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A HORA DA

REFEIÇÃO
de Luís Gonçalves

2ª Versão

telemóvel: 916940893
Email: goncalvesluis_1@hotmail.com

Copyright 2022 by Luís Gonçalves


Todos os direitos reservados
PERFIL DOS PERSONAGENS:

Miguel:
Miguel Francisco dos Santos Pereira, é um rapaz de 30 anos, alto e
magro. É divorciado, o que o faz muito feliz. Vive com os filhos e
o seu gato La Festas, por quem sente um grande amor e carinho,
numa casa situada na aldeia da cova da passarinha. Usa óculos de
massa, cabelos um pouco compridos, bigode. Usa uma camisa ás
riscas azuis e brancas, umas calças de ganga e uns ténis pretos.
Trabalha numa fabrica de luvas. É mimado pela sua mãe, é
esquecido, preguiçoso, um bocado atrapalhado e meio estúpido. Tem
um bom coração. Adora a banda portuguesa 4on Route. Tem fobia de
ratos e gosta de divulgar a sua vida toda nas redes sociais.

La festas:
É uma pessoa fantasiada de gato branco e preto, de raça comum
europeu com 6 meses de idade. Consegue ouvir e entender algumas
coisas que os humanos dizem, mas eles não o ouvem nem o entendem
apenas ouvem o seu miado. La Festas é um gato um pouco maldoso,
mal-humorado, oportunista, traiçoeiro, gozão, guloso e vingativo.
Mas também é esperto, inteligente e territorial. Odeia o
veterinário por o ter castrado. Apesar dos conflitos com o seu
dono até gosta dele.

Bandido:
Chama-se Zé Manel e tem 25 anos. Tem o corpo robusto. Usa pera e o
penteado em forma de crista. Tem um brinco e um piercing. Anda
disfarçado de carteiro e tem uma sacola. É um criminoso perigoso
conhecido pela policia, vingativo e meio idiota. Faz de tudo para
conseguir dinheiro e não ter de trabalhar.

Policia 1:
Tem 35 anos, bem constituído e é sargento da policia.

Policia 2:
Tem 26 anos, magro e é cadete da policia.

Carteiro:
Tem 40 anos e é um pouco forte. É um carteiro de verdade e traz
consigo uma sacola.
PRÒLOGO
Esta história passasse na Aldeia da cova da Passarinha. A
aldeia é ficticia e tem esse nome porque foi fundada no ano 1894
por uma senhora conhecida por “Ti Passarinha” por andar com um
passaro ao ombro.
CENA 1
Casa do Miguel

Cozinha

Há uma janela, duas portas. Uma do lado esquerdo do palco que dá


para a rua e outra do lado direito que dá para as outras divisões
da casa. Um frigorífico, um relógio de parede, um armário com
copos. Uma banca com gavetas, em cima desta estão dois frascos. Há
uma mesa com 4 cadeiras à volta. No chão, está uma taça vazia da
comida para o gato e uma vassoura encostada na parede.

Há uma música.

Abre-se o pano. O palco está sem ninguém.

Miguel entra na cozinha pela porta da esquerda com uma saca das
compras, mete-a em cima da mesa e fala para o público.

MIGUEL
Finalmente em casa. Estava a ver que nunca mais
saída daquela maldita fábrica das luvas, chiça! O que
vale é que hoje folgo à tarde, senão ainda enfiava uma
luva na boca do meu chefe. Sempre a mandar vir comigo.
Que eu sou um inútil e nem para sanita sirvo. Se isto se
diz alguém! E ainda tem a coragem de dizer que foi parar
à fabrica das luvas, porque caí de paraquedas. Grande
mentiroso! Se eu vou todos os dias de carro. Ele é que é uma
grande besta é o que é! E eu é que o tenho que aturar. Bom,
mas isso agora não interessa, pois o mais importante é que
está na hora da refeição e eu vou comer um rico bacalhau
cozido com umas batatas cozidas que a minha mãezinha me
fez. Pois, é que a minha santa esposa decidiu me deixar.
Trocou-me por um anão. Como é que ela teve a coragem de fazer
uma coisa destas? 10 anos de casados, hã! 10 anos de casados
e não foi capaz de me trair mais cedo. Já estava farto dela até
à pontinha dos cabelos e os meus cabelos ainda são um pouco
compridos. Era Miguel para aqui, Miguel para ali. Miguel
larga o sofá e ajuda-me a fazer isto. Era Miguel ajuda-me
fazer aquilo. Olha os miúdos que estão todos ranhosos. Fogo!
Abençoado par de cornos!

Miguel tira um tupperware da saca e abre a tampa.

MIGUEL (CONT)
Aqui está o bacalhau da minha mãezinha. Ah! Mas que
delicia! Quem tem uma mãe tem tudo! Mas ainda falta uma
coisa muito importante que comprei ali na taberna do
“Vira Picheiras”.

Miguel tira da saca uma garrafa de vinho tinto com um rotulo que
diz “Oferta da casa” e uma raspadinha.
MIGUEL (CONT)
Deixa-me tirar uma moeda da carteira.

Procura a carteira nos bolsos das calças, tira o telemóvel de um


bolso.

MIGUEL (CONT)
Não é isto!

Mete o telemóvel no bolso.

Volta a procurar a carteira em outro bolso.

MIGUEL (CONT)
Mas onde enfiei a...? Ah! Está aqui!

Tira a carteira do bolso.

Abre a carteira, tira uma moeda e raspa a raspadinha.

MIGUEL (CONT)
Yes! Yes! 5000 euros! 5000 euros! Eu não acredito que
ganhei 5000 euros numa raspadinha! Isto tem de ir para o
facebook! Os meus amigos tem de saber que eu ganhei 5000
euros.

Pega no telemóvel e tira uma fotografia.

MIGUEL (CONT)
Agora é só enviar para o meu perfil do facebook!
[escreve e lê] “Meus amigos facebookanos, vejam só o
prémio que ganhei nesta raspadinha”. [toca no ecrã do
telemóvel] Pronto! Já está enviado!

Pousa o telemóvel na mesa, mete a raspadinha num bolso.

