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UNIDADE TEMÁTICA3: INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA GNOSIOLOGIA OU

TEORIA DO CONHECIMENTO

1. NOÇÕES BÁSICAS: Teoria de Conhecimento, Conhecimento, Conceito, Realidade,


Elementos do Conhecimento e Faculdades do Conhecimento.

A palavra gnosiologia provém do grego “gnosis" que significa conhecimento e “logia” que quer
dizer estudo. A Gnosiologia também é chamada por Teoria de Conhecimento.

Teoria de Conhecimento é a disciplina filosófica que se ocupa do estudo do conhecimento, isto


é, estuda a relação entre sujeito e objecto no processo de conhecimento.

Trata especificamente sobre os problemas da origem do conhecimento, a possibilidade do


conhecimento, a natureza do conhecimento e o valor do conhecimento.

Conhecimento é o pensamento que resulta da relação que se estabelece entre o sujeito que conhece
e o objecto a ser conhecido. É a concordância entre a imagem e o objecto. Há conhecimento quando
há concordância entre os elementos cognitivos do sujeito e as propriedades do objecto.

O que significa conhecer?

- No sentido geral ou lato é aplicável a todos os seres animais. Significa recolher e organizar
informações sobre o meio envolvente, tendo em vista a constante adaptação de um organismo ao
meio e à sua sobrevivência.

- Em sentido restrito é aplicável apenas aos homens, podendo-se entender como a construção de
representações mentais que o sujeito organiza ao longo da sua vida na sua relação com os objectos.
É esta a perspectiva que seguiremos no nosso estudo.

Conceito é o termo que designa o que se constrói na nossa mente quando dissemos que
conhecemos ou sabemos algo.

Filosoficamente, quando se fala do conceito refere-se à idéia sobre alguma coisa. Portanto,
conceito é a imagem que o nosso entendimento retém de um objecto conhecido.

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Realidade é o objecto apreendido. Por isso, conceito representa a realidade na nossa mente de uma
forma abstracta. A realidade é o que há, ou seja, tudo aquilo que pode ser conhecido e representado
por nós, quer se trate de uma realidade física, mental ou virtual.

Concluindo, conhecimento é a apreensão e representação pela mente de uma realidade. Quando se


fala de conceito em Filosofia, faz-se referência à idéia abstracta de uma realidade. E a realidade é
o elemento apreendido.

Elementos do Conhecimento

No processo de conhecimento é indispensável à presença de dois elementos, sem os quais não


pode haver conhecimento que são: O sujeito cognoscente e o objecto cognoscível.

Faculdades do conhecimento

São os meios responsáveis pela recepção, transformação e organização das informações em


conhecimento. São os seguintes: sensação, percepção e razão.

Sensação - é a captação do objecto pelos sentidos. As sensações são processos fisiológicos de


ligação do organismo ao meio através dos órgãos sensoriais e são realizadas pela acção de um
estímulo específico sobre o receptor que é apropriado para recebê-lo. Por exemplo, os ouvidos
recebem os estímulos sonoros, os olhos recebem os luminosos, etc.

Percepção - é a seleção, organização e enquadramento das nossas sensações, isto é, quando as


sensações são tratadas, analisadas e organizadas racionalmente, quer de forma consciente quer
inconsciente.

Razão - é a elaboração de representações mentais abstractas: conceitos, discursos, relações lógicas


e teorias interpretativas sobre a realidade.

De salientar que são vários os factores que podem influenciar e moldar a percepção de um
determinado objecto:

- factores internos biológicos como o cansaço, a fome, a sede e o sono;

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- factores internos psicológicos como o medo, a motivação, expetactiva, todos esses podem
contribuir ou influenciar de forma positiva ou negativa no processo de conhecimento;

- factores externos como aintensidade, contraste de estimulos;

- factores culturais (o meio em que o sujeito vive, a sua educação, o seu ambiente social e
familiar).

Portanto, são muitos os condicionalismos, razão porque na mente de cada ser humano existe um
filtro que condiciona a percepção do mundo e que faz com que existam várias visões.

2. PERSPECTIVAS DE ANÁLISE DO CONHECIMENTO

Como aprendemos?

Existem várias perspectivas de explicação do fenômeno do conhecimento. Portanto, vamos


conhecer três, das quais duas são científicas (teorias filogenética e ontogenética) e uma filosófica
(a teoria fenomenológica).

Abordagem científica:

Perspectiva filogenética

A perspectiva filogenética é o estudo da evolução da espécie humana.

Segundo a paleontologia humana, o ser humano sofreu transformações significativas, desde a sua
origem até aos nossos dias. Portanto, o desenvolvimento cognitivo ocorreu graças à correlacção
do desenvolvimento das faculdades cognitivas (memória, linguagem, pensamento) o que provocou
a alteração fisiológica e funcional e a própria constituição morfológica obtendo um
desenvolvimento bio-psíquico-social e fazendo com que as actividades sensório-motoras
passassem às actividades perceptivo-motoras, permitindo a interiorização de imagens que por sua
vez constituem o alicerce da linguagem e da reflexão.

Ao longo do processo filogenético, o ser humano constitui-se numa dialéctica entre a acção e o
conhecimento. A acção provoca o conhecimento e este por sua vez provoca a possibilidade de

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novas e melhores acções e estas também possibilitam novos conhecimentos e assim
sucessivamente.

Perspectiva ontogenética (formação das estruturas cognitivas)

Nesta perspectiva defende-se que existe uma relação entre o indivíduo e o meio, no nascimento e
no desenvolvimento. Esta relação é determinada por um processo de adaptação do indivíduo ao
meio. Segundo o psicólogo Jean Piaget, o desenvolvimento psíquico ocorre em etapas porque o
organismo amadurece e sofre influências do meio físico e social. A assimilação e acomodação são
os dois processos que ocorrem na formação das capacidades cognitivas de uma criança e estão
presentes em todos os estádios de desenvolvimento. A assimilação é o processo mental através do
qual a mente incorpora novos dados resultantes da sua relação com o meio e a acomodação por
sua vez é o processo mental pelo qual os mecanismos mentais são alterados em função das novas
experiências provenientes da assimilação, por último, essas acções são equilibradas. (veja estádios
ou fases de desenvolvimento da criança segundo Piaget, a Obra de Chambisse e Cossa, 11a Classe,
2a Edição, pág 68-69, 2017).

Segundo Karl Marx na sua perspectiva sociológica do conhecimento (sociologia entendida como
ciência humana que estuda o modo de relacionamento dos indivíduos na sociedade), afirma o
seguinte: ˝o conhecimentohumano é determinado pelo meio social que molda o sujeito
cognoscente˝. De acordo com Karl Marx, se relacionamos duas crianças, uma com possibilidades
de frequentar bibliotecas, consultar internet, ver televisão, etc. e outra que apenas aprende do
professor, dos pais, ou amigos que lhe transmitem (sem os meios que o primeiro tem), o primeiro
terá mais possibilidades de saber do que o segundo.

Por outro lado, Karl Muunheim defende que o pensamento de um indivíduo é condicionado pelos
outros seres humanos, moldado pelo seu grupo de pertença, isto é, o conhecimento do indivíduo é
condicionado pelo inconsciente colectivo.

