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ESTUDO EM PROFUNDIDADE DE UM TRABALHADOR - VENDEDOR

AMBULANTE

Caroline Bernardo
Daiene Oliveira
Gabriela Santos
Joana Tavares
Luciana Cerqueira
Luísa Sousa
Stephanie Alves

Salvador, 2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
CURSO DE PSICOLOGIA

ESTUDO EM PROFUNDIDADE DE UM TRABALHADOR - VENDEDOR


AMBULANTE

Trabalho apresentado como requisito parcial


para aprovação no componente curricular
Psicologia, Gestão e Trabalho da graduação de
Psicologia, sob a orientação da Profa. Laila
Carneiro

Caroline Bernardo
Daiene Oliveira
Gabriela Santos
Joana Tavares
Luciana Cerqueira
Luísa Sousa
Stephanie Alves

Salvador, 2022
1. Introdução

Como abordado ao longo da disciplina Psicologia, Gestão e Trabalho, compreender

o mundo do trabalho na contemporaneidade implica confrontar inúmeras especificidades e

complexidades. Isso requer um trabalho de observação e fundamentação teóricas profundas, e

é o que aqui se pretende de forma introdutória, pois o campo de investigação é, obviamente,

muito vasto. Diante desse cenário, este trabalho investigou e analisou um trabalhador

autônomo para o estudo em profundidade aqui proposto, através de quatro categorias de

análise comumente usadas em Psicologia do Trabalho: Trabalho Digno e Decente, Sentidos e

Significados do Trabalho, Identidade Profissional e Interseccionalidade no Trabalho, a partir

da Psicologia do Trabalhar.

A escolha desses quatro temas parte do interesse da equipe em explorar tanto os

aspectos plurais, sociais e culturais dessa categoria de trabalho, quanto em investigar as

perspectivas mais particulares e subjetivas do trabalhador apresentado. Para atingir esse

objetivo, este estudo utiliza os conhecimentos da Psicologia e de outras áreas do

conhecimento que possam agregar e fundamentar uma análise crítica, embasada e detalhada a

partir dos textos empíricos sobre os construtos estudados na disciplina.

2. Fundamentação teórica

2.1. Trabalho digno e decente

O trabalho teve suas configurações alteradas diversas vezes ao longo da história,

mas a sua perpetuação no status quo de condição da existência humana sempre foi constante.

Esta condição de existência não se trata apenas do valor de troca que pode-se obter através do

trabalho, mas diz respeito também à formação de identidade individual, produção de cultura

humana e a instauração de relações entre o homem e a natureza que o cerca, construindo,


assim, a sociedade. Dentro desta perspectiva, o estabelecimento e a garantia de condições

dignas e decentes de trabalho tornam-se indispensáveis na construção e no fortalecimento do

bem-estar individual e coletivo na sociedade humana como um todo, como defende Castel

(2005) ao dizer que o trabalho é visto como eixo central para a estrutura e a dinâmica social.

Pensando no paradigma de trabalho digno e decente, a literatura nos fornece diversas

modalidades de conceituação; Blustein (2013, p. 8) afirma que o trabalho deve atender três

necessidades: a) a necessidade de sobrevivência e poder b) a necessidade de conexão social e

c) a necessidade de autodeterminação. A primeira necessidade (sobrevivência e poder) está

diretamente relacionada ao acesso à recursos como alimentação, moradia e capital social,

enquanto a segunda (conexão social), encontra-se ligada à construção de sentido de vida e

pertencimento social, e, finalmente, a terceira necessidade (autodeterminação) associa-se à

possibilidade de controle, escolha e planejamento da vida através da relação estabelecida com

os outros e os limites e potencialidades psicossociais.

Ainda no que tange a conceituação bibliográfica a respeito de trabalho digno e

decente, de acordo com a International Labor Organization (ILO, 1999), o que caracteriza um

trabalho decente é a oferta de renda justa, segurança no local de trabalho, proteção social,

melhores perspectivas de desenvolvimento pessoal e integração social, respeito pelos direitos

fundamentais, liberdade para as pessoas se expressarem, se organizarem e participarem das

decisões que afetam suas vidas, e por último, porém não menos importante, igualdade de

oportunidade e tratamento para todas os gêneros.

Tendo em vista as conceituações acima propostas, grande parte das relações de

trabalho na sociedade brasileira contemporânea, sob um olhar leigo e superficial, configurar-

se-iam como muito distantes do modelo de trabalho digno e decente proposto pelo

pensamento acadêmico. Entretanto, no campo da psicologia, entende-se a proposta do

trabalho decente como uma concepção psicossocial, ou seja, construída de acordo com o
contexto indivíduo/sociedade e nas relações estabelecidas entre ambos. Ademais, de acordo

com uma pesquisa realizada por Ribeiro, M. A. (2020), a maior parte da produção e

investigação científica deste tema provém do norte global, onde predominam os países

desenvolvidos, portanto, as definições do conceito acabam sendo mais relevantes para o

contexto social destes países, descontextualizando-se do resto do mundo; um grande exemplo

desta tendência é que o conceito de trabalho digno e decente, nas produções científicas do

hemisfério norte, gira em torno de empregos formais, sem dar conta da informalidade, que é

parte constituinte de extrema relevância no mundo do trabalho no hemisfério sul.

Outro ponto muito importante a ser salientado são algumas das discussões propostas

na trajetória para a construção destes conceitos. Quando se pensa em trabalho digno e decente

são levantadas questões como: seria o trabalho digno e decente uma causa ou uma

consequência das boas condições de trabalho? Ademais, seria a informalidade trabalhista um

empecilho para o trabalho decente ou uma modalidade alternativa que abarcaria necessidades

específicas de subjetividades individuais tão singulares? Indo ainda além, poderíamos

conceituar o trabalho decente como algo uno e singular ou haveriam, ainda, possíveis versões

de trabalhos decentes que variam em função de contextos sociais, necessidades individuais e

contemplação de desejos idiossincráticos? Mesmo articulando toda a discussão ainda há

muitas lacunas em aberto, esperando para serem preenchidas pela investigação científica que,

infelizmente, ainda é muito incipiente, sobretudo no Brasil.

2.2. Sentidos e significados do trabalho

O estudo dos sentidos e significados do trabalho surge na década de 80 com a

pesquisa Meaning of Work Research (MOW) (1987) que buscava justamente investigar o

significado do trabalho em oito países. Segundo Bendassolli e Guedes, S. (2014, p.132):


A abordagem do significado do trabalho adotada pelo grupo de pesquisadores do

MOW contribuiu para a compreensão do significado do trabalho como uma cognição

social, ou seja, uma interpretação compartilhada do mundo do trabalho, na qual estão

envolvidos aspectos históricos, econômicos, políticos e culturais.

De acordo com Borges (em Fernandes, Gonçalves e Oliveira, 2012, p.185) esse

estudo contribuiu para

a consideração do construto significado do trabalho como multifacetado; a inclusão,

além e à parte das atribuições de valor, de aspectos socionormativos, tais como o

sentido de obrigação geral e dever, direitos e contribuição societal; e na elaboração de

questionários padronizados e testados em vários países.

A partir do MOW muitas outras pesquisas e escalas surgiram, entre elas a proposta

por Rosso, Dekas e Wrzensiniewski (2010), que buscava diferenciar sentido de significado.

Bendassolli e Guedes ressaltam que, segundo esses autores,

A corrente do significado dá maior ênfase às cognições e interpretações socialmente

compartilhadas sobre o trabalho, enquanto a corrente do sentido investe na

compreensão do ato de dar sentido ao trabalho, ou seja, nos mecanismos que dão a

este a "qualidade de ser significativo” (literalmente: meaningfulness). (Bendassolli e

Guedes, 2014, pp.132-133)

Dessa maneira, sentido envolve as interpretações pessoais e aspectos emocionais do

trabalho, o que mobiliza o sujeito e como ele faz a sua leitura da sua relação com o trabalho,

envolve então a intencionalidade da consciência do sujeito nos processos de apreensão e

apercepção do mundo do trabalho, de forma que se relaciona com a sua história de vida e
vivências, logo é um processo e é menos estável ao ser comparado com os significados

(Bendassolli & Gondim, 2014). Ou seja, o sentido diz respeito a uma produção individual

diante dos significados grupais (Santos & Carvalho-Freitas, 2018).

Já os significados são um universo de narrativas sobre o valor, o papel, o propósito e a

finalidade do trabalho compartilhadas socialmente, que são construídas de forma coletiva em

um contexto histórico, político, econômico e social, sendo mais estáveis que os sentidos

(Bendassolli & Gondim, 2014; Santos & Carvalho-Freitas, 2018).

Entretanto, a literatura aponta que essa separação entre sentidos e significados é

somente uma divisão teórica, de modo que ambos dizem respeito ao mesmo fenômeno,

formando uma unidade indivisível que é mediada pelo trabalho enquanto uma atividade a ser

exercida pelo sujeito (Santos & Carvalho-Freitas, 2018). Portanto, o processo de significação,

de atribuir sentido ao trabalho, parte da relação que o sujeito estabelece com a representação,

com o valor, do modo que se relaciona com os significados compartilhados socialmente e a

experiência com o trabalho, e ainda para comunicar ao outro qual o sentido do trabalho para

si, precisa utilizar destes significados (Bendassolli & Gondim, 2014).

Logo é essa relação entre sentidos e significados que permitirá apreender o universo

simbólico que estabelece e marca a relação do sujeito com o que ele faz enquanto atividade

laboral, como afirmam Bendassolli e Gondim (2014).

No intuito de apreender esse universo simbólico, Fernandes, Gonçalves e Oliveira

(2012) propõem uma análise dos sentidos e significados sob a luz de quatro dimensões:

Dimensão da Realização Pessoal do Trabalho (o modo como o trabalho é fonte de satisfação

pessoal), Dimensão Emocional Positiva do Trabalho (o modo como o trabalho permite

oportunidades pessoais e sociais satisfatórias), Dimensão Emocional Negativa do Trabalho (o

modo como o trabalho é fonte de preocupação, stress, monotonia, cansaço) e Dimensão

Econômica do Trabalho às dimensões (o modo como o trabalho é um instrumento para


responder às necessidades fundamentais que são garantia da qualidade de vida), essas quatro

dimensões foram utilizadas como análise de uma escala de sentidos e significados e serão

utilizadas posteriormente na investigação das respostas de Paulo.

2.2.1. Categorias de sentidos-significados

As pesquisadoras Santos e Carvalho-Freitas (2018) investigaram quais são os sentidos

do trabalho para pessoas com deficiências adquiridas a partir de entrevista semiestruturada

com 13 pessoas no interior de Minas Gerais e chegaram, após a análise de conteúdo das

entrevistas, a um total de seis categorias de sentidos-significados do trabalho para aquele

grupo.

