A Ilusão Do Conhecimento e A Cólera No Comportamento Social Na Era Da Informação

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A ilusão do conhecimento e a cólera no

comportamento social na era da informação


Matheus Bernardino dos Santos
16 de julho de 2022

Universidade de Brası́lia - Instituto de Ciências Exatas


Departamento de Ciência da Computação - CIC 116726 - Informática e Sociedade
2020.1 - turmas A e B - Professor Jorge Henrique Cabral Fernandes
Prédio CIC/EST - Campus Universitário Darcy Ribeiro
Asa Norte 70919-970 Brası́lia, DF
matheus.bernardino@aluno.unb.br

Resumo
O presente texto chama o leitor a um diálogo no que diz respeito a aquisição
da ilusão do conhecimento, a partir da formação do conhecimento percebido,
onde é influenciado as atitudes, comportamentos e temperamentos dos in-
divı́duos que se expõem a reincidente propaganda de notı́cias sensacionalistas
nos ambientes das redes sociais. O questionamento elaborado aparece quando
essa recorrência de notı́cias se apresenta como fator vital para uma conduta
antiética de teor agressivo, como por exemplo, em manifestações polı́ticas,
individuais ou coletivas. Com esse fundamento, o dilema da ilusão do saber
se torna uma peçonha para a sociedade, surgindo a urgência de sua conscien-
tização e resposta sisuda ao estridente impasse social.
Palavras-chave: Ilusão do conhecimento, notı́cias online, comporta-
mento, manifestações, consumo de notı́cias, redes sociais, mı́dia jornalı́stica

1 Introdução
A proposta da presente dissertação se dilatará a partir da diacronia a respeito das
inovações tecnológicas na ciência da informação. Portanto, assim como tudo o que
envolve os progressos operados pela humanidade na natureza da existência, também
a tecnologia da informação tem seus dilemas que afetam tanto os indivı́duos em si
quanto o meio coletivo e global em que se relacionam. O mundo contemporâneo é
terreno fértil para a proliferação desses impasses, que se formam em uma era abun-
dante em acesso à informação, mas carente no desenvolvimento de um conhecimento
sólido e sadio.
Ocupando-se de rigorosa análise em tecnologias difusoras de relacionamentos so-
ciais, a exemplo: os sem precedentes smartphones e as redes sociais, Schäfer (2020),
nos chama a uma reflexão a respeito da recorrência de notı́cias da mı́dia em um
ambiente não formado para esse propósito. Exposto pela autora, essa reincidência

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constante de notı́cias nas redes sociais, por mais que, em um primeiro momento, apa-
rente ser bom negócio com nossa obrigação social de se estar informado, na verdade
se apresenta como um falso professor e um potencial embaraço colérico. Consu-
mir notı́cias sensacionalistas com gula (mesmo sem essa intenção), se mostrou tão
maligno ao nosso espı́rito, quanto o pecado capital a saúde de nosso corpo. Desse
modo, a interação entre os sites (ou aplicativos) de redes sociais e os de jornalismo,
gerou, além de outras influências, um obstáculo ao indivı́duo e, consequentemente,
a sociedade.
Como primazia para o seu estudo, a autora se debruça sobre estudos que pro-
varam a existência de ilusões do conhecimento a partir de “snack news” ou, grosso
modo, checadas rápidas em postagens minimalistas e chamativas que a mı́dia produz
com essa mesma intenção. Por conseguinte, fazendo analogia ao termo que a autora
emprega, demonstrarei que seu estudo traz a meditação de que um lanche não subs-
titui um almoço nutritivo; de que a comida processada pode ter sabor agradável
superficialmente e aparência atraente, porém não têm os nutrientes rudimentares
aos quais o corpo necessita para funcionar em sua capacidade natural e até além,
como saudável e forte. Nesse sentido, se voltarmos os olhos para a informação e
o conhecimento, notamos o semelhante dilema, e até um aviso: a informação não
nutre o que o conhecimento sustenta naturalmente.
Isto posto, exponho as questões substanciais a que entregarei ênfase para aprofun-
dar e difundir essa indispensável conscientização. Logo, é de fácil engano, confundir
ou não conhecer, por ignorância ou grosseria, que o conhecimento é mais profundo
do que a informação. Com esse fato, há de se entregar ênfase ao impasse que a
ilimitada abundância e acceso a informação impõe a todo indivı́duo com alcance aos
meios digitais informatizados. A ilusão do conhecimento proporciona justificativa
para convicções preestabelecidas e sem embasamento coerente com o rigor cientı́fico.
Gerando, assim, tendência a atitudes imponentes e vontade de se debater o assunto
alvo da utopia. Seguindo os resultados de exposição às “snack news”, que nada
mais fornece se não uma ilusão de se estar informado, ou pior, o sentimento de ser
capaz de argumentar e defender dilemas profundos sem ter um assentamento sólido
de entendimento; induzem os seus consumidores a tomar decisões inflamadas, como
protestos violentos, que reúnem milhares de pessoas para defender um ponto de
vista difundido a partir de um sentimento ilusório de razão, movido pela emoção
infundada de se fazer justiça e, por vezes, indo além disso: demonstrando o ego
humano em adereçar-se como revolucionário de seu tempo, depredando e vandali-
zando o patrimônio de seus compatriotas. Porém, se analisado, minuciosamente, as
motivações dessas manifestações, percebe-se a arrogância assentada em ideologias
imperceptivelmente manipuladas pelos ‘alimentos processados’ a que nutrimos nos-
sos fundamentos cognitivos, como sendo um dos motivadores vitais dessas atitudes
rancorosas. Todo esse detalhamento tem o objetivo de esclarecer quão profunda-
mente o conhecimento afeta nossas crenças, convicções e atitudes, o que direciona e
orienta quais decisões e partidos tomaremos com base nesses.
Com tudo isso, percebe-se que tanto a ignorância, quanto o conhecimento insu-
ficiente – isto é: o conhecimento percebido - são igualmente malignos quando nos
referimos a atitudes sadias e discussões/debates polı́ticos de boa-fé. Tais paradig-
mas, no modelo popular contemporâneo de manifestação, são negligenciados pelos

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motivos subsequentes: (a) uma dieta intelectual direcionada ao que agrada a opinião
daqueles que a defendem, sem se esforçar ou se sacrificar a remediar-se com pon-
tos de vista confrontadores; (b) fundamentos em conhecimento superficial adquirido
pelos meios sensacionalistas (diretamente escolhido) ou por mera satisfação com as
“snack news” (indiretamente adquirido). Schäfer utiliza a polı́tica como área de co-
nhecimento modelo para sua argumentação. Consequentemente, de modo evidente,
a fim de que os debates polı́ticos sejam saudáveis e livres de atitudes precipitadas
ou, por vezes, manifestas com cólera, os cidadãos têm a urgência e o dever sisudo
de se comprometer a um estudo diligente, com a intenção de ter fundamentos rigo-
rosos. Já que suas convicções estão ligadas a tomada de atitudes, e essas, por sua
vez, influenciam profundamente o meio polı́tico e a máquina pública, deve haver
qualidade e empenho para se ter uma coerência cientı́fica canônica e não superficial
direcionada por ilusões individuais. Nesse sentido, o desenvolvimento subsequente
apresentará a argumentação e exposição desses percursores motivos do estridente
dilema da influência digital sobre as razões humanas.

