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Tradução: Maggies, Gíh, Sandra Antonia,

Éd Dapper, Lorranne Cunha, Cápua,


Ainelis, Safira

Revisão Inicial: Nina

Segunda Revisão: Ro Martins

Revisão Rinal: Rosi Teo

Leitura Final: Nish

Formatação: Lola

Verificação: Ray
É a mesma velha história... “garota se disfarça de garoto”,
mas com um toque de rock’n roll.

Remy Curran sonha participar de uma banda, mas o grupo


que escolheu se nega a contratar alguém do sexo feminino como
baterista. Então, ela vai disfarçada de homem... e passa no teste.
Tornar-se “Sticks”, um membro da NonCastrato, entretanto, não é
exatamente o que esperava.

Passar a maior parte do tempo aprendendo a caminhar, falar,


agir e beber como um cara é difícil, mas o pior é ter que mostrar-se
indiferente, quando o cantor arrebenta corações da banda, Asher
Hart, a trata como um dos rapazes e não como uma mulher. Ela
nunca imaginou que ele seria muito mais que um rosto bonito com
uma bela voz, mas o cara é perfeito. É perfeito para ela.

E com o amor e a mentira andando juntos, Remy precisa


decidir se mantém a farsa ou arrisca-se a perdê-lo para sempre.

Quem poderia pensar que uma mentira para realizar um sonho


poderia impedi-la de alcançar a felicidade?
ASHER
Abro os olhos lentamente, acordando daquele estado de
felicidade pós-transa no momento que a mulher nua em cima
de mim se mexe e move a suave maciez da sua pele na
minha. Quando ela sai da cama e me dá a espetacular visão
do traseiro mais perfeito de todos, meu sorriso aumenta... até
que ela pega a calcinha e o sutiã.

Espere. Não, isso não pode acontecer. Piscando para


recuperar a consciência tento me sentar e não consigo.

— O que você está fazendo? O que aconteceu?

Ela não responde, o que não me surpreende. Não fui


capaz de entender mais de uma dúzia de palavras desde que
nos conhecemos e nada do que ela disse até agora foi em
inglês. Mas, segundo as palavras de Jason Derulo1, aquele
traseiro não precisava de explicação. Não naquele momento,
mas agora parece que sim já que ela está cobrindo-o com
uma calcinha de seda preta que se encaixa perfeitamente. E,
droga, a garota está linda nessa calcinha, sobretudo na parte
de trás, onde posso ver as duas nádegas bronzeadas
aparecendo sob o tecido.

— Você não vai embora, não é?

Cantor, compositor, ator e dançarino norte-americano.


1
Tento me sentar de novo. Ainda não consigo. Franzo o
cenho ao ver as algemas cobertas de pele que me prendem à
cabeceira da cama e passo alguns segundos reclamando até
que consigo ficar em uma posição vertical. Do outro lado do
quarto, ela vestiu a calça de ioga preta que baixei na noite
passada com os dentes.

Acho que é o momento de tirar meu espanhol da escola


do bolso. Com certeza vai ser horrível, mas não importa.

— Sentarse. — Droga, não. Acho que isso não é fique. —


Quedarse. — Digo, finalmente lembrando a palavra certa. A
cintura da calça está em seus quadris quando ela vira para
me enviar um olhar letal.

Não que eu a culpe, acabo de dar ordens como se fosse


um cachorro. Faço uma careta. — Quedarse. — Repito e
acrescento um pouco patético. — Por favor.

Ela suspira e revira os olhos antes de vestir a blusa e


pegar a bolsa.

— Não! Não vá. Por favor, não vá. Sinto muito. Não sei o
que fiz de errado, mas sinto muito mesmo. Droga, como se
pede perdão em espanhol?

— Lo siento. — Diz ela, sua voz um gemido tranquilo e


sexy, que quase parece um maldito sussurro.

Não tenho ideia do que significa lo siento, mas soa muito


estimulante saindo dos seus lábios. Meu corpo responde e
preciso dobrar uma perna para encobrir a ereção. Não quero
que ela veja o quanto estou excitado quando está me dando
um fora.
— Elisa! — Grito, batendo os punhos nas barras de
metal da cabeceira para chamar atenção.

Quando ela para na porta de costas, prendo a


respiração. É um momento crucial. O que eu disser agora
pode ser um fator decisivo para que ela fique ou vá embora.
Mas tudo que eu posso pensar em dizer é....

— Sinto muito. — E nem sequer sei por que merda


estou pedindo perdão. Sei apenas que cometi algum erro que
está fazendo com que ela vá embora.

Não pode ter sido o sexo. Ontem à noite e hoje de manhã


ela havia sacudido meu mundo e eu sei que o mesmo
aconteceu com ela já que não foi nada silenciosa quando
gozou. Então o que...

Elisa se volta lentamente e meu coração acelera quando


vejo as lágrimas escorrendo por seu rosto.

— Elisa? — Sussurro preocupado. O que em nome de


Deus fiz de errado? — Sério, sinto muito mesmo.

Ela engasga, fica vermelha e coloca as mãos no rosto


quando começa a soluçar.

— Tengo que hacer esto.

Balanço a cabeça. Derulo estava louco. Isso precisava de


uma explicação. Mas quando abro a boca para soltar mais do
meu espanhol ruim, implorando que ela não vá embora, Elisa
vira-se e corre escada abaixo, até que ouço a porta se
fechando.
— Espere! — Grito, passando de preocupado a furioso.
— Que diabos?! Elisa! Não pode começar a chorar e sair
correndo assim! Volte e solte as algemas desta maldita cama!
Diga-me o que fiz de errado. Por favor! ELISA!

Ela não volta. E não posso ir atrás dela.

Nos primeiros trinta segundos sozinho estou enfurecido,


batendo no colchão e quase deslocando os punhos para me
libertar das algemas. As coisas já não são divertidas... nem
atrevidas. Nos próximos trinta segundos encho o ar com
palavrões que nunca usei, em alto e bom som.

Mas nada disso me libertou. E então o pânico se instala.


Com os punhos machucados e a garganta doendo, pergunto-
me quanto tempo vou ficar nu e preso na minha própria
cama. As pessoas vão se preocupar comigo cedo ou tarde...
Depois de uns dias talvez. Os meninos da banda. Eles vão
aparecer aqui para me ver...., mas e se eu me desidratar até a
morte antes disso, ou o edifício pega fogo e tudo ao meu redor
se transforma em cinzas?

Ou... Droga. Agora preciso mijar. Stephen King não


escreveu um livro de terror sobre alguém algemado e sozinho
em uma cama? Odeio filmes de terror. Não quero
protagonizar o meu. Puxo as algemas mais algumas vezes
para aliviar a fúria e o medo crescente, mas só consigo piorar
os ferimentos.

Como diabos Elisa pôde me deixar aqui desta maneira?


Não é como se eu não soubesse onde ela trabalha. Posso
encontrá-la. E, ah... eu vou. Ela não vai sair disto sem que
nada aconteça. E o porquê das lágrimas? Isso fodeu com a
minha cabeça.

Não quero me irritar mais, já estou em uma grande


enrascada. Concentro-me na raiva.

— Mau movimento, princesa. — Digo ao quarto vazio,


sorrindo amargamente enquanto planejo minha vingança.

Pergunto-me como ela se sentiria se estivesse algemada


à cama e fosse obrigada a me contar todo os pensamentos
misteriosos que passam por sua cabeça bonita sob tortura,
com ferramentas como plumas... e calda de chocolate. E,
merda, lá estava meu pau burro de novo, ficando duro ao
pensar nela com as mãos algemadas e coberta com algo que
eu possa lamber. O idiota não percebe que me encontro em
uma situação desesperada? Não é o momento de pensar em
sexo. Embora ontem à noite tenha sido o melhor dos
encontros.

O celular na minha mesada de cabeceira começa a


tocar. Olho espantado ao vê-lo tão perto e tão longe ao
mesmo tempo. Quando toca novamente consigo distinguir o
nome "Sticks" na tela.

Perfeito. Se posso confiar em alguém durante uma


situação como esta é nele. Sei que posso contar com a
discrição e lealdade do Sticks e espero também que com
alguma ajuda. Agora, apenas tenho que encontrar uma
maneira de atender o telefone. Levanto a perna e uso o dedão
do pé para mover o botão. Erro duas vezes, mas graças a
Deus consigo. Com outro toque confiante do dedo ligo o viva
voz.

— Hey, cara. — Ofego, impressionado por soar tão


casual enquanto estou nu e algemado à minha cama.

— Tudo bem?

Sua voz enche meu apartamento e é como música para


meus ouvidos.

— Não muito.

— Estou... com fome e pensei em comer pizza. Quer vir


comigo?

— Claro. — Respondo, até mesmo encolhendo os


ombros para manter a aparência relaxada e casual. Sim,
estou tranquilo aqui, sem nenhuma preocupação no mundo.

— Ótimo. Pego você em um instante.

— Tudo bem, mas, hã, primeiro uma pergunta rápida.

— Bem, desembucha. — Diz ele, quando não pergunto


nada em cinco segundos.

Mordo o lábio, debatendo comigo mesmo se devo contar


o que aconteceu. A vergonha vai me matar. E, embora ele
com certeza vá me ajudar com o assunto, duvido que, mesmo
Sticks, deixe-me esquecer isto.

Mas logo penso em toda a coisa do Stephen King, e


minha bexiga tenciona mais uma vez me lembrando que está
cheia. Então, aperto os dentes e engulo meu orgulho.

— Por acaso você não teria... Chaves para algemas?


REMY
UM MÊS ATRÁS

Usando meus Cruch Taylor2 com estampa de zebra,


meias arrastão, minissaia jeans, cinto largo adornado com
prata e uma camiseta justa da banda The Pretty Reckless,
ajeito novamente a peruca com as pontas de cabelo loiro.
Meus dedos batem ao ritmo da música abafada martelando
através da porta e deixo o ritmo percorrer meu corpo,
conectando-me com o ambiente... até que o baterista do outro
lado da parede perde o ritmo.

Sentindo-me mal por ele, estremeço e meu coração


acelera em antecipação.

— Até mais tarde, perdedor. — Diz o cara ao meu lado,


sorrindo quando as guitarras e o baixo dentro do estúdio
param, interrompendo a canção.

Olho de lado para meu companheiro de banco e ele sorri


em resposta, levantando a mão fechada para bater na minha.

— Como ele estava cheio piercings e tatuagens, achei


que era competente, mas... oh, bem... — Repito o gesto
batendo na mão dele, enquanto um pequeno sorriso se abre
em meus lábios. Um baterista a menos no nosso caminho.

2
Sapatos casuais da Converse no Brasil.
Imaginando o sermão que o cara dentro do auditório
deveria levar, começo uma contagem regressiva,
perguntando-me quanto tempo até que a banda o expulse de
lá.

— Dez, nove, oito. — Murmuro baixinho e não consigo


alcançar o sete porque as portas duplas se abrem de repente
e um garoto com dreadlocks irrompe pela sala muito
zangado.

— Filhos da puta. — Grunhe ele, antes de lançar um


penetrante cenho franzido à fila de bateristas sentados no
banco encostado na parede oposta, todos esperando obter
êxito onde ele obviamente falhou.

O cara bufa depreciativamente e vai embora, batendo a


porta com força depois de atirar suas baquetas no lixo.

— Um mau perdedor, não acha? — Pergunta


ligeiramente meu companheiro de banco, enquanto observa a
cena.

— Bom... — Respondo, encolhendo os ombros — Vi


minha prima de seis anos fazer mais drama que isso por uma
boneca quebrada.

Com um sorriso de aprovação, ele assente.

— Muito bem, garota roqueira.

Estou mais do que bem, mas não quero assustá-lo.


Posso dizer, pelo brilho arrogante em seus olhos, que ele está
certo que hoje vai se dar muito melhor do que eu. Não quero
esmagar seu ego frágil, então simplesmente dou um sorriso
frio.

Sim, está tudo bem.

— Proximo. — Diz uma voz irritada no interior do


auditório, fazendo meu coração pular na garganta.

Deus, já é a minha vez? Com a autoconfiança abalada,


levanto-me com as pernas trêmulas e aliso à frente da saia.

Já que o cara ao meu lado fora muito amável, minha


submissa interna desperta e olho para ele preocupada,
procurando por algum tipo de apoio. Mas ele era o
“supercompetente”, não iria querer que eu tivesse êxito,
assim como não quero que ele tivesse. Entretanto não consigo
evitar, olho em sua direção mordendo o lábio e apagando
totalmente a incrível imagem de garota forte que eu queria
projetar.

Ele sorri e levanta os dois polegares, dando-me o


impulso que eu precisava. Respondo com uma piscadinha
descarada e me viro para a porta, pegando as baquetas rosas
no meu bolso traseiro enquanto ando.

O teto muito baixo, as luzes tênues e um grande espaço


aberto em volta da banda no centro da sala me fazem parar
em uma pausa intimidada, assim que fecho a porta. Só três
pessoas estão ali e nenhuma delas me conhece, embora eu
saiba quem são sem sequer olhar o instrumento a sua frente.
Eu entrei na internet e fiz o meu trabalho.

Na realidade, tinha-os visto tocar ao vivo apenas uma


vez, em um evento diurno no parque onde as bandas locais
vieram mostrar seus talentos no Quiosque Memorial. E eles
eram bons.

A melhor parte foi que Fisher, meu ex-namorado —


embora não fosse ex naquele momento — odiou. Desprezou-
os. Provavelmente, porque ficou verde de inveja. NonCastrato
tinha um som melhor, músicos mais talentosos e um cantor
principal muito mais sexy que tudo na sua banda. Mais
seguidores também. Eu lealmente o apoiei, disse que a Fish
N' Dicks, era muito melhor que a NonCastrato... embora não
fossem.

Para falar a verdade, fiquei hipnotizada, fui incapaz de


afastar os olhos, durante todo o tempo que a NonCastrato
tocou. O ritmo, as palavras, os incríveis riffs de guitarra me
deixaram fascinada, quase como se eles fossem de outro
mundo.

Eu estava com Fisher e os rapazes nos bastidores,


porque eles eram os próximos a tocar, então não assisti ao
show do melhor ângulo. Entretanto... foi incrível.

Depois que Fisher me traiu, quebrou meu coração,


minha confiança e meu iPod (o imbecil), eu comprei cada
canção que a NonCastrato gravou, como uma espécie de
vingança contra o babaca que agora desprezo.

Enfim... A coisa mais estranha aconteceu depois que


ouvi a quarta canção.

Eu me apaixonei pelas músicas. Todas as músicas.


Cada canção. Quando soube que estavam em busca de um
novo baterista, pareceu um presente dos céus. Amava suas
músicas, amava seu estilo e amava como muitas de suas
letras tinham a ver comigo e tocavam o fundo da minha alma.
Sempre quis ser baterista de uma banda, mas mais do que
tudo,eu queria jogar na cara do meu ex-namorado um
enorme “Rá! Sou melhor que você e estou em uma banda muito
mais talentosa do que a que você está! Toma essa, idiota. ”

E esta é a oportunidade de ouro para conseguir tudo o


que eu quero.

— Ehhh... Podemos ajudá-la? — Pergunta o cara com


um moicano laranja de quinze centímetros na cabeça.

É o baixista, Billy Galloway. O idiota que havia perdido o


controle nos bastidores de um show. Ele dá ao NonCastrato
uma reputação selvagem, porque gosta de mostrar sua merda
às groupies aos berros... bem, pelo menos isso é o que li na
internet.

Limpo a garganta e confirmo.

— Sim. Estou aqui para o teste. — Enquanto os três


piscam espantados, dirigo-me lentamente em direção a eles e
limpo a garganta outra vez. — Para... para a posição de
baterista.

Olá?! Para que outra coisa acredita que estou aqui?


Decido balançar as baquetas para realmente deixar as coisas
claras, já que parece que eles não entenderam ainda.
Finalmente, Galloway sussurra.

— Sim... não acredito, doçura.


Como? Embora meu estômago esteja dando voltas,
franzo o cenho, confusa. Eles não me quererem era meu
maior medo, mas ouvir isso antes mesmo de tocar é pior que
todas as horas na sala de espera temendo que não gostassem
do meu som.

Quando ninguém sorri e me diz que estão apenas


brincando, sacudo a cabeça, perplexa.

— Como?

Galloway inclina-se ligeiramente para frente e aponta a


porta.

— Não queremos você. Então, fora!

Fora? Olho para os outros dois membros da banda. O


guitarrista rítmico, Heath Holden, é o mais sem graça. Ele
não usa uma roupa legal, não é grosseiro, e não fala...
absolutamente nada. As únicas coisas diferentes nele são as
tatuagens subindo pelos braços enormes e a terrível barba de
motociclista que está deixando crescer. Não parece ter muita
personalidade, se querem minha opinião, mas o homem pode
tocar um lick3 maravilhoso a qualquer momento. Quando fixo
o olhar percebo que está com as bochechas vermelhas. Heath
vira-se repentinamente recusando-se a fazer contato visual,
concentrando-se em limpar a sujeira debaixo das unhas.

Então, dirijo minha atenção ao cantor principal. Asher


Hart, além de cantar todas as músicas, toca guitarra e piano
e é de longe o mais sexy. Ele é o cara para quem todas as

3
Licks são pequenos solos com as características do guitarrista executados durante a
música.
garotas jogam suas calcinhas e gritam, onde quer que a
NonCastrato se apresente. Sua voz é a razão do sucesso da
banda.

E, uau! Já falei que ele é incrivelmente gostoso? Uma


louca atração ferve em meu ventre. Mas que merda! Ele é
muito bonito para ser real. Não que eu sinta atração por
cantores principais, passei completamente desta fase graças
ao meu terrível e idiota ex. Apodreça, Fisher! Mesmo assim,
Asher Hart é um gato. E obviamente está muito entediado
para se preocupar comigo, em última instância. Sem ligar
para o meu olhar penetrante, ele desenrosca a tampa de uma
garrafa de água e toma um longo gole, agindo como se eu
estivesse tomando muito do seu precioso tempo.

Já que o idiota do baixista é o único incomodando-se em


falar comigo, volto-me para ele.

— É alguma espécie de brincadeira? — Embora não


fosse engraçado, solto uma risada alta. — Ainda nem me
ouviram tocar.

— Não precisa tocar. Você é uma garota.

Levanto as mãos. Que merda?

— Oh! Parabéns. Não é muita gente que consegue


perceber de primeira. Mas, sim, sou uma mulher. E daí?

— E daí que não queremos uma garota na nossa banda.


O nome é NonCastrato por uma razão, querida. Porque todos
temos pau.
Como se me interessasse ficar perto de algum dos seus
asquerosos paus! Hoje em dia quero que todos paus
apodreçam. Por mim, podem todos se afogar... junto com
seus donos.

Além disso, castrato significa que não têm bolas, não


paus. Idiota. Lamentavelmente não disse isso a Galloway,
porque estava muito aturdida.

— Mas sou excelente. — Protesto. — Sou muito, muito


boa.

Hart olha na minha direção levantando uma


sobrancelha, como se estivesse surpreso por ouvir isso da
minha boca. Mas Galloway somente encolhe os ombros, não
dando a menor importância.

— Então vá participar de uma banda só de garotas.

Fico de boca aberta. Isto não pode estar acontecendo.


Apenas.... Não pode estar acontecendo. Estou diante de uma
oportunidade real para realizar o sonho da minha vida e um
idiota cretino de um baixista está me dizendo não por que
tenho ovários? De maneira nenhuma, porra!

— Não quero ir para uma banda só de garotas. —


Respondo, apertando os dentes e olhando com o cenho
franzido. Na realidade, se houvesse alguma banda boa só de
garotas em um raio de 300 quilômetros procurando por uma
baterista, com certeza eu estaria me candidatando. Mas não
havia.
Além disso, quero estar na NonCastrato. A música deles
é meu tipo de música. E a banda precisa de um baterista e
precisa ser o melhor.

Também quero mostrar ao Fisher que minha banda


pode derrubar a pouco convincente banda dele a qualquer
momento. Tocar com a NonCastrato seria a solução perfeita.
A única solução.

Se apenas esses idiotas conseguissem abrir suas tolas,


sexistas e sujas mentes...

— Tudo bem. — Diz Galloway com um sorriso hipócrita


e puritano. — Diga o nome de uma banda mista que obteve
êxito e talvez tenha uma oportunidade.

Sorrio. De volta ao jogo!

— The Black Eyed Peas.

— Merda. — Murmura ele, sem parecer impressionado e


ainda debochando. — Todos são cantores, não tocam,
princesa. Eles não são uma banda.

— Está bem, então. — Sopro para tirar a irritante franja


loira da peruca dos meus olhos e começo a recitar uma nova
lista. — Fleetwood MAC, Blondie, Jefferson Airplane, The...

Galloway bufa e me corta.

— Sim e a única coisa que as garotas fazem nessas


bandas é cantar. Temos o Hart, não precisamos de outro
cantor.

— Talking Heads. — Levanto a voz para falar acima dele.


— Nesta, acredito que a garota era baixista. — Lanço um
olhar depreciativo para o baixo sobre seu ombro. — E
também a baixista no The Smashing Pumpkins e....

— Nenhuma era baterista — Galloway levanta a mão


quando abro a boca para protestar. — E o fato é que não
queremos uma mulher. É a nossa banda. Nossa decisão.
Então, adeus, querida. Quando precisar de uma fã para
chupar meu pau em um dos banheiros do show, chamo você.

Aperto os olhos e me volto para os outros caras, que


estão silenciosos.

— Os dois “cordeirinhos” vão ficar calados e deixar que


este imbecil tome todas as decisões por vocês? Ele é o quê...
O ditador ou algo assim?

— Direto nas bolas.

— Olhe, eu poderia ouví-la tocar. — Diz finalmente


Asher Hart. Olhos verdes escuros passeiam pelas minhas
roupas antes de pousarem no meu rosto e quando entrecerro
os olhos ele levanta as mãos, defendendo-se. — Sendo
honesto, estamos escolhendo nosso baterista por decisão
unânime e você já não tem isso. — Continua ele, olhando
para Galloway com um irritado cenho franzido. — Também
me parece que você não vai conseguir, independente se a
ouvirmos ou não.

— Não. — Diz Galloway, explorando o som da palavra


enquanto me dá um presunçoso piscar de olhos.

Lágrimas ameaçam cair, mas eu as engulo e molho os


lábios. Com Galloway fiquei apenas zangada por seu
descarado não, mas por alguma razão, a explicação
compassiva de Hart me partiu ao meio e me deixou
sangrando. Depois de um profundo suspiro, tento uma
última vez.

— Está bem, então, Billy. — Fixo toda a minha atenção


nele, já que aparentemente é o único a quem tenho que
influenciar. — Tudo o que estou pedindo é uma
oportunidade. Se não gostar do meu trabalho depois disso,
pode me mandar beijar o seu traseiro.

Ele ri.

— Prefiro que beije meu pau. E talvez uma chupada um


pouquinho profunda. Droga, querida, estou disposto a dar
essa oportunidade a você agora mesmo, se estiver com sede.

Galloway leva as mãos ao botão da calça, mas Hart


rapidamente manda que ele se cale.

Apertando os dentes para segurar minha resposta, olho


para Galloway, imaginando todas as maneiras que poderia
assassiná-lo. Nenhuma delas bonita. Ou rápidas.

— O que nos leva a outra razão pela qual não


deveríamos ter uma garota no grupo. — Finalmente, Holden
contribui com seu grão de areia, a voz suave enquanto
pestaneja. — Com o Gally por perto seríamos processados em
cinco minutos por assédio sexual.

Reviro os olhos.

— Acredite, posso administrar este filho de puta dizendo


bobagens. — Olho para Galloway com desinteresse. — Desde
que mantenha suas mãos para si, pouco me importa o que
ele diga.

Mexendo com os dedos, Galloway sorri.

— Ah, mas estas mãos gostam de vagar, baby.


Especialmente sobre paisagens como você.

Oh, mano!

— Billy. — Adverte Asher, antes de se voltar para mim e


sacudir a cabeça. — Sinto muito, este não é o lugar
apropriado para você. Estou certo que tem um talento
incrível, mas agora precisamos retornar aos testes. Temos
pouco tempo.

Minha garganta seca e mais uma vez experimento a


triste vontade de chorar. Mas me seguro, apertando os dentes
e olhando para eles, recebendo em troca três expressões
diferentes enquanto aguardam minha resposta.

— Então vocês preferem ser apenas outra banda de rock


comum? — Pergunto. — Com as calças de couro, — Aponto
para Galloway enrugando o nariz, antes de indicar Holden —
Tatuagens, piercings e um sexy vocalista galinha? — Com um
olhar feroz na direção de Hart, coloco as mãos nos quadris. —
Boa sorte em ir a qualquer lugar com isso.

Respiro fundo e ando em direção a porta e ao chegar lá


me viro e olho para eles.

— Ah e talvez devam procurar no Google Karen


Carpenter, Moe Tucker e Honey Lantree. Todas eram
bateristas mulheres de bandas mistas bem-sucedidas.
Certamente muito maiores que perdedores como vocês jamais
serão. Fodam-se, filhos da puta.

Não bato a porta como o baterista que havia saído antes


de mim, mas obviamente preciso mostrar minha cara para
todos os que estão esperando na sala ao lado. Coloco as
baquetas rosas no bolso traseiro e com toda a dignidade que
consigo reunir levanto a cabeça com orgulho, engolindo a dor.

Meu companheiro de fila sorri.

— Não queriam a uma garota, não é?

O brilho em seus olhos me diz que ele soube desde o


começo que eu não iria conseguir.

Não o honro com uma resposta. Levantando mais a


cabeça passo rigidamente pela sala, saindo do estúdio para o
dia deprimente e nublado. Não derramo uma lágrima até
chegar ao carro. A derrota me deixa desconsolada e zangada
por possuir ovários e ser tão perturbada emocionalmente.
PARTE I

REMY
Trinta minutos depois da minha vida ser arruinada,
baixo o volume de “I Love It” de Icona Pop4 no rádio do carro e
estaciono a uma quadra do restaurante mexicano
Castañeda’s.

Olho para o espelho já com o rosto limpo do batom e


delineador preto que usei naquele teste idiota, assegurando-
me de que meus olhos não estão mais vermelhos e inchados.
Entretanto, ao ver o meu reflexo não consigo evitar uma
risada amarga. A prova do meu festival de lágrimas havia
desaparecido, mas eu ainda parecia horrível, tão virginal e
cristã quanto uma professora de escola dominical. E apesar
de tudo, sei que meu tio não vai aprovar minha aparência.

O tirano prefere que eu esteja coberta até o pescoço,


com os casacos mais sem graça e as saias até os tornozelos,
feitas de tecido de saco. Mas fiz o melhor que pude com meu
jeans rasgado no joelho e um suéter preto solto, que
eventualmente se move pelo ombro revelando a alça da blusa
roxa, para combinar com os reflexos também roxos em meu
cabelo.

4
Icona Pop é um grupo sueco formado em 2009 e que tem a electro house, punk e indie pop
como influências musicais.
Já havia tirado a peruca de roqueira punk, então
penteio mais uma vez a juba escura com os dedos, pego a
bolsa e contorno a entrada principal do Castañeda’s até
chegar ao beco lateral, onde cumprimento Mick, o sem teto
que acampa por ali à espera dos restos de comida. Assim que
entro pela porta traseira do restaurante e penduro a jaqueta
no gancho, ouço o rádio tocar uma melodia latina familiar, ao
mesmo tempo que sinto um calor úmido penetrar meu
suéter.

— Se continuar chegando tarde, meu pai irá acorrentá-


la, prima.

Eu grito assustada e me viro para encontrar meu primo,


Big T, um apelido para Tomás, misturando a massa.

Meia dúzia de empanadas cruas, recheadas e seladas


encontravam-se em uma bandeja, prontas para entrar no
forno. Meu primo está em frente a elas, com uma rede
cobrindo os cabelos escuros e os braços tomados de farinha
até os cotovelos.

— Cállate. — Murmuro, enquanto guardo a bolsa e


coloco uma rede no cabelo.

Ele ri.

— O que é isso? Abandono o fogão para fazer o seu


trabalho e tudo o que recebo é um cala a boca? E em
espanhol, para piorar. Minha doce prima está me ofendendo.

Percebendo que estou sendo uma vaca com uma das


minhas pessoas favoritas no mundo, deixo escapar um
suspiro de desculpas.
— Um grande obrigado e um beijo na bochecha do meu
maravilhoso Big T. — Digo, abraçando-o por trás e me
inclinando por cima do ombro para dar um beijo úmido e
descuidado em sua bochecha.

Meu primo fica vermelho mas sorri, enquanto continua


misturando a massa com as mãos grandes.

— Shhhh. Chega. Conte como foi o teste. Deve ter se


saído bem já que ficou até tarde. Passou pela primeira etapa?

Meu sorriso diminui.

— O teste? Foi... bem.

Empurro-o com o quadril e assumo o trabalho, já que


assar é tecnicamente minha obrigação.

Dirijo toda a atenção para a tarefa de sovar a massa,


que de repente serve como uma daquelas esferas para aliviar
tensão. Dobrar. Amassar. Farinha. Dobrar. Amassar.
Esqueça as audições, cantores sensuais e as lágrimas que
causam. Farinha. Dobrar, amassar.

Tomás segura meu cotovelo.

— Filha da puta... está doida. Pare de torturar a pobre


massa.

Franzo o cenho para ele mas obedeço e largo o rolo. De


braços cruzados, meu primo apoia-se na mesa ao lado e
estuda minha expressão.

— Eles não são a única banda que existe, você sabe.


Aperto os dentes tentando ignorá-lo e pego a faca e a
placa que uso como molde para começar a cortar a massa em
círculos perfeitos.

— Mas é a melhor banda.

Ele suspira.

— Questão de opinião.

Sendo um fã de Los Horóscopos de Durango5, Tomás não


entende minha fascinação pelo pop, rock ou punk.

— Olhe... apague essa tristeza do rosto. Vovó vai estar


aqui esta noite trabalhando no caixa e vê-la é sempre um
motivo para sorrir. Além disso, ela vai saber que alguma coisa
não está bem e você não quer incomodar a nossa frágil
velhinha, não é? — Pergunta ele, arqueando uma
sobrancelha em censura

Eu suspiro e deixo meus ombros caírem.

— Não. Você está certo, vou parar de ser dramática.

— Bom. Porque está sendo um “pé no saco” estar ao seu


lado.

Tomás pega um punhado de farinha e joga na minha


direção... como se isso fosse me animar, ou algo assim.

— Tomás Emmanuel Fernando Castañeda! — Grito


indignada, tirando a rede da cabeça e sacudindo
freneticamente a farinha do meu cabelo. — Como você se
atreve? Idiota!

5
Grupo de música folclórica mexicana.
— Elisa! — O tom forte da voz do meu tio me faz
levantar os ombros até que minha coluna esteja reta como a
de um militar.

Merda. Apesar de me sentir em casa neste lugar onde


passei a maior parte da minha infância, nunca deixei de
estremecer com essa voz. Odiava ser apanhada soltando
palavrões na frente do tio Alonso.

Lembro que quando eu era pequena, ele me dava uma


batida nas mãos com uma régua, cada vez que me ouvia dizer
um palavrão. Hoje em dia ele já não censura minha
linguagem nem sai atrás de mim com uma régua, mas
certamente me deu um olhar de desaprovação assim que
entrou na cozinha.

Dou um passo para trás e prendo a respiração, antes de


virar e olhar para ele.

— Sim?

— Chegou tarde.

Troco o peso de um pé para o outro, incomodada,


olhando para o patriarca da minha família. Fui criada pela
minha avó, mas tio Alonso, o filho mais velho dela e pai do
Big T foi a única figura paterna em minha vida a partir dos
dois anos. Assim, apesar de não me importar mais com sua
atitude, ele ainda sabe fazer com que eu me comporte... ou
que me rebele.

Levanto o queixo e balanço a cabeça.


— Sim, sei que cheguei tarde. Sinto muito, mas... —
Faço uma pausa, tentando pensar em uma desculpa aceitável
para o atraso, já que ele odeia meu estilo musical. Mas tio
Alonso obviamente não quer ouvir desculpas hoje.

— Carmen não veio, precisamos de ajuda no salão da


frente e rápido.

Engulo um palavrão. Mas... merda. Odeio mais que tudo


ser garçonete.

— Não estou vestida para trabalhar no salão. — Digo,


apontando para o meu suéter.

— Apenas, vá. — Ordena ele.

— Sim, querido tio.

Minha resposta o faz franzir o cenho, porque


constantemente eu o chamo de tirano.

Ele odeia quando eu digo “querido tio” com a voz doce,


angelical e uma espécie de atitude subserviente. Tio Alonso
sabe que sou tudo, menos doce e angelical. Mas também
odeio que me chamem pelo segundo nome e ele é a única
pessoa no mundo que faz isso, porque acha que Remy é
muito masculino e também porque não é latino o suficiente
para seu gosto.

— E Elisa... — Resmunga, demonstrando irritação. —


Limpe a sua blusa. — Completa, apontando meu suéter.

Olho para baixo e vejo que está cheio de farinha.


Murmurando, dou umas batidinhas para limpá-lo da melhor
maneira possível, enquanto tio Alonso sai e nos deixa
sozinhos. Atrás de mim, Big T não consegue conter o riso.

— Idiota. — Sussurro novamente, falando mais baixo


desta vez, caso tio Alonso ainda possa nos ouvir. — Olha o
que você fez.

Isso só faz com que ele ria ainda mais.

— Desculpe, não sabia que você seria obrigada a ser


garçonete esta noite.

— Se você servir as mesas, eu termino as empanadas. —


Imploro, batendo os cílios para ele... mas devo ter usado esse
truque muitas vezes, porque não funciona.

— Nem em sonhos, prima. Sai fora.

— Idiota.

Dou um empurrão em meu primo antes de correr em


direção a porta para o balcão do bar. No salão, dezenas de
mesas já estão ocupadas. Merda, não estou com disposição
para ser uma boa garçonete esta noite. É segunda-feira, dia
das famílias, incluindo crianças malcriadas e pais fartos e
irritados.

Que alegria. Em qualquer lugar que Carmen esteja,


espero que sua ausência valha a pena, porque a mataria por
me fazer passar por isso justamente hoje. Se não fosse
obrigada a trabalhar estaria em casa, matando nazistas ou
zumbis no Call of Duty6... porque meu humor está perfeito
para extrair um pouco de sangue virtual.

6
Jogo de videogame.
Enquanto estou procurando um avental de garçonete e
um bloco de pedidos em baixo do balcão, ouço uma voz suave
me chamar do caixa. Levanto os olhos para ver minha
pequena avó de cabelos prateados sentada em um tamborete
me olhando. Tinha esquecido completamente que Big T havia
avisado que ela estaria aqui esta noite. Isso mostra o quanto
meu cérebro ficou disperso depois do teste.

— Vovó. — Digo, correndo para dar um abraço de neta


obediente. — Senti saudades.

Ela foi minha tutora legal, desde que eu tinha nove


anos, quando as drogas fritaram tanto o cérebro da minha
mãe que tiveram que colocá-la em uma instituição para
doentes mentais.

Já que vovó foi morar com tio Alonso assim que chegou
aos Estados Unidos com um visto de trabalho, dois anos
antes de eu nascer, criei-me virtualmente sob seu teto... e
seu governo. E, mesmo que minha avó pudesse ser assertiva
quando necessário, era uma alma doce e em geral
complacente com a autoridade de seu filho mais velho.

— Minha linda neta. — Murmura vovó, segurando meu


rosto e olhando fixamente em meus olhos. — Você parece
triste.

Forço um sorriso e balanço a cabeça.

— No estoy triste. — Digo em espanhol, tentando


tranquilizá-la. Odeio que ela consiga ver tanto dentro de mim,
mas não posso falar da minha audição porque vovó detesta
meu tipo de música tanto quanto tio Alonso. — Só... chateada
por ter que servir as mesas.

Depois de insistir para que eu fosse visitá-la com mais


frequência, ela me dá um tapinha e me manda trabalhar.

Com um rápido beijo em sua bochecha saio para anotar


os pedidos dos clientes que estavam esperando, porque meu
primo mais jovem, Luís, estava ocupado limpando bebidas
derramadas em uma mesa no lado oposto do salão.

— Olá. Boa noite. — Cumprimento com um sorriso a


família de três pessoas. — Já pediram suas bebidas?

Castañeda’s orgulhava-se de servir a autêntica comida


mexicana, embora os crispys de tacos não fossem nem um
pouco parecidos com os verdadeiros tacos do México, de onde
vinha minha família.

Tio Alonso chamava os tacos que servíamos aos


habitantes locais de chingaderas, o que literalmente quer
dizer pedaço de merda. Mas como eles eram um dos pedidos
mais populares, continuávamos vendendo-os.

Tirando isso, tudo o que servíamos eram verdadeiros


pratos mexicanos, e todos que trabalhavam aqui eram
autênticos descendentes de latinos. Na verdade, eu sou quase
uma exceção uma vez que meu sangue não é somente
mexicano, porque meu pai era americano com ancestrais
alemães-irlandeses. Ele ficou com mamãe tempo suficiente
para se casar e me dar seu sobrenome Curran, antes de
sumir no mundo. Mas me considero suficientemente
mexicana já que minha mãe era uma Castañeda. Suponho
que isso me deu um "passe" para trabalhar no restaurante da
família... e também me deu o privilégio de que o menino
sentado à mesa que eu estava atendendo sujasse minha calça
com muco e queijo, quando espirrou em cima de mim.

Que bom. Sorri para os pais com os dentes apertados,


como se tudo estivesse bem, apesar da vontade de
estrangular a criança. O menino agora estava cantando aos
gritos a música de “Bob, O Construtor”, e sentando em cima
dos chips de omelete para esmigalhá-los, enquanto seus pais
estudavam os menus alheios a tudo que estava acontecendo.

Contendo a irritação, anoto os pedidos e fujo, antes de


descarregar as frustrações do dia sobre eles.

Seis horas mais tarde, vou para o meu apartamento e


me atiro no sofá, lamentando as desgraças de hoje.

Isto era minha vida. E parece que vou continuar com


esta existência patética a longo prazo. Nenhuma posição de
baterista. Não vou ser membro de nenhuma banda... nada
além de servir clientes idiotas, que escreviam “LOL” na linha
da gorjeta e não desembolsavam um único centavo de
gratidão pelo excelente serviço que presto, embora quisesse
estar enroscada no meu sofá, chorando enquanto matava
coisas com o videogame... E talvez me lambuzando com
chocolate e sorvete.
E pinas coladas. Deus, gostaria de me afogar em muitas
pinas coladas! E talvez cantar músicas de amor tristes,
realmente bregas, como “My Heart Will Go On7”, enquanto
imaginava que todos os zumbis sacrificados eram Fisher... ou
aquele baixista da NonCastrato, e o vocalista
sexydemaisparaserdeverdade, Asher Hart.

O trabalho havia ajudado a me distrair da melancolia,


mas agora... nem a meia dúzia de manchas de gordura, o
cheiro ruim na roupa ou os pés doloridos poderiam me fazer
esquecer o teste estúpido e aquele grupo de idiotas da banda,
que riram na minha cara.

Na realidade, o cheiro de gordura e a dor nos pés só


ajudavam a ressaltar o quanto tudo é horrível. Nunca seria
aceita em nenhuma banda, não sei no que estava pensando
ao ir naquele teste. Nem mesmo sair com o cantor da Fish 'N'
Dicks havia me garantido um lugar na banda. Por que eu
achei que alguém mais me aceitaria? Eu era um fracasso,
nunca consegui nada que realmente sonhei obter em toda
minha vida. Um pai que estivesse presente e uma mãe sã que
me amasse? Negado. Terminar a universidade e mostrar ao
meu tio que não era uma inútil? Não. Casar com Braden
Fisher, que supus ser o grande amor da minha vida, e criar a
melhor banda junto com ele e seus companheiros? Merda,
não. Encontrar um homem que me amasse? Nada. Ser
baterista em qualquer banda que me aceitasse e tocar diante
de uma plateia ao vivo? Nem sequer a porra de um teste.

7
Céline Dion em Titanic.
PARTE II

Eu odiava aquele miserável e como estava triste e


abatida concentrei-me na raiva.

— Nunca mais vou escutar sua música idiota de novo,


NonCastrato. — Murmuro em voz alta para o apartamento
vazio, apertando os punhos em fúria.

Realmente, não esperava que houvesse alguém por ali,


então quando ouço uma resposta. soltei um grito assustado.

— Tive um mau pressentimento...

Olho com a cara fechada para a porta da cozinha onde


minha colega de apartamento está. Quase morri de susto.

Jodi havia prendido o cabelo vermelho em um coque no


alto da cabeça e usava uma camiseta verde com shorts
curtos, que mal cobriam o início de suas pernas. Ela sempre
se vestia assim quando estava em casa, independente se
fosse verão ou inverno... E estávamos em novembro.

Segurando com as duas mãos uma caneca fumegante


que cheirava a cappuccino ela se aconchega ao meu lado no
sofá e dá um suspiro de simpatia.

— Você teria entrado gritando e feliz se houvesse uma


boa notícia. — Diz.
Meu lábio inferior está tremendo. Nunca consegui
digerir bem a compaixão.

— Os idiotas nem sequer me ouviram.

— Sinto muito, puta.

Não faço ideia do porquê Jodi sempre utilizava a palavra


puta em espanhol para se referir carinhosamente a mim, mas
desde que eu havia ensinado isso a ela é assim que me
chamava.

Isso só me fez chorar mais, porque me lembrou que Jodi


gostava muito de mim e eu realmente precisava de um pouco
de amor neste momento. Malditos ovários.

— Foi porque você é uma garota? — Perguntou.

— Sim. — Passo a mão nos olhos e lhe dou um olhar


afiado. — Espera, como você sabe?

Ela encolhe de ombros.

— Por causa do nome da banda. NonCastrato e castrato


significa...

— Sei o que significa o maldito castrato. — Corto,


sentindo-me irritada... e patética... e bastante inútil.

Música era a minha vida. Já havia feito três semestres


na universidade quando Fisher insistiu que eu era necessária
em sua banda. Na época eu tinha escrito um artigo sobre
como na década de 1700 os meninos eram castrados antes
da puberdade para que suas vozes se mantivessem agudas, o
que deu origem ao termo castrato.
Não era uma idiota completa, só meio idiota. Bem, talvez
três quartos idiota... o que seja. Mesmo assim, sabia o que
significava castrato.

— É obvio que você sabe. — Diz Jodi docemente,


acariciando minha perna. — Mas o que não posso entender é
por que está sentada aqui chorando por causa desses idiotas.

Essa era minha companheira de apartamento. Foi


simpática, mas me deu um rápido chute na bunda para que
eu parasse com minha festa de auto piedade.

Pisco e limpo o rosto.

— Porque sonhei toda minha vida com este tipo de


oportunidade. Pratiquei, suei e sangrei para ser a melhor
baterista que existe, droga. E nem sequer podem me ouvir?

— Exatamente. Você trabalhou nisto durante anos,


então por que está desistindo agora? NonCastrato não é a
única banda. Certamente pode...

— Mas é a banda que eu queria estar! São bons, tocam


em muitos lugares e quero ser parte disso. Simplesmente...
alguma coisa a respeito deles me soa bem.

Até que me trataram como uma merda e me mandaram


embora.

— Então, lute por isso!

— Tanto faz. Não quero ter nada que ver com aqueles
imbecis agora. O que eu realmente gostaria de fazer é obrigá-
los a escutar o meu talento e depois rir e dizer não na cara
deles, quando me pedissem para tocar na sua banda.
— Oh, sim. Eu gosto dessa ideia. — Diz Jodi, apontando
na minha direção antes de tomar fôlego e continuar. — Faça
isso.

— Como se eu pudesse. — Derrotada, atiro as mãos


para o ar. — Os idiotas não estão dispostos a ouvir a uma
garota tocando bateria, lembra?

— Então, não seja uma garota tocando bateria. —


Rebate ela, como se fosse óbvio. — Duh!

Fico imóvel, olhando-a fixamente.

— Espera. O quê? Você está dizendo... — Arregalo os


olhos e voo do sofá para segurar o rosto dela com as duas
mãos. — Oh meu Deus, você é um gênio. Acha que eu
consigo? Acredita que eu posso me transformar em um
homem? Como... por mais ou menos uma hora?

Jodi nega com a cabeça, obviamente não seguindo o fio


dos meus pensamentos.

— Hã?

— Não é isso que você faz na universidade? Efeitos


especiais para filmes? Inclui máscaras, não? Você não
poderia me transformar em um menino como fizeram com
Robin Williams em Mrs. Doubtfire8?

— Hum... — Murmura Jodi, deixando escapar uma


risada nervosa, como se pensasse que eu estava brincando,
porém, temendo que não estivesse. Ela nega com a cabeça. —
Acho que você não percebe a quantidade de tempo e trabalho

8
Uma Babá Quase Perfeita, no Brasil.
necessários para fazer algo assim. E fica ainda mais difícil
quando precisa parecer realista.

Desesperada, seguro sua mão com o olhar suplicante.

— Eles só têm que acreditar durante o tempo que durar


o teste. Depois disso, quando perceberem o quanto sou boa,
vou tirar a máscara e dizer que uma garota pode ser
talentosa. E fodam-se.

Quando a tentação aparece nos olhos da minha


companheira de apartamento, soube havia vencido. Só
precisava implorar mais um pouquinho para romper sua
resistência.

— Jodi, por favor, preciso disso. Conto com você e seu


incrível talento para me ajudar a fazer um pouco de justiça
no mundo... para todas as mulheres.

E... Jodi se derreteu. Continuei com o olhar suplicante


enquanto seu conflito interno se convertia em pó.

— Oh, está bem. Mas se amanhã é o último dia de


testes, temos que começar, droga, agora mesmo.
ASHER
Um fato estranho sobre mim: realmente gosto de fatos
estranhos e incomuns.

Sei que o termo para quando se assassina um tio é


avunculicídio, uma irmã é fratricídio, uma esposa, uxoricídio,
a extinção total de uma raça, genocídio. Mas não sei qual o
termo para quando se quer assassinar seus colegas de
banda. Acho que deveria saber já que me encontro
considerando seriamente fazer uso dele.

Eles estavam me deixando louco.

O combinado era que antes de contratar o próximo


baterista todos deveríamos estar de acordo. Polegar para cima
de todo mundo e ele poderia entrar.

Não gostei muito do nosso último baterista, desde o


começo. Havia algo asqueroso nele que me irritava, mas como
ele tinha um bom ritmo não fui contra quando Gally o trouxe
“a bordo”. Eu fui tolerante. Oh, tem alguém em mente? Bem,
está dentro. Não sou mais. Rock me curou dessa ingenuidade
cega quando tentou matar um dos meus melhores amigos.

O cara era um piromaníaco que havia matado boa parte


da sua família em um incêndio anos atrás (o que com certeza
chama-se familicídio).
No momento. ele se encontrava apodrecendo na prisão
enquanto o resto de nós, que fomos apanhados no olho do
furacão, tínhamos quatro dias para encontrar um novo
baterista ou não seríamos capazes de tocar em nosso
concerto habitual de sexta-feira à noite... pelo sexto fim de
semana consecutivo.

Este era o segundo dia de testes dos três que havíamos


programado e ainda não tínhamos sido capazes de entrar em
acordo em relação a nenhum baterista. Nem um único. Eu
queria alguém talentoso e que não parecesse um
piromaníaco. Impressionantemente, houveram dois desses.

Gally estava obcecado com a imagem, não queria


ninguém que fosse intimidante. Sem muitos piercings no
rosto ou muitas tatuagens. Não ligava para o talento, só
queria saber da aparência... ou gênero, ao que parece, já que
não quis nem se incomodar em ouvir aquela garota.

E Heath... Bem, Heath não dava explicações, limitava-se


a sacudir a cabeça. Era sim ou não. Possivelmente, tinha
alguma espécie de pressentimento. Quem sabe? Era difícil
dizer com ele. Tenho que admitir, ninguém me impressionou
o suficiente para levantar o polegar, mas com alguns teria me
conformado se meus dois companheiros de banda não os
tivessem vetado imediatamente.

Acho que esta pequena coisa de democracia foi a pior


ideia.
Gally se atira em uma cadeira e geme, enquanto passa
as mãos pelos lados do seu moicano (laranja esta semana),
como se quisesse confirmar que ainda estava lá.

— Esta merda fede. Vamos parar por hoje.

Sim. Era a única coisa com a qual eu podia concordar.


Aponto para Heath.

— Mande-os embora.

Enquanto Heath passa a correia do violão por cima da


cabeça e coloca seu bebê no chão para ir em direção a porta,
eu solto minha Taylor9 e mexo com os ombros para aliviar a
tensão dos músculos. Não descansamos há horas e eu estava
sentindo as consequências.

— Reconvocação aqui, às oito? — Pergunto, quando


Heath retorna do corredor depois de ter dispensado todos os
candidatos.

— Re... O quê? — Gally me dá um olhar confuso, com a


boca aberta e os olhos entrecerrados.

Contenho o suspiro longo e cansado que se encontra


preso no meu peito.

— Reencontro. Querem que nos encontremos de novo


aqui às oito... da manhã?

Gally nega com a cabeça.

— Por que simplesmente não disse isso da primeira vez?

Oh meu Deus, realmente preciso sair daqui.

9
Marca de guitarra.
Desta vez, eu suspiro, massageando com as duas mãos
a parte de trás do pescoço para evitar que todas as veias
explodam.

— Eu os vejo pela manhã. — Digo, guardando a guitarra


no estojo e passando a alça por cima do ombro para apoiá-la
nas costas.

Enquanto, saio penso sobre o fato de nunca ter tocado


com qualquer banda antes. Trabalhei com Heath como
empacotador do turno da noite em uma empresa de
transporte local por dois anos. Durante um intervalo ele me
disse que gostava de tocar violão e então sugeri que
aproveitássemos o tempo para tocarmos juntos.

Começar uma banda real era a última coisa que eu


queria, mas o namorado da prima do Heath, mais conhecido
como Billy Galloway, ouviu-nos uma noite e começou a tocar
com a gente. Ele também disse que conhecia um baterista... e
assim nossos dias de garagem começaram, com os amigos
passando para nos ouvir.

Eu nunca pensei em começar uma banda de verdade,


mesmo quando uma das muitas meninas do Gally disse que
um dia nós seríamos famosos.

Quando Gally e Rock ouviram isso, tudo o que podiam


pensar era em ficarem conhecidos. E uma vez que nenhum
de nós tinha experiência no assunto, comecei a pesquisar e
descobri o que precisávamos fazer. Escolher um nome levou
mais de uma semana, foi uma dor de cabeça quase tão
grande quanto sobreviver à busca de um novo baterista. Mas
no final ficamos com NonCastrato.

O passo seguinte foi encontrar um lugar onde nos


apresentar. Depois de visitar alguns clubes noturnos que
eram bem conhecidos por aceitarem artistas novos e lhes dar
oportunidade de demonstrar seus talentos, dei um “salto de
fé” e entrei em contato com o novo proprietário do Forbidden.

O local sempre funcionou com música eletrônica, mas


eu não tinha nada a perder por simplesmente perguntar.
Depois de muita insistência consegui falar com Pick Ryan em
seu escritório e expus minhas ideias. Não sei por quê, devo
tê-lo encontrado em um bom dia ou algo assim, mas ele
concordou em nos deixar tocar no seu clube. Pode ter tido
algo a ver comigo dizendo que tocaríamos de graça e que eu
trabalharia para ele como garçom, que era o que precisava.
Enfim... ele havia concordado!

Então, em um piscar de olhos, eu estava pedindo


demissão da atividade de empacotador para trabalhar com
Pick no Forbidden e começando esta aventura musical com,
basicamente, três estranhos.

Entretanto, nem uma única vez me arrependi. Nem


mesmo com as muitas horas de trabalho, ou as dores de
cabeça, ou por virtualmente ter que preparar sozinho as
apresentações e escrever todas as canções originais que
cantamos. Foi sempre um desafio que adorei e era o lugar ao
qual eu pertencia. Mas sim, às vezes penso que seria legal se
todos levássemos um pouco mais a sério, ou como gostaria
que meus companheiros de banda entendessem o que
significava a metade das palavras que eu digo.

Mas, suponho que não precisamos ser iguais para


formar uma banda. Não há razões para lamentar ou ficar
melancólico, provavelmente, eu sou uma dessas pessoas que
não está destinada a ter um grande encontro de mentes com
os outros. Além disso, amanhã será um novo dia e vou me
assegurar de que a gente encontre o quarto membro da
banda para que minhas frustrações atuais sejam irrelevantes.

Apesar disso, enquanto saio do estúdio para a tarde


fresca de novembro, sinto uma certa inquietude. Insatisfação.
Porque ainda desejo ter.... Droga, nem sei o que é.
Possivelmente um amigo. Uma pessoa com a qual passar um
tempo e fazer alguma coisa, ou talvez não fazer nada.
Simplesmente, alguém que estivesse ali, para me ajudar a
pensar em outras coisas por alguns momentos. Um apoio...

Havia dito a mim mesmo por anos que não estava


sozinho. Mas porra, eu estava sozinho. E por estranho que
pareça, neste ano que trabalhei no Forbidden e fiz mais
amigos que nunca, foi quando percebi o quanto estou
sozinho.

Ou, possivelmente, estou de mau humor, porque ainda


me incomoda o que aquela garota disse.

Maldita garota, não somos um clichê. Trabalho duro


para ser eu mesmo e escrever músicas que sejam diferentes
das que existem por aí. Por que ela teve que falar a única
coisa que mais me incomodaria? Agora que suas palavras
haviam me contaminado, eu não parava de pensar nisso. E
me chamar de galinha? Será que falava sério? Ela nem me
conhece. Não sabe como me relaciono com as mulheres, ou
que há meses não faço sexo. Incomoda-me ser rotulado com
tanta facilidade. Já tentei me dizer que ela estava chateada e
que não posso culpá-la completamente por isso. Gally deveria
tê-la deixado tocar... outra razão pela qual estou irritado com
ele.

É possível que tenha sido somente a raiva falando.


Bom... a verdade é que estou irritado comigo mesmo. Deveria
ter “forçado a barra” para que ela tocasse. Merda, aquela
garota me afetou.

No momento que entrou pela porta com sua saia muito,


muito curta que mostrava as pernas longas e bronzeadas
movendo-se presunçosamente e com segurança, um calor
percorreu minhas vísceras até queimar meus neurônios. Esse
tipo de reação imediata e intensa só aconteceu duas vezes na
minha vida. Alguns meses atrás e.... hoje. Não gostei muito.

Enviou meus hormônios para aquele lugar primitivo,


onde só queriam uma coisa. Fui obrigado a me afastar e fingir
que tomava uma bebida, porque fiquei com medo de que se a
olhasse por mais tempo, poderia começar a gemer. Estive
imaginando como seria arrancar aquela peruca loira para ver
como realmente era, e em seguida empurrá-la contra a
primeira superfície disponível e me deleitar naquele corpo.

Sério, foi desejo à primeira vista. Estive tão ocupado me


controlando que não prestei atenção em Gally, até que ela
disse: isto é uma espécie de brincadeira. E aquela voz...
Merda, aquela voz me levou a imaginar outras cenas. Era
grave para uma mulher, mas ainda assim muito atraente.
Quando por fim me dei conta de que Gally a havia
dispensado devido a seu sexo, senti imediatamente uma
faísca de alívio. Eu nunca poderia me concentrar perto de
alguém que me atraia daquela maneira. Sei que fui
tendencioso, covarde, horrível e completamente sexista, mas
não poderíamos estar na mesma banda sem que eu quisesse
me atirar sobre ela... sempre. Provavelmente, isso a daria
mais munição para achar que eu era algum tipo de galinha.

Ando até a moto, sentindo-me péssimo por não ter dado


uma oportunidade à garota. A minha Triumph10 ano setenta e
dois seria fantástica se não fosse tão velha, mas custou
menos que qualquer veículo de quatro rodas que eu pudesse
encontrar e tinha o melhor rendimento de gasolina. De
qualquer jeito, adoro essa moto. Sento-me no banco e ativo o
combustível para depois empurrar o descanso e ligá-la. O
único lugar que tenho para ir é a casa do Mozart, o que me
parece uma opção miserável... então decido dirigir até meu
lugar favorito na terra.

O Forbidden existe há um pouco mais de um ano e eu


havia vivido todos os meus momentos felizes ali. Foi o
primeiro palco que me apresentei e para onde voltava a cada
noite de sexta-feira.

Minha banda tinha feito um nome e reuniu um grupo de


fãs por causa deste lugar. E foi no Forbidden que
10
Marca de motocicleta.
experimentei aquele primeiro golpe de intenso desejo, quando
vi uma desconhecida na multidão e quis saber tudo a
respeito dela.

Merda, eu soube que tinha um irmão dentro dessas


paredes. O lugar parecia mais com a minha casa do que o
lugar onde eu dormia todas as noites.

Vinte minutos depois estou no clube e fico satisfeito ao


me certificar que o Barracuda11 preto não se encontra no
estacionamento. Não preciso trabalhar esta noite, e sempre
espero que Pick me dê mais horas para trabalhar, assim
tenho algo para fazer com meu tempo livre. Mas no momento
uma cerveja e um pouco de companhia soava bem, preciso de
um pouco de energia positiva a minha volta para aumentar a
moral.

Quinn e Knox estão trabalhando no bar e de todos os


garçons do clube são os mais calados. Com o meu estado de
ânimo atual estou certo de que não serei um “bom papo”,
então eles são a opção perfeita para me acompanhar.

— Olá, Asher — Diz Quinn, com seu sorriso amistoso. —


Como vão os testes?

— Não vão. — Deixo-me cair em um tamborete. — Como


estão sua esposa e filho?

O sorriso dele é puro orgulho e sim, esse era exatamente


o tipo de energia exuberante que eu precisava.

11
O Barracuda é um coupé esportivo de porte médio da Plymouth, antiga divisão da
Chrysler.
— Zoey parece cem por cento melhor e o médico acha
que poderemos levar o J.B. para casa em uma semana.

— Isso é muito bom, homem.

A esposa de Quinn tinha dado à luz a um bebê


prematuro dois meses atrás. Era muito bom ouvir que ambos
se encontravam indo para recuperação completa e eu deveria
estar feliz que as coisas estavam dando certo para eles. Mas
no lugar de alegria uma bola amarga de solidão cresceu
dentro de mim. Por que não posso encontrar alguém? Quinn
encontrou, não é?

Knox coloca uma garrafa de cerveja na minha frente,


tira a tampa e desaparece.

— Obrigado — Digo a suas costas, feliz que ele soubesse


exatamente o que eu precisava.

Pego a garrafa e tomo um longo gole. Deus, isso é muito


bom. Eu suspiro e relaxo, satisfeito com o álcool.

Quinn foi ajudar um cliente do outro lado do balcão e


Knox permaneceu por perto fazendo o seu trabalho. Atrás
deles prateleiras de garrafas brilham na tênue luz azul de
fundo, o que dá à atmosfera um efeito calmante que alivia a
minha inquietude.

Eu gostaria muito, se pudesse simplesmente sentar ali e


viver nesse tamborete o resto da minha vida. Fecho os olhos e
inclino rosto para frente, descansando os cotovelos no balcão
e deixando o som e o aroma do Forbidden se infiltrarem em
mim.
Meu sonho pacifico não dura muito.

— Asher?

Uma voz familiar faz com que eu levante a cabeça e abra


meus olhos. Imediatamente alerta, viro-me, olhando surpreso
o homem que se aproxima.

— Merda! De onde você saiu?

Pick, meu chefe e há três semanas meu meio irmão,


diminui o passo e levanta uma sobrancelha.

— Bem... do meu escritório?

Droga, deveria saber que ele estaria aqui, ainda é cedo.


É o seu clube, por que não estaria? Mas quando cheguei o
Barracuda não estava lá fora...

— Comprou um carro novo ou algo assim?

— Na verdade, sim, comprei — Responde ele, cerrando


os olhos. — Por quê? Você está tentando me evitar?

— O quê? — Digo, como se fosse ridículo. — Não!

Ele sabe que eu estou mentindo. Pick olha para as


pessoas e de algum jeito consegue ler seus pensamentos.
Admiro isso nele, apesar de me intimidar. Merda, quase tudo
o que tem a ver com Pick Ryan me impressiona e inquieta na
mesma medida.

É muito estranho, surpreendente e absolutamente


estarrecedor saber que estou relacionado a alguém tão
intuitivo e ainda assim tão agradável. Se tivesse tido opção de
escolher alguém no mundo para ser meu irmão de sangue,
teria sido ele. Pick é uma dessas pessoas agradáveis,
tranquilas, que aceita os outros como eles são e cobre suas
costas sem você ter que pedir. E, entretanto, todo esse
assunto de irmãos me abala até a medula.

A "família" e eu nunca nos encaixamos. Não consigo


evitar esse pressentimento de que o meu desejo tornado
realidade faria tudo ir para o inferno.

Tenho muito a perder se Pick me dispensar. Este lugar e


o que há aqui, é toda minha vida. Meu trabalho, tocar no
palco do Forbidden com a banda, minha amizade com ele e
todos os outros rapazes e simplesmente... Bom, todas essas
coisas se converteram no que há de mais importante na
minha vida. Não sei o que faria sem tudo isso.

Pick continua a me olhar com seus olhos castanhos e


conhecedores, que deve ter herdado do seu pai, porque nossa
mãe tinha os olhos verdes como os meus.

— Nota-se. — Murmura. — Acompanhe-me.

— O quê?

Estou piscando como se ele tivesse falado em outro


idioma. Um sorriso divertido aparece em seu rosto enquanto
inclina a cabeça para a saída.

— Tenho um lugar para ir. Mova-se.

— Por quê? — Pergunto, fazendo uma careta quando a


palavra deixa a minha boca. Deveria ter perguntado onde.

— Apenas conversar um pouco. — Diz ele, encolhendo


os ombros.
A oferta é tentadora. Este é o tipo de familiaridade que
eu havia desejado há apenas alguns minutos. Não posso
acreditar, não vou cair em tentação. Isso não vai dar certo.
Não pode. Tudo que tem a ver com família em minha vida
termina mal. Por que isto seria diferente?

— Oh, Deus. — Pick revira os olhos e bate o braço no


meu. — Pare de pensar tanto. Tire seu traseiro do banco e
venha comigo.

— Mas... não terminei minha cerveja. — Sim. Isso


soou... ridículo.

Pick olha para o balcão na minha frente.

— Que cerveja?

Eu me viro para apontar a bebida, mas no balcão há


apenas um círculo úmido, enquanto Quinn atira uma garrafa
no lixo suspeitosamente parecida com a que estive bebendo.

— Então, vamos. — Pick me empurra de novo e com um


gemido de resistência, eu me levanto.

Digo a mim mesmo que estou fazendo isso apenas


porque ele é meu chefe e pode me despedir se me negasse a
obedecê-lo, mas, sinceramente, estou curioso. Não importa o
quanto eu esteja inseguro e assustado em começar uma
relação de irmãos que pode não dar certo, quero saber mais a
respeito daquele que veio do mesmo ventre que eu. Embora
não demonstre, quero fazer parte da família dele.
ASHER
Tudo começou com uma música idiota que eu escrevi
sobre minha mãe, que havia abandonando seu primeiro filho
no hospital horas depois do parto e foi viver uma vida
miserável junto ao meu pai, até o dia que ele bateu tanto nela
que a matou.

Quando cantei essa música no palco do Forbidden


algumas pessoas vieram me dizer que lembrava muito a
história do Pick, porque sua mãe o abandonou no hospital.
Isso me deixou pensando se ele não poderia ser aquele
menino, o que me levou a tomar a épica e estúpida decisão de
mencionar essa pequena coincidência diretamente a ele.

Pick rapidamente providenciou um teste de DNA e


boom... aqui estamos. Fodidos irmãos de sangue, filhos da
mesma mãe, mas com pais diferentes.

Depois de trabalhar para ele alguns meses, pensei que o


conhecia o suficiente, mas agora... agora me dou conta que
não sei quase nada. Como o fato de que ele gosta de
restaurar velhos carros clássicos.

Pick me leva até onde está estacionado um Mustang


azul com uma faixa branca no capô, acho que modelo 1970 e
eu deixo escapar um assobio baixo.

— Lindo carro.
— Obrigado. — Diz ele, abrindo a porta para mim. —
Não estava sequer ligando quando o encontrei. Troquei o
original 302 por um 351 e instalei um novo sistema de
calefação e ar, antes que ele voltasse a ronronar.

Basicamente, não entendi uma palavra do que ele disse,


mas concordo como se tivesse entendido e então sento no
banco do passageiro.

— Agora, vou trabalhar no interior e dar uma pintura. —


Continua.

Assentindo mais uma vez, passo as mãos ao longo do


banco áspero onde estou sentado.

— Não tinha ideia que você sabia arrumar carros


antigos.

Pick me olha enquanto liga o motor e, merda, não sou


um perito em carros, mas mesmo assim sei que a melodia
deste motor voltando a vida soa muito bem. Ele chama de
ronronar, mas para mim é mais como um profundo grunhido
satisfeito, como o som que um cara faz quando relaxa os
músculos sobre o colchão depois de gozar com força e
profundamente dentro de uma mulher suave e ansiosa.

— É obvio. É uma coisa minha. Trabalhei em uma


garagem antes de ser dono do Forbidden. — Informa,
inclinando a cabeça, como se não pudesse acreditar que eu
não soubesse isso.

Não sabia. Honestamente, era algo assombroso e um


pouco desconcertante descobrir que ele foi mecânico. Seu pai
também foi. Esse é um dos poucos detalhes que sabemos a
respeito do seu pai, fora o fato que ele fora assassinado aos
dezenove anos, no mesmo dia que Pick nasceu.

Isso, e que minha mãe se referia a ele como Chaz. Tudo


bem... perfeito. Ela falava muito a respeito de Chaz, como ele
fora seu verdadeiro amor e mais um monte de merda que um
menino de sete anos de idade não quer escutar da sua mãe.
Assim bloqueei da minha memória a maior parte das
histórias da sua sexualidade explícita. A coisa do mecânico,
entretanto, mostrava que Pick conseguiu um pouco do seu
conhecimento a respeito de carros dos seus genes. Se eu
fosse ele e não soubesse nada das minhas origens, gostaria
de saber.

Mas, por alguma razão, não falo nada. Não estou


preparado para ir por essa direção, tenho receio de onde isso
possa nos levar. Entretanto, sei que ele quer este vínculo
fraternal, Pick está preparado para ter um irmão.

E claro, a primeira coisa que ele diz enquanto coloca o


carro em movimento é: — Estive pensando que talvez
pudéssemos contar a todo mundo.

— Hummm? — Murmuro, fingindo-me de idiota.

É burrice e uma tática inútil que não me leva a lugar


algum, mas estou fazendo qualquer coisa para prorrogar o
inevitável. Ele não finge pensar que não tenho ideia do que
está falando, continua como se eu soubesse exatamente o
que quer dizer... E eu sei.

— Bem, tenho um pressentimento de que todos já


sabem. Contei a Tink, é óbvio.
Quando ele se vira para me olhar eu encolho os ombros,
completamente surpreso. Tink é o apelido de Eva, sua noiva,
embora a maioria de nós já a chamássemos de sua esposa.
Eles têm uma dessas estranhas e entrelaçadas relações que
eu nunca tinha visto antes de chegar ao Forbidden, o tipo
onde as duas partes compartilham tudo um com o outro.
Então, não deveria estar surpreso que ele tivesse contado.

— E estou certo que ela contou para Reese — Digo,


mencionando a melhor amiga e prima-irmã de Eva.

— Que provavelmente contou ao Mason.

Mason é o noivo de Reese e também trabalha no balcão


comigo.

— E sabe que ele provavelmente contou a.... todos. —


Termino, hesitante.

Passo as mãos pelo rosto, tentando vencer o pânico. Não


há razão para entrar em pânico..., mas estou. Não consigo
evitar, esta merda está tornando-se muito real para mim.

— Exato. — Pick concorda, encolhendo os ombros. —


Então, estive pensando, por que não tornar tudo oficial e
público? Assim todos vão deixar de fingir que não sabem.

Levanto as mãos, aterrorizado ao descobrir que estavam


começando a tremer.

— Olhe, podemos apenas... não sei... adiar qualquer


grande acontecimento por um tempo?

A decepção de Pick foi uma pausa de cinco segundos em


silêncio.
Mordo meu lábio, odiando dar uma resposta que ele que
não quer ouvir, mas droga... não estou preparado.

— Claro. — Finalmente ele responde, deixando que eu


pegue a saída mais fácil. Sei que esperava mais de mim. —
Você precisa de mais algum tempo para assimilar a notícia.
Eu entendo.

Deus, ele precisa ser tão compreensivo? O cara é nobre e


cheio de boas intenções, o que me faz sentir ainda mais na
merda por não conseguir superar toda essa porcaria
sentimental de família. Eu sei que queremos as mesmas
coisas. Sim, quero ser um bom irmão para ele e ter uma
dessas relações próximas que os irmãos têm.

Só que não posso.

— Sinto muito. Sei que estou reclamando mais do que


deveria. Mas apenas não.... não tenho sorte com toda
essa...coisa de família. É por isso... — Merda, sou um idiota.
— Droga, pareço estúpido, já que você obviamente também
não teve sorte.

— Na realidade... ultimamente tive muita sorte com essa


coisa de família.

O olhar dele desvia-se para o quebra sol do carro, onde


está a foto de uma loira sexy e dois pequenos meninos,
sorrindo para ele. Uma pontada aguda de inveja me
atravessa. Ele tem os filhos mais legais e a noiva que
qualquer cara sortudo poderia desejar. E o que é ainda mais
genial, eles o amam com a mesma intensidade.

Pick me olha com as sobrancelhas erguidas.


— Isso inclui você. — Diz ele.

Suspiro e afundo mais no banco, sentindo-me ainda


pior. Eu não mereço ter um irmão assim. Mas ele não me
deixa ficar remoendo a culpa, chegamos em frente à uma
casa agradável no subúrbio, com uma placa de vende-se. Pick
para o carro e desliga o motor.

— Porém vamos guardar segredo por um tempo se você


prefere assim. Não há problema. — Conclui.

— Obrigado. — Respondo distraidamente, enquanto


observo o lugar. Era exatamente o tipo de casa que sonhei
crescer. Quando não consigo aguentar mais a curiosidade,
viro-me para ele. — Onde estamos?

Pick observa a casa com um desejo semelhante ao meu.

— Tink e eu estamos procurando uma casa.

Olho atentamente para o jardim e fico de boca aberta,


incrédulo.

— E está considerando esta casa?

— O quê? Você não gosta? — Pergunta, com os olhos


pousados em mim.

— Não, sim. Sim, eu gosto! É assombrosa. É só que...


nada. Incrível, isso é tudo. Procurar casas. Oh. — Não posso
dizer que eu cometeria crimes inqualificáveis para viver em
um lugar como este, isso soaria dramático demais, então
abro a porta do carro, morrendo de vontade de ver como ela é
por dentro. O interior de uma bela casa não é algo que eu tive
a oportunidade de ver muitas vezes. — Bem... por que não
está fazendo isto com sua Tinker Bell12? — Pergunto,
enquanto ele me segue olhando com reserva para a porta
principal, onde um agente imobiliário está esperando.

Pick faz uma careta desgostosa e envergonhada.

— Eu a aborreci quando vetei tudo o que vimos assim


que saí pela porta dos fundos para o jardim. — Dou um olhar
curioso, mas ele dispensa qualquer explicação com um gesto.
— Longa história. Para encurtar, estamos procurando casas
separadamente. Depois que ela aprova o exterior me passa
uma lista das suas favoritas, para que eu encontre... A ideal.

— Certo.... — Digo em voz baixa, pensando que era uma


maneira estranha de procurar casas, mas... — Oh! Não, não
sou eu. É ele. — Explico, assim que o agente começa a falar
comigo.

Quando aponto para Pick, dou-me conta que


provavelmente teríamos o mesmo sobrenome se minha mãe
não o tivesse abandonado. Não, apague isso. Não teríamos,
porque eu não existiria se ela não o tivesse abandonado.

Mamãe estaria muito ocupada, criando uma criança que


ela amava e nunca teria conhecido o insignificante traficante
de drogas que era o meu pai. Eles não teriam começado seu
insalubre... o que quer que seja, espécie de relacionamento, e
eu nunca teria nascido. Ela provavelmente ainda estaria viva.

Esfrego a parte de trás do pescoço e observo o jardim da


frente, tentando não me sentir culpado por estar vivo
enquanto minha mãe não está. Foi ela que fez as escolhas

12
Fada Sininho das histórias infantis.
que a levaram a morte, eu era só um produto delas. Sempre
repito isso para mim mesmo. Não que me faça sentir melhor,
mas o que posso fazer agora? O que está feito... está feito.

— Este é meu irmão, Asher.

Arrancado dos meus pensamentos, eu me volto para o


agente com um sorriso tenso.

— Olá.

Ele apresenta-se como Brian e nos guia para dentro da


casa, rapidamente explicando todas as características.

Cheira como... Lar. Eu gosto. Eu quero.

— Como podem ver, a casa é de carvalho chanfrado


manchado com....

— Onde fica a porta traseira? — Pick corta o homem,


obviamente nem um pouco interessado nas condições da
casa.

— Uh... lá, uh.... Por aqui. — Responde Brian, perplexo.

Enquanto ele mostra a Pick onde fica a porta, eu estudo


o carvalho, decidindo que sim, gosto disso. E os ajustes
oblíquos eram legais. Se algum dia tiver minha própria casa,
eu gostaria que tivesse essa configuração luxuosa.

Rapidamente, eu me volto para segui-los até a saída e


então entramos em um pátio que me deixa babando,
imaginando churrascos, festas, piscina e talvez um
trampolim, junto com balanços para crianças. Mas Pick
coloca as mãos nos quadris e franze o cenho.
— Não. — Diz ele, voltando-se para a casa. — Sinto
muito, mas não é a indicada.

O agente e eu olhamos um para o outro, confusos.

— Espera. O quê? Sério que você não gosta desta casa?


— Pergunto, estendendo a mão para abranger o amplo e
assombroso pátio, completamente estarrecido. Meu novo
irmão está completamente demente.

Pick para e encolhe os ombros.

— É bonita, claro, mas... não é o lugar que estou


procurando.

Jesus! Eva tinha razão ao não querer procurar casas


com ele.

Quando meu irmão começa a caminhar para a porta de


saída, eu balanço a cabeça.

— Não quer ver o resto?

— Não preciso. Esta não é a casa.

— Bom, eu gostaria de vê-la. — Insisto.

Parando novamente, Pick me dá outro daqueles seus


olhares horripilantes, que enxergam dentro de você, entram
na sua cabeça e trazem à luz todos os seus desejos mais
profundos. Finalmente, assente como se entendesse.

— Está bem.

Então, olhamos sozinhos todos os cômodos vazios.


Brian não nos dá detalhes, fica escrevendo em um bloco em
frente à casa, provavelmente dizendo que o cliente era difícil
de agradar.

— Você é louco em não gostar deste lugar. — Murmuro,


enquanto visitamos os últimos cômodos.

— Ah, eu adoro. — Pick me corrige. — Só que este não é


o lugar certo.

Não entendo como pode não ser o lugar certo. É


assombroso.

— Daria minha bola esquerda para morar em uma casa


como esta. — Digo, olhando a coroa branca que decora o teto,
mas ainda sentindo o olhar do meu irmão.

— Alguma vez você morou em uma casa de verdade?

Sacudo a cabeça.

— Não. Alguns poucos apartamentos, um trailer, e agora


estou em um porão, abaixo de um depósito de
armazenamento de algum tipo de comércio. Mas uma casa,
nunca.

— Então, por que não compra uma? — Pergunta Pick


em voz baixa, depois de um curto silêncio.

Eu bufo.

— E morar com quem? — Olho para ele e sacudo a


cabeça. — Casas são para famílias.

Quando pena e compaixão aparecem em seus olhos,


percebo que falei demais. Mostrei que eu quero ser como ele.
Deixo a casa sem uma palavra e não paro até que estou
perambulando pelo jardim da frente. Não me sinto bem
demonstrando vulnerabilidade e deixando que outros saibam
o que eu mais quero.

Gostaria de dar um chute ninja e arrancar metade do


letreiro de venda, para afastar a ansiedade e o pânico que
tomam conta de mim, mas me controlo. Pick sai alguns
minutos depois, sacudindo as chaves do carro.

— Pronto para ir?

Concordo, agradecido por ele não tentar entender mais


nada.

No carro, ficamos em silêncio a maior parte do tempo.


Enquanto nos leva de volta ao Forbidden e a minha moto,
Pick procura uma música no rádio, mas não consegue
encontrar nada decente.

— Teve sorte em encontrar um novo baterista para sua


banda? — Pergunta, depois de suspirar.

— Não.

É tudo que posso responder. Continuo olhando pela


janela do carro, pronto para que este pequeno passeio chegue
ao fim. Estou me sentindo na merda porque sei que sou a
razão para o clima estranho e não tenho ideia de como deixá-
lo mais leve. Fico ali sentado, impotente e em silêncio,
fazendo tudo ficar pior. Quando Pick estaciona ao lado da
moto e volta-se para mim, a preocupação em seus olhos faz a
minha vergonha duplicar. Ele não tem razão para preocupar-
se ou sentir como se tivesse feito algo errado.
— Sei que não somos convencionais, Asher, mas Eva, os
meninos e eu... somos sua família agora. E todos os caras do
Forbidden... também. Você não está mais sozinho. —
Merrrrda. Simplesmente não é legal que ele possa me
entender tão bem. — Quando estiver pronto para nos aceitar
e deixar entrar, estaremos ali para você. Apenas lembre-se
disso.

Limpando a garganta, olho para as mãos, tentando não


ficar brega e sentimental. Tenho que limpar a garganta pela
segunda vez.

— Sim. — Murmuro, dando um olhar rápido na direção


dele antes de me virar e abrir a porta. — Obrigado.

Não dou a oportunidade para Pick responder. Saio,


fecho a porta e subo na moto, antes de me envergonhar de
vez fazendo algo embaraçoso como abraçá-lo e dizer que era o
melhor irmão que um cara poderia ter, que já o amava, ou
qualquer merda assim.

Mas me seguro e saio com a moto rugindo pela rua, o


vento afastando a umidade dos meus olhos. Não sei bem
como lidar com isso... se eu tenho uma família, não preciso
me sentir sozinho...

Então, por que este medo de aceitá-los?


REMY
Eu deveria saber quando recrutei Jodi para este
trabalho, que sairia perfeito.

Ela é assim.

E oh... Com certeza ficou perfeito. Fazer o molde de


argila foi trabalhoso. Para ela. Tudo o que eu que fiz foi ficar
quieta enquanto enchia minha cara de sujeira. Rapidamente
o molde estava pronto. O primeiro era uma réplica exata do
meu rosto, o segundo era o modificado, uma versão
masculina minha. Depois disso, foi fácil. Para mim, porque
foi aí que começou o verdadeiro trabalho para Jodi. Para que
a máscara funcionasse corretamente precisava ser a
representação exata do rosto que queríamos fazer. Cada falha
no molde aparecia no resultado.

Fico sentada observando com assombro enquanto ela se


inclina sobre o molde, removendo partes e lixando até a
perfeição.

— Que idade você quer aparentar? — Pergunta,


franzindo o cenho, concentrada. — Um montão de rugas ou
uma cara de bebê?

— Uh... a minha? — Respondo, em dúvida. — Talvez um


ano ou dois anos a mais.
— Início dos vinte. Entendi.

Ver o látex tomar forma é muito legal.

Jodi move o molde constantemente, o líquido


preenchendo cada dobra.

— Parece que estou vendo um programa de cozinha. —


Digo, enquanto como pipoca.

A uma da manhã o molde de argila secou o suficiente


para ser manipulado, então Jodi empurra o recipiente cheio
de látex líquido me fazendo estremecer.

— Mas não quero comer essa porcaria. Cheira como o


inferno.

— Oh, não fale de comida agora, vaca. Estou morrendo


de fome.

As mãos dela estão cobertas com uma espécie de


mistura líquida para trabalhar o molde. Eu definitivamente
não quero saber os ingredientes que vão ali.

— Bom, então abra a boca doçura, vou alimentá-la.

Eu pego as pipocas e Jodi obedientemente abre a boca.


Em nossas três primeiras tentativas, ela teve o nariz atingido,
a bochecha e finalmente o queixo. É quando me dou por
vencida e levanto da cômoda cadeira em que estou sentada e
coloco as pipocas diretamente em sua boca. Jodi reclama que
está com sede, então eu pego uma lata de refrigerante na
geladeira, um canudo e seguro para ela beber.

— Mmm, puta, você está me tratando bem. — Diz ela,


com um sorriso e uma piscadinha sexy.
É muito tarde para retornar a brincadeira, por isso só
dou um grunhido e me atiro novamente na cadeira, tentando
permanecer acordada com ela, enquanto leio posts divertidos
no Facebook do celular. Às três e meia da manhã, quando
estou começando a cochilar, o alarme soa nos informando
que o látex está seco. Jodi dá um pulo da cama onde estava
descansando e aterrissa de quatro no chão.

— Merda. — Murmura, sentando, esfregando os olhos e


deixando escapar um bocejo enorme. — É hora de realmente
criar seu novo rosto. Levante, mulher.

Ela me dá uma palmada na bunda ao passar e eu não


reclamo, afinal está fazendo tudo por mim. Simplesmente
bocejo e saio da cadeira em que estive encolhida. E, apesar de
estar só meio acordada durante o resto do processo, fico
observando com receio a criatividade de Jodi. Ela havia dado
ao meu eu masculino um queixo quadrado e uma testa com
rugas. Mas foi seu talento com o cabelo que me deixou
alucinada. Depois de encontrar uma peruca escura,
costurou-a a mão na máscara, deu um corte na frente,
costeletas leves e uma barba de um dia.

— Nossa! — Murmuro assombrada, enquanto Jodi


prende a segunda sobrancelha. — Isso parece.... Oh.

— Pensei em colocar um pouco de barba para cobrir a


maior parte do queixo, assim vai ser mais difícil saber que
está usando uma máscara.

Eu me limito a balançar a cabeça, incapaz de dizer


qualquer coisa, embora, sério, não acredito que alguém
adivinhe que é látex depois da forma precisa como Jodi
pintou e aplicou maquiagem.

— Jesus, é incrível.

Sabendo que é a melhor, minha amiga sorri, segurando


o produto final.

— Eu sei. — Ela faz um gesto para que eu me aproxime.


— Agora, bem, isto pode ser um pouco estranho. Tentei
deixar o mais cômodo possível, configurando a parte interior
para que se adapte ao formato do seu rosto, mas também vai
ficar mais quente dessa maneira.

— Então, graças a Deus que estamos no norte de Illinois


em novembro. — Brinco.

Abaixo a cabeça já coberta com uma rede de nylon para


prender meu cabelo natural e a máscara se desloca
suavemente. O látex ajusta-se e puxa a minha pele, mas Jodi
continua trabalhando nele, decidida a colocá-lo no lugar. E,
finalmente, consegue.

Eu abro os olhos, pisco algumas vezes e olho através de


um mini túnel.

— Oh, faz meus olhos parecerem mais profundos.

Jodi concorda com um sorriso de aprovação.

— Muito mais masculino. Sempre preferi isso nos


homens. Na realidade... você está um pouco sexy como
menino. — Para provar o que está dizendo ela mexe as
sobrancelhas e me dá uma piscadinha. — Lamentavelmente,
meninas não são a sua praia, eu me transformaria em bi por
você.

Reviro os olhos e volto a estudar meu rosto no espelho.

— Oh. — Digo de novo. Estou totalmente diferente de


mim. Minha testa está pronunciada, o nariz mais largo e o
queixo quadrado. Até mesmo minha boca foi apertada para
parecer mais larga e reta. Mexo o queixo algumas vezes e a
máscara não sai do lugar. — Isto é incrivelmente louco.
Parece tão real.

— Sim. Agora, vamos trabalhar com o resto do seu


corpo.

Jodi parece muito ansiosa e cheia de energia às dez da


manhã, depois de ter ficado acordada a noite toda. Eu me
volto para o espelho e levanto minhas falsas, densas e
escuras sobrancelhas.

— O resto do meu corpo?

— Bom, sim, puta. Se vamos fazer isso, vamos fazer


bem. Pode ser que você não tenha o tamanho DD, como eu,
mas isso... — Aponta para os meus seios. — É claramente
um peito feminino.

Com o cenho franzido, dou uma olhada na parte da


frente da minha camiseta.

— Não podemos colocar uma faixa elástica ou algo


parecido para escondê-los?

Ela bufa.
— Só se quiser disfarçá-los mais ou menos. E, depois de
todo o trabalho que tive com sua máscara, você não está
autorizada a ter mais ou menos no resto.

— Certo. Mas o que você está pensando exatamente?

Um grande sorriso se estende pelo seu rosto.

— Isto. — Anuncia ela, enquanto tira o que parece ser


um colete do seu armário. — É para atores masculinos, para
fazer com que seus peitos pareçam mais largos. Podemos
usá-lo em você, cortando dois buracos no interior para
acomodar seus seios.

Solto uma gargalhada.

— Oh meu Deus. Você tem algumas merdas muito


estranhas no seu armário.

Jodi encolhe os ombros.

— Não tão estranhas quanto ter argila e látex de


máscara à mão.

— Ponto para você.

Então, ela faz um peito masculino. E vai ainda mais


longe, costurando um tecido enrolado para me dar um
“pacote”.

— Para que diabos vou precisar de um “pacote”? —


Argumento. — Ninguém vai olhar para o meio das minhas
pernas.

— Nunca se sabe, talvez olhem. Fiz você parecer


bastante sexy como um menino e tenho certeza que alguma
garota na rua vai olhar com interesse.
— Honestamente, não me importa nem um pouco se
alguma garota me achar desprovido aí em baixo.

— Bom, eu me importo. E estou tomando conta do seu


lado masculino, por isso você vai usar.

— Oh, Jesus. — Suspiro.

Mas obedeço.

— Graças a Deus é quase inverno. — Acrescenta Jodi.


— Você pode usar jeans e camisetas largas e ninguém vai
achar estranho. — Ela revira minhas gavetas murmurando
algo a respeito de como é deprimente que eu tenha tantas
roupas que poderiam ser consideras masculinas.

— Aqui. — Diz finalmente, empurrando uma roupa em


minha direção. — Ponha está.

Depois de colocar minha roupa íntima de “homem”, visto


a calça jeans e uma camiseta preta do AC/DC sobre uma
branca térmica de mangas largas. Quando me viro, Jodi está
radiante, com um enorme sorriso no rosto. Então, ela pega o
que chama de “joias masculinas”, que se resumem a várias
pulseiras de couro preto com contas de prata, como
braceletes, e coloca nos meus pulsos. Por último borrifa uma
colônia em minha direção.

— Que merda? — Digo, tossindo e balançando as mãos


na frente do rosto.

— Tem que cheirar com o que se parece. — Jodi


argumenta, aproximando a colônia do peito com orgulho. —
Está simplesmente perfeito. Jogaria você nessa cama se não
soubesse que é uma garota. Droga, estou tentada mesmo
sabendo disso.

Olho para ela com indiferença, mas não me seguro e


sorrio.

— Gracias. Eu acho.

— Agora, vamos treinar seu andar masculino. — Exige,


balançando as mãos.

Isto me faz vacilar.

— O quê?

Jodi suspira.

— Você não vai se fazer passar por um garoto


caminhando por aí com os quadris balançando e empurrando
os seios.

Fico de boca aberta.

— Como? Eu não ando assim.

— Oh... caminha sim, puta. Embora seja um pedaço


sexy de homem, não pode evitar arrogância feminina. — Diz
ela, bufando.

— Mas eu não...

— Encurve os ombros um pouco mais, concentre-se em


manter os quadris alinhados e trate de fazer seu “pacote”
aparecer, como se fosse o máximo.

— Fazer... o quê?

— Assim é que os meninos sexys caminham, como se


estivessem lutando com seu lixo.
Eu só consigo balançar a cabeça com espanto.
Sinceramente, nunca vi um menino andar como se estivesse
tentando colocar seu pau à frente.

— De onde você tira essa merda?

— Apenas faça, puta.

Suspirando, sigo suas sugestões, tentando esconder o


rebolado e com a pau para frente, para imitar um menino.

— O que acha?

Ela geme e arranha o ar.

— Como se diz “Quero sentar na sua cara” em


espanhol?

— Jodi... — Digo, suspirando com exasperação. Ela às


vezes exagera. — Sério?

— Não, sério. Sempre quis saber como dizer isso a um


garoto. Oh e faz a voz de “señorita sensual”.

Não consigo segurar o sorriso.

— Quiero sentarme en tu cara. — Murmuro com voz


rouca, fazendo um biquinho.

Desde a vez que eu disse seu nome em espanhol, pondo


um pouco de sensualidade no tom, ela ficou totalmente
fascinada e intrigada. Até mesmo apelidou minha voz de
“señorita sensual”, embora afirmasse que não tinha nada a
ver comigo.

Faço-a repetir a frase várias vezes até que finalmente ela


consegue o tom certo. Quando fico satisfeita, ela também fica
e então dá um grito agudo, saltando em círculo e levantando
os punhos no ar.

— Você vai arrebentar no teste. Tenho certeza, puta.

Deixo a confiança dela me consumir, enquanto observo


meu disfarce.

— Sim. — Murmuro.

A esperança me inunda, realmente vou abalar no teste.


Tenho que fazer isso. Minha autoestima está em jogo.
REMY
Quase não chego a tempo.

Aproximadamente uma da tarde entro no estúdio,


torcendo para que os testes não tivessem terminado e sinto-
me aliviada ao ver seis meninos esperando na mesma sala
onde fiquei durante horas no dia anterior.

Todos estreitam os olhos. Não é nem perto da recepção


que recebi de meus companheiros bateristas ontem, porque
hoje eles viram um garoto. Viram competência.

Porcos chauvinistas.

— O teste para a NonCastrato é aqui? — Pergunto.

Apenas um cara é suficientemente amável para assentir,


mas isso é tudo. Os outros me ignoram.

Só duas pessoas aparecem depois de mim e como este é


o último dia estou entre os três últimos. Por alguma razão,
parece um mau presságio. Mas me mantenho firme, já fui
muito longe para largar tudo agora. Desta vez, merda, vou
tocar antes que eles falem qualquer coisa.

Idiotas.

Uma hora depois chega a minha vez. Quando entro não


estou nem um pouco nervosa. Talvez, por estar escondida
atrás da máscara, talvez porque eles já haviam me recusado e
as coisas só poderiam melhorar depois disso. Ou talvez
porque me sinto confiante. Não tenho ideia do porquê, tudo
só parece... certo desta vez. Muito mais certo que da última.
O lugar é exatamente o mesmo e os meninos continuam nos
mesmos lugares que estavam no dia anterior.

Mas hoje, Galloway me ignora. Parece estar de mau


humor e fica apenas brincando com o baixo. Hart assume e
me cumprimenta com a cabeça.

— Hey cara. Como é o seu nome?

Ponto para mim! Já consegui ir mais longe neste teste


do que no anterior. O disfarce de homem obviamente está
funcionando, ele me chamou de cara!

Limpo a garganta e respondo com o tom mais baixo


possível, embora minha voz já seja bastante grave para uma
mulher.

— Sticks.

— Sticks? — Bufa Galloway, finalmente olhando para


cima. — Oh... que original.

Ainda ofendida pela forma como ele me tratou ontem,


fico tentada a enfiar as baquetas no seu rabo. Mas não quero
causar um dano permanente aos meus bebês, mesmo não
sendo o meu par cor de rosa. Consigo me conter o suficiente
para simplesmente dar um olhar aborrecido.

— Tão original quanto um baixista babaca.

Holden deixa escapar uma gargalhada e recebe um olhar


furioso de Galloway.
— Você foi queimado. — Informa Holden a seu
companheiro de banda, sorrindo.

— Que se foda. — Galloway murmura para mim... ou


talvez para Holden, não sei bem. Provavelmente para os dois.

Hart esboça um meio sorriso.

— Bem, você pode rebater a merda do Gall e isso é um


pré-requisito. Vamos ver agora o que pode fazer com suas
baquetas. — Ele aponta para a bateria. — Suponho que você
domine a bateria acústica, certo?

Que idiota não domina a bateria acústica? Arqueio uma


das minhas sobrancelhas falsas. Jodi é o máximo, ela foi
capaz de adaptar a máscara para que eu conseguisse mostrar
expressões faciais, também.

— Só desde que tinha seis anos.

— Você se surpreenderia com quantidade de caras sem


talento que passou por aqui nestes últimos dias. — Diz Hart,
com um estremecimento de horror.

Balanço a cabeça demonstrando compreensão.

— Bem, posso tocar qualquer bateria que estiver a


minha frente.

Ele sorri e, maldição... esse sorriso... acho que não


deveria olhar enquanto está sorrindo. Muito perigoso.

— Bom. — Responde Hart, deixando-me emocionada. —


Quero testar um ritmo de fundo lento com uma rajada rápida
durante o coro, continuando com o dobro de tempo para
terminar.
Balanço as baquetas que peguei no bolso traseiro,
concordando.

— Vou fazer o que me diz, drill sargeant13.

Ele sorri novamente.

— Forrest Gump. Divertido. Nesse caso, vamos tocar


“Corra, papai, corra”. Você conhece esta?

Se eu conheço?

