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Copyright © 2020 by AllBook Editora.

Direção Editorial: Beatriz Soares


Tradução: Alice J. Silva
Preparação e Revisão: Clara Taveira e Raphael Pelosi Pellegrini
Projeto Gráfico e Diagramação: Cristiane | Saavedra Edições
Imagem de capa cedida pela: Passionflix
Adaptação da Capa: Flavio Francisco

Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma


parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser
reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos,
mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Os direitos morais do
autor foram declarados.

Esta obra literária é ficção. Qualquer nome, lugares, personagens e incidentes


são produto da imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas reais,
vivas ou mortas, eventos ou estabelecimentos é mera coincidência.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa
(Decreto Legislativo nº 54, de 1995)

DIREIT
OS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À ALLBOOK EDIT
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SUMÁRIO
Capa
Folha de Rosto
Ficha Catalográfica
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
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Passionflix
AllBook Editora
Julia
— Argh! — O gemido soa pelo elevador segundos depois que a
caixa metálica treme e para no meio do caminho entre os andares
três e quatro. O homem que acabou de entrar como se fosse o dono
da droga do lugar bate a palma da mão contra as paredes de metal
escovado, em seguida aperta o punho sobre o pacote em sua mão
enquanto aperta repetidamente no botão de abertura da porta e, em
seguida, o botão quinze com o outro.
Nada acontece.
— Não se incomode em chamar a gerência. Não é como se eles
fossem fazer algo sobre isso — eu murmuro do meu lugar no canto
oposto, com diversos pacotes empilhados em minhas mãos, indo da
cintura até sob o queixo, em atos precários de equilíbrio, e com
rastros nas bochechas das lágrimas que eu estava derramando
momentos atrás, escondida por seu tamanho.
Ele se vira para me olhar pela primeira vez, quase como se nem
soubesse que eu estava lá — não que eu esteja surpresa. Eu já o vi
antes. Ele e seu cabelo escuro perfeitamente penteado e sua
mandíbula rígida enquanto ele entra e sai deste lugar dia após dia
como se fosse o dono. Eu não tenho ideia de em que andar ele
trabalha nesta extensão de edifício, mas eu sei que não é no meu e
sei que é na metade superior. A metade dos executivos. A metade
em que as garotas das entregas são inexistentes — não servem
para nada além de ouvir comentários grosseiros ou serem ignoradas
completamente.
Nunca nada entre as duas coisas.
Olhos azuis de gelo se fixam nos meus, atrás dos óculos de
armação preta, e uma sobrancelha se levanta.
— Pode repetir? — sua voz resmunga.
E é claro que a voz dele é tão sexy quanto ele. Sorte a minha.
— Os elevadores são apenas a ponta do iceberg neste lugar, se
você quer saber. Desde que McMasters Sênior deu o fora, este
lugar não tem sido o mesmo. As grandes perucas no último andar
andam por aí em seus ternos de mil dólares e usam relógios que
custam mais do que carros. Eles governam o mundo a partir de
seus escritórios com vista de 360 graus, enquanto aqueles como eu,
na sala de correspondência, precisa tentar classificar cartas usando
luvas porque o aquecedor está quebrado e eles não se importam
em consertá-lo. Além disso, há os banheiros, que raramente
funcionam, os cortes orçamentários, que deixaram a comida do
refeitório imprópria até para um cachorro, e os bônus de Natal? Rá!
— Eu rio enquanto as lágrimas ameaçam cair novamente. — Os
bônus só são dados aos homens desta empresa que fingir tomar
decisões enquanto todos ao seu redor se esforçam fazendo o
trabalho real.
— Sutileza é o seu ponto forte, estou certo? — ele pergunta,
virando-se agora para me encarar. Há algo em sua voz, uma leve
cadência em uma palavra que eu não entendo muito bem, mas o
pensamento desaparece da minha mente quando seus olhos se
fixam nos meus. — E o que exatamente você quer dizer sobre
bônus de Natal?
Incomodadapela intensidade de seu olhar, eu olho para qualquer
lugar, exceto para ele. Observo sua camisa de flanela com as
mangas enroladas até o cotovelo. A largura de seus ombros. O
aroma bom, mas sutil, de sua colônia. O que mais ele está vestindo,
não tenho ideia por conta da minha pilha de pacotes que impedem a
visão mais abaixo.
Quando olho de volta em seus olhos enquanto o silêncio domina
o espaço, lembro que ele havia apertado o botão quinze no painel.
— Não importa. Você está em um dos andares que realmente
recebem um bônus. Esqueça tudo que eu disse. — Eu solto um
suspiro forte, para fazer com que minha franja saia do meu rosto, e
noto que este espaço apertado como o meu casaco pesado e eu
falar livremente me fazem ficar com calor de repente.
Ou talvez seja ele — quente de todas as maneiras certas, e eu
odeio que esse pensamento esteja passando pela minha cabeça.
— Não. — Ele dá um passo para mais perto, e os pacotes
balançam em meus braços. Mas ele não parece notar, porque está
muito focado em mim. — O que você quis dizer com isso?
A correria dos eventos de hoje enche minha cabeça e machuca
meu coração, de modo que todas as trepadas que eu gostaria de
dar parecem se dissipar nessa única palavra, não.
Eu olho para ele. Ele é parte do problema. O homem que entra
em um elevador sem olhar para trás, para a garota peculiar da sala
de correspondência cujos braços estão ocupados por muitas caixas.
Sempre ocupado demais, tentando salvar o que para ele parece ser
o mundo, um par de calcinhas de cada vez.
Ei!
Dê um passo atrás, Jules. Fique de boca fechada. Se queimar
nunca é uma coisa boa.
Mesmo que algum idiota como ele seja a razão de você ter sido
demitida.
Se você terminar suas entregas e não fizer uma cena, Jules,
você será paga até o fim da semana.
A voz anasalada do meu chefe, Barney, e seu comentário
passam rapidamente pela minha mente, seguido pela lista de contas
a pagar que eu tenho, cujo valor sei de cor.
E quase como se o destino precisasse reforçar minha sorte e
muito provavelmente a pior das temporadas de férias da minha vida,
o elevador sobe bruscamente. Sim. Você adivinhou. O monte de
pacotes, precariamente empilhados, cai das minhas mãos e se
espalha no chão, acompanhado pelo meu grito estrangulado
enquanto tento me estabilizar.
O sr. Camisa de Flanela emite um ruído que soa muito mais
sofisticado do que o meu.
E assim como naqueles filmes antigos dos anos 80, que eu amo,
o nervosismo nos abalou de modo que ambos nos dobramos ao
mesmo tempo — um “deixe-me orna-la” escapou de sua boca
naquele estrondo profundo — segundos antes de nossas cabeças
baterem uma contra a outra.