As categorias foram: 1) distração, ocupação e realização de atividades, que

corresponde ao livramento da pessoa da ociosidade, de modo que ela ocupe a mente,

preencha o tempo e organize e estruture o tempo das demais atividades cotidianas; 2)

Independência e sobrevivência, de modo que as pessoas relacionam o trabalho “à

contrapartida financeira e ao trabalho como forma de garantir o sustento da família e atingir

objetivos” (Santos & Carvalho-Freitas, 2018). Está relacionado também ao retorno material, é

forma que a pessoa tem de estar inserida na lógica de produção-consumo e obter o

reconhecimento material e financeiro, aspectos do capitalismo presentes na subjetividade das

pessoas; 3) Prazer e satisfação, abarcam o gostar da atividade que realiza e o contentamento

que sente e é gerado ao realizarem, havendo também pontos de vista que consideram o

trabalho como missão ou vocação. Tratando de aspectos de identificação e realização pessoal.

4) preenchimento da vida, o trabalho como podendo dar sentido à vida como um todo,

categoria equivalente à centralidade do trabalho, de caráter instrumental, ou seja, a função de

manutenção e reprodução da vida; 5) utilidade, envolvendo a geração de resultados e ajuda


aos outros, representando uma contribuição do indivíduo para a sociedade; e por fim, mas não

menos importante, a última categoria foi 6) valorização pessoal, representando o sentido do

trabalho como algo que eleva a autoestima e o apreço por si mesmo, desenvolvendo senso de

valor e dignidade.

Sendo assim, muitos aspectos presentes nas categorias encontradas pelas

pesquisadoras, a partir da entrevista com pessoas com deficiências adquiridas, estão presentes

em diversos grupos de trabalhadores, visto que se trata de categorias amplas com sentidos-

significados do trabalho inseridos em um mesmo contexto socioeconômico, político e

cultural.

2.2.2 As características de um trabalho significativo

Segundo os estudos de Morin (2001) com estudantes de administração e

administradores, um trabalho significativo é um trabalho que é realizado de forma eficiente e

leva a um resultado (finalidade e eficiência, de forma que existe de clareza e importância dos

objetivos; utilidade, valor do resultados; racionalidade das tarefas), é intrinsecamente

satisfatório (o trabalho se caracteriza como aprendizagem e desenvolvimento das

competências, realização e atualização, criatividade e autonomia, responsabilidade), é

moralmente aceitável (retidão das práticas sociais e organizacionais e contribuição social), é

fonte de experiências de relações humanas satisfatórias (afiliação e vinculação e serviço aos

outros, envolvendo relações do tipo cliente-fornecedor), garante a segurança e a autonomia

(independência financeira, envolvendo salário apropriado e justo; e saúde e segurança, diz

respeito a boas condições de trabalho) e mantém ocupado (ocupação, carga de trabalho

adequada).
Portanto, a partir dessas definições do construto sentido-significados, as categorias

adotadas e as características de um trabalho com sentido será possível analisar os dados do

trabalhador estudado e indicar se o trabalho exercido por ele é um trabalho significativo.

2.3. Interseccionalidade a partir da Psicologia do Trabalhar

Diante da complexidade em estudar as formas pelas quais a opressão molda a

natureza e a trajetória das vidas das pessoas, a teoria interseccional surge a partir dos estudos

da jurista negra Kimberlé Crenshaw, em 1989. A interseccionalidade é uma conceituação que

busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos

da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a

opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que

estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras (CRENSHAW,

2002, p. 177). De maneira complementar, Sirma Bilge (2009) destaca que o enfoque

interseccional vai além do simples reconhecimento da multiplicidade dos sistemas de

opressão que operam a partir dessas categorias e postula sua interação na produção e na

reprodução das desigualdades sociais. Consequentemente, a inserção ou não no mercado de

trabalho, a quantidade de horas trabalhadas, as posições sociais que se ocupa e o acesso às

previdências sociais acompanham tais desigualdades (Schucman, 2012).

Dessa forma, no campo do trabalho, a interseccionalidade ganha um espaço

importante a partir da Psicologia do Trabalhar (TPT), inicialmente exposta por Blustein

(2001, 2006, 2013) como uma meta-perspectiva e, anos mais tarde, como uma proposição

teórica (Duffy, Blustein, Diemer, & Autin, 2016). A Psicologia do Trabalhar surge como uma

crítica aos modelos de psicologia clássicos sobre o trabalho, que negligenciavam os fatores

contextuais e os indivíduos marginalizados. Isto é, a TPT reconhece em suas conceituações,


pesquisas, práticas e recomendações de políticas que o contexto do trabalho é

consideravelmente desigual, por influência do classismo, racismo, sexismo, heterossexismo,

dentre outros (Blustein, 2013). Propõe, então, abarcar todos os trabalhadores, sejam

empregados em organizações, trabalhadores informais, autônomos (categoria aqui estudada),

empreendedores e também as pessoas que desejam trabalhar.

Partindo dessa experiência dinâmica, a TPT estuda como as variáveis contextuais e

psicológicas impactam na capacidade de assegurar um trabalho digno e decente. São quatro

preditores para alcançar o trabalho decente: dois preditores contextuais/estruturais (restrições

econômicas e experiências de marginalização), e dois preditores individuais (capacidade de

volição e adaptabilidade de carreira) (Duffy et al., 2016).

A restrição econômica dá ênfase ao status socioeconômico dos trabalhadores e busca

compreender de que maneira este fator, objetivo ou subjetivo (Diemer & Ali, 2009), pode

interferir no acesso ao trabalho decente. De acordo com Liu (2013), a classe social pode ser

definida como a posição de uma pessoa dentro de uma hierarquia econômica e o classicismo

é uma forma de exclusão e rejeição social, tal qual racismo e sexismo, entretanto, diferente

dos outros gatilhos, a marginalização provocada pelo classicismo não carrega aspecto

fenotípico, parece invisível, automático e até normativo no funcionamento social. Nesse

sentido, Duffy et al. (2016) sugerem que haja interação entre marginalização e restrições

econômicas. Esse outro aspecto, a marginalização, pode ser compreendida como um

rebaixamento de pessoas para uma posição social de menor poder (Duffy et al., 2016).

Consequentemente, a marginalização estabelece barreiras que podem ameaçar o acesso ao

trabalho decente.

Dentre os preditores individuais, a volição representa a percepção individual de

escolha na tomada de decisão de carreira, apesar das restrições (Steger, Dik, & Duffy, 2012).

Dessa forma, pessoas que percebem altos níveis de volição em suas decisões sobre carreira
têm maior satisfação com o trabalho, pois optam por trabalhar em congruência com suas

preferências pessoais (Duffy, Autin, & Bott, 2015), podendo alcançar um trabalho

significativo (Steger et al., 2012). Para o modelo da TPT, quanto maior a volição, maior é a

probabilidade de se alcançar um trabalho decente, sendo que as experiências de

marginalização e as restrições econômicas tendem a prever negativamente a volição (Duffy et

al., 2016). Por fim, a adaptabilidade de carreira é um recurso psicossocial que envolve a

autorregulação tanto de características individuais quanto em resposta a fatores contextuais

(Johnston, 2018) e possibilita a prontidão para lidar com as questões previsíveis e

imprevisíveis originárias no mundo do trabalho (Savickas & Porfeli, 2012). A adaptabilidade

é composta por 4 dimensões: preocupação com o futuro profissional, controle de si e do

ambiente ao redor, curiosidade para explorar a si mesmo e diferentes cenários profissionais, e

confiança em construir e implementar suas atividades e projeto de vida (Savickas & Porfeli,

2012). Nesse modelo, a experiência de marginalização e as restrições econômicas podem

interferir negativamente nesta capacidade de adaptação (Duffy et al., 2016).

Além desses quatro preditores, a Psicologia do Trabalhar considera a personalidade

proativa, a consciência crítica e o suporte social, como variáveis moderadoras de nível

microindividual, e as condições econômicas (fatores do mercado de trabalho, tais como

índices de desemprego) como uma variável macrossocial (Duffy et al., 2016). Dessa forma,

ainda que o trabalho não seja intrinsecamente motivador, um comportamento autêntico e

autodeterminado pode ser produzido pelo próprio trabalhador se o contexto permitir que se

sintam competentes para suas responsabilidades, estejam envolvidos por relações

interpessoais e com autonomia de execução (Ryan & Deci, 2000).

Portanto, o modelo teórico da Psicologia do Trabalhar funciona através da

combinação de perspectivas psicológicas e sociológicas, por isso relacional (Duffy et al.,

2016). Como abordado por Cacciamali (2000), a realidade da América Latina encontra
algumas peculiaridades, como a heterogeneidade nas relações de trabalho informais. Para a

autora, esse trabalho se configura em processo de mudanças estruturais, que está em

andamento na sociedade e na economia, e que incide na redefinição das relações de produção,

das formas de inserção dos trabalhadores na produção, dos processos de trabalho e de

instituições. Diante dessa realidade, a abordagem TPT possibilita, na prática, entender como

todos estes elementos podem estar entrelaçados (Blustein, 2006).

2.4. Identidade profissional

O trabalho, de acordo com Bentivi et al. (no prelo) é uma “...ação humana de

apropriação da natureza para suprir uma necessidade, em que a partir da transformação da

natureza, o homem transforma-se a si mesmo (Marx, 2013 [1867]; Codo, 1997; Antunes,

2009).” (p.3-4), e que foi e é um meio de promoção de saúde e de adoecimento do indivíduo,

contribuindo também para a construção da sua identidade e da sua subjetividade.

Apesar do seu papel central na sociedade ao longo da história, o trabalho não se

configurou apenas de uma maneira, tendo passado por diversas transformações ao longo dos

séculos (Bentivi et al., no prelo).

Podemos sintetizar o conceito de identidade profissional como a união entre aspectos

relacionados às habilidades técnicas da profissão e as experiências pessoais do indivíduo.

Contudo, antes disso é necessário fazer algumas considerações iniciais, partindo da

compreensão que a identidade pessoal “faz parte do autoconceito, uma entidade conceitual

que depende da construção do self (instância reflexiva sobre si mesmo). Crenças sobre a

capacidade pessoal de desenvolver uma dada atividade profissional integram o autoconceito e

estão associadas à identidade profissional.” (Gondim et al., 2016). Sendo o conceito de


identidade fundamental na Psicologia, tanto para compreender aspectos pessoais, quanto

sociais.

Podemos dizer que existem duas dimensões associadas a identidade, a primeira é a

dimensão psicológica, onde o indivíduo se percebe como único, logo, distinto dos membros

do endogrupo, e a dimensão social, onde o mesmo percebe-se como semelhante aos

membros, possibilitando uma distinção do exogrupo. A esse respeito, Gondim et al. (2016)

aborda que “a dimensão da identidade introduz outro nível de tensão entre a afirmação e a

oposição, que se dá entre o pertencimento a um grupo social com o qual se compartilha

crenças e valores, sentidos e significados, e a oposição a um grupo de distanciamento, com o

qual se vivencia um tipo de estranhamento simbólico e muitas vezes físico." Logo, a

identidade se constrói através de uma dualidade entre o indivíduo e o outrem, bem como o

grupo social ao qual se identifica e aquele que se diferencia. Dessa forma, "as contínuas

trocas que se estabelece com o seu meio fazem com que os significados e sentidos sejam

reatualizados ou se modifiquem à luz de novas interpretações, com repercussões nas suas

identidades." (Gondim et al., 2016). Logo, a identidade social está implicada no exercício dos

papéis e no pertencimento a diversos grupos sociais, esses sofrem mudanças ao longo da vida

do indivíduo, elas sucedem as expectativas da sociedade a nível estrutural e as escolhas feitas

pelos próprios atores sociais, característica à nível individual.

