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DROGAS E RELIGIÃO
PARTE II: RITUAIS EXTÁTICOS CRISTIANIZADOS

Remonta  ao  fim  do  nomadismo  o  consumo  de  plantas


psicoativas  pelo  homem  com  o  intuito  do  congraçamento
com o divino (PARTE I). O desejo de passear pelo mundo
dos  deuses,  elevar  a  condição  espiritual  e  buscar  novos
elos de união grupal  sempre  estiveram  presentes  em  tais
práticas. As plantas capazes de propiciar essa experiência
passaram a ser vistas como um presente dos deuses, uma
ponte  presenteada  por  eles  para  facilitar  o  acesso  do
homem  a  seu  mundo.  Os  rituais  extáticos  eram  guiados
por  seres  capazes  de  se  aventurar  incólumes  às
impurezas espirituais que essa experiência proporcionava.
Eram estes os curandeiros, pajés, mestres, sacerdotes ou,
como  se  habituou  denominar  a  todos  esses  nos  dias  de FIGURA 1: Hari­hari segura um cogumelo Amanita [à esquerda], enquanto um ídolo asteca está
posicionado sob a proteção de um cogumelo [à direita].  Os  povos  da  Antigüidade  acreditavam
hoje,  os  xamães.  Alguns  exemplos  dessa  prática  são  o nas  plantas  psicoativas  como  um  presente  dos  deuses,  capazes  de  transportar  seu  espírito  a
consumo de cogumelos do gênero Amanita pelos sibérios planos divinos.
e hindus durante a pré­história e o consumo de cogumelos
do gênero Psilocibe pelos maias e astecas.

No entanto, o aparecimento das religiões judaico­cristãs modificou os paradigmas religiosos da humanidade. A crença passou a girar em
torno  de  um  único  Deus,  criador  do  Céu  e  da  Terra,  onipresente  e  onipotente,  cuja  palavra  fora  revelada  e  difundida  por  profetas  e
sacerdotes.  Não  cabia  nessa  crença  a  reencarnação  ou  contato  com  espíritos.  Sob  essa  nova  perspectiva  importância  das  plantas
psicoativas  nos  rituais  religiosos  desapareceu.  A  Igreja  Católica  medieval  considerava  tais  ritos  um  desejo  de  contatar  o  demônio  e
punia  rigorosamente  os  hereges  que  praticavam  tais  liturgias.  A  aceitação  do  Judaísmo,  do  Cristianismo  e  do  Islamismo  dentro  dos
limites dos antigos Impérios Persa e Romano baniu boa parte dos rituais religiosos extáticos da região.

Os  Grandes  Descobrimentos  reeditaram  esse  choque


cultural.  O  europeu  cristianizado  encontrou  civilizações
que  cultuavam  diversos  deuses  e  utilizavam  plantas
psicoativas  para  alcançarem  experiências  extáticas.  O
consumo de tais plantas foi duramente reprimido e valores
cristãos,  introduzidos.  Entre  os  povos  conquistados,
alguns  indivíduos,  apesar  de  aceitarem  a  fé  cristã  como
seu novo paradigma religioso, continuavam a cultuar suas
raízes religiosas nativas. Outros aceitaram aparentemente
FIGURA 2: O pitoresco: os nativos americanos pelo pincel europeu. O encontro do colonizador a  religião  européia  e  praticavam  seus  rituais  pagãos  às
branco, fiel a um único Deus, com os nativos, panteístas e  politeístas,  provocou  a  emergência
de novas religiões, que combinaram aspectos de ambas. escondidas.  Houve,  ainda,  nativos  cristianizados  que
reencontraram a fé de seus ancestrais tardiamente.