— Ai! — nós dois dizemos em uníssono enquanto nos sacudimos
para trás, mas quando eu piso e deslizo em um dos pacotes, caio
para frente. E antes que eu possa colocar o rosto perfeitamente
alinhado ao que estou olhando — a virilha de sua calça jeans escura
—, um par de mãos fortes agarram meus ombros e me impedem.
— Esse pacote não faz parte da sua entrega — ele murmura,
mas posso ouvir a diversão em seu tom. — Meus olhos estão aqui
em cima.
Sem fôlego e mais do que assustada com a pancada na cabeça
e com seu comentário, eu olho para cima e vejo seu rosto a poucos
centímetros do meu. Lábios. Nariz. Olhos. Todos eles parecem
implorar por mim. Encolho os ombros e saio de seu aperto, tão
rapidamente quanto finjo não notar.
— Estou bem. Istoé bom. Estamos bem. — Cada palavra é uma
sílaba afetada que sai da minha boca enquanto eu silenciosamente
me castigo sobre o motivo de estar tão nervosa.
— Ok. — Ele diz lentamente a palavra e estreita os olhos para
mim com um meio sorriso, uma expressão meio maluca em seu
rosto. — Seus chifres estão tortos.
— Chifres? — pergunto.
Ele aponta para minha cabeça.
— Os na sua cabeça.
— Oh. Oh! — Eu imediatamente pego meu arco e arranco, me
sentindo como uma aluna do jardim de infância vestida para o
programa de Natal enquanto está indo para o Quebra-Nozes.
— Por que você os tirou? Estava fofo.
— Fofa? — eu sussurro e balanço a cabeça. Ele realmente disse
que eu sou fofa?
Não. Ele disse que os chifres são fofos.
Você, não.
— Sim. Eles ficam bonitos em você. Você deve mantê-los.
Eu fico olhando para ele, piscando mais do que provavelmente
deveria, como se estivesse tentando processar o que ele acabou de
dizer, quando sei que ouvi muito bem. Em vez de dizer qualquer
coisa, eu me abaixo com toda graça que posso para que possa
começar a catar os pacotes.
Eu tenho de fazer algo com minhas mãos.
Qualquer coisa.
Porque estou gastando muito tempo focando nele, mesmo que
não goste de caras como ele — provavelmente estável.
Provavelmente bem-sucedido. E definitivamente acha que é bom
demais para alguém.
Como eu.
— Deixe-me orna-la.
— Não! — quase grito e ergo a mão sem olhar para ele. — Eu
consigo.
— Pelo visto — ele murmura, mas se inclina para frente, de
qualquer maneira, para me ajudar.
— Só não... eu não... só me deixa em paz — eu solto e
praticamente dou um tapa em sua mão. — Você já fez o suficiente
hoje.
Mas quando eu olho para ele e vejo em seus lábios um sorriso
que ilumina a porcaria do elevador de uma forma que um elevador
não deveria se iluminar, eu o odeio.
Completamente.
Por ser tudo que não sou. Por conseguir tudo que nunca
conseguirei. Por ser aquele que tem quando eu sou aquela que não
tem. Com o pouco que vi, ele é perfeito, suas modelos magras
devem ser ostentadas ao seu lado, enquanto estou bem longe
disso, apenas usando chifres de rena e com minhas curvas e
acolchoamento extra que não vão embora — eu tiro o casaco que
estou vestindo.
Essa é minha suposição, de qualquer maneira.
Porque homens tão perfeitos quanto ele deveriam ser ilegais.
— Eu? — ele tosse a palavra.
— Sim. Você — acuso enquanto esfrego o topo da minha cabeça
da mesma forma que ele.
— O que eu fiz?
— Você é só... — Aponto meu dedo para ele e balanço para
frente e para trás, mas verbalmente atrapalhada sobre o que dizer a
seguir.
— Está tendo um dia ruim? — ele pergunta como se ele se
importasse.
— Um dia ruim? Um dia ruim? — eu grito. — Tente ir ao banco
para sacar dinheiro e descobrir que seu namorado não apenas
dizimou sua conta, mas depois lhe enviou uma carta tipo Querido
John via mensagem de texto. Ah, e a cereja do bolo? Meu aluguel
vence no primeiro dia do mês, e o dinheiro para pagar está no bolso
dele, e não no meu.
Ele sibila em uma simpatia fingida.
— Você parece mais zangada do que chateada.
Eu balanço minha cabeça me sentindo mais aliviada do que
qualquer coisa.
— A separação, tudo bem. O roubo do dinheiro do aluguel, nem
tanto.
— O lado bom? O idiota não está mais na sua vida.
Eu olho para ele e para o pequeno sorriso bonito que tem nos
lábios.
— Do banco, dirigi até a estação ferroviária apenas para algum
idiota na via expressa bater na minha traseira. — Eu respiro fundo,
sabendo que ele não merece nem um pouco dessa ira que sinto ou
tem ideia do papel que está desempenhando nesse meu desabafo,
mas eu continuo mesmo assim. — Então... Eu escorrego para fora
em um pedaço de gelo, e quer saber, eu juro por Deus que ainda
tenho gelo na minha calcinha.
— Há tantos comentários que posso fazer sobre isso... Frígida,
Rainha do Gelo, Gatinha Fria... Mas vou ficar calado e me
comportar da melhor maneira — diz, e odeio o tom brincalhão com
uma voz mais infantil, o ângulo de sua cabeça faz meu corpo reagir
da maneira mais visceral.
É o espaço fechado.
Precisa ser.
— Tá vendo? Eu disse que era sua culpa — acuso apenas para
quebrar meu próprio fascínio por todo ele: a curva de seus lábios, a
força em suas mãos, o azul de seus olhos, a sensualidade de seus
óculos, a linha de sua mandíbula.
Sua risada é baixa e uniforme.
— Seu dia ruim é definitivamente minha culpa. Eu disse para o
idiota esvaziar suas contas e despejar você. Eu disse ao bundão
para bater o carro em você. E eu com certeza fiz aquele bloco de
gelo para que você escorregasse sobre ele. — Ele luta contra um
sorriso aberto enquanto tenta me fazer sorrir. — Uau. Nem mesmo
um sorriso. Deve haver mais, então.
— Não fui só abandonada pelo bundão.
— O bundão era o motorista, o ex é o idiota — corrige ele com
voz profissional seguido com um aceno de cabeça para eu
continuar.
