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UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

MESTRADO DE HIDRÁULICA E RECURSOS


HÍDRICOS
MÓDULO 3
Gestão Integrada de Recursos Hídricos

Prof. Álvaro Carmo Vaz (UEM)


Prof. Jackson Roehrig (Cologne University of
Applied Sciences)

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5. Planeamento de recursos
hídricos

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Planeamento
• Boa gestão dos recursos hídricos: garantir um
permanente ajustamento entre disponibilidades
e necessidades
– em quantidade e qualidade
– no espaço e no tempo
– de uma forma económica e socialmente viável
– satisfazendo de forma apropriada as funções
ambientais da água e dos ecossistemas dela
dependentes
• Boa gestão implica planeamento
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Planeamento
• Todas as intervenções necessárias devem ser
– analisadas suficientemente e em tempo útil
– debatidas pelas partes interessadas
– acordadas na maior base consensual possível
• Instrumento essencial: plano de bacia hidrográfica
• Política de Águas: O crescimento das necessidades de
água para diversos fins é uma fonte potencial de
conflitos e o Estado tem a responsabilidade de os prever
e definir soluções justas e adequadas. O planeamento
ao nível da bacia hidrográfica é o principal instrumento
para preparar e implementar em avanço as medidas
necessárias
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Lei de Águas de Portugal (2005)
O planeamento das águas visa fundamentar e orientar a
protecção e a gestão das águas e a compatibilização
das suas utilizações com as suas disponibilidades de
forma a:
a) Garantir a sua utilização sustentável, assegurando a
satisfação das necessidades das gerações actuais sem
comprometer a possibilidade de as gerações futuras
satisfazerem as suas próprias necessidades;
b) Proporcionar critérios de afectação aos vários tipos de
usos pretendidos, tendo em conta o valor económico de
cada um deles, bem como assegurar a harmonização da
gestão das águas com o desenvolvimento regional e as
políticas sectoriais, os direitos individuais e os interesses
locais;
c) Fixar as normas de qualidade ambiental e os critérios
relativos ao estado das águas.
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Objectivos do plano de bacia
• Garantir a disponibilidade de recursos hídricos
suficientes para satisfazer as futuras
necessidades de água para o abastecimento
urbano e rural, desenvolvimento socio-
económico e conservação ambiental através da
elaboração e actualização dos planos das
principais bacias hidrográficas de Moçambique,
de acordo com as metas assumidas pelo País
para as Metas de Desenvolvimento do Milénio
(Política de Águas, 2007)
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O que é o plano de bacia
• Um plano para a gestão e o desenvolvimento
dos recursos hídricos da bacia
• Um plano que integra as componentes
hidrológica, ecológica, social e económica no
contexto das realidades da bacia hidrográfica
• Um plano que orienta o plano anual da
entidade gestora dos recursos hídricos (ARA)
• Um plano que permite às partes interessadas
monitorizarem o desenvolvimento dos
recursos hídricos na bacia
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Política, Estratégia, Plano

Plano de bacia
a este nível

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Plano de bacia
• Razões para o plano de bacia
– Procurar soluções para problemas prioritários de recursos
hídricos que afectam a sociedade
– Estimular o crescimento económico e o desenvolvimento
– Reconhecimento do papel da água como promotor de
desenvolvimento e como um factor chave na redução da
pobreza
• Plano de bacia tem de ter em consideração
– Disponibilidade de água
– Contexto político e geográfico
– Actividades e desenvolvimentos que necessitam de água ou
influenciam os recursos hídricos (abastecimento de água e
saneamento, caudais ecológicos, irrigação, florestas, energia
hidroeléctrica, consumo industrial, turismo, navegação e outros
usos)
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Plano de bacia
• Plano deve resultar de cooperação e
negociação entre as partes interessadas,
cabendo o papel de liderança à entidade
gestora dos recursos hídricos da bacia
• Plano deve tomar em consideração a
vulnerabilidade das pessoas, infra-estruturas e
ecossistemas a eventos extremos (cheias e
secas)
• Plano deve incluir metas claras e ser dotado de
indicadores que permitam monitorar o progresso
da sua implementação
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Responsabilidades e prazos (Política
de Águas, 2007)
• A elaboração e actualização dos planos de bacias
hidrográficas é da responsabilidade da entidade
nacional responsável pela gestão dos recursos hídricos
• Os planos de bacias dos principais rios do país deverão
ser efectuados até 2015. Deverá ser activamente
promovida a participação das partes interessadas
durante a elaboração desses planos. Os planos deverão
ser estruturados de forma a permitir actualizações
regulares em intervalos de 5 anos.
• A prioridade na elaboração e actualização dos planos
das bacias irá para:
– bacias partilhadas, para servir de base para acordos
– bacias onde já existem conflitos de necessidades de água, para
se encontrar o melhor compromisso entre requisitos divergentes
– bacias com elevado potencial de desenvolvimento (energia
hidroeléctrica, irrigação) para apoiar e promover o seu
desenvolvimento económico 11
Ciclo de planeamento

