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COLEÇÃO MÓDULO ÚNICO

SUPER MATERIAL

CIRURGIA GERAL

ANATOMIA APLICADA A CIRURGIA


CUIDADOS COM O PACIENTE CIRÚRGICO
AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA | SUTURAS
ABDOME AGUDO | APENDICITE AGUDA
DIVERTICULITE AGUDA | MEGACOLON
CIRURGIA DE CONTROLE DE DANOS
COMPLICAÇÕES CIRÚRGICAS

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SUMÁRIO
01. ANATOMIA APLICADA À CIRUGIA
1. Introdução ......................................................................................................... 8
2. Acessos Cirúrgicos ....................................................................................... 8
Referências Bibliográficas ............................................................................. 15
02. CUIDADOS COM O PACIENTE CIRÚRGICO
1. Hidratação No Paciente Cirúrgico ..........................................................18
2. Analgesia No Paciente Cirúrgico ............................................................28
3. Nutrição No Paciente Cirúrgico ...............................................................34
4. Cicatrização .....................................................................................................43
Referências Bibliográficas ............................................................................. 51
03. AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
1. Introdução ....................................................................................................... 54
2. Avaliação Do Risco Cirúrgico ...................................................................56
3. Manejo Dos Medicamentos ..................................................................... 72
4. Classificação Das Cirurgias E Uso De Antibioticoprofilaxia......... 75
Referências Bibliográficas ............................................................................. 79
04. SUTURAS
1. Introdução ........................................................................................................82
2. Fases Da Cicatrização .................................................................................84
3. Materiais De Sutura .....................................................................................86
4. Suturas ..............................................................................................................93
5. Cuidados Pós-Sutura ............................................................................... 102
Referências Bibliográficas .......................................................................... 104
05. ABDOME AGUDO
1. Definição....................................................................................................... 107
2. Fisiopatologia E Etiologias...................................................................... 107
3. Quadro Clínico ............................................................................................. 111
4. Diagnóstico .................................................................................................. 111
5. Tratamento .................................................................................................. 112
6. Abdome Agudo Inflamatório .................................................................114
7. Abdome Agudo Obstrutivo ................................................................... 126
8. Abdome Agudo Perfurativo .................................................................. 136
9. Abdome Agudo Isquêmico .................................................................... 143
9.3. Clínica ......................................................................................................... 147
10. Abdome Agudo Hemorrágico............................................................ 152
Referências Bibliográficas........................................................................... 159

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06. APENDICITE AGUDA (CIRURGIA GERAL)
1. Anatomia E Definição............................................................................... 163
2. Epidemiologia.............................................................................................. 165
3. Fisiopatologia ............................................................................................. 165
4. Quadro Clínico ........................................................................................... 167
5. Apendicite Em Situações Especiais.................................................... 172
6. Diagnóstico E Classificação................................................................... 173
7. Tratamento .................................................................................................. 182
Referências Bibliográficas .......................................................................... 190
07. DIVERTICULITE AGUDA
1. Introdução ..................................................................................................... 193
2. Diverticulose ................................................................................................ 194
3. Diverticulite .................................................................................................. 198
4. Epidemiologia.............................................................................................. 199
5. Fatores de risco .......................................................................................... 200
6. Classificação................................................................................................ 202
7. Diagnóstico .................................................................................................. 203
8. Tratamento ................................................................................................... 211
9. Prognóstico e prevenção........................................................................ 219
10. Seguimento ............................................................................................... 220
Referências bibliográficas........................................................................... 224
08. MEGACÓLON
1. Definição....................................................................................................... 227
2. Megacólon Agudo ..................................................................................... 228
3. Megacólon Crônico ................................................................................... 236
4. Megacólon Tóxico...................................................................................... 243
Referências Bibliográficas .......................................................................... 254
09. CIRURGIA DE CONTROLE DE DANOS
1. Introdução ..................................................................................................... 257
2. Estágios Da Cirurgia ................................................................................ 259
Referências Bibliográficas .......................................................................... 272
10. COMPLICAÇÕES CIRÚRGICAS
1. Introdução ..................................................................................................... 275
2. Complicações Da Ferida Operatória ................................................. 275
3. Febre ............................................................................................................... 282
4. Complicações Pulmonares .................................................................... 285
5. Complicações Gastrointestinais ..........................................................288
6. Outras Complicações .............................................................................. 291
Referências Bibliográficas .......................................................................... 292

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 6

ANATOMIA APLICADA À CIRUGIA

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SUMÁRIO
1. Introdução ......................................................................................................... 8
2. Acessos cirúrgicos ........................................................................................ 8
Referências Bibliográficas ............................................................................. 15

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 8

1. INTRODUÇÃO 2. ACESSOS CIRÚRGICOS


O conhecimento anatômico é funda- Neste Material, abordaremos dois ti-
mental para o médico, em especial o pos de acessos cirúrgicos, que são
cirurgião. Logo, conhecer alguns pon- muito comuns e importantes, o ab-
tos, também chamados de marcos dominal – laparotomia e o torácico
anatômicos, é essencial para a prática – toracotomia.
médica. Inicialmente, precisamos re-
• Laparotomia – Existem algumas
lembrar sobre as linhas de tensão da
formas de se fazer uma incisão
pele: linhas perpendiculares a maior
na laparotomia, fazendo com que
força de tensão do músculo, como por
haja variações quanto as camadas
exemplo: na região frontal da face,
que terão que ser ultrapassadas,
local em que o músculo frontal está
até chegar à cavidade abdominal.
posicionado de cranial para caudal
Nesse sentido, considerando a
(sentido vertical), as linhas de tensão
laparotomia mediana, as camadas
estarão posicionadas horizontalmen-
são: pele, tecido subcutâneo (fáscia
te. A importância do conhecimento
de Camper e Scarpa), aponeurose
dessas linhas se dá pelo fato de ser,
do músculo reto abdominal (que
justamente, na direção delas, o local/
forma a linha alba), fáscia trans -
direção mais adequado para realiza-
versalis, gordura pré-peritoneal,
ção de incisões cirúrgicas e suturas,
peritônio e, após ele, a cavidade
pois é o local onde se consegue uma
abdominal. Porém, vale lembrar
cicatriz de maior qualidade.
que, na região da musculatura do
reto abdominal, há uma diferença
SE LIGA! As linhas de tensão são per- anatômica na presença da bainha
pendiculares ao sentido de movimento posterior do músculo reto, ou seja,
do músculo sob o qual ela está localizada. acima da linha arqueada(situada
2 cm abaixo da cicatriz umbilical),
há presença da bainha posterior
do reto do abdome, e abaixo dela
não há essa bainha.

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 9

Tela subcutânea
Pele

Músculo oblíquo
Fascia transversalis externo do abdome
Músculo
Gordura pré-peritoneal oblíquo interno
do abdome
Peritônio Músculo
transverso do
abdome
Figura 1: Camadas da parede abdominal. Fonte:Netter Interativo. 2004.

e outras. A possibilidade de acesso


SE LIGA! A formação das bainhas do é definida pelo objetivo da cirurgia,
músculo reto abdominal: A bainha an- ou seja, depende da hipótese diag-
terior é formada, quando acima da linha nóstica, de qual órgão está acome-
arqueada, por metade da bainha do oblí-
tido. Assim, define-se a melhor inci-
quo interno com a bainha do músculo
oblíquo externo, e quando abaixo dessa são e abordagem para o tratamento
linha é formada pela junção das bainhas do paciente. Porém, vale lembrar que
do oblíquo externo, interno e do trans- não é só o campo cirúrgico (ofereci-
verso. Já a bainha posterior, que só exis-
te acima da linha arqueada, é formada
do pela incisão) que tem significado,
através da junção da outra metade da uma outra consideração importante
bainha do obliquo interno com a bainha no momento do ato cirúrgico, é esco-
do transverso do abdome. lher uma abordagem que preserve o
máximo as estruturas anatômicas da
Como dito antes, existem diversas parede abdominal. Sabe-se que exis-
formas de acesso à cavidade abdo - tem algumas incisões muito conheci-
minal, sendo as principais: laparo - das, são denominadas por epônimos,
tomia no sentido vertical, horizon - serão representadas na figura abaixo.
tal, oblíquo, mediana, paramediana

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 10

CLASSIFICAÇÃO DAS LAPAROTOMIAS


Supra-umbilical, infra-umbilical e
Longitudinal Mediana e paramediana
xifopúbica.
Transversal Supra-umbilical e infra-umbilical
Subcostal, epigástrica, supra-umbilical, infra-
Oblíqua
-umbilical e lombo-abdominal
Toraco-abdominal
Combinadas

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Figura 2: Incisões abdominais. 1 – Kocher; 2 – Mediana transumbilical; 3 – McBurney; 4 e 6 – Paramedianas; 5- Rock-


-Davis; 7 – Transversa; 8 – Obliqua; 9 – Pfannestiel.

As incisões representadas acima são Incisão de Kocher: muito utilizada na


as formas mais conhecidas de acesso colecistectomia, ou em cirurgias he-
à cavidade abdominal, sendo utiliza- páticas menores;
das para fins específicos.

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 11

• Mediana: muito utilizada em cirur- chamada de Omento maior, que, ao


gias que não necessitam de um ser rebatido permite a visualização de
campo cirúrgico muito grande; outras estruturas, relacionadas a lo-
calização anatômica. No andar supe-
• McBurney: muito utilizada para as
rior do abdome, é possível visualizar
apendicectomias
o estômago, o fígado, a vesícula bi-
• Paramedianas: usadas para ci - liar, acessando através do ligamento
rurgias mais específicas, como de da pequena curvatura do estômago,
estômago, ou para acessar a pelve; é possível encontrar o corpo do pân-
• Rock-Davis:utilizada para apen - creas e rebatendo o estômago é pos-
dicectomia, porém com uma me- sível visualizar a cauda do pâncreas e
lhor aparência cicatricial; o baço. No andar inferior do abdome,
rebatendo o omento maior, encontra-
• Pfannestiel:muito utilizada nas ci- -se as alças do intestino delgado e o
rurgias ginecológicas e obstétricas. intestino grosso (cólons – ascenden-
te, transverso e descendente), lem -
brando que o cólon descendente é
É digno de nota que, com o avanço
melhor visualizado quando o delgado
tecnológico, essas incisões podem
é rebatido, bem como o sigmoide e o
ser substituídas por acessos menos
parte do reto. Continuando o inventá-
invasivos, que causem menos danos
rio dessa cavidade, uma outra porção
ao paciente, como uma menor res -
é o retroperitônio, estando nesse es-
posta endócrino, metabólica e imu -
paço alguns órgãos, como: algumas
nológica ao trauma (REMIT), menos
porções do cólon (aderência da face
tempo de internação e uma menor
posterior do ascendente e do descen-
extensão cicatricial, ou seja, uma me-
dente, gerando impressões mesenté-
lhora estética.
ricas), rins, adrenais, veia cava, aorta
Após acessar a cavidade abdominal, e os seus ramos, pâncreas e duodeno
deve ser feito o que chamamos de (exceto a primeira parte - superior).
inventário da cavidade abdominal. É Segue abaixo, algumas imagens que
necessário avaliar todas as estruturas ilustram essas estruturas anatômicas
abdominais, examinando-as, em es- citadas acima.
pecial, aquelas envolvidas na suspeita
diagnóstica, que pode ser direciona-
do por exames de imagem, mas lem- SE LIGA! Qual o marco anatômico que
separa o andar superior do andar infe-
bre-se que, sempre que possível, to- rior da cavidade abdominal? Mesocólon
das as vísceras devem ser avaliadas. transverso (situado abaixo do pâncreas).
Logo, após a abertura do peritônio, en-
contramos uma estrutura anatômica

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 12

Figura 3: Inventário da Cavidade Abdominal. Da esquerda para direita – andar superior do abdome, andar inferior e
retroperitonio.

processo cicatricial e para evitar o


SE LIGA! Manobras de acesso ao surgimento de complicações, como a
retroperitônio: deiscência de anastomose e as hér -
• Kocher: Através do descolamento da nias incisionais.
segunda e terceira porção do duode-
no, junto com a cabeça do pâncreas • Toracotomia – Assim como na
para o acesso da veia cava inferior e laparotomia, existem várias formas
o rim D; de acesso na toracotomia, ou seja,
• Cattel e Braasch: Através do desco- várias maneiras de acessas a ca-
lamento da região do cólon ascen- vidade torácica. Dentre elas, uma
dente do retroperitônio e manobra
essas estruturas juntamente com das mais conhecidas e mais usa-
o delgado para o andar superior do das é a esternotomia, ou toracoto-
abdome, permitindo um acesso ade- mia mediana, mas existem outras
quado para rim D, aorta e veia cava;
também, como: infraclavicular, ân-
• Mattox: Descolamento do cólon tero-lateral, vertical na região la -
descendente para o lado direito do
paciente, para o acesso do lado es- teral do tórax, póstero-lateral e as
querdo, ou seja, rim E e aorta. obliquas, que estão representadas
na figura abaixo. A forma de aces-
so depende muito de qual estru-
Por fim, a síntese (ou seja, o fecha-
tura o cirurgião quer avaliar, como
mento) da cavidade abdominal. Deve
por exemplo – acesso ântero-la -
ser feito por camadas, sem que seja
teral para avaliação do pulmão e
deixado espaço morto ou tecidos
esternotomia para avaliação do
desvitalizados, com uma boa união
coração.
das bordas, para a facilitação do

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 13

Figura 4: Diferentes formas de abordagem na toracotomia. 1 – Esternotomia; 2 – infraclavicular; 3 – póstero-lateral; 4


– oblíqua; 5 – vertical lateral.

SE LIGA!Muito cuidado com as úlceras


por pressão. Sempre lembrar de colocar
coxins, em especial, se o procedimento
tiver uma duração maior do que 2 horas.

SE LIGA! Lembre-se, as abordagens


devem ser sempre pela borda superior
da costela, para que não haja lesão de
vasos nervosos e sanguíneos.

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA

Cicatrização
Linhas de
Tensão da Pele
Perpendiculares
aos músculos

Laparotom

Camadas Incisão
Acessos Fechamento
Mediana

Mediana 1° Aponeurose Pele

Transversal 2° Subcutâneo Subcutâneo

Longitudinal 3° Pele Aponeurose

Fáscia
Oblíqua
Transversalis

Gordura
Tóraco-Abdominal
pré-peritônio

Peritônio

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ANTOMIAPLCDAÀIRUGA 15

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
TOWNSEND C.D., BEUCHAMP R.D., EVERS B.M., MATTOX K.L. Sabiston: Tratado de Ci-
rurgia, A Base da Prática Cirúrgica Moderna. 18ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

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CUIDADOS COM O
PACIENTE CIRÚRGICO

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SUMÁRIO
1. Hidratação No Paciente Cirúrgico ..................................................... 18
2. Analgesia No Paciente Cirúrgico ....................................................... 28
3. Nutrição No Paciente Cirúrgico .......................................................... 34
4. Cicatrização ................................................................................................ 43
Referências Bibliográficas ........................................................................ 51

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 18

1. HIDRATAÇÃO NO adiposo no organismo feminino, já


PACIENTE CIRÚRGICO que o tecido adiposo tem um baixo
teor de água em relação aos múscu-
Distribuição de água corporal
los e aos órgãos internos.
A água é um componente essencial A água do organismo está distribuída
no funcionamento do organismo, ne - em dois grandes compartimentos: o
cessário para muitas das suas funções intracelular e o extracelular. A água
vitais. A quantidade de água no corpo do interior das células 55% do total do
humano, designada por água corporal peso do indivíduo, enquanto a água
total (ACT), varia com a idade, sexo, do líquido extracelular corresponde
massa muscular e tecido adiposo. a 27,5%. O compartimento extrace -
A água corresponde à maior parte lular corresponde à água do plasma
do peso dos indivíduos. Em um neo- sanguíneo (7,5%) e à água do líquido
nato, a água corresponde a cerca de intersticial (20%).
75% a 80% do peso. Aos 12 meses Além disso, o nosso organismo tam-
de idade o teor de água do organismo bém tem água nos ossos e cartila-
é de 65% e na adolescência alcança gens (15%) e no meio transcelular
o valor de 60% no sexo masculino e (2,5%), que corresponde aos líquidos
55% no feminino, que se mantém na sinovial, peritoneal, pleural, pericárdi-
vida adulta. Essa pequena diferença co, líquor entre outros.
se deve à maior quantidade de tecido

COMPARTIMENTO CORPORAL PORCENTAGEM DE ÁGUA


INTRACELULAR 55%
INTERSTICIAL 20%
OSSO E CARTILAGEM 15%
PLASMA 7,5%
TRANSCELULAR 2,5%
Tabela 1. Distribuição da água corporal

O volume dos líquidos no organismo sempre lembrar que uma cirurgia é


é dinâmico, porém geralmente segue um trauma programado.
o padrão descrito acima. Entender Obviamente, as alterações no volume
como a água se distribui, como ela é hídrico que ocorrem no pós-operató-
produzida e quais as perdas diárias é rio vão depender do estado prévio de
de extrema importância para o ma- saúde, da sua “performance status”,
nejo de qualquer paciente, especial- da sua idade e magnitude do proce -
mente o cirúrgico, afinal, devemos dimento cirúrgico.

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 19

Saber o volume e a composição ele - perdas a partir da cirurgia que o pa-


trolítica dos líquidos digestivos tam- ciente foi submetido, além de se ter
bém é de extrema importância, afi- conhecimento de como manejar o pa-
nal é possível o cálculo da média das ciente no pós-operatório.

SAIBA MAIS!
Os eletrólitos, quando em uma solução aquosa, comportam-se como íons. Os íons são a me-
nor porção de um elemento químico que conserva as suas propriedades. Os cátions são os
íons que tem carga elétrica positiva, como o sódio (Na+) e o potássio (K+). Os ânions são os
íons que tem carga elétrica negativa, como o cloro (Cl-) ou o bicarbonato (HCO3-). O equilí-
brio químico de uma solução significa a existência de igual número de cátions e ânions. Os
eletrólitos são quantificados em miliequivalentes, que correspondem à milésima parte de um
equivalente grama, ou simplesmente equivalente. O equivalente de uma substância é a me-
nor porção da substância, capaz de reagir quimicamente e, corresponde ao peso atômico ou
ao peso molecular, dividido pela valência. Em geral, nos líquidos do organismo, os eletrólitos
são considerados em termos de miliequivalentes por litro (mEq/L).

VOLUME (24H) SÓDIO (MEQ/L) POTÁSSIO (MEQ/L) CLORETO (MEQ/L)


PRODUÇÃO ENDÓGENA 400mL - - -
URINA 1000-1500mL 60 40 150
SALIVA 1500mL 10 25 10
SUCO GÁSTRICO 2500mL 70 10 100
SUCO PANCREÁTICO 700mL 140 5 70
BILE 600mL 140 5 100
SUCO ENTÉRICO 3000mL 120 30 100
Tabela 2. Volume e composição dos líquidos digestivos

O organismo normal mantém o equi- Soluções para hidratação


líbrio entre o ganho e a perda diária
Durante expansões volêmicas, repo -
de água, regulando a diurese, o suor
sições volêmicas ou até mesmo du-
e as perdas insensíveis .Qualquer
rante a circulação extracorpórea ,
interferência nos mecanismos nor -
a oferta excessiva de líquidos ou de
mais da regulação, como quando o
eletrólitos, pode romper o equilíbrio e
paciente sobre perdas pelo procedi-
produzir complicações. A perda diá-
mento cirúrgico, pode gerar distúr-
ria de água corresponde à eliminação
bios do equilíbrio dos líquidos e de
pela urina, pelas fezes, pela evapora-
eletrólitos.
ção nos pulmões, durante a respiração

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 20

e pela formação do suor, dependendo composto por cristaloides ou coloides,


da temperatura ambiente e do grau de acordo com o hematócrito desejado.
de atividade física.
A perda total diária de um indivíduo Dessa forma, as soluções utilizadas
adulto é de aproximadamente 2.400 para hidratação podem ser:
a 2.900mL. O adequado equilíbrio da
água e dos eletrólitos do organismo
Cristaloides:
deve ser lembrado na preparação de
soluções para hidratação, na escolha São soluções homogêneas de íons
dos componentes do perfusatoe nos inorgânicos e pequenas moléculas
volumes necessários para esses proce- orgânicas dissolvidas em água. Uma
dimentos. As soluções devem ter a com- solução cristaloide pode ser hipotô-
posição química e a pressão osmótica nica, isotônica ou hipertônica.
idênticas ou muito próximas ao plasma,
para minimizar a possibilidade de pro -
duzir distúrbios hídricos e eletrolíticos. Coloides:
São soluções homogêneas não crista-
lina, que consistem em grandes mo -
CONCEITO! A circulação extracorpórea
consiste na substituição temporária das
léculas ou partículas ultramicroscópi-
funções de órgãos vitais de um paciente, cas de uma substância dispersa em
como coração e pulmão, quando eles es- outra. São soluções hipertônicas, que
tão inoperantes durante uma complexa
mantém um gradiente oncótico den-
cirurgia cardíaca, por exemplo. Os circui-
tos da circulação extracorpórea são pre- tro do intravascular muito importante.
enchidos por uma solução de perfusato,

FLUXOGRAMA – CRISTALOIDES X COLOIDES

CRISTALOIDES COLOIDES

SOLUÇÕES ISOTÔNICAS SOLUÇÃO PROTEICA

• CLORETO DE SÓDIO 0,9%


• RINGER
• ALBUMINA
• RINGER LACTATO
• PLASMA LYTE

SOLUÇÕES HIPERTÔNICAS SOLUÇÕES NÃO PROTEICAS

• CLORETO DE SÓDIO 3%
• DEXTRAN
• CLORETO DE SÓDIO 7,5%
• GELATINAS
• CLORETO DE SÓDIO 10%
• AMIDO
• COLETO DE SÓDIO 20%

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 21

A escolha da solução depende da adequada, sem precisar ofertar um


situação a qual o paciente se encon- grande volume de líquido para ele.
tra. A vantagem de utilizar soluções Observe a tabela abaixo e compare as
hipertônicas é a infusão de menor diferentes composições eletrolíticas
volume para o paciente. Com o volu- das principais soluções de hidratação.
me menor conseguimos re - A solução “Plasma Lyte” é a mais pró-
animar o paciente de forma xima da osmolaridade plasmática.

ELETRÓLITO RINGER
SF 0,9% RINGER PLASMA LYTE PLASMA
(MEQ/ML) L ACTATO
SÓDIO 154,0 147,5 130,0 140,0 136-145
POTÁSSIO - 4,0 4,0 5,0 3,5-5,0
CÁLCIO - 4,5 3,0 - 4,4-5,2
CLORETO 154,0 156,0 109,0 90,0 98-106
MAGNÉSIO - - - 3,0 1,6-2,4
LACTATO - - 28 - -
AC E TATO - - - 27 -
GLUCONATO - - - 23 -
OSMOLARIDADE 309 309 272 294 290-303
pH 5,5-6,2 5,0-7,5 6,0-7,5 7,4 (6,5-8,0) 7,4
Tabela 3. Composição das soluções x plasma

É importante lembrar que todas as gluconato dentre outros. Com isso,


soluções terão composições diferen- cabe ao médico escolher a melhor so-
tes de eletrólitos ou terão micromo - lução a depender da situação/indica-
léculas adicionadas, como o lactato, ção do paciente.

SAIBA MAIS!
O ringer lactato é a solução mais utilizada para a reanimação dos pacientes graves, víti-
mas de politraumas, pacientes em choque hemorrágico ou choque por outras etiologias não
traumáticas.

Sinais de desidratação desidratação é essencial para avaliar


se o paciente vai precisar de uma ex-
É de extrema importância saber se
pansão volêmica ou de uma reposi-
o paciente se encontra desidratado
ção volêmica.
e saber reconhecer os sinais de uma

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 22

FIGURA 1. SINAIS DE DESIDRATAÇÃO

TAQUICARDIA / TAQUIPNEIA

OLIGÚRIA

PELE E MUCOSAS SECAS

IRRITABILIDADE

CONFUSÃO MENTAL

HIPOTENSÃO ARTERIAL

Expansão volêmica x reposição Expansão volêmica:


volêmica
Corresponde à oferta de fluidos rápi-
Reposição volêmica: da para realizar uma manutenção do
volume intravascular efetivo. A oferta
Corresponde à oferta de fluidos ao
de fluidos, nesses casos, é realizada
paciente para realizar uma manuten-
por via endovenosa para reanimar o
ção na hemodinâmica. A oferta de
paciente. Ou seja, realizamos expan-
fluidos, nesse caso, é primeiramente
são volêmica em pacientes que apre-
por via oral.
sentam instabilidade hemodinâmica
Ou seja, realizamos reposição volêmi- e/ou sinais de gravidade.
ca em pacientes que não apresentam
instabilidade hemodinâmica ou sinais
de gravidade, para repor as perdas
basais ou perdas estimadas.

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CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 23

FLUXOGRAMA – REPOSIÇÃO VOLÊMICA X EXPANSÃO VOLÊMICA

REPOSIÇÃO EXPANSÃO
VOLÊMICA VOLÊMICA

SEM SINAL DE GRAVIDADE COM SINAL DE GRAVIDADE

QUANDO FAZER? QUANDO FAZER?

DESIDRATAÇÃO
TIPO DE CIRURGIA INSTABILIDADE HEMODINÂMICA
ALTERAÇÕES NO ESTADO MENTAL
PERDAS NO PÓS-OPERATÓRIO
(DRENOS, COMPLICAÇÕES) OLIGÚRIA
JEJUM ACIMA DE 6-8 HORAS ACIDOSE LÁTICA
NO PRÉ-OPERATÓRIO

uma cirurgia de urgência, a hidrata-


SE LIGA! Em artigos, consensos ou no ção deverá ser feita no intraoperató -
ATLS você pode encontrar a “confusão” rio. Essa reposição deverá ser feita
desses dois termos, pois é comum que além da reposição basal (que depen-
se utilize o termo “reposição volêmica”
de do estado do paciente e do pro -
inclusive quando estamos falando da
reposição de fluidos em pacientes he- cedimento realizado), que é feita pelo
modinamicamente instáveis. anestesista em qualquer cirurgia.
Caso não seja uma cirurgia de urgên-
Hidratação do paciente cirúrgico cia, seja uma cirurgia eletiva, a reposi-
ção deverá ser feita antes da cirurgia,
Antes de realizar uma cirurgia, a pri-
preparando o paciente para ele ir ao
meira observação que o médico de -
centro cirúrgico hidratado.
verá fazer é se o paciente apresenta
sinais de desidratação. Se o paciente não apresentar sinais
de desidratação, o médico deverá
Se o paciente apresentar sinais de
apenas calcular o volume para a ve -
desidratação, o médico deverá avaliar
nóclise de manutenção em decorrên-
a necessidade da cirurgia. Caso seja
cia do jejum. Observe a tabela abaixo

23
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 24

para saber como calcular o volume, • A boa hidratação no pré-operatório;


quantidade de calorias e eletrólitos
• Perdas insensíveis no
que deverão ser ofertados para o pa-
intraoperatório.
ciente em uma venóclise de jejum.

A hidratação no pós-operatório cor -


COMPONENTES PARA responde ao manejo do paciente na
MANUTENÇÃO EM 24 HORAS
enfermaria ou UTI e deve-se levar
ÁGUA 2000 a 2500 (35mL/kg/dia)
em consideração o tipo e duração
GLICOSE 100g (400Kcal)
da cirurgia, a estimativa de perda de
SÓDIO 1 a 2mEq/kg/dia (70-140mEq/dia)
fluidos diária (dreno, terceiro espa -
POTÁSSIO 0,5 a 1mEq/kg/dia (35-70mEq/dia)
ço, perdas insensíveis), se existem
Tabela 4. Venóclise de manutenção no jejum
complicações e a perda de fluidos
por causa das complicações (fístulas,
Após observar o paciente no pré - seromas, hematomas) e se o pacien-
-operatório e verificar a necessidade te está com alguma ostomia (e per -
de hidratação, partimos para o intra- das por essas ostomias). Importante
operatório, onde a necessidade de hi- lembrar quetodos os dados devem
dratação será de maior responsabili- ser medidos diariamente anotados
dade do anestesista. em prontuário. O mapa abaixo mos-
tra alguns parâmetros de perdas por
drenos e fístulas.
SE LIGA! Perceba que na frase acima
foi dito que a responsabilidade da hidra-
tação do paciente é maior para o anes-
tesista e não exclusiva do anestesista.
A cirurgia é realizada em equipe e toda
a equipe cirúrgica deverá debater para
identificar possíveis perdas maiores do
que o previsto e, assim, manter o pa-
ciente hemodinamicamente estável.

A avaliação da hidratação no intra-


operatórioleva em consideração:
• O planejamento do tempo cirúrgico;
• A avaliação do risco de
sangramento;
• A avaliação de doenças prévias do
paciente;

24
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 25

FLUXOGRAMA – PERDAS NO PÓS-OPERATÓRIO

EXCEDENDO 400mL
DRENOS
EM 8h (>50mL/hora)

AVALIAR O PACIENTE
PARA VOLUME DE REPOSIÇÃO

ALTO DÉBITO (>500mL/24h)


FÍSTULAS
BAIXO DÉBITO (<200mL/24h)

AVALIAR O PACIENTE PARA


VOLUME DE REPOSIÇÃO DE
Nas cirurgias que envolvem ostomias, FLUIDOS E ELETRÓLITOS
o paciente deverá ser avaliado desde
o intraoperatório até o pós operatório,
verificando a evolução dessa ostomia. terminais. Apenas com a localização
O tipo de ostomia também é de ex - da ostomia o médico consegue ava-
trema importância, pois as perdas liar o tipo de dejeção esperada atra-
variam muito entre uma ileostomia, vés dela e consegue também calcular
jejunostomia ou colostomia, sendo a perda de líquido.
que todas podem ser proximais ou

SAIBA MAIS!
O paciente com ostomia é um paciente com alto risco para desidratação (especialmente nas
ostomias altas), pois o fluido não passará por todo o trato gastrointestinal, dificultando ou im-
pedindo a absorção de líquido.

25
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO

FLUXOGRAMA – HIDRATAÇÃO D

SIM
PRÉ-OPERATÓRIO

HIDRATAÇÃO NO
INTRAOPERATÓRIO

A AVALIAÇ
• PLANEJAMENTO DO
HIDRATAÇÃO INTRAOPERATÓRIO • AVALIAÇÃO DO RIS
• AVALIAÇÃO DE DOE
• BOA HIDRATAÇÃO
• PERDAS INSENSÍVE

LEVAR EM CO
• TIPO E DURAÇÃO D
• DRENO
PÓS-OPERATÓRIO • PERDAS PARA O TE
• PERDAS INSENSÍVE
• COMPLICAÇÕES (F
• OSTOMIAS

26
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 27

Vias de administração da hídrico por via oral, poderá ser com-


reposição hídrica plementado pela via enteral(prefe -
rencialmente) ou parenteral.
A reposição volêmica deverá ser reali-
zada idealmente pela via oralsempre A via de administração da expansão
que o paciente puder receber fluidos, volêmica é a parenteral, por essa ser
alimentos ou medicamentos através uma fluidoterapia, agressiva, onde se
dessa via. Entretanto, caso não seja precisa restaurar o volume intravascu-
possível introduzir todo o volume lar efetivo rapidamente/agudamente.

SAIBA MAIS!
A FLUIDOTERAPIA DEVERÁ SER RESTRITIVA OU LIBERAL?
Estudo Restrictive versus Liberal Fluid Therapy for Major Abdominal Surgery, do ano de
2018, comparou 2983 pacientes submetidos à cirurgia abdominal de grande porte, divididos
em dois grupos: fluidoterapia restritiva e fluidoterapia liberal. Complicações foram avaliadas.
Pacientes com fluidoterapia liberal tiveram menos lesão renal aguda. Não houve diferença
em complicações (por exemplo: edema agudo de pulmão). Na fluidoterapia liberal, o paciente
recebia o dobro do volume no intraoperatório e pós-operatório. Nesses casos, os pacientes
ficaram mais protegidos de uma lesão renal aguda no pós-operatório. Com isso, é importante
salientar que deve-se ofertar ao paciente um volume hídrico de forma adequada, calculada e
consciente.

Projeto acerto Ele busca, referente à hidratação:


O projeto acerto é um projeto de ex- • Evitar períodos superiores a 6 ho-
trema importância que vem mudando ras de jejum;
como enxergar o paciente no pós-
• Evitar reposição volêmica ex -
-operatório, não somente na parte de
cessiva no intraoperatório e no
hidratação, mas em todos os aspec-
pós-operatório;
tos, tendo como mnemônico:
ACELERAÇÃO DA • Ingestão oral assim que se recupe-
rar da anestesia;
RECUPERAÇÃO
• Considerar sempre hidratação oral
TOTA L
em vez de intravenosa.
PÓS-OPERATÓRIA

27
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 28

PROJETO ACERTO

RETENÇÃO HÍDRICA
DE 7L OU MAIS

SOBRECARGA DE
ÍLEO ADINÂMICO
SÓDIO DE 700mmoL

PERIGO!
EXCESSO DE FLUIDOS
ACIDOSE GANHO DE PESO
ENDOVENOSOS
HIPERCLORÊMICA DE 3 A 6kg
E SÓDIO NO
PERIOPERATÓRIO

MAIOR PERMANÊNCIA
TAQUIARRITIMIAS
HOSPITALAR

EDEMA PULMONAR
RISCO DE IMOS E ÓBITO
PÓS-OPERATÓRIO

FONTE: WWW.PERIOP.COM.BR

2. ANALGESIA NO irá influenciar em toda a recupera -


PACIENTE CIRÚRGICO ção de um paciente possivelmente
debilitado.
O tratamento da dor no perioperató-
rioé de extrema importância para que Para tal, o paciente deve ser avaliado
o paciente fique confortável e tenha e reavaliado constantemente, para se
uma melhora mais rápida da cirurgia. saber se os medicamentos que estão
sendo prescritos estão adequados e
O alívio da dor no pré-operatórioé
se o tratamento não-medicamento -
importante especialmente se o pa- so está sendo feito. Esse tratamento
ciente apresentar alguma condição
deve seguir as orientações da Orga-
que já o cause dor ou que o deixe sus-
nização Mundial da Saúde (OMS), que
cetível a sentir mais dor, pois auxilia
consiste na analgesia escalonada e
na diminuição da liberação de cateco- ser individualizada, já que a dor é um
laminas e da resposta inflamatória.
sintoma individualizado. Um mesmo
No pós-operatório, a analgesia di- estímulo pode causar uma sensação
minui a ocorrência de complica- dolorosa completamente diferente
ções. Ou seja, lidar com a analgesia em uma pessoa em relação à outra.

28
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 29

Avaliação da dor no período os cuidados pós-operatórios, como


perioperatório quando ele poderá deambular ou o
tipo de decúbito que ele deverá fazer
Avaliação clínica
para diminuir a dor na lesão cirúrgica
O paciente deverá ser avaliado com
relação aos sinais e sintomas, carac-
terizar a dor em todos os aspectos: Escala visual de avaliação da dor
como é a dor, localização, a duração A Escala Visual consiste numa li-
da dor, fatores desencadeantes, fato- nha horizontal, com 10 centímetros
res de melhora, de piora, a duração e de comprimento, que tem assinala-
a progressão. da numa extremidade a classifica -
O exame físico deverá ser feito tam- ção “leve” e na outra a classificação
bém para complementar a caracte - “intensa”.
rização da dor. No caso do paciente Essa escala de avaliação da dor deve
cirúrgico, o médico deverá já idealizar ser realizada com pacientes lúcidos
o tipo e tamanho da incisão cirúrgica, e orientados,que possuam a condi-
para se ter uma ideia da quantidade ção e estado adequado para realizar
de analgesia que deverá ser prescrita a marcação, pois somente dessa for-
para esse paciente. ma será possível tratar a dor de forma
Para se prescrever a analgesia, o eficaz.
tipo da cirurgia precisa ser levado em O profissional de saúde explica ao
consideração. Cirurgias de emergên- paciente a escala numérica de ava-
cia, onde o paciente já apresenta um liação da dor de modo que a nota 0
grande processo inflamatório terão (zero)significa que o paciente não
um estímulo álgico maior para o sente nenhuma dore a nota 10sig-
paciente do que cirurgias eletivas . nifica dor em seu nível máximo . O
Ou então cirurgias de grande porte e paciente deverá fazer uma marcação
cirurgias abertas ocasionarão mais no ponto que representa a intensida-
dores ao paciente no pós-opera- de da sua dor. Após isso, mede-se em
tóriodo que pequenas cirurgias ou centímetros a distância entre o início
cirurgias laparoscópicas. Além disso, da linha (que corresponde a zero) e
caso o paciente saia com algum dis- o local assinalado, obtendo-se uma
positivo, como drenos ou cateteres, a classificação numérica.
analgesia prescrita também deverá
A avaliação da dor e o registo da sua
levar isso em consideração.
intensidade é responsabilidade do
O médico responsável do pacien- profissional de saúde que está pres-
te deverá ter bastante atenção com tando a assistência ao paciente.

29
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 30

Essa avaliação tem que ser feita de prejuízo da fala, impedidas de relatar
forma contínua e regular, juntamen- sua dor.
te com os demais sinais vitais, como A partir de 2002, os autores da es-
por exemplo: temperatura, frequên- cala FLACC fizerem modificações
cia cardíaca, frequência respiratória nos descritores de avaliação, a fim de
e pressão arterial, com o objetivo de adequá-la ao atendimento de crian-
otimizar o cuidado e melhorar a qua- ças com comprometimento cognitivo,
lidade de vida do paciente. Essa es- na faixa etária entre 4 e 19 anos. In-
cala auxilia o profissional e o paciente titulando-a FLACC revised (FLACCr),
a acompanhar sua melhora de acordo os autores também alteraram e am-
com a conduta analgésica tomada. pliaram para quatro orientações de
aplicação da escala.
Escala de FLACC A FLACCr apresenta cinco categorias
de avaliação, com escores somados
A escala de avaliação de dor FLACC
que variam entre zero e dez. A auto-
foi desenvolvida em 1997, com base
ra classificou os escores da seguin-
em parâmetros comportamentais ,
te forma: dor leve ( zero a três), dor
destinada à utilização dos profis -
moderada (quatro a seis) e dor in-
sionais da saúde, visando contribuir
tensa (sete a dez).
para a prática clínica na avaliação da
dor em crianças não verbaisou com

30
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO

FLUXOGRAMA – AVALI

AVALIAÇÃO DA DOR

AVALIAÇÃO CLÍNICA ESCALA VISUAL

SINAIS E
SINTOMAS CATEGOR

EXAME LEVE
FÍSICO NÃO INTERFERE NAS
DRENOS ATIVIDADES DIÁRIAS
FACE
INCISÕES E
DISPOSITIVOS
MODERADA
CATETERES
INTERFERE NAS
TIPO DE ATIVIDADES, MAS
CIRURGIA NÃO INCAPACITA PERNAS

CUIDADOS
NO PÓS- INTENSA
OPERATÓRIO
INCAPACITA PARA AS
ATIVIDADES DIÁRIAS ATIVIDAD

CHORO
FONTE:
ESCALA VISUAL: https://enfermagemflorence.com.br/escalas-
de-avaliacao-da-dor-em-uti/ ESCALA DE FLACC: Bussotti et
al. Adaptação cultural para o português do Brasil da escala de
CONSOL
avaliação de dor Face, Legs, Activity, Cry, Consolability revised
BILIDAD
(FLACCr). Rev. Latino-Am. Enfermagem vol 23 no. 4 Ribeirão
Preto july/Aug. 2015.

31
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 32

Tratamento não medicamentoso Tratamento medicamentoso


As orientações ao paciente são a O tratamento medicamentoso é rea-
base para o tratamento não medica- lizado a partir da Escada Analgésica
mentoso. As vezes o simples fato de da OMS, que irá depender do estímu-
dizer ao paciente para ele não mani- lo álgico que o paciente vai ter. Pa-
pular um dreno torácico, por exemplo, cientes com estímulos álgicos muito
faz com que ele não retire o dreno grandes terão uma tendência a ter
acidentalmente e tenha mais dor no dores mais fortes e, por isso, preci-
pós-operatório. sarão de medicamentos mais fortes
para realizar a analgesia. Observe a
imagem abaixo com atenção:
SE LIGA! O médico deverá reservar um
tempo para conversar com o paciente!
Muitas vezes o médico estará lidando ANALGESIA ESCALONADA
com pacientes que não têm noção do
que fazer e o que pode parecer lógico
para alguém, como não deitar sobre a
DOR FORTE
incisão cirúrgica, pode ser algo básico
para outra pessoa.

DOR MODERADA

OPIOIDES FORTES
MORFINA, METADONA,
FENTANIL, OXICODONA
DOR FRACA +/- NÃO-OPIOIDES
OPIOIDES FRACOS + ADJUVANTES
TRAMADOL, CODEÍNA
+/- NÃO-OPIOIDES
NÃO-OPIOIDES + ADJUVANTES
DIPIRONA, PARACETAMOL,
ANTI-INFLAMATÓRIOS
NÃO ESTEROIDES
+ ADJUVANTES

FONTE: DIRETRIZ DE TRATAMENTO


FARMACOLÓGICO DA DOR. Hospital Israelita Albert Einstein.

Para os pacientes que apresentam escala da dor, em todos os níveis de


dores subagudas ou crônicas, deve - dor, existe a prescrição de adjuvantes,
rão ser prescritos, além do analgé - que são medicamentos que não pos-
sico, os adjuvantes. Observe que na suem função analgésica por natureza,

32
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 33

mas que conseguem modular a dor ◊ Antes de se aumentar a dose


de alguma forma, seja na terminação de um medicamento, o médico
nervosa, na chegada na medula ou deverá realizar a associação
no sistema nervoso central. de medicamentos, tendo em
vista que alguns deles atuam
potencializando o efeito de
ADJUVANTES outros;
AMITRIPTILINA / NORTRIPTILINA
◊ Apenas um medicamento de
VENLAFAXINA
cada categoria por vez.
HALOPERIDOL
CARBAMAZEPINA • DOSE CORRETA : Menor dose
GABAPENTINA analgésica necessária com menos
PREGABALINA efeitos adversos.
BACLOFENO
CICLOBENZAPRINA
FLUOXETINA
Cuidado com os opioides
Tabela 5. Adjuvantes O médico não deverá ter medo de
prescrever opioides, porém é neces-
Princípios da escada analgésica da sário ter cuidado e atenção! Efeitos
oms adversos, como tolerância, abstinên-
cia (dependência física), vício (depen-
• DOR AGUDA: Iniciar pelos de - dência psicológica), sedação (cuidado
graus 2 e 3. A partir do momen- para o paciente não evoluir para in-
to que o paciente vai melhorando suficiência respiratória), constipação,
da dor, deve-se descer o nível do náuseas e vômitos, retenção uriná-
degrau. ria, deverão ser monitorados. Para
• DOR CRÔNICA: Iniciar pelo de - a retirada do medicamento opioide,
grau 1 + adjuvante. A partir do o médico deverá realizar o desmame,
momento, o médico observa a para evitar efeitos indesejados, como
evolução do paciente, até que ele a abstinência e o vício.
não apresente mais dor.
• VIA PREFERENCIAL:Via oral. SE LIGA! A classe de medicamentos do
Fentanil é a que apresenta mais efeitos
• POSOLOGIA: depressores do sistema cardiovascular,
como bradicardia e hipotensão.
◊ Intervalos fixos, para que os
pacientes não apresentem
mais dor;
◊ Doses progressivas;

33
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 34

3. NUTRIÇÃO NO A anamnese e o exame físico deve -


PACIENTE CIRÚRGICO rão ser completos, buscando sinais
de desnutrição, buscando antece -
Avaliação nutricional
dentes médicos que possam reforçar
A avaliação clínica é a primeira coisa a ideia de desnutrição ou até cirurgias
que deve ser feita em um paciente e comorbidades que possam ser um
cirúrgico, como discutimos anterior - risco para o status nutricional desse
mente. E nessa avaliação clínica, o paciente. A performance status do
estado nutricional do paciente deverá paciente deverá ser avaliado, visando
ser questionado. a capacidade funcional do paciente.

SAIBA MAIS!
A Escala de Status de Desempenho – ECOG, ou Performance Status, avalia determinados
critérios para medir como a doença afeta as habilidades de vida diária do paciente. Ela des-
creve o nível de funcionamento de um paciente em termos de sua capacidade de cuidar de si
mesmo, de suas atividades diárias e de sua capacidade física. A escala foi desenvolvida pelo
Grupo de Oncologia Cooperativa Oriental (ECOG), publicada em 1982.

Figura 4.Escala de performance – ECOG. Fonte: http://itarget.com.br/newclients/sbpt.org.br/2011/downloads/


temp/ESCALAS_DE_PERFORMANCE_DR_CABRAL.pdf

Além disso, o médico deverá solicitar nutricional, como hemograma, perfil


e avaliar os exames complementares de ferro, proteínas, função hepática
que sejam pertinentes à avaliação dentre outros.

34
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 35

Diagnóstico de desnutrição úlceras por pressão e também têm


um aumento das bactérias do trato
gastrointestinal, o que acarreta um
APRESENTAR DOIS OU risco aumentado de translocação
MAIS DOS SEGUINTES CRITÉRIOS bacteriana. Não somente a desnu-
ALIMENTAÇÃO INSUFICIENTE trição, mas também o retardo na in-
PERDA DE PESO trodução da dieta, seja por via oral ou
PERDA DE MASSA MUSCULAR enteral, aumenta o risco de prolifera-
PERDA DE GORDURA SUBCUTÂNEA ção e translocação bacteriana do tra-
EDEMA LOCALIZADO OU GENERALIZADO
to gastrointestinal.
STATUS FUNCIONAL DIMINUÍDO
Tabela 5. Critérios diagnósticos de desnutrição. Fonte:
Academy of Nutrition and Dietetics American Society
for Parenteral and Enteral Nutrition: identification and
Intervenções nutricionais
documentation of adult malnutrition (undernutrition).
Após o diagnóstico de desnutrição
ou de risco nutricional, o médico de-
Consequências da desnutrição em verá realizar então a intervenção nu-
cirurgia tricional. A introdução da dieta deve-
Pacientes desnutridos apresentam rá ser feita, sempre que possível pela
maiores chances de desenvolver, no via oral. Caso seja necessária a com-
pós-operatório, infecção do sítio ci- plementação da dieta (ou eventual-
rúrgico (pela imunidade alterada) e mente sua substituição), outras vias
cicatrização deficiente , com maio - deverão ser utilizadas. O mapa abai-
res chances de deiscência de ferida/ xo mostra como deverá ser realizada
anastomoses e hérnias incisionais. a intervenção nutricional.

Além disso, esses pacientes têm


maiores chances de desenvolverem

35
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO

FLUXOGRAMA – INTERVEN

G
P
SUPLEMENTAÇÃO
ORAL HIPERPROTEIC
PR

O AC
DESNUTRIÇÃO
FO
OU NUTRIÇÃO ENTERAL
INADEQUADA

CONCENT
PRÉ-DIGE

PARENTERAL
OA

36
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 37

Suplementação oral As formulações padrões podem ser


ofertadas aos pacientes ou os ali-
Existem diversos tipos de suplemen-
mentos que seriam ofertados por via
tos orais, sendo que a maioria deles
oral podem ser processados (proces-
fornece, em média, 300kcal por por -
sador/liquidificador) e ofertados pela
ção, 12g de proteína, polivitaminas
sonda. A formulação padrão é aquela
e minerais. Além dos formulados de
que o paciente irá utilizar as suas pró-
suplementação oral padrão, também
prias enzimas para digerir o alimen-
existem os suplementos orais hiper -
to. Ela é isotônica, apresenta as pro -
proteicos, indicados para pacientes
teínas intactas, além de carboidratos
com feridas e malignidades; os suple-
simples e complexos.
mentos pré-curtidos e pudins, indi-
cados para pacientes com disfagia e A formulação concentrada é utilizada
doenças neurológicas. quando é necessária a restrição de
volume para o paciente, sendo que
ela é levemente hiperosmolar. Caso
Enteral o paciente apresente alguma dificul-
A nutrição enteral poderá administra- dade na digestão de alimentos ou
da de forma gástrica ou pós-pilóri- não tolere a nutrição enteral padrão,
ca.Ela tem a vantagem de manter a as formulações pré-digeridas podem
função da barreira mucosa. O acesso ser ofertadas. Nessa formulação as
da nutrição enteral é por sonda (por proteínas se encontram hidrolisadas
exemplo nasogástrica) ou por via ci- e existe apenas a presença de carboi-
rúrgica/percutânea (por exemplo jeju- dratos simples.
nostomia ou ileostomia). Pacientes em dieta enteral podem
apresentar diarreia (muitas vezes
diarreia osmótica), complicações me-
tabólicas (alteração de glicemia, trigli-
cérides, alterações hepáticas), com-
plicações mecânicas (obstrução da
sonda, por exemplo) ou infecções do
acesso.

SE LIGA! Quando mais próxima da dieta


oral – padrão – o paciente receber, me-
lhor para a recuperação e nutrição dele.

37
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 38

FLUXOGRAMA – VIAS DE ACESSO PARA A NUTRIÇÃO ENTERAL

NUTRIÇÃO
ENTERAL

PÓS-PILÓRICO GÁSTRICO

SONDA NASODUODENAL SONDA OROGÁSTRICA

SONDA NASOJEJUNAL SONDA NASOGÁSTRICA

SONDA VIA SONDA VIA GASTROSTOMIA


JEJUNOSTOMIA CIRÚRGICA CIRÚRGICA OU ENDOSCÓPICA
POR PUNÇÃO
INCAPACIDADE PROLONGADA
DE ALIMENTAÇÃO GÁSTRICA

FONTE: http://www.minutoenfermagem.com.br/
postagens/2015/06/24/sondagem-nasogastrica/

38
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 39

Parenteral Pacientes em dieta parenteral correm


o risco de ter graves complicações,
A nutrição parenteral é realizada ex -
especialmente relacionadas com in-
clusivamente por via intravenosa,
fecção, já que a dieta é feita por aces-
feita por um cateter central, prefe -
so venoso central. Além disso, o pa-
rencialmente jugular ou subclávia (hi-
ciente pode apresentar complicações
perosmolar), ou por via periférica, se
metabólicas (hiperglicemia, distúr -
for diluída. Para se realizar uma die -
bios hidroeletrolíticos, síndrome da
ta parenteral, é necessário avaliar as
realimentação, disfunção hepática) e
indicações. O mapa abaixo mostra
complicações referentes ao acesso
como o médico deve proceder ao in-
venoso (pneumotórax, lesão vascular,
dicar uma nutrição parenteral.
arritmia, embolia gasosa).

FLUXOGRAMA – NUTRIÇÃO PARENTERAL

INDICAÇÕES
ESVAZIAMENTO CONTRA INDICAÇÕES
GÁSTRICO RETARDADO INSTABILIDADE
FALHA NA ANASTOMOSE HEMODINÂMICA
GASTROINTESTINAL NUTRIÇÃO CAPACIDADE DE
ÍLEO PARALÍTICO / PARENTERAL RECEBER ALIMENTAÇÃO
OBSTRUÇÃO MECÂNICA ORAL E/OU ENTERAL
FÍSTULAS DURAÇÃO PREVISTA DO
GASTROINTESTINAIS JEJUM INFERIOR A 5 DIAS
COMPLICAÇÕES DA SONDA DOENÇA TERMINAL
AVALIAR INDICAÇÕES E
DE ALIMENTAÇÃO CONTRAINDICAÇÕES

ACESSO CENTRAL PRESCRIÇÃO MONITORAMENTO RETIRADA DA DIETA

CATETER TOTAL
CONTROLE
DO VOLUME
DE LIQUIDOS,
LOCAL DE NA INDICAÇÃO DA
PARCIAL ELETRÓLITOS,
PUNÇÃO DIETA PARENTERAL,
GLICOSE, CÁLCIO,
O MÉDICO TAMBÉM
MAGNÉSIO E
DEVERÁ TER UM
FÓSFORO – 1x/dia
PLANEJAMENTO DE
AMINOTRANSFERA-
DESMAME DA DIETA
SES, BILIRRUBINA E
TRIGLICERÍDEOS –
1x/SEMANA

39
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 40

Suporte nutricional A nutrição oral deverá ser sempre a


pré-operatório preferencial. A nutrição parenteral
apresenta maior risco de complica-
O planejamento nutricional é uma das
ções para o paciente e ela deverá ser
etapas mais importantes que antece-
utilizada apenas como complementa-
dem a cirurgia, pois um paciente des-
ção da nutrição ou em casos onde o
nutrido, como visto anteriormente,
paciente não tolera a nutrição oral e
apresenta maiores chances de com-
tão pouco a enteral.
plicações. Nele deverá ser analisado
o tipo de cirurgia e a necessidade de
jejum prolongado, tendo em vista que Suporte nutricional
esses fatores influenciam diretamen- pós-operatório
te na recuperação do paciente.
Na avaliação nutricional, que teve iní-
O suporte nutricional deverá ser feito cio antes da cirurgia, o médico res-
em pacientes com desnutrição, sem a ponsável pelo paciente deverá pro -
necessidade de ser uma desnutrição gramar o retorno das funções do trato
severa, já que o paciente desnutrido gastrointestinal.
não deverá ser operado, exceto se for
uma cirurgia de emergência.

FLUXOGRAMA – RETORNO DAS FUNÇÕES DO TGI

RETORNO
DAS FUNÇÕES
DO TGI

HORAS / DIAS >7 A 10 DIAS

A DEPENDER INDICAR NUTRIÇÃO


DA CIRURGIA PARENTERAL

ATÉ O PACIENTE
ORAL ENTERAL PROVISÓRIA VOLTAR A TER
TRÂNSITO INTESTINAL

40
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 41

Imunonutrição os riscos de complicações referentes à


desnutrição.
A dieta imunomoduladora ganhou for-
ça nos últimos tempos com a prescri- A principal indicação da dieta imuno-
ção de suplementos enterais ou paren- moduladora são os pacientes desnu-
terais com arginina, glutamina, ácidos tridos e pacientes oncológicos, tendo
graxosessenciais (principalmente em vista o caráter consumptivo da
de cadeias médias) , que modulam a doença. A imunonutrição traz redu-
imunidade do paciente no pré-opera- ção nas complicações infecciosas e
tório, para ele chegar na cirurgia com no tempo de internação, além de di-
um status melhor, sendo assim, reduzir minuir o risco de deiscências (de feri-
da e de anastomoses) e má cicatriza-
ção (fístulas e hérnias incisionais).

SAIBA MAIS!
PROBIÓTICOS E SIMBIÓTICOS. São substâncias que estimulam o crescimento e a função
de micro-organismos intestinais benéficos. Essas bactérias (benéficas, próprias do TGI) ofer-
tadas ao paciente dificultam o crescimento e desenvolvimento de bactérias patogênicas ao
organismo. Esses suplementos podem ser administrados no pré-operatório ou no pós-opera-
tório, pelas vias enteral ou oral (idealmente no pré-operatório e por via oral). Seus benefícios
são a diminuição do risco de infecção do sítio cirúrgico e diminuição do tempo para retorno do
trânsito intestinal.

Taxa metabólica basal paciente, é necessário fazer uso da


fórmula de Harris-Benedict:
Para se calcular a quantidade de ca-
lorias que deverá ser ofertada ao

FLUXOGRAMA – TAXA METABÓLICA BASAL

FÓRMULA DE HARRIS-BENEDICT

HOMENS MULHERES

66,5 + (13,7 X PESO) + 665 + (9,6 X PESO) +


(5,0 X ALTURA) – (6,8 X IDADE) (1,8 X ALTURA) – (4,7 X IDADE)

41
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 42

Não é necessário gravar a fórmula, pois • Evitar períodos superiores a 6 ho-


atualmente existem aplicativos que ras de jejum;
fornecem a fórmula, precisando ape -
• Evitar reposição volêmica excessi-
nas adicionar as variáveis. Além disso,
va no intra e no pós-operatório;
é necessário levar em consideração o
fator atividade físicae as necessida- • Ingestão oral assim que se recupe-
des específicasde cada paciente. rar da anestesia;
• Considerar sempre hidratação e
Projeto acerto nutrição oral em vez da intravenosa;

Como dito anteriormente, quando fa- • Avaliação nutricional nas primeiras


lamos em hidratação do paciente ci- 24 horas;
rúrgico, o Projeto ACERTO é um pro- • Intervenção nutricional:
jeto que visa a:
◊ 5-7 dias antes da cirurgia
ACELERAÇÃO DA
◊ Em pacientes desnutridos: 14
RECUPERAÇÃO dias antes
TOTA L • Nutrição enteral ou parenteral ape-
PÓS-OPERATÓRIA nas em desnutridos graves;
• Antibiótico-profilaxia;
As diretrizes nutricionais do proje- • Uso restrito de sonda nasogástrica
to são: e drenos abdominais.

PROJETO ACERTO

↓O BALANÇO
NITROGENADO
NEGATIVO
↓A FASE CATABÓLICA MELHORAR A
PÓS-TRAUMA CICATRIZAÇÃO

ALTA PO MELHORAR A
BENEFÍCIOS
MAIS PRECOCE FUNÇÃO IMUNE

↓COMPLICAÇÕES MANTER A IMUNIDADE


SÉPTICAS NO PO DA MUCOSA DO TGI

↓A TRANSLOCAÇÃO
↓O PERÍODO DE ÍLEO BACTERIANA FONTE: WWW.PERIOP.COM.BR

42
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 43

4. CICATRIZAÇÃO trauma, reestabelecendo barreiras à


perda de líquido e infecção, reestabe-
A cicatrização é um processo imu-
lecendo o fluxo sanguíneo e linfático e
nocelular e bioquímico complexo que
restaurando a integridade mecânica.
objetiva reestabelecer a integridade
O reparo minucioso pode ser preju-
tecidual. Os mesmos eventos ocor -
dicado pela urgência do estabeleci-
rem em todo processo de cicatrização
mento da função.
independentemente do tipo de tecido
ou de lesão tecidual.
Qualquer processo que cause uma SE LIGA!A maioria dos processos de re -
estabelecimento da integridade tecidual
lesão terá dois caminhos para seguir: se dará por meio da cicatrização, pois
ou o da regeneração tecidual ou da apenas alguns tecidos têm a capacidade
formação de cicatriz. de regeneração tecidual, como o fígado,
o osso ou o organismo na fase do pro -
Reparo de fe ridas ◊ esforço dos teci- cesso do desenvolvimento embrionário.
dos para restaurar função e estrutu-
ras normais após o
Observe o gráfico abaixo. Ele mos -
tra a predominância de cada tipo ce-
Regeneração tecidual: lular do sistema imune nas fases do
processo de cicatrização. Na sessão
Restauração perfeita da arquitetura
abaixo, você pode acompanhar o que
do tecido sem formação de cicatriz.
ocorre em cada etapa do processo de
cicatrização, analisando em conjunto
Formação de cicatriz: com o gráfico.