A identidade profissional advém da identidade social, e emerge a partir da inserção do

indivíduo no trabalho. Através do processo de socialização profissional “existe um

compartilhamento com um grupo social profissional um conjunto de crenças, valores,

símbolos, significados e um domínio de conhecimento técnico e especializado, aspectos que

podem distinguir o seu grupo de pertença dos demais.” (Gondim et al., 2016). Nessa

perspectiva, temos a identidade profissional como uma eleição da profissão escolhida pelo
sujeito mediante aspectos de identificação, habilidades técnicas e aprendizagem, referências

indiretas, marcadores sociais e culturais do sujeito.

3. Método

No primeiro momento dessa atividade, escolhemos investigar o trabalho de um

trabalhador de nome fictício Paulo. Paulo tem 47 anos, se autodeclara racialmente enquanto

negro e se encontra na classe social b/c. Paulo trabalha como vendedor ambulante na frente

de uma instituição pública, vendendo bebidas, cigarros e salgadinhos, dentre outras

mercadorias, juntamente com sua mulher, que é baiana de acarajé.

Foram programados 04 encontros presenciais, no ponto em que Paulo trabalha, sendo

3 de coleta de dados e 1 de feedback. Cinco dias antes do primeiro encontro marcado, uma

das pesquisadoras pediu a Paulo que tirasse fotos do seu cotidiano que representassem a

identidade dele enquanto profissional, iniciando assim a pesquisa a partir do uso do

Photovoice. O primeiro encontro configurou-se pela apresentação da proposta do trabalho,

bem como das pesquisadoras, em seguida foram aplicadas as perguntas de caracterização

sociodemográfica e de história de vida do trabalhador (Apêndice A), buscando uma

contextualização do indivíduo e de sua história, logo após iniciou-se a coleta de dados

referentes aos temas em questão nessa investigação. Primeiramente realizou-se a entrevista

semiestruturada sobre trabalho digno decente e, logo após, houve a aplicação da escala de

sentidos e significados que foi impressa e entregue à Paulo.

No segundo encontro, deu-se continuidade a investigação com os temas

interseccionalidades e identidade profissional, sendo assim, foram aplicados os respectivos

questionamentos dos temas supracitados e também recolheram-se as fotos tiradas por Paulo.

O terceiro e último encontro de coleta de dados caracterizou-se pela sequência da análise de

sentidos e significados do trabalho, também com uma entrevista semiestruturada. O quarto


encontro programado para ser uma devolutiva a respeito das características investigadas neste

presente trabalho só ocorrerá após a entrega do mesmo. Todos os encontros foram

documentados através de gravações de áudios que foram previamente permitidos por Paulo.

O entrevistado, assim como todas as autoras do trabalho assinaram um Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido anexado no Apêndice F

3.1. Instrumentos e Materiais

A pesquisa foi desenvolvida a partir da observação do trabalhador, uma entrevista

Photovoice, entrevistas semiestruturadas, uma Escala de Sentidos e Significados e também

foram utilizadas as anotações feitas pelas pesquisadoras durante a coleta de dados.

O Photovoice é uma estratégia que permite a participação ativa da pessoa que

colabora com a pesquisa, de modo em que ela possa representar visualmente a sua

experiência, bem como também possibilita acessar a forma dela significá-la e interpretá-la

(Meirinho, 2017). Essa estratégia consiste em fotografias, retiradas pela participante, e a

partir delas há discussões orientadas para estimular o indivíduo a refletir sobre sua própria

experiência (With et al., 2009 como citado em Meirinho, 2017). Além disso, essa estratégia é

muito valorizada por desestabilizar a hierarquia pesquisador-participante, priorizando o saber

do participante sobre sua vida (Prins, 2010 como citado em Meirinho, 2017).

A entrevista semiestruturada consiste em uma série de questões abertas realizadas

pelos(as) pesquisadores(as) de acordo com seu tema de investigação. Entretanto, esse tipo de

técnica também permite que durante a entrevista os(os) pesquisadores(as) possam ter

autonomia para realizar outras questões que não estavam previstas (Laville & Dionne, 1999).
A fim de investigar a primeira concepção teórica, Trabalho digno e decente, as

pesquisadoras utilizaram uma entrevista semiestruturada (Apêndice B) composta por 14

questões como “Você acredita que todos os seus direitos (décimo terceiro, aposentadoria,

seguro desemprego) enquanto trabalhador estão garantidos? Está satisfeito com essa

realidade?” e “Quais os riscos que você percebe em relação ao exercício da sua profissão? Há

algo, no seu dia a dia de trabalho, que você considera que seja arriscado?”

Para analisar os sentidos e significados do trabalho de Paulo, foi feita uma entrevista

semiestruturada (Apêndice C) constituída por 11 perguntas que buscavam compreender o

lugar que o trabalho ocupa na vida de Paulo, dessa forma havia perguntas como “O que te

motiva a trabalhar diariamente?” e “O que o trabalho significa para você?” Para ampliar a

investigação, foi impressa a Escala de Significados Atribuídos ao Trabalho (Abreviada) –

Versão Brasileira – E SAT-BR (Apêndice D) adaptada e validada por Fernandes; Gonçalves

& Oliveira (2012). Paulo recebeu a escala impressa com o seguinte comando: "Responda os

itens abaixo marcando a opção que melhor representa a sua relação com o seu trabalho e o

que ele significa para você”. Os 25 itens se iniciavam com a frase “Para mim trabalhar

significa…”. As respostas foram dadas em uma Escala do tipo Likert de 6 pontos: (1)

Discordo totalmente, (2) Discordo raramente, (3) Discordo às vezes, (4) Concordo raramente,

(5) Concordo às vezes e (6) Concordo totalmente.

Cada ponto da escala likert tem o valor atribuído de 1 a 6, na análise de resultados foi

feita a média para cada dimensão usando como parâmetro a pontuação máxima que pode ser

obtida em cada dimensão e a pontuação obtida pelo trabalhador.

Embasadas pelo artigo de Fernandes, Gonçalves e Oliveira (2012), às dimensões

analisadas foram:
1. Dimensão da Realização Pessoal do Trabalho, constituída por 09 itens: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8,

9. Refere-se ao modo como o trabalho é fonte de satisfação pessoal, contribuindo para a

realização do sujeito, desafiando-o para atualizar os seus recursos e competências pessoais.

Nessa dimensão ressaltam-se aspectos relacionados à aprendizagem, crescimento pessoal,

competência, motivação e realização.

2. Dimensão Emocional Positiva do Trabalho, constituída por 07 itens: 10, 11, 12, 13, 14, 15,

16. Refere-se ao modo como o trabalho permite oportunidades pessoais e sociais satisfatórias,

em termos de atividade positiva, criativa e relacional.

3. Dimensão Emocional Negativa do Trabalho, constituída por 06 itens: 17, 18, 19, 20, 21,

22. Refere-se ao impacto desgastante, em termos pessoais e familiares, da atividade do

trabalho como fonte de preocupação, stress, monotonia, cansaço.

4. Dimensão Econômica do Trabalho, constituída por 03 itens: 23, 24, 25. Refere-se ao modo

como o trabalho é um instrumento para responder às necessidades fundamentais que são

garantia da qualidade de vida pessoal, familiar e a um reconhecimento social. Nessa

dimensão ressaltam-se aspectos relacionados ao lado financeiro do trabalho como salário,

subsistência e estabilidade financeira.

No intuito de estudar o quarto e último aspecto teórico, Interseccionalidades,

primeiramente perguntou-se qual a identificação racial do entrevistado e, em seguida, com

base na resposta a respeito da sua raça/cor, aplicou-se mais uma entrevista semiestruturada

(Apêndice E), composta por 14 perguntas, como “O que isso significa para você, a sua

identificação racial? O que te faz ser branco/negro/ pardo?” e “A cor, a raça, é uma questão

que interfere no seu trabalho? Se sim, de que forma?”


Em busca de investigar a terceira fundamentação teórica, Identidade Profissional, foi

usado o método do Photovoice. Dessa forma, solicitou-se à Paulo, cinco dias antes do

primeiro encontro, que tirasse fotos de coisas que remetessem a sua identidade profissional,

sinalizando quais são os aspectos do seu trabalho, sejam eles momentos, objetos, pessoas,

entre outras características, que representem esse autoconceito. No dia do encontro da

entrevista, foi demandado que diante do conjunto, o trabalhador escolhesse 3 (três), e em

seguida, para cada foto escolhida foram realizadas três questões disparadoras: 1) descreva a

sua fotografia; 2) o que essa foto representa para você? e 3) essa fotografia remete a um

sentimento positivo, negativo ou neutro? Ao final dos primeiros questionamentos foi

perguntado porque o conjunto de fotos escolhidas refletem a identidade profissional do

entrevistado.

4. Resultados e discussões

4.1. Trabalho digno e decente

De acordo com a literatura revisada podemos classificar alguns aspectos do trabalho,

e da relação do indivíduo com este, como indicativos do alcance de um trabalho digno e

decente, à exemplo de: uma oferta de renda justa que possibilite o indivíduo a dispor de

recursos como alimentação, moradia e capital social à partir do frutos do trabalho exercido;

garantia de segurança no local de trabalho, concomitante à proteção social garantida por toda

uma rede de proteção e apoio estatal ao trabalhador; respeito aos direitos fundamentais do

trabalhador; chances de melhores perspectivas de desenvolvimento pessoal e integração

social, bem como a construção de sentido de vida e pertencimento social com a comunidade à

qual o indivíduo se insere; e a possibilidade de controlar, escolher e planejar sua vida


trabalhista, salvaguardando a liberdade de expressão, a organização e a participação das

decisões que afetam suas vidas.

A seguir exploraremos cada indicativo tendo como base as falas do trabalhador

Paulo a fim de verificar a presença ou ausência de decência e dignidade no trabalho exercido

por ele.

A priori, a obtenção de renda justa, que garanta os recursos necessários para uma

vida estável, tais quais alimentação e moradia, foi confirmada por Paulo, com a ressalva de

que o isolamento social, em decorrência da pandemia do Coronavírus que estourou em março

de 2020, dificultou este aspecto em específico. Como seu trabalho envolve atendimento

direto ao público e manipulação de alimentos, seu modo de sobrevivência ficou altamente

comprometido, entretanto, com a volta da normalização das atividades sociais e,

principalmente, a reabertura dos portões da instituição na frente da qual ele trabalha,

possibilitaram que sua renda mensal voltasse, aos poucos, a ser o que era.

Em seguida, analisando o nível de segurança no local de trabalho do ambulante

Paulo, é possível observar que ele não se sente 100% seguro na sua barraquinha montada ao

lado de fora, na calçada da instituição, entretanto, há de se levar em conta o contexto socio

cultural em que este trabalhador está inserido: em um dos países com maior taxa de

criminalidade do mundo, ou seja, trabalhar como vendedor ambulante no Brasil sempre vai

apresentar um certo risco enquanto esta realidade não for alterada. Como disse o próprio

Paulo em entrevista ao afirmar que já presenciou cinco estudantes sendo assaltados de uma

vez por um mesmo indivíduo, na porta da instituição.