— Pfff! — Preciso me conter para não revirar os olhos. —


Conheço todas as músicas que vocês fizeram.

Hart parece feliz.

— Está bem então. — Diz, fazendo um gesto para o


tamborete. — Mostre-nos.

Depois de sentar, respiro fundo, levanto as mãos em


posição e começo com o prato, ajustando o tempo. Quando
acrescento os tambores, o baixo e as guitarras se unem a
mim, completamente em sintonia com o ritmo que impus.
Começo a sorrir, o alívio voando como um balão através do
meu corpo, até que estou engolindo a emoção. E embora eu
possa fracassar totalmente no final do teste, estou aqui,
agora, vivendo o meu sonho. Estou tocando com a
NonCastrato. Por um momento, esqueço o quanto eles são
idiotas e que deveria odiá-los, porque meu estado é de euforia
pura. Preciso obrigar meus pulmões a funcionarem... inspira,
expira...

Sargento instrutor. No original a personagem faz referência a uma frase do filme Forrest
13

Gump.
Quando Hart inclina-se para o microfone e começa a
cantar, a adrenalina em meu corpo aumenta
exponencialmente. Tem uma coisa no seu jeito de cantar que
sempre faz minhas calcinhas ficarem molhadas. Sim, sei que
parece errado molhar minhas “calcinhas masculinas” com
entusiasmo juvenil, mas é o que acontece.

A música me inspira, flui através do meu sangue. Eu me


transformo nela.

Quando Hart faz a passagem para outra parte da


música, eu mudo o tom da percussão, dando à canção um
toque extra de sonoridade. O baterista anterior não fazia isso,
mas sempre achei que ficaria melhor assim, então aproveito a
oportunidade. Afinal, o que poderiam fazer, me chamar de
idiota de novo? Vou tocar como eu quero.

O anel abafador da bateria não está funcionando bem


neste ambiente, então pego um lenço do bolso para reduzir o
som. Sem perder o ritmo coloco-o sobre o joelho, próximo ao
tambor para amortecer a reverberação. Dou um sorriso
quando minha técnica imediatamente funciona. Balançando
a cabeça acelero o ritmo, conforme Hart me pediu, e sua voz
em um crescendo vai ficando mais forte. No final da música
acrescento uma batida no prato e no tambor grande, embora
isto não esteja no original. Os outros param de tocar e eu
termino.

O eco das guitarras, bateria e da voz de Hart continua


ressoando no ambiente, enchendo-o com um peso que me faz
morder o lábio e prender a respiração. Os três caras se viram
para me olhar.

— Você trouxe o hi-hat14 no meio do segundo verso. —


Diz Hart finalmente. Seu olhar não é exatamente acusatório,
mas também não é tranquilizador.

Merda. Talvez eu não devesse ter me deixado levar tanto


e acrescentado um toque pessoal tão cedo, mas senti que
naquele momento era o certo.

Faço um gesto lento.

— Uh, sim. Pareceu-me... adequado.

Ficando cada vez mais nervosa pego o lenço do joelho


para limpar a testa úmida, e então lembro que o suor não
está exposto na minha pele.

— E o prato crash15 no final. — Acrescenta Holden. —


Isso é novidade.

— Bom... — Limpo a garganta. — Sabe... pensei... por


que não?

— Por que não? — Galloway repete com voz apagada,


sacudindo a cabeça e olhando para Hart e Holden. De
repente, ele me dá um susto. — Porra, sim! Por que, porra,
não?! Cristo, isso foi uma porra de incrível.

Holden assente, concordando com Galloway e eu quase


faço xixi nas calcinhas.

— De verdade? Gostaram?

14
Chimbal no Brasil. Basicamente, consiste em dois pratos montados em um pedestal,
equipado com dispositivo de pedal.
15
Prato de ataque, usado para acentuações de início e fim de compassos.
É obvio que gostaram. Eu tinha chutado totalmente a
bunda deles. Mas ouvi-los admitir em voz alta... menino, que
prazer me deu.

— Eu adorei. — Diz Holden. Seu sorriso era ridículo,


mas orgulhoso.

— Eu achei que nunca iríamos encontrar alguém com a


metade do talento do Rock, mas, merda, acho que você tem o
dobro. — Solta Galloway.

— Você tem ouvido para esta merda, Sticks. Uma porra


de um ouvido brilhante.

Graças a Deus, estou com a máscara, porque meu


verdadeiro rosto deve estar vermelho como um tomate neste
momento.

Feliz que posso dar um olhar frio e sereno, levanto as


sobrancelhas para Asher Hart, que ainda não havia falado
nada. Ele entrecerra os olhos, como se não confiasse no meu
talento e essa música tivesse sido um golpe de sorte.

— Vamos tentar com “Suor”. Quero ver como você toca


essa.

Por dois dias eu me sentei na sala ao lado e ouvi os


bateristas que tocavam com eles e nenhum executou mais de
uma música.

Isto significa alguma coisa. Alguma coisa boa.


Emocionada e um pouco enjoada concordo, limpando as
palmas das mãos suadas nas coxas.

— Sem problema.
“Suor” é uma das músicas mais forte deles, com alguns
movimentos de bateria bastante complicados. Mas nada que
eu não pudesse administrar.

Pronta para mostrar minhas habilidades, começo


imediatamente. E toco tão bem que surpreendo a mim
mesma. Quando a última batida do prato ressoa no ar,
Holden e Galloway uivam e gritam, enquanto Hart volta-se
devagar para me olhar fixamente.

Fico me retorcendo sob a sua inspeção. Sei que Jodi fez


um maldito de um bom trabalho me transformando em um
garoto, mas e se Hart conseguisse ver através da máscara? E
se ele realmente soubesse quem eu sou?

— “StoneHearted”16. — Diz, que é mais ou menos a sua


canção assinatura.

Sorrio e começo a contagem. Depois que terminamos


essa, imediatamente dou a entrada de percussão para
“Tetos”, uma música nova e minha favorita deles.

Hart olha na minha direção e eu me pergunto se ficou


zangado por ter iniciado uma nova canção sem que ele
pedisse, mas então um pequeno sorriso impressionado cruza
seus lábios e ele entra com a guitarra no tempo certo. Os
outros nos seguem e juntos tocamos uma quarta canção. Eu
estou pronta para mais uma quando Asher levanta a mão
depois de cantar a última estrofe, detendo-me.

Coloco as mãos nos joelhos e contenho a respiração,


enquanto ele me estuda por um segundo e balança a cabeça.

16
Coração de pedra, em português.
— Você pode tocar esta sexta-feira?

— Sexta-feira? — Repito, estupidamente. — É quando


vocês têm apresentação?

Hart assente.

— Sim, é o dia da nossa próxima apresentação. Você vai


estar disponível?

Merda.

— Espere. Está dizendo que estou dentro? Estou na


banda?

Eles fizeram testes durante três dias. Como podem


simplesmente contratar um de nós de uma hora para outra?
Ninguém pode ser suficientemente bom para ser contratado
depois de tocar quatro canções. Pode?

Hart levanta as sobrancelhas.

— Claro... Se você estiver interessado em se unir a


NonCastrato.

Seus olhos verdes são hipnotizantes e os cílios escuros


os emoldurando deixam-nos ainda mais persuasivos. Não
parece justo que um homem tenha olhos tão lindos, um rosto
tão maravilhoso e um corpo magnífico. Quero colocá-lo em
um selo e escrever uma carta a todos que conheço só pela
oportunidade de lambê-lo.

Ainda fazem selos? Deveriam. Selos lambíveis de Asher


Hart.

Pisco, tentando limpar meu cérebro confuso da luxúria e


só então o que ele acaba de dizer faz sentido. Eu me sinto
tonta. Merda, eles realmente querem me contratar depois de
quatro músicas. Estou na banda.

— Porra, sim, claro que sim! — Explodo.

Mas logo que estas palavras cruzam meus lábios, a


realidade se impõe. Droga, o que eu tinha acabado de fazer?
Este é o momento que eu deveria tirar a máscara e mandar
todos se foderem.

Mas as palavras não vieram. Tirar a máscara não


aconteceu, porque eu quero tocar nesse concerto mais do que
quero minha próxima respiração.

Quem liga se estou programada para trabalhar no


Castañeda’s? Carmen me deve uma. Qual o problema se eu
disse uma pequena mentira piedosa e os deixei acreditar que
era um cara? Meu gênero não tem relação alguma com o meu
jeito de tocar.

Só sei de uma coisa: não vou desistir da minha primeira


apresentação como baterista em uma banda.

Vou ter que ser um homem por um pouco mais de


tempo.

Ainda posso tirar a máscara depois de sexta-feira e fazer


com que todos se sintam estúpidos e sexistas por não terem
me dado uma oportunidade quando eu tinha me apresentado
como garota.

Vou fazer isso. Esperar até depois da apresentação para


deixá-los a par do meu segredo.
ASHER
O mais difícil para uma pessoa distraída é o aspecto
profissional e comercial das coisas.

— Tem certeza que não paguei? — Pergunto, colocando


o celular entre o ouvido e o ombro, ao mesmo tempo que me
ajoelho em frente à porta da garagem do depósito onde a
banda ensaia para abrir o cadeado.

— Estou olhando no sistema o histórico da sua conta


senhor Hart. Não consta qualquer pagamento, ainda.

Intrigado, porque estava certo de que já havia fornecido


a eles as informações do meu cartão de crédito, levanto a
porta de metal e entro na garagem pequena.

— Certo. Então envie outra fatura, vou tomar cuidado


desta vez. — Garanto.

Depois que a mulher confirma o envio, desligo e coloco a


guitarra sobre uma caixa onde está escrito "decorações de
natal". O depósito pertence à família do Heath, mas eles
usam apenas a metade do espaço e não se importam que a
gente coloque todos os materiais perto das paredes para
deixar espaço no centro, onde fica a bateria e o sistema de
som.
Ensaiamos aqui algumas vezes por semana há quase
dois anos, mas hoje vai ser a primeira vez que vamos tocar
com o novo membro da banda. Também é nossa única
oportunidade para nos ajustarmos antes do show, então,
estou um pouco nervoso. Espero que ele seja tão bom quanto
foi nos testes.

Quase agradeço à Shelly, do estúdio, por ter me ligado,


isso acabou me distraindo das preocupações.

Quando vejo uma das minhas caixas, sento na velha


mesinha e a coloco no colo para olhar os papéis que estão ali
e enquanto analiso alguns, alguém bate na porta. Eu levanto
os olhos para encontrar o novo baterista na entrada,
vacilante... com um olhar entre horrorizado e curioso.

— Ei, você veio. Entre. — Digo, fazendo um gesto para


convidá-lo a entrar, antes de continuar repassando os
documentos da caixa. — Os outros dois devem chegar a
qualquer momento.

O cara entra cauteloso, como se temesse que fosse cair


um piano em sua cabeça assim que entrasse.

— Então é aqui que ensaiam, hein? Tive que reler o


endereço que você me deu umas dez vezes. Tinha certeza que
estava enganado quando parei na porra do estacionamento
de um depósito.

— Sim, não é a melhor coisa, mas funciona.

— Se você está dizendo... — Murmura ele em voz baixa.


Com o canto do olho, observo-o ir na direção da bateria
e passar a mão sobre um dos tambores. Ele se senta com
cuidado no banquinho em frente as cinco peças e passa as
mãos nas coxas, olhando tudo ao redor.

Eu me pergunto se ele está nervoso, levanto uma das


folhas da caixa.

— Se precisar, as partituras de todas as nossas músicas


originais estão aqui, caso queira revisar alguma.

Sticks olha rapidamente em minha direção, como se o


tivesse pego de surpresa. Depois encolhe os ombros.

— Está tudo bem. Aprendi de ouvido quando escutei as


gravações.

Concordo, admirado com sua habilidade.

— Bem na hora.

Volto novamente a atenção para a tarefa de encontrar a


fatura que eu tinha certeza que havia pago, quando Heath e
Gally chegam. Gally é tão barulhento e agitado quanto Heath
é tranquilo e suave.

— O que estão fazendo, perdedores? Preparados para


rockear nesta garagem?

Sticks não responde e eu mal dou um distraído “olá”,


uma vez que acabo de encontrar o que estava procurando.

— Porra! Já fiz o pagamento.

— O pagamento do quê? — Pergunta Gally, que está


com Heath conectando os instrumentos ao amplificador.
— Mmmm? — Murmuro, levantando o olhar e sorrindo
triunfante. — Oh, o estúdio de música acaba de ligar dizendo
que eu não tinha pago os três dias que alugamos o local para
os testes. E eu sei que pagamos.

Balanço a fatura que tem um grande selo de “pago” e


tiro o telefone do bolso.

Gally está de boca aberta me olhando.

— Tivemos que pagar por isso?

Enrugo a testa, esperando que ele não estivesse falando


sério, mas quase certo que estava.

— Mmm... Você não acha que ensaiaríamos ali


diariamente se fosse de graça?

— Oh... é, sim, suponho. Nunca tinha pensado nisso. —


Responde, coçando a cabeça. — Não lembro de pagar
qualquer coisa pelo estúdio.

— Isso é porque não pagou. Eu paguei.

— Oh... — Murmura ele e sem me agradecer move a alça


do instrumento sobre o ombro. — Bom, vamos tocar ou não?

Levanto um dedo.

— Ainda não. Tenho que telefonar e resolver isso. —


Enquanto eu faço a ligação, Gally suspira e revira os olhos. —
Vai levar só um minuto.

A senhora com quem eu havia falado anteriormente


atende e dou o número do recibo e a data. Depois de uma
pausa ela concorda. Oh sim, ela encontrou o meu pagamento.
Sim... imagine. No momento que termino todo mundo já
está em seu lugar e me olhando ansiosos.

— Sinto muito. — Digo, colocando o telefone no bolso.

Gally quer saber se eu finalmente estou preparado.


Sticks e Heath continuam em silêncio, mas suas expressões
não demonstram aborrecimento pelo atraso.

Parece que o novo baterista vai ser tão tranquilo quanto


o nosso guitarrista principal.

— O que querem tocar primeiro, meninos? — Pergunto,


ao mesmo tempo que preparo o violão.

Sticks é o primeiro a responder.

— Ceilings17.

Lanço um olhar surpreso para ele. Não esperava que


falasse, mas fiquei feliz que o fizesse.

— Muito bem.

Apondo um dedo e peço que faça a contagem regressiva,


já que o ritmo da bateria começa esta canção. Ele inicia
imediatamente e eu fico assombrado, outra vez, em ver como
ele é bom.

Quase perco a entrada para começar a cantar, mas


assim que me concentro fico inundado pela música. Somos
bons juntos, melhor do que quando Rock era o baterista.
Sticks de alguma forma consegue nos manter em sintonia
com o ritmo que ele determina.

Tetos.
17
Repassamos a maioria das músicas originais e também
as versões mais populares que estamos acostumados a tocar
e cada uma parece melhor que a anterior.

Estou tão absorvido que não percebo quanto tempo


passou, até que Gally pede um descanso. Olho a hora no
telefone e vejo que estou atrasado.

— Merda. Ensaiamos mais de três horas. Tenho que ir


trabalhar.

Enquanto desconecto o violão, olho para o membro mais


recente da banda, que não apenas seguiu nosso ritmo sem
problemas como também nos guiou. Eu estive um pouco
preocupado que ele precisasse ensaiar mais, mas não...
Sticks está pronto para a ação no palco.

— Tudo bem tocar ao vivo amanhã? — Pergunto, para


ter certeza.

A emoção ilumina seus olhos, o que me faz sorrir.


Lembro do dia anterior ao meu primeiro concerto... a
antecipação ansiosa que vibrava através do meu corpo.

Sticks estremece com entusiasmo, mas aparenta calma


ao assentir e responder.

— Claro, apenas me diga onde.

— Já ouviu falar do Forbidden? Tocamos lá quase todas


as sextas-feiras, e estou tentando reservar outros lugares
também.
— Conheço o clube. Fui uma vez para cantar na noite de
karaokê. Vi no site que vocês se apresentam lá, só não me dei
conta que é onde tocam regularmente.

Ótimo.

— Sim...

Olho fixamente para Sticks, porque trabalhei em todas


as noites de karaokê que tivemos e não lembro dele. Estou a
ponto de falar quando Gally bufa.

— Cantou no karaokê? Você não acha chato? Espera...


O que cantou? All About that Bass18?

Sticks inclina-se para trás surpreso, olhando-o


boquiaberto.

— Como?

Furioso, já que ele perguntou isso apenas para me


incomodar, pego uma bola de basquete que está sobre uma
das caixas e jogo na direção dele.

— Cala a boca, filho da puta.

Gally ri e se abaixa, a bola bate apenas no seu ombro.


Ele uiva forte quando se esquiva do meu ataque caindo de
joelhos.

Sticks lança um olhar de curiosidade entre nós e Heath


limita-se a silenciosamente sacudir a cabeça.

— Certo, isso é um tipo de brincadeira interna, não é? —


Pergunta Sticks.

Sucesso de Meghan Trainor.


18
Eu suspiro.

— Não é nada. Apenas ignore.

— Posso fazer isso. Perfeitamente.

E falou tão alegre que Gally parou de rir e olhou com o


cenho franzido.

— É melhor conhecer seu lugar, novato.

— É? E onde é esse lugar? Sentado aqui, rindo de você?

Estou sorrindo quando guardo o violão, ouvindo os dois


discutirem. Então tiro a camiseta para trocá-la pela camiseta
preta do Forbidden e guardo a que estava usando em um
bolso lateral da capa do violão, antes de colocar a alça pelo
pescoço e firmá-lo às minhas costas.

Enquanto isso, Gally está se vangloriando para Sticks,


dizendo que é o melhor e que dormiu com mais mulheres que
ele.

— Vamos. — Desafia — só me dê um número


aproximado. Com quantas cadelas você fodeu?

Eu suspiro e estou pronto para ir embora e deixar de


lado esta conversa idiota quando Heath, finalmente, decide
falar.

— Você está perdendo tempo com essa linha de


perguntas.

— Hein? — Gally lança um olhar curioso. — Por quê?


— Porque, obviamente, Sticks joga em outro time. Nosso
amigo acaba de “secar” o peito do Hart, quando ele tirou a
camiseta.

— O que você está dizendo? — Grita Gally, dando um


salto de trinta centímetros para afastar-se de Sticks.

Eu me viro e olho boquiaberto para o nosso novo


baterista, que parece bastante surpreso por entrar na
conversa desse jeito.

Sticks se encolhe no tamborete, com os olhos se


movendo rapidamente, como um animal encurralado antes
do ataque.

— Porra! Eu não fiz isso. — Grita ele.

Levanto as sobrancelhas. Parece muito culpado para


estar dizendo a verdade.

— Você realmente é gay? — Não consigo evitar a


pergunta. — Porque isso seria genial.

— O que você está dizendo? — Repete Gally, virando-se


para mim e me olhando como se eu tivesse enlouquecido.

— O quê? — Olho para Gally e Heath, confuso com a


comoção. — Isso nos daria mais diversidade, já que fomos
acusados de ser um clichê.

E, sim, a acusação daquela garota ainda me incomoda.

— Diversidade? — Diz Gally aos gritos. — Merda, se


quiséssemos diversidade simplesmente poderíamos ter
contratado a garota punk que queria tocar conosco.
Não consigo evitar franzir o cenho quando ele fala da
menina.

— Que garota? — Pergunta Sticks, de repente muito


curioso.

Ignorando-o, olho para Gally.

— Foi você quem se negou a escutá-la.

— Como se você quisesse uma garota na banda... —


Rebate ele, encarando-me.

Encolho os ombros desdenhosamente.

— Nunca se sabe... poderia ter sido uma boa ideia. Mas


um de nós, ou seja, você, provavelmente ia transar com ela e
a mandaria embora dentro de uma semana. Então,
estaríamos no mesmo ponto, em busca de outro baterista
mais uma vez.

Sticks abre a boca para dizer algo e eu levanto uma mão


para detê-lo.

— De qualquer maneira não importa mais. Agora temos


o Sticks. — Sorrio amigavelmente para ele.

Problema resolvido, embora não de um jeito lisonjeiro.

Sticks levanta uma sobrancelha em censura.

— Então... nem sequer permitiram que ela fizesse um


teste, só porque era uma garota?

Suspiro e aponto significativamente na direção de Gally,


jogando a culpa nele.

— Ele não quis. Não eu.


Gally franze o cenho para Sticks.

— Oh, cala a boca, estranho. Nada de perguntas.

Eu estou a ponto de gritar por ele ser tão ofensivo, mas


Sticks devolve o olhar carrancudo.

— Eu não disse que era gay.

Gally levanta as mãos.

— Bom, prefere um pau a uma boceta ou não?

Sticks faz uma careta de dor e olha para baixo.

— Sim, suponho que sim.

Odiando o modo como Gally faz o novo membro do


nosso grupo se sentir envergonhado, dou um tapa forte no
peito dele e me viro para Sticks.

— Ignore-o, como nós fazemos. Ele nunca encontrou o


mágico para ganhar um cérebro.

Enquanto Sticks me dá um pequeno sorriso de


agradecimento, Gally enruga a testa, confuso.

— Quê? — Murmura ele

— Não importa. — Não tenho tempo para explicar o


“Mágico de Oz”. — Tenho que ir. Vejo-os amanhã no
Forbidden, caras.

Olho de maneira significativa em direção a Sticks para


me assegurar de que Gally não o assustou. Quando ele
balança a cabeça concordando, o alívio brota em meu peito.

A banda estava de volta. Graças a Deus.


ASHER
Estaciono dez minutos antes de abrirmos o clube e no
momento que entro fico surpreso ao ver que não sou o último
a chegar.

Todos, exceto Mason, estão ali, fazendo alguma coisa. É


quinta-feira, noite das garotas e com exceção do porteiro e
dos cozinheiros ao fundo, apenas os bartenders trabalham,
recebendo os pedidos e atendendo aos clientes.

Knox e Noel estão organizando o bar enquanto Ten e


Quinn tiram as cadeiras de cima das mesas.

— Estava na hora de você aparecer, rock star. — Grita


Ten.

— Oh, ei Ten. — Grito de volta, levantando o braço e


apontando para ele. — Antes que eu me esqueça, você
poderia dizer a Caroline que ela deixou uma das suas
camisetas no meu apartamento semana passada? — Quando
ele olha para mim com os olhos entrecerrados por eu estar
fazendo uma brincadeira com a sua esposa, começo a sorrir.
— É aquela branca apertada com a boca vermelha na frente.
Você sabe de qual estou falando, certo?

— Idiota, vou cortar você em pedacinhos.


Ninguém é mais divertido com raiva do que Oren
Tenning, então eu o provoco sempre que tenho chance. E o
que é melhor, ele tem uma resposta para tudo. No momento
certo, seu olhar franzido se transforma em um sorriso.

— Além disso, — Continua. — Tirei essa camiseta na


noite passada, então sei que você está mentindo.

Ele sai assobiando baixinho e afastando uma mesa que


está na sua frente.

Rindo, eu me viro para o bar onde Knox está


substituindo um barril. Eu adoro trabalhar com esses caras.

— Olá, irmão. — Digo a Knox com um aceno de cabeça.


— Como está Felicity? Entediada de você o suficiente para
que eu possa ficar com ela agora?

Olhos castanhos se levantam para me dar um olhar de


morte.

— Não, só vou cortá-lo em pedaços. — Responde ele,


com uma voz que quase me faz mijar nas calças, porque sei
que ele não está falando só por falar, ele quer mesmo dizer
isso.

Sim, Knox não é tão divertido com raiva. Mas em todo


caso ainda gosto dele, porque é um cara ótimo para se ter ao
lado quando você precisa de ajuda.

Eu limpo a garganta e dou um sorriso tenso, escapando


rapidamente para onde Ten está preparando a área dos
clientes. No entanto, assim que tiro a cadeira de cima da
mesa, Harper deixa três pessoas entrarem no clube.
Somente os VIPs, isto é, pessoas próximas aos
bartenders, são autorizados a entrar antes da abertura e
depois do fechamento, de acordo com as novas regras, então
eu olho para lá, curioso para ver quem veio nos visitar.

Com certeza é alguém de quem eu gosto, já que todos os


meus amigos encontraram as mulheres mais legais para se
apaixonar. Idiotas sortudos.

A bela morena que lidera o trio vai direto para o bar. Ela
está furiosa.

O primeiro garoto que a segue está com a cabeça


inclinada, envergonhado, enquanto o mais novo se aproxima
com uma expressão espantada.

Aspen Gamble para no outro lado do balcão em frente


ao seu marido, onde ele está contando os tickets antes de
colocá-los no caixa.

— Seu irmão. — Rosna ela, fazendo com que Noel


levante a cabeça. — Está tão profundamente encrencado...
não posso lidar com ele agora.

Instantaneamente Noel franze o cenho para o menino


mais velho, que está sentado em um banquinho com o olhar
sombrio, os cotovelos no balcão e o queixo nas mãos.

— Brandt, — Grunhe Noel. — Que diabos você fez?

Brandt abre a boca para responder, mas Aspen


responde antes dele.

— Ele brigou na escola. Na escola! Na escola onde eu


trabalho por apenas quatro meses. Foi tão humilhante... fui
chamada na sala do diretor. Oh, Deus, Noel. Nunca na minha
vida eu tive problemas com um diretor.

— Não era você que estava com problemas. —


Argumenta Brandt. — Eu estava.

— Mas eu tenho a sua custódia, o que me coloca na


mesma posição que você. Realmente não consigo acreditar no
que fez. Você quebrou o nariz daquele menino!

— Eu o destruí completamente. — Concorda Brandt


com um sorriso arrogante, antes que o olhar fulminante de
Aspen e Noel o obriguem a baixar a cabeça, envergonhado.

— O que ele fez para você que resultou nisso? —


Pergunta Noel, desconcertado.

— Ah, essa é a melhor parte. — Bufa Aspen, ainda


olhando para o cunhado. — Ele se recusa a divulgar essa
pequena informação. Então, eu não tenho ideia do porquê ele
se aproximou de um menino que simplesmente tentava
chegar ao seu armário entre as aulas e bateu nele “até a
morte”. Inclusive ouvi dizer que o deixou inconsciente por
alguns segundos. Mas tudo que Brandt diz sobre o assunto
é....

Ela olha para Brandt com as sobrancelhas levantadas e


ele suspira antes de relutantemente responder.

— O idiota mereceu.

— Ele disse esse verbatim para o diretor — reclama


Aspen.
Decido me sentar no banquinho do outro lado de Colton,
o irmão mais novo, que está olhando as garrafas alinhadas
na parede em frente a ele com os olhos arregalados. Ao ouvir
as palavras de Aspen, olha para mim.

— O que significa verbatim?

— Significa palavra por palavra. — Murmuro.

Ele balança a cabeça enquanto Noel suspira e esfrega o


rosto antes de dar a Brandt um olhar seco.

— O idiota mereceu? — Repete Noel.

— Claro que sim! — Grita Brandt.

— Então, é assim que o bar de Noel é por dentro? —


Pergunta Colton.

Não o corrijo dizendo que tecnicamente é o bar de Pick.


Como este é o local onde seu irmão mais velho trabalha,
provavelmente na sua cabeça é o bar do Noel.

— Sim. Muito legal, não é?

Ele encolhe os ombros.

— Não é ruim.

Então, ele bate na bancada para chamar a atenção de


Knox.

— Ei, barman. Gostaria de uma cerveja.

Knox o encara, confuso.

— Quantos anos você tem?

— Onze — Responde Colton, orgulhosamente.


— Sei... — Knox balança a cabeça lentamente. — Uma
limonada rosa é tudo o que vou servir a você.

Colton suspira derrotado.

— Ok — Grunhe.

— Por que você não pode confiar em mim? — Continua


Brandt. — Não ataquei um menino inocente e desprevenido.
O imbecil mereceu.

Enquanto Aspen e Noel o repreendem, dizendo para


tomar cuidado com o vocabulário, Ten dá um tapinha nas
costas dele, amigavelmente.

— Hey, irmão, eu acredito em você.

Noel faz uma careta para ele.

— Não se intrometa.

— Uh, perdão? Ele é meu cunhado, eu tenho o mesmo


direito que Shakespeare aqui — Argumenta Ten, apontando
para Aspen.

— Mas Aspen e eu temos custódia. Você não. Cuide do


que é seu.

— Não entendo por que você está sendo tão duro com
ele. Desde que foi morar com você, Brandt não teve nenhum
problema. Porra, ele tem sido ótimo.

— Obrigado. — Diz Brandt a Ten.

Knox coloca a bebida de Colton no balcão e o menino


toma um grande gole, suspirando de satisfação.
— Legal. — Agradece ele, olhando para Knox por um
segundo antes de levantar o queixo. — Ei, é você que namora
a Felicity?

Knox para e o olha com curiosidade.

— Sim. Por quê?

— Você a pediu um casamento?

Franzindo o cenho, Knox estreita os olhos.

— Não.

— Bem... — Colton estufa o peito — Ela é a mulher dos


meus sonhos, então... — Ele dá um suspiro sonhador ao
pensar em Felicity Bainbridge — Se vocês não estiverem
casados quando tiver dezesseis anos, eu vou torná-la minha.
Pensei em avisá-lo, você sabe, de homem para homem.

— Então... você está dizendo que tenho cinco anos para


pedi-la em casamento ou terei competição, é isso
homenzinho?

Colton mal encolhe os ombros e um sorriso apareceu no


rosto de Knox. Ele oferece a mão fechada e os dois batem os
dedos. Do outro lado, Brandt ainda está defendendo seu
ponto.

— Por que vocês se importam tanto com o motivo? O


nariz dele ainda vai estar quebrado e vou continuar suspenso
por uma semana. Nenhuma razão vai mudar as
consequências. Será que podemos deixar este assunto para
lá?
— Eu não entendo por que você simplesmente não nos
diz. — Grita Noel.

Quando vejo Brandt apertar os dentes, frustrado,


deduzo que ele está protegendo alguém.

Trinta segundos depois, descubro quem.

Mason chega tarde, dois minutos antes de abrirmos.


Quando ele vê Brandt vem direto em direção a ele.

— Você... eu tenho que falar com você. Sarah contou a


Reese o que você fez hoje.

Brandt faz uma careta e lentamente vira o tamborete


para encarar o irmão de Sarah.

— Ah é? Merda.

Mason balança a cabeça.

— Reese estava na casa da minha mãe quando Sarah


chegou da escola, visivelmente irritada. Demorou um pouco,
mas Reese conseguiu persuadi-la a contar o que aconteceu.
E... — Ele dá um longo suspiro — Obrigado.

Quando Brandt cora, claramente envergonhado, Noel


abre os braços.

— Obrigado? O quê? Lowe, que diabos ele fez?

Mason precisa de um segundo antes de falar.

— Um imbecil estava mexendo com a Sarah,


debochando da sua cadeira de rodas e inventando apelidos.
Aparentemente, ela passou a hora do almoço inteira
chorando no banheiro. Quando Brandt descobriu, ele
ensinou boas maneiras ao idiota.

Todos nós viramos para Brandt com admiração, o que o


faz afundar cada vez mais em seu banquinho, totalmente
envergonhado.

Aspen cobre o rosto com as duas mãos e solta um


gemido.

— Oh querido, sinto muito, Brandt, mas... — Ela baixa


as mãos e franze a testa. — Por que você não me contou?

— Porque ela estava envergonhada e não queria chamar


mais atenção. — Resmunga ele, olhando para Mason com
uma careta. — Não posso acreditar que ela contou a Reese.
Eu prometi que não falaria sobre isso.

Mason apenas encolhe os ombros.

— Acho que a culpa venceu. Ela não gostou quando


ficou sabendo que você se meteu em uma encrenca por causa
disso.

— Como se eu me importasse com uma suspensão por


esse motivo. Ela não me pediu para fazer nada do que fiz.
Droga, ela nem sabia que eu descobri. Ele mereceu e eu vou
enfrentar qualquer idiota que deboche dos meus amigos.

— Porra, obviamente você vai. — Grita Noel,


concordando. — Esse idiota “valentão”... Amanhã vou falar
com o diretor, ele precisa ser punido da mesma maneira ou
até mais do que você.

— E eu vou junto. — Declara Aspen.


— Oh, eu liguei para ele. — Mason diz, com um sorriso
irritado e tenso. — Ele está muito consciente de que o menino
não é tão inocente e me disse que vai tomar uma atitude.

— Ei, pessoal! — Brandt leva as mãos à cabeça. — Isto é


exatamente o que Sarah não quer. Se este assunto aumentar,
de um momento para outro um milhão de pessoas vai ficar
sabendo. Vão se sentir mal e ficar com pena, ou pior, podem
até mesmo culpá-la. Sarah não quer isso.

Percebendo que já testemunhei o suficiente do drama


familiar, saio do banquinho e passo a mão nas costas de
Colton, enquanto ele continua saboreando sua limonada rosa
e observando o show.

Vou dar uma última olhada na área dos clientes antes


de dizer a Harper que podemos abrir. Quinn, que teve a
mesma idéia, está pegando uma palha perdida do chão. Ele
sorri e balança a cabeça na direção do bar.

— Nunca é uma noite chata por aqui, hein?

Eu dou uma risada.

— Não com todo o drama que conseguimos provocar.

Aponto para Harper avisando-o que não há nenhum


problema e que ele pode liberar os clientes.

Ele assente e meio minuto depois as pessoas começam a


entrar. Eu pego os pedidos da minha primeira mesa da noite
e os levo para Knox, já que Mason e os Gambles continuam
discutindo sobre como resolver o problema dos irmãos mais
novos. Ten para de tentar dar sua opinião e decide ajudar-
nos a servir.

No momento que estou entregando uma bandeja


completa e recebendo o dinheiro meu telefone vibra. Olho
para a tela surpreso ao descobrir que é uma mensagem do
meu novo baterista.

Sticks: Acabo de perceber que não tenho a hora exata ou


o endereço de onde vai ser o show amanhã. Eu só fui ao
Forbidden uma vez e não estava dirigindo, então não tenho
certeza se lembro do percurso.

Eu envio uma mensagem com a hora e o endereço, e


ainda estou com o telefone na mão quando ele vibra
novamente, segundos depois.

Sticks: Obrigado. Meus dois meninos e eu vamos


encontrar com você lá.

Respondo com um “tudo bem” e enquanto estou me


perguntando quem são seus dois meninos, ele envia uma
nova mensagem.

Sticks: E quando digo dois meninos quero dizer minhas


duas baquetas, não o que está dentro das minhas calças.
Antes que eu possa pensar em uma resposta, ele me
envia outra mensagem.

Sticks: Claro, isso não significa que os outros dois não


estarão lá. Mas tecnicamente, você não vai ver esses caras,
então sim... estou apenas falando sobre as minhas baquetas.

Eu sorrio, divertindo-me com as mensagens incoerentes.


Quase podia imaginá-lo grunhindo, como se soubesse que
estava escrevendo merda que ele não tinha intenção de
mencionar e mesmo assim continuava escrevendo. E neste
momento, ele envia outra mensagem.

Sticks: Então, sim, é melhor eu me calar antes de


continuar me humilhando cada vez mais. Nos vemos amanhã.

Abro um largo sorriso e respondo confirmando.

— E com quem você está flertando? — Pergunta Ten,


dando-me um susto porque eu estava concentrado em
pressionar "enviar".

Faço uma cara feia, dando-lhe um empurrão quando ele


tenta ler as mensagens por cima do meu ombro.

— Não é da sua conta, intrometido. — Respondo,


colocando o celular no bolso.
Ele ri e mexe as sobrancelhas.

— Só me diga se ela é sexy.

Isso me faz revirar os olhos.

— O que faz você pensar que era uma garota?

— Porque você estava sorrindo como um menino


apaixonado enquanto lia as mensagens.

— Que merda? — Eu o empurro novamente, desta vez


com mais força. — Não é isso. Era o baterista da minha
banda e ele disse algo engraçado... então eu ri.

— Sei... — Ele continua me observando enquanto passa


a mão no rosto. — Não acredito em você. Você ficou lendo por
muito tempo para ser um cara.

Eu olho para ele completamente confuso.

— Hum?

— Você demorou para ler. — Explica ele. — Deve ser de


uma menina. Caras mandam mensagens de no máximo cinco
palavras... ou ligam. Então, sim... você certamente recebeu
mensagens pervertidas.

— Que seja. — Balanço a cabeça enquanto me afasto. —


Você é estranho, pare com isso.

— Não tem problema se você não quiser falar sobre ela.


— Grita Ten. — Eu vou descobrir quem é.

— Legal. — Murmuro.

Mas, por algum motivo estranho, o que ele disse ainda


está na minha cabeça. Certificando-me que ele não está
olhando, tiro o celular do bolso e leio outra vez minha troca
de mensagens com Sticks. De fato, tudo o que eu enviei foi
colocado em cinco palavras ou menos. Sua mensagem mais
curta tinha nove palavras.

— Huh. — Murmuro, franzindo a testa e colocando o


telefone de volta no bolso.

Então, eu termino meu turno e não penso mais no


assunto.
PARTE I

REMY
— Meu Deus! Eu sou uma idiota.

Jogo o celular na mesinha de centro como se estivesse


infectado e dou um tapa na testa, totalmente envergonhada.

Estou surpresa por Asher não me chamar de imbecil e


dizer para não me incomodar de ir ao show amanhã. As
mensagens que enviei são mais do que idiotas.

Comecei a mandar as mensagens querendo ser


engraçada, mas então achei que parecia imatura. Quando
tentei explicar o que eu realmente queria dizer, tudo foi para
o inferno e acabou saindo uma besteira.

— Ugh.

Decido que a culpa é dele. O cara é ótimo e depois de


passar horas em sua companhia, ouvindo-o cantar... meus
hormônios ainda estavam em erupção.

Asher me impressionou, de uma boa maneira. Após meu


primeiro encontro com o grupo, eu estava completamente
convencida de que Galloway era o líder e isso me preocupou.
Embora naquele momento eu não fosse tocar com eles, era
uma ideia perturbadora, alarmante e deprimente o fato
daquele idiota tomar decisões.

No entanto, depois desta tarde, ficou óbvio que Asher


estava cuidando das coisas. Ele sabia onde as músicas
estavam, pagava a conta do aluguel do estúdio, fazia
sugestões de mudanças e ajustes dos ritmos e foi o único que
lembrou onde deveríamos nos encontrar para o próximo
show. Se ele era o líder, eu podia segui-lo... especialmente
porque ele tem um grande traseiro. Mas Gally? Porra, não.
Nunca ficaria em uma banda que ele fosse o líder.

Resolvi mandar as mensagens quando estava pensando


sobre o show e me dei conta que Asher não havia dito a hora
exata. Então comecei um debate comigo mesma de dez
minutos, se eu deveria ligar ou enviar uma mensagem... E
tinha que ser ele, porque foi o único membro da banda que se
preocupou em trocar o número de telefone comigo.

Decidi enviar uma mensagem porque falar seria um


desastre. Eu estava muito consciente do que sua voz fazia
comigo.

E mesmo assim consegui estragar tudo, mesmo por


mensagem de texto.

Estou grunhindo envergonhada quando a porta da


frente abre e Jodi entra como uma brisa, carregando uma
pequena sacola e um grande sorriso.

— Hola, puta. Eu consegui algumas bugigangas para


você! — Então ela para quando realmente me vê. — Você
continua usando a máscara.
— Oh? — Eu olho para ela confusa, antes de perceber...
— Ah, merda. Sim. Acabei de voltar do ensaio. — Puxo
lentamente a máscara de "Sticks" da cabeça e sorrio,
atordoada por estar dizendo que eu estava em um ensaio ...
com minha nova banda! — Sabe o que mais? Eu realmente
gosto da idéia de ser gay.

Eu tinha mandado uma mensagem para Jodi contando


que os meninos me pegaram olhando para o Asher quando
ele estava trocando de camiseta e toda a conversa sobre ser
gay. Agora eu posso olhar para um menino, para Asher, já
que tenho certeza que não vou notar outros homens
enquanto ele estiver por perto e ninguém vai pensar que é
estranho.

Merda! Por que não tive essa idéia antes do teste? É


brilhante.

A “calcinha masculina” está irritando minha pele e


quando eu coço Jodi me olha de um jeito estranho.

— Querida, você lembra que é uma garota, certo?

Eu tiro a mão da virilha.

— Sim. Cale a boca! Além disso, é culpa sua, porque


essa calcinha que você fez está irritando a minha pele.

— Vou ignorar que está falando mal da minha incrível


invenção, porque estou feliz pela merda engenhosa que
acabei de fazer por você.

— Que você fez?


Jodi acena animadamente, de uma maneira feminina e
dramática.

— Bem... Apesar do fato de não aprovar essa ideia e


achar que você é louca por sair assim amanhã, decidi
mostrar meu apoio e comprei algumas pequenas coisas que
você vai precisar.

Sentando-me mais ereta, bato palmas, feliz.

— De verdade? — Oh, presentes! Adoro presentes. —


Sabia que por algum motivo eu amava você. O que comprou?

— Para começar, isso... — Diz, pegando de dentro da


bolsa uma coisa que parece um cartão de crédito, mostrando-
o com um gesto ostensivo antes de entregá-lo a mim.

Uma identidade falsa! Piscando, eu a removo da capa.

— Meu Deus! Você não deveria ter se incomodado. É


muito legal, Jodi. A última vez que tive uma identidade falsa
eu tinha dezessete anos e meu tio a encontrou antes que eu
tivesse a oportunidade de usá-la em um bar.

Surpreendentemente, ainda é excitante ter uma, mesmo


aos vinte e três anos. Jodi fez algumas fotos na primeira vez
que coloquei a máscara, mas pensei que eram para sua
aula... não por isso.

Sorrio ao ver meu rosto masculino ao lado do meu


verdadeiro nome, peso e estatura. A única coisa falsa é a
fotografia... e, para dizer a verdade, ela é simplesmente uma
versão alterada de mim mesma. Até mesmo o gênero certo
está marcado.
— Espere, aqui diz que eu sou mulher.

Franzindo o cenho, Jodi pega a identidade da minha


mão e coloca-a cuidadosamente em uma nova carteira.

— Como se alguém fosse verificar o “M” ou o “H”. — Ela


me entrega a carteira, que deve ser seu outro presente. —
Provavelmente, não vão nem pedir.

— Certo — Murmuro.

Levanto e coloco a carteira no bolso traseiro para sentir


como é carregar alguma coisa ali. Minha nádega contrai-se,
surpresa. Interessante... não incomoda, faz cócegas ou
qualquer outra coisa, é apenas diferente.

— E.... eu guardei o melhor para o final.

Jodi me joga um pedaço de silicone cor da pele. Pego-o


quando ele bate no meu peito e o afasto, girando-o em todos
os ângulos possíveis, estudando-o. Parecia um tipo de funil
de borracha.

— Eh... obrigada. Mas... — olho para ela. — O que


diabos é isso?

— É um Go Girl19.

— Desculpe-me? Que menina?

Suspirando, ela revira os olhos e vem até a minha frente


para pegar o objeto.

19
— Um dispositivo de urina feminino. Você sabe, para
fazer xixi de pé.

Para demonstrar, ela o coloca na virilha como se fosse


um vibrador. Então faz um som e empurra os quadris, como
se estivesse fazendo xixi no chão.

Eu teria rido, porque era muito engraçado, mas tenho


uma sensação ruim de que ela realmente quer que eu use
essa coisa.

— Hum... — Resmungo, coçando o lado da cabeça por


causa da peruca. — Você não está brincando, está?

Ela para e endireita o corpo, removendo o dispositivo de


“suas partes”.

— O quê? Eu só pensei que... você vai passar a noite


toda no clube e, mais cedo ou mais tarde, vai ter que ir ao
banheiro. — Jodi encolhe os ombros. — Como você vai estar
vestida de homem, eu simplesmente deduzi que vai ter que
usar o banheiro dos meninos. Se você for pega fazendo xixi
sentada, vão suspeitar. E olhe... — Ela levanta o objeto com
orgulho. — Eu até comprei cor da pele, porque parece mais
com um pênis real.

— Meu Deus! — Cubro o rosto com as mãos. — Diga-me


que eles não vêm coloridos.

— Meu favorito era lavanda, mas achei que não ajudaria


muito se eu o escolhesse.

— Louca!
Balanço a cabeça, incapaz de acreditar que ela está
falando sério.

— Olhe. — Jodi dobra o funil de uma forma diferente. —


A embalagem diz que é a melhor marca porque é mais
flexível.

— E... Eles são tão populares porque vêm em todos os


tipos — Murmuro, lendo o encarte desconfiada. Claro que
eles vêm de todos os tipos. — Como eu nunca ouvi falar do
Go Girl?

— Eu não sei. — Ela dá de ombros. — Talvez, seja


porque você não gosta de acampar ou escalar.

— Ou talvez seja porque eu gosto de ficar agachada com


a bunda de fora no mato para fazer xixi, esperando que o que
quer que toque minha boceta não seja uma cobra ou uma
folha envenenada.... como uma garota normal.

Jodi parece magoada com a minha reação ao presente e


eu detesto machucar seus sentimentos. Além disso, foi muito
legal da parte dela pensar em mim.

Eu a seguro pela mão.

—Obrigada. — Digo, com toda a sinceridade que consigo


reunir.

Não faço ideia de onde ela acha que devo guardar “a


coisa” enquanto não estou usando. Devo prendê-la com fita
adesiva na coxa ou algo assim? Eu já tenho um pênis falso
na “calcinha masculina”. Quantos pênis preciso? Embora
minha amiga tenha feito uma boa pergunta. Como diabos vou
usar banheiros públicos quando estiver com a banda? Espero
que o Forbidden tenha uma privada individual.

Vinte e quatro horas depois, chega o momento de


descobrir.

Mais uma vez, sou "Sticks". Deixo o Go Girl em casa e


me dirijo para o endereço que Asher me enviou.

A última vez que estive aqui foi no início do verão ou


talvez no final da primavera, não sei, mas me parece bastante
familiar, então estaciono e atravesso a rua até a entrada. Há
um aviso dizendo que eles vão abrir em meia hora e o painel
luminoso com a palavra “aberto” ainda não está aceso.
Quando vejo um porteiro bem em frente as portas principais,
decido bater no vidro para atrair sua atenção.

O homem franze a testa assim que sinalizo para entrar.


Eu não paro de bater até ele, finalmente, abrir uma fresta e
inclinar-se para fora.

— Ainda não abrimos.

— Sim, eu sei, desculpe incomodá-lo, mas... Sou da


banda. — Ele me olha como se não tivesse idéia do que estou
falando. — Você sabe... A NonCastrato. Eles vão tocar esta
noite, e.... eu sou da banda. — Acrescento cautelosamente. —
Preciso entrar e instalar minha bateria.

Deus, é ótimo dizer isso.


— Identificação?

Ele estende a mão com um olhar aborrecido no rosto.

— Uh... tudo bem.

Preciso agradecer a Jodi pela identificação falsa. Ela me


prestou um grande favor. Pego a carteira no bolso traseiro da
calça e mostro a ele, mordendo o lábio, esperando que ele não
perceba o grande e deslumbrante “M”.

Ele mal olha para o documento antes de me devolver e


imediatamente analisa uma prancheta que está na sua mão.

— Você não está na lista.

Por um breve momento meu coração para de bater. A


banda me rejeitou e a oportunidade de me apresentar em
público terminou antes mesmo de começar. Abro a boca mas
demoro um segundo para dizer algo.

— Oh sim. Sou novo. Entrei esta semana na banda.

O cara não parece se importar. Aparentemente, "você


não está na lista” é tudo que ele sabe dizer. A raiva, o medo e
a preocupação atravessam meu corpo, mas decido que a raiva
vai assumir completamente. Cheguei longe, recuso-me a
render-me agora.

— Olhe, eu preciso entrar e me preparar para o show.


Estamos sendo pagos para isso.

Pensando bem, será que pagam? Eu não perguntei e,


honestamente, é a última coisa que tenho em mente. Não
importa. A questão é que eu tenho que ir para o palco e....

— Você não está…


— Na lista! — Explodo. Sim, ele já disse isso. Muitas
vezes. — Mas juro que não estou mentindo. Você não pode
procurar outro membro da banda para responder por mim?

— Você vai me dar problemas?

Eu aperto os dentes.

— Não, se você simplesmente me deixar entrar.

Quando ele se afasta da porta e dá um passo ameaçador


na minha direção, respiro fundo e lembro que ele está vendo
outro cara. Provavelmente não vai ter problemas em usar os
punhos e me dar uma surra. Oh, merda, não quero apanhar
na primeira semana que sou um menino.

A porta atrás dele se abre novamente.

— Tudo bem por aqui, Grim20?

Olho atrás do gigante na minha frente e vejo outro


gigante, só que este é um cara atraente e não parece tão
ameaçador quanto Grim... Deus, o nome é perfeito para ele.

— Eu sou da banda. — Digo rapidamente, antes que o


idiota na minha frente me impeça. — Tenho que entrar e
ajudar a configurar o palco antes da abertura.

— Ah, você é o novo baterista?

— Sim! — Respondo, fazendo um gesto de


agradecimento antes de olhar para Grim, que ainda me
bloqueando.

— Espere um segundo, vou procurar Asher.

Em português significa implacável, cruel, impiedoso.


20
Ele desaparece e quando a porta se fecha estou mais
uma vez sozinha com o porteiro mal-humorado, que cruza os
braços e mantém a guarda em frente à entrada do clube.

— Vou procurar Asher. — Zombo, com um sorriso


petulante.

Grim responde com um grunhido.

Segundos depois, Asher coloca a cabeça para fora,


surpreso ao me ver.

— Oh, olá. Você chegou cedo. Entre. — Diz, abrindo


mais a porta.

Mas o cara na minha frente se recusa a sair do lugar.

— Grim, irmão, — A voz de Asher é persuasiva — Está


tudo bem, ele é da banda. Desculpe-me, pensei tê-lo colocado
na lista.

— Não há Remy Curran na lista. — Diz Grim.

— Remy? — Asher pisca, confuso, antes dos seus olhos


se iluminarem. — Claro. Sim. Não sei o seu nome verdadeiro,
então coloquei você na lista como Sticks. — Ele se vira para
Grim. — Você poderia ser gentil e escrever Remy Curran ao
lado de Sticks? E então ele pode entrar.

Grim não parece muito feliz, mas acena com a cabeça e


relutantemente se afasta.
PARTE II

Asher abre totalmente a porta e finalmente sou admitida


no interior do Forbidden.

Estou tentada a mostrar a língua e debochar um pouco


de Grim, mas me contenho, porque mostrar a língua
provavelmente não é uma atitude muito masculina... ou
madura.

— Lamento por isso. — Diz Asher, enquanto me guia


para o palco. — Grim é ex-militar, ele não descumpre
nenhuma regra. Nunca. Se Harper estivesse na porta esta
noite, você teria conseguido entrar sem tanto esforço. Mas
estou... surpreso. Nenhum dos caras aparece antes de
abrimos.

Isso me faz franzir o cenho.

— Quem arruma as coisas?

— Oh... estou acostumado a fazer tudo.

— Toda semana? Você, sozinho? — Pergunto, piscando.

— Sim. — Ele dá de ombros como se não fosse grande


coisa e se dirige ao palco. — Mas, como está aqui, vou deixar
a bateria com você.

— Certo.

Subo atrás dele e paro para olhar ao redor com


assombro, tentando imaginar como o lugar vai estar em uma
hora. Estive aqui uma vez antes, na noite do karaokê, mas
isto era totalmente diferente.
Sinto a emoção pulsar no meu corpo. Vou tocar aqui...
esta noite! Na bateria.

— Então Remy é seu nome verdadeiro?

Eu me viro para Asher que está ajoelhado junto a um


amplificador testando as cordas da sua guitarra. Quando
meu olhar encontra com o olhar verde e curioso dele, uma
pontada no estômago faz com que todas as minhas partes de
garota voltem à vida.

— Hum... Sim.

Oh, meu surpreendentemente extenso vocabulário perto


de um menino bonito deve tê-lo deixado impressionado.

Preciso me policiar ou logo estarei babando. Ele sorri e é


obvio, tenho que engolir um pouco de baba.

— Mas prefere Sticks?

Dou de ombros.

— Tanto faz. — Murmuro, obrigando-me a dizer mais


alguma coisa. — Qualquer um funciona.

Sua risada faz com que meus hormônios chorem.

Resolvo ignorá-lo e preparar minha área. Mas tudo já


parece estar quase em ordem. Preciso somente baixar o
banco, mover os pedais um pouco mais, reajustar o tambor e
aproximar alguns centímetros os tambores pequenos.

Assim que termino, pergunto a Asher se ele precisa que


eu faça mais alguma coisa. A nossa volta os outros
funcionários do bar estão preparando a abertura do clube.
— Hum... — Ele morde o lábio inferior e olha em volta
do palco. — Acho que está tudo pronto. Normalmente, eu
preparo tudo sozinho, então chego muito cedo, mas se você
quiser ajudar daqui para frente, posso mostrar o armário de
armazenamento e também como funciona o sistema de som.

Tento não ficar olhando para sua boca, mas ela é tão
loucamente sexy, que preciso limpar a garganta antes de
responder.

— Certo. Isso seria ótimo.

Então, ele começa a explicar e tenho que chegar mais


perto para ver melhor todas as funções que aponta. E “cara”,
o menino cheira maravilhosamente bem. Não é justo. Inalo
profundamente várias vezes, tanto que chego a ficar tonta.

Ele espirra e mesmo isso é incrivelmente sexy.

Quando Asher para de falar, percebo que preciso falar


alguma coisa.

— Tudo é muito bem organizando. — Digo, com a voz


mais aguda que o normal, soando extremamente feminina.

Como minha voz é sempre um pouco rouca, o som


áspero faz com que, por telefone, as pessoas frequentemente
me confundam com um homem. Mas ela não se pareceu nada
com a de um cara agora. Lanço um olhar preocupado para a
direita e fico aliviada ao perceber que Asher não pareceu
notar.

— Obrigado. — Responde ele, sorrindo com orgulho.


Estive tão ocupada ruminando minhas preocupações
que levo um tempo para me dar conta do que ele está
falando.

Sacudo a cabeça para voltar à realidade.

— Espera. Você acaba de dizer obrigado como se tivesse


montado isto? — Quando ele concorda, sorrindo com orgulho,
volto minha atenção para o painel de alavancas e botões,
assombrada. — Impressionante. Eu pensei que pertencia ao
clube.

— E pertence. — Eu franzo o cenho confusa e ele


explica. — Quando Pick, o dono do clube, me contratou, ele
me deu liberdade para instalar qualquer tipo de palco e
sistema de som que eu quisesse. E foi o que fiz.

Balanço a cabeça, ainda mais perdida.

— Você trabalha... aqui?

Isso significa que eu também trabalho aqui? Droga, vou


ter que lidar com aspectos legais, como números de seguro
social e essas bobagens? Uma coisa é mentir para tocar na
banda, outra é mentir para o governo. Merda, no que eu
estava me metendo?

— Sim, é uma longa história. Vim até aqui pedir para


que nos deixasse tocar uma noite e ele precisava de um
bartender. Então... fizemos um trato. Trabalho no bar as
noites que não tocamos e ele me deixa construir praticamente
qualquer coisa que tenha a ver com a música neste lugar.
Recebo dois mil pelas sextas-feiras, e reparto entre os quatro
membros da banda, mas somente eu sou contratado. — Ele
me dá um olhar de desculpa. — Sinto muito, quinhentos não
é muito, mas...

— Ouça, é mais do que me pagaram até hoje para tocar.


— Digo, aliviada por não ser contratada e emocionada porque
estava ganhando algum dinheiro.

— Sim, era assim que eu pensava quando nós


começamos. — Diz Asher rindo e batendo no meu ombro,
dando-me um susto enorme quando empurra ligeiramente
meu peito fora do lugar. — Acho que você vai se dar muito
bem, Sticks.

Momentaneamente esqueço que preciso acomodar meu


peito falso. Mas sério, quando Asher Hart sorri para mim com
tanta aprovação, a vida fica perfeita. Porra! Esta vai ser uma
noite que não vou esquecer jamais.
REMY
— Boa noite, Ellamore. Bem-vindos ao Forbidden!

A saudação de Asher pelo microfone resulta em uma


tonelada de fãs, em sua maioria mulheres, gritando,
sacudindo os braços grosseiramente e se atirando na frente
do palco.

Sentada no meu pequeno e seguro banco atrás da


bateria, sorrio quando Asher precisa dar dois pulos para trás
afim de evitar que as mãos das garotas o alcançassem. Sua
risada nervosa ecoa pelo sistema de alto-falantes.

— É bom ver vocês também, senhoritas, mas vamos à


música. Qual vocês querem?

As mulheres começam a gritar juntas algo que soa como


"If I Knew21", que não é título de nenhuma canção que a
NonCastrato toque.

Franzo o cenho confusa, perguntando-me que merda


estão dizendo. Asher olha para nós, falando sem emitir som
“Counting Stars22”, levantando as sobrancelhas em minha
direção e fazendo um sinal de positivo.

Não estou nervosa, normalmente não tenho problemas


em frente a multidões. E com a máscara no lugar não há

21
“Se eu soubesse”, em português.
“Contando estrelas”, em português, da banda OneRepublic.
22
sequer um resquício de ansiedade. Acho que meu
subconsciente percebe que se estragar alguma coisa vai estar
tudo bem, porque ninguém sabe quem realmente eu sou. Mas
no momento que Asher levanta o polegar em apoio,
silenciosamente me dizendo que tem certeza que eu vou fazer
tudo certo, uma pequena contração no meu pulso deixa tudo
dentro de mim um caos.

Então é culpa dele quando deixo uma maldita baqueta


cair.

Ela bate ruidosamente no chão oco do palco, produzindo


um ressonante eco que faz com que todos meus
companheiros de banda me olhem... E metade da multidão
também. Lutando para recuperar a baqueta perdida,
endireito-me tão rápido que o sangue corre todo para minha
cabeça, o que faz com que eu me sinta instantaneamente
enjoada.

Dou um sorriso arrependido e balanço as baquetas para


cima.

Tudo bem aqui. Não há absolutamente nenhuma razão


para vocês me olharem assombrados, como se eu fosse uma
idiota.

Asher se volta para o microfone.

— Acredito que esse é o momento para apresentar o


mais novo membro da nossa banda. Todos, por favor deem ao
Sticks, o melhor fodido baterista que já ouviram, um pouco
de animação, ok? — Colocando as mãos na boca, ele adiciona
baixinho: — É a primeira vez dele, então sejam amáveis, por
favor.

Algumas pessoas riem, mas “cara”, o público me


animou. Tudo se ilumina dentro de mim, balanço as
baquetas acima da cabeça em agradecimento e em seguida
bato quatro vezes uma na outra para ditar o ritmo da canção.
Boom... estávamos tocando um cover de uma das minhas
músicas favoritas do OneRepublic.

Ao vivo. Na frente das pessoas. A bateria entra no


segundo verso e quando chega a hora, toco perfeitamente.
É.... assombroso, meu sonho está se tornando realidade. Não
consigo deixar de sorrir, não consigo deixar de me sentir
animada, não consigo deixar de tocar. Assim que a música
termina, começo imediatamente “Ceilings”.

Asher olha surpreso para mim, revirando os olhos


quando percebe que ele deveria saber. Quando sorri e começa
a cantar sua voz me bate forte, parecendo vibrar pelos meus
ossos, ecoar ao longo da minha coluna vertebral e deixa
tremendo a ponta dos meus dedos dos pés. É nirvana pura.
Meu Deus.

Não percebi quantas canções ou quanto tempo


havíamos tocado até Asher dizer que vamos fazer um rápido
descanso. É quando me dou conta como minhas roupas e
também a máscara estão molhadas de suor por causa das
luzes.

Assim que levanto minhas pernas e costas gritam em


protesto por estar tanto tempo sentada, então mexo os
ombros e estico as pernas uma ou duas vezes, para depois
seguir os outro fora do palco e direto na multidão.

Como o Forbidden não tem bastidores somos


instantaneamente sufocados pelo público, a maioria indo
para perto de Asher, querendo tocá-lo. Um homem com uma
camiseta do clube aparece, o mesmo cara sexy que havia me
resgatado do Grim, e ajuda Asher a se libertar das meninas,
abrindo caminho para um corredor na parte de trás, onde
eles nos guiam para uma sala com um sofá, cadeiras, alguns
armários e uma pequena cozinha.

— Obrigado, Quinn. — Diz Asher ao belo gigante,


enquanto passa o braço sobre a testa brilhando de suor. —
Você é um salva-vidas.

O sorriso do Quinn é adorável, sexy, sexy e doce, tudo


em um.

— Sem problemas, mas agora é melhor eu retornar ao


bar. Vocês realmente ganharam o público esta noite. — Asher
se despede e quando Quinn está saindo acho que sente meus
olhos sobre ele, porque olha na minha direção e faz um
pequeno gesto de reconhecimento. — Bom trabalho, vocês
foram geniais meninos.

Depois que ele desaparece pela porta, olho para o lugar


onde tinha estado e tento não suspirar. Eu gosto de Quinn.
Há algo nele que me faz sentir... bem. E segura. Além disso,
ele é muito gostoso.

Galloway me dá um tapa no braço.


— Homem, você viu a ruiva que mostrou os peitos? Ela
estava usando uma blusa amarela justa com decote até o
umbigo. E estava gritando seu nome.

Pisco para ele, sem ter ideia de quem estava falando.

— É?

— Oh, sim. Mas você não gosta de garotas. Que


desperdício! — Ele se vira para Holden, que está limpando as
manchas de suor em baixo dos braços. — Holden, você viu a
menina, não é? Vou pegar essa cadela hoje mais tarde.

Faço um som de desaprovação e procuro Asher com o


olhar. Não entendo bem o porquê, mas estou sempre olhando
para ele quando está por perto. Embora não seja tão
musculoso e classicamente lindo como seu colega Quinn, a
estrutura esbelta e o rosto anguloso me causam a mesma
sensação. Exceto o sentimento de segurança... com ele, eu
me sinto... não sei... desafiada, um pouco sem fôlego,
entusiasmada. Como se estivéssemos parados à beira de um
precipício e eu sentisse a excitação queimando meu sangue
antes mesmo de pular.

Asher, ignorando a conversa, se inclina para o frigobar e


pega uma garrafa de água. Meu olhar vai direto para sua
bunda. Ele não usa calças super justas, como Galloway e
vários outros roqueiros, mas elas se ajustam
maravilhosamente bem ao seu traseiro perfeito.

Então ele endireita o corpo, muito rápido para o meu


gosto, e se volta para nós, acabando com a minha pequena
festa. Ele percebe que eu estou olhando e levanta a garrafa.
— Quer uma?

Balanço a cabeça, embora minha boca estivesse seca


como serragem.

— O que eu preciso é encontrar um banheiro.

O que eu estava temendo. Não quero entrar em um


banheiro masculino neste lugar. Por que, merda, por que
fiquei rindo do Go Girl da Jodi e o deixei em casa de
propósito?

— Pode usar o banheiro dos funcionários. — Diz ele,


fazendo um gesto para uma porta próxima.

Por pouco não choro de alívio.

— Obrigado.

Obrigada, obrigada, obrigada. Entro rapidamente no


pequeno banheiro, feliz em tê-lo só para mim. O suor no meu
rosto dentro da máscara está me incomodando como o
inferno, mas não caio na tentação de tirá-la, porque
provavelmente não vou conseguir colocar de volta.

Depois de lavar as mãos retorno para a sala. Galloway


continua tagarelando sobre as mulheres que ele acha que
pode dormir antes que a noite termine, e Holden escuta
pacientemente.

Asher está atirado no sofá de olhos fechados, os pés


batendo um ritmo que apenas ele pode ouvir e os lábios se
movendo silenciosamente, cantando para si mesmo.

Quando fecho a porta atrás de mim, seus olhos verdes


me avaliam.
— Está tudo bem até agora? Suas batidas foram geniais.

— Obrigado. — Respondo, sentando-me na cadeira ao


lado. — E estou bem. Definitivamente sentindo a vibração e
preparado para voltar.

A emoção na minha voz o faz sorrir, como um


profissional experiente sorrindo indulgentemente para um
novato e possivelmente lembrando da sua primeira vez.

— Então, descanse agora porque estamos apenas na


metade do caminho.

Já estamos na metade de caminho? Não! Não podemos


estar tão perto de terminar. Ainda tem muita energia em
mim.

Quero fazer isto por dias. Por mim já teria terminado


com este descanso que parece eterno. Asher volta a sua
tranquila meditação, ou o que quer seja que está fazendo,
enquanto Gally continua falando sobre seu pau e em quem
empurrá-lo hoje à noite.

Asqueroso. A seu lado, Holden escuta silenciosamente.


Eu me mexo impacientemente na cadeira, incapaz de ficar
quieta.

— Está bem, Sticks. — Diz Asher de olhos fechados. —


Vamos voltar agora.

Eu me pergunto por que ele está se dirigindo apenas a


mim, olho na sua direção, franzindo o cenho.
— Certo? — Continua, levantando-se do sofá e sorrindo
de um jeito sexy. — Juro que o seu entusiasmo é mais
barulhento que o murmúrio do Gally.

Galloway para de falar e olha na nossa direção.

— Por que você está me chamando?

— Por nada. — Asher faz um gesto com as mãos


sugerindo que ele é doido. — Vamos voltar.

A segunda metade da nossa apresentação parece passar


mais rápido que a primeira. Faltam quinze minutos para uma
da manhã, quando Asher deseja a todos uma boa noite.

Estou muito entusiasmada para me acalmar. Amei estar


no palco.

Sempre que assistia um show, eu desejava ter a


oportunidade de algum dia, fazer isto, mas não tinha ideia,
nenhuma ideia que me daria este tipo de prazer. Além disso,
os fãs realmente nos amaram, o que foi... uau.

E, merda, amo todos em volta da gente. Assim que


descemos do palco as pessoas nos rodearam, a maioria
novamente em torno de Asher, mas alguns em volta de
Galloway, Holden e eu também.

Dou um grito surpreso quando um par de braços me


envolvem e apertam fortemente.

— Oh meu Deus, Remy! — Grita Jodi no meu ouvido —


Não posso acreditar que você realmente conseguiu! Foi genial.

— Obrigado.
Eu sorrio e nos abraçamos de novo. Quando nos
separamos, vejo que ela está usando uma blusa justa
amarela com um decote profundo. Deus, deveria ter
adivinhado que ela era a fã da qual Galloway estava falando.

— Oh, merda. Você é a garota que se exibiu? Não posso


acreditar. Sério? Essa blusa é completamente de puta. Você
sabe que eu não vou transar com você, não é?

Jodi ri.

— Sei, mas não consegui evitar. Fui apanhada no calor


do momento.

— Não se preocupe, coração. — Diz Galloway sorrindo e


se intrometendo entre nós para colocar o braço sobre os
ombros de Jodi. — Os membros héteros da banda com
certeza apreciaram o show. Lindos seios.

Jodi levanta suas finamente depiladas sobrancelhas.

— Hum, obrigada.

— Sério! — Ele dá um sorriso lento. — Meu nome é


Billy. Billy Galloway.

Quando Jodi levanta a mão para apertar a dele,


empurro seus dedos para baixo.

— Não. — Olho para Galloway, franzindo o cenho. — Ela


não quer te conhecer.

— Sim, eu quero. — Diz Jodi.

Ignoro-a e continuo olhando para ele.

— Jodi é minha amiga. Fique longe dela. Entendeu?


— O queeee? — O inocente sorriso do Gally não
enganaria um menino de seis meses. — Apenas estou me
apresentado a sua amiga.

— E adivinhando o tamanho do seu sutiã. — Murmuro.

— Trinta e seis DD. — Recita ele.

Jodi fica de boca aberta.

— Uau, você é bom.

— Acertei, não é? — Gaba-se Gally. — Quer que eu te


mostre o quanto posso ser bom?

Neste momento Asher se junta a nós. Esquecendo Gally,


Jodi arregala os olhos e fica boquiaberta.

— Santa... Merda. — Sussurra, apertando meu braço. —


Asher Hart está parado bem ali.

— Oh, meu Deus. — Sussurro de volta. — Você está


vendo ele também?

Asher solta uma risada.

— Hey. — Diz, estendendo a mão para Jodi. — Você


deve ser a amiga do Remy.

Jodi murmura algo indecifrável enquanto aperta a mão


dele.

Reviro os olhos quando ela continua olhando-o e


balançando sua mão para cima e para abaixo, sem dizer
nada.
— Esta é Jodi. — Digo. — Minha amiga que...
normalmente tem melhores habilidades de comunicação que
eu.

— Quiero sentarme en tu cara. — Solta Jodi.

Embora Asher pestaneje confuso, obviamente sem


entender o que ela disse, estou chocada.

— Jodi! — Grito, incapaz de acreditar que ela tenha dito


isso e que tenha se lembrado como pronunciar a frase
corretamente.

Olho-a boquiaberta de horror.

— O quê? — Ela me pergunta inocentemente. — Ele


pode dizer que não, se não estiver interessado.

Com outra risada, Asher afasta os dedos dos dela.

— Seu amigo aqui salvou nosso traseiro esta noite. —


Diz ele, sem ter ideia do que Jodi havia acabado de
perguntar. — Não sei o que teríamos feito se não tivéssemos
encontrado Sticks. Ele tem um talento imenso.

— Oh, eu sei! — Jodi entrelaça o braço com meu e dá


um sorriso orgulhoso. — Remy toca bateria desde criança.
Ela é um assombro.

Paro de respirar quando percebo Asher com um olhar


confuso. Dou um discreto beliscão em Jodi e ela arregala
olhos, sobressaltada.

— Quero dizer, ele. Ele é um assombro.

— Droga, garota! — Afasto-a e dou um olhar crítico. —


Quantas doses você tomou?
Jodi dá uma risada nervosa, em pânico.

— Muitas. Obviamente. — Responde, respirando fundo e


olhando para ele.

Asher sorri rapidamente e se volta para mim.

— Hey, quando tiver um segundo, quero apresentar os


meninos que trabalham comigo.

Como ele está olhando para mim, deduzo que está


falando comigo.

Devolvo o olhar um pouco desconfiada. Não sei se quero


conhecer mais gente com esta máscara. É um bom disfarce,
mas me sinto culpada por enganar as pessoas.

Asher ainda está me olhando e seus olhos verdes são


cativantes. Malditos lindos olhos verdes.

— Certo. Está bem. Quando você quiser.

Imediatamente ele começa a me guiar para o bar. Parece


que “quando você quiser”, é agora.

Merda.
REMY
Não sei quantas vezes fomos parados por fãs que
queriam abraçar Asher, beijá-lo, ou simplesmente tocar sua
camiseta. Algumas não faziam contato corporal, mas ainda
chegavam bem perto, fazendo nossa caminhada até o bar
parecer a maratona de Boston.

Ele é principalmente vago e distante com todo mundo,


sorrindo, aceitando o abraço, mas logo se afastando. Estamos
a um metro e meio do bar quando uma loira linda nos
interrompe.

— Asher!

Ele dá o seu maior sorriso e a toma nos braços, beijando


o lado da sua cabeça.

Não tenho a menor ideia do porquê isso me incomodou.


Mal o conheço, e nunca fui de me sentir toda possessiva com
alguém só porque acho que ele é sexy. Não é o meu estilo.

Merda, eu sequer pisquei um cílio quando as fãs tinham


beijado Fisher na minha frente... mesmo estando
comprometida com ele. No entanto, o impulso de pegar a loira
pelos cabelos e afastá-la dele me bateu forte. Talvez, porque
ele ficou feliz ao vê-la.
— Hey, linda. — Diz ele em seu ouvido, acima do
barulho. — Obrigado por vir esta noite.

Tento de verdade encontrar alguma imperfeição na


garota, provavelmente é a namorada dele, mas, droga, não
encontrei um só defeito quando ela se virou para mim.

Que alegria, vou ser apresentada à um espécime


perfeito.

— Sticks, esta é Caroline.

Levanto uma sobrancelha e olho para ele fixamente.

— A razão pela qual tocamos "Sweet Caroline" esta


noite? Duas vezes. — Pergunto, sorrindo.

Asher me devolve o sorriso.

— Exatamente.

Olho para a menina e abro a boca para mentir, dizendo


é um prazer conhecê-la, quando ouço alguém gritar.

— Está bem, filho de puta. Basta de beijinhos e


abracinhos. Tire as mãos.

O quê? Olho para o bar e vejo um cara mostrando o


dedo médio para Asher. Não entendo porque ele está tão
furioso.

— Quem é? — Pergunto.

O sorriso do Asher fica maior e Caroline se afasta dele.

— O marido de Caroline.

Levanto as sobrancelhas, surpresa e, sim, sinto uma


pequena onda de alívio.
Depois de ver Caroline ir até o bar e beijar o homem,
que ainda está fazendo gestos para Asher, olho para ele,
confusa.

— Assim, você estava paquerando ela porquê...?

Ele ri entre dentes.

— Porque é divertido foder o Ten. Sério, você deveria


tentar.

Ele me dá um empurrão para frente até que estou de pé


onde antes tinha estado Caroline, porque ela já havia revoado
para longe e estava conversando com uma morena e uma
ruiva a uns cinco metros dali.

— Então, essa é sua mulher? — Pergunto, olhando para


o homem que Asher tinha chamado de Ten.

Quando encontro o olhar dele, surpreende-me ver que


metade do seu rosto está cheio de cicatrizes. Ten olha
apaixonadamente para Caroline e concorda com a cabeça.

— Sim. Sou um idiota com sorte.

Deixo escapar um assobio.

— Digo porque, merda... ela tem um belo rabo. Estou


certo que todos os homens aqui dariam seu ovo esquerdo
para tocar naquela bunda.

O sorriso de Ten morre instantaneamente.

— O que você disse, filho da puta?

Rindo, dou uma cotovelada no braço de Asher, que está


tomando água.
— Verdade. Isso foi divertido.

Ele começa a rir e se afoga, cuspindo um pouco no


balcão.

— Quem caralho é este idiota? — Pergunta Ten,


apontando para mim

— Ten, conheça Sticks, o mais novo membro da banda.


É nosso baterista.

— Parece um baterista morto para mim.

— Oh, deixe-o em paz. — Diz Asher brandamente,


enquanto pega um guardanapo e limpa a confusão. — Eu
disse que era divertido provocá-lo.

Mas Ten já está subindo por cima do bar decidido a me


mutilar.

Santa merda. Dou dois passos para trás, olhando com


preocupação. Mas que merda, uma noite em público e dois
meninos já tinham ameaçado chutar meu rabo. Os homens
eram sempre tão valentões?

Asher levanta uma mão e se interpõe entre nós.

— Relaxa, — Ordena com voz áspera. — Sticks é gay.


Não vai dar em cima de Caroline.

Ten para de repente e dá um olhar incrédulo a Asher,


antes de voltar-se para mim com uma expressão de dúvida.

— Você não pareceu muito gay com a merda que estava


cuspindo sobre ela.

Levanto minhas mãos.


— Sou, acredite. Acho você mais sexy que sua esposa.
Juro por Deus. — E só porque realmente foi divertido tirar
sarro dele, olho para sua esposa e dou de ombros. — Quero
dizer, claro, ela tem um traseiro lindo. A forma e o tamanho
são perfeitos para deixar qualquer garota com ciúmes. Mas
prefiro o que está por trás do seu zíper.

Baixo os olhos e faço uma careta significativa à parte da


frente de suas calças, notando que ele parece ter um bom
volume.

Percebo que Jodi estava certa quando fez minhas


“calcinhas de homem”.

Eu fico esperando que Ten fique todo homofóbico e diga


para eu me afastar, mas, me surpreendo quando ele se limita
a sorrir.

— Merda, sim, você gostaria. — Ele aponta para a


braguilha. — Este é único em sua classe, sua qualificação é
“perfeito”. Tenho um pau impressionante mesmo.

— Oh, Jesus. — Murmura Asher.

Ten levanta uma sobrancelha e o desafia com o olhar.

— O quê? Caroline não consegue manter as mãos


afastadas dele. Ou a boca. A sua boceta também o adora. —
Então, ele volta-se outra vez para mim. — E você... nem
sequer pode se aproximar dele, menino gay.

Finalmente consegui a resposta que estava procurando.


Sorrio e dou uma piscadinha.
Ten franze ainda mais o cenho. Mas uma fração de
segundo depois, um novo sorriso se desenha em seu rosto.

— Você acha que sou mais sexy que Hart, não? Vamos,
pode confessar. — Diz ele me dando uma cotovelada.

— Ehhh... — Não é que eu queira que Asher saiba o


quanto estou atraída por ele, mas adorei o seu olhar
incrédulo para Ten. Então, já que estou fodida mesmo,
continuo com o assunto. — Eu não iria tão longe.

Não quero deixar Asher desconfortável, mas não posso


mentir a respeito disto.

Sem querer olhar para ele, faço uma cara feia para Ten,
por me colocar nesta posição.

— O quê? Definitivamente tenho uma bunda melhor que


a dele.

Ten se vira para me mostrar seu traseiro. Eu olho.


Quero dizer, como não olhar? Um homem sexy
deliberadamente me mostrando a bunda em um jeans
apertado? E, sim, definitivamente tem algo interessante ali.
Mas apesar disso, havia algo a respeito da bunda durinha de
Asher, que me atraía mais.

— Não, na realidade não.

— Ahhh... Sua opinião não conta. Você é um inútil.

Ao meu lado, Asher começa a gargalhar. Uma dessas


risadas de corpo inteiro, que a gente precisa inclinar a cabeça
para trás para que todo o som saia. Sorrio também, aliviada
por ele não estar zangado com as coisas que eu disse.
Asher devolve o sorriso e me dá uma leve batida no
braço.

— Venha. Vou te apresentar ao resto dos meninos. Não


se preocupe, eles não são tão... Ten.

— O que significa que eles são de dar pena. — Diz Ten,


antes de voltar para o bar e se dirigir a um cliente que espera
atendimento.

Asher e eu vamos até o outro extremo do balcão, onde


estão reunidos um pequeno grupo de casais e Caroline, a
quem odeio muito menos agora que sei que ela é casada.

— Meninos! — Ele faz um gesto com a mão, ganhando a


atenção das pessoas ali reunidas. — Este é Sticks, o novo
baterista. Pensei em apresentar os novos membros da banda
de agora em diante, no caso de estarem relacionados a
alguém...

Olho para ele sem entender esse comentário estranho,


mas os outros riem.

— Esses são Mason e Reese. Mason também trabalha


aqui, mas é sua noite livre. O mesmo para o Knox ali. E essa
coisa linda a seu lado é Felicity, que é garçonete. Caroline
você já conhece. Faltam mais três damas, Eva, Zoey, e Aspen,
que estão em casa com as crianças esta noite. Mas acredito
que Pick está por aí...

Ele olha para uma porta ali perto antes que uma voz fale
a nossa esquerda.

— Aqui.
Asher e eu viramos e vejo um homem lindo sorrindo
para mim, com um anel de lábio e piercing na sobrancelha.

— Sticks, este é Pick, meu... — Asher pensa um


segundo e segura uma mecha do cabelo, como se de repente
se sentisse incomodado. Mas então conclui. — O... hum...
dono do Forbidden.

Um breve brilho de decepção cruza o rosto do Pick,


antes de que ele force seu sorriso de volta.

Estendo a mão.

— Prazer em conhecê-lo. Este lugar é incrível.

Não estou certa do porquê estendi a mão. Não fiz isso


com nenhum deles. Talvez, porque é o chefe de Asher, talvez,
porque senti que me deu mais atenção que os outros, ou
talvez algo na forma como Asher reagiu, como se esse cara
precisasse de mais... não sei, admiração? Respeito?

Algo rígido e incômodo emana de Asher enquanto Pick


me agradece e também parabeniza pela apresentação.

— E este cara é Noel. — Diz ele, tocando meu braço para


chamar atenção. — O outro garçom que trabalha ali é Quinn,
que você já conheceu.

Desvio os olhos de Pick e cumprimento Noel com a


cabeça, que retribui do mesmo jeito. Quinn está no outro
extremo do bar, diante de um liquidificador fazendo o que
parece... Oh Deus... uma pina colada. Morreria por uma
dessas agora mesmo. Quando Quinn coloca um guarda-
chuva no drink, junto com uma fatia de abacaxi e uma
cereja, estou quase gemendo.

Pinas coladas são o meu vício. Estou a ponto de ir todo


Jimmy Buffett23 e começar a cantar sobre fazer amor à meia-
noite e ficar preso na chuva, quando ouço Asher falando com
Noel.

— Hey, homem. Traga-me uma Angry Orchard24?

E de repente lembro que, merda, se vou beber algo, não


pode ser uma bebida feminina como pinã colada. Pode? Não,
provavelmente, não.

— Acabou. — Grita Noel enquanto enche uma caneca


com Miller Lite25.

Asher faz uma cara de dúvida.

— De verdade ou você está brincando comigo?

— Não temos aqui no bar. Se quiser ver na despensa, vá


em frente.

— Vou lá. — Asher volta seu olhar para mim. — Hey,


Remy, quer uma?

Nunca havia bebido esta marca antes e não era fã de


cerveja, mas não podia simplesmente beber uma pinã colada
e por alguma estranha razão não consigo dizer não a ele.

— Quero. — Respondo.

James William Buffett, cantor e compositor norte-americano cujo maior sucesso chama-se
23

“Margaritaville”.
Marca de cerveja.
24

Marca de cerveja.
25
— Remy? — Diz Ten, chegando assim que Asher se
afasta.

Levo um susto, surpresa que ele tenha aparecido do


nada no outro lado do balcão. Eu me viro para ele, movo o
olhar da bunda perfeita de Asher para os olhos cor de avelã
de Ten.

— Hum? Sinto muito, o quê?

Ele franze o cenho, olha para Asher e em seguida de


novo para mim.

— Ele acaba de chamar você de Remy.

— Sim... — Digo lentamente. — Provavelmente porque


esse é meu nome.

Quando eu termino de falar, Jodi chega e passa o braço


sobre meu ombro.

— Hey, puta. O que pediu para mim?

— Bom, bom, bom. — Murmura Ten. — Se não é Jodi...

Ela se volta para ele, seu olhar imediatamente


esquentando com interesse.

— Oh! Hey, Ten. — Susurra, com sua voz mais


sedutora.

A inquietação agita meu estômago. Droga! Se Jodi


conhece Ten, provavelmente dormiram juntos. Merda.
Gesticulo entre os dois.

— Vocês... se conhecem?
Enquanto rezo em silêncio para que digam não, Jodi
passa a língua nos lábios e seu olhar move pela camisa preta
e justa de Ten.

— Não tão bem quanto eu gostaria.

Os olhos de Ten estreitam-se ligeiramente.

— Mas isto é o melhor que você vai conseguir. Estou


casado agora.

O sorriso de Jodi se estende lentamente.

— Hey, tudo bem. Não me importo que sua esposa veja.


— Ela aproxima-se mais e baixa a voz. — Sou até melhor
quando dou um show.

— Está bem, chega garota. — Digo, segurando seu braço


e puxando-a para longe do garçom casado. — Trate de
manter suas mãos afastadas dos amigos dos meus novos
companheiros de banda, especialmente dos casados, por
favor.

Jodi bufa e faz uma careta.

— Falando de companheiros de banda, o idiota do Billy


Galloway se recusa a devolver minhas calcinhas.

Pisco para ela, momentaneamente desorientada. Não


entendo o que Jodi está querendo dizer.

— Como diabos ele conseguiu pegar sua lingerie? —


Pergunto, inclinando a cabeça.

Ela levanta as sobrancelhas.

— Como você acha, puta?


Fico de boca aberta.

— Meu Deus! Você fez sexo com ele? Agora? Mas...


você... como... Santo Deus, você acaba de conhecê-lo. E foi só
há cinco minutos.

Jodi dá de ombros.

— O que posso dizer? Ele bateu no lugar certo e não


levou muito tempo. — Então ela se interrompe, com os olhos
cada vez maiores. — Oh merda. Você queria ficar com ele?

— O quê ?! Eca, não. — Afirmo com nojo, negando com


a cabeça. — Não quero ter qualquer tipo de relação carnal
com meus companheiros de banda. Sobretudo esse.

— Então... você não liga que eu...? — Pergunta,


levantando as sobrancelhas.

Eu suspiro.

— Está perguntando um pouco tarde, mas não...


suponho que não. Simplesmente não posso acreditar que
você realmente o queira, ele é nojento.

Jodi coloca o cabelo para trás e olha novamente para as


pessoas por perto.

— Por que não? Ele é uma versão masculina minha.

Inferno, sim. Sabedoria promíscua... Bom, talvez.

Mas além disso, Gally é um imbecil intolerante, que não


se preocupa com nada mais além do seu pau. Jodi é uma
garota divertida que às vezes, ou muitas vezes, não pensa nas
coisas ou considera os sentimentos dos outros, mas por baixo
disso tem um bom coração e nunca feriu ninguém
deliberadamente.

Ou talvez eu esteja inventando desculpas. Conheço-a há


muito tempo e Jodi é mais como uma irmã mais nova que
uma amiga. Possivelmente posso estar fechando os olhos
para seus defeitos, perdoando-a com muita facilidade e
ficando na defensiva quando acho que alguém pode maltratá-
la.

— Oh! Ele está ali. — Diz, ficando na ponta dos pés e


olhando através da multidão. — Aquela calcinha era uma das
minhas favoritas. Desculpe. Tenho que recuperar minha
lingerie.

E vai embora de novo. Estou boquiaberta, parada no


mesmo lugar e ainda atordoada por ela ter transado com um
dos meus malditos companheiros de banda.

De repente, Ten bate no balcão do bar e aponta para


mim.

— Remy. — Ele quase grita. Depois aponta para Jodi. —


Jodi, Remy. Remy, Jodi. Santa merda!

Ele arregala os olhos e aponta para mim novamente,


inclinando-se sobre o balcão.

— É você. É... — Sussurra, o olhar se movendo sobre


meu corpo. — Jesus, agora entendo porque envia essas
longas mensagens de texto para o Hart. Você não é um
homem. É uma maldita garota!
PARTE I

REMY
— O quê? — Imediatamente olho em volta, para ver se
alguém ouviu, mas felizmente, ninguém prestou atenção.
Então, viro-me de novo para Ten, que está com os olhos
arregalados analisando meu peito.

— Como...? O quê...? — Ele inclina-se para frente. —


Incrível. O que fez com seus seios...?

Balanço a mão na frente do seu rosto para desviar a


atenção do meu peito.

— O quê? Não sou uma garota.

Não tem sentido negar, não sei por que falei isso. Tinha
planejado revelar a Asher, Galloway e Holden depois desta
noite o que eu era... ou melhor, o que não era. Realmente não
havia necessidade de prolongar mais, mas... achei que seria
mais respeitoso dizer a banda cara a cara e não deixar que
Asher descobrisse sozinho.

Até este momento, não senti o menor remorso pelo que


fiz. Eu tinha uma meta, embora meta fosse uma palavra
muito leve para descrever meu desejo de tocar com eles, vi
quais os obstáculos tinha, e fiz o que precisava fazer para
conseguir o que queria. E a pequena mentira que tive que
contar? Pfff. Esses idiotas mereciam por não terem sequer
permitido que eu tocasse no teste. Na realidade estava
ansiosa pelo momento de revelar minha verdadeira
identidade... até agora.

Gally... sim, ainda não me importo por estar o


enganando. Ele foi um idiota e ainda é. Holden... não o
conhecia o bastante para me preocupar com seus
sentimentos. Mas Asher... foi amável e decente comigo, ou
melhor, com o Sticks, e quanto mais o conheço, mais o
admiro como músico e como pessoa. É... diferente. E, ok,
possivelmente seu nível de gostosura está afetando alguns
dos meus pensamentos, mas mesmo assim... sinto-me mal
por mentir para ele.

— Sim, é uma garota. — Insiste Ten, trazendo-me de


volta à realidade... justamente ele, um barman sexy, casado e
com cicatrizes, que de algum jeito sabe muito. — Você é a
garota da camiseta do Incubus26.

— Não, eu... espera, o quê? — Olho para ele com uma


expressão confusa. — Quem é a garota da camiseta do
Incubus?

— Você sabe... — Ten balança um dedo. — A garota


para qual Asher escreveu aquela música, que veio aqui com a
camiseta do Incubus, cantou no karaokê e sacudiu
totalmente o mundo dele.

Balanço a cabeça, negando.

Banda norte-americana de rock alternativo.


26
— Sério, você toma um gole a cada bebida que serve?
Porque acho que está bêbado, homem. Você está falando
coisas sem sentido.

— Não estou bêbado e você é a maldita garota. — Insiste


ele. — Estávamos aqui, trabalhando, a noite que você cantou
“All About that Bass27”... com a Jodi. Eu estava de pé ao lado
dele quando disse que queria ter bebês com você um dia, e
todo esse lixo amoroso. Em seguida observei suas doces
esperanças e sonhos virarem cinzas, quando você pulou do
palco e beijou outro cara.

Estou olhando para ele, boquiaberta. Mas, sério, como


diabos ele sabia que cantei essa música aqui... com Jodi? E,
Jesus, eu estava com Fisher ainda? Não consigo lembrar.

— Que merda? — Murmuro, confusa e também curiosa


para descobrir exatamente do que ele está falando.

Ten sorri e aponta para o meu peito.

— Sério, não entendo por que você se disfarçou e entrou


para banda. Se foi para chamar a atenção dele não precisava.
Tudo o que tem que fazer é dizer quem você é. Juro por Deus,
ele ainda a procura todos os sábados à noite. Se você quiser o
homem, ele já é seu.

— Não... não tenho ideia do que você está falando. E não


sou uma garota.

— Sim e você não olhou para a bunda do nosso Hart


quando ele se afastou um minuto atrás — Diz ele com ironia,
rindo.
Música de Meghan Trainor.
27
— Porque sou gay. — Gaguejo

— Ou uma garota.

— Escuta aqui, idiota... — Rebato, apontando para


ele..., Mas Ten pega meu dedo e gira para examinar a palma
da minha mão.

— Sim. — Diz, mais para si mesmo. — Totalmente mão


de garota.

Afasto a minha mão da dele.

— Ouça! Não...

— Oh, não se preocupe. Não vou contar nada, isso


chamou minha atenção.

Endireitei-me e pisquei.

— É?

— Olhe, esse idiota me deve uma. Ele sabia que a única


garota da qual eu deveria me afastar ia escondida ao meu
quarto para foder os meus miolos, sem que eu soubesse que
era ela e não disse nada. Assim, não me sinto absolutamente
inclinado em contar que a garota dos seus sonhos é na
realidade o novo baterista da sua banda passando-se por um
menino. O que ainda me confunde. De novo, por que está
fazendo isso?

— O... espera. Volta. Por que você continua dizendo que


ela é a garota dos sonhos dele? E que porcaria é essa a
respeito de uma... canção?

— Santa merda. — Ele me olha como se eu estivesse


louca. — Você não sabe mesmo?
Franzo o cenho, muito além de irritada.

— Se eu soubesse, acha que estaria perguntando?

— Jesus, mas você é muito descarada. Não ouviu


mesmo a música?

— Não — Respondo, sacudindo a cabeça estupidamente.


— Você poderia começar a dizer alguma coisa que faça
sentido antes que eu tenha uma fodida dor de cabeça? Que
música?

Ten sorri de repente.

— Oh, eu gosto disso. Você vai ser boa para ele.

— Ten. — Grunhi, farta desta conversa. Estou realmente


ficando com dor de cabeça.

— Ele escreveu uma música sobre aquela noite que viu


você cantando aqui no karaokê, com a Jodi. — Explica ele,
suspirando. — Jesus, a banda toca essa música, como você
não conhece?

— Ah, não sei, talvez porque você está falando merda.


Não existe uma música assim. Acredite, estou familiarizada
com todas as canções da NonCastrato.

— Não. Na verdade, não acredito que esteja, mas deveria


estar.

Estou abrindo a boca para continuar discutindo quando


ele endireita o corpo e olha para alguém atrás de mim.

— Ele está vindo. — Diz.

— O quê?
Olho para trás e quase faço xixi na calcinha quando vejo
Asher se aproximando com uma caixa nas mãos. Ele deixa a
caixa no balcão e pega duas garrafas, antes de dizer a Ten
para decidir o que fazer com as cervejas que sobraram.
Depois tira as tampas e me passa uma.

— Por nossa melhor atuação até agora. — Brinda.

Sinto o corpo quente e esqueço tudo sobre Ten e o que


acabamos de discutir. Esta noite foi o melhor show da
banda? Oh Deus, amo ouvir isso. Bato minha garrafa com a
dele e dou um gole, levantando as sobrancelhas, surpreso.

— Santa merda. É boa.

Asher riu.

— Sim. Estou viciado nela.

Asher senta-se em um tamborete vazio e aponta para o


assento ao lado dele.

Procuro Jodi com o olhar e a vejo em uma mesa com


Galloway... sentada no seu colo enquanto ele coloca a língua
na garganta dela. Que nojo. Não sei para onde foi Holden, se
ainda continua aqui no bar. E já que não conheço ninguém
mais e não consigo pensar em uma boa razão para negar o
convite, sento-me no tamborete junto a ele, embora ainda me
sinta mal por estar enganando-o.

— Então, você toca a quanto tempo? — Pergunta ele.

Olho para as mãos de Asher. Eu gosto, são mãos de


músico, com dedos longos e magros e ele sempre as mantém
ocupadas. Agora mesmo está girando preguiçosamente a
garrafa sobre o balcão. É como se tivesse um excesso de
energia dentro dele e precisasse usar seus dedos para gastá-
la. Um tremor quente de luxúria me atravessa ao imaginar as
muitas maneiras mais produtivas que ele poderia usar seus
dedos. Deus, sou horrível. Concentre-se, Remy. Ele fez uma
pergunta.