Esforço dos tecidos para restaurar a


função e estruturas normais após o

Gráfico 1. Fases da cicatrização.


Fonte: Sabiston, 19ª Edição.

43
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 44

A resposta imediata à lesão tecidual síntese da matriz e neovascularização


é a fase inflamatória, que tem como para aliviar a isquemia do traumatismo.
objetivo limitar a dimensão do dano e A fase de maturaçãoé o período de
prevenir lesão adicional. contração da cicatriz com ligação cru-
A fase proliferativa é o processo re - zada de colágeno, retração e perda
parador e consiste na reepitelização, de edema.

FASE FASE FASE DE


INFLAMATÓRIA PROLIFERATIVA MATURAÇÃO

Figura 6. Fases da cicatrização. Fonte: https://amebioblog.wordpress.com/tag/cicatrizacao/

Fases do processo de cicatrização contém TGF- β(e também fator de


crescimento derivado das plaquetas
Fase inflamatória
[PDGF], fator de crescimento deri-
Esta fase se inicia imediatamen- vado dos fibroblastos [FGF], fator de
te após a lesão , com a liberação de crescimento epidérmico [EGF], pros-
substâncias vasoconstritoras , prin- taglandinas e tromboxanos), que
cipalmente tromboxano A2 e prosta- atraem neutrófilosà ferida.
glandinas, pelas membranas celula- O coágulo é formado por colágeno,
res. O endotélio lesado e as plaquetas plaquetas e trombina, que servem de
estimulam a cascata da coagulação. reservatório proteico para síntese de
As plaquetas têm papel fundamental citocinas e fatores de crescimento,
na cicatrização. Visando a hemosta- aumentando seus efeitos. Desta for -
sia, essa cascata é iniciada e grânu- ma, a resposta inflamatória se inicia
los são liberados das plaquetas, que com vasodilatação e aumento da

44
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 45

permeabilidade vascular , promo - precocemente, se a membrana basal


vendo a quimiotaxia (migração de estiver intacta, as células epiteliais mi-
neutrófilos para a ferida). gram em direção superior, e as cama-
Neutrófilos são as primeiras célu - das normais da epiderme são restau-
las a chegar à ferida, com maior con- radas em três dias. Se a membrana
centração 24 horas após a lesão. São basal for lesada, as células epiteliais
atraídos por substâncias quimiotáticas das bordas da ferida começam a pro-
liberadas por plaquetas. Os neutrófi- liferar na tentativa de restabelecer a
los aderem à parede do endotélio me- barreira protetora.
diante ligação com as selectinas (re - A angiogênese é estimulada pelo TN-
ceptores de membrana) e produzem F-α, e é caracterizada pela migração
radicais livres que auxiliam na destrui- de células endoteliais e formação de
ção bacteriana e são gradativamente capilares, essencial para a cicatriza-
substituídos por macrófagos. ção adequada.
Os macrófagos migram para a ferida A parte final da fase proliferativa é a
após 48 - 96 horas da lesão e são as formação de tecido de granulação. Os
principais células antes dos fibroblastos fibroblastose as células endoteliais
migrarem e iniciarem a replicação. Têm são as principais células da fase
papel fundamental no término do des- proliferativa. Os fibroblastos dos te -
bridamento iniciado pelos neutrófilos e cidos vizinhos migram para a ferida,
sua maior contribuição é a secreção de porém precisam ser ativados para sair
citocinas e fatores de crescimento , de seu estado de quiescência. O fator
além de contribuírem na angiogênese, de crescimento mais importante na
fibroplasiae síntese de matriz extra- proliferação e ativação dos fibroblas-
celular, fundamentais para a transição tos é o PDGF. Em seguida é liberado o
para a fase proliferativa. TGF- β, que estimula os fibroblastos a
produzirem colágeno tipo I e a trans-
formarem-se em miofibroblastos, que
Fase proliferativa promovem a contração da ferida.
A fase proliferativa é constituída por Entre os fatores de crescimento en-
quatro etapas fundamentais: epite- volvidos no processo cicatricial po -
lização, angiogênese, formação de dem ser citados o PDGF, que induz
tecido de granulação e deposição a proliferação celular, a quimiotaxia e
de colágeno. a síntese matricial; o fator epidérmi-
Esta fase tem início ao redor do 4º co, que estimula a epitelização; o fa-
dia após a lesão e se estende aproxi- tor transformador alfa, responsável
madamente até o término da segun- pela angiogênese e pela epitelização;
da semana. A epitelizaçãoocorre o fator fibroblástico, que estimula a

45
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 46

proliferação celulare angiogênese e o O colágeno produzido inicialmente é


fator transformador beta, responsá- mais fino do que o colágeno presente
vel pelo aumento da síntese matricial. na pele normal, e tem orientação pa-
ralela à pele. Com o tempo, o colágeno
inicial (colágeno tipo III) é reabsorvido
Fase de maturação e um colágeno mais espesso é produ-
A característica mais importante des- zido e organizado ao longo das linhas
ta fase é a deposição de colágeno de tensão. Estas mudanças se refletem
de maneira organizada, por isso é a em aumento da força tênsil da ferida.
mais importante clinicamente.

Gráfico 2:Correlação entre a substituição do colágeno e evolução da força tênsil. Fonte: Adaptado de Witte e Barbul,
1997.

A reorganização da nova matriz é um entre a síntese da nova matriz e a lise


processo importante da cicatrização. da matriz antiga , havendo sucesso
Essa fase se inicia em 2-3 semanas quando a deposição é maior. Mesmo
após a ocorrência da lesão e pode durar após um ano a ferida apresentará um
por até 2 anos. Fibroblastos e leucóci- colágeno menos organizado do que o
tos secretam colagenases que promo- da pele sã, e a força tênsil jamais retor-
vem a lise da matriz antiga. A cicatriza- nará a 100%, atingindo em torno de
ção tem sucesso quando há equilíbrio 80% após três meses.

46
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO

FLUXOGRAMA – REVISÃO DAS F

SÍNTESE DE MA
EXTRACELUL

CONTRIBUIÇÃO ANGIOGÊNE

48-96H FIBROPLAS
MACRÓFAGOS
APÓS A LESÃO

FASE F
INFLAMATÓRIA PROLIF

LIBERAÇÃO DE SUBST. INÍCIO IMEDIATAMENTE


VASOCONSTRITORAS APÓS A LESÃO

EPITELIZAÇÃO
ENDOTÉLIO LESADO
CASCATA DE
COAGULAÇÃO
PLAQUETAS

DESTRUIR BACTÉRIAS ANGIOGÊNES


TGF-B + PDGF +
FGF + EGF
PRODUZEM TEC. DE
RADICAIS LIVRES GRANULAÇÃO
NEUTRÓFILOS
↑CONCENTRAÇÃO DEP. DE
24H APÓS A LESÃO
COLÁGENO

47
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 48

Síntese do colágeno de colagenases: as séricas (elastase,


catepsina C e proteinase neutra) e as
Colágeno tipo I:
metaloproteinases. A atividade das
O colágeno tipo I é o mais frequen- colagenases é controlada por citoci-
te, é sintetizado pelos fibroblastos e é nas liberadas principalmente por cé -
mais predominante em ossos e ten- lulas inflamatórias, endoteliais, fibro-
dões. Ele é sintetizado 90% na derme. blastos e queratinócitos. A formação
da matriz extracelular é, pois, resul-
tante de um balanço entre a deposi-
Colágeno tipo II: ção e degradação de colágeno.
O colágeno tipo II é produzido nas
cartilagens hialinas.
Fatores que atrasam a
cicatrização
Colágeno tipo III:
Fatores locais:
O colágeno tipo III é mais comumente
encontrado em tecidos moles, como va- • Isquemia: a diminuição do aporte
sos sanguíneos, derme e fáscia. A der- de sangue ocasiona uma diminui-
me sã contém aproximadamente 80% ção no aporte de células do siste-
de colágeno tipo I e 20% de colágeno ma imune.
tipo III. Já o tecido de granulação ex - • Infecção: prolonga a fase inflama-
pressa 30 a 40% de colágeno do tipo III, tória, já que as células do sistema
sendo considerado colágeno imaturo. imune estarão tentando conter a
Ele está presente no início da cicatri- infecção e a ferida não progride
zação. Não tem tanta resistência, mas para a fase proliferativa.
é importante para a estruturação ini- • Corpos estranhos: prolongam a in-
cial da matriz extracelular e, com isso, flamação e existe uma maior pro-
o colágeno tipo I ganhar importância dução de colágeno para encapsular
no processo cicatricial. e bloquear aquele corpo estranho.
O fibroblasto inicia a síntese do colá- • Edema: diminui a circulação san-
geno intracelular no terceiro dia após guínea dentro da ferida, dificultan-
a lesão. O pico da produção de colá- do a troca de nutrientes.
geno ocorre em 6 semanas.
A degradação do colágeno se inicia
precocemente e é muito ativa durante Fatores sistêmicos:
o processo inflamatório. A sua diges- • Corticoides: realizam uma imunos-
tão ocorre em ambiente extracelular supressão, diminuindo o processo
e é mediada por colagenases espe - de ativação imunocelular.
cíficas. São conhecidos quatro tipos

48
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 49

• Diabetes mellitus e hipotireoidis- Cicatrização patológica


mo: pela alteração na microvascu-
Uma cicatriz patológica é aquela que
latura e pelo efeito imunossupres-
ocorre uma alteração no processo ci-
sor, além de um hipometabolismo.
catricial, podendo gerar a produção
• Tabagismo: dificulta a cicatriza - excessiva ou pouca produção de co-
ção da ferida por alterações na lágeno. Neste resumo focaremos na
microvasculatura. produção excessiva do colágeno, que
• Perfusão tecidual: uma má per - geram a ocorrência da cicatriz hiper -
fusão tecidual sistêmica tam- trófica ou do queloide.
bém atrapalha o processo de
cicatrização.
• Hipotermia e dor: FLUXOGRAMA – FATORES QUE DIFICULTAM A
CICATRIZAÇÃO
atrasam a ativação
imunocelular.
• Idade: nos pacientes idosos o FATORES QUE
DIFICULTAM A
processo de cicatrização se tor- CICATRIZAÇÃO
na comprometido por causa
da ativação do sistema
imune e recrutamento de
FATORES LOCAIS FATORES SISTÊMICOS
matéria prima para parti-
cipar no processo de cica-
ISQUEMIA CORTICOIDES
trização. Além disso, nos
pacientes idosos existe INFECÇÃO DIABETES MELLITUS
um poder menor de con-
tração da ferida nos mio- CORPOS ESTRANHOS HIPOTIREOIDISMO
fibroblastos, o colágeno
é produzido de maneira EDEMA TABAGISMO

mais lenta.
PERFUSÃO TECIDUAL
• Nutrição: o paciente des-
nutrido (hipoalbuminemia, hi- HIPOTERMIA E DOR
povitaminoses) cicatriza de
maneira deficiente. A deficiên- IDADE
cia de vitamina C é um fator a
parte no processo de cicatriza- NUTRIÇÃO

ção, pois essa vitamina é extre-


mamente importante na produção
do colágeno.

49
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 50

Figura 7. Cicatrização patológica. 1: Cicatriz hipertrófica / 2: Queloide. Fonte: http://www.dricarocarvalho.com.br/in-


dex.php/blog2/126-queloides-cicatrizacao-hipertrofica-e-betaterapia

Cicatriz hipertrófica no queloide e a digitopressão di-


minui o colágeno ali presente.
A formação dessa cicatriz, que é mais
elevada do que o normal, é caracteri- • Compressão (placa de silicone): a
zada por um maior processo inflama- compressão dos vasos (na região)
tório e um maior tempo de permanên- que levam nutrientes para o fibro-
cia na fase de remodelação. É comum blasto, diminuindo a população
também em pacientes de pele clara. dessas células e do tamanho da
cicatriz patológica.
Queloide: • Injeção intralesional (triancinolona)

A formação dessa cicatriz patológica • Excisão cirúrgica: precisa ser in-


se dá por uma produção muito exage- tralesional, pois quanto mais es-
rada de colágeno, gerando a um extra- tímulo o cirurgião der na cicatriz,
vasamento de colágeno, extrapolando maiores as chances de aumentar
os limites originais da ferida. É comum a cicatriz patológica. Não deve ser
em pacientes negros e asiáticos e tem uma abordagem tão utilizada para
uma predisposição genética (diferen- os queloides.
temente da cicatriz hipertrófica). • Betaterapia: tipo específico de ra-
dioterapia, que ocasiona a morte
Tratamento da cicatriz patológica dos fibroblastos e uma diminuição
da matriz extracelular existente
• Massagem: pode ser realizada tan- na cicatriz. Mais indicado para os
to na cicatriz hipertrófica, quanto queloides.

50
CUIDAOSCMOPACIENTCIRÚGCO 51

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Avaliação da dor em repouso e durante atividades no pós-operatório de cirurgia cardí-
aca. http://www.scielo.br/pdf/abd/v78n4/16897.pdf
CAMPOS, A, C. et al. Cicatrização de feridas. ABCD. Arq. bras. cir. escavação. São Paulo,
2007.
Cicatrização: conceitos atuais e recursos auxiliares- Parte I.
PEREIRA, Esdras Edgar Batista; SANTOS, Nadia Barreto dos; SARGES, Edilene do Socorro
Nascimento Falcão. Avaliação da capacidade funcional do paciente oncogeriátrico hospitali-
zado.Rev Pan-Amaz Saude , Ananindeua , v. 5, n. 4, p. 37-44, dez. 2014 .
SABISTON. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19.ed.

51
AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA

52
SUMÁRIO
1. Introdução .................................................................................................. 54
2. Avaliação Do Risco Cirúrgico .............................................................. 56
3. Manejo Dos Medicamentos ................................................................ 72
4. Classificação Das Cirurgias E Uso De Antibioticoprofilaxia.... 75
Referências Bibliográficas ........................................................................ 79

53
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 54

1. INTRODUÇÃO Anamnese Cuidadosa


Com o envelhecimento da população A anamnese é a parte mais importan-
e o aumento da expectativa de vida, te da avaliação clínica perioperatória.
os procedimentos cirúrgicos são rea- Dados positivos de história clínica
lizados em uma população com idade e alterações de exame clínico estão
média mais avançada e prevalência diretamente e independentemente
maior de comorbidades. Nesse con- associados ao aumento do risco de
texto, a avaliação clínica perioperató- complicações pós-operatórias.
ria ganha cada vez mais importância É importante salientar que o paciente
na tentativa de diminuir a morbidade se apresenta para a consulta focado
e a mortalidade perioperatórias. na sua doença cirúrgica, não valorizan-
A avaliação perioperatória é descrita do problemas outros concomitantes.
como a análise clínica que objetiva Por isso, sintomas como dor precordial,
quantificar o risco de complicações clí- dispneia, tosse e intolerância ao exercí-
nicas perioperatórias. Essa avaliação cio devem ser questionados ativamen-
deve ser baseada em variáveis clíni- te. Hábitos e antecedentes pessoais,
cas e em resultados de exames sub- incluindo os antecedentes cirúrgicos,
sidiários (quando indicados) e deve têm especial importância nesse tópico.
considerar os riscos de complicações O questionamento sobre diagnósti -
cardíacas e não cardíacas. Essa ava- cos prévios e o uso de medicações
liação deve ainda conter, além das es- é também essencial nesta avaliação
timativas de risco, as orientações de clínica. Interrogação sobre alergias
manejo pré, intra e pós-operatórias medicamentosas, efeitos adversos
para diminuição dos riscos encontra- desencadeados por anestésicos em
dos, que se denominam estratégias procedimentos cirúrgicos prévios,
protetoras. transfusões sanguíneas prévias, tam-
Os objetivos desta avaliação perio - bém é importante.
peratória são identificar comorbida -
des previamente não reconhecidas
Exames subsidiários
e fatores de risco para complicações
cirúrgicas; otimizar a condição médi- Vários estudos demonstram que exa-
ca pré-operatória; reconhecer e tra- mes solicitados rotineiramente, não as-
tar potenciais complicações; traba - sociados à indicação clínica específica,
lhar efetivamente como um membro não beneficiam os pacientes, além de
da equipe operatória, conjuntamente aumentarem os custos. Tal situação
com o cirurgião e o anestesista. ocorre porque a maioria dos pacientes
assintomáticos possui exames normais.

54
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 55

Apesar disso, geralmente os serviços entre as equipes relacionadas com o


possuem uma rotina de exames mí- cuidado do paciente. Exames mais es-
nimos a serem solicitados antes da pecíficos devem ser solicitados apenas
realização de qualquer procedimento. após avaliação clínica e avaliação da
Caso haja uma rotina de solicitação de indicação. A Tabela 1 apresenta uma
exames pré-operatórios, ela deve se sugestão de rotina de exames gerais
basear em exames de fácil realização, subsidiários a serem solicitados.
baixo custo e que sejam consenso

Hb
< 40 anos Ht
Coagulograma
ECG

PACIENTES SEM Creatinina


COMORBIDADES Glicemia
> 40 anos Sódio e Potássio
Hemograma
Coagulograma
Rx de tórax
Diabéticos ECG
Creatinina
Glicemia
Obesidade ECG
Glicemia
Creatinina
Hipertenso, nefropata, insuficiência cardíaca Sódio e Potássio
ECG
PACIENTES COM Hepatopata Creatinina
COMORBIDADES,
Coagulograma
INDEPENDENTEMENTE DA
IDADE Hemograma
Bilirrubinas
Albumina
Coagulograma
Em anticoagulação Hemograma
Creatinina
Coagulograma
História de sangramento
Hemograma
Tabagista, DPOC Rx de tórax
Tabela 1. Exames subsidiários para avaliação do risco cirúrgico. Fonte: Martins (2015)

55
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 56

Manejo de Doenças Crônica e 2. AVALIAÇÃO DO RISCO


Medicações CIRÚRGICO
Espera-se que o clínico que realiza a Avaliação Geral
avaliação compense as comorbida -
A avaliação geral mais comumente
des do paciente, assim como orien-
realizada é baseada na classificação
te o manejo das medicações de uso
da American Society of Anesthe -
crônico no período perioperatórío. Pa-
siologists(ASA) (Tabela 2). Paciente
cientes de difícil compensação ambu-
classificado como ASA I, possui uma
latorial podem ser internados alguns
mortalidade perioperatória de 0,06
dias antes do procedimento para
– 0,08%; o paciente ASA II, 0,27 –
compensação das comorbidades du-
0,40%; ASA III, 1,8 – 4,3%; ASA IV,
rante a internação.
7,8 – 23%; e ASA V, 9,4 – 51%.
Em casos mais complexos, pode ha-
Outros escores de avaliação geral ba-
ver a necessidade da avaliação de
seados no grau de atividade do pa-
outro especialista ou de acompanha-
ciente, como de equivalente meta -
mento conjunto do clínico geral no
bólico (Índice de atividade de Duke),
pós-operatório.
atividades básicas e instrumentais de
vida diária (ABVD e AIVD) e escalas
oncológicas (ECOG e Karnofsky), tam-
bém podem ser úteis na avaliação.

Nenhum distúrbio orgânico, psiquiátrico,


ASA I
fisiológico ou bioquímico
Hipertensão arterial sistêmica bem controlada;
Condição sistêmica leve e compensada
ASA II diabetes mellitus sem complicações; anemia; obe-
que não impõe limitação funcional
sidade; gestação
Diabetes mellitus com complicação vascular;
Doença sistêmica moderada a grave que
infarto do miocárdio prévio; hipertensão arterial
ASA III resulta em limitação funcional, porém sem
sistêmica não controlada; insuficiência renal crôni-
incapacidade funcional
ca; obesidade mórbida
Doença sistêmica grave que impõe in-
ASA IV capacidade funcional ou que representa Insuficiência cardíaca congestiva; angina instável
ameaça constante à vida
Paciente moribundo, ou seja, não é espe-
Rotura de aneurisma; hemorragia intracraniana
ASA V rado que sobreviva com ou sem a cirurgia
com PIC elevada
proposta
Paciente em morte cerebral; será operado
ASA VI
para retirada de órgãos para doação
Tabela 2. Classificação do risco cirúrgico da ASA. Fonte: American Society of Anesthesiologists physical status (Ann
R Coll Surg Engl 2011; 93: 185–187)

56
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 57

A avaliação dos riscos específicos “complicações cardíacas pós-ope -


deve englobar risco cardíaco e a ava- ratórias” compreende a isquemia
liação de todos os outros riscos clíni- miocárdica, disfunção miocárdica
cos pertinentes ao paciente e ao pro- aguda com congestão pulmonar e
cedimento. Estudos apontam que, se arritmias graves com instabilidade
for realizada apenas a avaliação de hemodinâmica. Estas complicações
risco cardíaco, deixa-se de estimar são a principal causa de mortalidade
mais de 50% do risco de o paciente pós-operatória.
morrer no pós-operatório. Veremos A avaliação do risco de complicações
as avaliações específicas adiante. cardíacas perioperatórias deve levar
Após a avaliação dos riscos e a pro- em conta o tipo de cirurgia, o estado
posição de estratégias protetoras, funcional e os fatores de risco cardio-
o avaliador deve informar esses ris- lógicos apresentados pelo paciente.
cos ao paciente e fazer uma análise Existem vários algoritmos desenvol-
da relação risco-benefício do proce- vidos para esse fim, entre eles o índi-
dimento. Essa avaliação, juntamente ce de Goldman, o do American Col -
com todos os riscos, as estratégias lege of Physicians , o do American
protetoras e a análise de risco-bene- College of Cardiologye da American
fício, deve ser informado ao cirurgião Heart Association e o índice cardía -
e ao anestesista. co revisado de Lee. Apesar de todos
terem vantagens e desvantagens, é
Avaliação importante usar algum deles para re-
de risco alização da estratificação de risco.
cardiovascular O risco intrínseco é baseado na taxa
de complicações cardíacas presen -
A avaliação do
tes em cada tipo de procedimento e
risco de com-
guarda boa correlação com o porte
plicações car -
cirúrgico. A Tabela 3 mostra o risco
díacas é parte
intrínseco de complicações cardio -
imprescindível
vasculares de alguns procedimentos
da avaliação clíni-
cirúrgicos.
ca perioperatória.
A expressão

57
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 58

CLASSIFICAÇÃO RISCO
TIPO DE OPERAÇÃO
DE RISCO CARDÍACO
Alto > 5%
Cirurgias vasculares (aórtica, grandes vasos, vascular periférica)
Cirurgias de urgência ou emergência
Operações prolongadas com grande
perda de fluido e sangue

Intermediário Endarterectomia de carótida e correção 1 - 5%


endovascular de aneurisma de aorta
abdominal
Cirurgia de cabeça e pescoço
Cirurgias intraperitoneais e intratorácicas
Cirurgias ortopédicas
Cirurgias prostáticas
Baixo < 1%
Procedimentos endoscópicos
Procedimentos superficiais
Cirurgia de catarata
Cirurgia de mama
Cirurgia ambulatorial

Tabela 3.Risco de complicações cardiovasculares dos procedimentos cirúrgicos. Fonte: Martins (2015)

O estado funcional do paciente ava- do status funcionam incluem o se -


liado pelo índice de atividade de Duke guinte: pode cuidar de si mesmo,
se mostrou preditor de eventos car- como comer, vestir ou usar o banheiro
díacos no pós-operatório, apesar da (1 MET); pode subir um lance de de-
subjetividade intrínseca do método. graus ou uma colina ou caminhar no
O status funcional cardíaco, deter - nível do solo a 4,8Km/h a 6,4 Km/h (4
minado por meio de aplicação de um METS); pode fazer trabalhos pesados
questionário aos pacientes, mostrou em casa, como esfregar pisos ou le-
associação com os desfechos pós - vantar ou mover móveis pesados, ou
-operatórios. O status funcional pode subir dois lances de escada (entre 4 e
ser expresso em equivalentes meta- 10 METS); pode participar de espor-
bólicos (1 MET é definido como um tes extenuantes, como natação, tênis,
consumo de oxigênio de 3,5 mL/Kg/ futebol e basquete (> 10 METS).
min, que é o consumo de oxigênio O algoritmo de avaliação do ris-
no repouso, numa posição sentada). co de complicações cardíacas mais
A habilidade de se atingir 4 METs de recomendado é baseado no algo -
atividade sem sintomas é um indica- ritmo do American College of Car -
dor de bom prognóstico. Indicadores diology(ACC) e da American Heart

58
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 59

Association(AHA), pois possui me - tomada de decisão ou nos cuidados


lhor acurácia na população quando perioperatórios de pacientes com es-
comparado aos outros algoritmos (Fi- tado funcional menor que 4 METs, ou
gura 1). desconhecido, testes de estresse far-
Cirurgias de emergência não neces- macológicos podem ser realizados.
sitam de avaliação de riscos. Se hou-
ver algum tempo para qualquer tipo Solicitação oe exames
de compensação pré-operatória, isso caroiológicos no pré-operatório
não deve ser considerado avaliação
de risco. Ecocardiograma:A solicitação de
ecocardiograma para avaliação de
Em pacientes com cardiopatia des -
risco cardíaco perioperatório não deve
compensada, a cirurgia deve ser adia-
ser realizada de rotina. É reservada
da até a compensação da cardiopatia.
para os casos em que há suspeita de
Cirurgias de baixo risco cardiológico
doença valvar não diagnosticada, do-
devem ser realizadas sem maiores
ença valvar sintomática, suspeita de
investigações cardiológicas, apenas
insuficiência cardíaca ou insuficiência
com a compensação clinica das co-
cardíaca com piora de grau funcional.
morbidades, se necessário.
Essas suspeitas surgirão durante a
Pacientes assintomáticos, com bom
consulta de avaliação perioperatória,
grau de atividade, têm uma chance
após história, exame clínico e análi-
2 vezes menor de complicações car-
se da radiografia de tórax e ECG Em
díacas e 5 vezes menor de isquemia
pacientes com insuficiência cardíaca
miocárdica perioperatória quando
estáveis que possuem avaliação re-
comparados a pacientes com baixo
cente da função ventricular não há
grau de atividade. Cirurgias nesses
necessidade da solicitação de eco -
pacientes também podem ser rea -
cardiograma no perioperatório.
lizadas sem maiores investigações
cardíacas, sempre com compensação
das comorbidades.
Pacientes com baixo grau de ativida-
de devem ser classificados em baixo,
moderado e alto risco dependendo da
presença ou não das variáveis de Lee
(Figura 1). A diretriz de avaliação car-
diovascular perioperatória da AHA/
ACC de 2014 recomenda ainda que,
se testes adicionais terão impacto na

59
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI

OPERAÇÃO DE Paciente possui alguma cardiopatia


EMERGÊNCIA? descompensada? Insuficiência coronariana
aguda (angina instável classe III ou IV; infarto SIM
recente < 30 dias); Insuficiência cardíaca
descompensada (início recente; classe
funcional IV, em piora de cl\asse funcional);
Arritmias graves (BAV 2º Grau Mobitz II
ou de 3º grau, bradicardias sintomáticas, Compensa
doença card
NÃO taquicardias supraventriculares com
antes da ciru
frequência cardíaca não controlada > 100
bpm em repouso, taquicardias ventriculares, eletiva
arritmia ventricular sintomática); valvopatia
grave (estenose grave: gradiente médio >
40mmHg, área valvar < 1cm² ou sintomática,
estenose mitral sintomática (dispneia
progressiva aos esforços, pré-síncope aos
esforços)

SIM

Operação

Pós operatório: avaliação


de risco, controle
dos fatores de risco,
pesquisa de enventos
cardiovasculares

Fonte: Martins (2015)

60
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 61

Testes não invasivos para isquemia: Pacientes com teste não invasivo nor -
Os principais testes não invasivos mal realizado nos últimos 2 anos e pa-
para isquemia são teste ergométrico, cientes com revascularização completa
ecocardiograma de estresse e cintilo- cirúrgica ou percutânea nos últimos 5
grafia de perfusão miocárdica. O prin- anos e que permanecem estáveis cli-
cipal questionamento no momento da nicamente também não necessitam de
solicitação do teste não invasivo é se novos testes não invasivos.
ele vai modificar a conduta periopera-
tória, incluindo a solicitação de testes
invasivos ou a modificação das me- Estratégias protetoras cardíacas
dicações protetoras perioperatórias. As estratégias protetoras cardíacas
Caso a resposta seja não, o teste não no período perioperatório podem ser
deve ser solicitado. resumidas em:
As possíveis indicações para solicita- • Revascularização profilática no
ção de testes não invasivos são: pré-operatório;
• Condições cardíacas isquêmi - • Cardioproteção farmacológica no
cas descompensadas, como an - perioperatório;
gina classe III ou IV ou angina
progressiva; • Monitorização intraoperatória;

• Pacientes de alto risco e com bai- • Diagnóstico e tratamento precoce


xa capacidade funcional que serão de complicações pós-operatórias.
submetidos a cirurgias de alto ris-
co, se for alterar a conduta; Revascularização profilática: Estu -
• Pacientes de alto risco e com bai- dos recentes mostram que a revas-
xa capacidade funcional que serão cularização miocárdica profilática cm
submetidos a cirurgias de risco in- pacientes estáveis do ponto de vis-
termediário, se for alterar a conduta; ta cardíaco não reduziu a chance de
complicação cardíaca pós-operatória,
• Pacientes de risco intermediário mesmo em cirurgias de alto risco.
e com baixa capacidade funcio -
nal que serão submetidos a cirur- É, ainda, importante considerar que,
gias de alto risco, se for alterar a quando se propõe uma revasculariza-
conduta. ção miocárdica antes de cirurgia, é ne-
cessário aguardar para poder proceder
com a cirurgia não cardíaca, principal-
Pacientes de baixo risco ou pacientes mente por causa da necessidade de
submetidos a cirurgia de baixo risco não antiagregação plaquetária dupla (Ta-
devem realizar testes não invasivos. bela 4).

61
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 62

TIPO DE INTERVALO INTERVALO cardíacas perioperatórias em pa -


REVASCULARIZAÇÃO MÍNIMO IDEAL cientes com doença coronariana
Variável: conhecida ou com fatores de risco
Cirurgia condições 30 dias cardiovasculares.
do paciente
Angioplastia sem stent 7 dias 14 dias Nesse contexto, as recomendações
Stent convencional 14 dias > 6 semanas são:
Stent farmacológico 1 ano Indefinido • Manter ácido acetilsalicílico na
Tabela 4. Duração da dupla antiagregação plaquetária dose de 75-100 mg/dia no perío-
após procedimentos de revascularização.
Fonte: Martins (2015) do perioperatório de pacientes co-
ronariopatas ou com múltiplos fa-
A revascularização profilática deve tores de risco;
ser considerada para pacientes que • Suspender ácido acetilsalicílico em
tenham indicação de revasculariza- neurocirurgias e ressecções tran-
ção independentemente do proce - suretrais de próstata;
dimento cirúrgico, como no caso de
• Em pacientes submetidos à colo-
lesões de tronco da artéria coronária
cação de stent, suspender clopido-
esquerda; doença triarterial; disfun -
grel 5 dias antes do procedimento
ção ventricular associada; angina não
e manter ácido acetilsalicílico du-
responsiva ao tratamento clinico; tes-
rante todo o período perioperató-
tes não invasivos de alto risco.
rio, respeitando-se o tempo ideal
de antiagregação dupla.
Cardioproteção farmacológica: O
uso de ácido acetilsalicílicoaumenta
Quando suspensos, os antiagregan-
o risco de sangramento cirúrgico em
tes devem ser reintroduzido assim
aproximadamente 50%, porém está
que possível no pós-operatório.
relacionado a sangramentos meno -
res, que não exigem intervenção mé- No caso do uso de estatinasestá
dica. As exceções ficam por conta de associado à diminuição significativa
neurocirurgias e ressecção transure - de complicações cardíacas no pós -
tral de próstata. O uso de tienopiridí- -operatório de cirurgias vasculares.
nicos, como o clopidogrel, aumenta A redução de risco em cirurgias não
substancialmente o risco de sangra- vasculares foi demonstrada apenas
mentos graves durante a cirurgia. em estudos retrospectivos. Sabe-se,
ainda, que a suspensão das estatinas
Por outro lado, a suspensão do ácido
no perioperatório está associada ao
acetilsalicílico causa aumento de 3
aumento de complicações cardíacas.
vezes na incidência de complicações
As estatinas devem ser, portanto,

62
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 63

mantidas em pacientes que já fazem • Considerados em pacientes de ris-


seu uso; usadas no perioperatório de co intermediário e cirurgia de risco
todas as cirurgias vasculares arteriais; intermediário.
consideradas em pacientes com pelo
menos 2 fatores de risco e cirurgia de
risco intermediário. Pode ser utilizado qualquer betablo-
queador, entretanto os mais estuda-
As drogas estudadas são sinvastati- dos são atenolol, metoprolol e biso-
na, 40 mg/dia; atorvastatina, 20 mg/ prolol. A introdução idealmente deve
dia; e fluvastatina 80 mg/dia. Devem ser realizada pelo menos 1 semana
ser iniciadas pelo menos 1 semana antes do procedimento, e o medica-
antes do procedimento e mantidas mento deve ser mantido por 30 dias
por 30 dias após o procedimento. De- após o procedimento. A dose de be-
ve-se avaliar se há indicação de conti- tabloqueador deve ser titulada para
nuar a medicação após esse período. atingir frequência cardíaca de 60-
O uso de betabloqueadores no pe - 70 bpm e PA sistólica > 100 mmHg.
rioperatório deve ser realizado com Pode haver necessidade de retornos
muita parcimônia. Caso sejam indica- ambulatoriais durante esse ajuste de
dos para pacientes de baixo risco, po- dose.
dem aumentar a mortalidade perio-
peratória. Além disso, deve haver um
cuidado especial com a monitorizaçâo Monitorização intraoperatória: A
da frequência cardíaca e da pressão monitorização intraoperatória da tem-
arterial (PA) após sua introdução. Os peratura corpórea é de suma impor-
betabloqueadores devem ser: tância. A hipotermia está relacionada
a aumento de eventos cardíacos e pa-
• mantidos em pacientes que fazem rada cardíaca no pós-operatório. Pa-
uso crônico; cientes que apresentam hipotermia
• Usados no perioperatório de pa - devem receber aquecimento passivo.
cientes com doença coronariana
conhecida; Diagnóstico e tratamento precoce
• Introduzidos em pacientes de risco de complicações pós-operatórias:
intermediário e alto submetidos à A grande maioria dos eventos cardí-
cirurgia vascular; acos pós-operatórios ocorre até o 2°
dia de pós-operatório. O diagnóstico
• Introduzidos em pacientes de precoce de isquemia perioperatória
alto risco e cirurgia de risco é estratégia importante na diminui -
intermediário; ção da mortalidade perioperatória.

63
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 64

Realização de eletrocardiograma Avaliação de risco pulmonar


(ECG) seriado e dosagem de troponi-
As complicações respiratórias pós -
na são as melhores estratégias nesse
-operatórias mais significativas e es-
sentido.
tudadas são: infecções (pneumonia),
O ECG seriado deve ser realizado no insuficiência respiratória e ventilação
pós-operatório imediato, 1° e 2° dias, mecânica prolongada, exacerbação
e está indicado em: de doença pulmonar de base, atelec-
• Pacientes de alto risco submetidos tasia e broncoespasmo.
a cirurgia de risco intermediário e Avaliação pré-operatória da função
alto; pulmonar pode ser necessária para
procedimentos cirúrgicos gerais ou
• Pacientes de risco intermediário
torácicos. Enquanto os procedimen-
com doença cardíaca isquêmica
tos neurocirúrgicos e da parte infe-
submetidos a cirurgia de risco mo-
rior do abdome e das extremidades
derado e alto.
têm pouco efeito no funcionamento
pulmonar e rotineiramente não re -
A dosagem de troponina deve ser re- querem estudos da função pulmonar,
alizada em casos de: procedimentos torácicos e da parte
superior do abdome podem diminuir
• Quadro clinico compatível com sín-
o funcionamento pulmonar e predis-
drome coronariana;
por a complicações. Com isso, é pru-
• Presença de instabilidade dente considerar a avaliação da fun-
hemodinâmica; ção pulmonar para todos os casos
de ressecção dos pulmões, para os
• Presença de disfunção miocárdica
procedimentos torácicos que reque-
aguda;
rem ventilação monopulmonar e para
• Pacientes de alto risco de compli- os casos de operações abdominais e
cações submetidos à cirurgia de torácicas de maior porte em pacien-
risco intermediário e alto; tes com idade superior a 60 anos
• Pacientes de risco intermediário com doenças preexistentes, tabagis-
com doença cardíaca isquêmica mo ou com sintomatologia pulmonar
submetidos a cirurgia de risco mo- evidente.
derado e alto.
Fatores de risco para complicações
Caso a dosagem de troponina não pulmonares:Fatores gerais que au -
esteja disponível, pode ser substituí- mentam o risco de complicações pul-
da por curva de CK/CKMB. monares no pós-operatório incluem

64
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 65

idade avançada (>60 anos), hipoal - pré-operatória de pneumectomias,


buminemia, estado funcional depen- de dispneia de causa incerta, doença
dente, perda de peso e, possivelmen- pulmonar obstrutiva (asma e DPOC)
te, obesidade. Condições comórbidas não compensada. Os testes neces -
concorrentes como a deterioração do sários incluem o volume expiratório
sensório, acidente vascular cerebral forçado no 1° segundo (VEF1), a ca-
prévio, insuficiência cardíaca conges- pacidade vital forçada e a capacidade
tiva, insuficiência renal aguda, ASA de difusão do monóxido de carbono.
>2, uso crônico de esteroide uso de Adultos com um VEF1 menor que 0,8
bloqueador neuromuscular de lon - L/s ou 30% do previsto têm um alto
ga ação (pancurônio) e a transfusão risco de complicações e de insuficiên-
sanguínea também se associam a um cia respiratória pós-operatória; solu-
maior risco de complicações pulmo- ções não cirúrgicas devem ser busca-
nares no pós-operatório. das. A ressecção pulmonar deve ser
Fatores de risco pulmonar específicos planejada para que o VEF1 pós-ope-
incluem a doença pulmonar obstrutiva ratório seja superior a 0,8 L/seg. ou
crônica (DPOC), tabagismo, expecto- 30% do previsto. Esse planejamento
ração no pré-operatório, pneumonia, pode ser feito com o auxílio de ma-
dispneia e apneia obstrutiva do sono. peamento quantitativo pulmonar, que
Estudos não demonstraram aumen- pode indicar quais os segmentos do
to de risco pulmonar em pacientes pulmão são funcionais.
asmáticos controlados e em obesos Na Tabela 5, são apresentados dois
graus I e II (excluindo as comorbida- escores de avaliação do risco pulmo-
des associadas). nar que estratificam o risco de pneu-
monia e insuficiência respiratória no
pós-operatório.
Exame da função pulmonar: A es-
pirometria é indicada na avaliação

65
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 66

RISCO DE INSUFICIÊNCIA
RISCO DE PNEUMONIA
RESPIRATÓRIA
Odds ratio (IC Odds ratio (IC
Pontos (1) Pontos (2)
95%) 95%)
Fatores de risco
Operação de aneurisma 14,3
Procedimentos 4,29 (3,34-5,5) 15 27
de aorta abdominal (12,0-16,9)
3,92 8,14
Operação torácica 14 21
(3,36-4,57) (7,17-9,25)
Operação abdominal 2,68 4,21
10 14
alta (2,38-3,03) (3,80-4,67)
Operação da cabeça e 2,30 3,10
8 11
pescoço (1,73-3,05) (2,40-4,01)
2,14 4,21
Neurocirurgia 8 14
(1,66-2,75) (3,80-4,67)
Operação vascular 1,29 4,21
3 14
arterial (1,10-1,52) (3,80-4,67)
1,56
Anestesia geral 4 - -
(1,38-1,80)
Operação de 1,33 3,12
3 11
emergência (1,07-1,72) (2,83-3,43)
Transfusão de ≥ 5 con- 1,35
3 - -
centrados de hemácias (1,07-1,72)
5,63
Idade (anos) ≥ 80 17
(4,62-6,84) 1,91
6
3,58 (1,71-2,13)
70-79 13
(2,97-4,33)
2,38 1,51
60-69 9 4
(1,98-2,87) (1,36-1,69)
1,49
50-59 4 - -
(1,23-1,81)
2,83
Grau funcional Dependente 10
(2,33-3,43) 1,92
7
Parcialmente 1,83 (1,74-2,11)
6
dependente (1,63-2,06)
Diminuição de 10%
Disfunções 1,92
do peso nos últimos 6 7 - -
orgânicas (1,68-2,18)
meses
1,72 1,81
DPOC 5 6
(1,55-1,91) (1,66-1,98)
1,47
AVC 4 - -
(1,26-1,82)

66
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 67

Diminuição da 1,51
4 - -
consciência (1,36-1,80)
1,47
Ureia <16mg/dL 4 - -
(1,26-1,72)
1,24
Ureia = 44-60mg/dL 2 - -
(1,11-1,39)
1,41 2,29
Ureia > 60mg/dL 3 8
(1,22-1,64) (2,04-2,56)
2,53
Albumina < 3 g/dL - - 9
(2,28-2,80)
Uso de corticoesteroide 1,33
3 - -
crônico (1,12-1,58)
Tabagismo no último 1,28
Hábitos 3 - -
ano (1,17-1,42)
1,24
Álcool (2 drinques/dia) 2 - -
(1,08-1,42)
ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO PULMONAR
Escore de risco de pneumonia Escore de risco de insuficiência respiratória
Risco es-
Risco es-
Pontos Risco Classe de Risco timado de
Classe de risco timado de Pontos (2)
(1) pulmonar risco pulmonar insuficiência
pneumonia
respiratória
0-15 I Baixo 0,24% 0-10 I Baixo 0,5%
16-25 II Baixo 1,19% 11-19 II Baixo 2,2%
Intermedi-
26-40 III Intermediário 4,0% 20-27 III 5,0%
ário
41-55 IV Alto 9,4% 28-40 IV Alto 11,6%
>55 V Alto 15,8% >40 V Alto 30,5%
Tabela 5. Escores de risco para complicações pulmonares pós-operatórias. Fonte: Martins (2015)

Estratégias protetoras: Para os pa - procedimento planejado), terapia


cientes classificados como de baixo broncodilatadora, terapia com antibi-
risco, deve-se sempre que possível óticos para tratar infecções preexis-
estimular a deambulação precoce tentes e tratamento dos pacientes as-
para minimizar o risco de complica- máticos com esteroides. Além disso,
ções pulmonares. As intervenções incentivar o exercício no pré-opera-
pré-operatórias que podem dimi - tório pode melhorar a recuperação do
nuir as complicações pulmonares no paciente no pós-operatório. Uma re-
pós-operatório incluem a suspen - comendação razoável seria encorajar
são do cigarro (dois meses antes do os pacientes a andar três quilômetros

67
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 68

em menos de uma hora várias vezes morbidade e da mortalidade dos pa-


por semana. Estratégias perioperató- cientes cirúrgicos. A incidência pós-
rias incluem o uso de anestesia epi- -operatória varia de aproximadamen-
dural, toalete brônquica vigorosa e fi- te 15 - 40% em cirurgias gerais até
sioterapia respiratória, e também com 60 - 80% em cirurgias ortopédicas,
broncodilatadores. quando não realizada profilaxia, ao se
realizar uma busca ativa. A profilaxia
diminui essa incidência em até 80%.
Avaliação do risco
tromboembólico A avaliação do risco deve ser realiza-
da preferencialmente durante a ava-
Denomina-se tromboembolismo ve - liação pré-operatória ambulatorial ou
noso a ocorrência de trombose ve - no momento da admissão do pacien-
nosa profunda e embolia de pulmão. te e deve seguir algum dos algorit -
Essas condições são prevalentes em mos das diretrizes para terapia anti-
pacientes internados, clínicos e ci - trombótica e prevenção de trombose
rúrgicos, com manifestações clinicas do American College of Chest Physi -
muito variáveis, desde assintomática cians(Tabela 6 e Figura 2).
até morte súbita.
Por conta disso, sua profilaxia tem
papel fundamental na diminuição da

68
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 69

1 PONTO 2 PONTOS 3 PONTOS 5 PONTOS

Idade 4-60 anos Idade 61 - 74 anos Idade > 75 anos AVC (< 1 mês)
História de TVP/ Artroplastia maior eletiva
Pequenas cirurgias Artroscopia
TEP dos membros inferiores
História familiar de Fratura de quadril, pele
IMC > 25 kg/m² Cirurgia geral > 45min
trombose ou membros inferiores
Traumatismo agudo da
Edema de membros inferiores Neoplasia Fator V de Leiden
medula espinal (< 1 mês)
Protrombina
Varizes Imobilização (>72h)
mutante
Anticoagulante
Gravidez ou pós-parto Acesso venoso central
lúpico
Abortamento espontâneo recorren- Anticorpo
te ou sem causa aparente anticardiolipina
Uso de anticoncepcional oral ou Hiper-homocistei-
terapia de reposição hormonal nemia
Trombocitope-
Sepse (1 mês) nia induzida por
heparina
Doença Pulmonar (1 mês), incluindo
pneumonia
Função pulmonar alterada
IAM
Insuficiência cardraca congestiva (1
mês)
Doença inflamatória intestinal
Paciente clínico acamado
Tabela 6. Escore de Caprini. Fonte: Martins (2015)
Escore: 0-1 ponto - risco muito baixo; 2 pontos - risco baixo; 3-4 pontos - risco moderado; ≥ 5 pontos - risco alto.

69
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI

ALGORITMO DE AVALIAÇÃO DO R

Cirurgia de pequeno porte,


duração < 60 aminutos,
internação ≤ 2 dias, sem
Cirurgia de alto risco restrição de mobilidade

Artroplastia total de quadril


Endoscópica
Artroplastia total de joelho
Laparoscópica
Fratura de quadril
Superfiial (mama,
Oncológica curativa
dermatológica, plástica)
Trauma raquimedular
Oftalmológica
Politrauma

Risco baixo > 60 anos

Risco alto

Fonte: Martins (2015)

70
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 71

Profilaxia:A profilaxia farmacológica rivaroxabana (10 mg/dia, iniciar 6-8


do tromboembolismo venoso deve ter horas após o procedimento); dabiga-
como princípio o uso da medicação trana (220 mg/dia, iniciar 1-4 horas
adequada, com início no momento após o procedimento); (apixabana 2,5
adequado, na dose adequada e pelo mg, a cada 12 horas, iniciar 12-24
tempo necessário. Essa opção é mais horas após o procedimento).
eficaz que a profilaxia mecânica e
deve ser usada sempre que possível.
SE LIGA! Existem algumas contrain -
Pode-se associar a profilaxia mecâni- dicações à profilaxia farmacológica. As
ca à farmacológica, especialmente em absolutas são hipersensibilidade aos
anticoagulantes; trombocitopenia indu-
pacientes de alto risco. Para pacien-
zida por heparinas ≤ 100 dias (no caso
tes de alto risco com contraindicação de uso de heparinas); sangramento ativo
à profilaxia farmacológica, deve-se (incluindo AVC hemorrágico, 2-4 dias);
preferir mecanismos de compressão bloqueio espinal ou coleta de liquor ≤
2 horas. As contraindicações relativas
pneumática intermitente ao uso de são plaquetopenia < 100.000/mm³; co-
meias elásticas. agulopatia; HAS não controlada (>180 x
110 mmHg).
O início da profilaxia deve ser feito
conforme segue:
O tempo indicado para a profilaxia
• Para pacientes de alto risco: pre-
varia conforme o tipo de cirurgia. Em
ferencialmente, 12 horas antes do
cirurgias em geral deve durar 7 - 10
procedimento (caso não tenha sido
dias ou enquanto houver risco. No
realizada antes, 12-24 horas após
caso de cirurgias oncológicas com in-
o procedimento);
tuito curativo deve ser mantida por 4
• Para pacientes de risco moderado: semanas. Tratando-se de artroplas -
em caso de anestesia geral: 2-4 tias, nas situações de artroplastias de
horas antes do procedimento; em joelho deve durar pelo menos 10 - 14
caso de bloqueio neuroaxial: pelo dias, sugerindo-se a extensão por 4
menos 2 horas após o bloqueio; - 5 semanas; no caso de artroplastia
caso não seja realizada antes do de quadril, deve durar 4 - 5 semanas.
procedimento, iniciar 12-24 horas É importante salientar que a profilaxia
após a cirurgia. deve ser mantida pelo tempo indica-
As medicações e os esquemas a se- do mesmo que o paciente tenha alta
rem utilizados são apresentados na hospitalar.
Tabela 7. Nas artroplastias de qua-
dril e joelho, há a possibilidade de
uso de anticoagulantes orais, como a

71
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 72

DROGA RISCO INTERMEDIÁRIO RISCO ALTO

Heparina não fracionada 5.000 UI, SC, a cada 12 horas 5.000 UI, SC, a cada 8 horas
Enoxaparina 20 mg, SC, 1X/dia 40 mg, SC, 1X/dia
Dalteparina 2.500 UI, SC, 1X/dia 5.000 UI, SC, 1X/dia
1.900 UI, SC, 1X/dia se peso < 70 kg 3.800 UI, SC, 1X/dia se peso < 70 kg
Nadroparina
2.850 UI, SC, 1X/dia se peso ≥ 70 kg 5.700 UI, SC, 1X/dia se peso ≥ 70 kg
Fondaparinux 2,5 mg, SC, 1X/dia 2,5 mg, SC, 1X/dia
Tabela 7.Doses de medicamentos para a profilaxia do TEV. Fonte: Martins (2015)

SAIBA MAIS!
Em situações de insuficiência renal com clearancede creatinina < 30mL/min, a profilaxia deve
ser realizada idealmente com heparina não fracionada com controle de TTPa (que não deve
se alterar) ou heparina de baixo peso molecular com controle de atividade antifator Xa (que
deve estar <0,5 UI/mL). A redução da dose de heparina de baixo peso molecular pela metade
é uma opção às alternativas anteriores.
Não existem dados sobre a segurança do uso de apixabana e rivaroxabana em pacientes
com clearance < 50 mL/min. A dose de dabigatrana deve ser reduzida para 150 mg/dia em
pacientes com clearancede 30 - 50 mL/min. Nenhum deles deve ser usado com clearance
< 30 mL/min.

3. MANEJO DOS Deve-se considerar substituição para


MEDICAMENTOS vias parenterais em casos de alitera-
ção na absorção gastrointestinal ou
No pré-operatório, é importante sem-
jejum prolongado. As medicações
pre fazer a revisão completa das medi-
que não são essenciais em curto pra-
cações utilizadas pelo paciente. Deve
zo devem ser suspensas.
ser incluído o uso de medicações sem
prescrição, álcool, tabaco e drogas
ilícitas. Ao manejar tais medicações, Beta-bloqueadores:Sua interrup -
deve-se lembrar que medicações cuja ção abrupta pode levar a taquicardia
interrupção abrupta seja sabidamen- reflexa e hipertensão. Há indicações
te mórbida devem ser mantidas e que para sua introdução no período pré-
alterações fisiológicas decorrentes do -operatório para proteção cardiovas-
estresse cirúrgico podem modificar o cular. Recomenda-se manter o uso,
metabolismo de drogas. inclusive no dia da cirurgia. Deve-se

72
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 73

considerar sua substituição por agen- no dia da cirurgia. Podem ser subs-
tes EV (p. ex., metoprolol, propranolol) tituídos por agentes EV somente se
em caso de jejum prolongado. houver indicação por complicações
como hipertensão ou arritmias.
Inibidores da enzima converso -
ra da angiotensina e bloqueado - Diuréticos:Sua manutenção está
res do receptor de angiotensina lI: associada a risco de: hipovolemia,
Sua manutenção está associada a hipotensão (depleção do volume in-
risco de: hipotensão (pelo bloqueio travascular pode potencializar efeito
da resposta do sistema renina-an - hipotensor de anestésicos) e hipopo-
giotensina-aldosterona à perda volê- tassemia. Recomenda-se manter o
mica), deterioração da função renal e uso e suspendê-lo no dia da cirurgia.
hiperpotassemia. Podem ser utilizados EV para manejo
A suspensão do uso, por sua vez, é de hipervolemia e congestão no perí-
associada à hipertensão no pós-ope- odo perioperatório.
ratório. Recomenda-se manter o uso,
inclusive no dia da cirurgia, se a indi- Alfa-2-agonistas:Sua suspensão
cação for por hipertensão. Se a indi- pode levar a hipertensão grave e is-
cação for por insuficiência cardíaca e quemia miocárdica. Há benefício com
PA basal for baixa, deve-se suspen- o seu uso por conta de suas proprie-
der o uso no dia da cirurgia. Pode-se dades analgésicas, sedativas e ansio-
considerar trocar por agente de meia- líticas, como adjuvantes. Recomen -
-vida mais curta, como captopril, para da-se manter o uso, inclusive no dia
facilitar o manejo pós-operatório. da cirurgia.

Bloqueadores dos canais de cál- Estatinas: Sua manutenção aumen -


cio:Sua associação com aumento de ta o risco de miopatia. Há indicações
sangramentos e anemia é controver- para introdução de estatinas no perí-
sa. Interrupção abrupta do uso mos- odo pré-operatório para proteção car-
trou risco de vasoespasmo em es - diovascular. Recomenda-se manter o
tudo de cirurgia de revascularização uso, inclusive no dia da cirurgia.
miocárdica.
Outros hipolipemiantes, como niacina
Estudos em cirurgia não cardíaca e fibratos podem causar rabdomióli-
mostraram diminuição de arritmias se. Recomenda-se suspender o uso
atriais e isquemia com o seu uso. Re- dessas drogas no dia da cirurgia e re-
comenda-se manter o uso, inclusive tomá-lo no retorno à dieta oral.

73
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 74

Controle glicêmico perioperatôrio situações em que haja risco de hipo-


perfusão tecidual, as tiazolinedionas
Os portadores de diabetes devem
aumentam o edema e podem precipi-
ser preferencialmente operados no
tar insuficiência cardíaca, e os inibido-
1° horário do dia, especialmente os
res de DPP-IV e análogos de GLP-1
usuários de insulina. Hipoglicemias
alteram a motilidade gastrointestinal.
e variabilidade glicêmica devem ser
evitadas.
A glicemia capilar deve ser monito- Insulinas:No caso de insulinas NPH,
rizada a cada 6 horas em pacientes detemir e glargina, a dose noturna
usuários de hipoglicemiantes VO e a pode ser mantida. Na manhã da ci-
cada 4 horas em usuários de insulina. rurgia, deve-se administrar:
O objetivo é manter glicemias de 100 • 2/3 da dose da insulina NPH ou
- 180 mg/dL (ao redor de 140 mg/dL). lenta se for operar no 1° horário;
Em pacientes usuários de medicações
• 1/2 da dose da insulina NPH ou
VO com Hb glicada (HbA1c) ≥ 9%,
lenta se for operar pela manhã;
deve-se considerar adiar a cirurgia ou
controlar de forma breve com insulina. • 1/3 da dose da insulina NPH ou
O ajuste ou a introdução de medica- lenta se for operar à tarde.
ções VO não são indicados para o rápi-
do controle glicêmico intra-hospitalar.
A insulina rápida ou ultrarrápida deve
As medicações VO têm lento início de
ter as doses prandiais fixas suspen-
ação, além de possuir limitações para
sas, e o esquema escalonado é manti-
alguns pacientes, como portadores de
do enquanto o paciente estiver em je-
insuficiência cardíaca e/ou insuficiên-
jum, conforme a HGT. Para o esquema
cia renal. A melhor forma de fazê-lo
escalonado em jejum, sugerem-se:
é por meio da insulinização em diver-
sos esquemas (insulina basal-prandial • 141-180 mg/dL: 1 UI;
com correção de glicemias).
• 181-200 mg/dL: 2 UI;
• 201-250 mg/dL: 3 UI;
Antidiabéticos orais: Medicações
antidiabéticas VO e injetáveis que • 251-300 mg/dl: 4 UI;
não a insulina (p. ex., exenatida) de- • 301-350 mg/dL: 6 UI;
vem ser mantidas até a véspera da ci-
rurgia, com suspensão na manhã da • 351·400 mg/dL: 8 UI;
cirurgia, uma vez que as sulfoniureias • 401 mg/dL: Considerar o uso de
aumentam o risco de hlpoglicemia, insulina EV em bomba ou adiar a
a metformina é contraindicada em cirurgia eletiva até melhor controle.

74
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 75

Em casos com glicemia < 100 mg/dL, glicose hipertônica a 25%, EV; ins -
deve-se instalar aporte de glicose de talar aporte de glicose em 5-10 g/h
5-10 g/h (p. ex., 100 mL/h de SG5%) (preferir 10 g/h); e repetir glicemia ca-
ou introduzir aporte de glicose de pilar a cada 15 minutos até glicemia
75-125 mL/h de SG 5% no início do > 80mg/dL.
jejum com uso de insulina conforme A Tabela 8 resume como deve ser o
glicemia capilar. manejo de alguns medicamentos no
Em casos de glicemia < 70 mg/dL, pré-operatório.
deve-se administrar bolusde 60 mL

DROGAS TEMPO DROGAS TEMPO

AAS* 7 dias ACO Não interromper


Drogas para doença
Clopidogrel** 7 dias Não interromper
psiquiátrica
Ticlopidina** 14 dias Colírios Usar no dia
Warfarina 4 dias Drogas para DRGE Não interromper
Betabloqueadores Não interromper Drogas para Asma Não interromper
iECA e BRA Individualizar Corticóides Não interromper
Diuréticcos Interromper no dia Medicamentos tópicos Interromper no dia
Hipoglicemiantes orais Interromper no dia Sildenafil ou similares Interromper 24h antes
Estatinas Não interromper Inibidores da COX-2 Não interromper
Digoxina Não interromper AINE’s (Não-seletivos) Interromper 48h antes
Drogas para doença
Não interromper Inibidores da MAO Não interromper ***
tireoideana
* Continuar se os riscos de eventos cardíacos forem maiores que de sangramento, como, por exemplo, pacientes com
doença coronariana ou cerebrovascular importante.
** Vide recomendações específicas na Tabela 4 no caso de portadores de stent.
*** Selecionar drogas anestésicas com cuidado pelo risco de síndrome serotoninérgica maligna.
Tabela 8. Drogas e tempo de suspensão antes do procedimento. Fonte: Carvalho (2016)

4. CLASSIFICAÇÃO DAS o procedimento cirúrgico. O tipo de


CIRURGIAS E USO DE procedimento (Tabela 9) é útil na de-
ANTIBIOTICOPROFILAXIA cisão do espectro de antibiótico ade-
quado e deve ser considerado antes
A profilaxia antibiótica adequada em da prescrição ou administração de
cirurgia depende dos patógenos mais
qualquer medicação pré-operatória.
comumente encontrados durante

75
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 76

A profilaxia antibiótica perioperatória,


geralmente, não deve ser continuada
além do dia da operação.