— Obrigada. — Eu reviro meus olhos. — Então, não só fui
abandonada pelo idiota, levei uma batida de carro do bundão e
tenho gelo nas calças, mas quando eu apareci para trabalhar, veja
bem, liguei três vezes para contar a eles sobre meu acidente, e
recebi um “Feliz Natal, você está despedida”.
— Não! — ele exclama, brincando, mas só depois que meus
olhos se enchem de lágrimas e meu lábio inferior começa a tremer,
ele percebe que estou falando sério. — Merda. Eu sinto muito.
— Não é nada. — Eu fungo, tentando lutar contra as lágrimas,
mas perco a batalha quando uma escorrega pela minha bochecha.
— É só que... — Deixo minhas mãos caírem em derrota. — O Natal
é em dois dias. Tudo que eu queria de Alex...
— Alex?
— O idiota. — Soluço ao ouvir a palavra, lutando contra a
corrente de emoções que estão ameaçando se derramar. — Tudo
que eu queria era me sentir especial. Meu único desejo era jantar no
Tavern on the Green para que eu pudesse fingir que pertenço a esta
cidade. Como se eu fosse um daqueles que trabalham no décimo
quinto andar... e... e... não importa. Só... Oh, meu Deus. — Eu
enterro o rosto em minhas mãos enquanto o embaraço me atinge
diretamente no plexo solar.
— O quê? — ele pergunta, com preocupação em sua voz,
embora eu tenha certeza de que ele está mais preocupado com ficar
preso por muito mais tempo em um elevador com uma Louca-
Emotiva-Garota-da-Correspondência.
— Eu sinto muito. — Eu balanço minha cabeça e finjo que não
tenho rastros de lágrimas em minhas bochechas. — Estou presa em
um elevador, abrindo meu coração para um cara que não se importa
a mínima, como um idiota faria. Vou apenas recolher meus pacotes
e seguir meu caminho natalino.
Eu me esforço para limpar uma lágrima com uma das mãos
enquanto pego uma pequena caixa e a empilho com a outra.
Desliza. Empilha. Desliza. Empilha.
— Há um problema — diz ele depois de alguns segundos, e
minha atenção volta a ele.
— E seria?
— Não há como você seguir seu caminho natalino. Estamos
presos em um elevador. Nós não vamos a lugar algum por um
tempo.
— Então devemos parar de falar. Certo? Devemos conservar o
ar. — O pânico me atinge, porque não pensei nisso antes de apenas
sugar todo o oxigênio com meu blá-blá-blá. — Oh, droga.
Mas ele apenas fica parado e olha para mim com um mínimo de
diversão gravada nas linhas do rosto.
— Qual o seu nome?
— Jules.
— Jules?
— Julia Jilliland.
— Uau. — Ele solta uma risada. — Isso é demais. Prazer em
ornaa-la, Jules Jilliland da sala de correspondência. — Ele estende
a mão para apertar a minha e, quando nossas mãos se tocam, sua
voz vacila por um segundo. — Eu sou... uh... sou...
Nós dois ficamos de pé quando o telefone no painel ao lado dele
toca alto. Sua risada é o que ressoa — isso e o calor na minha mão
onde a dele estava momentos antes — quando ele leva o receptor à
orelha.
— Devemos nos preocupar que você demorou tanto para ligar?
Serviço de celular é uma merda aqui, então estamos dependendo
de você para salvar nossas bundas — diz a quem quer que esteja
do outro lado da linha, dando uma risada.
E eu sorrio.
Eu odeio isso.
Sua indiferença é tão sexy quanto irritante. E, claro, agora que
ele se virou para o painel, eu tenho uma visão mais do que ampla
de suas costas. Uma bela parte traseira, devo acrescentar, que é
complementada por uma bunda muito elegante.
Não é como se eu esperasse menos. Ele tem uma armação de
óculos. A camisa enrolada que mostra antebraços fortes. Olhos que
questionam e sugerem e são mais quentes que o inferno. Um senso
de humor que eu finjo que não acho engraçado. A bela bunda...
Quer dizer, é claro que aceitaria ficar presa em um elevador com
uma perfeição como ele.
— Obrigado. Sim, estamos bem. Há maneiras piores de passar o
tempo dias antes do Natal — brinca. — Posso presumir que
sairemos antes disso? Natal, né? Porque senão Jules e eu
provavelmente deveríamos começar a entrar em pânico logo. — Ele
acena quando a pessoa do outro lado da linha diz algo e ri. — Isso,
e definitivamente precisaríamos de alguns Red Vines enviados pela
escotilha. — Outra risada. Outro aceno de cabeça. — Obrigado.
Quando ele desliga o telefone, ele se vira de modo que seus
ombros encostam na parede, suas mãos estão na grade que
circunda a caixa, um tornozelo está cruzado sobre o outro, e seus
olhos estão fixos mim.
— Eles estão trabalhando no conserto. Disseram que não deve
demorar muito.
— Red Vines?
— Alimentos — ele diz com uma piscadela.
— Então você deveria ter pedido Twizzlers.
— Sério? Estou preso em um elevador com alguém que ama
Twizzlers? Vai ter mais para mim, então. Ei, você tem certeza de
que não foi por isso que você foi despedida? Porque amar Twizzlers
é uma daquelas coisas que é difícil ignorar.
— Ãr-dã — eu digo com um aceno de cabeça.
— Você realmente acabou de dizer dã para mim? — Ele ri.
— Sim. Foi um dia horrível. Tenho permissão para dizer o que
diabos eu quiser. — Mas acabo sorrindo, e isso é muito bom depois
do dia que tive.
Eu me agacho de volta o mais graciosamente que posso em
minha saia, a fim de continuar pegando a pilha de pacotes marrons
que parecem idênticos no chão. Os pacotes que deveriam ser minha
passagem para fazer a diferença neste lugar. Meu primeiro passo
para chegar ao nível de escalada corporativa que aparentemente
termina no primeiro degrau para mim.
— Você sabe que eu poderia te ajudar, certo? Não te torna
menos capaz se eu o fizer.
— Mmm. — É tudo que eu digo, sabendo que estou brava com
ele por não me ajudar e, ao mesmo tempo, reconhecendo que não
quero sua ajuda.
Ou melhor, talvez seja porque eu não quero a ajuda dele já que
quanto mais ele fala, mais ele me faz rir e mais eu me esqueço que
ele é um daqueles que trabalham aqui, os quais eu não devo gostar.
Quanto mais posso fingir que ele não é tão atraente quanto
realmente é.
— Mmm? — Ele repete o som que eu fiz. — Issoé um sim, você
aceitará minha ajuda agora, ou não, você acha que sou um cretino
simplesmente porque tenho um pau, de que tipo foi esse som?
Meus olhos brilham ao encontrar os dele, e a diversão ilumina
seu olhar, mas seu rosto permanece completamente impassível,
exceto por sua mandíbula.
