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INFORMATIVO
TÉCNICO
CIENTÍFICO
DO INES
N° 28
JUL-DEZ/2007
Espaço Aberto
“As pesquisas desenvolvidas no Instituto Nacional de Edição
Educação de Surdos - INES no período de 1989 a 2007” Comemorativa
18 anos da
Revista Espaço
Atualidades em Educação
(Des) encontros entre o cotidiano escolar e as
Políticas Públicas de Educação
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p., Jul-Dez 2007
SUMÁRIO INES
ESPAÇO
Jul-Dez/07
EDITORIAL / EDITORIAL 05
REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA /
ESPAÇO ABERTO / OPEN SPACE REFLECTIONS ON THE PRACTICE
ATUALIDADES EM EDUCAÇÃO /
NEWS ON EDUCATION
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INES
ESPAÇO
SUMÁRIO
Jul-Dez/07
PRODUÇÃO ACADÊMICA / MATERIAL TÉCNICO- 94
THESES AND DISSERTATION ABSTRACTS PEDAGÓGICO /
TECHNICAL-PEDAGOGICAL MATERIAL
Mídia televisiva sem som
(manuscrito) 88
André Ribeiro Reichert
AGENDA / AGENDA 95
Marcas surdas: escola, família,
associação, comunidade, universidade
constituindo cultura e diferença surda 89
Vânia Elizabeth Chiella NORMAS PARA
PUBLICAÇÃO / 96
GUIDELINES FOR SUBMISSION OF
ARTICLES FOR PUBLICATION
RESENHA DE LIVROS / REVIEWS
Surdez e Educação
Betina Guedes 90
ESPACO ESPAÇO é um informativo técnico-científico de Educação e Educação Especial para profissionais de ambas as áreas. Os trabalhos publicados em
ESPAÇO podem ser reproduzidos desde que citados o autor e a fonte. Os trabalhos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores.
ISSN 0103-7668 Governo do Brasil - Presidente da República Luis Inácio Lula da Silva
Ministério da Educação Fernando Haddad
Secretaria de Educação Especial Claudia Pereira Dutra
Instituto Nacional de Educação de Surdos Marcelo Ferreira de Vasconcelos Cavalcanti
Departamento de Desenvolvimento Humano, Científico e Tecnológico Leila de Campos Dantas Maciel
Coordenação de Projetos Educacionais e Tecnológicos Alvanei dos Santos Viana
Divisão de Estudos e Pesquisas Maria Inês Batista Barbosa Ramos
Edição Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES - Rio de Janeiro - Brasil
Conselho Executivo
Organizadores desta edição: Profª Ms. Janete Mandelblatt - Prof. Ms. Maurício Rocha Cruz - Profª Drª Monique Mendes Franco
Conselho Editorial
Ms. Alexandre Guedes Pereira Xavier ( Ministério do Planejamento – MEC/INES) - Drª Cristina Lacerda (UNIMEP) - Drª Leila Couto Mattos (INES) - Ms. Maria Marta Ferreira da Costa Ciccone (INES)
Drª Monique Mendes Franco (INES/UERJ) - Dr° Elizabeth Macedo (UERJ) - Dr. Luiz Behares (Universidade de Montevidéu) - Dr. Henrique Sobreira (UERJ/FEBF) - Drª Regina Maria de Souza (UNICAMP)
Drª Sandra Corraza (UFRGS) - Drª Tânia Dauster (PUC/RJ) - Drª Mônica Pereira dos Santos (UFRJ) - Profª Ms. Janete Mandelblatt (INES/ISBE) - Prof. Ms. Maurício Rocha Cruz (INES/ISBE)
Dr. Victor da Fonseca (Universidade Técnica de Lisboa)
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EDITORIAL INES
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Estamos em festa! Com este número, ESPAÇO adquire sua maioridade. Há exatamente dezoito anos o projeto de
publicação, que visava a integrar pesquisas e reflexões sobre a Educação de Surdos, foi implantado no Instituto Na-
cional de Educação de Surdos (INES), dando início à ESPAÇO e sua bela trajetória, hoje consolidada e reconhecida
no meio acadêmico, tanto da Educação Especial quanto da Educação Geral.
Ao longo destas 28 publicações, a ESPAÇO cresceu, mudou, atendeu demandas institucionais, mas, sobretudo,
cumpriu o papel de divulgar semestralmente, no Brasil e demais países colaboradores, por meio de permutas e doações,
discussões relevantes no campo educacional.
Nossa festa parabeniza a ESPAÇO, o INES e todos aqueles envolvidos, durante todos esses anos, na concepção e
execução desta Revista, membros da comissão editorial, pareceristas externos, autores e, sobretudo, nossos leitores.
Neste número, na seção ESPAÇO ABERTO, o artigo As pesquisas desenvolvidas no Instituto Nacional de Educação
de Surdos (INES) no período de 1989 a 2007, de Leila Couto, coroa essa trajetória, disponibilizando o acesso aos dife-
rentes estudos e pesquisas e indicando o quanto o Instituto vem consolidando seu espaço como Centro de Referência
em Educação e Surdez no Brasil. O artigo é, ainda, um convite aos pesquisadores e estudiosos da área a partilharem
conosco futuras investigações.
Ana Dorziart e Cristina Lacerda, representantes de uma geração de pesquisadoras comprometidas diretamente com
a educação bilíngüe de surdos, abrilhantam a seção DEBATE. No texto A inclusão de surdos na perpectiva dos estudos
culturais, oriundo de um relato de pesquisa, Ana Dorziart, juntamente com Niédja Lima e Joelma Araújo, focaliza o
aluno surdo que freqüenta o contexto educacional inclusivo e revela que ainda persistem “dificuldades de dirigir o olhar
para refletir sobre a possibilidade de uma prática curricular que envolva as difrentes formas de apreensão, elaboração
e externalização de pensamento e, em especial, as peculiaridades dos surdos.” Cristina Lacerda e Bruna Bernardino
trazem a importante e atual discussão sobre o papel dos intérpretes numa perpectiva bilíngüe de educação de surdos.
O artigo O intérprete de Língua Brasileira de Sinais no contexto da Escola Inclusiva: focalizando sua atuação na educação
infantil problematiza, ainda, por meio de pesquisa desenvolvida com duas intérpretes que atuam em salas de aula, a
utilização desse recurso nessa faixa etária.
A seção ATUALIDADES EM EDUCAÇÃO vem fortalecer nosso número comemorativo com a participação da
professora e pesquisadora Clarice Nunes. O texto (Des)encontros entre o cotidiano escolar e as políticas públicas de edu-
cação é um presente. Nele, a historiadora indica um claro descolamento entre as políticas públicas de educação e o
cotidiano escolar, e discute “os efeitos dessa defasagem sob a perspectiva dos obstáculos nas unidades escolares à luz
de uma educação pública democrática, sob a concepção de Anísio Texeira”. Dialogando também com o contexto das
políticas públicas de educação, o texto O outro das cotas: políticas afirmativas e a reserva de vagas nas universidades pú-
blicas, de Monique Franco, traz o atual tema das cotas para o centro do debate. Rompendo com análises dicotômicas
entre favoráveis e desfavoráveis à política, a autora utiliza reportagens, cartas e entrevistas publicadas em jornais de
grande circulação para apresentar, de forma crítica, as categorias da culpa, vitimização e sacrifício como base das ações
afirmativas.
Ana Claúdia Flores abre a seção REFLEXÃO SOBRE A PRÁTICA com outro tema central na educação de surdos
atual: a questão do monitor surdo. O artigo Assistente Educacional em Libras: o sujeito que burlou o controle visa a
entender como se constitui o lugar do monitor surdo na interface entre o professor na sala de aula numa perspectiva
bilíngüe. No âmbito da educação geral, o artigo Práticas de Ensino e Espaços Educativos: formação docente na Faculdade
de Formação de Professores da UERJ, das professoras Helena Amaral da Fontoura e Gianine Pierro, fecha a seção e
dialoga com “as diversas dimensões com que as práticas educativas se expresssam na sociedade”.
A ESPAÇO conta ainda, neste número, com a resenha dos livros Surdez e Educação, de Maura Corcini Lopes, e
Currículo e mídia educativa brasileira: poder, saber e subjetivação, de Marlucy Paraíso. Assinam as resenhas, respectiva-
mente, Betina Guedes e Monique Franco. As seções PRODUÇÃO ACADÊMICA, AGENDA e MATERIAL TÉCNI-
CO-PEDAGÓGICO publicizam importantes realizações e informações no âmbito da Educação Geral e Especial e da
Educação de Surdos. Vale conferir.
Uma especial atenção fica por conta da seção VISITANDO O ACERVO DO INES, em que a historiadora Solange
Rocha nos conta um pouco dos caminhos institucionais que consolidaram a trajetória da ESPAÇO, aqui homena-
geada.
Boa leitura!
Monique Franco
Comissão Executiva de publicação & Comissão Editorial
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RESUMO ABSTRACT
Este artigo tem por objetivo infor- The aim of this article is to inform
mar sobre as pesquisas desenvolvidas about the researches developed in the
no Instituto Nacional de Educação National Institute of Deaf Education
de Surdos – INES, entre os anos de – INES from 1989 to 2007. These
1987 a 2007. Estas pesquisas são researches were conducted by INES
desenvolvidas por profissionais do professionals and by professionals from
próprio INES e por profissionais de other institutions who collected their
outras instituições que utilizam o data at INES. This work is based on a
INES como campo de pesquisa. O governmental decree (Portaria125/2007),
desenvolvimento deste trabalho está which defines norms and techniques for
baseado na Portaria n°125, de 20 de developing research in the institution.
agosto de 2007, que define normas
e técnicas para o desenvolvimento de
pesquisas na instituição. Keywords: research, deafness,
education.
Palavras-chave: Pesquisa, Educa-
ção, Surdez.
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ESPAÇO ABERTO INES
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INTRODUÇÃO nacional de educação de surdos em da educação infantil ao ensino médio.
esfera federal e, como tal, aglutina ações Dentre outras atividades, oferece for-
Até meados da década de 80 do referentes a um colégio de aplicação mação e capacitação de profissionais da
século XX, as pesquisas acadêmicas para alunos surdos e a um centro de área da surdez, curso superior bilíngüe
estiveram, basicamente, vinculadas desenvolvimento de pesquisas, visando de pedagogia e, para a comunidade,
às universidades, em seus cursos de à produção de conhecimento científico curso de LIBRAS. Produz e publica
mestrado e doutorado. A partir dos e ao desenvolvimento de pesquisas material pedagógico e realiza pesquisa
anos 90, entretanto, as pesquisas pouco acadêmicas na área da surdez. Como na área da surdez, atuando de maneira
a pouco começaram a ser valorizadas tal, o INES vem realizando, desde multidisciplinar. Por meio de seminá-
também nos cursos de graduação e 1989, pesquisas na área da surdez e rios e assistência técnica em âmbito
pós-graduação lato sensu. da deficiência auditiva. nacional, subsidia políticas públicas
Vinculadas aos programas universi- Este artigo tem como objetivo apre- estaduais e municipais de educação
tários, as pesquisas na área da educação sentar as pesquisas desenvolvidas de surdos.
especial vêm crescendo significativamen- no Instituto Nacional de Educação de Assim sendo, o INES situa-se em
te (JESUS, 2007; MANZINI, 2007; Surdos (INES), no período de 1989 esfera nacional como escola especial
BUENO, 2007; MARQUES, 2007; a 2007. para surdos, tendo ainda a responsa-
NAUJORKS, 2007; GOTTI, 2006; bilidade de assessorar as escolas regu-
DIAS, 2006; STUMPF, 2006). lares inclusivas, que incluem alunos
Para Manzini, O Instituto Nacional de surdos em suas classes regulares. Para
Educação de Surdos desempenhar tal função, precisa contar
No Brasil, o conhecimento científico com um quadro de profissionais que
produzido em educação tem ficado, Fundado em 1857, o INES, órgão se atualize constantemente e participe,
prioritariamente, a cargo das universi- do Ministério da Educação, é um cen- na comunidade acadêmica, de dis-
dades. Ainda são poucas as instituições tro de referência nacional na área da cussões acerca da prática pedagógica,
especializadas que atendem pessoas surdez. Tem como missão institucional social, bem como na área da saúde,
com deficiência que possuem setores a produção, o desenvolvimento e a visando à construção de ambientes
de pesquisa. Os conhecimentos pro- divulgação de conhecimentos cientí- de aprendizagem realmente inclusivos
duzidos por essas instituições acabam ficos e tecnológicos na área da surdez para surdos.
sendo produtos de alguns poucos pes- em todo o território nacional, bem Como centro de referência nacional
quisadores que trabalham de forma como subsidiar a Política Nacional de na área da surdez, o INES instituiu, em
isolada (2007, p. 146). Educação na perspectiva de promover 1999, sua primeira Política de Pesqui-
e assegurar o desenvolvimento global sa, através da Portaria/INES n.º 334,
As atuais políticas públicas educa- da pessoa surda, sua plena socialização, que foi revista e (re) publicada pelas
cionais prevêem uma reorganização o respeito às suas diferenças e o acesso Portarias/INES n.ºs 115, em 2002,
para as instituições especializadas, a a seus direitos. e 125, em 2007, definindo normas
fim de que estas passem a atuar como Como órgão do Ministério da e técnicas para o desenvolvimento de
centro de apoio pedagógico às escolas Educação, o INES segue as diretri- pesquisa por seus profissionais e por
regulares inclusivas, o que, sem dúvida zes educacionais gerais da Secretaria profissionais externos à instituição.
alguma, favorece o intercâmbio entre de Educação Especial (SEESP) e, em Os projetos de pesquisa devem
os profissionais da educação, que não termos específicos, como instituição atender ao interesse do INES em uma
podem mais alijar-se do processo de especializada na educação de surdos, das suas áreas de atuação, a saber: téc-
produção de conhecimentos e do de- promove uma educação bilíngüe, atra- nica e administrativa, educacional e
senvolvimento de pesquisas, isolando-se vés da língua brasileira de sinais, a de saúde, relacionadas ao campo da
em instituições especializadas. LIBRAS, e a língua portuguesa. Possui surdez e/ou da deficiência auditiva.
O Instituto Nacional de Educação um colégio de aplicação, com aproxi- O Colégio de Aplicação (CAP
de Surdos (INES) é o único centro madamente seiscentos alunos surdos, INES), o Instituto Superior Bilíngüe
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de Educação (ISBE), bem como o de situações-problemas instigantes, de “suporte técnico às pesquisas, nos
Departamento Técnico Pedagógico e que desafiam a prática educacional. projetos internos e externos” desen-
o Departamento de Desenvolvimen- A discussão acerca da instrumenta- volvidos no Instituto.
to Humano, Científico e Tecnológico lização teórico-metodológica, neste Atualmente, o INES faz parte do
constituem os campos de pesquisas da ambiente de busca e investigação, Diretório dos Grupos de Pesquisa do
instituição, cuja produção tem sido favorece a iniciação científica, esti- Conselho Nacional de Desenvolvimento
adensada por meio de algumas parcerias mulando a prática docente, ao mesmo Científico e Tecnológico (CNPQ),
com faculdades, universidades e outras tempo que a formação e a produção onde estão cadastrados dois grupos
instituições de ensino, da saúde e de acadêmicas. de pesquisa.
caráter social. Além das pesquisas internas, de-
O INES participa do diretório dos senvolvidas pelos nossos profissionais,
grupos de pesquisa do Conselho Na- existem as pesquisas externas, realiza-
cional de Desenvolvimento Científico das por profissionais que, embora não Pesquisas desenvolvidas
e Tecnológico (CNPQ) e conta com pertençam ao INES, procuram este
um professor doutor, especializado em Instituto como campo de pesquisa. As primeiras pesquisas foram fruto
deficiência auditiva, responsável pelo Essas atividades fazem parte de pro- das inquietações e das buscas dos
suporte técnico às pesquisas, nos pro- jetos de monografia, especializações nossos professores sobre questões bas-
jetos internos e externos desenvolvidos lato sensu, dissertações de mestrado tante específicas, que ainda hoje fazem
na instituição. e teses de doutoramento. parte do processo de escolarização de
Algumas pesquisas, após con- alunos surdos. Essas primeiras pesquisas
cluídas, são divulgadas nas revistas foram motivadas por uma explícita
Panorama geral da Espaço e Arqueiro, e também, muitas necessidade de mudança na prática
produção do INES vezes, geram produção de material pedagógica do colégio de aplicação
pedagógico, como livros didáticos e do INES, mais especificamente no
As pesquisas desenvolvidas pelos cartilhas. CDs interativos, jogos, fitas que diz respeito à língua portuguesa
profissionais do INES estão ligadas, de vídeo e outras formas de dissemi- e à construção de um currículo bilín-
de forma geral, às questões referentes à nação do conhecimento produzido güe. A necessidade de reformulação
prática pedagógica e fonoaudiológica, são freqüentes. do currículo era urgente.
bem como à área social e da saúde As primeiras pesquisas desenvolvidas Conseqüentemente, o bilingüismo
relacionadas à surdez e à deficiência no INES tiveram como consultoras passou a direcionar as pesquisas, e o
auditiva. De uma forma geral, os diferentes doutoras convidadas, que, ensino da língua portuguesa sofreu
pesquisadores são professores, fono- por possuírem especialização em de- total reformulação, passando esta a
audiólogos, assistentes sociais e outros terminada área de interesse do INES, ser considerada como segunda lín-
profissionais com larga experiência em diferentes momentos, eram contra- gua, enquanto que a língua brasileira
no campo da surdez e da deficiência tadas, temporariamente. Em seguida, de sinais tornou-se primeira língua e
auditiva, mas que não têm, necessa- o INES fez sua primeira contratação, língua de instrução.
riamente, no momento da pesquisa, ainda por não contar com nenhum O primeiro projeto de pesquisa
vínculo com instituições de ensino profissional interno com a titulação de – Prevenção da Deficiência Auditiva –,
superior. Alguns de nossos profissio- doutor, profissional esse que passou a desenvolvido em 1989 pela equipe de
nais, entretanto, realizam parte de suas ser responsável por todas as pesquisas fonoaudiologia do INES, teve como
pesquisas de mestrado e doutorado, da instituição, em âmbito externo ou objetivo traçar um perfil da etiologia
no próprio INES, utilizando-o como interno. da deficiência auditiva da população do
campo de pesquisa. Foi somente a partir de 2006 que INES, com desdobramento de ações
Essa prática tem por objetivo esti- um profissional do INES, especiali- voltadas à sua prevenção.
mular o desenvolvimento de posturas zado em deficiência auditiva e com a Em 1995, Surdez e Bilingüismo foi
e atitudes de cunho científico diante titulação de doutor, assumiu a função uma pesquisa que contou com uma
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parceria entre o INES e a Universidade continuidade ao projeto anterior, obje- currículo para o INES teve por obje-
do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), tivando a construção de um currículo tivo a construção de um currículo de
cujo objetivo foi implantar na Edu- bilíngüe e uma metodologia de ensino português como segunda língua para
cação Infantil do INES um projeto de português como segunda língua para o ensino no INES.
de educação com bilingüismo, para os ensinos fundamental e médio. O A partir de 2004, o número de
crianças surdas. projeto contemplou diferentes áreas do pesquisas desenvolvidas no Institu-
Em seguida, 1996, o projeto conhecimento, todas compartilhadas e to tornou-se bem mais significativo.
Proposta de reorganização do ensino construídas pela mediação da língua de Nesse ano, foram 20 e, em 2005, 21.
das disciplinas linguagem, língua por- sinais, como primeira língua e língua Em 2006 este número caiu para 14,
tuguesa e literatura brasileira no INES de instrução, e pela língua portuguesa mas chegou a 23 em 2007 (tabela 1).
foi desenvolvido para implantação, a como segunda língua, para literatura Todas essas pesquisas, em sua maioria
partir de 1997, do ensino de portu- e produção escrita. desenvolvidas a partir de uma abor-
guês em níveis, como aquisição de Em 1999, 18 pesquisas foram de- dagem metodológica qualitativa, têm
segunda língua. senvolvidas no INES. Dentre elas, o caráter investigativo e são predominan-
No ano de 1998, o projeto Proposta projeto de investigação Aquisição do
Tabela 1 - Número de pesquisas,
de currículo bilíngüe para o INES deu português como L2: uma proposta de
internas e externas, desenvolvidas
por ano letivo
1989 1
1995 1
1996 2
As primeiras pesquisas desenvolvidas no INES ti- 1997 2
1998 4
veram como consultoras diferentes doutoras con- 1999 18
2000 9
2001 3
vidadas, que, por possuírem especialização em de- 2002 5
2003 7
terminada área de interesse do INES, em diferentes 2004 20
2005 21
momentos, eram contratadas, temporariamente. Em 2006 14
2007 23
seguida, o INES fez sua primeira contratação, ainda Total de pesquisas - 130
Fonte: Instituto Nacional de Educação
por não contar com nenhum profissional interno de Surdos – INES. Divisão de Estudos
e Pesquisas – DIESP.
com a titulação de doutor, profissional esse que pas-
sou a ser responsável por todas as pesquisas da insti- temente descritivas, com uso freqüente
de entrevistas e questionários como
tuição, em âmbito externo ou interno. instrumento de coleta de dados.
Para Omote (2007), não há mé-
todos específicos para a realização de
pesquisa em educação especial. Métodos
de outras áreas são utilizados. Para ele,
há escassez de pesquisas experimentais,
não há estabelecimento de causalidade
e associação, há ocorrência do uso de
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As tabelas 2 e 3 mostram que foram te, conta com a orientação de um desenvolvidas 71 pesquisas internas, das
desenvolvidas 71 pesquisas em âmbito professor doutor, do próprio INES. quais 55 ligadas à prática pedagógica,
interno, ou seja, por profissionais do Há também alguns casos em que os 15 vinculadas a cursos de mestrado
INES, e 59 externas, por estudantes profissionais do INES estão matri- e 1 a de doutorado (tabela 2). Todas
de cursos de graduação, especialização culados em cursos de mestrado ou desenvolvidas por profissionais do
lato sensu e stricto sensu. doutorado e utilizam o Instituto como INES.
As pesquisas internas, como já foi campo de pesquisa em seus projetos. A As pesquisas externas, como dito
mencionado, são investigações con- orientação da pesquisa é, portanto, de anteriormente, são realizadas por estu-
duzidas pelos profissionais do INES responsabilidade total do orientador dantes ou por profissionais extraquadro
– alguns professores, fonoaudiólogos, do curso ao qual o profissional está INES, que o utilizam apenas como campo
audiologistas, assistentes sociais, psi- vinculado. Nessa situação as pesquisas de pesquisa. Estão sempre vinculadas
cólogos e outros que, guiados por suas também são consideradas internas por a cursos de graduação, especialização
práticas institucionais, pedagógicas, serem desenvolvidas por profissionais lato sensu, mestrado ou doutorado, de
clínicas ou técnicas, buscam respostas do INES. instituições públicas ou privadas. Foi
às suas indagações. Nesta situação, a No período de 1989 a 2007, foram empreendido um total de 59 pesquisas
pesquisa desenvolvida internamen-
Tabela 4 - Parcerias institucionais e tipos de pesquisa – Instituições Privadas (Nº- número de pesquisas realizadas;
G – de graduação; E – de especialização lato sensu; M – de mestrado e D – de doutorado)
Instituições N° G E M D
Pontifícia Universidade Católica do rio de Janeiro – PUC 17 13 - 2 2
Centro Universitário Plínio Leite – UNIPLI 11 11
Universidade Estácio de Sá – UNESA 9 7 2
Centro Universitário Augusto Motta – UNISUAM 3 1
Universidade Gama Filho – UGF 2 1 1
Centro Universitário Celso Lisboa – UCL 1
Universidade Veiga de Almeida – UVA 1 1 1
Universidade do Grande Rio – UNIGRANRIO 1
Universidade Cândido Mendes – UCM 1 1 1
Sociedade Universitária Redentor – SUR 1
Instituto Brasileiro de Educação Continuada – IBEC/UGF 1 1 1
UniverCidade 1 1
Universidade do Vale do rio verde de Três Corações – UninCor 1 1 2
Total 28 2 18 2
Total de instituições privadas: 50
Fonte: Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. Divisão de Estudos e Pesquisas – DIESP.
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Tabela 5 - Parcerias institucionais e tipos de pesquisa - Instituições Públicas (Nº- número de pesquisas realizadas;
G – de graduação; E – de especialização lato sensu; M – de mestrado e D – de doutorado)
Instituições N° G E M D
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ 9 7 - 1 1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ 6 2 - 3 -
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ e Karolinska
1
Instituto – Estocolmo (CAPAES)
Universidade Federal Fluminense - UFF 3 1 2 - -
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e pesquisa interna não
2
Tecnológico - CNPQ vinculada a curso
Universidade Estadual de Campinas - UEC 1 1
Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC 1 1
Universidade Federal do Pará – UFP 1 1
Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ pesquisa interna não
1
vinculada a curso
Universidade Estadual do Norte Fluminense - UENF 1 1
Centro federal de Educação Tecnológica Suckow da Fonseca - CEFET 1 1
London College of Printing - Londres 1 1
Ministério da Justiça pesquisa externa não
1
vinculada a curso
Total 11 2 9 2
Total de instituições privadas: 28
Fonte: Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. Divisão de Estudos e Pesquisas – DIESP.
externas, sendo 39 vinculadas a cursos Neste último grupo, duas pesquisas, um maior número de pesquisas de
de graduação, 12 a de mestrado, 4 em cadastradas no Diretório dos Grupos graduação (28) e de mestrado (18).
cursos de especialização lato sensu e de Pesquisa do CNPQ, são desenvol- As instituições públicas(tabela 5)
apenas 3 realizadas por doutorandos vidas no Instituto Superior Bilíngüe que desenvolveram parcerias com o
(tabela 3). de Educação do INES – ISBE. INES, num total de 28, também ti-
No período estudado, foram esta- As instituições privadas (tabela veram, em sua maioria, pesquisas de
belecidas parcerias institucionais com 4) que procuraram o INES para o graduação (11) e de mestrado (9). Estas
50 instituições privadas e 28 públicas. desenvolvimento de pesquisas tiveram
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modalidade apenas escrita, em tempo
Tabela 6 – freqüência dos temas investigados hábil para que ele possa acompanhar,
de forma adequada, o processo de es-
Língua Portuguesa 20 colarização?
Ensino 18 Os desafios são muitos. Mesmo
Educação Física 11 considerando-se, para os surdos, a língua
Fonoaudiologia 10 portuguesa apenas na modalidade escrita,
Aspectos SócioPsicoPedagógicos 9 ainda assim, por questões de diferenças
Audiologia 5 de modalidade e de estrutura entre a
língua que lhes é natural e a língua a
LIBRAS 5
ser aprendida, os resultados ainda estão
Matemática 5 muito longe dos que gostaríamos de
Ciências 4 obter. Conseqüentemente, o ensino
Prevenção 4 foi o tema seguinte mais procurado.
Informática 4 As discussões acerca da língua de ins-
Currículo 4 trução se definem através da língua
Inclusão 4 de sinais, mas, de novo, é a língua
Psicomotricidade 3
Ensino Profissionalizante 3
Alfabetização 3
Formação de Professores 3 Dentre os temas mais
Pré vestibular 2
Sociologia 2 pesquisados, a língua
Artes 2
portuguesa obteve a
Dança 2
Bilingüísmo 1 maior freqüência.
Monitoria 1
Inglês 1
História 1
Comunicação Visual 1 portuguesa, na sua modalidade oral e
Ensino Superior Bilíngüe 1 escrita, que está amplamente presente
Metacognição 1 na sociedade brasileira, acadêmica e
socialmente. Novos desafios, novas
Fonte: Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. propostas e muitas outras indagações.
Divisão de Estudos e Pesquisas – DIESP. Muito a ser construído.
Educação Física, fonoaudiologia
pesquisas começaram a surgir com freqüência. Sem dúvida alguma, desde e os aspectos sociopsicopedagógicos
mais freqüência a partir de 2002. Até os séculos XV e XVI, este vem sendo também tiveram considerável freqüên-
então havia um número bem maior o grande desafio da educação de cia e são áreas que contribuem para o
de pesquisas internas, sem vínculo surdos. Como possibilitar ao aluno desenvolvimento global do aluno, em
com outras instituições. surdo, cuja perda de audição impede especial, para suas relações pessoais, em
Dentre os temas mais pesquisados, a aquisição natural da língua oral, o que os aspectos sociopsicopedagógicos
a língua portuguesa obteve a maior aprendizado desta língua, mesmo na relacionam-se diretamente com este
indivíduo interagindo na sociedade.
