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PSICOLOGIA DA

EDUCAÇÃO

Alex Ribeiro Nunes


O processo de constituição
do conhecimento
no ser humano
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Analisar o conceito de conhecimento, bem como apropriar-se do


processo de constituição deste no ser humano.
„„ Compreender melhor o desenvolvimento do conhecimento, assim
como de que maneira o sujeito cognoscente o adquire.
„„ Conhecer alguns teóricos e as teorias desenvolvidas acerca da cons-
tituição do conhecimento humano.

Introdução
O conteúdo que compõe este capítulo certamente nos levará ao encontro
de diferentes saberes no que diz respeito ao processo de constituição
do conhecimento no ser humano. Conhecer, em seu sentido amplo,
significa o ato ou efeito de abstrair a ideia ou noção de alguma coisa,
como, por exemplo, o conhecimento das leis ou o conhecimento de um
fato (ou seja, obter informação). É a representação do saber, é a instrução
ou cabedal científico.
Este capítulo propõe uma análise e reflexão sobre os diferentes pro-
cessos de construção do conhecimento no sujeito, à luz de diferentes
estudos e interpretações de diversos pesquisadores que se debruçaram
e aprofundaram para tal, como é o caso de Piaget. A temática aqui
abordada se justifica pela necessidade de perceber e se apropriar de
estudos que tracem os processos de alcance da mente humana no que
se refere a conhecer, bem como se inteirar da ideia de que o ser humano
é um potencial e permanente conhecedor. O conhecimento movimenta
o sujeito e a vida.
2 O processo de constituição do conhecimento no ser humano

Conhecimento: conceito e constituição


no sujeito
Para pensarmos o conceito de conhecimento é preciso considerarmos que este
se configura como a soma das representações abstratas que se possui sobre um
determinado fato ou aspecto do mundo real. O conhecimento é, também, a junção
de informações reunidas na mente do sujeito. As pessoas estão submetidas e
expostas a muitos processos de aprendizagem considerando que o conhecimento
é tudo aquilo que adquirimos na relação com o nosso entorno, é o produto da
experiência organizada na mente do ser humano de forma única para cada pessoa.
Na constituição do conhecimento, o sujeito torna-se capaz de compreender, por
meio da razão, suas relações com os outros e com as coisas. No ato de conhecer é
dada ao indivíduo a possibilidade de colocar em prática suas faculdades sensoriais,
capacidade de raciocinar e se manter consciente do mundo e da realidade que o
cerca. O conhecimento também é um conjunto de informações armazenadas
mediante a experiência da aprendizagem, a posteriori, ou por meio da introspecção.
Segundo Davenport e Prusak, o conhecimento constitui-se em uma mistura
espontânea e fluida de experiência condensada, valores e informações relativas
ao contexto. Isto propicia uma estrutura para a avaliação e a absorção de novas
experiências e informações. O conhecimento se origina e é aplicado na mente
dos conhecedores (DAVENPORT; PRUSAK, 1998).
Em sentido mais abrangente, o conhecimento é como a posse de múltiplos
dados relacionados entre si. O mesmo emerge na percepção sensorial, que
chega ao entendimento e termina na razão. Dessa forma, vale afirmar que
o conhecimento é uma relação entre o sujeito e um objeto. O fenômeno do
conhecimento envolve quatro elementos fundamentais: o sujeito, o objeto, a
operação e a representação interna. O conhecimento é uma das potencialidades
do ser humano e não é considerado um objeto como pode ser uma cadeira. Sua
construção implica um processo intelectual de ensinamento e aprendizagem.

Acesse o link a seguir, que apresenta um conceito de conhecimento.


https://goo.gl/2D83UP
O processo de constituição do conhecimento no ser humano 3

O desenvolvimento do conhecimento
e o sujeito cognoscente
Somos seres do conhecimento, seres pensantes e em nós se constitui a
aprendizagem. Pensamos e refletimos preteritamente sobre as coisas, ela-
boramos projetos para o futuro, enfatizamos o tempo presente resolvendo
problemas, criando, sonhando e imaginando situações. Somos capazes de
construir pensamentos e conhecimentos sobre nós mesmos, ou seja, somos
capazes de nos colocar no lugar de objetos do nosso próprio pensamento
para almejar novos saberes e novas aprendizagens. Esse fantástico arsenal
de possibilidades de criar e de obter conhecimento nos torna uma espécie
única e surpreendente.
Não há dúvidas de que, por tais motivos, a constituição do conhecimento e
da aprendizagem no ser humano se tornou, no decorrer da história, objeto de
curiosidade de diversos filósofos, psicólogos e cientistas que desenvolveram
diferentes e importantes pesquisas e teorias a respeito do sujeito e das diferentes
maneiras de construção do conhecimento.
É importante ressaltar que, no âmbito da Psicologia, o estudioso Jean Piaget
aparece como um dos precursores do que hoje chamamos “construtivismo”,
onde o mesmo afirma que o sujeito cognoscente participa ativamente na
apreensão e na apropriação de um determinado conhecimento, por meio,
fundamentalmente, da interação de seu processo interno de equilibração das
suas experimentações e vivências com a realidade física.

