose inicial de 300 mg/dia por 30 dias, 200 importante diferenciar um deficit residual ou estado reacional de um
mg/dia por mais 30 dias e 100 mg/dia por mais 30 dias). caso de recidiva (ver Tabela 5). No caso de estados reacionais, por
exemplo, a pessoa deverá receber tratamento específico, sem reiniciar,
Outra opção na reação tipo 2 é a pentoxifilina, após alimentação, na porém, o tratamento PQT/OMS. No caso de suspeita de recidiva, o
dose de 1.200 mg/dia, dividida em doses de 400 mg de 8 em 8 horas, paciente deverá ser encaminhado para um centro de referência para
associada ou não ao corticoide. Ela pode ser uma opção para os casos confirmação e reinício do tratamento.
em que a talidomida for contraindicada, como mulheres grávidas e sob
risco de engravidar; pode beneficiar os quadros com predomínio de
vasculites. Deve-se reduzir a dose conforme resposta terapêutica, após
pelo menos 30 dias, observando a regressão dos sinais e sintomas gerais
e dermatoneurológicos.

A ocorrência de reações hansênicas não contraindica o início


da PQT, não implica sua interrupção e não é indicação de
reinício de PQT se o paciente já houver concluído seu
tratamento.

Por definição, a recidiva é a situação em que o paciente completa o


tratamento (poliquimioterapia) com sucesso e, depois, desenvolve novos
sinais e sintomas da doença. Não se pode falar de recidiva para os
doentes que anteriormente tenham sido tratados somente com
monoterapia ou para aqueles que não tenham completado o tratamento
(abandonos) e que voltem com novos sinais de atividade da doença. Trata-
se de um evento raro naqueles tratados regularmente, com os esquemas
poliquimioterápicos preconizados e, geralmente, ocorre cinco anos após
a alta. Entre as causas relacionadas à recidiva, temos: tratamentos
irregulares (principal!); persistência bacilar (bacilos latentes não são
afetados pelos medicamentos); resistência bacilar e reinfecção.
De acordo com o MS, os critérios clínicos para o diagnóstico de Grau 0 significa que nenhuma incapacidade foi encontrada.
recidiva, segundo a classificação operacional, são:
Grau 1 significa que se observou perda de sensibilidade nas mãos ou nos
pés (aos olhos não é dado grau 1). Perda de sensibilidade nas mãos ou
Critérios Clínicos para a Suspeição de Recidiva nos pés significa que um dos principais troncos nervosos periféricos foi
lesado pela hanseníase. Isso é mais comum nos estágios mais avançados
Paucibacilares (PB) – paciente que, após alta por cura, da doença do que durante o diagnóstico. Isso não deve ser confundido
apresentar dor no trajeto de nervos, novas áreas com com a perda de sensibilidade em uma lesão cutânea, que é causada por
alterações de sensibilidade, lesões novas e/ou exacerbação dano local nos pequenos nervos da pele e não nos principais troncos de
de lesões anteriores, que não respondem ao tratamento com nervos periféricos. As pessoas com anestesia (grau 1 de incapacidade) na
corticosteroide, por pelo menos 90 dias. planta dos pés, mas sem nenhuma outra anormalidade, correm risco
significativo de desenvolver úlceras plantares. Pessoas com grau 1 de
Multibacilares (MB) – paciente que, após alta por cura, incapacidade que utilizem rotineiramente os calçados apropriados estão
apresentar: lesões cutâneas e/ou exacerbação de lesões protegidas de úlceras e têm bem menos problemas de longa duração nos
antigas; novas alterações neurológicas, que não respondem pés. Portanto, a mensuração e o registro do grau 1 de incapacidade é um
ao tratamento com talidomida e/ou corticosteroide nas doses passo essencial para prevenir danos aos pés das pessoas afetadas por
e prazos recomendados; baciloscopia positiva; ou quadro hanseníase. É, portanto, um componente chave dos serviços de
clínico compatível com pacientes virgens de tratamento. hanseníase de boa qualidade.

Grau 2 indica a presença de uma lesão ou incapacidade visível.


TRATAMENTO CIRÚRGICO DAS NEURITES
Com relação aos olhos, isso inclui a incapacidade de fechar os olhos
A dor neuropática (neuralgia) pode ocorrer durante o processo completamente ou hiperemia evidente do olho (na hanseníase, isso é
inflamatório, associada ou não à compressão neural, ou por sequela da geralmente causado ou por uma úlcera de córnea ou por uveíte). Uma
neurite. Pacientes com dores persistentes, com quadro sensitivo e motor diminuição da acuidade visual ou cegueira também determina o grau 2
normal ou sem piora, devem ser encaminhados aos centros de referência de incapacidade.
para o tratamento adequado. Poderão ser utilizados antidepressivos
tricíclicos (amitriptilina, nortriptilina), fenotiazínicos (clorpromazina,
Para as mãos e pés, os danos visíveis incluem feridas e úlceras, bem
levomepromazina) ou anticonvulsivantes (carbamazepina,
como deformidades resultantes de fraqueza muscular, como o pé caído
oxicarbamazepina, gabapentina, topiramato). Para pacientes com
ou a mão em garra. Perda de tecido, com perda parcial ou reabsorção
quadro neurológico de difícil controle, as unidades de referência
dos dedos ou dos artelhos, é um sinal tardio da hanseníase, mas também
poderão também adotar protocolo clínico de pulsoterapia com
determina grau 2 de incapacidade para aquela mão ou pé específico.
metilprednisolona endovenosa, na dose de 1 g por dia, até melhora
acentuada dos sinais e sintomas. A terapia cirúrgica é uma modalidade
As principais formas de prevenir a instalação de incapacidades físicas
terapêutica de exceção, tendo como indicações os quadros refratários à
são o diagnóstico e tratamento precoces. A prevenção de deficiências
abordagem clínica:
(temporárias) e incapacidades (permanentes) não deve ser dissociada do
tratamento PQT/OMS, necessitando ser desenvolvida durante o
● Abscesso de nervo;
acompanhamento do caso e estar integrada às ações na rotina dos
● Neurite que não responde ao tratamento clínico padronizado, em serviços. A prevenção das incapacidades físicas é realizada por meio de
quatro semanas; técnicas simples e orientação do paciente para a prática regular de
autocuidados. O Sistema Único de Saúde deverá dispensar para os
● Neurites subintrantes;
pacientes os seguintes insumos: colírio para reposição de lágrima, soro
● Neurite do nervo tibial após avaliação, por ser, geralmente, silenciosa fisiológico para ressecamento do nariz, óleo com ácidos graxos
e, nem sempre, responder bem ao corticoide. A cirurgia pode auxiliar essenciais e creme com ureia a 10% para lubrificar e hidratar a pele.
na prevenção da ocorrência de úlceras plantares.

PREVENÇÃO DE INCAPACIDADES Critérios de Avaliação do Grau de Incapacidade e da


Função Neural
Incapacidade é um termo amplo que inclui qualquer impedimento,
limitação de atividade ou restrição de participação que afete uma Grau Características
pessoa. Graduação da incapacidade na hanseníase, deve-se determinar o
“grau de incapacidade” para cada caso novo de hanseníase. O grau, que 0 Nenhum problema com os olhos, mãos e pés
descreve a situação do paciente no momento do diagnóstico, varia em devido à hanseníase.
uma escala de 0 a 2. Determina-se o grau de incapacidade para cada
olho, cada mão e cada pé. Assim sendo, o paciente tem, na verdade, seis 1 Diminuição ou perda da sensibilidade nos
“graus de incapacidade”. Utiliza-se o maior grau atribuído como o olhos, diminuição ou perda da sensibilidade
Grau de Incapacidade do paciente. nas mãos e/ou pés.
● Notificação: a hanseníase é uma doença de notificação compulsória
2 Olhos: logoftalmo e/ou ectrópico; triquíase; em todo território nacional e de investigação obrigatória.
opacidade corneana central; acuidade visual
menor que 0,1 ou não conta dedos a 6 cm de
● Descoberta de casos e tratamento específico: por meio da detecção

distância. ativa e passiva (demanda espontânea e encaminhamento). A


detecção ativa de casos de hanseníase prevê a busca sistemática de
Mãos: lesões tróficas e/ou lesões
doentes, pela equipe da unidade de saúde, por meio das seguintes
traumáticas; garras; reabsorção; mão caída.
atividades: investigação epidemiológica de contatos; exame de
Pés: lesões tróficas e/ou traumáticas; garras; coletividade, com inquéritos e campanhas; exame das pessoas que
reabsorção; pé caído; contratura do demandam espontaneamente os serviços gerais de unidade de saúde,
tornozelo. por outros motivos que não sinais e sintomas dermatológicos ou
neurológicos; exame de grupos específicos, em prisões, quartéis,
escolas, de pessoas que se submetem a exames periódicos, entre
outros; mobilização da comunidade adstrita à unidade,
VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA
principalmente em áreas de alta magnitude da doença, para que as
pessoas demandem os serviços de saúde sempre que apresentarem
As principais medidas de vigilância compreendem: sinais e sintomas suspeitos. O tratamento da hanseníase é
eminentemente ambulatorial e os medicamentos devem estar
disponíveis em todas as unidades de saúde de municípios endêmicos.

● Vigilância de casos em menores de 15 anos: diante de um caso


suspeito de hanseníase em menores de 15 anos, deve ser preenchido o
“Protocolo Complementar de Investigação Diagnóstica de Casos de
Hanseníase em Menores de 15 Anos” (PCID – < 15) e, se confirmado
o caso, remeter esse protocolo à SMS, com a ficha de notificação do
Sinan, anexando cópia no prontuário do paciente.

● Vigilância de recidivas: as unidades de saúde dos municípios, diante


de um caso suspeito de recidiva, devem preencher a “Ficha de
intercorrências pés-alta por cura” e, encaminhar o caso para a
unidade de referência mais próxima. Uma vez confirmado o caso,
remeter a ficha para a secretaria municipal de saúde, juntamente com
a ficha de notificação do Sinan, anexando cópia no prontuário do
paciente.

● Atenção às áreas de ex-colônias de hanseníase: apesar do isolamento


compulsório ter sido abolido em 1962 no Brasil, muitas pessoas
permaneceram residindo em ex-colônias ou em seus arredores.
Outras foram internadas por razões sociais até o início dos anos
1980, em alguns estados. Recomenda-se, portanto, que essas
populações sejam alvo de ações de vigilância e controle de
hanseníase.

● Prevenção e tratamento de incapacidades físicas: todos os casos de


hanseníase, independentemente da forma clínica, deverão ser
avaliados quanto ao grau de incapacidade no momento do
diagnóstico e, no mínimo, uma vez por ano, inclusive na alta por
cura. Toda atenção deve ser dada ao diagnóstico precoce do
comprometimento neural.

● Investigação de contatos: sabe-se que a suscetibilidade ao bacilo tem


influência genética. Assim, familiares de pessoas com hanseníase
possuem chances maiores de adoecer. Desta forma, essa investigação
tem por finalidade a descoberta de casos novos pelo exame
dermatoneurológico entre aqueles que convivem ou conviveram, de
forma prolongada, com o caso novo de hanseníase diagnosticado,
devendo ser realizada:

● Anamnese dirigida aos sinais e sintomas da hanseníase;

● Exame dermatoneurológico de todos os contatos dos casos novos,


independentemente da classificação operacional;

● Vacinação BCG para os contatos sem presença de sinais e


sintomas de hanseníase no momento da avaliação, não
importando se são contatos de casos PB ou MB.
Por meio da Portaria SCTIE/MS nº 32, de 30/06/2015, a
rifampicina dose única foi incorporada no SUS para a
Para fins operacionais, define-se como: quimioprofilaxia de contatos de doentes de hanseníase para
realização do estudo PEP-Hans (profilaxia pós-exposição). O
● Contato domiciliar: toda e qualquer pessoa que resida ou tenha protocolo de tratamento consistiu em rifampicina 600 mg (dois
residido, conviva ou tenha convivido com o doente de hanseníase, no comprimidos de 300 mg) em dose única, administrado no segundo
âmbito domiciliar, nos últimos cinco (5) anos anteriores ao mês de tratamento do caso índice (aproximadamente quatro
diagnóstico da doença, podendo ser familiar ou não. Atenção semanas do início do tratamento do caso índice); em crianças
especial deve ser dada aos familiares do caso notificado, por acima de cinco anos de idade, a administração seria de 450 mg
apresentarem maior risco de adoecimento, mesmo não residindo no rifampicina e, em crianças ou adultos com peso inferior a 30 kg, a
domicílio do caso. Devem ser incluídas, também, as pessoas que recomendação foi administrar rifampicina 10 a 20 mg/kg. No
mantenham convívio mais próximo, mesmo sem vínculo familiar, entanto, após a conclusão do estudo, ficou decidido pela
sobretudo, aqueles que frequentem o domicílio do doente ou tenham desincorporação da estratégia no SUS, havendo consenso de que
seus domicílios frequentados por ele. deveria haver novos trabalhos que garantissem a sua aplicação.
● Contato social: toda e qualquer pessoa que conviva ou tenha Além disso, estudos conduzidos pela OMS demonstraram que o

convivido em relações sociais (familiares ou não), de forma próxima efeito protetor da rifampicina em dose única ocorreu somente nos

e prolongada com o caso notificado. Os contatos sociais que incluem dois primeiros anos, sem efeitos adicionais após quatro e seis

vizinhos, colegas de trabalho e de escola, entre outros, devem ser anos.

investigados de acordo com o grau e tipo de convivência, ou seja,


aqueles que tiveram contato muito próximo e prolongado com o ● Indicadores: usados para ajudar a descrever a situação
paciente não tratado. A aplicação da vacina BCG depende da epidemiológica e para acompanhar mudanças ou tendências em um
história vacinal e segue as recomendações do quadro a seguir: período de tempo.

Quadro: Recomendações para aplicação de BCG-ID nos contatos


intradomiciliares de hanseníase.

Avaliação da Cicatriz
Conduta
Vacinal

Sem cicatriz Prescrever uma dose

Com uma cicatriz de BCG Prescrever uma dose

Com duas cicatrizes de Não prescrever nenhuma


BCG dose

Nos menores de 1 (um) ano de idade, a conduta é:

● Não vacinados: administrar 1 (uma) dose de BCG;

● Comprovadamente vacinados que apresentem cicatriz vacinal: não


administrar outra dose de BCG.

● Comprovadamente vacinados que não apresentem cicatriz vacinal:


administrar 1 (uma) dose de BCG 6 (seis) meses após a última dose.

Todo contato de hanseníase deve receber orientação de que a BCG não


é uma vacina específica para este agravo e, nesse grupo, é destinada,
prioritariamente, aos contatos intradomiciliares. Recomenda-se a
avaliação dermatoneurológica pelo menos uma vez ao ano, por pelo
menos cinco anos, de todos os contatos domiciliares e sociais que não
foram identificados como casos de hanseníase na avaliação inicial,
independentemente da classificação operacional do caso notificado –
Paucibacilar (PB) ou Multibacilar (MB). Após esse período, estes
contatos deverão ser esclarecidos quanto à possibilidade de surgimento,
no futuro, de sinais e sintomas sugestivos de hanseníase.

SAIBA MAIS... *A figura 9D foi gentilmente cedida por Eduardo Bornhausen.


Os fungos geralmente são dimórficos, ou seja, podem se desenvolver sob
duas formas: (1) leveduras; ou (2) micélio. Acompanhe pela FIGURA 1.
As leveduras são unicelulares e se reproduzem de forma assexuada por
brotamento. A maioria dos fungos invasivos, agentes das micoses
profundas, multiplica-se nos tecidos do hospedeiro sob a forma de
leveduras... O micélio é um conjunto de hifas, que são elementos
filamentosos multicelulares ramificados, divididos ou não por septos
parciais (hifas septadas). Embora contenham múltiplos núcleos
celulares, todas as hifas de um micélio compartilham o mesmo
citoplasma e organelas, o que permite um crescimento
extraordinariamente rápido. Esta é a forma que en-contramos os fungos
na natureza, constituindo muitas vezes estruturas macroscópicas
(bolores), como mofos, líquen e cogumelos. É também a forma dos
fungos encontrados nas micoses superficiais da pele e fâneros. O micélio
pode se reproduzir tanto de forma assexuada (mitose) como sexuada
Fig. 9D*
(meiose + fecundação), sempre formando esporos, células programadas
para resistir às condições climáticas adversas, permitindo a dispersão do
fungo pelo ambiente natural; cada esporo, em condições favoráveis, gera
um novo micélio ou se torna uma levedura. Os conídios e os
esporangioesporos são exemplos de esporos assexuados, produzidos nos
MICOSES
conidióforos e esporângios, respectivamente, regiões especializadas do
micélio. Zigósporos, ascósporos, basidiósporos e oósporos são exemplos
de esporos sexuados, provenientes da conjunção de elementos de dois
INTRODUÇÃO
micélios diferentes. O tipo de esporo sexuado é utilizado para a
classificação taxonômica dos fungos...
VIDEO_03_DER
Os fungos constituem um reino dos seres vivos (reino Fungi), tal como
as bactérias e algas azuis (reino Monera) e os protozoários e certas algas
(reino Protista). O reino Fungi é dividido em filos, baseados no tipo de
esporo sexuado: zigomicetos (zigósporos), ascomicetos (ascósporos),
basidiomicetos (basidiósporos) e citridiomicetos (oósporos), sendo este
último não encontrado nas doenças fúngicas humanas. Estes são os
“fungos perfeitos”. O quinto filo, dos deuteromicetos, é composto pelos
“fungos imperfeitos”, ou seja, sem forma de reprodução sexuada
conhecida.

Diferentemente das bactérias, os fungos são organismos eucariotas, ou


seja, possuem um núcleo verdadeiro com uma membrana nuclear, e
podem ser uni ou multicelulares. Suas paredes celulares estão
constituídas de quitina; e suas membranas celulares, de ergosterol. São
seres heterótrofos, pois alimentam-se de nutrientes captados de outros
seres vivos, como animais ou plantas; portanto, muitos deles vivem em Fig. 1: Os Fungos.
parasitismo verdadeiro... Existem aproximadamente 50.000 espécies de fungos na natureza, a
maioria benéfica para os seres humanos, contribuindo para a
degradação e reciclagem da matéria orgânica, para a produção de
alimentos e bebidas e fornecendo metabólitos para a indústria
farmacêutica, como antibióticos e agentes citotóxicos. Entretanto, os
fungos podem prejudicar a agricultura, trazendo grandes perdas para a
economia, e causar doenças nos animais e seres humanos. Existem
algumas centenas de espécies de fungos capazes de provocar
patologia humana, sendo que 90% das micoses humanas são
atribuídas a apenas algumas dúzias de fungos.

As infecções fúngicas podem ser classificadas de acordo com o nível de


invasão tecidual em:

1. Micoses superficiais;

2. Micoses cutâneas;

3. Micoses subcutâneas;

4. Micoses profundas ou sistêmicas.


Essa classificação é baseada nas diferentes capacidades que esses
agentes normalmente apresentam de parasitarem desde as camadas
mais superficiais do tegumento até os órgãos internos, aonde chegam
através das vias aéreas (por inalação) ou por implantação transcutânea.
Determinados fungos só invadem os tecidos internos dos seres humanos
quando estes apresentam graves alterações do sistema imunológico. São,
por esse motivo, chamados fungos patogênicos oportunistas, sendo os
demais conhecidos como patógenos verdadeiros ou primários.

MICOSES SUPERFICIAIS E CUTÂNEAS

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O termo micoses superficiais inclui as doenças que não provocam uma
Fig. 2: Malassezia furfur.
resposta inflamatória histopatológica significativa no hospedeiro e está
representado pelas Ceratofitoses. Nelas, os fungos se proliferam na
camada córnea da pele ou sobre a haste livre dos pelos. As micoses
cutâneas, por sua vez, podem provocar mudanças patológicas no A doença é de ocorrência universal, predominando em locais de clima
hospedeiro, sendo representadas principalmente pelas dermatofitoses quente e úmido. Acomete adultos de ambos os sexos, após a puberdade,
(ou tíneas), quando os fungos (referidos como dermatófitos) são quando as glândulas sebáceas estão mais desenvolvidas. Acredita-se
tipicamente queratinofílicos, ou seja, adaptados a consumir queratina numa predisposição constitucional do indivíduo à infecção. Quase
para sua nutrição. Eles invadem a camada córnea, os pelos e as unhas, sempre as lesões são assintomáticas, caracterizadas por manchas ou
degradando-os e liberando antígenos que desencadeiam uma resposta máculas, múltiplas, confluentes (FIGURA 3), de cor variável conforme o
imunoinflamatória superficial. As ceratofitoses e as dermatofitoses são paciente (daí o nome “versicolor”). Podem ser hipocrômicas (em
exclusivas da pele queratinizada, poupando sempre as mucosas. A pacientes de pele pigmentada), eritematosas ou hipercrômicas
candidíase superficial é causada por leveduras do gênero Candida e pode acastanhadas (pacientes brancos), apresentando uma descamação fina
afetar tanto a pele quanto as mucosas. (furfurácea) ao se raspar a pele com a unha (sinal da unha ou de
Besnier) ou ao se esticar a pele (sinal de Zileri). Acomete
CERATOFITOSES caracteristicamente a face, o pescoço, o tronco superior e a porção
proximal dos membros superiores. O couro cabeludo costuma ser
afetado, embora a lesão seja geralmente imperceptível... A região pal-
PITIRÍASE VERSICOLOR moplantar e mucosa nunca são atingidas. A hipocromia da pitiríase
versicolor é explicada não só pela barreira física aos raios ultravioleta
Afecção cutânea causada pela Malassezia furfur, uma levedura do Sol, mas principalmente pela produção de ácidos dicarboxílicos
lipofílica, do filo dos basidiomicetos (embora sua taxonomia seja (ácido azelaico) pelo metabolismo do fungo, que inibe a tirosinase, que é
duvidosa...), encontrada como saprobiota da pele humana em mais de uma das enzimas responsáveis pela formação da melanina.
90% da população hígida, a qual antes recebia o nome de Pityrosporum
ovale ou orbiculare.

As leveduras são a forma predominante na vida saprobiota e


predominam nas áreas corporais ricas em glândulas sebáceas (couro
cabeludo, face, tronco superior), por necessitarem de ácidos graxos para
a sua nutrição. Quando provocam a dermatose, as leveduras são
encontradas em grande quantidade, neste caso associadas a hifas
rudimentares, ou pseudo-hifas (FIGURA 2).
Tratamento: geralmente é tópico, tratando-se o couro cabeludo (fonte
principal do fungo) e as lesões cutâneas. Uma opção utilizada é o sulfeto
de selênio a 2,5%, sob a forma de xampu, passando-se no couro
cabeludo (enxaguar após 15min) e nas lesões, durante quatro semanas.
Antifúngicos imidazólicos tópicos são excelentes opções de terapia,
como tioconazol 1% loção, ou isoconazol 1% loção, ou cetoconazol 2%
creme, aplicados nas lesões 1x/dia por quatro semanas, associado ao
tratamento com xampu de cetoconazol. Nos casos mais extensos ou
resistentes, indica-se a terapia sistêmica oral, com cetoconazol 200
mg/dia por dez dias, itraconazol 200 mg/dia por cinco dias ou
fluconazol 150 mg/semana por três semanas. É importante solicitar
provas de função hepática, antes de iniciar os imidazólicos (cetoconazol,
itraconazol, etc.), pois eles têm metabolismo hepático. Cuidado com
medicamentos que tenham metabolização hepática. Os antifúngicos
apresentam uma lista enorme de interações medicamentosas. Não
esquecer também que eles interagem com o anticoncepcional,
diminuindo a sua eficácia.

Fig. 3: Pitiríase versicolor (Malassezia furfur)*.

Diagnóstico: suspeitado clinicamente e pelo exame da luz de Wood


(fluorescência rósea-dourada característica). Confirma-se pelo exame
micológico direto, pelo raspado das lesões (elementos leveduriformes e
hifas curtas e largas, observados após preparação com KOH 10%).
É causada pelo fungo filamentoso denominado Phaeoannellomyces
werneckii (nomes alternativos: Exophiala werneckii, Cladosporium
werneckii), um fungo pigmentado (demáceo). Acomete usualmente o
extrato córneo palmar, mas pode atingir a superfície ventral dos dedos e
a região plantar. Apresenta-se de forma assintomática como mácula
acastanhada ou enegrecida (FIGURA 4), mais frequente em crianças do
sexo feminino. O diagnóstico diferencial é feito com melanoma, nevo
juncional e púrpura do atleta. O exame direto confirma o diagnóstico,
revelando hifas escuras septadas no preparado com KOH 10%. O
tratamento é feito com ceratolíticos (ácido salicílico creme 0,1%) ou
antifúngicos tópicos, devendo continuar o tratamento por mais duas
semanas após a cura clínica para evitarmos recidiva.

Fig. 4: Tínea negra (Phaeoannellomyces werneckii).

PIEDRA NEGRA

O agente etiológico é Piedraia hortae. Caracteriza-se por infecção do


pelo formando nódulos pretos aderentes à haste dos cabelos no couro
cabeludo e eventualmente na barba (FIGURA 5). Variam no tamanho
de microscópicos a milímetros. É encontrada em áreas tropicais como a
Amazônia. Tratamento: corte do cabelo associado a imidazólico tópico.

Fig. 3: Pitiríase versicolor (Malassezia furfur)*.

TÍNEA NEGRA
Fig. 5: Piedra negra (Piedraia hortae).

PIEDRA BRANCA
O agente etiológico é Trichosporum beigelii. A infecção do pelo é Pitiríase rubra pilar = de etiologia desconhecida, trata-se de uma
caracterizada por nódulos que variam do branco ao castanho claro, de doença crônica rara com hiperceratose palmoplantar e pápulas
consistência cremosa que podem ser removidas facilmente foliculares avermelhadas que se juntam para formar placas
mecanicamente. Acomete os pelos genitais, axilares, da barba e vermelho-alaranjadas e descamativas..
eventualmente do couro cabeludo. O diagnóstico diferencial é:
pediculose e tricomicose axilar. Tratamento: corte do cabelo associado a
imidazólico tópico ou sistêmico devido à alta taxa de recidiva. DERMATOFITOSES
Trichosporum beigelii também causa onicomicose (ver adiante).

São infecções causadas por fungos adaptados à invasão da camada


SAIBA MAIS... córnea da pele, pelo e unha, utilizando a queratina como meio de
subsistência, e são chamados de dermatófitos. Embora não invadam
Existem várias “pitiríases” na dermatologia e elas são bem diretamente a epiderme e a derme, seus antígenos são reconhecidos
diferentes uma das outras!!! Observem: pelas células de Langerhans e estimulam uma resposta
imunoinflamatória (hipersensibilidade) que atinge a epiderme e
Pitiríase versicolor = “pano branco”. Causada pela Malassezia eventualmente a derme superficial.
furfur. São manchas claras, acastanhadas ou avermelhadas, que
começam pequenas e podem coalescer, formando lesões maiores. São conhecidas cerca de 42 espécies de dermatófitos, abrangendo três
São recobertas por fina descamação que, muitas vezes, só é gêneros: Microsporum (16 espécies), Trichophyton (24 espécies) e
percebida quando a pele é esticada. Alguns pacientes podem Epidermophyton (2 espécies). Eles provêm do solo (geofílicos), dos
apresentar prurido, embora esta não seja a regra. animais (zoofílicos) e do homem (antropofílicos). Os fungos
antropofílicos estão mais bem adaptados à pele do ser humano, sendo
Pitiríase rósea de Gilbert = sua etiologia é controversa. os responsáveis pela maioria das infecções; as outras espécies podem
Sazonalmente, aparece mais no outono. Parece ter etiologia viral. desencadear uma reação inflamatória mais proeminente, devido a sua
Acomete mais mulheres, apresenta cura espontânea. O quadro pouca adaptação (Tabela 2).
começa com uma lesão primária – o “medalhão”, que tem forma
ovalada, com cerca de 3 cm e precede a erupção cutânea. A
erupção que compromete principalmente o tronco e a região
proximal dos membros é formada por manchas ovaladas de
coloração rosada e descamação na região interna dos bordos.
Assim como na pitiríase versicolor, a descamação pode ser vista
quando esticamos a pele. Costuma poupar face e extremidades.
Chama atenção a distribuição das lesões no tronco, que seguem a
direção das costelas (distribuição metamérica) e adquirem, junto
com a coluna vertebral, um aspecto de pinheiro. Pode haver
prurido em alguns casos. Cura-se espontaneamente, mas o
tratamento medicamentoso pode abreviar a doença e ajudar no Sua distribuição varia por influência de fatores populacionais, como
controle do prurido quando intenso. sexo (mais comum no sexo masculino); idade (tinha do couro cabeludo é
mais comum em crianças, e tinha do pé e inguinocrural são mais
comuns em adultos); imunidade (maior incidência no
Pitiríase liquenoide = também conhecida como parapsoríase em
imunocomprometido); hábitos (sociais, culturais, religiosos e
gotas. É uma vasculite de etiologia não definida. Na forma aguda
econômicos); populações fechadas (tripulações de navios e creches têm
(ou doença de Mucha-Habermann), as lesões em forma de
maior incidência de dermatofitoses).
pequenas gotas atingem o tronco (poupam a face), são
discretamente elevadas e de coloração rósea. Posteriormente,
sofrem necrose que evolui para a formação de crostas. Podem O contágio pode ser feito por contato direto com seres humanos,
cicatrizar e deixar pequenas manchas hipocrômicas como sequela. animais ou solo contaminado, ou indiretamente, por exposição a
Na forma crônica, as lesões não evoluem com necrose e formação fômites contaminados ou banhos públicos. A colonização começa na
de crostas, fazem apenas descamação. Tendem a desaparecer camada córnea da pele, no pelo ou na unha, e a sua progressão depende
com o tempo e podem recorrer. da interação dos fatores patogênicos do fungo e da imunidade do
hospedeiro (Tabela 3).

Pitiríase amiantácea ou “tinha amiantácea” = lesão eczematosa


do couro cabeludo que, na verdade, faz diagnóstico diferencial Tab. 3: Fatores determinantes da infecção fúngica.
com psoríase, dermatite seborreica e líquen plano. Pode estar
associada com condições como a dermatite atópica. Na Fatores inerentes ao Fatores inerentes ao
atopia,podemos encontrar também a Pitiríase alba, com manchas dermatófito hospedeiro
brancas e ásperas, de descamação fina, na face, braços e tronco.
1. Afinidade seletiva às 1. Integridade da epiderme.
diferentes classes de
2. Umidade local.
ceratina (pele, pelo e
unha). 3. Fatores de efeito antifún-
gico.
2. Virulência.
a. Transferrina
3. Adaptação.
insaturada ligada ao
ferro sérica.

b. Alfa-2-macroglobulina
no soro.

c. Ácidos graxos (função


antifúngica).

4. Fator genético.

5. Hábitos (higiene,
calçado, populações
fechadas).

A transmissão ocorre pelos esporos assexuados dos fungos (artrosporos,


conídios) liberados de suas hifas que, após aderirem aos queratinócitos,
começam a germinar, formando um novo micélio.

O diagnóstico pode ser feito com a raspagem das lesões e demonstrando


as hifas na preparação de KOH 10% (exame micológico direto). O Fig. 6A: Microsporum sp.
gênero é determinado pela morfologia de seus conidióforos Fig. 6B: Trichophyton sp.
(FIGURAS 1 e 6), e a espécie determinada pela cultura nos meios ágar
de Sabouraud (ágar glicose) ou ágar de Mycosel (cloranfenicol e
cicloeximida).

TINEA CAPITIS

A palavra tinea (verme) foi utilizada pela primeira vez no século V por
Felix Caesius. Foi empregada no passado para designar as lesões
fúngicas do couro cabeludo, unhas e pele provocados por dermatófitos.
Os dermatologistas do passado, ao verificarem lesões cutâneas na pele,
com contorno geográfico, irregular e circinado, pensaram ser as micoses
de origem helmíntica, como se fossem vermes adultos sobre uma
superfície lisa. Até hoje é adotado este termo “ tinea”, como exemplos:
Tinea pedis (acomete pé), Tinea capitis (acomete couro cabeludo), Tinea
cruris (região inguinal), etc.

Neste momento, tratamos da tínea do couro cabeludo, causada por


dermatófitos do gênero Microsporum ou Trichophyton. O cabelo é
Fig. 1: Os Fungos. invadido pelo fungo, quebrando-o perto da base e deixando uma área
Existem aproximadamente 50.000 espécies de fungos na natureza, a tonsurada (alopecia focal). Existem dois tipos: (1) tínea tonsurante; e (2)
maioria benéfica para os seres humanos, contribuindo para a
degradação e reciclagem da matéria orgânica, para a produção de tínea favosa ou favo. O parasitismo pode ser do tipo ectotrix
alimentos e bebidas e fornecendo metabólitos para a indústria
farmacêutica, como antibióticos e agentes citotóxicos. Entretanto, os (acometimento da cutícula capilar) ou endotrix (acometimento da haste
fungos podem prejudicar a agricultura, trazendo grandes perdas para a capilar).
economia, e causar doenças nos animais e seres humanos. Existem
algumas centenas de espécies de fungos capazes de provocar
patologia humana, sendo que 90% das micoses humanas são
atribuídas a apenas algumas dúzias de fungos. É mais comum em crianças entre 4-14 anos (a partir da puberdade, o
aumento das glândulas sebáceas, com produção de ácidos graxos
inibitórios, dificulta a proliferação do fungo e é por isso que na
adolescência há uma tendência de involução espontânea da Tinea
capitis).

TINEA CAPITIS TONSURANTE


Agentes etiológicos principais:

Microsporum canis (mais comum);

Trichophyton tonsurans.

Outros:

Trichophyton rubrum;

Microsporum audouinii.

O contágio inter-humano se dá por contato direto ou através de


máquinas de cortar cabelo, pentes ou escovas. O período de incubação é
entre 10-14 dias.

Clinicamente, surge alopecia focal, descamativa, associada ou não a


eritema. Os cabelos são fraturados próximos à pele, deixando pequenos
cotos nas áreas de tonsura. A tínea microspórica produz uma área única
e grande, enquanto a tínea tricofítica se apresenta com várias áreas
pequenas (FIGURAS 7A e 7B). O quadro é de evolução crônica. Na
tínea causada pelo M. canis há uma forma aguda com intensa reação
inflamatória, denominada quérion (Kerion Celsi), caracterizada pela
formação de placa elevada, bem delimitada, dolorosa, com eritema e
formação de pústulas e microabscessos que drenam pus à expressão
manual (FIGURA 7C). O exame da luz de Wood pode ajudar no
diagnóstico da tínea microspórica, ao revelar fluorescência esverdeada.
A confirmação necessita do exame micológico direto.

Fig. 7: Tinea capitis tonsurante.*


7A: Tínea tonsurante microspórica.
7B: Tínea tonsurante tricofítica.
7C: Quérion.

Tratamento: exige terapia sistêmica via oral. As drogas mais utilizadas


são: griseofulvina 10-15 mg/kg/dia por 8-12 semanas e terbinafina por 4-
8 semanas (< 20 kg: 62,5 mg/dia; 20-40 kg: 125 mg/dia; > 40 kg: 250
mg/dia). No quérion, além da terapia antifúngica, devem-se fazer
compressas de permanganato de potássio 1:40.000 e drenagem nos
casos mais graves.

TINEA CAPITIS FAVOSA (FAVO)


Agentes etiológicos:

Trichophyton schoenleinii (principal);

Microsporum gypseum (raro).

O T. schoenleinii é um dermatófito antropofílico. Ocorre em nosso meio


geralmente sob a forma de microendemias na zona rural ou em
pequenas comunidades do interior. Tem caráter crônico e se apresenta
como pequenas lesões crostosas crateriformes em torno do óstio
folicular, que recebem a denominação de escútula fávica (FIGURA 8) ou
“godet” (patognomônicas da tínea favosa!), acompanhada de
descamação e supuração. Ocorre atrofia com alopecia definitiva devido
ao acometimento do bulbo capilar pelo dermatófito.

Fig. 9: Tinea barbae.

TINEA CORPORIS
Fig. 8: Tinea capitis favosa.

Agentes etiológicos principais:

Trichophyton rubrum;
No exame da luz de Wood, observa-se fluorescência verde-palha. O Microsporum canis.
exame micológico confirma o diagnóstico. O tratamento é idêntico ao
da tínea tonsurante.
Outros:

Trichophyton mentagrophytes;
TINEA BARBAE
Trichophyton verrucosum;

Agentes etiológicos principais: Epidermophyton floccosum.

Trichophyton rubrum;
É a tínea da pele glabra (pele sem cabelo), conhecida como “impingem”.
Trichophyton mentagrophytes; Os três gêneros de dermatófitos podem causar a Tinea corporis! A
Microsporum gypseum. transmissão é inter-humana (contato direto, fômites, banhos públicos)
ou pelo contato com cães e gatos. Podem acometer qualquer tronco,
membros e face (tínea da face). Temos três formas clínicas: vesiculosa,
Existem três tipos clínicos:
anular e em placas. Tem caráter pruriginoso. Em sua forma mais
comum (FIGURA 10) trata-se de lesão eritematosa ou
1. Tipo inflamatório: idêntico ao quérion do couro cabeludo;
eritematopapular, de formato anular, descamativa, com bordos elevados
2. Tipo herpes circinado (FIGURA 9): lesões anulares circinadas eritematodescamativos ou vesiculosos, únicas ou múltiplas, e de
eritematopapuloescamosas, com vesículas nas bordas; tamanhos variáveis. As lesões podem coalescer dando o aspecto
circinado. O diagnóstico é confirmado pelo exame micológico direto.
3. Tipo sicose da barba: idêntico à foliculite bacteriana estafilocócica.
TINEA CRURIS (COCEIRA DE DHOBI)

Agentes etiológicos principais:

Trichophyton rubrum;

Epidermophyton floccosum.

Outros:

Trichophyton mentagrophytes.

É a tínea da região perineal ou inguinocrural, acometendo a partir da


dobra, o períneo, a coxa proximal e o abdome. O acometimento
geralmente é bilateral e a doença é extremamente pruriginosa. É mais
comum nos homens adultos, nos obesos e diabéticos. As lesões são
eritematoescamosas, por vezes com vesículas (FIGURA 11). Ao
contrário da candidíase inguinal, poupa a bolsa escrotal e não apresenta
lesões satélites. O diagnóstico e tratamento são semelhantes ao descrito
na Tinea corporis.

Fig. 11: Tinea cruris.*

TINEA PEDIS (INTERTRIGO) E TINEA


MANUUM

Agentes etiológicos principais:

Trichophyton rubrum;

Fig. 10: Tinea corporis. Epidermophyton floccosum;

Outros: Trichophyton mentagrophytes.

Tratamento: nas lesões localizadas, indica-se a terapia com antifúngicos


tópicos (creme a 1%) durante 2-4 semanas. Como opção temos os TINEA PEDIS
imidazólicos (tioconazol, miconazol, isoconazol, econazol ou bifonazol),
os tiocarbamatos sulfurados (tolciclato, tolnaftato), ciclopirox olamina,
terbinafina e amorolfina. Nas lesões disseminadas ou refratárias, a
terapia por quatro semanas com antifúngicos sistêmicos por via oral é a
melhor escolha. As opções são: cetoconazol 200 mg/dia, terbinafina 250
mg/dia, itraconazol 100 mg/dia, fluconazol 150 mg/semana.
A Tinea pedis (“pé de atleta”, “frieira”) é bastante comum, enquanto a Tratamento: antifúngicos tópicos por 2-3 semanas (os mesmos da Tinea
da mão é rara. Os agentes são os mesmos da Tinea cruris. Existem três corporis, com preferência pelos imidazólicos) em creme a 1%. Tratar
formas: (1) intertriginosa (T. rubrum: agente mais comum), com infecção bacteriana secundária se presente: compressa de permanganato
descamação, maceração e fissura dos espaços interdigitais e superfície 1:10.000 com ou sem antibiótico sistêmico (macrolídeo, tetraciclina). É
inferior dos artelhos, geralmente comprometendo os espaços entre o fundamental secar bem as regiões intertriginosas. O uso de pós-
segundo e terceiro ou entre o terceiro e quarto artelhos; algumas vezes antifúngicos e polvilho antisséptico no tênis ou sapato pode reduzir as
há infecção bacteriana secundária (presença de secreção purulenta); (2) recidivas.
vesicobolhosa (aguda), que pode estar associada à forma anterior; e a
(3) escamosa (crônica), apresentando eritematodescamação. A forma
TINEA MANUUM
mais comum é a intertriginosa (FIGURA 12).

Causada pelo T. rubrum. Bem mais rara que a Tinea pedis. Acomete
sempre uma das mãos e geralmente vem associada ao
comprometimento ungueal (tínea ungueal). Há escamação dos sulcos da
palma das mãos (FIGURA 13). O tratamento deve ser feito com
antifúngicos sistêmicos (cetoconazol, terbinafina, itraconazol,
fluconazol) por seis semanas (semelhante à tínea ungueal)...

Fig. 13: Tinea manuum.*

TINEA UNGUIUM (ONICOMICOSE)

Agentes etiológicos principais:

Trichophyton rubrum;

Epidermophyton floccosum.

Fig. 12: Tinea pedis. Outros:


12A: Forma intertriginosa.
Trichophyton mentagrophytes.
12B: Forma escamosa.

É a tínea ungueal, lesão da lâmina ungueal por dermatófitos. As unhas


se tornam grossas, opacas, de tonalidade amarelo esverdeada, frágeis,
É mais comum em homens jovens, durante o verão, e em diabéticos. É com sulcos e irregularidades (FIGURA 14A). Quando afetadas as
uma importante porta de entrada para o Streptococcus pyogenes e pode bordas, deve-se suspeitar de infecção por Candida. Sua prevalência é
ser responsável por episódios de erisipela de repetição. Diagnóstico: maior entre os idosos devido à diminuição na taxa de crescimento da
exame micológico direto e cultura. unha. Os diagnósticos diferenciais incluem psoríase e líquen plano. O
exame micológico direto é indispensável para instituir o tratamento. Um
quadro geralmente frequente nos imunodeprimidos é a onicomicose
subungueal proximal e a onicomicose branca superficial
(FIGURA 14B).
Também denominada tokelau ou chimberê. É encontrada em algumas
ilhas do pacífico e em alguns países da América Central e no Brasil
Central. São lesões escamosas que se imbricam e têm crescimento
excêntrico (FIGURA 15).

Fig. 15: Tinea imbricata.

TÍNEA INCÓGNITA

Existe uma falta de características clínicas de dermatofitose, muitas


vezes com história prévia de uso de corticoide que mascara o quadro. O
Fig. 14: Onicomicose (Tinea unguium).
diagnóstico é confirmado pelo exame micológico direto.

TÍNEA GRANULOMATOSA
Tratamento: tem de ser demorado e sempre utilizando antifúngicos
sistêmicos via oral associados à terapia tópica. Os cremes a 1% usados
Caracteriza-se por lesões eritematoescamosas, nódulos eritematosos
para tratar as demais tíneas são totalmente ineficazes, por não
com tendência à fistulização, tubérculos e até acometimento sistêmico
permitirem a penetração da lâmina ungueal... Um dos tópicos mais
com lesões ósseas, lesões tumorais e adenopatias.
efetivos tem sido a amorolfina 5% esmalte para unhas (Loceryl),
aplicado nas unhas afetadas 1x/semana até a melhora da lesão (alguns
meses). Pode ser usado sem terapia sistêmica para curar onicomicose DERMATOFÍTIDE (“IDE” DERMATOFÍTICA)
incipiente... Outros tópicos são: tioconazol 28% solução para unhas
(Tralen 28%), ciclopirox olamina 8% em esmalte (Loprox, Micolamina).
As “ides” são reações de hipersensibilidade que se manifestam em um
A terapia sistêmica é indicada quase sempre (excetuando-se os casos
local à distância da lesão original onde é demonstrado o agente
incipientes). Sua duração deve ser de seis semanas (tínea ungueal da
patogênico. Elas se devem à disseminação hematogênica de produtos
mão) e 3-4 meses (tínea ungueal do pé). Principais opções: terbinafina
antigênicos. Nas tubercúlides, por exemplo, o agente é o Mycobacterium
250 mg/dia, itraconazol 200 mg/dia. Essas drogas podem ser feitas sob a
tuberculosis... Nas dermatofítides, o agente é um dermatófito. A lesão
forma de “pulsoterapia”: terbinafina 250 mg 2x/dia durante uma
fúngica geralmente se localiza nos pés (Tinea pedis) ou no corpo (Tinea
semana e suspender três semanas, repetir este esquema por 3-4 vezes;
corporis), e as lesões da dermatofítide apresentam-se nas mãos, como
itraconazol 200 mg 2x/dia durante uma semana e suspender três
grupo de vesículas com base eritematosa, pruriginosas, na palma ou
semanas, repetir o esquema 3-4 vezes. A chance de cura da onicomicose
dorso das mãos (semelhante à desidrose), geralmente com
avançada com os antifúngicos citados é de 70-80%.
acometimento bilateral (FIGURA 16). Outros tipos de dermatofítide
são: máculas eritematosas esparsas no tronco (reação ao quérion) ou
TINEA IMBRICATA eritema nodoso nos membros inferiores. O teste intradérmico da
tricofitina costuma ser positivo. Por definição, o exame micológico não
demonstra o fungo na dermatofítide, mas o tratamento da lesão fúngica
Agentes etiológicos principais:
primária leva ao seu desaparecimento.

