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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

O FENÔMENO DOS THINK TANKS E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS: O


CASO DO INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS SOCIAIS (IPES)

JONATHAN FRADE ARAUJO

Seropédica, RJ

Agosto, 2019
2

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO


INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

O FENÔMENO DOS THINK TANKS E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS: O


CASO DO INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS SOCIAIS (IPES) PARA
ALÉM DAS FRONTEIRAS

JONATHAN FRADE ARAUJO

Sob orientação do Prof. Dr.

Pedro Henrique Pedreira Campos

Monografia submetida à comissão


avaliadora como requisito parcial para
obtenção do grau de bacharel em Relações
Internacionais no curso de Graduação em
Relações Internacionais.

Seropédica, RJ

Agosto, 2019
3

Monografia submetida à comissão avaliadora como requisito parcial para obtenção do


grau de bacharel em Relações Internacionais no curso de Graduação em Relações
Internacionais.

APROVADO EM DE DE 2019.

Comissão Examinadora:

______________________________________

Professor Pedro Henrique Pedreira Campos


Departamento de História - UFRRJ

______________________________________

Prof. João Márcio Mendes Pereira


Departamento de História - UFRRJ

______________________________________

Prof. Elaine de Almeida Bortone


Programa de Pós-Graduação em História - UFRJ

Seropédica, RJ
Agosto, 2019
4

Aos meus pais e irmãos, que me auxiliaram ao longo desta jornada, não me
permitindo esmorecer face aos obstáculos que surgiram.

Aos meus ancestrais, que me inspiram e os quais são motivos do meu mais profundo
orgulho.
5

RESUMO

Esta monografia tem como principal objetivo identificar e analisar a força de


influência de um mecanismo como os think tanks1, utilizando como exemplo o Instituto
de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), formado por empresários e militares, com amparo
do governo norte-americano, que teve importante participação no golpe de Estado de
abril de 1964 no Brasil, que depôs o governo do presidente João Belchior
Marques Goulart, cujos associados e parceiros chegaram à condução do novo regime,
elaborando políticas públicas e conduzido reformas. O IPES, para alcançar seu objetivo,
montou uma estrutura com um grau de complexidade amplo e sofisticado, que tinha a
finalidade de desenvolver e atuar estrategicamente, arquitetar campanhas e estudos
antagônicos ao governo de Goulart. Simultaneamente, elaborou projetos de governança e
anteprojetos de reformas de base, que foram utilizados pelo governo do presidente
Humberto de Alencar Castello Branco. Sua expertise foi repassada para as frentes
direitistas chilenas que eram antagônicas ao governo de Salvador Allende.

Palavras-chave: IPES, think tanks, ditadura civil-militar, Guerra Fria, golpe de Estado,
Chile

Tradução literal do inglês para o português: “Tanques de Ideias”.


1
6

ABSTRACT

This thesis has as main objective to reflect the influence force of a think tank
especially the Institute of Research and Social Studies (IPES), formed by businessmen
and military, with support from the US government, which had important participation in
the coup From April 1964, that overthrew the government of President João Belchior
Marques Goulart, whose associates and partners lead the new regime, developing public
policies and organizations promoted. The IPES, for its purpose, set up a structure with a
degree of complexity, ample and sophisticated for the strategic undertaking, campaigns
and studies antagonistic to the government of Goulart. At the same time, it drafted
governance projects and pre-projects for basic reforms, which is used by the government
of President Humberto de Alencar Castello Branco. Their expertise was passed on to the
chilean right wing fronts that were antagonistic to the Salvador Allende government.

Keywords: IPES, think tanks, civil-military dictatorship, Cold War; Coup d’État; Brazil,
Chile
7

SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................................................ 5
ABSTRACT ........................................................................................................................ 6
SUMÁRIO .......................................................................................................................... 7
Introdução ......................................................................................................................... 10
Capítulo 1 .......................................................................................................................... 17
Os think tanks .................................................................................................................... 17
1.1 - A gênese dos think tanks: ..................................................................................... 17
1.2 – A Revisão da Literatura: ................................................................................... 19
1.3 – A Expansão do mecanismo: ............................................................................. 23
Capítulo 2 .......................................................................................................................... 26
O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) ........................................................... 26
2.1 - A trajetória do IPES: ............................................................................................. 26
2.2 - A Estrutura do IPES .......................................................................................... 30
2.3 – A atuação do IPES: ........................................................................................... 36
Capítulo 3 .......................................................................................................................... 49
O IPES como agente das Relações Internacionais ............................................................ 49
3.1 - Os think tanks e as Relações Internacionais: ........................................................ 49
3.2 - O IPES como um think tank: ............................................................................. 53
3.3 - A relação entre o IPES e a queda do governo de Salvador Allende: ................ 56
Conclusão.......................................................................................................................... 63
Bibliografia ....................................................................................................................... 66
Páginas eletrônicas: ........................................................................................................... 67
Livros, capítulos, teses, dissertações e artigos: ................................................................. 67
Filmografia ........................................................................................................................ 72
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ABREVATURAS E SIGLAS
AEF - American Economic Foundation
AGO - Assembleia Geral Ordinária
AI – Anistia Internacional
AIFLD - American Institute for Free Labour Development
ALPRO - Aliança para o Progresso
BM – Banco Mundial
BNDE - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
CAS - Corpo de Assistências Sociais
CD - Comitê Diretor
CE - Comitê Executivo
CED - Committee for Economic Development
CESEC - Centro de Estudios Socio-Económicos
CEOP - Centro para el Estudio de la Opinión Pública
CF - Conselho Fiscal
CIA – Central Intelligence Agency
CIEX - Centro de Informações do Exterior
CLMD - Cruzada Libertadora Militar Democrática
CLUSA - Liga Cooperativa dos Estados Unidos
CO - Conselho Orientador
CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito
DSN - Doutrina de Segurança Nacional
ESG - Escola Superior de Guerra
FIEL - Fundación de Investigaciones Económicas Latinoamericanas
FM - Fundación Mediterránea
FMI – Fundo Monetário Internacional
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GEA - Grupo de Estudo e Ação