Jean Piaget (1896-1980) foi um renomado psicólogo e filósofo suíço, conhecido por
seu trabalho pioneiro no campo da inteligência infantil. Piaget passou grande parte
de sua carreira profissional interagindo com crianças e estudando seu processo de
raciocínio. Seus estudos tiveram um grande impacto sobre os campos da Psicologia
e, também, da Pedagogia.
Fonte: Jean (2014).
4 O processo de constituição do conhecimento no ser humano

Conheça outros aspectos da biografia de Piaget no link


ou código a seguir.

https://goo.gl/UjsVT3

Sobre a cognição, Moreira e Masini afirmam que

É o processo através do qual o mundo de significados tem origem. À medida


que o ser se situa no mundo, estabelece relações de significação, isto é, atri-
bui significados à realidade em que se encontra. Esses significados não são
entidades estáticas, mas pontos de partida para a atribuição de outros signi-
ficados. Tem origem, então, a estrutura cognitiva (os primeiros significados),
constituindo-se nos pontos básicos de ancoragem dos quais derivam outros
significados. Por exemplo, quando precisamos ensinar à criança a noção de
sociedade, podemos levá-la a dar uma volta no quarteirão e observar com
ela tudo o que lá existe. A criança atribuirá significados aos elementos dessa
experiência e poderá, posteriormente, compreender a sociedade. (MOREIRA;
MASINI, 1982, p. 3).

Esses significados e, consequentemente, esses conhecimentos, mesmo


quando apreendidos integralmente em sua forma primeira, existirão na es-
trutura cognitiva do sujeito como algo originalmente construído.

A consciência e o conhecimento
realizado pelo sujeito
A consciência e a possibilidade do conhecimento humano apresentam a maneira
como o sujeito se relaciona com o mundo e com a realidade. O ser humano
apresenta o seu modo de ser reativo ao mundo e às coisas: ele busca compre-
ender, ou seja, observa, transforma as ideias e estabelece as relações entre as
informações, os fatos e os dados para produzir o conhecimento e atuar com
sabedoria. De certa forma, nossa consciência nos possibilita o saber e, portanto,
nós reagimos ao mundo tentando compreendê-lo, construindo conhecimento.
A atividade humana é a base desse conhecimento e do pensamento do sujeito.
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Nessa perspectiva, vale lembrar, ainda, que existe o saber das emoções,
dos sentimentos, dos desejos, do inconsciente, ou seja, a consciência e o
conhecimento não se limitam apenas a um saber baseado na lógica. E para
se adaptar ao mundo e à realidade, nosso conhecimento está em permanente
transitoriedade e movimentação, revestindo-se constantemente de novos
anseios e de novos saberes que o contextualizam e o atualizam no mundo.
O conhecimento humano como manifestação da consciência é, também,
produto das relações estabelecidas socialmente de forma que, inevitavelmente,
aprendemos com o outro. Sem dúvida, neste processo, foi necessária uma
adaptação do cérebro humano para que se tornasse capacitado para pensar o
mundo até o presente momento: adquirir novas imagens, diferentes símbolos,
novas informações, diversos caminhos.
De acordo com Bock, Furtado e Teixeira:

O homem encontra um mundo de objetos e significados já construídos pelos


outros homens. Nas relações sociais, ele se apropria desse mundo cultural
e desenvolve o “sentido pessoal”. Produz, assim, uma compreensão sobre o
mundo, sobre si mesmo e os outros, compreensão construída no processo de
produção da existência, compreensão que tem sua matéria-prima na realidade
objetiva e na realidade social, mas que é própria do indivíduo, pois é resultado
de um trabalho seu. (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 144).

