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PRINCIPAIS TEMAS EM
GINECOLOGIA &
OBSTETRÍCA

Daniel Ricardo dos Santos Cruz


MEDICINA – Turma 2014
FPS

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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ÍNDICE
1. Ciclo Menstrual..........................................................................................................04
2. Hormônios..................................................................................................................10
3. Anticoncepção............................................................................................................12
4. Climatério...................................................................................................................19
5. Amenorréia................................................................................................................24
Conceitos, fisiologia, amenorréia primária, amenorréia secundária e etiologia da amenorréia:
hipogonadismo hipogonadotrófico, atraso constitucional da puberdade, hiperprolactinemia, Síndrome
de Sheehan, anovulação crônica, falência ovariana precoce e malformações uterovaginais
6. Sangramento Uterino Anormal................................................................................29
7. Sangramento Uterino Disfuncional.........................................................................33
8. Lesões Uterinas Estruturais.....................................................................................36
Adenomiose, Pólipo endometrial, Pólipo cervical, Leiomioma uterino,
9. Infertilidade...............................................................................................................42
Infertilidade feminina, infertilidade masculina, Indutores da ovulação e reprodução assistida.
10. Endometriose.............................................................................................................46
11. Síndrome Anovulatória Crônica Hiperandrogênica..............................................50
12. Úlcera Genital............................................................................................................53
Abordagem sindrômica, sífilis, cancro mole, herpes genital, donovanose, linfogranuloma venéreo.
13. Corrimento Vaginal: Cervicite e Vulvovaginite......................................................58
Abordagem sindrômica, vaginose bacteriana, candidíase vulvovaginal, tricomoníase, cervicites
14. Corrimento uretral....................................................................................................61
Abordagem sindrômica, uretrite gonocócica, uretrite não-gonocócica
15. Doença Inflamatória Pélvica....................................................................................63
16. Mama: doenças Benignas..........................................................................................65
Mastalgia, Adensamentos e cistos, descarga papilar, nódulos
17. Câncer de mama........................................................................................................70
18. Câncer de endométrio................................................................................................74
Câncer de endométrio, hiperplasia endometrial.
19. Tumor neoplásico de ovário......................................................................................78
20. Câncer de colo de útero..............................................................................................82
Câncer de colo de útero, HPV
21. Histerectomia..............................................................................................................88
22. Gravidez......................................................................................................................89
23. Gravidez: Modificações no organismo materno......................................................91
24. Gravidez: Diagnóstico................................................................................................94
25. Pré-natal......................................................................................................................97
26. Infecções Perinatais....................................................................................................103
27. Sangramentos da Primeira Metade..........................................................................109
28. Abortamento...............................................................................................................109
29. Prenhez ectópica.........................................................................................................113
30. Doença trofoblástica gestacional...............................................................................116
31. Sangramentos da Segunda Metade...........................................................................120
Descolamento prematuro de placenta, Placenta prévia, Inserção anômala de placenta, Rotura de vasa
prévia, rotura do seio marginal, rotura uterina.
32. Incompatibilidade Materno Fetal.............................................................................125
33. Amniorrexe Prematura..............................................................................................127

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34. Prematuridade............................................................................................................130
35. Síndromes Hipertensivas na gravidez.......................................................................134
Síndromes hipertensivas, dopplerfluxometria
36. Diabetes Gestacional..............................................................................................,....140
37. Gemelaridade..............................................................................................................144
38. Parto: Introdução.......................................................................................................147
39. Estudo do Parto: Trajeto............................................................................................149
40. Estudo do Parto: Estática fetal..................................................................................150
41. Estudo do Parto: Motor..............................................................................................152
Fisiologia, indução do parto, índice de Bishop, inibição do parto e discinesia uterina
42. Estudo do Parto: Mecanismo.....................................................................................154
43. Assistência ao Parto ...................................................................................................156
Fisiologia, Manobras, Partograma
44. Cesariana.....................................................................................................................160
45. Fórcipe Obstétrico......................................................................................................163
46. Vácuo extrator.............................................................................................................165
47. Puerpério.....................................................................................................................166

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CICLO MENSTRUAL
O sistema hormonal feminino é regido por uma hierarquia: hormônio de liberação das gonadotrofinas (GnRH)
liberado pelo hipotálamo; hormônio folículo estimulante (FSH) e hormônio luteinizante (LH), hormônios
sexuais da hipófise anterior secretados em resposta ao GnRH; estrogênio e progesterona, secretados pelo
ovário em resposta ao FSH e LH. Este é o eixo hipotálamo-hipófise-ovário (HHO).
Ciclo menstrual normal:
-Duração do ciclo menstrual: de 21 a 35 dias, com média de 28 dias.
-Duração do fluxo menstrual: varia de 2 a 7 dias. Por convenção, o primeiro dia da menstruação é considerado
o primeiro dia do ciclo menstrual.
-Perda sanguínea: 20 a 60 ml ou 20 a 80 ml (esses três dados numéricos anteriores variam entre fontes).
-Fases do ciclo ovariano: folicular, ovulatória (essa fase apenas em alguns livros-fonte) e lútea
-Fases do ciclo uterino: proliferativa, secretora e menstrual.
Ciclo ovariano:
-Fase folicular: consiste no período em que o folículo dominante é selecionado e se desenvolve sob a ação do
FSH até se tornar um folículo maduro. A duração dessa fase varia de 10-14 dias; é justamente essa variação
que determina a variação da duração do ciclo menstrual.
-Fase lútea: compreende o período da ovulação até o aparecimento da menstruação. A duração dessa fase é
normalmente fixa, durando 14 dias.
-Fase ovulatória: quando se considera essa fase, ela se estende do recomeço da meiose I após o pico do LH até a
rotura folicular, com a ovulação propriamente dita.
Eixo HHO:
Hipotálamo: desempenha um papel central na iniciação do ciclo menstrual. É uma estrutura neural situada na
base do cérebro, responsável pela liberação de neuro-hormônios, que são fatores liberadores de hormônios
hipofisários. São eles:
Hormônio de liberação das gonadotrofinas (GnRH): estimula a secreção de FSH e LH
Hormônio de liberação do hormônio do crescimento (GHRH): estimula a secreção de GH
Fator de liberação da corticotrofina (CRF): regula a secreção do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH)
Hormônio liberador da tireotrofina (TRH): regula a secreção do hormônio estimulador da tireóide (TSH)
O GnRH é secretado de forma pulsátil e contínua, necessária para uma função
adequada do restante do eixo. A fase folicular se caracteriza por pulsos
freqüentes de pequena amplitude de secreção do GnRH. Já na fase lútea há
um aumento progressivo do intervalo entre os pulsos, no entanto, a amplitude
é maior que na fase folicular. Essa redução na freqüência de pulso no final da
fase lútea é imprescindível para a diminuição da secreção de LH e aumento da
secreção de FSH. O GnRH tem meia-vida de 2 a 4 minutos.
Existem situações bem documentadas que levam a uma regulação incorreta do
eixo HHO e à amenorréia secundária. São exemplos: exercícios físicos, estresse, problemas emocionais, dietas
e demandas nutricionais.
Hipófise: localizada na sela túrcica, uma depressão óssea próxima ao hipotálamo. Se divide em duas partes:
-Adenohipófise (hipófise anterior): derivada do ectoderma epidérmico, não sendo composta de tecido neural.
Os hormônios produzidos pelo hipotálamo alcançam a adenohipófise pela circulação porta-hipofisária, não
existindo comunicação neural direta entre essas duas estruturas. É ela responsável pela secreção de FSH, LH,
TSH, ACTH, GH e prolactina.
-Neurohipófise (hipófise posterior): composta apenas por tecido neural, se constituindo como um
prolongamento do hipotálamo. Tem origem diferente da adenohipófise, sendo derivada do tecido
neuroectodérmico. Secreta dois hormônios: a ocitocina e a vasopressina (hormônio antidiuréitco – ADH).
Ovários: são as gônadas femininas responsáveis pela produção dos esteróides sexuais e pelo desenvolvimento

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dos folículos imaturos até sua fase final de amadurecimento. O estradiol e a progesterona são os principais
hormônios esteróides secretados pelos ovários.
Durante a vida fetal, por volta da 20ª semana de gestação, existem aproximadamente 7 milhões de folículos
primordiais. Cada um deles contém um oócito paralisado na prófase da primeira divisão meiótica (diplóteno),
até que o processo de evolução se inicie. Este pool de folículos imaturos vai se reduzindo gradativamente até
que ao nascimento cada ovário possui cerca de 1 milhão de folículos primordiais. Por ocasião da menarca cada
ovário possui cerca de 300.000 a 400.000 folículos em ambos ovários. Durante a menacme, em cada ciclo
menstrual cerca de 1.000 folículos sofrem o processo de atresia. Dessa forma, durante a vida reprodutiva da
mulher, apenas 400 a 500 oócitos serão ovulados.

CICLO OVARIANO

Fase Folicular
É a primeira fase do ciclo ovariano. Nesta fase, ocorre uma sequência ordenada de eventos que culminam no
recrutamento de uma coorte de folículos para a seleção do folículo dominante. Aproximadamente 6-12 ou
mais folículos são recrutados a cada ciclo.
O folículo destinado à ovulação passa por vários estágios. O resultado final é, comumente, um único folículo
maduro viável. Este processo dura cerca de 10 a 14 dias.
-Folículo primordial: Cada oócito circundado por uma camada de células da granulosa é denominado folículo
primordial. É este o primeiro estágio do
desenvolvimento folicular. O oócito está
paralisado no estágio diplóteno da prófase
I meiótica. A fase inicial do crescimento
folicular é independente das
gonadotrofinas, ou seja, não depende de
regulação hormonal. O mecanismo
regulador parece estar no próprio ovário.
-Folículo primário: o folículo primordial
torna-se um folículo primário com a
multiplicação das células da granulosa. Há
rápida proliferação das células da
granulosa em mais de duas camadas e
surgimento de outra camada de células, por
fora das células da granulosa, chamada de
teca;
-Folículo secundário ou pré-antral: surge
quando os folículos primários ao invés de
sofrerem atresia (pois possuem padrão de
crescimento limitado) adquirem a
capacidade de responder a elevação dos
níveis de FSH, incentivando o seu
crescimento. A partir dessa fase o
crescimento do folículo passa a depender
das gonadotrofinas hipofisárias. O oócito
aumenta de tamanho e é recoberto por uma
membrana, a zona pelúcida, que o separa
das células da granulosa circundantes.
As células da teca externa formam a
cápsula do folículo, altamente
vascularizada. (Teoria das duas células,

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duas gonadotrofinas:)As células da teca interna, que possuem receptores para LH, em resposta à ação deste
desenvolvem a capacidade de produzir androgênios (androstenediona e testosterona) a partir do colesterol. Já
nas células da granulosa, que possuem receptores para FSH, sob a a ação do FSH, há estímulo à atividade da
enzima aromatase p450, transformando os androgênios produzidos pelas células da teca em estrogênios
(estrona e estradiol).
-Folículo antral: há aceleração do crescimento com maior produção de líquidos, por efeito sinérgico do
estrogênio e do FSH, que resulta em folículos vesiculares (ou antrais). As células da granulosa que circundam
o oócito passam a ser chamadas de corona radiata e o pedículo de células que mantém o oócito projetado no
interior do folículo denomina-se cumulus oophoro . A partir daí, por mecanismo ainda desconhecido, mas
provavelmente relacionado ao maior número de receptores de FSH, um folículo (folículo dominante), por
volta do 5° dia do ciclo, começa a crescer mais que os outros; devido ao aumento do estrogênio produzido
pelo folículo dominante com conseqüente feedback negativo do FSH em nível hipotalâmico-hipofisário,
remove-se o suporte de gonadotrofinas e esses outros folículos sofrem atresia.
Apesar da diminuição dos níveis de FSH, o folículo dominante permanece dependente do FSH para completar seu
desenvolvimento até o estágio pré-ovulatório. Isso é possível porque ele possui vantagens quando comparado aos
outros folículos em processo de atresia: maior número de receptores de FSH, maior atividade da aromatase e
vascularização na teca aumentada, havendo fluxo preferencial das gonadotrofinas circulantes para este folículo.
Por outro lado, no estágio final do desenvolvimento do folículo antral, o FSH junto ao estradiol induz o
aparecimento de receptores de LH nas células da granulosa, o que permite que o folículo dominante responda
melhor ao pico de LH do meio do ciclo, responsável pela ovulação.
-Folículo pré-ovulatório (folículo maduro – folículo terciário – folículo de Graaf): Por motivo não conhecido,
no 12° dia do ciclo há uma secreção aumentada em 8-10 vezes do LH; este, promove a luteinização das
células da granulosa, transformando-as em secretoras de progesterona. Um pequeno aumento da progesterona
é detectado 12-24 horas antes da ovulação. Essa
elevação dos níveis de progesterona agem diretamente
na hipófise, contribuindo para a elevação do FSH e
LH, observada no meio do ciclo, que aumenta os níveis
de estrogênio e acelera o crescimento do folículo. As
células da teca dos folículos atrésicos, em resposta ao
LH, aumentam a produção de androgênios, fato que
pode estimular a libido na mulher e aumentar a
freqüência de relações sexuais no período pré-
ovulatório.
Com a onda de LH o oócito prossegue com a meiose e
torna-se apto à fertilização.
À medida que o folículo se desenvolve, o ovócito
primário completa a primeira divisão da meiose, de que
resultam o ovócito secundário (maior, contendo todo o
citoplasma do ovócito primário) e o primeiro corpo
polar, que se fragmenta e acaba por desaparecer. O
ovócito secundário inicia, depois, a segunda divisão
meiótica, que é interrompida, por ação de um fator
inibidor da meiose (provavelmente a inibina), em
metáfase II, completando-se apenas se ocorrer
fertilização.
Fase ovulatória:
Cerca de 32-36 horas após o início da secreção de LH
e cerca de 10 a 12 horas após o seu pico, ou seja, por
volta do 14° dia, o LH estimula a secreção de enzimas
proteolíticas pela teca externa e a secreção de
prostaglandinas (vasodilatador) que provoca a

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transudação de plasma para o interior do folículo que, em conjunto, causam a ruptura do folículo e liberação
do óvulo; sendo assim, infere-se que sem o pico de LH não há ovulação. A rotura folicular se acompanha da
eliminação do óvulo e do líquido folicular para a cavidade peritoneal. Pode haver uma irritação local e,
conseqüentemente, a dor abdominal (dor do meio) referida por algumas melhores. Tão logo isso ocorra, o
óvulo é apreendido pelas fímbrias tubárias e fica à mercê do movimento da tuba e do epitélio ciliar.
Quando se consideram apenas duas fases do ciclo ovariano
(folicular e lútea), os eventos descritos na fase ovulatória estão
contidos dentro da fase lútea.
Se houver fecundação, o ovócito completa a segunda divisão
meiótica, em que o citoplasma é, novamente, dividido de modo
desigual: a maior parte permanece no zigoto (ovo fertilizado) e
o restante vai para o segundo corpo polar que acaba por
degenerar. Se não houver fecundação, o óvulo degenera-se em
12 a 24 horas.
Fase lútea
Após a expulsão do óvulo, as células da teca externa e as
células da granulosa, mediadas pelo LH, transformam-se em
corpo lúteo ou corpo amarelo, secretor de alta quantidade de
progesterona e, em menor quantidade, de estrogênio. O pico
da secreção de progesterona ocorre no 8° dia após a
ovulação, coincidindo com os maiores níveis de estrogênio e
com a maior vascularização do endométrio. A síntese de
receptores endometriais de progesterona é dependente do
estrogênio, sendo este então necessário na fase lútea para que ocorram as alterações endometriais induzidas
pela progesterona após a ovulação.
Os pulsos de secreção do LH são maiores no início da fase lútea e diminuem gradativamente. Em média, em
12 dias, o corpo lúteo involui pela falta de LH e se transforma em corpo albicans. Entretanto, se ocorre a
fecundação, a gonadotropina coriônica o manterá secretor de progesterona por 2-4 meses, quando essa função
é admitida pela placenta.
Ao final da fase lútea, a regressão do corpo lúteo leva a uma queda dos níveis circulantes de estradiol,
progesterona e inibina A. O decréscimo da inibina A remove a influência supressora sobre a secreção de FSH
pela hipófise e este volta a elevar-se dias antes da supressão. O decréscimo do estradiol permite um aumento
dos pulsos de GnRH pelo hipotálamo, o que corresponde a mais um estímulo à secreção do FSH. Por fim, o
decréscimo principalmente da progesterona culmina com a menstruação.

CICLO UTERINO
O ciclo ovariano é acompanhado por alterações endometriais que tem o objetivo de preparar o endométrio
para a implantação. Essas alterações espelham a ação do estrogênio e da progesterona.
A camada cíclica do endométrio é denominada camada funcional, que se subdivide em camada esponjosa
(mais profunda) e camada compacta . Já a camada basal, que corresponde a um terço inferior do endométrio,
sofre poucas alterações durante o ciclo, sendo responsável pela regeneração do endométrio após a
menstruação.
Endométrio proliferativo
Ocorre logo após a menstruação. Caracteriza-se por crescimento mitótico progressivo da camada funcional,
em resposta a níveis circulantes de estrogênio. O endométrio, inicialmente fino (1mm) atinge cerca de 10mm
na fase pré-ovulatória. A modificação predominante nessa fase é a transformação das glândulas endometriais
inicialmente retas e curtas em estruturas mais longas e tortuosas.
Endométrio Secretor
Aproximadamente 48 a 72 horas após a ovulação a secreção de progesterona modifica histologicamente o
endométrio para a fase secretora. Esta caracteriza-se pela atuação da progesterona em contraposição à ação

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estrogênica, pois a progesterona causa uma diminuição dos receptores estrogênicos endometriais, reduzindo o
número de mitoses. As glândulas secretoras atingem seu máximo de secreção 7 dias após a ovulação, tornando
o endométrio propício à implantação do blastocisto.
Endométrio Menstrual
Na ausência de implantação, a secreção glandular cessa pela queda nos níveis de progesterona e ocorre ruptura
irregular do miométrio. A falta de esteróides sexuais acarreta espasmos vasculares da artéria espiral que levam

a isquemia endometrial e perda do tecido. A produção de prostaglandinas que ocorre durante todo o ciclo se
intensifica; a PGF2alfa é um potente vasoconstrictor que intensifica os espasmos arteriolares, causa isquemia
adicional do endométrio e leva à ocorrência de contrações miometriais. O fluxo menstrual cessa como
resultado da vasoconstricção prolongada, do colapso tecidual, da estase vascular e da reparação induzida pela
ação estrogênica decorrente do início de novo ciclo.

ALTERAÇÕES MENSTRUAIS
Muco: o muco vaginal, produzido
pelas células glandulares da
endocérvice, sob o efeito do
estrogênio, torna-se mais fluido,
comparável à clara de ovo, e adquire a
capacidade da filância, tornando-se
elástico. Já sob ação da progesterona,
o muco torna-se espesso, turvo e
perde a elasticidade, de aspecto
viscoso.
Mamas: na fase proliferativa, os
níveis crescentes de estrogênio
causam um rápido desenvolvimento
do tecido epitelial. Na fase secretora,
os níveis crescentes de progesterona
promovem a dilatação dos ductos
mamários. No período pré-menstrual,
o aumento simultâneo de estrogênio e
progesterona resulta em aumento da

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circulação local, edema interlobular e proliferação ducto-acinar, o que caracteriza-se por aumento do volume
mamário. Durante e após a menstruação, a queda dos níveis hormonais acarretam diminuição do volume
mamário.
Temperatura corporal: a progesterona produzida pelo corpo lúteo exerce ação termogênica a nível do
hipotálamo, provocando aumento da temperatura corporal de 0,3 a 0,8°C, o que resulta em um gráfico de
temperatura bifásico. Essa elevação inicia-se um dia após a ovulação e mantém-se por 11 a 16 dias: se menos
que 11 dias reflete insuficiência do corpo lúteo; se mais que 16 dias reflete gravidez. Mulheres que apresentam
um gráfico bifásico apresentam certamente ovulação. Já aquelas que possuem gráfico de temperatura
monofásico requerem a confirmação do estado ovulatório por outro método.

Fonte de Pesquisa:
MedCurso 2010 – Ginecologia volume 1
Atlas de Anatomia Humana – Prometheus
Fisiologia do Sistema Reprodutor feminino - Universidade do Minho.

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HORMÔNIOS
A pituitária (hipófise) anterior das meninas, como a dos meninos, não secreta praticamente nenhum hormônio
gonadotrópico até à idade de 10 a 14 anos. Entretanto, por essa época, começa a secretar dois hormônios
gonadotrópicos. No inicio, secreta principalmente o hormônio foliculo-estimulante (FSH), que inicia a vida
sexual na menina em crescimento; mais tarde, secreta o hormônio luteinizante (LH), que auxilia no controle
do ciclo menstrual.
O Colesterol para formar qualquer hormônio na supra-
renal deve ser antes convertido em pregnenolona. Como
podemos constatar, a progesterona é o primeiro esteróide
sexual de importância a ser formado. Mais adiante vêm
os androgênios (dehidroepiandrosterona [DHEA],
androstenediona e testosterona), e só no final surgem os
estrogênios (estrona e estradiol). Estes se formam
diretamente a partir dos androgênios (sintetizados no
córtex adrenal e nas células da teca interna), através de
um processo bioquímico de aromatização. A
aromatização se dá tanto no folículo ovariano como no tecido adiposo.

ESTROGÊNIOS
Os estrogênios são formados a partir de andrógenos nas células foliculares, mediado pela enzima aromatase
p450. Também são formados pela aromatização da androstenediona na circulação (feita pela aromatase p450).
O estradiol é o principal estrogênio e biologicamente o mais ativo. O estradiol de origem ovariana constitui
90% do estradiol circulante.
Os estrogênios são muito potentes, pois uma vez que boa parte da androstenediona e da testosterona não chega
a ser convertida respectivamente em estrona e estradiol, esta altíssima potência dos estrogênios torna-se uma
necessidade biológica da mulher. Isto porque a natureza feminina tem que se proteger contra os riscos de uma
deficiente conversão de androgênios em estrogênios. Neste sentido, outro mecanismo de defesa que a mulher
possui reside na capacidade que o seu tecido adiposo apresenta de efetuar a conversão periférica da
androstenediona em estrona.
Relação com FSH e LH: os estrogênios fazem, à nível central, feedback (-) com o FSH; quando em níveis
constantes exercem feedback (-) com o LH, enquanto que um aumento abrupto de estrógenos exerce um
feedback (+) do LH (fato que ocorre pouco antes da ovulação).
Funções do Estrogênio:
-Proliferação celular: induz as células de muitos locais do organismo a proliferar. Por exemplo, na
musculatura lisa do útero, causa aumento da vagina e o desenvolvimento dos lábios que a circundam, faz o
púbis se cobrir de pêlos, os quadris se alargarem e o estreito pélvico assumir a forma ovóide, em vez de
afunilada como no homem; provoca o desenvolvimento das mamas e a proliferação dos seus elementos
glandulares, e, finalmente, leva o tecido adiposo a concentrar-se, na mulher, em áreas como os quadris e
coxas, dando-lhes o arredondamento típico do sexo.
-Ossos: também estimula o crescimento de todos os ossos logo após a puberdade, mas promove rápida
calcificação óssea, fazendo com que as epífises se fechem dentro de poucos anos, de forma que o crescimento,
então, pára. Por isso a mulher cresce mais rápido, porém menos do que o homem. Na menopausa, a
diminuição da ação do estrogênio desregula os osteoblastos, nesta situação os osteoclastos se sobressaem,
havendo uma remoção grande de cálcio dos ossos, levando a osteoporose.
-Mamas: causam (1) desenvolvimento dos tecidos do estroma das mamas, (2) crescimento do extenso sistema
canalicular e (3) deposição de gorduras nas mamas. No entanto, são a progesterona e a prolactina que
ocasionam o crescimento determinativo e a função dessas estruturas (produção de leite).
-Pele: fazem com que a pele adquira textura macia. Além disso, fazem com que a pele se torne mais

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vascularizada do que o normal, este efeito está quase sempre associado ao aumento da temperatura da pele, e
resulta em maior sangramento por cortes superficiais do que o observado nos homens.
-Sabe-se há muito tempo que os estrogênios inibem a função de fagocitose dos macrófagos, através da
inibição da interleucina-6 dos macrófagos, e este é o mecanismo pelo qual estes impedem a osteoporose, a
formação da placa de ateroma e a doença de Alzheimer.

PROGESTERONA
Relação com o FSH e LH: quando em altas quantidades e de forma contínua, exerce feedback (-) para o FSH
e LH. Entretanto, a liberação aguda de progesterona aumenta as concentrações plasmáticas de LH nas 24-48
horas seguintes.
Funções da Progesterona: a progesterona tem pouco a ver com o desenvolvimento dos caracteres sexuais
femininos; está principalmente relacionada com a preparação do útero para a aceitação do embrião e à
preparação das mamas para a secreção láctea. Em geral, a progesterona aumenta o grau da atividade secretória
das glândulas mamárias e, também, das células que revestem a parede uterina, acentuando o espessamento do
endométrio e fazendo com que ele seja intensamente invadido por vasos sangüíneos. Determina, ainda, o
surgimento de numerosas glândulas produtoras de glicogênio. Finalmente, a progesterona inibe as contrações
do útero e impede a expulsão do embrião que está se implantando ou do feto em desenvolvimento.

PROLACTINA
Hormônio secretado pelo lactotrofo da hipófise anterior. Sua produção é pulsátil, regulada pelo controle
inibidor da dopamina secretada no hipotálamo.
Portanto, qualquer situação que diminua os
níveis de dopamina ou em distúrbios que
interrompam a circulação porta-hipofisária,
resultarão em aumento dos níveis de prolactina.
É um hormônio primariamente relacionado à
lactação. Clinicamente, níveis aumentados de
prolactina associam-se à anovulação, amenorréia e
galactorréia.
Embora o controle inibitório tônico da prolactina
prevaleça, muitos estímulos podem causar a sua
liberação, a saber: manipulação das mamas, drogas,
estresse, exercícios físicos e alguns alimentos.
Nenhum fator de liberação fisiologicamente
significativo foi ainda detectado em humanos.

OCITOCINA
Peptídio produzido principalmente pelo
hipotálamo. Sua secreção é deflagrada pela sucção,
através de um sinal emitido pela estimulação
mamária através de nervos torácicos até a medula
espinhal e daí para o hipotálamo.
Sua principal função é a estimulação de dois tipos
específicos de contração muscular: contração
muscular uterina durante o parto e contração dos
ductos lactíferos mamários que ocorrem durante o
reflexo de ejeção do leite.

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ANTICONCEPÇÃO
A contracepção é, provavelmente, a principal preocupação da mulher na idade reprodutiva. No Brasil, o
Ministério da Saúde disponibiliza diversos métodos na atenção pública de saúde com este intuito. Cabe ao
profissional de saúde respeitar as particularidades de cada casal e assegurar que todas as mulheres tenham
acesso às informações que permitam escolher o método mais adequado para a sua realidade.

Índice de Pearl: afere a


eficácia dos métodos
contraceptivos, sendo obtido
pelo número de gestações em
100 mulheres fazendo uso do
método em um ano. Em outras
palavras, este índice avalia o
número de falhas do método.
Logo, quanto menor o índice de
Pearl, melhor a eficácia do
método.

Classificação dos métodos:


-Métodos de comportamento: tabela, Billings, temperatura basal, sintotérmico, coito interrompido;
-Métodos de barreira: Mecânicos → preservativo (masculino e feminino), diafragma e esponja; químico →
espermicidas;
-Dispositivos intrauterinos: não medicados e medicados;
-Contracepção hormonal: Oral → combinado (monofásico, bifásico e trifásico), minipílula e pílula do dia
seguinte; Injetável → mensal e trimestral;
-Contracepção cirúrgica: ligadura tubária e vasectomia.
Critérios de escolha: na escolha do método, é essencial entender a realidade da paciente, as limitações de
cada método e suas contraindicações e a presença de comorbidades. A OMS lançou o artigo “Critérios
Médicos de Elegibilidade para Uso de Métodos Anticoncepcionais” no ano de 2009, onde cita as situações
onde cada método deve ser evitado. Os métodos são classificados em 4 categorias, segundo a OMS:
-Categoria 1: o método pode ser usado em qualquer circunstância;
-Categoria 2: o uso geralmente é permitido;
-Categoria 3: o método não é recomendado, exceto se outros métodos não estiverem disponíveis ou não sejam
aceitáveis;
-Categoria 4: o método não deve ser utilizado.
Cada método contraceptivo recebe uma categoria dessas citadas frente à diversas comorbidades da paciente.
Em alguns casos, acompanha-se da categoria adotada uma das seguintes letras, que traduzem: I- se refere a
iniciar o método em paciente portadora da determinada comorbidade e C- se refere a continuar o método em
paciente que desenvolveu a comorbidade após o início do uso do método. Para uso prático, a OMS lançou
uma roda com os principais critérios de elegibilidade dos métodos anticoncepcionais.

MÉTODOS COMPORTAMENTAIS
Resumem-se na observação dos sinais e sintomas que caracterizam as diversas fases do ciclo, com abstinência
sexual periódica. Devem ser abolidos na perimenopausa e próximo à menarca, devido a maior prevalência de
ciclos irregulares. O casal deve abster-se de sexo no período fértil, ou seja, por 3 dias antes da data presumida
da ovulação até 3 dias após, uma vez que o espermatozóide permanece viável no trato genital feminino por até
72 horas. A taxa de falha pode chegar a 20% no primeiro ano.

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Todos os métodos tem baixa eficácia, alteram o comportamento do casal, dependem da motivação e
aprendizado e não protegem contra DST/AIDS. Entretanto, devem ser ensinados quando situações, à exemplo
da crença religiosa, impedem a utilização de outros métodos.
Ogino-Knaus (tabelinha): a mulher deve ser orientada a registrar a duração do seu ciclo menstrual por 6
meses e, a partir daí, calcula-se a diferença entre o maior e o menor ciclo; se superior a 10 dias, este método
não deve ser utilizado.
Período de abstinência: o período fértil é calculado pela subtração de 18 do ciclo mais curto e de 11 do ciclo
mais longo. O intervalo obtido é aquele do ciclo menstrual em que deve ser feita abstinência sexual.
Temperatura corporal basal: Após a ovulação, o aumento dos níveis de progesterona estimula, no
hipotálamo, o aumento da temperatura corporal em 0,3 a 0,8°C, que permanece por 11 a 16 dias. Se
permanecer por menos que 11 dias sugere deficiência do corpo lúteo; se por mais que 16 dias indica gravidez.
Se não há aumento da temperatura (gráfico monofásico) provavelmente não há ovulação. A ovulação
geralmente precede em um dia o aumento da temperatura. A mulher deve aferir e registrar a temperatura
diariamente, ao amanhecer, após período de sono de, ao menos, 5 horas e antes de realizar qualquer atividade.
Limitações: vários fatores podem interferir na temperatura corporal (ex. infecções, insônia) e o método não
permite prevê a ovulação.
Período de abstinência: a mulher deve se manter abstinente desde o início do ciclo até a manhã do quarto dia
após o início do aumento de temperatura, uma vez que o óvulo se mantém viável por 48 horas.
Muco cervical (Billings): no início da primeira fase do ciclo o muco não é perceptível. Quando a mulher
percebe-o ele é espesso e pegajoso, tornando-se elástico e filante (comparável à clara de ovo) próximo à
ovulação e volta a ser espesso e perde a elasticidade após a ovulação. Altos índices de falha (IP = 39).
Período de abstinência: da percepção do muco até o 4° dia após a percepção máxima de umidade.
Método sintotérmico: resume a combinação entre as observações da temperatura basal e do muco cervical,
além de outros parâmetros (dor pélvica, enxaqueca), visando aumentar a eficácia.
Coito interrompido: consiste na ejaculação extravaginal. Requer grande controle por parte do homem, o que
nem sempre é obtido. Além disso, a ejaculação é precedida da liberação de secreções, que podem conter
espermatozóides, levando a IP>25%. Deve ser desestimulado, exceto quando não se dispõe de outros métodos.

MÉTODOS DE BARREIRA
Possuem como mecanismo de ação a interposição de uma barreira mecânica ou química que impeça a
ascensão de espermatozóides da vagina para o útero. A utilização correta, ou de métodos associados,
aumentam a eficácia.
Preservativo masculino: envoltório de látex que deve ser colocado no pênis ereto antes do início do ato
sexual. O usuário deve ser orientado a retirar o pênis da vagina assim que ocorra a ejaculação, evitando que o
conteúdo saia do reservatório com a diminuição da ereção. Tem validade, no geral, de 5 anos. A única restrição
é a alergia ao látex. Tem IP variando de 2 a 15%, a depender do uso correto.
Vantagens: protege contra DSTs (inclusive HIV e HepB), não depende de acompanhamento médico e é de
fácil acesso. Não dá proteção total contra o HPV devido a contaminação pelo contato da pele não coberta.
Desvantagens: requer motivação, manipulação durante o ato sexual e pode romper-se.
Preservativo feminino: consiste em um tubo de 17cm de comprimento e 8cm de diâmetro, com uma
extremidade fechada e outra aberta e com dois anéis mais rígidos em cada extremidade. Pode ser inserido até 8
horas antes do ato sexual e não é necessário que seja retirado imediatamente após a relação. Pode ser
associado a lubrificantes espermicidas, o que aumenta a eficácia do método. IP varia de 5 a 21%.
Vantagens: protege contra DSTs, inserção e retirada fora do intercurso sexual e maior resistência.
Desvantagens: proteção parcial contra Herpes e HPV, custo mais elevado e o anel pode provocar desconforto.
Diafragma: dispositivo circular flexível coberto por uma membrana de silicone ou látex. Tem o inconveniente
de depender de consulta médica para avaliar o tamanho adequado do diafragma para a paciente e oferecer as
informações quanto a introdução e retirada. A associação com espermicida aumenta a eficácia. Pode ser
inserido até duas horas antes do intercurso sexual e sua remoção só poderá ser feita 6-8 horas após a relação,
para garantir maior tempo de exposição do espermatozóide ao espermicida. IP varia de 6 a 16%.

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Contraindicações: passado de síndrome do choque tóxico (categoria 3), doença valvular cardíaca crônica
complicada, prolapso uterino e alterações anatômicas vaginais (ex. septo).
Desvantagens: protege contra DSTs, embora não proteja contra HIV.
Esponja cervical: constitui-se de poliuretano acompanhada de espermicida. É descartável e de fácil
colocação. Tem como principal limitação o custo elevado. Pode ser utilizada por 24 horas, devendo ser
descartada em seguida. Contraindicações semelhantes ao diafragma. IP entre 9 e 32%.
Espermicida: substância química que recobre a vagina e o colo do útero. Imobiliza ou destrói os
espermatozóides, por lesão de sua membrana celular. Deve ser aplicado antes da relação e dura até duas horas.
O produto mais utilizado tem como base o nonoxinol-9 a 2%. Não devem ser usados isoladamente. Podem
provocar microfissuras na mucosa vaginal, com aumento do risco de transmissão de HIV. IP entre 18 e 29%.

DISPOSITIVO INTRAUTERINO (DIU)


Consistem em artefatos que podem ser medicados com cobre ou progesterona. O principal mecanismo de
ação, segundo a OMS, é a interferência nas diversas etapas que precedem a fertilização, pois estimulam uma
reação inflamatória no útero pela presença de corpo estranho.
A ação contraceptiva do DIU é imediata, não necessitando da associação com outros métodos nas primeiras
relações sexuais. A fertilidade é rapidamente restaurada após sua retirada.
Orientações gerais de uso:
-A melhor época para inserção é no período menstrual, momento em que o colo uterino está mais entreaberto;
-Sua colocação deve ser precedida de exames para excluir inflamação, gravidez ou malformação uterina;
-Deve ser posicionado acima do OCI, sendo sua posição confirmada por USG transvaginal nos dois primeiros meses,
após esse período a cada 90 dias até completar um ano e depois o controle é anual;
-A antibioticoterapia profilática não está indicada de rotina, salvo em casos de endocardite bacteriana;
-Idade <20 anos é fator de risco para DST e o uso do DIU nessa faixa etária poderia permitir que o uso do método de
barreira fosse ignorado devido ao comportamento sexual irresponsável típico da idade;
-Após um abortamento, pode ser inserido imediatamente, se não houver sinais de infecção.
Contraindicações: gravidez, infecção puerperal, após aborto séptico, sangramento vaginal inexplicado,
câncer de colo uterino aguardando tratamento, câncer de endométrio, câncer de ovário, doença inflamatória
pélvica (DIP)/DST atual ou nos últimos 3 meses, doença trofoblástica gestacional, mioma com distorção da
cavidade uterina e entre 48 horas a 4 semanas após o parto (pois nesse período há maior risco de expulsão).
No caso do Mirena, adicionam-se: câncer de mama, enxaqueca com aura, cirrose compensada, hepatite aguda
e tumores hepáticos.
Intercorrências: perfuração (evento raro), expulsão (mais freqüente no primeiro mês e nulíparas),
dismenorréia e sangramento anormal (exceto Mirena) e apesar de diminuir a chance de gravidez, caso esta
ocorra, o risco de ser ectópica é maior (1/30).
-Gravidez: caso a paciente engravide, deve ser orientada quanto aos riscos de infecção, sendo proposta a retirada até,
preferencialmente, 12 semanas de gestação. Se os fios do endoceptivo não estiverem visíveis, a gravidez deve ser
acompanhada cuidadosamente. A gravidez com DIU leva a abortamento espontâneo em 50%.
-DIP: geralmente não há necessidade de retirar o DIU. Deve ser tratada usando os medicamentos apropriados. A
tendência atual é a retirada do dispositivo caso não haja melhora em 48 horas.
DIU de Cobre: Feito de plástico, com sua haste vertical enrolada com filamento de cobre. No primeiro ano de
uso as taxas de falha variam de 0,6 a 1,4%. Não há necessidade de intervalos entre a retirada de um DIU de
longa data e inserção de um novo. O mais utilizado é o Tcu 380A, com duração de 10 anos. O mecanismo de
ação consiste na alteração do muco cervical, tem ação espermicida e irritativa, além de provocar reação
inflamatória exuberante.
Benefícios: método de longa duração (10 anos), muito eficaz, não interfere nas relações sexuais, quando
retirado a mulher pode engravidar imediatamente, não interferem na quantidade ou qualidade do leite materno,
pode ser inserido imediatamente após o parto ou aborto induzido, não interage com outra medicação;
DIU de levonorgestrel (Mirena®): dispositivo em forma de T contendo um reservatório que libera 20mcg de
levonorgestrel diariamente, que vai reduzindo anualmente. A taxa de falha é de 0,1%. A duração do efeito
contraceptivo perdura por 5 a 7 anos.

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Mecanismo de ação: promove o espessamento do muco cervical, provoca anovulação em 25% das mulheres e
devido a liberação de levonorgestrel causa supressão dos receptores de estradiol e atrofia endometrial.
Efeitos colaterais: sangramento irregular ou spotting nos primeiros 3-5 meses, cefaléia, náuseas e depressão.
Benefícios: reduz a quantidade e a duração do ciclo menstrual e a intensidade da dismenorréia, reduz o risco
de doença inflamatória pélvica e gravidez ectópica, não altera a pressão arterial, o metabolismo de lipídios ou
carboidratos e as enzimas hepáticas e promove o controle da menorragia.

CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA
Deve-se ter em mente que a contracepção de emergência não protege contra a DST e não pode passar a ser um
método usual. Não há contraindicação para o método, por ser este ocasional. A única contraindicação absoluta
para a anticoncepção de emergência, pela OMS, é a gravidez confirmada. O IP é, em média, 2%. Quanto mais
próximo do ato sexual for utilizado, maior a efetividade, decrescendo com o tempo. Novas evidências
sugerem que existe efetividade com o uso até o 5° dia da relação sexual desprotegida, podendo, então, serem
utilizados.
Indicações: estupro, ruptura de preservativo, deslocamento de DIU e coito episódico não protegido.
Mecanismo de ação: varia conforme o momento do ciclo menstrual e com o método utilizado. Se utilizado na
primeira fase do ciclo menstrual, antes do pico do LH, irá alterar o desenvolvimento dos folículos, impedindo
a ovulação ou retardando-a por vários dias. Na segunda fase do ciclo, após a ovulação, o método atua
alterando o transporte de espermatozóides e do óvulo nas trompas: o mais importante é a modificação do
muco cervical, tornando-o espesso e hostil, impedindo ou dificultando a movimentação dos espermatozóides;
além disso, interfere na capacitação dos espermatozóides, processo fundamental na fecundação
-O mecanismo de ação deste tipo, sendo administrado antes ou após a ovulação, não envolve quaisquer efeitos após a
fecundação, não existindo evidências científicas que suportem um possível efeito abortivo deste método.
Efeitos colaterais: os efeitos mais importantes são as náuseas e vômitos, tonteiras, cefaléia, fadiga, mastalgia,
dor abdominal e irregularidade menstrual. Toda paciente deve ser alertada que não é esperado um sangramento
após o uso do método, podendo ocorrer, entretanto, o sangramento esperado para o fluxo menstrual ou este
pode ocorrer de forma adiantada ou retardada.
-Caso ocorram vômitos nas primeiras duas horas após a ingestão do comprimido, a dose deve ser repetida. Caso
persistam, pode-se optar pela utilização da via vaginal, com eficácia semelhante.
Tipos:
-Método de levonorgestrel: 0,75mg espaçados por 12 horas, ou em dose única de 1,5mg, que deve ser tomado
até 5 dias da relação, porém preferencialmente dentro de 72 horas desta. É mais efetivo, não apresenta as
contraindicações e efeitos colaterais típicos dos estrógenos e pode ser utilizado por mulheres em uso de
antirretrovirais, como em casos de violência sexual.
-Método de Yuzpe: também deve ser usado em até 5 dias do coito. É necessária a dose total de 0,2mg de etinil-
estradiol e 1mg de levonorgestrel, divididas em doses iguais a cada 12 horas.
Posologia: pílula com 0,05 de etinil-estradiol + 0,25mg de levonorgestrel -> 2 comprimidos a cada 12 horas;
pílula com 0,03mg de etinil-estradiol e 0,15mg de levonorgestrel -> 4 comprimidos a cada 12 horas.
-DIU de cobre: deve ser inserido em até 5 dias do coito. Contraindicado se estupro com alto risco de DST

CONTRACEPÇÃO HORMONAL
Os contraceptivos hormonais são constituídos de um estrogênio e uma progesterona sintéticos. Eventualmente,
um progestógeno isolado é utilizado.
Mecanismo de ação: os contraceptivos combinados promovem a anovulação pelo bloqueio do eixo HHO.
Suprimem o FSH e LH basais e diminuem a capacidade da hipófise de secretar gonadotrofinas em resposta ao
GnRH, além de possuírem efeito hipotalâmico. Com isso os folículos não amadurecem e não ocorre o pico do
LH no meio do ciclo necessário à ovulação. Já os contraceptivos orais apenas de progestogênios (minipílula)
promovem ciclos ovulatórios em até 40% dos casos e, eventualmente há maturação do folículo. Eles agem
atrofiando o endométrio e tornando o muco cervical mais espesso, alterando a motilidade tubária. A pílula
contendo apenas desogestrel 0,075mg (Cerazette®) é a mais efetiva em inibir a ovulação, com IP de 0,3-0,8.

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Anticoncepcionais Hormonais Orais (ACHO): são o método reversível mais utilizado no mundo.
-ACHO combinados: associação de estrogênio e progestógeno, variando nas dosagens hormonais e no tipo de
progestógeno. Existem três tipos, conforme a dose hormonal: monofásicos (mais usados; mantém a mesma
dose hormonal durante todo o ciclo), bifásicos e trifásicos (variam a dose hormonal conforme a fase do ciclo).
Composição: o estrógeno mais utilizado é o etinilestradiol; a menor dose utilizada é 15mcg/dia, sendo que
dosagem superior a 35mcg/dia aumenta o risco tromboembólico. O fumo é fator de risco para trombose
quando associado ao ACHO. A partir da dose de etinilestradiol utilizada, classificam-se os ACHO combinados
em: alta (>50mcg), média (50mcg), baixa (30-35mcg) e muito baixa (15 a 20mcg) dosagem.
Modo de uso: os ACHO mais utilizados são compostos de 21 comprimidos e a primeira caixa deve ser iniciada
no primeiro dia da menstruação. Após 21 dias de uso contínuo, deve ser feita uma pausa de 7 dias entre as
cartelas, reiniciando no 8º dia, para que ocorra o sangramento de privação. Existem também cartelas de 22, 24
(pausa de 4 dias) e 28 (uso ininterrupto) comprimidos. As pílulas podem ser utilizadas da adolescência até a
menopausa, não havendo evidências da necessidade de “pausa para descanso”.
Esquecimento de tomar a pílula: apenas 1 → tomar imediatamente a pílula ao lembrar-se e tomar a do dia seguinte no
horário regular. 2 ou mais → tomar imediatamente 1 pílula ao lembrar-se, utilizar método de barreira ou abstinência
sexual por 7 dias e contar quantas pílulas restam na cartela: >7: tomar o restante como de costume; <7: tomar o
restante como de costume e já iniciar uma nova cartela sem pausas.
Contraindicações (categoria 3 da OMS): serão listadas algumas das principais contraindicações:
-Amamentação entre 6 semanas e 6 meses do parto -Puerpério sem amamentação até 21 dias
-Fumo > 35 anos: menos que 15 cigarros/dia -Fatores de Risco para DCV -História de TVP e TEP
-Enxaqueca sem aura <35 anos -Cirrose compensada -Hiperlipidemias
-PAS entre 140-159 ou PAD entre 90-99mmHg
Contraindicações (categoria 4 da OMS): serão listadas algumas das principais contraindicações:
-Amamentação até 6 semanas do parto -Ca de mama atual -AVC atual ou prévio
-Fumo > 35 anos: mais que 15 cigarros/dia -DCV isquêmica atual ou passada -História atual de TVP e TEP
-Enxaqueca sem aura >35anos -Cirrose descompensada -Enxaqueca com aura
-PAS >160 ou PAD >100mmHg -Tumor hepático benigno/maligno -Hepatite aguda
-Diabetes com nefro, retino ou neuropatia -Diabetes > 20 anos ou outra doença vascular
Efeitos benéficos: regularizam o ciclo menstrual; promovem alívio da TPM; diminui o fluxo menstrual, a
dismenorréia, o hirsutismo e a acne; reduz o risco de DIP, gestação ectópica, doença trofoblástica gestacional e
neoplasia de ovário (principalmente) e de endométrio; melhora das doenças benignas da mama.
Efeitos colaterais: dos estrógenos → cefaléia, tonteira, náusea, vômito, edema, irritabilidade e cloasma. Dos
progestógenos → depressão, cansaço, alterações da libido, amenorréia, acne, ganho de peso. Nos ACHO de
baixa dosagem, pode ocorrer o sangramento de escape no meio do ciclo, fenômeno que se resolve com o
tempo, porém caso necessite de intervenção, recomenda-se a associação com estrógeno conjugado (Premarin®
por 3 a 5 dias). A associação com câncer de mama ainda não é bem documentada; o aumento do risco do
câncer de colo de útero parece estar relacionado à atividade sexual desprotegida. Pacientes com hipertensão e
enxaqueca, principalmente na presença de aura, possuem risco aumentado de complicações cardiovasculares
com o uso dos ACHO. Pacientes com diabetes ou doenças vasculares devem dar preferência a outro método.
-ACHO minipílula: tem uma dose de progestógeno que vai da metade a 1/10 dos ACHO combinados.
Composição: Noretisterona 0,35mg (Micronor®, Norestin®), levonorgestrel 0,030mg (Nortrel®) e
desogestrel 75mcg (Cerazette® - tem efeito melhor, pela inibição da ovulação em 97% dos casos).
Indicações: a maior indicação é a lactação, visto que sua eficácia menor pode ser compensada com o efeito
anticoncepcional da amamentação, sendo recomendada a partir de 6 semanas do parto nas lactantes e até 21
dias de puerpério naquelas que não amamentam. Pode também ser utilizada por mulheres em situações
especiais, como pacientes próximo à menopausa, com doenças mamárias benignas, hipertensão arterial,
coagulopatias, tabagistas > 35 anos, ou seja, naquelas com contraindicações ao uso de estrógenos.
Efeitos colaterais: lactantes → prolongamento da amenorréia. Não lactantes → alterações do fluxo menstural,
spotting, amenorréia persistente ou fluxo abundante ou prolongado. Cefaléia e sensibilidade mamária são
também observados.
Modo de uso: a utilização é de forma contínua. Apresenta mínimos efeitos na lactogênese. Como sua eficácia

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é de 96%, indica-se o uso de outro método associado, exceto no período da lactação, no qual a fertilidade está
diminuída, e na perimenopausa, pela menor fertilidade e pelo risco de trombose com o uso dos combinados.
Vale lembrar que a minipílula inibe a ovulação em apenas 60% dos casos.
Contraceptivos injetáveis:
-Trimestrais: a depomedroxiprogesterona (acetato de medroxiprogesterona) é a mais empregada. Uma dose
trimestral de 150mg IM suprime a ovulação por cerca de 14 semanas. Sua ação está relacionada à inibição dos
picos de estradiol e, conseqüentemente, de LH, evitando com isso a ovulação. Além disso, provoca atrofia
endometrial e espessamento do muco cervical.
Modo de uso: a dose deve ser administrada até o 5º dia do ciclo por via IM profunda. As doses subsequentes
são aplicadas a cada 90 dias. Não se deve massagear ou colocar calor local para não acelerar a absorção.
Efeitos colaterais: atraso no retorno à fertilidade por até 9 meses após o uso, depressão, ganho de peso,
alteração da libido e do humor, acne, queda de cabelo, mastalgia e sangramento irregular. Não aumenta o risco
de trombose, assim como o risco de câncer cervical, de ovário e hepático.
Contraindicações:
-Amamentação com menos de 6 semanas do puerpério -Tumor hepático benigno ou maligno -Enxaqueca com aura
-Vários fatores de risco para DCV -História atual ou pregressa: TVP, TEP, DCV isquêmica, AVC
-Cirrose descompensada -Sangramento vaginal inexplicado -Uso de rifampicina
-Mensais: são semelhantes em alguns aspectos aos ACHO combinados, embora utilizam de um estrogênio
natural, apresentando maior segurança. Sua eficácia é alta, com as usuárias apresentando ciclos regulares após
6 meses de uso, o que contrasta com os trimestrais, nos quais há amenorréia em 50% dos casos.
Composição: enantato de noretisterona 50mg + valerato de estradiol 5mg → Mesigyna ®;
acetofenido de algestona (dihidroxiprogesterona) 150mg + enantato de estradiol 10mg → Perlutan ®;
acetato de medroxiprogesterona 25mg + cipionato de estradiol 5mg → Ciclofemina ®.
Modo de uso: deve-se tomar a injeção todos os meses, com intervalo de 27 a 33 dias. O retorno da fertilidade
ocorre em cerca de 4 meses após a interrupção do tratamento, semelhante ao retorno da fertilidade após os
ACHO combinados, sem o inconveniente da tomada diária.
Contraindicações: de forma geral, as contraindicações são semelhantes às dos ACHO combinados.
Efeitos colaterais: ganho ponderal, cefaléia, irregularidade menstrual e alterações do humor.
Implantes subdérmicos: tem como mecanismo de ação uma liberação diária de hormônio que inibe a
ovulação por bloqueio do pico de LH, altera o muco cervical e atrofia o endométrio. Apresenta IP = 0,05.
Composição: o Implanon® consiste numa haste de 4cm de comprimento e 2mm de diâmetro que contêm
60mg de etonogestrel, liberando diariamente 60mcg nas primeiras 6 semanas, 35-45mcg/dia no final do
primeiro ano e 30-40mcg no final do segundo ano e 25-30mcg no final do terceiro ano.
Modo de uso: deve ser inserida uma haste no sulco entre o bíceps e o tríceps, na face medial do braço, após a
realização de botão anestésico. O implante não é biodegradável e apresenta ação comprovada por até 3 anos.
Vantagens: amenorréia (40% após 1 ano), diminuição da dismenorréia e melhora da TPM.
Desvantagens: mulheres com mais de 70kg apresentam maior taxa de falha do método; a amenorréia não é
bem vista por algumas mulheres e exige profissional habilitado para a sua colocação.
Contraindicações: possui as mesmas contraindicações do anticoncepcionais injetáveis trimestrais.
Adesivos transdérmicos: são compostos de etinilestradiol (liberação de 20mcg/dia) e norelgestromina
(liberação de 150mcg/dia), com uma área de 20cm². Tem IP = 0,03-0,08.
Modo de uso: é utilizado um adesivo por semana durante 3 semanas, com pausa na 4ª semana, quando ocorre
o sangramento de privação. Deve ser aplicado em local de pele seca, preferencialmente nos glúteos, face
externa dos braços, abdome e tronco. Não aplicar em mamas, região genital, MMII, cabeça e pescoço.
Efeitos colaterais: os adesivos apresentam mecanismo de ação, efeitos colaterais e contraindicações
semelhantes aos ACHO combinados. Efeitos adversos específicos incluem a queda total ou parcial do adesivo
(4% dos casos) e reação local que ocorre em 20% das usuárias.
Vantagens: em comparação ao ACHO combinado não sofre primeira passagem hepática, não acarreta picos
hormonais, não há necessidade de se lembrar todos os dias e a absorção não é afetada por distúrbios
gastrointestinais. Além disso, a norelgestromina possui baixo poder androgênico, favorecendo seu uso em

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mulheres com acne e pele oleosa.
Anel vaginal: o nome comercial no Brasil é Nuvaring®, composto por etinilestradiol (liberação diária:
15mcg) e etonogestrel (metabólito ativo do desogestrel, com liberação diária de 120mcg). IP = 0,3-8.
Modo de uso: o anel é posicionado no fundo-de-saco posterior vaginal pela própria mulher e deixado no local
por três semanas, quando, então, deve ser retirado e descartado. Faz-se um intervalo de uma semana para a
colocação do próximo anel, período no qual ocorre o sangramento de escape. Diferente do diafragma, a
posição do anel não é fundamental para a sua eficácia, visto tratar-se de método hormonal e não de barreira.
Efeitos colaterais: o anel apresenta mecanismo de ação, efeitos colaterais e contraindicações semelhantes aos
ACHO combinados. Suas vantagens assemelham-se aos adesivos transdérmicos. Já o motivo principal de
descontinuação do uso é o desconforto vaginal. Outros métodos são preferíveis em mulheres com infecções
vaginais e anormalidades anatômicas genitais.
MÉTODO DE LACTAÇÃO E AMENORRÉIA (LAM)
O LAM consiste no uso da amamentação como um método temporário de anticoncepção. Oferece proteção
natural contra a gravidez e permite que a mulher planeje outro método na ocasião adequada. Tem a vantagem
de garantir ao bebê os nutrientes necessários para o seu crescimento e desenvolvimento, além de proteção
contra doenças, através do leite materno. Apresenta IP rotineiro = 2 e se de forma ideal = 0,5.
Mecanismo de ação: baseia-se na inibição da ovulação, pela alteração dos hormônios naturais com a lactação.
Alguns pré-requisitos para eficácia do método devem ser cumpridos: amenorréia, aleitamento exclusivo sobre
livre demanda e menos de 6 meses do parto. Outro método deve ser adicionado se: retorno da menstruação
OU parada da amamentação em tempo integral OU quando o bebê completar 6 meses.
CONTRACEPÇÃO CIRÚRGICA
Constitui-se no único método de contracepção definitiva, sendo definido como método irreversível.
Esterilização feminina: pode ser realizada no momento de uma laparotomia para cesariana ou para outra
cirurgia no abdome, podendo ser, então uma: minilaparotomia após parto vaginal (a legislação brasileira não
prevê a laqueadura neste período), minilaparotomia no intervalo (procedimento ambulatorial) ou laparoscopia
(requer anestesia geral).
Esterilização masculina: a vasectomia é realizada sob anestesia local e consiste na ressecção do ducto
deferente. Apresenta IP entre 0,1 a 0,15%. As principais complicações incluem epididimite congestiva,
hematoma do escroto e infecção da ferida operatória. Não está associada a maior ocorrência de qualquer tipo
de câncer e não causa disfunção sexual. Após sua realização é indicado o uso de preservativo ou outro método
por 3 meses, pois pode haver espermatozóides no ejaculado durante este período.
Legislação - Lei 9263 de 12/01/1996: somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações:
-Em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de 25 anos OU pelo menos, com 2 filhos vivos, desde
que observado o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será
propiciado ao interessado as informações necessárias.
-Risco de vida ou à saúde da mulher ou do concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por 2 médicos.
-Condições: manifestação da vontade em documento escrito e firmado; é vedada a esterilização em mulher
durante o parto, aborto e até o 42° dia de puerpério (exceto nos casos de comprovada necessidade manifestada
por dois médicos); se presente união conjugal, o consentimento deverá ser de ambos; a esterilização em
incapazes só pode ser feita mediante autorização judicial; a esterilização como método contraceptivo só pode
ser realizada através de laqueadura tubária, vasectomia ou outro método cientificamente aceito, sendo vedada
através de histerectomia ou ooforectomia.
-Pena: caso não sejam observadas as condições citadas, reclusão de dois a oito anos ou multa.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Ginecologia volume 1.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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CLIMATÉRIO
Climatério é o período fisiológico que se inicia desde os primeiros indícios de falha ovariana, mesmo que os
ciclos continuem regulares ou até ovulatórios e termina na senilidade (65 anos). Nem sempre é sintomático.
Definições:
-Perimenopausa: é o período que compreende os anos que precedem a menopausa e os doze meses que se
seguem à menopausa. Há a presença de distúrbios da duração do ciclo menstrual.
-Menopausa: definida como a última menstruação devido à falência ovariana. É um diagnóstico retrospectivo,
após passado um ano de ter ocorrido. A idade média de ocorrência da menopausa é aos 51 anos.
-Pós-menopausa: período que se inicia doze meses após a última menstruação e vai até os 65 anos de idade.
-Senilidade: período que se inicia a partir dos 65 anos de idade.
Perimenopausa: A irregularidade menstrual é a maior característica dessa fase. Isto se deve a um aumento
dos níveis de FSH, que ocorre na perimenopausa, determinando um recrutamento e amadurecimento folicular
mais precoces.
Lembrar que a duração da fase folicular (primeira fase) é o principal determinante da duração do ciclo menstrual.
Além disso, a diminuição do número de ovócitos próximo à menopausa, há diminuição dos níveis de inibina, produto
das células da granulosa, que exerce um importante feedback negativo sobre a secreção do FSH. Com a diminuição
deste estímulo, os níveis de FSH se elevam.
Apesar dos níveis de FSH elevados, quanto mais próximo à menopausa os folículos envelhecidos tornam-se
cada vez mais resistentes à estimulação deste hormônio, o que torna a fase folicular mais longa e os ciclos
menstruais irregulares. A ausência de menstruação se instala quando o número decrescente de folículos atinge
o número crítico de 1.000 folículos, o que representa o limite inferior necessário para manter os ciclos
menstruais. Já os níveis de estradiol começam a cair apenas cerca de 6 meses a um ano antes da parada
completa do desenvolvimento folicular, uma vez que são mantidos pelos altos níveis de FSH. Apesar do
aumento do número de ciclos anovulatórios, enquanto há produção de estrogênio, ovulação e formação do
corpo lúteo, com produção de progesterona, o feedback do LH é mantido e os seus níveis não se elevam até
instalada a menopausa.
-Manifestações: o sintoma mais importante desta fase é a irregularidade menstrual, ocorrendo em mais de 50%
das mulheres. Sangramento uterino anormal (SUA) nessa fase pode ocorrer, e só pode ser considerado
decorrente de alterações hormonais (há um tecido proliferativo resultante dos efeitos estrogênicos não
contrabalanceado pela ação da progesterona, pois há vários ciclos anovulatórios) após cuidadosa avaliação
para excluir patologias subjacentes, devendo o câncer de endométrio ser sempre lembrado. Depressão,
ansiedade e irritabilidade podem ocorrer e não parecem estar associadas às alterações hormonais, sendo
decorrente de distúrbios psicológicos, envolvendo a aceitação do envelhecimento e a parada da procriação.
O câncer de endométrio tem incidência de 10% em mulheres com SUA durante o climatério. Na sua investigação,
deve ser realizada uma análise histopatológica de amostra endometrial, obtida através de histerectomia, exame de
eleição para diagnóstico de lesões hiperplásicas, ou, na sua ausência, de curetagem uterina fracionada (CUF)
Após excluídas as etiologias malignas, devemos tratar o sangramento. Para isso, a primeira opção é a Terapia
Hormonal (TH), usualmente com ACO combinados de baixa doses. Como a dose de estrogênio é 4 vezes
maior que a usada na menopausa, essas pílulas devem ser substituídas pela TH clássica aos 50 anos. Outras
opções são o uso de acetato de medroxiprogesterona na segunda fase do ciclo mensalmente, que supre a
ausência de progesterona (pois os ciclos são geralmente anovulatórios) ou inserção de um DIU de
progesterona, responsável pela diminuição do sangramento vaginal e leva a amenorréia em 50% dos casos.
Menopausa: apesar do ovário ter esgotado sua população folicular e a mulher ter entrado na menopausa, o
ovário continua ativo e todo o perfil hormonal da mulher se altera. Como não há mais folículos, a produção de
estrogênio pelo ovário torna-se desprezível. O principal estrogênio da mulher deixa de ser o estradiol,
produzido pelos folículos, e passa a ser a estrona, produto da aromatização nos tecidos periféricos (muscular,
hepático, cerebral e, sobretudo, adiposo) dos androgênios produzidos pelas suparrenais e ovários,
principalmente da androstenediona. As alterações dos níveis estrogênicos são responsáveis pela maior parte da

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morbidade da mulher após a menopausa.
Este fato explica o porquê de mulheres obesas apresentarem com freqüência níveis aumentados de estrogênio
circulante sem oposição da progesterona. Este fenômeno leva à formação de um endométrio proliferativo, o que
aumenta a chance de hiperplasia endometrial e câncer de endométrio. Em contrapartida, mulheres mais magras
possuem níveis estrogênicos mais baixos, com menor risco de câncer de endométrio, porém maior de osteoporose.
Como não ocorre mais crescimento folicular após a menopausa, o estímulo gonadotrófico hipofisário atua
sobre o estroma ovariano levando a síntese, mesmo que em menor quantidade, de androgênios, que se tornam
os principais hormônios produzidos pelos ovários (androstenediona e testosterona). Em relação à
progesterona, sua produção cessa após a menopausa.
Em conseqüência da queda dos níveis dos hormônios ovarianos, há elevação de 10-20 vezes do FSH e de
cerca de 3 vezes do LH, quando comparado aos níveis pré-menopausa. A ausência de menstruação associada a
níveis elevados de FSH e LH é diagnóstico de falência ovariana.
-Manifestações: a menopausa é um diagnóstico retrospectivo. Sintomas característicos como rubores faciais e
fogachos ou o teste de supressão com progestógeno podem ser indicativos da ocorrência da menopausa.
Pós-menopausa: após a menopausa o ovário apresenta produção hormonal discreta, basicamente restrita à
androstenediona e testosterona. Não há mais produção de estrogênio ou progesterona e, portanto, os níveis das
gonadotrofinas encontram-se elevados inicialmente, diminuindo com o passar dos anos. A clínica deste
período é decorrente basicamente da queda dos níveis estrogênicos.
Alterações precoces:
-Amenorréia prolongada: é o sintoma mais característico e evidente desta fase.
-Alterações vasomotoras: chamados de fogachos, essas alterações caracterizam-se por períodos transitórios e
recorrentes de rubor na face, pescoço e tórax, sudorese e sensação de calor, frequentemente acompanhados por
palpitações e ansiedade. Os episódios duram de 1 a 3 minutos e podem se repetir mais que 30 vezes ao dia.
São mais freqüentes à noite e recorrem por um a dois anos após a menopausa. Parece decorrer de uma
disfunção termorregulatória no hipotálamo pela retirada do estrógeno. Embora possa ocorrer ema até 20% das
mulheres perimenopáusicas, é mais característico do período pós-menopausa, acometendo 75-80% das
mulheres. Temperaturas elevadas, fumo, sedentarismo e exercício físico extenuante estão associados ao
surgimento dos sintomas.
-Outros sintomas: diminuição da libido, distúrbios do sono e alterações de humor são freqüentes.
Alterações tardias:
-Alterações atróficas: após os primeiros 4 a 5 anos da menopausa, aproximadamente 1/3 das mulheres que não
estejam recebendo TH começam a apresentar atrofia sintomática do epitélio vaginal, uretral e da base da
bexiga (tecidos estrogênio-dependentes).
Vagina: há perda da elasticidade e do enrugamento, diminuição e estreitamento do canal vaginal, redução das
secreções vaginais e elevação do pH. Os sintomas incluem ressecamento, dispareunia e infecções vaginais e urinárias
recorrentes. Os lubrificantes melhoram significativamente os sintomas sexuais.
Aparelho urinário: como tem embriologicamente a mesma origem do trato genital, o tecido é também estrógeno-
dependente. A atrofia pode causar disúria, urgência e infecções urinárias de repetição.
-Sistema nervoso central: pode surgir dificuldade de concentração e perda cognitiva e da memória recente.
-Doença cardiovascular: a grande maioria das desordens vasculares decorre da aterosclerose e os principais
fatores de risco são semelhantes aos do homem: HAS (principal), tabagismo, dislipidemia, diabetes, obesidade
e sedentarismo. No entanto, mesmo com todos esses fatores controlados, o risco de doença coronariana é 3
vezes superior ao do homem.
Estrogênio e aparelho cardiovascular: diminui níveis de colesterol total e LDL e aumenta o HDL; estimula a
produção endotelial de vasodilatadores e antiagregantes plaquetários (NO e PG); melhora o metabolismo periférico
de glicose com diminuição dos níveis de insulina; estímulo à fibrinólise; inibição do acúmulo de LDL em macrófagos
nas placas ateroscleróticas; redução dos níveis de renina e ECA.
-Osteoporose: doença esquelética sistêmica caracterizada por baixa massa óssea e deterioração da micro-
arquitetura do osso, levando à fragilidade óssea e propensão à fraturas. Após a menopausa, a taxa de perda
óssea aumenta significativamente, com perda de mais de 2% do osso cortical e 5% do osso trabecular por pelo
menos 5-8 anos, devido à excessiva ação dos osteoclastos relacionada à deficiência de estrogênio. Após esse

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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período, o ritmo de perda óssea tende a diminuir. Na maior parte dos casos a perda óssea é assintomática. Os
sinais e sintomas da osteoporose decorrem da sua principal conseqüência: as fraturas. As fraturas vertebrais
são as mais comuns, porém geralmente assintomáticas, não sendo comumente diagnosticadas. Já as fraturas de
fêmur são as mais letais, ocorrendo, geralmente, no fêmur proximal (transtrocanteriana).
O diagnóstico clínico é sugerido após a ocorrência de fratura atraumática ou advinda de trauma menor, como queda
da própria altura, sendo firmado pela densitometria mineral óssea [DMO] (coluna lombar L2-L4 e trocanter femoral),
que é padrão-ouro. Alterações na radiografia só serão evidenciadas quando a diminuição da densidade óssea
alcançarem níveis alarmantes. Interpretação da DMO: 1 a 2,49 DP abaixo do grupo de mulheres adultas jovens →
osteopenia; > 2,5 DP abaixo → osteoporose.
Indicações de DMO: mulheres > 65 anos, mulheres na menopausa com risco aumentado (baixo peso ou fratura
anterior por mínimo trauma), adultos com fratura em idade > 50 anos, adultos com condição associada à osteoporose
ou uso de medicação associada a perda de massa óssea (glicocorticóide >5mg/dia por >3meses), mulheres em TH
que desejem interromper o tratamento e na avaliação da resposta terapêutica.

PROPEDÊUTICA DO CLIMATÉRIO
Check-Up do climatério: por ser um período onde há aumento significativo de doenças crônicas, neoplásicas
e cardiovasculares, é essencial a avaliação rotineira da mulher, especialmente naquelas que farão uso de TH.
Deverão ser solicitados: lipidograma, glicemia, pesquisa de sangue oculto nas fezes (a partir dos 50 anos),
colpocitologia oncótica, mamografia, USG pélvica e DMO (em >65 anos ou com fatores de risco). Dosagem
de FSH, LH e estrogênio não deve ser rotineira. Avaliação dos hormônios tireoidianos só é necessária em
casos sintomáticos.
Orientações: intensificar precauções em relação ao sedentarismo, controle de PA e glicemia, tratamento de
dislipidemia e tireoidopatias, interrupção do tabagismo, tratamento de obesidade e investigar história familiar
de doenças crônicas e neoplasias.
Tratamento:
-Alterações vasomotoras: o tratamento inicial dos fogachos é a adoção de práticas que diminuem a
temperatura corporal, como exposição a ambientes arejados e uso de roupas leves. A prática de exercícios e a
interrupção do fumo também são efetivos. A TH reduz os sintomas dias após a sua instituição, mas deve ser
feita pelo menor tempo possível, de forma contínua; a maior dificuldade é a interrupção desta terapêutica, pois
frequentemente observa-se o retorno dos sintomas. A clonidina, um alfa-2 agonista central e periférico,
também pode ser utilizado, principalmente como primeira opção em hipertensas; na dose de 0,1-0,2mg/dia,
apresenta 80% de remissão dos sintomas. Outras opções são a paroxetina e a tibolona. Compostos à base de
fitoestrogênicos não apresentam evidência científica de eficácia no tratamento dos sintomas climatérios.
-Alterações atróficas: o tratamento com reposição estrogênica leva a uma melhora dramática dos sintomas em
cerca de um mês. Os lubrificantes vaginais, apesar de proporcionarem alívio dos sintomas, principalmente da
dispareunia, não promovem melhora no trofismo vaginal, podendo ser úteis nas pacientes com sintomas leves.
Quando outros fatores estão associados à deterioração sexual, tais como o envelhecimento, saída dos filhos de
casa, limitações físicas e não se sentir atraente, o acompanhamento psicológico é útil.
-Alterações de humor: a melhora dos sintomas vasomotores com a TH estrogênica influencia diretamente nas
alterações do humor.
-Osteoporose: os objetivos do tratamento visam a prevenção primária da osteoporose e a prevenção de fraturas
em pacientes com osteoporose já instalada. Estímulo à atividade física (30 minutos, 3x/semana, com
sobrecarga de peso), dieta (rica em cálcio) e interrupção do tabagismo são as principais medidas para
prevenção primária da osteoporose. Em relação aos medicamentos para prevenção e tratamento da
osteoporose, destacam-se:
-TH com estrogênios: inibem a reabsorção óssea, mas deve-se avaliar a relação custo-benefício, só devendo ser
indicada na impossibilidade de outras opções.
-Bifosfonatos: drogas de escolha para o tratamento da osteoporose. Reduzem a incidência de fraturas e comprovada-
mente aumentam a massa óssea do fêmur e da coluna vertebral. As principais medicações do grupo incluem:
alendronato (5mg/dia para prevenção, 10mg/dia para tratamento) e risedronato (5mg/dia). Podem ser administrados
semanalmente, multiplicando-se a dose por 7. Contra-indicados em renais agudos/crônicos e em grávidas.

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-Outros medicamentos: raloxifeno (modulador seletivo do receptor de estrogênio – SERM; tratamento de 1ª linha pra
osteoporose), calcitonina (pode também ser utilizada na impossibilidade do uso de estrogênio), cálcio, vitamina D
-O tratamento medicamentoso está indicado para paciente com fratura de vértebra ou quadril, DMO com < 2,5 DP
OU com DMO com osteopenia ( DP entre 1 e 2,5) e causas secundárias associadas a alto risco de fratura..
Terapia Hormonal (TH):
-Indicações: os fogachos são a indicação mais comum de início e manutenção de uma TH, havendo redução
dos sintomas em alguns dias após sua instituição; nesses casos, deve ser feita pelo menor tempo possível, de
preferência, menos que 5 anos. A reposição de estrogênio melhora drasticamente as alterações atróficas,
incluindo os sintomas vaginais e urinários, sendo a via tópica preferida, pois os efeitos locais são 4 vezes
superiores do que quando administrados por via oral; entretanto, a concentração sistêmica é menor, não
tratando sintomas como fogachos e não prevenindo a perda de massa óssea. A TH não deve ser prescrita com o
objetivo de tratar distúrbios depressivos.
-Efeitos adversos:
-Endometrial: o principal efeito adverso é o desenvolvimento de hiperplasia endometrial e câncer de endométrio,
principalmente naquelas que fazem o uso de estrogênio sem associação com progestógeno (risco 4 a 7 vezes maior).
Por isso, recomenda-se que aquelas em TH façam controle anual endometrial, através de biópsia do endométrio ou
USG transvaginal, na qual é aceito um eco-endometrial de até 8mm, sendo que a espessura menor que 5mm
praticamente elimina as chances de neoplasia endometrial em usuária de TH.
-Mama: atualmente, apesar de divergente e não bem estabelecido, considera-se que a TH com estrogênios não altera
de forma significativa a incidência de câncer de mama. A associação com progestógeno não exerce influência
benéfica.
-Cardiovascular:
-Fígado e vias biliares: como a metabolização quando administrado pela via oral é hepática, aumentam-se as chances
de doença da vesícula biliar e problemas hepáticos. Em hepatopatas e pessoas com história de doença biliar, deve-se
evitar a via oral.
-Contraindicações
-Absolutas: antecedente de câncer de mama; antecedente de câncer de endométrio; tromboembolismo agudo;
sangramento vaginal de origem indeterminada; doenças hepáticas ativas; porfiria
-Relativas: tromboembolismo prévio; doença coronariana; hipertensão arterial; diabetes melito; mioma uterino e
endometriose; doença da vesícula biliar; lúpus eritematoso sistêmico; melanoma.
-Vias e regime de administração:
-Oral: a TH em pacientes com útero preservado consiste na administração de estrogênios isolados durante 3 semanas
com associação de um progestógeno por 10 dias. Alguns autores recomendam a administração contínua do
progestógeno para evitar a hemorragia cíclica. Os estrógenos mais utilizados são: equinos conjugados (dose de 0,3,
0,45, 0,625 e 1,25mg/dia), estradiol micronizado (0,5 e 1mg/dia), etinil estradiol (5μg/dia), valerato de estradiol (2mg/
dia), adesivos de estrogênio (0,025 e 0,05mg/dia).
-Outras vias: vaginal, implantes subcutâneos, intranasal, adesivos transdérmicos, intramuscular e gel.
-Progestógeno: sempre devem ser associados à TH em mulheres com útero intacto. Tem como objetivo promover
proteção endometrial sem interferir nos benefícios estrogênicos. Pode ser usado em esquemas de 10 (menor tempo
para conferir proteção), 14 dias ou continuamente. Exemplos: acetato de medroxiprogesterona, progesterona
micronizada, acetato de noretindrona, levonorgestrel, dienogest. O mais utilizado é o acetato de medroxiprogesterona,
na dose de 2,5-5,0mg/dia ou 10mg/dia durante 12-14dias/mês.
Vale salientar que a reposição de progestógenos associados aos estrogênios está sempre indicada em pacientes
não histerectomizadas, visando a proteção endometrial, com diminuição comprovada do risco de câncer
endometrial.
Conclusões:
-A indicação primária de TH é para os sintomas menopáusicos moderados a intensos
(vasomotores)
-Quando os sintomas forem somente vaginais, dá-se preferência pela via vaginal para
administração; -Progestógenos estão sempre indicados em mulheres com útero
-Jamais utilizar TH como prevenção primária ou secundária de doenças cardiovasculares
-Ao se usar na prevenção da osteoporose, buscar alternativas que não a TH, principalmente se o

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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uso for previsto por mais que 5 anos
-A TH não é indicada na prevenção de demência ou Alzheimer
-Sempre utilizar menor dose e tempo necessários para alívio dos sintomas.
-Sempre examinar por completo a paciente antes da TH, com ênfase ao sistema cardiovascular e à
busca de câncer de mama oculto

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010, Ginecologia volume 3.

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AMENORRÉIA
A ausência de menstruação é um sintoma comum, que pode acometer até 5% das mulheres. Conceitos:
-Hipomenorréia: redução nos dias de duração do fluxo menstrual.
-Oligomenorréia: redução na freqüência das menstruações, ou seja, intervalos superiores a 35 dias.
-Espaniomenorréia: se refere aos intervalos menstruais superiores a 45 dias.
-Criptomenorréia: o sangramento não se exterioriza por alterações no trajeto de saída; ex. hímen imperfurado.
-Amenorréia: ausência de menarca ou de menstruação por, no mínimo, 3 ciclos consecutivos ou 6 meses.
-Atraso menstrual: ausência de menstruação por período inferior a 3 ciclos.
A amenorréia é considerada fisiológica na infância, na pós-menopausa, na gestação e no puerpério.
Classificação:
-Amenorréia primária: ausência de menstruação aos 14 anos de idade associada a falha no desenvolvimento
sexual (ausência de características sexuais secundárias) ou ausência de menstruação aos 16 anos mesmo que
com caracteres sexuais secundários presentes.
-Amenorréia secundária: ausência de menstruação por 6 meses ou pelo tempo equivalente a três ciclos
menstruais, uma vez a mulher no menacme.
Fisiologia:
-Ciclo menstrual: a menstruação é a eliminação cíclica do endométrio. O estímulo inicial para o
funcionamento hormonal feminino é o GnRh, um neuro-hormônio produzido pelo hipotálamo e secretado de
forma pulsátil; chega à hipófise pela circulação porta-hipofisária, onde estimula a secreção do FSH e LH.
Essas gonadotrofinas hipofisárias atuam nos folículos ovarianos, estimulando a produção de estrogênio e
progesterona, e o pico do LH desencadeia a ovulação. O estrogênio e a progesterona atuam no endométrio,
acarretando modificações do tipo proliferativo ou secretor, com o objetivo de prepará-lo para a implantação do
ovo. Caso não ocorra a gravidez, a secreção desses dois hormônios pelo corpo lúteo diminui, o que leva a
descamação do endométrio, originando o sangramento de privação hormonal, dito, menstruação. Vale salientar
que estímulos exógenos (meio ambiente), endógenos (órgãos e hormônios) e alterações psíquicas podem
intervir na regularidade do ciclo menstrual.
-Embriologia do aparelho reprodutivo: o desenvolvimento embriológico sexual normal consiste de três
processos sequenciais relacionados:
Estabelecimento do sexo cromossômico na fertilização: o organismo será masculino se XY e feminino se XX. Nos
dois primeiros meses de gestação os dois sexos se desenvolvem de maneira exatamente idêntica.
Determinação do sexo gonadal: se dá quando as gônadas até então indiferenciadas se desenvolvem em ovários ou
testículos, a partir de 8 semanas de gestação.
Desenvolvimento dos fenótipos sexuais: ocorre quando as estruturas precursoras sexuais indiferenciadas dão origem
às características masculinas ou femininas. Para que desenvolvam-se os órgãos masculinos, deve haver estímulo pela
testosterona produzida pelo testículo. Caso não ocorra estímulo pela testosterona, na ausência de testículos, o fenótipo
desenvolvido será feminino, mesmo na ausência dos ovários. Esse processo se completa por volta de 12 semanas no
sexo masculino e pouco mais tarde no sexo feminino.

AMENORRÉIA PRIMÁRIA
Os casos de amenorréia primária devem ser analisados de acordo
com a presença ou ausência dos caracteres sexuais secundários. O
exame físico minucioso pode demonstrar anormalidades no
desenvolvimento da genitália externa, virilização, hematocolpo e
estigmas de Turner. Diante da presença de sinais de determinada
patologia, não será difícil buscar o diagnóstico etiológico,
dispensando a realização de exames adicionais. Nos casos de
virilização é recomendável a avaliação das adrenais e ovários
através de dosagens hormonais, exames de imagem e cariótipos.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Vale lembrar que a principal etiologia da amenorréia primária sem
caracteres sexuais secundários (hipogonadismo) com elevação das
gonadotrofinas (hipergonadotrófico) é a disgenesia gonadal, sendo a
síndrome de Turner a causa mais comum. Já nos casos de
amenorréia primária com hipogonadismo hipogonadotrófico, a
principal causa é o hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático.

