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OS NÍVEIS DO CONHECIMENTO:

SENSO COMUM E SENSO CRÍTICO

LUCKESI, Cipriano e PASSOS, Elizete Silva. Introdução à filosofia.


6ª. Ed. São Paulo: Cortez, 2009 (p. 36 – 41)

O senso comum é a compreensão da realidade, constituída de um conjunto de


opiniões, hábitos e formas de pensamento, assistematicamente estruturada e
utilizada diariamente pelos seres humanos como forma de entendimento e
como forma de orientação de suas vidas.

É o entendimento que emana das experiências cotidianas das pessoas; por


vezes válido, por vezes sem qualquer fundamento ou justificação. Nem sempre
é válido o ditado de que a “voz do povo é a voz de Deus”, no sentido de que
aquilo que o povo diz, no dia-a-dia, é verdade. Por vezes, o que o povo diz é
simplesmente um conjunto de ingenuidades; porém por vezes é significativo e
tem validade. Assim, pode-se dizer que o senso comum carrega em seu seio o
bom senso, que nada mais é do que o conjunto de entendimentos e ações
realizadas pelo ser humano, com base no conhecimento espontâneo e
assistemático, que revelam acertos, diríamos quase que uma “ciência
implícita”.

Diz-se que este conhecimento é o da prática utilitária, devido ao fato de ele dar
suporte ao conjunto das ações diárias dos seres humanos em sociedade, sem
se perguntar e sem explicar em essência o que elas significam. Ou seja, faz-se
alguma coisa desta ou daquela maneira devido ao fato de que “acostumou-se”
a fazer assim. Porém, nunca se pergunta “porque” se faz desta maneira, nem
qual é o fundamento desse modo de agir. Por exemplo, usamos o dinheiro
diariamente, mas não nos perguntamos o que ele significa na economia
política e na sociedade capitalista na qual vivemos.

Do exposto, pode-se concluir que o conhecimento produzido pelo senso


comum é conhecimento, porém superficial, baseado nas aparências dos fatos
e acontecimentos.

Entre o senso comum e o senso crítico há um salto qualitativo; enquanto um é


superficial e fragmentário, o outro pretende ir à essência e buscar
compreensões coerentes e universais.

Um dos cernes da questão dos níveis do conhecimento se acha na maneira de


apreensão da realidade. O conhecimento prático-utilitário do senso comum
carece de um embasamento metodológico. Considerando que ele tem origens
nas experiências comuns e espontâneas do dia-a-dia, o enfrentamento da
realidade vai se dando de forma ametódica e assistemática. Os entendimentos
vão se formulando ao sabor das circunstâncias que se apresentam, o que os
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faz imediatistas e utilitaristas, já que as experiências vividas quase sempre
estão ligadas ao mundo mais próximo e, por isso, mais ou menos valorizadas,
a depender do papel que venham a desempenhar na satisfação de
necessidades emergentes. Por outro lado, o entendimento que se formula a
partir do senso crítico tem um nível completamente diferenciado, pela sua
coerência, organicidade e universalidade de seus juízos.

O senso crítico exige um patamar superior de investigação e produz um


entendimento mais significativo e abrangente da realidade.

Do ponto de vista da construção do conhecimento, ele é intencional, voluntário


e, por isso, utiliza-se de uma variado recurso lógico-metodológico para
apreender a verdade da realidade. Não espera, espontaneamente, que os
fatos exijam alguma interpretação. O senso crítico está sempre inquieto com o
desconhecimento e com a ignorância sobre os fatos e acontecimentos.
Intencionalmente, procura compreendê-los. Para tanto, busca a sua essência,
ou seja, o verdadeiro significado, que está oculto à primeira olhadela.

O conhecimento do senso crítico é metódico. Além disso, manifesta-se como


um patamar superior de compreensão da realidade. O que significa isso?
Significa que o seu resultado, a sua explicação, explicita significativamente o
que é um fato, o que é uma situação. Lembremo-nos dos casos da “febre
puerperal” e do “bonapartismo”. No nível do senso comum, a febre puerperal
poder ser um castigo dos céus, e o golpe de Estado um feito heróico de um
ditador. No entanto, no nível do senso crítico, esses conceitos explicativos
foram extraídos da própria realidade pelo uso de um instrumental
metodológico. Constituíram-se não como “eventuais explicações” da realidade,
mas sim como conceitos científicos universais e válidos. Isso significa que
valerão para sempre? Não! Tanto os desvios orgânicos da febre puerperal
como a prática de governo bonapartista poderão desaparecer da face da Terra
e, então, esses conceitos não serão mais do que lembranças de fatos que
aconteceram no passado.

CONHECIMENTO E INFORMAÇÃO

PIMENTA, Selma Garrido. (Org.) Saberes pedagógicos e atividade docente.

2ª. Ed. São Paulo: Cortez, 2000. (p. 22)

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Conhecimento não se reduz a informação. Este é um primeiro estágio
daquele. Conhecer implica um segundo estágio: o de trabalhar com as
informações, classificando-as, analisando-as e contextualizando-as. O terceiro
estágio tem a ver com a inteligência, a consciência ou a sabedoria. Inteligência
tem a ver com a arte de vincular conhecimento de maneira útil e pertinente, isto
é, de produzir novas formas de progresso e desenvolvimento; consciência e
sabedoria envolvem reflexão, isto é, capacidade de produzir novas formas de
existência, de humanização.

CONHECIMENTO E PODER

PIMENTA, Selma Garrido. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente.


2ª. Edição. São Paulo: Cortez, 2000. (p. 22)

A informação confere vantagens a quem a possui, senão as sociedades não


se armariam contra a divulgação das informações, nem as manipulariam. O
acesso à informação não se dá igualmente a todos os cidadãos.