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Abordagem filosófica:

Perspectiva fenomenológica (o conhecimento como um fenômeno)

No acto do conhecimento é indispensável à presença de dois elementos: o que conhece e o que é


conhecido, ou seja, o sujeito e o objecto. Portanto, esta perspectiva vai explicar a manifestação do
próprio conhecimento, partindo do princípio de que fenômeno é algo que se manifesta ou que
acontece.

No acto de conhecer a relação entre sujeito e objecto não pode ser suprimida: o sujeito não é sujeito
senão em relação ao objecto e vice-versa. O sujeito tem um pepel activo e o objecto passivo.

No acto de conhecimento o sujeito faz esforço para apreender as qualidades ou características do


objecto através da abstracção ou transcendência, daí que o sujeito percorre três momentos: Sai de
si, está fora de si, e volta para si.

3. PROBLEMAS E CORRENTES FILOSÓFICAS DA TEORIA DE CONHECIMENTO:

- Origem do conhecimento (racionalismo, empirismo, intelectualismo e construtivismo)

- Possibilidade do conhecimento (dogmatismo e cepticismo)

- Natureza do conhecimento (Realismo e Idealismo)

- Valor do conhecimento (Relativismo e Absolutismo)

O problema da (im)possibilidade do conhecimento

Dogmatismo - é uma doutrina filosófica que admite a mente humana conhecer com plena certeza
as coisas. É a atitude de todo aquele que crê que o homem tem meios para atingir a verdade
absoluta. O termo dogmatismo vem da palavra “dogma” que é uma verdade indiscutível, defendida
muitas vezes pelas religiões.

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Espécies de dogmatismo:

a) Dogmatismo espontâneo - afirma que o homem conhece os objectos tal qual são e que entre o
conhecimento e a realidade há um perfeito acordo, portanto, é uma atitude humana e psicológica
de quem deposita plena confiança nos dados dos sentidos, é uma crença que não permite reflexão
ou crítica.

b) Dogmatismo crítico/moderado - surge com Sócrates, ao refutar o relativismo dos Sofistas.


Admite a possibilidade de o homem possuir conhecimentos certos acerca das coisas, mas exige
que se faça um exame crítico de todas as coisas naturais, incluindo as verdades básicas ou
metafísicas.

René Descartes- por sua vez retoma a ideia dizendo que a atitude do filósofo para chegar à verdade
deve ser o uso da dúvida metódica. Seguindo a mesma ordem de ideias, o filósofo Claude
Bernard julga indispensável, para o sábio o uso da dúvida, segundo este filósofo a primeira
condição que deve ter um sábio, nas suas investigações, é a dúvida metódica ou filosófica.

Cepticismo - doutrina ou corrente filosófica que considera a mente humana incapaz de atingir
qualquer que seja o conhecimento ou a verdade com certeza absoluta. É uma atitude negativa ou
pessimista do homem face à possibilidade da mente atingir um conhecimento certo ou verdadeiro.

Como doutrina, o cepticismo surge com os Sofistas os quais ao constatarem as contradições dos
filósofos anteriores, concluíram de forma pessimista que a verdade absoluta era impossível.

O representante do cepticismo foi Pirron, o qual afirma categoricamente que não devemos confiar
nos sentidos, nem na razão, mas duvidar de tudo e de nada, inclusive da própria dúvida.

Argumentos ou fundamentos do cepticismo:

a) Os erros dos sentidos

Para os cépticos, os sentidos estão constantemente sujeitos a ilusões e alucinações, factores que
deformam as impressões captadas dos objectos, sendo por isso, fonte de erros. Por exemplo, um
prédio de 33 andares visto à distância assemelha-se a um de três ou quatro andares situado do outro
lado do observador. Ou estando num autocarro em movimento a observar a paisagem, o que parece

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estar em movimento não é o autocarro que o leva, mas sim a paisagem que observa. Parecendo
que em determinadas circunstâncias os nossos sentidos mostram-nos os objectos de formas
diferentes. Como confiar nos sentidos se são testemunhos falíveis?- pergunta o céptico.

b) Relatividade do conhecimento sensorial

As informações sensoriais sobre o mesmo objecto diferem de indivíduo para indivíduo e, por
vezes, no mesmo indivíduo, podem variar de acordo com as circunstâncias em que elas são
percebidas: o que para uns é quente, para outros pode ser frio e vice-versa; a água que para uns é
imprópria para o consumo, pode ser própria para outros. Portanto, a relatividade do conhecimento
é mais um argumento contra a existência de um conhecimento certo e absoluto das coisas.

c) A impossibilidade de demonstração

Para o cepticismo tudo deve ser demonstrado ou ter a sua prova, porém, nem tudo é demonstrável
como o cepticismo pretende, há verdades imediatamente evidentes que por si constituem
fundamento da aquisição de novas verdades.

O cepticismo como doutrina filosófica, na sua forma radical duvida de tudo e sustenta que nada é
seguro ou verdadeiro. Esta posição é insustentável e qualquer que seja o argumento é contraditório
pela seguinte razão: ˝se tudo é duvidoso como defende o cepticismo é igualmente duvidoso que
tudo é duvidoso˝.

Afirma o filósofo cristão Santo Agostinho (séc. IV-V): “se a verdade não existe é verdade que a
verdade não existe e, por conseguinte, existe a verdade, a verdade de que a verdade não existe,
ou por outra, se é verdade que nada existe que seja seguro, então, é verdade que nada é seguro,
por conseguinte, existe algo que é seguro, a verdade de que nada é seguro”.

A dúvida céptica é definitiva, é uma conclusão e não um ponto de partida, ela é destrutiva e como
tal opõe-se a dúvida metódica, sustenta René Descartes. Diógenes de Laércio afirma: “os
cépticos passam o tempo a destruir os dogmas das outras correntes e, em contrapartida, não
estabelecem nenhum”.

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Portanto, a indagação céptica desempenhou uma tarefa histórica notável, afastando as escolas
filosóficas contemporâneas da sua estagnação dogmática e estimulando-as incessantemente à
indagação dos fundamentos dos seus postulados.

Cepticismo Metódico

O cepticismo metódico consiste em começar por colocar em dúvida tudo o que se apresenta a
consciência, como verdadeiro e certo, para eliminar deste modo, todo o falso e chegar a um saber
absolutamente seguro.

O Criticismo de Immanuel Kant

O criticismo resulta da distinção entre a realidade tal como ela é (númeno) e a realidade como nos
aparece (fenómeno). Segundo Kant, o intelecto humano, não está estruturado de forma a captar as
propriedades do númeno, o mundo das coisas em si. Este mundo não se adapta aos esquemas do
pensamento. Por isso, só podemos falar da possibilidade do conhecimento no mundo dos
fenómenos que é uma verdade humana, finita e não absoluta baseada da experiência que nunca é
universal.

Na óptica de Kant, o ser humano só pode conhecer as coisas pertencentes ao mundo material e
jamais conhecer as do mundo das realidades espirituais. O nosso conhecimento produz verdades
não absolutas, porque dependem da experiência vivida pelo sujeito cognoscente.