Entre  as  várias  formas  de  sincretismo  religioso  que  se


estruturaram  ao  longo  dos  séculos  de  colonização
européia na América, duas chegaram aos nossos dias de
modo  bastante  organizado  e  complexo:  a  Igreja  Nativa
Americana  e  o  Santo Daime.  Santos  católicos  e  o  Cristo
fundiram­se  aos  deuses,  espíritos  ancestrais  e  entidades
da  natureza,  que  compunham  o  panteão  das  divindades
dos  povos  conquistados.  Tal  sincretismo  não  resultou
apenas  da  vontade  nativa  de  praticar  sua  religião,  mas
também devido às semelhanças entre ambas crenças.
A Igreja Nativa Americana

O  peiote  (Lophophora  williamsii)  é  consumido


milenarmente  entre  os  povos  nativos  do  México.  Os
astecas já conheciam suas propriedades alucinógenas e a
O peiote utilizavam  com  propósitos  religiosos.  A  civilização  que se
notabilizou pelo consumo da planta foram os huichóis. Os
O peiote (Lophophora williamsii) é um cacto capaz de adquirir diferentes formatos, de acordo
da  idade  e  das  condições  ambientais  de  crescimento.  Em  geral,  desenvolvem­se  de  modo
huichóis  descendem  dos  astecas.  Como  habitavam  os
contíguo, a partir do nascimento de botões. A primeira ilustração científica apareceu em 1847. altiplanos  mexicanos  de  Sierra  Madre,  permaneceram
isolados  por  longos  períodos  da  civilização  hispânica  e
A  planta  contém  um  alcalóide  alucinógeno,  o  3,4,5­trimetoxifeniletilamina.  Como  os  botões
secos para o consumo são chamados de mescal, o alcalóide recebeu o nome de mescalina. 
mantiveram mais fortes as tradições de seu povo, oriundas
do período pré­colombiano. 

O peiote em dois momentos: in natura com vários botões e florescências [superior] e o
mescal (botão seco) [inferior], modo pelo qual é consumido.
Os  huichóis,  tal  como  os  cristãos,  acreditavam  que  seu
Deus,  por
compaixão,  viera
à  Terra  para
salvar  seu  povo.
Para  os  cristãos,
ele se mostrou na
forma  de  um
FIGURA 3: O caçador  de  peiotes  e  seu  aparato.
O ritual da coleta do peiote tem profundas raízes homem,  que
com  a  maneira  como  os  caçadores  primitivos morreu,  mas
viam  o  mundo.  Os  huichóis  acreditam  que  o
ressuscitou  para
Criador encarnou no cervo e no peiote. O peiote
simboliza o coração do cervo e por isso deve ser salvar  seu  povo.
'caçado' com uma flecha e comido cru. Para  os  huichóis
seu  Deus  morreu
e  reencarnou  em
forma  de  peiote,
criado  para  dar
mais  sabedoria
aos homens.

Os  huichóis  e  os
carrizos
introduziram  o
hábito  de
consumir o peiote
entre  as  tribos
norte­americanas
FIGURA 4: O deus­cervo, encarnação do Criador. (Figura  5),  em
O  coração  do  cervo  é  devorado  pelos  coites, especial  entre  os
irmãos  mais  velhos  dos  huichóis.  Para  essa
civilização, o peiote simboliza o coração do cervo
comanches,  que
e comê­lo cru faz renascer o lobo que habita seu habitavam  as
espírito.  Autor:  Jose  Benitez  Sanchez planícies  do
(http://www.math.csusb.edu).
Texas  e
Oklahoma. Esse encontro se deu por volta do século XVII e resultou no surgimento da Igreja Nativa Americana duzentos anos depois
FIGURA  5:  Área  habitada  pelos  huichóis  e  carrizos  (vermelho)  no  final  do  século  XIX  e  as
prováveis  rotas  dos  comanches  pela  região,  através  das  quais  entraram  em  contato  com  o
consumo do peiote. http://www.history.uiuc.edu

Na transição para o século XIX, as tribos comanche e kiowa de Oklahoma encontravam­se em reservas indígenas. Outrora orgulhosas
de seu passado guerreiro e autônomo, estavam naquela época vencidas e restritas a territórios demarcados. Nesse ambiente, o peiote
começou  a  ser  consumido  por  essas  tribos.  O  intuito  era  buscar  um  contato  com  espíritos  ancestrais,  recuperar  suas  identidades
culturais e revigorar os laços de união entre os membros da tribo. Influências cristãs compuseram os rituais do peiote, provenientes da
ação de missionários religiosos presentes nas reservas indígenas. Em pouco tempo, não só os comanches e kiowas, mas também os
delawares, caddos, cheyennes, arapahos, poncas, otos, pawnee, osage e outras tribos mais faziam rituais de peiote.

