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ASPECTOS INSTITUCIONALES, COORDINACIÓN INTERJURISDICCIONAL Y ORGANIZACIÓN ADMINISTRATIVA

GESTÃO AMBIENTAL NO BRASIL:


SISTEMA NACIONAL DE MEIO AMBIENTE - DO FORMAL À REALIDADE

por Sílvia Capelli 1

1. Introdução Os brasileiros produzem, todos os dias, 125.281 toneladas


de lixo. Existem pelo menos 24.340 catadores nos lixões,
dos quais 22% têm menos de 14 anos de idade.
A doutrina jurídico-ambiental brasileira é unânime em afirmar
a modernidade e adequação da legislação nacional para a Dos 3.466 municípios que coletam lixo hospitalar, 1.193 não
proteção do meio ambiente, especialmente a partir da década fazem nenhum tipo de tratamento.
de 1980, com a promulgação da Lei da Política Nacional do A geração média de resíduos sólidos domiciliares no Brasil é
Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) e da Lei da Ação Civil Públi- de 0,6kg/habitante/dia e mais 0,3kg/habitante/dia de resí-
ca (Lei nº 7.347/85), que instrumentalizou a defesa ambiental duos de varrição, limpeza de logradouros e entulhos. Porém,
no País, culminando com a Constituição Federal de 1988. algumas cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba
Na década de 1990 destacam-se a Lei de Biossegurança alcançam o índice de 1,3kg/habitante/dia.
(Lei nº 8.974/95); a Lei da Política Nacional de Recursos Hí- É preciso, então, descobrir os motivos pelos quais existe tan-
dricos (Lei nº 9.433/97); a Lei dos Crimes e Infrações Admi- ta distância entre o que está previsto na lei e o que se ope-
nistrativas Ambientais (Lei nº 9.605/98); o Decreto que a re- ra na realidade.
gulamentou (Decreto nº 3.179/99); a Lei do Sistema
Para tanto, propõe-se uma abordagem crítica do sistema
Nacional de Unidades de Conservação (Lei nº 9.985/00); a
gestão ambiental brasileiro.
Medida Provisória que alterou o Código Florestal (MP nº
1.956-55/00); e a Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade).
Entretanto, se a legislação ambiental brasileira é considera- 2. Repartição de Competências Constitucionais:
da muito boa, por si só isso não é suficiente para a melhoria
O Brasil é uma República Federativa3 e a noção de federa-
da qualidade ambiental no País, o que revela a dissonância ção implica a descentralização de poder.4 Em conseqüência,
entre a lei e a real aplicação do direito. o ordenamento jurídico brasileiro reconhece competência
Exemplo disso é a recente publicação dos resultados da para legislar, exercer poderes e organizar-se administrativa-
Pesquisa Nacional de Saneamento Básico2 realizada pelo mente a todos os entes da Federação.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE que re- Como adverte SILVA,5 ao contrário do que ocorre na maioria
velou, mais uma vez, as dificuldades na implementação das das federações, onde a divisão de poder é dual (União e Es-
normas de proteção ambiental no Brasil. tados-membros), no Brasil os Municípios são reconhecidos
Segundo a referida pesquisa, 47,8% dos municípios brasilei- como entidades autônomas, dotadas de governos próprios e
ros não têm serviço de esgoto sanitário; 68,5% dos resíduos competências exclusivas.
das grandes cidades são jogados em lixões e alagados; e só Assim, a Constituição Federal Brasileira reparte o poder pa-
451 das cidades fazem coleta seletiva de detritos, embora ra o exercício das políticas públicas entre a União, os Esta-
97,9% delas contem com coleta de lixo. dos-membros, o Distrito Federal e os Municípios.

1
Procuradora de Justiça, Coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público do Estado do
Rio Grande do Sul, Presidente da Associação Brasileira do Ministério Público de Meio Ambiente – ABRAMPA, Secretária-Geral do Instituto
o Direito por um Planeta Verde, Especialista em Ecologia Humana e Professora de Direito Ambiental.
2
Pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, publicada na Revista Isto É, 3.4.02, reportagem denomina-
da País Sujo, pp. 74/82.
3
Art. 1º, caput, da Constituição Federal.
4
Farias, A., J. L. (1999). Competência Federativa e Proteção Ambiental, Sergio Fabris Editor, Porto Alegre, p. 113.
5
Da Silva, J. A. (1988).Curso de Direito Constitucional Positivo, 5a. Edição, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, p. 538.