GI - Grupo de Integração
GLC - Grupo de Levantamento de Conjuntura
GOP - Grupo de Opinião Pública
GPE - Grupo de Publicações e Editoriais
IADESIL - Instituto Americano para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre
IBAD - Instituto Brasileiro de Ação Democrática
IL - Instituto Liberal
IPES - Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais
ICOMI - Indústria e Comércio de Minério
LAIC - Latin American Information Committee
LIGHT - Serviços de Eletricidades S.A.
LTB - Listas Telefônicas Brasileiras S.A
MAC - Movimento Anticomunista
MASTER - Movimento dos Agricultores sem Terra
MUD - Movimento Universitário de Desfavelamento
NSA - National Security Archives
OTAN - Organização do Tratado do Atlântico Norte
ONU - Organização das Nações Unidas
OCDE - Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico
SNI - Sistema Nacional de Informações
SORPE - Serviços de Orientação Rural de Pernambuco
ULTAB - União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil
UNDP - United Nations Development Programme
UP - Unidad Popular
USAID - American Agency for International Development
10

Introdução

No sistema internacional2, os think tanks podem ser consideradas organizações


que possuem um papel fundamental no policy making3, na medida em que representam
um importante mecanismo de amparo às instituições governamentais. De forma
imprecisa, o United Nations Development Programme (UNDP, 2003) define estes
institutos como apenas atores que elaboram pesquisas e advocacy4 como qualquer outro,
objetivando influenciar políticas públicas. A credibilidade que essas organizações
possuem baseia-se na importância do conhecimento especializado, já que esses
mecanismos geralmente são compostos por profissionais capacitados tais como cientistas
políticos, economistas, sociólogos, internacionalistas e outros especialistas, os quais
conferem ao trabalho desenvolvido por essas entidades um alto nível de confiabilidade e
pragmatismo - embora nem sempre independente, como será exposto mais adiante neste
estudo monográfico.
A partir da compreensão de que os think tanks são um fenômeno norte-americano
em sua origem, James McGann (2005) elucida que essas organizações surgem no
prelúdio do século XX, em meio à ideologia reformista predominante na chamada "Era
Progressista", sendo a sua origem vinculada às tradições de filantropia corporativista,

2
O sistema internacional é o nível no qual se desenvolvem as relações entre os atores
internacionais, sendo eles Estados, organismos internacionais, organizações não governamentais ou
empresas privadas. O equilíbrio deste sistema está diretamente ligado à distribuição de poder entre os
atores, de forma que o relacionamento entre as partes oscila, genericamente, entre situações de cooperação
e conflito (PECEQUILO, 2004).
3
Abordagem científica que foca a criação da política pública. Busca integrar o estudo da teoria e da
prática política (FREY, 2000).
4
É uma prática política operada por indivíduo, organização ou grupo de pressão, no interior das
instituições do sistema político, com o intuito de influenciar a formulação de políticas e a alocação de
recursos públicos.
11

possuindo o objetivo de suprir a demanda por profissionalismo dentro da política


estadunidense, objetivando a despolitização decisória através da fomentação da formação
de especialistas em tópicos variados (TEIXEIRA, 2007). Em termos históricos, a gênese
dos think tanks possui um elo intrínseco com a valorização da expertise na esfera política.
Com a massificação do liberalismo após a Segunda Guerra Mundial, através dos
mecanismos como o Banco Mundial e o FMI, por exemplo, essas organizações passaram
a exercer bastante influência na esfera política, experimentando um crescimento
exponencial e progressivo do número de institutos e células atuantes ao redor do mundo.
Nos Estados Unidos, essas organizações atuam de forma contundente nas decisões
tomadas em Washington, sendo em razão disto consideradas uma das maiores porta
vozes da sociedade civil daquele país.
Os think tanks possuem um papel indispensável na manutenção hegemônica os
EUA no pós Segunda Guerra Mundial, podendo ter uma importância crucial para a
preservação dessa hegemonia, enquanto ponta-de-lança dos interesses nacionais norte-
americanos, a partir da simbiose entre os intelectuais e os centros decisórios
governamentais.
Os intelectuais e os think tanks são vetores que podem se retroalimentar em um
processo muitas vezes descolado da realidade. Para Norberto Bobbio (1997), o intelectual
se distingue do ideólogo e expert. O primeiro tem o papel de criar ideias, promover o
consenso (ou dissenso), elaborar concepções de mundo ou princípios que legitimam a
ação política. O segundo é um especialista que detém o conhecimento técnico e
desempenha o papel de assessoria ou aconselhamento de governantes, conferindo à ação
política um suposto caráter de racionalização. A literatura divide-se ao discutir o perfil do
intelectual recrutado para um think tank. Em linhas gerais, admite-se que ele pode variar
em um contínuo que, ora se aproxima do ideólogo (propagador de visões de mundo), ora
assume a posição típica de um expert (profissional que possui uma competência
específica).
Os think tanks atuam como propagadores do pensamento neoconservador, nas
esferas de poder e da opinião pública (TEIXEIRA, 2007), apresentado ao decorrer da
12

história dos Estados Unidos em um caráter de continuidade em torno do estabelecimento


norte-americano como um líder promotor dos princípios democratas e liberais
(PECEQUILO, 2003).
Na América Latina, com o advento dos governos nacional-populares5 nas décadas
de 50 e 60, os Estados Unidos, com a motivação de assegurar o protagonismo da
reconstrução do bloco capitalista no pós-Segunda Guerra contribuiu diretamente com a
disseminação e estruturação de think tanks na região com a intenção de suprimir os
governos enxergados pelos Estados Unidos como comunistas, que confrontavam com os
ideais democráticos apregoados pelo governo norte-americano, assim como garantir a
circulação da compreensão de livre mercado.
Neste contexto de embate ideológico que caracterizou a Guerra Fria, formou-se
no Brasil, em 1959, o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD); o Instituto de
Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), em 1961; e, em 1983, o Instituto Liberal (IL). Estes
institutos podem ser considerados como verdadeiros laboratórios de ideias orientados
pela doutrina liberal e neoliberal em território nacional. Embora esses think tanks não
sejam tão retratados atualmente, devido ao fato de o IPES e o IBAD já serem extintos (o
Instituto Liberal continua ativo), eles tiveram um papel relevante na sociedade brasileira
no tempo em que estavam em pleno funcionamento.
Fundado por militares e empresários no Rio de Janeiro em 1959, o IBAD foi
criado com o intuito de suprimir o suposto populismo de Juscelino Kubitschek e a
presença da corrente comunista em território brasileiro. O IBAD recebeu orientação e
financiamento da Central Intelligence Agency (CIA) para pôr em prática suas ações, e
sincronizou suas atividades com organismos paramilitares e anticomunistas, como o
Movimento Anticomunista (MAC) e a Cruzada Libertadora Militar Democrática
(CLMD) (STARLING, 1986). Teve suas atividades interrompidas por meio de ordem
judicial em 1963 após a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para
averiguar as denúncias de doações ilegais do IPES e do IBAD. No complexo