O ser humano apresenta uma enorme e permanente necessidade de ter


uma relação ativa com a realidade, com as coisas e com as pessoas que estão
ao seu redor. Tornou-se uma regra básica o fato de que o sentido da existên-
cia está na nossa atuação sobre o mundo, tentando transformá-lo conforme
nossas demandas. Ao agirmos dessa maneira estamos reafirmando nossa
capacidade de construir a nós mesmos o tempo todo, e o conhecimento é o
que nos permite isso.

A constituição do conhecimento no ser humano


Conhecer é apreender, é a apropriação mental de um objeto a ser conhecido.
Tal apreensão do objeto cognoscível pelo ser humano, que é o ser cognoscente,
pode acontecer sob diferentes óticas: ciência, senso comum, filosofia, teologia
e outras mais, de forma a gerar diversos tipos de saberes a partir das inúmeras
necessidades humanas. Muitos foram os estudiosos que se debruçaram nas
pesquisas sobre o processo de aquisição do conhecimento. Alguns deles serão
citados a seguir.
6 O processo de constituição do conhecimento no ser humano

Lev Vygotsky
Vygostky criticou as concepções que afirmavam serem as propriedades inte-
lectuais dos homens resultado da maturação do organismo, como se o desen-
volvimento estivesse predeterminado, e a sua elevação vinculada apenas a
uma questão de tempo. Vygotsky buscou as origens sociais das capacidades
humanas. Para ele o conhecimento e as aprendizagens sempre incluem relações
entre as pessoas. A relação do sujeito com o mundo está sempre mediada pelo
outro. Não há como nos apropriarmos do conhecimento sobre o mundo se não
tivermos o outro, ou seja, aquele que nos possibilita os significados que nos
oportunizam pensar o mundo à nossa volta. Vygotsky enfatiza, ainda, que o
desenvolvimento é um processo que se dá de fora para dentro. É no processo
de ensino-aprendizagem e de constituição do conhecimento que ocorre a
apropriação da cultura e, consequentemente, o desenvolvimento do sujeito.
Para ocorrer a aprendizagem, a interação social deve acontecer dentro da
zona de desenvolvimento proximal (ZDP), que seria a distância existente entre
aquilo que o sujeito já sabe – seu conhecimento real –, e aquilo que o sujeito
possui potencialidade para aprender – seu conhecimento potencial. Dessa
forma, a aprendizagem ocorre no intervalo da ZDP, sendo o conhecimento
real aquele que o sujeito é capaz de aplicar sozinho, e o potencial aquele no
qual ele necessita do auxílio de outros para ser aplicado.

Jean Piaget
Piaget, em seus estudos, reafirma que a criança constrói sua realidade como
um sujeito único, singular, situação em que o cognitivo está em supremacia
em relação ao social e ao afetivo. Na perspectiva construtivista de Piaget,
o início do conhecimento é a ação do sujeito sobre o objeto, ou seja, o co-
nhecimento humano se constrói nas interações homem-meio, sujeito-objeto.
Portanto, conhecer consiste em operar sobre o real e transformá-lo a fim
de compreendê-lo, sendo algo que se dá a partir da ação do sujeito sobre o
objeto de conhecimento. As formas de conhecer são construídas nas trocas
com os objetos, tendo uma melhor organização em momentos sucessivos de
adaptação ao objeto.
O processo de constituição do conhecimento no ser humano 7

O construtivismo pode ser caracterizado como uma corrente de pensamento que


ganhou espaço, especialmente no campo das teorias pedagógicas, inspirada na
obra de Jean Piaget (1896-1930), biólogo suíço reconhecido por dedicar sua obra ao
entendimento dos processos de aquisição do conhecimento humano. Os conceitos
piagetianos mais fundamentais fazem referência aos mecanismos de funcionamento
da inteligência e a constituição/construção do sujeito a partir de sua interação com o
meio. Nessa perspectiva as estruturas cognitivas do sujeito não nascem prontas, motivo
pelo qual o conhecimento repousa em todos os níveis onde ocorre a interação entre os
sujeitos e os objetos durante o seu processo de desenvolvimento. Fonte: Pereira (2017),

A adaptação ocorre através da organização, sendo que o organismo separa


entre estímulos e sensações, elegendo aqueles que irão se organizar em alguma
forma de estrutura. A adaptação possui dois mecanismos opostos, mas com-
plementares, que garantem o processo de desenvolvimento: a assimilação e
a acomodação. Segundo Piaget, o conhecimento é o equilíbrio/reequilíbrio
entre assimilação e acomodação, ou seja, entre os indivíduos e os objetos do
mundo (BASSO, 2014).

