Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
Socioeducativa em Contextos
Sociais Complexos
RELATÓRIO FINAL
PROJETO
DATA
julho de 2013
EQUIPA
João Sebastião (coordenador)
Joana Campos
Sara Merlini
Mafalda Chambino
1
Índice
Introdução ...................................................................................................................... 8
I. Violência, controlo disciplinar e estratégias de intervenção .................................... 10
1. A Violência na escola como problema social .................................................................. 10
1.1. transformações no sistema educativo e violência na escola ................................ 10
1.2. Representações sobre a violência ........................................................................ 12
2. A violência como problema científico............................................................................. 13
3. Desigualdades escolares e controlo disciplinar ............................................................... 18
3.1. Distinções territoriais e desigualdades escolares ...................................................... 18
3.2. controlo disciplinar e clima de escola....................................................................... 19
4. organização escolar e as políticas de regulação da violência na escola ......................... 21
4.1. As lideranças escolares e as orientações face à violência na escola ......................... 21
4.2. A evolução e centralidade das "políticas de regulação dos comportamentos" ......... 22
II. Políticas públicas ..................................................................................................... 24
1. As políticas de inclusão e igualdade: evolução, orientações e instrumentos ................... 24
2. As políticas de segurança escolar: contextos, conceitos e instrumentos de intervenção . 26
III. Territórios .............................................................................................................. 30
1. A perspetiva dos agentes locais ....................................................................................... 30
1.1. Caracterização dos agentes locais inquiridos ...................................................... 31
1.2. Relações entre os agentes locais .......................................................................... 33
1.3. Forças e fraquezas: colaboração, trocas e afinidades ......................................... 38
1.4. Prevenir e Intervir: necessidades e propostas de atuação ................................... 42
1.5. Dos instrumentos políticos às interações – considerações finais do diagnóstico
exploratório ..................................................................................................................... 43
2. A perspetiva dos representantes das instituições da rede socioeducativa local ............... 44
2.1. Intervenção dos das instituições da rede socioeducativa local – relações entre
parceiros .......................................................................................................................... 46
2.2. Estratégias de intervenção e colaboração ................................................................. 47
2.3. Posição face à escola ................................................................................................ 50
2.4. Principais dificuldades e problemas identificados.................................................... 51
IV. Escola ..................................................................................................................... 55
1. Os documentos escolares ................................................................................................. 55
1.1 Orientações da escola ................................................................................................ 55
1.2 Estrutura e Coordenação Organizacional .................................................................. 56
1.3 Estratégias e Mecanismos de prevenção ................................................................... 62
2
1.4 Regulação dos comportamentos e atitudes ................................................................ 63
1.5 Parceiros e parcerias das escolas ............................................................................... 69
2. A perspetiva dos eementos das direções escolares .......................................................... 71
2.1 Alunos violentos ........................................................................................................ 71
2.2 Orientações para a Regulação e Intervenção ............................................................. 73
2.3 Relações da escola com o exterior: famílias, entidades locais e forças da segurança 77
3. A perspetiva dos Professores ........................................................................................... 81
3.1. Percurso metodológico e amostragem ...................................................................... 81
3.2. Caracterização da população inquirida ..................................................................... 82
3.3. Integração organizacional dos professores ............................................................... 84
3.4. Atividade pedagógica e práticas disciplinares .......................................................... 93
3.5. Representações sobre a escola e a violência ........................................................... 100
3.6. representações, práticas e participação docente...................................................... 103
4. A perspetiva dos Alunos................................................................................................ 112
4.1. Violência na escola: a perspetiva dos alunos (inquérito)........................................ 112
4.2. Entrevistas a alunos reincidentes ............................................................................ 146
V. Conclusões ............................................................................................................ 163
VI. Metodologia Integrada de Intervenção ................................................................ 167
VII. Referências Bibliográficas ................................................................................. 170
Anexo A atividades do projeto .......................................................................................i
Anexo B Guiões de Inquirição ...................................................................................... ii
1. Questionário aos Agentes Sociais ..................................................................................... ii
2. Guião de entrevista para os Grupos Focais ...................................................................... iv
3. Guião de entrevista às Direções Escolares ........................................................................ v
4. Questionário aos Professores ............................................................................................ vi
5. Inquérito aos Alunos ....................................................................................................... xii
6. Guião de entrevista a alunos com comportamentos reincidentes ................................. xviii
Anexo C Lista de entidades locais inquiridas ............................................................ xxx
Anexo D Ficha de Produção Científica ...................................................................xxxi
Publicações ....................................................................................................................... xxxi
Comunicações e participação em Congressos e outros encontros científicos .................. xxxi
Formação ......................................................................................................................... xxxii
Disseminação de resultados ............................................................................................. xxxii
Anexo E Manual de Formação .............................................................................. xxxiii
3
Índice de Quadros
Quadro 1 - Relação entre agressão e intencionalidade ................................................ 15
Quadro 3 - Abordagens de regulação da violência em meio escolar ........................... 29
Quadro 4 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios
socioeducativos em estudo (seleção) ........................................................................... 31
Quadro 5 - Objetivos de atuação segundo o tipo institucional .................................... 32
Quadro 6 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios
socioeducativos em estudo (presenças) ....................................................................... 46
Quadro 7 - Estruturas de Gestão de Conflitos nas escolas – Gabinetes de Intervenção
...................................................................................................................................... 57
Quadro 8 - Medidas disciplinares corretivas - Regulamentação da tutela e das direções
das escolas .................................................................................................................... 59
Quadro 9 - Medidas disciplinares sancionatórias - Regulamentação da tutela e das
direções das escolas ..................................................................................................... 59
Quadro 10 - Medidas preventivas – Regulamentação das direções das escolas .......... 60
Quadro 11 - Ocorrências, procedimentos e medidas disciplinares registadas no
Gabinete Gestão de Conflitos da Escola E2 ................................................................ 64
Quadro 12 - Ocorrências por período e ano escolar no ano letivo de 2011/2012
registadas no Gabinete de Gestão de Conflitos da Escola E2 ...................................... 65
Quadro 13 - Ocorrências e medidas no 3º Período do ano letivo de 2011/2012
registadas pelo Gabinete de Intervenção Disciplinar da Escola E1 ............................ 65
Quadro 14 - Ocorrências por turma e ano escolar no 3º período do ano letivo de
2011/2012registadas pelo Gabinete Intervenção Disciplinar da Escola E1 ................. 66
Quadro 15 - Direitos dos alunos definidos por escola ................................................. 68
Quadro 16 - Deveres dos alunos definidos por escola ................................................. 68
Quadro 17 - Parceiros identificados nos documentos orientadores das escolas .......... 71
Quadro 18 - Responsáveis pela intervenção, por local das ocorrências e gravidade, por
escola............................................................................................................................ 75
Quadro 19 - Orientações para a gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros
...................................................................................................................................... 76
Quadro 20 - Representações dos dirigentes sobre a Tutela ......................................... 79
Quadro 21 - Guião do Inquérito por Questionários aos Professores ........................... 81
Quadro 22 - Universo e amostra do inquérito por questionário aos docentes ............. 82
Quadro 23 - Sexo e idade dos docentes inquiridos (%) ............................................... 83
Quadro 24 - Antiguidade dos docentes inquiridos na profissão e na escola (%) ......... 83
Quadro 25 - Situação na escola e cargos ocupados pelos docentes inquiridos (%) ..... 84
Quadro 26 - Perceção individual da cultura profissional e situação na escola dos
docentes inquiridos ...................................................................................................... 85
Quadro 27 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno, por
escola............................................................................................................................ 87
Quadro 28 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre Regulamento Interno, por
funções na escola ......................................................................................................... 87
Quadro 29 - Articulação organizacional em situação de conflito e conhecimento dos
docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno ....................................................... 88
Quadro 30 - Recursos considerados importantes pelos docentes inquiridos ............... 89
Quadro 31 - Índices de Gestão de conflitos por escola ................................................ 91
Quadro 32 – Recurso a elementos da escola para a resolução de situações de conflito
por estabelecimento de ensino dos docentes inquiridos .............................................. 92
4
Quadro 33 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre as práticas
profissionais e o recurso a elementos para intervir ...................................................... 93
Quadro 34 - Recurso a elementos e índices de gestão de conflitos (ANOVA) ........... 93
Quadro 35 - Fatores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos
por escola dos docentes inquiridos .............................................................................. 94
Quadro 36 - Práticas disciplinares dos docentes inquiridos, por escola ...................... 95
Quadro 37 - Índices de práticas disciplinares por escola dos docentes inquiridos ...... 96
Quadro 38 – Efeito dos castigos ou tarefas na melhoria do comportamento dos alunos
por escola dos docentes inquiridos .............................................................................. 97
Quadro 39 - Relação entre a eficácia dos castigos e as práticas disciplinares dos
docentes inquiridos ...................................................................................................... 98
Quadro 40 - Relação entre os critérios importantes na aplicação dos castigos e as
estratégias para lidar com a reincidência dos docentes inquiridos .............................. 99
Quadro 41 - Principal fator considerado pelos docentes inquiridos para que ocorram
situações de conflito na sala de aula, por escola ........................................................ 100
Quadro 42 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre o clima de escola e
a avaliação das situações de violência na escola ....................................................... 102
Quadro 43 - Análise Multivariada das práticas disciplinares renunciantes (MANOVA)
.................................................................................................................................... 103
Quadro 44 - Práticas disciplinares renunciantes: fatores associados ......................... 105
Quadro 45 - Análise univariada das práticas disciplinares pacificadoras .................. 106
Quadro 46 - Práticas disciplinares pacificadoras: fatores associados ........................ 107
Quadro 47 - Análise univariada da gestão reativa dos conflitos ............................... 107
Quadro 48 - Gestão reativa dos conflitos: fatores associados.................................... 108
Quadro 49 - Gestão proactiva dos conflitos: fatores associados................................ 109
Quadro 50 - Relação entre a opinião sobre as práticas profissionais e a opinião sobre o
clima de escola ........................................................................................................... 110
Quadro 51 - Relação entre as causas da violência e os fatores considerados mais
importantes na resolução dos comportamentos violentos .......................................... 111
Quadro 52 - Guião de Inquirição do Questionário aos Alunos .................................. 112
Quadro 53 - Composição da Amostra ........................................................................ 113
Quadro 54 - Autores, Vítimas e Testemunhas: construção dos índices ..................... 115
Quadro 55 - Perfis dos atores nas situações de violência na escola ........................... 115
Quadro 56 - Autores, Vítimas e Testemunhas (leitura em coluna)............................ 116
Quadro 57 - Autores por Sexo (leitura em linha) ...................................................... 116
Quadro 58 - Testemunhas por Idade (leitura em linha) ............................................. 117
Quadro 59 - Testemunhas por Ano Letivo (leitura em linha) .................................... 117
Quadro 60 - Vítimas segundo Benefício de ASE (leitura em linha).......................... 117
Quadro 61 - Categorias de violência: construção dos índices ................................... 118
Quadro 62 - Violência Física: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna) ... 118
Quadro 63 - Violência Relacional: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna)
.................................................................................................................................... 119
Quadro 64 - Violência Física: autores por sexo e por benefício de ASE (leitura em
linha) .......................................................................................................................... 119
Quadro 65 - Violência Física: vítimas por idade (leitura em linha) .......................... 121
Quadro 66 - Violência Física: vítimas por ano letivo (leitura em coluna)................. 121
Quadro 67 - Violência Física: vítimas por benefício de ASE (leitura em linha) ....... 121
Quadro 68 - Violência Física: testemunhas por idade, ano de escolaridade e benefício
de ASE (leitura em coluna) ........................................................................................ 122
Quadro 69 - Violência Relacional: testemunhas por idade (leitura em coluna) ........ 123
5
Quadro 70 - Violência Relacional: testemunhas por ano letivo (leitura em linha) .... 123
Quadro 71 - Legitimidade da violência (leitura em linha) ......................................... 124
Quadro 72 - Legitimidade da violência: construção dos índices ............................... 124
Quadro 73 – Legitimidade da violência: defesa e provocação ................................. 125
Quadro 74 - Autores vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) ..................... 127
Quadro 75 - Vítimas vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) ..................... 127
Quadro 76 - Autores/castigos e recompensas: resultados do teste do Qui-quadrado 128
Quadro 77 - Autores vs. Castigos Familiares (leitura em linha) ................................ 129
Quadro 78 - Autores vs. Recompensas familiares (leitura em linha) ........................ 130
Quadro 79 - Autores/opinião sobre a escola: resultados do teste do Qui-quadrado .. 131
Quadro 80 - Autores vs. Opinião positiva sobre a Escola (leitura em linha) ............. 132
Quadro 81 - Autores vs. Opinião negativa sobre a Escola (leitura em linha) ............ 133
Quadro 82 - Autores/Regulamento Interno: resultados do teste do Qui-quadrado .... 134
Quadro 83 - Razões para não conhecer o Regulamento Interno (leitura em linha) ... 135
Quadro 84 - Opinião sobre o Regulamento Interno (leitura em linha) ...................... 136
Quadro 85 - Autores/Opinião sobre os castigos: resultados do teste do Qui-quadrado
.................................................................................................................................... 137
Quadro 86 - Autores vs. Opinião positiva sobre os castigos aplicados na Escola
(leitura em coluna) ..................................................................................................... 138
Quadro 87 - Autores vs. Opinião negativa sobre os castigos aplicados na Escola
(leitura em coluna) ..................................................................................................... 139
Quadro 88 - Autores/Confiança e Obediência aos adultos da Escola: resultados do
teste do Qui-Quadrado ............................................................................................... 140
Quadro 89 – Autores vs. Confiança nos adultos da Escola (leitura em linha) ........... 141
Quadro 90 - Autores vs. Obediência aos adultos da Escola (leitura em linha) .......... 142
Quadro 91 - Autores/Importância dos estudos: resultados do teste do Qui-quadrado
.................................................................................................................................... 143
Quadro 92 - Autores vs. Importância dos Estudos: visão positiva (leitura em linha) 144
Quadro 93 - Autores vs. Importância dos estudos: visão negativa (leitura em linha)145
Quadro 94 - Tipo de comportamento e dimensão de rede por aluno e por escola ..... 148
Quadro 95 - Tipo de comportamento e dimensão de rede ......................................... 148
6
Índice de Figuras
Figura 1 - A violência enquanto forma de ação contingente ....................................... 16
Figura 2 - Centralidade dos atores em nomeações diretas ........................................... 33
Figura 3 - Intermediação (betweeness) dos atores em nomeações diretas ................... 36
Figura 4 - Simmelian Ties: relações de reciprocidade ................................................. 37
Figura 5 - Qualidade das relações ................................................................................ 39
Figura 6 - Frequência da colaboração .......................................................................... 40
Figura 7 - Frequência das trocas de informação e/ou recursos .................................... 41
Figura 8 - Distribuição etária dos inquiridos ............................................................. 114
Figura 9 - Ano escolar frequentado ........................................................................... 114
Figura 10 - Disposição das variáveis ......................................................................... 120
Figura 11 - Configuração do espaço social ................................................................ 120
7
INTRODUÇÃO
8
condições produtoras de violência e das esferas de intervenção (prevenção e regulação)
acionadas.