5
Optamos por esta categoria, elaborada por Alain Touraine (1989), pois permite incorporar regimes
que a noção de populismo dificilmente daria conta, como no caso do governo de Salvador Allende.
13

IPES/IBAD, o “IBAD agia como um centro tático e o IPES funcionava como centro
estratégico” (DREIFUSS, 2006 p. 176). Após a interrupção das atividades do IBAD, o
IPES assumiu o papel de protagonista na oposição ao governo de João Goulart.
No período que antecedeu ao golpe civil-militar de 1964, o IPES elaborou
diversos anteprojetos no intuito de desestabilizar o governo de João Goulart, bem como
suprimir a propagação dos ideais comunistas que foram difundidos nos diversos setores
da sociedade brasileira. Vários intelectuais renomados e militares de alta patente
compuseram o seu quadro, além de empresários e importantes figuras da sociedade civil,
que juntos atuaram de forma ampla, organizada e sistemática. O IPES apresentou
diversos projetos de políticas públicas que foram incorporados pelos governos militares.
Esse trabalho não possui o intuito de dar conta da totalidade das pesquisas
relacionadas à ditadura e sua relação simbiótica com o empresariado, embora serão
apontados alguns trabalhos de destaque que abordam estas temáticas.
Posto isso, o objetivo deste estudo monográfico é contribuir para a evolução do
debate sobre a força de influência de um mecanismo como os think tanks, sua relação
com o campo das Relações Internacionais, utilizando como exemplo a relação entre IPES
e as frentes direitistas que eram antagônicas ao governo de Salvador Allende, e
explicitando os aspectos da atuação do instituto no golpe civil militar de 1964, sua
atuação externa bem como sua relação com o regime autoritário chileno.
Para dar suporte teórico a essa monografia, no que se refere às principais
características das dinâmicas políticas e sociais que antecederam ao golpe de Estado,
foram utilizadas as obras de René Armand Dreifuss, 1964: a conquista do Estado - Ação
política, poder e golpe de classe e A internacional capitalista - Estratégias e táticas do
empresariado transnacional 1918-1986, consideradas as produções acadêmicas pioneiras
e mais consistentes acerca da atuação da sociedade civil ao abordar a participação da
chamada “elite orgânica”. Em suas obras, o cientista social René Armand Dreifuss
defende que a coalizão vitoriosa em 1964, articulada em torno do Instituto de Pesquisas e
Estudos Sociais (IPES), organizou os interesses sócio-políticos do capital multinacional e
associado – implantado durante os anos da presidência de Juscelino Kubitschek (1956-
14

1960), além de examinar, dentre vários aspectos, como o discurso do temor da


instauração no Brasil de um governo comunista foi disseminado nos diferentes setores
sociais brasileiros, através de uma difusão complexa arquitetada e liderada pelo IPES,
com o objetivo de desestabilizar o governo de João Goulart. Paralelamente, o autor
aborda de que forma a sociedade brasileira dinamizou-se a partir disto. Além das obras de
Dreifuss, utilizamos nesse trabalho diversas obras de outros teóricos do campo da
História, Sociologia, Ciências Políticas, Relações Internacionais e áreas correlatas.
Destacam-se as teses de Elaine Bortone, que foram fundamentais para compreender a
estrutura organizacional do IPES, bem como os seus projetos administrativos e de poder
que iriam ser incorporados pelo governo autoritário brasileiro, pós-64. Para facilitar a
compreensão sobre as questões e atores que envolvem e relacionam o golpe chileno com
a ditadura brasileira, as teses de Hernán Ramírez, bem como as obras de Luiz Moniz
Bandeira (Fórmula Para o Caos), dentre outros autores, foram fundamentais para esta
pesquisa.
Com relação à bibliografia referente aos think tanks, foram úteis os apontamentos
produzidos por acadêmicos das ciências humanas e sociais, sobretudo pensadores ligados
às Relações Internacionais6, devido ao fato das ações destas organizações se realizarem
dentro de um amplo espectro que abrangem diversas áreas do conhecimento. Aqui se
destacam as obras de Tatiana Teixeira, que foram o ponto de partida que possibilitou
conhecer a literatura acadêmica sobre esses institutos.
Este estudo justifica-se pela carência de um entendimento nacional sobre o que
são e como atuam essas organizações. Haja vista tamanho potencial que a temática dos
think tanks proporciona aos acadêmicos, abordamos, de forma breve, análises de autores
sobre estes mecanismos, visto que há bastante a ser explorado e identificado sobre as
características e a ação do fenômeno, principalmente no contexto nacional brasileiro. A
abordagem do IPES dentro do que se compreende como um “think tank”, ainda não foi

6
Estabelecemos aqui a diferenciação do nome da ciência do nome do objeto de estudo mediante o
uso de iniciais maiúsculas para a ciência – Relações Internacionais – e o uso de iniciais minúsculas para o
objeto do conhecimento – as relações internacionais.
15

suficientemente explorada, pois uma parcela significativa dos estudos sobre o tema não o
relacionam o instituto a esta compreensão, muitas vezes optando por evitar associar o
IPES a experiência brasileira do fenômeno, tendo em vista a atuação controversa do
instituto e sua relação com a experiência autoritária no Brasil. Além disso, ainda
permanecem obscuras as relações que este instituto estabeleceu com os agentes
responsáveis pela deflagração da experiência autoritária no Chile, que resultaram na
derrubada do governo de Allende e na interrupção dos projetos levados à cabo pela
Unidad Popular.
Os raros estudos formais disponíveis, bem como as diversas lacunas que ainda
precisam ser preenchidas, instigam a realização de uma investigação mais profunda que
aborde eficazmente a relação simbiótica entre o IPES e o panorama autoritário brasileiro,
bem como sua ligação com experiências autoritárias estrangeiras, especialmente as do
Cone Sul.
Para compreender o contexto histórico dos acontecimentos de abril de 1964 é
imprescindível abordar a forte relação que o evento e seus principais atores, tais como a
elite empresarial, possuíam com as tendências internacionais no campo político,
econômico e social no período posterior a Segunda Guerra Mundial. Neste período,
ocorre também a consolidação das Relações Internacionais como disciplina, haja vista a
complexidade da nova realidade internacional que sobrepôs com o fim do conflito.
No que concerne a este estudo monográfico, será dividido de maneira a facilitar a
compreensão do tema.
Deste modo, o primeiro capítulo abordará as definições mais recorrentes sobre o
fenômeno dos think tanks, sua gênese, a qual possui uma forte relação com o liberalismo,
o que configura este mecanismo como um instrumento de renovação do capitalismo e os
debates acadêmicos mais recorrentes com relação ao tema.
Visto isso, no segundo capítulo analisar-se-á a criação do IPES, sua estrutura e a
maneira sobre a qual o instituto atuou no contexto brasileiro no período antecedente a
abril de 1964, com o objetivo de expor de que maneira ocorreu a participação do IPES,
nos fatos transcorridos no período.
16