O poder não é intrínseco àqueles que produzem o conhecimento, senão


àqueles que controlam os produtores de conhecimento. Um enorme poder flui
do conhecimento, mas não daqueles que o produzem. Não basta produzir o
conhecimento, mas é preciso produzir as condições de produção do
conhecimento. Ou seja, conhecer, significa estar consciente do poder do
conhecimento para a produção da vida material, social e existencial da
humanidade.

CONHECIMENTO ESCOLAR

PIMENTA, Selma Garrido. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente.

2ª. Edição. São Paulo: Cortez, 2000 (p. 23)

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... A escola (e os professores) tem um grande trabalho a realizar com as
crianças e jovens, que é proceder à mediação entre a sociedade da informação
e os alunos, no sentido de possibilitar-lhes pelo desenvolvimento da reflexão
adquirirem a sabedoria necessária à permanente construção do humano.

Entendemos que a educação é um processo de humanização; que


ocorre na sociedade humana com a finalidade explícita de tornar os indivíduos
participantes do processo civilizatório e responsáveis por levá-lo adiante.
Enquanto prática social, é realizada por todas as instituições da sociedade.
Enquanto processo sistemático e intencional, ocorre em algumas, dentre as
quais se destaca a escola. A educação escolar está assentada
fundamentalmente no trabalho dos professores e dos alunos, cuja finalidade é
contribuir com o processo de humanização de ambos pelo trabalho coletivo e
interdisciplinar destes com o conhecimento, numa perspectiva de inserção
social crítica e transformadora.

A sociedade civilizada, fruto e obra do trabalho humano, cujo elevado


progresso evidencia as riquezas que a condição humana pode desfrutar,
revela-se também uma sociedade contraditória, desigual, em que grande parte
dos seres humanos está à margem dessas conquistas, dos benefícios do
processo civilizatório. Educar na escola significa ao mesmo tempo preparar as
crianças e os jovens para se elevarem ao nível da civilização atual – da sua
riqueza e dos seus problemas – para aí atuarem. Isso requer preparação
científica, técnica e social.

A finalidade da educação escolar na sociedade tecnológica, multimídia e


globalizada, é possibilitar que os alunos trabalhem os conhecimentos
científicos e tecnológicos, desenvolvendo habilidades para operá-los, revê-los
e reconstruí-los. Há que os articular em totalidades que permitam aos alunos
irem construindo a noção de cidadania mundial – em referência à expressão
utilizada por Morin (1993).

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A SOCIEDADE DO CONHECIMENTO E AS REFORMAS EDUCACIONAIS

José Eustáquio de Sene


Doutorando em Geografia Humana no Depto de Geografia da Universidade de São Paulo
eusene@uol.com.br

Buscando dar uma explicação historicamente conseqüente para a mudança no


papel da informação e do conhecimento, Castells utiliza a categoria “modo de
desenvolvimento”. De acordo com o sociólogo espanhol “os modos de
desenvolvimento são os procedimentos mediante os quais os trabalhadores
atuam sobre a matéria para gerar o produto, em última análise, determinando o
nível e a qualidade do excedente”. Assim, a história humana foi marcada por
diferentes modos de desenvolvimento: o agrário, o industrial e o informacional.
O que os diferencia é basicamente o fator de produção mais importante, o que
está atrelado ao grau de desenvolvimento tecnológico vigente em cada um
deles e ao nível de produtividade.

No modo de desenvolvimento agrário, vigente desde o neolítico, o fator de


produção mais importante era a terra. O trabalhador atuava sobre ela com o
objetivo de produzir os meios de subsistência, como os alimentos. Por séculos,
diferenças de produtividade estiveram mais ligadas à variabilidade de
fertilidade natural dos solos do que aos avanços tecnológicos.

Com o advento das revoluções industriais, a humanidade adentrou no modo de


desenvolvimento industrial. A partir da era industrial, os fatores de produção
mais importantes passaram a ser as matérias-primas e as fontes de energia.
Da perspectiva da Geografia houve uma crescente tecnificação do território,
uma enorme expansão do que Milton Santos chama de meio técnico. A partir
daí, todas as sociedades industrializadas passaram gradativamente a funcionar
segundo a lógica do industrialismo: a produção e circulação de bens
maquinofaturados; a agricultura, com a crescente mecanização; e até a cultura,
o conceito de “indústria cultural”.

Segundo a caracterização de Castells, hoje estaríamos vivendo em pleno


modo de desenvolvimento informacional. Deixamos de ser agrários e
industriais? A terra, as matérias-primas e as fontes de energia deixaram de ser
importantes? Nem é preciso dizer que continuamos a nos alimentar, logo
nossa espécie continua sendo agrária. A quantidade crescente de produtos
maquinofaturados disponíveis também não deixa dúvidas de que continuamos
sendo industriais. O que ocorre é que, como aconteceu antes com o
industrialismo, a lógica do informacionalismo comanda todos os setores das
sociedades contemporâneas, pelo menos das tecnologicamente mais
avançadas.

Com o termo “informacional”, Castells busca apreender o fato de que o


conhecimento transformou-se no principal fator de produção no mundo atual.
Em suas palavras:

No novo modo informacional de desenvolvimento, a fonte de produtividade


acha-se na tecnologia de geração de conhecimentos, de processamento de

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informação e de comunicação de símbolos. Na verdade, conhecimentos e
informação são elementos cruciais em todos os modos de desenvolvimento,
visto que o processo produtivo sempre se baseia em algum grau de
conhecimento e no processamento da informação. Contudo, o que é específico
ao modo informacional de desenvolvimento é a ação de conhecimentos sobre
os próprios conhecimentos como principal fonte de produtividade.

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