MIGUEL (CONT)
Deixa-me guardar a raspadinha no bolso. Depois tenho
de voltar à taverna para receber o prémio.

Abre uma gaveta da banca, tira os talheres, um abre-garrafas e um


guardanapo. Tira um copo do armário e senta-se á mesa. Abre a
garrafa do vinho, enche o copo e começa a comer.

MIGUEL (CONT)
Hum! Que delicia de bacalhau!

Ouve-se um gato miar.

MIGUEL (CONT)
O La Festas chegou! [fala para a esquerda] Já vai
La Festas! Já vai!
Miguel abre a porta.

CENA 2
Entra o gato La Festas

LA FESTAS
Livra estava a ver que não me abrias a porta!

MIGUEL
Mas por onde é que este gato tem andado?

LA FESTAS
Tenho andado aos ratos e a dar no focinho dos gatos que
se atrevem aparecer aqui à porta da casa. Eu defendo o que é
meu. Ou tu pensas que eu sou como tu? Não é, ó corno?

MIGUEL
Tão querido este gato! O que é que esta cabeça de gato
estará a pensar?

Miguel senta-se a comer.

LA FESTAS
Estou a pensar que estou com uma fome do caraças.
A caça hoje saiu-me furada. Vê lá tu que vinha eu a andar
na rua, triste por não ter caçado nada. Quando de repente
vejo uma ratazana enorme e gorda muito quietinha em frente
à nossa casa. “Afinal não está nada perdido.”, pensei eu cá
com as minhas patas. Mas quando lhe vou a dar uma trincadela
no pescoço, então não é que o raio da bicha era um porta-chaves
de plástico. Fiquei mesmo desiludido! Parecia mesmo real! Nem sei
como não parti um dente com a brincadeira

La Festas olha para a taça da ração.

LA FESTAS
Taça vazia? Ouve lá ó corno! Então deixas
a taça vazia?

La Festas mia.

MIGUEL
O que tu queres La Festas? Porque estás a miar?
Eu não sei falar a tua língua. Eu não sei falar
“gatês”!

LA FESTAS
Nem “gatês”, nem Português. Mas não te preocupes que não
és o único. Há muitos Portugueses que não sabem falar
Português. E alguns até treinam clubes de Futebol! Vá! Mas
(MAIS)
LA FESTAS (CONT)
dá-me lá qualquer coisa para comer, senão daqui a pouco o
meu estômago encolhe.

La Festas mia.

MIGUEL
Mas o que ele quer? Será que está sem comida
na taça?

Miguel levanta-se e vai até à taça.

MIGUEL (CONT)
Ah! Tens toda a razão, La Festas. Não tens comida
na taça. Que cabeça a minha! Desculpa meu amor!

LA FESTAS
Amor? Fogo! Vai chamar amor a outro. Preferia ser
amor de um burro!

Miguel tira uma saca da ração de um armário e despeja na taça.

MIGUEL
Vá! Toca a comer!

LA FESTAS
Outra vez ração de frango? Não tens por aí outra
coisa mais saborosa? Uns fígados de galinha, ou uns
patés de salmão?

Miguel volta a meter o saco no armário e senta-se a almoçar.

LA FESTAS (CONT)
Não ouviste o que eu disse? Eu quero comer outra coisa!

La Festas mia.

MIGUEL
O que foi? Já estás a ser chato!

LA FESTAS
Se não me deres outra comida melhor, vou ficar mesmo chato.
Pois faço greve de fome. Depois já estou a ver a cena. Tu
metes no facebook e ainda aparece para aí a CMTV. [imita os
jornalistas] Noticia de ultima hora! Numa aldeia perto da região
centro, chamada Aldeia da Cova da Passarinha, tem um Gato chamado
La Festas que faz greve de fome porque o seu dono é uma
grandessissima besta quadrada. [fim da imitação] E ficava famoso
durante uns tempos e tu também. Mas agora a falar a sério.
Dá-me outra coisa para comer por favor. Estou mesmo cheio
de fome.

La Festas mia.
MIGUEL
Ó La Festas deixa-me comer o bacalhau!

LA FESTAS
Bacalhau? Tu estás a comer bacalhau?
No outro dia ali a vizinha deu-me um bocado
e eu gostei. Dá-me lá um bocadinho de bacalhau.

La Festas mia ao pé de Miguel.

MIGUEL
Mas o que queres La Festas?

LA FESTAS
Quero bacalhau, pá.

La festas mia.

LA FESTAS (CONT)
Bem! Vamos lá fazer um pouco de manha
para ver se funciona.

La Festas roça a sua cabeça na perna de Miguel.

Som de ronronar do gato.

MIGUEL
Ah! Queres é festas não é La Festas?

Miguel faz festas ao La Festas.

La Festas salta para cima da mesa.

MIGUEL (CONT)
Não La Festas! [tira o tupperwere da mesa] Este
bacalhau é para mim! Tens ali a tua ração para
comeres.

LA FESTAS
Então come-a tu! Já estou enjoado dessa porcaria.

La Festas vai para o chão.

Miguel, volta a meter o tupperwere na mesa e volta a comer.

LA FESTAS
Dá-me só um bocadinho de bacalhau, não sejas
egoísta.

La Festas mia.
MIGUEL
Já disse que não, La Festas!

LA FESTAS
Mas porquê? Mas porque és assim? [pausa]
Desculpa mas eu não consigo resistir.

La Festas volta a saltar para cima da mesa.

MIGUEL
Outra vez em cima da mesa? Mas tu queres ir
lá para fora?

Miguel dois murros na mesa e La Festas vai para o chão.

LA FESTAS
Pronto, está bem! Não me dás um bocado, não é? Então deixa
estar que quando eu caçar uma ratazana, faço uma churrascada
com os meus amigos e não te dou nada a ti.

La Festas faz um miado triste.

MIGUEL
Oh! Não fiques assim La Festas. Eu não faço isto para
teu mal. O veterinário é que diz que tu não podes comer
bacalhau porque tem sal e faz mal aos gatos.