TAXA DE
CLASSIFICAÇÃO CARACTERÍSTICAS
INFECÇÃO
Não traumática
Sem inflamação
Limpas (Classe I) Sem quebra na técnica 2,10%

Trato respiratório, digestório ou geniturinário não abordados

Limpa-contamina- Trato gastrointestinal ou respiratório abordado sem danos


3,30%
das (Classe II) significativos
Grande quebra da técnica
Grande dano do trato gastrointestinal
Contaminadas
Ferida traumática, fresca 6,40%
(Classe III)
Entrada dos tratos geniturinário ou biliar na presença de urina ou
bile infectada
Inflamação bacteriana aguda, sem pus
Secção de tecido “limpo” a fim de ter acesso cirúrgico para a coleta
Sujas e infectadas de pus
7,10%
(Classe IV) Ferida traumática com tecido desvitalizado retido, corpos estranhos,
contaminação fecal ou tratamento tardio, ou todos estes, ou de uma
fonte suja
Tabela 9. Classificação das Feridas Operatórias e Taxas de Infecção da Ferida. Fonte: Townsend (2014)

Geralmente, antibióticos profiláticos Os pacientes submetidos a procedi -


não são necessários para casos de mentos de classe II se beneficiam de
feridas limpas (classe I), exceto quan- uma única dose do antibiótico apro -
do há implante de próteses de longa priado administrado anteriormente à
permanência ou quando há osteoto- incisão da pele. Em geral utiliza-se a ce-
mia. No caso de procedimentos vide- fazolina para os casos abdominais (he-
olaparoscópicos classe I, pode haver patobiliar, pancreático, gastroduode -
indicação de profilaxia antibiótica nos nal). Casos com feridas contaminadas
casos que resultam na colocação de (classe III) requerem preparo mecânico
um enxerto protético (i.e., tela), como ou antibióticos parenterais com ativi -
em uma herniorrafia laparoscópica. dade tanto aeróbica quanto anaeróbi-
ca. Esta abordagem deve ser seguida

76
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 77

tanto nos casos de cirurgia abdominal ser considerada. O uso de ceftriaxo-


de emergência, como na suspeita de na deve ser limitado a pacientes que
apendicite e em casos de trauma. necessitam de tratamento antimicro-
Casos com feridas sujas ou infecta- biano para colecistite aguda ou infec-
das geralmente requerem o mesmo ções agudas do trato biliar e não a ca-
espectro de antibióticos, que podem sos de cólica biliar ou discinesia sem
ser continuados no período pós-ope- infecção.
ratório nos quadros de infecção per- Os fatores que indicam um alto risco
sistente ou tratamento tardio. de complicações infecciosas na co -
O antibiótico apropriado deve ser es- lecistectomia laparoscópica incluem
colhido anteriormente à operação e procedimentos de emergência, dia -
administrado 60 min antes que seja betes, duração de longo procedi -
feita a incisão na pele (120 minutos mento, ruptura intra-operatória da
para vancomicina ou fluoroquinolo - vesícula biliar, idade superior a 70
nas). Se um agente com meia-vida cur- anos e conversão de colecistectomia
ta for usado (por exemplo, cefazolina, laparoscópica em aberta. É razoável
cefoxitina), ele deverá ser novamente administrar uma dose única de pro-
administrado se a duração do proce- filaxia antimicrobiana a todos os pa-
dimento exceder o intervalo de tempo cientes submetidos à colecistectomia
de readministração recomendado (a laparoscópica.
partir do início da dose pré-operató- A profilaxia não é rotineiramente in-
ria). A readministração também pode dicada para procedimentos braquio-
ser necessária se ocorrer sangramen- cefálicos. Embora não haja dados
to prolongado ou excessivo ou se hou- para apoiá-lo, pacientes submetidos
ver outros fatores que podem reduzir a procedimentos braquiocefálicos
a meia-vida do agente profilático (por envolvendo próteses vasculares ou
exemplo, queimaduras extensas). Po- implante de adesivo (por exemplo,
rém, vale lembrar que a função renal endarterectomia de carótida) podem
do paciente pode alterar a posologia se beneficiar da profilaxia. Essas dire-
de administração do antibiótico. trizes refletem recomendações para
Para pacientes com colonização por profilaxia antibiótica perioperatória
Staphylococcus aureus resistente à para prevenir infecções de sítio cirúr-
meticilina, é razoável adicionar uma gico e não fornecem recomendações
dose única pré-operatória de vanco- para prevenção de infecções opor -
micina ao esquema recomendado. tunistas em pacientes transplanta -
Com um trato biliar infectado, cober- dos imunossuprimidos (por exemplo,
tura antimicrobiana adicional deve para medicamentos antifúngicos ou
antivirais).

77
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI

TP/TTPa HMG Cr

GJ ECG RX de
Tórax

Na e K > 40 ANOS HM

TP/TTPa < 40 ANOS TP/TT

HMG PACIENTES SEM HISTÓRIA


COMORBIDADES SANGRAME
ECG

Cr
DIABÉTICOS

GJ

ECG AVALIAÇÃO
OBESIDADES
OPERATÓ
GJ

ECG HAS, DRC e/ou IC

Cr

Na e K HEPATOPATA DPOC

BT e
Cr frações RX de Tó

TP/TTPa ALBUMINA

HMG

78
AVLIÇÃOPRÉ-EATÓI 79

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Carvalho AM et al. Protocolo de Avaliação Pré-Anestésica da Maternidade Escola Assis
Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará. 2016.
Cohn SL et al. Evaluation of Cardiac Risk Prior to Noncardiac Surgery. UpToDate, 2020.
Martins MA et al. Manual do Residente de Clínica Médica. 1. ed., Barueri, SP: Manole, 2015.
Townsend CM et al. Sabiston Tratado de Cirurgia: A Base Biológica da Prática Cirúrgica Mo-
derna. 19. ed. Saunders - Elsevier, 2014.

79
SUTURAS

80
SUMÁRIO
1. Introdução ................................................................................................... 82
2. Fases Da Cicatrização ............................................................................ 84
3. Materiais De Sutura ................................................................................ 86
4. Suturas ......................................................................................................... 93
5. Cuidados Pós-Sutura .......................................................................... 102
Referências Bibliográficas ..................................................................... 104

81
SUTRAS 82

1. INTRODUÇÃO Henri de Mondeville, cirurgião que


preconizou que as feridas limpas ci-
A sutura constitui a aproximação das catrizam melhor, dessa maneira não
bordas de tecidos lesionados ou sec-
deveriam ser usados unguentos e
cionados. Tem como propósito a ma-
bálsamos, os corpos estranhos deve-
nutenção de uma correta contigui-
riam ser removidos e o sangramento
dade dos tecidos, visando orientar e cessado. Recomendava ainda curati-
facilitar as fases iniciais do processo
vos com compressas embebidas em
de cicatrização, ao mesmo tempo em
vinho quente.
que fornece uma força tênsil neces-
sária à união destes tecidos, até que Apenas no século XVI, Ambroise Paré
este processo se conclua. A aproxi- (1510-1590), considerado o funda-
mação das bordas dos tecidos res- dor da ortopedia, modificou o trata-
secados ou seccionados deve ser mento das feridas que, até então, ain-
mantida utilizando-se materiais que da eram cauterizadas com ferro em
resistam às trações e tensões que brasa e óleo fervente, substituindo
podem ser exercidas sobre a ferida. a cauterização por sutura com fios.
Paré desempenhou o principal papel
Os primeiros relatos que se tem dos
no revigoramento e na atualização da
procedimentos realizados para fecha-
cirurgia da Renascença, e representa
mento de feridas são do Egito antigo,
o corte do vínculo remanescente en-
por volta do ano 1100 a.C. Durante a tre as técnicas e o pensamento cirúr-
idade média um cirurgião conhecido
gico dos antigos e o impulso em dire-
como Albucasis (930-1013), nascido
ção a eras mais modernas.
na Espanha, escreveu o primeiro livro
ilustrado de cirurgia, introduzindo o No entanto, o uso dos fios se fazia de
uso do ferro em brasa para cauteriza- forma não asséptica, o que trazia uma
ção de feridas, o qual teve grande in- eminente chance de infecções e com-
fluência sobre os cirurgiões da época, plicações no sítio da ferida. Dessa
que usaram essa técnica por séculos. maneira, um importante nome a ser
citado é de Joseph Lister, um cirurgião
No século XIII, dois cirurgiões italia- inglês, que realizou monumentais es-
nos - Guglielmo Salicetti e seu aluno forços para introduzir a antissepsia
Guido Lanfranchi - abordaram em seu
sistemática, com base científica, no
livro Chirurgia Magna (1296), temas
tratamento de ferimentos e na reali-
como sutura de nervos e recomenda- zação de operações.
vam a sutura intestinal.
Por volta de 1865, Lister instilava
Já no fim do século XIII e início do ácido carbólico puro em feridas e so-
século XIV, as escolas francesas ga-
bre curativos, e também no ambiente
nham prestígio e há o destaque de

82
SUTRAS 83

em torno do campo operatório e da disponibilidade da esterilização levou


mesa. Além disso, um de seus prin- ao desenvolvimento de aventais, len-
cipais avanços foi o desenvolvimen- çóis, instrumentos e suturas estéreis.
to de suturas absorvíveis estéreis. Da mesma maneira, o uso de más-
Ele acreditava que grande parte da caras, gorros, luvas e jalecos opera-
supuração profunda encontrada em tórios também evoluiu naturalmente,
ferimentos era criada por ligaduras sendo que apenas em meados de
de seda previamente contaminadas. 1890 houve a uniformização destas
Lister desenvolveu uma sutura com técnicas em todas os procedimentos
categute carbolizado, que era melhor cirúrgicos realizados.
do que qualquer outra anteriormente Durante a Primeira Guerra Mundial
produzida. muitos avanços foram feitos em múl-
As técnicas de antissepsia defendidas tiplas áreas da cirurgia. Sem dúvida, o
pos Lister levaram certo tempo para maior feito cirúrgico foi no tratamento
serem aceitas e disseminadas, sendo de infecção de feridas. Os cirurgiões
os alemães os primeiros a entende - fizeram experimentos com nume -
rem a importância da bacteriologia e rosas soluções antissépticas e vá-
da teoria do germe. Como consequ- rios tipos de curativos cirúrgicos. Um
ência, foram os primeiros a expandir princípio de tratamento de ferimentos
a teoria de Lister sobre antissepsia, com base em desbridamento e irriga-
mas descartando seu spray em favor ção acabou evoluindo.
da fervura e do uso da autoclave. A

83
SUTRAS 84

MAPA MENTAL: INTRODUÇÃO E HISTÓRICO DAS SUTURAS

SUTURAS: aproximação das bordas de


tecidos lesionados ou seccionados

Egito Antigo

Primeiros relatos de fechamento de feridas

Século VIII

Albucasis introduz o uso de ferro em brasa


para cauterização de feridas

Século XIII

Guglielmo Salicetti e Guido Lanfranchi abordam o


tema sutura em seu livro Chirurgia Magna

Século XIV

Mondeville preconiza a limpeza das feridas para melhor


cicatrização

Século XVI

Ambroise Paré substitui a cauterização por sutura com fios

Século XIX

Joseph Lister desenvolve suturas absorvíveis estéreis

2. FASES DA (proliferativa) e fase de maturação (ou


CICATRIZAÇÃO de remodelamento).
O processo de cicatrização corres- A fase inflamatóriacaracteriza a re -
ponde a uma cascata de eventos ação imediata do tecido à lesão, na
que culminam com a reconstituição qual ocorre hemostasia e inflamação.
tecidual. Pode ser dividido em três Esta fase representa a tentativa de
etapas: inflamatória, regenerativa limitar o dano mediante parada do

84
SUTRAS 85

sangramento, selamento da superfí- de granulação e gerando intensa de-


cie da ferida e remoção de qualquer posição de colágeno, fibronectica e
tecido necrótico, resíduos estranhos àcido hialurônico, conferindo à ferida
ou bactérias presentes. Apresenta um rápido ganho de força tênsil. No
maior permeabilidade vascular, mi- entanto, ainda é necessária uma re -
gração de células para a ferida por sistência suplementar, mantida pelos
quimiotaxia, secreção de citocinas e materiais da sutura.
fatores de crescimento. Logo que se A fase de maturação, que tem início
completa a síntese da ferida, poucas no décimo quarto dia, se caracteriza
horas após a aproximação de suas por uma constante remodelação do
bordas, já ocorre um vedamento des- tecido conjuntivo. Neste instante, a
ta por um coágulo de fibrina, consti- ferida apresenta aproximadamente
tuindo uma barreira protetora contra 10% da resistência de um tecido sa-
a entrada de agentes infecciosos. dio, o que já é o suficiente para ga-
Ocorrerá então um acúmulo de poli- rantir uma sustentação. A partir de
morfonucleares, llinfócitos e monóci- então, a ferida começa a sofrer um
tos, estendendo-se até o quinto dia. processo contínuo de remodelação e
A partir do quinto dia, à medida que moldagem que culmina em ganho de
as respostas agudas de hemostasia força tênsil, evoluindo progressiva-
e inflamação começam a desapare- mente por até 2 anos.
cer, a estrutura da malha aguarda o
reparo da ferida por meio da angiogê-
SE LIGA! Após as considerações sobre
nese, fibroplasia e epitelialização. Dá- as fases da cicatrização se torna mais fá-
-se então início a fase proliferativa, cil entender a necessidade de utilização
também chamada de fase de granu- de materiais de sutura que mantenham
lação, na qual a ferida passa a ser po- forsa tênsil por um período adequado de
acordo com cada tecido.
voada por fibroblastos, macrófagos e
mononucleares, formando o tecido

85
SUTRAS 86

MAPA MENTAL: FASES DA CICATRIZAÇÃO

1. Hemostasia

Fase Inflamatória

2. Quimiotaxia

3. Migração epitelial

Fase Proliferativa 4. Granulação

5. Maturação

6. Contração

Fase de Maturação 7. Cicatriz

8. Remodelamento da cicatriz

3. MATERIAIS DE SUTURA A escolha dos fios deve basear-se


em critério objetivos como biocom-
Fios
patibilidade, força tênsil, elasticidade,
Para que o procedimento de sutura sítio anatômico a ser suturado, tensão
realizado seja bem-sucedido é neces- à qual será submetida a sutura, idade
sário fazer uma boa escolha em rela- do paciente e grau de contaminação
ção ao fio a ser utilizado, uma vez que da ferida, dentre outros.
eles serão os responsáveis pela jun- As principais características de um
ção dos tecidos que sofreram lesão fio de sutura idealsão demonstra-
ou diérese.. Dessa forma, o conheci- das no quadro a seguir:
mento das propriedades dos fios e da
região que será suturada é muito im-
portante para uma boa cicatrização.

86
SUTRAS 87

Ter adequada força tênsil e


Baixa reatividade tecidual Fácil manuseio
mantê-la por tempo suficiente

Maleável Bem visível Fácil esterilização

Não permitir crescimento


Resistente a trações Baixo custo
bacteriano

Figura 1.Características de um fio ideal.

modo, podem ser definidos como


SE LIGA! Na realidade o fio ideal não fios que apresentam maior força
existe, uma vez que nenhum fio de su- tênsil e durabilidade maior que 60
tura existente contempla todas estas dias. É importante salientar que ao
características desejáveis, no entanto,
longo do tempo estes fios também
seguindo estas premissas podemos re-
alizar a escolha do fio que melhor se en- se desintegram, contudo, quando
quadra em cada situação. comparados aos fios absorvíveis,
sua durabilidade é maior.
Propriedades dos Fios • Configuração:Os fios podem ser
monofilamentaresou multifila-
• Absorção: Os fios são classifica-
mentares. Fios monofilamentares
dos em absorvíveise inabsor-
possuem apenas um filamento e,
víveis. Os fios absorvíveis são
por este motivo, são menos male-
aqueles que, ao passarem por pro-
áveis e possuem maior memória, o
cessos de fagocitose, hidrólise ou
que torna mais difícil o seu manu -
reações de proteólise, se desin-
seio e diminui a segurança de seus
tegram e não deixam resíduos no
nós. No entanto, têm como vanta-
organismo. Também podem ser
gem o fato de causarem menos le-
definidos como fios que perdem
sões durante sua passagem pelos
rapidamente sua força tênsil, de
tecidos. Já os fios multifilamentares
modo que se mantêm aproxima-
possuem vários filamentos trança-
damente 60 dias sem perder suas
dos ou torcidos entre si, conferindo
características.
maior flexibilidade, porém causam
• Os fios inabsorvíveis permane - maiores traumas ao tecido e pos-
cem um tempo maior em contato sibilitam maior adesão bacteriana
com o organismo humano e, desse entre seus filamentos (Fig. 1).

87
SUTRAS 88

Figura 2. Configuração dos fios de sutura. Adaptada de: Bioline Fios Cirúrgicos Ltda.

• Origem:Os fios podem ter origem tensão e retornar ao seu compri-


biológica(animal ou vegetal) ou mento habitual após o fim desta.
sintética. Os primeiros materiais
• Memória:É definida como a capa -
utilizados nas sínteses cirúrgicas
cidade do fio em retornar a sua for-
eram de origem biológica, contudo,
ma original após ser manipulado.
devido a seu alto custo de produção
É uma propriedade não desejada
e à intensa reação inflamatória que
nos fios de sutura, uma vez que
podem desencadear, atualmente
permite que os nós se desfaçam
vêm sendo amplamente substitui-
com mais facilidade.
dos pelos fios sintéticos, que provo-
cam menos reatividade tecidual e • Coeficiente de fricção:É a capa-
podem ser manipulados de acordo cidade que o fio apresenta de des-
com as necessidades que o fabri- lizar através do tecido e dos nós.
cante acredita serem convenientes. • Segurança dos nós:Está intima-
• Força Tênsil:Termo utilizado para mente relacionada ao coeficiente
definir a força necessária para que de fricção de um fio. Fios com bai-
o fio sofra algum rompimento. Ao xo coeficiente de fricção, como os
escolhermos um fio de sutura, de- monofilamentares, afrouxam com
vemos ter em mente que a sua mais facilidade. Estudos apontam
força tênsil não deve ser menor ou que o nó é a região mais frágil de
maior que à do tecido no qual será uma sutura, sendo assim, um fio
utilizado, deverá ser equivalente. precisa ter uma força tênsil e um
coeficiente de fricção adequados
• Elasticidade:É a capacidade de
para não sofrer deslizamentos que
um fio se alongar quando está sob
possam desfazer o nó.

88
SUTRAS 89

• Reação tecidual:A ocorrência de da ferida, a técnica de sutura e os


um processo inflamatório é a fase materiais utilizados. Como dito an-
inicial da cicatrização, como visto teriormente, os fios multifilamen -
anteriormente. Determinados tipos tares permitem maior penetração
de fios de sutura podem induzir a bacteriana no interior da trama de
exacerbação desta resposta infla - seus filamentos. Estudos também
matória, o que pode culminar em demonstraram que reações enzi-
anormalidades da cicatrização. Os máticas envolvidas na absorção
fios monofilamentares inabsorví - dos fios, principalmente nos de ori-
veis são os que desencadeiam me- gem biológica, aumentam a adesi-
nor resposta inflamatória. Já entre vidade bacteriana.
os fios absorvíveis, os de origem
• Diâmetro/Calibre do fio: Os fios
biológica são os que desencadeiam
apresentam diâmetros ou calibres
maior reação tecidual, sendo que
variados expressos em número
esta atinge seu pico máximo no sé-
de zeros (#-0), por exemplo 2-0
timo dia após a realização da sutura.
(dois-zeros) ou 6-0 (seis-zeros).
• Crescimento bacteriano:A infec- O número de zeros corresponde a
ção constitui a complicação mais um diâmetro capaz de determinar
frequente nas suturas e seu surgi- a resistência tênsil. Quanto maior o
mento depende de algumas variá- número de zeros, mais fino é o fio
veis como o grau de contaminação (Fig. 2).

Figura 3. Numeração dos fios de sutura segundo o diâmetro.

• Visibilidade em campo cirúrgico: • Custo:É importante que olhemos


É importante que os fios tenham o custo dos fios, contudo o mais
alguma coloração para que haja importante é adequar o fio ao pro-
maior visibilidade no campo cirúr - cesso cirúrgico que será realizado.
gico. Desse modo é adequado que Abaixo podem ser vistos os principais
os fios não sejam transparentes ou fios de sutura utilizados na prática ci-
vermelhos, uma vez que podem ser rúrgica relacionados com suas res-
perdidos na presença de sangue. pectivas propriedades.

89
SUTRAS 90

FIOS INABSORVÍVEIS

Seda Algodão Nylon Aço inox Prolene

Origem Biológica Biológica Sintética Sintético Sintético

Multifilamen-
Mono ou multifilamen-
Configuração tar, trançado e Multifilamentar Monofilamentar Monofilamentar
tar trançado
revestido
Perde 50% em Perde 50% em
Força Tênsil Perde 11% em um ano Elevada Elevada
um ano seis meses
Maleabilidade Alta Alta Baixa Baixa Baixa

Segurança do
Alta Alta Baixa Alta Baixa

Reação Tecidual Intensa Intensa Mínima Ausente Mínima

Tecidos em
geral, incluindo Tecidos em Áreas de grande
Indicações gerais Suturas vascu-
cardiovascu- geral, incluindo tensão e cicatriza-
Indicação sendo mais usado em lares ou mesmo
lares, oftal- gastrointesti- ção lenta, como o
suturas de pele hernioplastia
mológicos e nal e pele esterno e tendões
neurológicos

FIOS ABSORVÍVEIS
Ác.
Categute Vicryl PDS Monocryl
Poliglicólico

Origem Biológica Sintética Sintética Sintética Sintética

Multifilamentar
Configuração Multifilamentar Multifilamentar trançado Monofilamentar Monofilamentar
torcido
Mantém 60%
Mantém 75% Mantém 50% ao
Mantém por 7 a no sétimo dia Mantém 50% entre o 25°
Força Tênsil após duas final da primeira
10 dias e 50% no 25° e 30° dias.
semanas semana
dia

Maleabilidade Baixa Alta Alta Baixa Alta

Segurança do
Boa Alta Alta Baixa Alta

Reação Tecidual Intensa Mínima Mínima Mínima Mínima

Sínteses em ge- Procedimentos


Indicações Suturas de múscu-
ral sem necessi- pediátricos e Suturas
Indicação gerais em los, aponeuroses e até
dade de retirada cardiovascu - intradérmicas
cirurgias mucosas
do fio lares

90
SUTRAS

MAPA MENTAL: CARACTER

Capacidade do
retornar a sua form
após ser manip
Absorvíveis

Inabsorvíveis Memória

Absorção
Força necessária
para que o fio sofra
algum rompimento Força Tênsil

Capacidade do fio se Elasticidade


alongar quando está
sob tensão e retornar
ao seu comprimento Reação tecidual
habitual ao fim desta

Diâmetro

Origem Vi
Quanto maior o número de
zeros, menor o diâmetro do fio
Biológica: animal ou vegetal

Sintética

91
SUTRAS 92

Agulhas triangulares (cortantes) ouespa-


tuladas. Seu corpo varia entre retan-
As agulhas são o principal agente
gular, redondo e espatulado, fazendo
traumático em suturas, tem por fun-
uma transição entra a ponta e a in-
ção promover a passagem do fio pelo
serção do fio. Agulhas cortantes fa-
tecido com o menor trauma possível.
cilitam a técnica cirúrgica em tecidos
Dividem-se em fundo ou olho (região
resistentes, como a derme, por exem-
em contato com o fio), corpo e pon-
plo. Porém, tecidos nobres como fí-
ta. Podem ser classificadas em trau-
gado ou córnea podem exigir menos
máticase atraumáticas. As agulhas
trauma local, sendo indicada a utili-
antigas que necessitavam da inser -
zação de agulhas rombas e espatu-
ção do fio eram mais traumáticas por
ladas nesses tecidos (Fig. 3). Quanto
terem sua extremidade distal alarga-
ao seu formato, podem ser retasou
da e estão em desuso, já as agulhas
circulares. As circulares têm curvatu-
acopladas ao fio tem um amplo uso
ra relacionada à fração de um círculo
na atualidade e causam um trauma
(1/4, 3/8, ½, 5/8). Diferentes curvatu-
necessário apenas para a passagem
ras facilitam determinado movimento
do fio.
durante sua utilização (Fig. 4).
Além disso as agulhas também po -
dem ser classificadas em cilíndricas,

Corpo Corpo Corpo

Ponta

Ponta
Ponta
Cilíndrica Cortante com corte reverso Ponta cortante e corpo cilíndrico

Corpo Corpo Corpo

Ponta Ponta Ponta


Cortante com ponta de precisão Ponta romba e corpo cilíndrico Microponta em espátula

Figura 4. Principais agulhas cirúrgicas disponíveis. Fonte: SAVASSI. Cirurgia Ambulatorial, 1999.

92
SUTRAS 93

Reta 1/4 círcul o 1/8 círcul o 1/2 círcul o 5/8 círcul o

Figura 5. Formatos e curvaturas das agulhas cirúrgicas. Fonte: Bioline Fios Cirúrgicos Ltda.

MAPA MENTAL: CARACTERÍSTICAS DAS AGULHAS

Triangulares x Cilíndricas Traumáticas x


x Espatuladas Atraumáticas

Retas x Circulares

4. SUTURAS abaixo dessa, estejam eles adequa-


damente tratados ou não. E associado
Todas as suturas promovem em maior
aos anteriores, há o efeito hemostá-
ou menor grau três efeitos básicos
ticoda sutura, decorrente da tensão
nos tecidos vivos onde são aplicadas.
dos pontos, da aproximação dos teci-
Há o efeito de síntese(aproximação),
dos e do recobrimento dos planos. A
em que a tensão da sutura terá o efei-
interação apropriada desses efeitos,
to de propiciar a cicatrização primária
resultando em tratamento adequado
da ferida. Secundariamente, ocorrerá das feridas, dependerá do material a
o recobrimento das estruturasem
ser utilizado e da correta técnica ci-
planos anatômicos imediatamente
rúrgica a ser empregada.

93
SUTRAS 94

As suturas podem ser classificadas corretamente; a escolha do material


quanto: 1) à permanência, em absor- adequado(instrumental, fios, agu -
víveis (temporárias) ou inabsorví- lhas) contribui substancialmente para
veis (permanentes); 2) à técnica, em o sucesso do procedimento. Deve-se
sutura descontínuaou sutura con- escolher o instrumental mais delica-
tínua; 3) aos planos, em planos se- do possível para cada tipo de sutura,
paradosou planos conjuntos; 4) à porém que cumpra sua utilidade de
posição das bordas, em coaptante, maneira eficaz.
eversante ouinversante . Além disso, deve ser observado o
tipo de ferida,e se há ou não pos-
Condições para uma Boa Sutura sibilidade de suturá-la, considerando
o tamanho e a gravidade da lesão, e
Algumas condições contribuem para o risco de infecção. Nem toda lesão
o sucesso do procedimento de sutu- é passível de sutura imediata, muitas
ra dos tecidos: lavagemcom solução vezes será necessário lançar mão do
salina para retirada de corpos estra- uso de retalhos, por exemplo, ou rea-
nhos; a antissepsiaao redor da lesão lizar profilaxias infecciosas.
evitará a deiscência da sutura devido
a processos infecciosos; apresen-
tação adequada das bordasda fe - Técnica Anestésica Ideal
rida permite uma sutura sem irregu- Dependendo da intervenção pro -
laridades ou falhas de aproximaçã; posta e do local, podem ser usadas
a hemostasiaprévia diminui a pos- diferentes técnicas de anestesia lo -
sibilidade de infecções e infiltração cal para a obtenção da analgesia.
dos tecidos, além de evitar a perda No caso da realização de suturas, o
da sutura por formação de coleções anestésico geralmente utilizado é a
(hematomas); a ausência de tensão lidocaína com vasoconstritor em ex-
entre as bordas, por aproximação de tremidades proximais (ex: couro ca-
planos profundos, quando necessá- beludo) e sem vasoconstritor em
rio, evita deiscências por erro técni- extremidades distais (ex: dedos). A
co e propicia cicatrizes com melhor técnica mais adequada é o bloqueio
qualidade; evitar espaços mortos e de campo, no qual a infiltração local
remover corpos estranhosou teci- de anestésico é realizada delimitan-
dos desvitalizados previne compli- do uma área circunscrita em torno da
cações e necessidade de reinterven- lesão a ser tratada. Essa delimitação
ções; anestesialocal diminuirá a dor deve ser realizada através da infiltra-
e tratá mais conforto para o pacien- ção em botões anestésicos em pelo
te, permitindo a realização da técnica menos dois pontos opostos. Deve-se

94
SUTRAS 95

introduzir a agulha obliquamente até Técnica de Sutura


os planos mais profundos repeitando
Existem, cinco pré-requisitos que de-
a área circunscrita. Aspira-se a serin-
vem ser respeitados para que se te -
ga previamente à administração do
nha uma sutura ideal:
anestésico local para verificar se há
retorno de sangue e se certificar que
o anestésico não está sendo injetado
na corrente sanguínea.

Simetria entre um ponto e outro


Não permitir que as bordas
Realizar tração adequada e entre o ponto e a borda da
fiquem sob tensão
ferida

Evitar nós sobre a ferida Fios e agulhas adequados

Para o correto posicionamento e a realizada em um único tempo ou em


utilização da agulha e porta-agulha dois tempos de uma borda a outra.
dividimos, mentalmente, a agulha
curva em terços. Na utilização usual,
a agulha está posicionada em 90º em Suturas Descontínuas
relação ao porta-agulhas, sob preen- Ponto Simples Separado: é a técni-
são na ponta do mesmo e com sua ca mais utilizada, pois é fácil e rápida.
ponta orientada para a palma da mão É o ponto ideal para uma aproxima-
do cirurgião. A transfixação dos te - ção correta das bordas de uma ferida.
cidos deve ser realizada com a pon- Utiliza-se agulha curva, portanto sua
ta da agulha mantendo contato em introdução na pele deve acompanhar
90º com a superfície, podendo ser seu círculo (Fig. 5).

95
SUTRAS 96

Figura 6. Ponto simples de pele. A e B: maneira correta de se dar o ponto. C: compensação no caso de bordas de
diferentes espessuras.Fonte: SAVASSI. Cirurgia Ambulatorial, 1999.

96
SUTRAS 97

Ponto Donati (“longe-longe, per -


to-perto”):Permite aproximação
uniforme das bordas mesmo quando
for uma incisão incorreta ou quando
as bordas forem irregulares, apesar
de ter uma execução mais trabalho -
sa. Ele começa de forma semelhante
ao ponto simples, mas uma vez com-
pletado o ponto simples a agulha é
voltada no sentido do início do pon-
to, pegando uma pequena porção de
derme e epiderme, dos dois lados da
ferida, de tal forma que, quando o nó
é atado, as bordas serão suspensas
(Fig. 6).
Figura 7. Ponto Donati. Fonte: SAVASSI. Cirurgia Am-
bulatorial, 1999.

Ponto em X: Utilizada em regiões contrária à inicial. Ao final, para finali-


com grandes resistências submetidas zar a sutura, o fio é passado em mes-
à tensão. O fio é passado em um lado mo nível ao inicial, em borda oposta
da incisão e, após, a um nível abaixo (Fig. 7).
nas duas bordas, iniciando pela borda

Figura 8. Ponto em X.Fonte: INGRACIO, A.R. Técnica cirúrgica, 2017.

97
SUTRAS 98

Ponto em U Horizontal:Na sutura intradérmica, de forma horizontal, em


em U horizontal, ou ponto de Gillies, U. O fio não é exteriorizado nesta bor-
a agulha penetra a pele de forma in- da. Após a confecção do U horizontal
tradérmica na fase inicial, em uma intradérmico, a agulha retorna verti-
das bordas. Na borda contralate - calmente e ao lado de sua entrada,
ral a passagem do fio é totalmente também intradérmica (Fig. 8).

Figura 9. Ponto em U Horizontal. Fonte:INGRACIO, A.R. Técnica cirúrgica, 2017.

Suturas Contínuas
Este tipo de sutura tem maior indi-
cação nos casos em que há grandes
extensões para suturar e é necessário
ganhar tempo, porém seus resultados
deixam a desejar.
Ponto Simples Contínuo (chuleio
simples): consiste na confecção de
pontos simples, seriados e sem inter-
rupção. O nó é realizado no início e no
final da sutura. Possui técnica rápida
e de fácil execução. (Fig. 9).

Figura 10.Ponto contínuo simples. Fonte:SAVASSI.


Cirurgia Ambulatorial, 1999.

98
SUTRAS 99

Ponto Contínuo Ancorado (chuleio A entrada e saída dos fios são reali-
festonado): Realizado da mesma zadas lado a lado, de forma contínua
forma que a sutura simples contínua, (Fig. 11).
porém com o cruzamento do fio en-
tre os nós. É utilizado para dar firmeza
à sutura, principalmente nas suturas
longas, conferindo maior fixação dos
lábios da sutura (Fig. 10).

Figura 12. Ponto em U Horizontal.

Sutura Intradérmica: É realizada por


passagem do fio de forma horizontal,
em plano mais superficial possível. A
passagem do fio contra lateral deve
Figura 11. Ponto Contínuo Ancorado. ser realizada no mesmo nível do tér-
mino da passagem imediatamente
Ponto em U Horizontal Contínuo anterior. O fio deve ser cruzado. O fio
(barra grega ou colchoeiro):Sutu- pode ser exteriorizado, com ou sem
ra realizada em U, horizontalmente, nó externo, nas duas extremidades.
transfixando a pele em suas bordas. Tem excelente confrontamento ana-
tômico e efeito estético (Fig. 12).

99
SUTRAS 100

Figura 13. Sutura intradérmica.Fonte: INGRACIO, A.R. Técnica cirúrgica, 2017.

Nós Cirúrgicos
Os nós cirúrgicos têm extrema im-
portância durante o ato cirúrgico para
hemostasia e síntese. Eles podem ser
feitos manualmente, com o auxílio de
um porta-agulhas ou serem usados
ambos. O nó verdadeiro da sutura é
dado com 3 seminós: 1º contenção;
2º fixação; 3º segurança.

100
SUTRAS

MAPA MENTAL: TÉCNIC

Ponto Simples
Ponto em X
Separado

Sem nós sobre a ferida Suturas descon

Fios e agulhas
adequados

Sem tensão Pré-Requisitos

Simetria

Nós cirúrgic
Tração adequada formados p
3 seminós

1º contenção 2º fixação

101
SUTRAS 102

5. CUIDADOS ser considerados estão: 1) aspecto da


PÓS-SUTURA cicatriz (seca, sem edema ou conges-
tão); 2) local da ferida (submetido ou
Após realizada a sutura a mesma
não a grandes tensões); 3) direção da
deve ser coberta com curativo ade -
cicatriz (obedece ou não as linhas de
quado e, caso seja necessário, devem
força da pele); 4) ausência de condi-
ser prescritas as profilaxias determi-
ções que interferem na cicatrização;
nadas. Além disso, devem ser pres-
5) tipo de tecido e sua capacidade de
critos analgésicos para controle da
adquirir resistência tênsil; 6) tensão a
dor e orientados os cuidados gerais
que o tecido será submetido.
com a higienização da ferida, como
lavagem com água e sabão e troca
dos curativos.
Os fios de sutura devem ser mantidos
apenas enquanto úteis. Como norma,
devem ser retirados o mais breve pos-
sível, logo que a cicatriz adquira resis-
tência. Entre os elementos que devem

102
SUTRAS

MAPA MENTAL:

Aproximação
bordas de tec
lesionados
1. Fase Inflamatória
seccionado

2. Fase Proliferativa

Fases da Cicatrização
3. Fase de Maturação
SUTURAS
Retas x Circulares Características
das Agulhas
Traumáticas x Atraumáticas

Triangulares x Cilíndricas x Seminós S


Espatuladas

1º contenção

2º fixação

3º segurança

103
SUTRAS 104

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Anderson Ricardo Ingracio. Técnica cirúrgica . Caxias do Sul, RS: Educs, 2017.
Courtney M. Townsend, Jr. et al. Sabiston tratado de cirurgia. Tradução: Alexandre Maceri
Midão et al. 19. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015.
GOFFI, F. S. Técnica cirúrgica: bases anatômicas, fisiopatológicas e técnicas da cirurgia.
4. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2001.
FONSECA, F. P. ; SAVASSI-ROCHA, P. R. Cirurgia Ambulatorial. 3. ed. Rio de janeiro: Edi-
tora Guanabara-Koogan, 1999.
MAGALHÃES, H. P. Técnica cirúrgica e cirurgia experimental. São Paulo: Elsevier, 1996.

104
ABDOME AGUDO

105
ABDOMEAGUDO 106

SUMÁRIO
1. Definição.................................................................................................. 107
2. Fisiopatologia e etiologias................................................................. 107
3. Quadro Clínico........................................................................................ 111
4. Diagnóstico............................................................................................. 111
5. Tratamento ............................................................................................. 112
6. Abdome Agudo Inflamatório............................................................ 114
7. Abdome Agudo Obstrutivo.............................................................. 126
8. Abdome Agudo Perfurativo............................................................. 136
9. Abdome Agudo Isquêmico............................................................... 143
9.3. Clínica.................................................................................................... 147
10. Abdome Agudo hemorrágico....................................................... 152
Referências Bibliográficas...................................................................... 159

106
ABDOMEAGUDO 107

1. DEFINIÇÃO Abdome
agudo
Nesse resumo abordaremos a defi - Abdome inflamatório
agudo Abdome
nição de abdome agudo e seus prin- obstrutivo agudo
cipais diagnósticos sindrômicos. Os
1 perfurativo
diagnósticos etiológicos serão abor-
dados com mais detalhes nos capí-
2 3
tulos específicos. O foco desse ma-
terial está no reconhecimento de um Figura 1: Causas mais comuns de abdome agudo
quadro de abdome agudo e quais
JOVENS IDOSOS
exames podem ser solicitados para
Doença biliar
determinar diagnóstico e guiar inter- Apendicite aguda Obstrução intestinal
venção necessária. Infarto intestinal
Diverticulite
Por definição, abdome agudo é um
grande quadro clínico abdominal va- Tabela 1: Causas mais comuns por idade.

riável que pode ser dividido em sín- As causas mais comuns de abdome
dromes, sendo cada uma delas ca - agudo são infecção, isquemia, obs -
racterizada por diferentes formas de trução ou perfuração.
instalação e progressão a depender
da sua etiologia. 2. FISIOPATOLOGIA E
O que todas as etiologias têm em co- ETIOLOGIAS
mum é a necessidade de definição
As causas mais comuns de abdome
diagnóstica imediata, para determinar
agudo são apendicite aguda, gastro-
a terapêutica adequada e necessida-
enterite aguda, síndrome do intes -
de de intervenção cirúrgica, reduzin-
tino irritável, várias cólicas e dor na
do a morbidade e a mortalidade.
ovulação.
A maioria dos casos requer encami-
Como dito anteriormente, o abdome
nhamento cirúrgico.
agudo pode ser dividido em grandes
síndromes:
CONCEITO: A expressão abdome
agudo refere-se a sinais e sintomas
de dor e sensibilidade abdominal, Abdome Agudo Inflamatório
uma manifestação clínica que, em É causada por processo inflamatório
geral, requer terapia cirúrgica de
emergência.
e/ou infeccioso em cavidade abdomi-
nal, órgãos ou estruturas adjacentes.
Costuma cursar com manifestações
O diagnóstico associado de abdome de peritonite e alterações de ritmo
agudo varia conforme a idade e o sexo. intestinal. Caracteriza-se por dor de

107
ABDOMEAGUDO 108

início insidioso e intensidade progres- mes de imagem e laboratório são


siva. Pode ser causado por um pro- uteis para estabelecer o diagnóstico
cesso agudo ou pela agudização de etiológico.
uma doença crônica.
EXAME O QUE PROCURAR
Procurar por leucocitose e
aumento de neutrófilos -
SAIBA MAIS: Peritonite é uma in- Hemograma
verificar se há desvio para
flamação da serosa que recobre a esquerda
as paredes internas e as vísceras
Identificar causas urinárias
abdominais, independente da cau-
Sumário de Urina Pesquisar desidratação,
sa, intensidade ou extensão. Pode
colúria, leucocitúria
ocorrer por infecção, substâncias
químicas irritantes ou presença de Marcadores inflamatórios.
corpos estranhos. Amilase e lipase Elevação do valor em 3x
sugere pancreatite aguda
Alguns sinais de peritonite são: sen-
B HCG, dosagem de Estimar perdas e avaliar
sibilidade abdominal, distensão/rigi-
eletrólitos, creatinina, outras causas, como doen-
dez muscular, náuseas e vômitos.
ureia sérica e função ças renais, causas hepáti-
hepática cas e biliares e gravidez.

Suas principais etiologias são: apen- Presença de ar em cavida-


Radiografia de tórax de abdominal – pneumope-
dicite aguda, colecistite aguda, pan-
ritônio.
creatite aguda e diverticulite. Obstruções intestinais,
Radiografia de
alças distendidas, níveis
abdome
hidroaéreos
Causas ginecológicas e
biliares
Presença de cálculos,
Ultrassonografia
espessamento das paredes
Colecistite Pancreatite abdominal
da vesícula, dilatação duc-
Hepatite
tal, aumento do diâmetro
do apêndice
Espessamento de paredes,
Aprendicite Tomografia densificação de gordura
Overticulite
Abcesso computadorizada pericólica, delimitação pan-
tubo-ovariano creática
ou gravidez
ectópica Tabela 2:Exames complementares – o que procurar.
A apendicite é a causa mais co -
Figura 2:Topografia das principais etiologias de abdo -
me agudo inflamatório mum de abdome agudo cirúrgico no
Fonte: Sabiston, 19 ed mundo, podendo ocorrer em qual-
O diagnóstico de um abdome agudo quer faixa etária, embora seja mais
inflamatório pode ser inferido através comum em adolescentes e adultos
de anamnese e exame físico – exa- jovens.

108
ABDOMEAGUDO 109

Essa síndrome será discutida com Tem caráter evolutivo e a dor costu-
mais detalhes ainda nesse capítulo. ma ser em cólica, geralmente perium-
bilical.
Abdome Agudo Perfurativo Pode apresentar causa mecânica, por
obliteração parcial ou total do lúmen,
Constitui-se a terceira causa mais co- ou funcional.
mum de abdome agudo gerando alta
Etiologias comuns: corpo estranho,
frequência de emergências abdomi-
bridas, hérnias, neoplasias, bolo de
nais não traumáticas.
áscaris.
Caracteriza-se por dor de início sú-
bito e intenso, difusa em todo abdo-
me, agravada com movimentação e
irritação peritoneal por derrame de
conteúdo de vísceras ocas no peri-
tônio.
A evolução natural da síndrome se
dá por inflamação química inicial com
posterior invasão bacteriana, agra -
vando o quadro.
Etiologias comuns: úlcera gastro -
duodenal, diverticulite, corpos estra-
nhos e neoplasia.
Figura 3:Tomografia Computadorizada de abdome
e pelve. Distensão e imagens hiperatenuantes arre-
dondadas em cólon sigmoide. Fonte: John Chii Tyng
Chao, Alexandre Joji Yagi, Frank Kenzo Tamura, Jessica
SE LIGA! Apesar de se caracterizar
Chia Sin Chen, Luiz Felipe Ferreira Fernandes, Tercio
como quadro agudo de início súbi- De Campos, Abdome agudo obstrutivo secundário a
to, a apresentação pode ser tardia fitobezoar como primeiro sintoma de tumor de cólon:
quando há tamponamento de uma relato de caso, Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa
úlcera, por exemplo. Casa São Paulo 2017

Abdome Agudo Vascular


Abdome Agudo Obstrutivo
Caracterizado por dor abdominal in-
Síndrome caracterizada por sinais e tensa de origem vascular, sendo uma
sintomas de obstrução em TGI, como urgência não-traumática grave por
náuseas, vômitos, distensão abdo - redução súbita do fluxo sanguíneo
minal, parada de eliminação de flatos intestinal. Quando o quadro é mais
e fezes. arrastado, a intensidade pode se

109
ABDOMEAGUDO 110

apresentar diminuída pela circulação Etiologias comuns:gravidez ectópi -


colateral. ca rota, ruptura de aneurisma de aor-
A dor é difusa e mal definida, apre- ta, rotura de baço.
sentando desproporção entre a dor e
o exame físico.
Etiologias comuns: embolia e trom -
bose mesentérica com isquemia in-
testinal, redução do débito cardíaco,
gastroenterites.

Figura 5:Dilatação de aneurisma de aorta abdomi -


nal. Nesse caso, não há extravasamento sugestivo de
vazamento ou ruptura. A ruptura de um aneurisma
pode se apresentar como causa de um abdome agu-
do hemorrágico. Fonte: https://radiopaedia.org/cases/
abdominal-aortic-aneurysm-36?lang=us acesso em
11/12/2019 às 21:46

DIAGNÓSTICO DIAGNÓSTICO
Figura 4: Congestão mesentérica. Sem líquido livre ou SINDRÔMICO ETIOLÓGICO
gás. Descontinuidade em Artéria Mesentérica Superior.
Fonte: https://radiopaedia.org/cases/mesenteri- Apendicite aguda, colecistite
Abdome agudo
c-ischemia?lang=us acesso em 11/12/2019 às 14:02 aguda, pancreatite aguda,
inflamatório
diverticulite.
Abdome Agudo Hemorrágico
Úlcera gastroduodenal,
Causado pela presença de sangue Abdome agudo
diverticulite, corpo estranho,
perfurativo
em cavidade abdominal. São mais neoplasias.
raros e geralmente acometem faixas Corpo estranho, bridas,
etárias mais avançadas. Abdome agudo
hérnias, neoplasias, bolo de
obstrutivo
áscaris.
Dor intensa, com rigidez e sinais de
hipovolemia, tais como hipotensão, ta- Abdome agudo
Gravidez ectópica rota, rup-
tura de aneurisma de aorta,
quicardia, palidez e sudorese. Como hemorrágico
rotura de baço.
há sangramento, a depender do vo-
lume e a velocidade de instalação do Embolia e trombose mesenté-
Abdome agudo rica com isquemia intestinal,
quadro, pode haver prejuízo neuroló-
vascular redução do débito cardíaco,
gico e a intervenção deve ser rápida. gastroenterites.
Em mulheres, sempre investigar ciclo Tabela 3: Diagnóstico Sindrômico x
menstrual e possibilidade de gravidez. Diagnóstico Etiológico

110
ABDOMEAGUDO 111

3. QUADRO CLÍNICO ção; (3) função intestinal; (4) menstru-


ação / contracepção; (5) ingestão de
A principal característica de um qua-
drogas.
dro de abdome agudo é a dor ab -
dominal. A dor possui intensidade e
localização variável de acordo com Exame físico
cada etiologia, como veremos duran-
A rapidez e objetividade do exame
te o módulo.
dependem do estado clinico do pa-
Outros sinais/sintomas associados ciente. Em pacientes instáveis faze-
mos uma avaliação rápida e monito-
DIAGNÓSTICO
SINDRÔMICO
OUTROS ACHADOS rização cardíaca, oximetria de pulso
e acesso periférico. Em pacientes es-
Náuseas, vômitos, febre, icte-
Inflamatório táveis podemos fazer uma avaliação
rícia, obstipação, diarreia
mais completa.
Vômitos, desidratação, náu-
Obstrutivo No exame abdominal devemos fazer
seas, obstipação.

Sinais de hipovolemia – pele


a inspeção, ausculta, palpação e per-
fria, pálida, úmida, aumen- cussão (nessa ordem). Pode se rea-
Hemorrágico
to do tempo de enchimento lizar também alguns testes clínicos,
capilar, pulso fino, taquipneia, como sinal de Murphy (sinal de sen-
taquicardia, redução do débi-
to urinário.
sibilidade peritoneal com colecistite
aguda), sinal do iliopsoas e do obtu-
Sintomas inespecíficos,
rador.
náuseas, vômitos, diarreia,
Vascular
distensão abdominal e cons- Os sinais físicos podem ser reduzidos
tipação.
em idosos, grosseiramente obesos,
Perfurativo
Náuseas, vômitos, febre, gravemente doentes e pacientes em
hipotensão. terapia com corticosteroides.
Tabela 4: Outros achados com esses dados.

4. DIAGNÓSTICO
Anamnese Exames Complementares

A dor deve ser analisada de acordo EXAMES LABORATORIAIS


com sua qualidade, quantidade, local Hemograma: anemia com perda sanguínea crônica
e irradiação, início, duração e desloca- (por exemplo, úlcera péptica, câncer, esofagite)

mento, fatores de melhora e piora e Leucograma: leucocitose com apendicite (75%),


pancreatite aguda, adenite mesentérica (primeiro
sintomas e sinais associados.
dia apenas), Colecistite (especialmente com Em-
Atenção especial deve ser dada a: (1) piema), pielonefrite

anorexia, náusea ou vômito; (2) mic- CONTINUA

111
ABDOMEAGUDO 112

EXAMES LABORATORIAIS verificar sinais vitais e estabilidade


Proteína c reativa (PCR): uso no diagnóstico e mo - clínica com monitorização para pa-
nitoramento de infecção, inflamação (por exemplo, cientes com condições potencial -
pancreática). Preferível para ESR mente instáveis.
Função hepática: distúrbio hepatocelular
É importante fazer dois acessos cali-
Amilase e/ou lipase sérica (preferível): valores 3x
acima do normal é mais provável que seja pan- brosos, com coleta de exames e tipa-
creatite aguda; também se eleva parcialmente gem sanguínea, em caso de dor ab-
com a maioria das lesões intra-abdominais (por dominal severa, além da reposição de
exemplo, gravidez ectópica rota, úlceras pépticas
perfuradas, empiema roto de vesícula biliar, aneu-
fluidos.
risma de aorta roto) O objetivo do manejo do abdome agu-
Testes de gravidez: urina e soro β-HCG – suspeita do, principalmente no departamento
de ectopia
de emergência, é descartar patolo -
Sumário de urina: sangue oculto nas fezes
gias com risco maior para o paciente
Tabela 5:Tabela antiga exames laboratoriais.
como o abdome agudo cirúrgico.
EXAMES DE IMAGEM
Os pacientes podem receber medica-
Raio-x: abdominal (ereto e supino). Rx de tórax: ar ções sintomáticas como analgésicos

sub diafragma úlcera perfurada
e antiespasmódicos como a combi -
Radiografias com contraste (por exemplo, Gas-
trografin refeição): diagnóstico de vazamento do
nação de dipirona e hioscina. Mas em
intestino casos de dor incontrolável, pode ser
USG: bom para sistema hepatobiliar, rins e pelve usada morfina, 0,05 mg/kg a cada 20
feminina. Procurar cálculos biliares; gravidez minutos até controle da dor (cuidado
ectópica; pseudocistos pancreáticos; aneurisma com pacientes com náuseas e vômi-
ou dissecção da aorta; metástases hepáticas e tu-
mores abdominais – apêndice espessado; coleção
tos, pois o medicamento pode piorar
paracólica. esses sintomas podem piorar). Em pa-
Tomografia computadorizada: fornece excelente cientes com quadros de litíase urinária,
exame de órgãos abdominais, incluindo massas podemos usar anti-inflamatórios.
e coleta de fluidos, podemos avaliar pancreatite
(aguda e crônica); inflamação peritoneal não diag- Há uma menor probabilidade de que
nosticada (melhor) – trauma; diverticulite; aneuris- a dor abdominal com duração de
ma da aorta com vazamento; patologia retroperi-
mais de 48 horas precise de cirurgia
toneal; apendicite (especialmente com contraste)
em comparação com a dor de menor
CPRE: mostra obstrução do ducto biliar e doença
pancreática duração. Um paciente com patologia
Ressonância magnética (especialmente útil com cirúrgica aguda pode piorar rapida -
contraste) mente. Dessa maneira, os sintomas
Tabela 6: Tabela antiga exames de imagem. graves persistentes nas primeiras ho-
5. TRATAMENTO ras requerem uma cuidadosa investi-
gação e acompanhamento constan-
O tratamento é dependente da etio- te. Além disso, pode-se considerar a
logia da dor abdominal. Deve-se

112
ABDOMEAGUDO 113

laparoscopia diagnóstica para os pa- uma ferramenta útil para o diagnósti-


cientes clinicamente estáveis e que co, mas é cada vez mais usada como
não foram submetidos à cirurgia por uma modalidade terapêutica de esco-
falta de uma causa óbvia. lha para condições como apendicite,
A laparoscopia diagnóstica pode ser colecistite, lise de adesão, reparo de
considerada em pacientes selecio - hérnia e muitas causas ginecológicas
nados. A laparoscopia não apenas é de abdome agudo.

Vamos lá! Para identificar um abdome agudo o primeiro passo é identificar


o que o caracteriza: dor abdominal. O paciente comparecerá na emergência
queixando de um quadro agudo de dor abdominal. Essa dor pode ter intensi -
dade e duração variável, mas é importante não subestimar o quadro que apre -
senta mais de 24h, ok? Afinal, a dor deve ser grande para levar o paciente a
procurar ajuda.
Lembrem que o paciente não é apenas a barriga. Como ele chegou ao PA? Qual o estado
geral do paciente? Qual a pressão arterial? Qual a temperatura? O paciente está taqui -
cárdico ou taquipneico? Algumas condições exigem intervenção imediata, como choque
hipovolêmico.
Feita a avaliação geral, a dor é a queixa principal no momento da entrada e devemos
caracterizá-la de forma adequada. Portanto, tempo de início da dor, intensidade e lo -
calização são essenciais. Embora discutido mais adiante, a localização da dor não se
restringe a abdome, o paciente deve ser questionado onde a dor começou, se ela
migrou para outra região e se ela irradia. Alguns padrões são mais sugestivos de
algumas síndromes e te ajudam na melhor dedução de um diagnóstico etiológi -
co, guiando assim os exames complementares que serão solicitados.
Como prosseguir a partir disso? Na sua investigação, é importante pro -
curar por sinais e sintomas associados: o paciente vomitou? Se sim, qual
o aspecto? Se não, sentiu náuseas? Houve alteração no ritmo intestinal?
Quais são os achados no exame físico abdominal do paciente? E o exame de
outros sistemas? Paciente ictérico pode ter uma colecistite, paciente hipo-
tenso pode ter um abdome agudo hemorrágico.
Qual é a história desse paciente? Ele fez alguma cirurgia? Uma
abordagem cirúrgica recente pode predispor bridas. O paciente
é do sexo feminino com vida sexual ativa e pode apresentar uma
gravidez ectópica rota ou uma doença inflamatória pélvica?
Os achados específicos de cada paciente te ajudarão na esco -
lha dos exames laboratoriais e de imagem para confirmação do
diagnóstico etiológico.
Enquanto esse diagnóstico não é definido, o paciente não deve esperar para receber
medidas de conforto e algum sintomático deve ser utilizado. Analgesia é fundamental,
assim como a evolução do paciente. Portanto, acompanhamento constante.

113
ABDOMEAGUDO 114

Esse é um esquema básico de condução de um paciente com queixa abdominal


na emergência. É importante lembrar que cada paciente é diferente e a doença
não leu o livro. Investigação atenciosa e precisa para identificar e tratar a causa
base o mais rápido possível!
O conhecimento dos diagnósticos sindrômicos e etiológicos e suas especificida-
des é o próximo passo. Continuem acompanhando o material!

6. ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO


6.1. Definição
Pode ser definido como quadro de dor abdominal súbito e inesperado, originado
de um processo inflamatório e/ou infeccioso localizado na cavidade abdominal.
Em algumas situações, o quadro apresenta-se com peritonite, sendo mandató-
rio o manejo cirúrgico nesses casos.
Existem diversas causas de Abdome Agudo Inflamatório (AAI), mas suas prin-
cipais etiologias são: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda e
diverticulite aguda. Falaremos sobre cada uma adiante.

6.2. Epidemiologia

Colecistite Jovens e idosos Apendicite 10-20 anos


Sexo feminino Sexo masculino

Pancreatite
Causa biliar: sexo feminino
Causa alcoólica: sexo Diverticulite
masculino > 50 anos

6.3. Fisiopatologia infeccioso ao peritônio e às modifi -


cações do funcionamento do trânsito
A fisiopatologia do AAI baseia-se na
intestinal.
extensão do processo inflamatório/

114
ABDOMEAGUDO 115

Peritonite visceral Peritonite parietal

Paralisia da musculatura lisa Contratura muscular


localizada ou difusa

Ileo paralitico
Fibras somáticas
cerebroespinais
Fibras autonômicas

Dor localizada
Distensão e contração visceral contínua e intensa

Dor difusa e mal localizada

Fluxograma 1: Peritônio visceral x peritônio parietal

Após instalada a peritonite, a deterio- dias existe uma exuberante resposta


ração clínica do indivíduo pode ser rá- inflamatória com formação de fibrina,
pida, constituindo sinal de gravidade aderências, pus, e, por fim, fibrose.
e mau prognóstico.
6.4. Clínica
FASE INICIAL
CLÍNICA DE AAI

Dor abdominal
Exsudativa Transudativa
Náuseas e vômitos

Horas de evolução Febre

Obstipação

FASE TARDIA
Tabela 7:Clínica de AAI
A dor abdominal é o sintoma prepon-
Presença de derante no AAI, podendo ser decor-
Fibrinopurulenta abscessos rente de um processo recente, como
na apendicite aguda, ou crônico agu-
dizado tal qual nos casos de colecistite
Dias de evolução
aguda por litíase biliar ou diverticulite
Fluxograma 2:Classificação de peritonite por doença diverticular do cólon. Cos-
Nas fases iniciais há ainda pouca ati- tuma ser progressiva e quando evolui
vidade inflamatória com aumento da com piora progressiva uma conduta
efusão peritoneal e quimiotaxia de cirúrgica é necessária na maioria das
células inflamatórias. Já nas fases tar- vezes.