AMENORRÉIA SECUNDÁRIA
A propedêutica da amenorréia secundária envolve:
-Dosagem de TSH: tem o objetivo de detectar o
hipotireoidismo subclínico (TSH elevado, T4 normal),
encontrado em pequeno número de pacientes amenorréicas
e/ou com galactorréia. Para relembrar, o TRH além de
estimular a secreção do TSH, apresenta ação estimuladora
sobre a produção de prolactina, o que explica a necessidade
de dosagem do TSH nos casos de amenorréia.
-Dosagem de prolactina: a prolactina é um hormônio
sintetizado pela adeno-hipófise que possui as funções fisiológicas de indução e manutenção da lactação,
inibição da função reprodutiva e inibição do impulso sexual. É secretada de forma pulsátil e com grande
variação durante o dia a fase do ciclo folicular, o que exige que, caso haja um nível elevado, este deva ser
confirmado. A hiperprolactinemia promove amenorréia pela inibição da secreção pulsátil de GnRH e
galactorréia pelo estímulo ao tecido mamário.
-Teste da progesterona: avalia simultaneamente o status estrogênico e a patência do trato genital. Baseia-se na
administração de acetato de progesterona 10mg/dia durante 5 dias ou de progesterona micronizada oral 300mg
por dia durante 5 dias. 2 a 7 dias após o término do esquema devemos avaliar se:
-Ocorre sangramento: significa que o estrogênio endógeno ocasionou a proliferação endometrial normal e o trajeto de
saída está pérvio. Portanto, deduz-se que o endométrio foi preparado previamente pelo estrogênio, mas não houve o
efeito da progesterona, por ausência de corpo lúteo, e sua conseqüente queda que faria ocorrer a menstruação. Caso
necessário, prossegue-se a investigação da causa específica da anovulação. Vale salientar que a exposição do
endométrio sem a oposição da progesterona é fator de risco para câncer de endométrio, devendo ser oferecido
tratamento à mulher, que consiste em: acetato de medroxiprogesterona 10mg nos 10 a 12 últimos dias do ciclo ou
anticoncepcionais orais combinados de baixa dosagem.
-Ausência de sangramento: deve-se suspeitar de causas relacionadas à produção estrogênica deficiente, resposta
endometrial inadequada ou fator obstrutivo do trato de saída. Prossegue-se então a propedêutica com o próximo teste.
-Teste do estrogênio: baseia-se na administração de estrogênios conjugados 1,25mg/dia ou 2mg de estradiol
por via oral durante 21 dias, com associação do acetato de medroxiprogesterona 10mg nos últimos cinco dias.
A mimetização de um ciclo com estrogênio e progesterona exógenos visa examinar a resposta endometrial: a
ocorrência de sangramento (teste positivo) exclui obstrução do trato de saída (causas uterovaginais), enquanto
a falta de resposta ao ciclo artificial atesta anomalias do trato genital. Portanto, o teste negativo geralmente
está associado a causas de amenorréia primária.
-Dosagem de FSH: nas pacientes em que se evidencia sangramento após o teste do estrogênio devem ser
avaliadas quanto à presença de uma causa ovariana ou um distúrbio no eixo hipotálamo-hipofisáio. Para isso,
dosa-se o FSH, que fará uma distinção entre:
-Hipogonadismo hipergonadotrófico: dosagens elevadas de FSH (>20mUI/ml) indicam que há integridade do eixo,
não estando ocorrendo produção hormonal a nível ovariano. Ex: menopausa e falência ovariana precoce.
-Hipogonadismo hipogonadotrófico: dosagens baixas de FSH (<5mUI/ml), por sua vez, indicam que não há produção
hormonal a nível ovariano por ausência de estímulo central. Ex: pré-púbere, disfunções hipofisárias e hipotalâmicas.
A alteração dos níveis de gonadotrofinas justifica o rastreio de tumores do SNC, através de RNM e/ou TC.

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Além dos tumores hipofisários e hipotalâmicos, a anorexia nervosa também pode cursar com níveis pré-
púberes (baixos) de gonadotrofinas. Entre as outras causas de aumento das gonadotrofinas estão os tumores
produtores de gonadotrofinas, tais como a neoplasia maligna de pulmão.
-Teste do GnRH: a administração de GnRH exógeno pode ser realizada nos casos de hipogonadismo
hipogonadotrófico para determinar a origem da disfunção. A elevação dos níveis de FSH e LH de 200% em
relação ao basal após a administração do GnRH sugere um defeito hipotalâmico. Em mulheres que não
responderam ao teste é indicada a sua repetição após 4 a 7 dias, pois pode ocorrer uma dessensibilização da
hipófise por hipotrofia funcional, secundária ao longo tempo sem estimulação.

ETIOLOGIA DAS AMENORRÉIAS


AMENORRÉIAS HIPOTALÂMICAS – Hipogonadismo hipogonadotrófico
A secreção pulsátil de GnRH é modulada por interação com neurotransmissores e esteróides gonadais
periféricos. Opióides endógenos, hormônio liberador da corticotropina (CRH), doença crônica, desnutrição,
estresse, exercícios físicos e distúrbios psiquiátricos inibem a secreção do GnRH, enquanto que catecolaminas,
acetilcolina e o peptídeo intestinal vasoativo estimulam seus pulsos de secreção. Este tipo de amenorréia inclui
alguns achados: níveis normais de prolactina, radiografia de sela túrcica normal, falha da terapia de supressão
com progesterona e resposta normal ao estímulo seqüencial com estrogênio e progesterona.
Estresse: estados de grande tensão, embora não tenha sido elucidado o mecanismo de atuação, desregula a
liberação do GnRh, podendo levar a quadros de amenorréia.
Distúrbios alimentares: a bulimia e a anorexia nervosa, por mecanismo psíquico e não nutricional, atua da
mesma forma que o estresse, podendo, inclusive, a amenorréia ser a primeira manifestação da doença.
Exercícios físicos: a rotina de atividade física extenuante pode induzir irregularidade menstrual, amenorréia
secundária ou primária (atraso na menarca de até 3 anos). A etiologia, neste caso,é multifatorial: alteração nos
neurotransmissores, percentual de gordura corpórea muito diminuído (pois há um limiar mínimo de gordura
corporal necessário à menarca), estresse e liberação de endorfinas.
Atraso constitucional da puberdade: não é causa muito freqüente de amenorréia. Os níveis de GnRH são
deficientes em relação à idade cronológica, estando associados a um retardo no desenvolvimento dos
caracteres sexuais secundários (puberdade tardia). Apesar de ser a causa mais comum de puberdade tardia, o
diagnóstico é de exclusão. Tem padrão familiar.
Neuropatias: a amenorréia também pode fazer parte de quadros de neuropatia. A síndrome de Kallman é a
mais conhecida das neuropatias determinantes de amenorréia hipotalâmica, na qual ocorre falha na migração
das células olfatórias e das produtoras de GnRH, resultando em hiposmia/anosmia e hipogonadismo
hipogonadotrófico (amenorréia em mulheres). Esta síndrome foi inicialmente descrita em homens.
Pós-pílula: decorre do feedback negativo contínuo exercido pelos hormônios presentes nos anticoncepcionais,
combinados ou não. Pode persistir por até 6 meses após a suspensão da pílula e por até 12 meses após a última
aplicação IM do acetato de medroxiprogesterona.
Outros: drogas (metoclopramida, metildopa) agem por feedback negativo aos neuro-hormônios ou pela
elevação da prolactina. Tumores podem levar à produção diminuída (amenorréia) ou aumentada de GnRH.

AMENORRÉIAS HIPOFISÁRIAS
O hipopituitarismo representa a minoria das amenorréias secundárias. Tumores, infartos, lesões infiltrativas ou
granulomatosas, ablações cirúrgicas, radioterapia e hiperprolactinemia podem determinar essa entidade.
Hiperprolactinemia: A hiperprolactinemia, como citado, promove amenorréia pela inibição da secreção
pulsátil de GnRH e galactorréia pelo estímulo ao tecido mamário. Pode provocar ainda hipoestrogenismo e
osteoporose, caso não tratada. Esses efeitos podem ser contornados com o uso de agonistas da dopamina,
como a bromocriptina e a cabergolina, pois a dopamina é o principal fator inibidor da secreção de prolactina.
Sempre que os níveis de prolactina estão elevados, uma vez descartadas outras causas secundárias de
hiperprolactinemia, deve-se solicitar uma RNM da hipófise visando identificar um possível prolactinoma, o

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principal tumor hipofisário. A TC também pode ser utilizada com esta finalidade. Causas:
-Hipotalâmicas:cistos, pseudotuomores, tumores e doenças infecciosas do SNC que bloqueiem a liberação de
dopamina podem resultar em hiperprolactinemia por feedback negativo.
-Hipofisários: microadenomas, prolactinomas, craniogaringioma e hipotireoidismo são as causas mais comuns
associadas a um aumento da secreção de prolactina.
-Metabólicas: cirrose hepática, insuficiência renal e, também enquadrado como causa metabólica, o hipotireoidismo.
-Drogas: os principais são os antagonistas da dopamina (fenotiazinas, tioxantenos, metoclopramida). Outras
medicações relacionadas são: neurolépticos (haldol), ADT (imipramina, amitriptilina), fluoxetina, cimetidina,
ranitidina, metildopa, ACHO, entre outros. A suspensão resulta em resolução imediata da hiperprolactinemia.
-Fisiológicas: anestesia, coito, estimulação da papila mamária, gestação, lactação, estresse, sono, pós-parto.
Tumores: o adenoma hipofisário é a causa tumoral mais freqüente de amenorréia, sendo o prolactinoma o tipo
mais comum, representando 50% dos adenomas.
Síndrome de Sheehan: resulta da necrose hipofisária secundária à isquemia local, que pode ocorrer em
hemorragias com instabilidade hemodinâmica (choque hipovolêmico) no parto. Se expressa clinicamente
como pan-hipopituitarismo, embora o setor gonadotrófico seja o mais atingido, ocorrendo amenorréia
secundária associada a ausência de lactação.
Síndrome de Simmonds: apresenta a mesma etiologia da síndrome anterior, embora não possua relação com
o parto. Diferente da síndrome de Sheehan, caracteriza-se por pan-hipopituarismo.

AMENORRÉIAS GONADAIS
Anovulação crônica: engloba todas as situações onde há falhas repetidas da ovulação. É causada por uma
assincronia entre a secreção de gonadotrofinas e a produção de estrogênio, com alteração dos complexos
mecanismos de feedback do eixo HHO, que culmina no insucesso do processo de maturação folicular e da
ovulação. Não há hipogonadismo, pois a produção de estrogênio é normal. O tratamento da anovulação
consiste em: desejo de gravidez → indução da ovulação com citrato de clomifeno; desejo de anticoncepção →
anticoncepcionais combinados ou acetato de medroxiprogesterona, visando induzir a decidualização do
endométrio, impedindo a progressão para hiperplasia endometrial.
-Síndrome da Anovulação Crônica Hiperestrogênica Hiperandrogênica: sua fisiopatologia é controversa. Resulta em
irregularidade menstrual, hirsutismo, acne, obesidade central, resistência à insulina e infertilidade
Disgenesia gonadal: importante causa de amenorréia primária. Está, na maioria dos casos, associada a
alterações cromossômicas, em especial a síndrome de Turnner.
-Síndrome de Turnner: anormalidade cromossomial mais comum como causa de insuficiência gonadal e amenorréia.
Aproximadamente 40% das mulheres com amenorréia primária apresentam ovários em fita (disgenesia). Não há o
desenvolvimento adequado dos caracteres sexuais secundários. A genitália é feminina e pré-púbere; útero, trompas e
vagina estão presentes, porém infantilizados. Várias alterações e estigmas podem ser encontrados.
Falência ovariana precoce: definida como a falência ovariana antes dos 40 anos de idade. Pode ser idiopática
ou secundária a irradiação pélvica, quimioterapia, processos infecciosos autoimunes, cirurgias, tumores ou
resistência ovariana as gonadotrofinas (síndrome de Savage). Dependendo da época que se manifesta, pode
determinar amenorréia primária ou secundária. Se pré-púbere, a deficiência estrogênica causa o
hipodesenvolvimento dos caracteres sexuais secundários. Se no menacme, aparecem sintomas climatéricos.
Deficiência de 5 alfa-redutase: essa enzima faz a conversão da testosterona na sua forma ativa, a
diidrotestosterona (DHT). As pacientes com esse distúrbio apresentam cariótipo XY, ou seja, apresentam
genitália externa feminina ou ambígua, pela não exposição fetal à DHT, e genitais internos masculinos
(testículos). Na puberdade, a elevação da produção de testosterona irá produzir alterações no timbre da voz,
ereção, libido masculino e desenvolvimento normal das mamas. Isso torna o manejo extremamente difícil, na
dependência do sexo de criação do indivíduo.

AMENORRÉIAS UTEROVAGINAIS
Para que o sangramento menstrual ocorra de forma cíclica e regular, além de um eixo em total integração com
o meio endógeno e exógeno, é necessária a resposta proliferativa do endométrio ao estímulo estrogênico, sua

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oposição pela progesterona na segunda fase do ciclo transformando-se em secretor e, por fim, um trajeto de
saída pérvio. Portanto, as causas de amenorréia uterovaginais podem ser decorrentes de falha da resposta
endometrial, de malformações uterinas ou do trajeto de saída, por agenesia ou simples obstrução.
Malformações dos ductos de Muller: esses ductos originam a genitália interna feminina (útero, trompas e
2/3 superiores da vagina). As malformações mullerianas associadas a amenorréia podem corresponder à
agenesia ou hipoplasia uterina ou a causas obstrutivas, como septo vaginal transverso e hímen imperfurado.
-Hímen imperfurado e septo vaginal transverso: a apresentação habitual se caracteriza por dor pélvica cíclica
associada à ausência da menarca, em meninas com caracteres sexuais secundários presentes. O diagnóstico é clínico,
com visualização direta da malformação e, quando há sangue retido, pela presença de hematocolpo. O diagnóstico é
firmado pela USG e o tratamento cirúrgico deve ser imediato.
-Síndrome de Asherman: é definida pela presença de sinéquias intrauterinas decorrentes de agressão endometrial
prévia, geralmente causando amenorréia secundária. Apresenta-se como pontos de aderências entre as superfícies
uterinas opostas. Esta complicação decorre de traumas na camada basal com exposição da muscular, onde os contatos
entre as pares opostas formam traves entre si durante o processo de cicatrização. A origem da amenorréia não é
obstrutiva e geralmente ocorre pela falha do crescimento endometrial. Curetagens uterinas excessivas ou repetidas,
processos inflamatórios, substâncias cáusticas e cirurgias uterinas podem ser a causa da síndrome.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Ginecologia volume 1

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SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL


O sangramento uterino anormal (SUA) é uma das queixas mais comuns nos ambulatórios de ginecologia,
acometendo mulheres de todas as faixas etárias. As maiores prevalências estão nos extremos de vida, quando a
freqüência de ciclos anovulatórios irregulares é maior.
No geral, uma paciente apresenta o mesmo padrão de sangramento menstrual durante toda a menacme. Sendo
assim, a queixa de mudança do padrão de sangramento é a informação mais importante na definição do SUA.
O sangramento menstrual normal, ao fim do ciclo ovulatório, resulta da queda dos níveis de estrogênio e
progesterona, secundário à atrofia do corpo lúteo. Também é pela interrupção do uso desses hormônios que ocorre
sangramento em pacientes usuárias de anticoncepcionais ou terapia de reposição hormonal. Apesar das divergências
na literatura, o ciclo menstrual normal varia de 21 a 35 dias, dura de 2 a 6 ou 8 dias e ocorre uma perda de sangue de
20 a 60 ou 80ml.
Padrões Anormais de Sangramento: há divergências conceituais entre as fontes. De forma geral:
-Menorragia: fluxo menstrual excessivo (> 60 ou 80 ml)
-Metrorragia: sangramento fora do ciclo menstrual. Neste caso, são mais freqüentes patologias orgânicas.
-Hipermenorréia: sangramento com duração maior que o normal (>6 ou 8 dias)
-Polimenorréia: intervalos entre ciclos diminuídos (<21 dias)
-Oligomenorréia: intervalos entre ciclos aumentado (>35
dias)
-Sinusiorragia: sangramento relacionado ao ato sexual
Etiologia: várias patologias podem cursar com SUA. Em
linhas gerais, as causas são agrupadas como:
-Orgânicas: gravidez, doenças sistêmicas, doenças
pélvicas, traumas e uso de medicamentos.
Gravidez: abortamento, doença trofoblástica gestacional,
gravidez ectópica, placenta prévia, descolamento
prematuro de placenta.
Doenças sistêmicas: linfoma, pênfigo, doença de Crohn,
doenças da tireóide, doenças hepáticas crônicas, doença
renal, tabagismo, síndrome de Cushing, hemorróidas,
uretrite, câncer de bexiga, infecção do trato urinário,
tumores vasculares.
-Coagulopatias: doença de Von Willebrand,
trombocitopenia (PTI, IRC, hiperesplenismo), leucemia
aguda, deficiência dos fatores de coagulação, doença
hepática avançada
Doenças pélvicas:
-Útero: benigno (pólipo, hiperplasia endometrial,
adenomiose, leiomioma), câncer (adenocarcinoma), infecção
-Cérvice: pólipo, câncer (carcinoma), infecção (cervicite).
-Vulva: condiloma, câncer, DST
-Vagina: pólipos, cistos de Gartner, câncer, vaginose
bacteriana, DST, vaginite atrófica
Traumas: intercurso sexual, abuso sexual, corpo estranho,
traumas pélvicos (acidentes automobilísticos).
Medicamentos: contracepção (oral, DIU), terapia de
reposição hormonal, tamoxifeno, anticoagulantes
-Disfuncionais (SUD): por definição, é o sangramento de
origem uterina na ausência de gravidez, doença pélvica
ou sistêmica, cuja origem se deve, exclusivamente, a um

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estímulo hormonal inadequado sobre o endométrio. O SUD é diagnóstico de exclusão. Sendo assim, ressalta-
se essa definição: o SUD é um tipo de SUA; logo, todo SUD é SUA mas nem todo SUA é SUD.

Nas provas de residência geralmente são questionadas as causas de menorragia. Sendo assim, são elas:
Coagulopatias (as já citadas + anticoagulantes), lesões estruturais (leiomioma, adenomiose e pólipos), neoplasias
(adenocarcinoma endometrial, sarcoma uterino) e outras (endometrite, hipotireoidismo, DIU, hiperestrogenismo e
endometriose).

Epidemiologia: é importante salientar as principais causas segundo a faixa etária da paciente:


-Neonatal: queda dos altos níveis de estrogênio materno durante a gravidez ao nascimento;
-Infância: corpo estranho (principalmente se vulvovaginite presente ou refratária ao tratamento), trauma
(abuso sexual, queda a cavaleiro), infecção, sarcoma botrióide (rabdomiossarcoma – tumor mais comum,
responsável por 20% dos casos de sangramento em menores de 10 anos) e puberdade precoce.
-Adolescentes: a imaturidade do eixo HHO comum até 2 anos após a menarca, é a principal causa de
anovulação em adolescentes. São também causas: coagulopatias (PTI seguida de doença de Von Willebrand),
complicações gravídicas, uso de anticoncepcionais (sangramento intermenstrual [spotting]), infecção
(sangramento irregular ou pós-coito pode estar associado à cervicite por clamídia) e causas anatômicas (septos
vaginais). Sendo assim, o SUD é a causa mais comum (95%) de SUA na adolescência.
-Menacme (idade reprodutiva): há divergências na literatura, mas segundo o Novak a causa mais comum é o
SUD (outros livros citam as anormalidades da gestação como principal causa). Outras causas freqüentes:
tumores benignos do útero (pólipos, leiomiomas e adenomiose), afecções sistêmicas (tireoidopatias, diabetes,
disfunções renais e disfunções hepáticas), anormalidades hematológicas (leucemia aguda, trombocitopenia e
doença de Von Willebrand), uso de anticoncepcionais, outros métodos contraceptivos (DIU, implante
subcutâneo e injeções de medoxiprogesterona), infecção (clamídia) e câncer.
-Disfunções renais: podem desencadear anovulação e, por conseguinte, SUA.
-Disfunções hepáticas: podem provocar anormalidades na produção de fatores de coagulação e, além disso, o fígado
desempenha papel importante no metabolismo de hormônios sexuais, causando então disfunção do eixo HHO.
-Tireoidopatias: hipotireoidismo comumente cursa com anormalidades menstruais, inclusive menorragia. Já o
hipertireoidismo pode resultar em oligomenorréia ou amenorréia; a principal causa de hipertireoidismo na mulher em
idade reprodutiva é a doença de Graves.
-Métodos hormonais: o spotting ocorre em até 40% das mulheres nos três primeiros meses de uso de
anticoncepcional. O mecanismo do spotting não está bem esclarecido, podendo estar associado com o endométrio
atrófico ou fatores relacionados à angiogênese. Principalmente na adolescência, a falta de adesão se configura como
principal causa do spotting. O tratamento é expectante e orientações quanto ao uso regular da pílula ou até mesmo a
substituição do método ou do esquema de administração do hormônio
-DIU: causa uma resposta inflamatória na cavidade uterina que pode desencadear hipertrofia do endométrio no sítio
de inflamação e resultar em sangramento intermenstrual.
-Perimenopausa: anovulação, tumores benignos de útero (pólipos, leiomiomas e adenomiose) e câncer
(neoplasias endometriais, cervicais e ovarianas devem ser sempre descartadas neste período).
-Pós-menopausa: terapia hormonal com estrogênios exógenos (30%), endometrite/vaginite atrófica (30%),
câncer de endométrio (15%), pólipos endometriais ou cervicais (10%), hiperplasia endometrial (5%) e outras
causas (10% → câncer de colo, sarcoma uterino e trauma). Apesar da principal causa de SUA nessa faixa
etária é a atrofia endometrial (naquelas sem uso de TH), as neoplasias endometriais, cervicais e ovarianas,
principalmente as endometriais, também devem ser sempre descartadas na presença de sangramento uterino.
Diagnóstico: não existe um rastreio diagnóstico universal, devendo os exames serem solicitados de forma
individualizada, baseada nas hipóteses diagnósticas formuladas a partir da história clínica.
-Anamnese: questionar sobre a história menstrual, a duração, o volume do fluxo, intervalos intermenstruais e
mudança do padrão menstrual.
-Exame físico: deve ser minucioso e sempre incluso o exame especular.
-Teste de gravidez: deve ser sempre solicitado para toda paciente na menacme, inclusive adolescentes,
qualquer que seja sua declaração sobre atividade sexual.

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-Hemograma e coagulograma: devem ser solicitados em casos de sangramento de moderada a grande
intensidade para identificar a possível presença de anemia e/ou coagulopatia.
-Ultrassonografia: é o primeiro passo nos exames de imagem. Permite a avaliação da espessura endometrial,
bem como o miométrio, a forma e volume do útero e dos anexos. É método não invasivo e de baixo custo.
Deve ser realizado preferencialmente pela via transvaginal; na sua impossibilidade, solicita-se a USG pélvica
Toda mulher no climatério que apresente SUA deve realizar USG Fatores de risco para câncer
transvaginal para avaliação do eco endometrial; este é normal até 4mm na endometrial:
mulher menopausada não usuária de TH e de 8mm nas usuárias de TH. -Uso de Tamoxifen
Nos casos de SUA em mulher menopausada em que há espessamento -Terapêutica estrogênica isolada
-Anovulação crônica
endometrial, eco heterogêneo ou acima de 35 anos com fatores de risco -Obesidade, diabetes
para câncer de endométrio, está indicada investigação adicional, por -Idade > 50 anos
histeroscopia seguida de biópsia endometrial.
-Histeroscopia: quando seguida de biópsia, é considerada padrão-ouro para investigação endometrial, pois
além da visualização direta da cavidade uterina, permite a coleta de material para estudo histopatológico
através da biópsia dirigida. Pode ser também terapêutica, à exemplo dos casos de pólipos, leiomiomas
submucosos, sinéquias e realização de ablação endometrial.
-Biópsia de endométrio: juntamente com a videohisteroscopia, o estudo histopatológico de biópsia dirigida é o
método padrão-ouro para o diagnóstico das afecções endometriais. Entretanto, geralmente é realizada às
cegas, por aspiração com cureta de Novak ou cateter Pipelle; nesse caso lesões focais podem passar despercebidas.
-Curetagem uterina: método diagnóstico e também terapêutico. Fornece maior quantidade endometrial que a
biópsia, mas requer anestesia geral para sua realização e subestima a presença de leiomiomas submucosos,
pólipos, hipertrofias e carcinomas focais. Muitas vezes é um dos últimos recursos terapêuticos em
sangramentos volumosos e agudos, ou na tentativa de conservar o útero.
-Outros exames: na suspeita de doenças relacionadas podem ser solicitados: TSH, T4 livre, provas de função
hepática, provas de função renal (uréia, creatinina), dosagem de prolactina, entre outros. Na suspeita de
coagulopatia deve-se solicitar: TTPA, TPAE, fibrinogênio, fator VIII, ristocetina C e fator de Von Willebrand.
-Exames sem alterações: vale lembrar que na ausência de qualquer substrato orgânico como causa de SUA,
por diagnóstico de exclusão, permite-se atribuir o diagnóstico de Sangramento Uterino Disfuncional – SUD.
Tratamento - Manejo de sangramento agudo: No momento do sangramento agudo, a avaliação do estado
geral da paciente é mandatória. Determina-se, junto com o volume do sangramento, a necessidade de medidas
terapêuticas urgentes no sentido de coibir a hemorragia. O manejo da fase aguda dependerá basicamente da
faixa etária, do estado geral da paciente e do volume de sangramento.
-Agentes antifibrinolíticos: a exemplo do ácido tranexâmico (1 a 1,5g VO, 3 a 4 vez ao dia), agem dentro de
duas a três horas após a administração, não interferem com a fertilidade e podem ser mais efetivos que AINEs
no tratamento da hemorragia aguda. Atuam como antifibrinolíticos, prevenindo a degradação da fibrina.
-Estrogênio intravenoso em altas doses: estrogênios promovem rápido crescimento do endométrio sobre a
superfície epitelial e estimulam a proliferação endometrial. Apesar de ser o tratamento de escolha inicial para
o controle do sangramento uterino agudo e profuso, não está mais disponível no Brasil.
-Estrogênio oral em altas doses (10mg/dia): os EC em regime equivalente ao EV podem ser oferecidos a
pacientes hemodinamicamente estáveis que podem tolerar a terapia oral sem distúrbios gástricos.
-Progestógenos em altas doses: altas doses de progestógenos como acetato de medroxiprogesterona 10 a
20mg, duas vezes ao dia por 10 dias, é opção a ser considerada. Nas situações em que há descamação irregular
do endométrio, pode-se obter uma curetagem hormonal. Porém, se um sangramento profuso resultou em
desnudamento endometrial, os progestógenos dificilmente serão eficazes.
-Contraceptivos orais: altas doses de ACHO combinado (pílulas com pelo menos 30 microgramas de etinil
estradiol) geralmente cessam o sangramento em 48 horas. Pode ser feito um ataque com 4 pílulas a cada 6
horas até que cesse o sangramento, por pelo menos 24 horas. Após o final do sangramento ou como início de
terapia, administrar uma pílula de 8/8 hrs por 3 dias, depois uma de 12/12 horas por 3 dias e segue-se de 1
pílula ao dia por 21 dias. Tende a ser menos efetivo que o uso de estrogênio isolado. Largamente utilizados.
-Tamponamento: pode ser feito pela introdução de um catéter de Folley na cavidade uterina, que deve ser

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enchido (10 a 30ml) e permanecer cheio por 3 horas, podendo permanecer até 12 horas. Esse procedimento irá
tamponar o sangramento e ajuda a estabilizar a paciente, enquanto o tratamento definitivo é iniciado.
-Curetagem uterina: pode ser tanto terapêutica como diagnóstica em pacientes com sangramento agudo. Coíbe
eficazmente sangramentos severos, inclusive em pacientes hemodinamicamente instáveis, e é a única opção
cirúrgica para mulheres que desejam preservar a fertilidade. Como limitação, não é curativa, havendo
recorrência do sangramento se não for iniciada outra terapia preventiva no pós-operatório.
-Ablação endometrial: é um tratamento efetivo para hemorragia aguda. Porém não é recomendado para
pacientes que desejam engravidar. Indicada nas refratárias ao tratamento clínico e naquelas que não possam
ser submetidas à histerectomia (ausência de condições clínicas para realização dessa cirurgia de grande porte)
ou que não a desejem. A presença de lesões hiper- ou neoplásicas é contraindicação para este procedimento.
-Histerectomia: no caso de falha de todos os outros métodos, a histerectomia pode ser considerada. É o único
procedimento que garante solução definitiva para o SUA.
Tratamento específico
-Anomalias estruturais: causas comuns de sangramento. Seu tratamento será abordado em capítulo específico.
-SUD: uma das maiores causas de SUA, terá seu tratamento específico abordado no próximo capítulo.
-Infecção: além das medidas para tratamento agudo, o uso de antibiótico costuma levar à resolução do quadro.
-Gravidez: as complicações gravídicas, identificadas a partir do b-HCG e USG, e se u conseqüente tratamento
obstétrico serão abordadas em capítulos específicos.
-Doenças sistêmicas:
-Doença renal: AINE são contraindicados, pois causam vasoconstricção da artéria renal. A administração cíclica de
progestógenos costuma ser útil. Na falha ou impossibilidade do tratamento clínico, indica-se tratamento cirúrgico.
-Tireoidopatias: o tratamento clínico da tireotoxicose ou do hipotireoidismo costuma corrigir a disfunção menstrual.
-Coagulopatia: o tratamento de mulheres com doença de Von Willebrand e SUA incluem desmopressina,
concentrados de plasma, contracepção hormonal, antifibrinolíticos e cirurgia. Nas deficiências dos outros fatores de
coagulação, o tratamento é feito pelo reposição do fator ausente.

Fontes de Pesquisa:
Sangramento uterino anormal: aspectos atuais da propedêutica. UERJ, 2003.
Sangramento uterino anormal. PUC – RS Ginecologia de Williams

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SANGRAMENTO UTERINO DISFUNCIONAL


Sangramento uterino disfuncional ou endócrino é definido como um sangramento uterino irregular, sem
nenhuma causa orgânica (genital ou extragenital) demonstrável. É, pois, um diagnóstico de exclusão, feito
após cuidadosa eliminação das causas orgânicas de sangramento uterino representadas pela gravidez e suas
complicações, patologias uterinas e pélvicas benignas e malignas, e problemas extragenitais, como distúrbios
da coagulação, doenças sistêmicas, endocrinopatias extra-ovarianas, ou uso de medicamentos que interferem
com a ação hormonal ou com os mecanismos de coagulação. Por definição, para que o sangramento seja
considerado disfuncional ele deve, necessariamente, responder à terapia hormonal.
Epidemiologia: distúrbio freqüente que pode ocorrer em qualquer época do período reprodutivo da mulher,
mas concentra-se principalmente em seus extremos, ou seja, logo após a menarca e no período perimenopausa,
quando alterações no eixo HHO levam à anovulação e são mais frequentes Aproximadamente 20% das
pacientes com sangramento disfuncional são adolescentes e 50% concentram-se na faixa dos 40 a 50 anos.
Etiologia: O sangramento uterino disfuncional é representado por duas situações distintas. Aquele que ocorre
em pacientes que estão ovulando e o que ocorre nas pacientes que não estão ovulando.
-SUD Ovulatório: a ovulação ocorre em 15% das pacientes com SUD. Pode se apresentar e ser causado por:
-Sangramento da ovulação: secundário à formação de pequenos trombos nos vasos endometriais, conseqüentes à
elevação plasmática dos níveis de estrogênio e/ou também se deve ao sangramento da rotura folicular por ocasião da
ovulação. Ocorre com mais freqüência ao fim da vida reprodutiva. É geralmente escasso e coincide com o período da
ovulação, que pode ser identificado pela secreção mucosa clara, abundante e filante que se apresenta rajada de sangue
e eventualmente associada à dor da ovulação (dor de Mittelschmerz).
-Descamação irregular: causada por regressão retardada do corpo lúteo, fazendo com que ainda persistam áreas sob
ação da progesterona do ciclo anterior juntamente com áreas de proliferação estrogênica do ciclo atual. É um
sangramento abundante com intervalos regulares. A biópsia mostra um endométrio em vários estágios.
-Sangramento pré-menstrual: ocorre com mais freqüência ao fim da vida reprodutiva, por uma produção insuficiente
de progesterona devido à insuficiência do corpo lúteo. Há perda escassa de sangue escuro antecedendo em alguns
dias a menstruação.
-Persistência do corpo lúteo (síndrome de Halban): é um episódio esporádico de sangramento que não ocorre de
maneira cíclica. Muito confundido com gravidez ectópica, pois apresenta-se como atraso menstrual, seguido de
perdas irregulares de sangue, dor no baixo ventre e presença de massa anexial palpável que corresponde ao corpo
lúteo hemorrágico. O diagnóstico diferencial é feito pela USG e b-hCG. Tem curso autolimitado
-SUD Anovulatório: é uma das manifestações clínicas dos estados de anovulação crônica, qualquer que seja
sua etiologia, e representa 85% dos casos de hemorragias disfuncionais. E m 80 a 90% dessas mulheres,
ocorre disfunção do eixo HHO, seja por imaturidade ou por outras causas (ex. obesidade, dietas), culminando
em anovulação. O sangramento pode ser leve ou intenso, constante ou intermitente, geralmente não associado
a sintomas de tensão pré-menstrual, retenção hídrica ou dismenorréia, embora a paciente possa queixar-se de
cólicas pela passagem do coágulo pelo canal cervical. A anovulação e o conseqüente SUD colocam a paciente
em risco para câncer de endométrio.
-Puberdade: a anovulação se deve a uma imaturidade do eixo HHO, ainda incapaz de levar um folículo ao estágio
maduro e desencadear o pico ovulatório de LH. Nesta época é comum encontrarmos os ovários policísticos (se existe
uma população folicular adequada e a presença de FSH, os folículos crescerão até um diâmetro aproximado de 6 a 8
milímetros, acumulando abaixo da superfície, dando-lhe o aspecto policístico).
-Menacme: a anovulação crônica é conseqüência geralmente de CAUSAS DE ANOVULAÇÃO
um mecanismo de feedback inapropriado, cujo resultado levará síndrome anovulatória crônica, anovulação
invariavelmente aos ovários policísticos. crônica normogonadotrópica, estresse,
-Climatério: a anovulação se deve à falência funcional dos hiperprolactinemia, hiperandrogenismo,
ovários, quando ainda produzem estrogênios mas não mais obesidade, dietas exageradas para perder
peso, exercício em excesso, imaturidade do
ovulam e conseqüentemente não produzem progesterona. eixo HHO em adolescentes, distúrbios da
Também os ovários poderão estar policísticos, desde que exista tireoide e diminuição da produção de
ainda uma população folicular suficiente, porem, não é a regra. estrogênio em pré-menopáusicas.

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Fisiopatologia do SUD anovulatório: O sangramento ocorre irregularmente na camada superficial, diferente
da descamação ordenada de toda a camada funcional do endométrio que ocorre na menstruação de ciclos
ovulatórios. O constante estímulo estrogênico não estabilizado pela progesterona, uma vez que não ocorreu
ovulação, resulta em um endométrio excessivamente proliferado em virtude dos níveis de estrogênio
constantes, porém com vascularização insuficiente. Ocorrem então áreas de necrose focal da mucosa que
cursarão com sangramento. Neste caso, há uma relação entre os níveis de estrogênio e a quantidade de
sangramento: baixos níveis de estrogênio levam a um sangramento irregular, tipo spotting; altos níveis de
estrogênio sustentam períodos longos de amenorréia, geralmente seguidos de sangramentos profusos.
A anovulação e o conseqüente SUD colocam a paciente em risco para câncer de endométrio (adenocarcinoma)
Diagnóstico: uma vez afastadas quaisquer causas orgânicas de sangramento uterino, etapa mais difícil no
diagnóstico, pode se atribuir ao sangramento sua origem disfuncional. A partir daí deve-se identificar se o
SUD é ovulatório ou anovulatório; para isso, necessita-se apenas de uma anamnese associada a qualquer
método que comprove a presença ou ausência da ovulação (temperatura basal, dosagem da progesterona,
colpocitologia funcional, cristalização do muco cervical, ultra-sonografia etc).
Diagnóstico diferencial:
-Imaturidade do eixo HHO: a história menstrual evidencia uma menarca na época habitual e ciclos subsequentes
irregulares no período e duração, o que, por si só, fala da possibilidade de ciclos anovulatórios, comum na
adolescência. As perdas sanguíneas comumente não são severas.
-Coagulopatias: caracterizam-se por sangramentos mais prolongados e/ou severos. Os defeitos na coagulação estão
presentes em 30% daquelas que necessitam de hemotransfusão. A menarca é, para muitas adolescentes, a primeira
oportunidade de testar seus mecanismos de coagulação.
-Pós-cesariana: um quadro muito comum em pacientes com mais de uma cesariana anterior é a ocorrência de
sangramento escasso, escuro, que se prolonga por 5-8 dias após a menstruação normal. É geralmente interpretado
como SUD. Pela repetição da cirurgia, ocorre uma cicatrização viciosa da histerorrafia, formando uma espécie de
vala, que reterá uma quantidade de sangue durante a menstruação que será lentamente eliminada após a regra.
-Relação com o ciclo: os sangramentos anormais cíclicos favorecem o diagnóstico de SUD, ao passo que
sangramentos acíclicos são mais sugestivos de patologias orgânicas.
Tratamento: a causa da anovulação, sempre que possível, deve ser tratada. Os princípios do tratamento são:
48. estabilizar e ou manter a estabilidade hemodinâmica;
49. corrigir a anemia aguda ou crônica (suplementar ferro);
50. retornar o padrão de ciclos menstruais normais;
51. prevenir a recorrência;
52. prevenir as consequências da anovulação a longo prazo (infertilidade ou adenocarcinoma de
endométrio).
-AINE: agentes orais eficazes e bem tolerados que costumam ser utilizados no tratamento de SUD. Seu uso
está relacionado ao papel das prostaglandinas na patogênese do SUD. Devem ser administrados poucos dias
antes ou concomitantemente ao início da menstruação, e continuados enquanto ela durar. São exemplos:
ibuprofeno (400mg 12/12 horas).
-Ácido tranexâmico (Transamin®): fármaco antifibrinolítico que age pela redução dos níveis de plasmina. Não
possui efeitos em outros parâmetros da coagulação, como TTPA, TPAE ou plaquetometria. Só necessita ser
administrado durante a menstruação e produz efeitos colaterais (gastrintestinais) mínimos. Pelo alto custo,
deve ser utilizado apenas quando os AINE isoladamente não conseguem controlar adequadamente o
sangramento.
-Progestógenos orais: mais utilizados e eficazes no SUD anovulatório, se constituindo como primeira opção
nestes casos. O acetato de medroxiprogesterona é um dos mais utilizados. A posologia é de 10mg/dia, sendo
administrado durante os dias 16 a 25 depois do início do fluxo menstrual; segue-se o sangramento de privação
3 a 5 dias após o uso. Outro fármaco da mesma classe é a Noretindrona, na dose de 5 mg/dia. No entanto não é
método contraceptivo.
-ACHO combinados: além do controle do sangramento, diminuem os sintomas de dismenorréia e são um
método contraceptivo. Sendo assim, em pacientes menores que 35 anos, não-tabagistas e com desejo de
contracepção, estes são os fármacos de escolha. Seu suposto mecanismo de ação é a atrofia endometrial. Deve

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ser utilizado 1 comprimido via oral uma vez ao dia por 21 dias.
-Danazol (androgênio): derivado da testosterona sintética, este fármaco cria um ambiente hipoestrogênico e
hiperandrogênico, levando a atrofia endometrial. A perda menstrual é reduzida à metade, podendo ocorrer
amenorréia. Para sangramentos intensos, a dose é de 100 a 200mg, VO, todos os dias. Como efeitos colaterais,
promove ganho de peso, pele oleosa e acne. A Gestrinona (2,5mg/dia a cada 3 a 4 dias) é outro androgênio
com efeitos similares ao danazol. Pelos seus efeitos androgênicos colaterais, ambos são considerados fármacos
de segunda linha, cuja utilização ocorre por curto período de tempo antes da cirurgia.
-Agonistas do GnRH: o estado hipoestrogênico criado por esses agentes produz atrofia endometrial e
amenorréia na maioria das mulheres. No entanto, os efeitos colaterais podem ser dramáticos, e incluem
aqueles típicos da menopausa. A perda óssea associada impede seu uso por tempo prolongado. Sua utilização
por curto prazo ajuda na indução da amenorréia,
permitindo a mulher reconstituir sua massa celular
vermelha antes da cirurgia.
-DIU de levonorgestrel (Mirena): a adição de
progestinas aos DIUs inertes reduz a expulsão,
melhora a ação contraceptiva e, em alguns casos,
após 3 meses da colocação, reduz a menorragia.
Pode ser empregado em todas as mulheres como
tratamento de primeira linha da menorragia ao
invés da medicação por via oral. Seus benefícios
são melhores na mulher em idade reprodutiva que
também desejam a contracepção.
-Cirurgia: quando o tratamento clínico falha ou
está associado a efeitos colaterais significativos, o
tratamento cirúrgico da menorragia inclui
procedimentos destrutivos do endométrio
(ablação), curetagem ou a histerectomia.

Fonte de Pesquisa:
Sangramento uterino anormal: aspectos atuais da propedêutica. UERJ, 2003.
Sangramento uterino anormal. PUC – RS
Ginecologia de Williams www.medicina.net

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LESÕES UTERINAS ESTRUTURAIS


ADENOMIOSE
Doença benigna uterina comum, caracterizada pela presença de ilhas de glândulas
endometriais e estroma no interior do miométrio. O tecido ectópico responde aos
estímulos hormonais, de tal forma que, durante a fase menstrual, esses focos
produzem pequenos sangramentos que ficam retidos entre fibras musculares,
culminando com uma reação inflamatória que resulta em dor e sangramento uterino anormal.
Pode estar associada à hipertrofia e hiperplasia miometrial e, por vezes, ao aumento volumétrico do útero,
geralmente mais pronunciado na parede posterior.
Epidemiologia: acomete preferencialmente mulheres entre 40 e 50 anos. É mais comum em multíparas e
cirurgia uterina anterior parece ser fator de risco. Não se sabe ao certo a prevalência, variando de 15 a 62%.
Manifestações: por vezes é assintomática. Quando sintomática, manifesta-se por hipermenorréia e/ou
menorragia, associada à dismenorréia intensa e progressiva, muitas vezes incapacitante, com início na 4ª
década. A freqüência e intensidade dos sintomas estão relacionados diretamente com a extensão da doença.
Classificação: é histológica e se baseia no grau de penetração do miométrio: I – acomete 1/3 do miométrio; II-
acomete 2/3 do miométrio e III – acomete todo o miométrio.
Diagnóstico: o diagnóstico clínico é difícil e apenas presuntivo, pois a maioria dos sintomas são similares ao
de outras desordens uterinas, como miomatose e endometriose.
-Exames complementares: a USG pélvica e a RNM podem sugerir fortemente o diagnóstico; entretanto, o
diagnóstico definitivo é dado pela análise histopatológica.
-USG-TV: apesar de sensibilidade e especificidade razoavelmente boas, a grande limitação deste método está na
diferenciação entre leiomiomas e adenomiomas. Além disso, os achados são muito inespecíficos. O período indicado
para sua realização é o pré-menstrual, quando a adenomiose está mais proeminente. São vistas áreas hipoecóicas e
heterogêneas dentro do miométrio com margens parcialmente definidas. Ocasionalmente a adenomiose apresenta a
imagem de queijo suíço, causada pelas áreas de hemorragia e coágulos no miométrio.
-RNM: possui alta sensibilidade e especificidade. É o método que delineia melhor a localização e extensão das lesões.
Sua maior vantagem é a distinção entre leiomiomas e adenomiomas. É atualmente a melhor referência para o
diagnóstico presuntivo da adenomiose. Zona juncional com irregularidades e espessamento superior a 12mm (normal:
varia de 1 a 3mm no ciclo menstrual) é praticamente patognomônica de adenomiose.
-Histerossalpingografia: pode apresentar sinal sugestivo de adenomiose: sinal de Dionisi, que corresponde a
irregularidades na superfície miometrial.
-Estudo histopatológico: o diagnóstico de certeza é histopatológico após histerectomia. 80% dos casos de adenomiose
associam-se a outras condições, principalmente leiomioma, pois este é o tumor uterino mais comum.
-Outros: TC apresenta baixa sensibilidade e especificidade. A videohisteroscopia pode apresentar sinais sugestivos
Tratamento:
-Clínico: deve ser tentado em pacientes com sintomas discretos ou na pré-menopausa. São utilizadas drogas
para antagonizar o estrogênio ou inibir a função ovariana. Nem sempre a resposta é tão efetiva.
-Análogo de GnRH: caso a RNM evidencie lesões focais de adenomiose, indica-se este medicamento por 3 a 6 meses
para que haja redução do tamanho das lesões e, posteriormente, seja realizada ressecção dos focos.
-DIU de levonorgestrel (Mirena®): utilizado caso a RNM evidencie doença difusa do miométrio. Boa opção naquelas
pacientes que ainda tem o desejo de engravidar ou para as que não podem/querem submeter-se à histerectomia.
-Cirúrgico conservador: indicado para aquelas que não podem/querem submeter-se à histerectomia.
-Ablação endometrial: Indicada para a adenomiose grau I. Nos casos de grau I e II, pode-se realizá-la e, em seguida,
fazer a colocação de um DIU de levonorgestrel.
-Adenomiomectomia: a retirada de todo o tumor é difícil pela sua característica infiltrativa.
-Cirúrgico definitivo: a histerectomia é ainda o tratamento definitivo. Entretanto, o achado de adenomiose em
mulheres mais jovens ou, como vêm ocorrendo na atualidade uma primeira gestação em idade mais elevada,
em mulher de maior idade nulípara, não justifica-se a histerectomia, sendo empregado o tratamento clínico.
PÓLIPO ENDOMETRIAL

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Lesões em relevo na superfície da cavidade uterina que reproduzem total ou parcialmente o endométrio.
São constituídos por glândulas e estroma endometrial; apesar disso, apresentam poucos receptores de
estrogênio e progesterona. Essa característica provavelmente se deve ao fato de serem os pólipos de origem no
endométrio basal e se projetam pelo endométrio funcional sendo, portanto, refratários às influências
hormonais do ciclo menstrual, isto é, não descamam junto com o endométrio menstrual e são insensíveis aos
tratamentos hormonais. Devido a freqüência de malignização (0,5-3,2%) devem ser sempre retirados.
Epidemiologia: a prevalência é variável, estando entre 10 a 25 % da população feminina, com predomínio a
partir dos 40 anos. A incidência aumenta com a idade durante os anos férteis (menacme).
Classificação: apesar de não ter correlação com os sintomas, conforme a sua histologia são classificados em:
-Hiperplásicos: mais freqüentes, principalmente na perimenopausa. Apresentam hiperplasia sem atipia celular.
-Funcionais ou mucosos ou glandulares: pólipos típicos do menacme
-Fibrosos ou fibrocísticos: são mais freqüentes em mulheres idosas, com características atróficas.
-Adenomatosos: apresentam predomínio de músculo liso no seu estroma.
-Mistos: quando somam-se características anteriores.
Manifestações: comumente assintomáticos, sendo achado ocasional de USG
rotineira. O sintoma mais comum é o sangramento uterino anormal (intermenstrual,
pós-menstrual escuro, menorragia ou sangramento na pós-menopausa), mais
freqüente quanto maior o pólipo. Aproximadamente 25% das mulheres com SUA
apresentam pólipos endometriais. Estão ainda relacionados à infertilidade, estando
presentes em 55% das inférteis sem causa aparente. A dismenorréia é rara.
Diagnóstico: é realizado por métodos de imagem e histeroscopia, pois não há
achados específicos ao exame clínico. O tamanho do pólipo não é suficiente para produzir aumento uterino.
-USG-TV: possui boa sensibilidade, sendo o pólipo descrito como imagem focal hiperecogênica no
endométrio. Como vantagens há o baixo custo quando comparado à RNM e não ser invasivo quando
comparado à histeroscopia.
-Histeroscopia: faz o diagnóstico definitivo. A videohisteroscopia é o método de maior acurácia. É possível
analisar forma, volume, consistência e localização do pólipo. Como não diferencia com segurança lesões
benignas das pré-malinas e malignas, faz-se necessário o estudo histopatológico.
Tratamento:
-Polipectomia: a ressecção cirúrgica do pólipo por via histeroscópica é o tratamento de eleição para os pólipos
endometriais. Apresenta os melhores resultados em termos de tratamento do SUA, das taxas de fertilidade e da
menor recidiva do pólipo. Deve seguir-se da análise histopatológica do material retirado. Deve ser sempre
realizada uma vez identificada a presença de pólipos, devido ao potencial de malignização destes.
-Curetagem uterina e métodos de extração às cegas: não são mais utilizados, uma vez que não asseguram a
ressecção completa do pólipo, em especial de sua base, local de maior potencial de malignização.
PÓLIPO CERVICAL
Possui origem na mucosa endocervical e, à semelhança do endometrial, é constituído de glândulas e estroma
hiperplasiado. Pode conter pedículo na endocérvice e se projetar pelo orifício externo do colo, ou serem largos
e espessos. A coloração, normalmente rósea, pode ser alterada pelo comprometimento vascular.
Manifestações: a sinusiorragia é o sintoma mais comum. Entretanto, pólipos mais volumosos ou com
pedículos mais longos podem aflorar à vulva e serem percebidos pela paciente. Durante a gravidez sangram
com freqüência, podendo o sangramento ser confundido com outras causas, como descolamento prematuro de
placenta ou placenta prévia; outra problemática é quando o sangramento na gravidez é atribuído ao pólipo,
porém deve-se à complicação gravídica subjacente.
Diagnóstico: o exame especular é definitivo para o diagnóstico. Os de maior volume podem também ser
percebidos pelo toque vaginal.
Tratamento: consiste na excisão por torção do pedículo e/ou na ressecção videohisteroscópica do pólipo; o
que define a conduta é a base, séssil ou pediculada, do pólipo.
LEIOM IOMA UTERINO

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Tumores benignos formados por fibras musculares lisas do útero com estroma de tecido conjuntivo em
proporções variáveis. São também denominados fibromas, fibromiomas, leiomiofibroma, fibróide ou,
simplesmente, mioma.
Epidemiologia: é a neoplasia benigna mais comum da mulher, representando cerca de 95% dos tumores
benignos do trato genital feminino. Estima-se que acometa 1/3 das mulheres na menacme. É responsável por
1/3 das histerectomias, se constituindo como a principal causa.
Fatores de risco: história familiar, idade reprodutiva, raça negra (2-3x mais comum), nuliparidade,
infertilidade, menarca precoce (antes dos 10 anos), etilismo (sobretudo cerveja) e hipertensão arterial. Em
contrapartida, por mecanismo ainda desconhecido, o tabagismo é fator protetor, assim como uso de ACHO.
Etiopatogenia:
-Níveis circulantes de estrogênio: indubitavelmente, este hormônio é o principal fator determinante do
crescimento tumoral, especialmente o estradiol. O aparecimento no menacme, o crescimento durante a
reposição hormonal e gravidez, a regressão do tamanho ou interrupção do crescimento após a menopausa e a
conexão com outras doenças hiperestrogênicas corroboram sua influência. Apesar dessas observações, não foi
observado aumento dos níveis de estrogênio em mulheres portadoras de leiomiomas uterinos. Existe, porém,
maior número de receptores de estrogênio nos tecidos tumorais, o que faz com que a massa, uma vez formada,
responda de forma mais sensível às variações do ambiente hormonal feminino.
-Níveis circulantes de progesterona: a progesterona também é responsável pelo crescimento do mioma, por
inibir a apoptose (através da alterações entre inibidores e promotores da apoptose) e estimular as mitoses e
crescimento celular durante a fase lútea.
-Alterações bioquímicas no mioma: no tecido do mioma há deficiência de 17-hidroxidesidrogenase tipo II,
responsável pela conversão do estradiol em estrona, um metabólito menos ativo. Em contrapartida, possui
níveis de aromatase mais elevados, que converte a androstenediona em estrona e a testosterona em estradiol.
Esses fatos sugerem que o mioma produza um ambiente hiperestrogênico favorável ao seu crescimento.
Patologia: os leiomiomas são tumores nodulares que podem ser únicos ou múltiplos, pequenos ou gigantes,
sésseis ou pediculados. São circunscritos, bem delimitados e pseudoencapsulados (não possuem cápsula
verdadeira). Macroscopicamente, quando predomina tecido conjuntivo são duros e brancacentos; quando
predomina o tecido muscular, são róseos e de consistência amolecida. Histologicamente se observam fibras
musculares lisas com tecido conjuntivo de permeio. São raras as mitoses (observadas em maior número na
gravidez e com o uso de ACHO), característica importante na distinção de leiomiossarcomas. À medida que os
miomas crescem podem apresentar as seguintes alterações degenerativas: hialina (mais comum, por
diminuição do suprimento sanguíneo), cística (secundária à liqüefação das áreas com degeneração hialina),
mucóide, rubra (comum na gravidez, ocasionadas por obstrução venosa pelo rápido crescimento tumoral),
gordurosa (mais rara), calcificação (resultado do déficit de suprimento sanguíneo), necrose (por interrupção do
suprimento sanguíneo) e sarcomatosa (degeneração maligna extremamente rara.
Classificação: podem ser classificados pela porção uterina na que se encontram, em cervicais, ístmicos ou
corporais (98%), ou podem ser classificados pela
posição relativa à camada uterina, em:
-Subseroso: posicionado abaixo da serosa (peritôneo
visceral) uterina. É o que causa menos sintomas.
Entretanto, pode crescer dissecando os folhetos do
ligamento largo, sendo, então, do tipo intraligamentar,
o que mais comumente causa obstrução ureteral.
-Intramural: posicionado dentre o miométrio. À
medida que cresce pode evoluir para subseroso ou
submucoso. É o mais freqüente. Relacionado à
hipermenorragia e dismenorréia.
-Submucoso: é a forma que provoca mais hemorragia
pela sua íntima relação com o endométrio.
Os miomas pediculados são um tipo especial de mioma, que podem originar-se do subseroso ou submucoso.

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Os miomas paridos representam o crescimento exagerado do pedículo do submucoso, havendo exteriorização.
Manifestações: menos de 50% dos miomas uterinos são sintomáticos. Quando sintomáticos, manifestam-se:
-Sangramento anormal: é o sintoma mais comum e o que mais leva a paciente à cirurgia. A hipermenorréia é o
distúrbio mais característico, evoluindo para polimenorréia até metrorragia. Parece decorrer do aumento da
superfície endometrial sangrante e da dificuldade do miométrio em se contrair. A presença e intensidade do
sangramento dependem mais de sua localização (mais comum quando submucoso), do que do seu tamanho.
-Dor pélvica e dismenorréia: a isquemia é responsável pela dor proveniente do próprio tumor. Contudo, a dor
deriva usualmente da compressão de estruturas adjacentes. A dor irradia para região lombar ou membros
inferiores; sintomas urinários e intestinais e dispareunia podem estar presentes (por congestão pélvica).
-Aumento do volume abdominal: comum em miomas volumosos que saem da cavidade pélvica. Não é
infrequente o crescimento tão exagerado que dê ao abdome aparência gravídica.
-Compressão geniturinária: nos miomas volumosos, nos intraligamentares e nos situados no istmo uterino
pode correr compressão vesical e/ou uretral. Manifesta-se por polaciúria (mesmo em tumores pequenos
quando há compressão vesical), incontinência urinária, hidronefrose e ITU de repetição.
-Distúrbios intestinais: a compressão do reto pode acarretar constipação, fezes em fita e hemorróidas.
-Infertilidade: é controverso que o mioma isoladamente cause
SINTOMATOLOGIA GERAL
infertilidade, geralmente havendo fatores associados. Apesar de não Subserosos: sintomas
interferirem na ovulação, os mecanismos que causam infertilidade são os compressivos e distorção
seguintes: oclusão do óstio tubário nos tumores fúndicos, alterações anatômica dos órgãos adjacentes.
vasculares endometriais impedindo a nidação e incapacidade de distensão Intramurais: sangramento e
uterina nos miomas múltiplos ou volumosos. dismenorréia
-Complicações gravídicas: abortamentos e outras complicações Submucosos: sangramentos
irregulares e infertilidade
obstétricas (apresentação anômala, TPP, DPP) podem ocorrer.
Diagnóstico: através da anamnese (investigando os sintomas mais característicos) e pelo toque vaginal
bimanual (avaliar útero: contorno, dimensões, forma, consistência e mobilidade) a maioria dos miomas pode
ser diagnosticada. Comumente os miomas aumentam o volume uterino, tornam sua superfície irregular
(nodular) e endurecida, diminuem a mobilidade uterina e alteram sua forma. Exames complementares:
-USG pélvica transvaginal ou transabdominal: é o exame de imagem mais importante e o mais facilmente
acessível. Evidencia nódulos hipoecóicos na parede uterina.
-Histerossalpingografia: não é exame de rotina. Indicado na avaliação da permeabilidade tubária em casos de
infertilidade. Pode identificar falha de enchimento da cavidade nos submucosos ou distorções nos intramurais.
-Histeroscopia: importante na avaliação do SUA, sendo úteis no diagnóstico diferencial com outras afecções
ginecológicas: pólipos endometriais, hiperplasia endometrial, adenomiose e carcinoma de endométrio. Nas
inférteis, permite a localização precisa do tumor, bem como a avaliação da permeabilidade dos óstios tubários.
-Videohisteroscopia e TC: não são exames de rotina no diagnóstico primário. Entretanto, miomas podem ser
achados quando esses exames são indicados para outras finalidades.
-RNM: é o melhor exame para visualização e mensuração do leiomioma. Sua limitação é o custo elevado. É o
método propedêutico ideal para diferenciação entre leiomioma e adenomiose, ou para constatação de
adenomiose associada.
Tratamento: O tipo e o momento ideal do tratamento dependem do: tamanho do mioma, localização,
sintomas, idade da mulher e aspiração reprodutiva.
-Conduta expectante: pacientes assintomáticas, pouco sintomáticas sem sintomas gerais e nas peri e pós-
menopausa devem ser acompanhadas clinicamente, não havendo qualquer justificativa para tratamento
intervencionista. Ancora-se em exames clínicos periódicos e USG seriadas, para assegurar que os tumores não
estão crescendo rapidamente.
-Tratamento clínico: o objetivo do tratamento é o alívio dos sintomas. Entretanto, a terapia medicamentosa
possui aplicabilidade limitada e há rápido retorno dos sintomas após sua suspensão, o que leva muitas
mulheres a preferirem o tratamento cirúrgico. O tratamento clínico está indicado para a redução tumoral,
controle da perda sanguínea, para pacientes na perimenopausa e paciente com risco cirúrgico elevado.
-Análogos do GnRH: são as drogas mais efetivas no tratamento clínico dos leiomiomas. Tem potência 15-200

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vezes superior ao hormônio natural. Podem ser utilizados por via IM, SC ou nasal, na forma de depósito.
Promovem um efeito inicial positivo sobre a hipófise na liberação de gonadotrofinas (primeiros 14 dias)
devido à saturação dos receptores (efeito flare-up); após este período, induzem a dessensibilização das células
gonadotróficas pela redução do número de receptores (fase de down regulation dos receptores), que persiste
por cerca de uma a três semanas e culmina com um profundo estado hipoestrogênico.
-Efeitos: redução média de 30-70% do tamanho dos miomas e 2/3 das pacientes desenvolvem amenorréia, melhoram
os padrões hematimétricos e diminuem o volume uterino;
-Limitações: pouco efeito sobre miomas calcificados ou com muita fibrose pela pouca vascularização;
-Efeitos colaterais: decorrentes do hipoestrogenismo: perda de massa óssea (pode culminar em osteoporose),
fogachos, ressecamento vaginal, distúrbios do perfil lipídico e alterações do humor.
-Indicações: devido aos efeitos colaterais, são indicados comumente no preparo pré-operatório de pacientes com
anemia significativa (Hb <9,5) ou, raramente, para minimizar sintomas nas mulheres na perimenopausa.
-Danazol: esteróide androgênico também com ação progesterona-like, possui atividades antigonadotróficas e
antiestrogênicas. Seu mecanismo de ação inclui supressão da secreção de GnRH e conseqüente inibição da
secreção de gonadotrofinas, inibição direta da esteroidogênese e indução de amenorréia.
-Efeitos: pela sua capacidade de induzir amenorréia, pode controlar a anemia conseqüente à menorragia provocada
pelos leiomiomas. Seu efeito sobre o volume tumoral é controverso. Devido ao hipoestrogenismo, assim como os
análogos do GnRH, está indicado apenas no pré-operatório.
-Efeitos colaterais: estão relacionados à sua propriedade androgênica e hipoestrogênica: ganho ponderal, retenção
hídrica, acne, hirsutismo, pele oleosa, fogachos, vaginite atrófica, redução mamária e instabilidade emocional.
-Contra-indicações: pacientes hepatopatas, pois a metabolização é hepática; quando hipertensão, ICC ou
comprometimento renal pois pode causar retenção hídrica; grávidas devido aos efeitos androgênicos no feto.
-DIU de levonorgestrel, progestógenos e ACHO: quando prescritos têm a função de reduzir o sangramento
decorrente do mioma pela ação dos progestógenos. Entretanto, o uso de progestógenos não está indicado para
redução do tamanho do mioma, havendo relatos que pode ocorrer aumento do tamanho tumoral. O DIU não
está indicado quando a presença de miomas distorce a cavidade uterina.
-Tratamento cirúrgico: está indicado no tratamento de SUA ou dor pélvica, na avaliação quando há suspeita
de malignidade (uma vez que os sintomas dos leiomiomas benignos e sarcomas uterinos são semelhantes), no
tratamento da infertilidade e no tratamento de abortamentos recorrentes. A histerectomia é o procedimento
definitivo. Miomectomia por várias técnicas e ablação endometrial são procedimentos alternativos
conservadores do útero.
-Histerectomia: os miomas são a causa mais freqüente de histerectomia (> 30%). Elimina as chances de
recorrência de sintomas causados por leiomiomas, sendo indicada para mulheres com prole constituída ou sem
desejo de engravidar, quando: muito sintomáticos, refratários a outros tratamentos ou se muito volumosos.
Contudo, a morbidade associada à histerctomia pode ter mais importância do que benefícios.
-Tipos: pode ser fúndica, subtotal (reservada para casos com grande dificuldade técnica intra-operatória) ou total. Há
ainda a pan-histerectomia (retirada também dos ovários).
-Vias: pode ser por via laparoscópica, por laparotomia ou por via vaginal. Esta última é considerada por muitos
autores como via preferencial, uma vez do retorno mais rápido às atividades normais e menores índices de
complicações e dor pós-operatória.
-Complicações: hemorragia, infecção, lesão ureteral, lesão vesical, lesão intestinal e fístulas.
-Miomectomia: opção para mulheres que desejam engravidar ou que não querem retirar o útero. Sua
desvantagem é o risco significativo de desenvolvimento de novos miomas. Pode ser realizada por:
-Laparotomia: é a abordagem clássica. No entanto, outras abordagens devem ser pensadas quando paciente sem prole
constituída, pelo risco de ruptura, apesar de muito menor que na cesariana clássica, e de infertilidade, pois pode
causar aderências quando muito próximo ao óstio tubário.
-Videolaparoscopia: está indicada quando pouco número de miomas subserosos (3-5), tamanho menor que 5 cm dos
intramurais e útero não muito volumoso (AFU < 17 semanas de gestação), sendo o não preenchimento desses
critérios as indicações para miomectomia por laparotomia.
-Histeroscopia: é, em geral, o tratamento de escolha para os miomas submucosos. Entretanto, a depender de sua
localização, tamanho e número de miomas pode não ser a terapêutica mais adequada. As maiores complicações
correspondem à perfuração uterina e problemas decorrentes da infusão de fluidos para distender a cavidade. Indicado

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para pacientes com miomas submucosos com: SUA, dor pélvica, infertilidade e/ou abortamentos recorrentes.
-Ablação endometrial: indicada para mulheres com prole constituída no tratamento de episódios de SUA. Não
está indicada na presença de miomas volumosos, na diminuição de sintomas álgicos e em mulheres que
desejam engravidar. Consiste na destruição do endométrio, que pode ser realizada por laser, balões térmicos,
microondas, fluidos quentes e criocirurgia.
-Miólise: corresponde à coagulação térmica videolaparoscópica ou crioablação do tecido miomatoso. Esta
técnica é mais fácil do que a miomectomia, mas pode aumentar a chance de formação de aderências pélvicas
subsequentes ou de ruptura uterina na gravidez. Indicada em pacientes com menos de 4 miomas, devendo, o
maior, não ultrapassar 10 cm. Quando combinada com a ablação endometrial, é mais eficaz que isoladamente.
-Radiologia intervencionista: técnicas conservadoras e pouco invasivas de tratamento dos miomas.
-Embolização da artéria uterina: consiste na injeção de
partículas na artéria uterina com o objetivo de interromper o
fluxo sanguíneo para os miomas e, conseqüentemente, sua
destruição. O maior calibre dos vasos do mioma que o da
circulação normal possibilita que a embolização seja realizada
seletivamente para a região do mioma, e não em regiões uterinas
normais.
-Indicações: pacientes sintomáticas com miomas volumosos e
múltiplos, não pediculados, não degenerados e que desejam
preservar o útero.
-Efeitos colaterais: atribuídos principalmente à oclusão de outras
artérias, como a que irrigam os ovários (resultando em falência
ovariana precoce), a bexiga, o intestino, os músculos e os nervos.
-Sintomas pós-cirúrgicos: pode provocar dor pélvica, vômitos e
cefaléia mesmo dias após a realização.
-Ultrassonografia focada guiada por RNM (ExAblate): outro método de abordagem minimamente invasiva
dos miomas. As ondas de USG são focadas para a lesão e resultam em ablação térmica do tecido, com
monitorização pela ressonância, com controle da temperatura em tempo real.
-Indicações: em pacientes que não desejam mais engravidar, mas que apresentem riscos cirúrgicos elevados ou que
não desejem retirar o útero.
-Limitações: é um método recente e de alto custo, não estando disponível para a população em geral (há apenas dois
aparelhos disponíveis no Brasil).
Miomas e gravidez: pode haver crescimento do tumor durante a gravidez, porém 2/3 não aumentam ou, até
mesmo, diminuem. O risco gestacional aumenta na presença de mioma, podendo ocorrer: gravidez ectópica,
abortamento, parto prematuro, amniorrexe prematura, apresentações anômalas, rotura uterina, hemorragias,
infecções e descolamento prematuro de placenta.

Fonte de Pesquisa:
MedCurso 2010 – Ginecologia volume 2.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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INFERTILIDADE
A infertilidade acomete 7 a 15% dos casais em idade reprodutiva. Conceitos:
-Infertilidade: ausência de gestação após um ano de coito sem uso de métodos contraceptivos.
-Esterilidade: é a incapacidade permanente de procriação.
Classificação: a infertilidade pode ser: primária → ausência de gestação prévia; secundária → história de
gestação prévia, mesmo que o produto da gestação não seja um nascido vivo.
Etiologia: entre as causas de infertilidade, 35% delas estão associadas ao fator masculino e 65% ao fator
feminino. Quando considerado apenas o fator feminino, temos como causas: fator ovulatório (40%), fator
tuboperitoneal (40%), infertilidade sem causa aparente (10%) e causas variadas (10% - fator uterino, fator
cervical, dentre outras).
Propedêutica: o início da investigação do casal dependerá da idade da mulher: >35 anos → a investigação
deve ser inciada após seis meses de atividade sexual sem método anticoncepcional ou imediatamente; < 35
anos → a investigação deve ser iniciada após um ano de atividade sexual sem método anticoncepcional.
Anamnese: deve conter dados sobre freqüência de relações sexuais, história menstrual, paridade prévia,
antecedentes de DST ou cirurgias sobre órgãos pélvicos e hábitos (uso de drogas, atividade física...).
Outros fatores relevantes: fertilidade em outros relacionamentos, uso prévio de anticoncepcional, presença de
anomalias dos órgãos pélvicos, história médica e cirúrgica, medicamentos em uso, história de quimioterapia e/ou
radioterapia, exposições ambientais e ocupacionais, disfunção sexual, impotência masculina, dispareunia,
sinusiorragia, exames e tratamentos prévios para infertilidade e aspectos psicológicos.
Exame físico: é fundamental. Inclui aferição de peso, altura e pressão arterial e avaliação do biotipo,
distribuição de pêlos, galactorréia, palpação da tireóide e exame ginecológico completo.
Exames complementares: os exames complementares gerais consistem em: sorologias para toxoplasmose,
citomegalovírus, hepatite B, rubéola, herpes simples, HTLV e HIV. Os exames complementares específicos,
que fazem parte da propedêutica básica de investigação, divergem na literatura, mas, de forma geral,
consistem em: espermograma, dosagens hormonais (FSH e estradiol basais, prolactina, TSH, T4 livre e
progesterona da segunda fase do ciclo), USG transvaginal seriada e histerossalpingografia. A
videolaparoscopia (VLSC) e a vídeo-histeroscopia (VHSC) devem ser individualizadas e não fazem parte da
propedêutica inicial.
Suplementação: a suplementação de ácido fólico é indicada e deve ser prontamente inciada para redução do
risco de malformações do tubo neural.

INFERTILIDADE FEMININA
De início, vale salientar que a mudança ocorrida na vida da mulher nas últimas décadas, relacionada à
educação, trabalho e uso de métodos contraceptivos, resultou no atraso do desejo reprodutivo. O impacto
desse atraso é claro: a idade cronológica é um forte determinante do sucesso reprodutivo, já que é fator crucial
na reserva ovariana. A fertilidade na mulher atinge o seu máximo aos 25 anos e cai consideravelmente após os
35 anos. Esse declínio é decorrente da produção mais precoce do pico de estradiol necessário à ovulação, o
que prejudica o desenvolvimento folicular; essa alteração é causada pelo aumento do FSH em fases mais
precoces por menor produção de inibina pelas células da granulosa. Outro fator que contribui para a queda da
fertilidade é o maior índice de abortamentos de 1º trimestre, devido a uma maior incidência de anormalidades
nos oócitos mais velhos.
Fator ovulatório: os distúrbios da ovulação são responsáveis por 40% de todos os casos de infertilidade
feminina. Por isso, inicialmente, a ovulação deve ser documentada. Ciclos regulares e aqueles acompanhados
de sintomas pré-menstruais correlacionam-se fortemente com a presença de ovulação (95%). Os métodos de
diagnóstico da ovulação e das alterações da fase lútea, com exceção da USG seriada, baseiam-se na produção
de progesterona pelo corpo lúteo após a eclosão do folículo.
-Curva da temperatura basal: é o método mais fácil e barato de se documentar a ovulação. A paciente registra

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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diariamente a sua temperatura pela manhã, antes mesmo de se levantar, em um gráfico. A progesterona
produzida pelo corpo lúteo exerce função termogênica no hipotálamo, provocando aumento da temperatura
em 0,3 a 0,8ºC após a ovulação, que resulta em um gráfico bifásico. A ovulação comumente ocorre um dia
antes da elevação da temperatura, que se mantém elevada por cerca de 11 a 16 dias. A elevação por <11 dias
sugere insuficiência do corpo lúteo e >16 dias sugere gravidez. Entretanto, mulheres com gráfico claramente
bifásico apresentam certamente ovulação, mas aquelas com gráfico monofásico necessitam de outros métodos
de confirmação ou não da função ovulatória. Por isso, não é mais um método amplamente recomendado.
-Dosagem de progesterona: a dosagem deste hormônio no meio da fase lútea, entre o 21° e 24° dia após a
menstruação, evidenciando sua elevação, constitui evidência indireta e retrospectiva da ocorrência da
ovulação. Entretanto, como os picos são intermitentes, uma amostra com altos níveis confirma a ovulação,mas
com baixos níveis não descarta a sua ocorrência.
-Biópsia de endométrio: apesar de a histologia endometrial possuir comprovadamente correlação com a
produção de progesterona pelo corpo lúteo, o fato de ser um método invasivo fez com que fosse substituída
pela dosagem de progesterona e realização de USG-TV seriada, estando reservada para casos específicos.
-USG-TV seriada: esse método demonstra a presença do folículo dominante e sua evolução, além de
identificar o corpo lúteo, que possui características próprias. Deve ser inciada a partir do 11º dia do ciclo. Sua
realização visa documentar a ovulação e programar o coito, em ciclos naturais, e em ciclos medicados objetiva
comprovar a resposta ao tratamento e programar intervenções (coito programado, inseminação intrauterina ou
aspiração de folículos para FIV).
Para avaliação da reserva ovariana existem testes que devem ser realizados entre o 2º e 5º dia do ciclo. Está
indicada quando a mulher apresentar mais de 35 anos, infertilidade sem causa aparente, história familiar de
menopausa precoce, cirurgia ovariana prévia, tabagismo e baixa resposta à estimulação com gonadotrofinas.
-FSH e estradiol basais: seu aumento reflete a diminuição dos folículos primordiais. Deve ser dosado no 3º
dia do ciclo. O FSH é o parâmetro mais sensível, estando alterado se maior que 10 ou 15pg/ml. O estradiol
superior a 60-80pg/ml também é fator de mau prognóstico.
Outras dosagens hormonais: poderá ser necessário solicitar outras dosagens hormonais caso a paciente apresente
ciclos menstruais irregulares, como TSH e T4 livre (para excluir tireoidopatias) e prolactina (para excluir
hiperprolactinemia).
-Teste de Effort: teste de estímulo com as gonadotrofinas. Como é caro, raramente é utilizado.
-Contagem de folículos antrais: é o parâmetro que apresenta maior correlação com a idade cronológica. É um
teste simples para predizer a resposta à estimulação ovariana controlada e à probabilidade de gravidez na
reprodução assistida.
Fator tuboperitoneal: responsável por 40% dos casos de infertilidade feminina. Inclui lesão ou obstrução
tubária e aderências peritubárias ou periovarianas, geralmente resultado de doença inflamatória pélvica
(principal fator), cirurgias pélvicas prévias ou endometriose.
-Histerossalpingografia: exame inicial para se documentar a perviedade tubária. Deve ser sempre realizada
após o término do fluxo menstrual, entre o 6º e 8º dia do ciclo, com o objetivo de evitar a ascensão de
microorganismos. Consiste na realização de radiografias de pelve após a injeção de contraste pelo colo
uterino. Permite visualizar pólipos, sinéquias, septos e malformações uterinas e obstrução tubária. Quando a
trompa é pérvia, o contraste extravasa para a cavidade abdominal bilateralmente, achado denominado de prova
de Cotte positiva. ATB é assunto controverso, mas AINEs são indicados, pois o exame causa dor.
-Histerossonografia: consiste na injeção de contraste ou, mais comumente, soro fisiológico na cavidade
uterina durante USG transvaginal. O método anterior tem se mostrado superior a este, apesar da
histerossonografia ser mais rápida, menos dolorosa e não utilizar radiação.
-Videolaparoscopia (VLSC): padrão-ouro para diagnóstico de doença tubária ou peritoneal, pois permite a
visualização direta das estruturas pélvicas. Emprega-se a cromotubagem (injeção de contraste que se derrama
na cavidade uterina) para avaliação da permeabilidade tubária. Além disso, a VLSC permite o tratamento
imediato das lesões encontradas. Em geral, é o último procedimento diagnóstico empregado em casos de
investigação de infertilidade. Geralmente é indicada quando há evidências de doenças pélvicas (aderências,
tumores anexiais ou endometriose) ou quando a HSG mostra alterações do contorno ou trajeto das trompas.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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A VLSC é a principal forma de tratamento em pacientes jovens (menores que 35 anos) que apresentem como causa
de infertilidade o fator tubário, especialmente a obstrução tubária. A FIV fica reservada para os casos onde a VLSC
não é capaz de reverter o problema tubário ou naqueles casais em que há outra causa de infertilidade associada ao
fator tubário.
Fator uterino: o fator uterino está mais associado com o abortamento de repetição do que com a infertilidade
propriamente dita. Malformações uterinas, leiomiomas, pólipos, sinéquias, endometrite, hiperplasia
endometrial e adenomiose são as principais alterações intracavitárias relacionadas à infertilidade.
-Histerossalpingografia: é o teste inicial comumente empregado para a avaliação da cavidade uterina.
-Vídeo-histeroscopia: dentro da propedêutica, a VHSC é um método empregado secundariamente para definir
anormalidades intracavitárias suspeitadas por outros exames de imagem (USG-TV, HSG e histerossonografia).
Malformações uterinas: comumente associadas à abortamento de repetição;
Leiomiomas: os submucosos e intramurais que distorcem a cavidade estão relacionados a piores resultados
reprodutivos, sendo, então, de indicação cirúrgica, mesmo que sem outros sintomas.
Sinéquias: causadas por infecções, curetagens uterinas e miomectomia. Geralmente tratados por histeroscopia
cirúrgica. Já os casos de infecções são tratados com antibioticoterapia.
Fator cervical: causa de infertilidade em somente 5% dos casos. O canal cervical é o local onde os
espermatozóides são armazenados, capacitam-se para fertilizar o óvulo e de onde são gradativamente
liberados para o trato genital superior. Produz o muco cervical para proteger o esperma do pH vaginal ácido.
-Teste pós-coito: consiste no exame do muco cervical, no período pré-ovulatório, de 4 a 12 horas após a
relação sexual. Avalia a interação espermatozóide-muco. Sua utilização na propedêutica básica não é mais
indicada, visto poder alterar-se em diversas situações e não mostrar-se indicador de prognóstico na
infertilidade.

INFERTILIDADE MASCULINA
A fertilidade masculina atinge um pico aos 35 anos de idade e diminui nitidamente a partir dos 45 anos. Com o
envelhecimento, há uma queda dos níveis de testosterona, fato que está associado a um decréscimo na
produção de espermatozóides e um aumento proporcional dos gametas anormais, mais sutil que aquele
apresentado pelas mulheres. Entretanto, aqui o fator idade é muito menor se comparado com a mulher.
Espermograma: faz parte da rotina básica de investigação do casal infértil. A história anterior de paternidade
não descarta esta avaliação. Consiste na avaliação de características objetivas – volume, liquefação, pH,
viscosidade, concentração, número total de espermatozóides, motilidade, morfologia e vitalidade – em uma
amostra de esperma com os valores de referência definidos pela OMS. O estudo da amostra deve ser realizado
em, no máximo, 1 hora após a coleta. Diante de um exame totalmente normal, não há a necessidade de
repetição; em contrapartida, caso seja encontrada alguma análise anormal, recomenda-se a repetição do
exame, de preferência com mais duas amostras em tempos diferentes. Caso ainda persistam alterações, está
indicada a dosagem hormonal de: FSH, LH e testosterona. Abstinência sexual de 2 a 3 dias, nem mais nem
menos, deverá ser respeitada antes da análise, para que não se altere a contagem ou vitalidade dos
espermatozóides. A coleta deve ser preferencialmente em laboratório, por meio de masturbação.

INFERTILIDADE SEM CAUSA APARENTE


Trata-se de um diagnóstico de exclusão, no qual há falha em alcançar a gravidez em um casal no qual
nenhuma causa definida de infertilidade foi encontrada. Fatores genéticos e imunológicos devem ser
considerados, embora ainda não existam testes consagrados para esta avaliação.

TRATAMENTO
O tratamento do casal é direcionado para a causa da infertilidade (ver tabela adiante).
Indução da ovulação:
-Citrato de clomifeno: é a droga de escolha nos casos de anovulação, iniciado na dose de 50mg/dia, por 5 dias,
a partir do 3º ou 4º dia do ciclo menstrual. O monitoramento do ciclo por USG-TV seriada é recomendada e
visa acompanhar o crescimento folicular e programar o coito.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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-Gonadotrofinas (hCG): estão indicadas nas pacientes que não respondem a doses de até 100 ou 150mg/dia do
citrato de clomifeno. O monitoramento do ciclo é obrigatório para acompanhar o desenvolvimento folicular.
Há maior risco de gestação múltipla e de hiperestímulo ovariano.
-Metformina: droga recomendada para induzir a ovulação em pacientes com resistência à insulina. Atua
reduzindo os níveis séricos de insulina e, conseqüentemente, de testosterona, restaurando a função ovulatória e
a ciclicidade menstrual. A dose recomendada é de 1.500mg/dia em 3 tomadas.
Reprodução assistida:
-Inseminação intrauterina (IIU): consiste em injetar, dentro do útero, espermatozóides originados do sémen
previamente processado em laboratório. Deve ser realizada na ausência de fatores tuboperitoneais, em ciclos
ovulatórios e na presença de cavidade uterina normal. Indicado nos casos de infertilidade sem causa aparente,
fator cervical ou imunológico e impossibilidade de ejaculação vaginal. O momento adequado da realização é
cerca de 24 a 36 horas após a injeção de hCG.
-Fertilização In Vitro (FIV): técnica na qual o óvulo é fecundado pelo espermatozóide no laboratório. As
principais indicações são: fator tubário, fator masculino, falência ovariana (utilizando óvulos de doadora) e
infertilidade sem causa aparente. Pode ser realizada de duas formas: FIV convencional (em desuso) e FIV com
injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI). A FIV convencional promove o encontro em
laboratório entre o oócito e o espermatozóide; já a FIV com ICSI (micromanipulação de gametas), através da
utilização de microagulhas, o espermatozóide é injetado dentro do óvulo, aumentando as chances de
fertilização. Esta última está sendo mais usada pelos laboratórios. As etapas a serem realizadas para a FIV são:
estimulação ovariana (promove liberação de maior número de óvulos) → punção ou aspiração de óvulos →
capacitação dos espermatozóides → FIV → transferência dos embriões. A maior complicação deste método é
a gestação gemelar
Síndrome do Hiperestímulo Ovariano (SHEO): condição iatrogênica relacionada ao uso de drogas indutoras da
ovulação, especialmente as gonadotrofinas. Se caracteriza por um aumento da permeabilidade vascular, ocorrendo
passagem de líquido para o terceiro espaço e hemoconcentração. O tratamento é de suporte e expectante.

Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Ginecologia volume 2.