— Desde criança. — Respondo, dando de ombros. —


Nós éramos vizinhos dos pais de Jodi e eles eram donos de
uma loja de música. Não dessas que vendem discos ou CDs,
mas uma verdadeira loja de música, que tinha pianos,
clarinetes, flautas, violões e todas essas coisas. Sempre que
eu ia para lá, eles estavam ouvindo as músicas mais legais
dos anos oitenta. Como minha família só ouvia música
Mariachi, visitar a casa dos Maleskys era como entrar em um
mundo totalmente novo e emocionante.

— E foi onde você comprou seu primeiro set de bateria,


claro. — Diz, dando uma piscadinha.

— Ah, você sabe... — Sorrindo, inclino meu queixo para


ele. — E você?

Asher dá de ombros e raspa a etiqueta da garrafa.

— Não sei. Sempre gostei de cantar. Quando eu era


criança, acho que era a única coisa que me fazia sentir
menos sozinho. Fui morar com meu tio aos sete anos e ele
passava muito tempo fora, então... — Ele encolhe os ombros
de novo, dizendo-me que não está muito confortável para
contar sua história. Mas, mesmo assim, continua falando. —
Um dia encontrei um velho violão no armário dele, e também
um folheto de instruções. Isso é tudo.

Olho para ele por uns bons cinco segundos.

— Espera, aprendeu a tocar sozinho?

Uma adorável expressão triste cruza seu rosto.

— Tive bastante tempo livre para praticar.

Ainda estou assombrada e minha boca aberta


provavelmente mostra isso.

— Meu Deus! Aprendeu mesmo a tocar violão sozinho?

Asher toma o último gole da sua Angry Orchard e


suspira. Depois, bate a garrafa no balcão e faz um gesto para
o Noel, indicando que precisa de outra.

Quando ele olha para mim posso dizer com certeza que
vai mudar de assunto. Isso me intriga. Um cantor, líder de
uma banda que não está interessado em falar sobre si
mesmo. Estranho.

E não é só isso, parece mais envergonhado do que


orgulhoso por eu estar impressionada que ele tenha
aprendido a tocar sozinho.

Fisher teria adorado qualquer elogio e contado toda a


história com riqueza de detalhes. Não que estivesse os
comparando. Não havia termos de comparação porque a
única coisa que eles tinham em comum é que ambos são
cantores em uma banda. Mesmo assim, realmente gosto mais
da atitude humilde de Asher.
— Então, qual é sua banda favorita? — Pergunta, quase
me fazendo sorrir por ter percebido que ele ia mudar de
assunto.

Eu bufo e faço uma careta.

— Como se pudesse reduzir a um só grupo.

— Entendo...

— Mas se tivesse que dizer, digamos... meu Top dez ou


algo assim, — Continuo, curiosa para saber se tínhamos
gostos similares. — Iria com o Metallica, Pink Floyd, Led
Zeppeling, Tom Pretty and the Heartbreakers, The Srones,
Incubus, Rush..., mas apenas pelo Neil Peart.

Asher sorri e concorda.

— O baterista. É obvio.

Sinto meus lábios curvarem-se com diversão e continuo


a minha lista.

— Beatles, Jimi Hendrix, Joan Jett, Heart, The


Bangles28...

Afogando-se com o gole que acabara de beber, Asher cai


na risada.

— The Bangles?

Franzo o cenho por ele rir das minhas Bangles.

— O quê?

28
The Bangles é uma banda Americana formada só por garotas.
— Nada. — Diz ele, fazendo um gesto com a mão. —
Simplesmente não esperava uma banda punk junto com
todos os grupos de rock que você estava citando.

— Ouça, elas tocam rock... algo assim. — Dou de


ombros. — Começaram com "Walk Like a Egyptian", uma
canção mais que divertida para tocar bateria. Para mim, esta
música está no topo com "Hot for Teacher", "Enter Sandman",
e "Tom Sawyer".

Havia mais bandas de garotas que eu amava, mas não


queria mostrar meu gênero ao listar muitas.

— Acredite, não estou descartando suas opções,


absolutamente. Concordo com cada uma delas. E ouça, já
ouvi muito Katy Perry e Taylor Swift e gosto delas, então não
se preocupe com gêneros musicais, pelo menos com relação a
mim.

— Homem, — Inclino-me para mais perto dele. — Não


fale sobre isso com o Galloway. Não acredito que ele seja
tão...

— Sim. — Asher levanta a mão para mostrar que minha


advertência não é necessária e dá de ombros
despreocupadamente. — Entendi. Eu gosto de todos os tipos
de música. Se tiverem um bom ritmo, letras geniais e
ressoarem em meus ossos, estou dentro.

Concordo respeitosamente.

— Legal.
Não digo que sou bastante parecida. Gosto de tudo,
country, rap, alternativa, hip hop, clássica... simplesmente
amo música.

— Mas cresci com meus pais ouvindo Nirvana.


Provavelmente por isso a maioria das nossas músicas se
inclinam para este estilo.

— Hum... definitivamente posso ver a influência.

Será que isto significa que ele tinha uma mão na criação
de algumas de nossas canções originais?

Quantas facetas esse cara podia ter na banda?


Guitarrista, vocalista, gerente e agora possível compositor?
Este menino precisava parar de dizer e fazer coisas para me
impressionar.

Asher espirra e imediatamente desculpa-se, pegando


alguns guardanapos de papel para limpar o nariz. E, merda,
gosto até mesmo da sua atitude educada, jogando o papel
usado em um cesto de lixo.

Argh! Minha fascinação por este cara está se tornando


ridícula. Preciso parar de pensar em como ele é sexy e voltar
para nossa conversa.

— Estive escutando Breaking Benjamin ultimamente. —


Digo, depois de tomar mais um gole.

— Mmm... — Asher aponta na minha direção enquanto


toma sua cerveja também. — Eu, Five Finger Death Punch.

— The Wrong Sede of Hell. — Falamos ao mesmo tempo,


imediatamente começamos a rir.
É o nome da nossa música favorita desse grupo.

— Bom, isso não é lindo? — Pergunta Ten, aparecendo


na nossa frente.

Fico tensa, espero que ele mantenha sua boca fechada.


Asher dá um pequeno gemido e balança a garrafa vazia na
cara do amigo.

— Não seja idiota. Só me consiga outra bebida.

— Homem, baixe a velocidade. Esta é o quê? A quinta da


noite?

— Não, é a.... — Ele franze o cenho como se estivesse


confuso.

— Terceira — digo.

— Certo. — Asher estala os dedos e aponta para mim. —


É a terceira... e a última, mãe.

— Quer outra? — Ten me pergunta, depois de uma


rápida careta.

— Hum, está bem. Una más.

Movo minha garrafa vazia para Ten, que está


balançando a cabeça.

— O quê? Que merda significa una más?

Reviro os olhos para ele.

— É espanhol. Significa uma mais. Por favor. Mas esta


vai ser minha última também. Provavelmente vou ter que
levar Jodi para casa... se é que já não foi com alguém.
Olho ao redor e fico surpresa ao vê-la ainda com o
Galloway, em sua mesa cheia de mulheres.

PARTE II

— Fiz dois anos de espanhol no ensino médio. — Diz


Asher. — E não aprendi uma merda.

Eu me volto para ele e sou atacada por uma nova onda


de luxúria. Merda, ele é muito bonito. E esses, olhos verdes
tão... intensos.

— Bom, toda minha família é do México, assim cresci


com um monte de gente que não sabe nada mais que
espanhol. — Explico. — É bastante comum para mim.

— Mesmo? Nunca teria pensado. Você parece tão...


americano.

— Sou americano. — Digo, arqueando uma sobrancelha.


— Nascido e criado aqui, em Illinois.

— Quero dizer... — Ele levanta uma mão e seus olhos se


acendem, como se estivesse preocupado de ter me ofendido.

— Meu pai era americano. — Explico. — Mas como não


lembro dele e fui criado pela família da minha mãe, sim,
pode-se dizer que meu lado latino é muito mais forte.
Provavelmente me apaixonei pelo rock porque era muito mais
exótico e emocionante do que o que estava acostumado a
ouvir em casa. Além disso, era divertido ser o rebelde no
grupo.

Com uma risada, Asher concorda.

— Isso faz sentido.

Ele está abrindo a boca para continuar quando duas


garotas se aproximam, e uma delas senta-se ao seu lado.

— Você é Asher Hart, não é? — Pergunta ela, passando


a mão no peito dele. — Nós adoramos seu show esta noite.

— Obrigado. — Diz ele, dando um sorriso amável, mas


afastando-se, obviamente incomodado com sua atitude.

Eu não consigo tirar os olhos das unhas pintadas de


vermelho, uma das mãos para cima e para baixo no peito dele
e a outra pelo estômago, indo em direção a virilha.

— Você tem a voz mais incrível de todos os tempos.

Asher segura o pulso da garota e dá um sorriso tenso.

— Fico feliz que você tenha gostado.

— Ouçam vocês! — Noel aponta às duas mulheres e as


manda embora com um gesto. — Esta é uma área VIP. Vocês
precisam sair daqui.

As duas bufam, descontentes, mas Noel entrecerra os


olhos e elas finalmente se afastam.

Assim que se libera das mãos da garota, Asher gira no


banquinho e esconde as pernas em baixo do balcão... bom,
porque assim as mulheres não podem subir no seu colo.

— Obrigado, homem. — Diz ao Noel.


— Oh... faço qualquer coisa por nossa pequena e
delicada flor. — Brinca ele, tentando beliscar as bochechas de
Asher e recebendo um tapa na mão e um palavrão.

Noel se afasta rindo e um Asher ruborizado dirige seu


olhar para mim.

— Sinto muito. Elas podem ser realmente... atiradas.

Mais uma vez fico surpresa. Fisher teria “dado corda”


para as meninas e eu só fui perceber isso depois que terminei
com o idiota. Sim, foi uma decepção saber que ele dormia
com uma nova garota cada vez que saía sozinho.

Tomo um pequeno gole de cerveja enquanto estudo o


rosto de Asher. Ele está olhando por cima do ombro para as
garotas que Noel tinha espantado e sua expressão me deixa
confusa, porque definitivamente vejo ali um brilho de
interesse. Mas também há uma desconfiança que não
combina com a atração.

— E... você não gosta das atiradas? — Não consigo


evitar a pergunta.

Ele olha para mim com os olhos verdes surpresos e em


seguida dá de ombros.

— Não sei. É que... — Ele dá de ombros outra vez. —


Acho que eu gosto de ser o que persegue, sabe. E
ultimamente não tem sido possível. — Completa, com um
último olhar para as meninas.

— Posso imaginar.
Eu com certeza havia experimentado a mesma sensação
que as outras mulheres tiveram esta noite.

— É vergonhoso. — Admite ele, aproximando-se e


baixando o tom de voz. — Todas elas se amontoam a minha
volta como se eu fosse algo, não sei, assombroso e não sabem
uma merda sobre mim. Sou só um cara normal e não posso
deixar de pensar que ficariam decepcionadas se realmente
chegassem a me conhecer.

Bem, não estou de acordo nesse ponto. Até agora ele


está parecendo ser um cara muito interessante... cada vez
mais.

Então, graças a Deus, Jodi aparece, antes que eu diga


qualquer coisa da qual possa me arrepender. Talvez, eu
tivesse deixado escapar que não acho, de maneira nenhuma,
que ele é chato.

Ela se joga em mim rindo, obviamente bêbada até a


bunda e quase me atira em direção a Asher. Preciso por um
pé no chão e me segurar no bar.

— Olá, puta. — Exclama, colocando os braços em volta


do meu pescoço e dando um grande beijo descuidado na
bochecha da máscara. — Oh meu Deus, está tão quente esta
noite. Eu já disse o quanto esse disfarce é bom? Você vai me
levar para casa? Poderia te dar uma falsa chupada no carro.

Deixo escapar uma risada nervosa, feliz por ela não ter
dito nada revelador, além de me chamar de puta e oferecer
uma falsa chupada. Espero que Asher não tenha captado
nada disso. Mesmo assim, ela está tão bêbada que pode me
delatar a qualquer momento.

— Sim, vou levá-la para casa. — Respondo, colocando


um braço ao redor da sua cintura para mantê-la em posição
vertical. — Você “caiu dentro do copo”, garota.

— Sinto-me bem. — Diz ela, inclinando a cabeça para


frente para ver quem está sentado ao lado.

Jodi arregala os olhos e fica sem fôlego.

— Oh meu Deus, aí está o magnífico cantor da sua


banda. De novo. Não quer lambê-lo? — Ela começa a subir no
meu colo para chegar até ele. — Olá... Asher Hart? Posso
lamber você?

— Jodi, — Puxei-a de volta para o outro lado. — Calma,


moça. Nada de lamber os meus companheiros de banda.

Ela enruga o nariz e faz uma careta.

— Assim não é divertido. Além disso... — Ela mostra a


língua. — Acabei de fazer sexo oral em baixo da mesa naquele
filho da puta do Billy, para conseguir minha calcinha de
volta. E minha língua esteve por toda parte...

Coloco a mão sobre a boca de Jodi para impedi-la de


continuar. Então lembro de onde ela acabara de colocar essa
boca e afasto rapidamente a mão, limpando-a no jeans. Yuck!

Dou uma olhada em Asher e sussurro sinto muito. Ele se


limita a rir.

— Está tudo bem.


— Quanto tempo você acha que vamos levar para
desmontar tudo?

Asher faz um gesto com a mão e balança a cabeça.

— Não se preocupe com isso. Eu me encarrego de tudo.


Só leve está encantadora dama para casa em segurança, que
vai ficar tudo bem.

Jodi ri e apoia a cabeça no meu ombro.

— Ouviu isso? Ele disse que sou encantadora.

— Ele chamou você de dama, por isso, é óbvio que


bebeu muito também.

— Ouça. — Murmura Jodi indignada, beliscando meu


braço e me fazendo pular. Neste momento o telefone do Asher
toca e enquanto ele atende, minha companheira de
apartamento inclina-se para sussurrar no meu ouvido: — Já
contou que é uma garota? Você disse que ia contar depois do
show desta noite. Aposto que ele vai levar o maior susto
quando souber.

— Shh... — Faço uma careta e balanço a mão para


impedi-la de falar. — Ainda não.

Depois desta noite meus objetivos mudaram. A energia


que eu senti ao tocar em público foi impressionante e adorei
como as pessoas reagiram, como elas gostaram.

E Asher... sentada aqui, falando com ele... percebi que


não quero deixar a banda.

Então, preciso de um novo plano. Tenho que ser


cuidadosa e convencer os meninos a me deixarem na banda
mesmo depois de revelar minha verdadeira identidade. Se
jogar as cartas certas, talvez, eles aceitem uma garota.

Mas antes que eu pudesse explicar isso a Jodi, Asher


segura meu ombro.

— Santa merda, Sticks, você não vai acreditar. — Ele


está com a voz emocionada e sacode meu ombro com força.
— Era o dono de um clube em Chicago. Ele estava aqui esta
noite, viu o show e quer que a gente toque em um dos seus
clubes. No próximo sábado. Ele nos ofereceu vinte mil dólares
por uma noite. Pode acreditar?

Fico de boca aberta enquanto Asher joga a cabeça para


trás e solta uma risada feliz e aliviada.

— Estou trabalhando há mais de um ano por uma


oportunidade como esta. Então, você está conosco por uma
noite, uma fodida noite, e boom, temos uma oferta de
Chicago. Você nos trouxe sorte!

— Eu...

Não consigo dizer nada. Balanço a cabeça tão surpresa


quanto ele e muito, muito nervosa.

Mas realmente, apesar disso... Mierda! Não posso contar


nada agora. E se eles ficassem furiosos e me expulsassem da
banda? O que iriam fazer? Eles precisavam de um baterista
para o próximo fim de semana.

Não posso decepcioná-los. Não posso decepcionar Asher.


Ele está tão lindo agora, um pouco louco e emocionado. E
sim, merda, realmente quero tocar nesse clube em Chicago,
também.

Então, suponho que isto significa que Sticks, o


baterista, vai ter que ficar na banda um pouco mais.
PARTE I

ASHER
Essa ligação... foi maravilhosa, incrível e mudou a
minha vida. Desde que atendi o telefone sou uma mistura de
antecipação e nervosismo.

Entretanto, tudo isso parece ter o dedo de Pick. Quero


dizer, sério, por que um bem-sucedido dono de um clube de
Chicago estaria aqui em Ellamore e no Forbidden, entre todos
os lugares, para nos ouvir tocar?

Tenho a sensação de que meu novo irmão tinha puxado


alguns fios para trazer o cara aqui. E, quando fui perguntar
diretamente a ele sobre isto, disse que estava muito ocupado
naquele momento para falar.

Não sei o que fazer. Só agradecer e seguir em frente?


Tentar recompensá-lo de algum jeito? Pedir que pare, porque
sei que algum dia ele vai se arrepender de me ajudar?

Como não tenho ideia do que fazer, decidi não pensar


nisso agora. Vou concentrar-me nos prós... como o fato de
que a NonCastrato acaba de receber uma oportunidade única
na vida.

Coisas boas estavam a ponto de acontecer, eu posso


sentir... como uma descarga de adrenalina disparando por
minhas veias. Tenho milhares de ideias para novas canções e
minha insônia crônica alcançou um novo nível.

No dia seguinte à tarde, eu me sento no assento de uma


velha bicicleta para rabiscar algumas letras em meu caderno.
Paro por alguns segundos para cantar as palavras na minha
cabeça, marco uma frase, ou às vezes, toda uma linha que
não funciona bem e escrevo algo novo em cima.

Acabo de elaborar uma estrofe que fez meu coração


acelerar com entusiasmo, quando alguém me chama.

— Toc, toc.

Levantando os olhos, sorrio para o novo baterista.

— Ouça, homem. Chegou cedo novamente. Isso vai


acabar virando hábito, certo?

Sticks encolhe os ombros e entra na garagem,


carregando uma sacola de algum restaurante de comida para
viagem. Que merda...cheira muito bem.

— Não chego mais cedo que você.

— Touché. — Murmuro, vendo-o sentar-se na banqueta


da bateria, abrir a sacola e tirar uma coisa com aspecto de
burrito frito que faz minha boca salivar e me lembra que
passou muito tempo desde a última vez que comi.

Nunca me lembro de comer ou dormir quando me sinto


inspirado. Mas assim que Sticks dá uma mordida no
empanado frito, não resisti.

— Que diabos é isso? Tem um cheiro incrível.


Parando na metade da mordida, ele levanta as
sobrancelhas e olha na minha direção.

— Sinto muito. — Diz, depois de mastigar cobrindo a


boca com a mão. —Tive que vir direto do trabalho e estou
morrendo de fome.

— Não. — Respondo, balançando a mão. — Não me


importo por você estar comendo. Está tudo bem. Quero dizer,
especificamente, o que é isso que está comendo?

— Oh! É uma chimichanga29. — Quando passo a língua


nos lábios, ele arqueia uma sobrancelha e estende a tortilha
na minha direção. — Quer uma? Tenho mais na sacola.

— Sério? — Fico de pé imediatamente. — Merda, quero


sim.

Sorrindo com arrogância, Sticks pega outra


chimichanga e me entrega. Agradeço, desembrulho, dou a
primeira mordida, e isso é tudo... estou morto. Passamos os
próximos minutos em silêncio, comendo com voracidade
antes que pudéssemos formar uma palavra coerente.

Finalmente, levanto minha quase terminada


chimichanga e anuncio com a boca cheia: — Isto é bom.

— Eu sei. — Sticks limpa a boca com um guardanapo.


— Minha família é proprietária do restaurante. Cresci com
esta merda.

— Idiota de sorte.

Tortilhas mexicanas recheadas com carne moída, legumes e temperos.


29
Dando um pequeno gemido, fecho os olhos e como o
último pedaço, tomando nota mentalmente do nome do
restaurante impresso na sacola. Preciso ir ao Castañeda's e
comer o menu completo.

— Sério, não era minha intenção interromper o que quer


que você estivesse fazendo. — Ele faz um gesto para meu
caderno abandonado do outro lado da sala.

Encolho os ombros.

— Não se preocupe, já escrevi o que precisava. Tem


algum alimento extra aí que não queira?

Com uma risada, ele vasculha dentro da sacola.

— Tenho duas empanadas.

Não tenho ideia do é isso, mas assim que ele me


entrega, minha boca se enche de água.

— Você é um maldito santo.

Sticks me observa comer por alguns segundos antes de


levantar as sobrancelhas e abrir a boca para falar alguma
coisa. Quando ele não diz nada faço um gesto, estimulando-o
a falar. Seus ombros caem um pouco e ele limpa a garganta.

— Lembra o outro dia, quando disse que eu podia ver as


partituras? — Eu confirmo e o observo ficar envergonhado. —
Esta oferta ainda está de pé?

— Sim. — Limpo a ponta dos dedos no jeans, mas


gostaria mesmo de lambê-los. — A caixa está lá.
Normalmente deixo aqui na garagem, caso a gente precise e
também porque tem menos probabilidade de alguma coisa
sumir.

Ele deixa a sacola ao lado do seu banco e vai em direção


a caixa. Eu volto para a bicicleta e tento criar uma linha para
completar as últimas que havia escrito, mas nada parece
adequado.

— Aqui tem algumas faturas, também — Diz Sticks de


repente, fazendo-me levantar os olhos para vê-lo franzindo o
cenho para a minha caixa.

— Sim. — Balanço a caneta. — Coloquei tudo que está


relacionado a banda aí. Como um arquivo. É simples e me
ajuda a manter um registro de onde estão as coisas.

— Sério? — Suas sobrancelhas se elevam com


incredulidade. — Porque não sei como pode encontrar uma
merda aqui. Isto é um maldito desastre.

Tenho que rir do horror no rosto dele.

— Sinta-se à vontade para organizar como quiser, só


não perca nada.

Ele bufa.

— Você está preocupado que eu perca alguma coisa?


Incrível!

— Oh, cale-se sabichão. — Digo rindo, antes de reler a


última linha e finalmente criar uma frase nova.

Estou fazendo alguns acertos na nova canção quando


Holden chega. Sticks tenta conversar com ele enquanto
espalha os papéis ao redor da caixa, mas não tem muito
sucesso. O cara só responde com grunhidos ou uma sacudida
de cabeça.

Cinco minutos depois Gally aparece e uma vez que


estamos todos aqui, eu solto a caneta e começamos a discutir
que músicas vamos tocar em Chicago.

Para nosso novo baterista, adicionei “Hot for Teacher30” à


nossa lista de covers. Ainda não tínhamos composições
originais suficientes para um show inteiro, então fazíamos
alguns covers. Essa música em especial me lembrava o Noel,
que fodeu a sua professora na universidade e casou-se com
ela. Quando contei isso, Sticks riu com prazer, o que me fez
sorrir também.

Ninguém contestou a sério a seleção de músicas que fiz,


foi a ordem no show que fez com que Gally saísse pela
tangente.

— Homem, "StoneHearted" é nosso maior sucesso.


Temos que começar com essa merda.

— Não concordo. — Diz Sticks. — Nenhum show que


estive começou com a canção mais popular. Tem que esperar
um pouco, para que a gente tenha tempo de ganhar o público
e então eles estarão esperando por ela. Um pouco antes da
metade do show é melhor.

O que é exatamente onde eu havia colocado. Dou um


sorriso agradecido, mas Gally bufa.

— Cale-se veado. Você não pode opinar.

30
Música de Van Halen.
— Ouça! — Grito, olhando para Gally. — Pode parar já
com os comentários depreciativos. E sim, ele pode opinar.
Sticks agora é tão membro da NonCastrato como qualquer
um de nós.

— Que seja. — Murmura Gally, dando alguns grunhidos


obscenos, mas pelo menos cruzando os braços e fechando a
boca.

— Acho que não podemos tocá-la no início também. —


Diz finalmente, Holden. — Três contra um.

Ele se vira para Gally sorrindo, talvez, feliz demais.

— Disse que seja, merda, — Rosna Gally. — Mas acho


que então deveríamos começar com uma do Kongos, “Come
with Me Now”.

— Provavelmente deveríamos começar com uma original.


— Argumenta Sticks.

Sabia que Gally ia dizer outra coisa totalmente


descabida e estava pronto para cortá-lo, mas no último
segundo ele fecha a boca e passa a mão pelos cabelos, verdes
hoje.

— Diabos, por que o gay aqui simplesmente não decide


tudo?

— Para ser honesto. — Digo — Já tinha uma ordem


planejada e sim, a primeira canção que coloquei foi “Ceilings”.

Sticks me mostra os dois polegares para cima e articula


boa escolha. Preciso desviar o olhar para não sorrir, porque
tenho a sensação de que Gally ficaria ainda mais furioso.
Então, li a lista completa. Cada um deu a sua
contribuição, e assim adaptamos a ordem das músicas até
que quase todos ficassem felizes. Quando vamos ensaiar
algumas das canções, estou tão preparado para mergulhar na
música que escolho aquelas que mais me desafiam
vocalmente, que me obrigam a usar todo o potencial da
minha voz.

No final do ensaio minha garganta está um pouco


dolorida pelo exercício, mas me sinto melhor do que nunca,
de um jeito que só é possível quando canto.

— Merda, homem. — Diz Stick com assombro. — Você


pode cantar a plenos pulmões qualquer música.

Sorrio, divertido com o jeito que ele falou.

— Não seja tão humilde com você mesmo, garoto da


bateria. Não estava mentindo quando disse que você fez uma
ótima interpretação de “Hot for Teacher”.

— Oh Jesus. — Geme Gally. — Vou embora antes que


comecem a elogiar as bolsas e os laços de cabelo um do
outro. Vão para o shopping juntos, se isso faz vocês felizes.
Merda.

Com isso, joga a alça do baixo sobre o ombro e vai


embora pisando forte.

— Gally não gosta quando as coisas não saem do jeito


que ele quer. — Diz Holden, em uma voz profunda e
tranquila.
— Isso ou simplesmente está de TPM. — Adiciona
Sticks.

— Bom, acredito que temos uma lista decente para tocar


no sábado, apesar do humor dele. — Digo, rindo

— Certo. — Concorda Sticks, ficando de pé e esticando


os braços. — Vamos sacudir esse clube.

Ele retorna para a caixa com as partituras e faturas,


continuando de onde parou sua autoproclamada tarefa de
organização. Guardo a guitarra e Holden faz o mesmo,
despedindo-se com um aceno antes de sair, silenciosamente.

Sticks olha na minha direção com o cenho franzido


quando sento em cima da mesa, um lugar mais cômodo que o
assento da bicicleta.

— Você não tem que ficar aqui por minha causa, posso
fechar a porta quando sair.

— Certo. Mas como também temos que fechá-la com um


cadeado e você ainda não tem a chave, acho que tenho que
ficar.

— Oh! — Ele fica de pé subitamente. — Merda, sinto


muito. Posso ir então. Não era minha intenção segurá-lo aqui.

— Não, sério. — Faço um gesto para que retorne. — Não


estou com pressa. Só tenho que estar no trabalho daqui a
uma hora mais ou menos. E isto... — Aponto para o caderno.
— Posso fazer aqui ou em casa.

Ele volta a sentar-se de pernas cruzadas no chão,


cautelosamente.
— Bom, se você não se importa... preciso terminar de
organizar está merda ou vou ficar louco.

Com uma gargalhada, balanço a mão.

— Faça o que quiser, homem.

Trabalhamos em total silêncio por um tempo, até que de


repente Sticks começa a falar.

— Todas estas músicas estão escritas com a mesma


caligrafia.

— Sim. — Levanto os olhos com curiosidade. — É uma


pergunta?

— Não, eu só...

Sticks analisa várias partituras e então levanta


rapidamente a cabeça para me olhar boquiaberto.

— Espera. Você...?

Arqueio uma sobrancelha, esperando que continue.

— Quantas canções você escreveu para a NonCastrato?


— Solta ele, abruptamente.

Inclino a cabeça para o lado, confuso.

— Todas. Por quê?

— Tod... Todas?

— Sim, claro.

— Inclusive “Ceilings”?

Incapaz de me conter, sorrio.

— Sim. Por quê? Você gosta dessa, certo?


Eu sabia que sim. Era a única que ele sempre pedia.

— Eu adoro. — Diz efusivamente. — Não posso acreditar


que você escreveu essa música.

— Sim, dá para ver que é sua favorita. O que ela tem


que você gosta tanto?

Ele levanta uma mão como se fosse tirar o cabelo dos


olhos, mas não havia nada ali. O movimento me faz franzir o
cenho, porque vi Caroline fazer a mesma coisa muitas vezes.
Eu me pergunto se ele tinha o cabelo comprido antes.

— Não sei... acho que lembra minha mãe. — Responde


finalmente.

Isso chama minha atenção.

— Sério? Sua mãe?

— Sim, ela uh... esteve metida com drogas quando eu


era mais jovem. — Murmura.

Entendo imediatamente.

“Ceilings” era uma canção deprimente. A letra contava a


história de uma garota que passou a vida olhando para o
teto, durante seus momentos mais cruciais. Apaixonou-se
enquanto estava deitada no banco traseiro do carro do
namorado, com os olhos cravados no teto. Contemplou o teto
baixo de uma oficina mecânica onde se escondia, quando um
acidente de carro o matou. O teto do hospital foi o que viu,
enquanto dava à luz ao bebê do seu amante morto aos
dezesseis anos. Ela chorou neste mesmo lugar quando tomou
a decisão de fugir do hospital e abandoná-lo. Quando sua
família se recusou a acolhê-la, envolveu-se com um traficante
de drogas que a transformou em uma viciada e olhou para o
teto do banheiro enquanto tentava abortar o bebê daquele
homem.

Finalmente, fixou o teto baixo da sala da sua casa, onde


ele a matou.

— É uma história tão comovente e realista... sempre me


deixa arrepiada. — Diz Sticks, esfregando os braços. — E
cada vez que ouço, não sei... automaticamente penso na
minha mãe.

Olho para ele em silêncio, experimentando uma


estranha conexão que nunca tive com mais ninguém antes.
Porque o que ele disse... era exatamente igual para mim,
também. Sempre pensava em minha mãe quando cantava.
Provavelmente porque era sobre ela...

PARTE II

Remy dá de ombros e continua.

— Quero dizer, se a família não tivesse intervindo,


facilmente ela cairia nesse tipo de vida, indo viver com um
cara que a espancaria até matá-la. Merda, se não fosse por
meu tio e avó, ela provavelmente teria me deixado no hospital
ou abortado.
Meu coração dá um salto no peito, porque entendo
totalmente o que ele diz.

— Isso é uma droga. — Murmuro. — Como ela está


agora?

Mas já sei que não é um final feliz. Não conheço


ninguém que esteve seriamente envolvido com drogas e
conseguiu superar.

Sticks baixa o olhar para as mãos.

— Seu cérebro não suportou e ela foi para uma


instituição de doentes mentais.

— Jesus. — Balanço a cabeça com simpatia. — Sinto


muito, homem.

— Não é sua culpa. Eu sou o pior filho que existe,


porque não suporto visitá-la. Dói muito. Ela nunca lembra
quem eu sou. A última vez, pensou que eu era sua irmã.

— Quer dizer que ela pensou que era sua irmã? —


Pergunto confuso.

A expressão no rosto de Sticks congela.

— É... sim. O que eu disse?

— Disse que ela pensou que você fosse sua irmã.

— Oh! Merda. Sinto muito. Mas se não fosse por minha


abuela e tio Alonso, é difícil saber onde ela teria terminado.
Com certeza em nenhum lugar decente.

Quando ele começa a brincar com a medalha do colar


que estava usando, eu levanto uma sobrancelha.
— Abuela?

— Sim. Avó em espanhol. Ela, o irmão mais velho da


minha mãe, tio Alonso, e dois de seus irmãos mais novos e
suas famílias, vieram para os Estados Unidos dois anos antes
de eu nascer. São um grande grupo muito religioso, que estão
sempre se metendo nos assuntos uns dos outros, mas...
respeito-os por isso. É o que os mantém juntos, você sabe,
eles se preocupam... com eles, estou muito melhor do que
estaria se estivesse sozinho.

Continuo observando-o brincar com a medalha até que


minha curiosidade ganha.

— É uma relíquia de família?

— Mmm? Isso? Não. Bom... suponho que sim. Minha


abuela disse que era da sua mãe. É só uma medalha da
Virgem de Guadalupe.

— Quem? — Pergunto, balançando a cabeça.

Sticks sorri.

— A Santa... Guadalupe. É famosa no México. Se vir


alguém usando isto, provavelmente é mexicano.
Pessoalmente, não sou muito religioso, mas... não sei. Gosto
de usá-la. Lembra minhas raízes, minha família. Sinto-me em
paz, como se estivesse em casa outra vez. Minha família... é
estranho, ninguém pode ser tão louco quanto eles. Todos
completamente diferentes de mim, mas... eu os adoro. Amo
sua cultura, o orgulho latino e tudo o que os faz ser eles. São
minha herança. Minha base.
— Isso é lindo. — Observando o ouro da medalha da
Virgem de Guadalupe brilhar, de repente desejo ter alguma
herança de família também. Mas não. Não tenho nada disso.
Baixo o olhar para o chão, onde estava mexendo em uma
corda de guitarra com a ponta do tênis. — Minha mãe... ela é
a garota da canção. Então, minhas raízes conseguiram ser
eliminadas da face da terra junto com ela.

Não sei por que disse isso. Talvez, porque ele havia
contado sobre sua mãe e eu senti que deveria contar algo
sobre mim, especialmente porque vivemos situações
similares.

Sticks fica parado um segundo antes de arregalar os


olhos.

— Quer dizer, em “Ceilings”? Escreveu sobre sua mãe?


É tudo... Real?

— Cada palavra.

— Mas... — Ele balança a cabeça e posso ver que está


tentando descobrir qual menino eu sou, se o que ela havia
deixado no hospital ou o que tinha tentado abortar.

— Eu sou sua tentativa fracassada de aborto, o engano


que cometeu com o traficante de drogas.

Remy fica de boca aberta.

— Uau. Assim o que... Espera... então, seu pai...?

— Está na cadeia. Statesburg — Acrescento,


estupidamente.

— Que merda. Onde você estava quando... você sabe...?


— Matou-a? Sentado no sofá. — Não tenho ideia do
porquê respondi. Não queria falar sobre isso. Mas continuo...
falando. — Comendo um prato de cereal e vendo os Power
Rangers na televisão.

Aquela velha e familiar sensação de culpa me invade.


Não sei ao certo como combatê-la, então apenas passo a mão
pelo cabelo e vou em frente com a história.

— O traficante chegou em casa pela manhã, depois de


passar a noite fora, provavelmente com outra mulher e
perguntou onde ela estava. Respondi que estava em seu
quarto, mas não falei que não estava sozinha. E não me dei
ao trabalho de correr para avisá-la que ele tinha chegado em
casa, porque só me metia em problemas quando tentava fazer
alguma coisa. Mas, Jesus, não posso evitar de me
perguntar... e se eu tivesse tomado uma atitude naquela
manhã? Talvez, se tivesse parado de comer meu cereal e
olhar para televisão, as coisas teriam sido diferentes...

— Quantos anos você tinha? — Pergunta Sticks,


lentamente.

Balanço a cabeça. Não importa. Eu tinha idade


suficientemente para saber que brigariam quando ele a
encontrasse na cama com um dos seus companheiros
traficantes. Mesmo assim respondo: — Sete.

— Jesus! Que merda você acha que pode fazer uma


criança de sete anos?

— Não sei. — Olho para a parede sem ver nada. —


Alguma coisa. Quando ele finalmente os encontrou juntos,
ainda não fiz nada. Meu pai começou a gritar e o outro cara
saiu correndo do quarto, arrumando as calças. Então mamãe
começou a gritar. Suponho que ela pegou algumas roupas e
ameaçou ir embora, porque entrou furiosa na sala,
carregando uma mala com as roupas saindo pelos lados.
Quando abriu a porta principal...

— Espera. Ela planejava deixar você lá?

O choque nos olhos do Remy me faz sorrir levemente.

— Não seria a primeira vez. Mas ela sempre voltava


porque precisava das drogas, então não fiquei muito
preocupado por não voltar a vê-la. Quando meu pai fechou a
porta para evitar que saísse e bateu nela, também não me
surpreendi. Eles batiam um no outro o tempo todo. E se eu
tentasse ajudar um deles, o outro se zangaria e bateria em
mim. Então, continuei ali sentado como um idiota...
enquanto ele a matava.

— Porra, Asher. O que aconteceu não foi sua culpa.


Você não pensa realmente que poderia tê-lo detido e salvo
sua mãe, não é? Ele simplesmente teria ficado furioso e
matado você também.

— Poderia ter corrido e chamado alguém para ajudar.


Mas simplesmente fiquei sentado observando enquanto ele
empurrava a televisão e quebrava. Quando caiu sobre ela e
saíram faíscas por toda parte, ela gritou de dor e eu... Só
olhei. Somente quando ela estava morta e seus olhos sem
vida olhavam para o teto, fiz alguma coisa. Meu pai me olhou
com emoção e pânico, e eu soube... o próximo seria eu. Tinha
visto tudo. Então... finalmente, foi aí que corri.

— Meu Deus! — Sticks coloca a mão sobre a boca. —


Para onde você foi? Ele conseguiu te pegar?

Tremi, de repente incomodado por ter contado tanto.

— Para a casa dos vizinhos. O velho que morava ali me


deixou ficar até a polícia aparecer, então não... meu pai
nunca me apanhou. Não o vi mais nesse dia. O próximo lugar
em que nos encontramos foi no tribunal, quando tive que dar
meu testemunho.

Droga, isso foi... intenso. Limpei a garganta e olhei os


papéis que ele segurava.

— Se quiser, pode levar a caixa para casa. Traga depois.

Não quero ficar mais tempo aqui, não depois de tudo


que falei.

— O quê? — Sticks olha para suas mãos e vê os papéis.


— Merda. Sinto muito. Mas sim, vou levá-la para organizar.

Ele está guardando as partituras dentro da caixa


quando de repente arregala os olhos e congela.

— O que é isso? Oh... maldição. — Sussurra.

— O quê? — Pergunto, curioso... E um pouco aliviado


pela mudança de assunto.

Olhando com uma expressão aturdida, ele balança o


que parece uma folha escrita com minha letra, acho que uma
das nossas canções.
— Isto não é.... não tocamos esta música. De onde saiu?

Pego o papel da sua mão para ver o que tem ali.

— Oh, Jesus. Preciso queimar está coisa.

— Não! — Sticks dá um pulo e arranca a folha das


minhas mãos para colocá-la protetoramente junto a seu
peito, olhando-me com horror. — Você não pode. Apenas... O
que é isto?

Suspiro e meus ombros caem em derrota. Falar nisso


era quase tão ruim quanto contar o que aconteceu aos meus
pais.

— É apenas uma droga de música que escrevi, logo


depois de ver uma garota cantar no karaokê do bar.

— Isto é mais que ver uma garota. — Seu olhar se move


pela página. — Você quer saber tudo sobre ela, casar e ter
filhos. Fazê-la sua única garota...

— Certo, obrigado! — Arranco a folha de suas mãos com


uma careta. — Não precisa ler a letra, eu escrevi e lembro o
que disse... infelizmente. — Quando Sticks me olha como se
eu estivesse ficando louco, faço um gesto com a mão,
sugerindo que não é grande coisa. — Olhe, é só uma música
que uma estranha que nunca vi antes, ou verei outra vez,
inspirou. Não significa nada.

Ele entrecerra os olhos, deixando-me saber que não


comprou o que eu disse.

— Então, por que é tão suscetível a respeito?


— Porque, — Aperto os dentes. — Tocamos uma vez no
Forbidden. Uma vez. Uma maldita vez e todas as mulheres
ficaram loucas tentando me convencer de que eram ela. E
quer saber a pior parte? Não acredito que vá reconhecê-la se
alguma vez a vir de novo. Vi uma vez há meses atrás, no lado
oposto de onde eu estava, acho que por três minutos. E, além
disso, ela tinha namorado, então não entendo porque todos
fizeram uma grande coisa disso. Não foi amor à primeira vista
como todos meus amigos ficam dizendo. Tenho certeza. Foi
só...

— Luxúria? — Pergunta Sticks, com calma.

Faço uma careta, imediatamente negando.

— Não. Quero dizer, sim, houve isso também. Mas foi...


mais. Como... não sei. Um desejo. Uma esperança. Uma... —
A palavra correta não me ocorre até que a digo em voz alta. —
Uma possibilidade. Como se de repente quisesse tentar algo
que nunca tive antes.

— Uma pequena beleza latina? — Sussurra ele,


parecendo quase com dor.

— O quê? — Pergunto confuso.

Ele pega a folha e aponta para letra.

— Você falou isso na... na canção.

— Foi? Ah sim, bem. Mas, não, não é neste sentido que


falo. Não tem nada a ver com aparência, embora ela fosse
bonita. Tem mais a ver com.... Um sentimento. Algo quente.
Bem ali, observando-a cantar, era onde eu pertencia no
universo. Como se tivesse encontrado meu lugar. Tudo.... se
ajustou.

Remy fica de boca aberta e me dou conta que outra vez


falei demais.

Limpo a garganta e coço a nuca.

— Como você vê, foi bem estúpido. Só uma falha


momentânea em meu louco radar. Nunca a verei de novo e
provavelmente é melhor para ela.

Quando ri da minha própria brincadeira, Sticks não se


juntou a mim. Bem pelo contrário, abaixou-se
repentinamente e começou a guardar os papéis dentro da
caixa.

— Tenho que ir. — Avisa.

— É... — Olho para baixo, surpreso com a sua pressa.


— Claro.

Agora me sinto realmente desconfortável por tudo que


contei. Merda. Será que vai querer sair da banda porque
descarreguei meu drama pessoal nele?

— Tem certeza que está tudo bem se eu levar a caixa


inteira? — Pergunta, sem fazer contato visual.

Era como se de repente tivesse medo de me olhar nos


olhos.

— Tenho. Está tudo... bem?

— O quê? — Sticks levanta seus olhos escuros ardentes


e não parece que está tudo bem. — Sim, claro. Sinto muito,
apenas... lembrei que tenho que estar em um lugar. Agora.
Desculpe, tenho que...

— Ir. — Termino por ele.

— Exato. — Diz, fazendo um gesto de gratidão por eu ter


falado a palavra que estava procurado.

Sticks levanta-se do chão preparado para sair


rapidamente. Mas quando quase tropeça em mim e preciso
dar um passo para trás para lhe dar espaço, parece
finalmente perceber minha presença.

— Merda, sinto muito. Uh... — Ele olha nos meus olhos


de novo e acredito que vê o quanto eu estou preocupado,
porque deixa escapar um suspiro e seus ombros caem. —
Não é sua culpa.

Franzo a testa sem entender sobre o que ele está


falando. Não era culpado por trazer uma carga de desconforto
a nossa conversa, fazendo-o querer ir embora rápido? Ou não
era minha culpa que...?

— Que ela morreu. — Esclarece. — Sua mãe. Sério, você


só pensa em tudo que poderia ter feito nesse dia. Mas sabe
que iria terminar... como terminou. A única coisa que poderia
ter mudado é que você morreria com ela.

Dou um passo para trás diante dessas palavras. Sempre


pensei que as coisas pudessem ser diferentes e em cada
realidade alternativa que criei na cabeça, era capaz de salvá-
la.
Mas possivelmente Sticks tem razão. Eu não teria sido
capaz de salvá-la e me dar conta disso é surpreendente.

— Realmente, tenho que ir. Vejo você na segunda-feira?


No ensaio?

Concordo, distraído com os pensamentos que ele


colocou na minha cabeça.

— Sim, certo. Nos vemos na segunda.

Não noto quando ele se vai. Deixo-me cair sobre a mesa


e passo as mãos no cabelo, perguntando-me... Remy tem
razão? A morte da minha mãe era inevitável?

Talvez, eu não fosse tão culpado como sempre achei.


PARTE I

REMY
Entro no meu apartamento com a caixa oficial da
NonCastrato nos braços sem conseguir parar de pensar em
tudo o que fiquei sabendo no ensaio de hoje... ou melhor,
tudo o que havia descoberto depois do ensaio.

Ficar sabendo sobre infância de Asher e seus pais me


deixou chocada. Mas então vi aquela música. Aquela incrível
e maravilhosa música...

Ten não estava louco afinal, havia realmente uma


música da NonCastrato que nunca ouvi. E entendo porque
Asher não quer tocá-la... é tão pessoal, tão reveladora, tão...
eu. Bem, pode ser a meu respeito, não posso ter certeza. Só
que todos os detalhes se encaixam. Por Deus, encaixam-se
muito bem.

Com os pensamentos dispersos em milhões de pedaços,


coloco a caixa sobre a mesinha onde sempre deixo as chaves
e a carteira e olho distraidamente para Jodi, que está vendo
televisão no sofá.

Não sei se ela me cumprimentou e não tenho ideia se


respondi, porque já estou revirando a caixa em busca
daquela música. Quando a encontro, pego a página com
minhas mãos trêmulas e releio a letra. Parece tão certo e,
entretanto... não posso acreditar.

A ideia de que Asher me viu uma vez e ficou tão


balançado pelo encontro que havia escrito uma... canção de
amor, fantasiando todo um futuro cheio de possibilidades
entre nós, é mais do que posso assimilar.

— Jodi. — Digo, ainda olhando os sonhos manuscritos


de Asher até que fico parada entre a televisão e ela.

— Shh... — Jodi faz um gesto para que eu saia da frente


da tela. — Olhe isto.

Ela aponta para... Santo guacamole... ela está vendo as


notícias? Quem é esta mulher e o que fez com minha
companheira de apartamento?

— Fecharam Statesburg. — Continua. — Aquela prisão


imensa não muito longe daqui. Parece que houve um grande
escândalo com o diretor e alguns presos. Acho que foi ruim o
bastante para que fechassem o lugar e parece que não há
espaço suficiente nas cadeias dos arredores para acomodar
todos os presos então simplesmente vão... deixar alguns deles
livres.

— O quê?

Viro-me para olhar, boquiaberta, as notícias.

— É. Todos os que tinham previsão de liberdade


permanente ou condicional para este ano, vão sair. Vamos ter
uns cinquenta novos delinquentes nas ruas junto com a
gente. Que tipo de merda é essa?
— Assustador. — Murmuro, olhando a tela enquanto a
câmara foca o exterior da prisão estatal, com as portas
abrindo para deixar sair o último ônibus cheio de condenados
que foram mandados para outras prisões. — Quando
aconteceu isto?

— Parece que está acontecendo há algumas semanas.


Mas a notícia acaba de cair na mídia.

— Statesburg está localizada há apenas uns trinta


quilômetros daqui, não?

— Embora pareça longe, é muito perto. — Jodi


estremece e abraça a si mesma. — Vou investir em um
alarme. — Então ela me olha ainda usando a máscara e
respira fundo. — E se fosse você, ficaria usando isso por um
tempo. Se soltaram algum estuprador, está muito mais
segura sendo um homem.

Reviro os olhos, mas o que ela falou me faz lembrar...


Sticks. A banda. Asher e sua música.

— Ouça... — Sento ao lado de Jodi e tento parecer


casual. — Lembra da noite que fomos ao Forbidden uns
meses atrás e cantamos no karaokê?

— Claro! — Ela volta-se para a televisão enquanto


morde o canto da unha. — Cantamos "All about that Bass",
não foi?

— Sim. — Essa parte eu lembro. E é exatamente o que a


garota cantou na música do Asher... com sua amiga ruiva...
quer dizer, Jodi... talvez. — Eu estava namorando o Fisher?
Agora é ela quem revira os olhos e geme.

— Sim. O imbecil disse que minha voz parecia com


miados de gatos de rua transando.

— Que idiota. — Enrugo o nariz com nojo e, sim, parece


exatamente com algo que Fisher poderia ter dito. Mas todos
os problemas com ele haviam terminado. Agora eu estou
muito concentrada em Asher para pensar naquele imbecil. —
Você lembra que roupa eu estava usando?

— Na realidade, não sei. — Diz com indiferença. — Você


nunca usa nada emocionante quando vamos dançar, só essas
estúpidas camisetas de bandas.

— Sei.

Mordo o lábio e volto meu olhar à canção, relendo a


frase sobre a latina bonita com a camiseta do Incubus, que
sacudira o mundo de Asher Hart. As notícias devem ter
passado para um tema diferente, menos interessante, porque
Jodi de repente se concentra de em mim.

— Por que todas essas perguntas? E o que é isso?

Ela pega a folha e eu explico enquanto lê. Depois que


conto tudo Jodi olha novamente para a canção e fica
boquiaberta.

— Merda, Remy. Somos nós. Asher Hart escreveu uma


canção sobre nós. — Seus olhos arregalados aterrissam em
mim. — Sobre você.

— Sim... isso é o que parece, não? — Pergunto, depois


de respirar fundo.
— O que você quer dizer com parece? Puta, isto é,
sobre... Nós.

Sacudo a cabeça, negando. Era muito... muito.

— Talvez, não.

— Oh, acredite em mim. É sim.

— Jodi, — Gemo — Não pode ser. Que merda eu vou


fazer se for sobre mim? Eu gosto muito...

— Então, conquiste-o imediatamente. Consiga um


ingresso para o melhor lugar no expresso Asher Hart,
porque... Ele escreveu para você uma música, puta. Faça
sexo selvagem com o menino em agradecimento.

Uf, é óbvio que ela não entenderia.

— Você está louca? Não posso fazer isso. Sou seu colega
de banda, que ele pensa que é um menino. Meu Deus, se
Asher descobre quem eu sou realmente, vai pensar o mesmo
que Ten. Que eu sabia da música o tempo todo e que me
disfarçar de garoto foi só uma artimanha para me aproximar
dele.

Oh... Maldição. Coloco a mão na testa e o látex da


máscara me surpreende, porque havia esquecido que ainda
estou usando

— O que vou fazer, Jodi?


Como eu não sou minha companheira de apartamento e
todas as minhas respostas não terminam em sexo, vetei a
idéia de “fazer sexo selvagem com Asher Hart”. Jodi e eu
decidimos ir agora a noite no Forbidden, porque é a noite do
karaokê e talvez a gente pudesse conseguir algumas
respostas, descobrir a verdade... a incerteza está me deixando
louca.

Não tenho nem ideia do porquê vou como Sticks. Asher


disse que era provável que não reconhecesse a sua garota
com a camiseta do Incubus se voltasse a vê-la e era ainda
mais provável que não me reconhecesse como a garota que
tentou entrar na banda, porque aquele dia eu estava de
peruca. Mas não quero correr o risco, então coloco a
máscara, o torso falso e a “calcinha de homem”.

Chegamos ao clube e não é Grim que está na porta. O


novo gorila deve ser Harper, outro dos caras que Asher havia
falado. Quando é nossa vez de entrar coloco a mão no bolso
traseiro para tirar o dinheiro do ingresso e a carteira de
identidade, mas Jodi aponta na minha direção.

— Ele está com a banda.

Dou um olhar sério, mas o gorila nos devolve um


enorme sorriso.

— Oh, é Sticks, o novo baterista? Olá, homem, prazer


em conhecê-lo. Sou Harper.

Ele estende a mão e eu limpo a garganta, tentando ter


uma atitude de menino.
— Olá. — Digo, apertando a mão dele e inclinando a
cabeça do jeito que os homens fazem.

Harper tem um temperamento muito melhor que o de


Grim. Ele não pede identificação e deixa Jodi e eu passarmos
sem nos cobrar.

— Não posso acreditar que tenha funcionado. —


Exclamo, olhando para trás para ter certeza de que ninguém
está nos perseguindo em busca do dinheiro.

Jodi sorri.

— É obvio que sim! Agora você é VIP aqui. Vamos ver se


também conseguimos bebidas grátis. — Diz, enganchando o
braço no meu.

— Melhor não. Não vamos exagerar.

Estou um pouco receosa de me aproximar do álcool


neste momento. Asher está atendendo o bar e embora ele
tenha sido a razão para virmos aqui esta noite, estou tendo
um ataque repentino de pânico. Eu quero descobrir se ele
sentiu-se atraído por mim, pela minha versão feminina, mas
tudo é.... sim, estou com medo.

Sinceramente, eu não sei como vou ser capaz de olhar


seus incríveis olhos verdes outra vez. Jodi não parece se
importar com meus nervos e aperta meu braço com mais
força.

— É por isso que estamos aqui, puta. Momento de


respostas!
Arrastada pelo cotovelo vou atrás dela, mas continuo
discutindo enquanto caminhamos.

— Sabe, não tenho certeza do porquê viemos aqui. Ele


colocou todos os detalhes imagináveis sobre a garota com a
camiseta do Incubus na música. Não é como se eu tivesse
uma verruga, tatuagem ou um traço distinto que pode fazer
com que Asher se lembre de repente. Merda, ele sequer
reconheceu você como a menina que me acompanhava,
quando a conheceu ontem à noite. Assim, sério, que mais
poderíamos conseguir?

— Ele não disse o comprimento do seu cabelo ou se era


mais alta ou mais baixa que a sua acompanhante? — Ela dá
um beliscão no meu braço, fazendo-me dar um pulo. — E
isso é por me chamar de mísera acompanhante, puta. Não
sou acompanhante de ninguém. Eu sou minha própria força
da natureza, muito obrigado.

Isso é verdade.

Mas em vez de me desculpar, fico rindo da sua ofensa,


porque sei que é isso que ela quer. Até que de repente
estamos no bar e nada parece tão divertido.

— Não quero fazer isto. — Resmungo, tentando me


afastar enquanto Jodi me puxa para frente.

Quando finalmente me rendo, ela me empurra contra a


beira do balcão, esmagando meu estômago e fazendo com que
o garçom mais próximo se vire surpreso.

Não é Asher, graças a Deus. Mas é lindo, e o fato de


estar me olhando como se eu fosse uma idiota que quase caiu
em cima do balcão, esquenta meu rosto miseravelmente
dentro da máscara.

Faço uma careta de desculpa para o garçom sexy e o


cumprimento.

— Olá... sinto muito, por isso.

Ele aperta os olhos um segundo antes de apontar para


mim.

— Você é Sticks, não é?

— Sim. E você é.... Mason?

Sorrindo, ele levanta o polegar.

— Tudo bem? Posso trazer algo para você e a.... — Olha


para Jodi — Sua amiga beberem?

— Quero uma pina colada. — Anuncia imediatamente


Jodi.

Maldita! Franzo o cenho. É óbvio que ela iria beber uma


dessas bem na minha frente, quando eu tenho que ser toda
viril.

— Claro. — Diz Mason, e depois me olha. — Sticks?

Aquela cerveja que eu tomei ontem à noite com Asher


estava legal, então peço uma dessas.

Mason vai preparar nossos pedidos e Jodi vira-se e fica


na ponta dos pés para me dizer no ouvido: — Não vejo seu
homem. Tem certeza que ele está trabalhando esta noite?

— Shh... Ele não é meu homem e sim, tenho certeza.

— Bom, onde ele está então?


Faço uma careta e balanço a cabeça, observando o
ambiente. Quero encontrá-lo e ao mesmo tempo estou com
medo de ver aquele cabelo comprido, escuro e com reflexos
loiros. Deus, o cabelo dele é incrível, perfeito para puxar
enquanto você está tendo um orgasmo.

— Ouça, você! Garçom sexy com a cicatriz — Exclama


Jodi, fazendo um gesto para o outro cara atrás do balcão, e
quase me matando de vergonha. — Asher está trabalhando
esta noite?

O menino, que Asher havia me apresentado como Knox,


faz uma pausa para olhar minha companheira de
apartamento com o cenho franzido.

— Isso é informação sigilosa, sinto muito.

Sorrio, vendo como seus colegas de trabalho são


protetores com ele. Deve chamar a atenção de mais mulheres
do que pensei inicialmente.

— Mas eu estou perguntando por ela. — Argumenta


Jodi, indicando-me com o polegar antes de se corrigir
rapidamente. — Quero dizer, por ele.

Knox olha na minha direção e leva um segundo até me


reconhecer, então seu rosto se ilumina.

— Oh, olá. Não tinha visto você.

— Não tem problema. Jodi, este é Knox, outro dos


colegas de trabalho do Asher. Você estava... ocupada com
outras coisas quando fomos apresentados ontem à noite.
Knox, esta é minha companheira de apartamento, Jodi.
PARTE II

— Bom, olá querido. Olá, vocês dois. — Jodi levanta o


queixo para Mason quando ele retorna com nossas bebidas.
— Vocês considerariam um trio? Porque sem dúvida me
ofereço como voluntária para ser a mulher no meio de um
sanduíche quente.

— Uh... — Mason e Knox ficam imóveis enquanto olham


para Jodi com horror. — Temos esposas.

— Oh meu Deus. — Grunhe Jodi, levantando as mãos


em derrota. — Será que cada maldito garçom sexy daqui já
tem dona?

— Todos, exceto Asher. — Responde Mason, colocando


nossas bebidas sobre o balcão e negando com um gesto
quando pego a carteira para pagar.

Merda, estou me acostumando a colocar a carteira no


bolso traseiro. Será que novamente ninguém ia me cobrar?

— Então, onde ele foi? — Pergunta uma voz a minha


esquerda.

Eu viro a cabeça para encontrar Pick ao meu lado,


apoiando o braço no balcão como se acabasse de chegar.

— Ajudar alguém com o karaokê... outra vez. —


Responde Mason, enquanto recolhe duas taças vazias.
— É obvio. — Murmura Pick, revirando os olhos.

Jodi praticamente me empurra para o lado para ficar de


frente para ele.

— Oh meu Deus. — Murmura, quase babando. — Quero


uns cinco iguais. Quem diabos é você?

Pick levanta a sobrancelha com piercing, surpreso


quando vê Jodi.

— Bom, não é a coisa mais doce? — Ele estende a mão.


— Meu nome é Pick.

Jodi segura a mão dele, mas não balança para


cumprimentá-lo e também não solta.

— Posso ter seus bebês?

Com um sorriso, ele nega com a cabeça e levanta a mão


dela para beijar seus dedos.

— Sinto muito, querida. Já tenho uma senhora para


isso. Mas eu agradeço a oferta. É bom para um homem ouvir
que uma mulher bonita aprecia sua aparência.

— Oh Deus. — Geme ela, voltando-se para me olhar


boquiaberta. — Ele me acha bonita.

— E também disse que tem dona.

Pego seu braço e puxo a mão dela, obrigando-a a soltá-


lo. Jodi geme de novo.

— Mas... ele é tão sexy. Só mais um toque? Uma


lambida? Cheirar? Por favor!
— Olhe, não é Carter Lang? — Pergunto, quando vejo
um menino na multidão que já havia visto sair do quarto dela
várias vezes ao longo dos anos.

Sabendo que Jodi se distrai facilmente, solto um suspiro


de alívio quando ela olha para frente.

— Puta merda, é! Volto logo.

E vai embora enquanto eu me viro para Pick.

— Sinto muito. Ela...

Não tenho ideia de como descrever Jodi. É doce e


divertida como o inferno, e nada tímida na hora de ir atrás do
que quer, incluindo homens. Mas... sim. Pode ser terrível.
Pick simplesmente ri.

— Não se preocupe com isso. Senti-me bajulado.

Assim que eu começo a virar para os dois garçons atrás


do balcão para pedir desculpas no caso de algum deles ter se
sentido insultado, Knox dispara para mim... ou melhor, para
Pick.

— Pick, juro que Miller Hart acaba de entrar pela porta


principal.

— O quê? — Solta ele, olhando rapidamente para a


multidão. — Onde?

Alertada pelo sobrenome de Asher na conversa, eu me


viro, olhando na direção que Knox havia indicado.

— Caralho. — Continua Pick. — Que diabos ele está


fazendo aqui? Pensei que ainda estava na prisão.
Leva meio segundo para entender de quem estão
falando.

Estalo os dedos e aponto para eles, lembrando das


notícias que Jodi estava vendo na televisão quando cheguei
em casa depois do ensaio.

— Ele estava preso em Statesburg?

Não consigo evitar a pergunta, porque de repente me


lembrei do que Asher havia falado. Que merda, isso não pode
ser bom.

Os dois caras me dão um olhar de reprovação por me


intrometer na conversa.

— É só que... — Explico. — Vi uma reportagem na


televisão dizendo que uns cinquenta presidiários da
Statesburg foram postos em liberdade condicional antes do
tempo, porque o lugar foi fechado e as outras prisões estão
muito cheias para absorver todos.

— Puta merda. — Murmura Knox, compartilhando o


olhar preocupado de Pick.

E uma vez que já tinha me metido muito nisso, só segui


em frente porque, sério, preciso saber.

— Quem é Miller Hart? É o pai de Asher, não é?

Inquietação cruza o rosto de Pick e ele assente


contrariado.

— Sim.

— Ah... porra. — Volto a estudar o cara. — Isto não é


bom.
— Acha que ele está aqui por causa do Asher? —
Pergunta Knox a Pick.

Mas quem responde sou eu.

— É óbvio. Por que vir aqui? Asher é seu filho... E a


única pessoa que viu o crime. Provavelmente foi o
testemunho do Asher que o colocou na cadeia. Se ele quer
vingança, inferno sim, este seria o primeiro lugar para ele vir.

— Espere. Como soube que Asher era a única


testemunha? — Pick me olha com uma espécie de suspeita
divertida. — Ele contou a você?

Encolho os ombros.

— Isso... surgiu.

— Merda. — Diz Knox de repente. — Ele está vindo para


cá. O que vamos fazer?

Pick assume o controle da situação.

— Knox, leve Asher para o meu escritório. Agora. Vou


me livrar deste filho da puta.

Mas Knox nega.

— Merda, não. Você não vai lidar com Miller Hart


sozinho. Ele é um velho patético, mas muito pouco confiável.

— Posso tirar Asher de vista. — Ofereço.

Pick me lança um olhar surpreso, ainda que agradecido.

— Obrigado.
REMY
Enquanto Knox pula por cima do balcão para sair com
Pick em direção a Miller Hart, eu olho para a área do palco
em busca de Asher. Neste momento começa a tocar uma
canção do One Direction, então o que quer que ele estivesse
ajudando o cliente a fazer, deve ter terminado. Isso significa
que provavelmente vai voltar para o bar.

Vou em direção ao palco para interceptá-lo e enquanto


estou empurrando as pessoas para abrir espaço, desviando-
me de grupos de mulheres fofocando, quase o atropelo.
Paramos de repente, um não esperando ver o outro. Seus
olhos se abrem com surpresa e algo que parece apreensão.

— Sticks! O que...?

— Oh, graças a Deus. — Digo, fazendo um sinal para


que ele me siga e saindo rapidamente em direção a uma
grande abertura que dá para um corredor amplo e de teto
baixo. — Vamos, vamos, vamos. Por aqui.

Fico bastante surpresa quando ele vem atrás de mim.

— Por quê? O que aconteceu?

— Não podemos ser vistos. — Seguro seu braço logo que


chegamos ao corredor menos abarrotado de gente. — Qual é
a porta do escritório do Pick?
Asher levanta as sobrancelhas, confuso, mas aponta em
direção a uma porta.

— Essa. Por quê? O que...?

Puxo-o para o escritório, fecho a porta com força e,


ofegante, apoio-me nela para evitar que ele saia. Asher
recupera o equilíbrio e olha com assombro.

— Que merda, homem?

— Sinto muito. É que, — Agito as mãos para mostrar


que preciso recuperar o fôlego e respiro profundamente. —
Pick pediu que trouxesse você aqui.

— Está bem. — Diz ele devagar, franzindo mais o cenho.


— E... Por quê?

— Ei... você sabe... — Hesito, fugindo da pergunta. —


Provavelmente vai dizer quando chegar aqui, então... vou
deixar a explicação para ele.

Asher abre a boca como se quisesse perguntar mais e


não soubesse o que perguntar.

— Bom, eu passei por aqui esta noite para me


desculpar. — Improviso rapidamente, dizendo a primeira
coisa que me passa pela cabeça.

Ele parece ainda mais desorientado.

— Por quê? — Pergunta, sacudindo a cabeça. — Fui eu


que fiz as coisas ficarem esquisitas.

— Não... espera, o quê? Você não fez nada ficar


esquisito. Por que está pensando isso?
Os ombros de Asher ficam tensos e ele se afasta, como
se quisesse proteger uma parte de si mesmo. Parece
completamente incomodado quando balança uma das mãos.

— Você sabe. — Murmura, sem olhar em minha direção.


— Por contar tanta merda.

— Oh... não é isso o que a gente faz quando conhece


alguém? Conta pequenas coisas?

— Sim, mas... — Finalmente ele olha na minha direção.


— Não foram pequenas. E não são coisas que conto para as
pessoas... nunca.

— Ah.

Percebo que Asher se abriu comigo mais que o normal e


a importância deste momento me tira o ar, ao mesmo tempo
que uma tristeza profunda enche o meu peito. Só quero... não
sei o que eu quero.

Mas certamente não quero que ele pense que não pode
confiar em mim.

— Você não fez nada para sentir-se desconfortável...


absolutamente. — Digo, com voz suave.

Levo um susto quando, inconscientemente, levanto a


mão para colocar o cabelo atrás da orelha e encontro as
mechas curtas. Ainda estou na forma de menino! Então limpo
a garganta e levanto os ombros, tentando uma pose mais
masculina.
— Então, por que está se desculpando? E por que saiu
correndo como se estivesse assustado? — Pergunta ele,
inclinando a cabeça.

— Bom, eu... eu estava me desculpando por ter saído


correndo no meio da nossa conversa. E precisei sair correndo
porquê... porque...

Merda, por que meu cérebro morreu agora? Não consigo


pensar em uma única pequena mentira e não posso contar a
verdade sem revelar que sou a garota da camiseta do
Incubus.

Não acredito que possa falar sobre isso... nunca, então


gaguejo qualquer coisa.

— Minha companheira de apartamento! Sim, Jodi. Sabe,


você conheceu-a ontem à noite. Eu fiquei de dar uma carona
para ela quando saísse do trabalho. — Mentira. — Lembrei
que estava me esperando, por isso saí correndo, não queria
que ficasse chateada. — Mentira. Mentira. Mentira.

Todas essas mentiras caem mal no meu estômago, então


me viro para olhar uma prateleira encostada à parede cheia
de pequenos porta-retratos.

— Então, você mora com ela? Com a Jodi? Eu não


sabia.

— Mmm. — Murmuro, feliz de não ter que mentir sobre


isso.

Levo a mão ao cabelo de novo, quase gemendo ao


lembrar que no momento não tenho cabelo comprido para
colocar atrás da orelha. Merda, por que tenho que ter um
tique nervoso tão feminino?

— Como é? — Pergunta Asher. — Morar com uma


mulher?

— Bem, por que seria...? — Oh! Ele pensa que a


situação é de um gay morando com uma mulher
heterossexual. — Quero dizer, além do fato de que brigamos
por todos os meninos bonitos, é como... como ter qualquer
outro companheiro.

— Ah.

Pelo tom de voz, Asher está ainda mais confuso com a


minha resposta. Olho para ele desesperada para mudar de
assunto antes de revelar algo que não devo, então aponto
para as fotos.

— Eh... você e Pick?

Ele me olha com suspeita.

— Po que você está perguntando isso?

Dou de ombros.

— Não sei. Não sei mesmo. É só que parece que há mais


entre vocês que só...você sabe, uma relação de chefe e
empregado. — Virei-me outra vez para as fotos, a maioria de
uma mulher loira e dois meninos adoráveis... exceto uma. —
Ele tem uma foto sua no escritório, mas nenhum de seus
outros bartenders estão aqui.

— Ah tem?
Asher vem para o meu lado e fica de boca aberta quando
vê a foto que eu estou apontando. No porta retrato, Asher se
encontra parado no palco, cantando no microfone, enquanto
toca guitarra. Os outros membros da NonCastrato estão
desfocados, ele é o foco principal da foto, obviamente.

— Merda. — Murmura, olhando fixamente. — Não tenho


a menor ideia do porquê esta foto está aqui.

— Parece que está prateleira é reservada para as fotos


de familiares. — Reflito, em voz alta.

Asher soltou um grande suspiro e passa uma mão pelo


cabelo.

— Suponho... — Começa lentamente. — Sim. Somos da


mesma família. Ele é.... meu irmão.

Apesar de que, obviamente, isso era uma hipótese real,


ouvir em voz alta me deixa confusa. Olho rapidamente para
ele.

— O quê?

Asher balança a cabeça, como se toda a questão


também o desconcertasse.

— Ninguém sabe ainda... não oficialmente. Mas, uh,


ele... Acontece, que depois que comecei a cantar a canção
“Ceilings”, eu descobri que ele tinha sido abandonado por sua
mãe biológica no hospital e....

— Puta merda. — Murmuro. — Seu chefe é seu irmão


perdido? Como aconteceu isso?

Asher me olha com uma expressão aturdida.


— Pergunto-me a mesma coisa todos os dias.

—Mas, espera. Há quanto tempo você sabe disto? Só


está tocando “Ceilings” há algumas...

— Semanas. — Ele termina por mim. — Os resultados


dos exames saíram há três semanas aproximadamente. E
ainda é.... realmente novo.

Solto um suspiro.

— Amigo. Isso... — Balanço a cabeça.

— Sim.

— Por que não anunciaram oficialmente? — Pergunto,


temendo pelo pior. — Ele não quer você como irmão?

Asher vira-se para foto.

— Ele quer. Na realidade, eu não quero contar.

Olho para ele de soslaio.

— Então... você não gosta dele?

— Não, sim. — Ele vira-se para mim, com olhar


desesperado e alerta. — Esse é o problema. Ele é um cara
realmente sério, com os pés na terra e correto. E... É meu
irmão. Isso é melhor do que jamais pensei ser possível. Mas...
Ele vai perguntar por ela.

— Por quem?

— Por nossa mãe. — Diz ele entredentes. — É lógico,


não? Você não gostaria de saber sobre sua mãe se acabasse
de conhecer um irmão que morou com ela?
Quando abro a boca para responder que sim, que acho
que sim, ele continua falando: — Você sabe que sim, vai
querer saber que tipo de pessoa ela era e como morreu. E vai
ter que ser eu a contar a vida miserável que teve e quem a
matou. E o que ele vai pensar de mim depois disso? Sou o
filho do assassino de sua mãe. Ele também não sabe que
tudo em “Ceilings” é verdade. O que acontece se descobre que
não quer ter nada a ver comigo? Não posso... — Ele balança a
cabeça, parecendo muito infeliz. — Simplesmente não estou
preparado para arriscar. Toda minha vida está neste lugar e
ele pode me tirar tudo com uma só palavra.

Eu limpo a garganta e coço a orelha.

— Então... você não disse nada sobre sua mãe ou pai


ainda?

Asher nega com a cabeça, os olhos verdes enchendo-se


de temor.

— E ele não perguntou?

— Não. Não, ainda. Mas sei que vai perguntar.

Dou um suspiro e encolho de ombros.

— Sabe, acredito que deveria falar, porque pressinto que


Pick já sabe o que aconteceu com sua mãe e quem a matou.

A expressão dele se transforma de preocupada em


confusa.

— O quê?

Neste momento a porta se abre e Pick entra.


Quando olho para seu irmão e depois de volta para ele,
Asher vê algo em minha expressão. Seu rosto se ilumina com
algum tipo de entendimento.

— Que diabos está acontecendo? — Pergunta a Pick,


antes de se virar para mim. — O que você disse a ele?

Levanto as mãos, contente por não ter nenhuma culpa


nessa história. Especialmente agora que sabia que tudo era
confidencial.

— Nada. Não disse merda nenhuma a ninguém. Nunca


trairia sua confiança dessa maneira.

Pick limpa a garganta, mostrando-me que assumiria a


partir de agora. Quando paro de falar, Asher lança um olhar
desconfiado entre nós dois.

— O quê?

— Miller Hart estava no clube. — Anuncia Pick.

Asher fica pálido e balança a cabeça.

— Perdão?

— Knox o reconheceu de quando estiveram juntos em


Statesburg.

— Espera. — Asher levanta as mãos para passa-las em


seu cabelo, antes de apertar a cabeça. Seu olhar frenético vai
para Pick. — Como sabe sobre... ele?

Pick respira fundo e senta-se no canto da sua mesa com


as mãos sobre os joelhos.
— Por favor, Asher, como você acha? Na noite que
deixou aquela mensagem no meu telefone, procurei na
internet tudo o que podia sobre você. Antes mesmo de saber o
resultado do DNA. Toda essa busca me levou a artigos sobre
Polly Ruddick... e seu assassino, Miller Hart.
ASHER
Oh Jesus. Isto é mais do que posso suportar. Pick sabe.
Ele sabe de tudo.

— Então... todo este tempo... você já sabia?

Ele assente. Estou sem ar, aterrorizado. E logo me dou


conta. Ele sabe... há muito tempo e não me demitiu nem me
tirou da sua vida.

— E ainda assim está tudo bem entre... — Mexo um


dedo entre nós. — A gente?

Pick levanta as sobrancelhas, surpreso.

— Você realmente ficou preocupado que eu não


quisesse...?

Ele faz uma pausa e olha com inquietação para Sticks,


que se encolhe ainda mais, totalmente desconfortável por
estar ouvindo nossa conversa. Mas eu bufo e agito a mão na
direção dele.

— Ele já sabe.

Isso parece pegar Pick de surpresa.

— De verdade?

Concordo, sem me preocupar com Sticks.

— Por que meu pai está aqui? Ele ainda está? Ele...
— Não, ele se foi. Knox e eu, especialmente Knox, o
acompanhamos à porta e explicamos que ele nunca vai ser
bem-vindo sob este teto.

O alívio me inunda.

— Você o colocou para fora?

— Sim.

Mas então a preocupação retorna. Que diabos fazia


Miller Hart aqui no Forbidden? Eu me sento no sofá e passo a
mão no rosto.

— Gostaria de saber quando ele saiu... pensei que ainda


continuaria preso por mais alguns anos.

— Eu posso responder a isso. — Diz Remy.

E então ele conta sobre os problemas em Statesburg. Eu


só consigo sacudir a cabeça.

— Bom... porra.

Sticks bufa, surpreso.

— É tudo o que tem a dizer?

— O que mais eu poderia dizer? — Pergunto, confuso.

— Oh, não sei. Que tal... “Onde é o local mais próximo


que podemos conseguir uma ordem de restrição? ”

Dou uma gargalhada.

— O quê? Por que diabos eu iria precisar disso?

— Raciocine, Asher. Ele acabou de sair da prisão depois


de ficar lá... quantos anos?
— Uh... — Rapidamente faço um cálculo mental. —
Dezesseis.

— Dezesseis anos atrás das grades e qual é o primeiro


lugar que vai quando ele é libertado? Aqui! O mesmo lugar
onde o filho, que testemunhou contra ele e o colocou na
prisão, trabalha.

Meu cérebro dá uma volta com essas palavras, nunca


tinha pensado dessa maneira. Mas fui a única testemunha
ocular, não? O velho, certamente está zangado comigo.

— Temos que conseguir algum tipo de proteção para


você. — Afirma Sticks com convicção, surpreendendo-me com
a seriedade com que está levando tudo isto.

— Não acho que seja necessário. — Bufo.

— Meu Deus! — Ele levanta as mãos com indignação. —


Não vê que isto é sério? Ele veio aqui... por sua causa. Talvez,
eu seja o único que pense assim, mas para mim esta atitude
é alarmante.

— Não, você não é o único. — Murmura Pick.

Olho para meu irmão que está com os braços cruzados e


passa o polegar sobre o lábio inferior, pensativo.

Jesus, eles estão preocupados comigo. Sim, meu pai


tinha sido um monstro terrível quando eu era criança e
naquela época eu tinha medo sempre que era obrigado a
estar com ele. Mas há alguns anos o visitei na prisão,
decidido a enfrentar meus demônios. Ele não me reconheceu,
pensou que eu fosse o novo advogado e começou a falar que
queria trocar a acusação de assassinato para autodefesa,
porque assim poderia sair da cadeia mais rápido. Não o
corrigi, deixei que ele falasse e depois fui embora, dizendo
que entraria em contato. Toda a visita me deixou... vazio por
dentro. Não senti nenhuma espécie de ternura por aquele
homem, mas também não senti medo.

A prisão acabou com ele, tornou-o um ancião débil e


patético, que não me provocou nenhum pingo de temor.
Então, é difícil ficar preocupado, agora.

— Talvez, ele não tenha vindo com más intenções. —


Digo a eles. — Talvez, o cara queira apenas reencontrar o
filho.

— Sim. — Concorda Remy, revirando os olhos


ironicamente e cruzando os braços. — Porque antes ele foi
nada mais que um pai repleto de amor e devoção, criando o
seu precioso menino em uma casa com drogas e batendo nele
e em sua mãe sempre que teve vontade. Claro.

Franzo o cenho, dando-me conta que havia falado


demais. Entretanto, ele tem razão.

— Ok. Mas eu sou seu único parente vivo. A quem mais


ele vai pedir dinheiro ou um lugar para dormir?
Honestamente, se vocês saíssem da prisão depois de
dezesseis anos, onde iriam? Ele precisa de algumas coisas e
deve acreditar que tenho o dever de providenciar.

— Bem, ele não vai conseguir nada de você.

O anúncio decidido de Remy me faz rir.


— Sério? E eu que pensei que devia dar a ele tudo que
tenho.

Sticks não parece apreciar meu sarcasmo.

— Traga-o de volta à razão, caramba. — Apela para Pick.

Meu irmão suspira e esfrega o rosto.

— Olhe. — Diz, deixando cair as mãos. — Não importa


qual seja o motivo do seu pai, eu também não o quero perto
de você. E só para ficarmos mais tranquilos, acho que
algumas medidas de proteção seriam interessantes.

— Está bem. — Levanto as mãos como se me rendesse a


sua vontade, e depois passo-as pelo cabelo. — Vou levar em
conta o que ambos disseram, e agradeço a preocupação dos
dois, mas, sinceramente, isto não é problema de vocês. —
Quando eles abrem a boca, parecendo dispostos a discutir
comigo, rapidamente continuo falando. — E, se ele me
procurar de novo, deixem que eu me encarrego. Vou mandá-
lo embora. Meu pai é um homem velho e fraco, não me
assusta mais e não vou permitir que me assuste novamente.

Quando me viro para a porta, Pick pula na minha


frente, os olhos em pânico.

— Onde você vai?

Eu suspiro. É bom saber que ele se importa o suficiente


para preocupar-se comigo, mas a respeito deste tema em
particular, não gosto.

— Voltar para o trabalho. Se não notou, o bar continua


aberto e está muito cheio.
Quase desafiando-o a reagir, olho para ele e abro a
porta.

— Só... cuide-se, sim? — Diz ele, com um suspiro de


resignação.

— Claro que sim, capitão. — Respondo, balançando a


cabeça e enviando um olhar a Sticks que está mordendo as
unhas com preocupação.

Entro no corredor e, quem diria, Miller Hart não pula


em mim com a intenção de me matar.

Pick e Remy chegam ao bar alguns minutos mais tarde e


ficam por perto, conversando, bebendo uma cerveja e me
deixando mais irritado a cada minuto. Evito os dois, não
estou disposto a falar sobre meu pai, ou até mesmo pensar
nele.

Só que não consigo tirá-lo da cabeça. Mexe comigo saber


que ele está livre, não entendo por que isso me afeta, mas
simplesmente me afeta. Não estou com medo, como eles
acreditam que eu deveria estar, mas estou muito surpreso.
E... Inquieto.

Não quero enfrentar o velho. Depois da minha primeira e


única visita havia deixado essa parte da minha vida no
passado e seguido em frente. Só quero continuar assim.

Meus dois autoproclamados guarda-costas foram


embora uma hora antes do bar fechar, mas, ou Pick tinha
ordenado a Knox que me acompanhasse até a moto, ou outra
pessoa que se preocupava com minha segurança tinha feito
isso.
É estranho... ter gente que pense e se preocupe comigo.
Não sei bem como lidar com isso, então só agradeci ao meu
colega de trabalho, dei boa noite e arranquei com a moto.

Quando chego em casa, sim... bem... observei para ver


se o velho se encontrava ali. Mas o beco que conduz a minha
porta está vazio. Abro todas as fechaduras, lembrando-me de
fechá-las e corro escada abaixo para meu pequeno domínio.
Mozart dando voltas na sua gaiola é o único ser vivo a me
receber.

— Olá, amiguinho. — Digo, acendendo a luz principal,


apesar de ter deixado o abajur aceso para que ele não ficasse
no escuro. Com a minha entrada ele se põe em marcha,
correndo rapidamente ao longo dos túneis que eu tinha
construído para que ele pudesse passar de jaula em jaula.
Quando está mais próximo, seu entusiasmo me faz sentir
bem-vindo, embora não acho que esteja feliz por mim
especificamente, o mais provável é que queira ser solto.
Assim, concedo o seu desejo e abro a porta da gaiola.

Ele sai em disparada, uma mancha de pele marrom


saltando um metro e meio para o encosto do sofá. Depois,
rapidamente se lança ao chão e desaparece em baixo da
cama. Eu suspiro.

— Sim, é bom ver você também, amigo.

Oh, bem. Ele é melhor companhia do que nada.

Tiro os sapatos, vou para a cozinha e abro a pequena


geladeira para pegar uma garrafa de água. Não como desde o
ensaio, quando devorei a metade da comida do Remy, mas a
verdade é que não tenho fome.

E não quero deitar, apesar de estar cansado. Já sei que


só vou dar voltas na cama e odeio ficar enredado em meus
próprios lençóis... A menos que estivesse com uma
companhia feminina.

Mas não tem nenhuma mulher aqui e a ideia do meu pai


livre e vagando pelas ruas ronda em minha cabeça. Posso
dormir uma ou duas horas mais tarde, mas agora não.

Sento-me em uma cadeira e pego o caderno e a caneta.


Certamente não me sinto inspirado como antes, mas esta
canção é a única coisa que eu consigo pensar.

Exceto, merda, imaginar meu pai, velho e enrugado, na


prisão e se queixando do quanto foi injustamente tratado.
Esfrego o rosto e tento abrir a mente. A primeira pessoa que
aparece em meus pensamentos é a garota com a camiseta do
Incubus, cantando no palco e batendo o quadril com o a
ruiva mais baixa a seu lado. Ela parecia tão atrevida e
relaxada ali, cantando com confiança porque sabia que era
bonita e tinha voz e só queria se divertir um pouco. Eu
desejei me divertir um pouco com ela.

Mas tanto dessa garota é impreciso na minha mente.


Como lembro de poucos detalhes reais além do cabelo
comprido e escuro, dei a ela as pernas da baterista que fez o
teste... E o rosto, embora não pudesse vê-lo muito bem em
minha memória. Sou muito ruim para recordar rostos. Acho
que as pernas e o cabelo terão que ser suficientes. Fantasio
pegar mechas daquele cabelo sedoso, comprido e escuro
enquanto aquelas pernas incríveis envolvem minha cintura...
merda, preciso pensar em uma nova frase para a canção.

Mas estou pensando em outra coisa. Minhas calças


jeans estão apertadas na virilha, então movo um pouco na
cadeira tentando ficar mais confortável. Isso não ajuda,
talvez, porque faz muito tempo que o pequeno Asher saiu
para brincar, e agora que despertou quer atenção. E continua
crescendo, exigindo ganhar alguma coisa.

Então, baixo o zíper e me acomodo melhor na cadeira.


Uma das pequenas vantagens de morar sozinho é que posso
sentar nu sem que ninguém se importe. Mas a ideia de que
ninguém se importa só reaviva a faísca de solidão que tem
estado me atormentando ultimamente e preciso me forçar a
pensar na menina com a camiseta do Incubus e as pernas da
garota baterista para superar este sentimento.

E sim, meu pau acaba de aumentar mais. Antes que eu


perceba estou movendo a mão ao redor da base e bombeando
com força, sem pensar em música nenhuma, fechando os
olhos para poder sonhar acordado com aquela pele suave e
cálida, o cabelo comprido e a boceta molhada e apertada.
Gozo forte e rápido.

Com um suspiro de alívio, afundo-me mais na cadeira e


apoio a cabeça no encosto. E enquanto ofego com os últimos
resquícios do orgasmo, sinto-me mais patético do que nunca.
Transar com uma mulher aleatória depois de um show não é
o que eu prefiro, mas tem que ser melhor que me masturbar
sozinho no apartamento. Pelo menos, posso ter um momento
de abraços antes que ela saia, dizendo que suas amigas não
iriam acreditar quando contasse que transou com Asher
Hart.

Meus amigos no Forbidden tem razão, preciso fazer sexo.


Muito.

Um som vindo da cama chama minha atenção e dou um


pulo quando vejo Mozart ali, de pé nas patas traseiras,
inclinando a cabeça para um lado e me olhando, movendo a
cauda peluda com interesse. Endireito-me na cadeira,
escondendo imediatamente meu pau dele.

— Que diabos, pequeno pervertido? Sério que você


acaba de ver isso?

O som da minha voz faz com que ele saia disparado e


desapareça em baixo da cama. Bufo com desgosto, mais
aborrecido comigo do que com meu bicho de estimação.
Limpo rapidamente a bagunça e fecho a calça, antes que
Mozart tente dar outra olhada.

E então pego a caneta e fico batendo com ela no


caderno, suspirando derrotado. A adrenalina do concerto de
Chicago estava oficialmente morta. Não sou capaz de escrever
outra palavra pelo resto da noite.
ASHER
Depois de colocar Mozart na gaiola com algumas
sementes de girassol, lá pelas oito da manhã finalmente
consigo dormir.

Às dez, meu telefone começa a tocar.

Estendo o braço às cegas para pegar o celular na mesa


de cabeceira... Três mensagens de texto e uma chamada.
Para mim, isso é muito. Ignoro as mensagens, mas atendo o
celular que continua tocando. A voz muito acordada do Pick
ressoa em meu ouvido.

— Ouça, tenho algumas casas para ver. Quer ir comigo?

Passo a mão sobre a cabeça, bocejo e então sento na


cama.

— Certo. Quando e onde?

— Pego você em dez minutos.

Desligo e balanço a cabeça, sem entender por que ele me


pedia para acompanhá-lo. Quando vou ler as mensagens,
descubro que não são de Pick. As três foram enviadas por
Sticks.

Sticks: Só para ter certeza que chegou em casa bem e que


seu pai não apareceu para sufocá-lo enquanto você dormia.
Sticks: Aqui é quando você responde e me diz que está
bem. Inclusive pode acrescentar um “agora desaparece” se
minha preocupação estiver incomodando.

E finalmente...

Sticks: Sério, homem. Você está morto ou só puto comigo?

Fico com pena dele, e resolvo responder.

Eu: Não estou morto, só dormindo.

Ele responde imediatamente.

Sticks: Merda, lamento acordá-lo. Esqueci que você


trabalha até tarde. Fico feliz que esteja vivo. Tente permanecer
assim. Precisamos de você no próximo domingo em Chicago.

Sorrindo, respondo que vou ver o que posso fazer a


respeito.

Então, jogo o telefone de volta à mesa de cabeceira e


procuro uma roupa para vestir antes que Pick apareça. Pego
a maçã que comprei para o Mozart e estou limpando-a
quando meu irmão estaciona em frente à porta.

— Que bairro vamos desta vez? — Pergunto, sentando


no banco do passageiro.

Pick responde enquanto coloca o carro em movimento e


solto um baixo e impressionado assobio.

— Bom...

— Nada é bom demais para minha família. — Diz ele


com um sorriso de orgulho.

— O que me lembra, — Continuo, acomodando-me


melhor no banco, jogando a cabeça para trás e fechando os
olhos. — Não acha que deveria casar-se de verdade com ela
antes de comprar uma casa? Ou você não quer saber dessa
merda tradicional?

Já chamavam um ao outro marido e mulher e os amigos


também os chamavam assim, só precisavam “atar o nó” de
verdade.

— Oh, sim... — Pick me dá um sorriso discreto e


petulante, mexendo as sobrancelhas. — Inclusive já
marcamos a data, será dentro de um mês. O que me lembra,
você será meu padrinho?

Fico sem ar. Depois de me sentar direito e bater com o


punho no peito, lanço a ele um olhar de incredulidade.

— O quê? Eu? E Mason?


Mason é a opção óbvia. Ele é o namorado de Reese e já
que Reese é prima de Eva e sua melhor amiga, ela sem
dúvidas vai ser a dama de honra.

Além disso os quatro passavam muito tempo juntos,


pelo menos foi o que ouvi. Certamente Pick é muito mais
próximo a Mason do que é de mim.

Mas ele só dá de ombros.

— Tenho certeza que ele vai entender que prefiro que


você esteja de pé ao meu lado.

Abalado por tal declaração, eu esfrego as mãos no rosto.

— Você realmente não tem problemas sobre quem é meu


pai, certo?

— O que você quer dizer? — Pergunta, olhando confuso.

Desabafo minha incredulidade.

— O que você acha? Ele... Ele matou a sua mãe.

Pick fecha os olhos rapidamente, como se estivesse


ainda mais confuso depois da minha explicação.

— Era sua mãe também.

Respiro profundamente. Ele definitivamente não é o tipo


de pessoa que coloca os pecados do pai sobre o filho, isso é
certo.

— Ainda não posso acreditar que você sabe tudo. —


Murmuro, mais para mim do que para ele. — Fico tentando
entender porque nunca me perguntou sobre ela.
Ele dá de ombros e vira o carro em direção a uma
agradável e tranquila rua residencial. Olho pela janela
“salivando” pelas lindas casas.

— Achei que você falaria quando estivesse preparado.

— Não é uma história bonita. — Digo, olhando uma mãe


com dois meninos pequenos abrindo a porta de casa e
saindo. Pareciam uma feliz e saudável família unida.

Afasto o olhar.

— Não pensei que fosse.

— Ela sempre falou muito sobre você... e seu pai.


Contou-me todo tipo de merda, coisas que provavelmente
nunca deveria ter contado. Ela disse que nunca perdoou meu
pai por tê-la impedido de me abortar, que ele entrou no
banheiro e estragou tudo. Mas ela amava o seu pai, se serve
de consolo. — Olho na direção dele e pela expressão em seu
rosto está bebendo cada palavra e quer ouvir mais. — Ela
tinha dezesseis e ele dezenove quando engravidou. Sempre o
chamava de Chaz, mas não sei o nome completo, sinto muito.

Pick encolhe um ombro levemente, dando a entender


que tudo bem eu não saber o nome do cara. Está aprendendo
mais sobre seu doador de esperma do que jamais pensou.

— A família dela não aprovou o relacionamento. —


Continuo. — Ele tinha deixado a escola, bebia muito e não
parecia querer nada além do trabalho de mecânico em uma
oficina.

Pick me olha fixamente.


— Mecânico?

— Sim, ele gostava de carros, também. Então, sabe


como é, quando Polly foi embora de casa para ficar com ele,
sua família cortou todos os laços. Ela engravidou quase que
imediatamente e entrou em trabalho de parto no mesmo dia
que seu pai foi assassinado em um tiroteio na oficina em que
trabalhava.

Contei rapidamente a última parte, sem saber ao certo


como ele iria reagir. Seus dedos apertam o volante, mas ele
não diz nada, só diminui a velocidade do carro até estacionar
em frente a uma casa de dois andares, com um aviso de
“vende-se” no jardim. Então, solta um suspiro.

— Então, ele também está morto, não é?

— Sinto muito. — Lamento, balançando a cabeça com


tristeza. — Ela estava zangada e não conseguiria lidar com
um bebê logo depois do que aconteceu, mas sempre falava
sobre o quanto se arrependia por ter deixado você no
hospital. Nunca tentou encontrá-lo, entretanto tinha certeza
que você estava em um melhor lugar.

Não menciono todas as vezes que ela disse que desejava


ter me abandonado e ficado com ele.

— Bom... suponho que isso seja alguma coisa... — Diz


Pick lentamente, olhando pela janela. Então, vira-se para
mim e levanta as sobrancelhas. — Preparado para olhar a
casa?
Eu o incomodei, e sinto-me um merda por isso, mas
como não sei como consertar, apenas concordo e abro a
porta.

— Vamos lá.

A verdade é que não quero olhar mais casas, então, logo


que nos encontramos com o corretor e ele começa a nos
mostrar o local, resolvo abrir o jogo.

— Vou poupá-lo do esforço homem, mostre o pátio de


trás da casa primeiro.

Pick ri, enquanto o outro cara me lança um olhar


engraçado. Mas fomos ver o pátio e vejo a decepção brilhando
no rosto do meu irmão. Ele não encontrou o que estava
procurando.

Quando estamos de novo no carro, afastando-nos da


casa, finalmente deixo a curiosidade levar a melhor.

— Então, vai me dizer o que é essa coisa do pátio


traseiro?

Pick me olha e faz uma careta.

— Você nunca acreditaria.

— Tente.

— Ok. Eu vi. Como... uma visão.

Não estou tão surpreso pelo que ele disse, mas sim por
saber que acredita nisso. Eu nunca teria pensado.

— Não me olhe assim. — Continua levantando um dedo


em advertência. — Não acredito nessa merda, mas é a
verdade. Quando era criança uma vez encontrei com uma
mulher que era bruxa. Uma bruxa de verdade, que vendia
poções e merdas como essa e lia o futuro. Bem... não é
mentira — Murmura lentamente e na defensiva.

Dou risada e levanto as mãos.

— Não disse que era.