O  grande  difusor  do  peiotismo  foi  Quanah  Parker  (Figura 6).  líder  comanche  de  Oklahoma  ajudou  a  espalhar  o  ritual  do  peiote  para
outras tribos do estado e conferiu a essa nova instituição um caráter intertribal. O rápido crescimento do peiotismo em Oklahoma e no
Texas  chamou  a  atenção  dos  missionários,  que  passaram  a  defender  sua  proibição.  Os  índios,  no  entanto,  souberam  se  articular
politicamente  em  seus  estados  e  contaram  com  a  ajuda  de  descendentes  integrados  à  'cultura  branca',  inclusive  professores
universitários.

Por volta da primeira década do século XX  o  peiotismo  ganhou  respaldo  governamental  para  existir.  Atualmente,  há  cerca  de  oitenta
capelas espalhadas pelo país, congregando cerca de duzentos e cinqüenta mil pessoas. O canto em língua nativa é o principal modo de
expressão dos cultos, acompanhado por instrumentos de percussão e entremeados por meditação. A cerimônia dura toda a noite e é
acompanhada pelo consumo de peiote. A Igreja não possui clérigos. A Bíblia é lida em grupo e cada um a interpreta livremente. A moral
é essencialmente cristã. O consumo de álcool é proibido para os membros do grupo.

FIGURA 6: Quanah Parker. Líder comanche  do FIGURA 7: Dois momentos da Igreja Nativa Americana: [à esquerda] comissão de peiotista reunida com o comitê médico
estado  de  Oklahoma,  considerado  um  dos durante a Convenção Constitucional de Oklahoma, que autorizou consumo do peiote no estado (1907) e [direita] capela da
grandes  difusores  do  peiotismo  entre  as  tribos Igreja em Oklahoma durante os anos 50. http://www.history.uiuc.edu
ameríndias  dos  Estados  Unidos.
http://www.history.uiuc.edu

O Santo Daime

O  consumo  da  ayahuasca  entre  os  povos  indígenas  da  bacia


amazônica  está  presente  entre  as  tribos  indígenas  da  bacia
amazônica  há  cerca  de  2000  anos.  Não  há  evidências  concretas
acerca de sua origem. A palavra deriva do quéchua, idioma oficial do
império  inca,  e  significa  vinho  da  alma.  Os  incas  conheciam  a
ayahuasca  e  a  utilizavam  com  propósitos  místico­religiosos.  Alguns
acreditam  que  talvez  tenham  eles  os  responsáveis  pela  propagação
do consumo da bebida entre outras tribos.

Uma  lenda  corrente  (Figura  8)  afirma  que  durante  a  invasão


espanhola  que  marcou  o  fim  do  império  inca,  comandada  pelo
conquistador  espanhol  Francisco  Pizarro  (1532­1534),  o  imperador
inca Atahualpa foi preso e assassinado. Um de seus irmão, o príncipe
Hayauasca,  se  refugiou  em  Machu­Picchu  e  depois  alcançou  a
floresta. Conhecedor do preparo da bebida sagrada dos deuses incas
ensinou­o a outras tribos, que a batizaram com seu nome.