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Referências Bibliográficas
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estudos culturais
The inclusion of deaf people in the Cultural Studies perspective
Ana Dorziart*
*Doutora em Educação pela UFSCar / Professora da UFPB
E-mail: anadorziat@jpa.neoline.com.br
Niédja Maria Ferreira Lima**
**Doutoranda em Educação pela UFPB / Professora da UFCG
E-mail: niedjafl@yahoo.com.br
Joelma Remígio de Araújo***
***Pedagoga pela UFPB / Intérprete de Libras
E-mail: joelmasurdo10@yahoo.com.br
RESUMO e adaptadas, indicando dificuldades de inclusive process been taking place? Are
dirigir o olhar para refletir sobre as there signs that the pedagogical practices
possibilidades de uma prática curricular have been assimilating the principles of a
As discussões tratadas neste texto que envolva as diferentes formas de culturally-committed type of teaching?”
se dão em torno da política de inclu- apreensão, elaboração e externalização Through the interviews, we noticed that
são escolar de pessoas diferentes, em de pensamento e, em especial, as pe- a significant number of informants re-
especial das surdas, e das repercussões culiares dos surdos. vealed to assume a posture present in the
dessa iniciativa na prática curricular das organizational culture of the schools, in
escolas. Diante disso, elegemos como Palavras-chave: Inclusão. Surdez. which the differences are tackled as being
nosso sujeito de pesquisa o aluno surdo Currículo. liable to complementary and adapted
que freqüenta o contexto educacional measures, showing difficulty in reflecting
inclusivo, buscando responder às se- ABSTRACT on the possibilities of having a curricu-
guintes questões: Como vem se dan- lum practice which involves the different
do o processo inclusivo, na visão dos forms of apprehension, elaboration and
alunos surdos? Há indícios de que as The discussions presented in this text externalization of one’s thoughts and,
práticas pedagógico-curriculares venham are centered on the educational inclusion especially, those peculiar to the deaf.
assimilando os princípios de um ensi- policy regarding people who are different,
no culturalmente engajado?. Através especially the deaf, and the repercussions
de entrevistas, constatamos que uma of this initiative on the school curriculum Keywords: Inclusion, deafness,
parcela significativa dos participantes practice. We have chosen the deaf learner curriculum.
revelou assumir uma visão presente na who attends the inclusive educational
cultura organizacional das escolas, em context as our research subject, seeking
que as diferenças são tratadas como answers to the following questions: “In
passíveis de medidas complementares the deaf learners’ viewpoint, how has the
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Assim, tratar sobre inclusão sig- ótica dos Estudos Culturais, as concepções
Introdução nifica ir além do ingresso de alunos subjacentes à inclusão, tendo em vista a
diferentes na escola; significa estar opinião de alunos surdos que estavam
A escola pública é um direito de atento para promover movimentos inseridos em salas de aula regulares.
todos. Esta é uma premissa inques- pedagógico-curriculares na escola
tionável, não apenas porque garantida que envolvam todos os alunos, não Reflexões iniciais
em lei, mas, sobretudo, porque respal- como uma massa homogênea, mas
dada no conceito de uma educação como possuidores de histórias próprias, Por um período considerável, o
democrática, justa, participativa e de percepções particulares, enfim com objetivo maior da Educação Especial
superação de movimentos que contri- peculiaridades que os fazem únicos. foi a integração dos ditos deficientes
buem para uma exclusão social cada E, dentre as muitas peculiaridades na sociedade. O termo integração era
vez mais acentuada. Diante disso, as existentes, está a das pessoas surdas, usado, basicamente, para representar o
iniciativas públicas, respaldadas na que desenvolveram ao longo de suas processo educacional dos alunos espe-
legislação vigente, têm intensificado vidas estratégias visuais-gestuais de ciais em escolas comuns, juntos com os
a prática de inserção de todos os alunos apreensão e de expressão de mundo, “normais”. Para atingir esse objetivo,
nas escolas, passo fundamental para a constituindo o que se passou a deno- o trabalho realizado nas instituições
construção de uma sociedade verda- minar de cultura surda. Por isso, nos especiais era voltado ao processo de
deiramente democrática. No entanto, perguntamos: Como vem se dando o reabilitação, visando a suprir as la-
a esse objetivo quantificável, medido processo inclusivo, na visão dos alunos cunas cognitivas, comportamentais,
por meio do número de alunos ingres- surdos? Como os surdos expressam aspectos lingüísticas e sociais dos alunos. A
santes no sistema, se unem outros de do cotidiano escolar? Há indícios de partir da Declaração Universal dos
natureza qualitativa, que determinam que as práticas pedagógico-curriculares Direitos do Homem, que fomentou
também a permanência desses alunos venham assimilando os princípios de um o debate sobre os direitos individu-
nas escolas. Um deles, de suma im- ensino culturalmente engajado? ais e abriu espaço a novas discussões,
portância, é o desenvolvimento de Diante dessas questões, desenvol- inclusive sobre o direito à educação,
práticas curriculares, que atendam as vemos um estudo em escolas da rede foram semeadas as primeiras idéias
demandas e necessidades dos envolvi- pública regular de ensino da cidade sobre a inclusão e produzidos vários
dos. Sem uma atenção especial a isso, de João Pessoa (PB), com o objetivo documentos e ações que contribuíram
estaremos instituindo um mecanismo de investigar o processo de inclusão para ampliar esse debate em níveis
de exclusão subliminar. Uma exclusão de alunos surdos. Entre os objetivos internacional e nacional.
mais perversa, porque ocorre por dentro elencados nesse estudo, realizamos o No âmbito mundial, o movimento
do sistema, sem ser vista. recorte do seguinte objetivo, a ser de- em prol dessa política foi deliberado em
Portanto, é importante unirmos ao senvolvido neste texto: analisar, sob a conferências, dentre elas a Conferência
terreno teórico-legal uma nova visão Mundial sobre Educação para Todos,
sobre currículo, em que as formas de
elaboração e subjetivação dos que estão
Um deles, de suma im- realizada em Jomtien, Tailândia, em
1990. Essa Conferência, que destacou
envolvidos na prática cotidiana seja
considerada, criado espaços adequados
portância, é o desenvol- a necessidade de se adotarem medidas
enérgicas para prover educação para
a que os alunos realizem suas próprias
elaborações, compartilhem suas dúvidas,
vimento de práticas cur- todos, sem distinção de qualquer es-
pécie, contou com a participação de
suas descobertas, exerçam, enfim, a
capacidade de ser agentes da sua for-
riculares, que atendam as 155 países de todo o mundo, além de
agências internacionais e organismos
mação. Essa perspectiva, denominada
por alguns autores de Estudos Culturais,
demandas e necessidades não-governamentais (SHIROMA; MO-
RAES; EVANGELISTA, 2000).
é cada vez mais estudada e aceita nos
estudos sobre Currículo.
dos envolvidos. Sob a influência das idéias conti-
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das nessa Conferência, aconteceu o sileira de Sinais (LIBRAS) tem sido das pessoas surdas, que desenvolvem
encontro em Salamanca, na Espanha, valorizado. Sobre isso, afirma Fernan- formas de organização em torno das
de 07 a 10 de junho de 1994, com des (2003) que garantir a presença capacidades visuais-gestuais, o que
a presença de mais de 392 represen- do intérprete em sala de aula é um constitui a chamada cultura surda.
tações governamentais e mais de 25 passo importante, mas insuficiente Portanto, para que aconteça a in-
organizações internacionais, que re- para suprir a passagem do conteúdo clusão dos indivíduos, é importante
dundou na Declaração de Salamanca. escolar para surdos, mesmo que estes que as discussões específicas e pon-
Essa Declaração ratifica a importância dominem a língua de sinais. Para ela, tuais sejam incluídas também numa
da inclusão dos chamados portadores todos os procedimentos que envolvem discussão sistêmica, que envolve as
de necessidades educacionais especiais o planejamento e as estratégias de en- reformas curriculares que vêm sendo
nas escolas regulares e detalha pro- sino e de aprendizagem precisam ser implementadas na contemporaneida-
postas sobre a necessidade de uma levados em conta, tendo em vista um de. Moreira, Pacheco e Garcia (2004)
preparação das escolas regulares no ensino de qualidade. afirmam que a temática do currículo
que concerne a espaço físico, corpo Nessa perspectiva, podemos con- está, mais do que nunca, presente em
docente, material didático etc. Nesse siderar que a inclusão é uma temática toda parte. Essa presença se articula
documento, a análise do tema é, na complexa, porque envolve mais do que em torno de dois eixos principais: o
maior parte do tempo, abrangente, o ingresso e a garantia de critérios para das políticas educacionais e o das dis-
incluindo todos os alunos de esco- o ensino dos diferentes, em especial cussões teóricas. No plano das políticas
las especiais e também os excluídos a de surdos, foco de nosso estudo. É públicas, tem sido visível o impacto
sociais como os meninos de rua e os necessário desenvolver o debate em dois das reformas curriculares realizadas nos
indígenas, dentre outros. níveis: o geral, que inclui a discussão últimos quinze anos, no contexto das
Em termos nacionais, as políticas sobre a escola pública brasileira, como o reformas neoliberais. Por isso, Pacheco
públicas posicionaram-se favoráveis fazem Souza e Góes (1999), sobretudo (2003) chama a atenção para o fato
à inclusão, envidando esforços para sobre as visões de currículo, praticadas de que considerar a política curricular
possibilitar o ingresso de todos na no seu interior em relação aos que já como um espaço público de tomada de
escola regular e instituindo critérios estavam supostamente incluídos; e o decisão significa, então, aceitar que as
para que isso acontecesse como reza a específico, relativo ao entendimen- escolas não devem ficar circunscritas a
própria Lei de Diretrizes e Bases (Lei to do que significa, para o processo administrações centralizadoras, pois os
n.º 9.394/1996), em seu capítulo V, pedagógico como um todo, possuir professores, alunos e pais, entre outros
artigo 58, que prevê serviço de apoio particularidades diferentes, como as que atuam no contexto curricular, devem
especializado e professores especiali-
zados ou capacitados para atender aos
portadores de necessidades especiais,
O termo integração era usado, basicamente, para
preferencialmente na rede regular de
ensino.
representar o processo educacional dos alunos especiais
No terreno prático, já se constatam
as iniciativas no sentido de atender a
em escolas comuns, juntos com os “normais”. Para atin-
um dos critérios fundamentais para
o desenvolvimento pedagógico ade-
gir esse objetivo, o trabalho realizado nas instituições
quado das pessoas surdas: a língua de
sinais. Como meio de sanar o enorme
especiais era voltado ao processo de reabilitação, visan-
problema comunicativo surgido no
ambiente escolar, onde se encontram
do a suprir as lacunas cognitivas, comportamentais,
alunos ouvintes e surdos e professores
ouvintes, o intérprete da Língua Bra-
lingüísticas e sociais dos alunos.
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ser vistos como decisores políticos, significações de forma cristalizada, e mais apropriada, pois passa a encarar
embora nem sempre reconhecidos. tentado tornar, com isso, a sociedade o surdo enquanto autor e ator de uma
No segundo eixo, a teoria curricular cada vez mais uniforme, padronizada. cultura minoritária, enquanto usuário
tem sido abalada por uma série de Ela tem se esmerado no abandono, de uma língua natural, enquanto grupo
perspectivas que colocam em questão anulação e rejeição às diferenças, em- que demanda uma educação bilín-
as visões mais tradicionais da teoria bora tenha buscado rever, ao menos güe e multicultural, enquanto pessoa
curricular, ocasionando o surgimento aparentemente, essa postura nas últi- diferente e de identidades legítimas
de uma diversidade de perspectivas no mas reformas pedagógicas, por já não (SÁ, 2002).
campo. O fundamental, nessa discussão, mais suportar o descontrole frente às É fundamental, portanto, indagar-
foi reconhecer que, para tentar tornar a diferenças (SKLIAR, 2003). mos sobre qual lugar ocupa o outro
sociedade mais humana, a escola deve Em meio a esse tão diversificado na educação, nas políticas públicas
buscar desbloquear os mecanismos de contexto contemporâneo, contraditó- implementadas que, conforme vimos,
exclusão existentes. rio e incerto, surge a perspectiva dos estão condicionadas a um certo olhar
Essa tem sido uma visão cada vez Estudos Culturais, que redefiniram, “quase obrigatório” sobre a alteridade
mais considerada no campo dos es- sob a inspiração, sobretudo de Michel e têm utilizado diversos imaginários
tudos sobre o Currículo, quando, já Foucault, o significado de cultura, de para enunciá-la. Assim, reafirmamos
na década de 60, Paulo Freire falava conhecimento e de currículo. Essa ten- a necessidade de que sejam fomenta-
sobre a importância do diálogo. Para dência representa um espaço em que o das reflexões sobre as diversas faces da
ele, é por meio da ação dialógica que tema da surdez pode ser discutido, como inclusão e, nessa perspectiva, que seja
o indivíduo recupera o direito de se uma questão epistemológica (SILVA, particularizado cada grupo de pessoas
pronunciar perante o mundo; criando 1997), e os conceitos de identidade e diferentes para um melhor entendimento
e recriando novos contextos, sai da diferença amplamente problematiza- sobre quem são e o que pensam esses
cultura do silêncio e descobre que o dos, com respaldo em autores como outros; enfim, sobre as representações
seu ser, mais do que tem história, pro- Silva (2004), Hall (1997), Woodward da alteridade na educação.
duz história. Esta perspectiva respeita (2004), entre outros. A discussão sobre
as diferenças e tem a percepção de diferença e identidade, na opinião de
que ninguém se educa sozinho, logo Silva (2004), não pode ser reduzida a A pesquisa
a libertação ocorre por meio de uma uma questão de respeito e tolerância O caminho percorrido
ação cultural coletiva. Quanto a isso, para com a diversidade. A diferença e
surge o aspecto da alteridade, que vê a identidade não estão simplesmente O estudo se realizou em três esco-
o outro como formador do eu, em aí como dados da natureza. Elas são las da rede pública regular de ensino,
um processo de trocas e assimilações, cultural e socialmente produzidas e, sendo duas do Ensino Fundamental
representando, muitas vezes, uma rup- como tal, devem ser questionadas e e uma do Ensino Médio, localizadas
tura de si mesmo em muitos aspectos problematizadas. Segundo Costa (2002), na cidade de João Pessoa (PB), que
e valores. Nesse sentido, o diálogo só os Estudos Culturais são resultantes, tinham alunos surdos incluídos. Cons-
existe quando aceitamos que o outro portanto, de uma movimentação teó- tituíram-se participantes do estudo
é diferente e pode nos dizer algo que rica e política que se articulou contra doze alunos surdos, identificados por
não conhecemos. as concepções elitistas e hierárquicas nomes fictícios, com a letra inicial
As justificativas presentes nos dis- de cultura, firmando-se como algo de da palavra surdo. A opção por nomes
cursos oficiais dos setores educacio- domínio político, no qual os grupos fictícios, em detrimento do uso de
nais estão sendo, há anos, construídas subordinados tentam resistir à impo- códigos (letras e/ou números), deve-
sobre as bases do respeito às diferenças, sição de significados que sustentam os se ao fato de acreditarmos que essa
mas observa-se uma total dicotomia interesses dos grupos dominantes. forma de identificação possibilita
entre o que é dito e a execução dessas Dessa forma, entendemos que a um melhor tratamento aos sujeitos
políticas. Na prática, temos presencia- discussão curricular no âmbito da edu- envolvidos no estudo.
do uma escola que tem reproduzido cação de surdos pode-se dar de forma
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Os dados deste estudo foram ob- é empregada na técnica de análise de (...) tenho leitura labial e converso
tidos a partir de entrevistas, com um conteúdo e se refere aos elementos com os professores e colegas da mesma
roteiro previamente elaborado. Segun- obtidos através da decomposição do forma – SUELI.
do Richardson (1999), a entrevista é conjunto da mensagem. Buscamos, Outros professores, no entanto não
uma técnica importante que permite assim, desvendar o que estava por trás conhecem nada e utilizam mímicas que
o desenvolvimento de uma estreita dos conteúdos manifestos, indo além não são LIBRAS (...) – SÉRGIO.
relação entre as pessoas. Ele esclarece das aparências do que foi explicitado, Através de gestos caseiros que improviso
que esse termo é construído a partir adotando uma atitude de diálogo com (...) – SÓCRATES.
de duas palavras: entre e vista. Entre os dados e o corpus selecionado. (...) pelo fato de eu ser oralizada então
indica a relação de lugar ou estado dá pra gente se comunicar – SAN-
no espaço que separa duas pessoas ou DRA.
coisas; e vista refere-se ao ato de ver, Desvelando aspectos Bem, se me perguntaram eu respondo,
ter preocupação com algo. Portanto, curriculares, por meio falo (...) e se não entendem eu escrevo
o termo entrevista refere-se ao ato de da especificidade do (...) – SAFIRA.
perceber realizado entre duas pessoas. Ser Surdo Não há comunicação nem relaciona-
As entrevistas foram gravadas em Comunicação surdo-ouvinte mento, apenas uma pessoa interage
áudio e transcritas, para que fosse comigo. Com os professores é pior,
possível registrar os depoimentos de Os alunos surdos, questionados não há comunicação e nem com os
forma fidedigna. quanto à forma de comunicação uti- outros profissionais – SIMÃO.
De posse de todos os dados, fizemos lizada com os ouvintes, disseram que
a transcrição passo a passo, registrando, recorriam, basicamente, ao intérprete, As declarações dos alunos surdos em
na íntegra, os depoimentos obtidos. além de usar a leitura labial, mímica e menção ao questionamento feito, em
Em seguida, classificamos os dados a oralização. Um deles falou que não havia sua maioria, fazem referência ao intér-
partir da leitura exaustiva e repetida nenhum tipo de comunicação. prete como instrumento indispensável
dos depoimentos, isto é, de uma “lei- para a obtenção de uma comunicação
tura flutuante”, no dizer de Minayo Quando o intérprete tá na sala de aula satisfatória com professores e colegas.
(1993, p. 235). Essa leitura permitiu a comunicação com os professores é Isso mostra o desconhecimento da
a apreensão das idéias centrais dos ótima e com os amigos também (...) língua de sinais por parte dos docen-
relatos e das descrições sobre o tema só com intérpretes – SÍLVIO. tes e colegas e, embora alguns alunos
em foco, destacadas em negrito. Se não tiver intérprete não tenho como me surdos tenham informado que faziam
A análise de dados serviu de comunicar com eles – SANDRO. leitura labial ou mímica, sabemos das
condução do processo descritivo. Pro- A comunicação tem melhorado, pois enormes limitações comunicativas desses
curamos, assim, estabelecer articulações há o intérprete (...) sou oralizado e recursos para os alunos surdos. Por-
entre os dados e os referenciais teó- os ouvintes falam sorrateiramente e tanto, partindo do princípio de que o
ricos da pesquisa, tomando por base peço-lhes para falar com mais calma currículo envolve as diferentes formas
as questões de pesquisa. Trabalhamos – SAULO. de apreender, elaborar e externalizar o
com unidades de registro para analisar (...) não sei ler lábios e preciso de conhecimento, exigindo uma interação
o conteúdo das falas dos entrevista- intérprete – SARA. dialógica constante entre os envolvidos
dos, destacando, para isso, trechos (...) quando as pessoas não sabem no processo, percebemos, com preo-
que constituíam o núcleo central e LIBRAS (...) chamo o intérprete (...) cupação, que o aspecto fundamental
que respondiam mais diretamente uso o corpo, escrevo algumas palavras de possibilidade de estabelecimento de
à questão, bem como as categorias (...) – SILAS. diálogo está subordinado a procedi-
eleitas (comunicação surdo-ouvin- (...) eu procuro sempre assim também mentos técnico-formais: interpretação
te, dificuldades quanto à inclusão e ler os lábios (...) a minha comunicação da língua a cargo de um profissional.
visão sobre o Ser Surdo). Segundo é boa porque eu falo e tem um ouvido Dorziat (1998) trata sobre o assunto,
Gomes (2002), a unidade de registro que eu escuto (...) – SOFIA. afirmando que o universo de ensino
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questão de palestras, de informações aos surdos só algumas vezes entendem. seu corpus as diferenças; sentir e tratar
sobre o que é a cultura de surdos, o Necessito de intérprete para melhorar, essas vozes, histórias, corpos, como
que é a vida de surdo, língua de si- porque tenho dificuldades em mate- desafios ao intercâmbio e à interpelação
nais, a questão da TV, filme legendado, mática – SAFIRA. radical das crenças, valores, símbolos
tudo que venha a facilitar o surdo (...) • Não há nenhuma dificuldade, da e identidades hegemônicas.
– SOFIA. forma que está acontecendo, deve
• Precisa ter mais intérpretes, curso continuar porque para os surdos está
de LIBRAS na escola para alunos e bom – SÉRGIO. Visão sobre o
professores, para futuramente haver • não tem dificuldade nenhuma. Não Ser Surdo
comunicação e relacionamento mais precisa melhorar nada, tá bom a inclusão
eficiente, livros e materiais específicos, – SANDRA. A representação do Ser Surdo nos
para os surdos divulgar e comemorar depoimentos dos próprios surdos
o dia do surdo, divulgar a língua e a Os relatos mostram que a pro- pontuou aspectos que enfatizavam a
cultura do surdo. O professor explica posta de inclusão praticada pelas questão da normalidade x deficiência.
e o surdo fica isolado. Necessário lutar referidas escolas sofre os reflexos do Os entrevistados fizeram referência: à
para melhorar a inclusão. Contratem ainda rudimentar sistema educativo limitação imposta pela falta de audição;
instrutor. Divulguem o resultado dessa brasileiro. Fatores elementares para o às características do surdo, evocan-
pesquisa – SIMÃO. ingresso dessa comunidade em uma do a normalidade; ao sentimento de
• Inclusão é um pouco complicado instituição regular de ensino, como tristeza pelo fato de serem surdos; e
(...) Precisa ter um estudo direcionado material apropriado, recursos huma- ao fato de o surdo ser especial. Eis os
para a criança surda, com vídeos, com nos capacitados e presença constante depoimentos:
instrutores, pois o surdo aprende por de intérpretes ou número suficiente
imitação, precisa aprender como lidar destes, em alguns casos, não foram • Ser surdo é viver num profundo
com outras pessoas. Alguns surdos adul- observados. Esses fatores dificultam silêncio. Não poder ouvir as informações
tos entendem a inclusão, outros estão em muito que essas escolas implantem que são passadas pelos professores, o
em processo. Faltam intérpretes, não há uma inclusão autêntica. No entanto, que é dito pelos alunos, a conversa
como incluir os surdos sem eles. Os insistimos em afirmar que é necessário que tá tendo (...) Então é perder mui-
professores não sabem LIBRAS e precisam tomar os procedimentos adotados como ta coisa, é não conseguir entender e
aprender no mínimo o básico para ter produto de uma concepção diferenciada compreender as coisas que são ditas,
comunicação e o surdo não passar por de currículo e não como adaptações as informações que são passadas, ficar
tantas dificuldades – SAULO. pontuais que apenas minimizam os na sala de aula com o professor falando
• Para acontecer a inclusão precisa-se efeitos devastadores da exclusão subli- pras paredes porque ele não consegue
ensinar LIBRAS para as pessoas da escola, minar, sofrida pela permanência das ouvir nem entender. Tá perdendo todas
a questão da escrita que é diferente da do práticas curriculares colonizadoras, as informações que ali são dadas e perde
ouvinte e as diferenças entre português que, embora reconheçam os dife- muito contato com o professor por
e LIBRAS. O ouvinte é diferente do rentes, utilizam tal identidade para causa disso daí. É viver num profundo
surdo – SARA. tratá-los como desvios ou ameaças silêncio – SÍLVIO.
• É preciso acrescentar intérpretes, mate- (CORAZZA, 2002). • É não conseguir perceber os sons,
riais apropriados, ex. TV com legendas Assim, faz-se necessária a perceber as falas, entender as coisas
e etc – SUELI. conscientização de todos quanto à que estão à sua volta – SANDRA.
(...) – Os professores não sabem LIBRAS importância de considerar a diferença • Realmente, é difícil a vida do surdo
e sem intérprete é impossível a inclusão como um princípio fundamental para porque nem todo mundo conhece
em sala de aula, pois sem o mesmo a promoção da igualdade. Segundo a LIBRAS, ninguém conhece, são
como surdo vai entender o assunto CORAZZA (2002), um currículo as- pouquíssimas as pessoas que têm
ministrado pelo professor?- SILAS. sim tem como meta escutar o que os consciência disso. O surdo vai pro
• Os professores ensinam aos ouvintes e diferentes têm a dizer e incorpora em banco ninguém sabe LIBRAS (...) É
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só a questão de entender que é uma
língua, uma maneira como o surdo
fala e se comunica com as mãos, então O surdo é uma pessoa normal
é questão de entender isso, de aceitar
a cultura e a vida do surdo (...) como qualquer outra, só tem uma limitação
– SOFIA.
que é a audição que dificulta o aprendizado,
• A vida do surdo é difícil, fico an-
gustiado, pois é difícil me comunicar mas, somos capazes de buscar isso e
com os ouvintes, sinto-me sozinho,
alheio, não entendo nada, preciso reverter a situação – SÓCRATES.
lutar, aprender, crescer, sempre pre-
cisando de alguém para ajudar na
comunicação – SILAS.
• Ser surdo, por um lado, é difícil para
enfrentar as coisas da vida. É difícil ver único problema é a comunicação que sou extrovertida e alegre – SAFIRA.
o surdo inserido num emprego, pois não existe com os mesmos, não posso Esses depoimentos mostram que
não tem grau de escolaridade avançado, me relacionar com ouvintes, não recebo a representação do Ser Surdo para os
nem cursos, e são colocados em áreas algumas informações da televisão, nem próprios surdos está extremamente
de produção com trabalho excessivo. política, não posso ouvir música e, às arraigada à visão médico-científica.
