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e
Cálculo Diferencial e Integral I
Apontamentos teóricos
2019/2020
Conteúdo
Introdução
1. Sucessões e Séries Numéricas
2. Limites e Continuidade
3. Cálculo Diferencial em R
4. Cálculo Integral em R
5. Complementos sobre Séries Numéricas. Séries de Potências
1
2
Introdução
Cálculo é uma palavra que deriva da palavra latina calculus que significa pedra. A ideia de
associar pedras e cálculos tem origem no facto de se terem usado pedras para fazer contagens,
antes de haver sistemas numéricos (ou por desconhecimento dos mesmos). Assim, numa disci-
plina de Cálculo,“calcula-se”. Partindo das ideias da matemática elementar (álgebra, geometria,
trigonometria), o Cálculo Diferencial e Integral, parte integrante e fundamental da Análise Ma-
temática, permite obter extensões a situações mais gerais, algumas das quais associadas a taxas
de variação. O quadro que se segue ilustra algumas comparações entre o que é feito com cálculo
elementar e com o cálculo diferencial e integral.
a1 + a2 + . . . + an a1 + a2 + a3 + . . .
Soma de um número finito de parcelas Soma de um número infinito de parcelas
3
A invenção do Cálculo, tal como o conhecemos hoje, é atribuı́da a I. Newton (1642-1727)
e a G. Leibniz (1646-1716), que o terão desenvolvido independentemente. Diz-se que Newton
foi o primeiro a criar e Leibniz o primeiro a publicar as ideias. Muitos outros matemáticos
contribuı́ram para o seu desenvolvimento, tendo adquirido rigor com A-L Cauchy (1789-1857)
que formalizou o conceito fundamental que é a pedra basilar do Cálculo - o conceito de limite.
O Cálculo Diferencial decompõe alguma coisa em peças cada vez mais pequenas, até ao
limite, para perceber como é feita a variação.
O Cálculo Integral junta (integra) pequenas peças de um todo, até ao limite, para medir o
todo.
Para descrever/prever fenómenos que envolvam taxas de variação de grandezas, como na
fı́sica, biologia, economia, entre outras, o Cálculo Diferencial e Integral é uma ferramenta essen-
cial.
Este curso faz a introdução ao chamado Cálculo Diferencial e Integral real e está estruturado
em cinco capı́tulos, cada um dos quais relacionados, respectivamente, com: cálculo de limites de
sucessões e de “somas infinitas”, cálculo de limites de funções, cálculo de derivadas, cálculo de
integrais, cálculo de “somas infinitas” envolvendo polinónimos.
4
1 Sucessões e séries numéricas
O nome deste capı́tulo é relativo aos dois tópicos que nele abordamos. O primeiro é introduzido
no ensino secundário, pelo que assumiremos conhecidos os principais conceitos e resultados.
Ainda assim, faremos uma revisão cuidadosa dos mesmos, nas aulas teóricas e/ou nas aulas
teórico-práticas.
Neste curso trabalhamos com números reais e, no que a conjuntos de números diz respeito,
utilizaremos as seguintes notações:
N = {1, 2, 3 . . .} números naturais;
R números reais;
Dado x ∈ R, notamos por [x] a parte inteira de x, ou seja, o maior número inteiro menor
ou igual ao número.
Exemplos. [4] = 4, [4, 76] = 4, [−4, 76] = −5, [π] = 3.
Para além das desigualdades listadas em d) e e) na proposição anterior, outras duas que são
importantes e que serão usadas algumas vezes no nosso curso são:
1. 2ab ≤ a2 + b2 , ∀a, b ∈ R;
2. Se x ≥ −1, então (1 + x)n ≥ 1 + nx, ∀n ∈ N. (Desigualdade de Bernoulli)
Sucessões e séries numéricas Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
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Um subconjunto I ⊆ R é um intervalo se, e só se, dados a, b ∈ I com a < b, se a < x < b,
então x ∈ I (isto é, se I contém dois números reais a e b também tem que conter todos os
números reais que estão entre a e b). Dados dois números reais a < b, recordamos que
[ a, b ] = {x ∈ R : a ≤ x ≤ b} (intervalo fechado);
] − ∞, a ] = {x ∈ R : x ≤ a} , ] − ∞, a [ = {x ∈ R : x < a} ,
ii) limitado inferiormente ou minorado se, e só se, existe m ∈ R tal que x ≥ m, ∀x ∈ A;
m diz-se um minorante de A;
Um conjunto que não é limitado diz-se que é ilimitado. Mais especificamente, diz-se que
um conjunto que não é majorado é um conjunto ilimitado superiormente, e que um conjunto
que não é minorado diz-se que é ilimitado inferiormente.
6
Exemplos. √
1) Sejam A =]1, 3 + 7] e B = {−12, −π} ∪ [−1, +∞[. O conjunto A é limitado; por exemplo,
−2 é um minorante de A e 6 é um majorante de A. O conjunto B é limitado inferiormente e
−12 é um dos seus minorantes; no entanto, B não é majorado.
√ dos minorantes de A é ]−∞, 1] e o de B é ]−∞, −12]. O conjunto dos majorantes
O conjunto
de A é [3 + 7, +∞[.
2) N é um conjunto ilimitado superiormente, mas limitado inferiormente, sendo ] − ∞, 1] o
conjunto dos seus minorantes.
3) O conjunto C =]−∞, 8] é ilimitado inferiormente, mas limitado superiormente, sendo [8, +∞[
o conjunto dos seus majorantes.
4) Z e (] − ∞, −6[ ∪ N) são conjuntos ilimitados.
Proposição 1.4
• (Caracterização do supremo)
Seja A um conjunto de números reais, limitado superiormente. Tem-se:
s = sup A ⇐⇒ 1) ∀x ∈ A x≤s
e
2) ∀y < s, ∃ x ∈ A : x > y
ou equivalentemente
s = sup A ⇐⇒ 1) ∀x ∈ A x≤s
e
20 ) ∀ε > 0, ∃ x ∈ A : s − ε < x.
• (Caracterização do ı́nfimo)
Seja A um conjunto de números reais, limitado inferiormente. Tem-se:
m = inf A ⇐⇒ 1) ∀x ∈ A x≥m
e
2) ∀y > m, ∃ x ∈ A : x < y
ou equivalentemente
m = inf A ⇐⇒ 1) ∀x ∈ A x≥m
e
20 ) ∀ε > 0, ∃ x ∈ A : x < m + ε.
7
Princı́pio do supremo - Princı́pio do ı́nfimo
Seja A um subconjunto não vazio de R.
O princı́pio do supremo (resp. ı́nfimo) garante a existência de supremo (resp. ı́nfimo) para um
conjunto majorado (resp. minorado) de números reais, e diz-nos que o supremo (resp. ı́nfimo) é
um número real. Observamos que se estivermos a trabalhar num universo menor , os √ princı́pios
√
anteriores deixam de ser leis gerais. Por exemplo, se o universo for Q, o conjunto ] − 2, 2[ ∩ Q
não tem supremo nem ı́nfimo em Q.
Observação. Seja A ⊂ R. Diz-se que sup A = +∞ se, e só se, A não for majorado em R e que
inf A = −∞ se, e só se, A não for minorado em R.
Seja D um subconjunto de R. Nesta disciplina trabalhamos com funções reais de variável
real, que representamos por f : D ⊆ R → R, que a cada x ∈ D fazem corresponder o número
real y = f (x) que se designa por imagem de x por meio de f . Dizemos que x é a variável
independente e que y é a variável dependente. O conjunto D é o domı́nio da função f . No
caso em que as imagens da função são obtidas por uma expressão da variável independente, então
o domı́nio é o maior conjunto onde a expressão que define f faz sentido (os valores admissı́veis
para a variável independente), a não ser que se explicite uma restrição deste. O contradomı́nio
de f é o conjunto de todas as imagens f (x) para x ∈ D e representa-se por f (D), ou seja,
n o
f (D) = f (x) : x ∈ D .
As primeiras funções com que vamos trabalhar têm domı́nio Np , com p ∈ N0 . Trata-se de funções
reais de variável natural e são as chamadas sucessões de números reais.
n o
1 1
n+1 n∈N un = n+1 1, 12 , 13 , 14 , 15 , 16 , . . .
0
n o
nπ nπ
1, cos π5 , cos 2π 3π 4π
cos 5 n∈N0
un = cos 5 5 , cos 5 , cos 5 , −1
8
Por uma questão de simplificação de escrita, ao longo do texto, vamos considerar as sucessões
com domı́nio N, observando-se que tudo permanece válido quando se considera uma sucessão
com domı́nio Np , para qualquer p ∈ N0 .
Definição 1.6 Uma sucessão (un ) diz-se limitada (resp. majorada, minorada) se o con-
junto dos seus termos for limitado (resp. majorado, minorado), ou seja, se existirem m, M ∈ R
tais que m ≤ un ≤ M , ∀n ∈ N (resp. se existir M ∈ R tal que un ≤ M , ∀n ∈ N, se existir
m ∈ R tal que m ≤ un , ∀n ∈ N).
Se uma sucessão não for limitada diz-se ilimitada.
Observação. A designação ilimitada para uma sucessão inclui três situações: uma sucessão
majorada mas não minorada, neste caso também dizemos que a sucessão é ilimitada inferior-
mente; uma sucessão minorada mas não majorada, caso em que também dizemos que a sucessão
é ilimitada superiormente; uma sucessão que não é majorada nem minorada. (Cf. Definição
1.2.)
Exemplos.
1. un = 3(−1)n , n ∈ N. Tem-se −3 ≤ un ≤ 3, ∀ n ∈ N, logo (un ) é limitada.
2. un = 4 + cos n, n ∈ N. Tem-se 3 ≤ un ≤ 5, ∀ n ∈ N, logo (un ) é limitada.
3. un = n + 10, n ∈ N. Tem-se 11 ≤ un , ∀ n ∈ N, logo (un ) é limitada inferiormente; (un ) não
é limitada superiormente, pois qualquer que seja M ∈ R, existe n ∈ N tal que n > M − 10,
ou seja, un > M .
4. un = (−2)n , n ∈ N, é ilimitada (superior e inferiormente).
Observação. Segue-se uma outra caracterização de sucessão limitada, equivalente à da de-
finição.
(un ) é limitada se, e só se, existe L tal que |un | ≤ L, ∀n ∈ N.
Prova. Se (un ) é limitada, então existem m, M ∈ R tais que m ≤ un ≤ M , ∀n ∈ N. Seja
L = max{|m|, |M |}, então |un | ≤ L, ∀n ∈ N.
Reciprocamente, se existe L tal que |un | ≤ L, ∀n ∈ N, então basta considerar m = −L e
M = L.
Verificar se uma sucessão é limitada usando a definição pode ser uma tarefa difı́cil, no entanto,
com a ajuda de outros conceitos e resultados teóricos podemos concluir mais facilmente. O estudo
da monotonia é uma ajuda preciosa nesse sentido.
Definição 1.7 Uma sucessão (un ) diz-se
i) crescente se, e só se, un ≤ un+1 , ∀n ∈ N;
ii) estritamente crescente se, e só se, un < un+1 , ∀n ∈ N;
iii) decrescente se, e só se, un ≥ un+1 , ∀n ∈ N;
iv) estritamente decrescente se, e só se, un > un+1 , ∀n ∈ N.
Em qualquer dos casos anteriores, a sucessão (un ) diz-se monótona.
Para fazer alusão aos casos i) e ii) usamos a escrita abreviada (un ) %, e para os casos iii)
e iv) usamos a simbologia (un ) &.
Exemplos e observações.
1
1) Vejamos que a sucessão 4 + 2n+1 n∈N é estritamente decrescente e é limitada.
1 1 1 −2
Seja un = 4 + 2n+1 , então un+1 − un = 4 + 2n+3 −4− 2n+1 = (2n+3)(2n+1) < 0, logo (un ) &.
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9
Tratando-se de uma sucessão (estritamente) decrescente, o seu primeiro termo é o máximo
do conjunto dos seus termos, assim
1
un ≤ u1 = 4 + , ∀n ∈ N.
3
Por outro lado, é imediato que un > 0, para qualquer n, temos então
1
0 < un ≤ 4 + , ∀n ∈ N,
3
ou seja, a sucessão dada é limitada.
2) Do exemplo anterior é fácil deduzir que, qualquer sucessão decrescente ou estritamente de-
crescente é limitada superiormente, sendo o seu primeiro termo o máximo do conjunto dos seus
termos. Analogamente, podemos concluir também que qualquer sucessão crescente ou estrita-
mente crescente é limitada inferiormente, sendo o seu primeiro termo o mı́nimo do conjunto dos
seus termos.
3) A sucessão (n5 − 7) é estritamente crescente.
Como n < n + 1, então n5 < (n + 1)5 , logo n5 − 7 < (n + 1)5 − 7, ou seja, un < un+1 , para
todo o n.
4) Se uma sucessão (un ) não muda de sinal (a partir de certa ordem), e un 6= 0, para todo o n,
a monotonia pode ser formulada usando a razão entre um termo e o anterior, isto é,
un+1
• se (un ) é uma sucessão de termos positivos e ≥ 1 (resp. > 1), então (un ) é crescente
un
(resp. estritamente crescente);
un+1
• se (un ) é uma sucessão de termos positivos e ≤ 1 (resp. < 1), então (un ) é decrescente
un
(resp. estritamente decrescente).
Pergunta 2. E se (un ) é uma sucessão de termos negativos, como formalizar a monotonia
usando a razão entre um termo e o anterior?
Definição 1.8 (Cauchy, 1821) Dizemos que o limite de uma dada sucessão (un ) é a(∈ R) e
escrevemos lim un = a ou un → a se, e só se,
∀δ > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ |un − a| < δ.
Assim, dizer que lim un = a significa que os termos da sucessão estão tão próximos de a
quanto se queira, desde que se tome n suficientemente grande.
Se o limite de uma sucessão é um número real (limite finito), a sucessão diz-se convergente,
caso contrário diz-se divergente.
Teorema 1.9 (Unicidade de limite) Se lim un = a e lim un = b, então a = b.
Exemplos.
1
1) Provar, por definição, que lim n+4 = 0.
1
Queremos ver que ∀δ > 0 ∃p ∈ N : n ≥ p =⇒
< δ.
n + 4
1
Fixemos δ > 0. Queremos encontrar uma ordem p, a partir da qual n+4 < δ. Ora
1 1 1
n + 4 < δ ⇔ n + 4 < δ ⇔ n > δ − 4.
10
2) As sucessões constantes são convergentes e o seu limite é o valor da constante.
x n
3) lim 1 + = ex , com x ∈ R.
n
Proposição 1.10 Sejam (un ) e (vn ) duas sucessões de números reais, a, b, λ ∈ R.
O teorema anterior traduz o facto do cálculo de limites ser uma operação linear.
Proposição 1.11 Dizer que lim un = a é equivalente a dizer que lim |un − a| = 0.
Do teorema anterior resulta que, se uma sucessão é ilimitada, então não é convergente.
Observe-se que há sucessões limitadas que não são convergentes, por exemplo a sucessão de
termo geral un = (−1)n é limitada e divergente.
Algumas sucessões divergentes destacam-se por apresentarem um comportamento com uma
certa regularidade, a saber, aquelas cujos valores se tornam e se mantêm arbitrariamente gran-
des positivamente ou arbitrariamente grandes negativamente. Estas situações são descritas e
nomeadas na próxima definição.