LA FESTAS
Veterinário? Nem me fales nesse animal. Tirou-me os meus
ricos tintins e nunca mais me os devolveu. Agora por causa
dele não posso fazer “La Festaszinhos” com as gatas. [pensativo]
Mas para que é que aquele gajo queria os meus tintins? Os
humanos são mesmo uns seres muito estranhos! Deviam ser
estudados! Cá para mim, foi para comer com ovos mexidos. Não!
É melhor nem pensar nisso, pois isso é muito bizarro. Bem lá vou
eu ter de comer aquela maldita ração.

Ouve-se o som das notificações do facebook.

Miguel pega no telemóvel. La Festas vai até ao comedoiro e come a


ração.

MIGUEL
Ena pá! Tanto comentário à minha publicação da raspadinha.

LA FESTAS
Raspadinha? Que raspadinha?

MIGUEL
Ali o meu vizinho João e a sua esposa Glória também
comentaram e os meus colegas de trabalho também. Tudo
falsidade, pois o que eles têm é inveja. Oh! O professor
(MAIS)
MIGUEL (CONT)
Marcelo Rebelo de Sousa também comentou.[lê no telemóvel] “Caro
amigo Miguel Francisco dos Santos Pereira. Parabéns pelo seu
prémio da raspadinha! Invista bem esse dinheiro. Assim que puder,
irei lhe fazer uma visita aí à Aldeia da Povoa da Passarinha para
tirarmos uma selfie os dois.

Miguel continua a mexer no telemóvel

LA FESTAS
Então quer dizer que tu ganhaste dinheiro numa
raspadinha e não me dizes nada!

MIGUEL
Olha! Até o meu chefe comentou. [lê a mensagem do
telemóvel] “Miguel, parabéns pelo teu prémio da raspadinha.
Acho que tu mereces!”. [para de ler] Também eu!
[continua a ler] “Aproveita o dinheiro e investe num cérebro
novo para ver se ficas mais inteligente.”

LA FESTAS
Até nem era mal pensado!

MIGUEL
O meu chefe é mesmo uma besta!

Miguel mete o telemóvel em cima da mesa.

LA FESTAS
Não. O teu chefe é um génio. [continua a comer a ração]
Não consigo comer mais esta porcaria. Parecem
caganitas de rato. Eu gosto mais de comida húmida. Mas
tu ainda não entendeste isso.

La Festas aproxima-se do dono.

LA FESTAS (CONT)
Desculpa lá Miguel. Mas vais ter de me dar um pouco
do teu bacalhau.

La Festas mia.

MIGUEL
O que queres La Festas? Já te disse que não te
posso dar da minha comida.

LA FESTAS
[solilóquio] Já sei! Tive uma brilhante ideia!

La festas dá três pancadas no armário. Miguel levanta-se e vai


abrir a porta da esquerda.
LA FESTAS (CONT)
[ri] Que estúpido!

La Festas salta para cima da mesa.

Miguel fecha a porta.

MIGUEL
Não era ninguém. Deve ter sido o filho do vizinho.
Bate na porta e depois foge, só para gozar com a minha
cara. Quando o apanhar vai ver!

Miguel dirige-se á mesa e vê La Festas está a comer o seu almoço.

MIGUEL (CONT)
O que estás a fazer La Festas? Eu já te disse que não
pode ser, caramba. Vais já para a rua.

Miguel arrasta o La Festas à força até à porta da rua. La Festas


tenta se libertar do dono.

LA FESTAS
[grita] Não! Por favor! Não me metas na rua! Eu não
estou a fazer nada de mal! Só quero comer a tua comida.

Miguel abre a porta e empurra o La Festas para a rua e em seguida


fecha a porta.

CENA 3
Ouve-se miar lá fora.

MIGUEL
[fala para a porta] Podes miar à vontade que não
tenho pena nenhuma de ti! Ninguém te manda ser guloso [pausa]
Oh! Pobrezinho! Vou-lhe abrir a porta. Não! È melhor comer
primeiro, depois abro-lhe a porta.

Fim do miado.

Miguel senta-se a comer.

Ouve-se um zumbido de uma vespa e o Miguel salta da cadeira.

NOTA: A vespa não se vê, apenas ouve-se o zumbido

MIGUEL (CONT)
Uma vespa asiática! Uma vespa asiática! Mas como
é que esta maldita entrou cá para dentro? E agora o que eu
faço? Tenho que me livrar dela senão ainda me dá uma ferradela
e eu tenho alergia ás picadelas destes insetos!

Miguel abre a gaveta de uma banca e tira um jornal. Enrola-o e


tenta matar a vespa com ele. Mas ela foge. Miguel percorre a
cozinha batendo nos seus moveis com o jornal para tentar matar a
vespa e fugindo para não ser picado.

MIGUEL (CONT)
Maldita vespa que não se deixa matar! Ai! Ai! Ai!
Que me vai picar! Tu não me piques ouviste?

Miguel abana o jornal tentando matar a vespa.

MIGUEL (CONT)
Não consigo a matar! É mais esperta que eu.
E se eu abrir a janela? Pode ser que ela saia.

Miguel abre a janela.

MIGUEL (CONT)
[para a vespa] Vai te embora sua vespa de um raio!

Miguel abana o jornal pelos cantos da cozinha espantando a vespa.

CENA 4
La Festas entra pela janela com um rato na boca.

Miguel fala para a vespa asiática.

MIGUEL
Isso vai! Desaparece daqui sua vespa asiática!
Maldito inseto! Finalmente se foi embora!

Miguel fecha a janela. La Festas mete o rato no chão

Fim do zumbido da vespa asiática.

LA FESTAS
Maldito inseto o quê? É picante! Puxa bem com
cerveja! Tenho que te ensinar tudo!

La Festas mia

MIGUEL
La Festas?! Mas, como é que entraste cá para dentro?
[pensativo] Oh! Claro! Entrou pela janela.
Sou mesmo burro!

LA FESTAS
[irónico] Não és nada burro, não. O teu cérebro é que tirou
umas férias.

MIGUEL
Mas o que tens aí ao pé de ti?
Miguel olha.