2 Método
Para que a análise do presente artigo seja considerada no rigor da comunidade
acadêmica, se faz necessário uma fundamentação teórica previamente estabelecida.
Assim são empregadas as proposições de Jones (2016) no desenvolvimento deste
texto. Além da vigência do que foi exposto em seu artigo, aqui são respeitadas
as orientações feitas pelo autor, essas que seguem o passo de seis pontos a serem
observados na produção de análise em dilema ético na tecnologia da informação.
O primeiro passo seria a exposição de um dilema ético especı́fico, extraı́do de
ambientes digitais onde impasses são potenciais. O Segundo se trata dos meios de
acesso a esses ambientes, isto é: as tecnologias desenvolvidas para a comunicação
globalizada. Importa também a análise da atuação social; intenção do projeto, sua
implantação e o uso cotidiano dessas conexões.
O terceiro passo é expor os princı́pios e valores ameaçados pelo impasse especı́fico,
compreendendo o momento ético do contexto. O quarto chama ao diálogo as normas
e regulamentações lesionadas ou que devem ser aplicadas com inflexibilidade sobre as
afrontas éticas identificadas. Vale lembrar que em diversas vertentes se é influenciada
a legislação: jurisdição, polı́tica, interesse econômico ou a ética da própria lei – além
de casos onde não há resolução regulamentadora.
No quinto passo é analisado o código de conduta dos profissionais e organizações,
que são os responsáveis pelo desenvolvimento dessas tecnologias: gerentes e usuários;
programadores e operadores. A análise da responsabilidade profissional desses agen-
tes conscientiza acerca dos debates éticos relevantes, intrı́nsecos ao seu ofı́cio.
Por fim, no último passo é construı́do a proposta de intervenção. Essa, será
fundamentada no código de conduta, na regulamentação aplicável e nos princı́pios
éticos. Produzindo soluções em potencial e provando diferentes alternativas para a
implementação de cursos práticos de ação.
Com tudo isso, ainda cabe arrazoar que os dilemas em informática não podem
ser analisados sob uma única lente crı́tica. Daı́ surgiriam parcialidades, o que é de-
sejoso evitar. Portanto, se torna indispensável a abordagem multidisciplinar, como

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Jones afirma, um exercı́cio interdisciplinar. Outra vez é atestado a importância da
compreensão do contexto completo, e não somente da parte em foco, pois, assim,
as fronteiras de especificidade são expandidas, revelando detalhes intrigantes que o
ponto de vista particular não percebe. Assim, as informações técnicas, os modelos
econômicos, os designs de interfaces, as analises textuais e o significado das relações
socias virtuais – todos pontos especı́ficos de disciplinas divergentes – colaboram para
uma análise completa e rigorosa da situação questionada. Nas palavras do autor:
“This framework offers a potential methodology for exploring the implications of
any computer technologies, existing or emerging.” Indo além dos limites disciplina-
res, essas conexões auxiliam no pensamento crı́tico e na formação sólida de uma
réplica contra as violações éticas nas sem precedentes redes globais de comunicação,
informação e aplicação.

3 Dilemas Éticos-Morais
Cabe ainda construir e tornar claro a argumentação lógica envolta aos dilemas éticos-
morais. Portanto, a apresentação do conceito formal de dilema se faz necessário; o
dilema é precisamente uma decisão. Decisão essa que em todas as opções elegı́veis
há um sofrimento, um desgosto que o agente decisor não gostaria de experienciar.
Tal agente, portanto, é quem sofre com o dilema – quem sofre com a decisão. Dilema
é a contextualização prévia às consequências geradas por essa mesma decisão. Ora,
a consequência é o que causa o sofrimento dos que recebem essa decisão; o decisor
sofrer com o dilema implica em ter a responsabilidade de tomar decisão, não neces-
sariamente padecer os sofrimentos do resultado posterior desse dilema (decisão). O
sofrimento é assim configurado devido as alternativas que são indesejáveis, indepen-
dente da escolha. Assim é o dilema, e assim este termo se relaciona, também, no
atual ambiente singular informático.
As alternativas propostas por um dilema são essencialmente prejudiciais. Apesar
disso, se for analisado princı́pios e valores éticos-morais, há um parâmetro de onde
se basear para a tomada de decisão. Este paradigma deve ser coerente com o que a
sociedade elege como saudável e aprova para uma manutenção da qualidade de vida
e bem-estar dos indivı́duos.
Nessa encruzilhada, temos os dilemas levantados pelas inovações na ciência da
informação. Assim, de acordo com o artigo-base Schäfer (2020) as redes sociais são
possı́veis fontes de alienação da informação, por ser manipulada com técnicas de
merchandising, tratando a informação como mercadoria e a expondo para consumo
sem a natural digestão, pelo contrário, as propagandas de notı́cias são elaboradas
com a intenção de cativar o olhar com informações rasas e incompletas à primeira
vista. Este impasse seria amenizado caso os usuários abrissem o artigo completo e o
lessem com atenção. Porém, não é a realidade em que a sociedade contemporânea se
encontra. As notı́cias-lanche (snack news como classifica Schäfer) geram a sensação
ilusória de se estar informado sobre o assunto da notı́cia, impedindo, quase por ins-
tinto, que a pessoa se interesse em ler o texto completo, o que lhe proporcionaria o
conhecimento fornecido pelo jornal transmissor. Há mais o que se falar dentro desse
tópico, demonstrando, a saber, que um texto produzido por jornalista ou colunista,
pode ser influenciado por sua parcialidade particular de seus ideais individuas, cer-