Definição 1.13
i) Dizemos que uma sucessão (un ) tende para +∞ ou que tem limite +∞, e escrevemos
lim un = +∞ ou un → +∞, se, e só se, ∀M > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ un > M.
Neste caso (un ) diz-se um infinitamente grande positivo.
ii) Dizemos que uma sucessão (un ) tende para −∞ ou que tem limite −∞, e escrevemos
lim un = −∞ ou un → −∞, se, e só se, ∀M > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ un < −M.
Neste caso (un ) diz-se um infinitamente grande negativo.
Em oposição às designações das definições anteriores temos os chamados infinitésimos que
são as sucessões que convergem para zero.
Se uma sucessão é tal que existe lim un = ` ∈ R, dizemos que a sucessão (un ) tende para `.
Assim, a expressão “(un ) converge para” vai sempre referir-se a limites finitos e a expressão
“(un ) tende para” engloba os casos finito e infinito.
Exemplos.
1) Temos que lim n = +∞, ou seja, a sucessão de termo geral un = n é um infinitamente grande
positivo.
2) Vejamos que lim(n2 + 3) = +∞. √
Para cada M > 0, basta tomar k = [ M − 3] + 1, se M ≥ 3, e k = 1 caso contrário. Assim,
para n ≥ k, tem-se
√ √
n ≥ [ M − 3] + 1 =⇒ n > M − 3 ⇔ n2 > M − 3 ⇐⇒ n2 + 3 > M, caso M ≥ 3.
11
Teorema 1.14 (Teorema da Sucessão Monótona) Toda a sucessão monótona e limitada é
convergente. Mais precisamente, se (un ) é uma sucessão limitada
i) e é uma sucessão crescente, então lim un = sup {un : n ∈ N} ;
ii) e é uma sucessão decrescente, então lim un = inf {un : n ∈ N} .
n
Exemplo. A sucessão 1 + n1 é monótona e limitada (cf. exercı́cios complementares refe-
rentes ao capı́tulo 1), logo é uma sucessão convergente.
Observação. Seja (un ) uma sucessão monótona e não limitada. Se (un ) não é limitada su-
periormente, então lim un = +∞ e, se (un ) não é limitada inferiormente, então lim un = −∞
(exercı́cio).
Exemplo. Verdadeiro ou falso?
“Seja (un ) uma sucessão crescente e limitada tal que 3 ≤ un ≤ 10, ∀n ∈ N. Então lim un = 10.”
Falso.
Se (un ) é uma sucessão crescente e limitada, então u1 ≤ un ≤ sup un = lim un .
Dizer que 3 ≤ un ≤ 10, ∀n ∈ N, não é dizer que 10 é o supremo da sucessão. Das desigual-
dades dadas apenas podemos concluir que 10 é um majorante dos termos da sucessão (e que
3 é um minorante).
A sucessão de termo geral un = 5 − n1 , para n ∈ N, satisfaz 3 ≤ un ≤ 10 para todo o n ∈ N
(verifique), é uma sucessão estritamente crescente, pois
1 1 1
un+1 − un = 5 − −5+ = > 0,
n+1 n n(n + 1)
e lim un = 5.
Dizemos que uma sucessão está definida por recorrência quando a determinação do valor
de um termo requer o conhecimento prévio de um ou mais termos anteriores da mesma. Por
exemplo, a sucessão que se segue
está definida por recorrência. Se quisermos determinar, por exemplo, u5 precisamos de conhecer
u4 e u3 , já que u5 = 3u3 − 2u4 . Tem-se assim
Princı́pio de Indução
Seja P (n) uma proposição na variável n ∈ Nm , com m ∈ N0 . Então:
Se
1. P (m) é uma proposição verdadeira
2. P (n) =⇒ P (n + 1),
então a condição P (n) é verdadeira para todo o n ∈ Nm .
Observação. Diz-se que uma proposição P (n), de variável natural, é hereditária, se P (n)
implica P (n + 1), isto é, se o facto de ser verificada por um número natural n implica que
também é verificada por n + 1, qualquer que seja n. O número natural n + 1 diz-se o sucessor
de n.
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Proposição 1.15 Seja (un ) uma sucessão tal que lim un = a ∈ R. Dado c ∈ R tal que c < a
(resp. c > a), então existe uma ordem k ∈ N tal que
Proposição 1.16 (Passagem ao limite das desigualdades) Dadas duas sucessões (un ) e
(vn ), suponha-se que existe uma ordem k ∈ N tal que
un ≤ vn , ∀n ≥ k.
lim un ≤ lim vn .
Corolário 1.17 Seja (un ) uma sucessão e a ∈ R. Se existe uma ordem k ∈ N tal que
un ≤ a (resp. un ≥ a), ∀n ≥ k,
Teorema 1.18 (Teorema das Sucessões Enquadradas) Dadas três sucessões (un ), (vn ), (wn ),
suponha-se que existe k ∈ N tal que
un ≤ wn ≤ vn , ∀n ≥ k.
Muitas vezes referenciamos este teorema de forma abreviada, escrevendo simplesmente TSE.
Exemplos.
3 + sin n 1
1) Consideremos a sucessão de termo geral an = 2
. Podemos escrever an = 2 (3+sin n);
n n
1
como 2 → 0 e 2 ≤ 3 + sin n ≤ 4, para todo o n ∈ N, então, pelo corolário do TSE, lim an = 0.
n
2) Mostre que a sucessão de termo geral
1 1
+ ... +
n2 (n + n)2
13
Designando por an o termo geral da sucessão dada, vem
1 1 1 1
an = 2 + 2
+ ... + 2
+ .
n (n + 1) (n + (n − 1)) (n + n)2
Vejamos que a sucessão é decrescente.
1 1 1 1 1
an+1 − an = 2
+ 2
+ ... + 2
+ 2
+
(n + 1) (n + 2) (n + n) ((n + 1) + n) (n + 1 + n + 1)2
1 1 1 1
− 2− 2
− ... − 2
− ,
n (n + 1) (n + (n − 1)) (n + n)2
donde
1 1 1
an+1 − an = 2
+ 2
− 2.
(2n + 1) (2n + 2) n
1 1 1 1
Observando que 2n + 1 > 2n e que 2n + 2 > 2n, vem < e < ,
(2n + 1)2 4n2 (2n + 2)2 4n2
donde
1 1 1 1 1 1
an+1 − an < 2 + 2 − 2 = 2 − 2 = − 2 < 0.
4n 4n n 2n n 2n
Concluimos assim que (an ) é (estritamente) decrescente.
Temos também
1 1 1 1 1
an = 2 + . . . + 2
≥ 2
+ ... + 2
= (n + 1) (1)
n (n + n) (n + n) (n + n) (n + n)2
| {z }
(n + 1) parcelas
e
1 1 1 1 1
an = 2
+ ... + 2
≤ 2 + . . . + 2 = 2 (n + 1).
n (n + n) |n {z n} n
(n + 1) parcelas
Como
n+1 n+1 n+1 n+1
lim 2
= 0 = lim 2
e 2
≤ an ≤ ,
(n + n) n (n + n) n2
pelo Teorema das Sucessões Enquadradas, concluimos que lim an = 0.
Neste caso, temos uma sucessão de termos positivos, pelo que a minoração an > 0, para todo
o n, é suficiente para obter a conclusão. O procedimento que usámos em (1) visa ilustar uma
técnica menos elementar que usamos muitas vezes.
Teorema 1.20 (Propriedades algébricas dos limites de sucessões) Sejam (un ) e (vn ) duas
sucessões de números reais, a, b, λ ∈ R.
1. Se lim un = a, então lim |un | = |a|.
2. Se lim un = a e lim vn = b, então lim(un + vn ) = a + b.
3. Se lim un = +∞ e (vn ) é minorada, então lim(un + vn ) = +∞.
4. Se lim un = −∞ e (vn ) é majorada, então lim(un + vn ) = −∞.
5. Se lim un = a, então lim(λun ) = λa.
6. Se lim un = a e lim vn = b, então lim(un · vn ) = a · b.
1 1
7. Se lim un = a e a 6= 0, então lim = .
un a
8. Se lim un = ±∞ e lim vn > 0 (resp. < 0), então lim un · vn = ±∞ (resp. ∓∞).
1
9. Se lim |un | = +∞, então lim = 0, e reciprocamente.
un
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Observações. 1) As propriedades 2 e 6 anteriores generalizam-se de modo natural à soma e ao
produto de um número finito de sucessões, respectivamente.
2) Observe-se que o caso 3 inclui a situação em que lim vn = +∞ e o caso 4, a situação
lim vn = −∞.
3) A propriedade 8 é válida nos casos lim vn = +∞ e lim vn = −∞, respectivamente. (Verifique.)
4) O teorema anterior não nos dá indicação sobre a existência e o valor do limite (se este existir)
nos casos que se seguem e que são designados por indeterminações:
• ∞ − ∞: quando queremos determinar lim (un + vn ) e
lim un = +∞ e lim vn = −∞;
0 un
• quando queremos determinar lim e
0 vn
lim un = 0 = lim vn ;
∞ un
• quando queremos determinar lim e
∞ vn
lim |un | = +∞ = lim |vn |.
6. |un vn − ab| = |un vn − un b + un b − ab| = |un (vn − b) + (un − a)b| ≤ |un ||vn − b| + |un − a| |b|,
mais uma vez, pelo Teorema 1.12, pelo Corolário 1.19 e pela Proposição 1.11, obtemos o
resultado pretendido.
7. Como lim un = a e a 6= 0, então lim |un | = |a| > 0, donde existe uma ordem k a partir da
qual |un | > |a|
2 . Assim, pela Prop. 1.15, temos, para n ≥ k
1 |a − un |
1 2 1 1
u − = |u | · |a| < |a|2 |un − a| =⇒ u → a .
n a n n
| {z }
→0
15
8. Vejamos o caso em que lim un = +∞ e lim vn > 0. Seja M > 0, arbitrariamente fixado.
Pela Proposição 1.15 existe uma ordem k1 , tal que, para n ≥ k1 se tem
lim vn
vn > .
2
Como (un ) tende para +∞, dado um número positivo qualquer, existe uma ordem a partir
da qual todos os termos da sucessão são maiores do que esse número. Assim, existe k2 tal
que, para n ≥ k2 , se tem
2
un > M · .
lim vn
Seja k = max{k1 , k2 } e n ≥ k, então
lim vn 2 lim vn
un · vn > un · >M· · = M =⇒ lim un · vn = +∞.
2 lim vn 2
Os restantes casos são análogos.
9.
lim |un | = +∞ ⇐⇒ ∀M > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ |un | > M
1 1
⇐⇒ ∀M > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ <
|un | M
1
⇐⇒ ∀δ > 0 ∃ k ∈ N : n ≥ k ⇒ <δ
u
n
1
⇐⇒ lim = 0.
un
Definição 1.21 Seja (un ) uma sucessão real. Dizemos que (vn ) é uma subsucessão de (un )
se existe uma aplicação ϕ : N → N estritamente crescente tal que vn = uϕ(n) .
(vn ) : u2 u4 u6 u8 . . .
Definição 1.22 Seja (un ) uma sucessão real. Chamamos sublimite de (un ) ao limite de uma
qualquer subsucessão convergente de (un ). Ao maior dos sublimites de (un ) chamamos limite
superior de (un ) e ao menor dos sublimites de (un ) chamamos limite inferior de (un ).
Nota. A definição anterior é coerente, pois prova-se que existem sempre, em R, o maior e o
menor dos sublimites de uma sucessão.
Proposição 1.23 Seja (un ) uma sucessão real, tal que lim u2n = a e lim u2n+1 = a, com a ∈ R,
então lim un = a.
Proposição 1.24 Seja (un ) uma sucessão real. Então lim un = a ∈ R se, e só se, qualquer
subsucessão de (un ) tende para a.
16
Proposição 1.26 (Bolzano-Weierstrass) Se (un ) é uma sucessão limitada, então (un ) ad-
mite uma subsucessão convergente.
Exemplo. A sucessão (un ) = ((−1)n ) é limitada, não é convergente mas admite subsucessões
convergentes, por exemplo, a subsucessão de termo geral u2n = 1 (subsucessão dos termos de
ordem par) e a subsucessão de termo geral u2n−1 = −1 (subsucessão dos termos de ordem
ı́mpar), são convergentes.
Definição 1.27 Sejam (un ), (vn ), (hn ) três sucessões tais que, a partir de uma certa ordem,
se tem un = hn vn e lim hn = 1. Então diz-se que (un ) é assintoticamente igual a (vn ) e
escreve-se un ∼ vn .
O sı́mbolo ∼ diz-se um sı́mbolo de Landau (há outros que teremos oportunidade de ver neste
curso).
Observação. Na definição anterior, se, a partir de certa ordem, (vn ) não se anula, então
un
un ∼ vn equivale a lim = 1.
vn
É fácil ver que, se (un ), (vn ) e (wn ) são três sucessões tais que un ∼ vn e vn ∼ wn , então
un ∼ wn e que se un ∼ vn então também se tem vn ∼ un (exercı́cio).
Exemplos. 1) Sejam un = 1
n e vn = 1
n+1 . Temos lim uvnn = 1, donde un ∼ vn .
2n7 + 6n2 − 8 3 4
2) Sejam un = 2n7 + 6n2 − 8 e vn = 2n7 . Como lim 7
= lim 1 + 5 − 7 = 1,
2n n n
então un ∼ vn .
3) Dados p, q ∈ N, ai ∈ R, com i = 0, . . . , p e ap 6= 0, temos que
ap np + ap−1 np−1 + . . . + a1 n + a0 ∼ ap np
e q
ap np + ap−1 np−1 + . . . + a1 n + a0 ∼ ap np .
q
p
q
17
1.3 Séries numéricas
1.3.1 Introdução
Sabemos fazer uma soma de duas parcelas de números reais, tal como sabemos somar um qual-
quer número finito de parcelas. Quando o léxico infinito entra no nosso vocabulário somos
naturalmente conduzidos à pergunta Como somar um número infinito de parcelas? Outra per-
gunta que se coloca de imediato é: Faz sentido falar numa soma de infinitas parcelas? Eis
o mote para esta secção - dar significado à expressão soma de infinitas parcelas e estudar as
consequências e propriedades desse significado.
Exemplo. Como somar infinitas parcelas que são alternadamente 1 e −1? Designemos por S o
valor dessa soma.
1 − 1 + 1 − 1 + . . . = S.
Observe-se o seguinte
(1 − 1) + (1 − 1) + . . . = 0,
e também
1 + (−1 + 1) + (−1 + 1) + . . . = 1.
Mas ainda podemos escrever
1 − (1 − 1 + 1 + . . .) = S,
ora o que está dentro de parênteses também vale S, assim
1
1 − S = S ⇐⇒ S = .
2
Neste exemplo temos três formas diferentes de calcular a soma de infinitas parcelas e em cada
uma delas obtivemos um valor diferente, o que não é concordante com a unicidade de valor que
pretendemos naturalmente obter. Assim, este caso ilustra, mais uma vez, que trabalhar com o
infinito requer cuidado e que nem sempre podemos aplicar os procedimentos do caso finito.
Temos
u1 = 0, 9
u2 = 0, 99
u3 = 0, 999
.. ..
. .
un = 0, 9| .{z
. . 9}
n
Nesta sucessão cada termo acrescenta mais uma casa decimal (igual a 9) ao termo anterior.