115
ABDOMEAGUDO 116

evolução do quadro, sobretudo quan-


SE LIGA! Dor exacerbada a mo -
do há processo supurativo instalado.
vimentação é comum em abdome
agudo inflamatório e indica perito- Obstipação comumente ocorre se -
nite. cundária à paralisia das alças intes-
tinais. Entretanto, diarreia pode es -
Náuseas e vômitos podem ocorrer na tar presente, sobretudo em casos de
evolução do AAI, podendo ser resul- abscessos pélvicos.
tado do quadro álgico intenso ou até
mesmo de estase intestinal secundá-
ria à irritação do peritônio visceral. 6.5. Diagnósticos etiológicos
A febre é um sintoma comumente Apendicite Aguda
observado, podendo surgir já nas fa- A apendicite aguda se dá por obs-
ses iniciais do processo, com tempe- trução do lume apendicular por corpo
raturas mais brandas, piorando com a estranho ou processo inflamatório.

Dor abdominal: Localização:


Contínua Epigástrica/
Cólica Periumbilical

Fossa ilíaca direita


Apendicite aguda (ponto de McBurney)

Febre
Baixa – moderada (38°C)
*Pode estar ausente nas
Náuseas e vômitos fases iniciais

Fluxograma 3:Apendicite aguda

ra da musculatura abdominal e/ou de-


Relembrando: Ponto de McBur -
neyé um pontosituado entre o
fesa voluntária à palpação.
umbigo e a espinha ilíaca ântero-
SINAL DESCRIÇÃO
-superior.
Dor à descompressão brusca
Sinal de Blumberg em fosse ilíaca direita por
Habitualmente encontra-se o indiví- palpação profunda

duo em posição antálgica e com um Dor em fosse ilíaca direita


Sinal de Rovsing por palpação na fossa ilíaca
bom estado geral. Pode haver sinais esquerda
de irritação peritoneal, com contratu- Tabela 8:Sinais de apendicite

116
ABDOMEAGUDO 117

SAIBA MAIS:
Sinal de Rovsing: A palpação no cólon descendente desloca os gases para o cólon as-
cendente, atingindo o apêndice inflamado hipersensível, provocando dor.

Como definir?

Anamnese +
Hemograma TC Abdome USG
exame físico

Desvio à esquerda Dúvida diagnós- Aumento do diâme-


em quadros mais tica a despeito da tro do apêndice.
avançados. USG

Exclusão de causas
Leucocitose discre- Pacientes obesos ginecológicas em
ta com predomínio mulheres.
de neutrófilos.

Sinal do alvo - au-


mento da espes-
sura das paredes.

Fluxograma 4: Como definir - Apendicite aguda

Figura 6: TC Apendicite

Colecistite Aguda
Inflamação química e/ou bacteriana do conteúdo biliar e, consequente -
da vesícula biliar. Causas comuns são mente, um fluxo retrógrado. A esta-
litíase vesicular ou colelitíase. se desse conteúdo gera fenômenos
Normalmente se dá por impacta - vasculares e inflamatórios.
ção de um cálculo, gerando estase

117
ABDOMEAGUDO 118

prometimento na dependência da
SAIBA MAIS:
intensidade do processo inflamatório.
Diferenciar colelitiase, coledocoli- Pode haver irritação peritoneal e icte-
tiase e colecistite
rícia por impactação de cálculo no in-
Os termos colelitiase, coledocolitiase
e colecistite podem ser parecidos de
fundíbulo – essa impactação ocasiona
início e por isso, é importante dife- edema e obstrução do ducto hepático
renciá-los. comum, a chamada Síndrome de Mi-
Colelitíase é a presença de cálculos rizzi, e consequentemente, colestase.
na vesícula biliar. Coledocolitíase é a
presença de cálculos nos ductos bi-
liares, mais especificamente, no duc- CONCEITO: A Sindrome de Mirizzi
to colédoco e colelitíase é a presença é uma causa rara de icterícia obs-
de inflamação na vesícula biliar, que trutiva. Resulta da impactação de
pode ocorrer por cálculos ou não. um cálculo no cÍstico ou no colo ve-
sicular, causando compressão ex -
Dor abdominal: trínseca do ducto hepático comum
cólica, relacionada Localização: e inflamação, com ou sem fistuliza-
a ingestão de ali- Hipocôndrio di- ção. Sendo o tratamento de eleição
mentos (secreção reito > epigástrio de natureza cirúrgica, o diagnóstico
de colecistocinina > > dorso.
pré-operatório é particularmente
contração da vesícu- *Pode se tornar
difusa importante devido ao elevado risco
la biliar) de lesão iatrogénica da via biliar.

Disponível em: http://rihuc.huc.min-saude.pt/bitstre -


Colecistite Aguda Febre > 38°C am/10400.4/879/1/S%C3%ADndrome%20de%20Mi-
rizzi.pdf

Náuseas e vômitos SINAL DESCRIÇÃO


Interrupção brusca da inspiração
Fluxograma 5: Colecistite aguda
Sinal de Murphy à palpação profunda em hipo-
O estado geral costuma estar pre - côndrio direito
servado, podendo apresentar com - Tabela 9: Sinais de colecistite

Como definir?

Raio-X de Anamnese +
USG de abdome TC de Abdome
abdome exame físico

Avaliação de órgãos e
Identificação de cál- Visualização de
estruturas adjacentes.
culos radiopacos. dilatação ductal
*Não é a melhor e impactação de
cálculos. Dúvidas diagnósticas
escolha.
(diagnóstico de
exclusão)

Fluxograma 6:Como definir - Colecistite Aguda

118
ABDOMEAGUDO 119

• 80 a 90% dos casos tratam-se de


casos leves com a presença de
um estado geral regular e posição
antálgica, sinais de desidratação e
hipovolemia.
• Nos casos de pancreatite grave
(10 a 20%) pode-se encontrar um
indivíduo com comprometimen -
to do estado geral, taquicárdico,
taquidispneico, hipotenso e com
abdome distendido apresentando
sinais de peritonite.
• Se associado à litíase biliar, pode
apresentar icterícia.

SINAL DESCRIÇÃO
Figura 7: Colecistite Equimoses e hematomas em
Sinal de Cullen
Fonte: Monteiro, Lima e Ribeiro, 2009. região periumbilical.
Sinal de Grey Equimoses e hematomas em
Pancreatite aguda
Turner região de flancos.
Processo inflamatório do pâncreas Tabela 10: Sinais de pancreatite
por ativação enzimática inadequada.
Apresenta um quadro menos bem ca-
racterizado. 80% dos casos estão re-
lacionados à doença biliar litiásica ou
ingestão de álcool, mas outras causas
podem ser apresentadas, como trau-
ma e infecções.
Localização:
região epigástrica
Dor: intensa e com irradiação
difusa para dorso (dor
em faixa)
Figura 8: Equimoses e hematomas em região perium-
Íleo paralítico: bilical e em região de flancos
Pancreatite Aguda
parada de elimi- Esses sinais são apresentados em
nação de fezes e
flatos e redução
casos severos e após quadro mais
Náuseas e vômitos dos ruídos hidro - tardio e são evidências de hemorra-
precoces e volumosos aéreos gia retroperitoneal.
Fluxograma 7: Pancreatite aguda

119
ABDOMEAGUDO 120

Amilase e lipase:
Os achados de clínicos e labora -
Anamnese +
exame físico aumento de 3x o toriais, assim como os achados de
valor de referência imagem, podem ser utilizados para
classificação prognóstica, pelas es-
Como definir? calas de Apache II e classificação de
Balthazar.

TC de abdome CRITÉRIOS DE GRAVIDADE DE BALTHAZAR

GRAU PONTOS

Delimitação A – Pâncreas normal 0

do pâncreas e B – Pâncreas aumentado 1


avaliação das
complicações C – inflamação do pâncreas ou gordura 2

peri-pancreática

Fluxograma 8: Como definir – pancreatite aguda D – Coleção única peri-pancreática 3

E – Duas ou mais coleções e/ou presen - 4

ça de ar intraperitoneal

NECROSE

Sem necrose 0

Necrose < 30% 2

Necrose de 30% a 50% 4

Necrose > 50% 6

INDICE TOTAL (alterações inflamatórias + necrose) = 0-10


PONTOS

ESCORE MORBIDADE (%) MORTALIDADE (%)

0-3 8 3

4-6 35 6

7-10 92 17

CRITÉRIOS DE GRAVIDADE DE BALTHAZAR

Figura 9: TC - pancreatite Idade Maior que 55 anos

Fonte: Abdome Agudo, 2006 Leucócitos Maior que 15.000/mm3


PaO2* Menor que 60 mmHg
A elevação da amilase sérica ocorre DHL ** Maior que 600 U/L
de forma mais precoce, normalizando AST ou ALT *** Maior que 200 U/L
após 48h, enquanto a lipase eleva-se Albumina Menor que 3,2g/dl
mais tardiamente, porém os níveis Cálcio Menor que 2 mmol/L
permanecem altos por mais tempo. Glicemia Maior que 180 mg/dl
Portanto, a amilase é mais sensível. Uréia Maior que 45 mg/dl

Tabela 11: Classificação de Balthazar

120
ABDOME AGUDO

SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO DE GRAVIDADE APACHE II


A 4 3 2 1 0 1

T retal (ºc) > 40,9 39-40,9 38,5-38,9 36-38,4 34-35,9


PAM > 159 130-159 110-129 70-109

FC > 179 140-179 110-129 70-109


FR > 49 35-49 25-34 12-24 10-11

SatO2 > 499 350-499 200-349 < 200


SiFiO2 ≥0,5 SiFiO2 ≤ 0,5 > 70 61-70
pH art > 7,69 7,60-7,69 7,50-7,59 7,33-7,49
Na (mmol/l) > 179 160-179 155-159 150-15 130-149

K (mmol/l) > 6,9 6,0-6,9 5,5-5,9 3,5-5,4 3,0-3,4

Cr (mg/dl) > 3,4 2-3,4 1,5-1,9 0,6-1,4


Ht (%) > 59,9 50-59,9 46-49,9 30-45,9
GB (x1000) > 39,9 20-39,9 15-19,9 3-14,9

Soma de pontos (A)= 0 a 4 pontos por cada item, consoante valores

ESCALA DE COMA DE GLASGOW (B)

Avaliação da abertura ocular/ Avaliação da resposta verbal/ Avaliação da resposta motora

Soma de pontos (B)=15- Escala de coma de Glasgow atual

CONDIÇÕES CRÔNICAS (D)


Comorbidades:
• Sem história de condições crônicas: 0 pontos
• Com história de condições crônicas, se o doente for admitido após cirurgia eletiva: 2 pontos
• Com história de condições crônicas, se o doente for admitido por cirurgia de urgência ou por outro motivo: 5 pontos

ESCORE APACHE II= Somatório de A+ B+ C+ D


Tabela 12: Escala de Apache II

121
ABDOMEAGUDO 122

Quer saber mais? Temos um resu- Disúria e polaciúria podem ser rela-
mo exclusivo de Pancreatite para tadas quando houver acometimento
você no Sanarflix! das vias urinárias (bexiga e ureter).

Anamnese +
Diverticulite aguda exame físico
Processo inflamatório de um ou mais
divertículos do cólon. Como definir?

SAIBA MAIS: TC de abdome Raio-X de abdome


Divertículossão protrusões sacu -
lares da mucosa através da parede Espessamento da Pneumoperitônio
muscular colônica. parede intestinal, e quadros
Diverticulose é a presença de di- densificação da obstrutivos
vertículos em todo cólon. gordura pericólica,
abscessos ou
Diverticulite é o processo inflama- líquido livre
tório de um ou mais divertículos do
cólon. Fluxograma 10: Como definir - Diverticulite Aguda

Localização:
Dor abdominal: Fossa ilíaca es-
Contínua querda ou região
Cólica suprapubica >
Dorso ipsilateral

Diverticulite Aguda Febre baixa

Figura 10: Diverticulite


Obstipação
Anorexia e náuseas ou diarreia Fonte: Abdome Agudo, 2006.
A TC é o exame mais indicado para
Fluxograma 9:Diverticulite aguda
confirmação diagnóstica e detecção
Paciente pode cursar com taquicar- de complicações.
dia discreta, distensão abdominal e
sinais de peritonite – dor à descom- 6.6. Tratamento
pressão brusca e à percussão. Pode
haver massas palpáveis, habitual - O tratamento do AAI baseia-se em
mente dolorosas, em FIE. O toque tratamento de suporte e específico:
retal costma ser doloroso. 1. Analgesia;

122
ABDOMEAGUDO 123

2. Reposição volêmica; complicada, sugerindo que essa pode


3. Correção de distúrbios eletrolíticos; ser uma estratégia viável na possibi-
→ lidade de seguimento dos pacientes,
4. Tratamento do íleo adinâmico entretanto não existem evidências
jejum, sonda nasogástrica nos ca- suficientes que indiquem seu uso ro-
sos de distensão gástrica e intesti- tineiro, uma vez que muitos desses
no delgado considerável ou vômi- pacientes necessitarão de aborda -
tos incoercíveis; gem cirúrgica na evolução do quadro.
5. Antibioticoterapia ou antibiotico -
profilaxia;
6. Tratamento de falência orgânica

se houver internamento em UTI
(mais comumente observado na
pancreatite aguda grave).

Apendicite Apendicectomia

Antibioticoterapia Figura 11:procedimento de apendicectomia por video -


Colecistite laparoscopia. Fonte: Sabiston, 18ª ed.
Colecistectomia Colecistite aguda
Antibioticoterapia empírica: cefazo -
Antibioticoterapia
lina, cefuroxima ou ceftriaxona nos
Pancreatite
CPRE casos leves a moderado. Nos casos
*Se colelitíase mais graves podem ser usados car-
bapenêmicos, betalactâmicos com
Antibioticoterapia inibidores de betalactamase, fluoro -
Diverticulite quinolonas com metronidazol.
Ressecção do
segmento
colônico
Fundo da Fígado
vesícula
Fluxograma 11:Tratamento especifico Ducto cistico
biliar Artérica cistica
Apendicite aguda Posição
subxifóidea do
instrumental
A apendicectomia é o tratamento pa-
Posições
drão da apendicite complicada e não subcostal
complicada; direita lateral
e medial do
instrumental
Estudos recentes analisaram o mane-
jo com antibioticoterapia isolada em Figura 12:colecistectomia laparoscópica. Vesícula biliar
é retraída cefalicamente usando-se uma pinça no fundo
indivíduos com apendicite aguda não da vesícula biliar. Fonte: Sabiston, 18ªed.

123
ABDOMEAGUDO 124

Colecistectomia de emergência em Pacientes ASA III, IV ou V, sem indi-


pacientes com instabilidade hemodi- cação de colecistectomia de emer -
nâmica ou dor intratável e para aque- gência, pode ser feito tratamento não

les com complicações; cirúrgico inicialmente antibiotico -
Para os indivíduos estáveis, a colecis- terapia e drenagem da vesícula biliar.
tectomia deve ser realizada no mes- Caso não respondam, tratamento ci-
mo internamento, dentro de três dias rúrgico deve ser instituído. Prefere-se
após o início dos sintomas – pacien- cirurgia laparoscópica à laparotomia.
tes ASA I ou II.

RELEMBRANDO: A CLASSIFICAÇÃO ASA

CLASSIFICAÇÃO EXEMPLOS PARA ADULTOS,


DEFINIÇÃO
ASA INCLUINDO, MAS NÃO LIMITADO A:
Um paciente saudável Uso saudável, não-fumador, sem ou com consumo
ASA I
normal mínimo de álcool
Paciente com doença Doenças leves apenas sem limitações funcionais
sistêmica leve substanciais. Os exemplos incluem (mas não se
ASA II limitam a): fumante atual, etilista, gravidez, obe-
sidade (30
doença pulmonar leve
Paciente com doença Limitações funcionais substanciais; Uma ou mais
sistêmica grave doenças moderadas a graves. Os exemplos incluem
(mas não se limitam a): DM ou HTN mal controla-
do, DPOC, obesidade mórbida (IMC ≥40), hepatite
ASA III ativa, dependência ou abuso de álcool, marcapasso
implantado, redução moderada da fração de ejeção,
DRT em diálise programada regularmente, prema-
turidade PCA <60 semanas, história (> 3 meses) de
IM, AVE, AIT ou DAC / stents.
Um paciente com do - Os exemplos incluem (mas não se limitam a): IAM,
ença sistêmica grave AVE, AIT ou DAC / stents recentes (<3 meses),
que é uma ameaça isquemia cardíaca em curso ou disfunção valvar
ASA IV
constante à vida grave, redução severa da fração de ejeção, sepse,
DIC, DIC, DRA ou DRT não sendo submetidas regu -
larmente diálise programada
Um paciente mori- Os exemplos incluem (mas não se limitam a): aneu-
bundo que não deve risma abdominal / torácico rompido, trauma maciço,
sobreviver sem a sangramento intracraniano com efeito de massa,
ASA V
operação intestino isquêmico diante de patologia cardíaca
significativa ou disfunção de múltiplos órgãos /
sistemas

124
ABDOMEAGUDO 125

CLASSIFICAÇÃO EXEMPLOS PARA ADULTOS,


DEFINIÇÃO
ASA INCLUINDO, MAS NÃO LIMITADO A:
Paciente declarado
com morte encefálica
ASA VI cujos órgãos estão
sendo removidos para
fins de doadores

* A adição de "E" indica cirurgia de emergência: (Uma emergência é definida como exis-
tente quando o atraso no tratamento do paciente levaria a um aumento significativo da
ameaça à vida ou parte do corpo)
Fonte: American Society Of Anesthesiologists, 2014.

Pancreatite aguda • Analgesia;


Ressucitação volêmica agressiva nas • Reposição volêmica;
primeiras 24 horas; • Dieta zero para repouso intestinal,
• Nutrição enteral após o quinto dia com retorno em 2 a 3 dias;
caso não tolere dieta oral;
• Antibioticoterapia em caso de in -
fecção documentada a partir da se-
gunda semana de suporte clínico;
• Estão indicadas terapias mini -
mamente invasivas nos casos de
complicações a partir da quarta
semana, como a ultrassonografia
endoscópica em vigência de pseu-
docisto pancreático;
• CPRE nos casos de pancreatite
secundária a colelitíase com evi -
dência de colangite sobreposta. Figura 13:Extensa diverticulite no sigmoide. Fonte:
Sabiston, 18ªed.

Nos casos leves continuação ou
Diverticulite aguda início do tratamento em caráter am-
bulatorial com antibioticoterapia oral
Tratamento hospitalar da diverticulite por 7 a 10 dias, evolução gradual da
não complicada: dieta, com reavaliações a cada 2 a 3
• Antibioticoterapia venosa contra dias inicialmente e semanalmente até
gram-negativos e anaeróbios; resolução completa do quadro;

125
ABDOMEAGUDO 126

• Pacientes estáveis hemodinami - • Pacientes instáveis necessitam de


camente devem ser submetidos à abordagem menos invasiva, como
ressecção definitiva do segmento ressecção limitada ou drenagem
→ →
colônico acometido Em pacien - percutânea de coleções proce -
tes classificados como Hinchey I dimento à Hartmann é preferido à
ou II pode-se proceder à anasto- anastomose primária em pacien -
mose primária com ou sem osto- tes com apresentações mais gra-
mia protetora; ves (Hinchey III ou IV);

RELEMBRANDO:

CLASSIFICAÇÃO DE HINCHEY
Estágio I Abscesso pericólico ou mesentérico
Estágio II Abscesso pélvico emparedado
Estágio III Peritonite generalizada purulenta
Estágio IV Peritonite fecal generalizada

Fonte: Sabiston, 18ª ed.

• Orientar dieta rica em fibra;

Nos casos de primeiro episódio de diverticulite aguda, com apresentação leve,


não é mandatória a indicação de colectomia.

6.7. Considerações Finais


É importante que o quadro de abdome agudo seja rapidamente reconhecido,
juntamente ao seu diagnóstico etiológico.
Embora a maioria dos casos tenha como tratamento específico, lembrar sempre
que o suporte clínico adequado faz parte do tratamento definitivo do paciente.

7. ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO


7.1. Definição
Abdome agudo obstrutivo (AAO) é uma situação de emergência na qual se en-
contra um fator obstrutivo em trato gastro intestinal (TGI) responsável pelo qua-

126
ABDOMEAGUDO 127

dro clínico. Apresenta gravidade variável e caráter evolutivo necessitando de


rápida intervenção, em sua maioria, cirúrgica.
As causas de AAO podem ser divididas em mecânicas e funcionais, originadas
no intestino delgado ou grosso, conforme tabela abaixo:

CAUSAS COMUNS MENOS FREQUENTES RARAS


Aderências (bridas) Doença diverticular Tumor de intestino
Hérnias externas Doença de Crohn Corpo estranho
Mecânica
Carcinoma colorretal Intussuscepção Bezoar
Volvo de sigmoide Íleo biliar
Pós-operatório (<72h) Síndrome de Olgivie Desordens metabólicas (uremia,
Funcional Pancreatite Aguda Opiáceos e anticolinérgicos cetoacidose)
Isquemia mesentérica Hemorragia retroperitoneal Distúrbios eletrolíticos (hipocalemia)
Tabela 13: Causas mecânicas x Causas funcionais

7.2. Epidemiologia no delgado, sendo as aderências (bri-


das) secundárias a cirurgias prévias
É a segunda síndrome abdominal
na cavidade abdominal o fator etioló-
aguda mais frequente, ficando entre
gico mais comum em países desen-
Abdome Agudo Inflamatório (1º) e
volvidos (PD).
Perfurativo (3º).
Nos países em desenvolvimento
Apresenta alta morbimortalidade
(PED), as hérnias compõem a primei-
quando há retardo no diagnóstico e/
ra causa (30 a 40%) seguida por bri-
ou manejo inapropriado, podendo
das (30%), tuberculose e doença de
alcançar taxas tão elevadas quanto
Crohn (10%).
20%, sendo o sofrimento de alças in-
testinais um importante contribuinte Câncer de cólon representa a principal
para esse desfecho. causa de obstrução no intestino gros-
so, além de volvo de sigmoide que se
CAUSAS FREQUÊNCIA (PD/PED) apresenta como frequente causa de
Aderência (Brida) 40-75% | 30% obstrução intestinal baixa em nosso
Carcinoma colorretal 15% meio.
Doença inflamatória 15% |10%
Hérnia 12% | 30-40%
Impactação fecal 8% SE LIGA! O megacólon chagásico
configura uma frequente causa de
Íleo paralítico 5%
obstrução intestinal no Brasil, habi-
Outras 5% tualmente através da formação de
Tabela 14:Causas AAO fecaloma, devido à alta prevalência
de doença de Chagas no país.
Cerca de 80% dos casos de abdome
agudo obstrutivo envolvem o intesti-

127
ABDOMEAGUDO 128

7.3. Fisiopatologia quanto o ponto posterior terá dis-


tensão devido ao acúmulo desses
Independente da etiologia a interrup-
componentes, gerando um colap-
ção do trânsito intestinal origina even-
so no sistema. Além disso, há influ-
tos que culminarão habitualmente
xo contínuo de secreções biliares e
com quadro obstrutivo. Discutiremos
pancreáticas, agravando o aporte
agora as obstruções e repercussões
de fluidos nesse segmento.
por localização.
O gás responsável pela distensão
Obstrução do intestino delgado
intestinal nos estágios iniciais da
obstrução é composto majorita -
Distúrbios Distensão
hidroeletrolíticos abdominal riamente pelo ar ingerido que pro -
gressivamente aumenta com os
gases gerados pela fermentação
Obstrução de
intestino delgado
das bactérias intestinais.
A distensão progressiva do seg -
mento acometido ocasiona au -
Oligúria Ausência de RHA
mento da pressão luminal compro -
Fluxograma 12: Obstrução do intestino delgado metendo a drenagem venosa com
aumento do influxo de água e ele-
• Disturbios hidroeletrolíticos: O trólitos para o lúmen, além de per-
intestino delgado possui função da através da camada serosa para
secretória e absortiva, sendo que a superfície peritoneal.
20% da água corporal total são
• Oligúria: A perda de sódio e água
provenientes desse processo, as -
para o lúmen intestinal aumenta
sim, obstruções nesse segmento
progressivamente enquanto a fun-
interferem na funcionalidade, po -
dendo resultar em depleção hi - ção absortiva permanece compro-
droeletrolítica significativa. metida, ocasionando depleção do
volume intravascular efetivo com
Vômitos frequentes exacerbam o
redução da excreção urinária de
distúrbio hidroeletrolítico resultan -
sal e água gerando oligúria e des-
do em hipocalemia e hipovolemia
graves, podendo levar ao óbito ou locamento de água do espaço ex-
a complicações cirúrgicas. tracelular para o intravascular.
• Distensão abdominal: O seg - • Ausência de ruídos hidroaéreos
mento anterior à obstrução terá (RHA): Inicialmente pode haver
absorção e eliminação de gases e aumento significativo da peristalse
fluidos pela mucosa intestinal, en- a fim de vencer o fator obstrutivo,
evoluindo posteriormente para fa-

128
ABDOMEAGUDO 129

diga da musculatura lisa com para- re caso a válvula permaneça com-


da dos movimentos intestinais. petente, levando à dilatação pro-
Na intussuscepção intestinal o seg- gressiva do cólon com posterior
mento proximal do intestino é inva- comprometimento vascular. Esse
ginado na porção distal adjacente. comprometimento pode gerar ne-
Essa condição é mais comum em crose e perfuração do segmento
crianças de três a nove meses de acometido.
vida. Em adultos, geralmente tu - O ceco é o local mais vulnerável
mores estão envolvidos na gênese à perfuração devido à sua parede
desse evento e o acometimento mais delgada que a do cólon es-
ileocólico é o mais comum. querdo.
• Volvo intestinal: O volvo intes-
tinal é uma importante causa de
Obstrução do intestino grosso
obstrução em alça fechada, uma
O comportamento da obstrução no vez que o segmento rotaciona
intestino grosso é determinado pela sobre o mesentério, podendo le-
competência da válvula ileocecal var a sofrimento vascular. Pode
(VIC). Em cerca de 20 a 30% dos pa- ser primário por má formação
cientes, a VIC torna-se incompeten- congênita ou secundário por ro-
te, reduzindo a pressão no lúmen do tação através de um orifício ou de
cólon com refluxo do conteúdo para uma aderência.
o íleo. • Sofrimento vascular: Caso haja
estrangulamento de alça intesti -
Válvula
Volvo intestinal
nal por aderência ou por angula-
Ileocecal (VIC ção pode haver comprometimen-
to vascular grave secundário ao
Obstrução de aumento da pressão na parede
intestino grosso intestinal resultando em redução
da drenagem venosa e mais tar-
Sofrimento Translocação
diamente necrose por ausência do
vascular bacteriana suprimento arterial.
• Translocação bacteriana: Se hou-
Fluxograma 13: Obstrução do intestino grosso
ver translocação bacteriana atra -
vés da parede intestinal danificada
• Válvula Ileocecal (VIC): Uma obs- gerando peritonite localizada ou
trução em “alça fechada” - entre a
difusa.
VIC e o ponto de obstrução – ocor-

129
ABDOMEAGUDO 130

Obstrução funcional existente, a exemplo de hipocale-


mia, uremia ou diabetes descom-
Distúrbios pensado.
metabólicos
Obstrução • Síndrome de Ogilvie: Outra con-
funcional
Síndrome dição descrita é a síndrome de
de Ogilvie Ogilvie na qual há pseudo-obstru-
Fluxograma 14: obstrução funcional
ção intestinal com distensão co -
lônica por disautonomia nervosa,
• Disturbios metabólicos: Distúr- sem fator mecânico. Pode levar a
bios metabólicos e/ou hidroeletro- sofrimento vascular e isquemia in-
líticos podem ocasionar obstru - testinal.
ção intestinal sem fator mecânico

Obstrução Aumento do Aumento da Pressão


Intestinal Peristaltismo Intraluminal

Aumento da RHA Alteração


Reflexo Distensão
Secreção Aumentados Vascular

Isquemia Translocação
Vômitos Acúmulo de Fluidos e Gás da Parede Bacteriana e
Intestinal Toxinas
Distúrbio Redução da Absorção
Hidroeletrolítico Estase

Perda de Redução da
Plasma e Absorção e
Sangue Motilidade

Fluxograma 15: Fisiopatologia

7.4. Clínica início súbito, evoluindo com náuseas,


vômitos e parada de eliminação de
O quadro clínico é variável e depende
gazes e fezes.
de alguns fatores, como local e tem-
po da obstrução; presença de compli- A distensão abdominal comumente
cações, como sofrimento vascular e encontra-se disposta centralmente
perfurações; grau de contaminação e na obstrução do intestino delgado
status clínico do paciente. e em flancos ou em abdome su -
perior nas obstruções baixas (“em
Habitualmente os pacientes com
moldura”).
AAO apresentam dor abdominal de

130
ABDOMEAGUDO 131

De forma didática, podem-se dividir Obstrução intestinal baixa (transi-


os sinais e sintomas de acordo com o ção ileocecal e intestino grosso)
sítio da obstrução:
Na obstrução do cólon, normalmente
há parada de eliminação de fezes e
Obstrução intestinal alta (Intestino flatos precocemente associada à dis-
delgado) tensão abdominal importante.

Dor abdominal: Localização: Náuseas e vômitos


Localização:
cólica periumbilical tardios de aspecto
Abdome inferior
fecalóide.

Obstrução
intestinal alta Obstrução
intestinal baixa

Vômitos Distensão Som metálico


precoces abdominal à ausculta Náuseas e vômitos
tardios de aspecto
Fluxograma 16: Obstrução intestinal alta fecalóide.

A parada de eliminação de fezes e ga- Fluxograma 17: Obstrução intestinal baixa


ses é um sinal que ocorre tardiamente A dilatação severa dos segmentos
durante a evolução da obstrução, uma intestinais pode levar a comprometi-
vez que o conteúdo colônico é esva- mento vascular com isquemia, necro-
ziado normalmente nas fases iniciais. se e perfuração. A perfuração ocorre
Os RHA podem estar aumentados principalmente em pacientes com VIC
inicialmente na tentativa de vencer o competente (75%), gerando obstru-
fator obstrutivo, a chamada peristal- ção em “alça fechada”, habitualmente
se de luta, apresentando aumento do na presença de tumores obstrutivos
timbre, conhecido caracteristicamen- do cólon esquerdo ou sigmoide.
te como som metálico, e gradualmen-
te podem desaparecer devido à fadi-
Complicações
ga da musculatura lisa.
Ao exame físico, além dos sinais e sin-
Dor constante, de início súbito e com
tomas descritos anteriormente, o pa-
aumento da intensidade pode sugerir
ciente pode apresentar sinais de desi-
comprometimento vascular.
dratação ou choque hipovolêmico.
A presença de sensibilidade/reativi -
SE LIGA! Íleo paralítico, em con - dade à palpação abdominal pode su-
traste com obstrução mecânica, é
gerir peritonite secundária ao estran-
uma condição indolor.
gulamento de alças.

131
ABDOMEAGUDO 132

A presença de massas abdominais EXAMES ACHADOS


sugere processo inflamatório ou ne- Perdas hidroeletrolíticas, sugerindo
oplásico. Eletrólitos causas metabólicas ou indicar es-
(Na, K, Cl) trangulamento e comprometimento
OBSTRUÇÃO OBSTRUÇÃO vascular.
INTESTINAL BAIXA INTESTINAL ALTA Acidose metabólica em comprome -
Dor abdominal central Dor abdominal em abdo- timento vascular, com aumento do
em cólica me inferior ou flancos Gasometria lactato e redução do bicarbonato.
arterial Alcalose metabólica pode ser
Vômitos precoces – Vômitos tardios – fecaló-
detectada dependendo do grau de
biliosos ides
depleção de cloreto.
Obstipação absoluta e
Obstipação tardia Tabela 16: Exames laboratoriais x achados
distensão predominantes

Tabela 15: Obstrução alta x Obstrução baixa

7.5. Diagnóstico Exames de imagem


O diagnóstico de abdome agudo Radiografia em decúbito dorsal e or-
obstrutivo pode ser feito a partir de tostase podem evidenciar dilatação
anamnese e exame físico minucio - de alças com nível líquido intralumi-
so. Além disso, é necessário avaliar nal proximais à obstrução, sugerindo
o estado geral do paciente, confirmar o nível do processo obstrutivo.
o diagnóstico e identificar a condição
Na dilatação do jejuno podem-se ve-
subjacente ao quadro obstrutivo.
rificar válvulas coniventes com as -
Exames complementares auxiliam no pecto de empilhamento de moedas.
diagnóstico diferencial e na diferen- Dilatações ileais apresentam válvulas
ciação entre obstrução funcional ou menos demarcadas.
mecânica, sítio da obstrução e identi-
ficação de complicações.

Exames laboratoriais

EXAMES ACHADOS
Desidratação, leucocitose (proces -
Hemograma so infeccioso, estrangulamento ou
perfuração)
Diabetes descompensado ocasio-
Glicemia
nando obstrução funcional
Podem indicar desidratação em ní-
Função renal veis baixos e evidenciar injúria renal
Figura 14: Empilhamento de moedas. Fonte: https://pe-
(ureia e aguda de origem pré-renal na vigên-
bmed.com.br/paciente-com-distensao-abdominal-e-pe-
creatinina) cia de desidratação grave ou choque ristalse-aumentada/ acesso em 17/12/2019 às 12:49
hipovolêmico quando elevados.

132
ABDOMEAGUDO 133

Na dilatação colônica, normalmente casos em que há sofrimento de alça


verifica-se dilatação com padrão de com perfuração intestinal.
“moldura” delineando a parede abdo-
minal marginalmente. Não se eviden-
cia gás no reto abaixo do fator obs- Estudos contrastados
trutivo. O trânsito intestinal e enema opaco -
No vólvulo de sigmoide identifica-se podem auxiliar no diagnóstico e ma-
a dilatação da alça associada ao me- nejo, principalmente em obstruções
gacólon. Ainda nesses casos pode parciais do intestino delgado.
haver impactação fecal com imagens
EXAMES
em “miolo de pão” dentro da alça.
Confirmar o diagnóstico de volvo
de sigmoide, tumor e invaginação,
Enema Opaco além de permitir avaliar o sítio da
obstrução através da parada do
contraste.
Pode ser usada na síndrome de
Olgivie, pois servirá como trata-
Colonoscopia
mento ao aspirar ao gás contido
nas alças.
Diagnóstico etiológico em quadros
Laparoscopia
semi-obstrutivos ou no tratamento
Figura 15:Padrão em miolo de pão. Fonte: https:// diagnóstica
de obstruções.
www.medicina.ufmg.br/imagemdasemana/index.php?-
caso=321 acesso em 17/12/2019 Suspeita de neoplasia colorretal
TC de
ou em diverticulites perfuradas
Observações abdome
bloqueadas.
Na síndrome de Olgivie pode eviden-
Tabela 17:Outros exames
ciar dilatação do cólon ascendente
Dado o risco potencial de perfuração,
e transverso sem, no entanto, fator
contrastes hidrossolúveis devem ser
obstrutivo associado.
preferidos ao bário, uma vez que o
Pneumoperitônio e líquido livre na extravasamento desses pode ocasio-
cavidade podem estar presentes nos nar peritonite grave.

EXAME OBSTRUÇÃO SIMPLES OBSTRUÇÃO COM SOFRIMENTO DE ALÇA


Dilatação de alças com nível líquido Dilatação de alças com nível líquido Presen-
Dados radiológicos Ausência de líquido livre em cavidade ça de líquido livre em cavidade Presença de
Ausência de pneumoperitônio pneumoperitônio (se perfuração )
Hemoconcentração Leucograma normal
Hemoconcentração Leucocitose com desvio à
Laboratoriais ou pouco elevado Hipocalemia ou nível
esquerda Hipercalemia Acidose metabólica
sérico de K+ normal
Tabela 18: Exames e diferença entre obstrução com e sem sofrimento

133
ABDOMEAGUDO 134

7.6. Tratamento O procedimento de escolha depende


da causa da obstrução, da existên -
Os objetivos do tratamento do abdo-
cia de comprometimento vascular e
me agudo obstrutivo são:
da condição clínica do paciente. Pa-
Reposição Descompressão cientes com obstruções do intestino
hidroeletrolítica gastrointestinal delgado sem história sugestiva de
aderências devem ser submetidos
à laparotomia exploradora precoce -
Objetivos do
tratamento mente.
Deve-se sempre melhorar a condição
Terapêutica
clínica do paciente antes da cirurgia
Analgesia
definitiva com o intuito de reduzir a morbimor-
talidade associada ao quadro obs -
Fluxograma 18:Tratamento
trutivo. Quando há estrangulamento,
Conduta conservadora pode ser es- após liberação de aderências, o cirur-
colhida em alguns casos, como em gião deve avaliar a viabilidade da alça
bolo de áscaris, invaginação intes - acometida, analisando critérios como
tinal, volvo de sigmoide, fecaloma e a integralidade da camada serosa,
aderências. peristaltismo e pulsação de vasos
Em casos de aderências, acima de mesentéricos.
75% dos casos a obstrução apresen- Nos casos de inviabilidade da alça
ta resolução apenas com tratamento deve-se proceder à ressecção do
conservador, caso não haja sinais de segmento com anastomose primária
estrangulamento de alça. ou confecção de orifício dependendo
Obstruções do intestino delgado di- da condição clínica do paciente.
ficilmente se resolverão sem cirurgia Nas obstruções colônicas o primei-
caso não apresentem resolução den- ro passo é a descompressão, sendo
tro de 48 horas de tratamento con- necessária cirurgia na maioria das
servador. obstruções mecânicas. A lesão obs-
trutiva deve ser removida sempre
Tratamento Cirúrgico que possível.

A cirurgia é indicada se existir uma


causa subjacente que necessita de Tratamento Conservador
tratamento, a exemplo de tumor ou Volvo de sigmoide pode ser maneja-
hérnias, mediante falha no tratamen- do clinicamente através da descom-
to conservador ou quando houver si- pressão por retossigmoidoscopia;
nais de irritação peritoneal.

134
ABDOMEAGUDO 135

Intussuscepção intestinal pode ser Na vigência de distúrbios de motilida-


corrigida a partir do uso de enema de sem, no entanto, apresentar fator
opaco quando o contraste consegue mecânico obstrutivo, deve-se pros -
vencer o fator obstrutivo, desfazendo seguir à reposição hidroeletrolítica, à
a invaginação. colocação de sonda nasogástrica e
Na síndrome de Olgivie, colonoscopia tratamento da causa subjacente.
pode ser usada para descompressão
dos cólons direito e transverso, mais
tratamento com neostigmina.

Obstrução intestinal

Analgesia Funcional
Correção
Hidroeletrolítica
SNG Corrigir Correção
hiperglicemia Hidroeletrolítica

Mecânica

Peritonite Instestino delgado Instestino grosso

Laparotomia exploradora Sofrimento de alça Colón esquerdo

Alça viável Ressecção à


Intussucepção Bridas
Hartmann
Alça inviável
Manejo clínico Ressecção +
Enema opaco? anastomose primária
Ressecação +
anastomose
primária Ostomia protetora

Ressecação
Colón direito
+ colostomia
temporária
Hemicolectomia
Volvo sigmoide Retossigmoidoscopia direita + ileotrans-
versoanastomose
Síndrome Oglive Colonoscopia
Bypass
ileotransverso

Fluxograma 19: Resumo - Obstrução intestinal

135
ABDOMEAGUDO 136

8. ABDOME AGUDO PERFURATIVO


8.1. Definição
Dando continuidade ao módulo, falaremos agora sobre Abdome Agudo Perfu-
rativo. Como se trata de um abdome agudo, a principal característica dessa sín-
drome clínica é a dor abdominal, não traumática, de início súbito. Diferentemen-
te do abdome agudo inflamatório, ocorre por perfuração de uma víscera oca.

SE LIGA! Importante lembrar que pode haver um quadro infeccioso após a perfuração
por instalação de uma peritonite química com posterior proliferação bacteriana.

As perfurações podem ainda ser clas- Abdome Agudo Inflamatório (1º) e


sificadas como altas ou baixas, tendo Obstrutivo (2º). A taxa de mortalidade
como referência o Ligamento de Treitz. varia entre 8 a 10% se não tratada,
Nas perfurações altas geralmente se dependendo a etiologia, como vere-
inicia por uma peritonite química, por mos adiante.
liberação de sucos digestivos, que Dentre as principais etiologias, a úlce-
culmina com proliferação bacteriana ra péptica evolui com perfuração em
e posterior processo infeccioso. Nas 10% dos casos, havendo uma preva-
perfurações baixas, é esperado iní - lência do duodeno em relação ao es-
cio por peritonite infecciosa de região tômago (14:1).
já colonizada com evolução para um
quadro sistêmico, podendo manifes-
tar sinais de septicemia. 8.3. Fisiopatologia
A gênese dessa síndrome se dá pela
Trauma Infecções Neoplasias perfuração de uma viscera oca. Essa
perfuração pode ser decorrente de
Possíveis causas
diversas causas, como: processo in-
flamatório, neoplásico, obstrutivo e
infeccioso.
Ingestão de Doenças
corpo estranho inflamatórias Geralmente, a evolução se dá da se-
guinte forma: com o extravasamento
Fluxograma 20: Possíveis causas de secreção luminal na cavidade te-
8.2. Epidemiologia mos uma inflamação peritoneal de
natureza química de intensidade va-
É a terceira síndrome abdominal agu- riável, seguida de invasão bacteriana
da mais frequente, ficando atrás de

136
ABDOMEAGUDO 137

secundária e progressivo processo perfuração geralmente associada à


infeccioso, com repercussões locais e ingestão de álcool, corticoides e AI-
sistêmicas. NES. Neoplasias e corpos estranhos
são causas importantes que podem
Saída de Saída de Peritonite
também aparecer em outros seg -
conteúdo conteúdo química mentos.
luminal luminal

Repercussão
Peritonite Invasão Intestino delgado
local e bacteriana
bacteriana
sistêmica As perfurações proximais geram peri-
Fluxograma 21: Fisiopatologia
tonite química inicialmente, já que há
As bactérias comumente encontra - extravasamento de enzimas ativas, e
das são: as perfurações mais distais são acom-
panhadas de peritonite bacteriana.
Pseudomonas
aeruginosa
Progressão de outros
processos inflamatórios
Bactérias comuns Kleibisiella sp (diverticulite e apendicite)

E. Coli
Volvos Doença
Fluxograma 22: Bactérias comuns
de ceco e Principais inflamatória
Agora falaremos sobre as principais sigmoide causas intestinal
causas e como os processos costu-
mam se instalar em cada topografia.
Lembrando que a divisão citada aci- Megacólon Síndrome
Neoplasias
ma sobre perfurações altas e baixas tóxico de Ogilvie
tem objetivo ilustrativo de como os
Fluxograma 23:Intestino Delgado – principais causas.
processos pode se dar com base no
Ligamento de Treitz. Nesse caso, di-
vidiremos em estômago e duodeno, CONCEITO: Divertículo de Me -
intestino delgado e intestino grosso. ckel é uma anormalidade congê -
nita comum no TGI por uma falha
Veremos que a fisiopatologia se rela- na obliteração durante o desen -
ciona e citaremos as principais etiolo- volvimento embrionário, gerando
gias por porção. um divertículo curto próximo à vál-
vula ileocecal. Uma das principais
complicações que podem ocorrer a
partir dele é a perfuração levando
Estômago e duodeno a um quadro de Abdome Agudo
Perfurativo.
As etiologias mais comuns são as úl-
ceras agudas e crônicas, sendo essa

137
ABDOMEAGUDO 138

Intestino grosso
flamatório, certo? O quadro da Di-
A peritonite é bacteriana desde o iní- verticulite, mesmo em AAI, pode
manifestar um quadro confundidor
cio. Além disso, a perfuração no colón com quadro perfurativo e obstru -
direito é mais grave que a do esquer- tivo. Uma das causas é essa: a di-
do, devido à alta virulência dos ger- verticulite pode ser uma etiologia
mes e pela consistência líquida das do abdome agudo perfurativo, mas
pelo conceito básico dessa síndro-
fezes. me, sabemos que ocorre por perfu-
ração desses divertículos após pro-
cesso inflamatório.
SAIBA MAIS: Nas obstruções me-
cânicas pode ocorrer o fenômeno
de alça fechada, quando a válvula As perfurações podem ocorrer em
ileocecal é competente (em 80% peritônio livre com extravasamento
dos casos), ou seja, não permite re- do líquido e difusão para toda a ca-
fluxo do conteúdo cecal para o íleo,
gerando distensão progressiva do vidade abdominal, florindo o quadro
ceco até sua perfuração. clínico típico, ou de forma bloquea-
da gerando sinais e sintomas locali-
Abdome agudo Doença zados – esses sinais e sintomas atí-
obstrutivo com inflamatória picos podem dificultar e retardar o
necrose intestinal intestinal diagnóstico.

Possíveis causas
8.4. Clínica
Divertículo Corpo Para discutir a clínica de cada sín-
Infecção
de Meckel estranho drome, precisamos nos ater sempre
Fluxograma 24: Principais causas – intestino grosso
à classificação principal, portanto, o
sintoma invariável é a dor abdomi-
nal. A partir disso, as demais ma-
RELEMBRANDO: A Síndrome de nifestações variam de acordo com
Ogilvie, como visto em abdome local em que ocorreu a perfuração,
agudo obstrutivo, também é co -
nhecida como pseudo‐obstrução
o tempo decorrido entre o início
intestinal aguda e caracteriza‐se do quadro e intervenção médica
pela dilatação das alças de cólon, e o grau de distribuição dos líqui-
podendo se estender até o reto, dos extravasados. Lembrando que
sem causas mecânicas.
alguns pacientes, como idosos e
imunosupressos podem ter o qua-
SE LIGA! Exploramos diverticulite
dro mascarado.
no capítulo de Abdome Agudo In-

138
ABDOMEAGUDO 139

De um modo geral, temos: SINAL DESCRIÇÃO


perda da macicez hepática à per-
Sinal de Jobert
Dor súbita, Abdome cussão do hipocôndrio direito.
intensa e difusa em tábua
Tabela 19:Sinais
Lembrem sempre que os sinais e sin-
Clínica tomas típicos ocorrem quando há pe-
ritônio livre – acometimento de toda
cavidade abdominal com dor e peri-
Evolução rápida Sinais de
peritonite tonite generalizada.
Avaliar SEMPRE: se a peritonite é
Fluxograma 25:Clínica
química ou bacteriana, nível da per-
A clínica pode ser acompanhada de furação e presença de comprometi-
sinais de sepse, hipotensão ou cho- mento sistêmico.
que a depender da gravidade do
caso. O acúmulo de gás pode com- 8.5. Diagnósticos etiológicos
prometer a musculatura diafragmá-
tica resultando em desconforto res- Úlcera peptídica perfurada
piratório. São úlceras perfuradas
que se estendem através
da parede muscular se -
SE LIGA! As úlceras perfuradas
podem ser tamponadas e conse - rosa, permitindo a comu-
quentemente, apresentarão quadro nicação entre a luz da víscera
mais arrastado. Outro motivo para e a cavidade abdominal, com extra-
curso mais indolente é a presença
vasamento de conteúdo.
de abscessos e fístulas.
As perfurações geralmente ocorrem
A dor pode ser lombar, nos casos de por desequilíbrio entre secreção de
perfurações retroperitoneais, ou irra- ácidos e a barreira mucosa gástrica.
diarem para os ombros nos casos de Esse conteúdo gástrico e duodenal
perfuração em abdome superior que na cavidade abdominal resulta em
irritam o diafragma. peritonite química.
Abdome em tábua é uma contratura Essas úlceras podem ser complica -
involuntária generalizada da parede ções da Doença úlcerosa peptídica e
abdominal por peritonte difusa. No a prevalência de H. Pylori no desen-
exame físico podem encontrar tam- volvimento nessa doença faz com
bém distensão abdominal e ausência que essa colonização esteja relacio-
de ruídos hidroaéreos. nada ao Abdome Agudo Perfurativo.

139
ABDOMEAGUDO 140

Nesse caso, há aumento da secreção A pressão colônica força fezes e bac-


gástrica e diminuição da secreção de térias através da perfuração para den-
bicarbonato da mucosa. tro da cavidade abdominal, levando à
peritonite generalizada e sepse.
Dor abdominal
*Pode haver irradia-
Dor em fossa ção para as costas,
ilíaca esquerda flanco, região ingui-
nal ou todo abdome

Divertículos Sinais de peritonite


Taquicardia Rigidez abdominal
Febre Náuseas e vômitos
Tríade clássica

Fluxograma 26:Divertículos
Devemos estar atentos, pois uma
possível evolução do quadro é o Cho- Corpos estranhos
que hipovolêmico.
Se um corpo estranho é in-
As informações diagnósticas de um gerido por via oral ou retal
AAP serão dadas de forma unificada é potencialmente capaz de
mais abaixo. causar um quadro de abdo-
me agudo perfurativo. O esô-
frago costuma ser o local mais acome-
Divertículos
tido por sua anatomia e localização,
A perfuração espontânea de um di- mas só a partir da cárdia, a perfuração
vertículo em peritônio livre com con- começa a manifestar sintomas abdo-
sequente peritonite é rara, porém gra- minais. Outros locais acometidos são
ve, podendo levar a óbito por sepse e locais de estreitamento, como piloro,
falência de múltiplos órgãos. angulações duodenais e flexura duo-
Surge por atividade cólica anormal, denojejunal.
modiciações da dieta ou fatores pre- Localização: região
disponentes constitucionais. Modifica- Dor: intensa epigástrica com
ções na estrutura muscular dificultam e difusa irradiação para dorso
(dor em faixa)
o esvaziamento do conteúdo fecal,
provocando erosões da mucosa e pro- Náuseas e vômitos
cessos inflamatórios. Além disso, se Corpo estranho precoces e
houver comprometimento da perfu - volumosos
são sanguínea dos divertículos, pode
Íleo paralítico
haver necrose e perfuração intramural.
Fluxograma 27: Corpo estranho

140
ABDOMEAGUDO 141

8.6. Diagnóstico cíficos, podendo nos ajudar a detec-


tar apenas a presença de processos
O diagnóstico de um Abdome Agudo
inflamatórios e infecciosos prévios.
Perfurativo se baseia na história clíni-
Assim, para confirmar a perfuração,
ca minunciosa, exame físico criterioso
métodos de imagem são os mais
e exames de imagem. E o laborató-
adequados.
rio? Exames laboratoriais são inespe-

Diagnóstico por imagem


A característica principal é a presença de ar e/ou líquido na cavidade peritoneal,
retroperitônio ou na parede dos órgãos. Em 75-80% dos casos há pneumoperi-
tônio e nos demais casos é esperado bloqueio no local da perfuração e, portan-
to, ausência de gás no segmento perfurado.

Radiografia simples
A radiografia é o exame inicial de escolha por ser um exame simples que mostra
com facilidade o melhor indicador de perfuração: pneumoperitônio.
O quadrante superior direito é onde mais frequentemente vemos ar livre. A sen-
sibilidade do exame pode ser elevada se o paciente permanecer na posição da
incidência por 10-20 minutos.
Pode ser solicitado em diversas incidências: ortostase, decúbito lateral e decú-
bito dorsal. Algumas incidências, como o decúbito horizontal possuem sensibili-
dade inferior, mas podem ser as únicas disponíveis no momento.
A radiografia em ortostase é ideal para identificar ar entre o diafragma e o fígado
ou estômago. Cerca de 50% do ar costuma se acumular abaixo do fígado ou no
espaço hepatorrenal.
Em decúbito lateral, temos boa visualização do ar entre o fígado e a parede abdo-
minal lateral, enquanto em decúbito dorsal podemos visualizar alguns sinais que
serão mostramos abaixo.
Sinais da radiografia em decúbito dorsal
SINAL RADIOGRÁFICO DESCRIÇÃO
delineamento da parede gástrica ou intestinal pela presença de gás na luz e na
Sinal de Rigler
cavidade peritoneal

CONTINUA

141
ABDOMEAGUDO 142

SINAL RADIOGRÁFICO DESCRIÇÃO


Sinal do ligamento delineamento das estruturas que normalmente não são vistas (ligamento falcifor-
falciforme me, ligamentos umbilicais) pelo gás, permitindo que o ligamento se torne radiopaco
Sinal do úraco o úraco torna-se radiopaco
Sinal do V invertido os ligamentos umbilicais laterais são visualizados
Tabela 20: Sinais Radiográficos

A. Sinal de Rigler B. Sinal do Ligamento Falciforme


Raio-X de abdome em decúbito Raio-X de abdome em decúbito dorsal,
dorsal, com alças do intestino delgado com imagem linear radiopaca (setas
distendidas por gás (setas pretas), brancas), delineado por ar livre na cavidade
associado a gás fora da luz intestinal abdominal.
(setas brancas), delineando a parede da
alça (ponta de seta branca).

Figura 16: Sinais radiográficos

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS EM EXAMES DE IMAGEM


Síndrome de Chilaiditi: interposição das alças entre a superfície hepá-
tica anterior e a cúpula diafragmática
Gordura subdiafragmática retroperitoneal ou entre fígado e diafragma
Pneumotórax e atelectasias basais
Distensão de vísceras ocas
Abscessos
Divertículos no estômago

Tabela 21:Diagnósticos diferenciais na imagem

Tomografia computadorizada cisa da perfuração e distribuição do


gás, além de possibilitar a visualiza-
A TC é um método excelente por sua
ção de abscessos, sinais sugestivos
elevada sensibilidade e especificida-
de obstrução e isquemia.
de. Nos permite uma localização pre-

142
ABDOMEAGUDO 143

e manejo inicial dos casos de hipo-


tensão e choque.
A antibioticoterapia de amplo espec-
tro pode ser feita antes do tratamento
definitivo ou no intra-operatório, po-
dendo manter-se posteriormente.
O tratamento é cirúrgico com objetivo
de rafia da perfuração, com ou sem
epiplonplastia nos casos de úlcera
TC apresentando grande quantidade de ar livre na ca-
vidade (ponta de seta), anteriormente ao estômago e ar péptica perfurada, ou a ressecção da
livre em topografia da bolsa omental (seta branca), suge- área comprometida, podendo fazer
rindo perfuração estomacal.
ressecção com anastomose primária
Figura 17:Tomografia computadorizada
ou com ostomia na impossibilidade
Fonte: https://www.researohgate.net/figure/88-year-ol -
d-woman-with-perforation-of-posterior-wall-of-gas- de se realizar a anastomose: imunos-
trio-boddy-and-this-complioatea_fig8_23964378
supressão, desnutrição, infecção.

SE LIGA! Como confirmar se o gás


está no espaço intraperitoneal ou 9. ABDOME AGUDO
retroperitoneal? Mudança de de - ISQUÊMICO
cúbito! O gás retroperitoneal migra
muito pouco e fica confinado nos 9.1. Definição
planos fasciais.
Agora falaremos sobre o abdome
Outros métodos agudo isquêmico. Abdome agudo is-
A videolaparoscopia pode ser útil quêmico é uma síndrome clínica ca-
principalmente nos paciente em uni- racterizada por dor abdominal, não
dade intensiva onde não há os parâ- traumática, de início súbito ou in -
metros dos sinais e sintomas clínicos. termitente, de intensidade variável,
representado pela isquemia mesen-
térica ou intestinal por fornecimento
8.7. Tratamento inadequado de oxigênio para o in -
testino, que necessita de interven -
Suporte clínico
ção médica imediata por ser poten-
Tratamento Antibioticoterapia cialmente fatal.
A isquemia mesentérica pode ser
Cirurgia
aguda ou crônica, mesentérica (intes-
Fluxograma 28: Tratamento
tino delgado) ou colônica (intestino
A abordagem inicial consiste em me- grosso).
didas de suporte com monitorização

143
ABDOMEAGUDO 144

Idosos Aterosclerose
Na isquemia mesentérica aguda, te-
mos também as três principais:

a. Trombosis
arterial

b. Embolismo
arterial
c. Isquemia
mesentérica no
oclusiva
Isquemia
d. Trombosis
Mulheres mesentérica
venosa
crônica
Figura 18: Causas principais: Abdome Agudo Isquêmico
A rapidez do diagnóstico está in - Fonte: Malta-Ramirez GA et al. Isquemia mesentérica
trinsecamente ligada ao sucesso do aguda: urgencia que exige um abordaje diagnóstico
integral, 2015.
tratamento e prognóstico. A taxa de
mortalidade é elevada, com cerca de
30% nos casos de trombose e 75-
1 Oclusão da Artéria Mesentérica
Superior (AMS) por êmbolo (50%)
ou trombo (15-25%)
80% nos casos de obstrução arterial
atribuído ao diagnóstico tardio. 2 Trombose da Veia Mesentérica
Superior (VMS) (5%)

9.2. Fisiopatologia 3 Isquemia mesentérica não-


oclusiva (20-30%)
Como dito, a isquemia mesentérica
pode ser classificada pelo tempo de Como esperado, as regiões mais
instalação em aguda ou crônica, e por propensas à isquemia são as áreas
localização como mesentérica e colô- pobres em circulação colateral, por
nica. dificuldade de compensar a perfu-
são em caso de obstrução na cir -
As três principais síndromes de is -
culação principal, são áreas como a
quemia intestinal são:
flexura esplênica e junção retossig-

1 Isquemia colônica
(70-75%)
moide.
Essa lesão intestinal pode se dar por
dois mecanismos:
2 Isquemia mesentérica
aguda (20-25%) Hipoperfusão com hipóxia

3 Isquemia mesentérica
crônica (5%)
Reperfusão

Mecanismo de lesão intestinal

144
ABDOMEAGUDO 145

Na hipoperfusão, o comprometi - hipoperfusão, teremos vasoconstri -


mento da oferta de oxigênio se dá ção e redução do fluxo colateral. Em
com uma redução do fluxo intesti - alguns casos, mesmo após restau-
nal maior que 50%. De forma geral, ração do fluxo, a vasoconstrição é
o intestino consegue compensar até mantida.
75% de hipoperfusão por até 12h Na reperfusão a lesão se dá por ação
sem dano substancial, pelo aumento de espécies reativas de oxigênio.
da extração de oxigênio e circulação
A sequência de eventos está resumi-
colateral. Se houver manutenção da
da no fluxograma abaixo:

1 Hipoperfusão

extração O2
+ circulação
Sem dano
substancial
colateral

2 Hipoperfusão
prolongada
Vaso
↓ constricção
+ fluxo pelas
Necrose e infarto
transmurral
Perfuração
coaterais

Fluxograma 29: Mecanismo de lesão intestinal

Principais fatores de risco: Isquemia Colônica


O cólon recebe menor suprimento
Doenças crônicas
sanguíneo em comparação ao res -
Má formação arteriovenosa to do TGI e isso faz dele o segmento
mais acometido.
Medicações vasoconstritoras
Existem três mecanismos principais:
Cirurgia cardiovascular, doença car -
díaca (em especial IAM), hemodiálise, 1 Isquemia colônica
não oclusiva (95%)
trombofilias, DAOP podem constituir
fatores de risco, assim como medi -
cações vasoconstrictoras, como opi-
2 Oclusão arterial por
êmbolos ou trombos
óides, imunomoduladores e cocaína.
Além disso, não podemos deixar de 3 Trombose de veia
mesentérica
cogitar má formações arteriovenosas
como origem da isquemia. Isquemia colônica mecanismos
A maioria das oclusões por êmbolos
Agora discutiremos a partir da locali-
ou trombos cursa com isquemia do
zação.
intestino delgado concomitante.