No terceiro capítulo, abordaremos de que maneira a temática dos think tanks se


relaciona às Relações Internacionais, e qual é sua pertinência para este campo. Além
disso, abordaremos o marco conceitual dos think tanks no intuito de mostrar o que melhor
se aplica ao caso do IPES. Por fim, abordaremos os think tanks como agente das relações
internacionais, através do exemplo da relação entre o IPES, instituto com base no Brasil,
e os adversários do governo de Salvador Allende, no Chile.
17

Capítulo 1

Os think tanks

Este capítulo abordará as definições mais recorrentes sobre os think tanks, a


gênese do fenômeno, e sua relação intrínseca com o liberalismo, e os debates acadêmicos
mais recorrentes através de uma breve revisão da literatura. Por fim, abordaremos a
expansão da fórmula do mecanismo e os fatores que contribuíram para esta expansão,
como a Guerra Fria e a necessidade dos Estados Unidos de expandirem seu ideário.

1.1 - A gênese dos think tanks:

A reconfiguração do capitalismo, no século XX, produziu transformações e exigiu


uma organização das forças burguesas para a expansão de seu sistema e a contenção da
influência do comunismo no âmbito internacional pela União Soviética. No plano
internacional, destaca-se a dominação dos Estados Unidos no comando da reconstrução
do bloco capitalista, através do Plano Marshall (1947), que visava recuperar os países da
Europa ocidental; a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, cuja
tarefa consistia em administrar o conflito pela via diplomática; a fundação da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), em 1949, e a criação do acordo de
Bretton Wood (1944), a que cabia assegurar a supervisão e controle das atividades
econômicas do mundo capitalista através do Fundo Monetário Nacional (FMI), do Banco
18

Mundial e do Acordo Geral de Tarifas e Comércio, destinados a aproximar as economias,


permitir a gradual liberalização das trocas internacionais e difundir preceitos comuns, que
resultou na expansão do comércio internacional. Toda esta reconfiguração levou aos
princípios do “consenso keynesiano”, que convergiam para o crescimento das funções do
aparelho do Estado (MARTINS, 2007).
O Banco Mundial, impulsionado por Washington e seus principais aliados durante
a Guerra Fria, engendrou uma organização que vai muito além de seus preceitos iniciais,
tornando-se um meio de difusão do liberalismo a todas as sociedades ao sul e ao leste
(PEREIRA, 2009). Estabelecidos os dispositivos essenciais para a reorganização do
capitalismo, as associações empresariais passaram também a desempenhar papel decisivo
na divulgação dos valores liberais pelo mundo. Posteriormente, ocorreu uma conferência
internacional organizada na Suíça pelo economista austríaco Friedrich Hayek, em 1947,
na qual participaram diversos intelectuais nas áreas de história, economia e filosofia, com
o objetivo de promover os valores do liberalismo7 e analisar a ordem pública e econômica
internacional. O resultado final dessa conferência foi a fundação da Sociedade Mont
Pèlerin, que pode ser caracterizada como o nascimento in vitro do neoliberalismo
(SOCARRÁS, 2013). Nesse sentido, o neoliberalismo surge como uma reação teórica e
política enérgica contra o Estado intervencionista e de bem-estar (ANDERSON, 1995).
O grande êxito da sociedade se deu porque buscou uma base forte na academia,
sobretudo na escola de Chicago, na qual Hayek lecionou (SANTOS 1989). Delas saíram
os institutos liberais de análise política, que consistiam em grupos de estudos de
intelectuais dedicados à renovação do liberalismo clássico para defender os valores da
liberdade individual, contra as ameaças das ideias socialistas, a produção da livre
empresa e a economia de mercado. Esses institutos liberais eram os think tanks. Suas
ideias eram apresentadas, discutidas e divulgadas através de publicações por todo o
mundo.

Segundo Daniel Mato (2007, p. 27), “a Sociedade Mont Pèlerin conta atualmente com 500
7

membros, de 40 países, entre os quais políticos notáveis, prêmios Nobel de Economia, empresários,
jornalistas e acadêmicos”.
19

A atuação dos think tanks na escala global eclodiu de maneira mais sólida após a
Segunda Guerra, período este que corresponde à consolidação das Relações
Internacionais como disciplina acadêmica.
Os think tanks são cada vez mais importantes em um cenário global complexo em
que a tomada de decisão não é um papel exclusivo do poder governamental. De modo
geral, são caracterizados como instituições de pesquisa, análise e amparo de políticas
públicas que ajudam a direcionar a tomada de decisão e buscam sensibilizar a sociedade
quanto a temas de seus interesses, operando como uma ponte entre o mundo acadêmico e
o governo e este a outros corpos políticos, sendo as mesmas ligadas a uma realidade
concreta, não abstrata.
O termo “think tanks” têm sua origem nas salas nas quais se debatiam as
estratégias militares durante a Primeira Guerra Mundial, “no jargão militar eram como se
chamavam as salas seguras e secretas onde se discutiam planos e estratégias militares
durante a guerra” (TEIXEIRA, 2007 p. 106). O termo passou a ser usado para referir as
organizações que ofereciam consultoria militar ao governo devido aos novos desafios
estratégicos que surgiram após a Segunda Guerra Mundial (TEIXEIRA, 2007).