O problema da origem do conhecimento

O conhecimento é constituido por ideas, juízos e raciocínios. Os juízos e raciocínios são obtidos a
partir das ideias. Por isso, o problema da origem do conhecimento consiste em determinar como
se adquirem as ideias e os primeiros princípios que normalizam todo o conhecimento. Este
problema dividiu os filósofos em diversas teorias:

Empirismo - (de emperia=experiência), trata-se de uma corrente filosófica que surgiu na


Inglaterra no século XVIII e tem como representantes John Locke, David Hume e George Berkeley
sendo os primeiros dois considerados mais importantes. Portanto, o empirismo é uma corrente
filosófica que defende a experiência como fonte do conhecimento. Os empiristas reservam para a

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razão a função de uma mera organização de dados da experiência sensível, sendo as ideias ou
conceitos da razão, simples cópias ou combinações de dados provenientes destas experiências.

Segundo John Locke “o Homem nasce ‘‘tábula rasa” e a experiência vai marcando o
conhecimento através do contacto com a realidade. Este conhecimento chega por dois modos:
sensação (através da qual nos chegam às coisas exteriores) e reflexão (que nos dá o conhecimento
daquilo que se passa dentro de nós).

Da experiência mediante a sensação, originam-se as ideias simples (adventícias); exemplo: a ideia


de azul, doce, macio etc. e, pela reflexão, a ideia de percepção, dúvida, desejo, etc. e todas as
operações mentais. As ideias complexas (factícias) nascem das ideias simples, em virtude da
actividade do sujeito que as une, separa, analisa e sintetiza.

O empirismo de Locke baseia-se no princípio segundo o qual “nada existe no intelecto humano
que não tenha passado pelos sentidos”. Com este princípio, Locke rejeita absolutamente o
inatismo de Descartes. Na óptica de Locke, não existem ideias inatas, pois se assim fosse, encontra-
las-íamos nas crianças e nos incautos.

Evolucionismo de Herbert Spencer procura conciliar o inatísmo de Descartes e o empirismo,


sustentando que o espírito do primeiro humano seria uma tábua rasa e que adquiria as ideias e os
conhecimentos graças à experiência (empirismo). Mas Spencer acrescenta que o espírito do
Homem actual já não é uma tábua rasa, visto possuir muitas ideias, que resultam de experiências
acumuladas e transmitidas de geração em geração (inatísmo). Assim, os nossos conhecimentos são
uma consequência directa de uma evolução apoiada na experiência. É nisto que assenta o seu
evolucionismo.

David Hume por sua vez, diz que todos os nossos conhecimentos se reduzem a impressões ou a
ideias simples, formando-se ideias complexas por meio de leis ou princípios chamados ‟ ideias de
associação ˮ.

Racionalismo - trata-se duma corrente filosófica que defende a razão como fonte do
conhecimento. Esta corrente admite várias doutrinas:

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- Platonismo, para Platão, as ideias são imitações ou sombras dos arquétipos (modelos ou
essências) do mundo das ideias, (Hiperurâneo) mundo puramente inteligível, constituído por
realidades abstractas e universais, que a alma vai recordando (teoria de reminiscência).

Segundo Platão, a alma racional viveria no mundo das ideias em plenitude de conhecimento.
Depois foi encerrada num corpo e a matéria obscureceu todas as ideias, as quais só podem ser
despertadas através dos sentidos. Quando o Homem nasce, já traz consigo as ideias.

- Platonismo Agostiniano, de Santo Agostinho, parte da filosofia Platónica e explica a origem das
ideias da seguinte maneira: “as ideias são expressas pela inteligência, isto é, as ideias provêm da
iluminação divina”.

- Inatismo Cartesiano, defendido por Descartes, o qual foi considerado de expoente máximo do
racionalismo. Segundo este filósofo, as ideias são inatas ao Homem, isto é, o Homem nasce com
as ideias e estas não estão sujeitas ao erro e todo o nosso conhecimento vem a partir dessas ideias
inatas, únicas e infalíveis. Segundo este filósofo, existem vários tipos de ideias: as ideias
adventícias, provindas da experiência e as factícias resultantes das adventícias (por exemplo a ideia
de sereia). E, por último, as ideias inatas, as que são co-naturais `a própria inteligência, que provêm
da razão e por isso não são sujeitas ao erro.

O Racionalismo de Baruch Spinoza, Spinoza, parte do princípio platónico da existência do


“mundo das ideias” como fonte do conhecimento humano. Na óptica de Spinoza a Filosofia seria
o conhecimento racional de Deus, e a liberdade humana torna-se a consciência da necessidade, ou
seja, não há livre arbítrio. No interior desse entendimento racionalista, não há lugar para a tragédia,
nem mistérios; tudo se torna à luz da razão (Deus). Uma vez que Deus se identifica com a natureza,
portanto, tudo o que existe é necessário, não pode ser diferente, pois faz parte da natureza divina.
Por isso, Spinoza dizia que natureza é Deus.

O Racionalismo de Leibnitz, este filósofo alemão do século XVIII admite um inatismo virtual,
as ideias inatas existem no nosso espírito como percepções inconscientes que se vão
consciencializando progressivamente pela experiência; tais conhecimentos são virtuais, no sentido
de que só existem na inteligência tal como uma imagem impressa numa película, da mesma forma
que a imagem precisa de ser revelada, assim também os conhecimentos existentes no intelecto

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precisam da experiência para se tornar actuais. Leibnitz ao defender um inatismo moderado, torna-
se, por assim dizer, nacionalista moderado.

Daqui conclui-se que para Leibnitz, a experiência não é suficiente para a obtenção do
conhecimento, conhecimento esse que seja logicamente necessário e universalmente válido. Por
isso, o papel da razão ou da inteligência é fundamental no processo da aquisição do conhecimento.

Apriorismo ou Intelectualismo - defendido por Kant, afirma que o conhecimento procede da


experiência, mas não se reduz à experiência. Kant faz isso por causa da oposição

verificada entre as duas grandes correntes da época moderna, (o Empirismo e o Racionalismo),


dado que cada uma privilegiava a sua posição, negligenciando a outra, daí que Kant procura
integrar o que há de positivo e conclui que as duas contribuem para a origem do conhecimento.

Kant faz esta integração, através de uma análise crítica das três principais operações da razão
humana: conhecimento, vontade e sentimentos. (sensações). Esta análise deu origem a três
importantes obras críticas que marcaram o mundo: a Crítica da Razão Pura, (sobre o
conhecimento), a Crítica da Razão Prática, (sobre a vontade) e a Crítica do juízo (sobre os
sentimentos). De acordo com Kant, só se chega à verdade e ao conhecimento através do juízo. O
juízo é a combinação que é feita do sujeito ao objecto. Kant distingue dois tipos de conhecimentos:
conhecimento puro, proveniente da razão e conhecimento empírico proveniente da experiência.
Na Crítica da Razão pura, kant afirma que todo o conhecimento humano começa com a
experiência, mas a experiência não esgota todo o nosso conhecimento. Acrescenta ainda que: “se
todo o conhecimento se inicia com a experiência, isso não prova, porém, que todo ele deriva da
experiência ”.