9
I. VIOLÊNCIA, CONTROLO DISCIPLINAR E ESTRATÉGIAS DE
INTERVENÇÃO
10
vieram colocar em causa as funções sociais da escola e a realidade da transição para o
mercado de trabalho (particularmente na Europa).1
A sensação de segurança face ao futuro que a escola dava às novas gerações converte-
se num sentimento de incerteza quanto aos benefícios potenciais da educação, uma
procura desencantada de educação (Grácio, 1986), resultante das transformações
radicais no mercado de trabalho (Canário, 2008). Esta transformação teve efeitos
particulares em Portugal uma vez que o "desencanto" ocorreu sobretudo em
indivíduos provenientes de grupos sociais pouco escolarizadas cujas famílias
realizaram esforços significativos para que os seus filhos atingissem níveis elevados
de escolaridade.
1Esta situação é experimentada de forma muito diferente nos diversos pontos do globo. Nos países em
que o crescimento económico tem sido elevado na última década (por ex. nos chamados BRICS ou
economias emergentes) o défice de qualificações existente coloca a questão de forma inversa,
encontrando-se a escola numa situação de alargamento sem perca da sua capacidade de atração .
11
aumento da supervisão e regulação das crianças por adultos, do enquadramento
permanente por instituições especializadas na infância e do fechamento da família.
Neste sentido, o alargamento e diluição espacial e temporal das fronteiras protetoras e
a difusão da perceção das crianças como vítimas e geradoras de riscos leva portanto a
uma tentativa de controlo do risco (Korbin, 2003; Gill, 2007).
12
planeamento e implementação de estratégias de prevenção e intervenção. A designada
violência de baixa intensidade (Dupper e Meyer-Adams, 2008:164) remete justamente
para os atos recorrentes de “pequena” violência, com reduzida gravidade, cuja
persistência nos quotidianos escolares tem impactos altamente negativos e a longo
prazo para os alunos. Não deixa no entanto de ser notável a divergência existente
entre a perceção popular (escalada de violência) e a evidência empírica (redução
sustentada dos incidentes ao longo da última década) (Mayer e Furlong, 2010; Fuchs,
2008; Matos, et. al., 2010).
A violência na escola surgiu como tema com uma significativa vitalidade na agenda
científica a partir dos anos 1970, marcada pela preponderância de propostas teóricas
inspiradas no conceito de bullying. Esta presença fez-se notar pelo aumento crescente
das investigações sobre o fenómeno e pela constituição de um campo de especialistas
(Brown e Munn, 2008). Desenvolveram-se diferentes abordagens, pautadas pela
crescente controvérsia acerca do carácter individual e patológico frequentemente
atribuídos aos comportamentos violentos (Bansel, et. al., 2009).
13
humanos, sociais e económicos deverão ser reduzidos (OMS, 2005). Automutilação
(suicídio, consumos de drogas legais ou ilegais), ofensas a outros (homicídio,
agressão, etc.) ou à sociedade (vandalismo, discriminação, etc.) estão considerados
nos comportamentos de risco e esta definição é particularmente comum nas
investigações epidemiológicas. Por sua vez, o conceito de comportamento antissocial
encontra-se mais associado às pesquisas na área da psicologia, sociologia e
criminologia. Aborda um leque de comportamentos como a violência física, as
ameaças e outro tipo de atitudes delinquentes, nomeadamente o roubo, o uso de
drogas e ofensas associadas ao incumprimento de regras, entre elas as escolares
(Carra, 2009a; Veenstra e Dijkstra, 2011).
2
Consideramos nesta definição apenas as situações de violência interpessoal, deixando de lado as
formas de violência institucional existentes na escola ou outras formas de violência social. Tal não
significa adotar uma abordagem individualista, mas antes delimitar algumas das dimensões centrais do
fenómeno no quadro da escola, centrando a análise nos processos relacionais que nela se produzem.
14
Quadro 1 - Relação entre agressão e intencionalidade
Tipo de Agressão
Física Psicossocial
O principal motivo é magoar o alvo,
Reativa/ reação emocional baseada em fúria,
que ocorre tipicamente em resposta Comportamento
Intencionalidade
Afectiva que
à provocação. procura ferir outros ao
Ocorre na ausência de provocação prejudicar o seu estatuto
deliberada, é desencadeada para social ou relações de
Proactiva/ obter algo em troca. O agressor tem amizade (agressão indireta
Instrumental a expectativa de que a agressão ou relacional).
física tenha consequências positivas
de carácter instrumental.
(Sebastião, 2009: 41)
Tendo por base esta distinção prévia podemos definir a violência como "atos
caracterizados pela agressão intencional, seja esta física ou psicossocial, podendo
assumir formas reativas/afetivas ou proactivas/instrumentais" (Sebastião, 2013:27).
Nesse sentido, a violência é uma configuração relacional particular marcada pela
tensão confrontacional (Collins, 2008), interação que incorpora tendencialmente
relações de poder assimétricas entre os atores (Sebastião, 2013). A limitação da
capacidade de reação das vítimas às consequências da agressão, seja pelo uso da força
física ou de mecanismos de pressão psicológica, coloca-as numa situação particular
de desproteção, impedindo muitas vezes o acionamento dos sistemas de regras
institucionais. Assim, um agressor caracteriza-se por ser tipicamente um indivíduo
que utiliza formas de poder (que são suportadas por agressividade física, verbal ou
psicológica) com o objetivo de, simultaneamente, anular a capacidade reguladora do
sistema de regras e de desencadear, ao nível relacional, um processo de dominação de
um ou mais indivíduos. A vítima nesta perspetiva é tipicamente um indivíduo que não
possui capacidade para resistir aos processos de dominação nem para ativar para sua
proteção o sistema de regras sociais da escola (Sebastião, 2009a: 46).
A anulação dos sistemas de regras pelos agressores (Domingues, 1995; Munn, et. al.,
2007; Brown e Munn, 2008; Carra, 2009a; Braun, et. al., 2011) expressa a
importância de investigar as variáveis organizacionais e os processos de intervenção
em situações de violência na escola, e implica adotar uma abordagem que enquadre as
esferas de intervenção e ação das instituições formais e dos agentes sociais e os
mecanismos que estruturam e regulam as conceções e práticas de violência. Trata-se
de perspetivar a violência enquanto forma de ação contingente, que traduz uma
configuração relacional particular com quadros de possibilidades diversos, em que
diferentes tipos e graus de tensão podem levar (ou não) a situações de confronto.
15
Figura 1 - A violência enquanto forma de ação contingente
16
Para aprofundar o conhecimento sobre o fenómeno da violência na escola a equipa do
OSE recorreu a uma combinatória de métodos extensivos e qualitativos em três níveis
de análise da difusão das situações violência. A nível macro analítico realizou-se a
recolha e análise de dados nacionais coletados através do formulário eletrónico online
situado na rede informática do Ministério da Educação, através do qual as escolas
devem fazer o registo obrigatório das ocorrências de violência.
3
Responsáveis pela gestão disciplinar da Escola, habitualmente são professores membros da direção,
assumindo a função de participar as ocorrências ao Ministério da Educação, através do formulário
eletrónico.
4
A opção pela aplicação dos inquéritos numa plataforma online em software especializado –
limesurvey – revelou-se vantajosa tanto ao nível da eficiência como da eficácia do processo de
inquirição. Um exemplo demostrativo disso mesmo foi o inquérito realizado a uma amostra de 792
alunos. Com a colaboração das escolas, foi possível colocar os alunos responder a partir de
computadores com ligação à Internet, em sessões coletivas, contando para o efeito com o apoio
presencial de membros da equipa de investigação. Além de evitar os habituais erros de inserção de
dados, este processo agilizou o tempo de tratamento dos dados e consequentemente da sua análise.
17
3. DESIGUALDADES ESCOLARES E CONTROLO DISCIPLINAR
18
estes indicadores produz hierarquias de prestígio relativo entre escolas, levando ao
agravamento da seletividade no acesso às escolas ou na organização do próprio
processo de ensino e aprendizagem, ou ainda, na fraca capacidade para atraírem e
fixarem os professores mais qualificados. As escolas situadas junto de bairros sociais,
bairros degradados ou predominantemente habitados por comunidades étnicas ou
imigrantes encontram-se no "fim da lista" dessas hierarquias simbólicas, traduzindo
uma forte perceção de que nestas escolas existem menores oportunidades educativas
contribuindo assim para reproduzir desigualdades sociais dos contextos sociais em
que se integram.
No entanto, estas hierarquias nem sempre surgem de forma evidente nas pesquisas,
constatando-se justamente que muitas dessas escolas têm maior abrangência de
ofertas educativas (como os cursos CEF e PIEF) e um efetiva estabilidade dos seus
corpos docentes (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Além disso, os fatores
subjacentes ao aparecimento de escolas com necessidades educativas extensas são
mais profundos, remetendo tanto para os processos de exclusão social no território
como para os processos de seleção social das escolas.
Para alcançar os seus objetivos, as escolas servem-se dos seus estatutos territoriais e
simbólicos. Thrupp e Lupton consideram os atributos característicos dos alunos
(como a classe, etnicidade, proporção de alunos oriundos de famílias refugiadas ou
com necessidades especiais), as diferenças características da escola e do meio
envolvente como fatores fundamentais da localização territorial, defendendo que "o
contexto realmente conta", contradizendo dessa forma os discursos acerca da
"neutralidade" da escolaridade (Thrupp and Lupton, 2006: 308).
Num dos estudos anteriormente realizados pela equipa do OSE, foi possível constatar
que competição pelos alunos de classe média era mais intensa entre as escolas
territorialmente mais próximas, concorrendo através de estratégias de atração e
seleção para o agravamento das diferenças encontradas nas estrutura social dos
territórios destas escolas (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Neste sentido, a
seleção dos alunos no momento da entrada para a escola ou através de processos
internos de triagem, que passam pelo encaminhamento de alunos para outras vias de
ensino além do regular ou pela utilização dos mecanismos de controlo disciplinar com
o mesmo fim, traduzem-se em situações de menor inclusão dos alunos e de maior
polarização social das escolas. Estes processos internos articulam-se com a
reconfiguração social dos territórios locais, com as escolas a reforçarem as
desigualdades escolares e sociais.