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Ciclo de planeamento
• Início do processo
– Entidade gestora a nível nacional (DNA)
– Mobilização de recursos financeiros e humanos
– Elaboração do plano: 2 anos (inicial), 1 ano
(actualizações)
• Manter
– Interesse político
– Envolvimento das partes interessadas
• Conhecidas orientações de política e estratégia
de recursos hídricos
• Síntese do conhecimento sobre a bacia
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Ciclo de planeamento
• Preparação de cenários de desenvolvimento
• Definição de uma estratégia / plano da bacia
• Aprovação pelas partes interessadas
• Obtenção de recursos para implementação
• Implementação (planos anuais) e monitorização
• Avaliação da implementação e revisão do plano
(intervalos de 5-10 anos)

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Pragmatismo é necessário
• Evitar ser ultra-ambicioso (plano para ficar na estante?)
• O plano da bacia deve tomar em devida conta a
realidade e os constrangimentos políticos, institucionais,
financeiros, de recursos humanos e outros
• O plano só terá sucesso se tiver apoio forte do Governo
e das partes interessadas
• Se uma parte ficar a perder com o desenvolvimento dos
recursos hídricos previsto no plano, assegurar que serão
devidamente compensados
• Evitar que o plano seja dominado por um pequeno grupo
de interessados, demasiado controlado pelo Governo ou
muito influenciado por doadores

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Experiência do projecto Púngoè
• Bacia internacional (Moçambique e Zimbabwe)
• Projecto incluía várias componentes
– Monografia
– Estratégia conjunta
– Capacitação institucional
– Envolvimento das partes interessadas
• Desenvolvido entre 2002 e 2007
• Capacitação institucional implicou aprovação de
estatutos, assistência técnica, diversos cursos de
formação técnica
• Envolvimento das partes interessadas levou á criação
do Comité da Bacia do Púngoè, visitas de membros de
ambos os países a toda a bacia
• Seminários com partes interessadas de ambos os
países no fim de cada fase do estudo
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Experiência do Projecto Púngoè
• Relatórios produzidos
– Monografia (extensa: relatório principal + 13 anexos
especializados)
– Cenários de desenvolvimento
– Estratégia conjunta
• Relatórios disponibilizados no site da internet
criado pelo projecto
• Estratégia conjunta aprovada pelos dois países
• Começa a ser implementado (projecto PP2)

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RELATÓRIOS DO PROJECTO PÚNGOÈ

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Estrutura do plano (exemplo)
A – Enquadramento
– Visão para a gestão dos recursos hídricos na bacia
– Objectivos a atingir
– Preparação do plano e constrangimentos
– Estrutura do plano
– Ligação com outros planos a nível nacional e
regional
– Quadro legal e institucional

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Estrutura do plano (exemplo)
B – Caracterização da bacia / Monografia
– Fisiografia (geometria, relevo, hidrografia, geologia,
solos, cobertura vegetal)
– Hidrologia (precipitação, evaporação, alturas e
caudais, água subterrânea, cheias)
– Qualidade da água e fontes de poluição
– Infra-estruturas hidráulicas
– Demografia e caracterização socio-económica
– Ocupação do solo
– Actividades económicas, potencial de
desenvolvimento
– Biodiversidade e estado de conservação ambiental
– Consumo e procura de água
– Problemas detectados, problemas urgentes
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Estrutura do plano (exemplo)
C – Cenários de desenvolvimento
– Projecções da futura procura de água, com base no
crescimento da população, índices macro-
económicos, potencial de recursos naturais e infra-
estruturas da bacia
– Infra-estruturas e medidas não estruturais para
ajustar a disponibilidade de água e promover a
sustentabilidade ambiental
– Estimativas de custos
– Estratégia adoptada, razões, custos