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2.1.Divisão das Competências Constitucionais pelo Cri- Por fim, a competência suplementar, prevista no art. 24,
tério da Extensão: parágrafos 2º, 3º e 4º, da Constituição Federal é deriva-
da da competência concorrente. Por ela, os Estados-
Ainda de acordo com SILVA,6 a competência divide-se, pelo
critério da extensão, em exclusiva, privativa, comum, conco- membros podem complementar a legislação federal para
rrente e suplementar. atender às suas peculiaridades regionais ou, diante da
inexistência de legislação federal sobre o assunto, exer-
A competência exclusiva é atribuída a uma entidade com cer a competência legislativa plena até que sobrevenha
exclusão das demais. O art. 21, da Constituição Federal a lei federal sobre o mesmo assunto, ocasião em que a
endereça poderes exclusivos à União. Nas matérias arro- legislação estadual terá sua eficácia suspensa no que
ladas nos incisos do mencionado artigo, como é exemplo contrariar àquela. Pode-se exemplificar com inúmeras
a energia nuclear (art. 21, inciso XXIII), somente a União leis ambientais que são suplementadas pelos Estados
pode agir. Há um monopólio dela para toda e qualquer como lei de agrotóxicos, código florestal, lei de recursos
ação envolvendo energia nuclear, desde a pesquisa, lav- hídricos, de resíduos sólidos, de biossegurança, etc.
ra, transporte até destinação final dos resíduos, sem es-
quecer da exploração da usina que opere com reator nu- Pode-se argumentar, por outro lado, a inutilidade da divisão
clear.7 Não há possibilidade de delegação de acima realizada, porque quem é competente para gerar a
competência ou de competência suplementar aos Esta- norma, o será para fiscalizá-la. Ou, em outras palavras, só
dos-membros ou aos Municípios nas matérias referentes poderá exercer a competência comum quem agregar o po-
à competência exclusiva. der de legislar sobre a mesma matéria.
A competência privativa, prevista no art. 22, difere da ex-
clusiva em dois aspectos: enquanto a competência ex-
clusiva é para agir, a privativa é para legislar. Ademais, a 2.2.Competência para legislar em meio ambiente:
privativa admite delegação de competência e competên-
cia suplementar, o que não ocorre na primeira espécie de A competência para legislar em matéria ambiental na Cons-
competência. Exemplos de competência privativa da tituição de 1988 seguiu o modelo da descentralização, que já
União para legislar sobre recursos ambientais são as era preconizado pela Lei nº 6.938/81.
previstas nos incisos IV (águas e energia); XI (trânsito e
transporte); XII (jazidas, minas, outros recursos minerais Assim, ao contrário do que ocorreu nas Cartas de 1946,
e metalurgia); e XIV (populações indígenas). 1967 e sua Emenda nº 1, de 1969, que davam competência
exclusiva à União para legislar sobre florestas9, por exemplo,
A competência comum, também denominada cumulativa a Constituição Federal de 1988 previu competência conco-
ou paralela, está prevista no art. 23, da Carta Magna que rrente para legislar em meio ambiente.
traduz o chamado federalismo cooperativo. Trata-se de
um elenco de atividades, entre as quais se inclui o exer- Caberá à União legislar sobre normas gerais e aos Estados
cício do poder de polícia administrativo-ambiental, ende- e Distrito Federal suplementar esta legislação. Inexistindo
reçado, simultaneamente à União, Estados-membros, norma geral sobre matéria de competência concorrente, os
Distrito Federal e Municípios. É também denominada de Estados exercerão competência legislativa plena. Por fim, a
competência administrativa ou executiva, por traduzir ta- superveniência de norma federal geral suspende a eficácia
refas ou ações que devem ser exercidas por todos os en- da lei estadual no que lhe for contrário.
tes da federação. Esta é a redação do art. 24, da CF:
A competência concorrente é elencada no art. 24 e dirigi- “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Fede-
da à União, Distrito Federal e Estados. Trata-se de com- ral legislar concorrentemente sobre:
petência para legislar em sentido formal.8 A matéria am-
biental é inserida nesse dispositivo constitucional, mais ...
precisamente nos incisos VI (florestas, caça, pesca, fau- VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza,
na, conservação da natureza, defesa do solo e dos recur- defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio
sos naturais, proteção do meio ambiente e controle da ambiente e controle da poluição;
poluição); VII (proteção ao patrimônio histórico, cultural,
artístico, turístico e paisagístico); e VIII (responsabilidade VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, tu-
por dano ao meio ambiente); rístico e paisagístico;

6
Obra citada, onde o autor define competência como “a faculdade atribuída a uma entidade ou a um órgão do poder público para emitir
decisões. Modalidade de poder para realizar suas funções.”
7
Que, de acordo com o art. 225, parágrafo 6º, deve ter sua localização previamente definida em lei federal, sem o que não poderá operar.
8
Isto é, lei que contemple o processo legislativo, o que não se confunde com as medidas provisórias, os decretos, as resoluções e outros
atos jurídico-normativos.
9
Affonso Leme Machado, P. Emenda Constitucional nº 1/69, art. 8º, XVII, letra h, em Direito Ambiental Brasileiro, 9a edição, São Paulo
Malheiros, p. 113.

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VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao con- Em matéria ambiental, a fiscalização compete paralelamen-
sumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, his- te à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí-
tórico, turístico e paisagístico; pios, nos seguintes termos:
Parágrafo 1º. No âmbito da legislação concorrente, a compe- “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do
tência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. Distrito Federal e dos Municípios:
Parágrafo 2º. A competência da União para legislar sobre III – proteger os documentos, as obras e outros bens de va-
normas gerais não exclui a competência suplementar dos lor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as pai-
Estados. sagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
Parágrafo 3º. Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os
IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de
Estados exercerão a competência legislativa plena, para
obras de arte e de outros bens de valor histórico, artísti-
atender a suas peculiaridades.
co ou cultural;
Parágrafo 4º. A superveniência de lei federal sobre normas
gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em
contrário.” qualquer de suas formas;

Assim, em meio ambiente, como nas outras matérias onde VII – preservar as florestas, a fauna e a flora; ...”
há competência concorrente, à União compete legislar sobre Percebe-se, pois, que a Constituição Federal confere um po-
“normas gerais”, isto é, às matérias e questões de predomi- der-dever a todos os entes da federação, simultaneamente,
nante interesse geral, nacional, enquanto aos Estados toca- para a realização das atividades elencadas nos incisos do
rá as matérias e assuntos de predominante interesse regio- art. 23.
nal. Normas gerais são aquelas que se limitam à fixação de
diretrizes, dos princípios gerais que serão especificados pe- A competência comum expressa o chamado federalismo
los Estados para atender às suas peculiaridades regionais. cooperativo que apregoa regras de cooperação entre a
União e os Estados e entre estes e os Municípios. Nesse
sentido, o parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal
2.2.1.Competência dos Municípios para legislar sobre Meio prevê que “lei complementar fixará normas para a coopera-
Ambiente: ção entre a União e o Estados, o Distrito Federal e os Muni-
Os Municípios não figuram no caput do art. 24 da Constitui- cípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do
ção Federal, daí surgindo dúvida sobre a possibilidade de le- bem-estar em âmbito nacional.”
gislarem em matéria ambiental. Entretanto, passados quatorze anos da promulgação da
Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interes- Carta Magna, não houve a esperada publicação da Lei Com-
se local e suplementar a legislação federal e estadual, no plementar que disciplinaria o federalismo cooperativo.
que couber. Essa é a dicção do art. 30, incisos I e II da Cons- Diante de tal omissão, como agir na hipótese de eventual
tituição Federal. conflito ou de superposição de ações por parte dos entes fe-
Há unanimidade doutrinária sobre a possibilidade de os muni- derativos?
cípios legislarem sobre meio ambiente, especialmente suple-
mentando a legislação federal e estadual, mas o alcance des-
sa possibilidade constitucional é restrito ao interesse local. 2.3.1. Conflito administrativo de gestão ambiental:

Para Freitas10, “a competência municipal existe e pode ser Se todos os entes políticos da federação podem e devem
exercida, porém não com o alcance atribuído à União e aos exercer as atividades previstas no art. 23 da Lei Maior, entre
Estados. Realmente, esta intenção não teve o constituinte, as quais se inclui a fiscalização ambiental, o que fazer dian-
pois, expressamente, excluiu os Municípios do poder conco- te de duplicidade de ações?
rrente previsto no art. 24 da Lei Maior.” Se não há definição constitucional de preferência, isso não
Maior debate ocorre com relação à extensão da competên- poderá acarretar a omissão de todos?
cia municipal nas matérias consideradas de competência co- Essas perguntas são respondidas afirmativamente. Esse é o
mum, especialmente na hipótese de conflito, como adiante grande problema do federalismo cooperativo no Brasil. É o
se verá. fato de ele existir apenas retoricamente e, não de fato.
Vejamos o que a legislação infraconstitucional nos diz a res-
2.3.Competência para a Fiscalização das Agressões Am- peito:
bientais e para o Licenciamento de Atividades Degra-
O art. 14, inciso I, da Lei nº 6.938/81 veda a cobrança da
dadoras ou Poluidoras:
multa simples ou diária, imposta à infração administrativa,
A competência para o exercício do poder de polícia adminis- pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Fe-
trativa, onde se localiza a atividade fiscalizadora, é comum, deral, Territórios ou pelos Municípios. O parágrafo 2º do
cumulativa ou paralela, expressões tidas como sinônimas. mesmo artigo afirma que “no caso de omissão da autorida-

10
Passos de Freitas, V. Direito Administrativo e Meio Ambiente, Curitiba, Juruá, 3a Edição, pp. 38 e 39.

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de estadual ou municipal, caberá ao Secretário de Meio Am- comunitário verificado com o alargamento de competências
biente (hoje ao Ministro de Meio Ambiente) a aplicação das implícitas em favor da Comunidade.13
penalidades pecuniárias previstas neste artigo.”
Por esse princípio, nos domínios que não sejam das atribui-
Poder-se-ia afirmar que a legislação acima mencionada não ções exclusivas, a Comunidade apenas intervém de acordo
foi recepcionada, nesse particular, pela Constituição Fede- com o princípio da subsidiariedade, se e na medida em que
ral, que lhe é posterior. Entretanto, a recente Lei dos Crimes os objetivos da ação não possam ser suficientemente reali-
e Infrações Administrativas Ambientais (Lei nº 9.605/98) re- zados pelos Estados-membros e possam ser, diante da di-
produz semelhante dispositivo legal: mensão ou dos efeitos da ação prevista, ser melhor alcança-
dos ao nível comunitário.14
“Art. 76. O pagamento de multa imposta pelos Estados, Mu-
nicípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa fede- Em suma, este princípio prega que as decisões serão toma-
ral na mesma hipótese de incidência.” das pelo nível político mais baixo, por aqueles que estão
mais próximos da situação potencialmente lesiva. Trata-se
Verifica-se, portanto, que o legislador optou, novamente, pe-
de um processo de descentralização política e administrati-
lo poder local ou regional, em detrimento do poder federal,
va associado ao fortalecimento do poder local.
na aplicação da sanção administrativa pecuniária.
Aliás, tal dispositivo está sendo questionado em ação judicial
que tramita no Estado do Paraná. Ocorre que, em janeiro de 2.3.1.2. Descentralização na Agenda 21 e exemplo de sua
2001, a Petrobrás, empresa pública federal, foi responsável aplicação no Brasil:
pelo derramamento de milhões de litros de óleo na Baía de
A cooperação entre países, entre diferentes níveis de gover-
Guanabara, no Rio de Janeiro. No mês de julho do mesmo
no, nacionais e locais e entre vários segmentos da socieda-
ano, na região metropolitana de Curitiba, Estado do Paraná,
de é enfatizada, fortemente, em todo o documento da Agen-
a mesma empresa também deu causa ao derramamento de
da 21.
óleo numa refinaria. Na primeira hipótese, o órgão federal in-
cumbido da execução da política pública, o IBAMA, havia Os princípios da cooperação e parceria apresentam-se co-
aplicado sanção pecuniária, no valor máximo permitido pela mo conceitos fundamentais na implementação da Agenda
Lei 9605/98, ou seja, R$ 50 milhões.11 Quando ocorreu o se- 21.
gundo fato, para o IBAMA, a Petrobrás era reincidente espe-
Indicativo da idéia de descentralização constante desse Do-
cífica, o que lhe permitia triplicar o valor da multa, nos termos
cumento é, v. g., o item 8.5., concernente à melhoria dos sis-
do art. 10, parágrafo único, do Decreto nº 3.179/99.12 Embo-
temas de planejamento e manejo, alíneas g e h, assim redi-
ra sabedor de tal fato, o Estado do Paraná, através de seu
gidos:
órgão executor, aplicou a multa, no valor de R$ 50 milhões.
O exemplo bem revela o conflito entre dois entes da federa- “(g) Delegar responsabilidades de planejamento e mane-
ção que atualmente disputam judicialmente os valores das jo aos níveis mais inferiores da autoridade pública sem-
multas aplicadas. pre que isso não signifique comprometer a eficácia; em
especial, devem ser discutidas as vantagens de se ofere-
Considero a legislação citada como inconstitucional. Isso
cerem às mulheres oportunidades eficazes e eqüitativas
porque, diante da competência comum e da inexistência da
de participação;
Lei Complementar a regrar o federalismo cooperativo, deve-
ria preponderar o critério da predominância do interesse. (h) Estabelecer procedimentos de inclusão das comuni-
dades locais nas atividades de planejamento para a
Mas qual é o interesse predominante se o dano ocorreu den-
eventualidade de ocorrerem acidentes ambientais e in-
tro do território de um Estado que, por sua vez, encontra-se
dustriais e manter ativa troca de informações sobre as
dentro do território nacional?
ameaças locais.”
Talvez o critério da predominância do interesse não seja o
melhor para a interpretação sobre a incidência da norma na
hipótese de conflito positivo. É preciso, assim, achar-se ou- Quanto ao estabelecimento de uma estrutura jurídica e regu-
tro critério. lamentadora eficaz, diz a Agenda 21 que a base para a ação
tem como objetivos:
• “8.16. O objetivo geral é promover, à luz das condições es-
2.3.1.1. Princípio da Subsidiariedade:
pecíficas de cada país, a integração entre as políticas de
O princípio da subsidiariedade surgiu no Tratado da União meio ambiente e desenvolvimento por meio da formulação
Européia para frear o processo de agigantamento do poder de leis, regulamentos, instrumentos e mecanismos coerciti-