Trichophyton concentricum.
Etiopatogenia

1. Fatores intrínsecos:
● Extremos de idade;
● Endocrinopatias;
● Gravidez;
● Doenças imunológicas;
● Neutropenia.

2. Fatores extrínsecos:
● Uso de dentaduras;

Fig. 16: Dermatofítide. ● Antibióticos;


● Antineoplásicos;
● Corticoides;
● Procedimentos cirúrgicos;
CANDIDÍASE CUTÂNEO-MUCOSA ● Anticoncepcionais.

2. Fatores menores:
Causada pelo fungo leveduriforme do gênero Candida, do qual existem
pelo menos 13 espécies capazes de infectar o ser humano. A espécie mais ● Umidade;
incriminada na candidíase cutâneo-mucosa é a Candida albicans (70- ● Traumatismo;
80%), mas podemos também encontrar C. tropicalis, C. parapsilosis e C.
guillermondii. As espécies de Candida pertencem ao filo dos
● Sudorese.
deuteromicetos (fungos imperfeitos) e se apresentam como leveduras,
pseudo-hifas (forma filamentosa constituída de brotamentos alongados
que não se soltam) e, dependendo da espécie, hifas verdadeiras
Formas Clínicas
(FIGURA 17).
1. Candidíase oral.

2. Queilite angular.

3. Candidíase genital.

4. Candidíase intertriginosa.

5. Candidíase folicular.

6. Candidíase da região das fraldas.

7. Candidíase ungueal.

8. Candidíase mucocutânea crônica.

Fig. 17: Candida albicans. Leveduras, hifas e pseudo-hifas. CANDIDÍASE ORAL

É a forma mais comum da doença cutâneo-mucosa. O quadro é comum


no período neonatal, quando os sistemas de defesa imunológica estão
A Candida albicans é um saprobiota (comensal) que habita a superfície
pouco desenvolvidos, e pode ser contraída da mãe durante o parto
da pele, mucosa oral, intestino e mucosa vaginal. Cerca de 50% das
vaginal. Pode ser contraído em crianças pelas mãos de médicos e
pessoas hígidas albergam este fungo... Quando se torna patogênica,
enfermeiras, chupetas e mamadeiras.
geralmente age como agente oportunista, por alguma ruptura nas
barreiras defensivas locais ou pela queda da imunidade celular (ex.: aids,
Também é comum nos enfermos, imunossuprimidos (ex.: aids), uso de
uso de corticoide ou imunossupressores, doenças genéticas). A
corticoide tópico para asma, pessoas com má higiene bucal. Pode
candidíase atinge com muita frequência recém-natos, mas pode
manifestar-se por placas branco-cremosas (FIGURA 18), às ve-zes
acometer adultos, idosos e certas profissões, como lavadeiras. A
pseudomembranosas, podendo assumir aspecto eritematoso ou
umidade local é um importante fator predisponente. Nas Tabelas a
enegrecido. As lesões são facilmente removidas com auxílio de uma
seguir estão listados os fatores que predispõem à candidíase superficial
espátula.
(cutâneo-mucosa) e as principais formas de apresentação.
Fig. 18: Candidíase oral.***

QUEILITE ANGULAR

Os ângulos da boca estão feridos, com fissuras, eritema e descamação


(FIGURA 19). Classicamente descrito no desnutrido, porém o quadro é
mais visto nas sociedades ocidentais, em pacientes desdentados ou que
usam dentaduras que não estão perfeitamente adaptadas.

Fig. 19: Queilite angular por Candida.

Fig. 20: Candidíase genital.**


CANDIDÍASE GENITAL 20A: Vulvovaginite.
20B: Balanopostite.

VULVOVAGINITE

É frequente nas seguintes situações predisponentes: gravidez, uso de


anticoncepcionais, diabetes, antibioticoterapia prolongada, irritação BALANOPOSTITE
mecânica ou química da mucosa vaginal (duchas vaginais). O quadro
caracteriza-se por leucorreia e pelas placas eritematosas e/ou A candidíase balanoprepucial é frequente em idosos, obesos, diabetes,
esbranquiçadas cremosas na vulva e mucosa vaginal (FIGURA 20A). higiene inadequada, pacientes não circuncisados. Pode ocorrer por
São pruriginosas. O diagnóstico é feito pelo exame direto (KOH 10%) e transmissão de parceira com candidose vulvovaginal.
pela cultura.
Caracteriza-se por lesões eritematoerosivas na glande recobertas ou não Ocorre nas dobras axilares, inguinais, interglútea, submamárias,
por induto esbranquiçado (FIGURA 20B). No prepúcio há eritema e principalmente em obesos, diabéticos e pessoas de pobre higiene.
edema, pode ter ardor e prurido. Apresenta-se como lesões eritematosas, úmidas, exsudativas, podendo
formar erosões ou fissuras, que são envoltas por um colarete córneo, e
com frequência há lesões satélites (FIGURA 21), uma importante
característica que diferencia a candidíase intertriginosa da Tinea cruris e
da Tinea corporis.

Fig. 20: Candidíase genital.**


20A: Vulvovaginite.
20B: Balanopostite.

Fig. 21: Candidíase intertriginosa. 21A: Virilha. 21B: Interglútea. 21C:


Inframamária. 21D: Interdigital (“mão da lavadeira”).

CANDIDÍASE INTERTRIGINOSA
As lesões podem cursar com prurido e ardência. A lesão interdigital
(mão ou pé) é mais comum em indivíduos que mantêm a umidade entre
os dedos (“mão da lavadeira”).

CANDIDÍASE FOLICULAR

Ocorre na área da barba como pústulas foliculares ou erosões crostosas


que se assemelham a foliculite bacteriana ou dermatofítica. É infecção
frequente nos diabéticos e imunossuprimidos.

CANDIDÍASE DA REGIÃO DAS FRALDAS

Ocorre pela retenção de urina e fezes, que leva à umidade e maceração


do local. Apresenta a clássica satelitose da candidíase, diferenciando-a Fig. 23: Candidíase ungueal.

da dermatite de contato das fraldas e da dermatite seborreica, lesões


comuns em recém-nascidos na área das fraldas FIGURA 22.

CANDIDÍASE MUCOCUTÂNEA CRÔNICA

Infecção crônica e recorrente da pele, das unhas e da orofaringe. Foi


descrita em pacientes com vários defeitos genéticos, principalmente
atingindo a função leucocitária ou o sistema endócrino (timo e
paratireoide); acomete principal-mente crianças (em geral antes dos três
anos). Lesões ceratósicas com tendência a formação de cornos cutâneos
ou de granulomas, localizados principalmente no couro cabeludo, face e
extremidades, podem ser encontrados.

Pode ter início tardio sem história familiar e surgir como manifestação
secundária de neoplasias e timoma.

Fig. 22: Candidíase da região das fraldas.


TRATAMENTO DA CANDIDÍASE

O mais importante é o médico identificar os fatores predisponentes, e


orientar o paciente a evitá-los.

CANDIDÍASE UNGUEAL
Na maioria dos casos de candidíase, a terapia com antifúngicos tópicos
é suficiente. No caso da candidíase oral ou orofaríngea, utiliza-se
É uma infecção comum nos diabéticos, nos desnutridos, nas pessoas que nistatina suspensão oral 100.000 U/ml, 2x/dia, bochechar e engolir,
retiram a cutícula e nas pessoas que mantêm um contato contínuo com durante duas semanas. Na vulvovaginite e na balanopostite, utiliza-se
água. Há eritema e edema doloroso em torno da matriz ungueal como antifúngico tópico a nistatina creme vaginal. Como opção,
(paroníquia por Candida) FIGURA 23. podemos usar dose única de fluconazol 150-300 mg. Na candidíase
intertriginosa, candidíase das fraldas, na queilite angular, pode-se usar
antifúngicos imidazólicos (cetoconazol, isoconazol, tioconazol, etc.).
Nos casos extensos, recidivantes, refratários ou na candidíase ungueal
(paroníquia), dá-se preferência pela terapia sistêmica. O período de
tratamento varia conforme o local acometido (intertriginosa: 4 semanas;
ungueal da mão: 12 semanas; ungueal do pé: 24 semanas). O fluconazol
150 mg/semana é a droga de escolha, embora haja a opção do
itraconazol 100-200 mg/dia ou em “pulsoterapia”.

MICOSES SUBCUTÂNEAS

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Decorrem da inoculação de determinados fungos patogênicos que
normalmente são encontrados no solo e plantas. Estes agentes entram
pela via transepidérmica e são depositados na pele ou no tecido
subcutâneo. Com o tempo surge uma lesão papulosa/nodulosa que pode
absceder e ulcerar. A infecção pode progredir por contiguidade ou
através do sistema de drenagem linfática regional.

As principais micoses subcutâneas são:

1. Esporotricose;

2. Cromomicose;

3. Feoifomicoses;

4. Lobomicose; Fig. 24

5. Micetoma.

ESPOROTRICOSE
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA
As apresentações clínicas podem ser classificadas, segundo a forma de
penetração do fungo no organismo, em dois grandes grupos que se
Infecção causada pelo Sporothrix schenckii. É adquirida pela inoculação
subdividem (Tabela 4).
traumática desse agente que, normalmente, gera quadro localizado na
pele e tecido celular subcutâneo, mas que, ocasionalmente, pode invadir
o trato respiratório após aspiração do fungo, provocando quadro Tab. 4
sistêmico.
1. Esporotricose cutânea Cutâneo-linfática.
(ou subcutânea). Cutâneo-localizada (ou fixa).
Trata-se de um saprobo na natureza e pode ser encontrado no solo e em
diversos vegetais. Possui distribuição universal com exceção de áreas Cutâneo-disseminada.
localizadas ao norte e ao sul das latitudes 50, acima e abaixo do
equador, respectivamente. Pode afetar, além do homem, outros animais 2. Esporotricose Pulmonar.
como gatos, cachorros, ratos, cavalos e papagaios. No passado, tratava- extracutânea (ou Osteoarticular, etc.
se de uma afecção predominantemente de caráter profissional, sistêmica).
acometendo principalmente fazendeiros, jardineiros, feirantes e outros
profissionais que lidam com o solo e produtos de origem vegetal.
Atualmente, em virtude de um provável desequilíbrio ecológico ainda
não totalmente esclarecido, o número de casos de gatos com a doença
FORMA CUTÂNEO-LINFÁTICA
(FIGURA 24) vem aumentando vertiginosamente e esta epidemia se
reflete numa maior incidência de pessoas com esporotricose, adquirida É a forma mais comum de apresentação (70-80% dos casos). Ocorre um
pela mordedura ou arranhadura desses animais. Hoje já se sabe que nódulo no local de inoculação, seguido de disseminação linfática
existem genótipos di-ferentes do Sporothrix schenckii, isto é, existem deixando um “cordão” ascendente de nódulos ao longo dos vasos
cepas mais virulentas, dependendo da região onde é encontrado. Por linfáticos regionais (FIGURA 25). Pode haver ulceração nos nódulos
exemplo, as cepas do Rio de Janeiro são mais virulentas do que as cepas com eliminação de material purulento. Ocorre mais comumente nas
do mesmo fungo no Rio Grande do Sul. áreas expostas como membros superiores e inferiores (adultos) e face
(crianças).
Em pacientes imunossuprimidos, após a inoculação transcutânea,
ocorre disseminação hematogênica, levando a lesões nodulares e
gomosas disseminadas por toda a pele. É rara. Não deve ser confundida
com os casos em que ocorrem múltiplos postos de inoculação
transepidérmica, que levam à formação de diversas lesões, mas não por
disseminação hematogênica.

FORMA EXTRACUTÂNEA

O paciente, em geral imunodeprimido, ingere ou inala o fungo e, por


disseminação hematogênica, este pode acometer diversos órgãos
Fig. 25** internos. A forma de maior importância clínica, devido a sua
prevalência, é o subtipo osteoarticular, caracterizado por uma mono ou
oligoartrite destrutiva, envolvendo as articulações dos cotovelos,
tornozelos, joelhos e punhos (estes dois últimos os mais frequentes),
além de osteolite e periostite. Outras formas de agressão a um único
órgão e/ou vários órgãos são descritas, entre eles: pulmões (lesão
FORMA CUTÂNEO-LOCALIZADA
cavitária), rins (nefrite), meningite, fígado, baço, pâncreas, glândula
mamária, tireoide, testículos, epidídimo, músculos e sistema nervoso
Lesão papulosa ou nodulosa que frequentemente evolui com ulceração central (meningite).
e eliminação de exsudato purulento (FIGURA 26). Ocorre mais amiúde
na face, podendo acontecer na mucosa orofaríngea. É caracterizada por
NÃO haver linfangite, permanecendo como lesão localizada, de DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
crescimento centrífugo, por continuidade e limitado, denotando, talvez,
uma boa resposta imunológica do tipo celular. A esporotricose deve ser diferenciada de outras doenças infecciosas que
podem cursar com a formação de lesões ulcerovegetantes,
principalmente à forma cutânea-fixa. Essas são agrupadas em uma sigla
mnemônica conhecida como PLECCT:

Paracoccidioidomicose;
Leishmaniose;
Esporotricose;
Cromomicose;
Carcinoma espinocelular;
Tuberculose.

Entre essas, a leishmaniose corresponde ao principal diagnóstico


diferencial da forma cutâneo-linfática que na esporotricose tem
marcado acometimento linfático (FIGURAS 27 e 28), pois pode cursar
com ulceração associada a comprometimento linfático semelhante,
porém menos exuberante.

Fig. 26

FORMA CUTÂNEO-DISSEMINADA
Exame histopatológico: observa-se a formação de granuloma na derme.
Raramente observamos elementos fúngicos como os esporos com
formato de charuto ou arredondados. Pode ocorrer depósito de
anticorpos ao redor das estruturas fúngicas gerando o achado
histopatológico conhecido como corpúsculo asteroide. Quanto mais
antiga for a lesão, mais difícil será encontrar o fungo.

TRATAMENTO

As formas cutâneas podem ser tratadas fundamentalmente de duas


formas. Pela solução saturada de iodeto de potássio via oral, cinco gotas
de 8/8h com as refeições. Aumentar diariamente a dose em uma gota
por tomada, conforme a tolerância do paciente, até a dose máxima de
Fig. 27
20 gotas de 8/8h (60 gotas/dia); e pelo itraconazol na dose de 100-200
mg/dia.

As formas extracutâneas devem ser tratadas preferencialmente com


itraconazol na dose de 200-400 mg/dia ou, nos casos mais graves, com
anfotericina B lipossomal (infusão venosa lenta de 3-5 mg/kg/dia
correndo em duas horas, com dose máxima de 800-2.950 mg). Tanto na
forma cutânea quanto na extracutânea, a farmacoterapia deve ser
mantida até um mês após a cura clínica da doença e, sempre que
necessário, devem ser realizadas culturas das lesões para confirmar sua
negativação. Lembrar que as gestantes com esporotricose, como não
podem tomar KI nem itraconazol, temos como opção terapêutica a
anfotericina B.

CROMOMICOSE (CROMOBLASTOMICOSE)

Fig. 28 ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA

Infecção causada por um grupo particular de fungos que comungam as


seguintes características:
É importante salientar que, além das causas infecciosas, as neoplasias
devem sempre ser lembradas como diferencial das lesões tumorais e
1. Produzem pigmento que lhes confere coloração acastanhada (fungos
ulceradas – principalmente o carcinoma espinocelular, já mencionado
demácios);
acima.
2. No tecido parasitado, se reproduzem por septações de uma mesma
célula, que se dão em mais de um plano, simultaneamente, dando
DIAGNÓSTICO origem a estruturas arredondadas características chamadas de
corpos ou células fumagoides ou talos muriformes ou corpos de
Baseia-se fundamentalmente no isolamento do fungo a partir de um Medlar.
fragmento do tecido ou do exsudato da lesão. Esses materiais são
cultivados em ágar Sabouraud e num intervalo de 5 a 21 dias
São diversos os agentes etiológicos (Tabela 5) sendo, porém, o
observamos o crescimento do fungo. O exame direto geralmente é
Fonsecaea pedrosoi considerado o principal no Brasil, e o Cladosporium
negativo.
carrionii, mais prevalente em regiões tropicais com baixos índices
pluviométricos, como ocorre na região semiárida do Nordeste
Recentemente vêm sendo estudados métodos imunológicos para o brasileiro. O nosso país é onde se registra o maior número de casos
diagnóstico e o acompanhamento terapêutico, mas estes ainda não dessa doença no mundo, seguido por Madagascar.
estão disponíveis.

Tab. 5
Intradermorreação com esporotriquina: não é utilizada com finalidades
diagnósticas. Sua negatividade apenas indica ausência de resposta
imune celular contra o fungo, não descartando a infecção.
Fonsecaea pedrosoi.
Phialophora verrucosa.
Rhinocladiella aquaspersa.
Cladosporium carrionii.
Fonsecaea compacta.
Cladophialophora ajeloi.

São fungos que vivem como saprobos no solo, vegetais e produtos


vegetais em decomposição. Para que ocorra a doença é necessária a
inoculação transcutânea direta, geralmente de forma traumática, não
havendo transmissão inter-humana. É, por isso, mais comum na zona
rural e em profissionais que trabalham com o solo e com plantas.

Fig. 29B
MANIFESTAÇÃO CLÍNICA

Transcorridos alguns meses após o trauma, surge pápula verrucosa que


cresce por continuidade na pele evoluindo continuamente para uma
placa verrucosa (FIGURAS 29A e 29B) com pontos enegrecidos (black
DIAGNÓSTICO
dots). Esses pontos são ricos em parasitas e é de onde, normalmente, se
colhe material para a realização de culturas. Os locais mais comuns são
as extremidades, principalmente nos membros inferiores. As lesões são É feito através do isolamento e identificação do fungo a partir da crosta,

frequentemente oligo/assintomáticas, exceto quando há infecção fragmento de tecido ou exsudato.

bacteriana secundária, quando é comum a queixa de prurido local. A


disseminação linfática ou hematogênica é excepcional. Outras Exame direto: após a aplicação de solução de KOH 10% ou lactofenol
complicações descritas são: linfedema crônico, elefantíase, carcinoma no material observado, observam-se estruturas arredondadas ou
espinocelular. ovoides, acastanhadas, com septos em diversos sentidos (vertical e
horizontal), conferindo aspecto semelhante à amora (moriforme) –
FIGURA 30. Raramente também podem ser observadas hifas tortuosas
e acastanhadas.

Fig. 29A

Fig. 30

Cultura em ágar Sabouraud: após aproximadamente uma semana,


observa-se cultura aveludada de coloração enegrecida.

Exame histopatológico: hiperplasia pseudoepiteliomatosa na epiderme e


corpúsculos acastanhados na derme. Podem ocorrer reação
granulomatosa e abscessos. Os pontos enegrecidos da placa verrucosa
representam a eliminação transepidérmica do fungo castanho.
TRATAMENTO

Geralmente, a resposta às drogas antifúngicas não é boa. Nas formas


localizadas, pode-se utilizar medidas cirúrgicas (crioterapia com
nitrogênio líquido, exérese cirúrgica, eletrocirurgia, laser de CO2)
associadas com itraconazol na dose de 200-400 mg/dia. Nas lesões mais
extensas, a escolha é para o itraconazol 200 mg/dia (18 meses) +
fluorocitosina 150 mg/kg/dia ou anfotericina B.

LOBOMICOSE (DOENÇA DEJORGE LOBO OU


BLASTOMICOSE QUELOIDEANA)

ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA Fig. 31

O Brasil é o país em que se registra o maior número de casos dessa


doença. Trata-se de afecção causada pelo fungo Loboa loboi, também
chamado Lacazia loboi. Sua classificação taxonômica ainda é muito
discutida pela dificuldade em estudá-lo, já que ainda não foi possível DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
isolá-lo em meios de cultura.

Deve ser feito com hanseníase, leishmaniose tegumentar anérgica,


Ocorre basicamente em áreas de floresta em que são elevadas a média queloide, dermatofibrosarcoma, histiocitomas e xantomas.
de temperatura anual e a pluviosidade, como na bacia amazônica.
Embora ainda não estejam determinados com clareza seu reservatório
natural e mecanismo de transmissão, acredita-se que a doença se DIAGNÓSTICO
desenvolva após a inoculação traumática do fungo pela via
transepidérmica, decorrido um intervalo de tempo que varia de alguns Exame direto: exsudato ou fragmento da lesão em solução de KOH 10%
meses a três anos. evidenciando células fúngicas em grande quantidade, vistas como
estruturas arredondadas com parede dupla espessa, refringentes e
Na natureza, a doença foi identificada apenas em seres humanos e dispostas em cadeia (disposição catenular) ligadas entre si por
golfinhos. formações tubulares. O fungo não cresce no meio de cultivo.

Exame histopatológico: reação granulomatosa com muitos histiócitos e


MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS fibrose. Presença de grande número de elementos fúngicos do mesmo
tamanho (dado importante na diferenciação com o Paracoccidioides
As lesões ocorrem quase que exclusivamente na pele das áreas expostas, brasiliensis).
como os pavilhões auriculares e os membros, não afetando órgãos
internos. Existem várias formas clínicas, sendo a apresentação mais
característica a forma queloideana: nódulos semelhantes ao queloide TRATAMENTO
(FIGURA 31), assimetricamente distribuídos (geralmente unilaterais),
com tendência a coalescer. Normalmente são assintomáticas e não O tratamento de escolha envolve procedimentos cirúrgicos/ablativos
mostram tendência à regressão espontânea. Outras formas clínicas quando possível. Nenhuma droga antifúngica mostrou resposta
como a infiltrativa, a verruciforme, a gomosa e a ulcerada são menos satisfatória. Normalmente se faz a associação dessas drogas como
frequentes. tentativa terapêutica. Já foi relatado o uso de clofazimina pó por 1-2
anos como opção alternativa.

MICETOMA

Quadro crônico de infecção da pele e tecido subcutâneo, podendo se


estender por continuidade até o osso, caracterizado pela tríade:

1. Aumento de volume;

2. Presença de fístulas;

3. Eliminação de grãos.
Há diversos agentes etiológicos, podendo ser causado por fungos e Normalmente não é possível diagnosticar com certeza a natureza
actinomicetos, dando origem aos micetomas eumicóticos e fúngica ou bacteriana de um micetoma baseando-nos apenas pelos
actinomicóticos, respectivamente. O chamado grão nada mais é que achados do exame físico. Ambos cursam com infecção crônica,
uma concreção granular formada por colônias do agente etiológico. fibrosante e de longa duração. Inicialmente ocorrem edema e eritema
que evoluem com a formação de fístulas. A evolução é indolente,
geralmente com inflamação e dor desproporcionalmente menores que os
EPIDEMIOLOGIA
esperados pelo aspecto da lesão.

A maioria desses agentes são saprobos do solo e de vegetais e geram


À palpação observa-se massa endurecida, pela fibrose, e eliminação de
lesão após inoculação traumática transcutânea. Por isso são mais
exudato contendo grãos (FIGURA 32).
localizados nas extremidades dos membros, principalmente nos pés.

Alguns textos tomam como sinônimo de eumicetoma o termo micetoma


maduromicótico. Os eumicóticos, de uma forma geral, possuem baixa
incidência e predominam nas zonas tropicais e subtropicais. A maioria
dos casos ocorre em homens entre 20 e 45 anos, muitas vezes etilistas
graves, desnutridos e com história de traumas de repetição nas
extremidades. Pelo menos 23 espécies de fungos já foram implicadas
como agentes de micetoma, sendo algumas das mais importantes
citadas na Tabela 6. No Brasil, o agente mais implicado é o Madurella
mycetomatis.

Tab. 6

Acremonium recifei.
Acremonium falciforme.
Madurella mycetomatis.
Madurella grisea.
Scedosporium apiospermum (Pseudallescheria boydii).
Aspergillus fumigatus.
Exophiala jeanselmei.
Fig. 32

Os micetomas actinomicóticos (actinomicetomas) não são mais


considerados doença do meio rural e sim cosmopolita, ainda que mais
prevalentes nas regiões tropicais e subtropicais. São muito mais As características dos grãos podem orientar na identificação clínica do
frequentes que os anteriores e normalmente causados por actinomicetos agente etiológico conforme as informações contidas nas Tabelas 8 e 9.
aeróbios. No nosso meio, a Nocardia brasiliensis é o patógeno mais
comumente implicado. Alguns outros agentes estão listados na
Tabela 7. Tab. 8

Aspecto do grão Fungos relacionados

Tab. 7
(eumicetomas)

Actinomadura madurae. Branco/amarelado Scedosporium apiosper-


Actinomadura pelletieri. mum, Acremonium recifei,
Streptomyces somaliensis. Aspergillus fumigatus.
Nocardia asteroides.
Vermelho Rubromadurella langeroni.
Actinomyces israelii.

Preto Exophiala jeanselmei,


O Actinomyces israelii, ao contrario dos demais, pode ser encontrado, Madurella mycetomatis,
normalmente, colonizando algumas mucosas humanas, sobretudo a oral Madurella grisea.
e a intestinal. É o principal agente da chamada actinomicose endógena,
não sendo, necessariamente, associado à formação de micetomas.
Tab. 9

MANIFESTAÇÃO CLÍNICA Aspecto do grão Fungos relacionados


(actinomicetomas)
Eumicetomas – Itraconazol 200-400 mg/dia por cerca de seis meses,
Branco/amarelado Actinomyces israelii, conforme resposta clínica.
Nocardia brasiliensis,
Nocardia asteroides.
FEOIFOMICOSE
Vermelho e poliédrico Actinomadura pelletieri.
Causados por fungos caracterizados por hifas septadas, toruloides (em
Preto Streptomyces “salsicha”) e produtores de pigmento acastanhado (fungos demáceos).
paraguayensis, Ao contrário dos agentes de cromomicose, não formam as estruturas
Pseudallescheria boydii. arredondadas características destas (corpos fumagoides ou talo
moriforme). Podem ou não gerar infecção oportunista, associada à
Muito endurecido Streptomyces somaliensis. doença crônica debilitante ou imunossupressão.
(calcificado)
ETIOLOGIA
A actinomicose endógena, em que 52% das vezes o agente etiológico é o
A. israelii (bactéria microaerófila), pode assumir três formas clínicas Diversas espécies de fungos demáceos podem causar feoifomicose, tais
distintas: como: Exophiala jeanselmei, Wangiella dermatitidis, Cladosporium
bantianum, etc.

A actinomicose endógena, em que 52% das vezes o agente etiológico é o


A. israelii (bactéria microaerófila), pode assumir três formas clínicas MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
distintas:

É dividida em duas formas: subcutânea e sistêmica ou disseminada,


1. Cervicofacial (70% dos casos): classicamente associada a condições cada qual com os seus principais agentes.
predisponentes como traumas da mucosa, extração dentária e
cirurgias orofaríngeas. Geralmente o hospedeiro apresenta algum
1. Forma subcutânea (Exophiala jeanselmei e Wangiella dermatitidis):
grau de imunodepressão, mesmo que temporária. Forma-se
ocorre após traumatismo local e inoculação. É mais comum em áreas
tumoração na mandíbula, com fístulas e, ocasionalmente, eliminação
expostas das extremidades. A lesão pode ter aspecto de nódulo, cisto
de grãos, sem comprometimento ganglionar importante;
ou abscesso (FIGURA 33).
2. Torácica: pode ocorrer por aspiração do agente ou extensão da lesão
2. Forma sistêmica (Cladosporium bantianum): essa forma,
cervical;
considerada uma infecção oportunista, é contraída por inalação,
3. Abdominal: muitas vezes é antecedida por traumatismos que contaminação cirúrgica, infusão de material contaminado ou
comprometem as alças intestinais ou procedimentos cirúrgicos infecção subcutânea seguida de disseminação hematogênica,
abdominais. especialmente para o sistema nervoso central, pois o C. bantianum é
um fungo neurotrópico. Formam-se múltiplos abscessos no cérebro
e, apesar disso, normalmente não é possível isolar o fungo a partir
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
do liquor. O quadro é indolente e composto predominantemente por
sinais neurológicos tais como náusea, letargia, hemiparesias,
É importante lembrar da botriomicose, uma lesão caracterizada por convulsões e coma. Normalmente não há febre.
achados clínicos semelhantes aos do micetoma (tumoração + fístula +
grão), porém provocada por bactérias que não formam filamentos (ao
contrário dos actinomicetos). É causada por diversos agentes tais como
o Staphylococcus aureus, a Pseudomonas aeruginosa, a Escherichia coli,
entre outros.

TRATAMENTO

Todos os pacientes devem ser avaliados quanto ao seu status nutricional


e receber suporte nutricional quando necessário. É indispensável a
avaliação das partes ósseas subjacentes, a drenagem do pus e o
debridamento cirúrgico dos tecidos desvitalizados. A quimioterapia
anti-infecciosa varia com o agente etiológico.
Fig. 33
Actinomyces israelii – Penicilina cristalina 18-24 milhões de unidades
por 2-6 semanas associada à amoxicilina por mais 6-12 meses.

Outras actinomicoses – Cotrimoxazol 800/160 mg de 8/8h ou 12/12h por


até dois anos. DIAGNÓSTICO
Exame direto: podem ser observadas hifas acastanhadas e toruloides.

Exame histopatológico: costuma apresentar uma sensibilidade maior


que o anterior, principalmente quando associado à cultura.

Cultura: único exame capaz de identificar, com precisão, a espécie


envolvida.

TRATAMENTO

Ressecção ou drenagem cirúrgica, quando possível, e anfotericina B ou


fluconazol, lembrando que este último possui uma boa penetração no
sistema nervoso central.

ZIGOMICOSES
Fig. 34

Infecções causadas por fungos do filo Zygomycota, micro-organismos


normalmente presentes como saprobos na natureza (solo, insetos,
répteis e anfíbios). É composto por duas ordens:
Entomoftoromicoses ou zigomicose subcutânea (basidiobolus e
conidiobolus). Após inoculação traumática, ocorre a formação de
1. Ordem Mucorales (gêneros Rhizopus, Absidia, Mucor e Rhizomucor);
granuloma eosinofílico que invade, principalmente, a gordura do tecido
2. Ordem Entomophthorales (gêneros Basidiobolus e Conidiobolus). celular subcutâneo. O basidiobolus acomete principalmente crianças do
sexo masculino abaixo de 20 anos, e acomete mais extremidades,
São doenças incomuns tanto no homem quanto nos animais, sendo os enquanto o conidiobolus acomete mais a região centrofacial de adultos.
da primeira ordem mais prevalentes em imunodeficientes e os da Forma nódulos, tumorações e grandes áreas de infiltração
segunda em imunocompetentes. óligo/assintomáticas. Apesar de poder atingir grande extensão, não
invade órgãos internos.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
DIAGNÓSTICO
Mucormicose ou zigomicose sistêmica (gêneros Rhizopus, Absidia,
Mucor e Rhizomucor). Esses fungos são resistentes em níveis de pH Exame direto: do escarro, lavado broncoalveolar, raspados cutâneos,
baixos (acidez), níveis em que outros micro-organismos morrem. Assim aspirados dos seios, evidenciando hifas curtas, largas e com septação
eles proliferam causando doença em situações de acidose como na irregular.
cetoacidose diabética. É o caso da mucormicose rinocerebral, na qual
há invasão do nariz e seios paranasais, com lesões necróticas, Cultura: fungo de crescimento rápido, sendo evidenciado após 48-72h.
gangrenosas, liberando secreção enegrecida de odor fétido, podendo se
estender ao sistema nervoso central (FIGURA 34). Como fungo Exame histopatológico: podem ser vistos os elementos fúngicos e a
oportunista, ele causa doença em situações de disfunção do sistema invasão de grandes e pequenos vasos, levando à trombose e necrose.
imune como diabetes mellitus, aids, leucemia, linfoma, transplantados Pode ser observada uma bainha eosinofílica circundando os granulomas
renais, etc. É característica sua capacidade de invadir os vasos (fenômeno de Splendore-Hoeppli).
sanguíneos provocando trombose vascular e necrose tecidual.

TRATAMENTO

● Mucormicose: controle clínico da doença de base associado ao


debridamento cirúrgico amplo. Anfotericina B na dose de 1,5-2
mg/kg/dia, dose total 40 mg/kg.

● Entomoftoromicose: cetoconazol 400 mg/dia ou itraconazol 200


mg/dia por 3-4 meses. Pode-se também prescrever a solução saturada
de iodeto de potássio na mesma posologia utilizada para
esporotricose.

MICOSES PROFUNDAS

VIDEO_06_DER
PARACOCCIDIOIDOMICOSE (BLASTOMICOSE
SUL-AMERICANA, MICOSE DE LUTZ-
SPLENDORE-ALMEIDA)

Tab. 10

1. Paracoccidioidomicose infecção (assintomática).

2. Paracoccidioidomicose doença (sintomática):


● Forma pulmonar primária;
● Forma aguda ou subaguda (tipo juvenil):

➤ Moderada;
Fig. 35
➤ Grave.
● Forma crônica (tipo adulto):

➤ Unifocal (pulmão + 1 órgão): leve, moderada ou


grave;

➤ Multifocal (> 1 órgão além do pulmão): leve


moderada ou grave.
● Forma sequelar ou cicatricial.

Revisando, vamos lembrar as formas possíveis de


paracoccidioidomicose.

A forma pulmonar primária é muito pouco diagnosticada,


correspondendo a um quadro respiratório agudo com infiltrado
pulmonar e adenopatia hilar, que geralmente é autolimitado.

Fig. 36
Lesões cutâneo-mucosas: ocorrem mais tipicamente na
paracoccidioidomicose crônica (doença de adultos > 40 anos),
predominando as lesões gengivais e de toda a orofaringe. É
característico o aspecto de erosão com pontilhado hemorrágico
denominada estomatite moriforme de Aguiar Pupo (FIGURA 35). Com
o tempo, estas lesões tornam-se vegetantes levando a deformações nos DIAGNÓSTICO
lábios, laringe (com disfonia) e raramente traqueal (podendo indicar
traqueostomia). Há acometimento de linfonodos regionais. As lesões da É feito com o isolamento do fungo dos tecidos.
pele ocorrem por disseminação hematogênica do fungo, e a face é o
local mais acometido. O espectro de lesões cutâneas varia desde lesões Exame direto: obtido de pus e secreções; são vistas células de formas
papulosas, papuloeritematosas, papulopustulosas, vegetantes e arredondadas com membrana de duplo contorno, gemulação única ou
ulceradas, com ponteado hemorrágico moriforme característico múltipla.
(FIGURA 36). Como há disseminação hematogênica, é de se esperar
que as lesões de pele sejam acompanhadas de lesões pulmonares, Cultura: revela-se o dimorfismo – cultivo a 25ºC demonstra crescimento
linfonodomegalia e lesões de outros órgãos, mesmo que na forma filamentosa (micélios) e a colocação da mesma cultura a 37ºC
subclinicamente. Na orofaringe, as lesões fazem diagnóstico diferencial faz com que a colônia assuma aspecto leveduriforme.
com CEC, leishmaniose tegumentar, histoplasmose, sífilis e tuberculose.
Na pele, o diagnóstico diferencial se faz com esporotricose, leishmaniose
Exame histopatológico: nos tecidos ocorrem microabscessos de
cutânea ou tegumentar, hanseníase, tuberculose, sarcoidose,
neutrófilos e reação granulomatosa com parasitos no interior dos
histoplasmose, CEC, cromomicose, criptococose.
microabscessos e de células gigantes. O parasita apresenta
caracteristicamente o aspecto de criptoesporulação em roda de leme.
Testes imunológicos: IgG e IgM anti- P. brasiliensis detectados pelo teste Existem basicamente duas formas de histoplasmose: a pulmonar e a
de imunodifusão são úteis para o diagnóstico e medição da atividade da generalizada. Esta última se divide em aguda, subaguda e crônica. As
doença. O teste de fixação de complemento detecta esses anticorpos de manifestações cutâneas são a grande marca da histoplasmose
maneira mais quantitativa, logo serve para avaliar a resposta ao disseminada crônica, a única forma de histoplasmose disseminada que
tratamento, infelizmente faz reação cruzada com anticorpos anti- não tem relação com o HIV. As lesões específicas (de onde se pode
Histoplasma capsulatum. Também são usados imunofluorescência, isolar o agente) são variadas (polimórficas) como pápulas
contraimunoeletroforese e ELISA. (FIGURA 38), nódulos, úlceras (FIGURA 39), fístulas e vegetações. São
bem descritas as lesões molusco-infeccioso-símile (FIGURA 40) e
acneiforme.
CONTROLE DE CURA

● Cura clínica, com resolução dos sinais e sintomas.

● Cura radiológica.
● Estabilização do padrão das imagens cicatriciais radiológicas
pulmonares em duas telerradiografias registradas com intervalo de
três meses.

● Cura imunológica.
● Negativação ou estabilização dos títulos de imunodifusão dupla em
níveis sorológicos bai xos (<1:2) observadas em duas amostras de so
- ro coletadas com intervalo de seis meses, após o período de
tratamento recomendado para itraconazol ou sulfametoxazol +
trimetoprima.

TRATAMENTO

Entre os quimioterápicos antifúngicos podemos utilizar:

● Sulfametoxazol + trimetoprima: ataque, dois meses: sulfametoxazol


2.400 mg e trimetoprima 480 mg/dia, e depois manutenção reduzindo
a dose para: sulfametoxazol 1.600 mg e trimetoprima 320 mg/dia por
22 meses;

● Itraconazol (droga de escolha na maioria dos casos): na dose de


ataque de 200 mg/dia durante 1-2 meses e manutenção com 100 Fig. 38
mg/dia;

● Sulfametoxazol + trimetoprima: na dose de ataque de 800/160 mg de


8/8h por quatro semanas seguido de 800/160 mg de 12/12h;

● Anfotericina B: para casos graves, 0,5-2 mg/kg/dia ou em dias


alternados, não ultrapassando a dose diária de 50 mg. Após ser
atingida a dose acumulada de 1,5-2 g deve-se iniciar o tratamento de
manutenção com uma das outras drogas.

A duração clássica do tratamento é de 6-12 meses. Mais recentemente


vem sendo utilizado o critério de melhora clínico-sorológica para a
interrupção do tratamento. Os pacientes deverão ser acompanhados por
pelo menos dois anos, com exames clínicos, radiológicos e sorológicos
após o tratamento.

HISTOPLASMOSE (DOENÇA DE DARLING)


Fig. 37
Fig. 39

DIAGNÓSTICO

Exame direto e cultura: melhor método para diagnosticar a


histoplasmose cutânea. A cultura pode positivar-se em 2-4 semanas.

Pesquisa do antígeno: está presente na urina em 90% dos casos de


histoplasmose disseminada.

Sorologia: pesquisa de anticorpo pelos métodos de fixação do


complemento e imunodifusão em gel. É uma excelente escolha para o
diagnóstico da histoplasmose pulmonar aguda.

Fig. 40
Histopatologia: granuloma contendo leveduras no interior de células
mononucleares. Pode ajudar no diagnóstico da histoplasmose cutânea e
sistêmica.
Podem ser observados eritema nodoso (FIGURA 37) e eritema
polimorfo como reações de hipersensibilidade ao parasita, mesmo na
histoplasmose pulmonar.
TRATAMENTO

Deve ser levada em conta a gravidade do quadro na escolha do


tratamento. A doença moderada, deve ser tratada com itraconazol 200
mg/dia (2-3 meses para a forma pulmonar aguda ou 12-24 meses para a
pulmonar crônica); a doença grave ou disseminada merece anfotericina B
0,7-1,0 mg/kg/dia por 1-2 semanas, com uma terapia de manutenção
com itraconazol 200 mg/dia.

CRIPTOCOCOSE

ETIOLOGIA, ECOLOGIAE EPIDEMIOLOGIA


Micose sistêmica de caráter oportunista causada pelo Cryptococcus e
que pode evoluir de forma crônica ou aguda. Apresenta como sinonímia
doença de Busse-Buschke, torulose.

Os fungos desse gênero são leveduras encapsuladas de distribuição


universal e que podem ser divididos em três variedades: C neoformans
(var.grubii, var.gattii e var.neoformans).

É uma levedura encontrada nas fezes das aves, vegetação em


decomposição e poeira. É considerada uma doença definidora de aids.

Aparentemente a porta de entrada são as vias aéreas inferiores, onde o


fungo chega por inalação. A infecção pulmonar primária costuma ser
assintomática e pode evoluir com cura espontânea ou disseminação Fig. 41

hematogênica. Estes casos estão intimamente associados a doenças


como linfomas, leucemias, aids e outros casos que cursam com
imunossupressão. Cerca de 13% dos pacientes com aids desenvolvem
criptococose em algum momento da síndrome.
DIAGNÓSTICO
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Exame direto e cultura: escolha para diagnosticar as lesões cutâneas. Na
coloração com Nanquim (tinta da China ou tinta da Índia), as
A forma subclínica (mais comum) ou sintomática com febre, tosse,
leveduras por possuírem uma cápsula de polissacarídea, formam um
emagrecimento e escarro purulento/sanguinolento são as apresentações
halo claro, sendo comparada ao “céu estrelado” (FIGURA 42). Na
mais comuns. A radiografia pode evidenciar infiltrados bem
cultura, o fungo cresce rápido, em 2-3 dias.
circunscritos ou difusos com padrão miliar (semelhante à tuberculose),
sendo as calcificações incomuns.

Como o fungo apresenta neurotropismo, as manifestações


meningoencefálicas costumam ser as mais importantes depois das
pulmonares. São de evolução grave e, muitas vezes, fatal apesar da
instituição de terapia adequada.

Cerca de 5-10% evoluem com comprometimento ósseo, principalmente


dos ossos longos, do crânio e das vértebras.

O acometimento da pele ocorre em 10-15% dos casos. Nos indivíduos


com primoinfecção as lesões do tipo eritema nodoso são observadas e,
em determinadas regiões dos Estados Unidos, considerada sua principal
causa. Nos pacientes com disseminação hematogênica
(imunodeficientes) podem adquirir as mais diversas apresentações
Fig. 42
(abscessos, pústulas, pápulas, úlceras, etc). As lesões molusco-
contagioso-símile (FIGURA 41) são, em geral, observadas e, segundo
alguns autores, uma das mais comuns.
Provas imunológicas: aglutinação em látex tem sensibilidade e
especificidade de 90%; pode haver falso-positivos.

Exame histopatológico: infiltrado inflamatório macrofágico com o fungo


podendo ser corado pela Mucicarmim.

TRATAMENTO

Formas graves ou meningoencefalite: anfotericina B 0,5-1,0


mg/kg/EV/dia + flucitosina 100 mg/kg/ VO/dia (6-10 semanas) ou
indução com anfotericina B + manutenção com itraconazol 400 mg/dia.

Formas moderadas: fluconazol 200-400 mg/dia, por 3-6 meses.


O tratamento da criptococose relacionada ao HIV foi discutido no É uma doença que acompanha o homem desde tempos remotos e que
bloco de Infectologia. tem apresentado, nos últimos 20 anos, um aumento do número de casos
e ampliação de sua ocorrência geográfica. Embora inicialmente
considerada uma zoonose de animais silvestres, que acometia
*As Figuras 3A, 3B, 7A, 7B, 7C, 10A, 10B, 11, 13, foram ocasionalmente pessoas em contato com florestas, a LTA começou a
gentilmente cedidas por Fabiano Leal. ocorrer em zonas rurais já praticamente desmatadas e em regiões
periurbanas. O que se observa é a coexistência de um duplo perfil
**As Figuras 20A, 20B, 21C, 21D, e 25 por Eduardo Bornhausen. epidemiológico, expresso pela manutenção de casos oriundos dos focos
***As Figuras 10C e 18 por Carolina Belo. ****E a Figura 14B por antigos, ou de áreas próximas a eles, e pelo aparecimento de surtos
Felipe Oliveira. associados a fatores decorrentes do surgimento de atividades
econômicas, como garimpos, expansão de fronteiras agrícolas e
extrativismo, em condições ambientais altamente favoráveis à
LEISHMANIOSE E TUBERCULOSE transmissão da doença.

Por se tratarem de importantes diagnósticos diferenciais das infecções A Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA), conhecida
fúngicas subcutâneas e sistêmicas, que acabamos de ver, vamos abordar popularmente como “úlcera de Bauru” ou “ferida brava”, é uma doença
aqui duas condições muito importantes no nosso país: leishmaniose endêmica em diversos países latino-americanos. Cerca de 90% dos casos
tegumentar e a tuberculose cutânea. das Américas estão no Brasil, Peru e Bolívia. No período de 1993 a
2012, a LTA apresentou média anual de 26.965 casos autóctones
registrados e coeficiente de detecção médio de 15,7 casos/100.000
LEISHMANIOSE TEGUMENTAR habitantes. Ao longo desse período, observou-se uma tendência no
crescimento da endemia, registrando-se os coeficientes mais elevados
VIDEO_07_DER nos anos de 1994 e 1995, quando atingiram níveis de 22,83 e 22,94
casos/100.000 habitantes, respectivamente. Ao se analisar a evolução da
LTA no Brasil, observa-se uma expansão geográfica, sendo que, no
AGENTE ETIOLÓGICO
início da década de 1980, foram registrados casos autóctones em 19
unidades federadas e, no ano de 2003, foi confirmada autoctonia em
A Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) é uma doença causada
todas as unidades da federação. A região Norte vem contribuindo com
por protozoários do gênero Leishmania, transmitida ao homem pela
o maior número de casos, seguida das regiões Centro-Oeste e Nordeste
picada de mosquitos flebotomíneos (Ordem Diptera; Família
(18,8 casos/100.000 hab.).
Psychodidae; Subfamília Phlebotominae), conhecidos popularmente
como mosquito palha, tatuquira ou birigui. No Brasil, existem mais de
A Leishmania braziliensis predomina em todo o território nacional e a
duzentas 200 espécies de flebotomíneos implicados em sua transmissão
L. guyanensis na região Norte. Outros agentes podem causar LTA, mas
e sete espécies de Leishmania responsáveis pela doença humana, sendo
respondem por um menor número de casos.
seis do subgênero Viannia e uma do subgênero Leishmania. As três
principais espécies são:
O parasita é transmitido por um vetor: um inseto flebotomíneo,
conhecido como mosquito-palha, birigui ou tatuquira (FIGURA 2). No
● Leishmania (Leishmania) amazonensis;
Brasil, as principais espécies envolvidas com a transmissão da LTA
● Leishmania (Viannia) guyanensi; pertencem ao gênero Lutzomyia. Na Amazônia (floresta), a principal
● Leishmania (Viannia) braziliensis. espécie transmissora é Lutzomyia umbratilis. O flebotomíneo silvestre
faz seus ninhos em folhas mortas e úmidas, raízes do solo, tocas de
animais, fendas de rocha e cavernas. Em outras regiões, o vetor
O agente Leishmania é um protozoário que possui duas formas
geralmente pertence às espécies Lutzomyia whitmani (que habita matas e
evolutivas: (1) forma promastigota, com flagelo, núcleo, cinetoplasto e
proximidades das habitações) e Lutzomyia intermedia (encontrado em
blefaroplasto, que se desenvolve no tubo digestivo do mosquito vetor;
torno das habitações).
(2) forma amastigota, sem flagelo, com núcleo e cinetoplasto, que se
desenvolve no interior dos leucócitos mononucleares (monócitos e
macrófagos).

