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ESPECIAÇÃO

Definição: divisão de uma espécie em duas reprodutivamente isoladas.


restrição: não é aplicável a espécies sem reprodução sexuada.

O evento crucial: isolamento reprodutivo.

Membros de espécies diferentes possuem diferenças genéticas, ecológicas,


comportamentais e morfológicas.

Nenhum desses critérios, porém, é suficiente para fornecer uma definição universal
de espécie.

Muitas espécies, no entanto, diferem por serem reprodutivamente isoladas


(conceito biológico de espécie).

Precisamos, portanto, compreender como surgem as barreiras reprodutivas entre


uma nova espécie e seu ancestral (=compreender a especiação).

Antes, porém: uma nova espécie pode ter as seguintes relações geográficas com
seu ancestral:

a) Isolamento geográfico (alopatria)


b) Existir em um continnum geográfico
c) Existir dentro da mesma área (simpatria)

Mecanismos de Isolamento Reprodutivo: características que fazem


com que espécies, quando simpátricas, mantenham conjuntos gênicos distintos.

Uma classificação dos mecanismos de isolamento nos animais (Mayr,


1993):

1. Mecanismos pré-copulatórios - impedem cruzamentos inter-específicos

a. Parceiros em potencial não se encontram (isolamento sazonal ou de hábitat)


b. Parceiros em potencial encontram-se, mas não copulam (isolamento etológico)
c. A cópula é tentada, mas não há transferência de espermatozóides (isolamento
mecânico)
2. Mecanismos pós-copulatórios - reduzem o completo sucesso dos cruzamentos
inter-específicos
Pré-zigóticos
a. A transferência de espermatozóides ocorre, mas o ovo não é fertilizado
(mortalidade gamética, incompatibilidade, etc)

Pós-zigóticos
b. O ovo é fertilizado, mas o zigoto morre (mortalidade zigótica por
incompatibilidade de cariótipos, etc.)
c. O zigoto produz uma F1 de híbridos inviáveis ou com viabilidade reduzida
(inviabilidade do híbrido)
d. Os zigotos dos híbridos da F1 são completamente viáveis, mas parcial ou
completamente estéreis ou ainda produzem uma F2 deficiente (esterilidade do
híbrido)

Alguns exemplos de mecanismos de isolamento


levando à especiação

Figura 1 - padrões de vôo e emissão fluorescente diferenciada em distintas


espécies de vagalumes.

Figura 2 - padrões de canto diferenciado levando à especiação em pássaros.


Figura 3 - barreira geográfica (Grand Canyon) levando à especiação em Sciurus
sp.

MECANISMOS DE ESPECIAÇÃO

Duas classificações das formas potenciais de especiação nos organismos


sexuados:

A - COM BASE NA GEOGRAFIA E NÍVEL (MAYR, 1963).

1. Hibridização (manutenção dos híbridos entre duas espécies)

2. Especiação instantânea (por meio de indivíduos)

A. Geneticamente: Macrogênese (mutação única conferindo isolamento


reprodutivo)
B. Citologicamente:
b.1. Mutação cromossômica (i. é, translocação)
b.2. Poliploidia
3. Especiação gradativa (por meio de populações)
A. Especiação alopátrica (geográfica)
B. Especiação parapátrica (semi-geográfica)
C. Especiação simpátrica

B - COM BASE NO ASPECTO GENÉTICO DA POPULAÇÃO (TEMPLETON, 1982)

1. Variação brusca

A. Manutenção do híbrido (seleção para o híbrido)


B. Recombinação do híbrido (seleção para os recombinantes seguindo-se a
hibridização)
C. Cromossômica (fixação da mutação cromossômica por deriva e seleção)
D. Genética (evento fundador em uma colônia)
2. Divergência
A. Hábitat (seleção divergente, sem o isolamento pela distância)
B. Clinal (seleção sobre uma clina -gradiente-, com o isolamento pela distância)
C. Adaptativa (surgimento de uma barreira extrínseca, seguida por microevolução
divergente).