11
De acordo com o art. 75 da Lei nº 9.605/98.
12
Que regulamenta a Lei nº 9.605/98.
13
Siqueira da Cunha, A. M. (1995). O princípio da Subsidiariedade na União européia, Revista Forense, vol. 332, out/dez, p. 421. Rio de
Janeiro, citado por Paulo Leite Farias, op. cit., p. 317.
14
Idem, ibidem, p. 318.

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vos adequados ao nível nacional, estadual, provincial e lo- mento ambiental, baseada na magnitude dos impactos ou na
cal... com os seguintes objetivos: localização dos empreendimentos e atividades.
(a) Disseminar informações sobre inovações legais e re-
gulamentadoras eficazes na área de meio ambiente e de-
senvolvimento, inclusive instrumentos coercitivos e in- 2.3.1.3. In Dubio pro Natura:
centivos para a observância, com vistas a estimular seu Por fim, um último critério pode ser adotado para a solução
uso e adoção ao nível nacional, estadual, provincial e lo- do conflito quanto à aplicação da legislação ambiental. É o
cal; ... princípio do in dubio pro natura ou da lei mais restritiva.
(c) Estimular o desenvolvimento e implementação de Tratando-se de competência comum, as normas que não fo-
programas nacionais, estaduais, provinciais e locais que rem conflitantes convivem, cada uma vigendo no seu territó-
avaliem e promovam a observância das leis e reajam rio. Havendo conflitos, entretanto, deve prevalecer a lei mais
adequadamente a sua não-observância.” restritiva.21 Essa regra tem uma razão lógica. Se cada ente
Enfim, são inúmeras as passagens da Agenda 21, aqui re- da federação é competente para editar sua legislação e se
produzidas apenas a título exemplificativo, que revelam o ca- cada uma vige em seu território, não há razão para editar lei
ráter descentralização da atuação estatal preconizada para menos restritiva, na medida em que a finalidade da norma de
a área de meio ambiente. direito ambiental –desenvolvimento sustentado– seria alcan-
çada pela norma de esfera superior, no caso de não edição
Exemplo de descentralização no Brasil é a Resolução do
da norma. Em outras palavras, só há razão para editar nor-
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA nº 237/97,
ma de direito ambiental numa esfera territorial de menor
que trata sobre o licenciamento ambiental.
abrangência se esta for destinada a conferir maior proteção
Por essa Resolução, que tem eficácia de lei,15 compete ao ór- ao bem jurídico meio ambiente.
gão federal (IBAMA), o licenciamento de atividades localiza-
das ou desenvolvidas no Brasil e em país limítrofe, cujos im- O princípio do in dúbio pro natura chega aos mesmos resul-
pactos ambientais ultrapassem o país, atividades tados da aplicação da lei mais restritiva. Nos casos em que
desenvolvidas ou localizadas em mais de um Estado ou cu- não for possível uma interpretação unívoca, havendo confli-
jos impactos ambientais ultrapassem mais de um Estado, das to entre norma geral e especial, deve preponderar a interpre-
atividades que envolvam energia nuclear e, por fim, em- tação mais favorável à proteção ambiental. O conflito é resol-
preendimentos ou base militares.16 Aos órgãos estaduais17 de vido pela aplicação da norma de maior restritividade.
meio ambiente (Secretarias Estaduais de Meio Ambiente) Na lição de FARIAS22 “teleologicamente assegura-se a pos-
compete o licenciamento de atividades localizadas ou desen- sibilidade de norma estadual estabelecer proibições, onde a
volvidas em mais de um município ou cujos impactos ultra- lei federal permita, bem como que a lei federal estabeleça
passem mais de um município, em unidades de conservação patamares mínimos de proteção ambiental a serem observa-
estaduais e em áreas de preservação permanente definidas dos em todo o País, dando-se efetividade à proteção am-
no art. 2º da Lei nº 4.771/6518 (Código Florestal). biental e ao desenvolvimento auto-sustentável.”
Por fim, aos municípios compete o licenciamento de ativida-
Em suma, as normas gerais, estabelecidas pela União dão a
des e empreendimentos de impacto local19 ou daqueles de-
sustentação ao sistema de proteção de meio ambiente e os
legados pelo Estado, por instrumento legal ou convênio.
Estados ou os Municípios não podem destruí-lo editando leis
Percebe-se, pois, nitidamente, a tendência descentralizado- menos restritivas. O planejamento, a estrutura do sistema, é
ra da Resolução20 ao dividir a competência para o licencia- incumbência da União.