EPIDEMIOLOGIA E CICLO EVOLUTIVO


Fig. 1

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

O período de incubação é de 1-3 meses. A lesão, inicialmente, aparece


apenas no ponto de inoculação, geralmente em áreas expostas da pele
(face, membros, mãos, pés). A lesão então passa por fases evolutivas.

Lesão inicial: forma-se uma pápula eritematosa que logo vira uma lesão
Fig. 2 papulocrostosa, papulovesiculosa ou papulopustulosa (FIGURA 3).

A LTA possui diversos reservatórios animais, incluindo os silvestres


(roedores, marsupiais, edentados e canídeos silvestres), sinantrópicos
(roedores) e domésticos (canídeos, felídeos e equídeos). Com relação a
esses últimos, seu papel na manutenção do parasito no meio ambiente
ainda não foi esclarecido. O flebotomíneo adquire a forma amastigota
destes seres que, então, se transforma na forma promastigota em seu
sistema digestivo, armazenando-se nas glândulas salivares.

Quando a fêmea do flebotomíneo (de hábitos vespertinos e


crepusculares) se alimenta do sangue humano, inocula as formas
promastigotas na pele (FIGURA 1). Os protozoários flagelados então
penetram nos macrófagos e monócitos da derme e hipoderme, perdendo
em seguida seu flagelo e convertendo-se na forma amastigota
(intracelular). Por divisão binária os amastigotos da Leishmania se
Fig. 3
proliferam dentro das células que, ao se romperem, liberam um grande
número de parasitos para infectar outras células. Os monócitos carreiam
a Leishmania pela corrente sanguínea, disseminando a infecção para
outros tecidos (como as mucosas). Lesão ulcerada: dias ou semanas depois, a lesão adquire aspecto
ulceroso. A úlcera da LTA possui bordos elevados e bem definidos
(“úlcera em moldura de quadro”), com centro granulado, de cor
vermelho vivo e com secreção serosa (FIGURAS 4A e 4B).
Fig. 4 Fig. 4

Lesão vegetante: as lesões podem evoluir para cicatrização espontânea


ou para a formação de placas vegetantes, verrucosas (FIGURA 5) que
cronificam e crescem lentamente.
Fig. 6

Fig. 5

Lesões mucosas: as lesões mucosas aparecem precocemente, embora seja


mais comum ocorrerem 1-2 anos depois do surgimento da pápula de
inoculação. Acometem especialmente o nariz, começando com eritema,
edema e discreta infiltração no septo nasal, asas do nariz e mucosa,
evoluindo com maior infiltração e lesão ulcerovegetante, que pode se
estender para as regiões laterais, lábios superiores e inferiores
(FIGURA 6). A orofaringe pode ser acometida com lesões no palato,
gengiva, laringe e faringe. Raramente, o pavilhão auricular também é
acometido de forma assimétrica. As lesões mucosas da LTA geralmente
são por disseminação hematogênica do parasito. Com o tempo, a
doença vai destruindo a cartilagem nasal, provocando o desabamento
do nariz (nariz de anta ou nariz de tapir) – FIGURA 7.

Fig. 7

O mesmo paciente pode apresentar apenas uma ou múltiplas lesões


cutâneas em estágios evolutivos diferentes.

DIAGNÓSTICO

Exame direto: o raspado da lesão é colocado em uma lâmina e corado


pelo Giemsa ou Leishman, para que possam ser observadas as formas
amastigotas no interior dos mononucleares.
Histopatologia: irá demonstrar um granuloma linfo-histiocitário. Nas É muito parecido com o tratamento que já vimos ao longo do ano para
lesões recentes, é comum se observar o parasito intracelular a leishmaniose visceral (calazar). A droga de escolha é um antimonial
(FIGURA 8); o mesmo não podemos afirmar para as lesões antigas. pentavalente, geralmente o de N-metil-glucamina (Glucantime), na dose
Quanto menos recente, mais difícil se torna observar o agente. de 15 mg/kg/dia de antimônio (formas cutâneas puras) ou 20 mg/kg/dia
(formas cutâneo-mucosas), por via intramuscular ou intravenosa (correr
lentamente), durante um período de 10-30 dias. A exceção fica para as
gestantes e pacientes coinfectados com HIV. Outras opções de
tratamento são: anfotericina B 25-50 mg/dia, venosa, até completar a
dose cumulativa de 1.200-2.000 mg do antibiótico; pentamidina 4
mg/kg, venosa, a cada dois dias (esta droga é mais eficaz para a
Leishmania guyanensis). A forma lipossomal da anfotericina B está
registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para
uso no tratamento da Leishmaniose Visceral (LV), mas não existe
registro para uso na Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA),
sendo considerada uma droga off label para essa indicação, pois ainda
não há eficácia comprovada por meio de ensaios clínicos controlados
que possam respaldar o seu uso rotineiro.

Fig. 8 Eletrocirurgia, criocirurgia e cirurgia corretiva podem ser métodos


adjuvantes nos casos mais graves e com destruição nasal.

Cultura: feita no meio NNN (Novy-MacNeal-Nicolle), sendo positiva PROFILAXIA


em apenas 40% dos casos. É liberada em algumas semanas.
Não há vacina e nem quimioprofilaxia. A prevenção da LTA é feita por
Sorologia: os métodos mais usados são a imunofluorescência indireta e medidas do tipo identificar e tratar os doentes, telar as casas, uso de
o ELISA. A sensibilidade oscila em torno de 75% e o teste pode ter inseticidas e repelentes e controle dos reservatórios domésticos.
reação cruzada com outras leishmanioses e com a doença de Chagas.

LEISHMANIOSE TEGUMENTAR DIFUSA (LTD)


Molecular: reação em cadeia da polimerase (PCR) também está
disponível.
É causada pela Leishmania (mexicana) amazonensis, ou simplesmente
Leishmania amazonensis. Predomina nos estados do Amazonas,
Teste intradérmico de Montenegro: ao contrário do que dissemos para o Maranhão, Pernambuco e Bahia. É uma forma diferente de
calazar, a reação de Montenegro possui um importante valor no leishmaniose cutânea, na qual se observam lesões elevadas queloideanas
diagnóstico da LTA. É feito pela inoculação de 0,1-0,3 ml de uma múltiplas e infiltração e ulceração na mucosa nasal, sem rotura do
solução de promastigotas mortas no antebraço. O surgimento de uma septo. O diagnóstico é fácil, pela riqueza de parasitas. O tratamento é
pápula > 5 mm de diâmetro indica teste positivo. A sensibilidade é de difícil, não havendo eficácia absoluta com os antimoniais, anfotericina B
quase 100% nos imunocompetentes e a especificidade também é alta, ou pentamidina. As lesões tendem a recidivar após o término da terapia
considerando-se que pacientes curados de LTA mantêm-se Montenegro (normalmente refratária ao tratamento).
positivos por tempo indeterminado. Indivíduos imunodeprimidos com
LTA podem ter a reação negativa.
TUBERCULOSE CUTÂNEA
TRATAMENTO
A tuberculose é uma doença endêmica em nosso meio, predominando
nas áreas urbanas e de baixa renda, onde existem aglomerados de
pessoas habitando ou trabalhando. Uma detalhada revisão sobre os
aspectos epidemiológicos, patológicos e patogênicos da tuberculose foi
realizada no bloco de Pneumologia. Aqui apenas destacaremos as
principais formas de tuberculose cutânea.

A tuberculose cutânea é causada pelas micobactérias do complexo que


contém os agentes Mycobacterium tuberculosis (principal), M. bovis,
bacilo BCG e M. africanum (somente na África). Trata-se de Bacilos
Álcool-Ácido Resistentes (BAAR), mas que não formam globias (como
acontece com o M. leprae). As lesões são de fundo granulomatoso, com
necrose caseosa (granuloma caseoso).

LÚPUS VULGAR
É a forma crônica da TB cutânea, ocorrendo mais em adultos PPD Lesões papulares iniciais evoluem lentamente para placas verrucosas
reatores, como um tipo de TB pós-primária por disseminação de um excêntricas (FIGURA 10), podendo ocorrer atrofia central. Predominam
foco tuberculoso interno, por via linfática, hematogênica ou no dorso das mãos, dedos ou pés. Faz diagnóstico diferencial com o
contiguidade. As lesões se localizam preferencialmente na face, grupo PLECCT. O diagnóstico é confirmado pela histopatologia
acometendo a região malar (daí o nome “lúpus vulgar”), dorso do (hiperqueratose e hiperplasia epidérmica, com granulomas na derme) e
nariz, mento e pavilhão auricular, embora possa surgir nos membros e cultura. A baciloscopia da lesão geralmente é negativa.
no tronco (FIGURA 9). A lesão inicial é uma mácula, pápula ou nódulo
de cor vermelho acastanhada e consistência mole. Da coalescência de
lesões, surgem placas infiltradas, circulares, anulares, com atrofia central
e eventual ulceração, semelhantes ao lúpus discoide e à lesão sarcoídica.
Aí está a principal característica do lúpus vulgar: pela vitropressão,
obtém-se à inspeção uma cor amarelada tipo “geleia de maçã”.

Fig. 10

ESCROFULODERMA

Também chamado de TB coliquativa. É a forma mais comum em nosso


meio!! Resulta da invasão bacilar por contiguidade de lesões do tipo
linfadenite (escrófula), TB ósseo ou articular, ou ainda TB do
epidídimo. As lesões localizam-se na região submandibular, cervical
e/ou supraclavicular. Aparecem nódulos subcutâneos eritematosos ou
eritematocrostosos que fistulizam material caseoso ou purulento
(FIGURA 11). O diagnóstico é dado pelo histopatológico (granuloma
caseoso), baciloscopia (ocasionalmente positiva) e cultura.

Fig. 9

Vários tipos de lesão são descritos: placas lisas, serpiginosas ou


policíclicas com escamas psoriasiformes (forma plana), nódulos
hiperqueratóticos (forma hipertrófica), ulcerações e destruição da
cartilagem nasal e auricular (forma ulcerada), lesões queloideanas
(forma cicatricial).

O diagnóstico é confirmado pela histopatologia (granuloma caseoso),


associada ao exame bacteriológico: a baciloscopia geralmente é
negativa, mas a cultura é positiva.

Fig. 11
TUBERCULOSE VERRUCOSA

É uma forma de TB cutânea por inoculação, mas de um indivíduo que


já havia sido previamente sensibilizado pelo bacilo (PPD reator). Era
comum em indivíduos que trabalhavam com o bacilo da tuberculose no
laboratório. Pode ocorrer em fazendeiros ou açougueiros, pela
CANCRO TUBERCULOSO
inoculação do M. bovis. Ainda há o mecanismo da autoinoculação.
É a TB primária de inoculação. Após 3-4 semanas do evento, surge uma O eritema nodoso pode ter uma série de causas, que são
pápula ou nódulo inflamatório que evolui para ulceração e que tende a numerosas e de diferentes etiologias: infecciosas, fármacos,
se cronificar. Linfadenite satélite é comum. O eritema nodoso neoplasias, doenças autoimunes... Estas causas devem ser
acompanha 10% dos casos. É mais comum nas mãos e dedos ou na individualizadas de país para país e os dados no Brasil são
cavidade oral (devido ao M. bovis adquirido pela ingestão de leite não precários. Segundo algumas publicações, a causa de EN mais
pasteurizado). O diagnóstico é feito pela baciloscopia da secreção comum, nas crianças, é a infecção estreptocócica, enquanto nos
drenada (rica em bacilos) ou pela cultura. O PPD inicialmente é não adultos predominam causas como drogas, sarcoidose e desordens
reator, tornando-se positivo durante a evolução do processo. autoimunes, principalmente doença inflamatória intestinal. A
relação da infecção por Streptococcus haemolyticus do grupo A e
EN é clássica, principalmente em crianças e adultos jovens.
REAÇÃO AO BCG Normalmente, as lesões cutâneas aparecem duas a três semanas
após a infecção de via aérea superior e são acompanhadas de
Normalmente, após a aplicação do BCG, surge uma pápula que depois aumento da ASLO. Em geral, a cultura de orofaringe não revela o
ulcera e evolui com pequena cicatriz no local da vacina. Entretanto, é patógeno. A tuberculose também é responsável por EN. Na
possível que o paciente evolua com lesões locais tuberculosas pela Europa, ele é visto mais comumente em crianças, acompanhando
atividade do bacilo de Calmette-Guérin (lembre-se de que ele está o foco pulmonar primário, concomitante com a virada do PPD.
apenas atenuado na vacina...). Entre essas reações adversas, podemos Entre as drogas causadoras de EN, as mais comuns são: sulfas,
destacar: (1) erupções exantemáticas, eczematosas ou eritema nodoso bromidas e ACO, mas a lista é vastíssima. Hoje, como a dose
por hipersensibilidade; (2) lúpus vulgar; (3) fenômeno de Koch (reação hormonal dos ACO é menor, este fenômeno é mais raro. A
local exacerbada, aumentando a úlcera e inflamando os linfonodos sarcoidose também é uma causa clássica de EN, como na
axilares); (4) escrofuloderma; (5) abscesso subcutâneo; (6) linfadenite síndrome de Löfgren (adenopatia e EN). Entretanto, um quadro de
regional exagerada. adenopatia hilar bilateral e EN pode ter diversas causas: linfoma,
TB, streptococcus, coccidioidomicose, histoplasmose, e infecções
por clamídia (C. pneumoniae). Em adultos, o EN na DII
TUBERCÚLIDES (“IDES” DA TUBERCULOSE)
usualmente acompanha um flare up de atividade de doença. A
RCU é mais associada ao EN do que a doença de Crohn.
Como vimos no capítulo passado, uma “ide” é uma reação de
hipersensibilidade à distância em resposta à presença de algum agente
infeccioso. Isso ocorre nas micoses, na sífilis e na tuberculose, entre ECTOPARASITOSES

outros. (infestações por artrópodes) (escabiose, pediculose, fitiríase,


pulíase, tungíase, miíase)
Tubercúlide papulonecrótica: as lesões ocorrem agrupadas e em surtos
autolimitados. São pápulas que se pustulizam, formando-se uma crosta
que, ao se desprender, deixa uma cicatriz. Predominam nos cotovelos, INTRODUÇÃO
joelhos e dorso das mãos e pés. Postula-se que um foco de TB interno
libere bacilos intermitentemente, cujos antígenos desencadeiam VIDEO_08_DER
inflamação na pele. Os arthropodos (arthro = articulação, podos = pés) formam um filo de
pequenos animais com patas articuladas, exoesqueleto rígido (composto
Eritema indurado de Bazin: é uma síndrome de paniculite lobular de quitina) e corpo dividido em dois ou três segmentos, sendo
vasculítico que pode ser uma tuberculide (eritema indurado) ou ser subdividido em duas classes principais: os insetos (classe Insecta) e os
relacionada a uma outra doença (vasculite nodular). Surgem nódulos aracnídeos (classe Arachnida).
inflamatórios nas panturrilhas (tipo eritema nodoso), com tendência à
ulceração. Geralmente há eritrocianose e livedo reticular associados. Entre as doenças causadas por artrópodes, as de maior importância
médica são:
Tubercúlide liquenoide: placas tipo líquen plano (achatadas, lisas,
brilhantes, eritematoacastanhadas) que se desenvolvem nas laterais do 1. A escabiose;
tronco. É uma forma muito rara de tubercúlide.
2. A pediculose;

3. A fitiríase;
O esquema terapêutico é baseado no esquema RIPE da mesma forma
que vimos para os pacientes com a forma pulmonar da doença. 4. A pulíase;

5. A tungíase; e
SAIBA MAIS Eritema nodoso. 6. A miíase.
É uma reação de hipersensibilidade do tipo vasculite da gordura
subcutânea (paniculite), formando-se nódulos dolorosos, com
ESCABIOSE
superfície eritematosa, com evolução autolimitada. Ocorre em 10%
dos casos de TB primária de qualquer órgão.
EPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIA
É causada pela fêmea fecundada do Sarcoptes scabiei, um pequeno Trata-se de uma afecção universalmente distribuída sendo observada em
ácaro que mede cerca de 0,3 mm (figura 1). São ectoparasitos que diversas partes do mundo. Acomete todas as raças, idades e classes
preci-sam do hospedeiro para a sua sobrevivência e reprodução. Ela sociais, embora predomine nos indivíduos adultos de baixa renda, que
penetra através da camada córnea (FIGURA 2), geralmente à noite e é moram em ambientes aglomerados e com pouca higiene. Já foram
capaz de depositar cerca de dois a três ovos por dia, durante o período relatados diversos surtos em hospitais, quartéis, creches e escolas.
de um a dois meses. O macho não invade o organismo, fecundando a Acredita-se que tanto a migração no interior da pele quanto a
fêmea ainda na superfície da pele. Sua transmissão normalmente ocorre hipersensibilidade do organismo ao ácaro e seus produtos metabólicos
pelo contato direto, inclusive o sexual, podendo também se dar, são determinantes na gênese da pruridermia, tão característica na
raramente, através de fômites (lençóis, toalhas, roupas, etc.) uma vez que escabiose.
o parasita morre após algumas horas fora da pele.

CICLO EVOLUTIVO

Acompanhe pela FIGURA 3. Uma vez transmitida à pele humana, a


fêmea adulta fecundada escava túneis (sulcos) no estrato córneo da
epiderme, em seguida fazendo a ovopostura a cada 2-3 dias, geralmente
à noite, momento de maior atividade parasitária. Cada fêmea expele
uma média de 3-4 ovos por dia e sobrevive no hospedeiro por cerca de
30-60 dias, durante os quais coloca uma grande quantidade de ovos,
proliferando o parasita. Fora do hospedeiro, estes ácaros não
sobrevivem muito tempo. Os ovos eclodem após sete dias, liberando
larvas hexópodes (seis patas) que migram para a superfície da pele e
criam pequenos nichos na epiderme ou penetram nos folículos pilosos,
criando uma espécie de esconderijo onde ocorrerá o término da
metamorfose: as larvas convertem-se em ninfas octópodes (oito patas),
que após diversas mudas se transformam em ácaros adultos (machos ou
fêmeas), num processo que dura em torno de 20 dias. Nesse momento, a
fêmea é fecundada pelo macho, adquirindo condições de escavar seu
túnel epidérmico e realizar a ovopostura, completando o ciclo. Larvas,
ninfas e formas adultas são encontradas também na superfície da pele,
Fig. 1: S. scabiei visto ao exame direto. de onde as fêmeas fecundadas podem infectar outro ser humano ou se
disseminar por outras partes da pele da mesma pessoa.

Fig. 2: Localização habitual na camada subcórnea.

Dentro da mesma espécie, existem diversas variedades de S. scabiei,


Fig. 3: Agente e ciclo evolutivo – observe a fêmea adulta do Sarcoptes
cada uma sendo parasito específico de cada espécie animal: S. scabiei scabiei (acima) e o seu ciclo biológico (restante da figura).
var. hominis (ser humano), S. scabiei. var canis (cão), S. scabiei var. suis
(porco), etc. Quando uma variedade animal parasita o homem, ocorre
apenas uma forma leve e autolimitada da doença.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Após um período de incubação que varia de 2 a 28 dias, na dependência
de se tratar ou não do primeiro contato com o ácaro, ou seja, de já haver
ou não o desenvolvimento de hipersensibilidade a esse agente, surge um
quadro de pruridermia intensa, notavelmente mais intensa à noite e ao
amanhecer. A lesão mais característica é o túnel (FIGURAS 4A e 4B),
de formato linear, sinuoso e coloração variável, medindo cerca de 5-15
mm e que possui, em uma das suas extremidades, uma pápula ou
vesícula chamada eminência acarina, local em que pode ser encontrado
o S. scabiei.

Fig. 5: Detalhe da lesão abdominal.

As principais complicações são a infecção secundária das


lesões escoriadas (impetiginização) e, consequentemente, a
glomerulonefrite.

SARNA INCÓGNITA

Mais comum em pessoas com bom nível socioeconômico,


tratadas de forma parcial ou em uso de corticoterapia tópica.
O paciente relata típica história de prurido, mas apresenta
pobreza de achados dermatológicos ao exame físico.

ESCABIOSE NODULAR

O paciente com escabiose pode desenvolver lesões nodulares


de coloração variável (coloração normal da pele,
Fig. 4: Túnel (burrow). hipercrômicas ou eritematosas) localizadas nas regiões
axilares e inguinais (nas crianças com alguns meses de vida)
ou genital e bolsa escrotal (nos adultos e crianças) –
FIGURA 6. Essas lesões são muito pruriginosas e podem
Esses organismos têm preferência pelas partes mais quentes do corpo permanecer por muito tempo, mesmo após o tratamento
como a porção inferior do abdome, nádegas, genitais, fossas axilares, adequado e, normalmente, não é possível isolar o S. scabiei
mamas, mãos (espaços interdigitais), cabeça (apenas nas crianças e delas (são desabitadas).
adultos imunodeficientes) e face anterior dos punhos e pés. São nesses
locais que encontramos a maior parte das lesões dermatológicas, que
podem ser variadas como: pápulas, nódulos, vesículas, pústulas,
escoriações, liquenificação e áreas de eczematização (FIGURA 5). A
manifestação dependerá da variedade e do número do agente envolvido,
além do tempo de evolução da doença, idade e status imunológico do
hospedeiro.
PEDICULUS CAPITIS

Tanto o macho quanto a fêmea do P. capitis alimentam-se do sangue


humano, e o ambiente ideal para a sua sobrevivência é no couro
cabeludo, lá encontrando as condições ideais para a ovopostura, onde
sobrevive por até 30 dias. Cada fêmea adulta põe em média dez ovos por
dia, denominados lêndeas (FIGURA 10). Estas ficam aderidas à base da
haste dos cabelos, mantendo a sua viabilidade quando próximos (até 6
mm) do couro cabeludo. As lêndeas são confundidas com “caspa”
(escamas seborreicas) ou resíduos de spray para cabelos, por terem
diâmetro diminuto (0,8 mm) e cor branco amarelada. Após sete dias, as
lêndeas eclodem liberando ninfas, que passam por três mudas seguidas
até chegar à fase adulta, em aproximadamente sete dias. A metamorfose
Fig. 8
total dura 15 dias. Faz diagnóstico diferencial com piedra branca, que é
uma micose superficial.

Fig. 7: Sarna crostosa.

Fig. 6: Escabiose nodular.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de escabiose é sugerido pelo prurido noturno,


lesões nas regiões cutâneas típicas e pela presença de
ESCABIOSE CROSTOSA
Fig. 9 (SARNA familiares com os mesmos sintomas. Pode ser confirmado,
NORUEGUESA) ocasionalmente, pelo exame microscópico direto com
solução de KOH 10% do raspado cutâneo das eminências
acarinas ou, principalmente, das escamas dos pacientes com
É provocada pelo mesmo agente da escabiose vulgar tendo,
a forma crostos, onde podem ser identificados o S. scabiei e
entretanto, como grande fator de-terminante, a alteração
TRANSMISSÃO
imunológica do paciente. Mais comumente observada em
seus ovos. Diante da baixa sensibilidade desse método,
muitas vezes acabamos recorrendo à prova terapêutica.
desnutridos, etilistas graves e pacientes com as mais diversas
causas
A forma de imunodeficiência,
infectante apresenta-se
é a fêmea adulta comPode
fecundada. grausser
variados
transmitida
de eritema
facilmente e descamação,
através desde lesõesoulocalizadas
do contato interpessoal nas regiões de
pelo compartilhamento TRATAMENTO
interdigitais,
fômites couro etc.),
(pentes, escovas, cabeludo e pavilhões
nas quais auriculares
o parasito até
pode permanecer
eritrodermia
vivo por e ceratoses palmoplantares associados com
poucos dias.
Juntamente com anti-histamínicos sistêmicos, dados para o
linfadenopatia e eosinofilia periférica (FIGURA 7). Nesses
alívio do prurido, devemos também prescrever medicações
pacientes a queixa de prurido pode estar ausente ou ser
discreta.
EPIDEMIOLOGIA escabicidas tópicas ou sistêmicas,
Fig. 10 todas igualmente eficazes.
Corticoesteroides de uso local também podem ser aplicados
nos casos de prurido excessivo e de nódulos no pênis e na
Tal como a escabiose e também por motivos semelhantes, a pediculose
bolsa escrotal. Entre elas, podemos citar:
do couro cabeludo primeiramente teve uma redução para recentemente
apresentar novo aumento do número de casos. Predomina em crianças
entre 3-10 anos. Estima-se uma prevalência entre 5-10% na população. PEDICULUS CORPORIS
Já a pediculose do corpo reduziu drasticamente a sua ocorrência,
especialmente pelo hábito de trocar de roupa diariamente, estando Este inseto vive nas dobras das roupas dos indivíduos infectados,
atualmente restrita a indivíduos com péssimos hábitos de higiene, como alcançando a pele humana apenas para o repasto sanguíneo. As fases de
mendigos de rua (“doença do vagabundo”). O Pediculus corporis já foi metamorfose são iguais às descritas para o P. capitis.
há muito tempo um causador de muitas mortes, ao transmitir o agente
do tifo epidêmico, uma ricketsiose provocada pela Rickettsia prowasekii,
que dizimou um grande número de pessoas na época das duas grandes PATOGÊNESE
guerras.

CICLO EVOLUTIVO
O piolho
1. Permetrina
causa prurido
5%: deve
e dermatose
ser colocada
pelo do
efeito
pescoço
da hipersensibilidade
para baixo, É fundamental tratar todos os indivíduos que moram com o
cutânea às
exceto
substâncias
em crianças
liberadas
até dez
pelaanos
sua esaliva
imunodeficientes,
e fezes. Alémnas
disso, o paciente, bem como seu parceiro ou parceira (namorados,
parasita quais
é um espoliador
a aplicaçãosanguíneo,
deve incluir
podendo
o couro
contribuir
cabeludo.
para
Essa
anemia por exemplo). No dia seguinte ao primeiro tratamento, o
ferropriva,
deve
especialmente
ser feita à noite,
em crianças
após o pequenas
banho, permanecendo
que se alimentam
até amal. indivíduo já poderia voltar às atividades habituais. Não há
retirada pela manhã. É recomendada a aplicação por necessidade de fazer a imersão em água fervente das roupas e
duas a três noites seguidas e uma segunda após 5-7 dias. dos lençóis, bastando apenas lavá-los normalmente até
Não
APRESENTAÇÃO CLÍNICA
deve ser aplicado em crianças menores de dois depois de dois dias de conclusão do tratamento. É
meses, em gestantes e durante o aleitamento. importante ressaltar que além de ineficaz, o uso de
O período de incubação vai de sete dias a três semanas. A pediculose do “sabonetes escabicidas” pode agravar o prurido. Após uma
2. Monossulfiram 25% em solução alcoólica (monossulfeto
couro cabeludo manifesta-se especialmente com prurido, o principal semana de tratamento, caso as lesões persistam, fica indicada
de tetraetiltiuram): diluir na proporção de uma parte do
incômodo desta ectoparasitose. Pode atrapalhar o sono e até mesmo o a sua repetição, de preferência com outro escabicida.
medicamento em duas a três de água para adultos e em
rendimento escolar de crianças. Podem ocorrer lesões eritematosas no
três a quatro partes de água para crianças. A aplicação
couro cabeludo e o paciente pode notar a presença das lêndeas
pode ser feita da mesma forma que a permetrina 5% com
(grânulos amarelo-esbranquiçados), distribuídas na base de seus PEDICULOSE
o cuidado adicional de alertar o paciente para não ingerir Fig. 11
cabelos. A coçadura pode causar escoriações, que podem culminar em
compostos alcoólicos pelo potencial de desenvolver o
piodermites secundárias.
efeito antabuse (efeito dissulfiram); AGENTE ETIOLÓGICO
3. Benzoato
A pediculose do de benzila
corpo 10-25%:
provoca lesõesapesar de bastante
papulour-ticariformes e
tradicional no tratamento da escabiose Dermatose causada pelo inseto do gênero Pediculus
purpúricas, com preferência pelo tronco, abdome(desde 1937) associadas
e nádegas, e do
baixo(dermatite
custo, vempruriginosa).
atualmente em desuso pelo potencial de (“piolho”) APRESENTAÇÃO
da ordem dos anopluro. CLÍNICA
Existem dois tipos de
a escoriações
eczematizar e agravar o prurido. É a substância ativa do pediculose: (1) do couro cabeludo, causada pelo Pediculus

bálsamo-do-peru. É utilizado de forma semelhante à (humanus) capitis (FIGURA 8); e (2) do corpo, causada pelo
O paciente apresenta intenso prurido nas áreas afetadas (virilha,
permetrina 5%; DIAGNÓSTICO Pediculus (humanus) corporis (FIGURA 9). São pequenos
genitália, etc.), com lesões papuloeritematosas. Lesões do tipo manchas
insetos hematófagos, medindo 3,0 mm (P. capitis) e 3,5 mm
4. Enxofre precipitado 5-10% em vaselina ou pasta d'água: azuladas podem aparecer pelo corpo (macula cerulea), por efeito
A maneira mais fácil (P. corporis), sem asas, com aparelho bucal picador-sugador
aplicado da émesma
o encontro
formadasque
lêndeas após o uso é,de para
os anteriores, um pente sistêmico de substâncias liberadas pelo parasita.
fino, embora a sua presença de
nãoescolha
necessariamente indique infestação e que apresentam na extremidade de suas patas uma forte
muitos, o tratamento para gestantes, lactantes
ativa (diagnóstico garra, como se fosse uma pinça que os mantêm fixos aos
e menores presuntivo).
de dois anos;O encontro dos adultos é mais difícil,
embora este seja o padrão-ouro para o diagnóstico. cabelos. DIAGNÓSTICO
5. Lindano (gama-hexa-cloro-benzeno ou gama-hexa-cloro-
ciclo-hexano) 1%: Já fora do mercado e utilizado de Achado do parasita na pele (geralmente com a cabeça parcialmente
TRATAMENTO
forma semelhante aos anteriores, constituía excelente introduzida no folículo piloso) e das lêndeas nos pelos.
opção terapêutica pela sua grande eficácia. Caiu em
Pode serdesuso pelosxampus
feito com relatosdedepermetrina
neurotoxicidade, sobretudo em
1% e deltametrina 0,02%.
crianças,
Ivermectina e pela
via oral doseassociação com
única (200 neoplasias
mcg/kg) do sistema
também é eficaz. As TRATAMENTO
nervoso
lêndeas devem sercentral nestacom
removidas faixapente
etária;fino, após passá-lo em vinagre
diluído
6. 1:1 em água morna.
Ivermectina: constitui a forma de tratamento sistêmico, Semelhante ao da pediculose (aplicar o xampu nas áreas

via oral, dose única diária, utilizando o comprimido de 6 comprometidas).

mg e respeitando oFITIRÍASE
peso do paciente na dose aproximada
de um comprimido pra cada 30 kg de peso (15-24 kg: 1/2 PULÍASE
comp., 25-35 kg: 1 comp., 36-50 kg: 1 ½ comp., 51-64 kg:
AGENTE
2 comp.,ETIOLÓGICO E CICLO
65-79 kg: 2 ½ comp., > 80 kg: EVOLUTIVO
3 comp.). Está
recomendada nas formas especiais da doença (crostosa, AGENTE ETIOLÓGICO E CICLO EVOLUTIVO
HIV) dos
É o “piolho e para pacientes
pelos com dermatite
pubianos”, tópicaconhecido
popularmente (todas ascomo
“chato”, demais podem
devido ao causar
formato dermatite
achatado por irritante
do parasita. primário),
Denomina-se Phtirus Diversas doenças podem ser causadas direta ou indiretamente pelas
mas não11).
pubis (FIGURA como rotina
A sua para as formas
morfologia é um clássicas, a fim deda do
pouco diferente “pulgas”, insetos da ordem dos sifonápteros. Estes ectoparasitos podem
Pediculus,evitar resistência.
medindo Por nãoO atuar
1,5 mm (fêmea). sobre osé semelhante
ciclo evolutivo ovos, o ao causar lesões cutâneas alérgicas (pulíase), decorrentes de sua picada e
tratamento
da pediculose é repetido
capitis, após umaquesemana
com a diferença paraacometidos
os pelos que também podem servir de vetores para doenças infecciosas humanas,
possamos
geralmente eliminar os
são os pubianos ácaros após
e perianais a sua eclosão. os
e eventualmente Deve ser do
axilares, como a peste bubônica, causada pelo bastonete Gram-negativo Yersinia
evitada
tronco, coxas em crianças A
e sobrancelhas. com menos deé 15
transmissão kg, em
através pacientes
da relação sexual. pestis, tularemia e tifo murino.
com alteração da barreira hematoencefálica e no período
de amamentação.
Ainda existem pequenos focos de peste bubônica no Brasil, mais
comumente em localidades dos estados do Nordeste. A doença é
transmitida pela “pulga dos roedores” (Xenopsylla cheopis) e o
reservatório é representado pelos ratos e ratazanas.
Aqui nos interessa a espécie Pulex irritans (FIGURA 12), a “pulga do O estrófulo, ou prurigo infantil (prurigo = síndrome caracterizada por
homem”, agente da pulíase humana (picada de pulga), um tipo de pápulas bastante pruriginosas), é uma afecção de crianças pequenas,
estrófulo, dermatose causada por picadas de inseto (pulgas, mosquitos, especialmente entre 1-2 anos de vida, causada por picada de insetos
formigas). A pulga do cão (Ctenocephalides canis) e a do gato ( (principalmente pulgas e mosquitos). Uma forma semelhante pode
Ctenocephalides felis), embora participem de nosso ambiente com ocorrer nos adultos. São lesões urticariformes, papuloerite-matosas,
animais domésticos, são agentes menos comuns da pulíase humana. As encimadas por vesículas (seropápula de Tomasoli) ou pequenas crostas,
pulgas são insetos hematófagos pequenos, sem asas, medindo 1-3 mm, mais comuns em áreas expostas e em crianças atópicas. Escoriações e
com corpo achatado lateralmente, possuindo aparelho bucal picador- liquenificação podem ocorrer (líquen urticado). A evolução é por surtos
sugador e o último par de patas adaptado à execução de grandes saltos, autolimitados. O prurigo de Hebra é uma reação de hipersensibilidade
facilitando a passagem entre dois hospedeiros. que pode ser deflagrada por pulgas e mosquitos, ocorrendo em crianças
principalmente da raça negra. São pequenas pápulas mais palpáveis que
visíveis, acometendo a face extensora dos membros e o tronco. Outras
condições similares seriam o prurigo simples do adulto (também
desencadeado por hipersensibilidade a insetos, além de causas variadas
como exposição solar e gravidez) e o prurigo nodular, de etiologia
desconhecida.

TRATAMENTO

Devem-se utilizar anti-histamínicos sistêmicos por período curto


associado ao tratamento tópico com cremes de corticoide ou pasta
d’água. No estrófulo e no prurigo de Hebra, a proteção contra picadas
de insetos é fundamental (repelentes, mosquiteiros, inseticidas, medidas
de higiene).

TUNGÍASE (BICHO-DE-PÉ)

Fig. 12
AGENTE ETIOLÓGICO E CICLO EVOLUTIVO

O agente é a Tunga penetrans (bicho-de-pé) – FIGURA 13–, um tipo de


As pulgas adultas são hematófagos obrigatórios e vivem boa parte do pulga de tamanho menor que as demais espécies: o adulto mede cerca
tempo parasitando a pele do hospedeiro próprio, mas podendo sugar de1 mm. Apesar de ambos os sexos serem hematófagos, apenas a fêmea
outra espécie animal, caso falte o seu preferido. As pulgas podem fecundada penetra nos tecidos do hospedeiro, alimentando-se e
sobreviver um longo período em jejum (40-120 dias), sendo, portanto, enchendo-se de ovos (cerca de 100), quando então toma uma forma
encontradas no meio ambiente doméstico (tapetes, cantos de paredes, hipertrofiada, denominada neosoma, do tamanho de um grão de
frestas do assoalho, panos, trapos) e peridomiciliar. ervilha. Os hospedeiros mais frequentes são o homem, o porco, o cão e
o gato.
O ser humano entra em contato com Pulex irritans quando a pulga salta
do ambiente ou de um hospedeiro acidental (cão, gato) para a pele
humana. A metamorfose da pulga é considerada completa (igual à da
borboleta), passando pelas seguintes fases: ovo - larva - pupa (forma
envolta em casulo) - adulto. A metamorfose completa dura 15-20 dias.

APRESENTAÇÃO CLÍNICA

A picada de pulga clássica é uma lesão urticariforme (urtica), ou seja,


pápula pálida ou rósea cercada de eritema, extremamente pruriginosa.
A intensidade da reação de hipersensibilidade de cada um irá
determinar a gravidade da lesão.
Fig. 13
Fig. 14

O parasita mantém a sua cabeça e corpo mergulhados na epiderme,


deixando para fora apenas a porção posterior, onde se encontra a
abertura genital. Os ovos são expelidos para o meio ambiente e a fêmea
TRATAMENTO
termina a sua postura ao longo de 15 dias, morrendo logo em seguida.
Os ovos caem no chão úmido e sombreado, onde eclodirão larvas que
sofrerão a metamorfose em dois estágios antes de formar a pupa e Consiste na enucleação do bicho-de-pé com agulha estéril, após
depois o adulto. Os machos e as fêmeas permanecem no chão em locais desinfecção local. A agulha é usada para escarificar a lesão, descobrindo
secos peridomiciliares, próximos a chiqueiros, montes de esterco, jardins o parasita que então é retirado manualmente. Eletrocauterização com
e hortas, aguardando o seu próximo hospedeiro (por exemplo, um ser anestesia local é um método alternativo. Nos casos de infestação
humano descalço). múltipla, pode-se fazer o tiabendazol oral 25 mg/kg, 2x/dia, por 3-5
dias.

APRESENTAÇÃO CLÍNICA
MIÍASE (BERNE OU BICHEIRA)
Surge uma pápula amarelada (batata) pruriginosa e dolorosa com um
ponto escuro central, representando a porção posterior do parasito AGENTE ETIOLÓGICOE CICLO EVOLUTIVO
(FIGURA 14). Pode ser uma ou múltiplas lesões, cada uma com uma
fêmea grávida, acometendo a planta do pé ou as pregas interdigitais ou
A miíase (myie = mosca, ase = doença) é a infestação tecidual por larvas
bordas periungueais.
de mosca. As moscas são insetos dípteros (duas asas) que podem
veicular parasitos ou causar a miíase, a infestação por suas larvas, que
se especializaram em alimentar-se do tecido animal. Existem dois tipos
de miíase: (1) miíase primária (berne): as larvas são capazes de penetrar
a pele sã; (2) miíase secundária (bicheira): as larvas são depositadas em
feridas abertas ou em cavidades corporais (olhos, nariz, ouvido, ânus,
vulva) – FIGURA 15. A miíase secundária pode ser causada por larvas
que se alimentam apenas de tecido necrótico e são parasitas facultativos
dos animais (miíase facultativa) ou por larvas que se alimentam de
tecido viável, sendo parasitas obrigatórios dos animais (miíase
obrigatória).
Fig. 18
Fig. 15

Os adultos da mosca varejeira (D. hominis) são moscas grandes de


No Brasil, a miíase primária (berne) – FIGURA 16 – é causada pelas
tórax cinza amarronzado e abdome azul metálico; suas larvas (bernes)
larvas (FIGURA 17) da mosca varejeira (Dermatobia hominis) – medem 1,5 mm quando recém-nascidas e chegam a 2 cm x 0,5 cm
FIGURA 18. A miíase secundária facultativa pode ser causada por quando desenvolvidas. Os adultos da C. hominivorax, C. macellaria e do
larvas de moscas do gênero Lucilia sp. ou da mosca Cochliomyia gênero Lucilia são moscas verde metálicas. Tanto os adultos quanto as
macellaria (Callitroga macellaria). A miíase secundária obrigatória é suas larvas são menores que os equivalentes da mosca varejeira. As
provocada por larvas de Cochliomyia hominivorax. As características larvas, quando no hospedeiro, posicionam-se com a extremidade
destas moscas e de suas larvas podem ser contempladas. posterior, contendo os espiráculos respiratórios, voltada para o orifício
de penetração (a larva respira ar atmosférico) e a extremidade anterior,
contendo o aparelho bucal, para dentro do tecido.

O ciclo evolutivo da D. hominis é interessante e representa o ciclo das


outras moscas causadoras de miíase (FIGURA 19). O adulto possui
vida curta (10 dias), mas antes disso, a fêmea fecundada em voos
rápidos captura outro inseto voador, como a mosca doméstica ou
mosquitos, e deposita seus ovos em seu abdome (15-20 ovos). Quando o
inseto pousa na pele do ser humano, os ovos são liberados e logo
eclodem larvas pequenas, que então penetram na pele e começam a
devorar o tecido do hospedeiro rapidamente, crescendo até 2 cm em 40-
60 dias. Em seguida abandona o hospedeiro e cai no chão, enterrando-
se na terra e terminando a metamorfose ao converter-se em pupa e
depois em adulto.
Fig. 16

Fig. 17
Fig. 19
No caso de C. hominivorax, C. macellaria e Lucilia sp., o ciclo é Consiste na enucleação da larva delicadamente com uma pinça, após
semelhante, porém não tem participação de insetos veiculadores: as atraí-la para o orifício de penetração por asfixia provocada. Pode-se
moscas adultas depositam seus ovos em grande quantidade nas feridas usar um esparadrapo ou um pedaço de toucinho, deixado por algumas
ou cavidades corporais, eclodindo den-tro de 24h, com as larvas horas (a larva gruda no esparadrapo ou penetra no toucinho). Uma
crescendo em 4-8 dias. As larvas podem alcançar 1,5 cm de tamanho e pequena incisão no local pode facilitar a saída da larva. Se o
são numerosas. Como vimos, larvas de C. hominivorax são parasitas procedimento não funcionar, ou ocasionar a morte do berne, mas sem a
obrigatórios e larvas de C. macellaria e Lucilia sp. são facultativos. sua retirada, a excisão cirúrgica está indicada.

APRESENTAÇÃO CLÍNICA TRATAMENTO DA MIÍASE SECUNDÁRIA

Retirada cuidadosa das larvas, após matá-las, utilizando-se éter ou


MIÍASE PRIMÁRIA FURUNCULOIDE (BERNE)
clorofórmio 5% em óleo de oliva. A ferida deve ser debridada. A miíase
cavitária muitas vezes necessita de uma cirurgia maior de debridamento,
O período de incubação vai até duas semanas. Pode acometer qualquer
durante a qual é retirada grande quantidade de larvas. A infecção
parte do corpo, predominando no couro cabeludo, na face e nos
bacteriana secundária deve ser tratada com antibióticos de amplo
membros. Pode ser foco único ou múltiplo, cada um apresentando uma
espectro para Gram-negativos, S. aureus e anaeróbios.
larva. Surge uma pápula pruriginosa que evolui ao longo de 2-3
semanas para um nódulo furunculoide de 1-3,5 cm, com orifício central
dando saída a material serossanguinolento e por onde a larva pode DERMATOVIROSES

aparecer de forma intermitente. O paciente sente dor, por vezes referida


como uma ferroada (latejante). Pode haver adenite satélite. Ao fim de
algumas semanas (geralmente um mês), o berne pode ser expelido
INTRODUÇÃO
espontaneamente, permitindo a formação de uma cicatriz. Nesse meio
tempo, o paciente sofre de dor ou incômodo e pode ainda complicar VIDEO_09_DER
com infecção secundária, celulite ou abscesso estafilocócico. As infecções virais são bastante comuns nos seres humanos. Na
infância, viroses transmitidas por via respiratória ou pelo contato entre
crianças são as predominantes, como a varicela, a rubéola, a
MIÍASE SECUNDÁRIA OBRIGATÓRIA (C. mononucleose infecciosa e o sarampo (doença praticamente erradicada
HOMINIVORAX) em nosso meio devido à vacinação). Estas são viroses exantemáticas,
abordadas com mais detalhes nos nossos módulos de Pediatria. No
As larvas penetram ou em feridas ou em cavidades mucosas (olhos, adulto, muitas viroses são transmitidas pelo contato íntimo ou sexual,
nariz, seios paranasais, vulva, ânus), destruindo os tecidos locais com como no caso do herpes e do HPV, viroses que também são expostas
grande voracidade, causando desfigurações. As larvas movimentam-se e devidamente no bloco de Gineco-Obstetrícia – IST. Neste capítulo,
aparecem na ferida ou insinuando-se nas cavidades mucosas de forma destacaremos os aspectos dermatológicos destas e de outras viroses.
intermitente, penetrando no tecido quando estimuladas. Há casos de
infestação por até 200 larvas!! Frequentemente, há infecção bacteriana
secundária, determinando febre, queda do estado geral ou sepse. A HERPES SIMPLES
letalidade pode chegar a 10%.
A família herpesviridae é formada por vírus DNA medindo 100-200 nm e
contém importantes agentes patogênicos para o ser humano, sendo este
MIÍASE SECUNDÁRIA FACULTATIVA
o seu único reservatório. São os chamados Herpesvírus Humanos
(HHV) e os principais exemplos são: Vírus Herpes-Simplex (HSV-1 e
Esta é a forma mais comum de miíase, ocorrendo em pacientes com HSV-2), Vírus Varicela-Zóster (VZV), Citomegalovírus (CMV), Vírus
feridas abertas prévias que apresentam áreas de necrose. Predomina em Epstein-Barr (EBV), o vírus herpes 6 (agente do exantema súbito) e o
mendigos, alcoólatras ou em pacientes debilitados, pela falta de cuidado vírus herpes 8 (agente do sarcoma de Kaposi). Vamos descrever neste
com as feridas. As larvas aparecem na superfície de forma intermitente e momento as lesões decorrentes dos HSV-1 e HSV-2 (herpes simples).
se movem provocando desconforto local.