MIGUEL (CONT)
[assustado] É um rato! Um rato!

Miguel salta para cima da mesa.

LA FESTAS
Escusas de ficar tão excitado que não é nada para
ti. Não me deixas comer o teu bacalhau, por isso
também não te dou o rato. A menos que queiras trocar.

La Festas mia.

MIGUEL
Como é que foste capaz de trazer essa coisa para aqui?

LA FESTAS
Então, com os dentes, como é que havia de ser?

MIGUEL
Mas onde é que eu tinha a cabeça quando me lembrei
de te trazer cá para casa?

LA FESTAS
Isso digo eu. Onde é que eu estava com a cabeça para ser
trazido cá para casa? Era tão feliz em casa da minha
antiga dona. Era cá uma boazona a mulher!... Não era como a tua
esposa, aquela que te meteu os chifres, que é magra que nem
um “esculipau”. Aquilo só se fosse para chupar os ossos...
Agora a minha antiga dona, era bem carnuda a mulher. E pernas? Oh!
Tinha cá umas pernas a rapariga, até serviam de arranhador
e tudo. Agora tu, nem para caixa de areia serves. E isso
deixa-me tão revoltado que por causa disso, no outro dia passei-me
da carola, mandei 3 marradas com tanta força nos azulejos da casa
de banho e de repente comecei a entender a voz dos seres humanos.

Nisto alguém dá 3 pancadas bem fortes na porta. O La Festas foge


para debaixo da mesa.

MIGUEL
Porra! Mas o que é isto? Parece
o terramoto de 1755. [pausa] Quem é?

BANDIDO (VOZ OFF)


É o Carteiro!

Miguel sai da mesa para o chão, abre a janela e pega no rato.

MIGUEL
Ai que bicho tão nojento!
LA FESTAS
Não! Não faças isso! Não faças isso! O rato é meu!

Miguel joga o rato fora. Volta a fechar a janela.

LA FESTAS (CONT)
Seu imbecil! Isto não vai ficar assim!

CENA 5
Miguel abre a porta e o bandido entra.

BANDIDO
Ora viva amigo! Posso entrar?

MIGUEL
Já cá está dentro!

BANDIDO
Desculpe estar a incomodar está na sua hora da refeição.

MIGUEL
Não tem mal! Veja lá é se da próxima vez bate
com menos força na porta.

BANDIDO
Porquê? Magoei a porta?

MIGUEL
Não! Mas assustou-me a mim e ao meu gato.

BANDIDO
Ai tem um gatinho? Tão fofinho! [para o La Festas] Anda cá!
Bicho! Bicho! Bicho!

LA FESTAS
Puxa que cara! Não sabia que os gorilas agora
também entregam cartas nas casas das pessoas.
Bem dizem eles que estamos no fim do mundo.

La Festas bufa e esconde-se debaixo da mesa.

MIGUEL
Veja lá se para a próxima é precisa tirar um curso
para aprender a bater numa porta.

BANDIDO
O quê? Também há cursos para isso?

MIGUEL
Não! Mas devia haver.
BANDIDO
Realmente é verdade. Com tanto curso que há por aí.
Então peço desculpa que para a próxima bato mais
devagar.

MIGUEL
Acho bem, senão vou-me chatear!

La Festas salta para cima da banca. Pega nos frascos e leva para
cima da mesa.

Miguel e o Bandido falam por gestos sem reparar no La Festas.

LA FESTAS
Vamos lá temperar a coisa com um bocadinho de
piripiri.

La Festas despeja um frasco no tupperware.

LA FESTAS (CONT)
E agora, um pouco de laxante. Não! Um pouco mais.

La Festas despeja outro frasco dentro do tupperware, no copo e da


garrafa do vinho.

La Festas mete outra vez os frascos na banca, esfrega as patas e


ri.

LA FESTAS
Isto é para ver se aprendes, Miguelinho.

MIGUEL
Então, mas diga lá o que o traz
por aqui. Senão daqui a nada é a hora
de jantar e eu ainda estou a almoçar.

BANDIDO
Então o senhor é que é o... Miguel... Francisco
dos Santos Nespereira?

MIGUEL
Pereira! Pereira!

BANDIDO
É a mesma coisa. Tenho aqui uma
encomenda para si.

MIGUEL
Uma encomenda para mim? [pensativo] Ai já sei!
Deve ser o cd daquela fabulosa banda de
Paços de Ferreira, os four on Route [4on Route]. É!
Eu encomendei-lhes um cd. Aliás o primeiro cd
deles com o nome a 1ª paragem.
BANDIDO
É! É mesmo isso!

MIGUEL
Finalmente chegou cá o cd. Estou mesmo desejoso para ouvir,
o Zé Nando a cantar e a tocar aquela celebre música “Mundo
Cruel”, acompanhado pelos instrumentos dos seus colegas. José
Matos, Hélder Gonçalves e Miguel Morais.

NOTA: pesquisar a música mundo cruel dos 4on Route no link:


https://www.youtube.com/watch?v=zPF2Glb3tC4

Miguel canta o tema mundo Cruel dos 4on Route.

La Festas tapa os ouvidos.

MIGUEL (CONT)
Mundo Cruel
Mundo Cruel
volta a ser
esperança
de quem quer viver.

BANDIDO
Não é assim! A música está bem, a letra é
que está mal. É assim:
[Canta a mesma música]
Mundo Cruel
Mundo Cruel

Bandido enfia a mão dentro da sacola e em seguida aponta uma


pistola ao Miguel.

Bandido torna-se ameaçador.

BANDIDO (CONT)
A raspadinha para o Zé Manel!

MIGUEL
[ri] Essa está boa! Mundo cruel, Mundo Cruel, a
raspadinha para o Zé Manel.

BANDIDO
Estás a gozar com a minha cara? A raspadinha
para cá! Sei muito bem que ganhaste 5000 euros.

MIGUEL
Eu não sei do que está a falar. Eu quero é o
meu cd dos four on Route [4on route].
BANDIDO
O teu cd dos 4on route? [ri] Ainda não percebeste que
isto é um assalto? Não há cd nenhum!