A ayahuasca
Mesmo  havendo  desacordo  entre  as  evidências  milenares  de
consumo  e  a  lenda  do  príncipe  Hayauasca,  a  lenda  revela  a
A  palavra  ayahuasca  significa  vinho  da  alma.  A  bebida  possui  dezenas  de
importância  da  bebida  como  um  elo  de  ligação  entre  os  incas  e  seu
outros  nomes,  tais  como  iajé,  cipó,  daime,  vegetal,  caapi.  Diversas  plantas
podem  ser  utilizadas,  com  o  intuito  de  provocar  reações  específicas  ou passado  glorioso  (agora  em  ruínas)  e  a  intenção  de  buscar  um
dependendo  das  tradições  de  cada  tribo.  Duas  plantas,  no  entanto,  são vínculo  de  união  entre  as  nações  subjugadas.  Uma  propriedade
essenciais:  o  cipó  do  jagube  (Banisteriopsis  caapi)  e  a  chacrona  ou  rainha
(Psychotria  viridis).  A  chacrona  é  rica  em  um  alucinógeno  denominado
espiritual que nunca poderia ser tomada por qualquer conquistador.
dimetiltriptamina  (DMT).  Uma  vez  no  organismo,  o  DMT  é  destruído  por  uma
enzima  chamada  monoaminoxidase  (MAO).  O  cipó,  no  entanto,  é  rico  em O consumo da ayahuasca permaneceu vivo entre as tribos indígenas
harmalina,  que  bloqueia  a  ação  da  MAO,  potencializando  a  ação  do  DMT  no amazônicas,  mesmo  após  a  chegada  dos  conquistadores  luso­
cérebro.
espanhóis.  O  hábito,  no  entanto,  continuava  exclusivo  das  nações
A chacrona ou rainha [à esquerda] e o caapi ou cipó do jagube [à direita] indígenas e era  visto  pela  população  das  cidades  e  povoados  como
algo demoníaco, capaz de causar visões amedrontadoras e capazes
de  levar  a  loucura.  Essa  situação  começou  a  modificar  com  a
chegada  do  século  XX  (Figura  9).  Nessa  época,  a  extração  da
borracha  se  constituiu  numa  atividade  altamente  lucrativa  e  atraiu
uma  grande  quantidade  de  retirantes  da  seca  nordestina.  Nesse
mesmo período, o Brasil se preocupava em demarcar suas fronteiras
e ocupar os territórios do norte do país. O Marechal Cândido Rondon
realizou várias expedições à Amazônia, levando o telégrafo e fazendo
contato com nações indígenas.

Nessa  época,  chegou  à  região  da  Basiléia  (Acre)  um  nordestino  da


cidade de São Vicente Ferrer (Maranhão) chamado Raimundo Irineu
Serra, que buscava em posto na extração do látex (Figura 9). Irineu
acabou  por  integrar  a  equipe  do  Marechal  Rondon  e  entrou  em
contato  com  diversas  tribos  indígenas.  Com  elas,  aprendeu  a
preparar a "bebida que causava visões". Ao consumi­la passou a ver
cruzes,  ao  invés  de  imagens  demoníacas  conforme  haviam  lhe
prevenido. Passou, então, a estudar a bebida. Durante uma de suas
experiências  apareceu­lhe  uma  mulher  (Clara),  que  se  dizia  ser
Nossa Senhora da Conceição, a Rainha da Floresta. A santa marcou
um novo encontro com Irineu na floresta para dali a oito dias. Nesse
período deveria apenas comer macaxeira insossa e tomar ayahusca.
FIGURA  8:  A  lenda  a  ayahuasca.  Conhecida  pelos  incas  há  milhares  de  anos  e
considerada  por  esse  a  bebida  sagrada  dos  deuses,  foi  levada  a  outras  tribos  da No oitavo dia, a santa retornou, entregou a Irineu os fundamentos da
Amazônia pelo príncipe Hayauasca, que  fugiu  do  massacre  espanhol  que  vitimou doutrina da ayahuasca e entregou a ele seu mundo espiritual.
seu irmão mais velho, o imperador Atahualpa.
Ao fundamentar o consumo da ayahuasca com base no cristianismo,
mestre irineu passou a chamá­la Daime: "'daime' paz, 'daime' saúde,
'daime' felicidade!" A  doutrina  do  Daime  foi  recebida  pelo  mestre  na
forma  de  hinos,  que  pregavam  o  amor  à  natureza  e  consagram  o
mundo  vegetal  e  o  planeta  como  o  cenário  sagrado  da  nossa  mãe­
terra.  A  conversão  da  ayahuasca  em  Santo  Daime  conferiu­lhe  a
bebida uma doutrina religiosa sincrética, com influências nativas, afro­
brasileiras  e  cristãs.  Sua  popularização era  apenas  uma  questão  de
tempo.

Em 1930, Mestre Irineu mudou­se para Rio Branco (AC), onde fundou
a  Igreja  do  Alto  Santo.  Em  1945,  fundou  o  Centro  de  Iluminação
Cristã Luz Universal (CICLU) , que chegou a congregar 500 membros
efetivos. Permaneceu em Rio Branco até a sua morte, em 1971.