Assim, no limite temos
0, 99999 . . .
18
Por outro lado, sabendo que (un ) é convergente, usando as técnicas de cálculo de limites
para sucessões definidas por recorrência, obtemos lim un = 1 (cf. Exercı́cio 27 da Ficha 1).
Concluı́mos então que
0, 9999 . . . = 1,
ou seja, demos significado à soma de infinitas parcelas
A ideia expressa no exemplo anterior é a usada para definir somas de infinitas parcelas a que
chamamos Série.
Definição 1.29 Dada uma sucessão de números reais (an ), com n ∈ N, chamamos sucessão
das somas parciais (Sn ) à sucessão cujo termo geral é
n
X
Sn = a1 + a2 + . . . + an = ak .
k=1
Por vezes a sucessão (an ) está definida em Np , onde p é um número inteiro maior ou igual a
∞
X X
zero e nesses casos a série é representada por an ou por an .
n=p n≥p
Exemplos.
∞
X 1
1) O termo geral da série é an = n21+3 e a sucessão das somas parciais é
n=1
n2
+ 3
1 1 1
Sn = a1 + a2 + . . . + an = + + . . . + 2 .
4 7 n +3
∞
(−1)n n
é an = (−1)
X
2) O termo geral da série n 2n e a sucessão das somas parciais é
n=3
2
1 1 (−1)n
Sn = a3 + a4 + . . . + an = − + + ... + .
8 16 2n
∞
1
X
3) O termo geral da série (−1)n sin(n) + n é an = (−1)n sin(n) + 21n e a sucessão das
n=2
2
1 1 1
somas parciais é Sn = a2 + a3 + . . . + an = sin 2 + − sin 3 + + . . . + (−1)n sin(n) + n .
4 8 2
4) (A subsucessão dos termos de ordem par da sucessão das somas parciais de uma série.)
∞
X
Considere-se a série an . O termo geral da sucessão das somas parciais da série é
n=1
Sn = a1 + a2 + . . . + an .
S2n = a1 + a2 + . . . + a2n ,
19
cujos termos são: S2 , S4 , S6 , S8 , . . ..
∞
X
Vejamos um exemplo concreto. Consideremos a série (n + 2). O termo geral desta série
n=1
é an = n + 2, e o termo geral da sucessão das somas parciais é
Sn = a1 + a2 + . . . + an = 3 + 4 + 5 + . . . + (n + 2).
Atendendo a que a soma anterior é a soma de n termos de uma progressão aritmética vale
3 + (n + 2) n(n + 5)
Sn = n= .
2 2
Assim, S1 = 3, S2 = 7, S3 = 12, S4 = 18, . . .
Temos também
S2n = a1 + a2 + . . . + an + . . . + a2n = 3 + 4 + 5 + . . . + (n + 2) + . . . + (2n + 2).
Observe-se que para obter o termo geral de (S2n ), somamos todos os termos de (an ), desde
a1 a a2n . Obtemos então
3 + (2n + 2)
S2n = 3 + 4 + 5 + . . . + (2n + 2) = 2n = (2n + 5)n.
2
X
Definição 1.30 Dizemos que uma série numérica an é convergente se a sucessão das
n≥p
somas parciais (Sn ) é convergente. Neste caso, ao valor S = lim Sn chamamos soma da série
e escrevemos ∞ X
an = S.
n=p
Caso contrário a série diz-se divergente.
Exemplos.
∞
X
1) A sucessão das somas parciais da série (4 − 2n) é a soma de n termos de uma progressão
n=1
aritmética,
2 + 4 − 2n
Sn = 2 − 2 − 4 − 6 − 8 − 10 − 12 − . . . + (4 − 2n) = n = 3n − n2 ,
2
então Sn → −∞, logo a série é divergente.
∞
X (−1)n
2) Observamos que a sucessão das somas parciais da série é a soma de (n − 2) termos
n=3
2n
de uma progressão geométrica, de razão − 12 , pelo que
n−2
1
1 1 (−1)n 1 1 − −2
Sn = − + + ... + = − · .
8 16 2n 8 1 − − 12
1 1
Assim, Sn → − 12 , logo a série é convergente e a sua soma é − 12 .
∞
X
3) Consideremos a série cujo termo geral é a sucessão constante an = 5, 5. A sucessão das
n=1
somas parciais é
Sn = |5 + 5 +{z. . . + 5} = 5n → +∞.
n parcelas
20
Assim a série é divergente. Observamos que o termo geral é convergente (pois an → 5), mas a
série é divergente, dado que Sn → +∞.
Da álgebra dos limites estudada, são agora óbvias as propriedades que se seguem.
∞
X ∞
X
• Dado λ ∈ R \ {0}, as séries an e λan têm a mesma natureza e tem-se
n=p n=p
∞
X ∞
X
λan = λ an .
n=p n=p
Observação. A soma de duas séries divergentes pode ser uma série convergente.
Decidir se uma série é ou não convergente é decidir se a sucessão das somas parciais é convergente.
De uma forma geral e directamente, esta decisão é muito difı́cil, já que o termo geral de (Sn ) tem
um número de parcelas que depende de n, e que na maioria das vezes não conseguimos reduzir
a uma expressão simples, o que dificulta o cálculo do limite. Em muitos casos recorremos a
resultados teóricos (critérios) que, com base na estrutura da série, nos dizem se estamos perante
uma série convergente ou divergente. Porém, esses critérios não nos dão indicação sobre o valor
da soma da série. Há, no entanto, dois tipos de séries em que usando métodos elementares é
possı́vel calcular o valor da soma. Usando séries de funções, como as que vamos aprender no
capı́tulo 5, e com outras (conteúdos de Análise Matemática III/Cálculo Diferencial e Integral
III) é possı́vel determinar a soma de uma maior diversidade de séries. Vejamos então os dois
casos simples.
∞
X
Chamamos série geométrica de razão r ∈ R a uma série da forma rn .
n=p
∞
X
Proposição 1.32 A série geométrica rn é convergente se, e só se, |r| < 1, tendo-se neste
n=p
caso ∞
X rp
rn = .
n=p 1−r
∞
X
Da proposição anterior sai que, se |r| ≥ 1, a série geométrica rn é divergente.
n=p
Exemplos.
X 1 1
30 3
1. é uma série geométrica de razão 13 , logo convergente, e a sua soma é 1 = .
n≥0
3n 1− 3
2
X 1 1
52 1
2. é uma série geométrica de razão 15 , logo convergente, e a sua soma é 1 = .
n≥2
5n 1− 5
20
21
3. Escrever a dı́zima infinita periódica 2, (51) na forma de fracção irredutı́vel.
Temos
2, (51) = 2+0, (51) = 2+0, 51+0, 0051+0, 000051+. . . = 2+51(0, 01+0, 0001+0, 000001+. . .)
Ora ∞ ∞ n
1 1 1 1 1 1
X X
2
+ 4
+ 6
+ . . . + 2n
+ . . . = 2n
=
10 10 10 10 n=1
10 n=1
102
∞
1 n
X
1
Como é uma série geométrica de razão 102
, é convergente, e a sua soma é
n=1
102
1
1
102 1
1 = .
1− 102
99
Assim
1
0, 01 + 0, 0001 + 0, 000001 + . . . = ,
99
donde
1 198 + 51 249 83
2, (51) = 2 + 51(0, 01 + 0, 0001 + 0, 000001 + . . .) = 2 + 51 · = = = .
99 99 99 33
∞
X
Chamamos série telescópica ou série de Mengoli a uma série que tem a forma (un −un+1 ),
n=p
onde (un ) é uma sucessão de números reais.
O termo geral da sucessão das somas parciais (Sn ) das séries de Mengoli é Sn = up − un+1
pelo que a série converge se, e só se, (un ) for convergente, tendo-se, neste caso, que a soma da
série é S = up − lim un .
Exemplos.
∞
!
X 2n5 2(n + 1)5 2n5
1) A série − é uma série de Mengoli com un = ,ea
n=2
n5 + 7n (n + 1)5 + 7n + 7 n5 + 7n
sua soma é
26 2(n + 1)5 26 28 14
S = u2 − lim un+1 = 5
− lim 5
= 5
−2=− =− .
2 + 14 (n + 1) + 7n + 7 2 + 14 46 23
2) O termo geral de uma série de Mengoli nem sempre aparece escrito na forma un −un+1 . Nesses
casos é necessário fazer uma manipulação algébrica, para que o reconhecimento seja feito, e para
que mais facilmente se possa determinar a sua soma. O próximo item exemplifica duas formas
de fazer a manipulação.
1 A B
3) Escrever a expressão racional como soma de fracções da forma e ,
(n + 1)(n + 3) n+1 n+3
onde A e B são números reais.
Queremos então que
1 A B
= + . (2)
(n + 1)(n + 3) n+1 n+3
Sucessões e séries numéricas Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
22
Reduzindo ao mesmo denominador o lado direito de (2) vem
1 A(n + 3) + B(n + 1) (A + B)n + 3A + B
= = .
(n + 1)(n + 3) (n + 1)(n + 3) (n + 1)(n + 3)
| {z } | {z }
(∗) (∗∗)
Ora, (*) e (**) são duas fracções com o mesmo denominador, logo são iguais se, e só se, os
numeradores forem iguais, ou seja, se
1 = (A + B)n + 3A + B, ∀n. (3)
A identidade anterior é uma igualdade entre duas expressões polinomiais (em n), pelo que é
verificada, se, e só se,
A+B =0 (não há termo em n do lado esquerdo de (3))
e
3A + B = 1 (o termo independente do lado esquerdo de (3) é 1).
Concluimos então que B = −A, logo A = 1/2 e B = −1/2. Podemos então escrever
1 1
1 1 1 1
= 2 − 2 = − . (4)
(n + 1)(n + 3) n+1 n+3 2 n+1 n+3
Existem várias técnicas para escrever a expressão racional dada na forma (4). Ao procedimento
anterior chamamos o método dos coeficientes indeterminados. Vejamos agora outra forma de
obter (4). Os factores do denominador da fracção dada são (n + 1) e (n + 3). Temos então que
a sua diferença é dois ((n + 3) − (n + 1) = 2). Assim escrevemos
1 1 2 1 (n + 3) − (n + 1) 1 (n + 3) (n + 1)
= = = − .
(n + 1)(n + 3) 2 (n + 1)(n + 3) 2 (n + 1)(n + 3) 2 (n + 1)(n + 3) (n + 1)(n + 3)
Obtemos então
1 1 (n + 3) (n + 1) 1 1 1
= − = − .
(n + 1)(n + 3) 2 (n + 1)(n + 3) (n + 1)(n + 3) 2 n+1 n+3
X 1
4) Calcule a soma da série .
n≥1
(3n + 1)(3n + 4)
Temos que (3n+4)−(3n+1) = 3. Aplicando o segundo procedimento descrito no ponto anterior,
vem
1 1 3 1 (3n + 4) − (3n + 1) 1 1 1
= = = − .
(3n + 1)(3n + 4) 3 (3n + 1)(3n + 4) 3 (3n + 1)(3n + 4) 3 3n + 1 3n + 4
1 1 1
Seja un = , então un+1 = = . Assim
3n + 1 3(n + 1) + 1 3n + 4
1 1X 1 1 1X
X
= − = (un − un+1 ).
n≥1
(3n + 1)(3n + 4) 3 n≥1 3n + 1 3n + 4 3 n≥1
X
1
A soma da série de Mengoli (un − un+1 ) é u1 − lim un+1 = 3+1 − 0 = 41 , logo a soma da série
n≥1
dada é
1 1 1
S= · = .
3 4 12
Pergunta 3. Seja (un ) uma sucessão convergente. Dados p, k ∈ N0 , qual é a soma da série
∞
X
(un − un+p )?
n=k
Sucessões e séries numéricas Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
23
∞
X ∞
X
Proposição 1.33 Seja j um número inteiro positivo. Então an converge se, e só se, an
n=1 n=j
∞
X ∞
X
converge. Tem-se ainda que, no caso em que há convergência, se an = S, então an =
n=1 n=j
∞
X ∞
X
S − (a1 + a2 + . . . + aj−1 ) e se an = M , então an = M + (a1 + a2 + . . . + aj−1 ).
n=j n=1
A propriedade anterior diz-nos que a natureza de uma série não é afectada pelos “primeiros
termos” que se considera da sucessão (an ) e em simultâneo põe em evidência o facto da soma
da série depender de todos os termos, pelo que, quando queremos calcular a soma de uma série
é fundamental indicar onde é que a série começa. Assim, quando estamos apenas a estudar
P
a convergência de uma série, muitas vezes referimo-nos simplesmente à série an , pois a sua
natureza não é afectada pela ordem do termo em que a série começa.
O teorema que se segue dá-nos uma condição necessária (mas não suficiente) para a
convergência de uma série.
Teorema 1.34 (Condição necessária de convergência)
∞
X
Se a série an converge, então lim an = 0 .
n=1
Observações.
1) Do teorema anterior conclui-se que se lim an 6= 0 ou se não existir o limite de (an ), então a
∞
X
série an é divergente.
n=1
2) Se o termo geral de uma série converge para zero, nada se conclui sobre a sua natureza a
X 1
partir apenas desse facto. Por exemplo, a série é uma série divergente e o seu termo geral
n≥1
n
1
an = n converge para zero.
Exemplos.
X
1. 5n , temos an = 5n → +∞, logo a série é divergente (pois o termo geral não converge
n≥1
para zero).
n+5
X 7
7
n+5
2. 1+ , temos an = 1 + n+5 → e7 6= 0, logo a série é divergente.
n≥6
n+5
(
X 3, se n é par,
3. (2 + cos(nπ)), temos an = então (an ) não é convergente, logo a
1, se n é impar,
n≥2
série é divergente.
∞
X
Definição 1.35 Sendo an uma série convergente, para cada m ≥ p chama-se resto de
n=p
ordem m ao número real rm dado por
∞
X
rm = an .
n=m+1
Tem-se então ∞ m
X X
an = an + rm ,
n=p n=p
o que mostra que rm → 0 e também que rm é o erro cometido ao aproximar a soma da série
pela soma parcial Sm .
Sucessões e séries numéricas Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
24
1.3.3 Critérios de convergência para séries de termos não negativos
“Divergent series are the invention of the Devil, and it is shameful to base on them any demons-
tration whatsoever.”
N. H. Abel (1802-1829)
Nesta secção vamos apresentar resultados que só se aplicam a séries cujo termo geral é uma
sucessão de números não negativos.
Teorema 1.36 Sejam p ∈ N e n≥p an uma série de termos não negativos. Então a série
P
Nota. Observe-se que numa série de termos positivos (não negativos) a sucessão das somas
parciais é estritamente crescente (crescente).
X 1
Prova-se que a série , designada por série harmónica, é divergente. Esta série pertence
n
n≥1
à classe das chamadas séries de Dirichlet, que são séries da forma
X 1
,
nα
sendo válido o resultado que se segue.
X 1
Proposição 1.37 A série de Dirichlet é convergente se, e só se, α > 1.
nα
O conhecimento da natureza das séries de Dirichlet é fundamental no estudo da natureza
das séries numéricas, já que alguns critérios, como vamos ver, decidem a natureza de uma série
por algum tipo de comparação com séries cujo comportamento é conhecido. Assim, estas séries
conjuntamente com as séries geométricas e as séries de Mengoli vão constituir a nossa base de
dados para as comparações que necessitamos fazer.