145
ABDOMEAGUDO 146

É mais prevalente em mulheres e deve graves, como choque, insuficiên -


ser suspeitada em pacientes com dor cia cardíaca grave, sepse, hipóxia
em abdome inferior e diarreia ou he- grave. Baseia-se na associação de
matoquezia. estados de baixo fluxo sanguíneo
e uso de drogas vasoconstrictoras.
A ICC é a etiologia isolada mais
Isquemia Mesentérica Aguda frequente.
• A oclusão da AMS pode ocorrer • A trombose da VMS é a principal
por embolos ou trombos. causa de isquemia de delgado em
• A oclusão por êmbolos é mais co- pacientes jovens com doenças car-
mum e costuma ter melhor prog- diovasculares. A obstrução aguda
nóstico, já que a obstrução é mais do fluxo venoso causa sequestro
distal do que na trombose, com do fluido intestinal, hipovolemia e
infartos menos extensos e, ge - hemoconcentração, gerando va -
ralmente, poupando o delgado. soconstricção arteriolar e redução
Os êmbolos são provenientes de da perfusão intestinal. Pode ser
trombos do átrio esquerdo, ventrí- primária ou secundária se tiver as-
culo esquerdo, valvas cardíacas ou sociada a algum dos fatores da Trí-
aorta proximal, tendo como fator ade de Virchow.
de risco IAM, fibrilação atrial ou es-
tenose mitral.
Hipercoagulabilidade
• A oclusão por tombros ocorre de-
vido à doença intrínseca da cama-
da íntima dos vasos, sendo a ate-
rosclerose o principal fator. Pode
estar associado a doenças do te-
cido conectivo, trauma abdominal, Estase venosa Lesão endotelial

sepse ou dissecção de aorta. Pode Triade de virchow


ser considerada uma isquemia
Estados de hipercoagulabilidade:
mesentérica crônica que agudizou.
neoplasias, deficiência de proteína
• A isquemia mesentérica pode ser C e S, policitemia vera, deficiência
não oclusiva, também conhecida de antitrombina III, uso de anticon-
como Vasoconstricção mesenté - cepcionais orais, síndrome antifos-
rica. É decorrente de um grave e folípide.
prolongado vasoespasmo asso -
• Estase venosa: hipertensão portal
ciado ao uso de drogas (digitálicos,
e ICC.
cocaína) ou doenças sistêmicas

146
ABDOMEAGUDO 147

• Lesão endotelial: pós-operatório rias estão comprometidas, uma por-


de esplenectomia, após trauma ção muito pequena surge por obs-
abdominal, sepse. trução de uma única artéria.

Isquemia Mesentética Crônica 9.3. CLÍNICA


É decorrente de episódios constantes Agora falaremos sobre as manifesta-
de hipoperfusão, típico de pacientes ções de um quadro de abdome agu-
com oclusões e estenoses de vasos do isquêmico. As formas de apre -
mesentéricos causados por ateros - sentação e gravidade dependem dos
clerose. É caracterizada pela angina fatores a seguir:
mesentérica ou intestinal nas primei-
ras horas após alimentar-se. Leito acometido (arterial ou venoso)

Existem duas explicações para a rela- Grau de obstrução


ção entre a dor e as refeições: Duração

1 Desequilíbrio entre demanda


metabólica e fluxo sanguíneo
Circulação colateral

Extensão das vísceras acometidas


esplâncnico

2 Hipoperfusão intestinal
Variáveis clínicas
Pode variar desde um quadro súbito
(infartos) a quadros de angina ab -
Relação dor e refeições dominal crônica, além de apresentar
A hipoperfusão intestinal se dá pelo sintomas variáveis como:
desvio do sangue para o estômago.
Essa teoria é a mais consistente devi -
do a correlação temporal da dor.
Náuseas e Diarreia e
Outras causas raras são: compressão vômitos constipação
do tronco celíaco pelo ligamento me -
diano arqueado (síndrome da com -
pressão do tronco celíaco), displasia Sintomas
fibromuscular, dissecção de aorta ou
Sangramentos podem ocorrem na
artéria mesentérica, vasculites e fi -
brose retroperitoneal. isquemia mesentérica crônica e na
isquemia colônica, mas o principal
Por ser uma doença crônica, o curso
sintoma presença em todos os casos
insidioso permite a formação de va -
sos colaterais
é a dor abdominal.

Na maioria das vezes, os sintomas No abdome agudo isquêmico, a prin-


ocorrem quando duas ou mais arté - cipal característica da dor abdominal

147
ABDOMEAGUDO 148

é a desproporção entre a intensidade referida e o exame físico.


A tríade da isquemia mesentérica crônica consiste em:

Dor abdominal
pós-brandial

Aversão a Perda de
comida peso

Tríade da isquemia
Nesse caso, a dor abdominal é bastante variável:

MAPA MENTAL - DOR ABDOMINAL

Isquemia
Êmbolos ou Trombose mesentérica Êmbolos ou
trombos arteriais da VMS não oclusiva trombos

Início súbito Início insidioso Dor branda Dor intensa

Pode ser Isquemia


localizada ou Dor abdominal
colônica
difusa

Quadrantes Lado
Epigástrica
inferiores esquerdo

Território Território
da AMS da AMI

Como diferenciar isquemia aguda mesentérica de colônica?

ISQUEMIA AGUDA ISQUEMIA AGUDA


CARACTERÍSTICAS
DO INTESTINO DELGADO DO INTESTINO GROSSO
Idade Variável > 60 anos
Fator precipitante Presente Raro
Estado geral Ruim estado geral Regular estado geral
Dor Severa Moderada, reativo

CONTINUA

148
ABDOMEAGUDO 149

ISQUEMIA AGUDA ISQUEMIA AGUDA


CARACTERÍSTICAS
DO INTESTINO DELGADO DO INTESTINO GROSSO
Sangramento Incomum Retal ou nas fezes
Tabela 22:isquemia mesentérica e colônica

No exame físico inicialmente o abdo- Pode haver: leucocitose em 75% dos


me pode estar normal, com dor leve a casos, hemoconcentração, acidose
moderada. A peristalse normal ou au- metabólica, elevação do lactato, fos-
mentada como reação inicial à hipóxia. fato e amilase sérica (elevações me-
Com a progressão da isquemia, temos: nos que na pancreatite).
Se houver necrose há elevação de
LDH, CPK, Fosfatase Alcalina (fração
Distensão Timpanismo intestinal).
abdominal aumentado

Exames de imagem
Progressão da isquemia
Sinais de choque e peritonite genera- Devem ser solicitados nos casos de
lizada são achados tardios e indicam pacientes estáveis.
prognóstico ruim. O exame de primeira escolha pelo
Colégio Americano de Radiologia na
9.4. Diagnóstico emergência é a Tomografia compu-
tadorizada com contraste de ab -
dome, pois identifica aterosclerose e
SE LIGA! Qualquer paciente com exclui outras causas de dor abdomi-
dor abdominal aguda e acidose me- nal aguda.
tabólica tem isquemia intestinal até
que se prove o contrário!
ACHADOS

Espessamento da parede intestinal e


O diagnóstico precoce depende de dilatação da víscera
reconhecer população de risco e o
Pneumatose intestinal ou portomesentérica –
alto índice de suspeita clínica. indica perfuração

Infarto de orgãos sólidos

Falta de enchimento arterial


Exames laboratoriais
Oclusão e trombos
Os exames laboratoriais são inespe-
cíficos. Tabela 23: Achados – tc de abdome

149
ABDOMEAGUDO 150

1 e 2: TC com bolhas de
ar na parede do intestino
delgado (setas brancas) e
espessamento de parede.
Figura 19:
Fonte: endler DA et al. Overvier of intestinal schemia in adults. Uptodate, jul/2018
Nos casos de trombose da VMS, podemos ver:

ACHADOS
Estenose ou oclusão de dois ou mais vasos mesentéricos
Vasos colaterais dilatados
Espessamento e realce da parede intestinal
Ingurgitamento da VMS
Trombo na VMS
Tabela 24:TC de abdome com trombose de VMS

3: TC (fase venosa) com


defeito importante do
contraste na VMS (círculo)
com aumento da densidade
da gordura mesentérica.
Figura 20: Achados na TC

4a e 4b: TC (fase venosa)


com defeito nítido do
contraste na VMS (círculo),
com oclusão por um
trombo. Edema em íleo
(4b) com redução do
contraste em sua parede.
Ausência de gás livre.

Figura 21: Achados na TC

150
ABDOMEAGUDO 151

A angiografia é o exame padrão ouro e somente nos casos estáveis, sem


na isquemia mesentérica aguda e sinais de peritonite ou evidência de
crônica, porém muitas vezes não é isquemia irreversível. Podemos vi-
necessária devido ao diagnóstico sualizar: edema, eritema, mucosa
pela TC. friável, nódulos hemorrágicos, úl -
A vantagem da angiografia é que pode cera linear única no eixo longitudi-
ser usada de forma terapêutica, como nal (sugestivo de isquemia).
em uma abordagem endovascular ou
injeção direta de vasodilatador. Deve 9.5. Tratamento
ser realizado nos casos suspeitados
em outros exames de imagem. Em pacientes instáveis com suspeita
de abdome agudo isquêmico, o tra-
Além dos achados vasculares já des-
tamento não deve ser postergado vi-
critos, podemos encontrar:
sando confirmação diagnóstica com
ACHADOS exames de imagem.
Sinal do menisco: oclusão abrupta da AMS por
êmbolos
Estreitamento na origem dos vasos mesentéricos
Tratamento clínico
Irregularidades nos ramos intestinais O manejo inicial inclui monitorização
Espasmos das arcadas arteriais cardíaca e dos parâmetros ventilató-
Oclusão e trombos rios, acesso venoso com reposição
Tabela 25: outros achados volêmica individualizada, correção
Outros exames disponíveis: de distúrbios hidroeletrolíticos, anal-
gesia e antibiótico venoso de amplo
• USG com Doppler: pode ser fei- espectro.
to como exame inicial nos casos
de isquemia mesentérica crônica. Antibioticoterapia venosa
Possui um valor preditivo negativo Anticoagulantes
acima de 90%. É menos utilizado
Tratamento clínico
que a TC devido as suas desvan-
tagens: examinador-dependente, O uso de antibiótico venoso protege
interposição gasosa, cirurgia ab - contra translocação bacteriana
dominal prévia. e reduz inflamação intestinal
• Colonoscopia: pode ser solicita - por reduzir a flora intestinal.
da nos casos de isquemia colôni- Os anticoagulantes são utiliza-
ca para confirmação diagnóstica. dos nos casos de oclusão arterial
Deve ser feito com insuflação míni- ou venosa e em alguns casos de
ma para evitar distensão excessiva isquemia mesentérica não oclu-

151
ABDOMEAGUDO 152

siva para evitar a formação de trom-


bos e sua propagação, com exceção
de casos de sangramento ativo.
A papaverina é um vasodilatador e
pode ser utilizada nos casos de vaso-
constricção, colocado diretamente na Isquemia mesentérica aguda com alça intestinal
AMS. não viável (seta), sendo necessário a ressecção.

É importante fazer a suspensão de Figura 22:Tratamento cirúrgico. Fonte: Pearl G. et al.


Acute mesenteric arterial occlusion. Uptodate: 2018
drogas vasoconstrictoras de uso
prévio.

Tratamento cirúrgico
O tratamento definitivo é cirúrgico e
pode ser necessário ressecção das
alças isquemiadas. A exploração ci-
Artéria mesentérica superior antes (A) e depois (B) da
rúrgica está indicada nos casos de: trombólise endovascular, com colocação de cateter na
origem do vaso.
Sinais de irritação peritoneal Figura 23:tratamento cirúrgico. Fonte: Pearl G. et al.
Acute mesenteric arterial occlusion. Uptodate: 2018
Sinais de infarto intestinal em imagem
Na isquemia mesentérica crônica ge-
Dúvida diagnóstica ralmente o tratamento é conservador
Tratamento cirúrgico visando a prevenção da progressão
Pode ser necessária uma segunda da aterosclerose com terapia antipla-
reabordagem (“second look”) em 24- quetária e anticoagulação nos casos
48h para reavaliar a persistência da de trombos. A revascularização é in-
isquemia. dicada nos sintomáticos com esteno-
Nos casos de oclusão arterial mesen- se importante com o objetivo de pre-
térica: venir infarto intestinal.

Laparotomia
Pancreatite
com embolectomia 10. ABDOME AGUDO
HEMORRÁGICO
Revascularização
Com trombos aberta ou angioplastia 10.1. Introdução
com trombólise in situ
Inumeras são as causas de hemor-
É feita usando
Revascularização
veia safena
ragia intra-abdominal. Possui etio -
logias variadas abrangendo desde
Fluxograma 30:Oclusão arteril mesentérica traumatismo abdominal, ruptura de

152
ABDOMEAGUDO 153

aneurismas da aorta ou de alguma 10.3. Etiologias


artéria visceral, neoplasias malígnas
3.1. Abdome Agudo Hemorrágico
até processos inflaatórios erosivos.
Vascular
2. Epidemiologia Ruptura de aneurisma de aorta ab-
dominal
Apesar de incomum, estando presen-
te em apenas 2% dos pacientes que O aneurisma da aorta abdominal
procuram atendimento de amergen- (AAA) está presente em 5-7% dos
cia com dor abdominal, se não diag- indivíduos acima dos 60 anos de ida-
nósticado precocemente, sua conse- de, predominando mais no sexo mas-
quencia pode ser fatal. culino tendo como principais fatores
de risco para essa categoria a idade
Sangramento abdominal pode ocor-
>65 anos, hipertensão arterial (HAS),
rer em qualquer idade, embora este-
tabagismo, doença pulmonar obstr -
ja mais presente entre 50 e 60 anos
tiva crônica (DPOC), aterosclerose,
de idade. É mais frequente em ho-
síndrome de Marfan, a síndrome de
mens, na proporção de 2:1. A etio-
Ehlers-Danlos e antecedente familiar
logia varia de acordo com a idade e
da doença.
sexo, conforme mapa abaixo.
Muitos pacientes com AAA são as-
sintomáticos e o diagnóstico é sus-
Em idosos é mais
comum ruptura de
peitado no exame físico pela pal -
tumores e aneurisma pação de massa pulsátil, distensão
de aorta abdominal
abdominal e dor à palpação. Nesses
pacientes, o ultrasom ou a tomo -
grafia computadorizada confirma o
diagnóstico.
Maior entre
Acomete
a 5ª e 6ª
mais o sexo
Em metade dos paciente com AAA,
década de
vida masculino a manifestação clínica inicial é ape-
nas referida como desconforto ou dor
abdominal mal caracterizada, poden-
do apresentar também dor na região
Em mulheres está Em jovens é mais dorsal. Os sintomas associados à dor
mais associado a comum ruptura de são vários, predominando náuseas e
origem ginecológica e aneurisma de artérias
obstétrica. viscerais vômitos. Poucos pacientes, cerca de
12%, com ruptura de aneurisma sa-
bem ser portadores de AAA.

153
ABDOMEAGUDO 154

Quando ocorre ruptura, a hipotensão emergência, exame que detecta tanto


arterial está presente em 25% dos a presença do AAA como de líquido
casos no atendimento inicial. livre na cavidade peritoneal.
O tratamento inicial é direcionado
para estabilização hemodinâmica do SE LIGA! Ao médico que atender
paciente, sendo o grau desse aco - o doente cabe iniciar a estabiliza -
metimento definidor da urgência ne- ção e, assim que suspeitar de AAA
roto, solicitar imediata avaliação do
cessária na avaliação radiológica e na
cirurgião vascular, mesmo antes do
indicação cirúrgica. Nos doentes ins- resultado dos exames, independen-
táveis hemodinamicamente, o diag - temente da condição hemodinâmi-
nóstico da ruptura do AAA pode ser ca do paciente.
confirmado pelo ultrassom na sala de

MAPA MENTAL - RUPTURA DE ANEURISMA DE AORTA ABDOMINAL

Ruptura de aneurisma
de aorta abdominal

Mais comum em Fatores de risco:


pacientes do sexo HAS, DPOC, Avaliação com USG
masculino com idade aterosclerose, na emergência
>65 anos antecedente familiar

Desconforto ou dor Exame físico: massa


Solicitar imediata Tratamento inicial:
abdominal, dor em pulsátil, distensão
avaliação do estabilização
dorso, náuseas e abdominal e dor a
cirurgião vascular hemodinâmica
vômitos palpação

TC de abdome sem contraste endovenoso mostrando aneuris- TC de abdome com contraste endovenoso mostrando aneuris-
ma de aorta infra-renal (seta preta), associado a massa hetero- ma de aorta infra-renal. Observa-se realce intraluminal da aorta
gênea envolvendo a região do aneurisma e se estendendo para (ponta da seta preta). Não foi identificado extravasamento do
a região paravertebral bilateralmente, mais acentuadamente à meio de contraste pata o interior do hematoma retroperitoneal
esquerda (posta da seta preta). (PsE = músculo psoas). (setas brancas), configurando aneurisma de aorta tamponado.
Figura 24: Achados na TC Figura 24: Achados na TC

154
ABDOMEAGUDO 155

Ruptura de aneurisma das artérias Habitualmente é assintomático. Ao


viscerais abdominais romper-se, manifesta dor no qua -

1
drante superior direito ou no epi -
Aneurisma da artéria esplê - gástrio e mimetiza a colecistite e a
nica:é mais comum no sexo pancreatite agudas. Dependendo
feminino e é o aneurisma mais da localização, o sangramento pode
comum entre os vasos viscerais ab- exteriorizar-se por hematêmese ou
dominais, correspondendo a cerca de melena, por erosão dos ductos bilia-
60% de todos os aneurismas de ar- res ou do tubo digestivo.
térias viscerais. Tem como fatores de A ressecção, ou a obliteração, dos
risco para ruptura desse aneurisma a aneurismas da artéria hepática está
hipertensão venosa portal, fibrodis - indicada em todos os pacientes.

3
plasia arterial e gravidez.
O tratamento do paciente que é ad- Aneurisma da artéria mesen-
mitido no hospital com choque hipo- térica superior: é o terceiro
volêmico em decorrência de sangra-
mais comum. Ocorre em indiví-
mento por ruptura do aneurisma é
duos abaixo de 50 anos e distribui-se
a laparotomia exploradora imediata igualmente entre os homens e as mu-
associada à reposição agressiva da lheres. Os fatores de risco são a endo-
volemia com soluções cristalóides e,
cardite, os traumatismos e a arterios-
quando necessário, com hemoderi -
clerose. A maioria dos aneurismas da
vados. Quando o aneurisma se situa artéria mesentérica superior ocorrem
distalmente, nas proximidades do em consequência de endocardite bac-
baço, o tratamento consiste na liga-
teriana.
dura proximal da artéria, seguida de
esplenectomia. Os sintomas variam muito. Quando
o aneurisma compromete a irrigação

2 Aneurisma da artéria hepáti-


ca:é predominante em homens
das alças intestinais, podem ocorrer
cólicas abdominais após as refeições,
sugestivas de claudicação intestinal.
acima de 60 anos de idade e Quando há ruptura, a dor é intensa,
corresponde ao segundo aneurisma dinfundida para todo o abdome e os
de arterinal visceral mais comum. sinais de choque tornam-se mais evi-
Atualmente, cerca de 38% ocorrem dentes. Pode ser acompanhada de
em decorrência de arteriosclerose, náuseas.
21%, de degeneração da camada O tratamento dessas lesões é muito
média, 18%, de traumatismo e ape-
variável, dependendo da localiza -
nas 16% são de origem micótica.

155
ABDOMEAGUDO 156

ção do aneurisma, da condição de intestinais e da condição clínica do


irrigação e de vitalidade das alças doente.

MAPA MENTAL - RUPTURA DE ANEURISMA DE ARTÉRIAS VISCERAIS ABDOMINAIS

Ruptura de aneurisma
de aorta abdominal

Aneurisma de Aneurisma de Aneurisma de artéria


artéria esplênica artéria hepática mesentérica superior

É o mais comum. Mais comum Mais comum em


em homens < 50 anos

Mais frequente no
sexo feminino Fatores de risco: ar- Se distribui igualmente
teriosclerose, trauma- entre os sexos
tismo, degeneração
Fatores de risco: gra- da camada média
videz, fibrodisplasia Fatores de risco: en-
e hipertensão venosa docardite, traumatis-
portal mo e arteriosclerose

Ruputura de Gravidez Ectópica Quando forma da cavidade endo -


etrial, o lugar mais frequente são as
trompas, representando cerca de
CONCEITO: Toda gravidez com im- 95% dos casos. Contudo, também
plantação e desenvolvimento fora
da cavidade endometrial. pode ocorrer nos ovários e na cavida-
de abdominal.
A gravidez ectópica (GE) ocorre entre Os sintomas de uma GE rota pode se
1-2% das gestações e corresponde a apresentar como atraso menstrual,
10-15% das mortes maternas no 1º geralmente o útero é menor do que
trimestre. Tem como principais fato- o esperado, além de dor abdominal
res de risco cirurgias intensa, súbita, inicial-
tubárias, gravidez ec- mente em baixo ven-
tópica prévia, uso de tre, que pode irradiar
Dispositivo Intrauterino para ombro (Sinal de
(DIU), tabagismo ≥ 20 cigarros por Lafond). Instabilidade hemodi -
dia; técnicas de reprodução assis- nâmica, hipotensão, taquicardia
tida e endometriose. e choque hipovolêmico. Durante

156
ABDOMEAGUDO 157

o exame físico há presença de dor à O tratamento da GE rota consiste em


palpação abdominal, dor aguda ao avaliação da volemia materna, bem
toque do fundo de saco de Douglas. como reposição volêmica e tratamen-
Além disso, pode apresentar sinal de to do choque hipovolêmico. A abor-
Cullen. Os sintomas da gravidez ini- dagem cirúrgica de urgência, sendo
cial normal também estão presentes: realizado muitas vezes laparotomia
aumento da sensibilidade mamária, exploratória com salpingectomia. Em
náuseas e polaciúria. casos eventuais admite-se a salpin-
gostomia com microcuretagem tubá-
ria e reconstituição da trompa atingi-
RELEMBRANDO: Sinal de Lafond:
dor referida no ombro por sangue
da. É conduta alternativa reservada a
acumulado em região subdiafrag - paciente em boas condições, que de-
mática devido irritação do nervo seja filhos e que possui a outra trom-
frênico. pa comprometida.

MAPA MENTAL - RUPTURA DE ANEURISMA DE ARTÉRIAS VISCERAIS ABDOMINAIS

Ruptura de aneurisma
de aorta abdominal

Fatores de risco:
cirurgias tubárias,
gravidez ectópica Sintomas: dor
prévia, uso de abdominal intensa, Tratamento: tratar
DIU, tabagismo, súbita, em baixo choque hipovolêmico, Ocorre em 1-2% das
endometriose ventre. salpingectomia gestações

Sinal de Lafond, dor Sinal de Lafond, dor 10-15% das mortes


aguda ao toque do aguda ao toque do maternas no 1º tri-
fundo de saco fundo de saco mestre de gestação

10.4. Diagnóstico

Exames laboratoriais
Os exames laboratoriais podem ser importantes para quantificar o sangramento
e suas repercussões fisiológicas. Na maioria das vezes, auxiliam no reconheci-
mento de alguma condição predisponente ao sangramento. Poucos são os que
permitem definir sua causa.

157
ABDOMEAGUDO 158

Se a hemorragia for em quantidade considerável e se houver tempo suficiente


para que se instalem os mecanismos compensatórios desencadeados pela hi-
povolemia, os valores da hemoglobina e a do hematócrito estarão reduzidos. A
leucocitose é usual e decorre da irritação peritoneal provocada pela hemoglobina
e da própria resposta homeostática à hipovolemia. O número de leucócitos pode
variar, dependendo do tempo de instalação do hemoperitônio. A contagem do
número de plaquetas é obrigatória. O estudo global da coagulação é útil para o
diagnóstico e orienta o tratamento. A atividade da protrombina, a tromboplasti-
na parcial ativada e a trombina são os mais utilizados.
O teste de gravidez é realizado quando a suspeita for prenhez ectópica rota.

Outrosmétodos diagnósticos
A ultrasonografia, a tomografia computadorizada e a ressonância magnética,
tem permitido o diagnóstico na maioria dos casos, com a vantagem de não se-
rem invasivos. A videolaparoscopia encontra sua indicação nos doentes com dor
abdominal aguda cuja indicação cirúrgica é duvidosa e nas afecções cuja corre-
ção cirúrgica é viável por esse método de acesso. Na dúvida diagnóstica, a vide-
olaparoscopia pode reduzir a realização de laparotomia desne- cessária de
19% para 0%.
Nas doenças ginecológicas agudas, a
videolaparoscopia é capaz de con-
firmar o diagnóstico em 82% dos
casos com cisto de ovário e em
80% das doentes com
hemorragia do corpo
lúteo. As contraindi -
cações do vide-
olaparoscopia
são insuficiên -
cia respiratória
grave, choque
hipovolêmico,
obesidade mór -
bida, múltiplas intervenções abdominais Design por pch.vector / Freepik
prévias e coagulopatias.

158
ABDOMEAGUDO 159

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160
APENDICITE AGUDA
(CIRURGIA GERAL)

161
SUMÁRIO
1. Anatomia e Definição.......................................................................... 163
2. Epidemiologia ......................................................................................... 165
3. Fisiopatologia ........................................................................................ 165
4. Quadro Clínico ...................................................................................... 167
5. Apendicite em situações especiais................................................ 172
6. Diagnóstico e classificação............................................................... 173
7. Tratamento ............................................................................................. 182
Referências Bibliográficas ..................................................................... 190

162
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 163

1. ANATOMIA E DEFINIÇÃO localizado a aproximadamente 2 cm


abaixo da válvula ileocecal, com com-
A apendicite é a causa cirúrgica mais
primento entre 2 e a 20 cm. Pode se
comum de dor abdominal em atendi-
apresentar em diferentes posições,
mentos de urgência. Seu diagnóstico é
entre as quais as mais importantes:
habitualmente fácil e essencialmente retrocecal, pélvica, pré-ileal, pós-ile-
clínico. Podem ocorrer algumas apre-
al e paracecal. As posições atípicas
sentações atípicas, que são relacio- podem ser observadas em situações
nadas, principalmente, à localização
em que o mesoapêndice excepcio -
do apêndice retrocecal e pélvica, que nalmente grande permite a sua maior
tornam o diagnóstico da apendicite
mobilidade e liberdade de posiciona-
desafio clínico - cirúrgico. É importan-
mento. A localização anatômica do
te a diferenciação da apendicite no
apêndice segue a seguinte distribui-
sexo feminino com as afecções pél-
ção: retrocecal (20,1 a 65,3%), pélvica
vicas como doença inflamatória pélvi- (3,7 a 78,5%), paracecal (0 a 12,3%)
ca, endometrite e abscesso ovariano.
e pré-ileal ou pós-ileal (1,2 a 50,9%).
O apêndice, o íleo e o cólon ascen -
dente derivam do intestino médio. O
apêndice aparece primeiro na oitava
semana de gestação como uma bol-
sa para fora do ceco e gradualmente
gira para uma localização mais medial,
conforme o intestino gira e o ceco tor-
na-se fixo no quadrante inferior direi-
to. A artéria apendicular, um ramo da
artéria ileocólica, supre o apêndice. O
exame histológico do apêndice indica
que as células caliciformes, que pro-
duzem muco, estão espalhadas por
toda a mucosa. A submucosa contém
folículos linfoides, o que leva à especu-
lação de que o apêndice deve ter uma
função imunológica importante, ainda
que indefinida, no início do desenvol-
vimento. Os linfáticos drenam para os
linfonodos ileocólicos anteriores.
Em adultos, o apêndice não tem ne-
nhuma função conhecida. É um pe- Figura 1. Variações na posição do apêndice. Fon-
te: https://www.uptodate.com/contents/images/
queno órgão tubular de fundo cego SURG/64911/Appendiceal_anatomy.jpg

163
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 164

Região ileocecal

Parte terminal
do íleo

Óstio do apêndice
vermiforme

Apêndice vermiforme
Figura 2. Região ileocecal e apendice vermiforme.Fonte: Atlas de anatomia humana / Frank H. Netter. - 6. ed. - Rio
de Janeiro : Elsevier, 2014.

164
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 165

A apendicite aguda é quando ocorre 3. FISIOPATOLOGIA


inflamação apêndice vermiforme e é
A obstrução apendicular pode ser
causado por uma obstrução repenti-
causada por fecalitos (massas fecais
na de sua luz.
duras), cálculos, hiperplasia linfoide,
processos infecciosos e tumores be -
2. EPIDEMIOLOGIA nignos ou malignos. A natureza ana-
tômica do apêndice favorece o qua-
É a causa mais comum de abdome
dro, uma vez que sua luz é pequena
agudo não traumático, com incidên-
em relação ao seu comprimento. O lú-
cia no mundo ocidental de 8%. Pos-
men obstruído favorece o crescimen-
sui discreto predomínio no sexo mas-
to bacteriano e a secreção da mucosa
culino e é mais comum entre os 10 e
favorece pressão sobre a luz. Inclusi-
30 anos de idade. É a emergência ci-
ve é a distensão da luz que promo-
rúrgica mais comum e utilizar preco-
ve a dor visceral que o paciente refe-
cemente da via cirúrgica melhora os
re como dor periumbilical ou visceral
resultados.
mal definida.
Sua sintomatologia clássica está pre-
Somente quando a inflamação ultra-
sente em 60% dos casos. A eficácia
passa a serosa e entra em com o peri-
em diagnosticar apendicite aguda é
tônio parietal que ocorre estimulação
de cerca de 80%, sendo de 78-92%
da inervação aferente parietal. É nes-
em homens e de 58- 85% em mu-
se momento que o padrão da dor é
lheres. O menor diagnóstico em mu-
mudado, algo característico da apen-
lheres ocorre, principalmente, por
dicite aguda, para uma dor localizada
essas possuírem mais diagnósticos
na fossa ilíaca direita de forte inten-
diferenciais relacionados ao aparelho
sidade, podendo se correlacionar dor
reprodutor. O diagnóstico diferencial
à descompressão brusca (sinal de
e as variações anatômicas represen-
Blumberg), indicando assim uma pe-
tam os principais entraves em seu re-
ritonite associada.
conhecimento clínico, o que propicia
atraso em relação ao diagnóstico e Quando a obstrução do apêndice
tratamento e aumento das chances é a causa da apendicite, a obstru -
de complicação. O apêndice pélvico ção leva ao aumento da pressão lu-
é a sua segunda apresentação mais minal e intramural, resultando em
prevalente e chega a superar a varia- trombose e oclusão dos pequenos
ção retrocecal em alguns trabalhos, vasos na parede apendicular e esta-
atingindo 51,2% dos casos. se do fluxo linfático. À medida que o

165
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 166

comprometimento linfático e vascular a perfuração e, nessa situação, é for-


progride, a parede do apêndice se tor- mado um abscesso localizado. De
na isquêmica e depois necrótica, que forma menos comum, a perfuração
normalmente pode evoluir para per - pode ser livre na cavidade peritoneal
furação caso não ocorra intervenção e sua consequência é a formação de
cirúrgica nas primeiras 48h. O omento diversos abscessos intraperitoneais,
e o intestino delgado podem bloquear e posterior choque séptico.

ESQUEMA FISIOPATOLOGIA APENDICITE AGUDA

FEZES HIPERPLASIA TUMOR PROCESSOS


CÁLCULOS
ESPESSADAS LINFOIDE (MAIS RARO) INFECCIOSOS

OBSTRUÇÃO

DISTENÇÃO

ISQUEMIA

PERFURAÇÃO

ABCESSO PERITONITE

A flora no apêndice normal é seme-


SE LIGA! O mecanismo de obstrução lhante à do cólon, com várias bac-
luminal varia de acordo com a idade do térias aeróbicas e anaeróbicas
paciente. Nos jovens, acredita-se que a facultativas. A natureza polimicro -
hiperplasia folicular linfoide devido à in-
biana da apendicite perfurada está
fecção seja a principal causa de apendi-
cite. Em pacientes mais velhos, é mais bem estabelecida. Escherichia coli,
provável que a obstrução luminal seja Streptococcus viridans e espécies de
causada por fibrose, fecalitos ou neo - Bacteroides ePseudomonas são fre -
plasia (carcinoide, adenocarcinoma ou
mucocele).
quentemente isolados, e muitos

166
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 167

outros micro-organismos podem ser moderada, localizada em região pe-


cultivados (apresentados na tabela riumbilical, que cursa com náuseas
abaixo). Entre os pacientes com apen- e anorexia. Cerca de 12h após o co -
dicite não perfurada aguda, as cultu- meço dos sintomas, a dor migra em
ras do líquido peritoneal em geral são cerca de 50-60% dos pacientes, se
negativas e têm uso limitado. Entre os localizando em fossa ilíaca direita, no
pacientes com apendicite perfurada, ponto de McBurney, que é localizado
as culturas do líquido peritoneal são no limite entre o terço médio e lateral
mais suscetíveis de serem positivas, de uma linha traçada da espinha ilía-
revelando bactérias colônicas com ca anterossuperior direita ao umbigo.
sensibilidades previsíveis. Como é
raro que os achados alterem a sele-
ção ou a duração do uso de antibió-
ticos, alguns têm desafiado a prática
tradicional de obter culturas.

TIPO DE BACTÉRIA PACIENTES (%)

ANARÓBICAS
Bacteroides fragilis 80
Bacteroides thetaiotaomicron 61
Bilophila wadsworthia 55
Peptosteptococcus spp. 46
Aeróbicas
Escherichia coli 77
Streptococcus virida ns 43
Estreptococos do Grupo D 27
Pseudomonas aeruginosa 18
Tabela 1. Bactérias Comumente Isoladas em Apendici-
te Perfurada. Fonte: Sabiston – tratado de cirurgia

4. QUADRO CLÍNICO
A apresentação sintomatológica ca-
racterística da apendicite aguda é
quadro inicial de dor abdominal ines-
pecífica (dor referida), de intensidade

167
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 168

Cicatriz
umbilical

Crista ilíaca
anterossuperior
direita ponto de
McBurney

Figura 3.Ilustração da localização do ponto de McBurney]. Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/b/


b1/McBurney%27s_point.jpg

A migração da dor é o sintoma mais difuso. O abdome do paciente se


importante para o diagnóstico da apresenta em tábua com rigidez ge-
apendicite aguda. Náuseas e vômitos neralizada e temperatura maior que
também podem acompanhar a dor e 39 graus. Esse segundo quadro pode
a febre acontece mais tardiamente no evoluir para sepse.
curso da doença. Alguns pacientes Ocasionalmente, a dor pode melhorar
apresentam sintomas inespecíficos um pouco após a ruptura do apêndice
como: indigestão, flatulências, altera- por causa de alívio da distensão vis-
ção do hábito intestinal, diarreia, mal ceral, embora um verdadeiro intervalo
estar generalizado. livre de dor seja incomum. Outros sin-
No caso de perfuração o paciente tomas possuem relação com a posi-
pode apresentar duas apresenta- ção da ponta do apêndice inflamado.
ções clínicas: perfuração bloqueada Se for próximo a bexiga, por exemplo,
é quando um abscesso é formado, o pode ser achado hematúria micros-
paciente queixa -se de desconforto cópica e manifestações urinárias.
em fossa ilíaca direita e pode haver No exame físico do paciente com
presença de plastrão (massa palpá- apendicite aguda geralmente o aco -
vel); e na perfuração livre ocorre dor metido pelo quadro fica imóvel no
de grande intensidade e com aspecto

168
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 169

leito. Está febril, com temperatura em o diagnóstico. Os pacientes podem


torno de 38 graus. No exame do ab- apresentar o sinal de Blumberg, sinal
dome, apresenta hipersensibilidade de rovsing e o sinal de psoas. Outra
à palpação, no ponto de McBurney parte importante do exame físico é
principalmente, com defesa abdomi- a pesquisa de massa em fossa ilíaca
nal. Um achado precoce é hipersen- direita, que pode indicar um abces-
sibilidade cutânea no quadrante in - so, o qual após confirmação por exa-
ferior direito. Algumas manobras no mes de imagem, trata-se de maneira
exame físico podem dar sinais para diferente.
o cirurgião da inflamação e confirmar

SAIBA MAIS!
SINAIS NO EXAME FÍSICO DA APENDICITE!

Figura 4.Sinal de Blumberg. Fonte: https://www.


pontodosconcursos.com.br/artigo/14644/neto-paixao/
sinal-de-blumberg

O Sinal de Blumberg é um sinal médico caracterizado por dor ou piora da dor à compressão
e descompressão súbita do ponto de McBurney, também chamado de ponto apendicular.
É traçado uma linha que liga a cicatriz umbilical com a espinha ilíaca ântero-superior, como
apresentado em ilustração anterior. Divide-se esta linha em 3 partes, sendo o ponto referido
o local que corresponde ao encontro do terço médio com o terço distal da linha. Dor no ponto
de McBurney, percebido durante o exame físico, é indicativo de peritonite naquele local.

169
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 170

Figura 5. Sinal de Rovsing.


Fonte:https://en.wikipedia.org/

Se a palpação do quadrante inferior esquerdo do abdômen do paciente resultar em dor no


quadrante inferior direito, diz-se que o paciente é positivo para o sinal de Rovsing. Essa pal-
pação é realizada procurando-se provocar um falso peristaltismo no intestino grosso, a partir
do sigmoide, retrogradamente, em direção ao cólon descendente, transverso e finalmente
ascendente, onde o acúmulo de gases e/ou fezes gera a dor pois é aí que se encontra o
apêndice.

Figura 6. Sinal de psoas e do obturador. Fonte:https://www.medicinanet.com.br/

O sinal do psoas é indicativo de irritação do músculo psoas. Posiciona-se o paciente em de-


cúbito lateral esquerdo, e o examinador deve realizar a hiperextensão passiva de membro
inferior direito (ou flexão ativa contra resistência). Em caso de dor a hiperextensão passiva ou
a flexão ativa, o sinal é positivo.
Já o sinal do obturador, assim como no do psoas, indica irritação no músculo de mesmo nome.
Para realizá-lo, com o paciente em decúbito dorsal, faz-se a flexão passiva da perna sobre a
coxa e da coxa sobre a pelve, então procede-se com uma rotação interna da coxa. Tem maior
sensibilidade nas apendicites com posição retrocecal, aderido ao músculo obturador. Dá-se
positivo quando se refere dor no hipogástrio.
As localizações dos dois músculos estão abaixo para entender o motivo de sua inflamação
junto com a inflamação do apêndice.

170
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 171

Ceco

Músculo
ilíaco

Figura 7.Localização do músculo psoas. Fonte:


https://www.aafp.org/afp/1999/1101/p2027.html
Apêndice
inflamado

Músculo psoas Tuberosidade


ilíaca

Ceco

Trocânter maior
do fêmur
Apêndice
inflamado

Figura 8. Localização do músculo obturador.


Fonte:https://www.aafp.org/afp/1999/1101/ Músculo obturador
afp19991101p2027-f2b.jpg] interno
Tuberosidade
isquiática

171
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 172

QUADRO CLÍNICO DA APENDICITE AGUDA

Dor em fossa
Vômito
ilíaca direita

dor migra

Dor abdominal
inespecífica Anorexia
periumbilcal

Febre < 38 graus Náuseas

EXAME FÍSICO -
Febre > 38 graus
SINAIS

Sinal de complicação

5. APENDICITE EM • Em criança há um quadro atípico.


SITUAÇÕES ESPECIAIS O paciente apresenta letargia, fe-
bre alta, vômitos intensos e diar-
A seguir será apresentado pacientes
reia frequente. O diagnóstico ge-
com quadros atípicos ou em que a
ralmente é tardio e a progressão
conduta é diferente:
do processo inflamatório é mais

172
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 173

rápida que o comum, com taxa podem ocasionar apendicite ao


de perfuração entre 15% e 65%, gerarem obstrução. Agentes como
maior que no adulto. O omento CMV e Cryptosporidiumcausam
ainda não está formado por com- infeção do órgão. O diagnóstico
pleto e não auxilia na contenção também é tardio, pelo fato do pa-
da perfuração e a peritonite gene- ciente com AIDS apresentar nor-
ralizada é mais frequente. Possui malmente queixas abdominais.
maior morbimortalidade.
• Pacientes com apendicite recor -
• Nos idosos a apresentação é atí- rente apresentam surtos de dor
pica também. Temperatura menos abdominal na fossa ilíaca direita,
elevada e a dor no abdome é mais sem presença de irritação perito-
insidiosa. A incidência de perfura- neal e de forma recorrente. O que
ção é ainda maior que na criança causa esse quadro é a obstrução
e apresenta, consequentemente, parcial da luz apendicular. O trata-
maior mortalidade. mento cirúrgico alivia os sintomas
da maioria dos pacientes. Os crité-
• A apendicite é a emergência ex -
rios diagnósticos são:
trauterina mais comum em grávi-
das, com frequência maior nos dois ◊ História de mais de 1 mês com
primeiros trimestres. O útero gra- ataques recorrentes de dor
vídico descola o apêndice superior abdominal em quadrante infe-
e lateralmente, por isso dificulta o rior direito (QID);
diagnóstico. Por isso, uma gestante ◊ Sensibilidade à palpação do
pode apresentar dor em hipocôn- QID sem irritação peritoneal;
drio direito, por exemplo, se estiver
◊ Achados Radiológicos no
com apendicite aguda. Somado a
estudo baritado. O não es -
isso a gestação possui sintomas
vaziamento do contraste no
semelhantes como náuseas e vô-
apêndice após 72h é um sinal
mitos. Leucocitose também é co -
diagnóstico, além do preen -
mum em grávidas. Sendo assim,
chimento incompleto.
o diagnóstico é tardio e existem
maiores chances de complicações.
A intervenção cirúrgica mais indica- 6. DIAGNÓSTICO E
da no segundo trimestre é a video- CLASSIFICAÇÃO
laparoscópica. Em outros períodos,
O diagnóstico da apendicite aguda é
utiliza-se a abordagem aberta.
clínico, associando uma boa anamne-
• Em pacientes com AIDS, Linfoma se e um exame físico que inclui a bus-
não Hodgkin e sarcoma de Kaposi ca dos sinais clínicos já ressaltados.

173
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 174

Pode-se ter auxílio de alguns exames Entre os escores diagnósticos, o mais


complementares, sendo que estes utilizado tem sido o de Alvarado, que
não devem atrasar a intervenção ci- é baseado em três sintomas, três si-
rúrgica. Além da cronologia caracte - nais e dois achados laboratoriais. De
rística: dor abdominal difusa ano - acordo com Alvarado, um valor no es-
rexia, vômito e náusea migração core maior que cinco ou seis pontos
da dor para a fossa ilíaca direita. Ou- é compatível com apendicite e o pa-
tro método adicional de confirmação ciente deve permanecer em observa-
de diagnóstico para casos mais incer- ção. Quando o valor é maior que sete
tos são os escores. ou oito pontos indica maior probabi-
lidade de apendicite e valor de nove
ou dez pontos é compatível com alta
SE LIGA! “O diagnóstico da apendi-
cite aguda é clínico, exames comple -
probabilidade da doença. Nos dois
mentares podem ajudar, mas NÃO últimos casos a laparotomia pode ser
DEVEM ATRASAR A INTERVENÇÃO indicada.
CIRURGICA”.
Em relação aos exames laboratoriais,
existe presença de leucocitosede
forma moderada (10 mil a 15 mil cé-
PARÂMETROS DO lulas/mm3), com neutrofilia e desvio
ESCORE
ESCORE DE ALVARADO
à esquerda . Quando ocorre gangre -
SINTOMAS na e perfuração, a contagem de cé-
Dor migratória da fossa ilíaca direita 1 lulas pode ser superior a 20 mil célu-
Anorexia 1 las. Caso a ponta do apêndice estiver
Náusea e/ou vômitos 1 próxima a bexiga e ureter, ocorre he-
SINAIS matúria e/ou piúria.
Defesa da parede no quadrante infe-
rior direito do abdome
2 A radiografia simples do abdome,
Dor à descompressão 1 apesar de possuir uso comum, pos-
Elevação da temperatura 1 sui utilização recorrente injustificada.
ACHADOS LABORATORIAIS Menos de 15% dos pacientes com
Leucocitose 2 apendicite aguda irão apresentar fe-
Desvio à esquerda 1 calito calcificado em fossa ilíaca di -
Total 10 reita. Esse exame pode ser útil para
Tabela 2. Parâmetros do escore de Alvorado. Fonte: excluir diagnóstico de litíase urinária,
http://www.scielo.br/pdf/rcbc/v41n5/pt_0100-6991-r-
cbc-41-05-00336.pdf
úlcera perfurada e obstrução de in-
testino delgado, mas é pouco utiliza-
do em casos de suspeita de apendi-
cite aguda.

174
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 175

Figura 9. Radiografias com presença de fecalito calcificado. Fonte: https://www.slideshare.net/Jeca012/


apendicite-aguda-slides

Já a ultrassonografiapossui sensibi- ou mais de diâmetro presença de lí-


lidade de cerca de 85% e especifici- quido livre, interrupção da ecogeni -
dade de cidade da submucosa e presença de
90% para o diagnóstico de apendi- apendicolito.
cite aguda. Apesar de
possuir limitações caso
o paciente for obeso ou
apresentar distensão
abdominal, é bastan -
te útil quando o diag -
nóstico é duvidoso. Os
achados ultrassono -
gráficos compatíveis
com apendicite são
apêndice não com -
pressível com 7mm

175
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 176

Figura 9. Achados ultrassonográficos compatíveis com apêndice normal. As imagens A e B mostram um apên-
dice normal medindo cerca de 6 mm de dimensão transversal máxima (seta). O apêndice era compressível e ne -
nhuma hiperemia foi demonstrada (seta) na imagem Doppler (C). Fonte: https://www.uptodate.com/contents/
image?imageKey=RADIOL%2F83557&topicKey=SURG%2F1386&search=apendicite&rank=2~150&source=see_link

Figura 10. Paciente do sexo feminino, 19 anos, que se apresentou no pronto-socorro com dor no quadrante inferior
direito. O ultrassom em escala de cinza do apêndice é projetado nos planos longitudinal (A) e transversal (B). Observa -
-se um apêndice não compressível, medindo quase 20 mm de diâmetro, consistente com o diagnóstico de apendicite
aguda. As porções ecogênicas da mucosa e da submucosa da parede tornaram-se descontínuas (setas), sugerindo
interrupção como resultado de descamação. O ar luminal (pontas de seta) resulta em sombreamento posterior.

176
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 177

Figura 11. Achados ultrassonográficos de apêndice normal acima e apendicite abaixo. Fonte: SABISTON. Tratado de
cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19.ed. Saunders. Elsevier.

Figura 12. Paciente do sexo masculino, 38 anos de idade apresentando apêndice com paredes espessadas (4mm) e
perda de estratificação habitual.Fonte: https://doi.org/10.1590/S0100-39 842003000200004

177
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 178

Figura 13.Paciente do sexo masculino, 23 anos de idade. Observa-se pequena quantidade de líquido ao redor do
apêndice. Fonte:https://doi.org/10.1590/S0100-39842003000200004

O exame de maior acurácia é a tomo- sinal da ponta de seta, caracterizado


grafia computadorizada . Os acha- pelo desenho de uma ponta de seta
dos sugestivos são: espessamento e na base de inserção do apêndice, em
distensão do apêndice, diâmetro an- virtude do edema nesta topografia.
teroposterior maior ou igual que 7mm A TC possui sensibilidade de 90% e
e inflamação periapendicular (edema, especificidade de 80% a 90% para o
coleção líquida e edema), que é tradu- diagnóstico. Em 50% dos casos, fe-
zido no exame através de borramento calitos são identificados. Ainda assim,
da gordura mesentérica. Existe, tam- é ideal utilizar desse somente em ca-
bém, um sinal indicativo em exames sos duvidosos, como em idosos.
feitos com contraste retal, esse é o

178
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 179

Figura 14. Apêndice normal. Enema opaco ( A) e tomografia computadorizada (B- seta). Fonte:https://doi.
org/10.1590/S0100-39842007000300012

Figura 15. Tomografia computadorizada. Sinais de apendicite (espessamento parietal e densificação da gordu-
ra mesentérica) no flanco direito, em localização mais anterior que o habitual (seta). Fonte:https://doi.org/10.1590/
S0100-39842007000300012

Figura 16. Tomografia computadorizada. Paciente do sexo masculino, com diagnóstico de apendicite aguda. Sinal da
ponta de seta(seta preta). Fonte: https://doi.org/10.1590/S0100-39842007000300012

179
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 180

A ressonância magnética também é 7 mm de diâmetro) é considerado um


um exame de imagem que pode auxi- achado anormal, enquanto um apên-
liar no diagnóstico de apendicite agu- dice com um diâmetro de 6 a 7 mm é
da em pacientes grávidas. Um apên- considerado um achado inconclusivo.
dice cheio de líquido e aumentado (>

Figura 17. Ressonância magnética da pelve de uma paciente com apendici-


te com 9 semanas de gestação. O apêndice foi preenchido com líquido e media 7 mm (seta). O
saco gestacional (GS) é visto mais baixo na pelve. Fonte:https://www.uptodate.com/contents/
image?imageKey=OBGYN%2F66666&topicKey=SURG%2F1386&search=apendicite&rank=2~150&source=see_link

Em casos em que mesmo com a clíni- sanar as dúvidas diagnósticas, é indi-


ca, exames laboratoriais e exames ra- cada a videolaparoscopia diagnóstica.
diológicos não forem suficientes para

180
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL)

ALGORITMO PARA AVALIAÇÃO D

ADULTO COM SUSPEIT


DE APENDICITE AGUD

Avaliar outros Probabilidade clínica de apen


diagnósticos Alvarado <4 aguda através de alvarado e

NÃO SIM

Qual o escore Realizar USG


de Alvarado? de abdome

Diagnóstico Não diagnós


Escore de
Alvarado entre Escore de
Alvarado > 6
4e6 Diagnóstico de
apendicite ou
outra patologia TC disponíve
Observar 12 horas e
refazer escore Manejo adequado

NÃO
Alvarado <4 Alvarado ≥ 4

Avaliar outros Exploração Refazer Escore de Alvarado


diagnósticos cirúrgica

Escore de
Escore de
Alvarado > 6 Alvarado Alvarad
entre 4 e 6
Escore de Alvarado modificada
Observar 12 horas
1 ponto: e refazer escore
• Dor migratória em quadrante inferior direito
• Anorexia
• Náuseas e/ou vômito Alvarado ≥ 4 Alvarado <4
• Dor à descompressão
• Elevação de temperatura >37,5°C
Avaliar outro
2 pontos: diagnóstico
• Defesa da parede no quadrante inferior
direito do abdome
• Leucocitose

181
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 182

A classificação da apendicite aguda 7. TRATAMENTO


em graus parte da riqueza de infor-
A maioria dos pacientes com apen-
mações obtidas com os exames de
dicite aguda é tratada por remoção
imagem e da cirurgia em si, tanto a
cirúrgica imediata do apêndice. Um
aberta como laparoscópica. Os fenô-
breve período de reposição com solu-
menos constituintes do processo in-
ção cristaloide geralmente é suficien-
flamatório podem definidos e depois
te para assegurar a indução segura da
de sua graduação podem mudar o
anestesia geral. Antibióticos pré-ope-
caminho do tratamento operatório e,
ratórios cobrem a flora colônica aeró-
também, avaliar a possibilidade do
bica e anaeróbica. Para pacientes com
desenvolvimento de complicações in-
apendicite não perfurada, uma dose
fecciosas pós-operatórias, mudando
única pré-operatória de antibióticos
a conduta pós operatória. A gradua-
reduz as infecções pós-operatórias
ção abaixo em processo inflamatório,
da ferida e a formação de abscesso
é um exemplo de avaliar a apendicite
intra-abdominal. Os antibióticos orais
existente.
pós-operatórios não reduzem adicio-
nalmente a incidência de complica-
ções infecciosas nesses pacientes.
GRAU ACHADOS INFLAMATÓRIOS
Para portadores de apendicites per -
Grau 0 Normal furadas ou gangrenosas, continua -
Grau 1 Hiperemia e edema mos com antibióticos intravenosos no
Grau 2 Exsudato fibrinoso período pós-operatório até o paciente
Grau 3 Necrose segmentar estar afebril. Para pacientes nos quais
Grau 4A Abscesso o diagnóstico continua duvidoso após
Grau 4B Peritonite regional a avaliação pré-operatória, a laparos-
Grau 4C Necrose da base do apêndice copia diagnóstica é útil porque permi-
Grau 5 Peritonite difusa te que o cirurgião examine o restante
Tabela 3. Classificação da apendicite aguda em graus, do abdome, inclusive a pelve, à pro-
de acordo com os achados inflamatórios. Fonte: https://
doi.org/10.1590/S0100-69912006000500006 cura de anormalidades.

Outras classificações muito usadas


são as que definem apendicite como
edematosa, supurativa, gangrenosa
ou perfurativa, dependendo do esta-
do do apêndice no início da cirurgia.