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ENDOMETRIOSE
A endometriose é a presença de tecido endometrial em localização extrauterina. Estes sítios ectópicos
localizam-se usualmente na pelve, embora possam ser encontrados em qualquer outro lugar do corpo. Apesar
de ser uma desordem comum, sua prevalência não é bem estabelecida. Estima-se que seja encontrada em 1%
das mulheres submetidas à cirurgia ginecológica, em 12 a 32% das mulheres no menacme submetidas à
videolaparoscopia (VLSC) por dor pélvica crônica, em 9 a 50% das mulheres submetidas à VLSC por
infertilidade e em 50% das adolescentes submetidas à VLSC para avaliação de dor pélvica.
Fatores de risco: a influência da idade, raça e status socioeconômico na prevalência da endometriose é
controversa. Entretanto, a endometriose é uma doença característica do menacme. Fatores de risco mais bem
estabelecidos são: história familiar de mãe acometida pela doença (fator genético associado a fatores
ambientais), ocorrência de gestação tardia ou nuliparidade, menarca precoce, ciclos menstruais curtos (<27
dias), presença de malformações uterinas, baixo IMC, raça branca e consumo exagerado de cafeína e álcool.
Etiologia: a etiologia não foi bem elucidada. Várias teorias buscam explicar a ocorrência da endometriose.
-Teoria da Implantação ou da Menstruação retrógrada ou do Refluxo menstrual: essa teoria propõe que, como
o sangue menstrual contém células endometriais viáveis, a regurgitação transtubária durante a menstruação
disseminaria essas células na cavidade peritoneal, que são capazes de se aderir e implantar. Entretanto, como a
menstruação retrógrada é um evento fisiológico em mais de 90% das mulheres saudáveis, outro fator deve
estar associado para que ocorra o desenvolvimento da doença.
-Teoria imunológica: propõe que a endometriose se desenvolve naquelas pacientes que apresentam alguma
alteração da imunidade humoral e celular, e que por isso as células endometriais escapariam de serem
eliminadas pelo sistema imune. A maior presença de leucócitos e macrófagos na cavidade peritoneal facilitaria
a implantação e desenvolvimento do endométrio ectópico, pela liberação de citocinas e fatores de crescimento.
-Teoria da metaplasia celômica: o epitélio celômico presente no peritônio é composto por células totipotentes.
Esta teoria baseia-se na capacidade deste epitélio sofrer metaplasia e originar células endometriais em locais
ectópicos. Observações na literatura sugerem que este seja o mecanismo responsável por alguns casos:
-Ocorrência de endometriose em meninas na pré-menarca e em mulheres que nunca menstruaram;
-Ocorrência de endometriose pleural ou pulmonar, já que as células endometriais não tem acesso ao tórax na ausência
de defeitos anatômicos (a pleura, assim como o peritônio, deriva do epitélio celômico totipotencial);
-Ocorrência de endometriose em locais incomuns, como nas extremidades (polegar, coxa e joelho);
-Ocorrência de raros casos de endometriose em homens que receberam altas doses de estrogênio na terapêutica do
câncer de próstata.
-Teoria da indução: corresponde a uma extensão da teoria na celômica, na qual acredita-se que há um fator
bioquímico endógeno capaz de induzir o desenvolvimento das células endometriais a partir das totipotentes.
-Teoria iatrogênica: evidências sugerem que o endométrio ectópico pode ser induzido de forma iatrogênica
por um transplante mecânico. Se baseia nos numerosos relatos de endometriose em cicatriz após
procedimentos ginecológicos, como cesariana, episiotomia, amniocentese e, até mesmo, VLSC.
-Disseminação linfática: essa teoria explica a rara presença de endometriose em sítios distantes da pelve. A
disseminação de células endometriais se daria por meio do sistema linfático.
Fisiopatologia: o desenvolvimento e o crescimento da endometriose é estrógeno-dependente. A aromatase,
enzima que converte os androgênios em estrogênios, é expressa de forma anormal no endométrio das
mulheres acometidas por endometriose. Os principais sítios de acometimento da endometriose são: ovários
(65%), ligamento uterossacros (2 a 60%), fundo-de-saco posterior (30-35%), folheto posterior do ligamento
largo (16-35%) e fundo-de-saco anterior (15-35%). Outros sítios menos comuns encontrados envolvem a
vagina, cérvice, septo retovaginal, ceco, íleo, canal inguinal, cicatrizes abdominais ou perineais, ureteres,
bexiga e umbigo. Casos excepcionais já foram descritos em mamas, fígado, vesícula biliar, extremidades,
vértebras, ossos, pulmão, diafragma e SNC, entre outros. Na microscopia da endometriose, observam-se
glândulas e estroma endometriais com ou sem macrófagos repletos de hemossiderina. Já macroscopicamente,

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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os focos da endometriose são reconhecidos por lesões:
-Típicas: são consideradas de acordo com sua evolução e idade: Vermelhas → são muito ativas, podendo apresentar-
se como petéquias; Pretas → menos ativas, descritas como “queimadura por pólvora”, podendo apresentar-se como
nódulos pretos, café-com-leite ou azulados; Brancas → consideradas resquícios cicatriciais. A evolução da lesão
vermelha até a branca é, em média, de 7 a 10 anos.
-Atípicas: vesículas, defeitos peritoneais e finas aderências (véu de noiva) no hilo ovariano e fundo-de-saco posterior.
No ovário, a lesão característica é o endometrioma (cisto de endometriose), que se apresenta como uma
estrutura cística com conteúdo líquido espesso e achocolatado cercado de áreas de fibrose.
Manifestações: o quadro clínico caracteriza-se principalmente por dor e infertilidade.
-Dismenorréia: é a queixa mais comum das pacientes com endometriose. Possui caráter progressivo. A
intensidade progressiva e o seu aparecimento após longo tempo de menstruações indolores são altamente
sugestivos do diagnóstico. Tipicamente começa antes do fluxo menstrual, usualmente persiste durante toda a
sua duração e ocasionalmente perdura dias após o término. A dor é difusa, referida na pelve, e intensa,
podendo irradiar para região lombar ou para as coxas.
-Dispareunia: quando associada a endometriose, a dispareunia caracteriza-se pela maior intensidade à
penetração profunda, por anteceder a menstruação e correlaciona-se com o envolvimento do fundo-de-saco e
do septo vaginal.
-Dor pélvica crônica: a dor da endometriose parece resultar da ação de citocinas inflamatórias na cavidade
peritoneal, dos efeitos diretos e indiretos do sangramento nos implantes e da irritação ou infiltração direta dos
nervos pélvicos.
-Infertilidade: cerca de 20 a 40% das mulheres inférteis apresentam endometriose. A infertilidade é atribuída a
três mecanismos principais: distorção da anatomia anexial dificultando a captação oocitária (por aderências
pélvicas e obstrução tubária), interferência no desenvolvimento oocitário e na embriogênese precoce, e
redução da receptividade endometrial (ausência de moléculas de adesão em mulheres com endometriose,
normalmente presentes durante a fase de implantação embrionária). Apesar da endometriose diminuir a
fecundidade, caso a gravidez ocorra, é possível observar a regressão e até a resolução da endometriose.
-Endometriose extragenital: este tipo de endometriose, apesar de comumente assintomático, deve ser
suspeitado nos casos onde há dor e/ou massa palpável fora da pelve com um padrão cíclico de aparecimento.
O local mais comum da doença é o intestino, principalmente cólon e reto.
Endometriose do TGI: manifesta-se por desconforto e distensão abdominal, constipação ou diarréia (mais freqüente),
náuseas e vômitos e sangramento recorrente cíclico (hematoquezia). Tenesmo, diminuição do calibre das fezes,
urgência para defecar e dor baixa posterior, principalmente no período menstrual, também podem ocorrer.
Endometriose do Trato urinário: pode cursar com disúria cíclica e hematúria até obstrução e retenção urinária.
Endometriose torácica: condição incomum, que pode manifestar-se por dor torácica, hemoptise e dispnéia,
decorrente de pneumotórax ou hemotórax.
-Endometriose e câncer: evidências epidemiológicas de grandes estudos sugerem que a endometriose é um
fator de risco independente para câncer de ovário epitelial. Geralmente acomete mulheres na pré-menopausa e
apresenta um prognóstico melhor que aqueles tumores não relacionados à endometriose.
Diagnóstico: os achados físicos dependem da localização e do tamanho dos implantes endometrióticos.
Geralmente não há achados anormais ao exame físico, sendo o achado mais comum a sensibilidade ao toque
do fórnice posterior, principalmente no período menstrual. Em alguns casos, podem ainda ser evidenciados:
sensibilidade localizada ou nódulos palpáveis no fundo-de-saco posterior ou no ligamento uterossacros; dor à
mobilização uterina; sensibilidade e aumento de tamanho das massas anexiais durante período menstrual;
fixação dos anexos ou do útero em posição retrovertida. Durante o exame especular, implantes
endometrióticos azulados podem ser visualizados na vagina, principalmente em fórnice posterior.
-VLSC: é o método diagnóstico de escolha, já que permite a visualização direta dos implantes e a biópsia das
lesões suspeitas. Ainda não se estabeleceu o momento específico para sua realização, mas recomenda-se que
seja na fase folicular precoce, o que diminuiria a possibilidade de confusão de um endometrioma com o corpo
lúteo hemorrágico e a possibilidade de realizar uma cirurgia na presença de uma gravidez inicial. Mesmo que
a cirurgia seja realizada para fins diagnóstico, recomenda-se ressecar ou cauterizar os focos de endometriose
ao mesmo tempo. A tendência atual, em termos diagnósticos, é indicar a cirurgia nas pacientes com quadros

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álgicos típicos, nas que não responderam ao tratamento conservador ou nas portadoras de infertilidade.
Pacientes que apresentem lesões clássicas de endometriose à VLSC devem ser tratadas como tal, mesmo na
ausência de confirmação histopatológica, desde que essa discordância seja atribuída a uma amostra
insatisfatória.
-Imagem: são raramente úteis para o diagnóstico devido a sua baixa sensibilidade em visualizar aderências ou
implantes peritoneais/ovarianos superficiais. Entretanto, a USG apresenta sensibilidade de 92% e
especificidade de 99% no diagnóstico de endometrioma, quando maiores que 5mm. A RNM também pode ser
utilizada, pois constitui ótimo exame na avaliação de massas pélvicas.
-Dosagem de CA 125: essa glicoproteína tem papel fisiológico ainda desconhecido, mas apresenta-se em
níveis elevados em diversas condições benignas e malignas. Pacientes portadoras de endometriose tem suas
concentrações séricas de CA 125 elevadas. Entretanto, não é um marcador sensível nem específico desta
doença.
Diagnóstico diferencial: várias condições compartilham um ou mais aspectos clínicos com a endometriose.
São elas: doença inflamatória pélvica, síndrome do cólon irritável, cistite intersticial, adenomiose, tumores
ovarianos, doença diverticular, câncer de cólon, dentre outros.
Estadiamento: não há um estadiamento ideal para endometriose, visto que os modelos propostos até então
não conseguem boa correlação com a intensidade da dor. O estadiamento mais utilizado continua sendo o da
American Fertility Society, que estadia a doença em graus:I (mínima), II (leve), III (moderada) e IV (severa).
Tratamento: independente do quadro clínico inicial, a endometriose progride em 2/3 dos casos dentro de um
ano, o que justifica o tratamento. A conduta expectante e sintomática (uso de AINE, embora não seja tão
eficaz) pode ser admitida em pacientes com doença mínima ou na perimenopausa, visto que com a menopausa
há a regressão dos endometriomas, pois são estrógeno-dependente.
-Abordagem clínica: o tratamento hormonal tem por objetivo a inibição da produção de estrogênio, que é um
indutor do crescimento do tecido endometrióide. Evita o risco de lesão iatrogênica de órgãos pélvicos, evita o
risco de aderências pélvicas pós-operatórias, suprime também os sintomas dos implantes não identificados
durante a cirurgia. Entretanto, como desvantagens, há o efeito colateral das medicações, não tem efeito
resolutivo sobre as aderências pélvicas e endometriomas e promove infertilidade durante o tratamento pela
supressão da ovulação. Portanto, em relação à infertilidade associada à endometriose, não há evidências que o
tratamento clínico seja benéfico
-Contraceptivos orais: qualquer pílula combinada de baixa dosagem é útil (30mcg de etinilestradiol), devendo ser
utilizada sem pausas para sangramento de privação.
-Progestogênios: promovem inibição do crescimento do tecido endometriótico, com decidualização e atrofia. Pode ser
empregado o acetato de medroxiprogesterona 30mg/dia via oral ou 150mg IM 3/3 meses ou DIU de levonorgestrel.
-Danazol: fármaco com propriedades androgênicas e progestogênicas. Promove inibição da secreção de GnRH e da
esteroidogênese. Apresenta grande número de efeitos colaterais devido a sua ação androgênica: ganho ponderal,
retenção hídrica, acne, pele oleosa, hirsutismo, alteração da voz, dentre outras. 400-800mg/dia VO por 6 meses.
-Gestrinona: droga antiestrogênica, antiprogestogênica e androgênica. Tem mecanismo de ação e efeitos colaterais
semelhantes ao danazol. A dose é de 2,5-10mg/VO, duas vezes por semana.
-Análogos do GnRH: a administração dos análogos de forma contínua, diferente da secreção pulsátil endógena,
dessensibiliza os receptores hipofisários, ocorrendo diminuição da secreção de gonadotrofinas hipofisárias.
Entretanto, inicialmente, por serem agonistas, estimulam o eixo HHO, efeito denominado flare-up, que se reverte em
alguns dias. Podem ser utilizados por via IM, SC e intranasal. Promovem uma pseudomenopausa química. Nos
tratamentos prolongados, para evitar a perda de massa óssea e os sintomas climatéricos, pode-se associar estrogênios
e progesterona, terapia denominada “add-back therapy”.
-Inibidores da aromatase: parecem regular a formação local de estrogênio nos tecidos endometrióticos, além de inibir
a produção ovariana e periférica (tecido adiposo) de estrógenos. Tem efeitos antiestrogênicos semelhantes aos
análogos do GnRH, inclusive a perda de massa óssea. Representados pelo Letrozol.
-Abordagem cirúrgica: está indicada quando os sintomas da endometriose são severos, incapacitantes ou
agudos; quando os sintomas não apresentam melhora ou pioram com o tratamento clínico ou quando a doença
é avançada; nos casos de infertilidade, onde o tratamento clínico além de não melhorar as taxas de gravidez,
priva a mulher de tentar a gravidez (devido a anovulação) e a expõe aos efeitos colaterais já citados.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


49
-Conservadora: é tipicamente representada pela VLSC. O tratamento é geralmente possível e desejável durante o
procedimento diagnóstico inicial. Engloba excisão, fulguração ou vaporização a laser de implantes endometrióticos e
remoção de aderências. Nas pacientes com idade superior a 38 anos, ou com mais de 7 anos de infertilidade,
comprometimento das trompas, aderências severas ou associação com infertilidade masculina, recomendam-se os
procedimentos de reprodução assistida imediatamente após a VLSC. Os indutores da ovulação e a inseminação
intraútero (IIU) podem melhorar os resultados de fertilidade em pacientes com trompas pérvias. Naquelas com
obstrução tubária, indica-se a fertilização in vitro (FIV).
-Definitiva: consiste na histerectomia abdominal e ooforectomia
bilateral, com a ressecção de todos os focos endometrióticos. Está
indicada nas mulheres com quadros graves e aderências extensas,
refratárias ao tratamento conservador, ou naquelas onde o futuro
reprodutivo não é desejado. Pode-se tentar preservar os ovários em
pacientes jovens para evitar a necessidade de terapia de reposição
estrogênica.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Ginecologia volume 2
Ginecologia Ambulatorial Baseada em Evidências. IMIP, 2010.

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50

SÍNDROME ANOVULATÓRIA CRÔNICA HIPERANDROGÊNICA


A Síndrome Anovulatória Crônica Hiperandrogênica (SACH), anteriormente denominada Síndrome dos
Ovários Policísticos (SOP) é uma síndrome caracterizada por ciclos anovulatórios irregulares, às vezes com
períodos de amenorréia, infertilidade, manifestações de hiperandrogenismo, obesidade e ovários aumentados
de volume com múltiplos cistos. Se constitui na causa mais comum, na mulher, de hiperandrogenismo
(responde por 80% dos casos), anovulação crônica, ciclos irregulares (90%), hirsutismo e infertilidade por
anovulação (40%), configurando-se na endocrinopatia feminina mais prevalente.
Etiologia: a etiologia permanece desconhecida, pois qualquer alteração que resulte em desequilíbrio do eixo
HHO pode levar a uma secreção inadequada de gonadotrofinas, com conseqüente anovulação e SACH.
Fisiopatologia: o hiperandrogenismo e a anovulação crônica podem ser causados por anormalidades nos
seguintes compartimentos:
-Compartimento Ovariano: nas portadoras da síndrome, os ovários são a principal fonte de androgênios. A
desregulação da enzima formadora de androgênios nas adrenais e nos ovários (citocromo P450c17) pode ser o
mecanismo central subjacente ao hiperandrogenismo. Além disso, alterações na atividade tanto da aromatase
quando da 5-alfa-redutase foram observadas. Uma vez produzidos, os androgênios podem inibir a secreção e a
pulsatilidade do FSH, alteram os pulsos de GnRH e aumentam os níveis de LH, estimulando as células da teca
ovariana a produzir mais androgênios.
FSH: a supressão dos níveis de FSH responde pela falta do estímulo adequado para o crescimento de novos folículos.
Esses, por sua vez, nunca chegarão à completa maturação e ovulação; sofrem processo de atresia e acumulam-se
abaixo da túnica albugínea ovariana, o que confere o aspecto policístico característico.
LH: sob o estímulo constante do LH, as células da teca mantém a produção de androstenediona e testosterona. Os
androgênios em excesso não sofrem completa aromatização ovariana pela falta de FSH, elevando os seus níveis
séricos. No ovário, causam espessamento da albugínea e aceleram o processo de atresia folicular. A nível sistêmico,
são responsáveis pelas manifestações de hiperandrogenismo.
-Compartimento adrenal: assim como nos ovários, nas glândulas adrenais existe a presença do citocromo
P450c17, produzindo androgênios, o que o torna o compartimento adrenal também participante da síndrome.
-Compartimento periférico: é constituído de pele e tecido adiposo. Participa da fisiopatologia porque no tecido
periférico ocorre a aromatização dos androgênios em estrona.
Obesidade: está presente em mais de 50% das portadoras de SACH, e interfere no processo ovulatório por três
motivos: (1) aumento da aromatização periférica de androgênios em estrona, (2) inibição da síntese hepática de
SHBG, o que resulta no aumento da fração livre de estradiol e testosterona e (3) aumento dos níveis de insulina que,
por sua vez, atuam de forma sinérgica com as gonadotrofinas (LH) estimulando a produção tecal de androgênios. A
importância da obesidade na fisiopatologia da anovulação é confirmada pela regularização dos ciclos e até concepção
após perda ponderal superior a 5% do peso corpóreo.
A contribuição do componente periférico se manifesta na fisiopatologia da SACH se manifesta de várias
formas: (1) a presença da 5-alfa-redutase na pele determina em grande parte o hirsutismo, (2) a atividade da
aromatase está aumentada nos adipócitos, aumentando junto com o peso corporal, (3) enquanto os níveis de
estradiol (E2) estão em níveis da fase folicular nas pacientes com a síndrome, os níveis de estrona (E1) estão
aumentados em conseqüência da aromatização periférica, o que determina um estado hiperestrogênico crônico
-Compartimento hipotálamo-hipófise: na SACH ocorre uma maior sensibilização da hipófise ao estímulo pelo
GnRH e uma maior freqüência de sua pulsatilidade, responsável pela maior secreção de LH. O FSH não
acompanha o aumento do LH, pois ele é inibido, por feedback negativo, pelos altos níveis de estrogênio
Portanto, há um aumento na relação LH:FSH, comumente observado na SACH. A hipersecreção de LH
resultaria no estímulo às células da teca na produção de androstenediona e testosterona. Pela ação da
aromatase periférica (pois a atividade aromatase ovariana está diminuída), parte é convertido em estrogênio
(estrona), o que explica o hiperestrogenismo presente nessas pacientes. A diminuição da SHBG aumenta os
níveis de testosterona e estrogênio livres. Por essa razão, o FSH não aumenta devido ao feedback negativo
exercido pelo excesso de estrogênio. Sem FSH, inibe-se a maturação folicular, resultando em anovulação.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Resistência à insulina: a resistência a insulina e o conseqüente estado de hiperinsulinemia, que pode ser
encontrado nos quadros de obesidade isolada, está presenta nas pacientes portadoras de SACH, sendo obesas
ou não. Já acreditou-se que a resistência a insulina poderia ser resultado do estado de hiperandrogenismo,
porém observações sugerem que esta não seja causa. Atualmente, foi constatado um possível “defeito” nos
receptores de insulina. Apesar disso, já está bem estabelecido que a resistência à insulina e o hiperinsulinismo
alteram a esteroidogênese ovariana de forma independente da secreção de gonadotrofinas da SACH. Isso
porque os receptores de insulina e do IGF-1 (fator de crescimento insulina símile) estão presentes nas células
estromais ovarianas; logo, a hiperinsulinemia age diretamente nas células da teca e estimula a atividade do
LH, aumentando a produção de androgênios na SACH. Por outro lado, a hiperinsulinemia aumenta
indiretamente a amplitude dos pulsos de LH e, no fígado, inibe a síntese de SHBG, o que aumenta a
biodisponibilidade dos androgênios e estrogênios.
Manifestações: não existe um quadro clínico universal para definir a SACH, uma vez que pode apresentar-se
com manifestações muito heterogêneas. Entretanto, os sinais e sintomas mais característicos, seguem-se:
-Irregularidade menstrual: devido ao estado anovulatório persistente e, por conseguinte, ausência da formação
do corpo lúteo. Apresenta-se como oligomenorréia ou amenorréia, podendo ocorrer SUD. A grande maioria só
menstrua com a utilização do teste da progesterona ou com o uso de ACHO.
-Hirsutismo: sinal clínico bastante freqüente, decorrente do hiperandrogenismo. Consiste na presença de pêlos
grossos em locais tipicamente masculinos (hipertricose → excesso de pêlos, em local não definido). É
constatado pela presença de mais de 8 pontos na escala de Ferriman-Gallwey.
-Obesidade: ocorre em mais de 50% das pacientes. A deposição de gordura é tipicamente central. Uma relação
cintura-quadril alta está associada a resistência à insulina e aumento do risco de doença cardiovascular.
-Acne, seborréia, alopecia frontal: conseqüentes ao hiperandrogenismo.
-Acantose nigricans: sinal clássico de resistência à insulina. Consiste no espessamento e escurecimento
cutâneo, que pode estar presente nas axilas, nuca, abaixo das mamas, face interna da coxa e vulva.
-Infertilidade: decorre da anovulação.
Repercussões clínicas:
-Diabetes mellitus (DM): pacientes com SACH possuem vários fatores de risco para o desenvolvimento de
diabetes, tais como: obesidade, resistência insulínica e história familiar de DM-2. Cerca de 1/3 das pacientes
possuem intolerância à glicose e até 10% apresentam DM-2.
-Hiperplasia endometrial, câncer de endométrio, câncer de mama e câncer de ovário: o hiperestrogenismo
crônico sem oposição da progesterona faz com que estas pacientes estejam sobre o risco destas patologias.
-Fibrinólise diminuída: há um elevação nos níveis circulantes do inibidor do ativador do plasminogênio.
-Hipertensão arterial: há um aumento na sua incidência, estando presente em cerca de 40% na perimenopausa
-Doença cardiovascular: há uma maior prevalência de aterosclerose e doença cardiovascular. O risco de
infarto agudo do miocárdio está aumentado em cerca de 7 vezes.
-Dislipidemia: achado comum na SACH, e inclui aumento do colesterol total, LDL e triglecerídios.
Diagnóstico: além da clínica, dispõe-se de alguns métodos laboratoriais.
-Hormônios para diagnóstico diferencial: TSH (hipotireoidismo), prolactina (hiperprolactinemia), 17-OH-
progesterona (hiperplasia adrenal tardia), cortisol sérico ou urinário de 24 horas (síndrome de Cushing).
-Dosagem de gonadotrofinas: a determinação dos níveis séricos é de pouca valia. O FSH pode ser solicitado,
em casos selecionados, para afastar falência ovariana ou amenorréia primária; nos casos de SACH, apresenta-
se normal ou baixo. A relação LH:FSH > 2:1 pode ser encontrada, mas não é obrigatória ao diagnóstico.
-Dosagem de androgênios: podem ser dosados, para comprovar sua elevação, a testosterona total e livre e o
sulfato de desidroepiandrosterona (S-DHEA). Dosagens rotineiras de seguimento não são necessárias.
-Avaliação de distúrbios metabólicos: glicemia de jejum, TOTG 75, colesterol total e frações e triglicerídeos)
-USG-TV: útil para o encontro de grande número de folículos ovarianos e/ou ovário de tamanho aumentado.
-Síndrome metabólica: está presente em 37-47% das mulheres portadoras de SACH, devendo, então, ser
pesquisada. A presença de, pelo menos, 3 critérios, confirma o diagnóstico.
Critérios diagnósticos: Os critérios atuais para o seu diagnóstico foram estabelecidos numa reunião de
consenso em Rotterdã, na Holanda, em 2003, em que ficou estabelecido que devem estar presentes pelo menos

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52
duas das três seguintes condições: oligomenorréia ou amenorréia (conseqüentes à oligo ou anovulação);
hiperandrogenismo clínico e/ou laboratorial; ovários policísticos definidos pela USG.
Diagnóstico diferencial: a SACH é diagnóstico de exclusão,
devendo ser descartadas doenças com quadro clínico
semelhante. Vale destacar que a SACH não provoca
virilização. Portanto, na presença de sinais como
engrossamento de voz, aumento do clítoris, etc. outras
etiologias devem ser pesquisadas, inclusive tumores.
Tratamento:
-Irregularidade menstrual: a perda de peso (5 a 10% do peso
inicial) é a primeira recomendação para as pacientes obesas,
pois promove a saúde, reduz os níveis de insulina e
androgênio e pode restaurar a ovulação, isoladamente ou
associada a indutores da ovulação. O uso de progestógenos
durante 10 a 14 dias por mês também pode controlar a
irregularidade menstrual. Derivados da 19-nortestosterona
estão contraindicados pelos seus efeitos androgênicos. Os
medicamentos recomendados são o acetato de
medroxiprogesterona (5-10mg/dia) VO, o acetato de
nomegestrol (5mg/dia) VO ou a progesterona micronizada
(200 a 400mg/dia) VO. Já nos casos onde se deseja a
contracepção, indicam-se os ACHO combinados. O
progestógeno de primeira escolha é o acetato de ciproterona,
em virtude do seu potente efeito antiandrogênico.
-Hirsutismo: nos casos em que o hisurtismo constitui o
principal objetivo do tratamento, a melhor opção terapêutica
passa a ser o uso do ACHO e de uma droga de ação
antiandrogênica de ação periférica, como o acetato de ciproterona (50 a 100mg/dia, 10 dias por mês), a
espironolactona (25 a 100mg/dia) e a finasterida (1 mg/dia). A melhora do hirsutismo é observada com 6
meses de tratamento.
-Acetato de ciproterona: potente antiandrogênico, através da competição pelos receptores androgênicos com a
testosterona e dihidrotestoesterona (DHT). Efeitos colaterais: ganho ponderal, diminuição da libido, sangramento
irregular, cefaleia.
-Finasterida: inibidor específico da atividade da enzima 5-alfa-redutase. Não impede a ovulação nem causa
irregularidade menstrual.
-Espironolactona: antagonista da aldosterona que age pela inibição da atividade da 5-alfa-redutase cutânea, compete
pelos sítios de ligação da DHT e reduz a biossíntese de testosterona. Efeitos colaterais: irregularidade menstural.
-Infertilidade: a orientação da perda de peso, como citado, é a primeira medida. Quando necessário, utilizam-
se dos indutores da ovulação: citrato de clomifeno (droga de primeira escolha, 50mg/dia por 5 dias),
gonadotrofinas (indicado na falha de doses de 100 a 150mg de citrato de clomifeno). O tratamento cirúrgico a
partir do drilling ovariano só está indicado nos casos refratários ao tratamento.
-Resistência à insulina: como a hiperinsulinemia parece ter um papel na anovulação associada à SACH, o
tratamento com sensibilizadores da insulina pode levar à ovulação e a gravidez, além de melhorar o perfil
glicêmico da paciente, ajudando na perda de peso.
-Metformina: é uma biguanida que atua suprimindo a glicogênese hepática, aumentando a sensibilidade periférica à
insulina e diminuindo a absorção intestinal de glicose. Reduz os níveis séricos de insulina e, consequentemente, de
testosterona, restaurando a função ovulatória e a ciclicidade menstrual. Deve ser iniciada na dose de 850mg/dia. Os
efeitos colaterais gastrointestinais, como náuseas, vômitos e diarreiamuitas vezes limitam seu uso.

Fonte de Pesquisa:Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 1.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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ÚLCERA GENITAL
A etiologia da úlcera vulvar é extensa, evolvendo doenças infecciosas, neoplásicas e sistêmicas. Este capítulo
abrangerá as úlceras genitais decorrente de DST. As DST que cursam com úlcera apresentam risco 18,2 vezes
maior na transmissão do HIV.

ABORDAGEM SÍNDRÔMICA
Considerando que o diagnóstico clínico das úlceras genitais é,
por vezes, difícil de ser realizado, o Ministério da Saúde lançou
no seu Manual de Controle das Doenças Sexualmente
Transmissíveis – DST, de 2006, o fluxograma para a abordagem
sindrômica das úlceras genitais.
*Em caso de herpes, tratar sífilis se VDRL reagente. Se o quadro
não é sugestivo de herpes, tratar sífilis e cancro mole.
**Se forem lesões ulcerosas múltiplas e alta a soroprevalência de
herpes, deve-se tratar herpes juntamente com a sífilis e cancro mole.
Concomitantemente à instituição do tratamento, deve-se
aconselhar e oferecer à pacientes os testes anti-HIV, VDRL,
sorologia para Hepatite B e C, e vacinar contra a hepatite B.
Enfatizar a adesão ao tratamento, notificar, convocar o parceiro e
agendar retorno.
Tratamento:
-Herpes genital:
-1° episódio: Aciclovir 200mg VO 4/4 hrs por 7 dias OU 400mg VO 8/8 hrs por 7 dias.
-Recorrência: iniciar tratamento preferencialmente ao surgimento dos pródromos (aumento da sensibilidade, ardor,
dor, prurido). Aciclovir 400mg VO 8/8 hrs por 5 dias.
-Imunodeprimidos: nos casos de manifestações severas com lesões mais extensas, pensar na possibilidade de
coinfecção por HIV. Aciclovir 5-10mg/kg de peso EV 8/8 horas por 5 a 7 dias.
-Gestantes: tratar a infecção em qualquer trimestre da gestação.
-Sífilis primária e cancro mole: na ausência de lesões vesiculosas, recomenda-se o tratamento presuntivo
destas duas doenças, que são as causas mais freqüentes de úlcera genital.

-Lesão > 4 semanas: nesses casos, deve-se suspeitar de donovanose, linfogranuloma venéreo ou neoplasias.
Encaminhar o paciente ou, se possível, realizar biópsia para investigar. Simultaneamente, iniciar tratamento
para donovanose, por no mínimo 3 semanas ou até a cura clínica, com: Doxiciclina 100mg VO 12/12 OU
Eritromicina 500mg VO 6/6 OU Azitromicina 1g VO em dose única seguido por 500mg VO/dia.

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ABORDAGEM ETIOLÓGICA

SÍFILIS
Doença infecciosa sistêmica, de evolução crônica, sujeita a surtos de agudização e períodos de latência quando
não tratada. É causada pelo Treponema pallidum, uma bactéria Gram-negativa de transmissão sexual ou vertical,
que pode produzir, respectivamente, as formas adquirida ou congênita da doença. O risco de infecção em um
intercurso sexual é 60% nas lesões de cancro duro e condiloma plano.
Transmissão: se dá por via sexual, através de soluções de continuidade, por via transplacentária e pela via
hematogênica (transfusão de sangue contaminado ou acidente de trabalho com material contaminado), esta
última cursando com o quadro da “sífilis decapitada”, isto é, sem a presença do cancro duro.
Etiopatogenia: Com um período de incubação de 10 a 90 dias (média de 21 dias), aparece a lesão primária da
sífilis, o o cancro duro, na região em que se deu a inoculação do T. pallidum. Após penetração e multiplicação
do treponema, há migração deste para a via linfática, gânglios satélites e corrente sangüínea, podendo se
instalar em diferentes órgãos e sistemas do corpo humano.
Classificação
-Sífilis adquirida: → recente (menos de um ano de evolução): primária, secundária e latente recente
→ tardia (mais de um ano de evolução): latente tardia e terciária
-Sífilis congênita: → recente: casos diagnosticados até dois anos de vida;
→ tardia: casos diagnosticados após os dois anos de vida
História natural e manifestações
-Sífilis Primária (cancro duro): Os principais locais de inoculação treponêmica e do protossifiloma são, no
homem, o sulco balano-prepucial e a glande do pênis; na mulher, colo uterino, vulva (muita atenção aos
pequenos e grandes lábios) e períneo. O cancro duro é uma lesão erosada ou ulcerada, geralmente única,
indolor, com bordos endurecidos, fundo liso, brilhante e secreção serosa escassa, repleto de treponemas vivos.
Acompanha-se de adenopatia regional indolor, móvel e não supurativa, que aparece
cerca de 10 dias após o surgimento da lesão. A lesão regride espontaneamente em 2 a 6
semanas, deixando, às vezes, uma cicatriz. Em 50% das mulheres e 30% dos homens
não ocorre a lesão primária. Por ser uma porta de entrada, a sífilis aumenta as chances
de contrair o HIV em duas a três vezes.
-Sífilis secundária: de 6 a 8 semanas do aparecimento do cancro duro e após sua cicatrização espontânea,
podem ocorrer lesões cutâneo-mucosas, não ulceradas, geralmente acompanhadas de micropoliadenopatia
generalizada e, ocasionalmente, de artralgias, febrícula, cefaléia e adinamia. Já existem anticorpos circulantes.
A principal manifestação desta fase da sífilis é cutânea. Regridem em 2 a 8 semanas
-Sifílides: pápulas eritemato-acastanhadas e não pruriginosas, sobretudo nas palmas das mãos e
plantas dos pés, que sugerem fortemente o diagnóstico do secundarismo.
-Alopecia aerata: é a queda de cabelo difusa, não cicatricial e que regride com o tratamento.
-Roséola: lesões papulares eritematosas, principalmente em tronco, podendo formar exantema morbiliforme
-Condiloma plano: é uma lesão altamente contagiosa que se caracteriza por pápulas de aspecto vegetante e úmido,
localizadas em zonas de dobras e atrito, como sulco interglúteo e região perineal.
-Placas mucosas: erosões planas, acinzentadas, recobertas por uma membrana úmida e halo eritematoso.
-Sífilis latente: A sífilis latente se estende desde o desaparecimento do secundarismo até a primeira
manifestação do terciarismo, caracterizando-se por testes sorológicos positivos para sífilis, mas sem achados
clínicos. Divide-se em precoce (recente) e tardia. Os pacientes nesta fase podem permanecer nela pelo resto da
vida, manifestarem sintomas do secundarismo ou evoluírem para a sífilis terciária.
-Sífilis terciária: surge 3 a 20 anos após a infecção. As principais apresentações são: lesões cutâneo-mucosas
(tubérculos ou gomas sifilíticas), neurológicas (tabes dorsalis, demência), cardiovasculares (aortite luética com
conseqüente aneurisma aórtico) e articulares (artropatia de Charcot). Não se observam treponemas nas lesões e
as reações sorológicas tem títulos baixos.
Diagnóstico:
-Pesquisa direta: só se aplica a lesões das fases primária e secundária. Exige colher material da lesão e observar

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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por microscopia em campo escuro o movimento dos treponemas. Padrão-ouro para a sífilis primária.
-VDRL: teste sorológico não-treponêmico, utilizado para screening. Indicações: suspeita de sífilis em qualquer
fase, para todos os pacientes portadores de DST e na rotina do pré-natal. Instituído o tratamento correto, tende
a negativar-se em 6-12 meses, podendo, no entanto, permanecer com títulos baixos por longos períodos de
tempo ou até por toda a vida; é o que se denomina “memória” ou “cicatriz” sorológica. Títulos baixos podem
representar também falso-positivo, sífilis muito recente ou sífilis tardia, tratada ou não. Positivo quando > ¼.
Falsos-negativos: ocorrem quanto o título de Ac é muito alto, não ocorrendo floculação – efeito prozona.
Falsos-positivos: colagenoses, malária, doença de chagas, leptospirose, idosos, gravidez....
-Sorologias treponêmicas: o mais difundido é o FTA-Abs
(Fluorescent Treponema Antibody Absorvent Test, se mantém
sempre constante mesmo com o tratamento). Positiva primeiro
que o VDRL. Atualmente está disponível o FTA-Abs IgM, para
confirmar doença recente e o FTA-Abs IgG, para confirmar
contato com a doença.
Exames e fases da sífilis:
-Sífilis primária: campo escuro (+), VDRL (+) após 1-2 semanas e FTA-Abs (+) em 85 % dos casos.
-Sífilis secundária: campo escuro (+) nas lesões mucosas úmidas, VDRL (+) em altas titulações e FTA-Abs (+)
-Sífilis terciária: campo escuro (-), VDRL (+) pouco reativo e FTA-Abs (+).
Tratamento:
-Sífilis primária: Penicilina G benzatina 1.200.000UI IM em cada nádega, dose única.
-Sífilis secundária: Penicilina G benzatina 1.200.000UI IM em cada nádega, duas doses, intervalo de 1 semana.
-Sífilis terciária, latente tardia (>1ano) ou latente de tempo desconhecido: Penicilina G benzatina 1.200.000UI
IM em cada nádega, 3 doses, intervalo de 1 semana entre cada dose. Neurossíflis: Penicilina cristalina 14 dias IV
Obs: Após a dose terapêutica inicial na doença recente, poderá surgir a reação febril de Jarisch-Herxheimer, com
exacerbação das lesões cutâneas e involução espontânea em 12 a 48 horas. Geralmente exige apenas cuidado
sintomático e não justifica a interrupção do esquema terapêutico. Não significa hipersensibilidade à droga; todo paciente
com sífilis submetido à terapêutica penicilínica deve ser alertado quanto à possibilidade de desenvolver tal reação.
Seguimento: Após o tratamento da sífilis, recomenda-se o seguimento sorológico por teste não treponêmico
quantitativo de 3 em 3 meses, durante o primeiro ano e de 6 em 6 meses no 2° ano. Se título baixo e estável em
duas oportunidades (ou seja, deve diminuir duas titulações), após um ano, pode ser dada alta.

CANCRO MOLE
É uma afecção de transmissão exclusivamente sexual, provocada pelo Haemophilus ducreyi, um Gram-negativo.
História natural e manifestações: o tempo de incubação é de 1-14 dias, mas geralmente
é de 2-4 dias. O risco de transmissão em um intercurso sexual é de 80%. São lesões
dolorosas, o que difere do cancro duro da sífilis, e geralmente múltiplas devido à auto-
inoculação. A borda é irregular, apresentando contornos eritemato-edematosos e fundo
irregular recoberto por exsudato necrótico, amarelado, com odor fétido e muito friável.
No homem, as localizações mais freqüentes são no frênulo e sulco bálano-prepucial; na
mulher, na fúrcula e face interna dos pequenos e grandes lábios. Em 30-50% dos casos o
bacilo atinge os linfonodos inguino-crurais, causando linfadenite inguinal dolorosa, unilateral (bubão),
inicialmente manifesta por tumefação sólida e dolorosa, que evolui para liqüefação e fistulização em 50% dos
casos.
Diagnóstico: O diagnóstico laboratorial é feito utilizando-se a coloração pelo método de Gram em esfregaços de
secreção da base da úlcera ou do material obtido por aspiração do bubão. Observam-se bacilos Gram negativos
intracelulares. A cultura, método diagnóstico mais sensível, é de realização difícil. O PCR é o padrão-ouro,
embora ainda de custo elevado. A biópsia não é recomendada, pois não confirma a doença.
Recomendações: a melhora clínica e reavaliação deve ocorrer 7 dias após instituído o tratamento. O tratamento
dos parceiros é sempre indicado, devido ao estado de portador assintomático. É importante excluir a
possibilidade de sífilis associada, pelo método do campo escuro ou VDRL.

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HERPES GENITAL
Doença causada pelo Herpes simplex virus (HSV) 1 e 2, transmitida predominantemente pelo contato sexual,
inclusive oro-genital. A transmissão pode-se dar, também, pelo contato direto com lesões ou objetos
contaminados, inclusive pelo beijo em pessoas sem lesão aparente, desde que haja uma solução de continuidade
para inoculação, visto que o vírus não penetra pela pele ou mucosa íntegra. O HSV-1 predomina nas lesões
periorais e o HSV-2 nas genitais, embora ambos possam causar lesão em qualquer parte do corpo.
Manifestações: no homem, localiza-se mais freqüentemente na glande e prepúcio; na mulher, nos pequenos
lábios, clitóris, grandes lábios, fúrcula e colo do útero. As lesões são inicialmente pápulas eritematosas,
seguindo-se por vesículas agrupadas com conteúdo citrino, que se rompem dando origem a ulcerações. A
adenopatia inguinal dolorosa bilateral pode estar presente em 50% dos casos. As lesões cervicais (cervicite
herpética), freqüentes na primo-infecção podem estar associadas a corrimento genital aquoso. Após a infecção
primária, o HSV ascende pelos nervos periféricos sensoriais, penetra nos núcleos das células ganglionares e entra
em latência. Após a infecção genital primária por HSV 2 ou HSV 1, respectivamente, 90% e 60% dos pacientes
desenvolvem novos episódios nos primeiros 12 meses, por reativação dos vírus. A recorrência das lesões pode
estar associada a febre, exposição à radiação ultravioleta, traumatismos, menstruação, estresse físico ou
emocional, antibioticoterapia prolongada e imunodeficiência. O quadro clínico das recorrências é menos intenso
que o observado na primo-infecção, porém precedido de pródromos característicos: aumento de sensibilidade,
prurido, “queimação”, mialgias, e “fisgadas” nas pernas, quadris e região anogenital.
Diagnóstico: é clínico, embora o diagnóstico citológico de Tzanck (visualização de multinucleação e
balonização celulares em lâmina) possa ser utilizado. A cultura de tecido e PCR são técnicas específicas, porém
não disponíveis. A sorologia não é útil no diagnóstico, pois a maioria das pessoas são infectadas.
Tratamento: não existe cura definitiva, mas os antivirais são eficientes em reduzir a duração do episódio e
diminuir o número de recidivas. A dor pode ser aliviada com analgésicos e AINE. Fazer higiene local.
Herpes e gravidez: o risco de transmissão ao feto é maior quando ocorre primoinfecção durante p 3° trimestre
de gestação. A prevenção de herpes neonatal compreende: evitar contato com pessoas contaminadas, interromper
a gestação por via alta se lesões ativas no canal de parto, evitar relação durante o 3° trimestre com parceiro
sabidamente infectado caso a gestante não tenha história de infecção genital conhecida. A infecção neonatal
ocorre intraparto em 85 % dos casos, 10% por contato com lesão de pele de outras pessoas e 5% intraútero, de
forma ascendente ou transplacentária, estando esta última associada a abortamento, parto prematuro, lesões
cutâneas e malformações congênitas, especialmente coriorretinite.
Tratamento supressivo (profilaxia): pode ser empregado para quem apresenta 6 ou mais episódios de herpes ao
ano e quando o parceiro é soronegativo para herpes. Aciclovir 400mg VO 2x/dia.

DONOVANOSE
Doença crônica progressiva que acomete preferencialmente pele e mucosas das regiões genitais, perianais e
inguinais. É freqüentemente associada à transmissão sexual, embora os mecanismos de transmissão não sejam
bem conhecidos, com contagiosidade baixa. Causada pelo Calymabacterium granulomatis, um Gram-negativo.
História natural e manifestações: O período de incubação varia de 8 dias a 12 semanas, mas a minoria das
lesões surge 30 dias após exposição sexual. O quadro clínico inicia-se com ulceração de borda plana ou
hipertrófica, bem delimitada, com fundo granuloso, de aspecto vermelho vivo e de sangramento fácil. A
ulceração evolui lenta e progressivamente, podendo se tornar vegetante. Se dissemina por contigüidade ou por
auto-inoculação em superfícies próximas (lesão em espelho). A infecção secundária pode produzir dor e
exsudação (presença de pus). Não há adenite, embora possam se formar pseudo-bubões (granulações
subcutâneas). Na mulher, a forma elefantiásica é observada quando há predomínio de fenômenos obstrutivos
linfáticos.
Diagnóstico: A identificação dos corpúsculos de Donovan no material de biópsia pode ser feita pelas colorações
de Wright, Giemsa ou Leishman.
Recomendações: o critério de cura e finalização do tratamento é o desaparecimento da lesão. Devido a baixa
infectividade, não é necessário tratar o parceiro. Além dos fármacos já citados, a adição de gentamicina (1mg/kg/
dia EV 8/8) deve ser considerada nos casos graves e em grávidas desde o início do tratamento.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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LINFOGRANULOMA VENÉREO
É uma doença infecciosa de transmissão exclusivamente sexual, caracterizada pela presença de bubão inguinal,
com período de incubação entre 3 e 30 dias. O agente causal é a Chlamydia trachomatis, um Gram-negativo
mais frequentemente relacionado à uretrite não-gonocócica.
História natural e manifestações: A evolução da doença ocorre em 3 fases: lesão de inoculação, disseminação
linfática regional e seqüelas.
-Lesão de inoculação: inicia-se por pápula, pústula ou exulceração indolor, que desaparece sem deixar seqüela.
Freqüentemente não é notada pelo paciente e raramente é observada pelo médico. Localiza-se, no homem, no
sulco coronal, frênulo, prepúcio; na mulher, na parede vaginal posterior, colo uterino, fúrcula e genitália externa.
-Disseminação linfática regional: No homem, a linfadenopatia inguinal desenvolve-se entre 1 a 6 semanas após
a lesão inicial, sendo geralmente unilateral (em 70% dos casos) e constituindo-se o principal motivo da consulta.
Na mulher, a localização da adenopatia depende do local da lesão de inoculação. O comprometimento
ganglionar evolui com supuração e fistulização por orifícios múltiplos, que correspondem a linfonodos
individualizados, parcialmente fundidos numa grande massa. Sintomas constitucionais como febre, anorexia e
indisposição podem ocorrer.
-Seqüelas: ocorrem mais freqüente na mulher (drenagem linfática perianal) e homossexuais masculinos
(intercurso sexual anal), devido ao acometimento do reto. O quadro principal é de uma proctite, caracterizado
por mucosas retais hiperemiadas e friáveis, com múltiplas micro-ulcerações. Febre, dor retal e tenesmo são
comuns. A obstrução linfática crônica leva à elefantíase genital, que na mulher é denominada estiômene. Podem
ocorrer fístulas retais, vaginais, vesicais e estenose retal.
Diagnóstico: O diagnóstico deve ser considerado em todos os casos de adenite inguinal, elefantíase genital,
estenose uretral ou retal. Raramente vai entrar no diagnóstico de doenças ulceradas agudas, a menos que esteja
em sua fase inicial. Na maioria dos casos, o diagnóstico é feito em bases clínicas, não sendo rotineira a
comprovação laboratorial.
Tratamento: esteato de eritromicina 500 mg, VO, de 6/6 horas, por 21 dias, inclusive em gestantes.
Recomendações: os parceiros sexuais devem ser examinados e tratados caso tenham tido contato sexual com a
paciente nos 30 dias precedentes à instalação dos sintomas. Os antibióticos não revertem as seqüelas, como
estenose retal ou elefantíase genital.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Ginecologia volume 6.


Manual de Controle das Doenças Sexualmente Transmissíveis. Ministério da Saúde, 2006.

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CORRIMENTO VAGINAL – CERVICITE E VULVOVAGINITE


ABORDAGEM SINDÔMICA – CORRIMENTO VAGINAL

Deve-se realizar anamnese incluindo os critérios de risco para a identificação das mulheres com maior
possibilidade de infecção cervical por gonococo e/ou clamídia. A presença de qualquer critério é suficiente
para indicar tratamento. Nestes casos, mesmo na ausência dos sinais clínicos para cervicite ao exame
ginecológico, a paciente será considerada como portadora assintomática e deve receber o tratamento. Na
presença ou ausência de critérios de risco ou de evidências de cervicite, deve-se prosseguir com a investigação
das causas de corrimento vaginal, pesquisando as principais vulvovaginites.

VULVOVAGINITES
Considera-se como vulvovaginite toda manifestação infamatória e/ou infecciosa do trato genital feminino
inferior, ou seja, vulva, vagina e epitélio escamoso do colo uterino (ectocérvice). As vulvovaginites se
manifestam por meio de corrimento vaginal, associado a um ou mais dos seguintes sintomas inespecíficos:
prurido vulvovaginal, dor ou ardor ao urinar e sensação de desconforto pélvico. Entretanto, muitas infecções
genitais podem ser completamente assintomáticas.
Secreção vaginal fisiológica: composta por muco cervical, células vaginais e cervicais esfoliadas, secreções das
glândulas de Bartholin, pequena quantidade de leucócitos e microorganismos da flora vaginal. Tem a cor branca ou
transparente, pH ácido (abaixo de 4,5), volume variável e sem odor. Geralmente localizada no fundo de saco posterior
Flora vaginal normal: a flora normal da vagina é polimicrobiana. O Lactobacillus spp é a espécie bacteriana
predominante, representando 90% das bactérias comensais da vagina em uma mulher sadia em idade reprodutiva.
Mecanismos de defesa: um dos principais mecanismos de defesa às bactérias que habitam o trato genital inferior é o
pH vaginal ácido, que se deve à ação dos lactobacilos, que metabolizam o glicogênio das células superficiais vaginais
em ácido lático. Vale lembrar que o acúmulo de glicogênio celular é estimulado pela ação do estrogênio: esse fato
explica o porque de uma secreção vaginal abundante em grávidas, que são ricas em estrogênio.
As vulvovaginites representam uma das principais causas de consulta ao ginecologista. As pacientes
geralmente se queixam de fluxo vaginal aumentado, prurido e irritação, que podem estar associados a odor
desagradável, a ardência e a intenso desconforto.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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VAGINOSE BACTERIANA
A vaginose bacteriana é caracterizada por um desequilíbrio da flora vaginal normal, devido ao aumento
exagerado de bactérias, em especial as anaeróbias, principalmente a Gardnerella vaginalis, associado a uma
ausência ou diminuição acentuada dos lactobacilos acidófilos. Não se trata de infecção de transmissão sexual,
apenas pode ser desencadeada pela relação sexual em mulheres predispostas, ao terem contato com sêmen de
pH elevado. É a principal causa de corrimento vaginal nas mulheres.
Manifestações: apesar de quase metade das mulheres serem assintomáticas, quando presente, o corrimento
vaginal apresenta-se de duas formas:
-Corrimento vaginal com odor fétido, semelhante a peixe podre, mais acentuado após o coito e durante o período
menstrual, condições na qual o pH vaginal se eleva, pois o corrimento é resultado do metabolismo das bactérias
anaeróbias no trato genital inferior em meio alcalino
-Corrimento vaginal branco-acinzentado, de aspecto fluido ou cremoso, algumas vezes bolhoso; dor às relações
sexuais (pouco freqüente)
Diagnóstico: baseado na presença de ao menos 3 dos 4 critérios de Amsel:
(1) corrimento acinzentado ou branco-acinzentado, homogêneo, fino;
(2) pH vaginal> 4,5 no exame com papel indicador colocado em contato com a parede vaginal sem tocar o colo
(3) Teste das Aminas (Whiff-test) positivo
(4) visualização de Clue Cells (células epiteliais vaginais com sua membrana recoberta por bactérias) ou células guia
no exame microscópico a fresco da secreção vaginal.

CANDIDÍASE VULVOVAGINAL
É uma infecção da vulva e vagina, causada por um fungo comensal que habita a mucosa vaginal e a mucosa
digestiva, que cresce quando o meio torna-se favorável para o seu desenvolvimento. A relação sexual não é a
principal forma de transmissão visto que esses organismos podem fazer parte da flora endógena em até 50%
das mulheres assintomáticas. É a segunda causa mais comum de corrimento vaginal.
Etiologia: Cerca de 80 a 90% dos casos são devidos à Candida albicans e de 10 a 20% a outras espécies
chamadas não- albicans (C. tropicalis, C. glabrata, C. krusei, C. parapsilosis).
Fatores de Risco: diabetes mellitus descompensado, gravidez, uso de ACHO em altas doses, uso de
antibióticos, corticóides ou imunossupressores, infecção pelo HIV e higiene inadequada.
Manifestações: prurido vulvovaginal (principal sintoma e de intensidade variável); corrimento branco
grumoso e semelhante a leite coalhado; queimação vulvovaginal; disúria e/ou dispareunia; escoriações de
coçadura; vagina e colo recobertos por placas brancas ou branco-acinzentadas, aderidas à mucosa.
Diagnóstico laboratorial:
(1) teste do pH vaginal menor ou igual a 4,5;
(2) exame direto a fresco com KOH a 10% (solução adstringente) mostra com facilidade a presença de pseudo-hifas
na secreção vaginal (em cerca de 70% dos casos)
(3) bacterioscopia pelo gram: também mostra as pseudo-hifas coradas fortemente pelo gram.
O simples achado de cândida na citologia oncótica não justifica o tratamento.

TRICOMONÍASE
É uma infecção causada pelo protozoário Trichomonas vaginalis (protozoário flagelado). Sua principal forma
de transmissão é a sexual, com risco por ato de 60 a 80%, constituindo-se uma DST. Na mulher pode acometer
vulva, vagina ou cérvice, causando uma cervicovulvovaginite. Os homens são, de forma geral, assintomáticos
(excepcionalmente causa corrimento uretral)
Manifestações: a principal queixa é o corrimento abundante, amarelo ou amarelo-esverdeado, mal cheiroso e
bolhoso. Há ainda prurido vaginal intenso, hiperemia e edema da vulva e vagina, disúria, polaciúria e dor
suprapúbica (sinais inflamatórios). A sintomatologia é intensa após a menstruação ou durante a gravidez,
condição na qual está associada a feto de baixo peso e à rotura prematura das membranas. Além disso,
apresenta um achado peculiar: colpite focal ou difusa, chamada de “Colo em framboesa”
Diagnóstico: o teste do pH vaginal mostra valores acima de 4,5. O exame microscópico direto evidencia o
parasita. Cabe salientar que a tricomoníase pode alterar resultado de citologia oncótica.

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ESQUEMAS TERAPÊUTICOS - VULVOVAGINITES
Agente 1ª opção 2ª opção Gravidas após 1° trimestre e
lactantes
Gardnerella Metronidazol 400-500mg 12/12hs Metronidazol 2 g VO dose Metronidazol 250 mg 3 vezes ao
VO 7 dias única ou dia durante 7 dias ou
Metronidazol gel 0,75%, Metronidazol 400mg 12/12hs
uma aplicação vaginal (5 g), VO 7 dias ou
2 vezes ao dia, por 5 dias; ou Clindamicina 300 mg, VO, de
Clindamicina 300 mg, VO, 12/12 horas, por 7 dias
de 12/12 horas, por 7 dias;
Candidíase Miconazol, creme a 2%, via vaginal, Fluconazol- 150 mg VO em Miconazol, creme a 2%, via
uma aplicação à noite ao deitar-se, dose única ou vaginal, uma aplicação à noite ao
por 7 dias;ou Itraconazol 200mg VO 12/12 deitar-se, por 7 dias; ou
Nistatina 100.000 UI, uma aplicação, hs em 1 dia ou Nistatina 100.000 UI, uma
via vaginal, à noite ao deitar-se, por Cetoconazol 400mg VO/dia aplicação, via vaginal, à noite ao
14 dias. (+ barato e acessível). por 5 dias deitar-se, por 14 dias
Tricomoníase Metronidazol 2g VO dose única ou Secnidazol 2g, VO, dose Metronidazol 2 g VO dose única
Metronidazol 400-500mg 12/12hs única ou Tinidazol 2g VO
VO 7 dias (faz-se esse uso quando se dose única
quer cobrir a Gardnerella).
Observações:
-O simples achado de cândida na citologia oncológica em uma paciente assintomática, não justifica o tratamento.
-A vaginose bacteriana e a candidíase são infecções endógenas. Assim, apenas os parceiros de mulheres com
tricomoníase, devem ser tratados com o mesmo medicamento em dose única, porque esta é considerada uma DST.
-Durante o tratamento, devem ser suspensas as relações sexuais e manter o tratamento se a paciente menstruar.
-O tratamento sistêmico para candidíase deve ser feito somente nos casos de difícil controle ou recorrentes (4 ou mais
episódios/ano). Nesses casos, devem-se oferecer sorologia anti-HIV e investigar causas sistêmicas predisponentes
(diabetes, imunodepressão, inclusive a infecção pelo HIV, uso de corticóides e outros).

CERVICITES
Cervicite mucopurulenta ou endocervicite é a inflamação da mucosa endocervical (epitélio colunar do colo
uterino). A etiologia das cervicites está relacionada com Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis.
Manifestações: Embora a infecção seja assintomática em 70-80% dos casos, a mulher portadora de cervicite
poderá vir a ter sérias complicações se não for tratada. Uma cervicite prolongada, sem o tratamento adequado,
pode-se estender ao endométrio e às trompas, causando Doença Infamatória Pélvica (DIP). Alguns sintomas
genitais leves, como corrimento vaginal, dispareunia ou disúria, podem ocorrer na presença de cervicite
mucopurulenta. O colo uterino pode ficar edemaciado, sangrando facilmente ao toque da espátula. Pode ser
verificada a presença de mucopus no orifício externo do colo. Em gestantes:
-Infecção gonocócica: poderá estar associada a um maior risco de prematuridade, ruptura prematura de membrana,
perdas fetais, retardo de crescimento intra-uterino e febre puerperal. No recém-nascido, a principal manifestação
clínica é a conjuntivite, podendo haver septicemia, artrite, abcessos e couro cabeludo, pneumonia, meningite,
endocardite e estomatite.
-Infecção por clamídia: poderá estar relacionada a partos pré-
termo, amniorrexe prematura, endometrite puerperal, além de
conjuntivite e pneumonias do recém-nascido. O recém-nascido
de mãe com infecção da cérvice por clamídia corre alto risco de
adquirir a infecção durante a passagem pelo canal de parto.
Diagnóstico: a cultura para clamídia e gonococo é o exame
considerado padrão-ouro, porém pouco disponível na prática
médica.
*Em gestantes e < 18 anos, não utilizar ciprofloxacina e ofloxacina

Fonte: Manual de Controle das DST's. Ministério da Saúde, 2006.

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CORRIMENTO URETRAL
Uretrites são processos infecciosos e inflamatórios da uretra, caracterizadas principalmente pela descarga de
material purulento ou mucopurulento. Entretanto, 70% das mulheres e 30% dos homens infectados por
clamídia, assim como 80% das mulheres e 10% dos homens infectados por gonococo podem não apresentar
sintomas. Como os agentes etiológicos são transmitidos via sexual, logo a uretrite se configura uma DST.
Agentes etiológicos: as bactérias de maior importância
clínica para uretrites são Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia
trachomatis. Outras bactérias também estão associadas às
uretrites, principalmente na mulher, tais como Ureaplasma
urealyticum e Mycoplasma genitalium. À exceção do N.
Gonorrhoeae, as outras bactérias são de difícil isolamento;
portanto, dividiu-se as uretrites em duas classes: Uretrites
gonocócicas e uretrites não-gonocócicas.
Abordagem sindrômica: O diagnóstico da uretrite é baseado
na presença de corrimento uretral purulento ou
mucopurulento. Caso seja possível, deve-se realizar o exame
bacterioscópico do corrimento com coloração de Gram
(durante a consulta). Como não se pode descartar a
possibilidade de co-infecção pela clamídia, cujo diagnóstico
laboratorial exige técnicas raramente disponíveis, recomenda-
se, sempre, o tratamento concomitante para as duas infecções
(co-infecção presente em 10-30%). Se estiverem ausentes os
diplococos intracelulares, deve-se tratar o paciente apenas
para clamídia como indicado no quadro abaixo, visto que o
gonococo é identificado pela bacterioscopia em 95% dos
casos.
Em menores de 18 anos, está contraindicada a ofloxacina e o
ciprofloxacina. Não se deve ordenhar a uretra durante ou após o
tratamento.
Como é uma DST, o parceiro deve ser tratado.
Se no retorno, 7-10 dias após início do tratamento, ainda houver
corrimento e se o tratamento do paciente e do parceiro foi
adequado, deve-se oferecer o tratamento para os agentes menos
freqüentes, que consiste em: Eritromicina (estearato) 500mg VO
6/6 por 7 dias + Metronidazol 2g VO dose única.
Além dessas recomendações do MS 2006, o CDC 2006
recomenda a abstinência sexual até 7 dias de iniciado o
tratamento na paciente e no parceiro.
URETRITE GONOCÓCICA - Gonorréia
É a uretrite causada pela N. gonorrhoeae, o gonococo, um diplococo Gram-negativo. O período de incubação
é curto, de 2 a 5 dias, sendo o risco de transmissão de 50% por intercurso sexual.
Manifestações: no homem, a sintomatologia é aguda: o sintoma mais precoce é o prurido na fossa navicular,
que se estende para toda a uretra e, em 1-3 dias, surge a disúria e o corrimento. Sintomas gerais como febre e
astenia podem ocorrer. Na mulher, o quadro comumente se manifesta por uma cervicite, assintomática na
grande maioria dos casos. Entretanto, pode evoluir com as mesmas complicações de uma cervicite prolongada
sem tratamento adequado: pode-se estender ao endométrio e às trompas, causando Doença Infamatória Pélvica
(DIP) e infertilidade.

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URETRITE NÃO-GONOCÓCICA
São denominadas uretrites não gonocócicas (UNG) as uretrites sintomáticas cujas bacterioscopias pela
coloração de Gram e/ou cultura são negativas para o gonococo. A C. trachomatis é o agente mais comum de
UNG. O Ureaplasma faz parte da microbiota urogenital de cerca de 60-80% das mulheres sexualmente ativas.
Manifestações: a UNG é assintomática na grande maioria das mulheres. Quando sintomática, pode se
manifestar como uma cervicite (também assintomática na maioria) ou com corrimento uretral mucóide e
discreto, acompanhado de disúria, ou ainda apresentar-se com um sangramento purulento simulando uma
uretrite gonocócica.
Síndrome de Reiter: Vale lembrar que a UNG por Chlamydia está associada ao desenvolvimento da síndrome
de Reiter: Uretrite + Artrite + Conjuntivite.

Fonte de Pesquisa:
Manual de Controle das DST's. Ministério da Saúde, 2006. Brasil
Medcurso 2010 – Ginecologia.

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DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA


A Doença Inflamatória Pélvica (DIP) é o conjunto de sinais e sintomas secundários à ascensão de
microorganismos para o trato genital superior (ultrapassam o OCI), sendo provenientes da vagina e/ou
endocérvice. Inclui: endometrite, salpingite, abscesso tubo-ovariano e peritonite pélvica.
Epidemiologia: a faixa etária mais prevalente encontra-se entre 15 e 25 anos. A taxa de mortalidade é baixa.
Já a morbidade é alta, podendo ter como conseqüências: infertilidade por fator tubário (12-25%), aumento da
incidência de prenhez ectópica (6-10x) e dispareunia e dor pélvica crônica (17-20%).
Etiologia: a DIP é um processo agudo na ampla maioria dos casos. Em cerca de 90%, é originada de agentes
sexualmente transmissíveis. A Neisseria gonorheae (gonococo) e a Chlamydia trachomatis (clamídia) são os
dois únicos patógenos primários relatados na literatura e respondem por mais 2/3 dos casos de DIP. Outros
possíveis patógenos primários da DIP permanecem no anonimato. A despeito do patógeno inicial, a DIP
comumente evolui com infecção polimicrobiana (Gardnerella, Mycoplasma, E. coli, Klesbisiella, Bacteoides,
Estreptococo beta-hemolítico). Vale salientar que a infecção por Actinomices israelli, com um quadro de DIP
crônica, é comum em usuárias de DIU. Estudos recentes enfatizam a associação do Haemophilus influenzae,
do Streptococcus pyogenes e dos aneróbios com a DIP clinicamente grave.
Fatores de risco: a DIP compartilha dos mesmos fatores de risco das DST. São eles: idade inferior a 25 anos,
início precoce da atividade sexual, mulheres solteiras, baixo nível socioeconômico, tabagismo, etilismo e uso
de drogas ilícitas (relacionam-se à imunossupressão), múltiplos parceiros sexuais, história prévia de DST/DI e
vaginose bacteriana (facilita a ascensão dos patógenos). O uso de preservativos comprovadamente diminui a
incidência. A relação de ACHO e DIU com a DIP, como fator de risco ou não, ainda não está bem
estabelecida.
Fisiopatologia e manifestações: a DIP inicia-se com a ascensão do patógeno pelo trato genital, mais
precisamente pela sua passagem através do OCI. Este processo é facilitado no período perimenstrual e pós-
menstrual imediato, devido a abertura do colo uterino e pela fluidez do muco cervical decorrente da ação
estrogênica. O principal sintoma de DIP é a presença de descarga vaginal purulenta, quase sempre
acompanhada de dor abdominal infraumbilical, dor na topografia dos anexos, dor à mobilização do colo
uterino e febre. Podem também ocorrer os sintomas atípicos, tais como SUA, dispareunia e sintomas urinários.
Algumas mulheres apresentam quadro de DIP totalmente assintomático.
-Endometrite: Todo processo começa com uma endometrite, que se caracteriza pela presença de plasmócitos
no estroma endometrial. A paciente se queixa comumente de dor à mobilização do colo uterino e de dor
abdominal infraumbilical. Esta é a primeira manifestação da DIP.
-Salpingite: A seguir, o processo infeccioso pode se dirigir às trompas, com intensa reação inflamatória. Esse
fato, explica a dor à palpação dos anexos. A inflamação da superfície tubária pode acarretar ainda a formação
de aderências, que justificam a dor pélvica crônica e/ou a infertilidade por fator tubário que algumas pacientes
desenvolvem. Provavelmente essas aderências são também responsáveis pelos casos de gestação ectópica.
-Abscesso tubo-ovariano: em alguns casos as fímbrias envolvem o ovário e formam o abscesso tubo-ovariano.
Eventualmente, o conteúdo do abscesso pode cair na cavidade peritoneal e constituir um abscesso em fundo de
saco de Douglas, ou entre as alças intestinais, ou no espaço subdiafragmático. Neste estágio, as pacientes
apresentam sinais de irritação peritoneal.
-Síndrome de Fitz-Hugh-Curtis: nas infecções por gonococo e clamídia, podem surgir, agudamente, pequenos
abscessos na superfície hepática, que cursarão com exsudato purulento visível na cápsula de Glisson, na
ausência de acometimento do parênquima hepático. Na fase crônica, há as aderências do tipo “corda de
violino” entre a parede anterior e a superfície hepática. As manifestações clínicas incluem dor pleurítica e dor
em hipocôndrio direito.
Diagnóstico: o diagnóstico é usualmente baseado nos achados clínicos que, na realidade, são imprecisos. Não
existe um meio diagnóstico padrão-ouro: nem anamnese, exame físico ou laboratorial. É nesse sentido que
para estabelecer o diagnóstico, é necessário 1 critério elaborado OU 3 critérios maiores + 1 critério menor.

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-Exames complementares: na maioria dos casos de DIP, o diagnóstico é realizado pela história clínica e
achados do exame físico. Nos casos subagudos, o emprego dos exames complementares adquirem maior
importância. Os principais exames são:
-Teste de gravidez: para excluir gravidez ectópica ou abortamento séptico.
-Hemograma completo: evidencia, comumente,
leucocitose com aumento do número de bastões.
-Provas inflamatórias (PCR e VHS): na quase
totalidade dos casos, ambos estão elevados.
-EAS e urocultura: para afastar ITU
-USG: poderá revelar a presença de líquido livre na
pelve, abscessos tubo-ovarianos e pélvicos.
-Sorologias: VDRL, sorologia para hepatite B e C e
imunofluorescência indireta para clamídia.
-Biópsia de endométrio: pode confirmar a endometrite.
Padrão-ouro para diagnosticar endometrite.
-Videolaparoscopia: permite a obtenção de um
diagnóstico acurado de salpingite e diagnóstico bacteriológico mais completo (exame bacteriológico de material colhido
durante a VLSC). As evidências de DIP aguda pela VLPC são: hiperemia tubária, edema tubário, exsudato purulento na
superfície tubária ou extravasando pela extremidade fimbriada. É padrão-ouro nos acometimentos tubários e peritoneais.
Estadiamento de Monif e conduta:
-Estágio 1: endometrite e salpingite sem peritonite. Tratamento ambulatorial.
-Estágio 2: salpingite aguda com peritonite. Tratamento hospitalar.
-Estágio 3: salpingite aguda com oclusão tubária ou abscesso tubo-ovariano. Tratamento hospitalar.
-Estágio 4: abscesso tubo-ovariano roto com secreção purulenta na cavidade e abscesso > 10 cm. Tratamento
hospitalar cirúrgico, com remoção do abscesso, preservando, sempre que possível, os ovários. A extensão da
cirurgia é determinada pelos achados da laparotomia.
Sinais de abscesso tubo-ovariano roto: queda acentuada do estado geral, refratariedade ao tratamento clínico, febre
persistente e/ou comprovação pela USG (hemoperitônio, abscesso de fundo de saco de Douglas).
*Obs: se constituem indicações de tratamento hospitalar: presença de abscesso tubo-ovariano (massa
palpável ou evidência USG), quadro grave (peritonite, náuseas, vômitos ou febre > 39° C), gestantes,
pacientes imunocomprometidas, ausência de resposta ao tratamento ambulatorial nas primeiras 72 horas.
Tratamento: a antibioticoterapia (ATB) deve ser direcionada para os germes mais envolvidos, ou seja, o
gonococo, clamídia e anaeróbios (Bacteroides fragilis). Deve contemplar ainda a vaginose bacteriana,
frequentemente associada a DIP, bactérias Gram-negativas, bactérias facultativas e estreptococos.
-Ambulatorial:
-Ceftriaxona 250mg IM D.U. + Doxicilina 100mg VO 12/12 por 14 dias COM ou SEM metronidazol 500mg VO 12/12
-A Ceftriaxona pode ser substituída por uma quinolona: Ciprofloxacina 500mg VO 12/12 por 14 dias.
-A associação com metronidazol visa cobrir os anaeróbios e a vaginose bacteriana, comumente associada ao quadro.
-Hospitalar:
-Clindamicina 900mg IV 8/8 + Gentamicina IV/IM 2mg/kg seguido de manutenção de 1,5mg/kg 8/8.
-Opção: Ampicilina/Sulbactam 3g IV 6/6 + Doxiciclina 100mg IV ou VO de 12/12 por 14 dias.
Os parceiros devem ser examinados e tratados caso tenham mantido contato sexual com a paciente nos
últimos 60 dias que precederam o aparecimento dos sintomas. Consiste em: Azitromicina 1g VO D.U. +
ciprofloxacino 500mg VO D.U.
-Cirúrgico: a VLSC é recomendada nos casos de dúvida diagnóstica (DIP, apendicite e gravidez ectópica) e na
ausência de resposta à terapia parenteral por 72 horas. A laparotomia fica reservada para casos de emergência
que cursam com instabilidade hemodinâmica, como rotura de abscesso tubo-ovariano. Em ambas, é
recomendado drenar abscessos, lavar exaustivamente a cavidade e coletar material para cultura.
Reavaliação: ambulatorial → 72 horas. Hospitalar → 24-48 horas. Nesse período deve haver melhora clínica.
Seqüelas: Precoces → abscesso tubo-ovariano, fase aguda da síndrome de Fitz-Hugh-Curtis e morte.
Tardias→ infertilidade, prenhez ectópica, dor pélvica crônica, dispareunia e fase crônica da síndrome de FHC.
Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Ginecologia. Manual de Controle das DST's. Ministério da Saúde, 2006.

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MAMAS – DOENÇAS BENIGNAS


MASTALGIA
É um sintoma e não uma doença. Responde por 40% das consultas no menacme.
Etiologia: é desconhecida. Existem várias teorias para sua explicação, entre elas o hiperestrogenismo (o
estrogênio é fundamental para a ocorrência de mastalgia cíclica), a deficiência de progesterona na fase lútea, o
aumento dos níveis séricos de gonadotrofinas, alteração na secreção pulsátil de prolactina (picos noturnos
elevados e valores aumentados anormalmente pela manhã), ectasia ductal (a dilatação ductal é mais freqüente
nas mulheres portadoras de mastalgia) e a deficiência de ácidos graxos poli-insaturados (ácido enoleico,
digamenoleico e araquidônio). Como citado, todas são teorias, algumas com mais evidências que outras.
Entretanto, a deficiência de ácidos graxos é a teoria atualmente mais aceita, na qual este estado levaria a maior
sensibilidade e afinidade dos receptores mamários aos estrógenos e progestógenos; o ácido araquidônico é
precursor da prostaglandina, que é moduladora da ação hormonal.
Fatores de risco: alguns fatores estão implicados no surgimento ou aumento de intensidade da dor. São eles:
estresse, tabagismo, retenção hídrica, uso de medicamentos (antidepressivos, ansiolíticos) e ingestão de café.
Classificação: existem três grupos de dor nas mamas: cíclica (relacionada com o ciclo menstrual), acíclica e a
dor extramamária (dor que tem origem no tórax ou em outras localizações, mas que é percebida nas mamas).
-Mastalgia cíclica: normalmente ocorre na fase lútea tardia, frequentemente 2-3 dias antes da menstruação.
Em geral é bilateral e referida nos quadrantes superiores externos, pois aí predomina o tecido glandular.
-Mastodínea: é o desconforto mamário que precede a menstruação em 2 a 3 dias. É considerada normal.
-Mastalgia acíclica: a dor pode ser constante ou intermitente. As causas mamárias mais importantes são a
ectasia ductal, a adenose esclerosante, a esteatonecrose e as mastites agudas e crônicas.
-Dor extramamária: as causas mais importantes são: nevralgia intercostal, contratura muscular, angina,
espondiloartrose vertebral, colelitíase, síndrome de Tietze (costocondrite → inflamação da articulação
costocondral, manifesta por pontos dolorosos principalmente no 2º, 3º e 4º arcos costais), doença de Mondor
(tromboflebite das veias superficiais do tórax e parte superior do abdome, sendo rara e associada à trauma
local, manifesta por dor aguda na topografia da veia trombosada e presença de cordão fibroso no local).
Intensidade da dor:
-Mastalgia leve: não interfere na qualidade de vida (sono, relações sexuais) e nas atividades diárias (trabalho).
-Mastalgia moderada: interfere na qualidade de vida, mas não nas atividades diárias
-Mastalgia grave: interfere na qualidade de vida e nas atividades diárias.
Diagnóstico: o diagnóstico é clínico. Os exames complementares são solicitados habitualmente para afastar a
hipótese de câncer. USG mamária e mamografia são os exames comumente solicitados. Vale lembrar que nos
casos de dor extramamária, a radiografia de tórax pode ser útil.
Tratamento: as diretrizes recomendam que o tratamento envolva afastar a hipótese de câncer, orientar a
paciente e utilizar medicamentos o mínimo possível. A maioria dos casos de mastalgia não requer tratamento
medicamentoso e salienta-se que apenas 1% dos casos de câncer apresentam-se com mastalgia.
-Medicamentoso: está indicado, em linhas gerais, para pacientes com o sintoma a mais de 6 meses e/ou com
alteração das atividades diárias e/ou da qualidade de vida. Os medicamentos mais empregados são:
tamoxifeno 10mg/dia por 2 a 6 meses (fármaco mais eficaz no controle da mastalgia, tendo ação
antiestrogênica; efeito colateral: câncer de endométrio), danazol 100 a 200mg/dia (antigonadotrófico que
induz uma pseudomenopausa, não se mostrando superior ao tamoxifeno; efeitos colaterais: acne,
hirsutismo,irregularidade menstural), gestrinona
2,5mg duas vezes por semana (tem propriedades
androgênicas, antiestrogênicas e antiprogestogênicas;
efeitos colaterais: hirsutismo, acne, irregularidade
menstrual, diminuição da libido, engrossamento da
voz), análogos do GnRH, bromocriptina, entre outros.

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-Cirúrgico: não mostrou eficácia comprovada
-Dor extramamária: o tratamento é dirigido à causa-base do sintoma.

ADENSAMENTOS E CISTOS
Atualmente, utiliza-se o termo Alterações Funcionais Benignas da Mama (AFBM) para descrever: mastalgia
cíclica, adensamentos e cistos. Representam as alterações mais freqüentes da mama, principalmente na faixa
etária do menacme.
Manifestações a tríade clássica das AFBM é: mastalgia cíclica, espessamentos mamários e cistos. Pode
ocorrer ainda descarga papilar sero-esverdeada, multiductal e bilateral.
Exame físico:
-Mastalgia cíclica: descrita no tópico anterior;
-Adensamentos: corresponde a uma área de endurecimento localizado. Aparecem, ao exame, como
espessamentos mamários, acompanhados ou não de dor e nódulos. Em geral, não requer tratamento adicional.
Decorrem das variações hormonais cíclicas, desaparecendo no período pós-menstrual.
-Cistos: são a etapa involutiva do lóbulo mamário. São tumores de aparecimento
rápido, móveis, elásticos, indolores (na maioria) e mais freqüentes nas porções
centrais da mama. A imagem ultrassonográfica dos cistos é característica:
anecoica, margens bem definidas, redonda ou oval, com reforço acústico
posterior. O tratamento consiste em uma punção da lesão à nível ambulatorial
(PAAF). O tratamento cirúrgico só está indicado para a exclusão de neoplasias
(naqueles que apresentam massa residual pós-punção ou líquido sanguinolento) e
para os casos de cistos complexos.

DESCARGA PAPILAR
Corresponde à saída de secreção pela papila, sendo considerado por alguns autores descarga papilar apenas
quando ocorre fora do ciclo gravídico-puerperal e do período da lactação. Representa 7 a 10% das consultas
no ambulatório de mastologia, possuindo em 95% dos casos uma causa benigna.
Fisiológico x patológico: a bilateralidade e a secreção multiductal são fatores
preditores de benignidade. O derrame sanguinolento ou em água de rocha,
espontâneo e/ou uniductal possui mais valor preditivo para câncer. A associação
com nódulos ou massas aumenta em torno de 60% o risco de malignidade.
Etiologia: exitem várias doenças que podem se manifestar com descarga papilar,
sendo, 95% delas, benignas. Vale salientar que o derrame em homens está mais
associado ao câncer que na mulher.
-Papiloma intraductal: Principal causa de derrame papilar sanguinolento ou serossanguinolento. Pode gerar nódulo
subareolar palpável. Não é considerado tumor pré-maligno. Comumente o tratamento é a exérese do ducto atingido.
-Papilomatose juvenil: afecção rara que se caracteriza por nódulo palpável subareolar. O derrame nem sempre está
presente. Acomete adultos jovens, entre 20 e 40 anos. Como se trata de hiperplasia ductal ou lobular, há risco
aumentado para câncer, sendo necessário acompanhamento regular.
-Carcinoma: geralmente causa derrame papilar quando associado a um nódulo.
-Ectasia ductal: é a dilatação dos ductos com estase de secreção nos mesmos.
De etiologia desconhecida, seu principal fator de risco é a idade acima de 50
anos. Não exige tratamento a menos que a descarga seja importante ou
espontâneo; se necessário, realiza-se a exérese do sistema ductal terminal.
-AFBM: caracteriza-se por descarga multiductal, bilateral e sero-esverdeada.
-Adenoma de mamilo: tumor raro, benigno e de fácil diagnóstico. Causa um
nódulo palpável nas camadas superficiais do mamilo. Em geral está associado
a derrame papilar sanguinolento.
-Galactorréia: a sua principal causa é farmacológico, sobretudo por
psicotrópicos. Pode ser causada ainda por adenomas hipofisários (galactorréia,
amenorréia e infertilidade) ou de causa idiopática.

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Diagnóstico: O tipo de secreção ajuda a identificar as causas de
base (ver tabela ao lado); a descarga fisiológica possui
coloração que varia do amarelo-esverdeado ao azulado. O
derrame papilar que apresenta maior valor semiológico é o
espontâneo, pois 2/3 das mulheres não lactantes, se estimuladas,
irão apresentá-lo. Na presença de nódulo, a investigação deve
seguir a propedêutica do nódulo. Na sua ausência, deve ser feita
a expressão radiada, ou seja, a palpação em raios no sentido
periferia-centro, seguida de pressão firme na aréola para
identificar o ponto-gatilho do derrame.
-Exames complementares: são coadjuvantes na investigação
terapêutica. A mamografia é o exame padrão, para exclusão de
nódulos, calcificações ou outros achados. A USG é geralmente complementar à mamografia, exceto em
jovens, na qual a USG pode fornecer mais informações.
Tratamento: O derrame papilar fisiológico não requer investigação, devendo-se apenas orientar a paciente
quanto à normalidade do quadro. Quando a galactorréia é farmacológica, está indicada a suspensão ou troca
do agente. Já a investigação e o tratamento do derrame papilar patológico só obedece uma diretriz: a biópsia
cirúrgica é obrigatória, pois nenhum exame substitui o valor da histologia.