— Fui na casa dela para jogar uma pedra na janela


porque havia incomodado um dos meus amigos, mas ela me
pegou em flagrante e colocou as mãos no meu rosto. Não sei
o que diabos fez, mas de repente tive esta visão, como se
estivesse lembrando do passado, mas era o futuro. Vi Tinker
Bell, Julian e Skylar... Dez anos antes de conhecer a Eva e
que os meninos sequer tivessem nascido. Estávamos vivendo
como uma família, em uma casa que só vi o pátio de trás, e....
— Pick olha para mim — Você estava em uma das visões
também.

— Eu?

Sinto um arrepiou na cabeça quando ele assente.

— Você estava na recepção do meu casamento, vestindo


um smoking, perto do sistema de som no palco do Forbidden,
exatamente com ele está agora. É por isso que não recusei
você quando apareceu naquele dia perguntando se podia
tocar. Já tinha te visto antes e queria que ficasse por perto
para conhecê-lo melhor.

— Merda. — Digo, surpreso com tudo que ouvi.


— Ah... Aliás, a primeira canção que Eva e eu temos que
dançar é “Baby Love31”. Não esqueça.

— Merda. — Repito, enquanto ele sorri.

— Muita informação?

— Sim, um pouco. — Respondo, embora esteja negando


com a cabeça. Então, eu me viro completamente no banco
para olhar na direção dele. — Você não está brincando, certo?

Ele balançou sua cabeça.

— Não.

— Hum... — Bato os dedos no lábio inferior ao ritmo de


“Baby Love”, porque agora essa canção está colada à minha
cabeça. — Então, deixa eu ver se entendi. Você está
procurando por aquele pátio que viu em sua visão nas casas
que está olhando para comprar?

Ele faz um gesto que me diz que sim e eu bufo.

— Bem, isso é estúpido.

— O quê? — Pick me dá um olhar surpreso antes de


estacionar em frente à minha casa.

Apenas dou de ombros, sem me desculpar.

— Ao meu ver, você já tem as melhores partes do sonho.


A mulher e os meninos, certo?

— Certo — Responde ele, lentamente.

— Então, porque apenas não aproveita isso e deixa que


o resto aconteça na hora certa? Pare de tentar tornar tudo

31
Música do grupo The Supremes.
realidade porque, merda... Alguém pode estar morando na
casa dos seus sonhos e talvez ela só esteja disponível para a
venda daqui a alguns anos. Por que se torturar e a Eva,
colocando tudo de cabeça para baixo e incomodando-a no
processo, quando poderiam estar desfrutando as melhores
partes juntos?

Pick fica calado e pensativo por alguns momentos.

— Bom ponto. — Murmura, olhando para mim e


sorrindo. — Com certeza Tinker Bell seria muito mais feliz se
sentisse que participou na decisão de onde vamos morar.

— Então... aí está.

— Maldição. — Ele deixa escapar uma risada. — Por que


não pensei nisso antes?

— Acho que você só precisava que seu irmãozinho


colocasse um pouco de juízo nessa sua cabeça dura.

Pick sorri, verdadeiramente feliz com a resposta.

— Então você finalmente está preparado para admitir


que somos parentes, heim?

Olho para a porta enferrujada que leva ao meu


apartamento.

— Suponho que devo, já que serei seu padrinho de


casamento.

Quando arrisco um olhar na sua direção, ele sorri para


mim e mexe em meu cabelo, como um irmão mais velho
provavelmente faria.
Gostaria de passar mais tempo com ele, mas sinto que
pode ser arriscado. É como se fosse acontecer alguma coisa
ruim se eu ficasse muito tempo por perto, e então poderia
perdê-lo.

— Vejo você mais tarde. — Digo, enquanto abro a porta.

Mas Pick segura meu braço.

— Ouça, espere. — Olho para ele e vejo que está atento


às três fechaduras na minha porta. — Seu pai não apareceu,
certo?

— Deus, você parece o Sticks. Não, ele não apareceu por


aqui e não o vi no bar também, depois que você saiu.

— Bem... — Ele morde delicadamente o piercing no lábio


inferior. — O que está acontecendo entre você e seu novo
baterista?

Essa pergunta me pega de surpresa.

— Nada. Por quê?

Ele dá de ombros.

— Não sei. É que vocês parecem muito próximos pelo


pouco tempo que se conhecem.

Não estou entendendo bem o que ele quer dizer...

— Sim, eu acho. Gosto dele. É engraçado, tem bom


gosto musical e pode fazer o diabo na bateria.

E tem um jeito estranho de me fazer contar todo meu


drama pessoal. Além disso sinto uma estranha conexão com
ele.
— Acredito que ele também gosta de você. — Murmura
Pick. — Muito.

Estou prestes a negar e bufar com sua declaração, mas


então me dou conta...

— Não sei. Ele é gay, pode ser possível.

— Uh-huh... talvez seja isso. Ele é.... gay.

Franzo o cenho, confuso.

— O que você quer dizer? Não gosta dele?

— Sim, sim gosto. Ele parece legal. Só é.... diferente.

Fico tenso, quase na defensiva por meu novo amigo.

— Diferente como?

— Não sei. — Responde Pick, parecendo confuso. — Só


que ontem à noite quando vocês estavam conversando,
alguma coisa nele fez você tratá-lo como se fosse... uma
mulher.

Impossível não rir.

— Sim, acho que é essa coisa gay. Não sei bem...

— Então, você notou as atitudes femininas também?


Merda, pensamos do mesmo jeito então.

Continuo sorrindo quando abro a porta do carro.

— Deixe meu pobre baterista em paz. Ele pode ter todas


as atitudes que quiser, ainda acho que é um cara legal como
o inferno.

— Sim, eu me diverti falando com ele. — Diz ele,


inclinando-se na minha direção quando saio do carro. — E só
para você saber, se resolver se interessar por homens agora,
ainda assim vou anunciá-lo orgulhosamente como meu
irmão.

— Oh... vá a merda, homem.

Bato a porta do carro com força, rindo e sacudindo a


cabeça enquanto me viro para minha casa.

Mas, sério, não pode um homem heterossexual ser só


amigo de um homem homossexual sem que todo mundo
pense bobagens?
REMY
Não consigo acalmar meus nervos. É sábado, estamos
em Chicago e em algumas horas vamos tocar em um lugar
enorme e para uma multidão de espectadores exigentes que
estão acostumados as bandas maiores que se apresentam no
clube. E vão nos pagar dez vezes mais que o normal. É como
se estivéssemos de verdade chegando a algum lugar!

Asher alugou uma van para nos trazer junto com todo
nosso equipamento. Como a bateria ocupa muito espaço,
viemos apertados e o cheiro era de morte porque Heath tem
um sério problema de gases.

Depois de quatro horas abro a porta traseira e respiro


profundamente. Meu Deus, ainda bem que chegamos ao hotel
onde vamos passar a noite, porque tudo que eu quero é tirar
a máscara, o peito falso e descansar nua na cama, só para...
arejar.

Atrás de mim, Gally e Heath começam a descarregar


suas coisas enquanto Asher se dirige a recepção principal
para confirmar nossos quartos. Roubo outro momento para
mim mesma, agradecida por não ter que ouvir Gally degradar
as mulheres se gabando sobre quantas bocetas conseguiu, ou
por não estar cheirando os peidos com aroma de meia suja do
Heath.
Mas Gally tinha que me interromper.

— Sticks, você arruma toda sua merda. Não vou


arrastar sua bagagem gay.

Viro-me para fulminá-lo com o olhar, porque minha


mala é preta e simples. Deus, ele é tão idiota.

Mas volto a van pisando forte, não quero mesmo suas


mãos asquerosas perto das minhas coisas.

— Sinto muito, caras. — Anuncia Asher quando retorna,


mostrando dois cartões. — Parece que vamos ter que dormir
como casais esta noite.

Meu estômago começa a retorcer.

— Como?

Fui explicitamente clara ao dizer que queria meu próprio


quarto, mesmo se tivesse que pagar a mais. Puta merda, isto
não podia estar acontecendo de verdade. Como vou tirar a
máscara para dormir? O pânico aperta minha garganta.

— Qu... Qu... como vamos fazer?

Asher dá de ombros se desculpando.

— Estamos muito perto do Soldier Field32 e


aparentemente os Bears têm um jogo de futebol amanhã.
Consegui os dois últimos quartos disponíveis.

Franzo o cenho. Bears idiotas. Futebol idiota. Por que,


por que, por que isso aconteceu? Estava contando com meu
próprio maldito quarto.

32
Estádio de futebol americano.
Asher lança a Gally um dos cartões.

— Você e Sticks podem ficar no 5B. Holden e eu ficamos


no....

— Oh, porra, não — Explode Gally. — Você não vai me


obrigar a passar a noite com o veado. E se na metade da noite
ele decide vir para minha cama e ficar de quatro?

— Como se isso fosse acontecer. — Bufo.

— Ele vai me ver trocar de roupa. — Lamenta-se Gally,


ignorando-me completamente. — E eu durmo nu. Não quero
que Sticks me veja nu.

Eu também não quero. Viro-me para Asher, implorando


com os olhos.

— Por favor, Deus, não me faça ficar com ele.

— Está bem. — Diz Asher revirando os olhos para Gally.


— Você fica com Heath e Sticks pode ficar comigo.

Oh, Deus, o quê? Eu, dividir o quarto com Asher Hart?


Não! De certa forma isso é pior porque quero vê-lo nu. Merda,
o que aconteceria se o visse nu? Provavelmente iria para a
cama dele na metade da noite. Estou me sentindo um pouco
doente de preocupação.

Mas sério, como diabos vou esconder que sou uma


garota de alguém que vai dividir o quarto comigo? Merda. Não
vou tirar a máscara durante toda esta viagem?

— Têm duas camas no quarto, não é?

Asher me dá um olhar seco.


— Sim.

Quase desmaio de alívio com essa resposta, mas consigo


dar apenas um aceno contido.

— Boa!

Então, deixamos os instrumentos dentro da van,


descarregamos nossas bagagens e, enquanto Heath e Gally se
afastavam para encontrar o 5B, Asher e eu ficamos no piso
térreo, procurando o 1D.

Caminho atrás dele, arrastando a mala enquanto ele só


carrega uma pequena bolsa de lona no ombro. Minha mente
dá voltas pensando nas diferentes formas que minha
identidade pode ser revelada. Graças a Deus não vou ficar
menstruada agora, então não preciso ter por perto meus
produtos de higiene feminina. Inclusive saí para comprar
todos os artigos de homem para continuar com meu papel.

Mesmo assim, basta dar uma olhada em minha


bagagem para ver minhas calcinhas ou a máscara de
reposição que Jodi fez, caso aconteça algo com esta.

Não estou certa de como Asher ou os outros dois vão


reagir quando descobrirem, mas sei que não quero me
arriscar que aconteça enquanto estou presa com eles em
Chicago.

— Lamento que tenha ficado preso com o cara gay. —


Digo, tentando não me preocupar com o que possa acontecer.
Asher está de costas para mim abrindo a porta de nosso
quarto. Puta merda, não posso acreditar que estou a ponto de
dividir um quarto de hotel com Asher Hart.

— Não se preocupe com isso. — Ele olha por cima do


ombro e sorri. — O que Gally não sabe é que vi Heath dormir
nos intervalos, quando trabalhávamos juntos, e ele ronca
como um maldito trem de carga.

Solto uma risada e balanço a cabeça.

— Bom...

A porta está aberta e ele entra na minha frente.

— Tem alguma preferência de cama?

E agora estou falando de camas com Asher Hart.

Que irreal.

— Uh... não. Como quiser.

Estaria completamente de acordo com simplesmente


dividir, mas não digo isso em voz alta.

Asher joga a bolsa na cama perto da porta e


imediatamente tira os sapatos. Arrasto minha pequena mala
até a cama que fica perto do banheiro e espio pela porta para
ver o tamanho, porque aparentemente este pode ser o único
lugar em que conseguirei me separar de Sticks por alguns
minutos e respirar. É pequeno, mas está limpo, então vai que
ter que servir.

Quando me viro, Asher está tirando a camiseta e


jogando-a na cama. Minha boca fica seca. Sério, para um
cara magro os músculos são impressionantes. Ele coloca a
mão no zíper da calça e meus olhos quase saem das órbitas.

— O que... o que... o que você está fazendo? — Consigo


perguntar.

Ele baixa as calças e fica só com as boxers.

— Não quero ficar cheirando como o rabo do Holden


pelo resto da noite, então vou tomar uma ducha rápida.

— Oh...

Não consigo afastar os olhos enquanto ele abre a bolsa e


procura alguma coisa lá dentro. Provavelmente, deveria olhar
para outro lado, ou fazer algo produtivo como... não sei. Mas,
sério, tenho que parar de olhar boquiaberta.

Não consigo. Simplesmente continuo observando... e


provavelmente babando.

— Droga, esqueci de pegar as coisas de banho —


Murmura Asher repentinamente, levantando os olhos para
mim. — Ouça, você trouxe artigos de higiene? Odeio esses
pequenos sabonetes que eles deixam no banheiro, só dá para
lavar o polegar do pé.

Levo um segundo para voltar a realidade.

— Esqueceu tudo? Como pode esquecer todas as


malditas coisas de banho?

Coloco a mala sobre a cama e abro, assustada com o


que pode estar por cima.

Asher bufa.
— Como você consegue lembrar de tudo?

Pego meu nécessaire de cosméticos masculinos e atiro


para ele, que pega facilmente.

— Não é tão difícil.

Ele abre e assobia.

— Jesus, sério, você lembrou de tudo mesmo. Para que


diabos é tudo isto?

Ofendida por sua pergunta, franzo o cenho.

— O que quer dizer? Só trouxe o que precisava.

— De verdade? — Arqueando uma sobrancelha, ele


levanta um pote. — Você precisa disto? Não sei nem o que é!

— É gel. Você sabe, para ajeitar o cabelo.

— Claro — Responde e coloca de volta na bolsa, só para


tirar um pente, sabonete, shampoo e desodorante. — Isto é
tudo o que um homem precisa. E um aparelho de barbear, se
for ficar fora por muito tempo.

Dou um suspiro e faço “cara de paisagem”.

— Homem das cavernas.

— Cala a boca. — Diz sorrindo e joga a bolsa na minha


direção.

Despreparada, luto para pegá-la.

— Vou tomar banho. — Anuncia ele, enquanto entra no


banheiro. — Obrigado por me emprestar suas coisas. “Te
devo uma. ”
— Uhuuuu. — Murmuro distraída, olhando para
nécessaire. — Espera! Você não quer o condicionador? —
Pergunto, levantando o tubo para que ele o veja.

Asher para e olha para trás, franzindo o cenho.

— Pensei que só as mulheres usavam isso.

— Oh, Deus, poderia ler esta pequena etiqueta? Diz


condicionador para homens.

— Sim, mas apenas... — Ele se interrompe


bruscamente, como se soubesse que o que estava a ponto de
dizer era ofensivo.

— Apenas o quê? — Pergunto, levantando as


sobrancelhas. — Termine a frase. Só os caras gays usam?

Asher franze o cenho.

— Isso... não é o que eu ia dizer.

Demonstro com o olhar que eu sei a verdade e ele franze


ainda mais o cenho.

— Sério, não posso acreditar que não use


condicionador. — Digo, suspirando. — Seu cabelo parece tão
suave e brilhante, como se você cuidasse dele. Com todas
essas luzes loiras, deve ter um montão de pontas duplas. É
só... é uma situação triste, isso é tudo o que eu posso dizer. E
aposto que suas raízes...

— Oh irmão! Me jogue o maldito condicionador. — Diz,


estendendo a mão.

Eu atiro, sorrindo presunçosamente por alguma razão.


— E quando terminar, vou usar o gel no seu cabelo e
mostrar como pentear essa preciosa juba.

Asher congela, observando-me, apenas os cílios


movendo-se enquanto ele pisca.

— Você... quer pentear meu cabelo?

— O quê? — Pergunto inocentemente. — Sou gay,


lembra?

Um pequeno sorriso curva seus lábios e os ombros


relaxam um centímetro.

— Está brincando comigo, não é? É obvio.

— Como poderia resistir? — Digo, dando uma


piscadinha e soprando um beijo.

— Jesus! Sabia que havia uma razão para eu gostar de


você. — Responde ele, sacudindo a cabeça e rindo, enquanto
fecha a porta do banheiro.

Um imenso sorriso se estende por meu rosto. Isso foi


divertido. Nota para mim mesma: fazer joguinhos verbais com
Asher Hart tão rápido quanto for possível. Claro, ele me tratou
como um cara durante todo o tempo, mas esta pequena bolha
dentro de mim continua subindo e subindo por meu peito.

Apesar da sua completa falta de habilidade


organizacional, Asher é um grande cara. Nenhuma só vez
tinha feito algo para me incomodar, diferente dos outros dois,
com quem, graças a Deus, não tenho que dividir o quarto. E
tem meu senso de humor. Ninguém tem meu senso de
humor. Isto é simplesmente... incrível.
Ouço o barulho da ducha e meu sorriso sofre uma morte
súbita.

Tudo o que consigo imaginar é ele... nu e molhado,


movendo o sabonete que eu havia comprado em partes que
nunca chegarei a ver.... ou tocar. Neste momento, desejo ser
suas mãos, movendo-as pelo abdômen musculoso ou lavando
o cabelo.

Diabos. Isto não me surpreende. Ele está me torturando


sem sequer perceber, porque Asher Hart não precisa fazer
nada para atrair uma mulher, simplesmente tem que ser ele
mesmo. E eu estou atraída por ele. Muito.
ASHER
Acabo deixando que Remy penteie meu cabelo. Não sei
bem por que, afinal, ele estava simplesmente brincando.

E é divertido brincar com ele...

Para dizer a verdade preciso de uma distração, estou um


pouco nervoso com esta noite. Tocar no Forbidden se tornou
normal e previsível, adoro fazer shows lá, mas sei que se
quisermos crescer temos que diversificar. Assim... estou
vivenciando experiências novas e que dão medo. Incluindo o
cabelo penteado com gel.

Sticks fala o tempo todo, atropeladamente, mudando a


voz para parecer com a dos estilistas exagerados dos filmes
dos anos oitenta e fazendo gestos afeminados com a mão.

— Não se preocupe, querido, vai ficar magnífico.

— Quieto, idiota. — Tento dar um tapa no joelho dele,


mas Sticks pula para trás, esquivando-se. — Só faça essa
“coisa”.

Ele então coloca a mão no pote de gel de merda e afunda


os dez dedos no meu cabelo.

Fecho os olhos e tento não aproveitar muito. Porque...


merda. Fui criado por pais que não demonstravam nenhum
tipo de afeto e depois por um tio que era do mesmo jeito,
então qualquer contato humano, inclusive o mais leve, para
mim é como um completo contato carnal.

E ele está me torturando enquanto trabalha lenta e


suavemente, puxando meu couro cabeludo ritmicamente,
forçando-me a engolir um gemido de prazer. Isto me faz
pensar que não sou verdadeiramente tocado, além das
cotoveladas amistosas ou tapas no ombro por parte dos
amigos, há meses.

E me faz desejar sexo, corpo roçando outro corpo, mãos


e lábios acariciando, seios na boca e dedos enterrados
profundamente em algo apertado e molhado.

Quando Sticks diz algo sobre o quanto está surpreso por


meu cabelo não ter pontas duplas, dou um pulo
sobressaltado, lembrando repentinamente que é ele que está
me tocando.

— Falta pouco? — Pergunto mal-humorado, mexendo-


me desconfortável na tampa fechada da privada.

As mãos dele no meu cabelo de repente parecem muito


pessoal. Nem mesmo as mulheres com que eu tinha dormido
haviam brincado tanto com meu cabelo. Sei que elas
gostavam de puxá-lo quando estavam gozando, mas logo
depois disso não servia para mais nada.

Não estou certo de como lidar com o fato de que Remy


esteja agindo de forma tão casual, como se fosse uma coisa
comum estar mexendo no meu cabelo. E nunca, nem em um
milhão de anos, vou admitir que gosto disso.
— Jesus, muito impaciente? — Ele afasta as mãos e eu
quase lamento. Logo depois Sticks pega o pente, faz uns giros
aqui e ali e afasta-se. — Aí está. Perfeição. O que acha? —
Pergunta, sorrindo orgulhosamente e apontando para o
espelho.

Paro e observo meu reflexo. Ele penteou de um jeito que


o cabelo caía de lado, desordenado..., mas era uma desordem
controlada. Pareço com uma maldita estrela de rock. Mas
hey, acho que essa é a ideia.

— É...

— Super sexy. — Confirma Remy, ganhando um cenho


franzido da minha parte. Mas ele dá de ombros, alucinado. —
Sim, se você pensou que tinha um monte de mulheres atrás
de você antes, espere até esta noite menino. Essa bela
bagunça vai atrair todas as garotas.

Dou uma risada, mas falar em mulheres me faz pensar


em sexo, de novo. Passou-se muito tempo desde a última vez
que fiz sexo e um calor pulsante se estende através do meu
pênis. Logo minha mente fica em modo “super caverna”,
incapaz de pensar em algo que não fosse bocetas. E
estocadas.

Merda. Tenho que fazer algo a respeito.

Grunhindo alguma coisa, não sei bem o quê, escapo do


banheiro e pego a carteira e a chave.

— Vou explorar por aí, ver se estamos perto do clube.


Quando eu voltar provavelmente será hora de ir. O banheiro é
todo seu, cara.
Sticks apoia o ombro no batente da porta e me observa.
Quando ele responde "tudo bem" sinto um estranho mal-
estar, como se devesse fazer mais, saber mais, ou diabos, sei
lá... simplesmente não parece que está tudo bem. Então, saio
correndo.

— Obrigado de novo por.... você sabe. — Digo, fazendo


um gesto para o meu cabelo e saindo pela porta.

Fiquei fora mais tempo do que deveria, mas ao menos


entendi como é o trajeto e quando voltei para me reunir com
a banda, consigo nos levar diretamente ao nosso destino sem
me perder.

Com o falatório do Gally e o forte silêncio do Holden, a


estranheza que senti mais cedo com relação ao Sticks se
dissipa e sou capaz de pensar no que vai acontecer em alguns
momentos.

Enquanto esperamos nos bastidores — porque este


lugar realmente tem bastidores — para o começo do show,
Sticks levanta o pescoço e começa a pular na ponta dos pés,
como se estivesse se preparando para uma corrida ou algo
assim.

— Que diabos está fazendo? — Pergunto, sacudindo a


cabeça e sorrindo.

Ele só dá de ombros.

— Aquecendo. — Responde, movendo os ombros e


chutando com cada perna antes de sacudi-las. — Você não
tem nem idéia de como fico com os músculos rígidos depois
de estar sentado no banco por muito tempo.
Faz sentido, por isso me viro e paro de respirar quando
o coordenador faz um gesto para irmos.

— Vamos tocar. — Anuncio aos meninos, guiando para


palco, onde o pessoal já tinha preparado nosso equipamento.

Respiro bruscamente quando vejo a multidão. Este lugar


não está tão cheio como o Forbidden, mas é facilmente quatro
vezes maior, o que significa que há duas vezes mais pessoas.
A pista está escura e quatro holofotes azuis iluminam as
posições que devemos ficar. Já sinto a parte de trás do meu
pescoço aquecer. Vou rapidamente para o meu lugar, coloco a
Taylor no ombro e pego o microfone, observando para me
certificar que todos estão preparados. Quando Remy assente,
dou o sinal e começamos, antes mesmo de nos apresentar.
Duas canções mais tarde conto à multidão um pouco sobre a
gente, quem éramos e onde podiam encontrar mais
informações. Neste ponto o público já está animado com a
nossa música e responde com entusiasmo quando apresento
cada um dos membros da banda.

E logo estamos tocando de novo, balançando cada


canção. Achei que poderíamos ter um problema quando
Holden teve um pouco de medo do palco e perdeu o ritmo na
guitarra, mas Remy se manteve firme o tempo todo e ele
facilmente retomou. Aliviado, cantei um pouco mais forte
para compensar, e ninguém pareceu perceber.

O público aplaudiu, dançou e se divertiu. No momento


que terminamos, eu estava coberto de suor, mas sentindo
uma descarga de adrenalina incrível.
O dono — sim, o dono em pessoa — reuniu-se conosco
atrás do palco para nos convidar a voltar dentro de um mês e
só preciso olhar para meus companheiros para ver que eles
aceitam, então digo logo que sim. Depois disso ganhamos
tickets para bebidas com desconto no bar. Acho que nós
quatro estávamos com muita energia acumulada para voltar
ao hotel, por isso pegamos os tickets e fomos para lá.

Gally some imediatamente, para procurar uma aventura


de uma noite, mas Holden, Sticks e eu encontramos uma
mesa livre para nos sentar.

As pessoas levaram uns poucos minutos para nos


reconhecer, mas logo um trio de loiras idênticas chegou à
nossa mesa e uma, particularmente atrevida, senta-se em
meu joelho e fica ali para me dizer o quanto tinha gostado de
nos assistir. Seu perfume é forte, mas o corpo é suave e
feminino e como tenho toda esta energia para gastar, não a
afasto. Inclusive coloco a mão na sua cintura para que não
perca o equilíbrio e caía da minha perna.

A menina flerta comigo enquanto suas amigas se


aproximam. Uma delas finalmente vira-se para Sticks
querendo conversar.

Sei que a mulher no meu colo vai estar de acordo se eu


quiser levar isto mais longe. Inferno, acho que estaria de
acordo mesmo se eu quisesse arrastá-la para um canto
escondido no clube e comê-la ali. Mas algo continua me
impedindo de agir, provavelmente a maneira que ela não para
de me chamar pelo nome e sobrenome juntos. É irritante.
Estamos sentados a menos de dez minutos quando
alguém se aproxima, dizendo meu nome. Olho para trás e
quase caio da cadeira quando encontro o olhar zombador do
meu pai.

— Que diabos? — Digo. — O que você está fazendo


aqui?

— Temos que conversar. — Responde ele, olhando


lascivamente o decote da mulher no meu colo, antes de
prestar atenção em mim outra vez. — Agora.

— O que... como me encontrou?

— Está postado no site da sua pequena banda. Fui


expulso daquele bar de merda que você toca normalmente e
como ainda não tenho o endereço da sua casa este é o único
lugar onde poderia te encontrar.

— Ele não quer falar com você. — Responde Sticks por


mim, aparecendo ao meu lado com os braços cruzados e
fulminando meu pai com o olhar.

O velho pisca para ele antes de bufar.

— Que diabos é isto? — Pergunta-me. — Seu guarda-


costas? O idiota é menor que eu.

— Também sou mais jovem, mais rápido e estou


armado. — Informa Sticks, estreitando os olhos.

Sua postura me diverte e agrada, porque significa que


ele se importa o suficiente para cobrir minhas costas. Mas é
completamente desnecessário.
— Desculpe-me por um minuto, querida. — Digo,
tirando a menina do colo e me virando para falar com Remy.
— Pode deixar que eu tomo conta disto.

Faço um gesto ao meu pai para que me siga e procuro


um lugar tranquilo para ouvir o que ele tem a dizer. Sticks
vai atrás e fica a alguns metros de distância. Não falo nada
porque ele parece realmente preocupado. Cara estranho...

Então estou cara a cara com o homem que costumava


ser meu pesadelo vivo. Mas não sinto medo agora que sou
muito maior que ele.

Meu pai está enrugado, tosco e amargurado e eu sequer


posso pensar nele como um assassino. Eu estava lá e vi o
choque... ele não queria tirar a vida dela. Não era nada mais
que um valentão desagradável e fracassado.

— O que você quer? — Pergunto, cruzando os braços.

— Quero saber onde está meu contrabando. — Grunhi


ele, chegando assustadoramente perto.

Mas isso também me parece uma piada. Balanço a


cabeça porque não tenho ideia.

— Que contrabando?

— O maldito contrabando que escondi antes de me


prenderem.

Tenho que rir, não vejo este cara há dezesseis anos e


tudo o que ele quer são suas drogas? Nenhum “perdão por
assassinar a sua mãe? Por todos os lábios machucados e
olhos roxos? Por criar você como um escravo? ” Só “onde
estão minhas drogas? ”

Bom... faz sentido.

— E você realmente acha que sei o que aconteceu com


essa merda? Nunca me deixaram voltar ao apartamento. Não
sei o que aconteceu com nada.

O velho morde o lábio inferior grunhindo com decepção.

— Você acha que os policiais encontraram?

Levanto as mãos.

— Não tenho ideia. E, honestamente, não me importa


uma merda o que tenha acontecido com suas drogas. Você
está por conta própria.

Quando começo a caminhar, ele me segura pela manga


da camisa.

— Ouça, não terminei de falar com você, menino.

Sticks aproxima-se, colocando a mão no bolso. Meu pai


dá um olhar severo, mas imediatamente me solta.

— Você me deve. — Continua, inclinando-se na minha


direção. — Não sei quantas vezes impedi que aquela cadela te
matasse. Quando ela quis afogá-lo na banheira ou te sufocar
com um travesseiro, eu mantive você respirando, e
proporcionei o necessário.

Observei-o impassível.

— Não entendo o porquê.


Ele nunca havia demonstrado nem um pingo de
compaixão.

— Porque achei que você seria como eu. — Quando


começa a chegar mais perto lembra de Remy e dá um olhar
cauteloso na direção dele. — Mas você não puxou a mim. —
Diz, com os lábios curvando-se em uma careta depreciativa.

Balanço a cabeça e suspiro, focando em Sticks porque


não posso olhar o desperdício de pessoa que é meu pai.

— Eu já disse que não sei onde está seu contrabando e


não sei mesmo. Então... terminamos.

Começo a caminhar de novo, mas ele me chama.

— Eu preciso de um pouco de dinheiro para começar de


novo. Diabos, menino, não se afaste de mim. Você vai se
arrepender disto.

Remy vem para o meu lado e começamos a caminhar


juntos, sem olhar para trás.

— Não falei que o velho não estava atrás de mim para


me matar? — Pergunto, com o canto da boca.

— Oh, sim, claro, esse "você vai se arrepender disto" não


foi nada ameaçador.

Eu começo a rir.

— Relaxa, cara. Tenho certeza que essa é a última vez


que vamos ouvir falar dele.

— Acho que você está enganado, mas...


— Você tem uma arma mesmo? Que diabos tem no
bolso?

Simplesmente não posso imaginá-lo colocando uma


arma entre o condicionador e o gel.

— Um spray e um apito. — Responde ele a contragosto.

Jogo a cabeça para trás e dou uma gargalhada

— Homem, você me faz rir. — Admito, segurando o


ombro dele.

— Hummm. Bom, olhe para isso. — Murmura, quando


estamos quase chegando a mesa. — Seu harém de putas foi
suficientemente amável para esperar por você.

Seu tom amargo só me faz sorrir.

— O quê? Você está com ciúmes porque não há nenhum


cara no grupo?

Ele me olha carrancudo.

— Uh-huh. Sim, deve ser por isso.

Quando dou de ombros e começo a me dirigir para a


mesa, ele toca meu braço.

— Não posso ficar, vou pegar um táxi e ir para o hotel.


Tem certeza que seu pai não vai voltar? Posso deixar meu
apito com você.

Mostro meu dedo médio.

— Acho que posso me arrumar sem um maldito apito


para prevenção de estupro.
Ele balança a cabeça e olha para as mulheres nos
observando e esperando que voltássemos.

— Não sei, Hart. Aquela parece pronta para rasgar sua


roupa a qualquer momento, esteja você disposto ou não.

Dou um empurrão nele, rindo.

— Eu espero que sim. Agora “te manda”. Vejo você no


hotel.

Uma expressão miserável cruza o rosto de Sticks, mas


logo concorda e vira-se para ir embora.

Observo-o afastar-se por um segundo, em seguida


balanço a cabeça e volto para as mulheres.
REMY
Bem, sim, admito. Ver aquela mulher caindo sobre
Asher me transformou em uma cadela ciumenta.

Não consigo evitar. Ela estava tocando-o onde eu queria


tocá-lo. Não é justo. Não posso nem sequer entrar no jogo, já
que estou fingindo ser um menino. Incapaz de vê-la em cima
dele por mais um segundo, saí em disparada e voltei ao hotel
me sentindo miserável, quando deveria estar totalmente
excitada e feliz. Sacudimos aquele clube. E tudo foi muito
legal até a hora que aquela puta sentou no colo de Asher e ele
colocou o braço na sua cintura.

Estou tão furiosa que a preocupação com o fato do pai


dele ter aparecido ficou em segundo plano. Puff. Tento não
me perguntar o que teria acontecido se eu estivesse em modo
menina, usando maquiagem e um vestido curto preto.

Será que eu poderia competir pela atenção dele com


aquela puta? Droga, por que ficar pensando nisso? Nunca
vou ter essa oportunidade. Dei um tiro no pé na hora que
entrei no auditório como Sticks.

Depois de tomar uma ducha extralonga e de limpar e


secar a máscara que estava muito suada, coloco-a
novamente, porque não tenho ideia de quando Asher vai
voltar.
Sei que não vou conseguir dormir com o meu cabelo
comprido preso, é muito incômodo, mas mesmo assim vou
para a cama e apago o abajur. Fico me revirando pelo que
parece uma eternidade, perguntando-me o que ele estava
fazendo com aquela garota, se estava tocando-a, onde ela o
beijava, que roupa estava sendo tirada... merda. Dou um soco
no travesseiro. Isto é burrice, ele é meu companheiro de
banda. Só. Asher pode fazer o que quiser com quem quiser.

Não devo me envolver ou me preocupar. Então, por que


diabos estou com tanta vontade de chorar? Finalmente,
depois do que parecem horas, caio em um sono inquieto.

Sinto como se mal tivesse adormecido quando acordo


sobressaltada com a porta do quarto sendo aberta.

Fico gelada, quase sem respirar, espero que Asher esteja


sozinho, que ele não tenha trazido sua amiga junto. Oh Deus.
E se ela estivesse aqui? Será que ele espera que eu durma
enquanto fode com outra mulher a poucos passos de
distância?

Nem no inferno posso lidar com isso. Meu rosto arde


dentro da máscara, mas eu não coço ou movo um músculo
enquanto pés, — só um par — arrastam-se pelo chão. As
molas do colchão rangem atrás de mim quando Asher senta-
se na cama.

Meu corpo responde imediatamente, esquentando sem


controle o disfarce que já é quente. Mas então o aroma de
perfume feminino chega ao meu nariz e congelo outra vez. Ele
transou com a garota.
A loira. Realmente odeio essa loira. Asher deixa escapar
um suspiro longo e cansado e posso imaginá-lo esfregando o
rosto e talvez passando os dedos talentosos pelo cabelo
escuro e macio. Aquele mesmo cabelo onde antes eu tinha
passado os dedos, o mesmo que queria experimentar outra
vez.

Ele levanta-se. O barulho suave de tecido me diz que


está tirando a roupa. Oh, homem. Meu termômetro interno
dispara chegando às nuvens, com a intensidade do meu
tesão.

Não devo olhar. Não devo olhar. Não devo olhar, mesmo.
Realmente estou sendo uma boa garota e não estou olhando.
Mas aí ele vai para o banheiro e passa pela minha cama,
justamente quando estou com os olhos abertos no quarto às
escuras... Bom, às escuras até que Asher acende a luz do
banheiro e me dá de presente a visão da sua bunda nua
perfeita. Deus. Aquelas nádegas bronzeadas são... São... Sim.
Deus.

Ele fecha a porta do banheiro rápido demais me


envolvendo novamente na escuridão do quarto. Quando ouço
o barulho da ducha, minha imaginação dispara, pensando
em todos os lugares que poderia tocar aquele corpo molhado
e nu... passando o sabonete na pele quente de músculos
definidos e deixando um rastro escorregadio desde o
estômago até entre as pernas, onde provavelmente iria
acariciar seus testículos ao lavá-los.
Merda. Uma ducha nunca me pareceu tão sexy antes.
Queria tanto estar sob o chuveiro com ele.

Meu corpo dói e os mamilos queimam com a


necessidade de serem tocados. Fecho os olhos e respiro
através da máscara, cada respiração um pouco mais curta e
excitada. Sem controle minha mão está na cintura da calça
de pijama e em seguida dentro da calcinha.

Deus, como eu gosto de calcinhas sexys de seda. São


perfeitas para dar prazer, atingem o clitóris e criam a fricção
certa para uma experiência sensacional. Mas esta noite não
importa o que estou usando. Posso gozar simplesmente
ouvindo Asher Hart cantar "Budapest" do George Ezra, no
chuveiro.

Estou a centímetros de me acariciar, os quadris já


levantando da cama, quando a água é desligada. Merda, por
que ele não tomou um banho mais longo? Tiro a mão e aperto
as pernas, ouvindo o barulho da porta do banheiro.
Automaticamente, meus olhos abrem. Asher sai, molhado,
com uma toalha enrolada na cintura.

Estou boquiaberta com a beleza que é seu peito nu


quando ele para, surpreso.

— Merda. — Diz, fazendo uma careta. — Sinto muito,


Rem. Não quis te acordar.

— Está tudo bem.

Arrasto as palavras, como se tivesse acordado agora,


quando a verdade é que estou completamente desperta. Com
um bocejo, viro-me na cama para não ficar encarando-o.
Mas isso não resolve nada. Ele aproxima-se do seu lado
do quarto, que é para onde estou virada. E, a propósito, deixa
cair a toalha.

— Está dormindo há muito tempo? — Pergunta


naturalmente, como se não estivesse ocorrendo nada de
impressionante e ainda me dando uma olhada enquanto
procura as calças de pijama na mochila, levantando as
sobrancelhas com curiosidade.

— Uh...

Meus olhos se negam a piscar, apenas fico olhando ele


vestir a calça sem cuecas.

Oh Cristo. Ele dorme sem cuecas? Isto não é algo que eu


deveria saber.

Tecnicamente não tenho que saber que ele é tão bem-


dotado. Mas, bem, ele é. Como pode um homem magro ser
tão grosso onde mais importa? Lambendo os lábios, viro para
o outro lado enquanto puxa os lençóis e deita.

— Não muito. — Finalmente consigo dizer.

Não muito? Ok! Esse é provavelmente um dos pênis


mais longos que tive a oportunidade de ver. E a
circunferência? Precisaria das duas mãos para envolvê-lo.

— Oh, bem. Ouça, vou incomodá-lo se acender minha


luz?

— Claro que não.


Certamente, não vou voltar a dormir agora. Muitos pênis
bem-dotados flutuavam na minha mente cada vez que
fechava os olhos.

— Obrigado.

Ouço passos e barulho de papel amassado, mas me


nego a olhar. Não até que um certo aroma chega ao meu
nariz.

— Puff. Que cheiro horrível é esse? — Pergunto, virando-


me para o lado dele.

Asher está sentado na cama com o torso nu, as costas


apoiadas em dois travesseiros e as pernas esticadas sobre os
lençóis, comendo.

— Salgadinhos. — Anuncia, levantando o pacote para


me mostrar. — Sabor churrasco. Quando os vi na máquina
do corredor não pude resistir. Esta merda e tic tac sabor
laranja são o meu vício.

Enrugo o nariz.

— Bom, espero que tenha comprado alguns tic tacs,


também. Aposto que seu hálito vai ficar horrível depois disso.

Sem ofender-se, Asher começa a rir.

— Que seja, idiota. Ia perguntar se você queria alguns.

Imediatamente estendo a mão no espaço entre as


camas.

— Merda, sim. Se vou ser obrigado a cheirar isso a noite


toda, posso comê-los também.
Com outro sorriso, Asher inclina-se para colocar uma
quantidade considerável na minha mão.

— Você realmente é divertido, Sticks.

— Sim, sou um comediante regular. Não seja miserável.

Ele não foi, o que me surpreendeu. Provavelmente está


sendo muito generoso com algo que é a sua comida favorita,
porque colocou tanto na minha mão que alguns caíram no
tapete.

— Oh, merda. — Deixo escapar em um grito


consternado. — Os salgadinhos caíram.

— Regra dos cinco segundos. — Diz Asher, e se lança da


sua cama.

— Ouça, esses salgadinhos são meus. — Digo


indignada, saltando da cama atrás dele, empurrando-o com o
ombro.

Pego os três salgadinhos no chão e coloco-os na boca.


Então, enquanto ainda estou mastigando, grito: — Há! — Na
cara dele, provavelmente com um bafo de churrasco.

Não foi meu momento mais atraente, mas ele pensa que
eu sou um menino, então... quem se importa? Eu o derrotei
na guerra dos salgadinhos. Yuuuhuuu!

— Maldito. — Reclama Asher, dando um soco na minha


panturrilha.

Abro a boca mais de surpresa que de dor. Merda,


realmente ia ter que me acostumar a este tipo de brincadeira
de bater no outro.
— Ai! — Digo com o cenho franzido e esfregando a
perna.

Mas isto me confirmou que de fato ele pensa que eu sou


do sexo masculino. De maneira nenhuma posso imaginá-lo
dando um soco em uma menina.

Eu gostei um pouco, apesar de estar com a perna


ardendo. Pelo menos sei que está completamente à vontade
comigo e relaxado o suficiente para ser ele mesmo. Estou
vendo o verdadeiro Asher Hart, com a guarda totalmente
baixa.

Ele olha para mim com os lábios sexys retorcendo-se


maliciosamente.

— Ver você comer esses salgadinhos me fez pensar no


que pode ter acontecido neste chão. Você está comendo tudo
isso, sabe?

Paro de mastigar, mas em seguida dou de ombros e


engulo.

Fiz uma coisa tão de menino que estou orgulhosa de


mim mesma. Mas também faço uma nota mental para
gargarejos três vezes mais longos pela manhã e escovar os
dentes duas vezes.

Resmungando em voz alta, Asher se arrasta de volta


para a cama e pega o caderno.

— Você está sempre escrevendo nessa coisa. — Digo,


mais curiosa do que nunca para saber o que ele está
rabiscando como um louco.
— Hum? São só letras. — Murmura distraído, a voz
demonstrando que está concentrado em outra coisa. —
Quase sempre tenho que escrever alguma coisa antes de ir
para cama à noite, caso contrário não consigo dormir porque
meu cérebro fica frenético.

— Não acredito! — Estou surpresa e me sentindo mais


conectada com ele do que deveria. — Faço isso também.

Asher me olha impressionado.

— De verdade?

Inclino-me no outro lado da cama onde está minha


bagagem, abro o zíper e pego o caderno. Olho para ele antes
de abrir as páginas para mostrar as folhas preenchidas.

— Não pode ser. — Murmura ele, estendendo a mão


para pegar o caderno.

Com o cenho franzido, fecho-o e aperto no peito.

— Não acredito, Scooter33.

Aprendi da maneira mais difícil a não mostrar minhas


letras, porque Fisher havia roubado uma delas para a Fish 'N'
Dick's. Aliás, foi o único sucesso deles.

Mas Asher pisca para mim como se eu estivesse louca.


Então...

— É que... todas são horríveis. Assim, você não precisa


perder seu tempo olhando-as.

33
Scooter é um personagem muppet da série The Muppet Show.
— Ok. Mas quero decidir se elas são ruins ou não. Além
disso, noventa por cento das minhas cheiram mal também.
Agora... me dê isso.

Quando balanço a cabeça obstinadamente, ele me dá


um sorriso sexy.

— Mostro o meu se me mostrar o seu.

Solto um grunhido.

— Querido, acabo de ver o seu e deixe-me dizer... puta


merda, caralho. Você ganha.

Asher fica de boca aberta e nega com a cabeça.

— Não posso acreditar que você tenha dito isso.

Dou de ombros.

— O quê? Que você é maior? Bem, você não hesitou em


mostrar seu lixo, então só estou dizendo que é um pau
impressionante. Sério, deve ficar orgulhoso desse monstro.
Quero dizer, na hora que você saiu do banheiro eu só
queria... você sabe, chupar. — Digo, fazendo um gesto com as
mãos como se estivesse segurando um enorme pênis invisível.
— Quero dizer...

Oh santo Inferno, fui longe demais, inclusive para um


gay. Olho para Asher me preparando para levar um chute na
bunda, ou ser atirado para fora do quarto... ou algo assim.
Mas ele só joga a cabeça para trás e ri.

— Porra, é tão engraçado. Isso deve ser a coisa mais gay


que já ouvi você dizer.
— Sim, sinto muito. — Murmuro, depois de respirar
fundo.

— Não se preocupe. — Sem deixar de rir, Asher enxuga


as lágrimas dos olhos. — Mas, caramba, você é
definitivamente cem por cento gay, certo? Quero dizer,
realmente prefere meninos.

— Hum... sim — Respondo, como se isso não devesse


ser tão difícil de acreditar.

Ele balança a cabeça.

— Isso é tão estranho. Nem sequer peitos? Quero dizer...


Seios, cara. — Diz, fingindo apertar. — São tão... Hummm...
“Comíveis”.

Dou de ombros.

— Hey. — Ele continua ainda balançando a cabeça,


estudando-me como se eu fosse alguma espécie de ser
sobrenatural. — Bom, tudo bem. E bocetas então? Sério, se
você tem um pau é impossível torcer o nariz para elas. São
tão molhadas e quentes e apertadas. Elas são feitas para
receber um pau e é como se estivesse no céu quando está
dentro delas. E o sabor. Alguma vez você provou uma boceta?

— Eca. Não. — Respondo, levantando as mãos e


enrugando o nariz.

— Bem, esse é seu problema. Não tem ideia do que está


perdendo.

— Está tentando me converter em hétero? — Pergunto,


estreitando os olhos.
— Não. — Então ele ri, como se risse de si mesmo. —
Bem, não acho que estou. Só quero entender o que você não
gosta em uma mulher, porque elas são perfeitas, todas
suaves e femininas e com um cheiro delicioso. — Asher
respira fundo e fecha os olhos. — Não há nada melhor que se
afundar em uma boceta enquanto está chupando um mamilo.
E depois, quando as pernas envolvem sua cintura apertado...
é só... Nirvana.
REMY
Sinto um calor subir pelas coxas até que minha boceta
está tão molhada e dolorida que tenho que apertar as pernas
sob as cobertas. Asher pisca e me olha com seus brilhantes
olhos verdes, mostrando que a visão que descreveu o afetou
tanto quanto a mim

Pergunto-me que tamanho está seu pênis agora e como


iria me sentir se ele estivesse em cima de mim, penetrando
profundamente entre as minhas pernas enquanto chupava
meus mamilos. Deus...

Estremeço, notando que ele faz o mesmo.

— Sinto muito, é que... amo as mulheres. — Murmura,


antes de olhar para longe, como se de repente estivesse
desconfortável.

O que me faz pensar no cheiro do perfume quando


entrou no quarto há apenas meia hora. A luxúria diminui e
em seguida morre por completo.

— Sim, posso afirmar isso. — Digo, enquanto ele me dá


um olhar confuso. — Você estava cheirando como uma dúzia
de putas quando entrou. Eu também teria pulado no
chuveiro se fosse você.
Asher ri, nem um pouco ofendido, apenas limita-se a
sacudir a cabeça.

— O perfume era só de uma mulher. A loira. Monique.

Eu suspiro, desejando a Monique uma morte prematura


horrível.

— Bem, Monique tem o bom hábito de impregnar com


seu perfume as outras pessoas.

— Se você está dizendo... — Murmura Asher, sem


demonstrar nada.

Fico de boca aberta enquanto o olho fixamente.

— Oh, desculpe cara, mas não foi isso o que Monique fez
quando vocês transaram?

A boceta daquela gambá provavelmente era tão usada


que não conseguiu ser apertada o suficiente para ele.

— Huh? — Asher me olha como se eu estivesse louca e


depois balança a cabeça. — Não. Nós não tivemos relações
sexuais.

— Hum. — Murmuro, sem comprar esta história.

— Estou falando sério.

Eu reviro os olhos.

— O que, então? Cheirava como ela porquê...

— Porque ela não parava de esfregar-se em mim como


uma gata no cio. — Completa, carrancudo.
— Certo. Então você está dizendo que ama tudo nas
mulheres, mas quando uma se esfrega em você como uma
gata no cio não aceita sua oferta? Gally sem dúvida aceitaria.

— Caralho! Por acaso me pareço com o Gally?

Quando percebo o quanto ele está incomodado e irritado


com este tipo de perguntas, recuo, surpresa.

— É realmente sério, não é? Você não transou com ela.

— Não, não transei.

Fico sem ar, a esperança brotando no meu peito.

— Por que não?

— Porque...

Ele parece atordoado demais para continuar, mas


insisto, porque estou morrendo de curiosidade.

— Porque...?

— Certamente eu estava tentado. — Diz ele, encolhendo


os ombros. — Parece que faz uma eternidade desde a última
vez que estive com uma mulher e estou querendo fazer sexo
ultimamente como... você não tem ideia, mas...

De maneira nenhuma vou deixar este assunto morrer.

— Mas o quê? — Então me dou conta. Oh, Deus! —


Você tem alguma DST?

— Caralho, não! — Ele me lança um olhar sombrio e


aponta ameaçadoramente. — Bom, está bem, vou falar, mas
se você repetir algo do que vou dizer a Gally ou Holden, vou
chutar seu traseiro de volta a Ellamore. Entendeu?
Solto uma gargalhada.

— O que pareço? Algum tipo de menina fofoqueira


desesperada para contar aos outros seus assuntos pessoais?
Por favor.

Asher relaxa os ombros e olha para o teto.

— É só que... não sou muito fã de encontros de uma


noite. — Admite a contragosto.

— Diga de novo? — Peço colocando a mão em volta da


orelha.

— Cale-se, filho da puta. Simplesmente não é algo que


eu curta. Entendeu? — Pergunta, estreitando os olhos.

Levanto as mãos.

— Acredite, não estou tirando sarro. Estou surpreso,


isso é tudo.

E de verdade, estou impressionada.

Asher olha para o teto, sentindo-se humilhado.

— Patético, não é?

— Eu não diria isso. É só... incomum para um homem


na sua posição. — Um ótimo e incrível incomum. — O que me
deixa curioso quanto ao... por quê?

— Sabia que essa seria sua próxima pergunta. —


Suspira, ainda olhando para o teto.

— E então? — Levanto as sobrancelhas, dando a


entender que ainda queria a resposta, independente de
qualquer coisa. — Para alguém que ama tanto as mulheres e
está ansioso para fazer sexo...

— Amo as mulheres, mas quero alguém que me queira e


não. — Revira os olhos — Asher Hart.

Abro a boca para responder, mas não sai nada.

— Mas você não é Asher Hart? — Pergunto, depois de


um segundo.

Ele grunhe e franze o testa.

— Sim, mas... Cristo, nem sei como explicar isso.

Quando ele puxa o cabelo, frustrado, decido ter pena e


paro de me fazer de tola.

— Quer alguém que aprecie o homem que você é, não


uma groupie que queira marcar um ponto com o cantor da
banda.

Afastando as mãos do cabelo, ele me olha como se


acabasse de descobrir sua alma gêmea.

— Sim. — Murmura. — Exatamente.

Balanço a cabeça, para mostrar que o entendia.

— Então não quer só a conexão física. Quer algo mais


profundo...

— Oh, confie em mim, eu adoro a conexão física. — Diz


ele, olhando para as mãos. — E tenho feito essa história de
uma noite porque parece ser a única coisa que as mulheres
querem de mim. É só que... não sei. Todos os meus amigos
no Forbidden têm estas mulheres incríveis e eles são
completamente loucos por elas. Quando os vejo juntos,
simplesmente parece tão...

— Grande?

Ele deixa escapar um suspiro e me olha.

— Pergunto-me como seria uma relação real.

Essa confissão me surpreende.

— O quê? Nunca esteve em uma?

— Não. Você?

— Com uma mulher? — Pergunto, sorrindo. — Não.

— Com um cara, então? — Murmura ele, deixando


escapar um som divertido.

— Bem... sim. Algumas vezes. Quero dizer, não


toneladas, mas... Três ou quatro foram suficientemente
significativas.

Asher concentra-se em mim como se acabasse de


descobrir que eu sabia o significado secreto da vida.

— Como são?

— As relações? — Pergunto, franzindo o cenho.

— Sim.

Deixo escapar um suspiro e passo as mãos pelo cabelo,


surpresa quando encontro os fios curtos da peruca. Por um
momento, havia esquecido que sou Sticks, o cara da bateria.
Simplesmente fora Remy... Falando com Asher.

— É... — Mentalmente lembro a mim mesma que sou


um cara, e tento pensar em uma forma masculina para
descrever uma relação, mas não consigo. — Em primeiro
lugar, é estressante como o inferno. Você sempre tem medo
de mostrar seu verdadeiro eu. Só quer mostrar o que acha
que a outra pessoa gostaria de ver, por isso está sempre no
limite, na esperança de impressionar e tentando descobrir se
o outro quer uma mudança. Embora seja algo excitante e
emocionante também. Mas então... então finalmente dá um
clique e você percebe que tem esta... coisa... esta coisa
incrível em comum que realmente não tem com mais
ninguém. Você se abre mais e descobre outros cliques e antes
que perceba a vida é incrível e está pensando na pessoa dia e
noite, mal pode esperar para voltar a vê-la e ama tudo a
respeito dela.

Asher esboça um sorriso, como se estivesse imaginando


o que eu acabara de descrever e gostasse da visão.

— De verdade?

Assinto.

— E então ele se torna um idiota mentiroso, que quebra


seu coração e sua confiança e deixa uma cadela endurecida
no que antes foi um ser humano.

Ele pisca, inclinando-se para trás.

— Uau... uh, não esperava que você terminasse assim.

— Bom... — Digo, dando de ombros. — Não há felizes


para sempre para todo mundo.

— O que fez de você essa pessoa cínica? — Pergunta ele,


depois de me observar por um momento.
Dou de ombros e começo a brincar com o caderno no
meu colo.

— Ele só... quer dizer, além de me fazer sentir como se


estivesse me fazendo um grande favor em estar comigo, traiu-
me com cada mulher que podia e....

Asher inclina a cabeça para o lado, confuso.

— Ele dormia com outras mulheres?

Merda, esqueci do gay de novo. Argh. Limpo a garganta.

— Sim, é que, uh, ele é bi.

E curiosamente, adorei falar essa mentira. Fisher


odiaria ser chamado de bissexual. Rá!

Ele balança a cabeça como se compreendesse e faz uma


careta de simpatia.

— Bem, isso é uma merda. Que outras coisas ele fez?

— Oh. Ele, hu... escrevi algumas canções que... ele


roubou, tocou-as com a sua banda e disse que eram dele.

— Merda. — Murmura ele, com compaixão. — Não é de


admirar que não queira que eu veja seu caderno.

Dou de ombros e abro as páginas do caderno.

— Sinto muito, não estou acusando você de plagiador. É


que... sabe o quê? Sei que não é como ele. Aqui. — Digo,
jogando o caderno no colo dele.

Asher pega-o, a hesitação brilhando nos olhos verdes.

— Tem certeza? Respeito totalmente sua privacidade,


cara. E entendo por que é....
— Leia. — Murmuro. — Se você sequer pensar em
roubar qualquer uma das minhas letras vou cortar esse seu
pau enorme e dar para o Gally comer a força.

Ele ri.

— Tudo bem.

Entretanto, antes de abri-lo, joga-me seu caderno.

Um nó se forma na minha garganta quando percebo que


ele está confiando em mim também. Quando Asher abre meu
caderno, eu faço o mesmo com o seu.

Um segundo mais tarde, dou um assobio.

— Merda, são incríveis.

— Aqui também. — Murmura distraído, muito


concentrado no meu trabalho para falar.

Conforme passo pelas páginas, meu espanto vai


crescendo cada vez mais, surpreso que ele não tivesse
algumas, bom a maioria, convertidas em canções.

— Sério, Asher, você tem um talento incrível.

— Hmm? — Resmunga, olhando para cima e mordendo


o lápis, algo que eu sempre faço quando estou presa em uma
letra. — Obrigado, mas não estou escrevendo uma merda
estes últimos dias. Continuo preso nessa letra.

Asher olha para o caderno novamente.

— Ah é? — Vou para última página. — Vamos ver o que


você tem aqui.
— Espere! — Grita, pulando da cama para pegar seu
caderno...

Pisco surpresa e então sorrio.

— Oh, vamos. Não se esconda agora, cante o que já


compôs.

Ele balança a cabeça.

— Eu nunca... normalmente não consigo cantar em voz


alta até que a letra esteja pronta. Parece... estranho.

— Então leia porque, sério, como diabos posso ajudá-lo


se não souber onde diabos ficou preso?

— Você não tem que... — Asher deve ter visto algo na


minha expressão porque dá um longo suspiro, antes de
folhear as páginas e ler em silêncio. — Bem, acho que não dá
só para ler, também. Teria que cantar.

Levanto as sobrancelhas.

— Então, cante.

Eu sei que ele não tem medo de cantar em frente ao


público, mas de repente parece inseguro e me olha de um
jeito estranho.

— Não vá ficar rindo se eu cantar como um merda, ok?

Reviro os olhos.

— Será que você pode confiar um pouco mais em mim?


Sei que nada sai perfeito da primeira vez.

— Certo. — Diz ele, começando a cantar.


A capela, a voz dele é linda. Queria sentar no seu colo
na cama e deixá-lo cantar o resto da noite... ou da minha
vida. Mas como uma boa garota fico simplesmente
balançando a cabeça antes de estender a mão e marcar o
ritmo na mesa de cabeceira. Ele sorri, obviamente ficando
mais confiante e começa a mexer o corpo. Até que para de
repente.

— E isso é tudo o que eu tenho, não consegui escrever


mais nada.

Suas palavras ainda fluíam, a melodia prendendo fogo


em meu sangue.

Continuo marcando o ritmo.

— Até que as estrelas se desvaneçam e o dia trague a


escuridão. — Canto.

Asher me olha, piscando e dá um passo para trás.

— Merda. — Se não tivesse visto a surpresa tão


claramente no seu rosto, definitivamente a teria ouvido na
voz. — Isso... isso é perfeito. Como...?

Dou de ombros e fico feliz que ele não possa ver o rubor
por baixo da máscara.

— Estou só terminando o que você começou.

— Bom, traga seu traseiro aqui, vamos terminar esta


música. Agora.
ASHER
Estou acabando de salvar meu trabalho no laptop
quando Sticks murmura algo no sonho. Por volta das quatro
da manhã ele foi para sua cama, pegou um travesseiro e se
enroscou, fechando os olhos enquanto me ajudava com a
última frase da letra. Adormeceu em poucos minutos, mas eu
não conseguia dormir porque estava muito animado, afinal,
tínhamos terminado algo que há semanas estava
trabalhando.

Então, peguei o laptop da mochila e abri o programa de


música, esperando criar a melodia perfeita para as palavras.
Sticks havia dormido pacificamente durante as últimas três
ou quatro horas, mas quando bateu a mão na cabeceira,
começou a acordar.

— O que...? — Grita, de repente levantando a cabeça


para me olhar, os olhos avermelhados e boquiaberto.

Seu cabelo está espalhado pelo travesseiro, e quando


vejo que é uma peruca presa a uma máscara não posso
deixar de me perguntar se era por isso que havia trazido
tantos produtos de beleza.

Droga, eu não sei nada a respeito de perucas. Talvez, ele


a lavasse e colocasse gel como se fosse cabelo natural.
Gostaria de saber que diabos aconteceu para deixá-lo
tão fodido, fazendo-o achar que precisa usar tudo isso.
Coitado desse cara...

— Merda, sinto muito. — Murmura, passando a mão


pelo rosto enquanto senta na cama. — Não posso acreditar
que adormeci.

— Não tem problema. — Abro o arquivo em que estive


trabalhando e coloco o cursor na opção reproduzir. — Quer
ouvir o que fiz até agora?

— Huh? — Sticks me olha piscando, claramente meio


adormecido. — Quanto tempo estive desligado, que horas são
e como diabos pode ainda estar acordado?

— São oito mais ou menos e você dormiu um pouco


depois das quatro. E sofro de insônia, então... não estou
acostumado a ter mais do que umas poucas horas de sono...
ou simplesmente não dormir.

Ele balança a cabeça completamente desorientado. Não


posso conter um sorriso.

— Ouça nossa canção.

Pressiono reproduzir e enquanto a melodia começa,


Sticks estreita os olhos e inclina a cabeça para o lado ao
mesmo tempo que estuda as ondas que aparecem na tela.

Quando começo a cantar a letra que criamos juntos, seu


olhar encontra o meu e ele fica de boca aberta até a última
nota.

— O quê? ... como? ... porra, isso é totalmente incrível.


Dou de ombros, mas o elogio faz meu peito apertar de
orgulho.

— Não, de verdade. — Continua ele. — Como diabos foi


capaz de fazer toda a melodia em apenas algumas horas?

— Não foi muito complicado, além disso ainda não está


pronta, tenho que acrescentar outros instrumentos. Mas é
um começo.

— É um começo brilhante. Você é um fodido gênio. Um


gênio da música.

A admiração dele me faz sentir estranho, então fecho o


laptop e me espreguiço.

— Na verdade, estou morrendo de fome. Quer ir ao


Denny no outro lado da rua e encher a cara de panquecas?

— Merda, não. Vou voltar a dormir. — Sticks abraça o


travesseiro ao deitar e puxa os lençóis até o queixo. — Duvido
que Gally ou Holden estejam prontos antes do meio-dia, por
isso não me acorde até lá.

— Uh... temos que sair antes das onze.

— Então dez e meia. — Murmura. — Com certeza, adoro


a música. Acho que vai ser nosso próximo sucesso.

Sorrio e balanço a cabeça, enquanto a respiração pesada


de Sticks enche o quarto. Eu gosto deste cara. É estranho,
mas divertidíssimo e foi muito legal escrever com ele ontem à
noite. Nunca tinha tentado fazer isso antes com ninguém. Ele
não teve medo de discordar, mas ao contrário de Gally, não
ficou mal-humorado ou foi grosseiro e muito menos
pressionou para fazer do seu jeito. Quando eu tive outra
ideia, escutou minha opinião e a levou em conta.

NonCastrato ganhou muito desde que ele ingressou na


nossa banda.

Então, assobiando baixinho a melodia da nova canção,


visto-me, pego o meu cartão e fecho as persianas para que a
luz não incomode meu colega de banda. Depois de apagar o
abajur que ficou ligado à noite toda, saio à procura de
comida.

Assim que cruzo a rua e entro no restaurante lembro


que deixei a carteira no hotel. Suspiro e passo as mãos pelo
rosto, chegando à conclusão que eu deveria ter tirado uma
soneca para recarregar o cérebro.

Grito para a garçonete que vou voltar logo e saio para o


ar fresco da manhã, sentindo-me realmente acordado
somente quando estou atravessando a rua de volta. No hotel,
pego o cartão do bolso e entro no quarto, notando que a luz
continua apagada como eu deixei. Então, eu olho para a
porta do banheiro e percebo através da fresta que o interior
está iluminado e há sons de água do chuveiro e alguém
cantando... “e um abraço forte, um abraço forte”. Uma voz
claramente feminina está dando uma serenata no banheiro.
Fico imóvel, franzindo o cenho com força, enquanto a letra da
canção de Doris Day “A Bushel and a Peck” continua.

A princípio acho que entrei no quarto errado e recuo,


com vergonha de ser apanhado no quarto de outra pessoa,
mas então me dou conta que entrei com o meu cartão.
Acendo a luz e vejo meu laptop e os cobertores de Remy
bagunçados na cama vazia, além disso a mala dele e minha
mochila estão no chão. É o quarto certo.

Mas, quem diabos está no chuveiro? Pelo som eu diria


que Sticks conseguiu uma mulher..., mas ele não gosta de
mulheres.

Aproximo-me e empurro suavemente porta. O vapor sai,


nublando um pouco a minha visão, mas eu posso ouvir a voz
da mulher mais forte. “Faz meu coração parar”, continua ela
com uma voz bastante decente.

Levanto as sobrancelhas, intrigado.

— Remy? — Digo, sem ter ideia do porquê, uma vez que


sei que ele não está lá.

— Que...? — Grita ela.

Confuso com tudo isso abro a cortina do chuveiro.

A mulher nua e molhada grita de novo, colocando


imediatamente o braço sobre os seios e a mão entre as pernas
para cobrir-se.

— Merda! — Murmuro, suspirando.

Ficamos olhando um para o outro boquiabertos, a água


fazendo o cabelo da menina cair sobre o rosto.

Racionalmente, sei que devo virar de costas, mas, por


alguma razão, eu tinha perdido a capacidade de pensar
racionalmente.

— Quem é você? — Pergunto.


Ela afasta o cabelo do rosto para poder me ver,
provavelmente esquecendo que precisava cobrir-se. Meu
olhar cai para aqueles seios lindos e vejo a garota ficar sem
fôlego, baixando imediatamente o braço... um segundo
depois, pega a cortina do box e envolve o corpo, escondendo
todas as melhores partes.

— Não falo inglês. — Ofega, com uma voz quente e


sensual e que deixa meus hormônios enfurecidos.

Ah, merda. Balanço a cabeça, completamente


estupefato.

— Não sabe inglês?

— Não. Não falo inglês.

— Merda.

Passo a mão sobre o rosto, agradecido por não estar


babando ou qualquer coisa assim porque, porra, tem uma
garota muito sexy falando em espanhol no meu chuveiro.
Bem, não sei nada de espanhol.

— Droga, onde está Remy quando você precisa dele? —


Digo, olhando para trás.

— Remy? — Repete a garota, virando-se um pouco e


balbuciando algo em espanhol enquanto mexe as mãos sem
parar.

Pisco, sem entender absolutamente nada, mas ela disse


o nome de Remy.

— Conhece o Remy? — Pergunto, lentamente.


Ela assente, com os olhos iluminando-se pelo
reconhecimento.

— Sim. Remy — E murmura outra coisa em espanhol.

Estou certo de que falou a palavra amigo, então levanto


o dedo.

— Amigo. — Repeti. Sim, uma palavra que eu entendia.


— Amigo. Certo. Ele... deixou você entrar para tomar... um
banho... você, sozinha?

Aperto os olhos, porque isso não parece plausível.

— Deus. — Geme ela, levando a cortina do chuveiro


mais para perto dos seios. Então morde o lábio e fez um gesto
com a mão livre para que eu saia, balbuciando algo em
espanhol que não tenho a menor ideia do que significa.

Mas o gesto e o desespero no rosto fazem sua súplica


suficientemente óbvia.

— Merda, desculpe. — De repente me dou conta do


quanto estou surpreso e levantando as mãos retrocedo até
bater na porta entreaberta. Não consigo afastar os olhos, a
garota é simplesmente... impressionante. — Vou deixar você
terminar e juro, olhar para outro lado... logo. Assim que o
sangue deixar meu pau e retornar à cabeça, para que eu
possa pensar racionalmente de novo, porque... Droga.

Porra, acabo de falar isso em voz alta, certo? Graças a


Deus ela não sabe inglês, embora tenha ficado ruborizada
como se soubesse. Mas então a garota fica irritada e me
bombardeia com mais espanhol, desta vez definitivamente me
repreendendo por ser um cara esquisito e ainda estar
olhando-a.

Deixo escapar um suspiro nervoso e retorno tropeçando


para o quarto, fechando a porta do banheiro para que ela
tenha privacidade.

Mas Jesus, isso foi... na verdade, não estou muito certo


do quê, mas definitivamente foi intenso. Será que devo ficar
chateado ou indignado por uma desconhecida se sentir tão à
vontade no meu quarto? Bem, quando lembro da sua
magnífica nudez não consigo invocar nenhuma dessas
emoções.

Ando pelo quarto passando as mãos no cabelo,


perguntando-me que diabos está acontecendo. Onde está
Remy e por que deixou que uma garota sexy entrasse no
nosso quarto para tomar banho... sozinha?

Finalmente me dou conta de que posso perguntar, então


tiro o telefone do bolso e digito o número. Do outro lado do
quarto, The Bangles começa a cantar "Walk Like na
Egyptian", que deve ser o ringtone do Sticks, porque quando
procuro de onde vem o som vejo o celular na mesa de
cabeceira. Puta que pariu. Ele não levou o telefone... onde
quer que tenha ido. Onde ele foi? Quando ouço o chuveiro
sendo desligado, viro-me naquela direção. Então percebo que
provavelmente ainda continuo sendo esquisito. Melhor sentar
na minha cama para esperar.
Na verdade, não tive que esperar absolutamente nada, a
porta do banheiro abriu e dois grandes olhos castanhos
apareceram. Levanto a mão para cumprimentá-la.

— Olá de novo.

— Merda. — Murmura ela, franzindo o cenho. Então


parece respirar profundamente antes de abrir a porta por
completo.

A garota havia envolvido o corpo com uma toalha que


mal cobria a parte superior de suas coxas úmidas, mostrando
as belas pernas musculosas e bronzeadas. Ela caminha na
ponta dos pés descalços para a cama e pega as roupas que
estão ali.

— Obrigado. — Diz, enquanto faz um gesto para suas


costas, acho que agradecendo por ter usado meu chuveiro.
Então mexe a mão e acrescenta: — Adeus.

O quê? De maneira nenhuma. Levanto-me da cama tão


rápido que ela estremece e para, olhando-me com receio.

— Você não precisa ir. — Digo, apontando para a roupa


que ela segurava. — Pode colocar sua roupa primeiro. Está
tudo bem.

Ela balança a cabeça e aponta para a porta, falando um


monte de merdas que não entendo. Quando começa a fugir
paro na sua frente e coloco a mão na porta, deixando-a
imóvel e assombrada.
Sei que estou assustando-a muito e gosto disso.
Definitivamente, ela tinha me assustado quando a vi no
chuveiro.

— Sou Asher. — Apresento-me, apoiado ligeiramente na


porta e bloqueando sua saída.

A garota respira fundo, olha para o chão por um


momento e depois levanta a cabeça me olhando de frente,
sem medo, enquanto faz um gesto para a porta.

— Por favor. — Murmura, pedindo que a deixe sair.

Só sorrio e nego com a cabeça.

— Acho que não, linda. É a sua vez. Qual o seu nome?


Nombre? Qual o seu nome?

Seus olhos se abrem mais e ela balança a cabeça


firmemente.

— Não. — Sussurra.

Aproximo-me mais, meu sorriso se tornando maior.

— Não o quê? Não é seu nome, ou não, não pode me


dizer seu nome?

— Não. — Repete, respirando mais rápido conforme me


aproximo.

Definitivamente não parece mais estar com medo. Seus


olhos brilham calorosos, ela sequer se afasta. Eu me
pergunto se ela vai me beijar pela forma extasiada com que
está me olhando. Quero que me beije.
A luxúria me queima, fazendo minha pele arder e o meu
pau ficar duro.

Sem deixar de sorrir aproximo-me mais, parando só


quando estou a um simples centímetro de pressionar minha
boca na dela.

— Sim. — Argumento em voz baixa, brincando.

Ela estremece e pisca rapidamente, mas balança a


cabeça negando-se a ceder.

— Não. — Insiste, em um sussurro rouco. — Por favor.

A decepção toma conta de mim, mas não esperava que


ela fizesse diferente.

— Bem, quem quer que seja, foi muito legal te conhecer.


— Murmuro, abrindo a porta e dando um passo para trás. —
Espero encontrar você de novo, nua no meu chuveiro.
Preferivelmente logo.

— Gra... — Seus olhos se abrem surpresos e ela


balbucia alguns sons desconexos e ofegantes. — Adeus.

Quando a porta é fechada e eu me encontro sozinho no


quarto, passo a mão pelo cabelo e me viro, tentando entender
o que acabou de acontecer.

Quero correr atrás dela, mas que diabos vou fazer se


conseguir alcançá-la? A menina se nega a dizer seu nome e
certamente não vamos conseguir manter uma conversa de
verdade, então não vou descobrir como ela entrou no quarto
ou por que estava ali. E jogar a garota por cima do meu
ombro e levá-la para minha cama para foder até deixá-la sem
sentido, provavelmente é uma má ideia.

Talvez, se tivesse esquecido alguma coisa eu teria uma


razão para localizá-la e.... o quê? Ficar na sua presença por
mais alguns segundos? Embora seja uma ideia muito idiota é
a única que tenho, então corro até o banheiro rezando para
encontrar suas calcinhas ou qualquer outra coisa.

Mas não encontro nada. O pequeno banheiro ainda está


nublado e uma ocasional gota de água escorre do chuveiro,
lembrando-me de que recentemente ela esteve nua aqui
dentro. O cheiro é do sabonete de Remy, mas isso não
importa.

Uma visão da garota nua enche minha cabeça e antes


que eu perceba estou tirando a roupa e entrando no box.
Fantasio que ainda está aqui, molhada e linda. Enquanto ligo
a água ao máximo, na minha mente estou imobilizando-a na
parede.

Pego meu pau me perguntando como seria empurrar


dentro dela, sentir a maciez da pele, chupar os seios e
balançar os quadris repetidamente entre suas coxas abertas.

— Deus.

Acelero o ritmo, o orgasmo corre através das minhas


costas até chegar entre as pernas, pressionando o escroto e
saindo disparado pelo meu pau. Baixo a cabeça e apoio a
mão livre na parede, acariciando-me até terminar por
completo.
À medida que o alívio começa a me satisfazer, vem o
desgosto. É tão patético me masturbar sozinho no chuveiro
depois de ver uma garota bonita.

Preciso fazer sexo com urgência ou provavelmente vou


me masturbar até ficar cego. Nunca deveria ter recusado
Monique. Que diabos estou esperando afinal? E daí se a
mulher não era minha alma gêmea? Alguns minutos íntimos
com uma completa estranha tem que ser melhor que nada,
porque neste momento, não tenho nada.
REMY
Oh, merda, oh merda, oh mierda. Não posso acreditar
que fui tão burra e me deixei apanhar no chuveiro. Quando
Asher saiu para comer percebi que era a última oportunidade
de tomar um banho antes de ir embora, então, mesmo
exausta, pulei da cama e tentei ser rápida. Mas, porra, ele me
pegou em flagrante.

Tive a presença de espírito de usar minha voz de


“señorita sensual”. Jodi estaria orgulhosa. Eu, pelo contrário,
estou horrorizada. Mas Asher não descobriu a verdade e
quando me perguntou quem eu era, o espanhol simplesmente
saiu, e foi bom, porque ele não conseguiu me entender.

Odeio mentir e tenho certeza de que algum dia vou ser


descoberta, mas não queria que fosse naquele momento, nua
sob o chuveiro, com ele olhando como se me achasse
atraente.

Asher realmente me achou atraente. Isso foi... incrível.


Ele paquerou comigo. Porra, paquerou... comigo! Nunca o vi
tão atrevido ou sedutor com uma mulher antes. Jamais. Mas
então... já confessou que não gosta de ser a caça e eu sem
dúvida fui difícil o suficiente para atrair o predador. Não
intencionalmente, porque naquele momento só queria fugir,
embora vê-lo caçar fosse erótico demais.
Nervosa, com medo e usando somente uma toalha em
volta do corpo, seguro a máscara e as roupas junto ao peito
enquanto corro pelos corredores do hotel até encontrar um
banheiro. Ao entrar solto tudo no chão. Foi bom estar nua
quando ele entrou, isto o distraiu o suficiente para que não
percebesse a máscara na penteadeira do banheiro.

Amaldiçoando-me pela estupidez de ter deixado a porta


entreaberta, tiro a toalha e procuro na pilha de roupas uma
calcinha. Odeio tomar banho de porta fechada, fica tão
esfumaçado e quieto, então...

— Burra, burra, burra — Murmuro, vestindo o peito de


espuma e o resto da roupa.

Meu cabelo está molhado e não tenho nada para penteá-


lo, então seco com a toalha o melhor possível, passo os dedos
para desembaraçá-lo um pouco e faço um coque para poder
colocar a máscara.

Observo-me no espelho para avaliar os problemas


técnicos, mas a única coisa fora do lugar é a orelha esquerda.
Deixo escapar um suspiro e me viro para sair do banheiro.

Neste momento percebo que estou descalça. Não posso


voltar para o quarto descalça porque Asher vai querer saber
onde estão meus sapatos e me bombardear com perguntas.
Preciso inventar algumas respostas, com urgência.

Enquanto corro pelo hotel procurando algo para calçar,


tento pensar em uma história plausível. Mas, na verdade...
por que Sticks permitiria que uma garota entrasse no quarto
e a deixaria sozinha tomando banho? Bom, talvez ele achasse
que ela precisava de um pouco de privacidade. Mas Asher vai
querer saber quem é ela. Vou dizer o quê? Que uma garota
qualquer simplesmente bateu na porta e pediu para usar o
banheiro?

Não, ele não vai acreditar nessa história. Se a deixei


sozinha no quarto, então teria que conhecê-la e se a conhecia
teria que pensar em um nome e possivelmente uma história
de vida, se ele ficasse muito curioso.

Já menti o suficiente com toda essa coisa de “ser um


cara”, não quero mentir mais do que o necessário.

Decido fingir que não sei de nada. Sim, isso soa bem.

Depois de milagrosamente encontrar um par de sapatos


estragado do Chicago Bears na tampa de um dos contêineres
de lixo lá fora, volto ao hotel, prendendo a respiração quando
entro no nosso quarto.

Asher levanta-se imediatamente. Mal abri a porta e ele


já está falando na minha cara.

— Onde diabos você estava?

Cambaleio um passo para trás, um pouco preocupada


com a ira em seus olhos.

— Eu... estava procurando você. Pensei que ia tomar o


café da manhã no Denny e como não consegui voltar a dormir
fui lá, mas você não estava.

— Porque esqueci a carteira no quarto e voltei para


pegá-la. Quem era a garota?
Juro, eu mereço um Oscar pela forma que franzi as
sobrancelhas, surpresa.

— Que garota?

— A... A... — Balbucia ele por um segundo, assinalando


freneticamente o banheiro. — A garota no chuveiro! —
Finalmente consegue dizer.

Olho para a porta aberta do banheiro e de novo para ele,


de boca aberta.

— Há uma garota no chuveiro? — Pergunto, como se ele


estivesse delirando.

— Sim! — Asher move uma mão para mim. — Bem, não


agora. Mas estava ali quando entrei.

— Não pode ser. — Digo, a incredulidade aparecendo na


minha voz. Vou até o banheiro e olho o box ainda molhado. —
Quem era? Como entrou aqui?

— Isso é o que estou tentando perguntar a você! Ela


disse que te conhecia.

— É?

Coço a cabeça, mostrando-me ainda mais confuso.


Pobre Asher, está realmente desconcertado com tudo isto.

— Bom... Caramba — Murmura ele, passando as mãos


pelo cabelo. — Acho que sim. Ela só falava espanhol.

Levanto as sobrancelhas ofendido.

— Oh, então pessoas hispânicas devem se conhecer?


— Não... não é desse jeito. — Ele deixa escapar um
suspiro antes de explicar-se. — Eu disse o seu nome e o rosto
dela se iluminou, como se o conhecesse. Depois falou... algo
que tinha a palavra amigo. Tem que ser uma das suas
amigas.

Merda, Asher parece muito preocupado. Fico com


vontade de contar tudo, mas o modo como ele vai reagir me
assusta.

— Bem... — Franzo o cenho, odiando cada segundo


desta trama. — Como ela era?

— Magnífica. — Diz imediatamente, fazendo meu ritmo


cardíaco aumentar. — Cabelo preto, comprido e reto, com
algumas mechas roxas. Olhos da mesma cor que os seus,
mas maiores. Cílios grossos, escuros, que pareciam não
terminar nunca. Rosto em forma de coração, traços perfeitos.
Seios e pernas magníficos, e.... — Respira fundo. — Um corpo
para foder. Não vou mentir, ela era linda.

Fico vermelha e querendo agradecer. Merda, quero


mesmo é empurrá-lo na cama para que ele pudesse apreciar
tudo de perto e pessoalmente.

— Esquisito. — Murmuro.

Ele assente.

— Então, realmente não tem idéia de quem era, ou como


entrou aqui?
— Não. Lamento. Você... acha que devemos comunicar
ao hotel? É um pouco estranho que alguém possa entrar no
quarto dessa maneira.

— Não acho necessário. Só tomou um banho, e não


acredito que roubou nada, exceto uma toalha... quero dizer,
meu laptop continua ali.

— Huh. Ainda assim é.... estranho.

— Sim. — Concorda, em um tom igualmente perplexo.

A culpa que sinto por mentir aumenta E não consigo


mais continuar olhando-o, então vou para o meu lado do
quarto.

— De todo jeito vou revisar minhas coisas para ver se


está tudo aqui.

Voltamos no começo da noite para Ellamore. Asher, é


obvio, contou a Heath e Gally sobre a garota do chuveiro.

— Você fodeu com ela? — Perguntou Gally.

Asher se negou a responder e só revirou os olhos.


Também não falou sobre o quanto a achou bonita.

Pareceu-me adorável o jeito como ele escondeu o que


pensava da garota do chuveiro, para protegê-la de um
pervertido como Gally.
O dia seguinte, segunda-feira, não tínhamos ensaio, o
que era bom porque eu precisava trabalhar na hora do
almoço.

Mas não consegui tirar Asher da cabeça.

A história com seu pai, a música que (possivelmente)


compôs para mim, como foi divertido escrever aquela letra
com ele, toda a culpa que carrego por continuar mentindo.

Eu precisava vê-lo.

Já terminei de organizar a caixa do NonCastrato. Pensei


em levá-la quando fosse ensaiar no dia seguinte, mas não
podia esperar tanto tempo. Então, depois de sair do trabalho
e tomar um banho, enviei uma mensagem perguntando se ele
ia estar no Forbidden.

Meia hora mais tarde estou no clube vestido como


Sticks. O lugar parece meio morto... bem, não está cheio
como sempre e como algumas mesas estão livres posso
caminhar diretamente para o bar sem ter que pedir licença a
ninguém.

É legal. Quase pacífico. Estou tentada a sentar em um


banquinho, pedir uma cerveja e suspirar de alegria. Toda
essa atmosfera me dá vontade de ver reprises de Cheers34.
Observo o ambiente procurando Asher, mas não o encontro.
Seu colega de trabalho que sabe que eu sou mulher é o único
trabalhando. Merda. Como é o nome dele? Asher disse um
número. Oito? Nove?

34
Sitcom americana. Cheers era o nome de um bar em Boston, onde um grupo de pessoas
conhecidas vinham para sentar, beber, contar fatos malucos, reclamar e contar piadas.
Dez. É isso. Ten.

Receosa, coloco a caixa sobre o balcão e olho séria para


ele.

— Preciso entregar algo para Hart. Ele está aqui?

O cara para de secar o copo que pegou na pia e olha


para mim.

— Você sabe que não precisa falar como menino comigo,


não é? Sei que você é uma garota, lembra?

Droga, nem percebi que estava falando como um


menino. Isto é ruim. Parece que virou um hábito, assim que
coloco a máscara começo agir como um garoto. E se eu
perdesse totalmente minha feminilidade?

Bem, não preciso pensar nisso agora...

— Asher disse que trabalha esta noite e que eu poderia


deixar isto para ele.

— Ah é? — Ten deixa a taça seca de lado e inclina-se,


apoiando os braços no balcão para olhar dentro da caixa. —
O que é? Brinquedinhos sexuais?

— Quisera eu.

Afasto a caixa para impedi-lo de ver as pastas e arquivos


que eu tinha organizado.

Ele endireita-se e dá de ombros, perplexo.

— Hey, não importa. Minha coleção com Caroline já está


completa, então tudo bem. Estou pensando em Hart. Esse
menino espera muito.
Franzo o cenho, confusa.

— Muito para quê?

Ten pisca como se não pudesse acreditar que eu não


tenho nem ideia do que ele está falando.

— Sexo. — Acrescenta e posso ouvir um “dã” silencioso.

Oh, irmão, eu deveria saber.

— Sério. — Continua. — Não acredito que seja saudável


para um homem estar todo esse tempo sem sexo.

— Espera, ele conta suas... façanhas?

Eu não quero ouvir a resposta. É decepcionante saber


que Asher é esse tipo de cara, que conta tudo para se
vangloriar. Estava começando a pensar que ele era bom.
Aliás... mais que bom.

Ten levanta as sobrancelhas.

— Façanhas? Sim, aí está. Agora você parece uma


garota de novo.

Reviro os olhos e dou as costas para ele começando a


andar, decidida a procurar Asher eu mesma. Mas Ten fala
novamente atrás de mim.

— É obvio que ele não conta essa merda.

Não deveria parar, mas paro. E quando viro novamente


Ten me dá um sorriso arrogante, sabendo que estou mais
interessada do que deveria.

— Só sei que quando faz sexo Hart definitivamente


demonstra.
— Demonstra como?

Deus, por que estou perguntando? Não quero saber...


bem, claro que quero.

Ten ri.

— Por que você não vai descobrir? Ele está sozinho no


depósito fazendo o inventário de uma carga que acaba de
chegar.

— Você é um idiota. — Bufo, saindo para encontrar o


depósito.

— Cuidado, Sticks. Você está parecendo uma garota


agora.

Sabendo que não vou ganhar contra esse cara, finjo que
não ouvi e vou procurar o depósito.

— No final do corredor, a última porta à esquerda. —


Grita Ten.

Sigo a indicação dele e chego a uma porta quebrada.


Permaneço imóvel depois de abri-la, ouvindo Asher cantar a
plenos pulmões a versão de Hozier para “Take me to Church”.

Realmente ele tem a voz mais incrível e gosta de canções


que desafiem suas cordas vocais.

Asher ama cantar. E, Deus, eu adoro ouvi-lo. Apoio a


caixa no quadril, o ombro na parede e desfruto do espetáculo.
Ele esvaziou uma caixa de garrafas de Bourbon e está
terminando de colocá-las na prateleira quando chega ao
“Amém” na música. Então faz uma pausa e inclina a cabeça
para trás, realmente gemendo o refrão.
Estou hipnotizada. Não importa se está sozinho ou em
frente a uma multidão, ele coloca o coração e a alma nisso,
não?

Assim que começa o verso seguinte Asher volta ao


trabalho, endireitando a fila de garrafas na prateleira. Em
seguida dá um passo para trás para inspecionar, só para dar
um passo à frente e empurrar uma das garrafas meia
polegada para a direita.

Tenho que rir, não consigo evitar. É uma graça. O cara é


tolerante, age como se nada o incomodasse, desorganizado e
esquecido às vezes e, entretanto, tem este pequeno lado
perfeccionista totalmente em contradição com o resto dele.

Assustado, ele para de cantar e vira-se para mim.

— Te amo. — Digo em espanhol, soltando


impulsivamente a primeira coisa que me vem à cabeça.
PARTE I

REMY
Não percebi o que falei até que Asher me dá um sorriso
confuso.

— Te amo? O que significa isso?

Congelo. Minha boca está aberta, mas as palavras não


saem. Não quis dizer isso. É que ele estava tão lindo
arrumando as garrafas com seu transtorno obsessivo
compulsivo e aquela voz que me inundava com uma sensação
de felicidade, que as palavras simplesmente escaparam.

— Uh... — Estou muito lenta para o meu gosto. — Você


sabe... bom trabalho.... Com suas habilidades de
armazenamento. Acredito que pode ganhar algum tipo de
prêmio por sua organização das prateleiras de álcool.

Asher fica um pouco ruborizado enquanto vem na


minha direção. Mas depois balança a cabeça e sorri.

— Cale a boca, espertinho.

Eu adoro o jeito como ele caminha, com essa arrogância


intencional que é tão incrivelmente masculina. Não parece em
nada com o que Jodi tinha tentado me ensinar e não tem
nada a ver com o movimento do quadril.
É a postura, o corpo e até mesmo a forma como suas
coxas ficam afastadas que o fazem tão masculino. É a
confiança. “Sticks” jamais andará assim.

— Já terminou? — Pergunta Asher, estendendo a mão


para pegar a caixa.

Não respondo, só o olho pegar uma pasta e analisar as


planilhas de cálculo que fiz.

— São impressionantes. Obrigado, cara.

A apreciação entusiasta na expressão dele aquece meu


corpo.

Asher volta a cantarolar “Take Me to Church” em voz


baixa enquanto continua olhando meu trabalho.

— Você realmente adora cantar, não é?

— Sim. — Responde, com um sorriso no rosto. — Não


comecei a ser roqueiro porque queria um bando de mulheres
me atacando em qualquer lugar que eu fosse. Na realidade,
minha outra razão para estar em uma banda era incomodar
meu pai.

Neste ponto ele parece comigo. Recentemente fiz reflexos


roxos nos cabelos somente para incomodar meu tio, que
odiava cabelos coloridos.

— Asher Hart, o cantor rebelde. — Anuncio, estendendo


as mãos como se estivesse lendo a placa de identificação na
porta de um escritório.

Ele sorri ligeiramente.


— Quando eu era criança, meu velho costumava me dar
uma surra cada vez que me surpreendia cantando. Eu estava
brincando com meus carrinhos e pensando nas minhas
coisas, tentando ficar longe dele, quando de repente pah... do
nada recebia um tapa na cabeça porque estava cantando sem
nem perceber. Ele me mandava cortar essa merda de cantar
porque era coisa de gay.

— Droga. — Murmuro.

Eu já sabia que ele fora maltratado, mas ouvir os


detalhes reais acabava comigo.

Tio Alonso foi um idiota rigoroso e estava sempre me


botando de castigo, mas nunca me bateu fisicamente além de
uns tapas nas mãos.

Asher me dá um sorriso malicioso e repentino, que me


diz que sua infância horrível já não era um problema para
ele.

— Se eu não adorasse tanto os seios das mulheres


provavelmente teria me tornado gay, só para incomodá-lo
mais.

Estremeço ao ouvir isso, quero arrancar a camiseta e


deixá-lo desfrutar dos meus seios. Mas então lembro que
estou em “modo menino”. Na verdade, em “modo menino
gay”.

— Bem, isso é uma pena. — Digo, levantando as


sobrancelhas como se estivesse tentando-o a mudar de lado.

Asher ri e bate no meu braço.


— Sinto muito. — Desculpa-se, com um sorriso divertido
e adorável, que faz meus hormônios ferveram.

Este homem vai ser a minha morte. Quanto mais tempo


passo com ele, mais eu gosto e mais atraída eu fico.

— Tenho que voltar para o bar. — Diz ele, fazendo um


gesto para a porta. — Quer uma cerveja ou algo assim?

Como não estou pronta para deixá-lo, concordo.

— Claro.

Segui-o para fora do depósito e espero no corredor


enquanto deixa a caixa da NonCastrato na sala de descanso.
Quando voltamos para a área principal, Asher vai pegar uma
cerveja e Ten aproveita para aproximar-se.

— Já contou para ele? — Murmura.

Franzo a testa.

— Cale-se.

Ele limita-se a rir e em seguida vai para o outro extremo


do bar servir um cliente.

— O que foi isso? — Pergunta Asher curioso, olhando


entre nós dois enquanto abre a garrafa e a coloca na minha
frente.

Graças a Deus estou de máscara e ele não pode ver o


meu rubor, então apenas finjo que não sei do que está
falando, encolho os ombros e tomo um gole de cerveja.

— Como vou saber? Falo somente inglês e espanhol,


“idiotez” não.
— Essa foi boa. — Diz ele, rindo

Já disse que adoro sua risada? Eu adoro. Mas adoro


mais ainda ser capaz de fazê-lo rir. Ele gosta não só da garota
que achou bonita no chuveiro ou daquela que viu cantando
no palco, ele gosta de mim. A pessoa. Isso me faz sentir
melhor do que posso dizer.

Assim que fica de costas atendendo um cliente, bato no


balcão para chamar a atenção de Ten. Ele franze a testa com
desconfiança mas aproxima-se.

— Você tem certeza que aquela música era para mim?

— Ah, então finalmente escutou a música?

Eu grunho. Não tenho tempo para o “eu disse” dele.

— Ten. — Advirto-o.

Ele revira os olhos e suspira.

— A garota com a camiseta do Incubus cantou com a


Jodi. Tenho certeza. Quantas amigas chamadas Remy ela
tem?

Só eu. Engulo a saliva.

— Ela era mais alta, com o cabelo preto e liso? Mais alta
que Jodi? Usava uma camiseta do Incubus preta e apertada?

— Sim, sim e sim.

Merda. Mordo o lábio. Parece exatamente comigo. Mas


ainda não quero admitir.

— Alguma outra característica? Tatuagens? Marcas de


nascença? Alguma outra coisa?
Ele suspira, claramente cansado do interrogatório.

— Não, mas... — De repente estala os dedos e aponta


para mim. — Tatuagens. O homem que ela beijou depois de
cantar tinha uma tatuagem no lado esquerdo do seu rosto,
que era um...

— Peixe. — Termino por ele. — Meu Deus! Era eu. Oh...


Por.... Deus. — Enterro o rosto nas mãos e inclino-me para
frente, incapaz de digerir isto. — Que diabos vou fazer?

— Diga a verdade ao Hart. — Aconselha Ten,


encolhendo os ombros despreocupado, como se fosse algo
fácil. Em seguida entrecerra os olhos. — Espera, você
terminou com o cara de peixe, não é?

Olho como se estivesse louco.

— Sim! Era um imbecil, mentiroso, infiel e ladrão. Sim...


já acabou. Completamente.

— Bem, então conte a verdade e vai ficar tudo bem.

Vai ficar tudo... bem, não? Sim, claro.

— Realmente acha que vai ser fácil assim? Ele


simplesmente... esqueceria que estive mentindo por quase
duas semanas? — Pergunto, olhando-o incrédula.

— Sim. Eu nunca entendi por que mentiu, para


começar. Há uma boa razão para isso, certo?