182
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 183

sua consistência firme e procedesse


SE LIGA! VIDEOLAPAROSCOPIA vs a sua liberação. Atenção particular é
CIRURGIA ABERTA dada à manipulação cuidadosa dos
Vários estudos randomizados prospec- tecidos inflamados para minimizar o
tivos têm comparado a apendicectomia risco de ruptura durante o procedi-
laparoscópica e a aberta, e as diferen- mento. Nos casos difíceis, o aumen-
ças globais nos resultados ainda são
pequenas. A porcentagem de apendi - to da incisão e o desbridamento das
cectomias realizadas por laparoscopia aderências seguindo a trajetória da
continua a crescer. Pacientes obesos tênia colônica em direção ao ceco
têm menos dor e hospitalizações mais
facilitará a localização e liberação do
curtas após apendicectomia laparos-
cópica versus aberta. Pacientes com apêndice em geral. O mesoapêndice
apendicite perfurada têm taxas menores é ligado e seccionado entre pinças. A
de infecções da ferida após a remoção base do apêndice é esqueletizada em
laparoscópica do apêndice. Pacientes
tratados por laparoscopia têm resulta-
sua junção com o ceco. Um fio absor-
dos de melhor qualidade de vida duas vível é colocado em torno da base do
semanas após a cirurgia e taxas mais apêndice, e o mesmo é clampeado,
baixas de readmissão. Em comparação seccionado e ressecado. Faz-se, en-
com a apendicectomia aberta, a aborda-
gem laparoscópica envolve custos mais tão, uma sutura em bolsa de tabaco
elevados de sala de cirurgia, mas estes com fio absorvível ou uma sutura em
têm sido contrabalançados em algumas Z em torno da parede cecal e o coto
séries pela menor duração da estadia
apendicular é sepultado no fundo do
hospitalar. Contudo, ação potencialmen-
te mais limitada e maior dificuldade por ceco. A ligadura simples e o sepulta-
perda de sensação tátil na cirurgia são mento provavelmente têm resultados
pontos negativos da laparoscopia. equivalentes. Se a base do apêndi-
ce e o ceco adjacente estiverem ex-
Nas cirurgias abertas, é empregada tensamente solidificados, realiza-se
a incisão transversa do quadrante in- uma ressecção ileocecal. A incisão
ferior direito (no ponto de McBurney), cirúrgica é fechada primariamente na
chamada de Davis-Rockey, ou incisão maioria dos casos porque a taxa de
oblíqua, chamada de McArthur-Ro - infecção da ferida operatória é inferior
ckey. Após a abertura do peritônio, o a 5%.
apêndice inflamado é identificado por

183
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 184

Figura 18. Descrição – A: localização das possíveis incisões para uma apendicectomia aber-
ta. B: abertura por planos. C, D e E: ligação da base e divisão do apêndice. F: colocação de sutu-
ra em bolsa ou ponto Z. G: Inversão do coto apendicular. Fonte: https://www.uptodate.com/contents/
image?imageKey=SURG%2F53185&topicKey=SURG%2F1383&search=apendicite&source=outline_link&sp=0

184
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 185

A apendicectomia laparoscópica ofe- ou Liga-Sure, ou entre clipes, depen-


rece a vantagem da laparoscopia dendo da espessura desse tecido. Em
diagnóstica combinada com o po - geral envolvemos o apêndice com um
tencial de recuperação mais rápida ou dois Endoloops absorvíveis colo -
e incisões que são menos agressi - cados na base do apêndice, e, então,
vas. Caso uma TC seja realizada no colocamos um terceiro Endoloop (≈
período pré-operatório, ela deve ser 1 cm distalmente) e seccionamos o
avaliada pelo cirurgião para colher apêndice. Nos casos em que a base
informações que podem ajudar na está endurada e friável, usamos um
identificação da posição do apêndice grampeador endoscópico de 30 mm
em relação ao ceco. Após a injeção para seccionar o apêndice. Na maio-
do anestésico local, colocamos uma ria dos casos, entretanto, o custo adi-
porta de 10 mm no umbigo, seguida cional considerável do grampeador é
de uma porta de 5 mm na região su- injustificado. Qualquer líquido extra-
prapúbica na linha média e uma porta vasado é prontamente aspirado e, da
de 5 mm a meio caminho do trajeto mesma forma, qualquer apendicolito
entre as duas primeiras portas e à identificado é removido para evitar
esquerda do músculo reto do abdo- formação de abscesso pósoperatório.
me. O laparoscópio de 5 mm e óptica O apêndice é colocado em uma bolsa
de 30 graus é orientado para a porta e removido pela porta da cicatriz um-
central com o cirurgião e o assistente bilical. A fáscia a 10 mm do local do
à esquerda do paciente. Com o pa- trocarte é suturada, e todas as feridas
ciente na posição de Trendelenburg e são fechadas primariamente. Aos pa-
inclinado para o lado esquerdo, inves- cientes, prescreve-se uma dieta sem
tigando delicadamente o íleo termi- restrições e medicamento oral após a
nal medialmente e seguindo a tênia intervenção cirúrgica. A maioria dos
do ceco caudalmente para localizar pacientes com apendicite não per -
o apêndice, que é, então, pinçado. O furada recebe alta 24 horas após o
mesoapêndice é seccionado usan- procedimento.
do-se um bisturi harmônico de 5 mm

185
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 186

Figura 19. Descrição A, Superior esquerda, localização das portas locais para apendicectomia laparoscópi-
ca. B, dissecção do mesoapêndice, que circunda o apêndice. C, Colocação de um Endoloop absorvível que cir-
cunda a base do apêndice. D, Divisão do apêndice por Endoloops. E, Colocação do apêndice em uma bolsa
de amostra antes da remoção do apêndice pela porta umbilical. Fonte:https://www.uptodate.com/contents/
image?imageKey=SURG%2F78264&topicKey=SURG%2F1383&search=apendicite&source=outline_link&sp=0

186
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 187

Em casos de perfuração livre associa- de método de imagem para drenar o


do a peritonite difusa, a incisão reco- abscesso. O tratamento com antimi-
mendada é a laparotomia. Durante a crobianos deve ser mantido por uma a
cirurgia a conduta é a lavagem inten- duas semanas. Pelo fato da recorrên-
sa da cavidade somada à antibiotico- cia de apendicite aguda ser de 15%
terapia sistêmica. Pacientes que se a 25% nesses casos, é recomendado
apresentam à sala de emergência de realizar videolaparoscopia eletiva seis
forma tardia provavelmente já pos - a oito semanas após o quadro inicial.
suirão perfuração e abscesso. Nesse Assim, em caso de abscessos o trata-
caso, a conduta é internação hospi- mento segue a sigla CADE:
talar e realização de US ou TC para Conduta não operatória
confirmação da suspeita.
Antibioticoterapia
Após o início da antiobioticoterapia
sistêmica, caso os abscessos forem Drenagem percutanea
menores que 4cm a conduta é apenas Estabilização
antibioticoterapia, com reavaliações.
Se forem maiores do que 4 a 6cm ou
o paciente esteja com febre, utiliza-se

187
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 188

TRATAMENTO DE ABCESSO NA APENDICITE AGUDA

ABCESSO
APENDICULAR

Exame físico +
TC ou ultrassom

Fleimão -+
Abcesso > 4-6cm
abscesso pequeno

Antibióticos +
Febre/ sepse Afebril
drenagem

Criança Adultos

Melhora Nenhuma melhora Melhora

Dieta regular + Dieta regular +


Operar
ATB orais + alta ATB orais + alta

Apendicectomia Colonoscopia
após intervalo 2-4 semanas

Nenhuma neoplasia Neoplasia

Considerar apendi- Estadiamento/


cectomia com intervalo colectomia

188
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL)

MAPA MENTAL APEND

APENDICI

Causa Clínica

Obstrução da Inicialmente dor Anamnese +


Hemograma
luz apendicular periumbilical exame físico

Migração da dor US
Fecalito para quadrante Leucocitose
inferior direito abd

Desvio para
Cálculo Náuseas
esquerda

Hiperplasia
Vômitos
linfoide

Tumores Anorexia

Processos
Febre
infecciosos

Sinal de
Blumberg

Sinal de
Rovsing

Sinal do
Psoas

Sinal do
obturador

189
APENDICTEAGUDA(CIRURGIAGERAL) 190

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
SABISTON JR, DAVID C., and R. DANIEL BEAUCHAMP. Sabiston-Tratado de Cirurgia, 2v.
Elsevier Brasil, 2005.
Gomes, Carlos Augusto, and Tarcizo Afonso Nunes. “Classificação laparoscópica da apen-
dicite aguda: correlação entre graus da doença e as variáveis perioperatórias.” Revista do
Colégio Brasileiro de Cirurgiões33.5 (2006): 289-293.
Borges, Paulo Sérgio Gomes Nogueira, Marilia de Carvalho Lima, and Gilliatt Hanois Falbo
Neto. “Validação do escore de Alvarado no diagnóstico de apendicite aguda em crianças e
adolescentes no Instituto Materno Infantil de Pernambuco, IMIP.” Revista Brasileira de Saú-
de Materno Infantil3.4 (2003): 439-445.
Montandon Júnior, Marcelo Eustáquio, et al. «Apendicite aguda: achados na tomografia com-
putadorizada-ensaio iconográfico.» Radiologia Brasileira40.3 (2007): 193-199.
Zorzetto, Arquimedes Artur, et al. “O uso da ultra-sonografia no diagnóstico e evolução da
apendicite aguda.” Radiologia Brasileira36.2 (2003): 71-75.

190
DIVERTICULITE AGUDA

191
SUMÁRIO
1. Introdução .................................................................... 193
2. Diverticulose ............................................................... 194
3. Diverticulite ................................................................. 198
4. Epidemiologia. ............................................................ 199
5. Fatores de risco ......................................................... 200
6. Classificação............................................................... 202
7. Diagnóstico ................................................................. 203
8. Tratamento .................................................................. 211
9. Prognóstico e prevenção ....................................... 219
10. Seguimento .............................................................. 220
Referências bibliográficas.......................................... 224

192
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 193
3

1. INTRODUÇÃO A apresentação clínica da diverticuli-


te aguda varia de dor abdominal leve
Diverticulite aguda corresponde à
à peritonite com sepse. O diagnós -
presença de inflamação e infecção
tico geralmente é feito apenas com
associadas aos divertículose, como
base nas características clínicas, mas
você verá mais abaixo, é uma com-
a imagem é necessária em apresen -
plicação da doença diverticular do
tações mais severas para descartar
intestino. Este resumo fornece uma
complicações como abscesso e per -
visão geral da diverticulose e um re -
furação. O tratamento da diverticulite
sumo clínico, baseado em evidências,
depende da gravidade da apresenta-
da epidemiologia, diagnóstico e trata-
ção, presença de complicações e do-
mento da diverticulite aguda.
enças pré-existentes nos pacientes.

Figura 1. Introdução. Fonte: https://bit.ly/2PHnIkO

193
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 194
4

MAPA: INTRODUÇÃO

Complicação da diverticulose,
com inflamação e infecção
associadas aos divertículos

Tratamento depende da
Varia de dor abdominal DIVERTICULITE
gravidade, presença de
leve á peritonite com sepse AGUDA complicações e comorbidades

Diagnóstico geralmente clínico,


mas imagem é necessária para
2. DIVERTICULOSE descartar complicações das vezes), ela é chamada
de diverticulose.A partir
A diverticulose ou doença diverticular
do momento a presença de divertículos
dos cólons é uma afecção onde ocorre
gera sintomas, onde, majoritariamente
herniação ou protrusão da mucosa são sintomas inespecíficos, chamamos
e submucosa do intestino grosso,
de doença diverticular.
em forma de saculações, através das
fibras musculares, em geral onde pe- Entretanto, essas terminologias são
netram os vasos sanguíneos. muitas vezes utilizadas como sinôni-
mas, sendo usado diverticulose para
Quando a ocorrência de divertículos
se referir à doença diverticular e vice
nos cólons não gera sintomas (maioria versa, isso varia de autor para autor.

MAPA: TERMINOLOGIAS

PRESENÇA DE
DIVERTÍCULOS

Assintomático Sintomático

Infecção e inflamação
DIVERTICULOSE DOENÇA DIVERTICULAR
dos divertículos

DIVERTICULITE AGUDA

194
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 195
5

A doença diverticular é classifica - nesses pacientes é de ordem infec-


da de três formas, com as seguintes ciosa, decorrente da perfuração de
características: um divertículo, gerando um quadro
de diverticulite aguda.
Forma hipertônica: Quando o processo infeccioso se res-
tringe basicamente à região da per -
É a forma mais comum , pois está furação, chamamos de diverticulite
associada à fisiopatologia mais fre - aguda não complicada e, nesses ca -
quente. Essa forma geralmente ocor- sos, o paciente refere dor em flanco
re em indivíduos jovens(abaixo dos esquerdo e ocasionalmente em hipo-
50 anos de idade), que apresentam gástrio, com nítida reação peritoneal.
constipação intestinal, em decorrên - Pode ocorrer febre associada.
cia da baixa ingesta hídrica e de fibras
Quando o processo infeccioso leva à
na dieta. Nesses pacientes, o cólon é
formação de um abscesso importan-
“forçado” a realizar contrações hiper-
te na região afetada ou, então, à peri-
tônicas para o deslocamento das fe -
tonite generalizada, com pus ou fezes
zes e o sigmoide é o segmento mais
na cavidade abdominal, configura a
afetado.
diverticulite aguda complicada. Es -
O quadro clínico desses pacientes ge- ses pacientes eventualmente podem
ralmente é composto cólicas, descon- obstruir ou formar fístulas para ór -
forto abdominal e dificuldade de de- gãos internos, como a bexiga, ou até
fecar. A complicação mais frequente mesmo para a pele.

SAIBA MAIS!
Um dos fatores que contribuem com a fisiopatologia da doença diverticular, é uma lei da física:
a Lei de Laplace. Pierre Simon Laplace disse que quanto menor o diâmetro de um tubo, maior
a pressão interna. Ou seja, quanto menor o diâmetro do cólon, maior a pressão intraluminal.
Dito isto, sabemos que o cólon é mais estreito na região do retossigmoide, sendo assim, a
pressão nessa região é maior, corroborando com o fato de ser o local de maior aparecimento
de divertículos.

Forma hipotônica: causadas em grande parte das ve -


zes pela deficiência na produção de
Essa forma geralmente acomete
colágeno.
indivíduos idosos , como pacientes
acima de 60 anos, e ocorre por cau- O quadro clínico dos pacientes ge -
sa de fraquezas na parede intestinal, ralmente é de hemorragia, que pode
ser de pequena, média ou grande

195
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 196
6

intensidade, a depender da área afe- Forma mista:


tada. Quanto maior a hemorragia,
Pacientes com a forma mista da do -
maiores as chances de ocasionar
ença diverticular do intestino geral -
instabilidade hemodinâmica e da
mente são maiores do que 60 anos
necessidade de transfusões san -
de idade e apresentam característi-
guíneas. Em aproximadamente 70 a
cas das duas outras formas.
75% das vezes o sangramento cessa
espontaneamente.

MAPA: FORMAS CLÍNICAS DA DOENÇA DIVERTICULAR

FORMAS
CLÍNICAS

HIPERTÔNICA MISTA HIPOTÔNICA

Geralmente acomete
Forma mais comum, associada à Apresenta características
pacientes idosos, associada à
fisiopatologia mais frequente das duas outras formas
deficiência no colágeno

A doença decorre da formação A doença decorre da formação


de pseudodivertículos de divertículos verdadeiros

Complicação mais Complicação mais


frequente é a diverticulite frequente é a hemorragia

196
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 197
7

SE LIGA!Existem dois tipos de divertículos: o divertículo verdadeiro e o


pseudodivertículo.
DIVERTÍCULO VERDADEIRO:
Corresponde a uma herniação de toda a espessura da parede intesti-
nal, sendo constituídos por mucosa, submucosa, camada muscular pró-
pria e serosa. A ocorrência do divertículo verdadeiro não é muito comum
nos cólons e ele é gerado normalmente pela deficiência de colágeno, es-
tando relacionado com a doença diverticular dos cólons na sua forma
hipotônica.

PSEUDODIVERTÍCULO:
Consiste em uma protrusão da mucosa e submucosa através da cama-
da muscular. A camada muscular não forma a saculação do pseudo -
divertículo , em contrapartida, ela diminui o seu óstio, fazendo com que
fecalitos que entrem na saculação saiam mais dificilmente, favorecendo
assim a formação da sua maior complicação: a diverticulite.
O pseudodivertículo geralmente ocorre em locais de fragilidade intrínseca
da mucosa intestinal e está relacionado com o aumento da pressão in -
traluminal provocado pela diminuição do consumo de fibras e água.

MAPA: TIPOS DE DIVERTÍCULOS

Herniação de toda a
espessura da parede
intestinal
Mucosa, submucosa,
DIVERTÍCULO
muscular própria e
VERDADEIRO
serosa
Sangramento é a
complicação mais
TIPOS DE frequente
DIVERTÍCULOS
Muscular própria não
evagina

Herniação da mucosa e
PSEUDODIVERTÍCULO
submucosa

Diverticulite é a
complicação mais
frequente

197
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 198
8

3. DIVERTICULITE bacteriano, isquemia tecidual local,


inflamação e microperfurações.
Diverticulite então é a infecção e in-
flamação dos pseudodivertículos
colônicos. Ela ocorre em 10 a 25%
das pessoas acometidas pela diver -
ticulose. A diverticulite pode evoluir
com formação de abscesso, fístula,
perfuração com peritonite e estenose
com obstrução colônica.
A causa desse processo ainda não é
bem compreendida, mas sabe-se que Favorecendo a

o acúmulo de resíduos particulados proliferação bacteriana e

no saco diverticular favorece a obstru- posterior inflamação

ção do óstio estreito do pseudodiver- Figura 2. Divertículo obstruído. Fonte: https://bit.


ly/2XLSUDW
tículo e ocasiona supercrescimento

MAPA: FISIOPATOLOGIA

FISIOPATOLOGIA

Muscular própria do Alguns estudos mostram


Foram encontradas
intestino comprime o óstio que pacientes com
semelhanças com SII e DII
do pseudodivertículo diverticulite apresentam

Fecalitos que
Hipercontratilidade/menor Aumento do TNF-α,
entram na saculação tem
relaxamento intestinal metaloproteinases e histamina
dificuldade de sair

Ocorre um aumento da
proliferação bacteriana e
inflamação local

198
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 199
9

4. EPIDEMIOLOGIA vários divertículos e o cólon circun-


dante e evidências recentes sugerem
A diverticulose é uma doença é que o risco ao longo da vida de de -
bastante comum , afetando menos
senvolver diverticulite colônica aguda
de 10% da população com menos de
do lado esquerdo é de cerca de 4%
40 anos, mais de 30% da população
entre pacientes com diverticulose,
acima dos 45 anos e de 50 a 80% e dados de populações ocidentais
dos adultos com idade superior a 80
sugerem que até um quinto dos pa -
anos. Entretanto, por ser uma doença
cientes com diverticulite aguda têm
basicamente assintomática, poucas
menos de 50 anos idade.
pessoas estão cientes que possuem
divertículos, descobrindo apenas Dos pacientes com doença incidente,
quando ocorre alguma complicação. aproximadamente 20% terão um ou
mais episódios recorrentes dentro de
Os estudos da diverticulose apontam
10 anos. Pacientes com diverticulite
que não existe uma correlação evi-
apresentam o início agudo ou suba -
dente com o sexo, pois é uma doença
gudo da dor abdominal, que normal-
que acomete igualmente homens mente está localizado no quadrante
e mulheres . A diverticulose colôni -
inferior esquerdo, por ser a laterali -
ca aguda do lado esquerdo é comum
dade mais acometida. Outros sinais e
nos países ocidentais, com sua preva-
sintomas de apresentação comuns in-
lência aumentando em todo o mundo, cluem náusea sem vômito, febre bai-
provavelmente devido a mudanças
xa, alteração dos hábitos intestinais
no estilo de vida. O cólon sigmoide é
e elevação da contagem de glóbulos
geralmente a parte mais comumen -
brancos e marcadores inflamatórios.
te envolvida, enquanto a diverticulite
aguda do lado direito é mais rara, mas Nos Estados Unidos, a prevalência
muito mais comum em populações de diverticulite aumentou dramatica-
não ocidentais. mente nas últimas décadas e é esti -
mada em 180 / 100.000 pessoas por
Embora a diverticulose colônica do
ano. Ainda que a diverticulose não
lado esquerdo permaneça mais co - tenha predileção por sexo, a diverti-
mum entre pacientes idosos, um au- culite é mais comum em mulheres
mento dramático de sua incidência foi
do que em homens, principalmen-
observado em faixas etárias mais jo-
te após a sexta década de vida, e
vens nos últimos anos. em brancos do que em outros grupos
Como vimos, a diverticulite é carac- raciais.
terizada pela inflamação de um ou

199
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 200
10

MAPA: EPIDEMIOLOGIA

EPIDEMIOLOGIA

DIVERTICULOSE DIVERTICULITE

Maioria das Abaixo de 50 anos:


Menos de 10% da Risco de 4% de
perfurações ocorre no predominantemente
população <40 anos desenvolver
primeiro episódio em homens

Taxa de recorrência 50-70 anos:


Mais de 30% da
após o primeiro predominantemente
população >45 anos
episódio: 9-23% em mulheres

63 anos é a
50-80% da
média para
população >80 anos
admissão hospitalar

Acomete igualmente • Idade: o aumento da idade é um


homens e mulheres importante fator de risco para di -
verticulose e diverticulite.

5. FATORES DE RISCO • Obesidade: um IMC acima de 25


está associado ao aparecimento
Já foi apresentado que para o paciente da diverticulose.
apresentar diverticulite, é necessário
que ele tenha diverticulose, com isso, • Álcool e tabaco: uso de álcool,
os fatores de risco para a diverticulo- uso particularmente pesado, pode
se também são para a diverticulite. ser um fator de risco para diverti -
culite, embora as evidências sejam
conflitantes

200
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 201
11

• Alimentação: quando o paciente de fibra alimentar, alto consumo de


já apresenta divertículos colônicos carne vermelha, obesidade, inativi-
por outros fatores, a dieta e o estilo dade física e tabagismo estão as -
de vida desempenham um papel sociados a um risco aumentado de
importante no desenvolvimento diverticulite.
de diverticulite. O baixo consumo

SAIBA MAIS!
Um estudo descobriu que 50% dos casos de diverticulite poderiam ser evitados com a ade-
são a um estilo de vida saudável, incluindo ingestão de fibras alimentares > 23g por dia,
consumo de carne vermelha <51g por dia, atividade física vigorosa 2 h por semana, índice de
massa corporal <25 e a proibição do tabagismo.

• Medicamentos:vários medica- MAPA: FATORES DE RISCO


mentos também estão associados
a um risco aumentado de diverti -
culite. O uso regular de antiinfla- Histórico familiar
matórios não esteroidais (≥ 2 ve-
zes / semana) está associado a um
risco aumentado de 70% de diver- Envelhecimento
ticulite. Corticosteroides e analgé -
sicos opiáceos também parecem
aumentar o risco de diverticulite. IMC>25 e sedentarismo

• Histórico familiar: pacientes com


histórico familiar de diverticulite Uso de álcool e tabaco
apresentam risco aumentado tam- FATORES
bém para desenvolverem diver - DE RISCO
ticulite. Estima-se que os fatores Baixo consumo de fibras
na alimentação (<23g)
genéticos representem 50% da
suscetibilidade à doença diverti-
cular, embora os marcadores ge - Baixa ingestão de água
néticos dessa doença ainda não
tenham sido identificados.
Alto consumo de carne
vermelha (>51g)

Alto consumo de AINES,


corticosteroides e analgésicos
opiáceos

201
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 202
12

6. CLASSIFICAÇÃO et al. classificaram a gravidade da di-


verticulite aguda em quatro níveis:
Existem vários sistemas de classifica-
ção para a diverticulite colônica aguda
e nenhum foi conclusivamente prova- CLASSIFICAÇÃO DE HINCHEY
do ser superior na previsão dos resul- Estágio I Abscesso pericólico ou flegmão
tados dos pacientes. Entretanto, nas Abscesso pélvico, intra-abdominal
Estágio II
últimas três décadas, a classificação ou retroperitoneal
de Hincheytem sido a mais utilizada Estágio III Peritonite purulenta generalizada
na literatura internacional. Estágio IV Peritonite fecal generalizada
Tabela 1. Classificação de Hinchey
Em pacientes com achados cirúrgicos
de abscessos e peritonites, Hinchey

Figura 3. Classificação de Hinchey.Fonte: https://bit.ly/2DUwlpq

202
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 203
13

SAIBA MAIS!
Em 2015, uma proposta para uma classificação da diverticulite colônica aguda foi publicada
pelo grupo de trabalho de diverticulite aguda da Sociedade Mundial de Cirurgia de Emergên-
cia. É um sistema simples de classificação da diverticulite, com base nos achados da tomo-
grafia computadorizada, que pode orientar os médicos no tratamento da diverticulite aguda e
pode ser universalmente aceito para a prática diária. A classificação da Sociedade Mundial de
Cirurgia de Emergência divide a diverticulite aguda em 2 grupos: sem complicações e com-
plicadas. No caso de diverticulite aguda não complicada, a infecção envolve apenas o cólon e
não se estende ao peritônio. No caso de diverticulite aguda complicada, o processo infeccioso
prossegue além do cólon. A diverticulite aguda complicada é dividida em 4 estágios, com
base na extensão do processo infeccioso:

CLASSIFICAÇÃO DA SOCIEDADE MUNDIAL DE CIRURGIA DE EMERGÊNCIA


Diverticulite não complicada; divertículos, espessamento da parede, aumento da densidade da
Estágio 0
gordura pericólica
a. Bolhas de ar pericólicas ou pequena quantidade de líquido pericólico sem abscesso (até 5 cm
Estágio 1 do segmento intestinal inflamado)
b. Abscesso ≤ 4 cm
a. Abscesso > 4 cm
Estágio 2
b. Gases distantes (> 5 cm do segmento intestinal inflamado)
Estágio 3 Fluido 3D difuso sem gás livre distante
Estágio 4 Fluido difuso com gás livre distante
Tabela 2. Classificação da sociedade mundial de cirurgia de emergência

7. DIAGNÓSTICO diverticulites ocorre no cólon sigmoi-


de ou descendente.
Diagnóstico clínico
A apresentação clínica da diverti -
SE LIGA! Não podemos esquecer que
culite aguda varia de dor abdominal nas populações asiáticas, a diverticulite
leve a peritonite com instabilidade é predominantemente do lado direito e,
hemodinâmica, dependendo da gra - portanto, a dor é mais frequentemente
vidade da doença. A dor abdominal, localizada do lado direito. Entretanto de-
vemos ficar atentos aos pacientes que
geralmente aguda a subaguda, é o apresentam dor no lado direito ou su -
sintoma de apresentação mais co- prapúbica devido à localização / anato -
mum. Ela é localizada principalmen - mia do cólon sigmoide.
te no quadrante inferior esquerdo,
devido ao fato de que a maioria das Outros sintomas de apresentação co-
muns incluem diarreia, febre baixa,

203
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 204
14

constipação e náuseas sem vômitos.


Devido à proximidade do cólon infla- SE LIGA! Um paciente com quadro de
mado com a bexiga, alguns pacientes diverticulite que apresenta fecalúria,
podem apresentar sintomas urinários. pneumatúria ou piúria, procurar por fís -
tula colovesical. Caso ele apresente uma
Obstipação e distensão abdominal passagem de gases e/ou fezes pela va-
podem indicar obstrução. A obstru- gina, procurar por fístula colovaginal.
ção geralmente é mais comum após
um ou mais episódios de diverticulite
aguda, como resultado de formação MAPA: DIAGNÓSTICO CLÍNICO
de cicatrizes e estenoses, entretanto
ela também pode advir da inflama-
ção, que gera um edema na parede
do cólon. O sangramento retal é um DIAGNÓSTICO
CLÍNICO
sintoma incomum e deve exigir ava -
liação de outras fontes de dor.

Diagnóstico geralmente clínico,


Quadro clínico
mas a imagem é necessária
extremamente variado
para descartar complicações

Dor abdominal aguda ou Sintomas urinários


subaguda geralmente é o devido a proximidade da
sintoma mais comum bexiga com o cólon inflamado

Obstipação e distensão
Na população asiática a dor é
abdominal podem
frequentemente do lado direito
indicar obstrução

Caso haja sangramento


Localizada normalmente no
retal, investigar outras
quadrante inferior esquerdo
causas para a dor

Diarreia, constipação, febre


baixa e náuseas sem vômitos
com a descrição correta das carac -
terísticas da dor e busca por dis -
tensão ou até mesmo uma massa
inflamatória.
O exame físico de um paciente com
suspeita de diverticulite deve incluir Instabilidade hemodinâmica, rigidez
sinais vitais, com muita atenção à abdominal e dor difusa são obser -
temperatura, frequência cardíaca e vadas em pacientes com perfuração
pressão arterial.O exame abdominal livre e peritonite generalizada. Um
deve ser feito muito cuidadosamente, exame pélvico deve ser realizado em

204
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 205
15

mulheres para avaliar possíveis cau - estado mental ou comprometimento


sas ginecológicas da dor ou busca por respiratório ficar alerta para diverti-
fístulas. Um exame retal pode revelar culite grave com sepse.
sensibilidade. Se houver alteração no

MAPA: EXAME FÍSICO

Temperatura,
frequência cardíaca e
pressão arterial
Descrição correta das
características da dor
Exame abdominal
Deverá ser Busca por distensão
completo, mas com abdominal ou massa
bastante atenção a inflamatória

Avaliar possíveis
causas ginecológicas
para dor
EXAME Exame pélvico
FÍSICO
Busca por fístulas
Confusão mental ou Suspeitar de
comprometimento diverticulite
respiratório com sepse

Instabilidade Suspeitar de
hemodinâmica, rigidez perfuração e peritonite
abdominal e dor difusa generalizada

Diagnóstico diferencial quadrante superior direito e são en -


contradas anormalidades nos testes
Várias outras doenças têm uma apre-
de função hepática e nas imagens bi-
sentação semelhante à diverticuli -
liares. Pacientes com colite isquêmica,
te. As doenças gastrointestinais que
infecciosa e inflamatória apresentam
podem simular diverticulite incluem
diarreia frequentemente sangrenta.
apendicite, doença biliar, obstrução
intestinal, malignidade do cólon, do - A síndrome do intestino irritável e a
ença inflamatória intestinal, pancrea- doença diverticular não complicada
tite aguda, constipação, gastroenteri- sintomática são dois distúrbios gas -
te aguda e hérnia encarcerada. trointestinais que podem ser difíceis de
distinguir da diverticulite leve, principal-
A doença biliar, incluindo colecisti-
mente porque os pacientes com am -
te aguda, coledocolitíase e colangite,
bos os distúrbios podem ter um históri-
geralmente se manifesta com dor no
co de diverticulite. O risco de distúrbios

205
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 206
16

funcionais do intestino e da síndrome pélvica, torção ovariana, cisto ovaria-


do intestino irritável aumenta em pa - no rompido ou gravidez ectópica são
cientes após um episódio de diverticu- causas comuns de dor abdominal.
lite, talvez devido à hipersensibilidade A dor associada a essas condições
visceral. No entanto, as evidências que ovarianas é geralmente aguda no iní-
ligam a diverticulose aos sintomas in - cio e intermitente. Anormalidades no
testinais crônicos são precárias. exame pélvico e achados na imagem
O câncer colorretal pode ser diferen- abdominal diferenciam causas gine -
ciado da diverticulite com base no cológicas de diverticulite.
aparecimento mais crônico dos sinto- As etiologias geniturinárias da dor
mas, incluindo mudança progressiva abdominal incluem nefrolitíase e in-
nos hábitos intestinais e hematocácia. fecções do trato urinário. A dor nes -
Nas mulheres, distúrbios ginecoló - sas condições geralmente ocorre nas
gicos, incluindo doença inflamatória costas ou no flanco e é acompanhada
por disúria.

DOENÇA SINTOMAS CO N STATAÇÕ ES


Início crônico ou subagudo de constipação é Espessamento localizado da parede intesti-
Câncer colorretal
sangue oculto nas fezes nal sem inflamação pericólica na imagem
Aumento da lactato desidrogenase sérica;
Início agudo de dor abdominal, segui- parasitológico de fezes negativos, espes-
Colite isquêmica do pelo desenvolvimento de diarreia é samento segmentar da parede intestinal,
hematoquezia frequentemente com "impressão digital"ou
pneumatose
Apresentação subaguda ou crônica; diarreia
Espessamento difuso ou multifocal da pare-
Doença inflama- como uma característica predominante;
de intestinal na imagem; ulceração do cólon
tória intestinal hematoquezia; sintomas constitucionais
vista na colonoscopia
(perda de peso, fadiga)
Diarreia como uma característica predomi-
Colite infecciosa Cultura de fezes positiva
nante; dor leve não localizada
Dor periumbilical de início agudo que migra
Apendicite aguda para o quadrante inferior direito; anorexia; Apêndice anormal na imagem
paciente jovem
Apendagite Início agudo ou subagudo de dor abdominal Teste laboratorial normal; imagem abdomi-
epiploica localizada sem outros sintomas nal com apêndice epiplóico inflamado
Obstrução intes- Obstipação é vômito, sons intestinais dimi-
Padrão intestinal obstrutivo na imagem
tinal, vôlvulo nuídos ou ausentes
Síndrome do Dor abdominal intermitente crônica é
intestino irritável hábitos intestinais alterados; pode ter um
Exames laboratoriais é de imagem normais;
e doença diverti- histórico de diverticulite; pacientes com
atendem aos critérios de Roma IV
cular não compli- síndrome do intestino irritável tendem a ser
cada sintomática mais jovens, com predominância feminina

206
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 207
17

DOENÇA SINTOMAS CO N STATAÇÕ ES


Doença epigástrica aguda ou no quadrante
Colecistite, doen- Enzimas hepáticas elevadas; anormalidade
superior direito, que irradia para as costas
ça biliar da árvore biliar na imagem
ou ombro; icterícia
Distúrbios do Dor no flanco ou nas costas que irradia para
Exame de urina com sedimento ativo
trato urinário os órgãos genitais; disúria; hematúria
Sensibilidade ao movimento anexial ou
cervical, secreção mucopurulenta ou outras
Distúrbios Início agudo de dor pélvica; irregularidades anormalidades no exame pélvico; detecção
ginecológicos menstruais; corrimento vaginal; de doenças sexualmente transmissíveis;
resultados positivos no teste de gravidez;
anormalidades ginecológicas na imagem
Tabela 3. Diagnóstico diferencial

Exames laboratoriais Sumário de urina deve ser realizado


para excluir causas urinárias de dor
Pacientes com diverticulite geralmen-
e, em mulheres em idade fértil, deve
te apresentam um número elevado de
ser realizado o Beta HCG. Eletrólitos e
glóbulos brancos e PCR. A contagem
enzimas hepáticas são úteis para des-
de glóbulos brancos é normalmen -
cartar causas biliares de dor. E nos pa-
te levemente elevada na diverticulite
cientes que apresentam diarreia, de -
não complicada, mas pode ser maior
vem ser realizados estudos de fezes
no cenário de complicações.
para descartar etiologias infecciosas.

SAIBA MAIS!
Três estudos entre os anos de 2013 e 2015 identificaram a proteína C reativa (PCR), como
um biomarcador útil de inflamação, informando que ela pode ser útil na predição da gravidade
clínica da diverticulite aguda.
Em 2013, Kechagias A et al., realizou estudo retrospectivo que chegou à conclusão que em
um episódio leve de diverticulite, é muito provável que os pacientes apresentem PCR menor
que 170 mg/l (sensibilidade de 87,5%, especificidade de 91,1%). E que aqueles com maio-
res valores de PCR têm maior probabilidade de serem submetidos a cirurgia ou drenagem
percutânea.
Em 2013, Van de Wall BJ et al., avaliou valor diagnóstico dos marcadores de infecção soroló-
gica e da temperatura corporal, ao discriminar diverticulite complicada e não complicada. So-
mente a PCR tinha valor diagnóstico suficiente. A PCR mediana em pacientes com diverticu-
lite complicada foi significativamente maior do que em pacientes com doença não complicada
(224 mg/l, faixa de 99 a 284 versus 87 mg/l, faixa de 48 a 151, respectivamente). Pacientes
com PCR de 25 mg/l tiveram 15% de chance de ter diverticulite complicada. Isso aumentou
de 23% para um valor de PCR de 100 mg/l para 47% para 250 mg/l ou superior. O limiar ideal
foi alcançado em 175 mg/l, com um valor preditivo positivo de 36%, valor preditivo negativo
de 92%, sensibilidade de 61% e especificidade de 82%.

207
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 208
18

Mäkelä et al. publicaram um estudo comparando os valores de PCR de 350 pacientes que
apresentaram pela primeira vez sintomas de diverticulite aguda com os achados da TC e pa-
râmetros clínicos.
Nesse estudo, o valor de corte da PCR de 149,5 mg/l discriminou significativamente diverti-
culite aguda não complicada de diverticulite complicada (especificidade 65%, sensibilidade
85%). Um valor de PCR acima de 150 mg/l e idade avançada foram fatores de risco indepen-
dentes para diverticulite aguda complicada. O valor médio da PCR foi significativamente maior
nos pacientes que morreram (PCR média de 207 mg/l) do que naqueles que sobreviveram
(PCR média de 139 mg/l). Além disso, um valor de PCR acima de 150 mg/l e líquido abdo -
minal livre na TC foram variáveis independentes que predizem a mortalidade pós-operatória.
O estudo confirmou que a PCR é útil para prever a gravidade da diverticulite aguda na admis-
são. Os autores concluíram que pacientes com um valor de PCR superior a 150 mg/l têm um
risco aumentado de diverticulite complicada e devem sempre ser submetidos a um exame de
tomografia computadorizada.

MAPA: EXAMES LABORATORIAIS

PROTEÍNA C Biomarcador útil de inflamação, podendo ser útil na


REATIVA predição da gravidade clínica da diverticulite aguda

+
Normalmente levemente elevada
GLÓBULOS
na diverticulite não complicada, mas pode
BRANCOS
ser maior no cenário de complicações
+
EXAMES PARA
Sumário de urina, Beta HCG, Eletrólitos e
DESCARTAR
enzimas hepáticas, parasitológico de fezes
OUTRAS DOENÇAS

AUXILIAM NO
Os exames, quando somado a uma
DIAGNÓSTICO DA
clínica compatível e exames de imagens,
DIVERTICULITE
auxiliam na rapidez do diagnóstico.
AGUDA

Exames de imagem de exames de imagem pode deixar


passar algumas complicações, como
Conforme dito acima, realizar um
abscessos, por exemplo.
diagnóstico de diverticulite apenas
com base nos achados clínicos e ex-
tremamente difícil e a não realização

208
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 209
19

episódios recorrentes ocorrem em


SE LIGA!Distinguir a doença complica-
um segmento diferente do cólon.
da da doença não complicada é essen-
• Apresentam sinais e sintomas
cial para determinar a necessidade de
antibióticos, drenagem percutânea de graves, como dor intensa, com -
abscesso e cirurgia. prometimento hemodinâmico e/ou
respiratório, sensibilidade difusa e
proteção no exame, rigidez abdo -
A imagem abdominal geralmente é
minal e leucócitos e/ou PCR mar -
útil para pacientes que:
cadamente elevados.
Apresentam pela primeira vez uma
suspeita de diverticulite,para confir - • Não respondem ao tratamen -
mar o diagnóstico. Em episódios sub - to médico para avaliar o desen-
sequentes, a imagem pode não ser volvimento de complicações.
necessária se a apresentação e a gra - Pacientes imunocomprometidos
vidade forem semelhantes aos eventos apresentam maior risco de com -
anteriores. plicações e podem não apresentar
resposta inflamatória. Portanto, o
• Apresentam múltiplos episódios limiar para geração de imagens é
recorrentes, pois a documenta- baixo neste subgrupo.
ção da localização da diverticulite
durante pelo menos dois episó -
dios é útil se a cirurgia profilática A tomografia computadorizada (TC)
for considerada. A probabilidade abdominal de múltiplos detectores
de episódios recorrentes após a ci- com contraste intravenoso e luminal
rurgia é minimizada quando todos é o exame de escolha na diverticu-
os segmentos envolvidos anterior- lite, porém ela fornece ao paciente al-
mente são ressecados e 30% dos tas doses de radiação.

Figura 4. A,B: TC de abdome com contraste. Notam-se sinais de diverticulite aguda caracterizados por espessamento
parietal do sigmoide, divertículos, densificação da gordura regional (seta em A) e presença de gás extraluminal, indi-
cando pneumoperitônio (setas em B). C: Sinais de perfuração intestinal. TC de abdome, plano axial, contraste intrave-
noso, demonstra pneumorretroperitônio (setas), secundário a diverticulite. Fonte: https://bit.ly/2Y2OpVZ

209
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 210
20

A ultrassonografia (US) abdominal é mais limitadas, particularmente em


outro exame que pode ser utilizado pacientes obesos.
para avaliar pacientes com suspei - A ressonância magnética (RM) pode
ta de diverticulite, apresentando a ser considerada em pacientes que
vantagem de reduzir o contraste e a não são candidatos à TC ou US. A ra-
exposição à radiação e poder ser re- diografia abdominal simples pode ser
alizado à beira do leito em pacientes útil na avaliação do pneumoperitônio
gravemente doentes. No entanto, a e na exclusão de outros diagnósticos,
US é mais dependente do operador como obstrução intestinal, mas não
do que a TC e oferece visualizações pode ser usada para confirmar o diag-
nóstico de diverticulite ou abscesso.

MAPA: EXAMES DE IMAGEM

Apresentam o
primeiro episódio
de diverticulite, para
confirmar o diagnóstico

Apresentam recorrência,
para documentar, caso
a cirurgia profilática seja
uma opção Dor intensa,
Imagem abdominal é comprometimento
útil para pacientes que hemodinâmico/
Apresentam sinais e respiratório
sintomas graves
Rigidez abdominal,
leucócitos/PCR
muito elevados

EXAMES DE
IMAGEM Imunocomprometidos
Não respondem ao
não apresentam boa
tratamento realizado
resposta inflamatória

TC abdominal de
Exame de escolha,
múltiplos detectores
porém fornece altas
com contraste
doses de radiação
intravenoso
Exames de escolha
Pode ser realizada a
Ultrassonografia
beira do leito, porém é
abdominal
operador-dependente

210
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 211
21

8. TRATAMENTO
SE LIGA! Devemos indicar uma consulta O tratamento do paciente com diver-
com um gastroenterologista ou com um ci-
rurgião quando os pacientes apresentam: ticulite irá depender da gravidade da
• Sintomas crônicos ou recorrentes sem
apresentação, presença de compli-
evidência clara de inflamação, para cações e comorbidades associadas.
avaliar a possibilidade de doença di- Inicialmente o médico responsável
verticular não complicada sintomática deverá determinar se o paciente tem
ou síndrome do intestino irritável.
doença complicada ou não compli-
• Sintomas refratários, sintomas que
se repetem logo após o término da
cada. A diverticulite não complicada
terapia ou hematoquezia significati- muitas vezes pode ser tratada clinica-
va, para avaliar a possibilidade de um mente e ambulatorialmente, enquan-
diagnóstico alternativo, como doen - to a diverticulite complicada requer
ça inflamatória intestinal, colite seg-
mentar associada a diverticulite ou cuidados mais agressivos e, muitas
diverticulite refratária “fumegante”. vezes, cirurgia urgente ou eletiva.

SAIBA MAIS!
Sartelli M. et al, ao descreverem as diretrizes da Sociedade Mundial de Cirurgia de Emergên-
cia, em 2017, classificaram as infecções intra-abdominais em complicadas e não complicadas.
Nas infecções intra-abdominais não complicadas, a infecção envolve apenas um único órgão
e não se estende ao peritônio, enquanto que nas infecções intra-abdominais complicadas, o
processo infeccioso se estende além do órgão, causando peritonite localizada ou difusa.

A diverticulite aguda não complica - Tratamento clínico


da é um processo inflamatório ana-
Pacientes com sintomas de diverti -
tomicamente confinado. Os achados
culite aguda não complicada e sem
da TC incluem divertículos, espessa -
comorbidades significativas, capazes
mento da parede e aumento da den-
de tomar líquidos por via oral e re -
sidade da gordura pericólica.
ceber cuidados em casa, podem ser
tratados ambulatorialmente . Es-
SE LIGA! Pacientes com diverticuli - ses pacientes devem ser reavaliados
te não complicada geralmente têm um dentro de 7 dias a partir do momen-
curso indolente com baixa incidência de to do diagnóstico, porém, caso eles
complicações subsequentes.
apresentem deterioração da condição
clínica, a reavaliação deverá ocorrer
mais cedo. Pacientes com comorbi -
dades significativas e incapazes de

211
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 212
22

tomar líquidos por via oral devem até que a resolução seja alcançada.
ser tratados no hospital com fluidos Pacientes com perfuração, abscessos
intravenosos. grandes, sepse ou obstrução intes -
Pacientes com pequenos abscessos tinal ou pacientes que não toleram a
que estão bem o suficiente para serem ingestão de líquidos ou têm doença
gerenciados em ambulatório também preexistente significativa devem ser
podem ser tratados com antibióticos tratados no ambiente hospitalar com
orais, mas com um curso mais longo antibióticos intravenosos.

MAPA: TRATAMENTO CLÍNICO


TRATAMENTO
CLÍNICO

Tratamento depende da
Inicialmente o médico deverá
gravidade, presença de
definir se o paciente apresenta
complicações e comorbidades
diverticulite complicada ou não
do paciente

Complicada: o processo
Não complicada: a infecção
infeccioso se estende além
envolve apenas um órgão e
do órgão e causa peritonite
não se estende ao peritônio
localizada ou difusa

Tto ambulatorial caso tenham pequenos


Tto ambulatorial caso sejam capazes de tomar
abscessos e possam tomar antibióticos
líquidos VO e receber cuidados em casa
VO

Tto intra-hospitalar caso apresentem


Devem ser reavaliados em 7 dias, mas caso haja
perfuração, abscessos grandes, sepse,
deterioração da saúde, reavaliar antes
obstrução

Tto intra-hospitalar caso não tolerem


Tto intra-hospitalar caso não sejam capazes de
ingestão de líquidos e/ou tenham
tomar líquidos VO e receber cuidados em casa
comorbidades importantes

212
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 213
23

Uso de antibióticos na diverticulite associada à sepse exige que os mé -


colônica aguda não complicada dicos mantenham um alto índice de
suspeita clínica, nas condições que
O consenso atual para o tratamento
predispõem à sepse. Nesses casos,
da diverticulite colônica aguda não
está indicada a antibioticoterapia
complicada é de que essa doença
que cobre bacilos Gram-negativos e
pode ser uma condição autolimitada,
anaeróbios logo de imediato.
na qual as defesas locais do hospe -
deiro podem controlar a inflamação Os ensaios comparando antibióticos
sem antibióticos em pacientes imu - específicos para o tratamento da di-
nocompetentes. Nesse contexto, os verticulite são limitados. Em geral, an-
antibióticos devem ser usados de tibióticos de amplo espectro com co-
maneira seletiva e não rotineira em bertura gram-negativa e anaeróbica
pacientescom diverticulite colônica devem ser prescritos. Dessa forma,
aguda não complicada em pacientes antibióticos comumente usados para
imunocompetentes. pacientes ambulatoriais estáveis in-
cluem a combinação de fluoroquino-
Da mesma forma, pacientes com di-
lona ou trimetoprim-sulfametoxazol
verticulite recorrente com manifesta -
com metronidazol ou moxifloxacina
ções leves e típicas, podem ser tra-
ou amoxicilina e clavulanato como
tados de forma conservadora. Esses
agentes únicos.
pacientes podem ser instruídos a con-
sumir uma dieta líquida clara e a tomar Para pacientes internados com do -
analgésicos para alívio da dor. Se não ença moderada, recomenda-se tra -
houver melhora dentro de dois a três tamento intravenoso com fluoro -
dias, os antibióticos podem ser inicia- quinolona mais metronidazol, ácido
dos. Para esses pacientes (estáveis e ticarcilina-clavulânico, ertapenem ou
imunocompetentes com diverticulite moxifloxacina. Meropenem, imipe -
não complicada), os antibióticos orais nem-cilastatina, piperacilina-tazo -
são considerados adequados. bactam ou doripenem podem ser ne-
cessários para pacientes gravemente
Entretanto, em pacientes de alto risco,
enfermos, especialmente aqueles
como pacientes imunocomprometi-
com imunocomprometimento.
dos, idosos e pacientes com comorbi-
dades associadas, a alta mortalidade

213
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 214
24

MAPA: USO DE ANTIBIÓTICOS NA DIVERTICULITE NÃO COMPLICADA

Pacientes de alto risco


(imunocomprometidos e com
comorbidades significativas
associadas), a antibioticoterapia
deve ser iniciada de imediato

Pacientes com diverticulite DIVERTICULITE Pode ser uma condição autolimitada,


recorrente de manifestações leves
AGUDA NÃO na qual as defesas do organismo
e típicas podem ser tratados de
COMPLICADA podem controlar a infecção
maneira conservadora

Os antibióticos devem ser utilizados


de maneira seletiva e não rotineira
em pacientes imunocompetentes

Uso de antibióticos na diverticulite principalmente uma infecção adqui-


colônica aguda complicada rida na comunidade, sendo as Ente -
robacteriaceae produtoras de beta-
A antibioticoterapia desempenha um
-lactamase de espectro estendido,
papel importante no tratamento da
principal ameaça à resistência.
diverticulite aguda complicada, nor -
malmente é um tratamento antibi-
ótico empírico . O regime deve de - SE LIGA! Os fatores de risco mais signi-
pender da gravidade da infecção, dos ficativos para patógenos produtores de
patógenos que se presume estarem beta-lactamase de espectro estendido
incluem exposição prévia a antibióticos
envolvidos e dos fatores de risco in- e comorbidades que requerem terapia
dicativos dos principais padrões de antibiótica concomitante.
resistência.
A cobertura da antibioticoterapia A interrupção do tratamento com an-
deverá cobrir bactérias Gram-posi - tibióticos deve ocorrer no quarto dia
tivas e Gram-negativas, bem como do controle da fonte, pois diversos es -
para anaeróbios. A maioria das di - tudos demonstraram que em pacien -
verticulites agudas complicadas é tes com infecções intra-abdominais

214
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 215
25

complicadas, os resultados após apro- Pacientes que apresentam sinais de


ximadamente 4 dias de antibioticotera- sepse além de 5 a 7 dias de tratamen-
pia de duração fixa foram semelhantes to antibiótico adequado, exigem in -
aos de um curso mais longo de antibi- vestigação diagnóstica agressiva em
óticos, que se estendeu até após a re- busca de um reservatório de infecção.
solução de anormalidades fisiológicas.

MAPA: USO DE ANTIBIÓTICOS NA DIVERTICULITE COMPLICADA

Pacientes que apresentam


sinais de sepse após o quinto
dia de tratamento, buscar
outra fonte de infecção

A interrupção do tratamento DIVERTICULITE Antibioticoterapia empírica


deve ocorrer a partir do quarto AGUDA tem um papel importante na
dia de controle da fonte COMPLICADA diverticulite aguda complicada

A cobertura antimicrobiana deve


cobrir patógenos Gram-positivos,
Gram-negativos e anaeróbios

TIPO DE
AGENTE UNICO VÁRIOS AGENTES DURAÇÃO
TRATAMENTO
Moxifloxacina 400mg VO a cada 24 horas Trimetopim-sulfametoxazol 160mg/800mg
Ambulatorial da 4-7 dias se a fonte for
Amoxicilina-clavulanato 875mg/125mg VO a cada 12 horas
diverticulite leve controlada/o abscesso
VO a cada 12 horas ou 1000mg/62,5mg Ciprofloxacina 750mg VO a cada 12 horas
não complicada for drenado
2 comprimidos a cada 12 horas Levofloxacina 750mg VO a cada 24 horas
Cada um em combinação com metronida -
zol 500mg VO a cada 6 horas
Ertepenem 1g IV a cada 24 horas
Hospitalar de Cefazolina 1-2g IV a cada 8 horas
Moxifloxacina 400mg IV a cada 24 horas 4-7 dias se a fonte for
diverticulite Cefuroxima 1,5g IV a cada 8 horas
Ticarcilina-clavulanato 200mg/300mg/ controlada/o abscesso
complicada leve a Ceftriaxona 1-2g IV a cada 12-24 horas
kg/dia em doses divididas a cada 4-6 for drenado
moderada Cefotaxima 1-2g IV a cada 6-8 horas
horas
Ciprofloxacina 400mg IV a cada 12 horas
Levofloxacina 750mg IV a cada 24 horas
Cada um em combinação com metroni-
Imipenem-cilastatina 500mg a cada 6
dazol 500mg IV a cada 8-12 horas ou
Hospitalar de horas ou 1g IV a cada 8 horas
1500mg IV a cada 24 horas 4-7 dias se a fonte for
diverticulite com- Meropenem 1g IV a cada 8 horas
Cefepima 2g IV a cada 8 horas controlada/o abscesso
plicada grave com Doripenem 500mg IV a cada 8 horas
Ceftazidima 2g IV a cada 8 horas for drenado
peritonite Piperacilina-tazobactam 3.375g IV a
Ciprofloxacina 400mg IV a cada 12 horas
cada 6 horas
Levofloxacina 750mg IV a cada 24 horas

Tabela 4. Antibioticoterapia

215
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 216
26

Dieta • Abscesso intra-abdominal me -


nor do que 4 centímetros de di-
Tradicionalmente, uma dieta líquida
âmetro, sem peritonite (estádio
clara é recomendada no início do
1 de Hinchey):Há um tempo, o
curso,com avanço gradual para uma
tratamento desse abscesso era a
dieta pobre em fibras até que os sin-
drenagem percutânea, entretanto
tomas resolvam. Após a resolução
atualmente está prescrita somente
dos sintomas do paciente, recomen -
a administração de antibióticos e
da-se uma dieta rica em fibras e po-
repouso intestinal.
bre em carne vermelha. Para pacien-
tes hospitalizados com doença grave • Abscesso intra-abdominal maior
é recomendada a abstenção ingestão do que 4 centímetros de diâme-
oral até que a doença se estabilize. tro (estádio 2 de Hinchey):dre -
nagem percutânea guiada pela
tomografia computadorizada as -
Dor sociada à antibioticoterapia, princi-
Paracetamol e antiespasmódicos , palmente se houver disponibilida -
como a diciclomina, são agentes de de de radiologia intervencionista.
primeira linha no controle da dor e das Esse procedimento pode ser pro -
cólicas em doenças leves a moderadas. gramado em um período de 6 a 8
semanas. Esse período coincide
SE LIGA! Alguns medicamentos, ain-
com a quiescência do processo in-
da que frequentemente utilizados para flamatório, normalização do exame
controle da dor (principalmente refra- físico e redução da leucocitose. En-
tária a outras medidas) na diverticuli - tretanto, pode ser realizada abor -
te, estão frequentemente associados a
complicações, como anti-inflamatórios dagem cirúrgica precoce, em 7 a
não esteróides (diverticulite incidente e 30 dias após a resolução do pro -
complicada) e narcóticos opiáceos (di - cesso infeccioso, o que pode redu-
verticulite perfurada). zir o tempo de internação hospita-
lar e determinar menor morbidade
Tratamento cirúrgico e menos necessidade de ostomia.
As principais indicações para inter - • Abscesso intra-abdominal com
venção cirúrgica na diverticulite são material fecal grosseiro, peri -
doenças complicadascom perfura - tonite generalizada (estádio 3
ções, abscessos, estenoses e fístulas de Hinchey), perfuração vis -
e diverticulite recorrente. A aborda - ceral não contida (estádio 4 de
gem cirúrgica de todas as indicações Hinchey) e sepse não contro -
está evoluindo e, em geral, está se lada:procedimento cirúrgico de
tornando menos agressiva.

216
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 217
27

urgência. A mortalidade nessa técnica consiste na aspiração de


eventualidade é elevada. pus, lavagem abdominal e coloca-
ção de drenos.
• Peritonite não feculenta (estágio
III de Hinchey): lavagem laparos- • Peritonite feculenta (estágio IV
cópica para controlar a peritonite de Hinchey):a ressecção é sem-
e permitir uma ressecção eletiva pre recomendada.
com anastomose primária. Essa

MAPA: TRATAMENTO CIRÚRGICO

Atualmente não é
Intra-abdominal
cirúrgico: antibiótico +
< 4cm
repouso intestinal

Drenagem percutânea
Intra-abdominal guiada por TC +
Abscessos
> 4cm antibiótico + repouso
intestinal

Intra-abdominal
com material fecal Procedimento
grosseiro, peritonite cirúrgico de urgência
TRATAMENTO generalizada

Lavagem
Sigmoidectomia,
laparoscópica c/
colectomia esquerda,
Não feculenta posterior ressecção
direita (dependendo do
eletiva + anastomose
segmento afetado)
primária
Peritonite

Procedimento
Feculenta
cirúrgico de urgência

Historicamente, em pacientes que Alternativamente, a sigmoidectomia


necessitam de cirurgia por diverticu - com anastomose primária e ileosto -
lite aguda do lado esquerdo, era rea- mia com alça de desvio foi proposta
lizada uma sigmoidectomia com co - para esses pacientes. Embora alguns
lostomia final e bolsa de Hartmann, dados sugiram que essa abordagem
entretanto essa abordagem está as- esteja associada a menos complica -
sociada a um alto índice de complica- ções e maiores taxas de reversão do
ções e estomas permanentes. estoma, os estudos existentes são

217
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 218
28

pequenos e predominantemente re - Dito isto, cada paciente deverá ser ana-


trospectivos, com uma alta probabili- lisado e a abordagem cirúrgica será
dade de pacientes com perfis de risco feita de acordo com fatores individu -
favoráveis serem selecionados para ais, como o local da diverticulite, o grau
anastomose primária. de inflamação na área da anastomose
proposta e a estabilidade do paciente.
A ressecção colônica com bolsa de
Hartmann é atualmente a cirurgia de
escolha em pacientes com peritonite
generalizada gravemente enfermos
ou com múltiplas comorbidades.

Figura 5. Ileostomia. (A) Um segmento do intestino é


colocado acima da parede abdominal garantindo um posi-
cionamento livre de tensão. (B) Uma enterotomia é criada
ao longo da extremidade eferente (ou distal) do estoma
em alça. (C) Usando suturas de maturação absorvíveis,
uma extremidade aferente proximal everting (esquerda) e
uma extremidade eferente distal rente (direita) são criadas.
Isso permitirá que o efluente passe pelo bico proximal para
o sistema de bolsa coletora e evite vazamento para a pele
ao redor. A extremidade de descarga distal permitirá a
ventilação. Fonte: UpToDate, 2020 Figura 6. Ressecção de doença diverticular. Os pro-
cedimentos em dois estágios são usados em situações
de emergência em que houve contaminação peritoneal.
Pacientes com diverticulite aguda do Comum entre as abordagens é que o segmento agressivo
da doença diverticular seja ressecado na primeira ope -
lado direito poderão ser submetidos ração. (A) Estágio 1 consiste no procedimento de Hart-
mann; o cólon sigmoide doente é removido, o fluxo fecal é
a uma colectomia parcial do lado di - desviado e o reto é seccionado. No estágio 2, a continui-
reito. É importante salientar que não é dade intestinal é restabelecida por uma colorectostomia
descendente. (B) No estágio 1, o sigmoide doente é remo-
necessário remover toda a extensão vido, e ambas as extremidades do intestino são trazidas
do cólon acometido pela diverticulose, à superfície, uma como colostomia final e a outra como
fístula mucosa. No estágio dois, a continuidade intestinal é
mas somente a porção acometida pelo restabelecida como no painel A. Fonte: UpToDate, 2020
processo inflamatório e infeccioso, com
paredes espessadas e friáveis.

218
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 219
29

Estudos comparando ressecção ele - internação e qualidade de vida. As


tiva aberta e laparoscópica para di - atuais diretrizes de diverticulite reco-
verticulite recorrente no sigmoide ge- mendam que a abordagem laparos -
ralmente indicam que a abordagem cópica seja usada para colectomia
laparoscópica diminui a incidência eletiva para diverticulite, se houver
de complicações maiores, tempo de cirurgião com experiência disponível.

Figura 7.Colectomia parcial. Fonte: https://bit.ly/3gKPrgx

MAPA: LAPAROSCOPIA

Diminui as chances de CIRURGIA


Diminui o tempo de internação
complicações relativas a cirurgia LAPAROSCÓPICA

Diminui a REMT

9. PROGNÓSTICO E anos.O risco de reincidência após o


PREVENÇÃO segundo episódio é de 55% em 10
anos e após o terceiro episódio é de
Após um primeiro episódio de di-
40% em 3 anos.
verticulite, o risco de recorrência é
de aproximadamente 20% em 10

219
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 220
30

MAPA: RISCO DE RECORRÊNCIA

É o risco de recorrência
20% após o primeiro episódio de Risco em 10 anos
diverticulite aguda

É o risco de recorrência
55% após o segundo episódio de Risco em 10 anos
diverticulite aguda

É o risco de recorrência
40% após o terceiro episódio de Risco em 3 anos
diverticulite aguda

O risco de recorrência em pacientes incidentes, estima-se que uma dieta


com doença complicada tratada cli- rica em fibras e atividade física redu-
nicamente parece ser semelhante ao zam o risco de recorrência.
de pacientes com doença não com-
plicada. Após um episódio de diverti-
culite não complicada, o risco a curto
10. SEGUIMENTO
prazo de abscesso ou perfuração é A colonoscopia é recomendada em
muito baixo (2%). Aproximadamente pacientes após o episódio incidente
40% dos pacientes com diverticulite de diverticulite para descartar ou-
não complicada relatam dor abdomi- tras patologias, como câncer de có -
nal leve a moderada 1 ano após a re- lon e doença inflamatória intestinal.
solução da diverticulite. Como a colonoscopia teoricamente
Os fatores de risco para diverticulite pode aumentar o risco de diverticulite
recorrente incluem idade jovem no perfurada, é recomendável que a co-
início, gravidade do evento incidente, lonoscopia seja marcada para 4 a 8
número de recorrências, extensão do semanas após a resolução da diver -
cólon envolvido durante o evento in - ticulite. A colonoscopia pode não ser
cidente e histórico familiar de diver - necessária em pacientes que fizeram
ticulite. O papel dos fatores de dieta um exame colonoscópico recente e
e estilo de vida na diverticulite recor- de alta qualidade.
rente não é claro. No entanto, usan - Estima-se que 80% dos pacientes
do dados de estudos de doenças com diverticulite terão apenas um

220
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 221
31

episódio. Além disso, eventos re - como perfuração são geralmente vis-


correntes tendem a ter a mesma ou tas durante o primeiro ou o segundo
menor gravidade e complicações episódio.