E, claro, agora minha mente está fixada em seu pau.
— Fofo. — Eu forço a palavra, assim como me forço a parar de
pensar em seu pacote particular.
Ele encolhe os ombros.
— Você é quem iria me morder por tentar ajudar. Eu prefiro
manter minhas mãos firmemente presas a correr o risco de alguém
arrancá-las. — Ele estende as mãos e mexe seus dedos. — Elas
são úteis.
— Eu entendi — bufo, com raiva de mim mesma por ter recusado
a ajuda antes mesmo de dizer algo. — Obrigada por oferecer,
porém... — acrescento, mais do que disposta a admitir que meu
mau humor não é culpa dele.
— De nada.
O silêncio retorna seguido por um barulho em algum lugar acima
de nós que me faz olhar para o teto.
— Você pode parar de olhar para mim agora — murmuro
enquanto pego outro pacote e coloco na pilha.
— Eu nunca te vi antes. Você é nova na empresa?
— Não. Trabalhei aqui por dez meses.
— Não me diga.
— Não é realmente surpreendente.
— Por que eu sinto que você está constantemente falando em
enigmas?
— Para qual andar você estava indo? — eu pergunto, precisando
trazer minha mente de volta à realidade e interromper essa paixão
colegial florescendo.
— Décimo quinto.
Eu bufo.
— Exatamente.
As garotas das entregas não se misturam com executivos aqui,
na Garters & Lace. Essa é a primeira regra que você aprende
quando começa a trabalhar aqui.
Ele se agacha para ficar na altura dos meus olhos. Esse olhar faz
meu pulso disparar, e o espaço ao nosso redor parece encolher.
— Aqueles enigmas de novo, Jules.
Archer
— Você tem olhos muito peculiares — murmuro e recebo um
aceno de cabeça assustado.
E eles ficam mais peculiares à medida que se estreitam e olham
para mim. Azul-escuro no entorno, enquanto um cinza-claro
preenche o centro. Eles estão carregados de desconfiança tanto
quanto de curiosidade.
Ela solta o ar pelo nariz.
É adorável pra caralho.
Quase tão adorável quanto ela em seus coturnos Dr. Martens
pretos e meia-calça brilhante por baixo do sobretudo. Não é alguém
para quem eu olharia duas vezes em um dia normal — me chame
de idiota pela confissão —, mas há algo nela, algo na expressão em
seu rosto e o sarcasmo em sua voz que me fez olhar uma segunda
vez.
Além de seus chifres de rena, agora jogados no chão ao lado de
seus pacotes.
Como o cabelo cor de chocolate puxado para cima com um nó.
Os lábios carnudos pintados de rosa-pálido, e seus olhos... são
quase grandes demais para o rosto, mas são muito impressionantes
emoldurados com cílios grossos e escuros que te atraem.
— Eu não estou falando em enigmas, você apenas não é alguém
que nota uma garota como eu.
Abro a boca para refutá-la, mas sei muito bem que está certa... e
pela primeira vez eu odeio isso. Mais do que isso, odeio ouvir a
opinião dela sobre Garters & Lace. Sobre trabalhar aqui.
— Eu discordo — afirmo. — Eu sei bastante sobre você. Idiota.
Bundão. Merda de gelo. Chefe do caralho. Twizzlers. Vê? Sei muito
mais sobre você do que você pensa.
Não sorria, Jules.
Eu te desafio a não fazer.
Ah, aí está. Aqueles lábios se erguem nos cantos e suavizam a
tristeza em seu rosto.
Suas bochechas ficam rosadas quando ela começa a tirar a
jaqueta como se a claustrofobia tivesse acabado de bater.
E, diabos, sim, eu deveria estar preocupado com seu súbito
momento de pânico, mas estou muito ocupado observando o mapa
de curvas que ela acabou de desenterrar sob o sobretudo.
Uau.
Uma palavra. Issoé tudo que tenho tempo para pensar enquanto
observo o volume de seus seios e a curva de seus quadris sob o
suéter de Natal maluco que me faz querer dizer ho-ho-ho.
Uau.
— Só porque você está sendo forçado a isso. — A hostilidade
em sua voz me faz parar de olhar incessantemente, e antes que eu
possa perguntar o que ela quer dizer, o elevador dá um solavanco.
Nós dois sacudimos em reação quando ela cai para a frente
sobre um pacote, antes de agarrar o corrimão para evitar a queda.
— Jesus — ela deixa escapar enquanto o pânico cintila em seus
olhos, os nós dos dedos brancos quando eles apertam com força.
— Ele é a estrela do feriado — digo, tentando acalmá-la um
pouco, mas recebo um olhar feroz em vez disso.
E eu o sustento, muito curioso sobre Jules Jilliland e seus
coturnos.
— Ei, se você foi demitida, por que ainda está carregando
pacotes?
Ela range os dentes, e o mau humor dispara em seus olhos. Se
você tivesse me perguntado há cinco minutos se ela era sexy, eu
teria dito que ela é mais do tipo adorável — nariz de botão, lábios
carnudos, olhos inocentes —, mas aquele brilho em seus olhos e a
posição de seu queixo mudam minha opinião. Ela é definitivamente
sexy.
Quem diria que você tinha isso em você, Jules?
— Porque meu chefe me disse, embora eu tenha sido demitida
por estar atrasada, que se eu entregar esses pacotes, ele vai me
pagar pelo resto da semana.
— Ah. — Eu aceno e franzo os lábios, já fazendo uma nota
mental para verificar com Barney, na sala de correspondência, por
que ele a despediu. Jules puxa a bainha de seu suéter para baixo e,
é claro, isso torna o V de seu decote muito mais profundo.
Você apenas não é alguém que nota uma garota como eu. Suas
palavras ressoam em minha mente e voltam ao que ela disse antes
de o elevador nos interromper.
— Você disse que eu estou sendo forçado a notar você. O que
isso deveria significar?
Ela sustenta meu olhar por um segundo antes de balançar a
cabeça e desviar os olhos para baixo, apenas para perceber que,
quando caiu para frente, seu joelho esmagou uma caixa, e o
conteúdo se espalhou no chão.
Coisas rendadas. Fio-dental em uma variedade de cores.
Calcinhas em renda. Caleçon de cetim sexy. Cada peça com o
logotipo Garters & Lace costurado. Cada uma delas, eu
imediatamente a imagino vestindo por baixo do suéter.
Você pode me culpar?
A risada dela enche o elevador pela primeira vez, mas não é
exatamente quente.
— Exatamente — ela diz com um aceno de cabeça. — Décimo
quinto andar.