— Eles sequer me ouviram quando fui tocar vestida de


garota no teste. — Suspiro. — Então, tive a louca e estúpida
ideia de me vestir como um homem, para ver se fazia
diferença. E obviamente fez. As coisas então simplesmente se
tornaram uma bola de neve, cada vez que eu ia dizer a
verdade acontecia algo que me fazia adiar um pouco mais.
Até que agora... agora parece tarde demais para falar sem
causar um grande problema.

Ten balança a cabeça enquanto falo, como se


entendesse e simpatizasse com meu dilema. Mas então
levanta as mãos.

— Portanto, espera... você fez o teste como uma menina?

Eu confirmo.

— Por que Hart não reconheceu você então? — Pergunta


ele.

Envergonhada, admito a verdade, baixando o rosto ao


falar.

— Eu exagerei um pouco ao me vestir para a ocasião.


Usei uma peruca loira de roqueira, meias arrastão e....

— E você gosta, obviamente, de estar incógnita. —


Conclui Ten.

— Na realidade, não. Foram somente... essas duas


vezes.

— O que bastou para enganar completamente o meu


menino.

— Ouça, — Murmuro, franzindo a testa. — Nunca tive a


intenção de enganar ou machucar ninguém.

Mas Ten já não está prestando atenção em mim e um


sorriso nostálgico se espalha pelo seu rosto.
— Sabe, minha mulher também se disfarçou para me
pegar. Foi muito sexy... E uma maneira eficaz de ganhar o
garoto.

Ou perdê-lo, no meu caso, penso silenciosamente.

— O que eu perdi? — Pergunta Asher, aproximando-se


do lado esquerdo de Ten e dando batidinhas no balcão. — Do
que estamos falando?

— Remy tem algo para dizer a você. — Anuncia Ten,


antes de apertar o ombro de Asher e afastar-se.

Franzo a testa, desejando estrangulá-lo. Mas Asher já se


virou na minha direção.

— O que está acontecendo?

— Eu... — Olho para os olhos verdes e.... perco


totalmente a coragem. — Tenho que ir. É tarde.

De fato, quando pego o celular vejo que é realmente


tarde. Quase hora de fechar.

— Está bem. — Asher sorri e levanta a mão. — Nos


vemos no ensaio amanhã. E obrigado por organizar a caixa.

— Claro. — Respondo, descendo do banquinho e saindo


rápido do clube para poder chorar todo o percurso até em
casa.

Depois de chegar ao meu solitário apartamento, sem


nenhuma ideia de onde Jodi se encontra para chorar com ela,
faço uma “festa de auto piedade” no chuveiro, obcecada com
o fato de que nada do que acontecer a partir de agora vai ter
um final feliz. Fiz aquele teste para encontrar a mim mesma,
ser aceita em uma banda por quem eu era, e incomodar o
meu ex. Mas nada disso aconteceu. Tenho fingido o tempo
todo, sou outra pessoa, e Fisher sequer pode saber o que está
acontecendo comigo.

No momento não tenho nem ideia do porquê ainda estou


mentindo. Espere um segundo... sim, eu sei. Meu principal
objetivo é não machucar Asher, só não sei como, exceto
continuar enganando-o. Merda, estou fodida. Muito fodida.

Quando desligo o chuveiro meus dedos estão enrugados,


mostrando-me o tempo que fiquei ali ruminando meus
problemas. O pior é que não encontrei nenhuma solução.
Asher nunca vai querer me ver nem falar comigo de novo
depois que descobrir tudo.

Visto calças cômodas e uma regata e pego sorvete na


geladeira. Estou colocando a colher diretamente dentro do
pote quando meu telefone toca.

É Asher. Claro. Porque minha consciência culpada


precisa ouvir sua voz para que eu me sinta ainda em pior
estado.

— Não acordei você, certo? — Pergunta ele, assim que


atendo.

— Não. Claro que não. — Tiro a colher e coloco de novo


a tampa para ocultar todas as provas do meu festival de
autopiedade.
— Bom. — Ele deixa escapar um suspiro. — Esperava
que estivesse acordado, porque... Preciso de uma carona... se
estiver na área.

— Uma carona?

— Sim, minha moto arrancou e.... morreu. Estou parado


aqui no estacionamento e Ten já foi embora. Pensei em
chamá-lo de volta, mas então tive uma imagem mental
horrível, porque sei que ele acorda Caroline cada vez que
chega em casa do trabalho e não queria interromper, você
sabe... nada.

— Ah, mas como você sabe que não está interrompendo


nada ao me ligar?

— Merda. — Diz ele, depois de um segundo calado. —


Sinto muito. Se está ocupado, vou chamar...

— Não, não. — Respondo rindo. — Só estou brincando


com você. Estarei aí em alguns minutos.

Desligo e vou me vestir, demorando mais tempo do que


eu queria para colocar a roupa do Sticks. Esta merda não foi
feita para vestir rápido.

Na minha pressa, rasgo um pouco do látex na nuca,


mas espero que o cabelo cubra. Não que importe, ele já sabe
que eu uso uma máscara, acho que pensa que estou
grotescamente desfigurado. Merda... outra mentira no prato,
que já está transbordando.

Quinze minutos mais tarde entro no estacionamento


vazio na rua do Forbidden, onde uma figura está apoiada em
uma moto de aspecto selvagem, diretamente sob a claridade
da lâmpada. Por Deus! Asher tem uma motocicleta. Bom, ele
já tinha me contado, mas precisei ver para processar
realmente suas palavras.

Asher Hart dirigia uma moto.

Neste segundo ele ficou... cinco vezes mais sexy.

Tentando afastar o calor, deixo escapar um suspiro e


paro junto a ele baixando o vidro.

— Continua sem arrancar? — Pergunto.

Ele afasta-se da moto e levantava mão para abrir a porta


do carro.

— Não. — Responde depois de entrar, desabando no


banco de mau humor. — Descobri o problema. Cortaram a
mangueira do combustível.

Pisco e olho para ele fixamente.

— Cortaram? Está dizendo cortar, cortar?

Asher arqueia uma sobrancelha, lembrando-me de que


não há outro tipo de corte.

Fico de boca aberta.

— Merda. Quem faria... — E então me dou conta. —


Droga. Acha que foi seu pai?

Essa ideia o deixa surpreso e ele me lança um olhar


estranho.

— Não. — Então nega com a cabeça e faz uma careta,


como se quisesse garantir a si mesmo que sua resposta
continuava sendo não. — Por que ele faria isso? Já tivemos
nosso confronto. Tudo o que ele queria de mim eram suas
drogas, algo que eu não tenho. Então, duvido que vá voltar a
vê-lo.

— Seu testemunho o colocou na cadeia, Asher. Por


anos. — Murmuro.

— Sim, claro. Mas meu testemunho de fato não fez


merda nenhuma. Haviam provas e evidências suficientes para
prendê-lo sem que eu precisasse dizer nada.

Isto me deixa confusa. Ligo o carro e saio, deixando sua


adorável fera morta para trás.

— Então, por que você teve que testemunhar?

Por que fazer uma criança passar por esse tipo de


estresse se não era necessário?

Asher encolhe os ombros e vira-se para olhar pela


janela.

— Não sei. Suponho que os advogados pensaram que


um menino de sete anos não estaria suficientemente
traumatizado depois de ver a mãe assassinada.

— Que filhos da puta. — Sussurro, concordando.

— Com certeza não é razão suficiente para que o velho


queira se vingar de mim, dezesseis anos depois.

Mordo o lábio enquanto penso sobre isso.

Então me dou conta que estamos na entrada do


estacionamento porque não tenho nem ideia de onde ele
mora.
— Para onde vamos?

— Oh, sinto muito. Por aqui. Depois vire à esquerda


quando chegarmos a avenida.

— Então, quem você acha que fez isso? — Insisto. —


Porque, você sabe, as mangueiras de combustível não se
cortam sozinhas.

Ele me olha, impressionado.

— Então você acha que alguém quer me prejudicar por


que cortaram a mangueira de combustível da minha moto?
Isso é.... um conserto de trinta dólares e o pior que poderia
ter acontecido, como de fato aconteceu, é a moto não ligar.
Poderiam ter feito algo muito pior se realmente quisessem me
atingir. Acho que foi somente uma brincadeira dos meninos.

Faço uma careta.

— Não é uma brincadeira muito divertida.

Asher deixa escapar um suspiro de frustração e passa a


mão pelos cabelos.

— Sim, eu não estou rindo. — Admite. — Vá para o


norte.

PARTE II

Olho para ele, surpresa.


Não estamos indo para uma área residencial. Os únicos
prédios nesta parte da cidade são algumas fábricas fechadas
e condenadas a serem futuras lojas. Onde diabos ele mora?

— Vire aqui.

— Isso é um beco. — Digo, hesitante.

— Sim, eu sei.

Finalmente dou a volta, sacudindo a cabeça lentamente.

— Você mora em um beco?

— Alugo o porão. E a única entrada é pelo beco.

— Horripilante. — Murmuro, entrecerrando os olhos


para ver melhor através da total escuridão que rodeia o lar de
Asher.

— Bem aqui.

Eu paro e desligo o motor.

— Sério, homem. — Diz ele, dando-me um olhar


divertido. — Estou bem. Não precisa me acompanhar até a
porta. Meu velho não está escondido em uma esquina
esperando para me matar.

— Já vamos ver isso. — Respondo, tirando o cinto de


segurança e abrindo a porta.

— Certo. — Suspira Asher, derrotado. — Pode entrar se


quiser, mas não há muito para ver.

Minha curiosidade a respeito deste porão somada a


preocupação com a mangueira de combustível cortada,
impulsionam-me a segui-lo através da escuridão até uma
porta de metal enferrujado e amassada, como se várias
pessoas tivessem chutado ela em diferentes ocasiões.

— Olhe por onde anda. Não tem luz na escada.

Depois de abrir a porta, ele desaparece no interior.

Respiro fundo e entro. Uma luz suave vinda de uma


janela ajuda a iluminar um pouco e desço com cautela
porque os degraus são mais altos do que eu esperava e a
madeira range assustadoramente. Mas pela forma que Asher
desceu, devem ser resistentes.

Assim que chega lá em baixo ele acende uma luz no


apartamento.

— Melhor? — Grita.

— Sim, obrigado.

Chego a porta e fico imóvel, boquiaberta de assombro.


Santa merda, não é um lixo. Tudo é pequeno, mas a cozinha
em um canto parece relativamente nova e também todos os
móveis e....

Quando um estrondo de metal explode acima de mim


quase faço xixi nas calças.

— Meu Deus! — Grito, levando as mãos ao peito


enquanto me afasto rapidamente da porta e olho para cima,
com medo do que ouvi.

Estou agindo como uma mulher, droga.

— Que diabos foi isso? — Emendo, depois de limpar a


garganta.
Mas já posso ver o que causou todo esse barulho.

Asher prendeu meia dúzia de jaulas na parede, inclusive


por cima da porta, então colocou tubos de alumínio entre elas
para que a criatura que vivia ali pudesse ir de uma jaula para
outra.

— Isso... — Anuncia ele na ponta dos pés para alcançar


a porta da jaula mais próxima. — É Mozart.

Um brilho de pele marrom se lança através das gaiolas e


logo que Asher abre a porta o animal salta mais ou menos
uns três metros, aterrissando no encosto do sofá antes de
pular para o chão e desaparecer debaixo da cama.

Aponto para a cama sem ter certeza do que realmente vi.

— Isso é um esquilo.

Asher sorri com orgulho.

— Eu sei. Genial, não é? Fui a todos os pets shops da


cidade até encontrá-lo. Parece que era um caso de resgate, foi
encontrado no parque com uma perna quebrada. Depois de
curá-lo, não era seguro deixá-lo voltar à vida selvagem,
apesar de estar bem. Ele foi devolvido três vezes antes de
ficar comigo, porque arranhava todos os donos. — Asher
encolhe os ombros como se não pudesse entender por que
um esquilo arranharia alguém. — Aprendi que é só não
tentar tocá-lo e lhe dar seu espaço que ele fica bem.

Balanço a cabeça tentando superar o fato de que Asher


Hart tem um esquilo como animal de estimação.
— Quero dizer, entendo... por que alguém compraria um
bichinho esperando interagir e acariciá-lo?

— Cale a boca, sabichão.

Asher sorri e vai para a cozinha, onde abre um armário


e pega um punhado de amendoins.

Imediatamente a cabeça de Mozart aparece, o nariz


retorcendo-se enquanto observa Asher atirar os amendoins
em vários lugares da sala.

— Eu gosto porque é legal observá-lo. Os esquilos são


gênios. Só olhe.

Lançando-se para fora do seu esconderijo, Mozart salta


e faz do seu objetivo recuperar todos os amendoins, tentando
de tudo para impedir qualquer humano se aproxime dele.

— É legal mesmo. — Admito, colocando as mãos nos


quadris e observando Mozart desaparecer de novo sob a cama
de Asher, uma cama King de aspecto confortável, com os
cobertores desarrumados como se ele tivesse acabado de
levantar dos lençóis brancos.

Merda, não posso ficar olhando para a cama.

— Pessoalmente, teria optado por um cão ou um gato. —


Digo, obrigando-me a parar com os pensamentos do que eu
gostaria de fazer naquela cama. Mozart ficaria assustado e
até poderia ter um ataque do coração com tudo que quero
fazer com seu dono. — Você sabe, um bichinho que
realmente pudesse tocar.
— Só porque não posso tocá-lo não quer dizer que não
deva ser cuidado e amado. Essas são as almas que mais
precisam de atenção.

Pisco para ele, percebendo que falava de si mesmo.


Possivelmente.

Depois que Asher me confessou em Chicago que


gostaria de ter uma relação com alguém, ocorreu-me que ele
não tinha ninguém em quem tocar... E isso parecia ser o que
mais desejava.

Não tenho a sorte de poder tocá-lo. Realmente tocá-lo.


Mas nesse momento decido que vou dar-lhe mais atenção,
porque eu posso continuar sendo seu amigo.

— Por que o nome Mozart? — Pergunto.

— Porque o Mozart original também era um gênio. Você


sabe, ele só tinha quatorze anos quando escreveu sua
primeira ópera. Uma maldita ópera.

— Por que você sabe algo assim?

Ele encolhe os ombros.

— Encontrei isso na internet uma vez, quando


procurava sites de música. E li um artigo sobre ele e cliquei
em sua música. Fez o esquilo dormir... então, dei a ele o
nome de Mozart.

Olho para o rato de árvore com cautela quando ele sai


de baixo da cama para nos vigiar, como se soubesse que era o
tema da conversa. Seus pequenos e brilhantes olhos
castanhos parecem sábios, ainda que nervosos.
— Está bem, posso entender por que ficou com ele. —
Então olho para Asher franzindo a testa. — Você disse ele,
certo? É um esquilo menino?

— Merda, acho que realmente não sei. — Admite. —


Nunca deixa eu me aproximar o suficiente para olhar.

— Então ele poderia ser ela?

— É um ele. Tem um jeito masculino.

— Você nunca deveria acreditar nessa merda, sabe?

Eu sou a prova viva.

Asher ri e faz um gesto com a mão para mim.

— Certo, idiota. Bem, como você pode ver, meu pai não
está escondido na minha casa com um facão, uma pistola ou
um motosserra. Estou perfeitamente a salvo aqui com meu
esquilo selvagem. Então...

É meu sinal para ir. Mas me sinto mal por abandoná-lo,


apesar de ser tarde e ele provavelmente querer dormir...
nesse colchão que parece tão confortável.

Continuo repetindo suas palavras na minha cabeça e


parecem a indireta de um homem solitário.

Então, quando baixo os olhos, vejo um jogo do Play


Station sobre sua mesa de centro. Pego a caixa e a aperto
contra o peito.
— Você tem a nova edição do Black Ops III35. Santa...
Merda. Isso é tão legal. Só tenho a versão original e a versão
zumbi.

Asher arqueia as sobrancelhas com interesse.

— Você joga Call of Duty?

Dou um olhar que diz que ele está louco até mesmo por
perguntar.

— Merda, sim. Meu primo Big T, oficialmente se negou a


jogar contra mim. Bebezinho chorão. Acho que chutei o rabo
dele muitas vezes.

— Oh, então você acha que é bom, não é?

— Acho? — Deixo escapar um suspiro e olho para ele,


desafiando-o. — Querido, não sabe o que é uma surra real
até ser vencido no Call of Duty... por mim.

Assim que digo essas palavras lembro que ele sabe sim o
que é ser surrado... por seus pais.

Respiro fundo olho para ele, certificando-me de que não


toquei em um ponto sensível. Asher só sorri.

— Desafio aceito, imbecil. Estou dentro.

Jogamos até a madrugada. Ele não era ruim e como eu


nunca tinha jogado esta versão antes, tive que aprender. Mas
logo que entendi o programa chutei o rabo dele. Asher ficava
exigindo uma revanche cada vez que perdia, então não tenho
ideia de quantas horas jogamos, só sei que em algum

35
Call of Duty: Black Ops III é um jogo eletrônico de tiro produzido pela empresa Treyarch.
momento ele trouxe aperitivos e bebidas. Foi tudo tão
divertido que simplesmente perdi a noção do tempo.

Eventualmente desmaiei esgotada no seu sofá.


ASHER
Estou comendo uma maçã de café da manhã, uma maçã
que comprei para o Mozart, quando meu celular tocou.

Sei que não devo comer a fruta do meu animal de


estimação. Tudo o que li a respeito diz que os esquilos
precisam de uma dieta balanceada de frutas e vegetais, junto
com plantas e nozes. Mas como nozes parecem ser sua
comida favorita, é o que ele ganha mais.

Além disso, algumas das frutas estavam começando a


estragar, então... acho melhor comer antes de estragar.
Nunca fui dessas pessoas que comem frutas, mas estou
começando a gostar, acho inclusive que posso me acostumar
às comidas saudáveis.

— Alô? — Atendo, com a boca cheia.

Remy se mexe no sofá, o cabelo falso saindo por todos


lados enquanto me observa sobre o encosto com os olhos
vermelhos. Levanto a mão para ele e finjo um golpe com o pé,
antes de virar de costas. Quando o homem do outro lado da
linha se apresenta o entusiasmo toma conta de mim.

— Sério? — Deixo escapar sem querer.

O homem ri antes de responder que sim, é sério. Então


conversamos e discutimos os detalhes.
Desligo e me viro para contar as notícias a Sticks.

— O quê? — Pergunta ele imediatamente, pulando do


sofá. — Temos outro show, não?

— Aqui na cidade, no Grenada. No próximo sábado.

— Santa merda.

— Esse foi o primeiro lugar em que tentei conseguir um


show para a NonCastrato, um ano depois que começamos.
Agora, o cara está implorando por nós. Oh, doce justiça...

— Boa. — Diz Sticks, fazendo uma dancinha da vitória


que me faz rir.

— E assim começa. — Digo dramaticamente,


perguntando-me o que conseguiríamos depois disto.

As coisas definitivamente estão indo bem para a banda.

— Isso é tão legal. — Diz Sticks, depois de bater o punho


comigo. — É como... um sonho que virou realidade. As vezes
ainda não acredito que vocês me deixaram entrar na banda.
É só... surreal. E incrível.

— Honestamente, você é puro talento. Tenho certeza que


conseguiria entrar em qualquer banda que quisesse.

Ele bufa.

— Pense outra vez. Eu quis isto por anos e tentei em


mais lugares do que você imagina.

— Então, por que não... — E então eu entendo. — Está


dizendo que não o aceitaram por que é gay?

Que idiotas!
Um olhar inquieto cruza o rosto dele, mas logo em
seguida inclina a cabeça e coça a nuca.

— Mais ou menos, se.... é porque prefiro os caras. — Ele


olha para cima novamente, demonstrando uma profunda
gratidão. — Sério Asher, você não tem nem ideia do presente
que me deu, não só pela oportunidade de estar na banda,
mas também por.... Me aceitar.

— Ei. — Digo com delicadeza, querendo segurar seu


ombro ou, não sei, de algum jeito convencê-lo de que era
importante para mim. — Mande a merda aquelas pessoas que
se recusaram a olhar além da superfície e ver a pessoa
grandiosa que você é. E sabe o que mais? Estou feliz que
foram idiotas, porque a perda deles foi o nosso ganho. Tocar
na banda com você e chegar a conhecê-lo foi... foi bom.

Os olhos de Remy brilham como se ele fosse chorar.

Merda, espero que não chore. Já fico sem saber o que


fazer perto de garotas chorando, com certeza não vou saber
lidar com um cara.

— Obrigado. — Responde ele, antes de limpar a


garganta e olhar o apartamento. — Mas, caramba, não posso
acreditar que dormi no sofá. Que horas são, afinal?

— São dez e quinze.

Sticks arregala os olhos.

— Merda! Estou atrasado para o trabalho. Ah... tenho


que ir.
Ele começa a se afastar, depois faz uma pausa como se
precisasse da minha permissão ou algo assim.

— Vá embora, cara. Eu lamento, teria te acordado mais


cedo se eu soubesse. Deveria ter perguntado.

— Não tem problema.

Sticks pega os sapatos que tirou em algum momento da


nossa batalha de Call of Duty, corre para as escadas e acena
para o Mozart, que mais uma vez está metido em sua cova.

— Vejo você no ensaio. — Grito, sorrindo com a saída


agitada.

— Sim, nos vemos lá. — Responde ele das escadas.

Assim que a porta se fecha meu sorriso morre. A sala de


repente parece bastante... vazia.

Nem mesmo meu esquilo correndo na jaula pode encher


o vazio. Respiro fundo e decido que tenho outras coisas para
me preocupar... uma mangueira de combustível para
substituir, um novo show para planejar, música para nossa
nova canção para compor. Ocupado, ocupado, ocupado. Não
tenho tempo para me sentir sozinho.

— Irmão. — Diz Remy no meu ouvido, segurando forte


meu braço. — Você não disse que a Fish 'N' Dicks estaria aqui
esta noite.
Estávamos no Grenada e a banda que Stick mencionou
já estava no palco tocando.

— Eu disse que outros grupos estariam tocando esta


noite antes da gente. — Grito, porque o som estava muito
alto.

— Mas não especificou que a Fish 'N' Dicks seria um


deles.

Franzo a testa me perguntando por que ele parece tão


chateado. Então encolho os ombros.

— Não vejo nenhum problema. A música “Tomorrow's


Promise36” é demais.

Esse comentário parece pegar meu baterista de


surpresa.

— Sério? — Pergunta ele, como se eu acabasse de


elogiar seu guarda-roupa. Então de repente endireita os
ombros e limpa a garganta. — O vocalista é um idiota.

Eu começo a rir.

— Se os idiotas me incomodassem, nunca teria feito


uma banda com o Gally.

— Huh? — Murmura Gally ao ouvir seu nome.

Remy olha para o baixista e rapidamente se vira para


mim.

— Tem razão.

Promessas do Amanhã, em português.


36
E depois não fala mais nada... até que realmente
tropeçamos com a outra banda no backstage, eles saindo e
nós nos preparando para entrar depois do segundo grupo.
Sim! Nós vamos fechar a noite.

— Bem, bem, bem, se não é a NonCastrato — diz o


cantor quando nos vê. Acho que seu nome é Fisher alguma
coisa, não lembro. — Você é Hart, certo?

— Ei, cara. — Digo, sem demonstrar que não lembro seu


nome. — O que está acontecendo?

Ele olha para Remy, que parece tenso junto a mim.

— Não muito. Ouvi que tiveram que conseguir um novo


baterista porque o último fez... O quê? Foi preso por queimar
toda a família em um incêndio?

— Ele queria saber onde você morava também. —


Rebate Remy.

Gally começou a uivar com essa resposta, o que faz


Holden rir. Dou a Remy um olhar de “se comporte”, mas ele
me ignora e estreita os olhos para o homem com uma
tatuagem de peixe que ocupa metade do seu rosto.

— Quem é você? — Pergunta o “cara de peixe”, franzindo


a testa.

— Não é da sua conta.

Os dois caminham um em direção ao outro para


começar a brigar ali mesmo, mas eu decido intervir e coloco a
mão entre eles.
— Ei, ei, ei. Estamos aqui para tocar esta noite, amigos,
sem brigas.

Remy imediatamente respira fundo e se retira, mas o


outro cara continua a encará-lo.

— Seu baterista tem um problema sério de atitude.

— Está tudo bem. — Asseguro, batendo nas costas dele


para mandá-lo embora. — Bom trabalho esta noite.

Finalmente pacificado, o “cara de peixe” respira fundo e


sai, grunhindo.

— Que merda? — Digo, virando-me para Remy.

Geralmente é com Gally que eu me preocupo que vá


entrar em uma briga.

— Odeio esse idiota. — Murmura ele.

— E você o conhece? Porque ele não parecia conhecer


você.

— Eu... eu conheço uma menina que saiu com ele... e foi


magnificamente fodida. Para dizer o mínimo, eu não sou fã
desse cara.

— Certo. — Termino por ceder. — Só me avise da


próxima vez que vai ter um bate-boca com outra banda,
então vou estar preparado.

— Bom, se eu soubesse que ele ia estar aqui...

— Ok. — Levanto as mãos. — Vou avisá-lo se formos


tocar no mesmo lugar outra vez.

— Obrigado.
Ele fez uma última careta e isso foi tudo. Fomos para o
palco, tocamos com o coração e deixamos a multidão gritando
e pedindo mais.

Gally, Heath e Remy foram para o camarim e o dono do


clube me parou com o pagamento em dinheiro. Disse a ele
que adoraríamos voltar sempre que nos convidasse.

Tentei não me preocupar com meus amigos do


Forbidden. Todos os meninos tinham esperneado quando
souberam que eu não estaria lá para a noite do karaokê. Pick
mandou calarem-se e explicou que as novas apresentações
eram grandes oportunidades para mim. Mas eu me
preocupava com ele também, tinha me ajudado a começar e
me dado mais oportunidades que qualquer pessoa. Tocar
aqui me fazia sentir como se o estivesse abandonando,
embora saiba que ele não quer que eu pense assim.

É estranho ter um membro da família que só quer o


melhor para mim, faz-me desejar poder fazer mais por ele.

Afasto esses pensamentos e volto para os meninos, que


parecem já estarem dormentes bebendo uma garrafa de Grey
Goose37 que tinha ficado na sala.

— E aí está o homem do momento. — Diz Remy,


levantando a garrafa em um brinde. — Asher Hart. —
Completa, fazendo o som de uma multidão rugindo antes de
tomar um grande gole.

37
Marca de vodka.
— Idiota ambicioso. — Reclama Gally, roubando a
garrafa pela metade da boca de Remy, que acaba derramando
Vodka pelo queixo.

— Filho da puta. — Responde ele ao Gally, enquanto


limpa a Vodka com o dorso da mão. Então, sorri para mim
com olhos suaves. — O que aconteceu, chefe?

Não tenho ideia do por que me chamou de chefe, mas


levanto o dinheiro e balanço a cabeça.

— É dia de pagamento. — Anuncio.

— Boa. — Grita Gally, empunhando a mão no ar. — Dê-


me meu dinheiro!

Uma vez que o único lugar disponível para sentar é o


sofá onde Remy está esparramado por praticamente toda a
maldita coisa, empurro um lado de suas pernas com o joelho
e me sento junto a ele.

Ele sorri e coloca um Twizzler 38na boca e eu aproveito e


roubo um pedaço grande do outro lado do doce.

— O gerente nos convidou para tocarmos de novo no


próximo mês, se nós estivermos interessados. Disse que
estávamos.

— Inferno, claro que estamos. — Diz Gally, enquanto


Holden assente.

38
Remy está muito ocupado franzindo a testa para o
pedaço de doce que eu roubei. Ele levanta a mão para roubar
de volta e grunhe quando sou mais rápido, tirando-o da boca
e balançando o Twizzler ironicamente. Então, eu lambo todo
o comprimento do doce, espalhando meus germes para que
ele não o quisesse de volta porque estava nojento.

— Rá. — Digo triunfalmente. — Lambido, por isso é


meu. Isso é a vingança por chutar meu rabo no Call of Duty.

Ele me olha com “cara de paisagem”.

— Sério? Muito maduro! — Então, ele mexe as


sobrancelhas. — Agora, só quero mais.

Enquanto eu caio na risada e quase me afogo com o


Twizzler, Gally assobia.

— Isso é doente, homem. E nojento. Flerte não é


permitido aqui, veado.

— Hum. — Murmura Remy, inclinando-se para pegar na


bolsa um novo Twizzler. — Você simplesmente está com
ciúmes porque não é o objeto do meu flerte.

— Wow. — Diz Gally, enquanto arranca sua parte do


dinheiro da minha mão. — Com certeza, não estou. Sério,
pombinhos, vocês ficaram muito carinhosos desde que
dividiram o quarto em Chicago.

— Sim. — Remy deixa escapar um grande suspiro


sonhador, pressionando a mão no peito e batendo os cílios
para mim. — Ficamos muito mais unidos. Foi maravilhoso.
— Jesus, Sticks. — Franzo a testa para ele. — Você está
muito bêbado, não é?

Ele solta uma risada rouca e me sopra um beijo.

— Completamente, baby.

— É, estou vendo. — Faço um gesto para o Heath,


pedindo a garrafa de Vodka que agora está com ele. — Parece
que vou ter que beber para me recuperar.
REMY
Depois que Asher tomou um bom gole de Grey Goose,
dividiu o resto do dinheiro em três partes iguais.

Ocorreu-me que ele deveria ganhar mais. Não só porque


cantava, tocava e escrevia todas as músicas, mas também
porque agia como nosso produtor, organizando todos os
shows e cuidando da parte funcional da NonCastrato.

Odeio admitir, mas o admiro bastante.

Meia hora mais tarde, não odeio tanto admitir, na


verdade estou ansiosa por isso.

— Cara, eu admiro muito você. — Murmuro, enquanto


coloco um braço bêbado por cima do ombro dele. — Cantor
incrível, músico talentoso, compositor... E um corpo mais que
surpreendente, com uma bunda que eu quero morder. Existe
algo em que você seja ruim?

Asher apoia-se pesadamente em mim, com tanta


dificuldade para sentar-se reto quanto eu.

— Não posso distinguir a esquerda da direita. — Admite,


depois de cerrar os olhos como se estivesse perdido em
pensamentos.

— Merda. — Dou um sorriso descuidado e orgulhoso. —


Quer dizer que, sei algo que você não sabe?
— Deveria tê-lo visto tentando dançar o hokey pokey em
um casamento uma vez. — Diz Gally, rindo com a lembrança.

— Foi no casamento da prima do Holden e.... — Asher


sorri para Heath. — Lembra que eu costumava transar com
ela? Cara, ela era sexy.

— Sim. — Holden, franze a testa. — Eu lembro.

— Tinha uma boca feita para foder. Além disso, gostava


de engolir.

— Acredito que vou ficar doente. — Digo para Asher, que


ri.

— Falo sério. — Afirmo.

Gally me dá um chute no joelho.

— Cale a boca, gay de merda. As bocas das mulheres


foram feitas para os paus dos homens. Estou dizendo isso...
porque você não deve saber como é um boquete bem dado.
E... Agora quero uma boceta. — Ele levanta-se, cambaleante.
— Quem está comigo? Por que continuamos aqui sentados
como um grupo de perdedores quando há algumas cadelas de
primeira e seminuas por aí? Vamos encontrar alguma boceta.

Heath levanta-se primeiro, e Gally dá tapinhas nas


costas dele, felicitando-o. Então vira-se para Asher.

— E você, Hart? Quer caçar uma menina conosco?

Desta vez Asher realmente parece considerar a oferta,


até que encolhe os ombros e começa a sair do sofá.

— Bem...
— O quê? — Pergunto, olhando-o.

Mas ele não está prestando atenção, muito ocupado


tentando manter-se em pé.

Gally estala a língua para mim.

— Sinto muito, menino gay. Suponho que isso deixa


você de fora.

— Não, Remy ainda pode vir — Alega Asher, chamando-


me para que os seguisse. — Ele pode ser nosso
“casamenteiro”.

Faço uma careta, de repente não tão bêbada como


estava alguns segundos atrás. A ideia de ajudar Asher a
conseguir uma menina me deixa mal do estômago, com
vontade de vomitar todo o álcool que havia ingerido.

— Ou talvez ele possa conseguir seu próprio garoto. —


Acrescenta Asher, enviando-me um sorriso alentador.

Devolvo um pequeno sorriso enquanto levanto.

— Claro, contem comigo.

Contem comigo? Que diabos eu estava dizendo? Não


quero ver ele pegar uma menina.

E, no entanto, não posso deixar de ir. Vou ficar


preocupada a noite toda, pensando em quem ele tinha
escolhido, se era bonita, divertida e....

— Muito bem! — Anima-se Asher, dando-me um tapa


nas costas antes de colocar o braço sobre meu ombro,
levando-me para fora da sala.
Heath e Gally caminham a nossa frente enquanto eu me
inclino e faço uma careta quando Asher espirra.

— Pensei ter ouvido você dizer que não gostava de


encontros de uma noite. — Murmuro baixinho.

— Eu não gosto. — Responde ele, colocando um dedo


nos lábios, embora minha voz tenha sido bem discreta. —
Mas estou excitado, desesperado e suficientemente bêbado
para não me preocupar com o quanto vou me sentir horrível
depois.

Abro a boca para discutir, mas o olhar que ele me dá é


permeado por um doloroso desejo, que eu sei que não posso
preencher com algumas rodadas de Call of Duty.

— Preciso disso, Sticks. Preciso... de alguma coisa.

Sei exatamente o que ele precisa. Ser tocado.

Então, para mudar de assunto, sorri e bate o corpo no


meu.

— E quem sabe... talvez, eu realmente conheça minha


alma gêmea por aí.

Meu Deus, espero que não. Vê-lo levar um encontro de


uma noite para casa já seria bem ruim, porém observá-lo em
uma relação séria com outra mulher... sim, pode me matar
agora.

Juro, todas as mulheres no prédio sentiram no ar a


necessidade dele. Assim que saímos do camarim e entramos
na parte principal do bar elas chegaram, tocando-o,
elogiando-o, oferecendo seus sorrisos de bruxa má e raposa.
Fui rapidamente afastada quando o cercaram, e à
medida que o espaço entre nós aumentava, soube que ele
estava perdido para mim.

Queria me afogar no álcool, mas... não consegui. Fui ao


bar e pedi água, antes de voltar-me para a multidão de fãs,
olhando sem poder fazer nada.

Depois de alguns goles comecei a pensar que a sorte


poderia estar ao meu lado. Asher afastou educadamente
todas as garotas e conforme a multidão decepcionada saia
uma a uma, eu me sentia melhor. Se continuasse assim, isso
salvaria minha noite.

Finalmente ele desaba em um banquinho do bar, com a


testa franzida.

— Quais são as probabilidades de que uma mulher


neste lugar não saiba que estou em uma banda?

— Oh, por volta de zero a nada. — Respondo, com bom


humor.

— Obrigado, imbecil. — Diz ele entre dentes. — Isso me


faz sentir muito melhor.

Solto uma risada e dou um tapa no braço dele.

— Só fui honesto, meu amigo.

— Bom, eu gostaria de uma boa mentira neste


momento. Então, talvez você pudesse ser amável e.... uh.

Alguém tropeçou e bateu nele por trás, quase jogando-o


em cima de mim.
— Oh, sinto muito, não vi você. — Solta uma menina,
com os olhos arregalados e cobrindo a boca com a mão. —
Está tudo bem? Derramou sua bebida?

— Não, está tudo bem. Estamos bem. — Asher me olha


para se certificar de que eu estou bem e então vira-se para a
mulher. — Você está bem?

Ela sorri e estende a mão.

— Bom, agora estou. Meu nome é Tamra.

— Asher. — Diz ele, apertando a mão da menina.

— Archer? — Pergunta ela, inclinando-se para frente.

— Não. É Asher — Enfatiza ele, um pouco mais forte.

— Ah, certo. Você veio ver as bandas, Asher? —


Murmura a menina, sem soltar a mão dele.

Ele levanta as sobrancelhas e me dá um sorriso, como


se dissesse: de zero a nada, heim?

E vira-se novamente para Tamra... A puta.

— Algo assim. Você veio para vê-las?

Quando começam uma conversa sobre as bandas desta


noite e a música em geral, reviro os olhos e me afasto, doente,
revoltada e, merda, ferida. Ele vai ficar com ela. Eu sei. Odeio
isso, entretanto não posso fazer nada a respeito.

Devo ir embora. Sei disso. Mas eu não consigo, tenho


que ficar e me torturar. Preciso ver. Eles combinam
totalmente. Asher vai com calma e ela gosta. Quero dizer, ele
não paquerou, nem a olhou da mesma forma que me olhou
quando me surpreendeu no chuveiro — um pequeno consolo
— porém bastou. Ele estava bêbado e suficientemente
desesperado para levá-la para casa.

Quando ela disse que precisava ir ao banheiro, mas que


voltaria em seguida, ele vira-se para mim e faz um sinal de
positivo, com um sorriso que parece dizer: temos uma
ganhadora.

Não devolvo o sorriso, só desço do banquinho.

— Também tenho que fazer xixi.

O sorriso dele morre.

— Uh... claro.

Afasto-me dali porque não posso continuar olhando a


expressão esperançosa e emocionada em seu rosto.

Ao chegar aos banheiros vejo que uma pequena sala que


antecede os espaços destinados aos homens e as mulheres.
Ignoro por completo o lado dos homens e, baixando a cabeça,
tiro a máscara. Quando endireito o corpo e sacudo o cabelo,
um menino que acabava de entrar para congelado, olhando-
me boquiaberto.

— Amigo. — Digo, levantando as mãos e me virando


antes que ele pudesse escapar para o lado dos homens.

Não me abalo, estou muito bêbada, ou ciumenta, ou


algo assim para pensar nisso. Corro para o banheiro das
mulheres e paro quando vejo Tamra com umas amigas
arrumando o cabelo no espelho acima das pias.
— Você é uma cadela sortuda. — Diz uma, batendo no
braço da Tamra. — Não posso acreditar que esteja a ponto de
conseguir o Asher fodido Hart.

— Certo. — Tamra ri e morde os lábios para fazê-los


parecerem mais cheios.

Respiro e me encosto na parede ao lado da porta. Não


posso acreditar. Ela já sabia quem ele era, porque Asher não
disse seu sobrenome. Deus, é obvio que ela já sabia, só era
melhor no jogo que o resto das mulheres ignorantes lá fora.
Isto era exatamente o que Asher não queria, uma fã
enganando-o para “entrar em suas calças”. Tinha que avisá-
lo, mas... como?

Ele nunca acreditaria no que acabo de ouvir no


banheiro de mulheres.

Com vontade de chorar, afasto-me da parede e vou em


direção a uma cabine vazia. Tamra e seu grupo me veem e
dão sorrisos hesitantes.

— Eu adoro mechas roxas. — Tem o descaramento de


me dizer.

Retribuo um sorriso enojado.

— Obrigada.

Meu cabelo é um desastre, eu sei. Ficou preso sob a


máscara durante horas e provavelmente está emaranhado e
suado, grudado na cabeça.
Escapando para a cabine, sento-me e abraço a mim
mesma, ouvindo a conversa das putas com vontade de
chorar.

— Acha que vocês vão para a casa dele ou algum motel?

— Como se isso importasse. Ficarei feliz com o banco


traseiro do carro se for isso o que ele quer.

É uma moto, cadela. Ele dirige uma motocicleta, não um


carro.

E então imagino-o transando com ela na moto e tenho


que fechar os olhos com força e pressionar os lábios para não
chorar.

— Desde que a gente não vá para minha casa. — Ri


Tamra, começando a parecer muito petulante.

Suas duas amigas também riem.

— Sim, tenho certeza de que seu marido e seus dois


filhos não gostariam que você dormisse com o Asher, o deus
do rock Hart, no sofá da sala.

Arregalo os olhos enquanto elas riem. O quê? Não é


possível. A raposa é casada? Fico de pé e tento abrir a porta,
mas ela está trancada. Então, eu demoro um segundo antes
de conseguir sair e no momento que estou do lado de fora as
três mulheres se foram deixando somente seus risinhos tolos
de bundas casadas ecoando no ambiente.

Resolvo seguí-las, mas assim que saio do banheiro vejo


Asher vindo na minha direção. E ele me vê. No instante que
seus olhos ficam arregalados e a boca forma um “O” surpreso
lembro que esqueci de colocar a máscara de novo.

Rapidamente me escondo atrás de um grupo de três


meninos que passavam naquele momento.

— Ei, espere. — Grita Asher.

Continuo escondia atrás do meu escudo humano até


que passamos por uma porta. Coloco a mão no trinco para
ver se está destrancada.

Quando ouço um clique e a porta abre, entro em uma


sala escura, que não sei se é um escritório, um depósito ou
alguma outra coisa. Com medo de ficar trancada ali dentro,
sozinha, deixo a porta entreaberta e fico espiando.

— Filho da puta. — Sussurro, quando vejo um


determinado Asher caminhar na minha direção, como se
soubesse onde estou escondida.

Tamra o encontra antes e segura-o pelo braço,


perguntando para onde ele ia. Asher olha para a porta quase
fechada.

— Eu... eu pensei ter visto alguém que conhecia. Viu


uma garota? Uma... talvez latina, com o cabelo comprido,
escuro e com reflexos roxos.

— Reflexos roxos? — Pergunta Tamra e seu sorriso


congela. Em seguida sacode a cabeça. — Não, tenho certeza
de que não a vi. Lamento.

Deus! Que mentirosa! Bem, eu sou uma mentirosa pior.


Mas ela está tentando levá-lo para a cama com artimanhas
sujas e isso é errado. Quando ele tenta afastar-se, Tamra
segura-o pelo braço outra vez e começa a caminhar de volta à
nossa mesa. Asher lança um último olhar nostálgico à porta
enquanto vai embora.

Solto um suspiro ensurdecedor, conto até dez e coloco a


máscara tão rápido quanto é humanamente possível,
esperando que não esteja torta. Então saio do esconderijo e
corro de volta para a mesa também.

De maneira nenhuma posso deixar que essa cadela faça


isto com o meu Asher. Alcancei-os bem a tempo. Os dois
estão de pé, Tamra move a alça da bolsa no ombro como se
estivesse prestes a sair e Asher colocando dinheiro sobre a
mesa para a gorjeta. Em seguida, ele coloca a mão na parte
inferior das costas dela. Eu passo na frente e eles param,
surpresos, obrigando-me a fingir que estou surpresa também.

— Oh, olá. Já vão? — Pergunto, inocentemente.

— Sim. — Asher me dá um olhar estranho. — Eu fui


atrás de você no banheiro, mas não o encontrei.

— Ah... sim. Eu... — Merda. Olhando para o bar,


rapidamente improviso. — Resolvi pegar outra bebida.

— Bem, vamos embora. Esta é Tamra, a propósito. —


Viro-me para ela e dou um sorriso agradável. — Tamra, este é
meu amigo, Remy.

— Olá — diz ela, estendendo a mão de uma maneira


patética e insegura que me deixa louca.

Pego a ponta de seus dedos assim mesmo.


— Prazer em conhecê-la. — Então estalo os dedos e
aponto para ela. — Oh, você não é a garota que estava
colocando a aliança na bolsa no lado de fora do banheiro
alguns minutos atrás?

— O que você disse? — Pergunta Asher, virando-se para


ela com as sobrancelhas levantadas.

O choque nubla o rosto da garota.

— Eu... eu... não, certamente não era eu.

— Sim, definitivamente era você. — Ronrono, incapaz de


conter um sorriso enquanto balanço o dedo. — Estava
gabando-se para suas amigas sobre como estava a ponto de
transar com Asher, o deus do rock Hart, não é mesmo?

— O quê? Como...? — Ela balança a cabeça e me olha


boquiaberta, tentando descobrir como eu sabia. Depois vira-
se para Asher. — Isso nunca aconteceu.

Não assim. Talvez não exatamente da maneira como eu


descrevi, mas, oh, definitivamente aconteceu. Asher não
parece se importar como as coisas aconteceram,
simplesmente dá um passo decidido para longe dela.

— Você realmente é casada?

— Eu...

A culpa no rosto dela diz que sim.

— E mentiu sobre não saber quem eu era. — Acusa,


antes de levantar as mãos. — Isso só... não é legal.

Então ele se vira e sai dali.


Tamra está de boca aberta.

— Que diabos? — Exclama.

Quando ela me olha, eu encolho os ombros.

— Ouça... A vida é uma cadela que morre logo, não é?

— Você... — Tamra entrecerra os olhos. — É um maldito


mentiroso. Obrigado por arruinar a minha noite.

Ela sai furiosa e quando estou a ponto de gritar “olha


quem fala”, eu paro.

Eu sou uma mentirosa e com certeza uma mentirosa


pior do que ela, penso novamente. Tamra planejou enganá-lo
por uma noite, estou enganando-o há semanas e
provavelmente vou continuar durante quem sabe quanto
tempo mais.

Não havia nenhum final à vista, porque não sei como


contar a verdade. Sentindo-me uma merda, olho pelo local
até que o encontro no bar tomando água, acho que para
recuperar a sobriedade.

Olho para Asher inclinado sobre o balcão e seus ombros


parecem tensos. Deixo-me cair ao seu lado e por alguns
segundos ninguém fala.

— Sinto muito. — Digo, finalmente.

Ele solta uma gargalhada e me lança um olhar cansado.

— Por que diabos você sente?

— Eu só... atrapalhei você. — Murmuro.


Porque sou uma cadela malvada e ciumenta que não é
capaz de suportar vê-lo levar outra mulher para casa.

— Não. Você me salvou de foder uma mulher casada. Eu


deveria estar agradecendo... não você me pedindo desculpas.
Idiota.

— Entretanto... — Dou um longo suspiro — Se eu


tivesse mantido minha boca fechada, você poderia ter um
pouco de alívio.

— Ou arruinar um casamento.

Virando-se para mim, ele olha nos meus olhos e coloca a


mão sobre meu ombro.

— Você acaba de salvar o meu rabo. Obrigado, cara. Isso


é coisa de um verdadeiro amigo.

Só que eu não me sentia como uma amiga. A decepção


atravessa até minha alma e sinto-me como a maior fraude da
história.

Um verdadeiro amigo simplesmente ia querer que ele


fosse feliz. Nesse momento juro a mim mesma que vou ajudá-
lo a encontrar uma mulher antes do final da noite, mesmo
que isso seja a última coisa que eu faça. E tudo bem se
depois eu chorar até dormir. Mereço isso. Asher, por outro
lado, merece o contato humano que tanto deseja.
PARTE I

ASHER
Bom, isto fede. A noite começou muito bem e
rapidamente caiu para o inferno. Tudo porque estive
pensando com meu pau estúpido.

Estou praticamente sóbrio de novo quando termino de


tomar a última das garrafas de água que pedi. A meu lado,
Remy está pensativo. Não tinha falado muito desde que
tentou se desculpar por salvar meu rabo, apenas sentou-se
de costas para o bar, olhando a multidão.

Acho que ele entendeu o estado de ânimo em que eu me


encontrava, então só o ignorei por um tempo. Mas agora é o
momento de fazer alguma coisa, então bato com a garrafa
vazia no balcão a minha frente para chamar atenção.

Não vejo Holden e Gally há bastante tempo, mas tudo


bem, realmente só quero me despedir de Sticks.

— Acho que vou embora.

Ele me olha, alarmado.

— O quê? Não. Para onde?


— Para casa. — Desço do banquinho, passando as mãos
pelos bolsos para verificar se estou com a carteira e as
chaves. — Só estou... indo para casa.

— Por quê? — Sticks balança a cabeça, confuso,


levantando-se também. — Você vai se render? E... sua
necessidade?

Suspiro, sentindo-me um idiota por ter confessado isso.

— Estou bem. Está tudo bem. Tenho uma mão e ela


conhece bem o meu pau.

Essa resposta pareceu deixá-lo perplexo.

— Olhe. — Suspiro, decidindo ser realista — Tenho a


sensação de que... O incomodaria se eu fosse para casa com
uma mulher esta noite. E você é meu amigo. Não quero
desfilar com uma garota na sua frente.

Pronto, falei.

E ele tem uma reação inesperada. Remy dá um passo


para trás boquiaberto, olhando-me com os olhos arregalados
e balançando a cabeça.

— Perdão? O que você quer dizer com “me incomodar”?

Ele parece tão ofendido que imediatamente me dou


conta que estraguei tudo.

— Merda. — Levanto as mãos, tentando me desculpar.


— Não deveria ter dito nada. Parecia muito menos arrogante
na minha cabeça.

— Incrível. — Murmura ele surpreso. É quase como se o


tivesse chamado de mentiroso e trapaceiro. — Realmente
acha que desejo você, não? Bom, azar, cara. Não ligo se você
levar dez mulheres para sua casa esta noite. Foda a quem
quiser. Não estou nem aí.

Quando ele começa a afastar-se, eu o seguro pelo braço.

— Espere. Merda. Eu lamento. Sério, Rem. — Levanto as


mãos de novo. — Sinto muito. Eu não... fui um idiota.

Remy me olha fixamente por cinco segundos antes de


murmurar algo em espanhol e esfregar o rosto. Depois, baixa
as mãos e me dá um olhar cansado.

— Droga..., mas você tem razão, teria me incomodado.


— Admite ele a contragosto.

Remy levanta a cabeça, parecendo tão culpado e


arrependido que quero tranquilizá-lo. Até estendo a mão
para colocar em seu ombro, mas paro na metade porque não
quero enviar um sinal equivocado.

— Eu desconfiava. — Suspiro.

— Mas a coisa é. — Continua ele, finalmente levantando


os olhos — Não importa o quanto eu o deseje e perceba que é
muita consideração da sua parte preocupar-se com os meus
sentimentos, você também é meu amigo Asher e quero que
seja feliz. Por isso não espero que você vire um monge
miserável, ainda mais por minha culpa. Eu estou bem.

Balanço a cabeça, olhando-o de perto.

— Muito bem, então daqui para frente... serei discreto.


— Digo, depois de ter certeza que ele está realmente bem.

Remy faz uma careta.


— Na realidade... prefiro saber.

— É?

— Se você não falar, vou enlouquecer me perguntando.


— Responde ele, encolhendo os ombros tristemente. — Cada
vez que você sorrir ou eventualmente parecer feliz, vou
pensar que é porque transou. Vou ficar me estressando e os
piores cenários possíveis vão passar pela minha cabeça. Mas
se eu souber... bom, então eu sei, vou lutar contra isso e
superar.

— Bom, faz sentido. Então, não vou esconder.

— Obrigado. — Responde Remy, fazendo um gesto de


agradecimento.

— Então... como vamos fazer para isto funcionar?


Realmente não quero causar nenhum mal-estar entre a
gente.

Remy começa a rir e sacode a cabeça.

— Não tenho idéia. Talvez, você não deva colocar a


língua na garganta de uma menina na minha frente. Isso
seria legal.

— Nunca fiz isso.

— Então, não vai ter nenhum problema. Posso aprovar


ou descartar se a menina for horrível?

Solto uma gargalhada.

— O que você acha de encontrar alguém para mim que


eu goste?
— Não. Sinto muito. — Ele faz uma careta. — Isso seria
impossível. Duvido que eu possa encontrar uma mulher que
considere suficientemente boa para você.

Eu suspiro e balanço a cabeça. Não tenho certeza de


que alguém não seja “suficientemente boa” para mim, afinal
não sou capaz de encontrar uma menina que realmente
queira ficar comigo por mais de uma noite. Mas não quero
pensar nisso agora.

Dou uma olhada no meu amigo.

— Você sabe que esta é a conversa mais estranha que já


tive com um cara, não é?

— Bem, você está me contando... não posso acreditar


que admiti em voz alta que sinto alguma coisa por você.

Dou de ombros, sem saber como responder. Tudo isto


está fora da minha zona de conforto, mas por alguma razão
saber que Remy gosta de mim não é um problema. Talvez,
porque ele não vem forte ou realmente espera que eu
corresponda.

E porque ele está sendo legal e relaxado, falando com


leveza sobre seus sentimentos, acabamos rindo em vez de nos
sentirmos incomodados.

— Honestamente, cara. Você me lisonjeia.

Remy dá um tapa no meu braço.

— Cale a boca. É embaraçoso.

— Não é tão ruim. — Respondo rindo.


— Ok. Agora vai ter que contar algo embaraçoso a
respeito de você.

— Inferno, claro que não. — Ele franze a testa e eu me


rendo. — Bem... O nome que estava na minha certidão de
nascimento era Ashley.

No começo ele parece não entender.

— Não acredito.

— Oh... Sim. Minha mãe decidiu que eu era uma


menina e me deu o nome de Ashley Jean e ainda legalizou
tudo antes que meu pai descobrisse. Ele ficou tão irritado...
se recusou a me chamar assim, por isso com o tempo virou
Asher. E, então, quando estive sob a custódia do meu tio, ele
ajudou-me a mudar de nome legalmente.

Remy fica boquiaberto.

— Santa merda, ela realmente queria chamá-lo de


Ashley. E não para homenagear o Ashley Wilkes de “...E o
vento levou”, mas porque queria que fosse uma menina?

— Sim. E suspeito que teria me criado como menina,


com vestidos rosas de babados, se meu pai deixasse.

— Dios mío! Isso é....

Ele nega com a cabeça, parecendo aturdido.

— Estranho. Sim, eu sei. Mas pode continuar. Ria,


idiota.

Ele ri, mas mexe as mãos ao mesmo tempo.


— Não. Na verdade, é um pouco triste. — Murmura,
suspirando. — E eu cresci chateado porque tinha um nome
de menino.

Franzo a testa sem entender.

— Huh?

Ele vai falar e de repente fica com uma expressão


estranha.

— Eu só... você sabe, por ser gay... — Gagueja, depois


de alguns segundos — poderiam ter escolhido um nome mais
comum e que eu pudesse ter um apelido como Alex ou...

— Remy pode ser usado indistintamente. — Argumento.


— Na realidade, Remy para uma garota seria bastante
adequado.

— Você acha? — Pergunta ele com um tom de voz


melancólico.

Quando franzo o cenho, ele rapidamente limpa a


garganta.

— Então, sobre esta garota que vamos encontrar para


você está noite... — Continua esfregando as mãos e
observando a multidão a procura de possíveis alvos.

— Não, vamos deixar quieto esta noite. Além disso,


estou morrendo de fome. Em vez disso, vamos conseguir algo
para comer.

Remy pisca, como se nunca tivesse ouvido falar nisso.

— Comida?
— Taco Bell39. Só há um lugar para ir depois de uma
noite bebendo. Yo quiero un Taco Bell — Cantarolo o jingle
do restaurante.

— Não. — Diz ele, franzindo o nariz e sacudindo a


cabeça. — Não, não, não. Não quero Taco Bell. A única
comida mexicana que eu como é a do Castañeda’s.

Lembro do chimichanga que comi e passo a mão no


estômago. Isso parece bom, mas...

— Suponho que não ficam abertos até tarde.

Ele nega com a cabeça.

— Mas eu poderia ligar para o meu primo Big T e pedir


para ele ligar a grelha. Faz as melhores torradas de tinga40.
Oh, ou torresmo, se você quiser for um aperitivo frio.

— Nah. Não o incomode. Vamos encontrar uma cafeteria


24 horas ou algo assim.

Meia hora mais tarde, estamos sentados jantando, um


em frente ao outro comendo toucinho, ovos, bolachas e
molho.

— Fomos bem esta noite, não é? — Diz Remy, limpando


os farelos dos cantos da boca com o polegar. — Acho que
melhor do que em Chicago.

39
Taco Bell é uma rede de restaurantes de fast-food, inspirada pela culinária mexicana.
40
Tinga é um prato mexicano típico feito com carne moída, tomate, cebola, alho e uma
variedade de molho de pimenta.
— Sim.

Sem dúvida nos aprimoramos e aprendemos a tocar


melhor como grupo, mas a palavra Chicago me lembra outra
coisa.

— Ouça. — Exclamo, estalando os dedos. — Esqueci de


contar, mas vi a garota do chuveiro no Granada.

Remy abaixa garfo.

— Garota do chuveiro? — Pergunta lentamente.

Reviro os olhos porque, na realidade, a quem mais eu


poderia estar me referindo?

— A mulher que encontrei no chuveiro em Chicago... no


hotel. — Adiciono, quando ele continua me olhando como se
não tivesse nem ideia do que eu estou dizendo.

— E ela estava... No Granada? Esta noite? — Quando


assenti, ele entrecerra os olhos. — Tem certeza?

— Cem por cento. Era ela, as mesmas mechas roxas no


cabelo e tudo.

— Isso... isso... — Ele balança a cabeça e me dá um


sorriso malicioso. — Isso é um pouco difícil de acreditar,
cara. A mesma garota em Chicago e aqui, em Ellamore?

Ele tem razão, parece um pouco fora de propósito.


Mordo o lábio inferior, certo de que era ela, mas, ainda assim,
duvidando de mim mesmo.

— Você não acha que estou ficando louco, não é? Quero


dizer, não tenho feito muito sexo e ultimamente me masturbo
muito... será que estou começando a delirar? Oh, merda. —
Encosto-me na cadeira, aturdido. — E se essa menina nem
esteve no quarto? E se ela não existir e está obsessão for pior
do que a que eu tinha pela garota com a camiseta do Incubus
e no final eu acabar em um canto babando e me balançando
porque fiquei louco?

— Uh...

Evidentemente sem saber o que dizer, Remy abre e fecha


a boca algumas vezes, mas não sai nada.

— Não importa. — Murmuro, para que ele saiba que não


precisa dizer nada. — Provavelmente você tem razão. Não
deve ser a mesma menina. Eu somente queria que fosse
porque, você sabe, havia química quando a vi em Chicago.

— Química? — Pergunta Remy, levantando as


sobrancelhas interessado. — Oh, sério? Conta aí.

Suspiro e reviro os olhos.

— Cale-se, filho da puta. Prefiro falar a respeito das


suas obsessões do que das minhas.

— Ah, mas já sabemos quem é minha atual obsessão,


não é?

Respiro fundo, lembrando que sou eu. Merda. Não quero


ir lá novamente. Abro a boca para me desculpar, mas ele
balança a mão.

— Além disso, é notícia velha. — Continua Remy. —


Vamos voltar a você. Esta menina do chuveiro, seja honesto,
é mais ou menos a mesma química que sentiu pela garota
com a camiseta do Incubus?
Abro a boca para responder e me dou conta de que não
sei o que dizer.

— Não tenho certeza. Estranho... os dois encontros


foram... diferentes mas tiveram a mesma intensidade. Faz
sentido?

— Na realidade, não.

— Sabe... agora que você mencionou a menina da


camiseta Incubus, começo a achar que elas se parecem
muito. Mesma altura, cabelo comprido e escuro, um olhar
latino determinado. Lamento nunca a ter visto de perto.

Remy dá uma batida na mesa, como se acabasse de ter


uma ideia.

— Podem ser a mesma garota.

Eu bufo.

— Claro... Porque ela apareceu no Forbidden, no


Granada e em Chicago nas mesmas noites que eu estive lá.
Isso é totalmente possível... — Digo, revirando os olhos
ironicamente.

— É... Pouco possível. — Concorda Remy.

Sorrio e nego com a cabeça.

— Sim, misture as duas em uma garota roqueira punk e


teremos a mulher dos meus sonhos... Boom.

Ele endireita o corpo na cadeira.

— Garota roqueira punk? Quem é a garota roqueira


punk?
Merda. Minha boca fala demais.

— Ninguém. Somente... uma garota que fez o teste para


baterista um dia antes de você aparecer.

— Pensei que somente uma garota... tinha feito o teste


— Diz ele, apoiando o queixo nas mãos.

— Sim... e tinha uma aparência punk, usava uma


peruca de pontas brancas como Tina Turner e umas roupas
rasgadas...

Quando me dou conta onde eu posso chegar com essa


confissão, paro e levanto uma mão.

— Sabe, vou parar por aqui. Vou parar de pensar em


sexo, de falar em sexo e mulheres e..... toda essa merda.
Vamos para a minha casa matar alguns zumbis futuristas...
O que você acha?

Remy abre a boca e em seguida sacode a cabeça.

— Não sei, já é tarde. E alguns de nós não temos


insônia. Sou uma dessas raças estranhas que precisam de
mais de duas horas de sono por noite, por isso... vou para
casa dormir.

A decepção me bate fortemente. Não quero ir para casa


sozinho, mas concordo e forço um sorriso.

— Ok, perdedor, vou treinar em casa para chutar o seu


rabo na próxima vez que jogarmos.

Ele bufa.
— Pode ir sonhando filho da puta. Acho mais fácil se
você simplesmente enfrentar os fatos. Nunca vai me ganhar
porque sou uma lenda.

PARTE II

Quando chego em casa me sinto mais sozinho do que o


habitual.

Deixo Mozart sair para brincar, mas ele corre e se


esconde em baixo da cama. É uma péssima companhia...

Começo praticar a letra da música nova enquanto limpo


as gaiolas e finalmente pego no sono perto das cinco da
manhã.

Pick me liga as oito.

— Tenho outra casa para visitar esta manhã. Você vem?

Bocejando, sento e passo os dedos pelo cabelo.

— Sim, claro. Mas pensei que você fosse começar a fazer


as visitas com a Eva.

— Ela se nega. Mas quer que eu dê uma olhada nesta


última casa. Então... pego você às dez?

— Ok.

Desligo e arrasto minha bunda da cama. Mozart bate na


gaiola me lembrando que tenho que alimentá-lo, mas assim
que coloco um pouco de brócolis ele simplesmente me olha,
dando a entender que não estava nem um pouco a fim de
comer aquele lixo saudável. Então, suspiro e dou alguns dos
meus salgadinhos de milho velhos, que ele devora
rapidamente.

Quando Pick chega, já estou na porta esperando-o.

— Seu pai deu alguma notícia? — Pergunta, no


momento que entro no carro.

— Jesus, você é tão chato quanto Sticks. — Resmungo.

— Sticks? — Ele levanta uma sobrancelha. — Por quê?

Conto do encontro com meu pai em Chicago e como


Remy o tinha ameaçado com gás de pimenta e um apito.

Pick joga a cabeça para trás e ri.

— Eu gosto desse menino. Mantenha-o por perto.

Encolho os ombros, porém não conto sobre a mangueira


de combustível cortada e a teoria de Remy a respeito disso.
Consertei a moto no dia seguinte, não havia razão para
preocupá-lo.

— Então, para que bairro elegante nos dirigimos hoje?

Pick estreita os olhos na minha direção por debochar do


seu possível novo endereço.

— Glendale.

Faço um sinal de positivo. Não é tão luxuoso como o


último bairro que visitamos, ainda assim é uma área decente
e adequada para famílias.
— A tia e tio da Tinker bell e os pais da Reese, moram
ali.

— Ahh. — Murmuro. — Legal.

Desta vez, assim que chegamos fomos logo falar com a


agente imobiliária.

— Podemos ver o pátio?

Ela nos conduz pela casa em direção a uma porta de


correr de vidro.

— Então, quando é o casamento afinal? — Pergunto a


Pick.

— No domingo da próxima semana.

Fico imóvel enquanto Pick avança para o meio do jardim


e vira-se lentamente.

— Você disse no domingo da próxima semana? —


Repito, certo de que não ouvi direito. — Porque isso é em...

— Onze dias. Sim, eu sei.

— Merda, cara. Qual é a pressa?

Ele encolhe os ombros.

— Simplesmente, decidimos que não queríamos esperar


mais. Vamos fazer tudo no Forbidden então... não precisa de
muita decoração ou planejamento. A festa vai ser pequena, só
para quem trabalha no clube, suas famílias e talvez a tia e o
tio da Tinker bell. Isso me lembra... — Finalmente ele olha na
minha direção — Já que você vai ser o padrinho, vou ter que
encontrar um DJ para a recepção?
— Não. Posso pedir ao Remy, ele sabe mexer em tudo e
tenho certeza de que não vai se negar.

— Genial. — Diz Pick distraído, olhando uma enorme e


velha árvore no canto do pátio.

Coloco a mão por cima do ombro dele, fazendo um gesto


para a casa.

— Vamos voltar então?

Mas meu irmão permanece ali, olhando a árvore e


depois em volta como se procurasse algo.

— Merda. É.... é este o lugar? — Pergunto, apontando


para a terra, de repente me sentindo como se estivesse de pé
na grama sagrada.

— Não sei. — Murmura Pick, passando a mão pelo rosto


e em seguida fazendo um gesto para a cerca que separava o
pátio dos vizinhos. — Parece... diferente. Esta cerca era
branca e havia uma pequena árvore... bem ali. E um enorme
balanço com um canteiro de tulipas roxas e amarelas ao lado.

Abro um grande sorriso e dou um tapa carinhoso no


ombro dele.

— Bem, parece que você tem alguma pintura a fazer e


também serviço de jardinagem e construção porque,
parabéns irmão mais velho, acaba de encontrar a casa dos
seus sonhos.

— Merda. Eu consegui. — Diz ele, com um aspecto


aturdido e sem palavras, passando as mãos pelo cabelo e
olhando boquiaberto ao redor do pátio. Então, olha na minha
direção. — Não sei como plantar uma puta árvore.

Tenho que rir.

— Bem, acho que vai ter que aprender. Venha. Vamos


ver o interior. Quantos quartos têm? Será que tem um para
quando o tio Asher aparecer de vez em quando?

— Eu não sei. — A voz de Pick parece oca e ele


permanece parado no centro do pátio. — Não perguntei
quantos quartos tinha.

Quando percebo que ainda está muito transtornado


para caminhar, seguro-o pelo braço e o arrasto até a porta. —
Vamos, velho. Vamos ver como é o dormitório principal,
aquele que você vai fazer amor com sua esposa pelo resto da
vida.

Isso o faz se mover. Analisamos minuciosamente cada


quarto e em cada um que entrávamos, o sorriso dele ficava
maior, como se não pudesse acreditar na sua boa sorte. Fez
pequenos comentários sobre qual seria o quarto de Julian, de
Skylar e de Chloe. Não tenho nem ideia de quem é Chloe, mas
realmente não preciso saber porque o crescente entusiasmo
do meu irmão é impressionante.

Ele tem um futuro, uma família e agora o lar perfeito.


Estou feliz por ele... e extremamente ciumento. Não tenho
vontade de voltar para o meu apartamento, não vou trabalhar
esta noite e a banda não tem ensaio. É como se eu não
tivesse nada.
Depois que Pick me deixa em casa, corro pelas escadas
para o meu porão e mando uma mensagem a Remy, para ver
se ele quer comer algo comigo. É quase meio-dia e eu não
tomei café da manhã, meu estômago está grunhindo. Parece
o plano perfeito. Mas ele responde dizendo que precisa
trabalhar, então o chamo de perdedor e jogo o telefone na
mesa de centro.

Sento no sofá para ver televisão, mas realmente não


estou com ânimo. Não quero nem jogar Call of Duty, porque
foi muito mais divertido quando joguei com Sticks.

Urgh. Preciso de uma vida.

Deito a cabeça para trás, e fico olhando o teto, até que


meu estômago grunhe de novo. E como não estou com humor
para preparar minha própria comida, resolvo que agora é um
bom momento para conhecer o restaurante da família do
Remy. Castañeda's, se não me engano.

Levanto-me novamente, pego o telefone, a carteira e as


chaves e saio pela porta.
REMY
— Elisa!

Estou parada, com as mãos enterraras em um recipiente


cheio de farinha quando a voz do tio Alonso me traz de volta à
realidade, fazendo com que eu me vire rapidamente.

— Sinto muito. — Desculpo-me, antes mesmo de ser


criticada por qualquer razão que ele estava a ponto de me
criticar desta vez. — Vou colocar a massa no forno em cinco
minutos.

Desde que recebi a mensagem de Asher estou distraída.


Ele pareceu solitário. Não tenho nem ideia de como posso ter
percebido isso através de uma mensagem, mas ainda assim
estou me sentindo culpada por não ter saído com ele e por ter
que recusar sua oferta para passar um tempo ontem à noite e
por mentir e estar me apaixonando e....

Droga, só estou me sentindo extremamente culpada, ok?

Mas tudo ficaria pior se tivesse ido para casa dele ontem
à noite. Preciso me distanciar, estou sentindo muitas coisas e
fica difícil lidar com ele por perto.

— Não precisa. — Diz meu tio, chamando-me com a mão


— Ou melhor, sim, a massa tem que ir para o forno, mas
preciso de você para algo mais.
Quando franzo a testa, confusa, ele solta um suspiro.

— Juan e Diego não podem vir hoje.

Balanço a cabeça, sem entender o que eu tenho a ver


com isso.

Os dois irmãos mais novos da minha mãe, Diego e Juan,


só vêm uma vez por semana, às quartas-feiras, para tocar ao
vivo com Big T e Luis, o filho de Diego, no grupo de
Mariachis.

Eles vão de mesa em mesa cantar para os clientes


enquanto o tio Diego e Big T tocam violão, tio Juan a gaita e
Luis balança as maracas.

Batendo palmas com impaciência, tio Alonso sinaliza


que o siga.

— Vamos. Precisamos de entretenimento ao vivo. É


quarta-feira e as pessoas estão esperando pela música.

Fico boquiaberta, emocionada, jamais pensei que ele


fosse me pedir isso.

— E quer que eu toque violão? Ou gaita? — Pergunto,


porque domino os dois instrumentos.

Mas meu tio franze a testa.

— Não, não. Você canta, a sua voz é linda. Tomas pode


acompanhá-la com o violão.

Meus ombros caem. É claro que ele quer que eu cante...


e o mais provável é que deseje algo como "Ave Maria" ou
"Don’t Cry for me, Argentina", alguma coisa comovente e
deprimente.
Ele nunca me deixou tocar nenhum instrumento, o
homem é tão terrivelmente tradicional, que acredita que as
mulheres não podem tocar em um grupo Mariachi, somente
cantar. Huh. Não é que eu odeie cantar, só detesto sua
perspectiva da vida, às vezes.

— Vamos. — Diz ele novamente, batendo palmas como


se estivesse chamando um cão.

Suspiro e viro-me para a mesa.

— Mas, e os pães?

Meu tio avalia meu trabalho por um segundo antes de


me chamar com um gesto outra vez.

— Traga com você. Pode terminar de preparar na mesa


de trabalho da frente. Vai ser como um programa de música e
culinária ao vivo.

Soltando outro suspiro pego o recipiente, uma bandeja


de forno, e algumas outras coisas que posso precisar e o sigo
para fora da cozinha, com o avental coberto de farinha e uma
rede no cabelo.

A sala de jantar está agitada e repleta de gente, mas


ninguém presta atenção em mim ou em meu tio enquanto o
sigo até a mesa de trabalho, onde ele afasta um vaso e
começo a limpar a superfície para eu usá-la.

Estou de pé atrás dele, segurando os utensílios contra o


peito e esperando como uma boa garota, quando alguém
aparece atrás de mim.
— Sabia que ele ia convencer você a cantar. — Murmura
meu primo no meu ouvido.

— Cale-se. — Digo, olhando por cima do ombro e dando


uma leve cotovelada no estômago de Big T.

Sorrio ao ouvir um grunhido.

— Prima, você é má.

Meu sorriso aumenta um pouco mais.

— Então, o que vamos tocar? “Cielito lindo"? — Pergunta


ele, mordendo o lábio inferior.

— Não... alguma coisa diferente.

Sinto o telefone vibrar no meu traseiro, avisando que


chegou uma nova mensagem. Como de costume, pego o
celular para ver quem está falando comigo.

Asher!

Asher: Santa merda! A encontrei.

De quem ele está falando? Começo a digitar para saber


quem ele encontrou quando entra outra mensagem.

Asher: Como se chama a garota que...?

— Elisa! — Grita tio Alonso, dando-me um grande susto.


Levanto os olhos antes terminar de ler e vejo meu tio
indicando que tudo está preparado. Guardo o celular no
momento que ele vibra com uma terceira mensagem, respiro
fundo e concentro-me em arrumar os ingredientes enquanto
Big T se posiciona atrás de mim, um pouquinho à esquerda.
Alguns clientes olham na nossa direção, comendo e
conversando, provavelmente percebendo que eu estava a
ponto de fazer alguma coisa para entretê-los.

— Prima? — Diz Big T, justamente quando o telefone


vibra no meu traseiro pela quarta vez.

Ele quer saber o que vou cantar. Sei que tio Alonso
espera que eu cante somente em espanhol, mas decido fazer
um pequeno mix dos dois idiomas.

— “Qué Será Será” — Respondo, porque Doris Day era


uma das cantoras favoritas da minha mãe, antes que ela
ficasse doente.

Segundos depois o violão começa e em algumas mesas


próximas as pessoas param de comer para nos observar. Mas
é somente quando termina a introdução e começo a cantar
que temos a atenção de todo o mundo.

Ignoro o público e ajo como se estivesse completamente


concentrada no meu trabalho de salpicar farinha na mesa.
Assim que uma fina camada cobre a madeira pego a massa e
o rolo.

Mais pessoas param suas conversas para me observar.


Continuo fingindo que não estou prestando atenção e, de
propósito, sujo o rosto com farinha ao afastar uma mecha de
cabelo que escapou da toca. Quando levanto o rolo para virar
a massa estou chegando ao refrão da música e no auge da
voz e, juro, todos no restaurante deixam de fazer o que estão
fazendo só para me ouvir. É quase eletrizante. Sim, tocar
bateria é minha alma e coração, mas neste instante posso
entender por que Asher ama cantar músicas verdadeiramente
poderosas, que exigem toda a sua potência vocal. Isso faz
com que a gente se sinta muito bem.

Foco em algum lugar profundo dentro de mim enquanto


sinto a melodia do violão fluir pelas mãos do meu primo,
então o som da minha voz alcança o ponto culminante e a
última nota é ouvida por todo o restaurante silencioso.

Ficando de frente para todos os assobios, aplausos e


gritos, pisco e sorrio para a minha audiência... até ver um par
de olhos verdes intensos me observando de uma mesa no
canto.

Ai, merda. Asher está aqui.

Congelada, só consigo olhar enquanto ele, boquiaberto,


levanta-se de onde está sentado sozinho e dá um passo na
minha direção.

Meu coração cai e aterrissa no estômago. Deus, ele está


vindo falar comigo. Que diabos eu vou fazer?

— Muito bem, Elisa. — Diz tio Alonso, dando-me um


tapinha no ombro quando passa perto de mim.

Seu elogio me tira da “rigidez pós morte” e o encaro,


surpresa. Em seguida ele aponta para a mesa e me manda
levar os pães para minha prima Frida, na cozinha. Respondo
que vou em um segundo e dou uma olhada para Asher, que
continua se aproximando.

Quando ele para, como se não soubesse o que fazer, eu


pego a bandeja, dou meia volta e aproveito para fugir. Assim
que estou atrás da porta de vaivém olho por uma das janelas
circulares e o vejo de pé, observando o lugar por onde eu
tinha desaparecido. Assim que me vê espiando, um sorriso
aparece em seu rosto e ele me cumprimenta com a mão.
Deus. Esse sorriso. Esse sorriso que diz "sei que você me viu
e lembra de mim", provoca tantas coisas que eu nem posso
dizer.

Não posso encontrá-lo novamente estando “de mulher”,


não tenho certeza se posso resistir. E preciso resistir, porque
mentir e fingir que sou homem já é bem ruim, mas ir para a
cama com ele como mulher enquanto continuo mentindo e
fingindo ser um homem nas outras ocasiões, é muito pior.

O que quer que aconteça, não posso voltar a me


encontrar com ele estando de mulher. Não, a menos que
conte a verdade.

Consigo evitá-lo no restaurante. Fico tanto tempo na


fritadeira que quando meu tio pede que eu volte para outra
canção, ele já não está mais lá e posso me apresentar com
tranquilidade para os clientes.
Mas Asher já sabe onde trabalho e isso pode ser um
desastre. Preciso fazer alguns sérios acertos para impedir que
ele volte a me ver vestida de mulher.

Quando termino meu turno e vou ligar para ele, vejo as


mensagens

Asher: Santa merda! Encontrei-a.

Asher: Como se chama a garota que trabalha no


restaurante da sua família? Aquela que tem mechas roxas no
cabelo?

Asher: Não importa. Acabo de descobrir.

Franzo a testa tentando lembrar se alguém me chamou


de Remy, mas em seguida me dou conta... Tio Alonso me
chamou de Elisa. Várias vezes.

Asher: Ligue assim que sair do trabalho.

Soltando um suspiro toco no número dele, insegura a


respeito do que dizer, mas determinada a despistá-lo de...
Bom, de mim. Sim, mal posso acreditar que vou fazer isso.

— Oi. — Diz Asher e, juro, o ânimo e o sorriso em sua


voz iluminam meu interior.
— Oi. — Murmuro, ainda insegura, pois sei que vai
perguntar por ela... quer dizer, por mim. Vai perguntar por
mim.

— Então, já sei com quem você pode me conseguir um


encontro.

— Hmm? — Minha garganta seca imediatamente, mas


me faço de boba. — O quê?

— Com a garota do Castañeda's, o restaurante da sua


família. Elisa, certo?

Ai, merda. Ele acreditou que meu nome é Elisa.

— Elisa? — Digo lentamente.

Sério. Comigo? Queria um encontro comigo? Por uma


fração de segundo sonho acordada. Posso usar minha voz de
señorita sensual, fingir que sou alguém chamada Elisa e por
fim poderei tocar Asher Hart do modo que estou querendo há
muito tempo.

Mas logo a realidade se interpõe. Não, não posso fazer


isso. De maneira nenhuma. É que... não vou fazer.

— Você não vai acreditar, ela é a garota do chuveiro. De


Chicago.

Fico com as palavras presas na garganta. Que diabos


vou dizer agora?

— Ah, sim? — Gaguejo.

— Sim e é da sua família, certo? Você disse que todos


que trabalhavam ali eram da família. Ela é sua prima ou algo
assim?
— Claro — respondo, sem saber o que mais posso dizer.

Ele solta uma risada.

— Você não parece muito seguro.

Encolho os ombros e faço um gesto com a mão.

— Bem, você sabe... as árvores genealógicas mexicanas


são complicadas.

— Ahh. — Murmura, como se entendesse, embora eu


estivesse sendo mais confusa do que qualquer outra coisa. —
Então, realmente não sabe o que ela fazia em Chicago, no
nosso quarto de hotel?

— Pois é.... contei que ia estar em Chicago naquele fim


de semana porque ela também estaria e provavelmente disse
o nome do hotel, mas não pensei que fosse passar para me
ver. Talvez, quando fui tomar o café da manhã com você,
tenha deixado a porta aberta e ela chegou naquele momento
para me visitar e.... precisava usar o chuveiro. Vou ter que
perguntar...

— Sim... faça isso. E... Por que não lembrou de quem eu


falava quando mencionei as mechas roxas, já que obviamente
você sabia que ela estava na cidade?

Merda, Asher, pare de me obrigar a inventar mais


mentiras.

— São roxas? — Pergunto, rindo. — Achei que eram


cinzas. Big T sempre me chateia dizendo que parecem cinzas
em vez de roxas.
— Não. — Soa a voz de Asher no meu ouvido. — São
roxas, bem claras.

Quase agradeço, feliz por minhas mechas não


parecerem cinzas.

— Acha que pode fazer isso? — Pressiona ele.

Pisco confusa e balanço a cabeça.

— Fazer o quê?

— Conseguir um encontro com ela?

Asher parece tão ansioso... por me conhecer. A mim!


Uma incrível dose de adrenalina me atravessa e de um
momento para o outro me sinto mais viva do que nunca. Ele
me deseja. A minha versão feminina. Quero gritar e dançar e
abraçar a todo mundo.

Mas então... a realidade se interpõe.

— Não... Desculpa, não posso. — Digo, a decepção


aparente na minha voz.

Silêncio. Ele não esperava essa resposta, pensou que eu


o ajudaria.

— Por causa dos seus sentimentos por mim ou por que


é sua prima? — Pergunta e eu posso ouvir a dor na sua voz

— Não, não. Não tem nada a ver com.... nenhuma


dessas questões. — Asseguro-lhe rapidamente.

Fico sem palavras, tentando pensar em uma resposta


que possa agradá-lo.

— Ela tem namorado?


— Não.

Merda. Sim! Deveria ter dito que sim, isso o teria


conformado. Droga, por que sou tão burra?

— Então...?

— Você não quer sair com ela. — Solto, sem saber mais
o que dizer.

Asher ri.

— Sim, sim, quero sair com ela. Acabei de dizer.

— Não... — Balanço a cabeça, embora ele não possa me


ver. — Não quer.

— Por quê?

— Porque...

— Sim, Remy, por quê?

— Porque você não a conhece.

Outra vez ele ri, mas desta vez sem humor.

— Por isso quero conhecê-la. Para ver como as coisas


fluem.

Mas continuo sacudindo a cabeça.

— Não.

Finalmente, a irritação aparece na sua voz.

— Mas que diabos você pensa que eu faria? Sei que é


sua família e que certamente quer protegê-la, mas achei que
fôssemos amigos o bastante para que saiba que eu nunca...
— Não é isso. — Interrompo-o. — Não se trata de nada
disso.

— Então o que é?

Asher parece tão... encolho ombros, me sentindo uma


merda.

— Talvez seja o contrário. — Digo, antes de conseguir


me deter. — Talvez, eu me preocupe que você saia
machucado. Não ela.

Porque, honestamente, eu não quero machucá-lo.

— O quê? — Pergunta ele, alguns segundos depois.

— Por favor, somente... confie em mim. — Murmuro. —


Não posso... não posso contar os detalhes, mas sei que você
não gostaria de ter um relacionamento com ela.

— Ok. — Suspira Asher.

Mas eu sei que não está ok, ele realmente quer conhecer
minha versão feminina.

Alguns minutos depois Asher diz secamente que precisa


desligar.

Eu baixo o celular, sento em uma cadeira e abraço a


mim mesma, perguntando-me como diabos ia consertar esta
confusão.
ASHER
Nunca deveria ter pedido a Remy para me apresentar a
sua prima. Não sei se ele não quis porque não confiava que
eu fosse tratá-la bem ou porque queria ficar comigo.

Ele insistiu que não era nada disso, mas alguma coisa
tinha que ser. Ele agiu como uma mulher que diz que está
bem, quando você sabe que não está. A conversa inteira
pareceu estranha, como se eu estivesse falando com uma
garota. Nunca me preocupei em ferir os sentimentos de
outros caras, muito menos com o que eles estavam sentindo.
Não havia drama, ou dava um chute no traseiro por me
incomodar ou mandava a merda. Cinco minutos depois
éramos amigos de novo.

Não é assim com Remy Curran. Não tenho certeza se é


por que ele é gay ou alguma outra coisa, mas já se passaram
três dias e a distância entre nós só aumenta. Eu tampouco
estou facilitando as coisas, continuo ofendido porque ele se
recusou a me ajudar com uma garota que eu queria muito
conhecer, mais que provavelmente qualquer outra garota, até
mesmo mais que a garota com a camiseta do Incubus e
também porque bloqueou meu pau ao me dizer que não me
queria perto dela de jeito nenhum.
Então, agora eu nem sequer posso tentar consegui-la
por mim mesmo. Sinceramente, foi um movimento de merda.
Ele sabia melhor do que ninguém que minhas intenções eram
as melhores, que eu não iria foder a garota para abandoná-la
depois. Eu realmente queria conhecê-la.

O imbecil. E se era porque me queria para ele, também


precisava sair dessa. Quero dizer, eu gosto do cara. Remy se
transformou em um dos meus melhores amigos nas poucas
semanas que nos conhecemos, mas não vou mudar de lado,
nem mesmo por ele. Eu gosto de mulher, não tem jeito.
Merda. Esse assunto inteiro me irritava muito.

Toda essa história faz com que eu queira me afastar dele


e do seu drama. Só que sinto saudades de encontrá-lo. Ele é
divertido, competitivo, tem gostos parecidos com os meus,
então sempre tínhamos muito sobre o que falar e sei que
posso confiar nele com praticamente qualquer coisa. É o
amigo perfeito, exceto a parte onde quer o meu pau, mas
posso ver além disso.

Várias vezes peguei o telefone para ligar nos últimos


dias, mas desisti porque ele também estava me evitando.

Foi embora logo depois do ensaio na quinta-feira, sem


implicar comigo como sempre. Na noite da sexta-feira no
Forbidden, onde a gente sempre passava um momento
juntos, ele alegou uma dor de cabeça e foi para casa logo
após o show terminar. Atitudes totalmente de mulherzinha.
Se eu não soubesse, juraria que era uma garota.

— Você está quieto hoje.


Desvio os olhos da janela do carro de Pick e olho para
ele. Estou cansado de estar sempre no banco do passageiro,
preciso comprar meu próprio carro para estar na direção de
vez em quando. Não sei se é a falta de sexo, mas quase posso
sentir meus testículos encolhendo até se transformarem em
ovários.

Estou tão chateado por estar sentado aqui, estressado


com um amigo e sem poder falar com uma garota, que de
repente soltar um peido bem alto e fedorento, ou arrotar, ou
qualquer outra coisa de homem, parece uma boa ideia para
provar que não estou perdendo minha masculinidade.

— Estou bem. — Murmuro, imediatamente percebendo


que acabo de fazer a linha puramente feminina de “estar
bem”. Droga!

— Preciso ficar com alguém. — Acrescento rapidamente.

Pick solta uma risadinha.

— Vendo as mulheres irem em massa para você depois


dos shows, não dá para pensar que tenha um problema com
isso.

— Sim, mas tudo o que elas querem é um cantor de


banda. Gostaria... de terminar com essa merda. Você só pode
lidar com um certo número de transas vazias e sem sentido
antes de querer...

Resolvo não completar o raciocínio. Parece aborrecido e


lamuriento até para meus próprios ouvidos e além de tudo,
dois homens não falam sobre isso.
Mas eu não só havia conversado com o Sticks sobre esse
assunto como também estou falando com Pick. Droga.

Que diabos há de errado comigo?

— Oh.... meu irmãozinho está crescendo?

Franzo a testa, sem entender muito bem o que ele quer


dizer com isso.

— Hum?

— É um sinal de maturidade masculina quando um


homem percebe que ele está preparado para deixar de ser um
mulherengo e se assentar com uma boa mulher.

Maturidade? Huh? É isso que está acontecendo? Porque


ainda me sinto como um menino inútil e idiota a maior parte
do tempo.

Porém amadurecer parece melhor do que me


transformar em uma garota.

— Você anda inquieto e nervoso, não? Sente-se solitário


e patético, porque continua rejeitando as coisas seguras que,
na verdade, não tem razão nenhuma para rejeitar, não é isso?

Merda! Como ele sabe?

A expressão de choque deve ter revelado meus


sentimentos, porque ele me dá um sorriso cúmplice.

— Já passei por isso. Só fiquei feliz quando encontrei a


minha Tinker bell.

— Idiota sortudo. — Murmuro, fazendo-o rir.

— Eu entendo, ok?
Quando ele estaciona na frente de um trailer, endireito-
me no banco e esqueço meus próprios problemas. Chegamos
a casa do meu tio, que é o único membro da família com
quem eu mantenho algum contato, embora faça três ou
quatro anos desde a última vez que o visitei... ou liguei.

Depois que minha mãe morreu e meu pai foi preso, as


autoridades entraram em contato com o lado materno da
minha família para ver se eles poderiam ficar comigo.
Ninguém ficou interessado em criar um bebê do crack, exceto
o irmão mais velho da minha mãe, Stan. E ele não era um
cara carinhoso.

Como trabalhava para uma empresa de transportes, ele


ficava fora muitos dias e o maior interesse que demonstrava
por minha vida era um “como vai? ” Cada vez que me via.

Mas nunca me bateu ou mesmo gritou comigo. Ele


somente era alguém que estava ali... às vezes. Ainda assim
sou agradecido, porque se não fosse por ele, eu seria posto
em um lar adotivo e quem sabe onde poderia terminar.

De qualquer modo, uma vez que Stan era irmão de Polly,


ele também era tio de Pick. Então, quando perguntei ao meu
irmão se queria conhecê-lo, ele disse que sim.

E é por isso que estamos aqui, hoje.

A visita ao meu tio era uma pequena surpresa. Não


liguei antes porque o cara nunca atendia o telefone, então
nem sequer me incomodei. Ele ficou ligeiramente
sobressaltado ao me ver quando abriu a porta do trailer.
— Asher? É você? Quanto tempo... finalmente ganhou
um pouco de peso, pensei que fosse ser um pau pelo resto da
vida. Bom, entra. Quem é este? — Ele observa Pick
cautelosamente antes de voltar seu olhar para mim. — Está
saindo com homens agora?

Jesus. Não. O tio Stan também...

— Não, este é Pick. Pick Ryan. Ele, uh... Bom, ele é seu
sobrinho também.

O olhar de Stan que está sobre as tatuagens e piercings


do Pick vira-se imediatamente para mim.

— Como? — Pergunta ele, com uma sobrancelha


levantada.

Eu explico que Pick é o bebê que Polly deixou no


hospital e conto como tínhamos nos encontrado.

Stan passa a mão em sua barba por fazer.

— Bom, inferno, não fiquei sabendo que esse menino


tinha sobrevivido. Pensei que Polly teve um aborto
espontâneo.

— Bem... — Encolho os ombros. — Ela não abortou.

— É um prazer conhecê-lo. — Diz Pick, estendendo a


mão.

Stan olha fixamente, como se não soubesse o que fazer,


até que finalmente pega a mão de Pick.

— Você tem o queixo dos Ruddick. — Murmura meu tio,


pensativamente.
— Viemos para ele conhecê-lo, mas também para ver se
você tem alguma informação sobre o pai de Pick. Talvez,
alguma pista... — Digo.

— Seu pai está morto. — Anuncia Stan abruptamente,


fazendo-me dar um passo para trás.

Graças a Deus, eu já havia dito isto a Pick, então não foi


nenhuma surpresa, mas, droga, meu tio não foi nem um
pouco sútil.

— Não sei o seu nome real, só que Polly o chamava de


Chaz.

— Sim. — Murmura Pick, com a decepção cintilando nos


olhos. — Asher me disse.

— Não há muito que valha a pena saber, de qualquer


maneira. Ele era um bêbado inútil. Não ia a lugar algum além
da oficina mecânica onde trabalhava, na rua Bullview.

Isso desperta a atenção de Pick.

— Você está falando da oficina mecânica do Murphy?

— Sim. — Stan estala os dedos. — Esse lugar.

A expressão mais estranha cruza o rosto do meu irmão.

— Merda. — Murmura ele, estupefato.

— O quê? — Pergunto. — O que isso tem a ver?

Pick vira-se na minha direção, mas sem realmente me


ver. A emoção faz suas pupilas dilatarem-se e a boca abrir.

— Eu trabalhei lá. — Diz ele.


Então, fomos para a oficina do Murphy. Pick me conta
que o dono dirigiu o lugar por quase quarenta anos e que
provavelmente lembraria de um empregado chamado Chaz.

Descemos do Mustang e vamos em direção a porta de


aço aberta, onde no som de um rádio, a voz de Luke Bryan
geme sobre despir-se e retornar à vida simples.

Pick dá um leve chute em um par de botas velhas que


estão saindo debaixo de um antigo caminhão Chevy.

— Murphy está por aí?

As botas se movem até que podemos ver o rosto


manchado de graxa do mecânico.

— Bem, olá. O filho pródigo retorna. Você vai voltar a


trabalhar para nós de novo, Pick?

Meu irmão simplesmente balança a cabeça.

— Só preciso conversar com o Murphy hoje.

O cara inclina a cabeça para a direita.

— Ele está no escritório.

— Obrigado, homem.

Pick caminha para lá e eu o sigo. A porta de vidro para o


escritório está aberta e, apesar do frio lá fora, um pequeno
ventilador gira lentamente, oscilando em cima de uma pilha
de papéis. O homem sentado atrás dele parece ser magro,
alto e com ombros curvados. Ele usa os óculos na ponta do
nariz enquanto lê algo em uma prancheta que tem nas mãos.

Meu irmão bate no marco da porta.

— Murphy, você tem um minuto?

O homem levanta a cabeça, as sobrancelhas cinza


arqueando-se com a surpresa.

— Olha! Se não é Pick. Entre, menino, sempre tenho um


minuto para você.

Pick se afasta para que eu entre junto e depois de me


dar uma olhada, ele vira-se para seu antigo chefe.

— Você é o dono deste lugar há muito tempo, certo?

— Quarenta anos no próximo verão. Por que esta


pergunta? Se quer comprar a oficina é só me oferecer um
preço decente e eu levarei em consideração.

— Ah! — Pick ri e balança a mão. — Não, estou muito


ocupado com o clube para brincar com carros.

Um sorriso carinhoso se estende no rosto de Murphy


enquanto reclina-se na sua cadeira.

— Você costumava amar brincar com carros, se me


lembro bem.

— Ainda amo, mas agora só com o meu. Não quero fazer


disso um negócio.

— Então, por que veio aqui se você não quer trabalhar


para mim de novo, ou comprar minha parte e também não
precisa consertar um carro? — Ele se reclina mais na cadeira
e fixa o olhar nas minhas mãos. — Quer que contrate está
coisa aí? Não parece que ele teve graxa sob as unhas um
único dia em sua vida.

— Não, ele... — Pick dá uma olhada para mim. — Este é


meu irmão. Ele está me ajudando com uma pequena busca,
preciso encontrar alguém e embora pareça mentira, nossa
pista nos trouxe aqui, até um de seus empregados há...vinte
e cinco ou vinte e seis anos atrás.

Algo estranho cintila no rosto de Murphy. Ele endireita o


corpo, de repente interessado.

— Hum?

— Sim — Diz meu irmão, esfregando as mãos nas coxas.