Há dois tipos de vírus herpes-simplex: tipo 1 (HSV-1), responsável


As larvas deste tipo de miíase se alimentam de tecido necrótico e, principalmente por infecções na face e no tronco, e o tipo 2 (HSV-2),
portanto, não causam destruição do tecido adjacente, daí o bom relacionado especialmente às infecções genitais. Entretanto, ambos
prognóstico desses casos. podem infectar qualquer parte da pele ou das mucosas.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO INFECÇÕES PELO HSV-1

O diagnóstico é clínico, mas eventualmente, no caso da miíase de


cavidades mucosas, é necessária a complementação com exames de
imagem (TC) para avaliar a destruição tecidual.

TRATAMENTO DO BERNE
A transmissão do HSV-1 é por contato pessoal, próximo ou íntimo. Por
não resistir à secagem e à temperatura ambiente, a transmissão por
fômites ou aerossol é difícil. Os indivíduos portadores do HSV-1
transmitem o vírus pela saliva ou qualquer outra secreção infectada, ou
ainda pelo contato direto com as lesões. Cerca de 70% dos adultos com
mais de 40 anos são soropositivos para o HSV-1 e muitos o excretam de
forma intermitente na saliva ou secreções, mesmo quando
assintomáticos. As partículas virais (vírions) penetram facilmente as
mucosas e pequenas soluções de continuidade da pele (abrasões). Uma
vez adquirido, o HSV-1 penetra nas células da epiderme e derme,
multiplicando-se e atingindo terminações nervosas locais. A maioria
(cerca de 75% dos casos) não desenvolve sintomas e a infecção
permanece subclínica. A principal característica do vírus é a sua
persistência no organismo do hospedeiro: ele simplesmente não é
eliminado. Ao invés disso, caminha pelos axônios neurais e ganha os
corpos celulares dos neurônios do gânglio do trigêmio (gânglio de
Nasser), onde o seu genoma permanece em estado latente incorporado
Fig. 1*
no genoma celular. A qualquer momento, por mecanismos ainda não
conhecidos, o vírus pode voltar a se replicar nos neurônios do gânglio e
descer pelos nervos periféricos e terminações nervosas para novamente
atingir a pele e causar lesões. As manifestações clínicas são distintas e
estão relacionadas ao estado imunológico do paciente. Na
primoinfecção herpética, pela imaturidade do sistema imunológico
HERPES OROLABIAL (REATIVAÇÃO
específico contra o vírus, as manifestações clínicas, quando ocorrem, HERPÉTICA)
são floridas e mais prolongadas. Na reativação herpética, o quadro
clínico é mais brando, pelo uso da memória imunológica. Esta forma é mais comum em adultos. Pode ser desencadeada por
exposição ao sol, trauma, estresse emocional ou por uma infecção
respiratória febril. Iniciando-se com um pródromo de uma dor em
Embora o HSV-1 esteja mais relacionado à gengivoestomatite, ao
queimação ou ardência na região labial ou perilabial, cerca de 24h antes
herpes orolabial e ao herpes cutâneo, e o HSV-2 mais ao herpes genital,
do surgimento das lesões. Surgem vesículas agrupadas, com base
ambos os vírus podem causar qualquer das manifestações! O sexo oral é
eritematosa, acometendo uma pequena área orolabial unilateral (
geralmente o responsável pelo herpes oral por HSV-2 e pelo herpes
genital pelo HSV-1. FIGURAS 2A, 2B e 2C). Não há sinais e sintomas sistêmicos. A dor
melhora após as primeiras 24h e as lesões regridem após cinco dias. A
frequência de episódios recorrentes é extremamente variável. Um estudo
GENGIVOESTOMATITE HERPÉTICA mostrou que em 25% dos casos a recorrência era uma por mês, e em
(PRIMOINFECÇÃO) 20%, duas por ano (a maioria oscilava entre estes extremos).

Afeta principalmente crianças. O período de incubação entre a


exposição e o aparecimento dos sintomas é de 3-10 dias (média de 6-8
dias). O quadro inicia-se abruptamente com febre alta, dor de garganta,
mialgia, adenopatia cervical e aparecimento de lesões vesiculares
dolorosas múltiplas envolvendo lábios, região perioral e cavidade bucal.
As lesões clássicas do herpes simples são vesículas com base eritematosa
que posteriormente podem se romper, evoluindo para pequenas lesões
ulceradas (FIGURA 1), por vezes formando-se pequenas crostas. Pode
haver acometimento do palato e da faringe, provocando dificuldade
para deglutir alimentos e odinofagia. O principal diagnóstico diferencial
é com a herpangina (enterovirose por coxsackie A que produz vesículas
no palato, mas poupa a mucosa anterior da cavidade oral e a região
labial). A síndrome do HSV-1 é autolimitada, durando cerca de 10-14
dias, mas pode se estender por até seis semanas. A desidratação é uma
complicação comum e deve ser evitada... Alguns quadros de
primoinfecção herpética podem ser brandos, com poucas vesículas e
sem febre ou comprometimento do estado geral.
Fig. 3: Panarício herpético.

ERUPÇÃO VARICELIFORME DE KAPOSI


(ECZEMA HERPÉTICO)

A erupção variceliforme de Kaposi é um quadro de herpes simples que


se dissemina em lesões cutâneas preexistentes, geralmente em indivíduos
com dermatite atópica. Aparecem vesículas por toda área da dermatite e
que logo se transformam em pústulas (FIGURA 4).

Fig. 2

Fig. 4: Eczema herpético.

PANARÍCIO HERPÉTICO E HERPES CUTÂNEO

O HSV-1 pode causar lesões típicas (vesículas agrupadas com base


eritematosa) em qualquer parte da pele, geralmente após inoculação INFECÇÕES PELO HSV-2
direta do vírus. Predomina neste grupo o panarício herpético, adquirido
pelo contato do dedo com secreção contaminada ou lesão herpética. A transmissão é por contato sexual, geralmente se manifestando como
Pode ocorrer por autoinoculação. Médicos, dentistas, enfermeiros são herpes genital (que é uma IST). Embora na primoinfecção genital 30%
grupos de risco para este tipo de manifestação. O panarício herpético dos casos sejam pelo HSV-1, a reativação herpética genital quase
também pode ser causado pelo HSV-2... Surge abruptamente dor, sempre é pelo HSV-2. Estima-se que 20-50% dos adultos com vida
edema e eritema da extremidade do dígito com aparecimento das sexual ativa sejam portadores do vírus e podem transmiti-lo mesmo
vesículas (FIGURA 3). Sintomas sistêmicos e adenite satélite podem quando assintomáticos. Tal como no caso do HSV-1, a infecção por
ocorrer. HSV-2 também é persistente, com o vírus mantendo-se no estado de
latência nos gânglios sacrais. Este pode ser reativado a qualquer
momento, justificando os casos de herpes genital recorrente.

HERPES GENITAL
O quadro está mais bem descrito na apostila de Ginecologia de IST. O
período de incubação é de 3-14 dias e a duração dos sinais e sintomas é
em média de 12 dias para a primoinfecção e de 9 dias para a infecção
recorrente. No homem, as lesões ocorrem na glande e prepúcio, e na
mulher, nos grandes e pequenos lábios, clitóris e colo uterino. As lesões
são vesículas com base eritematosa, que evoluem para úlceras e crostas
sero-hemorrágicas (FIGURA 5). O quadro da primoinfecção é mais
proeminente e pode cursar com febre, adenopatia inguinal e queda do
estado geral. Disúria e secreção uretral no homem e corrimento aquoso
na mulher são relatados.

Fig. 6A: Eritema polimorfo.

Fig. 5

HERPES SIMPLES NEONATAL


Fig. 6B: Eritema polimorfo (multiforme).
Ocorre quando a mãe apresenta herpes genital com a contaminação do
neonato durante o parto. Pode se manifestar de três formas: (1)
envolvimento de pele, olho e mucosa oral; (2) encefalite; e (3) doença
disseminada. Atinge mais frequentemente cabeça ou região glútea. É
contraindicado o parto normal em gestantes apresentando herpes
genital.
HERPES SIMPLES EM IMUNODEPRIMIDOS

O HSV em latência surge frequentemente pela imunossupressão. É uma


OUTRAS MANIFESTAÇÕES DA INFECÇÃO das complicações mais frequentes na aids. A característica clínica
HERPÉTICA muitas vezes torna-se bem diferente do habitual, as lesões podem se
apresentar de forma verrucosa ou úlceras crônicas (FIGURAS 7A e 7B)
com mais de um mês de evolução, e acompanhado de dor. É a causa
ERITEMA POLIMORFO HERPÉTICO
mais frequente de úlceras orais na aids.

O eritema polimorfo ou multiforme é uma erupção cutâneo-mucosa por


hipersensibilidade disseminada que se caracteriza por lesões
papuloeritematosas, algumas do tipo em alvo (centro mais proeminente
ou vesiculoso), predominantemente na palma das mãos e membros –
FIGURA 6A e FIGURA 6B). Pode ser provocada por reação a drogas
ou por agentes infecciosos, destacando-se o vírus herpes-simplex. A
forma grave desta dermatose é a síndrome de Stevens-Johnson,
caracterizada pela disseminação das lesões para o tronco, que podem
ser eritematosas, purpúricas e bolhosas, e acometimento da mucosa
orogenital. Sempre que estivermos diante de um paciente apresentando
um quadro de eritema polimorfo, temos que investigar história de
herpes, por ser uma das principais causas. O quadro surge, em geral, 7-
10 dias após o herpes.
Primoinfecção (gengivoestomatite):
● Aciclovir VO 15 mg/kg, 5x/dia, por 7 dias.

Primoinfecção (herpes genital):


● Aciclovir VO 400 mg, 3x/dia, por 7-10 dias;
● Fanciclovir VO 250 mg, 3x/dia, por 7-10 dias;
● Valaciclovir 1.000 mg, 2x/dia, por 7-10 dias.

Panarício herpético:
● Aciclovir VO 400 mg, 3x/dia, por 10 dias.

Imunodeprimidos (aids, transplantados):


● Aciclovir IV 5 mg/kg 8/8h por 7 dias ou VO 400 mg 5x/dia
por 14-21 dias;
● Fanciclovir VO 500 mg, 2x/dia, por 7 dias;
● Valaciclovir 500 mg, 2x/dia, por 7-10 dias.

HERPES-ZÓSTER

O vírus varicela-zóster (VZV) causa dois tipos de doença no ser


humano: (1) varicela; e (2) herpes-zóster. A varicela é uma doença febril
com exantema vesicular disseminado que ocorre quase sempre na
infância e foi devidamente descrita na apostila de Pediatria. A varicela é
Fig. 7: Herpes simples genital em paciente com aids.
a primoinfecção pelo VZV, enquanto o herpes-zóster é a reativação do
vírus. O VZV, tal como o HSV-1 e HSV-2, permanece latente nos
neurônios ganglionares. A diferença é que qualquer gânglio da medula
espinhal e mesmo gânglios dos pares cranianos (trigêmio e geniculado)
podem conter o vírus. A partir desses gânglios, o vírus desce pelos
DIAGNÓSTICO nervos periféricos ou pares cranianos para novamente acometer a pele,
sempre respeitando um determinado dermátomo.
O diagnóstico é clínico. Na dúvida, uma possibilidade é o o método de
Tzanck (raspado do assoalho de uma vesícula, corando-se pelo Giemsa,
Leishman ou HE; o exame é positivo na presença de células
QUADRO CLÍNICO
multinucleadas que indicam infecção pelo vírus herpes-simplex ou pelo
VZV). O herpes-zóster ocorre vários anos depois do episódio de varicela (
FIGURAS 8A e 8B). É mais comum após os 40 anos de idade,
especialmente nos idosos. O quadro se manifesta em um dermátomo
TRATAMENTO unilateral (esta é a principal característica da doença!!). O paciente
refere um pródromo de dor em queimação na área do dermátomo
Não existe evidência científica sobre a eficácia dos antivirais de uso acometido, por vezes associada à febre. Dias depois aparecem as lesões:
tópico para o herpes. O tratamento objetiva reduzir a duração dos vesículas agrupadas com base eritematosa, dolorosas (FIGURAS 8C e
sintomas e o tempo de eliminação viral (contagiosidade). Nos 8D). A dor é decorrente da necroinflamação do gânglio reativado. Os
imunodeprimidos, diminui a letalidade da doença. Os antivirais são nervos mais frequentemente atingidos são os intercostais (50%), vindo,
indicados na primoinfecção (gengivoestomatite ou herpes genital), no em seguida, trigêmio (15%), cervical, lombar e lombossacro. As
herpes genital recorrente, no panarício herpético, no eczema herpético, vesículas tornam-se crostas e as lesões tendem a desaparecer em 2-4
no imunodeprimido e em qualquer manifestação sistêmica da virose semanas, podendo haver infecção bacteriana secundária.
(ceratoconjuntivite, encefalite, etc.).

As opções principais são aciclovir, valaciclovir e fanciclovir. No herpes


orolabial por reativação (herpes orolabial recorrente), o tratamento é
indicado quando pode ser iniciado antes do aparecimento das vesículas
(no pródromo). Veja alguns dos esquemas recomendados:

TRATAMENTO DA INFECÇÃO POR HSV-1 E HSV-2


O herpes-zóster oftálmico atinge a região do ramo oftálmico do
trigêmio, acometendo também a córnea e por vezes outras estruturas do
olho, com risco de amaurose. O envolvimento do ramo nasociliar leva à
formação de vesículas no lado ou na ponta do nariz – sinal de
Hutchinson. Na síndrome de Ramsay-Hunt, o território do gânglio
geniculado é contemplado, surgindo lesões no ouvido externo,
associadas a paralisia facial periférica e sintomas vestibulococleares
(vertigem, zumbido, hipoacusia).

Outras possíveis complicações são: Guillain-Barré e pupila de Argyll-


Robertson.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O diagnóstico é clínico ou confirmado pelo método de Tzanck. O


tratamento específico só é indicado se iniciado até 72h após o início dos
sintomas. Visa reduzir o tempo dos sinais e sintomas e o risco de
neuralgia pós-herpética. As doses são dobradas em relação ao herpes-
simplex... As opções são:

Aciclovir VO 800 mg, 5x/dia, por 7-10 dias;

Fanciclovir VO 500 mg, 3x/dia, por 7 dias;

Valaciclovir VO 1.000 mg, 3x/dia, por 7 dias.

Alguns autores recomendam associar corticoide no seguinte esquema:

● Prednisona 30 mg 2x/dia até o 7º dia + 15 mg 2x/dia até o 14º dia +


7,5 mg 2x/dia até completar 21 dias.

O uso da prednisona serviria para prevenção da neuralgia pós-herpética


e este benefício seria mais evidente nos pacientes acima de 50 anos.
Entretanto, este assunto permanece controverso.

A neuralgia pós-herpética é tratada com anticonvulsivantes (


carbamazepina 200 mg 2x/dia) e aplicação tópica de creme de capsaicina
0,025-0,075%.

HERPES-ZÓSTER EM IMUNODEPRIMIDOS

É comum em pacientes com aids e nos transplantados. Manifesta-se


com acometimento extenso por mais de um dermátomo e tende a ser
Fig. 8
recorrente. Estas características devem sempre aventar a suspeita de
imunodeficiência, indicando a solicitação do anti-HIV nos casos
apropriados. O tratamento, especialmente nos casos graves, é feito com
Aciclovir IV 10 mg/kg, 8/8h, por 10-14 dias. O corticoide está
A complicação principal é a neuralgia pós-herpética, ocorrendo em 10- contraindicado.
15% dos casos (mais comum nos idosos). Definida pela persistência (>
30 dias) de dor em queimação e disestesia na área afetada após o
desaparecimento das lesões. Pode persistir por meses ou anos se não
VÍRUS EPSTEIN-BARR
tratada e, eventualmente, é bastante limitante. (LEUCOPLASIA PILOSA)
É um vírus de distribuição universal, sendo que mais de 90% dos
adultos apresentam sorologia positiva para EBV. A primoinfecção
ocorre na infância, e a localização do vírus na faringe e glândulas
salivares permite a excreção pela saliva e disseminação viral. Além de
ser o agente etiológico da mononucleose infecciosa, uma virose
exantemática da infância, o EBV causa a leucoplasia pilosa oral,
caracterizada pelo surgimento de lesões filiformes esbranquiçadas na
cavidade oral, geralmente na face lateral da língua, assintomáticas
(FIGURA 9). Está quase sempre associado à aids e faz diagnóstico
diferencial com a candidíase oral. Ao contrário desta última, as placas
brancas não saem com a espátula... O tratamento antirretroviral do
HIV costuma ser suficiente para regredir a lesão. Terapia tópica com
podofilina ou isotretinoína é eventualmente usada.

Fig. 10****

Fig. 9: Leucoplasia pilosa oral.

PITIRÍASE RÓSEA DE GILBERT

É uma doença causada pelo herpesvírus subtipos 6 e 7, sazonal, mais


comum entre pessoas jovens. Inicia-se por uma lesão eritematoescamosa
arredondada, de crescimento centrífugo, atingindo, em média, 2-8 cm de
diâmetro, localizada em geral nos membros ou no tronco – é a lesão-
mãe, também chamada de medalhão (FIGURA 10). Depois de
aproximadamente duas semanas, surgem lesões menores,
eritematoescamosas (FIGURA 11), com predominância no tronco, e
certa frequência nos membros; a descamação é mais nítida na parte
interna da borda da lesão. O prurido é quase sempre discreto, e não há
sintomatologia geral; a involução ocorre dentro de 8 a 12 semanas.

Fig. 11: Pitiríase rósea.

Drogas são capazes de produzir quadro clínico semelhante:


isotretinoína, isoniazida, metronidazol, captopril, β-bloqueadores, etc.

Os principais diagnósticos diferenciais são com sífilis secundária,


farmacodermia, tinea corporis e psoríase.
A conduta é expectante, embora possamos utilizar corticoide tópico.
Nos casos muito extensos e eruptivos, podemos utilizar prednisona oral.

PAPILOMAVÍRUS HUMANO (HPV)


(VERRUGAS, CONDILOMA ACUMINADO, ETC.)

Os papilomavírus são vírus DNA medindo 45-55 nm, da família dos


papovavírus, que infectam células epiteliais da pele ou mucosas. Em
relação ao seu hospedeiro, são espécie-específicos, sendo que os
papilomavírus humanos (HPV) são exclusivos do ser humano. Existem
mais de 100 tipos de HPV, um grupo infectando a pele e o outro a
genitália. O primeiro grupo é o responsável pelas verrugas humanas,
epidermodisplasia verruciforme e doença de Bowen da pele; e o segundo
grupo, pelo condiloma acuminado, papulose bowenoide, doença de
Bowen da mucosa e neoplasia intraepitelial e carcinoma de colo uterino
(principal), vulva, pênis e ânus.

VERRUGA HUMANA

É uma papilomatose da pele causada por diversos tipos de HPV.


Existem vários tipos de HPV causadores de verruga, predominando os
tipos 1, 2 e 4 na verruga vulgar e plantar, e os tipos 3 e 10 nas verrugas
planas (ver adiante). A prevalência de verrugas é maior em crianças e
adolescentes (pico entre 12-16 anos). Cerca de 10% das crianças e 3,5% Fig. 12: Verruga vulgar.
dos adultos apresentam esta afecção. É uma doença universal e estima-
se que atinja até 25% das consultas ambulatoriais de dermatologia. A
infectividade do vírus em um indivíduo depende da carga do vírus e da
imunidade do hospedeiro. A transmissão é pelo contato direto
interpessoal, autoinoculação ou por piscinas e recintos esportivos.
Existem várias formas clínicas: (1) verrugas vulgares (70% dos casos);
VERRUGA PLANTAR
(2) plantares (25% dos casos); e (3) planas (5% dos casos). Um tipo
especial do ponto de vista epidemiológico é a “verruga vulgar do Pelo efeito da pressão do corpo, as verrugas plantares têm crescimento
açougueiro”, que ocorre nas mãos e dedos, sendo causada normalmente endofítico, apresentando-se como lesões planas com halo
pelos tipos 2 e 7 de HPV. hiperceratórico (FIGURA 13), sendo conhecidas popularmente como
“olho de peixe”. Frequentemente é muito dolorosa, dificultando a
deambulação, sendo então denominada mirmécia.
A verruga é uma pápula hiperceratósica, devido à hiperproliferação
epitelial localizada. Após a inoculação epidérmica do HPV o período de
incubação é em torno de três meses. As verrugas podem ser
permanentes ou podem regredir espontaneamente dentro de dois anos,
especialmente em crianças, nas quais isso ocorre em 60-70% dos casos.
Agora descreveremos os tipos principais de verruga...

VERRUGA VULGAR

É o tipo mais comum e mais clássico. É uma lesão papulovegetante


hiperceratórica de tamanho variável. Pode ser única ou múltipla e
predomina no dorso das mãos, dedos (região periungueal) e pés
(FIGURA 12).

Fig. 13****

VERRUGAS PLANAS
São pápulas planas de 1-5 mm, ligeiramente salientes (liquenoides), de
cor levemente amarelada, sendo numerosas (FIGURA 14) e
predominando no dorso das mãos, no antebraço, pescoço e na face.

Fig. 15: Verruga filiforme.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O diagnóstico é clínico, raramente sendo necessário o exame


Fig. 14: Verrugas planas (pescoço).* histopatológico de um fragmento (revelando achados típicos). O
tratamento é a destruição local da verruga e para isso diversos métodos
podem ser utilizados. É importante ressaltar que toda a verruga deve ser
eliminada juntamente com uma pequena parte da epiderme sã logo
abaixo da lesão, para reduzir o risco de recidiva da virose. As verrugas
VERRUGA FILIFORME vulgares geralmente são tratadas com ceratolíticos do tipo ácido
salicílico 16,5% (associado a ácido láctico 14,5%), aplicado
exclusivamente na lesão 1x/dia por sete dias, crioterapia com nitrogênio
É semelhante a uma espícula, saindo de forma perpendicular ou oblíqua
líquido, cirurgia (eletrocoagulação + curetagem), ácido tricloroacético
à pele (FIGURA 15). Predominam na face (pálpebra, comissuras da
(TCA) 50-70%, laser ablativo (CO2) ou fita crepe. Durante o
boca) e pescoço.
procedimento cirúrgico, pode ser indicada anestesia local e o médico
deve se proteger com máscara das partículas virais dispersas no ar... A
crioterapia tem a vantagem de efeito mais rápido, embora seja uma
técnica dolorosa... A verruga plantar é de tratamento difícil, dando-se
preferência para o ácido nítrico fumegante 66%, após raspagem da
verruga. É contraindicada a cirurgia de eletrocoagulação pela
dificuldade de cicatrização na região plantar. As verrugas planas podem
ser destruídas com tretinoína 0,05-0,1% gel ou creme diariamente à
noite por 4-6 semanas. A associação com crioterapia pode ser
necessária. Uma alternativa é o 5-Fluorouracil (5-FU) 5% creme,
diariamente por sete dias. As verrugas filiformes são tratadas com
exérese cirúrgica seguida de eletrocoagulação da base.

EPIDERMODISPLASIA VERRUCIFORME (LUTZ-


LEWANDOWSKI)
Causada pelos tipos 5 e 8 de HPV. É uma doença genética de herança Esta doença é devidamente descrita na apostila de Ginecologia de IST.
autossômica recessiva, que se manifesta na infância ou adolescência A transmissão é sexual. É a doença venérea mais comum, causada na
com xerodermia e erupção papuloverrucosa disseminada. As lesões são maioria das vezes pelos tipos 6 e 11, de baixo risco oncogênico.
semelhantes às da verruga plana, entre 2-6 mm de diâmetro ( Aproximadamente 80% das pessoas sexualmente ativas serão
FIGURAS 16A e 16B), e podem coalescer, formando placas. São portadoras do vírus em algum momento de suas vidas. É fundamental
comuns lesões de fotoexposição solar nas áreas expostas, como saber que a maioria dos indivíduos infectados e que elimina o vírus do
melanose e ceratose solar (actínica). Futuramente, cerca de 50% dos condiloma nas secreções genitais não apresenta lesões e não sabe que
casos evoluem para carcinoma espinocelular, surgindo lesões ulceradas. está infectado! O vírus é altamente transmissível, passando para 2/3 dos
contactantes! O preservativo de látex não previne a transmissão. A
melhor maneira de prevenir é reduzindo o número de parceiros sexuais
(este é o maior fator de risco...). O condiloma acuminado manifesta-se
como excrecências verrucosas tipo couve-flor de tamanho variado
(FIGURA 17), acometendo no homem a região balanoprepucial e na
mulher, a vulva, períneo, vagina e colo uterino. Em ambos os sexos,
pode acometer o ânus e a região perianal. Só para lembrar, os tipos 16 e
18 de HPV são altamente oncogênicos, mas são agentes incomuns do
condiloma.

Fig. 16

CONDILOMA ACUMINADO(VERRUGA
GENITAL)

Fig. 17

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
O diagnóstico é clínico, porém, nos casos duvidosos com lesões muito É uma dermatose pré-maligna originada por alguns subtipos de HPV
pequenas, a aceticoscopia permite a identificação: aplica-se ao local (16, 18, 31, 33, 35, etc.) com potencial oncogênico. Apresenta-se
ácido acético 3-5%, fazendo as lesões ficarem esbranquiçadas. O exame clinicamente como pápulas de coloração acastanhada, medindo 4-5
ginecológico de rotina pode fazer o diagnóstico utilizando-se a mm, localizados preferencialmente no pênis (FIGURA 19), vulva,
colposcopia e a anuscopia. A biópsia confirma os casos de diagnóstico região perianal ou períneo de adultos jovens, sexualmente ativos. O uso
clínico incerto. O tratamento é feito com a destruição local do prévio de podofilina é fator de risco...
condiloma. As opções podem ser classificadas naquelas realizadas pelo
médico e nas realizadas em casa pelo paciente. No primeiro grupo (pelo
médico), podemos utilizar a podofilina 25% 1x/semana até seis semanas
ou desaparecimento completo das lesões, ou o ácido tricloroacético
(TCA) 80-90%, repetindo-se após uma semana, ou crioterapia, ou
eletrocoagulação, ou laser ablativo CO2, interferon intralesional. No
segundo grupo (pelo paciente), as alternativas são: podofilox 0,05%
solução, usando-se o cotonete e aplicando-se 2x/dia por três dias,
descansando quatro dias e repetindo-se o ciclo por 4-6 semanas, ou
imiquimode 5% creme 3x/semana ao deitar por até 16 semanas. O
imiquimode tem mostrado uma taxa menor de recidiva, embora seja
bem mais caro. Vale ressaltar que a podofilina, o podofilox e o
imiquimode são contraindicados na gestante, cujo condiloma deve ser
tratado com TCA ou cirurgia. O acompanhamento é fundamental, para
diagnosticar e tratar as recidivas. Fig. 19: Papulose bowenoide.

CONDILOMA ACUMINADO GIGANTE


(BUSCHKE-LÖWENSTEIN)
MOLUSCO CONTAGIOSO
É um condiloma de grandes dimensões (FIGURA 18), que pode
obstruir a vulva ou o ânus, causado geralmente pelos tipos 6 e 11 de
Causado pelo maior vírus já encontrado, mede cerca de 300 nm. Este
HPV. A gestação é um importante fator de risco. O tratamento é feito
vírus é do tipo DNA que pertence ao grupo Poxvírus, em especial ao
com eletrocoagulação ou laser ablativo. Nos casos mais extensos, o
subgrupo Parapoxvírus. Acomete a pele humana e é transmitido pelo
etretinato via oral pode ser benéfico, associado à terapia local.
contato próximo interpessoal, sendo mais comum em crianças e
adolescentes. Pode também ser transmitido por via sexual. As lesões
dermatológicas encontradas são pápulas com umbilicação central,
medindo aproximadamente 0,5 cm, geralmente agrupadas e sem base
eritematosa (FIGURA 20). Em pacientes imunodeprimidos, podemos
encontrar lesões maiores e mais numerosas. No adulto, acomete mais
área genital, enquanto na criança atinge mais face, tronco e membros
superiores. Existem duas micoses profundas, histoplasmose e
criptococose, que podem se expressar clinicamente com lesões
semelhantes ao molusco nos pacientes com HIV e aids.

Fig. 18""

PAPULOSE BOWENOIDE

Fig. 20""
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O diagnóstico é clínico, embora nos casos duvidosos a biópsia o


confirme. A curetagem é o método de eleição para o tratamento. É
necessário o retorno a cada duas semanas para tratar possíveis lesões
que apareçam posteriormente.

ACRODERMATITE PAPULOSA INFANTIL


(SÍNDROME DE GIANOTTI-CROSTI)

Tem como principal etiologia o vírus da hepatite B, porém outros vírus


também podem desencadeá-la (CMV, Epstein-Barr, coxsackie A16, B4,
B5, echovirus 7 e 9, poliovírus, parvovírus, etc.). Clinicamente,
caracteriza-se por erupção eritematosa ou papuloeritematosa, não
pruriginosa, sem tendência a confluir, localizada na face, nádegas,
membros e tronco (FIGURAS 21A e 21B), de instalação em cerca de 3-
5 dias e perdura por 3-8 semanas, acompanhada de linfadenopatia,
principalmente inguinal e axilar.

Fig. 21: Síndrome de Gianotti-Crosti.

*As FIGURAS 1, 8A, 8B, 11A, 14 e 17 foram gentilmente cedidas


por Fabiano Leal.

**As FIGURAS 12A, 12B e 16A por Luna Azulay.

***FIGURA 2A por Elisa Fontenelle.

****FIGURAS 10 e 13 por Sergio Serpa. A FIGURA 2C por


Eduardo Bornhausen Demarch

”A FIGURA 7A por Carolina Belo, 5 e 7B por Nanashara Diane.

””FIGURAS 18 e 20 por Aguinaldo Bonalumi.


Tipos mais comuns Frequência relativa

Exantema induzido por drogas. 45-75%

Urticária/angioedema. 20-25%

Eritema pigmentar fixo. 10%

Eritema multiforme (fixo). 5-6%

Outras erupções. < 5%

Em relação à patogênese e à fisiopatologia, podemos classificar as


farmacodermias em não imunológicas (não alérgicas) e imunológicas
(alérgicas).

1. Não alérgicas:

● Superdosagem (ex.: necrose por derivados do ergot);

● Fatores individuais (ex.: idiossincrasia e intolerância);

● Efeitos colaterais (ex.: alopecia pelo uso de citostáticos);

● Alteração do equilíbrio ecológico (ex.: candidíase vaginal após


corticoterapia ou antibioticoterapia);

● Teratogenicidade (ex.: focomelia por talidomida);

2
Cap. ● Fototoxicidade (ex.: tetraciclina, dapsona, psoralenos);
FARMACODERMIAS

● Interações medicamentosas (ex.: inibindo ou estimulando a


metabolização pelo citocromo p450).

Neste grupo merecem destaque:

INTRODUÇÃO
a. A urticária não alérgica, provocada pela liberação histamínica
induzida por contrastes iodados, morfina, codeína, curare
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As farmacodermias são reações cutâneas aos diversos medicamentos (antracúrio, vecurônio, succinilcolina) e inibidores da ECA

utilizados na prática médica. Estima-se uma incidência entre 2 e 3% dos (FIGURA 1);
pacientes hospitalizados. Qualquer fármaco pode causar erupções b. A necrose cutânea pelo cumarínico, quadro grave decorrente de
cutâneas, embora os mais frequentemente implicados sejam as fenômeno tromboclusivo dos vasos cutâneos (FIGURA 2);
penicilinas (especialmente as aminopenicilinas), as sulfonamidas, os
c. A reação de Jarisch-Herxheimer. Esta última é observada
anticonvulsivantes aromáticos (fenitoína, carbamazepina, fenobarbital),
classicamente após o uso da penicilina G benzatina para tratar a
os Anti-Inflamatórios Não Esteroidais (AINE) do grupo dos oxicams
sífilis. Ocorre após 4 a 12 horas da primeira injeção, manifestando-se
(piroxicam, tenoxicam, etc.) e butazonas (fenilbutazona), inibidores da
por febre moderada, mal-estar, cefaleia, mialgia, rubor facial,
ECA, hidralazina e alopurinol. Existem vários tipos de farmacodermia,
leucocitose, exacerbação das lesões preexistentes ou um novo rash
cada um apresentando o seu grupo de drogas mais comumente
eritematoso, durando até 24 horas. Ocorre em 50% dos casos na
envolvidas (ver adiante). É claro que existem medicamentos que estão
sífilis primária, em 90% dos casos na sífilis secundária e em 25% na
incluídos em mais de um tipo de erupção cutânea. Virtualmente,
sífilis latente.
qualquer quadro clínico pode ser mimetizado por fármacos. Algumas
formas são graves e potencialmente fatais, como a reação anafilática, a
Síndrome de Stevens-Johnson (SSJ) e, principalmente, a Necrólise
Epidérmica Tóxica (NET). Excetuando-se a reação local a medicações
tópicas, exemplificada pela dermatite de contato, vamos destacar os
principais tipos de farmacodermia quanto à sua incidência relativa
(Tabela 1).

Tab. 1: Tipos de farmacodermia.


Drogas mais comuns

Betalactâmicos (penicilinas).
Sulfonamidas.
Eritromicina.
Gentamicina.
Anticonvulsivantes aromáticos.

O rash cutâneo aparece geralmente dentro de duas semanas após início


da droga (podendo também ocorrer até duas semanas após a sua
suspensão). O mecanismo é desconhecido. Um tipo clássico é o rash
induzido pela ampicilina em 85% dos pacientes com mononucleose
infecciosa (vírus Epstein-Barr). É uma erupção eritematosa
maculopapular de distribuição simétrica, geralmente pruriginosa, que
surge principalmente no tronco e nas áreas de pressão em pacientes
acamados (FIGURA 3).

Fig. 1

Fig. 2
Fig. 3

2. Alérgicas (segundo a classificação de Gell e Coombs):


Pode ser do tipo morbiliforme (com lesões eritematosas confluentes,
● Reação tipo I: imediata (após 30 a 60 minutos), mediada por IgE, semelhantes ao sarampo). Com a suspensão da droga, desaparece em
provocando degranulação de mastócitos e basófilos, liberando uma a duas semanas. O principal diagnóstico diferencial é com as
histamina, prostaglandinas e leucotrienos. Representada por viroses exantemáticas.
urticária, angioedema e reação anafilática;

● Reação tipo II: citotoxidade mediada por anticorpos (IgG e IgM); URTICÁRIA E ANGIOEDEMA
● Reação tipo III: mediada por imunocomplexos. Exemplificada
pela vasculite cutânea e a doença do soro;
Drogas mais comuns
● Reação tipo IV: mediada pela imunidade celular (linfócitos T
helper). Exemplificada pela dermatite de contato.

Devemos ressaltar que muitas formas de farmacodermia não têm


mecanismo muito bem estabelecido, como é o caso de eritema
multiforme, SSJ e NET.

EXANTEMA INDUZIDO POR DROGAS


Penicilinas.
Cefalosporinas.
Sulfonamidas.
Contraste iodado.
AINE (oxicams, butazonas).
Anestésicos.
Plasma (na deficiência de IgA).
Látex.
Não IgE mediada:
Morfina, codeína;
Contraste iodado;
IECA (principalmente captopril).

A urticária é um distúrbio comum na população (cerca de 20% das


pessoas terão um episódio ao longo da vida), caracterizado por placas
eritematosas, de bordos irregulares, confluentes ou não, com o centro
pálido, predominando no tronco e nas extremidades proximais, bastante
pruriginosas, conhecido como urtica ou ponfo (FIGURA 4). Algumas se
apresentam como lesões policíclicas. O prurido pode ser generalizado,
referido mesmo nas áreas sem lesão. Pode ser classificada em aguda (< 6
semanas) ou crônica (> 6 semanas). Na forma aguda, a chance de
encontrar uma causa específica é maior e costuma estar relacionada a
infecções e reação a medicamentos, comida ou insetos. No caso dos Fig. 5

medicamentos, pode aparecer 30 a 60 minutos após (imediata) ou


mesmo dias após sua administração (tardia). Na urticária crônica, não
identificamos a etiologia em 80-90% dos casos, sendo comumente
O edema de glote é uma complicação esperada e pode vir associado a
autolimitada, com duração média de 2-5 anos.
uma reação de náuseas e vômitos, febre baixa, hipotensão ou choque
(choque anafilático). É o que chamamos de reação anafilática e pode
matar o paciente se não tratado de imediato. A fisiopatogenia da
urticária e do angioedema é semelhante, o que difere é a profundidade
do acometimento. O angioedema é dividido em: adquirido e hereditário.
No angioedema hereditário, há uma deficiência do inibidor da C1q
esterase.

O tratamento da urticária/angioedema medicamentoso é a suspensão da


droga implicada e o início de anti-histamínicos. As drogas de escolha
são os antagonistas-H1. Os anti-histamínicos de primeira geração, com
potencial sedativo e efeitos anticolinérgicos (boca seca, visão borrada,
retenção urinária, diplopia, secura vaginal), são representados pela
hidroxizina, na dose de 25 a 50 mg 6/6h, dexclorfeniramina 2 mg 6/6h,
prometazina 25 mg 6/6h. Os anti-histamínicos de nova geração (não
Fig. 4
sedativos) são: loratadina 10 mg/dia, cetirizina 10 mg/dia, fexofenadina
60 a 120 mg 2x/dia.

O angioedema (edema angioneurótico) está presente em 50% dos casos Nos casos refratários, pode-se associar um antagonista-H2 (ranitidina,
ou pode vir de forma isolada. É caracterizado pelo edema mole dos cimetidina, famotidina). Os corticoides (prednisona 30 a 40 mg/dia) são
lábios, pálpebras, língua, de apresentação assimétrica e algumas vezes de valor limitado em urticária/angioedema agudos, embora possam ser
desfigurante (FIGURA 5). acrescentados nos casos mais graves. A adrenalina (epinefrina) IM na
dose 0,3 a 0,5 ml da solução 1:1.000 é indicada no tratamento da reação
anafilática (como principal droga!!).

Já nos casos de angioedema hereditário, pode-se fazer reposição do


inibidor de C1q esterase nas crises, e nos períodos intercrise, é utilizado
danazol, estanazol, oximetolona, ácido épsilon aminocaproico e ácido
tranexâmico na tentativa de evitar uma crise.
Fenoftaleína (laxantes).
Anafilaxia
Tetraciclinas.
Sulfonamidas.
Trata-se de uma grave reação multissistêmica, potencialmente
fatal e de início rápido, cujo mecanismo principal está Penicilinas.
relacionado à liberação abrupta de mediadores sistêmicos por Barbitúricos (fenobarbital).
mastócitos. Normalmente, teremos a produção de anticorpos AINE (oxicams, butazonas).
IgE em uma exposição prévia a um antígeno, associada à
Salicilatos.
degranulação mastocitária quando ocorre a reexposição ao
antígeno. É possível a liberação direta destes mediadores
também por medicamentos e fatores físicos. Para o
Caracterizado pelo surgimento de uma ou múltiplas lesões, que
diagnóstico de anafilaxia, é necessário um dos dois critérios:
começam com uma tonalidade eritematosa, e com o passar do tempo,
vão ficando acastanhadas, bordos bem definidos, não pruriginosas
1 - Evento de início agudo (minutos a várias horas) de uma (eventualmente com sensação de queimação), predominando na face, no
doença com envolvimento da pele, mucosa, ou ambos pescoço, nas extremidades e na genitália, de distribuição assimétrica
(urticária generalizada, prurido ou edema de lábios, língua (FIGURA 6A). Podem ocorrer bolhas. O diagnóstico é confirmado
e úvula) e que, pelo menos, um dos seguintes sinais ou quando surge a mesma lesão, exatamente nos mesmos locais das lesões
sintomas estejam presentes: alteração respiratória (ex: prévias, após nova exposição à droga. As lesões recorrentes podem
dispneia, sibilância) ou pressão arterial baixa ou sintomas deixar hiperpigmentação residual (FIGURA 6B).
associados de disfunção orgânica.

2 - Dois ou mais dos seguintes sinais e sintomas, ocorrendo


rapidamente (minutos a várias horas), após exposição a
um provável alérgeno para aquele paciente: envolvimento
da pele e mucosa (urticária generalizada, prurido ou
edema de lábios, língua ou úvula), alteração respiratória
(dispneia, sibilância/broncoespasmo, estridor, redução do
PFE e hipoxemia), pressão arterial baixa ou sintomas
associados de disfunção orgânica (hipotonia, colapso,
síncope e incontinência), sintomas gastrointestinais
persistentes (dor abdominal em cólica, vômitos).

A ANAFILAXIA É UMA EMERGÊNCIA MÉDICA!!! Na


abordagem, além da manutenção de vias aéreas pérvias, a
primeira medida farmacológica a ser adotada é a
administração de adrenalina intramuscular (primeira linha, na
coxa anterolateral) ou intravenosa. A dose é de 0,01 mg/kg
(0,01 ml/kg) da solução de 1 mg/ml (1:1.000). Importante:
lembre-se de que a via subcutânea não é recomendada, uma
vez que a absorção é incerta. As demais medidas incluem:
reposição volêmica (o choque é distributivo), anti-histamínicos Fig. 6
(angioedema e prurido), corticoides (visando sintomas tardios,
porém de ação questionável) e broncodilatadores (sibilância
refratária). A posição supina com membros inferiores elevados
também está indicada.

VASCULITE POR HIPERSENSIBILIDADE

Tem como mecanismo proposto a reação de hipersensibilidade tipo III,


ERITEMA PIGMENTAR FIXO
ou seja, uma doença por imunocomplexos, causando vasculite
leucocitoclástica de predomínio nos membros inferiores. O paciente
apresenta uma erupção eritematosa maculopapular que se transforma
Drogas mais comuns
num rash purpúrico, com petéquias e púrpuras confluentes, de
distribuição simétrica pelos membros inferiores (FIGURA 7). A
presença da púrpura palpável (elevada) e a ausência de plaquetopenia
são bastante sugestivos do diagnóstico. Lesões urticariformes, bolhas e
necrose podem ocorrer.
Embora exista relação com drogas em alguns casos, é fundamental
frisar que, na maioria das vezes, o eritema multiforme minor não é
causado pela exposição a drogas, mas sim pela infecção pelo vírus
herpes-simplex (eritema multiforme herpético). As lesões surgem
geralmente até seis dias após o herpes labial recorrente (forma mais
comum de herpes associado). Cerca de 90% dos casos de eritema
multiforme de curso recidivante estão associados ao vírus herpes-
simplex, sendo que em 80% desses casos ocorre herpes manifesto; no
restante, observa-se apenas o DNA viral na epiderme das áreas de lesão.

Trata-se de uma erupção eritematosa de início súbito, distribuição


simétrica, raramente pruriginosa, predominando na porção extensora
dos membros, mãos e pés (embora possa ocorrer na região palmar), face
e eventualmente mucosa oral. Em alguns casos, o rash progride
centripetamente para o tronco (FIGURA 8). Uma vez estabelecida, o
rash cutâneo é estável e desaparece espontaneamente após uma a três
semanas, com um curso extremamente benigno.

Fig. 7

A erupção pode ser assintomática ou associada a um conjunto de sinais


e sintomas que recebem a denominação de doença do soro. Esta pode se
apresentar com ou sem a vasculite cutânea leucocitoclástica e/ou lesão
urticariforme. Caracteriza-se pela ocorrência, sete a dez dias após a
administração da droga, de febre alta, mialgias, artralgias e
linfadenopatia. Por ser uma doença mediada por imunocomplexos, há
queda do complemento plasmático. Suspendendo-se o medicamento, os
sintomas desaparecem em dias ou poucas semanas.

ERITEMA POLIMORFO (ERITEMA


MULTIFORME)

Drogas mais comuns

Sulfonamidas.
Penicilinas.
Quinolonas. Fig. 8
Cefalosporinas.
Anticonvulsivantes aromáticos.
Alopurinol.
AINE.