15
Porque a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente confere expressamente esta competência ao CONAMA – art. 8º, inciso i, Lei 6938/81.
16
Art. 4º, incisos I a V, da Resolução CONAMA nº 237/97.
17
Art. 5º, incisos I a IV, da Resolução CONAMA nº 237/97.
18
O artigo 2º do Código Florestal arrola as áreas de preservação por força de lei. Entre outras, destaca-se o topo de morros e as margens
de qualquer curso d’água, cuja extensão depende da largura do referido curso d’água.
19
Art. 6º, da Resolução CONAMA nº 237/97.
20
Alguns autores, como Francisco Van Acker, em Breves considerações sobre a Resolução 237, Revista de Direito Ambiental nº 8,
pp.165/169; Paulo Affonso Leme Machado, Direito Ambiental Brasileiro, Malheiros, 9a Edição, 2001 e ANDRADE, Filippe Augusto Vieira
de, Resolução CONAMA 237, de 19.12.97: um ato inválido pela eiva da inconstitucionalidade e da ilegalidade, Revista de Direito
Ambiental, 13, jan-mar 99, pp. 105/115, consideram a previsão de licenciamento ambiental pelos Municípios, feita pela Resolução
237/97 como inconstitucional, por definir que o licenciamento ambiental será realizado num único nível de competência (art. 7º) extrap-
olando o conteúdo do art. 23 da CF e por desbordar do art. 10 da Lei nº 6.938/81 que define como competente para o licenciamento o
órgão estadual do Sistema Nacional do Meio Ambiente.
21
Mukai. T. A. (1992). Direito Ambiental Sistematizado. Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 20.
22
Obra citada, p. 356.

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3. O Capítulo próprio para o meio ambiente na rão o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, as-
Constituição Federal de 1988 sim estruturado:
I – Órgão Superior: o Conselho de Governo, com a fun-
A Carta Magna de 1988, pela primeira vez na história legis- ção de assessorar o Presidente da República, na formu-
lativa brasileira, dedicou um capítulo próprio para o meio am- lação da política nacional e nas diretrizes governamen-
biente e reconheceu-o como bem jurídico. tais para o meio ambiente e os recursos ambientais;
Antes de 88, as Constituições previam a matéria ambiental II – Órgão Consultivo e Deliberativo: o Conselho Nacio-
de forma setorizada, em normas como as que afirmavam a nal do Meio Ambiente – CONAMA, com a finalidade de
propriedade do subsolo à União, que conferiam competência assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo,
para legislar sobre florestas, caça, pesca, energia, águas, diretrizes de políticas governamentais para o meio am-
etc. biente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de
Atualmente, o art. 225, caput, da Constituição da República sua competência, sobre normas e padrões compatíveis
consagra que “todos têm direito ao meio ambiente ecologi- com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e es-
camente equilibrado, bem de uso comum do povo e essen- sencial à sadia qualidade de vida;
cial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público
III – Órgão Central: Secretaria do Meio Ambiente da Pre-
e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
sidência da República,26 com a finalidade de planejar,
presentes e futuras gerações.”
coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal,
Percebe-se, ainda que implicitamente,23 o princípio do de- a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas
senvolvimento sustentado ao definir o direito não só às pre- para o meio ambiente;
sentes, como às futuras gerações, ao meio ambiente ecolo-
IV – Órgão Executor: o Instituto Brasileiro do Meio Am-
gicamente equilibrado.
biente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA,
Ademais, a Constituição Federal reconhece autonomia ao com a finalidade de executar e fazer executar, como ór-
bem jurídico meio ambiente, inconfundível com os recursos gão federal, a política e diretrizes governamentais fixa-
ambientais24 que dele fazem parte, categorizando-o como das para o meio ambiente;
bem de uso comum do povo. Destarte, afirma-se que o meio
V – Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades esta-
ambiente é bem público, insuscetível de apropriação priva-
duais responsáveis pela execução de programas, proje-
da, cujo usufruto, com os qualificativos de higidez e equilíbrio tos e pelo controle e fiscalização das atividades capazes
ecológico, é garantia de toda a população brasileira. de provocar degradação ambiental;
Nos parágrafos e incisos que se seguem ao caput do art. VI – Órgãos Locais: os órgãos ou entidades municipais,
225, a Constituição elenca uma séria de atividades públicas responsáveis pelo controle e fiscalização dessas ativida-
que devem ser desenvolvidas para garantir a higidez e equi- des, nas suas respectivas jurisdições.”
líbrio ecológico do meio ambiente. Tais atividades retratam
uma competência comum à União, Distrito Federal, Estados- O Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA é estru-
membros e Municípios.25 turado nas três esferas de poder, União, Estados e Municí-
pios, além de contar com um órgão colegiado, o Conselho
Nacional de Meio Ambiente, com caráter consultivo e delibe-
4. Sistema Nacional de Meio Ambiente - rativo.
SISNAMA São órgãos executores do SISNAMA no plano federal, o IBA-
MA27 (inciso IV); estadual ou seccional, as Secretarias Esta-
O Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, vem ex- duais de Meio Ambiente (inciso V); e municipal ou local, as
presso no art. 6º, da Lei nº 6.938/81, nos seguintes termos: Secretarias Municipais de Meio Ambiente (inciso VI).
• “Art. 6º. Os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Verifica-se que a idéia de descentralização está presente na
Distrito Federa, dos territórios e dos Municípios, bem como estruturação do SISNAMA e se coaduna com a competência
as Fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis constitucional comum.28 A gestão ambiental e, conseqüente-
pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constitui- mente, a execução das políticas públicas ambientais no Bra-