Além disso, há também os riscos do trabalho em si, como se queimar com o óleo

quente do acarajé, estarem expostos aos carros que passam na rua e o próprio ato de ter que

dirigir à noite, cansado, após tantas horas de trabalho. De acordo com palavras do próprio

Paulo, “(...) os riscos que a gente passa: um carro bater e atropelar a gente, assaltos, (...)
fico cansado de voltar para casa dirigindo, também. Moro perto, mas para mim, eu acho que

é arriscado, né?”

Concomitante a isso, há o aspecto da proteção social que se entrelaça com o respeito

pelos seus direitos fundamentais sendo garantidos, ambas temáticas também investigadas

durante as entrevistas. O fato do trabalhador Paulo possuir cadastro como

Microempreendedor Individual (MEI) e, portanto, ter um CNPJ, garante a ele facilidades

como a abertura de conta bancária, o pedido de empréstimos e emissão de notas fiscais, além

de todos direitos (bem como as obrigações) de uma pessoa jurídica. Além disso, o fato de

Paulo contribuir para o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), garante a ele direitos

como profissional brasileiro, tais como aposentadoria e cobertura remunerada em caso de

doença e acidente. Entretanto, ao ser questionado sobre suas condições ideais de trabalho,

Paulo frisou que a muito tempo aguarda o quiosque fixo tão prometido pela prefeitura, para

que ele já não tivesse que montar e desmontar sua barraquinha todos os dias, o que facilitaria

seu trabalho e garantiria condições trabalhistas que alavancariam seu senso de trabalho digno

e decente.

A respeito do tópico de desenvolvimento pessoal e integração social, bem como a

construção de sentido de vida e pertencimento social, estes foram os resultados mais positivos

obtidos durante a entrevista, no que tange à trabalho digno e decente. Paulo apresentou um

ponto de vista totalmente otimista em relação ao acolhimento que recebe de seus clientes e

das pessoas em torno do seu local de trabalho; de acordo com palavras do próprio

entrevistado: “Sou bem acolhido, graças a Deus! É o saber chegar, é o saber lidar com as

pessoas! (...) Aqui, graças a Deus, de professor a zelador, de reitor a pró-reitor, todo mundo

sempre me tratou bem e eu sempre tratei as pessoas bem, né?”. Observa-se que o

acolhimento social percebido por Paulo é extremamente satisfatório para a execução de seu

trabalho.
Outro ponto importante, ainda no tópico de desenvolvimento pessoal, é sua

participação na Associação Nacional de Baianas de Acarajé (ABAM), bem como na

Associação dos Ambulantes de Ondina; ambos grupos sociais permitem uma ancoragem

social do trabalhador e uma sensação de reconhecimento em suas atividades laborais. Além

disso, Paulo também participa do Mercado IAÔ, projeto de iniciativa da artista baiana

Margareth Menezes, que possibilita a obtenção de cursos gastronômicos que agregam valor

ao trabalho de Paulo, possibilitando o desenvolvimento do mesmo no mercado de trabalho.

Paulo também menciona os cursos disponibilizados pelo SEBRAE e pelo SENAC, ambos

fornecidos através da prefeitura: “A gente sempre tomou treinamento, porque a gente sempre

é treinado. Além da gente ser associado da ABAM (Associação de Baianas de Acarajé da

Bahia), a gente também toma curso pela prefeitura. A gente é pequeno empreendedor, a

gente tem CNPJ, a gente toma curso pelo SEBRAE, pelo SENAC, tudo a gente toma curso",

todas essas falas apresentam um grande indicativo de desenvolvimento profissional e pessoal.

Por fim, porém não menos importante, avaliamos também os construtos de liberdade

de expressão, organização e participação das decisões que afetam sua vida como trabalhador

e indivíduo. Pudemos investigar, através de algumas perguntas feitas em entrevista, sua auto

percepção em relação ao nível de controle, escolha e planejamento de vida; e, através disso,

concluímos que Paulo se sente, sim, livre e com autonomia para decidir e seguir os passos em

sua ocupação profissional, isto porque, além da ancoragem em associações como a ABAM e

a Associação de Ambulantes de Ondina, ele menciona, em um dado momento da entrevista,

que não trocaria aquele ponto de vendas por um trabalho formal de carteira assinada, pois,

para ele, a liberdade de fazer seus próprios horários e trabalhar para si mesmo, vale mais do

que a garantia de um salário fixo. De acordo com suas próprias palavras, ao ser questionado

se a ele fosse apresentada a oportunidade de largar seu ponto para ter a garantia de um salário

(considerando que ambulantes autônomos ganham por produção e não tem garantia de renda
fixa), ele respondeu:“É uma pergunta difícil porque aqui eu me divirto, você sair de um

lugar que você tá identificado… Se fosse por um milhão eu largava (risos), porque sair de

um lugar que você está se divertindo para ganhar salário mínimo e ficar atrás de uma mesa

do jeito que eu sou agitado… Não dá certo não”

Logo, de forma geral, há muitos elementos no trabalho de Paulo que, ao serem

elencados e analisados, a partir dos critérios de classificação de um trabalho digno e decente,

tornam possível afirmar que é um trabalho com muitos elementos e características de um

trabalho digno e decente. Apesar das ressalvas em torno das condições de trabalho, como a

segurança no local, o risco inerente aos procedimentos do trabalho e a falta de estrutura física

adequada para as vendas, podemos afirmar sim que Paulo sente-se inserido em uma realidade

laboral digna que o possibilita trabalhar de forma decente.

4.2. Sentidos e significados

A partir dos métodos e instrumentos utilizados (a observação, a escala de sentidos e

significados e a entrevista semiestruturada) foi possível encontrar quais os sentidos-

significados atribuídos por Paulo ao trabalho que ele realiza e também é possível avaliar se é

um trabalho significativo ou não para ele e como com os elementos presentes ao compará-los

com a literatura é possível afirmar ou não se diz respeito a um trabalho significativo.

A partir da análise da Escala de sentidos e significado, foi possível perceber, como

mostra a Tabela 1 abaixo, ao falar da Dimensão de Realização Pessoal do Trabalho, ou seja,

sobre como o trabalho é capaz de proporcionar satisfação pessoal, Paulo respondeu todos os

itens com “concordo totalmente”, dessa forma, ele considera que o seu trabalho o

proporciona coisas como, “uma possibilidade de progressão na carreira; “fazer novas

aprendizagens”; “a possibilidade de explorar e realizar novas ideias” e “a oportunidade para


manter a confiança nas minhas capacidades.”. No que tange a Dimensão Positiva do

Trabalho, Paulo manteve suas respostas em sua maioria no ponto “concordo totalmente”, com

exceção apenas do item “pra mim trabalhar significa estar em um ambiente físico agradável"

em que marcou “discordo às vezes”. A média de 5,57 demonstra que ele percebe o trabalho

como um facilitador de experiências pessoais e sociais, portanto concorda com frases como,

“pra mim trabalhar significa uma fonte de felicidade e bem-estar” e “pra mim trabalhar

significa uma forma de ajudar os outros.”

Tabela 1. Pontuações da Escala de Significados Atribuídos ao Trabalho (Abreviada) –


Versão Brasileira (ESAT-BR)
Dimensões Pontuação máxima Pontuação obtida Média

Dimensão da Realização 54 54 6
Pessoal do Trabalho

Dimensão Emocional 42 39 5,57


Positiva do Trabalho

Dimensão Emocional 36 15 2,5


Negativa do Trabalho

Dimensão Econômica do 18 3 1
Trabalho

Os escores mais baixos nessa escala, foram encontrados nas Dimensões Negativas e

Econômica do Trabalho, média 2,5 e 1 respectivamente. Paulo, portanto, não vê o seu

trabalho como algo desgastante e estressante e também não o vê como forma de garantia de

qualidade de vida ou estabilidade econômica. Paulo discorda então que trabalhar significa

uma atividade repetitiva e aborrecida ou um fardo pesado que ele tem que suportar

diariamente, e explícita no entanto, que trabalhar raramente pode ser uma atividade

desgastante e cansativa. Ao falar da dimensão econômica, Paulo deixa claro que discorda

totalmente que seu trabalho configure como uma garantia de um bom salário, garantia de

sucesso econômico e garantia de estabilidade e segurança.


Dessa forma, pode-se perceber que Paulo coloca o seu trabalho não só como parte

central da sua vida, mas também como algo muito positivo e que lhe proporciona realizações,

prazer, superação de limites e uma fuga do ócio, e apesar de não fornecer estabilidade,

segurança e um retorno financeiro favorável, ele não vê o seu trabalho como algo

emocionalmente negativo.Essas percepções obtidas a partir da análise da escala ficam mais

evidentes em conjunto com a análise das respostas de Paulo a entrevista semiestruturada.

Sendo assim, a partir dos resultados da escala e dos argumentos de Paulo, é possível

perceber como ele atribui ao trabalho o sentido-significado de prazer e satisfação, essa

categoria proposta por Santos e Carvalho-Freitas (2018) faz menção ao contentamento da

pessoa provocado pela realização da sua atividade profissional e pontos de vista que

englobam o fato da pessoa gostar do que faz, logo esses aspectos podem ser exemplificados

pelas falas de Paulo, como: “aqui é bom tá aqui, por causa dos [clientes], fiz amizade com

tanta gente”; “com certeza, porque através disso aqui já fiz muito eventos, fiz muita

amizade, fui pra muitos lugares”

“aqui é! cê vê que quando não venho praqui, eu fico triste em casa, fico deprimido,

é…realmente, na greve mesmo, minha filha, pô fiquei triste pra caramba…

quando não venho praqui… aqui eu me divirto, aqui eu trabalho e me divirto ao

mesmo tempo, dou risada, [...]”

Dessa forma, é nítido o modo como a conexão com os clientes e a maneira que ele

trabalha o permite ficar alegre e isso tem muita relação com a possibilidade dele poder, a

partir da vivência do seu trabalho, exercer aspectos de sua personalidade e de seu talento,

como argumenta Morin (2001), isso pode ser percebido também a medida em que Paulo fala

ao longo das entrevistas sobre como ele adora se comunicar e interagir com as pessoas e
como o fato de ser comunicativo faz parte da sua forma de ser e estar no mundo desde de

muito novo: “As vantagens pra mim é que eu gosto de trabalhar com público, eu gosto de

trabalhar com público, entendeu?”; “Eu sou muito comunicativo[...]”

Comunicação com o povo. Tanto que é a parte que eu mais gosto. Porque desde de

pequenininho eu tive bar com meu pai né? Sempre tive bar e aí sempre meu pai teve

bar e eu sempre fui comunicativo né? Também sou músico, aí eu toco, tenho banda

de forró tudo isso, ai comunicação com um com outro, sou fácil de fazer amizade,

sou fácil de gostar e também fácil de desgostar.