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Estrutura do plano (exemplo)
D – Plano da bacia
– Programas e actividades de curto prazo:
investimentos, capacitação, actividade corrente
– Programas e actividades a médio prazo
– Custos de investimento a curto e médio prazos
– Custos operacionais
– Cobertura de custos

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Problemas com implementação
• Frequentemente grande parte dum plano de
bacia não é implementado
• Possíveis razões
– Falta de empenho do Governo
– Plano é irrealista, exige recursos fora do alcance (da
ARA, do Governo e doadores)
– Um ou mais grupos que não concordam com o plano
bloqueiam a sua execução
– Plano já está desactualizado quando se pretende
iniciar a implementação
– Plano envolve acordos internacionais (bacias
partilhadas) difíceis de conseguir
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Modelação no plano de bacia
• modelos matemáticos - via eficiente para
análise de informação com vista à predição, em
termos de espaço e tempo, das interacções e
impactos das várias componentes da bacia
hidrográfica para diversas alternativas de
projectos e regras de exploração
• modelos produzem informação, não decisões
• modelação é útil se
– objectivos do plano estiverem claramente definidos
– existir mais do que uma alternativa a considerar
– houver conhecimento científico sobre as questões em
causa
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Modelação no plano de bacia
• Horizonte temporal do plano – considerar o longo prazo
(30-50 anos) mas detalhar o curto e médio prazos
• Passo de tempo – suficientemente pequeno para captar
a variabilidade hidrológica, base mensal considerada
adequada
• Modelo matemático - utiliza informação conhecida
(informação hidrológica, procuras de água, parâmetros e
relações entre as várias componentes do sistema de
recursos hídricos) para determinar valores das variáveis
de decisão que permitem melhor satisfazer os
objectivos a atingir, sujeito a um certo conjunto de
restrições de carácter físico, ambiental, social e
económico
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Exemplos de variáveis de decisão
• capacidade útil duma albufeira
• volume a reservar para encaixe de cheias
• caudais ecológicos para garantir a preservação
de determinados ecossistemas
• capacidade de geração a instalar numa central
hidroeléctrica
• dimensões de canais ou condutas
• altura de diques de defesa contra cheias
• volumes de água a atribuir a diferentes
utilizadores
• área a irrigar
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Optimização vs Simulação
• Modelos de optimização
– empregam algoritmos que permitem calcular a
solução óptima (ou as soluções melhores) sem
recorrer à enumeração exaustiva de todas as
soluções possíveis
– modelos são classificados como prescritivos
– mais conhecidos utilizam Programação Linear
• Modelos de simulação
– descrevem o que irá acontecer ao longo do tempo
em determinados pontos do sistema caso se
implementem determinadas alternativas de projecto
ou exploração de infraestruturas ou de atribuição de
água ou outras decisões do mesmo tipo
– ideais para responder a questões do tipo “E se?”
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Optimização vs Simulação
• Vantagens relativas
– modelos de simulação permitem uma descrição muito detalhada
do sistema de recursos hídricos, com incorporação de séries
hidrológicas extensas e com outputs representando a
variabilidade dos indicadores seleccionados
– problema principal com modelos de simulação é o número
elevado de simulações necessárias para se chegar a soluções
próximas da óptima (enumeração exaustiva), tem de se
empregar algoritmos eficientes de busca do óptimo
– Modelos de simulação funcionam bem com pequeno número de
variáveis de decisão e com modeladores e agentes de decisão
experientes e que interagem
– Modelos de simulação são preferíveis quando não há um só
óptimo para todas as partes interessadas e se pretendem
analisar possíveis soluções de compromisso

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Função objectivo
• Nas décadas de 1960-70, objectivo era: maximizar o
benefício líquido actualizado
• objectivo de máxima utilidade económica não é
actualmente considerado como podendo integrar todos
os objectivos de importância para a sociedade,
nomeadamente de carácter social e ambiental,
processos de optimização multi-critério
• modelos de visão partilhada
– discussões entre as partes interessadas no processo de
desenvolvimento do modelo e dos resultados que este vai
produzindo
– cada parte percebe melhor as preocupações dos outros
– permite chegar a uma visão comum sobre como o sistema de
recursos hídricos funciona e eventualmente a um consenso
sobre como é que deve ser desenvolvido e gerido
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Modelo de visão partilhada

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Exº: como atribuir os recursos
hídricos da bacia?