Aqui descreveremos o eritema multiforme minor, que deve ser


diferenciado do eritema multiforme major (síndrome de Stevens-
Johnson), uma erupção que pode compartilhar tipos de lesão com a
forma minor, mas que parece ser uma entidade patogênica e
fisiopatológica diferente (ver adiante).
As lesões podem ser de várias morfologias (como o nome sugere),
embora alguns pacientes possam ter apenas uma delas. O aspecto mais
comum é o de lesões eritematopapulares arredondadas, bordos bem
definidos, tamanhos variados (poucos milímetros a 2 cm), que podem
ou não apresentar confluência. Muitas dessas lesões apresentam bordas
edematoeritematosas e centros violáceos ou pigmentados ou podem ter
características purpúricas (FIGURA 9). As lesões clássicas do eritema
polimorfo são as “lesões em alvo” ou “lesões em íris”, que são
fundamentais para o diagnóstico. Caracterizam-se por terem anéis
concêntricos alternados, cada um com uma morfologia ou cor diferente.
As lesões típicas são elevadas e possuem três ou mais anéis. As lesões em
alvo atípicas são achatadas ou planas e contêm apenas dois anéis. São
exemplos de lesão em alvo aquelas com centro eritematoso, violáceo ou
vesiculoso, circulado por palidez e novamente eritema (FIGURA 10). Fig. 11

Em alguns pacientes, surgem algumas bolhas (eritema multiforme


bolhoso). As lesões mucosas são vistas em 70% dos casos,
apresentando-se nos lábios, cavidade bucal, palato, gengiva e genital
Não há fase prodrômica e tipicamente não ocorrem sintomas
(FIGURA 11). São lesões enantematosas, erosadas ou esbranquiçadas,
constitucionais. O estado geral do paciente encontra-se bom. Pelo seu
geralmente dolorosas.
curso benigno e autolimitado, geralmente não há necessidade de
tratamento.

Na dúvida diagnóstica, pode-se confirmá-lo pela biópsia. A doença


acomete basicamente a derme superficial, que se encontra edemaciada e
contendo infiltrado mononuclear (linfocítico), predominando na junção
dermoepidérmica. Há degeneração hidrópica da camada basal, discreta
espongiose (edema intercelular dos queratinócitos) e necrose satélite dos
queratinócitos (em volta de infiltrado linfocítico).

SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON E
NECRÓLISE EPIDÉRMICA TÓXICA
(SÍNDROME DE LYELL)
Fig. 9

Drogas mais comuns

Sulfonamidas.
Penicilinas.
Quinolonas.
Cefalosporinas.
Anticonvulsivantes aromáticos.
Alopurinol.
AINE.

A Síndrome de Stevens-Johnson (SSJ) e a Necrólise Epidérmica Tóxica


(NET) provavelmente constituem espectros de uma mesma doença,
sendo a NET uma forma mais grave do que a SSJ. Este conceito é
relativamente recente, já que estas síndromes foram apresentadas como
Fig. 10 entidades diferentes.

Em 1922, Stevens e Johnson descreveram uma síndrome de crianças


com febre, estomatite crostosa, envolvimento ocular grave e lesões
cutâneas disseminadas eritematopigmentadas. Em 1956, Lyell descreveu
uma síndrome em adultos semelhante à síndrome da pele escaldada
estafilocócica, com necrose epidérmica e rash eritematomacular. Daí
também chamarmos a NET de síndrome de Lyell.
São doenças cutâneas que possuem um potencial de evolução grave, Um defeito da detoxicação hepática e cutânea de metabólitos
com letalidade de 5% para a SSJ e de 30 a 50% para a NET. A causa medicamentosos pode ser observado em alguns pacientes propensos.
mais comum de morte é a septicemia secundária. Nestes indivíduos acumulam-se em níveis maiores as hidroxilaminas
reativas do metabolismo das sulfonamidas e óxidos de areno do
metabolismo dos anticonvulsivantes aromáticos. Estes metabólitos estão
CLASSIFICAÇÃO E EPIDEMIOLOGIA
envolvidos na gênese da síndrome. No caso dos agentes infecciosos, o
queratinócito seria sensibilizado por antígenos virais.
Segundo consensos atuais, a diferença entre as duas entidades é apenas
quantitativa. Ambas são definidas pelo acometimento de duas ou mais
O grave dano epidérmico na SSJ e NET decorre da ação dos linfócitos
áreas de mucosa (oral, ocular, genital), exantema eritematoso
T citotóxicos CD8 que, ao interagirem com os queratinócitos
disseminado contendo lesões em alvo atípicas e lesões bolhosas que
sensibilizados, induz a sua apoptose. A liberação local de TNF-alfa é
geram desnudamento cutâneo (escaldamento). O termo SSJ é reservado
extrema, fruto da interação entre macrófagos ativados e queratinócitos.
para os casos com menos de 10% de pele desnudada e o termo NET,
A imunofluorescência é negativa.
para os casos mais graves, com mais de 30% de pele desnudada. Os
pacientes intermediários com 10 a 30% de pele desnudada são referidos
como overlap SSJ-NET. A SSJ é inapropriadamente referida por alguns O histopatológico revela um discreto infiltrado inflamatório
como “eritema multiforme major”. Pela estatística americana, a SSJ é mononuclear subepidérmico, com degeneração hidrópica da camada
duas vezes mais comum que a NET e a proporção de casos entre as três basal e extensa necrose eosinofílica da epiderme. Nas áreas bolhosas ou
entidades (SSJ, overlap, NET) é de aproximadamente 3:2:1,7. Todas elas desnudas, há caracteristicamente necrose de toda a espessura da
são cerca de duas vezes mais comuns em mulheres. Predominam nos epiderme e descolamento subepidérmico.
adultos, embora possam ocorrer em crianças, especialmente a SSJ. A
taxa de ocorrência entre as drogas mais incriminadas é de 10 a 20 casos MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
a cada 100.000 administrações do fármaco.

■ SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON
ETIOLOGIA
Um estágio prodrômico de 1 a 14 dias é encontrado em metade dos
A relação com medicamentos é encontrada em mais de 50% com a SSJ e pacientes, caracterizando-se por febre, mal-estar, cefaleia, coriza, angina
em 80 a 95% com a NET. As drogas mais frequentemente suspeitas são (comprometimento orofaríngeo), mialgias, artralgias (síndrome gripal) e
a penicilina, os antibióticos penicilina, os antibióticos contendo sulfa, eventualmente vômitos e diarreia. Nesse momento, o paciente pode
os barbitúricos, os anticonvulsivantes, os analgésicos, os anti- fazer uso de analgésicos-antitérmicos que podem ser implicados
inflamatórios não esteroides e o alopurinol. Em alguns casos, ocorre inadvertidamente na causa da erupção.
juntamente com uma outra doença grave, complicando o diagnóstico.
As manifestações clínicas ocorrem com uma média de 14 dias após a
Quadro cutâneo: começa com uma erupção eritematosa maculopapular,
exposição, porém com ampla variação (1 a 45 dias). Após a reexposição,
por vezes morbiliforme, aparecendo no tronco e na face e progredindo
o período de latência é mais curto e as manifestações são mais graves. A
centrifugamente para as extremidades. Algumas lesões individuais são
SSJ pode ser causada por agentes infecciosos, destacando-se o
lesões em alvo atípicas, achatadas, com centro violáceo ou pigmentado e
Mycoplasma pneumoniae. Esta infecção está presente em 15% dos casos
halo eritematoso. São maiores que as do eritema multiforme minor. As
de SSJ e costuma ocorrer entre 5 e 20 anos de idade. Outros agentes
lesões são dolorosas e tendem à confluência, especialmente na face, no
podem estar relacionados, embora mais raramente.
pescoço e no tórax anterior, que podem apresentar um eritema difuso e
bolhas (FIGURAS 12 e 13), ocasionalmente hemorrágicas. A pele do
Existe um aumento importante da incidência de SSJ/NET em pacientes paciente exibe o sinal de Nikolsky positivo: descolamento da epiderme
portadores de HIV, especialmente os casos provocados pelas após tração manual. Este sinal é precoce e aparece antes de surgirem as
sulfonamidas. Há também uma relação genética com o HLA A29 e B12. áreas de desnudamento espontâneo. Dentro dos primeiros quatro a
cinco dias as lesões eritematosas aumentam em número e tamanho. As
FISIOPATOLOGIA E PATOLOGIA áreas de eritema confluente podem originar áreas desnudas
(FIGURA 14), desprendendo epiderme necrótica, com aspecto de
escaldadura. Por definição, na SSJ estas áreas somam no máximo 10%
A patogênese e a fisiopatologia são parcialmente conhecidas. Dependem
da pele total.
do poder citotóxico direto dos linfócitos T CD8 sobre os queratinócitos
da epiderme, modulados pelos linfócitos T CD4. Não há participação
importante dos anticorpos. Aparentemente, a droga, ou mais
comumente um metabólito da droga, é incorporado na membrana dos
queratinócitos, servindo de hapteno ao ligar-se no complexo de
histocompatibilidade classe I.
● Lesões mucosas: são universais e são fundamentais para a definição
clínica da síndrome. Costumam ser extensas e muito sintomáticas.
Duas ou mais membranas mucosas estão envolvidas, entre oral,
ocular e genital. Em 40% dos casos, as três estão comprometidas. Na
mucosa oral (estomatite), os lábios, cavidade bucal, palato e língua
podem apresentar lesões. O quadro começa com queimação labial e
oral, evoluindo com edema, eritema e bolhas que logo se rompem,
deixando erosões vermelho hemorrágicas, cobertas por
pseudomembranas branco acinzentadas e úlceras rasas aftosas. Os
lábios são recobertos por crostas hemorrágicas características da
síndrome (FIGURAS 15 e 16).

Fig. 12

Fig. 15

Fig. 13

Fig. 14
Fig. 17

■ NECRÓLISE EPIDÉRMICA TÓXICA

Também é comum a fase prodrômica, tal como na SSJ. Surge um rash


cutâneo eritematoso morbiliforme, com ou sem lesões-alvo atípicas,
predominando na face e no tronco e evoluindo para confluência. A pele
já nesta fase apresenta sinal de Nikolsky positivo (FIGURA 18). Ao
longo de quatro a cinco dias, as lesões cutâneas transformam-se em
Fig. 16 grandes bolhas flácidas que deixam grandes áreas cutâneas desnudas,
que aparecem como erosões gotejantes serosas intensamente
eritematosas (FIGURA 19). O desnudamento atinge 30 a 90% da
superfície corporal e assemelha-se a um grande queimado por
As lesões orais são bastante dolorosas. Pode ocorrer acometimento de escaldadura. O acometimento das mucosas é extenso e grave, tal como
gengiva, faringe, laringe e até esôfago e traqueia. O envolvimento genital na SSJ.
quase sempre inclui lesões erosivas (após rotura de bolhas
hemorrágicas) ou purulentas, ocupando a vulva, a vagina ou a glande e
a fossa navicular, podendo levar a retenção urinária e parafimose
(FIGURA 17). As lesões oculares são potencialmente graves e podem
deixar sequelas. Há conjuntivite (olho vermelho) e queimação ocular,
evoluindo para vesiculação, erosões dolorosas e lacrimejamento
bilateral. Em casos mais graves, surgem conjuntivite purulenta,
pseudomembranas, úlceras da córnea, uveíte anterior e panoftalmite. As
sequelas oculares podem levar à cegueira e podem ser: simbléfaro
(aderência da conjuntiva palpebral à córnea), sinéquia, entrópio
(inversão palpebral), ectrópio (eversão palpebral), triquíase (inversão
ciliar), opacidades corneanas e cicatrizes. A intervenção de um
oftalmologista na fase precoce é fundamental para o tratamento dessas
lesões...

Fig. 18
Embora alguns autores tenham sugerido a transferência rotineira dos
pacientes (especialmente aqueles com NET) para o centro de
queimados, esta conduta não é necessária para a maioria dos casos. As
fórmulas de reposição volêmica para o grande queimado também não
se aplicam à SSJ/NET, pois as lesões são diferentes: na queimadura, há
lesão dérmica importante e a lesão vascular com extravasamento de
fluidos para o interstício, é o principal mecanismo da perda fluida; na
SSJ/NET, a lesão dérmica é discreta e a perda hidroeletrolítica ocorre
basicamente pelo mecanismo transepidérmico (evaporação).

De qualquer forma, os pacientes com SSJ/NET devem ser internados no


hospital e tratados numa enfermaria com cuidados especializados. O
principal tratamento é o de suporte, incluindo as seguintes medidas:

1. Reposição hidroeletrolítica, guiada pelos sinais vitais, hematócrito e


eletrólitos séricos;

2. Nutrição enteral (a maioria dos pacientes não tolera ingestão oral);

3. Asseio traqueobrônquico;

4. Medidas oftalmológicas preventivas (lubrificantes oculares, limpeza


e remoção de adesões);

5. Debridamento da pele necrótica apenas quando terminar a


progressão da doença (fase estável), recobrindo-se as lesões com gaze
embebida em soro fisiológico ou curativos hidrocoloides. Deve ser
evitada a sulfadiazina de prata, pelo risco de agravamento do
mecanismo de destruição imunológica.

Fig. 19 O uso de corticoides em dose alta (1 mg/kg/dia de prednisolona) é


bastante controverso!! Alguns autores preconizam o seu uso quando o
paciente está na fase precoce da doença, enquanto ainda há progressão
das lesões. O tratamento é por período curto: uma a duas semanas e
desmame rápido. Outros autores contraindicam os corticoides por
ALTERAÇÕES ORGÂNICAS E LABORATORIAIS alegarem a piora do prognóstico, por agravarem as infecções.

A SSJ e a NET, frequentemente, são acompanhadas de alterações O uso de antibioticoterapia sistêmica profilática não é preconizado.
laboratoriais inflamatórias e distúrbios hidroeletrolíticos. Estes são mais Entretanto, qualquer sinal focal ou sistêmico de infecção deve
comuns e mais graves na NET. Exemplos: leucocitose neutrofílica leve a imediatamente indicar coleta de material para cultura e início de
moderada, anemia leve, hipoalbuminemia, microalbuminúria, elevação antibióticos. Na fase inicial, predominam os Gram-positivos,
de transaminases, aumento do VHS e proteína C-reativa. Na especialmente o S. aureus; na fase tardia, devemos cobrir também P.
desidratação grave, pode haver azotemia pré-renal. O acometimento aeruginosa.
orgânico é raro na SSJ e comum na NET. Predominam lesões no
aparelho respiratório, no trato gastrointestinal e no fígado. São Tratamentos inovadores têm sido testados, como a imunoglobulina
descritos: dispneia, tosse, obstrução traqueal, desprendimento da intravenosa, plasmaferese, ciclosporina, ciclofosfamida, N-acetilcisteína
mucosa traqueobrônquica, expectoração de cálculos bronquiais, e fatores derivados de colônia (GCSF). Um estudo com a talidomida
infiltrado pulmonar, broncopneumonia e raramente SDRA. A sepse não mostrou benefício.A utilização de imunoglobulina não vem
pode contribuir para alguns desses achados. No trato gastrointestinal: encontrando respaldo nos últimos estudos. Por outro lado, evidências
diarreia, dor abdominal, hemorragia digestiva; no fígado, podemos ter mostram um possível papel para a ciclosporina como terapia adjuvante.
hepatite com icterícia e elevação proeminente das enzimas hepáticas.

PROGNÓSTICO
TRATAMENTO
Embora sejam doenças com potencial de graves complicações e até de
fatalidade (como já vimos), tanto a SSJ quanto a NET possuem curso
autolimitado, com as lesões começando a regredir após três a seis
semanas. As lesões cicatriciais costumam afetar as mucosas, com
especial importância para a ocular. Ao contrário do grande queimado,
não há necessidade de cirurgia plástica com enxerto cutâneo, pois a
resolução das lesões de pele costuma ocorrer sem sequelas.
Os fatores de mau prognóstico são: idade avançada, HIV positivo, Já foi devidamente descrito no bloco de Reumatologia. Para relembrar,
ingestão de múltiplos fármacos, lesão orgânica (especialmente renal), é causado principalmente pela hidralazina em doses acima de 200
desnudamento extenso. A causa mais comum de morte é a septicemia. mg/dia. Outras drogas frequentemente implicadas são: procainamida,
anticonvulsivantes aromáticos, isoniazida. O paciente desenvolve um
rash cutâneo lúpus-símile, com fotodermatose, rash malar, rash discoide,
OUTRAS FARMACODERMIAS erupção eritematosa maculopapular difusa, além de lesões orais, artrite,
serosite e alterações hematológicas (citopenias). Caracteristicamente
FOTODERMATOSES POR FÁRMACOS não há comprometimento renal e do sistema nervoso central. A doença
desaparece em algumas semanas com a suspensão da droga.

Podem ser de dois tipos: (1) erupções fototóxicas; (2) erupções


fotoalérgicas. Nas erupções fototóxicas, o fármaco se distribui pela pele SÍNDROME DE HIPERSENSIBILIDADE (DRESS –
e aumenta a sua sensibilidade física à radiação ultravioleta tipo UVA. O DRUG REACTION WITH EOSINOPHILIA AND
paciente evolui tal como uma queimadura de sol intensa, de primeiro ou SYSTEMIC SYMPTOMS)
segundo grau (bolhosa), em áreas fotoexpostas, sem ter tido uma
exposição tão intensa ao sol (FIGURA 20). As drogas mais envolvidas
É uma síndrome rara, potencialmente grave, que aparece entre duas a
são: tetraciclinas, AINE, fenotiazinas, amiodarona e psoraleno.
seis semanas após exposição à droga, sendo mais comum com os
anticonvulsivantes aromáticos, especialmente a fenitoína e o alopurinol.
O paciente apresenta-se inicialmente com febre, mal-estar,
linfadenopatia e erupção cutânea morbiliforme, que pode se tornar
confluente e progredir para uma dermatite esfoliativa. Manifestações
hematológicas típicas são eosinofilia e linfocitose atípica. Envolvimento
de órgão interno é esperado, com acometimento hepático em 60-80%
dos pacientes. Outros achados seriam nefrite e pneumonite intersticiais.
Após a suspensão do medicamento envolvido, que é a principal medida
terapêutica a ser estabelecida, a melhora ocorre gradualmente dentro de
seis a nove semanas.

A presença de importante adenopatia cervical, axilar, intratorácica e


retroperitoneal com febre caracteriza a síndrome do pseudolinfoma
típica da fenitoína.

Fig. 20
PÊNFIGO E PENFIGOIDE FARMACOINDUZIDO

O pênfigo é uma bulose intraepidérmica autoimune caracterizado por


Na erupção fotoalérgica, os raios ultravioleta do sol transformam a acantólise (perda da aderência entre os queratinócitos epidérmicos) e
droga num composto imunogênico, que sensibiliza os linfócitos e formação de bolhas flácidas que se rompem. Quando induzido por
determina lesões do tipo eczema, também em áreas fotoexpostas. Os drogas possui as mesmas características dos pênfigos idiopáticos (ver
agentes mais comuns são os tópicos, como produtos fenólicos em capítulo de buloses). O histopatológico com imunofluorescência é
sabonetes e substâncias usadas em determinadas fragrâncias. confirmatório. As drogas mais implicadas são as que possuem
grupamento tiol (SH): captopril, piroxicam, penicilamina, penicilina.

ERITRODERMIA EXFOLIATIVA
O penfigoide é uma bulose subepidérmica autoimune por destacamento
dermoepidérmico. As bolhas são tensas, diferentemente do pênfigo.
Este termo identifica um eritema descamativo difuso disseminado pelo
Pode ser autolimitado (farmacodermia típica) ou persistente (neste caso,
corpo, envolvendo mais de 50% da superfície cutânea. Pode ser causado
a droga somente foi o desencadeante da forma idiopática). A
por psoríase, eczema atópico, micose fungoide (síndrome de Sézary) e
histopatologia com imunofluorescência também é diagnóstica.
farmacodermia, esta última responsável por cerca de 10% dos casos. As
drogas mais envolvidas são: sais de ouro, arsenicais, mercuriais,
barbitúricos e penicilinas. PUSTULOSE EXANTEMATOSA GENERALIZADA
AGUDA (PEGA)
LÚPUS FARMACOINDUZIDO
É uma farmacodermia caracterizada pela formação de múltiplas
pústulas estéreis não foliculares com base eritematosa, pruriginosas ou
dolorosas, distribuídas de forma simétrica, predominantemente na face
e nas regiões intertriginosas (FIGURA 21). Febre moderada e
leucocitose neutrofílica são comuns.
Fig. 21

Esta erupção tem latência extremamente curta, ocorrendo após 24 horas


da exposição ao fármaco e desaparecendo em poucos dias (nove a dez
dias) após a sua suspensão.

O histopatológico é compatível com uma vasculite dérmica. As drogas


mais incriminadas são: penicilinas e macrolídeos.

ERUPÇÃO LIQUENOIDE

Semelhante ao líquen plano: pequenas placas achatadas, violáceas e


bastante pruriginosas, de distribuição simétrica por tronco e membros. Fig. 22
A mucosa oral é envolvida em até 70% dos casos. As drogas mais
envolvidas são: metildopa, betabloqueadores, AINE, quinidina,
penicilamina, reveladores fotográficos.

ERUPÇÃO ACNEIFORME IODODERMA E BROMODERMA

Múltiplas pápulas inflamatórias e pústulas, distribuídas pela face, pelos Diversas drogas contêm iodo ou bromo em suas preparações. A
ombros (FIGURAS 22A e 22B) e pelo tórax superior, muito amiodarona e os contrastes radiológicos são os principais exemplos de
semelhantes à acne inflamatória (mas sem comedões típicos), podem preparados com iodo. Existem xaropes para tosse antigos que contêm
ocorrer após uso das seguintes drogas: corticosteroides, anabolizantes, iodeto de potássio. Diversas drogas contêm brometo, como o brometo
anticoncepcionais, barbitúricos, tioureias, lítio, tuberculostáticos, de ipatrópio ou tiotrópio (DPOC) e o brometo de priridostigmina
halógenos, como iodo, bromo e cloro, além de algumas medicações (miastenia gravis).
tópicas faciais. Desaparecem após a suspensão das drogas, mas, muitas
vezes, exigem tratamento da mesma forma como é feito para a acne. As lesões dependem de mecanismo de hipersensibilidade celular, com
atração de linfócitos, macrófagos e neutrófilos para o local
sensibilizado. No iododerma, ocorre erupção acneiforme, com pápulas e
pústulas em regiões seborreicas do corpo (face, tronco superior). Lesões
purpúricas, supurativas e ulceradas podem ocorrer.

No bromoderma, surgem lesões vegetantes, ulceradas e pustulares, de


curso crônico e insidioso, predominando nos membros inferiores e na
região malar.

* As FIGURAS 6B e 22B deste capítulo foram gentilmente


cedidas por Eduardo B. Demarch.
** A FIGURA 7B por Fabiano Leal.
Fig. 6B: Eritema polimorfo (multiforme).

Fig. 7: Herpes simples genital em paciente com aids.

3
Cap. DERMATITES ECZEMATOSAS

INTRODUÇÃO

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O termo eczema é derivado do grego ekzein e significa ebulição,
efervescência. Ele se refere a um conjunto de dermatoses inflamatórias
que compartilham o fato de apresentarem, no início do seu
desenvolvimento, a espongiose (edema intercelular da epiderme),
podendo evoluir com a formação de liquenificação. A dermatite
espongiótica é, muitas vezes, percebida ao exame físico como
vesiculação ou, até mesmo, bolhas (FIGURA 1). Daí a vesícula ser
considerada, por alguns autores, como a lesão elementar mais
característica desses quadros. Atualmente os termos eczema e dermatite
são tomados como sinônimos pela maioria dos textos.
ETIOLOGIA

A dermatite atópica consiste em um processo inflamatório cutâneo


crônico, pruriginoso e recorrente. Em cerca de 80% dos pacientes são
encontradas outras manifestações de atopia (rinite alérgica, asma, etc.).
É tipicamente uma doença da infância – metade dos casos se apresenta
no primeiro ano de vida e 80% até os cinco anos. Apenas 2% dos casos
ocorrem após os 45 anos. Apesar da etiologia desconhecida, são
reconhecidos diversos fatores que participam da sua patogênese:

■ FATORES GENÉTICOS:

História familiar em 70% dos casos;

Fig. 1: Comparação entre a pele normal e a espongiótica. Se ambos os pais forem atópicos, 81% das crianças desenvolvem
manifestações de atopia.

Muitos fatores podem ser implicados na sua gênese, e duas ou mais ■ FATORES FISIOLÓGICOS:
formas de eczema podem estar presentes simultaneamente. Independen-
temente do tipo, normalmente eles são o resultado da interação entre Psicofisiologia: tendência à hiperatividade;
fatores relativos ao organismo e elementos externos a ele (Quadro 1),
sendo, assim, divididos em dois grandes grupos. Prurido: autoperpetuador e agravado no período noturno, o que traz
grande desconforto aos pais, alterando o padrão do sono;

Sudorese: assim como a xerodermia, agrava ou incita o prurido;

Reatividade vascular anômala: vasoconstrição periférica e


dermografismo branco.

■ FATORES IMUNOLÓGICOS:

Elevação de IgE, quando associada a manifestações respiratórias e,


neste caso, correlaciona-se com a gravidade da doença;

Deficiência seletiva de IgA, mais frequente que na população geral;

Depressão imune celular: este dado é bem observado na prática diária


pela maior frequência de infecções bacterianas, lesões mais extensas de
Nos casos em que predominam os elementos externos são chamados de molusco contagioso, de lesões de verruga vulgar refratárias ao
exógenos, e os internos, de endógenos (Quadro 2). tratamento e do herpes simples.

Quadro 2 A colonização por Staphylococcus aureus ocorre em 75 a


90% dos pacientes.
Eczemas Exógenos Eczemas Endógenos

Uma possível complicação que devemos ficar atentos, é o


● Dermatite de contato por ● Dermatite atópica
chamado ECZEMA HERPÉTICO ou ERUPÇÃO
irritante primário ● Dermatite seborreica VARICELIFORME DE KAPOSI, que é a disseminação do
● Dermatite de contato vírus herpes simples.
● Eczema asteatótico
alérgica
● Eczema discoide

QUADRO CLÍNICO
DERMATITE ATÓPICA (ECZEMA ATÓPICO)
Além da história de atopia, as principais características são:
● Prurido intenso (máximo à noite, levando à inversão do sono);

● Xerose cutânea (aumenta perda de água transepidérmica e diminui


retenção da camada córnea);

● Lesões com mais de seis semanas, cursando com exacerbações e


remissões (40% mantêm sintomas até a vida adulta);

● Liquenificação da pele.

As apresentações típicas podem ser divididas em três estágios, de acordo


com a idade:

● Lactente (2 meses-2 anos): lesões eritematosas, papulosas ou


papulovesiculares (eczema agudo), evoluindo para descamação com
exsudato seroso. Afeta principalmente a face, couro cabeludo,
pescoço e superfícies extensoras, normalmente poupando a região da
fralda.

● Fase infantil (2-12 anos): lesões vesiculosas subagudas com menos


exsudação (pele muito seca e liquenificação residual persistente).
Afeta preferencialmente áreas flexoras (especialmente fossas
poplíteas e cubitais), nádegas, raiz posterior da coxa, dorso das
mãos, tornozelo e pescoço.

● Fase do adolescente e do adulto (> 12 anos): placas mais localizadas


e com predomínio da liquenificação (liquenoide). Acometem
principalmente as superfícies de flexão, punhos, dorso das mãos, Fig. 2: Lesão típica da forma infantil em áreas flexoras como a fossa
poplítea.
pescoço e pálpebras inferiores.

DIAGNÓSTICO

Podemos utilizar duas formas principais de estabelecer o diagnóstico de


dermatite atópica:

● Hanifin e Rajka (clássicos): são necessários três critérios maiores e


três menores, conforme o quadro ao lado:

● United Kingdom Work Group (Willians e col. – mais recentes):

Presença de prurido cutâneo somado a três ou mais dos critérios a


seguir:

1. História de prurido envolvendo áreas flexurais, cervical, palpebral,


tornozelos;
Fig. 3: Pitiríase alba (eczemátide) – máculas hipocrômicas mal
2. História de pele seca generalizada no último ano; delimitadas.

3. Início das lesões de pele antes dos dois anos de idade (esse critério
somente é aplicado para pacientes com quatro anos ou mais);

4. Dermatite atual envolvendo áreas flexurais (ou região


malar/fronte/face externa dos membros em pacientes menores de
quatro anos). Critérios Diagnósticos de Dermatite Atópica
Segundo Hanifin e Rajka (1980)

Critérios maiores Critérios menores


Cuidados gerais:
Prurido Xerose
● Ambientais: banhos, vestuário, cortinas, brinquedos e almofadas,
Típica distribuição e Ictiose/hiperlinearidade
animais domésticos, cama. Todos os materiais devem ser de fácil
morfologia das lesões palmar
lavagem para evitar acúmulo de ácaros;
Evolução crônica ou Reatividade do prick test
recorrente
● Emolientes;
IgE sérica elevada
História pessoal ou familiar Início em idade precoce
● Alimentares: prova da exposição/exclusão;
de atopia (asma, rinite ou Apoio psicológico aos pais, orientando quanto à história natural de
Suscetibilidade para ●

DA) períodos de exacerbação e acalmia;


infecções cutâneas
Tendência para dermatite ● Corticosteroides: mais indicado o uso de corticoide tópico de média
inespecífica de mãos e pés ou alta potência. Em crianças deve-se evitar o uso de corticoide de
Eczema mamilar alta potência, principalmente na região das dobras cutâneas, pela
Queilites maior capacidade de absorção e efeitos sistêmicos;

Conjuntivites recorrentes ● Antibioticoterapia sistêmica. Está indicada nas formas extensas,


Ceratocone (extremamente mesmo sem evidência clara de infecção secundária. A maior
raro) colonização por estafilococos nestes pacientes serve como
superantígeno, isto é, agravamento das lesões de eczema atópico. O
Catarata subcapsular
superantígeno é capaz de estimular os linfócitos de forma intensa e
anterior
sem precisar da célula apresentadora de antígenos;
Escurecimento orbital
● Anti-histamínicos sedativos, pois há agravamento noturno,
Eritema facial
interferindo no padrão do sono;
Pitiríase alba
● Imunomoduladores: talidomida, pimecrolimus, tracolimus,
Pregas anteriores em
fototerapia;
pescoço
Prurido em áreas de suor
● Imunossupressores: azatioprina, ciclosporina A.

Intolerância à lã
O pimecrolimus e o tacrolimus são conhecidos como
Acentuação perifolicular
imunomoduladores ou macrolídeos imunossupressores.
(ceratose folicular)
Alergia alimentar
Influência de fatores DERMATITE DE CONTATO
emocionais e ambientais
Dermografismo branco DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE
(atrito na pele levando à PRIMÁRIO (DCIP)
vasoconstrição)

Nestes casos, um irritante é qualquer agente químico capaz de produzir


inflamação quando aplicado sobre a pele na concentração e tempo
suficientes, sem a participação do mecanismo de memória imunológica
(sem sensibilização prévia). Irritantes fortes geram dermatite em
virtualmente todos os indivíduos, ao passo que os fracos, apenas nos
mais susceptíveis ou após repetidas exposições.

A DCIP é uma das principais causas de doenças ocupacionais


(mecânicos, lavadeiras, serventes, professoras, domésticas, etc.).
Exemplo clássico é a dermatite das mãos das donas de casa,
desencadeada pelo uso de sabões e detergentes, que inicia nas polpas
digitais e eminências palmares, levando à xerodermia, à fissura e à
descamação (FIGURA 5).

Fig. 4: Prega de Dennie-Morgan – dupla prega infraorbitária. Sinal de


Hertogue: redução dos folículos pilosos no terço distal das
sobrancelhas secundária ao prurido. Outro achado seria o tubérculo de
Kaminski (protuberância centrolabial superior).

TRATAMENTO
Há formação então dos linfócitos de memória que permanecem no
gânglio regional e dos linfócitos efetores que ganham a corrente
sanguínea, levando à disseminação da sensibilidade de contato. Numa
segunda exposição ao antígeno, após completar a fase aferente, inicia-se
a fase elicitativa em que os linfócitos sensibilizados levarão ao
aparecimento da dermatite em 48 a 72 horas, pela liberação das
citocinas pró-inflamatórias.

As manifestações clínicas aparecem num período cada vez mais curto,


mais grave e de forma mais extensa ao contato contínuo ou por reação
cruzada com substâncias de estrutura análogas como, por exemplo, as
sulfas e os derivados da procaína.

O diagnóstico é baseado na morfologia e na topografia das lesões,


Fig. 5 associado ao teste provocativo ou teste de contato epicutâneo, que
simula ou induz a resposta alérgica através do contato com a substância
suspeita, sendo realizada a “leitura” num período de 48 a 72 horas. No
teste positivo pode-se observar o desenvolvimento de lesões de eczema
Outro exemplo de DCIP é a dermatite das fraldas (ou dermatite naquela região, isto é, eritema, vesículas, exudação. Entretanto, deve-se
amoniacal) na qual o quadro é provocado, fundamentalmente, pelo lembrar que é fundamental correlação clínica, pois até 8% da população
contato com a urina e com o pH alcalino das fezes. O início e a apresenta o teste de contato ao níquel, sem terem manifestação
gravidade das manifestações dependem da concentração e do tempo de dermatológica.
exposição, assim como da espessura da pele daquela região (Quadro 3).
O teste de contato não se aplica, pois é negativo. Para diagnóstico, o O teste não deve ser realizado na fase aguda e nem após exposição solar
mais importante ainda é uma boa anamnese. intensa devido ao eritema induzido e pelo efeito imunomodulador que
depleta as células de Langerhans. Como se trata de uma reação do tipo
celular, o uso de imunossupressores pode originar resultado falso-
negativo, mas o uso de anti-histamínico não interfere na resposta.

Uma forma clínica importante refere-se ao eczema contactante-


endotante, no qual, havendo sensibilização prévia por contato e,
posteriormente, o uso sistêmico de medicação análoga, ocorre
desenvolvimento de dermatite com tendência à generalização. As
características pontuais das dermatites de contato são resumidas nos
Quadros 4 e 5.

Quadro 4

DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE


PRIMÁRIO

● Não há reconhecimento antigênico.


● Teste de contato negativo.
● Substâncias ácidas ou alcalinas.

DERMATITE DE CONTATO ALÉRGICA (DCA) ● Pode se desenvolver ao primeiro contato.


● Geralmente limita-se à região de contato.
A reação alérgica ocorre em pessoas predispostas, caracterizando uma
● Depende da concentração e tempo de exposição.
reação de hipersensibilidade do tipo celular, ou IV (na classificação de
Gell e Coombs). O hapteno é uma estrutura de baixo peso molecular
capaz de penetrar na camada córnea, ligar-se a proteínas da pele e reagir
Quadro 5
com o sistema imune. A célula de Langerhans, através do complexo
principal de histocompatibilidade, é capaz de reconhecer e processá-lo, DERMATITE DE CONTATO ALÉRGICA
migrando até a área paracortical do linfonodo adjacente, onde os
linfócitos são sensibilizados.
● Há reconhecimento antigênico.
● Teste de contato positivo.
● Necessita contato prévio (sensibilização).
● Disseminação à distância.
● Menor dependência da concentração ou do tempo de
exposição.

■ DERMATITES ALÉRGICAS IMPORTANTES E


PRODUTOS RELACIONADOS:

● Sulfato de níquel (FIGURA 6): ligas de metais. Causa mais frequente


de eczema de contato alérgico em mulheres.


Dicromato de K+: couro, cimento (FIGURA 7).

● Formalina: esmalte de unha (FIGURA 8).

Fig. 8: O eczema ao esmalte geralmente se manifesta nas pálpebras.

É importante deixar bem claro que, de nada adianta um teste de contato


isolado, se não correlacionar com a clínica. E por que mencionamos
isso? Sabemos que, em cada 100 mulheres, oito tem positividade para o
níquel sem ter a clínica, portanto nunca interpretem exames
isoladamente!!!

Fig. 6
TRATAMENTO

■ LESÕES LOCALIZADAS:

1. Fase exudativa aguda ou subaguda:


● Compressas e banhos de permanganato, água boricada;

● Corticoides em cremes;

● Antibioticoterapia concomitante em caso de infecção secundária.

2. Fase crônica (liquenificada), na qual predominam a xerodermia e o


espessamento da pele (FIGURA 9):

Fig. 7
Fig. 10

O quadro tende a ser crônico, recorrendo principalmente nos meses


mais frios e menos úmidos. O tratamento consiste na aplicação de
Fig. 9
emolientes e corticoterapia tópica.

DERMATITE DE ESTASE
● Emolientes, corticoides, ceratolíticos.

Quadro eczematoso associado à insuficiência venosa dos membros


■ LESÕES DISSEMINADAS: inferiores. Assim, vários fatores estão implicados na sua gênese:
tromboflebite, obesidade, artrites e deformidades congênitas, gravidez.
● Corticosteroide sistêmico em baixas doses. Sede frequente de infecção secundária e celulite de repetição, que pode
culminar com linfedema. As lesões eritematoexsudativas, liquenificadas,
pruriginosas das pernas podem estar associadas à dermatite ocre,
ECZEMA NUMULAR (ECZEMA DISCOIDE) ectasia vascular e lipodermatoesclerose (afinamento e esclerose do terço
distal da perna que confere aspecto conhecido como perna em “garrafa
Doença caracterizada pela presença de placas ovais ou circulares e de champagne”). Em alguns casos há eritema intenso confundido com
contornos bem definidos. De etiologia ainda indeterminada, vários erisipela (FIGURA 11).
fatores já foram associados a ela: xerose cutânea, umidade ambiente,
sensibilidade ao estafilococo, atopia, etilismo, fatores psicológicos e
sensibilidade ao ouro e à metildopa.

Normalmente acomete adultos, sendo raro em crianças e tem início nos


membros inferiores, dorso das mãos e superfície extensora dos braços
como lesões em forma de moedas (numular). As lesões possuem aspecto
eritematoso com vesículas e crostas sobrejacentes (FIGURA 10).
Enquanto surgem novas lesões, outras podem apresentar crescimento
centrífugo. É comum a queixa de prurido intenso.

Fig. 11

ECZEMA DESIDRÓTICO (POMPHOLYX)


Compreende de 5 a 20% dos eczemas recidivantes das mãos e dos pés.
Nota-se aparecimento súbito de vesículas claras, profundas,
pruriginosas (sem eritema), semelhantes ao grão de sagu, na borda dos
dedos (FIGURA 12). Há melhora espontânea em três semanas. O
prurido pode ser intenso e a doença é agravada por fatores emocionais.

Fig. 13

Fig. 12

Na maioria dos casos não se descobre a etiologia, mas deve-se sempre


examinar o paciente buscando infecção fúngica à distância, levando ao
aparecimento de hipersensibilidade e formação de vesículas estéreis
palmares, fenômeno conhecido como dermatofitide.

ECZEMA SEBORREICO (“CASPA”)

Trata-se de uma doença inflamatória, superficial, crônica, com


predileção por couro cabeludo (FIGURA 13), sobrancelhas, bordos Fig. 14
palpebrais, sulco nasolabial e região pré-esternal (chamadas áreas
seborreicas) – FIGURA 14.

A prevalência da doença na população é de 5%, mas as estimativas


desta doença em portadores do HIV é maior. Nestes, há a tendência ao
desenvolvimento de lesões mais inflamatórias, extensas e rebeldes ao
tratamento. De modo geral, os homens são mais acometidos,
principalmente quando há história familiar. Em sua forma mais leve, ela
está frequentemente associada com o estresse e a ansiedade.

Outros fatores associados são: Malassezia sp. (fungo sapróbio da pele),


doença de Parkinson, obesidade e diabetes. No recém-nato, pode haver
acometimento intenso do couro cabeludo, formando escamas espessas e
amareladas denominadas de capuz de leite (FIGURA 15).

Uma manifestação rara é a doença de Leiner, em que as lesões tornam-


se extensas/generalizadas e associadas com diarreia, anemia, vômitos e
deficiência da fração C3 do complemento. Fig. 15

TRATAMENTO:
● Xampu de enxofre, coaltar, ácido salicílico, zinco, sulfeto de selênio
ou antifúngico (azol);

● Corticosteroides ou antifúngico em creme;

● Prednisona oral: casos graves.

ECZEMA ASTEATÓTICO

Também conhecido como eczema de inverno, eczema craquelé ou


eczema senil, trata-se de uma dermatose associada à diminuição do teor
lipídico da pele. Sua prevalência é maior em idosos e no período do
inverno. Normalmente surge nos membros como lesões levemente
eritematodescamativas sem limites precisos sobre uma pele xerótica
(FIGURA 16). Pode evoluir com fissuras cutâneas e prurido de
intensidade variável. Não é rara a associação com eczema numular. O
tratamento geralmente é feito orientando-se o paciente a evitar o
excesso do uso de saponáceos durante o banho e estimular a aplicação
de emolientes sobre as áreas afetadas.

Fig. 16

4
Cap. DERMATITES

ERITEMATODESCAMATIVAS E

PAPULARES

PSORÍASE

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A psoríase é uma doença crônica hiperproliferativa inflamatória da pele,
relativamente comum, caracterizada pelo surgimento de pápulas
eritematoescamosas que confluem formando placas, de aspecto tão
característico que geralmente não causa problemas para o diagnóstico.
Em alguns casos, está associada a uma doença articular soronegativa, a
artrite psoriásica. A sua etiopatogenia é desconhecida, embora seja uma
doença imunomediada.

EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO

A prevalência da psoríase varia em torno de 2% da população. A


doença acomete igualmente ambos os sexos e aparece em qualquer
idade (inclusive crianças), embora o principal pico de incidência seja
entre 20-30 anos, com um segundo pico entre 50-60 anos.
Aceita-se uma predisposição genética, com herança multigênica, mas
que requer fatores ambientais para sua expressão. Se um dos proge-
nitores tem psoríase, a chance de aparecer a doença no descendente é de
8%; se os dois pais têm psoríase, a chance eleva-se para 40%... Existe
uma correlação da forma cutânea vulgar (mais comum) com os
antígenos HLA-Cw6, B13 e B17, enquanto as formas artropática e
pustulosa estão mais relacionadas ao HLA-B27 (um importante
marcador genético das espondiloartropatias soronegativas...).

Existem fatores desencadeantes que podem exacerbar a psoríase: (1)


estresse emocional; (2) alguns medicamentos, como betabloqueadores,
antimaláricos, sais de lítio, indometacina e inibidores da ECA; (3)
infecções, como a estreptococcia por S. pyogenes (psoríase gutata) e a
infecção pelo HIV (forma generalizada de psoríase); e (4) fatores físicos,
como trauma cutâneo (de qualquer tipo) e outras dermatites,
provocando o fenômeno de Koebner (ver adiante).

Por outro lado, a exposição solar parece ter efeito de melhora das lesões,
um benefício que pode ser explorado na terapia da doença...

PATOGENIA E PATOLOGIA

A psoríase é uma doença que cursa com atividade inflamatória da


derme papilar (justificando o eritema) e hiperproliferação da epiderme
(justificando espessamento e descamação). Na epiderme, o ciclo celular
dos queratinócitos está bastante encurtado. A interação entre os
queratinócitos, células de Langerhans e linfócitos T parece ser
fundamental para o desenvolvimento da doença. A expressão de
adesinas e a liberação de mediadores pelas células da epiderme servem
como importante fator de quimiotaxia para neutrófilos e monócitos.
Entre eles, destacam-se os leucotrienos (explicando a exacerbação pelo
uso de indometacina, um inibidor da ciclo-oxigenase). A doença é
mediada pelo linfócito T, sendo o TNF-alfa uma das principais
Fig. 1: Lesão típica da psoríase.
citoquinas implicadas na patogênese da doença.

A histopatologia é característica, tendo os seguintes achados: (1)


paraceratose (aparecimento de núcleo nas células da camada córnea); O sinal de Auspitz (sinal do orvalho sanguíneo) é característico e
(2) ausência da camada granulosa; (3) acantose (espessamento da utilizado como auxílio no diagnóstico clínico da psoríase: após
camada espinhosa); (4) atrofia das áreas suprapapilares; (5) curetagem e remoção mecânica das escamas, brotam depois de alguns
papilomatose (projeção das papilas dérmicas sobre a epiderme); (6) segundos gotas de sangue da lesão (FIGURA 2). Este processo é
infiltrado inflamatório misto na derme papilar; (7) acúmulo de denominado curetagem metódica de Brocq; numa primeira etapa há o
neutrófilos dentro do estrato córneo (microabscesso de Munro) e destacamento da escama (sinal da vela) e posteriormente vamos
formando coleções na epiderme (pústula espongiforme de Kogoj), esta observar o aparecimento de uma membrana opaca translúcida chamada
última envolvida na psoríase pustulosa. (membrana de Duncan).

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

As lesões típicas são placas eritematoescamosas, bem delimitadas


(envoltas por pele normal), de tamanhos variados (FIGURAS 1A e 1B).
As escamas são grandes e de tonalidade prateada (escamas
psoriasiformes). Em relação à distribuição, tamanho e morfologia das
lesões, podemos definir a psoríase vulgar (forma mais comum, com as
lesões típicas supracitadas) e as formas variantes de psoríase: numular,
girata, anular, pustulosa entre outras. Na maioria das vezes, as lesões
são assintomáticas, embora uma minoria de pacientes refira prurido e
sensação de queimação, especialmente nas lesões palmoplantares e
intertriginosas. Algumas lesões de psoríase apresentam um halo
hipocrômico ao redor das lesões conhecido como halo de Woronoff.
Fig. 4A: Locais típicos da psoríase vulgar (couro cabeludo, pavilhão
auricular).
Fig. 2: Sinal de Auspitz.

O fenômeno de Koebner (FIGURA 3) é característico da psoríase e do


líquen plano. É o surgimento de uma lesão típica da doença em áreas de
trauma cutâneo (cicatrizes) de vários tipos (abrasões, incisões,
queimaduras, contusões, escoriações, raspagem, depilação, tatuagens,
fricção, fita adesiva, etc.), irritantes químicos e outras dermatites.