MODELOS DE ESPECIAÇÃO

Consideraremos aqui três modelos principais:

1 Especiação Alopátrica

 vicariante (divisão de populações - espécies)


 peripátrica (isolados periféricos - efeito fundador)

2 Especiação Parapátrica

3 Especiação Simpátrica

1. ESPECIAÇÃO ALOPÁTRICA

Evolução de barreiras reprodutivas entre populações que estão geograficamente


separadas.

 A barreira física reduz o fluxo gênico (migração) entre as populações.


 Esta barreira pode aparecer por mudanças geológicas e geomorfológicas
(rios, cursos d'água, cadeias de montanhas, deriva continental, vulcões,etc)
ou por eventos de dispersão (deslocamento de populações para locais
distantes, dispersão provocada pelo vento, correntes marinhas, etc.)
 Alopatria é definida por uma severa redução do movimento dos indivíduos
ou de seus gametas entre as populações, e não necessariamente significa
uma maior distância geográfica (ex: curso de rio, cânion, etc).
 Todo biólogo evolucionista concorda que a especiação alopátrica ocorre e
muitos sustentam que ela é o principal modelo de especiação em animais
(Mayr 1963, Futuyma e Mayer 1980, Coyne 1992).
 As populações isoladas se diferenciam adquirindo distintas variações
(mutações) e alterando frequências alélicas por deriva ou seleção natural
até que ocorra isolamento reprodutivo, de maneira que, se estes grupos
voltarem a viver em Simpatria, não serão "compatíveis" reprodutivamente.

Dois tipos principais de Especiação Alopátrica:

A. Especiação Vicariante

Ocorre quando duas populações são divididas pelo surgimento de uma barreira
extrínseca.
Figura 4 - especiação Vicariante (Alopátrica estrita)

B. Especiação Peripátrica (ou “efeito fundador” - ver detalhe no final desta


página)

Ocorre quando há formação de uma colônia periférica a partir da população


original, por dispersão e, após várias gerações, ocorre
isolamento reprodutivo. Comum em eventos de colonização de ilhas a partir do
continente. Neste caso a diferenciação se dá mais acentuadamente na colônia filha,
com menor número de indivíduos, sendo que a população original no final da
especiação será a mais parecida com a espécie ancestral.

Figura 5 - especiação Peripátria (Alopátrica com efeito fundador)

Evidências para a especiação alopátrica:

a. Correspondência entre descontinuidade biológica e topográfica. Ex.: i) animais


aquáticos mostram uma maior diversidade regional em regiões montanhosas onde
há sistemas de rios isolados. ii) Em ilhas, espécies que são homogêneas em termos
de variação continental podem divergir em aparência, ecologia e comportamento.

b. O Registro fóssil mostra o aparecimento súbito de uma espécie distinta,


sugerindo que ela invadiu a partir de uma outra região, na qual ela surgiu
(Eldredge, 1971).

c. Experimentos de laboratório demonstram que o isolamento reprodutivo incipiente


pode se desenvolver entre populações isoladas de Drosophila sp. e Musca
domestica.
Zonas Híbridas: locais em que as populações diferindo em várias ou muitas
características intercruzam-se, em maior ou menor extensão.

Tais zonas são interpretadas como local de contato secundário entre as populações
que se diferenciaram em alopatria, mas que não alcançaram um status pleno de
espécie. Algumas zonas híbridas no entanto são vistas entre espécies (ver abaixo
em especiação Parapátrica).

Ex.: duas raças (subespécies) do gafanhoto Caledia captiva:

- Formam uma zona híbrida de aproximadamente um quilômetro de largura por


200 quilômetros de comprimento, no sudeste da Austrália.
- Diferem em pelo menos nove rearranjos cromossômicos
- Formam F2 e retrocruzamento com híbridos inviáveis.

2. ESPECIAÇÃO PARAPÁTRICA:

Ocorre sem que haja isolamento geográfico. Neste modelo, as populações se


divergem por adaptação a ambientes diferentes dentro de um continuun na faixa de
dispersão da espécie ancestral.