NÓDULOS
Lesões que podem ser delimitadas nas mamas em três dimensões (largura, comprimento e profundidade).
Difere dos adensamentos porque nestes a lesão só pode ser delimitada em largura e comprimento. Embora o
seu encontro seja assustador, cerca de 80% dos nódulos mamários são benignos.
Características: o principal aspecto ao caracterizar os nódulos mamários é fazer
sua distinção entre características de benignidade e de malignidade, que irão guiar
o raciocínio clínico. Estão elas descritas ao lado.
Etiologia: são várias as causas de tumores benignos na mama. As principais são:
-Fibroadenoma: é o tumor benigno mais prevalente da mama feminina. Predomina
entre os 20 e 35 anos. Sua manifestação mais comum é o tumor palpável
fibroelástico, móvel, indolor, de 2 a 3 cm de diâmetro, com rápido crescimento
inicial e posterior estabilização. O tratamento é conservador em menores de 25
anos e com características benignas. Entre os 25 e 35 anos a conduta é
individualizada e, após essa idade, sua exérese é indicada quando palpáveis, com
rápido crescimento, se história familiar de câncer de mama e se MMG ou USG
duvidosas.
-Papiloma intraductal: sua manifestação mais comum é a descarga papilar
uniductal serossanguínea ou sanguinolenta.
-Lipoma: proliferação benigna das células adiposas. Apresenta-se como um nódulo amolecido, bem
delimitado, que pode atingir grandes dimensões. O tratamento indicado pode ser conservador ou a exérese
cirúrgica, a depender da literatura.
-AFBM: a lesão elementar é o cisto, já descrito anteriormente.
-Hamartoma: se manifesta entre a 3ª e 4ª décadas de vida. Formado por uma quantidade variável de tecido
glandular, gordura e tecido conectivo. São clinicamente muito semelhante ao lipoma, diferenciados apenas
pela histologia. O tratamento consiste na retirada completa do tumor.
Diagnóstico: os parâmetros importantes que devem ser avaliados são: tempo de surgimento, aumento de
tamanho, biópsias ou aspirações prévias de cistos, presença de dor, relação da dor com o ciclo menstrual e a
idade da paciente.
Punção Aspirativa com Agulha Fina (PAAF): é o primeiro passo na investigação dos nódulos mamários, pois
diferencia as lesões císticas das sólidas. Permite a obtenção de material para o exame citológico. Pode ser
guiada por USG ou MMG. Não existem contraindicações absolutas ao procedimento. Tem um índice de falso-

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negativo de 10%; por isso, apesar de uma PAAF negativa, em casos de alta suspeição de câncer, deve-se
prosseguir coma investigação diagnóstica através do exame histopatológico (biópsia). Além de diagnóstica, a
PAAF pode ser terapêutica, como no caso dos cistos simples. Complicações do exame: hematomas (mais
freqüente), pneumotórax (principalmente em mulheres magras com mamas pequenas) e infecções.
-Cistos: a presença de líquido sanguinolento, massa palpável após a aspiração do líquido e recidivas freqüentes
chamam a atenção para a possibilidade de carcinoma intracístico, estando a biópsia formalmente indicada.
-Tumores sólidos: o material aspirado deve ser sempre encaminhado ao exame citológico, que só possui valor se
positivo; caso negativo, não afasta o diagnóstico de câncer, sendo necessária a biópsia.
USG: método que assegura boa diferenciação entre nódulos sólidos e císticos. Apresenta adequada eficiência
em mamas densas (pacientes jovens) e complementa o rastreio mamográfico. Em linhas gerais, é método
indicado principalmente em mulheres jovens, lactantes e gestantes. Dentre alguns dos achados, vale
diferenciar que: sombra acústica é sinal de malignidade e reforço acústico é sinal de benignidade.
Mamografia: método principal e seguro de auxílio ao exame clínico das mamas, sendo o meio propedêutico
mais importante no diagnóstico das lesões subclínicas. Reduz em torno de 30% a mortalidade por câncer de
mama. Cerca de 10-15% dos tumores podem não ser detectados, o que se deve, na maioria das vezes, a uma
maior densidade mamária. É particularmente útil na avaliação de nódulos, adensamentos, calcificações e
cistos em mamas adiposas.
Indicações: rastreamento de lesões subclínicas em mulheres assintomáticas, estudo de lesões palpáveis,
acompanhamento pré e pós-terapêutico de paciente com câncer de mama, guia para procedimentos invasivos,
planejamento cirúrgico, cancerofobia e pesquisa de sítio primário em casos de câncer oculto.
Screening - Ministério da Saúde: a partir de 40 anos → exame clínico anual das mamas. 50-69 anos → mamografia a
cada 2 anos. Com fatores de risco → exame clínico e mamografia a partir dos 35 anos de idade ou 10 anos antes da
idade de acometimento no caso-índice. Fatores de risco: história de parente de primeiro grau com câncer de mama
abaixo dos 50 anos; história de parente de 1º grau com câncer de mama bilateral ou de ovário em qualquer faixa
etária; história de parente homem com câncer de mama.
BI-RADS: é a padronização da nomenclatura dos achados mamográficos proposto pelo Colégio Americano de
Radiologia. Categorias:
0→ Inconclusivo. Necessário utilizar de outros métodos (USG, RNM) ou repetir o exame em nova incidência.
1 → Sem achados. Repetir o exame conforme screening.
2 → Achados benignos. São eles: calcificações vasculares ou cutâneas, fibroadenoma, calcificações redondas, fios de
sutura calcificados, linfonodo intramamário. Não merecem investigação, devendo continuar o screening normal.
3 → Achados provavelmente benignos. São eles: nódulo de densidade baixa, contornos regulares, pequeno e de
limites bem definidos; calcificações puntiformes. Preconiza-se o controle mamográfico semestral por 3 anos.
4 → Achados suspeitos de malignidade. São eles: nódulo de contorno bocelado ou irregular e limite pouco definido,
microcalcificações pleomórficas, lesões espiculadas. Está indicada avaliação histopatológica da lesão.
5 → Achados sugestivos de malignidade. São eles: nódulo denso e espiculado, microcalcificações pleomórficas
agrupadas ou seguindo o trajeto ductal, ramificadas. Recomenda-se o estudo histopatológico da lesão.
6 → Achados com malignidade confirmada. Configura os casos em que o diagnóstico por biópsia foi realizado ou
nos casos de avaliação após quimioterapia pré-operatória.
RNM: exame não invasivo, de custo elevado, de alta sensibilidade e valor preditivo positivo de 100% para os
tumores invasores maiores que 2mm, não identificando tumores menores que esse tamanho ou
microcalcificações. Está indicada como método complementar à mamografia para avaliação de recidivas em
pacientes submetidas ao tratamento conservador e à radioterapia, para avaliar a regressão tumoral em paciente
submetida à quimioterapia, para mulheres com alto risco para câncer de mama com mamas densas e para
estudo de mamas com silicone.
Biópsia: está indicada nos casos sugestivos de malignidade segundo os métodos de imagem.
-Core biópsia (punção com agulha grossa ou biópsia de fragmento): requer anestesia local e pequena incisão
com bisturi na pele. A agulha é acoplada a uma pistola, e vários disparos são realizados, obtendo-se as
amostras. Pode ser guiada por USG em tumores pequenos ou às cegas em tumores grandes. Indicada em
nódulos sólidos, microcalcificações agrupadas, densidade assimétrica e distorção do parênquima.
-Mamotomia (biópsia percutânea à vácuo): utiliza-se um sistema à vácuo com agulhas para obtenção das

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amostras. Pode ser guiada por USG ou radiografia. Está indicada para avaliação de lesões não palpáveis, não
estando indicada nos nódulos palpáveis pois há métodos menos sofisticados e de menor custo.
-Biópsia cirúrgica: considerada padrão-ouro para a obtenção de amostra dos tumores para exame
histopatológico. Pode ser empregada em qualquer caso. É obrigatória na suspeita de falso-negativo de core ou
mamotomia.
Excisional: indicada nas lesões menores, havendo sua retirada completa.
Incisional: consiste na retirada de apenas um fragmento do tumor, sendo indicada em tumores de maiores dimensões.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Ginecologia.

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CÂNCER DE MAMA
O câncer de mama é definido como a proliferação maligna das células epiteliais que margeiam os ductos ou
lóbulos. É o principal câncer feminino e representa a 4ª causa de mortalidade entre as mulheres. Sua
incidência vem aumentado nos últimos anos, embora a mortalidade, nos países desenvolvidos, tem diminuído
gradativamente.
Fatores de risco:
-Sexo: 99% dos casos ocorrem em mulheres -Idade: o risco é aumentado após os 40 anos. -Raça: branca.
-Antecedentes pessoais: a história prévia de câncer de mama associa-se a risco de 50% de desenvolver um
novo câncer. Além disso, outros tumores, principalmente endométrio, ovário ou cólon, e a história de
radioterapia para linfoma de Hodgkin também estão associados com maior risco para câncer de mama.
-Lesões histológicas: a hiperplasia ductal, principalmente a atípica, incrementa o risco para o câncer de mama.
Assim também ocorre com o carcinoma ductal e lobular in situ, considerados lesões precursoras do câncer.
-História familiar: o passado de câncer de mama em parentes de 1º grau (mãe, irmã ou filha) aumenta o risco
em 2,5 vezes.
-História menstrual: menopausa tardia (>55 anos) e menarca precoce (<11 anos)
-História obstétrica: nuliparidade e primiparidade tardia (acima dos 30-35 anos).
-Fatores nutricionais: dietas ricas em gordura, sobretudo na pós-menopausa, e o sedentarismo.
-Hábitos: o etilismo e o tabagismo como fatores de risco são um tema divergente na literatura. Segundo o
Ginecologia ambulatorial baseado em evidências (IMIP), a relação entre o álcool e o CA de mama está
relacionada à ingestão diária.
-Uso de ACHO: a relação com o câncer de mama permanece controversa.
-Terapia Hormonal: outro tema divergente, porém considera-se que o uso de TH por mais que 10 anos
aumenta o risco do câncer de mama.
-Densidade mamária: isoladamente, é o fator mais importante para a avaliação do risco de uma população. A
presença de mais de 75% da mama densa representa um aumento de 5 vezes o risco de desenvolver o câncer.
-Genética: o câncer de mama pode ser classificado como esporádico ou hereditário. Apenas 5-10% dos casos
são atribuídos à herança genética e à alta penetrância de oncogenes. As mutações que tem maior influência no
surgimento do câncer de mama são as mutações do BRCA1 e BRCA2
BRCA1: mutações nesse gene aumentam o risco para 56-80% do câncer de mama e para 15-60% do câncer de
ovário. O teste genético para pesquisar mutações nesse gene deve ser sempre realizado, se possível, quando houver:
(1) um ou mais casos de CA de mama na família em idade inferior a 50 anos ou CA de ovário em qualquer idade; (2)
parente com mutação genética conhecida; (3) caso de parente do sexo masculino com CA de mama; (4) casos
múltiplos de CA, CA de mama + CA de ovário e (5) CA de ovário não mucinoso e/ou CA de tuba uterina.
-Amamentação: até hoje não está clara sua relação com o câncer de mama, como provável efeito protetor.
Fisiopatologia: a primeira célula maligna surge no epitélio ductal suscetível, ativada por fatores genéticos ou
ambientais, tais como radiação ou agentes químicos. Nesse epitélio, ocorrerá uma proliferação anormal,
denominada de hiperplasia típica. Na maior parte dos casos, essa proliferação cessa nesse estágio, sem
maiores perigos. Entretanto, em determinadas situações, os gatilhos de iniciação tumoral alteram o protótipo
celular, ocorrendo, então, hiperplasia atípica. Essa lesão pode evoluir para os reais precursores dos
carcinomas invasores: os carcinomas intraductais ou intralobulares. Esses dois carcinomas, pelos mais
diferentes estímulos (angiogênicos, hormonais, enzimáticos), continuam sua proliferação celular, rompendo a
membrana basal ductal, e penetram no estroma mamário, evoluindo para o carcinoma invasivo. Caso invada o
sistema de circulação da mama, o carcinoma pode embolizar através dos vasos sanguíneos ou linfáticos,
principais vias de disseminação, estabelecendo metástases, principalmente, em ossos, assim como no pulmão,
cérebro e fígado, embora possam disseminar-se para qualquer órgão.
Manifestações: a queixa mais comum das pacientes corresponde à presença de tumor ou nódulo mamário. O
tumor maligno usualmente tem crescimento insidioso e localiza-se preferencialmente no quadrante superior

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externo ou na região central. Comumente é unilateral, firme, de consistência endurecida ou até pétrea e indolor
(a dor só está presente quando o tumor atingiu grandes dimensões). Descarga papilar pode estar associada.
Traumas, exercícios físicos, uso recente de medicações e início súbito não possuem relação com o câncer. A
presença de gestação em curso ou o estado puerperal podem mascarar e dificultar o diagnóstico.
Diagnóstico: o exame físico deve avaliar cuidadosamente as mamas e as cadeias linfáticas axilares e supra e
infraclaviculares. A presença de tumoração endurecida, de forma variável, contornos irregulares, limites
imprecisos, aderido a planos profundos ou pouco móvel é a apresentação clássica, mas nem sempre é
encontrada. Casos avançados podem revelar abaulamentos ou retrações da pele (aspecto de casca de laranja).
A descarga papilar pode estar associada e é geralmente uniductal, espontânea e intermitente; normalmente é do
tipo água de rocha, sanguinolenta ou serossanguinolenta.
Exames complementares: ver mais no capítulo das alterações benignas da mama.
-PAAF: primeiro passo na investigação dos nódulos mamários, pois diferencia entre as lesões císticas das
lesões sólidas. Os tumores sólidos são diagnosticados após a falha em aspirar líquido com a PAAF. De
qualquer forma, o material que for aspirado deve ser encaminhado para citologia, que isoladamente não faz
diagnóstico de câncer nem encerra a investigação de um nódulo suspeito: diante de um nódulo suspeito, a
citologia só possui valor se positiva, pois, se negativa, é obrigatória a realização da biópsia.
-USG: método que diferencia bem nódulos sólidos de císticos. São achados sugestivos de malignidade:
margens irregulares, hipoecogenicidade, textura heterogênea, sombra acústica posterior, entre outros.
-Mamografia: principal método de rastreio do câncer de mama. São achados sugestivos de malignidade:
nódulos espiculados, de limites mal definidos, com distorção do parênquima adjacente, presença de
microcalcificações (<0,5mm) pleomórficas e agrupadas. É o único exame capaz de identificar este último
achado.
-RNM: útil no estudo da mama contralateral, na avaliação de focos secundários do tumor na mama ipsilateral,
no rastreio da recidiva local do tumor e na avaliação de pacientes em uso de implantes mamários. Útil também
na identificação de metástases, com especificidade significativa nos casos de metástases ósseas.
-Cintilografia: empregada para rastreamento e diagnóstico de metástases à distância, sobretudo as ósseas.
-Tomografia computadorizada e radiografia: utilizados no rastreio e diagnóstico de metástases.
Diagnóstico histopatológico: os principais métodos utilizados no diagnóstico histopatológico são: core,
mamotomia e biópsia ciŕurgica (ver em: Mamas – alterações benignas). A biópsia de congelação fornece o
resultado histopatológico na hora, porque é realizada com o patologista na sala do centro cirúrgico, e objetiva
a terapêutica no mesmo ato cirúrgico, logo após a definição histopatológica.
Rastreamento - Ministério da Saúde:
> 40 anos → exame clínico anual das mamas.
50-69 anos → mamografia a cada 2 anos.
Com fatores de risco → exame clínico e mamografia a partir dos 35 anos de idade ou 10 anos antes da idade
de acometimento no caso-índice.
Fatores de risco: história de parente de primeiro grau com câncer de mama abaixo dos 50 anos; história de parente de
1º grau com câncer de mama bilateral ou de ovário em qualquer faixa etária; história de parente homem com câncer
de mama.
Classificação histológica:
-Carcinoma in situ: corresponde à doença local, ou seja, à lesão restrita ao epitélio, na qual não ocorre invasão
do estroma.
-Carcinoma ductal in situ: é considerada lesão precursora do câncer de mama. Na maioria dos casos, tem prognóstico
favorável. Caracteriza-se pelo achado, à microscopia, de células de padrão ductal: célula grande, coesa, com graus
variados de atipia celular. A disposição destas células no interior dos ductos define o subtipo histológico: cribiforme,
micropapilar, papilar, sólido e comedocarcinoma (pior prognóstico).
-Carcinoma lobular in situ: não se apresenta como lesão palpável nem visível macroscopicamente ao exame
histopatológico. Constitui achado microscópico incidental a partir de tecido mamário removido cirurgicamente por
outro motivo. Caracteriza-se por células pequenas, não coesas. Alguns autores consideram este carcinoma como lesão
precursora, outros não o consideram. Porém é consenso que representa um indicador biológico de aumento de risco
para o desenvolvimento de tumor invasor, devido ao seu potencial para bilateralidade.

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-Carcinoma infiltrante: corresponde à doença invasiva, ou seja, quando há infiltração do tecido mamário.
-Carcinoma ductal infiltrante: é o tipo mais comum, correspondendo a 70-80% das lesões invasivas diagnosticadas
após a biópsia. Sua capacidade de reação estromal pode determinar retrações quando há reação fibrótica e
abaulamentos ou massa palpável de consistência pétrea quando a reação é intensa e/ou tuberosa. O prognóstico é
bom, porém torna-se péssimo caso hajam metástases.
-Carcinoma lobular infiltrante: representa 5-10% dos casos. Apresenta maior tendência à bilateralidade e
multicentricidade. Está mais associada ao uso do TH que o tipo ductal. O achado típico é de uma área mal definida,
infiltrada e espessada na mama, com pouca expressão mamográfica.
-Carcinoma mucinoso: mais comum em pacientes idosas. Apresenta bom prognóstico.
-Carcinoma tubular: responde por 2% dos casos. Também apresenta bom prognóstico.
-Carcinoma medular: representa 5% dos casos. Normalmente as células são pouco diferenciadas (alto grau
histológico), embora o prognóstico seja melhor que o do que o carcinoma ductal infiltrante. Ocorre com maior
freqüência em pacientes mais jovens, tendo sido associado a mutações do BRCA1.
-Doença de Paget: desordem do mamilo e da aréola, com células tumorais acometendo a epiderme das papilas
mamárias. Caracteriza-se clinicamente pela aparência eczematóide, com presença de erosão e descamação.
-Carcinoma papilífero: responde por 1-2% dos casos. Incide preferencialmente na pós-menopausa, acometendo a
região central da mama. Frequentemente, manifesta-se com derrame papilar sanguinolentao.
-Carcinoma inflamatório: forma distinta de câncer de mama localmente avançado, caracterizado clinicamente por
eritema, edema, calor e endurecimento da pele, com aspecto característico de casca de laranja.
Estadiamento: o estadiamento segue o padrão internacional TNM. Caso deseje se aprofundar, como é muito
extenso e de difícil memorização, recomenda-se consultar um livro-texto.
Fatores prognósticos de recidiva:
-Invasão de vasos e linfático -Idade <40 anos -Ausência de margens livres -Hereditariedade
-Linfonodos axilares acometidos -Tumor >2cm -Maior grau histológico -Multicentricidade
-Todos os tipos histológicos, exceto: tubular, papilar, medular e mucinoso
Tratamento:
-Cirúrgico: consiste na abordagem do tumor primário e da axila, com ou sem associação da radioterapia.
-Cirurgia conservadora: preserva boa parte da mama. Limita-se à ressecção da área com contém o tumor, com
boa margem de segurança. Indicada para tumores pequenos ou mesmo nos maiores, desde que haja boa
relação entre o volume tumoral e o mamário (até 20% da mama). É obrigatória a realização da radioterapia.
-Tumorectomia: ressecção total do tumor, sem estabelecimento de margem de segurança;
-Segmentectomia: ressecção do setor que engloba o tumor, com margem de segurança de, pelo menos, 1 cm;
-Quadrantectomia: ressecção do setor que engloba o tumor, com ampla margem de segurança, e da pele sobrejacente
-Cirurgia radical: indicada nos casos de tumores malignos infiltrantes que ocupam mais de 20% do volume
mamário, ou ainda nos casos de tumores localmente avançados.
-Mastectomia simples: corresponde à exérese apenas da mama, com extensão variável da pele que a recobre,
incluindo sempre o complexo aréolo-papilar. Indicado nos casos de tumores multicêntricos ou intraductais extensos.
-Mastectomia radical: indicada para tumores infiltrantes nos quais a multicentricidade não permite a cirurgia
conservadora. A mastectomia radical modificada segundo a técnica de Patey é a mais empregada atualmente, na qual
realiza-se a retirada da mama e do músculo peitoral menor, associado ao esvaziamento axilar.
-Esvaziamento axilar: a cadeia linfática axilar é a mais acometida. A abordagem axilar está indicada sempre
que o tumor primário for infiltrante, independente do seu volume e da cirurgia realizada para extirpá-lo.
Portanto, nos casos de carcinoma in situ, sua realização pode ser dispensada. Essa abordagem pode ser
realizada pela técnica do linfonodo sentinela ou pelo esvaziamento axilar clássico.
-Biópsia do linfonodo sentinela: tem o objetivo de avaliar a real necessidade de realizar o esvaziamento axilar
completo. Injeta-se, na mama afetada, um corante; o primeiro linfonodo de drenagem linfática identificado (linfonodo
sentinela) é retirado cirurgicamente e, por biópsia de congelação, define-se se há presença tumoral. Se evidenciada a
invasão tumoral do linfonodo sentinela, o esvaziamento axilar completo estará indicado.
-Radioterapia: tem como principal indicação o controle locorregional da doença. Pode ser empregada no pré-
operatório para reduzir o volume tumoral ou no pós-operatório para diminuir as taxas de recidiva. Está
obrigatoriamente indicada em: cirurgias conservadoras, tumor > 4cm e/ou mais que 3 linfonodos acometidos.
-Quimioterapia: visa auxiliar o tratamento locorregional e controlar e tratar o surgimento de metástases à

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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distância. Parece ser o principal responsável por afetar a evolução natural da doença, com melhora drástica na
sobrevida. Pode ser do tipo:
-Neoadjuvante: pré-operatória. Visa diminuir o tamanho tumoral, possibilitando transformar uma cirurgia
radical mutiladora em uma cirurgia conservadora. Além disso, tem a capacidade de diminuir metástases á
distância. Como desvantagens, pode atrasar o tratamento cirúrgico e aumentar as complicações da cirurgia e
radioterapia.
-Adjuvante: propõe-se complementar o tratamento cirúrgico, diminuindo as taxas de recidiva e de mortalidade.
Está principalmente indicada na presença de fatores de mau prognóstico.
-QT para tratamento de metástases à distância.
-Hormonioterapia: consiste na utilização de substâncias que inibam ou diminuam a atividade dos hormônios
endógenos (estrogênio e progesterona) na mama. Por esta razão, está indicada para os casos de tumores com
receptores hormonais positivos. Pode ser ablativa ou cirúrgica (ooforectomia) ou medicamentosa. Assim como
a QT, pode ser empregada de forma neoadjuvante, adjuvante ou no controle de metástases à distância. Os
medicamentos utilizados são:
-Tamoxifeno: modulador seletivo dos receptores de estrogênio. No entanto, na mama, funciona como um
verdadeiro antagonista. O uso do tamoxifeno adjuvante é recomendado nos casos de receptor estrogênico
positivo, pois reduz a recorrência e recidiva, além de diminuir a ocorrência de novo tumor na mama
contralateral. Como nos outros órgãos desempenha função primária de agonista, pode desencadear, como
efeitos colaterais, aumento do risco em 2,4 vezes do câncer de endométrio, indução da ovulação, aparecimento
de fogachos de difícil controle e aumento do risco de trombose. Deve ser administrado na dose de 20mg/dia
durante 5 anos.
-Inibidores da aromatase:
merece destaque o anastrozol e
letrozol. Sua ação está na
inibição da conversão periférica
de androgênios em estrogênios
pela aromatase, através do
bloqueio da ação das enzimas do
complexo citocromo P450.
Possui menos efeitos colaterais
que o tamoxifeno.

CÂNCER DE MAMA NA GRAVIDEZ


É o câncer de mama que surge durante a gestação ou até um ano de puerpério. A gravidez não parece alterar o
curso da doença, embora esses casos costumem ser graves, por apresentarem, com freqüência, diagnóstico
tardio do tumor. Por outro lado, o manejo é difícil, pois a gravidez traz uma série de dúvidas em relação ao
tratamento, que pode produzir alterações no concepto.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 4
Ginecologia Ambulatorial Baseada em Evidências – IMIP.

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CÂNCER DE ENDOMÉTRIO
O adenocarcinoma de endométrio responde por cerca de 96% das neoplasias malignas do corpo uterino. No
Brasil, corresponde ao 2º câncer mais freqüente do trato genital feminino, com incidência de 6-8/100.000.
Classificação:
-Tipo 1: é o mais freqüente (75-85% dos casos), acomete mulheres na perimenopausa, com história de
exposição estrogênica sem a oposição da progesterona. Origina-se, habitualmente, de um endométrio
hiperplásico que evolui para adenocarcinoma. Apresenta melhor prognóstico, pois possuem maior grau de
diferenciação e são diagnosticados em idade mais precoce. A maioria é do tipo endometrioide.
-Tipo 2: origina-se a partir do epitélio atrófico, não possuindo relação com hiperestrogenismo e hiperplasia
endometrial. Tende a acometer mulheres mais velhas, magras e na pós-menopausa. É menos diferenciado e
menos sensível aos progestógenos. Tem pior prognóstico, relacionado com a tendência à invasão profunda do
miométrio e disseminação metastática.
Fatores de risco: os principais fatores de risco associam-se aos efeitos
proliferativos da exposição prolongada ao estrogênio, principalmente
quando contínua sem oposição progestogênica. O estímulo hormonal
acarreta alterações proliferativas no tecido endometrial, que podem
culminar em hiperplasia e precipitar transformação maligna.
-Idade: a idade média de diagnóstico é entre 50-60 anos. Daí conclui-se
que “o câncer de endométrio é o câncer das avós, e o câncer de colo é o
câncer das mães”.
-Classe socioeconômica: o câncer é mais comum naquelas de maior
nível socioeconômico. Supõe-se que a alimentação rica em gorduras
acarreta maior ganho de peso e maior índice de estrogenicidade.
-Síndrome de Lynch II: o câncer de endométrio é o câncer
extracolônico mais comum em pacientes portadores desta síndrome. É
uma doença autossômica dominante, caracterizada pela ocorrência de
câncer de cólon não polipóide hereditário, por volta dos 35-45 anos.
45% das mulheres das famílias acometidas por essa síndrome
desenvolvem o câncer de endométrio.
-Obesidade: IMC>30 é o fator de risco mais importante na gênese da
doença. O excesso de estrona, oriunda da aromatização periférica,
resume o mecanismo de ação que aumenta o risco do câncer nesta
condição clínica. Esse efeito é mais marcante e importante na pós-
menopausa, onde praticamente inexiste produção ovariana de estrógeno
-Passado de anovulação crônica: qualquer estado anovulatório é
considerado fator de risco, devido a ação estrogênica sem oposição pela progesterona do corpo lúteo.
-Menarca precoce, menopausa tardia (>52 anos) e nuliparidade: estes fatores aumentam o tempo de
exposição aos estrógenos. A nuliparidade aumenta 2 a 3 vezes o risco de desenvolver a doença.
-Terapia Hormonal com estrógenos: aumenta em 4 a 8 vezes o risco do câncer.
-Terapia com tamoxifeno: essa droga é um estrógeno fraco que age como antagonista na mama, porém no
endométrio seu efeito é estrogênico, aumentando o risco do câncer.
-Diabetes melito: as diabéticas apresentam menopausa mais tardia, além de que as diabéticas geralmente são
também obesas, fatos que explicam o aumento do risco do câncer.
-HAS: parece estar ligada à diabetes e à obesidade, e não como fator de risco direto do câncer de endométrio.
Fatores protetores: multiparidade, uso de ACHO combinados e uso de DIU com progesterona são
considerados fatores protetores porque impõem a contraposição com progesterona aos efeitos estrogênicos. O
tabagismo também diminui o risco do CA de endométrio devido ao seu efeito antiestrogênico.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Fisiopatologia: o processo de carcinogênese do câncer de endométrio não é totalmente compreendido, mas
provavelmente envolve mutações no gene supressor tumoral p53. Mais de 90% dos cânceres de corpo uterino
são do endométrio, sendo o restante devido ao sarcoma. Dos endometriais, mais de 90% são adenocarcinomas,
que podem ser endometrióides (65%), mucinosos, de células claras (muito agressivo), serosos (muito
agressivo), adenoacantomas e escamoso ou epidermóide.
-Adenocarcinoma endometrióide: é o tipo histológico mais comum. Sua classificação baseia-se no grau de
diferenciação: grau 1 (muito), 2 (moderadamente – 60% dos casos) e 3 (pouco). Em geral, os tumores não
endometrióides são indiferenciados ou de alto grau (grau 3 – pouco diferenciados).
O crescimento inicial do câncer ocorre na camada glandular e
cresce, progressivamente, para o segmento inferior do útero,
podendo comprometer o colo uterino, e simultaneamente para o
miométrio. Por contiguidade pode infiltrar bexiga e reto. Através
das trompas de falópio pode ocorrer migração de células neoplásicas
para a cavidade peritoneal. A disseminação hematogênica é pouco
freqüente; já o sistema linfático é a via predominante das
metástases, que comumente ocorrem em estádio avançado e na
presença de grande invasão miometrial, podendo acometer vagina e
pulmão, principalmente, além de fígado, ossos e cérebro.
Manifestações: mais de 95% das mulheres são sintomáticas, sendo
o sangramento genital a principal queixa. O sangramento na pré-
menopausa se manifesta como sangramento uterino anormal
(irregular, duração prolongada, fluxo excessivo) e na pós-menopausa como metrorragia, hematométrio
(coleção de sangue no interior do útero) e desconforto pélvico (decorrente do hematométrio e disseminação da
doença). Nas pacientes assintomáticas, o câncer é geralmente suspeitado pela demonstração de espessura
endometrial em USG de rotina alterada ou, mais raramente, pela presença de atipias celulares glandulares de
significado indeterminado (AGUS) à colpocitologia.
Rastreamento: atualmente, não é preconizado o rastreamento do câncer de endométrio, pois não existe um
exame apropriado, econômico e aceitável que reduza a mortalidade. Não há recomendação de rastreio em
obesas, diabéticas, usuárias de TH ou de tamoxifeno.
Investigação: algumas pacientes necessitam ter o câncer de endométrio excluído. São elas:
-Paciente com sangramento genital ou piométrio ou hematométrio na pós-menopausa
Alguns autores recomendam que a investigação do sangramento genital na pós-menopausa seja feito apenas se
este for persistente ou se estiver associado a eco endometrial à USG-TV > 4 a 5mm.
-Paciente assintomática menopausada com células endometriais na colpocitologia
-Paciente na pré-menopausa apresentando SUA, principalmente se passado de anovulação
-Paciente na perimenopausa com sangramento intermenstural ou aumento do fluxo menstrual
-Paciente em uso de tamoxifeno com espessamento endometrial à USG-TV ou sangramento genital.
Diagnóstico: o diagnóstico da neoplasia endometrial é histológico.
-Exame físico: raramente evidencia alguma alteração sugestiva de câncer de endométrio, exceto nos casos
avançados. A obesidade e a hipertensão arterial são fatores usualmente associados. O exame ginecológico
deve buscar sinais de ulceração de colo uterino (indício de invasão cervical) e metástases vaginais; o toque
vaginal bimanual é mandatório para avaliar tamanho e mobilidade uterina. O exame geral visa procurar sinais
de alteração nos locais comuns de metástases, presentes nos estádios mais avançados: abdome → ascite,
massas abdominais; linfonodos periféricos → especialmente os inguinais.
-Exames complementares: como citado, o diagnóstico é histológico. A obtenção da amostra do endométrio
pode ser obtida por biópsia endometrial dirigida por vídeo-histeroscopia (padrão-ouro e atualmente o método
de escolha) e por curetagem uterina fracionada (método de escolha na ausência da vídeo-histeroscopia, pois é
a biópsia é obtida às cegas). Todas as pacientes devem ter o diagnóstico histológico antes do início do
tratamento. Os outros exames complementares que podem/devem ser solicitados são:

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-Pré-operatório de rotina: classificação sanguínea, hemograma, uréia, creatinina, ácido úrico, desidrogenase láctica,
transaminases, sumário de urina e coagulograma.
-Citologia oncótica e colposcopia: um dado a ser valorizado é a presença de células endometriais na citologia
cérvico-vaginal após o 10º dia do ciclo menstrual ou a presença dessas células na pós-menopausa. Entretanto, esses
achados só estão presentes em 30-50% das mulheres com CA de endométrio, não sendo admitido como teste de
rastreio nem de diagnóstico, sendo necessário, caso alterado, estudo adicional (histopatológico).
-USG-TV: na pós-menopausa, é utilizada como método de rastreio de alterações endometriais. A espessura
endometrial máxima admitida na pós-menopausa é de 4 [IMIP] a 5 [MS] mm (sensibilidade de 96-98% e
especificidade de 36 a 68% para CA de endométrio) e de até 8mm se a mulher é usuária de terapia hormonal (TH);
valores acima requerem avaliação adicional com estudo histopatológico. O risco de câncer de endométrio é de 1%
naquelas com eco endometrial <5mm e acima de 95% naquelas com eco superior a 1 cm. Outros achados sugestivos
são coleção de líquido intrauterino e endométrio hiperecogênico ou irregular ou com ecogenicidade mista. Em
mulheres na pré-menopausa, a avaliação USG é menos útil, uma vez que tais mulheres apresentam endométrio mais
espesso, não havendo um limite máximo, tal como na pós-menopausa, da espessura endometrial.
-CA 125: não é sensível nem específico. Seu uso fica reservado para o seguimento pós-operatório e/ou de doença
avançada.
-Radiografia de tórax, USG de abdome superior, TC e RNM: exames úteis para a avaliação da extensão do tumor e da
presença de metástases. Não são úteis como métodos de rastreio e/ou de diferenciação entre doença benigna e
maligna. Retossigmoidoscopia e cistoscopia são utilizados para avaliar extensão à reto e bexiga, respectivamente.
Estadiamento: o estadiamento do câncer de endométrio é cirúrgico, e baseia-se nos critérios da FIGO 2009. A
cirurgia preconizada é a histerectomia total abdominal com salpingoofarectomia bilateral (pan-histerectomia)
+ linfadenectomia pélvica e para-aórtica bilateral + lavado peritoneal. Os anexos (ovários) devem ser sempre
retirados, exceto em pacientes jovens com baixo risco de doença ovariana, com neoplasia de baixo grau e
estádio precoce e sem doença extrauterina, nas quais a manutenção pode ser considerada. A intervenção
cirúrgica só está contraindicada quando os achados apontam para doença avançada, tais como: envolvimento
cervical macroscópico, disseminação parametrial, invasão da bexiga ou reto e metástase a distância. A
histologia da neoplasia e a profundidade da invasão miometrial são os principais fatores determinantes do
risco de metástases linfáticas.
Estádio 0 – carcinoma in situ
Estádio I – Tumor confinado ao corpo uterino
IA: invasão menor que a metade da espessura do miométrio;
IB: invasão igual ou maior que a metade da espessura do miométrio.
Estádio II – Tumor se estende a colo uterino, mas sem extensão além do útero (apenas o envolvimento
glandular endocervical deve ser considerado)
Estádio III – Disseminação local ou regional
IIIA: invasão (extensão direta ou metástase) da serosa e/ou dos anexos e/ou citologia peritoneal positiva;
IIIB: invasão (extensão direta ou metástase) vaginal e/ou parametrial;
IIIC: metástase para linfonodos pélvicos (IIIC1) ou para-aórticos (IIIC2)
Estádio IV – Tumor invade bexiga e/ou mucosa intestinal e/ou há metástases à distância.
IVA: invasão tumoral da bexiga ou retossigmóide;
IVB: metástases à distância, incluindo gânglios intra-abdominais (excluem-se os gânglios inguinais e para-aórticos e
metástases para vagina, peritônio pélvico ou anexos).
Prognóstico: a maioria das mulheres com câncer de endométrio apresenta-se no estágio I e tem um bom
prognóstico, com uma taxa de sobrevida global superior a 90%. Fatores a serem considerados no prognóstico
são: tipo histológico, grau de diferenciação, estadiamento, grau de invasão miometrial e presença de metástase
Tratamento: o tratamento ocorre durante o estadiamento e é cirúrgico. Como citado, a cirurgia preconizada é
a histerectomia total abdominal com salpingoofarectomia bilateral (pan-histerectomia) + linfadenectomia
pélvica e para-aórtica bilateral + lavado peritoneal. Pode ser complementado com terapêuticas adjuvantes
(pós-operatórias), como braquiterapia (radioterapia da cúpula vaginal, realizada em estádios mais iniciais),
radioterapia externa (radioterapia pélvica) ou quimioterapia (nos estádios avançados). A hormonioterapia pode
ser aventada no lugar do tratamento cirúrgico em mulheres com estádio IA que desejam preservar a fertilidade.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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LESÕES PRECURSORAS
A identificação das lesões precursoras do câncer de endométrio é da maior relevância, visto que podem ser
tratadas adequadamente, propiciando assim uma diminuição importante das formas invasoras e, por
conseguinte, redução significativa da morbimortalidade.
-Pólipo endometrial: é uma hiperplasia localizada da mucosa uterina em resposta aos efeitos proliferativos dos
estrogênios. Geralmente são pediculados. Em geral, aqueles que progridem para transformação carcinomatosa
são os com hiperplasia adenomatosa atípica. Devem ser sempre retirados, através de polipectomia vídeo-
histeroscópica, que obrigatoriamente necessita ser precedida pela histeroscopia diagnóstica (ver mais em
capítulo específico: Lesões uterinas estruturais).
-Hiperplasia endometrial: é a lesão precursora de todas as neoplasias endometriais relacionadas ao
hiperestrogenismo

HIPERPLASIA ENDOMETRIAL
Se caracteriza por uma proliferação anormal de glândulas e estroma, com predominância do componente
glandular, o que determina aumento do volume endometrial, com alterações glandulares, arquiteturais e
citológicas. Seu surgimento resulta de um endométrio proliferativo persistente, devido à estimulação
estrogênica prolongada (endógena ou exógena), sem a habitual ação antagonista da progesterona. Sua
importância clínica se deve ao fato de que pode cursar com sangramento uterino anormal (SUA), pode estar
associada a tumores ovarianos produtores de estrógeno, podem derivar de estrogenioterapia isolada e podem
preceder ou mesmo coexistir com o câncer de endométrio.
Classificação: baseia-se na complexidade glandular (simples e complexa) e na atipia citológica:
-Hiperplasia simples (risco oncogênico: 1%) -Hiperplasia simples com atipia (risco oncogênico: 8%)
-Hiperplasia complexa(risco oncogênico: 3%) -Hiperplasia complexa com atipia (risco oncogênico: 29%)
Portanto, o risco de progressão para câncer está associado à presença e à intensidade da atipia citológica.
Manifestações: o principal sintoma da hiperplasia endometrial é o SUA. Nas pacientes assintomáticas, deve
ser suspeitada e investigada em mulheres anovuladoras crônicas, obesas, usuárias de TH ou de medicações
com ação estrogênica sobre o endométrio(tamoxifeno).
Diagnóstico: a USG pélvica transvaginal é um exame não invasivo e de fácil reprodução, que constitui-se de
grande valia na triagem de pacientes que deverão ser submetidas à biópsia de endométrio. A espessura (eco)
endometrial superior a 4-5mm tem uma alta sensibilidade (96%) para câncer de endométrio, porém uma baixa
especificidade (até 61%). A histeroscopia apresenta alta sensibilidade para patologia endometrial,
constituindo-se exame importante para orientar ou dirigir a biópsia, sendo muito superior à curetagem,
procedimento realizado às cegas. O exame histológico a partir da biópsia de endométrio é o padrão-ouro, por
revelar os diversos achados hiperplásicos com e sem atipias.
Tratamento: depende da idade, do desejo de engravidar, do tipo histológico e da presença de atipia citológica.
-Hiperplasia típica: o tratamento é conservador. Visa controlar o sangramento e evitar a progressão para o
câncer. A melhor opção é o emprego de progestógenos:
Acetato de medroxiprogesterona: 10 a 20mg/dia, 14 dias/mês por 6 meses ou contínuo por 3 meses;
Acetato de megestrol: 20 a 40mg/dia contínuos por 3 meses
Após o término do tratamento, deve ser realizada a vídeo-histeroscopia com biópsia do endométrio para
confirmar a regressão da hiperplasia.
-Hiperplasia atípica: o tratamento consiste, em qualquer idade, em histerectomia total com ou sem
ooforectomia (sempre com salpingectomia). Essa conduta é preferível, pois essa hiperplasia tende a persistir
com o tratamento clínico e apresenta alto potencial de malignização. Em pacientes jovens sem prole
constituída e naquelas sem condições cirúrgicas, pode-se optar pelo tratamento contínuo com progestógeno em
altas doses (acetato de medroxiprogesterona 100-200mg IM, seguidos de 100mg a cada 2 semanas por 30 dias
e 100mg/mês por 6 meses OU Mirena®). O grande problema é que é alta a taxa de recidiva após o tratamento,
quando então, novamente, está indicada formalmente a histerectomia.

Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 5. Ginecologia ambulatorial baseada em evidências – IMIP.

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TUMOR NEOPLÁSICO DE OVÁRIO


Os tumores ovarianos podem ser benignos, limítrofes (borderline) e malignos. Aproximadamente dois terços
dos tumores ovarianos são encontrados no menacme e a grande maioria é benigno (80 a 85%). Comumente, se
manifestam por presença de massa pélvica/anexial ao exame físico; caso esta seja sólida, irregular e fixa torna-
se altamente sugestiva de malignidade. No menacme, as massas ovarianas são provavelmente benignas, já na
pós-menopausa são mais preocupantes, pois a probabilidade de malignidade aumenta consideravelmente.
-Borderline: são tumores limítrofes ou de baixo potencial de malignidade, cujo comportamento biológico e aspecto
histopatológico os coloca entre os tumores benignos e malignos. Tendem a permanecer limitados aos ovários por
longos períodos e correlacionam-se, na maioria, com prognóstico muito bom.

O câncer de ovário desfia a ginecologia e a oncologia, pois o diagnóstico precoce é difícil e a taxa de cura está
inalterada nos últimos anos, mesmo com o avanço da cirurgia e da quimioterapia. No Brasil, corresponde a 2%
de todos os cânceres, se constituindo como o oitavo câncer mais comum feminino. Apesar de representar
apenas 25% das malignidades do trato genital, é responsável pela maior taxa de mortalidade, uma vez que seu
diagnóstico é feito tardiamente, com 75% dos casos, ao diagnóstico, em estágio avançado.
Fatores de risco: apesar da identificação de fatores de risco, tema controverso na etiologia destes tumores,
ainda não foi definida uma população de risco para o seu desenvolvimento.
-História familiar de câncer ovariano: fator de risco mais importante para o desenvolvimento. A síndrome de câncer
de mama-ovário hereditária (BRCA 1 e 2) é a relação hereditária mais comum, respondendo por 85-95% de todos os
casos de câncer hereditário. A síndrome de Lynch II (câncer ovário-endométrio-cólon) também está associado.
-Idade avançada (ápice entre 60-65 anos) -Oligoparidade, Nuliparidade ou infertilidade
-Raça branca -Hiperestimulação ovariana (indutores da ovulação)
-Obesidade -Tabagismo -Endometriose
Fatores de proteção: estudos disponíveis na literatura sugerem que a malignidade ovariana surgiria através de
um processo de reparação anômalo na superfície ovariana durante a ruptura e reparo em cada ciclo ovulatório.
Portanto, fatores que promovem a inibição da função ovariana, atuariam como fatores protetores.
-Amamentação: inibição ovariana pela lactação -Ooforectomia profilática
-Laqueadura tubária -Paridade: ter no mínimo um filho reduz o risco para 0,3-
0,4
-Anticoncepcionais orais: único modo de quimioprevenção documentada
Manifestações: na maioria dos casos de câncer o curso é assintomático. Quando surgem sintomas, geralmente
são vagos e inespecíficos (irregularidade menstrual, constipação, dispareunia, dores pélvicas), e traduzem

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


79
doença avançada. O sinal mais importante é a presença de massa pélvica ao exame físico.
TUMOR NEOPLÁSICO EPITELIAL
É o tipo mais comum e o seu risco aumenta com a idade. Os tumores epiteliais podem ser do tipo adenoma
(benigno), borderline (baixo potencial de malignidade) e adenocarcinoma (maligno).
Patologia: o câncer epitelial de ovário parece iniciar-se a partir do epitélio superficial do ovário (celômico).
Apresenta uma ampla variedade de aspectos morfológicos, pois pode expressar propriedades relacionadas com
o epitélio da tuba uterina (tumor seroso), endocérvice ou epitélio colônico (tumor mucinoso), endométrio
(tumor endometrióide) ou do trato urogenital
(tumor de células claras). Esses subtipos
histopatológicos apresentam prognósticos
diferentes, apesar de, aparentemente, derivarem
da mesma estrutura epitelial.
-Cistadenoma: é um tumor epitelial seroso
benigno, que se constitui no tumor ovariano
mais freqüente.

TUMOR NEOPLÁSICO NÃO EPITELIAL


Cânceres de ovário não epiteliais representam
apenas 10% dos cânceres de ovário. Inclui tumores de células germinativas, tumores do cordão e estroma
sexual, carcinomas metastáticos e uma variedade de raros tumores.
-Tumor de células germinativas: constitui cerca de 20% de todas as neoplasias ovarianas, mas apenas 5% dos
tumores malignos do ovário. Nas primeiras duas décadas de vida, cerca de 70% dos tumores ovarianos são de
origem germinativa. É derivado de células germinativas primitivas da gônada embrionária e compreende:
disgerminoma (tipo histológico mais comum, de bom prognóstico), teratomas imaturos, tumor do seio
endodérmico, carcinoma embrionário (raro, muito agressivo, incide em pacientes em torno de 14 anos e
secreta estrógenos, o que leva ao quadro de pseudopuberdade
precoce), coriocarcinoma (raro, extremamente agressivo) e formas
mistas. Caracterizam-se por serem agressivos, com crescimento
rápido, porém com altos níveis de resposta à quimioterapia. Seus
marcadores séricos são a alfafetoproteína (AFP), a gonadotrofina
coriônica humana (hCG) e a desidrogenase láctica (DHL).
-Teratoma cístico benigno (cisto desmóide): é o tumor germinativo mais
comum, de caráter benigno. 80% surgem na idade fértil e a transformação
maligna ocorre em apenas 2% dos casos. Apresenta células dos três
folhetos embrionários, podendo ser encontrado folículos pilosos,
cartilagem, osso, dentes e áreas de calcificação.
-Tumores de células dos cordões sexuais: representam 5% de todos os tumores ovarianos. Derivam do
estroma ou mesênquima do cordão sexual indiferenciado, podendo conter nele células femininas (granulosa e
teca) assim como células masculinas (Sertoli e Leydig). Podem ser benignos, apresentarem baixo grau de
malignidade ou serem malignos. Podem ainda ser produtores de hormônios. Classificação:
-Tumores de células estromais-granulosa:
-Tumor das células da granulosa: tumores malignos, com capacidade de secretar grandes quantidades de estrogênio:
meninas→ puberdade precoce, mulheres→ hiperplasia endometrial, doença cística mamária e câncer de endométrio.
-Tumor de grupo tecoma-fibroma: são os tumores de cordão sexual mais comum. Raramente são malignos.
-Androblastomas (tumores das células de Sertoli-Leyding): tumores malignos extremamente raros. Possuem
como principal característica a produção de androgênios, o que causa virilização em mais de 70% dos casos.
-Bem diferenciado: tumor das células de Sertoli, Tumor de Sertoli-Leydig, Tumor de células de Leydig
-Moderadamente diferenciado -Mal diferenciado
-Ginandroblastoma: tumor benigno raro associado com a produção de androgênios e estrogênios.
-Não classificados
-Tumores metastáticos: aproximadamente 5% dos tumores ovarianos são metastáticos de outros órgãos, mais

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


80
frequentemente do trato genital feminino, da mama e do trato gastintestinal.
CONDUTA DIAGNÓSTICA
Frente a uma massa anexial, o exame pélvico completo, incluindo o toque vaginal e toque retal, com coleta de
exame colpocitológico deve ser sempre realizado. A avaliação por USG é mandatória.
-Tumores com características funcionais ou benignas: causam dores leves e admitem conduta conservadora.
-Tumores com características neoplásicas malignas: massa palpável sólida, de qualquer tamanho, bilateral,
fixae de consistência heterogênea ao exame físico é sugestiva de malignidade, em qualquer idade, e requer
laparotomia exploradora, com coleta de líquido ascítico para citologia ou, na sua ausência, deve ser realizado
o lavado peritoneal. A videolaparoscopia ainda não é totalmente aceita nos casos de malignidade, mas nos
casos benignos é a abordagem ideal. Punção aspirativa guiada por USG ou TC não deve ser realizada nos
casos suspeitos de malignidade, pelo risco de rompimento da cápsula e disseminação das células tumorais.
Exames complementares:
-Laboratoriais: dosagem de beta-hCG (para exclusão de gravidez), citologia, hemograma, VHS, pesquisa de
sangue oculto nas fezes e marcadores tumorais (menacme → CA 125, alfafetoproteína, beta-hCG, DHL e
CEA; climatéricas → CA 125, CEA)
CA 125: marcador tumoral mais empregado no estudo dos carcinomas epiteliais. Encontra-se elevado em 60% dos
casos. É inespecífico, podendo estar aumentado em: endometriose, doença inflamatória pélvica, gravidez e
carcinomas de endométrio, endocérvice, trompas, mamas, cólon, vias biliares, pulmão, estômago, entre outros.
Apresenta baixa sensibilidade e especificidade, com sua grande indicação o seguimento pós-tratamento.
CEA (antígeno carcinoembriogênico): pode estar aumentado, sobretudo nos tumores mucinosos e embrionários.
Beta-hCG e alfafetoproteína: bastante úteis no estadiamento e seguimento de pacientes portadoras de tumores de
células germinativas.
-USG pélvica: é o estudo mais indicado, visto que o exame clínico não é capaz de diferenciar se a massa
anexial é benigna ou maligna. Informa a origem da massa (anexial, uterina ou intestinal) e fornece elementos
sobre o seu tamanho, consistência e ecogenicidade. Critérios de malignidade: tamanho do cisto maior que
10cm, parede grossa e irregular, vegetações intracísticas, papilares ou nodulares, tumor heterogêneo, presença
de líquido ascítico e linfonodomegalias.
-Doppler: complementa casos sugestivos de malignidade pela USG. Sugere malignidade se baixa resistência
vascular (índice de resistência <0,4) e presença de neovascularização, principalmente se fluxo central.
-Outros exames: A TC, RNM, USG abdominal e radiografia de abdome não são métodos primários para o
diagnóstico. Podem ser utilizados em situações específicas, podendo revelar informações (calcificação,
presença de ascite, avaliação de linfonodomegalias) necessárias ao planejamento do tratamento.
-Estudo histopatológico: apesar de termos em mãos todos os exames citados anteriormente, é o estudo
histopatológico que dará o diagnóstico definitivo final da origem da massa anexial: benigna ou maligna. A
biópsia de congelação com histopatológico é realizada no intra-operatório para confirmação diagnóstica.
ESTADIAMENTO
Estágio I: Tumor limitado aos ovários
-IA: Tumor limitado a um ovário -IB: Tumor limitado aos dois ovários
-IC: Tumor limitado a um ou ambos os ovários, apresentando qualquer das seguintes características: cápsula rota,
tumor na superfície ovariana, células malignas em líquido ascítico no ou lavado peritoneal.
Estágio 2: Tumor em um ou ambos os ovários, com extensão pélvica
-IIA: Extensão para útero e/ou trompas -IIB: Extensão para outros tecidos pélvicos
-IIC: Extensão para útero e/ou trompas e/ou para outros tecidos pélvicos (IIA e IIB), porém apresentando células
malignas no líquido ascítico ou em lavado peritoneal.
Estágio 3: Tumor em um ou ambos os ovários, com metástase peritoneal fora da pelve, confirmada
microscopicamente, e/ou metástase em linfonodo regional
-IIIA: Metástase peritoneal microscópica além da pelve
-IIIB: Metástase peritoneal macroscópica além da pelve, com 2cm ou menos em sua maior dimensão
-IIIC: Metástase peritoneal macroscópica além da pelve, com 2cm ou mais em sua maior dimensão e/ou metástase em
linfonodo regional
Estágio 4: Metástase à distância (exclui metástase peritoneal).

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GRAU HISTOLÓGICO
Assim como o câncer de endométrio, o câncer de ovário é classificado, histologicamente, em graus: 1 → bem
diferenciado; 2 → moderadamente diferenciado e 3 → Pouco diferenciado.

DISSEMINAÇÃO
A propagação do câncer de ovário pode ocorrer por 4 tipos de disseminação:
-Transcelômica: é o modo mais comum, no qual a disseminação se dá por esfoliação das células do ovário,
havendo propagação das células malignas através do fluxo do líquido peritoneal.
-Continuidade ou extensão direta: o comprometimento capsular do tumor facilita a disseminação direta pela
vizinhança, ou seja, pelas trompas, útero, ovário contralateral e peritônio pélvico.
-Linfática: é comum, porém ocorre mais tardiamente.
-Hematogênica: é rara, e geralmente ocorre no final da doença, em estágios avançados.
Vale salientar que o sítio mais habitual de metástase à distância é o fígado, seguido do pulmão e cérebro.

RASTREAMENTO
A utilidade dos marcadores tumorais e da USG pélvica no rastreamento do câncer ovariano ainda não foi
estabelecida. Considerando os resultados falso-positivos para CA 125 e USG-TV, particularmente em
mulheres na pré-menopausa, não se estabeleceu nenhum rastreio direcionado a este tipo de câncer atualmente.
O Instituto Nacional do Câncer Americano estabeleceu, entretanto, um rastreio para aquelas pacientes de risco
(Síndrome de Lynch II) a partir dos 40 anos de idade, com exame pélvico, toque retal e dosagem de CA 125
semestralmente, associado a USG-TV com doppler anualmente; nas pacientes sem risco, recomenda-se que
após a menopausa realizem, anualmente, o exame pélvico e a USG-TV.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
É indicado em praticamente todos os casos de neoplasia maligna. O diagnóstico do câncer de ovário requer
uma laparotomia exploradora, mesmo que aparentemente este esteja restrito aos anexos, visando o
estadiamento da doença, necessário para o planejamento posterior.
A laparotomia mediana é a via de acesso indicada para as massas anexiais suspeitas. Segue-se com a coleta de líquido
ascítico e, na sua ausência, realiza-se lavado peritoneal. Deve ser avaliada toda a cavidade abdominal, seus órgãos,
espaços (lojas, cúpulas, fundo-de-saco) e linfonodos, com realização de biópsias peritoneais. Procede-se então a
ressecção dos implantes macroscópicos para o diagnóstico histopatológico por congelação.
Se confirmado o diagnóstico de malignidade, deve-se prosseguir com a cirurgia fundamental para câncer de
ovário: histerectomia tipo I + anexectomia bilateral (salpingoofarectomia) + omentectomia infracólica.
Quando o tumor não está restrito aos ovários, deve-se proceder a cirurgia de citorredução, com o objetivo de
deixar a menor quantidade de tumor residual, facilitando a ação da terapia adjuvante.
-Cirurgia Second-look: realizada em pacientes em que não há evidências de neoplasia (clínica, laboratorial ou
imagem) após tratamento cirúrgico e quimioterapia, para determinar a resposta ao tratamento.
-Cirurgia conservadora: a anexectomia unilateral pode ser realizada nas pacientes jovens que desejam engravidar,
contato que apresentam estádio IA grau 1 ou tumor borderline. Realiza-se reoperação posterior após atingida a prole.
-Quimioterapia (QT): preconizada em todos os casos de Grau 3, câncer de células claras, e do estádio IC em diante.
-Video-laparoscopia: não é uma abordagem cirúrgica indicada, estando reservada para casos específicos.
Conduta cirúrgica:
-Estádios IA e IB graus 1 e 2: Tratamento cirúrgico (cirurgia fundamental).
-Tumor borderline ou estádio IA grau 1 que desejem engravidar: cirurgia conservadora (anexectomia unilateral)
-Estádios IA e IB grau 3 e Estádio IC: Tratamento cirúrgico (cirurgia fundamental) + Terapia adjuvante (QT)
-Estádios II e III: Tratamento cirúrgico (cirurgia fundamental + citorredução) + Terapia adjuvante (QT)
-Estádio IV: Tratamento cirúrgico (cirurgia fundamental + citorredução) OU Poliquimioterapia exclusiva.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Ginecologia volume 4
Ginecologia Ambulatorial Baseada em Evidências – IMIP.

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CÂNCER DO COLO DO ÚTERO


O colo uterino é constituído por dois tipos de epitélio:
-Epitélio colunar (cilíndrico) simples: característico da endocérvice, responsável pela secreção do muco;
-Epitélio escamoso estratificado não queratinizado: característico da ectocérvice, responsável por maior
proteção, revestindo também o fundo de saco e a vagina em toda a sua extensão.
O ponto de encontro entre esses dois epitélios denomina-se junção escamocolunar (JEC). A JEC é um ponto
dinâmico, que modifica a sua localização em resposta à faixa etária, gravidez, paridade, menopausa,
traumatismos, infecções e estimulação hormonal.
A metaplasia escamosa é um processo fisiológico de transformação do epitélio colunar em escamoso, o que
origina uma “nova JEC”. A região compreendida entre a JEC original e a JEC ativa denomina-se zona de
transformação, correspondendo, então, a uma região de metaplasia escamosa. Como essa metaplasia é um
processo fisiológico e comum na menacme, seu encontro não indica nenhum tipo de tratamento ou cuidado
especial.

INTRODUÇÃO
O câncer do colo do útero é o segundo tumor mais comum entre as mulheres, excluindo-se os tumores não-
melanoma. Constitui-se um problema de saúde pública no Brasil, visto que uma porcentagem importante de
mulheres entre 35 e 49 anos nunca realizaram o exame citopatológico do colo do útero (Papanicolau). Dentre
todos os tipos de câncer, o câncer do colo uterino é o que apresenta um dos mais altos potenciais de prevenção
e cura, que chega perto de 100%, quando diagnosticado precocemente. É uma doença evitável e de evolução
lenta, com longo período desde o desenvolvimento de lesões precursoras ao aparecimento do câncer.
Fatores de Risco: se relacionam aos processos que levam à formação de atipias celulares, funcionando como
agressores da região. A zona de transformação é a região mais suscetível à ação destes agentes.
-HPV: é o principal fator de risco na transformação de atipias na zona de transformação, responsável por 99%
dos casos de câncer de colo uterino. Age acelerando as mitoses celulares, o que aumenta as chances de ocorrer
atipia. Sua infecção é endêmica entre os indivíduos sexualmente ativos. Os principais subtipos associados ao
câncer são o 16 e 18.
-Início precoce da atividade sexual: importante fator de risco, quando a coitarca ocorre antes dos 16 anos.
-Número de parceiros sexuais: fator mais importante que o anterior, pois um maior número de parceiros
sexuais aumenta as chances de um parceiro ser portador de vírus de alto risco.
-Parceiro sexual: há risco 4-5 vezes maior de câncer de colo em mulheres que tiveram parceiro com câncer de
pênis. Além disso, parceiro com início precoce de atividade sexual e DST também aumentam as chances.
Mulher monogâmica, com ausência de fatores de risco, pode ainda estar sob risco de desenvolver câncer de colo,
devido ao comportamento sexual prévio ou atual do seu parceiro.
-Outras DST: a presença de outras DST (gonorréia, sífilis, herpes), aumenta as chances de câncer de colo.
-Uso de anticoncepcional hormonal oral (ACHO): não se sabe bem a etiopatogenia, mas acredita-se que a
relação com o câncer de colo uterino não se deve apenas aos efeitos da pílula, mas possivelmente também ao
comportamento sexual do grupo de mulheres usuárias.
-Tabagismo: importante fator na gênese do câncer de colo. Está diretamente relacionado com a carga tabágica
(tempo de consumo e n° de cigarros/dia). O mecanismo envolve o efeito carcinogênico direto da nicotina.
-Deficiência vitamínica: a vitamina A é importante fator na manutenção da integridade do epitélio escamoso.
A carência desta vitamina está associada a maior incidência de câncer de colo uterino.
-Imunidade: pacientes HIV positivas, lúpicas, diabéticas, transplantadas em uso de corticoterapia ou
quimioterapia e/ou radioterapia apresentam comprometimento da imunidade e estão sob maior risco de
desenvolver o câncer. Cabe salientar que a presença de carcinoma invasor de colo uterino em paciente HIV
positiva é neoplasia definidora de AIDS.
-Baixo nível socioeconômico: todos os fatores de risco são mais prevalentes em mulheres de nível socio-

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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econômico mais baixo, além das menores oportunidades de acesso à meios preventivos, diagnósticos e
terapêuticos.
-Outros: multiparidade, desnutrição, má higiene genital, agentes químicos e exposição à radiação ionizante.
História natural: o câncer de colo uterino é uma doença de crescimento lento e silencioso, descrito como
uma afecção iniciada com transformações intraepiteliais progressivas que podem evoluir para uma lesão
cancerosa invasora em um prazo de 10 a 15 anos. Pode ser propagar diretamente por continuidade (vagina e
corpo uterino), por contigüidade (paramétrios, paracolpos, bexiga e reto), para linfáticos (seguindo um padrão
ordenado e razoavelmente previsível) e por via hematogênica (pouco comum e tardia).
Manifestações: o carcinoma do colo do útero pode apresentar quadro clínico variável, desde a ausência de
sintomas (fase pré-invasora ou em estádios iniciais) até quadros de sangramento vaginal anormal, seja por
aumento do fluxo menstrual, sangramento vaginal intermitente, intermenstrual em mulheres na menacme,
sangramento na pós-menopausa ou sangramento pós-coito (sinusorragia). Quando diagnosticado em estádios
avançados, dependendo da localização do comprometimento locorregional, a paciente pode apresentar
corrimento vaginal serosanguinolento, anemia, emagrecimento, dor pélvica ou lombar de grande intensidade
com irradiação para membros inferiores, edema de membros inferiores e insuficiência renal pós-renal (uremia)
Exame físico: deve-se procurar sinais de suspeição do câncer de colo uterino.
-Inspeção: observar a presença de lesões ou tumores (pólipos, condilomas, papilomas), a aparência, cor,
fluidez e viscosidade das secreções cérvico-vaginais.
-Toque vaginal: procurar espessamentos ou irregularidades nas paredes vaginais. Investigar extensão do tumor
para os fórnices vaginais. Aplicar o exame bimanual para avaliar o útero e anexos.
-Toque retal: é o exame clínico mais importante na avaliação da infiltração dos paramétrios.
Diagnóstico: O diagnóstico é predominantemente clínico, iniciando-se com avaliação dos dados obtidos por
meio da anamnese e exame físico. As lesões microinvasoras são geralmente assintomáticas. O exame clínico e
a biópsia dirigida, quando mostra carcinoma francamente invasor, levam ao diagnóstico sem a necessidade de
conização. No entanto, quando o diagnóstico por biópsia é de lesão pré-neoplásica de alto grau ou de lesão
microinvasora, há necessidade de conização para confirmação.

CONDUTA DIAGNÓSTICA
O tripé do diagnóstico do câncer de colo de útero e de suas alterações precursoras consiste em: citologia +
colposcopia + histopatologia. A histopatologia, entretanto, é o padrão-ouro.
Rastreamento: o exame preconizado para rastreamento do câncer de colo de útero é a citologia oncótica,
conhecida popularmente como preventivo. O Ministério da Saúde preconiza que seja realizado em mulheres
de 25 a 60 anos de idade (algumas fontes preconizam iniciá-lo 3 anos após a primeira relação sexual), uma vez
por ano e, após dois exames anuais consecutivos normais, a cada três anos. É realizada através da coleta de
material concomitante pela espátula de Ayres e pela escova endocervical, que colherão material da ectocérvice
e da endocérvice, respectivamente. A época mais propícia para a coleta é o período periovulatório, pois o
sangue menstrual dificulta a leitura da lâmina.
-Orientações à paciente: não utilizar duchas vaginais e fazer abstinência sexual aproximadamente 48 horas
antes do exame, não utilizar cremes vaginais nos 7 dias que precedem o exame e não utilizar nenhuma espécie
de lubrificante no espéculo.
-Situações especiais:
Grávidas→ a coleta endocervical não é contraindicada, devendo-se aproveitar a oportunidade para a realização do
rastreamento, preferencialmente até o 7 ° mês de gestação;
Puérperas→ aguardar 6-8 semanas pós-parto para realizar, para que o colo uterino readquira suas condições normais;
Virgens→ não se deve realizar a citologia de rotina;
DST→ mulheres com DST devem ser submetidas à citologia mais frequentemente (anualmente), exceto em casos de
condiloma em genitália externa.
Atrofia genital → recomenda-se o uso de estrogênios tópicos previamente à coleta.
pós-Histerectomia → se total: coleta de esfregaço do fundo de saco vaginal; se subtotal: rotina normal.
-Outros achados: podem ainda ser achados da citologia a candidíase, trichomonas e herpes simples.

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Classificação: ao longo dos anos surgiram várias classificações citológicas. A mais atual é a de Bethesda, uma
classificação americana que surgiu em 1988 e foi readaptada em 1991 e 2001.
-Classificação de Papanicolau: Classe: I – células normais; II- células atípicas sem malignidade; III- células
com atipias sugestivas de malignidade; IV- células muito sugestivas de malignidade; V – células malignas.
-Classificação da OMS (1968): displasia leve, moderada e grave e carcinoma in situ.
-Classificação de Richardt (1967): considerou a
displasias como neoplasia intraepiteial cervical (NIC).
NIC 1 – células atípicas em até 1/3 do epitélio; NIC 2 –
células atípicas entre 1/3 e 2/3 do epitélio; NIC 3 –
células atípicas em mais de 2/3 do epitélio. Quando a
atipia atinge todo o epitélio, mas não ultrapassa a
membrana basal, denomina-se carcinoma in situ.
Portanto, NIC 3 engloba displasia severa e carcinoma
in situ.
-Classificação de Bethesda:
-Células típicas: exame negativo para malignidade;
-Células atípicas:
-Epitélio estratificado (escamoso): lesão intraepitelial escamosa (LIE) de baixo grau de malignidade e LIE de alto
grau de malignidade. A LIE de baixo grau (LSIL) corresponde à NIC 1, e inclui as alterações celulares associadas ao
HPV (coilocitose, discariose e disceratose). A LIE de alto grau (HSIL) corresponde à NIC 2 e 3, com história natural
mais agressiva.
-Epitélio cilíndrico (glandular): células endocervicais/glandulares atípicas e células endometriais.
-Células de significado indeterminado:
-Epitélio estratificado (escamoso): ASCUS (atipia em células escamosas de significado indeterminado possivelmente
não neoplásica) e ASC-H (atipia em células escamosas em que não é possível afastar lesão de alto grau)
-Epitélio cilíndrico (glandular): AGUS (atipia em células glandulares de significado indeterminado)
-Presença de câncer
-Epitélio estratificado: carcinoma escamoso
-Epitélio glandular: adenocarcinoma endocervical in situ
Conduta (Ministério da Saúde):
-LIE de baixo grau (NIC 1): repetição do exame citopatológico em 6
meses na Unidade de Atenção Básica (UAB), já que na maioria das
pacientes (60 a 85%) há regressão espontânea. Se duas citologias
negativas, a paciente retorna ao rastreamento de rotina. Se positiva,
com qualquer atipia, deve-se encaminhar a paciente à unidade de
referência para realização de colposcopia imediata.
-LIE de alto grau (NIC 2 e 3): exige tratamento. Se o diagnóstico for a
nível de atenção básica, a paciente deve ser encaminhada para serviço
de referência, para realização de colposcopia como conduta inicial.
Cabe salientar que 70-75% das pacientes com diagnóstico citológico de
LIE de alto grau apresentam confirmação diagnóstica histopatológica e
1 a 2% terão diagnóstico histopatológico de carcinoma invasor.
-ASCUS: 70 a 90% das pacientes tem desaparecimento dessas
alterações. Portanto, a conduta é a repetição com 6 meses da citologia
na UAB. Se duas citologias semestrais negativas, a paciente retorna ao
rastreamento de rotina. Se resultado igual ou mais grave, encaminhar a
paciente à unidade de referência para a realização de colposcopia.
Apresentando lesão, deve-se proceder a biópsia.
-ASC-H: o risco de LIE de alto grau (NIC 2 e 3) é alto (24 a 94%).
Portanto, a conduta deve ser encaminhar a paciente da UAB para o
serviço de referência para realização de colposcopia imediata.

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-AGUS: 9 a 54% dos casos apresentam LIE de alto grau, 0-8% adenocarcinoma in situ e 1-9%
adenocarcinoma invasor no exame histopatológico. Portanto, a conduta deve ser encaminhar a paciente da
UAB para o serviço de referência para realização de colposcopia imediata.
INDICAÇÕES DE COLPOSCOPIA
LIE-AG, ASC-H, duas citologias com ASCUS, AGUS (pesquisar também canal endocervical) e pacientes
imunossuprimidas com LIE de baixo grau.
Colposcopia: Consiste na visualização do colo uterino através do colposcópio, após a aplicação do ácido
acético e do lugol. A colposcopia é considerada satisfatória quando a JEC é visualizada.
-Ácido acético: coagula proteínas citoplasmáticas do epitélio alterado. Portanto, quanto mais proteínas, mais
esbranquiçada fica a lesão, determinando o epitélio acetobranco, que pode ser tênue ou denso.
-Teste de Schiller: consiste na embrocação do colo uterino com lugol (solução de iodo). Procura identificar áreas de
epitélio escamoso desprovidas de lugol, logo, que não serão coradas. Se iodo positivo, logo Schiller negativo. As
células normais do colo são ricas em glicogênio. Câncer de Colo Uterino
Os achados colposcópicos normais são o epitélio escamoso original, o epitélio Rastreio: Citologia
colunar e a zona de transformação. Epitélio acetobranco, mosaico, pontilhado e Confirmação:
vasos atípicos constituem os achados colposcópicos anormais, sendo os vasos Histopatológico (biópsia)
atípicos o achado de maior suspeição de câncer. O método permite identificar a
área acometida, avaliar a extensão, orienta o local da biópsia e contribui para planejar o tratamento adequado.
Histopatológico: é o método padrão-ouro no diagnóstico das afecções cervicais, definindo a conduta
terapêutica. O material pode ser obtido por biópsia incisional dirigida, biópsia em cone, curetagem
endocervical ou biópsia excisional.

CLASSIFICAÇÃO DO CÂNCER
O Carcinoma epidermóide é o tipo histológico mais freqüente dos
tumores epiteliais do colo uterino, respondendo por mais de 80% dos
casos. 7-10% correspondem ao adenocarcinoma. Os outros tipos de
câncer estão apresentados na tabela ao lado.

ESTADIAMENTO DO CÂNCER
O estadiamento do câncer de colo uterino é clínico e envolve: exame
ginecológico (especular, toque vaginal e toque retal), colposcopia,
exame histopatológico e métodos de imagem.
Estádio O: carcinoma in situ, carcinoma intraepitelial
Estádio 1: carcinoma restrito ao colo uterino
-Ia: invasão do estroma até profundidade de 5 mm e extensão de 7mm
-Ia1: invasão até 3mm de profundidade e 7 mm de extensão;
-Ia2: invasão de 3-5mm de profundidade e 7 mm de extensão
-Ib: invasão > 5mm de profundidade e/ou >7mm de extensão ou
aqueles do estádio Ia que podem ser visualizados macroscopicamente.
-Ib1: o câncer pode ser visto, mas não ultrapassa 4cm;
-Ib2: o câncer pode ser visto e ultrapassa 4 cm.
Estádio 2: carcinoma estende-se além do colo, mas não há extensão à
parede pélvica nem ao terço inferior da vagina.
-IIa: ausência de comprometimento parametrial
-IIa1: câncer <4cm; -IIa2: câncer > 4cm
-IIb: acometimento parametrial
Estádio 3: carcinoma estende-se até a parede pélvica (ao toque retal não há espaço livre de câncer entre o
tumor e a parede pélvica) ou acomete o terço inferior da vagina.
-IIIa: extensão ao terço inferior da vagina, mas não à parede pélvica
-IIIb: extensão à parede pélvica ou hidronefrose ou rim não funcionante.

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Estádio 4: disseminação do carcinoma
-IVa: disseminação do tumor para órgãos adjacentes (bexiga e reto)
-IVb: disseminação para órgãos distantes.

TRATAMENTO
Lesões intraepiteliais cervicais: é o tripé citologia-colposcopia-histologia que vai definir a localização das
lesões, seu grau histológico, sua extensão em profundidade e sua ocupação glandular e, em conseqüência,
definir o tratamento.
-Métodos físico-destrutivos: não permitem a análise histopatológica. São eles: crioterapia/criocauterização,
vaporização com laser, eletrocoagulação.
-Exéreses: permitem a retirada da lesão com a possibilidade de estudo histopatológico.
-Cirurgias de alta freqüência (CAF): utiliza-se um aparelho emissor de uma onda de freqüência de 2-4 MHZ. É
contraindicada, sendo indicada a conização clássica, se: citologia e/ou colposcopia sugerindo microinvasão, suspeita
de lesão glandular, JEC não visível e gravidez.
-Conização a frio: consiste na retirada de um tronco em forma de cone do colo uterino. É procedimento diagnóstico
que passa a ser terapêutico nos casos de carcinoma in situ.
Câncer de colo uterino: o tratamento assemelha-se ao de qualquer outro tipo de malignidade. As modalidades
terapêuticas incluem tratamento primário com cirurgia, radioterapia, quimioterapia ou quimiorradioterapia.
-CA in situ: conização (nesse caso, diagnóstico e terapêutico);
-Estádio I
-Ia1: sem invasão linfática → conização ou histerectomia tipo I; com invasão linfática → traquelectomia com
linfadenectomia pélvica;
-Ia2: traquelectomia radical tipo II + linfadenectomia pélvica; histerectomia com linfadenectomia pélvica;
-Ib1: traquelectomia radical + linfadenectomia pélvica ou histerectomia tipo III + linfadenectomia pélvica
-Ib2: histerectomia tipo III + linfadenectomia pélvica e aórtica lateral OU quimioterapia primária
Estádio II
-IIa: histerectomia tipo III + linfadenectomia pélvica e aórtica lateral OU quimiorradioterapia primária
-IIb: quimiorradioterapia primária
Estádio III:
-IIIa e IIIb: quimiorradioterapia primária
Estádio IV:
-IVa: quimiorradioterapia primária ou exenteração
-IVb: quimioterapia primária + radioterapia adjuvante.
Obs: sempre que possível, deve-se realizar a histerectomia. Nos estádios em que há um tratamento alternativo
à histerectomia, este é dirigido a pacientes sem prole definida.
A traquelectomia é a extirpação cirúrgica do colo uterino com preservação do útero. A traquelectomia é uma cirurgia
conservadora da função reprodutiva
A Exenteração é uma cirurgia mais extensa utilizada para tratar a recidiva do câncer ou o estádio IVa. Nela, são
removidos os mesmos órgãos como numa histerectomia radical com dissecção de linfonodos pélvicos e, além disso,
dependendo do local onde o câncer se disseminou, podem ser removidos o reto, bexiga, vagina e parte do cólon.
Fatores prognósticos: o prognóstico depende basicamente do estádio clínico no momento do diagnóstico.
Tipo histológico, soropositivas, volume da doença, invasão linfonodal, idade da paciente, anemia e presença
de comorbidades são também fatores que influenciam na sobrevida.
Seguimento
-1° ano: exame ginecológico trimestralmente; citopatológico e colposcopia do fundo de saco vaginal; toque
vaginal e retal; USG abdominal e endovaginal aos 6 e 12 meses; radiografia de tórax aos 12 meses (estádios II
a IV) e hemograma na suspeita de anemia.
-2° ao 5° ano: consultas semestrais e condutas citadas acima rotineiramente;
-Após o 5° ano: consultas e exames anualmente.

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HPV
O papiloma vírus humano (HPV) é um vírus endêmico entre a população de sexualmente ativos, com mais de
50% das mulheres sexualmente ativas com 50 anos já tendo sido contaminadas, se constituindo na infecção
sexualmente transmissível mais comum do trato genital feminino. Acelera o número de mitoses celulares,
aumentando as chances de atipia e, conseqüentemente, do câncer.
Tipos: Existem mais de 100 subtipos, sendo o 16 e 18 responsáveis por 70% de todos os cânceres cervicais,
por serem os mais mitogênicos. O 16 é o mais prevalente e o mais associado ao carcinoma de células
escamosas. O subtipo 18 é responsável por 20% dos tumores, mais comum entre os adenocarcinomas. Os
subtipos do HPV classificam-se em: baixo (6, 11, 42, 43, 44), médio (31, 33, 52) e alto (16, 18, 45 e 56) risco.
Os tipos 6 e 11 são os mais associados ao condiloma acuminado, logo, de baixo risco para câncer; entretanto,
em 5% dos casos são encontrados vírus de alto risco concomitantemente.
Manifestações: existem diversas manifestações, a depender da resposta imunológica e da presença de
cofatores. A lesão mais evidente da infecção é o condiloma acuminado. A infecção pelo HPV pode evoluir
para: cura espontânea com desaparecimento do vírus; persistência do vírus associada à citologia normal;
alterações celulares transitórias que desaparecem espontaneamente; alterações celulares persistentes que não
progridem e alterações celulares que evoluem para carcinoma in situ.
-Gravidez: como na mulher grávida ocorre uma imunossupressão fisiológica e maior produção de esteróides,
cria-se um ambiente propício à replicação viral. Por isso é comum, nas gestantes, a formação de condilomas
gigantes ou a rápida evolução para lesão neoplásica de grau mais acentuado. No tratamento é indicada a
retirada com eletrocautério, ressecção cirúrgica ou uso de ATA. O uso de podofilina ou antiblásticos é
proscrito, devido aos seus comprovados efeitos teratogênicos. A cesariana só está indicada nos casos de
condilomas gigantes que obstruem o canal de parto, pois não protege o RN da infecção.
-Soropositivas: a coinfecção com HPV nas pacientes portadoras de HIV cursa com maior prevalência de
lesões em número e extensão. Além disso, a recidiva das lesões é quase uma constante.
Diagnóstico: as lesões exofíticas hiperplásicas são facilmente identificadas à inspeção, porém é recomendada
a confirmação histopatológica. Entretanto, as lesões do epitélio escamoso da ectocérvice são menos óbvias,
sendo surpreendidas, geralmente, na colpocitologia de rotina.
Tratamento: O objetivo do tratamento é destruir a lesão causada pelo vírus, e não o próprio agente, devido a
inexistência de terapêutica eficaz para este objetivo. O tratamento é recomendado para: erradicar condilomas
acuminados por questões estéticas e evitar infecções secundárias; prevenir a evolução para malignidade;
prevenir a transmissão vertical durante a gravidez e prevenir a transmissão horizontal, visto tratar-se de uma
DST. Dentre as medidas gerais, estão: recomendação do uso de preservativo durante as relações sexuais,
encaminhamento do parceiro para investigação e tratamento das infecções secundárias.
-Condiloma acuminado: pode ser tratado com cauterização com eletrocautério, laser, substâncias químicas,
imunomoduladores ou ressecção cirúrgica. Nas lesões extensas de vulva, a fulguração com eletrocautério ou
destruição com laser deve ser preferida. Nas mais localizadas pode-se utilizar o ATA (ácido tricloracético).
Lesões muito volumosas necessitam de ressecção cirúrgica.
-ATA: substância cáustica que atua localmente, ocasionando desnaturação protéica em tecidos infectados e sadios.
Não apresenta efeitos sistêmicos, mas produz ulceração local. Pode ser usado com segurança em gestantes.
Vacinas: duas vacinas estão aprovadas no Brasil: a vacina bivalente (subtipos 16 e 18) e a quadrivalente (HPV
6, 11, 16 e 18). São administradas em 3 doses, porém não fazem parte do calendário vacinal. A ANVISA
liberou o uso da bivalente para mulheres de 10 a 25 anos e da quadrivalente para aquelas entre 9 e 26 anos.

Fontes de Pesquisa:
MedCurso 2010 e 2013 – Ginecologia, volume 5
Câncer de colo uterino: Tratamento. Projeto Diretrizes, 2011.

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HISTERECTOMIA
Histerectomia tipo I ou Histerectomia simples ou Histerectomia extrafascial: tratamento apropriado para
pacientes com tumores, de qualquer etiologia, em estádios iniciais, nos quais não há invasão do espaço
vascular linfático.
Histerectomia tipo II ou Histerectomia radical modificada ou Piver II: é menos extensa que uma
histerectomia radical. Envolve a remoção de parte dos paramétrios e ligamentos uterossacros, terço superior
da vagina, linfadenectomia pélvica sistemática e linfadenectomia paraórtica seletiva.
Histerectomia tipo III ou Histerectomia radical ou Wertheim-Meigs: consiste na histerectomia com
remoção de todo o paramétrio acompanhada da dissecção de linfonodos pélvicos, juntamente com a retirada
da maior parte dos ligamentos uterossacros e cardinais e do terço superior da vagina. Caso haja desejo da
função hormonal, podem-se preservar os ovários.
Histerectomia radical estendida tipo IV: o tecido periuretral, a artéria vesical superior e até ¾ da vagina são
removidos.
Histerectomia radical estendida tipo V: são ressecadas partes do terço distal do ureter e da bexiga.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 5.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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GRAVIDEZ
FECUNDAÇÃO
A fecundação é a fusão do oócito secundário com o espermatozóide, duas
células haplóides, que ocorre na ampola tubária gerando uma célula diplóide,
o zigoto.
Durante o ato sexual, cerca de 200 a 600 milhões de espermatozóides são
depositados na porção superior da vagina e sobre o colo uterino. Durante a
ascensão pelo canal cervical, útero e trompas, sofrem transformações
estruturais e bioquímicas para se tornarem capazes de fertilizar o oócito, a
chamada capacitação.
A primeira etapa é a liberação da hialuronidase do acrossoma do espermatozóide para assim penetrar na
camada mais externa do oócito secundário, a corona radiada. Após a entrada do espermatozóide, este libera
outras enzimas (reação acrossômica) e penetra na zona pelúcida e funde a sua membrana plasmática à
membrana do oócito. Simultaneamente à esta fusão, ocorrem modificações na zona pelúcida que impedem a
entrada de novos espermatozóides no oócito, ou seja, impedem a polispermia. A partir daí segue-se o término
da segunda divisão meiótica, originando o pró-núcleo feminino e o segundo corpo polar, que sofre extrusão
para o espaço perivitelínico. Concomitantemente o núcleo do espermatozóide aumenta de tamanho e constitui
o pró-núcleo masculino. Por fim, a membrana dos dois pró-núcleos se rompem, o material genético dos dois
gametas se fundem e forma-se uma nova célula, o zigoto.