Fig. 4B: Locais típicos da psoríase vulgar (cotovelos, joelhos, mãos,


tronco).

Fig. 3: Fenômeno de Koebner (após retirada de um adesivo).

PSORÍASE VULGAR OU PSORÍASE EM


PLACAS (FORMA CRÔNICA ESTACIONÁRIA)

É a forma mais comum e uma das mais benignas. Os locais mais


frequentes (FIGURAS 4A, B e C) são, por ordem decrescente: couro
cabeludo, com placas bem delimitadas e seus bordos aparecem nos Fig. 4C: Psoríase na infância.****
limites do escalpo e na região retroauricular, face extensora dos cotovelos
e flexora dos joelhos, região lombossacral e periumbilical no tronco,
pavilhão auricular e dorso das mãos.
Uma vez instaladas, as lesões tendem a seguir um curso crônico e
flutuante, ocorrendo períodos de remissão em cerca de 30% dos casos,
seguidos por períodos de exacerbação, de intervalo variável e
imprevisível.

SUBTIPOS DA PSORÍASE VULGAR

Psoríase vulgar generalizada: as placas são de tamanho maior e


acometem diversas áreas do corpo, (FIGURA 5) incluindo couro
cabeludo, tronco e membros.

Fig.5: Psoríase vulgar generalizada.

Psoríase girata e anular: na psoríase girata, as placas são confluentes e


circinadas; na psoríase anular, as placas apresentam clareamento central
e parecem mapas geográficos (FIGURA 6).

Fig. 7: Psoríase invertida (axilar e genital).

Fig.6: Psoríase anular.

PSORÍASE UNGUEAL
PSORÍASE INVERTIDA

Placas eritematosas crônicas com pouca ou nenhuma descamação


(FIGURA 7), localizadas nas regiões intertriginosas (axilas, região
inguinal, genitália, pescoço). Costumam ser algo pruriginosas.
As unhas estão comprometidas em 35-50% dos casos (FIGURA 8A),
sendo uma importante característica da doença. Geralmente, o paciente
também possui lesões cutâneas da psoríase, embora existam casos de
envolvimento ungueal isolado. As principais alterações ungueais da
psoríase são: (1) depressões puntiformes (pitting); (2) manchas
amarelas abaixo da lâmina ungueal; (3) descolamento da lâmina
ungueal; (4) fissuras longitudinais; (5) ceratose subungueal; (6)
onicodistrofia grave. Há casos também de perda ungueal (anoníquia),
especialmente nas formas pustulosas. O comprometimento pode ser de
uma, poucas ou todas as unhas.

Fig. 8B***

As pústulas são múltiplas, pequenas (2-3 mm), apresentando halo


eritematoso e que se distribuem simetricamente pelo tronco e
extremidades proximais. As placas eritematosas tendem à confluência,
gerando grandes áreas de eritema contendo as pústulas (FIGURA 9).

Fig. 8A: Psoríase ungueal: pitting e coloração amarelada.

Fig. 9: Psoríase pustulosa generalizada.

PSORÍASE PUSTULOSA GENERALIZADA

Também chamada de psoríase pustulosa de von Zumbusch, é uma


forma de evolução hiperaguda e episódica, associada a sinais e sintomas PSORÍASE PUSTULOSA LOCALIZADA
sistêmicos. O principal fator desencadeante é a suspensão abrupta de
corticosteroides sistêmicos, usados (erradamente) para tratar outras
Existem duas formas: (1) psoríase pustulosa palmoplantar; e (2)
formas de psoríase ou qualquer outra doença. Pode também ocorrer
acrodermatite contínua de Hallopeau (pústulas nos quirodáctilos e
seguindo uma farmacodermia exantematosa. Tem o início súbito, com
artelhos).
febre alta, mal-estar, fraqueza, leucocitose neutrofílica, aumento do VHS
e hipocalcemia. A erupção pustulosa aparece logo após a febre e vem em
surtos que duram vários dias. Há casos registrados de fatalidade. A PSORÍASE ERITRODÉRMICA
psoríase pustulosa disseminada na gravidez e conhecida como impetigo
herpetiforme (FIGURA 8B).
É uma forma generalizada de psoríase que se manifesta com eritema e A lesão articular ocorre em 5-20% dos pacientes com psoríase, sendo
descamação por quase todo o tegumento corporal (FIGURA 10), com caracterizada por uma artropatia crônica inflamatória soronegativa
alterações na termorregulação, hemodinâmica e no equilíbrio (fator reumatoide negativo), relacionada ao HLA-B27 (espondilite e
hidrossalino. Faz diagnóstico diferencial com outras causas de sacroileíte) e HLA-B37 e B38 (artrite periférica). As cinco formas foram
eritrodermia difusa, como farmacodermias, dermatite atópica e micose devidamente descritas no bloco de Reumatologia, bem como o
fungoide com síndrome de Sézary. diagnóstico e tratamento.

DIAGNÓSTICO

Na maioria das vezes é clínico, pelo aspecto e distribuição das lesões e


pela presença do sinal de Auspitz. Na dúvida, podemos confirmá-lo
com a biópsia.

TRATAMENTO

Não existe um tratamento definitivo da psoríase, sendo o seu objetivo o


controle clínico da doença, utilizando fármacos tópicos e/ou sistêmicos
com propriedades antiproliferativas e anti-inflamatórias.

Como a psoríase é uma doença crônica, que pode durar muitos anos, é
importante avaliaro paciente de forma cuidadosa para fazer um bom
planejamento de tratamento. Esse planejamento irá depender não só do
tipo da psoríase como também da extensão da doença cutânea e
articular. Em caso de envolvimento articular, é importante trabalhar em
Fig. 10: Psoríase eritrodérmica.****
conjunto com o reumatologista.

TRATAMENTO TÓPICO

PSORÍASE GUTATA É usado para as formas localizadas (psoríase leve a moderada). Várias
são as opções: corticoides tópicos (ex.: betametasona 0,05%), coaltar

É uma forma benigna de início abrupto, com lesões arredondadas (alcatrão), em preparações 2-5% em vaselina ou óxido de zinco 20%,

pequenas (0,5-1,5 cm) esparsas, predominando no tronco superior e antralina (ditranol) 0,1-0,5% + ácido salicílico 1-2%, aplicado 1x/dia ou
1-3% em veículo aquoso, aplicar por 20-30min e retirar, 1x/dia (terapia
extremidades proximais (FIGURA 11). Frequentemente acomete
de contato curto), calcipotriol (análogo da vitamina D) a 0,005% 1x/dia,
crianças ou adultos jovens dias após uma estreptococcia do trato
tazaroteno (retinoide) em gel 0,1%. Existem tópicos para psoríase sob a
respiratório superior.
forma de creme, pomada e xampu. No tratamento facial, podemos
utilizar ainda tacrolimus ou pimecrolimus como alternativa ou para
poupar os corticoides.

FOTOTERAPIA

É uma opção para a terapia da doença moderada a grave ou refratária


às medidas tópicas. A terapia tópica geralmente é necessária de forma
adjuvante e para alívio sintomático. A fototerapia utiliza a aplicação da
radiação ultravioleta nas lesões psoriásicas. Existem dois métodos: (1)
PUVA (Psoraleno + UVA): consiste na aplicação de doses progressivas
(2-3x/semana) de radiação UVA, aplicadas após 2h da ingestão do
Metoxipsoraleno (MOP), uma substância fotossensibilizante. A
combinação do psoraleno com os raios UVA inibe a síntese do DNA da
lesão, determinando progressiva regressão. Após cada aplicação, é
fundamental a proteção contra a luz solar por 24h, sendo necessário
Fig. 11: Psoríase gutata.
também o uso de óculos escuros neste período. Além dos efeitos
colaterais imediatos, geralmente leves, múltiplas sessões de PUVA
podem aumentar o risco de envelhecimento cutâneo e carcinoma
espinocelular da pele. (2) Método de Goeckerman (coaltar + UVB): uma
pomada de coaltar é aplicada em todas as lesões e o paciente é
ARTRITE PSORIÁSICA submetido a doses diárias de UVB. Possui eficácia semelhante à PUVA.
TERAPIA SISTÊMICA A etiopatogenia da doença é totalmente desconhecida. Postula-se um
mecanismo autoimune envolvendo linfócitos T ativados contra os
queratinócitos da camada basal da epiderme. Fatores como drogas,
Indicada nos pacientes refratários ou com contraindicação à fototerapia
vírus da hepatite C e genéticos têm sido implicados em sua patogênese,
e nos casos graves e extensos de psoríase (particularmente, a psoríase
mas nenhum deles mostrou relação com todos os casos. Na verdade, a
eritrodérmica e forma pustulosa generalizada, bem como na forma
reação a drogas é denominada erupção liquenoide, sendo uma doença
artropática). Veja as opções mais utilizadas:
diferente do líquen plano idiopático. Há uma importante associação
com o HLA-DR1. Como veremos, a histopatologia é típica e capaz de
a. Acitretina: este derivado do ácido transretinoico substituiu o confirmar os casos de diagnóstico clínico duvidoso.
etretinato na terapia da psoríase, por ter meia-vida mais curta e,
portanto, melhor risco de teratogenia em mulheres. A principal
indicação é na psoríase pustulosa generalizada, na qual age rapida- EPIDEMIOLOGIA
mente! A dose é de 0,5-1,0 mg/kg/dia por 3-4 meses. Pode ser usado
em combinação com PUVA (RePUVA); O líquen plano costuma ocorrer entre 30-60 anos de idade, sendo raro
b. Metotrexato: trata-se de um agente citotóxico inibidor da síntese de em crianças e idosos. Não há preferência racial nem sexual, embora
DNA por antagonismo da diidrofolato redutase. É feito na dose de alguns autores o considerem mais comum em mulheres. Estima-se que
15 mg/semana (5 mg 12/12h por três tomadas). A dose cumulativa 0,5% da população apresente a doença pelo menos uma vez na vida.
do metotrexato deverá ser sempre calculada, já que, a partir de 1,5 g,
deverá ser considerada a realização de biópsia hepática para prevenir
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
a grave hepatotoxicidade (cirrose hepática). Outros efeitos adversos
são: leucopenia, mucosite, intolerância gastrointestinal;
Na sua forma completa, o líquen plano afeta a pele, a mucosa oral, a
c. Ciclosporina: imunossupressor que inibe a produção de IL-2 pelos mucosa genital e as unhas. A lesão cutânea clássica é uma pápula
linfócitos T. Pode ser usado no lugar do metotrexato em casos poligonal achatada, de cor eritematoviolácea de 0,5-2 cm de, diâmetro,
selecionados. A dose inicial é de 2,5-3 mg/kg/dia. A função renal com discreta descamação fina (FIGURA 12). Uma rede reticulada fina e
deve ser monitorizada e a droga suspensa se houver aumento de mais branca costuma estar presente na superfície da placa (FIGURA 13),
de 50% da creatinina; sendo denominadas estrias de Wickham, praticamente patognomônicas
d. Biológicos: proteínas ligantes derivadas de células vivas que da doença! São mais bem observadas com lente de aumento
objetivam bloquear moléculas/citocinas (TNF-alfa) da ativação (dermatoscopia) após molhar a lesão com água ou óleo. As lesões do
inflamatória mediadoras da resposta Th1, no caso da psoríase. Os líquen são quase sempre pruriginosas e o prurido pode variar de leve a
principais exemplos são etanercepte, infliximabe e adalimumabe. bastante intenso. Para caracterizar o líquen plano, lembramos dos 5
Outras opções seriam o ustequinumabe, cujos alvos são IL-12 e IL- “P”s: Placa, Plana, Poligonal, Púrpura, Pruriginosa.
23; bem como o secuquinumabe, ixequizumabe e brodalumabe,
anticorpos anti-IL-17A.

e. Apremilast: agente oral inibidor de fosfodiesterase tipo 4, capaz de


reduzir algumas citocinas envolvidas na patogênese da psoríase.

É importante marcar que o uso de corticosteroide sistêmico pode levar ao


rebote da psoríase se não usado adequadamente, sendo em geral evitado.
Só seria recomendado em casos de emergência em que não se disponha
de outro recurso, devendo ser acompanhado de medicações que
permitam a sua retirada gradual.

LÍQUEN PLANO Fig. 12: Lesões clássicas do líquen plano.

O líquen plano é uma dermatose relativamente frequente que acomete


adultos, cuja causa é desconhecida e que se manifesta como lesões
papulosas ou placas com características próprias, frequentemente
pruriginosas, de evolução aguda, recidivante ou crônica. Lesões na
mucosa oral e genital podem ocorrer e tendem a cronificar.
Fig. 13: Estrias de Wickham.

As lesões do líquen plano tendem a ser múltiplas e distribuídas


simetricamente nas extremidades, predominando na superfície flexora
dos punhos e antebraços (locais mais clássicos) e terço inferior das
pernas (FIGURAS 14, 15, 16 e 17). Coxas, abdome e região dorso
inferior também são locais comumente envolvidos. A face geralmente é
poupada; o envolvimento palmoplantar é pouco usual. As lesões do
líquen plano geralmente regridem deixando hiperpigmentação residual,
mais proeminente em pessoas de pele escura.
Fig. 16: Líquen plano da perna e pé.

Fig. 14: Líquen plano do punho.

Fig. 17: Líquen plano do tronco.

O fenômeno de Koebner é descrito no líquen plano, tal como na psoríase.


É caracterizado pelo aparecimento das lesões típicas no local de um
traumatismo ou de uma cicatriz (FIGURA 18).

Fig. 15: Líquen plano dos punhos e antebraços.


O acometimento mucoso é observado em 60-70% dos pacientes com
líquen plano (autores nacionais mencionam 1/3 dos casos...) e
predomina na cavidade oral, seguido pela genitália. O líquen plano
mucoso pode ocorrer também de forma isolada (20% dos casos). A
cavidade oral é a mais envolvida, geralmente com lesões de padrão
reticular esbranquiçadas na mucosa jugal (FIGURA 20), como se fossem
as estrias de Wickham... Existe uma forma erosiva na mucosa oral,
lingual ou gengival, geralmente bastante dolorosa (FIGURA 20). As
lesões na genitália masculina ocorrem na glande (FIGURA 21),
usualmente com lesões anelares, por vezes únicas. Na genitália feminina,
a doença manifesta-se com placas de leucoplasia, eritrodermia ou
vaginite escamosa generalizada (FIGURA 22). Existe uma síndrome de
associação do líquen plano erosivo gengival e vulvar, com lesões
dolorosas. Existe o líquen plano da mucosa anal, conjuntival, labial, etc.
O líquen plano erosivo pode estar associado à hepatite C crônica...

Fig. 18: Fenômeno de Koebner.

São descritas formas localizadas (mais comum) e formas disseminadas.


A forma disseminada aguda evolui rapidamente, iniciando com lesões
nas extremidades que progridem centripetamente para o tronco
(FIGURA 19).

Fig. 19: Líquen plano difuso.


Fig. 20: Líquen plano oral. Forma erosiva (acima) e forma reticulada
(abaixo).
Fig. 21: Líquen plano da genitália masculina (forma anelar).

Fig. 23: Líquen plano pilar.

O líquen plano ungueal (FIGURA 24) é observado em 10-15% dos casos.


Tal como a psoríase, o líquen plano está entre as dermatoses
inflamatórias idiopáticas que podem acometer as unhas... Os achados
mais comuns são: onicosquisia (fragmentação distal), sulcos ou estrias
longitudinais (onicorrexe), hiperceratose subungueal e onicólise. O
pterígio ungueal (crescimento dianteiro do eponíquio com aderência à
lâmina proximal) é um achado clássico do líquen plano.

Fig. 24: Líquen plano ungueal. Observe a onicosquisia (à direita),


onicorrexe e pterígio (acima) e onicodistrofia em múltiplas unhas
Fig. 22: Líquen plano da genitália feminina (forma erosiva). (abaixo)

O líquen plano do couro cabeludo é referido como líquen plano pilar


(FIGURA 23). Começa com pápulas foliculares eritematoceratósicas FORMAS VARIANTES
individuais que coalescem para formar placas tonsurantes (perda de
cabelo). A lesão pode ser única, múltipla ou difusa por todo o escalpo.
As formas variantes de líquen plano podem ocorrer associadas ou não a
Esta forma de líquen plano deixa alopecia cicatricial.
lesões típicas da dermatose em outros locais.

LÍQUEN PLANO HIPERTRÓFICO

As lesões predominam nos membros inferiores (tornozelos) e são


espessas, elevadas, acastanhadas e hiperceratósicas (FIGURA 25),
podendo adquirir formato verrucoso. São intensamente pruriginosas,
havendo liquenificação da lesão (acentuação dos sulcos cutâneos) pela
coçadura. É descrita a possível transformação para carcinoma
espinocelular.
Fig. 25: Líquen plano hipertrófico.

LÍQUEN PLANO ATRÓFICO


Fig. 26: Líquen plano actínico.

As lesões crescem e deixam o centro atrófico pigmentado. Predominam


no abdome e nos membros inferiores.

LÍQUEN PLANO BOLHOSO LÍQUEN PLANO LINEAR

É quando há o surgimento de lesões bolhosas no curso do líquen plano, As lesões apresentam aspecto linear ou zosteriforme, frequentemente
em geral as bolhas são mais localizadas, e é fundamental fazer o representando o já mencionado fenômeno de Koebner a uma cicatriz
diagnóstico diferencial com líquen plano penfigoide, que é a traumática.
concomitância de duas patologias, o líquen plano com o penfigoide
bolhoso, e nestes casos, as bolhas são mais difusas.
LÍQUEN PLANO ANULAR

LÍQUEN PLANO ACTÍNICO Algumas lesões podem ter caráter anelar, com bordos elevados. Uma
área típica deste tipo de lesão é o pênis.
As lesões predominam nas áreas fotoexpostas, como na face
(FIGURA 26), pescoço e dorso das mãos. Podem ter caráter anular.
ERUPÇÃO LIQUENOIDE FARMACOINDUZIDA

Foi descrita com mais detalhes no capítulo de “Farmacodermias”... As


lesões costumam ocorrer com grande período de latência após a
exposição à droga. Predomina a metildopa, beta-bloqueadores, AINE,
quinidina, penicilamina e sais de ouro.

DIAGNÓSTICO

Na presença de lesões características, o diagnóstico não traz problemas.


Damos destaque ao caráter poligonal das lesões e à presença das estrias
de Wickham, além do pterígio ungueal e das lesões mucosas associadas.
Em caso de dúvida, o diagnóstico pode ser confirmado pela biópsia. O
histopatológico revela infiltrado mononuclear linfocitário em faixa na
derme papilar e na junção dermoepidérmica e degeneração hidrópica da
camada basal, com corpos coloides hialinos (queratinócitos degenerados
por apoptose). Mostra também acantose (proliferação da camada
espinhosa da epiderme), formando um aspecto de “dentes-de-serra”
(alongamento das cristas interpapilares da epiderme), hipergranulose
(proliferação da camada granulosa) e hiperceratose (espessamento da
camada córnea). A imunofluorescência é típica, demonstrando depósitos
subepidérmicos de IgM, e, menos comumente, de IgG, IgA e fibrina. A
imunorreatividade linear da junção dermoepidérmica para fibrinogênio-
fibrina também é característica de líquen plano.

HISTÓRIA NATURAL Fig. 27: Líquen nítido.

O líquen plano é uma doença imprevisível, embora seja esperada a


regressão espontânea paulatina das lesões ao longo dos próximos 1-2 O diagnóstico é clínico ou confirmado pela biópsia. A histopatologia é
anos. As recidivas são observadas em 15-20% dos casos, geralmente com característica, demonstrando uma densa massa de células linfo-
lesões ocupando a mesma localização anterior. São mais comuns na histiocitárias imediatamente abaixo de uma crista epidérmica, que
forma generalizada da doença. O líquen plano mucoso tende a possui paraceratose central (presença de núcleos nas células da camada
cronificar, especialmente o da cavidade oral. Há indícios de que a forma córnea e afinamento ou ausência da camada granulosa).
oral erosiva aumente o risco de carcinoma espinocelular (escamoso) de
boca!
A doença costuma ser autolimitada, resolvendo-se em alguns meses, até
um ano. Pode haver recidivas. Na decisão de tratar, os corticoides
TRATAMENTO tópicos ou sistêmicos são opções razoáveis, bem como PUVA e
derivados do ácido retinoico sistêmicos.

Cada caso deve ser avaliado, dando ênfase para a intensidade dos
sintomas, à cosmese, sem perder de vista o fato de a doença ter uma LÍQUEN SIMPLES
tendência autolimitada. A decisão é feita em conjunto com o paciente.
O alívio do prurido pode ser conseguido com anti-histamínicos
É uma placa liquenificada (com acentuação dos sulcos, espessamento e
antagonistas-H1, como a hidroxizina 10-50 mg 6/6h e aplicando pasta
hiperpigmentação da pele), bastante pruriginosa (FIGURA 28), na qual
d’água ou mentol 20% às lesões. Os casos de doença cutânea localizada,
surge um ciclo vicioso de coçadura-liquenificação-mais prurido-mais
doença oral ou genital, podem ser tratados com aplicação de corticoide
coçadura. O processo de liquenificação é decorrente do trauma mecânico
tópico, como o valerato de betametasona, acetonido de fluocinolona e a
constante do ato de coçar. O estímulo inicial, quando presente, pode ser
triancinolona. A forma generalizada pode ser abordada com corticoide
uma picada de inseto ou irritantes relativos químicos ou físicos. O
sistêmico: prednisona 30-60 mg/dia por 4-6 semanas e desmame em mais
estado emocional é um fator importante na patogênese.
4-6 semanas. O uso dos derivados do ácido retinoico por via oral tem-se
mostrado benéfico. As opções são a isotretinoína, o etretinato e a
acitretina (efeito benéfico comprovado em recente estudo
randomizado). Fotoquimioterapia com PUVA costuma ter bons
resultados no líquen generalizado. Outras drogas com possível benefício
no líquen plano são a griseofulvina, a hidroxicloroquina, a ciclosporina
e a heparina de baixo peso molecular.

LÍQUEN NÍTIDO

Doença de causa totalmente desconhecida, que acomete principalmente


crianças e adultos jovens, caracterizada pelo aparecimento de múltiplas
pequenas pápulas de 2-5 mm, achatadas, brilhantes (daí o nome líquen
nítido), não pruriginosas, distribuídas geralmente no tronco inferior, nas
coxas, nos antebraços e na genitália (FIGURA 27).
É uma lesão única, de localização predominante na nuca, região sacra,
genital e membros. O diagnóstico é clínico, embora possa ser
confundido com outras dermatites. O histopatológico mostra
hiperceratose, acantose, alargamento das cristas epiteliais e leve
infiltrado linfo-histiocitário ao redor. O tratamento deve enfatizar a
orientação ao paciente, que deve parar de coçar a lesão. Sedativos,
hidroxizina e corticoides tópicos podem ser utilizados.

*A Figura 1B deste capítulo foi gentilmente cedida por Nanashara


Valgas da Silva. **A Figura 7A foi cedida por Aguinaldo
Bonalumi. ***AFigura 8B foi cedida por Nayibe V.
Solanomartinez. ****As Figuras 4C e 10 foram cedidas por
Fabiano Leal.

Fig. 28: Líquen simples (cotovelo).

5
Cap. DERMATOSES BOLHOSAS CRÔNICAS

(BULOSES)

INTRODUÇÃO

VIDEO_13_DER
São doenças não congênitas que cursam, fundamentalmente, com a
formação de bolhas decorrentes de reação autoimune. Entre elas,
algumas assumem maior importância clínica devido a sua prevalência, a
saber:

1. Pênfigo vulgar;

2. Pênfigo foliáceo;

3. Penfigoide bolhoso;

4. Dermatite herpetiforme.

Apesar de compartilharem a mesma lesão elementar (bolha), nas duas


primeiras, as bolhas se formam dentro da epiderme (bolhas
intraepidérmicas), ao passo que nas demais, no plano subepidérmico.

PÊNFIGO VULGAR
O termo “pênfigo” deriva do grego pemphix, que significa bolha. Existe
uma ruptura da coesão entre os queratinócitos (acantólise), devido à
destruição das estruturas de adesão intercelular, denominadas
desmossomos. A doença é causada diretamente por autoanticorpos que
reagem contra epítopos desmossomais (desmogleína 3).

EPIDEMIOLOGIA

Embora seja a forma de pênfigo mais comum nos EUA e Europa, no


Brasil perde em frequência para o pênfigo foliáceo, pela presença da
forma endêmica deste último (ver adiante). É uma doença relativamente
rara, quando comparado a outras dermatoses. É mais frequente entre os
judeus ashkenazi e povos de origem mediterrânea, tendo, portanto, uma
incidência maior nos locais com maior população dessas origens. A
doença tem associação com HLA-DR4 e DQw8. Não possui
preferência de sexo nem raça e costuma se apresentar entre os 50-60
anos. Fig. 2

PATOGÊNESE E PATOLOGIA

No pênfigo vulgar, surgem autoanticorpos do tipo IgG dirigidos contra


MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
determinada proteína desmossomal: a desmogleína tipo 3. Esses
anticorpos, atacando os desmossomos dos queratinócitos suprabasais
(local onde predominam as desmogleínas 3), determinam acantólise, ou Uma das principais características do pênfigo vulgar é acometer as

seja, a desagregação dos queratinócitos. O histopatológico é mucosas, especialmente a mucosa oral. Esta é acometida em,

diagnóstico! Caracteriza-se pelo descolamento intraepidérmico logo virtualmente, todos os pacientes, sendo que, em 50% dos casos, pode

acima da camada basal (fenda suprabasal), destacando todo restante da anteceder as manifestações cutâneas por vários meses (a desmogleína 3
é muito encontrada no epitélio das mucosas). A lesão oral se apresenta
epiderme (FIGURA 1). A imunofluorescência direta da pele demonstra
com úlceras aftosas, evoluindo para erosões dolorosas e extensas,
acúmulo de IgG (+ C3) na superfície dos ceratinócitos (FIGURA 2),
acometendo a cavidade bucal (FIGURA 3). Muitas vezes, dificultam a
sendo este um achado característico.
alimentação do paciente. Eventualmente os lábios, a língua, a
orofaringe e outros sítios mucosos do corpo (ex.: genitália) podem ser
afetados.

Fig. 1

Fig. 3
A lesão cutânea típica do pênfigo vulgar é uma bolha flácida, que logo É suspeitado pela clínica, mas deve sempre ser confirmado pela biópsia.
sofre rotura, deixando uma erosão vermelho vivo, com aspecto de “bife Esta deve ser realizada numa bolha intacta para o histopatológico e na
sangrante” (FIGURA 4). Esta erosão apresenta um odor característico, pele aparentemente sã, para a imunofluorescência direta (acurácia de
descrito como “ninho de rato”. Ao examinar o paciente, o médico praticamente 100%). O sangue do paciente deve ser colhido para a
observa múltiplas e extensas erosões, marginadas por retalhos de bolhas pesquisa pela imunofluorescência indireta dos anticorpos
rotas, encontrando eventualmente algumas bolhas flácidas que ainda antidesmossomais, encontrados em 75% dos casos. O título destes
não romperam (FIGURA 5). A doença pode afetar qualquer parte do anticorpos pode ter associação com a atividade da doença apenas em
tegumento, predominando na cabeça, tórax e dobras axilares. alguns pacientes.

TRATAMENTO

Na era pré-corticoide, o pênfigo vulgar era invariavelmente fatal. Os


pacientes morriam por desidratação e sepse bacteriana. Com o
tratamento atual, a mortalidade caiu para 5% (geralmente por
complicações infecciosas). A base da terapia é o uso de corticosteroides
sistêmicos em altas doses, como a prednisona na dose de 2 mg/kg/dia. A
dose do corticoide é ajustada de acordo com a gravidade do quadro,
podendo variar de 40 mg/dia (forma localizada) até 200 mg/dia (forma
grave). O tratamento é mantido até a resolução do quadro clínico
(primeiras semanas). A negativação do sinal de Nikolsky é o primeiro
indício de inatividade da doença. Depois, a dose é paulatinamente
reduzida e mantida em dias alternados, embora a recorrência seja
comum. Em muitos pacientes, é necessário associar imunossupressores,
Fig. 4* como azatioprina ou ciclofosfamida, com intuito de poupar o uso do
esteroide. Um estudo demonstrou a remissão completa e prolongada
(cura?) de 40% dos pacientes que usaram prednisona + azatioprina.
Alguns autores brasileiros preferem usar a dapsona 100 mg/dia no lugar
dos imunossupressores. Casos muito graves podem precisar de
plasmaférese ou imunoglobulina intravenosa.

PÊNFIGO FOLIÁCEO

EPIDEMIOLOGIA

Há duas variantes de Pênfigo Foliáceo (PF). São eles: (1) PF não


endêmico (pênfigo de Cazenave); e (2) PF endêmico (fogo selvagem). O
fogo selvagem (forma endêmica) tem o seu maior número de casos
Fig. 5 registrados no Brasil, tendo elevada frequência no Distrito Federal,
Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais (triângulo mineiro) e São Paulo
(oeste paulista). Tem predileção por populações ribeirinhas e acreditava-
se na participação da picada de um mosquito simulídeo (Simulium
O sinal de Nikolsky é o achado clínico clássico do pênfigo. Mesmo na nigrimanum), que poderia agir como vetor de algum vírus. Entretanto,
pele aparentemente sã, provoca-se facilmente o descolamento da pele trabalhos mais recentes vêm contestando essa hipótese.
quando o dedo do examinador a traciona tangencialmente. Na
síndrome de Stevens-Johnson e necrólise epidérmica tóxica, o sinal de A doença não é, a princípio, de causa infecciosa, mas alguns agentes
Nikolsky só está presente na pele acometida. O sinal de Asboe-Hansen poderiam atuar como desencadeante da reação autoimune. Nas áreas
também é positivo no pênfigo: ao pressionar gentilmente uma bolha, endêmicas, a prevalência pode chegar a 2-3%, predominando em
provoca a sua progressão (o seu conteúdo líquido “corre” sob a pele). crianças e adultos jovens. Por isso, em nosso meio podemos afirmar que
o pênfigo foliáceo é o tipo mais comum de pênfigo! O PF não endêmico
DIAGNÓSTICO é uma doença universal que acomete pessoas principalmente a partir de
40-50 anos, tendo associação com HLA-B16, A26 e A24. O pênfigo
foliáceo (e em menor escala o pênfigo vulgar) pode ser desencadeado
por certos fármacos, caracterizando o pênfigo farmacoinduzido. As
principais drogas incriminadas são: d-penicilamina, penicilina,
rifampicina, captopril e propranolol.

PATOGÊNESE E PATOLOGIA
No pênfigo foliáceo, os autoanticorpos patogênicos são voltados
exclusivamente contra a desmogleína 1. Esta proteína é essencial para a
integridade dos desmossomas da camada granulosa da epiderme. São os
queratinócitos desta camada que sofrem acantólise (desagregação). O
histopatológico difere do pênfigo vulgar por ter a zona de clivagem
numa porção superficial da epiderme (FIGURA 6). O achado na
imunofluorescência direta da pele é semelhante ao do pênfigo vulgar.

Fig. 6

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Ao contrário do pênfigo vulgar, as mucosas são geralmente poupadas!


Nesta doença, dificilmente são encontradas as bolhas intactas, pois,
geralmente, já se encontram rompidas pela sua extrema superficialidade.
Portanto, o que predomina no paciente são múltiplas erosões crostosas
sobre base eritematosa (FIGURA 7), conferindo um aspecto semelhante
a “salpico de lama” ou ceratose seborreica (esta conhecida como lesão
acantomata). As lesões cutâneas do PF atingem predominantemente as
áreas seborreicas do corpo (face, região malar, couro cabeludo, região
pré-esternal e interescapular). O paciente sente sensação de queimação
que piora, caracteristicamente, com o calor ou exposição solar (daí o
termo “fogo selvagem”).

Fig. 7

A doença pode apresentar-se restrita às áreas seborreicas fotoexpostas,


principalmente regiões malares, com aspecto eritematocrostoso
semelhante ao lúpus eritematoso agudo. Este quadro, que apresenta
banda lúpica positiva em até 80% dos casos e acantólise ao
histopatológico, recebe o nome de pênfigo eritematoso ou síndrome de
Senear-Usher (FIGURA 8).
A suspeita é clínica e a confirmação é pela biópsia (histopatológico da
lesão e imunofluorescência direta da pele aparentemente sã).

TRATAMENTO

Sem o tratamento, 40% dos pacientes com fogo selvagem morriam nos
primeiros dois anos. Na maioria dos casos restantes, a doença toma um
curso crônico, com exacerbações e remissões, com eventual fatalidade. A
letalidade total do PF era de 60%! Somente 10% dos casos, com forma
localizada, evoluíam bem, eventualmente com remissão espontânea...
Com o tratamento, o prognóstico do pênfigo foliáceo sofreu uma
dramática melhora. Baseia-se também no uso de corticosteroides
sistêmicos, neste caso em doses mais baixas do que no pênfigo vulgar,
em geral não ultrapassando 1 mg/kg/dia de prednisona. Os
imunossupressores muitas vezes não são necessários. Nos casos de PF
localizado, o tratamento com corticoides tópicos pode ser suficiente.

PENFIGOIDE BOLHOSO

Trata-se de uma doença autoimune, em que há a formação de


autoanticorpos dirigidos contra a membrana basal da junção
dermoepidérmica, onde ocorre o descolamento e a formação da bolha e
acúmulo de eosinófilos. Não há acantólise. A imunofluorescência direta
mostra depósitos de IgG + C3, de padrão linear ao longo da camada
basal (FIGURA 9). Os autoanticorpos são direcionados contra o
Antígeno Penfigoide (AP ou BP), que é um componente da camada
basal, encontrado na porção superior da lâmina lúcida, representado
pelas proteínas BP230 e BP180. Esses autoanticorpos são encontrados
no soro do paciente (imunofluorescência indireta), respectivamente, em
100% e 65% dos casos. A doença tem uma prevalência um pouco maior
que a dos pênfigos não endêmicos, afetando igualmente ambos os sexos
e raças e incidindo preferencialmente em idosos ou adultos velhos.
Clinicamente, o paciente apresenta bolhas tensas, duradouras, grandes,
sobre a pele sã ou eritematosa, com conteúdo citrino ou hemorrágico
(FIGURA 10), de distribuição simétrica e predominando em áreas
flexoras (face interna da coxa, virilha, abdome inferior, axila). Pode
atingir mucosa oral em até 30% dos casos. A doença é mais benigna que
os pênfigos, embora também tenha um curso crônico, com exacerbações
e remissões.

Fig. 8

Em outros casos, as lesões se disseminam no sentido craniocaudal


(forma generalizada), algumas vezes evoluindo com eritema
descamativo por quase todo o tegumento (forma eritrodérmica). No
pênfigo foliáceo, os sinais de Nikolsky e de Asboe-Hansen também são
positivos!

Fig. 9
DIAGNÓSTICO
Fig. 10
Fig. 11

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
DERMATITE HERPETIFORME
O diagnóstico baseia-se na clínica, histopatologia e imunofluorescência.
O tratamento é feito geralmente com corticosteroides sistêmicos, em Doença crônica extremamente pruriginosa na qual observamos bolhas e
doses moderadas (0,5-1 mg/kg/dia), embora haja estudos comprovando vesículas agrupadas de forma simétrica distribuídas sobre a face
uma eficácia semelhante com corticoides tópicos, mesmo nos casos extensora dos membros (FIGURA 12). Em alguns pacientes observamos
extensos. Tetraciclina + nicotinamida e dapsona podem proporcionar apenas pequenas lesões encimadas por crostas nos cotovelos e joelhos,
efeitos benéficos. acompanhado de prurido. Ao exame histopatológico, é uma dermatose
neutrofílica e a imunofluorescência da pele revela depósitos de IgA na
Há outras doenças integrantes do grupo das buloses que também junção dermoepidérmica. Virtualmente todos os casos estão associados
cursam com formação de bolhas subepidérmicas. Vale citar: à intolerância intestinal ao glúten (doença celíaca) que, nesses pacientes,
costuma cursar sem alterações do hábito intestinal.

1. Penfigoide bolhoso farmacoinduzido: associado ao uso de d-


penicilamina, furosemida, captopril, penicilinas, sulfasalazina,
salicilatos e amiodarona. A suspensão da droga pode ou não
permitir a remissão.

2. Penfigoide cicatricial: acometimento predominante ou restrito das


mucosas, sendo a oral a mais frequentemente afetada e a ocular com
as mais graves complicações. Pode evoluir com sequelas cicatriciais
(sinéquias, aderências, lesão da córnea).

3. Herpes gestacional: quadro que ocorre no 2º ou 3º trimestre da


gestação, manifestando-se com uma erupção eritematourticada
bastante pruriginosa, que evolui com vesicobolhas, começando no
abdome e se espalhando para as nádegas e extremidades
(FIGURA 11). A evolução é benigna e autolimitada, cessando com
término da gestação, porém podendo recorrer numa nova prenhez.

Fig. 12

O diagnóstico dessas doenças baseia-se nos achados clínicos e


histopatológicos associados às imunofluorescências direta e indireta.

*A Figura 4 deste capítulo foi gentilmente cedida por Fabiano


Leal.
O grande responsável pelo surgimento das fotodermatoses é a Radiação
Ultravioleta (RUV). A luz solar que atinge a superfície terrestre é
composta de UVA e UVB. O UVA é o maior responsável pelo
fotoenvelhecimento e bronzeamento pigmentar imediato, enquanto o
UVB é o responsável pela queimadura solar, bronzeamento pigmentar
tardio e pelo desenvolvimento do câncer de pele. Cerca de 95% dos raios
ultravioleta que atingem a Terra são do tipo UVA e apenas 5% são
UVB. Os raios UVA possuem intensidade praticamente constante
durante o dia e durante o ano inteiro. O UVA atinge a camada mais
profunda da pele e a intensidade de radiação UVA que chega até a
camada basal da epiderme é 700 vezes maior que a radiação UVB.

A pele fotoenvelhecida é caracterizada por atrofia, cor amarelada e


opaca, aumento das pregas cutâneas, rugas profundas, dando um
aspecto romboidal e telangiectasias. As lesões predominam nas áreas
expostas ao sol (face, pescoço, região superior do tórax, mãos,
antebraços). As principais fotodermatoses podem ser divididas de
acordo com o prazo de aparecimento e encontram-se na Tabela 1.

Tab. 1

Fotodermatoses

Exposição de curto Exposição de longo prazo

prazo

● Fotoenvelhecimento (rugas);

6
● Queimaduras (1º, 2º
Cap. grau); ● Melanose solar (lentigem solar);
ONCOLOGIA DERMATOLÓGICA

● Sardas (efélides); ● Ceratose actínica (ceratose


● Bronzeamento; solar);

● Insolação.
● Elastose solar;
● Leucodermia gutata solar;
INTRODUÇÃO
● Xerodermia solar.

VIDEO_14_DER
A pele cumpre a função de barreira física, protegendo o ser humano do Algumas destas lesões cutâneas por exposição solar serão mostradas
meio ambiente. A proteção natural contra o sol inclui os pelos, nas FIGURAS 2 a 5, com uma pequena e concisa explicação em suas
melanina e células de defesa. Porém, toda essa proteção não é suficiente legendas. A ceratose actínica será comentada a seguir...
em longo prazo, sendo a exposição prolongada, por profissão ou beleza,
uma das principais causas de envelhecimento e o principal fator de risco
para o desenvolvimento de lesões pré-malignas e malignas. Podemos
classificar a pele de acordo com a sua sensibilidade e resposta à
exposição solar em seis fototipos segundo Fitzpatrick (Tabela 2).

FOTODERMATOSES
Fig. 1

Fig. 2: Queimadura solar de primeiro grau: grande área de eritema,


com ardor importante. É totalmente reversível.

Fig. 3: Sardas (efélides): são manchas acastanhadas devido ao


aumento da produção local de melanina (mas não à proliferação de
melanócitos). Predominam na face, ombros e região superior do dorso.
São mais comuns em ruivos. Surgem na infância, tornando-se mais
aparentes no verão e menos pigmentadas no inverno.

Fig. 5: Elastose solar (cútis rhomboidalis nuchae): a pele apresenta


dobras grosseiras, particularmente em torno do pescoço, poupando as
áreas protegidas (abaixo do queixo).

A fotoproteção é recomendada a todas as pessoas. Além de prevenir ou


reduzir as fotodermatoses, a fotoproteção diminui o risco das neo-
plasias cutâneas. Os filtros ou protetores solares são compostos de
substâncias físicas e/ou químicas que agem como barreira física e/ou
química à radiação ultravioleta. O Fator de Proteção Solar ou FPS é a
razão entre a quantidade mínima de: energia/radiação UV necessária
para produzir um eritema mínimo em uma pele fotoprotegida e a
quantidade de energia/radiação UV necessária para produzir o mesmo Fig. 4: Melanose solar (lentigo): surge na fase adulta, sendo mais
comum nos idosos. São manchas acastanhadas permanentes devido à
eritema numa área da pele desprotegida/sem aplicar o fotoprotetor. É proliferação de melanócitos na camada basal.
importante lembrar ao paciente que o filtro solar não é um passaporte
ao sol, e sim mais uma proteção, assim como o chapéu, ou a camisa, os
óculos, a barraca. Outra opção disponível seria de roupas que contêm,
em seu tecido, filtro solar.

LESÕES CUTÂNEAS PRÉ-CANCERÍGENAS

CERATOSE ACTÍNICA
É a lesão pré-cancerígena epitelial mais comum em indivíduos de pele
clara. É também chamada de ceratose solar ou ceratose senil. Este
último é um termo inadequado, já que o desenvolvimento da lesão está
relacionado à exposição solar e não à idade em si.

São lesões cutâneas pré-malignas que consistem da proliferação de


queratinócitos aberrantes, que se desenvolvem em resposta à exposição
prolongada à radiação ultravioleta. Caracterizam-se por pequenas
placas hiperceratóricas descamativas em base eritematosa, de 2-6 mm,
geralmente múltiplas e localizadas em áreas fotoex-postas como cabeça,
pescoço, antebraços e dorso das mãos, sendo que 65% localizam-se nos Fig. 6: Observar a lesão eritematodescamativa extensa no antebraço.
Veja também a presença de lentigens (melanose solar).
membros superiores (FIGURA 1). À palpação, as lesões apresentam
uma aspereza e algumas vezes as lesões são mais sentidas do que vistas.
A ceratose actínica do lábio é conhecida como queilite actínica e
geralmente afeta mais o lábio inferior, pois recebe uma quantidade Tratamento: a terapia é tópica e deve ser guiada pelo tamanho,
maior de exposição solar. localização da lesão e idade do paciente. As opções são semelhantes às
citadas para a ceratose actínica, como: terapia fotodinâmica,
As lesões podem persistir indefinidamente ou transformar-se em imiquimode, 5-fluorouracil, criocirurgia, eletrocoagulação ou excisão e
carcinoma espinocelular (CEC), com baixo risco de metástase, exceto sutura.
nos casos de CEC derivados de ceratose actínica no lábio inferior em
que aumenta esta probabilidade. Por estarem relacionadas à
ERITROPLASIA DE QUEYRATE PAPULOSE
fotoexposição cumulativa, são marcadores de risco para CEC,
carcinoma basocelular (CBC) e melanoma.
BOWENOIDE

São duas formas de carcinoma espinocelular in situ do pênis. A


Tratamento: embora a maioria das ceratoses actínicas não evolua para
papulose bowenoide afeta o corpo, e a eritroplasia de Queyrat, a
câncer, o risco de transformação em CEC é avaliado em 1 a cada 1.000
mucosa (glande, prepúcio, uretra). Esta última caracteriza-se por placa
pacientes em um ano.
bem delimitada, brilhante, de superfície aveludada, eritematosa
(FIGURA 7), de crescimento lento. Acomete mais homens não
Entre as possibilidades terapêuticas podemos citar: (1) fotodinâmica; (2)
circuncidados, acima de 40 anos. O traumatismo constante, higiene
imiquimode (imunomodulador) 5% em creme; (3) 5-fluorouracil
ruim, herpes simples genital, HPV 16 e 18 têm sido identificados como
(antimitótico) 1-2% na face 1x/dia e 5% no corpo 2x/dia, por duas a três
fatores de risco. Tem chance de transformar-se em CEC invasor em 33%
semanas. É importante orientar o paciente que a partir do terceiro ou
dos casos. Apresenta como diagnóstico diferencial: balanite de Zoon,
quarto dia, em média, as lesões vão piorar, e para ele não interromper o
candidíase, psoríase, etc. Ambas as doenças podem ser causadas por
tratamento, já que isso é o esperado; (4) criocirurgia (nitrogênio
HPV, sendo os subtipos 16, 18, 31 e 35 os mais prevalentes.
líquido); (5) curetagem, com ou sem eletrocoagulação; (6) diclofenaco
sob a forma de gel 2-3% 2x ao dia; (7) peelings químicos; (8) laser.

DOENÇA DE BOWEN

Considerado um carcinoma espinocelular in situ, que pode evoluir para


forma invasiva em 5% dos casos (estes são geralmente mais agressivos
do que os que surgem de ceratose actínica). Geralmente única,
manifesta-se como placa achatada rósea, eritematosa ou
eritematopigmentada, bem delimitada, com bordas regulares e com
escama ou crosta na superfície, algumas vezes fazendo diagnóstico
diferencial com CBC, Tinea corporis, eczema numular, ceratose actínica,
psoríase e ceratose seborreica, pode atingir vários centímetros de
diâmetro (FIGURA 6). Localiza-se tanto em áreas fotoexpostas como
não fotoexpostas, principalmente em cabeça, pescoço e pernas,
preferencialmente em pacientes acima dos 60 anos. Fig. 7: Eritroplasia de Queyrat (carcinoma espinocelular in situ):
observar a lesão eritematosa brilhante na glande.