Figura 6 - Parapatria

A adaptação a ambientes/nichos distintos que ocorrem ao longo da grande faixa de


dispersão da espécie ancestral parece ser a mais importante etapa neste processo
de especiação. Muitas vezes pode ser criada uma zona híbrida entre as duas
espécies "incipientes" derivadas, cujos híbridos podem possuir diferentes graus de
viabilidade ou fertilidade. Esta zona híbrida pode funcionar como barreira ao fluxo
gênico entre as duas espécies que se estão se diferenciando.

3. ESPECIAÇÃO SIMPÁTRICA:

É um modelo que não envolve isolamento geográfico em populações habitando a


mesma área restrita. Se dá quando uma barreira biológica ao intercruzamento se
origina dentro dos limites de uma população, sem nenhuma segregação espacial
das "espécies incipientes" (que estão se diferenciando).

- A maioria dos tipos existentes para este modelo de especiação é controvertida.

- Uma exceção é o da especiação instantânea, por poliploidia, que ocorre em


plantas.

Figura 7 - Especiação poliplóide nas plantas Clarkia sp. (em Simpatria)

- Se uma simples mutação ou alteração cromossômica (tal como poliploidia)


confere um isolamento reprodutivo completo em um passo, a reprodução não terá
sucesso, a não ser que haja um endocruzamento (autofertilização ou cruzamento
com irmãos, que também podem carregar a nova mutação).

- Entre animais, o endocruzamento é raro, mas ocorre em grupos como


Chalcidoidea (himenópteros parasitas).

- Muitos modelos de especiação simpátrica baseiam-se em seleção disruptiva, como


no caso de dois homozigotos para um ou mais locos que estão adaptados a
diferentes fontes de recursos e há variação de múltiplos nichos.

- A especiação simpátrica é teoricamente possível, mas provavelmente ocorre


apenas sob certas condições excepcionais. Depende basicamente de fatores
genéticos tais como: formação de híbridos "deletérios" entre distintos genótipos da
população original, favorecimento pela Seleção do acasalamento entre
determinados genótipos (acasalamento preferencial), etc.

- Exemplos de especiação simpátrica mais estudados em animais referem-se à


formação das espécies de Ciclídeos dos lagos de crateras africanos (Tanganika,
Vitória, Malawi, etc.).

TEORIAS GENÉTICAS DE ESPECIAÇÃO

- Durante a especiação, as populações divergem em direção a equilíbrios genéticos


diferentes e incompatíveis

- As teorias genéticas sobre como as populações passam a ocupar picos adaptativos


diferentes e incompatíveis são de dois tipos:

a. Divergência Gradual: as forças de seleção experimentadas por duas


populações espacialmente isoladas diferem de modo que elas gradativamente se
movem em direção a picos adaptativos diferentes.

b. Deslocamento de Pico: supõe que o ambiente das duas populações é o


mesmo, mas que quaisquer das duas constituições genéticas são favorecidas pela
seleção (processo adaptativo estocástico).

divergência gradual

deslocamento de pico

Figura 8 - dois modelos genéticos de especiação.


O Efeito do Fundador do ponto de vista genético

- Alteração nas freqüências gênicas por deriva genética, que promovem uma
cadeia de mudanças genéticas em outros locos. Isto se dá no caso de colonizações
envolvendo um número pequeno de indivíduos (efeito fundador), também
chamado de gargalo de garrafa ou efeito "bottleneck" (figura 9 abaixo), comum em
processos de especiação Alopátrica por Peripatria.

- Segundo Mayr, a evolução numa espécie de ampla distribuição é provavelmente


um processo lento, porque o conjunto gênico co-adaptado resiste à mudança e
porque o fluxo gênico entre as suas populações se opõe à divergência.

- Por outro lado, a evolução em colônias recém-fundadas (peripatria)


provavelmente é mais rápida e pode favorecer alterações que determinem a origem
de novas espécies e novos gêneros. O número pequeno de indivíduos nesta
população fundadora pode fixar diferentes alelos, que pode levar a uma crescente
divergência da população ancestral com o passar das gerações.

Figura 9 - o efeito gargalo de garrafa (bottleneck).

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