19
introduzem assim arbitrariedades e desigualdades na interpretação e tratamento das
situações (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b).
Medidas como a suspensão são repetidamente usadas para "libertar" a escola dos
alunos identificados como fontes de perturbação, por vezes provocando mesmo a
expulsão intencional desses alunos. Apesar das ameaças reais e percebidas no
imediato estarem entre os principais motivos do recurso à pena de suspensão, a
maioria dos alunos suspensos da escola esteve envolvida em atos que não poderão ser
considerados violentos ou criminosos (Taras, 2003:1206).
20
escolar em turnos, podem acarretar custos sociais e académicos negativos, sobretudo
para os alunos mais desfavorecidos ou com maiores dificuldades de aprendizagem.
Analisar a escola implica olhar para uma configuração social particular que se
caracteriza por condicionamentos estruturais que limitam o seu desenvolvimento
organizacional e por atores sociais que interagem a partir de interesses e motivações
individuais e grupais, nem sempre coincidentes com os da organização ou dos
quadros normativos mais amplos. É nesta relação que se perspetivam as organizações
escolares, tanto na sua inteligibilidade como na sua imprevisibilidade, pois torna-se
necessário entender as organizações escolares não como entidades altamente
organizadas exteriores aos atores mas, antes, "anarquias organizadas e sistemas
debilmente acoplados" (Barroso, 1991:74). Esta abordagem incita-nos a olhar para a
escola enquanto "um espaço-tempo de mediação de interesses e poderes diversos,
interiores e exteriores às suas fronteiras físicas, prefigurando-se como uma
organização em ação" (Torres e Palhares, 2010:152). A problemática da violência na
escola contribui assim para compreender a reação da escola a situações críticas que
colocam frequentemente em causa os seus próprios fundamentos, designadamente os
psicossociais, organizacionais e normativos.
A identificação e compreensão das lógicas de ação e dos quadros que orientam a ação
sublinham a importância dos "jogos" de poder, interesses, conflitos, estratégias e
coligações dos atores no quotidiano organizacional das escolas (Silva, 2007:103). É
neste âmbito que as lideranças escolares adquirem maior relevância. Segundo Trigo e
Costa (2008:571) a escola "precisa de uma liderança que coloque no centro da sua
21
atividade a ética, a moral, os valores, as pessoas, o diálogo e a relação entre pessoas, a
adaptabilidade à mudança, o desenvolvimento organizacional, a qualidade" de forma
a corresponder aos desafios atuais. O desempenho da liderança pode constituir um dos
principais contributos na mudança dos sistemas educativos e das organizações
escolares – devido à procura de maior eficácia e ao aumento dos níveis de qualidade
que permitem o crescimento e desenvolvimento institucional. Para Silva (2009) a
liderança ganha especial importância quando é potenciada por práticas suscetíveis de
alargar e reforçar a sua influência, entre as quais o papel das lideranças intermédias:
"elementos críticos potenciadores de sucesso ou artífices do contrário" (Silva,
2009:53), às quais compete gerir recursos de base e estabelecer a ponte entre a
realidade da sala de aula e a direção.
Neste sentido, pode-se afirmar que se produz um efeito cruzado entre os princípios
fundadores do projeto estratégico da escola, os modelos organizacionais, os estilos de
liderança e as representações sobre a origem da violência e as formas possíveis de a
enfrentar. Foi possível constatar que as escolas mais abertas e preocupadas com a
equidade na educação, e por essa razão com processos internos mais democráticos e
participados, são as mais capazes de controlar e prevenir as situações de violência e
que conseguem construir ambientes mais favoráveis ao desenvolvimento dos
processos educativos de todos os alunos (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a).
22
imediata entre a correção dos comportamentos e a melhoria dos resultados escolares
(Maguire, et. al., 2010), encerrando uma visão simplista da melhoria do desempenho
dos sistemas educativos.
23
II. POLÍTICAS PÚBLICAS
5 Para a sua implementação foi criado o Programa Comunitário de Ação Contra a Exclusão Social em
2002 (Gonçalves, 2006:136)
6
Perspetiva de racionalização em que se procurou maior simplificação, integração e coerência entre os
processos de coordenação existentes (op. cit . pp. 137).
24
garantir a coerência e coordenação entre os objetivos da coesão social e os objetivos
do crescimento e do emprego. Estas alterações reorientaram a terceira geração do
PNAI entre 2006-2008, com um novo quadro de objetivos para a proteção social e a
inclusão social, dos quais três são específicos para a inclusão: 1) garantir o acesso de
todos a direitos, recursos e serviços essenciais e simultaneamente erradicar as formas
extremas de exclusão e discriminações que levam à exclusão social; 2) garantir a
inclusão social ativa de todos através da promoção da participação no mercado de
trabalho e do combate à pobreza e à exclusão social das pessoas e grupos mais
marginalizados; 3) garantir a boa coordenação das políticas de inclusão social e o
envolvimento de todos os níveis de governo e agentes pertinentes; a sua eficiência e
integração em todas as políticas públicas relevantes (económicas e orçamentais; de
educação e formação; programas de fundos estruturais como o FSE) e que consideram
a perspetiva da igualdade de género. Em 2008-2010, após avaliação e consequente
aprovação da estratégia implementada anteriormente, deu-se continuidade às
prioridades e objetivos políticos no sentido de as reforçar e melhorar. Essas
prioridades tiveram como eixos estratégicos de intervenção responder ao impacto das
alterações demográficas e promover a inclusão social de todos os cidadãos,
procurando prevenir e reduzir as desigualdades.
Em 2010 foi definida a nova estratégia europeia, designada Europa 2020, que aponta
para um crescimento mais inteligente, sustentável e inclusivo, num prazo de dez anos.
Representando uma revisão do modelo anterior, esta agenda definiu as prioridades,
objetivos e iniciativas para orientação e coordenação das medidas políticas a nível
nacional e europeu. Foi dado especial enfoque ao crescimento inclusivo com
particular preocupação com a criação de emprego e a redução da pobreza, tendo como
um dos grandes objetivos reduzir pelo menos em 20 milhões o número de pessoas em
risco ou situação de pobreza e exclusão social7. Parte integrante desta nova estratégia
constitui a plataforma europeia contra a pobreza e a exclusão social, iniciativa criada
também em 2010, com o intuito de coordenar e gerir as intervenções promovidas,
tendo quatro medidas principais:
1) Melhorar o acesso ao trabalho, à segurança social, aos serviços essenciais
(cuidados de saúde, alojamento) e à educação;
2) Utilizar mais eficazmente os fundos da UE para apoiar a inclusão social e lutar
contra a discriminação;
3) Encorajar a inovação social para encontrar soluções inteligentes na Europa do pós-
crise, em especial no que toca a um apoio social mais concreto e eficaz.
4) Fomentar novas parcerias entre os sectores público e privado.
Estas alterações sustentam uma mudança nas estratégias definidas para a inclusão
social, reconhecendo a multidimensionalidade da pobreza e da exclusão social. As
estratégias deste modo definidas passaram a considerar, por um lado, um maior
número de pessoas em risco de pobreza, em privação material ou com uma
intensidade de trabalho muito baixa, e por outro lado, a dimensão territorial dos
fenómenos. Sendo os Programas Nacionais de Reforma elaborados por cada Estado
membro, a tradução efetiva dessas orientações encontra-se no instrumento político
nacional mais relevante nesta matéria, o Plano Nacional para a Igualdade (PNI). Na
sua quarta geração, o IV Plano Nacional para a Igualdade, Género, Cidadania e Não
25
Discriminação 2011-2013 enquadra-se nos compromissos assumidos por Portugal nas
várias instâncias internacionais e europeias (como a ONU, o Conselho da Europa e a
União Europeia). Neste plano procura afirmar-se a igualdade como fator de
competitividade através de três eixos: reforço da transversalidade do género e
integração desta dimensão em todos os domínios de atividade política e social;
implementação de ações específicas para ultrapassar determinadas situações de
desigualdade; abordagem das discriminações múltiplas – "quando à pertença sexual se
juntam outros fatores de discriminação e os seus efeitos em homens e em mulheres"
(Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012).
A integração das orientações definidas nos vários domínios de decisão e ação política
(local, regional e nacional) mediante uma estratégia de territorialização, é vista como
garantia da concretização e eficácia das mesmas e um princípio fundamental de boa
governação (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012). Emerge
portanto uma nova fase de políticas europeias para a inclusão e coesão social e
territorial, que procura integrar os diversos atores chave na sua coordenação, através
do diálogo entre parceiros institucionais e não institucionais.
26
que o ato violento assume. Alguns investigadores defendem uma maior preocupação
com a escolha dos argumentos, métodos e fórmulas no sentido de adquirir um
controlo teórico sobre as virtualidades semânticas dos conceitos (Debarbieux,
2002a:65). Por esse motivo, alertam para o efeito da adoção de uma definição unívoca
do fenómeno da violência na escola pelo refinamento de categorias corresponde a um
vácuo teórico (e que se encontram na base da criação de alguns modelos de
intervenção) (Sebastião, et al 1999; Sebastião, Alves e Campos, 2003).
8
De que é exemplo o Programa Anti-bullying de Olweus, que foi largamente implementado na
Noruega em conjunto com outras iniciativas, além da Áustria, Finlândia, Alemanha e Islândia.
9
Em termos históricos, a violência policial contra os estudantes universitários no período do Estado
Novo e os confrontos físicos resultantes de intensos debates políticos entre estudantes ou mesmo
professores na época da Revolução dos Cravos são exemplo disso. Contudo, o enquadramento da
violência tinha um carácter essencialmente político, que não se coaduna com o tipo de violência que
podemos encontrar nas escolas hoje. Pequenos furtos, agressões esporádicas ou sistemáticas, uso de
armas, ameaças a professores e a colegas, ou a destruição de bens e equipamentos escolares ou pessoais
são realidades vividas pelas escolas portuguesas nos últimos anos.
27
implementado progressivamente num conjunto de escolas com a coordenação do
Gabinete de Segurança do Ministério da Educação10. Tendo como objetivo reduzir ou
erradicar as situações de violência e insegurança nas escolas e meio envolvente
(Preâmbulo – Despacho n.º 25 650 de 19 de Dezembro de 2006), os seus princípios
estratégicos baseiam-se na territorialização, na parceria, na formação e na
monitorização do fenómeno.
10
Gabinete criado em 1984 com um enquadramento meramente administrativo até 2007, ano em que
foi criada a Equipa de Missão para a Segurança Escolar, cujo mandato de três anos consistiu na
concepção, desenvolvimento e concretização de um sistema de segurança nas escolas. Em 2009 é
constituído assim o Gabinete Coordenador de Segurança Escolar enquanto estrutura administrativa
autónoma a funcionar em dependência do ME, e regulamentada a situação dos prestadores de serviço
de vigilância nas escolas e dos procedimentos concursais.
11
Inspirado em experiências de outros países como os EUA, Canadá, Inglaterra, França ou Holanda, o
policiamento de proximidade traduz-se no princípio que os agentes das Forças de Segurança devem
trabalhar conjuntamente com os cidadãos de modo a encontrar soluções para os problemas da
comunidade associados à criminalidade, desordem e outros que concorram para a redução do
sentimento de segurança (Lisboa e Dias, 2008:4).
12
Entendendo-se que grande parte das ocorrências resultavam também da necessidade de
reorganização das escolas nesta matéria para a prossecução dos objetivos educativos.
28
Quadro 2 - Abordagens de regulação da violência em meio escolar
Abordagem Objetivo da Medida Medidas em Portugal
Resolução de incidentes ocorridos ou redução Aumento do número de guardas e à colocação de
das oportunidades de ocorrência de violência. alarmes e câmaras de videovigilância nas escolas no
Policial/ Sistemas de resposta rápida e reforço da âmbito do Programa Escola Segura, bem como à
Externa vigilância, que nem sempre são eficazes criação de linhas telefónicas de apoio à vítima,
/contraproducentes na melhoria do clima de designadamente o SOS Professor da Associação
escola e da convivência Nacional de Professores.
Interventiva
O Sistema Jurídico de Autonomia e Administração
Escolar (Decreto Lei 137/2012)14 e o Novo Estatuto do
Regulamentação, definição de papéis a Aluno (Lei n.º 51/2012)15 são produtos que
desempenhar na gestão de conflitos e apoio ou representam particularmente as iniciativas nacionais de
Escolar/ Interna formação de professores (sensibilização, regulamentação e estruturação organizacional das
acréscimo de assistentes educativos e/ou treino competências a desempenhar. As iniciativas de apoio
específico de gestão de conflitos13). ou formação de professores têm cabido sobretudo ao
Programa Escola Segura16 ou a outras entidades
formadoras contratadas pelas escolas.