— Vamos, Jules. O que diabos isso significa?
— Isso significa que você é do décimo quinto andar. Um dos
caras com sorrisos condescendentes e as mãos-bobas que
acontecem quando ninguém está olhando. Você é o executivo que
não dá mais atenção à garota das entregas do que às merdas que
vende. Merda que serve apenas para o colírio que levam no braço,
em vez de servir para a mulher comum que mataria alguém para se
sentir sexy assim por um único momento. Issoé o que quero dizer
com décimo quinto andar. — Ela acena com a cabeça
resolutamente, como se eu tivesse a mínima ideia do que ela está
falando, mesmo que não tenha, antes de olhar para trás e pegar as
calcinhas espalhadas.
Eu luto para acertar a postura ao ouvir suas palavras. Em suas
observações. Em tudo que não percebi nos últimos oito meses,
desde que meu avô morreu inesperadamente, porque estive muito
ocupado fazendo o curso intensivo para aprender como administrar
este lugar.
Os bônus de Natal não estão sendo pagos a todos os nossos
funcionários. Assédio sexual por parte dos executivos. Cristo. Mais
coisas que preciso examinar. Mais coisas para se atualizar na
Garters & Lace e tirar os métodos antiquados do meu avô.
E ao mesmo tempo... Lembro-me do frio na sala de
correspondência. As horas miseráveis e o trabalho não apreciado. A
atitude de desprezo dos andares superiores em relação aos que
trabalham nos andares inferiores. A comida ruim que havia sido
vendida mesmo tendo expirado meses antes na venda das
máquinas.
Posso estar comandando as coisas agora, mas vovô me fez
aprender tudo sobre este lugar do zero.
— Então, em que andar você está, hein? — Jules pergunta e me
tira dos meus pensamentos.
— Eu não trabalho aqui na Garters & Lace. — A mentira desliza
em minha língua, e eu não me arrependo... um pouco.
— Rá. Sim, você trabalha. Eu já vi você se pavoneando aqui
antes.
— Pavoneando? — Eu ri. — Eu não me pavoneio.
Ela apenas torce os lábios enquanto me encara, seus olhos me
dizendo o contrário, o fantasma de um sorriso em seus lábios
reforçando.
— Sim, você o faz. Aposto que você se pavoneia até o último
andar. — Ela levanta as sobrancelhas e suspira antes de olhar de
volta para o pacote em sua mão.
— Não, sério. — Eu penso em uma desculpa, qualquer coisa
para que ela olhe para mim novamente. — Trabalho somente em
um plano de marketing.
— Para quê?
— A nova linha de outono. — Ela olha para mim, com esses
olhos eletrizantes, e eu posso ver o momento em que compra a
mentira. — O que você quis dizer sobre a merda que eles vendem?
Outra bufada.
— Tá vendo? Eu te disse, você é o problema.
Essa mulher. Ela está me confundindo pra caralho, e eu preciso
de uma droga de roteiro para segui-la, mas até parece que eu não
quero tentar enquanto estamos presos aqui no elevador.
— Pode repetir? —eu pergunto.
— Sim. Você. — Ela balança a cabeça. — Você pode não
trabalhar aqui, mas você empurra a merda que eles, Garters & Lace,
vendem. Que tal vender algo para as mulheres que as faça se sentir
bem? Essas... — ela empurra o punhado de calcinhas na minha
direção... — só cabem em tamanhos 34. Elas são sensuais, bonitas
e delicadas. Você realmente acha que elas cabem em um corpo
como o meu?
Eu pego uma da mão dela e seguro a tira de renda vermelha na
ponta do meu dedo indicador. Nossos olhos se encontram por cima
dele, e não posso evitar o sorriso que brinca com o canto dos meus
lábios.
— Nós temos tempo. Você sempre pode experimentar. — Eu
levanto uma sobrancelha e recebo uma carranca em resposta.
Brilhante, Archer. Você se preocupa com o assédio sexual de
funcionários e então vem e manda essa.
Ah, mas ela não é mais uma funcionária.
Pelo menos tem isso.
Isso e a imagem dela nessa calcinha sexy.
— É exatamente disso que estou falando. Estes se encaixam em
modelos e adolescentes. As que você vende para as mulheres
comuns, a norma dos Estados Unidos que é um tamanho de
quarenta e oito a cinquenta, são ridículas. Gatinhas estampadas nas
frentes das calcinhas. E donuts. Cores monótonas. Mal cabem. —
Ela respira fundo. — E nós sabemos que dia da semana é hoje. Não
precisamos usá-los em nossas calcinhas como um lembrete. Aposto
que os modelos do tamanho 34 não têm os dias da semana.
Minha risada reverbera pelo espaço apertado. Dias da semana?
Donuts estampados.
— Então porque eu estou indo para o décimo quinto andar, eu
sou a razão pela qual sua calcinha tem gatinhos?
— Claro, você se concentrou nessa parte. — Ela bufa, coloca as
mãos nos quadris e se ajoelha no chão.
— Bem. — Eu movo a cabeça de um lado para o outro enquanto
meus olhos traçam suas mãos sobre a onda de seus quadris. —
Essa palavra chama a atenção de um homem.
— Assim como as palavras lingerie de oportunidades iguais —
ela afirma. — Sexy vem em todos os tamanhos. — Ela fica de pé, e
eu estendo minha mão para orna-la, e fico surpreso quando ela a
pega. — O idiota que comanda este lugar parece esquecer isso. As
curvas também são sensuais.
— Elas com certeza são — murmuro, sua mão ainda na minha
enquanto meus olhos correm sobre as curvas dela antes
encontrando seus olhos. Seus lábios se abrem, seus olhos se
agitam... e foda-se se eu não devo beijá-la agora.
Dê um passo para trás. Dê um passo para trás.
— Vou me certificar de transmitir suas ideias em minhas reuniões
de marketing daqui em diante.
Eu meio que espero que ela bufe com o comentário, mas ela não
o faz. Em vez disso, nossos olhares se sustentam à medida que a
tensão aumenta ao nosso redor. À medida que minha mente já nos
despiu e nos deitamos sobre estes pacotes.
— Jules? — pergunto por muitos motivos, e eu não tenho certeza
qual escolher.
Almoçar comigo.
Venha trabalhar para mim.
Passe a noite comigo.
Você é simplesmente incrível.
Jules
O elevador sacode, e nossas mãos se afastam. Antes que eu
possa pensar, antes mesmo de perceber que desejo que ele, o
executivo dos andares superiores, me beije — as portas se abrem.
Eu engulo o ar frio do saguão enquanto viro as costas para ele
momentaneamente e seguro na grade para recuperar o fôlego. Para
encontrar algum senso de sanidade que pareço ter perdido da falta
de oxigênio do elevador.