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tamente esse é outro dilema difundido por essa tecnologia da informação. Mas o
que exclama preocupação é anterior a essa análise mais profunda da produção do
texto. Já que, uma minoria de 7% de acordo com análise de artigos de pesquisas
sociais ( Schäfer (2020), página 1), de fato abre o link da notı́cia rápida e lê o texto
completo. Assim, o que mais preocupa é a grande maioria sendo anestesiada e influ-
enciada pelas notı́cias manipuladas para serem rapidamente consumidas, isso sem
(ou com) a atenção dos desenvolvedores/publicadores de que sua ambição de mais
leitores em suas páginas podem estar formando um exército de indivı́duos alucinados
por euforias alimentadas nessas informações rasas e desnutridas. Desse modo, outro
impasse é imposto: a relevância desses tipos de notı́cias sobre a formação de atitudes
e comportamentos, que será amplamente explorado nos tópicos subsequentes a este.
Com essa contextualização, aparece a argumentação de Schäfer envolvendo o
conhecimento percebido e o conhecimento factual. E aqui o decisor sofre com o
dilema. Pois depende de o usuário escolher entre ver, se interessar, ler a notı́cia
rápida e seguir o link para ler o texto (adquirindo o conhecimento factual) ou ver, se
interessar, ler a imagem atraente e ignorar o texto, continuando a navegar na rede
social e repetir o mesmo processo com outras notı́cias, lanchando-as (aquisição do
conhecimento percebido). A primeira escolha é árdua e requer esforço e resiliência
cognitiva para entregar aquele tempo maior para a leitura completa. No entanto,
fornece aprendizado real. A segunda escolha é regida pela preguiça e comodismo,
que são preferenciais ao instinto de nossa espécie, por questões primitivas de sobre-
vivência. O que gera, segundo os resultados da pesquisadora, a lembrança de fatos
na capacidade de curto prazo do cérebro, mas não configura o real aprendizado, que
é evidenciado pela lembrança de longo prazo.
Devemos sempre ter a consciência que web sites não são a mesma ideia de redes
sociais. São ambientes distintos, utilizados com intenções divergentes e desenvol-
vidos com propósitos heterogêneos. Daı́ o perigo das redes socias como meio de
transmissão de notı́cias. Portanto, uma solução para o impasse do conhecimento
ser enganoso a partir da influência de interesses que não seja a compreensão impar-
cial de um assunto, seria a regulamentação global definitiva para os meios sociais
digitais não conter notı́cias de qualquer natureza. Em uma primeira abordagem
pode parecer uma decisão extrema, mas tendo em vista a peçonha que é para o
indivı́duo e para a sociedade essa influência do conhecimento percebido, seria o caso
haver a referida proibição e o incentivo ao redirecionamento para sites especı́ficos,
desenvolvidos com o propósito da difusão de notı́cias e a interface favorável para a
leitura completa dos artigos, ao invés de somente manipular todo o ambiente para
mais visualizações e consumo, o que favorece a empresa jornalı́stica transmissora
especı́fica.

4 Análise Tecnológica
As tecnologias essencialmente envolvidas com o dilema são os web sites de notı́cias e,
principalmente, as redes sociais. Entendemos por redes sociais (Dollarhide (2021)) o
ambiente online da web especı́fico para relações interpessoais que incorpora imensa
densidade de informação e ferramentas para comunicação. Por definição, rede social
é a tecnologia informatizada em computadores que usa como base a internet para

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disponibilizar comunicações tão rápidas quanto instantâneas. Essas redes facilitam
o compartilhamento de ideias, pensamentos e informações em larga escala, sem
limite de fronteiras, tendo potencial de conectar indivı́duos desde entre cidades até
a relações internacionais.
O poder das mı́dias sociais vem da capacidade de conectar e compartilhar in-
formação com qualquer indivı́duo na Terra, e isso simultaneamente com a acessibili-
dade diversificada do ambiente. Para se ter um parâmetro do alcance da difusão que
essa tecnologia possibilita, levantamentos recentes resultam em mais de 4.2 bilhões
de usuários de mı́dias socias em todo o mundo (Tankovska (2021b)), a grande por-
centagem desses usuários acessa por meio de dispositivos móveis, o que concede
alcance imediato a toda a informação contida nessa mı́dia. Isto posto, percebe-se
que tal configuração da era da informação provoca além de somente benefı́cios a
humanidade, implica também em possı́veis impasses associados ao relacionamento
complexo que temos com essa tecnologia inédita na História.
Não é novidade que o ambiente digital nos traz riscos especı́ficos, que se não
forem conscientizados podem gerar uma onda de malefı́cios para os usuários em
diversas vertentes. Um exemplo seria o vı́rus de software; ou as notı́cias falsas (fake
news) e mais este, que é a discussão deste texto, o consumo passivo de pobres fontes
de informação online. O artigo tomado como base, aponta o Facebook como objeto
de análise do proposto dilema. Sendo a maior rede social atualmente (Tankovska
(2021a)) a escolha da autora é adequada para demonstrar um quadro real quanto
aos impasses envolvidos com o consumo dessa mı́dia.
O artefato tecnológico Facebook (Hall (2008)) é uma empresa Americana que
oferece serviços de redes sociais online. Fundada em 2004 por Mark Zuckerberg,
Eduardo Saverin, Dustin Moskovitz e Chris Hughes, todos estudantes, na época, da
Universidade de Harvard. A intenção dos inventores do Facemash (primeira versão
do Facebook) foi a de que houvesse um serviço online privado para os estudan-
tes da universidade, onde os discentes avaliassem a atratividade de seus colegas.
Sendo um tópico muito cativante na juventude, brevemente consolidou-se o grande
número de usuários dessa rede de relacionamentos. Contudo, a trajetória inicial da
empresa foi marcada por complicações: logo após dois dias de operação, foi desli-
gado o serviço pela Universidade devido a violação da polı́tica interna da instituição
de ensino em consequência das iniciativas de Zuckerberg, o principal desenvolvedor
da rede social. Apesar disso, tamanha foi a fama dessa inovação que houve con-
luio apoiando o Facemash, fazendo, assim, Mark adotar uma URL para sua rede
http://www.thefacebook.com em Janeiro de 2004.
No mês seguinte do mesmo ano, foi laçado a rede social TheFacebook.com, onde
era possı́vel o compartilhamento de fotografias e informações pessoais ou qualquer
outro conteúdo dentro dessas categorias. Imediatamente outras universidades do
paı́s foram alcançadas pela crescente difusão do artefato e dentro de cinco meses já
haviam 250 mil estudantes de 34 escolas usando a rede; no mesmo ano, ainda, a
empresa passou a reter ads (publicidade monetizada) de outras empresas. Foi du-
rante os anos de 2004 e 2005 que o Facebook ergueu o que seriam seus fundamentos
rudimentares: a linha do tempo (chamada primeiro de Wall); o suporte para pro-
pagandas; o argumento de transparência na identidade pessoal (honestidade contra
o perfil falso); a funcionalidade de marcar pessoas nas fotos postadas no site (o que