Tratamento: pode ser realizado com terapia fotodinâmica, 5-


fluorouracil, excisão cirúrgica, laser de Erbium ou laser de CO2.

CORNO CUTÂNEO
É uma designação morfológica para um nódulo hiperceratótico denso e São resultantes da exposição crônica ao arsênico. Antigamente se
cônico que se assemelha a um chifre de um animal (FIGURAS 8A e tratava diversas patologias com o arsênio, o arsenito de potássio oral
8B). É o resultado de uma aderência incomum de material ceratinizado. (solução de Fowler) para psoríase e trióxido arsênico (pílulas asiáticas)
Um grande número de desordens pode provocar essas lesões, porém na para asma são dois exemplos de exposição médica ao arsênico. As
maioria dos casos de corno cutâneo encontramos a ceratose actínica. ceratoses arsenicais se desenvolvem nas áreas de fricção e trauma,
Outras patologias que podem representar o corno cutâneo são: principalmente nas palmas e plantas, como pápula em forma de calo,
carcinoma espinocelular, verruga viral, ceratose seborreica, geralmente simétricas, amareladas, duras, pontudas, múltiplas, variando
ceratoacantomas, carcinoma renal metastático, carcinoma sebáceo, de 2 a 10 mm de diâmetro. Podem lembrar verrugas ou ceratodermia
sarcoma de Kaposi, angioceratoma, molusco contagioso, entre outros. palmoplantar. Outra forma clínica é o aparecimento de lesões
São mais encontrados na face e couro cabeludo, porém também podem eritematoescamosas (FIGURAS 9A e 9B), geralmente em áreas
ser encontrados nas mãos e pênis. Essas lesões podem variar de fotoprotegidas, mas podem surgir em áreas fotoexpostas. Esta segunda
tamanho, de poucos milímetros a vários centímetros. Elas podem ser apresentação clínica representa lesões de doença de Bowen, mas
brancas ou amareladas, retas, curvadas ou retorcidas. Uma biópsia também pode haver o aparecimento de carcinoma basocelular. Outro
tangencial incluindo a base não é só diagnóstico, mas muitas vezes estigma de arsenicismo crônico são mudanças pigmentares na pele, com
curativo. O curso e prognóstico dependem da desordem de base. placas hiperpigmentadas com áreas de despigmentação lembrando
“gotas de chuva”. Essas placas podem afetar os mamilos, axilas, virilhas
e ponto sobre pressão. Tende a poupar mucosa oral. Também pode
haver perfuração do septo nasal, alopecia difusa, neuropatia e
frequência aumentada de desenvolvimento de carcinoma pulmonar e
geniturinário após 30 anos, em média. O tratamento pode ser realizado
com cirurgia convencional, crioterapia, retinoides, dentre outros.

Fig. 8

CERATOSE ARSENICAL

Fig. 9
Deriva das células não queratinizadas que originam a camada basal da
CERATOSE TÉRMICA
epiderme. É o câncer mais comum em humanos, corresponde a 75% de
todos os tipos de câncer de pele e 25% de todos os tipos de câncer
São produzidas por estimulação crônica da radiação infravermelha,
diagnosticados nos EUA. É mais comum em idosos e no sexo masculino.
apreciadas na pele por uma sensação agradável de calor.
É raro no indivíduo negro. Os principais fatores de risco são: pele clara,
olhos claros, cabelo ruivo, efélides, exposição solar (atualmente muito
Eritema ab igne, um padrão pontilhado, reticulado de discutido), especialmente durante a infância e do tipo intermitente
hiperpigmentação é observado naqueles pacientes que aplicam causando queimadura; outros fatores: radiação terapêutica, exposição
almofadas de calor no corpo. As pessoas que habitualmente sentam ao arsênico, imunossupressão (transplantados), tabagismo (pequeno
perto da lareira para se aquecer tendem a desenvolver as lesões nas risco), nevo sebáceo de Jadassohn. É o menos agressivo dos tumores
pernas e coxas. Assim como os danos solares crônicos podem produzir malignos da pele, apresentando raramente metástase. A invasão local é o
ceratoses actínicas, os danos térmicos podem produzir suas próprias maior perigo, pela capacidade de invadir e destruir tecidos adjacentes,
sequelas (eritema ab igne). O tratamento preconizado é a cirurgia. inclusive ossos. É importante notar que o risco para desenvolver um
novo CBC varia de 35-50%. O CBC apresenta-se como pápula (ou
nódulo), perolado e com telangiectasias (FIGURA 11). O crescimento é
CERATOSE DE RADIAÇÃO CRÔNICA
progressivo, eventualmente podendo ulcerar. Localiza-se
preferencialmente nos dois terços superiores da face com 30% das lesões
Aparecem como ceratoses discretas, placas hiperceratósicas ou lesões
localizando-se no nariz. Quando atinge pálpebra, acomete mais o canto
exulceradas (FIGURA 10) após a exposição aos raios X. As ceratoses de medial da pálpebra inferior. Não ocorre nas palmas, plantas e mucosas.
radiação crônica podem se desenvolver após muitos anos de exposição As formas clínicas do CBC são:
crônica à radiação, como acontecia com dentistas, também com
pacientes de radioterapia e em pacientes vítimas de acidentes nucleares,
como ocorreu em Chernobyl, na Ucrânia. A terapia se resume em
cirurgia.

Fig. 11: Forma nódulo-ulcerativa: observar a lesão em maior aumento,


mostrando o aspecto perolado com telangiectasias.

Fig. 10

● Nódulo-ulcerativo – mais comum – (FIGURA 12);

● Plano-cicatricial;
Obs.: vale a pena chamar a atenção que o ceratoacantoma não é uma ● Esclerodermiforme (FIGURA 13);
lesão pré-maligna, nem maligna. É uma lesão benigna. Tem como
sinonímia o nome de molusco sebáceo. Apresenta sua origem no ● Pigmentado (FIGURA 14);
folículo pilossebáceo. Pode involuir espontaneamente. Acomete mais ● Superficial (FIGURA 15);
homens da raça branca e os locais mais acometidos são: parte central da
face e membro superior.
● Basoescamoso ou metatípico (apresenta áreas com CBC e CEC).

CÂNCER DE PELE NÃO MELANOMA

CARCINOMA BASOCELULAR (CBC)

VIDEO_15_DER
Fig. 12 Fig. 14: Forma pigmentada: observar a marcação da margem
cirúrgica.

Fig. 15: Forma superficial.

Diagnóstico e tratamento: a biópsia confirma o diagnóstico e o


tratamento inclui diversas modalidades cirúrgicas e não cirúrgicas. A
escolha vai depender de fatores como risco de recorrência da lesão,
características do paciente (ex.: comorbidades, imunossupressão) e
disponibilidade.

Fig. 13: Forma esclerodermiforme.


A exérese cirúrgica com 4-5mm de margem é normalmente a primeira
escolha para as lesões com baixo risco de recorrência (lesões primárias;
< 10 mm em áreas não críticas da face e pescoço; < 20 mm no tronco e
extremidades, exceto área pré-tibial, mãos, pés, unhas e tornozelos;
histologia do tipo superficial ou nodular; e paciente imunocompetente).

Para lesões que apresentem maior repercussão estética e funcional ou


maior risco de recorrência (zona H da face), a cirurgia micrográfica de
Mohs é uma técnica mais precisa, com checagem das margens por
microscopia durante o procedimento. Assim, ela permite identificar e
remover a lesão, ao mesmo tempo que preserva tecido saudável ao redor
da lesão. Nos pacientes que não são candidatos à cirurgia ou que optam
por não fazê-la, as opções incluem terapia tópica (imiquimode, 5-
fluorouracil); terapia fotodinâmica; curetagem e eletrodissecção
(raspagem com cureta); criocirurgia; e radioterapia.
Fig. 16: Zona H: área relacionada a maior risco de recorrência no
CBC.

CARCINOMA ESPINOCELULAR (CEC)

Representa 15% das neoplasias malignas de pele. É derivado dos


queratinócitos suprabasais (camada espinhosa). É também conhecido Fig. 17: Corno cutâneo (CEC).
como carcinoma de células escamosas ou carcinoma epidermoide.
Apresenta uma incidência maior acima dos 40 anos de idade, sendo
duas vezes mais comum em homens (de pele clara). Principais fatores de
risco: fotoexposição (radiação ultravioleta), exposição ao arsênico ou
hidrocarbonetos aromáticos, lesões precursoras (ceratose actínica, doença
de Bowen, eritroplasia de Queyrat, líquen escleroatrófico genital,
cicatrizes de queimaduras-úlcera de Marjolin, úlceras e fístulas crônicas),
HPV 16 e 18 (mucosa genital), imunossupressão (é o mais associado aos
transplantados), genodermatoses, como albinismo ou xeroderma
pigmentoso (ambas associadas com um aumento da susceptibilidade da
pele à radiação UV). O tabagismo está associado com desenvolvimento
de CEC da cavidade oral. Manifesta-se clinicamente na pele como placa
eritematosa ceratósica que, segundo o grau de proliferação da camada
córnea, pode evoluir para um corno cutâneo (FIGURA 17); ou pode
apresentar-se como pápula ou nódulo com diversos graus de ulceração e
infiltração segundo o tempo de evolução (FIGURA 18). O CEC
localizado na mucosa apresenta-se como placa de leucoplasia ou então
como lesão infiltrativo-vegetante. O corno cutâneo pode representar um Fig. 18: CEC ulcerado.
CEC ou simplesmente uma hiperceratose colunar benigna (mais
comum).

Diferentemente do carcinoma basocelular, as metástases são mais


comuns e acontecem em 0,5-6% (especialmente em linfonodos
regionais) dos casos e são mais frequentes em lesões recorrentes e em
lesões que invadem estruturas profundas ou nervos cutâneos. A orelha
tem a maior chance de recidiva (18%). A possibilidade de metástase
aumenta quando a lesão se localiza no lábio (12%) e sobre cicatrizes (até
40%)!!

O carcinoma verrucoso é uma forma do CEC de baixo grau de


malignidade que clinicamente se apresenta como uma tumoração
exofítica verrucosa em várias regiões. Recebe também os seguintes
nomes:
1. Papilomatose florida (oral) – (FIGURA 19);

2. Condiloma acuminado gigante de Buschke-Lowenstein (anogenital)


– (FIGURA 20);

3. Epitelioma cuniculatum (CEC localizado na região plantar) –


(FIGURA 21).

Fig. 19: Papilomatose florida (CEC verrucoso).

Fig. 21: Epitelioma cuniculatum.

Diagnóstico e tratamento: o diagnóstico deve ser confirmado pela


biópsia. A escolha terapêutica deve se basear também no risco de
recorrência da lesão. Mais uma vez, aparecem como principais
modalidades a excisão cirúrgica convencional e cirurgia micrográfica de
Mohs, tendo como opções a curetagem e eletrodissecção, criocirurgia, e
a radioterapia para áreas de difícil acesso cirúrgico ou como adjuvante
no caso de metástase a linfonodos.

NEVOS
Fig. 20: Condiloma acuminado gigante de Buschke-Lowenstein (CEC
verrucoso).
Os nevos representam a neoplasia benigna cutânea mais comum. Pelo
menos um nevo é encontrado virtualmente em todas as pessoas.
Histologicamente, caracterizam-se por uma proliferação localizada de
melanócitos na pele, geralmente na junção dermoepidérmica (nevo
juncional), embora possa estar localizada na derme. Clinicamente são
manchas hipercrômicas, quase sempre de cor homogênea, acastanhada
ou enegrecida. Podem ser planos ou elevados. O nevo mais comum (que
todos têm pelo menos um...) é o nevo melanocítico (FIGURA 22).
Geralmente são múltiplos, pequenos (< 6 mm) e predominam nas
regiões fotoexpostas.
Os nevos congênitos aparecem ao nascimento e se desenvolvem em volta
dos apêndices cutâneos e infiltram o tecido subcutâneo. São placas
hiperpigmentadas pilosas, de variados tamanhos. Quando de pequenas
dimensões, não aumentam o risco de melanoma. Os nevos congênitos
gigantes, entretanto, são maiores que 20 cm e têm 4-20% de risco de
transformação maligna (FIGURA 24).

Fig. 22

Fig. 24
Uma grande profusão desses nevos indica risco para melanoma (acima de
50 nevos). É muito raro estes nevos se transformarem em melanoma,
porém são marcadores de risco indireto.
O nevo azul muito raramente pode malignizar, principalmente quando
Os nevos displásicos (FIGURA 23) caracterizam-se por um tamanho um estiver localizado na região sacral, e for maior que 1 cm.
pouco maior que os melanocíticos, pela variação de cor, geralmente
duas cores (variando do róseo ao acastanhado-enegrecido) e de bordas O nevo halo ou vitiligo perinévico ou nevo de Sutton, caracteriza-se
irregulares. Como o nome sugere, o histopatológico apresenta algumas pelo aparecimento de um halo hipocrômico em torno de um nevo
atipias. O risco de melanoma é baixo quando existem poucas lesões. O melanocítico. Eventualmente está presente no melanoma.
grande problema desses nevos é a confusão diagnóstica com melanoma
e, portanto, na maioria das vezes necessitam de biópsia confirmatória. O nevo de Spitz (melanoma da infância) é uma lesão melanocítica
Existe uma síndrome do nevo displásico familiar, que apresenta alto risco benigna com características clínicas e histopatológicas semelhantes às
de melanoma, especialmente em adolescentes e adultos jovens. É do melanoma, devendo ser lembrada no diagnóstico diferencial. Suas
definida pela presença de > 75-100 nevos, pelo menos um deles > 8 mm características principais incluem um padrão estelar (starburst), que é o
e pelo menos dois familiares com este fenótipo ou histórico de mais frequente, seguido do padrão globular e atípico. O diagnóstico
melanoma. deve ser confirmado por exame histopatológico (melanócitos grandes,
com ou sem atipia nuclear e citoplasma abundante, dispostos em
ninhos). Não existe consenso sobre a conduta, sendo comumente
indicada a retirada da lesão.

MELANOMA

VIDEO_16_DER
É o tumor maligno com origem nos melanócitos, que geralmente tem a
pele como local primário (embora possa acometer outros tecidos),
sendo considerado o mais agressivo dos tipos de câncer de pele devido
ao seu alto potencial para produzir metástases. Embora seja responsável
por apenas 4% das neoplasias malignas cutâneas, é o tipo mais agressivo
devido ao seu alto potencial para produzir metástases. Vem mostrando
aumento na incidência nos últimos anos, embora a mortalidade (ainda
elevada) tenha caído, particularmente nos jovens, em virtude da
Fig. 23 detecção mais precoce e de uma melhor terapêutica.
Este tumor é predominante em indivíduos de pele clara (98%), com A presença de nevos também deve ser destacada, ainda que a maioria
maior incidência em áreas equatoriais (sobretudo África do Sul e dos melanomas não tenha o nevo como lesão pré-neoplásica (apenas 1/4
Austrália), o que revela a importância da exposição solar. Ocorre dos casos apresentam correlação histológica). Indivíduos com nevos
geralmente em adultos jovens de 20-50 anos de idade. O melanoma melanocíticos apresentam maior risco; sobretudo os congênitos gigantes
localiza-se predominantemente no tronco, em homens, em contraste (> 20 cm). A síndrome do nevo displásico representa um fator de risco
com as pernas e o quadril, nas mulheres. para melanoma (dez vezes), geralmente mais precoces e menos espessos.
O risco também aumenta se o paciente apresenta mais que 50 nevos.
O risco de desenvolvimento do melanoma está associado a fatores
genéticos, ambientais e individuais. Entre os fatores, a exposição solar é Quanto ao fator genético, os mais importantes estão no locus CDKN2A
um dos grandes vilões. Um dado para auxiliar o paciente com os (relacionado a dois genes de supressão tumoral – p16 e p14ARF), no
cuidados com o sol é o índice ultravioleta. O Índice Ultravioleta (IUV) locus CSK4, na via RAS e no gene MITF. O xeroderma pigmentoso,
mede o nível de radiação solar na superfície da Terra. Quanto mais alto, doença autossômica recessiva caracterizada por deficiência no
maior o risco de danos à pele e de aparecimento de câncer. O índice UV mecanismo de reparo do DNA, apresenta risco até 2.000 vezes maior
é calculado com base em vários fatores, segue abaixo alguns exemplos: que a população normal. O albinismo também aumenta a chance de
desenvolvimento da neoplasia.
● A espessura da camada de ozônio sobre sua cidade (detectada com o
uso de satélites);

● A cobertura de nuvens sobre sua cidade (as nuvens bloqueiam a


radiação UV em graus variados);

● A época do ano (no inverno, a radiação UV é mais baixa do que no


verão em razão do ângulo do sol);

● A altitude de sua cidade (altitudes mais altas recebem mais radiação


UV).

O IUV é apresentado como um número inteiro. De acordo com


recomendações da Organização Mundial da Saúde, esses valores são
agrupados em categorias de intensidades, conforme mostra a tabela a
seguir:

CATEGORIA ÍNDICE ULTRAVIOLETA

BAIXO <2

MODERADO 3a5

ALTO 6a7
Fig. 25: Lentigo maligno-melanoma.

MUITO ALTO 8 a 10

EXTREMO > 11

Os indivíduos de fenótipo claro (olhos, pele, cabelo loiro ou ruivo) têm


maior risco em relação aos indivíduos de pele negra, para o
aparecimento de lesões malignas. A exposição solar na infância e a
fotoexposição intermitente levando à queimadura são fatores mais
importantes para o melanoma do que a exposição contínua sem
queimadura (ao contrário do CEC, que depende da exposição
cumulativa). Culturalmente, algumas regiões associam pele bronzeada a
sinal de beleza, e muitos aderem à prática das câmaras de bronzeamento
artificial, outro fator de risco, que está proibido pela Anvisa. Pacientes
do sexo masculino apresentam pior prognóstico. O sol pode agravar
diversas dermatoses, como por exemplo: pênfigo foliáceo, lúpus,
xeroderma pigmentoso, pelagra, etc.
Fig. 26: Melanoma extensivo superficial.

Fig. 28: Melanoma lentiginoso acral.

A história pessoal de melanoma, por sua vez, aumenta a chance de ter


outro melanoma em até nove vezes, e o paciente deve ser mantido sob
vigilância ao longo de toda a vida. Outro fator, a história familiar, tem
um risco cinco vezes maior, ainda que apenas 5-10% destas neoplasias
sejam verdadeiramente familiares.

CLÍNICA E DIAGNÓSTICO

As lesões do melanoma costumam ser únicas e predominam em áreas


fotoexpostas, especialmente aquelas com exposição intermitente (ex.:
dorso nos homens, porção inferior dos membros inferiores nas
mulheres). É importante que ele relate se aquele nevo cresceu, se tem
prurido (coceira), se sangra. Devemos fotografar todos os nevos
suspeitos. Os tipos clínicos de melanoma são resumidos na Tabela 3.
Não podemos esquecer das formas mais raras de melanoma, que são os
melanomas primários de mucosa, os amelanóticos (FIGURA 29), os
raríssimos de órgãos internos, e os excepcionais congênitos. Qualquer
Fig. 27: Melanoma nodular.
das formas clínicas pode se tornar amelanótico.
Segundo as recomendações do GBM (Grupo Brasileiro de Melanoma),
o laudo deve conter: tipo histológico do melanoma, fase de crescimento
(radial ou vertical), níveis de invasão (classificação de Clark),
profundidade (índice de Breslow), número de mitoses por milímetro
quadrado, infiltrado inflamatório linfocitário peritumoral/intratumoral,
invasão vascular linfática e sanguínea, invasão perineural, ulceração,
regressão, satelitose microscópica e margens cirúrgicas.

Por último, dispomos da imuno-histoquímica como ferramenta


diagnóstica, capaz de identificar a natureza da linhagem celular, sendo
utilizada para a identificação de tumores primários ou metastáticos
pouco diferenciados, tumores de células fusiformes, melanomas
amelanóticos e no diagnóstico diferencial com outras condições. Os
marcadores principais são a proteína S-100 e o HMB-45. Uma
limitação do exame é que ele não é capaz de diferenciar a lesão
melanocítica em benigna ou maligna.
Fig. 29

Classificação de Clark Índice de Breslow


No diagnóstico clínico é importante lembrar a regra do ABCDE, para (nível de invasão) (espessura do tumor)
lesões pigmentadas nas quais as variáveis a serem analisadas são:
Nível I: in situ ≤ 1 mm
(intraepidérmico)
Assimetria;

Nível II: derme papilar > 1-2 mm


Bordas irregulares; superior

Cores diversas – maior ou igual a duas cores (preto, azul, Nível III: derme papilar > 2-4 mm
marrom, cinza, vermelho, branco) na mesma lesão;
Nível IV: derme reticular > 4 mm
Diâmetro maior que 6 mm;
Nível V: hipoderme
Evolução (qualquer alteração que tenha ocorrido na lesão – O índice de Breslow determina a espessura tumoral (dimensão vertical a
tamanho, formato, novos sintomas). partir do ponto mais profundo de invasão ao topo da camada granulosa
ou à célula mais superficial em caso de ulceração), usando uma ocular
micrométrica. Havia uma classificação de Breslow anterior que usava
como parâmetros: in situ, até 0,76 mm, de 0,76 a 1,5 mm, de 1,5 a 4 mm
e acima de 4 mm. Atualmente, estas medidas devem ser expressas na
DIAGNÓSTICO E ESTADIAMENTO que mais se aproxima de 0,1 mm, e não de 0,01 mm. Assim, deveremos
utilizar apenas uma casa decimal, aproximando para mais quando acima
de 0,05 e para menos abaixo disto. Ex.: um melanoma com 0,75 mm
deve ser expresso no laudo anatomopatológico como 0,8 mm. Por outro
O diagnóstico diferencial deve ser feito com nevos, CBC pigmentado, lado, um melanoma com 0,94 mm será expresso como 0,9 mm. Quando
a biópsia é feita por punch ou shaving, em que a lesão é representada
granuloma piogênico, ceratose seborreica, melanoníquia estriada, parcialmente, deve-se medir a espessura segundo Breslow e informar
no relatório anatomopatológico que tem espessura de, pelo menos, a
trauma, etc. A dermatoscopia (“lente de aumento especial”) é uma maior espessura encontrada no espécime.
ferramenta útil na avaliação de lesões pigmentadas, tornando possível
identificar a origem celular da lesão; no entanto, o diagnóstico definitivo A principal forma de estadiamento do melanoma se dá pelo sistema
é histopatológico. A biópsia deve ser excisional com margens de 1-3 mm TNM (ver Tabela 4). Segundo dados norte-americanos para a
e coxim de gordura subdérmica, com exceção para tumores maiores ou sobrevida em cinco anos, teríamos: 96% para o estágio 0; 92,5% e 74,8%
em locais anatômicos nobres, nos quais realizaremos uma biópsia para estágios I e II; 49% nos casos de metástase linfonodal (estágio III);
incisional na área mais suspeita (área mais pigmentada ou mais e 17,9% para o estágio IV (metástases à distância). Entre os fatores
elevada). O melanoma possui dois tipos de crescimento: radial (cresce prognósticos desfavoráveis, poderiam ser incluídos: localização (cabeça,
para os lados, portanto tem melhor prognóstico) e vertical (cresce para pescoço e tronco), sexo masculino, idade acima de 60 anos, intensidade
baixo, tendo pior prognóstico, maior chance de enviar metástase, temos da infiltração linfocitária, regressão tumoral, tipo histológico, índice
como exemplo o melanoma nodular). Assim, é fundamental que a mitótico, microssatelitose, tipo celular predominante, marcadores
amostra de pele seja retirada até o tecido celular subcutâneo, já que a imuno-histoquímicos e citomorfometria nucleolar.
espessura vertical do tumor é o valor preditivo mais importante para o
prognóstico, tratamento e seguimento.
A maioria dos pacientes apresenta-se em estágios iniciais I e IIA no
momento do diagnóstico, quando a cirurgia é curativa em 70-90% dos
casos. A cirurgia é o tratamento mais efetivo, sendo que, de acordo com
o estadiamento, poderá ser acompanhada de algum procedimento
adjuvante, como linfadenectomia, quimioterapia, radioterapia ou
imunoterapia.

A investigação de envolvimento linfonodal regional deve ser feita com


linfocintilografia pré-operatória e biópsia do primeiro linfonodo de
drenagem (Linfonodo Sentinela – LS ou LNS), poupando os pacientes
das extensas dissecções linfáticas do passado. O LS quase sempre
corresponde ao primeiro local de implantação tumoral, pois a
disseminação ocorre tipicamente de forma ordenada e sequencial. A
ideia é a de que, não havendo metástase no LS, há mais de 95% de
possibilidade de que não ocorra doença metastática naquela cadeia. A
pesquisa do LS, embora deva ser individualizada de acordo com a idade
e as comorbidades do paciente, está indicada principalmente para
pacientes sem acometimento linfonodal clinicamente detectado com
espessura tumoral > 0,8 mm ou < 0,8 mm e ulceração. Pacientes com
linfonodos palpáveis ou com biópsia (+) para LS devem ser submetidos
à dissecção de todos os linfonodos da respectiva cadeia de drenagens –
não exatamente por aumentar a sobrevida (este benefício ainda não está
esclarecido), mas pelo fato de melhorar a qualidade de vida do paciente.

Quando o exame físico dos linfonodos é duvidoso, o emprego da


ultrassonografia de linfonodos pode ser indicado. O exame também
pode ser indicado em pacientes que preenchem os critérios para biópsia
do linfonodo sentinela (BNSL), mas não realizam o procedimento, em
pacientes nos quais o BNL não é possível ou é tecnicamente mal
sucedido (por exemplo, porque a migração linfocintigráfica de corante
falhou e linfonodo sentinela de drenagem não pode ser identificado), e
naqueles em que, apesar de um BNSL positivo, a dissecção completa
dos linfonodos não é realizada. Para boa parte dos pacientes, a
ressecção cirúrgica será suficiente. O tratamento adjuvante, por sua vez,
fica indicado para os tumores em estágio IIB, IIC e III, quando se tem
um risco elevado de recorrência e óbito. Este é atualmente um campo
TRATAMENTO
vasto e em pleno crescimento, interferindo na escolha itens como a
presença da mutação BRAF e o perfil de toxicidade. Até pouco tempo,
A terapia do melanoma está baseada na ressecção da lesão com margem
a única possibilidade disponível era o interferon alfa em altas doses.
de segurança adequada à espessura da lesão. Assim, depois de
Atualmente, esta interleucina tem sido desencorajada em prol do uso de
diagnosticado e estadiado pela biópsia, se o tumor não for metastático,
opções melhores, como a imunoterapia com os inibidores de checkpoints
é realizada a excisão local para ampliação das margens, conforme o
imunológicos, representados pela classe dos inibidores da PD1
quadro a seguir.
(programmed cell death protein 1) – nivolumabe e pembrolizumabe.
Outra opção é o anticorpo monoclonal contra o receptor CTLA4 do
linfócito – ipilimumabe. Temos também a terapia direcionada contra a
Margens Recomendadas para Excisão do Melanoma proteína quinase ativadora mitogênica (MAPK) com uso do
dabrafenibe, trametinibe e vemurafenibe.
Espessura da lesão Margens recomendadas

In situ 0,5 a 1,0 cm

≤ 1,0 mm 1,0 cm

> 1,0 mm e 2,0 mm 1,0 a 2,0 cm

> 2,0 mm 2,0 cm


Nos pacientes com melanoma metastático, o tempo mediano de
sobrevida estimado é em torno de oito meses. A quimioterapia não
mostrou, até o momento, aumentar a sobrevida global, mas se justifica
pela paliação de sintomas nos pacientes que não obtiveram resposta
com a terapia adjuvante com as opções anteriores. A dacarbazina,
temozolomida e carboplatina/paclitaxel são exemplos de esquemas já
avaliados. A radioterapia fica indicada para os casos de metástases
ósseas e cerebrais.

DETALHES SOBRE O ESTADIAMENTO DO


MELANOMA – AJCC

É importante entender bem esta questão da “margem ideal de


ressecção”, que sempre leva dúvida aos alunos... Muitos
questionam: “Mas como assim margem ideal, se o tumor já foi
removido para definir o Breslow na biópsia?” Temos de
entender que, na biópsia, a margem desta exérese inicial é
exígua, mínima (em torno de 1-3 mm), para que não seja
comprometida a drenagem linfática da área. Daí, dependendo
então do Breslow, esta mesma margem deve ser ampliada em
determinadas medidas a partir da cicatriz da exérese inicial.
Isso se fará em um segundo momento!

O acompanhamento deve incluir a história clínica e exame físico,


principalmente no local primário, linfonodos regionais, fígado, baço,
pulmão, cérebro (o melanoma é a terceira causa de metástase cerebral).
Nos pacientes sem metástases, o seguimento é feito a cada três meses
por um ano e depois a cada 6 a 12 meses nos casos de melanoma com
espessura menor de 1 mm. Para os mais profundos, a cada três meses
por dois anos, a cada seis meses por três anos e depois anualmente.
Caso haja suspeita de envolvimento visceral, podem ser realizadas
punção aspirativa com agulha fina guiada por exame de imagem ou
biópsia aberta da área suspeita. E, se positivos para malignidade,
devem-se considerar as opções terapêuticas a seguir:

● Metástase solitária ou limitada: ressecção ou terapia sistêmica,


principalmente quando há progressão da metástase;

● Metástases disseminadas não acometendo o Sistema Nervoso


Central (SNC): terapia sistêmica;

● Metástases disseminadas acometendo o SNC: cirurgia/radioterapia


ou terapia sistêmica.
6. Tivemos também a substituição do termo LN (+)
1. Não se utiliza mais mitoses para estadiamento em T1 (na
“microscópico” por “clinicamente oculto” (EC I-II com meta
edição anterior, a presença de mitoses em melanomas < 1
nodal determinada pela biópsia do LS) e do termo LN (+)
mm passava de T1a para T1b, da mesma forma que a
“macroscópico” por “clinicamente detectado” (EC III). O
ulceração). Entretanto, no relatório anatomopatológico, as
volume do tumor no LS é considerado fator prognóstico de
mitoses devem continuar a ser mencionadas, por mm2, por doença regional e deve ser definido para todos pacientes,
terem valor prognóstico. A ulceração deve ser somente mas não é usado, até o momento, para determinar
mencionada se a epiderme desaparecer e for substituída categoria de N.
por crosta fibrinoleucocitária. Erosões parciais e sítios de
7. Ainda sobre o N, algumas observações importantes:
biópsias anteriores não configuram ulceração.
● N + = Número de linfonodos envolvidos compreende a
2. “T0” deve ser utilizado quando não há evidências de tumor
soma daqueles detectados por BLNS (+) mais os
primário (desconhecido ou regressão completa do
encontrados na complementação;
melanoma). Melanomas in situ devem ser categorizados
como “Tis”. ● pN1(sn) = LN positivo diagnosticado por técnica de LS,
sem completar a linfadenectomia; se esta for feita,
3. “Tx” deve ser utilizado quando não é possível medir o
designa-se pN1;
Breslow (ex.: pela qualidade do corte histológico, cortes
tangenciais ou curetagem). Entretanto, quando o corte é ● Extensão Extra Nodal (ENE) ou extracapsular =
tangencial, pode-se mencionar a espessura para efeito de Extensão da metástase fora da cápsula, invadindo
tratamento, uma vez que é razoável supor que a tecido adjacente, podendo ou não formar blocos
verdadeira medida não será maior do que a medida (cortes linfonodais coalescentes.
tangenciais tendem a aumentar a espessura do Breslow
medido). Não se deve medir Breslow se a epiderme não
estiver representada no corte. *As Figuras 8B e 9B, deste capítulo foram gentilmente cedidas
4. Pacientes com melanomas múltiplos sincrônicos devem por Felipe Oliveira.
ser categorizados pelo que exibe o maior T, e deve ser
mencionado no estadiamento como M. Exemplo: paciente
com múltiplos melanomas cujo maior T é T3, e não tem
metástases linfonodais ou sistêmicas, deve ser
mencionado como pT3(m)N0M0 ou pelo número de
melanomas: pT3(3)N0M0.

5. Com relação ao N (metástase locorregional), pode haver


apresentação nodal ou não nodal. A nodal consiste no
envolvimento linfonodal regional (reconhecimento clínico,
imagem ou pela avaliação do LS – metástase oculta). A
não nodal, pelas micrometástases patologicamente
detectadas ou pelas lesões satélites ou em trânsito,
clinicamente avaliáveis. As metástases locorregionais não
nodais podem ocorrer por espalhamento angiotrópico ou
intralinfático e são classificadas em três formas:
● Satélite (SAT) – tumor grosseiramente visível até 2 cm
do primário;
● Microssatélites (MSAT) – são metástases
microscópicas, cutâneas e/ou subcutâneas,
encontradas ao exame histológico, descontínuas do
foco do tumor primário, não podendo haver fibrose ou
inflamação separando os focos (caracterizaria
regressão) e sem tamanho ou distância mínimas do
primário;
● Metástase em trânsito (MIT) – tumor clinicamente
evidente, dérmico ou subcutâneo, a partir de 2,0 cm do
primário, em direção ou não ao primeiro foco de
drenagem linfática.
Fig. 1: Folículo pilossebáceo.

O que é a acne?
A lesão básica da acne, o comedão ou comedo, é uma elevação da pele
perifolicular devido a um acúmulo de sebo e queratinócitos no istmo do
folículo piloso, devido ao bloqueio do infundíbulo e ao aumento da
atividade da glândula sebácea. A formação do comedão dá início a um
processo inflamatório, que pode ser leve, moderado ou grave,
eventualmente deixando áreas de cicatriz após resolução espontânea. As
lesões da acne localizam-se nas áreas da pele seborreica, que possuem
glândulas sebáceas proeminentes, como a face, o tórax superior e a
porção proximal dos braços. Estas glândulas se desenvolvem na

7
puberdade, justificando a ocorrência predominante da acne em
Cap. MISCELÂNEA
adolescentes e adultos jovens.

PATOLOGIA E PATOGÊNESE

Acompanhe a FIGURA 2... O evento inicial é a hiperqueratose folicular


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no infundíbulo, de causa desconhecida. Há um aumento da proliferação
Neste capítulo, selecionamos algumas condições que não podem ser
dos queratinócitos, que se desprendem e formam uma rolha
encaixadas especificamente nos grupos anteriores, mas que merecem ser
infundibular composta por células queratinizadas e sebo, denominada
comentadas na nossa apostila. A Dermatologia é uma área de
microcomedo, que só pode ser visto em cortes histológicos. Esta lesão já
conhecimento médico bem ampla e algumas dessas condições podem
pode ser vista em crianças pré-puberais.
aparecer na prova. Confiram!!!

ACNE VULGAR

A acne é uma doença dos folículos pilossebáceos. Como você pode


observar na FIGURA 1, este folículo é uma espécie de invaginação da
pele que alberga a haste do pelo, firmemente aderida a uma bainha de
epiderme e à matriz do pelo, onde se encontram as células da matriz, na
região do bulbo capilar. Observe ainda que a glândula sebácea
desemboca no folículo piloso e que a porção entre a epiderme e o ponto
de drenagem desta glândula é denominado infundíbulo. A região do
folículo abaixo deste ponto e até a inserção do músculo eretor do pelo é
denominada istmo.
Fig. 2 Fig. 3

Durante a puberdade (adrenarca), há um aumento da produção de


androgênios, tanto na mulher quanto no homem. Na mulher, estes
hormônios são produzidos exclusivamente na glândula suprarrenal
(adrenal), representados pela dehidroepiandrosterona (DHEA) e
androstenediona. Os androgênios possuem um efeito de hipertrofiar as
glândulas sebáceas e aumentar a sua secreção. Nesse momento, o
microcomedo começa a acumular grande quantidade de sebo e ainda
mais queratinócitos, produzindo uma elevação da pele, ao que
chamamos de comedão fechado ou cravo branco (FIGURA 3). O
comedão é uma pequena elevação da pele, de 1-2 mm de diâmetro,
semelhante à miliária. A pressão do acúmulo de sebo pode abrir o
orifício folicular, formando o comedão aberto ou cravo preto
(FIGURA 4): a cor enegrecida que aparece na ponta desta lesão é
decorrente da impactação de queratinócitos e acúmulo de melanina.

Fig. 4

A presença da bactéria Cutibacterium acnes (anteriormente conhecida


como Propionibacterium acnes) é fundamental para a formação e
progressão da acne!! Trata-se de um difteroide anaeróbio saprófita,
presente na pele de todas as pessoas. Normalmente é só um agente
colonizador, mas quando há obstrução infundibular e acúmulo de sebo
no folículo (microcomedo), a bactéria encontra o meio propício para se
proliferar, já que se nutre basicamente de lipídios. O micro-organismo
hidrolisa os triglicerídeos do sebo em ácidos graxos irritantes para a
parede folicular, induzindo mais hiperqueratinização.
O C. acnes é um grande contribuinte (se não o maior!) para o processo
inflamatório da acne! A bactéria causa inflamação pela liberação de
fatores quimiotáxicos para neutrófilos e de ácidos graxos livres,
produtos da hidrólise do sebo. Os ácidos graxos e as enzimas
neutrofílicas provocam a ruptura do folículo, liberando bactérias,
queratina e lipídios pró-inflamatórios para a derme circunjacente, o que
leva à formação da pápula inflamatória (FIGURA 5). A proliferação
bacteriana na derme pode agravar o processo patológico, culminando
na formação de pústula (FIGURA 6), nódulo inflamatório (FIGURA 7)
ou “cisto”, e até eventualmente um abscesso, este último nas formas
mais graves de acne.

Fig.7

Os fatores genéticos são implicados no desenvolvimento da acne, que


teria um comportamento de transmissão autossômica dominante.
Embora quase todos os adolescentes desenvolvam acne, as formas pós-
puberais e as formas mais graves possuem uma forte predisposição
hereditária.

Alguns fatores externos podem exacerbar a acne, destacando-se o


estresse emocional e o período menstrual. Os fatores da dieta não
possuem a relação popularizada pelos leigos... Nada comprova, por
exemplo, que a acne possa ser desencadeada por chocolate... Um estudo
recente demonstrou associação da acne com alguns alimentos, como por
exemplo, ingestão de leite, mas ainda são poucos estudos mostrando
essa correlação.

Fig. 5 Síndromes androgênicas femininas causam acne, geralmente compondo a


síndrome SAHA (Seborreia, Acne, Hirsutismo, Alopecia), muitas vezes
associada à síndrome dos ovários policísticos. Outra endocrinopatia, a
síndrome de Cushing (hipercortisolismo), também cursa com acne e
outros sinais de androgenismo.

Entre as causas de acne secundária, predominam: (1) acne por


cosméticos; (2) acne estival, por sudorese excessiva; (3) acne mecânica,
pela oclusão física por chapéus, capacetes, bandagens, etc.; (4) acne
clórica (cloracne), pelo contato, inalação ou ingestão com compostos
orgânicos clorados (hidrocarbonetos halogenados, incluindo a dioxina),
geralmente na indústria química; (5) acne dos pesticidas (manipuladores
de agrotóxicos); (6) acne dos óleos e graxas; (7) acne medicamentosa
(corticosteroides, anabolizantes, anticoncepcionais, barbitúricos,
tioureias, lítio, tuberculostáticos, halógenos, como iodo, bromo e cloro,
tópicos faciais).

A acne por cosméticos é a forma mais comum de acne induzida,


ocorrendo quase exclusivamente em mulheres pós-adolescência, entre
20-50 anos. Numerosas substâncias cosméticas para a face são
comedogênicas (cerca de 50% dos cremes faciais podem causar acne!).
Alguns sabões, em uso excessivo, podem causar acne, como o de
hexaclorofeno. Medicamentos tópicos são acnogênicos pela presença
Fig.6
das substâncias veiculares (lanolina, vaselina) e corticoides. A sudorese
excessiva (acne estival ou “acne de Majorca”), em associação com
cremes fotoprotetores, é causa de acne ao gerar edema do óstio folicular.
A oclusão folicular também pode justificar a acne mecânica. Das drogas
sistêmicas causadoras de acne, destacam-se os corticosteroides.
QUADRO CLÍNICO

A acne é uma afecção dos adolescentes (10-19 anos), com as lesões


surgindo com os primeiros sinais da puberdade em quase todos os
jovens. Segundo alguns autores, a acne do adolescente é mais comum
em meninos. A acne pós-adolescência é observada em cerca de 10% da
população, entre 20-55 anos, sendo bem mais comum em mulheres (3:1)
e tendo forte predisposição genética ou associação com síndromes
androgenizantes (ex.: ovários policísticos).

Como vimos, as lesões da acne ocorrem nas áreas de pele seborreica:


qualquer porção da face, pescoço, tórax superior, ombro, porção
proximal do braço (área tricipital). As lesões são polimorfas e
dependem da gravidade do quadro. Podem ser comedões (lesão
característica), fechados ou abertos, pápulas inflamatórias, pústulas,
nódulos, eventualmente abscessos superficiais. A história natural mais
comum da acne é a involução das lesões após a adolescência, porém
deixando sequelas cicatriciais nas formas mais graves que não foram
tratadas adequadamente... A acne é classificada de acordo com a
gravidade em graus I, II, III, IV e V.

Acne grau I (acne não inflamatória): também chamada acne


comedônica, caracteriza-se pela presença de comedões como lesão
proeminente (FIGURA 8A). É a forma mais comum de acne. O
comedão fechado (cravo branco) é uma pequena lesão elevada, da cor
da pele ou levemente clareada, semelhante à miliária, sendo mais bem Fig. 8: Acne grau I (comedônica).

identificada quando a pele é distendida. Pela espremedura, após


perfurar-se a lesão com uma agulha desinfectada, sai uma massa
esbranquiçada. O comedão aberto (cravo preto – FIGURA 8B) possui
Acne grau II (papulopustulosa): caracteriza-se pela presença, além dos
um ponto escurecido em sua superfície. Pela luz de Wood, encontra-se
comedões, de múltiplas pápulas inflamatórias e pústulas (FIGURA 9A e
tonalidade vinho, devido à produção de porfirina pelo C. acnes.
9B), com acometimento basicamente facial. A seborreia (aumento do
sebo cutâneo) está presente.
Fig. 9: Acne grau II (papulopustulosa).

Acne grau III (nódulo-cística): também chamada de acne nódulo-


abscedante, sendo igual à acne grau II (acne papulopustulosa), mas com
o acréscimo de nódulos furunculoides (FIGURA 10) que pela drenagem
Fig. 11: Acne grau IV (conglobata).
eliminam substância purulenta e são inapropriadamente referidos como
“cistos”. Pode acometer basicamente a face ou estender-se para tronco e
região proximal dos braços.

Acne grau V (acne fulminans): uma forma bastante grave, mas bem rara
em nosso meio, caracterizando-se pela associação de acne grau III ou
IV com lesões eritematoulceradas, cuja biópsia revela vasculite, além de
febre, leucocitose e poliartralgia.

Como vimos, a evolução das formas mais graves de acne (graus III e
IV), na ausência de tratamento, é para a formação de cicatrizes
indeléveis do tipo múltiplas pequenas depressões, especialmente na face
(FIGURA 12). Manchas residuais (melanodermia) podem ocorrer,
principalmente nos indivíduos de pele escura.

Fig. 10: Acne grau III (nódulo-cística).

Acne grau IV (acne conglobata): uma forma grave de acne em que


predominam os nódulos purulentos que confluem, determinando
abscessos fistulizantes, bridas e lesões queloideanas (FIGURA 11).
Predomina em homens.
Tratamento acne grau I = tópicos comedolíticos.
Opções: retinoides (primeira linha), ácido azelaico, ácido
salicílico).

Acne grau II: como no grau I, a terapia tópica é suficiente na maioria


dos pacientes. A melhora costuma ocorrer dentro dos primeiros três
meses, embora a terapia deva ser mantida indefinidamente durante o
período acnogênico. Como se trata de acne inflamatória, são
fundamentais drogas com ação anti-C. acnes. O peróxido de benzoíla
2,5-10%, geralmente é feito junto a antibióticos tópicos, tais como a
eritromicina 2-4% e a clindamicina 1%, que podem ser encontrados
combinados. O peróxido de benzoíla tem ação comedolítica e
antimicrobiana. Uma outra medida é a associação dos antimicrobianos
Fig. 12: Cicatriz do acne.
tópicos pela manhã (peróxido de benzoíla ± eritromicina ou
clindamicina) com os derivados retinoicos (tretinoína, isotretinoína ou
adapaleno) à noite. Nos casos refratários ou extensos, podemos associar
à terapia tópica, um antibiótico sistêmico. Alguns antibióticos possuem
além da propriedade antimicrobiana, um efeito anti-inflamatório na
DIAGNÓSTICO acne. A primeira escolha é a tetraciclina 500 mg 2-4x/dia, tendo como
opções alternativas: doxiciclina 100 mg 1x/dia, minociclina 100 mg
O diagnóstico é clínico e geralmente não oferece dificuldade. A 1x/dia, sulfametoxazol + trimetoprima 400/80 mg 2x/dia, eritromicina
localização característica (face, tórax superior, etc.) e a apresentação 250-500 mg 2x/dia e azitromicina 500 mg/dia (esquema de pulsoterapia).
polimorfa (comedões, pápulas, pústulas, nódulos) são suficientes na
maioria dos casos. É importante identificar se o paciente apresenta
Tratamento acne grau II = tópicos anti-C. acnes e comedolíticos.
alguma doença ou condição associada à acne, como síndromes
Opções: (1) PB + antibiótico tópico (eritromicina ou clinda); (2) PB
virilizantes, Cushing, ovários policísticos, drogas, agentes químicos,
(de manhã) + retinoide (à noite); (3) PB isolado. Casos refratários
contactantes (ex.: cosméticos, etc.). A rosácea pode ser confundida com
ou extensos: associar antibiótico sistêmico (tetraciclina,
a acne, porém diferencia-se pela ausência de comedões, presença de
doxiciclina, minociclina, eritromicina, SMZ + TMP).
telangiectasia e faixa etária.