Há um barulho nas minhas costas enquanto ouço vozes perto de
nós.
— Desculpe por isso, senhor.
— Jules — diz o Sr. Camisa de Flanela, interrompendo o
trabalhador de manutenção que sinto de pé atrás de mim. Eu ajeito
meu sobretudo e me viro para encará-lo. — Aqui estão seus
pacotes. — Ele os coloca em meus braços.
— Obrigada.
— O mínimo que posso fazer é orna-la a ornaa-los.
— Não. Está tudo bem. — Balanço a cabeça, de repente me
sentindo instável e com os pés vacilando. Eu pego os pacotes,
segurando o mais apertado que posso, como se eles fossem me
aterrar. — Eu cuido disso.
— Tem certeza? Eu sei que sou do décimo quinto andar, mas
não tenho nenhum problema em ajudar. — Ele sorri suavemente de
sua piada, mas é quase como se, com as portas abertas e o mundo
real de volta ao nosso redor, a lacuna entre nós se torne muito
maior.
— Tenho certeza. — Quanto mais cedo eu estiver longe disso
tudo, dele, deste edifício, deste maldito dia, melhor. — Obrigada.
Obrigada. — Eu começo a andar, e ele dá um passo na minha
frente.
— Espera. — Ele estende a mão e coloca os chifres de rena na
minha cabeça, seus dedos demorando enquanto ele enfia uma
mecha de cabelo errante atrás da minha orelha. — Pronto. Agora
você está pronta para ir.
O sorriso torto que ele me dá mexe coisas em mim que não
deveriam se mexer. Há peças doendo que não deveriam estar
doendo.
Eu luto entre a necessidade de ir e o desejo de ficar.
— Uhn, pacotes. Você pegou o seu?
— Bem aqui — diz e enfia o pacote debaixo do braço antes de
estender a mão, a pousando em meu bíceps. — Jules...
— Obrigada por tentar me fazer rir — eu digo, assustada com
seu toque e o desejo repentino por mais. — Por tentar me fazer
sentir melhor. Eu...
— Depois de tudo isso, você ainda odeia Red Vines. É uma
pena.
Sua piada funciona. Eu sorrio suavemente.
— E você não vai experimentar Twizzlers. — Eu dou um passo
para trás a fim de ganhar alguma distância. — Feliz Natal. — Dou
um aceno de cabeça antes de sair do elevador e me afastar ele.
— Feliz Natal, Jules.
Sua voz se faz presente atrás de mim, e preciso de cada grama
de força de vontade que possuo para não me virar e olhar para ele.
Jules
— Jesus Cristo, Julia. Eu te pedi uma porcaria de uma coisa —
Barney zomba e, por um momento, eu penso estar presa no
elevador ontem. Oh, Ele é a estrela da estação, e, por alguma
razão, isso me faz lutar contra um sorriso, apesar da minha situação
atual: de pé, diante do meu ex-chefe pedindo meu pagamento final.
— Pedi que entregasse esses pacotes para mim, e você conseguiu
fazer besteira. Você foi minha melhor garota e...
— Você me despediu, Barney. Se eu fosse sua melhor garota,
você teria me dado uma segunda chance. — Eu suspiro, olhando ao
redor das pilhas de correspondência classificadas, mas paradas. A
sala dos pacotes está vazia. Barney deve ter deixado todos
trabalhando meio período para o feriado, para que todos estivessem
livres para estar em casa na véspera de Natal antes que a neve
comece.
— Jules. — Meu nome soa com arrependimento e me dá
esperança de que ainda possa ter um emprego aqui.
— Não estou aqui para causar problemas. Eu só quero meu
cheque. — Eu encolho os ombros.
— E eu só quero o erro corrigido. Você percebe que entregou o
pacote errado para o dono da empresa, certo?
— Não, não entreguei. Eu não tinha nenhum pacote para um
McMasters. — Eu sei que não. Eu nunca estive no escritório dele.
— Você diz isso, mas recebi uma ligação do próprio Archer
McMasters perguntando por que ele recebeu um pacote para outra
pessoa, e não o pacote muito importante que ele esperava. Você
pensa que isso faz parecer que estou no comando? Você pensa...?
— Qual é o seu ponto, Barney? — eu pergunto. — Você quer
que eu troque os pacotes? Bem. Me dê meu trabalho de volta, e eu
vou resolver o problema. Embora eu saiba com certeza que não
baguncei nada ontem.
Minhas palavras param seu discurso e, pela primeira vez desde
que botei os pés aqui, eu noto que as olheiras estão mais escuras,
seu cabelo, um pouco mais bagunçado, mas há um fantasma de um
sorriso em seus lábios que me faz sentir como se tivesse sido
enganada.
— O quê? — Ele solta uma risada.
— É véspera de Natal. Tenho certeza de que você tem uma
família para a qual voltar para casa, enquanto eu não tenho planos
para hoje... Então vá em frente e pode me dar. Eu vou consertar.
— Eu estava pronto para ornaa-la a ir consertar o problema, e
você simplesmente se oferece para isso?
— Merda. Posso voltar e recusar para ver qual seria a oferta do
suborno? — Eu rio, de repente tendo a sensação de que as coisas
podem simplesmente dar certo. De repente, torço que elas deem
certo.
— Não. Você não pode... Mas você terá meu agradecimento
eterno... e um pouco mais de compreensão da próxima vez.
— Próxima vez? — A esperança borbulha.
— Sim. Próxima vez. — Seu sorriso é suave e sincero. — Você
ligou e me avisou sobre o acidente e sobre seu atraso... Eu despejei
meu estresse em você.
— Você despejou mesmo.
Nossos olhos se fixam enquanto o arrependimento passa pelos
dele.
— Sinto muito, Jules. Eu exagerei.
— Obrigada. Você está com o pacote para que eu possa orn-lo lá
para cima? — eu pergunto.
Ele estende a mão e entrega um pacote para mim.
— Não é lá para cima. O Sr. McMasters foi descansar. Vamos ver
para onde isso precisa ir... — Ele olha para sua prancheta rabiscada
com um monte de notas. — Isso precisa ir para o Tavern on the
Green.
— Claro que precisa. — Eu rio, porque é tudo que posso fazer. O
único lugar que eu queria que Alex fosse comigo na véspera de
Natal, e vou acabar indo para lá apenas como uma garota
entregando um pacote. Perfeito.
— Seu cheque, Jules. — Barney coloca meu pagamento em
cima do pacote. — E te vejo aqui na próxima semana, no mesmo
horário, na mesma escala.
— Verdade?
— Verdade. Feliz Natal, Jules.