Desse modo, faz-se perceptível a forma enfática que Paulo se refere às relações

satisfatórias que ele estabelece com todos os seus clientes e faz questão de externar que eles

ocupam níveis hierárquicos diversos dentro da instituição pública e também fala sobre como

se relaciona bem como os funcionários da segurança pública e o quanto criou bons laços de

amizades e é chamado para participar de eventos, tanto a trabalho quanto a lazer. Além das

falas de Paulo, foi possível observar esses aspectos interacionais em campo, e como ele se

relaciona bem com os seus clientes. Esse relacionamento corrobora com o postulado por

Torres; Bendassolli; Lima; Paulino & Fernandes (2018):

Os trabalhadores por conta própria valorizam o que, para eles, é a existência

de seu negócio: os clientes. Com eles, os vendedores desenvolvem uma

relação de amizade [...] É para esses mesmos clientes que aqueles organizam

sua atividade de trabalho, aprendendo competências e habilidades que

facilitem essa interação e culminem na venda.(p.35)

Ademais, baseando-se nas categorias propostas por Santos e Carvalho-Freitas (2018)

é possível afirmar que outros sentidos-significados atribuídos por Paulo são a independência
e sobrevivência, visto que essa categoria abarca à contrapartida financeira do trabalho, ou

seja, o retorno material, a forma de sustentar a família, que permite prover sua autonomia e

uma certa segurança para continuar gerindo sua própria vida como ele mesmo afirma: “[...]

eu que gerencio meu dinheiro e minha vida, [...]” e “Eu tenho uma filhinha de 16 anos de

idade, tenho que cuidar dela, as contas pra pagar, as coisas pra se fazer, então a gente fica

no corre corre.”

Destarte, além do provimento e do sustento da própria filha e da família, Paulo faz

menção sobre como o trabalho permite que ele esteja inserido no circuito de produção-

consumo, pela perspectiva do reconhecimento material e financeiro (Santos e Carvalho-

Freitas, 2018), esse tipo de aspecto pode ser visto nas falas de Paulo ao ser questionado sobre

o que o trabalho significa e proporciona para ele:

[...]Sem trabalhar a gente não tem nada o que a gente quer. A gente não compra um

carro, não compra um sofá, uma televisão, não compra um computador. Então com

o trabalho você pode fazer o que você bem quer né? Você vai ta com seu

dinheirinho no bolso.[..]

[...] o bem-estar da gente, ter condições de você comprar o que você bem quer,

porque sem o trabalho você não tem dignidade nenhuma né? É como os amigos de

bairro, né? Quando você tá com dinheiro, todo mundo é seu amigo [...]

Além disso, outro sentido-significado atribuído ao trabalho por Paulo foi o

preenchimento da vida, ou seja, o lugar central que o trabalho ocupa na vida de Paulo, que

pode ser notado na resposta dele ao ser questionado qual esse local de ocupação do trabalho

em sua: “TUDO. Pouquíssimo lazer e mais trabalho. [...] Então praticamente o trabalho da

gente ocupa todo o tempo da gente, né? Lazer pouquíssimo!”


Essa centralidade do trabalho apresentada por Paulo tem mais relação com quantidade

de demanda envolvida na realização do trabalho, como ele afirma que não é simplesmente

chegar e vender o produto, há toda uma estrutura de atividades durante o dia para que se

chegue ao local do trabalho e realize a venda. São atividades que a maior parte do tempo é

realizada somente por ele e sua companheira, logo todos os processos de trabalho demandam

muito do tempo dos dois. Logo essa centralidade pode ser bem relacionada ao entendimento

de Paulo com o caráter instrumental do trabalho, ou seja, a função de manutenção e

reprodução da vida (Lima et al, 2013 citado por Santos e Carvalho-Freitas, 2018).

Ademais, outro sentido-significado atribuído ao trabalho por Paulo pode ser

categorizado como a utilidade, que como afirma Santos e Carvalho-Freitas (2018) diz

respeito a geração de resultados e a ajuda aos outros. Além disso, tem muita relação com a

contribuição social, o que é feito em prol da sociedade (Morin et al., 2007 e Oliveira, 2004

citados por Santos e Carvalho-Freitas, 2018). Aspectos esses que puderam ser notados nas

seguintes falas de Paulo:“eu acho que eu trago bem-estar, comodidade[...] além de trazer

um bem estar, alimentar bem o povo com uma coisa de qualidade, a gente traz segurança

pra [instituição pública]”

Outra forma de contribuição social de Paulo é quando ele gera posto de trabalho para

outras pessoas e também auxilia na documentação de outros trabalhadores junto à associação

que faz parte:

“Além de eu trabalhar pra mim, eu ainda procuro ajudar…aqui… ele trabalha

comigo, então tô ajudando ele a ganhar o dele, então to ajudando ela a ganhar o dela

e os outros ambulantes mesmo, eu procuro até ajudar, não por forma de

concorrência né? como forma de querer ajudar[...]”


Além disso, outro sentido-significado que pode ser atribuído ao trabalho por Paulo,

mas que não foi mencionado diretamente por ele é o da valorização pessoal, que diz respeito

ao “trabalho como algo que fortalece a identidade pessoal, eleva a autoestima e desenvolve o

senso de valor e dignidade” (Santos & Carvalho-Freitas, 2018). Desse modo, foi possível

observar como Paulo fala do seu fazer com muito gosto, fala orgulho de como sabe lidar

muito bem com as pessoas, como administra o seu negócio, exercendo funções

administrativas diversas, fala de seu poder de comunicação, de como buscar o

aperfeiçoamento e entendimento do produto que oferece, de forma que reconhece o seu valor

diante das pessoas através do trabalho honesto e bem feito que ele faz questão de enfatizar.

Sendo assim, os sentidos-significados atribuídos ao trabalho por Paulo são

independência e sobrevivência, prazer e satisfação, preenchimento da vida, utilidade e

valorização pessoal, conforme já apresentado nos parágrafos anteriores.

Além disso, a partir do modelo proposto por Morin (2001) é possível destacarmos

algumas características do trabalho de Paulo que o tornam um trabalho significativo. A

começar, pelo fato de poder classificá-lo como um trabalho intrinsecamente satisfatório, visto

que Paulo aprende novas competências, atualiza seu potencial e aumenta a sua autonomia.

Tais característica podem ser percebidas quando Paulo partilha o fato de está sempre

participando de treinamentos e aprimoramentos:

“A gente sempre tomou treinamento, pq a gente sempre é treinado. Além da gente

ser associado [...]. A gente também toma curso pela prefeitura, a gente é pequeno

empreendedor, a gente tem CNPJ, a gente toma curso pelo SEBRAE, pelo SENAC,

tudo a gente toma curso. Agora mesmo eu tô fazendo gastronomia [...]”


“Então cada dia mais eu vou crescendo em relação a contato, a conhecimento, que a

gente não fica só parado, não fica só vendendo, a gente procura fazer um curso, a

gente procura fazer um, um entendimento do que a gente trabalha, porque não

adianta você só vender, você chegar ali e comprar, porque tem muita gente que

compra, vende hoje bom, amanhã tá vendendo ruim, então tem que procurar saber o

que você vende [...] pra aumentar a sua qualidade do seu produto, então pra mim o

entendimento vem sempre.”

Ademais, outra característica que pode ser visualizada é o fato de Paulo estar

solucionando problemas e utilizando o seu julgamento para tomada de decisões, segundo

Morin (2001) isso permite um fortalecimento do sentimento de competência e autoeficácia,

além do mais, a medida que tem que resolver problemas e vencer dificuldades Paulo é

estimulado a ser criativo. Criatividade esta que pode ser notada quando no período de

Pandemia, precisou adaptar o seu modelo de negócio: "Transformei meu modo de trabalhar,

nunca fiz delivery, comecei a fazer delivery, botei o acarajé no aplicativo 99 Food. [...]

transmissões, grupo de whatsapp e aí Facebook, Instagram foi divulgando e aí comecei a

trabalhar através disso!”.

E por fim, outras características que tornam um trabalho intrinsecamente satisfatório é

o fato dele conseguir feedback dos seus clientes de modo que possa melhorar, quando

necessário, os seus serviços: “É a qualidade do nosso serviço, né? Qualidade do nosso

serviço que a gente tá fazendo. E o sentimento positivo, de tá sendo recompensado por

aquilo que você fez.", “mas quando você vê cliente chegando, você vê cliente comprando,

você vê que tem retorno.”. E também como já mencionado anteriormente, é um trabalho que

corresponde à personalidade, aos talentos e aos desejos dele.


Ademais, como afirma Morin (2001) um trabalho que tem sentido é fonte de relações

humanas satisfatórias, com os colegas de trabalho, com os clientes, permitindo realizar trocas

e encontrar com pessoas honestas, ajudá-las e manter sempre o contato com os outros e de

forma intensa, isso tudo é estimulante para o trabalhador e para o fortalecimento de suas

identidades pessoais e sociais, logo foi possível perceber essas características a medida em

que Paulo relatou sobre as amizades e relações diversas que estabelece com os seus clientes e

outros colegas vendedores ambulantes no seu ambiente de trabalho.

Outra classificação proposta pelo modelo de Morin (2001) é que o trabalho que tem

sentido garante a segurança e a autonomia. Desse modo, as características do trabalho giram

em torno de independência financeira e saúde e segurança relativas às boas condições de

trabalho. Pensando nas características do trabalho de Paulo, de fato é trabalho que permite

que ele tenha suas necessidades básicas atendidas, junto à sua família, de modo que ele seja

independente financeiramente e autônomo, como ele mesmo mencionou. Entretanto, há um

instabilidade financeira e até emocional pelo fato de ser um trabalho que a pessoa fica muito

a mercê da variabilidade da clientela, do clima e a falta de certeza quanto a renda que será

gerada no mês, como afirma Paulo: “A instabilidade é financeira e emocional…quando você

vende você fica com ânimo, quando você não vende você fica com outro ânimo…”.

E ainda as condições de trabalho, como já discutido anteriormente ao abordamos

trabalho digno e decente, não são tão boas, visto que se localiza em um local aberto, onde

fica exposto a riscos, como a exposição à fuligem de carros e ônibus, assaltos, chuvas e ser

um trabalho que necessita de montagem e desmontagem repetitivo.

Ademais, outra classificação que é possível articular com o trabalho de Paulo e os

elementos que ele compartilhou com as pesquisadoras, é “o trabalho que tem sentido é

moralmente aceitável” (Morin, 2001), diz respeito a um trabalho que está articulado com

causas significativas e contribui socialmente com algo, logo Paulo ver o seu trabalho como
algo que colabora para o bem-estar e segurança dos seus clientes e de fato é um trabalho que

está neste lugar de oferta desses aspectos desde a maneira com as pessoas são recebidas e se

sentem bem quista por ele, com o trabalho dele junto a sua companheira proporcionam bem-

estar e segurança às pessoas.

E por fim, é um trabalho que mantém Paulo ocupado e estrutura a organização da sua

vida, mas a carga de trabalho não é uma carga horária adequada, visto que como Paulo

mencionou, praticamente todos as horas dele e de sua companheira estão voltadas para o

trabalho, em função da necessidade que tem em trabalhar para manutenção da própria vida e

por viverem em um contexto econômico e político totalmente injusto ao trabalhador

brasileiro.