25
Teorema 1.38 (1.o Critério de comparação) Sejam an e
P P
bn duas séries de termos não
negativos e suponha-se que a partir de certa ordem se tem
an ≤ bn .
Então
P P
1. se bn converge, então também an converge.
P P
2. se an diverge, então também bn diverge.
Prova. Tratando-se de séries de termos não negativos, as sucessões das somas parciais são
convergentes se, e só se, são majoradas (cf. Teorema 1.36).
P P
Designemos por (An ) e (Bn ) as sucessões das somas parciais de an e bn , respectivamente.
Sem perda de generalidade, suponhamos que an ≤ bn , para todo o n (caso contrário basta
considerar as séries que começam no ı́ndice a partir do qual a desigualdade se verifica). Assim,
An ≤ Bn , ∀n. (6)
P
1. Se bn converge, então, pelo Teorema 1.36, (Bn ) é majorada, ou seja, existe M > 0 tal
que Bn ≤ M , para todo o n, logo, por (6), também (An ) é majorada. Novamente pelo
Teorema 1.36 concluimos que (An ) é convergente, portanto, por definição, também a série
P
an é convergente.
P
2. Suponhamos agora que an é divergente. Então, pelo Teorema 1.36, a sucessão (An ) não
é majorada. Temos que (An ) é uma sucessão monótona crescente (An+1 −An = an+1 ≥ 0),
e como não é majorada, então tende para +∞.
De (6) concluimos que também Bn → +∞ e, consequentemente,
P
bn é divergente.
O critério anterior permite tirar conclusões sobre a natureza de uma série, através da com-
paração do termo geral da série em estudo, com o termo geral de uma série cuja natureza é
conhecida, desde que esteja estabelecida uma relação de ordem conveniente entre os dois termos
gerais. Nem sempre essas relações são fáceis de obter. Uma forma alternativa de obter as con-
clusões do critério, consiste no cálculo do limite do quociente entre os termos gerais em causa,
como nos diz o próximo resultado.
natureza. Frequentemente as séries que pretendemos estudar estão na situação do 2.o critério
Sucessões e séries numéricas Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
26
de comparação, mas usamos esta última formulação, por ser mais expedita. Vejamos o exemplo
que se segue. Como
5n2 + n 5n2 5
√ ∼ 4 = 2,
8
n + 4n − 1 n n
X 5n2 + n X 1
então as séries √ e5 são da mesma natureza, como a segunda é convergente
n8 + 4n − 1 n2
(série de Dirichlet com α = 2) a primeira também o é.
|an | é uma série de termos não negativos pelo que a sua natureza pode
P
Observe-se que
eventualmente ser determinada recorrendo a um dos critérios estudados na secção anterior.
converge.
|an | convergente
P P P
an convergente então an Absolutamente Convergente.
|an | divergente e
P P P
an convergente então an Simplesmente convergente.
P
q da Raiz ou de Cauchy, 1821) Seja
Teorema 1.42 (Critério an uma série e suponha-se
n
que existe o limite lim |an |.
q
n
|an | < 1, então
P
1. Se lim an é absolutamente convergente.
q
n
|an | > 1, então
P
2. Se lim an é divergente.
q
n
Observação. Nas condições do critério anterior, se lim |an | = 1 nada se pode concluir. A
|an | → 1+ , então pode concluir-
P p
n
série an pode ser convergente ou divergente. No entanto, se
se que a série é divergente.
27
P
Teorema 1.43 (Critério da Razão ou de D’Alembert) Seja an uma série e suponha-se
an+1
que existe o limite lim
.
an
an+1 P
1. Se lim
< 1, então an converge absolutamente.
a n
an+1 P
2. Se lim
> 1, então an diverge.
a n
Como aplicação do teorema anterior e da sua prova temos as propriedades que se seguem.
an+1
• Se lim
< 1, então lim an = 0.
a
n
an+1
• Se lim
> 1, então lim |an | = +∞.
a
n
P
Teorema 1.44 (Abel, Dirichlet) Seja bn uma série cuja sucessão das somas parciais é
limitada e seja (an ) uma sucessão decrescente e com lim an = 0. Então an · bn é convergente.
P
Definição 1.45 Chama-se série alternada a uma série da forma (−1)n an onde an ≥ 0,
P
∀n ∈ N. Assim, os termos de uma série deste tipo são alternadamente positivos e negativos.
Corolário 1.46 (Critério de Leibniz, 1682) Seja (an ) uma sucessão decrescente de números
positivos tal que lim an = 0. Então a série (−1)n an é convergente.
P
28
2. A sucessão (an ) do exemplo anterior não é uma sucessão monótona, pois
(a1 = 19 , a2 = 14 , a3 = 1
81 , a4 = 1
16 , a5 = 1
279 .)
Assim, temos um exemplo de uma série alternada que é convergente e a sucessão (an )
não é decrescente. Esta situação ilustra que há séries alternadas que não estão nas
condições do Critério de Leibniz ( (−1)n an , com an ≥ 0, (an ) & e lim an = 0) e que são
P
convergentes, ou seja, a condição no Corolário 1.46 que pede que sucessão (an ) seja de-
crescente, não é uma condição necessária para a convergência da série, é apenas suficiente.
3. A prova do Critério de Leibniz pode ser feita directamente, sem recorrer ao Teorema de
Abel-Dirichlet, verificado os passos que se seguem. Seja (Sn ) a sucessão das somas parciais
da série do Corolário 1.46, que supomos começar em n = 1.
Terminamos esta secção com um resultado que nos permite estimar o erro que se comete
quando numa série alternada convergente, de soma S, se usa a soma parcial de ordem n para
aproximar S.
∞
X
Proposição 1.47 Seja (−1)n an uma série alternada convergente, com (an ) decrescente, e
n=p
seja S a sua soma. Então
29
3) Se termo geral (an ) envolver produtos, em que o número de factores envolvido varie com n,
como por exemplo, factoriais, ou envolva potências, então a escolha deve recair sobre critério da
razão. Veja-se o exemplo seguinte.
Como o termo geral muda de sinal uma infinidade de vezes, começamos por estudar a série
dos módulos. Designando por an o termo geral da série vem
n4 + 3n2 − 1 n4 + 3n2 − 1 n4 1
|an | = | cos(n6 + 4)| · 8
≤ 8
∼ 8
= 4. (8)
| {z } 2n + 6n + 4 2n + 6n + 4 2n 2n
≤1
1
é uma série convergente (série de Dirichlet com α = 4 > 1), logo de (8), pelos 1.o
P
Ora n4
o
e 2. critérios de comparação, concluı́mos que |an | é convergente, ou seja, a série an
P P
é absolutamente convergente.
Nota. Quando o termo geral de uma série muda de sinal uma infinidade de vezes e a série
é convergente, devemos indicar qual o tipo de convergência: simples ou absoluta.
30
Ainda os restos
O próximo resultado diz-nos como estimar o resto de ordem m de uma série convergente que se
encontre nas condições do critério da razão.
X
Proposição 1.48 Seja an uma série de termos positivos convergente e suponha-se que, dado
n≥p
um inteiro m ≥ p, existe uma constante 0 < λ < 1 tal que
an+1
< λ, ∀n > m.
an
Então o resto rm da série verifica as condições
am+1
am+1 < rm < .
1−λ
Resposta 2.
un+1
• se (un ) é uma sucessão de termos negativos e ≥ 1 (resp. > 1), então (un ) é decrescente
un
(resp. estritamente decrescente);
un+1
• se (un ) é uma sucessão de termos negativos e ≤ 1 (resp. < 1), então (un ) é crescente
un
(resp. estritamente crescente).
31
Sı́ntese da secção
n P∞ n rp
• Série geométrica: converge sse |r| < 1, tendo-se neste caso
P
n≥p r n=p r = 1−r ;
∞
X
• Série de Mengoli: (un − un+1 ), Sn = up − un+1 ;
n=p
• se |an | diverge e
P P P
an converge, an diz-se simplesmente convergente;
• Critério de Abel-Dirichlet:
P
bn com as somas parciais limitada, (an ) decrescente e
lim an = 0. Então an · bn é convergente.
P
gente.
P∞ n
• n=p (−1) an uma série alternada convergente, com (an ) decrescente. Então
|rn | = |Sn − S| ≤ an+1 , ∀n ∈ Np .
32
2 Limites e continuidade
Neste capı́tulo damos inı́cio ao estudo das funções reais de variável real. Começamos por estudar
as chamadas noções topológicas. Estes conceitos prendem-se com noções de proximidade e estão
fortemente relacionados com o comportamento das ditas funções contı́nuas. Estão integrados
num ramo da matemática chamado Topologia e que é muito importante, nomeadamente quando
precisamos de falar de limites de funções, o conceito central da Análise Matemática.
Uma vizinhança do ponto a é qualquer conjunto que contenha uma vizinhança de centro em
a e raio δ, para algum δ > 0.
Um conjunto diz-se aberto se todos os seus pontos forem pontos interiores. Um conjunto
diz-se fechado se contiver todos os seus pontos fronteiros. Observe-se há conjuntos conjuntos
que não são abertos nem fechados. Por exemplo, os intervalos abertos são conjuntos abertos,
os intervalos fechados são conjuntos fechados e os intervalos semi-abertos não são abertos nem
fechados.
Limites e continuidade Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
33
Dado um conjunto X ⊂ R, observe-se que
·
[ ·
[
R = int X fr X extX,
·
[
onde o sı́mbolo denota a união disjunta.
Proposição 2.4 (Critérios de ponto de acumulação) Dados um conjunto de números re-
ais D e um ponto a ∈ R, são equivalentes as seguintes condições
1. a é ponto de acumulação de D;
2. em toda a vizinhança de a existe uma infinidade de pontos de D;
3. em toda a vizinhança de a existem pontos de D \ {a}.
Exemplos. Vamos determinar o interior, o exterior, a fronteira, o derivado e os pontos
isolados dos conjuntos que se seguem.
1. A =]5, 10[
• Int A =]5, 10[
• Ext A =] − ∞, 5[∪]10, +∞[
• Fr A = {5, 10}
• A0 = [5, 10]
• Pontos isolados - ∅
A é um conjunto aberto.
2. Seja X um conjunto finito.
• Int X = ∅
• Ext X = R \ X
• Fr X = X
• X0 = ∅
• Pontos isolados - X
X é um conjunto fechado.
3. B = {−3}∪]5, 12]
• Int B =]5, 12[
• Ext B =] − ∞, −3[∪] − 3, 5[∪]12, +∞[
• Fr B = {−3, 5, 12}
• B 0 = [5, 12]
• Pontos isolados - {−3}
B não é um conjunto aberto, nem um conjunto fechado.
1
4. C = {5 + , n ∈ N}
n
• Int C = ∅
• Ext C = R \ (C ∪ {5})
• Fr C = C ∪ {5}
• C 0 = {5}
• Pontos isolados - C
C não é um conjunto aberto, nem um conjunto fechado.
Limites e continuidade Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
34
5. Q
• Int Q = ∅
• Ext Q = ∅
• Fr Q = R
• Q0 = R.
• Pontos isolados - ∅
Observe-se que entre dois racionais há sempre racionais e irracionais, e também entre dois
irracionais há sempre racionais e irracionais.
Q não é um conjunto aberto, nem um conjunto fechado.
Da definição anterior resulta que, se existir limite de uma função num ponto ele é
único. Resulta também que a existência e o valor do limite de uma função num ponto só
dependem dos valores que a função toma nalguma vizinhança desse ponto (excluindo o ponto):
diz-se, por este motivo, que o conceito de limite tem carácter local.
isto significa que a distância entre f (x) e b pode ser arbitrariamente pequena desde que se
tome a distância entre x e a suficientemente pequena (mas não nula);
35
2) b = +∞, dizer que lim f (x) = +∞ é dizer que
x→a
e isto significa que, dado M > 0 qualquer, desde que se tome a distância entre x e a
suficientemente pequena (mas não nula), f só assume valores maiores do que o valor M ;
o que significa que f só assume valores menores do que qualquer −M < 0 que se considere,
desde que se tome para x valores cuja distância a seja suficientemente pequena (mas não
nula).
Exemplos. (
1, se x 6= 2
1) Seja f (x) = , então lim f (x) = 1.
3, se x = 2. x→2
2) Seja f (x) = 2x + 3, x ∈ R.
Usando a definição de limite segundo Cauchy, vejamos que lim f (x) = −1.
x→−2
Queremos provar que
δ
|2x + 3 + 1| < 2 · ε = 2 · = δ.
2
Fica então provado o pretendido.
1
3) É fácil provar que lim = +∞.
x→0 x2
− 1 ,
se x < 0
4) Seja f (x) = x
4 − x2 , se x ≥ 0.
O limite de f no ponto zero não é +∞ (não existe), pois para valores de M > 0 suficien-
temente grandes, há sempre valores de f abaixo desse valor, quando tomamos x em qualquer
vizinhança de zero, como é ilustrado no gráfico que se segue.
36
A existência de limite de uma função, num ponto, garante que a função goze de algumas
propriedades. Por exemplo, uma função é limitada numa vizinhança de um ponto onde tem
limite, em R, situação enunciada na próxima proposição.
Temos várias formas equivalentes de dizer que o limite de uma função f , num ponto a, é b, no
caso em que b ∈ R, como listamos seguidamente.
Teorema 2.9 As definições de limite de uma função segundo Heine e segundo Cauchy são
equivalentes.
Da definição de limite de uma função num ponto segundo Heine conclui-se que, se existirem
duas sucessões que convergem para a por valores diferentes de a e cujas imagens por meio de
f têm limites diferentes, então não existe o limite lim f (x). Temos assim um critério de não
x→a
existência de limite de uma função num ponto. O exemplo que se segue ilustra a utilidade
prática desta definição.
Exemplo.
1
Seja f (x) = cos e consideremos as sucessões de termos gerais
x
1 1
xn = →0 e yn = → 0.
2nπ (2n + 1)π
Temos
1 1
f (xn ) = cos 1 = cos 2nπ = 1 e f (yn ) = cos 1 = cos(2n + 1)π = −1,
2nπ (2n+1)π
assim lim f (xn ) = 1 6= −1 = lim f (yn ), logo não existe lim f (x).
x→0
Seguidamente vamos ver dois conceitos que estão na base de um outro critério de existência/não
existência de limite de uma função num dado ponto.
37
Definição 2.10 Seja f : D ⊆ R → R e suponhamos que existe p > 0 tal que ] a − p, a [ ⊂ D.
Dizemos que b (∈ R) é o limite lateral à esquerda de f no ponto a, e escrevemos
Notas.
1) Por abuso de linguagem, dizemos frequentemente limite à direita/à esquerda de a.
2) As definições anteriores não estão enunciadas na sua forma mais genérica, pois, na noção de
limite lateral à esquerda (resp. à direita) não é necessário que ]a − p, a[ (resp. ]a, a + p[) esteja
contido em D, mas apenas que a ∈ (D ∩ ] − ∞, a[)0 (resp. a ∈ (D ∩ ]a, +∞[)0 ). A D ∩ ] − ∞, a[
(resp. D ∩ ]a, +∞[) chama-se domı́nio de f à esquerda (resp. à direita) de a e representa-se
por Da− (resp. Da+ ).