SEGMENTAÇÃO
O estágio da segmentação ou clivagem inicia-se após a formação do zigoto. O zigoto passa por sucessivas
divisões durante seu trajeto pela trompa uterina em direção ao útero. Cada célula originada denomina-se
blastômero. Há um rápido aumento do número total de blastômeros, mas não da massa total do embrião, pois
este ainda está envolto pela zona pelúcida que restringe o processo de expansão. Com as mitoses sucessivas,
no 2° dia há 4 blastômeros, no 3° dia há oito blastômeros e no 4° dia há 16 a 32 blastômeros, que constituem
uma esfera maciça denominada mórula. No 5° dia ocorre a formação do blastocisto, que coincide com a
chegada do embrião à cavidade uterina.
Blastocisto: denomina-se blastocisto quando há a formação de um espaço repleto de líquido no interior do
embrião (blastocele), rechaçando as células centrais para a periferia. O trofoblasto define a delgada camada

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celular externa do zigoto que dará origem à placenta. O embrioblasto ou pólo embrionário corresponde ao
conjunto de células internas agrupadas em um dos pólos, que originarão o futuro concepto, vesícula amniótica,
vesícula vitelínica e alantóide. À medida que ocorre a expansão do blastocisto, este desprende-se da zona
pelúcida, processo denominado de hatching, para que ocorra a nidação.

NIDAÇÃO
A implantação do blastocisto no epitélio endometrial começa ao fim da primeira semana (6° dia após a
fecundação) e se completa ao final da segunda semana. Geralmente o blastocisto se posiciona no terço
superior e na face posterior do útero (fase de aposição), região de maior vascularização do endométrio. A
seguir há o contato direto do epitélio endometrial com o trofoblasto (fase de adesão), mediado pelas
integrinas, que conferem um estado de receptividade do endométrio à adesão pelo trofoblasto. Posteriormente
ocorre a fase de ruptura da barreira epitelial, fundamental para a progressão do blastocisto até o estroma
endometrial. Por fim, acontece a fase de invasão,
que define um processo proteolítico e imunológico
autolimitado. Assim, o trofoblasto penetra no
estroma, invade os vasos endometriais-miometriais e
substitui em parte as células endometriais.
Após a implantação do trofoblasto no endométrio ele
se prolifera e divide-se em duas camadas: o
citotrofoblasto – estrutura responsável por ancorar a
placenta à decídua e ao miométrio, e o
sinciciotrofoblasto – epitélio que recobre as
vilosidades placentárias, responsável por transporte
de gases, nutrientes, metabólitos e produção de
hormônios (estrogênios, progesterona,
glicocorticóides, hCG).

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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GRAVIDEZ: MODIFICAÇÕES NO ORGANISMO MATERNO


As adaptações maternas decorrem, em quase sua totalidade, da reação orgânica à presença do concepto e dos
seus tecidos (aloenxerto), da sobrecarga hormonal ou da ação mecânica desencadeada pelo útero gravídico.

CUTÂNEAS
Alterações atróficas: as estrias gravídicas ou víbices são alterações atróficas que traduzem o estiramento da
fibras colágenas. Incidem mais frequentemente em áreas predispostas à diminuição da hidratação e ao
estiramento, tais como abdome, mamas, nádegas e coxas. Quando ocorrem na gestação costumam ser
avermelhadas e, após o parto, adquirem coloração branqueacenta.
Alterações vasculares: resultam de vasodilatação imposta pelo padrão hormonal da gestação, sobretudo pelo
aumento do estrogênio.
-Eritema palmar: se apresenta como uma vermelhidão difusa em toda a superfície palmar, com piora ao
avançar da gravidez. É encontrado em 70% das gestantes e tende a desaparecer após o parto.
-Telangiectasias ou Aranhas vasculares: diminutos vasos que se ramificam de um corpo central. Aparecem
principalmente na face, pescoço e superfície superior do tronco e braços. Surge em 60% das brancas.
Alterações pigmentares: o padrão hormonal da gestação, caracterizado por altos níveis de estrogênio e
progesterona, acarretam uma hipertrofia do lobo intermediário da hipófise, que resulta na liberação de alfa-
melatropina, que tem ação estimulante sobre os melanócitos. As alterações pigmentares aumentam com a
exposição solar e são decorrentes do estimulo aos melanócitos.
-Linha nigrans: pigmentação cor preto-acastanhada da linha média do abdome.
-Cloasma gravídico: manchas acastanhadas na face. Não é exclusiva da gestação.

MAMAS E APARELHO GENITAL


Mamas: a mastalgia é um dos primeiros sinais clínicos da gestação, decorrente da hiperplasia de elementos
glandulares e ramificação dos ductos mamários; surge por volta da 5ª semana de gestação, pelo processo de
congestão mamária. Na 8ª semana, por estímulo do estrogênio, progesterona e prolactina, as aréolas tornam-se
mais pigmentadas e nelas surgem projeções representadas por glândulas sebáceas e glândulas mamárias
acessórias, denominadas de Tubérculos de Montgomery. À 16ª semana, já é possível a extração do colostro e é
notória a rede de Haller, caracterizada por delicadas veias logo abaixo da pele. O sinal de Hunter surge com
20 semanas, e traduz o surgimento, por hiperpigmentação, da aréola secundária. Estrias por crescimento
exagerado das mamas também são visíveis.
Útero: as miofibrilas sofrem hiperplasia e hipertrofia durante a gravidez, aumentando o volume uterino para
cerca de 500 a 1000 vezes do volume pré-gravídico. Entretanto, a espessura da parede muscular torna-se
menos espessa, devido à distensão, podendo chegar a apenas 1,5cm. Há um aumento de tecido conjuntivo, dos
ligamentos de sustentação uterina e de vasos sanguíneos e linfáticos; este último é imprescindível para o
desenvolvimento gradativo do fluxo uteroplacentário. O aumento uterino se dá por ação, principalmente, do
estrogênio, fazendo com que o útero, inicialmente pélvico, à 12ª semana de gestação alcance a sínfise púbica,
na 16ª semana esteja entre a sínfise e a cicatriz umbilical, na 20ª atinge a cicatriz umbilical e por volta da 40ª
semana tangencia o apêndice xifóide.
Colo uterino: a consistência e a coloração da cérvice se alteram pelo edema e aumento da vascularização
impostos pelo perfil hormonal da gravidez. O colo uterino torna-se, então, amolecido e arroxeado. A
hiperplasia e hipertrofia glandular causa a eversão do epitélio colunar, tornando a ectocérvice friável e
sangrante. Os altos níveis de progesterona reduzem a concentração do sódio nas secreções cervicais, tornando
o muco viscoso, espesso e não se cristaliza quando desidratado. O tampão mucoso protege o colo, sendo
eliminado dias antes do parto, devido ao afinamento e encurtamento observados na cérvice.
Trompas: diminuem a sua mobilidade por ação da progesterona.
Ovários: o processo de maturação folicular cessa. O corpo lúteo permanece funcionante, e se constitui o

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responsável pela produção de progesterona durante as primeiras 6-7 semanas de gestação.
Vagina: apresenta-se violácea devido à embebição gravídica. As células musculares e as papilas da mucosa
vaginal se hipertrofiam, o que resulta no aumento de comprimento e largura vaginal. O pH torna-se mais
ácido pela ação dos lactobacilos sobre o glicogênio acumulado nas paredes vaginais. O aumento da
vascularização e da atividade glandular resulta em aumento da secreção vaginal, que assume aspecto leitoso
por conter células epiteliais em descamação.
Vulva: também se encontra violácea e com hipertrofia de grandes e pequenos lábios.

OSTEOARTICULARES
Postura e marcha: o peso adicional da gravidez desestabiliza o equilíbrio materno ao colocar seu centro de
gravidade à frente. Para corrigir o eixo corporal, a gestante assume, involuntariamente, a atitude de lordose
lombar. Como resultado, pode ocorrer compressão radicular e lombalgia, queixa freqüente na gestação. Além
disso, como outra atitude compensatória, amplia a sua base de sustentação, adotando marcha típica anserina –
passos curtos e lentos, com base alargada.
Sistema articular: a embebição hormonal gravídica promove o relaxamento dos ligamentos do sistema
articular. Essa frouxidão acomete todas as articulações maternas, porém é mais acentuada nas articulações da
pelve, o que favorece, à exemplo, a abertura da sínfise púbica em até 12mm.

HEMODINÂMICAS
Coração: a síndrome hipercinética define o sistema cardiovascular da gestante. A freqüência cardíaca
materna aumenta em 10 a 15 bpm, aumento importante para a manutenção do débito cardíaco. Sopro sistólico
pode ocorrer, por diminuição da viscosidade sanguínea. Extrasístoles e desdobramentos da 1ª bulha são
comuns. O ECG não se altera. Com a evolução da gravidez, o diafragma se eleva e desloca o coração para
frente e para cima, o que torna o ápice cardíaco movido lateralmente. Este fato produz um aumento da silhueta
cardíaca observado na radiologia de tórax.
Débito cardíaco: com a diminuição da pressão arterial e da resistência vascular periférica associados ao
aumento do volume sanguíneo, do peso materno e do metabolismo basal, após 10-12 semanas de gestação o
débito cardíaco aumenta, atingindo ápice por volta da 20-24ª semana. O aumento é na ordem de 30 a 40%. Já
ao final da gestação, o débito cardíaco se eleva quando a paciente assume o decúbito lateral (por
descompressão da cava inferior), quando está no trabalho de parto (conseqüente às metrossístoles) e no
puerpério (pela drástica redução no volume uterino, o que equivale a uma auto-hemotransfusão).
Resistência vascular periférica e pressão arterial: a resistência vascular periférica diminui na gravidez, fato
provavelmente relacionado à circulação uteroplacentária e à ação da progesterona, prostaglandinas e
estrogênio sobre a parece vascular. A menor resistência vascular e, conseqüentemente, os menores níveis de
pressão arterial, são observados por volta da 20ª semana de gestação, por ocasião da 2ª onda de invasão
trofoblástica. A partir daí tendem a aumentar, porém mantendo-se sempre menor que os níveis pré-gravídicos.
O componente da PA que tende a mais alterar-se é a PAD (10-15mmHg); a PAS possui uma diminuição menos
acentuada (3-4mmHg), pois a queda da RVP é compensada pelo aumento do débito cardíaco.
Pressão venosa: o útero em crescimento comprime as veias pélvicas e a cava inferior, o que dificulta o
retorno venoso e aumenta em, aproximadamente, três vezes a pressão venosa nos membros inferiores. Como
conseqüência, as alterações mais referidas são: edema em MMII, varicosidades vulvares e hemorróidas,
principalmente nas idades gestacionais mais avançadas.
Hipotensão supina: a compressão da cava inferior quando a paciente permanece cerca de 5 minutos em
decúbito dorsal acarreta uma queda do débito cardíaco, que leva a um reflexo vasovagal, cursando com
bradicardia, hipotensão e lipotímia. O distúrbio é rapidamente corrigido quando a grávida assume o decúbito
lateral.

HEMATOLÓGICAS
Volume plasmático: o volume plasmático aumenta em torno de 40 a 50% a partir da 6ª semana de gestação,
com pico entre a 30 – 34ª semana. Esse aumento provoca hipervolemia, havendo diminuição da viscosidade

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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sanguínea e hemodiluição. Essa hipervolemia é importante, pois funciona como resposta compensatória às
demandas do útero hipertrofiado, à necessidade de equilíbrio pela queda do retorno venoso (devido a
compressão da cava inferior) e à perdas sanguíneas futuras do parto.
Eritrócitos: há um aumento aproximado de 20-30% no número de hemácias, fato que reflete o aumento na
demanda de oxigênio. Porém o aumento da volemia é mais pronunciado, o que leva a uma queda do
hematócrito em dois a três pontos, fato que determina a anemia fisiológica da gestação.
Leucócitos: a leucocitose durante a gravidez também é freqüente e se deve ao aumento no número de
neutrófilos segmentados.
Plaquetas: a contagem de plaquetas encontra-se, relativamente, inalterada.
Fatores de coagulação: a gravidez se caracteriza por um estado de hipercoagulabilidade, caracterizado pelo
aumento de: fibrinogênio, agentes pró-coagulantes, fatores de coagulação VII, VIII, IX e fator de Von
Willebrand; e redução do sistema fibrinolítico. O estado de hipercoagulabilidade associado à hipervolemia
ajuda a combater os riscos de hemorragia materna na dequitação placentária. Entretanto, produzem estado de
vulnerabilidade à trombose venosa profunda (TVP), tromboembolismo pulmonar (TEP) e coagulação
intravascular disseminada (CIVD).

METABÓLICAS
Ganho ponderal: a gestante adquire, em média, 12,5kg em toda a gestação. Esse aumento ponderal decorre
ao aumento do útero e do seu conteúdo (feto, placenta, líquido amniótico), das mamas, do volume sanguíneo e
do líquido extravascular e às alterações metabólicas com o intuito de reserva de energia.
Metabolismo Hídrico: a retenção de água, principalmente decorrente do edema, é característico e se deve ao
aumento da pressão venosa vascular e diminuição da pressão coloidosmótica intersticial.
Metabolismo protéico: a concentração de albumina circulante sofre redução por hemodiluição.
Metabolismo dos carboidratos: a gestação é um estado potencialmente diabetogênico, que vai testar o
correto funcionamento do pâncreas. Esse fato guarda relação com o aumento dos hormônios contrainsulínicos
(hormônio lactogênio placentário, cortisol) que ocorre no segundo trimestre, causando resistência insulínica,
como garantia do aporte de glicose ao feto. Normalmente, a gestação caracteriza-se por hiperinsulinemia,
hipoglicemia de jejum e hiperglicemia pós-prandial.

RESPIRATÓRIAS
As alterações respiratórias estão mais pronunciadas em torno da 37ª semana de gestação. Surgem para
compensar a diminuição global do volume pulmonar ocasionado pela elevação do diafragma. A caixa torácica
aumenta seu diâmetro e os ângulos subcostais se alargam. Portanto, aumenta-se a PaO2 no sangue materno e
diminui-se a PaCO2, facilitando o transporte placentário de CO2 fetal para a circulação materna.

URINÁRIAS
Ocorre aumento de 50% da taxa de filtração glomerular após 6 semanas de gravidez. Como conseqüência, há a
perda de alguns nutrientes (aminoácidos e vitaminas lipossolúveis), redução da concentração sérica de uréia e
creatinina e ocorrência de glicosúria. Na bexiga, há diminuição do tônus vesical. Essas alterações levam a
ocorrência de glicosúria fisiológica, polaciúria e incontinência urinária e a um aumento na incidência de
infecção urinária.

GASTROINTESTINAIS
O útero durante o seu crescimento desloca o estômago e intestinos. O esvaziamento gástrico e o trânsito
intestinal se tornam mais lentos, cursando com constipação intestinal e aumento da incidência de
hemorróidas. Devido à diminuição do tônus do esfíncter esofágico inferior, ocorre pirose.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 1.

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GRAVIDEZ: DIAGNÓSTICO
Segundo o livro Obstetrícia Básica, a gravidez só se inicia a partir do contato do ovo com o endométrio, ou
seja, a partir da nidação.
O diagnóstico precoce da gestação possui como vantagens a busca por assistência pré-natal em estágios
iniciais da gravidez e mudanças precoces nos hábitos de vida, que beneficiam a mãe e, principalmente, o feto.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO
Os livros Obstetrícia Básica e Obstetrícia Fundamental (Rezende) agrupam os sinais e sintomas da gravidez da
seguinte forma:
-Sintomas de presunção: 6 semanas → polaciúria e náuseas; 16-20 semanas → percepção materna dos
movimentos fetais.
-Sinais de presunção: 4 semanas → atraso menstrual; 5 semanas → congestão e mastalgia; 8 semanas →
tubérculos de Montgomery; 16 semanas → rede de Haller e 20 semanas → sinal de Hunter.
-Sinais de probabilidade: 6-8 semanas → sinais de Hegar, Piskacek e Nobile-Budin, alterações cervicais e
alterações da vulva e vagina.
-Sinais de certeza: 10-12 semanas → ausculta de BCF com o sonar; 14 semanas → sinal de Puzos e 18-20
semanas → percepção dos movimentos fetais, palpação de partes fetais e ausculta dos BCF com Pinnard.
Sintomas iniciais: são sintomas referidos ao início da gestação: náuseas, vômitos, sialorréia, aumento da
sensibilidade álgica mamária, polaciúria, nictúria, tonteiras, constipação intestinal, desejos alimentares,
perversão do apetite (pica), labilidade emocional, pirose e alterações visuais e auditivas.
-Náuseas: é o principal sintoma da gravidez inicial. Ocorre principalmente pela manhã e pode acompanhar-se
de episódios eméticos. De gênese desconhecida, acredita-se que seja resultado da adaptação materna ao hCG,
surgindo entre a 6ª e 14ª semana. O aparecimento após as 12 semanas impõe uma avaliação complementar
para outras causas.
Hiperêmese gravídica: síndrome caracterizada pela persistência de náuseas e vômitos que aparecem antes da 20ª
semana, associada à perda de peso (>5%), desidratação, distúrbio hidreletrolíticos e cetose na ausência de outras
causas. É rara, surgindo em 2 a cada mil gestantes. Pode associar-se com malformações (trissomia do 21 e hidropsia
fetal). Sua etiopatogenia é desconhecida, mas envolve fatores endócrinos (o pico da secreção de hCG coincide com a
exacerbação clínica da hiperêmese, há melhora com o avançar da gravidez pela queda do hCG e é mais freqüente e
intenso em situações de nível elevado do hCG, como gestação múltipla e doença trofoblástica gestacional),
imunológico e psicossomáticos. O diagnóstico é clínico a partir da anamnese e exame físico (sinais de desidratação e
desnutrição). Tratamento:em casos leves pode ser controlada com dieta (menor quantidade e maior frequência) e
antieméticos (dimenidrinato, escopolamina, metoclopramida, ondansetron); nas formas graves indica-se internação
hospitalar.
-Medidas gerais: controle de peso e diurese; jejum de 24-48 horas, evoluindo progressivamente a dieta após
estabilização; hidratação parenteral e evitar medicamentos a base de ferro.
-Medicamentos: a metoclopramida é a droga mais utilizada. A pirodixina é a droga mais segura. A clorpromazina é
utilizada nos casos refratários. Outras drogas: ondansetrona e dimenidrinato.
Metoclopramida (Plasil®): comprimido (10mg), solução injetável (5mg/ml), solução oral (5mg/5ml) e solução oral gotas
pediátrico (4mg/ml). Dose: 10mg 30 minutos antes das refeições até 4x/dia; crianças: 0,1-0,2mg/kg/dose até 4x/dia.
-Polaciúria: parece estar relacionada a um aumento na produção urinária total, iniciado a partir da 6° semana.
Além disso, o útero em crescimento pode comprimir a bexiga. Com a evolução da prenhez, o útero cresce no
2° trimestre em direção à cavidade abdominal e este sintoma desaparece. Nas últimas semanas usualmente
ocorre novo aumento da freqüência urinária em virtude da compressão vesical pelo pólo cefálico. Deve-se
suspeitar de cistite na presença de disúria, hematúria ou piúria.
-Constipação intestinal: relaciona-se a um aumento da progesterona que diminui a motilidade intestinal.
-Tonteiras: derivam de uma queda da resistência vascular periférica. Torna-se preocupante quando ocorre
concomitantemente a arritmias e convulsões.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Sinais:
-Atraso menstrual: sinal cardinal da gestação precoce. Considera-se quando a mulher na idade reprodutiva
apresenta atraso superior a 10 a 14 dias, principalmente nas sexualmente ativas sem uso de método
contraceptivo. Vale lembrar que mesmo aquelas em anticoncepção podem engravidar por falhas no método.
-Alterações cutâneas: incluem as estrias, o cloasma gravídico
(deriva da hiperpigmentação da face), a linha nigra (por aumento da
melanina na linha alba) e o sinal de Halban (aumento da lanugem no
limite do couro cabeludo).
-Alterações mamárias: são mais marcantes em primigestas. Na 5ª
semana as mamas tornam-se doloridas pela congestão. Na 8ª semana
surgem os tubérculos de Montgomery, projeções na aréola
secundárias à hipertrofia das glândulas mamárias. Com 16 semanas é
possível a extração do colostro e verifica-se um aumento da vascularização
venosa, a rede de Haller. Por fim, na 20ª semana os mamilos tornam-se
hiperpigmentados e de delimitação imprecisa – sinal de Hunter (aréola
secundária).
-Aumento do volume abdominal: sinal inespecífico que deve ter diagnóstico diferencial com outras causas, à
exemplo de ascite e tumor abdominal.
-Aumento do volume uterino: na 12ª semana o útero pode ser palpado acima da sínfise púbica. Na 16ª semana
ele se encontra entre a sínfise púbica e a cicatriz umbilical. Na 20ª semana atinge a cicatriz umbilical e na 40ª
o apêndice xifóide.
-Sinal de Hartman: sangramento relacionado à nidação. É o sangramento que ocorre
7-8 dias após a fecundação devido a implantação do blastocisto. Pode confundir-se
com um sangramento menstrual, alterando a percepção do atraso da menstruação.
-Sinais ligados ao desenvolvimento uterino inicial:
-Sinal de Hegar: é a flexão do corpo uterino sobre o colo do útero durante o toque
bimanual. Decorre da consistência elástica e amolecida que o útero assume entre 6-8
semanas, principalmente em região ístmica.
-Sinal de Osiander: percepção de pulso da artéria vaginal ao toque. Relaciona-se ao rápido
crescimento uterino
-Sinal de Piskacek: assimetria uterina à palpação. Se deve ao crescimento uterino assimétrico, maior no local de
implantação do embrião.
-Sinal de Nobile-Budin: preenchimento do fundo-de-saco vaginal pelo útero gravídico, perceptível ao toque.
-Regra de Goodel: amolecimento do colo uterino percebido ao toque. O colo passa de uma consistência da cartilagem
nasal para ser semelhante à consistência labial nas grávidas.
-Sinal de Jacquemier ou Chadwick: representa a coloração violácea da mucosa vulvar, do vestíbulo e meato
uretral.
-Sinal de Kluge: tonalidade violácea da mucosa vaginal, decorrente da congestão vascular.
-Sinais patognomônicos:
-Ausculta dos batimentos cardiofetais: podem ser identificados pelo estetoscópio de Pinard (20ª semana) em grávidas
não obesas e pelo sonar doppler (10ª semana). A FC fetal varia de 120 a 160 bpm.
-Percepção de partes e movimentos fetais: perceptível a partir da 18-20ª semana a partir da palpação.
-Sinal de Puzos: percebido a partir da 14ª semana, descreve o chamado rechaço fetal intrauterino. Consegue-se a
partir do impulso no útero durante o toque vaginal, que afasta o feto para longe do dedo do examinador e, pela
tendência de retorno do feto à sua posição, permite novamente a sua sensação (rechaço).
Sintomas tardios: não são empregados para o diagnóstico de gravidez. São eles:
-Dispnéia: de aparecimento gradual e não relacionada a outros sintomas respiratórios (ex. tosse, esforço
respiratório). Causada pelos efeitos da progesterona no centro respiratório (aumento da freqüência
respiratória) e pelo crescimento do útero gravídico.
-Lombalgia: tipicamente surge após o primeiro trimestre. Resulta da modificação do centro de gravidade
materno e dos efeitos hormonais da gravidez.

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DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
-Beta-hCG: A detecção da fração beta do hormônio gonadotrófico humano (beta-hCG) no plasma e na urina
maternos constitui a base do diagnóstico laboratorial da gravidez. Esse hormônio é produzido pelo
sinciciotrofoblasto a partir do 10° dia de fertilização, prevenindo a involução do corpo lúteo, principal sítio de
produção da progesterona por 6-7 semanas. A sua concentração plasmática duplica a cada 48 horas. O seu pico
de secreção varia conforme a fonte entre 8-10 semanas e 12-14 semanas de gestação. Níveis de beta-hCG
superiores a 1.000UI/L asseguram a presença de gravidez em 95% dos casos.
-USG: A ecografia obstétrica pode ser realizada por via transvaginal ou transabdominal (pélvica). A avaliação
ultrassonográfica da idade gestacional é mais precisa da 6ª até a 12ª semana de gravidez, período em que se
emprega como técnica o comprimento cabeça-nádega do embrião. A partir da 14ª semana a acurácia da USG
para estimar a idade gestacional diminui progressivamente; as principais medidas utilizadas passam a ser o
diâmetro biparietal e comprimento do fêmur. Os BCF são observados entre 6-7 semanas de gestação.
-Zona discriminatória do hCG: representa a correlação entre os níveis séricos de beta-hCG e a visualização do
saco gestacional e outras estruturas por USG transvaginal do 1° trimestre. A ausência de saco gestacional
intrauterino com valores de beta-hCG superiores a 1.000mUI/ml deve levantar a suspeita de implantação
ectópica.

CRONOLOGIA DA GRAVIDEZ
Idade gestacional
A data da última menstruação (DUM) é o parâmetro convencional para o cálculo da idade gestacional. Por
conseguinte, a idade da gestação corresponde ao tempo transcorrido entre o primeiro dia da última
menstruação e a data atual.
Em 20% dos casos há divergência entre a IG pela DUM e pelo USG. Nesses casos, se a IG pela DUM estiver
dentro do intervalo de confiança da estimativa ecográfica (±1 semana no 1° trimestre, ±2 semanas no 2°
trimestre e ±3 semanas no 3° trimestre), ela é aceita. Caso não esteja nesse intervalo, considera-se a
estimativa ecográfica.
Data provável do parto
É calculada pela regra de Nagele, que consiste na soma de 9 meses e 7 dias à DUM, ou nos meses posteriores
a março, na subtração de 3 meses e adição de 7 dias. Salienta-se que se durante a soma ultrapassa-se de 30-31
dias, o excedente será o dia e soma-se um mês (ex. DUM: 28/10/2012 → DPP: 04/08/2013).
Períodos da gestação
-Abortamento: processo espontâneo ou provocado pelo qual a cavidade uterina se esvazia de seu conteúdo
gestacional antes que a gravidez atinja 20-22 semanas ou que o concepto ultrapasse o peso de 500g.
-Aborto: é o produto do abortamento.
-Parto prematuro: aquele que ocorre antes da gestação completar 37 semanas e após ultrapassar 20-22
semanas
-Parto termo: toda gravidez que se encontra entre 37 semanas completas e 42 semanas incompletas.
-Gestação prolongada: gestação com duração maior que 42 semanas completas.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 1

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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PRÉ-NATAL
Conjunto de medidas e protocolos de conduta que tem por finalidade assegurar, na medida do possível, ao
término da gestação, o nascimento de uma criança saudável e a garantia do bem-estar materno e neonatal.
Envolve: confirmar a gravidez, diagnosticar e tratar doenças maternas preexistentes, aconselhar a gestante e
familiares quanto aos eventos fisiológicos da gravidez, identificar e minimizar pequenos distúrbios da
gravidez e identificar e tratar precocemente intercorrências gestacionais.
Recomendações do Ministério da Saúde (2006):
O início do pré-natal deve ser o mais precoce possível, preferencialmente nos primeiros 120 dias de gestação.
Idealmente, a realização de consulta pré-concepcional possibilitaria reconhecer doenças ou agravos prévios
passíveis de tratamento, minimizando os riscos gestacionais.
Recomendam-se que sejam realizadas pelo menos seis consultas de pré-natal durante a gestação,as
distribuídas da seguinte forma: uma consulta no primeiro trimestre, duas no segundo e três consultas no
terceiro trimestre da gestação.
Em todas as consultas, o obstetra deverá seguir um protocolo mínimo da consulta, que consiste em: anamnese
e exame físico geral, medidas de peso e pressão arterial, indagação sobre a percepção dos movimentos fetais
(possível a partir da 18ª semana em multíparas e 20ª semana em primíparas), determinação da altura do fundo
de útero (AFU) e ausculta dos batimentos cardíacos fetais (BCF).
Os exames complementares fundamentais durante a gestação e que devem ser solicitados rotineiramente são:
-ABO-Rh, Hb e Ht: na primeira consulta
-Glicemia de jejum, Urina tipo 1 e anti-HIV: na primeira consulta e outra próximo a 30ª semana de gestação
-VDRL: na primeira consulta e outro próximo a 30ª semana de gestação; deve ser repetido no momento do
parto ou em caso de abortamento.
-HbsAg: ao menos um exame próximo a 30ª semana de gestação
-Sorologia para toxoplasmose: na primeira consulta, se disponível.
Avaliação do risco gestacional: a triagem das gestantes com risco gestacional deve ser realizada em uma
unidade básica de saúde. Uma paciente que inicialmente foi classificada como baixo risco pode, a qualquer
momento, tornar-se de alto risco, e necessitar de acompanhamento em uma unidade especializada de saúde.
Entretanto, não obrigatoriamente uma gestante classificada como de alto risco deve ser encaminhada a um
serviço especializado, devendo ser referenciada aquelas com fatores clínicos mais relevantes (risco real) e/ou
fatores preveníveis que demandem intervenções mais complexas. A seguir, são apresentadas situações onde
deve ser considerado o encaminhamento, segundo o Ministério da Saúde:
-Características individuais e condições sociodemográficas desfavoráveis: idade <15 anos ou >35 anos,
perigos ocupacionais (esforço excessivo, exposição a agentes químicos ou biológicos), situação familiar
insegura (principalmente adolescentes), baixa escolaridade, condições ambientais desfavoráveis, altura
<1,45m, peso <45 ou >75kg, dependência de drogas lícitas ou ilícitas.
-História reprodutiva anterior: morte perinatal explicada ou não, RN com restrição de crescimento ou pré-
termo ou malformado, abortamento habitual, esterilidade/infertilidade, nuliparidade ou multiparidade,
síndromes hemorrágicas, pré-eclâmpsia ou eclâmpsia, macrossomia fetal, cirurgia uterina anterior.
-Comorbidades: cardiopatias, pneumopatias, nefropatias, endocrinopatias (especialmente DM), hemopatias,
HAS em uso de anti-hipertensivo, epilepsia, ITU, doenças infecciosas (hepatite, toxoplasmose, HIV, sífilis,
DSTs), doenças autoimunes (LES, colagenoses), ginecopatias (miomatose, malformação uterina, tumores).
-Doença obstétrica atual: alteração do crescimento uterino ou volume do líquido amniótico, trabalho de parto
prematuro, gravidez prolongada, ganho ponderal inadequado, pré-eclâmpsia ou eclâmpsia, amniorrexe
prematura, hemorragias na gestação, isoimunização, óbito fetal.
Anamnese: a anamnese obstétrica é semelhante a qualquer anamnese da prática médica, devendo questionar a
paciente sobre o seu estado atual, antecedentes pessoais, antecedentes familiares, história fisiológica e seus
hábitos sociais. Contudo, alguns aspectos devem ser ressaltados:

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-Terminologia:
-Gesta: esse sufixo refere-se ao número de gestações que a paciente apresentou, não importando a duração ou o
número de fetos em cada uma delas. Temos: nuligesta, primigesta e, a partir daí, genericamente, multigesta.
-Para: esse sufixo refere-se ao número de gestações em que houve viabilidade fetal, excluindo-se, portanto, os
abortos (feto com menos de 20-22 semanas e/ou com peso inferior a 500g). Para definição de paridade não se leva em
consideração o número de fetos nascidos em cada parto ou quantos sobreviveram. Assim, a paridade não é maior se o
parto é gemelar, nem menor se o feto já nasce morto.
-Idade: a gravidez tem melhores condições biológicas quando se desenvolve entre os 18 e 35 anos. É mais
freqüente aneuploidia nas mais velhas e abortamento e DHEG em ambas as faixas etárias.
-História ginecológica e obstétrica: deve-se conhecer a data da última menstruação (DUM) para o cálculo da
idade gestacional e da data provável do parto. Maior freqüência de gestação múltipla e abortamento precoce
são encontradas em gestações após tratamento de infertilidade. O intervalo interpartal (interregno) inferior a 2
anos é prejudicial ao organismo materno por dificultar o restabelecimento das reservas nutricionais e impedir a
recuperação das condições orgânicas alteradas com a gestação. Já o intervalo interpatal superior a 10 anos
exige maior atenção, uma vez que a paciente comporta-se como se nunca tivesse parido.
Exame físico: várias modificações no organismo materno são observadas com a gestação (já discutido em
capítulo anterior). Preconiza-se o exame físico geral da paciente, com ênfase no gineco-obstétrico. Medida de
PA e peso, determinação da AFU e ausculta de BCF deve ser realizado em todas as consultas. A palpação
abdominal é recomendada a partir do segundo trimestre através do uso das manobras de Leopold-Zweifel:
-1ª manobra: o examinador estando do lado direto da paciente e de frente a ela, com as duas mãos delimita o fundo
de útero e observa qual pólo fetal que o ocupa.
-2ª manobra: desliza-se as mãos do fundo do útero em direção ao pólo inferior para identificar o dorso fetal de um
lado e os membros do outro. Determina a posição fetal, facilitando a procura do BCF.
-3ª manobra: visa explorar a mobilidade da apresentação com o estreito superior da pelve. Procura-se apreender o
pólo entre o polegar e o dedo indicador ou médio, imprimindo-lhe movimentos de lateralidade para verificar o grau
de penetração da apresentação na bacia e confirmar o diagnóstico da apresentação pela comparação com o outro pólo
identificado na 1ª manobra.
-4ª manobra: o examinador volta sua costas à paciente e coloca as mãos sobre as fossas ilíacas, caminhado-as em
direção ao hipogástrio, distanciadas em 10 cm. Com a ponta dos dedos procura penetrar na pelve, para averiguar o
grau de penetração do concepto no estreito superior da bacia.
O tamanho do útero pode nos fornecer informações a respeito da idade gestacional aproximada. De 10-12
semanas o útero está acima da sínfise púbica; com 16 semanas encontra-se entre a sínfise e a cicatriz
umbilical. Com 20 semanas atinge a cicatriz umbilical. A partir daí até a 32ª semana, a AFU correlaciona-se
bem com a idade gestacional: um centímetro corresponde a uma semana. Para obter esta medida, o ponto zero
da fita métrica é fixado na borda superior da sínfise púbica, estendendo-a ao longo do maior eixo do útero e
com a mão esquerda delimita-se o fundo uterino.
O BCF é audível a partir da 10-12ª semana pelo sonar e a partir da 20ª semana pelo estetoscópio de Pinard.
Exames complementares: as recomendações a seguir são para as gestantes classificadas como de baixo
risco; em casos de alto risco, propedêutica auxiliar deverá ser solicitada.
-Sangue: os exames que devem ser solicitados incluem:
-Hemograma completo, tipagem sanguínea e fator Rh: caso este último seja negativo, deve-se acrescentar o teste de
Coombs indireto e a tipagem do cônjuge.
-Glicemia de jejum: se inferior a 85mg/dl, o rastreamento é negativo. Entre 85-110mg/dl, indica-se o teste de
tolerância à glicose com 75g de dextrosol e dosagem da glicemia após 2 horas, devendo ser realizado entre a 24 e 28ª
semana de gestação; se superior a 140mg/dl há intolerância à glicose e se superior a 200mg/dl diagnostica-se
diabetes. Se a glicemia de jejum inicial for superior a 110mg/dl (repetido e confirmado o valor elevado), não há
necessidade de TOTG e está diagnosticada a diabetes na gestação.
-Sorologias: o anti-HIV e o VDRL devem ser solicitados na primeira consulta e repetidos no terceiro trimestre, pois
há risco de infecção durante a gestação e os casos positivos poderão receber a profilaxia para prevenção da
transmissão vertical e tratamento adequado. O HbsAg deverá ser solicitado próximo à 30ª semana, visando
determinar a necessidade de profilaxia neonatal. O rastreio de infecção por rubéola e citomegalovírus não é
recomendado no pré-natal, uma vez que não há tratamento disponível para prevenção da transmissão vertical ou

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redução da morbidade fetal; além disso, os defeitos congênitos ocorrem quando a doença se instala no primeiro
trimestre. A pesquisa da infecção por toxoplasmose deve ser estimulada, já que a infecção aguda na gestação pode
receber tratamento adequado.
-Urina: as modificações gestacionais favorecem o desenvolvimento de ITU, a exemplo da estase urinária,
aumento da produção de urina, glicosúria e aminoacidúria, favorecendo o crescimento bacteriano e a infecção.
A bacteriúria assintomática (>105 UFC/ml em urina de jato médio de pacientes assintomáticas) está associada
ao desenvolvimento de pielonefrite em grande número de casos, além de aumentar o trabalho de parto
prematuro, número de abortamentos e restrição de crescimento. Portanto, o Ministério da Saúde recomenda o
rastreio durante o pré-natal com Urina tipo I; na presença de nitritos, polimorfonucleares, numerosas bactérias
ou hemácias sem sinais clínicos de infecção, deve-se solicitar urocultura com antibiograma. Já na presença de
sintomas, deve ser realizado o tratamento mesmo antes do resultado da urocultura. Alguns serviços
preconizam a urocultura de rotina. O microorganismo mais freqüente é a E. coli, sendo também encontrados o
Proteus, Klesbisiella pneumoniae e Enterobacter.
-Tratamento: o tratamento da bacteriúria assintomática, da cistite e da pielonefrite deve ser dirigido pelo
antibiograma. Nas sintomáticas, em que não se deve esperar o resultado da urocultura, o tratamento empírico consiste
em: nitrofurantoína 100mg 6/6 horas por 10 dias; cefalexina 500mg 6/6 horas por 7-10 dias; amoxicilina 500mg/dia
por 7-10 dias; ácido nalidíxico e sulfametoxazol-trimetropim (ambos 500mg 6/6 horas por 7 dias) devem ser evitados
no terceiro trimestre da gestação. Nova urocultura deve ser solicitada 3 a 7 dias após terminado o tratamento.
-Ultrassonografia (USG): embora bastante corriqueira em todo o mundo, não há evidências de que a USG de
rotina tenha qualquer efetividade sobre a redução da morbimortalidade perinatal ou materna. Entretanto, existe
evidência que sua realização precoce na gravidez está relacionada com melhor determinação da idade
gestacional e detecção precoce de gestações múltiplas e de malformações fetais, clinicamente não suspeitas.
Sendo assim, a sua não realização não constitui omissão e nem diminui a qualidade do pré-natal (Ministério da
Saúde, 2005). A maioria dos autores nacionais recomendam que se realize uma USG por trimestre. As
melhores evidências científicas apontam que na indisponibilidade de USG, deve-se optar por pelo menos um
único exame entre a 18ª e 20ª semana, por avaliar adequadamente a anatomia fetal e ainda ser fidedigna
quanto a idade gestacional.
-USG transvaginal: deve ser realizada após confirmação laboratorial da gestação para determinação da idade
gestacional e definição do local de implantação ovular.
-USG obstétrica do 1° trimestre (11-14ª semana): tem por objetivos: calcular a idade gestacional através da medida
do comprimento cabeça-nádega e diâmetro do saco gestacional; rastrear alterações cromossomiais através da
determinação da translucência nucal e atestar a vitabilidade fetal através da ausculta do BCF.
-USG obstétrica do 2° trimestre – morfológica (18-20ª semana): estuda a morfologia dos órgãos fetais e identifica
malformações. A determinação da idade gestacional nesse período é obtido pela medida do comprimento do fêmur e
do diâmetro biparietal fetal.
-Outros métodos complementares:. podem ser acrescidos à rotina mínima do Ministério da Saúde:
-Colpocitologia Oncótica: se a mulher não a tiver realizado nos últimos 3 anos;
-Urocultura e USG obstétrica: onde houver disponibilidade;
-Eletroforese de hemoglobina: na suspeita clínica de anemia falciforme;
-Sorologia para rubéola: quando houver sintomas sugestivos.
Outros métodos que visam avaliar a vitabilidade fetal incluem a dosagem de rastreio genético
(alfafetoproteína, estriol, beta-hCG) no sangue materno, a dopplervelocimetria, a cardiotocografia, a biópsia
de vilo corial, a amniocentese, a cordocentese e a amnioscopia. Podem ser solicitados com bases nas
necessidades clínicas da gestante e do feto, não devendo ser realizados de forma rotineira para toda gestante
Orientações gerais:
-Evitar esportes que exijam grande atividade física, pois o exercício físico extenuante pode ocasionar aumento
da temperatura corpórea e possíveis danos ao feto;
-Estão terminantemente proibidos: atividades que possam expor a paciente a radiação ou drogas teratogênicas;
o fumo, pois está ligado a casos de óbito fetal, RN de baixo-peso e diversas malformações congênitas, como
conseqüência de um aumento da resistência vascular placentária; a ingestão de bebidas alcoólicas, mesmo em
pequenas quantidades, pois está associada a aumento do risco de disfunção cerebral;

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-Não há evidências de que a atividade sexual resulte em estimulação do trabalho de parto, não havendo
restrições quanto a sua prática, desde que não ocasione dor, sangramento ou desconforto à paciente.
Nutrição: para avaliação do estado nutricional deve-se utilizar o IMC: > 25 → gestante obesa, 20-25 →
eutrófica e < 20 → desnutrida. Para as grávidas eutróficas espera-se um ganho de peso de 9-13 kg no termo
(300-400g/semana), para as obesas moderadas (IMC <28) o ganho ponderal deve ser de 7 kg e para as
desnutridas deve ser de 9-13 kg somado à diferença de peso necessário para que esta torne-se eutrófica. A
necessidade de todos os componentes nutricionais estão aumentados durante a gestação, porém alguns
merecem destaque devido a sua importância:
-Ferro: a suplementação de ferro deve ser prescrita para a gestante e mantida durante a amamentação. É o
único nutriente cujas necessidades gravídicas não podem ser supridas de forma satisfatória pela alimentação,
ocorrendo anemia ferropriva em praticamente todas as gestantes que não fazem a sua suplementação.
-Recomenda-se reposição de 40mg/dia de ferro elementar, o que equivale a 1 comprimido (200mg) de sulfato ferroso
-Ácido fólico: comumente há queda dos seus níveis na gravidez, porém raramente instala-se uma anemia
megaloblástica. Mesmo assim, sua reposição é indicada, pois a sua deficiência está comprovadamente
associada a defeitos do tubo neural, como espinha bífida, anencefalia e onfalocele.
-Recomenda-se a reposição de 400mcg/dia a partir de 30 dias antes da concepção em gestantes de baixo risco e de
5mg/dia a partir de 90 dias antes da concepção em gestantes de alto risco de defeitos do tubo neural (ex. epilépticas
em uso de anticonvulsivante), ambos até o término da gestação.
-Cálcio e proteínas: a demanda desses elementos aumentam consideravelmente durante a gestação, devido a
mineralização do esqueleto fetal e a formação do tecido muscular, respectivamente. Sendo assim, a ingesta de
alimentos ricos em proteínas e cálcio (principalmente leite) deve ser estimulada.
-Vitaminas: sua suplementação no período pré-gestacional ou no primeiro trimestre, não previne abortamentos
precoces, tardios ou perdas fetais. A vitamina A em altas doses (>10.000UI/dia) é teratogênica.
QUEIXAS COMUNS
Grande parte das queixas comuns da gestantes deriva das modificações normais do organismo materno
durante a gravidez. Estas merecem, na maioria das vezes, mais esclarecimento do que tratamento.
-Náuseas e vômitos: mais comuns no 1° trimestre
-Pirose: tratar com antiácidos e evitar decúbito logo após refeições, café, chá preto, doces e alimentos gordurosos
-Constipação: decorre da atonia intestinal pela ação inibidora da progesterona sobre a contratilidade da fibra
muscular lisa e, na gravidez avançada, pela compressão das vísceras abdominais pelo útero gravídico. Deve ser
tratada com aumento da ingestão de água e fibras.
-Hemorróidas: ocasionadas por aumento da pressão venosa por compressão da cava inferior. O tratamento
intervencionista é contraindicado na gravidez. Os sintomas regridem com medidas simples, como melhor higiene
local, prevenção de esforços excessivos, alimentação rica em fibras; pomadas com anestésico e corticóide são úteis.
-Edema gravitacional: decorre do aumento da pressão hidrostática no leito venoso por compressão da cava inferior.
Não tem qualquer importância clínica, não sendo indicado tratamento medicamentoso nem restrição salina.
-Varizes: decorrem do aumento da pressão venosa, inatividade e diminuição do tônus vascular. Mais comum em
multíparas e podem acontecer em MMII, na vulva e na vagina. Tratamento intervencionista (medicamentoso ou
cirúrgico) não está indicado, podendo ser estimulado o uso de meias compressivas e elevar os pés ao deitar.
-Polaciúria e urgência urinária: decorrem da compressão vesical. Não necessita de tratamento.
-Fadiga: devido às alterações de postura e aumento do peso. Deve-se descartar anemia. O repouso é indicado.
-Dor lombar: comum no último trimestre, decorre de postura inadequada. Orientações quanto a postura adequada,
exercícios de relaxamento muscular (hidroginástica) e massagens são úteis.
-Cefaléia: decorre da vasodilatação e edema cerebral pela ação da progesterona, que atua diminuindo o tônus
vascular. O uso de analgésico comum (paracetamol) é eficaz na maioria. Antienxaquecosos são contraindicados.

VACINAÇÃO
Tétano: a vacina dT é recomendada a partir de 20 semanas para profilaxia do tétano neonatal e suas doses
devem ter intervalo de 60 dias (pelo menos 30 dias). Duas doses são suficientes para prevenção do tétano
neonatal, sendo que a última deve ser administrada até 20 dias antes da data provável do parto. Está indicado:
-Esquema incompleto → completar esquema vacinal; -Esquema completo há mais que 5 anos → 1 dose de reforço;
-Esquema completo há menos que 5 anos → não há necessidade de reforço vacinal.

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Influenza: a vacinação é recomendada pelo CDC em toda mulher grávida no período do inverno.
Raiva: a vacinação deve ser realizada em casos de acidente.
Hepatite B: indicada a vacinação para gestantes com menos de 20 anos e sorologia negativa ou para gestantes
de alto risco (mais de um parceiro nos últimos 6 meses, parceiro com hepatite B, uso de drogas injetáveis).
Febre amarela: deve ser evitada, mas é indicada em casos de viagem inevitável para área endêmica
Vacinas de vírus vivos atenuados: Sabin – contra pólio; Tríplice viral (SCR/MMR) – sarampo, caxumba e
rubéola. Estão contraindicadas durante a gravidez.
-Rubéola: deve-se aguardar período mínimo de um mês após sua aplicação para engravidar. Caso a grávida vacine-se
inadvertidamente, deverá ser encaminhada para centro de referência, apesar de não haver relatos de rubéola intra-
útero a partir de contaminação pela vacina.

MEDICAMENTOS
Sulfas: devem ser evitadas no final da gravidez, pois podem competir com a bilirrubina indireta pelos sítios de
ligação com a albumina, levando ao kernicterus neonatal. É ainda antagonista do ácido fólico, devendo ser
acompanhadas de suplementação quando indicadas.
Drogas tuberlostáticas: a estreptomicina é a única droga do esquema contra tuberculose documentadamente
prejudicial para o concepto, levando a surdez congênita.
Vancomicina e quinolonas: apesar dos seus efeitos no adulto, não existe comprovação de alterações fetais.
Antifúngicos: a anfotericina B, miconazol e nistatina podem ser utilizadas com segurança. Cetoconazol,
metronidazol e tinidazol podem ser utilizados a partir do 2° trimestre. O fluconazol não deve ser utilizado por
via oral durante a gestação.
Antirretrovirais: é limitada a experiência de seu uso. A ribavirina é comprovadamente teratogênica.
Anti-helmínticos: podem ser prescritos a partir do 2° trimestre.
IECA: Comprovadamente teratogênicos, levam a oligoidramnio, agenesia renal, hipoplasia pulmonar e morte.
Anti-hipertensivos: diuréticos podem levar a malformações no 1° trimestre. Betabloqueadores podem cursar
com CIUR, baixo peso ao nascer, bradicardia e policitemia. Entre os bloqueadores dos canais de cálcio, o
diltiazem é seguro, porém nifedipina e verapamil podem reduzir o fluxo placentário.
Anti-asmáticos: a grande maioria pode ser utilizada com segurança, incluindo adrenalina e glicocorticóides.
Anti-neoplásicos e imunossupressores: a grande maioria está associada a enorme quantidade de
malformações congênitas. São exemplos: ciclofosfamida, metotrexato e azatioprina. Contraindicadas.
AINE e Coxibs: em geral não são teratogênicos. Sua administração pode levar a gravidez prolongada,
disfunção renal irreversível no feto e oclusão precoce do ducto arterioso, devendo ser evitados.
Anticonvulsivantes: mulheres com epilepsia tem risco duas a três vezes maior de terem fetos malformados.
Entretanto, mais de 90% daquelas que utilizam anticonvulsivantes terão filhos normais. Deve-se preferir o uso
em monoterapia, doses fracionadas e menor dose possível que se consiga o controle anticonvulsivo. Não
existe uma droga de escolha a ser utilizada na gestação. O Valproato é contraindicado.
Antidepressivos: Os ISRS (fluoxetina e sertralina) são os mais seguros, se constituindo como os de escolha.
ADT associam-se a malformações em membros e o lítio a alterações cardíacas (anomalia de Ebstein).
Benzodiazepínicos: o diazepam é a droga mais estudada, tendo sido demonstrada associação com fenda labial
e palatina, CIUR e malformações nos membros. Pode causar ainda hipotonia e sonolência neonatal.
Antipsicóticos: estudos com haloperidol e clorpromazina sugerem que seu efeito teratogênico é mínimo.
Talidomida: notório teratógeno humano. Causa malformações nos membros geralmente bilaterais, anomalias
renais, cardíacas, torácicas e da face. A gravidez deve ser proibida até 2 anos após o uso da droga.
DROGAS
Etilismo: aumenta o risco de abortamento e pode determinar malformações congênitas em até 30% dos fetos.
Mesmo o etilismo leve pode ser prejudicial e deve ser evitado. Gestantes que consomem grandes quantidades
de álcool podem levar ao desenvolvimento, no concepto, da síndrome alcoólica fetal: retardo mental, déficit
de crescimento, alterações de comportamento e fácies típica (hirsutismo, fissuras palpebrais e microcefalia).
Defeitos cardíacos e cerebrais são também comuns.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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Marijuana: seu princípio ativo atravessa livremente a placenta e chega também ao leite materno. Em altas
doses, causa anomalias em animais. Até o momento não existem evidências que a marijuana possua algum
efeito teratogênico em humanos. Relatos apontam para a maior ocorrência de leucemia na infância.
Cocaína: provoca grave vasoconstricção no organismo materno e, por atravessar livremente a placenta, no
feto. Está relacionada ao DPP, abortamento espontâneo, TPP, CIUR e sofrimento fetal crônico. Malformações:
atresia intestinal, defeitos nos membros, defeitos cardíacos, microcefalia e retardo mental.
Tabagismo: está associado ao abortamento, prematuridade, restrição do crescimento fetal, DPP e amniorrexe
prematura. As malformações mais associadas são a onfalocele, gastrosquise, fenda labial, hidrocefalia,
microcefalia, atresia de intestino, entre outras. Seu efeito é dose-dependente. Caso não se consiga abandonar o
hábito, a gestante deve reduzir a, no máximo, o consumo de 10 cigarros por dia.

DIREITOS DA GESTANTE
-Falta justificada mediante
declaração de comparecimento
para consultas e exames;
-Mediante atestado médico,
tem direito a mudança de
função no trabalho, caso esta
traga risco para si ou ao bebê;
-Estabilidade no emprego, não
podendo ser demitida a partir
da data da confirmação da
gestação até 5 meses de pós-
parto, exceto se por “justa
causa” (ex. roubo, homicídio);
-Licença-maternidade de 120
dias a partir do 8º mês;;
-Mediante atestado médio, o
período de repouso pode ser
prorrogado por 2 semanas
antes ou após os 120 dias;
-Salário-maternidade com
remuneração integral: se
empregadas, não exige-se
tempo mínimo de contribuição
mas, se autônomas, exige-se
ao menos 10 contribuições à
previdência para ter este
direito
-Dispensa do trabalho por dois
períodos de 30min para
amamentar, até os 6 meses;
-Licença-paternidade para o
pai por 5 dias a partir do parto;
-Considera-se parto o
nascimento a partir da 23ª
semana de gestação, inclusive
natimorto

Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 1.

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103

INFECÇÕES PERINATAIS
SÍFILIS
Doença infecciosa sistêmica, de evolução crônica, sujeita a surtos de agudização e períodos de latência quando
não tratada. É causada pelo Treponema pallidum, uma bactéria Gram-negativa de transmissão sexual ou vertical,
que pode produzir, respectivamente, as formas adquirida ou congênita da doença. No Brasil, a sífilis congênita
permanece como grave problema de saúde pública e sua incidência tece crescimento com a entrada da população
feminina na epidemia de HIV/AIDS. Por isso, a sífilis congênita é uma doença de notificação compulsória.
Classificação
-Sífilis adquirida: → recente (menos de um ano de evolução): primária, secundária e latente recente
→ tardia (mais de um ano de evolução): latente tardia e terciária
-Sífilis congênita: → recente: casos diagnosticados até dois anos de vida;
→ tardia: casos diagnosticados após os dois anos de vida
Manifestações:
-Sífilis adquirida: caracteriza-se pelo surgimento de cancro no local da inoculação (sífilis primária), inclusive
extragenital, indolor, com linfadenopatia local. Cerca de, em média, 8 semanas após o seu desaparecimento,
podem aparecer lesões de diferentes aspectos, principalmente máculas, caracterizando a sífilis secundária.
Ambas as formas podem desaparecer sem tratamento, entrando em fase de latência. A sífilis terciária, com
manifestações neurológicas decorrentes de longos anos de infecção sem tratamento, hoje é raramente descrita.
-Sífilis congênita: na sífilis recente a transmissão vertical é de 100%, devido aos altos títulos, e permanece em
torno de 70% nos casos tardios. Após a infecção fetal, a gestação pode evoluir com abortamento, natimorto,
parto prematuro ou óbito perinatal. Entretanto, cerca de 70% dos casos são assintomáticos, e os 30% restantes
podem apresentar hepatoesplenomegalia, lesões cutâneas variadas (geralmente bolhosas em palmas das mãos,
planta dos pés e ao redor da boca e do ânus), anemia, linfadenopatia, convulsões, entre outros.
Rastreio e Diagnóstico: o Ministério da Saúde preconiza a realização de, no mínimo, dois testes sorológicos
não treponêmicos (VDRL) durante a gestação: um na primeira consulta de pré-natal e o segundo em torno de
28 semanas de gestação. Além disso, recomenda o rastreio na admissão em maternidades para parto e
abortamento. É considerado positivo se > ¼, ou seja, de 1/8 em diante. Os testes sorológicos treponêmicos,
tais como o FTA-ABS, são utilizados para a exclusão de resultados falso-positivos, comumente quando há
baixos títulos por reação cruzada; uma vez positivos, tendem a não negativar mesmo após a cura da infecção
(cicatriz sorológica).
Tratamento: A penicilina é efetiva no tratamento da sífilis e na prevenção da sífilis congênita. O regime de
tratamento deve ser de acordo com a sífilis materna, inclusive no que tange aos casos de pacientes HIV-
positivas. Nos casos de alergia à penicilina (1%), o tratamento deve ser mantido após dessensibilização, pois a
penicilina é a única droga que trata o feto. Outra complicação que pode ocorrer em decorrência do tratamento
é a reação de Jarish-Herxheimer (mialgia, cefaléia e piora das lesões cutâneas, por liberação de grande número
de espiroquetas na corrente sanguínea), usualmente nas primeiras 24 horas após instituído o tratamento.
-Sífilis primária: Penicilina G benzatina 1.200.000UI IM em cada nádega, dose única.
-Sífilis secundária: Penicilina G benzatina 1.200.000UI IM em cada nádega, duas doses, intervalo de 1 semana.
-Sífilis terciária, latente tardia (>1ano) ou latente de tempo desconhecido: Penicilina G benzatina 1.200.000UI IM em
cada nádega, 3 doses, intervalo de 1 semana entre cada dose. Neurossíflis: Penicilina cristalina 14 dias IV
Critérios de tratamento inadequado na gestante:
-Todo tratamento feito com qualquer medicamento que não a penicilina;
-Tratamento incompleto, mesmo tendo sido feito com penicilina;
-Tratamento não adequado para a fase clínica da doença;
-Administração do tratamento com menos de 30 dias antes do parto;
-Elevação dos títulos após o tratamento, no seguimento;
-Parceiro(s) não tratado(s) ou tratado(s) inadequadamente ou sem documentação do tratamento.

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TOXOPLASMOSE
Também chamada de doença do gato, é uma doença infecciosa que pode ser congênita ou adquirida. Écausada
pelo Toxoplasma gondii, um protozoário intracelular obrigatório. Os hospedeiros definitivos são os gatos e os
intermediários são os homens, outros mamíferos não-felinos e as aves. O T. gondii tem tropismo por células do
SNC, olhos e músculos. A transmissão se dá por via horizontal (ingestão do oocisto em alimentos ou água
contaminada por fezes do felino ou pela ingestão de cisto tecidual presente em carne crua ou mal passada) ou
por via vertical (transmissão transplacentária dos taquizoítos). No Brasil, a soropositividade para
toxoplasmose em gestantes varia de 40 a 80%; no IMIP, a soropositividade foi de 77,5%. Já a incidência de
toxoplasmose congênita, o Brasil, varia de 0,3-2 a cada 1.000 nascidos vivos.
Ciclo evolutivo: o ciclo é composto por duas fases
-Fase sexuada: No gato, que é o hospedeiro definitivo: inicia quando um gato infecta-se e passa a eliminar oocisto
nas fezes. No meio externo, o oocisto amadurece, passando a ter o esporozoíto, que caracteriza o oocisto infectante.
-Fase Assexuada: Ocorre num hospedeiro suscetível (homem, cão e aves). Este hospedeiro intermediário, ingerindo o
oocisto maduro, ficará infectado. O oocisto libera esporozoítos que invadem os enterócitos, onde multiplicam-se
assexuadamente, liberando taquizoítos (ou trofozoítos), que alcançam o sangue e a linfa.
Transmissão materno-fetal: ocorre quando os trofozoítos que se encontram na circulação materna atingem a
placenta e são transmitidos ao feto; desse modo, a transmissão congênita só deve ocorrer durante a
primoinfecção materna, com exceção das gestantes imunodeprimidas. A taxa de transmissão vertical é
inversamente proporcional à idade gestacional da primoinfecção materna: 13% no 1º trimestre, 29% no
segundo trimestre e 50% no terceiro trimestre. Entretanto, apesar de menos freqüente, a doença fetal é mais
grave quando a mãe é infectada no primeiro trimestre da gestação. Aconselha-se que em mulheres que
desejam engravidar e quem tiveram infecção documentada pelos testes sorológicos, o intervalo entre a
infecção e a concepção seja de 6 meses, período suficiente para que seja conferida imunidade efetiva contra a
transmissão congênita.
Manifestações:
-Forma adquirida: em imunocompetentes tem evolução benigna e, na maioria das vezes, assintomática. São
quadros possíveis no imunocompetente: toxoplasmose febril aguda, linfadenite toxoplásmica e toxoplamose
ocular. No imunocomprometido, a reativação da toxoplasmose pode manifestar-se como neurotoxoplasmose.
-Toxoplasmose na gravidez: a infecção materna é usualmente assintomática, estando os sintomas presentes em
apenas 10% dos casos: linfadenopatia e fadiga, geralmente sem febre. Por isso, tem-se sugerido a realização
de testes sorológicos na gestação, durante o acompanhamento pré-natal, para que seja dado o diagnóstico.
-Forma congênita: pode se manifestar de uma das quatro formas: infecção subclínica, seqüela ou reativação
de uma infecção prévia não diagnosticada, doença sintomática nos primeiros meses de vida e toxoplasmose
neonatal. Aproximadamente 85% das crianças com infecção congênita parecem normais ao nascimento, sendo
então uma minoria as que apresentam graves manifestações ao nascimento e na infância.
-Toxoplasmose neonatal: Resulta da infecção intra-uterina. No 1° trimestre costuma levar ao aborto. Se a
infecção ocorre no 2° trimestre, o bebê pode nascer prematuramente, mostrando sinais de encefalite com
convulsões e calcificações cerebrais. Pode apresentar a tétrade de Sabin: microcefalia com hidrocefalia,
coriorretinite, retardo mental e calcificações intracranianas. Na infecção durante o 3° trimestre, o RN pode
apresentar miocardite, hepatite com icterícia, anemia, plaquetopenia, coriorretinite e ausência de ganho de
peso, ou, mais comumente ser assintomático. A ausência de manifestações ao nascimento, o que ocorre na
maioria, não impede que seqüelas se desenvolvam, tais como coriorretinite, surdez e retardo mental.
Diagnóstico:
-Infecção materna: o teste sorológico
baseia-se na detecção de anticorpos IgM e
IgG. Nos casos de IgM positiva onde há
dúvidas se a infecção é aguda recente ou
tardia, pois o IgM permanece positivo por
até um ano da infecção, pode ser realizado o
teste de avidez de IgG: se baixa avidez →

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infecção aguda (até 4 meses; logo, só solicitar se IG <16 semanas); se baixa avidez → infecção crônica.
-Infecção fetal: diante da confirmação da infecção materna, impõe-se a investigação fetal, através da
realização de reação em cadeia da polimerase (PCR) para T. gondii realizada em líquido amniótico, colhido
por amniocentese. Este procedimento deverá ser realizado a partir de 18 semanas de gestação. A sorologia
fetal por meio da cordocentese está em desuso devido aos riscos inerentes ao procedimento. Recomenda-se
ainda a realização de USG quinzenal ou mensal em fetos de gestantes com suspeita de primoinfecção na
gestação, para avaliação da presença de sinais indiretos da infecção fetal.
-Período neonatal: para a confirmação diagnóstica nos RN com suspeita de toxoplasmose congênita, além das
possíveis manifestações, deve-se dosar anticorpos IgM e/ou IgA em sangue periférico. A dosagem de
anticorpos IgG apresenta dificuldades na interpretação devido a passagem transplacentária destes anticorpos.
Tratamento: o tratamento da gestante com toxoplasmose aguda pode prevenir ou atenuar a doença congênita,
porém não existe consenso acerca do tratamento mais apropriado. Recomenda-se:
-Espiramicina (Rovamicina®): a dose é de 3g/dia (2 comprimidos de 8/8 horas). Deve ser inciada nos casos
suspeitos e mantida até o termo, exceto se doença fetal já instalada, visto que é ineficaz nestes casos.
-Pirimetamina (Daraprim® 25mg 12/12 horas): deve ser utilizada associada à sulfadiazina (Sulfadiazina®
500mg 6/6 horas) e ao ácido folínico (10mg/dia). Está indicada nos casos de doença fetal confirmada logo
após a propedêutica invasiva. O esquema deve ser mantido até o termo, não mais sendo necessário alternar
com a espiramicina. Se o diagnóstico é dado a partir da 30ª semana, já deve ser iniciado esse esquema, pelo
alto risco de transmissão fetal. O uso de pirimetamina está contra-indicado no 1° trimestre por ser teratogênico
Propedêutica: portanto, toda gestante deve ter sorologia na primeira consulta de pré-natal.
IgM- e IgG- → orientação e sorologia trimestral;
IgM- e IgG+ → tranqüilização e seguimento pré-natal;
IgM+ e IgG- → infecção aguda ou falso-positivo. Solicitar IgA ou repetir sorologia com 3 semanas ou iniciar
espiramicina
IgM+ e IgG+ → infecção aguda ou crônica: confirmar infecção aguda com teste de avidez, IgA ou, se
indisponível, iniciar espiramicina e realizar investigação da infecção fetal (PCR do LA por amniocentese);
Infecção fetal confirmada → iniciar pirimetamina + sulfadiazina + ácido folínico.
Profilaxia: primária → programas de promoção de saúde, visando evitar situações que coloquem a gestante
em risco de adquirir a primoinfecção. Secundária → evitar a transmissão vertical em gestantes com infecção
aguda, através do uso da espiramicina. Terciária → evitar ao máximo as seqüelas nos fetos com infecção
confirmada, através do uso da pirimetamina + sulfadiazina.
Rastreamento: o rastreamento universal das gestantes permanece controverso, devido a alguns motivos:
-Diagnósticos falso-positivos, uma vez que 1,3% das mulheres apresentam IgM falso-positiva na gestação;
-A incidência de infecção materna primária é relativamente baixa;
-Mesmo quando o diagnóstico materno é estabelecido, a eficácia do tratamento antenatal é incerta.
No Brasil, a triagem sorológica para toxoplasmose não é recomendada pela FEBRASGO, enquanto o
Ministério da Saúde a recomenda, sempre que possível, através da dosagem de anticorpos IgM para todas as
gestantes que iniciam o pré-natal.

RUBÉOLA
Doença exantemática aguda viral aguda, com alto poder de contágio, que pode acometer qualquer faixa etária,
mas ocorre principalmente em crianças. A transmissão se dá pela via respiratória; nos casos de rubéola
congênita, a transmissão é transplacentária, e ocorre com maior freqüência nos casos de primoinfecção
materna no início da gestação. A pessoa infectada transmite o vírus por aproximadamente 5-7 dias antes e 5-7
dias após o início do exantema.
Manifestações:
-Rubéola adquirida: o quadro clínico caracteriza-se por exantema maculopapular, róseo e puntiforme difuso,
com duração de 3 dias, e de distribuição cefalopodálica e de resolução espontânea. Principalmente em adultos
podem ocorrer, 5-10 dias antes do exantema, pródromos: febre, conjuntivite e linfadenopatia retroauricular,
entre outros. Cerca de 50% dos pacientes apresentam infecção subclínica. O tratamento é sintomático.

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-Síndrome da Rubéola Congênita (SRC): apesar de a grande maioria dos RN ser assintomática, a SRC é grave
e acomete 40-60% dos RN cuja a primoinfecção materna foi nos 2 primeiros meses de gestação, 30-35% dos
RN no terceiro mês de gestação e 10% no quarto mês, sendo rara quando a primoinfecção ocorre após a 20ª
semana de gravidez. As manifestações classificam-se em precoces (do nascimento até o 1° ano de vida) ou
tardias (do 2° ano à idade escolar)
-Manifestações precoces: são subdivididas em transitórias (baixo peso ao nascimento, púrpura trombocitopênica,
hepatite, anemia hemolítica, lesões ósseas) e permanentes (prematuridade, morte intrauterina; ocular- catarata,
glaucoma, retinopatia; SNC- microcefalia, encefalite; cardiopatias- persistência do canal arterial, comunicação
intraventricular; auditivos- surdez neurossensorial e central).
-Manifestações tardias: destaca-se a surdez, que pode ser perceptível apenas quando a criança apresentar dificuldade
de aprendizagem, endocrinopatias (diabetes, tireóide, deficiência de GH), oculares (glaucoma, catarata) e vasculares.
Diagnóstico: o diagnóstico materno é feito pela dosagem de anticorpos IgM no sangue, dosados logo após a
suspeita de contágio e 10-14 dias depois do início do exantema. Anticorpos IgG, embora possam estar
presentes na fase aguda, caracterizam infecção antiga. Se o diagnóstico na gestante é realizado, deve-se, então,
pesquisar a doença no feto através de PCR ou cultura viral no LA, obtido por amniocentese (deve ser realizada
30 dias após infecção materna e somente após a 14ª semana de gestação). USG e ecocardiograma fetal devem
fazer parte da rotina diagnóstica e acompanhamento pré-natal para investigação de alterações graves no feto.
Tratamento e profilaxia: o tratamento em ambas as formas é apenas sintomático. A vacina tríplice viral
(SCR/MMR) é a única forma de prevenção. Além da dose preconizada aos 12 meses de idade, ela está
disponível para mulheres na idade fértil, devendo-se evitar a vacinação em mulheres grávidas, embora existam
controvérsias do risco de SRC após vacinação em gestante (não existem casos de SCR pós-vacina relatado).

CITOMEGALOVÍRUS
A infecção pelo citomegalovírus (CMV, herpes vírus tipo 5) é uma das infecções congênitas mais comuns em
todo o mundo. 1% dos RN são infectados na vida intrauterina; do restante, 10% são infectados no primeiro
ano de vida e 33% até os 10 anos de idade. Sua transmissão se dá por fluidos corporais (leite materno, saliva,
secreções cervicovaginais, urina, fezes), pela via parenteral/tecidos transplantados e pela via transplacentária.
Manifestações: a grande maioria das infecções (90%), seja ela primoinfecção, reativação ou reinfecção, é
assintomática. Entretanto, a primoinfecção em pacientes imunossuprimidos e na infecção intrauterina antes da
16ª semana de gestação surge uma forma exuberante da doença. Depois do período neonatal, a mononucleose
por CMV é a manifestação mais freqüente da doença em indivíduos sadios.
-Infecção congênita: a doença ocorre em 5% dos fetos infectados. A forma grave decorre da transmissão
vertical no primeiro trimestre, e caracteriza-se por petéquias, icterícia e hepatoesplenomegalia, além de
microcefalia, com ou sem calcificações cerebrais, CIUR, prematuridade e outras alterações do SNC. Óbito
fetal pode ocorrer. Parte dos pacientes que sobrevivem desenvolvem seqüelas neurológicas, inclusive os
assintomáticos ao nascimento.
-Infecção perinatal: o contágio pode ocorrer no momento do parto ou no contato pós-natal com leite
infectado. A maioria dos RN permanece assintomática. Se há manifestações, assemelha-se à mononucleose.
Diagnóstico:
-Infecção materna: anticorpos IgM e IgG devem ser dosados. Entretanto, anticorpos IgM podem persistir por
anos na circulação, assim como podem ser produzidos durante reinfecção ou reativação, situações que não
caracterizam a primoinfecção materna. Portanto, nos casos de IgM (+), deve-se solicitar o teste de avidez de
IgG, que segue a mesma lógica do rastreio para toxoplasmose: baixa avidez → infecção recente; alta avidez
→ infecção passada.
-Infecção fetal: a realização de amniocentese para detectar, por PCR ou cultura viral, constitui-se no padrão-
ouro. Deve ser realizada, no mínimo, sete semanas após a infecção materna, para reduzir os casos de falso-
negativo. O diagnóstico pós-natal é sorológico e através da busca de complicações(exame físico, USG).
Diagnóstico diferencial: enquanto no CMV observa-se calcificações intracerebrais periventriculares, na
rubéola há cardiopatia congênita. Ambas apresentam lesões auditivas, microcefalia e retardo mental.
Tratamento: a globulina hiperimune para CMV em gestantes com primoinfecção é controversa.

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HERPES VIRUS SIMPLEX
Os vírus HSV-1 e HSV-2 produzem infecções que afetam as superfícies cutâneo-mucosas, principalmente a
extravaginal e perigenital, respectivamente. Os seres humanos são o único reservatório. Ambos os vírus
apresentam alta infectividade e baixa patogenicidade. É uma infecção cosmopolita, com até 90% dos adultos
apresentando evidência sorológica de contato com o HSV-1. O contágio pelo HSV-1 ocorre por contato direto
com as lesões ou secreções, enquanto que o HSV-2 tem transmissão sexual e vertical
Herpes neonatal: se dá por infecção ascendente após ruptura das membranas ou por contato com secreções
infectadas e/ou lesões ativas no canal de parto. A disseminação transplacentária é rara. O HSV-2 é o agente
mais frequentemente envolvido. Manifesta-se desde quadro leve, restrito à pele, olhos e boca, até um quadro
de infecção disseminada, com dificuldade respiratória, hepatite, choque e possível comprometimento do SNC.
Se não tratado, tem taxa de mortalidade de 65% na doença disseminada.
Diagnóstico: as lesões vesiculares de base eritematosa são características, fechando o diagnóstico materno.
Quando necessário, o isolamento do vírus em cultura de tecido ou a demonstração de antígenos do HSV ou
DNA em raspados da lesão são o padrão-ouro. No RN, o quadro clínico descrito é característico; testes
sorológicos podem ser realizados em casos de dúvida diagnóstica. Vale salientar que a pesquisa de infecção
intrautero não se faz necessária, visto que a transmissão transplacentária é rara e a contaminação geralmente
ocorre próximo ou durante o parto.
Tratamento: a presença de lesões ativas do herpes em região genital contraindicam o parto vaginal. Nos casos
de infecção neonatal, deve ser utilizado o aciclovir EV, 60mg/kg/dia, divididos em 3 doses.

VARICELA
Doença causada pelo vírus da varicela-zoster (herpes tipo 6), configurando a primoinfecção por esse vírus.
Nos casos de reativação, denomina-se herpes zoster. É uma doença endêmica, que atinge até 90% dos
contactantes suscetíveis. Mais de 90% dos casos ocorrem em menores que 15 anos e adultos jovens. A
transmissão se dá por gotículas respiratórias e pelo contato com as lesões cutâneas.
Manifestações: em crianças, adultos e gestantes, a primoinfecção inicia-se por pródromos (febre baixa,
anorexia), seguido de rash macular com progressão cefalopodálica, caracterizado pela rápida progressão de
mácula para pápula, desta para vesícula e desta para a crosta. O exantema é pruriginoso. Entretanto, na
gestação a varicela é mais grave, pois pode ocorrer envolvimento fetal: se infecção materna entre a 8ª-20ª
semana de gestação, pode resultar em embriopatia (microcefalia, microoftalmia e hipoplasia de membros); se
infecção materna entre 5 dias antes e 2 dias pós-parto resulta em varicela grave no neonato, por contágio sem
passagem de imunoglobulina.
Diagnóstico: o diagnóstico é clínico, baseado na apresentação típica do doença. Quando necessário, faz-se o
isolamento do vírus em cultura.
Tratamento: em gestantes no terceiro trimestre, é indicado o uso de aciclovir oral ou EV por 7 dias.
Tratamento sintomático (antitérmicos e analgésicos) e medidas para evitar infecção associada (compressas de
permanganato de potássio e antibióticos) podem ser realizados.
Profilaxia: indica-se a Ig Hiperimune Antivaricela-zoster em RN cujas mães tenham tido varicela 5 dias antes
até 2 dias pós-parto e em gestantes/imunocomprometidos sem história prévia de varicela que tenham
contactantes com a doença.

HEPATITES
As hepatites virais são causadas por vários agentes etiológicos com características epidemiológicas, quadro
clínico e exames laboratoriais semelhantes, mas cada uma delas guarda particularidades importantes. A
distribuição é universal.
Quadro clínico: O quadro clínico das hepatites apresenta muitas semelhanças, podendo, a sua grande maioria,
se mostrar assintomática ou apresentar-se de forma subclínica com sinais e sintomas inespecíficos e de curta
duração. As hepatites B e C são passíveis de cronificação, com quadros clínicos graves, apresentando cirrose e
câncer hepático ao longo dos anos. Apesar dos diferentes tempos de incubação, surgem pródromos (febre,
náusea, vômito, cefaléia, astenia), seguidos, em uma a duas semanas de icterícia, colúria e acolia fetal.

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-Hepatite A: a transmissão é fecal/oral por contato inter-humano e/ou com água e alimentos contaminados. A
doença é autolimitada e tem caráter benigno. Nas grávidas, a hepatite A não tem seu curso alterado e o
prognóstico permanece sem alterações, assim como o prognóstico da gravidez. Não está associada a taxas
significativas de transmissão vertical e perinatal.
Anti-HAV total Anti-HAV IgM Intepretação

+ + Infecção aguda

+ - Infecção passada ou vacina


- - Ausência de contato

-Hepatite B: a transmissão é por via parenteral, vertical e sexual, considerada uma DST. Caso a infecção
ocorra por transmissão vertical, o risco de cronificação dos RN é de cerca de 70 a 90% quando a gestante
apresenta infecção aguda, bem superior ao dos adultos infectados, que gira em torno de 5-10%. Portanto, o
rastreio no pré-natal através do HBsAg se faz imperativo para que medidas sejam tomadas para limitar a
infecção do concepto e do recém-nascido. A via de parto das gestantes infectadas é uma decisão obstétrica,
não sendo a cesariana uma opção para diminuição da transmissão neonatal. A amamentação não é
contraindicada e deve ser estimulada. Ao nascimento, o RN de mãe portadora de hepatite B crônica, com
HbeAg positivo, deve receber, nas primeiras 12 horas de vida, a imunoglobulina humana anti-hepatite B e a
vacina contra hepatite B.
Rastreio na gestante: o Ministério da Saúde recomenda que na rotina básica dos exames do pré-natal seja
solicitado, ao menos, o HBsAg próximo à 30ª semana para avaliar a necessidade de imunoglobulina para o
concepto ao nascimento. Se: Negativo → parar o acompanhamento. Positivo → solicitar HbeAg e Anti-HBe.
Quando o anti-HBs é solicitado, se for negativo, assim como o HbsAg, está indicada a vacinação materna.
Marcadores sorológicos:
HBsAg- 1º marcador presente, porém não diz se a infecção é aguda ou crônica;
HBeAg- presente na fase de replicação viral, sendo o paciente altamente infeccioso;
Anti-HBc IgM- infecção recente (presente até 32 semanas pós-infecção);
Anti-HBC IgG- indica contato prévio com o vírus;
Anti-HBe- indica o fim da fase replicativa;
Anti-HBs- confere imunidade ao HBV, presente após o desaparecimento do HBsAg, indicando cura e/ou imunidade
por vacina.
-Hepatite C: a transmissão se dá principalmente por via parenteral, sendo impossível identificar a via de
transmissão em grande parte dos infectados. Pessoas que receberam hemotransfusão antes do ano de 1993 são
pessoas incluídas no grupo de risco para serem portadoras desse vírus. A transmissão sexual é pouco freqüente
e a transmissão vertical é rara quando comparado à hepatite B. 70-90% das pessoas infectadas pelo HCV irão
desenvolver a forma crônica da doença, podendo cursar com cirrose e hepatocarcinoma, em um período de 20
anos. Nas pacientes gestantes e portadoras do HCV, o curso da doença não é alterado pela gestação, e vice-
versa. Não existem evidências ligando o HCV a malformações fetais. Não existe um tratamento específico
para a hepatite C, como também não há medidas profiláticas para evitar a transmissão vertical. A via de parto é
de decisão obstétrica e a amamentação deve ser estimulada.
Tratamento: o tratamento baseia-se em repouso relativo, boa alimentação, hidratação e sintomáticos para os
sintomas de fase aguda. Nenhuma das hepatites virais representa contraindicação ao aleitamento materno e
nenhuma é indicação de cesariana.

Fonte de Pesquisa:
Gestação de Alto Risco Baseada em Evidências – IMIP.
Manual de Controles das DST – Ministério da Saúde, 2006.
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 1.