O conhecimento empírico é sempre subjectivo, por isso não se pode confiar muito neste tipo de
conhecimento, pois, depende de como o sujeito sofre a influência do objecto. O conhecimento
empírico ocupa-se com o conhecimento dos fenómenos, ou seja, com os objectos que se
manifestam no mundo sensível, enquanto o conhecimento puro ou inteligível ocupa-se com o
mundo numénico a que pertencem as entidades enquanto pensadas, objectos em si (puros).

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Construtivismo - explica em geral como a inteligência humana se desenvolve partindo do
pressuposto de que o desenvolvimento da inteligência é determinado pelas acções mútuas entre o
indivíduo e o meio.

Esta corrente surge das teorias de epistemologia genética de pesquisa sócio-histórica de Jean
Piaget e Lev Vysotsky. Estes acreditam que o homem não nasce inteligente, mas também não é
“tábula rasa”, porém, responde aos estímulos do ambiente para depois formar o conhecimento,
dado que o conhecimento se forma através do meio em que cada um se encontra, daí se conclui
que este (o conhecimento) nunca é objectivo, mas sim subjectivo. De acordo com Piaget existem
dois procedimentos usados no acto da aquisição do conhecimento: a assimilação e a acomodação.

Para Piaget, “só se conhece e aprende aquilo que se faz”. Entretanto, o conhecimento resulta não
da assimilação de percepções, mas da interiorização das acções do sujeito sobre os objectos.

Revolução copernicana na teoria do conhecimento

Como vimos nas aulas anteriores, no acto do conhecimento, o objecto é quem determina o sujeito
(perspectiva clássica), ou seja, o conhecimento consistia na adaptação do sujeito ao objecto.

Esta visão, segundo Kant, revelou profundas lacunas no conhecimento, dado que não explicava a
existência de seres incognoscíveis pelo homem. Isto levou Kant a afirmar que não é o sujeito que
se adapta aos objectos, no acto de conhecimento, mas o contrário.

Para Kant, os objectos é que se adaptam à inteligência humana. Assim, é facil explicar a existência
de seres incognoscíveis pelo Homem – eles não se adaptam à inteligência humana, por isso, não
os pode conhecer.

Esta nova visão da relação sujeito objecto chamou-se de revolução copernicaca na teoria de
conhecimento.

Esta teoria ajudou a descobrir que a razão humana encontra na natureza aquilo que ela mesma
coloca, segundo os esquemas da nossa razão.

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O problema da natureza ou essência do conhecimento

Com este problema pretendemos saber qual dos dois extremos, sujeito e objecto, é determinante.
Será que o nosso conhecimento atinge a realidade ou apenas a sua representação, a sua imagem?
As coisas são o que elas são, ou o que nós pensamos que elas são (realismo ou idealismo)?

Realismo - a palavra vem do latim RES (coisa), é a tese segundo a qual nós conhecemos as coisas
e não as ideias. Segundo esta doutrina conhecer é sempre conhecer algo posto de fora de nós.

Formas do realismo:

- Ingénuo/natural, que admite a existência das coisas tal qual as percebemos;

- Crítico, partindo dos dados sensoriais, apreende as características essenciais dos objectos e
corrige os possíveis erros percepção.

Podemos apontar, como principais filósofos realistas, Aristóteles e S. Tomás de Aquino.

Idealismo - não nega propriamente a existência do mundo exterior, mas afirma que o nosso
conhecimento não atinge a própria realidade em si mesma, pós reduz o conhecimento a meras
representações ou ideias dos objectos.

Surgiu na Grécia Antiga com Platão. A través do seu idealismo transcendente no qual as ideias ou
arquétipos ideais representam a realidade verdadeira, na qual as realidades sensíveis seriam cópias
imperfeitas. O idealismo de Platão reduz o real ao ideal, isto é, o ser em ideia, pois como dizia “as
ideias são o sol que ilumina e torna visíveis as coisas”.

Hegel (grande filósofo idealista alemão) afirma o seguinte: “todo o real é ideal e todo o ideal é
real”.

O Idealismo propriamente dito só aparece na época moderna com Descartes, ao procurar defender
que o mundo externo é atingido pelas nossas representações. Outro idealista foi Berkeley, que
reduziu toda a realidade à ideia e negou a existência de toda a realidade material. Para ele, a
realidade do mundo externo reduz-se à representações mentais “ existir é ser percebido”.

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O problema do valor do conhecimento

Relativismo- afirma que o conhecimento é relativo, quer em função ao sujeito cognoscente, quer
em função ao objecto conhecido.

O relativismo tem várias subdivisões:

- relativismo sensorial dos Sofistas - segundo Protágoras, ˝o homem é a medida de todas as


coisas (homo mensura)˝, o que quer dizer que todo o conhecimento é relativo, isto é, depende do
sujeito cognoscente; por exemplo, a mesma água pode aparecer fria a um indivíduo e quente ao
outro, ou a mesma comida pode parecer mais salgada para uns e menos salgada para outros.

- relativismo positivista - Augusto Comte (pai do positivismo), segundo Comte, nenhum


conhecimento pode ultrapassar a experiência, todo o conhecimento é positivo (trata-se do
relativismo positivo).

- relativismo pragmático - considera-se pragmático aquele que adequa os conhecimentos aos fins
práticos a que se propõe e obtém resultados úteis e proveitosos.

O pragmatismo surgiu no início do século XX, nos EUA com William James, Charles Pierce e
John Dewey, os quais privilegiam a dimensão prática do homem. Segundo William James a
validade de uma ideia só pode ser verificada pelo seu resultado prático, isto é, pela utilidade.

Para o Pragmatismo, o homem foi feito para a acção, assim sendo, a verdade só pode ser definida
em função dessa mesma acção. Tudo o que ajuda a agir e produz realmente efeito será verdadeiro
para cada indivíduo, pelo que as nossas ideias têm um valor relativo.

Absolutismo - segundo esta corrente, o conhecimento tem um valor absoluto e objectivo porque
atinge o fundo da realidade ou a sua essência, não se limitando as suas aparências ou das suas
modificações.

N.B. Quando falamos do conhecimento como valor absoluto, não estamos a dizer que conhecemos
a realidade total e perfeitamente, pois, sob este aspecto, o conhecimento é relativo por estar em
contínua evolução e ser maior para uns do que outros. Isto significa que é o conhecimento da
verdade que varia, e não a própria verdade. A verdade de hoje será sempre verdade, se o é para um

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indivíduo, sê-lo-á para todos, de todos os tempos e lugares- é neste sentido que afirmamos que o
conhecimento tem um valor absoluto. O que é realmente verdadeiro ficará e será integrado em
novos conhecimentos, uma vez que o Homem, sedento de conhecer, vai descobrindo na realidade
novas propriedades, assim, vai enriquecendo o seu conhecimento-é assim que funciona o
conhecimento científico que, nesse sentido, é dinâmico e está em perpéctua renovação. O que
varia não é a verdade, mas o nosso conhecimento acerca dessa verdade.