— Feliz Natal, Barney.
O metrô na parte alta da cidade é um pesadelo. Os compradores
de última hora entram no vagão e os zumbidos de excitação são tão
predominantes quanto o frio nítido que está no ar.
Puxando meu casaco firmemente em torno de mim, eu levo meu
tempo caminhando pelo Central Park. Escuto os ruídos da cidade às
minhas costas e observo os primeiros flocos de neve caindo à
medida que a porta do restaurante se abre para mim.
É como eu imaginei que seria por dentro — como uma explosão
de decoração de Natal. Árvores com muitos enfeites e decorações
espalhadas por toda parte, misturadas com o rico aroma de comida
e o zumbido baixo de conversas.
O anfitrião sorri para mim, apesar de eu não estar nem perto de
bem-vestida o suficiente para comer aqui essa noite ou em qualquer
outra noite.
— Bem-vindo ao Tavern on the Green. Como posso orna-la?
— Oi. — Eu puxo o pacote de debaixo do meu casaco, onde eu o
estava protegendo do clima. — Eu tenho que entregar um pacote
para um convidado, Archer McMasters.
— Ah, sim. Senhorita Jilliland? Ele me disse que você viria. Por
aqui.
Eu aceno e o sigo, meus olhos observando tudo ao meu redor.
Tenho esperança de pegar um vislumbre de um rosto famoso,
porque me convenci de que as celebridades costumam vir aqui, mas
não vejo nenhuma.
O anfitrião vira uma esquina ruma a uma pequena sala com uma
mesa sozinha perto de uma lareira. Uma pequena árvore de Natal
está no canto, as bolas de Natal prateadas refletem as chamas.
Dois lugares postos à mesa. Um vazio. Um ocupado, e vejo as
costas de um homem para mim.
— Senhor McMasters?
— Hm?
— A senhorita Jilliland está aqui.
— Ótimo. Que bom.
E aquela voz.
Eu conheço essa voz.
Meus pés congelam no lugar quando eu percebo quem é.
E quando Archer McMasters se vira para me encarar, encontro
seus vibrantes olhos azuis por trás de lentes com moldura preta.
— Senhorita Jilliland.
Archer McMasters era o homem no elevador. O CEO da Garters
& Lace. O homem que eu disse que basicamente não sabia como
gerenciar sua própria empresa.
Jesus.
Eu odeio o choque de eletricidade que passa por mim quando
nossos olhos se encontram.
Sério?
Pensei ter imaginado a química que senti no elevador ontem. Eu
falei da boca para fora que não era nada. Eu estava errada. Oh, tão
errada. Porque ela está de volta com apenas um simples olhar e o
som de sua voz dizendo meu nome.
Eu quero me encolher e me transformar em um nada.
Não só eu o insultei, mas provei minha incompetência ao
entregar o pacote errado para ele.
Me matem.
Tantos pensamentos passam pela minha cabeça, mas tudo que
consigo pensar é que, se acabei de conseguir meu emprego de
volta, certamente estou despedida agora.
Seja profissional, Jules. Dê a ele o pacote e vá embora. Salve
sua bunda.
— Sente-se, Jules. — Sua voz é baixa, mas eu ouço cada sílaba
acima do zumbido do restaurante.
— Não. Eu... uhn... seu pacote. — Dou um passo à frente e o
empurro para ele. — Foi trocado ontem. Peço desculpas. Tenho
certeza de que era importante, eu me confundi, me desculpe. —
Cada palavra sai mais rápida do que a anterior enquanto ele apenas
fica parado, com os olhos fixos nos meus, seu rosto impassível.
Archer estende a mão, pega a entrega e a coloca na mesa na
frente dele.
Ele aponta para a cadeira ao lado dele, mas não fala nada.
— Não. Eu... de novo, me desculpe.
— Sente-se — ele exige, e eu exalo audivelmente.
Porcaria. Porcaria. Porcaria.
Mas eu me obrigo. E, claro, a única cadeira para sentar fica no
canto, onde a dele está.
Tento não notar os detalhes dele, mas falho. Miseravelmente. A
camisa social branca desabotoada na gola. As abotoaduras. A
maneira como seu polegar sobe e desce pela borda de seu copo
alto.
— O quê? Sem chifres de rena? — ele pergunta.
— Sem. — Minha voz está suave, e de repente me sinto
constrangida por minha roupa de segunda mão neste restaurante
sofisticado. Eu aliso o tecido sobre meus joelhos e me movo na
cadeira.
— Eu gosto deles em você.
Eu ofereço um sorriso parcial, mas desvio meus olhos para a
taça de champanhe que um garçom acaba de deslizar na minha
frente.
— Sinto muito, você tem companhia vindo. Eu já vou.
Quando me levanto, Archer coloca a mão no meu braço e me
segura.
— O pacote não foi trocado, Jules.
Minha mente fica confusa.
— Sim, foi. — Aponto para a etiqueta na frente. — Seu nome
está bem aqui. Eu errei — confesso, embora saiba que não havia
um único pacote para Archer McMasters ontem.
Eu congelo quando ele se inclina para mais perto, e o perfume
sutil de sua colônia enche meu nariz.
— Jules. — Sua voz é baixa, o calor de sua respiração atinge
minha bochecha. — Eu fiz de propósito.
Eu viro o rosto em direção ao dele, que está a apenas alguns
centímetros do meu. Minha respiração trava, e meu coração
dispara, porque, sim, eu estraguei tudo, mas, inferno, se cada parte
de mim apenas não reagisse a todas as partes dele, seria tudo mais
fácil.
— Você o quê? — pergunto, embora eu saiba que o ouvi
corretamente.
— Eu queria ver você de novo.
Eu pensava que meu pulso estava acelerado momentos antes,
mas meu coração simplesmente dá um pulo no meu peito.
— Por quê? — Minha voz sai em um sussurro.
— Vários motivos. — Ele estende a mão e coloca uma mecha
rebelde de cabelo atrás da minha orelha, um gesto que parece
natural e íntimo. Quando ele termina, passa as costas da mão ao
longo da linha da minha mandíbula e eu luto contra o desejo de
esfregar mais a bochecha em sua mão.
O desejo me atravessa como eu nunca experimentei antes, mas
com um fio de ansiedade. Uma consciência nítida de quem ele é e
quem eu sou e por que diabos estou sentada aqui com ele.
Meus olhos piscam ao mirar seus lábios e depois voltam para
seus impressionantes olhos azuis.
— Por quais motivos? — eu pergunto quando finalmente
encontro minha voz.
— Mmm. Motivos. — Sua língua se lança para lamber os lábios
enquanto seu braço repousa nas costas da minha cadeira, seu
polegar agora correndo para cima e para baixo na linha da minha
coluna, como se eu fosse seu copo.