23
Benjamin, A. H. Pela adoção implícita e sem definição do conceito de desenvolvimento sustentável na legislação brasileira.
Desenvolvimento Sustentável: um conceito juridicamente insustentável?, IV Seminário Internacional de Direito Ambiental, Brasília,
auditório do STJ, 6 e 7 de maio de 2002. www.cjf.gov.br
24
O conceito de recursos ambientais encontra-se no art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/81.
25
A única exceção é a prevista no parágrafo 6º do art. 225, que se refere à localização de usina nuclear, competência privativa da União,
através de lei federal.
26
Atualmente, Ministério do Meio Ambiente.
27
Autarquia Federal criada pela Lei nº 7.735, de 22.2.89.
28
Do art. 23, da CF.

54
ASPECTOS INSTITUCIONALES, COORDINACIÓN INTERJURISDICCIONAL Y ORGANIZACIÓN ADMINISTRATIVA

sil, incluindo a fiscalização e o licenciamento ambiental, é de órgãos encarregados da execução das políticas ambien-
distribuída a todos os entes da federação. tais, como é o caso dos Municípios, ora à superposição en-
tre órgãos de esferas distintas, como é exemplo a atuação
do IBAMA e dos Estados. Por fim, também órgãos que não
4.1. Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA: integram o SISNAMA tentam se sobrepor a ele, exercendo
competências que não lhe são outorgadas pela legislação.
O Conselho Nacional de Meio Ambiente é o órgão consulti-
vo e deliberativo do Sistema Nacional de Meio Ambiente – Muito embora a Lei nº 6.938/81 tenha idealizado pelo Siste-
SISNAMA. Trata-se de um órgão colegiado de grande rele- ma Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA33 a estrutura dos
vo na gestão ambiental brasileira, Reúne-se na Capital Fe- órgãos dedicados à realização da gestão ambiental em nos-
deral e é composto de Plenário, Comitê de Integração de Po- so país, o certo é que o sistema tem-se demonstrado inefi-
líticas Ambientais, Câmaras Técnicas, Grupos de Trabalho e ciente, caracterizando-se por diversos conflitos de ação ins-
Grupos Assessores.29 titucional.34
O esperado federalismo cooperativo não é aplicado. Inexis-
4.1.1. Competência do Conselho Nacional de Meio Ambiente: te coordenação entre as esferas administrativas distintas e,
A competência do CONAMA vem definida no art. 8º, da Lei até, entre esferas administrativas de mesmo nível hierárqui-
nº 6.938/81 e no art. 7º, do Decreto nº 3.942, de 27.9.02. co. No mais das vezes o que se vê é, alternativamente, a
Destaca-se a sua competência para editar atos jurídicos nor- omissão de todos os órgãos ou a competição entre eles pa-
mativos com força de lei, em matéria de licenciamento am- ra o exercício do licenciamento ambiental ou aplicação das
biental, além de editar padrões de qualidade para o meio sanções administrativas.
ambiente, de decidir em última instância recursos adminis- No Rio Grade do Sul, por exemplo, o IBAMA negou-se a
trativos e de exigir estudos e documentos complementares aceitar que parte das medidas compensatórias devidas por
ao licenciamento ambiental, na hipótese de realização de es- ocasião do licenciamento da hidroelétrica de Itá revertessem
tudo de impacto ambiental.30 para unidades de conservação estaduais, sob o argumento
Integram o plenário do CONAMA,31 51 membros ou consel- de que o licenciamento era federal. Também é comum a dis-
heiros, distribuídos entre órgãos governamentais (governo puta entre pastas de um mesmo ente político, numa verda-
federal, estaduais e municipais), organizações não-governa- deira medição de forcas entre secretarias como planejamen-
mentais, representantes de trabalhadores e de empresários, to, meio ambiente e cultura, por exemplo, cujos pareceres
de entidades profissionais, da comunidade indígena e da co- nem sempre se encontram, ensejando decisões administra-
munidade científica. Além disso, participam do CONAMA, tivas anacrônicas em detrimento de posições tecnicamente
com voz, mas sem direito a voto,32 um representante do Mi- abalizadas.
nistério Público Federal, um do Ministério Público dos Esta- A desarticulação entre o poder público de esferas distintas,
dos e um da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Am- ou mesmo dentro de um mesmo ente político, tem propicia-
biente e Minorias da Câmara dos Deputados. do o fortalecimento do setor privado, esse historicamente or-
Dada a correlação atual de forças no Legislativo Federal e à ganizado, fazendo com que o Estado se mantenha refém de
morosidade, ínsita ao processo legislativo, o CONAMA tem decisões implementadas à sua revelia, tornando-o um mero
avultado em importância como órgão “legislador” no Brasil. mitigador de impactos previamente engendrados.
Tal situação tem sido objeto de muitas críticas no meio jurí- O que se percebe é a inexistência de cooperação e de coor-
dico-ambiental. Não obstante isso, destaca-se o caráter de- denação entre esferas administrativas distintas ou, sequer,
mocrático e o amplo espectro de participação social permiti- entre esferas do mesmo nível hierárquico.
do pela composição do CONAMA.
Ou todos se omitem, ou todos quer licenciar e aplicar san-
ções.
5. A crise do Sistema Nacional de Meio Ambiente Com relação ao licenciamento, talvez contribua para a ine-
xistência de articulação e coordenação entre os órgãos de
O Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA está em gestão, o fato de que o licenciamento tem como foco a ava-
crise. Os maiores problemas dizem respeito ora à omissão liação pontual de projetos, centrado na fase de avaliação