4. NÍVEIS DO CONHECIMENTO

- Conhecimento do Senso comum - também chamado por conhecimento popular. Resulta da


experiência diária do homem e caracteriza-se por ser: superficial, sensitivo, subjectivo,
assistemático e acrítico.

- Conhecimento científico - é metódico, sistemático, verificável, factual ou real e falível.

- Conhecimento filosófico - caracteriza-se por ser valorativo, racional, sistemático e não


verificável.

Existem outros tipos de conhecimento como:

- Conhecimento religioso (teológico) tem como fonte principal a natureza divina ou sobrenatural.
É valorativo, inoperacional, sistemático, não verificável, infalível e exacto.

- Conhecimento mitológico- trata-se da narrativa de significação simbólica, transmitida de


geração para geração e considerado verdadeiro dentro dum grupo.

- Conhecimento intuitivo- sendo a intuição o acto de pressentir, é um conhecimento imediato de


um objecto na plenitude da sua realidade seja objecto de ordem material ou espiritual. Este
conhecimento por ser imediato é difícil de fundamentar.

5. IMPORTÂNCIA, LIMITES E PERIGOS DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

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Faça uma reflexão sobre a importância e perigos do conhecimento científico para o Homem
e a Natureza. (Confira a Obra de Chambisse e Cossa, 11a classe, 2a Edição, pág 81, 2017). NB.
Não se limite nisso.

Limites do Conhecimento Científico

Desde a segunda metade do século VXII que a cultura ocidental assiste, fascinada, aos primeiros
passos dados pela ciência e aos rápidos francos progressos que esta realiza. São tão surpreendentes
as suas realizações que o Homem se convenceu de que, finalmente, tinha nas suas mãos o
instrumento necessário à sua transformação em ˝Senhor do Universo˝. Doravante, a ciência
permitir-lhe-á o domínio não só da Natureza como também do Homem.

Confiante no poder da ciência, acreditou que ela poderia desenvolver se desligada de qualquer
outro tipo de conhecimento e que só ela poderia trazer benefícios para a humanidade.

Com efeito, as limitações da ciência em responder aos problemas concretos do Homem fez com
que a confiança outrora dada a ciência se questionasse. Retomando a classificação tripartida da
história humana proposta pelo positivismo, observamos que o seu erro fundamental foi de
hipertrofiar o método das ciências experimentais, desvalorizando todo tipo de saber diferente do
proposto pelo seu método.

De facto, nos últimos decénios do século XIX e nos princípios do século XX estas tendências
aventura, principalmente por dois motivos:

a) O aprofundamento da pesquisa científica , que se tornava cada vez mais consciente dos seus
limites;

b) A persistência de questões éticas e metafísicas, mesmo depois de o positivismo tentar sufocá-


las como expressões da imaturidade do Homem, e a consciência de que somente uma visão
espiritualista pode responder de forma adequada a tais questões.

Wilhelm Dilthey (1833-1911), um dos maiores representantes da nova corrente oposta ao


positivismo, observa já que o método positivo das ciências experimentais satisfazia apenas as
exigências para o estudo e compreensão dos fenómenos naturais, sendo absolutamente inadequado
para o estudo e compreensão dos fenómenos culturais ou espirituais.

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6. CLASSIFICAÇÃO DAS CIÊNCIAS SEGUNDO AUGUSTO COMTE

Augusto Comte (1798-1857), filósofo francês, fundador da Sociologia, inspirado pelo ambiente
do século XVIII, fundou a chamada lei dos três estádios, comparando o desenvolvimento do
psiquismo humano com o crescimento do homem. Para ele o psiquismo humano atravessa três
estados. Nomeadamente: teológico, metafísico e positivo, fazendo-os corresponder as fases da
infância, juventude e maturidade, respectivamente.

No estado positivo não se admite a justificação teológica nem a metafísica, mas sim a científica.
O científico está ligado ao empírico, ao prático, ao mensurável.

O positivismo não se preocupa com o problema da causalidade, quer somente estabelecer os


procedimentos metodológicos para a produção de proposições válidas, de acordo com o seu
próprio sistema. Ele não se preocupa com o problema da causalidade dos factos; quer perceber
como acontece certo fenómeno, sem se interessar pelas suas causas (a causalidade é característica
da Filosofia).

A transição de um estado ao outro depende da simplicidade ou complexidade do fenómeno em


consideração. Quando for simples, mais rapidamente passará. Por exemplo da teológica `a
metafísica. Se for complexo mais tempo requer para a sua transição.

A partir desta base de raciocínio, Comte classificou as ciências em sete categorias, das mais
simples `as mais complexas nomeadamente: a Matemática, a Astronomia, a Física, a Química,
a Biologia, Sociologia e a Moral. Portanto, a Moral pelo nível mais alto de complexidade teórico
levaria mais tempo a passar `a categoria positiva, pelo facto de não ser fácil a identificação dos
elementos a serem considerados num acto moral.

Outros autores utilizaram também o critério da complexidade crescente, originando classificações


com ligeiras diferenças em relação a Comte.

Classificacão de Wilhelm Dilthey - este estabeleceu uma distinção notória no seio das ciências:
entre ciências de explicação ou da natureza e ciências de compreensão ou do espírito.

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O modo explicativo seria característico das ciências naturais, que procuram o relacionamento
causal entre os fenómenos. A compreensão seria o modo típico de proceder das ciências humanas,
que não estudam factos que possam ser explicados propriamente, mas visam aos processos
permanentemente vivos da experiência humana e procuram extrair deles e seus sentidos.

Para a sua difusão, a maior contribuição foi de Dilthey, que, em Introdução às ciências do espírito
(1883), insistiu na diferença entre as ciências que visam conhecer casualmente o objecto, que
permanece externo, isto é, as ciências naturais, e as que ao contrário visam compreender o objecto
(que é o Homem) e a revivê-lo intrinsecamente, isto é, as ciências do espírito.

Proposta actual de classificação das ciências

1. Ciências Formais - (Lógica e Matemática)

2. Ciências Empíricas ou Naturais - (Física, Química, Biologia e Astronomia)

3. Ciências Sociais e Humanas - (Psicologia, Sociologia, Economia, Política, Direito, História e


Geografia). A Filosofia não aparece nesta classificação porque é a partir dela que derivam todas
estas ciências, ela está na base.

7. A QUESTÃO DA VERDADE E OS ESTADOS DO ESPÍRITO FACE AO


VERDADEIRO

A verdade é a correspondência entre o conceito e a realidade, seja ela empírica ou meta-empírica.


Portanto, dizer que é algo verdadeiro implica a correspondência daquilo que e dito com a realidade.

A verdade é o que uma coisa é realmente. Entretanto, a definição do conceito verdade não é
unívoca, pois, tem mais de um significado.

Espécies da verdade:

Verdade ontológica – consiste na conformidade das realidades com a ideia de Deus que as
concedeu. Ex: Água, terra, montanha, etc.

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Verdade lógica – é a conformidade da inteligência com a realidade, isto é, com a verdade
ontológica. Não é possível ter a verdade lógica sem a ontológica, se partimos do princípio de que
a verdade ontológica, diz respeito ao ser.