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gerou uma oportunidade de relacionar amigos e amigos de amigos) e, em 2005, foi
aberta a rede internacional para estudantes fora do Estados Unidos se cadastra-
rem como usuários. Fora esses, nos anos seguintes a empresa expandiu ainda além
seus horizontes, a saber: permitiu que qualquer estudante maior de 13 anos usu-
fruı́sse da rede social, e ainda: as empresas que anunciavam em seu site, criavam
novas relações com os consumidores de seus produtos, esse engajamento em larga
escala direto com os clientes das empresas foi pioneiro do ambiente do Facebook,
influenciando mais empresas a começar investir na rede social como meio para sua
publicidade e propaganda.
O revés com a privacidade aconteceu muito cedo na história da empresa, desde
2006 com a criação do News Feed (Feed de Notı́cias), que relatava toda a mu-
dança mais atual dos contatos do usuário; a polêmica mais relembrada foi com a
implementação do serviço Beacon, que permitia seus amigos verem quais produtos
comprara das companhias participantes do serviço, o que certamente gerou con-
trovérsia já que seus membros sentiram que sua privacidade foi invadida. O dilema
do Facebook com a privacidade é constante, apesar de a empresa se preocupar com
a polı́tica de privacidade, ela não deixa de ser criticada pela complexidade dessa
polı́tica e por sua frequente retificação.
Em consequência da natureza de seu ambiente, o Facebook se tornou um ins-
trumento influenciador de movimentos polı́ticos, o caso conhecido seria da eleição
presidencial dos Estados Unidos em 2008 (Weigel et al. (2011)). Portanto, ainda
que os desenvolvedores e projetistas não intentem em influenciar a grande cadeia de
comunicação que proporcionaram com suas faculdades, o ambiente da rede social é
fértil para a disseminação de informações sedutoras que tem a capacidade de infor-
mar, mas, por vezes, com parcialidade, como ocorre em manifestações polı́ticas, por
exemplo.
Tendo esse contexto nota-se que a gênese do Facebook foi benigna, já que a
intenção dos fundadores era o sucesso de sua ideia na área de relacionamentos inter-
pessoais. Contudo, há consequências irremediáveis contra a ambição desenfreada,
por certo foi uma brecha para corromper-se a iniciativa social, a abertura para mer-
chandising (mercadoria). Mercadoria do ambiente para terceiros, e esses, com suas
próprias intenções, imputam o que não estava no projeto original: ofertas envolven-
tes que priorizam somente a venda do produto, sendo oferecido a todo custo em
único objetivo de conseguir mais e mais clientes que lhe gerem dinheiro e lucro.
Esse é o espı́rito de todo e qualquer negócio. Seguramente não foi diferente com o
Facebook e por isso abertamente negociaram a venda de espaço na página de sua
empresa, tendo em vista o aumento de clientes para os terceiros e uma entrada de
renda continua, de certo era bom contrato.
Tal exemplo ilustra o que ocorre atualmente com as notı́cias de sites de mı́dia
jornalı́stica dentro do ambiente da rede social. É o mesmo princı́pio das empresas
que formavam os primeiros stakeholders do Facebook: a ‘venda’ indiscutı́vel de seu
‘produto’, como que não importa se tem qualidade factual para o consumidor; não
é levado em conta se estou imparcial na produção de meu texto, apenas que venha
o acesso ao meu site e esse venha depressa; ou se é produzido apenas por obrigação
com os princı́pios da publicidade, sacrificando o rigor cientı́fico de toda e qualquer
informação. Esse é o cenário da grande maioria anexada nas redes sociais, a questão

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da ética na produção e disseminação de notı́cias não cabe somente ao consumidor
(usuário) ou o implementador (projetista) do ambiente transmissor, mas principal-
mente daquele que busca um espaço de divulgador nessa sociedade interconectada
tão facilmente influenciada. Tendo em vista que essas esferas das redes sociais são
abertas com liberalidade a todo e qualquer indivı́duo ou empresa que se propõe fazer
parte, cabe a este mesmo terceirizado a condenação de se manter às rédeas da moral
universalmente entendida e da ética vastamente difundida no contemporâneo.
Resta, ainda, o tema da conscientização do usuário. Aqui cabe o que se refere o
dilema da ilusão do conhecimento. Apesar de haver a necessidade quanto a agressiva
crı́tica contra as notı́cias rápidas, o consumo dessas não deixa de ser escolha do que
utiliza a rede social. Os usuários do Facebook (Walton (2021)) não são especı́ficos
e não é errôneo expor que todo mundo é o seu mercado alvo – como foi exposto no
parágrafo anterior. Para fins de contextualização, os usuários do Facebook tendem
mais para estudantes de universidade do que os de ensino médio (pesquisa orientada
no artigo citado previamente). Assim, não é eufemismo citar outra vez que depende
do esforço individual para tornar o ambiente digital social em mais um instrumento
para aquisição de conhecimento, e isso através da análise crı́tica ativa de se ponderar
acerca da fonte, do autor e do domı́nio da informação exposta na mı́dia social.
Apesar de que, como foi proposto aqui, os difusores terceirizados desses ambientes
não colaborarem com a aquisição de nutrientes saudáveis a vida intelectual de seus
consumidores nas redes sociais.