1.2 – A Revisão da Literatura:

No propósito de situar o debate, iremos expor uma breve revisão literária acerca
do fenômeno de modo a possibilitar a identificação dos objetivos e do modus operandi
dessas instituições, levando em consideração a natureza multifacetada dos think tanks.
Serão apresentadas de maneira breve as teses vigentes acerca do conceito de think tanks
na bibliografia internacional8, a partir do levantamento apresentado por Júnia Rosa
Soares (2009), bem como outras definições encontradas pelo autor deste trabalho.
Na literatura tradicional anglo-saxônica, os think tanks são instituições
independentes, organizadas que realizam pesquisas e geram conhecimento político

8
Para um levantamento igualmente abrangente, consultar Teixeira 2007:105-164.
20

relevante e que preenchem uma lacuna fundamental entre a academia (pesquisa) e o


governo (poder). Ou seja, os think tanks produzem conhecimento de importância e
prestígio e fazem uma ponte entre o conhecimento e o ambiente prático político (HAASS,
2002).
Rich (2004) acrescenta que não há interesses em voga na ação dos institutos
sendo os mesmos um espaço de elaboração e promoção de ideais, um núcleo de
conhecimento independente com a capacidade de formular ideias e direcioná-las pelos
mais diversos segmentos de modo a divulgá-las para além deste núcleo. Ambos
argumentam que os institutos atuam de maneira independente. Howllet e Ramesh (2003)
também utilizam do argumento da independência, porém ambos acreditam que as ações
em determinados momentos podem favorecer as posições defendidas pela organização. A
reprodução do discurso da independência negligencia aspectos como os interesses na
disputa pela influência em políticas públicas.
Como elucida Stone e Denham (2004), utilizar o argumento de independência
como uma característica elementar de think tanks não faria sentido em determinados
contextos culturais, especialmente em países em desenvolvimento e transicionais.
Segundo Nakamura (2002), os think tanks seriam considerados atores importantes
das sociedades democráticas os quais asseguram um processo pluralista na gestão
pública. Embora esta abordagem seja bastante favorável entre os estudiosos interessados
na temática dos think tanks, esta abordagem pode ser debatida na medida em que é
motivo de questionamento a compreensão de que um mecanismo que concentra
intelectuais com expertise os quais produzem pesquisas com determinada relevância
científica específica, no mesmo nível que qualquer outro ator da sociedade civil. Neste
sentido, é necessário pontuar que existe um patamar distinto de poder, do qual os think
tanks gozam. Considerando isto, é primordial argumentar que, em uma sociedade plural,
existem níveis distintos de poder que variam a eficácia de influência em políticas
públicas de cada ator.
Na visão de Denise Gros, os think tanks são institutos privados de pesquisa que estão
presentes no processo de formulação de políticas públicas, que visam, prioritariamente, a
21

defesa de interesses próprios frente ao Estado, orientados pela doutrina do


neoliberalismo, defendendo princípios da propriedade privada, da liberdade individual e
do livre mercado, enfim, uma “sociedade com Estado mínimo e uma supremacia do
mercado e da liberdade econômica individual” (GROS, 2008, p.2).
Compreendendo que essas organizações são orientadas como mecanismos de superação
de deficiências das sociedades modernas, é necessário explorar a importância do papel
dos think tanks na produção intelectual e a função das ideias na ação política. As ideias,
produto final fabricado por esses mecanismos, oferecem um campo de possibilidades
para a ação e desenvolvimento de um determinado conjunto de políticas. Servem também
como um mapa em um universo de incertezas, são utilizadas como bandeiras de
movimentos intelectuais e ideológicos. Além disso, as ideias ajudam a criar uma nova
compreensão social de antigas questões, podem enfraquecer o poder de coalizões
políticas ou pavimentar o caminho para a formação de outras, ao desestabilizar o
consenso político pré-existente (CALLAHAN, 1999; GOLDSTEIN & KEOHANE, 1993;
SMITH, 1991). Elas não possuem forma, podendo ser transfiguradas em informações,
imagens, dados, discursos de campanha, publicações, análises, ou seja, não se pode
considerá-las um objeto tátil de poder (RICCI, 1993). Isso pressupõe que as ideias podem
ser originárias de qualquer lugar e influenciar qualquer fase de processos políticos, seja a
formulação, articulação, ou a implementação de opções políticas, sendo uma tarefa muito
complexa descobrir a origem real de uma ideia (KINGDON, 2003; ABELSON, 2006).
Considerando isto, então, como saber quem é o autor de uma ideia, doutrina, política de
governo, ou se as mesmas partiram de um think tank? Para Ricci (1993) não há como
saber qual será o efeito das ideias promovidas por eles o que representa um problema
para dimensionar a influência desses mecanismos, expondo um hiato metodológico que
ainda permanece no estudo dessas instituições.
O conceito de Michel Foucault (1982), no qual a verdade se baseia no formato em
que o discurso científico está centrado e nas instituições que o produzem se tratando de
um “conjunto de procedimentos regulados para a produção, a lei, a repartição, a
circulação e o funcionamento dos enunciados, ou ademais, o conjunto das regras segundo
22

as quais se distingue o verdadeiro do falso e se atribui ao verdadeiro efeitos específicos


de poder” (FOUCAULT, 2007, p. 13-14) é útil para compreender a legitimidade da
produção e do discurso dos think tanks. Foucault aborda de que forma a legitimação do
discurso e o argumento da verdade funciona:

A verdade não existe fora do poder ou sem poder (...) A verdade é deste
mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos
regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua “
política geral” de verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz
funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem
distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona
uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados para a
obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o encargo de dizer o que
funciona como verdadeiro. (FOUCAULT, 1982, p.12)

É possível refletir sobre a ação dos think tanks e dos intelectuais que legitimam
esses mecanismos, conferindo-lhes credibilidade, pois o que faz com o que o poder seja
mantido e aceito é que ele não atua apenas como uma força que nega e coage, mas que
permeia, forma conhecimento e elabora discurso9, uma cadeia produtiva que transpassa
todo o corpo social muito além do que um dispositivo negativo que possui a função de
reprimir (Foucault, 1982). O discurso é, então, a reverberação de uma verdade (Foucault,
2004), verdade que “está circularmente ligada a sistemas de poder, que a produzem e a
apóiam, e a efeitos de poder que ela induz e que a reproduzem” (Foucault, 1982 p. 14).
Deste modo, a legitimação dos think tanks se baseia na importância que o
conhecimento possui no mundo contemporâneo. Posto isto, fica claro que o papel dos
think tanks e de seu núcleo intelectual é, sobretudo, dar sentido e legitimar políticas,
tornando, assim, opaco o caráter dominador do discurso e diminuindo a clareza de uma
determinada agenda, o que facilita sua aceitação e absorção (TEIXEIRA, 2007).