MIGUEL
Um assalto?

BANDIDO
Sim, seu imbecil! Quem te manda partilhar no
facebook que ganhaste 5000 euros numa raspadina?
Se fosses esperto ficavas caladinho, não?

Miguel fica nervoso.

MIGUEL
[para o público] Ai que eu estou tramado!

BANDIDO
Vamos!

MIGUEL
Vamos para onde?

BANDIDO
Raspadinha para cá, senão disparo!

MIGUEL
Pronto eu digo paro! Já disse!

BANDIDO
Olha que tu não brinques comigo que
eu carrego mesmo no gatilho.

LA FESTAS
Ai de ti que toques no meu dono ouviste?

La Festas bufa para o Bandido.

BANDIDO
O que queres ó gato?

La Festas foge para debaixo da mesa.

Bandido tranca a porta que vai para a rua e enfia a chave no bolso
das calças.

BANDIDO (CONT)
Pronto! Assim estamos mais seguros.

MIGUEL
De...deve haver aqui algum equivoco. Eu... Eu não
ganhei nada. Eu... Eu nem jogo em raspadinhas.
BANDIDO
Mas tu estás a fazer de mim parvo ou quê?
Mas tu pensas que eu não vi no facebook?

MIGUEL
Nã... Não pode ser! I...I...Isso é
impossível.

BANDIDO
Estás-me a chamar mentiroso?

Bandido aproxima-se de Miguel com ar ameaçador e este foge.

MIGUEL
Não! Não! Na... Nada disso! Só estou a dizer que
o que está a dizer nã... não corresponde à verdade.

BANDIDO
O quê? Outra vez a chamar-me mentiroso?

Bandido aproxima-se de Miguel e este afasta-se.

MIGUEL
Nã...não! Não está a entender!

BANDIDO
Agora estás-me a chamar burro?

Bandido aproxima-se de Miguel e este afasta-se.

MIGUEL
Não! Não!

BANDIDO
Olha tu vê lá! Estás abusar! Não gosto que me chamem
burro. Já bem basta as humilhações que passei nas aulas
de Matemática por não saber a tabuada do 1.

MIGUEL
[mentindo] Não! Não é isso! O que eu quis dizer
é que alguma coisa de errado aconteceu aqui... talvez...
talvez eu tenha sido vitima de facejaking!

BANDIDO
Não foi o facejaking, não! Foste tu que me chamaste
burro que eu bem ouvi. Não metas as culpas para cima
dos outros.

MIGUEL
Não! Eu estava a querer dizer que alguém entrou no
meu facebook e partilhou uma raspadinha com o prémio de
5000 euros na brincadeira.
BANDIDO
Pois! Pois! Deves pensar que caiu nessa. Raspadinha para cá,
já!

MIGUEL
Mas eu já lhe disse que não tenho nada, senhor Zé António.

BANDIDO
Estás-me a chamar Zé António, meu palhaço? O meu nome é Zé Manel,
Zé Manel! Zé António é o nome do juiz que me condenou a primeira
vez que fui preso, por ter sido apanhado a traficar as galinhas
dos meus vizinhos. E sabes o que me faziam na cadeia?

MIGUEL
Não!

BANDIDO
Iam-me todos os dias ao pacote.

MIGUEL
[pasmado] Iam-lhe ao pacote?

BANDIDO
Sim. Ao pacote das gomas que eu tinha lá para comer sempre
que tivesse fome. E isso deixou-me bastante revoltado.
Porque eu adoro aquelas gomas, porque tinha o formato de uns
ursinhos estás a perceber? Por isso toma cuidado a próxima vez
que fores para dizer o meu nome.

MIGUEL
Está bem, peço desculpas.

BANDIDO
Agora saca para cá mas é a raspadinha, senão eu dou-te
uma chumbada nessa testa que vais fazer uma viagem
até à quinta das tabuletas.

Miguel marca um numero no telemóvel.

BANDIDO (CONT)
O que é que pensas que estás a fazer?

MIGUEL
Vou ligar à minha mãezinha para avisar que vou
fazer uma viagem. Só para ela não ficar preocupada.

BANDIDO
Vais ligar à mãezinha, vais. Vais é ligar à policia,
não é? Dá cá isso! [tira o telemóvel ao Miguel] É lá! Grande
maquina! É um [tenta falar inglês] “Sangue Sug”!

LA FESTAS
Uma sangue suga precisavas tu eu sei bem onde.
BANDIDO (CONT)
Ainda vou ganhar umas granas à custa dele.

Bandido mete o telemóvel no bolso.

LA FESTAS
Já agora aproveita e enfia-o ao fundo das
costas e espera que ele toque.

La Festas mia e depois bufa.

BANDIDO
O que é que foi ó gato? Vê lá se queres conversa.

LA FESTAS
Tu é que deves querer conversa!

La Festas bufa e foge

MIGUEL
Devolva-me o telemóvel por favor!

BANDIDO
Está mas é calado! Eu vou contar até 5, se não me deres a
raspadinha. Pum! 1,2,3... a seguir ao 3 vem qual?

MIGUEL
Vem o 4.

BANDIDO
Isso sabia eu. [ri] 4...

MIGUEL
[interrompe] Pronto! Eu dou-lhe a raspadinha! Eu dou-lhe a
raspadinha! Mas não me mate, por favor. Não me mate que eu
tenho duas criancinhas para criar e a minha mulher ainda por
cima fugiu com um anão.

BANDIDO
Olha lá! Por acaso não foi com aquele tipo da política?

LA FESTAS
[para o bandido] Não, foi com o teu cérebro.

MIGUEL
Da política? Penso que não!

BANDIDO
Era só uma piada! [ri]

LA FESTAS
Estás cá com umas piadas que eu vou ali e já não volto mais.
BANDIDO
Vá! Passa para cá a raspadinha para eu ir embora. Antes que
apareça por aí a policia. Fogo! Estou cá com uma sorte hoje! Um
telemóvel caríssimo como o fogo e uma raspadinha de 5000 euros.
Para um tipo que está desempregado e sem 1 cêntimo na carteira
não é mau.