5 A Ilusão e a Cólera
O dilema especı́fico redigido no corrente texto, se insere na formação da ilusão
do conhecimento e a cólera do comportamento social gerado pela influência dessa
ilusão. A partir da reincidência de notı́cias superficiais nas redes sociais, ocorre a
formação de um conhecimento percebido, contrário ao conhecimento que é formado
pela leitura completa de artigos. Essa percepção de se estar informado motiva
uma falsa segurança da aquisição do conhecimento observado, gerando, então, a
ilusão do saber. A começar com essa ilusão, surgem impulsos que formam atitudes
relacionadas com aquela informação, a saber: o excesso de confiança na própria
inteligência e a inclinação para se debater a informação adquirida pelas notı́cias
rasas nas redes sociais.
Sabendo que a mı́dia comporta um papel vital para o nı́vel de conhecimento de
uma sociedade, já que por ela há acesso e aquisição de informação, deve haver uma
conscientização acerca da postura dos consumidores da informação posta a mesa
pela mı́dia. Esse fato se torna ainda mais agudo na era da informação, pois com
toda a sorte de informação servida instantaneamente de modo quase onipresente,
carece um comportamento crı́tico quanto seu consumo e uso. Para tanto, no âmbito
mais rudimentar desse dilema, se encontra o agente decisor, eu e você, os quais fazem
o indispensável uso dos ambientes da internet, de modo cotidiano e constante, mas
que também necessitam ter a consciência de não aceitar as informações expostas
passivelmente. As vertentes dessa escolha se apresentam em duas formas: a) ler o
artigo completo e assim adquirir conhecimento acerca do tópico; b) satisfazer-se com
a notı́cia superficial apresentada pela mı́dia no momento de acesso as redes sociais,

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o que configura a formação de um mau hábito, que quando reincidente, gera uma
inclinação a comportamentos de ignorância.
A primeira opção é árdua, pois devemos escolher sofrer um esforço cognitivo a
mais no nosso cotidiano: dedicar tempo e atenção para uma leitura completa e crı́tica
do texto apresentado pela mı́dia. A questão é, enquanto a curiosidade é intrı́nseca
a nossa espécie, o esforço, além do que já temos em fácil acesso, é tido como uma
perda de energia desnecessária. Portanto, para a natureza do nosso corpo, quanto
mais cômodos estivermos e menos energia gastarmos, melhor e mais proveitoso será.
Não é novidade que as corporações (públicas ou privadas), que buscam lucro e
prosperidade, exploram essa falha nos rudimentos do Homo sapiens. Desse modo,
percebe-se o cenário em que nos encontramos perante o grande ambiente digital
informatizado, o qual nos expomos todo o dia. Seguindo esse pensamento, há de se
perceber a tendencia que temos para não buscar mais do que já está diante de nossos
olhos; a autora Schäfer (2020) enfatiza, baseada em outras pesquisas, que somente
7% dos artigos de jornais postados nas redes sociais são lidos completamente, isso
significa que o vasto complementar dessa porcentagem se satisfaz com a imagem e o
trecho textual sensacionalistas, os quais são os vilões desse dilema, que alimentam
o conhecimento percebido em detrimento do conhecimento factual ao priorizarem a
notı́cia rápida acima da leitura completa do referido artigo.
A segunda opção, é o ponto chave desse texto. É onde germina a ilusão do saber
e a percepção de se estar informado. Ao escolher, subconscientemente por hábito
ou passivelmente por ócio, apenas deparar-se com a propaganda de notı́cia exposta
no mural de notı́cias das redes sociais, o usuário está se expondo e proliferando a
uma construção de fonte pessoal de informações desnutridas que, longe de não o
influenciarem, na verdade passará a ordenar suas atitudes a partir desse hábito,
já que essa é a base de sua aquisição de conhecimento diário como ser humano.
A frequência com que temos contato com tópicos de notı́cias resulta na percepção
de se estar bem informado quanto ao assunto daquela notı́cia. Nesse sentido, se
essa dieta superficial for mantida, os resultados também serão coerentes com o valor
nutritivo desses insumos. Daı́ surgem as manifestações antiéticas do comportamento
do indivı́duo que está sendo influenciado, por vezes sem consciência dessa influência,
pela recorrente informação rasa exposta em seu cotidiano. Ora, essa ilusão de se
conhecer, partindo de fontes que carecem de rigor, e sendo alimentada por nossa
própria vontade irredutı́vel e apoiada pelo que vemos – e não estudamos – nos meios
digitais, gera, na verdade, impasses disfarçados de benignidades a nossa sociedade.
Pelo artigo-base fica explı́cito que há consequências para a sociedade partindo dessa
ilusão do conhecimento, a que os indivı́duos consumidores, na pesquisa, de notı́cias
rápidas nos meios sociais digitais, formam de maneira indireta fortes convicções e
desejo de compartilhar seus ideais se baseando em um sentimento ilusório de se estar
informado.
Cabe ainda apresentar o argumento de que a informação simplificada, ou seja,
aquela formulada com interesse sensacionalista pelas corporações que se proponham
o ofı́cio de divulgador de informação, não substitui a informação rigorosa que, para
ser compreendida, requer do leitor um esforço cognitivo árduo. Essa divergência é
ainda mais profunda: a informação produzida com sensacionalismo, gera parciali-
dade no entendimento do tópico discutido. A intenção de manter, e gerar cresci-

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mento, nos acessos do web site ou rede social é argumento suficiente para direcionar
os investimentos dessas corporações para manipular a informação publicada em seus
respectivos ambientes; de modo que, por natureza de nosso ser, a informação sim-
plista, que gera sensacionalismo no que lê, prendendo sua atenção com o estimulo
das emoções do usuário.
Nesse cenário, tal abordagem da informação é extremamente peçonhenta a
formação de um cidadão que deveria ser regido pela ética, moralidade e boa-fé. Toda
essa corrupção de saudáveis virtudes se deve ao teor magro em nutrientes dessa in-
formação superficial e sensacionalista. Essa, que é responsável, dentro do contexto
já exemplificado da polı́tica, por manifestações de cólera no comportamento daque-
les adeptos a uma dieta desnutrida em sua fonte de conhecimento. Schäfer expôs
explicitamente em suas pesquisas que a reincidência de notı́cias rasas, é responsável
pela vontade de se debater o assunto; além de influenciar na disposição de argumen-
tar sobre o assunto dessas notı́cias, se apresentando com excesso de confiança ao seu
conhecimento.
Tudo isso embasa a questão de manifestações com teor de agressão tão recorrentes
no presente século (mas não exclusivo dele). Um exemplo a ser dado para a ilus-
tração desse dilema, foi o recente episódio com o ex-presidente Donald Trump, dos
Estados Unidos, onde a rede social Twitter (2021) suspendeu a conta desse usuário,
que detinha grande poder como influenciador de opiniões, após suas publicações se-
rem classificadas como incitação à violência. Ocorreu que, após as eleições de 2020,
onde o ex-presidente Donald Trump foi derrotado pelo eleito presidente Joseph R.
Biden Jr., logo na primeira semana de 2021, D. Trump publica em sua rede social
mensagens que clamavam uma fraude eleitoral, o que acendeu as emoções daqueles
que o apoiaram ao longo da eleição. Com essa falsa acusação de fraude nas eleições
presidenciais de seu paı́s, Donald Trump causou a elevação de um sentimento de
protesto contra o Estado americano. Além de suas publicações no Twitter, houve
também um discurso a uma multidão, tudo isso cumulou em uma postura de cólera
daqueles manifestantes. Estimulados pelas mensagens sensacionalistas de D. Trump
e instigados por uma teoria da conspiração levantada pelo mesmo, uma multidão
concordou com essa emoção de se revolucionar a seu tempo, consumando uma ma-
nifestação polı́tica de acordo com seu sentimento agressivo.
O episódio terminou com uma invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021 por
uma multidão motivada pela ilusão de se estar com a razão, a partir da influência
recorrente de um lı́der polı́tico usando como meio de comunicação uma rede social.
O assalto ao Capitólio teve um triste fim: cinco pessoas foram mortas (quatro ma-
nifestantes e um policial) e dezenas foram presas. Mas não deixa de servir como
exemplo para a extensão da influência da rede social como meio divulgador, per-
mitindo que qualquer pessoa com um teclado e uma conexão de Internet possa se
conectar sem esforço ao maior sistema de distribuição do mundo.
Apesar de que, os códigos de ética das corporações analisadas serem redigidas
com postura perfeitamente ética, sem brechas e com teor comprometido a sociedade,
há de se observar que nem todas as questões que influenciam todas as vertentes
que envolvem todo o ambiente virtual, com todos os ângulos de possibilidades de
relação, são explicitamente regulamentados. O presente dilema é uma evidencia
dessa complexidade. Por consequência disso, a confiança recai toda sobre o agente