Tem gente que esquece que o surdo é vezes, sofro por viver isolado por falta Ao recorrer a uma comparação entre
uma pessoa normal e colocam-no na de comunicação. Em parte sou triste, surdos e ouvintes, pôde-se observar que
produção, ao invés de uma área que pois é muito difícil a comunicação o parâmetro de vida dos surdos está dire-
possa ganhar experiência e progredir. – SIMÃO. tamente ligado à pessoa do ouvinte. Ao
O surdo tem capacidade de aprender (...) – É ser uma pessoa como outra, adotarem este ponto de vista, atribuindo
tanto quanto o ouvinte, mas muita dotada de emoções e sentimentos iguais a o conceito de normalidade ao ouvinte,
gente não enxerga isso. qualquer outra pessoa – SÉRGIO. o surdo torna-se vítima da supremacia
• Sou instrutor de LIBRAS, isto é (...) – É ser triste. Não posso falar, não desta visão social predominante, que
uma vantagem, trabalho, ministro tenho comunicação com os ouvintes, o tem levado a sorver a designação de
cursos, e tiro proveito da surdez e sou sinto vontade de escutar, mas paciência, anormais ou deficientes. A repercus-
alegre, se não tivesse trabalho estaria até em família não há comunicação. são disso é a visão de que o ouvinte
me auto-destruindo. Sou alegre em Não posso atender ao telefone, tanto encontra-se sempre em uma posição
família, mas, algumas vezes, sinto-me na sociedade como em família fico de vantagem em relação a ele (surdo),
no meio de estranhos mesmo sendo triste por falta de comunicação, só comprometendo consideravelmente sua
oralizado – SARA. com o grupo dos surdos me sinto feliz auto-estima, através de sentimentos de
• O surdo é uma pessoa normal como – SAULO. inferioridade e tristeza.
qualquer outra, só tem uma limi- (...) – Às vezes fico triste porque os Desse modo, a maioria dos de-
tação que é a audição que dificulta ouvintes falam rápido e não entendo, e poimentos mostrou que o olhar dos
o aprendizado, mas, somos capazes preciso da ajuda da minha família que surdos para si mesmos recaiu sobre
de buscar isso e reverter a situação é ocupada e não me ajuda. Gosto de aspectos limitadores ou incompletos,
– SÓCRATES. ser surda, sei que o ouvinte desenvolve acompanhando um movimento da cul-
(...) – É uma pessoa normal, é uma rápido e o surdo também. Ser surdo é tura ocidental de ser ou representar a
comunidade que gosta de estar inserida ser diferente, ter cultura e língua pró- si mesmos, a partir de algum modelo
e ser feliz. Gosta de brincar e tem habi- pria. A família não sabe disso, precisa de estética, de inteligência, de nor-
lidades da mesma forma que qualquer aprender (...) – SUELI. malidade.
outra pessoa – SANDRO. (...) – Ser especial, ser inteligente, ter
• Sou normal igual aos ouvintes, o muitos amigos surdos. Sinto muita paz,
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A incapacidade do homem em valorizar as necessidades lingüísticas e mesmo
as diferenças gerou uma variedade de de interação surdo-intérprete, não
insatisfeitos que estão numa busca são consideradas. Portanto, não é a
constante de estereótipos, de modo a tolerância das formas de comunicação
se adaptarem, em contradição, muitas que vai resolver toda a problemáti-
vezes, com suas peculiaridades (DOR- ca do ensino para as pessoas surdas,
ZIAT, 1999, p. 32). mas as formas como os envolvidos
no processo educacional concebem a
linguagem e a importância ou lugar
Reflexões finais das duas línguas (Língua de Sinais
e Língua Portuguesa), como fatores
culturais, nas interações dialógicas e
Os depoimentos dos participantes práticas em sala de aula.
levam a crer que persiste nas concep- Precisamos, também, entender que,
ções dos entrevistados, como reflexo embora o intérprete tenha representado
das práticas escolares investigadas, uma aceitação da Língua de Sinais,
uma inclinação a considerar a inclu- enquanto principal língua de instrução
são como algo a ser acrescido à atual dos surdos, sua presença não pode ser
rotina escolar. vista como um substituto do professor,
Ao compreendermos que o currículo uma vez que entendemos a premência
inculca visões particulares de mundo e da interação professor-aluno, para que
produz identidades individuais e sociais seja desenvolvida uma prática peda-
específicas, questionamos o tipo de gógica crítica, participativa, criativa
formação oriunda de um currículo que e autônoma.
desconsidera as formas de expressão O presente estudo aponta, portanto,
e organização dos alunos envolvidos. para a necessidade de uma maior refle-
Poderíamos almejar para os surdos um xão curricular no âmbito educacional,
currículo que considerasse também as com o intuito de transformar a escola
experiências e o referencial histórico em um espaço verdadeiramente demo-
que eles têm construído, sem descon- crático, onde se estabeleçam múltiplas
siderar as interfaces com a(s) cultura(s) relações entre o eu e o outro; onde os
e a(s) realidade(s) ouvinte(s), já que diferentes interlocutores reconheçam
muitas dimensões entre identidade não só a condição bilíngüe do surdo,
e alteridade estão envolvidas no pro- suas diferenças e potencialidades, mas,
cesso social. também, outras questões que discutem
Não é apenas a inclusão da Língua a surdez como diferença política; en-
de Sinais que vai orientar uma nova fim, onde seja possível desenvolver um
abordagem curricular, mas a obser- currículo para todos, envolvendo, em
vação e aceitação dos surdos em sua particular, o processo cultural inerente
totalidade, em suas especificidades, aos surdos, como enfatizam os Estudos
diferenças grupais e individuais e, ao Culturais em Educação.
mesmo tempo, nos aspectos específicos
de sua cognição (FRANCO, 1999). Esta
colocação é pertinente, pois, segundo
revelam os dados, as peculiaridades
dos alunos surdos, que ultrapassam
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A INTÉRPRETE DE LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS NO
CONTEXTO DA ESCOLA INCLUSIVA: FOCALIZANDO
SUA ATUAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
The Brazilian Sign Language interpreter in the inclusive educational context: focusing his/her
performance in Infantile Education
Bruna Mendes Bernardino*
*Graduanda do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e bolsista de
Iniciação Científica na área de Intérprete de Língua de Sinais
E-mail: bruna.fono2007@gmail.com
Cristina Broglia Feitosa de Lacerda**
** Doutora em Educação. Pós-Doutorado no Consiglio Nazionale de Ricerca – Roma. Docente dos cursos de
Fonoaudiologia. Intérprete de LIBRAS e Pós-Graduada em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba.
Coordenadora do Caderno CEDES n. 69, vol. 26/2006 e autora do artigo: A Inclusão Escolar de Alunos
Surdos... Pesquisa atual financiada pelo CNPq (Universal) Programa inclusivo bilíngüe para surdos.
E-mail: clacerda@unimep.br
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Nessa perspectiva, defendem-se formação de professores e funcionários,
Introdução também projetos de escolarização adaptações metodológicas, curriculares
bilíngüe que pressupõem educadores e de material pedagógico, e ensino de
O desenvolvimento da linguagem com domínio da língua de sinais e da Língua de Sinais a familiares, entre
nos seres humanos tem início logo ao língua oral da comunidade majoritária outras medidas (KELMAN, 2005).
nascimento, a partir da interação do e que ofereçam à criança surda um Mas, o processo de inclusão apenas
bebê com as pessoas ao seu redor. Tal ambiente lingüístico adequado, no qual começa quando o aluno surdo é colocado
processo de interação tem papel funda- haja interlocutores que se comuniquem em classe regular, pois a inclusão requer
mental no desenvolvimento dos seres com ela de forma natural, como ocorre esforços e cuidados individualizados,
sociais (VYGOTSKY, 2000). Sendo com as crianças ouvintes. já que o atendimento a suas caracte-
assim, a criança ouvinte tem a opor- Entretanto, há um imenso abismo rísticas particulares implica mudan-
tunidade de conviver com a língua entre as propostas acadêmicas e o coti- ças que incluem revisões curriculares,
utilizada por sua família, adquirindo-a, diano escolar. Como afirma Silva (2005), muitas vezes não realizadas em razão
o que favorece seu desenvolvimento, esse cotidiano nos revela, ainda hoje, dos elevados custos com os quais a
enquanto a criança surda não tem a uma grande lacuna entre o desenvol- escola precisa arcar, como a ampliação
possibilidade dessa aquisição, pois, na vimento do conhecimento produzido de recursos humanos e pedagógicos,
maioria das vezes, não tem acesso à nas universidades/pesquisas e a reali- nem sempre disponíveis.
língua utilizada por seus pais (LACER- dade das escolas no que diz respeito à Lacerda (2003) discute as reflexões
DA, 2002). Dessa forma, é freqüente educação do surdo. Diferentes práticas de autores que defendem a inclusão,
crianças surdas se tornarem isoladas do pedagógicas têm sido desenvolvidas e mas argumentam que é preciso reco-
mundo pela falta de comunicação, e aplicadas na educação de surdos, mas nhecer que ainda pouco se sabe sobre
essa redução significativa de interações nota-se que um grande número de como agir no cotidiano das práticas
implica um atraso de linguagem, fa- surdos, ao concluir sua escolarização de inclusão.
zendo com que ocorra uma defasagem básica, não é capaz de ler e escrever
em seus processos de interação social fluentemente ou de ter domínio sobre [...] no caso da surdez a mera inserção
e escolarização, justamente por não os conteúdos pertinentes a esse nível de de um intérprete de língua de sinais
contarem com conhecimentos espe- escolarização. Infere-se que tal lacuna em sala de aula, não garante que as
rados para sua idade. esteja diretamente ligada a fatores que necessidades especiais dessa população
As pessoas surdas, nas mais diversas vêm acompanhando o processo edu- sejam respeitadas. Ser acompanhado
regiões do mundo, quando em contato cacional do surdo por gerações. por um intérprete ou professor especia-
entre si desenvolvem uma língua pró- Além disso, a política educacional lizado configura, em si, uma situação
pria, viso-gestual, capaz de atender às vigente em nosso país aponta para a de desigualdade em relação aos seus
necessidades de interação, comunicação inclusão de alunos surdos nas escolas pares. A possibilidade de relação direta
e constituição dos seres humanos. Com regulares juntamente com alunos ou- com o professor e os colegas é muito
base nessa experiência, estudiosos e vintes. Mas, para que alunos surdos restrita, e se sabe que a interação com
as próprias comunidades surdas vêm possam beneficiar-se da inclusão em pares é crucial para o desenvolvimento
defendendo uma abordagem bilín- escola regular, com garantias de que completo da criança, através da interação
güe de atendimento à pessoa surda, não fiquem cognitivamente limitados com outros significativos. Mesmo em
cujo pressuposto básico é que o surdo e socialmente isolados, é preciso que relação à socialização também não se
aprenda primeiramente a Língua de sejam feitas adaptações no espaço esco- observam ganhos evidentes. Os autores
Sinais como sua língua de domínio e, lar, visando também uma abordagem referem estudos que mostram pouca ou
com base nessa língua, adquira e/ou bilíngüe, que implica ações tais como: a nenhuma relação com seus pares e as
aprenda a língua de seu país (língua presença efetiva da Língua de Sinais no dificuldades enfrentadas nessa área. Estar
oral), que será sua segunda língua espaço escolar, o ensino de Língua de fisicamente juntos não quer dizer
(LACERDA, 2003). Sinais por professor/instrutor surdo ou que a socialização esteja presente
intérprete de Língua de Sinais, melhor (LACERDA, 2003, p.13).
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No entanto, o que se observa fre- Art. 14. As instituições federais de ensino do aluno surdo. A presença do intér-
qüentemente é que a Língua de Sinais, devem garantir, obrigatoriamente, às prete pode, por vezes, mascarar uma
ao ser introduzida nos espaços escolares, pessoas surdas acesso à comunicação, inclusão que exclui.
passa a ser coadjuvante no processo, à informação e à educação nos pro- É importante esclarecer que há
enquanto o português mantém-se com cessos seletivos, nas atividades e nos diferenças na inserção de ILS nos di-
o papel principal. As implicações dis- conteúdos curriculares desenvolvidos ferentes níveis de ensino. A primeira
so no processo de ensinar/aprender em todos os níveis, etapas e modali- delas se refere à idade do aluno, já
caracterizam práticas de exclusão e dades de educação, desde a educação que nas séries iniciais a criança en-
não o contrário como tanto se almeja infantil até à superior. contra-se ainda em desenvolvimento
(QUADROS, 2005). lingüístico, enquanto nas séries mais
Na busca de solucionar ao menos Todavia, é importante ressaltar que adiantadas o aluno já está amadureci-
uma parte dos problemas enfrentados, esse direito garantido por lei, recente- do e tem condições lingüísticas mais
surgem propostas para o reconhecimento mente, ainda não reflete a realidade consolidadas.
de que os alunos surdos necessitam de de muitos surdos no Brasil, que são Nesse sentido, a presença de alu-
apoio específico, e um desses apoios é o atendidos, geralmente, de forma precária nos surdos nas escolas de Educação
intérprete de Língua de Sinais (LACER- pelas instituições de ensino. Infantil traz também para esse nível
DA, 2000; 2002). Quando se insere Para a inclusão dos surdos e a de ensino questões relativas ao uso de
esse apoio humano na escola regular, efetivação do direito à informação, é diferentes línguas, acesso à LIBRAS,
amplia-se a possibilidade de aprendi- imprescindível o reconhecimento do possibilidades de organização de um
zagem e melhor aproveitamento dos profissional intérprete de LIBRAS, que atendimento bilíngüe, entre outros,
conteúdos ministrados pelo professor, é quem propicia a comunicação entre com crianças que estão em processo
já que o aluno surdo poderá receber as surdo e ouvinte, devendo o mesmo ter de aquisição de língua e linguagem, e
informações em Língua de Sinais. domínio da LIBRAS e do Português; precisam de ambientes bem estrutu-
O intérprete possui um papel conhecimento das implicações da rados, para favorecer sua construção
fundamental em uma escola que se surdez no desenvolvimento do in- de conhecimentos. São necessários
pretende inclusiva e bilíngüe, pois será divíduo surdo; conhecimento sobre profissionais que tenham domínio
responsável por passar as informações a comunidade surda e convivência da LIBRAS, que pensem estratégias
durante as aulas (professor ensina em com ela. pedagógicas que contemplem as neces-
Português e o intérprete traduz essas Um primeiro ponto a ser focalizado sidades das crianças surdas. Em alguns
informações para Libras); é também o é aquele relativo ao papel ocupado pelo casos, a presença do intérprete é pro-
mediador na relação com o professor e intérprete em sala de aula, o qual é o piciada na busca de que alguns desses
com os alunos ouvintes e demais pes- mediador de relações estabelecidas entre alvos sejam alcançados. A presença
soas da comunidade escolar, fazendo o aluno surdo com os ouvintes. Outro de Intérprete Escolar nesse nível de
com que sua condição lingüística seja aspecto relevante para a educação é ensino tem sido problematizada por
respeitada. Mas, se engana quem acha que o professor ouvinte pode minis- alguns autores (ANTIA; KREIMEYER,
que a presença do intérprete assegure trar suas aulas sem preocupar-se em 2001; TURETTA, 2006), já que pode
que a criança irá aprender tudo que lhe como passar as informações em sinais, favorecer a participação dos alunos
é passado, pois trata-se de uma criança atuando normalmente na língua de surdos em diversas atividades, mas, ao
como qualquer outra, com vontade que tem domínio. De um modo geral, mesmo tempo, se constitui em tarefa
própria e atenção volitiva, que pode é através do intérprete que o surdo adicional para eles quando se considera
ter dificuldades e facilidades. poderá fazer-se ouvir e falar. Todavia, sua idade e seu domínio bastante inicial
O Decreto-Lei n.º 5.626, de 22 de a inserção de um intérprete de Língua da Língua de Sinais, sua capacidade de
dezembro de 2005, que regulamenta de Sinais (ILS) em sala de aula não atenção para diferentes interlocutores
a Lei LIBRAS (Lei n.º 10.436/2002), assegura que as questões metodológicas e línguas no espaço escolar, além das
obriga a presença dessa língua na sala sejam alteradas para contemplar todas dificuldades inerentes aos processos
de aula: as necessidades educacionais especiais de produção/interpretação.
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ainda que o Português escrito deve ser mas elas só serão eficazes se de fato a de intérprete há aproximadamente
ensinado como segunda língua, e as condição lingüística especial do sur- nove anos. Trabalha em outro período
aulas ministradas em LIBRAS. A pers- do for compreendida e respeitada, e em outra escola, como professora em
pectiva inclusiva da escola permanece ações para a criação de uma efetiva classe especial para surdos, tendo já
aberta, todavia numa proposta que escola bilíngüe forem implementadas participado de vários eventos regio-
deve priorizar a LIBRAS nos processos (LACERDA, 2006) nais como intérprete. Tem 24 anos
de ensino/aprendizagem. O contato e cursa o terceiro ano de Pedagogia.
e as trocas com alunos ouvintes po- Aprendeu LIBRAS no contato com
derá ocorrer no espaço escolar para surdos, pois trabalhou durante oito
além das atividades em sala de aula Método anos em instituição especializada e
(LACERDA, 2006). fez vários cursos rápidos de aperfei-
É importante ressaltar que a prá- A pesquisa se desenvolveu em uma çoamento em LIBRAS, sem contudo
tica que será analisada neste estudo Escola de Educação Infantil1 da rede ter certificação da Federação Nacional
envolve a participação do ILS jus- pública, na qual se encontram inseri- de Educação e Integração dos Surdos
tamente na Educação Infantil, nível das crianças surdas em classes de ou- (FENEIS).
educacional não indicado pelo citado vintes. Foram focalizadas duas salas A técnica de coleta de dados
Decreto-Lei para a presença de ILS. dessa escola, aquelas que contavam adotada foi a de entrevista semi-estru-
As justificativas para este interesse de com a presença de crianças surdas e turada, a qual dá condições ao entre-
pesquisa baseiam-se, justamente, na intérpretes de LIBRAS. As salas têm vistado de discorrer livremente sobre
singularidade da realidade vivencia- aproximadamente quinze alunos cada. A o tema que lhe é proposto. Segundo
da, já que a Prefeitura Municipal que primeira, jardim I, conta com crianças Minayo (2000), na entrevista podem
financiava o Programa de Inclusão de quatro a cinco anos, sendo doze ser obtidos dados que se referem di-
focalizado não aceitava outro modelo ouvintes e seis surdas. A segunda é a retamente ao indivíduo entrevistado,
de inclusão que não aquele de crianças da pré-escola, com crianças de seis a isto é, suas atitudes, valores e opini-
surdas freqüentando classes regulares, sete anos, sendo três surdas e treze ões, dados esses que só podem ser
nos diversos níveis de ensino. ouvintes. conseguidos com a contribuição dos
Portanto, a escola de que os surdos Como o foco desta pesquisa é atores sociais envolvidos. As entrevistas
precisam, defendida no Decreto-Lei conhecer melhor o trabalho das in- ocorreram no próprio ambiente de
n.º 5.626, e a escola real oferecida aos térpretes, foram realizadas entrevistas trabalho, por opção das entrevistadas.
surdos ainda são bastante distintas. com duas que atuavam na escola. No Estavam presentes somente a pesquisa-
Apesar do diálogo estabelecido en- Jardim I, atua Amanda2 , intérprete dora e a intérprete, tendo em vista que
tre os pesquisadores e o município, há dois anos nessa escola, sendo essa cada uma foi entrevistada em um dia
a experiência de educação apresenta- sua única experiência como intérprete. diferente, em um ambiente silencioso
da aqui ainda reflete os princípios de Aprendeu a LIBRAS no contato com organizado para a entrevista.
uma educação inclusiva de surdos na a comunidade surda na igreja que fre- As entrevistas foram audiograva-
rede regular, que se pensa e se orga- qüentava, sem, todavia, ter realizado das e transcritas com base no padrão
niza fundamentalmente para alunos cursos formais para sua qualificação ortográfico da língua, integralmente,
ouvintes. Esse é o grande obstáculo como intérprete. Tem 26 anos e pre- buscando retratar as angústias, anseios
do processo inclusivo dos surdos na tende ingressar na universidade para e conforto de falar sobre certos assun-
educação, e não basta a legislação cursar Pedagogia. tos, o que pode dificultar a leitura dos
para uma transformação efetiva das A segunda, Juliana, atua na sala que não estavam presentes, já que a
práticas. As leis podem induzir ações, de pré-escola. Desempenha o papel transcrição é fiel à produção oral.
1
Escola referência no município para o atendimento de crianças surdas em idade pré-escolar. Conta com ILS e instrutor surdo para ensino de LIBRAS aos funcionários
da escola e para a condução de Oficinas de LIBRAS oferecidas aos alunos surdos para desenvolvimento de linguagem.
2
Os nomes são fictícios para resguardar a identidade dos participantes.
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Para realizar a análise das entre- Os trechos citados mostram que, na que a professora está ministrando.
vistas, foram identificados temas re- percepção das ILS, as crianças surdas Para os alunos surdos que chegam
levantes, não elaborados a priori, mas sabem que a intérprete e a professora à escola, geralmente sem uma língua
que emergiram dos próprios dados, ocupam papéis diferentes, sem, con- desenvolvida e, conseqüentemente, com
por sua recorrência ou singularidade, tudo, terem claras quais as funções um conjunto de conceitos e conheci-
representando os diversos aspectos de cada uma. Isso pode ser explicado mentos restrito quando comparados
discutidos pelas intérpretes. Com por se tratar de crianças ainda muito a seus pares ouvintes, a necessidade
base no material teórico estudado e pequenas, sem experiência escolar an- de acompanhar as explicações do pro-
nos dados das entrevistas, buscou-se terior, em muitos casos, e que estão fessor, de estar atento às solicitações
interpretar os depoimentos que serão constituindo os papéis sociais relativos e propostas é ainda mais premente,
apresentados a seguir. à escola em seu cotidiano. pois quando perdem algo têm maior
As crianças se referem à intérprete dificuldade para conseguir acompanhar
como “a tia” que faz sinal, marcando as atividades. Além disso, a intérprete
Resultados e discussões sua percepção de que é ela que atua acaba tendo que motivá-los e criar
principalmente usando LIBRAS, mas condições para seu interesse, para
• Criança percebe a diferença en- não se pode esperar que compreen- além daquilo que a professora tenta
tre intérprete de Língua de Sinais dam de forma ampla a função do ILS, fazer em sala.
e professor pois mal sabem que existem línguas Em outros pontos da entrevista
diferentes, que são (ou se busca que percebe-se que as intérpretes assumem
AMANDA: Assim, eles sabem que ela sejam bilíngües) usuários de LIBRAS. uma série de funções, como ensinar
é a professora, eles não sabem bem Assim, a figura do ILS precisa ser cons- sinais e aspectos da Língua de Sinais,
o que é ser uma professora, mas eles truída, explicada e elaborada em suas já que essas crianças estão adquirindo
sabem que é ela que comanda aqui, relações. essa língua e manifestam várias dú-
porque quando ela não está, eles sabem A intérprete Amanda brinca com vidas e desconhecimentos; atender a
que não sou eu, então a gente bagunça os alunos quando a professora não demandas pessoais do aluno, já que
pra caramba, a gente bagunça assim está presente, deixando claro que a são os únicos interlocutores adultos
aí eu falo “a tia Paula vai vir, a tia autoridade da sala é responsabilida- a quem a criança pode recorrer em
Paula vai ficar brava”, aí eles sabem de da professora. Assim, aos poucos, sua língua; atuar frente ao compor-
que a Paula... Então, quando ela não nas atividades escolares e nas relações tamento do aluno, negociando sua
está, eles pedem as coisas pra mim, sociais que se vão constituindo, os adequada participação em sala de
mas eles sabem que as coisas são da alunos reconhecem ser papel da pro- aula, e atuar como educador frente
tia Paula, que é dela.... fessora autorizar saídas, organizar as às dificuldades de aprendizagem do
AMANDA: Também, assim, eles sa- atividades entre outras tarefas. A ILS aluno, já que as dúvidas deste são,
bem que ela é a professora e eu sou a fica mais próxima das crianças, sem em geral, primeiramente expostas às
tia que faz sinal. a responsabilidade da classe sobre si, intérpretes, aproximado-as muito de
AMANDA: Aí elas ficam na conversa, e ficando mais à vontade na ausência um educador. Muitos autores defendem
conversa, e conversa, e se eu não chamo da professora. que esse profissional deveria integrar
atenção elas continuam conversando, Ressalte-se, porém, que os trechos a equipe educacional. No entanto,
não está nem aí com a gente, então apresentados indicam que a função das isso o distancia de seu papel tradi-
eu tenho que chamar atenção, falar intérpretes vai além da atividade de cional de intérprete, razão por que
para prestar atenção, aí eles prestam interpretar, porque sua tarefa em sala essas questões relativas ao papel do
atenção, aí eu pego um pouquinho de aula é acima de tudo colaborar para ILS, seus modos de atuação e os li-
antes, explico de novo, aí se eles não que o aluno compreenda os conteúdos mites dessa função têm sido bastante
estão prestando atenção, eu chamo trabalhados. Portanto, a ILS participa problematizados (LACERDA, 2003;
atenção de novo... chamando os alunos para prestarem KELMAN, 2005).
atenção e não perderem o conteúdo
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do algum material, então é parada, desrespeitado na prática de ILS que
Trabalho em parceria a gente já combinou isso, pra eu não atuam no espaço escolar.
com a professora ficar andando e o surdo não precisar Desse modo, a boa relação entre
tendo que me seguir... a professora e a intérprete favorece a
AMANDA: Ah sim... tem planeja- AMANDA: Assim, ela pergunta “como ocorrência de um trabalho mais ade-
mento, a gente faz uma ordem de que está, eles estão entendendo”, às quado com as crianças. Além disso,
planejamento toda semana, aí a gente vezes ela pergunta “está tudo bem”, ambas trabalham juntas, por muitas
vê tudo o que vai fazer durante a se- “está tudo certo”, aí se foi, eu falo “ai horas, em um mesmo ambiente, e, nesse
mana, se tem alguma coisa diferente volta, espera um pouquinho que estou sentido, manter uma relação amistosa
a gente já vai atrás. lá ainda no começo”, aí a gente vai se é fundamental. Os trechos destacados
JULIANA (com relação à professo- entendendo. É bom estar assim, um permitem inferir também que o tempo
ra): Oh, e fora isso a gente tem uma bom tempo com a pessoa porque já de trabalho conjunto faz com que au-
afinidade grande no trabalho, então tem liberdade pra falar “espera um mente a afinidade/intimidade entre a
eu não tenho nenhum trabalho com pouquinho”, “pode ir”, né, porque aí professora e a intérprete, favorecendo
ela e nem ela comigo, né. Nunca teve demora um pouco pra gente explicar que uma diga à outra o que está dando
atrito de chegar e falar “não, isso aí e ela já falou, né... errado ou certo, de forma mais livre e
não está servindo”, nunca teve nada colaborando para melhores condições
disso, sempre foi muito discutido o Os depoimentos evidenciam a de ensino/aprendizagem.
que a gente faz... importância de o planejamento das As intérpretes revelaram ainda que
AMANDA: A minha relação aqui atividades escolares ser antecipado o início de sua atividade foi bastante
com a professora é boa, eu já estou para o intérprete, pois dessa forma difícil, pois a professora não estava
com ela desde o ano passado, então este tem tempo de se preparar em acostumada a dividir seu espaço de
a gente tem liberdade para fazer as relação a pensar/escolher sinais que trabalho – a sala de aula – com ou-
coisas, para conversar, para estar serão mais adequados e necessários tro profissional, o que demandou da
falando as coisas que a gente está para o entendimento dos alunos intérprete a conquista gradual de seu
fazendo, então é muito boa. É no surdos sobre determinado assunto, espaço, construindo uma relação po-
começo é difícil, porque às vezes o e até mesmo buscar outros recursos sitiva e profissional para possibilitar
professor não está acostumado, né, (visuais, por exemplo, para favorecer seu trabalho.
situação nova, eles não têm o costume a aprendizagem). Tal planejamento é Outro ponto discutido é o lugar que
ainda, então agente tem que criar feito, nessa escola, em parceria com a o intérprete educacional deve ocupar
uma rotina, né, pra ele pegar, então professora. Nesse contexto, a intérprete em sala de aula, de modo a desempe-
aí gente vai se organizando assim, colabora expondo o que sabe sobre nhar bem o seu papel, sem incomodar
aí vai bem... a surdez e discutindo possibilidades a professora e os alunos ouvintes. Sua
JULIANA (em relação à professora): de certos conteúdos serem abordados posição à frente da sala de aula, em
Então, pelo tempo que a gente está considerando a falta de audição. Ao um canto, junto a um grupo precisa
junto, né, então no começo eu esbarrava mesmo tempo, sua participação no ser negociada para que se busque a
nela, né porque eu pelo menos nunca planejamento favorece um melhor melhor posição para interpretar sem
tinha dividido sala com ninguém, não desempenho na interpretação, pois criar problemas. A intérprete não pode
sabia muito bem o que fazer aqui, mas conhece os argumentos antecipada- invadir o espaço da professora. Cada
é sossegado, já tem um lado certo, a mente, não precisando improvisar uma deve saber seus deveres e funções,
gente já tem... a gente já estipulou um tanto. Além disso, cabe ressaltar que, o que é feito através de negociações
esquema pra ela não ficar passeando embora o acesso prévio às informações entre ambas; mas, se isso não for con-
na sala, pra eu não precisar ficar cor- que serão interpretadas seja exigência versado ou não for refletido, poderá
rendo atrás dela, então quando tem fundamental para a atuação de intér- gerar um acúmulo de mal-entendidos
aula expositiva assim, alguma coisa pretes em qualquer língua (PAGURA, que tornará as relações difíceis.
na lousa, ou que esteja apresentan- 2003), este aspecto freqüentemente é Os depoimentos revelam tam-
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Os recortes mostram que a relação
Os depoimentos evidenciam a importância de o pla- da intérprete com o aluno surdo me-
lhora com o passar do tempo, pois,
nejamento das atividades escolares ser antecipado
quando as crianças chegam à escola,
para o intérprete, pois dessa forma este tem tempo não gostam do contato, não sabem
bem como se relacionar, dominam
de se preparar em relação a pensar/escolher sinais pouco a Língua de Sinais e precisam se
que serão mais adequados e necessários para o en- acostumar com a escola e com novos
amigos. As experiências familiares das
tendimento dos alunos surdos sobre determinado crianças surdas filhas de pais ouvintes,
em geral, envolvem um ambiente de
assunto, e até mesmo buscar outros recursos (visuais,
maior solidão, de poucos interlocuto-
por exemplo, para favorecer a aprendizagem). res, ou de interlocuções muito liga-
das apenas às situações concretas. A
presença de um adulto que domina
bém que a professora se preocupa banheiro junto, então é como se fos-
LIBRAS e que pode conversar com
com os alunos surdos, pois sempre se um amiguinho assim... eu falo, às
elas é algo novo e que precisará ser
interrompe a aula para perguntar se vezes eles obedecem, mas às vezes
elaborado.