Entre o vasto leque de medidas portuguesas estão:
1. Intervenção cívica e/ou comportamental: Formação cívica, Programa Parlamento de Jovens;
Intervenção
pressupõem a responsabilização dos alunos e Treino de competências pessoais e sociais; Projetos de
cívica e/ou
podem enquadrar-se no âmbito da Educação gestão de conflitos entre pares ou de melhoria da
comportamental
para a cidadania e/ou para a Saúde autoestima do aluno; Programa Saúde Escolar e
Programa Eco Escolas.
O instrumento que melhor se enquadra neste tipo de
2. Alteração do Ambiente ou clima de escola:
Alteração do iniciativa em Portugal foi o Programa de
Preveem a melhoria das condições físicas dos
Preventiva Ambiente ou Modernização do Parque Escolar cujo objectivo foi
espaços escolares e dos seus equipamentos,
clima de escola modernizar a rede pública de escolas secundárias e
bem como a promoção do clima de escola.
outras afetas ao Ministério da Educação.
Principais instrumentos: Programa Territórios
Procura de 3. Procura de Equidade (igualdade de
Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP);
Equidade oportunidades, democratização do ensino):
Programa Escolhas; Diversificação de vias de ensino:
(igualdade de medidas de combate à reprodução das
Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF),
oportunidades, desigualdades sociais, nomeadamente o
Curso de Educação e Formação para Jovens (CEF),
democratização insucesso escolar e o abandono escolar
Percurso Curricular Alternativo (PCA) e Cursos
do ensino) precoce.
Profissionalizantes
Fonte: Observatório de Segurança Escolar, 2012 – adaptado de Smith (2004) e Debarbieux et al (2003)
13
Na Europa, as formações em gestão de conflitos são habitualmente destinadas a professores,
deixando com frequência o pessoal não docente e os pais excluídos destas iniciativas.
14
Este decreto procede à segunda alteração do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril, alterado pelo
Decreto-Lei n.º 224/2009, de 11 de setembro. O novo modelo de escola alterou significativamente os
níveis organizacionais de decisão e atuação, numa ótica de descentralização e autonomia, permitindo às
escolas rentabilizar e mobilizar recursos que resultaram, por exemplo, no decréscimo efetivo do
número de incidentes.
15
Sendo um normativo em constante reformulação nos últimos anos e que tem gerado um aceso debate
político, o atual Estatuto do Aluno adequa e reforça as medidas disciplinares (de carácter corretivo e
sancionatório) a aplicar na escola, agilizando igualmente os processos disciplinares e as tomadas de
decisão. Este documento é apropriado e traduzido para o Regulamento Interno de cada Escola ou
Agrupamento de Escolas, verificando-se variações pouco significativas de estabelecimento para
estabelecimento a nível documental. Nas práticas, porém, a situação é outra.
16
Nomeadamente as sessões de sensibilização e formação promovidas regularmente pelas Forças de
Segurança e pontualmente pelo Gabinete Coordenador de Segurança Escolar, para além do apoio
sistemático das estruturas regionais em colaboração com este gabinete ou da criação de programas de
atuação específica (Vigilantes nas Escolas Primárias na Amadora).
29
III. TERRITÓRIOS
30
se numa observação de diagnóstico, de natureza preliminar, cuja finalidade principal é
avaliar os padrões de interação de um conjunto de instituições locais. 17 Tanto os
recursos (temporais e materiais) como os objetivos principais do projeto, no
desenvolvimento do qual esta análise se inscreve, circunscreve a análise com enfoque
para a descrição das propriedades estruturais emergentes (padrões ou regularidades
sociais) na rede. Metodologicamente destaca-se que os diversos momentos de
contacto entre a equipa do Observatório de Segurança Escolar e as instituições
constituintes da amostra garantiram um nível de confiança significativo e,
consequentemente, um acesso privilegiado a esta rede, constituindo um excelente
ponto de partida.
Zona 1
Freguesia
Tipo/ Local Município Freguesia 1 Freguesia 2 (Freguesias Total
3
1 e 2)
Autárquica ou Oficial não judiciária 3 1 2 1 2 9
Associação, Projeto ou Programa Social 0 2 1 0 1 4
Educação e Formação 1 1 1 0 1 4
Policial ou Judicial 1 1 1 0 1 4
Saúde 0 0 0 1 1 2
Total 5 5 5 2 6 23
Fontes: Informações privilegiadas das escolas e análise dos documentos oficiais.
17
Aprofundada posteriormente no decurso do projeto, com a aplicação de mais grupos focais com as
instituições em análise, neste relatório no ponto 2. do capítulo III. Comunidade.
31
não responderam. Situação que procuráramos ver suprida em desenvolvimentos
posteriores do projeto. Ainda que apenas 18 tivessem respondido, foi
simultaneamente relevante constatar que as nomeações dos parceiros18 se centraram
sobretudo no conjunto total de entidades que estavam previamente selecionadas para
o estudo 19 , verificando-se ainda uma forte correspondência entre os respetivos
objetivos de atuação e o tipo institucional atribuído na classificação.
Esta afinidade verifica-se, por exemplo, entre instituições muito distintas como a
Associação APP5 – cujo objetivo revelado é: Acolher, capacitar e integrar são o seu
mote de ação/ intervenção. – e o Programa Comunitário APP2.2 – com objetivos
idênticos: Promover o desenvolvimento de competências escolares (...) fomentando o
sucesso escolar e a inclusão escolar. Contribuir para a inserção social e cultural dos
destinatários e beneficiários. Intervir junto das crianças e jovens no sentido de diminuir o
risco de exclusão social a partir de ações que promovam a responsabilização pela
comunidade.
18 A liberdade de nomeação, restringida até 10 parceiros possíveis, foi uma das opções metodológicas
na construção do instrumento de inquirição para a análise de redes. Embora uma lista exaustiva dos
parceiros permita suprir os problemas "típicos" de recurso à memória neste tipo de técnica, o facto de
se tratar de relações estabelecidas entre instituições garantiu-nos alguma fiabilidade na obtenção dos
dados. Resta salientar que cerca de 70% das instituições (N=18) escolheram até 6 parceiros o que, dada
a problemática em análise, seria expectável.
19
A lista de entidades locais inquiridas encontra-se em anexo, no ponto B, capítulo IX.
32
1.2. RELAÇÕES ENTRE OS AGENTES LOCAIS
Legenda: Locais – Concelho: Branco; Freguesia 1: Cinza 75%; Freguesia 2: Cinza 50%; Zona 1
(Freguesias 1 e 2): Preto; Freguesia 3: Cinza 25%. Tipo de instituição: AO: Círculo; APP: Quadrado;
EF: Triângulo; PJ: Quadrado com círculo; S: Losango.
33
Um dos aspetos a destacar no grafo das relações orientadas (ou direcionadas)
apresentado diz respeito à distribuição das instituições segundo a proximidade
geográfica. A posição dos atores na estrutura da rede está claramente disposta pelos
territórios locais em que estas se encontram. Esta evidência ganha particular
relevância relativamente à comunicação, à transferência de recursos e à colaboração
entre estas entidades, uma vez que o contexto local em que se situam determina
significativamente as ligações de adjacência/ diretas estabelecidas entre elas e
circunscreve o funcionamento do seu sistema de relações.
Na figura 2 o tamanho dos atores (ou nodos) está representado de acordo com o seu
grau de centralidade, seja por terem feito muitas escolhas, seja por terem sido muito
escolhidos. A escola EF2 e a unidade de saúde S4 são as instituições que têm maior
número de conexões emitidas e recebidas, ocupando uma posição muito particular na
rede pois têm um grau de atividade elevado relativamente aos outros, usufruem de
maior estatuto (maior prestígio ou liderança) e de maior número de alternativas
disponíveis (maior independência)21. Excetuando estas duas instituições, as restantes
têm maior frequência de nomeações recebidas ou de nomeações emitidas mas não de
ambas. Considerando o prestígio ou o número de nomeações recebidas pelos atores da
rede, a PJ2 e a PJ5 têm um lugar igualmente de destaque. Contudo, apesar destes dois
atores serem relativamente mais "populares" que os restantes, a sua capacidade de
controlo/ liderança é menor, uma vez que só uma dessas ligações é recíproca (PJ2 –
EF2). Já as comissões de proteção (AO3.2 e AO4), seguidas pela escola EF1
apresentam um grau elevado de nomeações recebidas e nulo de nomeações emitidas,
20
Para esta análise consideramos apenas a matriz das mutualidades (ou relações diretas) porque os
dados matriciais são binários e em maior quantidade do que os recolhidos com as outras dimensões
relacionais em estudo. As relações entre os atores estão representadas por setas direcionadas.
21
Tendencialmente, atores com maior centralidade adotam inovações mais cedo por terem maior
probabilidade de captar o que flui na rede (informação sensível).
34
colocando-as numa posição de recetoras das trocas e colaborações institucionais, que
não são correspondidas22.
22
Os dados apresentados mereceriam uma avaliação posterior com as instituições em questão, para
aprofundar as razões de fraca interdependência.
23
Um resumo dos principais resultados com este tipo de análises pode ser encontrado em Mizruchi, M.
S. (2006:76). Além do grau de centralidade (das relações diretas), a intermediação e a proximidade
(closeness) constituem indicadores de centralidade indireta de uma rede, perfazendo os três tipos de
análise da centralidade dos atores, cujos referenciais teóricos foram propostos e desenvolvidos por
Freeman desde 1979 (Mizruchi, 2006:83).
35
Figura 3 - Intermediação (betweeness) dos atores em nomeações diretas
Os atores com maior grau de intermediação na rede em análise (fig. 3) são: a equipa
de reinserção social PJ5 e a unidade de saúde S4, seguidos pela comissão de proteção
AO3.2 e a equipa da rede social concelhia AO5.1. Um dos fatores que poderá explicar
(ainda que parcialmente) esta distribuição remete para o tipo de estrutura
organizacional e objetivos destas instituições, pois apresentam uma relativa
centralização de funções e serviços específicos de resolução das situações de
violência comparativamente aos restantes atores. As duas primeiras constituem órgãos
específicos para prevenção e intervenção judicial e cuidados de saúde, enquanto que
as últimas são órgão oficiais e autárquicos cuja finalidade é o acompanhamento, seja
na proteção de crianças e jovens, seja pelo incentivo a uma abordagem de intervenção
integrada das instituições do município. Cada gatekeeper em foco tem pelo menos
uma relação direta com um dos outros, criando três subgrupos conectados (ou grafos
possíveis). Um desses subconjuntos integra todos os intermediários a uma distância
(geodésica) de grau 1 pela seguinte ordem: [S4, AO5.1, PJ5, AO3.2]. Estas relações
de adjacência conferem aos referidos atores um nível significativo ou alto de
intermediação pois, além de constituírem pontos chave de relação com os restantes
integrantes da rede, estão conectados diretamente entre eles. Pode-se inclusivamente
inferir que a comissão de proteção AO3.2 e a equipa de reinserção social PJ5, nesta
rede em concreto, são atores intermediários do território 3; A PJ5 e a S4 fazem a
ponte com o território 1, com a segunda a desempenhar um papel central no acesso ao
território 2. A AO5.1, por sua vez, ocupa uma posição de intermediação essencial na
ligação entre as outras três instituições.
36
A distribuição das interdependências dos atores desta rede apontam para pistas
relevantes na exploração de algumas das dinâmicas relacionais. Apesar da análise da
centralidade ser decisiva para a compreensão do estatuto ou poder simbólico dos
atores (sobretudo em relações direcionadas), vislumbram-se outros padrões de
interação nesta rede com importância análoga, como a coesão e reciprocidade. A
observação das relações de adjacência permite-nos constatar que não se trata de um
grupo coeso, porque é escassa em circuitos (ou seja, em subgrupos cujos nodos
coincidem) e é excessiva em árvores (i.e. grafos conexos sem circuitos). Uma
distribuição de relações deste tipo é comum em redes cujos atores têm uma orientação
na direção das suas conexões, apresentado portanto uma densidade baixa ou relações
dispersas (sparse).
24
De forma genérica, assume-se que a inclusão de um terceiro sujeito num encontro entre outros dois
(díade), por um lado, transforma a relação substantiva entre os dois primeiros como, por outro, produz
uma nova configuração – a tríade [que pode ser de vários tipos: fechada ou hierárquica, etc. – para
maior aprofundamento vd. isomorfismo das tríades, Holland e Leihardt (1981:43)].