MIGUEL
Ai está desempregado? Então olhe, se quiser arranjo-lhe
lugar na fabrica das luvas onde eu trabalho. É pertinho daqui.
Fica ali ao pé das ruínas da casa da falecida Ti Passarinha,
a fundadora desta aldeia. Sabe onde é que é?

BANDIDO
Não.

MIGUEL
É fácil! O senhor Carteiro vai daqui e depois...
e depois... Não sei explicar muito bem o resto.

BANDIDO
Também não interessa. Eu não quero trabalhar.
Trabalhar faz calos nas mãos. Prefiro ganhar
dinheiro através da arte do gamanço.

MIGUEL
Mas isso está errado!

BANDIDO
Como está errado? Até aqueles senhores de fato e
gravata que aparecem na televisão praticam essa
arte. Por isso, se eles podem, também posso. Agora
vamos-nos deixar de conversas e passa para cá a
raspadinha, já!

MIGUEL
Mas... Mas... Mas... eu não a tenho aqui
a raspadinha.

BANDIDO
Então tens onde?

MIGUEL
Não sei onde a meti.

BANDIDO
Então procura!

LA FESTAS
Tenho de fazer alguma coisa para
salvar o Miguel deste animal.
La Festas morde na perna do Bandido.

BANDIDO
[grita] Ai! Seu maldito gato!
Espera aí que já vais levar uma chumbada.

La Festas foge para debaixo da mesa perseguido pelo Bandido.

BANDIDO (CONT)
[olha para a mesa] É lá! Mas o que estou a ver aqui? Oferta
da casa? Então quer dizer que te assalto e ainda
recebo bucha? [ri] Sou um bandido privilegiado.

LA FESTAS
Eu não tenho assim tanta certeza. [ri]

MIGUEL
[para o Bandido] Não! Isso é a minha refeição.

BANDIDO
Era tua refeição. Está escrito na garrafa que é
oferta da casa, por isso [tenta falar inglês] “xarope!
Bico aite!”.

LA FESTAS
Ai cai-te cai-te! Diretamente para a retrete. [ri]

BANDIDO
Bom! Está na hora da refeição aqui do Zé Manel! Por acaso,
até vem mesmo a calhar que ainda não almocei hoje.

LA FESTAS
Então bom proveito! [ri]

BANDIDO
[para Miguel] E tu para de olhar para mim com essa cara de
enterro e vai-me buscar a raspadinha, já! Imediatamente!
Senão... [mostra-lhe a pistola]

MIGUEL
Está bem, eu vou buscar.

Bandido começa a comer e Miguel sai.

CENA 6

BANDIDO
Isto já está frio! [fala para a porta da direita] Olha
lá! Não tens micro-ondas ou um forno elétrico para
isto? [pausa] Oh! Que se lixe, come-se assim mesmo.

Bandido continua a comer.


BANDIDO (CONT)
Huum! Esta porra está picante! Ui! Ui! Este gajo
não deve ser bem normal. Mete picante no bacalhau.

Bandido bebe uma bolada de vinho.

BANDIDO (CONT)
Ah! Que rica pinga! Agora está melhor!

Bandido continua a comer.

LA FESTAS
E ainda vai ficar melhor! [ri]

Som dos intestinos a trabalhar.

BANDIDO
E lá! Mas o que se passa aqui? Ai!
Ai! Que eu não estou bem. Preciso de uma
casa de banho. [para o La Festas] Olha lá ó gato
onde fica a casa de banho?

La Festas bufa.

BANDIDO [CONT)
Oh! Os gatos não falam é verdade. Que cabeça a minha!
[levanta-se] Ai! Ai! Que eu estou mesmo aflito!.

CENA 7
Entra o Miguel.

BANDIDO
Então achaste a raspadinha?

MIGUEL
Nã... Não encontrei.

BANDIDO
Então procura!

Som dos intestinos a trabalhar.

BANDIDO (CONT)
Ai! Ai! Que não aguento mais! Uma casa de banho?
Uma casa de banho?

MIGUEL
Fica ali à esquerda.

Miguel aponta para a porta da direita e o Bandido sai de cena.


CENA 8

MIGUEL
Ele não pode ficar com os meus 5000 euros. Eu tenho que
fazer alguma coisa mas o quê? É isso! Vou ligar à policia!

LA FESTAS
Boa Miguel! Realmente és muito inteligente.
Como vais ligar à policia se o carteiro ficou com
teu telemóvel? Carteiro quer dizer... ele é qualquer
coisa acabado em “eiro” menos carteiro.

La Festas mia.

MIGUEL
O que queres La Festas? Não te posso agora dar
mimo.

Miguel procura o telemóvel nos bolsos das calças e tira a


raspadinha.

BANDIDO (VOZ OFF)


Ai que eu estou mal!

MIGUEL
Oh! Mas não é isto! Já é a segunda vez que me acontece!

Mete a raspadinha na mesa.

MIGUEL (CONT)
Então mas onde meti a porcaria do telemóvel? Oh! É
verdade! O Zé Manel ficou com ele. Vou lhe pedir para
ligar à policia.

LA FESTAS
Então mas parou-te o pinheiro ou quê? Então tu vais
pedir para o bandido ligar à policia para o vir prender?
Achas mesmo que vai resultar?

Miguel fala para a porta

MIGUEL
Hey! Ó Zé Manel podes ligar à policia para...?

CENA 9
Entra o Bandido mal arranjado e aponta a pistola para Miguel.

BANDIDO
Como é que é? Queres que ligue para a policia para
quê? Hã?!

Bandido aproxima-se de Miguel e este vai fugindo.


MIGUEL
Para... Para o vir ajudar, porque o senhor
não está bem.

BANDIDO
Tu estás a gozar com a minha cara?

MIGUEL
Não! Não!

BANDIDO
Mas parece! Sabes o que acontece a quem goza com a
minha cara?

MIGUEL
Não... Não... Mas imagino!

LA FESTAS
Deixa o meu dono seu brutamontes!

La Festas morde no Bandido.

BANDIDO
Ai! Ah seu gato, filho da mãe! Espera aí que já
vais ver.