3) Tal como o conceito de limite de uma função num ponto, o conceito de limite lateral pode
ser dado em termos de vizinhanças (como está enunciado) ou em termos de sucessões (como na
definição de limite segundo Heine), bastando para tal tomar sucessões no domı́nio da função à
esquerda (resp. à direita) do ponto a, quando se pretende determinar o limite lateral à esquerda
(resp. à direita).
Um teste prático para provar a descontinuidade de certas funções, em certos pontos, está
expressa no próximo corolário.
Exemplo.
Não existe limite da função no ponto x = 1, pois os limites laterais são distintos.
38
Definição 2.13 Seja f uma função definida num intervalo da forma ] a, +∞ [ para um certo
a ∈ R. Dizemos que o limite de f quando x tende para +∞ é b ∈ R, e escrevemos
lim f (x) = b,
x→+∞
Se f está definida num intervalo da forma ] − ∞, a [ para um certo a ∈ R, dizemos que o limite
de f quando x tende para −∞ é b ∈ R, e escrevemos
lim f (x) = b,
x→−∞
Os próximos resultados estão relacionados com a comparação de limites de funções que são
comparáveis (numa relação de ordem) na vizinhança de um determinado ponto.
Teorema 2.14 Sejam f, g : D ⊆ R → R, a ∈ D0 . Suponhamos que existe δ > 0 tal que
1. Se existirem os limites lim f (x) e lim g(x), então lim f (x) ≤ lim g(x).
x→a x→a x→a x→a
Exemplos.
1) Analogamente a situações já estudadas com as sucessões, a desigualdade estrita entre duas
funções, na vizinhança de um ponto, onde ambas têm limite finito, não implica a desigualdade
estrita entre os respectivos limites. Por exemplo, para f (x) = 1 − x2 e g(x) = 1 + x2 , tem-se
f (x) < g(x), ∀x ∈ R \ {0} e, no entanto, limx→0 f (x) = limx→0 g(x) = 1.
2) Sejam f (x) = x e g(x) = x + sin2 x. Temos que f (x) ≤ g(x), para todo x ∈ R, e
limx→+∞ f (x) = +∞, logo limx→+∞ g(x) = +∞.
O próximo resultado traduz uma propriedade importante dos limites: o sinal do limite de
uma função num ponto determina o sinal da função numa vizinhança do mesmo ponto.
39
Teorema 2.15 Seja f uma função definida em Vp (a) \ {a}, p > 0 e tal que lim f (x) = b.
x→a
Se b > 0 (respectivamente, b < 0), então existe ε > 0 tal que f (x) > 0 (respectivamente,
f (x) < 0) para todo x ∈ ] a − ε, a + ε [ \ {a}.
Observações.
1) O teorema anterior também é válido para o caso de limites laterais.
2) Se limx→a f (x) = +∞, basta a desigualdade f (x) ≤ g(x) para concluir que também
limx→a g(x) = +∞. Analogamente, se limx→a h(x) = −∞, basta a desigualdade g(x) ≤ h(x)
para concluir que também limx→a g(x) = −∞. Estas situações são justificadas pelo Teorema
2.14.
Aplicação. Usando o teorema anterior e as desigualdades
sin x π π sin x
cos x < < 1, x ∈ − , 0 ∪ 0, , deduz-se que lim = 1.
x 2 2 x→0 x
Corolário 2.17 Sejam p > 0, a ∈ R, f e g funções definidas em Vp (a) \ {a} tais que
∃ M > 0 : |f (x)| ≤ M, ∀x ∈ Vp (a) \ {a} e lim g(x) = 0.
x→a
7. lim f (x) = ±∞ e lim g(x) > 0 (resp. < 0) ⇒ lim (f (x) · g(x)) = ±∞ (resp. ∓∞);
x→a x→a x→a
1 1
8. lim f (x) = b ∈ R \ {0} ⇒ lim = ;
x→a x→a f (x) b
1
9. lim |f (x)| = +∞ ⇒ lim = 0 e reciprocamente.
x→a x→a f (x)
40
Observações.
1) O teorema anterior verifica-se analogamente para o caso dos limites laterais.
2) As propriedades 2 e 6 anteriores generalizam-se de modo natural à soma e ao produto de um
número finito de funções, respectivamente.
3) Note-se que no teorema anterior os casos em que a = +∞ e a = −∞ estão incluı́dos.
4) Observe-se que o caso 3 (resp. 4) inclui a situação em que lim g(x) = +∞ (resp. −∞).
x→a
5) A propriedade 7 é válida nos casos lim g(x) = +∞ e lim g(x) = −∞, respectivamente.
x→a x→a
6) Tal como no caso das sucessões, o teorema anterior não nos dá indicação sobre a existência e o
valor do limite (se este existir) nos casos que se seguem e que são designados por indeterminações:
0 f (x)
• quando queremos determinar lim e lim f (x) = 0 = lim g(x);
0 x→a g(x) x→a x→a
∞ f (x)
• quando queremos determinar lim e lim |f (x)| = +∞ = lim |g(x)|.
∞ x→a g(x) x→a x→a
À semelhança das sucessões, vamos definir a relação assintoticamente igual nas funções.
Observação. Na definição anterior, se g não se anula em Vδ (a) \ {a}, para algum δ > 0, então
f (x)
f (x) ∼ g(x) (x → a) equivale a lim = 1.
x→a g(x)
41
Exemplos.
10x7 + x − 4
1. 10x7 +x−4 ∼ 10x7 , (x → +∞), pois lim = 1 e 10x7 +x−4 ∼ −4, (x → 0).
x→+∞ 10x7
2. Dados n ∈ N, ai ∈ R, com i = 0, . . . , n e an 6= 0, temos que
sin x
3. sin x ∼ x, (x → 0), pois lim = 1.
x→0 x
4. sin x ∼
/ x, (x → +∞).
5. Sejam m e b dois números reais não simultaneamente nulos. Diz-se que a recta y = mx + b
é uma assı́ntota, em +∞, ao gráfico da função f , se limx→+∞ (f (x)−(mx+b)) = 0. Temos
então
f (x) f (x)
lim (f (x) − (mx + b)) = lim (mx + b) − 1 = 0 ⇐⇒ lim = 1,
x→+∞ x→+∞ mx + b x→+∞ mx + b
logo
f (x) ∼ mx + b, (x → +∞).
2.3 Continuidade
Definição 2.21 Sejam f : D ⊆ R → R e a ∈ D. A função f diz-se contı́nua no ponto a se,
e só se,
∀δ > 0 ∃ ε > 0 : ∀x ∈ D |x − a| < ε ⇒ |f (x) − f (a)| < δ.
Caso contrário f diz-se descontı́nua em a.
A função f diz-se contı́nua se for contı́nua em todos os pontos de D.
Proposição 2.22 Nas condições da definição anterior, f é contı́nua em a se, e só se, para toda
a sucessão (xn ) ⊂ D convergindo para a, lim f (xn ) = f (a).
O próximo resultado caracteriza a continuidade de uma função em pontos do domı́nio que são
pontos de acumulação.
Observações.
1) Uma função é contı́nua nos pontos isolados do seu domı́nio e nos pontos onde o limite da
função nesse ponto é igual ao valor da função no mesmo ponto.
2) De definição anterior resulta que a função identidade (f (x) = x) e a função módulo
(f (x) = |x|) são contı́nuas.
3) Também são contı́nuas, em R, as funções definidas por x 7→ sin x, x 7→ cos x, x 7→ ex e, em
x > 0, a função x 7→ log x.
Vejamos que a função seno é contı́nua em R. Seja a ∈ R. É sabido que
x−a x+a
sin x − sin a = 2 sin cos .
2 2
42
Atendendo a que | sin x| ≤ |x|, ∀x ∈ R e a que o cosseno em módulo é menor ou igual a 1,
vem
x−a x − a
x + a
| sin x − sin a| ≤ 2 sin
cos ≤ 2
= |x − a|.
2 2 2
Como |x − a| → 0, quando x → a, então, do Teorema 2.16, concluimos que
lim | sin x − sin a| = 0 ⇐⇒ lim sin x = sin a,
x→a x→a
logo a função seno é contı́nua em a. Como a foi tomado arbitrariamente, esta função trigo-
nométrica é contı́nua em R.
A continuidade da função cossenopode ser provada sabendo que a função seno é contı́nua e
tendo presente que cos x = sin π2 − x .
A menção à prova da continuidade das outras funções referidas será feita no último capı́tulo.
4) Se (xn ) é uma sucessão de pontos do domı́nio de uma função f e (xn ) converge para um ponto
onde f é contı́nua, temos então que
lim f (xn ) = f (lim xn ).
Assim, dada uma sucessão (xn ) convergente, temos, por exemplo,
lim sin xn = sin(lim xn ) e lim exn = elim xn .
Adoptando as convenções
e+∞ = +∞ e e−∞ = 0,
podemos, mais geralmente, escrever
lim exn = elim xn para toda a sucessão (xn ) com limite em R.
Analogamente com as convenções
log(+∞) = +∞ e log 0 = −∞,
podemos escrever
lim log(xn ) = log(lim xn ) para toda a sucessão (xn ) positiva com limite em R.
Pela proposição anterior a função f˜ assim construı́da é contı́nua em a. Diz-se, por isso, o
prolongamento por continuidade de f ao ponto a.
sin x
Aplicação. O prolongamento por continuidade de x 7→ ao ponto 0 é a função f˜ definida
x
por
sin x , se x ∈ R \ {0}
f˜(x) = x
1, se x = 0.
Sendo (xn ) uma sucessão arbitrária tal que xn → 0, como sin xn = f˜(xn )xn (mesmo se xn = 0)
e f˜ é contı́nua no ponto 0, temos que lim f˜(xn ) = 1, donde se conclui
sin xn ∼ xn , se xn → 0.
43
Proposição 2.25 Sejam f : D ⊂ R → R, a ∈ D ∩ Da0 + ∩ Da0 − . Então, f é contı́nua no ponto a
se, e só se,
lim f (x) = f (a) = lim f (x).
x→a− x→a+
Um ponto onde uma função não é contı́nua diz-se um ponto de descontinuidade da função.
Existem descontinuidades com caracterı́sticas diferentes. Vamos atribuir diferentes designações
às diferentes situações.
De acordo com a proposição anterior, uma função f pode ser descontı́nua num ponto
a ∈ D ∩ Da0 + ∩ Da0 − se lim f (x) não existe ou se lim f (x) existe em R mas o seu valor é diferente
x→a x→a
de f (a). No segundo caso diz-se que f tem uma descontinuidade removı́vel no ponto a.
A designação anterior prende-se com a ilustração da situação. Com efeito, redefinindo a função
f no ponto a do seguinte modo
(
f (x), se x 6= a
g(x) = lim f (x), se x = a
x→a
Se os limites laterais de f no ponto a existirem ambos, em R, mas lim f (x) 6= lim f (x)
x→a− x→a+
dizemos que f tem uma descontinuidade por salto no ponto a.
44
b desc. de 1.a espécie, c desc. de 2.a espécie 0 desc. de 2.a espécie
Usando a continuidade das funções constantes e da função identidade resulta que toda a
função polinomial é contı́nua. Logo, também as funções racionais (quocientes de funções poli-
nomiais) são contı́nuas nos pontos que não anulam os respectivos denominadores, ou seja, nos
seus domı́nios.
Da continuidade do seno e do cosseno deduz-se também a continuidade da tangente, da
cotangente, da secante e da cossecante, nos seus domı́nios.
As operações algébricas entre funções permitem, como observado no parágrafo anterior,
aumentar a lista de funções contı́nuas. O próximo resultado permite incrementar consideravel-
mente essa lista, usando a composição de funções. É, portanto, um resultado muito importante
no contexto do cálculo de limites.
1. b ∈ R e f é contı́nua em b,
ou
2. b = +∞ ou b = −∞,
então
lim f (g(x)) = lim f (t).
x→a t→b
45
Aplicações.
1) Se lim g(x) existe (em R), tem-se
x→a
lim g(x)
lim eg(x) = ex→a ,
x→a
3) Para calcular um limite do tipo lim f (g(x)) com f contı́nua, pode fazer-se a mudança de
x→a
variável t = g(x). Supondo que lim g(x) = b, o limite a calcular transforma-se em lim f (t).
x→a t→b
bx
Vejamos que lim √ = +∞.
x→+∞ x
Usando a desigualdade de Bernoulli vem
logo
bx (h + 1)x 1 [x]h (x − 1)h
α
= √ ≥√ + √ ≥ √ → +∞,
x x x x x
logo
ax
lim = +∞.
x→+∞ xα
46
1) Tem-se
log(1 + xn ) ∼ xn e e xn − 1 ∼ x n se xn → 0.
2) Se lim g(x) = 0, tem-se ainda
x→a
3) De 1) obtém-se
log xn ∼ xn − 1 se xn → 1.
Estes resultados facilitam o cálculo de limites, já que permitem simplificar de alguma forma
as expressões das funções com que se trabalha.
ex − e−x
1. lim .
x→0 sin x
Trata-se de uma indeterminação do tipo 00 . Temos
e3x − esin x
2. lim .
x→0 2x
Temos novamente uma indeterminação do tipo 00 . Vem então
!
e3x−sin x − 1 3x − sin x 3 1 sin x
sin x
lim e = lim = lim − = 1,
x→0 2x x→0 2x x→0 2 2 x
já que
esin x → 1, x → 0;
e
e3x−sin x − 1 ∼ 3x − sin x, (x → 0), pois lim (3x − sin x) = 0.
x→0
log x
3. lim (indeterminação 00 ).
x→1 ex − e
Munidos destes novos resultados, podemos estudar mais algumas séries numéricas, como se
ilustra nos exemplos que se seguem.
Limites e continuidade Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
47
Exemplos de aplicação ao estudo das séries numéricas.
X 1
1. Vamos determinar a natureza da série (−1)n sin .
n
Seja an = sin n1 . Como
1 π
0< ≤1 e ]0, 1] ⊂]0, [,
n 2
então an > 0, para todo o n.
|(−1)n an | = sin n1 .
P P
Começamos por pensar na série dos módulos,
sin x sin n1 1
Atendendo a que lim = 1, vem lim 1 = 1, pois n → 0, ou seja, sin n1 ∼ n1 . Então
x→0 x
n
X 1 X1
sin ∼ ,
n n
sin n1 é uma série divergente (pelo 2.o critério de comparação de termos gerais).
P
ou seja,
Sendo a série dos módulos divergente, é necessário estudar a natureza da série dada.
Temos
1 1 1 1
> , logo sin > sin ,
n n+1 n n+1
já que a função seno é crescente em ]0, π2 [. Assim, an > an+1 , para todo o n, ou seja, (an )
é uma sucessão decrescente. Além disso, lim sin n1 = sin 0 = 0. Nestas condições o critério
de Leibniz permite concluir que a série dada é convergente. Como já sabemos que a série
dos módulos diverge, então podemos afirmar que a série converge simplesmente.
48
Definição 2.33 Sejam f, g : D ⊂ R → R duas funções tais que f (x) > 0, ∀x ∈ D. Define-se,
em D, a função f g do seguinte modo
f (x)g(x) = eg(x) log f (x) .