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decisor, através da decisão desse que procederá os resultados do dilema imposto.
Nesse sentido, Jones (2016) comenta sobre a escolha e postura comportamental do
usuário da informática:
“Access depends not only on having the financial means to acquire the necessary
technical resources but also the necessary skills and knowledges to use such resources.
This can result in knowledge divides between those who have the expertise to use
technology to their benefit, and those who don’t.”
Assim, permanece compreensı́vel que o maior peso dos resultados da escolha, vem
da postura do decisor frente a onipresente exposição a informação. Como implica
o dilema proposto aqui, não basta ter informação, as sociedades contemporâneas
são as mais bem servidas de conhecimento até o atual ponto da História. Portanto,
podemos não saber o que fazer com essa novidade. Para que não encontremos
malefı́cios no manuseio e consumo da informática e suas tecnologias, basta, como
orienta Jones, um pensamento crı́tico e ativo frente a informação imponente de
todo dia; a postura analı́tica implica uma habilidade de distinguir a parcialidade e
sensacionalismo do rigor factual e ético que se apresenta como requisito para uma
vida intelectual saudável.

6 Fundamento Jurı́dico
Pode-se expor que, a regulamentação do ambiente da internet é um construto em
andamento. Para se ter um arcabouço legislativo acerca do dilema apresentado nesse
texto, se faz necessário ter uma ideia enxuta do que se trata.
Analisando com mais detalhe as questões e impasses mais debatidos do desafio
da regulamentação da internet, como a privacidade e o uso de dados pessoais, nota-
se que o dilema da ilusão do conhecimento se relaciona em muitos ângulos ainda
mais profundos. Mais minuciosos pois, além dos princı́pios éticos em que os imple-
mentadores e desenvolvedores necessitam se submeter para a produção e difusão de
um produto da tecnologia da informação, há uma subjetividade comportamental no
que se aplica à escolha do usuário de ler ou não o artigo completo; de estar consci-
ente do conhecimento percebido e do conhecimento factual; de ter ciência da ilusão
intelectual formada a partir de qualquer fonte de informação desnutrida na era da
informação.
Dito isso, é adequado ao dilema expressar-se, também, na forma da liberdade
de expressão, prevista na Constituição (1988) em seu Art. 5º. O inciso IV (é li-
vre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato) imputa a liberdade
de expressar as ideias individuais, mas com a explı́cita assinatura do autor. Não
é intencional demonstrar falhas em nossa Constituição, mas é do conhecimento de
todos que há análises e até estudos rigorosos feitos para encontrar brechas na Carta
magna. Tal oportunismo não é exclusivo dos paladinos da justiça pública, empre-
sas também buscam encaixar-se e, assim, proporcionar mais rendimento as suas
intenções corporativas, sejam elas benignas aos participantes ou não.
Desse modo, permanece implı́cito a existência de um argumento que favorece
as publicações sem restrições quanto ao valor interno da mensagem divulgada nas
mı́dias sociais; quanto ao teor substancial da mensagem e da intenção das asso-
ciações envolvidas (geralmente o lucro financeiro e a prosperidade de seus negócios).

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O inciso XIV garante, universalmente, o acesso à informação, assim todos tem o livre
acesso a toda a sorte de informação que encontrarmos. Porém, o que o dilema ques-
tiona é acerca do teor dessa informação: ela proporciona um crescimento intelectual
saudável? Ou está manipulada segundo a vontade de seus publicadores? Especi-
ficamente no ambiente digital percebe-se essa falta de compromisso e sensibilidade
ao intelecto e, consequentemente, ao comportamento do consumidor de informações
online.
Nesse sentido, torna-se apropriado citar o Marco Civil da Internet L12965 (2014),
que é o articulador entre o direito constitucional de se expressar e a internet. Sendo
uma ferramenta fundamental para a liberdade de expressão, o Marco Civil da Inter-
net apresenta princı́pios, enumerados no Art. 3º, que regulam o uso da internet no
Brasil, assegurando como direitos e garantias aos usuários da internet, no Artigo 7º,
dentre outros mais, a inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações. Essa
regulamentação trata bem dos direitos dos usuários e dos deveres dos projetistas,
mas se analisado o dilema em questão, a ilusão do conhecimento gerada por fontes
desnutridas de informação, permanece vazia a gritante lacuna moral e ética sendo
agredida.
Para que a qualidade do texto seja acrescentada, resta ainda a citação do Pacto
Internacional sobre os Direitos Civis e Polı́ticos D0592 (1992), adotado pela XXI
Sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas de 1996 (e em vigor no Brasil em
1992), através do Decreto n. 592. Onde oferece um detalhe a mais para a funda-
mentação regulatória desse dilema. O Artigo 19, trata da liberdade de expressão,
formalmente expondo que:
“2. Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a
liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza,
independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em
forma impressa ou artı́stica, ou por qualquer outro meio de sua escolha.”
Como já foi exposto, esse princı́pio não satisfaz a problemática do dilema, so-
mente descreve o oportunismo de muitos adeptos ao ambiente influente das mı́dias
sociais na internet. Contudo, o inciso 3 propõe um contraponto:
“3. O exercı́cio do direito previsto no parágrafo 2 do presente artigo implicará
deveres e responsabilidades especiais. Consequentemente, poderá estar sujeito a cer-
tas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei e que se
façam necessárias para:
a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;
b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral pública.”
Discernindo bem esse parágrafo, conhece-se um regimento que vai contra a
prática da difusão inconsequente de informações tendenciosas; manipuladas; par-
ciais. Atentando ao detalhe que as informações produzidas pela mı́dia jornalı́stica
que contamina as mı́dias socias com notı́cias rápidas (snack news) seduzindo os
usuários com imagens e textos produzidos com técnicas de marketing – no lugar de
uma leitura completa com rigor imparcial – geram, se assim consumidas, um senti-
mento de cólera (caso o assunto seja polı́tico, por exemplo; como apontou Schäfer
(2020)) que leva a comportamentos com teor agressivo motivado por essa ilusão do
conhecimento percebido, acumulando até mesmo em manifestações povoadas por in-
divı́duos carregados pela ignorância e violência. Torna-se claro a violação do tópico