A assimilação é a incorporação dos dados da realidade nos esquemas disponíveis no


sujeito, é o processo pelo qual as ideias, pessoas, costumes são incorporados à atividade
do sujeito. A criança aprende a língua e assimila tudo o que ouve, transformando isso
em conhecimento seu. A acomodação é a modificação dos esquemas para assimilar
os elementos novos, ou seja, a criança que ouve e começa a balbuciar em resposta à
conversa ao seu redor gradualmente acomoda os sons que emite àqueles que ouve,
passando a falar de forma compreensível.
8 O processo de constituição do conhecimento no ser humano

Henry Wallon
Para este teórico estudioso, a criança (sujeito) é essencialmente emocional e
gradualmente vai constituindo-se em um ser sociocognitivo. Wallon elaborou
seus estudos focando a criança contextualizada, como uma realidade viva, em
movimento, em transitoriedade e abrangente no conjunto de seus comporta-
mentos, conhecimentos, percepções e suas condições frente à sua existência.
Basso (2014) enfatiza que, na visão do pesquisador Henry Wallon, as trocas
relacionais da criança com os outros são fundamentais para o desenvolvimento
do indivíduo e para a constituição do conhecimento. As crianças nascem
imersas em um mundo cultural e simbólico, no qual ficarão envolvidas em
um “sincretismo subjetivo”, por pelo menos três anos. Durante esse período,
há uma completa indiferenciação entre a criança e o ambiente humano, sua
compreensão das coisas dependerá dos outros, que darão às suas ações e
movimentos formato e expressão.
Antes do surgimento da linguagem falada, as crianças comunicam-se
e constituem-se como sujeitos com significado, por intermédio da ação e
interpretação do meio entre os seres humanos, construindo suas próprias
emoções, suas percepções e seus entendimentos, que são seu primeiro sis-
tema de comunicação expressiva. Esses processos comunicativos-expressivos
acontecem em trocas sociais como a imitação. Imitando, a criança desdobra,
lentamente, a nova capacidade que está a construir (pela participação do outro
ela se diferenciará dos outros) formando sua subjetividade e dando início à
constituição de seus conhecimentos. Pela imitação, a criança expressa seus
desejos de participar e de se diferenciar dos outros construindo-se em sujeito
próprio (BASSO, 2014).
Resumindo, os seres humanos se distinguem dos demais animais pela
consciência, pelas questões culturais, pela religião, por uma diversidade de
características e todos esses aspectos são inicialmente e fortemente marcados
pelos diferentes processos de constituição do conhecimento. Diante das muitas
possibilidades, o sujeito se apropria do objeto e constrói conceitos que não são
o objeto real, mas a representação do mesmo objeto. Essa representação pode
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assumir feições das mais variadas, a depender do sujeito que a constrói, do


momento histórico, de suas vivências, de seus contextos, de seus estímulos e
da área do conhecimento que está sendo investigada. O processo de constru-
ção do conhecimento no sujeito é, por sua vez, um eterno navegar por águas
inusitadas e surpreendentes.

BASSO, C. M. Algumas reflexões sobre o ensino mediado por computadores. Centro de


Tecnologia UFSM, Santa Maria, 2014. Disponível em: <http://coral.ufsm.br/lec/02_00/
Cintia-L&C4.htm>. Acesso em: 29 out. 2017.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo
de psicologia. São Paulo: Saraiva, 2008.
CONCEITO de Conhecimento. QueConceito, Sao Paulo, 2017. Disponível em: <http://
queconceito.com.br/conhecimento>. Acesso em: 27 out. 2017.
DAVENPORT, T. H.; PRUSAK, L. Conhecimento empresarial: como as empresas gerenciam
o seu capital intelectual. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
JEAN Piget: biografia. Portal Educação, Campo Grande, 2014. Disponível em: <ht-
tps://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/psicologia/jean-piaget-bio-
grafia/53974>. Acesso em: 27 out. 2017.
MOREIRA, M. A.; MASINI, E. F. S. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel.
São Paulo: Moraes, 1982.
PEREIRA, L. C. Construtivismo. InfoEscola, 2017. Disponível em: <https://www.infoescola.
com/educacao/construtivismo/>. Acesso em: 29 out. 2017.

Leitura recomendada
GUIMARÃES, A. A. O professor construtivista: desafios de um sujeito que aprende. Cam-
pinas: Unicamp/ IEL, [2001]. Disponível em: <http://www.unicamp.br/iel/memoria/
projetos/ensaios/ensaio38.html>. Acesso em: 27 out. 2017.

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