Logo de forma geral há muitas características no trabalho de Paulo que junto aos

sentidos-significados que ele atribuiu nos faz afirmar que é um trabalho significativo, com

algumas ressalvas, como a falta de boas condições de trabalho, a instabilidade financeira e

emocional e a excessiva carga horária de trabalho, tudo isso em função dele ser um

trabalhador no Brasil.

4.3. Interseccionalidade a partir da Psicologia do Trabalhar

Partindo da análise das dimensões raciais, de gênero e idade, o entrevistado não

apresentou no discurso vivências de discriminacão racial, sexismo ou idadismo. Dessa forma,

isso representa, na prática, uma experiência diferente do que a literatura espera sobre as

condições contextuais e históricas desses recortes. Como destacado por Blustein (2006), a

Psicologia do Trabalhar reconhece que atualmente existem formas diferentes de opressão

política e social, e que exercem grande influência nas possibilidades de vida das pessoas, sem

excluir o entendimento de que as pessoas também exercem influência sobre suas vidas. Logo,
a justificativa central para a construção da TPT, de que não há estudos, até o momento, que

explicam adequadamente as experiências de trabalhar das pessoas nos “degraus inferiores da

escada da posição social” (Duffy, Blustein, Diemer & Autin, 2016, p. 127) se aplica nesse

estudo das experiências de trabalho de Paulo.

Nesse sentido, Paulo se identifica racialmente como negro e, nas palavras dele,

pertencer a essa identificação racial “ significa tudo né? Ainda mais porque minha avó foi

escrava. Meu avô era português e minha avó foi escrava e índia. [...] A família é toda negra,

já vem de raízes africanas”. No entanto, mesmo com a noção de ancestralidade racial, ele

não apresenta ligação com a cultura africana, apontando que “muitos seguem aquelas bandas

de matriz africana, como Olodum, mas eu não tenho esse gênero musical. Tenho um

totalmente diferente. Sou negro, mas musicalmente não sigo essas coisas, meu negocio é

rock in roll, forró, tenho banda de forró e sou músico também, já toquei em várias bandas.

Nunca gostei de olodum, pagode, principalmente esses que rebaixam a mulher, esses

pagodes de facção" e completa que “a minha casa era terreiro de candomblé, meu pai era

pai de santo, mas depois acabou quando meu pai e minha madrasta faleceram. Depois não

tive mais contato. Só frequentava porque era na minha casa.” Além disso, embora trabalhe

com a venda de Acarajés que, segundo o antropólogo Vivaldo da Costa Lima (2010), possui

ancestralidade africana e foi introduzido no Brasil através dos escravos de etnia nagô, das

regiões iorubás da Nigéria e do atual Benin, Paulo não apresenta uma identificação cultural

com o acarajé. Ele atribui a comercialização desse alimento a dois fatores: a junção

experiência da sua esposa na produção de acarajé e ao seu aprendizado, desde criança, em

trabalhar com vendas e atividades comerciais.

Quanto às relações com sua esposa, Paulo aponta que as atividades e demandas

domésticas e do trabalho são divididas, e destaca que os dois fazem, conjuntamente, cursos

de culinária e aprimoramentos para a atividade comercial e vendas de acarajé. É importante


destacar que o trabalho em conjunto aparenta ser, para Paulo, como apontado por Ryan &

Deci (2000), um comportamento autentico e autodeterminado, diante de um contexto que

permitiu que ele se sinta competente para suas responsabilidades, e está envolvido pelas

relações interpessoais do seu trabalho e com a autonomia de execução.

Em relação a idade, Paulo aponta a vivência do preconceito partindo das pessoas que

são mais velhas e que trabalham na comercialização do acarajé há mais anos do que ele. A

partir das suas falas “as baianas de acarajé hoje em dia, você vê que 80% são mais idosas

[...]. Quando a gente começou a vender acarajé aqui, a gente fez cursos, somos da ABAM,

temos advogados e somos tombados e protegidos pelo IPHAN. Por ser mais novo, dentro de

6 meses a gente comprou carro. Aí rola aquele ciúme e inveja né? Tem uma baiana mesmo

que disse que tinha 20 anos trabalhando com acarajé e não tinha um carro e eu tinha 6

meses trabalhando e tinha um. Entendeu? A minha visão era outra.” Dessa forma, Paulo

apresenta três aspectos importante da TPT, apontado por Duffy e colegas (2016) como

atributos pessoais e sociais que podem alterar a direção e a força do impacto do contexto, na

capacidade de garantir um trabalho decente, com destaque para a personalidade proativa, a

consciência crítica e o suporte social. Dessa forma, a personalidade proativa representa a

disposição individual do entrevistado para tomada de iniciativa, através dos cursos de

capacitação. A consciência crítica, ao analisar que, normalmente, o esperado é que o

comércio e venda de acarajé não sejam boas fontes de retornos financeiros mas, a partir da

ligação de Paulo com algumas associações e aprimoramentos, ele conseguiu sair do que era

esperado na sua profissão. Além disso, o suporte social, está presente fundamentalmente no

trabalho em conjunto com sua mulher e a forma como ele se sente seguro nessa atividade,

através dos conhecimentos adquiridos com o pai para exercer atividades comerciais.

No entanto, na variável classe econômica, Paulo destaca vivências pessoais de

preconceito social. Quando questionado se ele percebeu, em relação a sua cor, algum tipo ou
gesto de discriminação (pergunta 6), ele diz que “Não pela cor, mas pela roupa. Como eu

trabalhava na Vitalmed, eu só andava nos ‘trinks’, roupa social, sapato brilhando, gravata.

Então, sempre que eu entrava nas lojas, as pessoas me abordavam rapidinho para atender.

[...] Antes eu entrava nas lojas e todo mundo vinha falar comigo, mas certa vez eu tava de

folga, fui de bermuda e chinelo (mas eu estava com dinheiro no bolso), e fui comprar um

freezer na Insinuante da Bonocô. Entrei, abri o freezer, mexi no freezer e tinham 8

vendedores lá e eu olhei pra eles. Continuei olhando, fechei e fui embora”.

No âmbito profissional, o entrevistado não relata experiência de preconceito social.

Ele aponta que no ambiente de trabalho “ [...] todo mundo é parceiro. De reitor a faxineira,

todo mundo vem aqui. Quando to lá dentro, o vice-reitor vem ‘tomar uma’ comigo, também

leva os professores que vêm de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, pra ‘tomar uma’

comigo.” No entanto, analisando partes do discurso ao longo das entrevistas, é possível

perceber elementos de preconceito social, através da constante tentativa de diferenciação de

Paulo do que é ilícito e o esforço em se aproximar do que está dentro do âmbito da

legalidade. Para o entrevistado, trabalhar é conectar-se ao mundo social e, para as pessoas

sem muitas escolhas, as conexões relacionais são profundamente relevantes para o

desenvolvimento de uma vida de trabalho digna e com significado (Blustein, 2011). Esse

aspecto pode estar atrelado às consequências que as experiências de marginalização e as

restrições econômicas podem produzir (Duffy et al., 2016). E, numa perspectiva

macrossocial, surge como via fundamental para a superação da pobreza, de desigualdades e

da exclusão social (OIT, 2015).

Pode - se compreender essa experiência a partir de alguns elementos relacionados a

constante reafirmação de Paulo quanto ao distanciamento da criminalidade, que surgiram ao

longo das entrevistas: a escolha da polícia militar (imagem 3) no photovoice, como

fundamental para garantir seu trabalho e sua segurança; a diferenciação cultural, ao apontar o
estilo musical do pagode como “pagodes de facção” na qual ele não se identifica por esse

motivo; o relato de pedido à filha, que quando namorasse “não se misturasse com ninguém

do bairro e nem que fosse do tráfico ou de facção”; a experiência profissional, na qual ele

afirma que “tudo que você imaginar já vendi, menos drogas” e por fim, de maneira

complementar, a reafirmação constante sobre a regulamentação do seu trabalho e o receio

com a criminalidade como ameaça ao seu sustento, nas suas palavras “tirei a licença daqui e

deixei tudo legalizado. Aqui tá tudo cadastrado e certinho. Aqui ninguém mexe, só ladrão

mesmo”. Nesse sentido, existem três componentes, do âmbito pessoal de Paulo, que podem

ser responsáveis por amortecer as experiências de marginalização e restrições econômicas,

que são: a percepção de volição de trabalho, a adaptabilidade de carreira e a capacidade de

conseguir um trabalho decente. Dessa forma, a volição (Duffy, Diemer, Perry, Laurenzi, &

Torrey, 2012) é perceptível nas tomadas de decisão de Paulo sobre a legalidade e

aprimoramento constante na carreira, apesar das restrições, adversidades, riscos e da

exposição inerente do trabalho ambulante. A adaptabilidade (Savickas & Porfeli, 2012) está

presente na curiosidade de Paulo em oportunidades de crescimento pessoal e na confiança

para aprender novas habilidades, mesmo diante da instabilidade do mundo do trabalho. E,

além disso, o acesso ao MEI (Microempreendedor Individual) retira o seu trabalho da

categoria de trabalho informal, tornando-o trabalhador autônomo, com contribuição ao

Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), e garantindo-lhe benefícios sociais.

4.4. Identidade profissional

Um outro enfoque concentra-se nos elementos fundamentais para a construção da

identidade social e profissional do trabalhador estudado, para isso, esta análise requer uma
compreensão a respeito do conjunto de fotografias escolhidas pelo trabalhador a partir do

Photovoice, que dizem respeito à construção da sua identidade profissional, aspectos que são

relevantes ao exercício do trabalho e a formação do indivíduo em questão. Dessa forma, a

associação das três imagens escolhidas representam aspectos fundamentais para a

manutenção do seu trabalho atrelada a sua identidade profissional. Nas palavras de Paulo,

isso é possível pois essa representação diz respeito a “vida, no geral da vida, é tudo né? Os

três representam tudo. Porque a gente hoje, sem segurança, sem qualificação no que você

faz, qualificação no seu trabalho, e sem o cliente pra te dá o retorno você não é nada. Não

adianta ter um produto que não seja bom e que não tenha cliente. Se o produto tem que ser

bom para ter retorno dos clientes, né? E a polícia para dar segurança para todo mundo,

tanto para mim quanto para os clientes.”

Consideramos, com base na teoria da socialização e da construção de identidades de

Claude Dubar, que “as identidades profissionais são maneiras socialmente reconhecidas para

os indivíduos se identificarem uns com os outros, no campo de trabalho e do emprego”

(Dubar, 2005). A forma identitária laboral coabita com outras formas identitárias, como a de

gênero, que tem origem na socialização familiar e nesse aspecto, o trabalhador relata no

primeiro dia de entrevista que começou a trabalhar por volta dos 13 anos ao auxiliar seu pai

que também era comerciante, e a forma simbólica, que inclui valores estéticos, políticos e/ou

religiosos. Por outra maneira, a construção de identidades também está relacionada a

atributos institucionais, como escolaridade, formação, a grupos sociais de referência, além de

outros marcos institucionais.