estão entendendo, ou dá um tempo quando eles também não estão com
As intérpretes, para se aproximar
maior para que a intérprete explique vontade de obedecer, não obedecem
das crianças, parecem lançar mão de
novamente um conteúdo; só então também, às vezes eu fico brava com
recursos como se aproximar e “ficar
continua a ministrar sua aula. Essa eles, falo “vou falar para a professora
amigas”, que elas mesmas referem
característica da professora facilita o pôr de castigo” ou “fica ali no canto
como complicados porque posterior-
trabalho da ILS e deve ser destaca- sentadinho um pouquinho”, porque
mente geram confusão sobre limites
da como necessária, pois se trata de às vezes tem que dar uma dura pra
(as crianças não obedecem) para as
crianças pequenas, que, além de não parar, porque se não, bate no amigo,
relações e sobre qual é o papel daquele
terem muitos conhecimentos elabo- faz coisas que não é pra fazer, então
adulto naquele espaço (ameaça cha-
rados, são surdas, o que dificulta o tem que começar a ir cortando.
mar a professora). O manejo dessas
acesso ao que acontece ao seu redor. JULIANA: Às vezes. Quando tem
situações parece complexo e aponta
O empenho da professora e a tentativa alguma atividade diferente, que é
para a dificuldade de se delimitarem
de criar melhores condições no espaço nova ou um conceito novo que eu
os papéis de cada um nesse ambiente,
escolar, em conjunto com a ILS, são sei que eles não viram, como agora
as competências e a autoridade. Neste
fundamentais para a implementação que eles estão vendo adição, é uma
aspecto, os depoimentos deixam per-
de um projeto de inclusão. coisa nova pra eles, então eu procuro
ceber o despreparo desse profissional
deixar eles juntos porque facilita pra
para lidar com tais situações freqüentes,
Relação entre a intérprete mim, porque eu sei que eu vou inter-
quando estão envolvidas crianças na
e o aluno surdo vir na atividade, o que não é sempre
faixa etária abordada.
que eu faço, eu procuro deixar eles
As intérpretes relatam que são os
AMANDA: Essa turma eu estou com fazerem sozinhos como os outros, a
alunos que escolhem o lugar onde
eles desde o ano passado, eles estavam não ser que eles peçam, mas quando
querem sentar, desde que se posicionem
no maternal II e aí eles estão agora é uma coisa nova eu procuro colocar
de frente para elas, facilitando assim
no jardim I, então eles estão acostu- eles juntos. Às vezes eles estão... um
o trabalho, inclusive de identificar se
mados assim comigo, então eu fico não quer olhar pra cara do outro e
algum deles está desatento ou não está
meio mãe deles. vai cada um pra um canto, normal,
entendendo algo. Elas aceitam o desejo
AMANDA: Eu sou amiga deles, né, assim, nunca foi imposto, assim “fique
deles de não ficar perto uns dos outros
brinco junto, pego junto, vamos no junto um do outro”.
ou de sentar junto de outro colega
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que não seja surdo, pois essa relação está entendendo. É bem diferente, por se interessem pelo assunto e enten-
vai sendo construída no convívio e é exemplo, de você ser interprete num dam o que está sendo trabalhado. Nos
inerente a uma proposta inclusiva, pois evento ou numa outra situação. depoimentos, elas contam que essa é
as crianças buscam proximidade com JULIANA: O que é tratado na escola, uma diferença importante entre ser
seus pares, que, no caso, são todos os eu acho que mesmo com a sensibilidade intérprete numa escola de educação
alunos da classe. da professora dessa sala, eu acho assim, infantil e ser intérprete em outros níveis
que o conhecimento que ela tem é de ensino, em que as crianças já têm
• Domínio restrito de LIBRAS limitado assim, a um conhecimento um domínio melhor de LIBRAS e de
pelo aluno surdo e a necessidade acadêmico que é passado, e o surdo conhecimentos de mundo, ou ainda de
do uso de estratégias especiais pelo já vem com esse déficit de linguagem interpretar num evento social, em que
intérprete de Língua de Sinais de nascimento, então coisa básica que somente interpretam o discurso de uma
eles deveriam aprender naturalmente, outra pessoa, sem um compromisso
AMANDA: Falta, às vezes, recurso já está perdida praticamente, né, não maior com a aprendizagem.
para conseguir estar chegando, assim, tem, e chegou na escola é abordado As tais estratégias visuais são ela-
atingindo eles. Às vezes se a gente está um esquema bem... como que eu boradas pelas próprias ILS, em servi-
passando alguma coisa, aí às vezes a posso dizer, bem restrito de sala de ço, segundo as necessidades que vão
gente sente uma dificuldade de estar aula mesmo, e o resto fica perdido, surgindo no dia-a-dia. Elas sentem a
fazendo com que eles entendam, ou entendeu? necessidade de ser criativas para lan-
com que eles prestem atenção, porque AMANDA: É, às vezes, o que fazer çarem mão de recursos possíveis e que
eles têm cinco anos agora, né. pra... porque tem que usar muito façam sentido para os alunos. Aulas
AMANDA: Porque os ouvintes, assim, recurso visual, né, então tem que ter expositivas, por exemplo, podem ser
eles estão sempre recebendo informa- o visual pra chamar e eles poderem auxiliadas pela prática de atividades
ção, mesmo que não queira. Eles estão entender, porque não adianta eu fazer que favoreçam um melhor entendi-
passando e recebendo informação, eles um sinal ... eles não vão saber nunca mento dos alunos surdos; e muitas
estão em casa recebendo informação, se eu não mostrar isso é isso e fazer dessas iniciativas partem da própria
então isso acelera o aprendizado deles, o sinal pra que eles entendam, pra intérprete, que tem um conhecimento
né, já os surdos não, eles não têm esse começar a entender, né, aí às vezes a maior sobre a surdez e percebe que o
privilégio de estar passando na rua gente tem um pouco de dificuldade modo como a professora apresentou
e ouvir alguém comentando alguma nisso, pra bolar algo que realmente certo conteúdo fez pouco sentido para
coisa “ai, passou um furacão não sei chame a atenção deles. os alunos surdos.
aonde”, eles não ouvem, as crianças É possível concluir que, apesar de
sabem “ah, é tia ontem teve um fu- Nota-se que, devido à faixa etária toda a disponibilidade da professo-
racão!!” mas eles não sabem nem o das crianças, por se tratar da educa- ra, falta ainda conhecimento sobre a
que é o furacão. ção infantil, o domínio de LIBRAS surdez que favoreça a elaboração de
JULIANA: O intérprete principalmente, é restrito, a maior parte das crianças atividades mais pertinentes, levando
na escola, ele não é só interprete, né, está aprendendo LIBRAS na escola, em conta o domínio restrito de língua
porque muitas vezes a gente vai fazer o pelo contato com seus colegas surdos, e de experiências sociais perpassadas
que a professora está propondo, você com o educador surdo e também com pela linguagem. As professoras possuem
percebe que o surdo não está enten- a intérprete. Assim, é freqüente que conhecimentos acadêmico-teóricos sobre
dendo, mesmo você interpretando. a intérprete use um sinal, ou elabore a surdez, que precisam ser ampliados
Então o que tem que fazer? Tem que um conceito em LIBRAS que não é para que ocorra uma aprendizagem
fazer um aparte, um paralelo do que compreendido pelos alunos, por seu efetiva e uma inclusão efetiva.
está acontecendo ali, pra você chegar domínio restrito da língua. Nesse Alguns estudos sobre a inclusão
até o ponto que o surdo sabe, pra contexto, as intérpretes se apegam a e o papel do intérprete em sala de
tentar aproximar o que a professora recursos visuais para complementar aula marcam a importância de um
está tentando dizer. Não sei se você as aulas e para que os alunos surdos relacionamento estreito e integrado
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entre os profissionais que trabalham Então a gente vai perguntar para outro
com a criança, quando se pretende surdo, aí pergunta para outro surdo, se É possível observar nos
que a inclusão seja satisfatória (AN- esse surdo não sabe, aí pergunta para
TIA; KREIMEYER, 2001). Contudo, outro, e aí até a gente definir o que.... depoimentos a percepção
para isso é preciso que se constitua que sinal é realmente, né.
um funcionamento de equipe e que Como discutido na parte inicial que têm de que precisam
todos sejam vistos como importantes deste artigo, a formação específica para
e participantes no processo de apren- a atuação como ILS ainda é incipien- atualizar-se e refletir sobre a
dizagem e que sejam consideradas as te. As pessoas aprendem LIBRAS nas
singularidades do desenvolvimento de associações de surdos, ou em institui- prática, porque apenas atuar
linguagem das crianças com surdez ções religiosas (em sua maioria), e o
(LACERDA, 2003). domínio da LIBRAS já é considerado não parece ser suficiente.
suficiente para que assumam a tarefa
de interpretar. No que se refere à Elas falam sobre o valor
Formação do formação do ILS para atuar no es-
Intérprete de Língua de paço educacional, a lacuna é ainda da experiência acumulada,
Sinais em serviço maior, porque pouco se sabe sobre
essa tarefa e o perfil desejável para já que referem o segundo
JULIANA (referindo-se a outra intérpre- a atuação nesses espaços. Trata-se de
te): Super boa, é ótima minha relação uma atividade profissional nova, que ano de trabalho como mais
com ela, a gente discute bastante, estuda vem-se constituindo na prática, pelo
bastante, né, às vezes ela vem com al- fazer e pelas oportunidades abertas fácil, pois tinham a vivência
guma dúvida, a gente tem esse tempo paulatinamente, e é urgente a discussão
agora, né, das 7 às 8h, ou das 7:30 às e a implementação de locais para a anterior como parâmetro
8h de repente, pra fazer isso. Então a formação desses profissionais, já que
gente acaba discutindo bastante coisa, muito do que se propõe para a edu- para sua atuação.
trocando material. É tranqüila. cação e desenvolvimento dos alunos
AMANDA: Ah, eu acho bom, eu gos- surdos está nas mãos dos ILS. que referem o segundo ano de tra-
to, eu acho que a gente está fazendo o As ILS entrevistadas têm reuniões balho como mais fácil, pois tinham
possível, né, o que a gente pode fazer periódicas com as docentes coordena- a vivência anterior como parâmetro
e a cada ano a gente vê o que foi feito doras do projeto de inclusão. Nesses para sua atuação. Referem também
o que deu certo e o que não deu, para encontros são discutidos aspectos da que as trocas entre elas – duas pessoas
poder estar arrumando e cada vez me- prática, dificuldades, problemas e diferentes, com práticas diferentes –,
lhorando, né. modos de atuar mais adequadamente. favorecem o encontrar soluções para
AMANDA: Tem que ver sinal, pesquisar Todavia, tais reuniões não foram certos problemas, idéias diversas de
sinal, até o jeito de estar falando, porque citadas pelas intérpretes na entrevista, como reagir diante de situações com-
aí às vezes eu vejo com surdo, né. Teve fazendo pensar que as informações e plicadas, alternativas de atuação frente
uma época que teve até um probleminha trocas nesses espaços têm sido insufi- à demanda pedagógica, entre outras.
no Natal, “o Natal está chegando”, aí, que cientes e não se configuram para elas Além disso, pesquisam novos sinais e
chegar que eu vou usar, então foi uma como um espaço de formação. significações entre si e nas interações
semana atrás de como o natal ia chegar. É possível observar nos depoi- com a comunidade surda e outros ILS,
Então são coisas assim, que às vezes parece mentos a percepção que têm de que já que a prática exige essa atualização/
simples, mas que não é, né, a gente tem precisam atualizar-se e refletir sobre ampliação constante.
que explicar direitinho, então a gente tem a prática, porque apenas atuar não Porém, os depoimentos também
que usar o sinal correto, porque não é parece ser suficiente. Elas falam sobre apontam para a dificuldade da formação
qualquer chegar, é o chegar de uma data. o valor da experiência acumulada, já em serviço, uma vez que se exige delas
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atuar, buscar saídas para a atuação, feitas palestras, reuniões de capacitação Nos depoimentos aparece a intér-
buscar melhorar e refletir sobre seu e outras atividades, a compreensão prete entendendo seu trabalho como
trabalho, tudo a um só tempo. da realidade das pessoas surdas se faz restrito à sala de aula, pois refere que
lentamente e ainda é bastante parcial. ainda há muito preconceito por parte
Conhecimento da escola Avaliam que professores e demais funcio- dos funcionários da escola frente aos
sobre a surdez e o nários da escola têm um conhecimento alunos surdos e aos modos de como
conhecimento do ILS pouco aprofundado sobre a surdez, tratá-los e acolhê-los.
sobre a surdez conhecimento esse que, nos entraves Elas defendem que, para que ocorra
do cotidiano, se revela insuficiente a inclusão de um modo mais efetivo,
JULIANA: As pessoas, mesmo com para enfrentar as reais necessidades do algumas coisas precisariam ser modifi-
as atitudes, mesmo com o projeto aluno surdo e as demandas impostas cadas, aprofundando esclarecimentos
que está há pouco tempo, eles ainda pela inclusão. sobre a surdez e preparando melhor
não entendem o que é surdez, enten- a escola para receber alunos surdos,
deu? Então sempre a gente tem que principalmente por se tratar de uma
estar, de uma maneira ou de outra, A inclusão de alunos escola de educação infantil, que signi-
chamando a atenção pra isso. E a fica o início da vida escolar, a primeira
gente sempre acaba saindo de... não surdos na escola regu- experiência nesse ambiente e a base para
como uma a ajuda pra eles mas uma... as séries seguintes, que exigirão sempre
por parte de quem... ah, tem alguns lar, segundo a percep- uma bagagem maior e um domínio
professores, alguns funcionários que de LIBRAS mais consistente.
não entendem, né, então a gente tem ção das ILS entrevis-
que acabar falando uma coisa óbvia
porque você vê que a criança não está tadas, se mostra como Conclusões
acompanhando, né. Eu acho que esse
é o maior problema. bastante problemática. As crianças surdas que freqüentam a
JULIANA: Então, o trabalho com a educação infantil, por serem ainda muito
escola é o mais complicado, eu acho. A escola conhece pou- pequenas e filhas de pais ouvintes, não
Eu acho que esse trabalho de inclu- têm muitos conhecimentos anteriores
são é um negócio que envolve mudar co sobre a surdez, e, sobre aspectos culturais e sociais, em
uma sociedade, e as pessoas não estão geral, por não compartilharem uma
preparadas pra isso psicologicamente mesmo sendo feitas língua com seus pais, língua essa que
mesmo, eu acho que nem é má vontade possibilitaria trocas de informações e
das pessoas mas, é bem complicado, eu
palestras, reuniões de a aquisição de conceitos. Além disso,
pelo menos vejo bastante dificuldade sabem ainda poucos sinais por estarem
ainda aqui... o pessoal não tem muito
capacitação e outras pouco expostas à LIBRAS, o que as
preparo não, mas eu acho que não é coloca numa situação de atraso no
atividades, a compre- desenvolvimento da linguagem e con-
um negócio de má vontade, eu acho
que é um negócio social mesmo, é um ensão da realidade das seqüente defasagem na aquisição de
preconceito, mas é um negócio social, conhecimentos em geral.
mas pessoalmente é tranqüilo. pessoas surdas se faz Elas também são pequenas/jo-
vens, como as demais crianças que
A inclusão de alunos surdos na lentamente e ainda é freqüentam esse nível de ensino, e
escola regular, segundo a percepção têm dificuldade em centrar a atenção,
das ILS entrevistadas, se mostra como bastante parcial. obedecer a regras, entender aspectos
bastante problemática. A escola conhece da dinâmica da sala de aula, que são
pouco sobre a surdez, e, mesmo sendo características comuns às crianças da
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educação infantil, que constroem es- de-se que, para a Educação Infantil,
sas capacidades na e com a própria a língua de instrução seja a LIBRAS,
vivência escolar. para que os alunos surdos não precisem
É com essa clientela que as intér- da presença do ILS, e para que possam
pretes de LIBRAS entrevistadas pre- se desenvolver e construir conheci-
cisam atuar. Assim, como foi visto mentos diretamente em sua língua.
nos depoimentos, elas precisam in- São crianças que ainda estão em
terromper a aula, muitas vezes para aquisição de linguagem e construindo
dirimir dúvidas, explicar conteúdos e conceitos básicos. E ter que processar
conceitos individualmente, conquistar isso superando barreiras entre línguas
a atenção das crianças, buscar sinais e (português/LIBRAS), barreiras estas
formas adequadas de passar os conte- inerentes à prática da interpretação,
údos, na tentativa de construir com é certamente um obstáculo a mais
elas os conceitos almejados a partir para o seu desenvolvimento. Preten-
das possibilidades que se apresentam. de-se ensinar em duas línguas – uma
Nesse sentido, o trabalho do intér- inacessível às crianças (português) e a
prete se torna complexo e, por vezes, outra usada apenas como instrumento
distorcido, pois apenas interpretar é para passar o que a professora diz (LI-
bastante insuficiente. BRAS) – dificultando muito qualquer
Nesse ambiente, o intérprete se processo de aprendizagem.
desdobra para conquistar a atenção É inegável que esta prática é
das crianças, ganhar sua confiança e melhor que aquela da inserção da
colaborar na construção de uma língua criança surda na escola sem a pre-
comum que possibilite trocas mais sença da LIBRAS, porém o ideal da
efetivas e o melhor desenvolvimento Educação Bilíngüe precisa pressupor
geral possível. Mas, para tal, muitas o domínio da LIBRAS e a construção
vezes se aproxima das crianças de tal dos conceitos fundamentais nesta lín-
modo que sua função se confunde, e gua, e isto só pode ser alcançado em
as crianças parecem ter dificuldade em uma proposta de Educação Infantil
perceber a configuração do papel do na qual a língua de instrução seja a
intérprete (que, de fato, é múltipla nesse própria LIBRAS.
ambiente), pois eles querem brincar,
querem que o intérprete realize todos
os desejos, visto que é difícil para elas
entender que aquele adulto que sabe
LIBRAS e pode se comunicar com
elas com menos dificuldade não es-
teja sempre a sua disposição só para
conversar e brincar.
Assim, esta pesquisa permite ver a
dificuldade de atuação do ILS nesse
nível de ensino, como ele precisa se
desdobrar atuando mais na construção
da língua e na construção de conceitos
do que propriamente como um intér-
prete. Diante dessa realidade, defen-
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ATUALIDADES EM INES
ESPAÇO
EDUCAÇÃO Jul-Dez/07
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Clarice Nunes*
* Doutora em Educação pela PUC/Rio. Professora Titular em História da Educação da Faculdade de Educação da
UFF(aposentada). Atualmente vinculada como Pesquisadora do CNPq associada ao Programa de Pós-Graduação
em Educação da UFF. Fundadora do Grupo de Trabalho de História da Educação da ANPEd e sua coordena-
dora por quatro anos. Autora de livros, artigos, ensaios e publicações técnicas na área de História da Educação.
Organizadora de número especial sobre História da Educação para a Revista Brasileira de Educação. Coordenadora
da Coleção das obras de Anísio Teixeira pela editora da UFRJ. Consultora de diversas instituições científicas e de
publicações pedagógicas.
E-mail: drcnunes@gmail.com
RESUMO ABSTRACT
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p.41, Jul-Dez 2007
INES
ESPAÇO
ATUALIDADES EM
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EDUCAÇÃO
Já dizia Michel de Certeau que Ninguém é inocente, tanto na arte das surgiu a questão que me habitou in-
inventamos o cotidiano. Na introdução práticas quanto na arte do relato sobre ternamente: até que ponto as políticas
do segundo volume da sua obra A elas. O cotidiano encerra uma arte de públicas afetam o cotidiano escolar?
invenção do cotidiano: Morar, cozinhar fazer e uma arte de viver. Minha hipótese é a de que a defasagem,
(1996), aparece uma definição: Não creio que seria possível, nem sempre denunciada, entre as políticas
gostaria de fazer, um artigo descontex- propostas e a sua execução, com todas as
o cotidiano é aquilo que nos é dado tualizado, porque o cotidiano não é nuanças possíveis, é elemento crucial no
a cada dia (ou que nos cabe em par- sempre o mesmo, embora os rituais se jogo entre as estratégias implícitas nas
tilha), nos pressiona dia após dia, nos repitam e certas práticas se reproduzam. políticas globais (sejam elas nacionais,
oprime, pois existe uma opressão do Logo, para mim, não é possível falar estaduais e/ou municipais) e as táticas
presente [...] O cotidiano é aquilo que do cotidiano da escola sem localizar locais dos sujeitos. Ora, os interesses
nos prende intimamente a partir do de que escola se fala, dos usos dos seus e desejos de educadores e educandos
interior. É uma história a meio-caminho espaços e tempos, dos instrumentos e não são determinados, nem captados
de nós mesmos, quase em retirada, às dispositivos utilizados pelos sujeitos pelo sistema educacional no qual estão
vezes velada. (1996, p. 31) que ali circulam e vivem parte de suas inseridos. Essa defasagem indica que
vidas. Estar atento às práticas desses nenhuma situação é fixa, apesar de
Enfim, o cotidiano é a representa- sujeitos num espaço praticado, como o parecer que “nada muda”. Significa,
ção que construímos a partir de uma das nossas escolas, não significa retornar também, que tirar partido das situações
relação entre a familiaridade e o es- ao que é individual. Cada um de nós implica uma politização característica
tranhamento. é resultado de uma multiplicidade de das práticas cotidianas, incompreen-
Nos dois volumes dos estudos de relações determinadas pela situação dida pelas tentativas, recorrentemente
Michel de Certeau sobre o cotidiano de classe, de etnia, de gênero, que mal sucedidas, de homogeneização das
apresentam-se questões teóricas impor- implicam mil e um modos de exercício políticas públicas e/ou pela motivação
tantes para o estudo do cotidiano das de uma política da ação, da interação, das práticas partidárias.
instituições escolares. A principal delas da apropriação e do emprego de tudo Os (des)encontros entre o coti-
coloca em evidência as operações do coti- aquilo que se produz institucional- diano escolar e as políticas públicas
diano, as criações anônimas, contingentes, mente: uma linguagem, uma postura, serão trabalhados em dois momentos.
que irrompem e se perdem nas nossas um conjunto de crenças, inclusive as No primeiro, abordo a defasagem entre
(des)memórias, que tornam possíveis as nossas próprias subjetividades, dentro certos aspectos das políticas governa-
pequenas resistências, movem recursos de conjunturas específicas.
impensados e deslocam as fronteiras Inspirei-me em um dos nossos mais
da dominação dentro das instituições famosos educadores para abordar o Estar atento às práticas
e entre elas. São essas surpresas do dia- tema: Anísio Teixeira (1900-1971), cujo
a-dia que sinalizam para esse autor e pensamento e realizações constituem desses sujeitos num es-
a equipe que promoveu tão fecunda uma vertente das mais ricas de uma
pesquisa sobre o cotidiano, que existe tradição pedagógica democratizante paço praticado, como o
uma “liberdade gazeteira das práticas” em nosso país. Sendo Anísio um or-
(1996, p.19). Nessa afirmação está ganizador de homens e instituições, das nossas escolas, não
implícito um pressuposto: o da crença sistematicamente preocupado com as
na inteligência e capacidade de inven- temáticas da legislação educacional, da significa retornar ao
ção do mais fraco, aquele que aparece, organização e da gestão escolar, como
num primeiro momento, desarmado poderia provocar-me para tratar a te- que é individual.
diante das estratégias dos poderosos. mática do cotidiano? Imediatamente
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mentais e das experiências concretas sofrem, segundo Roberto Da Matta de lealdade e fidelidade entre o grupo
vividas em certas escolas públicas do (1987): a pressão das regras legais e beneficiado e a autoridade pedagógica.
estado do Rio de Janeiro, sobretudo do burocráticas, que definem um serviço Esse hábito cultural permanece muito
ponto de vista da participação na vida público e aquela que tem origem nas vivo. A importância que ainda hoje
da escola. E, no segundo momento, redes de relações pessoais a que todos assumem as relações pessoais num
discuto o efeito que tem essa defasagem, se submetem e aos recursos sociais espaço público coloca os educadores
tanto do ponto de vista dos obstáculos, que elas mobilizam. inquietos, porque não têm apenas uma
quanto das potencialidades à luz de Em pesquisa recentemente con- face assistencialista, a mais comum
uma educação pública democrática cluída1 , trabalhamos enfaticamente, presente nas escolas em todo século
tal qual pensou Anísio Teixeira. nas entrevistas realizadas, a relação passado. Essas relações hoje também
entre o público e o privado através são encaradas como problema que difi-
de decisões, gestos, atitudes, frases, culta tanto a democratização da escola
Os obstáculos à situações antigas e atuais das escolas e do ensino, quanto a transparência
participação de públicas fluminenses. Nesse texto, o do funcionamento das instituições e
educadores e contexto escolar é o da comunidade a autonomia dos professores e estu-
educandos no gonçalense. Refiro-me, sobretudo, a dantes. Como esse hábito cultural se
cotidiano escolar algumas das escolas públicas gonçalenses atualizou? Como essa permanência
nas quais trabalharam ou trabalham pode ser explicada?
Os educadores liberais brasilei- nossos entrevistados. Creio, no entanto, Diversos incidentes e declarações
ros criaram, em pleno século XX, que, apesar desse contexto específico, registrados na pesquisa que nossa
um sistema de educação, até então o que notamos que ocorre nessas es- equipe realizou mostram como uma
inexistente em nossa sociedade. Essa colas pode perfeitamente referir-se a relação pessoal pode dobrar, romper
criação, obedecendo aos imperativos aspectos também presentes em outras ou provocar o “esquecimento” da lei.
de um projeto unificado de educação, escolas, principalmente as localizadas É o caso, por exemplo, dos professo-
que disputava espaço com o sistema nas periferias urbanas. res que chegam à instituição públi-
elitista e dualista, exigiu a instalação Apesar das sucessivas reformas de ca enviados por alguma autoridade
de um conjunto de regras impessoais educação efetivadas no país nas décadas educacional e/ou política e o diretor
de ação. Tais regras foram aprendidas de 1920 e 1930, ainda nas décadas de finge que “as coisas passaram pelos
pelos professores através da sua for- 1940 e 1950 era comum, sobretudo trâmites oficiais”; ou o caso daqueles
mação profissional, do exercício da nesses locais, a criança matriculada na professores que acumulam funções em
escrituração escolar, da organização escola pública (ou privada) transitar número de horas ou com atividades
das classes escolares (pela seleção dos entre o espaço da sala de aula e a casa não permitidas legalmente, durante
alunos, pela divisão do tempo e da do professor com grande naturalidade. anos sem serem descobertos; ou, por
definição de um conteúdo comum, As diretoras e diretores escolares teciam exemplo, o caso da diretora de escola
por exemplo). No entanto, essas re- seu poder pessoal e político a partir pública que acoberta as faltas do casal
gras impessoais entraram diretamente das relações que iam engendrando na de professores em viagem de núpcias,
em conflito com as relações pessoais. posição ora de proprietários, ora de afirmando que “[...]. O Estado engana
De fato, os ambientes escolares não funcionários das escolas. Distribuíam a gente, a gente engana o Estado”.
fogem aos dois tipos de pressão que favores, criando uma relação de troca Uma leitura das entrevistas que
todas as instituições sociais brasileiras que criava e reforçava o sentimento realizamos mostra que as relações
Cf. Clarice Nunes. Das políticas públicas à história da formação docente e às memórias dos professores do Estado do Rio de Janeiro. Niterói, 2007, 343 páginas.
1
Relatório de Pesquisa que obteve financiamento do CNPq através de bolsas de produtividade e de iniciação científica.