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b do inciso 3, que condena completamente o teor de tais publicações, mesmo nas
mı́dias sociais, sendo, assim, infração contra uma recomendação internacional da hu-
manidade. Trata-se, portanto, de uma transgressão quanto a uma ação regulatória
oficial, que é comumente ignorada pela ambição e motivação ı́mpia dos autores de
snack news.

7 Os Praticantes
As atividades profissionais que estão substancialmente envolvidas com o dilema são
as empresas que regem as redes sociais e as sedes que administram as mı́dias jor-
nalı́sticas, essas que estão intrinsecamente relacionadas com o artefato tecnológico
antes citado.
Nesse sentido, seria injusto culpar os engenheiros de software da Facebook pela
propagação de snack news nesses ambientes. Portanto, cabe a administração da em-
presa receber a responsabilidade quanto ao consentimento a disseminação de notı́cias
rasas e enredadoras. Quanto às mı́dias jornalı́sticas online, apesar de serem fonte
de conhecimento factual, como Schäfer apontou, devido as estratégias gananciosas
quanto as suas matérias publicadas, a implementação de técnicas de mercadoria
usando a informação, tem se mostrado um malefı́cio corrupto para essa mı́dia.
Os Padrões de Comunidade Facebook (2021) e os Termos de Serviço Facebook
(2020), não apresentam explicitamente limitações para a publicação manipulada de
informação. Há a aderência ao combate a condutas prejudiciais, sendo proibido a
publicação de qualquer natureza ilegal, discriminatória ou fraudulenta; incluindo,
também, compartilhamentos que prejudiquem ou viole o direito de outras pessoas.
Em um trecho do Termos de Serviço, a empresa é assertiva e expõe:
“Não controlamos nem orientamos o que as pessoas e terceiros fazem ou dizem
e não somos responsáveis pela conduta deles (seja online ou offline) ou por qualquer
conteúdo que compartilham (inclusive conteúdo ofensivo, inadequado, obsceno, ilegal
ou questionável).”
Tal declaração pode ser vista como um reflexo do direito dos indivı́duos de se
expressar abertamente, mas prova, ainda mais, o quão subjetivo é a decisão de se
consumir ou não as fontes de informação que, ao invés de construir conhecimento,
engoda uma ilusão do mesmo. Já nos Padrões de Comunidade, a saber, é informado
um tópico onde conteúdos questionáveis são listados, dentre esses há os maiores
impasses que podem envolver as redes sociais, como: discurso de ódio; violência e
conteúdo explı́cito; nudez e atividades sexuais; conteúdo cruel ou insensı́vel. Isso
sem citar as questões de privacidade. Desse modo, é indiscutı́vel que a empresa
Facebook não têm uma postura antiética, pelo contrário, é apreensiva em atender e
regular nas diversas vertentes sociais, morais e étnicas que envolvem os seus usuários,
desenvolvedores e projetistas. Assim, não há evidência de trabalhadores ferindo a
ética ao exercer sua função na empresa.
Analisando a imprensa, há de citar o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros,
pela FENAJ (2021), que regulamenta a conduta e responsabilidade do profissional
jornalista, bem como afirma o direito ao acesso à informação. Logo no capı́tulo I é
manifesto que a divulgação da informação necessita ser precisa e correta, bem como
a veracidade deve ser sempre um requisito. Além disso, no Capı́tulo II, o Art. 4º

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expõe que “O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato
dos fatos, razão pela qual ele deve pautar seu trabalho pela precisa apuração e pela
sua correta divulgação.” Evidenciando a obrigação que esse profissional tem de se
manter justo e honesto quanto ao exercı́cio cognitivo que faz para gerar um produto
do conhecimento.
Com ainda mais arcabouço argumentativo, o Art. 7º dispõe das proibições
quanto a função do jornalista; em seu inciso II afirma que o profissional jornalı́stico
não pode se submeter a regras que corrompem a genuı́na apuração dos fatos e à cor-
reta divulgação da informação por ele produzida; o V veta usar o jornalismo para
incitar a violência, a intolerância, o arbı́trio e o crime. O Capı́tulo III, entretanto,
é especialmente vital para a produção deste texto; regendo as responsabilidades
dessa profissão, declara, no Art 11º, que o jornalista não pode divulgar informações:
“I - visando o interesse pessoal ou buscando vantagem econômica; II - de caráter
mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cober-
tura de crimes e acidentes.” Notando que há regulamentação quanto a manipulação
da informação para satisfazer quaisquer desejos se não o rigor esclarecido no pre-
sente código, há de se questionar a postura dos divulgadores e produtores de snack
news, que visam mais a informação como mercadoria a ser vista por milhões, do que
uma fonte saudável de conhecimento ao indivı́duo que a consumir. Evidenciando,
assim, que há certa e rigorosa normatização para a profissão que, por vezes, pode
ser desvanecida devido aos interesses fundamentados em viés parcial do autor.
Resta, ainda, citar o Código de Ética do Profissional de Informática SBC (2013),
que se relaciona com ambos os praticantes do dilema, expostos aqui. Esse elabora
treze artigos que governam os profissionais de informática. Os praticantes desse di-
lema se relacionam profundamente com a informática, por ser o ambiente de trabalho
principal para ambos, existe a necessidade de não permanecer alheio aos princı́pios
citados nesse código, que busca zelar pela ética na natureza de operação desse ins-
trumento de comunicação. Conforme exposto, percebe-se a ilustração completa
do dilema da ilusão do conhecimento e sua influência no comportamento humano.
Mesmo com normas oficiais, há violações que geram vastas consequências para a
sociedade, para tanto é urgente a conscientização desse impasse.