Ex: Água – é um líquido incolor, insípido, inodoro.

Verdade moral – consiste na conformidade entre aquilo que pensamos e as nossas palavras ou
acções.

Ex: Não roubar, enfim praticar a justiça.

Atitudes da inteligência perante a verdade

As atitudes refere-se ao estado do espírito perante a verdade. Que podem ser:

Estado de ignorância - entende-se por ignorância a ausência do conhecimento relativamente a


um enunciado e como se não existisse; não há juízo.

Divisão da ignorância:

a) Ignorância vencível ou culpável - é aquela que o sujeito pode dominar por meios próprios e
normais; é culpável porque o indivíduo não sabe o que por norma deveria saber.

Exs: O Carpinteiro que não sabe fazer cadeira ; O enfermeiro que não sabe aplicar injecção.

b) Ignorância invencível, inculpável - trata-se da carência da ciência não devida e esta


dificilmente o sujeito pode fazer desaparecer.

Ex: O sapateiro que não sabe a fórmula química da água.

Estado de dúvida – é o estado de equilíbrio entre a afirmação e a negação. No estado de dúvida


o espirito não adere, ou porque os motivos ou para afirmar e negar se equilibram (duvida positiva)
ou não se equilibram, mas não são suficientes para excluir o medo de erro (ainda duvida positiva);
ou não tem razão alguma nem para afirmar, nem para negar (duvida negativa, que equivale a
ignorância).

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A dúvida pode ser:

a) Metódica (ou cartesiana) – consiste na suspensão voluntaria, fictícia ou real, mas sempre
provisoria, na aceitação de uma verdade tida por certa, com o fim de verificar o seu valor. Esta é
necessária à constituição de qualquer ciência. É também conhecida por dúvida cartesiana por ter
sido Descartes o primeiro a estabelecê-la como método;

b) Reflexiva - quando a hesitação ocorre após o exame das razões, (resulta dos exames das razões
pró e contra).

c) Sistemática ou Céptica – Estado definitivo do espirito relativamente a toda a verdade; é


impossível legitimar as nossas verdades espontâneas que devemos ter sempre como incertas.
Enquanto a duvida metódica e provisoria (nunca definitiva) e constitui o método de chegar à
verdade, duvida céptica é definitiva e é um fim. consiste em não aderir definitivamente a nenhuma
das partes com o pretexto de que tudo está errado.

d) Metódica – é provisória até a completa verificação duma verdade dita como certa.

Estado de opinião - é o estado intermédio entre a dúvida e a certeza. A opinião caracteriza-se por
uma adesão cautelosa do espírito a uma das partes, sem excluir a possibilidade de que pode vir a
enganar-se. Porém, a inteligência é inclinada para uma das partes por motivos que lhe parecem
mais plausíveis e prováveis.

Estado de certeza - é adesão firme e inabalável do espirito a uma verdade conhecida, sem receio
de errar. A certeza supõe, pois, a manifestação completa da verdade, isto é, da conformidade do
enunciado com a realidade, emitindo um juízo seguro. Esta manifestação faz-se mediante a
evidencia, que e o método e fundamento da certeza como a probabilidade e o motivo da opinião.
Entretanto não se deve confundir certeza com verdade, pois embora coincidam, a certeza pode ser
uma adesão involuntária ao erro.

Critério da verdade – é o que nos permite distinguir o verdadeiro do falso. Esse critério é a
evidência, motivo último de toda a certeza e verdade.

A evidência é a clareza com que o objecto se apresenta e se impõe à mente, isto é, o espelho da
própria verdade que se reflecte na mente e impõe a sua adesão. A evidência pode ser imediata

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quando a verdade se impõe à mente, sem necessidade de demonstração e mediata quando necessita
de ser demonstrada através da observação ou da experiência.

8. O ERRO: CAUSAS E REMÉDIO

O erro é não conformidade do espírito com a realidade. É a adesão firme àquilo que
objectivamente é falso, mas que, do ponto de vista subjectivo, nos parece ser verdadeiro.

As causas do erro podem ser de duas naturezas:

- Psicológicas: falta de compenetrção ou atenção do espírito que interpreta mal os dados dos
sentidos. É o caso daquele homem que vê no bronze o ouro; paixão, que nos impede de raciocinar
correctamente, deixando-nos, muitas vezes, obsecados, impossibilitando-nos, deste modo, de
reflectir.

- Morais: a vaidade, que resulta da demasiada confiança na nossa pessoa; o interesse (económico,
social, potítico,etc); a preguiça intelectual, que não nos deixa questionar o valor dos nossos
motivos e, por isso, nos leva a aceitar sem reflexão determinadas asserções ligeiramente
formuladas.

Remédio: Todo o erro é combatido nas suas causas, procedendo-se metodicamente e refletindo-
se sobre as coisas, acautelando-se contra as sugestões da paixão e imaginação; suspendendo o juízo
e duvidando, se for necessário; não aceitando como verdadeiro ou falso senão o que conhece como
tal, através dos meios legítimos.

9. EPISTEMOLOGIA CONTEMPORÂNEA

O debate contemporâneo sobre a evolução da ciência trouxe duas perspectivas ou posições


antagónicas: Continuísmo (continuidade) e descontinuísmo (ruptura). Enquanto uns defendem que
o desenvolvimento da ciência é linear e cumulativo, outros defendem o contrário: a ciência é
revolucionária.

O Continuísmo - dentro desta corrente de pensamento encontramos duas linhas: (o continuísmo


radical e moderado).

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O continuísmo radical defende que a ciência evolui de forma linear e cumulativa: linear, porque
evolui sempre na mesma linha, o que significa que os conhecimentos uma vez estabelecidos,
jamais serão postos em causa; acumulativa, pelo facto de os novos conhecimentos se juntarem aos
anteriores, como se tratasse de um celeiro.

Esta concepção da ciência é fruto de alguns pressupostos gnosiológicos, de entre eles:

- A associação do conhecimento com o método de verificação, um método que se acha infalível,


capaz de discernir a veracidade e a falsidade das hipóteses.

- O conhecimento é tomado como fruto de uma entidade fidedigna (a razão humana), que acumula
o conhecimento adquirido ao longo dos tempos.

- A ciência obedece a um processo evolutivo, cujas descobertas se interligam entre si, ou seja, há
ligação entre uma descoberta recente e a anterior.

- O Homem apreende a ciência de forma gradual, começando pelas coisas mais simples e evoluindo
para conhecimentos cada vez mais complexos, criando uma imagem de um conhecimento
historicamente linear.

- Na ciência, os pontos fracos (erros, hipóteses caducas) não são relevados, transparecendo ser (a
ciência) um produto de uma gradual evolução, num itinerário sempre seguro e sem algum erro.

O Continuísmo moderado- considera que esta visão da ciência é irrealista e ingénua.