Nas condições da definição anterior, existem algumas situações que, existindo os limites
lim f (x) e lim g(x), com a ∈ D0 , conduzem a novas indeterminações, a saber
x→a x→a
Nos casos não incluı́dos nos anteriores, sempre que existem lim f (x) e lim g(x), tem-se que
x→a x→a
lim g(x)
lim f (x)g(x) = lim f (x) x→a .
x→a x→a
49
2.4 Teorema de Bolzano
O supremo e o ı́nfimo do contradomı́nio de uma função dizem-se muitas vezes, abreviadamente,
o supremo e o ı́nfimo da função. Do mesmo modo, se o contradomı́nio de uma função tiver
elemento máximo ou elemento mı́nimo, ele diz-se, também e respectivamente, o máximo ou o
mı́nimo da função.
Nas condições do teorema anterior, dependendo da função e do valor de k, pode existir mais
do que um c, tal que f (c) = k.
Nota. O teorema anterior pode ser enunciado da seguinte forma (mais geral).
Seja I um intervalo real e f : I → R uma função contı́nua. Então, dado k ∈ R estritamente
compreendido entre o ı́nfimo e o supremo da função em I, existe c ∈ I tal que f (c) = k.
Corolário 2.35 Seja f uma função contı́nua no intervalo [ a, b ]. Se f (a)·f (b) < 0, então existe
(pelo menos) um ponto c ∈ ] a, b [ tal que f (c) = 0.
50
Corolário 2.36 Sejam I um intervalo de R e f : I → R uma função contı́nua. Então f (I) é
um intervalo.
Exemplos.
3. Seja (
−2, se x ∈ [−3, 0[
f (x) =
1, se x ∈ [0, 2].
Temos f (−3) · f (2) < 0, no entanto f não se anula. O que é que falha?
Limites e continuidade Ana Rute Domingos e Ana Cristina Barroso
51
4. Seja g(x) = x, com x ∈ [−4, −1] ∪ [2, 4].
À semelhança do exemplo anterior, g(−4) · g(4) < 0 e g não se anula. O que é que falha?
Vamos terminar este capı́tulo com um resultado referente à continuidade da função inversa de
uma dada função. Recordamos que, dada uma função injectiva f : D ⊆ R → f (D) ⊆ R,
chamamos função inversa de f , e representamos por f −1 , à função f −1 : f (D) → D que
verifica
(f −1 ◦ f )(x) = x, ∀x ∈ D e (f ◦ f −1 )(y) = y, ∀y ∈ f (D).
Teorema 2.37 Seja f uma função contı́nua e injectiva definida num intervalo I de R. Então
f −1 é contı́nua no seu domı́nio.
É fundamental que f esteja definida num intervalo pois caso contrário a função inversa pode
apresentar descontinuidades.
52
Classificação das Descontinuidades
• 1.a espécie
- descontinuidade removı́vel
(existe em R o limite da função no ponto, mas é diferente do valor da função no ponto),
• 2.a espécie,
Pelo menos um dos limites laterais da função no ponto é infinito ou não existe (em R).
sin x log(1 + x) ex − 1
lim =1 lim =1 lim =1
x→0 x x→0 x x→0 x
ax xα
lim = +∞ lim = +∞ lim xα log x = 0
x→+∞ xα x→+∞ log x x→0+
0 ∞
∞−∞ 0×∞ 00 ∞0 1∞
0 ∞
53
54
3 Cálculo Diferencial em R
3.1 Noção de derivada, propriedades gerais
55
Resulta imediatamente das definições anteriores e do Teorema 2.11 o seguinte
Teorema 3.3 Sejam f : D ⊆ R → R e c ∈ D ∩ Dc0 − ∩ Dc0 + . A função f é diferenciável em
c se, e só se, existirem e forem iguais as suas derivadas laterais no ponto c, tendo-se então
f 0 (c) = f−0 (c) = f+0 (c).
Assim, se f−0 (c) 6= f+0 (c), então f 0 (c) não existe.
A existência da derivada lateral esquerda (respectivamente, direita) de uma função num
ponto c permite definir a recta tangente à esquerda (respectivamente, à direita) ao gráfico de f
no ponto P (c, f (c)) como a recta de declive f−0 (c) (respectivamente, f+0 (c)) que passa em P .
Exemplo. A função f (x) = |x| não é diferenciável em x = 0 pois
f (x) − f (0) x f (x) − f (0) −x
f+0 (0) = lim = lim = 1 e f−0 (0) = lim = lim = −1.
x→0+ x−0 x→0 x
+ x→0 − x−0 x→0 − x
56
Conclui-se assim que se f é diferenciável em c, então
Isto significa que uma função diferenciável no ponto c pode ser aproximada, numa vizinhança
desse ponto, pelo polinómio P1 (x) = f (c)+f 0 (c)(x−c), sendo o erro cometido nesta aproximação,
R1 (x) = ϕ(x)(x − c), um infinitésimo de ordem superior a x − c, quando x → c, isto é,
R1 (x)
lim = 0. Voltaremos a este assunto mais tarde.
x→c x − c
O resultado anterior permite-nos mostrar que a noção de diferenciabilidade é mais forte que
a noção de continuidade, no sentido expresso no corolário que se segue.
Repare-se que o recı́proco do corolário anterior é falso. Por exemplo, a função f (x) = |x| é
contı́nua em c = 0 mas não é aı́ diferenciável uma vez que, como já vimos, as suas derivadas
laterais nesse ponto têm valores distintos.
Existem também funções contı́nuas que nem sequer possuem derivadas laterais em determi-
nados pontos. Por exemplo, a função
x sin 1 ,
se x 6= 0
f (x) = x
0, se x = 0
1
x sin x
é contı́nua em c = 0 mas não existe f+0 (0) = lim (e analogamente para f−0 (0)).
x→0+ x
Vejamos agora algumas propriedades algébricas da derivação.
.
Cálculo Diferencial em R Ana Cristina Barroso e Ana Rute Domingos
57
O teorema que se segue diz-nos como determinar, nas condições indicadas, as derivadas
laterais para certos tipos de funções, ditas funções definidas por ramos, nos pontos em que a
função muda de expressão.
Nas condições enunciadas, se as derivadas g 0 (c) e h0 (c) puderem ser calculadas usando as
regras de derivação, o cálculo das derivadas laterais de f pode ser feito sem ser necessário
recorrer à definição. Note-se que f não é necessariamente diferenciável em c, isso só acontece
quando g 0 (c) = h0 (c). Convém também frisar que este resultado só é válido no caso de f ser
contı́nua em c, como mostra o exemplo que se segue.
(
−1, se x < 0
Exemplo. Seja f a função definida em R por f (x) =
x, se x ≥ 0.
f tem uma descontinuidade por salto em x = 0. Pondo g(x) = x e h(x) = −1 tem-se
g 0 (x) = 1, h0 (x) = 0, ∀x ∈ R, no entanto
f (x) − f (0) −1
f−0 (0) = lim = lim 6 h0 (0).
= +∞ =
x→0− x x→0 − x
58
Foi visto atrás que se f : D ⊆ R → R é diferenciável podemos definir a sua função derivada
através da correspondência x 7→ f 0 (x). Se esta nova função for diferenciável, define-se a segunda
derivada de f por f 00 (x) = (f 0 )0 (x). Desde que as derivadas sucessivas existam, este processo
pode ser iterado de modo a definir a terceira derivada, a quarta, e assim sucessivamente, sendo
a derivada de ordem n (n ∈ N) de f dada por
dn f
(x) = f (n) (x) = (f (n−1) )0 (x).
dxn
Exemplo. Sendo f (x) = x2 + 5x − 2 + cos x, com x ∈ R, calcular f (4) (x).
Derivando sucessivamente temos f 0 (x) = 2x + 5 − sin x, f 00 (x) = 2 − cos x, f 000 (x) = sin x e
f (4) (x) = cos x, para x ∈ R.
Por convenção, f (0) (x) = f (x). Assim, dado n ∈ N, f diz-se n vezes diferenciável no ponto
c se existir e for finita a derivada f (n) (c). Dizemos que f é de classe C n (n ∈ N) no ponto c se f
for n vezes diferenciável em c e se f (n) for contı́nua em c. Uma função diz-se de classe C 0 se for
uma função contı́nua. f diz-se de classe C ∞ , ou infinitamente diferenciável, num ponto se
tiver derivadas finitas de qualquer ordem nesse ponto. Estas noções estendem-se, naturalmente,
a conjuntos contidos no domı́nio de f . São exemplos de funções de classe C ∞ , em R, as funções
polinomiais e as funções definidas por ex , sin x e cos x, em R+ , a função x 7→ log x e, em R \ {0},
a função definida por x1 .
Repare-se que se f é de classe C n+1 em c, então f é n + 1 vezes diferenciável em c, pelo que
f é de classe C n no ponto c. Em particular, toda a função de classe C 1 é diferenciável mas o
recı́proco é falso. Por exemplo, a função
x2 sin 1 ,
se x 6= 0
f (x) = x
0, se x = 0
mas f 0 é descontı́nua em c = 0.
Se f e g são n vezes diferenciáveis em c, prova-se, por indução, que as funções f + g, f · g e
f
(se g(c) 6= 0) também são n vezes diferenciáveis em c.
g
59
Deste teorema resulta, por exemplo, que (xα )0 = αxα−1 , ∀x > 0 e ∀α ∈ R, e, se u é uma
u0 (x)
função diferenciável tal que u(x) 6= 0, (log |u(x)|)0 = .
u(x)
Nas condições do teorema anterior, se f, g, h são funções tais que h é diferenciável em c, g é
diferenciável em h(c) e f é diferenciável em g(h(c)), então f ◦ g ◦ h é diferenciável em c e tem-se
(f ◦ g ◦ h)0 (c) = f 0 (g(h(c)))g 0 (h(c))h0 (c).
Este resultado generaliza-se à composição de n funções diferenciáveis e pode ser demonstrado
por indução.
x3 cos 1 , se x 6= 0
Exemplo. Seja f (x) = x2
0, se x = 0.
60
3.3 Funções circulares inversas
É bem conhecido que a função f (x) = sin x não é injectiva e, portanto, não é invertı́vel.
já é injectiva. Assim, dado y ∈ [ −1, 1 ], existe um e um só x ∈ − π2 , π2 tal que sin x = y. A
este x damos o nome de arco cujo seno é y e escrevemos x = arcsin y. Podemos assim definir
a função inversa de
π π
f: − , → [ −1, 1 ]
2 2
x 7→ sin x,
gráfico de f
por
π π
−1
f : [ −1, 1 ] → − ,
2 2
y 7→ arcsin y.
gráfico de f −1
Sendo funções inversas uma da outra, os seus gráficos são a reflexão um do outro na recta
y = x, e tem-se
sin(arcsin y) = y, ∀y ∈ [ −1, 1 ]
e
π π
arcsin(sin x) = x, ∀x ∈ − , .
2 2
√ !! √
2 2
Exemplos. Tem-se sin arcsin − =− ; sin(arcsin 7) não faz sentido uma vez que
2 2
π π
7∈
/ [−1, 1]; arcsin sin = .
3 3
Cálculo Diferencial em R Ana Cristina Barroso e Ana Rute Domingos
61
13π π π
Como ∈
/ − , obtemos
6 2 2
13π π π π
arcsin sin = arcsin sin + 2π = arcsin sin = ,
6 6 6 6
dado que x 7→ sin x é periódica de periodo 2π.
Uma vez que a derivada da função seno, y = cos x, não se anula no intervalo aberto − π2 , π2 ,
resulta do teorema da derivação da função inversa que a função arcsin é diferenciável no intervalo
aberto ] − 1, 1 [, tendo-se
d 1
(arcsin y) = p , ∀y ∈ ] − 1, 1 [.
dy 1 − y2
De modo análogo, se restringirmos o domı́nio da função y = cos x ao intervalo [ 0, π ],
g : [ 0, π ] → [ −1, 1 ]
x 7→ cos x,
gráfico de g
obtemos uma bijecção sobre [ −1, 1 ]. Assim, dado y ∈ [ −1, 1 ], existe um e um só x ∈ [ 0, π ] tal
que cos x = y. A este x damos o nome de arco cujo cosseno é y e escrevemos x = arccos y.
Podemos assim definir a função inversa da função g por
g −1 : [ −1, 1 ] → [ 0, π ]
y 7→ arccos y.
gráfico de g −1
Tem-se assim,
cos(arccos y) = y, ∀y ∈ [ −1, 1 ]
e
arccos(cos x) = x, ∀x ∈ [ 0, π ] .
Uma vez que a derivada da função cosseno, y = − sin x, não se anula no intervalo aberto
] 0, π [, resulta do teorema da derivação da função inversa que a função arccos é diferenciável no
intervalo aberto ] − 1, 1 [, tendo-se
d 1
(arccos y) = − p , ∀y ∈ ] − 1, 1 [.
dy 1 − y2
Cálculo Diferencial em R Ana Cristina Barroso e Ana Rute Domingos
62
Embora não seja injectiva no seu domı́nio, a restrição da função tangente ao intervalo
− π2 , π2 é uma bijecção sobre R. Assim, para cada número real y existe um e um só x ∈ − π2 , π2
tal que tan x = y. A este x damos o nome de arco cuja tangente é y e escrevemos x = arctan y.
A inversa da função
π π
h: − , → R
2 2
x 7→ tan x,
gráfico de h
é a função dada por
π π
−1
h :R → − ,
2 2
y 7→ arctan y
gráfico de h−1
tendo-se
tan(arctan y) = y, ∀y ∈ R
e
π π
arctan(tan x) = x, ∀x ∈ − , .
2 2
Uma vez que a derivada da função tangente, y = sec2 x, não se anula em R, resulta do
teorema da derivação da função inversa que a função arctan é diferenciável em R, tendo-se
d 1
(arctan y) = , ∀y ∈ R.
dy 1 + y2
63
(
x3 + arctan (x − 1) , se x ≥ 1
Exemplo. Considere a função definida em R por f (x) =
log(2 − x) + x, se x < 1.
e
lim f (x) = lim (log(2 − x) + x) = 1
x→1− x→1−
pelo que lim f (x) = f (1). Assim, o cálculo das derivadas laterais de f no ponto x = 1 pode ser
x→1
feito recorrendo ao Teorema 3.8. Tem-se então
Nesta secção vamos estudar dois teoremas importantes envolvendo funções diferenciáveis. Co-
meçamos por recordar as noções de extremo local, de extremo absoluto e de função monótona.
Definição 3.12 Uma função f : D ⊆ R → R tem um máximo local (ou relativo) num ponto
c ∈ D se, e só se, existe δ > 0 tal que f (c) ≥ f (x), ∀x ∈ Vδ (c) ∩ D. f tem um mı́nimo local
(ou relativo) num ponto c ∈ D se, e só se, existe δ > 0 tal que f (c) ≤ f (x), ∀x ∈ Vδ (c) ∩ D.
A estes valores f (c) damos o nome de extremos locais (ou relativos) de f e dizemos que
c é um ponto de extremo local de f (maximizante, no caso em que f (c) é máximo, e
minimizante, no caso em que f (c) é mı́nimo).
64
Para a função cujo gráfico está representado na figura anterior, f (a), f (c) e f (e) são mı́nimos
locais de f , f (b) e f (d) são máximos locais.
Definição 3.13 Seja f : D ⊆ R → R. Diz-se que f atinge um máximo (absoluto) em D se
existe x0 ∈ D tal que f (x) ≤ f (x0 ), ∀x ∈ D. Diz-se que f atinge um mı́nimo (absoluto) em
D se existe x0 ∈ D tal que f (x) ≥ f (x0 ), ∀x ∈ D.