Bandido corre atrás do La Festas que foge para debaixo da mesa.

Barulho dos intestinos.

BANDIDO (CONT)
Ai! Ai! Outra vez diarreia não! Outra vez Diarreia não!

Bandido sai de cena para direita.

CENA 10
MIGUEL
Ufa!

LA FESTAS
Estás a ver que não foi boa ideia
o que fizestes? Isto tudo por tu seres
burro.

La Festas mia.

MIGUEL
O que queres La Festas? Se ao menos tu falasses,
se calhar ainda me davas uma ajuda.
LA FESTAS
Farto de falar estou eu, mas tu nunca me ouves.
[pensativo] Já sei! Lembrei-me de uma coisa! Tu não tinhas
outro telemóvel antes do samsung? Sim tinhas
eu lembro-me. Até o deixaste cair para dentro da
sanita uma vez. Mas o gajo sobreviveu.

La Festas mia.

MIGUEL
O que queres La Festas? Estás assustado não é?
Pois eu também! Não sei o que fazer!

LA FESTAS
Procura o teu telemóvel velho caramba!
.
La Festas mia.

MIGUEL
Calma La Festas não fiques assim, porque
senão também fico nervoso.

O Bandido berra fora de cena.

La Festas salta para cima da banca.

LA FESTAS
Miguel, procura a porra do telemóvel e liga à
policia antes que seja tarde.

La Festas mia, Miguel abre a janela.

MIGUEL
Eu até saltava daqui, mas tenho medo de partir um pé ao
cair no chão. [grita fora cena] Acudam-me! Acudam-me! [solilóquio]
Oh! Bem me podiam estar a matar que ninguém ouve. [pausa]
Vem ali a filha da vizinha!

Bandido berra fora de cena.

Miguel grita para fora da janela.

MIGUEL (CONT)
Hey! Hey! Ó Catarina! Ó Catarina! Estou a falar contigo!
Preciso de ajuda! Hey! [solilóquio] Está bem, está. Está ali
a ouvir musica. Sentou-se em cima de um tijolo e não me ouve...
[pensativo] Espera aí! Tijolo? Eu tenho um telemóvel antigo
daqueles tipo tijolo aqui em casa.

LA FESTAS
Fogo! Grande burro! Foi preciso veres uma miúda
em cima de um tijolo para te lembrares que tens um
telemóvel antigo.
La Festas mia.

MIGUEL
É isso mesmo. Foi a minha mãezinha que me emprestou quando
me roubaram o meu smartphone na praia. Pedi a um tipo mal
encarado para me tirar uma fotografia com os meus filhos e o
gajo fugiu com o telemóvel. Há cada filho da mãe! Bem, mas
agora não há tempo a perder. Tenho de procurar a máquina.

Miguel procura o telemóvel tijolo dentro do armário.

Bandido berra fora de cena.

MIGUEL (CONT)
Não está aqui dentro! Mas onde eles estará?

Miguel procura nas gavetas da banca e tira o telemóvel tijolo.

MIGUEL (CONT)
Aqui está ele! [mexe no aparelho] Tem a bateria a 2 por cento.
Onde estará o carregador? Deve estar aqui algures.

Miguel procura nas gavetas.

LA FESTAS
Vai! Anda lá!

La Festas mia.

MIGUEL
Calma La Festas! Tudo se vai resolver!

Som da bateria do telemóvel acabar.

MIGUEL (CONT)
1 por cento! Que se dane a bateria. Vou ligar assim
mesmo!

Miguel mexe no telemóvel e deixa cair para o chão.

MIGUEL
Fogo pá!

Miguel pega no telemóvel e marca um número.

Bandido berra fora de cena.

Som da marcação de números no telemóvel

MIGUEL (CONT)
[fala ao telemóvel] Estou sim?... Daqui fala Miguel
(MAIS)
MIGUEL (CONT)
Francisco dos Santos Pereira. Estou a ligar, porque está
aqui um homem em minha casa e está armado... Moro na Aldeia
da Cova da Passarinha, porta numero 10... Ok! Até já!

Miguel mete o telemóvel na gaveta.

Batem à porta.

MIGUEL (CONT)
[grita] Quem é?

LA FESTAS
Deve ser o Pai Natal em tronco nu.

POLICIA (VOZ OFF)


É a policia!

MIGUEL
É lá! Foram rápidos!

LA FESTAS
Devem ter vindo de foguetão!

CENA 11
O Bandido aparece da direita.

BANDIDO
Hello! Estavas a ver se eu caía pelo buraco
da sanita não era? Mas não. E agora voltei para acabar contigo,
com o teu gato e bazar com a raspadinha. [gargalhada maléfica]

Miguel grita para a porta da esquerda.

MIGUEL
Estou trancado aqui dentro! Estou trancado aqui
dentro!

BANDIDO
Isso sei eu que estás trancado! Qual é a novidade?
Pensas que sou algum estúpido ou quê?

La Festas morde no Bandido.

BANDIDO (CONT)
[grita] Ai!

LA FESTAS
Toma que é para aprenderes!
BANDIDO (CONT)
Maldito gato! Vou dar cabo de ti! Vais morrer seu filho da
mãe!

La Festas foge do Bandido e este persegue-o. Andam os dois à volta


da mesa.

MIGUEL
Não! Não faça mal ao meu gato!

Bandido puxa o gatilho contra o gato.

BANDIDO
Mas esta merda não dispara?

Som de um arrombamento.

CENA 12
A porta da esquerda cai para o chão. Entram os policias.

Miguel olha espantado para a policia.

Bandido mete a raspadinha no bolso das calças.

Bandido tenta saltar a janela.

Som de um cão a ladrar.

BANDIDO
Ai que cão tão grande!

MIGUEL
Ali senhores policias. [aponta para Bandido]

BANDIDO
A policia! Ai! Ai!

POLICIA 1
Zé Manel? Até que enfim que o apanhamos!

BANDIDO
Eu não me posso gabar do mesmo!

Bandido foge pela porta da direita. A policia persegue-o.

CENA 13
Som de uma grande algazarra.