Duhem, historiador e filósofo da ciência, não nega que a ciência seja construída de forma
continuísta, porém, reconhece que ao longo do processo da sua construção houve erros e
correcções dos mesmos. Ele defende que as descobertas científicas de uma época baseiam-se nas
investigações e debates das épocas precedentes, em que os erros registados são examinados e
corrigidos, constituindo uma autêntica continuidade, havendo ligação entre uma época e outra.

O Descontinuísmo - alguns filósofos da ciência, como Bachelard, A. Koyré, K. Popper e T.


Khun, defendem que o desenvolvimento da ciência conhece momentos de descontinuidade, ou
seja rupturas, que separam de forma clara, uma fase da outra. Trata-se de momentos surpreendentes

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que afectam a legitimidade dos princípios gerais. Quando é que se diz que os princípios gerais
perdem legitimidade?

Na ciência, as teorias funcionam sempre ligadas a um princípio geral – o paradigma. Quando este
não consegue enquadrar em si as novas descobertas, escapam dos seus ˝carris˝, revelando
contradições ou lacunas irreparáveis, a comunidade científica é forçada a abandonar o antigo
paradigma e a conceber um novo que enquadre as novas descobertas e abra o caminho para as
novas pesquisas.

Karl Popper (1902-1994): Refutabilidade e falsificabilidade

Filósofo austríaco das ciências exactas e humanas, nega o progresso científico considerado como
acumulação de conhecimentos. Aqui reside a sua posição descontinuísta. Karl Popper defende que
a ciência analisa e critica as teorias anteriores, corrigindo-as ou até substituindo-as. Portanto, a
ciência não progride por acumulação de teorias mas através de críticas `as teorias anteriores e a
inovação das mesmas ou até banindo as anteriores para dar lugar a novas teorias capazes, e que
entram em consonância com a nova realidade científica. Por isso para Popper o progresso da
ciência é feito através de revoluções intelectuais e científicas, pelo que, a ciência, evolui através
do processo de refutação e falsificação, o que significa que o desenvolvimento da ciência é um
processo constante de eliminação de erros.

Popper acredita que a ˝sucessão de teorias tende a aproximar-se cada vez mais da verdade, uma
meta por si considerada inalcançável˝. Para ele, ˝as teorias não são senão pontos de vista do senso
comum submetidos a procedimentos críticos e, por isso esclarecidos˝.

Na ciência nós procuramos a verdade e a verdade não é dada pelos factos, mas sim pelas teorias
que correspondem aos factos. Argumenta ainda que a teoria científica será sempre conjectural e
provisória. Não é possível confirmar a veracidade de uma teoria pela simples constatação de que
os resultados de uma previsão efectuada com base naquela teoria se verificaram. Essa teoria deverá
gozar apenas do estatuto de uma teoria ainda não contrariada pelos factos. O que a experiência e
as observações do mundo real podem e devem tentar fazer é encontrar provas da falsidade daquela
teoria. Este processo de confronto da teoria com as observações poderá provar a falsidade da teoria

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em análise. Nesse caso há que eliminar essa teoria que se provou falsa e procurar uma outra teoria
para explicar o fenómeno em análise.

Desta forma, Popper contesta a indução e a logica indutiva, porque, segundo ele, não permitem o
desenvolvimento da ciência. A adopção de uma lógica indutiva implica a verificação da verdade
das teorias e o que interessa não é a verificação, mas a corroboração das teorias, que significa que
a teoria não é demostrada como falsa, que resiste às refutações depois de ter sido intensamente
experimentada. Uma teoria corroborada é aquela que, num dado momento, mais se aproxima da
verdade.

A solução do problema da indução parte das teorias e passa pela substituição da lógica indutiva
pela dedutiva. Todas as teorias são hipóteses, conjecturas que durarão mais ou menos tempo até
serem completamente ou parcialmente refutadas. Só terão sucesso as teorias que são refutáveis,
falsificáveis, testáveis e que, tendo resistido, são confirmadas. O método da ciência consiste em
procurar factos que a refutem- procurar uma falha numa teoria. A falsificação é um critério para
determinar o caráter empírico de um sistema de proposições. Porém, a falsificação de uma teoria,
exige regras que determinem as condições em que um sistema pode ser considerado falsificado.

Gaston Bachelard e o obstáculo epistemológico

Este filósofo é de opinião contrária à de Popper, pois, para ele, a criação de uma nova ciência
implica uma ruptura, corte, com os conhecimentos anteriores, nomeadamente com o senso comum,
defende que o desenvolvimento da ciência é descontínuo. Segundo Bachelard, o conhecimento
científico só pode ser construído em luta contra os obstáculos epistemológicos, fazendo a
perspectiva ruptura epistemológica. Entre tais obstáculos, encontram-se o empirismo e o
conhecimento sensível, que é próprio do senso comum e que o seu objecto é constituído pelas
evidências, sendo que a sua finalidade é exclusivamente de nível utilitário.

A noção de obstáculo epistemológico é de fundamental importância para o desenvolvimento da


ciência. É na superação destes obstáculos que reside o sucesso de uma pesquisa científica. Deve
ser do conhecimento da comunidade científica de que eles existem e que se não forem
neutralizados podem comprometer o processo da pesquisa, desde os seus fundamentos até aos seus
resultados.

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Para Bachelard nós construímos opiniões fundamentando-as na experiência, pensamos os casos
concretos e damos a esses pensamentos o estatuto de norma que regulam o interesse comum:
instruímo-nos pela fé empírica nas coisas. Mas todo o conhecimento cuja génese concreta ou
factual é conduzida pela via da normalização pragmática própria do interesse comum, não tem
estatuto de conhecimento científico. Este conhecimento é dogmático, constituindo um entrave ao
desenvolvimento da ciência e, por conseguinte, é um obstáculo epistemológico. Para derrubar os
obstáculos epistemológicos é preciso:

1. Psicanalisar o interesse, isto é, analisar os conteúdos daquilo que designamos por conhecimento,
consciencializá-los como bloqueios mentais, como entraves ao desenvolvimento do conhecimento,
como obstáculo ao pensamento, pois, nada é dado mas tudo é construído.

2. Arruinar todo o utilitarismo, ou seja toda a Filosofia do “não”, que afasta a atenção pela
satisfação íntima e pelo interesse comum que vê o corpo de conhecimentos científicos como um
conjunto de objectos concretos para usar, gozar.

3. Desviar o espírito do imediato concreto para a abstracção, para o racional, para o humano, para
o construído.

Para tal Bachelard defende a presença da ruptura no processo de desenvolvimento da ciência, a


dois níveis do conhecimento: “ uma ruptura com o senso comum, para a construção do
conhecimento científico, e uma ruptura com a ciência anterior, para o progresso do conhecimento
científico, pois quando se apresenta `a cultura científica, o espirito nunca é jovem. É mesmo muito
velho porque tem a idade dos seus preconceitos”.

A Teoria de Thomas Khun

Khun faz uma análise fenomenológica das rupturas epistemológicas, já defendidas pelos seus
antecessores. Para o efeito ele usa expressões como:

Paradigma- é o princípio que regula as pesquisas científicas de uma determinada época; trata-se
de uma teoria científica dominante na qual todas as outras se integram. O elemento específico para
a compreensão do paradigma é o método. O paradigma define especificamente a metodologia
apropriada para o desenvolvimento da ciência, nos moldes estabelecidos pelo paradigma, por isso,

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o conceito de paradigma em Khun, chega a ser comparado ao credo de uma comunidade religiosa.
O paradigma determina tanto o método de solução dos problemas, quanto os problemas que devem
ser resolvidos.