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ABORTAMENTO
Abortamento é a interrupção da gestação com feto pesando menos que 500g ou com idade gestacional inferior
a 20-22 semanas. O termo aborto refere-se ao produto eliminado durante o abortamento. Pode ser subclínico
(ocorre antes da próxima falha menstrual) ou clínico (ocorre após gravidez já diagnosticada). O abortamento
clínico incide em 15-20% das gestações, mas cerca de 25% das gravidezes evoluem com abortamento. Destas,
80% são interrompidas até a 12ª semana de gestação.
Classificação:
-Abortamento precoce: interrupção da gestação até a 12ª semana de idade gestacional;
-Abortamento tardio: interrupção da gestação após a 12ª semana de idade gestacional;
-Abortamento habitual: ocorrência de três ou mais episódios consecutivos de abortamento.
Etiologia:
-Anormalidades cromossômicas: são a causa mais comum, respondendo por 50-80% dos abortamentos, clínico
ou subclínico. As aneuploidias são a causa mais freqüente, sendo as trissomias (16, 22, 21...) os tipos de
aneuploidias mais encontrados. Decorrem da fertilização por gametas anormais, de fertilização anômala ou de
irregularidade na divisão embrionária. Mais comuns em mulheres em idade materna avançada.
-Desordens anatômicas: incompetência istmocervical, miomas (especialmente o submucoso), malformações
uterinas (útero unicorno, bicorno, didelfo ou septado), sinéquias uterinas (síndrome de Asherman) e distopias
uterinas.
-Doenças endócrinas: insuficiência lútea, hipotireoidismo, diabete melito insulino-dependente (especialmente
se ausente o controle glicêmico periconcepcional) e síndrome anovulatória crônica (abortamento em 20-40%).
Insuficiência lútea: definida pela produção insuficiente de progesterona pelo corpo lúteo, principal responsável pela
produção nas primeiras 6-7 semanas de gestação. O tratamento se baseia na suplementação exógena de progesterona.
-Distúrbios imunológicos: o principal distúrbio é a síndrome do anticorpo antifosfolipídio (SAAF), uma causa
autoimune de abortamento de repetição, presente em 15-20% das mulheres com abortamento habitual. Os
episódios de abortamento habitual ocorrem, com maior freqüência, durante o segundo trimestre.
-Infecções: as principais infecções que podem levar ao abortamento são: rubéola (quando adquirida próxima à
implantação ovular), parvovírus, citomegalovírus, listeria, herpes simples, hepatite B, HIV, ITU, infecções
ascendentes (vaginoses, clamídia e gonorréia), sífilis, toxoplasmose, malária, entre outras.
Fatores de risco: os principais fatores de risco para a ocorrência de abortamento são os seguintes:
-Idade materna avançada; -Uso de álcool ou cocaína; -Uso de gás anestésico;
-Uso excessivo de cafeína; -Tabagismo materno e/ou paterno; -Uso de DIU;
-Nova gestação nos primeiros 3 meses de puerpério; -Abortamento espontâneo prévio;
-Múltiplos abortamentos prévios provocados; -Radiação em altas doses;
-Medicações: misoprostol (Cytotec®), retinóides, metotrexato, AINEs (exceto acetaminofen).
Apresentação clínica e conduta: (as manifestações estão descrias na tabela a diante)
-Ameaça de abortamento: ocorre em 15-20% de todas as gestações. A probabilidade de evoluir para
abortamento espontâneo é de 50%, sendo de apenas 10% após visualização da atividade cardíaca fetal à USG.
-Diagnóstico: o exame ginecológico visa afastar causas de sangramento vaginal, tais como lesões, infecções
ou pólipos vaginais, especialmente após o coito. Os valores de beta-hCG quantitativo estão dentro da
normalidade (ao se visualizar o saco gestacional intrauterino, os valores são > 1.000mUI/ml); também é útil a
sua dosagem seriada, visto que, em uma gravidez normal, o valor sérico duplica a cada 3 dias. À USG não há
alterações significativas: o saco gestacional encontra-se íntegro e, caso já seja possível visualizar o embrião,
os batimentos cardiofetais estarão presentes.
Diagnóstico diferencial: a gravidez ectópica tem quadro clínico muito semelhante. Quando não se vê imagem de
gestação intrauterina à USG, deve-se recorrer a dosagem de beta-hCG e USG seriado para definir o diagnóstico.
-Conduta: deve-se indicar repouso relativo, abstinência sexual, prescrever antiespasmódicos (se necessário) e
dar apoio psicológico. A administração exógena de progesterona e o uso de imunoglobulina são controversos

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-Abortamento inevitável: caracteriza-se pela presença de um ovo íntegro, porém inviável. Quase sempre é
precedido por ameaça de abortamento.
-Diagnóstico: ao exame, o colo uterino está aberto e a bolsa amniótica pode estar herniada pelo canal cervical.
Sangramento genital e cólicas em baixo ventre podem estar presentes. O valor do beta-hCG é positivo, porém
diminuído e decrescente. À USG, normalmente observam-se sinais de descolamento decidual (hematoma
retrocorial), saco gestacional irregular e ausência de batimentos cardiofetais.
-Conduta: a paciente deve ser internada e receber hidratação venosa. 70% dos casos até a 8ª semana de
gestação apresentam resolução espontânea em até 72 horas. Naqueles que não se resolvem espontaneamente,
deve-se instituir o esvaziamento uterino. Caso haja manipulação da cavidade uterina (abortamento
provocado), administra-se antibioticoterapia profilática. Em pacientes Rh negativas, está indicada a
administração de imunoglobulina anti-Rh para prevenção de aloimunização materna.
-Abortamento completo: expulsão total e espontânea do feto e anexos. Clinicamente, caracteriza-se pela
parada ou diminuição do sangramento e das cólicas, sendo mais freqüente antes da 8ª semana de gestação.
-Diagnóstico: o útero encontra-se contraído e pequeno para a idade gestacional e o colo está fechado na
maioria das vezes. À USG, podem-se observar imagens compatíveis com coágulos. O diagnóstico diferencial
com gravidez ectópica também é fundamental nestes casos.
-Conduta: se restringe ao encaminhamento da paciente para acompanhamento ambulatorial e, nas gestantes
Rh negativas, procede-se a administração da imunoglobulina anti-Rh.
-Abortamento incompleto: o quadro clínico depende de como esteja o colo. Colo aberto → percebe-se a
presença de material ovular ao exame ginecológico, com sangramento e cólicas moderados; também chamado
por alguns autores de abortamento em curso. Colo fechado → ocorre a eliminação quase total dos produtos
ovulares, as cólicas e o sangramento regridem, e o diagnóstico é feito exclusivamente pelo encontro, à USG,
de restos ovulares intrautero.
-Diagnóstico: o útero, em ambos os casos, encontra-se menor que o esperado para a idade gestacional. A
dosagem de beta-hCG é normalmente negativa. À USG visualiza-se eco endometrial amorfo e mal definido.
-Conduta: consiste no esvaziamento uterino.
-Abortamento infectado/séptico: complicação do abortamento incompleto, geralmente associado à
manipulação da cavidade uterina em tentativas de provocar o abortamento. Inicia-se por endometrite, podendo
progredir para peritonite, choque séptico, insuficiência renal, CIVD e morte materna. Comumente a infecção é
polimicrobiana, por ascensão de germes que colonizam o trato genital inferior, como anaeróbios e Gram (-).
-Manifestações: quando a infecção é limitada até o miométrio, a paciente está em bom estado geral, com febre
baixa e dores discretas; o sangramento é escasso e não há sinais de abdome agudo. Se a infecção atinge
paramétrio, anexos ou peritônio, há febre alta, taquicardia, dor constante, defesa abdominal e saída de
sangramento de odor fétido (devido a presença de anaeróbios). O útero encontra-se amolecido, com redução
da mobilidade, e colo entreaberto. Nos casos de infecção generalizada, geralmente por bactéria Gram (-), há
peritonite e choque séptico, com febre elevada, hipotensão, taquisfigmia e coagulopatia, podendo culminar
com falência cardiorrespiratória.
-Diagnóstico: além do quadro clínico, à USG observam-se imagens de restos ovulares e/ou coleções
purulentas no fundo de saco de Douglas.
-Conduta: deve haver internação hospitalar, com vigilância dos sinais vitais, isolamento do agente por
hemoculturas e culturas do material cervical e avaliação do comprometimento hemodinâmico e da extensão do
processo infeccioso. Reposição volêmica, profilaxia antitetânica, imunoglobulina anti-RH, ocitocina e
antibioticoterapia são mandatórias.
Ministério da Saúde: recomenda como esquema preferencial de tratamento a associação de clindamicina (600-900mg
6/6 ou 8/8hrs) + gentamicina (1,5mg/kg/dose 8/8hrs). A dose pode ser ajustada para administração uma vez ao dia:
clindamicina 2.700mg e gentamicina 5,0mg/kg EV ao dia.
Após a instituição da antibioticoterapia, deve-se proceder o esvaziamento uterino, sempre com a
administração de ocitocina antes e após o procedimento, para diminuir o risco de perfuração uterina. Em casos
graves de peritonite e sepse, se não houver melhor após 48 horas de iniciado o antibiótico e realizado o
esvaziamento uterino, pode ser necessária a histerectomia, além de lavagem exaustiva da cavidade peritoneal.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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-Abortamento retido: caracteriza a interrupção da gravidez com retenção de ovo morto por período
prolongado, alguns autores definindo este período como > 4 semanas. Caracteriza-se por regressão dos
sintomas gravídicos, exceto pela amenorréia persistente. O volume uterino se estabiliza ou involui.
-Diagnóstico: à USG há irregularidade do saco gestacional, alterações da vesícula vitelínica e ausência de
atividade cardíaca fetal. O exame deve ser repetido em 15 dias para confirmação diagnóstica.
-Conduta: a ausência de batimentos cardiofetais à USG em um embrião com comprimento cabeça-nádega
maior ou igual a 5mm indica interrupção da gestação.
-Ovo anembrionado: consiste na ausência de embrião no saco gestacional íntegro em gestação com mais de 6
semanas, idade gestacional que já se espera visualizá-lo.
-Conduta: cerca de 50% dos casos com menos que 12 semanas resolvem-se espontaneamente em até 15 dias.
Quando a eliminação não ocorre espontaneamente, pode optar-se pela conduta medicamentosa (misoprostol
vaginal) ou pelo esvaziamento cirúrgico da cavidade uterina. Imunoglobulina anti-Rh deve ser administrada.
-Abortamento habitual ou recorrente: consiste na ocorrência de três ou mais episódios consecutivos de
abortamento espontâneo. Pode ser primário (todas as gestações culminaram em abortamento) ou secundário
(gestações a termo precedem os abortamentos). O risco de novo abortamento é de 46% no primário e de 30%
no secundário. Dentre as causas, destacam-se: doenças cromossomiais, anormalidades anatômicas do útero,
incompetência istmocervical, doenças da tireóide, diabetes mellitus, insuficiência do corpo lúteo, síndrome do
anticorpo antifosfolipídio, baixo reserva ovariana, síndrome anovulatória crônica e hiperprolactinemia.

Métodos para esvaziamento uterino


-Clínicos:
-Ocitocina: perfusão venosa até expulsão fetal, seguida de posterior esvaziamento uterino cirúrgico. Pode ser
realizada de forma paralela ao procedimento cirúrgico para diminuir o risco de perfuração e hemorragia.
-Misoprostol: uma dose de 200mcg a cada 4 horas (ou 400mcg 12/12h ou 800mcg 24/24h) pode ser utilizado
para que ocorra expulsão fetal em quadros que se desenvolvem a partir de 12 semanas de gestação. Vem sendo
considerado o tratamento de escolha, pelos menores riscos quando comparado ao tratamento cirúrgico.
-Cirúrgicos:
-Aspiração Manual Intrauterina (AMIU): procedimento ambulatorial, sem necessidade de anestesia geral ou
internação. É o procedimento de eleição em gestações inferiores a 12 semanas. É menos traumático que a
curetagem, diminuindo o risco de sinéquias e de perfuração uterina.
-Aspiração à vácuo: semelhante à AMIU, porém utiliza de sistema à vácuo para aspiração.
-Curetagem uterina: reservada para gestações superiores a 12 semanas ou naquelas em que a AMIU não possa
ser realizada ou na presença de grande quantidade de material para aspiração. Tem maior risco de perfuração
uterina: na suspeita de sua ocorrência, deve-se parar o procedimento, fazer infusão venosa de ocitocina e
manter conduta expectante; a laparotomia só está indicada em casos de irritação peritoneal (abdome agudo).
-Microcesariana: fica reservada para os raros casos onde o esvaziamento não se deu por via vaginal ou na
presença de hemorragia volumosa. Consiste no esvaziamento uterino por via alta.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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INCOMPETÊNCIA ISTMOCERVICAL
É a falência do sistema oclusivo uterino, de tal forma que o colo não se mantém fechado, impossibilitando a
manutenção da gestação até o termo. A interrupção da gravidez ocorre ou por dilatação istmocervical
estimulando a contratilidade uterina ou por contaminação das membranas, devido contato direto do ovo com a
cavidade vaginal, causando amniorrexe e infecção amniótica.
Manifestações: caracteriza-se por expulsão fetal, a cada gestação, em idade gestacional mais precoce, o que
leva desde a ocorrência de partos prematuros até abortamentos de repetição. O trabalho de parto geralmente é
curto e indolor e o feto, quando nasce vivo, é morfologicamente normal.
Diagnóstico e tratamento: constata-se dilatação anômala, com bolsa-das-águas podendo chegar à vagina. À
USG-TV, há encurtamento e dilatação do colo. O método mais empregado para tratamento é a circlagem
eletiva profilática, entre 12 a 16 semanas ou, excepcionalmente, em casos de emergência, entre 16 e 24
semanas de gestação, pela técnica de MacDonald. Deve ser evitada em IG precoce pelo risco de abortamento e
em IG posterior pelo risco de amniorrexe iatrogênica. Recomenda-se a retirada dos pontos na 37ª semana ou
na ocorrência de: RPMO, óbito fetal ou sinais de infecção ovular. Contraindicam a circlagem: dilatação >4cm,
malformação fetal grave, RPMO, IG > 24s, atividade uterina e infecção genital e atividade uterina.
SÍNDROME DO ANTICORPO ANTIFOSFOLIPÍDIO (SAAF)
Se caracteriza pela presença, no plasma materno, de três anticorpos que conferem um maior risco de trombose,
inclusive dos vasos placentários: anticoagulante lúpico, anticardiolipina e beta2-GPI. Além de abortamentos
espontâneos de repetição, manifesta-se por tromboses venosas (2/3 dos casos) e arteriais (1/3), além de
manifestações neuropsiquiátricas. VDRL falso-positivo, trombocitopenia e prolongamento do TTPA são
outros achados laboratoriais que podem estar presentes.
Diagnóstico: o diagnóstico se baseia no achado de, ao menos, um critério clínico e um critério laboratorial.
-Critérios clínicos:
(1) um ou mais episódios de trombose arterial ou venosa em qualquer tecido ou órgão;
(2) uma ou mais mortes fetais, morfologicamente normais, de causa indeterminada, a partir da 10ª semana de gestação
(3) um ou mais partos prematuros de fetos morfologicamente normais, com 34 semanas ou menos;
(4) três ou mais abortamentos espontâneos consecutivos com menos de 10 semanas de gestação.
-Critérios laboratoriais:
(1) anticorpo anticardiolipina (IgM ou IgG) presente em duas coletas com intervalo de, ao menos, 6 semanas;
(2) anticorpo anticoagulante lúpico presente em duas coletas com intervalo de, no mínimo, 6 semanas;
(3) presença de anticorpos beta2-GPI
Tratamento: diante das complicações materno-fetais, as gestantes que preenchem os critérios diagnósticos de
SAAF devem receber tratamento profilático com AAS 100mg/dia (AAS infantil) e heparina. Nas pacientes
com história anterior de trombose venosa, a profilaxia com heparina é realizada com 5.000-10.000UI/dia ou
com uma heparina de baixo peso molecular, como enoxaparina, na dose de 40mg/dia. Essa associação leva a
desfecho favorável em 70% das gravidezes.

LEGISLAÇÃO – INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ


Para a realização da interrupção voluntária da gravidez deve-se ter sempre o consentimento da mulher, salvo
nos casos de risco iminente de vida. Pacientes maiores que 18 anos podem decidir sozinhas, entre 16-18 anos
devem ser assistidas pelos pais e as menores que 16 anos devem ser representadas pelos mesmos.
O abortamento voluntário só está permitido no Brasil nas seguintes situações:
-Presença de doenças graves nas quais a gestação traz risco de vida à paciente, comprovada por laudo de 2 médicos;
-Gravidez decorrente de violência sexual. A violentada basta dirigir-se à uma unidade de saúde e informar a
violência, não necessitando de boletim de ocorrência policial. O médico pode se recusar a realizar o procedimento
por questões morais, desde que referencie a paciente a profissional ou unidade que o realize.
-Malformações fetais graves incompatíveis com a vida, mediante autorização judicial
A interrupção voluntária da gravidez utiliza-se das mesmas técnicas realizadas para os casos de abortamento
espontâneo, salientando-se que pode ser realizada até a 20ª semana de gestação.
Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 3.

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PRENHEZ ECTÓPICA
É a implantação do blastocisto em qualquer local que não seja a superfície endometrial da cavidade uterina.
Pode ocorrer nas trompas, ovários, peritônio, cérvice, ligamento largo e, extremamente raros, fígado, baço,
diafragma e espaço retroperitoneal. Ocorre em torno de 1 a 2% de todas as gestações, principalmente nas
gestantes maiores que 30 anos e que já conceberam anteriormente (80-90% dos casos). Nos Estados Unidos,
representa a principal causa de morte materna no 1º trimestre de gestação.
Patogênese: sua patogênese está relacionada ao trânsito lentificado ou obstruído do ovo para o útero ou ainda
da antecipação da capacidade de implantação, que geralmente ocorre entre o 7º e 8º dia após a fecundação.
Fatores de risco: estima-se que em 50% dos casos, nenhum fator de risco é identificado.
-Alto risco: -Cirurgia prévia sobre a trompa -Exposição intraútero ao dietilestilbestrol(aumenta o risco em 9 vezes)
-Salpingites -Gestação ectópica prévia (risco de 9-15%)
-Endometriose -Alterações anatômicas da trompa (ex. divertículo, tumor)
-Uso de DIU (de cobre ou hormonal): a gravidez não é freqüente, mas quando ocorre, 1 em 30 será
ectópica. Portanto, o risco relativo de gravidez ectópica é maior, mais o risco absoluto não.
-Moderado risco: -Infecção pélvica prévia -Infertilidade tratada com indutores da ovulação
-Endometriose pélvica -Múltiplos parceiros sexuais
-Baixo risco: -Tabagismo -Cirurgias abdominais prévias (ex. apendicite)
-Fertilização in-vitro -Início de atividade sexual com menos de 18 anos de idade

PRENHEZ TUBÁRIA
É responsável por 95-98% dos casos de prenhez ectópica, sendo mais freqüente em região ampular, seguida de
região ístmica, ambos representando até 99% dos casos de prenhez tubária.
Fisiopatologia: nos casos de prenhez tubária, ocorre desenvolvimento embrionário inicial, com produção
hormonal semelhante a uma gravidez tópica e, portanto, com todos os seus sinais e sintomas. Os sintomas
inciais da gravidez tubária são inespecíficos, podendo o diagnóstico não ser dado neste momento. Com sua
evolução, pode se manifestar por rotura tubária, um quadro de abdome agudo.
Manifestações: os sintomas clássicos da gravidez ectópica são: dor abdominal, amenorréia e sangramento
vaginal. Essa tríade está presente em 50-60% dos casos e, no restante, ao menos um deles se manifesta. Esses
sintomas podem ocorrer nos casos de rotura tubária ou mesmo na sua ausência.
-Rotura tubária: ocorre em 30% dos casos, principalmente quando a gravidez se localiza na porção ístmica da
trompa. Geralmente a rotura é espontânea, mas o trauma associado ao coito ou ao exame bimanual pode ser o
responsável. A rotura se associa a abundante hemorragia intraperitonial, dor aguda e intensa na fossa ilíaca ou
hipogástrio e choque. Entretanto, sinal de irritação peritoneal (Sinal de Blumberg) pode ou não estar presente.
Dor no ombro (Sinal de Laffon), quando ocorre, se dá por irritação do nervo frênico. Equimose periumbilical
(Sinal de Cullen) pode surgir e, em 20% dos casos, uma massa abdominal é palpável no local da ruptura. O
sangramento genital se deve à interrupção de suporte hormonal ao endométrio após a rotura da tuba e se
caracteriza por ser escasso e escurecido, intermitente ou contínuo. O acúmulo de sangue no fundo de saco
pode gerar dor e abaulamento (Sinal de Proust) ao exame ginecológico. Sinais de descompensação
hemodinâmica podem surgir, sendo geralmente mais graves do que o sangramento exteriorizado.
-Quadro subagudo: representa 70% dos casos, geralmente por gravidez na porção ampular. Não ocorre ruptura
tubária, havendo separação parcial do trofoblasto e da placenta por distensão da trompa, o que ocasiona perda
sanguínea para a cavidade abdominal. Sinais de hemorragia intraperitonial estão presentes, porém em quadro
bem menos intenso que o da ruptura.
Diagnóstico: o diagnóstico deve ser considerado em toda mulher no menacme que apresente dor pélvica
aguda com atraso ou irregularidade menstrual. Os quadros de rotura tubária manifestam-se como abdome
agudo e geralmente o diagnóstico não apresenta dificuldade. Já os quadros subagudos necessitam de maior
investigação e diagnóstico diferencial com outras patologias. Nesses pacientes, como a história de atraso
menstrual está ausente em até 1/3 dos casos e, muitas vezes, o sangramento vaginal é associado ao período

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menstrual, os exames complementares assumem importância fundamental para confirmação diagnóstica.
-Dosagem quantitativa de beta-hCG: a gonadotrofina coriônica humana é um hormônio produzido pelo
sinciciotrofoblasto que previne a involução do corpo lúteo, mantendo-o produtor de progesterona até a 6-7ª
semana de gestação. Sua produção cresce exponencialmente após o início da gestação, aumentando 66% a
cada 48 horas e duplicando a cada 3 dias, tornando-o marcador preciso da atividade trofoblástica. Um beta-
hCG negativo afasta prenhez, inclusive ectópica; níveis acima de 1.000UI/L asseguram a presença de gestação
em 95% dos casos. A zona discriminatória do beta-hCG consiste no seu valor quantitativo a partir do qual a
não visualização do saco gestacional intrauterino sugere fortemente o diagnóstico de gravidez ectópica: 1.500
mUI/ml e 6.500 mUI/ml para ultrassonografia transvaginal e abdominal, respectivamente. Com níveis de beta-
hCG inferiores a 1.000, o diagnóstico de prenhez ectópica só poderá ser estabelecido se houver visualização
da vesícula vitelínica, pólo fetal ou atividade cardíaca na massa, uma vez que o corpo lúteo pode ser
confundido com massa anexial.
-Dosagem seriada de beta-hCG: é útil quando não há imagem característica à USG, para diferenciação de um
quadro de abortamento. A diminuição progressiva do valor indica abortamento. A elevação, mesmo que lenta,
do valor faz necessária a realização de um novo exame USG em alguns dias.
-USG-TV: deve visualizar imagem intrauterina de gravidez quando o beta-hCG é superior a 1.500; caso isso
não ocorra, suspeita-se de prenhez ectópica. O diagnóstico é reforçado na presença de: anel tubário →
presente em até 70% dos casos e consiste em um anel apresentando centro anecóico e periferia com eco
aumentado; sinal do halo → consiste em halo anecóico ao redor do anel tubário, representando edema da
serosa da tuba uterina.
Relembrando: à USG-TV, o saco gestacional pode ser visualizado com 4 semanas de gestação, a vesícula vitelínica
com 5 semanas e o embrião e o BCF com 6 a 7 semanas. Como regra geral, as mesmas estruturas podem ser
visualizadas à USG abdominal com uma semana de atraso.
-Doppler: alguns achados predizem o diagnóstico de prenhez tubária: aumento do fluxo à artéria tubária
(causado pela implantação do trofoblasto na trompa), fluxo trofoblástico periférico ao saco gestacional, fluxo
de baixa resistência na artéria tubária do lado afetado e neoformação vascular em possível tumoração anexial.
-Culdocentese: é a punção do fundo de saco posterior. Útil quando não se dispõe da USG, pois evidencia
sangramento escuro que não coagula, atestando o hemoperitônio. Não diferencia entre prenhez ectópica rota,
cisto hemático e abortamento tubário. A punção negativa, porém, não afasta o diagnóstico de rotura tubária.
-Dosagem de progesterona: útil quando os níveis de beta-hCG são inconclusivos e à USG não visualiza-se o
saco gestacional. Níveis de progesterona menores que 5ng/ml raramente estão associados a uma gravidez
viável. Portanto, esse achado associado a crescimento de beta-hCG em 48 horas, porém um aumento inferior a
50%, apresenta valor preditivo positivo de quase 100% para gravidez não viável.
-Curetagem uterina: alguns autores recomendam que seja realizada apenas em mulheres em que o hCG seja
inferior ao nível discriminatório e que apresente uma elevação anormal. 30% destes casos apresentam
gravidez intrauterina não viável e o restante uma prenhez ectópica. Este procedimento, então, reduziria o
tratamento desnecessário com metotrexato em 30% das pacientes sem gravidez ectópica.
-Laparoscopia e laparotomia: estes procedimentos cirúrgicos não se bastam ao diagnóstico (a partir da
visualização da trompa afetada), mas também ao tratamento dos casos de gravidez ectópica tubária. Não deve
ser postergada em função dos testes diagnósticos se houver instabilidade hemodinâmica e possível ruptura.
Conduta:
-Instabilidade hemodinâmica (pois provavelmente ocorreu rutura tubária) ou gravidez ectópica >5cm ou
prole completa ou gravidez ectópica recorrente na mesma trompa → cirurgia radical;
-Estabilidade hemodinâmica (se supõe que não ocorreu rutura tubária) ou desejo de procriação e massa
anexial < 5cm → tratamento cirúrgico conservador ou tratamento medicamentoso.
-Estabilidade hemodinâmica, beta-hCG em baixos níveis (<1.000) e declinando, paciente assintomática e
saco gestacional <3-3,5cm → conduta expectante.
Tratamento: o tratamento cirúrgico radical consiste na salpingectomia por laparotomia. O tratamento
cirúrgico conservador é realizado através de laparoscopia, preferencialmente, e consiste, se a trompa estiver
íntegra, na salpingostomia linear (incisão na parede tubária com posterior remoção do saco gestacional).

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-Tratamento medicamentoso: tem os mesmos índices de posterior gravidez tópica e manutenção da perviedade
tubária que o tratamento cirúrgico conservador. Para maiores chances de sucesso, é indicada a sua realização
caso preencham-se todos os seguintes critérios: IG < 6 semanas, saco gestacional <3,5cm, feto sem atividade
cardíaca e beta-hCG <5.000. Cabe ao médico e à paciente a escolha da terapia mais adequada.
Metotrexato (MTX): antagonista do ácido fólico que interfere na produção de purinas e pirimidas, interferindo na
síntese de DNA e RNA e, conseqüentemente, na multiplicação celular.
A droga de escolha é o metotrexato, administrado nos seguintes esquemas:
-Injeção no saco gestacional de 50mg de MTX dose única: tem como vantagem menores efeitos colaterais, porém
requer de procedimento invasivo (laparoscopia ou guiado por USG) .
-Injeção IM de 50mg/m² dose única: apresenta menores taxas de sucesso, porém com menos efeitos colaterais. Dosa-
se o hCG em 4 e 7 dias; caso este último não tenha caído 15% do valor em referência ao 4º dia, repete-se a dose de
50mg/m². Caso necessário, realiza-se uma terceira dose. Após a 3ª dose, se não houver queda hormonal, declara-se o
fracasso da terapia e outra abordagem deve ser instituída.
-Injeção IM de 1mg/kg em dias alternados: alterna-se 1mg/kg de MTX com 0,1mg/kg de ácido folínico, durante 1
semana. O beta-hCG deve ser dosado diariamente até uma queda de 15% em dias consecutivos. Caso não seja
observada a queda, o esquema pode ser repetido por até 4 vezes, com intervalo de 7 dias entre eles.
Os principais efeitos colaterais são: náuseas, vômitos, diarréia, estomatite, supressão da medula óssea,
alopécia, dermatite, neurotoxicidade, hepatotoxicidade, nefrotoxicidade e dor abdominal. Está contraindicado
em: aleitamento, imunodeficiência, doença hepática ou renal, discrasias sanguíneas e alcoolismo. Portanto,
preconiza-se acompanhamento com hemograma, coagulograma, função renal e função hepática.

OUTRAS FORMAS DE PRENHEZ ECTÓPICA


Prenhez ovariana: 0,5-3% das gestações ectópicas. Na maior parte dos casos, ocorre rotura precoce do órgão,
com passagem do ovo fecundado para a cavidade peritoneal e hemorragia, que normalmente não é grave. Em
outra parcela, o ovo permanece in situ, envolvido por um coágulo sanguíneo (mola ovárica) ou ainda é
reabsorvido. O sintoma mais freqüente é a dor pélvica crônica. Para o diagnóstico, devem ser preenchidos os 4
critérios de Spiegelberg: (1) trompa intacta no lado afetado, (2) saco gestacional na topografia ovariana, (3)
útero conectado à gravidez pelo ligamento ovariano e (4) presença de tecido ovariano no saco gestacional.
Tratamento: medicamentoso nos casos de gravidez inicial íntegra, ooforectomia parcial em casos de rotura e
ooforectomia total nos casos de rotura com sangramento incontrolável.
Prenhez cornual/angular/intersticial: 2-3% das ectópicas. A nidação ocorre em um dos cornos, que por ter
tecido muscular mais distensível, leva ao diagnóstico em estágios mais avançados. Por isso, esta forma está
associada a maior risco de sangramento e rotura uterina. O tratamento é o mesmo preconizado para a gravidez
tubária, porém, em sangramentos profusos, a ressecção miometrial ou a histerectomia podem ser necessárias.
Prenhez abdominal: pode ser primária ou secundária à implantação inicial do embrião na trompa, seguida de
abortamento para a cavidade abdominal, com posterior reimplantação do saco gestacional, preferencialmente
no fundo-de-saco de Douglas. Pode evoluir ao termo, embora que menos de 50% dos fetos sobrevivam, por
déficits de irrigação no local da nidação. Está associada a até 20% de mortalidade materna, por hemorragias,
infecções, obstrução intestinal , de vias urinárias e outros. Malformações fetais estruturais são freqüentes.
-Diagnóstico: o diagnóstico clínico é difícil, embora seja suspeitado pela queixa de dor à movimentação fetal,
dificuldade de delimitar o contorno uterino, altura do fundo de útero menor que o esperado para a idade
gestacional e apresentações anômalas persistentes. A USG pode estabelecer o diagnóstico, embora em casos
avançados possa ser inconclusiva. RNM é uma alternativa.
-Tratamento: em gestações inciais, o tratamento medicamentoso é preferível. A partir daí, a laparotomia é o
procedimento de escolha, devendo-se manter a placenta para retirada posterior após uso do MTX, pois a
tentativa intempestiva de sua extração está associada a hemorragias profusas.
O tratamento conservador é extremamente controverso, mas pode ser tentado em casos onde há estabilidade
hemodinâmica, IG >26s, ausência de grandes malformações e sofrimento fetal, placenta localizada em abdome
inferior e saco amniótico íntegro. Indica-se hospitalização e aceleração da maturidade pulmonar fetal, visando a
interrupção precoce da gestação.
Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 3

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DOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONAL


Engloba o grupo de doenças caracterizadas por proliferação anormal do trofoblasto. Ocorre em 1 a cada
10.000 gestações.
Embriologicamente, as células externas ao blastocisto recebem o
nome de trofoblasto, constituindo o vilo corial. O trofoblasto se
divide em dois: citotrofoblasto → constitui as vilosidades
primárias; e sinciciotrofoblasto → faz a invasão do endométrio,
sendo responsável pela reação decidual, que consiste na
adaptação do endométrio à implantação do ovo. As células do
sinciciotrofoblasto produzem a gonadotrofina coriônica humana
(hCG). Existe ainda uma outra camada de células, o trofoblasto
intermediário, responsável pela produção do hormônio
lactogênio placentário.
As doenças do trofoblasto podem ser benignas ou malignas.
Quando benigna, denomina-se mola hidatiforme, completa ou
incompleta. Quando maligna, é chamada de neoplasia
trofoblástica gestacional ou tumor trofoblástico gestacional.
Fatores de risco: a etiologia da doença ainda não foi definida, mas alguns fatores de risco estão
correlacionados ao surgimento da doença. A gestação anterior normal é tida como fator de proteção.
-Idade >40 anos; -Intervalo interpartal curto; -Síndrome anovulatória crônica;
-Abortamentos prévios; -Mola hidatiforme anterior; -Exposição à radiação ionizante;
-Inseminação artificial; -Tabagismo; -Uso de contraceptivos orais.

MOLA HIDATIFORME
É a doença trofoblástica gestacional benigna. Acredita-se estar relacionada à ocorrência de degeneração das
vilosidades coriônicas associada à hiperplasia dos elementos trofoblásticos, enquanto uma outra teoria afirma
ocorrer neoplasia benigna do trofoblasto, que leva à degeneração das vilosidades coriônicas. Em 2/3 dos
abortamentos por ovo anembrionado, observa-se degeneração micromolar (edema das vilosidades com
potencial molar).
Patologia: macroscopicamente, observam-se vesículas com líquido claro, semelhante à cachos de uva ou
hidátides. A eliminação deste material vesicular é sinal patognomônico da doença. Já microscopicamente,
observa-se proliferação trofoblástica, degeneração hidrópica do estroma e déficit de vascularização.
Classificação:
-Mola completa: caracterizada pela eliminação de grandes vesículas e pela ausência de feto e/ou âmnio.
Decorre da degeneração hidrópica de todas as vilosidades coriais, devido à perda da vascularização vilosa.
Quanto à genética, a mola completa sempre é diplóide, com todos os cromossomos sendo de origem paterna.
-Homozigótica: cariótipo 46XX. O concepto resulta da fertilização de um óvulo cujo núcleo está ausente ou foi
inativado, por um espermatozóide com 23X cromossomos, que se duplica e dá origem a um embrião com
cromossomos totalmente paternos. Ocorre edema generalizado e hiperplasia grosseira do trofoblasto. Responde por
90% dos casos, há altos níveis de hCG e tem baixa probabilidade de malignidade.
-Heterozigótica: cariótipo 46XY ou 46XX. Decorre da fertilização de um óvulo por dois espermatozóides 23X e 23Y.
Há maior tendência a doença trofoblástica persistente. O risco de evolução para tumores agressivos é de 20%.
-Mola incompleta ou parcial: decorre, mais frequentemente, da triploidia (69XXY, 69XXX, 69XYY),
havendo origem biparental: dois genomas paternos e um materno. Em 10% dos casos há tetraploidia. Nesse
tipo, há duas populações distintas de vilosidades coriais, uma normal e outra com degeneração hidrópica. O
aspecto de “cachos de uva” geralmente não se apresenta. Tecido fetal está sempre presente, mesmo que não
visto macroscopicamente. Na maioria dos casos a gestação é inviável, com o feto apresentando estigmas de
triploidia, como malformações múltiplas e restrição do crescimento.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


117
Manifestações: o quadro clássico é de sangramento genital intermitente e progressivo, útero amolecido, em
geral indolor e maior do que o esperado para a idade gestacional e náuseas e vômitos intensos pelos altos
níveis de beta-hCG. Toxemia gravídica ocorre em 30% dos casos de mola completa, evoluindo com eclâmpsia
e/ou HELLP. A toxemia é precoce e, quando surge antes de 24 semanas, é sugestiva do diagnóstico de mola. A
eliminação de vesículas é sinal patognomônico, e só ocorre na mola completa. O fenômeno do “útero em
safona” pode estar presente, e se deve ao crescimento uterino, seguido de eliminação do material intraútero e
posterior crescimento com grande acúmulo de coágulos. A hiperestimulação dos ovários pelo hCG pode levar
ao desenvolvimento de cistos ovarianos teca-luteínicos, manifestados como massa anexial bilateral palpável.
Os cistos não devem ser tratados, pois regridem após a resolução da doença, embora possam sofrer torção ou
ruptura, culminando com quadro de abdome agudo. Como complicações da mola completa, pode ocorrer
hiperêmese gravídica, tireotoxicose em 10% dos casos (o hCG possui semelhante estrutural com o TSH,
estimulando o aumento da produção de hormônios tireoidianos), CIVD e embolização trofoblástica (inclusive
para pulmão, cursando com quadro de insuficiência pulmonar e, à radiografia, infiltrado pulmonar bilateral)
Diagnóstico: é clínico, laboratorial e ultrassonográfico. O quadro clínico já foi descrito anteriormente.
-USG:
Mola completa: os vilos se apresentam com uma
forma característica de “flocos/tempestade de neve”.
Traduz massa central heterogênea com numerosos
espaços anecóicos discretos, que corresponde a
edema difuso das vilosidades coriônicas hidrópicas.
Mola incompleta: evidencia tecido placentário com
ecos dispersos de dimensões variadas, associado à
presença de feto, âmnio e cordão umbilical e/ou
espaços anecóicos focais (queijo suíço).
-Laboratorial: o diagnóstico laboratorial é baseado
no beta-hCG quantitativo, onde níveis superiores a
200.000 sugerem mola completa. Na mola parcial,
raramente os níveis estão maiores que 100.000,
valor tido como o do pico em gestações normais,
por volta da 10ª semana. É utilizado ainda como
parâmetro prognóstico e de resposta ao tratamento.
Conduta: consiste em: 1- Avaliar complicações
maternas (anemia, hipertireoidismo, PE,
insuficiência respiratória), 2- Realizar profilaxia pra
isoimunização Rh nas pacientes Rh negativas, 3- Proceder o esvaziamento uterino e 4- envio do material para
confirmação diagnóstica histopatológica (obrigatório).
-Esvaziamento uterino: é o tratamento recomendado para a DTG. Pode ser realizado das seguintes formas:
vácuo-aspiração (procedimento de eleição, pelo menor risco de perfuração uterina), AMIU (aspiração manual
intrauterina), curetagem (quando não estão disponíveis outros métodos), indução com misoprostol por via
vaginal ou histerectomia (para mola incompleta com mais de 4 meses, colo desfavorável à indução e
sangramento profuso).
Seguimento: após o esvaziamento, é importante a dosagem seriada semanal do beta-hCG, devido a
possibilidade de malignização da doença. Ele deve cair até negativar, por volta de 8-10 semanas após o
tratamento. Após 3 amostras negativas consecutivas, a repetição do exame passa a ser quinzenal (mais uma
dosagem) e posteriormente mensal, até completarem 6 meses do primeiro resultado negativo. O aumento do
beta-HCG, níveis estacionados durante 3 exames semanais consecutivos e beta-hCG persistente durante 6
meses após o tratamento mesmo que em queda lenta, são sinais que sugerem malignização da doença. Durante
todo o período de seguimento é importante que a paciente não engravide, uma vez que a elevação dos níveis
de beta-hCG pela nova gravidez, podem mascarar um possível diagnóstico de persistência ou malignização da
mola hidatiforme. Exames de imagem podem ser solicitados para a avaliação do quadro durante o seguimento.

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118
NEOPLASIA TROFOBLASTICA GESTACIONAL
Apesar de conflitante na literatura, a não regressão dos níveis de hCG ou sua elevação sugerem a presença de
tumor trofoblástico gestacional. Entretanto, o tratamento precoce da mola não diminui o risco de evolução
para a neoplasia e, portanto, o seguimento não deve ser descartado.
Estadiamento: o estadiamento das três formas da NTG é baseado nos critérios da FIGO 2000:
Estádio 1: Tumor confinado ao útero
Estádio 2: Tumor invade outras estruturas genitais (anexos, vagina ou ligamento largo)
Estádio 3: Doença com extensão pulmonar com ou sem envolvimento genital
Estádio 4: Outros sítios de doença metastática.
Escore de risco: também a
FIGO desenvolveu um escore
de risco para NTG, baseada
nos fatores de risco da doença,
proposta pela OMS.
A doença e classificada como
baixo risco se escore menor ou
igual a 6 e de alto risco se
igual ou maior a 7.
Tratamento: a conduta varia conforme o estadiamento da doença:
Estádio 1: monoquimioterapia com metotrexato + ácido folínico;
Estádio 2: baixo risco → tratamento igual ao do estádio 1; alto risco → poliquimioterapia
Estádio 3: poliquimioterapia
Estádio 4: poliquimioterapia + cirurgia adjuvante (histerectomia e ressecção dos nódulos metastáticos).
-Monoquimioterapia: metotrexato 50mg IM nos dias 1, 3, 5 e 7 + ácido folínico 7,5mg nos dias 2, 4, 6 e 8. Este
esquema deve ser realizado a cada duas semanas, até a negativação dos níveis de beta-hCG.
-Poliquimioterapia: o esquema poliquimioterápico utiliza-se da associação das seguintes drogas: etoposide,
metotrexato, actinomicina D, ácido folínico, ciclofosfamida e vincristina.
Classificação da NTG:
-Mola invasora: é o corioadenoma destruens. Corresponde a 70-90% dos casos de NTG, sendo considerada
uma seqüela da mola hidatiforme. A mola completa e a incompleta evoluem para a mola invasora em 20% e
4% dos casos, respectivamente. É o tipo de NTG que invade o miométrio e a parede uterina, com potencial de
metástases a distância. A diferença do coriocarcinoma consiste na manutenção da estrutura vilositária.
Manifestações: metrorragia persistente, subinvolução uterina e infecções. Curetagens uterinas não diminuem o
sangramento. O diagnóstico é dado pela manutenção ou elevação dos altos níveis de beta-hCG e visualização
de imagens sugestivas de invasão miometrial à USG e/ou doppler, com o diagnóstico sendo firmando a partir
do exame histopatológico do útero após a histerectomia.
Prognóstico: pode evoluir para coriocarcinoma. Metástases estão presentes em 4% dos casos ao diagnóstico.
-Coriocarcinoma: representa 10-30% dos casos de NTG. Consiste na transformação maligna após uma
gravidez molar, ectópica ou normal. Em 50% dos casos há história prévia de gestação molar (raros casos após
molar incompleta), em 25% de um abortamento, em 22,5% de uma gravidez normal e em 2,5% de ectópica.
Manifestações: o tumor preenche a cavidade uterina, invadindo útero e vasos, o que provoca hemorragia e
necrose, geralmente vermelho-escuro e bastante friável. Normalmente há história de gravidez recente,
especialmente molar, estando o útero aumentado e com sangramentos persistentes. O nível de beta-hCG
permanece positivo e é essencial para o diagnóstico. Entretanto, quando não precedido de mola hidatiforme, o
diagnóstico é difícil. No momento do diagnóstico, a maioria dos pacientes apresenta doença metastática;
quando presente, tem preferência por pulmão (80%), vagina (30%), pelve (20%) fígado, e cérebro (10%). O
diagnóstico de certeza se faz pelo exame histopatológico.
Tratamento: o coriocarcinoma é bastante sensível à quimioterapia, sendo um dos poucos casos de tumor
maligno nos quais pacientes extremamente metastáticos tornam-se, frequentemente, curados. Normalmente
não há necessidade de histerectomia.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


119
Prognóstico: a morte é conseqüência da insuficiência respiratória, decorrente ou não de hemorragia pulmonar,
ou da hemorragia cerebral.
-Tumor trofoblástico do sítio placentário: tumor raro, que compromete o endométrio e miométrio, composto
basicamente de trofoblasto intermediário. Desta forma, não produz elevados níveis de beta-hCG, uma vez que
não há proliferação do sinciciotrofoblasto, porém suas células derivadas do citotrofoblasto produzem
hormônio lactogênio placentário e prolactina. Desenvolve-se no local de implantação placentária meses a anos
após um abortamento, gestação molar ou gravidez a termo (maior parte dos casos). Caracteriza-se por uma
massa sólida, bem circunscrita, dentro do miométrio, com invasão não destrutiva do endométrio.
Prognóstico: essa variedade é muito agressiva, com pouca resposta à quimioterapia. O tratamento de escolha é
a histerectomia associada a quimioterapia. A doença confinada ao útero tem bom prognóstico com a
histerectomia.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 3

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120

SANGRAMENTOS DA SEGUNDA METADE DA GESTAÇÃO


DESCOLAMENTO PREMATURO DA PLACENTA (DPP)
Consiste na separação da placenta normo-inserida no corpo uterino, em gestação com idade superior a 20
semanas e antes da expulsão fetal, que implica em sangramento uterino e redução do aporte de oxigênio e
nutrientes para o feto. Ocorre em 0,4 – 3,5 % de todas as gestações. Pode determinar o óbito fetal e, em
relação à mãe, CIVD, hemorragia, choque, histerectomia e, menos usualmente, o óbito.
Fatores de risco: a etiologia não é firmada, mas o fator mais associado ao DPP é a hipertensão arterial. Os
fatores mecânicos ou traumáticos internos embora raramente associados ao DPP, são os únicos fatores que
podem ser considerados como causadores do quadro.
-Causas mecânicas ou traumáticas internas: brevidade do cordão (por circular do cordão, por exemplo), versão fetal
externa (procedimento obstétrico que visa alterar artificialmente a apresentação fetal), retração uterina intensa (rotura
prematura das membranas em casos de polidrâmnio), miomatose uterina, torção do útero gravídico e traumatismo
abdominal.
-Causas não traumáticas: está relacionada, em todos os casos, à má perfusão placentária com necrose da decídua
basal. São exemplos: síndromes hipertensivas (principal fator envolvido, devido a obstrução das artérias deciduais ou
infartos no sítio placentário), placenta circunvalada, tabagismo e uso de cocaína, anemia e má nutrição, consumo de
álcool, corioamnionite e idade materna superior a 35 anos.
Fisiopatologia: a hemorragia decidual que inicia o sangramento é o primeiro fator fisiopatológico.
Conseqüentemente, forma-se o hematoma retroplacentário que invade a placenta formando uma “cratera”.
Esse processo aumenta a área descolada e dá início ao ciclo vicioso e irreversível que caracteriza a DPP.
Quando mais de 50% da superfície placentária é descolada, é inevitável a morte fetal. O sangue extravasado
em contato com o útero exerce ação irritante, provocando hipertonia e, na maioria dos
casos, há evolução para trabalho de parto. Com a infiltração sanguínea miometrial, há
desorganização das fibras musculares, cursando com hipotonia no pós-parto, que pode
resultar em hemorragia materna. A presença de um útero arroxeado, edemaciado e
hipotônico recebe o nome de útero de Couvelaire ou apoplexia uteroplacentária. A
tromboplastina liberada na formação do coágulo retroplacentário pode alcançar a
circulação materna, estimulando a cascata de coagulação, o que deflagra uma CIVD.
Classificação:
Grau 1 (leve) → assintomático, sendo o diagnóstico pelo histopatológico da placenta que revela o hematoma;
Grau 2 (moderado) → o diagnóstico é dado pelos sinais clássicos de DPP, estando o feto ainda vivo;
Grau 3 (grave) → caracteriza-se pelo óbito fetal. Pode ser sem coagulopatia (3A) ou com coagulopatia (3B).
Manifestações: a apresentação clássica corresponde à presença de sangramento vaginal escuro na segunda
metade da gestação, hipertonia uterina e sofrimento fetal, comumente associados à hipertensão arterial.
Entretanto, em até 20% dos casos o sangue fica retido entre a placenta descolada e o útero (hemorragia oculta)
não se exteriorizando pela vagina. Além disso, o volume do sangramento pode não refletir a gravidade do
descolamento, pois coágulos volumosos podem ficar retidos. Usualmente, mesmo na vigência de perda
sanguínea importante, a freqüência do pulso se mantém normal (pulso paradoxal de Boero), geralmente em
fases iniciais, pois com o decorrer da hemorragia, instala-se o quadro típico de hipovolemia, traduzido por
hipotensão e taquicardia. As manifestações do sofrimento fetal agudo são mais relacionados à extensão do
descolamento, ocorrendo alterações dos BCF em mais de 70% dos casos. A rotura alta das membranas pode
provocar passagem de sangue para cavidade amniótica, o que constitui o hemoâmnio, detectada em até 50%
dos casos. A dilatação cervical pode completar-se rapidamente, sendo rotineiro o parto em alude: feto, placenta
(juntamente com o hematoma retroplacentário) e páreas expulsos em turbilhão
Diagnóstico: o diagnóstico de DPP é clínico. A USG serve mais para afastar o diagnóstico de placenta prévia
do que para confirmar o quadro de DPP, visto que o hematoma retroplacentário só é visualizado em ¼ dos
casos. Os exames laboratoriais tem o objetivo de rastrear as complicações do DPP: anemia grave, choque
hipovolêmico e discrasia sanguínea; este último é fundamental na abordagem do paciente com DPP.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


121
Diagnóstico diferencial: o principal diagnóstico
diferencial é a placenta prévia. Vale lembrar que a dor
abdominal nos casos de hemorragia da segunda metade
da gestação é quase exclusiva da DPP.
Tratamento: em linhas gerais, a conduta no DPP
depende basicamente da vitabilidade fetal. Uma
intervenção rápida e adequada melhoram o prognóstico
materno-fetal.
-Feto vivo: A interrupção da gravidez é mandatória.
Apesar das divergências na literatura se é sempre necessário o parto cesariana, de forma geral, se o feto está
vivo, preconiza-se realizar a cesariana em qualquer que seja a fase de parto, excetuando-se os casos de parto
iminente, no qual é admissível o parto vaginal. Alguns autores defendem que se o feto estiver vivo, admite-se
a amniotomia sob vigilância contínua e monitorização da freqüência cardíaca fetal.
-Feto morto: caso se confirme o óbito fetal intraútero, não há necessidade da interrupção imediata da gravidez,
sendo imprescindível zelar pela saúde materna, que está em perigo pelo risco de CIVD, uma vez que o óbito
fetal é determinado por um descolamento mais intenso que aumenta as chances de coagulopatia. Sendo assim,
de forma geral, está indicada a interrupção da gravidez por via vaginal (pelo risco de hemorragia da cesárea),
estabilização materna (reposição sanguínea e de fatores da coagulação) e a amniotomia (quando o parto está
próximo a ocorrer). A amniotomia reduz a compressão da cava inferior, dificulta a ampliação da área de
descolamento, melhora a hipertonia uterina, identifica o hemoâmnio e induz ou acelera o trabalho de parto.
Complicações: as principais são o choque hipovolêmico (e como conseqüência IRA e necrose hipofisária→
Síndrome de Sheehan) e CIVD.
Prognóstico: Materno → mortalidade de 3%; Fetal → mortalidade geral de 90%: 100% nos casos graves,
65% nos moderados e 25% nos leves.

PLACENTA PRÉVIA (PP)


Também chamada de inserção viciosa da placenta, a placenta prévia é a inserção de qualquer parte da placenta
no segmento inferior do útero, cobrindo total ou parcialmente ou avizinhando o orifício cervical interno (OCI)
após 28 semanas de gestação. Ocorre em 0,5-1% das gestações
Só pode ser considerada a partir de 28 semanas porque a placenta muitas vezes “migra” durante a gestação, fato
relacionado ao crescimento assimétrico do útero. A migração termina em torno da 28ª semana.
Fatores de risco:idade materna avançada e multiparidade são os fatores mais significantes, sendo a idade mais
importante que a paridade. Endometrite, curetagem uterina e cicatrizes uterinas prévias aumentam as chances,
pois a placenta procura locais de melhor oxigenação para suprir o concepto. O tabagismo também aumenta as
chances de ocorrência, pois causa hipoxemia na interface materno-fetal e, como conseqüência, um maior
crescimento da placenta na tentativa de suprir o embrião, podendo então atingir o OCI.
Fisiopatologia: normalmente a placenta busca se implantar em locais de maior vascularização, que são o
fundo e a parte súpero-posterior do útero. A decidualização pobre do útero, possivelmente relacionada a
fatores inflamatórios ou atróficos do endométrio, acompanhada de vascularização deficiente, faz com que a
placenta desvie-se da área de sua inserção primitiva e busque locais de maior vascularização, o que leva a sua
implantação heterotópica.
Classificação: depende da localização da placenta em relação ao OCI
-PP Completa ou central total ou total: quando a placenta recobre totalmente o OCI;
-PP parcial ou central parcial: quando recobre parcialmente o OCI;
-PP marginal: a placenta alcança a borda do OCI sem ultrapassá-lo;
-Placenta de inserção baixa ou lateral: placenta localizada no segmento inferior do
útero, muito próximo ao OCI, porém não alcança-o. Esta última classificação não é
considerada por todos os autores.
Manifestações: o quadro clássico da PP é de um sangramento na segunda metade da
gestação, vivo, indolor, de início e cessar súbito, sem relação com exercícios físicos

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122
ou traumas e sem outros sintomas. O primeiro episódio de sangramento pode se exibir em pequenas
quantidades. Ao contrário do DPP, o sangramento se exterioriza sempre e totalmente. Deve-se destaque a:
-Não realizar o toque vaginal nas pacientes com diagnóstico suspeito ou confirmado de PP, pois pode deflagrar
sangramento intenso e por em risco a mãe e o concepto. Quando fundamental no diagnóstico, deve ser
realizado em ambiente cirúrgica, para intervenção de urgência se necessário, e revela tecido esponjoso.
-Nas pacientes com diagnóstico confirmado de PP deve-se realizar a amniotomia quando se opta por parto via
vaginal, pois favorece a descida da apresentação e compressão da borda placentária, diminuindo a hemorragia.
Diagnóstico: além da clínica sugestiva, o diagnóstico é confirmado por um único exame: USG ou RNM. O
principal diagnóstico diferencial é com DPP.
Tratamento: depende da idade gestacional, da intensidade do sangramento e do tipo de inserção viciosa:
Hemorragia importante? - sim → interrupção da gravidez
- não → gestação a termo: - sim → interrupção - não → conduta conservadora
Quando necessário interromper a gravidez, a via de parto depende do tipo de inserção viciosa:
-Placenta prévia total: com feto vivo ou morto a via é sempre a cesariana;
-Placenta prévia parcial: a via é a cesariana, exceto em multíparas se o parto estiver próximo ao fim, o sangramento
for discreto e não haja obstáculo mecânico importante ao parto vaginal;
-Placenta prévia marginal ou baixa: o parto vaginal é permitido, a depender do quadro hemodinâmico materno: em
caso de sangramento intenso, a via de parto a ser escolhida é sempre a cesariana. Se a via de parto escolhida for a
vaginal, deve-se proceder a amniotomia.
Quando se optar por conduta conservadora é fundamental a hospitalização da gestante, para avaliação da série
vermelha da gestante e da vitabilidade fetal. A aceleração da maturidade pulmonar é mandatória.

INSERÇÃO ANÔMALA DE PLACENTA


Em situações normais a placenta penetra em toda a espessura da porção superficial (compacta) da decídua
basal, não se estendendo à camada profunda (esponjosa), o que favorece o descolamento placentário no
secundamento. A penetração mais acentuada na camada esponjosa condiciona dificuldades ou impede a
dequitação, sendo denominada, em qualquer implantação anormal, de acretismo placentário. Quanto à
profundidade da penetração da vilosidade corial, a placenta anormal inserida classifica-se em:
-Placenta acreta: as vilosidades penetram até a esponjosa, dificultando o secundamento. A conduta é a retirada
manual da placenta, seguida de curetagem. Em casos de insucesso, a histerectomia total abdominal (HTA) está
indicada, se constituindo como o tratamento padrão-ouro.
-Placenta increta: as vilosidades penetram até o miométrio, impedindo o secundamento. A conduta é a HTA.
-Placenta percreta: as vilosidades alcançam a serosa, podendo perfurá-la, causando hemorragias peritoneais. A
extração manual, assim como a placenta increta, é impossível, sendo indicada a HTA.
Fatores de risco: ocorre mais comumente em circunstâncias onde a formação decidual foi perturbada. A
situação mais comum é sua ocorrência após uma cesárea prévia. Outros fatores incluem: idade materna maior
que 35 anos, multiparidade, defeitos endometriais, leiomiomas uterinos e tabagismo.
Manifestações: a apresentação clínica é uma hemorragia profusa, que ocorre no momento da tentativa de
descolamento placentário. Parte ou toda a placenta permanece fortemente aderida à cavidade uterina. Quando
a placenta é totalmente acreta, não se dá o descolamento; a hemorragia só ocorre no momento da tentativa de
descolamento placentário.
Diagnóstico: com no geral o diagnóstico não é dado no pré-natal, seu diagnóstico se dá pela dificuldade de
extração da placenta e pelo estudo anatomopatológico, que determina o grau de infiltração placentária.
-Diagnóstico pré-natal: a época ideal para o diagnóstico é entre a 20 e 24ª semana de gestação, através da
USG e da RNM. Na USG o principal sinal é a perda do espaço claro retroplacentário.
Normalmente entre a placenta e a bexiga há uma área clara (hipoecóica) que representa o miométrio e a vasculatura
miometrial retroplacentária normal. A não visualização dessa área é um dos principais sinais da inserção viciosa.
Complicações: a hemorragia maciça é a complicação mais comum. Seqüelas potenciais da hemorragia intensa
incluem: CIVD, SARA, falência renal e até mesmo a morte.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Tratamento: quando diagnóstico pré-natal, programar a interrupção eletiva da gestação a termo por via alta.
Como já mencionado, quando a placenta é acreta pode-se tentar a extração manual; nos casos de insucesso e
nos casos de placenta increta ou percreta, a única solução é a HTA.

ROTURA DE VASA PRÉVIA


Os vasos prévios correspondem a uma anomalia na qual os vasos umbilicais
cruzam o segmento inferior do útero (região do OCI) e se colocam em frente à
apresentação. É comumente associada a inserção marginal do cordão, a placentas
bilobadas e mais comumente (50%) à inserção velamentosa do funículo umbilical
Inserção velamentosa: os vasos sanguíneos deixam o cordão umbilical antes da
inserção placentária e caminham, em leque, sem a proteção da geléia de Warthon, até
alcançar a massa placentária. Se relaciona a diabetes materno, tabagismo, idade
materna avançada, malformações congênitas e restrição do crescimento fetal.
Manifestações: o examinador cuidadoso poderá palpar um vaso fetal tubular frente à apresentação; a
compressão dos vasos pelo dedo do examinador pode induzir alterações no BCF. Tipicamente a rotura de vasa
prévia caracteriza-se pela presença de hemorragia no final da gravidez ou durante o trabalho de parto, no
momento do rompimento da bolsa das águas, seja espontânea (amniorrexe) ou artificial (amniotomia). A
quantidade de sangue fetal que pode ser perdida sem matar o feto é pequena.
Diagnóstico: o diagnóstico pré-natal pode ser dada pela USG com dopplerfluxometria colorida, que é
mandatória nos casos de: placenta de inserção baixa, placenta bilobada e gravidez por reprodução assistida.
Tratamento: a melhor conduta é a interrupção eletiva da gestação a partir de 36 semanas por via alta.
Prognóstico: a mortalidade depende do momento do diagnóstico: pré-parto → 3%; intra ou pós-parto → 56%.

ROTURA DO SEIO MARGINAL


O seio marginal consiste na extrema periferia do espaço interviloso. Suas paredes são formadas pela placa
basal e pelas membranas, no ponto onde ambos se refletem sobre a decídua vera. Sua rotura causa
sangramento periparto, de pequena quantidade, de origem materna, indolor, vermelho-vivo, sem outros
sintomas, com placenta normo-posicionada. Não há sofrimento fetal. O diagnóstico não pode ser dado no pré-
natal, só sendo possível pelo estudo histopatológico após a saída da placenta.

ROTURA UTERINA
Consiste no rompimento parcial ou total do miométrio durante a gravidez ou trabalho de parto. Ocorre
frequentemente a extrusão do feto e de partes fetais. Possui grande impacto no futuro reprodutivo da mulher e
pode levar a morte materna e fetal, sendo uma das mais graves complicações gestacionais.
Fatores de risco: Os principais fatores de risco são a cesariana prévia , o parto obstruído (desproporção
cefalopélvica, apresentações anômalas e tumores prévios) e a indução de parto. Trauma uterino (armas brancas
ou de fogo, acidentes automobilísticos), malformação uterina, doença trofoblástica gestacional, manobra de
Kristeller e sobredistensão uterina (gemelaridade, polidrâmnio) são outras causas envolvidas.
Rotura uterina na gravidez: é rara, podendo ser espontânea ou relacionada a traumas. No início da gravidez
a rotura uterina resulta em quadro de abdome agudo grave. Cursa com dor intensa, hemorragia interna e
irritação peritoneal, podendo evoluir com choque hipovolêmico. A ocorrência na segunda metade da gestação
resulta em quadro mais brando, porém de igual gravidade. Ao exame são evidenciadas duas massas,
representando o feto e a massa uterina. BCF inaudíveis. O prognóstico fetal é o óbito e o materno é grave.
-Tratamento: a laparotomia exploratória deve ser imediata, tanto para confirmação do diagnóstico como para a
terapêutica e controle da hemorragia. Nas pacientes com prole constituída está indicada a histerectomia,
enquanto nas nulíparas tenta-se a rafia da lesão. Hemotransfusão e antibiótico profilático estão indicados.
Rotura uterina no parto: pode ser espontânea ou provocada (uso de ocitocina, manobras de versão externa,
Kristeller). O quadro clínico caracteriza-se por dois momentos bem distintos:
-Iminência de rotura uterina – Síndrome de Bandl-Frommel: a paciente se apresenta ansiosa e agitada, com
contrações uterinas vigorosas e excessivamente dolorosas. A distensão das fibras é tão importante que à

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palpação percebe-se próximo à cicatriz umbilical o anel que separa o corpo uterino do segmento inferior:
Sinal de Bandl (confere ao útero aspecto semelhante à ampulheta). Os ligamentos redondos são desviados
para a face ventral do útero e, excessivamente distendidos, também podem ser palpados: Sinal de Fommel. Ao
ser diagnosticada essa síndrome, caso não haja intervenção imediata, sobrevém a rotura uterina.
-Rotura uterina: caracteriza-se por dor súbita e lancinante na região hipogástrica. O trabalho de parto é
imediatamente paralisado. À palpação abdominal, podem ser palpadas partes fetais. A hemorragia, discreta ou
severa, pode ser oculta ou se manifestar por sangramento vaginal. Pode ocorre choque hipovolêmico. A
comunicação do útero roto com a cavidade peritoneal leva à passagem de ar para a cavidade, produzindo
crepitação à palpação abdominal: Sinal de Clark. Ao toque vaginal, o sinal mais importante é a ascensão da
apresentação: Sinal de Reasens. Os BCF são inaudíveis após o evento, pois a morte fetal é a regra.
-Tratamento: a identificação rápida e precisa dos sinais de rotura uterina constituem a principal forma de
prevenção deste evento no curso do trabalho de parto. Em casos de exacerbação da atividade contrátil do
útero, a utilização de uterolíticos pode evitar a rotura. O diagnóstico de rotura uterina exige a intervenção
cirúrgica, que pode variar de uma simples rafia de útero até a histerectomia.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Característica DPP PP Rotura de Vasa Rotura de seio Rotura Uterina
prévia marginal
Início Súbito Gravidade Após amniotomia Súbito e periparto Súbito
progressiva
Hemorragia Escura, única, Viva, rutilante, de Viva, única Viva, única Viva, única
oculta em 20% repetição
Origem Materna/fetal Materna Fetal Materna Materna
Sofrimento fetal Grave e precoce Ausente ou tardio Grave e precoce Ausente Grave e tardio
Hipertonia Sim Não Não Não Não
Dor Sim (hipertonia) Não Não Não Cessa
Amniotomia Diminui o risco de Diminui a Desencadeia o Não interfere Não interfere
CIVD hemorragia sangramento

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia.

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IMCOMPATIBILIDADE MATERNO-FETAL
A eritroblastose fetal, também denominada Doença Hemolítica Perinatal, é uma doença decorrente da
produção de anticorpos maternos contra antígenos presentes no sangue fetal, devido a algum tipo de
incompatibilidade sanguínea materno-fetal. Sua incidência vem diminuindo com o passar dos anos,
principalmente após a instituição da profilaxia com imunoglobulina.
Etiopatogenia:
-Incompatibilidade ABO: é a forma mais freqüente de eritroblastose fetal, porém menos grave que a
incompatibilidade Rh.
A produção de anticorpos ocorrerá sempre que o sangue de um indivíduo entre em contato com hemácias que
possuam antígenos não encontrados em seus eritrócitos. Indivíduo do grupo A produzirá anticorpos anti-B e vice-
versa. Indivíduos do grupo AB não produzem anticorpos, podendo ser expostos a sangue A ou B (receptor universal).
Já indivíduos do grupo O produzem anticorpos anti-A e anti-B, no entanto, nenhum anticorpo é formado contra ele
(doador universal).
A situação mais freqüente é a mãe ser O, possuindo então anti-A e anti-B e o feto ser A ou B ou AB. A grande
maioria dos anticorpos é da classe IgM, felizmente, não atravessando a placenta, explicando a forma mais leve
da doença (anemia) no recém-nascido. Uma vez que tais anticorpos são naturais, não há profilaxia disponível
para este tipo de incompatibilidade. Cabe lembrar que ao contrário do observado na incompatibilidade Rh, não
existe a necessidade de exposição prévia da mãe a sangue A, B ou AB para o desenvolvimento de anticorpos,
pois estes já são naturalmente encontrados no organismo materno, provavelmente decorrente da exposição a
bactérias no decorrer da vida.
-Incompatibilidade Rh: dentre os antígenos do sistema Rh, o antígeno D é o mais comumente implicado nos
casos de aloimunização, sendo sua presença quem determina que o indivíduo é Rh positivo. A sensibilização
materna ocorre quando aproximadamente 1 ml de sangue fetal Rh positivo entra em contato com a circulação
materna sendo esta Rh negativo, levando a síntese de anticorpos anti-D IgM inicialmente e, depois, IgG. A
severidade da sensibilização piora a cada gravidez, logo o risco de anemia fetal aumenta progressivamente. A
incompatibilidade ABO leva a uma relativa proteção contra a sensibilização Rh, pois os anticorpos maternos
anti-A e anti-B destroem as hemácias fetais transmitidas para a mãe antes mesmo que haja a sensibilização.
Fisiopatologia: para que ocorra a doença é necessário que haja:
-Incompatibilidade sanguínea materno-fetal
-Aloimunização Rh materna: traduz o aparecimento de anticorpos anti-D na circulação de gestantes Rh
negativas em resposta aos antígenos D provenientes da circulação do feto Rh positivo. O contato do sangue
fetal com o materno ocorre a partir de hemorragias feto-maternas que podem ocorrer durante a gestação, como
nos casos de hemorragia do primeiro trimestre e, principalmente, durante o parto, especialmente o operatório.
Estima-se que a hemorragia feto-materna ocorra em 75% das gravidezes, sendo mais freqüente quanto mais
avançada a gestação. No primeiro contato, haverá produção de anticorpos IgM, que não atravessam a placenta.
No segundo contato, há a produção de anticorpos IgG, que atravessam a placenta. Em exposições
subsequentes, o processo tende a ser ainda mais acentuado, ou seja, o acometimento fetal em cada gestação
tende a ser mais grave que na anterior.
-Passagem de anticorpos maternos para o feto: uma vez produzidos, os anticorpos IgG podem atravessa a
placenta e, ao invadirem a circulação fetal, fixam-se às hemácias do concepto, com posterior hemólise e
instalação de eritropoiese extramedular no fígado. Esse processo é responsável pelo desenvolvimento da
anemia fetal, que pode ser leve, moderada ou grave, conforme a intensidade da hemólise.
-Consequências fetais: frente à anemia fetal, há hipóxia tecidual que leva ao aumento da contratilidade e do
débito cardíaco. Com o agravamento da anemia, pode ocorrer insuficiência cardíaca e falência miocárdica.
Além disso, devido a hematopoiese extramedular, pode haver desenvolvimento de hipertensão porta e
hipoproteinemia. Esses fatores são, em conjunto, responsáveis pelo quadro de hidropsia fetal, caracterizado
pelo extravasamento de líquido para o terceiro espaço, com formação de derrame pleural, pericárdico, ascite e

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126
edema cerebral. Pode ocorrer ainda desenvolvimento do kernicterus no RN, pela impregnação de bilirrubina
indireta nos núcleos da base cerebrais.
Diagnóstico: a anamnese é fundamental para investigar o número de partos da mulher, sua evolução e a
ocorrência de abortos. Dados que sugerem imunização Rh incluem antecedente de um ou dois filhos normais,
seguidos de RN com icterícia grave e persistente (já nas primeiras horas pós-parto) associada a anemia,
hidropsia e morte (nos casos graves). Quando há história de um natimorto, a probabilidade de nova ocorrência
é de 75%. Deve-se pesquisar ainda o fator Rh do parceiro.
-Teste de Coombs indireto: é marcador de risco da doença, não tendo relação direta com sua gravidade. Caso
seja negativo, deve ser repetido com 28, 32, 36 e 40 semanas de gestação (o Coombs indireto reflete as 4
últimas semanas), para diagnóstico de possível sensibilização durante a gravidez. Deve ser solicitado ainda no
pós-parto imediato, juntamente com o teste de Coombs direto e fator Rh do recém-nascido. Se positivo e
titulação <1/8 deve ser repetido mensalmente; se > 1/8 está indicada a investigação de anemia fetal através de
métodos invasivos (amniocentese) ou biofísicos (dopplerfluxometria).
-Amniocentese: a espectrofotometria do LA, obtido através de amniocentese, permite estimar indiretamente a
concentração de bilirrubina no LA.
-Cordocentese: método padrão-ouro de avaliação da anemia fetal, permitindo a dosagem de Hb e Ht, além de
confirmar a tipagem sanguínea e quantificar os anticorpos eritrocitários presentes na circulação fetal (Coombs direto).
Além disso, consiste no meio utilizado para a terapêutica intrauterina, através de transfusão sanguínea. Como tem
riscos, só está indicada quando outros métodos sugerirem acometimento grave do feto, que possa necessitar de
tratamento intrauterino.
-Dopplefluxometria: método não-invasivo que evidencia sinais de anemia fetal, através da avaliação da artéria
cerebral média. Está indicada a partir de 20 semanas de gestação para gestantes com Coombs indireto >1/8.
Profilaxia: é mandatória para todas as gestantes Rh negativo não sensibilizadas (coombs indireto) após o
parto (maior eficácia até 72 horas, embora apresente resultados até 28 dias) e/ou em qualquer caso de
hemorragia durante a gestação (placenta prévia, ameaça de abortamento), interrupção precoce da mesma
(abortamento, parto prematuro, prenhez ectópica, doença trofoblástica) e procedimentos invasivos (biópsia de
vilo corial, amniocentese, cordocentese). Realizada com imunoglobulina anti-D na dose de 300mcg
intramuscular. Preconiza-se ainda a administração da imunoglobulina na 28ª semana de gestação nas pacientes
com Coombs indireto negativo, embora ainda não existam evidências que suportem essa prática e que esta
conduta não seja preconizada pelo Ministério da Saúde, não estando disponível no SUS. Um Coombs indireto
realizado 24 a 48 horas após a administração da imunoglobulina deve ser positivo, pois identifica a
imunoglobulina exógena; a permanência de um Coombs indireto positivo além de três meses após a dose da
imunoglobulina sugere falha na profilaxia, ocorrendo produção endógena de anticorpos pela mãe –
sensibilização.
Tratamento:
-Feto: pode-se optar pelo tratamento intrauterino ou após o nascimento. Indica-se a antecipação do parto para
fetos maduros ou próximos da maturidade ou transfusão intrauterina em casos de doença grave (Hto <30% ou
Hb <10g/dl ou hidrópicos) em fetos muito prematuros.
-Transfusão intrauterina: o sangue é administrado através da veia umbilical, por meio da cordocentese. Pode ser
realizada a partir de 20 semanas de gestação, quando o cordão umbilical já está mais espesso, permitindo o
procedimento. O tipo sanguíneo infundido deve ser sempre O negativo. O procedimento será repetido sempre que
necessário.
-Recém-nascido: o grupo sanguíneo e fator Rh do concepto devem ser determinados logo após o parto, assim
como realizado o teste de Coombs direto. O tratamento se baseia na fototerapia e, quando necessária, a
exangineotransfusão.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 3.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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ROTURA PREMATURA DAS MEMBRANAS OVULARES


Também chamada de amniorrexe prematura, a rotura prematura das membranas ovulares (RPMO) é definida
como rotura espontânea das membranas amnióticas após a 20ª semana de gravidez e antes do início do
trabalho de parto. É dita pré-termo quando ocorre antes das 37 semanas de gestação. Ocorre em 2-3% do total
de nascimentos e 15-25% dos casos se complicam com infecção. Seu impacto é significativo na morbidade e
mortalidade pré-natal e nos custos hospitalares com internamentos e terapêutica.
Período de latência: período compreendido entre a ocorrência de amniorrexe prematura e a expulsão fetal.
Etiopatogenia: as principais causas da amniorrexe prematura são a inflamação e a infecção. A produção de
enzimas proteolíticas pelas bactérias infectantes, assim como um aumento das metaloproteinases, promovem a
destruição da fibronectina, uma espécie de ‘cola’ na interface materno-fetal (ou seja, entre o cório e a decídua),
com conseqüente enfraquecimento das membranas e sua posterior ruptura. Paralelo a isso, citocinas
inflamatórias produzidas pela decídua atuando através da produção de prostaglandinas também estão
envolvidas. Em muitos outros casos, a etiologia da RPMO não é identificada.
Fatores de risco: a RPMO compartilha de muitos fatores de risco com a prematuridade. Os principais são:
-Exames invasivos: amniocentese e cordocentese -Insuficiência istmo-cervical -Polidrâmnio
-Inserção baixa da placenta -Trabalho de parto prematuro -Macrossomia
-Infecções genitais (estrepto B, gonococo) -Sangramento genital -Tabagismo
-Vaginose bacteriana -Gestação múltipla -Traumatismo
-Passado de parto prematuro -Uso de drogas
Vale salientar que a atividade sexual e exercícios físicos não são mais considerados como fatores de risco para
a amniorrexe prematura.
Manifestações e diagnóstico: em cerca de 80% dos casos o diagnóstico é dado facilmente pela história
clínica e exame físico.
-Anamnese: a paciente relata típica história de líquido claro ou amarelo escorrendo subitamente pelas pernas.
-Exame físico: tem maior acurácia no diagnóstico se realizado até uma hora de ocorrido o evento. Deve-se
confirmar a amniorrexe através do exame especular, que é obrigatório, visto que outras causas de umidade na
vagina podem simular o quadro, tais como incontinência urinária, corrimento vaginal ou sudorese. Ao exame
especular observa-se líquido saindo pelo colo ou acumulado em fundo-de-saco posterior. Caso não seja
visualizado, deve-se proceder a manobra de Tarnier, que consiste em elevar a apresentação fetal pela palpação
abdominal e realizar, então, uma compressão uterina, na tentativa de visualizar a saída de líquido. O toque
vaginal deve ser evitado, exceto em gestantes em trabalho de parto ou na suspeita de corioamnionite, pois o
toque vaginal aumenta consideravelmente o risco de infecção.
-Teste da cristalização: o fluido obtido do fundo de saco vaginal, aplicado sobre uma lâmina e deixado secar
por 10 minutos apresenta uma aparência típica de folha de samambaia, também observada no muco cervical
estrogênico (primeira fase do ciclo menstrual). Durante a gestação não é esperada a cristalização do muco
cervical devido aos altos teores de progesterona.
-Teste do papel de Nitrazina: consiste na introdução de uma fita em fundo-de-saco posterior que irá identificar
o pH. Baseia-se no fato do pH vaginal situar-se entre 4,5 e 5,5 e o pH do LA ser alcalino, entre 6,5 e 7,5. Caso
a fita fique azul, que significa pH superior a 6,0, está confirmada a RPMO.
-Presença de elementos fetais na secreção vaginal: a presença de lanugem e de células da epiderme fetal são
também fatores que confirmam o diagnóstico.
-USG: permite avaliar a diminuição do líquido amniótico. Para isso, utiliza-se preferencialmente a medida do
ILA (Índice de líquido amniótico), que mede o maior bolsão vertical de LA encontrado em cada um dos 4
quadrantes uterinos. Apresenta baixa sensibilidade, pois um exame normal não descarta a ocorrência da
RPMO. É capaz de sugerir fortemente a amniorrexe prematura na presença de história típica de perda de
líquido, embora a diminuição do LA pode estar presente em outras patologias, como malformações fetais,
insuficiência placentária, pós-datismo e uso de medicações.

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128
Prognóstico: aproximadamente 1/3 das mulheres com amniorrexe prematura desenvolve sérias infecções,
como corioamnionite, endometrite e sepse. O feto e o neonato estão sob elevado risco de complicações; a
maior parte das gestações (50%) com RPMO evolui para parto prematuro em menos de uma semana da rotura.
Os neonatos estão vulneráveis a problemas como síndrome do desconforto respiratório, seqüelas neurológicas,
infecção (pneumonia, sepse, meningite) e enterocolite necrotizante. A RPMO está também associada a risco
aumentado de descolamento placentário e prolapso de cordão. Oligodrâmnio precoce e severa pode resultar
em hipoplasia pulmonar e deformidades faciais e ortopédicas (síndrome de Potter). Todas essas complicações
são mais comuns quando ocorre antes de 23 semanas de gestação.
Complicações:
-Infecção: causa ou conseqüência da RPMO. O risco de ocorrência é mais elevado quanto maior o período de
bolsa rota, podendo ocorrer corioamnionite e parto prematuro, especialmente até 72 horas após a ruptura
-Prematuridade: poucas gestações com RPMO pré-termo estabelecidas atingem o termo e 50% entram em
trabalho de parto em, no máximo, 1 semana, 75% em 2 semanas e 85% em 28 dias. O período de latência
varia de acordo com a idade gestacional, sendo maior quanto menor a idade gestacional.
-Acidentes de parto: é maior a incidência de apresentações distócicas, como as pélvicas e córmicas.
-Compressão e prolapso do cordão: tem risco especialmente alto, devido ao oligodrâmnio.
-Sofrimento fetal: anormalidades da freqüência cardíaca fetal são mais comuns após a RPMO do que em
partos prematuros com membranas íntegras, por provável compressão do cordão em situações de
oligodrâmnio, corioamnionite e descolamento placentário.
-Malformações: a mais característica é a Seqüencia de Oligodrâmnio (ou de Potter),
decorrente da compressão fetal. Pode ocorrer também em outras causas de oligodrâmnio
severo, como na agenesia renal. Há fácies anômala, hipoplasia pulmonar (ocorre se
oligodrâmnio severo antes de 24s de idade gestacional), achatamento da ponte nasal, dobra
anormal da orelha, posição anormal das mãos e pés e atitude de flexão por contratura de
cotovelos e joelhos.
-Risco de cesariana: como as alterações da freqüência cardíaca fetal são mais comuns nos
casos de amniorrexe prematura, observa-se uma maior freqüência do procedimento.
Conduta: na presença de infecção materna ou fetal, é mandatória a interrupção da gestação, independente da
idade gestacional, com preferência pela via vaginal, visto aos maiores riscos de infecção abdominal com a
cesariana. Para identificá-la, a febre é o sinal mais confiável no diagnóstico, quando presente a RPMO;
leucocitose não parece ser um bom indicador da infecção, devendo-se associar outros parâmetros como
taquicardia fetal, sensibilidade uterina e odor vaginal fétido. Descartado o processo infeccioso, a conduta irá
depender basicamente da idade gestacional:
-IG > 34 semanas (34 semanas e 6 dias): nestes casos, assim como naqueles em que há sinais de sofrimento
fetal ou infecção, é mandatória a conduta ativa, consistindo em interrupção da gestação. A escolha da via de
parto deve seguir os critérios obstétricos. Não está indicado o uso de tocolíticos ou corticóide nesse período. A
profilaxia do estreptococo do grupo B segue suas indicações clássicas (ver abaixo).
-IG entre 24 e 34 semanas: se não há sinais de infecção, sofrimento fetal ou metrossístoles, a conduta deve ser
conservadora visando o amadurecimento pulmonar fetal. Entretanto, se o parto é iminente, deve ser realizada a
profilaxia da infecção pelo estreptococo B hemolítico, a corticoterapia e a neuroproteção com sulfato de
magnésio (se idade gestacional entre 24 e 32 semanas e 6 dias).
-Neuroproteção: visa diminuir os riscos de paralisia cerebral. Vários esquemas são propostos; no IMIP, preconiza-se
o uso de sulfato de magnésio em um ataque de 6g, seguido de 1g/hora até 24 horas ou até a expulsão fetal.
-IG menor que 24 semanas: a conduta não é bem estabelecida, pois a sobrevida é bastante baixa nos fetos que
nascem nessa faixa etária, assim como são muitas as complicações precoces e tardias quando instituído o
tratamento conservador. A corticoterapia, a antibioticoterapia e o uso de tocolíticos não mostram benefícios,
não sendo indicados. Preconiza-se que a gravidez evolua naturalmente, seja com sua manutenção, seja com
parto ou abortamento. A via de parto é preferencialmente vaginal, mesmo que com colo desfavorável, no qual
é útil o uso do misoprostol. Deve-se esclarecer a paciente quanto ao quadro e vigiar sinais de infecção. A
profilaxia do estreptococo do grupo B, se necessária, está indicada.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


129
Tratamento conservador: a paciente deve ser mantida hospitalizada, em repouso, com hidratação abundante
(essa medida carece de evidências mais bem estabelecidas) e submetida à pesquisa de infecção e sofrimento
fetal, através de ausculta fetal, cardiotocografia e perfil biofísico fetal. O exame especular e o leucograma
devem ser realizados de forma seriada durante 3 dias; se normais, devem ser repetidos a cada 3 dias. A
amnioinfusão não tem evidências que a indiquem.
-Corticoterapia: comprovadamente diminui o risco de angústia respiratória e mortalidade em fetos
prematuros. Embora seus benefícios sejam maiores após 24 horas de instituído o tratamento, resultados
melhores já são observados naqueles com tratamento de menor duração, nos quais não foi possível o seu
término. Deve ser utilizado betametasona 12mg IM 1x/dia por 2 dias ou dexametasona 6mg IM 2x/dia por 2
dias. Doses adicionais rotineiras após sete dias não estão indicadas, mas o resgate após 15 dias é aceito.
-Tocólise: apresenta boa efetividade em prolongar a gestação por, ao menos, 48 horas nos casos de RPMO,
tempo necessário à realização da corticoterapia. Sua utilização rotineira não evidenciou melhoras nas taxas de
prematuridade, morbidade e mortalidade fetais. Seu uso deve ser bastante criterioso e precedido de avaliação
rigorosa das condições maternas e fetais, uma vez que a atividade uterina pode estar associada à infecção da
cavidade uterina. Atualmente, a inibição na RPMO é admitida apenas durante as 48 horas de corticoterapia.
-Antibioticoprofilaxia: diminui a morbidade neonatal e o risco de infecção materna, além de aumentar o tempo
de latência. O antibiótico mais adequado parece ser a eritromicina; a amoxicilina/clavulanato deve ser evitada,
pelo maior risco de enterocolite necrotizante. No IMIP, como a eritromicina não mais está disponível,
preconiza-se o uso de: Azitromicina 1g VO dose única + Ampicilina 2g EV 6/6 horas por 48 horas seguida de
1g 6/6 horas por mais 5 dias.
-Profilaxia da infecção pelo estreptococo do grupo B: mesmo tendo sido realizada a antibioticoprofilaxia, a
profilaxia para S. agalactiae deve ser realizada nos casos onde há indicações, quando não se consegue inibir o
parto (parto iminente).
Indicações de profilaxia:
-Gestantes com cultura vaginal ou retal positiva entre 35 e 37 semanas de gestação;
-Gestantes com fatores de risco nas quais não realizou-se a cultura retovaginal;
-Gestantes com fatores de risco e com cultura retovaginal negativa há mais que 5 semanas;
-Gestantes com bacteriúria pelo estreptococo do grupo B em qualquer fase da gravidez, mesmo após o tratamento
adequado;
-Gestantes com filhos acometidos por infecção pelo estreptococo do grupo B em gestação prévia.
Fatores de Risco
-Trabalho de parto com menos de 37 semanas;
-Temperatura intraparto maior ou igual a 38ºC;
-Amniorrexe há mais de 18 horas
Não deverão receber a profilaxia intraparto:
-Gestantes submetidas à cesariana eletiva, mesmo com cultura positiva, na ausência de trabalho de parto ou RPMO;
-Gestantes com swab negativo em intervalo inferior a 5 semanas, mesmo na presença de fatores de risco

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 2.