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pessoais são fortes nas instituições memorando que provoca o afastamento diretores dessas escolas. Esses diretores
públicas de ensino e têm causado des- do professor da sua escola para uma tinham um papel que teoricamente a
conforto e conflito subterrâneo e/ou outra) para abafar uma necessidade gente chama de “exército burguês”.
aberto. O depoimento da pesquisadora que de alguma forma vinha à tona. Um exército finamente organizado
Léa da Cruz (2005), que concluiu uma Nesse processo, até o sindicato dos para não deixar o movimento penetrar
tese brilhante, já felizmente transfor- professores foi isolado, “embarreirado”, nas escolas. E houve uma coisa clara
mada em livro, pode ser um exemplo como dizia uma professora. A pesqui- também, quer dizer, além da dificul-
interessante para apreciarmos as sub- sadora afirma em entrevista: dade de penetrar na escola e fazer com
versões cotidianas a nobres objetivos que aquela preparação contaminasse a
proclamados. Vou contar o caso. O fórum se realizou no mês de de- rede, essas reuniões também aconteciam
Léa é professora de uma uni- zembro, com todas as dificuldades semelhantemente lá na prefeitura e
versidade pública e foi convidada no meio do caminho. Estava claro sempre com temáticas pensadas pra
por uma ex-aluna para trabalhar o jogo, absolutamente claro o jogo que se gerasse uma discussão e dali
na assessoria de um grupo que de que a prefeitura estendia o espaço as temáticas do fórum fossem cons-
dela solicitava subsídios teóricos para a realização do fórum e usava truídas. A representação das escolas
para refletir sobre a democracia na uma tesoura de grama... sabe!.. aquela era escolhida (...) por indicação do
escola e com essa realidade lidar, em tesoura assim, grandona, que a gente próprio diretor.
São Gonçalo. Afinal, a Secretaria de corta grama.Cortava todas as gramas
Educação do município preparava que iam nascendo... e havia mecanismos Pelo depoimento de Léa, fica claro
um fórum pela democratização do muito claros para perceber isso, um que nem a Secretaria nem os diretores
ensino e seu objetivo era o de que, deles, o mais forte deles, era o papel dos gonçalenses das escolas de ensino fun-
nessa preparação, todas as escolas da damental, naquele momento, tinham
rede enviassem representantes para interesse efetivo na democratização das
a discussão. Ela iniciou o trabalho e escolas, porque evidentemente certos
procurou inverter sua lógica inicial, interesses particulares seriam atingidos,
já que entendia que a democratização um deles a diminuição do poder das
Léa renunciou à possi- direções, que se erigiu justamente na
deveria ser discutida não a partir das
propostas da Secretaria de Educação, troca de favores apoiada nas relações
bilidade de levar qualquer pessoais. O depoimento de uma das
mas dos argumentos dos representantes
das escolas. Os debates aconteceram diretoras de uma escola pública de
texto porque acreditava formação de professores bastante co-
e foram acalorados. Léa renunciou à
possibilidade de levar qualquer texto nhecida em São Gonçalo é recheado
que a democratização só de casos exemplares da afirmação desse
porque acreditava que a democratiza-
ção só se daria a partir da vontade dos poder: a relação ambígua, de amor
se daria a partir da vonta- e ódio, com autoridades políticas; a
participantes das escolas, das suas deci-
sões e atitudes. Entretanto, comenta, manipulação das matrículas; a troca
de dos participantes das de favores com professores no acober-
um movimento com toda a aparência
de democrático foi substantivamente tamento de faltas para realização de
escolas, das suas decisões projetos fora da escola; as perseguições
solapado no seu objetivo, minado pela
própria prefeitura e pelos diretores políticas sofridas e, por certo, também
e atitudes. exercidas, mas ocultadas ao pesquisador
das escolas, que utilizaram sua lide-
rança e dispositivos de controle como que fazia a entrevista.
o Comunicado Interno (famoso CI, Mas acrescentemos os desdobra-
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mentos dos encontros dos quais Léa sindicato foi literalmente vaiado pela dades pedagógicas, sala de vídeo, uma
da Cruz participou no final da década plenária e as questões que o sindicato merenda escolar maravilhosa. Enfim,
de 1990 e que prepararam o grande levantava eram questões muito fortes estava num colégio bem estruturado.
fórum de educação no município, no e muito verdadeiras, muito verdadei- As alunas, diz ela, eram:
final de 1998. ras. Aí eu comecei a me perguntar o [...] alunas de classe média. E eu fui
que estava acontecendo. Quer dizer, formada na UFF para trabalhar com
Bom, o que aconteceu durante a pre- eu já vinha me perguntando... desde pobre, pela coisa pública, pelos filhos
paração é que muitas vezes esses de- junho, maio/junho, quando comecei dos excluídos, e dei de cara com uma
poimentos dos professores eram muito a freqüentar as tais reuniões (...) O classe média que você falava de fome,
fortes..., mas no fórum eles apareceram que acontece num município em que de questões sociais mais graves, as me-
em situações contraditórias diversas, os seus professores se colocam con- ninas passavam longe, sabe, elas iam
instigantes a meu ver, é a palavra que tra aqueles que estão representando pra Disneylândia, já tinham vídeo em
gosto de usar. Nos grupos de debates, seus próprios interesses? O que está casa, quase todas, né, o Rotary Club
as questões apareceram de uma forma acontecendo? supria quem não tinha, o Rotary Club
clara, a FFP estava tomada de pessoas, Selecionei um outro caso que tinha uma relação com os padres de lá
foi uma freqüência muito interessante, considerei muito interessante para que os garotos tinham tudo, material
mas muitos diretores não liberariam ilustrar nossa reflexão. Em nossa escolar com fartura e aí ninguém tinha
seus professores para irem ao fórum, pesquisa registramos o depoimento problema social naquela sala [risos] e
disseram que não liberariam alunos, de uma professora “perseguida” pela eu era professora de sociologia naquele
portanto se confirmando o que havia direção da escola em outra localida- curso e aí era danado para... (...) aí a
acontecido durante a preparação. Então, de do estado. Nesse depoimento fica minha aluna, Luciana, me disse assim
um dia inteiro houve discussão, no evidente como certos projetos cultu- um dia “_Professora, a senhora é tão
outro dia pela manhã houve discussão, rais e pedagógicos podem ameaçar as novinha, mas tão revoltada!” [risos].
no horário da tarde houve fechamento autoridades escolares. Quando Ilana E aí eu fiquei até preocupada, porque
do fórum com plenária final e, ali al- foi para Teresópolis ensinar Sociolo- quando você trabalha Sociologia, você
gumas coisas foram interessantíssimas. gia no Instituto de Educação local, trabalha muito [a questão da] luta
Primeiro, o enfrentamento do sindi- sua pretensão era preparar o terreno de classe, né, e aí eu fiz um trabalho
cato, enfrentamento pesado com uma para fixar residência, integrando-se com um professor de Geografia, na
carta denúncia, afirmando que aquele definitivamente tanto na escola como época, que a gente mapeou o traba-
movimento não era legítimo, que era na localidade, mas não sabia o que lho infantil. Então ele trabalhava a
um movimento colado com o poder a aguardava... Ao escolher a escola, questão do mapeamento, do que
municipal, que não era representativo, depois de concurso realizado, pensava acontecia com a cidade, a mudança
e não apenas a carta denúncia, mas encontrar nela, já que era uma escola da cidade física, espacialmente e eu
um enfrentamento frontal, pessoal próxima ao meio rural, alunas filhas trabalhava as relações sociais e como
mesmo durante a plenária final. E aí de trabalhadores assalariados. Quando isso se desdobrava dentro das escolas:
eu achei muito interessante o relato das chegou lá, praticamente no início da clientelismo, troca de vagas por voto,
conclusões e decisões dos grupos de década de 1990, sua primeira impressão e tudo aquilo aconteceu na cidade.
discussão, eles ganhavam..., eles foram era a de que estava num paraíso: classes E aí a direção da escola começou a
reduzidos, ganharam outro tom e outro de no máximo 25 alunos; possibili- perceber que isso estava acontecen-
significado nessa plenária. Esvaziaram- dade de o professor obter material do na escola, a gente começou a ter
se totalmente, muito, mas muito. E xerografado fornecido pela escola, certa influência, uma mudança da
na hora que o sindicato se confrontou um almoxarifado farto com todo o visão de mundo das meninas, estava
com o Secretário de Educação, ... o tipo de materiais necessários às ativi- muito confortável, ninguém sentia
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culpa, ninguém sentia... pergunta- administrativo contra a direção. Ia as- no início não sabia bem o que era.
va se o mundo era assim: será que sinar o ponto no Instituto, enquanto Ia às escolas, via as distorções todas.
todo mundo tem o que eu tenho? E aguardava certos papéis que deveriam Trabalhava orientando a escola para
como elas iam trabalhar para crianças lá chegar e que tardavam, mas o livro saná-las, mas, por “debaixo dos panos”,
no meio rural que, em Teresópolis, sumia. Mesmo sem dar aulas, lhe era tudo voltava ao que era antes, porque
multisseriado era uma realidade forte, exigido que permanecesse em horário não havia interesse real em resolver as
né, essas meninas iam ser professoras integral durante três dias na semana. questões identificadas. A única coisa
de classes multisseriadas, de filho de O inquérito administrativo levou três boa que diz ter usufruído com essa
peão, de filho de desempregado. Tere- anos para ser resolvido. Ficou suspensa, função foi ver o Estado por dentro e
sópolis já tinha, naquela época, 80% sem receber pagamento. Depois da compreender por que ocorriam certos
de crescimento das favelas e a gente resolução do inquérito, soube que as fatos. Afirma:
com aquela imagem de Teresópolis, coordenadoras do Instituto haviam
cidade... serrana... tudo bonitinho com sido destituídas do cargo por desvio de [...] eu passei a ver a parte interna
hortências...né, daquele sítio onde tem verba escolar. A Secretaria de Educação do estado que eu não conhecia, porque
o Didi e a Seleção Brasileira treina, chamou a professora e autorizou sua eu sempre vivi o pedagógico, eu sempre
e aí...tinha a pobreza crescendo em volta, mas sem contar os três anos em fiz o “fazer”, vivi o fazer, aí eu vi aquela
Teresópolis a passos largos, o trabalho que ficou “no limbo” como tempo de outra máquina entendi uma porção
infantil comendo solto nas confecções trabalho. Um ano depois do início de de coisas, e ficou aquele negócio de
e nas indústrias de bijouterias. A gente tanto conflito, numa assembléia de querer... bom se o meu salário não é
deu pra prefeitura um mapa disso. Só professores na concha acústica da UERJ, digno porque tem dez, vinte, só numa
que o prefeito da cidade, tinha naquela Ilana vê uma faixa com a inscrição: escola, ou mais, que está recebendo
escola o principal curral eleitoral, e a TERESÓPOLIS PRESENTE. Ouviu sem trabalhar, então meu salário nunca
coordenação da escola se reelegia e elegia, alguém chamar seu nome: vai melhorar por isso. A gente diz que
reelegia e elegia diretores mantendo tem que trabalhar 50 minutos de aula,
aquela escola como curral eleitoral e ’Ilanaaa!! Ilanaaa!!’ Aí veio a Luciana (a a escola põe 40, mas te apresenta 60,
eles começaram a saber do meu tra- citada ex-aluna): ‘Professora eu estou então é um direito do aluno que está
balho, e começaram... Já tinham uma há 8 meses dando aula para crianças sendo burlado. Então.tem professor
implicância muito grande, porque eu de 1ª à 5ª série numa escolinha lá no disso, mas ele assina ponto, atende,
tirei uma desviada de função, quando... fim do mundo... [risos] Justamente a faz atendimento,[por exemplo] ensino
a escola foi obrigada a abrir uma vaga realidade que você previa. Sem ..sem religioso, o professor é lotado na escola,
para o Estado, para Rede, a contra receber nada, professora...’. Aí eu falei mas faz atendimento na igreja dele,
gosto, e aí no ano de 1992 quando fui para ela: ‘_Luciana, você é tão novi- então nem aparece. Tem o servente
renovar... fui buscar minhas turmas nha, mas tá tão revoltada, com um que fez o concurso, mas é advogado
descobri que tinha sido colocada em ano...’ [risos, muitos risos]. Ela riu, e não pega no cabo da vassoura, só
disponibilidade. me abraçou e disse assim: ‘A senhora vai lá assinar. Então essas coisas... É
não esquece, né....’ o professor de vinte e duas horas, que
A aprendizagem para Ilana de que fez o concurso para vinte e duas horas,
“no fundo da escola havia relações muito Assim como Ilana, os técnicos edu- mas que trabalha numa instituição
familiares”, como ela diz, foi dura. cacionais que participam de atividades doze horas e fica tudo bem, até como
Procurou o gerente administrativo da dentro da Secretaria de Educação sofrem professor de primeira à quarta!
Secretaria de Educação e descobriu que com as “soluções pessoais”. Margarida, _Não está em desvio de função?
ele estava conivente com a direção da outra entrevistada, ocupou por dois Não está em desvio de função.
escola. Mesmo assim, abriu inquérito anos um cargo de controladora, que Então essas coisas foram ... porque
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para quem tinha padrinho a coisa emergência que haja na escola, eu posso diretores e professores não exercem
retornava. Então tinha um desgas- contar com eles. No início, naquela autonomia e auto- responsabilidade, os
te muito grande. Era um quadro de euforia, quando aquelas verbas saíram alunos lhes seguem o exemplo. Mães
pessoal em que tinha, vamos dizer, foi uma alforria. Eu queria fazer as e avós solteiras que voltam aos ban-
300 pessoas recebendo, assinando, 50 compras aqui, ali, aqui, ali. Aí depois cos escolares para concluir o Curso
delas você não sabia onde estavam, começaram a voltar as notas. As das Normal acabam levando os problemas
Não estavam prestando serviço dentro Casas Bahia não estavam de acordo particulares para dentro da sala de
da escola. Então quando você ficava... com o que o Estado queria. Aí fui eu aula, contando com a compreensão do
achava todo mundo, dava memorando lutar contra as Casas Bahia. Tive que professor, como atesta Suely, que tem
para cada um se apresentar, aí vinha ir para o Rio e para não sei aonde. dificuldade para avaliar seus alunos.
a Secretaria por trás, o político por Comecei a ver que eu não poderia me Como afirma Margarida, as regras
trás dava um jeitinho e continuava deslumbrar. Querer poupar demais. Eu sempre valem para os outros:
tudo como dantes, então eu não me teria que escolher bons fornecedores,
prestei àquilo. Então eu vi que eu não assim eu lucraria, eu só sairia lucrando [...] aquilo que a gente vê lá [na
podia fazer nada. para a escola. Meu primeiro processo escola fundamental] é uma réplica aqui.
de verbas geral foi super complicado. A nossa aluna de hoje, ela senta de
É inevitável que a troca de favores Eu saía comprando um tiquinho em pernas para cima, com os fundeiros
acabe extravasando os muros das escolas cada lugar, mais barato e o Estado aparecendo e pergunta: ‘O que tem?’
e que os alunos também aprendam não entendeu isso. Queria até que Ela não traz material, ela não sabe
estratégias que passem por esse caminho. eu devolvesse o dinheiro, porque eu horário de prova, não sabe que é seu
Virgínia conta, por exemplo, como comprei em uma firma cuja matriz horário de aula, ela não sabe que tem
sua indicação de diretora foi feita por era em Minas Gerais e os mapas que que trazer material xerografado, ela não
um fornecedor de merenda que lhe vendiam eram bem mais baratos do que sabe que tinha que fazer tal atividade...
exigiu, quando já havia tomado posse, aqui, mas como ficava fora do Rio de Quer dizer, completamente sem hábito,
a exclusividade na compra dos seus Janeiro eu não podia ter comprado. Aí sem atitude [de professora].
produtos. Conta ainda os conflitos comecei a perceber que estava dando Não tem hábito nenhum! E ela
que enfrentou para não atender a essa muita dor de cabeça e procurei con- acha que lá ela pode pôr o dedinho
exigência. Mas mesmo depois desse seguir fornecedores bons. Hoje tenho no nariz do professor [da escola fun-
episódio, relata como os fornecedores vários, que os professores adoram, e as damental] e a gente tenta tirar, tenta
de merenda ajudam as escolas con- merendeiras também gostam. não, agente impõe que pelo menos,
sertando material quando é preciso, ela pense, mas não fale. Porque a
até desentupindo esgoto. Como ela Virgínia optou por uma solução postura profissional do professor já
afirma: viável em meio às exigências burocráticas foi tomada, agora a dela está por vir,
e as necessidades da escola. Desistiu de ela tem que escolher o que ela quer
Isso fica uma coisa mais pessoal, mas lutar contra a corrente. Quem ainda ser. Então ela quer um aluno de seis,
em benefício da escola. Os fornecedores luta contra a corrente são os professores sete anos, pronto e acabado. E que
costumam ajudar muito a escola. Se eu das escolas formadoras, uma vez que ela fale e ele obedeça. As regras têm
fosse ao supermercado fazer a compra, os alunos reproduzem situações vividas que funcionar sempre para o aluno
talvez eu economizasse alguns reais, mas também nas escolas de ensino funda- de alfa, para elas não.
por outro lado eu perderia... Vai que mental e esperam que os problemas
eu precise de uma doação para fazer que os perturbam sejam resolvidos ou, Se para a direção das escolas as
alguma festa para os professores, ou pelo menos, amenizados pelos outros: regras valem para alguns e não para
alunos... Eles estão prontos. Qualquer pais, professores, coordenadores. Se todos, por que seria diferente com
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os alunos? Quando a Secretaria de Antes de o sistema de educação ser social, que ofereceu um modelo de
Estado criou o estágio remunerado, na criado, o que existia eram as escolas participação na vida comunitária e
década de 1990, a direção do Instituto que funcionavam nas casas dos pro- referências comuns ao que significa
Clélia Nanci elaborou alguns critérios fessores. As escolas recebiam números, educar-se, através de valores capazes
para selecionar os estudantes: que não mas eram conhecidas pelo nome do não só de se transformarem em normas
fossem repetentes, tivessem cursado docente: a escola da Dona Juracy; de comportamento, mas também de
a escola desde o primeiro ano, nunca do professor Paschoal, etc. Uma das metamorfosear direito em favor (da
houvessem ficado em dependência e primeiras coisas que se altera com a bolsa de estudo), direito em carida-
tivessem boas notas, sobretudo em construção dos prédios escolares é a sua de e assistência (uniformes, comida).
Português. O que fizeram os alunos nominação. A criação das escolas de Esses valores, no entanto, passaram
insatisfeitos, os não escolhidos? Foram formação, e dentre elas os institutos de a conviver com os valores de merca-
por conta própria à região metropo- educação, considerados então centros do, que enfatizam a competição e o
litana e conseguiram lá as vagas de de excelência formativa, não eliminou, conflito. A escola vira uma instituição
estágio, independentemente do processo sobretudo nas periferias urbanas, um maternalista, que procura, através dos
criado pela escola. A seleção caiu por modelo artesanal de formação docente, seus projetos, corrigir os abusos do
terra. O processo fugiu do controle forjado nas escolas de fundo de quintal capitalismo. O investimento feito no
da escola formadora. ou de varandas. social pelas professoras é menos cívico e
A interferência conflituosa de de- Nesses casos, a modernidade mais místico. Há fortes indícios de que
cisões administrativas sobre decisões mesclou seus referenciais aos do tradi- o significado que a doutrina católica
pedagógicas afeta dramaticamente o cionalismo. O privatismo e o assisten- teve nas décadas anteriores está sendo
cotidiano escolar. Um exemplo, dentre cialismo, como aspectos dessa tradição, substituído pela mensagem evangélica
muitos que nossa pesquisa registrou, num local que combina modernidade e das denominações protestantes mais
foi a decisão de Darcy Ribeiro de colocar miséria, foram movimentos nos quais, conservadoras.
alunos do pré-escolar freqüentando o contraditoriamente, as mulheres flu- A narrativa das professoras mostra
mesmo espaço que os da Faculdade de minenses ganharam o seu espaço e, de que existe uma resistência à moderni-
Formação de Professores da UERJ/SG. alguma forma, participaram das regras dade que não se expressa em atitudes
“Ele esqueceu, como afirmou Fátima do jogo do mercado de trabalho e dos doutrinárias, partidárias ou em ações
Cunha, que meninos de 4 anos não círculos de prestígio e poder. Ainda políticas e culturais organizadas, mas
poderiam freqüentar o banheiro dos hoje, as donas das escolas privadas gon- em práticas às vezes quase despercebidas
homens, o mesmo ocorrendo com as çalenses defendem uma educação nos do cotidiano das instituições de ensino.
meninas”. princípios do decoro, da tradição, da Vários desses detalhes foram capturados
Nossa pesquisa demonstrou que, precedência da pessoa e da família, do através das entrevistas que realizamos.
de um lado, quando o Estado está poder pessoal. Criticam o clientelismo As entrevistadas e biografadas, salvo
ausente, o privatismo e o assistencia- político, mas sabem usá-lo sempre e raríssimas exceções, praticamente não
lismo em São Gonçalo tomam conta quando necessário. Para elas é mais defendem a democracia. Defendem o
da escola, das atitudes das autoridades importante que suas escolas pareçam humanismo. Aliás, como mostrou Léa da
educativas muito imbuídas da ideologia modernas (pelo conjunto de atividades Cruz, o medo e a ausência de expressão
cristã, seja na versão católica, seja na e abordagens com relação ao usuário) das “línguas cortadas” dos professores
versão protestante. Quando o Estado do que sejam modernas. gonçalenses do ensino fundamental com
está presente, atitudes do âmbito do A cultura local impôs à moderni- quem manteve contato, denunciam
privado e do familiar atravessam as dade gonçalense, sobretudo nas déca- que o diálogo e o convencimento são
instituições, resistindo às regras que das de 1950, 1960, um ritmo ditado substituídos pelas atitudes autoritárias,
a legislação impõe. em boa parte por certo catolicismo controladoras, punitivas dentro das
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escolas, tendo na figura do diretor um sabilidade da luta pela organização da que aparece valorizado quando atende
dos seus principais orquestradores e de própria categoria profissional ou por ou se propõe a atender às necessida-
certos procedimentos, como o currí- reivindicações políticas e sociais mais des ditadas por uma prática docente
culo obrigatório, os métodos usados, o amplas. As dificuldades do cotidiano anterior e/ou simultânea à escola de
Comunicado Interno (CI) suas armas ativam nesse profissional a desconfian- formação. Cremos que seja também
de intimidação, armas que inflam a ça e ocasionam a perda do convívio tarefa da história da educação desven-
política de silenciamento instituciona- como valor, justamente o convívio tão dar esse modo de educar a partir da
lizada. A prática da tutelagem dentro valorizado nas relações familiares e de experiência prática que persiste, e é
das escolas é muito forte e solapa as vizinhança. Esse aspecto é subestimado reinventada e valorizada por parcela
iniciativas de genuína autonomia e de nas análises históricas e sociológicas, significativa de estudantes dos Cursos
construção de uma consciência crítica mas esses mecanismos vividos, que de Licenciatura, sobretudo de Peda-
e de auto-responsabilidade. distorcem a nossa compreensão da gogia, desde as cidades periféricas aos
Dentro das instituições forma- história, de quem nos tornamos e grandes centros.
doras, as resoluções das dificuldades dos sentidos que atribuímos à nos- Existe uma herança que se construiu
são sempre empurradas para os outros sa própria vida, são cruciais para a através da produção de representações
profissionais, as outras escolas do sis- compreensão do ofício. de desqualificação, primeiro do modelo
tema, a Secretaria, as gerações futuras. Ao nos debruçarmos sobre as artesanal pelos educadores liberais a
Perde-se o presente e as possibilidades iniciativas públicas de ensino, temos favor de um modelo profissional, o
efetivas de intervenção no cotidiano, já secundarizado ou ignorado que o mo- que acarretou uma resistência cons-
que entendemos que ele não apresenta delo formativo artesanal de professores tante e surda dos professores leigos
apenas o lado opressivo, a que se referia convive ainda, e fortemente, com o e mesmo daqueles já formados nas
Michel de Certeau. Poucas, dentre as modelo de formação profissional. Esse redes públicas e privadas, sobretudo
entrevistadas, revelaram habilidade para convívio nos obriga a repensar a relação das cidades do interior e das cida-
subverter as regras do jogo autoritário entre a casa e a escola, o privado e o des periféricas aos grandes centros.
através do trabalho pedagógico e/ou público, o laico e o religioso na educação Enquanto os Institutos de Educação
de organização do grupo de profes- brasileira. Na dinâmica formativa, o (criação de Lourenço Filho em São
sores e de alunos. Perde-se também modelo artesanal tem prioridade nas Paulo, consagrado pela sua atuação
o passado, justamente pela ausência áreas mais abandonadas pelos poderes como diretor do Instituto de Educação
das referências históricas do profes- públicos. Está a cargo de iniciativas do Rio de Janeiro na década de 1930)
sor, que se vê atropelado pelos órgãos particulares. Se considerarmos, hoje, passaram a ser vistos como instituições
administrativos, pela distância entre o sistema de ensino em São Gonçalo, de excelência, a marca da desquali-
a organização do trabalho desejada e o modelo artesanal é forte no que diz ficação, por comparação, atingiu as
a efetiva. Como afirmamos em outro respeito à Educação Infantil, mas já Escolas Normais Regionais e mesmo
texto já publicado (NUNES, 2002), as foi forte com relação ao Ensino Fun- as instituições privadas de ensino na
circunstâncias nas quais os professores damental. Ainda existem, se bem que maior parte dos municípios brasileiros.
trabalham apresentam especificidades, reorientadas para outro nível de ensino, Pela Lei 5.692/71, o magistério foi
mas é recorrente o parcelamento, a inúmeras escolas de fundo de quintal transformado numa das habilitações
extensão da jornada de trabalho e aguardando uma oportunidade de se do ensino de segundo grau, o que con-
a expropriação do controle sobre o institucionalizarem como escolas pri- tribuiu para descaracterizar as Escolas
ato educativo. Essas características vadas. Hoje esse modelo artesanal está Normais e os Institutos de Educação
limitam a liderança do professor à de certa forma subordinado ao modelo enquanto instituições formadoras, ao
sala de aula. Ele acaba transferindo, profissional praticado nas escolas de mesmo tempo em que a formação do
como já afirmei, para outros a respon- formação em nível médio e superior, professor primário foi elevada ao nível
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superior nos cursos de Licenciatura Franco e Vera (1995), como: a não-apli- obrigações de estudantes, o empre-
Plena. E, por último, mas não menos cação efetiva dos recursos da educação go do tempo e as tarefas necessárias
importante, a criação dos Institutos ao sistema educativo; a dificuldade da ao desempenho da função da escola
Superiores de Educação concorre com escola em acompanhar as mudanças (HUTMACHER, s.d).
as tarefas até então realizadas pelas tecnológicas e dos sistemas de trabalho; Há esperança, se os professores
Faculdades de Educação, instituição a impossibilidade de a escola dar uma tiverem no interior da escola opor-
privilegiada de formação dentre as resposta efetiva, como vinha fazendo tunidade de forjar espaços/tempos
décadas de 1970 e 19902 . em anos anteriores, às expectativas de para organizar a troca e o debate co-
Estamos em 2008 e a formação ascensão social; a falta de confiança da letivo em torno de suas práticas; se
desejável, que é a de nível superior, sociedade e, sobretudo, dos pais dos as secretarias municipais e estaduais
ainda não está universalizada no país. alunos no sistema educativo, já que construírem um tempo/espaço para
Continuamos convivendo com uma os títulos escolares perderam seu valor pensar o trabalho sobre o trabalho
formação mínima, em que os Cursos simbólico; e a massificação do sistema realizado nas escolas. O que é preci-
Normais de nível médio ainda têm um de ensino, que levou à substituição dos so romper? O modo de pensamento
papel a cumprir e continuam sendo anseios de qualidade pela improvisação substantivamente prescritivo, que
procurados nos municípios mais pobres e às respostas urgentes diante de inú- preside um rol de jornadas, semanas,
por uma população que, em muitos meras deficiências. Ou elogiamos as seminários, projetos de capacitação
casos, sem opção, não encontra vagas experiências-piloto e inovadoras quando e oficinas propostos como soluções
nas escolas públicas de formação geral existem, ou criticamos o sistema como para problemas da prática docente e
de nível médio. A profissão docente um todo. Não existe esperança de que que constituem resposta reativa aos
não é mais tão desejada pelos jovens, essas representações mudem? problemas identificados, reproduzindo
sequer os mais pobres. Como afirmei em texto recente, nesse nível as atitudes dos professores
Todos ficamos espremidos entre dois alunos e docentes são tributários das em suas instituições de ensino. Essas
discursos fortemente estereotipados: o representações e práticas que têm lu- respostas passageiras esgotam-se na
que ainda idealiza o magistério e a figura gar nas escolas sobre o que é ensinar, sua contingência e proporcionam a
do professor, enfatizando qualidades aprender e trabalhar em conjuntos ilusão de se estar produzindo uma
que remetem à ação de figuras bíblicas, humanos formalizados e hierarquiza- política, quando de fato revelam a
como Jó e sua paciência na adversidade, dos. Os obstáculos à mudança estão total ausência dela.
ou figuras cinematográficas como o instalados não propriamente em algum A lei, o decreto, ou qualquer im-
superman para superar os obstáculos agente, embora os diretores escolares posição externa, não muda a escola,
profissionais e o que aponta a ruína ainda sejam peça fundamental dentro o professor ou o aluno. O que muda
do sistema de ensino, o fracasso do das escolas na rota que pretendemos é uma atuação simultânea em vários
sistema escolar e da atuação docente impingir a essas instituições. Os obs- níveis, que assegure remuneração digna
(ESTEVE; FRANCO; VERA, 1995). táculos no cotidiano da escola estão aos docentes, estrutura de apoio ao
Às vezes essas representações se conju- nas representações dominantes e par- seu trabalho, recursos para melhorar
gam fortemente. tilhadas por professores e alunos. São as condições de trabalho e a qualidade
Essa imagem deteriorada do professor representações que cindem os saberes cultural e pedagógica dos professores;
foi construída por alguns fatores alheios curriculares dos significativos, o espa- uma gestão cotidiana respeitosa, dinâ-
à sua ação direta, como apontam Esteve, ço de trabalho e lazer, os direitos e as mica e conseqüente dentro das escolas
2
Os Institutos Superiores de Educação não são exatamente novidades. Apareceram propostos como recomendação na Conferência Regional Latino-
Americana sobre a educação primária gratuita obrigatória realizada pela UNESCO, em colaboração com a OEA e o governo do Peru, realizada em Lima
no ano de 1956, dentro de uma concepção de desenvolvimento integrado da América Latina.