MIGUEL
Ai que me metem a casa abaixo!
CENA 14
Os policias aparecem trazendo o Bandido algemado.

BANDIDO
Larguem-me! Larguem-me! Isto não é justo!
Eu não fiz nada de mal! [para Miguel] Isto não vai ficar
assim ouviste? Eu vou voltar e vou ajustar contas contigo!

POLICIA 1
[para o bandido] Anda lá seu malandro, pouca conversa!
[para Miguel] Muito obrigado por nos ter chamado, senhor
Miguel. Já andávamos atrás desta ave de rapina há um
tempo.

Som dos intestinos a trabalhar.

BANDIDO
Ai! Ai! Eu preciso de ir à casa de banho, outra vez!
Por favor, eu preciso de ir à casa de
banho!

Os dois Policias e o Bandido saem de cena.

CENA 15
MIGUEL
Fogo! Que bela hora da refeição esta, La Festas. Nunca me
vou esquecer. Mas desde já deixa-me te agradecer por teres
estado sempre ao meu lado. E pelas mordidelas no Carteiro. Ou
melhor... no Zé Manel. Que grande patife que ele é! Mas acabou
na prisão! Mas nesta história toda o que interessa é que aprendi
uma lição. Nunca se deve publicar a nossa vida pessoal no
facebook. A coisa podia dar para o torto!

LA FESTAS
Ainda bem que aprendeste! Só espero é
que não te esqueças de voltar a cometer o mesmo erro.
Mas já agora deixa-me te dizer que apesar de ser um pouco
mauzinho contigo percebi que és muito especial para mim, pois
fiquei com medo de te perder. Já viste? E depois quem me dava
de comer? Não podia passar a vida a comer ratos,
senão deves de miar, ainda começava a guinchar como
os ratos. E no inverno? Já não tinha onde me aquecer nos dias
de geada.

La Festas mia.

MIGUEL
Com esta história toda. Perdi o apetite. Vou
meter isto no frigorífico e como amanhã.

Miguel pega na garrafa do vinho e no tupperware.


LA FESTAS
Não! Não guardes isso! Deita isso fora!

La festas morde na perna de Miguel. Miguel assusta-se.

MIGUEL
[grita] Ai!

Miguel deixa cair tudo para o chão.

Som de garrafa a partir.

MIGUEL (CONT)
La festas! Olha o que fizeste! Por causa de ti parti
a garrafa do vinho “oferta da casa”. Olha para isto! O vinho
todo espalhado no chão. Um vinho caríssimo! Espera aí que
vais ver!

La Festas foge pela porta da direita e Miguel vai atrás dele.

Som uma grande algazarra fora de cena.

CENA 16
Miguel entra em cena e fala para a porta da direita.

MIGUEL
Ficas agora trancado na casa de banho que é para
saberes. Agora por causa de ti, vou ter de comprar
outra garrafa ao “vira picheiras”. E por falar em vira
picheiras, tenho de lá ir levantar o meu prémio.

LA FESTAS (VOZ OFF)


Tira-me daqui!

La Festas mia fora de cena.

Miguel olha para a mesa.

LA FESTAS (VOZ OFF)


Tira-me daqui imediatamente seu cara de cu!

La Festas mia.

MIGUEL (CONT)
Mas onde está a raspadinha? Eu tinha aqui em cima.
Como ela desapareceu? Será que foi aquele patife do falso
carteiro que me roubou? Vou ligar à policia! Isto não vai
ficar assim.

Procura o telemóvel no bolso das calças.


MIGUEL (CONT)
Eu não acredito nisto. Levaram o tipo preso com a raspadinha
e o meu telemóvel. Ai mas que cabeça a minha. Como eu não me
lembrei? Tenho de ir à esquadra.

CENA 17

Entra um carteiro.

CARTEIRO
Ora viva amigo!

MIGUEL
Boa tarde! Faça o favor de dizer!

CARTEIRO
O senhor é o Miguel Pereira?

MIGUEL
Sim, sou eu, porquê!

CARTEIRO
Tenho aqui um encomenda para si.

MIGUEL
Uma encomenda para mim? Eu sei muito bem que
encomenda é que o senhor tem para mim.

CARTEIRO
Pois presumo que saiba. Certamente foi o senhor que
encomendou.

MIGUEL
Não! Porque eu não encomendo coisas a bandidos como senhor.

CARTEIRO
Bandidos como eu?

MIGUEL
Sim! Ou pensa que eu não sei! O senhor viu a minha publicação
no facebook e toca a disfarçar-se de Carteiro para me sacar a
raspadinha como o outro, não é?

CARTEIRO
Hã?! Sacar a raspadinha? Eu? Não lhe admito que diga isso.
Eu apenas vi aqui lhe entregar uma correspondência de
Paços de Ferreira.

MIGUEL
Ai sim? Então olhe! Espere aí que também tenho uma
correspondência para si!

Miguel vai buscar a vassoura.


CARTEIRO
Mas... Mas o senhor está bem? Então eu devia de estar de férias,
só estou aqui a substituir um colega porque lhe roubaram a farda
e ainda sou mal tratado?

MIGUEL
Ao ataque!

Miguel corre em direção ao carteiro.

CARTEIRO
Porra! Deixa-me ir embora que este gajo é maluco!

Carteiro sai de cena pela esquerda.

CENA 18
MIGUEL
Yes! Desta vez foi o maior! Consegui derrotar o bandido.
Se é que ele correu a sete pés. [ri] [imita o carteiro] Ai eu
apenas vi aqui lhe entregar uma correspondência de
Paços de Ferreira. Deve ser deve! [imita o carteiro] Eu devia de
estar de férias, só estou aqui a substituir um colega porque lhe
roubaram a farda! [pensativo] Espera aí! Se calhar era mesmo o
Carteiro com o meu cd dos four on route [4on route]. Ó mundo cruel,
eu tenho de fazer alguma coisa! Eu tenho de o apanhar!

Miguel vai a sair a correr pelo lado esquerdo. Mete a porta


no sitiou.

A porta cai para o chão. Encolhe os ombros e sai.

Fecha o pano

FIM

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