— Sim? — Minha voz falha com a palavra simples quando ele se
vira para mim e seus joelhos colidem com os meus.
— Em primeiro lugar, eu menti para você. Estou no vigésimo
andar, não no décimo quinto.
— É o que diz o rótulo do seu pacote.
— E ainda acho que Red Vines são melhores do que Twizzlers.
— Então você não vai gostar do seu pacote. Está cheio de
Twizzlers — eu minto, mas me derreto quando aquele macio sorriso
desliza por um canto de sua boca.
— Dois podem jogar esse jogo. — Ele pisca.
— Anotado.
— Você estava certa.
— Naturalmente — murmuro e consigo dele uma risada que me
rouba um sorriso.
— Quero que você trabalhe para mim no meu departamento de
design.
— O quê? — Minha voz se eleva em um tom chocado, porque
essa é a última coisa que eu esperava ouvir de sua boca.
— Você ouviu. Você estava certa. Examinei todos os nossos
produtos. As curvas são sensuais. Elas merecem ser comemoradas,
admiradas e adornadas adequadamente, e eu sei que você não tem
problema em falar com os do décimo quinto andar.
— Ãr-dã.
Ele ri, balançando a cabeça enquanto olha pela janela, vendo
que a neve está caindo com um pouco mais de intensidade.
— Lingerie com oportunidades iguais é uma coisa boa. Uma
mulher muito inteligente me disse isso.
Calor flui através de mim por seu comentário, com o orgulho que
sinto e a descrença ainda vasculhando algo de errado nisso tudo.
— Estou falando sério. É uma ideia brilhante, e odeio nunca ter
pensado nisso. Há muitas mudanças que preciso fazer na
empresa... e eu espero que você esteja lá comigo para me ajudar
orna-las reais.
— Por quê?
— Porque você é a única que parece me dizer a verdade.
Sutileza não é o seu forte, e eu preciso disso.
— Eu nem sei o que dizer — murmuro porque, além de ele ter
me deixado sem palavras, seus dedos na parte de trás do meu
pescoço me distraem.
— Diga sim e aceite isso também — diz ele enquanto desliza um
envelope pela mesa em direção mim.
Eu olho para ele com um sorriso curioso antes de pegar o
envelope e abrir. O que está dentro me faz suspirar em voz alta. É
um cheque no valor de $20.000. Antes que eu possa dizer uma
palavra, ou mesmo processar o que estou olhando, Archer me
interrompe:
— Você não pode descontar isso até que diga sim.
Quando ele percebe que ainda estou em choque, acrescenta:
— Jules, isso é um bônus de incentivo para o novo cargo. Um
que é bem merecido. E resolve o problema do aluguel que o idiota
te deixou segurando. Há outra vantagem em trabalhar no vigésimo
andar, serviço de carro corporativo. Use-o enquanto o seu está no
conserto por causa do bundão.
Eu só posso olhar para o homem que nunca esperei encontrar
aqui, sentado à minha frente, ainda tentando digerir tudo.
— Ei, Jules? Mais uma coisa.
— Hmm?
E antes que eu possa falar, seus lábios encontram os meus em
um beijo devastador para meus sentidos.
Cada parte de mim ganha vida e depois queima sob o fogo que
ele acendeu.
Quando ele se inclina para trás, o gosto de seu beijo ainda na
minha língua, sussurra em meu ouvido:
— Estive pensando em fazer isso o dia todo.
Demoro um segundo para encontrar as palavras que seu beijo
inesperado acabou de tirar de mim.
— Isso é tudo?
Ele joga a cabeça para trás e ri alto o suficiente me dar a certeza
de que o resto dos clientes estão olhando em nossa direção.
— Não se preocupe. Tenho muito mais do que isso.
— Estou ansiosa para você provar.
Ele se inclina para frente e pressiona um beijo oposto ao último
nos meus lábios. Antes, estava com fome, já este é terno, macio e
repleto de emoções não ditas que eu nem mesmo me atrevo a
pensar.
— Depois do idiota, do bundão, do gelo de merda e do chefe
otário — ele murmura meu ouvido, o calor de sua respiração
batendo em minha bochecha. — Eu acho que você ganhou seu
jantar na Tavern on the Green. Jante comigo.
— Archer...
Sim.
Por favor.
— Eu não posso. Eu...
— Abra o pacote, Julia.
— O quê? — Seu pedido reverbera em meus pensamentos
tortos.
— Abra.
Eu deslizo o dedo por baixo da fita e abro o pacote. É minha
risada que ressoa quando vários sacos de Twizzlers caem sobre a
mesa.
Mas quando eu olho para cima e encontro seus olhos, com fogo
dançando neles, minha risada se encerra.
Como isso aconteceu?
Como estou jantando com Archer McMasters do vigésimo andar?
E por que eu não quero que isso acabe nunca?
— Feliz Natal, Jules.
— Feliz Natal, Archer.
— Isso é um sim, então? — Seus olhos me imploram mais do
que suas palavras.
— Vinte mil dólares comprariam muitos Twizzlers.
Ele joga a cabeça para trás e ri.
— Então a oferta está fora da mesa.
Ele se inclina e me beija, apesar de suas palavras. O tipo de
beijo que me diz que sou querida e desejada. E que este pode ser o
início de algo muito inesperado, mas perfeitamente perfeito.
Quando eu me inclino para trás e olho nos olhos de Archer, eu
sei que este pode não ser um Natal tão horrível, afinal.
— Sim.

FIM.
Tudo começou com o convite. Para o novo casamento do meu
ex-noivo.
Deveria tê-lo ignorado. Jogado fora ou ateado fogo. Mas não fiz
nada disso. Eu respondi dizendo que iria e levaria um
acompanhante. E então, acidentalmente, minha assistente o enviou
pelo correio.
É aí que Hayes Whitley entra em cena. Estrela de cinema. O
homem que conquistou o coração de milhões de pessoas. Entreguei
o meu a ele há anos. Ele foi meu primeiro amor. Era meu tudo. Bem,
até ir embora para correr atrás dos seus sonhos sem nem me dizer
adeus.
Quando ele apareceu, do nada, dez anos depois, eu deveria ter
me afastado dele. Deveria ter rejeitado sua oferta para me levar ao
casamento do meu ex. Nunca deveria ter permitido que ele me
beijasse.
Mas não fiz isso.
E agora, ficamos nos perguntando se os fragmentos de vida que
compartilhamos ainda se encaixam de alguma forma. O primeiro
amor é difícil de esquecer. A questão é: será que queremos
esquecer? Ou devemos arriscar e ver o que acontece depois?
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