37
A aplicação do teste ao padrão relacional que apresentamos confirmou a fraca
homogeneidade (e densidade) dos subgrupos, havendo apenas três formações ou
subconjuntos de relações recíprocas (triádicas), das quais duas são "hierárquicas" e
uma é "coesa". Por outras palavras, em dois subconjuntos (ou componentes do grafo)
um dos atores estabelece relações recíprocas com outros dois, mas estes não se
relacionam entre si. No subgrupo coeso existem relações recíprocas entre todos os
(três) atores. A emergência destes dois padrões revela-se relevante em vários aspetos.
38
Figura 5 - Qualidade das relações
39
modo, sobretudo se se considerarem indicadores mais específicos das relações
(frequência da colaboração e trocas). Este padrão também evidencia que as interações
mantidas são de carácter maioritariamente unilateral, cuja reciprocidade é pouco
significativa, como já tínhamos apresentado anteriormente.
40
Figura 7 - Frequência das trocas de informação e/ou recursos
Com efeito, a APP3 e a AO1 ocupam uma posição igualmente central no indicador de
trocas raras/ ocasionais. Disposição que é explicada exatamente pelo número de
apreciações feitas e não pelas recebidas. Também a AO2.1 e a PJ2 integram este
grupo, com a primeira a destacar-se pelo número avaliações emitidas e a segunda
pelas recebidas, sendo a instituição por excelência que a rede de parceiros avalia
como fraca em trocas de informação e/ou recursos.
Os padrões encontrados – seja pela simples interação entre os atores, seja pela
avaliação mais concreta de alguns aspetos relacionais – apontam para algumas pistas
relevantes no aprofundamento e compreensão da rede de instituições que intervêm
(conjunta ou isoladamente) na regulação das situações de violência com crianças e
jovens. Neste âmbito, o cruzamento com os dados qualitativos sobre as necessidades e
propostas de atuação constitui informação particularmente útil, no sentido de
complementar e enriquecer a análise.
41
1.4. PREVENIR E INTERVIR: NECESSIDADES E PROPOSTAS DE ATUAÇÃO
Esta análise, embora concisa, permite-nos concluir sobre alguns aspetos salientados
no estudo das relações entre os parceiros. Nomeadamente, o facto de grande parte das
42
instituições considerar necessário uma maior articulação e coordenação para intervir
ou pela alusão a projetos mais específicos e mais participados e envolventes. As
respostas dadas validam o padrão global encontrado de relações dispersas e altamente
contextualizadas, cuja reciprocidade e intensidade de colaboração e trocas de
informação e/ou recursos é pouco significativa.
Não só a nível macro, mas também no interior de cada uma das organizações, o leque
de interpretações das políticas e sistemas de regras é diverso. A atenção dada e a
responsabilização comum pelos casos de violência apoia-se num entendimento difuso,
sobretudo nas situações que requerem maior disponibilidade de recursos técnicos,
pondo em causa a eficiência e a eficácia de ações realizadas e o consequente sucesso
dos resultados. Os padrões encontrados na rede são reveladores disso mesmo, já que
no domínio da interação é possível identificar um conjunto de instituições cujas
relações são dispersas e com um grau baixo de reciprocidade e comunicação efetiva.
Isto quer dizer que as relações institucionais mantidas em matéria de regulação da
violência não traduzem explicitamente as demandas e normativos delineados para este
efeito.
43
As necessidades externas e propostas de ação indicadas pelos representantes
institucionais analisados mostram que o caminho para a construção dos objetivos de
intervenção conjunta e integrada ainda é longo. Apesar da convergência entre
objetivos e tipo institucional, a distribuição das relações ocorre sobretudo pela
proximidade geográfica, havendo um número muito reduzido de parceiros
interdependentes. Estes padrões apontam para um maior isolamentos dos parceiros no
desenvolvimento das suas ações, com estratégias de intervenção pouco articuladas,
designadamente por parte das escolas e das polícias. Não obstante, uma das escolas
(EF3) e uma das unidades de saúde (S4) da rede (total) preenchem um lugar de
prestígio junto dos restantes parceiros em todos os indicadores (nomeações, maior
frequência nas colaborações e trocas, relações positivas) e apresentam um dinamismo
relevante nas relações estabelecidas. O território 2 e as instituições com funções mais
centrais destacam-se igualmente por serem aquelas que apresentam relações mais
estruturadas ou colaborantes. No que respeita à intermediação, as escolas e as polícias
ocupam uma posição periférica no conjunto global da rede, mas apresentam um
padrão de reciprocidade semelhante no interior de dois dos territórios. A maior
exigência das avaliações ou vulnerabilidade à colaboração e trocas de
informação/recurso foi outra das tendências verificadas nesta análise, com as
instituições de tipo Autárquico/Oficial (AO) e Policial/Judicial (PJ) a acumularem o
maior número de apreciações negativas ou fracas. Além disso, a polarização de
instituições com nomeações emitidas ou recebidas é reveladora da fraca
interdependência patente na rede. É relativamente paradoxal constatar que apesar de
todos os representantes, sem exceção, indicarem a necessidade (interna ou externa) ou
proporem atuações em conjunto, os padrões que emergem das suas relações com os
parceiros revelam precisamente o contrário.
44
análise prévia orientaram a construção do guião semiestruturado de inquirição e a
seleção das instituições sociais e seus representantes.
Em cada uma das sessões explicámos aos intervenientes que o encontro procurava
aprofundar o conhecimento relativo às suas perspetivas sobre o fenómeno da
violência, enquanto representantes das suas instituições, compreender os modelos de
intervenção desenvolvidos no território, assim como a articulação interinstitucional, e
o que consideram ser os obstáculos e soluções relativamente ao problema. Os
intervenientes demonstraram interesse em participar nestes momentos de discussão e
reflexão conjuntas. Os espaços em que se realizaram as sessões foram gentilmente
cedidos pelos representantes das escolas, em dois territórios, e da junta de freguesia
noutro, e que tiveram uma colaboração de ativa e interessada na organização das
sessões. Coube à coordenação da equipa conduzir o debate, introduzindo os tópicos e
direcionando a discussão sobre o tema, de uma maneira não-estruturada e natural
(Parasuraman, 1986: 245). Para o registo e recolha da informação utilizámos o
suporte áudio e retirámos notas sobre os contributos dos intervenientes, a ordem dos
participantes e outras informações relevantes para a análise. A análise dos temas
discutidos nas sessões, centra-se tanto no que se aproximam e como no que diferem,
relativamente aos seguintes aspetos: 1) Foco de ação dos parceiros; 2) Estratégias de
intervenção e colaboração entre parceiros; 3) Relação com a escola e 4)
Contrariedades encontradas.
25
A literatura indica que cada grupo focal seja composto entre seis e doze participantes, não excedendo
cinco grupos por projeto de investigação (Morgan, 1997; Suter, 2004) supracitado em Galego, C. e
Gomes, A. (2005).
45
2.1. INTERVENÇÃO DOS DAS INSTITUIÇÕES DA REDE SOCIOEDUCATIVA LOCAL –
RELAÇÕES ENTRE PARCEIROS
46
Uma outra distinção relevante, quer nas conceções, quer nas práticas de intervenção
destas entidades prende-se com o facto de serem de nível central ou local. O leque de
possibilidades de ação de cada instituição é condicionado pela sua abrangência,
verificando-se por esse motivo um maior ou menor distanciamento na resolução dos
casos de acordo com o seu foco de ação. Neste sentido, houve uma grande
convergência dos participantes na defesa de atuações a nível local, caso a caso,
articulada com os parceiros relevantes para cada situação, em detrimento de uma
intervenção mais alargada e abrangente.
47
por exemplo, menciona o excesso de burocracia e a demora nos processos que trava
as tentativas de transmissão atempada da informação e o estabelecimento de pontes
interinstitucionais. A ausência de recursos humanos para intervir é outro dos
obstáculos identificados pelos parceiros. Todos os representantes deste território
consideram que a rede é um espaço privilegiado para a troca de influências, mas isso
requer alguma arrumação e preparação das instituições que possibilite a abertura e as
trocas, uma organização que nem sempre acontece na freguesia T1.
Outro aspeto destacado é a frequência dos encontros do grupo, havendo uma reunião
semanal para discussão das situações prioritárias, que além de garantir uma
intervenção efetivamente articulada, permite que os parceiros mantenham relações de
proximidade fortes. Ainda que esta colaboração esteja formalmente enquadrada, os
representantes afirmam que ultrapassam frequentemente a sua esfera de ação,
alargando e potenciando deste modo a ação conjunta, onde todos trazem e todos
recebem. Nesse sentido, os parceiros procuram identificar estrategicamente os
problemas da localidade, contando com a colaboração de todos para a definição de
um plano de ação, que lhes permite antecipar situações problemáticas relacionados
com a violência. Esta vantagem contribuiu para experimentarem estratégias e modos
de ação adequados às especificidades dos problemas com um sentido de
territorialidade e proximidade.
48
território T1 realça também que tem havido respostas, colaboração e apoios dos vários
parceiros à entidade, mas destaca obstáculos na articulação com a escola E1.
Questionados sobre o que pode ser feito para ultrapassar essas limitações e melhorar a
intervenção, os representantes das entidades locais entendem que o trabalho tem de
ser desenvolvido de modo sistémico e com a inclusão de toda a comunidade. Apesar
de não haver um trabalho em parceria, a existência de situações de colaboração caso a
caso é referida e apoiada por todos.
Por sua vez, no território T2 a atuação caso a caso acumula com uma aposta na
criação de condições para as crianças e jovens, ou seja, trata-se de uma ação que se
pretende que seja mais que paliativa. Os parceiros ilustram esta estratégia com a
organização conjunta de colónias de férias e ocupação dos tempos livres das crianças
e jovens em período de interrupção letiva, ações que entendem ser chave na
prevenção de comportamentos disruptivos, bem como no desenvolvimento de um
sentido de pertença e participação na comunidade. Salientam ainda a relevância do
trabalho efetuado pelos técnicos junto das suas crianças e jovens, apontando para uma
ética profissional comum, na qual prevalece o bom senso na tomada de decisão e na
atuação.
49
Em síntese, pode afirmar-se que estes territórios contrastam significativamente em
relação ao nível de colaboração e funcionamento da rede, contudo a escola é
considerada como parceiro central. Por um lado por ser a instituição onde a maioria
das crianças e jovens da localidade se encontram e passam uma parte substancial do
seu dia. Por outro, por entenderem que a escola tem, ou deve ter, um papel ativo no
diagnóstico e na atuação de primeira linha dos casos problemáticos. Nesse sentido, a
postura dos parceiros locais em relação à escola é um indicador pertinente tanto para a
compreensão da articulação da rede, como para a identificação dos bloqueios e
potencialidades de atuação. Porém, apenas na freguesia T2 se verificou uma
disposição efetiva da escola em assumir esse papel preponderante.
Para os diversos parceiros presentes nos grupos focais, a escola é considerada uma
instituição com um papel relevante na atuação em rede. No entanto, a perceção da sua
função e da responsabilidade que tem na resolução de casos é frequentemente objeto
de discordância e crítica nos debates tidos entre os parceiros no âmbito dos grupos
focais. A freguesia T2 constitui uma exceção, para os representantes das entidades
locais a escola desempenha uma função central e fortemente aglutinadora, e
contribuiu ativamente para a formalização e desenvolvimento da atual rede,
usufruindo da sua margem de autonomia, de uma forma global e estratégica.
50
do Ensino Básico um problema cuja solução tem de passar por uma maior divulgação
e possibilidades de encaminhamento, assim como a necessidade de melhorar a
imagem negativa que existe na comunidade sobre essas vias. Esta opinião não é
partilhada pela escola, por entenderem que existe um grande esforço e trabalho nos
cursos alternativos, que frequentemente resulta em casos de sucesso apesar dos
problemas iniciais. Esclarecem que a escolha destes cursos formativos exige recursos
e negociação, que só é possível depois de se preencherem as vagas do Ensino Regular
numa rede educativa que está sobrelotada.
Apesar das divergências encontradas, foi possível constatar que a escola assume uma
dupla função na rede, por um lado por ser um espaço onde se realizam parte as
intervenções de primeira linha, seja pela sinalização de casos, seja pelo
acompanhamento efetuado com os alunos. Por outro, funciona como aglutinadora dos
parceiros, na medida em que é promotora de ações conjuntas, orientando muitas vezes
as estratégias tomadas, nomeadamente através da cedência de espaços para a
concretização de atividades nos tempos não letivos.
51
oportunidades para desenvolver trabalho conjunto e junto das crianças e jovens.