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As reflexões que se seguem foram também apresentadas no texto de apresentação que escrevemos no relançamento do livro de Anísio Teixeira, Educação
é um Direito, pela editora da UFRJ, em 1996, p. 7-20.
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Cf. Hugo Lovisolo. A tradição desafortunada: Anísio Teixeira, velhos textos e ideais atuais. Rio de Janeiro: CPDOC, 1989. Ver especialmente p. 9.
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do educacional, que não submerge menos subserviente aos interesses do- tão bem sublinha Anísio Teixeira, se
ao âmbito jurídico e/ou normativo, minantes dentro do Estado. Não basta, constrói numa tática de confiança na
que é menos evidente, mas também no entanto, defender a participação. natureza humana, que se torna um
determinante na produção da educação É preciso avaliar em que condições critério orientador da ação de que nós,
e da escola. essa participação pode tornar-se rea- professores das escolas públicas, mais do
Pensar dessa outra forma nos res- lidade, e isto pressupõe a investigação que nunca, hoje, necessitamos. Afinal,
ponsabiliza mais. Também nos obriga tanto das potencialidades quanto dos um ponto importante da herança da
enquanto educadores, professores e obstáculos à participação, presentes tradição pedagógica democratizante
cidadãos a abrir a unidade escolar para tanto na unidade escolar, quanto na é a afirmação da democracia como
a participação efetiva dos seus agentes, comunidade em que está instalada. prática do governo da educação e da
dos seus usuários reais ou potenciais. Esta forma de encarar a questão se vida humana.
Exige ainda que cada escola pública apóia não apenas numa análise política,
construa um projeto de trabalho e ensino sociológica ou cultural, mas, como
Referências Bibliográficas
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São Paulo: Xamã, 2005.
DA MATTA, R. A casa & a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro: Guanabara,
1987.
DE CERTEAU, M. et al. A invenção do cotidiano: morar, cozinhar. Petrópolis, RJ: Vozes, 1986.
ESTEVE, J.M.; FRANCO, S. y VERA, J. Los profesores ante el cambio social. Barcelona: Anthropos; México:
Universidad Pedagógica Nacional. Secretaria de Educación Pública, 1995.
LOVISOLO, H. A tradição desafortunada: Anísio Teixeira, velhos textos e ideais atuais. Rio de Janeiro:
CPDOC, 1989.
NUNES, C. Apresentação. In: TEIXEIRA, A. Educação é um direito. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ,
1996.
_____. Ensino Normal: formação de professores. Diretrizes Curriculares Nacionais. Rio de Janeiro: DP&A,
2002.
_____. Das políticas públicas à história da formação docente e às memórias dos professores do Estado do Rio de
Janeiro. Niterói, 2007, 343 páginas. Relatório de Pesquisa.
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O OUTRO DAS COTAS: POLÍTICAS AFIRMATIVAS E A
RESERVA DE VAGAS NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS1.
The Other in the quote system: affirmative actions for admission in public universities
Monique Franco*
*Historiadora pela PUC/RJ e Mestre em Educação pela UFRJ. Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em
Comunicação e Cultura da UFRJ/ECO, Professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos e Membro do
Conselho Executivo e Editorial da Revista Espaço. Professora Adjunta do Departamento de Educação da Faculdade
de Formação de Professores da UERJ. Seus estudos focalizam os processos de normatização e homogeneização social e
cultural, com destaque nas críticas às supostas políticas inclusivas, contando com diversas participações em Congressos,
publicações de artigos e capítulos de livros
E-mail: mfranco@uerj.br
1
Parte deste trabalho foi apresentada ao NP 13 – Comunicação e Cultura das Minorias, do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercon (XXVIII
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação). UERJ – 5 a 9 de setembro de 2005.
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Embora não seja o foco direto deste trabalho, o tema da justiça perpassa transversalmente toda a obra de Nietzsche. Para Eduardo Melo Resende (2004),
a concepção de justiça em Nietszche pauta-se por uma perspectiva crítica ao modo como ela é concebida pela tradição metafísica ocidental. Todavia, não
se oferece, com o autor, uma resposta do que seja o justo, mas mantém-se o homem em sua incomensurabilidade trágica: o preço da luta pela superação
da alienação passa pela problematização incessante dos pressupostos culturais e morais que estruturam a vida, porque eles tendem, sempre, a pretender
alçar-se à condição de certeza apagadora de toda a multiplicidade de interesses e perspectivas, de todo o conflito, do próprio devir, ocupando o lugar e
o papel deixados pela metafísica (p.XIX).
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Essa caracterização é explicitada a partir de Mc Laren (1999), que faz uma tipologia das diferentes feições atribuídas aos discursos ditos multiculturais.
A postura assimilacionista reflete uma ideologia na qual está em jogo, para a aceitação do Outro, a assimilação dos padrões dominantes ou “normais”.
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o povo e sobre eles derramaram fé e contra a ética cristã, em A genealogia às forças básicas de compra, venda,
amor: assim prestaram um serviço à da moral (1887), que fundamentou comércio, troca e tráfico. [...] Como
vida. Foram os exterminadores que suas posições. Nesse escrito, o autor seria de esperar após o que foi dito,
colocaram as armadilhas para o povo sustentou que o cristianismo criara imaginar tais relações contratuais des-
e chamaram-lhes “estado”: sobre ele um doentio moralismo que “ensinou” perta sem dúvida suspeita e aversão
suspenderam uma espada e cem apeti- o homem a envergonhar-se de todos pela antiga humanidade, que as criou e
tes... Essa é a mensagem que vos dou: os seus instintos. Via o cristianismo, permitiu. Precisamente nelas fazem-se
cada povo tem sua própria linguagem como uma doença maligna que havia promessas; justamente nelas é preciso
do bem e do mal, que o vizinho não atacado o Império Romano com a ajuda construir uma memória naquele que
compreende. Inventou a sua linguagem da “mentira da igualdade das almas”, promete; nelas, podemos desconfiar,
própria de costumes e direitos. Mas o os homens deveriam buscar, em con- encontraremos um filão de coisas duras,
estado mente em todas as linguagens seqüência, valores que transcendessem cruéis, penosas (p. 52-53).
do bem e do mal; e tudo o que diz é a moral convencional divulgada pelo
mentira – e tudo que tem foi roubado cristianismo. Para ele a injustiça nunca Também em A gaia ciência, Nietzs-
(NIETZSCHE, 2003, p. 152). reside na desigualdade dos direitos, ela che (1998) busca elucidar a passagem
está na reivindicação de direitos iguais. histórica do castigo físico para o castigo
O que se apresenta aqui como O autor vai desenvolver, em seguida, moral, ao avançar em sua opinião sobre
“políticas da piedade” está indicado o conceito de “consciência de culpa” o nascimento da culpa.
no ensaio de Baudrillard – A transpa- ou “má consciência”, dando origem ao
rência do mal: ensaio sobre os fenômenos conceito material de dívida. Na segunda A relação de direito privado entre o
estranhos. A tese do autor remete à dissertação – Culpa, má consciência e devedor e seu credor, da qual já fala-
critica já desenvolvida por Nietzsche coisas afins –, ele afirma: mos longamente, foi mais uma vez,
(1999) com relação ao ideal ascético4 e de maneira historicamente curiosa
– “o bom é aquele que luta contra os Mas como veio ao mundo aquela outra e problemática, introduzida numa
seus desejos” – e à noção de igualda- ‘coisa sombria’, a consciência de culpa, relação na qual talvez seja, para nós,
de tais como foram concebidos na a ‘má consciência’? – Com isso voltamos homens modernos, algo inteiramente
civilização ocidental, sobretudo na aos nossos genealogistas da moral. [...] incompreensível: na relação entre vivos
forma propalada como bandeira na Esses genealogistas da moral teriam e seus antepassados. Na originária co-
Revolução Francesa. sequer sonhado, por exemplo, que o munidade tribal – falo dos primórdios
Na esteira do ascetismo cristão, grande conceito moral de ‘culpa’ teve – a geração que vive sempre reconhece
que promoveu a reordenação mono- origem no conceito muito material para com a anterior e, em especial,
teísta das noções de dívida, culpa e de dívida? Ou que o castigo, sendo para com a primeira, fundadora da
reparação, o argumento desse ensaio reparação, desenvolveu-se completa- estirpe, uma obrigação jurídica (e não
sustenta que, na contemporaneida- mente à margem de qualquer suposição um mero vínculo de sentimento: seria
de, o discurso afirmativo sobre o acerca da liberdade ou não liberdade lícito inclusive contestar a existência
Outro tem usado como estratégia de da vontade? [...] Já revelei: na relação desse último durante o mais longo
dissimulação os conflitos em torno contratual entre credor e devedor, que é período da espécie humana). A con-
do sofrimento e da vitimização. Foi tão velha quanto à existência de pessoas vicção prevalece de que a comunidade
precisamente o ataque de Nietzsche jurídicas, e que por sua vez remete subsiste apenas graças aos sacrifícios
4
Com base no Dicionário de Filosofia de Abbagnano, (1970, p.78), “[...] a palavra ascese significa propriamente exercício e, originalmente, indicou
treinamento dos atletas e sua regras de vida. Com os Pitagóricos, Cínicos e Estóicos, (VI a.C.) a palavra começou a aplicar-se à vida moral enquanto
realização da virtude que implica limitação dos desejos e renúncia. O sentido de renúncia e mortificação tornou-se, a partir daí, predominante”.
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e às realizações dos antepassados – e Sabe-se que o percurso desenvolvido últimos séculos. Elencam-se certas
de que é preciso lhes pagar isso com pelo pensamento ocidental apontou formas de sofrimento numa escala
sacrifícios e realizações: reconhece- para uma consolidação cada vez maior de vítimas válidas, que tendem a se
se uma dívida [schuld], que cresce do ideal ascético. Estar-se-ia vivendo, tornar potenciais modismos e, even-
permanentemente, pelo fato de que pois, sob a égide de uma psicologia tualmente, vítimas oficiais.
os antepassados não cessam, em sua do ressentimento, da culpa e, conse- Registros de indagações e de busca
sobrevida como espíritos poderosos, qüentemente, da busca constante de de categorizações acerca do sofrimento
de conceder à estirpe novas vantagens supostas “reparações”. existem desde da Antigüidade Clássica
e adiamentos a partir de sua força. e parecem indicar um certo caráter
[...] Os ancestrais das estirpes mais A contemporaneidade, a inexorável da condição humana, num
poderosas deverão afinal, por força da mídia e a vitimização: a questionamento e enfrentamento con-
fantasia do temor crescente, assumir captura do sofrimento tínuo da própria existência, na medida
proporções gigantescas e desaparecer do Outro em que esta evidencia, sobretudo, a
na treva de uma dimensão divina in- relação do homem consigo mesmo e
quietante e inconcebível – o ancestral O outro já não é feito para ser com o Outro.
termina necessariamente transfigurado exterminado, odiado, rejeitado, seduzi-
em deus (p.78). do; ele é feito para ser compreendido, Sofrer parece ser, acima de tudo, a
liberado, mimado, reconhecido. Depois demanda por solução de algo que afli-
E ele continua: “[...] nesse mundo dos Direitos do Homem, deveriam ser ge. Ou seja, é estreita a relação entre
cresceram e foram levados às alturas instituídos os Direitos do Outro. Aliais, sofrimento e dor, assim como entre
o conceito e o sentimento de Deus já existem: é o Direito Universal à di- solução e felicidade. Nesse ponto, vale
o sentimento de culpa em relação à ferença. Orgia de compreensão política observar que, na contemporaneidade,
divindade não parou de crescer du- e psicológica do outro, ressurreição na sociedade de consumo, a noção
rante milênios, e sempre na mesma do outro onde já não há outro. Lá de felicidade está atrelada ao mito da
razão” (p. 79). onde havia o Outro, adveio o Mesmo igualdade, e o de sofrimento, ao meca-
Ainda que de forma crítica, Freire (BAUDRILLARD, 2003). nismo de captura (BAUDRILLARD,
Costa (2000) analisa a correlação dos 1995). Esse é um gancho importan-
aspectos desenvolvidos por Nietzsche A questão da vitimização tem te para o entendimento das políticas
na Genealogia da Moral ao “advento ocupado espaço expressivo no dis- da piedade, travestidas em políticas
do vocabulário da ‘intencionalidade’, curso contemporâneo sobre a culpa. afirmativas.
‘negligência’, ‘causalidade’ e ‘res- Diversas são as abordagens e os au-
ponsabilidade’”, que justificaria, ra- tores que dedicam seus estudos a essa De forma quase ininterrupta, ima-
cionalmente, a aplicação de punições problemática. gens de vítimas distantes são mostradas
(p. 26). Amato (1990) afirma que o sofri- pela mídia. Elas passam a ser os olhos
mento e a vitimização, associados às das consciências e um drama político
No texto é dito, em outras palavras, que a questões da dívida e da culpa, tornaram- de muita audiência. Isso é novo no
contrapartida material pelo não pagamento se preocupações centrais na política e século XX, que invade o século XXI.
da dívida é substituída pela satisfação íntima na identidade moderna. Os discursos O sofrimento de estranhos, o sofri-
de fazer o outro sofrer. E para legitimar, daí resultantes oprimem e dominam a mento do Outro passou a ser parte
moralmente, a substituição feita, imputa- consciência contemporânea e a retórica importante na mídia contemporânea
se ao devedor disposições mentais como política. O autor ressalta que a questão e na retórica política, sem que, no
intenção, responsabilidade ou negligência do sofrimento cresceu numericamente entanto, se enfrente a discussão da
no ato da infração (p. 27). e se tornou mais complexa nos dois constante produção desse sofrimento
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pelo próprio homem ou sistema, nas e de forma diferenciada, bloqueia e moderno surgido paulatinamente
diversas instâncias naturais, sociais e impede a felicidade geral. ao nascimento do espaço público e
culturais nas quais se vive. A “natureza Ehrenberg (1998) argumenta, ain- indica a distinção de um modelo de
humana”, sobretudo aquela cultivada da, que há uma responsabilização5 , entendimento acerca do sofrimento
pela religião e pela moderna filantropia, direta ou indireta, por todas as vítimas do Outro e de parâmetros de justiça
nos designou responsáveis por algumas do mundo, independentemente de e moral para enfrentá-lo. Em síntese,
formas de sofrimento. Rebelamo-nos quão distantes elas estão ou estive- entre os gregos chamados pré-socrá-
contra o sofrimento sem sentido, aquilo ram de nossos interesses, influências ticos, a universalização das primeiras
que nos parece injusto e intolerável. e ações. Cria-se, assim, a idéia de que regras de moral e justiça se baseava
Ao mesmo tempo, outras formas de nós – pessoa felizes e poderosas, por em provas materiais que apontavam
sofrimento são negligenciadas e mes- força de nossos interesses ou praze- sofredores ou não sofredores6. Ou
mo negadas. res, nossos ou de nossos antepassados seja, havia uma regra que qualifica-
Atualmente, essas “escolhas” recaem – agimos mal diante de um mundo va felizes e infelizes, e isso não era
sobre as “injustiças” cometidas contra de vítimas. “problema”. A justiça não era uma
os negros, as mulheres, os homossexu- E aqui um ponto fundamental condição de distribuição. A própria
ais, os deficientes, ou ainda o terceiro para nos ajudar a refletir. O elemen- estrutura da religião politeísta, do-
mundo, percebido como um vasto to moral da noção de certo ou errado minante no período, não julgava o
território de sofrimento e vítimas. Um não foi apenas universalizado, mas, desejo e sim o sacrifício. Nesse caso,
mundo de sofrimento e vitimização sobretudo, internalizado, assumindo a justiça não fundava uma definição
sustentando o desenvolvimento dos formas ilimitadas, perpétuas de auto- de felizes ou infelizes. O monoteísmo
países ricos – contraditoriamente, responsabilidade. Parte das políticas e o cristianismo é que irão provocar
mundo esse que problematiza víti- afirmativas contemporâneas parece um outro tipo de universalização – a
mas e vitimados. ter esse caráter. consolidação da noção de sacrifício
Numa era que proclama a felicidade Na esteira do ascetismo cristão que a partir de uma política da piedade.
como meta universal, em que a feli- promoveu a reordenação monoteísta São as noções do dízimo, do bom
cidade e o bem-estar são expectativas das noções de sofrimento, culpa e samaritano, da compaixão e da uni-
oficiais da maioria, cresce a existência sacrifício, argumenta-se aqui que, versalização, através do corpo cristão,
de inúmeras ações que visam diminuir na contemporaneidade, o discurso que informam a necessidade de que
o sofrimento de vítimas potenciais. afirmativo sobre o Outro tem usado todos devem ser ajudados. Nesse caso,
Todavia, tais ações podem não estar como estratégia de dissimulação os a justiça tem o papel de fundar, de
comprometidas com o sentimento de conflitos em torno do sofrimento e marcar uma condição – a de infeliz, de
justiça. Muitas vezes, como membros de da vitimização. injustiçado, de culpado, etc., o que, de
uma sociedade que almeja estar segura Também Boltanski (1999) desta- forma anacrônica, pode apontar para
em casa e em paz com sua consciência ca a situação teórica contemporânea a impossibilidade da própria justiça,
individual, constantemente dá-se o de uma dívida ética com relação ao uma vez que a marcação de condi-
confronto com o sofrimento dos Outros, sofrimento de estranhos. Segundo ção acaba por provocar um constante
o que, acima de tudo, continuamente o autor, esse é um acontecimento adiamento da condição do Outro na
5
Inspirado em Nietzsche, Ehrenberg (1998) ressalta que a cultura contemporânea teria como marca maior a responsabilidade individual pelo sofrimento.
Aponta para o que denominou de “negatividade ética”, que definiria o que ninguém pode ser e, por conseguinte, o que se deve ser.
6
Mais uma vez Ehremberg (1998) elucida a questão quando ressalta que, anteriormente, haveria uma relação simbólico-religiosa com o sofrimento,
estabelecendo um nexo entre mal natural e falha moral. Nesse momento, aliava-se sofrimento e castigo, e a solução era estabelecida por meio do sa-
crifício e do ritual. Já na contemporaneidade, cria-se a noção de causalidade social, em que o mote passa a ser a maior responsabilidade individual ou
auto-responsabilidade sobre o sofrimento.
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mediação com a política. A solução aqui é o de que parte das políticas nacional, apoiado por liberais e pro-
das políticas de ação afirmativa parece afirmativas contemporâneas parece gressistas brancos, unidos numa ampla
ocupar, em parte, esse papel ideológico, ter esse caráter. defesa de direitos. É nesse contexto
até porque tem sido bem-sucedida, que se desenvolve a idéia de uma ação
tanto ao instigar o confronto, com o Cotas e discursos: afirmativa, exigindo que o Estado, para
suporte das diferentes mídias, como do mundo da reprovação além de garantir leis anti-segregacionistas,
ao criar alicerceis bem aceitos para o ao universo do juízo viesse também assumir uma postura
adiamento de futuras soluções7. ativa para a melhoria da população
Outro fator importante a ser con- Desde o pós-guerra, sobretudo com negra. (2002, p. 198).
siderado na obra do autor é o fato de o surgimento do Estado de Bem-Estar
que a estrutura básica da política da Social e com a criação de diferentes or- Passadas mais de quatro décadas
piedade pressupõe uma transferên- ganismos internacionais como a ONU e de experiências com as políticas
cia que é, em si, virtual – um feliz a UNESCO, entra em pauta a noção de afirmativas, os EUA podem ser vistos
olhando um infeliz. Instaura-se um remediar as desigualdades e sofrimentos, como referência no assunto. Outras
espetáculo do sofrimento, em que a princípio deflagrados pelo conflito experiências semelhantes ocorreram
não há ação política possível, e sim mundial e, em seguida, pela política em vários outros países da Europa
seu constante adiamento, quando neocolonialista ainda vigente. Ocidental, assumindo formas e ações
trabalhamos relacionando piedade e A esse movimento se seguiram, na diferenciadas.
justiça. O universal que está posto é década de sessenta, diferentes pleitos O termo, já repleto de ambigüi-
a condição determinante do Outro reivindicatórios de igualdade – como dades e contradições, chega ao Brasil
como sofredor e infeliz, indicando, no o dos negros, das mulheres, dos ho- no bojo do processo de redemocrati-
máximo, as causas desse sofrimento mossexuais –, além de críticas culturais zação iniciado na década de oitenta.
e as nossas responsabilidades frente oriundas de análises antropológicas que O sistema de cotas ou a chamada
a elas. Cria-se, assim, uma idéia de então se firmavam, dando lugar a uma reserva de vagas, mecanismo já uti-
responsabilidade moral ativa (interesse) reflexão acerca do caráter hierarquizante e lizado em outros países, a princípio
ou passiva (omissão), em que causar etnocêntrico das categorizações literárias, visa oportunizar acesso ao ensino su-
sofrimento é não evitar o sofrimento! artísticas, religiosas, lingüísticas, etc. É perior público aos segmentos menos
Ou seja, uma não-ação é condição de nesse mesmo período que surge, nos favorecidos e excluídos da população
possibilidade de um não-acontecimento, Estado Unidos, o termo positive action (que aqui têm sido classificados com
indicando, assim, uma tendência con- como resposta ao problema segregacio- a polêmica categoria de “carentes”) e,
temporânea de colonização do futuro nista. Como afirma Moelhlecke: especificamente, aos que se autode-
e sua virtualização. nominam negros ou pardos, posto
E aqui outro ponto fundamental Nos anos 60, os norte-americanos que esse é considerado, também, um
para nos ajudar a refletir. O elemento viviam um momento de reivindica- segmento tradicionalmente limitado
moral da noção de certo ou errado ções democráticas internas, expressas em termos de mobilidade social, em
não foi apenas universalizado, mas, principalmente no movimento pelos função de sua origem estar marcada
sobretudo, internalizado, assumin- direitos civis, cuja bandeira central era a pelo processo de escravização.
do formas ilimitadas e perpétuas de extensão da igualdade de oportunidade É importante citar, também, o es-
auto-responsabilidade. O argumento para todos. No período, começam a se tudo de Thomas Sowell (2004) acerca
afirmar como uma das principais forças do efeito das ações afirmativas e da
atuantes, com lideranças de projeção adoção de cotas na Índia, Malásia,
7
Aqui se pode citar a questão da necessidade concreta de aumento das vagas nas Universidades públicas e a adoção da política de cotas como contraponto
de adiamento.
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“chance diferenciada”, precisam mos- têm conseguido seu lugar na sociedade cartas, 12/11/2004)
trar que são “merecedores” de tanta com lutas e sacrifícios. (O Globo, cartas, Vamos combinar assim: eu sou a fa-
“piedade”. 29/05/2004) vor da reserva de vagas por N razões
Vale observar que as reportagens • As cotas, facilitando artificialmente e você pode ser contra pelas mesmas
foram selecionadas e aqui transcritas o acesso à universidade, criarão mais razões. (Folha de São Paulo, cartas,
sem a preocupação cronológica ou desigualdade e frustração. E a culpa 14/10/2004)
de posicionamento. O objetivo foi, será do racismo dos brancos. (O Globo, Não preciso dessas migalhas que caem
sobretudo, demonstrar que o deba- artigo, 20/04/2004) da mesa dos banquetes. (O Globo, car-
te parece circular e esbarrar nas suas • Temos esperança de essa lei um dia tas, 22/09)
próprias contradições. Vejamos alguns não será mais necessária. (O Dia, artigo, Essa luta por benesses não contribui
trechos que, “contra” ou “a favor”, pa- 21/05/2004) para valorizar o esforço e o sacrifício que
recem constituir-se da mesma origem • Depois de conceder, que político se todos os negros e outras raças fizeram.
conceitual: dispõe a retirar algum benefício? (O (JB, cartas, 28/06/2004)
Globo, artigo, 29/06/2004) As cotas não resolvem o problema
• Se o governo está pensando em • Quem chega a Universidade é por da marginalização dos negros, vítimas
punir os atos racistas, deve começar mérito e não por canetada. (O Dia, da maior violência contra uma etnia
punindo a si mesmo. (O Globo, cartas, cartas, 28/10/2004) em todos os tempos. (Folha Dirigida,
25/03/2004) • Os estudantes negros não pre- cartas, 15/06/2004)
• No momento da inscrição, o candidato cisam de esmolas. (O Globo, cartas, Não creio que eles estarão preparados
será fotografado. Portanto, o candida- 18/03/2004). para agarrar essa oportunidade. (O
to pardo terá de se dizer obrigatoria- • Não adianta fingir uma igualdade Dia, cartas, 28/10/2004).
mente negro. (O Globo, reportagem, social que não existe, inserindo pessoas
20/03/2004) despreparadas nas Universidades. (O Como se pode observar, mistu-
• No caso de dúvida, o candidato deverá Globo, cartas, 31/11/2004) ram-se, lado a lado, pressupostos de
cumprir um período de quarentena, sem • Como se nota, a lei maior não deixa vitimização, de sacrifício, de culpa,
expor-se a raios solares. (Folha Dirigida, margem para ações discriminatórias de reparação.
reportagem, 28/04/2004) travestidas de ações afirmativas. (O Com isso, pretende-se sugerir que
• Os negros acabam sendo vítimas de Globo, artigo, 05/03/2004) a contemporaneidade parece estar-se
um preconceito dissimulado. (O Globo, • O tema da “inclusão social” presta- movendo num domínio de uma “su-
artigo, 03/10/2004) se a medidas populistas, que podem pramoral”, em que não há mais certo
• Mal comparando, obter justiça social acabar prejudicando exatamente os ou errado, justo ou injusto, já que se
na entrada da Universidade, é como potenciais beneficiados pelo sistema. pode observar uma paulatina transfe-
tentar maquiar o Frankenstein. Ba- (Veja, artigo, 28/04/2004) rência das conseqüências das ações dos
tom, ruge e pó de arroz, não conse- homens frente ao seu destino (VAZ,
guiram reduzir sua feiúra. (Veja, artigo, Além de vários outros exemplos, 1997). Ações desejadas ou indesejadas
24/05/2004) os seguintes fragmentos de cartas pa- são atreladas a noções de autocontro-
• As ações afirmativas são políticas recem sintetizar os pressupostos des- le, e a questão moral parece agora se
voltadas para um problema específico critos aqui: concentrar exatamente naquele que
que é a história da discriminação dos perde o controle, naquele que perde
negros. Taxá-las de antidemocráticas Talvez estejamos utilizando o princípio a oportunidade.
equivale transformar a vítima em réu. da homeopatia e combatendo o veneno Beck (1992), traçando um diag-
(O Globo, artigo, 02/04/2004) com pequenas doses do próprio veneno nóstico sobre a contemporaneidade,
• Ao longo da história, as minorias que promove a doença. (Folha Dirigida, aponta algumas questões elucidativas
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ATUALIDADES EM INES
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para este trabalho. Segundo o autor, uma moral de audiência, marcada pelo
o processo intenso de individualiza- artifício, ou moral da exterioridade, em
ção em curso na contemporaneidade que o esquema meta-histórico promove
pode ser identificado em diferentes a interiorização da regra moral. Ou seja,
instâncias de crise, como a crise das no monitoramento do comportamento
relações de trabalho, a crise da família considerado bom ou ruim, pode-se
nuclear ou mesmo a própria crise da traçar uma passagem importante que
ciência e da razão, gerando com isso distinguiu nossa entrada na moderni-
outros tipos de “causa pública”. Mais dade: a relação entre exterioridade e
uma vez, as políticas afirmativas seriam interioridade. No momento em que
emblemáticas dessa tendência. a exterioridade preponderava, havia,
Ou seja, parece estar havendo uma a princípio, respeito e equivalência na
mudança na justiça ou na lógica da gestão da imagem do Outro. Isso quer
distribuição – mais especificamente na dizer que os laços sociais eram estabele-
lógica como a questão da igualdade vem cidos a partir de práticas de visibilidade,
sendo trabalhada nas causas sociais. E práticas de crenças. Na passagem para
esse parece ser o ponto central desta uma moral interiorizada, amplia-se a
análise. Em síntese, a modernidade gestão da audiência, da qual ninguém
trabalharia com a idéia de distribuição mais escapa. É o grande golpe do ideal
de bens calçada nos conflitos sociais. Já ascético: eu internalizo o Outro – o
a modernidade tardia ou reflexiva parece meu próprio sacrifício.
movimentar-se a partir do conceito de E assim seguimos sofrendo. Cabe
distribuição de “mazelas”, ou seja, de a pergunta de Nietzsche (1999): “Em
distribuição de riscos (LUHMANN, que medida pode o sofrimento ser com-
1993). É sobre esse novo enfoque que pensação para a dívida?” (p.45)
parece estar fundamentada grande parte Por último, cabe frisar que, a des-
dos discursos e das ações das políticas peito das críticas aqui desenvolvidas,
afirmativas. tem-se por princípio lutar por me-
Ou seja, perdemos aí o risco do lhores condições de vida, de renda e
aleatório, a possibilidade concreta do acesso aos bens culturais. No caso das
exercício da alteridade e promovemos políticas ditas inclusivas, caberia não
uma homogeneização do Outro e sua desistir da tarefa de transformar as
transformação em mesmo – agora pa- condições materiais que reproduzem
dronizado em sua suposta afirmação as desigualdades. No caso específico
de identidade diferenciada. das cotas, seria importante indagar,
Baudrillard (1990), em sua crítica para além do que foi problematizado
ácida acerca das estruturas mentais e aqui, qual o papel e o lugar conferido
sociais do homem contemporâneo, hoje ao ensino universitário.
indaga: “mas onde está a alteridade?”