— Tudo o que sei é que ele era conhecido por Chaz e que foi
assassinado aqui, ou perto daqui, possivelmente por tiros.

A mão de Murphy voa para a boca enquanto olha


fixamente para Pick, com uma repentina intensidade.

— Meu Deus. — Murmura ele, piscando como se


lágrimas estivessem nublando seus olhos.

— Lembra dele? — Pergunta Pick suavemente, mas


dando um passo para frente com impaciência, porque é óbvio
que Murphy lembrava de Chaz.

Murphy limpa a garganta.

— Chaz era o diminutivo de Charles. Charles Edward


Murphy... Filho.

Olho para Pick quando ele respira fundo, mas meu


irmão está ocupado olhando fixamente para seu antigo chefe.
— Quer dizer... está me dizendo que ele era seu filho?

— Era. Porque você está perguntando sobre ele?

Pick vira-se para mim, acho que está muito atônito para
falar. Sorrio para Murphy e decido explicar o que está
acontecendo.

— Ele, uh... Bom, descobrimos que minha mãe, Polly


Ruddick, também era a mãe de Pick.

— Meu Deus! — Diz Murphy, incapaz de tirar os olhos


do Pick. — Achei que se parecia com ele. No primeiro dia em
que veio aqui procurando trabalho, podia ver tanto de Chaz
em seus olhos... provavelmente é por isso que o contratei sem
referências, mas eu... nunca teria sonhado que você fosse
aquele bebê.

— Então, você sabia... estava ciente de que minha mãe


estava grávida de...

Ele interrompe-se quando Murphy concorda.

— É claro. Eles estavam juntos, moravam na minha


garagem quando ela estava grávida. Polly entrava na cozinha
bem cedo e eu preparava um café da manhã farto e nutritivo
para você crescer saudável.

— Soube que ela deu à luz no mesmo dia?

— Sim — Diz Murphy, comovido. — Alguns dias depois


do funeral fui vê-lo. Polly já tinha ido embora, mas eles me
deixaram olhar você através de uma janela.

— E você não... tentou conseguir minha custódia? —


Pergunta meu irmão, com a voz embargada.
A culpa aparece nos olhos Murphy antes que ele afaste o
olhar.

— Merda, Pick. Tinha acabado de perder meu filho,


minha esposa havia morrido anos atrás e estava tentando
dirigir meu próprio negócio. De maneira nenhuma, eu
conseguiria cuidar de uma criança.

Murphy e eu vimos a desolação iluminar os traços de


Pick.

— Entendo, Murphy. Teria sido duro. — Diz ele, depois


de respirar fundo.

Como se acabasse de perceber seu erro, o rosto de


Murphy adquire uma expressão de súplica.

— Eles me disseram que encontrariam um lar adotivo


muito bom, com pessoas que passavam por cursos e eram
treinados para cuidar de um bebê. Pensei... que seria o
melhor para você. — Um sorriso vacilante ilumina o rosto
dele. — E, inferno, olhe para você agora. Saiu-se
perfeitamente bem.

— Sim, perfeitamente.

Chuto uma mancha no piso, quase mordendo a língua,


porque quero contar ao Murphy que Pick não ficou bem...
não por muitos anos. Mas deduzo que Pick não quer que ele
saiba, ou teria dito alguma coisa.

Não posso interferir.

— Se serve de consolo. — Continua Murphy. — Sua mãe


amava-o desesperadamente.
Levanto os olhos e vejo o sorriso carinhoso no rosto do
homem mais velho.

— Ela era jovem, merda, ambos eram muito jovens, mas


ela em especial. E mesmo assim... nada importava. Ela só
falava e sonhava com o dia da sua chegada. Ela teria sido
uma mãe maravilhosa se Chaz não houvesse... — Murphy
limpa a garganta. — Eles iam chamar você de Dugger.

— Dugger? — Murmura Pick, olhando-me com uma leve


expressão de dor. — Dugger Murphy.

— Lindo. — Digo, levantando os dois polegares e me


abstendo de contar o nome que nossa mãe me deu.

Pick me mostra o dedo do meio antes de virar-se de novo


para seu avô. E enquanto estou rindo tento não deixar a
inveja amarga aparecer, embora ela esteja se movendo dentro
de mim.

Queria tanto dizer a Pick como era bonito que nossa


mãe o tivesse amado. Porque ela nunca tinha me amado, na
verdade ela me odiava, e disse isso com frequência. Polly
desejava que eu tivesse morrido e ficou furiosa com Miller
Hart por tê-la impedido de abortar.

Ela queria seu verdadeiro bebê de volta.

Eu sempre soube que ela amava Pick, não a mim, mas


ouvir isso novamente apenas deixava a dor mais profunda.

— Acho que terminamos aqui. — Diz Pick, dando uma


batidinha em meu cotovelo antes de virar-se estoicamente
para seu antigo chefe... seu avô. — Murphy, obrigado por sua
informação. Vou... vou refletir sobre isto por algum tempo,
então, provavelmente, vou voltar para a gente conversar, se
isto estiver bem para você.

Murphy assente e um sorriso ilumina seu rosto.

— Eu gostaria muito, obrigado.

Enquanto meu irmão se afasta a passos largos,


precisando de espaço para pensar, seu avô me dá uma
olhada.

— Agora você... você tem os olhos da sua mãe. — Diz,


depois de um tempo.

Então, ele sorri carinhosamente, como se isso fosse algo


do qual eu deveria me orgulhar.

Assinto, apertando os lábios para fazê-lo acreditar que


estou sorrindo. Mas tudo o que consigo pensar é o quanto eu
tinha odiado Polly pelo fato de ter herdado seus olhos. Quase
tanto quanto ela tinha me odiado.
PARTE I

ASHER
Depois que meu irmão me deixa em casa resolvo parar
de ser covarde e inseguro. Se é maturidade o que Pick chama
isto, então eu serei maduro e vou ligar para Remy. Além
disso, quero matar uns zumbis com meu amigo de novo.

Mas assim que pego o telefone no bolso, ele toca.


Quando vejo Sticks na tela começo a sorrir.

— Ouça, perdedor. — Atendo, aliviado por falar com ele


novamente. — Estava pegando o celular para te ligar.

— Estava?

Ele parece tão surpreso que me faz rir.

— Inferno, sim. Só tenho que ir trabalhar às cinco,


então ia ligar para saber se você quer jogar Call of Duty.

— É claro. Na realidade, estou ligando porquê... tenho


algo para você.

Balanço a cabeça, embora saiba que ele não pode me


ver.

— Bom, traga seu rabo aqui, cara.

Dez minutos mais tarde, alguém bate à porta. As


pessoas poderiam pensar que eu estou esperando a visita de
uma garota sexy, porque estou um pouco ansioso para
atender. Mas não me importo.

Assim que ele chega uma sensação de alívio se instala


dentro de mim.

— Isto é para você.

Sticks me estende uma pequena embalagem marrom no


momento que entramos no apartamento. Quando arqueio
uma sobrancelha, curioso, ele sacode a embalagem com
impaciência.

— Vamos, pegue. Não é venenoso, eu juro.

Pego e desdobro a parte superior para poder olhar


dentro.

— Que diabos?

Olho com descrença e temor a caixa de preservativos


escrita com marcador preto na lateral "USE-ME, POR
FAVOR".

— E lembrei de comprar a antialérgica.

Quando levanto os olhos, incrédulo, vejo que Remy


parece muito orgulhoso de si mesmo. Ele suspira como se
estivesse aborrecido por eu não estar feliz.

— Isto demonstra que estou perfeitamente bem com


você saindo e fazendo sexo com quem quer que seja...

— Mas não com sua prima. — Acrescento, tentando não


parecer amargurado e esperando que não ter “metido o pé” e
piorado as coisas entre nós.
Eu ainda esperava que ele mudasse de opinião a
respeito de Elisa.

Ele não mudou. Claro.

Remy franze a testa por um segundo antes de encolher


os ombros.

— Com ela não.

Gostaria de ficar furioso, grunhir e discutir, mas... este


era Sticks e mesmo que o método fosse estranho, ele queria
fazer as pazes comigo. Então, eu aceitei.

— Bem... obrigado, acho. — Digo, enquanto jogo a caixa


na cama.

— Então, vamos matar merda agora? — Pergunta ele,


com os ombros relaxados e um sorriso de alívio no rosto.

— É claro.

— Então... Dugger Murphy, hein? Não vejo o Pick sendo


chamado assim.

Enquanto dou um descanso aos controles para pegar a


taça de Angry Orchard41 e tomar uns goles, Remy acaba com
a pequena invasão inimiga aproximando-se de nós.

Merda, ele é realmente bom neste jogo.

— É verdade.

Marca de cidra.
41
Largo a taça quando vejo-o entrar em um prédio com a
arma ainda no coldre.

Ele bufa e sorri para mim.

— Deus, sua mãe tinha um gosto asqueroso para


nomes.

Disparo na cabeça de um cara que estava a ponto de


eliminá-lo.

— Merda, não o vi. — Remy aperta os dentes com


frustração. — Obrigado.

Ele agradece a contragosto, o que me mostra o quanto é


competitivo e odeia perder ou pedir ajuda.

— Mmm hmm. — Murmuro com displicência.

Mas ele ainda me mostra o dedo médio e eu acabo rindo.

— Então, esse cara, o dono da oficina onde Pick


trabalhava, é o avô paterno dele? Isso é uma loucura.

— Sim, tão louco quanto eu descobrindo que meu chefe


é também meu irmão.

Não conto que estou um pouco enciumado por Pick ter


descoberto um membro da família que não o odiava
abertamente, nem estava ressentido com ele, ou
simplesmente não dava uma merda a respeito da sua vida.

Mas então me dou conta. Eu também descobri um


membro da família que é legal, não é? Tecnicamente não
estou batendo zero nesse sentido.
— Ouça, continuo esquecendo de perguntar. Você pode
ser o DJ na recepção de casamento do Pick? Vai ser no
Forbidden, no próximo domingo.

— No próximo domingo? Quer dizer em oito dias?

— Sim. Eu sempre pensei que Eva gostaria de algo


grandioso, bem planejado, mas parece que estão prontos e
não querem perder tempo. Então, o que me diz? Você é
realmente a única pessoa em quem confio para controlar o
sistema de som.

— Sou?

A voz rouca de Remy me diz que ele se sente honrado


com isso.

— Bem, certo. — Continua, depois de limpar a garganta,


soando bem menos emocional. — Não tem problema. Como
Pick está lidando com tudo?

— Com os planos do casamento? Como se eu


soubesse...

Ou me importasse.

— Não. — Diz ele, suspirando. — Com a emoção de


conhecer o tio e o avô no mesmo dia. Como ele está se
sentindo com isso?

Que pergunta estranha...

— Não tenho nem ideia, parecia estar bem. Por quê?

— Oh, Jesus. — Remy revira os olhos. — Vocês homens


héteros... Juro... estão sempre com medo de perguntar sobre
os sentimentos dos outros homens.
Agora eu estou realmente perplexo.

— O que diabos eu deveria perguntar?

— Não sei. — Sticks suspira como se me considerasse


impossível. — Perguntar se está bem, talvez. Se quer falar
sobre isso. Se...

— Tenho certeza de que Eva está se encarregando dessa


parte. Ele não precisa de mim para um abraço ou um tapinha
nas costas.

Pela extremidade do olho, vejo Remy me olhando.

— E você?

— Hum?

— E quanto a você? Não tem uma Eva com quem falar


ou para abraçá-lo.

Olho para ele incrédulo.

— Mas eu não vi meu avô hoje pela primeira vez.

Esta visita ao avô de Pick foi a confirmação do quanto


minha mãe tinha me desprezado.

— Sim, mas teve lidar com seu tio depois de não o ver
por.... Quanto tempo? E passou a manhã toda com Pick,
quando há um mês atrás cagava-se de medo.

— Cristo! Conto demais para você. — Quando ele só


sorri, reviro os olhos. — Meu tio continua completamente
desinteressado com o que acontece na minha vida e Pick...
não sei, estou começando a gostar da ideia de que ele é meu
irmão.
— Sério? — Isso parece agradar Remy. — Que bom!

— Sim. Desde que ele me disse que tinha investigado


Polly na internet e sabia o que havia acontecido com ela e
com meu pai, eu não estou tão assustado.

— Falando do seu pai...

— Não. — Digo, levantando a mão para cortá-lo. — Não


voltei a vê-lo desde aquela vez no bar.

— Bem, continuo achando que ele está seguindo você.


Com certeza está vigiando-o — Argumenta Remy, depois de
um momento de silêncio.

Eu duvido muito que ele esteja fazendo isso.

— E se eu disser que isso não me importa? Enquanto


ele estiver longe de mim e eu não tiver que enfrentá-lo, está
tudo bem.

— Mas e se ele...

— Sticks... — Dou um olhar penetrante. — Não estou


preocupado porque ele não tem razão nenhuma para vir atrás
de mim.

No momento em que meu pai percebeu que eu não


podia ajudá-lo com as drogas e que não vou dar nenhum
apoio financeiro, provavelmente esqueceu que eu existia. Que
bom. Adeus e até nunca.

— Bom, vou continuar paranoico e me manter alerta.

Nego com a cabeça, embora alguém preocupado com


meu bem-estar talvez seja uma coisa boa.
— Faça o que quiser. A partir de agora faço de você meu
guarda-costas oficial.

Faço um sinal da cruz para ele.

— Um sinal da cruz? Sério? Que diabos foi isso?

— Não tenho nem ideia, pareceu-me apropriado. —


Respondo, rindo.

Ele ri de volta.

— Cara, você é tão estranho.

A maneira como ele balança a cabeça, como se estivesse


perplexo com a minha estranheza me faz rir ainda mais.
Estou prestes a debochar e dizer que é um idiota com grande
amor por mim quando me interrompo... talvez, seja melhor
deixar para lá.

Então, lembro de algo que li na internet algumas noites


atrás, quando não conseguia dormir porque estava
preocupado com a nossa amizade.

— Acha que sou estranho? Bem, você sabia que quando


cortavam as bolas dos meninos para eles cantarem, a falta de
testosterona no corpo fazia que suas...?

— Articulações ósseas não ficassem muito duras,


portanto eles cresciam mais e tinham uma capacidade
pulmonar maior para cantar ainda mais forte. Sim, na
realidade já sabia.

Fico de boca aberta, em estado de choque. Merda, como


ele sabe disso? Não tenho certeza se estou impressionado ou
irritado que ele tivesse me vencido... outra vez.
Antes que eu possa decidir, meu telefone toca. Atiro os
controles de lado para pegar o celular, porque uma vez mais
Remy está matando todos sem a minha ajuda.

— É Pick. — Digo, franzindo a testa e me perguntando o


que estava acontecendo com ele.

Realmente precisamos falar a respeito de sentimentos e


toda essa merda? Não tenho nem ideia de como fazer isso,
mas por Pick vou tentar.

— O que houve? — Pergunto.

— Cara. — Pick deixa escapar um longo suspiro. —


Jesus, Asher, você não vai acreditar mas acabo de receber
uma ligação de Reese. A mãe do Mason morreu há mais ou
menos uma hora.

— O quê? — Sento-me reto no sofá. — Que loucura. O


que aconteceu?

— Não sei. Ela não me deu detalhes, mas disse que


Mason está muito chateado. Ele está com a irmã, Sarah e ela
não parece nada bem. Estamos indo para lá agora. Vemos-
nos lá? — Pergunta ele, depois de uma pausa.

— Uh... Claro. Sim. Estarei lá assim que for possível

Depois de desligar, continuo olhando para o telefone.

— Merda. — Murmuro.

Remy para o jogo e senta-se, a preocupação nublando


seu rosto.

— O que aconteceu?
— Meu amigo Mason...

— O do bar?

— Sim.

Ele faz um sinal com a mão, pedindo para eu continuar.

— O que aconteceu com ele? Está bem?

— Não. Quero dizer, sim, está. Mas sua mãe... merda,


acho que ela acaba de morrer.

— Uau! — Sticks encosta-se no sofá, piscando. — O que


aconteceu? Acidente de carro?

— Não tenho nem ideia. Pick não sabia e Reese não


disse quando ela ligou para ele. — Fico de pé, sentindo-me
desorientado enquanto olho cegamente pela sala. — Preciso
ir. Dizer que sinto muito e, não sei, merda... só estender a
mão se por acaso precisarem de alguma coisa, acho.

Devo ter me mexido muito rápido, porque uma onda de


enjoo me assalta. Tudo o que posso ver são os olhos mortos
da minha mãe, olhando sem ver nada. E se a irmãzinha de
Mason tivesse visto sua mãe morrer?

— Ei. Você está bem?

Remy segura meu braço, devolvendo-me à terra, ao


presente.

— Sim. Só lembrando merda do passado. Pick disse que


a irmã do Mason, Sarah, estava bastante alterada. Comecei a
me perguntar se ela estava lá. Se viu tudo também.

O olhar audacioso de Remy crava em mim.


— Viu o quê? — Murmura ele em voz baixa. — Você viu
quando sua mãe morreu?

Ouço um som e balanço a cabeça.

— Tudo. — Respondo, sem realmente querer.

Sticks tem uma forma de arrancar coisas com um


simples olhar.

— Isso deve ter sido uma merda. Alguma vez falou com
alguém sobre isto?

Dou uma olhada na direção dele.

— Sim, é claro. Tive que repetir minha versão dos fatos


pelo menos umas vinte vezes. À polícia, aos advogados, aos
juízes...

— Não, quero dizer de um psiquiatra. Ajuda emocional.

Eu bufo.

— Sério? Acha que meu tio estaria disposto a


desembolsar dinheiro para algo assim?

Stan sempre achou que tinha cumprido totalmente com


seu dever ao me deixar morar no trailer com ele. Não fez
nenhum esforço além disto, a não ser me perguntar de vez
em quando se eu precisava de dinheiro para comprar minhas
coisas pessoais.

— Ele deveria ter conseguido ajuda imediatamente


depois do que aconteceu. Não é bom para...

— Sticks. — Digo, levantando uma mão para que ele se


calasse. — Aconteceu há anos, acho que já superei. E sei que
você gostaria que me abrisse e compartilhasse meus
sentimentos e toda essa merda, mas vou ver meu amigo
agora e estar lá se ele precisar.

Dou uma olhada ao redor da sala, sentindo-me


totalmente perdido e sem saber o que fazer. Até que Remy
segura meu braço.

— Eu vou levar você. — Diz em voz baixa.

Solto um suspiro, sentindo-me patético por estar


precisando de ajuda. A notícia tinha me afetado
profundamente e isso me surpreendeu.

— OK. Obrigado. — Murmuro, aceitando a oferta do


meu amigo.

Remy então pega as chaves, a carteira e o telefone da


mesa de centro e faz um gesto para a porta.

Como minha cabeça ainda está uma bagunça, sigo as


instruções dele sem hesitação. Mas assim que abro a porta,
ele para.

— Merda. Comida. Precisamos de comida.

Olho para trás, franzindo a testa.

— Hum?

— Você sabe. — Diz ele, balançando a mão. — Quando


um ente querido de alguém próximo morre a gente leva
comida, como ensopados e essas merdas.

Levanto uma sobrancelha.


— Você é um idiota se pensa que sei remotamente como
cozinhar um guisado.

Remy começa a rir.

— Não tem por que ser um guisado, pode ser. Só...


alguma coisa. Algo útil. — Então ele se anima. — Quando a
mãe do Big T morreu as pessoas trouxeram comida, mas só
aquele velho, Jorge, se lembrou de trazer pratos de papel,
guardanapos e talheres de plástico. Foi o mais usado. Eu
sempre me disse que, já que não sei cozinhar, isso é o que
faria se alguma vez tivesse que visitar um membro da família
de alguém que morreu.

Solto um suspiro.

— Certo. Vamos passar por alguma loja de conveniência


e pegar alguns pratos de papel e essas coisas.

PARTE II

Meia hora mais tarde batemos na porta de Reese e


Mason. Eva abre, e seu rosto ilumina-se quando me vê.

— Asher! — Ela me puxa para um forte abraço,


murmurando em meu ouvido o quanto significaria para
Mason e Reese que eu tivesse vindo. Então, vê o cara atrás de
mim. — Oh! Olá.
Apresento Remy e ele dá uma saudação respeitosa antes
de nos seguir pelo corredor até a cozinha, onde Pick e Reese
se encontravam em cima de um catálogo telefônico,
debatendo sobre qual funerária contatar.

— Olhem quem encontrei na porta. — Anuncia Eva.

Reese levanta os olhos e, embora seu rosto esteja


vermelho e contraído por obviamente ter estado chorando,
sorri quando me vê.

— Asher. Muito obrigado por ter vindo. — Diz,


levantando-se para me dar um abraço.

Eu entrego a sacola, e quando ela descobre o que tem


dentro seu olhar ilumina-se.

— Oh! Obrigada. Foi muita consideração. Isto


provavelmente é melhor do que qualquer outra coisa.

Olho para Remy, preparado para lhe dar o crédito, mas


ele me dá uma cotovelada e sussurra: — Só responda “de
nada”.

Então, obedientemente me volto para Reese e dou de


ombros.

— De nada. Então... — Murmuro, sem ter certeza do que


perguntar.

— Ela tomou uma overdose. — Diz Reese em voz baixa.

Olho para ela, surpreso.

— A mãe do Mason? Merda. Não sabia que...


— Ela não era. Parece que teve problemas com remédios
há muito tempo. Ela costumava roubar medicação da Sarah
para lutar com.... bom, a vida, suponho. Mas parou muito
antes de eu aparecer. Mason só foi me contar quando nos
mudamos da Flórida para cá. Mas acho que nestes últimos
meses... converteu-se em um problema de novo. — Ela
balança a cabeça e seus olhos se enchem de lágrimas. —
Sarah foi quem a encontrou. Depois que nos chamaram, ela
não disse uma palavra.

— Merda. — Murmuro, sentindo pela irmã do Mason.

— E Mason... meu Deus. — Mais lágrimas inundam os


olhos de Reese. — Não sai do telefone ligando para os
advogados e assistentes sociais, determinado a garantir que
possamos ficar com a custódia da Sarah e não parou para
pensar sobre o que realmente aconteceu. Acho que ele não
quer pensar nisso.

Não o culpo. Antes que eu pudesse dizer alguma coisa,


oferecer ajuda ou algo que fosse necessário, dois meninos
pequenos entram na sala.

— Mamãe, papai. — Gritam, indo para seus pais.

Olhando para o que deduzo serem meus sobrinhos


correndo para Eva e Pick em busca de atenção, eu fico
impressionado. São tão lindos e têm muita sorte de terem
pais que se preocupam com eles, que não vão ter uma
overdose e os abandonar, que somente.... amam-nos.

Mais pessoas aparecem do corredor: Noel e sua família,


Quinn e Zoey com seu pequeno bebê.
Reese vai em direção a Zoey e pega o bebê nos braços,
dizendo que realmente precisa de uma dose de ternura neste
momento. Brandt olha ao redor da cozinha e de repente
estreita os olhos.

— Sarah está aqui, certo?

A dor nubla o rosto de Reese enquanto balança o bebê.

— Sim, mas... sinto muito Brandt, ela não está falando


com ninguém, nem mesmo com Mason. Sarah está muito
mal.

Um brilho de determinação aparece nos olhos de


Brandt.

— Posso ir vê-la mesmo assim?

Tenho a sensação de que ele encontraria uma maneira,


mesmo se Reese negasse. Mas ela concorda.

— Claro. Ela está deitada no meu quarto e de Mason.

Depois que ele sai nós ficamos ali, conversando em voz


baixa. Aspen e Quinn entregam pratos de comida para Eva,
que os guarda na geladeira.

Quando Mason entra na sala, com aspecto pálido,


cansado e um pouco emocionado, as meninas se reúnem em
volta dele para abraçá-lo, enquanto nós, os meninos, ficamos
de pé atrás, inclinando a cabeça de um jeito que diz “sinto
muito pela sua perda”.

Julian e Skylar continuam tentando gritar e correr pela


cozinha, até que Pick pega-os nos braços.
— Vou levá-los para casa. Tink... fique o tempo que
precisar com seus primos. E me chame quando quiser ir para
casa.

Eu estou prestes a me oferecer para levá-la em casa


quando ela quisesse, assim Pick não teria que voltar, quando
Remy levanta a mão.

— Hum, oi. Posso vigiá-los. Não tem problema. Se


tiverem um espaço para as crianças passarem um tempo,
todos podem ficar.

Reese coloca a mão no braço dele.

— Muito obrigada, Sticks. — Agradece ela, antes de


olhar na minha direção. — Poderia mostrar onde fica o
escritório? Ali tem DVDs infantis e brinquedos para manter
os meninos ocupados.

Balanço a cabeça e ajudo Remy a pegar os pequenos


bárbaros de Pick e Eva. Quando começamos a caminhar pelo
corredor e passamos pelo quarto de Mason e Reese, o
murmúrio da voz de Brandt me fez parar na porta
entreaberta e olhar para dentro.

— Você vai ficar bem. — Diz baixinho, deitado de


conchinha atrás de Sarah enquanto lhe acaricia o cabelo. —
Morar com o irmão mais velho não é tão ruim. Na realidade
para mim tudo ficou melhor. Você vai ver.

Sarah segura a camisa dele no ombro e aperta com


força.

— Por favor... não... me deixe.


— Não vou a lugar algum. — Assegura Brandt. — Vou
ficar aqui com você.

Atrás de mim, Remy me dá uma cotovelada, dizendo-me


em silêncio que estou escutando uma conversa privada. Mas
assim que chegamos ao escritório de Mason e Reese, ele sorri.

— Bem, isso não é a merda mais doce que você já viu?


Acho que me apaixonei por esse cara.

Sorrio e balanço a cabeça.

— Sim, Brandt é uma boa semente.

Observo a sala que obviamente foi criada para entreter


Julián e Skylar. Os dois meninos imediatamente procuram
seus brinquedos e começam a brincar.

— Tem certeza que não se importa de ficar aqui com


eles?

— Cresci sendo babá dos meus primos mais novos. Não


se preocupe. — Ele me empurra em direção a porta. — Agora
vá ficar com seus amigos.

— Obrigado, Rem. Você é um verdadeiro amigo — Digo,


enquanto começo a me afastar.
PARTE I

REMY
Então fiquei tomando conta dos pequenos.

Nenhum deles realmente viu o filme, só brincaram um


pouco por ali e depois subiram nas minhas pernas, ficando
um de cada lado. Às vezes uma cena ruidosa ou
particularmente ativa chamava sua atenção, mas apenas eu
vi todo o filme.

No momento que os créditos finais subiram, eu estava


sentada no chão e eles estavam dormindo, cada um
descansando a cabecinha em uma das minhas coxas
enquanto lágrimas corriam por meu rosto, algumas dentro da
máscara, outras fora.

— Oh, Deus. — Soluço, esfregando o rosto com a palma


das mãos. — Esta merda é triste.

— Ei, Rem! — Asher aparece na porta, segurando


o batente e inclinando o corpo. — Está preparado para ir?
Tenho que trabalhar e Aspen disse que vai ficar de olho
em Skylar e Ju...

Ele para quando me vê e respira fundo.

— Você está chorando?


— Este filme é triste para caralho. — Quase grito.

Julian desperta e eu acaricio seu cabelo cacheado para


acalmá-lo até que ele volta a dormir profundamente.

— Quero dizer, que merda? É um filme do


Disney, pensei que todos os filmes da Disney tivessem finais
felizes.

Ele ri. O filho de puta está rindo da minha angústia.

— Qual é o filme? — Pergunta, soltando o batente da


porta para entrar na sala e poder ver a tela.

— Tinker Bell e o Monstro da Terra do Nunca, ou algo


assim. Não lembro. Ele nunca vai voltar a vê-la. — Faço um
gesto para a imagem do monstro que cruzou a tela. — E essa
fada Fawn, ela o ama. Deveriam ficar juntos. Isto é.... ruim. E
Deus, o filme é tão bom.

Asher se deslumbra vendo os créditos.

— Que música é essa?

— É “1.000 Years” do KT Tunstall. Você conhece?

— Não. — Murmura ele, com o olhar fixo na tela. —


Mas eu gostei.

— É perfeita para o filme. Deus, este triste, encantador


e incrível filme.

Acomodo delicadamente as crianças com as mantas


que estão sobre o sofá, acaricio suas cabecinhas e fico
de pé.
Minhas costas e pernas estão rígidas de estar sentada
no chão por muito tempo, então alongo-me e depois tiro o pó
do traseiro.

— Você disse que precisa ir? — Pergunto.

— Hã? — Asher desvia o olhar da televisão e me olha,


piscando antes de sacudir a cabeça para limpar mente.

— Oh! Sim. É sábado, noite de karaokê. Tenho que


chegar cedo, então é melhor irmos. — Ele sorri para os
meninos. — Acredito que eles gostaram de você, obrigado de
novo por tomar conta deles. Mason e Reese realmente
precisavam de Pick e Eva hoje.

— Não foi nenhum problema. São bons


meninos... e incrivelmente lindos.

Sigo-o para fora da sala, vendo que o apartamento está


muito mais tranquilo do que tinha estado antes com os
meninos correndo por ali.

Embora eu adore ser o baterista da NonCastrato, sempre


que me visto como Sticks, é desgastante.

Eu realmente, realmente, sinto falta de ser uma garota.


Quer dizer, ainda posso ser eu mesma quando estou em casa
e quando vou trabalhar no Castañeda’s, mas parece
que, tirando isso, estou sempre com a máscara e agindo
como homem. Quase todo o dia.
Sei, sei... por que diabos estou reclamando? Eu meti
meu próprio rabo nesta maldita situação. Fiz minha cama...

Não significa,
entretanto, que não tenho remorso. Embora, provavelmente,
teria feito tudo de novo. Adorei tocar com a banda e a
oportunidade de conhecer Asher.

Quando eu contar, o veredicto final ainda vai estar


com Gally e Heath.

Heath pode ficar bem, mas é difícil dizer, já Gally me


preocupa, é um imbecil irremediável.

Mas tenho que contar o quanto antes, mesmo


preocupada em destruir tudo ao expor minha verdadeira
identidade. Só que isso definitivamente incomodaria Asher e
eu faria qualquer coisa para não o incomodar, inclusive
continuar me vestindo como Sticks.

Nunca fui a garota mais feminina do planeta, mas três


noites depois de cuidar das crianças de Pick e Eva enquanto
Asher ajudava a consolar Mason e Reese, senti necessidade
de agradar meu lado feminino.

Coloquei uma máscara facial de abacate, duas rodelas


de pepino nos olhos e tomei um longo banho de banheira.
Não saí da água até que os dedos dos meus pés e mãos
estivessem enrugados e sem cor.

Depois disso, coloquei um vestido soltinho e uma toalha


nos cabelos, e andei descalça pelo apartamento até a cozinha
para comer sorvete, chocolate e tomar uma taça de chá com
especiarias. Também, fiz as unhas e sobrancelhas. Então,
quando terminei tudo, eu estava renovada e pronta para
conquistar o mundo de novo.

Não penso em sair, mas resolvo colocar um dos meus


pequenos vestidos pretos, um pouco de maquiagem e ajeitar
os cabelos, só porque eu posso, antes de retornar à
cozinha e uff... lavar os pratos.

Tínhamos passado alguns dias sem lavar a louça e ela


estava amontoada na pia. E o que era pior, a chapa da
máquina de fazer waffles que não tinha sido usada por mais
de uma semana ainda estava no balcão, esperando ser limpa.
Estou certa de que tanto Jodi quanto eu,
tínhamos usado todos os pratos e também a maldita chapa,
mas como ela era uma dor na bunda para limpar, nós duas a
colocamos de lado. Fecho os olhos e me pergunto se seria
errado simplesmente jogá-la fora e comprar outra. Seria como
uma espécie de troca, afinal eu poderia comprar algo bonito e
autolimpante. Será que existe alguma máquina de waffle auto
limpante? Bom, deveria.

Estou com nojo, mas vou limpar essa coisa estúpida.

O sabão e a esponja estão nas minhas mãos quando


ouço Jodi entrar em casa, mais cedo do que o normal para
uma terça-feira à noite.

Grito que estou na cozinha e volto para a tarefa


ingrata, enquanto canto “Anaconda”. Balanço os quadris para
acompanhar a música de Nicki Minaj porque, inferno, não
isso que se deve fazer quando está cantando as músicas
dela?
Estou terminando o primeiro verso quando
alguém ri atrás de mim.

Dou um grito surpreso e viro para trás, espalhando a


espuma que estava nas minhas mãos por toda parte.

— Oh, meu Deus! Sinto muito. Não era minha intenção


assustá-la. — Diz a garota apoiada no batente da porta da
cozinha, rindo muito. — Acabei ouvindo a música
e tinha que olhar quem estava cantando.

Olho para ela boquiaberta, piscando e sem poder


acreditar... porque eu a conhecia.

— Que diabos você está fazendo aqui. — Atiro,


balançando a cabeça confusa. Então, assim que me
dou conta do quanto estou sendo grosseira, bato com a mão
na boca. — Quero dizer... sinto muito. É que... não estava
esperando ninguém. Pensei que era minha colega de
apartamento chegando em casa e....

— Quer dizer Jodi? Oh! Ela chegou. — A loira faz um


gesto com o polegar por cima do ombro, apontando a sala. —
Temos aula de Desenho Teatral juntas e como saímos mais
cedo, decidimos ir em algum lugar para comer, mas ela
queria passar em casa antes para trocar de roupa. Então...
Voilà. É por isso que estou aqui. Sou Caroline.

— Re... — Automaticamente começo a responder, mas


paro.

Não sei se devo dar meu nome verdadeiro. Ela é amiga


do Asher, casada com seu colega de trabalho. Será que é
seguro deixá-la me conhecer como uma garota?
Decido simplesmente estender a mão e dizer a verdade.
Não quero ter que mentir o resto da noite.

— Remy. — Digo, sorrindo.

Ela me devolve o sorriso, como se


estivesse satisfeita com minha resposta. Será que ela sabe a
verdade? Seu marido sabe, mas será que contou?

— Quer ir conosco? — Pergunta, olhando ansiosa, como


se realmente quisesse a minha companhia.

— Uh... — Olho para os pratos, que realmente não


queria terminar de lavar.

Mas passar muito tempo com a amiga de Asher pode ser


perigoso, ela pode me pegar em alguma mentira... antes que
eu pudesse declinar o convite, Jodi irrompe na cozinha.

— Sim! É óbvio que vai. Parece que não vejo você há


séculos. Ultimamente está sempre tão ocupada, passando o
tempo com....

— Claro. — Corto, antes que ela diga o nome de Asher


ou da banda. — Vou com vocês, se não se importarem.

— Claro que não. — Responde Caroline alegremente.

— Legal! — Dou um sorriso forçado enquanto meu


coração pulsa com o estresse. — Vou me trocar e colocar algo
mais adequado.

— Oh,, inferno, não. — Jodi segura meu braço. —


Faz muito tempo desde a última vez que a vi brilhando assim.
Você está muito bem, continue com esta roupa. Pensando
bem, por que está vestida assim para lavar pratos?
Fico vermelha e encolho os ombros.

— Só, você sabe... às vezes é bom sentir-se linda


enquanto está trabalhando como um burro nas tarefas
domésticas.

Caroline ri da minha resposta.

— Acho que gosto disso.

Dou um pequeno sorriso amarelo. Muito bom...


provavelmente terei que mentir e enganá-la a noite toda. E
gostei dela. Droga, mais uma coisa para me sentir culpada.

— Sabe, você cantando me lembra um dos meus


amigos. Está sempre cantando quando está focado em coisas
como a limpeza.

— Hum. — Murmuro, tentando não agir como se


estivesse interessada pela coincidência, porque tenho a
sensação de que sei exatamente a qual amigo ela se refere.

— Bem, se não estou autorizada a me trocar,


deveríamos ir agora. Certo?

— Vamos para noite já. — Diz Jodi.

Para falar a verdade, eu gostei de Caroline, mas seria


melhor se não tivesse gostado, assim não me sentiria tão
culpada por enganá-la. Mas ela é tão agradável e amável e me
inclui em tudo o que ela e Jodi discutem, que é impossível
não gostar. Então, assim que chegamos ao restaurante e
sentamos, peço uma pina colada ao primeiro garçom que se
aproxima da nossa mesa, antes mesmo que ele pergunte o
que nós queremos.

O quê? Fazia muito tempo que eu não tomava uma.

Jodi ri e Caroline só me dá um olhar curioso.

— Sentindo saudades da vida de garota? — Pergunta


Jodi assim que o garçom se afasta.

Chuto a perna dela por baixo da mesa com meus


sapatos de salto alto. Caroline, que está atenta, vira-se para
mim como um míssil atraído pelo calor.

— Vida de garota?

Faço um gesto com a mão e balanço a cabeça, como


se não fosse nada do outro mundo. Mas Jodi imediatamente
começa a explicar.

— Remy é a garota que está vestindo-se como um


garoto.

Dou outro chute em Jodi sob a mesa, mas


ela continua falando.

— Sabe o meu projeto de conclusão? — Quando bato


novamente, ela volta-se para mim com o cenho franzido.

— Por que continua me chutando?

Caroline começa a rir.

— Acredito que ela está tentando fazer você se calar,


assim não vou saber quem ela é realmente.

Com um gemido, afundo na cadeira.


— Mas você já sabe. Certo?

Ela ri mais ainda.

— Sim. Descobri alguns dias atrás, depois da sua


primeira apresentação no Forbidden, quando Jodi trouxe
uma imagem do Sticks à classe e explicou como ela ajudou a
transformar você para entrar na banda do Asher.

— Meu Deus, Jodi! — Digo, boquiaberta. — Você contou


à uma turma inteira, cheia de gente?

Minha companheira de quarto faz uma careta,


percebendo que poderia ter errado.

— Bom, eu...

— Ela realmente contou. — Informa Caroline,


alegremente.

— Genial. — Murmuro. — Agora, você, seu marido e


uma sala de aula inteira cheia de estranhos sabem.

— Espera. — Interrompe Caroline. — Orem sabe?

— Você é casada? — Grita Jodi, espantada.

— Orem? — Pergunto.

Caroline revira os olhos.

— Bom, você não pensou que seu verdadeiro nome


era Ten, certo?

— Uh, bom, acho que nunca pensei nisso.

— Como pode ser casada? — Continua Jodi, olhando


boquiaberta para Caroline, como se nunca a tivesse visto.
— Jodi, você conhece seu marido. Diabos,
paquerou com ele no bar e tentou “entrar em suas calças”
semanas atrás.

PARTE II

— Paquerou com meu marido? — Ofega Caroline,


piscando para o Jodi. — Bem, não a culpo, mas, merda, você
não está dormindo com dois membros da banda do Asher?

Foi minha vez de olhar completamente atônita. Voltei-


me para Jodi.

— Dois membros?

— Oh, sim! — Diz, sorrindo despreocupadamente, como


se simplesmente tivesse esquecido de mencionar tal
detalhe. — Fui para casa com o barbudo no último fim de
semana, logo depois que você nos abandonou.

— Você... — Balanço a cabeça, ainda sem compreender.


— Heath? Você foi para a cama com o Heath?

— Sim e.... Hum... garota, deixe-me dizer uma coisa: ele


é bem-dotado. Quero dizer, enorme mesmo. O maior que já
vi. Ainda estou caminhando estranho por causa daquela
noite. — Ela inclina-se para mim, levantando as
sobrancelhas, antes de dizer confidencialmente: — Ele gosta
por trás e estou dizendo muito atrás, no.... no....
— Oh! — Solto, instantaneamente levando as mãos aos
ouvidos, sem querer saber nada sobre isso. — Não
posso acreditar. E o Gally?

Jodi franze o cenho.

— Quem?

— Gally — Grunho. — Galloway. Billy Galloway. O


baixista da minha banda. Pensei que tinha dormido com ele.

— Oh! Certo. — Ela suspira, sorrindo. — Sim, ainda


faço sexo com ele. Não é tão grande, mas o que falta em
tamanho, definitivamente sobra em criatividade. Os
brinquedos que ele tem... deixe-me dizer...

Estou meio engasgada porque, sério, não quero ter este


tipo de informação sobre meus companheiros de banda.

— Mas... — Continua Jodi, piscando. — Parece que


estou passando por toda a banda... Como uma puta. Sendo
assim, deveria pegar Asher agora, certo?

Minha surpresa transforma-se imediatamente em


fúria.

— Sobre o meu cadáver!

Merda! Sei que ela disse isso para me incomodar e claro


que “caí como um patinho”. Quando Caroline ri, percebo o
quanto pareço possessiva com relação ao Asher.

— Bem, é só que... — Gaguejo.

Jodi dá um tapa no cotovelo de Caroline.


— Acho que Remy reclama muito. — Então, ela sorri
para mim. — Sei que você sente algo por ele.

— Claro que não. — Bufo.

— Você o ama. — Debocha minha amiga. — Você


que ter filhos com ele. Você...

— Pare. — Grunho.

— Asher na realidade é um menino doce e maravilhoso.


— Diz Caroline, pensativa. — Você poderia ter se apaixonado
por alguém muito pior.

Suspiro. Sim, eu sei.

— Bom eu... não vou seduzi-lo. — Anuncia Jodi,


levantando uma mão como se estivesse fazendo um
juramento. — Mas tenho que dizer, se ele der em cima de
mim não posso fazer nada, vou sacudir seu mundo.

— Você não vai. — Digo, embora eu saiba que ela nunca


faria isso. Inferno, foi Jodi quem me alertou sobre Fisher,
quando ele deu em cima dela.

Sério, Asher não ficaria com ela... não


é? Não. Ele procura um relacionamento significativo e Jodi é
alérgica a isso. Ela quer provar todos, gosta de experimentar,
de ver o que há lá fora.

— Mal posso esperar para que ele conheça seu


verdadeiro eu. — Murmura Caroline, antes de chupar o
canudinho da pina colada.

Fico olhando para ela como se estivesse louca, porque,


sério, tinha que ser louca para falar isso.
— Sim, porque será emocionante ver como ele reage
a um mês de decepção.

Caroline dá de ombros.

— Não se falar no momento adequado. Como... um


pouco antes de colocar a roupa de novo.

— Eu já disse que ela precisa transar com ele. —


Enfatiza Jodi.

Olho para as duas mulheres do outro lado da mesa


como se elas estivessem loucas.

— De maneira nenhuma. — Anuncio. — Não vou


acrescentar isso a minha lista de coisas erradas. Ele vai me
odiar quando descobrir.

— Não sei. —
Murmura Caroline, sorrindo maliciosamente. — Um garoto
pode perdoar muita coisa depois de...

— Nem sequer termine essa frase. — Advirto. — Porque


não vai acontecer. Fim da discussão. Vamos falar de outra
coisa.

Caroline começa a falar do casamento de Pick e Eva.

— Não posso acreditar que só faltam cinco dias. Eles


tentaram adiar depois do que aconteceu com a mãe de
Mason, no sábado. Mas tanto Reese quanto Mason insistiram
que eles não transferissem.

— Como estão Mason e sua irmã? — Pergunto.

A expressão de Caroline se enche de simpatia.


— Ainda estão bastante abalados. Reese diz que Mason
se culpa porque acredita que deveria saber o que estava
acontecendo. E Sarah... — Ela balança a cabeça. — A única
pessoa com quem ela fala é Brandt. Ele tem ficado por lá,
porque a ajuda a comer e dormir. Tenho o mau
pressentimento de que vai levar um tempo para superar.

Pobre garota...

— Uma vez vi minha mãe ter uma overdose. Mas


consegui chamar tio Alonso e a levamos para o hospital bem
a tempo de fazer uma lavagem no estômago e salvá-la.

Sinceramente, não sei como teria reagido se ela não


tivesse se recuperado.

Nós três conversamos um pouco mais até que preciso ir


ao banheiro, e obriguei Jodi e Caroline a me acompanharem.

Estou me sentindo tão bem.

Quando chegamos ao banheiro, eu suspiro e acaricio o


sinal na porta.

— Não posso acreditar que estou usando o banheiro das


mulheres de novo. Não é maravilhoso?

Jodi ri e assim que encontra uma cabine disponível


entra.

— Juro, nunca ouvi alguém tão emocionado por poder


usar o banheiro feminino.

— Bom, estou cansada de ter que usar todo tempo o dos


homens. Preciso dizer, não é agradável. Juro, cada cara que
usa o banheiro falha ao mirar o vaso sanitário. Os pisos...
Oh, meu Deus, garotas. Os pisos são tóxicos.

Caroline aperta o estômago, rindo.

— Sério, você vai ter que escrever uma autobiografia


quando tudo isso terminar. “Minha Vida Como Homem. ”

Então, ela tira o telefone da bolsa e troca mensagens


com alguém.

Sorrio, perguntando-me se ela estava


escrevendo para o seu marido... Até que as palavras “quando
tudo isso terminar” me batem. Merda, não posso fazer isto
para sempre, não é? Estou vivendo meu sonho, tocando
bateria para uma banda incrível..., mas realmente não sou
eu. Assim que a verdade vier à tona, serei
dispensada tão rápido que vou enlouquecer.

De forma nenhuma posso manter isto em segredo para


sempre. Engulo meu medo e observo Caroline guardar o
telefone e virar-se para o espelho para verificar a maquiagem.

Finalmente, entro em uma cabine para fazer xixi.

Quando saio já não me sinto tão animada... e o banheiro


está vazio.

— Garotas? — Chamo..., Mas Caroline e Jodi haviam


desaparecido. — Bom, toda a diversão de ir ao banheiro em
grupo terminou. — Murmuro, enquanto lavo as mãos e seco.

Depois de atirar as toalhas de papel no lixo, olho no


espelho, aliso o vestido, arrumo o brilho no canto do lábio e
saio do banheiro feminino para retornar a nossa mesa.
Então, assim que atravesso o corredor e entro na parte
principal do restaurante, meu olhar encontra ninguém mais
que Asher Hart. Ele está a três metros de distância,
inclinando sobre o balcão do bar como se estivesse esperando
que alguém tomasse seu pedido.

Quando me vê, endireita-se e parece prender a


respiração.

— Olá. — Murmura ele, surpreso.

Aperto a bolsa no estômago e olho para ele com a boca


aberta, congelada em meus saltos altos.

— Hola. — Consigo responder afinal.

Seu olhar desvia dos meus olhos e se move pelo meu


vestido favorito, pelas pernas e saltos. Troco o peso do corpo
de um pé para outro, sentindo-me nua.

— Elisa, certo? — Pergunta, depois de me comer com


os olhos por uns bons dez segundos.

Assinto estupidamente e logo, por alguma razão, digo


seu nome. O rosto dele ilumina-se com um sorriso. E, meu
Deus, esse sorriso me derrete inteira.

— Asher, sim. — Diz. — Boa memória.

Não sei o que dizer sobre isso, só fico ali, incapaz de me


mover ou desviar o olhar. Então, o barman nos interrompe,
trazendo a bebida e obrigando Asher a virar-se para ele.

— Obrigado. — Agradece ele, ao mesmo tempo que paga


a bebida. — Ei, você não viu por aí uma loira pequena e
linda? Achei que ia me encontrar com ela aqui.
Respiro fundo enquanto ouço o barman dizer que tinha
visto muitas loiras essa noite. Meu coração acelera e, juro, os
olhos lacrimejam.

Merda, droga... Ele ia encontrar-se com uma mulher


aqui? O cara estava em um maldito encontro?

Começo a sair quando Asher volta-se de repente para


mim e abre a boca para falar, a expressão arrependida e
ofegante em seu rosto me dizendo que gostaria de estar aqui
comigo e não com a loira de plástico. Não. Não vou me
perder no desejo estampado em seus olhos verdes.

— Buenas noches. — Digo respeitosamente, depois de


suspirar e balançar a cabeça.

Estou decepcionada. Mas, sério, o que esperava que ele


fizesse? Que esquecesse todas as mulheres no planeta
e desejasse só a mim? Eu sou uma idiota.

Além disso, minha versão homem o fez prometer que


deixaria minha versão de mulher em paz. Ele está apenas
respeitando o desejo do seu amigo e retrocedendo.

Inclino a cabeça, despedindo-me e saio, mas como


não sei para onde ir, acabo esbarrando em um cara que
parece estar se dirigindo ao banheiro.

— Disculpa. — Digo, assegurando-me de falar em


espanhol.

Mas quando tento me desviar, ele sorri e se move


comigo.
— Espere, por que a pressa, señorita? Ultimamente
estou desejando conhecer uma pequena mexicana.

Franzo o cenho para o idiota asqueroso e tento sair dali


novamente, mas ele ainda me impede. Respiro fundo para
evitar mandá-lo a merda e talvez dar uma joelhada em suas
bolas. Com Asher me observando quero manter isso em um
tom diplomático.

Até que o idiota me tocou, passando a mão pelo meu


braço nu.

— Por que não vem ao banheiro comigo, querida? Vou


mostrar o que uma verdadeira carne branca sabe fazer.

Urgh. Encho os pulmões para dizer o que penso a


respeito dessa proposta, quando Asher se coloca entre nós.

— Ou somente poderia sair do caminho dela, imbecil.

Ele é mais baixo e não tão musculoso quanto o


outro cara, mas qualquer que seja a expressão
que Asher mostrou ao idiota, fez com que ele desse um passo
atrás e levantasse as mãos.

— Desculpa, amigo. Não vi que ela estava com alguém.


Você sabe, uma mulher vestida assim implora para ser....

— Tratada com a mesma cortesia e respeito que todas as


mulheres no planeta. — Grunhe Asher, com as mãos
fechadas em punhos.

— Entendi. — Admite o imbecil, com as mãos ainda


levantadas. — Ela é sua. Estou indo.
Ignorando-me, ele passa por Asher e foge para o
banheiro masculino.

Asher volta-se para mim, mas eu não posso... não agora.


Ainda que ele tenha saltado em minha defesa tão docemente,
é mais do que consigo suportar. Logo que seus olhos verdes
cheios de compaixão encontram os meus, viro-me e vou
embora. Sem sequer saber para onde.

Jodi e Caroline desapareceram. Asher provavelmente


está confuso com minha reação. E a única
coisa que eu quero é chorar. Não porque o
valentão tivesse me incomodado, poderia ter ensinado uma
lição a ele, mas porque Asher me deixou arrasada.

Odeio, odeio, odeio mentir para ele. Atravesso a porta


mais próxima e encontro um pequeno espaço aberto para
fumantes, vazio. Aliviada por ter um momento a sós, esfrego
os braços por causa do frio e abro a bolsa para procurar o
telefone. Preciso descobrir o que diabos aconteceu com
Caroline e a minha companheira de apartamento.

Entretanto, antes que possa pegá-lo, a porta abre e....


sim, Asher entra.
ASHER
Ela está tão linda nesse vestido e com esses sapatos de
salto. Sim... de dar água na boca, por isso vim até aqui,
mesmo dizendo a mim mesmo dez tipos diferentes de
estúpido por agir como um idiota apaixonado.

— Você está bem? — Pergunto, lembrando


imediatamente que ela não sabe falar inglês. — Bien? —
Insisto, levantando as sobrancelhas com a pergunta.

Elisa solta a bolsa, que fica presa pela alça no ombro


dela, e concorda com a cabeça, passando as mãos pelos lados
dos braços.

Ela não parece bem, está tremendo de frio e aflita. Fico


feliz por ter parado no bar antes de segui-la até aqui.

Levanto a garrafa de água que comprei para ela e


ofereço.

— Água?

Ela pega a garrafa com calma.

— Gracias.

Enquanto Elisa abre a garrafa e toma um longo gole,


dou um passo atrás, para lhe dar espaço. Mas, inferno, ela é
linda até mesmo bebendo água. A única coisa que eu quero é
diminuir a distância entre nós e lamber todo aquele longo e
gracioso pescoço.

Lembrando a mim mesmo que eu tinha jurado


a Sticks que iria me manter afastado, dou outro passo para
trás.

— Bom... com certeza você veio até aqui para ficar


sozinha e tomar um pouco de ar. Então vou.... — Dou outro
passo e bato as costas na porta. — Tchau.

Ela caminha na minha direção, levantando a mão como


se me pedisse para ficar.

— Espera.

Eu congelo.

— Sim?

Então, ela para, deixa cair a mão e uma expressão


estranhamente culpada cruza seu rosto, como se não devesse
ter tentado me parar.

Solto um suspiro.

— Deus, você é tão encantadora.

Fico feliz que ela não possa entender minha patética


confissão, apesar de seus olhos mudarem, como se tivesse
entendido.

— Solo un beso42. — Diz, e dá um passo para mim.

Seus olhos estão cheios de desejo e isso faz os músculos


do meu estômago tencionarem com esperança.

“Somente um beijo”, em espanhol.


42
— O quê...? — Começo a perguntar, mas ela
segura minha camisa e me puxa para frente. Logo seus
braços estão em volta do meu corpo e ela está... merda, ela
está me abraçando.

Não posso lembrar a última vez que fui abraçado.


Diabos, não posso lembrar a última vez que fui tocado. Ela é
tão suave e feminina, com curvas em todos os lugares certos
e cheira como o céu. E suas mãos... não param de acariciar
minhas costas, como se não pudesse deixar de me tocar,
querendo sentir cada vez mais.

Enquanto todas essas sensações estão na minha


cabeça, todo o sangue corre para o meu pau e eu só quero
estar mais perto, satisfazê-la e.... então me satisfazer.

— Está bem. — Murmuro, movendo os dedos por suas


costas.

Deus, a sensação de suas costas sob minhas


mãos é maravilhosa. Acaricio o cabelo, beijo a têmpora e sinto
ela respirar profundamente em meu pescoço, então... é sua
boca na minha garganta? Ou talvez a língua? Não estou
certo, mas está me fazendo gemer. Puxo-a só um pouco mais
confortavelmente contra mim e inclino a cabeça para baixo.

Elisa levanta o rosto e nossas bocas ficam alinhadas, os


lábios a centímetros de distância. Vagamente, sei que não
devo beijá-la, há uma boa razão para isso, mas juro pela
minha vida, não consigo lembrar qual é.
Seus olhos são como piscinas castanhas de tentação e
eu sou um homem afogado. Tento resistir, até mesmo
pressiono minha testa na dela, mas já é muito tarde.

Esta mulher me pertence. Quando ela levanta a boca


levemente, eu baixo a minha, até que nossas respirações se
transformam em uma. Seguro sua nuca, o cabelo escuro e
sedoso flutuando sobre meus dedos e me fazendo tremer de
desejo. No instante seguinte nossos lábios estão selados.

Não tenho nem ideia do por quê, mas sinto como se


houvesse esperado durante anos para beijá-la. Tudo o que sei
é seu nome e, entretanto, nada parece tão certo como colar
minha boca à dela.

Meu corpo desabrocha com a consciência, a pele queima


com o conhecimento de que a pessoa que me toca e pressiona
o corpo ao meu, é a única que deveria fazê-lo.

Abro a boca, hesitante no início, estou com medo de


assustá-la, mas tudo o que eu quero é que este momento
continue. Quase grito quando seus lábios também se abrem e
a língua encontra a minha. Com um gemido faminto
aprofundo o beijo. Ela geme e fica na ponta dos pés, puxando
meu cabelo e pressionando o peito no meu. Minhas
necessidades mais básicas assumem o controle, levanto-a
e caminho com ela alguns passos para sentá-la em uma mesa
próxima.

Suas pernas imediatamente envolvem minha cintura e


enquanto uma mão fica no meu cabelo, a outra passa pelas
costas e segura firme minha bunda, incentivando-me a
encaixar mais profundamente entre suas coxas. A saia do
vestido sobe até a cintura e quando empurro minha ereção no
calor entre suas pernas, ambos gememos. Aperto a coxa
exposta e levanto sua perna, passando a mão na pele suave
até encontrar a beirada da calcinha.

— Ay, por Diós! — Ela fica sem fôlego, segurando-se em


mim enquanto joga a cabeça para trás e geme.

Meu dedo move por baixo do tecido sedoso e em sua


bunda perfeita. Ofegante, ela inclina-se de novo para frente e
apoia a testa no meu peito.

Sigo rumo ao calor suave até que... ganhei na loteria.


Ela está molhada, tão molhada que nós dois prendemos a
respiração. Acaricio o calor úmido antes de colocar um dedo
dentro dela.

— No puedo esperar. — Murmura Elisa, com voz


estridente.

— Mas..., mas... — Seus dedos encontram o botão do


meu jeans e eu me perco. — Merda.

Pressiono o rosto no lado da sua cabeça e enquanto ela


tenta me liberar, rasgo sua calcinha, não preciso de nada no
meu caminho.

Elisa está ofegante e gemendo, não consegue abrir meu


jeans. No momento que tiro suas mãos para ajudá-la e abro o
botão, ouço a porta abrir-se.

A bofetada gelada da realidade me lembra de onde


estamos e como eu absolutamente não deveria tocá-la.
Sentindo-me culpado, viro o corpo com cuidado para
escondê-la de quem quer que esteja entrando.

Caroline entra e para na soleira da porta.

— Oh, meu Deus! — Grita, arregalando os olhos ao ver


as pernas de Elisa, que não consegui esconder.

Dou um passo à frente para protegê-la melhor.

— Caroline? Caralho! Onde você estava?

— Uh...

Ela não parece saber o que responder, continua olhando


boquiaberta às pernas da Elisa, até que seu olhar move para
meu jeans parcialmente desabotoado.

Rapidamente, fecho o botão da calça.

— A próxima vez que me mandar uma mensagem


pedindo uma carona para casa não desapareça, certo?

— Oh sim. Sinto muito, eu... acho que estava no


banheiro quando você chegou.

Elisa segura a parte de trás da minha camisa e levanta a


mão para me tranquilizar e dizer que está tudo bem. O
movimento parece assustar Caroline.

— Bem, parece que você não ficou abandonado, não é?

Fulminei-a com o olhar.

— Está pronta para ir agora?

Eu preciso sair daqui antes que me esqueça de novo que


prometi sequer respirar na direção de Elisa. Mas Caroline
nega com a cabeça.
— Oh, você sabe... na verdade a garota com quem eu
vim está pronta para ir embora, então vou com ela. Além
disso... acabo de lembrar que você deve estar de moto.

Isso me faz franzir o cenho.

— Tem medo de andar de moto?

— Não... mas acho que quando eu for andar de moto


com um cara pela primeira vez.... sabe... colocar as pernas ao
redor das suas coxas e esmagar os seios nas suas costas,
prefiro que essa experiência seja com o Orem e não com
você.

Bom... quando ela coloca dessa maneira.

— Entendo. Então você deve ir com sua amiga, se


puder.

— Vou fazer isso. — Diz ela alegremente... muito alegre,


como se tivesse algum tipo de motivação interior.

— Vocês dois, divirtam-se.

Atrás de mim, Elisa fica tensa e me dou conta que


continuo tentando escondê-la. Caroline, obviamente, sabe
que ela está ali, então dou um passo para o lado, mas não
saio de perto dela.

— Caroline, esta é Elisa. — Apresento.

— Elisa? É um prazer conhecê-la. — Caroline fala


lentamente, antes de balançar a cabeça para cumprimentá-
la. Depois volta-se para mim. — Sabe, talvez
você pudesse dar uma carona à Elisa, já que acabei de ver a
pessoa com quem ela veio ir embora.
Percebo que Elisa fica tensa outra vez, mas não diz
nada.

— Sério? Isso é horrível.

Olho para Elisa sem saber como dizer que ela foi
deixada para trás.

— Sabe alguma coisa de espanhol? — Pergunto,


virando-me para Caroline.

— Huh? Não, nem uma palavra, sinto muito. —


Responde ela, balançando a cabeça. Então, levanta a mão
para se despedir e vai para a porta. — Vocês dois, não façam
nada que eu não faria.

— Merda. — Murmuro, depois que ela vai embora.

Estou um pouco em pânico, porque não tenho ideia de


como dizer à garota ao meu lado que ela foi deixada para
trás, ou mesmo perguntar como chegar à sua casa.

Elisa solta um longo suspiro enquanto desce da mesa e


arruma a saia do vestido.

— Cristo, eu sinto muito. — Digo, passando as mãos


pelos cabelos. — Não posso acreditar que acabo de... aqui, em
público, como se.... e rasguei sua calcinha. Juro que vou te
dar outra. E...

As palavras somem quando ela levanta os olhos.

— Jesus! Ainda quero muito você. — Murmuro,


levantando as mãos, como se estivesse me rendendo. — Mas
não posso, vou me comportar. Prometi a um bom amigo que
manteria minhas mãos longe de você.
Preciso ser objetivo.

— Remy... é isso! Aposto que ele sabe onde você mora.


Não se preocupe, vou ligar para ele e estou certo de que vem
aqui para levá-la para casa sã e salva.

Enquanto pego o telefone no bolso, Elisa abre sua bolsa


e também pega o seu. Não sei o que ela fez, mas não ligou
para ninguém. Segundos depois o telefone de Remy cai
diretamente na caixa postal.

— Porra. — Sussurro, ele não sabe o quanto estou


tentando ser um bom menino e não tocar na sua prima...
mais do que já tinha tocado?

Passo a mão pelo cabelo novamente.

Como diabos vou levá-la em casa se nenhum de nós


entende uma palavra do que do outro diz?

Ela deve ter visto a angústia no meu rosto, porque se


aproxima de mim e levanta a mão para tocar minha
bochecha. Fecho os olhos e inclino a cabeça, tentando
resistir, mas seus dedos são tão suaves e gentis... quando ela
fica na ponta dos pés para me dar um beijo, eu viro o rosto
para roçar levemente nossos lábios. Elisa fecha os olhos e
segura minha camisa nos ombros.

— Tu casa. — Sussurra.

Lembrando o significado de casa das minhas aulas de


espanhol na escola, percebo que ela acaba de pedir para ir à
minha casa. A resistência é inútil, eu a quero muito mesmo,
então concordo.
— Bom. Vamos para minha casa.

Não tenho nem ideia se ela entendeu o que eu disse,


porém não se afastou quando entrelacei meus dedos com os
dela para levá-la até a Triumph. Será que alguma vez já
segurei a mão de uma mulher? Acho que não e eu gostei. É
quente. Acolhedor.

Beijo seus dedos quando chegamos a moto e se ela se


surpreende ao ver como nós vamos para casa, não
demonstra. Depois que eu sento, mostro as partes que ela
precisa evitar e onde deve colocar os pés.

Seus saltos são um problema que ela logo resolve,


tirando-os e subindo atrás de mim, descalça. Elisa
aconchega-se, apertando meus quadris entre suas coxas,
envolvendo os braços ao redor de minha cintura e esmagando
os seios nas minhas costas. Ela faz tudo tão certo que é como
se tivesse nascido para isso.

Acho que já andou antes, o que me deixa mais tranquilo


porque não trouxe nenhum capacete. Nunca uso quando
ando pela cidade. Mas ela parece não se importar, então
cubro brevemente suas mãos, antes de acelerar.

O vento está meio frio e quando sinto-a estremecer fico


incomodado por não ter trazido uma jaqueta. Graças a Deus
não moro muito longe, mas também não quero correr, então
no momento que entro no beco, ela está gelada, batendo os
dentes e tremendo.
— Não se preocupe, vamos nos esquentar logo. —
Asseguro, enquanto espero ela calçar os sapatos para ajudá-
la a descer.

Seguro sua mão de novo e a conduzo pela escuridão até


a porta. Minha escada e seus sapatos me preocupam, mas
me mantenho por perto para evitar qualquer acidente.

— O último. — Respiro, ficando mais nervoso assim que


ela entra no apartamento.

Droga. Não deveria tê-la trazido. A última pessoa que


esteve aqui foi o Sticks, e eu prometi a ele que me afastaria
desta mulher. Estou quebrando a promessa e provavelmente
rompendo nossa amizade no processo.

Mas mesmo preocupado com a reação dele, pego o


cobertor da minha cama e cubro Elisa para aquecê-la.

Ela me olha e eu já estou duro outra vez.


Merda, geralmente não era tão fácil, mas isso tem acontecido
muito ultimamente. Talvez, todos esses meses sem ter
relações sexuais, não empurrar em uma boceta quente, de
querer ser tocado... tudo isso está me deixando impaciente.

E, além disso, trata-se dela, a garota que tinha feito eu


me masturbar mais do que o habitual desde que a vi no
chuveiro. Nua. A química que experimento perto dela é algo
fora de série.

Preciso tê-la nua outra vez.


Um ruído de cima nos faz virar e olhar para Mozart, que
está tentando soltar uma noz que se encaixou nas grades da
sua gaiola.

— Oh... sim. — Fico vermelho imaginando o que ela vai


pensar de mim por ter um esquilo como animal de estimação.
Espero que isso não a assuste. — Esse é Mozart.

Elisa não foge horrorizada, pelo contrário, sorri


carinhosamente e se estica para ajudá-lo.

— Não, espere!

Tento detê-la para que ele não a arranhe, mas ela


simplesmente pega a noz e provoca Mozart, que se afasta e
depois para, olhando para a mão dela.

Quando ela oferece a noz através das grades, ele


balança a cauda, tentado. Eu sei exatamente como ele se
sente. Mozart avança para frente e para. Prendo a respiração,
curioso se o esquilo realmente vai pegar a noz dos dedos dela.
Quero dizer para tomar cuidado, mas pela forma cautelosa
que ela se mexe, já sabe. Mozart pega a noz e eu dou um grito
abafado.

— Merda. Ele pegou diretamente da sua mão.

Elisa vira-se para mim, radiante e orgulhosa. Seu


sorriso me rouba o fôlego e antes que possa me deter, estou
pegando seu rosto e beijando-a.

— Eu adoro esse sorriso. Quero roubar todos para mim


e você não será capaz de sorrir para qualquer pessoa da
forma que está sorrindo neste momento, exceto para mim.
O olhar dela fica suave e seus olhos brilham como se
estivessem cheios de emoção. Elisa toca meu rosto
brandamente, dá um beijo delicado na minha boca e em
seguida afasta-se para tirar minha camisa e jogá-la de lado.

Vejo-a prender a respiração, seu olhar analisando meu


peito antes de começar a tocar... e quando move os dedos,
age como se fosse sua única oportunidade, querendo
absorver cada momento da experiência. Afasto o cabelo do
rosto dela para ver sua expressão. Elisa está excitada e me
olha de novo, sorrindo desse jeito que rouba minha razão.
Beijo-a novamente e então a pego nos braços, levando-a para
a cama. Depois de deitá-la, paro um segundo, simplesmente
desfrutando da visão nos meus lençóis, até que ela se
senta, tira os sapatos e se desloca para a beira da cama,
chegando ao zíper da minha calça jeans. Desta vez consegue
abrir e eu rapidamente tiro-a ficando apenas com a
cueca boxer. Quando Elisa pega meu pau por cima da cueca,
eu seguro seu pulso.

— Ainda não.

Levanto seus braços e puxo lentamente o vestido, depois


tiro o sutiã e, sorrindo, a calcinha rasgada.

Calcinha que eu tinha destruído.

Deito-a novamente e observo os olhos castanhos


queimarem de desejo quando eu me acomodo em cima dela.

Elisa sorri e eu sorrio de volta.

— Olá. — Digo em voz baixa.


— Hola. — Sussurra ela.

O brilho do colar de ouro no seu pescoço chama a


minha atenção e eu pego o pingente familiar.

— Guadalupe. — Murmuro, lembrando o nome da santa


na imagem.

Ela sorri, como se estivesse orgulhosa por eu ter


aprendido. E esse sorriso... Droga. Inclino-me para um beijo
profundo e molhado, com a boca aberta em um redemoinho
de línguas.

Elisa geme e arqueia o corpo, os mamilos duros tocando


o meu peito. Afasto os lábios, para dar atenção aos seios,
lambendo e chupando até que ela grita e segura com força os
lençóis.

Todo o tempo meus dedos procuram suas curvas,


descobrindo cada detalhe do corpo maravilhoso. Assim que
inclino para o outro seio, sinto-a acariciar meu cabelo,
minhas costas... Elisa está descobrindo meu corpo como eu
estou fazendo com o dela.

— Te amo! — Sussurra ela, passando as unhas pela


minha pele.

Lembrando que Remy havia dito que isso queria dizer


bom trabalho, levanto meu rosto e sorrio.

— Obrigado. — Digo, recebendo um olhar confuso.

Ela não viu nada ainda, mas eu rapidamente vou


mostrar outra coisa que tenho guardada para seu corpo
perfeito. Movo para baixo distribuindo beijos na pele suave,
até que chego no V entre suas coxas. Elisa segura meu cabelo
e eu sorrio, observando a sua respiração rápida e os olhos
castanhos brilhantes e desfocados. Ela está muito excitada.

— Isso, baby. — Digo, acariciando as mãos em meu


cabelo. — Segure-se com força, porque o passeio vai ser
intenso.
REMY
Meu quadril ergue-se da cama no segundo que a língua
dele me toca. O cabelo suave entre meus dedos e a língua
rápida excitam-me tanto que acabo gritando algumas
palavras desconexas em espanhol. Acho até que arranquei
um pouco do seu lindo cabelo quando o calor úmido
e abrasador me consumiu.

Finalmente ele para de me torturar e coloca a língua


entre os lábios da minha vagina para encontrar meu clitóris.

— Hijo de puta. — Ofego. — Mierda! Oh, Dios mío!

Asher penetra dois dedos no meu interior e grito seu


nome enquanto meu útero contrai-se quase dolorosamente.

Os espasmos são tão intensos que me deixam sem


ar. Arqueio em baixo dele, chocada e aturdida quando onda
após onda me inundam atingindo cada terminação nervosa
do meu corpo. Até que caio no colchão ofegante e totalmente
esgotada.

De repente entendo porque os franceses chamam isto de


“pequena morte”. Sério. O melhor orgasmo que já tive. Olho
para o teto sem entender como vou ter forças para ir embora
daqui. A vida como eu a conhecia acaba de ser alterada
completamente.
— Merda, você parece estar tão bem agora. — Murmura
Asher, em uma dessas vozes masculinas presunçosamente
satisfeitas.

Olho para ele, não completamente ressuscitada de


minha pequena morte. Mas seu sorriso fica maior quando
nossos olhares se cruzam. Oh, sim, ele sabe exatamente o
que acaba de fazer. Então, com arrogância, limpa os lábios
vermelhos e inchados com as costas das mãos.

Lindos lábios mágicos, que abrigam a língua perfeita.

Gemo e meu sexo estremece, querendo-o de volta em


mim. Meu Deus. Quem diria que Asher Hart seria a porra de
um deus do sexo?

Ainda chocada com meu orgasmo, sorrio quando ele


paira sobre mim, lambendo e brincando com meus mamilos
excitados enquanto estende uma das mãos até a mesa de
cabeceira e abre a gaveta superior.

Oh, bem, penso entusiasmada, mais sexo.

Ele senta-se com uma caixa familiar na mão, e uma


onda de felicidade me envolve ao ver que não usou nenhuma,
está até mesmo lutando para abrir a caixa.

Mas no momento que lê a minha mensagem Asher para


e seu sorriso determinado desaparece.

— Merda. — Sussurra, com uma expressão fechada no


rosto.

Ele está lembrando da promessa para o meu “eu


menino”. Respiro fundo e sinto a onda de felicidade deixar
meu corpo. Estou fazendo com que ele se sinta culpado e a
última coisa que eu quero é isso. Tudo é culpa minha,
somente minha, Asher não fez nada errado.

Droga, o que eu tinha feito ao meu belo e doce Asher?


Estendo a mão e seguro seu rosto, preciso convencê-lo de que
não há mal nenhum no que estamos fazendo.

Seu olhar tempestuoso fixa-se em mim.

— Sinto muito. — Diz brandamente. — Prometi a um


bom amigo que não faria isto.

Lágrimas brotam nos meus olhos, não só porque odiava


fazer isto ele, mas também porque tinha chamado meu eu
masculino de “um bom amigo”. Abraço-o e encosto meu rosto
ao dele, tentando demonstrar que está tudo bem, que o
entendo.

E embora minhas partes de garota estejam palpitando e


prontas para continuar, não quero torturá-lo com uma culpa
desnecessária. O aroma de Asher enche minha respiração e
inalo profundamente, percebendo que esta pode ser a última
vez que estaria assim tão perto dele. Esfrego o rosto no dele,
saboreando a suave ardência da barba.

Quando toco os lábios em sua têmpora, ele deixa


escapar um som torturado, fechando os olhos com força. E
assim que pressiono nossas testas ele segura minha nuca
para evitar que me afaste.

— Que droga estou fazendo? — Asher pergunta a si


mesmo, sacudindo a cabeça. — Isto não deveria ser tão difícil
de parar. Não sei nada sobre você. Você não entende uma
puta palavra que eu digo. E por que estou sentado aqui
falando comigo mesmo enquanto você está nua na minha
cama, e tudo que eu quero é me enterrar tão fundo que não
consiga lembrar meu próprio nome?

Abrindo os olhos, ele se afasta e procura meu olhar,


como se quisesse entrar na minha cabeça.

— Entretanto, quando olho em seus olhos, sinto que


poderia ser mais, muito mais. Como se eu pudesse ser tudo.

Beijo-o. Sério, ele não está ajudando. O homem não


pode me dizer uma merda como essa e não esperar que eu
queira transar com ele até deixá-lo sem sentido. Minha língua
vai fundo, e ele está junto comigo, empurrando-me de volta
ao colchão, abrindo a camisinha e tirando a cueca com uma
intensidade selvagem. Arqueio o corpo para
ele, segurando seus ombros desesperadamente.

Então, baixo o olhar e minha boca fica seca, vendo-o


colocar a camisinha.

Mas merda. Eu sabia que era grande porque o espiei no


quarto do hotel em Chicago. Mas ereto, o pau do Asher é
enorme. Sem dúvida nunca estive com um cara
tão grande antes. Fico um pouco preocupada e recuo quando
ele se inclina sobre mim. Parece tão predador... e eu sei que
vai ser áspero. Excita-me na mesma medida que me assusta.
Asher deve ter visto minha apreensão porque para e levanta
as sobrancelhas, olhando nos meus olhos.

— O quê?

Eu engasgo.
— Grande.

— Grande. — Repete ele confuso, até que parece


entender e seu lado arrogante reaparece. — Grande. Bem,
obrigado.

O sorriso arrogante fica maior.

Franzo o cenho porque não estou tentando transformá-


lo em um completo arrogante, mesmo que encantador. E
Deus, esse cara poderia ser.

Então, quando Asher percebe que eu estou mais


preocupada que assombrada, passa os dedos suavemente na
minha bochecha.

— Querida, não se preocupe. Vai encaixar, eu prometo.

Sim, é fácil para ele. Não está prestes a ser empalado


pelo Empire State Building43 dos paus. Mas quando ele
pressiona a ponta na minha abertura e eu abro mais as
pernas para facilitar, de repente grande parece muito
atraente. No momento que ele realmente investe dentro de
mim e sinto as paredes internas alargarem-se para acomodá-
lo, começo a gemer.

— Sí! Sí!

Asher começa a meter mais fundo, com força e eu tinha


razão, ele não vai ser gentil essa noite. Não, mesmo. Foi com
tudo, juro, com tudo. Grito, mas não de dor. Merda,
tinha razão, encaixou perfeitamente.

43
Empire State Building é um prédio de 102 andares na Fifth Avenue em New York.
O prazer é tão intenso que meus músculos internos
contraem e eu gozo antes mesmo que ele comece a
bombear. Asher fica dentro de mim observando meu rosto
durante o orgasmo e só quando tento recuperar o fôlego, ele
começa a sorrir.

— Viu? Encaixe perfeito.

Que presunçoso! E eu adoro. Ele sai e empurra


para dentro de novo, fazendo-me ofegar com o impacto.
Então, o homem começa a bombear com força, os quadris
chocando-se com os meus trazem de volta à loucura do
prazer.

— Puta que pariu. — Diz ele, pressionando a testa na


minha. — Isso não é apenas sexo.

Abro os olhos, mas mal posso focá-lo. O mundo está


muito confuso, meu corpo sente isso também.

— É muito mais que sexo. — Ofega ele, enterrando os


dedos no meu cabelo para impedir que eu vire o rosto. — Que
diabos você está fazendo comigo, mulher?

Eu não tenho certeza se ele está levando tanto de mim


quanto eu dele, ou estamos apenas trocando. Minha alma em
troca da dele. Isso é tão lindo que meus olhos se enchem de
lágrimas.

— Te amo. — Digo.

Mas tudo o que ele faz é assentir.

— Eu sei. É tão bom. Tão bom. O melhor que eu já vivi.


Asher enterra a testa no meu ombro e seu corpo fica
tenso. Quando começa a gozar sinto uma onda de prazer
atravessar meu corpo, da ponta dos dedos do pé até o couro
cabeludo, quase como se fosse forçada a me acender com
ele. Abraçados um ao outro atravessamos a tempestade.

E então nossos corpos se acalmam, Asher cai sobre


mim, pesado e deliciosamente quente. Pressiono-me nele
saboreando este momento enquanto dura.

— Te amo. — Admito de novo.

— Sim, foi bom.

Franzo o cenho, perguntando-me por que ele continuava


dando essa resposta. Até que recordo... Sticks, eu, disse que
te amo significa “bom trabalho”.

Respiro aliviada e também um pouco decepcionada de


que ele não tenha nem ideia do que eu estou realmente
dizendo. Mas é bom que não saiba, talvez, desta forma eu
possa preservar um pouco da minha dignidade, depois que
ele descobrir tudo e me deixar.

A ideia de perdê-lo enche meus olhos de lágrimas.

Limpo o rosto úmido no momento que ele murmura algo


e sai de mim, caindo pesadamente no colchão ao meu lado
Pisco aturdida quando ele literalmente
dorme segundos depois de gozar.

— Bom, parece que você dormiu. — Anuncio em voz


alta, um pouco decepcionada, mas também aliviada de ter
um momento para mim.
Asher não responde, com os lábios separados exala
longas respirações. Parece esgotado, mas também satisfeito e
feliz. Estendo a mão e gentilmente afasto uma mecha de
cabelo da sua testa.

— Sinto muito. — Murmura ele, meio dormindo. —


Nunca consigo ficar acordado depois do sexo.

Eu sorrio.

— Está tudo bem. — Respondo em inglês, porque acho


que ele está suficientemente adormecido para não perceber
que língua estou falando.

Aproveito o momento e o acaricio, cada linha do rosto,


os ombros, o tórax, ao redor do umbigo. Quando chego ao
pênis tiro a camisinha, certa de que ele vai ficar agradecido
por evitar a confusão quando acordar.

Levo o preservativo para o banheiro, faço xixi e lavo as


mãos e o rosto para me refrescar.

Quando retorno o som metálico da gaiola chama minha


atenção. Mozart me observa, muito alerta.

— Ouça, pare de me olhar fixamente, pervertido. —


Coloco as mãos sobre meus seios, e então decido: — Sim,
definitivamente é um esquilo macho.

Percebendo que eu não ia proporcionar-lhe mais um


espetáculo, ele vira-se e corre para entrar em uma gaiola bem
longe de mim. Volto para a cama e me sento na beira, vendo-
o dormir profundamente.
— Você é realmente especial. — Digo, passando de novo
os dedos por seu cabelo.

Quando vou me afastar, Asher segura meu pulso e abre


os olhos verdes turvos de sono, fazendo-me ofegar.

— Não vá. — Diz arrastando as palavras e me puxando


de volta para a cama junto com ele.

Incapaz de negar seu pedido, deito e o deixo me virar de


costas, com a bunda acomodada no seu pênis e seu braço ao
redor da minha cintura. Juntos, soltamos um suspiro de
satisfação.

Fecho os olhos enquanto ele me acaricia distraidamente,


a mão para cima e para baixo em meu quadril. Mas logo seus
dedos se movem mais para cima e ele os direciona ao redor
do meu seio, beliscando o mamilo, fazendo com que endureça
imediatamente. Arqueio o corpo e sem querer aperto o
traseiro de novo contra ele.

O pau de Asher treme, a umidade se acumula entre


minhas pernas e antes de me dar conta estou ofegando por
mais. Ele rapidamente me vira e empurra por trás. A
investida me deixa surpresa e me faz gemer... de um jeito
bom. Ele me penetra algumas vezes e solta um palavrão,
saindo de repente.

— Merda, sinto muito. Camisinha.

Asher me olha boquiaberto, em choque, então pega um


preservativo de cima da mesa de cabeceira.
Estar com ele é tão bom que eu nem sequer estou
acreditando que realmente está acontecendo. Asher tem
razão, tudo é tão intenso e aterrorizante que não pode ser
apenas sexo normal.

Quando ele me penetra novamente, eu estou pronta,


mas a surpresa do seu pau dentro de mim ainda é uma
emoção deliciosa. Impulsiono para trás e ele vem para frente,
o gemido de satisfação me dizendo o quanto gosta disto.

Asher pega meu cabelo na nuca e mantém minha


cabeça no travesseiro enquanto eu levanto a bunda para lhe
dar um acesso mais profundo. Suspiro e começo a gozar,
deixando escapar algumas palavras em espanhol, porque por
alguma razão essa é a língua que eu falo quando estou no
auge da paixão.

— Merda, sim. — Murmura Asher, parecendo saber o


quanto eu gosto disso.

Então, ele investe dentro de mim para liberar-se.

Desta vez teve forças para tirar a camisinha e jogá-la em


um cesto de papéis próximo da cama. Depois deita e me
puxa, aconchegando-me a ele.

— Pensando bem, é bom que a gente não entenda uma


palavra do que o outro diz, assim não temos que conversar
depois do sexo. Porque você receberia uma conversa
de merda da minha parte.

Sorrio, sem me importar que ele durma, Asher precisa


de todo o descanso que possa conseguir. Somente quando
ouço a respiração pesada atrás de mim é que fecho os olhos.
Não tenho a mínima ideia de quanto tempo dormimos.
Só sei que um fenômeno aconteceu aqui, porque nunca dormi
abraçada a um homem durante toda a noite. Cinco minutos
com o Fisher e eu já me retorcia querendo me afastar, porque
ficava com calor e me sentia sufocada. Com o Asher, pelo
contrário, sinto-me tão bem que não quero me mexer.

Mas preciso sair daqui... a menos que queira confessar


tudo, o que não quero. Agora não. Não com o apartamento
ainda cheirando a sexo.

Eu fiz tudo errado, dormi com ele apesar de estar


enganando-o. É o pior dos piores momentos. Mesmo
assim... não me arrependo cem por cento porque,
bom, merda... foi a melhor noite da minha vida. Olho para ele
uma última vez antes de sair da cama para pegar o celular e
ligar para minha companheira de apartamento para vir me
buscar, agora.

Vinte minutos mais tarde estou abraçando minha bolsa


na frente do apartamento de Asher esperando por Jodi. Mal o
carro para ao meu lado, eu já estou abrindo a porta e
entrando.

— Vamos. — Murmuro.

A cadela me dá um sorriso.

— Bem, ele deve ter sido bom, se o ninho de ratos no


seu cabelo quer dizer alguma coisa.
— Vá à merda. — Murmuro, penteando o cabelo com os
dedos. — Isto tudo é culpa sua. Não queria transar com
ele, Jodi. Jesus, no que vocês estavam pensando? Foram
vocês que orquestraram tudo, não?

— Oh, você quer ficar calma, puta? Nós organizamos


apenas um encontro casual e feliz entre vocês dois, não
colocamos o pau dele na sua boceta. Isso foi tudo culpa sua.

— Jesus, Deus. — Soluço, as lágrimas imediatamente


escorrendo pelo meu rosto. — Transei com ele. Não posso
acreditar que transei com ele.

— Querida, não é para tanto. — Suspira Jodi. — É


apenas sexo...

Para ela, a união de dois corpos é apenas sexo, sim. Mas


para mim... é mais. Não posso programar meu corpo, coração
e mente para achar que sexo só significa um momento bom.
E, além disso, nada do que tinha acontecido poderia ser
classificado apenas como sexo.

— Não, não é só sexo. Deixei tudo pior, em dobro.


Merda, triplo. Ele nunca vai me perdoar quando souber. Vai
me odiar.

— Nunca se sabe. — Argumenta ela. — O quanto foi


bom ontem à noite?

— O melhor de todos. — Murmuro miseravelmente,


secando o rímel com um lenço de papel que encontrei na
bolsa.
— Bom, então talvez seja mais fácil para ele superar a
mentira... se quiser ficar com você. — Rebate Jodi, dando
uma piscadinha.

— Não, ele vai me odiar. Foi tão bom... e eu estou


apaixonada por ele, merda. Quero dizer, juro por Deus que
amo tudo em Asher Hart. É o melhor homem, o melhor
amante e o melhor amigo que já tive.

Vagamente me dou conta de que acabo de dizer que ele


é um amigo melhor do que ela, mas Jodi não se ofende.

— Oh! Bom... isso pode mudar as coisas. — Diz ela, não


tão indiferente ao meu sofrimento.

— Você acha? O que devo fazer agora?

Mas Jodi não tem nenhum conselho sábio para mim.


PARTE I

REMY
Às duas da tarde eu tinha me acalmado, ou pelo menos
não estava mais chorando, mas foi preciso muito tempo e
persuasão da Jodi para eu conseguir ir ao ensaio da banda.

— Por que você quer que eu vá? — Choramingo. — Você


nem queria que eu estivesse na banda.

— Bom, você não me escutou, então agora que está na


banda é seu dever ir aos ensaios. Além disso, Asher vai se
perguntar por que você não apareceu, ligar os pontos e
descobrir a verdade. Quer que ele descubra assim?

— Não. Claro que não.

Obviamente preciso levantar minha bunda e ir ensaiar.

Fui a penúltima a chegar, somente Asher chegou depois


de mim, o que era estranho.

Ele estava apático, bocejou várias vezes e ficava


sacudindo a cabeça para manter-se desperto. Não entendo,
porque Asher sempre foi muito ativo, inclusive ficava
tamborilando os dedos cada vez que tinha que ficar quieto.
Vê-lo assim era... e foi então que lembrei da “história” de
Ten.
O sexo o deixava cansado. Fico excitada ao me dar
conta de que isto foi tudo por minha causa. Mas logo me
repreendo por até mesmo pensar na noite anterior.

Entretanto, Asher não se encontrava só apático, ele


também estava preocupado... com Sticks. Não fez contato
visual comigo em todo o ensaio, e quando tinha que falar
alguma coisa com relação a bateria olhava para todos, nunca
diretamente para mim.

Ele sente-se culpado por romper a promessa e odeio


fazê-lo passar por isso.

Logo que o ensaio termina fico por ali, sabendo que


preciso fazer alguma coisa. Confessar, ou... não sei. Só fazer
a coisa certa.

Heath e Gally vão embora e Asher me dá um olhar


cauteloso, enquanto finjo arrumar os tambores da bateria.

— Tudo bem? — Pergunto diretamente.

Ele dá um pulo e leva a mão a boca antes de virar-se


para mim.

— Hum?

Droga, ele não consegue esconder. Abro a boca


para... não sei, talvez dizer toda a verdade quando...

— Fiz sexo ontem à noite. — Diz Asher, de repente.

Pisco porque, sério, eu não esperava que dissesse isso.

— Está... bem. — Respondo, hesitante.

Ele mexe as mãos na minha direção.


— É só que... você disse que queria saber, então... estou
contando.

Oh, entendo. Tinha esquecido dessa conversa.

— Bom... está bem, então. Obrigado por contar...


também fiz sexo ontem à noite. — Acrescento sem pensar.

Já que estamos confessando meias verdades parece


lógico contar e embora eu me sinta envergonhada, ele fica
feliz.

— De verdade?

Eu concordo e vejo seus ombros relaxarem de alívio.

— Oh, graças a Deus. — Diz, para depois acenar um


dedo entre nós. — Então... estamos bem?

— Claro. — Respondo, dando de ombros.

Por dentro estou gemendo, Não! Ainda sou uma grande


mentirosa e não mereço nem um pouquinho da sua amizade.

— Legal. — Comemora Asher, feliz.

Não posso dizer a verdade.

E a culpa só aumenta enquanto retorno para casa.


Realmente, realmente, realmente tenho que contar. Tudo.
Ontem à noite fui longe demais, e agora cada vez que o vejo
sei que vou querer pular em cima dele, ou gritar que menti.

Jodi não está por perto quando voo para dentro do meu
apartamento, mas gostaria que estivesse para me convencer
de que vou fazer o certo.
Tiro a roupa de Sticks, visto-me como Remy, a garota, e
me dirijo ao apartamento de Asher... como uma mulher.

A moto não está no beco quando chego lá, então


continuo dirigindo. Umas poucas quadras depois
amaldiçoo minha falta de coragem, estaciono o carro e
retorno à entrada do beco andando mantendo o rosto virado
para baixo para proteger-me do vento frio e planejando o que
eu vou dizer. Quero fazer uma confissão completa e honesta,
já que não posso voltar atrás.

O que está feito, está feito. Mas eu posso fazer o que é


certo daqui em diante. Antes tarde do que nunca, não é?

Entro no beco com os braços em volta do corpo e ouço o


ruído familiar da moto no extremo oposto. Chegamos a porta
de entrada mais ou menos ao mesmo tempo.

Asher está desligando o motor e descendo da moto


exatamente quando levanto o rosto e tiro o cabelo dos olhos,
tomando coragem para falar com ele... em inglês... com a voz
do Sticks.

Mas ele fala primeiro.

— Graças a Deus, você voltou. Estou chegando do seu


restaurante e me disseram que não estava trabalhando hoje.

Abro a boca para dizer que não, que tinha o dia livre,
mas ele segura meu rosto e me beija. Amo os lábios de Asher.
Quero dizer, sério, sua boca mata as células do cérebro.
Minha mente entra em curto-circuito quando seguro os
braços fortes e o beijo também. Asher geme, levanta-me e eu
passo as pernas ao redor da sua cintura. Ele me prende na
parede ao lado da porta e continua me beijando enquanto
tenta abri-la.

— Não consigo parar de pensar em você desde que


acordei sozinho na cama, sentindo seu cheiro. — Diz,
pressionando a testa na minha.

Droga, eu não tinha parado de pensar nele também.


Beijo-o novamente e vamos para a escada, mas assim que
desce dois degraus comigo em seus braços ele para, porque
quase caímos e quebramos nossos pescoços.

— Merda, sinto muito.

Asher me coloca em pé um degrau acima dele, mas


continuo agarrando-o, beijando o pescoço, mordendo... quero
memorizar cada centímetro da sua pele.

— Jesus. — Geme e me apoia na parede da escada para


continuar me beijando.

Asher se afasta alguns centímetros e eu consigo abrir o


jeans para pegar o pau dele, mas ele não tem a mesma
facilidade com minhas calças de ioga. Foi mais fácil subir
meu vestido ontem à noite.

— Merda. — Diz, deitando-me nas escadas.

Segurando meus seios nas mãos, ele baixa a boca até a


cintura da minha calça, pega-a entre os dentes e começa a
baixá-la. Contorço o corpo para ajudá-lo e graças a Deus
minhas calcinhas vão junto, porque não quero que ele rasgue
outra e na fome que está, teria rasgado em meio segundo.
Com o jeans pendurado nos joelhos, Asher pega uma
camisinha na carteira e rapidamente a coloca no pau.

No momento seguinte, está enterrado em mim. Atiro a


cabeça para trás desfrutando do forte impulso na minha
boceta. Encaixamos-nos tão bem... digo algumas palavras em
espanhol, sem me preocupar com os degraus machucando
minhas costas. Com Asher enterrado tão fundo dentro de
mim, nada importa.

Gozo rapidamente e ele também, a combustão


simultânea fazendo nossos corpos chocarem-se durante o
orgasmo,

Assim que nos acalmamos, Asher murmura alguma


coisa e sai de mim, sentando-se apoiado na parede, com as
mãos no rosto e ofegando.

Embora me sentisse mole como macarrão, não o queria


desacordado nas escadas. Que lugar horrível para dormir!
Oscilo até o lado dele, coloco seu braço ao redor do meu
ombro e tento ficar de pé e levá-lo comigo.

Ele geme em desagrado, mas segura-se ao corrimão e


levanta-se.

— Obrigado. — Murmura. — Você é muito legal comigo.

Acaricio seu peito e beijo-o no rosto.

— Não vá embora desta vez, certo? — Pede, arrastando-


me com ele enquanto desaba sobre a cama — Só... fique.

E eu fiquei. Bocejando, fecho os olhos e durmo, até que


em algum momento da noite, ele me desperta com a boca
entre as minhas pernas e a língua massageando o clitóris.
Meu quadril ergue-se da cama imediatamente.

— Olá. — Diz ele, com os olhos sonolentos e o sorriso


cheio de vida.

Murmuro algo, não sei se em espanhol ou inglês, mas


qualquer que seja o som distorcido que sai de mim, faz-o rir.
Então, ele levanta minhas pernas até meu peito, senta-se
para poder empurrar em mim deste ângulo e fica observando
enquanto me tortura com seu pau, penetrando-me fundo e no
ângulo correto para bater no lugar perfeito.

— Eu adoro ver você gozando. — Admite, antes de me


levantar até que ficamos sentados retos, eu em seu colo,
olhando um para o outro. — Agora, goze de novo.

Sacudo a cabeça, ainda não completamente refeita do


último. Mas Asher não se importa, move o polegar sobre o
meu clitóris, empurra com mais força dentro de mim e me faz
gritar logo em seguida.

O resto da noite segue um padrão


similar. Transamos, dormimos de vez em quando,
abraçamos-nos e uma hora comemos um lanche de maçãs e
queijo que ele trouxe para cama.

Mozart tornou-se estritamente um voyeur44, tanto que


Asher teve que levantar e atirar uma manta sobre sua gaiola.