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PREMATURIDADE
Define-se parto pré-termo ou prematuro aquele ocorrido entre 20-22 semanas e 37 semanas incompletas. No
nosso meio, as taxas de prematuros situam-se em torno de 10% dos nascimentos.
Relembrando: o parto ocorrido antes de 20-22 semanas de gestação é considerado abortamento. Pequeno para a idade
gestacional (PIG) é o RN que nasce abaixo do percentil para a idade gestacional. RN de baixo peso ao nascer é todo
aquele que nasce com peso inferior a 2.500g, independente da idade gestacional.
Etiologia: estima-se que 45% dos casos de prematuridade sejam decorrentes de parto pré-termo com as
membranas íntegras, 30% decorram de rotura prematura das membranas ovulares (RPMO) e em 25% dos
casos o parto pré-termo é opção médica, como solução para complicações materno e/ou fetais. Entre as
causas, estão:
-Iatrogenia: cesariana eletiva com IG calculada erroneamente;
-Sobredistensão uterina: principalmente nos casos de gestação gemelar e polidrâmnio;
-Amniorrexe prematura: primária ou secundária a outros fatores;
-Gestação de alto risco: devido a alterações endócrinas e aumento da contratilidade;
-Malformações uterinas e Miomas: pois o útero suporta mal a distensão dada pelo feto;
-Incompetência istmo-cervical: causa de prematuridade, abortamento tardio e amniorrexe prematura;
-Infecções: infecção aguda (a hipertermia leva ao aumento da cinética uterina) ou corioamnionite. Os
microorganismos mais associados são: E. coli, estreptococo do grupo B, clamídia trachomatis, trichomonas,
bacterioides, Gardnerella e Neisseria gonorrhoeae.
Fatores de Risco: os fatores de risco para a prematuridade são semelhantes aos da RPMO. A história de parto
prematuro anterior é o fator de risco mais significativo para a ocorrência de novo evento. Dentre os outros
fatores de risco, destacam-se:
-Estresse: mulher solteira, baixo nível socioeconômico, ansiedade, depressão, cirurgia abdominal durante a gravidez;
-Fadiga ocupacional: postura em pé, uso de máquinas industriais, esgotamento físico, estresse mental;
-Distensão uterina excessiva: gestação múltipla, polidrâmnio, anomalia uterina ou miomatose;
-Fatores cervicais: história de aborto de 2º trimestre, história de cirurgia cervical, dilatação prematura do colo;
-Infecção: DST, infecção sistêmica, bacteriúria, pielonefrite, doença periodontal.
Fisiopatologia: o parto pré-termo é um evento multifatorial, no qual estão envolvidas a liberação de citocinas
inflamatórias (interleucinas, TNF), hormônios hipotalâmicos e adrenais (ocitocina, cortisol e hormônio
liberador da corticotropina), produção de estrógenos placentários, prostaglandinas e formação de trombina. A
liberação dessas substâncias parece ser resultado de um dos quatro processos patológicos: ativação prematura
do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal materno e fetal, inflamação/infecção, hemorragia decidual e distensão
uterina patológica.
Manifestações e diagnóstico: a atividade uterina segue um padrão de acordo com a idade gestacional: entre
28 a 32 semanas de gestação estão presentes as contrações de Braxton-Hicks, indolores, aproximadamente 2
por hora e, entre 33 e 36 semanas até 3 por hora. No trabalho de parto prematuro, a atividade uterina encontra-
se precocemente aumentada, sendo as contrações dolorosas, persistindo por no mínimo 1 hora, a despeito do
repouso materno ou analgesia. Podemos então classificar em:
-Ameaça de trabalho de parto prematuro: atividade uterina aumentada e apagamento parcial ou total do colo
com dilatação ausente ou discreta.
-Trabalho de parto prematuro franco: quatro contrações em 20 minutos (ou 8 em 1 hora), associada a
apagamento cervical maior ou igual a 80% e dilatação cervical maior que 2 cm.
Diagnóstico complementar: alguns exames complementares podem ser utilizados como preditores de
trabalho de parto. Entretanto, apresentam altas taxas de falso-positivo. Não são usados rotineiramente pois
além do alto custo, não há medidas efetivas para oferecer às pacientes com resultado alterado para que assim
fosse mudado o prognóstico da gestação.
-USG: avalia o comprimento do colo uterino. Em mulheres de alto risco de prematuridade, a distância menor
que 25mm entre o orifício cervical interno e externo, entre 18 e 24 semanas de gestação, parece ser preditor de

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


131
parto antes de 35 semanas de gravidez.
-Amniosure: teste mais moderno que apresenta a maior sensibilidade e especificidade para o diagnóstico.
-Dosagem de fibronectina fetal na secreção cervicovaginal: as fibronectinas são glicoproteínas encontradas no
plasma e no fluido extracelular. Acredita-se que seja a 'cola' do trofoblasto, promovendo a adesão entre a
interface uteroplacentária e a membrana fetal-decídua. É liberada na secreção cervicovaginal quando ocorre
ruptura dessa interface, o que justifica o seu uso como marcador de trabalho de parto.
Prognóstico: o parto pré-termo é responsável por 75% da mortalidade neonatal e 50% das lesões neurológicas
na criança. Está associado à maior ocorrência de tocotraumatismos e anóxia, podendo haver graves lesões
cerebrais. Pode ainda se associar a seqüelas tardias, como retardo do crescimento, disfunções auditivas e
visuais, maior chance de óbito no primeiro ano de vida e complicações imediatas, à exemplo de
hiperbilirrubinemia, persistência do canal arterial, enterocolite necrotizante, hemorragia intracraniana e
síndrome da angústia respiratória (SAR).
-SAR: é a principal causa de óbito no RN prematuro. É decorrente da ausência de surfactante (lecitina) efetivo,
produzido pelo pneumócito tipo 2, responsável pela estabilidade alveolar, pois reduz a tensão na interface ar/alvéolo,
impedindo o colabamento alveolar. Caracteriza-se por RN com dispnéia, taquipnéia, acidose, cianose e estertores.
Prevenção: a prevenção primária do trabalho de parto prematuro consiste na eliminação ou redução dos
fatores de risco. O acompanhamento rigoroso pré-natal em mulheres com história de parto prematuro anterior,
com fatores de risco e/ou com gestação gemelar é indispensável. Existem ainda outras medidas eficazes:
-Diminuição da atividade física: deve ser instituída em mulheres de risco a partir de 20 semanas de gestação,
especialmente em mulheres com atividade árdua, que permanecem longo tempo em pé e que realizem
atividades cansativas. O repouso em leito hospitalar ou domiciliar não apresenta firmes evidências. Da mesma
forma, o repouso no leito não deve ser recomendado rotineiramente a mulheres grávidas de gêmeos.
-Circlagem: consiste na sutura do orifício interno do colo uterino. É um procedimento utilizado para a
correção da incompetência istmo-cervical (IIC) em pacientes com alto risco de parto prematuro. Deve ser
realizada de forma eletiva preferencialmente entre 14 e 16 semanas de gestação. Pode ser realizada
excepcionalmente entre 16 e 24 semanas de forma emergencial. Deve ser evitada em períodos precoces da
gestação, devido ao maior risco de abortamento e em períodos posteriores pelo maior risco de rotura
iatrogênica de membranas ovulares. A técnica mais utilizada é a cirurgia de MacDonald. Alguns autores
recomendam a utilização de uterolíticos antes e depois do procedimento, por no mínimo 12 horas. É ainda
recomendada a remoção dos pontos às 37 semanas de gestação ou em casos de RPMO, presença de sinais de
infecção ovular ou contrações que não respondem aos uterolíticos. Repouso no leito por 3-5 dias e abstinência
sexual por 1 semana. Contraindicações: dilatação do colo superior a 4 cm, malformações fetais, infecção
cervical ou vaginal purulenta, RPMO, atividade uterina, membranas protusas e IG maior que 24 semanas.
-IIC: As maiores causas da IIC são alterações congênitas
(malformações uterinas) ou adquiridas (tumores, cirurgias). O
diagnóstico é dado pela história típica de perda fetal no segundo
trimestre, de forma indolor, com poucas ou nenhuma contração
uterina. As perdas podem ser múltiplas e, caracteristicamente, em
idade gestacional mais precoce quanto maior o número de gestações.
O USG evidenciando comprimento cervical menor que 20mm,
dilatação do orifício interno ou imagem em funil no orifício interno
do colo medindo pelo menos 16mm após 16 semanas de gestação
são dados importantes para o diagnóstico.
-Suplementação com progestógenos: deve ser realizada na forma
de supositórios vaginais diários ou injeções intramusculares
semanais, a partir do 2º trimestre (em torno da 20ª semana) ate 34
semanas de gestação.
Tratamento
-Conservador: inclui medidas para interromper o trabalho de
parto prematuro e, com isso, prolongar a gestação, possibilitando
o uso do corticóide e a transferência para centros terciários.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


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-Hidratação venosa: não há evidência a favor de sua realização.
-Antibióticos: o uso de antibióticos no trabalho de parto prematuro não mostrou benefício em prolongar a
gestação e, portanto, não deve ser recomendado. Entretanto, possui indicação formal na RPMO.
-Tocólise: indicada para a inibição das contrações uterinas, por conta dos prejuízos fetais associados à
prematuridade. As drogas geralmente utilizadas são:
-Betamiméticos: substâncias semelhantes às catecolaminas que atuam na musculatura involuntária lisa, causando
relaxamento muscular. Eficazes em prolongar a gestação por 48 horas. Estão contraindicados em cardiopatas, anemia
falciforme e história de edema agudo de pulmão. Seu uso deve ser cuidadoso em hipertireoidismo, asma compensada,
diabetes, polidrâmnio, gestação gemelar e sangramento ativo. Efeitos colaterais: palpitação, taquicardia materna e
fetal, tremores, hiperglicemia, hipoglicemia neonatal. Salbutamol (Aerolin) 5 amp (5mg/ml) diluídas em 500ml
SG5%, iniciar com 10gts/min e aumentar 10 gts a cada 20 minutos até cessar as metrossístoles.
-Inibidores da síntese de prostaglandinas: atua inibindo a síntese de cicloxigenase e bloqueando a conversão de ácido
araquidônico em prostaglandina. A indometacina é o fármaco mais utilizado, na dose inicial de 100mg por via retal,
seguida de 100mg via retal a cada 12 horas ou 25-50mg por via oral a cada 4 horas por, no máximo, 3 dias.
Contraindicações: púrpura trombocitopênica, úlcera péptica, agranulocitose, asma brônquica, doença renal ou
hepática, plaquetopenia e gestação acima de 32 semanas. O oligodrâmnio e o fechamento precoce do canal arterial (e
conseqüente hipertensão pulmonar fetal) estão associados ao uso de indometacina por mais que 48-72 horas e após a
32ª semana de idade gestacional.
-Bloqueadores dos canais de cálcio: são tão ou mais eficazes que os betamiméticos, apresentando bem menos efeitos
colaterais. A nifedipina é o principal representante. Há diversos esquemas de posologia, dentre eles: ataque oral com
30mg seguido de 20mg a cada 4 a 6 horas; 10 mg via oral a cada 20 minutos até o máximo de 4 doses. Entre as
contraindicações estão: hipotensão (PA <90x50mmHg), uso concomitante de sulfato de magnésio (risco de bloqueio
neuromuscular e hipotensão grave) e ICC com disfunção ventricular esquerda.
-Sulfato de Magnésio: age através da competição com os íons cálcio pela entrada nas células musculares. Revisão
sistemática não evidenciou benefício em seu uso, mesmo quando comparado ao placebo, além da associação com
maior risco de morte fetal. Posologia: ataque de 4-6g IV em 20 minutos seguido de manutenção com 3-4g/h em BIC.
Devido ao risco de toxicidade pelo magnésio, deve ser avaliado, periodicamente (a cada 2-4 horas) os níveis séricos
de magnésio ou, na sua indisponibilidade, os parâmetros: reflexo patelar, freqüência respiratória e débito urinário;
caso alterados, o sulfato deve ser suspenso e administrado 1g de gluconato de cálcio a 10%.
A tocólise tem algumas contraindicações: Absolutas → doença materna de difícil controle (hipertensão arterial
grave e DPP), corioamnionite, malformações fetais incompatíveis com a vida, óbito fetal, sofrimento fetal
agudo e maturidade pulmonar fetal comprovada; Relativas → placenta prévia, colo com dilatação superior a
4cm e RPMO.
-Corticoterapia: a corticoterapia materna antenatal promove redução significativa da mortalidade neonatal.
Sua ação parece ser mais efetiva após 48 horas do início de sua administração, embora existam evidências de
benefícios horas após o seu início. Age pela aceleração da maturação pulmonar, pelo estímulo aos
pneumócitos tipo II na produção do surfactante. Os fármacos recomendados são a dexametasona e a
betametasona; outros corticóides não devem ser utilizados pois não atravessam adequadamente a barreira
placentária. Posologia: Betametasona → 12mg IM 1x/dia por dois dias; Dexametasona → 6mg IM 2x/dia por
dois dias. Deve ser realizada em toda gestante entre 24 e 34 semanas de gestação com risco de parto pré-
termo. Seu uso não se associa com diminuição da incidência de SAR, mas reduz sua gravidade.
Contraindicações: presença de infecção ovular, úlcera péptica sangrante, diabetes descompensado e alcalose
hipocalêmica. Não há efeitos colaterais fetais descritos.
-Ativo: é a opção nos casos de contraindicação à tocólise e nos casos de gestações superiores a 34 semanas.
-Rastreio e profilaxia para infecção por Streptococcus beta-hemolítico do grupo B: o S. agalactiae é um
diplococo gram-positivo que pode ser encontrado na vagina de 15-35% das gestantes. Devido a seriedade e
prevalência de infecção neonatal por esse agente, recomenda-se que todas as gestantes com idade gestacional
entre 35-37 semanas sejam rastreadas através da coleta de swab vaginal e retal. As indicações de profilaxia
intraparto com antibioticoterapia para o estreptococo são:
-Gestantes com cultura vaginal ou retal positiva entre 35 e 37 semanas de gestação;
-Gestantes com fatores de risco nas quais não realizou-se a cultura retovaginal;
-Gestantes com fatores de risco e com cultura retovaginal negativa há mais que 5 semanas;

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


133
-Gestantes com bacteriúria pelo estreptococo do
grupo B em qualquer fase da gravidez, mesmo após o
tratamento adequado;
-Gestantes com filhos acometidos por infecção pelo
estreptococo do grupo B em gestação prévia.
Fatores de Risco
-Trabalho de parto com menos de 37 semanas;
-Temperatura intraparto maior ou igual a 38ºC;
-Amniorrexe há mais de 18 horas
Não deverão receber a profilaxia intraparto:
-Gestantes submetidas à cesariana eletiva, mesmo
com cultura positiva, na ausência de trabalho de parto
ou RPMO;
-Gestantes com swab negativo em intervalo inferior a 5 semanas, mesmo na presença de fatores de risco
Assistência ao parto: uma vez não havendo mais indicações de tocólise ou não se conseguindo realizá-la com
sucesso, deve-se determinar o melhor momento e a via de interrupção da gravidez. O risco de asfixia neonatal
e traumatismo fetal é consideravelmente maior nessas gestações, implicando necessidade de monitorização
rigorosa.
-Avaliação da vitalidade fetal: deve ser realizada de forma rigorosa. Nos fetos pré-termo, há uma variabilidade
diminuída da freqüência cardíaca e uma linha de base mais alta à cardiotoco. As acelerações de batimento
fetais são mais discretas (cerca de 10 bpm) e menos freqüentes.
-Via de parto: não se justifica a indicação de cesariana em fetos prematuros em apresentação cefálica. A
cesariana parece beneficiar fetos com peso fetal estimado menor que 1.500g em apresentação pélvica,
devendo-se realizar a histerotomia longitudinal nos casos de prematuridade extrema.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 2.

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134

SÍNDROMES HIPERTENSIVAS NA GRAVIDEZ


Os distúrbios hipertensivos complicam cerca de 15-22% das gravidezes, se constituindo importante causa de
morbimortalidade perinatal e a principal causa de mortalidade materna.
Fatores de risco: raça negra, extremos de vida reprodutiva (<15 anos e >35 anos), história familiar, PE prévia,
gravidez gemelar, gestação molar (na qual sintomas surgem antes de 20 semanas), diabetes, obesidade,
hipertensão crônica, doença renal e hidropsia fetal. A exposição ao sémen do parceiro diminui o risco de PE.
Fisiopatologia: a etiologia da PE ainda é desconhecida e motivo de investigação. Atualmente há quatro teorias
que buscam explicar o seu desenvolvimento. Uma das mais aceitas tem como base a implantação anormal da
placenta no leito uterino devido à ausência da 2ª onda de migração trofoblástica, entre a 16ª e 20ª semana.
-Teoria da placentação anormal: há dois tipos de trofoblasto: citotrofoblasto e sinciciotrofoblasto. Este último
é responsável pela invasão da decídua e das artérias espiraladas, alargando o seu diâmetro em 4 a 6 vezes; o
resultado é o aumento do fluxo sanguíneo para que haja um adequado desenvolvimento da placenta e do feto.
Na Pré-eclâmpsia (PE) há um deficiente invasão, principalmente na 2ª onda (16-20 semanas), o que torna os
vasos 40% menores do que na gravidez normal. Assim, a resistência arterial não cai adequadamente, os vasos
permanecem estreitos e, conseqüentemente, desenvolve-se uma isquemia placentária, que se torna mais
pronunciada com a progressão da gestação. Em conseqüência da isquemia, há um desequilíbrio entre a
produção de vasodilatadores (prostaglandina) e vasoconstrictores (tromboxano) pelo endotélio, ocorrendo
espasmo arteriolar placentário e sistêmico, evento básico na fisiopatologia da hipertensão na gestação. A lesão
endotelial, além de aumentar a reatividade vascular e causar o desenvolvimento de hipertensão, favorece a
deposição de fibrina no leito vascular, deflagrando eventos de CIVD. Portanto, o distúrbio endotelial no
controle do tônus vascular leva então a hipertensão, aumento da permeabilidade vascular (edema e
proteinúria) e isquemia em órgãos-alvo (cérebro, fígado, rins e placenta), além de poder deflagrar CIVD.
-Teoria da má adaptação: baseia-se numa resposta imune materna deficiente aos antígenos paternos, regulada
pelo sistema HLA. Quando há essa deficiência, ocorre adaptação inadequada ao tecido placentário.
-Teoria do estresse oxidativo: relaciona a hipoxemia placentária como a responsável pela geração de radicais
livres, que ganham a circulação materna e causam danos endoteliais.
-Teoria da susceptibilidade genética: a PE é mais observada em mulheres com história familiar, em gêmeas e
na raça negra, o que faz considerar um possível fator genético relacionado à doença.
Repercussões sistêmicas:
-Cardiovascular: ocorre hemoconcentração por vasoconstricção associada ao aumento da permeabilidade
vascular. Há, então, menor líquido circulante, porém não ocorre hipovolemia devido a vasoconstricção.
-Hematológicas: a anormalidade mais comum é a plaquetopenia decorrente da formação de microtrombos. O
TP, TTPA e fibrinogênio não se alteram, exceto se acometimento hepático ou DPP. A queda do hematócrito, se
presente, é decorrente da hemólise.
-Renal: a lesão mais característica, porém não mais patognomônica, é a endoteliose capilar glomerular.
-Endócrinas e metabólicas: na gravidez normal, a concentração dos componentes do sistema renina
angiotensina aldosterona (SRAA) está aumentada, porém a resposta vascular permanece diminuída devido a
secreção equilibrada de vasoconstrictores e vasodilatadores. Na PE, em resposta à retenção primária de sódio e
à hipertensão, a secreção de renina pelo aparelho justaglomerular diminui (logo, também decresce a
concentração de angiotensina II e aldosterona), porém há uma maior reatividade do músculo liso arteriolar
devido ao aumento dos vasoconstrictores (tromboxano).
-Cerebral: não é a hipertensão arterial que está implicada na fisiopatologia das crises convulsivas, e sim a
disfunção endotelial, semelhante a que ocorre na placenta e nos rins, que é responsável pela formação de
microtrombos no SNC, fenômeno que causa a isquemia cerebral. Somam-se ainda os eventos de vasoespasmo
das artérias cerebrais como contribuintes aos episódios convulsivos. Uma causa de morte (60% dos óbitos) em
pacientes com PE é a hemorragia cerebral, geralmente por aumento da permeabilidade e rotura do vaso.
Outras manifestações cerebrais incluem cefaléia, alterações visuais, escotomas e, mais raramente, amaurose.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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-Hepáticas: a lesão endotelial hepática pelo vasoespasmo e depósito de fibrina leva à hemorragia periportal.
Manifesta-se por dor em hipocôndrio direito, dor epigástrica, elevação das aminotransferases e, nos casos mais
graves, hemorragia subcapsular ou rotura hepática.
-Uteroplacentárias: há redução do fluxo em 40 a 60 %, por aumento da resistência vascular, decorrente da
ausência da segunda onda trofoblástica. Essa redução explica a expressiva incidência de infarto placentário,
crescimento retardado da placenta e seu descolamento. Estes fenômenos determinam sofrimento fetal crônico
e são responsáveis pela elevada mortalidade perinatal. A atividade uterina está aumentada, o que explica a
grande incidência de prematuridade.
Tipos:
1- Hipertensão arterial sistêmica crônica (HASC): na gravidez, é definida como um estado hipertensivo (PA
>140x90mmHg) presente antes do início da gestação ou diagnosticado antes das 20 semanas de gestação. Não
está associada a edema e proteinúria (salvo nos casos de nefropatia presente antes da gravidez) e persiste
decorrida doze semanas do parto.
Vale lembrar que a PA fisiologicamente na gravidez sofre uma redução, principalmente após as 16 semanas, o que
pode tornar normal uma PA antes elevada. Os IECA são contraindicados e os diuréticos devem ser evitados.
2- Hipertensão arterial crônica com pré-eclâmpsia sobreposta: também chamada de hipertensão crônica
agravada pela gravidez. Caracteriza-se por um agravamento da hipertensão crônica caracteristicamente após a
24ª semana de gestação. Pode ser acompanhada de proteinúria (PE sobreposta). Estigmas de hipertensão
crônica (nefropatia e retinopatia hipertensiva) ajudam a diferenciar este tipo da pré-eclâmpsia isolada.
3- Pré-eclâmpsia: se refere ao aparecimento de hipertensão e proteinúria após 20 semanas de gestação em
paciente previamente normotensa. É multissistêmica, idiopática e específica da gravidez humana e puerpério.
Hipertensão na gravidez é definida como PA >140x90 e proteinúria como 300mg ou mais de proteína em urina
de 24 horas. O edema ou aumento súbito do peso não são mais critérios diagnósticos, como eram considerados
-Eclâmpsia: é a ocorrência de crises convulsivas em paciente com pré-eclâmpsia, descantando-se outras
causas. São geralmente do tipo tônico-clônicas generalizadas, podendo aparecer antes, durante e até 10 dias
após o parto. Algumas pacientes evoluem diretamente para eclâmpsia, sem PE (eclâmpsia branca). Geralmente
as convulsão são autolimitadas (2-3 minutos) e precedidas de cefaléia, alterações visuais, epigastralgia, dor no
quadrante superior do abdome e hiperreflexia tendinosa (sinais e sintomas de iminência de eclâmpsia)
4- Hipertensão gestacional ou transitória: é a hipertensão, geralmente leve, que se desenvolve ao final da
gestação, sem a presença de proteinúria ou dos sintomas de pré-eclâmpsia. A PA retorna aos níveis normais em
até 12 semanas de puerpério e recorre em 80% das gestações subsequentes. É, então, um diagnóstico
retrospectivo.
Rastreio: como a gestante com PE é geralmente assintomática, a detecção precoce da doença requer uma
cuidadosa observação clínica em intervalos regulares. Ganho excessivo de peso e aumento da PA,
especialmente a PAD, mesmo em níveis normais, são sinais de alerta. Entretanto, o uso de métodos de rastreio
não é acompanhado por diminuição da incidência de PE e, dessa forma, sua utilização rotineira não está
indicada. O teste de hipotensão supina, o exame de fundo de olho e o Doppler das artérias uterinas são exames
desenvolvidos com o intuito de predizer PE, porém nenhum se mostrou suficientemente específico ou sensível
para permitir sua indicação rotineira no pré-natal. Portanto, aferição de PA e realização de proteinúria
permanecem como testes de rastreio e diagnóstico dos distúrbios hipertensivos.
Complicações: a única forma de se curar os distúrbios hipertensivos é com o término da gestação. O risco de
complicações como convulsões, DPP, hemorragia cerebral, edema agudo de pulmão, hemorragia hepática e
insuficiência renal regridem completamente após o parto.

PRÉ-ECLÂMPSIA
Diagnóstico: diagnosticada na presença de hipertensão (PA >140x90) e proteinúria (300mg ou mais de
proteína em urina de 24 horas). A hipertensão é o sinal clínico mais freqüente da síndrome. Um aumento de
30mmHg na sistólica e 15mmHg na diastólica em relação aos níveis pré-gravídicos já foi considerado
patológico, mas esse critério não deve mais ser utilizado devido a baixa sensibilidade; entretanto, tais
elevações merecem investigação. Em relação à proteinúria temos alguns exames para identificá-la:

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-Proteinúria de 24 horas: presença de 300mg ou mais de proteína em urina de 24 horas. Exame mais acurado.
-Proteína em fita (Labistix): 1+ ou mais em duas amostras colhidas com intervalo mínimo de 4 horas seria
correspondente a 300mg em urina de 24 horas. Entretanto, não correspondente fidedignamente aos exame de 24 horas
-Dosagem em amostra isolada: 30mg/dl ou mais em amostra isolada correlaciona-se a 300mg em urina de 24 h
-Razão proteína/creatinina: Níveis >0,19 associam-se a 300mg em urina de 24 h. Minimiza tempo.
A proteinúria é não-seletiva e costuma ser achado tardio no curso da doença, pois depende do
desenvolvimento de lesão histológica glomerular para se manifestar. Cerca de 20% das pacientes com
eclâmpsia não desenvolvem proteinúria. Portanto, raramente a proteinúria precede a hipertensão.
Classificação:
-PE Leve: é aquela que não preenche os critérios de gravidade, ou seja, PA <160x110 em duas aferições e
proteinúria entre 300mg e 2g em 24 horas, o que corresponde a 1+ no Labistix
-PE grave: é considerada grave caso a paciente apresente qualquer sinal de toxemia: PA > 160x110mmHg que
persiste após 30 minutos de repouso em decúbito lateral esquerdo (DLE); proteinúria >2g/24 horas (ou 2+ no
Labistix); Creatinina sérica >1,2mg/dL; sinais de iminência de eclâmpsia; surgimento de síndrome HELLP
-Iminência de eclâmpsia: distúrbios cerebrais (cefaléia fontoccipital pouco responsiva a analgésicos), distúrbios
visuais (visão turva, escotomas, diplopia e amaurose), dor epigástrica ou no quadrante superior direito (sinais de
isquemia hepática ou de distensão capsular por edema e hemorragia) e reflexos tendinosos profundos exaltados.
Prevenção: são aceitas duas medidas preventivas, a partir da 14ª semana de gestação:
-Aspirina: uso de 100mg/dia de aspirina em pacientes de alto risco: hipertensas crônicas, pacientes com
história familiar ou obstétrica de PE (PE, Eclâmpsia, HELLP, DPP) e/ou aquelas com incisura bilateral na
Dopplerfluxometria das artérias uterinas (nesse último caso, a droga deve ser iniciada com 20-24 semanas de
gestação). Seu uso deve ser interrompido 5 dias antes do parto.
-Cálcio: uso de 2g/dia para pacientes de risco que fazem baixa ingesta do íon na alimentação.

ECLÂMPSIA
Caracteriza-se pela presença de convulsões tônico-clônicas em gestante ou puérpera com PE. Ocorrem em 2%
dos casos de PE grave. A causa exata de ainda é incerta, sendo implicado o vasoespasmo acompanhado de
isquemia, infarto local e edema, assim como encefalopatia hipertensiva. Após a convulsão sobrevém um
estado comatoso (pós-ictal), seguido de alterações respiratórias, taquicardia, hipertermia e acidose lática. Mais
raramente um coma profundo é ocasionado por hemorragia dos centros cerebrais, sendo o prognóstico
reservado. Bradicardia fetal pode ser observada durante a após a eclâmpsia e não requer parto de emergência;
a estabilização materna é suficiente para a recuperação fetal. Classificação:

SÍNDROME HELLP
Significa Hemolisis, Elevated Liver enzimes e Low Platelets. Pode DEFINIÇÕES
representar uma forma grave de PE ou se desenvolver na ausência de Hipertensão arterial: PAS >
hipertensão e proteinúria, o que ocorre em 15-20% dos casos. 140 e/ou PAD >90
-Hemólise: definida pela presença de anemia hemolítica microangiopática, sendo Proteinúria: >300mg em
a alteração mais importante da tríade. Diagnosticada pela presença de esquizócitos urina de 24 horas, sendo grave
quando >2g/24hrs ou se >2+
no esfregaço de sangue periférico, aumento de bilirrubina (>1,2mg/dl) às custas
Plaquetopenia: <100.000/
de indireta, DHL aumentada (>600UI/l) e diminuição da hemoglobina. mm³, sendo grave quando
-Elevação das enzimas hepáticas: AST > 70UI/l -Plaquetopenia: inferior a <50.000/mm³
100.000 Elevação das enzimas
Outros sintomas incluem: dor no quadrante superior direito ou epigástrica hepáticas: AST >70U/L e
(80% dos casos), piora do edema (50%), hipertensão (85%), proteinúria DHL > 600U/L
(87%), náuseas e vômitos (50%), cefaléia (40%), alterações visuais (15%) e Anemia microangiopática:
BT >1,2mg/dL e esquizócitos
icterícia (5%). A mortalidade é muito maior que na PE isolada, variando de 0 em sangue periférico.
a 24%, geralmente por rotura hepática, CIVD, edema pulmonar, trombose de
carótida e AVE.

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TRATAMENTO DOS DISTÚRBIOS HIPERTENSIVOS
Pré-Eclâmpsia leve:
-Interrupção da gestação: a terapêutica deve ser conservadora até que o concepto atinja o termo (37 semanas),
quando então é recomendada a interrupção da gravidez, de preferência por via vaginal, mesmo que seja
necessário realizar a indução. A interrupção imediata da gestação só está indicada se surgirem sinais de
agravamento ou de sofrimento fetal.
-Tratamento ambulatorial: O acompanhamento materno-fetal deverá ser rigoroso, com consultas de pré-natal
semanais, constando de avaliação periódica da gestante e da vitalidade fetal.
-Orientações gerais: dieta balanceada, sem necessidade de restrição sódica; repouso relativo; informações
quanto aos sinais de agravamento.
-Medicamentos anti-hipertensivos: o tratamento anti-hipertensivo não altera o curso da doença, não reduz a
morbimortalidade perinatal e ainda pode diminuir a perfusão placentária. Portanto, nas formas leve, o
tratamento anti-hipertensivo não está indicado.
-Avaliação do bem-estar materno: deve-se avaliar periodicamente a gestante para detectar precocemente a
progressão da doença. Avaliar: ganho ponderal; PA; hemograma com plaquetas; uréia, creatinina e ácido úrico;
aminotransferases e DHL; EAS e proteinúria de 24 horas.
-Avaliação do bem-estar fetal: Clínico → movimentação fetal; crescimento uterino e volume do líquido
amniótico (LA) para rastreamento de crescimento intra-uterino restrito (CIUR) e oligodrâmnio. Complementar
→ cardiotocografia (semanalmente após 30-32 semanas), USG obstétrica (avaliar perfil biofísico fetal) e
dopplervelocimetria (solicitar ao diagnóstico e repetir, se normal, uma vez por mês). Os achados indicativos
de gravidade incluem: centralização, diástole zero, oligodrâmnio e CIUR severo.
PE grave e Eclâmpsia:
-Internação e estabilização materna
-Medidas gerais: proceder cateterismo venoso e vesical, dieta normossódica e avaliação da vitalidade fetal.
-Interrupção da gestação: PE grave: IG < 23 semanas → deve ser interrompida pelo péssimo prognóstico
materno-fetal; IG entre 24 e 34 semanas → estabilização materna e interrupção da gravidez 48 horas após
iniciado o uso do corticóide ou conduta conservadora caso as condições clínicas maternas e fetais permitam;
IG > 34 semanas → estabilização materna seguida de interrupção da gestação. Eclâmpsia: deve ser tratada
com a interrupção da gravidez em qualquer idade gestacional, logo após estabilização materna, em benefício
da mãe.
-Aceleração da maturidade pulmonar fetal: quando necessária, é realizada com betametasona 12mg IM a cada
24 horas, no total de duas doses.
-Sulfato de magnésio: usado para prevenir ou controlar as convulsões, não possuindo ação anti-hipertensiva. É
a droga mais efetiva na terapia anticonvulsivante. Parece agir através de uma vasodilatação seletiva da
vasculatura cerebral. Deve ser prontamente indicada em todo quadro de eclâmpsia ou PE grave com sinais de
iminência de eclâmpsia. Deve ser mantida até 24 horas após o parto, podendo se estender até as 48 horas.
-Esquema: dose de ataque de 6g (1 ampola) EV lento (em 30 minutos), seguido de dose de manutenção de 2g/hora em
bomba de infusão.
-Avaliação: para evitar a intoxicação pelo magnésio, que pode causar depressão muscular, respiratória e cardíaca,
alguns parâmetros devem ser avaliados a cada 4 horas: magnesemia (se disponível), reflexos tendinosos profundos
(especialmente o patelar), diurese (se menor que 25-30ml/hora indica um reajuste da dose para evitar a intoxicação,
uma vez que a depuração é renal) e respiração (<12 irpm indica intoxicação).
-Antídoto: se presente qualquer sinal de intoxicação, está indicada suspensão imediata da droga e administração de
gluconato de cálcio 1g EV, infundido lentamente em 3-5 minutos.
-Níveis séricos de Mg e intoxicação: 10-15mEq/L → abolição do reflexo patelar; >15mEq/L → depressão
respiratória; > 30mEq/L → parada cardíaca.
-Tratamento anti-hipertensivo: medicamentos devem ser sempre administrados se PAD >110mmHg e/ou PAS
>160mmHg, devido aos riscos de hemorragia cerebral. O objetivo é alcançar valores de PAS de140-155 e
PAD de 90-100, visto que diminuição a níveis inferiores podem levar ao comprometimento do bem-estar fetal,
devido ao agravamento da perfusão placentária.
-Tratamento agudo: hidralazina é o medicamento de escolha, na dose de 5mg IV a cada 20 minutos até estabilizar a

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PA ou até alcançar a dose máxima de 30mg, quando deve-se utilizar outras drogas. Opções: labetalol (bloqueador alfa
e beta) 20mg EV a cada 10 minutos, até dose máxima cumulativa de 300mg; Nifedipina (bloqueador dos canais de
cálcio) 10mg sublingual a cada 30 minutos; nitroprussiato de sódio (deve ser evitado em gestantes, exceto nos casos
refratários a outras drogas).
-Tratamento crônico: deve ser instituído em casos de prematuridade extrema na qual as condições maternas permitam
levar a gestação e nas pacientes com hipertensão prévia. A metildopa é a droga de escolha, na dose inicial de 250mg
VO 2x/dia até a dose máxima de 4g/dia. Como é considerado um anti-hipertensivo leve, muitas mulheres irão
necessitar de outras drogas. Opções: hidralazina 25mg 2x/dia (máximo de 300mg/dia), Verapamil (bloqueador dos
canais de cálcio) 80mg/dia (máximo de 240mg/dia) e labetalol 100amg 2x/dia (máximo de 2400mg/dia). IECA são
contraindicados e diuréticos devem ser evitados.
-Via de parto: o parto deve ser preferencialmente por via vaginal, mesmo nos casos de eclâmpsia, levando em
consideração a idade gestacional, condições fetais, presença de cesariana anterior e condições do colo. Em
gestações menores que 30 semanas com colo desfavorável ou naquelas em que o feto possui parâmetros
desfavoráveis na CTG e no Doppler ou ainda se feto <1.500g, deve-se optar pelo parto cesário.
HELLP: o principal tratamento é a interrupção da gravidez. Na presença de feto com idade >34 semanas,
indica-se estabilização materna seguida de interrupção da gravidez; se idade inferior a 34 semanas, deve-se
estabilizar a paciente, fazer uso de glicocorticóide e proceder a internação em centro terciário pois,
geralmente, após 24 horas do corticóide a conduta consiste em interromper a gravidez. As mesmas
recomendações da terapia anti-hipertensiva e do sulfato de magnésio da PE grave/eclâmpsia aqui se aplicam.
O parto vaginal é preferível em gestantes em trabalho de parto ou com amniorrexe prematura e com feto em
apresentação cefálica, independente da idade gestacional; indução do parto está indicada em > 30 semanas
com colo favorável e > 34 semanas com colo favorável ou não. Em geral, nas primeiras 24 a 48 horas de
puerpério na síndrome HELLP, há uma piora transitória do quadro clínico, devido ao consumo de plaquetas e
fatores de coagulação.
Hipertensão gestacional: conduzir como PE leve
Hipertensão agravada: conduzir como PE grave.

PROGNÓSTICO
Na eclâmpsia, a mortalidade materna é de 10-15%, sendo a principal causa a hemorragia cerebral (60%),
seguida pelo edema agudo de pulmão. Na pré-eclâmpsia leve e grave a mortalidade materna é rara, a não ser
que evolua com síndrome HELLP. As possíveis complicações dos casos graves incluem: DPP, CIVD,
insuficiência renal aguda, hemorragia intracerebral, amaurose transitória, parada cardiorrespiratória,
pneumonia de aspiração, edema agudo de pulmão e hemorragia pós-parto. Em geral, os danos são reversíveis,
à exceção da hemorragia cerebral que pode levar a danos neurológicos irreversíveis.
A mortalidade perinatal está relacionada à menor idade gestacional e à gravidade da doença: 5-15% na pré-
eclâmpsia, 7-60% na síndrome HELLP e 30-35% na eclâmpsia.
O surgimento de PE na gravidez é fator de risco definido para HAS posterior, sendo aconselhado o
acompanhamento dos níveis pressóricos e mudanças nos hábitos de vida.

DOPPLERFLUXOMETRIA
Exame no qual, pelo estudo da artéria umbilical e cerebral média e do ducto venoso, fornece uma avaliação
confiável do bem estar fetal.
Em condições normais, o estudo da artéria umbilical do feto mostra um componente sistólico e um diastólico.
Este último, com o evoluir da gravidez, apresenta um aumento do seu fluxo. Quando este fenômeno não
ocorre ou quando acontece o contrário, ou seja, diástole zero ou diástole reversa, respectivamente, estamos
diante de situações patológicas provocadas pelo aumento da resistência dos vasos placentários, impedindo o
fluxo normal de sangue.
A avaliação da artéria cerebral média tem importância para identificar o fenômeno de centralização. Ele ocorre
devido à hipoxemia: nessa situação, ocorre perfusão preferencial para órgãos nobres (cérebro) em detrimento
de outros órgãos (rins, pele e intestino). Esse fenômeno é notado por uma diminuição da resistência devido à

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


139
vasodilatação cerebral, o que provocará uma inversão da relação umbílico-cerebral, que geralmente é menor
que 1. A centralização significa sofrimento fetal.

Fonte de Pesquisa:
Projeto Diretrizes.
Medcurso 2010 – Obstetrícia.

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140

DIABETES GESTACIONAL
O conceito de diabetes gestacional inclui toda intolerância à glicose, de qualquer intensidade, com início ou
detecção pela primeira vez na gravidez, com necessidade ou não de insulina. Constitui-se a complicação mais
comum do período gestacional, com incidência estimada entre 2,5 a 7,5% das gestações no Brasil. Mesmo
com o acompanhamento em serviços terciários, as suas complicações são graves e as malformações fetais são
desfechos freqüentes (6-10%). A diabetes pode ser autolimitada à gravidez, devendo haver nova avaliação
glicêmica 6-8 semanas após o parto.
Fatores de Risco: são considerados fatores de risco para o desenvolvimento de diabetes gestacional:
-idade superior a 35 anos; -obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual; -baixa estatura (<
1,50m);
-deposição central excessiva de gordura corpórea; - história familiar de diabetes em parentes de 1° grau;
-crescimento fetal excessivo, polidrâmnio, hipertensão ou pré-eclâmpsia na gravidez atual;
-antecedentes obstétricos de morte fetal ou neonatal, de macrossomia ou de diabetes gestacional.
Etiopatogenia: com a necessidade de transferência de glicose para o feto, o organismo gravídico utiliza-se de
meios para garantir este aporte glicêmico. Para isso, os hormônios característicos da gravidez, e que são
secretados de forma ascendente, antagonizam a ação da insulina, o que culmina com resistência à insulina e
hiperglicemia pós-prandial. Destacam-se como principais influências da gestação sobre o metabolismo
glicêmico:
-Alterações hormonais: o hormônio lactogênio placentário (hLP) é sintetizado pela placenta em teores
crescentes com a evolução da gestação, e exerce forte antagonismo à ação da insulina. Cortisol, estrogênio,
progesterona e prolactina também são sintetizados em quantidades ascendentes e são hiperglicemiantes.
-Alterações metabólicas:
-Resistência à ação periférica da insulina: pelo bloqueio exercido pelos hormônios anteriormente citados;
-Catabolismo acentuado: como o concepto requer glicose para a sua nutrição e crescimento, dependendo da
magnitude da queda de glicose materna, pode ocorrer hipoglicemia de jejum. Para evitá-la, o organismo aumenta a
gliconeogênese hepática e há maior e mais rápida mobilização de lipídios para fornecimento de energia;
-Anabolismo facilitado: durante o período da alimentação, ocorre elevação mais acentuada da glicemia materna, que
permite sua maior transferência placentária, e maior conversão de glicose em triglicerídeos para posterior utilização
como fonte de energia para o concepto.
Classificação: a classificação atual do diabetes tem como base o processo patogênico envolvido: Diabetes tipo
1 (destruição das células pancreáticas/deficiência absoluta de insulina), Diabetes tipo 2 (resistência à insulina/
deficiência relativa de insulina), Diabetes gestacional e outros tipos específicos de diabetes. A primeira
classificação do diabetes gestacional, desenvolvida por Priscila White (1949), está em desuso, sendo utilizada,
geralmente, apenas a nomenclatura A1- sem insulinoterapia e A2- com insulinoterapia

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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Fisiopatologia e Manifestações:
-Alterações maternas:
-Glicosúria e Infecção urinária: o aumento progressivo do débito cardíaco da gestante acarreta aumento do
fluxo plasmático renal e maior filtração glomerular. Este fato compromete a capacidade de reabsorção da
glicose e promove glicosúria, mesmo se glicemia normal, porém mais grave quanto mais elevada a glicemia. E
provavelmente devido à glicosúria, há maior incidência de ITU. Como a pielonefrite está associada ao parto
pré-termo, recomenda-se o rastreamento da bacteriúria assintomática na gestante.
-Candidíase vaginal: há um aumento na incidência desta infecção, provavelmente relacionado ao acúmulo de
glicogênio na mucosa vaginal e conseqüente acidificação do meio.
-Lesões vasculares: o agravamento de lesões vasculares preexistentes, como as renais e da retina, é um tema
controverso. Entretanto, a presença de nefropatia diabética está associada a pior prognóstico, com aumento do
risco de abortamento, parto prematuro, pré-eclâmpsia, CIUR e morte neonatal.
-Pré-eclâmpsia: há aumento na sua incidência, porém a fisiopatologia é incerta.
-Complicações gestacionais
-Abortamento: a maior incidência de abortamento nas diabéticas grávidas está provavelmente associada a
alterações metabólicas, tais como a acidose fetal. Está diretamente relacionado a níveis de hemoglobina
glicada >12% e glicemia pré-prandial superior a 120mg/dl no primeiro trimestre.
-Mortes fetais tardias: assim como os casos de abortamento, as mortes fetais súbitas tardias, por volta da 35ª
semana de gestação, parecem estar relacionadas à acidose metabólica fetal, decorrente de uma hipoxemia de
consumo, pois a hiperglicemia provoca uma disfunção no transporte de oxigênio e no metabolismo fetal.
-Alteração do volume do líquido amniótico: o polidrâmnio ocorre em 25% das grávidas diabéticas e,
possivelmente, resulta do aumento da diurese fetal, devido à hiperglicemia. Parece ainda que a maior
concentração de glicose no líquido amniótico provoca, por efeito osmótico, aumento na captação de água para
o líquido. ILA >18 possui relação com macrossomia fetal e exige melhor controle glicêmico. A avaliação por
USG deve ser realizada a cada 2-3 semanas após a 24ª semana de gestação.
-Complicações fetais:
-Anomalias congênitas: a incidência de anomalias congênitas é muito superior nas diabéticas que nas grávidas
no geral. O efeito negativo da hiperglicemia na organogênese se deve a uma maior ação de radicais livres e
menor ação de genes responsáveis pela produção do ácido araquidônico, causando defeitos do tubo neural.
Destacam-se os defeitos cardíacos (35%), os do fechamento do tubo neural (10%) e musculoesqueléticos
(15%). As cardiopatias (transposição de grandes vasos, CIV e coarctação da aorta) tem incidência 4 vezes
superior que nas grávidas saudáveis, a síndrome da regressão caudal é 252 vezes superior e o situs inversus
incide 84 vezes mais. Estes defeitos resultam da ausência do controle periconcepcional (período da
organogênese) do diabetes, havendo, assim, necessidade de acompanhamento e controle glicêmico pré-
concepcional de diabéticas que desejam engravidar. Portanto, destaca-se que o maior risco de anomalias
congênitas está presente nas diabéticas descontroladas que engravidam, não estando aumentado nos casos de
diabetes gestacional, assim como o que se refere aos casos de abortamento.
Síndrome de Regressão Caudal: anomalia congênita característica dos casos de filhos de mães diabéticas.
Caracteriza-se por provocar alterações nas extremidades inferiores do corpo.
-Macrossomia (peso >4000g): a hiperglicemia materna facilita a passagem transplacentária de alta quantidade
de glicose, que estimula o pâncreas fetal saudável a produzir insulina, que exerce os seus efeitos anabólicos,
tais como o hormônio de crescimento, provocando aumento das proteínas, dos lipídios e do glicogênio
corpóreo, o que confere ao concepto o aspecto característico. A maior deposição de gordura se dá nos
membros e no tronco. Ressalta-se que o controle glicêmico materno reduz drasticamente a incidência de fetos
macrossômicos.
-Distócia de espáduas: é a dificuldade de liberação dos ombros fetais durante o parto vaginal de feto em
apresentação cefálica. Tem sua freqüência aumentada nos filhos de mães diabéticos decorrente da
macrossomia. Nesses casos, deve ser usada suavidade ao abaixar e elevar a cabeça, além de manobras para
ajudar o desprendimento das espáduas, tais como McRoberts, pressão suprapúbica e manobra de Woods.
-Crescimento intrauterino restrito (CIUR): resulta do comprometimento das trocas placentárias em função da

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doença vascular do vilo terciário.
-Prematuridade: a maior incidência da prematuridade decorre da hiperdistensão uterina por polidrâmnio, da
insuficiência placentária e por indução de nascimento em benefício materno e/ou fetal.
-Complicações neonatais:
-Síndrome da Angústia Respiratória: os altos níveis de insulina fetal retardam e alteram o mecanismo de
fisiológico de amadurecimento pulmonar, com redução da produção de surfactante.
-Hipoglicemia neonatal: a hiperinsulinemia fetal é também responsável pela hipoglicemia neonatal,
complicação metabólica fetal mais comum do filho de mãe diabética. O nascimento interrompe o aporte
excessivo de glicose ao feto, e então os níveis de insulina tornam-se desproporcionais ao da glicemia fetal.
-Hipocalcemia: parece advir da prematuridade, embora sua causa ainda não seja bem elucidada.
-Policitemia: provavelmente decorre do aumento das necessidades de oxigênio induzida pela hiperglicemia.
-Hiperbilirrubinemia: possivelmente associada à policitemia e à imaturidade dos sistemas enzimáticos.
Diagnóstico: o diabetes próprio da gravidez é caracteristicamente um distúrbio da gravidez avançada. Por este
motivo, a hiperglicemia identificada no 1° trimestre geralmente denota doença prévia à gravidez, embora
mesmo assim, se diagnosticada no período gravídico, será considerada diabetes gestacional. Além disso,
glicemia de jejum > 126m/dl, HBA1c >6,5% e glicemia aleatória >200mg/dl (esta última repetida ou
confirmada com outro método) também predizem diabetes clínico. A dosagem de hemoglobina glicada não
deve ser utilizada como critério diagnóstico da diabetes gestacional.
-Ministério da Saúde: o rastreio com glicemia de jejum na primeira consulta está indicado apenas nas gestantes com
fatores de risco (citados acima), sendo rastreio positivo se >85mg/dl. As que tiveram rastreio positivo na 1ª consulta
ou que passaram a apresentar algum fator de risco, devem realizar um TOTG 75g entre 24 e 28 semanas, sendo
diagnóstico de diabetes gestacional se qualquer valor superior ao normal: 92/180/153mg/dl.
-American Diabetes Association (ADA 2012): o rastreio do diabetes clínico tipo 2 na primeira consulta está indicado
para todas as gestantes, sendo diagnóstico se glicemia de jejum superior a 126mg/dl ou HBA1c >6,5% ou duas
glicemias aleatórias >200mg/dl ou glicemia aleatória >200mg/dl sintomática. Aquelas com rastreio inicial negativo e
as que não se submeteram ao rastreio inicial devem fazer um TOTG 75g entre 24 e 28 semanas, sendo diagnóstico se
qualquer valor superior ao normal: 93/180/153mg/dl.
*A grande mudança do consenso do ADA foi a possibilidade de diagnóstico de diabetes clínico no rastreio inicial da
gestante. Além disso, o rastreio do diabetes gestacional tornou-se universal, entre 24-28 semanas, não mais sendo
necessário realizar os dois passos, pois agora todas as gestantes sem diagnóstico irão direto para o TOTG 75.
-IMIP: a diferença entre o consenso do IMIP e do ADA 2012 é que: glicemia de jejum entre 92 e 125mg/dl na
primeira consulta deve ser repetida e, se mantém-se nesses níveis, confirma o diagnóstico de diabetes gestacional.
Além disso, o rastreio com glicemia de jejum na primeira consulta é universal, não estando reservado para os casos
de pacientes com fatores de risco.
Vale ressaltar que há a possibilidade do diabetes não desaparecer com o término da gestação, devendo ser
realizado novo teste com 6 semanas de puerpério. Mesmo normal, as pacientes possuem uma chance de 50 a
60% de se tornarem diabéticas em 10 anos, sendo recomendados exercícios físicos regulares e dieta adequada.
Conduta:
-Controle periconcepcional: as mulheres diabéticas que desejem engravidar devem apresentar controle
glicêmico adequado no período periconcepcional para reduzir o risco de abortamentos e malformações.
Valores de hemoglobina glicada acima de 10% estão associados a risco significativo de malformação fetal.
-Controle glicêmico na gravidez: o acompanhamento da gestante diabética envolve algumas medidas;
-Glicemia capilar antes e 1-2 horas após as refeições nas diabéticas em uso de insulina;
-Perfil glicêmico a cada 2 semanas nas pacientes com controle adequado e semanalmente nas de controle inadequado;
-Dosagem de HbA1c a cada 2-3 meses, com valor ideal entre 5 a 7%;
-Função renal trimestral com dosagem de uréia, creatinina e proteinúria nas com diabetes clínico;
-Fundo de olho trimestral nas com diabetes clínico.
-Dieta: inicialmente o controle glicêmico pode ser realizado apenas com dieta adequada. A dieta deve ser
composta de 40-50% de carboidratos, 30-40% de gordura (máximo de 10% de gordura saturada) e 15-25% de
proteínas, divididos em 3 refeições e 3 lanches diários. Para pacientes próximas ao peso ideal, recomenda-se a
ingestão de 30 kcal/kg/dia, com mínimo de 2.000kcal/dia.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


143
-Atividade física: a atividade física regular é também recomendada, pois melhora o controle glicêmico quando
comparado à dieta isolada. Indica-se atividade 3 vezes por semana, com duração de 30 minutos de exercícios
de média intensidade. Deve ser evitada em pacientes com glicose >250mg/dl, pois estas pacientes
descompensadas pioram com os exercícios.
-Hipoglicemiantes orais: são contraindicados na gestação, mesmo nas diabéticas que já faziam seu uso, pois
cruzam a placenta, causando aumento da insulinemia e alterações metabólicas fetais. Entretanto, o seu uso nas
diabéticas clínicas só deve ser suspenso quando substituído pela insulina, a nível de atenção terciária, visto
que a hiperglicemia materna no período da embriogênese é mais danosa que possíveis efeitos dos
hipoglicemiantes sobre o feto.
-Insulinoterapia: está indicada em diabéticas que já faziam seu uso prévio à gravidez, naquelas que utilizavam
hipoglicemiantes orais e ainda em diabéticas gestacionais sem controle satisfatório com dieta e exercícios.
Além dos valores de glicemia, é indicação de insulinoterapia alteração do crescimento fetal.
-Dieta: a insulinoterapia deve ser instituída caso, após ao menos uma semana de dieta adequada, a glicemia
apresenta-se: jejum → > 90mg/dl: 1hora após a refeição → >140mg/dl; 2 horas após a refeição → >120mg/dl.
-Dose: A dose inicial é de 0,3-0,5U/kg de insulina de ação intermediária (dividida em 2/3 pela manhã e 1/3 à noite)
OU, segundo o IMIP, se perfil glicêmico disponível (normal: jejum → <90, após as refeições → <120), a dose de
insulina (NPH ou regular) é de 1 unidade para cada elevação de 10mg/dl no horário em que ela esteja alterada. Caso
necessário, pode ser feita a associação de insulina de ação intermediária e de ação rápida, divididas em 2/3 e 1/3 da
dose total, respectivamente. Durante a evolução da gravidez, doses crescentes de insulina são necessárias.
-Acompanhamento obstétrico:
-Consultas: realizar consultas quinzenais até 30-34 semanas e semanais a partir desta data; urocultura trimestral;
-USG morfológica e ecocardiograma fetal: a partir de 24 semanas nas diabéticas prévias;
-USG obstétrica seriada: entre 28 e 34 semanas, a cada 2-3 semanas, e semanal a partir das 34 semanas, para
avaliação de peso e volume do líquido amniótico;
-Cardiotocografia: semanal (28-34 semanas), 2x/semana (>34 semanas) ou diária (> 36 semanas ou em pacientes
internadas), que avalia as alterações da freqüência cardíaca fetal decorrentes das alterações de seu pH;
-Dopplerfluxometria: a partir de 26 semanas, para avaliação de insuficiência placentária, devido à associação de
diabetes e pré-eclâmpsia.
-Interrupção da gestação: as gestantes com bom controle metabólico, sem antecedentes de morte perinatal ou
macrossomia, e sem comorbidades podem aguardar a evolução natural ao parto. Entretanto, a partir de 40
semanas em pacientes controladas com dieta e a partir de 39 semanas naquelas em uso de insulina,
recomenda-se a indução do parto. Este pode ser por via vaginal, estando a cesárea indicada eletivamente se
houverem alterações da vitalidade fetal, retinopatia proliferativa ou macrossomia evidenciada à USG. Se em
qualquer momento for evidenciada alteração da vitalidade fetal, está indicada a antecipação do parto.
-Controle glicêmico intraparto: a dieta deve ser zerada por 8 horas, a insulina NPH deve ser suspensa, deve-se
infundir soro glicosado ou fisiológico (com infusão de glicose) visando euglicemia e a insulina regular deve
ser administrada conforme glicemia capilar, realizada de 2/2 horas.
-Controle glicêmico pós-parto: após o parto, as necessidades insulínicas caem consideravelmente. Caso a
paciente iniciou o uso de insulina durante a gravidez, esta deve ser suspensa e realiza-se glicemia capilar ou
glicemia sérica: se normal → reavaliar em 6-12 semanas de puerpério, se alterada → reiniciar insulina em 1/3
da dose utilizada ao fim da gestação. Caso a paciente utilizava insulina previamente à gravidez, a insulina
deve ser reajustada para a dose anterior à gestação.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 4
Consenso sobre diabetes – ADA, 2012.

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GEMELARIDADE
A incidência anual da gestação gemelar é de aproximadamente 26 casos para 1.000 nascimentos, e de gestação
trigemelar é de 6 casos para 1.000. É responsável por 17% dos partos pré-termo e por 24% dos RN de baixo
peso.
Conceitos: a gestação múltipla é a presença de dois ou mais conceptos no útero materno e, posteriormente,
fora dele. Classifica-se em dupla ou gemelar, tripla (trigemelar), quádrupla e assim por diante. Cada produto
da gestação gemelar é um gêmeo.
-Zigotia: refere-se à origem dos gêmeos: se de um mesmo ovo ou de óvulos diferentes.
Monozigótica: resulta da fertilização de um óvulo por um único espermatozóide. Os gêmeos monozigóticos
correspondem a 1/3 dos gemelares. O genótipo dos gêmeos é o mesmo: o sexo é obrigatoriamente igual, como
também o grupo sanguíneo, fatores séricos, características físicas e tendências patológicas. Chamados de univitelinos
Dizigótica: resulta da fertilização de dois óvulos por espermatozóides diferentes. A placentação é obrigatoriamente
dicoriônica, enquanto que nos monozigóticos a placentação depende do momento em que ocorre a divisão após a
fecundação. Os gêmeos são chamados de bivitelinos ou gêmeos fraternos.
Outras possibilidades: um único óvulo pode ser fecundado por dois espermatozóides, com posterior divisão do
zigoto. Pode ocorrer ainda a superfecundação (fertilização de dois óvulos em coitos diferentes durante o mesmo ciclo
menstrual) e poliembrionia (formação de vários embriões a partir de um único zigoto).
-Corionia: diz respeito ao tipo de placentação, ou seja, ao número de placentas. Como já citado, os gêmeos
dizigóticos (DZ) são obrigatoriamente dicoriônicos, sempre com duas placentas. No entanto, elas podem estar
fusionadas, dando a impressão de uma só massa placentária. Já em relação aos monozigóticos (MZ), a
placentação depende do momento, em relação à fecundação, no qual ocorreu a divisão do zigoto:
Até 72 horas: Dicoriônica Diamniótica (30% dos MZ)
Entre 4º e 8º dia: por divisão do embrioblasto com o cório já formado torna-se Monocoriônica Diamniótica (30%)
Entre 8º e 12º dia: por divisão completa do disco embrionário, torna-se Monocoriônica Monoamniótica (1%)
Entre 13º e 15º dia: a separação do disco embrionário é imperfeita, acarretando gestação Monocoriônica
Monoamniótica de gemelaridade imperfeita. Como a separação é incompleta, os produtos finais são gêmeos siameses.
Fatores de risco: a freqüência de gêmeos idênticos (univitelinos) é estável (1:250) em todo o mundo, tida
como um evento ao acaso, não parecendo sofrer influência de raça, história familiar, idade materna e paridade.
Já os gêmeos dizigóticos sofrem influência desses fatores:
-Drogas indutoras da ovulação: gonadotrofinas ou citrato de clomifeno
-História familiar: apenas a história da mulher é relevante -Técnicas de fertilização assistida
-Fatores nutricionais: mulheres altas e com sobrepeso. -Raça: principalmente em negras
-Idade materna: a incidência aumenta progressivamente a. -Paridade: multiparidade
té os 37 anos, quando decai por decréscimo da produção hormonal
Diagnóstico da gemelaridade: na anamnese, buscar história familiar de gemelaridade, uso recente de indutor
da ovulação e questionar sobre sensação de útero maior que o esperado para a idade gestacional. Ao exame
físico, verificar se há aumento exagerado da circunferência abdominal e do fundo uterino, tentar individualizar
as partes de dois fetos e proceder a ausculta de batimentos de dois ou mais fetos.
-Exames complementares: a presença de
dosagem quantitativas de beta-hCG acima de
50.000mUI/ml levanta a suspeita de gestação
múltipla. Entretanto, com o advento do
emprego rotineiro da USG para datar a
gravidez e avaliar a vitalidade fetal,
diminuiu-se a incidência de gestação gemelar
não diagnosticada. Em geral, o diagnóstico é
pela USG-TV, que visualiza dois ou mais
sacos gestacionais (4-5 semanas), dois ou

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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mais embriões (5-6 semanas) e atividades cardioembrionárias distintas (6-7 semanas).
Diagnóstico da zigotia: esse diagnóstico intrauterino possui muito menos importância que o diagnóstico da
corionia, porque o principal determinante do prognóstico da gestação gemelar, ou seja, da morbimortalidade, é
a corionia e não a zigotia. Além disso, em 45% dos gemelares, a zigotia antes do parto é indeterminada, pois
embora o sexo seja concordante, a placenta é dicoriônica. (ver fluxograma a seguir).
Diagnóstico da corionia: se dois fetos dividem a mesma placenta a gestação é denominada monocoriônica
(MC). Nestas gestações, os fetos podem pertencer à mesma bolsa amniótica (MA) ou a bolsas distintas (DA).
Caso os fetos apresentem placentas diferentes, a gestação é dicoriônica (DC) e obrigatoriamente DA.
-Saco gestacional: a melhor fase para diagnóstico USG da corionia
é entre 6 a 9 semanas, quando o achado de saco gestacional duplo
identifica a gestação DC e, em contrapartida, o achado de saco
gestacional único identifica a gestação MC. Já o âmnio só é visível
a partir da 8ª semana.
-Twin peak ou sinal de lâmbda ou sinal do Y:
outra época de eleição para determinar a
corionia situa-se entre 11 e 14 semanas, por
ocasião da translucência nucal. O achado de
duas placentas, assim como o sexo discordantes,
atestam a dicorionia. Entretanto, quando só há
uma massa placentária, o sinal de
dicorionicidade é o Twin peak, que traduz a
presença de reentrância de tecido coriônico
entre as duas membranas amnióticas,
caracterizando a dicorioncidade.
-Sinal do T: também pode ser surpreendido na USG de 11 a 14 semanas. Na variedade monocoriônica, a
inserção do septo na placenta em forma de T caracteriza uma placentação monocoriônica diamniótica.
Acompanhamento da gestação gemelar: a realização de USG de rotina no início do pré-natal deve ser
incentivada, para se obter o diagnóstico precoce. A assistência pré-natal deve ser de gestação de alto risco. As
necessidades nutricionais são maiores, com ganho de peso esperado entre 15 e 18kg. À exceção da
corticoterapia de rotina à 28ª semana na gestação trigemelar, na gestação gemelar a corticoterapia não deve ser
feita rotineiramente, estando formalmente indicada na possibilidades de trabalho de parto prematuro; neste
caso, o uso de tocolíticos é medida coadjuvante ao corticóide. Uma USG anteparto deve ser realizada para
avaliar o peso fetal e verificar a apresentação fetal que, obviamente, interferem na escolha da via de parto.
Complicações:
-Obstétricas: a gestação múltipla caracteriza-se por maior incidência de anemia (grande demanda de ferro e
ácido fólico), hiperêmese gravídica, hipertensão e pré-eclâmpsia (independente da raça ou paridade), diabetes
gestacional, polidrâmnio, abortamento, amniorrexe prematura, parto prematuro, crescimento intrauterino
restrito, placenta prévia (em virtude de uma maior massa placentária), descolamento prematuro de placenta,
anomalias congênitas, hemorragia pós-parto (resultado da hipotonia uterina pela sobredistensão do órgão),
insuficiência placentária, estrias gravídicas, edema e varizes de MMII e varizes vulvares.
-Polidrâmnio: é cerca de 10 vezes mais comum. Agrava os fenômenos compressivos, aumenta o desconforto materno
e a freqüência de prematuridade.
-Parto prematuro: ocorre em 30% dos casos. A duração da gravidez diminui em razão inversa ao número de fetos.
Entre os testes de predição do parto prematuro, a medida ultrassonogŕafica do colo uterino, de tamanho menor que
25mm entre 20 e 24 semanas, é a mais importante. A cerclagem eletiva, a hospitalização e a restrição de atividade
física domiciliar não contribuem para a profilaxia do parto pré-termo gemelar.
-Descolamento prematuro de placenta: 8 vezes mais freqüente, devido ao maior volume placentário e à maior chance
de descompressão súbita de um útero sobredistendido após o parto ou na amniorrexe de um polidrâmnio.
-Insuficiência placentária: na prenhez dicoriônica, é causa de oligodrâmnio grave em um dos fetos, com conseqüente
“emparedamento” deste feto, conhecido como stuck twin. O diagnóstico diferencial deve ser feito com a síndrome da
transfusão feto-fetal.

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-Fetais:
-Morte fetal intraútero: a morte de um dos fetos é observada em 5 para 100 pares de gêmeos, sendo maior em
dicoriônicos. O óbito que acontece no início da gestação é geralmente acompanhado de absorção fetal, sem
intercorrências. Em idade gestacional mais avançada, aumenta as chances de mortalidade do outro feto, sendo
de 25% nos monocoriônicos e de 2,5% nos dicoriônicos.
-Síndrome da Transfusão feto-fetal (STFF) ou Síndrome Transfusor-transfundido (STT): é uma complicação
específica das gestações monocoriônicas monozigóticos, em especial os diamnióticos, cujas circulações se
comunicam na região da placenta. Se não tratada quando ocorre antes de 24 semanas, resulta em morte de um
ou ambos os fetos em 80 a 90% dos casos.
Fisiopatologia: a STT decorre da presença de anastomoses transplacentárias entre a circulação de fetos
monocoriônicos, principalmente arteriovenosas, com desequilíbrio da transfusão sanguínea em favor de um deles.
Assim, há transfusão de sangue de um dos fetos (doador) para o outro (receptor), através das anastomoses vasculares
existentes na placenta. O feto doador fica hipovolêmico e desenvolve palidez, oligúria, oligodrâmnio e CIUR. Já o
feto receptor fica hipervolêmico, manifesta pletora e desenvolve poliúria, polidrâmnio, hidropsia e insuficiência
cardíaca.
Diagnóstico: o melhor critério é a discordância de líquido amniótico existente nas duas cavidades: bolsão maior que 8
cm na cavidade do feto receptor e bolsão menor que 2 cm na cavidade do feto doador.
Classificação: a gravidade da doença é classificada em estágios de acordo com critérios USG: Estágio 1 →
polidrâmnio no receptor e oligodrâmnio no doador; 2 → não visualização da bexiga do doador; 3 → doppler anormal
em qualquer um dos fetos; 4 → hidropsia fetal e 5 → óbito de um ou ambos os fetos.
Tratamento: Amniocentese seriada para o feto receptor (reservada para os casos leves e tardios, para prevenir o parto
prematuro secundário ao polidrâmnio) ou fotocoagulação com laser das comunicações vasculares de fetoscopia entre
16 e 26 semanas de gestação (reservada para os casos graves de ocorrência antes de 24 semanas; visa ocluir as
anastomoses vasculares, interrompendo a troca de sangue intergemelar).
-Gêmeos siameses: são classificados de acordo com o local de fusão, sendo o mais freqüente a fusão pelo
tórax-abdome (toracoonfalópagos: 47% dos casos).
Via de parto: a elevada freqüência de apresentações anômalas, de discinesias uterinas, de distócias
posicionais, de acidentes específicos da gestação múltipla (trabalho de parto prematuro, amniorrexe
prematura, atonia uterina...) piora o prognóstico fetal no parto. Em linhas gerais, a indução e o manejo ativo
do trabalho de parto assim como as indicações de cesarianas são as mesmas da gestação única, acrescidas de
algumas situações especiais inerentes à gemelaridade. Não há respaldo na literatura para a indicação de
cesariana em todos os casos de gestação gemelar. A apresentação do primeiro gemelar é, atualmente, o critério
mais importante na decisão pela melhor via de parto.
-Indicações de cesariana:
Número de fetos igual ou superior a 3 Gêmeos siameses Anomalias congênitas
Gestação monoamniótica Síndrome transfusor-transfundido Vitalidade fetal comprometida
Gestação diamniótica com prematuridade extrema Gestação monoamniótica (risco de enovelar o cordão)
Primeiro feto em apresentação não cefálica Feto 2 com estimativa de peso 25% maior que feto 1
Portanto, o parto pode ser por via vaginal quando fetos diamnióticos, o feto 1 está em apresentação cefálica e
os pesos são concordantes (ou feto 1 > feto 2), estando ambos com boa vitalidade. Ainda assim, pode ser que a
cesariana torne-se necessária após o parto vaginal do feto 1.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 4.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


147

PARTO: INTRODUÇÃO
O parto é o estágio resolutivo da gestação. Consiste na expulsão do feto do útero através da via vaginal ou da
retirada do bebê pela via abdominal.
Definições:
-Quanto a idade gestacional:
< 36 semanas e 6 dias → parto prematuro ou pré-termo
entre 37 semanas a 41 semanas e 6 dias → parto a termo
> 42 semanas completas → parto pós-termo
-Quanto à gestante:
-Paridade: nulípara → nunca pariu; primípara → pariu ou vai parir pela primeira vez; multípara → já pariu
diversas vezes; não leva em conta o número de fetos nascidos vivos ou mortos, entretanto, descarta-se os
abortos (<22 semanas).
-Gesta: nuligesta → nunca engravidou; primigesta → primeira concepção da mulher é a atual; multigesta ou
plurigesta → presença de mais que uma gestação, independente da duração delas, do produto da concepção e
do número de conceptos em cada uma.
-Quanto ao parto:
-Espontâneo: quando se desencadeia e termina sem interferência X Induzido: se desencadeado por
medicamentos ou manobras;
-Distócico: se for perturbado por condições anômalas X Eutócico: se ocorre de forma fisiológica e normal;
-Operatório: caso seja efetuada alguma operação para concluir o parto, incluindo o uso de fórcipe.
-Quanto ao produto da concepção:
-Nascido vivo: expulsão ou retirada de um produto da concepção do corpo da mãe, independente da idade
gestacional, que apresente qualquer sinal de vida: respiração, batimentos cardíacos, pulsação do cordão
umbilical, movimentos efetivos, estando ou não cortado o cordão umbilical.
-Nascido morto/ Natimorto: morte de um produto da concepção antes da expulsão ou extração completa do
corpo da mãe. O óbito fetal é reconhecido pela ausência dos sinais descritos acima.
-Abortamento: morte de um produto da concepção antes que este atinja a vitabilidade, ou seja, antes da
gestação completar 20 a 22 semanas ou antes do concepto atingir um peso de 500g.
Início do trabalho de parto: nem sempre é fácil defini-lo, havendo divergência entre, praticamente, todos os
autores. Entretanto, de forma geral, é considerado iniciado o trabalho de parto no momento em que a paciente
entra na fase ativa do parto (dilatação de 3cm em primíparas e 4cm em multíparas).
Períodos do parto: os períodos clínicos do parto não devem ser confundidos com os tempos do mecanismo
do parto. O trabalho de parto ativo é divido em 3 períodos; alguns autores acrescentam o quarto período, que
vai da expulsão da placenta até uma hora após. Antes de iniciado o trabalho de parto, o útero sofre
modificações ao longo de várias semanas, período chamado de pré-parto ou premunitório.
-Período premunitório (pré-parto): não é propriamente uma fase clínica do parto. Inicia-se entre 30 e 36
semanas de gravidez, estendendo-se até o desencadeamento do trabalho de parto. Há a acomodação da
apresentação ao canal de parto. As gestantes começam a perceber as contrações uterinas (contrações de
Braxton-Hicks), que são indolores, incoordenadas e irregulares, com a função de preparar o canal de parto,
porém podem ser confundidas pela gestante com o início do trabalho de parto. Com a aproximação da data
provável do parto, há aumento da secreção cervical, tipicamente como muco com raios de sangue. A saída do
tampão mucoso endocervical é um sinal do parto, decorrente do apagamento do colo uterino. Culmina na fase
latente do TP.
Fase latente: fase em que as contrações uterinas tornam-se progressivamente mais intensas e regulares, na ausência
de dilatação progressiva e rápida do colo, que caracteriza o início do trabalho de parto. Dura de 14 a 20 horas.
Fase ativa: presença de 2 contrações uterinas eficientes (rítmicas, dolorosas, com duração >30s) em 10 minutos
associadas a dilatação de 3 cm em primíparas e 4 cm em multíparas.
-Dilatação: a primeira fase clínica inicia-se quando são atingidas contrações uterinas de freqüência,

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148
intensidade e duração suficientes para produzir o apagamento e a dilatação do colo uterino (engloba parte da
fase latente e a fase ativa). Essa primeira fase termina quando o colo está totalmente dilatado (10cm).
Caracteristicamente, o colo uterino primeiro apaga-se para depois dilatar nas primíparas; nas multíparas,
observamos o inverso. Há a formação de uma espécie de projeção das membranas ovulares através do colo, a
chamada “bolsa das águas”.
O período de dilatação varia de 10-12 horas nas primíparas e de 6-8 horas nas multíparas.
-Expulsivo: inicia-se com a cérvix completamente dilatada (10cm) e termina com a expulsão fetal. As
contrações uterinas atingem seu máximo, na freqüência de 5 em 10 minutos, com duração de 60-70 segundos.
Uma nova força começa a atuar: a contração da musculatura do diafragma e da parede abdominal, que
associados às contrações uterinas, comprimem o útero de cima para baixo e de frente para trás, expelindo o
bebê. A paciente apresenta vontade de defecar e encontra-se agitada.
O período expulsivo dura, em média, 50 minutos nas primíparas e 20 minutos nas multíparas. É considerado
prolongado caso apresente mais que 2h em primíparas ou 1h nas multíparas.
-Secundamento: também chamado de delivramento ou dequitação, compreende o desprendimento, descida e
expulsão da placenta e membranas ovulares. Ocorre entre 5 a 30 minutos após o término do período expulsivo.
É considerado prolongado quando ultrapassa 30 minutos. Ocorre pelas contrações uterinas que diminuem o
volume do útero e conseqüentemente aumentam a espessura da parede muscular; com esta redução a placenta
se descola, visto que não possui elasticidade. Há então a infiltração de sangue entre a placenta e a decídua
basal, originando o hematoma retroplacentário. Mecanismos da dequitação:
-Baudelocque-Schultze: 75% dos casos. A implantação placentária encontra-se no fundo uterino (corporal). A
superfície fetal brilhante aparece primeiro na saída vaginal, com sangramento somente após a expulsão;
-Baudelocque-Duncan: 25% dos casos. A placenta, implantada nas paredes laterais uterinas, desce lateralmente,
acompanhada de discreto sangramento contínuo.
-Período de Greenberg: corresponde a 1ª hora após a saída da placenta. Representa a hemostasia do sítio de
inserção placentário. É o período onde há maior possibilidade de hemorragias, devendo haver observação
cautelosa. Os mecanismos de hemostasia se seguem:
-Miotamponamento: inicia-se imediatamente após a saída da placenta. Consiste na potente contração da musculatura
uterina, tamponando a saída dos vasos uteroplacentários (ligaduras vivas de Pinard). Caso não ocorra, há a “atonia
uterina”.
-Trombotamponamento: depende da formação de pequenos trombos que obliteram os vasos uteroplacentários e da
formação do hematoma retroplacentário.

ESTUDO DO PARTO
Sob o ponto de vista mecânico, são quatro os elementos básicos para o estudo do parto:
1- Trajeto: A bacia
2- Objeto: O feto
3- Motor: Contrações uterinas
4- Mecanismo: Conjunto de movimentos passivos desempenhados pelo feto para que possa nascer.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 2

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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ESTUDO DO PARTO: TRAJETO


O conhecimento da anatomia da pelve feminina permite o correto manejo dos tempos do parto e auxilia no
diagnóstico da gravidez e suas complicações. Do ponto de vista obstétrico, a correta avaliação dos diâmetros
da bacia permite calcular a proporcionalidade entre o trajeto e o feto e determinar condutas durante a
assistência ao parto.
Trajeto mole: é constituído pelo segmento inferior do útero, colo do útero, vagina e região vulvoperineal.
-Segmento inferior: se estende do istmo (entre corpo e colo uterino) até o orifício interno do colo do útero.
-Colo uterino: corresponde a um canal com dois orifícios, um interno e um externo. Durante o TP apresenta
dois fenômenos: apagamento (diminuição da espessura de 3cm para 0,5 cm) e dilatação (de 0 até 10cm).
-Vagina:estrutura cilíndrica musculomembranosa que, durante a gravidez, adquire grande distensibilidade.
-Região vulvoperineal: constituída pela vulva e períneo, com estruturas musculares e aponeuroses.
Distócias do trajeto mole: anomalias do trajeto mole podem dificultar o parto, causando distócias. Essas anomalias
podem se localizar em qualquer ponto do trajeto. Qualquer coisa que se interponha entre a apresentação e o canal de
parto denomina-se prévio. Causas de distócias: atresia de vulva/vagina, septos vaginais, neoplasias, miomas uterinos..
Trajeto duro: a pelve é o canal ósseo do parto. É constituída pelos ossos ilíacos (2), sacro, cóccix e pube, com
suas respectivas articulações (sínfise púbica, sacroilíacas, sacrococcígea). O promontório corresponde ao
vértice da articulação entre a 5ª vértebra lombar e o sacro. A pelve é dividida, pelo anel do estreito superior,
em grande bacia e pequena bacia. A pequena bacia é a mais importante no parto, por constituir o canal ósseo
por onde o feto vai passar durante o mecanismo do parto. Nela há três níveis que, por serem mais estreitos,
podem impedir ou dificultar a progressão fetal durante o parto vaginal. São eles:
-Estreito superior: delimitado anteriormente pelo pube, lateralmente pela linha inominada e posteriormente
pelo promontório. Possui três diâmetros: anteroposterior → menor distância entre o promontório e a sínfise
púbica (10,5cm); oblíquo → da eminência ileopectínea à articulação sacroilíaca (12,5cm) e transverso →
estende-se da linha inominada de um lado a outro da pelve (13cm). Os diâmetros anteroposteriores são
chamados de conjugatas. São elas:
-Conjugata vera anatômica: linha que une a borda superior da sínfise púbica
e o promontório (11cm)
-Conjugata vera obstétrica: distância entre a face interna da sínfise púbica e o
promontório (10,5cm). Representa o espaço real do trajeto da cabeça fetal.
-Conjugata diagonalis: linha que une a borda inferior da sínfise púbica e o
promontório (12cm).
-Estreito médio: delimitado pela borda inferior do pube e pelas espinhas
ciátiacas. Os diâmetros deste estreito medem: anteroposterior → 12 cm;
transverso ou biespinha ciática → 10 cm, se constituindo o menor
diâmetro da pelve materna. As espinhas ciáticas representam o plano 0
dos planos de DeLee.
-Estreito inferior: os pontos de referência desse estreito são as partes moles. É limitado pelos músculos que
unem o osso sacro às espinhas ciáticas e pelos músculos que unem o ísquio ao cóccix. Assim, é delimitado
anteriormente pela borda inferior do pube, lateralmente pelos músculos sacroilíacos e posteriormente pelo
músculo isquicoccígeo. Diâmetros:
-Anteroposterior – Conjugata exitus: liga a borda inferior do pube ao cóccix, medindo 9,5cm. Entretanto, pelo movimento
da cabeça fetal durante o desprendimento pode alcançar 11cm.
-Transverso: delimitado pelas tuberosidades ciáticas, medindo 11 cm.
Morfologia da pelve: São 4 os tipos fundamentais de pelve: ginecóide → 50% das pelves femininas, com o
melhor prognóstico para o parto vaginal; andróide → 20%, não tendo bom prognóstico do parto por via baixa;
antropóide → 25%, podendo ocorrer distócias no estreito superior e platipelóide → apenas 5% dos casos.

Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 2.