(p.131).
Assim, indica-se, neste ensaio, que,
no jogo da reputação da cultura oci-
dental contemporânea, toda a moral, é
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ATUALIDADES EM
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ASSISTENTE EDUCACIONAL EM LIBRAS: O SUJEITO
QUE BURLOU O CONTROLE
The Educational Assistant in the Brazilian Sign Language: the subject that has deceived control
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1
I“...as expressões monitor e consultor são empréstimos que fazemos de outras realidades acadêmicas que no momento nos auxilia na denominação desse
trabalho, mas que no futuro poderão ser modificadas, se necessário ou mesmo desaparecerem dando lugar a educadores surdos capacitados na prática
e/ou formados academicamente” (LEITE, 1997).
2
Com a finalidade de “(...) construir um trabalho de consultoria em LIBRAS no INES, e por não se conhecer nenhum registro, teórico ou prático até a
presente data onde pudéssemos buscar subsídios para sua implantação” (LEITE, 1997).
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língua – no caso o monitor surdo – se idéia de que só os “[...] Surdos po- como segunda língua ter ocorri-
faz imprescindível tendo em vista que, dem pretender utilizar uma verdadeira do anteriormente à divulgação dos
segundo Flores, Baptista e Alvarenga Língua de Sinais” (ROMAND, 2003, PCN, enfatizando, porém, que não
(2004), alunos surdos ingressos na p. 13). havia nenhum privilégio neste fato,
fase inicial do Ensino Fundamental Outro fato relevante é que o campo somente o mérito do cumprimento
apresentam formas diferenciadas de de trabalho do INES abrange a área do dever.
expressão, estabelecidas no ambiente da surdez, e desde 1997 o projeto Neste contexto significativo de
familiar. pedagógico se pauta em uma visão reconhecimentos, o monitor surdo
Isto é significativo, visto que “a sociointeracionista, abordando os do INES, que atua principalmente
interação com membros mais maduros “conhecimentos de mundo, textual na construção de conhecimento de
da cultura é que vai provocar o salto e sistêmico” que se firmaram com a mundo, ficou conhecido como “[...]
qualitativo para o pensamento verbal” oficialização dos Parâmetros Curricu- um profissional surdo contratado pela
(OLIVEIRA, 1993, p. 47). lares Nacionais de Língua Portuguesa escola que atua junto aos professores
A comunicação que ocorre ge- (PCN/LP, 1998) no ano posterior. e alunos, favorecendo a interlocução
ralmente entre criança surda e pais Quanto ao ensino de segunda língua, adequada, em LIBRAS, no momento
ouvintes são “recursos compartilhados também há menção no PCN de Língua da aula [...]” (FAVORITO, 2000, p.
entre ambos, não compreensíveis nem Estrangeira. 14).
pelos falantes da língua oral nem pelos A convivência entre comunidades locais De acordo com a base teórica, essa
usuários da Língua de Sinais da co- e imigrantes ou indígenas pode ser interlocução é adequada, pois Rego
munidade da língua local” (SOUZA, um critério para a inclusão de deter- (2002) relata que, segundo Vygotsky,
1998, p. 69). Esse tipo de comunicação, minada língua no currículo escolar. mediante oportunidades de diálogo, o
no máximo, se torna compreensível Justifica-se pelas relações envolvidas adulto (neste caso, um Surdo que tem
no círculo familiar. nessa convivência: as relações culturais, a LIBRAS como a primeira língua)
A deficiência lingüística em LI- afetivas e de parentesco. Por outro interpreta, atribui significado aos gestos,
BRAS de professores que atuam com lado, em comunidades indígenas e posturas, expressões, como também
alunos surdos3 é notória. Com efeito, é em comunidades de surdos, nas quais insere a criança no mundo simbólico
“importante ressaltar que os professores a língua materna não é o Português, de sua cultura.
de Surdos também são ou deveriam justifica-se o ensino de Língua Por- Assim, ao interagir e dialogar com
ser intérpretes de LIBRAS” (TESKE, tuguesa como segunda língua. (PCN, os membros mais maduros, a criança
2003, p. 101), pois testes comprovaram 1998, p. 23) aprende a usar a linguagem como ins-
que “a mensagem chegava ao Surdo trumento de pensamento e meio de
deturpada, o que gerava conflitos e No documento da equipe de Lín- comunicação. Torna-se possível uma
incompreensão entre os agentes envol- gua Portuguesa do INES (11 de julho melhor qualidade na discussão de seus
vidos no diálogo” (idem, p. 100). de 2000), enviado à Direção-Geral, à conhecimentos e uma categorização
Portanto, justifica-se a preocupação (DETEP) e ao (COAPP), com vistas de conceitos em primeira língua com
com a formação e o aperfeiçoamento de aos orientadores pedagógicos e suas um igual, o que ocorre com qualquer
intérpretes e de professores intérpretes, equipes, comentou-se a construção criança.
que são alternativas na educação dos da hipótese de o ensino de Português
surdos. Por outro lado, é coerente a
3
Em concordância com Sacks (1999), foi utilizado o termo Surdo (com S maiúsculo) para enfatizar o indivíduo pertencente a um grupo lingüístico e
cultural que possui particularidades como a língua, o pensar, o agir etc., e não apenas os aspectos biológicos ligados à surdez.
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de que “a LIBRAS é capaz de levar a) monitor surdo: profissional com f ) intérprete da área da surdez:
informações completas dentro de um formação de Ensino Médio, modelo profissional ouvinte que faz a inter-
contexto significativo, dando acesso de língua e identidade, que trabalha pretação em Libras para o português e
ao mundo cultural e possibilitando no INES com o professor em sala de vice-versa. Essa profissão foi reconhe-
entendimento imediato e amplo” aula, em horário determinado, favo- cida ao final do semestre de 2005. O
(NOGUEIRA, 1998, p. 12). recendo a interlocução adequada. Seu intérprete é formado por instrutores
No decorrer do texto, a autora relata trabalho tem ênfase no conhecimento surdos; em alguns casos, pelos agentes
que o projeto ocasionou diferentes de mundo, podendo também abranger multiplicadores que são monitores do
reações por parte de profissionais áreas do conhecimento textual e/ou INES.
ouvintes, mas é interessante focar sistêmico da segunda língua, ou seja,
a seguinte afirmação: “valorizamos Português escrito, mediante conceitos Em consulta a dicionários de
o surdo quando um deles passou a negociados em LIBRAS; língua portuguesa, o monitor, entre
fazer parte da equipe” (NOGUEIRA, b) agente multiplicador de LIBRAS outros conceitos, seria “aquele que dá
1998, p. 15). (FELIPE, 1998b, p. 65): Surdo que, [...] lições. [...].” Entenda-se lição como:
Nessa época, nesse determinado mediante o convênio FENEIS/MEC, matéria; tema; aula. Com a definição
contexto, o professor trabalhava com capacita e instrumentaliza Surdos para desses termos, a meta é afastar possíveis
os alunos exercícios oro-faciais, mas o atuarem como instrutores de LIBRAS mal-entendidos sobre o profissional
monitor surdo desse evento, embora em todo o Brasil. É imprescindível alvo desta pesquisa, visto que não se
bem oralizado, sempre usava LIBRAS mencionar que entre os ministrantes trata do “monitor” citado por Maineri
e nunca falava com as crianças. capacitados para tal estão monitores (1998) como um aluno explorado. O
Entretanto, esse não foi o trabalho do INES (SECAF); termo “instrutor” indicado naquele
inicial, pois o ex-monitor Alex Curione c) professor surdo do INES: traba- contexto é o profissional que mais se
(2001) relata que ainda como aluno lha com os alunos surdos, utilizando a aproxima do monitor surdo abordado
fez parte de um grupo de estudos com Língua de Sinais em aulas de História neste trabalho.
as professoras Wilma Favorito, Regina e Gramática. Há no INES ex-moni- Outrossim, o monitor surdo não
Augusta e Silvia Pedreira, em 1994. tores que se formaram professores e equivale a “auxiliar/estagiário”, um “as-
As questões levantadas e amadurecidas quiseram mudar de atuação; sessor” de quem o professor se serve
deram origem ao projeto de consul- d)monitor surdo contador de his- permanentemente, como se referem os
toria e monitoria. Quando o projeto tória: trabalha com os professores da artigos 133, 134 e 135 do capítulo 3,
se tornou oficial, cabe esclarecer que biblioteca, favorecendo a interlocu- concernente à formação do profissional
esse lugar foi ocupado por sujeitos que ção adequada ao contar histórias em surdo, no documento Que educação
possuíam o Ensino Médio, e o termo primeira língua; nós surdos queremos, elaborado pela
monitor, segundo Leite (1997), teve e) assistente educacional: nomen- comunidade surda a partir do pré-
como empréstimo outras realidades, clatura sugerida por profissionais da Congresso ao V Congresso Latino-
conforme já mencionado. instituição para os monitores surdos Americano de Educação Bilíngüe para
Assim, faz-se necessária uma melhor do INES, na época do andamento Surdos, realizado em abril de 1999, no
elucidação da definição dos termos e desta pesquisa. Mas, na realidade, essa salão de Atos da Reitoria da UFRGS
funções que circundam este contexto, denominação não é correntemente – Porto Alegre.
para que seja possível iniciar uma dis- empregada, nem nos contratos dos Em nome da Federação Nacional
cussão sobre o sujeito monitor surdo profissionais, apesar do status adqui- de Educação e Integração dos Sur-
que atua no INES. rido com o surgimento do curso de dos (FENEIS), que é filiada a World
Encontram-se os seguintes termos capacitação para monitor, digo, para Federation of the Deaf, o documento
neste contexto: assistente educacional em LIBRAS; Que educação nós surdos queremos foi
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de 1995, ocorreu a primeira reunião engajados em filmagens de Clássicos educacional bilíngüe e pela aborda-
de pais, na qual Paulo André Bulhões da História, parte da Cultura Mundial, gem sócio-interacionista” (Idem). O
expressou que “[...] o mundo dos com adaptações para a Comunidade seu processo metodológico é mediado
ouvintes e dos Surdos não é sepa- Surda. pelo “par mais competente com os
rado, sendo a diferença os Sinais” Paulo André, além dessa ati- alunos” (Equipe Noss, 2005a, p. 59),
(NOGUEIRA, 1998, p. 15). E con- vidade, participava do NOSS – um neste caso o Surdo.
cluiu: “[...] Eu quero ver o futuro das projeto de Educação em Saúde, sob A coordenadora Regina Almeida
crianças melhor, por isso estou aqui” a coordenação da professora Regina relata, em entrevista, a crença de “que o
(Id., ibid.). Almeida, cujo foco é “a inclusão social que mais seduz os alunos a procurarem
Nesse mesmo evento, ao tratar através da acessibilidade e eqüidade a orientação do NOSS seja a presença
da capacitação profissional, a coor- nas áreas da educação e da Saúde dos profissionais Surdos Capacitados
denadora expressou que era primordial contribuindo assim, à cidadania e à e a utilização de material didático-
os professores ouvintes conhecerem emancipação da pessoa surda” (AL- informativo em Língua Brasileira de
propostas bilíngües, e o monitor “ser MEIDA; FERRARI, 2003, p. 59). O Sinais” (Idem).
engajado no processo de treinamento NOSS atende o Ensino Fundamental e Alex Curione de Barros
em serviço, já que não tem formação Médio do INES. Consolidou parcerias Ao ser indagado sobre como che-
de professor” (Idem, p. 16). Muitas para o ano de 2006 com o Centro gou ao trabalho de monitoria, Alex
vezes o monitor pode estar em um Municipal de Saúde Silveira Martins e comentou que em 1994 participava de
lugar de professor, mas vale ressaltar o Curso de Medicina da Universidade um grupo de estudos com a professora
que esta não é a sua formação. Federal Fluminense. Há ministração Wilma Favorito (Língua Portuguesa),
Em Brasília, no ano de 2001, de palestras sobre sexualidade e surdez Silvia Pedreira (História), e Regina
houve um curso para capacitação de no componente curricular “Saúde e Augusta (Biologia). Esse trabalho
instrutores e agentes multiplicadores, Sociedade.” deu origem, após amadurecimento
que reuniu 76 Surdos de todos os es- Acrescente-se que o NOSS firmou dos termos abordados, a um projeto
tados do Brasil, para estudar a nova acordo de cooperação técnica com o de consultoria. Quando o projeto se
metodologia de ensino que vem sendo Instituto de Bioquímica Médica/IBQM tornou oficial, Alex já havia-se forma-
desenvolvida pelo grupo de pesquisa da Universidade Federal do Rio de do. Inicialmente foram contratados
de LIBRAS/FENEIS. Janeiro. Esse acordo objetivava a cria- três Surdos (Paulo André, Leandro e
Em um relato desse curso, destaca- ção e implementação de “Cursos de Nelson Pimenta) para a monitoria.
se: “As aulas foram ministradas pelos Férias” para os alunos surdos do En- Em 1997, houve uma nova contra-
professores surdos: Paulo André Martins sino Médio, estágios em laboratórios tação para preencher duas vagas (Alex
Bulhões, Myrna Salermo Monteiro e as de pesquisa científica, bem como a e Heloise).
ouvintes Emeli Marques Leite e Tanya criação e implementação do curso de Sobre o trabalho de monitoria
Mara Felipe” (Curso de Capacitação, Técnico de Laboratório, destinado a que desenvolveu com alunos e pro-
2001, p. 101). jovens surdos do Ensino Médio. fessores do INES, Alex relatou que
Tornou-se comum o envolvimento Segundo Almeida & Ferrari (in era um trabalho muito importante,
dos monitores em diferentes proje- Equipe Noss, 2005b), esse projeto pos- feito diretamente com os alunos sur-
tos. No decorrer desta pesquisa, os sui duas vertentes: educação e saúde, dos, propiciando a compreensão em
monitores surdos estavam também sendo fundamentado pela “filosofia
4
BARROS, Alex Curione. “É meu desejo que haja reconhecimento da surdez e um grande desejo por nossa 1a língua que é a de sinais.” Revista Espaço
– Informativo técnico-científico do INES, Rio de Janeiro, n. 16, p.60-62, 2001.
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“[...] são construções culturais, internalizadas pelos indivíduos ao longo de seu processo de desenvolvimento. [...] significados que ordena o real em
categorias” (OLIVEIRA, 1992, p. 28 apud REGO, 2002, p. 76).
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(os níveis de organização do sistema os discursos em sala de aula são estru- [...] fenômeno de dimensão cultu-
lingüístico: lexical, morfológico, sin- turados no cérebro dos alunos, pois ral. É produzida em sociedade, pode
tático e fonético-fonológico). cada um armazena suas informações ser vivida, produzida e ampliada na
Mediante este fato, é reconhecido o de acordo com suas categorizações, o escola. [...] Produção de si própria,
valor de um igual, no caso o monitor seu poder de apreensão, e não pelo produção de relações afetivas e cog-
surdo, quando atua junto aos alunos poder de expressão do professor. nitivas, produções de cultura, que ao
e promove a interação, discussão e Contudo, pode-se concordar com mesmo tempo a circunda e atravessa.
formação da identidade, por meio do a idéia de que a apreensão de um sig- No seu sentido mais óbvio possível,
discurso em primeira língua. nificado não se faz de forma súbita, pode-se entender pensamento como
Sendo assim, o monitor surdo é mas gradual. Isto evolui na medida possibilidade de estabelecer relações,
de grande importância não só para em que o indivíduo se desenvolve e nexos de significação, de imaginar,
a família, mas para toda a sociedade interage dialogicamente com outros entender e se perguntar (GOLDBA-
“[...] por possibilitar que a criança iguais, pois as palavras, segundo Veras, CH, 1995-6, p. 24).
surda se identifique, ou pelo menos somente ganham valor pela significa-
reconheça, num surdo mais velho, uma ção sintática: Segundo Hoffmeister (1999), as
pessoa que não está marginalizada, que crianças surdas, por serem filhas de
pode, normalmente, construir por si [...] no jogo de presença e ausência, um pais ouvintes, possuem poucas opor-
uma forma digna de independência.” elemento substitui o outro e o desloca; tunidades de se comunicarem e desen-
(SKLIAR, in Investigando na Primeira o elemento substituinte invoca o outro, volverem naturalmente a linguagem,
Língua de Surdos – NUPPES – edital substituindo-o. [...], a criança acede ao ainda mais quando entram tardiamente
04/2000). Então, o Surdo adulto que símbolo, participa de uma atividade na comunidade surda.
ocupa o lugar de par mais competente gramatical que permitirá sua introdu- Dessa forma, acredita-se que o
em primeira língua, (des)marginaliza- ção na ordem simbólica, deixando-se progresso das crianças
se. capturar por ela. A função simbólica
O monitor “[...] será ainda o ins- é inseparável do discurso, na medida “puede ser guiado con éxito a través
trumento de formação do professor em que nele fazem sentido as regras de una interacción con otro miembro
ouvinte, na medida em que estará sociais, os interditos, as promessas, competente de su cultura, por ello la
trazendo novas metodologias, como as crenças; e em que a criança, por interacción social es fundamental para
o uso e a transmissão do conhecimento sua fala, enquanto acontecimento de toda comunicación humana (hablada
através da língua de sinais” (Idem.) língua, nela se torna sujeito. (VERAS, y escrita); es universal y aplicable a
e negocia com o professor ouvinte o 1998, p. 20) todos los lenguajes existentes” (HO-
sinal apropriado para um determinado CEVAR, 1999, p. 83).
contexto (fato freqüente no INES). Usando a linguagem em diferentes
Outrossim, tem-se consciência situações e contextos, aos poucos ela evo- Pensamento e
de que cada Surdo como educando lui junto com o próprio significado da Linguagem
é único, portanto “[...] mesmo em palavra. Assim, linguagem e pensamen-
uma turma de crianças surdas, jamais to vão-se transformando da infância à No diálogo em primeira língua,
encontraremos sujeitos iguais por serem idade adulta. os conflitos na comunicação podem
surdos. Eles possuem história, meio Alguns esclarecimentos são pertinentes ser diminuídos, possibilitando ao
familiar, sexo, raça, cor, religião, lín- quando se menciona o tema linguagem aluno tomar uma posição discursiva
gua, situação econômica, identidades no trabalho com o surdo, pois um leque frente a um conhecimento, visto que
diferentes” (SKLIAR, 1998, p. 11). de questões é suscitado; portanto, aqui a os conceitos podem ser negociados.
Com efeito, não há certeza de como linguagem deve ser entendida como: Oliveira (1992, p. 28 apud REGO,
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Um dos monitores resolveu fazer prova para gari, por necessidades financeiras.
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formação de monitores [...]”, sendo ao lado dos ouvintes, como, para que, fundado sobre uma idéia clara e que
exigida a colaboração da União. E por que e o que ensinar, dentro da assim, [...] somos cinco ou seis vezes
o nº 22 – “[...] Incentivar, durante filosofia educacional bilíngüe. tentados a refazê-la” (SAUSSURE,
a década, a realização de Estudos e Além disso, não se pode descar- 1978, s/p)
pesquisas, principalmente pelas ins- tar a possibilidade da presença desse Termos como monitor, adjunto,
tituições de Ensino Superior, sobre profissional em diferentes espaços, assistente e outros podem parecer
diversas áreas relacionadas aos alunos como Museus, Centros Culturais, similares, em consulta ao dicioná-
que apresentam necessidades especiais entre outros. rio, mas não se prestam a fornecer o
para aprendizagem”, também sendo Tendo em vista o que foi exposto, é esclarecimento adequado. Para uma
exigida a colaboração da União. possível compreender que a nomencla- melhor organização administrativa,
Dessa forma, ganha força a idéia de tura “monitor surdo” não explica quem a direção denominou assistente edu-
que, mais que uma Alternativa Educa- é ou deixa de ser esse profissional, o cacional em LIBRAS o sujeito que
cional, esse pode vir a ser um agente que gera mal-entendidos. Portanto, é ocupa esse lugar.
multiplicador, ou seja, um formador notório que uma nova nomenclatura Quanto a esse dado, esta pesquisa
de outros sujeitos surdos, mediante se faz necessária. preferiu não discorrer, mas sugere que
“meios de assistência”, pois, mesmo Ao se focalizar o tema nomen- se mude o caminho. Ou seja, o lugar
para os Surdos que utilizam a língua clatura, em vários momentos com e o sujeito existem; então, que a no-
como natural e são envolvidos na sua Paulo André Bulhões, Leandro Elis menclatura surja mediante LIBRAS,
comunidade, isso se faz necessário, “pois Rodrigues, Heloise Gripp Diniz e Alex para que seja traduzida posteriormente
ninguém nasce pronto” (VIDEIRA Curione Barros (surdos que atuam para o português.
CONTARATO, 2003). no Ensino Fundamental da Insti- Dessa forma, pode ser que na in-
Com efeito, o Surdo que partici- tuição), foi percebido que a procura dagação Que sujeito é esse? a palavra se
pa da educação do mesmo, com um dessa denominação especial remete à torne óbvia e consiga esclarecer logo
lugar delimitado, no caso como moni- reflexão quanto ao significado de uma a princípio “quem ele é, ou o que
tor/assistente educacional, conquista palavra, pois “quanto mais clara for, ele não é”, sinalizando o lugar que o
um espaço de forma social, histórica e mais inexprimível em lingüística ela se sujeito ocupa.
política. Isto porque, com uma visão torna, porque acredito que não exista
sociocultural própria, reflete e constrói um só termo nesta ciência que seja
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disciplinas de conteúdos específicos licenciaturas, a Faculdade manteve o sino do estado e nos municípios de
com as pedagógicas. Estas condições Estágio Supervisionado I a cargo do São Gonçalo, de Niterói e do Rio de
caracterizam a FFP como um espaço DEDU, focalizando, em sua ementa, Janeiro, bem como em instituições
único, por ser voltada exclusivamente um estágio direcionado para as práticas que desenvolvam projetos educativos.
para formação de professores e pos- docentes. Essa proposta nos permite Nossa experiência tem-se voltado para
sibilitar experiências inovadoras na continuar e ampliar nosso princípio a vivência com alunos dos diferentes
área, dentre as quais se insere a do formador para além da prática docente cursos oferecidos, acompanhando suas
presente relato. na escola, contextualizando os espaços práticas e reflexões e pensando em
Quando da reformulação dos seus educativos e divulgadores de cultura, conjunto caminhos para o estudo da
cursos de licenciatura, atendendo à democratizando a aprendizagem, como formação de professores, em especial
demanda da LDB, em 1996, que previa sustenta Morin: em São Gonçalo. Temos por objetivo
trezentas horas para a carga horária refe- consubstanciar a formação docente
rente à Prática de Ensino, a FFP/UERJ, [...] não há uma política imediata a considerando as diversas dimensões
nos seu trabalho interno de debate entre ser posta em prática, mas sim a ur- com que as práticas educativas se
os departamentos, decidiu dividi-la gência de uma tomada de consciência expressam na sociedade, ou seja, os
em Prática de Ensino I, II e III. Para política da necessidade de trabalhar modos de pensar, sentir e agir dos
a primeira fase, responsabilidade do por uma democracia cognitiva (2002, professores no movimento constante
Departamento de Educação (DEDU), 1971). da sua formação.
definiu em noventa horas-aula a carga Atualmente a FFP/UERJ tem em De maneira geral, nos cursos de
horária voltada para o conhecimento e média 2.700 alunos inscritos nos seus licenciatura, temas ou metodologias
vivência do processo de aprendizagem. sete cursos de Formação de Professores, inter/transdisciplinares são vistos como
Para as fases restantes, de responsabili- dos quais, em média, a cada semestre estratégias da ação pedagógica e
dade dos departamentos de referência quinhentos alunos estão inscritos e não assumidos como um paradigma
do curso de formação do aluno, a FFP distribuídos nas doze turmas de Prática para esta formação. Estudos realizados
fixou a carga horária em 210 horas- de Ensino I (Estágio Supervisionado por Cazelli (2000), Falcão (1997) e
aula, destinadas aos estágios no Ensino I), oferecidas em módulos com quinze Valente (1998), quanto à participação
Fundamental (5.ª à 8.ª séries) e no alunos cada. Falamos ainda da expe- de parcerias entre espaços educadores
Ensino Médio, tendo como referência riência em Prática de Ensino, pois a e escolas, evidenciaram a necessidade
as práticas docentes. Para a licenciatura maior parte dos alunos ainda é regida de implementação de um trabalho
em Pedagogia, as trezentas horas-aula pelo currículo antigo, portanto sem mais extenso de formação de profes-
foram distribuídas em dois semestres, alteração da nomenclatura ou da carga sores para participação em ações de
divididas em duas turmas. Com a horária. No curso de Pedagogia, as duas alfabetização científica, explorando
nova reformulação das Licenciaturas turmas deste componente curricular1 devidamente o potencial da relação
em 2006, a Prática de Ensino passa são compostas, a cada semestre, por museu-escola, mas que também seja
a se chamar Estágio Supervisionado, vinte alunos. entendida na sua acepção ampla de
com quatrocentas horas. Confirman- Realizamos atividades de estágio alfabetização artística, o saber, enfim,
do a proposta anterior para as outras em escolas nas diversas redes de en- na dimensão cultural.