9
Compreende-se discurso como toda prática expressiva de linguagem, sendo parte integrante de um
contexto sócio-histórico, e que intencione à produção e circulação social de sentido (Rabaça e Barbosa,
2001), com a intenção de produzir efeito de significação, por meio de argumentos, cujo objetivo é “capturar
a aprovação do público pelo lado emocional, criando imagens simpáticas e empáticas do orador e seu
público” (Pinto, 1999:14)
23

1.3 – A Expansão do mecanismo:

Embora este trabalho não tenha como intuito se ater e prolongar o debate acerca
do conceito de think tanks e, porventura, sua aplicação ao caso do IPES, bem como a
contraposição sobre a utilização do termo10 para caracterizar o instituto, é imprescindível
expor algumas conceituações sobre o fenômeno e identificar a que mais se aplica ao caso
do IPES, a fim de identificar de que maneira o fenômeno incorporou-se à realidade
brasileira.
De acordo com Diane Stone (2005), é possível considerar quatro marcos na linha
do tempo dos think tanks. O primeiro marco surgiu antes da Segunda Guerra Mundial,
com a atuação de institutos da Europa Ocidental e dos Estados Unidos, com foco na
discussão de temas relacionados à urbanização, industrialização e crescimento econômico
no século XX, delimitando esses institutos como um fenômeno anglo-americano. A
segunda fase ocorreu com o fim da Segunda Guerra Mundial e com o crescimento de
think tanks pela Europa, que debatiam sobre segurança e política externa. O período foi
marcado pela proliferação de institutos de política externa, centros de estudo de institutos
de estudos de segurança e desenvolvimento, em uma era definida pela Guerra Fria, as
rivalidades das superpotências e o surgimento das questões do Terceiro Mundo. Após os
anos 70, a terceira fase é definida pelo surgimento de grupos de debate sobre a
instabilidade econômica e política dos países em desenvolvimento, predominando as
pautas sobre desregulamentação, privatização e liberalização financeira, que são
estruturas do consenso de Washington. Por fim, a quarta fase é caracterizada por novas
formas de comunicação e interação virtual e global (STONE, 2005).
O desafio de estudar um think thank brasileiro consiste em verificar a existência
dos mesmos, pensar em um modo de conceituar um modelo brasileiro e descobrir
especificações institucionais, para, a partir disso, poder traçar uma linha sobre o que seria
um modelo brasileiro (TEIXEIRA, 2007). No Brasil, tanto a atuação quanto a análise

10
Para maior aprofundamento sobre o debate, consultar: MORAES, 2016.
24

sobre a função dessas organizações ainda são incipientes, quando comparado aos Estados
Unidos, onde os think tanks amparam as decisões tomadas em Washington e direcionam
a política externa norte-americana de maneira abrangente e expressiva, cabendo ressaltar
que devido a este fato, a literatura e a produção intelectual sobre os think tanks é
predominantemente estadunidense.
Embora haja exemplos relevantes da atuação de think tanks brasileiros, tal como
será exposto mais adiante o caso do IPES, delimitar um modelo brasileiro ainda
representa uma tarefa árdua, devido ao fato dessas organizações apresentarem diferentes
formatos. Posto isso, é interessante buscar compreender a realidade múltipla dessas
organizações no Brasil, a sua moldura a realidade brasileira a fim de esclarecer quais são
ou foram os possíveis impactos dessas organizações no contexto nacional. A partir do
caso do IPES, será possível observar a potencialidade dessas organizações no arranjo
político e poder de influência na produção de pesquisas que amparam políticas públicas.
Como exemplo da dificuldade de identificar um modelo brasileiro desses mecanismos,
temos o caso das organizações híbridas que atuam tanto como think tanks quanto
empresas de consultoria que operam sob a abordagem do design thinking11, que visa a
inovação e, consequentemente, a geração de lucro e aumento de capital de grandes
empresas. O fortalecimento do conceito de think tanks nos Estados Unidos se
correlaciona com o advento da concepção de que o conhecimento técnico deve sobrepujar
os impulsos ideológicos e político partidários. No Brasil, o discurso tecnocrático passa a
ser incorporado e difundido de maneira ampla na década de 1950, seguindo as tendências
dos países centrais. Dessa maneira, o esforço pela aplicação do conhecimento técnico
especializado na administração pública e no aparelho do Estado se torna cada vez mais
encorpado no âmbito interno. Nesse sentido, pelo menos quatro ondas foram discernidas
por Diane Stone (2005) no padrão de crescimento dos think tanks em todo o mundo. A
primeira geração antes da Segunda Guerra Mundial; a segunda onda nos países da

11
Design thinking é um método prático-criativo de solução de problemas ou questões, com vistas a
um resultado futuro. Nesse sentido é uma forma de pensar baseada ou focada em soluções, com um
objetivo inicial, em vez de começar com um determinado problema. Então, concentrando no presente e no
futuro, os parâmetros do problema e suas soluções são exploradas simultaneamente. Cross, Nigel.
"Designerly Ways of Knowing." Design Studies 3.4 (1982): 221-27.
25

OCDE12, e inclusive no Brasil; o boom mundial de think tanks a partir do final década de
1970; e a transnacionalização dos think tanks no novo milênio (STONE, 2005).
Como podemos observar, estes mecanismos configuram-se como um instrumento
de renovação do capitalismo e possuem uma intrínseca relação com as correntes liberais.
Podemos observar também a multiplicidade da revisão literária e a dificuldade dos
estudiosos do assunto em estabelecer um marco teórico que dê conta de caracterizar o
fenômeno de maneira eficiente.

12
Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE). É uma organização
internacional, composta por 34 países e com sede em Paris, França.
26

Capítulo 2

O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES)

Neste capítulo, iremos elucidar como surgiu o IPES, de que maneira o instituto
organizou-se, quais foram as suas fontes financiadoras e de que forma ele atuou e
contribuiu para o processo que resultou na deflagração do golpe civil-militar de 64.
Abordaremos a trajetória do instituto, sua estrutura e como ele atuou frente aos fatos
ocorridos durante sua existência.

2.1 - A trajetória do IPES:

Embora a existência do IPES tenha sido relativamente curta (não mais que uma
década) as atividades desta entidade proporcionaram efeitos profundos na conjuntura e
nos acontecimentos na qual ela esteve inserida. Não é exagero conceder ao IPES a
importância de ter sido o propulsionador e centro ideológico por meio do qual os agentes
do golpe civil-militar foram motivados13.
Optou-se por utilizar a nomenclatura “civil-militar” neste trabalho em razão da
participação de parcelas da sociedade civil, através do IPES, no golpe de 1964 e pelo
predomínio de civis e tecnoempresários nos órgãos administrativos e ministérios no
governo, pós-64.