Note-se que, se f atinge um máximo e um mı́nimo em D então f é limitada, mas f pode ser
limitada e não ter máximo ou mı́nimo em D. Vamos ver um teorema que estabelece condições
suficientes para que possamos garantir a existência de máximo e de mı́nimo de uma função.
Começamos por enunciar resultados auxiliares que permitem provar esse teorema.
Proposição 3.14 (Caracterização de compactos por sucessões) Um conjunto K ⊂ R é
compacto se, e só se, toda a sucessão em K admite uma subsucessão convergente em K.
Proposição 3.15 Uma função contı́nua transforma conjuntos compactos em conjuntos com-
pactos.
Em particular, se I é um intervalo compacto (fechado e limitado) de R e f : I → R é uma
função contı́nua, então f (I) é um intervalo compacto.
Teorema 3.16 (Teorema de Weierstrass) Se f é contı́nua num intervalo compacto [ a, b ],
então f atinge um máximo e um mı́nimo em [ a, b ].
65
Teorema 3.19 (Teorema de Rolle, 1691) Sejam a, b ∈ R tais que a < b e f uma função
diferenciável no intervalo aberto ]a, b[ e contı́nua no intervalo fechado [a, b]. Se f (a) = f (b),
então existe (pelo menos) um ponto c ∈ ]a, b[ tal que f 0 (c) = 0.
Este resultado diz-nos que, nas condições enunciadas, existe pelo menos um ponto no inter-
valo aberto ]a, b[ onde a recta tangente ao gráfico de f é horizontal.
Teorema 3.21 (Teorema do Valor Médio de Lagrange, 1797) Sejam a, b ∈ R tais que
a < b e f uma função diferenciável no intervalo aberto ]a, b[ e contı́nua no intervalo fechado
f (b) − f (a)
[a, b]. Então existe (pelo menos) um ponto c ∈ ]a, b[ tal que f 0 (c) = .
b−a
66
Geometricamente, este teorema diz-nos que, nas condições enunciadas, existe pelo menos um
ponto no intervalo aberto ]a, b[ onde a recta tangente ao gráfico de f é paralela à recta que passa
nos pontos A = (a, f (a)) e B = (b, f (b)).
67
De (13) e de (14) vem então
1 arctan b − arctan a 1 b−a b−a
< < ⇔ < arctan b − arctan a < ,
1 + b2 b−a 1 + a2 1 + b2 1 + a2
pois b − a > 0.
c) Seja f (t) = t − log(1 + t) definida em ] − 1, +∞[. Uma vez que f é diferenciável no seu
1
domı́nio, tendo-se f 0 (t) = 1 − , ∀t > −1, f está nas condições do Teorema de Lagrange em
1+t
qualquer intervalo compacto contido em ] − 1, +∞[. Podemos assim aplicar o referido teorema
a f no intervalo [0, x], com x > 0. Concluimos que existe c ∈ ]0, x[ tal que
f (x) − f (0) 1 x − log(1 + x) c x − log(1 + x)
f 0 (c) = ⇔1− = ⇔ = . (15)
x−0 1+c x 1+c x
Ora 0 < c < x pelo que
c
0< < c < x. (16)
1+c
Por (15) e (16) obtemos
x − log(1 + x)
0< < x ⇒ 0 < x − log(1 + x) < x2 ,
x
dado que x > 0.
Nesta secção estudaremos um resultado muito útil que nos permite levantar indeterminações do
tipo 00 ou ∞
∞ . Começamos com uma generalização do Teorema do Valor Médio de Lagrange.
Teorema 3.22 (Teorema do Valor Médio de Cauchy, 1821) Sejam a, b ∈ R tais que
a < b e sejam f e g funções contı́nuas em [a, b], diferenciáveis em ]a, b[ e tais que
g 0 (x) 6= 0, ∀x ∈ ]a, b[. Então existe (pelo menos) um ponto c ∈ ]a, b[ tal que
f 0 (c) f (b) − f (a)
= .
g 0 (c) g(b) − g(a)
f (x) f 0 (c)
lim = 0 .
x→c g(x) g (c)
f (c + h) − f (c)
O resultado anterior estende-se aos casos em que f 0 (c) = lim = ±∞ e
h→0 h
g(c + h) − g(c)
g 0 (c) ∈ R, ou f 0 (c) ∈ R e g 0 (c) = lim = ±∞. Se g 0 (c) = 0 e f 0 (c) 6= 0 podemos
h→0 h
f (x)
concluir que lim
= +∞.
x→c g(x)
68
cos π4 + x
Exemplo. Calcular o limite limπ .
x→ 4 cos(2x)
= cos π4 + x e g(x) = cos(2x). Note-se que f e g são diferenciáveis em R, que
Pomos f (x)
f 4 = g 4 = cos π2 = 0 e que existe uma vizinhança de π4 onde g não se
π π
anula, excepto no
π 0 0 π π
próprio ponto 4 . Mais ainda, g (x) = −2 sin(2x), donde g 4 = −2 sin 2 = −2 6= 0. Assim,
pela proposição anterior temos
cos π4 + x f0 π
− sin π2
f (x) 4 1
limπ = limπ = 0 π = = .
x→ 4 cos(2x) x→ 4 g(x) g 4 −2 2
f 0 (x) f (x)
Se existe, em R, o limite lim , então também existe lim e tem-se
x→c g 0 (x) x→c g(x)
f (x) f 0 (x)
lim = lim 0 .
x→c g(x) x→c g (x)
π
Exemplos. 1) Calcular o limite limπ sec(2x) cos +x .
x→ 4 4
Atendendo à definição da função x 7→ sec x temos
cos π4 + x
π
limπ sec(2x) cos + x = limπ .
x→ 4 4 x→ 4 cos(2x)
Uma vez que estamos na presença de uma indeterminação do tipo 00 aplicamos a regra de Cauchy:
derivando o numerador e o denominador do quociente acima, obtemos
− sin π4 + x
1
limπ = .
x→ 4 −2 sin(2x) 2
cos π4 + x − sin π4 + x
1
limπ = limπ = .
x→ 4 cos(2x) x→ 4 −2 sin(2x) 2
√
3 + x3 log x
2) Calcular o limite lim .
x→1 sin(πx)
Podemos novamente aplicar a regra de Cauchy dado que temos uma indeterminação do tipo 00 .
√
Uma vez que 3 + x3 ∼ 2, (x → 1), obtemos
√ 2
3 + x3 log x 2 log x x 2
lim = lim = lim =− .
x→1 sin(πx) x→1 sin(πx) x→1 π cos(πx) π
Mais uma vez a existência do último limite garante a existência do primeiro e a igualdade entre
ambos.
69
√ (
cos x , se x ≥ 0
3) Considere a função definida em R por f (x) = −2x
a + be , se x < 0.
Determine os valores de a e de b de modo a que f seja diferenciável no ponto x = 0.
Começamos por estudar a continuidade de f no ponto x = 0. Tem-se
√
lim f (x) = lim cos x = 1 = f (0)
x→0+ x→0+
e
lim f (x) = lim a + be−2x = a + b.
x→0− x→0−
Assim, f é contı́nua em x = 0 se, e só se, a + b = 1. Portanto, se a + b 6= 1 f não é contı́nua em
x = 0, pelo que também não é diferenciável nesse ponto.
Supondo que se tem a + b = 1, e recorrendo ao Teorema 3.8, temos f−0 (0) = h0 (0), onde
h(x) = a + be−2x . Dado que h0 (x) = −2be−2x vem f−0 (0) = h0 (0) = −2b.
√ 1 √
Por outro lado, pondo g(x) = cos ( x) tem-se g 0 (x) = − √ sin x , ∀x > 0. Uma vez que
2 x
a expressão anterior não está definida em x = 0, para calcularmos f+0 (0) recorremos à definição:
√
0 f (x) − f (0) cos( x) − 1
f+ (0) = lim = lim
x→0+ x x→0+ x
√ 1 √ 1 1
= lim − sin( x) √ = lim − x √ = − ,
x→0 + 2 x x→0 + 2 x 2
√ √
onde fizémos uso da regra de Cauchy e do facto de sin( x) ∼ x (x → 0+ ). Portanto f é
diferenciável em x = 0 se, e só se,
1 3
a+b=1 a=1− =
(
a+b=1 4 4
⇔ 1 ⇔ 1
f−0 (0) = f+0 (0) −2b = − b= .
2 4
f (x) f 0 (x)
lim = lim 0 .
x→c g(x) x→c g (x)
70
∞
Temos agora uma indeterminação do tipo ∞ pelo que, derivando o numerador e o denomi-
nador do quociente anterior, vem
1
log(log x) x log x
lim = lim = lim (− log x) = 0.
x→1+ 1 x→1+ −1 1 x→1+
2 ·
log x log x x
Assim, pela continuidade da função exponencial, para calcularmos o limite inicial basta
calcular lim sin(2x) log(sin x), que é uma indeterminação do tipo 0·∞. Tem-se então, aplicando
x→π −
a regra de Cauchy e usando as relações cos x ∼ −1, (x → π) e cos(2x) ∼ 1, (x → π),
log(sin x)
lim sin(2x) log(sin x) = lim
x→π − x→π − 1
sin(2x)
cos x
sin x cos x sin2 (2x)
= lim = lim
x→π − −2 cos(2x) x→π − −2 sin x cos(2x)
2
sin (2x)
(2 sin x cos x)2
= lim = lim 2 sin x cos2 x = 0.
x→π − 2 sin x x→π −
Portanto,
lim (sin x)sin(2x) = e0 = 1.
x→π −
Nos dois exemplos anteriores, a existência dos últimos limites calculados, obtidos por apli-
cação da regra de Cauchy, garantem a existência dos limites iniciais e as igualdades indicadas.
Nesta secção vamos relacionar a monotonia de uma função diferenciável f com o comporta-
mento da sua primeira derivada. Começamos por notar que se f é crescente (respectivamente,
decrescente) e diferenciável no conjunto aberto D, então f 0 (x) ≥ 0 (respectivamente, f 0 (x) ≤ 0),
∀x ∈ D, uma vez que
f (y) − f (x)
≥0
y−x
f (y) − f (x)
(respectivamente, ≤ 0). Observe-se, no entanto, que se f é estritamente monótona
y−x
e diferenciável a sua derivada não é necessáriamente positiva (ou negativa). Por exemplo, a
função f (x) = x3 é estritamente crescente mas f 0 (x) = 3x2 pelo que f 0 (0) = 0.
O teorema que se segue é uma consequência imediata do Teorema do Valor Médio de La-
grange.
71
Teorema 3.26 Seja f uma função contı́nua num intervalo I e diferenciável em int I.
ii) Se f 0 (x) ≤ 0, ∀x ∈ int I (respectivamente, f 0 (x) < 0, ∀x ∈ int I), então f é decrescente
(respectivamente, estritamente decrescente) em I.
É de salientar que o resultado anterior é válido apenas em intervalos. Por exemplo, para a
1 1
função f (x) = , definida em D = R \ {0}, tem-se f 0 (x) = − 2 < 0, ∀x ∈ D. No entanto f não
x x
é (estritamente) decrescente em D pois, por exemplo, −1 < 1 e f (−1) < f (1), mas podemos
afirmar que f é estritamente decrescente em cada um dos intervalos ] − ∞, 0[ e ]0, +∞[.
iii) f 0 (x) não muda de sinal em ]c − δ, c[ ∪ ]c, c + δ[, então c não é um ponto de extremo local
de f .
Como é claro a partir da demonstração, o resultado anterior estende-se aos casos em que
f 0 (c) não existe, desde que f seja diferenciável numa vizinhança Vδ (c) \ {c} e seja contı́nua em
c. A hipótese de continuidade de f em c é fundamental, como mostra o seguinte exemplo.
72
(
2x2 + 1, se 0 ≤ x < 1
Consideremos a função f (x) =
2(x − 2)2 , se 1 ≤ x ≤ 2.
(
0 4x, se 0 ≤ x < 1
f é descontı́nua em x = 1, f (x) = , logo f 0 (x) > 0, se 0 < x < 1, e
4(x − 2), se 1 < x ≤ 2
f 0 (x) < 0, se 1 < x < 2, no entanto f não atinge um máximo local em x = 1.
Por vezes pode ser difı́cil determinar o sinal de f 0 à esquerda e à direita de um ponto crı́tico
c. Nesses casos, como veremos mais tarde, há outro modo de determinar se c é ou não um ponto
de extremo de f que envolve estudar o sinal de uma derivada de ordem superior à primeira de
f no próprio ponto c, veja-se o Teorema 3.43 e o Corolário 3.44.
No caso de uma função f estar definida num intervalo fechado ou semi-aberto (ou numa união
de intervalos deste tipo), os extremos locais de f podem ser atingidos em pontos da fronteira
do seu domı́nio. Uma vez que não são pontos interiores, estes não são pontos crı́ticos de f .
Observe-se que se f atinge um extremo local num ponto fronteiro do seu domı́nio a derivada
lateral correspondente não tem que se anular. Para estes casos tem-se o resultado que se segue.
Teorema 3.28 Seja f : [a, b] → R.
i) Se f+0 (a) < 0 (respectivamente, f+0 (a) > 0) ou se lim f (x) = f (a) e f 0 (x) < 0,
x→a+
∀x ∈ ] a, a + δ [ (respectivamente, f 0 (x) > 0, ∀x ∈ ] a, a + δ [), então f atinge um máximo
(respectivamente, mı́nimo) local em a.
ii) Se f−0 (b) < 0 (respectivamente, f−0 (b) > 0) ou se lim f (x) = f (b) e f 0 (x) < 0,
x→b−
∀x ∈ ] b − δ, b [ (respectivamente, f 0 (x)
> 0, ∀x ∈ ] b − δ, b [), então f atinge um mı́nimo
(respectivamente, máximo) local em b.
O facto de uma função f atingir um extremo local num ponto c ∈ D depende do com-
portamento de f numa vizinhança de c. No caso dos extremos absolutos temos que ter em
consideração o comportamento de f em todo o seu domı́nio. Nem todas as funções têm extre-
mos absolutos, no entanto, o Teorema de Weierstrass garante-nos que toda a função contı́nua
definida num intervalo compacto atinge nesse intervalo um máximo e um mı́nimo absolutos (cf.
Teorema 3.16). Note-se, por fim, que os extremos absolutos de f , quando existem, são atingidos
em pontos crı́ticos de f , ou em pontos onde f 0 não existe ou, ainda, em pontos da fronteira do
domı́nio.
Exemplo. Determinar os extremos da função f (x) = x5 − 5x + 7, definida no intervalo [0, +∞[.
Comecemos por notar que f é diferenciável em [0, +∞[, já que se trata de uma função
polinomial, e que
f 0 (x) = 5x4 − 5 = 5(x2 − 1)(x2 + 1).
Os pontos crı́ticos de f são as soluções da equação f 0 (x) = 0 ⇔ x4 = 1 que pertencem ao seu
domı́nio; neste caso, apenas x = 1 é ponto crı́tico. Estudando o sinal de f 0 observamos que
f 0 (x) > 0, se x > 1, e que f 0 (x) < 0, se 0 ≤ x < 1. Os Teoremas 3.27 e 3.28 permitem concluir
que f atinge um máximo local em x = 0 e um mı́nimo local (que é absoluto) em x = 1, sendo
f (0) = −5 e f (1) = 3. Por outro lado, limx→+∞ f (x) = +∞ pelo que f (0) não é máximo
absoluto de f .