Se o Daime teve um fundador, teve também um difusor. Após a morte
de  Mestre  Irineu,  um  de  seus  principais  discípulos,  o  seringueiro
Francisco Mota Melo continuou o trabalho do mestre (Figura 10). Em
1973,  fundou  na  margem  esquerda  do  rio  Purus  a  comunidade  Vila
Céu  do  Mapiá  e  dentro  desta  organizou  sua  entidade  religiosa,  o
Centro  Eclético  da  Fluente  Luz  Universal  Raimundo  Irineu  Serra
(CEFLURIS). Com mais de 100 casas, o Mapiá é o hoje o centro do
daimismo. Com  a  morte  de  Padrinho  Sebastião,  seu  filho,  Padrinho
Alfredo,  o  substituiu.  Padrinho  Sebastião  foi  o  responsável  pela
propagação  do  Daime  na  capital  Brasília  e  nos  estados  da  Paraíba,
São  Paulo,  Minas  Gerais,  Rio  de  Janeiro,  Santa  Catarina  e  Rio
Grande  do  Sul,  além  de  países  no  exterior  como  Argentina,  Chile,
Estados Unidos, Alemanha, Holanda e Japão.

O  presente  artigo  teve  como  intuito  apontar  exemplos  vivos  do


consumo religioso de substâncias psicoativas. A cristianização de tais
rituais atualizou sua linguagem e possibilitou a sobrevivência desses
até os dias de hoje. O culto aos membros ancestrais, aos elementos
da natureza e o desenvolvimento espiritual constituem o eixo central
dessas religiões. Tanto o governo brasileiro quanto o norte­americano
permitem  o  consumo  da  ayahuasca  e  do  peiote,  dentro  do  contexto
religioso  organizado  por  ambas.  O  surgimento  de  empreendimentos
turísticos  a  esses  locais  e  de  apresentações  sintéticas  das
substâncias (farmausca), fora do contexto religioso, vem chamando a
atenção das autoridades, mas ainda não há resoluções claras nesse
sentido.

FIGURA 9: O nascimento do Daime. O maranhense Raimundo Irineu Serra partiu
rumo ao Acre seguindo o fluxo migratório dos retirantes da seca, rumo à extração
da  borracha  amazônica.  Na  Basiléia  (AC)  integrou  a  Força  Expedicionária  do
Marechal  Rondon  e  entrou  em  contato  com  os  povos  indígenas  e  conheceu  a
ayahuasca. Segundo seus relatos, durante uma de suas experiência com a "bebida
que causava visões" lhe apareceu Nossa Senhora da Conceição, que lhe ensinou
os fundamentos da doutrina do Daime e o hinário. Tornou­se o Mestre Irineu.

FIGURA  11:  Francisco  Montes  Shuña.  A  origem  da  ayahuasca  e  da


chacrona.

FIGURA  10:  Padrinho  Sebastião.  Assumiu  a  frente  o  movimento  daimista  após  a


morte de Mestre Irineu. Fundou a Vila Céu do Mapiá, centro religioso do Daime. Foi
também o protagonista da popularização do culto pelo país.

As mirações

A ingestão da ayahusca visa a proporcionar vidências, comunicação com espíritos,
alívio físico e psíquico, curas, dentro de um ritual que não só estabelece um nexo
entre o humano e o divino, como também uma unidade mais alta entre os membros
do  grupo.  O  ritual  envolve  todo  o  ciclo  de  vida  das  plantas,  seu  preparo  pelos
membros  e  o  consumo  grupal.  A  manifestação  musical,  através  do  canto  dos
hinários  e  o  bailado,  é  o  ponto  central  da  liturgia  daimista.  As  cerimônias  se
estendem por horas e o Daime é consumido ao longo da ocasião.

Êxtase da revelação, o momento em que o daimista recebe as visões, que são ao
mesmo  tempo  consideradas  reais  e  numinosas,  é  denominado  mirações.  É  o
momento em que o pensamento é sentido como uma vibração capaz de modelar,
criar, curar e alcançar telepaticamente outras mentes e planos espirituais.

Paulo César Amaringo. As janelas do Céu.

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