1
Este conceito – componente curricular – foi construído a partir da LDB 9.394/1996, e organizado na Resolução CNE/CEB 01/2004 como uma
atividade obrigatória, diferentemente de disciplina, uma vez que enfoca especificamente a relação teoria-prática, no currículo dos cursos de Licencia-
tura, com quatrocentas horas e iniciado a partir da metade do curso de graduação. Para o curso de Pedagogia, são oferecidos quatro módulos: Estágio
Supervisionado I, II, III, IV.
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atuam: professores e alunos. O Jambeiro, em Niterói; o Espaço dadas, promover as necessárias arti-
Especificamente no curso de Pe- Cultural Banco do Brasil, o Museu culações para construir coletivamente
dagogia, vimos sistematizando, nos Antônio Parreiras; o Paço Imperial; alternativas, colocando a educação a
últimos anos, algumas ações em parceria o Museu de Astronomia (MAST) e serviço do desenvolvimento de relações
com museus, a fim de que os alunos a Casa José Bonifácio. democráticas e solidárias, aproximan-
realizem parte de sua carga horária O Estágio Supervisionado carac- do-nos da proposição de Boaventura
de estágio nesses locais. Essa prática, teriza-se como um locus de consoli- Santos, quando afirma que:
diretamente associada às ações que esses dação das aprendizagens e de práti-
alunos desenvolvem nas escolas, tem cas profissionais. É um componente A ciência é para nós um exercício de
descortinado a quebra da fragmentação curricular que se propõe estabelecer cidadania e de solidariedade e sua
de saberes nas quais a ação educativa fortemente a relação entre o saber e qualidade é aferida em última ins-
pode ser redimensionada. Estagiando o fazer docentes, evidenciada pela re- tância pela qualidade da cidadania
na escola e no museu, o aluno-pro- lação teórico-prática. Diferentemente e de solidariedade que promove ou
fessor se percebe aprendendo com as de uma política de formação docente torna possível. (2002, p. 22)
propostas e concepção de educação para as atividades de estágio voltadas
que tais instituições produzem, como para a cópia e/ou análise de modelos A escola pode ser pensada como
também a olhar a escola e a sala de de professores no final do curso, o que um espaço no qual as pessoas com-
aula como espaços de construção de propomos para o seu desenvolvimen- partilham perguntas, preocupações,
conhecimento e cultura. to é um percurso reflexivo no qual o alegrias e dores, colaborando para o
Como resultado dessa proposta, aluno se aproprie das condições de desenvolvimento criativo das crianças
acreditamos contribuir para a relação sua formação, trazendo autoria para e dos jovens. Para tanto o professor
da universidade com as instituições suas ações profissionais, com foco na precisa, na sua prática docente, desvelar
produtoras de saber e arte, no sentido religação dos saberes que se expressa a trama de uma rede compreensiva
da socialização dos saberes e da cultura. no pensamento de Morin: dos fenômenos humanos, naturais
Identificamos também a ampliação e culturais, construindo então uma
da noção de cultura e conhecimento Penso que a missão de aprender a religar escola protetora, conhecida e familiar,
expressa por nossos alunos, e o interesse e a problematizar representa um retorno ao mesmo tempo inquietando seus
e participação nas atividades, trazendo a uma missão fundamental [...] para alunos, surpreendendo-os e provocando
para suas práticas aqueles que já são atingir a unidade complexa do homem. o nascimento de perguntas.
professores, ou desenvolvendo atividades Acrescento que a religação constitui Nos museus/espaços educadores,
referentes a propostas realizadas nas de agora em diante uma tarefa vital, procuramos a especificidade de cada
escolas em que fazemos estágio. porque se funda na possibilidade de um. Assim, como exemplo, citamos
Entre as instituições com que regenerar a cultura pela religação de as experiências na Casa da Descober-
trabalhamos estão: o Museu de Arte duas culturas separadas, a da ciência e ta, onde participamos de oficinas do
Contemporânea de Niterói (MAC); a das humanidades. Esta religação nos Projeto Ver Ciência, dos trabalhos
o Museu Histórico Nacional no Rio permite contextualizar corretamente, específicos para o Dia da Criança,
de Janeiro (MHN); o projeto cultural assim como refletir e tentar integrar o da Mostra Internacional de Vídeos
de São Gonçalo; o Espaço Cultural nosso saber na vida. (2002, p. 68) Científicos e de visitas acompanhadas
da Marinha/Ilha Fiscal; a Casa de Rui de monitores da UFF.
Barbosa; O Museu da Vida, na Fun- Nossa intenção é traduzir o pro- Através das parcerias pudemos per-
dação Instituto Oswaldo Cruz (Fio- cesso pedagógico em curso, elucidar a ceber o distanciamento existente entre
cruz); a Casa da Descoberta, da UFF; quem serve, explicitar suas contradições a discussão teórica sobre a construção
A Casa da Ciência, na UFRJ; o museu e, com base nas condições concretas do conhecimento e da cultura nos
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espaços museológicos, sua concepção Trazendo o depoimento da educa- e este, definido como a característica
de educação e os currículos dos cur- dora espanhola Eulália Bosch sobre sua do pensamento crítico. Concordamos
sos de graduação para formação de prática educativa na Espanha quanto à com Lipman quando nos diz que
professores. articulação da aprendizagem dentro e
Nas cidades do Rio de Janeiro fora da escola, identificamos a categoria Devemos ter em mente que bons pro-
e de Niterói, alguns museus favo- da instigação, da provocação frente ao fissionais elaboram bons juízos tanto
recem a contextualização artística, saber, que pode acontecer, segundo sobre suas próprias práticas como sobre
sociocultural e histórica, associando a autora, a partir dessa interação e o tema de suas práticas.
as ciências humanas às ciências da na- favorecer a imaginação.
tureza, apresentando assim enorme Para Bosch, as relações de apren- Lipman concebe como “investi-
potencial de motivação de jovens e dizagem, neste caso, se revestem de gação” toda prática autocrítica e au-
público em geral para a cultura artística qualidade, quando diz: tocorretiva. Ele propõe a criação da
e científica. Além disso, nos últimos “comunidade de investigação” como
anos, esses espaços, respaldados em Todas as instituições, não apenas os novo paradigma em educação, pelo
políticas e programas próprios, na museus, precisam estar com suas portas qual as aulas deveriam deixar de ser
troca de experiências em seminários abertas para as crianças e os jovens. aquilo que são para converter-se em
e ainda na literatura específica, vêm As instituições têm funcionado como círculos de investigação filosófica. O
elaborando ações e mediações atra- armazéns, guardam o patrimônio da conceito de comunidade de investiga-
vés de programas educativos voltados cidade. Mas a cidade, para continuar ção recebe influência significativa da
para o público escolar, englobando a viva, necessita que seus cidadãos tenham tradição pragmatista representada, nos
formação continuada de professores. acesso a esse patrimônio, para que o Estados Unidos, por Charles S. Peirce
Em contrapartida, percebemos que transformem em sua própria bagagem e John Dewey, entre outros.
as instituições escolares buscam nos e continuem vivendo (2002, p. 7). Na medida em que se apropriam
espaços sociais instrumentos de sig- de sua aprendizagem e constroem
nificação do conhecimento estudado Temos como objetivo provocar caminhos na formação docente, li-
em seus currículos, através de ativida- debates e discussões, preocupadas cenciandos demonstram interesse de
des de pesquisa ou de campo com o com a formação de opiniões, pen- discutir e socializar suas experiências,
exercício de práticas e procedimentos sando na importância da formação participando de apresentações de tra-
inter/transdisciplinares. do espírito crítico, entendido este balhos em seminários e congressos, o
Nesse sentido, reafirmando a como um alargamento de resultados, que favorece outra dimensão de sua
indicação proposta nos Parâmetros e na identificação de características formação docente: a socialização de
Curriculares Nacionais (MEC/PCN, essenciais que levem a conexões entre experiências educativas. Apresentamos,
1999) quanto à cultura científica, en- eles. Em resumo, queremos exercitar no ano de 2003, na semana da UERJ
tende-se que essas práticas colaboram a possibilidade de expressar opiniões sem muros2, uma produção coletiva da
para promover competências e habi- com base em critérios. qual participaram professoras e alunas,
lidades que sirvam para o exercício de Explicando melhor, diríamos que diante do encantamento com a expo-
intervenções e julgamentos práticos, seguimos uma linha de pensamento sição Arquitetura de Palavras, de Malu
respondendo às necessidades da vida que nos mostra o conhecimento como Fatorelli3 , na qual a autora exibia,
contemporânea. sendo o resultado de um bom juízo, em grandes painéis, “tecidos” com os
2
Trata-se de uma mostra, realizada na UERJ, das diversas ações de ensino, pesquisa e extensão da Universidade.
3
Artista plástica e professora da UERJ e da Escola da Escola de Artes Visuais do Parque Laje. Nasceu e vive na cidade do Rio de Janeiro, tendo acumulado
formação e experiência artística nacional e internacional.
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VISITANDO O
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DEZOITO ANOS DA REVISTA ESPAÇO
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PRODUÇÃO INES
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MÍDIA TELEVISIVA SEM SOM (MANUSCRITO)
Soundless TV Media
André Ribeiro Reichert*
*Dissertação de Mestrado em Educação (Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2006)
Orientador: Prof° Drº Carlos Bernardo Skliar
Co-orientador: Maura Corcini Lopes
E-mail: andrereichert@ipametodista.edu.br
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PRODUÇÃO
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ACADÊMICA
MARCAS SURDAS: ESCOLA, FAMÍLIA, ASSOCIAÇÃO,
COMUNIDADE, UNIVERSIDADE CONSTITUINDO
CULTURA E DIFERENÇA SURDA
Deaf marks: school, family, association, community, university, building up culture and
deaf difference
Vânia Elizabeth Chiella*
*Dissertação de Mestrado em Educação (Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2006)
Orientador: Profº Drª Maura Corcini Lopes
E-mail: vaniachiella@gmail.com
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Surdez e EducaçÃo
Deafness and Education
Betina Guedes*
*Fonoaudióloga. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos
Sinos (UNISINOS).
E-mail: guedesbe@gmail.com
Material recebido em agosto de 2007 e selecionado em agosto de 2007
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DE LIVROS
que sugere em relação aos surdos e inexistência, mas sim de mostrá-la com
a surdez, com base na possibilidade uma invenção surda para que a dife-
de analisarmos a surdez como inven- rença surda possa ser narrada de um
ção que se dá na cultura. A autora dá outro lugar” (p.71-2). Dá continuidade
continuidade ao primeiro capítulo do refletindo sobre o que se conceitua Transitando por
livro, situando os Estudos Surdos no como currículo surdo, partindo do
campo da investigação educacional. entendimento de que “um currículo discursos que se
Conclui acrescentando à militância e surdo talvez exista na possibilidade
produção teórica dos Estudos Surdos cotidiana da experiência” (p.86). afastam da concepção
o surgimento do NUPPES (Núcleo No último capítulo do livro inti-
de Pesquisa em Políticas de Educa- tulado “Para saber mais”, Lopes traz da surdez tida como
ção para Surdos), que se constituiu sugestões de sites que abordam a
vinculado a Universidade Federal do educação dos surdos e demais elemen- condição de deficiência,
Rio Grande do Sul. tos da cultura surda, que considera
No segundo capítulo do livro, Lopes estarem em sintonia com a abordagem busca inspiração nas
analisa os mecanismos disciplinares, dos Estudos Surdos. Concluindo esse
as engrenagens postas em funcio- capítulo deixa-nos uma provocação: discussões de base
namento na educação dos surdos, a “como estão se constituindo novas
resistência surda e a recusa às práticas estratégias de dominação e de nor- antropológicas e
ouvintistas, com base em passagens malização surda a partir das políticas
históricas que permitem “fazer pensar de inclusão e a partir das políticas de culturalistas, para
o presente da educação e da escola de divulgação da LIBRAS?” (p.93).
surdos, a partir de leituras e interpre- É com esse tom de provocação, significar outras
tações do passado” (p.39). Ao final do no sentido de colocar em movimento
capítulo enfatiza a necessidade de se práticas e discursos estagnados pelas formas de olhar,
problematizar os processos lingüísticos relações de poder que os sustentam,
que permeiam a educação dos surdos, que Maura Corcini Lopes nos apre- interpretar e narrar a
localizando e tematizando a Língua senta outras possibilidades de olhar a
de Sinais no cenário educacional e surdez e a educação. Leitura de extre- diferença surda.
político brasileiro. ma importância para profissionais da
No terceiro capítulo do livro, a educação e da saúde, que pretendem
autora problematiza os conceitos de orientar-se nas últimas discussões feitas
comunidade e de comunidade surda, no campo da educação de surdos.
“não na intenção de comprovar a sua
Referências Bibliográficas
LOPES, Maura Corcini. Surdez e educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p.92, Jul-Dez 2007
RESENHA INES
ESPAÇO
DE LIVROS Jul-Dez/07
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Currículo e Mídia Educativa Brasileira:
poder, saber e subjetivação
Curriculum and the Brazilian educational media: power, knowledge and subjectivation
Monique Franco*
*Historiadora. Mestre em Educação – FACED/UFRJ. Doutora em Comunicação e Cultura – ECO/UFRJ.
Professora Adjunta da Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
– FFP/UERJ e do Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES/MEC.
E-mail: mfranco@uerj.br
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p.93, Jul-Dez 2007
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DE LIVROS
mento central de seu estudo está no na minuciosa pesquisa que a autora torno da educação pública e pelo
entendimento de que “no discurso apresenta, como o endereçamento da próprio país.
da mídia educativa sobre a educação mídia para determinados segmentos, O livro é uma oportunidade para
escolar investigado é divulgado um deixa estrategicamente transparecer todos os pesquisadores, professores e
tipo de escola, de currículo e de su- singularidades em meio a um inten- estudantes que dialogam com o campo
jeito pedagógico para intervir nesses so processo regulatório. Instaura-se, da educação, do currículo e das novas
‘objetos’ e para que seja exercido o assim, um processo de identificação tecnologias da informação, sobretudo
governo de si, dos outros e de Esta- não necessariamente constrangedor, quando estes tecem interfaces com
do”. (p.30) E continua contundente mas sim dotado de tecnologias de as perspectivas pós-estruturalista, a
– “Nesse discurso, feito com sucesso auto-regulação, postas a serviço de identificar novas formas de entendi-
midiático e de um sentimentalismo governar e subjetivar os “sujeitos pe- mento para o complexo mecanismo de
sedutor, são feitas promessas sobre a dagógicos”, sobretudo os docentes, agenciamento que as mídias educativas
escola, o currículo e a professora, e tanto para reiterar visões cristalizadas podem produzir no extenso processo
são apresentadas como metas de seus na sociedade sobre a professora, sobre de significação atribuído aos conhe-
programas para libertar o Brasil e os a mulher ou mesmo sobre o jovem e a cidos modos de produção e recepção
brasileiros da descolarização e do sub- própria família, como também, para de mensagens imagéticas.
desenvolvimento” (idem). fabricar um modelo de subjetividade Apesar de sua densidade conceitual,
Deixando claro sua filiação concei- docente romantizada e dedicada, tal o livro apresenta de maneira leve e
tual com os estudos pós-estruturalistas, qual a mídia educativa requer. Percor- sempre articulada à realidade cotidiana
especialmente Michel Foucault e com rendo os “pensamentos autorizados” os elementos necessários a sua compre-
os estudos culturais, a autora descreve e as estratégias de governo usadas na ensão e utilização crítica para pensar
seu percurso de trabalho na seleção mídia educativa, a autora busca “di- os desafios postos, na atualidade, a
dos materiais e a metodologia utilizada ferenciar os modos de pensamento e dimensão educativa.
“para ‘ler’ o currículo da mídia educa- os tipos de julgamento que procuram,
tiva,” (p.33). Os seguintes capítulos reivindicam e adquirem autoridade
nos fornecem, de forma vigorosa, ele- ou aos quais se atribuiu autoridade”
mentos para compreender como os (p.35) para defender o argumento de
“sujeitos pedagógicos” incitados por que os discursos produzidos ali têm,
esses discursos acabam aprisionados no currículo, uma eficiente tática de
em determinada “vontade de verda- governar, fazendo identificar os sujeitos
de” por meio de formas de regulação, pedagógicos como co-responsáveis de
técnicas e instrumentos. Fica claro, uma grande missão pedagógica em
Referências Bibliográficas
Paraíso, Marlucy Alves, Currículo e Mídia Educativa Brasileira: Poder, Saber e Subjetividade. Chapecó:
Arbos, 2007.
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p.94, Jul-Dez 2007
AGENDA INES
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AGENDA
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NORMAS PARA INES
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Os interessados em enviar artigos para a Revista ESPAÇO devem seguir, obrigatoriamente, o seguinte padrão
editorial:
1. A ESPAÇO aceita para publicação artigos inéditos de autores brasileiros e estrangeiros que tratem de Educação,
resultantes de estudos teóricos, pesquisas, reflexões sobre práticas concretas, discussões etc. Excepcionalmente po-
derão ser publicados artigos de autores brasileiros ou estrangeiros editados anteriormente em livros ou periódicos
que tenham circulação restrita no Brasil.
2. Os ARTIGOS devem ter no mínimo trinta mil e no máximo cinqüenta mil caracteres com espaços, incluindo refe-
rências bibliográficas e notas (contar com Ferramentas do processador de textos - Word ou Star Office, por exemplo).
3. A publicação de ARTIGOS está condicionada a dois pareceres de membros do Conselho Editorial e/ ou colabora-
dores ad hoc. A seleção de artigos para publicação toma como critérios básicos sua contribuição à Educação geral, à
Educação Especial, à Educação de Surdos e áreas afins, bem como à linha editorial da ESPAÇO; a originalidade do
tema ou do tratamento dado ao mesmo, assim como a consistência e o rigor da abordagem teórico-metodológica.
Eventuais modificações de estrutura ou de conteúdo, sugeridas pelos pareceristas ou pela Comissão Editorial, só
serão incorporadas mediante concordância dos autores.
4. De acordo com a caracterização das seções, a ESPAÇO também publica REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA,
RESENHAS E RESUMOS DE TESES E DISSERTAÇÕES.
5. As REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA não devem ultrapassar vinte mil caracteres com espaços. Os demais
requisitos para os artigos também devem ser atendidos.
6. As RESENHAS não devem ultrapassar oito mil caracteres com espaços, e os RESUMOS DE TESES E DISSER-
TAÇÕES, quatro mil caracteres com espaços. É indispensável a indicação da referência bibliográfica completa da obra
resenhada ou comentada. A digitação e a formatação devem obedecer à mesma orientação dada para aos artigos.
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NORMAS PARA
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PUBLICAÇÃO
7. Textos que tratem de temas polêmicos ou que debatam algum assunto, com defesa de posicionamentos, poderão
ser publicados na seção DEBATE. Nesse caso, a ESPAÇO procura publicar no mínimo dois artigos com diferentes
abordagens. Os textos devem obedecer ao limite de cinquenta mil caracteres com espaço e atender aos demais
requisitos indicados para os artigos.
9. Os artigos e outros textos para publicação devem ser digitados em um dos programas de edição de texto em
formato Word for Windows. As orientações para formatação estão especificadas ao final destas Normas.
10. As menções a autores, no correr do texto, devem subordinar-se à forma (Autor, data) ou (Autor, data, p.), como nos
exemplos: (Silva, 1989) ou (Silva, 1989, p. 95). Diferentes títulos do mesmo autor, publicados no mesmo ano, deverão
ser diferenciados adicionando-se uma letra depois da data, por exemplo: (Garcia, 1995a), (Garcia, 1995b) etc.
11. As Referências bibliográficas devem conter exclusivamente os autores e textos citados no trabalho e ser apresentadas
ao final do texto, em ordem alfabética, obedecendo às normas atualizadas da ABNT. Artigos que não contenham
as referências bibliográficas ou que as apresentem de forma incorreta não serão considerados para exame e
publicação. Observa-se que as bibliotecárias das universidades estão aptas a oferecer orientações relativas ao seu
uso correto. Exemplos da aplicação das normas da ABNT encontram-se ao final destas Normas.
12. As notas de rodapé devem ser exclusivamente explicativas. Todas as notas deverão ser numeradas e aparecer no
pé de página (usar comando automático do processador de textos: Inserir/Notas).
13. Todos os artigos devem conter, no início, título em português e em inglês, resumo (em português) e abstract (em
inglês) que não ultrapassem mil caracteres cada, com indicação de pelo menos três palavras-chave e key words.
14. Ao início do texto, o autor deve fornecer dados relativos a sua maior titulação, instituição e área em que
atua, bem como indicar o endereço eletrônico e o postal completo, para correspondência.
15. Quadros, gráficos, mapas, imagens etc. devem ser apresentados em folhas separadas do texto (indicando-se os
locais em que devem ser inseridos), devendo ser numerados e titulados, bem como apresentar indicação das fontes
correspondentes. Sempre que possível, deverão ser confeccionados para reprodução direta.
16. O envio de qualquer colaboração implica automaticamente a cessão integral dos direitos autorais.
1. Digitar todo o texto na fonte Times New Roman, tamanho 12, entrelinha simples, sem fontes ou atributos
diferentes para títulos e seções.
Informativo Técnico-Científico Espaço, INES - Rio de Janeiro, n.28, p.98, Jul-Dez 2007
NORMAS PARA INES
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2. Utilizar negrito e maiúsculas para o título principal, e negrito e maiúsculas e minúsculas nos subtítulos
das seções.
3. Para ênfase ou destaque, no interior do texto, utilizar apenas itálico; assinalar os parágrafos com um único toque
de tabulação e dar Enter apenas no final do parágrafo.
4. Separar títulos de seções, nome do autor etc. do texto principal com um duplo Enter.
5. As citações diretas com mais de três linhas devem aparecer em Times New Roman, tamanho 11, separadas do
texto principal com duplo Enter e introduzidas com recuo de 4cm da margem esquerda, sem as aspas.
1. Livro
1.1 sobrenome(s) do(s) autor(es), seguido(s) do(s) respectivo(s) nome(s); título da obra (em itálico) e subtítulo (se
houver) precedido de dois-pontos (em fonte normal); nome do tradutor (quando houver); edição, local (seguido
de dois-pontos), editora e ano da publicação.
Exemplo: APPLE, Michael W. Educação e poder. Tradução: Maria Cristina
Monteiro. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
2. Artigo: sobrenome(s) do(s) autor(es), seguido(s) do(s) respectivo(s) nomes; título do artigo (fonte normal); título do
periódico (em itálico); volume e número do periódico; páginas correspondentes ao artigo e ano da publicação.
Exemplo: MACHADO, L.R.S. Cidadania e trabalho no ensino de segundo grau.
Em Aberto, v. 4, n.º 28, p. 35-8, 1985.
3. Coletâneas: sobrenome(s) do(s) autor(es), seguido(s) do(s) respectivo(s) nome(s); título do capítulo (fonte nor-
mal), seguido de In; sobrenome(s) do(s) organizador(es) e iniciais do(s) respectivo(s) nome(s); em seguida, Org.
entre parênteses; título da coletânea (em itálico), dois-pontos e subtítulo (se houver); nome do tradutor (quando
houver), edição, local da publicação seguido de dois-pontos, editora e ano da publicação.
Exemplo: ROMÃO, José E. Alfabetizar para libertar. In: GADOTTI, M.; TORRES,
C. A. (Orgs.). Educação popular: utopia Latino-Americana. São Paulo: Cortez, 1994.
4. Dissertação ou tese acadêmica: sobrenome do autor seguido do nome; título da obra (em itálico), seguido de
dois-pontos, se houver subtítulo (em fonte normal); ano da defesa; tipo (dissertação ou tese); grau acadêmico
obtido (entre parênteses), travessão e instituição onde foi apresentada.
Exemplo: DI GIORGI, Cristiano Amaral Garboggini. Utopia da educação popular: o paradigma da educação
popular e a escola pública. 1992. Tese (Doutoramento em Educação) – Faculdade de Educação,
Universidade de São Paulo.
1 As orientações aqui oferecidas baseiam-se nas seguintes normas da ABNT: n.os 10520 (para citações) e 6023 (para referências).
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NORMAS PARA
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PUBLICAÇÃO
GUIDELINES FOR SUBMISSION OF ARTICLES
FOR PUBLICATION
Characterization of the Sections of Espaço
2. The articles should be of the minimum length of thirty (30) thousand and maximum of fifty (50) thousand
characters with spaces, including bibliographic references and notes (they have to be counted with the Tools of
the Word processor - either Word or Star Office, for instance).
3. The publication of articles is conditioned to two appraisals by referees from the Editorial Board and/or by ad hoc
referees. The selection of articles for publication takes into account its contribution to General Education, Special
Education, Education of the Deaf and similar areas and to the editorial line of Espaço, as well as the originality
of the theme and of its discussion and the rigor and consistency of its theoretical and methodological framework.
Any eventual change in structure or content as suggested by either the referees or the Editorial Board are only
incorporated into the text with the thorough agreement of the authors.
4. According to the characterization of its sections, ESPAÇO also publishes REFLECTIONS ON THE PRAC-
TICE, REVIEWS and THESES AND DISSERTATION ABSTRACTS.
5. REFLECTIONS ON THE PRACTICE should be of the maximum length of twenty (20) thousand characters
with spaces and should fulfill all the other requirements.
6. REVIEWS shouldn’t have more than eight (8) thousand characters with spaces and THESES AND DISSER-
TATION ABSTRACTS should not exceed four (4) thousand characters with spaces. Complete bibliographic
references are obligatory for reviewed or commented on texts. The typing and formatting of the text should follow
the same instructions given for the articles.
7. Texts that discuss polemic subjects or that debate a particular point of view or opinion on a subject can be published in
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the section named Debate. In this case, ESPAÇO tries to publish at least two articles with different approaches. In this case,
the texts should not exceed fifty (50) thousand characters with spaces and should fulfill all the other requirements.
8. The original manuscripts can be sent to the Executive Committee of ESPAÇO either by mail (one copy in ress
and the corresponding file in a floppy disk) or by the e-mail: comissaoeditorial@ines.gov.br
9. The articles and other texts for publication should be typed in one of the programs of text editors in Words for
Windows format. Instructions for formatting the manuscripts can be found at the end of this guideline.
10. Citations of authors within the text should be as follows: (author, date) or (author, date: p.), as in the following examples:
(Silva, 1989) or (Silva, 1989: 95). Different titles of the same author that have been published in the same year should be
mentioned with a different letter after the date, as for instance: (Garcia, 1995a), (Garcia, 1995b) and so forth.
11. Bibliographic references should have only the authors and texts cited within the article and should be presented
at the end of it, in alphabetic order. Articles without bibliographic references or works that inappropriately
present the references will not be considered for publication.
12. References at the bottom of the page should be exclusively of a clarifying nature. All of those should be numbered
and be presented at the bottom of the page (please use the automatic computer key that reads “Insert/Notes”).
13. All the articles should have, in the beginning, a title in English and in Portuguese, a summary (in Portuguese)
and an abstract (in English). The summary and the abstract should not be longer than 1.000 characters each,
indicating at least three palavras-chave and three key words.
14. In the beginning of the paper, the author should present data relative to his/her highest degree, institution and
area of knowledge, as well as full e-mail and postal address for correspondence.
15. Tables, graphs, maps, images and others should be presented in a separate sheet and the places where they
should be inserted should be presented. They also should be numbered and have titles attached to them, as well as
present their corresponding sources. Whenever possible, they should be available in a direct reproduction mode.
16. Sending an article for publication implies in the cession of copyrights to ESPAÇO.
17. ESPAÇO is not complied to give back the manuscripts it has received.
1. The whole manuscript should be typed in Times New Roman, size 12, with simple lines between them, without
any special fonts or attributes for titles and sections.
2. Use bold and capital letters for the main title, and bold and capital and normal letters for the sub-titles of sections.
3. For highlighting purposes within the manuscript, use only italics; also, paragraphs should be signaled only with
a touch of tabulation and by touching the Enter key only.
4. Separate titles of sections, name of the author and so on from the main text with a double Enter.
5. For transcriptions, use the same Times New Roman, size 11, separated from the main text with a double Enter
and should be introduced with two touches of tabulation.
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Realização
INES
Instituto Nacional de
Educação de Surdos
Secretaria
de Educação
Especial
Ministério
da Educação
GOVERNO FEDERAL
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