Cabe ainda salientar que mesmo com as formas de reconhecimento social

relacionadas ao vendedor ambulante, vistas como atípicas, negativas e preconceituosas e,

geralmente, mal vistas pela sociedade, essa profissão é parte constituinte importante no

mundo do trabalho no sul global, sendo um fator constituinte ao se inserir na vida do sujeito,
garantindo dignidade, independência, fortalecimento da sua identidade e permite ao indivíduo

contribuir ao mundo e dar um sentido à sua existência. Por outro lado, esta mesma sociedade

carrega em si o próprio habitus de consumo de bens e serviços tornando-se um marco

identitário para esse trabalhador (Bourdieu, 2007), substituindo outros atributos clássicos da

identidade, como escolaridade, formação e profissionalização. Dessa forma, como a atividade

de vendedor ambulante exercida por Paulo é atrelada ao comércio de produtos da categoria

alimentícia, o acesso à sociedade de consumo é facilitado e, a partir disso, torna-se possível

uma validação social do seu trabalho.

Segundo Dubar (2005), a compreensão sobre a construção da identidade ocorre a

partir das representações individuais e subjetivas dos próprios indivíduos. No entanto, como

requer um reconhecimento ou não reconhecimento de outras pessoas, ela se constitui como

uma construção conjunta, portanto submetida a dualidade, esse aspecto pode ser observado ao

longo das falas de Paulo, e na escolha da Imagem 1 (clientes) como representativa na sua

compreensão a respeito da sua própria identidade profissional, sendo que a identidade nada

mais é que “(...) o resultado a um só tempo estável e provisório, individual e coletivo,

subjetivo e objetivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que,

conjuntamente, constroem os indivíduos e definem as instituições” (Dubar, 2005).

Imagem 1.

Clientes - sentimento evocado: positivo


A construção da identidade ocorre num processo comunicativo e de trocas, de

negociação identitária. Por isso pode-se afirmar que Paulo construiu a própria identidade

profissional mediante a atividade que exerce. Logo, o trabalhador associa a mesma com a

necessidade da clientela estar presente, ao consumo e à venda como maneiras de reafirmar a

sua profissão, e consequentemente, validar seu esforço diário a fim de exercer sua função

profissional, figura fortemente presente em seu discurso a respeito da escolha da fotografia

que representa os clientes mesmo como sentimento positivo atrelada a mesma, em suas

palavras, “positivo, com certeza. Porque quando você faz um evento que não tem ninguém

você fica triste né? Porque você não tá vendendo, você teve aquele trabalho todo e não tá

vendo o retorno, mas quando você vê cliente chegando, você vê cliente comprando, você vê

que tem retorno. Porque meu trabalho não é só aqui, meu trabalho vem desde casa, a gente

acorda cedo, feira de São Joaquim, da feira pro mercado, depois casa. [...] É um trabalho

da porra que a gente tem, entendeu? Nós temos. O trabalho da gente não é só, a gente

sentou aqui e vendeu não, vem desde de manhã, de casa. Ainda lavar as panelas, ela vai

dormir tarde, eu vou dormir tarde todo dia, a gente acorda cedo, tudo pra fazer isso aqui.”

Em vários momentos da sua fala o trabalhador reafirma que o exercício do seu

trabalho não está atrelado apenas ao lugar da prestação de serviço, mas também ao longo de
todo o dia. O trabalho está intrinsecamente atrelado a sua rotina diária, preenchendo grande

parte do seu dia-a-dia. Logo, sua identidade social, no caso da profissional, está diretamente

relacionada com o tempo dedicado às funções necessárias, a dedicação e o tempo gasto no

exercício laboral.

A identificação pessoal do Paulo com o seu trabalho é um ponto-chave para a

compreensão desse aspecto, ela possibilita a construção por parte do trabalhador de uma

identidade profissional positiva, que supera uma desvalorização profissional, permitindo-o

projetar uma carreira e se engajar tanto nas suas funções, quanto na qualificação para o

exercício das mesmas. Aspecto este que pode ser observado em sua fala a respeito de

progressão de carreira, “então cada dia mais eu vou crescendo em relação a contato, a

conhecimento, que a gente não fica só parado, não fica só vendendo, a gente procura fazer

um curso, a gente procura fazer um, um entendimento do que a gente trabalha, porque não

adianta você só vender, você chegar ali e comprar, porque tem muita gente que compra,

vende hoje bom, amanhã tá vendendo ruim, então tem que procurar saber o que você vende,

um camarão bom, uma qualidade boa, pra aumentar a sua qualidade do seu produto, então

pra mim o entendimento vem sempre.”

Partindo dessa perspectiva, a escolha da Imagem 2 (barca de acarajé), reforça que a

qualidade do produto e a qualificação profissional é fundamental para uma maior satisfação

dos clientes e um maior retorno, seja ele financeiro ou social, aspecto este que é característico

da profissão de vendedor ambulante, configuração relacionada também a identidade

profissional, sendo esta “um tipo de identidade social fruto da percepção de inclusão em um

grupo social que compartilha um domínio específico e técnico de saber, e que permite

demarcar o grupo profissional de pertencimento ou identificação (endogrupo) e o grupo de

distanciamento ou de contra-identidade profissional (exogrupo).” (Gondim et al., 2016)

Imagem 2.
Barca de acarajé - sentimento evocado: positivo

Ademais, as demais pessoas são importantes nessa construção, pois o julgamento de

outrem sobre seus atributos e competências interfere na sua autopercepção, isso nos permite a

compreensão de como os clientes têm importância significativa na formação das crenças

sobre si próprio, e na sua identidade profissional. Além disso, a identidade profissional tem

uma implicação social com um "modo de fazer", transformando o entorno e a si mesmo

(Gondim et al., 2016). Nesse sentido, Paulo atribui um significado social importante ao seu

trabalho, em suas palavras, o seu trabalho enquanto vendedor ambulante que ocupa o espaço

público da cidade, “além de trazer um bem estar, alimentar bem o povo com uma coisa de

qualidade, a gente traz segurança [...], porque como eu falei, como eu sou comunicativo, fiz

amizade com as polícias daqui, eu tenho o contato de todo mundo, eu boto viatura aqui na

frente, as motos ficam aqui, os alunos [...] não ficam lá no ponto, ficam todo mundo aqui

comigo de noite, fica todo mundo aqui comigo de noite, entendeu? Quando eu saio, eu aviso

“saia daqui, fique lá na frente. Fica mais perto do portão lá”, a gente já livrou muita gente

de assalto aqui, viu?”


Essa importância social fica ainda mais evidente quando o trabalhador, ao escolher a

Imagem 3 (motos da Polícia Militar) na entrevista do Photovoice, reforça uma implicação

social naquele espaço geográfico no qual está exercendo sua atividade profissional,

implicação esta que está relacionada com a segurança pública, mas não apenas, entende-se

que essa segurança é relevante também para a manutenção da sua clientela e,

consequentemente, das suas vendas, atribuindo a Imagem 3 o sentimento de segurança, “é o

sentimento de segurança, e amizade que eu fiz aqui também, amizade com o batalhão todo,

se você quiser o número de todo mundo aqui eu tenho. Então é isso aí, o sentimento de

segurança para todos nós, não só para mim, mas para os alunos também, os clientes.”

Imagem 3.

Motos da Polícia Militar - sentimento evocado: segurança

Com isso, a partir desse estudo é possível reforçar a prerrogativa que as identidades

sociais é um conceito relacional e podem ser reafirmadas ou reformuladas ao longo da vida

do sujeito. Gondim e autoras, salientam que a identidade social está relacionada com os

papéis e o sentimento de pertencimento aos grupos sociais, ou seja, não se nasce com uma, ou

várias identidades, elas são construídas nos processos de inserção e interação social ao longo

da trajetória de vida. Nesse sentido, podemos supor que o início da construção da identidade
profissional de Paulo, se deu primeiramente no âmbito familiar, ao lado do seu pai que

exercia a mesma função profissional, “então, fiz meus corri dessa forma e meu pai tinha o

comércio, tinha um bar... comércio! Então eu tô no comércio desde pequeno, né?", ou seja,

sua identidade profissional foi se desenvolvendo ao longo do seu percurso enquanto

vendedor, “eu sempre trabalhei com vendas, né? eu já vendi tudo que você já pensar nessa

vida.”

Com esses raciocínios é perceptível que cada pessoa tem um papel fundamental, ativo

e reflexivo na formação das suas identidades, e que a construção da identidade profissional

pode estar fundamentada em diversos fatores, nesse caso específico, a experiência direta da

pessoa, a qualificação e aperfeiçoamento profissional, a proatividade, autogestão, autonomia

que são marcadores importantes para refletir sobre o trabalho do microempreendedor e do

trabalhador autônomo, além da experiência indireta de trabalho associada a profissão de

comerciante do pai.

Por fim, diante da instabilidade do exercício da função de vendedor ambulante no

contexto atual, se faz necessário refletir a identidade do trabalho e profissional do vendedor

ambulante no atual sistema econômico, perpassados por aspectos que cristalizam essas

identidades a um grupo específico de trabalhadores e trabalhadores, que são perpassados por

marcadores de raça, classe social e gênero no exercício das suas atividades diárias, sem

deixar de lado uma reflexão a respeito das diversas possibilidades do trabalhar, e que mesmo

havendo características específicas dessa profissão que não estão relacionadas a um vínculo

organizacional do trabalho, ainda é possível, como afirma Paulo ao longo desse estudo, que

haja uma escolha consciente por sua profissão perpassada por identificação, motivação,

satisfação e habilidades. Ou seja, não somente as identidades sociais (as identidades de

trabalho e profissional) são atropeladas pela instabilidade das referências, mas também a

identidade pessoal. Cada um necessita reafirmar ou redefinir identidades para integrar-se


como pessoa no mundo atual e não experimentar estranheza nas relações sociais e nem em

relação a si mesmo. Adiciona-se a esta problemática o fato de a identidade de trabalho em

uma sociedade capitalista assalariada estar fortemente centrada no vínculo empregatício.

(Gondim et al., 2016)

4.5. Mapa conceitual


5. Considerações Finais

O presente trabalho proporcionou ao grupo infindáveis reflexões sobre o trabalho

exercido pelo vendedor ambulante, e todas as contingências que os circundam. Os temas aqui
analisados - trabalho digno e decente, sentidos e significados, interseccionalidades e

identidade profissional - foram elucidadores para uma investigação ampla sobre não só sobre

as características dos comerciantes de rua e as experiências e visões do trabalhador

entrevistado, bem como sobres os nossos próprios entendimentos e expectativas a respeito

desse segmento de trabalho.

Dessa forma, foi muito interessante perceber, por exemplo, como Paulo não via o seu

trabalho como um fardo e sim como uma atividade positiva e permissiva que ocupava um

lugar central na sua vida ou como a raça não era um fator tão importante no seu ramo e local

de trabalho, assim acabamos por desmistificar ideias construídas antes do estudo.