MAPA: SEGUIMENTO

SEGUIMENTO

A recomendação é realizar A colonoscopia deve ser


colonoscopia após um episódio realizada de 4 a 8 semanas após o
de diverticulite aguda quadro de diverticulite aguda

Ela pode não necessária Essa recomendação se deve


se o paciente tem um exame ao fato da colonoscopia aumentar
recente e de qualidade o risco de diverticulite perfurada

SAIBA MAIS!
ALGUMAS RECOMENDAÇÕES COM RELAÇÃO À PREVENÇÃO, DIAGNÓSTICO E TRATA-
MENTO DA DIVERTICULITE AGUDA
Diretrizes da Associação Americana de Gastroenterologia, 2015
• Antibióticos devem ser usados seletivamente.
• A colonoscopia deve ser realizada após a resolução da diverticulite aguda se um exame
de alta qualidade não tiver sido realizado recentemente.
• A ressecção colônica profilática na diverticulite não complicada deve ser feita caso a caso.
• Recomenda-se uma dieta rica em fibras ou suplementação de fibras após a resolução da
diverticulite.
• A atividade física, idealmente diária, é recomendada após a resolução da diverticulite.
• O uso de aspirina pode ser continuado após a resolução da diverticulite, principalmente se
for para prevenção secundária.
• O consumo de nozes e pipocas não precisa ser evitado em pacientes com diverticulose
ou diverticulite.

221
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 222
32

• AINEs sem aspirina devem ser evitados, se possível, após a resolução da diverticulite.
• Mesalamina, rifaximina e probióticos não são recomendados para prevenção de recorrência.

¡ar÷metros de ¡rïtica da ¬ociedade Americana de ólon e irurgiƉes ¤etaisɈ ȃȁȂȅ


• A avaliação inicial deve incluir uma história e exame físico, hemograma completo, exame
de urina e radiografias abdominais em cenários clínicos selecionados.
• A tomografia computadorizada do abdome e da pelve é a modalidade de imagem inicial
mais apropriada.
• A ultrassonografia e a ressonância magnética podem ser alternativas úteis de imagem.
• O tratamento não operatório inclui antibióticos orais ou intravenosos e modificação da
dieta.
• A drenagem percutânea guiada por imagem é geralmente o tratamento mais apropriado
para pacientes estáveis com grandes abscessos diverticulares.
• Após a resolução da diverticulite incidente, a colonoscopia deve ser realizada se não for
realizada no passado recente.
• A decisão de recomendar a colectomia sigmoide eletiva deve ser individualizada.
• A colectomia eletiva deve ser considerada após a recuperação de diverticulite complicada.
• A ressecção eletiva de rotina com base na idade jovem (<50 anos) não é recomendada.
• A colectomia sigmoide urgente é necessária para peritonite difusa ou quando o manejo
não operatório falha.
• A decisão de restaurar a continuidade intestinal após a ressecção deve incorporar fatores
do paciente, fatores intraoperatórios e preferência do cirurgião.

Resumindo o tratamento... uma dieta pobre em fibras até que os


sintomas resolvam. Pacientes com
A abordagem do tratamento da di-
grandes abscessos necessitam de
verticulite aguda depende da presen-
antibióticos intravenosos e drenagem
ça de complicações (abscesso, perfu-
percutânea geralmente seguida de
ração), gravidade da apresentação e
ressecção cirúrgica eletiva. Pacientes
carga da doença comórbida. Pacien -
com perfuração e peritonite neces -
tes imunocompetentes estáveis e
sitam de antibióticos intravenosos e
com diverticulite não complicada po-
tratamento cirúrgico emergente. Já
dem frequentemente ser tratados em
os pacientes com doença complicada
ambulatório e, às vezes, sem antibió-
não devem receber nada por via oral
ticos. Para diverticulite não complica-
até que a diverticulite seja controlada.
da, uma dieta líquida clara é recomen-
dada por vários dias e avançada para

222
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA

MAPA RESUMO DIV

Exames laboratoriais e de imagem

TC com contraste é o exame de escolha

Diagnóstico geralmente clínico, mas a imagem


necessária para descartar complicações

Diagnóstic
Quadro clínico
extremamente variado
Dor abdominal aguda ou subaguda,
diarreia, constipação, febre baixa e Quadro clínico
náuseas sem vômitos

Presença de inflamação e infecção


associadas aos divertículos Definição
Complicação da doença
diverticular do intestino
Epidemiologia

50-70 anos:
predominantemente
em mulheres
Sedentarismo e IMC>25
Abaixo de 50 anos:
Envelhecimento, uso de predominantemente
álcool e tabagismo em homens
Pacientes com
Histórico familiar diverticulose tem risco
de 4% de desenvolver
Alto consumo de AINES, diverticulite
corticosteroides e analgésicos opiáceos
Baixo consumo de fibras na alimentação Fatores de risco
(<23g) e baixa ingesta de agua

223
DIVERTICULITEAGUDA
DIVERTICULITE AGUDA 224
34

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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proposta de um sistema de pontuação clínica.2011.
Boynton W, Floch M: New strategies for the management of diverticular disease: Insi -
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prevention of acute diverticulitis. Ann Gastroenterol. 2016.
Feingold D. et al. Parâmetros de prática para o tratamento da diverticulite sigmoide.
2014.
Kechagias A, Rautio T, Kechagias G, Mäkelä J. O papel da proteína C reativa na predição
da gravidade clínica da diverticulite aguda. 2014.
Kiewiet JJ, et al. Validação externa de duas ferramentas para o diagnóstico clínico de
diverticulite aguda sem imagem. 2014.
Laméris W, et al. Uma regra de decisão clínica para estabelecer o diagnóstico de diver-
ticulite aguda no pronto-socorro. 2010.
Mäkelä JT, Klintrup K, Takala H, Rautio T. O papel da proteína C-reativa na previsão da
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2015.
Swanson, SM, & Strate, LL. Diverticulite Colônica Aguda. Anais de medicina interna.
2018
Van de Wall BJ, et al. O valor de marcadores de inflamação e temperatura corporal na
diverticulite aguda. 2013.

224
MEGACÓLON

225
SUMÁRIO
1. Definição.................................................................................................. 227
2. Megacólon Agudo................................................................................ 228
3. Megacólon Crônico.............................................................................. 236
4. Megacólon Tóxico................................................................................. 243
Referências Bibliográficas ..................................................................... 254

226
MEGACÓLON 227

1. DEFINIÇÃO consideram outras áreas do intes -


tino também, pois o diâmetro do in-
Megacólon é definido como uma dila-
testino grosso é diferente em áreas
tação do cólon que não é causada por
diferentes, assim medições maiores
uma obstrução mecânica.
que 6,5 cm para a região retossig -
Em termos numéricos é definido móide e maiores que 8 cm para o có-
como uma medida de ceco maior que lon ascendente também podem ser
12 cm de diâmetro. Alguns autores significativas.

Cólon normal Megacólon

Figura 1.Megacólon. Fonte:Trusted

227
MEGACÓLON 228

Transverso > 6cm

Ascendente > 8cm Descendente > 8cm

Ceco > 12cm

Retossigmoide > 6,5cm

Figura 2. Medições do intestino grosso para definição Megacólon

O megacólon pode ser dividido em 2. MEGACÓLON AGUDO


três categorias:
O megacólon agudo trata-se de uma
• Megacólon agudo (pseudo-obs - pseudo-obstrução colônica (ou intes-
trução, síndrome de Ogilvie); tinal) aguda, caracterizada por acha-
• Megacólon crônico, que inclui dos físicos e radiológicos iguais àque-
causas congênitas, adquiridas e les associados à obstrução mecânica
idiopáticas; dos cólons, porém sem causa orgâni-
ca de distensão colônica.
• Megacólon tóxico

228
MEGACÓLON 229

A doença foi retratada pela primeira Etiologia


vez em 1948 por William Ogilvie, e
O megacólon agudo está associado
por isto, é também conhecida como
à várias doenças, sejam elas traumá-
síndrome de Ogilvie. É uma condição
ticas, obstétricas, cirúrgicas, cardior-
rara, que geralmente ocorre em pa-
respiratórias, neurológicas:
cientes hospitalizados portadores de
alguma doença clínica ou cirúrgica. • Anormalidades metabólicas, in -
cluindo insuficiência renal, hipoti -
reoidismo e hipertireoidismo;
Fisiopatologia
• Perturbações eletrolíticas, que po-
A fisiopatologia da pseudo-obstru - dem alterar a função autonômica;
ção colônica aguda ainda é desco -
nhecida. A teoria mais aceita para ex- • Doenças que podem desregular
plicar a sua fisiopatologia refere-se à neurotransmissores e perturbar as
excessiva supressão parassimpática, células intersticiais de Cajal e sis-
estimulação simpática ou ambas, que tema nervoso entérico;
resultam em atonia do cólon. • Medicamentos que alteram a ati-
Esse desequilíbrio da inervação au- vidade motora colônica, como: an-
tonômica levaria a um excesso de ticolinérgicos, antidiarreicos, opioi-
entrada motora simpática (por uma des, bloqueadores dos canais de
falha de contato), diminuição da en- cálcio, antipsicóticos, digitálicos,
trada motora parassimpática do cólon clonidina, dexmedetomidina;
distal (e por isso tem falha no relaxa- • Gravidez, pois alterações hormo -
mento e atonia) e excesso de entrada nais durante a gravidez podem
motora parassimpática (causando fa- afetar o tônus do cólon;
lha no relaxamento).
• Causas obstétricas, geralmente
Outras teorias defendem ser uma in-
associadas à cirurgia de cesariana,
terrupção dos arcos reflexos inibitó-
devido a alteração da inervação
rios, causando a uma motilidade anor-
autonômica;
mal de um segmento levando a uma
dilatação dos segmentos seguintes. • Doença inflamatória intestinal, in-
Além disso, há uma teoria que defen- cluindo colite ulcerosa e doença de
de que a causa seja uma estimulação Crohn.
excessiva de receptores opioides pe-
• Infecções, incluindo vírus (herpes
riféricos por opioides endógenos e/ou
zoster, varicela zoster, citomegalo-
exógenos.
vírus e dengue grave), Clostridium
difficile (colite pseudomembranosa),

229
MEGACÓLON 230

Trypanosoma cruzi (doença de de distensão abdominal. Outros sin-


Chagas) e Entamoeba histolytica tomas de apresentação comuns in -
(disenteria amebiana). cluem dor abdominal (60-80%), náu-
sea e vômito (13-60%), constipação
(50%) e, paradoxalmente, diarreia se-
Epidemiologia cretora (20-40%), além de febre em
Como vimos, é uma condição rara pacientes com complicações.
e por isto, os dados na literatura são
bem escassos. Nos EUA, foram relata-
Exame físico
dos uma taxa de incidência de 100 ca-
sos em 100.000 internações por ano No exame físico, os achados podem
em 2016. A maioria dos pacientes é ser os seguintes:
do sexo masculino, com idade maior
• Os sinais vitais podem ser normais.
que 60 anos, sem predileção de raça.
• Taquicardia, de acordo com a du-
ração do megacólon e do estado
de hidratação do paciente.
RARO • Taquipneia, devido compressão
(0,1%)
da cavidade torácica pela disten-
são abdominal. Nesse sentido, os
campos pulmonares podem estar
diminuídos.
EPIDEMIOLOGIA
• Abdome: distendido e timpâni -
co à percussão, e dor à palpação
superficial ou profunda, em geral
> 60 ANOS MASCULINO moderada, sem sinais, porém, de
irritação peritoneal. Os ruídos-hi -
droaéreos estão ausentes, dimi -
nuído ou som metálico, devido à
Quadro Clínico fisiopatologia de prejuízo motor
peristáltico intestinal.
Clínica
• O exame de toque retal deve ser
Os sintomas podem mimetizar um ab- realizado para excluir a impacta -
dome agudo. O mais comum é a dis-
ção fecal, e , em geral, há presença
tensão abdominal, presente em 89% de fezes na ampola retal.
dos casos, sendo que não é comum
o histórico de episódios semelhantes

230
MEGACÓLON 231

[SE LIGA] A presença de febre, sensi- Diagnóstico Diferencial


bilidade severa e sinais peritoneais deve
levantar a suspeita de perfuração do có- Os principais diagnósticos diferen -
lon ou isquemia. ciais são:

Megacólon Impactação Prolapso Volvo Megacólon


Tumor
Crônico fecal retal sigmoide tóxico

Para diferenciar, alguns dados aju - confirmação com exames de imagem.


dam. No megacólon agudo os sinto- Assim, o diagnóstico é feito por exclu-
mas abdominais são mais brandos são, sendo necessário excluir causas
dos que as obstruções mecânicas, mecânicas de dilatação colônica.
com menor distensão abdominal,
menor repercussão obstrutiva a mon-
tante (náuseas e vômitos), menor dor Clínica
abdominal e repercussão sistêmica. Uma história clínica completa e um
Já nas obstruções mecânicas, o pe- exame físico minucioso são necessá-
ristaltismo encontra-se aumentado à rios, abordando-se tanto o contexto
ausculta abdominal. A fase de silên- abdominal e gastrointestinal, quanto
cio peristáltico na obstrução mecâni- o contexto sistêmico e as comorbi -
ca é tardia e associada a gravidade, dades do paciente. Deve-se dedicar
com piora da perfusão e função in- especial atenção às diferenças ob -
testinal. O que no megacólon agudo serváveis ao exame físico abdominal
a fisiopatologia da doença cursa jus- e toque retal.
tamente com a piora da peristalse, de
forma que precocemente há redução Laboratório
dos ruídos hidroaéreos.
Laboratorialmente, podemos encon -
trar as alterações etiológicas mencio-
Diagnóstico nadas (distúrbios hidroeletrolíticos,
Deve-se pensar em megacólon agu- leucocitose) ou então associadas às
do quando os sintomas citados forem comorbidades e descompensações
observados e demais causas foram de aparelhos e sistemas, como sepse
excluídas. Entretanto é necessária a e insuficiência renal.

231
MEGACÓLON 232

Exames de imagem dilatação de alças associada a um


ponto específico de obstrução e tran-
O exame radiológico inicial é a radio-
sição de calibre para alças finas/co-
grafia simples. Geralmente observa-
labadas. Pode-se ainda observar
-se uma dilatação das alças intes -
fatores de compressão intrínseca
tinais, níveis hidroaéreos em alças
(tumores por exemplo) ou extrínse -
dilatadas, a presença ou ausência de
ca (linfonodomegalias mesentéricas,
gás na ampola retal e sinais de com-
aderências) do lúmen intestinal.
plicação (ex: pneumoperitônio)

Figura 3. Megacólon agudo. Observa-se um padrão de


pseudo-obstrução intestinal, sem obstrução mecânica,
com íleo adinâmico, nível hidroaéreo e grande dilatação
de ceco e transverso. Fonte: Ribas, 2009.

Quando o diagnóstico definitivo for


necessário, pode-se lançar mão de Figura 4. Tomografia computadorizada. (1) Janela partes
moles. Observa-se espessamento da parede do cólon
um estudo contrastado (enema opa- esquerdo com edema submucoso (pontas de seta),
co) ou tomográfico do abdome. Na encordoamento de gordura pericolônica e ascite (seta). O
cólon transverso é visto dilatado acima de 6 cm (estrela),
pseudo-obstrução colônica aguda, e é notado o afinamento da parede./ (2) Janela pulmonar.
haverá ampla contrastação colônica, Observa-se padrão anormal do cólon transverso e pseu-
dopólipo nodular (pontas de seta). Fonte: Moulin, 2011.
de alças dilatadas.
Na tomografia, a obstrução intesti -
nal comporta-se com uma grande A colonoscopia, além de ser um
bom exame diagnóstico, tem papel

232
MEGACÓLON 233

terapêutico, descomprimindo o cólon Como a desidratação faz parte do


(abordado melhor no item tratamento). contexto clínico, e a reposição volê-
mica, guiada pela monitorização do
débito urinário, é recomendada.
Tratamento
Recomenda-se ainda reavaliação e
O tratamento inicial é suporte nutricio- vigilância laboratorial: hemograma,
nal, reposição hidroeletrolítica, melhora eletrólitos, lactato e função renal, se-
da motilidade intestinal, uso de antibi- riados 12-24 horas com o objetivo
óticos e neostigmina. Também podem de acompanhar a evolução do qua-
ser realizadas tentativas de descom- dro, precedidos sempre de exames
pressão com uso de sonda retal ou via físicos seriados com foco no abdome.
colonoscopia. A cirurgia deve ser su- Distúrbios eletrolíticos, principalmen-
gerida como última opção, somente se te hipocalemia, hipocalcemia e hipo-
houver falha terapêutica. Dessa forma, magnesemia, devem ser prontamen-
os objetivos do tratamento serão: te corrigidos. Leucocitose deve ser
• Tratamento da doença primária interpretada como secundária à cau-
base sa de base (sepse) ou como possível
sinal de perfuração iminente.
• Estabilização e controle clínico do
paciente A vigilância radiológica é interessan-
te para o acompanhamento da pro-
• Prevenção de complicações graves gressão ou não da distensão colônica
• Reestabelecimento do trânsito em pacientes sem sinais de alarme
intestinal e com proposta de tratamento con-
servador. Também exerce papel no
reconhecimento de pacientes sobre
O paciente deve ser colocado em re- risco de perfuração intestinal (dis -
gime de enfermaria ou cuidados in- tensão do ceco maior que 14 cm) ou
tensivos de acordo com sua gravida- já complicados com tal perfuração
de. O tratamento da doença base é (pneumoperitônio).
primordial, e deve ser implementado A pseudo-obstrução colônica aguda
o quanto antes. (Ogilvie) muitas vezes também res -
O jejum e repouso intestinal são par- ponde bem às medidas gerais. En -
te do tratamento, associado a uma tretanto, em caso de não melhora em
sondagem nasogástrica para des - 48-72h, medidas específicas podem
compressão gastrointestinal, gástri - ser consideradas.
co, redução da distensão abdominal e
minimização do risco de vômitos, re-
gurgitação e broncoaspiração.

233
MEGACÓLON 234

Tratamento conservador Terapia medicamentosa


É indicado nos pacientes sem sinais Inibidores da acetilcolinesterase têm
de alarme. Inclui suspensão da dieta, ação validada em virtude de sua ação
reposição hidroeletrolítica (se neces- colinérgica e são amplamente utiliza-
sário) e medidas de suporte (como dos como primeira opção nos casos
posicionamento, deambulação). refratários às medidas não farmaco-
lógicas. A droga mais utilizada é a
neostigmina.
SE LIGA! O uso de laxativos osmóticos
deve ser evitado, pois podem cursar com
aumento da formação de gases no cólon
e piorar a distensão.

MEDICAÇÃO DOSE EFEITOS COLATERAIS CONTRAINDICAÇÕES


Asma, doença pulmonar
Bradicardia, miose, hipotensão,
obstrutiva crônica, bradicar-
2-2,5 mg, infundida náuseas, vômitos, hipersalivação,
dia, terapia com beta bloque-
Neostigmina de 3-5 minutos. Pode sudorese, broncoconstrição, crepi-
adores, infarto do miocárdio
repetir até 3x. tações, tremores, cólicas abdomi-
recente, insuficiência renal e
nais e diarreia
acidose

Colonoscopia foram refratários às medidas iniciais


não farmacológicas, farmacológicas
Apesar de alguns autores considera-
e colonoscópicas. Lança-se mão da
rem como medida de primeira linha,
descompressão cirúrgica por cecos-
é indicado para pacientes cujas me-
tomia ou, em casos de perfuração e
didas terapêuticas iniciais não foram
isquemia, ressecção intestinal.
resolutivas. O exame, ao contrário da
colonoscopia diagnóstica habitual, é
realizado sem a insuflação de gases Prognóstico
no cólon. É realizada a aspiração do
conteúdo, com excelente eficácia. Determinado por:
• Causa subjacente do megacólon
Cirurgia • Presença de comorbidades
A última opção são os procedimen- • Desenvolvimento de complicações
tos cirúrgicos. Geralmente são indi -
cados nos pacientes com peritoni -
Na ausência de complicações, a mor-
te ou distensão colônica maior que
talidade é de aproximadamente 15%
14cm ou cujos tratamentos iniciais

234
MEGACÓLON 235

em comparação com até 45%


em pacientes com isquemia
intestinal ou perfuração es -
pontânea de megacólon não
Reflexo motor inibido
tóxico. No entanto, a maio -
ria dos pacientes responde
ao tratamento antes do início
destas complicações, ocorren- Estímulo excessivo dos
do em 20% dos casos. Obser- receptores opioides
(endógeno e exógeno)
va-se relação da mortalidade
aumenta com o atraso da te-
rapia de descompressão. Distúrbios eletrolíticos, altera-
Alterações no estímulo ções metabólicas, medicações,
do SNA doença inflamatória
intestinal, infecções.

Pseudo-obstrução
aguda do cólon. Sem causa
Fisiopatologia Etiologia
mecânica obstrutiva.

MEGACÓLON
AGUDO

Tratamento Diagnóstico Sintomas

Distensão abdominal,
Tratar causa Clínico
obstipação, dor abdominal,
Hidratação venosa
náuseas e vômitos,
Sonda nasogástrica
hiporexia, dispneia.

Laboratório
Exame físico: desidratação,
taquicardia e taquipneia,
Neostigmina
abdome globoso e
(antagonista adrenérgico) Exames de imagem: hipertimpânico, dor a palpação
Dilatação do cólon, excluir do abdome, RHA ↓
perfuração. identificar
obstrução

Cirúrgico: se perfuração Toque retal:


ou isquemia colônica Colonoscopia sangue ou muco
(diagnóstica e terapêutica)

235
MEGACÓLON 236

3. MEGACÓLON CRÔNICO Alterações nos nervos intestinais


Caracterizada por estase fecal crô - O controle da contratilidade colônica
nica, com dilatação, alongamento e é através da interação complexa dos
hipertrofia das camadas musculares, nervos colônicos intrínsecos, contro-
sem que exista obstáculo mecâni - le nervoso esplâncnico e entrada do
co responsável por obstrução, atin - sistema nervoso central. A via final
gindo mais frequentemente o cólon comum do controle nervoso intrínse-
sigmoide. co da motilidade colônica é através
Classifica-se: dos nervos pós-ganglionares: nervos
colinérgicos estimuladores e nervos
inibidores que liberam óxido nítrico.

Megacólon
crônico
Alterações funcionais nas células
de Cajal
Estudos em camundongos, mostra -
ram anormalidades envolvendo o
número e a função das células inters-
ticiais de Cajal (células marcapasso
Congênito Adquirido
intestinais). Os distúrbios herdados
provavelmente envolvem maturação
e função anormais dessas células,
enquanto os distúrbios adquiridos
Ex: Doença de Ex: Doença demonstram um número reduzido
Hirschsprung de Chagas delas.

Auto-anticorpo contra o receptor


muscarínico (doença de Chagas)
Fisiopatologia
Em pacientes com doença de Cha-
Apesar de muitos estudos, a fisio - gas, autoanticorpos foram encon -
patologia ainda não é totalmente trados em quase todos os pacien -
comprovada. Acredita-se que este - tes com cardiomiopatia chagásica e
ja relacionada à distúrbios primários megacólon.
envolvendo sistemas musculares e
nervosos do intestino. Os estudos
mostram:

236
MEGACÓLON 237

Etiologia intestino. Esta doença é rara, causada


por alterações genéticas, e os sinto-
A principal causa de megacólon ad-
mas já podem surgir desde as primei-
quirido é a Doença de Chagas, que
ras horas ou dias após o nascimento.
acontece por lesões nas termina -
Entretanto, se as alterações e os sin-
ções nervosas intestinais provocadas
tomas forem leves, pode-se demorar
devido à infecção pelo protozoário
semanas ou meses até se identificar
Trypanosoma cruzi , transmitido pela
corretamente a doença e, nestes ca-
picada do inseto barbeiro.
sos, é comum que o bebê tenha um
Dentre as causas congênitas, a prin- atraso no crescimento, devido a uma
cipal é a doença de Hirschsprung, menor capacidade de absorção dos
que acontece devido a uma deficiên- nutrientes dos alimentos.
cia ou ausência de fibras nervosas no

MEGACÓLON
CRÔNICO Doença de Hirschsprung
(aganglionose congênita)

Síndrome de Waardenburg-
Entéricas
Shah

Neoplasia endócrina múltipla


tipo 2A
Congênito

Neurogastrointestinal
mitocondrial
Viscerais
Neuropatia
oculogastrointestinal

Doença de Chagas, Doença de


Doenças Parkinson, distrofia miotonica,
neurológicas neuropatia diabética,
amiloidose

Doenças Esclerodermia, dermatomiosite,


Adquirido LES, doença mista do tecido
sistemicas
conjuntivo

Doenças Hipotireoidismo, hipocalemia,


metabólicas porfiria, feocromocitoma

237
MEGACÓLON 238

SAIBA MAIS!
A doença de Hirschsprung é causada por uma única mutação genética do proto-oncogene
RETna banda 10q11.2. O defeito ocorre em 1 em cada 5.000 nascidos vivos. Alguns casos
são familiares, com uma incidência geral de 3,6% entre os irmãos dos casos-índice.

Epidemiologia Os sintomas descritos são: abdome


distendido, dor abdominal crônica e
A causa mais comum de megacólon
quadro de obstipação.
no mundo é a doença de Chagas. A
faixa etária de maior incidência fica O megacólon crônico pode atingir o
entre os 20 e 60 anos, com pico en- reto e tende a fazer com que o ânus
tre os 40 e 50 anos. Grande parte da se abra (devido dilatação do reto), se-
aquisição dessa doença se dá na área cundário à disfunção do mecanismo
rural. Cerca de 2 a 5% dos indivíduos interno do esfíncter. Esses pacientes
infectados pelo tripanosoma desen- podem apresentar diarreia secundária
volvem o megacólon chagásico. Aco- à incontinência por transbordamento.
mete principalmente segmento distal
do cólon e o reto.
• Exame físico
A frequência do megacólon adquiri-
do é igualmente distribuída entre os ◊ Emagrecimento
sexos. Já no megacólon congênito, ◊ Abdome: Distendido, poden -
doença de Hirschsprung , ocorre pre- do ou não estar tenso, tumo-
dominantemente no sexo masculino. ração palpável na fossa ilíaca
esquerda.

Quadro Clínico ◊ Toque retal: Presença de mas-


sa dura de fezes logo acima
• Clínica do anel anorretal. O exame de
O megacólon crônico pode ser toque retal digital em um pa-
classificado em dois grupos, de ciente com doença de Hirs -
acordo com o início dos sintomas: chsprung pode revelar uma
grande quantidade de mate -
• O grupo congênito terá início dos rial fecal retido.
sintomas antes de 1 ano de idade.
• O grupo adquirido desenvolve sin-
tomas após os 10 anos de idade
até a idade adulta.

238
MEGACÓLON 239

Diagnóstico Diferencial • Ajuda a diferenciar a presença de


megacólon, megareto ou ambos
Os principais são:
• Ajuda a definir a anatomia
• Pseudo-obstrução colônica aguda
(megacólon agudo) • Pode ser usado terapeuticamente
para evacuar o cólon
• Megacólon tóxico

Diagnóstico
Associar dados da anamnese e exa-
me físico, guiados por exames labo-
ratoriais e exames de imagem para
confirmação.
• Laboratório
Exames laboratoriais gerais. Im -
portantes para excluir outras etio -
logias, incluindo anormalidades
eletrolíticas (por exemplo, cálcio,
magnésio, fósforo), a reação de Ma-
chado-Guerreiro (Doença de Cha-
gas). Testes de função tireoidiana Figura 5. Enema baritano. Observa-se distensão abdo-
minal e contração irregular. Fonte: Peyvasteh, 2016.
também devem ser realizados.
• Exames de imagem Estudo de trânsito colônico
◊ Radiográficos
Trata-se de um exame simples que
Importantes para triagem inicial e permite a avaliação da motilidade co-
avaliação de gravidade, como vis- lônica. Para fazer este exame é neces-
tos no item Megacólon agudo. sário ter excluído doenças orgânicas
◊ Enema Baritado potencialmente causadoras de cons-
tipação intestinal, como por exemplo,
neoplasias colorretais, doença diver-
Exame radiográfico com contraste ticular dos cólons, estenose (estrei -
por via retal. São uteis para: tamento) de segmentos colônicos ou
• Avalia com precisão o tamanho do do reto secundária a patologias infla-
cólon matórias ou infecciosas, entre outras
causas.

239
MEGACÓLON 240

Utiliza-se capsulas contendo marca-


dores em forma de anéis radiopacos.
Em seguida, são realizados radio -
grafias de abdome em ortostase em
tempos diferentes.

Figura 6. Marcador radiopaco em forma de anéis por


cápsula.

Figura 7. Tempo de transico colonico no 3ª e 5ª dia. As linhas mostram a divisão dos cólons: CD = direito, CE = es-
querdo, RS -retossigmoide. Fonte: Neto, 2003

Manometria Anorretal
A manometria anorretal consiste Ausencia
Presença de resposta
em medir basicamente as pressões de resposta inibitória
dos músculos do esfíncter anal, inibitória Fala a favor
a sensação no reto e os reflexos retoanal de megacólon
Gânglios congênito
neurais que são necessários para
intactos Necessário
executar os movimentos normais Doença biopsia
do intestino. Ajuda na distinção do adquirida retal para
megacólon congênito de adquirido. confirmar

240
MEGACÓLON 241

Colonoscopia + Biópsia como sais de magnésio, sorbitol ou


lactulose (os dois últimos podem au-
Importante para descartar uma causa
mentar a flatulência).
obstrutiva / mecânica da dilatação do
cólon. A biopsia será útil para deter- Corrigir anormalidades de eletrólitos /
minar a etiologia da doença. metabólitos e remova os medicamen-
tos que possam influenciar a motilida-
Embora a biópsia de espessura total
de colônica (por exemplo, narcóticos,
seja o critério padrão para estabe -
agentes anticolinérgicos, antagonis -
lecer um diagnóstico da doença de
tas dos canais de cálcio).
Hirschsprung, a biópsia de sucção da
mucosa é adequada na maioria dos Se a dilatação persistir ou piorar, a des-
casos. A ausência de células ganglio- compressão colonoscópica pode ser
nares é característica da doença de tentada. Entretanto, após a descom -
Hirschsprung, e manchas específicas pressão, a dilatação geralmente se re-
para acetilcolinesterase são usadas pete; portanto, a descompressão com
para destacar a morfologia anormal. colonoscopia deve ser cuidadosamente
considerada, pois não apresenta riscos
em um cólon despreparado e dilatado.
Tratamento
Abordagem multiprofissional. Em ca- Cirúrgico
sos não complicados o manejo inicial
é conservador. Recomendado se a dilatação persis -
tir ou piorar após o esgotamento das
medidas médicas acima. As opções
Conservador operativas em megacólon incluem co-
Deve-se realizar medidas para de - lectomia total abdominal com anasto-
simpactação fecal, seja por enemas mose ileorretal, proctocolectomia total
ou supositórios. Em pacientes que com ileostomia e proctocolectomia total
necessitam de hospitalização, a des- com anastomose ileoanal, dependendo
compressão com sonda nasogástrica do local do cólon afetado. A colectomia
e retal pode auxiliar no tratamento. abdominal total com anastomose ileor-
retal é a operação de escolha do mega-
Optar por dieta rica em fibras e rica
cólon com reto de tamanho normal.
em líquidos, o que geralmente ajuda
a diminuir a constipação. Associada a
alta ingesta hídrica. Prognóstico
O uso de laxantes pode ser conside- O prognóstico está relacionado à gra-
rado e continuado se forem úteis. Os vidade do megacólon e à gravida -
melhores são os agentes osmóticos, de das comorbidades do paciente.

241
MEGACÓLON 242

Embora alguns pacien-


tes não possam ser tra-
tamento conservador e
Adquirida: Doença de necessitarem de cirur -
Alterações nos Chagas, Doença de Parkinson,
nervos TGI: esplâncnico, neuropatia diabética,
gia rapidamente, outros
colônicos e SNC esclerodermia, LES, hipo/ pacientes podem ser
pipertireoidismo...
mantidos em um pro -
grama intestinal rigoro -
Alterações funcionais so. O risco de complica-
nas Células de Cajal Idiopático
(marcapasso intestinal) ções (como perfuração
espontânea) é de 3%.
Não existem dados de
Auto anticorpo
Congênito: Doença de mortalidade.
Hirschsprung, Síndrome
contra receptor muscarínico
Waardenburg-Shah, neoplasia
(Doença de Chagas)
endócrina múltipla 2 A e 2B...

Principal causa:
Fisiopatologia Etiologia
Doença de Chagas

Alteração na motilidade,
MEGACÓLON
inervação e musculatura do cólon.
Obstrução funcional
CRÔNICO

Tratamento Diagnóstico Sintomas

Tratar obstipação
Congênito < 1 ano
Aumentar ingesta de Clínico
Adquirido > 10 anos
fibras+água

Cirúrgico: colectomia Abdome distendido,


Laboratório dor abdominal
total + ileoretoanastomise crônica, obstipação

Exames de imagem:
enema opaco, estudo de
transito colônico, Toque retal: fezes
manometria anorretal,
colonoscopia + biópsia.

242
MEGACÓLON 243

4. MEGACÓLON TÓXICO inflamação e a óxido nítrico sintetase


aumentada aumentam os níveis locais
O megacólon tóxico é uma complica- de óxido nítrico, o que inibe o músculo
ção aguda e grave causada por algum
liso do cólon e causa dilatação.
tipo de inflamação intestinal. Trata -
-se, então, de uma colite tóxica aguda À medida que a inflamação progride
com dilatação do cólon não obstruti- para as camadas do músculo liso do
va maior que 6 centimetros. Dentre cólon, o óxido nítrico e os modulado-
as causas mais comuns encontra-se res inflamatórios locais parecem estar
a doença de Crohn e a retocolite ulce- envolvidos na patogênese. os neu -
rativa, embora possa estar associada trófilos passam a invadir a camada
a qualquer tipo de colite, seja devido muscular e danificam diretamente as
a uma torção intestinal, diverticulite, células musculares pela liberação de
isquemia intestinal ou uma obstrução enzimas proteolíticas, citocinas e leu-
por câncer do cólon. A dilatação do cotrieno B.
cólon pode ser total ou segmentar. A captação sistêmica de citocinas e
Durante um quadro de megacólon tó- outros mediadores inflamatórios leva
xico, há uma intensa dilatação do in- à febre, taquicardia, hipotensão e ou-
testino que tem evolução rápida, gra- tros sinais de toxicidade sistêmica.
ve e que causa risco de morte, devido O envolvimento do plexo mioentérico
à intensa inflamação que acontece no não é consistente e provavelmente
organismo. não contribui para a dilatação do có-
lon. Hipocalemia e outros distúrbios
eletrolíticos provavelmente não con-
Fisiopatologia
tribuem para a dilatação na maioria
A fisiopatologia não é totalmente dos pacientes.
comprovada. Porém é sabido que vá-
rios fatores podem contribuir para o
seu desenvolvimento e precipitação.
Nos casos de colite não complicada,
a resposta inflamatória é confinada
à mucosa. Estudos mostraram que
quantidades significativamente au -
mentadas de óxido nítrico sintetase
induzível na própria muscular de pa-
cientes com megacólon tóxico, par -
ticularmente nos segmentos colôni -
cos mais dilatados. Pensa-se que a

243
MEGACÓLON 244

Etiologia
Colite ulcerosa

Inflamatórias Doença de Crohn

Colite pseudomembranosa

MEGACÓLON
TÓXICO Causadas por Salmonella,
Shigella, Campylocter,
Infecciosas Yersinia, Clostridium difficile,
Entamoeba histolytica,
Rotavírus, Citomegalovírus

Colite por radiação, colite


Outras isquemica, Colite secundaria a
quimioterapia

Epidemiologia colite ulcerosa. Ambos os sexos são


afetados igualmente. A duração mé-
A incidência de megacólon tóxi -
dia da doença foi relatada em 3-5
co depende da etiologia. O risco de
anos.
um paciente com colite ulcerosa de-
senvolver a doença foi estimado em
1-2,5%. Na colite pseudomembra - Quadro clínico
nosa, megacólon tóxico ocorre em
0,4-3% dos pacientes. Em um estu- Geralmente os sinais e sintomas são
do em 2013 de 1236 pacientes inter- semelhantes a uma colite aguda. As
nados no hospital por um período de queixas comuns incluem diarreia,
19 anos, o megacólon tóxico estava sangramento retal, tenesmo e vômi-
presente em 6% dos pacientes, es- to; associados à sintomas do quadro
pecificamente 10% das internações tóxico: Febre alta, dor e sensibilidade
por colite ulcerosa e 2,3% das inter- abdominal taquicardia e desidratação.
nações por doença de Crohn.
Atinge geralmente adultos jovens, na Exame físico
faixa etária de 20-40 anos (porém to- Além dos sinais de toxemia ditos
das as idades podem ser atingidas), acima (taquicardia+febre), o pacien -
geralmente como consequência da te pode ficar irritado. Nas colites

244
MEGACÓLON 245

inflamatórias (isto é, colite ulcerosa, Diagnóstico


colite de Crohn), os achados físicos
O diagnóstico
podem ser mínimos, porque altas
doses de anti-inflamatórios são ro -
tineiramente usadas; no entanto, o Critérios de Jalan
abdome pode distender-se e os sons Além disso, podemos aplicar os crité-
intestinais geralmente diminuem. Si- rios diagnósticos de Jalan:
nais de perfuração também podem
ser mascarados por altas doses de
anti-inflamatórios, como na doença EVIDÊNCIA RADIOGRÁFICA DE DILATAÇÃO
inflamatória intestinal. DO CÓLON - CÓLON TRANSVERSO SUPERIOR
A 6 CM.
Três dos seguintes achados:
Fatores de risco • Febre
• Taquicardia (> 120 batimentos / min)
Doença inflamatória intestinal • Leucocitose (> 10,5 x 103 / μL)
• Anemia
Condição que gera dismotilidade do TGI
Um dos seguintes achados:
Uso de antibióticos
• Desidratação
Quimioterapia • Estado mental alterado
Imunossupressão • Anormalidade eletrolítica
Pode mascarar o quadro clínico; • Hipotensão
Retardo no diagnóstico;
Maior gravidade;
Risco de perfuração. Laboratório
Ingesta de alimentos ou água contaminada
Os sinais identificados são inespecífi-
cos, mas fornecem dados para acom-
Diagnóstico Diferencial panhamento desses pacientes. De -
ve-se solicitar:
Enquanto a resposta inflamatória tí-
pica da colite ulcerosa é limitada à • Hemograma evidenciando anemia
mucosa, o megacólon tóxico é carac- (devido perda sanguínea nas fezes)
terizado por inflamação grave que se e leucocitose com desvio à esquer-
estende para a camada do músculo da. Entretanto a leucocitose não é
liso, paralisando o músculo liso do có- um sinal fidedigno, visto que uma
lon e levando à dilatação contagem anormalmente baixa ou
mesmo uma contagem de leucóci-
tos dentro dos limites normais não
descarta megacólon tóxico. Isso
porque em pacientes imunossupri-
midos ou extremamente tóxicos, a

245
MEGACÓLON 246

contagem de leucócitos pode real- tratamento de megacólon tóxico. De-


mente ser normal ou baixa. vendo, inclusive, seriar as radiografias
para avaliar a eficácia e o progresso
• Perfil nutricional: vitaminas, prote-
do tratamento. São úteis também
ínas, albumina. Para avaliação do
a ultrassonografia e a tomografia
estado nutricional do paciente
computadorizada.
• Coagulograma: caso seja necessá-
rio intervenção cirúrgica.
Radiografia
• PCR e VHS: A taxa de sedimen-
Os achados radiográficos incluem o
tação de eritrócitos (VHS) e os ní-
seguinte:
veis de proteína C-Reativa (PCR)
geralmente são elevados. Embo -
ra esses achados possam apoiar Cólon transverso dilatado (> 6 cm)
o diagnóstico pois eles não são
Perda de haustrações do cólon
específicos, utilizado mais para Presença de massas intraluminais de tecidos mo-
acompanhamento. les (pseudopólipos)
Ar intraperitoneal livre - Possível achado, melhor
visualizado na radiografia de tórax ortostase ou
Exames de imagem em decúbito lateral esquerdo

Radiografias abdominais simples Desbaste parietal segmentar como patognômico


para megacólon tóxico
são essenciais para o diagnóstico e

Figura 7. Radiografia abdominal. Evidencia edema de mucosa e agravamento da distensão do cólon transverso. Inter-
valo de dois dias entre as radiografias. Fonte: Brian, 2018.

246
MEGACÓLON 247

Ultrassonografia
A ultrassonografia intestinal é poten-
cialmente um teste diagnóstico para
megacólon tóxico. Estudos recentes
evidenciaram alterações em comum
em um grupo de pacientes:

Perda completa de haustrações no cólon


Paredes intestinais hipoecóicas e espessadas com
margens internas irregulares no cólon sigmóide e
descendente
Dilatação acentuada do cólon transverso (> 6 cm)
Paredes intestinais hipoecóicas e finas (<2 mm)
sem haustrações no cólon dilatado
Ligeira dilatação das alças intestinais ileais (di-
âmetro> 18 mm) com aumento de gás e líquido
Figura 8. Radiografia de abdome. Paciente com colite intraluminal
ulcerosa. Observa-se perda das haustrações na região
da flexura esplênica do cólon.

Figura 9. Ultrassonogradia de abdome. Observa-se distensão do cólon transverso marcada (6cm) – secção longitudi-
nal do abdome. Fonte:Maconi, 2004.

247
MEGACÓLON 248

Tomografia computadorizada permanecer incerto ou se conside -


Útil na identificação de uma perfura- rar que a causa da toxicidade é um
ção local ou contida, se o diagnóstico abscesso.

Figura 10.TC de abdome. Secção axial: cólon transverso distendido, cheio de ar, com haustrações irregulares e con -
torno luminal nodular (setas). Ascite se desenvolveu (pontas de flechas). Fonte:Imbriaco, 2001.

Colonoscopia + biopsia deve ser mínima. Porém, geralmente


A colonoscopia geralmente é justifi- é uma contra-indicação, não sendo
cada apenas se o paciente não tiver realizada.
uma ou nenhuma inflamação míni - A patologia nos casos de megacólon
ma do sigmoide ou do reto. A perfu- tóxico demonstra inflamação aguda
ração é uma complicação potencial envolvendo todas as camadas do có-
óbvia dessa abordagem. Se houver lon. Quantidades variáveis de necro-
sinais de gravidade no paciente, o se e degeneração estão presentes. É
exame não deve progredir além da observada infiltração por células in-
sigmoidoscopia e a insuflação de ar flamatórias (neutrófilos, macrófagos

248
MEGACÓLON 249

e linfócitos). Os plexos mioentérico e estiver desnutrido, considere a nutri-


submucoso são geralmente preser - ção parenteral.
vados. A marca microscópica da MT Deve-se cessar a dieta e sondar
(TC) é a inflamação que se estende o paciente com tubo nasogástri -
além da mucosa até as camadas do co, para auxiliar na descompressão
músculo liso e serosa. gastrointestinal.
Durante a ressuscitação inicial, a re-
posição de líquidos, a reposição de
eletrólitos e a transfusão devem ser
agressivas.
Todos os medicamentos que pos -
sam afetar a motilidade colônica - in-
cluindo narcóticos, antidiarreicos e
agentes anticolinérgicos - devem ser
interrompidos.

Figura 11. Amostra de anatomia patológica de pacien-


Antibióticos intravenosos de amplo es-
te com colite pseudomebranosa. Observa-se placas pectro (IV) devem ser iniciado (todos):
amareladas características. Fonte: Brian, 2018

Tratamento MEDICAMENTO DOSE


Amoxicilina + 50 mg/Kg/dia, 8/8h (dose máxi-
O tratamento da MT inclui três objeti- Clavulanato ma 1g/dose)
vos principais: 50-100 mg/Kg/dia, 12/12 horas
Ceftriaxone
(dose máxima 2g/dose)
• Reduzir a distensão colônica para
Dose de ataque: 15 mg/Kg/dose
evitar a perfuração Metronidazol Manutenção: 7,5 mg/Kg/dose,
6/6 ou 8/8 horas.
• Corrigir distúrbios de líquidos e
eletrólitos
Lembrando que esta é uma sugestão.
• Tratar a toxemia e os fatores
Deve realizar antibioticoterapia com
precipitantes.
cobertura equivalente a ampicilina,
gentamicina e metronidazol.
É necessária uma monitorização Deve ser iniciado também o uso de
cuidadosa e frequente do pacien - corticoide intravenosos. Os corticoste-
te, devendo ser solicitado a cada 12 roides têm propriedades anti-inflama-
horas: hemograma, eletrólitos e ra - tórias e causam efeitos metabólicos
diografias abdominais. Se o paciente profundos e variados. As opções são:

249
MEGACÓLON 250

MEDICAMENTO DOSE COMENTÁRIO


Maior potência mineralocorticoide. Diminui a inflamação,
Hidrocortisona 100 mg , IV, 6/6 horas suprimindo a migração de leucócitos polimorfonucleares e
revertendo o aumento da permeabilidade capilar.
Maior potência anti-inflamatória relativa. Diminui a infla-
Metilprednisolona 60 mg, IV, 1x/dia mação, suprimindo a migração de leucócitos polimorfonu-
cleares e revertendo o aumento da permeabilidade capilar.

Outra medicação é a Ciclosporina, Embora sejam necessários mais estu-


que é imunossupressor. Ela modula dos, a terapia com ciclosporina pode
a ação das células T, através da ini- evitar a necessidade de colectomia
bição de sua função. Alguns estudos urgente, permitindo que uma colecto-
indicam que a ciclosporina pode ser mia subtotal eletiva ou proctocolecto-
benéfica no tratamento, com uma mia seja realizada sob circunstâncias
taxa de resposta inicial de até 80%. mais controladas.

MEDICAMENTO DOSE EFEITOS ADVERSOS


imunossupressão e infecções oportunistas, hi-
2-4 mg/Kg, IV, 12/12 horas.
Ciclosporina pertensão, toxicidade renal e complicações
Até 7-10 dias
neurológicas.

Seriar (a cada 12 horas):


Hemograma, eletrólitos e Rx
É importante reconhecer adominal
que, embora a melhora sin-
tomática possa correspon - Nutricão parenteral
der à melhora no processo
da doença, esse nem sem- Reposição volêmica/
pre é o caso. A interrupção Transfusão sanguínea
dos movimentos intestinais
TRATAMENTO Antibióticos de longo
pode indicar piora da condi- CLÍNICO espectro
ção do paciente.
Corticoide venoso

Ciclosporina

Suspender medicações que


transito intestinal

250
MEGACÓLON 251

Cirúrgico • A colectomia subtotal preserva a


As indicações para intervenção cirúr- possibilidade de anastomose anal
gica urgente incluem: em bolsa ileal

• Perfuração livre • Aproximadamente 50% dos pa -


cientes com doença de Crohn têm
• Hemorragia maciça (Hb: 6-8) envolvimento mínimo do reto
• Aumento da toxicidade • Além disso, a realização de uma
• Progressão da dilatação do cólon. proctocolectomia total em um pa-
ciente gravemente doente e tóxi-
co e em altas doses de esteróides
A maioria dos autores recomenda aumenta o risco de complicações,
colectomia se houver dilatação per- morbidade e mortalidade.
sistente ou se não houver melhora
na terapia médica máxima após 24-
72 horas. Outros defendem que seja Prognóstico
realizado a terapia conservadora por Alguns estudos demonstraram que
até 7 dias e se o paciente demons- o prognóstico é ruim com o trata -
trar melhora clínica, mas persistir com mento médico de megacólon tóxico,
a dilatação do cólon realizar a inter- em que cerca de 29% dos pacientes
venção cirúrgica. Porém, se nenhuma tem casos de recidiva e quase meta-
melhora ocorrer durante 48-72 ho - de dos pacientes (47%) precisam ser
ras com terapia conservadora deve- submetidos a cirurgia de resseção de
-se optar pela ressecção cirúrgica de cólon.
urgência.
O prognóstico de sobrevida em pa-
A cirurgia realizada por ser uma proc- cientes sem complicações melhora,
tocolectomia total ou uma colectomia observando uma taxa de mortalidade
subtotal. A preferência na literatura é de 4-5%. Em casos de complicações,
realizar uma colectomia subtotal; isso a taxa de mortalidade aumenta para
se deve aos seguintes motivos: 20%.
• O paciente geralmente está muito
doente, e não prolongar a opera-
ção é prudente, se possível.

251
MEGACÓLON 252

Processo inflamatório
acomete toda a espessura
da parede do cólon

Inflamação crônica:
Retocolite ulcerativa,
Doença de Crohn, colite
Paralisia da pseudomembranosa.
musculatura = dilatação Infecção: Salmonella,
Shiguella, rotavírus, ameba
Megacólon com
toxemia (SIRS).
Colite tóxica aguda.
Fisiopatologia Etiologia
Condição grave.

MEGACÓLON
TÓXICO

Tratamento Diagnóstico Sintomas

Clínico Dor e distensão


Antibiótico amplo espectro
abdominal, obstipação,
Hidratação venosa
FEBRE, náuseas e vômitos,
Sonda nasogástrica
Laboratório hematoquezia, enterorragia.

Critério de Jalan: Exame físico: taquicardia


Corticoide venoso, CT >6cm no Rx e taquipneia, febre,
ciclosporina, Três dos quatro (febre, rebaixamento do nível
agentes biológicos taquicardia, leucocitose, anemia) de consciência,
Um dos quatro: desidratação, desidratação, descorado.
RNC, distúrbio eletrolítico,
hipotensão
Cirúrgico (colectomia
Toque retal:
subtotal + ileostomia): se
ausência de obstrução/
perfuração, hemorragia ou Exame de imagem: Rx, USG,
sangue em dedo de luva
isquemia colônica TC e colonoscopia

252
MEGACÓLON 253

CA > 8 cm
CT 6cm
CD 8 cm
RT > 6,5 cm
Ceco > 12 cm

Dilatação do cólon sem


Critérios numéricos
obstrução mecânica

MEGACÓLON

Megacólon agudo Megacólon crônico Megacólon tóxico

Megacólon com
Pseudo-obstrução Alteração na motilidade,
toxemia (SIRS).
aguda do cólon. Sem causa inervação e musculatura do
Colite tóxica aguda.
mecânica obstrutiva. cólon. Obstrução funcional
Condição grave.

253
MEGACÓLON 254

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
SABINSTON, D. C., TOWNSEND, C. M. Sabiston textbook of surgery: The biological basis of
modern surgical practice. Elsevier Saunders. 19th ed., 2012.
Gamarra, Roberto. Et al. Acute Colonic Pseudoobstruction (Acute Megacolon, Ogilvie Syn-
drome). Medscape. 2020
Manuel, David. Et al. Chronic Megacolon. Medscape 2019
Brian, Lin et al. Toxic Megacolon Treatment & Management. New York College of Osteopa-
thic Medicine. 2018
Ribas Filho Jurandir Marcondes, Malafaia Osvaldo, Fouani Neme Moussa, Fouani Marcelo
Morikuni, Justen Marcel da Silva, Trevisan Nilo Brasil et al . Síndrome de Ogilvie (pseudo-obs-
trução intestinal aguda): relato de caso. ABCD, arq. bras. cir. dig. 2009.
MOULIN, Véronique et al. Toxic megacolon in patients with severe acute colitis: computed
tomographic features. Journal of Clinical Imaging, v. 35, issue 6, p. 431-436, November–De-
cember 2011.
Azevedo, Rodrigues. Pseudo-obstrução intestinal aguda: recomendações para diagnóstico
e tratamento. PEBMED. 2018.
Peyvasteh Mehran, Askarpour Shahnam, Ostadian Nasrollah, Moghimi Mohammad-Reza,
Javaherizadeh Hazhir. Acurácia Do Diagnóstico De Achados Do Enema Opaco Na Doença
De Hirschsprung. Abcd, Arq. Bras. Cir. Dig. 2016
Neto, S. Estudo do tempo de transito colonico em pacientes com megacolon chagásico com
constipação. USP. 2003.

254
CIRURGIA DE CONTROLE DE DANOS

255
SUMÁRIO
1. Introdução ................................................................................................ 257
2. Estágios Da Cirurgia ........................................................................... 259
Referências Bibliográficas ..................................................................... 272

256
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 257

1. INTRODUÇÃO A ideia dessa cirurgia começou no


início do século XX, quando Pringle
O trauma corresponde a principal
sugeriu que o controle de uma he -
causa de morte entre 1 a 44 anos
morragia hepática fosse feito a partir
de idade e, aproximadamente 5 mi-
da colocação de compressas. Porém,
lhões de pessoas morrem por ano,
o termo “controle de danos” foi intro-
no mundo, devido a essa doença. duzido pela primeira vez em 1983,
Pacientes politraumatizados com le -
quando uma laparotomia teve que ser
sões potencialmente fatais, necessi-
interrompida devido a uma hemorra-
tam, muitas vezes, de procedimentos
gia intensa, e reabordada posterior -
cirúrgicos a fim de regularizar o seu mente, de forma programada e com o
estado hemodinâmico.
paciente estável. Com o emprego da
Entretanto, uma grande parte desses laparatomia abreviada, a mortalidade
feridos não possuem reserva fisioló- dos pacientes com sangramentos ex-
gica suficiente para suportar cirurgias tensos caiu de 98% para 35%
de grande porte e que demandam um
A princípio, a cirurgia de controle de
tempo prolongado. Nesse contexto, danos estava associada ao trauma
surgiu a cirurgia de controle de da-
abdominal. Contudo, atualmente, os
nos. Essa estratégia cirúrgica, visa
princípios básicos dessa cirurgia
diminuir o tempo de operação o sufi-
foram estendidos para outros ce -
ciente para regularizar os parâmetros nários, como no tratamento de trau-
fisiológicos dos pacientes, adiando o
mas torácicos, ortopédicos, cranioen-
gerenciamento definitivo das lesões
cefálicos, vasculares e até mesmo em
para um segundo momento mais
contextos não traumáticos.
apropriado.

SAIBA MAIS!
O termo “controle de danos” está associado a marinha norte americana, e faz referência aos
navios de guerra, que, apesar dos danos sofridos durante as missões, precisavam se manter
firmes até a chegada ao porto, para que pudessem então, serem submetidos aos reparos
definitivos.

Assim, a prioridade da cirurgia de aumentar a sobrevida dos pacientes.


controle de danos é controlar, de for- Para isso, a cirurgia deve ser inter -
ma não definitiva, as hemorragias ex- rompida antes do paciente entrar
tensas, infecções ou vazamento do em exaustão metabólica.
conteúdo de vísceras ocas, a fim de

257
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 258

Tríade Letal A acidose metabólica corresponde a


diminuição do pH sanguíneo e é um
A taxa de mortalidade dos pacientes
indicador importante de prognóstico.
gravemente feridos aumenta, de for -
Pacientes com pH < 7,2 possuem
ma significativa, quando há um dese-
alta taxa de mortalidade. Nessas
quilíbrio metabólico importante que
situações, pode ocorrer um aumento
leva a uma exaustão fisiológica. As
compensatório da respiração, tornan-
principais etiologias que perturbam
do-se mais intensa na tentativa de
esse equilíbrio correspondem aos
eliminar o gás carbônico e reverter o
elementos da “Tríade Letal”, que inclui
quadro, resultando numa sobrecarga
hipotermia, coagulopatia e acidose
do sistema respiratório. Além disso, a
metabólica.
acidose metabólica impede a ativação
A hipotermia é uma complicação dos fatores de coagulação, cuja fun-
comumente presente nas vítimas de ção enzimática depende de um pH
traumatismos graves. A temperatura ideal, e consequentemente leva o pa-
corporal abaixo de 35ºC está associa- ciente a um quadro de coagulopatia.
da a um pior prognóstico, e por isso,
A coagulopatia pode estar presen-
deve ser evitada e corrigida, o mais rá-
te em até 30% dos pacientes poli-
pido possível. No trauma, a hipotermia
traumatizados. A hipotermia é uma
é consequência de diversos fatores,
causa importante dessa complicação,
que inclui a administração de fluidos
uma vez que, a diminuição da tem-
não aquecidos, exposição do doente,
peratura impossibilita a ativação dos
incapacidade de termorregulação e a
fatores de coagulação, que entram
perda significativa de sangue.
em um estado de hipometabolismo.
Essa perda de sangue estimula uma Além disso, a administração exces-
descarga simpática , promovendo siva de fluidos promove uma diluição
taquicardia (sinal mais precoce de plaquetária, o que agrava ainda mais
choque) e vasoconstricção periférica, o quadro de coagulopatia, aumentan-
a fim de preservar a circulação para do a chance de sangramento.
os órgãos mais vitais, sendo eles: co-
Assim, podemos perceber que ostrês
ração, rins e cérebro. A hipoperfusão
componentes da tríade letal corres-
sustentada culmina na conversão do
pondem a um ciclo vicioso , no qual,
metabolismo aeróbico em anaeró -
uma complicação se torna fator de
bico, visto que, a oferta de oxigênio
risco para a outra. Logo, quanto mais
está reduzida. Com isso, há um au-
sangue o paciente perde, mais hipo -
mento na produção de ácido lático
térmico ele fica. Quanto mais hipotér-
e o paciente entra em um estado de
mico, maior o metabolismo anaeróbico
acidose metabólica.
e consequentemente, maior acidose

258
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 259

metabólica. Quanto maior a acidose A cirurgia de controle de danos, en-


metabólica, mais prejudicada a função tão, é utilizada para prevenir que o pa-
enzimática dos fatores de coagulação, ciente atinja essa tríade letal. Quando
portanto, pior o estado de coagulopa- os três elementos estão presentes, a
tia. E quanto mais grave a coagulopa- taxa de mortalidade pode chegar até
tia, maior é o risco de sangramento. E 98%, ou seja, dificilmente o paciente
assim, o ciclo continua. irá sobreviver.