8 Proposta de Intervenção
Para que a conscientização desse dilema seja evidente, se faz exigente uma proposta
de intervenção. Para tanto, como já foi observado antes, como o usuário decisor é
o principal agente desse dilema, recaı́ sobre o mesmo a responsabilidade de eleger a
escolha mais árdua e benigna a si mesmo; para isso há a questão da conscientização
acerca da ignorância gerada por essa ilusão da percepção de se estar informado;
deve haver resistência psicológica, usando como instrumento a inteligência emocio-
nal contra o sentimento de cólera despertado por todo aquele que se inclina a um
debate ou manifestação de seu saber, seja sua fonte saudável ou não. Nesse sentido,
foi observado os preceitos apresentados por Jones (2016), em concordância com o
desenvolvimento do dilema ao longo do presente texto, logo o estudo de Jones acon-
selha ter uma postura ativamente analı́tica e multidisciplinar para conviver com as
inovações da tecnologia da informação. O autor declara:

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“This kind of analysis is an exercise in critical thinking in its fullest sense [...]
It implies an ability to distinguish opinion from fact, to recognise biases and falla-
cies, and to substantiate claims with evidence. It may also involve an unpacking
of taken-for-granted beliefs, common-sense assumptions and dominant ideologies to
reveal how technologies are socially and historically constructed, and how they may
be skewed in support of particular interests and agendas.”
De imediato se torna nı́tido a conduta do usuário da internet frente ao oceano de
informações que lhe apresentam. A habilidade e predisposição de ler criticamente,
identificando e ponderando a data, os autores, o conteúdo, o domı́nio do site etc. E
tendo atitudes além de uma análise superficial, observando minuciosamente e tendo
um método de procedimento para adquirir conhecimento, é o que nutrirá com sólido
alimento o intelecto do usuário. Esse método, nas palavras de Jones, implica uma
capacidade de distinguir opinião de fato, de reconhecer preconceitos e falácias, e de
fundamentar as alegações com evidências; decompondo crenças, suposições de senso
comum e ideologias dominantes para revelar como as tecnologias são construı́das
social e historicamente, e como elas podem ser distorcidas em apoio a interesses e
agendas particulares.
Com tudo isso, resta a afirmação de que não basta uma censura direta dos Esta-
dos, sim uma educação comportamental dos indivı́duos que usufruem das tecnologias
sem precedentes na humanidade. Bem como uma conscientização acerca do dilema
da ilusão do conhecimento e sua consequência como sendo uma conduta de cólera,
individual e coletiva, dependendo da situação vivida por cada cidadão. Em toda
a situação há a influência dos meios midiáticos, tão presentes no cotidiano do ser
humano contemporâneo. Por consequência disso há a urgência de se ter iniciativas
de educação comportamental e temperamental para aqueles que se expõem a toda
sorte de informação online. Cursos de capacitação em inteligência emocional; estu-
dos coletivos sobre os códigos ética, tanto na disciplina da tecnologia da informação
SBC (2013), quanto a observação e cobrança a respeito do Código de Ética dos Jor-
nalistas Brasileiros FENAJ (2021). Além disso, explanações educativas, mesmo em
instituições de ensino, em todos os campos do conhecimento, sejam feitas no tema
de pensamento e leitura ativa e crı́tica, seguindo o conselho de Jones:
“The challenge is how to engage students through relevant topics, and through
values and principles that resonate with their own experiences, while at the same time
encouraging critical approaches that look beneath the surface and question taken-for-
granted assumptions.”
A responsabilidade de ter uma mentalidade e comportamento social sadios é
completamente do indivı́duo, tendo consciência da atual situação do mundo con-
temporâneo, devido suas inclinações a diversos tipos de corrupção, como o impasse
demonstrado nesse dilema, nos é um alerta para buscar o conhecimento com de-
terminação e esforço, não somente apreciar as ferramentas da ciência como uma
maneira de ser mais rápido e melhor. As consequências desse dilema se mostra-
ram peçonhentos para a sociedade onde se prolifera a conduta descomprometida
dos usuários da internet em conjunto com a propaganda sensacionalista das mı́dias
envolvidas, onde não se importam com a qualidade nutricional a que servem seus
consumidores, mas tão somente desejam o acesso e frequência constante em suas pla-
taformas virtuais, viciando e, mesmo que indiretamente, influenciando seus usuários

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a uma formação de hábitos nocivos ao seu comportamento individual e, consequen-
temente, coletivo.

9 Considerações Finais
O presente artigo foi o resultado de um estudo dirigido ao longo da disciplina In-
formática e Sociedade, que tem por objetivo estimular a pesquisa e análise quanto
as relações entre a ciência e tecnologia da informação e a sociedade. Nesse rela-
cionamento encontram-se inúmeros dilemas de natureza ético-moral, onde o apre-
sentado aqui fora apenas um único ângulo do grande debate desses ambientes web.
Além dessa matriz, houve a introdução e o trabalho feito com o instrumento Over-
leaf/LaTex, sendo de vital importância para a concepção de um artigo rigoroso.
Tanto a finalidade de ter experiência com a ferramenta Overleaf, quanto a de de-
senvolver uma postura analı́tica frente a um dilema, foram desenvolvidos conforme a
orientação do professor. Certamente foi um desafio, mas devo registrar que desde o
primeiro dia de aula, o professor nos questionou sobre dilemas que envolvem a soci-
edade e a inovação que as tecnologias de informação trouxeram para a disseminação
de informações. Logo me veio algo que sempre incomodou minha consciência quando
me deparava com fontes de conhecimento no ambiente online. Assim, desenvolvi esse
incômodo com base no artigo de Svenja Schäfer, explorando e aprofundando o que
ocorre quando somos expostos a informações rasas e desnutridas.
Por mais que o artigo requereu tempo e padecer esforço, não posso negar o cres-
cimento que adquiri como estudante. A partir da proposta do estudo, foi exercitado
o dever da consciência e a habilidade de criticar e analisar questões fundamentais
para a composição sadia de nossa sociedade. Alicerçado na atividade de refletir,
pesquisar e apresentar um dilema, o presente artigo foi elaborado com a intenção de
conscientizar a respeito da ilusão do conhecimento.

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