A Ciência normal e Anomalia - a ciência normal é o momento em que a comunidade científica


desenvolve com sucesso as suas pesquisas mediante o paradigma em vigor. A actividade principal
neste período é explicar os fenómenos ainda não esclarecidos, enquadrando-os na teoria
dominante. Nesta etapa o seu desenvolvimento (da ciência) é contínuo, o cientista desenvolve as
suas pesquisas dentro dos limites estabelecidos pelo paradigma.

Ora, quando aparecem problemas científicos que escapam aos limites do paradigma, quando não
se enquadra na ciência normal, considera-se anomalia. Por outras palavras, considera-se anomalia
um problema cujo paradigma dominante não capta.

Ciência extraordinária - quando as anomalias se acumulam, entra-se num período de crise, pois
os fundamentos do paradigma são postos em causa. Imaginemos que, um dia, se venha a duvidar
da ressurreição de Cristo, que é a base da fé cristã católica: os cristãos católicos estariam a viver
uma autêntica crise. É precisamente isto que acontece na ciência.

A acumulação de anomalias abala o paradigma; e o comportamento dos cientistas é o de procurar,


obviamente, outras teorias e fundamentos que substituam o paradigma que se mostra ultrapassado.

Revolução científica - acontece quando se descobre um novo paradigma. Trata-se de uma nova
visão do mundo e de adopção de novos critérios para a interpretação dos fenómenos, ou seja, uma
nova forma de fazer a ciência. Significa literalmente, a superação da crise.

A revolução científica implica uma mudança de mentalidade da comunidade científica, no sentido


de deixar de crer no antigo paradigma, e aceitar em substituição, o novo paradigma, chegando-se
de novo ao estado de equilíbrio a que se chama ciência normal e daí em diante os cientistas passam
a resolver os problemas mediante o novo paradigma. De salientar que a mudança de paradigma
faz-se com menor frequência o que revela certa resistência dos cientistas na adopção de novos
paradigmas

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Exercício I- Realização do Teste-1. Data limite de entrega:01/06-05/06/20020.

1. Defina o conhecimento.
2. Quais são os elementos que intervém no processo da construção do conhecimento?
3. No processo da construção do conhecimento, o sujeito desempenha um papel activo e o
objecto, passivo. Comente.
4. Como se chama aquilo que-se constrói na mente do sujeito quando afirmamos que conhecemos
algo?
5. O Homem conhece as coisas porque é doptado de certas capacidades. Mencione-as.
6. Mencione as perspectivas de análise que nos levam a aprendizagem.
7. Na perspectiva ontogenética, segundo Piaget, o conhecimento é resultado de um processo de
adaptação do indivíduo ao meio. Neste processo, ocorre duas actividades inter-relacionadas:
assimilação e acomodação resultando num equilíbrio. Explique os termos destacados.
8. Na perspectiva fenomenológica, o que significa dizer: o sujeito sai de si, está fora de si, e volta
para si.
9. Enuncie a questão levantada pelo problema da (im)possibilidade do conhecimento.
10. Mencione as correntes que discutem o problema da (im)possibilidade do conhecimento e os
seus respectivos representantes.
11. O cepticismo descarta a possibilidade de o Homem atingir a verdade. Com que bases se apoia?
12. Fazendo uma análise pessoal, preferes ser adepto do dogmatismo ou cepticismo? Fundamente
a sua posição.
13. Para Descartes, qual deve ser a atitude daquele que deseja alcançar um conhecimento seguro?
14. Distinga a dúvida céptica da dúvida cartesiana.

Para Kant, porque é que o Homem só pode conhecer o mundo dos fenómenos e não o do númeno?

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Exercício II-Realização do teste-2. Data limite de entrega: 29/06-03/07/2020.

1. Qual é a questão discutida pelo problema da origem do conhecimento e mencione as


respectivas correntes envolvidas?
2. ˝Admitimos, pois, que na origem, a alma mente humana é como uma tábua rasa˝.
a) Destaque a corrente realçada no trecho acima citado e os respectivos expoentes.
b) Explique como se adquire o conhecimento na visão desta corrente?
3. Mostre como Platão justifica a origem do conhecimento a partir da sua teoria de
reminiscência.
4. Como é que Kant argumenta a origem simultânea do conhecimento na experiência e na
razão?
5. Em que se divergem o empirismo e o construtivismo quanto ao mecanismo de aquisição
do conhecimento?
6. Se admitirmos, segundo Kant, que no acto do conhecimento, o sujeito e que adapta ao
objecto, que impasse nos deparamos e como o autor procura inverter o cenário?
7. Qual é a questão discutida pelo problema da natureza do conhecimento e mencione as
respectivas correntes envolvidas?
8. ˝O nosso conhecimento reflecte a realidade em si mesma, não se trata de uma simples
criação da nossa consciência a que nada corresponde fora de nós˝. Qual é o problema e a
corrente filosófica da Teoria de Conhecimento referenciada no texto?
9. A máxima hegeliana: ˝Todo o real é ideal e todo o ideal é real˝, pertence a que doutrina
filosófica?
10. Explique a relação entre o idealismo e o racionalismo?
11. Qual é a questão discutida pelo problema do valor do conhecimento e mencione as
respectivas correntes envolvidas?
12. Na questão discutida pelo problema do valor do conhecimento, qual e a visão de cada
corrente?
a) Qual é o fundamento do relativismo pragmático na questão do valor do conhecimento?
b) O relativismo pragmático ao definir a utilidade como critério de veracidade do
conhecimento manifesta-se contra a concepção estática da verdade. Comente.

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Exercício III –Realização do teste-3. Data limite de entrega: 27/07-31/07/2020.

1. Mencione os tipos de conhecimento.


2. Distingue o conhecimento comum do conhecimento científico e filosófico.
3. Qual é a tese principal do Positivismo de Augusto Comte?
4. Qual é a visão de Dilthey em relação ao positivismo?
5. De alguns exemplos de vantagens e desvantagens do conhecimento científico.
6. O que justifica os limites do conhecimento científico?
7. Defina a Epistemologia.
8. Mencione as correntes que discutem sobre o processo da evolução da ciência e os seus
representantes.
9. O que significa dizer, para o continuísmo, que o conhecimento científico progride de forma
linear e acumulativa e com que bases se apoia?
10. Como é que o conhecimento científico desenvolve na visão discontinuísta?
11. Quando é que se pode afirmar que o paradigma escapou dos seus carris?
12. Para Popper, a ˝sucessão de teorias tende a aproximar-se cada vez mais da verdade, uma meta
por si considerada inalcançável˝. Comente.
13. Explica os seguintes conceitos: Paradigma, Ciência normal e Anomalia, Ciência
extraordinária e Revolução científica que Khun usa par explicar o processo da evolução da
ciência.

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