Apesar disso, procuram manter esse trabalho noutros momentos, mas menos
frequentemente. Os problemas de carência alimentar também têm trazido maiores
dificuldades na gestão da regulamentação escolar, recorrendo para o efeito sobretudo
ao Banco Alimentar Contra a Fome.
52
social, subsistem muitas amas ilegais no bairro. Esta situação deve-se a um
desajustamento do número de creches face às necessidades das famílias, assim como
dos horários praticados relativamente aos de trabalho dos pais e do tipo de apoio que
precisam em caso de doença das crianças. Ou seja, as amas recebem e cuidam das
crianças mesmo que estejam doentes, praticam horários ajustados aos dos pais,
aceitando crianças em horários pós-laboral, por exemplo. O que coloca um dilema aos
representantes da rede pois: legalmente teríamos que denunciar, mas se o fizermos
estas crianças ficarão em muito piores situações.
53
mecanismos de intervenção e como de prevenção a nível territorial. As redes locais
permitem aceder a recursos e estratégias de atuação planeadas conjuntamente,
adequadas a problemáticas específicas identificadas pelos parceiros. Verifica-se,
porém, que para um funcionamento deste tipo de intervenção bem sucedido é
necessário um conjunto de parceiros interessados que dinamizem a rede, superando
convicções e práticas institucionais divergentes.
54
IV. ESCOLA
1. OS DOCUMENTOS ESCOLARES
A diversidade cultural e vulnerabilidade económica das famílias dos alunos parece ser
marcante na medida em que são dos aspetos repetidamente apontados, referindo por
exemplo os desafios inerentes à abertura da escola a uma população heterogénea e
multicultural inserida num meio sócio económico difícil. [Projeto Educativo
Agrupamento da Escola E1, pp.7] Segundo os documentos escolares, as
características dos alunos e meios de origem criam obstáculos ao nível do
funcionamento e papel da escola, uma vez que – quer ao nível das expectativas quer
26
2010/ 2011 e 2011/2012 foram os anos letivos considerados para a análise documental, pela
disponibilidade de documentos aprovados e em vigor, uma vez que as alterações normativas da tutela
para 2012/2013 não permitiram o acesso atempado aos mesmos. Todas as escolas foram alvo de
avaliação externa, tendo sido recolhidos os respetivos Relatórios disponibilizados pelo site da IGE (não
houve apresentação de Contraditórios em nenhum dos casos), havendo apenas uma em que a Avaliação
foi anterior ao atual mandato (E2) – considerando-se apenas para a análise as continuidades e rupturas
de Liderança. Tivemos ainda acesso a outros documentos como o Projeto Curricular ou os Planos
Anuais e Plurianuais de Atividades que foram sempre tomados, quando pertinentes, como
complemento aos recursos em análise.
55
das práticas – tanto os alunos como os pais/responsáveis apresentam níveis elevados
de desinteresse [Projeto de Intervenção da Diretora E3, pp.7]. Ou seja, consideram
que a falta de acompanhamento, de participação e as fracas expectativas relativamente
à escola e ao percurso escolar dos educandos (especialmente no caso das escolas E2 e
E3, numa lógica de reprodução de trajetórias pouco escolarizadas) contribuem
frequentemente para o abandono, insucesso e indisciplina [patente por ex. no Projeto
Educativo de Agrupamento da E2, pp.8]. Facto que reflete nestes documentos, muitas
vezes, a perceção de uma escola com funções acrescidas, como espaço de educação
de competências sociais e cívicas, para além do ensino.
27
Patentes nos Projetos Educativos de Agrupamento e/ou nos Projetos de Intervenção das Diretoras das
escolas, designadamente: PEA/E1, pp.6-7; PEA/E2, pp. 21; PID/C3, pp. 31.
28
Escola E2 – Gabinete Gestão de Conflitos; Escola C3 – Gabinete Acolhimento e
Intervenção/Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família; Escola E1 – Gabinete de Intervenção Disciplinar.
56
mediação e intervenção em situações de conflito29. Organizacionalmente e para esse
efeito foram constituídas equipas às quais foram atribuídas funções e
responsabilidades diversas. Estas equipas são formadas por nomeação das respectivas
Diretoras e compostas por docentes no caso de duas das escolas (E1 e E3) ou, como é
o caso da E2, com a colaboração/ integração de outros elementos da escola (oriundos
das equipas multidisciplinares do Programa TEIP ou integração de Assistentes
Operacionais).
Formação dos
elementos da
Designação Âmbitos de Constituição da Atribuição de Funções/
equipa em Tutorias
de Gabinete Atuação equipa Responsabilidades Tarefas
gestão de
conflitos
Constituída por Diretor pode Recebe/
Professores e delegar encaminha
Gabinete Diagnóstico,
Freguesia coordenado por competências na alunos com
E1 Intervenção Mediação e Sim Não
T1 Professores Equipa do ordem de
Disciplinar Intervenção
(reuniões Gabinete de saída de
quinzenais/mensais); Intervenção sala de aula
Equipa de
Integração/ Diretor pode Recebe/
acompanhamento delegar encaminha
Gabinete Diagnóstico,
Freguesia constituída por competências no alunos com
E2 Gestão de Mediação e Sim Sim
T2 diversos recursos Subdiretor, ordem de
Conflitos Intervenção
humanos do Adjunto ou saída de
Agrupamento Conselho de Turma sala de aula
multidisciplinar
Diagnóstico,
Gabinete de
Mediação,
Acolhimento Recebe/
Intervenção,
e Acompanhamento encaminha
Melhorar
Freguesia Intervenção Constituída por e encaminhamento alunos com
E3 meios de Não especifica Sim
T3 /Gabinete Professores dos casos ordem de
Comunicação
Apoio ao disciplinares saída de
e criar clima
Aluno e à sala de aula
de respeito e
Família
confiança
29
A escola C3 prevê ainda objetivos de melhoria dos meios de comunicação e criação de um clima de
respeito e confiança. As práticas de monitorização, os procedimentos e os modos de apropriação
internos são evidentemente singulares em cada escola.
57
está inserida, ou seja, a escola tem a responsabilidade de melhorar e aperfeiçoar o
meio social em que está inserida. Na escola E2 uma das principais linhas orientadoras
de atuação é o aumento das responsabilidades na manutenção dos espaços mediante o
incremento da participação e desenvolvimento cívico das crianças e jovens (os
alunos). A escola E1 aposta prioritariamente na informação e sensibilização dos Pais/
Encarregados de Educação sobre as normas de conduta, estando prevista formação
específica sobre estes assuntos exclusivamente para estes agentes. Além disso, esta
escola perspetiva as responsabilidades de prevenção e intervenção, relativamente à
segurança, disciplina e criação de um clima pacífico, a todos os elementos da
comunidade educativa (escola, corpo docente e não docente, alunos e demais
membros pertencentes ao estabelecimento escolar).
30
Estatuto do Aluno, alínea n.º 1 do Artigo 52º, lei nº 39/2010 de 2 de Setembro. Normativo em vigor à
data do estudo
58
Quadro 7 - Medidas disciplinares corretivas - Regulamentação da tutela e das direções
das escolas
59
No caso das medidas disciplinares sancionatórias não se verificam tantas variações.
Com efeito, a suspensão é a única medida que surge relativamente diferenciada do
que está estabelecido no Estatuto do Aluno e apenas no caso da escola E2. Nesta
escola a responsabilidade de aplicar a medida de suspensão é exclusiva do Diretor de
Agrupamento, sem a possibilidade de consulta ao Conselho de Turma. O Estatuto do
aluno regulamenta que nos casos de aplicação da medida disciplinar sancionatória de
suspensão compete ao diretor decidir se deverão, ou não, ser estabelecidas parcerias
para o acompanhamento/integração do aluno durante o período de cumprimento da
pena, isto é:
Para além das medidas disciplinares encontram-se diversas estratégias nestas escolas
definidas para prevenir e intervir sobre os comportamentos desviantes dos alunos. O
encaminhamento e os apoios individualizados ou dirigidos a grupos específicos são
comuns às três escolas. A supervisão de alunos sinalizados, a procura de integração na
abertura do ano letivo e a preocupação com a transição de ciclo são outras das
medidas preventivas.
Encaminhamento para outras vias de ensino (interno ou externo); Intervenção direta da Psicóloga: acompanhamento
semanal das turmas PCA, apoio individualizado a alunos identificados. Sensibilização e tarefas na Formação Cívica
E1
no 5º ano; Acolhimento no início do ano letivo (a Assistentes Operacionais e a alunos novos – alunos do 9º ano
apadrinham alunos de 5º ano).
Tutorias; Encaminhamento de alunos para CEF, PIEF e PCA (interno); Reconhecimento de maior articulação entre 1º
E2
e 2º Ciclos do Ensino Básico
Alunos reincidentes são sinalizados, vigiados e acompanhados por técnicos que os encaminham/ orientam para vias
E3
alternativas (interno ou externo); Tutorias.
60
necessidade de integração dos alunos num novo quadro de relações e sistema de
regras, constituindo-se assim como um momento particularmente sensível no campo
da regulação de atitudes e comportamentos. De acordo com as Avaliações Externas da
IGE, em matéria de transição e sequencialidade entre ciclos de ensino, verificámos
que em todas as escolas é assinalada a procura de articulação e preparação destes
processos, nomeadamente pela existência de mecanismos e/ou práticas de orientação
vocacional. Em complemento, nos Projetos Educativos de Agrupamento e de
Intervenção da Diretora das escolas E3 e E2, há também um especial enfoque no
trabalho cooperativo e colaborativo entre os docentes que potencie a articulação
disciplinar e interdisciplinar. Numa perspetiva de coesão e fortalecimento do
agrupamento, na escola E3 encara-se a integração e articulação entre os diferentes
níveis de ensino como veículo para o estabelecimento de um clima escolar bem
sucedido, na promoção de uma atmosfera de cooperação e convívio. Enquanto na
escola E2 um dos principais objetivos prende-se com o incentivo à articulação entre
ciclos, em que o princípio da continuidade pedagógica na constituição de turmas se
afigura como uma solução para uma resposta concertada e adequada.
A escola tem, assim, autonomia para adotar orientações próprias sobre a constituição
de turmas que se pretendem criteriosas e ponderadas, devendo para isso ser
acompanhadas por um processo de diagnóstico e análise das características e percurso
escolar dos alunos.
61
extraordinárias do Conselho de Turma (por iniciativa ou proposta), sempre que
quaisquer assuntos de natureza pedagógica ou disciplinar o justifiquem. Finalmente,
as escolas podem ainda designar professores tutores para acompanhamento em
particular do processo educativo de um grupo de alunos. As escolas E2 e a E3
promovem e implementam Sistemas de Tutorias, com o intuito de orientar e
acompanhar alunos sinalizados com problemas de aprendizagem e/ou integração na
escola e na turma.
Apesar das dificuldades identificadas, a análise destas escolas revela que estas se
encontram munidas de competências que lhes permitem desenvolver estratégias
alternativas, facilitadoras e potenciadoras de um ambiente escolar pacífico e seguro.
Na análise identificaram-se diferentes estratégias previstas pelos responsáveis
escolares das escolas em estudo, e que se podem agrupar nos seguintes domínios de
ações:
62
- Articulação e coordenação da escola no âmbito da segurança e da regulação da
violência: nas escolas E1 e E3 os responsáveis escolares planificam diversas ações a
este nível. Na Escola E3 a direção escolar prioriza a uniformização e coerência de
regras e procedimentos com vista à promoção da articulação entre as diferentes
instâncias e órgãos da escola; nas escolas E1 e E3 há por parte dos responsáveis a
previsão da implementação de sistemas de vigilância (como o cartão magnético) e a
manutenção dos espaços escolares.
63
lideranças, do envolvimento dos atores nos processos de tomada de decisão, dos
fatores organizacionais e das condições para a sua implementação. Tendo gabinetes
de apoio para a mediação e intervenção em situações de conflito, as escolas do estudo
dispõem igualmente de informação sistematizada sobre as ocorrências participadas e
que medidas foram atribuídas em cada ocorrência. A monitorização do fenómeno
parece representar para os responsáveis escolares destas escolas uma primeira etapa
de regulação do problema na medida em que no âmbito do trabalho desenvolvido por
esses gabinetes usam instrumentos de diagnóstico e de avaliação sobre a intervenção
no combate à violência na escola. Os processos de monitorização e organização da
informação distinguem-se por escola, particularmente em termos de registo e
apresentação.