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Exº: como atribuir os recursos
hídricos da bacia?
• Pretende-se calcular o máximo volume que se
pode disponibilizar para rega sem afectar o
consumo urbano nem o caudal ecológico
• Quanto é que o volume aumenta se se construir
a montante uma albufeira de armazenamento?
• Como resolver este problema com um modelo
de simulação?
• Software comercial: HEC-ResSim (gratis),
RIBASIM (Delft Hydraulics), MIKE Basin (DHI),
WRYM (DWAF)

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Exercício
• Resolver o problema definido nos slides
anteriores usando um modelo de
simulação em Excel
• Dados: hidrologia (séries de precipitação,
evaporação, caudais), curvas da albufeira,
metas do consumo urbano e do caudal
ecológico e correspondentes fiabilidades
exigidas, fiabilidade exigida à irrigação,
consumos unitários de irrigação

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Exemplo

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Esquematização do exemplo
anterior

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Esquema do modelo de planeamento
da bacia do rio Umbeluzi

Movene
Fronteira

Caudal
Rega – Área1 Ecológico
Calichane

Rega – Área 3 Indústria A.A.


Maputo
Umbeluzi
B. Pequenos
Libombos
Rega – Área 2

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Regras do modelo do Umbeluzi
⚫ Prioridades
⚫ abastecimento urbano ao Grande Maputo
⚫ caudal ecológico no estuário
⚫ Indústria
⚫ Irrigação
⚫ Os escoamentos do Movene são pequenos
mas são utilizados em primeiro lugar para
poupar quanto possível a água armazenada na
barragem
⚫ Áreas de rega apenas servidas se a cota da
albufeira estiver acima de 35 m

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Esquema do modelo de planeamento
da bacia do rio Incomati
Rega – Sabié

R. Sabié Transf. p/ Rega Rega Rega


Maputo Timanguene Xinavane Malengane
B. Corumana
Fronteira

Caudal
Ecológico

Rega – Rega - Rega


R. Incomáti
COFAMOSA Pequenos MARAGRA
agric.

A.A. A.A. Rega


Ress. Moamba Moamba
Garcia
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Regras do modelo do Incomati
⚫ Prioridades
⚫ abastecimentos urbanos: Maputo, Ressano Garcia,
Moamba
⚫ caudal ecológico no estuário
⚫ Irrigação
⚫ Apenas se descarrega água da Corumana
quando caudal do Incomati não é suficiente ou
para usos no Sabié a montante da confluência
⚫ Barragem da Corumana considerada com
comportas
⚫ Não se incluíu a barragem da Moamba-Major

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Esquema do modelo de planeamento
da bacia do rio Limpopo

R. Limpopo
Rega Rega P.
AGRISUL Agric.
Fronteira

B. Macarretane
Caudal
Ecológico

B. Massingir
A.A. Rega Rega
Chokwé Chokwé SRBL
R. Elefantes

Rega Rega
Elefantes Procana

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Regras do modelo do Limpopo
⚫ Barragem de Massingir reabilitada
⚫ Barragem de Macarretane sem armazenamento
⚫ Não incluída a barragem de Mapai (potencial)
⚫ Prioridades
⚫ abastecimentos urbanos (pequeno consumo)
⚫ caudal ecológico no estuário
⚫ Indústria
⚫ Irrigação (sucessivamente: Elefantes, HICEP, SRBL, outros no
Baixo Limpopo, PROCANA, Agrisul)
⚫ Não considerada futura produção de energia em
Massingir
⚫ Utilizado primeiro o escoamento não regularizado do rio Limpopo
⚫ Massingir descarrega quando o escoamento do Limpopo não é
suficiente e para utilizações a montante da confluência
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