29
Art. 4º do Decreto nº 3.942, de 27 de setembro de 2001.
30
O estudo de impacto ambiental, instrumento da política nacional do meio ambiente, está previsto no art. 225, parágrafo 1º, inciso IV, da
CF e na Resolução nº 1/86 e 9/87 do CONAMA. É exigível para toda e qualquer atividade capaz de gerar significativa degradação ambi-
ental. Seu momento de realização é prévio ao licenciamento ambiental.
31
Art. 5º, incisos I a X, do Decreto nº 3.942/01.
32
Art. 5º, parágrafo 1º, incisos I a III, do Decreto nº 3.942/01.
33
Art. 6º.
34
Fernandes, E. Assim, também Legislação Ambiental Brasileira: panorama e breve avaliação, Curso de Direito Urbanístico à distância,
PUC/MG.

55
1º CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE APLICACIÓN Y CUMPLIMIENTO DE LA NORMATIVA AMBIENTAL EN AMÉRICA LATINA - FARN

prévia. O planejamento ambiental, via zoneamento, fora do 4. existência de conselhos de meio ambiente com repre-
nível municipal, poderia contribuir para mudar este cenário. sentação paritária da sociedade civil;
Por fim, problema bastante recente no Brasil é a tentativa do 5. existência de fundos municipais de meio ambiente;
exercício do licenciamento ambiental por órgão exógeno ao
6. definição de prioridades em conjunto (União, Estados e
Sistema Nacional de Meio Ambiente. Trata-se da discussão
Municípios);
em torno da biotecnologia. A legislação brasileira de biosse-
gurança (Lei nº 8974/95) determina a intervenção dos Minis- 7. gestão compartilhada (exemplo – definição e implemen-
térios da Agricultura, Saúde, Meio Ambiente e Ciência e Tec- tação de regras para o licenciamento e fiscalização lo-
nologia, na aferição dos critérios de segurança agronômica, cais)
toxicologia, licenciamento ambiental e biossegurança para o
8. fiscalização da gestão compartilhada pelo Conselho do
exercício de atividades de biotecnologia no País. Entretanto,
Meio Ambiente (Conselho Estadual fiscalizando a ação
a Comissão Nacional Técnica de Biossegurança (CTNBio)
do Município);
tem sustentado sua competência para o licenciamento, in-
clusive ambiental, de organismos geneticamente modifica- 9. deslocamento do licenciamento para um nível mais es-
dos, em detrimento do Ministério do Meio Ambiente e do tratégico: programas prioritários, licenciamento conjunto,
Conselho Nacional de Meio Ambiente, a quem compete de- consórcio de municípios;
finir as normas de licenciamento. A matéria está sub judice, 10. ampla participação popular (especialmente com assento
sendo mais um exemplo de falta de articulação do sistema. nos conselhos e através das audiências públicas).

5.1. Algumas propostas para minimizar a crise do Sistema: 6. O papel do Ministério Público
Se é certo concluir que a implementação dos ditames da
Agenda 21 exige investimentos na descentralização admi- O Ministério Público é definido no art. 127 da Constituição
nistrativa, também é verdade que esta descentralização não Federal como “instituição permanente, essencial à função ju-
pode se dar sem cautelas. risdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem ju-
rídica, do regime democrático e dos interesses sociais e in-
Isso ocorre porque os Municípios não têm tradição na ges-
dividuais indisponíveis”.
tão ambiental, ao passo em que, também, dada a proximida-
de entre governantes e forças econômicas locais é razoável Adiante, o art. 129, inciso III, da Carta Magna afirma ser fun-
supor que haverá considerável pressão sobre as decisões ção institucional do Ministério Público “promover o inquérito
locais. civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio pú-
blico e social, do meio ambiente e de outros interesses difu-
A gestão ambiental local deve limitar-se às atividades cujos
sos e coletivos.”
impactos não ultrapassem os limites territoriais do município,
sob pena de invasão da esfera local de área de interesse es- No Brasil, o Ministério Público praticamente detém o mono-
tadual, com efetivo dano ao meio ambiente. É preciso assi- pólio da ação civil pública ambiental, muito embora o art. 5º,
nalar que a grande maioria dos empreendimentos sujeitos da Lei nº 7.347/85 legitime, também, a União, Estados, Mu-
ao licenciamento geram impactos para além do território de nicípios, Autarquias, Empresas Públicas, Fundações, Socie-
um município e, por isso, deverão ser licenciados pelo Esta- dades de Economia Mista ou por Associação (ONG ambien-
do. Exemplo: a maior parte dos casos de poluição hídrica e tal). Em 1992, como documento preparatório à participação
atmosférica. Ademais, não se pode esquecer o sinergismo do Ministério Público na Rio 92, a Confederação Nacional do
entre as atividades que poderá potencializar um impacto que Ministério Público efetuou levantamento estatístico sobre a
numa primeira análise seja local. autoria das ações civis públicas em matéria de meio ambien-
te que tramitavam no País, ocasião em que constatou a no-
Como propostas para a implementação da gestão local é tável cifra de 97,6% correspondendo à iniciativa do Ministé-
preciso levar em conta o seguinte: rio Público.
1. necessidade de definição concreta de competências de O Ministério Público tem como tarefas, entre outras, a tutela
cada ente da federação, através da promulgação de Lei judicial e extrajudicial do meio ambiente. A última tem avulta-
Complementar, nos termos do art. 23 da Constituição Fe- do em importância ultimamente.35 Essa tutela extrajudicial se
deral; dá de inúmeras formas: celebração de compromissos de
ajustamento,36 que vale como título executivo extrajudicial;
2. capacitação dos gestores municipais;
criação de Promotorias Regionais, Temáticas e Volantes;
3. linhas de financiamento federal para a solução de proble- participação nos Conselhos Nacional e Estaduais de Meio
mas ambientais locais (exemplo – coleta seletiva de lixo Ambiente; criação de conselhos internos para definir priori-
e destino adequado dos resíduos sólidos); dades e linhas de atuação institucional, etc.