2010/2011 2011/2012
Ocorrências 433 354
Procedimentos disciplinares 89 23
Medidas Disciplinares
65 9
Sancionatórias
Fonte: Direção da Escola E2
De modo mais detalhado, a distribuição das ocorrências por ano de escolaridade e por
ciclo de ensino apresenta oscilações significativas ao longo do ano letivo 2011/2012.
No 2º ciclo EB há maior número de ocorrências, sobretudo no 5º ano de escolaridade,
com um aumento progressivo de situações entre o primeiro e o segundo período
escolar. No 3º ciclo EB o número de ocorrências registadas é substantivamente
menor, havendo um ligeiro acréscimo no segundo período escolar, especialmente no
8º ano, com 36 ocorrências registadas pela equipa do gabinete. Destas, 22 são apenas
numa turma de ensino regular, na qual apenas 2 alunos em 7 identificados, não
reincidiram no seu comportamento ao longo do segundo período. A reincidência
reforça o a posição do 2º ciclo EB como ciclo que reúne o maior número de
ocorrências na escola. Do total de alunos a frequentar a escola neste ano letivo
verificaram-se 12 situações com mais de 6 reincidências, distribuindo-se do seguinte
modo por anos de escolaridade: 6 no 5º ano; 4 no 6º ano; 1 no 8º ano e 1 no 9º ano.
64
Quadro 11 - Ocorrências por período e ano escolar no ano letivo de 2011/2012 registadas
no Gabinete de Gestão de Conflitos da Escola E2
31
Por exemplo, em 2008/2009 foram aplicadas 119 medidas disciplinares sancionatórias, que incluíam
o condicionamento no acesso aos espaços escolares e suspensões, estas últimas eram particularmente
usadas com alunos reincidentes e com frequência aplicadas de forma sucessiva.
32
Ainda que estas variações necessitem de um maior aprofundamento quanto à gravidade e tipo de
ocorrências registadas, destaca-se que há um número de turmas significativamente menor no terceiro
ciclo nesta escola.
65
Quadro 13 - Ocorrências por turma e ano escolar no 3º período do ano letivo de
2011/2012registadas pelo Gabinete Intervenção Disciplinar da Escola E1
9º
5º ano 6º ano 7º ano 8º ano
ano
A 5 0 4 2 1
B 0 2 12 0 0
C 4 1 9 0 1
D 3 0 0 0 0
E 3 0 0 2 3
F 2 1 0 1 -
G 7 7 - - -
H 1 7 - - -
I 6 1 - - -
J 4 1 - - -
L - 6 - - -
Total 35 26 25 5 5
Fonte: Direção da Escola E1
66
orientações presentes no diploma relativo ao Estatuto do Aluno. O RI das três escolas
apresentam uma organização similar :
1) Secção introdutória – em que se apresentam as finalidades, determinação e
qualificação das infrações e medidas disciplinares;
2) Secção sobre medidas corretivas – em que que, além dos critérios de aplicação,
orientações e procedimentos, se definem e listam o tipo de medidas (5 no total:
advertência oral 33 , ordem de saída, tarefas/ atividades de integração escolar,
condicionamento no acesso ou utilização de materiais e equipamentos e mudança de
turma);
3) Secção sobre medidas sancionatórias – tal como na anterior, nesta parte apresenta-
se a definição das medidas (que são três: repreensão registada, suspensão (de 1 até 10
dias), transferência de escola), as orientações e procedimentos, assim como os
critérios de cumulação de medidas disciplinares.
Tal como está explanado no Estatuto do Aluno, as escolas têm autonomia para
regulamentar outras medidas corretivas, tendo-se verificado na análise aos
documentos escolares algumas variações a este nível. A escola E3 define a
permanência do aluno nos seus gabinetes de apoio na sequência de uma ordem de
saída, já a escola E2 acrescenta o impedimento de participar em visitas de estudo e
atividades festivas ou de atividades de representação da escola. As três escolas
estipulam um conjunto de tarefas a desempenhar pelos alunos orientadas para
trabalhos e ações de manutenção, apoio e organização dos espaços interiores e
exteriores da escola ou das atividades não letivas. No caso das escolas E3 e a E2 o
desenvolvimento de um trabalho autónomo ao nível das diferentes áreas curriculares,
disciplinares e não disciplinares apresenta-se como uma atividade de integração.
Nos Regulamentos Internos destas escolas encontra-se ainda a apresentação de
tipologias de medidas disciplinares a aplicar. Na escola E1 para as situações de faltas
justificadas e/ou injustificadas dos alunos há uma tipificação dos procedimentos, e na
da escola E3 há para as situações de ordem de saída de aula para os alunos que
cometem infrações. Ambas as escolas têm documentos autónomos sobre as normas de
conduta dos alunos. Nos Regulamentos Internos das escolas E2 e E3 a informação
sobre os procedimentos disciplinares tal como se encontra no Estatuto do Aluno, não
está incluída nos respetivos regulamentos; no documento da escola E1 remete-se para
os artigos do referido estatuto.
33
As alterações ao estatuto do aluno, introduzidas pela lei nº 39/2010 de 2 de Setembro, mais
concretamente no artigo 26º, incluíram pela primeira vez a Advertência no conjunto de medidas
corretivas. O carácter recente destas mudanças explica porque razão a escola E1 não consideram esta
medida nos seus RI (aprovados em 2009). Ressalva-se ainda que as mudanças normativas mais
recentes, constantes no novo estatuto do aluno (Decreto Lei n.º 51/2012 de 5 de Setembro), não foram
consideradas porque os documentos em vigor nas escolas no momento da análise correspondiam a um
período anterior a estas (mandatos de 2009 a 2012).
67
acordo com os horários e normas previstas estão regulamentados nos documentos
orientadores das três escolas. Os restantes direitos são específicos de cada escola,
estando a possibilidade de reunir, se associar e ter acesso a informação presente em
duas escolas (E2, E3).
Direitos E1 E2 E3
Direito à diferença, bem como a consideração e valorização dos diferentes saberes e culturas x
Processo de ensino-aprendizagem e avaliação: apoio, participação, esclarecimento x x x
Exercer livremente o seu direito de reunião, associação e informação x x
Utilizar as instalações da escola bem como os seus recursos nos termos regulamentares x x x
Participação em atividades lúdico-culturais (dispensa das atividades letivas) x
Ser assistido em caso de acidente ou doença súbita no decorrer de atividades escolares x
Fonte: Regulamentos Internos e Códigos de Conduta das escolas
À semelhança dos direitos, as escolas regulamentam mais deveres do que os que estão
previstos no Estatuto do Aluno. Em particular aqueles que remetem para normas de
conduta e de convivência, designadamente para as situações vividas em sala de aula.
As responsabilidades sobre os bens e equipamentos escolares são outro aspeto focado,
prevendo-se com detalhe, nos documentos orientadores, os cuidados a ter na
utilização e manutenção dos materiais. O cumprimento dos deveres escolares e a
informação ou apoio junto dos adultos da escola não são obrigações previstas nas três
escolas, possivelmente por abrangerem dimensões que já estão largamente
regulamentadas nos deveres gerais do aluno.
E1 E2 E3
Dever de manter, utilizar e responsabilizar-se pelos bens e equipamentos x x x
Atuar segundo princípios cívicos: ter uma conduta ordeira, assídua, pontual, obediente… x x x
Evitar riscos, perturbações, atos ilícitos ou proibitivos x x x
Cumprir com as responsabilidades escolares (justificação de faltas, plano de recuperação,
x x
desempenho de funções atribuídas, etc.)
Informar e/ou solicitar apoio de um agente educativo, caso surja algum problema (não
x
solucionável localmente)
Fonte: Regulamentos Internos e Códigos de Conduta das escolas
68
não estando prevista qualquer participação na elaboração dos mesmos. Na
programação de atividades a escola E3 apresenta uma fraca colaboração e
envolvimento dos alunos, ao contrário das escolas E2 e E1, que os incluem na
construção dos planos de atividades, conhecimento e definição de regras, dos critérios
de avaliação, dos temas a abordar e das atividades a desenvolver – podendo ser
propostas e executadas pelos próprios discentes.
Apesar de não estar previsto o envolvimento dos alunos nos órgãos de decisão, em
termos gerais, constatámos nos Regulamentos Internos a indicação de diferentes
formas de organização das atividades escolares com vista à promoção da participação
dos alunos na vida escolar. Situando-se entre as secções de direitos e deveres do
aluno, os documentos das três escolas integram, de maneira mais sumária (E1, E2) ou
mais detalhada (E3), um ponto relativo à representação dos alunos. Nas três escolas,
as responsabilidades dos delegados e subdelegados estão relacionadas com os seus
deveres de representação da turma, que implicam: a solicitação e integração de
reuniões, promoção da articulação e cooperação entre os alunos e os professores e a
Direção de Turma; e a coordenação dos processos de consulta, informando, e
conhecendo a opinião da turma. Por sua vez, a escola E3 estipula as competências e
perfis dos representantes dos alunos, de acordo com os valores e princípios
promovidos pela escola – nomeadamente a assiduidade, pontualidade, o sentido de
responsabilidade, de justiça e de entreajuda e solidariedade – além de boas
capacidades de relacionamento e de intervenção nos conflitos. Ser um elemento de
coesão da turma e de ligação entre a turma e o diretor de turma também correspondem
às características indicadas, e integram o conjunto de competências relativas à
representação, participação e comunicação estabelecida entre os alunos e os órgãos
deliberativos e consultivos da escola.
34Salvaguarda-se que a avaliação externa na escola E2 foi realizada em 2007, estando a decorrer uma nova
avaliação no ano letivo 2012/2013.
69
(alternativo) para a resolução dos problemas de violência e agressividade nos espaços
educativos.
Tomando por referência os parceiros identificados pelas escolas nos seus documentos
orientadores, distribuímos as entidades respetivas pela tipologia institucional
anteriormente adotada35. A escola E2 é aquela que apresenta um leque de relações
mais abrangente, relacionando-se com todos os tipos de instituição, seguida pela
escola E3. Tais resultados reforçam o que na análise de redes apresentada
anteriormente se concluiu relativamente a cada território. Por um lado pela
diversidade e maior consistência das relações entre parceiros do mesmo território, por
outro, pela assunção da escola E2 como elemento aglutinador e promotor da rede do
seu território.
35
Explicitada na análise de redes dos agentes locais, ponto 1 do capítulo III. Territórios.
70
Quadro 16 - Parceiros identificados nos documentos orientadores das escolas
T1 T2 T3
Tipo institucional Entidades parceiras
E1 E2 E3
Autarquia x x x
Autárquica ou Oficial
Instituições Públicas (Sociais) x x
não judiciária
Institutos Técnicos (Formação/ Emprego) x
Programas Comunitários x x x
Associação, Projeto ou IPSS/ ONG x x x
Programa Associações Culturais/ Desportivas x x
Associações de Pais e EE x x
Saúde Centro de Saúde x x x
Policial ou Judicial Forças de Segurança x x
A partir da análise às entrevistas aos responsáveis escolares das três escolas foi
possível compreender uma significativa uniformidade das representações sobre a
violência na escola. Nos discursos dos entrevistados há referências explícitas às
diferentes dimensões do fenómeno, seja a física, a psicológica ou a verbal. O aluno
violento é entendido pelos entrevistados como uma fonte de preocupação e de elevado
36
Os seis elementos entrevistados residem no concelho em estudo. Na sua maioria têm uma vasta
experiência de desempenho de funções em cargos de liderança escolar, embora com formações iniciais
muito diferenciadas.
71
desafio para a gestão da escola, considerando como problema prioritário e de extrema
importância, seja para a escola em geral, seja para os alunos em particular.
(...) é aquele que, sem nós darmos por ela, está “molestar” os outros é mais difícil de
detetar – é a maior preocupação! [Diretora Escola E2]
Um aluno violento é aquele que não se respeita nem a si nem aos colegas e
constantemente! Porque a partir do momento que ele agride, seja verbalmente, seja
fisicamente um colega também... Ele também não está... E só vem basicamente para a escola
com essa intenção... Além de estar a prejudicar os outros colegas, está a estragar o seu
futuro. Por isso é que eu digo que ele não tem respeito por si próprio. Porque, o que é que ele
vais ser? É isso sempre que eu os questiono: "O que é que tu vais ser? Como as coisas como
estão no país, tu não vês?" [Delegado Segurança Escola E1]
Eu acho que é um pouco de tudo, na minha opinião, não é? Ora um aluno que, realmente,
não tenha objetivos em termos de aprendizagem, se é obrigado pelo EE ou por um regime
qualquer a vir para um local – que é a escola – onde ele está sujeito a regras e neste
momento ele não tem objetivo nenhum, eu acho que uma coisa leva à outra, não é? Para
alguns alunos pode ser efetivamente o fator: não tem vontade nenhuma de aprender, nem de
estudar e então vai chatear; ou o contrário – porque há problemas exteriores que traz para a
escola: uma família desintegrada ou alguém que... Efetivamente, se são miúdos com
problemas de personalidade, porque há fatores familiares que aí são bastante evidenciados e,
efetivamente, a aprendizagem já aí está. [Diretora Escola E1]
72
tarde. Em grande medida, porque para os entrevistados se trata de um momento mais
propenso para que haja mais comportamentos agitados. Outra justificação prende-se
com a exiguidade dos espaços escolares destinadas à prática de jogos ou brincadeiras
nos intervalos (por vezes usam as salas de aulas ou outros espaços de aprendizagem).