Outros pontos interessantes envolve a oportunidade que tivemos de conhecer as

condições e processos do vendedor ambulante cadastrado como MEI e identificar que diantes

de diversos elementos é possível caracterizar o trabalho exercido por Paulo como

significativo, digno e decente, mesmo que diante de algumas ressalvas, em torno da carga

excessiva de trabalho, a estrutura física inadequada, os riscos inerentes ao processo e a

instabilidade financeira.

Quanto aos aspectos positivos, dignos, decentes e significativos envoltos no trabalho

de Paulo, o destaque maior é para o prazer e a satisfação que Paulo demonstra ter em interagir

com as pessoas, clientes e associações, o quanto isso é o que mantém o seu trabalho

proveitoso, contribui fortemente para a construção das suas identidades profissionais, sociais

e pessoais, permite que ele tenha suporte técnico e social e esteja inserido em contextos que

permitam o desenvolvimento e fortalecimentos de competências, autonomia e garantias de

direitos.

Dessa forma, foi possível identificar a dinamicidade e os impactos de elementos

psicológicos, sociológicos e estruturais no trabalho do entrevistado, deslocando a perspectiva

de passividade e do raciocínio linear e generalista sobre o trabalho ambulante e o trabalhador


Paulo. Nesse sentido, apesar das adversidades, o entrevistado explora as possibilidades de ser

o protagonista de sua própria história, lutando diariamente em muitos aspectos de sua vida

pessoal e profissional. É intrigante identificar que apesar dos sistemas discriminatórios

produzirem desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de raças, gênero,

etnias e classes, Paulo desenvolveu recursos psicológicos e preditores individuais que

facilitam o seu trabalho e que propiciam mecanismos de enfrentamento nesse contexto.

A partir dessa conjuntura, para compreender melhor os dados recolhidos e as

dimensões investigadas, foi preciso, também, caminhar pelas esferas do direito e dos âmbitos

sociais, sendo relevante a compreensão de questões relativas aos direitos, valores e moral.

Nesse sentido, no livro Relação de Emprego, Dependência Econômica e Subordinação

Jurídica (2014) elaborado por Murilo Oliveira, o ambulante, ou seja, aquele que escolhe os

produtos que compra e vende pelo preço que considera adequado (trabalhador autônomo), é

equiparado a um pequeno empresário. A sua posição jurídica é de empresário, de

empreendedor. E assim, portanto, as categorias do direito do trabalho, não se aplicam para o

nosso sujeito analisado (mesmo sendo ele um contribuinte associado e que participa do MEI).

A questão é que o ambulante trabalha para si, não para outrem. A discussão, da proteção a um

trabalhador autônomo, tem sido feita, justamente, porque hoje, também há um conjunto de

figuras que ficam na zona intermediária entre assalariados e autônomos. No caso dos

ambulantes, também é importante dizer, que eles estão pautados por uma condição de

informalidade e precariedade, porque ocupam este meio de vida, muitas vezes arriscado e

economicamente desfavorecidos, porque não acham emprego formal ou, como no caso do

nosso sujeito investigado, não têm capital suficiente, para colocarem uma loja física e

estruturada.

Então, deste modo, poderíamos concluir que implicar o governo, no sentido de

abarcar as demandas que dignificaria essa classe de trabalhadores, seria o principal caminho.
Segundo Murilo Oliveira (2014), hoje, no direito brasileiro, não há proteção para essas

pessoas, porque essas são tidas como empresárias. Para combater a informalidade e proteger

esse tipo de trabalhador, o que sugerimos e concluímos, portanto, é preciso que se busque

instaurar no Brasil, o que alguns países europeus já fazem: adoção da renda mínima. Sendo

assim, a partir de uma renda melhor, poderiam escolher algum trabalho diferente ou investir

mais no trabalho que já possuem, em busca de melhorias, como no caso de Paulo.

Por fim, a realização do estudo em profundidade nos permitiu integrar os construtos

estudados, notando o quanto eles estão imbricados e o quanto se faz necessário contextualizá-

los para que seja possível uma leitura mais ampla, principalmente, sobre as diversas formas

de trabalho que existem no Brasil.

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Torres,T. L. ; Bendassolli, P. F.; Lima, F. C.; Paulino, D. S. & Fernandes, A. P. F.


Representações Sociais do Trabalho Informal para Trabalhadores por Conta Própria. Revista
Subjetividades, Fortaleza, 18(3): 26-38, dezembro, 2018
Apêndice A - Caracterização sociodemográfica e história de vida do trabalhador

1. Questões sociodemográficas (idade, local de nascimento, escolaridade, estado civil,


possui filhos, gênero, raça/cor, orientação sexual, classe social, local de residência,
casa própria ou aluguel.)
2. Comente um pouco de seu percurso com o trabalho até chegar a esse momento da sua
vida.
3. Como foi que a profissão de vendedor ambulante entrou na sua vida? Há quanto
tempo?
4. Como você definiria o seu trabalho? Quais são suas funções? Quais as atividades que
você exerce? Qual o produto que você comercializa?
Apêndice B - Entrevista semiestruturada de Trabalho digno e decente

1. Você exerce seu trabalho, em uma área pertencente à uma instituição pública. Existe
algum tipo de acordo, benefícios, exigência ou supervisão da instituição, em relação
ao seu trabalho?
2. Quais os riscos que você percebe em relação ao exercício da sua profissão? Há algo,
no seu dia a dia de trabalho, que você considera que seja arriscado? [objetivo da
pergunta: identificar os possíveis riscos, como inspirar monóxido de carbono,
exposição ao sol, cortes, topadas]
3. O senhor já sofreu algum acidente de trabalho na sua função atual?
4. Se ocorrer algum imprevisto, como fica a questão da sua renda? Fica comprometida?
5. Caso você adoeça e não possa realizar suas funções diárias de trabalho, existe alguma
outra fonte de renda para auxiliar no seu sustento (exemplos: INSS ou outro auxílio
do governo)?
6. Quando os alunos entram de férias e em situações como a da pandemia, em que a
universidade esteve fechada, quais foram os impactos no seu trabalho e na sua vida?
7. A remuneração pelo seu trabalho, costuma ser satisfatória para o seu sustento e da sua
família?
8. O que você poderia nos dizer, a respeito do modo como é tratado e acolhido?
9. Quais as desvantagens do seu trabalho? [exemplos teóricos: falta de garantias,
benefícios da seguridade social]
10. Quais dificuldades existem nas suas relações sociais por ser um vendedor ambulante?
E nos seus direitos de cidadão? [exemplos teóricos: dificuldade de conseguir crédito
no banco, a carteira de trabalho já foi um marco de nascimento cívico, uma pessoa
sem carteira tem menos valor]
11. Quais as vantagens de ser vendedor ambulante? E as desvantagens?
12. Quais seriam as condições de trabalho ideais para a sua profissão? Qual é a sua
realidade? (objetivo da pergunta: saber o que falta para as boas condições de trabalho
dele)
13. Você acredita que todos os seus direitos (décimo terceiro, aposentadoria, seguro
desemprego) enquanto trabalhador estão garantidos? Está satisfeito com essa
realidade? [segunda pergunta para ser feita após a primeira resposta]
14. Você participa de alguma organização social, como associação, coletivo? De que
forma você atua nesse lugar?

Apêndice C - Entrevista Semiestruturada de Sentidos e Significados do Trabalho

1. Que lugar o trabalho ocupa na sua vida?


2. O que te motiva a trabalhar diariamente?
3. O que o trabalho significa para você?
4. O que o trabalho impacta e proporciona na sua vida?
5. Você se considera satisfeito com o seu trabalho? Por quê?
6. O que você mais gosta no seu trabalho? Por quê?
7. Você trocaria de trabalho? Por quê?
8. Sua profissão foi uma escolha? Comente. (Observar se foi em função das condições
da sua vida naquele momento, por junção dos fatores, como por exemplo, baixa
escolaridade e qualificação profissional, desemprego.)
9. Na sua opinião, qual a importância do seu trabalho para a sociedade?
10. Como o senhor acha que seu trabalho é visto pelas outras pessoas? (objetivo é
investigar valorização ou desvalorização social, discriminação, ou seja, significados)
11. Quais são as características do seu trabalho que você considera que sejam mais
valorizadas pelas pessoas?

Apêndice D - Escala de Significados Atribuídos ao Trabalho (Abreviada) –


Versão Brasileira – E SAT-BR

Itens:

1. Uma possibilidade de progressão na carreira


2. Fazer novas aprendizagens
3. Assumir novas responsabilidades
4. A possibilidade de explorar e realizar novas ideias
5. À possibilidade de utilizar os meus saberes a situações novas
6. A oportunidade para manter a confiança nas minhas capacidades
7. A possibilidade de utilizar as minhas capacidades e competências
8. Uma forma de realização pessoal
9. Cada vez maior exigência, dedicação e empenho
10. A possibilidade de apreciar a beleza das coisas
11. Poder estar num ambiente físico agradável
12. A possibilidade de realizar atividades de lazer como: esporte, convívio com os
amigos, participação em clubes
13. A oportunidade para construir uma sociedade mais solidária e justa
14. Uma oportunidade para fazer amizades
15. Uma fonte de felicidade e bem-estar
16. Uma forma de ajudar os outros
17. Uma atividade desgastante e cansativa
18. Um ambiente estreante e pesado
19. Uma atividade repetitiva e aborrecida
20. Um fardo pesado que tenho de suportar cada dia
21. Participar de um ambiente que só cria problemas
22. Preocupação e instabilidade constantes
23. A garantia de um bom salário
24. Garantia de sucesso econômico
25. Garantia de estabilidade e segurança

Apêndice E - Entrevista semiestruturada de Interseccionalidades

1. Como o senhor se identifica racialmente? E o que isso significa pra você?


2. E o que te faz ser negro?
3. Você acredita que tem algum aspecto cultural que te faz ser negro?
4. Em relação a religiosidade, você tem alguma ligação com as de matriz africana?
5. E o acarajé, como surgiu na vida de vocês?
6. Você já percebeu, em relação a sua cor, algum tipo ou gesto de discriminação?
7. No ambiente de trabalho atual, você já percebeu alguma discriminação?
8. Então pensando na questão de ser negro, você acredita que isso não interfere muito?
9. E pensando na convivência e nas demandas com sua esposa, você percebe alguma
diferenciação no trabalho doméstico entre vocês?
10. Pensando em uma mulher trabalhadora ambulante e um homem trabalhador
ambulante, como o senhor, você percebe que há diferenças no tratamento ou alguma
vantagem e desvantagem? Se sim, ao que o senhor atribui essa diferença?
11. E o fato de o senhor ser homem, percebe alguma vantagem ou desvantagem?
12. E a desvantagem em ser um trabalhador homem?
13. Você percebeu alguma diferença quando começou a trabalhar e agora?
14. O senhor percebe, em comparação com as pessoas que trabalham na mesma profissão,
diferenças em relação a idade?

Apêndice F - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido


_________________________________________________
Caroline Bernardo

_________________________________________________
Daiene Oliveira da Silva

_________________________________________________
Gabriela Santos

_________________________________________________
Joana Tavares

_________________________________________________
Luciana Cerqueira

_________________________________________________
Luísa Sousa

____________________________________________
Stephanie Alves

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