Na manhã seguinte, despertei primeiro, ainda envolta


em seus braços e com uma dor gostosa entre as pernas.

44
Observador. Indivíduo que experimenta prazer sexual ao ver estímulos sexuais, objetos
associados à sexualidade ou o próprio ato sexual praticado por outros
Tenho que ir embora. Duas noites seguidas é ... é duas
vezes pior. Mas assim que tento sentar, os braços dele me
apertam com força.

— Oh, não. Você não vai sair escondida novamente, nem


que eu tenha que algemá-la na cama. Pensando bem...

Asher levanta-se e caminha nu pelo quarto até a mesa,


pega uma sacola de presente, tira alguma coisa de dentro e
vira-se sorrindo. Fico de boca aberta quando vejo as algemas
peludas com estampas de leopardo penduradas em seus
dedos.

— Comprei para fazer uma brincadeira com meu irmão.


Era para ser um presente de casamento, mas agora acho que
tenho uma utilidade melhor para elas. Venha aqui, linda.

Não sei se quero ser algemada, então solto uma risada e


me afasto, enquanto ele se lança para mim. Asher persegue-
me pela cama, sorrindo o tempo todo, até que para e dá um
suspiro agitado.

— Não?

— Não. — Respondo, sacudindo a cabeça.

Mas então uma ideia me bate e eu pego as algemas.


Asher levanta as sobrancelhas ao pedido, mas as entrega
facilmente.

Abro um sorriso e indico a cabeceira da cama. Ele me


olha confuso, e um segundo depois compreende.

— Oh... quer me algemar?


Concordo e mordo o lábio, sem conseguir conter o
sorriso diante a ideia.

— Está bem. — Responde, com os olhos verdes ardendo


de luxúria.

Asher deita-se de costas e estende os braços para que


eu possa algemá-lo. Merda, ele está tão gostoso me olhando
com expectativa enquanto passo a língua nos lábios tentando
decidir o que quero fazer com ele primeiro. As risadas que
estavam crescendo dentro de mim morrem quando a luxúria
se acumula no meu abdômen.

Deus, este homem deitado nu é como um banquete.


Quero lambê-lo. Inclinando-me, coloco a língua no seu
umbigo e vou subindo, lambendo o abdômen, que estremece
e fica tenso em baixo de mim, o peitoral... até que chego ao
pescoço. Ali, mordo e chupo a suavidade da sua pele,
inalando o aroma que era puramente ele, deleitando-me com
o gemido que vibra na minha boca.

Asher vira o rosto para me olhar e esse olhar nos olhos


verdes, cheio de confiança e afeto... quero guardar este
momento na memória para sempre. Acaricio com a ponta dos
dedos o rosto dele, memorizando cada detalhe, a textura da
pele, o cheiro...

Então, inclino-me e gentilmente pressiono meus lábios


nos dele. Asher puxa as algemas para encontrar meu beijo e
quando tenta ir mais longe eu o detenho, querendo explorar
mais. Sorrindo, ele encosta-se nos travesseiros, observando-
me.
Passo alguns minutos, mexendo em seu cabelo e ele
geme quando minhas unhas roçam o couro cabeludo.
Distribuo beijos rápidos em cada braço, decidida a não
perder um sinal ou sarda e o que minha boca perdia, meus
dedos tocavam.

— Cristo. — Murmura ele, fechando os olhos e


inclinando a cabeça para trás. — Isso é bom.

Com um sorriso, acaricio o peito e o estômago, contendo


o fôlego quando chego no V na base do abdômen. Asher
também sorri e solta o ar que estava prendendo para me
mostrar que estou torturando-o.

Mantendo contato visual, movo os dedos na base do pau


e coloco a cabeça na minha boca. Vejo os olhos dele
dilatarem-se quando sinto o sabor salgado na língua.

PARTE II

— Santa... — Ele tenta falar, enquanto uma gota de suor


escorrega por sua têmpora.

Sem deixar de olhar em seus olhos, chupo com mais


força, até o pênis tocar a parte posterior da minha garganta.
Seus lábios se abrem, mas parece não poder fazer nada mais
além de respirar quando coloco uns centímetros a mais.
Embora não consiga colocar tudo, isso não me impede de
tirar e colocar outra vez.
— Deus. — Ofega Asher, os olhos fixos nos meus,
ocasionalmente baixando-os para meus lábios ainda ao redor
dele, para depois retornar aos meus olhos outra vez.

Acaricio as bolas alguns segundos e sinto escroto


endurecer sob meu toque. Ele está perto de gozar, mas não
quero que isso aconteça na minha boca. Quando paro de
chupar Asher grunhe, mas não discute, fica só observando
com os olhos ardendo de desejo enquanto eu pego a caixa
de camisinhas, que já está ficando vazia.

— Tão linda. — Murmura, olhando minhas mãos


colocando o preservativo e sei que está falando sério, porque
ele não tem ideia que eu consigo entender tudo.

Em vez de ficar de frente, viro de costas e sento no colo


dele. Asher geme e tenta levantar o quadril antes que
eu esteja preparada, então seguro-o para mantê-lo na cama e
dou um sorriso de advertência.

— Está bem. — Diz, respirando rápido enquanto outra


gota de suor escorre por seu rosto. — Vou me comportar,
juro. Mas, droga, adoro este jogo.

Sorrio, encantada, depois seguro o pau e me posiciono


sobre ele de uma maneira que posso esfregá-lo na entrada do
meu ânus.

— Ah, você tem que estar brincando. — A voz dele está


alta, surpresa, e repleta de luxúria. — É muito bom para ser
real.

Mas no último segundo dou uma piscadinha e o movo


para minha vagina.
— Caralho, você gosta de brincar... — A palavra brincar
sai mais como um grunhido porque foi neste momento que
me sentei sobre ele, tomando-o completamente. — Merda.
Bem, isso não é tão ruim. Porra.

Deixo minha cabeça cair para trás e solto uma risada.


Asher diz mais algumas coisas e eu começo a falar em
espanhol, porque simplesmente não consigo evitar. Quando
minha boceta começa a contrair em um orgasmo intenso, ele
grita, empurrando os quadris e gozando junto comigo.

Assim que terminamos, saio de cima dele e tiro a


camisinha.

— Obrigado. — Murmura, olhando-me como se eu


valesse um milhão dólares.

Depois de jogar o preservativo no lixo deito ao lado dele,


com a cabeça em seu ombro para poder olhá-lo nos
olhos. Nenhum de nós se mexe para tirar as algemas, acho
que gostamos de estar assim.

Sorrio e o acaricio no queixo e nos lábios, vendo que ele


está ficando com sono.

— Você ainda não sabe, mas vamos ficar


juntos. Vou fazer com que funcione, com a barreira do idioma
ou não, porque nada na minha vida foi tão incrível assim. —
Diz, com os olhos verdes tão cheios de sinceridade que
preciso fechar os meus e enfiar o rosto no seu pescoço.

— Te amo. — Digo, envergonhada e culpada por não


falar em inglês.
Este maravilhoso e incrível homem não merece tudo o
que tenho feito, ele merece mais, muito mais.

— Não posso mais fazer isto. — Admito, porque não


posso mesmo.

Ele tinha acabado de fechar os olhos quando eu me


afasto. Preciso ir, preciso escapar antes de estourar
em lágrimas.

— O que você está fazendo? O que aconteceu? Não está


indo embora, não é?

Coloco rapidamente as calcinhas e pego o sutiã. Não


posso olhar para ele, não posso dizer nada. Preciso fugir.
Asher tenta me pedir para ficar com a pior pronúncia do
mundo das palavras sente-se e fique.

— Não! Não vá. Por favor, não vá. Sinto muito. Não sei o
que fiz de errado, mas sinto muito mesmo. —
Murmura, como se fosse ele que tivesse arruinado tudo e não
soubesse como consertar. — Droga, como se pede perdão em
espanhol?

Eu digo, embora ele não entenda o que estou dizendo e


continue pedindo, tentando me convencer a ficar. Isso só me
faz sentir pior por cada mentira, e ainda mais determinada a
ir embora.

Segurando as lágrimas, paro na porta e olho para ele.


Asher pisca, surpreso ao me ver chorando.

— Elisa?

— Tengo que hacer esto.


E saio correndo pelas escadas. Uma vez que estou no ar
frio, vou andando rapidamente para o meu carro, estacionado
duas quadras adiante. Lágrimas nublam minha visão quando
ligo o motor, mas sigo em frente.

Ao chegar em casa me dou conta da merda que fiz. Não


posso simplesmente deixá-lo lá, algemado à cama.

Procuro o telefone na bolsa e ligo, embora eu saiba que


ele não pode me atender. Mas "Sticks" pode ter tentado entrar
em contato... e como não consegue resolve ir ao apartamento
para verificar se está tudo bem, se o pai não o matou ou algo
assim.

E, merda, no que eu estava pensando? Como pude


deixá-lo preso quando seu pai louco o seguia de perto? O que
seu velho faria se o encontrasse assim, será que o
machucaria? Deixei-o no apartamento completamente
desprotegido.

Estou a ponto de entrar em casa para trocar minha


roupa pela de Sticks quando Asher atende, surpreendendo-
me muito.

— Hey, cara. — Diz ele, parecendo completamente sem


fôlego e casual, como se não estivesse nu e algemado à cama.

— Tudo bem?

Bem, talvez ele tenha conseguido se libertar.

— Não muito.
A voz dele soa rígida, até mesmo para meus ouvidos.
Não tenho certeza de como provoquei isto, porque continuo
agindo como duas pessoas diferentes.

Eu só quero tirar a máscara. Ainda assim


as consequências dos meus atos eram muito grandes para
serem resolvidas.

— Estou... com fome e pensei em comer pizza. Quer vir


comigo?

— Claro. — Responde ele, ainda sem mencionar sua


situação, embora eu saiba que vai ter que me dizer... logo.

— Ótimo. Pego você em um instante.

— Tudo bem, mas, hã, primeiro uma pergunta rápida.

— Bem, desembucha. — Murmuro, esperando que ele


me conte o que aconteceu.

— Por acaso você não teria... chaves para algemas? —


Pergunta, depois de hesitar um pouco.

— Uh...

Merda, não estava preparada para essa pergunta,


apesar de ter lógica. Mas não tenho as chaves, não sei nem
onde podem estar.

— Não importa. — Diz ele de repente. — Sei que tenho


alguma por aqui. Você pode vir... vir e me ajudar?

— Claro. Estarei aí em menos de vinte minutos.

Desligo antes que ele possa dizer mais alguma coisa.


Estou de volta à casa de Asher em quinze minutos,
usando a máscara, o torso falso e calças de homem. Quando
estaciono em frente ao apartamento, fico furiosa comigo
mesma outra vez. Como posso ter deixado a porta aberta? O
pai dele poderia ter entrado para machucá-lo. Um pouco
assustada de que o velho pudesse ter chegado antes de mim,
corro para a porta.

— Asher? — Grito.

— Aqui em baixo.

Sentido uma enorme sensação de alívio desço os


degraus de dois em dois.

Esqueci o quanto o havia deixado exposto, mas Asher


conseguiu usar as pernas para cobrir o pau com os lençóis.

Diabos. O menino é pura arte.

Fico com a boca cheia de água quando lembro tudo o


que fizemos juntos nessa cama. Mas a maneira cautelosa
com que está me olhando, e o rubor no rosto porque não
pode se esconder do amigo gay, trazem-me de volta à
realidade. Ele abre a boca, provavelmente para explicar, mas
eu levanto a mão.

— Não quero saber.

Asher dá um suspiro de alívio.

— Obrigado.

— Minha única pergunta é: onde estão as chaves?


— Droga, não sei muito bem. — Murmura ele,
parecendo zangado consigo mesmo. — Mas devem estar na
sacola de presente sobre a mesa.

A sacola tem papel saindo por cima. Depois de procurar,


encontro a caixa das algemas e, sim, êxito! As pequenas
chaves estão dentro.

— Encontrei! — Digo, virando-me com as chaves na


mão.

— Graças a Deus. — Geme ele.

Um olhar suspeito cruza o rosto de Asher e seus olhos já


não estão cheios de confiança e calor. Era a bofetada que eu
precisava para retornar à realidade.

— Só vai levar um segundo. — Prometo, enquanto me


ajoelho no lençol e coloco a chave na fechadura.

Logo depois de um pequeno giro e um clique, Asher


encontra-se livre. Ele baixa os braços rapidamente e puxa o
lençol para cobrir-se, enquanto se afasta de mim.

Saio da cama para lhe dar espaço e percebo que ele


fecha os olhos e se concentra em respirar, antes de olhar os
pulsos. Quando me dou conta que a pele está irritada,
aproximo-me.

— Oh meu Deus, você está ferido.

Ele levanta a mão para me acalmar.

— Estou bem.

Só que ele não está bem, parece perdido.


— Então...? — Pergunto, sem ter certeza do que ele quer
que eu faça agora.

Insegura com o que deveria fazer.

Mexo as pernas, tentando me acalmar e falhando. Asher


suspira e nega com a cabeça, sem fazer contato visual.

— Você tinha razão. Não deveria ter ficado com Elisa.

Fico de boca aberta. Não achei que iria falar sobre isso e
por um momento, não sei o que dizer. Quando ele levanta o
rosto, está tão culpado e arrependido que minha própria
culpa e necessidade de dizer a verdade está na ponta da
língua.

Encolho um ombro.

— Bom, agora você sabe.

E talvez agora ele fique longe da “Elisa”, para o seu bem,


embora só a ideia me faça querer chorar por dentro.

Asher balança a cabeça, franzindo o cenho.

— É tudo o que tem a dizer?

Olho para ele sem saber o que mais poderia dizer, a


menos que cuspisse uma grande verdade. O que, claro, não
faço. Ele está obviamente confuso.

— Não está chateado que fiquei com ela, de todas as


formas, pelas suas costas?

Exalando um longo suspiro cansado, balanço a cabeça,

— Não. — Respondo honestamente.


Na verdade, estou muito, muito contente que ele tivesse
ficado comigo, de todas as formas.

— Nossas duas noites juntos serão umas das melhores


lembranças que vou guardar.

— Como eu disse, é com você que me preocupei desde o


início. Se queria continuar com isso e aproveitar as
oportunidades é.... — Não sei como dizer ou mesmo se
deveria dizer. — Além disso, tenho o pressentimento de que
não... a incomodou.

Quando Asher me olha confuso, eu levanto a mão.

— Bem, posso imaginá-lo tentando parar... e ela só


querendo mais.

Ele não diz nada, recusando-se a falar disso e como não


quero que pense que estou puxando assunto de vestiário
masculino, olho para outro lado.

Mozart está na sua gaiola, inclinando a cabeça de lado,


estudando-me. Pergunto-me se ele sabe que eu sou a mesma
pessoa de ontem à noite.

— Se não quer comer agora, está tudo bem. — Digo,


esperando que ele não queira, porque preciso de um tempo
longe para pensar.

— Não. Vamos. Tenho que sair um pouco para tirá-la da


cabeça.

Quero deixar sua mente em paz mais do que a minha,


então vamos para a pizzaria mais próxima. Faço qualquer
coisa por ele.
Comemos em silêncio, perdidos em nossos
pensamentos. Asher não falou o que pensava ou o que
planejava com "Elisa" e eu fico grata por isso. Quando o deixo
na sua casa, ele agradece e sai do carro.

Antes de entrar, ele vira-se e diz que eu sou um amigo


de verdade.

Sinto-me perdida depois disso. Não posso continuar com


este segredo, não posso mais mentir, não posso
levar uma vida dupla. Preciso contar, ele merece saber a
verdade. Vai doer quando Asher me tirar da sua vida e vou
ter que lidar com isso. Eu só realmente, realmente não
gostaria de estar presente quando ele soubesse a verdade,
mas é melhor que saiba por mim.

Amanhã, prometo. Vou encontrar com ele pela manhã e


contar tudo.
PARTE I

ASHER
Quando chego ao Forbidden à noite ainda me sinto sem
energia, pronto para deitar de novo na cama e hibernar o
resto do inverno.

Gostaria muito de “matar” meu turno e encontrar


Elisa. Poderia passar no seu trabalho, mas sem perguntar
por ela desta vez, não quero parecer um perseguidor total.
Melhor esperar uns dois dias antes de voltar lá. Merda.

Estou bocejando quando cruzo a porta da frente e


cumprimento Harper, perguntando-me se poderia talvez jogar
a carta de irmão com Pick e não trabalhar esta noite. Então,
lembro que, droga, Mason também vai estar ausente.

Ele enterrou a mãe há apenas dois dias e ainda tem que


fazer a mudança da irmã mais nova para o seu apartamento.
Estamos com pessoal insuficiente.

Desanimado, porque a partir do momento que Elisa se


arrastou para fora da minha cama esta manhã nada
aconteceu do jeito que eu queria, volto a bocejar.

— Santa Merda. — Explode Ten, aparecendo na minha


frente e me obrigando a parar. — O rock star finalmente fez
sexo, heim? O tempo é uma merda, cara.
Ele bate no meu ombro para me dar os parabéns e eu
faço uma cara feia, porque odeio que sempre saiba quando
estive com uma mulher. Estou começando a me afastar do
seu rabo chato quando ele continua o assunto.

— Não acredito que você descobriu que a sua garota


baterista é a garota com a camiseta do Incubus. Ou, merda,
por fim ela criou coragem e contou?

Faço uma pausa tentando dar sentido ao que ele acabou


de dizer. Por fim, balanço a cabeça.

— O quê?

— O quê? — Diz Ten de volta, como se não entendesse


minha confusão.

— Jesus. — Murmuro. — Juro, você só faz sentido cinco


por cento das vezes. Por que está falando da garota com a
camiseta do Incubus? E quem diabos é essa garota
baterista?

Os olhos de Ten brilham.

— Ahh, merda. Você não dormiu com a baterista ontem


à noite, certo? — Pergunta ele, parecendo ofendido. — Então,
com quem diabos você transou?

— Não é de sua conta. — Grunho. — Agora explique-se.

— Oh, você sabe... — Ten dá de ombros e começa a se


afastar. — Não é nada, só me ignore.

Mas eu o puxo de volta pela camiseta.

— Não acredito, filho de puta. Explique.


Ele suspira e esfrega o rosto.

— Jesus, não posso acreditar que ela ainda está com


muito medo para contar.

— Ten. — Advirto.

— Droga, está bem. Não dá para manter um segredo


desses para sempre. O baterista da sua banda...

— Remy? O que tem ele? — Pergunto, ainda mais


confuso.

— Não é ele, é ela.

Fecho os olhos, sem entender.

— Uh?

— Deus! — Dando um suspiro de desgosto, Ten nega


com a cabeça e olha para o teto. — Seu amigo gay, Remy, não
é um menino gay. Ele sequer é um homem. Na realidade é
uma mulher, com seios e todas as outras coisas que vêm com
as garotas.

Imediatamente abro a boca para dizer que é mentira,


mas as palavras não saem. Estou com a cabeça girando,
sempre pensei que Remy tinha alguma coisa feminina nele,
como quando me encorajou a “falar”, e.... Jesus, o cara usava
uma máscara. Merda.

De repente tudo faz sentido. Mas ainda não estou


preparado para aceitar completamente a ideia. Remy não
pode ser uma garota... simplesmente não pode.

Estou tentando entender o que está acontecendo


quando Ten lança outra bomba.
— E não é só uma mulher qualquer, é a garota da
camiseta do Incubus, aquela para quem você escreveu a
música.

— Se.... se Remy realmente for uma garota, que diabos


faz você pensar que ela é a garota da camiseta do Incubus?

— Porque a noite que ela cantou no karaokê vi que era


amiga da Jodi. E como eu conheço a Jodi perguntei quem era
a garota, mas ela só me disse que o nome dela era Remy.

Continuo balançando a cabeça, porque realmente não


posso sequer considerar isto. Será mesmo que a ruiva que
estava junto com minha garota da camiseta do Incubus é a
companheira de apartamento de Remy?

Talvez, seja. Não prestei muita atenção à ruiva. Diabos,


não consigo lembrar claramente como era a garota para quem
escrevi a música.

— Assim, — Continua Ten. — Quando Remy, seu


baterista, apareceu aqui com Jodi, somei dois mais dois e....
bam, descobri tudo. E ela admitiu quem era quando
perguntei. Impressionante, não?

Impressionante? Impressionante não é exatamente a


palavra que eu usaria.

— Você está morto. — Grunho, antes de dar um soco no


rosto dele.

— Merda. — Grita Ten, apertando os olhos e afastando-


se de mim. — Que porra, homem?
— Que porra pergunto eu. — Rujo, avançando para
pegar a frente da camiseta dele e socá-lo outra vez.

De repente muitas pessoas estão ali. Quinn me arrasta


para longe do imbecil que eu queria matar e Noel ajuda Ten a
permanecer de pé.

— Como pôde não me contar nestes meses todos que


sabia o nome dela? — Pergunto, lutando contra Quinn. —
Você viu quanto tempo passei a procurando, o quanto eu
queria saber alguma coisa sobre ela.

Ten faz uma careta e limpa o rosto.

— Sim, bom... a vingança é uma merda, não?

Eu não tenho ideia do que ele está falando.

— O quê?

— Caroline. — Diz ele entre dentes. — Você sabia que


ela entrava escondida no meu quarto e não disse nada. Só me
deixou continuar inconscientemente traindo meu
melhor amigo. Bom, vá à merda. Você está tendo o que
merece.

Fico de boca aberta e a emoção toma conta de mim. Não


tinha ideia que Ten guardava rancor por isso. Durante todo
este tempo pensei que fôssemos amigos que brincavam um
com o outro, mas agora...

— O que em nome de Deus está acontecendo aqui? —


Pergunta Pick, saindo apressado do escritório com Knox logo
atrás.
Puxo o braço que Quinn está segurando, mas não para
bater em Ten, bufo e aponto para o idiota de olho roxo.

— Pergunte a ele. Obviamente, sabe mais do que


acontece na minha vida do que eu.

— Ten? — Diz Pick, virando-se para ele.

Enquanto, Ten murmura alguma coisa, passo a mão na


boca, sem poder acreditar no que ele disse. Quando começo a
me afastar, Pick segura meu braço.

— Ouça, onde você vai?

Balanço a cabeça, sem ter certeza de mim mesmo.

— Preciso de respostas e só uma pessoa me pode


dar. Tenho que ir.

Compreensão e preocupação brilham nos olhos de Pick,


mas ele concorda.

— Claro, o que precisar. Tudo bem?

— Não. — Grunho e passo as mãos pelo cabelo. — Não


sei. Só preciso ir.

Pick faz um gesto de despedida com a mão enquanto eu


dou um último olhar para Ten, chocado e ferido que não
prestei atenção nele todo este tempo.

Depois de sair não telefono para Remy, não estou certo


se posso ouvi-la mentir mais. Ligo para o Gally e o enrolo
para conseguir o número da Jodi, com a promessa de que
não vou fazer sexo com ela.

Jodi responde no segundo toque.


— Alô?

— Oi Jodi, é o Asher. Estou tentando falar com o Remy,


mas ele não atende o celular. Preciso entregar algumas
coisas. Qual é o endereço de vocês?

— Hum... oh... Bom, Remy não está aqui agora.

— Tudo bem. Posso deixar com você, se estiver em casa


e você pode entregar a ele quando chegar.

— Oh! Bom, certo. — Ela parece aliviada e sei que está


mentindo. — Nesse caso...

Depois que Jodi me dá o endereço delas, subo na moto.

— Obrigado. Daqui a pouco chego aí. — Digo, antes de


desligar e sair do estacionamento.

Chego ao apartamento de Remy em tempo recorde e


depois de correr pelas escadas até o segundo andar, bato na
porta até que sua companheira atende. Jodi coloca a cabeça
para fora e me dá um sorriso estranho.

— Oi, sexy. — Então ela olha para minhas mãos


enterradas nos bolsos. — Uh... o que você vai deixar
para Remy?

— Nada. Era mentira.

Tiro uma das mãos do bolso para empurrar a porta,


mostrando que ia entrar. Jodi não tenta me deter, dá um
passo para trás e me deixa entrar, olhando-me boquiaberta.
— Oh... o quê...?

— Ela não está aqui ou você mentiu sobre isso também?

Jodi arregala os olhos.

— Merda. Você sabe. — Sussurra ela.

— Sim. — Digo, assentindo lentamente e olhando ao


redor, procurando sinais de que o baterista que eu conhecia
realmente morava aqui.

Mas é apenas uma típica sala de estar que poderia ser


do apartamento de qualquer pessoa. Vou em direção a um
corredor próximo e começo pela primeira porta que vejo meio
aberta.

— Hum... o que você está fazendo? — Pergunta Jodi,


correndo atrás de mim.

Não sei ao certo, nunca entrei no apartamento de uma


mulher para vasculhar. Estou meio cego, metade da minha
consciência me diz para parar e me comportar, a outra
metade precisa de respostas.

A porta se abre para um banheiro claramente feminino,


com produtos para o cabelo, bijuterias e todo tipo
de merda de garotas sobre a bancada. Vejo o
desodorante em aerossol que Remy me emprestou quando
estivemos em Chicago.

Merda. Chicago. Tornamos-nos amigos naquele quarto


de hotel. E todo o tempo ela nunca considerou que seria
muito mais honesto me dizer que não era homem.

Vou para a porta seguinte, abro e acendo a luz.


Quando me dou conta que este é, sem dúvida, o
quarto dela, prendo a respiração. Pintado em magenta
brilhante, azul elétrico e verde limão, tem pôsteres de rock e
bateristas espalhados diagonalmente por todas as paredes.

No pôster de Neil Peart está escrito “mantenha a calma e


toque bateria”, em outro “seja fiel a seus sonhos” e a imagem
de um par de baquetas, os outros pôsteres são de bandas
como Metallica, Iron Maiden, Alice in Chains... Incubus.

Este quarto é tão Remy..., entretanto é o quarto de uma


garota. Respiro fundo quando vejo um sutiã branco aos pés
da cama. Jesus, Remy definitivamente é uma mulher.

E é então que eu vejo. Uma máscara de látex pendurada


na cabeceira da cama. Uma máscara com o rosto de Sticks.
Pego e imediatamente espirro, mas em vez de jogá-la de lado,
seguro com força.

Na porta, Jodi está com o celular na mão escrevendo


uma mensagem.

Suspiro e balanço a cabeça.

— Não. — Digo. — Não, não faça isso. Não consegui me


preparar para isso e não quero que ela fique preparada
também.

Jodi culposamente baixa o telefone.

— Ela nunca quis... — Começa, mas eu levanto a mão


para detê-la.

— Não quero ouvir de


você. Quero que Remy explique... tudo.
A preocupação ilumina o rosto dela enquanto morde o
lábio.

— O que você vai fazer?

— Não tenho ideia. — Respondo, com uma risada


áspera.

Minha mente não para de girar. Não estou exatamente


zangado, talvez, um pouco de saco cheio, mas principalmente
confuso. Não consigo entender por que... por que fingir ser
homem? Não faz nenhum sentido. E por que achou que não
poderia me contar?

Achei que Sticks e eu tínhamos nos aproximado tanto


que ele, ou ela, confiava em mim como eu confiava... oh,
droga. De repente lembro de toda a merda que contei desde
que nos conhecemos. A maior parte eram provavelmente
coisas que eu não teria admitido a uma mulher, como o
quanto adoro comer uma boceta e.... Oh, Jesus! Tratei-a
como se fosse um dos meus amigos, chamando-a de filho de
puta, perdedor, imbecil.

Santa Mãe, nunca chamaria uma mulher por qualquer


um desses nomes.

E então lembro de falar sobre a garota com a camiseta


do Incubus. Minha cabeça quase entra em curto-circuito com
isso. Falei com ela a respeito dela!

Por que não me disse nada? Ela sabia como eu me


sentia a respeito da garota com a camiseta do Incubus, como
a procurei durante meses.... Espere. Será que Remy soube
que procurei por ela? Acho que não falei isso, só disse que
queria terminar com essa história. Talvez, eu tenha feito ela
acreditar que não queria nada com ela como mulher.

Mas nada disso explica por que ela fingiu ser um


homem.

Ao final do corredor, a porta do apartamento se abre e


ouço uma voz.

— Oi puta. Estou em casa e trouxe comida. Sorvete de


chocolate com caramelo em dobro e você vai me ajudar a
comer isto.

PARTE II

Solto um suspiro. Essa definitivamente é a voz


de Remy.

Todas as minhas perguntas estavam a ponto de serem


respondidas. Jodi e eu silenciosamente nos olhamos
enquanto escutávamos os passos irem provavelmente em
direção a cozinha para deixar o sorvete.

— Jodi? Oi? Está em casa?

— Uh... Sim. — Jodi me lança um olhar cauteloso, como


se estivesse com medo que eu fosse cortar sua garganta ou
algo do tipo, se dissesse a verdade. — No seu quarto, puta.

— O que está fazendo no meu quarto? Não importa,


estou feliz que esteja aqui. Precisa me ajudar a encontrar
uma maneira de dizer ao Asher... — Remy prende a
respiração quando me vê, parando de repente e apertando o
peito.

Não tenho ideia do que estava esperando, possivelmente


que estaria vestida como Sticks, embora a maldita máscara
ainda estivesse na minha mão. Mas a última coisa que
esperava ver era... Elisa. Eu fico de boca aberta, a surpresa
me impedindo de dizer qualquer coisa.

Com os olhos arregalados de pânico, ela olha para Jodi.


Quando retorna o olhar para mim e vê a máscara, vira-se
novamente para sua companheira de apartamento.

— Ele já sabe. — Jodi sussurra, com uma careta de


simpatia.

Remy, Elisa ou quem quer que fosse, olha para mim.

— Asher... — Começa em voz baixa, dando um passo na


minha direção.

Retrocedo e levanto a mão, rejeitando-a, tentando


entender o que está acontecendo. Mas, merda, droga,
porra.... Isto muda tudo. Disfarçar-se de homem era uma
coisa, isso não me deixou terrivelmente zangado, mas me
enganar como Elisa também e até mesmo transar comigo...

— Que merda do caralho está acontecendo? Vou


trabalhar esta noite e descubro que você não só é uma
garota, mas é a garota para qual escrevi uma música e estive
procurando por meses. E agora, quando a vejo entrando no
quarto, é Elisa também? Quem você é realmente, porra?
Oh Deus, não tinha me dado conta até esse momento
que não sabia o verdadeiro nome dela.

— Eu... eu sou Remy. — Responde ela em voz baixa.

Fecho os olhos, silenciosamente ordenando que não


mentisse agora.

— Juro. — Diz ela, levantando as mãos. — Meu nome


completo é Remy Elisa Batalham. Elisa é meu segundo nome,
mas só meu tio me chama assim.

— E aparentemente entende inglês perfeitamente bem.


— Provoco.

Então, dou-me conta. Droga, ela entende inglês.


Entendeu tudo o que eu disse quando estivemos juntos,
coisas que nunca teria admitido a uma garota que acabara de
conhecer.

Cristo, como as mentiras foram se acumulando. Passo


os dedos pelo cabelo, puxando-o, tentando me acalmar, mas
simplesmente... tudo isto está me deixando louco.

— Precisa sentar? — Pergunta ela, estendendo uma mão


para mim, preocupada.

Dou um olhar assassino.

— Não, não preciso me sentar, droga. Preciso da porra


de uma explicação. Por quê?

— Eu só... — Seus cílios piscam rapidamente e posso


ver as lágrimas alagando seus olhos, enquanto ela abraça a si
mesma. — Só queria uma oportunidade de estar na banda.
Balanço a cabeça, confuso, não é a resposta que eu
esperava.

— O quê?

— NonCastrato. Fui ao teste para baterista como eu


mesma..., mas aquele idiota do Galloway não me deixou tocar
uma única música com vocês.

Fico de boca aberta, outra vez.

— A garota roqueira punk? — Sussurro com horror. —


Era você?

Quando ela concorda, eu atiro os braços para cima e


bufo. Mas é obvio. Com a minha sorte, a maior mentirosa do
planeta é “as três mulheres” com quem eu tinha sonhado e
fantasiado ultimamente.

Perfeito.

— Qual era a da peruca de Tina Turner?

Ela dá de ombros e parece um pouco doente.

— Nada. Simplesmente pensei que seria legal para o


papel.

O papel? Sim, definitivamente tinha estado


interpretando um papel... durante toda porra do mês.

— Quantas identidades secretas você tem?

Remy balança a cabeça e baixa o rosto.

— Essas são todas. — Quando eu respiro com força, ela


levanta o olhar e franze o cenho. — De verdade!
— Deixe-me ver se entendi. — Digo, passando as mãos
pelo cabelo e tentando endireitar tudo na minha cabeça
confusa. — Então, inventou o "Sticks", o baterista gay, para
entrar na banda...

Eu me detenho abruptamente e faço uma careta, porque


percebo que Sticks não existe. Todas as rodadas
de Call of Duty que jogamos, as brincadeiras, escrever
músicas juntos, ele me ajudando com toda a merda do meu
pai...

Quando lembro que em Chicago ele, ou ela, estava


disposto a me defender com nada mais que gás de pimenta e
um apito, uma flecha de dor me atravessa. Sticks, meu
amigo, foi-se para sempre. E por que, merda, não me
ocorreu que gás pimenta e apito são preventivos femininos
clássicos contra o estupro? Eu sou um idiota do caralho.

Quantas vezes ela deve ter rido de mim por ser um


idiota sem noção?

Fecho os olhos enquanto Remy continua.

— Na verdade, não era minha intenção me juntar à


banda. Simplesmente estava tão zangada por vocês nem me
ouvirem que planejei tirar máscara e dizer: “rá, uma mulher
pode tocar bateria tão bem quanto um homem”. Mas você me
convidou para tocar na sexta-feira e eu nunca tinha tocado
em frente à uma plateia antes. Queria saber como era. Nessa
mesma noite, fomos chamados para fazer o show em Chicago
e você parecia tão emocionado, não podia dizer que era uma
garota e simplesmente deixá-los. Se Gally tivesse me
descoberto, eu teria ido a Chicago?

— Ah... então tudo isto foi apenas para me ajudar? —


Grunho.

Ela fica vermelha e deixa escapar um pequeno suspiro.

— É obvio que não, mas contribuiu para não contar


imediatamente. Até que passei do ponto onde podia contar
tudo sem causar um grande sofrimento e depois estava muita
assustada... porque sabia que reagiria desta maneira.

Desta maneira? Ela pensa que eu estou


exagerando, hein? Reviro os olhos. Legal.

— Onde se encaixa a garota da camiseta do Incubus em


tudo isto?

Tenho que saber.

— Não se encaixa. — Diz ela, piscando confusa.

Levanto uma sobrancelha, dizendo que tente de novo,


então ela aperta os dentes e grunhe: — Só soube dessa
música depois que me juntei à banda, foi Ten quem me falou
sobre ela.

Caralho, Ten.

— Mas quando leu a letra percebeu que era sobre você?

— Depois que li a letra, sabia que havia uma clara


possibilidade de que eu fosse a garota, sim.

— Incrível.
Passo as mãos pelo rosto e me viro, porque é muito
difícil olhar para Elisa e não lembrar cada detalhe de tudo o
que tínhamos feito na cama.

— Posso confirmar essa parte. — Diz Jodi. — Realmente


ela não tinha ideia de que era a garota da canção até...

Eu me viro e olho para ela, rapidamente calando-a.

— Sabe... — Jodi aponta com o polegar por cima do


ombro à medida que retrocede para a porta. — Vou deixar os
dois a sós para que discutam isto.

E sai em disparada do quarto.

Olho para Remy, que parece ter encolhido ainda mais,


como se esperasse que eu a atacasse fisicamente. Estive
dentro desta mulher, vi-a nua, toquei, provei e tive o melhor
sexo da minha vida com ela. Sonhei que poderíamos ter
algum tipo de futuro juntos e na realidade, pensei que
tínhamos começado algo grande.

Mas tudo foi uma mentira.

Não tenho certeza se compro sua história sobre a garota


da camiseta do Incubus, mas não tenho como descobrir se
está falando a verdade, assim, vou direto para a questão mais
significativa para mim... e me doía perguntar.

— E Elisa? — Sussurro.

Lágrimas enchem os olhos dela, enquanto balança a


cabeça.

— Eu achava que nunca a conheceria. Não imaginava


que você voltaria ao hotel para pegar sua carteira e a
descobriria no chuveiro. Não tinha ideia que iria
ao Castañeda’s e a veria no trabalho. E você nunca deveria
tê-la levado para sua casa. Eu avisei, droga, eu não falei para
você se afastar dela?

— Um pouco hipócrita da sua parte, não é? — Digo,


bufando. — Já que você é ela... por que não se afastou na
primeira vez que a beijei?

Ela fica de boca aberta, surpresa, como se isso fosse a


pergunta mais ridícula que alguém já tinha feito.

— Já se olhou no espelho?! — Grita. — Você é incrível.


Nenhuma mulher heterossexual em seu juízo perfeito poderia
remotamente resistir a tudo isso.

Quando ela estende a mão para me abranger da cabeça


aos pés, eu dou uma risada áspera.

— Certo.

— Estou falando sério. — O rosto dela fica pálido


enquanto me observa, como se soubesse que não importa o
que diga, tudo entre nós terminou. — A última coisa que
eu queria era me apaixonar por você. Inferno, depois que um
cantor de merda destruiu minha fé nos homens por completo,
esperava desprezá-lo totalmente. Mas assim que o conheci
eu... bom, a prova do quanto você é incrível é que conseguiu
romper com o estereotipo.

— Bom para você, porque neste momento eu não sou


muito seu fã. Jesus, na realidade não sei nada a seu respeito.
Você é uma completa estranha para mim.
— Asher. — Sussurra ela, pressionando a mão no peito
enquanto duas lágrimas escorregam por seu rosto.

Odeio vê-la chorar, mas a pressão em meu peito torna


impossível ir até ela para consolá-la. A porra do meu coração
está partido.

— Sim, você me conhece. Sabe tudo o que tem que


saber sobre mim. O que eu falei quando era Sticks, é
exatamente o que eu penso.

— Exceto que realmente não é um homem, realmente


não é gay, e.... ah sim... entende o inglês perfeitamente.
Cristo. — Digo, puxando o cabelo. — Quantas vezes você não
riu, achando-me estúpido por não descobrir?

— Nunca. — Jura, balançando a cabeça enfaticamente.


— Nunca, nem uma única vez ri de você.

— Aposto que sim. — Murmuro. — Tratei você como um


cara. Empurrava-a e brincava, chamei-a por nomes que
nunca chamaria uma mulher.

Remy abraça a si mesma.

— Não me importava. Mostrava que éramos amigos.

— Sim, nós éramos. Provavelmente foi um dos amigos


mais próximos que já tive. E você simplesmente... tirou isso
de mim. Assim como quando entrou por essa porta e me
mostrou que Elisa, a única mulher que sacudiu meu mundo,
não existe também.

— Não, eles existem. — Remy nega com a cabeça mais


uma vez. — Eles existem. Sticks e Elisa ainda estão aqui. —
Diz ela, batendo com a mão no peito. — Só que agora são
uma única pessoa. Remy.

É a minha vez de negar com a cabeça.

— Não. A única pessoa que estou vendo é


uma mentirosa da porra.

Dou a volta para sair rapidamente do quarto.

— Espere! E amanhã?

Paro e olho para ela de novo, franzindo o cenho.

— O quê?

— É sexta-feira. A banda. Dia de tocar no Forbidden.

Merda. E para piorar tudo ela acaba de destruir minha


banda, também.

— Ah, você não está mais na banda. — Anuncio em voz


baixa.

A devastação toma conta do seu olhar, mas ela concorda


com respeito.

— E no domingo? Ainda precisa de alguém para ser


o DJ do casamento de Pick.

Caralho.

Aperto as têmporas quando a dor de cabeça começa.


Como no inferno essa pessoa se tornou tão essencial em
algumas poucas semanas? Não tenho tempo para encontrar
um novo DJ e não confio em ninguém mais para ficar no som
como confiava em Sticks... aliás, nela.
— Se ainda estiver disposta, Pick precisa de você. —
Consigo dizer relutantemente através dos meus dentes
cerrados.

Gostaria de mandá-la a merda, mas não posso fazer isso


com meu irmão. Pick quer que alguém toque Baby Love para
ele dançar com a Eva.

— É obvio que estou disposta.

Faço um gesto de agradecimento e olho para ela


fixamente.

— Simplesmente mantenha-se longe e, droga, não fale


comigo. Na verdade, se eu nunca mais precisar vê-la depois
de domingo, seria muito bom.

Lágrimas enchem seus olhos, mas ela concorda.

Sem ser capaz de ficar um segundo a mais, saio e corro


até meu apartamento.

Merda, esqueci de fechar minha casa direito antes de


sair para o trabalho mais cedo... porque estive muito ocupado
pensando em encontrar Elisa. Bom, encontrei-a. E desejava
não o ter feito.

Meu telefone me alerta de uma mensagem de texto


do Pick, mas não posso responder agora. Dizendo palavrões
em voz alta, chuto a parede e depois atiro no chão todas as
coisas que estavam em cima da mesa, uma delas a sacola de
presente das algemas que usei com....

— Filha de puta. — Rujo.


Pego meu caderno de letras e atiro do outro lado do
quarto também. A canção que tinha escrito com ela de
repente parece uma grande brincadeira, e provoca um gosto
ácido na minha boca. Não posso acreditar que ela me
enganou completamente.

Olho com nojo a caixa do Call of Duty em cima da mesa


e quero destroçá-la com minhas próprias mãos. Jogo-a contra
a parede e sem querer atinjo a gaiola de Mozart.

— Merda. Sinto muito, Mozart.

Mas quando vou olhar, Mozart não está lá. E a porta


está aberta.

Tenho certeza que não o deixei sair. Com tudo o que tem
acontecido com Elisa estes últimos dias, não tive tempo de
deixá-lo correr livremente, desde segunda-feira.

— Mozart?

Apesar de saber que ele não estaria ali, revisto cada


centímetro da gaiola. Depois, fico de joelhos e olho em baixo
da cama, seu esconderijo favorito.

— Mozart. — Chamo novamente.

A única coisa ali em baixo eram algumas nozes que ele


armazenou. Quase destrocei o apartamento, mas a única
coisa que sei com certeza depois de uma hora de busca é que
meu esquilo se foi.
REMY
Destroçada é apenas uma palavra para o que senti
depois que Asher saiu do meu quarto.

Já sofri antes, fui enganada e traída pelo homem com


quem queria me casar, esmagada quando minha mãe ficou
louca e me abandonou, uma intrusa a cada reunião familiar
porque não era exatamente como eles. Estou acostumada a
não ter o que desejo. Mesmo assim, de alguma forma isto é
pior, porque desta vez sei que mereço. É cem por cento minha
culpa. Cada decisão que tomei neste mês que passou me
trouxe a este momento.

Não consigo acreditar que minha única temporada em


uma banda tenha terminado assim, mas o que doeu mais foi
ver a expressão de dor no rosto de Asher quando percebeu o
quanto eu tinha mentido. Não acho que tenha machucado
alguém assim antes.

Quero morrer.

Jodi tentou me consolar. Não ajudou muito. Então ela


tentou a técnica do supere, pare de chorar e “bola pra frente”.
Isso também não funcionou. Eu não quis nem sorvete.
Finalmente rendeu-se e me deixou sozinha na cama, debaixo
das cobertas e com um monte de lenços de papel que
terminei em dois minutos.
Não acredito que alguém na vida comece uma história,
pensando em ser vilão. As pessoas têm um objetivo e tentam
conquistá-lo.

Eu nem sequer tinha um objetivo que valesse a pena.


Não tinha uma vida para salvar e não estava lutando por
justiça ou liberdade. Só fui totalmente egoísta, querendo
sentir que pertencia a uma banda. E mesmo assim, quando
fiz tudo para alcançar esse sonho, terminei pisoteando outro
sonho que nem sequer tinha me dado conta que era
muito melhor... até ser muito tarde.

Em algum momento, Asher deve ter dito ao Heath e


ao Gally que não iríamos tocar no Forbidden e o porquê. As
mensagens começaram a aparecer perto da meia-noite. A
maioria era do Gally.

Gally: Você é a porra de uma garota? Que caralho? Que


maneira de separar uma banda, vaca. Só queria ser a próxima
Yoko Ono, não?

Gally: Ouça, se for sexy, quer transar?

Só recebi uma do Heath.

Heath: ESTE é o motivo do porquê era uma má idéia ter


uma garota na banda.
Então, chorei um pouco mais, porque tinha arruinado
as coisas para todos os meninos. Em algum momento, dormi,
mas só para despertar algumas
horas depois e voltar para minha festa de autocompaixão,
antes de dormir de novo.

Estou com a cabeça pulsando e os olhos inchados


quando tropeço para fora da cama na manhã
seguinte. Prendo o cabelo em um coque desordenado no alto
da cabeça, os fios negros caindo por toda a parte, e an
descalça até a cozinha, vestindo nada mais que uma camiseta
e shorts por baixo de um roupão.

Não tenho fome nem sede, mas estou cansada de ficar


no meu quarto, então resolvo fazer um chocolate quente.
Estou saindo da cozinha com a xícara na mão quando a porta
do quarto de Jodi abre e passos se aproximam.

Esperando ver minha companheira de apartamento,


preparo-me para dar um bom dia mais ou menos alegre...,
mas ela não é a pessoa que aparece na minha frente. Arregalo
os olhos.

— Que inferno? — Grito.

Gally ri e seu olhar vai para as minhas pernas nuas.

— Então você é o verdadeiro Sticks, hã? Parece que


precisa colocar sua máscara de novo, doçura.

Depois disso ele sai, todo presunçoso e asqueroso. Suas


palavras me doem e imediatamente levo a mão ao rosto,
sabendo que estou parecendo com o inferno depois da noite
que tive. Quando a porta de Jodi se abre outra vez eu aperto
os dentes.

— Não posso acreditar que trouxe esse idiota para o


nosso apartamento ontem à noite. Ele é um total...

Heath? Quando outro membro do NonCastrato aparece


fico em choque. Se meu queixo não fosse fixa teria
ricocheteado no chão.

— Que... como...Huh? — Gaguejo.

Heath fica vermelho, mas me cumprimenta com a


cabeça respeitosamente, antes de correr para a porta e fugir.

Fico olhando boquiaberta, sem entender nada.


Momentos depois Jodi sai do quarto, queixando-se de dores
musculares, espreguiçando-se e dando um
grande e satisfeito bocejo.

— Mmm... dia.

Só consigo olhar fixamente enquanto ela passa ao meu


lado e entra na cozinha. Dou a volta e sigo-a.

— Jodi? — Digo finalmente, em voz baixa, enquanto


observo-a preparar a própria xícara fumegante.

— Sim? — Pergunta, de costas para mim. —


Finalmente está pronta para me deixar ajudá-la a ficar mais
animada?

— O quê? Não. Uh... eu prefiro que me explique por que


Gally e Heath acabam de fugir do seu quarto.

— Certo. — Diz ela, voltando-se para mim com um


sorriso brilhante. — Oh puta, parece que você visitou o
inferno. Precisa urgente de uma ducha e fazer algo com seu
rosto.

— Foco, mulher. Gally e Heath. — Murmuro, apertando


os dentes.

Jodi dá de ombros.

— Oh, certo. Bom, eles continuavam brigando por


mim, assim... só os ensinei a compartilhar.

Os poucos goles de chocolate quente que eu


acabara de tomar reviram no meu estômago, ameaçando sair
de novo.

— Eca. — Balbucio, tentando não imaginar o que


aconteceu no quarto dela e ainda assim já imaginando.

Deixo o chocolate quente na bancada e volto ao meu


quarto para chorar mais um pouco. Não consigo entender
porque ver minha companheira de apartamento com dois
caras que eu nem sequer queria para mim me dá vontade de
chorar. Mas quando Jodi vem ao meu quarto alguns minutos
depois para ver como eu estou, sinto-me suficientemente
infeliz e amargurada para não querer conversar, porque ela
não parou nada em sua vida para estar comigo.

Embora tenha tentado.

Jodi só suspira e vai embora, deixando-me sozinha no


apartamento. É difícil não pensar em como Asher não teria se
dado por vencido tão facilmente se Sticks estivesse assim, tão
deprimido. Ele, com certeza, ficaria comigo.
O que me faz chorar de novo por ter perdido meu melhor
amigo.

Não sei quanto tempo se passou depois disso, mas estou


meio dormindo quando alguém bate na porta da frente.

Pensando que poderia ser Asher, pulo da cama e quase


desmaio quando o sangue chega rápido demais à minha
cabeça. Preciso de um segundo para recuperar o fôlego antes
de correr para a porta, tentando dar um jeito no cabelo.

— Santa merda. — Ofega Ten, retrocedendo. — Você é


assim como mulher?

— Não enche o saco Ten. — Repreende Caroline,


aparecendo atrás dele. — Ninguém pode parecer apresentável
depois da noite que ela deve ter tido. Como você está,
querida?

Balanço a cabeça tentando decifrar por que eles estão


aqui.

— O que estão fazendo aqui? — Finalmente consigo


perguntar.

— Sabemos que as coisas deram errado com Asher


ontem à noite, então estamos aqui para tentar ajudá-la e
descobrir um jeito de vocês fazerem às pazes.

Bufo e passo as mãos pelo rosto, olhando para Ten.

— Você também, huh?

Ele dá um suspiro aborrecido antes de admitir.

— Tive que contar e trouxe à tona um velho assunto que


nem me incomoda mais... só porque podia.
— Este é o motivo do olho roxo?

— É.

— Meninos. — Murmura Caroline, segurando meus


ombros e dando uma boa olhada no meu rosto. — Eles
acreditam que bater um no outro resolve tudo.

— Bom, normalmente resolve. — Discute Ten, atrás


dela.

Sua esposa o ignora.

— Bem, primeiro vamos tomar um banho. Você não será


capaz de pensar claramente até que se sinta humana de
novo.

— Porra, sim. — Ten esfrega as mãos, entra e fecha a


porta. — Minha mulher no banho com outra garota... vai ser
incrível de ver.

— Você fica aqui. — Adverte Caroline,


com as sobrancelhas levantadas. — Além disso, tenho certeza
de que ela pode tomar banho sozinha. — Então, vira-se para
mim e morde o lábio. — Ou não?

Quando digo que sim, Ten murmura um palavrão e nos


chama de algo equivalente a desmancha-prazeres, depois cai
no sofá e pega o controle remoto.

Caroline me empurra para o banheiro e escolhe uma


roupa para eu trocar antes de ligar o chuveiro e me deixar
sozinha. No piloto automático, tomo meu banho, visto-me,
passo um creme no rosto e prendo o cabelo.
Surpreendentemente sinto-me melhor quando termino, um
pouco mais humana outra vez.

Caroline e Ten olham na minha direção assim que entro


na sala.

— Bom, santa merda, que diferença faz uma pequena


ducha. — Diz Ten, erguendo as sobrancelhas.

— Cale a boca. — Caroline dá um tapa no braço do seu


marido antes de levantar-se e vir até onde estou. — Sente-se
melhor?

Dou de ombros.

Mostrando sua simpatia, ela pega minha mão e me guia


de volta ao sofá, sentando-me entre os dois.

Pensei que estivesse zangada com ela por ter armado o


encontro com Asher na noite de quinta. Mas então... Jodi me
trouxe à razão. Não foi Caroline que colocou o pênis dele
dentro de mim. Poderia tê-lo detido em algum ponto.

— Então... — Começa ela, virando-se para me olhar


enquanto acomoda uma das pernas sobre o sofá. — Viemos
aqui para ajudá-la a ter o Asher de volta, porque sinto que o
encontro que planejei no restaurante a outra noite só piorou
as coisas e porquê... bom.... porque acho que posso ter uma
chance melhor de ser perdoada por ter sido tão intrometida.

Fico surpresa diante da admissão crua, mas


basicamente entendo onde ela quer chegar, apesar de tudo.

— Não... nós não... Asher não vai me perdoar. Não tenho


nenhuma oportunidade com ele nem no inferno.
— Bobagem. — Diz Ten, mexendo a mão como se minha
situação não fosse grande coisa. — Só faça um bom sexo com
ele e vai perdoá-la por tudo.

— Sexo... — Atiro, franzindo o cenho. — Foi como me


meti neste desastre, em primeiro lugar. Se tivesse sido capaz
de manter a porra das minhas mãos afastadas poderia,
talvez, tê-lo convencido a me perdoar. Mas não... não
consegui manter minhas pernas juntas, não é?

— Que seja. — Bufa Ten. — O sexo resolve qualquer


coisa com um cara.

— Não sei. — Murmura Caroline, mordendo o lábio


pensativa. — É de Asher que estamos falando, não de você.

— Tem razão. — Grunhe Ten. — Hart não é normal.

Então se enterra mais fundo no sofá, como se não


tivesse mais ideias.

— Espere! — Grita Caroline de repente, sentando-se


mais ereta. Depois vira-se e segura minhas mãos. — Como
você atraiu a atenção dele?

Franzo o cenho, pensando no dia em que fiz o


teste como Sticks, mas Caroline responde sua própria
pergunta.

— Sua voz. Quando cantou no karaokê.

Olho para ela e sei exatamente o que está pensando.


ASHER
Embora a banda não tenha tocado, trabalhei sexta-feira
à noite, precisava fazer alguma coisa, não queria ficar no meu
muito silencioso apartamento.

Não encontrei Mozart, ele não apareceu na minha porta.


Quando vi um esquilo morto na rua quando ia para a
Forbidden, disse a mim mesmo que não podia ser Mozart, ele
deve ter encontrado um lindo e tranquilo parque em algum
lugar e estava vivendo seu sonho, recolhendo nozes e subindo
em árvores. Apesar de tudo, ainda sentia muita saudade.

No sábado cheguei cedo ao trabalho, embora fosse outra


noite horrível de karaokê. Merda, gostaria de passar o resto
da vida sem ouvir essas músicas.

Para meu azar, meia dúzia de jovens já estavam se


preparando para cantar “All about that Bass”, todas usando
camisetas do Incubus.

Odeio.

Odeio ainda mais esta noite, agora que sei quem é a


garota da camiseta do Incubus.

Quando mais uma menina termina de cantar estou


quase enlouquecendo, então decido dizer ao Quinn e ao Knox
que vou ao depósito verificar nossos estoques.
Neste momento ouço uma voz familiar no sistema de
alto-falantes.

— Estava ouvindo vocês tentarem imitar minha


interpretação original.

Levanto a cabeça rapidamente para ver Remy em um


jeans azul apertado, uma camiseta preta e justa do Incubus,
o cabelo longo solto nas costas e uma guitarra presa ao
ombro.

— E preciso dizer, algumas de vocês... — Ela estremece


e inclina-se mais para o microfone. — São realmente
horríveis.

Fico de boca aberta vendo Remy ignorar as vaias e


respostas maliciosas, sorrindo para a multidão como se não
se importasse.

— Se estiverem curiosos, a camiseta do Incubus que eu


estava usando aquela noite era esta.

Ela joga os cabelos para trás e mostra sua camiseta.

— Ah e a ruiva que cantou comigo... está bem ali — Diz,


apontando para as escadas do palco onde Jodi está de pé.

Jodi acena e manda beijos, enquanto Remy senta-se no


banco e coloca a guitarra no colo.

— Então... não vou cantar “All about that Bass” esta


noite porquê... Bom, porque Asher está cansado de ouvi-la e
também porque seria ridículo imitar minha própria
interpretação. Vou tocar algo um pouco diferente, e como não
tem uma versão legal para essa música no karaokê, trouxe
minha guitarra para me ajudar.

Ela dá uns tapinhas na lateral da sua Taylor — caralho,


ela tem uma Taylor, também — e começa a tocar.
Perfeitamente.

— Não sabia que a sua namorada tocava guitarra e


bateria. — Diz Quinn ao meu lado enquanto olha Remy
cantar “Green Eyes45” do Coldplay.

— Ela não é minha namorada. — Murmuro, com a voz


rouca. — Mas sim, aparentemente é cheia de surpresas. Eu
também não tinha ideia que ela tocava. E ela toca
incrivelmente bem.

Estou com o olhar fixo no palco, não consigo entender


meus sentimentos enquanto ela canta com voz clara que eu
sou o seu mar, mas meu peito fica apertado e perco o fôlego.

São palavras vazias, digo a mim mesmo, mantendo-me


firme. Ela não vai conseguir chamar minha atenção. Preciso
pensar que é apenas uma letra de música, não significa nada,
como Remy não significa nada porque sequer a conheço.

Ainda assim não consigo acreditar que ela está no palco


cantando... para mim. Tentando conseguir meu perdão.
Claro, muitas outras mulheres cantaram “All about that
Bass” para que eu as notasse. Mas Remy... é diferente. Penso
em tudo que compartilhei, como abri meu coração e ela... ela
só mentiu.

45
“Olhos Verdes”, em português.
A amargura por ser enganado luta contra uma parte
minha que quer perdoá-la.

Não consigo mais olhar, então viro de costas quando a


música termina, e ainda bem que terminou, porque não vou
aguentar muito tempo essa guerra mental.

— Oh, não. Sinto muito querida, mas vou ficar aqui e


cantar até que a mensagem que estou tentando passar
chegue aos ouvidos que eu quero que ouça. Não vou deixar
este palco até que Asher Hart suba aqui e me obrigue a
descer.

Eu me viro para olhar justamente quando ela está


espantando três mulheres que estão tentando tomar seu
lugar. Remy volta-se novamente para o público e quando seu
olhar encontra o meu, ela dá uma piscadinha, junto com um
sorriso cúmplice, como se soubesse que eu estou
retrocedendo.

Como me conhece bem... franzo o cenho e coloco as


mãos nos quadris, para mostrar que não estou achando
graça. Felizmente, ela me ignora e começa a cantar “The
Reason46” do Hoobastank, onde diz que lamenta ter me
machucado e que deseja afastar toda minha dor.

Por um minuto olho fixamente, cativado por sua beleza,


sua voz... e pelas palavras. Então, quando lembro que
deliberadamente me fez pensar que não sabia falar inglês,
pergunto-me que inferno ela está fazendo ali me torturando
com sua presença.

46
“O Motivo”, em português.
No refrão da música finalmente torna-se claro. Ela
pensa que só por estar cantando... vai me ter de volta.

— Porra. — Murmuro quando seu olhar encontra o meu


e não se desvia.

Olho ameaçadoramente, mas como ela continua


cantando, dou as costas, resmungo algo ao Quinn e saio para
os fundos do bar. Assim que chego a despensa, começo a
caminhar de um lado para o outro, amaldiçoando em voz
baixa. Não posso me deixar envolver.

Depois de alguns minutos, abro a porta para ver se uma


nova música tinha começado. Parece que não, mas então...
escuto a voz de Remy.

Ela ainda está no palco cantando, desta vez “Please


Forgive Me47” do Bryan Adams. Cristo. Há muitas canções de
desculpas, ela pode cumprir sua promessa e cantar a noite
toda. Se não parasse com isso agora, eu poderia terminar
fazendo algo realmente estúpido, como perdoá-la.

Volto para o bar e quando vejo Pick sentado em um


banquinho assistindo Remy, paro ao seu lado.

— Você não vai fazer nada?

Ele se volta para mim, surpreso, depois dá de ombros.

— Você ouviu. A única pessoa que pode fazê-la descer


do palco é você.

Abro a boca para dizer que é a porra do seu bar, que ele
pode expulsá-la a hora que quiser. Mas Pick sorri.

47
“Por Favor me Perdoe”, em português.
— Além disso, dei permissão para ela cantar a noite toda
se quiser.

— Merda. Não me admira que você ainda esteja aqui até


tão tarde, antes do seu casamento. Sabia que ela ia estar
aqui e queria me ver sofrer, não é?

Pick franze o cenho.

— Não, não quero ver você sofrer. Quero ver meu irmão
se reconciliar com alguém que foi um bom amigo para ele no
mês passado e o fez muito feliz no processo.

E ela aparentemente o conquistou... quero discutir. Mas


não consigo esquecer todos os bons momentos que Remy e eu
tínhamos passado juntos... como Sticks e Elisa.

— Ela não é....

Começo a dizer que ela não é a mesma pessoa, que


Sticks era meu amigo, mas, detenho-me. Porque ela é Sticks
e não sei como me sinto sobre isso.

A irritação que está começando dentro de mim de


repente assume o controle e eu parto para o palco.

Os olhos dela se iluminam com esperança quando vê


que estou me aproximando. Mas não sorrio nem demonstro
nada, simplesmente fixo os olhos na máquina de karaokê e
seleciono uma música. Depois, pulo no palco e pego o
microfone das mãos dela.

Remy pisca, franzindo ligeiramente o cenho, mas o


sorriso permanece no seu rosto. Tenho certeza que ela está
pensando que eu vou cantar algo sobre perdoá-la, mas o que
surge é “Bad Blood48” da Taylor Swift. E cantei olhando
diretamente para ela. Remy abre a boca em choque, o olhar
magoado.

Quando pela quarta vez digo que temos problemas e


que não podemos solucioná-los, ela respira fundo e
completamente zangada se afasta do palco. Pensei que era o
fim, mas Remy vai até a máquina de karaokê e escolhe algo
da lista. Não quero, mas estou mais do que curioso para
saber o que ela tinha escolhido. Assim quando “Sorry Seems
to Be the Hardest Word49” do Elton John rompe a voz da
Taylor Swift e ela me rouba o microfone para cantar, eu
balanço a cabeça.

Que mulher teimosa... não sabe quando parar? Rebato


sua música com “Better Things to Do50" do Terry Clark.

Por alguma razão, esperava que ela respondesse com


determinação, já que entrei no jogo, mas somente a tristeza
toma conta dos seus olhos enquanto me observa cantar e
ouve as frases amargas que saem da minha boca. Com os
ombros caídos em derrota, ela balança a cabeça concordando
e sai rapidamente do palco. Enquanto umas vinte mulheres
aplaudem, Remy foge, chocando-se com Pick. Depois, segura
o braço da amiga e sai do clube.

Extremamente decepcionado, embora não queira


perdoá-la, afasto-me do microfone e atravesso a multidão de
volta à despensa, onde fico andando de um lado para o outro,

48
“Sangue Ruim”, em português.
49
“Desculpa Parece Ser a Palavra Mais Difícil”, em português.
50
“Coisas Melhores para Fazer”, em português.
até que a porta se abre e Pick entra. Aperto os dentes e
balanço a cabeça, indicando que de maneira nenhuma estou
disposto a falar sobre isto.

— Você não deveria estar em casa com Eva e as


crianças?

— Não. — Responde, apoiando os quadris em um barril


próximo. — A Eva quis ser tradicional, então me expulsou
dizendo que não podia vê-la até o casamento. Como não acho
que seja um bom momento para incomodar o Mason e a
Reese, planejei alugar um quarto de motel... a menos que
você queira receber a seu irmão mais velho por uma noite.

Dou de ombros.

— Claro. Não posso descrever meu sofá como muito


confortável, mas... dá para dormir.

— Obrigado. — Agradece Pick, observando-me caminhar


e passar repetidamente as mãos pelos cabelos. — Então...
Remy.

— Não quero falar sobre isso. — Digo, fulminando-o com


o olhar quando ele sorri.

— Ela tinha um ótimo disfarce, não dava para ter ideia


de que era uma mulher. E uau, ela é.... realmente diferente
como mulher. Não há razão para que se sinta um idiota por
não ter desconfiado, ninguém desconfiou.

— Não disse que me sinto como um idiota. — Murmuro.

Pick simplesmente levanta as sobrancelhas e eu


suspiro, cedendo.
— Bem... sinto-me idiota pra caralho. Mas também
estou de saco cheio. Ela mentiu e me traiu por semanas,
porra, é como se estivesse fazendo piada de tudo que contei.
Pensei que tinha um amigo de verdade, e era só um disfarce
para entrar em uma maldita banda.

Não posso contar sobre Elisa porquê... só não posso.

Pick abre a boca para responder, mas como tenho


certeza que vai dizer algo em defesa dela, continuo
vociferando.

— E agora... agora ela pensa que pode passear por aqui,


balançar os quadris, cantar algumas músicas e vou.... o quê?
Simplesmente esquecer tudo o que fez? Não, caralho. Não vou
voltar com ela. Nem sequer a conheço.

— Você não vai perdoá-la? — Pergunta Pick, sorrindo.

Abro a boca para dizer que não, mas acho que aprendi
algumas coisas sobre ela e sabia que não desistiria fácil.
Tenho certeza de que a sua versão feminina é tão competitiva
quanto o Sticks era.

Remy definitivamente é uma cantora talentosa, tem bom


gosto em suas escolhas musicais e gosta de brincar e
provocar o público tanto quanto eu. Inferno, ela poderia ser a
pessoa perfeita... se não tivesse me enganado tanto.

— Sei que Remy deu a você os motivos para ter feito o


que fez. — Continua Pick.

Havia esquecido que ele estava ali, então suspiro e olho


para longe.
— Sim, deu.

— Mas você não acredita que ela teve uma boa razão?

— Não sei.

Coloco as mãos nos quadris e olho para o teto, indeciso.


Será que posso acreditar na razão que ela me deu? Porque,
honestamente, não entendo por qual outro motivo ela teria se
disfarçado de homem. Não pode ter sido para se aproximar de
mim, pois depois de descobrir sobre a garota com a camiseta
do Incubus, ela sabia que teria muito mais sucesso comigo
vestida de mulher.

Mesmo assim, depois de me conhecer, não percebeu que


eu não me importaria em ter uma garota na banda? Eu teria
lutado contra Gally e Heath para ela ficar. Essa falta de
confiança me dói.

— Se você realmente ama alguém vai descobrir que pode


perdoar quase tudo, porque viver sem a pessoa é mais difícil
que qualquer mágoa que possa guardar. — Diz Pick.

Olho para ele, mas aparentemente esse é o único sábio


conselho que ele tem para me oferecer. Afastando-se do
barril, meu irmão me dá um tapinha no ombro e sai da
despensa para me deixar “incomodamente” em paz.

— Filho da puta. — Digo, quando ele está saindo.

Como se atreve a falar a palavra amor? Não amo Remy.


Nem sequer a conheço. Mas mesmo pensando assim, lembro
de todas as vezes que rimos e discutimos o Call of Duty, a
noite que compartilhamos um pacote de salgadinhos e
escrevemos uma música juntos, quando me deu uma carona
depois dos problemas com minha moto e como ficou
preocupado com o meu pai, de como me levou até a casa do
Mason quando eu não estava no meu melhor estado mental...

Fizemos amor por duas maravilhosas noites seguidas.


Eu a conheci. E gostei. Além disso, sinto saudades.

Quando volto para o balcão, não estou mais zangado,


mas ainda não sei bem o que fazer. Pick plantou a semente
da dúvida na minha cabeça e a maldita coisa estava
crescendo.

Posso perdoá-la? Posso voltar a ser só um amigo como


fui do Sticks? Posso ser um amante outra vez? Estremeço
diante dessa ideia, mas rapidamente a coloco de lado, porque
não tenho certeza das respostas. O maior problema é....
posso viver sem ela?

Neste momento um casal se aproxima do bar para pedir


bebidas. Não presto muita atenção, eles estão conversando
baixinho coisas românticas e melosas em espanhol e isso me
irrita, porque lembro que Remy falava comigo em espanhol
para disfarçar a voz.

Mas então o homem diz uma coisa que chama minha


atenção: “ Eres mi nena, mi chica. Te amo51”. Eu paro
imediatamente e arregalo os olhos. Te Amo? Remy me disse
isso... muitas vezes, como Elisa.

Como Sticks, ela disse que significava bom trabalho.


Mas o cara olhando fixamente para sua namorada não parece

51
“Você é minha querida, minha garota. Amo você.”
estar dizendo que ela fez um bom trabalho. Antes que eu
perceba o que estou fazendo, vou até eles.

— Desculpem-me. — Eles olham para cima. — Você


acaba de dizer te amo para ela?

O homem franze o cenho.

— O quê?

— O que significa te amo?

Ele me olha como se eu estivesse louco enquanto a


mulher sorri e se aconchega ao namorado colocando os
braços ao redor da sua cintura.

— Significa amo você. — Diz ela.

Sinto como se tivesse levado um soco no estômago,


minha respiração falha enquanto tropeço um passo para trás.
Não esperava que ela dissesse isso. É só que... estou com a
mente em branco para formar qualquer pensamento coerente.

Balanço a cabeça, agradecendo, e saio de lá sem


lembrar se entreguei as bebidas ou não. O resto da noite
passa como um borrão, não consigo me concentrar em nada
exceto no fato que te amo significava amo você.
ASHER
Na tarde de domingo, eu estava ao lado de Pick, vendo-o
se casar com o amor da sua vida no salão dos fundos do
Forbidden.

Acho que o encontrei pela primeira vez neste clube e


aqui descobri que era meu irmão e também foi onde vi Remy
pela primeira vez no palco. Sinto que minha vida
verdadeiramente começou quando coloquei os pés neste
lugar... e é o último lugar que eu queria estar neste momento.

Logo que saímos do salão e fomos pelo corredor para a


parte principal do clube onde seria a recepção, sabia que a
veria. Tinha certeza que estaria instalando o sistema de som,
assegurando-se que tudo estivesse preparado para começar.
Ela era organizada, pelo menos sua versão de Sticks era.

E quando cheguei lá estava ela, em um vestido preto


que abraçava suas curvas, tirando o cabelo do rosto
enquanto inclinava-se para a mesa de som.

Alguém para ao meu lado e dá tapinhas amigáveis nas


minhas costas. Quando viro o rosto, fico chocado ao ver Ten,
também observando Remy e dando um grande suspiro.

— Sim, provavelmente eu também ia ceder e perdoaria.


— Diz, antes de me olhar e arquear uma sobrancelha. —
Assim como você também vai me perdoar por ser um idiota
na outra noite, não é?

Balanço a cabeça, rindo do seu pedido de desculpas.


Além disso, o olho roxo me ajuda um pouco a superar.

— Não há nada que perdoar, homem. Você é meu


“brother”.

Os ombros de Ten relaxam.

— Porra, sim. Contando que você pare de flertar com a


Caroline só para me irritar.

— Oh, merda! Não seria divertido, seria?

Com o canto do olho, vejo Caroline ali perto,


observando-nos. Dou um passo na direção dela e coloco o
braço na sua cintura para puxá-la para o meu lado.

— Olá linda! Este padrinho aqui está precisando um


pouco de afeto.

Com um sorriso, Caroline me dá um beijo no rosto e um


abraço apertado antes de Ten grunhir e a afastá-la.

— Certo, já está bom idiota. Isso é tudo, você está de


volta na minha lista negra.

Eu ri, feliz por voltarmos a ser amigos.

Assim que me viro, vejo Remy ao lado do palco me


observando falar com Caroline e Ten.

Meu sorriso morre e respiro fundo, até que alguém toca


o braço dela desviando sua atenção. Quem era aquele cara?
Não estou com ciúmes. Porra, não. Mas posso ter
fechado as mãos em punhos quanto ele chega mais perto.
Muito perto. Enquanto Remy responde alguma coisa, suas
mãos se mexem de maneira ostensiva.

Sem perceber, ando na direção deles.

Ela não vê eu me aproximar, está de costas falando


rapidamente em espanhol com o garoto. Quando chego perto,
o cara me dá uma olhada e Remy vira-se para olhar o que
tinha chamado a atenção dele.

Remy leva um susto quando me vê, coloca a mão sobre


o coração e cambaleia para trás, batendo no peito do cara,
que a segura pelos braços para mantê-la em pé. Enquanto
olho para a mão dele, ela sussurra meu nome.

— Asher! Eh... o que faz aqui? Você disse que ia ficar


longe de mim.

Olho para os olhos escuros, arregalados e preocupados e


não respondo, simplesmente desvio a atenção para o garoto
com a mão no braço dela. Remy limpa a garganta e afasta-se
um passo para apresentá-lo.

— Este é meu primo Tomás, Big T., que aceitou ser meu
assistente hoje. Talvez, você se lembre dele do Castañeda’s,
tocou violão quando eu cantei...

Ela não termina a explicação, como se estivesse com


medo que a lembrança despertasse minha raiva.

Cumprimento Tomás com a cabeça, negando-me a


acreditar no alívio que estou sentindo.
— Tudo bem?

Ele balança a cabeça em resposta.

Esquecendo-o, viro-me de novo para a Remy.

— Qual o problema?

— Problema? Por que você acha que temos algum


problema? — Pergunta ela, levantando as sobrancelhas e
lançando um olhar rápido ao seu primo antes de retornar
para mim. — Estamos bem, volte para seus amigos e divirta-
se. Tenho certeza que eles já me odeiam o suficiente sem eu
monopolizar seu tempo.

Remy tenta empurrar meu braço, mas não me mexo.

— O que faz você pensar que eles a odeiam?

— Bom... você me odeia, então eles devem me odiar,


porque são leais. Além disso, também menti para eles a
respeito de quem eu era. Só parece lógico.

Abro a boca para dizer que não a odeio... então paro.


Depois de dizer que não queria ter nada mais a ver com ela
novamente, depois de rejeitá-la da maneira que rejeitei ontem
à noite... parece que a odeio, não é? Uma sensação incômoda
passa por meu corpo. Insegurança e culpa mescladas com
saudade. Quero manter minha raiva e dor, mas realmente
não posso odiá-la completamente.

Fui muito apressado em afastá-la? Porra, não gosto


desse sentimento de querer estar perto e ainda não confiar
nela o suficiente.
— Eles não odeiam você. Até mesmo acham que eu já
deveria tê-la perdoado.

— Sério? — Seu rosto acende com entusiasmo,


enquanto leva as mãos ao peito e olha para o outro lado do
bar. — Oh... eu adoro seus amigos. Deveria ouvi-los, eles
querem o melhor para você.

Não posso deixar de sorrir. Porra. Não quero ser legal


com ela, então fico sério novamente. Remy me traiu da
maneira mais vergonhosa e humilhante possível.

— Pare de mudar de assunto. Qual o problema? —


Pergunto, meu sorriso se transformando em um grunhido.

Ela volta a franzir o cenho e faz um som de frustração.

— Sério, como você sabe que algo está errado?

Porque já tinha visto como Stick ficava quando estava


preocupado e Remy mostrava um comportamento similar.

— Qual o problema? — Repito.

Os ombros dela caem.

— Não consigo ligar a mesa de som.

— Tentou o interruptor principal de energia?

Normalmente o mantenho ligado porque fica em stand


by e não lembro de ter desligado ontem a noite depois do
karaokê, mas como não lembro muito da noite de ontem...
então, tudo é possível.
— Oh, não, por que não pensei nessa ideia? Sim, já
tentei o interruptor de energia! — Diz ela, enquanto puxo o
interruptor.

Sorrio porque sua resposta é tão típica do Sticks que


sinto saudades do meu amigo. Mas meu sorriso desaparece
quando o sistema não responde ao meu comando.

— E a tomada. — Começo, parando imediatamente


quando Remy me olha feio. — É obvio que você verificou se
estava conectado. — Respondo por ela, ainda assim olhando
o cabo. — Talvez, o fio esteja solto do outro lado...

Tenho a sensação que também já verificou as conexões


do outro lado porque ela suspira e cruza os braços enquanto
me observa segurar a tomada e puxar o cabo... Porra. O cabo
fica na minha mão, o resto dele... Não estava lá.

— Merda. — Murmura Remy surpresa, pulando para


frente para ver o cabo cuidadosamente cortado que estou
segurando. — Certo, isso eu não vi.

Ergo os olhos e vejo seu olhar espantado enquanto


balança a cabeça como se pedisse desculpas por não ter
percebido o óbvio.

— Oh meu Deus, você não pensa que eu fiz isso, não é?

— O quê? — Realmente não pensei isso. — Não.

Ela me olha aliviada.

— Bem, porque não fiz. — Então ela tem uma ideia, por
que franze a testa enquanto olha para o cabo cortado. — Você
sabe, isso está parecendo com o que aconteceu com o cabo
da bomba de combustível da sua moto, também foi
cuidadosamente cortado. — O jeito com que ela me olha
demonstra que tem outra teoria de conspiração se formando
na sua cabeça. — Claramente alguém está querendo
incomodá-lo. Ainda acho que é seu pai.

Dou um suspiro. Sim, nisso era definitivamente igual ao


Sticks, paranoico sobre o meu velho e tudo mais.

— Como isto tem a ver comigo? — Levanto o cabo. —


Claramente é contra Pick.

Merda. Pick. Ele precisa de música para sua recepção,


ou vai ficar louco porque sua visão de dançar com a Eva
“Baby love” não vai se realizar. Precisávamos de música.
Rápido.

— Mas Pick é seu irmão. — Remy parece determinada a


discutir comigo. — E é como... é a pessoa mais próxima a
você nesse momento. A pior maneira de ferir você seria ir
atrás daqueles a quem você ama, certo? E Pick é a única
pessoa que você realmente ama, certo?

Essa pergunta me faz parar. Amo Pick, não? E o Mozart,


que provavelmente morreu e agora mais do que nunca tenho
certeza que não deixei sua gaiola aberta.

Mas eles eram os únicos a quem eu realmente amava?

Meu olhar viaja para os olhos preocupados de Remy e


não consigo responder a essa pergunta.

— Bem, neste momento não importa quem cortou o


maldito cabo. — Diz o primo dela, fazendo-me piscar e
retornar à realidade. — Temos outros problemas... por
exemplo como vamos conseguir que esta festa comece? Há
algum outro tipo de alto-falante aqui?

Posso correr até em casa e pegar minha guitarra se for


preciso. Olho-o fixamente, tentando pensar em alguma
solução. Nós três seríamos capazes de montar uma banda
rapidamente? Mas então Remy estala os dedos.

— A máquina de karaokê, tem um pequeno alto falante.


Isso vai funcionar.

Balanço a cabeça, gargalhando.

— O quê? Você vai cantar no karaokê a noite toda? Essa


recepção pode durar horas.

Ela dá de ombros, já se afastando para abrir um


armário próximo e tirar a máquina de karaokê.

— Se precisar... sim. — Responde ela, enquanto prepara


o karaokê. — Além disso, Big T pode me substituir quando eu
precisar de um descanso. Sua voz não é tão ruim.

Seu primo bufa com isso, mas não discute nenhuma


das suas declarações.

Suspiro e olho para a máquina de karaokê. Geralmente


é conectada ao sistema de som, mas também foi projetada
com um sistema de alto-falante interno. Aparentemente, esta
noite, será usado,

Remy e eu nos inclinamos ao mesmo tempo para ligá-la.


— Desculpe. — Murmuramos juntos quando quase
batemos a cabeça, então nos separamos um centímetro e
começamos a ligar a máquina.

— Caralho. — Diz ela em voz baixa, voltando-se


lentamente para mim. — Você está com um cheiro muito
bom.

Eu não quero, mas meu corpo reage lembrando-se de


cada toque, do sabor e dos beijos que me deu. Olho para o
rosto dela e seus olhos cintilam, como se estivesse com
problemas para falar.

— Sinto muito. É só que... ele é novo. Você não usava


esse perfume antes.

A luxúria toma conta do meu corpo. Tento afastá-la,


tento me agarrar ao fato de que estou zangado com ela, mas
uma necessidade diferente da que experimentei com qualquer
outra pessoa ruge através do meu sangue.

Preciso sacudir a cabeça e piscar para retornar ao


presente, para lembrar-me de onde estou e o que tenho que
fazer. E que não estou a sós com Remy Curran.

— É, ah... Eva me deu de presente, porque sou


padrinho. Achei que devia usá-lo hoje.

— Bom, é incrível. Acredito que acabei de engravidar.

Não consigo conter a gargalhada, mesmo não querendo


sorrir. Ela inclina-se mais para ligar o karaokê e de repente
também posso sentir seu perfume.
Algo feminino, não como o xampu masculino que Sticks
usava. Cheira como... Elisa. E porra, agora tenho uma
ereção.

— Você tem que admitir. — Diz ela, enquanto nossos


dedos se tocam — Que é bom não espirrar quando me
aproximo, porque... não preciso mais usar a máscara de
látex.

Olho-a fixamente, a segundos de me inclinar para frente


e beijá-la com força. Mas o brilho predador nos meus olhos
deve ter soado como um aviso de advertência.

— Certo, tudo bem. — Remy levanta as mãos. — Parei,


só... porra, deixe-me sentir seu perfume mais uma vez antes
de ir embora. — Ela inclina-se, respira fundo e se afasta
rápido. — E só para avisar, você está muito sexy em um
smoking.

— Sticks. — Advirto, sem realmente me sentir


incomodado.

— Vou parar, juro! Aceito o fato de que acabei com


qualquer chance que poderia ter com você. De agora em
diante vou ser verdadeira e transparente e não vou mais
flertar.

Olho para ela sem saber o que pensar, porque


honestamente, estou ao mesmo tempo decepcionado e
aliviado com suas palavras.

Fazendo uma cruz com o dedo sobre o coração ela


mantêm sua promessa e se afasta. Enquanto termino de ligar
o karaokê, Remy se volta para a máquina, já procurando uma
música para cantar.

Observando as pessoas, vejo que todos os meus amigos


do bar estão presentes, inclusive Mason, Reese e Sarah.
Usando um vestido de dama de honra, Reese se mantém
perto do noivo, acariciando seu braço de forma
tranquilizadora e Brant Gamble está sentado ao lado da
cadeira de rodas da Sarah, ele diz algo que leva um pequeno
sorriso aos lábios da garota.

Sei que devem estar sofrendo com a perda da mãe do


Mason e espero que esta noite anime um pouco seus
espíritos.

Olhando ao redor sorrio para Julian e Skylar, que


correm em círculos ao redor da pista de dança, com os globos
girando sobre eles.

Logo encontro Ten e Caroline perto de Quinn e Zoey, que


está entregando o bebê para Caroline segurar. Noel e Aspen
estão no balcão falando com Felicity e Knox.

Localizo a noiva e o noivo perto de Murphy e Pick está


olhando em minha direção. Quando devolvo o olhar, ele faz
um sinal, vira-se para Eva e estende a mão.

Meu coração fica apertado e sinto um nó na garganta.


Espero que ele não perceba que não estamos completamente
preparados, não quero arruinar a festa e sua primeira dança
com a esposa. Mas então a música do karaokê começa e,
caralho, Remy está cantando “Baby love”, a canção que Pick
queria dançar com Eva.
Olho boquiaberto, estupefato. Porra, ela é incrível.
REMY
Asher me deixa louca ficando por perto enquanto canto
a primeira música. E não é só isso, ele me olha o tempo todo.

E a forma como olha é.... carinhosa. Isto é mais do que o


suficiente para dar ideias a uma pobre garota, para me fazer
pensar que a raiva pode estar diminuindo e um dia vai me
perdoar.

Mas depois da forma brutal que me dispensou na noite


anterior, sei a verdade. Cantei para ele com todo meu
coração, disse com cada letra que o amava e que sentia muito
por tê-lo magoado. E como ele respondeu? Disse que havia
muito ressentimento entre nós e que estava melhor sem mim.

Mensagem recebida. Dolorosamente. Nunca vou ter


outra oportunidade com ele, sem chance. Então por que
diabos Asher continua me olhando? Quando a música chega
ao fim, aproxima-se, parecendo confuso.

— Como você sabia que era essa a música?

— O quê? — Franzo o cenho e olho para a máquina. —


Lembro que uma vez você disse que essa era a música deles.

— Ah.

Entretanto, ele continua me olhando como se eu tivesse


feito algo errado.
— Acha que devo cantar algo mais?

— Não. — Diz ele, balançando a cabeça. — Foi perfeito.


Obrigado de novo por fazer isso pelo Pick.

Asher estende a mão como se fosse acariciar meu braço


e talvez me dizer que eu era um amigo de verdade, como
estava acostumado a fazer quando o ajudava com alguma
coisa, mas em seguida franze o cenho, retira a mão e dá a
volta para afastar-se.

Observo-o caminhar com as mãos nos bolsos, o que faz


levantar a parte de trás do seu smoking e deixar a calça justa
na bunda aparecendo. Merda, como ele está sexy com essa
roupa.

É difícil acreditar que já esteve nu em baixo de mim,


uma vez na vida.

— Você está babando. — Diz Big T no meu ouvido,


assustando-me. — Ah... precisamos de mais músicas.

— Merda.

Inconscientemente limpo a boca como se tivesse babado


de verdade, mas em seguida volto para o karaokê e começo a
cantar uma canção após outra. A noite avança, o álcool flui
livremente e meu primo reveza comigo em algumas músicas
para que eu pudesse descansar a voz.

Bebo água e olho o salão, onde as risadas e a


camaradagem correm soltas. Mas sobretudo observo Asher.
Ele se enquadra nesse grupo, seus colegas de trabalho o
empurram e riem, estão sempre brincando. É muito legal e
ele está feliz. O que me deixa contente e também triste porque
nunca terei a oportunidade de fazê-lo feliz.

Quando chega o momento de jogar o buquê, Reese e


Felicity levam Sarah na cadeira de rodas até o centro e a
ajudam a pegar as flores.

Em seguida, todos os meninos empurram um


cambaleante Asher para o meio da pista de dança, enquanto
Pick retira a liga de Eva.

Ele vira-se e tenta trazer Mason e Knox, mas ambos


negam e dizem que estão praticamente casados, então Asher
encontra os dois irmãos menores do Noel, Colton e Brandt e
os arrasta para lá com ele.

Solto uma risada, surpresa por lembrar o nome de


todos. Mas Asher tinha falado bastante deles, descreveu-os
perfeitamente quando pensou que eu era um menino, por
isso fica fácil saber quem é quem.

Quase sinto como se os conhecesse tão bem quanto ele.

Brandt pega a liga depois que Asher sai rapidamente do


caminho e, sorrindo, acena como uma bandeira, antes de
levá-la até Sarah e colocar na sua cabeça como uma coroa.

Começo as músicas para dançar, como “The Chicken


Dance”, “Limbo”, “Cha Cha Slide” e quando chega o momento
de “Hokey Pokey”, resolvo fazer uma brincadeira com Asher.

— Ouçam, todos. — Grito no microfone. — O padrinho


vai precisar da ajuda de todas as mulheres com essa próxima
música porquê... — Coloco a mão sobre o microfone para
fazer uma careta, antes de continuar — Ele não distingue
muito bem a direita da esquerda.

Ele ri e me mostra o dedo do meio, mas aceita a ajuda


das meninas, que vão para a pista fazer o “Hokey Pokey” com
ele.

Depois, passo microfone ao Big T para que ele pudesse


entreter os convidados com a canção do “Jarabe Tapatío52”.

Quando Asher me vê fazer uma pausa vem na minha


direção, com esse jeito de andar masculino que só Asher Hart
poderia aperfeiçoar, balançando a cabeça e rindo.

— Muito obrigado. Não posso acreditar que você


lembrou disso.

Dou um pequeno sorriso enquanto bebo água.

— Não esqueci nada.

Os olhos dele aquecem com minha confissão e sei que


também está lembrando de algumas coisas. Sinto os mamilos
endurecerem e a calcinha ficar molhada, então limpo a
garganta e tento me controlar... falhando miseravelmente.

Duas garotas bêbadas rindo sem parar se aproximam


cambaleando, interrompendo o momento. Quando me dou
conta que é a noiva e a dama de honra, endireito-me com
respeito.

— Remy. — Exclama Reese, balançando-se junto a Eva


para segurar meu braço. — Você pode cantar “Dear Future

52
Dança mexicana.
Husband” para eu dançar com o Mason? Acho que isso vai
animá-lo.

Fico tensa com o pedido da música da Meghan Trainor.


Estou tentando evitar as músicas dela esta noite porque não
quero irritar mais o Asher fazendo ele lembrar de “All About
that Bass”.

Mas Reese tinha passado por muitas coisas


ultimamente com a morte da sogra e tendo que cuidar da sua
cunhada adolescente. Não posso dizer que não.

— E quero que você e Asher cantem “Charlie Puth”


juntos. — Pede Eva. — Fiquei sabendo das travessuras de
ontem à noite e agora quero ouvi-los. Além disso, quero
dançar essa com meu homem.

Sério? Estas garotas estão tentando acabar comigo. Não


queriam uma, mas duas canções da Meghan Trainor e uma
delas com Asher? Ah... Ele não vai gostar.

Trocamos um olhar relutante. Ele não quer cantar


comigo e eu não quero obrigá-lo, embora no fundo eu queira
cantar com ele.

Antes que possamos recusar, entretanto, Eva levanta o


braço e declara: — A noiva está pedindo.

— Caralho. — Murmura Asher, voltando-se para Eva. —


O que você quiser, boneca.

— Obrigada! — Ela aplaude e inclina-se para dar um


beijo no rosto dele. — Você é o melhor cunhado de todos.
Agora vá cantar primeiro minha música.
Então, depois que Big T termina, Asher e eu
selecionamos a música que ela pediu. É ao mesmo tempo
estranho e incrível estar de pé tão perto deste homem lindo
enquanto cantamos juntos sobre sexo, embora eu tenha
consciência de que não voltarei a tocá-lo.

Quando levanto os olhos em uma frase significativa vejo


que ele está me olhando também, então mantemos o contato
visual durante o resto da música e não consigo disfarçar
meus sentimentos.

Quando a música acaba, Asher suspira e me olha


fixamente.

— Mais uma.

Franzo o cenho, embora meu coração acelere por ele


querer cantar mais uma canção comigo.

— Quero cantar a do filme Tinker Bell. — Diz, franzindo


o cenho enquanto tenta lembrar o nome da música.

— “1000 Years” com o KT Tunstall e Bleu?

— Sim. Essa. — Responde, estalando os dedos.

Asher me olha e.... Deus, se cantar “Charlie Puth” já


tinha deixado minhas emoções à flor da pele, “1000 Years”
acabou comigo para sempre.

Nós olhamos nos olhos um do outro e prometemos que


nosso amor ainda estaria presente depois de mil anos. As
lágrimas brilham em meus cílios quando pôr fim a melodia se
desvaneceu.

Em seguida, ele assume o controle do microfone.


— Antes de começar a canção da Reese, tenho algumas
coisas a dizer.

Meu coração vai parar na garganta... eu meio que


desejava que ele dissesse algo sobre mim, que havia me
perdoado e queria nos dar outra chance. Mas isso não
aconteceu.

— Está bem, escutem. — Asher faz um gesto com a mão


para chamar a atenção das pessoas. — Pick me disse que não
precisava fazer um discurso de padrinho, mas como já bebi
bastante vou fazer.

Ele faz uma pausa, esperando que as risadas morram


antes de começar de novo.

— Vim a este clube há pouco mais de um ano, sem


banda, sem família, e sem amigos verdadeiros. Mas graças ao
Patrick Ryan, ganhei os três. Se não fosse por esse homem
ali. — Aponta para o Pick. — Eu teria renunciado a todos os
meus sonhos. Minha banda teria morrido em seus dias de
garagem, não teria chegado a conhecer todos esses garçons
imbecis com quem trabalho e amo até a morte... nem teria me
apaixonado por todas suas mulheres encantadoras.

Asher inclina-se para seu grupo de amigos antes de


continuar.

— E eu descobri, há alguns meses, que eu tinha uma


vida de verdade e um irmão de sangue. Pick. — Ele levanta a
mão em um brinde. — Sinto-me honrado de ser o irmão mais
novo de um homem incrível como você... e estou com ciúmes
da esposa magnífica e das crianças que você tem. Parabéns,
cara.

Pick aproxima-se e o puxa para um enorme abraço de


urso e quando se afasta limpando as lágrimas, Eva corre para
abraçar Asher também.

Então Reese faz um discurso de dama de honra, mas


não tão incrível como o de Asher... na minha opinião.

Os discursos me dão um tempo para me recompor e fico


muito feliz que ele tenha encontrado um lugar para pertencer
depois de uma infância tão solitária. Mas logo, Reese me
passa o microfone, anunciando que é o momento para “Dear
Future Husband”.

Cantei sua música, mas não cantei para ela. Olhei para
Asher e todas as palavras que saíram dos meus lábios eram
para ele, que me observava, enquanto bebia uma garrafa do
Angry Orchard.

Depois disso, Quinn e Zoey aproximaram-se dizendo que


eles cantariam algumas músicas, que era para eu tirar uma
folga e comer um pedaço de bolo.

Estou sozinha junto à mesa enterrando meu garfo em


uma fatia de bolo, que parecia maravilhoso, quando de
repente o prato foi tirado da minha mão.

— Não! — Asher diz, com os olhos arregalados pelo


medo.
Olho para as minhas mãos vazias boquiaberta, sem nem
sequer um pedacinho de bolo, então volto minha atenção
para o ladrão de bolos.

— Que...?

— Acabei de ouvir alguém dizendo que tem óleo de


amendoim nos ingredientes.

— Amendoim...? — Começo em voz baixa, respirando


fundo. — Caralho. Obrigada.

Ele assente e desaparece novamente enquanto olho para


trás, com um pequeno sorriso nos lábios. Caramba, ele
lembrou da minha alergia e me salvou. Meu herói.

Caroline chama minha atenção e faz um sinal de


positivo, mas reviro os olhos, mostrando que acho que ela
está louca. Asher não deixar que eu me mate não significa
que o cara está pronto para voltar comigo e muito menos me
perdoar. Entretanto, uma pequena parte minha espera que
ela tenha razão.

Já que Big T precisava abrir o restaurante na manhã


seguinte, ele foi embora mais cedo, mas como eu estava bem
voltei para o microfone e cantei várias músicas, afinal estava
me divertindo muito para me importar se amanhã ficaria sem
voz. Além disso, algumas pessoas estavam dispostas a me dar
um descanso e tentar a sorte no karaokê.