Nas descrições e explicações sobre os incidentes no recreio na sua maioria os
entrevistados enquadram estes incidentes no que consideram ser um processo de
crescimento e adaptação das crianças à escola. Há nos seus discursos uma
naturalização relativamente ao comportamento violento dos alunos, referindo-se às
caraterísticas das faixas etárias e etapas de desenvolvimento em que se encontram os
alunos. Na sua totalidade os entrevistados declararam que a violência está a diminuir
progressivamente nos seus espaços escolares, associando de forma significativa a
ocorrência de incidentes às características da população escolar e da localidade.
73
relativamente à orientação para a intervenção prende-se com as principais
dificuldades, nomeadamente, o controlo do cumprimento de regras nos pátios.
Organizacionalmente orientam a intervenção a partir de um modelo por etapas, que
define os procedimentos de diagnóstico, o plano de ação, as modalidades de
participação, a divulgação dos resultados, a reflexão e (re)adequação dos
procedimentos.
No âmbito das orientações para a intervenção definidas pelas direções das três escolas
as equipas dos gabinetes de intervenção ocupam uma posição central. A estas equipas
cabe o desempenho de uma função de mediação, fundamental na operacionalização
dos procedimentos definidos pelas escolas. Pela sua constituição essas equipas
usufruem de um elevado grau de influência junto dos vários níveis hierárquicos da
organização escolar, seja na liderança de topo, seja nas intermédias, seja ainda junto
dos restantes professores e funcionários das escolas. O encaminhamento para os
gabinetes de intervenção disciplinar depende do local das ocorrências e da gravidade
da situação. Em cada escola a definição dos procedimentos é específica e depende, em
grande medida, das modalidades de distribuição da autoridade, por um lado, e da
definição de gravidade das ocorrências, por outro.
74
Na escola E1 a uniformização dos procedimentos de atuação apoia-se na organização
do Gabinete de Intervenção disciplinar. O gabinete tem uma equipa e espaço próprios,
e procede ao atendimento direto dos alunos em conflito, cabendo-lhes a função de
registo das ocorrências e consequente transmissão das informações para os órgãos e
entidades respetivas. Nesta escola o gabinete produziu Fichas de relato, onde se
inscrevem a participação e encaminhamento das ocorrências. Por outro lado, são
distribuídas as instruções de atuação a toda a comunidade educativa, nomeadamente
na sala de aula na mesa dos professores ou anexado aos livros de ponto. Em casos
considerados graves cabe à direção atuar.
Quadro 17 - Responsáveis pela intervenção, por local das ocorrências e gravidade, por
escola
75
essencialmente com a atitude dos autores e do contexto em que ocorre o ato. A justiça
na operacionalização dos critérios e aplicação das medidas disciplinares constitui uma
das preocupações expressas pelos responsáveis desta escola.
Canalização de recursos para a regulação da violência: disponibilização de um espaço para mediação de conflitos e
E1 acompanhamento das ocorrências;
Carências de RH em parte superadas pelos técnicos colocados ao abrigo do Programa TEIP
Canalização de recursos para a regulação da violência: conjunto alargado de projetos direcionados para a diminuição da
E2 violência na escola (nomeadamente, treino de competências sociais)
Carências de RH em parte superadas pelos técnicos colocados ao abrigo do Programa TEIP
Canalização de recursos para a regulação da violência: Oferta variada de clubes e atividades (frequência diferenciada
segundo o perfil do aluno);
E3
Carências de RH: Gestão estratégica de RH, a escola dispõe de 2 mediadores, 1 técnica de serviço social e 1 vigilante
GCSE.
76
2.3 RELAÇÕES DA ESCOLA COM O EXTERIOR: FAMÍLIAS, ENTIDADES LOCAIS E
FORÇAS DA SEGURANÇA
As famílias
As famílias dos alunos são atores distintos quanto à natureza das relações e vínculos
estabelecidos com as escola. O contacto com os Encarregados de Educação é
entendido pelos responsáveis das escolas tanto como obrigação e como necessidade.
Por esse motivo as direções têm uma postura generalizada que privilegia a promoção
da comunicação e colaboração com estes. No entanto, apontam para níveis
contrastantes de envolvimento quando caracterizam a relação que se estabelece entre
a escola e as famílias dos alunos. Associam de forma significativa um maior
dinamismo e elevada participação nos assuntos escolares às famílias que designam
como “estruturadas” e o oposto para as famílias que consideram “desestruturadas”, e
que reúnem um conjunto de condições que consideram explicativas para a falta de
investimento e acompanhamento escolar dos seus filhos, como parcos recursos
económicos e escolares, serem imigrantes ou encontrarem-se em condição de
exclusão social. Relativamente à colaboração e participação na vida da escola
distinguem entre os pais colaborantes com a escola, os pais que responsabilizam a
escola e os pais que se demitem das funções parentais, criando obstáculos e resistindo
à intervenção da escola. Para este último tipo várias ilustrações foram dadas,
explicando que nestas situações é acionado, imediatamente, um processo de
sinalização e participação às entidades competentes, como a CPCJ.
O que exigem à escola não é muito diferente, a maneira de exigir é que é [Delegada
de Segurança Escola E2]
Há alunos que se nós telefonarmos aos pais, o aluno vem "direito" no outro dia,
pronto! [Risos] Percebe o que eu quero dizer? Que basta isso para resolver a situação.
Porque muitas das vezes é desconhecimento do EE. E de vez em quando não é por mal, é
porque entra às oito e sai às oito da noite e não consegue. Não consegue, pronto! [Delegado
Segurança Escola E1]
77
As relações com as entidades locais são estabelecidas através de protocolos de
parceria. Em grande parte essas parcerias passam pela cedência de recursos escolares.
As escolas E3 e E2 têm protocolos de parcerias de concessão de alguns espaços nos
seus estabelecimentos escolares a outras entidades locais dirigidos para a realização
de atividades desportivas (com usufruto ou não dos seus alunos) ou recreativas (como
eventos de congregações religiosas ou atividades da associações de pais e de diversas
instituições locais). Além do pavilhão gimnodesportivo da escola, na E3 referem
também a cedência do refeitório e outros espaços escolares. Neste âmbito as direções
das três escolas salientam a promoção e/ou o desenvolvimento de projetos/ planos de
formação, como por exemplo: cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA,
níveis B1, B2 e B3), Português Para Todos (PPT) e cursos de Alfabetização (EFCB).
A escola E3, além de realizar cursos de PPT e de Alfabetização (EFCB), promove
ainda o desenvolvimento de cursos extra escolares (mediante uma parceria
estabelecida com a Comissão Social de Freguesia, o Programa K’Cidade e a
Associação Islâmica da localidade, e formações de curta duração (através de um
protocolo com a escola profissional do concelho vizinho):
Uma escola inserida numa comunidade destas é uma escola da qual se exige muito –
temos investido nas parcerias porque nos permite movimentar numa série de situações. A
escola não se pode fechar sobre si própria. Isto é um porto seguro, os alunos sentem isso e
queremos que os pais também o sintam. [Diretora Escola E3]
78
indiretamente, também em alguns casos está a par ou leva alguns casos de situações...
[Diretora Escola E1]
E1 E2 E3
Consideram haver autonomia para regular X X X
Manifestam concordância com as medidas e programas desenvolvidos pela
X X
tutela
Estabelecem um relacionamento com Positivo (diálogo, entreajuda) X
a tutela Negativos (conflituoso)
Consideram haver ausência de recursos/ apoios X X
Consideram que há uma imposição legislativa, desadequada às condições e
X X
características da escola
Consideram haver instabilidade na regulamentação do enquadramento legal X X
Consideram que os normativos impedem uma boa resposta de atuação X
79
De uma forma geral, os responsáveis das três escolas consideram haver autonomia
para a regulação das situações de conflito, considerando haver uma maior inibição na
prevenção do que na intervenção, devido à carência de recursos:
Nós é que temos de resolver as situações de conflito. À exceção da legislação e das medidas
de transferência, em que estamos dependentes da tutela, somos nós que resolvemos. Em
termos de prevenção, dependemos dos recursos da tutela... Para ter mais recursos humanos,
por exemplo mais um vigilante, só com a ajuda da tutela. Câmaras de vigilância também não
temos... [Diretora Escola E3]
Só que nós tivemos um grande – estamos a ter um grande problema, muitas baixas, o
Ministério demora muito tempo a substituir. Porque para uma pessoa que mete baixa nós
demoramos quase cerca de um mês para ter cá alguém. Porque o Ministério demora cerca de
15 dias para nos dar resposta se não tem ninguém de quadro de zona, que esteja com horário
zero e que possa vir para cá [Delegado Segurança Escola E1]
80
3. A PERSPETIVA DOS PROFESSORES
81
permitindo aos professores responder através da internet. O desenvolvimento desta
estratégia de inquirição teve boa aceitação por parte dos responsáveis escolares, que
nos encontros presenciais colaboraram no processo de divulgação e solicitação de
preenchimento do questionário. Foi realizado um pré-teste (entre 8 e 12 de Outubro),
cujos resultados permitiram avaliar e validar as questões definidas. Assim, em
colaboração com as direções das escolas, estabeleceu-se como período de
preenchimento dos questionários o período entre 15 de outubro e 4 de novembro,
prazo que se previa alargado para que todos respondessem. No entanto, apesar da
mobilização dos docentes, o número total de respostas na data prevista não se revelou
satisfatório. De modo a garantir o volume de respondentes planeado, as direções
desenvolveram conjuntamente com a equipa de pesquisa estratégias alternativas de
mobilização dos professores. Apesar disso, em apenas uma escola o número de
respostas aumentaram mais significativamente face às solicitações das direções,
prolongando-se por essa razão o prazo de aplicação do inquérito até 15 de Dezembro.
Apesar dos obstáculos encontrados na aplicação, foi possível recolher um conjunto
significativo de resposta.
Total de % de
Total de Professores
Respostas inquiridos
Escola E1 100 34 34%
Escola E2 75 34 45%
Escola E3 87 57 65%
Total 262 125 48%
82
Quadro 22 - Sexo e idade dos docentes inquiridos (%)
Ser professor é para a maioria dos inquiridos a profissão que desempenham há pelo
menos 10 anos. Este indicador converge com a idade na análise por escola,
verificando-se maior antiguidade na profissão para os docentes da escola E1. Se
considerarmos o número de anos na escola como indicador de estabilidade do corpo
docente, constata-se que em geral estas escolas são estáveis, na medida em que têm
cerca de 84% dos seus professores há pelo menos 3 anos na escola. Estes valores
alteram-se ligeiramente na análise por escola, com menor número de professores
recentes (0 a 2 anos) na escola E1.
A maior parte dos professores inquiridos leciona e desempenha outro cargo ou função
na escola, especialmente na escola E1 em que 85,3% dos docentes se encontra nesta
situação. Entre os cargos ou funções ocupadas, as mais comuns relacionam-se com a
direção de turma ou responsabilidades de liderança intermédia (como coordenação
dos diretores de turma de ciclo ou coordenação de departamento). As tarefas de
coordenação ou apoio a atividades estão mais presentes na escola E2, neste caso,
acima dos cargos de liderança intermédia – o que aponta possivelmente para uma
coordenação organizacional mais apoiada em projetos/ iniciativas do que em
estruturas formais de articulação. Por sua vez, na escola E3 há a mesma proporção de
professores com funções não letivas, além das letivas, e de professores com cargos de
liderança intermédia.
83
Quadro 24 - Situação na escola e cargos ocupados pelos docentes inquiridos (%)
Neste breve retrato verifica-se que os inquiridos são na sua maioria do sexo feminino
e têm entre os 41 e os 50 anos, estão há pelo menos 10 anos na profissão e na escola
respetiva há mais de 3 anos, na qual lecionam e ocupam outro cargo ou função,
tendencialmente enquanto diretores de turma. Hipoteticamente os não respondentes
serão docentes mais novos, há menos tempo na profissão e/ou na escola, ou pelo
contrário, m