35
Cappelli, S. (2002). Atuação Extrajudicial do MP na tutela do Meio Ambiente. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, nº 46,
jan-mar, pp. 230/260, www.mp.rs.gov.br , centros de apoio, centro de apoio de defesa do meio ambiente, doutrina.
36
Art. 5º, parágrafo 6º, da Lei nº 7.347/85.

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ASPECTOS INSTITUCIONALES, COORDINACIÓN INTERJURISDICCIONAL Y ORGANIZACIÓN ADMINISTRATIVA

O Ministério Público, embora não tenha como tarefa institu- Agenda 21, publicação do Ministério Público do Estado do
cional participar da execução direta das políticas públicas Pará, série documentos, nº 1, Belém, 2000.
ambientais é um auxiliar muito importante na implementação
da defesa do meio ambiente. Andrade, F. A. V. Resolução CONAMA 237, de 19.12.97: um
Com relação à gestão ambiental e à proposta contida neste ato inválido pela eiva da inconstitucionalidade e da ilega-
trabalho –a da descentralização controlada–, o Ministério lidade, Revista de Direito Ambiental, 13, jan-mar 99, pp.
Público pode contribuir fiscalizando a atuação dos governan- 105/115;
tes, especialmente dos Prefeitos, processando-os civil (ação
por improbidade administrativa) ou criminalmente (crime am- Arruda, G. M C. Implementação de um Desenvolvimento
biental praticado por Prefeito). Sustentável, Anais do 1º Congresso Internacional de Di-
Além disso, o Ministério Público pode ser um coadjuvante da reito Ambiental, São Paulo, Instituto o Direito por um Pla-
implementação de políticas públicas ambientais, como é o neta Verde.
caso da experiência do Estado do Rio Grande do Sul com a
gestão compartilhada do licenciamento ambiental, exigindo Benjamin, A. H. V. Desenvolvimento Sustentável: um Con-
que os Municípios exerçam suas competências nesta área, ceito Juridicamente Insustentável? IV Seminário Interna-
além de participar ativamente dos Conselhos de Meio Am- cional Direito Ambiental, 6 e 7 de maio de 2002, Auditó-
biente. rio do Superior Tribunal de Justiça, www.cjf.gov.br

Capelli, S. A. Atuação Extrajudicial do MP na tutela do Meio


7. Conclusão Ambiente, Revista do Ministério Público do Rio Grande
do Sul, nº 46, jan-mar/2002, pp. 230/260.
Embora a gestão ambiental tripartite prevista na Constituição
Federal sofra vários percalços, especialmente pela impreci- Farias, P. J. L. (1999). Competência Federativa e Proteção
são de competências e pelas tentativas de burla ao sistema,
Ambiental, Porto Alegre, Sérgio Fabris Editor.
o certo é que o Brasil tem envidado esforços para a imple-
mentação das diretrizes da Agenda 21, rumando para a des- Fernandes, E. Legislação Ambiental Brasileira: panorama e
centralização da gestão ambiental. breve avaliação. Curso de Direito Urbanístico à distância,
Tal descentralização não é imune a críticas, no mais das ve- PUC/MG;
zes fundadas pelo receio de que a proximidade das forças
econômicas com as autoridades locais possa gerar danos ao Freitas, V. P. (2001). Direito Administrativo e Meio Ambiente.
meio ambiente. 3a edição, Curitiba, Juruá.
Para fazer frente a esta situação, é preciso que haja organis- Machado, P. A. L. (2001). Direito Ambiental Brasileiro. 9a.
mos de fiscalização e acompanhamento dessa descentrali-
Edição, São Paulo, Malheiros.
zação, como ocorre no Estado do Rio Grande do Sul, atra-
vés de Resoluções do Conselho Estadual de Meio Matos, E. L. (2001). Autonomia Municipal e Meio Ambiente.
Ambiente37 que prevêem uma comissão tri-partite que avalia
Belo Horizonte, Del Rey.
o pedido de habilitação do Município para atividades capa-
zes de gerar impactos locais. Moraes, A. (2002). Constituição do Brasil Interpretada, São
Por fim, nunca é demais lembrar que parte da inexecução Paulo, Editora Atlas.
das políticas de gestão tem relação com a antinomia entre
uma legislação ambiental de Estado máximo e a realidade Mukai, T. (1992). Direito Ambiental Sistematizado. Rio de Ja-
fática, que aplica a política de redução da capacidade exe- neiro, Forense Universitária.
cutiva do Poder Público.
PNUMA, na Oficina Regional para a América Latina, O De-
A preservação do meio ambiente é incompatível com a filo- senvolvimento do Direito Ambiental Latino Americano e
sofia do Estado Mínimo. Essa é a contradição que os países
em desenvolvimento precisam equacionar. sua Aplicação, Informação sobre as mudanças jurídicas
depois da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (RIO-92), 2001, México;
Referências Bibliográficas
Silva, J. A. da. (1988). Curso de Direito Constitucional Posi-
Acker, F. V. Breves considerações sobre a resolução 237, de tivo. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais.
19.12.97, do CONAMA, que estabelece critérios para o li-
cenciamento ambiental, Revista de Direito Ambiental, 8, Sobrinho, M. de O. F. (1995). Da Competência Constitucio-
out-dez 97, pp. 165/169. nal Administrativa. Curitiba, Editora Gênesis.

37
Resoluções 5/98, 4/00 e 10/00.

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