FLUXOGRAMA: ESQUEMA DA TRÍADE LETAL

Choque
Hipovolêmico

Hipotermia Acidose Metabólica Coagulopatia

Hipoperfusão tecidual Inativação de


fatores de coagulação

Metabolismo Anaeróbico

↑Sangramento

Seleção do paciente
2. ESTÁGIOS DA CIRURGIA Esse é um estágio fundamental do pro-
cesso. Apesar de não haver um con-
A abordagem da cirurgia de controle
senso absoluto quanto aos critérios
de danos pode ser dividida em cinco
para a indicação da cirurgia de contro-
estágios distintos : seleção do pa -
le de danos, o reconhecimento da ne-
ciente, operação abreviada, correção
cessidade dessa abordagem deve ser
dos parâmetros fisiológicos na UTI,
feito de forma mais precoce possível.
reoperação programada e fechamen-
Temos que identificar o paciente que
to da parede abdominal. Vamos abor-
tem altas chances de desenvolver a
dar separadamente cada uma dessas
tríade letal, e recuperá-lo antes.
etapas:

259
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 260

Caso contrário, os resultados podem evidência intraoperatória de cho -


ser desfavoráveis. É extremamente que refratário e desenvolvimento
importante que os cirurgiões avaliem de arritmia ventriculares
o contexto de uma forma ampla, ob-
• Necessidade de reconstrução da
tendo informações quanto aos parâ-
parede abdominal ou torácica em
metros fisiológicos do paciente, o me-
mais de um tempo cirúrgico: pa-
canismo do trauma e a gravidade das
cientes com edema visceral impor-
lesões. A decisão tem que ser preco-
tante, com impossibilidade do fe -
ce, e se possível, antes do paciente
chamento da parede sem tensão e
entrar no centro cirúrgico.
sinais de síndrome compartimental
• Padrão de lesão identificado du -
“É melhor recuar do que presen- rante a cirurgia: lesão venosa ex-
ciar o paciente atingir seu limite tensa de difícil acesso, lesão hepá-
fisiológico.” tica grave associada a instabilidade
hemodinâmica;
Ademais, é imprescindível que o hos- • Necessidade de reanimação com
pital tenha pré-requisitos mínimos grandes volumes
para acompanhamento desses do -
entes. Isso inclui uma equipe técnica
qualificada, centros cirúrgicos espe - Operação abreviada
cializados ou que pelo menos tenham Como você já sabe, a abordagem do
uma supervisão cirúrgica contínua, e controle de danos inicialmente era
disponibilidade de vagas em Unidade aplicada apenas para o tratamento de
de Terapia Intensiva (UTI), visto que, lesões abdominais, porém, sua ideia
dificilmente esses pacientes ficarão já foi disseminada para outros con-
em enfermaria. textos traumáticos. A princípio, vamos
Alguns critérios altamente aceitos entender o processo da laparotomia
para instituir a estratégia cirúrgica de abreviada.
controle de danos são: A prioridade dessa cirurgia é contro-
• Hemorragia não controlada por lar rapidamente os focos hemorrági-
métodos convencionais cos. Em seguida, interromper o curso
da infecção, caso haja lesões do trato
• Desordem fisiológica grave: pa - gastrointestinal, e por fim, fornecer
cientes hipotérmicos, com tem- um fechamento temporário da pare -
peratura abaixo de 34ºC, diag- de abdominal, visto que, há indicação
nóstico pré-operatório ou absoluta de uma segunda operação,
intraoperatório de coagulopatia, e além disso, diminui o risco de uma

260
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 261

possível síndrome compartimental. O mais significativo. Posteriormente,


ideal é que essa cirurgia seja reali- as compressas devem ser removidas
zada em até 90 minutos. na ordem inversa, para que então, o
abdome possa ser inspecionado e
manipulado.
HORA DA REVISÃO!
Como a síndrome compartimental ab -
dominal (SCA) já foi citada aqui algumas
vezes, vamos revisá-la e diferenciar al-
guns conceitos importantes. A hiper -
tensão intra-abdominal e a SCA são
entidades clínicas distintas. A primeira é
definida como uma pressão intra-abdo-
minal sustentada > 12mmHg, enquanto
a segunda corresponde a uma eleva-
ção pressórica persistente > 20mmHg,
associada a uma disfunção orgânica,
prejudicando quase todos os sistemas.
Pacientes com SCA comumente cur -
sam com distensão abdominal, oligúria
progressiva, hipotensão, taquicardia,
edema periférico, além de evidências
clínicas de hipoperfusão, como pele fria
e pálida. Por isso, idealmente, a pressão Figura 1. Compressão manual do fígado com compres-
sas para hemostasia. Fonte:UpToDate, 2020
intra-abdominal de pacientes em pós-
-operatório de grandes cirurgias ou re-
posição volêmica agressiva deveria ser
medida diariamente, principalmente na A depender do vaso lesionado, o con-
presença de pelo dois fatores de risco. trole da hemorragia pode feito através
de uma sutura simples. Porém, nos
casos de lesões graves de vasos san-
Inicialmente, a laparotomia é realiza-
guíneos essenciais, shunts temporá-
da a partir de uma incisão na pele,
rios ou ligaduras são mais indicados.
no tecido subcutâneo e na linha alba,
Os reparos vasculares complexos
mantendo o peritônio fechado. Nesse
devem ser realizados numa abor -
momento, toda a equipe, inclusive os
dagem posterior.
anestesistas, devem se preparar para
a perda de sangue que pode ocorrer
assim que o peritônio foi liberado.
Ao incisar o peritônio, o controle da
hemorragia deve ser feito com a
colocação de compressas nos qua-
tro quadrantes, priorizando aqueles
no qual o sangramento parece ser

261
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 262

Figura 3. Ilustração do tamponamento com balão para


controlar sangramento hepático.Fonte: UpToDate,
2020

Figura 2.A imagem mostra um shunt vascular na


artéria ilíaca direita (ponta da seta) e um cateter de dre-
nagem no ureter danificado (seta) para desviar a urina.
Fonte: UpToDate, 2019

Sangramentos esplênicos, renais ou


hepáticos podem ser controlados
através de sutura do parênquima ou
ainda através de balões insuflados
confeccionados a partir de sondas ou
drenos. Nos casos de sangramento
Figura 4. Utilização de dreno como balão para controle
incontrolável de órgãos não essen - de hemorragia hepática. Fonte: www.sanarflix.com.br
ciais, como o baço por exemplo, po -
demos fazer a ressecção.

SAIBA MAIS!
No caso de uma hemorragia hepática, o sangramento pode ser controlado através da Mano-
bra de Pringle. Essa manobra consiste no clampeamento, através do forame de Winslow, da
tríade portal, que é composta pela artéria hepática, veia porta e ducto colédoco.

262
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 263

ressecar a víscera perfurada. Para


identificar as lesões, o cirurgião deve
inspecionar todo o comprimento intes-
tinal, que vai do ângulo de Treitz (flexura
duodenojejunal) ao reto. Caso seja pos-
sível, a perfuração deve ser reparada
com sutura simples ou grampeamento.
Porém, lesões maiores ou múltiplas
comumente exigem a ressecção do
intestino. Nesses casos, os cotos pro-
ximal e distal devem ser sepultados.
Figura 5. Controle de sangramento hepático usando a Anastomoses primárias ou osto -
manobra de Pringle. Fonte: UpToDate, 2020 mias não devem ser realizadas, uma
vez que, aumentam o tempo cirúrgico
Quanto ao controle dos focos de in - e o risco de deiscência anastomótica
fecção, a conduta ideal é vedar ou pós-operatória.

Figura 6.Uso do grampeador para fazer a ressecção do segmento intestinal. Fonte: www.sanarflix.com.br

Controlada a hemorragia e a infecção, • Curativos por pressão negati-


o abdome deve ser fechado tempo - va:também conhecido como fe -
rariamente. Para isso, podemos usar chamento assistido por vácuo
diferentes técnicas: (VAC), esse curativo consiste em

263
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 264

uma esponja, que é fixada de for- permitindo o efluxo do fluido pe-


ma ajustada na ferida aberta, um ritoneal. Além de acelerar o pro -
curativo adesivo transparente e cesso de cicatrização da ferida ,
um tubo que é introduzido a partir essa terapia aumenta a possibili-
de um furo feito no adesivo. Esse dade de fechamento primário da
tubo é conectado a uma bomba parede, uma vez que, a pressão
de sucção, que por sua vez, apli- negativa se opõe a retração lateral
ca uma pressão negativa contínua, da musculatura.
reduzindo o volume da espuma e

Figura 7. Ilustração da terapia de ferida por pressão negativa. Fonte: UpToDate, 2020

• Bolsa de Bogotá : é utilizado um


material translúcido recobrindo a
fáscia abdominal, que permite a vi-
sualização das vísceras.

Figura 8. Sistema de ferida por pressão negativa. Fon-


te: UpToDate, 2019

264
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 265

Figura 9. Fechamento temporário da cavidade abdominal utilizando a “Bolsa de Bogotá”.Fonte: www.sanarflix.com.br

• Síntese com pinças de Backaus: Agora que você entendeu a laparo -


são utilizadas pinças para fazer a tomia abreviada, vamos abordar, de
reaproximação da pele. Foi um dos forma breve, a cirurgia de controle de
primeiros métodos descritos para danos em outros tipos de traumas:
o fechamento temporário da pa-
• Trauma torácico : a toracotomia/
rede abdominal, porém não é o
esternotomia para controle de
mais indicado , uma vez que, não
danos é uma estratégia que visa
controla o fluido da ferida, além de
manter o hemitórax ou esterno
possibilitar a ocorrência de uma
aberto a fim de evitar hemorragia
síndrome compartimental.
pleural ou tamponamento cardíaco
nos casos de edema importante
do coração.

Figura 10. Fechamento da parede abdominal utilizando


pinças Backaus. Fonte: UpToDate, 2020

265
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 266

Figura 11.Paciente após


cirurgia de controle de danos
com exposição do hemitórax
esquerdo e abdome, devido
a síndrome compartimental.
Fonte: SABISTON. Tratado
de cirurgia: A base biológica
da prática cirúrgica moderna.
19.ed.

• Trauma cranioencefálico (TCE) : Dessa forma, há uma redução do


nesses casos, a craniectomia risco de herniação de estruturas
descompressivapode ser reali- cerebrais, como o úncus.
zada para controle da hipertensão
• Trauma ortopédico : nesse contex-
intracraniana refratária, permitindo
to, a cirurgia de controle de danos
a expansão do cérebro para além
visa a colocação de dispositivos de
dos limites da caixa craniana, ou
fixação externa em pacientes ins-
após a drenagem de um hemato-
táveis demais para serem submeti-
ma intracranian o onde é espera-
dos a estabilização interna definitiva.
do um edema cerebral significativo.

Figura 12. Cirurgia de


controle de danos no
trauma ortopédico. A
foto mostra um disposi-
tivo de fixação externa
utilizado para proporcio-
nar uma rápida estabi-
lização óssea. O reparo
definitivo é realizado
posteriormente. Fonte:
UpToDate, 2019

266
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 267

Correção dos parâmetros administrados, minimizar a exposição


fisiológicos na UTI do paciente, retirar roupas úmidas,
utilizar colchões térmicos, irrigar as
Nessa etapa, o objetivo é restaurar
sondas gástricas e vesicais com solu-
os parâmetros fisiológicos do pa-
ção salina aquecida a 39-40ºC ou fa-
ciente, para que ele possa ser sub-
zer a irrigação da cavidade abdominal
metido a uma nova operação . O
através de drenos ou cateteres.
tempo de permanência da UTI pode
variar de 24h a 48h, embora não
haja um consenso. Nesse momen- Correção da coagulopatia e
to, devem ser feitas as correções da reposição volêmica
hipotermia, coagulopatia e acidose
metabólica, controle da volemia, bem O controle da coagulopatia é o
como dos parâmetros ventilatórios e ponto central para melhorar o
respiratórios do paciente. Ademais, prognóstico do paciente . Como vi-
os curativos também podem ser alte- mos anteriormente, a hipotermia
rados conforme a produção do conte- está intimamente relacionada com
údo abdominal, até que o fechamento o desenvolvimento da coagulopatia.
definitivo seja viável. Logo, para tratarmos essa complica-
ção é fundamental fazer o controle
da temperatura do doente. Além
Correção da acidose metabólica disso,é necessária a reposição de
plaquetas e fatores de coagulação,
A correção da acidose metabólica
que muitas vezes é feita a partir da
pode ser feita a partir do controle
ativação do protocolo de transfusão
da hipotermia, bem como da admi-
maciça.
nistração controlada de cristaloide
e/ou transfusão sanguínea. Dessa
forma, a perfusão ideal é restaurada HORA DA REVISÃO!
e o metabolismo anaeróbico é cessa- O protocolo de transfusão maciça con-
do, diminuindo a produção de ácido siste na transfusão de mais de 10 uni-
lático. dades de sangue em 24h ou mais de 4
unidades em 1 hora. Além do concen-
trado de hemácias, é recomendada a re-
posição de plasma e plaquetas em pro-
Correção da hipotermia porção equilibrada (1:1:1).
O controle da temperatura corporal
é um componente imperativo na res- Vale ressaltar que a reposição volê -
suscitação do controle de danos. Para mica nesses pacientes visa manter
isso, é importante aquecer o ambien- uma pressão arterial adequada ou
te e todos os fluidos antes de serem

267
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 268

até mesmo um pouco menor do que ao processo de ressuscitação de con-


os parâmetros considerados normais. trole de danos. O excesso de fluido
Essa estratégia de manter um pa- pode contribuir para hemodiluição e
ciente hipotenso por um certo perí- hipotermia, agravando ainda mais a
odo é conhecida como “Hipotensão coagulopatia.
Permissiva”, e está muito associada

SAIBA MAIS!
A estratégia da hipotensão permissiva, segundo a recomendação das diretrizes europeias
publicada em 2019, visa manter uma PAS entre 80 a 90 mmHg. Vale ressaltar que essa
abordagem é contraindicada para pacientes com suspeita de TCE, visto que, a conduta mais
importante para limitar o dano cerebral nesses pacientes, é manter uma pressão arterial sufi-
ciente para garantir a perfusão cerebral.

Quanto a nutrição nesse período, é METAS A SEREM ATINGIDAS NA UTI


importante aumentar a quantidade de Pressão sistólica 90mmHg
calorias a base de proteína, uma vez Lactato sérico < 2,5 mmol/l
que, o paciente com abdome aberto Base Excess > -4 mmol/L
apresenta uma perda de líquido peri- Hemoglobina > 10g/dl
toneal associada a uma perda líquida Hematócrino > 30%
proteica, que pode levar a um quadro Temperatura > 35º C
de desnutrição. Tempo de protombina < 15 s

Embora não seja consenso, algumas TTPa < 35 s


Plaquetas > 50.000/mm3
metas que devem ser atingidas na
UTI estão representadas na tabela Fibrinogênio > 100 mg/Dl
Cálcio Sérico > 0,9 mmol/L
abaixo.
Índice Cardíaco > 3L/min/m2
Saturação O2 > 95%
Frações inspiradas de O2 (FIO2) < 50%
Dosagem de inotrópicos Baixa
Tabela 1.Metas dos valores dos parâmetros fisiológi -
cos que devem ser monitorizados na UTI.

Ainda nesse período de recuperação


na UTI, é importante manter o pa -
ciente sedado para melhorar o padrão
respiratório, fazer antibioticoprofilaxia

268
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 269

e controlar a pressão da cavidade de algum segmento intestinal, é nes-


abdominal, mantendo-a abaixo de se momento que o trânsito deve ser
20mmHg, para evitar o surgimento restabelecido com anastomoses ou
de uma síndrome compartimental. exteriorização de estomas.
Essas medidas oferecem conforto
ao paciente.
Fechamento da parede abdominal
Nos casos de lesões hepáticas, esplê-
nicas ou traumas pélvicos graves, por O fechamento convencional da pare-
exemplo, o sangramento que foi tem- de abdominal, quando possível, pode
porariamente controlado na cirurgia, ser realizado durante a cirurgia do
agora poderá ser tratado com embo- reparo definitivo das lesões. Nesses
lização, através da arteriografia. casos, podem ser utilizadas técnicas
para obter reforço, como a utilização
de telas. Entretanto, em muitos casos,
Reoperação programada há uma tensão tão significativa, devi-
Após a estabilização dos parâmetros do a contração da musculatura late -
fisiológicos do doente, o reparo defi- ral, que impede a reaproximação das
nitivo das lesões deve ser progra- bordas. Nessas condições, o fecha-
mado. Idealmente, a reoperação deve mento definitivo da parede não deve
ocorrer em até 48h após a admissão ser realizado devido ao risco de sín-
do paciente, porém, não existem da- drome compartimental e hérnia ven-
dos que determinem um período mí- tral, sendo, portanto, adiado para uma
nimo ou máximo para isso. A situa- nova cirurgia.
ção clínica do paciente é o que irá Para o fechamento temporário do
determinar o momento exato. abdome, são utilizadas algumas téc-
Durante a cirurgia definitiva, as com- nicas, a exemplo do dispositivo de
pressas que foram deixadas no Wittmann Patch e o curativo por
abdome para tamponar os focos pressão negativa. Como este último
hemorrágico, devem ser retiradas cui- já foi abordado anteriormente, va-
dadosamente. Os tecidos necrosados mos entender agora como funciona o
devem ser desbridados e a coleções Wittmann Patch: o dispositivo é su-
de fluidos aspiradas. turado na fáscia da parede abdominal
lateralmente, criando uma ponte que
Os shunts utilizados nas lesões vas- permite a reaproximação das bordas.
culares graves, agora podem ser Como essa sobreposição é ajustada
substituídos por reparos vasculares para acomodar um aumento ou dimi-
complexos. Se durante a cirurgia de nuição do edema abdominal, à medi-
controle de danos, houve ressecção da que o inchaço diminui, as bordas

269
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 270

fasciais são aproximadas em direção pode ser retirado e a parede abdo-


a linha média. Assim, quando estão minal é fechada.
próximas o suficiente, o dispositivo

Figura 13. Foto à esquerda mostrando a colocação de uma barreira de prevenção de aderências, foto à direita mos-
trando o dispositivo ajustado com uma leve tensão para evitar a retração lateral e manter o domínio abdominal. Fonte:
https://bit.ly/39qFWAk

Atualmente, a cirurgia de controle


de danos é amplamente aceita e re -
conhecida pelos cirurgiões, sendo
inclusive, uma abordagem rotineira
no manejo de pacientes gravemente
politraumatizados. Quando bem indi-
cada e feita de maneira conveniente,
essa estratégia reduz a morbimor -
talidade, aumentando a sobrevida
dos pacientes vítimas de traumas
graves.
Figura 14. Aproximação das bordas à medida que
o inchaço abdominal diminui. Fonte: https://bit.
ly/39qFWAk

270
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS

MAPA MENTAL DA CIRURGIA DE

HIPOTERMIA V
INT

DIMINUIR
MORTALIDADE

CONTROLE
TEMPORÁRIO
DAS LESÕES

RESTAURAR OS CIRUGIA
PARÂMETROS CONCEITO DE CONTRO
FISIOLÓGICOS DE DANO

DIMINUIR O TEMPO
CIRÚGICO

FASES

1. SELEÇÃO 2. OPERAÇÃO 3. CORREÇÃ


DOS PARÂMET
DO PACIENTE ABREVIADA FISIOLÓGICOS

CONTROLE DO
VOLEM
DECISÃO PRECOCE SANGRAMENTO

CONTROLE DA PARÂMET
INFECÇÃO RESPIRAT

FECHAMENTO
TEMPORÁRIO TRÍADE L
DA PAREDE

271
CIRURGIADECONTROLEDEDANOS 272

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
COLWELL et al. Initial management of moderate to severe hemorrhage in the adult
trauma patient. UpToDate. 2020
Edelmuth et al. Cirurgia para controle de danos: Estado atual. Rev Col Bras Cir. 2013.
GESTRING et al. Negative pressure wound therapy. UpToDate. 2020
JACOBS et al. Surgical techniques for managing hepatic injury. UpToDate. 2020
KUTCHER et al. Acute coagulopathy associated with trauma. UpToDate. 2019
MARTIN et al. Management of the open abdomen in adults. UpToDate. 2019
SABISTON. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19.ed.
SARANI et al. Overview of damage control surgery and resuscitation in patients sustai-
ning severe injury. UpToDate. 2019

272
COMPLICAÇÕES CIRÚRGICAS

273
SUMÁRIO
1. Introdução ................................................................................................ 275
2. Complicações da ferida operatória ............................................... 275
3. Febre .......................................................................................................... 282
4. Complicações pulmonares ............................................................... 285
5. Complicações gastrointestinais ..................................................... 288
6. Outras complicações .......................................................................... 291
Referências Bibliográficas ..................................................................... 292

274
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 275

1. INTRODUÇÃO Ademais, uma realização cuidadosa


dos tempos cirúrgicos (diérese, he -
As complicações cirúrgicas ainda são mostasia, exérese e síntese) diminui
um desafio no tratamento operatório
a possibilidade de complicações ci-
dos pacientes. Elas constituem uma
rúrgicas, da mesma forma que o uso
possibilidade real no dia a dia do ci-
criterioso de medicações pré-opera-
rurgião. Frequentemente, os resul- tórias, como os antibióticos, podem
tados funcionais das operações são
exercer influência no pós-cirúrgico,
comprometidos pelas complicações,
evitando o surgimento de situações
podendo, em alguns casos, fazer com
complicadas.
que o paciente nunca recupere o nível
funcional pré-operatório. Observa-se Após o término da operação, a vigilân-
que a parte mais significante e difí- cia é obrigatória. A avaliação comple-
cil das complicações é o sofrimento ta, cuidadosa e regular dos pacientes
impingido ao paciente que ao entrar nesse período permite ao cirurgião
no hospital, espera que será curado detectar precocemente as complica-
de uma determinada patologia, sem ções, de modo a permitir o tratamento
que existam intercorrências, mas delas de forma mais rápida e efetiva.
acaba exposto a sofrimentos e difi- Na vigilância pós-operatória, alguns
culdades por causa das complicações elementos merecem atenção espe -
cirúrgicas. cial, como: feridas operatórias, avaliar
a ingestão e o débito do paciente (em
Sabe-se que existem diversos moti-
especial, o urinário), checar os perfis
vos relacionados com as causas das
de temperatura (curva de tempera-
complicações, mesmo que o cirurgião tura), verificar os níveis de atividade,
adote uma técnica cirúrgica adequa- avaliar o estado nutricional e checar
da, a cirurgia não está livre das inter-
os níveis de dor. Com isso, o cirurgião
corrências. No entanto, é verdade que
prudente irá lidar de maneira mais rá-
um cirurgião descuidado pode come- pida, completa e apropriada com as
ter erros técnicos que contribuem possíveis complicações cirúrgicas.
para o surgimento das complicações.
Nesse sentido, percebe-se que o ris-
co de eventos adversos diminui muito 2. COMPLICAÇÕES DA
com um cuidadoso processo de ava- FERIDA OPERATÓRIA
liação pré-operatória, como: estado
nutricional do paciente, condição pul- • Seroma → O seroma é uma co -
monar e cardíaca do doente e outras leção de gordura liquefeita, soro e
questões relacionadas a possíveis líquido linfático que se forma sob a
comorbidades e medicações em uso. incisão cirúrgica. Esse líquido, ge -
ralmente, é claro, amarelado e um

275
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 276

pouco viscoso, sendo encontrado


na camada subcutânea, logo abai-
xo da derme. São representantes
das complicações mais benignas
após um procedimento cirúrgi- Figura 1.Aspiração de Seroma.
co, ocorrendo quando se cria um Fonte: Sitapati.info/Reprodução
grande retalho de pele no curso
da operação, como visto nos casos
de mastectomias, dissecções au- • Hematoma → Trata-se de uma
xiliares, dissecção da região ingui- coleção anormal de sangue, geral-
nal e em grandes hérnias ventrais. mente na camada subcutânea de
No geral, se apresentam como um uma incisão recente ou em um es-
edema localizado e bem circuns- paço potencial na cavidade abdo -
crito, com desconforto à pressão e minal após exérese de um órgão,
ocasional drenagem de líquido cla- como o hematoma na loja esplêni-
ro pela ferida imatura. A prevenção ca após uma esplenectomia. É uma
pode ser obtida pela colocação de complicação mais preocupante do
drenos de sucção sob os retalhos que os seromas, pois possui um
de pele ou no potencial espaço maior potencial para infecções se-
morto criado pela linfadenectomia, cundárias. A formação do hema-
de modo que a retirada prematura toma se dá com sangramento na
desses drenos resulta, no geral, em camada envolvida após o fecha-
grandes seromas, que requerem mento da pele, estando relacio -
aspirações repetidas, sob condi- nado com a hemostasia, depleção
ções estéreis, seguidas pela colo - dos fatores da coagulação e pre -
cação de curativos compressivos. sença de coagulopatia. As mani-
Quando um seroma reacumula festações clínicas variam de acor -
após pelo menos duas aspirações, do com o tamanho e localização do
deve ser evacuado pela abertura hematoma, podendo se manifestar
da incisão e limpeza da ferida com como uma tumefação expansiva
gaze umedecida com solução sa- ou como dor na área da incisão ci-
lina para permitir cicatrização por rúrgica, ou como ambas. Quanto
segunda intenção. Ademais, um aos locais de surgimento, tem-se
seroma infectado também é trata- diferentes manifestações, como:
do por drenagem aberta. no pescoço – comprometimento
de via aérea; no retroperitônio –
íleo paralítico, anemia e outras; ex-
tremidades e cavidade abdominal
– síndrome compartimental. Para

276
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 277

prevenção do hematoma, deve - relacionada com erros técnicos


-se corrigir no pré-operatório qual- de suturas muito próximas à mar-
quer anormalidade da coagulação gem, muito distante, ou sob gran-
e descontinuar medicamentos que de tensão, e a infecção profunda
a alterem. Quando o hematoma é é uma das causas mais comuns
pequeno, não exige nenhuma in- de separação localizada da ferida,
tervenção e acabará sendo rea- além de outros fatores que podem
bsorvido, mas hematomas maio - contribuir, como: pressão intra-ab-
res ou que possam comprometer dominal aumentada e fatores que
funções vitais (como obstrução de influenciam adversamente a ci -
vias aéreas) podem ser drenados. catrização da ferida. A deiscência
pode ocorrer sem aviso e a evisce-
ração torna o diagnóstico óbvio, e
SE LIGA!Várias condições podem favo -
recer o surgimento dos hematomas por
nos casos iniciais, a investigação
se relacionarem com a coagulopatia, tais pode ser feita com um aplicador de
como: distúrbios mieloproliferativos, in- ponta de algodão estéril ou com o
suficiência hepática e renal, septicemia, dedo enluvado na ferida, para de-
deficiência dos fatores de coagulação e
também o uso de medicamentos (aspiri- tecção da deiscência. Para preven-
na, clopidrogel, heparina e outros).] ção, pode-se lançar mão de sutura
com pontos separados. Uma vez
diagnosticada, o tratamento de -
• Deiscência da ferida operató -
pende da extensão da separação
ria → É a separação das camadas
da fáscia e da presença de evisce-
musculoaponeuróticas no início
ração ou contaminação intra-ab -
do curso pós-operatório. Está en-
dominal significativa. Dessa forma,
tre as complicações mais temidas,
uma deiscência pequena pode ser
pois há possibilidade de evisce -
tratada conservadoramente, co -
ração e necessidade de interven-
brindo a ferida com gaze umedeci-
ção imediata, além de haver pos-
da e uma bandagem abdominal, e
sibilidade de deiscência repetida,
no caso de evisceração, os intesti-
infecção da ferida e formação de
nos devem ser cobertos com uma
hérnia incisional. Essa complica-
compressa estéril umedecida com
ção ocorre em cerca de 1 – 3%
solução salina e o paciente deve
dos pacientes submetidos a ope -
ser preparado para retornar à sala
rações abdominais, ocorrendo com
de operação após um período curto
maior frequência com 7 – 10 dias
de reanimação volêmica. Durante
de pós-operatório, mas pode ocor-
a reabordagem cirúrgica, realiza-
rer a qualquer momento, entre 1
-se uma exploração completa da
a mais de 20 dias. No geral, está

277
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 278

cavidade abdominal para exclusão um problema significativo para os


de foco séptico ou uma deiscência cirurgiões. Nos Estados Unidos,
anastomótica que possa ter pre - essas infecções são responsá-
disposto à deiscência da incisão veis por quase 40% das infecções
cirúrgica. O tratamento da infec- hospitalares entre pacientes cirúr -
ção tem importância crítica antes gicos. As infecções na ferida são
de se tentar o fechamento da pa- causadas por contaminação bac-
rede abdominal. Se a fáscia estiver teriana do sítio operatório e podem
infectada ou necrótica, realiza-se ocorrer devido à transecção ou pe-
seu desbridamento, se após isso netração do lúmen de víscera oca
as margens da fáscia não puderem na cavidade abdominal. Existem
ser aproximadas sem tensão inde- alguns critérios para o diagnóstico
vida, deve-se considerar o fecha- da infecção de ferida operatória,
mento com tela absorvível ou com baseado na categorização geral
as próteses biológicas. das incisões (superficial, profun -
da ou espaço orgânico), descritos
na tabela abaixo. Outras fontes de
SE LIGA! Para os pacientes de alto ris-
co de deiscência (idade avançada, obe-
bactérias são: flora da pele pre -
sidade, deiscência prévia, desnutrição sente em todos os pacientes, ou
e doenças sistêmicas), cuidado com as por falha na técnica cirúrgica, que
suturas contínuas, possuem maior faci- pode permitir a contaminação exó-
lidade para separação.
gena. Os patógenos associados na
ferida cirúrgica refletem a área que
permitiu a inoculação da infecção,
mas as bactérias principais são: S.
aureus e S. coagulase-negativo.
No entanto, vale lembrar que nas
cirurgias gastrointestinais, as es-
pécies que predominam são: En-
terobactérias e E. coli. Na maioria
dos casos, as infecções ocorrem
entre o 5ª e 6ª dia pós-operató -
rio, mas podem surgir mais cedo
Figura 2. Deiscência de ferida operatória ou mais tarde, sendo que cerca de
Fonte: NEFFA, Lívia et. Al., 2019 90% das infecções de ferida ope-
ratória ocorrem nos primeiros 30
• Infecção da ferida → São compli- dias. Elas se apresentam na forma
cações comuns e continuam sendo de eritema, sensibilidade elevada,

278
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 279

edema e, ocasionalmente, drena- feridas limpas, a profilaxia é con-


gem. Além disso, o paciente pode troversa e nas cirurgias com pro -
apresentar leucocitose e febre bai- cedimentos limpos contaminados,
xa, sendo considerada infectada os antibióticos estão indicados. O
quando: observa-se drenagem de antibiótico de escolha depende do
material altamente purulento pela sítio operatório e a microbiota da-
ferida; a ferida abre de forma es- quele local. O momento ideal para
pontânea e drena liquido purulen- a administração do antibiótico é
to; há drenagem de líquido da feri- importante, sendo mais eficiente
da com cultua positiva; o cirurgião quando administrado por via IV 30
observa eritema ou drenagem e minutos antes de se fazer a inci-
abre a ferida depois de conside - são. No geral, uma cefalosporina
rá-la infectada. O tratamento tem de 1ª geração, como a cefazolina é
início com a implementação de útil, mas pode haver necessidade
medidas preventivas antes e du- de antibióticos mais potentes, em
rante a operação, como cessação casos individualizados. O uso de
do tabagismo, perda de peso, con- drenos para prevenção de infec-
trole glicêmico adequado e banho ções pós-operatórias permanece
pré-operatório com sabão con- controverso. Outro assunto con-
tendo antibiótico. Os antibióticos troverso é a necessidade ou não
pré-operatórios para profilaxia são de realizar a cultura da ferida infec-
administrados seletivamente. Para tada, no caso de feridas pequenas
feridas sujas, o uso de antibióticos e superficiais, não há necessidade,
não é profilático, mas sim, terapêu- mas se há celulite ou necrose as-
tico, enquanto que nos casos de sociada, pode ser benéfica.

INCISIONAL SUPERFICIAL INCISIONAL PROFUNDA ESPAÇO ORGÂNICO


Infecção com menos de 30 Infecção com menos de 30 dias após Infecção com menos de 30 dias após
dias após operação; operação; operação;
Compromete pele e tecido Infecção que ocorre em um menos de 1 ano Infecção que ocorre em um menos de 1 ano após
subcutâneo + pelo menos após a operação com implante e a infecção a operação com implante e a infecção envolve
um dos fatores: drenagem envolve tecidos moles profundos + um dos qualquer parte da operação aberta ou manipula-
purulenta; diagnóstico de fatores: drenagem purulenta oriunda do da + um dos seguintes fatos: secreção purulenta
infecção do sítio da opera- espaço profundo, sem extensão para órgãos; em um dreno instalado em um espaço orgânico;
ção pelo cirurgião; sintomas abscesso encontrado em um espaço profun- organismos cultivados no material aspirado do
de eritema, dor e edema do no exame direto, na radiologia ou durante espaço orgânico; abscesso encontrado em exame
local. a reoperaçao; diagnóstico pelo cirurgião; direto ou radiológico ou durante a reoperação;
sintomas de febre, dor e sensibilidade. diagnóstico de infecção pelo cirurgião.
Tabela 1. Critérios Diagnóstico
Referência: TOWNSEND C.D., BEUCHAMP R.D., EVERS B.M., MATTOX K.L. Sabiston: Tratado de Cirurgia, A Base da Prática
Cirúrgica Moderna. 18ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

279
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 280

SE LIGA! Você lembra como é a classi-


• Feridas crônicas → São aquelas
ficação da ferida operatória? Ai vai uma
revisão básica - Limpa: sem penetra- que não cicatrizaram completa-
ção de víscera oca, fechamento primário mente em um período de 30 a 90
da ferida, sem inflamação, sem falhas na dias após o procedimento cirúrgico.
técnica asséptica, procedimento eletivo;
Limpa contaminada: víscera oca pene-
Essas feridas são mais frequente-
trada, mas controlada, sem inflamação, mente encontradas nos pacientes
fechamento primário da ferida, pequena que fazem uso de altas doses de
falha na técnica asséptica, utilização de corticoides, nos imunossuprimi-
dreno mecânico, preparação intestinal
no pré-operatório; Contaminada: ex- dos com câncer, que estejam em
travasamento descontrolado de uma quimioterapia, em radioterapia,
víscera oca, inflamação aparente, feri - pacientes desnutridos, pacientes
da aberta, traumática, grande falha na
com deiscência de sutura, com
técnica asséptica; Suja: não tratada,
extravasamento descontrolado de uma uma grande base de granulação e
víscera, pus na ferida cirúrgica, ferida pacientes com AIDS. A prevenção
aberta supurativa e inflamação grave. dessas feridas geralmente é difícil,
mas nas situações em que é possí-
vel, medidas como evitar uma ope-
ração sobre o local irradiado, orien-
tar um paciente obeso a perder
peso antes da cirurgia, ou melhorar
o estado nutricional antes do pro -
cedimento, além de orientar sobre
a cessação do tabagismo podem
contribuir para a prevenção.

Figura 3. Infecção de ferida operatória


Fonte: GEMPERLI & MENDES, 2019

280
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS

MAPA MENTAL – COMPLICAÇÕES

FERIDAS
OPERATÓR

COMPLICAÇÕ

DEISCÊNCIA DE
SEROMA HEMATOMA
OPERATÓR

Coleção:
Gordura liquefeita; Coleção: Separação das ca
Soro; Sangue musculoaponeu
Líquido linfático

Localização: Localização: Complicação te


Tecido subcutâneo Tecido subcutâneo Risco de evisce

Prevenção
Prevenção: Potencial para
Suturar com po
Drenos de sucção Infecções secundárias
separados

Tratamento: Tratamento
Tratamento:
Drenagem Conservador
Drenagem
Observar (pequenos) Reabordagem ci

281
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 282

3. FEBRE agentes anestésicos (halotano,


enflurano e outros) e relaxantes
A febre é uma das complicações re - musculares despolarizantes (suc-
lacionadas a termorregulação, sendo
cinilcolina e suxametionina) cau-
importante a avaliação de algumas
sam elevação na concentração do
situações: quando a febre surge (in-
cálcio mioplásmico. Quando isso
traoperatório, antes de 72h do pós- acontece nos pacientes suscetí-
-cirúrgico ou após 72h), como está a
veis, ocorre uma liberação anor -
ferida operatória, presença de catete-
mal de cálcio, que provoca ativa-
res e outras queixas do paciente.
ção prolongada dos filamentos de
• Febre no intraoperatório → Nes- músculo, culminando em rigidez e
se momento, duas hipóteses são hipermetabolismo, o que gera hi-
mais prováveis, são elas: infecção póxia celular, acidose lática e hiper-
pré-existente ou reações transfu- capnia, além da geração excessiva
sionais. Além disso, vale lembrar de calor, que se não for tratada cul-
de um dos principais diagnósticos mina na morte de miócitos e a rab-
diferenciais, a hipertermia maligna. domiólise (que leva a hipercalemia
A hipertermia maligna (HM) é e mioglobinúria). Por fim, o pacien-
uma crise hipermetabólica poten- te desenvolve coagulopatia disse-
cialmente fatal que se manifesta minada, ICC, isquemia intestinal e
durante ou após a exposição a um síndrome compartimental. Suspei-
anestésico geral, que é deflagra- ta-se de suscetibilidade à HM no
dor em indivíduos suscetíveis. A pré-operatório, no paciente com
estimativa é que ocorra um episó- história familiar de HM ou história
dio de hipertermia maligna em 1 a pessoal de mialgia após exercício,
cada 30.00 – 50.000 adultos. Tra- uma tendência ao desenvolvimen-
ta-se de uma doença que é her - to de febre, doença muscular e in-
dada e autossômica dominante, tolerância à cafeína. Para esses in-
com dois genes de suscetibilidade divíduos, a anestesia deve ser sem
identificados em seres humanos e deflagrador (barbitúricos, benzo -
quatro mapeados a cromossomos diazepínicos, opioides, propofol,
específicos, mas não identificados etomidato, cetamina, óxido nitroso
definitivamente. Essa mutação e bloqueadores neuromusculares
resulta em regulação alterada do não despolarizantes). Os indivídu-
cálcio no músculo esquelético na os sem suspeita de suscetibilidade
forma de efluxo aumentado desse podem manifestar a doença pela
íon proveniente do retículo sarco - primeira vez durante ou imedia-
plasmático no mioplasma. Alguns tamente após a administração de

282
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 283

um anestésico geral deflagrador, paciente com O2 a 100%, admi-


com manifestações clínicas variá- nistração de anestesia alternativa,
veis, podendo ser a forma abortiva concluir a operação, administrar
(taquicardia, arritmia, temperatura Dantrolene (relaxante muscular)
elevada e acidose) e outros cursam 2,5 mg/kg em bólus, e repetir a
com a rigidez muscular, sendo que cada 5 min, depois 1 – 2 mg/kg/h,
o espasmo do músculo masseter é até normalização ou desapareci-
um sinal patognomônico precoce. mento dos sintomas, checar e mo-
Outros sintomas incluem – taquip- nitorizar o paciente (gasometria
neia, hipercapnia, rubor de pele, arterial, creatina cinase, eletrólitos,
hipoxemia, hipotensão, anormali- lactato e mioglobina), além de ele-
dades eletrolíticas, rabdomiólise e trocardiograma, sinais vitais e dé -
hipertermia. O tratamento é base- bito urinário e deve-se adotar me-
ado na descontinuação da droga didas de suporte.
deflagradora, hiperventilação do

SAIBA MAIS!
A hipertermia maligna é uma elevação da temperatura não hipotalâmica.

• Febre no pós-operatório → Vele e vômitos). Vale lembrar que o pa-


lembrar que a febre é um dos acha- ciente que apresenta febre preco-
dos mais preocupantes no pacien- ce, merece uma avaliação adequa-
te em pós-operatório, podendo da da ferida operatória, justamente
ocorrer em até 2/3 dos pacientes e devido a possibilidade de infecção
a sua causa é infecciosa em cerca necrosante do sítio operatório. Já a
de 1/3 dos casos. Quando a febre febre que surge após as 72 horas,
surge antes de 72 horas de pós- está associada com outras causas,
-operatório, em especial, quando como: infecção do trato urinário,
tem surgimento nas primeiras 24 – infecção da ferida operatória (na
48 horas, deve-se pensar em ate- forma não necrosante), deiscência
lectasia, que normalmente, evolui anastomótica, sinusite, tromboem-
com uma febre baixa. Além disso, bolismo venoso profundo e coli-
outras causas podem ser: infecção te pseudomembranosa (paciente
necrosante do sítio cirúrgico ou que fez uso prévio de antibióti-
peritonite difusa (cursa, geralmen- cos). O tratamento é determinado
te com: febre, distensão abdominal pelos resultados da avaliação do

283
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 284

paciente (etiologia da febre/sítio antitérmicos e caso haja suspeita


da infecção), sendo que muitos ci- de infecção, deve-se entrar com
rurgiões recomendam a diminui- antibiótico mais adequado para o
ção da temperatura com o uso de sítio infeccioso.

MAPA MENTAL – FEBRE

Descontinuação da droga +
Hiperventilação + Dantrolene

Surge após contato com


deflagrador. Um anestésico.
Indivíduos suscetíveis

Crise hipermetabólica

Diagnóstico diferencial: Elevação da temperatura


Hipertermia Maligna Não hipotalâmica

Infecção pré-existente Reação transfusional

INTRAOPERATÓRIO

FEBRE

Pode ocorrer em até


PÓS-OPERATÓRIO
2/3 dos pacientes

Antes de 72h Após 72h

Infecção do trato urinário;


Infecção da ferida operatória;
PENSE EM ATELECTASIA
Deiscência anastomótica;
Colite pseudomembranosa;

284
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 285

4. COMPLICAÇÕES pulmonares. A pneumonia pode se


PULMONARES desenvolver de forma precoce (2 –
5 dias após admissão ao hospital)
Sabe-se que diversos fatores contri-
ou tardiamente (> 5 dias). Possui
buem para uma fisiologia pulmonar
como principais focos etiológicos:
anormal após um procedimento ci-
aspiração dos conteúdos orofarín-
rúrgico, como: diminuição na capaci- geos e gástricos. Quanto ao qua-
dade residual funcional (relacionada
dro clínico, sabe-se que a atelecta-
com distensão abdominal, incisão
sia é a causa mais comum de febre
dolorosa na região abdominal supe -
pós-operatória nas primeiras 48h,
rior, obesidade, tabagismo, DPOC, com os pacientes apresentando
decúbito dorsal prolongado e sobre -
uma febre baixa, mal-estar e dimi-
carga de líquidos, que pode levar à
nuição dos murmúrios vesiculares
edema pulmonar). A capacidade vital
nos campos pulmonares inferiores
desses pacientes pode estar reduzi- e, como dito antes, se não tratada
da em até 50% do normal, durante
de forma agressiva, é muito pro -
os dois primeiros dias de pós-opera-
vável que evolua para pneumonia.
tório. Além disso, o uso de narcóticos
Desse modo, com o estabeleci -
inibe de forma significativa o impulso mento da pneumonia, o paciente
respiratório.
apresenta febre alta, ocasional-
• Atelectasia e Pneumonia → A mente, confusão mental e a tosse
atelectasia é a complicação respi- produtiva (com secreção espessa),
ratória mais comum no pós-ope - leucocitose e radiografia de tórax
ratório. Isso ocorre através da ação revelando infiltrados. Caso o pa -
dos anestésicos, da incisão abdo - ciente não seja prontamente diag-
minal e dos narcóticos pós-opera- nosticado e tratado, poderá evoluir
tórios, que faz com que os alvéo - de forma rápida para insuficiência
los periféricos entrem em colapso, respiratória e necessitar de intuba-
podendo ocorrer uma derivação ção. A prevenção da atelectasia e
pulmonar. Diante disso, caso não da pneumonia está associada ao
haja intervenção imediata, esses controle da dor, que permite que o
alvéolos podem permanecer co - paciente respire profundamente e
lapsados levando ao acúmulo de consiga tossir. Encoraje o pacien-
secreções que podem se infectar te a tossir com a aplicação de um
por bactérias. O risco parece ser travesseiro sobre o local da inci-
particularmente alto em pacien- são abdominal, além de encora-
tes tabagistas, que sejam obesos já-lo a respirar profundamente e
e apresentam copiosas secreções a tossir, sendo essa a abordagem

285
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 286

de tratamento isolada mais valio - por bactérias patogênicas. Dentre


sa na resolução da atelectasia e da os fatores de risco para regurgita-
pneumonia. ção e aspiração, estão: lesão dos
esfíncteres esofágicos e reflexos
laríngeos, motilidade GI alterada e
ausência de jejum pré-operatório,
e quanto a aspiração orofaríngea,
sabe-se que o idoso é bastante
suscetível, além dos pacientes com
tubo nasogástrico ou debilidade de
deglutir e limpar suas vias aéreas.
Quanto a clínica, o paciente com
aspiração, no geral, apresenta his-
tória de vômitos associado à aspi-
ração, manifestando-se com sibi-
Figura 4. A imagem mostra atelectasia do lobo superior los e respiração ruidosa, enquanto
direito. Observa-se, além da opacidade acometendo a que os pacientes que aspiram con-
porção apical do hemitórax direito, o desvio da traqueia
para a direita (seta preta) e a redução volumétrica desse teúdo gástrico cursam com tosse e
hemitórax. sibilos. Vale lembrar que alguns pa-
Fonte: Rodrigues AJ et. Al, 2018. cientes apresentam aspirações si-
lenciosas, sugeridas pela presença
• Pneumonite por aspiração e de infiltrado na radiografia de tórax
Pneumonia por aspiração → Sa- ou PaO2 reduzida e outros pacien-
be-se que a aspiração de conteú- tes podem ter manifestações mais
dos orofaríngeos ou gástricos para graves, com apneia e sibilo que
o trato respiratório é uma compli- progressivamente evoluem para
cação grave das intervenções ci- edema pulmonar e SARA. A pre -
rúrgicas. A pneumonite por aspi- venção da aspiração é obtida com
ração (relacionada com contato do medidas que reduzem o conteúdo
conteúdo gástrico com a mucosa gástrico, minimizem a regurgitação
pulmonar), também chamada de e protejam a via aérea. Além disso,
Síndrome de Mendelson, descre- é importante que no pós-operató-
ve uma lesão pulmonar aguda que rio evite-se o uso de narcóticos em
resulta da inalação de conteúdos excesso, que haja incentivo à de -
gástricos regurgitados, enquanto ambulação e a alimentação deve
que a pneumonia por aspiração ser adaptada para os pacientes
resulta da inalação de secreções obnubilados, idosos ou debilita-
orofaríngeas que são colonizadas dos. Com a suspeita de aspiração

286
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 287

o paciente deve ser prontamen- também devem receber antibió -


te monitorado e se necessário ele ticos, em especial, que cubram os
deve ser intubado, seguido de as- gram-negativos.
piração agressiva da árvore brôn-
quica. Nos pacientes com pneumo-
SE LIGA! Como dito acima, esses pa-
nite sem 48 horas está indicada a cientes podem evoluir com outras com-
antibioticoterapia empírica e aque- plicações pulmonares, tais como: Ede -
les com pneumonia por aspiração ma pulmonar, trauma pulmonar agudo
e síndrome da angústia respiratória do
adulto (SARA)

MAPA MENTAL – COMPLICAÇÕES PULMONARES

COMPLICAÇÕES
CIRÚRGICAS

Prevenção: A capacidade vital dos


Controle da DOR pacientes
PULMONARES
Permite que o paciente < 50% do normal
respire e consiga tossir. Nos 2 primeiros dias

ATELECTASIA PNEUMONIA

É a complicação Precoce Tardia


Colapso dos alvéolos
mais comum 2 – 5 dias > 5 dias

Devido aos anestésicos Etiologia

Pode culminar Aspiração: Orofaríngea


em infecção e Gástrica

Lembrete: A aspiração
gástrica pode ocasionar uma Síndrome de Mendelson
pneumonite por aspiração.

287
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 288

5. COMPLICAÇÕES disso, no pós-operatório imediato,


GASTROINTESTINAIS a restrição alimentar e a analgesia
narcótica também contribuem para
• Íleo e Obstrução intestinal pós- a alteração da motilidade intesti-
-operatória precoce → A obstru- nal. A obstrução intestinal mecâni-
ção intestinal pós-operatória pre - ca precoce é comumente causada
coce é considerada como aquela por aderências (cerca de 92% dos
que ocorre em 30 dias após a casos), fleimão ou abscesso, hér-
operação. Essa obstrução pode nia interna, isquemia intestinal ou
ser funcional(íleo), decorrente da intussuscepção.
inibição da atividade intestinal pro-
pulsiva, ou mecânica, resultado
de uma barreira física. O íleo que SE LIGA!Causas de íleo paralítico: pan-
ocorre imediatamente após a cirur- creatite, peritonite, hemorragia e infla -
mação peritoneal, anormalidades ele -
gia na ausência de fatores precipi- trolíticas, pneumonia, medicamentos e
tantes, dura em média 2 – 4 dias, víscera inflamada.
sendo denominado de íleo primá-
rio ou pós-operatório. Por outro O íleo pós-operatório afeta prima-
lado, o íleo que ocorre devido a riamente o estômago e o cólon. No
um fator precipitante e se associa íleo adinâmico o estômago, o delga-
em atraso no retorno da função in- do e o cólon são acometidos. Quanto
testinal é chamado de íleo secun- a obstrução mecânica, sabe-se que
dário ou adinâmico ou paralítico. ela pode ser completa ou parcial, po-
Já a obstrução mecânica pode ter dendo ocorrer na parte proximal ou
como causa uma barreira luminal, distal do delgado. A extensão das
mural ou extramural. O mecanismo manifestações clínicas varia com a
fisiopatológico e a etiologia do íleo causa, grau e nível de obstrução. Nos
pós-operatório não são bem com- casos de obstrução alta, há vômitos
preendidos. Vários eventos podem no início do curso da doença e podem
ser desencadeantes em um pro - apresentar distensão mínima ou não
cedimento cirúrgico abdominal, apresentam distensão, além da pre -
como: estresse cirúrgico e a mani- sença de vômito bilioso. Aqueles com
pulação do intestino, resultando em obstrução distal, vomitam tardiamen-
atividade simpática inibitória sus- te no curso da doença e apresentam
tentada e liberação de hormônios distensão abdominal mais pronuncia-
e neurotransmissores, bem como da, com vômitos inicialmente biliosos
ativação da resposta inflamatória que se tornam mais fecaloides. Ou-
local, que resulta em supressão tros sintomas que podem surgir, são:
do aparelho neuromuscular. Além

288
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 289

febre, taquicardia, manifestações de SE LIGA!A tomografia de abdome per -


hipovolemia e sepse. O diagnóstico é mite um diagnóstico mais acurado da
obstrução mecânica, sendo capaz de
baseado nos achados clínicos e nos diferenciar em obstrução complicada
achados radiográficos. As radiogra - e não complicada, parcial ou completa.
fias abdominais revelam alça intes - Além disso, é capaz de identificar tipos
tinal difusamente dilatada por todo específicos de obstrução – em alça fe-
chada, intussuscepção, bem como as
o trato intestinal, com ar no cólon e condições associadas – isquemia in-
reto, além de níveis hidroaéreos. Nos testinal, abscesso e pancreatite, como
casos de obstrução mecânica, existe exemplos.
uma pequena dilatação do delgado
com níveis hidroaéreos e válvulas co- As medidas preventivas devem ser
niventes espessadas no intestino pro- iniciadas no período intraoperatório e
ximal ao ponto de obstrução e pouco continuadas no período pós-operató-
gás, ou nenhum, no intestino distal à rio imediato. Durante o ato cirúrgico o
obstrução. A tomografia é um exa - médico deve manipular de forma sua-
me que pode auxiliar no diagnóstico, ve os tecidos e limitar a dissecção pe-
devendo ser solicitada nos casos de ritoneal somente ao essencial, além de
quadros confusos, se as radiografias ser evitada a lesão de alças intestinais
não forem diagnósticas ou se a res- causadas por instrumentos e utiliza-
posta ao tratamento for inadequada. ção de medidas como barreiras an-
tiadesão. No período pós-operatório
os eletrólitos devem ser monitorados
e qualquer alteração deve ser corrigi-
da. Forma de analgesia alternativa aos
narcóticos podem ser usadas, como
os AINEs e colocação de uma epidural
torácica com anestésico local.
Por fim, quando há suspeita ou diag-
nostico de uma obstrução pós-opera-
tória, uma abordagem em três etapas
deve ser seguida: reanimação, inves-
tigação e intervenção cirúrgica. Logo,
uma relaparotomia deve ser realizada
se houver uma obstrução de intesti-
no em alça fechada de alto grau ou
complicada, intussuscepção ou peri-
Figura 5. Radiografia abdominal demonstrando signi-
ficativa dilatação de alças intestinais (Sinal do empilha- tonite. O íleo adinâmico é tratado me-
mento de moedas). Fonte: Portal Dr Pixel, Unicamp diante a resolução de algumas das

289
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 290

anormalidades (possíveis etiologias) e caso o paciente mantenha-se estável


esperando-se a cura, geralmente não e com melhora clínica e radiológica.
sendo exigida intervenção cirúrgica. Caso sejam detectados sinais de de-
A obstrução mecânica parcial, inicial- terioração ou se não ocorrerem me -
mente, é tratada de forma expectante, lhoras, a cirurgia está indicada.

MAPA MENTAL – COMPLICAÇÕES PULMONARES

COMPLICAÇÕES
CIRÚRGICAS

GASTROINTESTINAIS

Obstrução Intestinal

Precoce Diagnóstico Tratamento

Em até 30 dias
Clínica + Radiologia Investigação
após a operação

Funcional Mecânica Reanimação

Intervenção
Íleo Barreira física
Cirúrgica

Inibição da atividade
Intestinal propulsiva

290
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 291

6. OUTRAS cardíacas; Insuficiência cardíaca; Re-


COMPLICAÇÕES nais – Retenção urinária; Injúria renal
aguda; Metabólicas – Insuficiência
É verdade que todos os sistemas po-
adrenal (rara, porém potencialmente
dem ser acometidos no período do
letal); Crise hipertireoidiana; Hipoti -
pós-operatório, sendo que os mais
reoidismo; Síndrome da secreção ina-
frequentemente relacionados com as
propriada de hormônio antidiurético;
complicações cirúrgicas são os des-
Hepatobiliar – Lesão de ducto bi-
critos acima. No entanto, vale a pena
liar; Neurológico – Delírio; Distúrbio
lembrar algumas possíveis com-
cognitivo; Psicose; Convulsões; AVC
plicações relacionadas aos demais
e AIT; Ouvido, nariz e garganta –
sistemas do organismo, como: Car-
Epistaxe; Perda auditiva aguda; Sinu-
diovascular – Hipertensão pós-ope-
site nosocomial; Parotidite.
ratória; Isquemia e infartos periopera-
tórios; Coque cardiogênico; Arritmias

291
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 292

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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TOWNSEND C.D., BEUCHAMP R.D., EVERS B.M., MATTOX K.L. Sabiston: Tratado de Ci-
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NEFFA, Lívia; MAIA, Valéria Rocha; COELHO, Ciênio Martins de Souza; ARAÚJO, Izabella
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Rodrigues AJ, Évora PRB, Vicente WVA. Postoperative Respiratory Complications. Me-
dicina (Ribeirão Preto) 2008. 41 (4): 469-76.

292
COMPLICAÇÕESCIRÚ GICAS 293

293
Índice
CAPA 1
Bem-Vindo 2
Aproveite 3
SUMÁRIO 4
Página 5 5
ANATOMIA APLICADA À CIRURGIA 6
Página 7 7
Página 8 8
Página 9 9
Página 10 10
Página 11 11
Página 12 12
Página 13 13
Página 14 14
Página 15 15
CUIDADOS COM PACIENTE CIRÚRGICO 16
Página 17 17
Página 18 18
Página 19 19
Página 20 20
Página 21 21
Página 22 22
Página 23 23
Página 24 24
Página 25 25
Página 26 26
Página 27 27
Página 28 28
Página 29 29
Página 30 30

294
Página 31 31
Página 32 32
Página 33 33
Página 34 34
Página 35 35
Página 36 36
Página 37 37
Página 38 38
Página 39 39
Página 40 40
Página 41 41
Página 42 42
Página 43 43
Página 44 44
Página 45 45
Página 46 46
Página 47 47
Página 48 48
Página 49 49
Página 50 50
Página 51 51
AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA 52
Página 53 53
Página 54 54
Página 55 55
Página 56 56
Página 57 57
Página 58 58
Página 59 59
Página 60 60
Página 61 61
Página 62 62
Página 63 63
Página 64 64

295
Página 65 65
Página 66 66
Página 67 67
Página 68 68
Página 69 69
Página 70 70
Página 71 71
Página 72 72
Página 73 73
Página 74 74
Página 75 75
Página 76 76
Página 77 77
Página 78 78
Página 79 79
SUTURAS 80
Página 81 81
Página 82 82
Página 83 83
Página 84 84
Página 85 85
Página 86 86
Página 87 87
Página 88 88
Página 89 89
Página 90 90
Página 91 91
Página 92 92
Página 93 93
Página 94 94
Página 95 95
Página 96 96
Página 97 97
Página 98 98

296
Página 99 99
Página 100 100
Página 101 101
Página 102 102
Página 103 103
Página 104 104
ABDOME AGUDO 105
Página 106 106
Página 107 107
Página 108 108
Página 109 109
Página 110 110
Página 111 111
Página 112 112
Página 113 113
Página 114 114
Página 115 115
Página 116 116
Página 117 117
Página 118 118
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Página 120 120
Página 121 121
Página 122 122
Página 123 123
Página 124 124
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Página 127 127
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Página 130 130
Página 131 131
Página 132 132

297
Página 133 133
Página 134 134
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Página 157 157
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Página 160 160
APENDICITE AGUDA (CIRURGIA GERAL) 161
Página 162 162
Página 163 163
Página 164 164
Página 165 165
Página 166 166

298
Página 167 167
Página 168 168
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CIRURGIA DE CONTROLE DE DANOS 255
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COMPLICAÇÕES CIRÚRGICAS 273
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