TRATAMENTO Acne grau III e IV: a conduta diverge entre a literatura nacional e
americana. Uma droga revolucionária no tratamento da acne surgiu,
sendo usada desde o início da década de 80 do século passado. Trata-se
O tratamento da acne sofreu grandes mudanças nos últimos anos, com
de isotretinoína oral (Roacutan®), um derivado do ácido retinoico. É o
o melhor conhecimento de sua patogênese e fisiopatologia e pelo
ácido 13-cis-retinoico. Esta droga atua eletivamente na glândula
surgimento de novas drogas. Antigamente, a acne era tratada apenas
sebácea, reduzindo a sebogênese e normalizando a queratinização
com tópicos esfoliantes, como ácido salicílico, resorcina e enxofre.
folicular, sendo o único fármaco capaz de curar a acne. Apresenta uma
Atualmente, os tópicos antiacne são diferentes e mais eficazes, e a
taxa de cura de 80-90%. As demais terapias mantêm o controle da acne,
terapia sistêmica trouxe grande avanço no controle das formas graves.
mas não curam a doença, que pode recidivar em qualquer momento da
adolescência, caso sejam suspensas. Os antibióticos sistêmicos
Acne grau I: a terapia tópica é suficiente. A melhora costuma ocorrer
(tetraciclina, etc.) e a terapia hormonal com etinilestradiol (0,035 mg) +
dentro de quatro semanas. O uso de sabonetes a base de enxofre e ácido
ciproterona (2 mg) têm sido as ferramentas indicadas preferencialmente
salicílico ou os que contém triclosano são os mais utilizados. A
pela literatura estrangeira nas formas graves de acne. A isotretinoína é
preferência, dos tópicos, é pelos retinoides tópicos, como a tretinoína
reservada para os casos refratários após 3-6 meses.
0,05% gel, a isotretinoína 0,05% gel, e o adapaleno 0,1 ou 0,3%,
aplicados à noite, uma fina camada, após limpeza da pele, e retirados
A literatura nacional recomenda na acne grau III, IV ou V, o uso
pela manhã. A exposição solar deve ser evitada, pois os retinoides
precoce da isotretinoína, alegando a cura da doença. O grande
deixam a pele altamente sensível à fotoexposição. Para os pacientes que
problema deste medicamento é a sua formal contraindicação na
não podem ou não querem evitar a exposição solar, o ácido azelaico
gravidez ou em mulheres com possibilidade de engravidar (por ser
15% gel pode ser indicado, aplicado 1-2x/dia. Um tópico tradicional, o
teratogênico) e seus efeitos adversos. A prednisona 20 mg/dia, pelos seus
ácido salicílico 0,5-2%, seria uma droga de terceira linha, mas ainda
efeitos anti-inflamatórios potentes, pode ser associada nos casos mais
eficaz em muitos casos. A extração manual dos comedões só é necessária
graves de acne, para prevenir o flare-up (exacerbação da acne) sendo
nos poucos casos de refratariedade, como adjuvante aos tópicos
obrigatória na acne grau V.
antiacne. Deve ser feita com o auxílio de um extrator de comedão, após
desinfecção local (para evitar o risco de infecção bacteriana secundária).
A isotretinoína é usada na dose 0,5-1,5 mg/kg/dia. O período mínimo de É uma afecção dermatológica de causa desconhecida que tem algumas
tratamento é de cinco meses. Alguns pacientes podem necessitar de semelhanças com a acne, porém não apresenta nenhuma associação
terapia por mais tempo, chegando até dez meses. Mulheres com risco de fisiopatológica. Há um tempo achava-se que a doença tinha relação com
engravidar devem associar anticoncepcionais (etinilestradiol + a presença do ácaro Demodex folliculorum nos folículos, pois seu
ciproterona). Os principais efeitos adversos fora da gravidez são: secura parasitismo possui associação estatística com a rosácea. Trabalhos mais
labial e queilite (em quase todos os pacientes), eritema facial (40% dos recentes, entretanto, não conseguiram comprovar o papel patogênico
casos), prurido, mialgias, hipertensão intracraniana benigna (quando deste parasita. Há uma resposta vascular alterada, responsável por
associada à tetraciclina), hepatite, hipercolesterolemia, surtos eritematosos na face (flushing), inicialmente de curta duração,
hipertrigliceridemia, pioderma gangrenoso, pitiríase rósea de Gilbert, mas depois evoluindo com eritema persistente. E em muitos casos o
granuloma piogênico (FIGURA 13). Doenças sistêmicas, como flushing, parece se tornar algo curioso para o paciente, e os amigos, pois
nefropatia e hepatopatia contraindicam o uso do retinoico. como não sabem que é uma doença, encaram o fato como uma pessoa
tímida, envergonhada, onde qualquer fator emocional desencadeia o
flushing. É necessário atenção, pois já pode ser uma manifestação inicial
de rosácea (não esquecer que outras doenças também podem começar
com flushing, como é o caso da policitemia vera e da síndrome
carcinoide).

O uso de corticoide tópico fluorado na face por tempo prolongado pode


induzir um quadro rosácea-símile.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

A rosácea acomete predominantemente mulheres de pele branca entre


30-60 anos. Acomete basicamente a face, envolvendo a face central
(nariz, região malar, mento, fronte) e o pescoço. Pode ser confundida
com o rash malar do lúpus eritematoso sistêmico. Na fase inicial da
Fig. 13
doença (fase pré-rosácea), há eritema discreto da face central, que se
agrava com surtos (flushing) de intensidade variável, surgindo
espontaneamente ou desencadeado por fatores do tipo exposição solar,
calor, frio, vento, ingestão alcoólica e alimentos quentes. As lesões da
Tratamento acne grau III, IV, V = terapia sistêmica + tópica do rosácea são eritema, telangiectasias, pápulas e pústulas. As
grau II. Opções: (1) isotretinoína oral (contraindicado em telangiectasias são um achado característico, servindo como importante
gestantes, mulheres com risco de engravidar, hepatopatas, critério diagnóstico. Podemos distinguir quatro formas clínicas...
nefropatas); (2) antibióticos sistêmicos por período prolongado;
(3) antibióticos sistêmicos + anticoncepcionais (em mulheres). Rosácea grau I (eritematotelangiectásica): apenas eritema e
Prednisona nos casos muito inflamatórios e no grau V. telangiectasias (FIGURA 14), com surtos de flushing.

Devemos frisar que os casos de acne relacionados a endocrinopatias,


como a síndrome dos ovários policísticos, não respondem muito bem à
isotretinoína. Estes tipos de acne merecem terapia específica do
distúrbio hormonal. As erupções acneiformes por cosméticos,
medicamentos, etc. devem ser tratadas com a suspensão do agente
causador!

ROSÁCEA (“ACNE ROSÁCEA”)

Fig. 14: Rosácea grau I (observe as telangiectasias e o eritema).

Rosácea grau II (papulopustulosa): nas áreas eritematosas, aparecem


pápulas e pústulas (FIGURA 15) e edema. Pode se estender até a região
de implantação capilar, retroauricular e pré-esternal.
Fig. 16: Rosácea grau III (infiltrativa-nodular).

Rosácea grau IV (rosácea fulminans): quadro agudo, com reação


inflamatória intensa, nódulos e abscessos. Antigamente chamada de
pioderma facial.

A rosácea pode se associar a comprometimento ocular em até 50% dos


casos (rosácea ocular). Pode ocorrer blefarite, conjuntivite, episclerite,
ceratite e uveíte. Não há relação entre a gravidade da rosácea cutânea e
Fig. 15: Rosácea grau II (papulopustulosa).
a ocular...

DIAGNÓSTICO
Rosácea grau III (infiltrativa-nodular): placas eritemato-edemato-
infiltrativas (FIGURA 16), nódulos, hiperplasia sebácea e eventualmente
Geralmente é clínico. Na dúvida, pode-se indicar a biópsia. Esta revela
abscessos.
capilares dilatados na derme com infiltrado linfo-histiocitário
perivascular. Na forma papulopustulosa, há infiltrado neutrofílico
perifolicular e na forma infiltrativa, aumento das glândulas sebáceas e
infiltrado inflamatório crônico. Em 10% dos casos, encontra-se
granuloma.

Os principais diagnósticos diferenciais são: acne, demodecidose, LES,


bromoderma, iododerma, síndrome carcinoide e policitemia vera.

TRATAMENTO
O paciente deve evitar todos os fatores desencadeantes possíveis. Compreende um grupo de lesões relativamente comum, que
Dependendo da literatura e do grau da rosácea, pode-se tratá-la com normalmente aparecem no primeiro ano de vida. De acordo com a
medicação tópica, sistêmica ou tópica + sistêmica. Entre os produtos Sociedade Internacional para o Estudo das Anomalias Vasculares,
tópicos, destacam-se os antimicrobianos em creme. As principais opções podemos classificar as lesões segundo a tabela a seguir.
são: metronidazol 0,75-1%, ácido azelaico 20%, peróxido de benzoíla 2,5-
10%. A tretinoína 0,05-1% é uma segunda opção para o tratamento
tópico. Para a terapia sistêmica, a droga de escolha é a tetraciclina,
Classificação das anomalias vasculares
começando-se com a dose 500 mg, 2x/dia, por 3-6 semanas, seguindo-se
500 mg/dia por 6-12 semanas. Outras alternativas são: minociclina 100
Tumores Malformações
mg/dia e eritromicina 250 mg 2x/dia. O tratamento sistêmico deve ser
mantido por um mínimo de seis semanas, fazendo-se a manutenção com
Hemangioma da infância Capilares
os tópicos. Para erradicar as telangiectasias, prefere-se a terapia com
laser.
Hemangioma congênito Venosas

rapidamente involutivo (RICH)


RINOFIMA
Hemangioma congênito não Arteriais
O rinofima é, segundo alguns autores, uma variante da rosácea, involutivo (NICH)
caracterizada pelo intumescimento progressivo do nariz devido à
hiperplasia progressiva das glândulas sebáceas e tecido conjuntivo, Hemangioendotelioma Linfáticas
associado a alterações vasculares. É uma desordem exclusiva de homens kaposiforme
com mais de 40 anos de idade.

Angioma em tufo Mistas ou combinadas


Na forma fibroangiomatosa, ocorre intumescimento nasal com eritema,
pústulas e rosácea associada. Na forma glandular, o aumento do nariz
Granuloma piogênico
cursa com nódulos; o nariz cresce, tornando-se proeminente e lobulado
(FIGURA 17), com telangiectasias.
Entre os tumores, o destaque fica para o hemangioma da infância – uma
lesão vascular benigna caracterizada por processo proliferativo do
endotélio vascular. Ao nascimento, podemos ter em até 40% dos casos
uma lesão precursora (mancha anêmica, pápula eritematosa ou
telangiectasia). A lesão também pode aparecer nas primeiras semanas
de vida. Elas crescem rapidamente nos primeiros três meses e mais
lentamente até os oito ou dez meses, e apresentam fase de involução
lenta, demorando alguns anos, sendo substituída por tecido
fibroadiposo. Até os nove anos de idade, a involução se dará em 90%
dos casos. Podem ser classificados em: superficial (mais comum),
profundo e misto.

Como normalmente é uma condição benigna e autolimitada, a maioria


dos pacientes será abordada de forma expectante, e os pais devem ser
Fig. 17: Rinofima (antes e depois do tratamento clínico + cirúrgico). devidamente orientados. No entanto, 20-40% dos pacientes podem
apresentar alguma complicação relacionada à localização, ulceração ou
mesmo ao crescimento rápido, levando a prejuízo estético e/ou
funcional. A principal indicação de tratamento se dá para o
O tratamento da forma fibroangiomatosa é a tetraciclina sistêmica. As hemangioma periorbital, genital/anal, ponta do nariz, labial e
telangiectasias são tratadas com laser ou eletrocoagulação. A segmentar extenso. Não dispomos, até o momento, de um protocolo
isotretinoína é uma opção terapêutica. Quando há importante padronizado para o tratamento dos hemangiomas e a terapia sistêmica
intumescimento nasal, a cirurgia está indicada para retirar o excesso de inclui, sobretudo, o uso de propranolol e corticoides. A ulceração deve
tecido. Os métodos utilizados são: barbirese (shaving), dermoabrasão, ser abordada com analgesia, limpeza local com soro e substâncias
TCA a 90%, laser de CO2 e eletrodissecção. O resultado do tópicas, como a sulfadiazina de prata a 1%. Curativos hidrocoloides
procedimento costuma ser muito bom. A presença de hiperplasia podem ser úteis, principalmente se não houver infecção secundária.
sebácea ajuda na reepitelização pós-operatória.
Quanto às malformações vasculares, devemos atentar para as capilares,
caracterizadas por manchas eritematosas ou vinhosas (manchas cor
LESÕES VASCULARES EM PEDIATRIA
vinho do Porto ou nevus flammeus) presentes ao nascimento, que
normalmente não desaparecem espontaneamente. O tratamento pode
ser feito com laser, sendo comum a necessidade de múltiplas sessões.
PELAGRA

Dermatose ocasionada pela deficiência de vitamina B3 (niacina). Trata-


se de uma doença tipicamente de pacientes desnutridos, em que se
incluem os alcoólatras e ex-obesos submetidos à cirurgia bariátrica. Na
clínica, vamos marcá-la sempre pela doença dos 3Ds: Dermatite,
Demência e Diarreia. A lesão cutânea é um rash hiperpigmentado
simétrico, que ocorre em áreas de exposição solar.

Fig. 18: Pelagra.

● A pele glabra é encontrada nas palmas e plantas, não possui folículos


pilosos nem glândulas sebáceas. Sua espessura é bem maior, e
podemos distinguir diferentes camadas na epiderme. Sua superfície é
dotada de sulcos e cristas, levando ao extremo a formação dos
dermatóglifos, responsáveis pelas nossas impressões digitais;

● O outro tipo de pele já possui pelos e glândulas sebáceas. Sua


espessura é extremamente variável dependendo do local na superfície
corpórea. Varia consideravelmente também o tipo e densidade dos
pelos e glândulas sebáceas ao longo do corpo.

São listadas as principais funções da pele:

Proteção: a rigidez da pele é devido à sua espessura, à coesão estrutural


entre os ceratinócitos e à adesão da epiderme à derme. A melanina,
assim como os antioxidantes, protege a pele das radiações;

Termorregulação: o sistema de glândulas sudoríparas e a propriedade de


vasodilatação cutânea promovem a eliminação de suor e a refrigeração
do organismo, cruciais para a nossa sobrevivência como espécie;

Resposta imunológica: a resposta imune inata e adquirida atua


principalmente na pele, pois é a pele a primeira linha de defesa no
sistema imunológico contra substâncias tóxicas, bactérias e células
neoplásicas recém-formadas;

Barreira à perda de água e de substâncias: sem a integridade da epiderme


e, principalmente, da camada córnea, a perda de água corporal para o
meio ambiente resultaria em desidratação, distúrbios hidroeletrolíticos e
perda de proteína, resultando em morte. Essa situação pode ser
observada em muitas doenças dermatológicas e no paciente grande
Apêndice ANATOMIA E FISIOLOGIA DA PELE
queimado;

A pele humana consiste num epitélio estratificado de origem Sensação: a pele e as mucosas são órgãos sensoriais orientando-nos em
ectodérmica em contato com uma derme de tecido conjuntivo de origem nosso contato com o ambiente, além de poderem produzir sensações
mesenquimal. A interface entre essas duas estruturas de origem percebidas como agradáveis ou incômodas;
embrionária tão distinta é a junção dermoepidérmica, tão irregular que
é repleta de projeções da epiderme para dentro da derme, os chamados Excreção: através das glândulas écrinas, a pele excreta água, eletrólitos,
cones interpapilares. Abaixo da derme existe o panículo adiposo HCO3, ureia, metais pesados, etc.;
também chamado de hipoderme ou tecido celular subcutâneo, rico em
gordura.
Endocrinometabólica: a pele é o sítio de conversão periférica e síntese de
muitas substâncias. Entre elas estão hormônios sexuais como estronas,
Grosseiramente, há dois tipos de pele: testosterona, di-hidrotestosterona e a vitamina D.
Melanócitos: são células de origem ectodérmica, migram da crista
EPIDERME
neural até atingirem a camada basal da epiderme. Sua principal função
é a síntese de grânulos (os melanossomas) ricos em uma macromolécula
chamada melanina cuja função é absorver a radiação UV. Através de
longos dendritos, cada melanócito “inocula” seus melanossomos num
grupo de aproximadamente 36 ceratinócitos. Esse conjunto melanócito-
ceratinócitos é denominado unidade epidermomelânica.

O número de melanócitos varia segundo o sítio anatômico. O número


total de melanócitos não varia de uma raça para outra, o que determina
os diferentes tons de pele é a morfologia, tamanho e distribuição dos
melanossomos. A melanina é sintetizada pela ação da enzima tirosinase.
Os melanócitos também sofrem estímulo da radiação UV e de
hormônios (MSH e hormônios sexuais), mediadores inflamatórios e
vitamina D3 produzida na epiderme. O bronzeamento produzido pelo
sol deve-se a uma excitação da tirosinase pelo ultravioleta, levando à
formação de melanossomos.

Células de Langerhans: vêm ganhando grande importância na


comunidade científica atualmente. As células de Langerhans são
originárias da medula óssea e possuem citoplasma claro contendo os
grânulos de Birbeck. Na epiderme, elas são responsáveis pelo
reconhecimento e apresentação de antígenos solúveis e haptenos para os
linfócitos T e, assim, iniciam uma resposta imunológica. As células de
Fig. 1: As camadas da pele. Langerhans também são encontradas nas mucosas, baço, timo,
linfonodos e mesmo na derme.

Célula indeterminada: as células dendríticas indeterminadas não


Os ceratinócitos são o tipo celular que compõe a maioria das células possuem função conhecida ainda.
(80%) da epiderme, além de serem responsáveis pela composição dos
pelos, unhas e glândulas. Originam-se da intensa atividade mitótica na
Células de Merkel: são células de núcleo lobulado e citoplasma claro,
camada basal da epiderme, passando por um processo de diferenciação
nas quais são encontrados os grânulos osmiófilos, contendo
estrutural do citoesqueleto e metabólica à medida que vão emergindo
neurotransmissores. Esses neurotransmissores são liberados mediante
para camadas superiores da epiderme. A coesão entre ceratinócitos é
pressão sobre a pele, dando a estas células uma função como receptores
feita por pontes moleculares chamadas desmossomos. Acima da camada
mecânicos.
basal, podemos observar esses desmossomos na membrana celular dos
ceratinócitos, semelhantes a espinhos, daí o nome dessa camada:
camada espinhosa (ou camada de Malpighi). A diferenciação do DERME
citoesqueleto dos ceratinócitos à medida que eles se aproximam da
superfície corpórea ocorre com a produção de tonofilamentos de
É a camada de tecido conjuntivo abaixo da epiderme. É composta por
queratina que se ligam aos desmossomas. Essa queratina é sintetizada
uma rede complexa de fibras, principalmente colágeno e elastina, e
em grânulos citoplasmáticos que podem ser vistos nos ceratinócitos da
preenchida com material amorfo composto por macromoléculas
camada granulosa (daí o seu nome). Bem próximo à superfície, os
retentoras de água (ex.: ácido hialurônico). É na derme onde vão se
ceratinóticos adquirem um aspecto ultraespecializado: eles perdem seus
instalar o sistema vascular e nervoso da pele além de abrigar os anexos
núcleos e se achatam, liberam substâncias formando um cimento
cutâneos. Existem na derme células residentes, responsáveis pela síntese
intercelular e adquirem maior resistência pela formação de ligações
e destruição da matriz extracelular; são fibroblastos, histiócitos, células
cruzadas entre os filamentos de queratina através da ativação da
dendríticas e mastócitos. Podemos também observar células sanguíneas,
profilagrina em filagrina. Essa transformação dos ceratinócitos em
tais como linfócitos, plasmócitos, eosinófilos e neutrófilos que transitam
discos aderentes cria uma barreira compacta e impermeável conhecida
pela derme. A derme é didaticamente dividida em três partes:
como camada córnea. Com a senescência e o contínuo fluxo de células
da camada basal à superfície, esses ceratinócitos descamam para o meio
1. Derme papilar: mais superficial, em contato com a membrana basal,
ambiente.
formada por fibras colágenas mais finas e dispostas mais
verticalmente, tem maior celularidade;
Ainda na epiderme, existem outros tipos celulares de grande
importância: 2. Derme reticular: mais profunda, constituída por feixes mais grossos
de colágeno, ondulados e dispostos horizontalmente;

3. Derme adventícia: é a derme que fica em torno da membrana basal


de anexos e vasos, semelhante à derme papilar.
■ JUNÇÃO DERMOEPIDÉRMICA 1. Hemidesmossomos: os filamentos de ceratina do citoesqueleto se
inserem na placa hemidesmossômica da membrana celular, que é
rica em plectina e uma proteína de 230 kd chamada antígeno do
Na interface entre a epiderme (ectoderme) e derme (mesoderme) existe
penfigoide bolhoso 1 (PBAg1). A partir da placa desmossômica
esta estrutura, a membrana basal, de grande complexidade e
partem fibras transmembrânicas formadas por uma molécula de 180
responsável pela coesão entre essas duas camadas. Isso tanto é verdade
kd, chamada antígeno de penfigoide bolhoso 2 (PBAg2), e integrinas
que muitas doenças bolhosas, ou seja, em que a coesão da pele perde-se
(penfigoide bolhoso é uma doença bolhosa da pele na qual essas
dando origem a bolhas, têm na sua etiologia a destruição de proteínas
moléculas – antígenos – são acometidas, resultando em perda da
específicas da membrana basal (antígenos). A superfície de contato
coesão da junção dermoepidérmica);
entre a derme e a epiderme é aumentada, pois essas camadas se
interpenetram. As papilas dérmicas são projeções da derme na epiderme, 2. Lâmina lúcida: é a porção mais frágil da junção dermoepidérmica,
a exemplo das vilosidades intestinais; e os cones interpapilares são as composta por glicoproteínas, laminina e fibronectina. Por aqui
projeções da epiderme na derme. atravessam as fibrilas de ancoragem que ligam o hemidesmossomo à
lâmina densa abaixo;
A membrana basal tem funções ainda mais nobres que a manutenção 3. Lâmina densa e sublâmina densa: formada por colágeno tipo IV,
da coesão, é ela quem orienta o crescimento dos ceratinócitos em laminina, proteoglicanas sulfatadas e o antígeno da epidermólise
direção à superfície, além de emitir sinais que estimulam a atividade bolhosa adquirida (outra doença bolhosa). É essa a camada
mitótica da camada basal e de servir como barreira à passagem de responsável pela barreira às macromoléculas e onde irão se ligar as
macromoléculas e células. fibrilas de ancoragem que partiram dos hemidesmossomos dos
ceratinócitos da camada basal. Daqui partem novas fibrilas de
A estrutura da membrana celular do ceratinócito da camada basal que ancoragem, mais grossas e longas, que se inserem na profundidade,
conecta a epiderme à membrana basal é o hemidesmossomo. ligando-se às estruturas fibrilares da derme (fibras colágenas e
elásticas, etc.) ou que formam alças que retornam à membrana

A membrana basal é dividida em camadas moleculares (FIGURA 2): basal.

Nota: não confundam membrana basal (estrutura fibrilar de


coesão derme epidérmica) com a camada basal da epiderme
(uma camada formada por ceratinócitos enfileirados)!!!

Ainda na derme, há muitos elementos celulares e fibrilares.

■ FIBROBLASTOS

São células fusiformes responsáveis pela síntese e degradação do


colágeno e da matriz extracelular.

Fig. 2: Hemidesmossomo.
■ HISTIÓCITOS, MACRÓFAGOS E CÉLULAS
DENDRÍTICAS DA DERME

Constituem uma família de células do sistema reticuloendotelial com


capacidade de fagocitose, apresentação de antígenos a linfócitos e
síntese de citocinas imunorreguladoras. São provenientes de células
precursoras da medula óssea.

■ MASTÓCITOS

Células que apresentam grânulos metacromáticos (têm cor diferente da


do corante) pela coloração Giemsa, ricos em mucopolissacarídios
ácidos. Também possuem atividade fagocitária. São encontrados em
torno dos anexos e vasos do plexo superior. Há dois tipos de grânulos
no citoplasma do mastócito:

● Grânulos secretórios: contêm heparina, histamina, triptase, quimase,


carboxipeptidase, fatores quimiotáticos para neutrófilos e eosinófilos;

● Grânulos lisossomais: contêm hidrolases ácidas que atuam na


degradação da matriz extracelular.
Logo, o mastócito desempenha as seguintes funções: É uma família de proteínas sintetizadas pelos fibroblastos da derme e é
responsável pela integridade estrutural e resistência da pele; com fibras
1. Atua no turnover e reparação da derme; variando entre 2 e 15 μnm de diâmetro. A molécula básica do colágeno é
composta por três cadeias polipeptídicas entrelaçadas como uma corda;
2. É elemento chave na ativação dos eosinófilos e na reação de
cada cadeia possui a repetição da sequência de aminoácidos Am-Gly-
hipersensibilidade do tipo I de Gell e Coombs;
Am (sendo Gly a glicina, e Am podendo ser outros aminoácidos, mais
3. Está na linha de frente na defesa contra parasitas. comumente a prolina ou a hidroxiprolina). São sintetizadas como
moléculas de pró-colágeno, têm os aminoácidos lisina e prolina
hidroxilados em presença de vitamina C, depois o pró-colágeno é
■ INERVAÇÃO DA DERME
clivado e polimerizado em fibrilas, que organizadas formarão fibras
colágenas. Até o momento foram descobertos 19 tipos de colágeno,
As sensações de tato e pressão são captadas por estruturas sendo o tipo I o mais comum (80% do colágeno total). Outros colágenos
especializadas da derme, os corpúsculos de Meissner e Vater-Pacini. A de destaque são o tipo IV, por ser predominante na junção
sensação de dor, prurido e temperatura são captadas por fibras nervosas dermoepidérmica, e o tipo VII (antígeno da epidermólise bolhosa), que
amielínicas com terminações nervosas livres na derme papilar. A é formador das fibrilas de ancoragem, e o tipo XVII, que é o antígeno
sensação causada varia com a intensidade do estímulo: uma inflamação do penfigoide bolhoso 2 presente no hemidesmossoma. Há um
leve da pele pode causar prurido, mas, se for uma inflamação muito equilíbrio dinâmico entre a síntese e a degradação do colágeno na
intensa, a sensação transmitida será a de dor. Atualmente, se sabe que derme.
as fibras responsáveis pela transmissão de dor e prurido são distintas,
mas podem influenciar-se mutuamente, isso tanto é verdade que a
sensação de dor interfere com um prurido previamente existente na ■ FIBRAS ELÁSTICAS
mesma área afetada.
São fibras coradas pela orceína e formam uma rede por toda a extensão
O sistema nervoso autônomo é responsável pela inervação motora na da derme, envolvendo vasos e anexos também. Essa rede é um sistema
pele. As fibras adrenérgicas inervam os vasos sanguíneos (seu estímulo que confere elasticidade à pele, ou seja, a capacidade da pele retornar ao
leva à vasoconstrição), os músculos piloeretores e as glândulas estado original após ter cessado uma força deformante. Esse sistema é
apócrinas. As fibras autonômicas que inervam as glândulas écrinas são composto por três tipos de fibra elástica:
colinérgicas. As glândulas sebáceas NÃO são reguladas por inervação, a
secreção delas é inteiramente endócrina, sendo regulada pelos ● Oxitalânicas: encontradas na derme papilar em disposição vertical;
hormônios androgênicos circulantes. ● Eulanínicas: formam uma rede horizontal entre a derme papilar e
reticular;
■ VASCULARIZAÇÃO DA DERME ● Fibras elásticas maduras: formam uma rede horizontal em toda a
derme reticular.
É composta por arteríolas, capilares arteriais e venosos e vênulas
distribuídos em duas redes horizontais (plexos vasculares inferior e
superior) ligadas por vasos comunicantes. HIPODERME OU PANÍCULO ADIPOSO

O plexo vascular inferior é formado por vasos perfurantes advindos do Situa-se abaixo da derme reticular e é formada por lóbulos de
músculo subjacente. A malha vascular se estende pelo plano entre a adipócitos (células ricas em lipídios), delimitados por septos de tecido
derme e a hipoderme. Do plexo inferior partem, então, os vasos conjuntivo irrigados e inervados. Os vacúolos lipídicos contêm
comunicantes, que ascendem até o plano entre a derme papilar e a triglicerídios, colesterol, vitaminas e água. O panículo adiposo é quem
derme reticular e, ao longo desse plano, formam uma segunda malha dá a mobilidade da pele sobre a musculatura, também age como
vascular, o plexo vascular superior. Do plexo vascular superior ainda isolante térmico, depósito de calorias, amortecedor de traumas e
partem os capilares das papilas dérmicas. Para a termorregulação, recentemente se tem destacado pela sua função endócrina (ex.:
existem estruturas contráteis mioepiteliais localizadas em shunts conversão periférica de hormônios sexuais).
arteríolo-venulares, essas estruturas são os glômus.

OS ANEXOS CUTÂNEOS
Os vasos linfáticos têm a função de promover a drenagem de líquido,
proteínas e lipídios da derme. Além disso, eles têm grande importância
A estrutura pilossebácea é o principal anexo cutâneo. Ela é composta
imunológica, pois é através deles que a célula de Langerhans viaja da
pelo folículo piloso, glândula sebácea, glândula sudorípara apócrina e
epiderme até o linfonodo regional na iniciativa de montar uma resposta
músculo piloeretor.
imunológica contra um antígeno.

■ FOLÍCULO PILOSO
ESTRUTURAS FIBRILARES DA DERME

■ COLÁGENO
Os folículos pilosos são formados todos na vida embrionária a partir de Glândula sebácea. São glândulas exócrinas que possuem um ducto e
projeções epidérmicas em forma de clava. Um neonato tem uma porção acinar. O ducto desemboca no folículo piloso entre o
aproximadamente cinco milhões de folículos, e não nascerão mais infundíbulo e o istmo. Sua porção acinar é composta por células
folículos por toda a sua vida. Os folículos podem alterar bastante seu espumosas holócrinas (que descamam por inteiro liberando sua
aspecto sob a influência de hormônios androgênios. As células centrais secreção, o sebo). Tem a mesma origem embriológica do folículo piloso.
da projeção em clava, situadas bem próximo à hipoderme, dão origem O sebo é constituído por esqualeno, colesterol, ésteres do colesterol,
às células do bulbo piloso, de onde derivam a haste do folículo e as ésteres graxos e triglicerídios. Sua atividade é máxima durante a
estruturas adjacentes. puberdade, pois a sua regulação é feita inteiramente por hormônios
androgênios. Podem desembocar diretamente na superfície da pele. Na
O folículo maduro é composto de uma haste pilosa, duas bainhas (as mucosa oral, são vistas como grânulos de Fordyce.
bainhas foliculares interna e externa) e um bulbo germinativo. O
folículo piloso é dividido em três segmentos: Glândula sudorípara apócrina. Só se desenvolve nas regiões axilar,
genital e periareolar, a partir da estrutura embrionária do folículo
1. Infundíbulo: se estende desde a superfície até a inserção do ducto da piloso. Entram em atividade na puberdade por ação de hormônios
glândula sebácea; androgênios. Também responde a estímulos nervosos. É formada por
ducto, que desemboca acima do ducto da glândula sebácea no folículo
2. Istmo: compreende o segmento entre a inserção do ducto da
piloso, e porção acinar localizada próxima da hipoderme e composta
glândula sebácea até a inserção do músculo piloeretor;
por células cuboidais apócrinas (a porção apical de seu citoplasma é
3. Segmento inferior: esse segmento só existe durante a fase de destacado liberando assim sua secreção). Produz uma secreção oleosa e
crescimento do pelo (anágena) e vai da inserção do músculo inodora, que é comumente metabolizada pela flora bacteriana na axila e
piloeretor até a base do bulbo. região genital derivando odor forte.

As células da matriz do bulbo piloso passam por mitoses em ritmo


acelerado, migram através do canal folicular, sofrendo compactação e RECEPTORES DE SUPER- SENSAÇÃO PERCEBIDA
desidratação, e formam a haste pilosa que nada mais é do que uma FÍCIE
densa formação de células ceratinizadas recobertas por uma fina
cutícula. Receptores de Krause Frio

A haste em crescimento é envolvida pelas várias camadas concêntricas Receptores de Ruffini Calor
do canal folicular. A camada mais externa, rica em glicogênio, é a
bainha externa do folículo. Essa bainha está em repouso e é contínua
Discos de Merkel Tato e pressão
com a epiderme. A bainha folicular interna é composta pela camada de
Henle, camada de Huxley e cutícula, e pode ser vista como uma
Receptores de Vater-Pacini Pressão
membrana gelatinosa envolvendo a haste quando um pelo é arrancado.
Ela protege e molda a haste em crescimento, mas se desfaz antes de
Receptores de Meissner Tato
atingir a inserção do ducto da glândula sebácea (o infundíbulo).

Terminações nervosas livres Principalmente dor


A haste pilosa formada e emergente à pele é dividida em três camadas
concêntricas: cutícula (externa), córtex e medula (interna). A cutícula
protege e mantém o córtex íntegro; ela costuma ser lesada pela Glândula sudorípara écrina. É responsável pela sudorese e
escovação e por produtos cosméticos, gerando fios de pontas duplas. O termorregulação do corpo pela perda de calor promovida pelo suor.
diâmetro da haste depende da síntese e do acúmulo de proteínas no Tem distribuição universal, concentrando nas palmas e plantas. O ácino
córtex enquanto ainda na base do folículo piloso. Várias doenças (porção secretora) fica bem próximo à hipoderme, emitindo um ducto
sistêmicas podem alterar esse metabolismo resultando em pelos de que vai desembocar diretamente na superfície.
diâmetro fino. A cor do pelo depende de melanossomos depositados nas
células do córtex e da medula próximos à matriz do bulbo piloso. A termorregulação obedece a um set-point hipotalâmico, que por sua
vez emite impulsos às glândulas através de terminações simpáticas
Existem três tipos de pelos: colinérgicas (e não noradrenérgica como ocorre com o resto do sistema
simpático no organismo). A composição do suor se assemelha um
1. Pelos terminais: espessos e pigmentados. São encontrados no couro pouco à da urina: ureia, amônia, lactato, aminoácidos, cloreto de sódio,
cabeludo, barba, axilas, região genital e sofrem influência dos potássio, bicarbonato, etc. É um filtrado hipotônico em relação ao
hormônios androgênios; plasma.

2. Pelo lanugo: pelos finos encontrados no feto;


Aparelho ungueal. Esses anexos consistem em placas laminares de
3. Pelo velus: finos e sem pigmento, são encontrados no adulto e ceratina protegendo o dorso das falanges distais. Seu crescimento é
cobrem a maior parte do corpo. Não é afetado pela ação dos lento (0,5-1 mm por semana) e distal, surgido a partir da matriz ungueal
androgênios. proximal. É composto de lúnula, eponíquio, lâmina ungueal, leito
ungueal e hiponíquio.
Fig. 3: O aparelho pilossebáceo. Fig. 1: Hipercromia: mácula café com leite da neurofibromatose.

LESÕES ELEMENTARES

Por definição, trata-se de uma apresentação morfológica “diferente da


pele normal, induzida por causas físicas, químicas, animadas ou
psíquicas”. Pode ser classificada em:

A. Modificação da cor;

B. Formações sólidas;

C. Lesão de conteúdo líquido;

D. Alteração da espessura;

E. Por solução de continuidade da pele;

F. Lesões caducas;
Fig. 2: Máculas hipocrômicas de pitiríase versicolor localizadas no
G. Sequelas. braço.

Vamos definir as principais características de cada grupo a seguir!

MODIFICAÇÕES DA COR (MANCHA OU


MÁCULA)

Representam uma alteração circunscrita da cor da pele, sem


modificação da textura ou relevo. Podem ser subdivididas em:

1. Manchas pigmentares (discrômicas).

● Relacionada à melanina: melanodérmica (hipercromia –


FIGURA 1), ou leucodérmica (hipocromia – FIGURA 2 – e
acromia – FIGURA 3).

● Relacionada aos pigmentos endógenos (bilirrubinas e caroteno) e


exógenos (antimalárico, prata, clofazimina, amiodarona,
Fig. 3: Mácula acrômica de vitiligo na pálpebra.
corantes).
2. Manchas vasculossanguíneas.

Eritema: divide-se em transitório e permanente.

● Transitório:

➤ Rubor;

➤ Cianose (hemoglobina reduzida ou desoxi-hemoglobina > 5%);

➤ Figurado: são os eritemas desenhados. Podem ter aspectos


característicos como no eritema crônico migratório da doença de
Lyme. Eritema giratum repens, paraneoplasia associada à
neoplasia pulmonar. Eritema marginatum, observado na febre
reumática;

➤ Enantema: eritema com acometimento da mucosa;


Fig. 5: Telangiectasia: múltiplas lesões telangiectásicas na face.
➤ Exantema: aparecimento súbito e com tendência à generalização.
Há dois tipos principais. Morbiliforme ou rubeoliforme: eritema
entremeado com áreas de pele sã, característico da rubéola e
forma frequente de farmacodermia. Escarlatiniforme: difuso e Púrpura: nestes casos há extravasamento de hemácias e não desaparece
uniforme, próprio da escarlatina; a vitropressão.

➤ Mancha anêmica: aumento local da sensibilidade às


● Petéquia: lesões puntiformes. Quando ganham volume (púrpuras
catecolaminas, levando à diminuição do aporte sanguíneo para a
palpáveis), podem ser encontradas nas vasculites.
região.
● Víbice: petéquias lineares.
● Permanente:
● Equimose (FIGURA 6).
➤ Mancha angiomatosa (FIGURA 4): aumento do número de
capilares. Com o acometimento da região de inervação do nervo ● Hematoma.
trigêmio (ramo oftálmico), devemos lembrar a associação com a
síndrome de Sturge-Weber;

➤ Telangiectasia: dilatação permanente do calibre de pequenos vasos


(FIGURA 5). Pode ser manifestação da insuficiência hepática na
forma adquirida. Quando acomete mucosa labial e as
extremidades, possível quadro de telangiectasia hemorrágica
hereditária (doença de Rendu-Osler-Weber), se complica com
hipertensão pulmonar e sangramento do trato gastrointestinal.

Fig. 6: Equimose: lesão equimótica localizada no primeiro pododáctilo


devido a um trauma local.

Fig. 4: Angioma: lesão plana eritematovinhosa, classificado como


tumor vascular (proliferação vascular, e não um erro na morfogênese), FORMAÇÕES SÓLIDAS
localizado na face.

Pápula: elevação circunscrita palpável menor que 0,5 cm (FIGURA 7).


Fig. 7: Pápula: lesão acastanhada no tronco anterior. Exemplo:
ceratose seborreica.

Fig. 10: Nódulo: lesão mais palpável do que visível. Exemplo: eritema
nodoso.
Placa: lesão em forma de disco, por extensão ou coalescência de pápulas
ou nódulos. Superfície em platô (FIGURA 8).

Tumoração: lesão maior que 3 cm. Pode estar relacionada com doença
de depósito como no tofo gotoso (FIGURA 11).

Fig. 8: Placa: lesão eritematoescamosa. Exemplo: psoríase invertida.

Tubérculo: lesão de consistência dura, elevada com mais de 0,5 cm que Fig. 11: Tumoração no dorso de uma paciente jovem. Exemplo: lipoma.

deixa cicatriz ao involuir. Pode ser manifestação de doença


granulomatosa como a sarcoidose e a hanseníase (FIGURA 9).

Goma: nódulo que sofre evolução em quatro fases (FIGURA 12):

Fig. 12: Lesão gomosa da esporotricose.

Fig. 9: Tubérculo: lesão eritematoamarelada da hanseníase


tuberculoide.
➤ Endurecimento (infiltração celular da hipoderme);

➤ Amolecimento (necrose central);


Nódulo: lesão mais palpável que visível, maior que 1 cm (FIGURA 10). ➤ Esvaziamento (fistulização-úlcera);

➤ Reparação (fibrose com cicatriz).


Vegetação: crescimento exofítico pela hipertrofia das papilas dérmicas.
Podem ser de dois tipos: verrucosa e condilomatosa (FIGURAS 13 e
14).

Fig. 15: Múltiplas vesículas agrupadas. Exemplo: herpes simples.

Bolha: em abóbada e com mais de 0,5 cm (FIGURA 16).

Fig. 13: Verrucosa: seca (epiderme íntegra). Exemplo: verruga vulgar.

Fig. 16: Bolha tensa e brilhante. Aspecto mais frequente nas buloses
com clivagem subepidérmica como no penfigoide bolhoso. Nos
pênfigos as bolhas são flácidas e mais efêmeras.

Pústula: lesão de conteúdo purulento até 1 cm (FIGURA 17). Podem ser


Fig. 14: Condilomatosa: úmida (perda epidérmica). Exemplo: sépticas ou assépticas como na psoríase pustulosa. Foliculares
condiloma acuminado. (foliculite) ou interfoliculares (impetigo).

Para fixar as doenças ulcerovegetantes, usa-se o acrônimo PLECCT:

➤ Paracoccidioidomicose;

➤ Leishmaniose;

➤ Esporotricose;

➤ Cromomicose;

➤ Carcinoma espinocelular;

➤ Tuberculose.

LESÕES DE CONTEÚDO LÍQUIDO


Fig. 17: Acúmulo de conteúdo líquido purulento. Exemplo: acne.

Vesícula: conteúdo claro com menos de 0,5 cm (alguns autores


consideram < 1 cm) e intra-epidérmica. Múltiplas vesículas agrupadas
em base eritematosa, características da infecção herpética Abscesso: coleção purulenta, proeminente e circunscrita, tamanho
(FIGURA 15). variável, flutuante, dermo-hipodérmica ou subcutânea, com rubor, dor e
calor (quente) ou não (frio) – FIGURA 18.
Fig. 18: Lesão eritematosa, flutuante, purulenta, localizada na região
Fig. 20: Local frequente desta lesão elementar pelo ato da coçadura.
cervical. Exemplo: abscesso.

Infiltração: espessamento difuso por infiltrado inflamatório, tumoral,


infeccioso ou por doenças de depósito. Relevante a infiltração de áreas
ALTERAÇÃO DA ESPESSURA frias como pavilhão auricular na hanseníase.

Ceratose: espessamento da epiderme por aumento da camada córnea Esclerose: endurecimento da pele por proliferação do tecido colágeno
(FIGURA 19). ou do subcutâneo, tornando o pregueamento difícil (FIGURA 21).

Fig. 19: Aumento da camada córnea, frequentemente observado nas


ceratodermias.

Fig. 21: À primeira vista, pensamos em mancha ou mácula, mas como


na dermatologia devemos sempre palpar a lesão, notamos uma
dificuldade de pregueamento da pele. Exemplo: esclerodermia.
Liquenificação: aumento dos sulcos e saliências por atrito (FIGURA 20).

Atrofia: diminuição da espessura. Pode ser superficial (apergaminhada)


ou profunda.

SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE DA PELE

Escoriação: lesão superficial linear traumática.

Erosão: acomete apenas a epiderme.

Exulceração até derme papilar.

Ulceração ou úlcera: acomete toda derme e/ou hipoderme


(FIGURA 22).
Fig. 22: Lesão ulcerada do eritema nodoso hansênico.

Fissura: linear e estreita (FIGURA 23).

Fig. 24: Uma das causas mais frequentes de fístulas cutâneas:


hidrosadenite. Pertuitos intercomunicantes com drenagem de pús.

LESÕES CADUCAS

Escama: lâminas epidérmicas secas pelo exagero de ceratina normal ou


Fig. 23: Ceratose plantar e fissura. Pode ser observada em pacientes
com hipotiroidismo e no climatério. defeituosa. Podem ser:

● Furfuráceas ou pitiriásicas (FIGURA 25);

Fístula: trajeto linear sinuoso e profundo com eliminação de substâncias


(FIGURA 24).

Fig. 25: Exacerbação da descamação com o estiramento da pele.

● Laminares.
Crosta: ressecamento de exsudato. Pode ser:
Para auxiliar no raciocínio diagnóstico, podemos organizar as
● Serosa; lesões cutâneas em primárias (lesão cutânea inicial) e
● Purulenta/melicérica: cor de mel. Aspecto do impetigo; secundárias (decorrentes de manipulação ou infecção de
uma lesão primária), sendo as últimas representadas pelas
● Hemática.
sequelas, lesões caducas, solução de continuidade da pele e
alterações da espessura. Além do tipo de lesão, outros
Úlcera de decúbito: úlcera secundária à necrose. aspectos podem ser observados, como número (única ou
múltipla); configuração (anular, arciforme, circinadas,
discoides, linear), organização (localizada, generalizada) e
SEQUELAS
distribuição corporal (face, tronco, extremidades).

Cicatriz: reparação conjuntiva e epitelial da pele traumatizada. Pode ser:

● Atrófica (FIGURA 26);


As FIGURAS deste capítulo foram gentilmente cedidas pelo Prof.
Fabiano Leal.

Fig. 26: Estria é um tipo de cicatriz atrófica.

● Hipertrófica: acompanha a margem do insulto traumático;

● Queloide: a lesão prolonga-se além da margem do trauma


(FIGURA 27).

Fig. 27: Queloide após perfuração da orelha para uso de brinco.

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