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Sra Gabor: Precisavam de um bode expiatório.

O nosso filho caiu do céu bem na frente deles,


na hora certa. As pessoas nâo deviam se deixar influenciar pelas acusações que ouvem de
qualquer um. E vc acha que eu, a mãe, vou fazer o papel do carrasco?

Sr Gabor: Durante 14 anos eu só observei de longe seus métodos de educação. Foi sempre
contra as minhas convicções. Educar uma criança não é uma brincadeira. Uma criança merece
a nossa sagrada preocupação. Não estou lhe acusando nada, Fanny. Porém, agora que eu
quero remediar os danos que eu e você causamos ao garoto, por favor, não se meta no meu
caminho.

Sra Gabor: Eu me meto no seu caminho sim. Eu me meto no seu caminho, porque sou mãe.
Enquanto correr uma gota de sangue no meu corpo eu vou lutar pelo meu filho. Ou vou ver
meu filho se definhar dentro de um reformatório? Uma instituição que corrige
comportamentos corruptos? Dizem que melhoram uma natureza criminosa nessas
instituições. Mas, como uma criança pode suportar a isso sem se tornar um criminoso? Pensa
em uma planta. Agora tira a terra. Tira o sol. Tira o ar dessa planta. Você acha que ela
sobrevive? Eu não reconheço nenhum erro da minha parte. Pelo contrário, agradeço aos céus
pela lucidez. Por ter permitido despertar um senso de caráter no meu filho. O que ele fez de
tão errado? Me diz porque eu não tenho o menor interesse de inocentar o Melchior. Não se
trata disso. Mas, tampouco compartilho do motivo pelo qual estão enxotando nosso filho na
escola. E, se é que ele fez algo de errado, ele bem que já está pagando. Você é advogado e
sabe muito bem disso. Ou, deveria saber. Na teoria você até que pode estar com a razão. Na
prática, eu não posso permitir que lancem o nosso único filho violentamente pra morte!

Sr. Gabor: Isso não depende de nós Fanny. Quem Não aguenta a marcha, deve ser colocado de
lado. Você acha uma “simples curiosidade prematura” aquilo que, na verdade, já é uma
deformidade de caráter. Não cabe a vocês mulheres decidirem sobre essas coisas. Quem
escreve o que o Melchior escreveu já está começando a apodrecer no mais íntimo do seu ser.
Uma natureza minimmente saudável não se presta a esse tipo de coisa. Ninguém é santo.
Todo mundo se afasta do bom caminho. Mas, o texto dele, no entanto, aponta para uma
questão de princípio, manifesta uma corrupção espiritual excepcional que nós juristas
indicamos com a expressão “alienação moral”. Não sei o que se pode fazer por ele nesse
estado. Mas, nós, como pais da pessoa em questão, devemos agir com seriedade. Chega de
discussões, Fanny. Eu sei como vai ser difícil para você. Eu sei que você o venera porque a
natureza dele é quase um reflexo da sua. Mas, seja forte. Se mostre, pelo menos uma vez
altruísta com relação ao seu filho.

Sra Gabor: Altruísta em relação ao meu filho? Você, sendo advogado, gostaria que me
mostrasse qual lei diz que uma mãe – ou melhor, uma mulher – é menos para seu filho por ser
mulher? Só podia ser um homem para falar uma coisa dessas. Só podia ser um homem para
ser tão cego a ponto de não ver o que salta aos olhos! Se é que eu entendi alguma coisa, o que
importa é o melhor para o nosso filho. Pois bem, eu cuido do Melchior desde que ele nasceu, e
o faço com consciência e serenidade porque sei que ele estaria suscetível às represálias do
mundo. E quando eu penso em amor, quando eu penso em “princípio”, eu penso em regar a
nossa própria plantinha, a que nós escolhemos ter, e na constância dessa prática. E não
delegarmos um papel que é nosso, por direito e por obrigação. Eu não sou perfeita, mas há 15
anos sou eu quem toma a frente nessa rega. Então, somos nós os responsáveis por esse
incidente!?

Sr Gabor: Fanny!
Sra Gabor: Imagina que amanhã caia uma telha na sua cabeça e o seu pai, ao invés de cuidar
do ferimento, pisa ainda mais na ferida. Isso seria uma crueldade e não faz o menor sentido. É
absurdo! Eu não vou permitir que eliminem meu filho, não diante dos meus olhos. Afinal de
contas, o que é que ele escreveu de mais? Será que esse escrito não seria a prova definitiva da
inocência, da tolice, da própria infantilidade dele? Meu bem, para escrever uma coisa dessas…
- É preciso não fazer ideia nenhuma do juízo das pessoas. É preciso ser um completo burocrata
desalmado, ou completamente tapado para enxergar nisso uma corrupção moral. Se você
colocar Melchior em um reformatório eu me separo de você. E vou encontrar as pessoas
certas para tirar nosso filho dessa derrocada.

Sr Gabor: Você vai ter que se encaixar. Se não hoje, amanhã. Não é fácil para ninguém prestar
contas com a infelicidade. Por enquanto eu vou ficar do seu lado e se sua coragem ameaçar
enfraquecer, eu não vou medir esforços para aliviar o seu coração. Eu já vejo um futuro tão
cinza, tão tempestuoso. Só falta agora você se perder de mim tb.

Sra Gabor: Eu não o vejo mais. Ele não suporta a maldade. Ele não se acovarda perante a
sujeira. O exemplo mais terrível passa batido diante dos olhos dele. E eu o vejo de novo. Seu
coração pulsando alegria primaveril, seu sorriso luminoso. Tudo, tudo. A resolução infantil dele
de lutar pelo o que é bom, pelo o que é justo. Ah, esse céu, e o tanto que eu zelei por
luminosidade e pureza da alma como se fossem meus bens mais preciosos. Agora que o
malfeito precisa de castigo, se limite a mim. Faça de mim o que quiser, mas tira suas mãos
terríveis do meu filho.

Sr Gabor: Ele é um criminoso.

Sra Gabor: Ele não é um criminoso.

Sr Gabor: Ele é um criminoso sim! E eu daria tudo para poupar esse seu amor sem limites. Mas,
o fato é que ele cometeu um crime. Uma senhora me procurou hoje de manhã,
perturbadíssima. Mal conseguia falar. Ela me entregou essa carta, que a filha dela de 14 anos
recebeu. Na carta Melchior pede perdão pelo que fez. Que ela não se preocupasse mesmo
quando as consequencias começassem a aparecer. Que ele ia cuidar de tudo e ia ajudar em
tudo. Agora, expulso da escola ficaria mais fácil.

Sra Gabor: Impossível.

Sr. Gabor:

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