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ESTUDO DO PARTO: ESTÁTICA FETAL


A estática fetal traduz as relações do feto com a bacia e com o útero. Seu estudo é importante, visto que para
cada orientação fetal há um mecanismo específico de descida e uma conduta médica adequada no período de
dilatação e expulsão.
Definições: o estudo da orientação fetal envolve:
-Atitude: relação das diversas partes fetais entre si. Geralmente o concepto apresenta-se em flexão
generalizada, o que caracteriza o ovóide fetal.
-Situação: é a relação entre o maior eixo fetal (cabeça-nádega) e o maior eixo uterino (canal cervical-corpo
uterino). Três situações podem ocorrer: longitudinal, transversal e oblíquo.
-Posição: relação entre o dorso fetal com os pontos de referência do abdome materno. Se longitudinal →
direita ou esquerda; se transversa → anterior ou posterior .
-Apresentação: relação entre o pólo fetal e o estreito superior da pelve materna. Se longitudinal → cefálica ou
pélvica; se transversa → apresentação córmica (ponto de referência: acrômio).
-Variedade de de apresentação:
-Cefálica: relaciona-se ao grau de deflexão do pólo cefálico. Fletida → fontanela posterior (lambdóide). Defletida de:
1° grau → fontanela anterior (bregmática), 2° grau → glabela, 3° grau → mento (apresentação de face).
-Pélvica: completa (pés e nádegas na apresentação) e incompleta (apenas nádegas na apresentação).
Feto: o estudo do feto visa conhecer suas estruturas ósseas. A cabeça fetal é representada pelo pólo cefálico.
-Ossos do crânio: parietais (2), frontais (2), temporais (2), occipital, esfenóide e etmóide.
-Suturas: linhas que separam os ossos do crânio. São elas: interfrontal, sagital (entre parietais), coronal (entre
frontais e parietais), lambdóide (entre parietais e occipital), temporal (entre parietais e temporais).
-Fontanelas: depressões na cabeça que se formam por ocasião da união das suturas. Anterior (bregmática ou
grande fontanela), posterior (lambdóide ou pequena fontanela), esfenoidal e mastóidea.
Situação fetal: relação entre o maior eixo fetal e o maior eixo uterino. A situação longitudinal é a encontrada
em 99% das gestações a termo. A situação transversa incide em 0,5-1% das gestações, sendo fatores
predisponentes: multiparidade, placenta prévia, anomalias uterinas e leiomiomas submucosos. A situação
oblíqua é instável, de transição, e em algum momento torna-se longitudinal ou transversa.
Apresentação fetal: relação entre o pólo fetal e o estreito superior da pelve materna. Os fatores que
determinam a acomodação fetal podem determinar a troca de uma posição para outra, fenômeno denominado
versão. Em geral, até o sexto mês de gestação, a cabeça fetal é encontrada no fundo uterino (apresentação
pélvica) e, após essa idade, é comum a ocorrência de um movimento circular do feto, quando ele assume a
apresentação cefálica. A explicação mais plausível para a maior freqüência da apresentação cefálica é que o
fundo uterino aloja mais facilmente a pelve fetal, que é mais volumosa. Já em relação à apresentação pélvica,
vários fatores estão envolvidos, tais como: hidrocefalia e outras malformações fetais, vícios pélvicos,
gemelaridade, malformações/tumores uterinos, prematuridade, brevidade do cordão umbilical e oligodrâmnio.
Atitude: relação das diversas partes fetais entre si.
-Apresentação cefálica: a variedade das atitudes fetais é responsável pela descida da apresentação através do
estreito médio da pelve, e está intimamente relacionada à duração do TP. A classificação da atitude toma como
referência o pólo cefálico, de acordo com seus pontos de referência, em relação a dois eixos:
-Eixo anteroposterior: segundo este eixo, classificamos a atitude fetal a partir da proximidade do mento ao
tórax. Sendo assim, temos a atitude de:
-Total flexão – apresentação cefálica fletida (de vértice):
incide em 95-96% das gestações a termo. É o ovóide fetal.
O ponto de referência no momento da insinuação é
lambda.
-Deflexão – apresentação cefálica defletida: a cabeça se
afasta em graus variados da face anterior do tórax,
alterando o prognóstico do parto normal. Neste caso,

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


151
temos os graus de deflexão: 1° grau → apresentação de bregma, 2° grau → apresentação de fronte (glabela), 3° grau
→ apresentação de face (mento). Na deflexão de 3° grau, o pescoço fetal está muito estendido, de forma que o
occipito entre em contato com o dorso, podendo ser observado em situações como oligodrâmnio.
-Eixo laterolateral: classifica-se a atitude fetal de acordo
com a distância entre sutura sagital e o pube e sacro.
-Sinclitismo: representa a sutura sagital apresentando-se
eqüidistante do pube e do sacro, sem inclinações laterais;
-Assinclitismo: consiste no encaixe do pólo cefálico com a
sutura sagital apresentando uma inclinação lateral, seja
anterior (obliquidade de Nagele – sutura mais próxima ao
sacro) ou posterior (obliqüidade de Litzmann – sutura mais
próxima do pube.
-Apresentação pélvica: responsável por 3 a 4% dos partos a termo. Sua
freqüência é maior na gestação pré-termo (25% daquelas em 28 semanas)
quando comparada ao termo. A atitude fetal pode ser:
-Pelvipodálica – pélvica completa: quando pernas e coxas estão fletidas,
com pés e nádegas na apresentação;
-Pélvica simples ou incompleta modo nádegas: quando coxas estão fletidas sobre a bacia e as pernas
estendidas sobre a superfície anterior do tronco, havendo apenas as nádegas na apresentação.
Altura da apresentação: baseia-se na comparação do plano fetal mais
baixo com os planos da bacia. Este parâmetro é um indicador dinâmico
da evolução do TP. O plano da bacia mais utilizado para definir a altura
da apresentação é o planos de DeLee: nele, o diâmetro biespinha
isquiática é o plano de referência 0; cada centímetro que o plano fetal
mais baixo esteja acima do plano 0, torna-se um plano negativo (-1, -2, -
3), enquanto que cada centímetro que o plano fetal mais baixo alcance
abaixo do plano 0, torna-se um plano positivo (+1, +2...). Os planos de
DeLee variam de -5 a +5 (outras fontes: -3 a +3) . Os planos de Hodge estão em completo desuso.
Posição fetal: é a relação entre o dorso fetal e o lado do abdome materno. Logo, o dorso fetal pode estar à
direita ou esquerda do abdome materno (o inverso em relação ao obstetra durante o exame) e voltado para a
face anterior ou posterior do abdome. No final da gestação, a posição mais comum é a esquerda e anterior.
Variedades de posição: nomeiam-se pelo emprego de letras. A primeira letra refere-se ao ponto de referência
fetal e as demais ao ponto de referência materno. Assim, a variedade de posição OEA significa que a
apresentação é cefálica fletida (O → de occipital) no qual o ponto de referência é lambda, que se relaciona
com o estreito superior da bacia à esquerda (E) e anteriormente (A). MDP, portanto, traduziria, mento à direita
e posterior. As variedades orientadas para o sacro (S) ou púbis (P) exigem, em sua nomenclatura, apenas duas
letras (OP ou OS, por exemplo).
A variedade mais favorável ao parto vaginal é a cefálica fletida, preferencialmente se anterior. As defletidas associam-
se a maior taxa de insucesso no parto vaginal. A apresentação de bregma (1° grau) geralmente é transitória e
transforma-se, na maioria, em fletida. A de fronte (2° grau) é rara e impossibilita na grande maioria o parto vaginal,
uma vez que o diâmetro da cabeça na pelve materna torna-se o maior possível). Já a de face (3° grau) permite o parto
vaginal apenas se a variedade seja mento anterior (MEA, MDA ou MP), visto que se o mento estiver voltado para
posterior torna-se impossível a flexão da cabeça e o desprendimento.
Diagnóstico da apresentação e da posição do feto: vários métodos podem ser utilizados: palpação
abdominal, exame vaginal (toque), ausculta e, em casos de dúvida, estudos de imagem (USG, RX, RNM).
-Palpação abdominal: utiliza das manobras de Leopold-Zweifel (ver no capítulo de pré-natal).
-Exame vaginal: geralmente o toque só permite o diagnóstico da apresentação e posição fetal uma vez que
tenha se iniciado o TP, quando o colo então se abre.
-Ausculta: isoladamente não tem valor diagnóstico, mas seu local de melhor audição reforça os resultados da
palpação e do toque.
Fonte de Pesquisa: Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 2.

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ESTUDO DO PARTO: MOTOR


A contratilidade uterina é o fenômeno mais importante do trabalho de parto (TP), indispensável para fazer
dilatar o colo e expulsar o feto.
Tocometria: é a mensuração das contrações uterinas, e seu registro gráfico é a tocografia. Serve para
diagnosticar e tratar os distúrbios que possam aparecer durante o parto. Há vários métodos para avaliar a
contratilidade uterina, sendo a tocometria externa, apesar de ser menos precisa, o método de eleição durante o
trabalho de parto, por ser isento de risco e de fácil manuseio. Ela baseia-se em um transdutor abdominal de
pressão acoplado ao aparelho de cardiotocografia.
Existem ainda outros métodos de registo da pressão: intramiometrial (invasivo, limitado a investigação científica),
amniótica (único método invasivo utilizado na prática clínica), placentária (catéter ligado a um manômetro no cordão
umbilical durante o secundamento) e do útero vazio (para estudo da contratilidade uterina no puerpério).
As características que podem ser observadas durante a tocometria são: tônus uterino, freqüência (em 10
minutos por convenção), intensidade, duração (em segundos), atividade uterina, trabalho uterino e tríplice
gradiente descendente (as ondas de contração no momento do parto iniciam-se em um dos marcapassos
localizados próximos as trompas, onde são mais intensas, e se propagam do fundo para o colo uterino).
Contratilidade nas diferentes fases:
-Gravidez: as contrações uterinas são incoordenadas, infrequentes, focais, de baixa intensidade e não possuem
o tríplice gradiente descendente. Essas contrações são chamadas de contrações de Braxton-Hicks. Entre 28-32
semanas possuem freqüência de 2 a cada hora e, entre 33-36 semanas, até três por hora.
-Trabalho de parto: a fase de dilatação inicia-se quando as contrações atingem a freqüência de 2 a 3 em 10
minutos, intensidade de 30 a 40mmHG e duração de 30 a 40s. Ao final deste período, a freqüência é de 4 em
10 minutos e duração de 50s. No período expulsivo temos 5 a 6 contrações em 10min, intensidade de 50 a 60
mmHg e duração de 60 a 80s. A essas contrações expulsivas associam-se as contrações voluntárias ('puxos' –
contratilidade da musculatura abdominal com a glote fechada).
-Secundamento: o útero continua a contrair-se de forma intensa e ritmada, embora as contrações sejam
indolores. Duas ou três contrações depois do nascimento geralmente são suficientes para descolar a placenta.
-Puerpério: as contrações vão diminuindo de freqüência e intensidade. Quando a mãe amamenta, a liberação
reflexa de ocitocina causa a contração uterina mais intensa, muitas vezes referida como cólica.
Funções da contratilidade uterina: manutenção da gravidez, dilatação e apagamento do colo uterino
(amadurecimento do colo uterino), formação do segmento uterino inferior (pela dilatação do istmo), descida e
expulsão fetal, descolamento da placenta e hemostasia puerperal (miotamponagem com transformação do
útero em globo de segurança de Pinard).
Repercussões hemodinâmicas:
-Organismo materno: cada contração impulsiona 300ml de sangue, com considerável aumento do retorno
venoso, do débito cardíaco e da pressão arterial. Durante o relaxamento uterino, se a grávida estiver em
decúbito dorsal, a compressão da cava inferior pelo útero pode levar à hipotensão supina.
-Feto: as repercussões são causadas principalmente pela redução do fluxo uteroplacentário, pois há
compressão dos vasos sanguíneos intramiometriais. Essa redução pode causar hipóxia transitória no feto
durante as contrações.

INDUÇÃO DO PARTO
O parto é induzido quando iniciado artificialmente por meios farmacológicos ou mecânicos que produzem
metrossístoles suficientes para desencadear o trabalho de parto.
Indicações: gravidez prolongada, amniorrexe prematura com sinais de infecção ovular, síndromes
hipertensivas, malformação fetal incompatível com a vida, morte fetal.
Contraindicações: gestação múltipla, apresentação fetal anômala, útero com histerotomia prévia (cesariana –
não é contraindicação absoluta), placenta prévia, colo uterino imaturo, obstrução do canal de parto,

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


153
macrossomia fetal, sorologia para HIV positiva, malformações uterinas, carcinoma cervical invasivo.
Índice de Bishop: é a melhor forma de avaliar a maturidade
do colo uterino e predizer a probabilidade de a indução
resultar em parto vaginal. Apesar das divergências na
literatura, do Rezende e Sogimig, temos a seguinte
interpretação deste índice: pontuação < 6 → é necessário
amadurecimento cervical prévio à indução e sugere que o
parto não iniciará sem indução; > 6 → colo maduro e
favorável à indução; >8 → o parto vaginal deve iniciar após
indução ou após o início do trabalho de parto.
Conduta:
-Colo uterino desfavorável: considera-se fundamental a realização de preparo cervical prévio à indução. As
opções dependem do grau de contratilidade uterina: sem dinâmica uterina → misoprostol 25 a 50 mcg via
vaginal de 4/4 a 6/6 horas até IB > 6, podendo ser realizado por até 48 horas; com dinâmica uterina → indução
mecânica através de dilatação com catéter de Foley n° 14 ou 16 (método de Krause).
-Colo uterino favorável: neste caso, as principais opção de indução são as seguintes:
-Amniotomia: provoca um aumento na produção local de prostaglandina, e seus principais efeitos adversos são o
aumento dos riscos de infecção amniótica e o prolapso do cordão umbilical.
-Infusão de ocitocina: método mais difundido, capaz de iniciar ou aumentar as contrações rítmicas. Como efeitos
adversos, pode produzir taquissistolia, hipertonia uterina e sofrimento fetal agudo. Dilui-se 5UI de ocitocina em
500ml de SG5%, formando uma solução com 10mUI/ml. Iniciar a infusão com 8 gotas/minuto, duplicando-se o
gotejamento a cada 30 minutos até que se observe atividade uterina favorável (3 a 4 contrações em 10 minutos) e até
a dose máxima recomendável de 64 gotas por minuto.

INIBIÇÃO DO PARTO
A tocólise é a intervenção farmacológica mais empregada para prevenção do parto prematuro. Vários
medicamentos possuem a capacidade de inibir a contração uterina (tocolíticos). Os mais empregados são (ver
mais no capítulo de RPMO): beta-adrenérgicos (salbutamol → evitar em cardiopatas, hipotireoidismo e
diabéticas), inibidores da síntese de prostaglandinas (indometacina → utilizar apenas antes de 32 semanas,
pelo risco de fechamento precoce do ducto arterioso) e bloqueadores dos canais de cálcio (nifedipina).

DISCINESIAS UTERINAS
São as distócias dinâmicas ou funcionais, decorrentes da contratilidade uterina anormal. A contratilidade
uterina torna-se ineficiente para dilatar o colo e atuar na progressão do parto. Por outro lado, a atividade
uterina pode ser exagerada, capaz de provocar o parto rápido e precipitado (parto disfuncional).
Discinesias quantitativas: a onda contrátil é generalizada e mantém o tríplice gradiente descendente. Apenas
seus valores estão alterados. Pode ocorrer: hipoatividade (hipossistolia → intensidade < 25mmHg;
bradissistolia → freqüência < 2 em 10minutos), hiperatividade (hipersistolia → intensidade >50mmHg;
taquissistolia → freqüência > 5 em 10 minutos), hipotonia (tono < 8mmHg) ou hipertonia (tono >12 mmHg).
-Hipotonia/hipoatividade: administração de ocitocina, prostaglandina (via vaginal ou intracervical) e amniotomia.
-Hipertonia/hiperatividade: decúbito lateral esquerdo (melhora a perfusão uterina por descompressão da cava
inferior), descontinuar o uso de uterotônicos, prescrição de meperidina (analgesia reduz a liberação de catecolaminas)
e uso de tocolíticos (nos casos de hipertonia por taquissistolia).
Discinesias qualitativas: encontramos ondas generalizadas com inversão do tríplice gradiente descendente ou
ondas localizadas, assincrônicas e incoordenadas (incoordenação uterina).
Tratamento: decúbito lateral esquerdo, infusão de ocitocina em doses fisiológicas, amniotomia, analgesia e sedação
(meperidina ou peridural). Caso não surtam efeito, indica-se fórcipe, se aplicável, ou cesariana.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 2.

Principais Temas em Ginecologia & Obstetrícia


154

ESTUDO DO PARTO: MECANISMO


Conjunto dos movimentos que o feto é obrigado a realizar na sua passagem pelo canal de parto. Esses
movimentos são todos passivos, independem da vida do feto e são resultantes de forças (contração uterina e
abdominal) que impulsionam a apresentação. É a análise do parto do ponto de vista mecânico.
Os movimentos corporais fetais tem o objetivo de colocar os menores diâmetros do feto em concordância com
os menores diâmetros da pelve. O mecanismo do parto possui características constantes, porém varia de
acordo com a morfologia da pelve e o tipo de apresentação.
Tempos: A decomposição em tempos é meramente didática.
-Insinuação: é a passagem do maior diâmetro da apresentação pelo estreito superior da pelve. É confirmado
através do toque vaginal, quando percebe-se que o vértice da apresentação atingiu as espinhas ciáticas. O
movimento fetal que possibilita a diminuição da apresentação é a flexão (na apresentação cefálica) ou a
deflexão (na apresentação cefálica defletida de face). Na apresentação pélvica ocorre redução dos diâmetros
por aconchego dos membros inferiores sobre o tronco. Na córmica, o feto de tamanho normal não se insinua,
impossibilitando o parto por via vaginal, à exceção quando o feto é morto, onde ocorrem movimentos atípicos.
-Descida: é a insinuação mais profunda, em
virtude da qual a cabeça penetra e enche a
escavação. Os movimentos são a rotação
interna da apresentação e, concomitante, a
penetração das espáduas no estreito superior da
bacia.
-Desprendimento: o movimento acessório é a
deflexão na apresentação cefálica fletida ou a
flexão na apresentação de face, movimentos
contrários aos da insinuação. Outro movimento
presente é a rotação externa da cabeça e a
rotação interna das espáduas.

APRESENTAÇÃO CEFÁLICA FLETIDA


É a apresentação de 95-96% dos casos, sendo a
menos sujeita a pertubações do mecanismo, e a
considerada eutócica por natureza. Nesta
apresentação, o feto situa-se longitudinalmente e
o pólo cefálico fletido está voltado para o
estreito superior da bacia.
A insinuação ocorre quando o maior diâmetro
da apresentação, neste caso o diâmetro
biparietal, ultrapassa o estreito superior da bacia.
Para que ele ocorra, há o movimento de flexão.
O diagnóstico da insinuação pode ser dado por:
palpação abdominal → impossibilidade de
palpar o limite inferior do pólo cefálico durante
a 4ª manobra de Leopold; toque vaginal → o
ponto de maior declive da apresentação alcança
o plano das espinhas ciáticas (plano 0 de
DeLee).
Podem ocorrer movimentos de inclinação lateral
da apresentação durante o deslocamento pelo

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


155
canal de parto, denominados de assinclitismo. Os movimentos de assinclitismo podem ser:
-Obliqüidade de Nagele: é o assinclitismo anterior, onde a sutura sagital está mais próxima do sacro do que do pube;
-Obliquidade de Litzmann: é o assinclitismo posterior, a sutura sagital está mais próxima ao pube que ao sacro
Caso seja transitório, o assinclitismo é considerado como acomodação da apresentação (fisiológico). Caso seja
definitivo, evidencia-se distócia. A ausência de flexão lateral, condiciona o sinclitismo.
Durante a rotação interna da descida, o pólo cefálico rotará preferencialmente para a posição OP (occipito-
púbica), variedade em que o desprendimento é facilitado, e menos comumente para a posição occipito-sacra
(OS). Independente da apresentação inicial (OEA, OEP...) a rotação interna se dará preferencialmente para a
posição OP, pois nesta posição a deflexão da cabeça facilita o desprendimento fetal. Caso o feto não atinja a
posição OP ou OS, não conseguirá sair, ficando impactado na pelve materna.
Durante todo o tempo da descida, a cabeça permaneceu fletida. O feto realiza então um movimento de
deflexão, que distende a musculatura perineal e dá passagem para o desprendimento do pólo cefálico. Uma
vez fora da genitália, a cabeça realiza uma nova rotação, a rotação externa da cabeça, voltando o occipital
para o lado onde se encontrava no momento da insinuação. Este movimento é simultâneo à rotação interna das
espáduas.
A rotação externa da cabeça simultânea à rotação interna das espáduas faz com o que o maior diâmetro do feto no
interior da mãe, neste momento, o diâmetro biacromial, se desprenda pelo maior diâmetro da via de saída do trajeto, o
diâmetro pube-sacral. Foi pelo diâmetro pube-sacral que saiu o maior diâmetro do pólo cefálico, o diâmetro
biparietal, na orientação OP ou OS.
Uma vez acomodado, há o desprendimento do ombro anterior e, logo após, o desprendimento do ombro
posterior. O desprendimento do restante do corpo ocorre sem dificuldades.

APRESENTAÇÃO PÉLVICA
O parto pélvico tem altos índices de complicações quando comparado ao cefálico. Entretanto, a apresentação
pélvica não constitui indicação obrigatória de parto cesariano, mesmo em primíparas. A cesariana está
indicada em algumas situações associadas à apresentação pélvica; destacam-se: peso fetal <1,5kg (pois o feto
não dilata o suficiente a pelve materna) ou >4kg, cesariana anterior, amniorrexe prematura, malformação fetal
compatível com a vida, parada da progressão do parto, vício pélvico, gestação gemelar, obstetra inexperiente,
mau passado obstétrico (morte fetal ou seqüela), procidência de membros.
Para melhor análise do mecanismo de parto dessa apresentação, decompõe-se o feto em três segmentos:
cintura pélvica, cintura escapular e cabeça derradeira.
-Parto da cintura pélvica: A insinuação termina quando o diâmetro bitrocanteriano (maior diâmetro
perpendicular à linha de orientação) transpõe a área do estreito superior da bacia materna. Durante a descida
ocorre a rotação interna. O desprendimento é mais fácil na apresentação pélvica completa (pelvipodálica) que
na incompleta (pélvica simples); nesta última, os membros inferiores estendidos ao longo do corpo da feto
prejudicam a flexibilidade do tronco, conferindo a característica de bloco rígido. Em contrapartida, a
apresentação pelvipodálica dificulta a insinuação.
-Parto da cintura escapular: durante a insinuação o diâmetro biacromial, por compressão, reduz sua dimensão
e se insinua na bacia materna. No momento em que os ombros atingem o assoalho perineal, a cabeça está se
insinuando. A descida transcorre com a rotação interna das espáduas; a rotação das espáduas e a rotação da
cabeça ocorrem conjuntamente, tanto interna como externamente. No desprendimento, a espádua anterior é a
primeira a aflorar a vulva e, em seguida, sai a espádua posterior.
-Parto da cabela derradeira: o parto do pólo cefálico ocorre com maior dificuldade e de forma mais
trabalhosa na apresentação pélvica, quando comparada à apresentação cefálica.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 2.

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156

ASSISTÊNCIA AO PARTO
Estuda as medidas e procedimentos que podem ou devem ser empreendidos durante o trabalho de parto (TP).
Muitas aspectos da assistência são controversos, acreditando-se, atualmente, que muitas medidas empregadas
rotineiramente são desnecessárias e, por vezes, danosas.
Primeiro período – Dilatação
As gestantes, instruídas durante o pré-natal, devem procurar assistência uma vez que acreditem ter iniciado o
trabalho de parto. Ocorrendo o diagnóstico de trabalho de parto, a parturiente deve ter internação hospitalar.
Prescrição inicial:
-Tricotomia: estudos de revisão sistemática não mostraram benefícios da sua realização. Entretanto, autores
recomendam que os pelos sejam aparados com tesoura apenas no trajeto da episiotomia, quando necessária;
-Hidratação venosa: é indispensável, pela necessidade de correção de anormalidades da contração, práticas
anestésicas e possibilidade de complicações do parto;
-Enteróclise: deve ser evitada, uma vez que estudos comprovam que não há redução de infecção materno-fetal;
-Dieta: evitar a dieta zero, assim como dieta com sólidos. Podem ser administrados 250 ml de líquidos a cada 2 horas,
por via oral, atentando para o risco de broncoaspiração em procedimentos anestésicos.
-Deambulação: o decúbito não é preconizado durante todo o TP, sendo permitido que a paciente ande pelo quarto e
adote a posição mais confortável. Vale ressaltar que o decúbito dorsal deve ser evitado pelo risco de hipotensão
supina (caso deitada, a gestante deve assumir decúbito lateral) e pela ocorrência de discinesias.
Toque vaginal: avalia a progressão do apagamento e da dilatação do colo uterino, a sua orientação (anterior,
médio ou posterior) e consistência. Avalia também a progressão da descida do feto (altura da apresentação) e
presença de assinclitismo. Possibilita identificar o estado da bolsa das águas (íntegra ou rota). Quanto ao
líquido amniótico, permite avaliar sua quantidade indiretamente, pelo volume formado pela bolsa das águas.
-Orientações: fazer assepsia adequada antes de proceder o toque, utilizar luvas estéreis, lavar as mãos e proceder o
toque com delicadeza. Evitar toques desnecessários, pois predispõem à infecção puerperal. Não há freqüência pré-
estabelecida, devendo-se individualizar os casos, embora preconiza-se, de forma genérica, a cada 1 a 2 horas.
Bem-estar fetal: é uma das avaliações mais importantes durante o período de dilatação. Geralmente é avaliado
pela ausculta dos BCF antes, durante e após, no mínimo, duas contrações, a cada 30 minutos em pacientes de
baixo risco e a cada 15 minutos nas pacientes de alto risco (SOGIMIG. Segundo o Rezende, a cada 15 minutos
independente do risco). A avaliação do líquido amniótico permite a observação da presença de mecônio, que
pode ser sinal de sofrimento fetal.
Bem-estar materno: consiste na avaliação freqüente dos sinais vitais maternos e de orientações e apoio. Não é
adequado instruir a paciente a “fazer força” neste período pois, além de totalmente desnecessário, pode levar à
exaustão.
Amniotomia: sua realização rotineira é questionável, pois aumenta o risco de compressão do cordão umbilical
e de infecção. Pode reduzir o tempo total do TP em até 1-2 horas se realizada quando a dilatação do colo é de
5 cm. Rezende defende a sua realização, enquanto outras evidências sugerem que seja apenas realizada em
casos de progressão anormal do TP.
Medicamentos: as drogas mais utilizadas são os analgésicos, a anestesia de condução e a ocitocina. A
analgesia peridural deve ser oferecida à parturiente sempre que possível, após a comprovação da adequada
evolução do TP (colo > 4cm, atividade uterina coordenada e apresentação fetal insinuada e adaptada à cervice)
Quando não está disponível, a alternativa são os opiáceos, com preferência pela meperidina.
Segundo período – Expulsão
Bem-estar fetal: devido as contrações uterinas mais freqüentes e intensas deste período, a avaliação constante
do bem-estar fetal é importante. Feita por ausculta dos BCF, neste período, de 5 em 5 minutos antes, durante e
após duas contrações uterinas. Eventualmente utiliza-se cardiotocografia, oximetria de pulso fetal e análise do
pH do sangue capilar fetal.
Posição ideal: as mais utilizadas são as de litotomia (decúbito dorsal, flexão parcial das coxas e joelhos em
abdução) e a de Laborie-Duncan (se diferencia apenas pela flexão exagerada das coxas sobre o abdome,

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


157
facilitando o desprendimento fetal). A parturiente só deverá adotar essas posições próximo ao nascimento. A
posição de cócoras ou o parto dentro da água não mostraram superioridade as anteriores. Posições horizontais
devem ser evitadas, pois não facilitam o esforço expulsivo materno e perdem o auxílio da gravidade.
Medidas de assepsia: as mãos do obstetra devem ter sido lavadas, o períneo deve ser preparado com PVPI e
devem ser utilizados campos estéreis, gorros, máscara e capote.
Anestesia: caso não seja realizado o bloqueio peridural, efetua-se a anestesia do períneo. O bloqueio é feito em
nível das espinhas ciáticas bilateralmente e complementado com infiltração superficial na linha de incisão da
episiotomia, se indicada.
Proteção do períneo:
-Episiotomia: atualmente, seu uso de forma indiscriminada não está indicado. Pode ser mediana ou médio-lateral,
sendo a mais utilizada a médio-lateral direita, embora, no Brasil, existem locais onde se preconize a médio-lateral
esquerda. A mediana é mais fisiológica, porém apresenta maior risco de lacerações para o reto. Já a médio-lateral
apresenta mais risco de lesão muscular, sangramento e dor no pós-parto.
-Manobra de Ritgen modificada: consiste na compressão do períneo posterior e controle da deflexão da cabeça fetal
com a mão oposta, visando evitar a deflexão rápida da cabeça e, conseqüentemente, a chance de traumas maternos.
Tração suave da cabeça e desfazer circulares: após a saída da cabeça do concepto, deve-se avaliar a presença
de circulares de cordão e desfazê-las. Uma vez desfeitas, posicionam-se os dedos indicador e médio de ambas
as mão formando uma espécie de 'gancho' para exercer uma tração suave da cabeça do concepto, primeiro para
baixo e depois para cima, para facilitar o desprendimento das espáduas.
Medidas quando o feto impacta:
-Apresentação cefálica – cabeça fetal impactada
Manobra de Kristeller: consiste na compressão do fundo uterino sendo, atualmente, contraindicada.
Fórcipe obstétrico: indicado quando a abreviação do desprendimento do pólo cefálico for indicado.
-Apresentação cefálica – ombros impactados : a literatura é divergente quanto a melhor sequência de
manobras a serem empregadas.
Pressão suprapúbica: pode ser realizada no sentido vertical, com o objetivo de comprimir o ombro fetal,
diminuindo o diâmetro biacromial. Deve ser a primeira manobra a ser tentada, associada ou não a seguinte.
Manobra de McRoberts: hiperflexão das coxas
Manobras rotacionais (Woods): pressão na face escapular do ombro posterior fetal com o auxílio de dois
dedos, a fim de rodá-lo 180° no sentido anti-horário, para que ocorra a liberação de
um ombro.
-Apresentação pélvica
Manobra de Bracht: é principal manobra a ser utilizada quando o desprendimento dos
ombros e da cabeça fetal não ocorre espontaneamente. Ao verificar o desprendimento
da nádega, o operador a apreende; quando aflora à vulva o ângulo inferior da
escápula, o operador acentua o encurvamento do feto, sem tracioná-lo. Procura-se
então horizontalizar o dorso, que é progressivamente elevado na direção do ventre
materno, fazendo-o girar ao redor da sínfise púbica. Os braços deverão se desprender
espontaneamente, ou com pequeno auxílio digital. Na ocasião do desprendimento da
cabeça, o auxiliar exerce pressão supra-púbica, enquanto o operador acentua a lordose
do feto. A cabeça então se desprende. A paciente deve ser instruída a fazer força
durante toda a manobra, pois a metade superior do tronco deve ser expelida,
idealmente, em uma só contração.
Outras manobras: quando a manobra de Bracht falha, outras manobras podem ser
utilizadas, sendo descritas em ordem de preferência:
-Liberação dos ombros:
-Desprendimento in situ: através da introdução dos dedos do operador para puxar o braço
-Manobra de Lovset: rotação do feto em 180°
-Manobra de Rojas: rotação do feto em mais de 180°
-Manobra de Deventer-Muller: movimentos pendulares de elevação e descida do feto
-Manobra de Pajot: introdução da mão do operador na vagina, abaixando o braço fetal.

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158
-Liberação da cabeça derradeira:
-Manobra de liverpool: deixar o corpo do feto pendendo por 20s para promover a descida do pólo fetal, depois do
qual eleva-se o feto de tal forma que ele gire sob a sínfise materna. Deve ser associada a manobra de McRoberts
(hiperflexação das coxas da parturiente sobre o ventre materno).
-Fórcipe de Piper: desenhado especialmente para o desprendimento da cabeça derradeira
-Manobra de Mauriceau: o feto é apoiado no antebraço do obstetra que introduz os dedos médio e indicador na boca
do feto, fletindo o pólo cefálico.
-Manobra de Wiegand-Martin-Wieckel: semelhante a anterior, porém exerce-se pressão na cabeça fetal através do
abdome materno. Indicada na cabeça derradeira que não se insinuou.
Terceiro Período – Secundamento
Procura-se avaliar se a placenta já se descolou. Nenhuma manobra mais intempestiva deve ser realizada. A
tração forçada do cordão umbilical é proscrita (risco de rotura do cordão e inversão uterina), bem como a
compressão vigorosa do fundo do útero (manobra de Credé, que pode levar também a inversão uterina).
Recomenda-se o uso de 10U de ocitocina profilática intramuscular, de forma rotineira imediatamente após a
expulsão fetal, seguida de clampeamento e tração controlada do cordão umbilical. Essa conduta ativa associa-
se a menores perdas sanguíneas e menor risco de hemorragias puerperais.
Durante sua exteriorização, pode-se impor leve tração e torção axial da placenta, para auxiliar no seu
descolamento (manobra de Jacob-Dublin).
Após a saída da placenta deve-se fazer novamente assepsia da genitália externa materna e revisão do canal de
parto para identificar se houve alguma laceração. Nesse momento, se foi efetuada episiotomia, procede-se a
episiorrafia. Graus das lacerações:
1° grau: lesão da pele do períneo, fúrcula e mucosa vaginal;
2° grau: fáscia e músculo do períneo, sem lesão da muscular do esfíncter
3° grau: lesão da camada muscular do esfíncter anal
4° grau: lesão que atinge a mucosa retal, expondo a luz do reto.
Quarto período – Período de Greenberg
Este é o período onde mais ocorrem hemorragias, seja por atonia uterina, seja por lacerações do trajeto.
Também podem ocorrer sangramentos por retenção de restos placentários ou de membranas. É um período em
que deve ser feita observação atenta da parturiente.
Deve ser verificado se o útero está contraído – globo de segurança de Pinard.
A perda sanguínea média total no parto normal é de 500ml e na cesariana é de 1.000ml.
O uso de medicamentos para contração uterina é limitado atualmente aos casos de hemorragia no pós-parto, de
partos operatórios ou de presença de fatores predisponentes para hemorragia (ex. gravidez gemelar).

PARTOGRAMA
Representação gráfica da evolução do TP, cujo uso se tornou obrigatório em toda a maternidade a partir de
1994 (OMS).
Relembrando: O trabalho de parto divide-se em duas fases: latente e ativa. Na primeira, o útero já tem contrações
mais intensas e regulares, porém sem dilatação do colo suficiente para caracterizar a fase ativa do TP (3 cm em
primíparas e 4 em multíparas). A fase ativa de dilatação se divide em 3 fases: fase de aceleração (dilatação inicial,
cerca de 1 hora), fase de inclinação máxima (dilatação linear e rápida) e fase de desaceleração (dilatação em
velocidade constante); é nesta última que normalmente ocorre a descida da apresentação e é ela que precede o
período expulsivo.
Existem vários tipos diferentes de partograma, sendo o da página seguinte o mais utilizado. Nele, observamos
na parte superior um espaço para a marcação da dilatação do colo em cm, a altura e a variedade da
apresentação. Observamos também que foram traçadas duas linhas diagonais neste espaço: a da esquerda é a
'linha de alerta' e a da direita a 'linha de ação'. Logo abaixo, observamos local para registro da hora do exame,
BCF, contrações uterinas, estado da bolsa das águas, administração de medicamentos e procedimentos
efetuados durante o parto.
Montagem do partograma: As marcações são iniciadas na fase ativa do parto (2 ou 3 contrações eficientes
em 10 minutos com colo dilatado em 3 a 4 cm). Cada divisória vertical corresponde a uma hora. A dilatação

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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cervical deverá ser indicada no ponto correspondente no gráfico, traçando-se na hora imediatamente seguinte a
linha de alerta e, em paralelo, quatro horas após, a linha de ação.
A taxa normal de dilatação do colo varia de 1,2 a 1,5cm/hora. Se a dilatação for inferior a 1cm/h, a marcação
irá se aproximar da linha de alerta, o que implica, apenas, uma maior observação clínica. Caso a dilatação pare
ou atrase ainda mais, será ultrapassada à direita a linha de ação, o que implica a necessidade de intervenções
(parto disfuncional), que não necessariamente é uma intervenção cirúrgica.
Interpretação: as distocias são identificadas pela observação das curvas de dilatação cervical e de descida da
apresentação fetal.
Distocias são dificuldades encontradas na evolução de um TP vaginal, podendo estar relacionadas a problemas ou
alterações com a mãe ou o feto, que podem trazer riscos para ambos. O contrário seria eutócia.
Em geral, quando a dilatação não está se processando normalmente, há problemas com a contratilidade uterina
(hipocinesia ou discinesia). A desproporção cefalopélvica é suspeitada quando há parada da descida da
apresentação, podendo o colo dilatar-se completamente. A distocia de rotação é suspeitada quando a cabeça do
feto não roda para OP, permanecendo em variedades transversas ou obliquas durante o período expulsivo.
Alterações possíveis:
-Fase latente prolongada: dilatação cervical menor que 3 a 4 cm apesar do tempo excessivo de contrações
dolorosas e regulares. Definida como duração >20h em primíparas e >14h em multíparas. Não é indicativa de
distocia e não necessita de correção. Apenas
exige atenção, pois é fator de risco para parto
disfuncional.
-Fase ativa prolongada / distocia funcional
primária: dilatação cervical <1cm/hora
(ultrapassa a linha de alerta), decorrente,
geralmente, de discinesias uterinas.
-Parada da dilatação: dilatação cervical
mantida (ultrapassa a linha de alerta) por dois
toque sucessivos em paciente na fase ativa do
TP. Decorrente em geral de desproporção
cefalopélvica ou alteração da posição de
apresentação fetal (deflexão, variedades
transversas). Metrossístoles normais.
-Parto precipitado: dilatação, descida e
expulsão do feto em intervalo < 4 horas.
Taquissistolia e hipersistolia estão presentes,
podendo ser decorrente, por exemplo, da
administração excessiva de ocitocina.
-Parto pélvico prolongado: quando >1h em
multíparas e >2h em primíparas. Ocorre descida
progressiva, mas excessivamente lenta no
período expulsivo, geralmente por
contratilidade diminuída.
-Parada da descida: diagnosticada por dois
toques sucessivos, com intervalo de 1h, após a
dilatação completa. Decorre, em geral, da
desproporção ou alteração da posição da
apresentação fetal (deflexão, variedades
transversas). Metrossístoles normais.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia volume 2.

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160

CESARIANA
O parto cesáreo ou operação cesariana é o ato cirúrgico que consiste na abertura da parede abdominal
(laparotomia) e da parede uterina (histerotomia) para a extração do concepto na cavidade uterina. É o
procedimento cirúrgico mais realizado na mulher no Brasil, com freqüência crescente desde 1960, atingindo
taxas superiores a 40% dos partos. Apesar da inexistência de estudos metodologicamente corretos para a
definição da taxa ideal de cesariana, considera-se que deva estar entre 15 e 25% do número total de partos.
Fatores predisponentes: o Ministério da Saúde vem lançando mão de medidas de natureza administrativa,
técnica e educacional com o objetivo de diminuir a alta incidência de cesariana. Estão implicados no aumento
da sua taxa de realização: redução da paridade (pela presença de condições mais comuns em primíparas que
indiquem a operação), aumento da idade das gestantes, monitorização fetal eletrônica, apresentação pélvica,
decréscimo na aplicação do fórcipe médio e fatores socioeconômicos e demográficos. Entretanto, apenas esses
fatores não justificam a alarmante taxa de cesarianas no Brasil.
Indicações: as indicações podem ser maternas, fetais ou para ambos. Em relação à real necessidade da
cirurgia, existem indicações absolutas e relativas. Quando é realizada sem que haja urgência, denomina-se
cesárea eletiva.
-Absolutas:
-Desproporção cefalopélvica -Cicatriz uterina corporal prévia -Placenta prévia total
-Situação transversa -Herpes genital ativo -DPP com feto viável
-Morte materna com feto vivo -Procidência de cordão ou membro fetal
-Obstrução do canal de parto por condilomatose vulvar extensa
-Relativas:
-Feto não reativo -Gestante HIV + (depende da carga viral) -Apresentação pélvica
-Gemelaridade -Colo desfavorável à indução do parto com passado de cesárea
-Psicopatia -Macrossomia em gestante diabética -Discinesia uterina
-Pré-eclâmpsia -Pós-maturidade -Oligoidramnio
-Doença hemolítica perinatal -Prematuridade extrema -Primiparidade idosa
-Mais do que uma indicação relativa.
As quatro indicações mais comuns de cesariana são: falha de progressão durante o trabalho de parto (30%),
histerotomia prévia (30% - usualmente relacionada a cesariana prévia), apresentação fetal anômala (10 %) e
sofrimento fetal (10%). Não existem contraindicações absolutas à cesariana.
Situações mais importantes:
-Placenta prévia total: é indicação absoluta de cesariana, esteja o feto vivo ou morto. A urgência dependerá da
intensidade do sangramento. Quando não há história de sangramento e a IG está acima de 36 semanas, persiste
a indicação absoluta de cesariana, que será realizada eletivamente.
-Descolamento prematuro de placenta (DPP):
Feto morto ou inviável → indicação relativa e materna, a depender do quadro materno (sangramento, coagulopatia)
Feto viável no trabalho de parto → indicação de urgência absoluta materno-fetal
Feto viável no período expulsivo → indicação relativa materno-fetal; se indicada, a urgência é absoluta
-Prolapso de cordão e sofrimento fetal agudo:
Feto inviável/morto → não é indicação de cesárea;
Feto viável → indicação absoluta;
Feto viável no período expulsivo → indicação relativa, porém se indicada a cesárea, a urgência é absoluta.
-Prematuridade: indicação controvertida. Mostra maior consistência nos casos de prematuridade extrema.
-Infecção: a cesariana nos casos de infecção intrauterina implica em uma maior exposição materna ao
processo infeccioso. Neste casos, geralmente dá-se preferência pelo parto via vaginal. Necessidade da cirurgia
depende da idade gestacional, da viabilidade e comprometimento fetal e do estágio do trabalho de parto.
-Distocia ou falha de progressão: devido à heterogeneidade desta condição clínica, os casos devem ser
individualizados. É difícil estabelecer uma regra de até quando se deve insistir no parto vaginal e qual é o
momento ideal para optar pelo parto operatório.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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-Apresentação pélvica: fetos nessa apresentação possuem maior risco de prolapso de cordão e de distocia
(cabeça derradeira) do que aqueles em apresentação cefálica. Estudos mais novos evidencial a incidência de 4
vezes mais risco de mortalidade perinatal no parto vaginal na presença de apresentação pélvica, indicando a
cesárea em todos os casos. Apesar disso, os tratados de obstetrícia permanecem com a indicação quando
apresentação pélvica em primíparas, individualizando-se os casos.
-Situações especiais:
-Parto normal pós-cesariana: a história de uma cesariana prévia não é indicação de novo procedimento. Se incisão
prévia transversal no segmento inferior, a probabilidade de deiscência é de 0,5%, o que não justifica nova cesárea.
Caso a cicatriz prévia tenha sido realizada mais acima ou caso seja vertical, o parto vaginal é contraindicado, visto
que a probabilidade de rotura uterina almeja 12%. Pacientes com mais de uma cesárea prévia apresentam risco 3
vezes superior de rotura uterina do que aquelas com apenas uma cesárea, havendo divergência entre os autores se é
realmente indicação de nova cesárea. Indução com ocitocina deve ser criteriosa e com rigorosa monitorização, devido
ao maior risco de rotura uterina. O uso de misoprostol não é indicado.
-Gestação gemelar: a indicação de cesárea irá depender da relação entre os fetos. Os casos de gestações diamnióticas
onde o primeiro feto é pélvico, nas gestações trigemelares e nas monoamnióticas, a interrupção da gestação por via
alta está associada a melhores resultados perinatais.
-HIV: o parto cesáreo é a via de parto mais recomendada nestes casos para diminuir o risco de transmissão vertical.
Deve ser realizada eletivamente em torno de 38 semanas de gestação. Entretanto, o parto vaginal pode ser concebido
em gestantes com carga viral indetectável e que tenham feito uso adequado da profilaxia antirretroviral.
-HPV: a cesariana está indicada apenas se houver obstrução mecânica do canal de parto ou risco de hemorragia grave.
-Herpes genital ativo: o risco de transmissão na primoinfecção durante o parto vaginal é de 30 a 50%.
-Câncer de colo uterino: a via de parto varia de acordo com a idade gestacional e com o estadiamento da doença.
-Miomatose uterina: os miomas tendem a crescer durante a gravidez, podendo dificultar ou impedir o parto vaginal.
-Cesariana pós-morte: em caso de morte materna, a cesariana deve ser realizada na tentativa de salvar o concepto. A
incisão da parede abdominal e útero deve ser realizada longitudinalmente e o mais rapidamente possível, idealmente
dentro dos primeiros 5 minutos após a morte materna, em vigência da RCP. A cesariana realizada prontamente
beneficia o feto e o sucesso das manobras de RCP, pela descompressão da aorta e melhora do retorno venoso.
Pré-operatório: devem ser observados no pré-operatório:
-Maturidade pulmonar fetal: deve estar estabelecida antes da indicação de uma cesariana eletiva que preceda
as 39 semanas de gestação.
-Anestesia: antes de qualquer procedimento cirúrgico, a paciente deve ser avaliada em consulta anestésica para
estratificação do seu risco operatório.
-Dosagem de hemoglobina: uma dosagem basal de hemoglobina é recomendada no pré-operatório de qualquer
cirurgia com risco potencial de perda sanguínea significante.
-Antibioticoprofilaxia: é um tema controverso na literatura. Aqueles autores que a defendem, recomendam
uma dose intravenosa de cefalotina ou cefazolina 2g imediatamente após o clampeamento do cordão, para
profilaxia de infecção em todas as pacientes submetidas à cesariana.
-Cateterização vesical: a maioria dos obstetras opta pela introdução de catéter vesical antes do início da
cirurgia para evitar a distensão da bexiga e a dificuldade na exposição do segmento inferior.
-Tricotomia: caiu por terra a crença de que a tricotomia reduz o risco de infecção da ferida operatória.
Portanto, quando realizada, deve-se apenas aparar os pêlos com tesoura, pois a gilete causa escoriações na pele
Operatório:
-Anestesia: a escolha do método anestésico deve considerar as características clínicas da paciente e do feto, a
indicação da cesariana, comorbidades e estágio do trabalho de parto. A pneumonite por inalação de conteúdo
gástrico (Síndrome de Mendelson) é a causa mais comum de morte por anestesia em obstetrícia.
-Anestesia de bloqueio (epidural ou subaracnóidea): é o método mais empregado para cesariana. Vantagens → evita
o risco da síndrome de Mendelson e permite contato precoce entre mãe e feto. Desvantagens → extenso bloqueio
necessário para a cirurgia, podendo acarretar hipotensão. Contraindicações → hipovolemia (DPP e PP), infecção do
local de punção, discrasia sanguínea (HELLP, CIVD, trombocitopenia) e hipertensão intracraniana
-Anestesia geral: reservada para casos especiais, particularmente as contraindicações da anestesia de bloqueio e
situações de grave risco fetal, pela rapidez na administração anestésica.
-Técnica cirúrgica: a incisão cutânea mais realizada é a transversal pois, embora implique em tempo de

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162
cirurgia maior e maior necessidade de hemotransfusões, apresenta menor risco de herniação e melhor
resultado estético. Já a incisão mediana infraumbilical apresenta menor risco de sangramento, menor chance
de infecções graves da parede abdominal, melhor campo operatório e retirada mais rápida do feto, porém seu
resultado estético faz com que a a incisão transversal seja preferida.
-Pfannenstiel: é a técnica de laparotomia mais empregada no Brasil. É feita uma incisão transversal 3cm acima da
sínfise púbica, estendendo-se além das bordas dos músculos reto abdominal. A aponeurose é então descolada para
cima até próximo da cicatriz umbilical e para baixo até a sínfise púbica. Os músculos reto abdominais são separados
na rafe mediana e o peritônio parietal é incisado longitudinalmente. Na teoria, esta incisão não está recomendada nas
emergências obstétricas, como DPP, sofrimento fetal, grandes hemorragias e instabilidade hemodinâmica.
O peritônio visceral uterino é então incisado transversalmente sobre o segmento uterino inferior; o miométrio
sofre divulsão digital. A histerotomia corporal longitudinal (cesariana clássica) é destinada para situações
especiais, como a cesariana post-mortem, prematuridade extrema e inacessibilidade ao segmento inferior por
múltiplas aderências.
A extração fetal na apresentação cefálica consiste na introdução da mão do cirurgião no interior do útero que
deverá orientar o occipital do feto para a histerotomia, enquanto é feita pressão no fundo uterino (Manobra de
Geppert). A remoção da placenta deve ser efetuada pela expressão do fundo uterino (Manobra de Credé)
acompanhada de delicada tração do cordão umbilical, evitando-se a remoção manual, pelo risco de
isoimunização e aumento do risco de infecção. O fechamento do peritônio visceral e/ou parietal é opcional,
embora alguns autores advoguem o seu não fechamento.
Pós-operatório: logo após o parto imediato, a paciente deve ser observada cuidadosamente para identificar,
precocemente, quaisquer sinais de atonia uterina, sangramento vaginal excessivo, hemorragia incisional ou
oligúria. Em linhas gerais, o pós-operatório baseia-se em hidratação e analgesia (opióides, AINE). A
deambulação e a introdução da dieta devem ser precoces, dentro de 6 a 8 horas, pois garantem o retorno da
peristalse pelo reflexo gastrocólico e diminuem o risco de TVP. A dosagem de Hb no pós-operatório de
cesarianas eletivas em pacientes assintomáticas não é necessário.
Complicações:
-Peroperatórias: decorrem de hemorragias, aderências e extração fetal difícil. Como alternativas terapêuticas para a
hemorragia, inclui-se: massagem uterina, compressão manual da aorta abdominal, ligadura bilateral das artérias
uterinas, ligadura das hipogástricas e histerectomia.
-Pós-operatório imediato: trombose venosa profunda e tromboembolismo pulmonar.
-Pós-operatório tardio: a infecção é a complicação mais comum, podendo ser uma peritonite, endometrite ou ITU. As
complicações locais incluem deiscência da ferida operatória, infecção da cicatriz cirúrgica e hematomas. Outras
complicações incluem: edema agudo pulmonar, pneumonia por aspiração, atelectasia, embolia pulmonar e íleo
paralítico metabólico ou secundário à peritonite.
Prognóstico: A mortalidade materna diminuiu bastante nas últimas décadas; entretanto, a mortalidade materna
é significantemente maior nas cesarianas de urgência do que nas eletivas. Na maioria dos casos, é a
enfermidade que indicou a cesariana a responsável pela mortalidade materna, e não o procedimento em si. As
principais causas de mortalidade decorrentes da cirurgia decorrem de problemas associados à anestesia,
infecção puerperal e episódios tromboembólicos. A ocorrência da síndrome de Mendelson diminuiu
fortemente pela expansão dos bloqueios regionais.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 2.

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


163

FÓRCIPE OBSTÉTRICO
Fórcipe é o instrumento destinado a apreender a cabeça fetal e extraí-la através do canal de parto. Existem
vários modelos com diferentes manejos, porém sua estrutura comum consiste em dois ramos cruzados, cada
um contendo: colher, pedículo, articulação e cabo. Cada colher possui três curvaturas: cefálica, pélvica e
perianal.
Tipos de fórcipe: os fórcipe mais utilizados são: clássicos → Tucker-McLane, Simpson e Elliot; Especiais →
Kielland, Barton e Piper. Os clássicos se prestam para a maior parte das aplicações, enquanto os especiais tem
indicações específicas.
-Simpson: é o fórcipe mais utilizado, em cerca de 90 % das aplicações. Serve praticamente para todas as
necessidades, exceto para a apresentação em variedade de posição transversa.
-Kielland: excelente instrumento para realizar rotações mais amplas da cabeça na pelve, semelhante ao fórcipe de
Simpson, porém é o instrumento de escolha em variedades de posição transversa.
-Barton: desenhado para casos de variedade de posição transversa quando a apresentação encontra-se alta na pelve.
-Piper: é um instrumento desenhado especialmente para a extração da cabeça derradeira.
Mecanismo de ação: o fórcipe é desenhado com a função de apreender a cabeça do feto (preensão ou
pegada), rodá-la se necessário (rotação) e extraí-la através da pelve materna (tração).
-Preensão: a única posição adequada para a pegada é a biparietomalomentoniana.
-Rotação: deve seguir a conformação do instrumento utilizado para não traumatizar a
vagina.
-Tração: deve ser simultânea às contrações uterinas e realizada sempre no eixo da
pelve materna, ou seja, deve-se lembrar que o canal de parto não é um cilindro, pois
apresenta uma curvatura dando-lhe o aspecto de “J”.
Classificação das operações com fórcipe: baseia-se na altura da apresentação na pelve. Segundo a
classificação mais atual (ACOG, 1988), classifica-se em:
-Desprendimento/de alívio: o couro cabeludo é visível no intróito vaginal sem separar os lábios. A sutura
sagital encontra-se no diâmetro ântero-posterior do estreito inferior.
-Baixo: a apresentação encontra-se no plano +2 de DeLee ou abaixo dele, mas não no assoalho pélvico.
-Médio: a cabeça do feto está acima do plano +2 de DeLee, porém encontra-se insinuada.
Diagnóstico clínico da insinuação da apresentação cefálica: quando ao toque vaginal percebe-se que o vértice (pólo
cefálico) encontra-se ao nível ou abaixo do nível das espinhas ciáticas (plano 0 de DeLee).
-Alta: a cabeça não está insinuada ou encontra-se no limite da insinuação. Nesta situação, atualmente o fórcipe
obstétrico está proscrito, pois apresenta mais riscos que a cirurgia cesariana.
Indicações:
-Alívio: constitui-se a principal indicação do fórcipe atualmente. Traduz os casos onde há dilatação total do
colo uterino e a cabeça fetal está baixa e rodada em occipito-púbica, no assoalho pélvico. Tem os objetivos de:
reduzir a perda sanguínea materna, reduzir o esforço e desconforto do período expulsivo e evitar a compressão
prolongada da cabeça fetal.
-Maternas:
-Falha na progressão do parto por discinesias uterinas (insuficiência das contrações);
-Sofrimento materno: parto longo que provoca exaustão materna com insuficiência da prensa abdominal;
-Comorbidades que contraindiquem o esforço físico materno do período expulsivo e que exibam risco cirúrgico alto,
tais como cardiopatias, pneumopatias (EAP, crise asmática) e neuropatias.
-Dificuldade ou impossibilidade de utilização da prensa abdominal: astenia, hérnias abdominais, anestesia condutiva;
-Fetais:
-Retenção da cabeça derradeira na apresentação pélvica;
-Sofrimento fetal agudo no período expulsivo
-Prematuridade: pois o fórcipe reduz a compressão prolongada sobre a delicada cabeça do feto prematuro
-Procidência irredutível de membros e de funículo quando a cabeça fetal está insinuada.

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164
Condições de praticabilidade: todos os critérios abaixo devem ser preenchidos para que o fórcipe seja aplicado
-Cabeça insinuada; -Membranas Rotas;
-Dilatação total do colo uterino; -Canal de parto sem obstáculos (sem tumores e sem estenoses);
-Reto e bexiga vazios; -Feto vivo ou morte recente que possibilite a pega da cabeça;
-Avaliação do tipo pélvico; -Diagnóstico preciso da variedade de posição (para pega ideal);
-Operador habilitado; -Proporcionalidade (volume da cabeça fetal e a pelve devem ser compatíveis)
Técnica geral de aplicação: a paciente deve estar em posição de litotomia, sendo empregado os cuidados de
antissepsia da vulva, períneo e vagina. Procede-se a analgesia peridural ou bloqueio bilateral dos nervos
pudendos e a cateterização vesical para esvaziamento da bexiga. As condições de praticabilidade devem ser
confirmadas. Segue-se a apresentação do fórcipe à vulva, ou seja, colocar o fórcipe frente ao períneo,
simulando a posição que irá ocupar dentro da pelve. Feito isso, deve ser escolhida a primeira colher.
O nome da colher do fórcipe é dado pela mão que segura o cabo ou, ainda, como o fórcipe é introduzido de maneira
cruzada, o nome da colher do fórcipe é também o nome do lado da mãe onde está sendo introduzido. Nas variedades
de posição oblíqua, a primeira colher a ser introduzida é a posterior. Nas variedades de posição diretas (OP e OS) a
primeira colher a ser aplicada é a esqueda.
Continuando, introduz-se os dedos-guia para, então, introduzir a primeira colher. Aplica-se a segunda colher e
é feita a articulação das duas colheres. A partir daí deve-se verificar a pegada, proceder a rotação (se
necessária), tração e extração, todas durante a contração uterina. Quando for iminente o parto da cabeça fetal a
tração deve ser interrompida (para evitar que as colheres escorreguem e causem lesões na mãe ou no feto), as
colheres devem ser retiradas e, após a expulsão do feto e placenta, é obrigatória a revisão do canal de parto.
Complicações: quando aplicado incorretamente, o
fórcipe pode resultar em sérios problemas, tanto para a
mãe quanto para o feto.
-Maternas: lacerações (vulva, vagina, reto e útero), lesão
da bexiga, aumento das perdas sanguíneas, infecção,
hematomas, fratura do cóccix.
-Fetais: Céfalo-hematoma, dano cerebral, hemorragia
intracraniana, depressão geral, asfixia, escoriações e/ou
lacerações faciais, compressões oculares, paralisia do
nervo facial e/ou hipoglosso, seqüela neurológica tardia,
paralisia braquial e fratura do crânio.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 6.

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VÁCUO EXTRATOR
Baseia-se na retirada da cabeça fetal por meio de ventosas. Praticamente não é mais utilizado no Brasil, sendo
mais usado em países europeus, como Inglaterra.
Indicações: tem indicações semelhantes às do fórcipe. Entretanto, requer maior tempo para a extração fetal
que o fórcipe, não devendo ser preferencial em situações emergenciais. As principais indicações incluem:
período expulsivo prolongado, cardiopatia descompensada, doença pulmonar, alterações cerebrovasculares,
disfunções neuromusculares nas quais o esforço expulsivo seja impossível ou contraindicado e sofrimento
fetal.
Contraindicações: apresentação pélvica, apresentação de bregma, apresentação de face, prematuridade
(abaixo de 34 semanas, pois há maior risco de hemorragias intraventriculares), operador inexperiente,
impraticabilidade pela variedade de posição ou altura da apresentação fetal, incerteza da variedade de posição
e suspeita de desproporção cefalopélvica.
Condições de praticabilidade: Assemelham-se às condições de praticabilidade do fórcipe:
-Apresentação cefálica fletida -Variedade de posição conhecida -IG > 34 semanas
-Dilatação cervical total -Membranas rotas -Cateterismo vesical
-Cabeça fetal em +3 de DeLee -Proporcionalidade cefalopélvica -Operador experiente
-Possibilidade de realizar cesariana em caso de insucesso
Técnica de aplicação: inicialmente, revisar as condições de praticabilidade. Feito isso, verificar as conexões e
testar o vácuo no aparelho com luvas estéreis. Avalia-se, então, a variedade de posição fetal (pela palpação da
sutura sagital e fontanelas) e identifica-se a fontanela posterior. Procede-se a aplicação da campânula de maior
tamanho que se adapte bem, assegurando que não há nenhum tecido mole (cérvice ou vagina) dentro do bordo
da campânula. Com a bomba, cria-se um vácuo de pressão negativa. A partir daí, deve ser feita tração durante
o período das contrações, buscando o vetor força que mimetize a curvatura pélvica.
A ventosa, com diâmetro aproximado de 6cm, deve ser posicionada na sutura sagital, aproximadamente a 3cm ou 2
dedos do centro da fontanela anterior.
Fracasso da aplicação: o insucesso é considerado quando: o feto não for extraído 3 tentativas consecutivas; a
campânula desliza da cabeça fetal duas vezes apesar da tração feita corretamente; tentativas maiores que 30
minutos. Nestes casos, está indicada a cesariana.
Complicações: O hematoma subgaleal ou subaponeurótico é a maior complicação do vácuo-extrator e ocorre
quando o sangue acumula-se no espaço entre a gálea aponeurótica e o periósteo dos ossos do crânio. Também
são comuns o cefalohematoma e escoriações do couro cabeludo. Quando comparado ao fórcipe, a maioria dos
estudos não evidencia melhores resultados perinatais com o uso do vácuo-extrator, além de estar associado a
aumento do risco das complicações acima descritas.
Entretanto, o uso do fórcipe está associado a maiores
taxas de lesões maternas e lesões do nervo facial.
Desta forma, o uso do vácuo parece mais adequado
em gestantes com mais que 34 semanas nas quais a
probabilidade de sucesso seja muito elevada,
visando minimizar os riscos maternos, enquanto que,
na idade inferior a 34 semanas, o fórcipe é mais
adequado, pois o risco de complicações fetais é
significativo.

Fonte de Pesquisa:
Medcurso 2010 – Obstetrícia, volume 6.

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PUERPÉRIO
Puerpério ou pós-parto é um período cronologicamente variável a depender da literatura. De forma geral, é o
período de 6 a 8 semanas que se inicia após o parto (vaginal ou cesáreo), ou seja, após a expulsão da placenta.
É uma fase ativa na qual acontecem fenômenos de natureza psíquica, hormonal e metabólica, marcada pela
involução dos órgãos reprodutivos e do organismo materno à situação pré-gravídica.
Fases: Puerpério imediato → 1° ao 10° dia; puerpério tardio → 10° ao 45° dia; puerpério remoto → após o
45° dia.

FISIOLÓGICO
Manifestações Involutivas e fisiológicas
-Útero: imediatamente após o secundamento, em virtude das contrações rigorosas e rítmicas, o útero inicia seu
processo de diminuição de volume, encontrando-se, neste momento, a nível de cicatriz umbilical. Diminui
cerca de 1cm por dia, tornando-se novamente intrapélvico com 15 dias e volta às dimensões pré-gravídicas
com 4 semanas. As contrações vigorosas no pós-parto respondem também pela hemostasia da ferida
placentária, pela compressão dos vasos sanguíneos. Ao útero contraído, de consistência firme, dá-se o nome de
globo de segurança de Pinard.
A involução uterina ocorre principalmente por uma diminuição no tamanho das fibras musculares à custa da
diminuição citoplasma, e não do seu número. Ocorre de forma mais rápida nas mulheres que amamentam, pois a
estimulação dos mamilos acarreta a produção de ocitocina pela neuro-hipófise; este hormônio promove a ejeção do
leite e desperta as contrações uterinas referidas pela paciente como cólicas: reflexo útero-mamário.
Devido as contrações uterinas, após cerca de uma semana o colo uterino não mais permite a exploração
digital. O orifício externo da mulher que já pariu jamais recupera a sua conformação original puntiforme,
assumindo um aspecto em fenda transversa.
A dequitadura da placenta e das membranas leva consigo apenas a camada esponjosa da decídua. A camada
superficial da decídua basal é enfraquecida e irregular, sofre necrose e é eliminada na forma de lóquios. A
regeneração do sítio de inserção placentária se conclui em três semanas do parto.
-Vagina: as pequenas lacerações cicatrizam rapidamente e, em 5 ou 6 dias, já não são visíveis. O epitélio da
vagina sofre um processo de atrófico de origem hormonal denominado crise vaginal pós-parto, processo que
acontece durante os primeiros 15 dias do pós-parto e pode causar desconforto local.
-Função ovulatória: retorna em, aproximadamente, 6 a 8 semanas, caso a paciente não amamente, apesar
desse período ser variável. Os ciclos menstruais na lactação costumam ser anovulatórios, mas a ovulação e a
gravidez podem ocorrer nesse período. Por esse motivo, não se deve esperar o reinício da menstruação para
iniciar a contracepção.
-Mamas: as mamas sofrem alterações proliferativas e secretórias durante toda a gestação. No momento do
parto, o colostro já está presente e a descida do leite (apojadura) ocorre entre o primeiro e terceiro dias após o
parto. A prolactina é o hormônio galactorréico mais importante. O adequado e freqüente esvaziamento das
mamas é indispensável para a manutenção da secreção láctea. Já para o esvaziamento mamário é fundamental
a ação contrátil mioepitelial da ocitocina.
-Trato urinário: a hipotonia e o relaxamento das paredes da bexiga e dos ureteres regridem em duas a oito
semanas, mas podem persistir por até 3 meses. A hipotonia da bexiga e ureteres contribuem para a ocorrência
de superdistensão, esvaziamento incompleto, resíduo urinário significativo e até de refluxo ureteral.
Conseqüentemente, é aumentado o risco de infecções e há diminuição do débito urinário.
-Alterações hemodinâmicas: o volume plasmático aumenta em cerca de 10% no pós-parto imediato, pela
descompressão aorto-cava e pela regressão do edema gravídico. Como conseqüência, o débito cardíaco
aumenta em cerca de 300ml no puerpério imediato. A pressão venosa nos membros inferiores retorna ao
normal, com amenização das varizes vulvares e dos membros inferiores e das hemorróidas.
-Alterações hematológicas: a série vermelha não apresenta modificações importantes, a menos que o parto

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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tenha cursado com perda sanguínea significativa. Durante o trabalho de parto observa-se leucocitose, que
persiste ou aumenta na primeira semana do puerpério. Valores de 25.000/ml são considerados normais,
principalmente às custas de granulócitos sem desvio à esquerda. O sistema de coagulação é ativado por
ocasião do parto e do sangramento decorrente deste evento.
Manifestações clínicas:
-Dor: na maioria das vezes, a dor resulta das contrações uterinas vigorosas próprias do puerpério.
Normalmente, este desconforto não dura mais que uma semana. Em alguns casos podem ser necessários
analgésicos.
-Lóquios: consistem de exsudatos e transudatos misturados com elementos celulares descamados e sangue,
decorrentes da involução uterina e regeneração da ferida placentária. Nos primeiros três a quatro dias, os
lóquios são avermelhados, pois contém sangue → lóquios rubros. Gradativamente se tornam róseos ou
serossanguíneos → lóquios serosos. Progressivamente assumem coloração esbranquiçada ou amarelo-clara e,
em torno do 10° dia, passam a ser chamados de lóquios alvos.
A persistência de lóquios avermelhados após duas semanas, principalmente se acompanhado de subinvolução uterina,
levanta a possibilidade de restos placentários. A presença de odor forte e desagradável acompanhado de febre e de
lóquios com coloração achocolatada é sinal de infecção puerperal (endometrite).
-Perda de peso: na puérpera ocorre uma redução de 5 a 6kg de peso corporal (pelo esvaziamento uterino e
perda sanguínea) e de 1-2kg de líquido (edema e diurese excessiva). O peso anterior é normalmente atingido
ao final do sexto mês pós-parto.
-Distúrbios do humor: alterações do ritmo circadiano e do humor são fenômenos comuns e transitórios, sendo
o apoio psicológico à mãe e à família fundamental. A disforia pós-parto ocorre em aproximadamente 60% das
puérperas e se caracteriza por alterações do humor transitórias, benignas e autolimitadas. Está associada às
alterações hormonais intensas e aos fatores psicossociais da gravidez. Tem início no 3° dia pós-parto e
desaparece espontaneamente ao 14° dia. Em raras oportunidades, o distúrbio evolui para depressão maior.
-Elevação da temperatura: é considerada fisiológica quando ocorre nas primeiras 24 horas e se limita a 24
horas. Nos 2° ou 3° dia pode ocorrer a “febre do leite”, relacionada à apojadura.

PATOLÓGICO
Define as complicações que se estendem do terceiro período após o parto (delivramento) até 6-8 semanas.
Hemorragia pós-parto: é uma das principais causas de mortalidade materna em todo o mundo. É definida e
diagnosticada clinicamente como um sangramento excessivo que torna a paciente sintomática (vertigem,
síncope) e/ou que resulta em sinais de hipovolemia (hipotensão, taquicardia e/ou oligúria). Perdas sanguíneas
acima de 500ml no parto vaginal e de 1.000ml no parto cesáreo são consideradas perdas excessivas.
Classificação: A hemorragia pode ser dividida em: primária/precoce/imediata → se acontece nas primeiras 24
horas pós-parto; secundária ou tardia → quando ocorre após as 24 horas até 6-8 semanas do parto.
Causas: as principais causas são lembradas pelo mnemônico dos 4T: Tônus (atonia uterina), Trauma
(laceração de trajeto), Tecido (retenção placentária ou de fragmentos) e Trombina (coagulopatia).
Complicações: as mais relevantes são: anemia, fadiga crônica, choque hipovolêmico, CIVD e insuficiência
renal, hepática e respiratória. A síndrome de Sheehan (necrose hipofisária isquêmica) é uma complicação
tardia da hemorragia obstétrica de qualquer etiologia; a hipóxia, em função do espasmo das artérias pituitárias
leva a necrose hipofisária, que envolve agalactia, amenorréia, atrofia genital, hipotireoidismo e insuficiência
adrenal.
-Atonia uterina: ocorre quando há perda na eficiência da manutenção da contração miometrial. Constitui a
principal causa de hemorragia e choque hipovolêmico após o secundamento. Se constitui uma das principais
causas de histerectomia pós-parto.
-Diagnóstico: o principal achado é sangramento genital que não necessariamente é volumoso, porém é
contínuo. Ao exame físico encontra-se útero acima da cicatriz umbilical, flácido e depressível.
-Tratamento: Geral → acesso venoso para infusão de 2.000 a 3.000ml de SF0,9%, SVD para controle do
débito urinário (manter superior a 30ml/h), reserva de hemoderivados e manobra de Hamilton (massagem do
fundo uterino com a mão esquerda associada ao toque vaginal com a mão direita, tendo elevar e realizar a

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anteroversoflexão do útero). Farmacológico → ocitocina (tratamento de primeira linha) 5 unidades em bolus
IV, misoprostol 400mcg (2 comprimidos) por via oral ou retal. Cirúrgico → indicado nos casos de falha das
medidas anteriores; deve ser feita revisão do canal de parto então suturas, ligaduras arteriais, embolização ou
até mesmo a histerectomia.
-Lacerações de trajeto: constituem a segunda maior causa de hemorragia puerperal precoce. A presença de
sangramento ativo em paciente com útero contraído deve levantar a suspeita dessa hipótese.
-Causas: episiotomia extensa, feto macrossômico, manobra de Kristeller, parto pélvico operatório (fórcipe).
-Tratamento: realizado por revisão sistemática do canal de parto, hemostasia imediata e correção das
lacerações. Caso ocorra instabilidade hemodinâmica, as medidas gerais e o emprego de fármacos está indicado
-Retenção placentária: a retenção da placenta ou de restos placentários causa hemorragia devido à dificuldade
de contração miometrial. Ao exame, além de graus variados de sangramento, observa-se o útero discretamente
aumentado de tamanho e o canal cervical dilatado. O diagnóstico pode ser confirmado pela USG.
-Tratamento: constitui-se na administração de fármacos uterotônicos (ocitocina, misoprostol), na remoção da
placenta ou dos restos placentários, após anestesia, mediante a manobra de Credé (processo para descolamento
de placenta) ou curagem (extração manual da placenta) ou curetagem uterina (se restos placentários).
-Inversão uterina: é a invaginação do fundo uterino que pode alcançar o segmento inferior, ultrapassá-lo,
chegar à vagina (inversão parcial) e surgir fora da vulva (inversão total). É uma complicação rara que se deve
à má assistência no secundamento, com tração exagerada do cordão umbilical ligado à placenta ainda
implantada no fundo uterino.
-Manifestações: a inversão uterina se apresenta com dor aguda e hemorragia precoce que leva ao choque em
minutos. O choque, classicamente neurogênico, pode não guardar relação com a perda sanguínea.
Classicamente, para o diagnóstico são necessários: fuga da matriz na palpação abdominal, choque e
hemorragia.
-Tratamento: inclui a instalação de dois acessos (um para solução salina e um para hemotransfusão) e a
correção manual imediata da inversão uterina, de preferência sob anestesia geral. Caso a placenta ainda esteja
aderida, realiza-se a manobra de Taxe → retirar a placenta e, posicionando a palma da mão no centro do fundo
do útero, pressioná-lo para cima. Essa manobra é efetiva em mais de 90% dos casos.
Infecções puerperais: termo genérico para descrever processos infecciosos após o parto, caracterizados por
febre com duração superior a 48 horas, dentro dos primeiros 10 dias do puerpério, excluindo-se as primeiras
24 horas. A depender da fonte, além das infecções genitais estão inclusas as infecções da mama.
A ausência de febre não significa a ausência de infecção. Da mesma forma, a ocorrência de pico febril isolado no
puerpério, principalmente após o parto vaginal, é comum e normalmente apresenta resolução espontânea.
Fatores de risco: a cesariana é, isoladamente, o principal fator de risco para infecção puerperal, elevando o
risco de endometrite em 5-30 vezes, o de bacteremia em até 10 vezes e o de morte por infecção em até 80
vezes. Outros fatores de risco importantes são:
-Partos vaginais: rotura das membranas superior a 12 horas, bacteriúria intraparto, múltiplos toques vaginais,
corioamnionite, traumatismo intraparto.
-Parto cesáreo: trabalho de parto prolongado, rotura das membranas superior a 12 horas e anestesia geral.
Etiologia: os principais microorganismos envolvidos em infecção puerperal são: aeróbios gram-positivos (S.
beta-hemolítico do grupo B [S. agalactiae], A e D, Enterococos e S. aureus), aeróbios gram-negativos (E. coli,
Klesbisiella, Proteus, Enterobacter, Pseudomonas), anaeróbios gram-positivos e gram-negativos e a Clamydia.
Em infecções graves, principalmente quando na presença de gás em tecidos, deve-se pensar em Clostridium
perfingrens.
-Endometrite/endomiometrite: a endometrite é possivelmente o início de quase todos os processos infecciosos
do útero e anexos, e é a infecção puerperal mais prevalente. Surge comumente entre o 4° e 5° dia após o parto.
-Sintomas: febre alta, útero subinvoluído e amolecido, colo entreaberto com lóquios piossanguinolentos e
fétidos. Não há empastamento dos paramétrios nem massas palpáveis.
-Agente: a endometrite é geralmente uma infecção polimicrobiana causada por bactérias que atingem o útero
por via ascendente. A clamídia é bactéria associada a endometrite puerperal tardia (após o 10° dia).
-Tratamento: a ATB deve ser iniciada logo após o diagnóstico e mantida até que a paciente se torne afebril, por

Daniel Ricardo Cruz – MED 2014 – FPS


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72 horas, e assintomática. O esquema recomendado é: ampicilina (2g IV 6/6 hrs) + gentamicina (1,5mg/kg 8/8
hrs). A clindamicina (900mg IV 8/8hrs) ou o metronidazol (500mg IV 8/8hrs) podem ser somados para
promover cobertura anaeróbia se a cesárea for realizada.
-Infecções de episiorrafia: geralmente resultam de traumatismos e hematomas contaminados pela flora
vaginal. As pacientes referem dor intensa perineal associada a hipertermia e sinais de abscesso em formação.
-Tratamento: lavar a ferida diariamente com SF0,9% e ATB por 7 a 10 dias com: gentamicina (240mg/dia se <
70kg ou 320mg/dia se >70kg IV em dose única) + clindamicina (600mg IV 6/6 hrs ou 900mg IV 8/8 hrs).
-Infecção da parede abdominal: a ferida operatória apresenta-se com hiperemia, calor, celulite e secreção
purulenta. O tratamento é feito por 7-10 dias com gentamicina (dose anterior) + oxacilina (1g IV 4/4 horas por
24 horas e depois passar para cefalexina 500mg VO 8/8 hrs).
-Complicações
-Parametrite: em geral associa-se à endometrite. Há espessamento do paramétrio, habitualmente unilateral, o
toque genital é muito doloroso e a febre é alta. O tratamento é o mesmo da endometrite.
-Salpingite: geralmente associada a endometrite. Há dor abdominal aguda, principalmente em fossa ilíaca,
defesa abdominal discreta e febre alta. O esquema ATB é o mesmo recomendado para endometrite.
-Abscesso pélvico: febre persistente, geralmente vespertina, em paciente com ATB adequada e massa pélvica
identificável à palpação abdominal ou USG. O ATB é semelhante ao da endometrite + drenagem do abscesso.
-Peritonite: a paciente apresenta febre alta, palidez, pulso rápido, dor pélvica intensa, inicialmente em baixo-
ventre, depois em todo o abdome. Sinal de Blumberg é positivo, há diminuição do peristaltismo ou distensão
abdominal com íleo paralítico. Abaulamento de fundo de saco posterior pode estar presente. Ocorre
principalmente quando infecção por S. beta-hemolítico. O esquema ATB é igual ao da endometrite.
-Sepse e choque séptico: a paciente apresenta a SIRS, sendo freqüentes fácies toxêmica, febre alta, taquicardia,
mialgia, irritabilidade, letargia e hipotensão. A maioria dos casos de choque séptico é subsequente à infecção
por enterobactérias, principalmente E. coli. Na sepse causada por Clostridium a evolução é dramática e
comumente caracteriza-se pela presença de gás em tecidos moles (enfisema subcutâneo, nos exames de
imagem). A presença de gangrena, hemólise intravascular, icterícia, CIVD e IRA denunciam a gravidade do
quadro. Essas pacientes devem ser internadas em UTI, receber ATB empírica de amplo espectro e deve ser
avaliada a necessidade de tratamento cirúrgico, como desbridamento, drenagem de abscessos ou histerectomia
-Fasciite necrotizante: complicação rara , mas potencialmente fatal que pode acometer episiorrafias, feridas
operatórias e lacerações perineais. Ocorre extensa área de necrose entre o 3° e 5° dia pós-parto. Normalmente
a flora é polimicrobiana. O tratamento exige debridamento cirúrgico agressivo e ATB de amplo espectro.
Doenças tromboembólicas: o termo tromboembolismo envolve todos os processos vasculares oclusivos,
incluindo tromboflebite superficial, trombose venosa profunda, tromboflebite séptica pélvica e
tromboembolismo pulmonar.
Transtornos psiquiátricos: as alterações do ritmo circadiano e do humor são fenômenos comuns e
transitórios. O suporte psicológico à mãe e aos familiares é indispensável. Poucas vezes é necessário medicar.
Caso o quadro persista ou se agrave, exige-se uma abordagem especializada – psiquiátrica.
-Disforia pós-parto (“Blue sindrome”): ocorre em 60% das puérperas e se caracteriza por alteração do humor
transitória, benigna e autolimitada. O quadro geralmente tem início no terceiro dia após o parto e desaparece
espontaneamente por volta do 14° dia de puerpério. As alterações hormonais intensas do pós-parto associada
aos fatores psicossociais da gravidez são a principal hipótese etiopatogênica.
-Depressão pós-parto: é o episódio de depressão maior que ocorre nas primeiras quatro semanas do puerpério.
Os principais fatores de risco são história de depressão ou ansiedade durante a gravidez, ocorrência de eventos
traumáticos, gravidez na adolescência e transtornos prévios ao ciclo gravídico-puerperal.

ALTERAÇÕES NAS MAMAS LACTANTES


Apojadura: evento fisiológico que corresponde a grande e súbita afluência de leite nas mamas das puérperas.
Geralmente ocorre entre o 3° e 5° dia após o parto (mais comumente no 3° dia).
Ingurgitamento mamário: caracteriza-se pela estase láctea repentina em puérperas com bom estado geral,
principalmente 48 a 72 horas pós-parto, refletindo a apojadura. Acompanha-se de desconforto e hiperdistensão

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mamária e hipertermia local.
-Causas: pega mamilar inadequada, sucção insuficiente, produção excessiva do leite e obstrução do ducto
mamário resultante da formação de cristais, possivelmente pela dieta rica em cálcio.
-Tratamento: o melhor tratamento é a manutenção do aleitamento e o apoio físico e psicológico à puérpera. A
freqüência das mamadas deve ser aumentada e a ordenha do excesso de leite é recomendada. O uso de
compressas frias entre as mamadas para aliviar a dor e o edema ou de compressas quentes na hora da mamada
por aumentar o reflexo da ocitocina não está recomendado, pelo efeito rebote que provocam.
Fissuras mamárias: erosões alongadas em torno dos mamilos resultantes, na maioria das vezes, da pega
inadequada do recém-nascido por má técnica ou por ingurgitamento mamário. Como são soluções de
continuidade, predispõem à ocorrência de mastites.
-Prevenção: consiste na exposição das mamas ao sol e na lubrificação das mamas com o leite antes de cada
mamada. Orientar a paciente quanto à pega ideal. Evitar o uso de pomadas e cremes nos mamilos.
-Tratamento: na presença de lesões, o aleitamento não deve ser suspenso e a puérpera deve realizar ordenha
freqüente para evitar e/ou tratar o ingurgitamento mamário.
Mastite puerperal: processo infeccioso, agudo ou crônico, que pode acometer todo o tecido mamário
(glandular, subcutâneo e pele). O agente etiológico mais freqüente é o S. aureus e outros saprófitas da pele,
que penetram no tecido, na maioria das vezes, por fissuras mamárias prévias. Nas formas graves, quando há
evolução para ulceração e necrose, associam-se bactérias gram-negativas aeróbias (E. coli, Pseudomonas) ou
anaeróbios. O diagnóstico é facilmente estabelecido pela associação do quadro com o ciclo gravídico-
puerperal, estase láctea e dor intensa.
-Tratamento: envolve o uso de analgésicos, antitérmicos, suspensão das mamas com sutiãs adequados,
esvaziamento completo das mamas para evitar estase (preferencialmente por ordenha manual) e
antibioticoterapia. A ATB dura 7-14 dias (a depender da fonte) e o fármaco de 1ª escolha é a cefalexina; outras
opções são a ampicilina e eritromicina. A amamentação deve ser mantida, com início da mamada pela mama
não afetada. A mama comprometida deve ser totalmente esvaziada.
Abscesso mamário: corresponde à presença de secreção purulenta no tecido mamário. A ATB deve ser
instituída, e a drenagem cirúrgica sob anestesia está indicada se houver flutuação. A incisão deve ser o mais
distante possível da aréola, para que se possa preservar a lactação. A amamentação na mama afetada deve ser
interrompida apenas se houver drenagem purulenta espontânea pela papila e de incisão cirúrgica muito
próxima ao mamilo.

Fonte de Pesquisa:
MedCurso 2010 – Obstetrícia.

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