Cálculo Diferencial em R Ana Cristina Barroso e Ana Rute Domingos
73
O estudo dos extremos de uma função tem inúmeras aplicações práticas em problemas de
optimização onde se pretende maximizar ou minimizar funções (diferenciáveis). Vejamos um
exemplo.
Exemplo. Pretende-se construir uma caixa com a forma de um paralelepı́pedo de base quadrada
e com volume V = 1250 dm3 . O material para fazer a base custa 35 cêntimos por dm2 , para o
topo da caixa custa 15 cêntimos por dm2 e o material para os lados da caixa tem o preço de 20
cêntimos por dm2 . Determinar as dimensões da caixa que minimizam o seu custo.
Designando por x a medida do lado da base quadrada da caixa e por y a da sua altura, o
1250
volume V é dado por V = x2 y = 1250, donde y = . Podemos assim exprimir o custo da
x2
base, do topo e dos lados da caixa, em função da variável x, respectivamente por 35x2 , 15x2 e
80 × 1250 105
4 × 20 × xy = = . O custo total c(x) a ser minimizado é, pois,
x x
105 105
c(x) = 35x2 + 15x2 + = 50x2 + , x > 0.
x x
105 102 (x3 − 103 )
Como c0 (x) = 100x − 2 = , esta função anula-se apenas em x = 10, tendo-
0
x 0
x2
-se c (x) < 0, se x < 10, e c (x) > 0, se x > 10, donde c atinge um mı́nimo absoluto em
x = 10. Assim, as dimensões da caixa que minimizam o seu custo são x = 10 dm = 1 m,
1250 105
y= = 12, 5 dm = 1, 25 m, sendo o custo mı́nimo dado por c(10) = 50 × 102 + cêntimos,
100 10
ou seja 150 euros.
74
Definição 3.30 Seja f : D ⊆ R → R uma função contı́nua em c ∈ int D. O ponto c diz-se um
ponto de inflexão se, e só se, existe δ > 0 tal que o gráfico de f tem a concavidade virada
para cima em ]c − δ, c[ e virada para baixo em ]c, c + δ[ ou vice-versa.
Se a função f for duas vezes diferenciável podemos determinar a concavidade do gráfico de
f estudando o sinal da sua segunda derivada.
Teorema 3.31 Seja f uma função duas vezes diferenciável num intervalo aberto I.
i) Se f 00 (x) > 0, ∀x ∈ I, então f 0 é estritamente crescente em I e a concavidade do gráfico
de f é virada para cima em I.
ii) Se f 00 (x) < 0, ∀x ∈ I, então f 0 é estritamente decrescente em I e a concavidade do gráfico
de f é virada para baixo em I.
iii) Se f 0 muda o tipo de monotonia no ponto c, então f tem um ponto de inflexão em c.
Observação. Dizer que uma função muda o tipo de monotonia num ponto c significa que numa
vizinhança de c, o tipo de monotonia à esquerda do ponto é diferente da monotonia à direita,
sendo decrescente e passando a crescente ou vice-versa.
O resultado que se segue permite-nos identificar possı́veis pontos de inflexão.
Teorema 3.32 Se o ponto c ∈ int D é um ponto de inflexão de f : D ⊆ R → R, então f 00 (c) = 0
ou f 00 (c) não existe.
Note-se que o recı́proco do teorema anterior é falso. Por exemplo, para f (x) = x4 tem-se
f 00 (0)
= 0, no entanto x = 0 não é ponto de inflexão uma vez que o gráfico de f tem sempre
a concavidade virada para cima. Neste caso, f 0 é uma função estritamente crescente, pelo que
não há alteração do seu tipo de monotonia em x = 0.
5
Exemplo. Determinar as concavidades apresentadas pelo gráfico da função f (x) = 3x 3 − 5x.
2
A função f é contı́nua no seu domı́nio que é R. Derivando duas vezes obtemos f 0 (x) = 5x 3 −5,
10 − 1 10
para x ∈ R, e f 00 (x) = x 3 = √ , se x 6= 0. Concluimos que f 00 (x) < 0, se x < 0, e
3 33x
f 00 (x) < 0, se x < 0, pelo que o gráfico de f tem a concavidade virada para baixo no intervalo
] − ∞, 0[ e tem a concavidade virada para cima no intervalo ]0, +∞[. Uma vez que f é contı́nua
em x = 0, este ponto é um ponto de inflexão.
75
Definição 3.34 Seja f : D ⊆ R → R tal que o domı́nio D de f contém um intervalo da forma
[M, +∞[ (respectivamente, ] − ∞, M ]), para um certo M ∈ R. Dizemos que a recta y = mx + b
é uma assı́ntota ao gráfico de f em +∞ (respectivamente, em −∞) se, e só se,
Nas condições da definição anterior é fácil de ver que a recta y = mx + b é uma assı́ntota ao
gráfico de f em +∞ se, e só se,
f (x)
m = lim e b = lim (f (x) − mx),
x→+∞ x x→+∞
76
3.9 Fórmula de Taylor
A classe de funções mais simples que conhecemos é a das funções polinomiais. De facto, é muito
simples adicionar e multiplicar polinómios e estes também são muito fáceis de derivar. Para
além disso, qualquer uma destas operações produz novamente um polinómio.
Veremos agora como aproximar uma dada função por polinómios e qual o erro que se comete
quando se faz essa aproximação (em geral, o erro diminui à medida que se aumenta o grau dos
polinómios usados).
Antes de prosseguirmos vamos apresentar uma notação, dita de Landau, que será particu-
larmente útil para o que se segue.
Observação. Na definição anterior, se g não se anula em Vδ (c) \ {c}, para algum δ > 0, então
f (x)
f (x) = o(g(x)) (x → c) equivale a lim = 0.
x→c g(x)
x2
Exemplos. Tem-se x2 = o(x) (x → 0), pois lim = 0 e x7 = o(ex ) (x → +∞), pois
x→0 x
x7
lim = 0.
x→+∞ ex
Consideremos uma função f , diferenciável num intervalo aberto contendo o ponto c, e seja
P1 (x) o polinómio cujo gráfico é a recta tangente ao gráfico de f no ponto c, ou seja,
Repare-se que P1 tem grau menor ou igual a 1 (se f 0 (c) = 0 e f (c) 6= 0, P1 é constante e não
nulo, logo tem grau 0) e satisfaz as condições
ou seja a função f pode ser aproximada pelo polinómio P1 sendo o erro cometido nesta apro-
ximação um infinitésimo de ordem superior a x − c numa vizinhança do ponto c. Vamos agora
generalizar esta ideia, construindo um polinómio de grau menor ou igual a n, Pn (x), que seja
uma melhor aproximação de f próximo do ponto c, isto é, de forma a que o erro cometido nessa
aproximação seja o((x − c)n ), e de tal modo que Pn e f , bem como as suas derivadas até à ordem
n tenham o mesmo valor em c.
77
Definição 3.37 Seja f : D ⊆ R → R uma função com derivadas até à ordem n num ponto
c ∈ D ∩ D0 . Ao polinómio
n
f (k) (c) f 00 (c) f (n) (c)
(x − c)k = f (c) + f 0 (c)(x − c) +
X
Pn (x) = (x − c)2 + . . . + (x − c)n
k=0
k! 2! n!
onde
n
f (k) (c) f 00 (c) f (n) (c)
(x − c)k = f (c) + f 0 (c)(x − c) +
X
Pn (x) = (x − c)2 + . . . + (x − c)n
k=0
k! 2! n!
À função Rn chamamos resto de ordem n e o erro que se comete, quando se aproxima f (x)
por Pn (x) (polinómio de Taylor relativo ao ponto c), é dado por
78
Proposição 3.40 (Unicidade do Desenvolvimento de Taylor) Sejam I um intervalo de
R e f : I → R uma função n vezes diferenciável no ponto c ∈ I. Se existem constantes
b0 , b1 , . . . , bn ∈ R tais que
f (x) = b0 + b1 (x − c) + . . . + bn (x − c)n + R
e n (x),
f (n+1) (ξ)
Rn (x) = (x − c)n+1 ,
(n + 1)!
Exemplo 3.42 Registamos aqui alguns desenvolvimentos de MacLaurin que nos serão úteis no
que se segue:
x2 xn
i) ex = 1 + x + + ... + + o(xn ), (x → 0), ∀x ∈ R;
2! n!
x3 x5 x2n+1
ii) sin x = x − + + . . . + (−1)n + o(x2n+1 ), (x → 0), ∀x ∈ R;
3! 5! (2n + 1)!
x2 x4 x2n
iii) cos x = 1 − + + . . . + (−1)n + o(x2n ), (x → 0), ∀x ∈ R;
2! 4! (2n)!
x2 xn
iv) log(1 + x) = x − + . . . + (−1)n−1 + o(xn ), (x → 0), ∀x > −1.
2 n
As figuras que se seguem representam os gráficos das funções x 7→ ex e x 7→ sin x, bem como
alguns dos seus polinómios de Taylor em torno do ponto c = 0.
79
Exemplo. Seja f (x) = sin(log x). Determinemos o polinómio de Taylor de ordem 1, de f ,
em torno do ponto x0 = 1, e mostremos que esse polinómio fornece um valor aproximado de
f (1, 05), com erro inferior a 0,0025.
Tem-se f (1) = sin(log 1) = 0 e, pela regra de derivação da função composta,
1
f 0 (x) = cos(log x) , f 0 (1) = 1.
x
Assim, o polinómio pedido é
P1 (x) = 0 + 1 · (x − 1) = x − 1,
sendo P1 (1, 05) = 1, 05−1 = 0, 05. Pela fórmula de Taylor sabemos que |f (x)−P1 (x)| = |R1 (x)|.
f 00 (c) 2
Pondo x = 1, 05, vamos majorar |R1 (1, 05)| = (1, 05 − 1) para algum c verificando
2!
1 < c < 1, 05. Uma vez que, pelas regras de derivação do produto e da função composta, se tem
1 1
f 00 (x) = − sin(log x) 2
− 2 cos(log x),
x x
resulta que
−1
1 2
|R1 (1, 05)| = 2 sin(log c) + cos(log c) (0, 05)
c 2
1
< 0, 0025 |sin(log c) + cos(log c)|
2
1
≤ 0, 0025 |sin(log c)| + |cos(log c)| ≤ 0, 0025,
2
1
onde usámos o facto de ser c > 1, donde c2
< 1. Podemos então concluir que
1) Atendendo a que log(1 + 2x3 ) ∼ 2x3 , (x → 0), e usando o desenvolvimento ii) do Exemplo
3.42, temos
80
1 − cos(2x)
2) Usando a identidade sin2 x = , a relação sin2 x ∼ x2 , (x → 0), e ainda o
2
desenvolvimento iii) do Exemplo 3.42, vem sucessivamente
1 1 x2 − sin2 x
lim − = lim
x→0 sin2 x x2 x→0 x2 sin2 x
1 − cos(2x)
x2 − 2x2 − 1 + cos(2x)
= lim 2 = lim
x→0 x4 x→0 2x4
(2x) 4
2x2 − 1 + 1 − 2x2 + + o(x4 ) 24 1
= lim 4! = = .
x→0 2x 4 2 · 4! 3
3) Pelos casos i), ii) e iii) do Exemplo 3.42 substituindo, respectivamente, x por x3 , x4 e x2 ,
tem-se
3
ex = 1 + x3 + o(x3 ), (x → 0);
sin(x4 ) = x4 + o(x4 ), (x → 0);
x4
cos(x2 ) = 1 − + o(x4 ), (x → 0),
2
donde
x4 ex + 1 − cos(x2 )
lim 3
x→0 sin(x4 ) − 2x(ex − 1)
x4 1
x4 + o(x4 ) + 1 − 1 + 1+
= lim 4 2 = 2 = −3,
x→0 x + o(x4 ) − 2x(x3 + o(x3 )) 1−2 2
uma vez que −2x · o(x3 ) = o(x4 ).
Vejamos agora outra aplicação da fórmula de Taylor que se prende com a caracterização dos
pontos crı́ticos de uma função diferenciável.
Como vimos atrás, se uma função real f , definida e diferenciável num intervalo I, atinge um
extremo local num ponto c ∈ intI, então f 0 (c) = 0. No entanto, como já observámos, o recı́proco
é falso. Interessa, assim, ter um critério que permita determinar se num certo ponto c ∈ intI
onde a derivada de f se anula, é atingido um extremo local. Tem-se então o seguinte resultado
Teorema 3.43 Sejam n ∈ N, n ≥ 2, I um intervalo aberto contendo o ponto c e f : I → R uma
função com derivadas contı́nuas até à ordem n em I e tal que f 0 (c) = 0. Suponhamos ainda que
f (n) (c) é a primeira das sucessivas derivadas de f que não se anula em c. Então:
i) se n é ı́mpar, f não tem extremo local em c;
ii) se n é par e f (n) (c) > 0, então f tem um mı́nimo local em c;
iii) se n é par e f (n) (c) < 0, então f tem um máximo local em c.
81
Como a primeira das sucessivas derivadas de f que não se anula no ponto x = 0 é a de
ordem 4, e 4 é um número par, concluimos, por aplicação do teorema anterior, que f atinge um
extremo local em x = 0. Dado que f (4) (0) < 0, f (0) = 2 é um máximo local.
Chama-se a atenção para o facto do corolário anterior não permitir tirar qualquer conclusão
acerca da natureza do ponto crı́tico c, no caso em que f 00 (c) = 0. Com efeito, é fácil ver que
x = 0 é ponto crı́tico de ambas as funções f (x) = x3 e g(x) = x4 e que se tem f 00 (0) = g 00 (0) = 0.
Dado que g(x) ≥ g(0) = 0, g(0) é mı́nimo absoluto de g, no entanto x = 0 não é ponto de
extremo local de f .
3 x3 x2
Exemplo. Verificar que x = 1 é ponto crı́tico da função p(x) = x5 + x4 − −5 −x+1 e
5 3 2
determinar se é ponto de extremo local de p.
p é uma função polinomial, logo é de classe C ∞ (R). A sua primeira derivada é dada por
p0 (x)= 3x4 + 4x3 − x2 − 5x − 1, donde p0 (1) = 0 e, portanto, x = 1 é ponto crı́tico de p. Uma
vez que não conhecemos as outras raı́zes do polinómio p0 não é fácil estudar o sinal de p0 numa
vizinhança de x = 1. Assim, em alternativa ao teste da primeira derivada, vamos usar o teste
da segunda derivada para determinar se x = 1 é ponto de extremo local de p. Derivando mais
uma vez obtemos p00 (x) = 12x3 + 12x2 − 2x − 5. Como p00 (1) = 17 > 0 concluimos que p atinge
um mı́nimo local em x = 1.
82
Tabela de Derivadas
No que se segue, u representa uma função da variável x.
f (x) f 0 (x)
eu(x) u0 (x)eu(x)
u0 (x)
log(|u(x)|)
u(x)
u0 (x)
tan(u(x)) u0 (x) sec2 (u(x)) =
cos2 (u(x))
−u0 (x)
cotan(u(x)) −u0 (x)cosec2 (u(x)) =
sin2 (u(x))
u0 (x)
arcsin(u(x)) p
1 − u2 (x)
u0 (x)
arccos(u(x)) −p
1 − u2 (x)
u0 (x)
arctan(u(x))
1 + u2 (x)
83
84