O mais surpreendente foi quando os bêbados Ten e


Asher vieram aos tropeções para o palco, de braços dados.
— Queremos cantar “I Just Had Sex53”. — Anuncia Ten.

— Não, ele quer cantar. — Diz Asher rindo. — Só estou


aqui para fazer a parte do Akon... e para ver Noel chutar a
bunda dele.

Levanto as sobrancelhas e, rindo, balanço a cabeça.

— Ten canta? Sério?

Ten franze o cenho como se estivesse ofendido.

— Porra não, mas como estou muito bêbado vou cantar.


E vou incomodar muito o meu cunhado, então... preciso fazer
isso!

— Seu cunhado? — Pergunto, rindo.

— Noel. Não sabia que ele é irmão da Caroline?

— É? Não, não tinha nem ideia.

Olho para as pessoas no salão e vejo Caroline e Noel


juntos com Brandt, Colton, Sarah e Aspen. Então passo o
microfone para eles e preparo a música.

— Filho da puta. — Grita Noel indignado, assim que Ten


começa a cantar a primeira frase.

Quando Noel parte para frente, eu me aproximo e


levanto as mãos para detê-lo, temendo que Asher pudesse
ficar no meio do fogo cruzado. Noel não tenta passar por
mim, mas fica por ali olhando e mostrando o dedo do meio
para Ten, gritando alguns palavrões.

53
“Acabei de Fazer Sexo”, em português. Música de The Lonely Island.
Asher inclina-se, rindo tanto que mal pode cantar sua
parte da música, só no final ele consegue se controlar.

Entretanto, vê-lo se divertindo é difícil. Sei que é


egoísmo da minha parte querer ser a única pessoa a fazê-lo
sorrir, mas não posso evitar. Estou louca por este homem.

No momento em que a recepção do casamento termina


meus pés estão me matando e minha garganta parece em
carne viva. Mas simplesmente alongo as costas e começo a
guardar a máquina de karaokê. Só meia dúzia de pessoas
permanecem por ali. Knox, Felicity, Ten e Caroline, que
ajudavam a limpar a pista e Asher, que veio cambaleando até
meu lado, fazendo um gesto com a mão.

— Ouça, senhorita sexy, deixe-me ajudá-la a guardar


isso.

Dou uma risada e o dispenso.

— Oh, não, não. Posso lidar com isso, moço bêbado.


Estou surpresa que ainda consiga ficar de pé.

— Sei. — Diz ele, estendendo os braços e olhando para


as pernas oscilantes. — É como uma espécie de milagre.

Merda, ele é adorável inclusive quando está


completamente bêbado.

— Garota baterista. — Grita Ten, enquanto coloca sua


jaqueta sobre os ombros de Caroline e começa a guia-la para
a saída. — Hart não está em condições de dirigir, você pode
levá-lo para casa?
Arregalo os olhos. É claro que não, não posso levar
Asher para casa. Ele está todo doce e bêbado. E se eu não
conseguisse me conter e acabasse abusando dele
sexualmente?

— Você não pode levá-lo? — Pergunto, implorando com


os olhos.

Mas Ten somente sorri.

— Porra, é claro que não. Meu plano é fazer sexo oral na


Caroline enquanto ela leva minha bunda bêbada para casa.

— Ah. — Digo, enrugando o nariz.

Não posso discutir com isso e também já era muito


tarde, ele e Caroline acabavam de sair pela porta principal,
deixando-me aqui sozinha... com Asher.

Olho freneticamente ao redor, mas Knox e Felicity


tinham desaparecido também. Caralho.

— Lembra onde eu moro, não é? — Pergunta Asher,


movendo seu dedo pelo meu braço. — Porque tenho uma
lembrança muito boa de você na minha casa.

Olho para ele e sei que estou condenada. De maneira


nenhuma posso deixá-lo dirigir assim e tampouco vou
conseguir negar se ele tentar algo. E levando em consideração
o olhar de luxúria em seus olhos verdes, sem dúvida vai
acontecer algo.

Maldição. Eu estou fodida... literalmente.


REMY
Assim como eu temia, Asher era o tipo de bêbado com
tesão e meloso.

— Você foi ótima esta noite. — Diz ele, sentado no banco


de passageiro do meu carro. — Eu já disse o quanto você
esteve ótima?

— Hum... — Mordo o lábio para me controlar. — Não,


você não disse. Mas agradeço.

— De nada. No entanto, é verdade. Você era a mulher


mais bonita no clube. Não conte nada à noiva, mas você
estava mais bonita que a Eva. E estou neste carro
completamente sozinho com você neste momento. Porra, sou
um idiota de sorte. Hey... — Chama ele, arrastando as
palavras enquanto vira a cabeça para me olhar. — Você sabe
uma coisa?

— O quê? — Pergunto, querendo mudar de assunto.

Ele suspira enquanto me observa.

— Eu aprendi o que realmente significa “te amo”.

Merda! Eu não pretendia que o tema mudasse para esse


assunto. Aperto as mãos no volante e não digo nada. Porque
eu disse isso para ele? Sabia que ele poderia perguntar a
tradução para qualquer pessoa que soubesse espanhol.
— Ninguém nunca me disse isso antes em qualquer
idioma. — Murmura ele, com a voz rouca.

Isso parte meu coração e de repente entendo porque


disse que o amava. Eu intuí que ele não ouviu muito essas
palavras da sua mãe, seu pai, ou do tio que o criou. Nenhum
deles deve ter falado, e Pick era um irmão muito novo para
dizer algo assim...

Então, eu disse porque ele merecia ouvir e foi sério.


Asher é um homem extraordinário, que só precisa de uma
pessoa para amá-lo e dizer o quanto é especial.

Sabia que não deveria ter sido eu, mas não fui capaz de
resistir. Todo mundo precisa ouvir “eu te amo” pelo menos
uma vez na vida.

— O que você disse foi a sério? — Pergunta ele.

Ranjo os dentes e concentro-me em dirigir até entrar na


rua que leva à sua casa. Mas assim que desligo o motor, ele
volta à questão.

— Você falou?

Deixo escapar uma respiração profunda e calmamente


digo a verdade.

— Sim. — Os olhos dele estão brilhantes por causa do


álcool, mas parece estranhamente lúcido. — Eu quis dizer
isso.

Asher deixa escapar o ar por entre os dentes cerrados.


Então aproxima a mão e toca minha perna nua.

— Eu quero passar o resto da noite dentro de você.


— Asher. — Gemo, colocando as mãos sobre o rosto. —
Não diga isso. Você está bêbado.

Ele dá de ombros.

— E?

— E obviamente você esqueceu o que sente por mim.


Sou a sua pessoa menos favorita no planeta, lembra? Você
vai se arrepender pela manhã.

— Eu sei exatamente o que sinto por você, Remy. Estou


bastante irritado com o que fez e não sei se vou conseguir
perdoá-la, mas ainda assim a desejo. — Diz ele, acariciando a
minha coxa e movendo a mão entre as minhas pernas. — E
sinto sua falta.

Estremeço com o contato e fecho os olhos, lutando


contra a tentação. Mas ele continua a falar, continua a me
tentar.

— Eu desejo você em baixo de mim a noite toda, quero


passar as mãos e a boca sobre seu corpo. — De repente, seu
toque já não é doce e suave, ele levanta o meu vestido e move
os dedos pela minha calcinha. — Quero isso também.

— Deus. — Ofego, apertando o volante enquanto ele


esfrega meu clitóris através do tecido de seda da calcinha.

Eu gemo uma fração de segundo antes dele.

— Jesus e você já está molhada para mim. — Murmura


ele, empurrando um dedo dentro de mim

— Asher, espera.
Seguro seu pulso e aperto as pernas, prendendo sua
mão onde está, mas evitando que me desse mais prazer...
então o maldito homem curva o dedo dentro de mim.

— Por quê? Você quer isso tanto quanto eu.

Asher encontra o meu ponto G e o acaricia


insistentemente, enquanto jogo a cabeça contra o encosto do
banco e aperto os dentes, tentando conter o prazer que só
aumenta. Deus, ele sabe exatamente onde tocar.

Amaldiçoando abertamente em espanhol, abro as pernas


e levanto os quadris, abandonando-me a esse assalto
delicioso. Quando a euforia me atinge percebo vagamente que
ele me fez ter um orgasmo com nada mais que um dedo...,
mas estou muito drogada pelas endorfinas felizes para me
importar com este fato vergonhoso. Cada músculo do meu
corpo fica mole quando desabo no banco, completamente
drenada.

— Você fala em espanhol quando goza. — Constata ele.

Asher parece espantado com isso, como se fosse um fato


novo. Bom, esta parte não era mentira, afinal.

Ainda ofegante do orgasmo, viro-me para ele com os


olhos atordoados e selvagens.

— Você se surpreenderia com todas as coisas que


aconteceram entre nós que foram realmente verdadeiras.

Seu olhar é intenso e também um pouco selvagem.

— Entra comigo, Remy.


Não é uma pergunta, é uma ordem e, por Deus, eu o
sigo. Pego a mão, quando ele a estende e vamos para a porta,
onde fico beijando seu ombro até que ela esteja aberta.

Quando chegamos na metade das escadas ele para e


olha para mim.

— Lembra quando não consegui esperar para ter você e


a possuí aqui?

Deus, como eu poderia esquecer? É uma das razões


pelas quais estou aqui com ele de novo, quando sei que não
deveria.

— Não se atreva a tentar agora. — Aviso, apertando sua


mão com força. — Você está bêbado demais para lidar com
isso neste momento.

Asher ri.

— Não se preocupe. Preciso de uma cama para todas as


coisas que tenho em mente.

Estremeço e seguro sua mão com mais força.

Ele me leva direto para a cama e fica parado ao lado


dela, beijando-me enquanto remove meu vestido pelos
ombros. Assim que fico de sutiã e calcinha, Asher recua para
me olhar por completo.

— Impressionante. — Diz em voz baixa, segurando


minha mão novamente para me ajudar a subir na cama.

Depois de me acomodar de costas com a cabeça apoiada


em seu travesseiro, ele coloca a mão no meu quadril.
— Fique assim. — Ordena, pegando meus braços e
colocando acima da cabeça. — Imagine que está amarrada.

Eu sorrio.

— O quê? Sem algemas?

Asher balança a cabeça, sem devolver meu sorriso.

— As algemas não estão mais aqui. — Murmura, os


olhos verdes focados nos meus. — Elas me instigavam a ir
atrás de você.

Engulo a saliva, porque não tive a intenção de trazer à


tona um tema doloroso.

— Sinto muito. — Sussurro.

Ele não responde, seu olhar concentrado no meu peito.

Asher estende a mão e passa os dedos pelas taças do


meu sutiã. Não é tão intenso como o contato na pele, mas
ainda assim me faz estremecer e os mamilos clamarem por
atenção. Então, ele tira o sutiã e inclina-se para chupar um
mamilo. Eu me curvo, gritando e apertando as mãos na
cabeceira da cama para não o desobedecer. Em seguida, ele
move seu corpo, pega minha calcinha com os dentes e puxa
para tirá-la. Quando sua língua devora minha boceta não
consigo evitar, seguro o cabelo sexy e suave e aperto o quadril
no rosto dele.

No momento que consigo abrir os olhos, Asher está


limpando a boca e sorrindo.

— Quando eu achava que você era um cara, falei o


quanto amava o gosto de uma boceta, certo?
Eu concordo, esperando que ele não pense que está
cometendo um grande erro em estar aqui, desta forma, com
uma mentirosa como eu. Mas Asher apenas sorri, como se
fosse divertido revelar tal coisa.

— Eu disse um monte de merda. Muito mais do que


disse a qualquer outro ser vivo no planeta.

Eu não sei o que responder, exceto que lamento que ele


tenha confiado em mim, enquanto todo o tempo tive medo e
traí sua confiança. Prendo a respiração... porque realmente
não lamento, adorei toda a confiança que depositou em mim.

Seus olhos verdes parecem tristes enquanto me olha,


colocando a mão sobre o meu quadril. Asher ainda está
completamente vestido e eu posso ver sua excitação
aparecendo na frente das calças.

Tenho que admitir, nunca tive um cara de smoking me


fazendo sexo oral. Era elegante.

— Foi por isso que você voltou na noite seguinte? Por


que sabia que eu odiava aventuras de uma noite?

Eu nego com a cabeça.

— Não. Voltei para dizer a verdade. Mas então você me


beijou, e.... eu não consegui...

Triunfo masculino brilha em seus olhos e ele sorri


levemente.

— Você está querendo dizer que minha boca tem algum


tipo de poder místico de controle mental sobre você?

— Bem... — Murmuro.
Ele ri, sai da cama, tira o paletó e começa a desabotoar
a camisa.

— Você vai ter que me mostrar como funciona este


poder.

Sento-me para ajudá-lo com os botões, depois passo as


mãos por dentro da camisa, sobre o peito e a removo pelos
ombros.

— Tudo o que você precisa fazer é sorrir e certamente já


estou morta.

— Sério? — Seus lábios formam um sorriso satisfeito. —


Como este?

— Uh-huh.

Pressiono os lábios em seu peito e ele acaricia meu


cabelo, deixando-me ter um pouco de diversão antes de me
empurrar para trás e pedir para eu me deitar novamente.

Asher tira as calças, observando-me todo o tempo.

— É o último. — Diz, quando pega a caixa de


preservativos. — Sabia que usaria todos com você quando
comprou a caixa?

Nego com a cabeça.

— Comprei pensando que não usaria nenhum comigo...


e odiando cada mulher com quem você fosse usar.

Ele se concentra em colocar a camisinha, antes de deitar


sobre mim e me olhar nos olhos.

— E você foi a única.


Deixo escapar um suspiro trêmulo, as lágrimas
brilhando em meus olhos porque sei que ele está me dando
um presente. Eu não mereço estar aqui.

Tiro os cabelos da sua testa suavemente, saboreando o


momento.

— Remy. — Sussurra ele, quando empurra dentro de


mim.

Fico sem fôlego e arqueio o corpo, enquanto ele aperta


os dentes e mantém seu olhar no meu, até mesmo quando os
olhos verdes se tornam embaçados pela luxuria.

— Droga. — Diz Asher rispidamente. — Você sempre me


toma por completo. Já tive mulheres me pedindo para não
empurrar tão fundo porque não conseguiam. Sexo vazio e
superficial. Mas com você não. Nunca.

Ele se inclina, os lábios a um centímetro dos meus


enquanto se mexe lentamente dentro de mim, empurrando
fundo antes de se retirar para mergulhar novamente.

Então me beija.

Envolvo minhas pernas ao redor dele e agarro seu


cabelo quando nossas bocas se unem. Asher empurra com
mais força, seu quadril me fazendo escorregar sobre o
colchão com cada estocada poderosa.

— Como minha boca está agora? — Pergunta ofegante, a


respiração no meu ouvido. — Você sabe o que eu realmente
quero, não?
Eu sei, mas não posso. Dói muito. Então, fecho os olhos
e me agarro a ele com mais força enquanto aumenta o ritmo.

— Droga, Remy, diga.

Eu gemo minha recusa e fecho os olhos com força, antes


de enterrar o rosto no seu pescoço. Mas Asher segura a parte
de trás da minha cabeça com uma doçura que eu não
esperava.

— Por favor.

E a dor na sua voz é minha perdição.

— Te amo. — Sussurro.

Ele joga a cabeça para trás, gemendo. Vejo a satisfação


atravessar seu rosto quando fecha os olhos e abre a boca,
como se experimentasse o nirvana.

— Te amo. — Repito, movendo os dedos até sua


garganta antes de me inclinar para beijar a veia pulsando no
pescoço. Depois, afundo os calcanhares na base das suas
costas e o incentivo a ir mais fundo, chupando um ponto
abaixo da orelha. — Te amo más de lo que nunca he amado a
otro54.

Ele não tem ideia das palavras de amor que eu disse,


mas segurando minha bunda com uma mão e o cabelo com
outra, beija-me como se não houvesse amanhã, enquanto
acelera e goza, com um rosnado masculino de satisfação.

— Oh, meu Deus! Asher... — Grito, gozando também.

54
Eu te amo mais do que já amei alguém.
Acho que ele desmaiou, porque permanece imóvel em
cima de mim, com a testa descansando no meu ombro...
então, ele acaricia minhas costas.

— Não se mova. — Diz ele, colocando a mão ao redor da


minha cintura, enquanto senta na cama. — Só vou me livrar
disto. Volto logo. Precisa de alguma coisa?

Olho entre as minhas pernas e faço uma careta.

— Sim, por favor.

Com um aceno de cabeça, ele desaparece no banheiro.


Ouço a água correndo na pia e quando volta, entrega-me uma
toalha umedecida com água morna.

— Obrigada.

Enquanto, eu me limpo ele se senta ao meu lado,


olhando-me intensamente, ainda que esteja sonolento. Com
qualquer outro cara, isso provavelmente seria estranho, mas
com Asher não, era diferente. Íntimo. Quase uma união.

Assim que termino, ele pega a toalha da minha mão e


atira do outro lado do quarto, em um cesto de roupa suja.

— Você vai ficar o resto da noite? — Pergunta, virando-


se para mim.

Minha resistência já tinha ido para o inferno e como


estou muito aliviada que ele não me chutou depois de ter
conseguido o que queria, eu concordo.

— Sim.
— Certo. — Asher deita-se atrás de mim sob as cobertas
e coloca o braço em volta da minha cintura. — Eu gosto de
dormir com você.

Fecho os olhos e digo a mim mesma que isso não


significa que me perdoou. O que aconteceu entre nós não
significa nada, ele ainda está bêbado e provavelmente vai se
lamentar pela manhã. Não devo ter ilusões.

— Eu amo você. — Digo, em inglês, enquanto me


aconchego, quase caindo no sono.

O braço em volta da minha cintura me pressiona com


mais firmeza, mas não houve resposta. E embora isso me
doesse, não esperava que ele retribuísse o sentimento.
REMY
Eu dormi bem mais do que pretendia e estou bem.
Asher, no entanto, está inconsciente, respirando
profundamente ao meu lado. Tenho tempo para escapar
antes que ele acorde, mas quero ficar mais alguns segundos
aqui. Quase não consigo acreditar que passei mais uma noite
com ele

Asher é tão lindo... os cílios longos, os lábios que se


abrem para deixar sair cada respiração, o cabelo caindo na
testa, mechas escuras mescladas com loiras destacando suas
feições. Não consigo evitar, estendo a mão suavemente para
afastá-las da sua testa e, claro, o cabelo sedoso me chama,
então passo os dedos por mais alguns fios.

Meu olhar cai sobre os ombros nus até onde os lençóis


brancos se encontram sob as axilas. Ele é uma dessas
pessoas que dormem do seu lado da cama e eu também.
Talvez, em alguma realidade alternativa, poderíamos dormir
juntos, cada um do seu lado da cama, aconchegados no
nosso sono.

Mas nesta realidade, ele ainda está com raiva de mim


por ser uma maldita mentirosa e só dormiu comigo porque
estava bêbado e com tesão.
E eu realmente tenho que sair daqui antes que ele
acorde e tudo vire um ninho de vespas. Não quero saber se
está com raiva de mim por me aproveitar do seu estado de
embriaguez na noite passada, quero terminar esta noite com
ele dormindo pacificamente e todo o meu corpo
deliciosamente dolorido pela nossa recente atividade sexual.

Saiu da cama e me visto no escuro da forma mais


silenciosa possível. Depois, pego os sapatos nas mãos para
poder andar na ponta dos pés em direção às escadas.

— Saindo cedo? — Pergunta uma voz sonolenta.

Dou um grito abafado, levando a mão ao coração.

— Puta merda. Você está acordado?

— Sim. — Responde ele com a voz rouca, sentando-se e


passando a mão pela cabeça para arrumar os cabelos.

Os lençóis escorregam pela sua cintura, deixando


descoberto um peito tonificado e ardente que me faz salivar.
Quero voltar para ele, rastejar por baixo das cobertas,
abraçar seu corpo quente e permanecer ali para o resto da
vida. Mas a realidade é uma cadela e, na vida real, ele faz
uma careta, lembrando-me que deve estar de ressaca e
verdadeiramente sóbrio pela primeira vez em horas.

Sóbrio e consciente. O que é razão suficiente para fugir e


ficar longe da cama e do seu corpo delicioso... antes que me
chute para fora e grite comigo por ser uma vagabunda que
não conseguiu manter as mãos longe dele quando estava
vulnerável e fora de si.
Estremeço, sentindo a sua dor.

— Desculpe, eu queria sair daqui antes de você acordar.


— Mudo o peso do corpo de um pé para outro e mordo os
lábios. — No caso de você estar lamentando o que aconteceu
a noite passada e não querer me ver.

Ele para de segurar a cabeça e deixa cair as mãos no


colo para me olhar. Mas não diz nada, o que me deixa mais
desconfortável do que nunca. Olho para o teto e limpo a
garganta antes de falar.

— Então, está arrependido?

Asher não responde imediatamente e como não consigo


suportar o suspense, olho na direção dele. Mas ele não me
tranquiliza dizendo que não lamenta, porque provavelmente
está arrependido de tudo e deve estar desejando que o que
aconteceu ontem à noite entre nós nunca tivesse ocorrido.

Sinto-me devastada e não quero chorar na frente dele,


por isso preciso sair logo. Mas também quero ficar mais um
segundo porque pode ser que por algum milagre ele decida...
não sei... perdoar-me, ou algo assim.

— Eu não tenho certeza. — Admite Asher, finalmente.

Pisco, perguntando-me em primeiro lugar se havia


escutado direito. Então, balanço a cabeça. Ele acaba de dizer
que não tem certeza? Que diabos? Não tem certeza?
Certamente, ele tem que saber se está arrependido de ter feito
sexo comigo ou não.
Cacete, a única razão para um cara como ele não estar
me tranquilizando tem que ser porque lamenta. Então, por
que não deixa de ser covarde e me diz de uma vez?

— Você sabe... — Murmuro, a dor e a raiva trazendo à


tona minha personalidade atrevida. — Eu sei que estraguei
tudo. Menti por mais de um mês, traí sua confiança e feri
seus sentimentos, eu o enganei da forma mais terrível que se
possa imaginar e sinto muito por isso. Lamento. A última
coisa que eu queria era machucar você. Se pudesse voltar no
tempo... não sei se faria diferente, porque se eu fizesse,
nunca teria chegado a conhecê-lo tão bem como o conheço.
Nunca saberia como... você é incrível. E... não teria me
apaixonado por você. Não posso me arrepender dessa parte.
Mas também não posso deixar você usar meus sentimentos e
minha consciência culpada contra mim novamente. A
próxima vez que quiser sexo comigo, terá que significar algo.
Entendido?

Ele respira profundamente, passando as mãos pelo


rosto.

— Sim — Murmura, desviando o olhar. — Eu entendo.

— Vou embora. — Digo, virando para sair. Mas um


lugar vazio acima da porta chama a minha atenção.
Franzindo a testa, olho para ele outra vez. — Onde o Mozart
está?

Asher me olha com uma expressão atormentada.

— Ele se foi.
Ofegando, dou um passo para trás, levando as mãos ao
peito e piscando para ele, tentando dar sentido as suas
palavras.

— O que você quer dizer com se foi?

A Pequena criatura estava tão cheia de vida, e Asher


cuidava dele muito bem. Não podia simplesmente... morrer.
Certo?

— Porra, quero dizer que se foi. — Retruca ele,


parecendo bravo por eu me intrometer no assunto. —
Cheguei em casa, a gaiola estava aberta e ele não estava no
apartamento.

— Mas... — Faço uma careta, sacudindo a cabeça. —


Isso não faz sentido. É um esquilo. Não há outra maneira de
sair do apartamento, exceto pela porta e ele não pode ter
aberto a porta sozinho.

— Bem, então, ele deve ter escapado quando eu entrava


ou saía. Não faço ideia.

Envio um olhar de “não acredito”.

— E você não acha que teria visto ele correr entre suas
pernas quando abriu a porta?

— Já disse, não sei. Eu só sei que cheguei em casa e ele


havia partido.

Mordendo os lábios, eu me viro para estudar a parede


onde a gaiola do Mozart ficava pendurada.

— Acho que outra pessoa o deixou sair.

Asher solta um suspiro cansado.


— Impossível. Ninguém mais veio aqui... exceto você.

Eu me viro lentamente.

— Não fui eu.

— Eu sei disso. Então, quem está sugerindo que invadiu


meu apartamento? — Quando vê a resposta em meu rosto,
ele geme. — Oh Jesus. Ainda com a teoria que meu pai quer
vingança?

— Faz sentido. — Digo, na defensiva.

E sim... para mim fazia sentido.

— Então, por que apenas soltar Mozart, em vez de, você


sabe, matá-lo? E por que perder tempo com todas essas
piadas irritantes quando ele poderia simplesmente
aproximar-se com algo muito mais letal... como uma arma?

— Porque ele é um valentão que gosta de remover a


casca até chegar na carne ferida. Esse tipo de gente
raramente começa com um ataque frontal se não estão
completamente seguros de que são maiores, mais fortes e
podem ganhar. Você já não é uma criança de sete anos, então
ele está tentando encontrar seus pontos fracos. E
provavelmente não matou Mozart no ato, por que quem
poderia pegar aquela coisinha astuta para matá-la? Por que
se incomodar quando o fato mais devastador para você seria
se ele desaparecesse?

E eu percebi que foi devastador. Seus olhos se fecham


com dor quando olha para o lugar onde a gaiola de Mozart
estava pendurada. Ele devia estar chateado, se havia tirado
tudo para não ficar vendo.

Eu me abraço, olhando para o local vazio.

— Espero que Mozart esteja bem.

Asher funga e balança a cabeça.

— Ele provavelmente está se divertindo em um belo


parque, com muitas árvores cheias de nozes.

Ou foi morto, penso silenciosamente. Asher me olha com


a testa franzida, como se lesse meus pensamentos.

— Eu pensei que você ia embora, porque estava com


raiva de mim. — Murmura ele.

— Só você pode decidir se está arrependido de ter


dormido comigo ou não.

Os olhos verdes me fitam com raiva.

— Oh, bem, desculpe-me por estar um pouco confuso.


Mas você me machucou mais do que qualquer outra pessoa e
isso assusta. Ninguém chegou tão perto de mim antes sem
que eu estivesse consciente disto. Então, desculpe se está me
levando mais tempo do que você gostaria para eu decidir se
posso confiar em você de novo.

Eu baixo a cabeça mergulhando no que ele disse.


Realmente, machuquei-o e acima de tudo o deixei tão mal
que ele não sabe se algum dia vai poder confiar em mim
novamente.

Sei exatamente o que Asher está sentindo. Quando


Fisher me feriu e enganou, ele levou junto minha confiança e
pisou nos meus sentimentos. Eu não quis mais saber de
outros homens.... até Asher.

E, no entanto, aqui estou eu, fazendo a mesma coisa


para a única pessoa que me ajudou a ficar curada. Que
vergonha...

— Certo. Vou embora.

— Remy. — Diz ele.

Mas já estou correndo pelas escadas para escapar. Para


fugir de mim mesma. Mas por mais rápido que eu corra e por
onde quer que eu vá, ainda está ali, comigo... a cadela que
feriu Asher Hart.
PARTE I

ASHER
A vontade de correr atrás de Remy e arrastá-la de volta
para o meu apartamento é enorme. Porra, ela provavelmente
está chorando agora e não quero isso, só quero que a minha
cabeça pare de doer por alguns minutos para que eu possa
pensar com clareza novamente.

Será que ela não entende que nunca tive a oportunidade


de amar e ser amado antes? Não assim. Cacete. E saber que
tudo começou com uma mentira acaba com a confiança...
que homem em seu juízo perfeito daria outra oportunidade?
Creio que só um louco que quer ter a sua mulher de qualquer
jeito.

Um segundo depois atiro os lençóis longe, pego a


primeira calça que encontro e ainda a vestindo, corro escada
acima. Mas quando chego na rua ela já havia partido, tudo o
que vejo é a luz traseira do carro enquanto vira a esquina.

Droga. Seguro a cabeça dolorida e, com cuidado, ando


de pés descalços sobre o asfalto sujo. Agora tenho que ir
atrás dela e ainda não sei o que quero dizer... acho que posso
começar confessando que não lamento o que aconteceu
ontem à noite porque foi... incrível.
Mas ainda estou irritado por ela fugir de mim outra vez
e também é difícil pôr de lado todas as mentiras. No entanto,
Pick está certo. Preciso perdoá-la, porque sei que não quero
passar o resto da vida sem ela.

Ontem à noite, eu abri os olhos para o fato de que a


conheço de verdade. Ela pode ter me enganado sobre várias
coisas importantes, mas por dentro continua sendo a mesma
pessoa. E não estou disposto a perder um amigo... ou uma
amante.

Com um suspiro, corro as mãos pelo cabelo e me viro


para entrar no apartamento. Preciso me vestir, tomar um
analgésico e beber um litro de água antes de ir atrás dela.

Mas antes de dar um passo para entrar, um estranho


animal em uma lixeira vizinha me faz parar.

Pensei que ia ver um rato, então quando um animal com


aparência de um esquilo com o pelo todo desalinhado sai
como uma flecha da lixeira quase fico furioso comigo mesmo.

— O que... Mozart?

Só podia ser ele, porque correu diretamente para a porta


e entrou, descendo as escadas até desaparecer dentro do meu
apartamento.

— Merda. — Digo, depois de respirar fundo. — Meu


mascote voltou para casa.

A emoção toma conta de mim, passo a mão trêmula


sobre o rosto antes de entrar correndo e pegar algo para ele
comer. Não deve ter sido tratado gentilmente pela vida lá fora,
porque se move como se estivesse com frio e medo.

Eu queria segurá-lo, mas sei que não vai gostar. Então,


eu corro para a cozinha e esvazio um saco de amendoins no
chão. Ele sequer se importa que eu fique parado perto da
comida, corre e começa a comer ali mesmo.

— Pobre rapaz. — Murmuro, indo pegar um pote com


água. — Foi difícil lá fora, certo?

Um sorriso ilumina meu rosto enquanto olho Mozart por


um minuto, antes que ele decida que já é suficiente e
desapareça embaixo da cama. Eu suspiro e olho em volta,
antes de rir aliviado.

— Bem-vindo de volta ao lar, amigo. — Digo em voz alta.

Minha voz ecoa no apartamento vazio. Olho em volta


pensando que a primeira pessoa a quem quero contar é
Remy.

Caralho, ela é a única para quem quero ligar e contar. E


isso me diz tudo. Ela mentiu, mas teve uma razão para isso...
e nunca me machucou, também pediu desculpas e dá para
ver que realmente sente muito. Então, claro que posso
superar porque, caramba, amo essa mulher.

Reconhecer isso instantaneamente me deixa feliz. ou


trazê-la de volta.

Arranco as calças para tomar um banho rápido e depois


da ducha me visto, coloco os sapatos e pego o telefone.
Assegurando-me que Mozart ainda está satisfeito embaixo da
cama, endireito-me e vou em direção a porta.

Remy Elisa Curran, aqui vou eu.

Dez minutos mais tarde, paro em frente ao prédio dela,


desligo a moto e fico sentado, só... olhando.

Como cheguei até aqui sem um plano? Ela foi épica,


cantou músicas para mim na frente de centenas de pessoas...
e tudo o que eu consigo pensar em dizer é: eu não me
arrependo. Faço uma careta pela minha estupidez, um pouco
tentado a bancar o covarde e voltar para casa.

Eu não tenho experiência com o amor. E se falhasse? O


que acontece se ao nos dar uma oportunidade acabasse...
matando-nos? E se por estar com tanto medo da dor, perder
a melhor coisa que poderia ter me acontecido?

Cerrando os dentes, pulo da moto e entro no prédio.


Tenho até o segundo andar para decidir o que vou fazer e
passo a maior parte do tempo respirando como um lutador
pronto para pular no ringue para seu primeiro round.

Tudo terminou bem entre Pick e eu. Vai dar certo com
ela também. E estranhamente, parece que mais uma vez
estou arriscando tudo que importa na minha vida apenas
para construir um relacionamento com alguém. Mas esta
menina vale a pena.

Quando chego à porta e levanto a mão para bater, ela se


abre, fazendo-me pular para trás, surpreso.
Esperava ver Remy, então pisco os olhos confuso
quando Gally sai para o corredor. Ele encontra-se tão
ocupado colocando o cinto que só percebe que estou na sua
frente quando quase tropeça em mim.

— Oh, olá, cara. — Um sorriso presunçoso e relaxado se


espalha pelo seu rosto. — Você finalmente decidiu pôr fim ao
seu período de seca?

Ele levanta a mão fechada para bater na minha para me


felicitar, quando outro membro da banda, Holden, sai do
apartamento puxando a camiseta.

Olho boquiaberto entre os dois.

— O que...? Mas, é sério... O quê?

Gally ri enquanto Holden fica vermelho. Finalmente, o


meu baixista dá de ombros.

— O que eu posso dizer? A garota não consegue se


satisfazer somente com um pau. Ela gosta quando cada
buraco está cheio.

Rindo, Gally bate o braço contra o meu, como se


compartilhássemos algum tipo de piada interna. Mas tudo o
que eu consigo é sentir um gosto ácido na boca e ver um
borrão de luz.

— Não se preocupe, Hart. — Diz Gally, sua voz irritando


meus ouvidos. — Deixamos a garota satisfeita e ansiosa por
você. Divirta-se.

Não paro para pensar, acho que não é possível pensar


no momento. Eu só quero machucar o idiota, fazê-lo sangrar
e gritar de dor... da mesma maneira que está fazendo comigo.
Com um rugido selvagem, eu pulo sobre ele, empurrando-o
contra a parede.

— Está morto, imbecil. Eu não posso acreditar que você


a tocou. Porra, ela te odeia.

Dou um soco em um dos olhos dele e teria acertado o


outro se Holden não tivesse me puxado para trás. Isso só me
irritou mais. Também tentei atingi-lo, mas ele usou minhas
próprias táticas contra mim e me prendeu na parede,
apertando o braço na minha garganta.

Lutei e o empurrei para me soltar, mas o imbecil era


maior. Isso me faz gritar de frustração e raiva, porque se eu
tivesse o tamanho de Knox, Quinn ou mesmo Noel, o teria
derrubado.

Com um surto de adrenalina me lanço contra ele


novamente fazendo-o tropeçar para longe de mim. Estou a
ponto de socá-lo quando escuto uma voz.

— Que porra é essa? — Pergunta Remy, chorando.

Mas a voz dela não vem da direção do apartamento.

Virando a cabeça olho de boca aberta para as escadas,


onde ela está parada, com o mesmo vestido que havia usado
na noite passada e segurando um copo plástico.

Os olhos estão vermelhos e inchados de tanto chorar, o


cabelo está despenteado..., mas nunca esteve tão bonita. Levo
um segundo para recuperar o fôlego.
Atrás de nós, a porta do apartamento se abre totalmente
e vejo Jodi olhando com curiosidade para o corredor, vestindo
apenas um casaco curto, que foi abotoado de um jeito que
mostra que ela não está usando nada por baixo.

Jodi fecha os olhos e diz um palavrão baixinho.

— Que diabos está acontecendo aqui? — Dizem as


garotas, quase simultaneamente.

— Pergunte a este filho da puta. — Responde Gally e


percebo que ele está apontando para mim, mas estou muito
envergonhado baixando a cabeça e me repreendendo pela
estupidez para realmente vê-lo. — Ele é o idiota que nos
atacou sem razão assim que passamos pela porta.

Todos esperam minha explicação em silêncio.

— Asher? — Murmura Remy, como se estivesse


realmente preocupada comigo.

— Droga, eu... — Quando levanto o rosto e encontro seu


olhar, perco a coragem. Merda, eu não quero dizer a verdade.
— Eu... interpretei mal a situação.

Ela pisca, franzindo a testa, em seguida olha para Gally,


Holden e Jodi, até que arregala os olhos, surpresa.

— Você está falando sério? — Pergunta Remy, virando-


se para mim.

Estremeço e coloco a mão na minha cabeça dolorida.


Merda, esqueci de tomar um analgésico para ressaca.

— Não sei o que estava pensando. — Imediatamente


começo a colocar a culpa na confusão que não consegui
entender. — Não estava pensando. Cacete, eles saíram
vestindo as roupas.

Remy levanta as sobrancelhas e coloca as mãos nos


quadris.

— Então, você deduziu que eles estavam comigo?


Realmente? Uau, isso deve ter sido um ménage de dois
minutos, porque saí do seu apartamento há vinte minutos
atrás.

Abro a boca para negar a minha suposição idiota, mas


porra... ela tem razão. Gally, sem saber quando manter a
boca fechada, desfila na minha frente e lambe os lábios
enquanto observa o vestido de Remy.

— Isso não é realmente uma má ideia. Você parece


muito melhor do que alguns dias atrás... Remy. Então, por
que não leva eu e o Holden para conhecer seu quarto?

Quando ele chega perto dela, rosno e o empurro para


trás.

— Afaste-se.

Seus olhos se estreitam e acho que ele quer revidar, por


isso me viro completamente para encará-lo. Mas Remy se
interpõe entre nós, colocando uma mão no meu peito e
levantando a outra na direção de Gally para detê-lo.

— Já chega. — Ordena.

Quando Gally e eu paramos, ela deixa escapar um


suspiro e diz algo em espanhol.

— Porque estavam brigando? — Pergunta.


Eu gostei que ela deixou a palma da mão no meu peito.

— Porque é muito mais rápido para aliviar o estresse


que comer sorvete ou conversar com outra garota como vocês
fazem. — Respondo.

Ela olha para mim com os olhos castanhos repletos de


emoção. Há humor ali, mas em seguida seu rosto desvanece
em uma expressão de dor.

— Não é o momento para ser machista e lindo. —


Finalmente ela murmura.

— Sinto muito. — Murmuro.

A mão dela continua sobre meu coração e eu sinto o


tremor quando pressiona um pouco mais forte, como se
estivesse tentando entrar dentro de mim antes de retirá-la.
Eu poderia ter dito que já está completamente dentro do meu
coração, mas Gally começa a rir, quebrando o clima.

— Oh, então agora são “amigos de foda”, hein? Diga-me,


Hart, você tentou entrar nas calças dela antes ou depois que
descobriu que Remy era uma garota?

Eu curvo os lábios em um sorriso e Remy


imediatamente vai ao meu encontro para impedir que eu dê
outro soco nele. Fecho os olhos e respiro fundo para me
acalmar.

— Tenha mais respeito ao falar da nossa baterista,


idiota.
Com um suspiro, Remy se vira para mim, jogando o
cabelo sobre o ombro. Gally franze a testa, balança a cabeça e
troca um olhar com Holden antes de se virar.

— Nossa baterista? Pensei que ela estava fora da banda.


Você enviou uma mensagem cancelando o show de sexta-
feira e contando que Remy era uma menina.

Aperto os dentes, porque ela estava fora da banda


quando enviei essa mensagem, mas agora mudei de ideia.

— Somente os atualizei sobre a mudança de status. E


nós tivemos que cancelar sexta-feira por.... outros motivos.

Remy não me corrige, graças a Deus, simplesmente


estreita os olhos para nós três, ansiosa para escutar como
iria terminar esta conversa.

— Sério? Então, você quer a porra de uma cadela na


banda? — Gally explode em descrença, apontando para Remy
enquanto me olha. — Mas o nome da banda é NonCastrato
porquê...

— Não importa o porquê do nome NonCastrato. E não a


chame de cadela. O fato é que ela já está na banda há mais
de um mês, que diferença faz...

— Porque não quero uma maldita garota na banda! —


Gally rosna.

Carrancudo, fecho as mãos em punhos e olho para


Holden, esperando ele dar sua opinião, embora eu possa ver
em seu rosto que ele está ao lado de Gally.
— Se não a querem, então também não vou ficar. — Ao
meu lado Remy respira fundo, surpresa, mas estou olhando
para os dois caras. — Remy é a melhor baterista que já
conheci e vou fazer parte de qualquer banda que ela esteja.

Gally olha para mim por um segundo antes de xingar e


levantar as mãos.

— Tudo Bem. Entretanto, se ela fizer qualquer drama,


estou fora. — Diz ele, saindo furioso.

Na verdade, quem está fazendo drama é ele com essa


saída tempestuosa, coisa que jamais vi Remy fazer. Holden
balança a cabeça, despedindo-se e vai atrás de Gally.

Eu os vejo ir embora e lembro perplexo o que acabaram


de fazer juntos com Jodi.

PARTE II

Jodi limpa a garganta.

— Então, hum... sim. Mais uma vez, estou sem graça


perto de vocês. Então... então vou parar de falar... outra vez.

E desaparece dentro do apartamento, fechando a porta e


deixando-me sozinho com Remy.

Olho para ela, de repente sem palavras. Vim para que a


gente se entendesse, mas depois... tudo isso aconteceu.
Então, suspiro e passo as mãos pelo cabelo.
— Sinto muito. Eu não estava pensando.

— Isso você já havia dito. — Diz ela, abraçando a si


mesma e olhando para o chão.

— Minha cabeça ainda estava confusa esta manhã. —


Eu tento explicar, pois não parece que ela vá me perdoar por
achar que estava com os caras. — Eu esqueci de tomar um
analgésico para ressaca e estava preocupado, tentando
decidir o que falar. Quando ele abriu a porta... não sei. É
que... perdi completamente a capacidade de pensar
racionalmente. Fui direto para o modo homem das cavernas,
pronto para lutar por minha mulher.

Mas Remy ainda não olha para mim.

— Droga. Eu não estou acostumado com isso. As


mulheres que realmente me conhecem não dizem eu te amo.

Finalmente, ela olha para cima com os olhos arregalados


de surpresa.

— Não parecia real. — Digo, depois de respirar fundo. —


Era mais fácil acreditar que você não quis dizer isso e havia
seguido em frente. Pensar em você e eles.... em um instante
eu... foi apenas uma reação imediata, instintiva, que foi
muito estúpida e....

Quando ela se aproxima e coloca os dedos sobre a


minha boca para me calar, eu suspiro.

— Tudo bem. — Murmura.

Ela baixa a mão e chupo o lábio inferior, tentando


provar o seu toque. Deus, eu estou perdido por essa mulher.
— Você sabia que sua companheira de apartamento
estava... com os dois? — Pergunto, inseguro.

Remy estremece.

— Infelizmente, sim. — Então, ela vê a bebida que havia


deixado em cima do corrimão, pega, toma um gole e me olha
desconfiada. — Você realmente brigou com eles para eu ficar
na banda?

De repente não sei o que fazer com as mãos, então as


coloco nos bolsos.

— Bem... — Dou de ombros timidamente. — É o que


você mais queria no mundo, não é?

Quando ela não responde, olho para o seu rosto. Seus


olhos parecem marejados e incertos, por isso, dou um passo
e sussurro seu nome.

— Droga. — Murmura ela, apertando os olhos. — Sim,


isso costumava ser o que eu mais queria no mundo.

Curvo os lábios com satisfação.

— Costumava ser?

Quando ela morde o lábio e concorda com a cabeça,


chego mais perto. A respiração de Remy fica mais rápida e
meu corpo treme de necessidade.

— Então, o que você quer agora mais que tudo? —


Pergunto, vendo-a abrir bem os olhos. — Basta dizer. —
Encorajo-a em voz baixa.

Mas ela nega com a cabeça.


— Eu... não posso. Estraguei tudo.

— Você tem certeza disso?

Seus olhos se enchem de lágrimas.

— Asher. — Sussurra, tocando novamente meu peito.

É a minha vez de balançar a cabeça.

— Porque por mais que eu tente, não consigo ter raiva


de você.

Ela soluça e rapidamente leva a mão à boca, os olhos


fixos em mim, como se não pudesse acreditar no que está
ouvindo.

Então, continuo falando.

— Acho que eu queria odiá-la porque me senti tão


estúpido. Eu deveria saber... eu só... deveria ter sido capaz de
descobrir.

— Não. — Diz, balançando a cabeça e segurando meu


braço — Eu enganei você todo o tempo, menti e enganei,
então não havia como saber. Você não fez nada de errado. O
erro foi meu...

Eu coloco os dedos nos seus lábios para silenciá-la.

— Nunca me importei se você era Sticks ou Elisa, garoto


ou garota. Sempre quis estar perto de você. Eu... — Dou uma
pequena risada autocrítica e olho para o teto. — Você sabe
por que fui capaz de levá-la para minha casa apenas dez
minutos depois do nosso primeiro beijo, sem um pingo de
dúvida, mesmo depois de dizer várias vezes que desejava
encontrar uma mulher para realmente começar um
relacionamento?

Remy me olha envergonhada.

— Sim, porque fazia muito tempo que...

— Claro que não. — Rosno. — Minha libido não me


controla, eu poderia ter esperado mais.

Ela franze a testa, surpresa... e ainda confusa. Então...

— Foi porque você era tão familiar... — Inclino-me para


a frente e apoio a testa na dela. — Era como se nos
conhecêssemos, eu não entendia naquela época que havia
uma razão para isso. Mas também fiquei com Elisa, sem
realmente falar com ela, porque era a parte que faltava na
minha relação com.... Sticks. Seu álter ego cobriu minha
necessidade emocional, então a única coisa que faltava era
intimidade e você me deu isso também... deu-me tudo o que
eu mais queria. E eu nunca poderia imaginar que viria da
mesma pessoa.

— Droga. — Ela funga e limpa o nariz, enquanto as


lágrimas correm por seu rosto. — Você vai me perdoar, certo?

— Sim, eu vou.

Sorrio e pego seu rosto para enxugar as lágrimas com os


dedos. Ela fecha os olhos e inclina a cabeça.

— Mas eu menti, eu...

— Pare. — Murmuro em voz baixa, antes de soltar um


grande suspiro e passar as mãos sobre seu rosto.

Então, vejo mais lágrimas e só consigo sacudir a cabeça.


— Por favor, pare de chorar. — Digo, pegando suas
mãos.

Ela nega com a cabeça.

— Não consigo. Chorei quase o mês inteiro, desde que


conheci você, e nunca choro tanto. Como me transformou
nesse poço de lágrimas?

— Acho que Nazaré55 realmente sabia do que estava


falando.

— O quê? — Bufa ela. — Isso que o amor dói?

Um sorriso floresce no meu rosto.

— Só você entende minhas piadas musicais. Eu amo


que me entenda. Como não poderia perdoá-la?

— Porque não mereço. — Gagueja Remy, ainda com as


lágrimas escorrendo pelo rosto. — Eu estava tão errada.

Tudo o que posso fazer é encolher os ombros, abraçá-la


e beijar seu cabelo.

— Quem pode dizer que eu não faria o mesmo no seu


lugar? Você me disse o quanto queria estar em uma banda e
que ninguém nunca deu uma oportunidade. Sinceramente,
foi algo inteligente. E vi a mentira se tornar uma bola de
neve, então sei que você não estava fazendo nada com
segundas intenções, não quis me ferir ou enganar ou...

— E quanto a Elisa?

Eu congelo, ainda chateado por isso, mas... não me


arrependo.
55
Banda de hard rock escocesa, que interpreta a música “Love Hurts”.
— O que tem ela? — Pergunto com a voz rouca.

— Talvez, seja o pior que eu fiz. Quero dizer, você mais


ou menos me disse como conquistá-lo, que gostava de ir atrás
da garota. E eu não tinha a intenção de despertar o caçador
em você, mas sabia que...

— Eu acho que você disse que não consegue resistir a


mim ou a minha “boca Power”. — Interrompi-a, sorrindo até
ela ficar corada.

— Sim. — Murmura ela, revirando os olhos. — É


verdade. Mas você também me disse que queria conhecer
uma mulher antes de levá-la para a cama e eu não te dei essa
chance, fiz você passar por mais uma noite de aventura,
embora soubesse que você odiava, e eu...

Remy para de falar quando vê que eu estou rindo.

— Por que diabos você está rindo?

— Porque você é tão linda quando está tentando me


defender.

— Mas...

— Não. Shhh.

Pressiono minha boca na dela e, sim, funciona. Ela para


de falar. Eu queria ir mais fundo, beijá-la mais, mas preciso
dizer mais uma coisa antes de me perder no prazer que é
Remy Curran.

— Eu não me arrependo de nada. Agora você vai parar


de tentar discutir, mulher? Vai aceitar voltar para casa
comigo para que eu possa mostrar uma surpresa e em
seguida fazer amor pelo resto da tarde?

Os grandes olhos castanhos brilham com esperança.

— Ok, leve-me para casa.


REMY
Desperto com os lábios dele pressionando ao longo da
minha coluna, mordendo-me e saboreando cada mordida com
a língua. As mãos acariciam os lados dos meus seios, até que
ele consegue segurá-los.

— Mmm. — Cantarolo feliz, mantendo os olhos fechados


porque tenho um pouco de medo de que esta tarde que passei
nua com Asher tenha sido um sonho

Nus no sofá jogando Call of Duty, nus na cozinha


preparando um lanche para sobrevivermos, nus na cama
usando uma nova caixa de camisinhas... felizmente, sempre
nus.

— Sinto-me tão... bem.

— É? — Sussurra Asher, antes de se inclinar e beijar


um lugar sensível atrás da minha orelha. — Então, fique aqui
enquanto estou fora, assim quando eu voltar posso retomar
de onde parei.

Abro os olhos.

— Fora? Retomar? — Com o rosto franzido, eu me viro,


ofegando quando o encontro vestido com um jeans e uma
camiseta preta, muito sexy..., mas mesmo assim... — Onde
você vai?
Os olhos verdes viajam por meu corpo, parando nos
meus seios expostos.

— Tenho que ir trabalhar. Mas pode ficar aqui. — Ele


me olha com uma expressão incerta no rosto. — Quer ficar?
Você... uh... você estaria me fazendo um favor enorme porque
estou um pouco preocupado em deixar o Mozart sozinho até
montar a gaiola.

Na realidade ele tentou pendurar a gaiola, mas eu não o


deixei colocar a roupa, achei que seria adorável vê-lo fazer
isso nu. Asher se negou e em troca me comeu com força e
rápido... essa opção foi boa também.

Coloco as mãos no seu rosto, não quero que ele fique


preocupado.

— É óbvio que vou cuidar do Mozart para você. Não vou


deixar que nada aconteça ao seu querido esquilo.

Asher sorri e imediatamente mergulha para um beijo


intenso.

— Obrigado, mas para ser bem sincero, só quero voltar


para casa e encontrar você dormindo na minha cama.

— Oh... — Digo, revirando os olhos. — Fale a verdade, o


que você quer é me manter aqui como prisioneira para
satisfazê-lo sexualmente, não é?

O sorriso do imbecil aumenta.

— Se eu tivesse guardado as algemas...


Jogo a cabeça para trás, rindo, então o abraço e arqueio
o pescoço para que ele possa me beijar. A felicidade se irradia
por todos os meus membros.

— Te amo tanto.

A pressão dos lábios para no meu queixo. Eu gostaria


que ele dissesse que me ama também, mas Asher não diz
nada e quando baixo a cabeça encontro os olhos verdes
aflitos. Sei que ele gosta de ouvir minha declaração e posso
ver que quer responder do mesmo modo, mas simplesmente
tem medo. Então, sorrio e o beijo levemente, acariciando seu
cabelo.

Asher nunca disse essas palavras a uma mulher e eu


sinto uma espécie de alegria que esteja indeciso porque
quando finalmente disser, vai significar mais. E até lá vou ser
paciente e brincar de escrava sexual.

Com um gemido, Asher pressiona seu corpo ao meu e


me beija.

— Sério, tenho que ir trabalhar. — Diz ele, sorrindo.

— Então vá trabalhar. — Respondo, mas enquanto digo


isso aperto-o contra mim e me asseguro que meu joelho roce,
não tão acidentalmente, entre suas pernas.

— Puta que pariu, mulher tentadora, nua e sexy. —


Grunhe, segurando uma das minhas coxas para colocar os
quadris entre minhas pernas, depois de desabotoar suas
calças jeans. — Só temos tempo para uma rapidinha.
— Oh, bom! — Grito com alegria, tirando sua camiseta
ao mesmo tempo que ele abre um pacote de preservativo.

Ainda estou com a camiseta dele na mão quando Asher


empurra dentro de mim. Ofego surpresa e cravo as unhas
nas suas costas, enquanto ele me penetra sem piedade.

— Por Deus, é uma rapidinha mesmo. Mmm... mais


rápido. Mais forte!

Não sei se ele entende o que estou dizendo ou se


simplesmente percebe o que meu corpo quer, mas Asher me
deixa repleta de uma satisfação física tão grande que gozo
com força e rápido. Sentindo meu coração em paz, fecho os
olhos e me agarro a ele no momento do seu orgasmo.

— Amo você. — Sussurro.

Asher suspira, pressiona o corpo ao meu e ficamos ali,


simplesmente abraçados e em silêncio. Estou acariciando
suas costas e o cabelo quando percebo que ele está ficando
sonolento e vai dormir em cima de mim em questão de
segundos. Mas não estou pronta para despertá-lo.

Entretanto, um barulho me fez olhar por cima do ombro


de Asher. Mozart está de pé no final da cama nos olhando.
Grito assustada e jogo a camiseta que estava amassada na
minha mão.

Com toda a confusão, Asher acorda e senta-se para ver


o que está acontecendo.

— Precisava colocá-la de novo. — Diz, arrastando as


palavras, ainda meio dormido.
— Bom, seu esquilo precisa parar de ser um pervertido.
— Respondo, com o cenho franzido. — Sério, ele estava
olhando sua bunda.

Ele ri, arrastando-se até o final da cama para pegar sua


roupa e se preparar para o trabalho... de novo.

— Estou tão feliz que vocês dois se dão bem.

Sento e cruzo os braços, enquanto ele termina de vestir-


se.

— Não haveria problema se ele aprendesse qual é o seu


lugar. — Cutuco o peito dele com o dedo e grito no quarto
para que Mozart pudesse me ouvir... em qualquer lugar que
estivesse. — Esta é a bunda do meu homem, esquilo. Tire
seus olhos de cima, entendido?

— Isso, querida.

Sorrindo, Asher vem de novo para cima de mim e me


beija com força e rápido. Quando se afasta o sorriso continua
orgulhoso, como se estivesse feliz por eu dizer que ele é meu.

Arqueando uma sobrancelha, dou uma olhada para o


seu pescoço.

— Bom, se quiser que eu marque minha propriedade...

Deixo ele ir cinco minutos mais tarde, com um sorriso


bobo nos lábios e um chupão no pescoço.
Sinto uma paz emocionante quando dou uma volta para
analisar o apartamento, perguntando-me o que ia fazer
durante as próximas oito horas, até ele voltar. Não sei muito
bem por que quero ficar aqui, mas a idéia de estar rodeada
pelas coisas dele faz com que me sinta... maravilhosa.

Uma hora eu vou ter que ir para a minha casa, voltar à


vida normal e começar nossa relação a partir daí, mas esta
noite simplesmente vou ser a escrava sexual de Asher Hart.

Depois de me vestir, porque estar nua para o Mozart não


é tão divertido como estar para seu dono, preparo algo para
comer e vou alimentar o esquilo. Tenho a sensação de que
estou tão dominada por essa maldita bola de pelos quanto
estou pelo Asher.

Mozart nega a minha oferta de frutas, então eu parto


para alguns amendoins, mas faço ele se aproximar e pegá-los
da palma da minha mão... o que o pequeno esquilo ambicioso
finalmente faz. Enquanto o observo desfrutar da comida,
apoio os braços sobre os joelhos e balanço a cabeça.

— Não sei como diabos você não tem urticária com


essas coisas. Amendoins são terrivelmente assassinos.

Mas Mozart não via nenhum problema e continuou


comendo, feliz. Com um suspiro de contentamento, coloco-me
de pé e saio à procura da gaiola pelo apartamento.

O que pensei que seria uma tarefa bastante simples


transformou-se em horas de palavrões, suor e um pouco de
sangue quando raspei o braço algumas vezes nos arames,
mas consegui, a gaiola ficou pendurada basicamente como
antes. Quando terminei, cocei a cabeça perguntando-me
como diabos Asher ia conseguir que seu rato de árvore
voltasse a ficar ali depois de deixá-lo livre. Então, decidi que
ele podia fazer essa tarefa quando chegasse em casa.

Também joguei um pouco do Call of Duty, mas não é tão


divertido jogar sozinha... sinto falta do meu homem. Já é
tarde, talvez eu pudesse dormir um pouco, mas estou
impaciente demais, uma parte de mim está preocupada que
tudo isto seja uma mentira e que ele não volte, ou que eu não
vá vê-lo mais ou... sei lá. Este é o apartamento dele, não tem
como Asher não voltar para cá, mas a sensação persiste.
Parece que simplesmente não mereço um final feliz.

Falta mais ou menos uma meia hora para Asher chegar


quando ouço uma batida na porta de cima. No começo me
assustei, mas em seguida sorrio, perguntando-me que
brincadeira ele está armando. Corro pelas escadas e abro a
porta, preparada para qualquer tipo de entrada que Asher
tivesse planejado.

Mas não há ninguém no beco escuro e uma sensação de


inquietude toma conta de mim. Estou me virando para entrar
quando vejo uma pequena caixa com as palavras “PARA
REMY” no chão, perto da porta. Imediatamente um sorriso
aparece em meu rosto.

Como diabos, ele soube que eu adoro presentinhos?


Será que perguntou para Jodi? Pego a caixa, desço
rapidamente e assim que sento na cama, rasgo o papel.
A caixa de chocolates me faz rir, é algo tão típico de um
cara que quer conquistar uma garota. Bem, droga, eu já sou
dele, não precisa mais ser tão doce. Mas fico feliz, porque o
chocolate é muito bom.

Coloco a primeira trufa na boca e gemo quando afundo


os dentes no chocolate até chegar no.... Mhmm... Caramelo.

Depois de três bombons começo a me perguntar onde


Asher está. É estranho que tenha me deixado um presente e
não apareça para eu agradecer. Oh... vou agradecer de forma
sexy. Se estivéssemos na minha casa, eu colocaria um
conjunto de calcinha e sutiã que comprei porque era lindo,
mas nunca usei.

Bom, uma garota precisa se conformar com o que tem,


então tiro a roupa e procuro na gaveta de camisetas até que
encontro uma suave e desgastada que o vi usar em mais de
uma ocasião. Coloco-a com um pouco mais de pressa que o
normal e sento no braço do sofá para recuperar o fôlego,
estranhando meu repentino esgotamento.

Quando estou comendo o quarto ou quinto bombom


começo a sentir o coração acelerado e a sala girando... que
esquisito. Estendo a mão para me sustentar e sacudo a
cabeça. Que merda?

Tento engolir, mas o chocolate não quer descer, então


ofego e uma dor violenta atravessa o meu estômago.
Segurando o abdômen, desloco-me do sofá para o chão,
dobrando-me até cair.
Mozart sai debaixo da cama como se estivesse
preocupado, aproximando-se para me ver. Tento dizer que
está tudo bem, mas um segundo depois me dou conta de que
não posso falar... porque minha garganta está inchando.

Pisco quando o esquilo fica fora de foco, meus olhos


também incharam.

Oh, merda. Reação alérgica.

Um pouco desconcertada porque nunca fiquei assim


antes, procuro minha bolsa, sem conseguir lembrar de onde
tinha deixado. Tento olhar ao redor do apartamento, mas não
consigo ver nada e a minha respiração também piorou. Com
voz áspera chamo Mozart, sem saber o que ele poderia fazer...
procurar minha bolsa? Mas fico feliz que ao menos ele esteja
aqui comigo.

Os pulmões paralisaram, não consigo enchê-los de


oxigênio e acho que comecei a vomitar. Sinto-me perdida,
minha pele está tão fria e úmida, que a única coisa que posso
fazer é ficar deitada, tremendo.

Um segundo antes de perder a consciência uma lágrima


escorrega por meu rosto. Isto vai ser um golpe duro para ele.
Asher esperou toda a vida que alguém o amasse e agora...
agora eu ia deixá-lo. Não, não posso fazer isso. Tento mais
uma vez me arrastar às cegas, procurar a bolsa com as mãos,
mas só encontro um pelo quente e grosso.

Outra lágrima rola pelo meu rosto enquanto acaricio


Mozart... até que tudo fica preto.
ASHER
Acelero a moto cantando em voz baixa “Hey Brother” do
Avicii. Quero chegar logo em casa para entrar em baixo dos
lençóis com Remy.

Fiz rapidamente a limpeza no bar, pensando nela quente


e nua na minha cama, quando estou sentando na moto
Mandy, uma das garçonetes me chama.

— Hey, Asher, minha bateria morreu de novo. Você


poderia me ajudar? Tenho os cabos.

Dou um pequeno grunhido interno enquanto me viro


para ela.

— Claro.

— Posso ajudá-la se você quiser. — Diz Quinn.

Fico com vontade de aceitar, mas Quinn provavelmente


quer chegar logo em casa para ver sua esposa e o bebê tanto
quanto eu quero ir para casa ficar com Remy.

Casa. A palavra dança na minha mente e me enche de


uma paz maravilhosa. Ela é minha casa e eu finalmente vou
dizer que a amo. Esta noite. Assim que ajudar Mandy.

— Não, pode ir homem, eu dou um jeito aqui.

Faço um gesto me despedindo de Quinn e vou ajudar


Mandy.
Assim que o carro fica pronto, espero ela sair do
estacionamento, subo no meu bebê e dirijo em direção ao
familiar beco escuro.

As luzes estão acesas quando abro a porta... ela esperou


por mim. Sorrindo, procuro-a pelo apartamento, preparado
para encontrá-la nua e estendida sobre algum móvel,
esperando-me... Como uma boa escrava sexual.

Mas não há nenhuma Remy nua, nem mesmo uma


Remy dormindo na cama. De fato, a cama está feita e vazia.

Respiro profundamente, não estava preparado para que


ela me deixasse assim... não estou certo do que isso significa,
ou o que vou fazer se ela não estiver mesmo aqui. Quando
começo a percorrer lentamente o apartamento meu esquilo
vem voando de debaixo da cama até mim.

— Jesus — Grito, dando um passo para trás, sem


entender por que diabos ele corre a minha volta e logo se
afasta de novo.

— O que te deram para comer? — Pergunto com o rosto


franzido, vendo-o pegar o que parecia um bombom do chão e
desaparecer de novo em baixo da cama.

Um bombom? O quê? Dou alguns poucos passos e a


mão de uma pessoa aparece estendida no chão do outro lado
do sofá.

— Oh Deus... Remy!
Corro até lá e me ajoelho junto à figura imóvel. Seu
rosto está irreconhecível, inchado e com manchas, mas pela
cor do cabelo dá para ver que é ela.

— Oh Jesus, não. — Pego-a nos braços e aperto o corpo


inerte no meu peito, perguntando-me que diabos tinha
acontecido. — Remy, acorda. Fala comigo. O que aconteceu?

Coloco os dedos no seu pescoço e sinto um batimento


fraco. Acho que sinto um pequeno batimento, não tenho
certeza.

— Tem pulso. — Digo em voz alta, falando para


ninguém.

Então vejo a caixa de bombons vazia, a poucos


centímetros de distância. Olho a caixa por um momento
antes de tirar o telefone do bolso traseiro e marcar 911.

Parece demorar uma eternidade para atenderem. Cristo,


os operadores de emergência não devem atender
imediatamente? Quando uma senhora finalmente fala
comigo, descrevo tudo da melhor maneira que eu posso.

— Sim, inconsciente. — Digo. — Está toda inchada e....


sim, há erupções na pele.

— Parece uma reação alérgica. — Responde ela.

— Merda. Ela é alérgica a amendoim. — Meu olhar


desvia-se para a caixa de bombons. Oh Deus. Parece que ela
comeu... não sei. Quantos Mozart comeu? — Há uma caixa
vazia de talvez duas dúzias de bombons aqui. Deve ter algum
tipo de ingrediente com amendoim neles.
— Ela precisa ficar deitada com as pernas para cima,
depois cubra-a com uma manta.

Disposto a tentar qualquer coisa a coloco no chão e pego


um travesseiro e uma manta da minha cama. Ela está
totalmente inconsciente.

— Você vai enviar uma ambulância?

— Sim, mas temos que fazer algo agora, porque se a


reação for tão grave quanto você está descrevendo ela não
pode ficar mais de quinze minutos sem tratamento.

Meu coração quase para. E se já se passaram os quinze


minutos? Não tenho nem ideia de quanto tempo ela está
assim. Cristo.

— Bom, então que merda faremos?

— Ela deve ter algum tipo de medicação de emergência à


mão se for uma alergia conhecida, como um Epipen56 ou algo
assim.

Não tenho nem ideia do que é um Epipen, mas quando


vejo a bolsa de Remy na mesa da cozinha corro até lá e a
esvazio. Uma tonelada de coisas de merda cai... Recibos
velhos, carteira, bloco de notas, absorventes, palheta de
guitarra, batom, mas... que merda é um Epipen?

— Jesus. — Ofego, com medo que ela morra enquanto


estou ali sem saber muito bem o que procurar, porque minha
alergia a látex não é ruim o suficiente para eu usar algum
tipo de medicação de emergência.

56
Autoinjetor de epinefrina.
Estou a ponto de atirar a bolsa longe quando sinto algo
duro em um bolsinho com zíper. Quase choro de alívio
quando leio em letras pretas Epipen.

— Achei! — Grito ao telefone, correndo de novo para


Remy, que está com Mozart a poucos centímetros de
distância.

Arranco a tampa enquanto escuto as instruções do


operador de emergência sobre como injetar a medicação,
depois cravo a agulha na coxa de Remy, fecho os olhos e rezo.
Por favor, por favor, por favor funcione.

Encontrei a minha mulher, não posso perdê-la agora.


Um, dois, três segundos se passam e então Remy ofega. Abro
os olhos quando ela se mexe tentando se virar, tossindo e
ofegando de novo.

— Remy? Baby? — Pego-a nós braços, ajudando-a a


ficar de lado. — Estou aqui, vai ficar tudo bem. A ajuda já vai
chegar.

Ela segura meu pulso e aperta, dando a entender que


está me ouvindo. Lágrimas escorregam por meu rosto.

— Vai ficar tudo bem. Oh Deus. Está tudo bem. Vai ficar
tudo bem.

Não tenho o número de ninguém da família de Remy,


então ligo para Jodi, que me encontra no hospital com
Holden e Gally. Quando conto o que aconteceu, ela estremece
e abraça a si mesma.

— Oh Deus. Vou ligar para a família dela.

Enquanto eles ficam do outro lado da sala de espera e


Jodi liga para as pessoas, eu sento com os cotovelos apoiados
nos joelhos e enterro o rosto nas mãos. Não consigo acreditar
que estive tão perto de perder Remy. Assim que ela despertar
vou dizer o quanto a amo... e que ela não pode morrer.

Mando uma mensagem para Pick. Não sei por que fiz
isso, ele é um recém-casado que provavelmente está na lua
de mel agora. Não deveria tê-lo incomodado, mas Pick é
minha família e eu preciso de alguém comigo. Entretanto não
pedi que viesse, só contei o que aconteceu.

Estranhamente, sinto-me um pouco melhor depois


disso, só de ter alguém com quem falar.

Estou sentado ali há uns dez minutos, esperando,


quando vejo alguém que parece ser o primo Remy entrando
na sala de espera, seguido de um senhor mais velho parecido
com ele, provavelmente o tio Alonso e uma velhinha, que
imagino que seja a avó. Eles aproximam-se de Jodi exigindo
respostas e enquanto ela os atualiza o melhor que pode, Big T
traduz tudo para à avó em espanhol. A senhora aperta a boca
como se fosse chorar.

— Asher foi quem a encontrou e salvou sua vida. — Jodi


aponta para mim. — Ele sabe mais do que eu.
Três pares de olhos se concentram em mim. Endireito-
me na cadeira, embora não esteja preparado para ser o
centro das atenções.

— Quem é você? — Pergunta o tio, olhando-me com


desprezo e desconfiança.

— Eu... — Fico de pé e estendo a mão. — Asher Hart,


senhor. Sou... amigo de Remy.

O homem mais velho aperta minha mão.

— Remy tem muitos amigos gringos. O que você fazia no


apartamento dela?

Olho para ele surpreso, não esperava este tipo de


pergunta.

— Eu, uh... na realidade ela estava na minha casa.


Cheguei do trabalho e a encontrei inconsciente no chão,
então o serviço de emergências me explicou como injetar o
Epipen.

— Bom... — Diz Big T, batendo no meu braço


amigavelmente. — Obrigado por ajudá-la.

O pai dele franze o rosto e diz algo em espanhol que faz


seu filho se encolher e responder com algumas palavras.
Então, o tio de Remy se vira na minha direção, como se não
soubesse de que maneira agir comigo agora. Não estou certo
do que Big T disse, mas pareceu acalmar um pouco o velho.

— Conhecem alguém que pudesse querer envenená-la?


— Pergunto. — Alguém deu a ela uma caixa de chocolates
com amendoim, mas... não acredito que tenha sido acidental.
— Provavelmente foi acidental. — Diz Jodi rapidamente
quando vê o alarme nos rostos da família de Remy.

Big T nega com a cabeça.

— Não sei, cara. Remy não tem inimigos, ela é muito


simpática, você sabe. Talvez seu ex, aquele vocalista. Qual é
mesmo o nome dele?

Por um segundo, pensei que ele se referia a mim, mas


logo, Big T levanta o dedo.

— Fish, o idiota. Isso.

Fico de boca aberta.

— Braden Fisher? Ela saía com ele?

Jodi se encolhe e assente, antes de olhar para Big T, que


revira os olhos.

— Conhece-o? Não posso ver esse cara porque quero


machucá-lo. Ele a enganou e.... — Ele arregala os olhos como
se estivesse a ponto de falar demais. — Roubou a letra de
uma música dela.

Tento pensar em mais alguém que estivesse zangado


com ela por qualquer motivo. Além de mim, as únicas
pessoas que me ocorrem são Gally e Holden... que se viram
obrigados a aceitá-la na banda.

Mas quando olho para eles, Gally está falando com voz
aborrecida para Jodi: — Será que vamos fazer sexo esta
noite? Afinal, fomos caridosos vindo aqui ver como ela está...

Bom, Gally e Holden provavelmente não a envenenaram.


Olho para a entrada da sala suspirando frustrado, até
que alguém à espreita no corredor chama a minha atenção.
Antes que eu consiga dar uma boa olhada a pessoa vai
embora. Estreitando os olhos, decido segui-lo. O homem está
a uns vinte metros de distância, de costas para mim, com os
ombros curvados e a cabeça para baixo, como se estivesse
tentando esconder o rosto, mas eu sei quem é. Merda.

— Ei. — Grito e ele olha para trás.

Sim, ali está meu pai. Filho de puta.

Quando nossos olhos se encontram, ele se assusta e


começa a correr. As palavras de Remy de repente ecoam na
minha cabeça. A pior maneira de fazer mal a você seria
machucando alguém que você ama. E ele não precisou
investigar muito para notar que eu a amava.

Corro também e assim que viro para outro corredor algo


bate com força no meu rosto, fazendo-me cair de joelhos.
Sinto o gosto de sangue na boca e vejo estrelas.

— Cristo. — Digo, acertando as pernas na minha frente


e ouvindo o grito do velho quando o derrubo.

Quando a cabeça do meu pai bate no chão de ladrilhos,


eu aproveito para pular em cima dele e socá-lo no rosto.

— Foi você? Deu os chocolates a ela?

Ele ri e eu posso ver o sangue na sua boca.

— Terminei o trabalho ou ela ainda está viva?

— Filho da puta.
Bato de novo, provavelmente quebrando o seu nariz,
mas ele também bate com algo ao lado da minha cabeça,
jogando-me no chão.

— Estou decepcionado porque não consegui me desfazer


do seu estúpido mascote. — Grunhe ele, enquanto se levanta.
— Que tipo de idiota tem um esquilo como animal de
estimação? Você não tem dignidade?

Ele está segurando uma coisa acima da cabeça. O que


é? Parece um porta papel de metal que ele deve ter roubado
de algum consultório ou de uma enfermaria.

Levanto as mãos para proteger o rosto e tento me


afastar, porque não sei se conseguirei suportar outro golpe. O
prazer doentio em seus olhos me mostra o quanto meu pai
adora estar nesta posição.

Aperto os dentes, preciso bater nas pernas dele outra


vez. Mas alguém o empurra pelas costas, fazendo o porta
papel sair voando e ele cair de joelhos.

— Agora, velho, ninguém tem permissão para machucar


meu irmãozinho.

Olho boquiaberto para Pick, que jogou meu pai no chão


e está pressionando o pé na garganta dele.

— O que você faz aqui? — Pergunto, assombrado.

— Você me chamou, eu vim. — Diz ele, encolhendo os


ombros. — É o que eu faço.

Fico de joelhos e deixo escapar um suspiro de alívio,


virando-me para o velho.
— Então, você realmente fez toda a merda, como cortar
o cabo de combustível da moto e o do sistema de som do
clube?

Meu pai grunhe, mas não pode responder já que meu


irmão está esmagando suas cordas vocais no momento. Ele
só sacode a cabeça.

— E pensou que eu era um idiota. Deveria ter vindo


direto para mim velho, você fez uma caminhada burra. Agora
vai perder sua liberdade condicional e voltar para a cadeia... e
não conseguiu se vingar. Isso é triste... muito triste.

— Eu deveria ter deixado que sua mãe abortasse você o


dia que entrei no banheiro e a encontrei todo ensanguentada
— Diz ele quando meu irmão alivia o pé, com os olhos cheios
de ódio. — Você nunca foi útil para nenhum de nós. Nunca
foi nada. Sua pobre mãe morreu tendo uma triste visão de
você.

Respiro fundo e Pick olha na minha direção,


preocupado.

— Terminei aqui. — Constata meu irmão com voz


áspera.

Neste momento, duas enfermeiras chegam ao corredor e


o que elas veem é um cara tatuado e cheio de piercings
segurando um homem no chão com a bota. Mas meu irmão...
olha para as mulheres com um sorriso agradável.

— Olá, senhoras. Será que poderiam me fazer um favor


e chamar a segurança ou talvez a polícia? Este homem acaba
de admitir que tentou matar a namorada do meu irmão.
Elas concordam e saem correndo.

Olho para Pick e ele me olha de volta... então sorrimos


um para o outro.

— Obrigado por vir. — Digo, finalmente.


ASHER
Estou sentado sozinho na sala de espera quando Pick
me encontra novamente.

O médico esteve aqui e disse que Remy estava melhor, a


inflamação diminuiu, as vias respiratórias estavam limpas e
ela descansava pacificamente.

Então, todos foram tentar vê-la, enquanto eu continuo


sentado aqui, olhando para a parede e tentando não pensar
no quanto estive perto de perdê-la porque meu pai me odeia.

Realmente, deve haver algo ruim em mim para que meu


pai, meu próprio sangue, me deteste tanto. Talvez me
envolver com Remy fosse uma má ideia, afinal ela quase foi
morta e não vale a pena por uma paixão colocar a vida de
uma mulher em perigo.

— A polícia acaba de prender seu pai.

Dou um pulo quando ele fala. Pick se aproxima


lentamente e senta-se ao meu lado.

— Talvez, não o liberem antes desta vez.

— Isso seria bom. — Pick esfrega as mãos e olha ao


redor da sala de espera, antes de se virar para mim. — O que
está fazendo aqui sozinho? Fiquei sabendo que o médico deu
notícias e todos foram ver Remy.
— Sim, ela vai ficar bem. Sua família está lá agora.

— E por que você não foi com eles?

Encolho os ombros.

— Você não a perdoou? — Insiste Pick.

Balanço a cabeça, para dizer que sim, eu a perdoei.

— Então, não vejo qual é o problema.

Ranjo os dentes e seguro a almofada de vinil em baixo


de mim.

— Ele foi atrás dela por minha culpa. — Respondo. —


Ela quase morreu esta noite, Pick. Ela...

— Mas não morreu.

Suas palavras tranquilas me surpreendem.

— Mas poderia ter acontecido. — Digo entre dentes,


encostando-me no encosto da cadeira e levando as mãos à
cabeça. — Jesus, que diabos estou fazendo aqui ainda?
Deveria estar a milhares de quilômetros, porque só assim ela
estaria a salvo. Por que quero ficar? Não sei uma merda sobre
o amor e as relações, meus próprios fodidos pais não me
queriam e muito menos me amavam. Por que esperar que...

— Ouça. — Pick coloca a mão na parte de trás do meu


pescoço e junta sua testa a minha. — Não deixe essa merda
que seu pai disse entrar na sua cabeça dessa maneira.

— O quê? — Pergunto, minha voz ficando rouca. — A


parte do aborto? Merda, isso não é novidade, mamãe me
contou que tentou me matar muitas vezes. Ela me odiava.
Odiava que eu fosse seu filho e não você, o bebê que ela
sempre lamentou abandonar. Odiava-me por estar ali. E,
quer saber o que é mais surpreendente? Eu realmente
gostava dela. Escutava mamãe falar de você e do seu pai com
tanta devoção e reverência e queria que ela falasse de mim
dessa maneira, que me olhasse e somente...

— Quer saber o que penso? — Pick me interrompe. —


Acho que nossa mãe era uma moça perturbada que nunca
aprendeu o verdadeiro significado do amor e que não tinha
nenhuma razão para trazer filhos a este mundo. Mas aqui
estamos, e estou muito contente e honrado de ter encontrado
você.

Sinto um nó na garganta e fecho os olhos.

— Não importa de onde viemos. — Continua ele. — Nós


dois superamos e seguimos em frente... por nossa conta. E
estou muito orgulhoso do homem que você se tornou. Não há
nada e nenhuma razão pela qual você não deva ter uma vida
plena e feliz junto as pessoas que ama. E quero você por
perto, irmão. Você merece ser feliz. — Pick solta meu pescoço
e me dá uma batida nas costas. — Agora, vá em frente.

REMY
Acordo com o dedilhar suave de um violão. No fundo,
um monitor emite um bip e um outro som, acho que de
oxigênio.

Viro o rosto para a melodia do violão e Asher entra em


foco, sentado à minha direita, tocando para mim. Meus olhos
parecem cheios de areia e a garganta seca, lembram-me o
que aconteceu.

Os chocolates... alguém tinha me dado chocolates com


algum tipo de amendoim neles, mas não estou muito
preocupada com isso agora. Estou acordada e respirando
bem de novo, então acho que deu tudo certo.

No momento, só quero ouvir Asher tocar para mim. Não


conheço a melodia, mas lembra muito “Hey There Delilah” do
Plain White T'S... E ainda assim é diferente.

Não sei se a ouvi antes... até que ele começa a cantar.

Acordo ouvindo sua respiração

Caído no travesseiro junto com o meu

Outra noite passada em seus braços

E sei que este dia é perfeito.

Sim, ele é

Porque há esta promessa em seu sorriso

E não importa o que aconteça amanhã,

Atravesso quilômetros com você aqui, ao meu lado.


Oh... posso fazer tudo com você aqui, ao meu lado.

Às vezes seguro as palavras

Que quero dizer a você

Porque isto que começamos

É muito suave e muito novo.

Oh... oh, oh, oh, oh... ao meu lado.

Mas há esta promessa em seu sorriso

E não importa o que aconteça amanhã,

Atravesso quilômetros

Com você aqui, ao meu lado.

Posso fazer tudo, absolutamente tudo

Quando sei que você vai estar aqui amanhã,

De pé ao meu lado.

Você já me ensinou a amar,

A rir e escutar seu coração.

OH baby, não posso esperar para aprender um pouco


mais

Assim nunca vamos estar realmente separados.

Desta vez é certo


Podemos fazer tudo.

Só você e eu

Ao seu lado.

Sorrio sentindo as lágrimas queimarem meus olhos


quando ele canta a última parte.

— Essa música é minha.

Então, Asher levanta os olhos verdes....

— Eu sei. Sinto muito, troquei o ritmo um pouco. Achei


que precisava de um tom mais suave que o que Fish ‘N’ Dicks
usa.

— Não. Ficou bom assim. Perfeito. Lindo. Exatamente o


tipo de tom que eu tinha em mente quando a escrevi. —
Balanço a cabeça com assombro. — Como você soube?

— Que era sua letra? — Um sorriso ilumina seu rosto.


— Não foi muito difícil descobrir.

— Obrigada. — Digo em voz baixa, emocionada. — Ficou


perfeita. Não tem ideia do que isto significa para mim.

Asher baixa o violão e estende a mão para pegar a


minha, passando lentamente o polegar sobre a intravenosa.

— E você não tem ideia do que você significa para mim.


— Ele parece com dor, como se fosse difícil engolir. — Porque
eu nunca disse. Jesus, Remy... você não pode imaginar o que
foi segurar seu corpo inconsciente em meus braços e me dar
conta de que nunca cheguei a dizer isso.
— Asher, você não tem que...

Mas ele balança a cabeça, parando-me.

— Mas eu quero. Quero dizer agora. Também amo você,


Remy. Já estava apaixonado por você no mês passado e não
percebi, eu...

Asher para de falar e fecha os olhos brevemente, como


se sua voz não saísse.

— Te amo. — Digo e lágrimas de felicidade enchem meus


olhos. — Mas não precisa dizer isso porque quase morri.
Você...

— Não é por isso. Juro. — Asher leva minha mão à boca


e beija os dedos. — Eu estava tentando encontrar um jeito de
dizer que te amo quando cheguei em casa e encontrei-a no
chão.

Eu respiro fundo, tremendamente surpresa.

— Estava?

Ele concorda e inclina-se para frente, apoiando o rosto


em meu braço.

— Te Amo. Eres mi nena, minha chica57.

Um sorriso vibra dentro de mim.

— Meu Deus! Isso foi... perfeito.

Estou aliviada e feliz quando os lábios dele se chocam


com os meus. Abro a boca e nossas línguas se enroscam,
então, Asher aproxima-se mais e eu seguro seu cabelo com

57
Amo você. Você é meu bebê, minha garota.
força, sentindo os dedos dele acariciarem a veia pulsando no
meu pescoço.

Quando ouvimos as vozes das enfermeiras do lado de


fora do quarto nos afastamos, assustados e ao mesmo tempo
cada um de nós toca os lábios, lembrando do beijo. Logo
começamos a sorrir juntos. Quase não posso acreditar que
isso esteja acontecendo realmente.

— Quem ensinou você a falar essa frase em espanhol?

Asher ri e fica um pouco vermelho.

— Tomás pode ter me ajudado um pouco.

— Big T? — Pergunto, olhando em volta.

— Precisou ir embora. Resmungou algo sobre ter que


cobrir seu turno no restaurante, já que sua bunda preguiçosa
não vai trabalhar amanhã... suas palavras.

Tenho que rir.

— Parece com algo que ele diria.

— Seu tio, e sua avó estavam aqui também. E Jodi junto


com.... Gally e Holden.

— Sério? — Arqueio as sobrancelhas. — Devem ter


pensado que conseguiriam um bom sexo extra com Jodi se
viessem.

— Conhece-os bem. Não sei se a NonCastrato


sobreviverá. Não sei... Merda, não sei um monte de coisas.
Tudo o que sei é que de agora em diante vou estar em
qualquer lugar que você estiver. E provavelmente vou ser o
homem mais feliz do mundo.
— Oh, meu Deus! — Uma lágrima de felicidade
escorrega por meu rosto. — Poderia ouvir coisas como estas
todos os dias.

— Isso é o que eu planejo, baby. Isso é o que eu planejo.


— Asher está se inclinando com a intenção de me beijar de
novo quando para e faz uma careta. — Mas acho que antes
devo dizer que... você estava certa sobre o meu pai.
QUATRO ANOS DEPOIS...

REMY
Bom, a NonCastrato acabou sobrevivendo. Perdemos
mais um membro da banda, mas surpreendentemente, ou,
talvez, eu devesse dizer tristemente, não foi Gally.

Heath Holden deixou o grupo no momento que o pai do


Asher foi condenado a mais dez anos de prisão, ou mais
precisamente no momento que Jodi deixou tanto ele quanto
Gally e se meteu com um garoto de um clube de
motociclistas.

Bom, ela disse clube... eu chamava de turma, mas era


tudo a mesma coisa.

Falando em Miller Hart, a partir do dia que ele foi preso,


quando me deu os chocolates, Asher não foi mais vítima de
brincadeiras de cortar cabos ou coisas neste estilo. Todos
concordamos que ele estava por trás disso, também.

E sim, ter razão nisso era muito bom.

Então, quando Heath nos abandonou, meu primo


Tomás ficou mais que feliz em se juntar a NonCastrato como
guitarrista principal, para a decepção do tio Alonso.
Big T se adaptou muito bem ao rock. Gostava
principalmente da quantidade de mulheres que vinha com
isso. E Asher acabava ajudando os novos hábitos de
mulherengo do meu primo porque sempre afugentava as
mulheres que vinham em direção a ele. Por mim tudo bem
afinal, Asher Hart era todo meu. E a vida era boa. Oh, muito
boa.

Entramos no táxi suados e esgotados depois do nosso


show no Metropolitan — sim, eu disse no fodido Metropolitan
— mas alegres e preparados para ver nossos amigos. Asher
imediatamente me puxa para seu colo e me beija
profundamente.

— Meu Deus! Não posso acreditar que acabamos de


tocar no Metropolitan. — Grito, enquanto ele beija minha
garganta.

— Não posso acreditar que temos que ir ver meus


amigos patéticos e não posso levar você diretamente para a
cama. Está linda com essa roupa.

Asher move a mão pela minha coxa até que ela


desaparece embaixo da saia curta. Seguro o pulso dele e dou
uma rápida olhada para o taxista, esperando que não
estivesse nos observando.

— Senhor Hart, senhor Hart... — Advirto-o com um


sorriso, tocando meu nariz ao dele. — Tio Alonso nos disse
explicitamente que não vai haver nada disso até depois do
casamento.

Asher geme e pressiona mais o meu corpo.


— Porra, seu tio está delirando. Saímos juntos há quatro
anos, já te dei o anel, estamos morando na mesma casa.... ele
realmente acredita que nós não...?

Pressiono um dedo nos seus lábios mágicos.

— Se ele acredita não sou eu que vou dizer o contrário.


Você vai?

— Porra, não. — Asher suspira, antes de arrastar uma


fileira de beijos no meu pescoço. — Mas não vou permanecer
celibatário neste mês que falta até nosso casamento.

— Oh, muito menos eu. Só espere até chegarmos no


nosso quarto que vou mostrar o quão pouco celibatária eu
vou ser.

Ele geme e sinto seu pau cada vez mais duro apertar o
meu traseiro.

— Ok. Vamos pular está coisa de reunião de amigos e ir


direto para o nosso quarto, com uma garrafa de champanhe e
talvez alguns morangos... E calda de chocolate.

Fico encantada com o interesse dele. E eu tinha


colocado uma surpresa embaixo da roupa que eu sabia que
ele ia adorar arrancar.

Toco a ponta do nariz de Asher com o dedo.

— Mas Ten e Caroline não vêm nos visitar com


frequência desde que se mudaram para a Califórnia. Quero
vê-los e pôr em dia nossa conversa.
— Bem... — Diz ele, batendo a cabeça no banco do carro
e gemendo. — Vou fazer um esforço por Caroline, Ten pode
comer merda.

Sorrio, feliz que ele e Ten continuassem com as


provocações, embora não morassem mais na mesma cidade.
Asher sente saudades do amigo e está ansioso para vê-lo de
novo, junto com o resto da turma.

Fiquei surpresa pela facilidade com que todos me


aceitaram depois da forma que começou minha relação com
Asher. Tive medo que fossem ser mais críticos porque eu
menti e machuquei seu amigo, mas eles me trataram da
maneira que Asher queria que eles me tratassem, com
aceitação. E agora eu sentia como se também fossem minha
família.

— Ainda não posso acreditar que tio Alonso nos disse


nada de sexo até o casamento. — Diz Asher, pegando a
minha mão para brincar com o anel de noivado. — Será que
alguma vez vou fazer algo que o agrade de verdade?

— Não se preocupe com isso. — Respondo, dando um


beijo no seu rosto. — Ele não suporta nenhum estranho.
Merda, apenas me tolera e eu sou sua sobrinha. Mas a vovó
ama você e isso é tudo o que importa.

Asher me olha com o cenho franzido.

— Remy, seu tio ama você.

Dou uma risada e reviro os olhos, embora sinta o peito


apertar com a ideia.
— Sou do seu sangue, ele tem que me aceitar.

Mas meu futuro marido nega com a cabeça.

— Não, não tem. Mas na semana passada, por exemplo,


pediu duzentos cartões da NonCastrato para passar aos
clientes do restaurante. E ouvi ele elogiando você mais de
uma vez.

Engulo um enorme nó na garganta.

— Sério?

Bom, talvez meu tio não me ache tão chata afinal.

— Sério. — Asher me dá um beijo no rosto. — Ninguém


tem que amar você, nem sua família nem qualquer outra
pessoa. Nós amamos... porque, bom, não podemos evitar.
Você é incrível.

— Olhe para você sendo todo doce. — Murmuro,


tentando esconder o quanto suas palavras me afetaram
roçando a boca na dele. — Deve estar desejando muito fazer
sexo esta noite.

— Claro que sim, quero, mas cada palavra que eu disse


é a verdade. É impossível não te amar, Remy Elisa Curran,
quase Hart.

— Igual a você, Ashley Jean Hart.

— Oh, amor, simplesmente não consegue resistir, não é?

— Não. — Digo rindo e o beijo de novo.

No momento que o carro para em frente ao hotel estou a


ponto de dizer que nossos amigos podem esperar uns
minutinhos, que primeiro vamos dar uma “rapidinha”, mas
então ele paga o táxi, pega a minha mão e me arrasta para
dentro, procurando o número do quarto de Pick no telefone.

— É o quarto 312. — Esclareço, enquanto ele franze o


rosto olhando suas mensagens.

Asher olha para mim.

— Tem certeza?

Só concordo e sorrio, então ele balança a cabeça e


coloca a mão na minha nuca.

— Por isso vou casar com você. Eu seria um desastre


perdido sem minha organizada Remy.

Depois de outro beijo suave, ele geme e se afasta.

— Muito bem, primeiro os amigos.

Surpreendentemente, chegamos ao quarto 312 ainda


vestidos, depois de Asher me acariciar e beijar de novo. Ele
sempre ficava excitado depois de um espetáculo, o
entusiasmo da apresentação era uma injeção de adrenalina
para nós. E eu adorava.

Quando a porta do quarto de Pick se abre, separamos-


nos rapidamente.

— Já era hora. Quantas “rapidinhas” deram pelo


caminho? — Pergunta Eva, levantando uma sobrancelha e
passando a mão na barriga de grávida. — Se não tomarem
cuidado, vão terminar assim.

Asher ri e se aproxima para um abraço.


— O quê? Não está pronta para ser tia?

— Provavelmente, mais pronta que você, querido. —


Responde ela, dando um beijo no rosto dele. — Agora entrem.
Estão perdendo toda a diversão. Asher e Remy estão aqui!

— Hurra! — Grita Aspen, sentada no chão apoiada em


Noel e com uma taça na mão.

Claramente bêbada, ela levanta a taça para nós antes de


jogar a cabeça para trás e esvaziá-la.

Reese e Caroline levantam em um salto e correm para


nos receber com abraços. O resto dos meninos nos
cumprimenta com a mão. Zoey, Quinn, Felicity, com o bebê
no colo e Knox parecem muito confortáveis em seus assentos
para se levantarem.

Mason murmura algo para Pick, fazendo-o rir e Ten


permanece sentado no chão com o rosto vermelho e.... que
merda? Está com lágrimas nos olhos?

Uma Reese, também muito grávida, abraça-nos, dizendo


que adorou o show. Então, Caroline segura minha mão e dá
uma olhada no meu anel de noivado que ela ainda não tinha
visto...

— Estou tão feliz por vocês. — Diz ela, passando um


braço ao redor do meu pescoço e outro no de Asher, para nos
abraçar.

— Obrigado, linda. — Asher dá um beijo no rosto dela


antes de apontar com o queixo para Ten. — O que está
acontecendo com o seu marido?
— Oh, não ligue. — Responde Caroline com descaso. —
Está um pouco emocionado porque acaba de saber que vai
ser papai.

— Oh, meu Deus! — Grito. — Você está grávida? Oh


Deus, parabéns!

Puxo-a para outro abraço e nós rimos juntas, enquanto


pulamos em círculo.

— Não é demais? — Pergunta Reese, passando a mão


em seu próprio ventre. — Nosso grupo está se convertendo
em uma fábrica de fazer bebês.

Asher passa um braço ao redor da minha cintura e


pressiona a boca no meu ouvido.

— Eu tenho uma suspeita de que não estamos muito


longe deles.

Dou uma olhada, mas ele não parece consternado com a


ideia.

— Quer? — Pergunta, levantando as sobrancelhas e


sorrindo.

Merda, eu não posso acreditar nisto. Asher está


preparado para ter filhos... comigo?

Já somos avós. Alguns meses depois que Asher e eu


compramos uma casa com um grande pátio traseiro fechado,
onde Mozart podia fazer tudo o que quisesse, tínhamos ido a
um pet shop e comprado um companheiro para ele, um que
nos asseguraram era outro macho. Alguns meses mais tarde
Mozart engordou e teve três pequenos bebês. Acho que eu
não fui a única me fazendo passar por menino, afinal.

Não tenho nem ideia de como Asher e eu íamos fazer


com um bebê em nossas vidas, estando sempre na estrada
com a NonCastrato. Mas também não estou preocupada. Com
um homem como Asher Hart ao meu lado não tenho medo do
dia seguinte.

Só espero ansiosa a promessa do amanhã.

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