13
De acordo com a historiadora e jornalista Denise Assis, o IPES foi montado para servir como o
“ovo da serpente do golpe militar” - (Trecho do documentário “O dia que durou 21 anos”).
27

O autor Hernán Ramiro Ramírez (2005), que desenvolveu uma tese de doutorado
onde foi elaborada uma perspectiva comparada entre o IPES e outras organizações de
mesma finalidade na Argentina, como a Fundación de Investigaciones Económicas
Latinoamericanas (FIEL) e a Fundación Mediterránea (FM), delimita quatro períodos na
existência do IPES e, a partir deles, faz uma análise minuciosa das especificidades de
cada um desses momentos.
O primeiro momento é marcado pela estruturação organizativa, expansão,
lançamento do seu projeto político de desestabilização do governo Goulart e a
manifestação de numerosas marchas e contramarchas. (RAMÍREZ, 2005)
O segundo momento, que teve duração até dia 27 de maio de 1964, quando ocorre
a separação das duas seccionais que originaram, da filial carioca, o IPES Guanabara.
Neste momento, o amadurecimento do instituto, bem como sua atuação política se
consolida. Ainda neste período, ocorre um aumento substancial da participação do
empresariado nos embates políticos, assim como das grandes quantias e colaborações
financeiras oriundas deste empresariado, tornando esta etapa o auge das contribuições
arrecadadas pelo instituto. (RAMÍREZ, 2005) Além disso, a entidade passa a usufruir de
um poder expressivo, já que vários membros do instituto passam a fazer parte da nova
administração (BORTONE, 2016).
O terceiro período, que vai até 1967, o IPES se esforça para se posicionar dentro
do novo panorama político interno e externo. Passado o perigo que o populismo
representava, o instituto adota uma postura que busca novos objetivos, traçando novas
estratégias que fossem mais consonantes a ele, recebendo inicialmente o apoio dos
políticos que detinham poder que participavam de seus eventos, cenário este que se
estendeu até as mudanças ocorridas dentro do já estabelecido governo militar, quando a
presença de funcionários da administração nas atividades da entidade, diminuiu
consideravelmente, tornando clara a perda de poder e prestígio. (RAMÍREZ)
O quarto (último momento) se estende até 1971, quando as atividades do instituto
são encerradas. Esta última etapa é marcada por decisões conjunturais erráticas, que
evidenciaram a incapacidade do IPES Guanabara para recrutar sócios e patrocinadores,
28

que pudessem manter o manter, bem como definir um caminho às atividades da entidade,
explicitando a dificuldade do IPES Guanabara em resolver esses problemas. (RAMÍREZ,
2005). Tangenciada a trajetória do IPES, prosseguiremos com o restante dos fatos, bem
como dos aspectos que merecem ser ressaltados com relação ao instituto.
Após os fatos que sucederam a renúncia do então presidente Jânio Quadros, em
agosto de 1961, e a tumultuada posse de seu vice, João Belchior Marques Goulart,
considerado nacionalmente como o maior herdeiro político de Getúlio Vargas naquele
período, no cargo de presidente, ocorre a fundação do Instituto de Pesquisas e Estudos
Sociais (IPES)14. A organização surge por meio da fusão das concepções da Encíclica
Mater et Magistra15, acerca da evolução da questão social de acordo com a Doutrina
Cristã e da Aliança para o Progresso (Alpro). Membro importante da Escola Superior de
Guerra e um dos principais ideólogos da Doutrina de Segurança Nacional (DSN), o
General Golbery do Couto e Silva assume a direção do Instituto. Dreifuss destaca que a
fundação do complexo IPES/IBAD no dia 29 de novembro de 1961 foi recepcionada
favoravelmente pelos grandes órgãos da imprensa, bem como pela cúpula eclesiástica,
intelectuais e políticos:

14
Relação dos sócios fundadores: Augusto Trajano de Azevedo Antunes, Harold Cecil Polland,
Glycon de Paiva Teixeira, Heitor Almeida Herrera, José Rubens Fonseca, Oswaldo Tavares Ferreira,
Antonio Gallotti, Cândido Guinle de Paula Machado, Gilbert Huber, Jorge Oscar de Mello Flores, Jorge
Franke Geyer, Guilherme Borghoff, Hélio Gomide, Jorge Bhering de Matos, José Luiz Moreira de Souza,
Maurício Vilela, Miguel Lins, Dênio Chagas Nogueira, José Garrido Torres, João Nicolau Mader
Gonçalves, José Duvivier Goulart, Joviano Rodrigues de Moraes Jardim, Eurico Castanheira, Oscar de
Oliveira, Abelardo Coimbra Bueno, Álvaro Americano, Bento Ribeiro Dantas, Nelson Parente Ribeiro,
Orlandy Rubem Corrêa, Odylo Costa Filho, Rubem da Fraga Rogério, Aurélio de Carvalho, Mauro Ribeiro
Viegas, Décio de Abreu, Carlos Henrique Schneider, Tony Bahia, Fernando Ihler, Joaquim Carneiro, Oscar
de Carvalho, Adalberto Bueno Neto, Fernando Machado Portella, José Inácio Caldeira Versiani, João
Baptista Leopoldo Figueiredo, Luiz Cássio dos Santos Werneck, Paulo Ayres Filho, Paulo Reis Magalhães,
Juan Missirlian, Jorge Duprat de Britto Pereira, Jorge Augusto Vidal, Fernando da Silva Sá, Ésio Alves
Ferreira, Liberato da Cunha Friedrich, Leopoldo Figueiredo Junior. - Estatuto IPES/GB - 1964. (MORAES,
2016)

Encíclica elaborada pelo papa João XXIII que condenava o comunismo como “ateu e
15

intrinsecamente mau”, dentre outras coisas.


29

(...) Seu lançamento foi recebido favoravelmente pelos diversos órgãos da


imprensa, tais como o Jornal do Brasil, O Globo, o Correio da Manhã e a
Última Hora. Contou também com o beneplácito do conservador Arcebispo do
Rio Dom Jayme de Barros Câmara, enquanto outras figuras políticas,
eclesiásticas e intelectuais aplaudiram da mesma forma o seu aparecimento.
(DREIFUSS, 1981, p. 163)

Essa concentração da elite ao redor deste complexo que possuía como objetivo resguardar
seus interesses, não foi um fenômeno observado somente no Brasil. Em toda América
Latina, no final da década de 50 já existiam grupos com características similares ao IPES,
esses diversos grupos possuíam um canal comum por onde passavam informações
concernentes às experiências. Organizações com formatos similares existiam também
pela Europa e nos Estados Unidos, alguns desses think tanks norte-americanos, como o
Latin American Information Committee (LAIC) e a American Economic Foundation
(AEF), apoiavam financeiramente colaboraram na coordenação do IPES bem como
outras organizações congêneres no Cone Sul (DREIFUSS, 1981). Foi intensa a relação do
IPES e segmentos anticomunistas e setores empresariais estadunidenses no início da
década de 60:

O IPES do Rio de janeiro era também intimamente ligado à American


Economic Foundation – AEF, para a qual o IPES se tornou o canal de difusão
brasileiro. [...] O Latin American Information Committee – LAIC, com sede
em Nova York, patrocinado e financiado por corporações dos Estados Unidos,
distribuía fundos dessas companhias aos grupos escolhidos para receberem
colaboração, aos quais proporcionava certo grau de coordenação internacional.
O LAIC patrocinou pelo menos duas reuniões gerais desses grupos, realizadas
em Nassau (nas Bahamas), em 1962 e 1963. (DREIFUSS, 1981, p. 171)

Os Estados Unidos apoiaram amplamente e ajudaram a articular os projetos para


depor os presidentes que se negassem a se alinhar ao seu projeto político dos países da
América Latina. No início da década de 60, o presidente dos Estados Unidos recém-eleito
John Kennedy, determinou alguns regimes estratégicos contrarrevolucionários. A Aliança
para o Progresso (Alpro), programa financeiro idealizado pelos Estados Unidos no
governo de Kennedy para ser realizado na América Latina, era uma das estratégias que
tinham como objetivo frear possíveis tendências revolucionárias comunistas na região
30

(PADRÓS, 2005)16. O Committee for Economic Development - CED (Estados Unidos -


1942), que desenvolveu relevantes ações na esfera transnacional, composto por um
conglomerado de industriais de extraordinária formação intelectual, profissional, e
acadêmicos, com inclinações políticas, planejava os Estados Unidos no intuito de evitar
uma crise financeira e absorver práticas de planejamento que possibilitasse o capitalismo
moderno (DREIFUSS, 1987). A este comitê coube:

a reorientação desenvolvimentista da política norte-americana para a América


Latina, após a revolução cubana, propondo estreitamento das relações entre os
governos do hemisfério, entre as empresas transnacionais e o grande capital
local, numa tentativa de dinamização e integração da economia regional e no
combate político-ideológico às esquerdas e outras tendências reformistas
consideradas perigosas (DREIFUSS, 1987, p. 108).

Sendo assim, competia aos think tanks das nações capitalistas desenvolvidas,
formar e patrocinar suas irmãs congêneres pelo mundo, com as quais manteve estreitos
laços ideológicos, vínculos e ligação organizacional, firmando uma conexão internacional
do empresariado. Em razão de crises e transformações sociais, políticas e econômicas
globais que afligiam as demandas da burguesia, era necessário o estabelecimento do
capitalismo moderno no mundo e a participação desta burguesia na arena política para
protegê-la seu interesse essencial, o capital.

2.2 - A Estrutura do IPES

O IPES, no seu estatuto, se apresenta como um instituto de pesquisa


comprometido com o desenvolvimento democrático do Brasil, empenhado em analisar o
panorama e as dificuldades da nação, propor soluções de viés liberal, e divulgá-las para
todo o país. Autoproclamando-se como o “Estado Maior” o IPES observava, julgava e
atuava (BORTONE, 2013).

“A Aliança para o Progresso” (ALPRO), articulação político-institucional que condicionava, em


16

troca da ajuda financeira norteamericana, a subordinação dos governos latino-americanos aos interesses da
potência. O intuito era oferecer recursos para viabilizar projetos de combate e erradicação das mazelas
sociais nas esferas da saúde, educação, habitação e trabalho. Visava-se, com isso, esvaziar os focos de
tensão e de degradação social existentes, estabilizando o domínio das elites locais e protegendo os
interesses dos EUA. Ver Padrós, 2005.
31

A principal finalidade do instituto era elaborar estudos e atividades de natureza


social e de benefício privado. Suas atividades foram de grande relevância para o golpe de
1964, de modo que o governo de Castello Branco declara em 1966, através do Decreto nº
59.593 a organização como um “bem de utilidade pública” (BORTONE, 2013).
O IPES compreendia que para garantir o êxito de sua ação política era necessário
que sua atuação ocorresse em nível nacional. Deste modo, em seguida ao seu
estabelecimento no estado da Guanabara (RJ) e em São Paulo, o instituto fundou outras
unidades pelo Brasil a fim de fomentar a mobilização de forças em outros estados da
federação. O instituto possuía sede em diversos estados, que possuíam como objetivo a
consolidação de focos de apoio regional como em Pernambuco (IPES Pernambuco), Belo
Horizonte (IPES Belo Horizonte -1962) (Starling, 1986), Paraná (IPES Paraná), Rio
Grande do sul (IPESul - 1962) (Moraes, 2012), Santos (IPES Santos - 1962), Belém
(IPES Belém) e Manaus (IPES Manaus), que, embora submetidos e reguladas pelo
Comitê Nacional (Rio de Janeiro e São Paulo), de onde advinham as diretrizes de
coordenação (DREIFUSS, 1981), gozavam de certa autonomia de atuação (BORTONE,
2013).
O IPES Rio de Janeiro recebia os relatórios dos outros tentáculos do instituto pelo
Brasil para, a partir deles, elaborar a ação política que seria disseminada nos mais
variados âmbitos da sociedade. Além disso, criou uma espécie de pequenos núcleos em
municípios interioranos, como o núcleo fundado em Nova Friburgo, no estado do Rio de
Janeiro, assim como em empresas, para que os “empresários levassem para dentro de
suas companhias as ideias democráticas do IPES e o neocapitalismo liberal”17.
A estrutura do IPES era composta pelo Comitê Diretor (CD), o Conselho
Orientador (CO), Conselho Fiscal (CF) e o Comitê Executivo (CE), sistematizados nos
núcleos regionais. Eles realizavam anualmente uma Assembléia Geral Ordinária (AGO),
para balanço financeiro, análise da ata anual do CE e para eleição e posse do CO. Esta
estrutura foi organizada com a finalidade de conferir sincronicidade, agilidade e
coerência as atividades do instituto, e evitar a concentração de poder sob
17
Ata do IPES CD de 27.11.62, CE de 29.11.62 e Roteiro básico para um programa de ação em
longo prazo, de 06.06.63, apud, BORTONE. 2013.
32

responsabilidade de uma parcela pequena de empresários. Os cargos de direção dos


grupos que formavam o IPES, (CD, CO e CE), eram preenchidos por “proprietários,
acionistas, presidentes e diretores de multinacionais e associados (...) incluía oficiais
militares de prestígio, (...) jornalistas, acadêmicos e tecno-empresários” (DREIFUSS,
1981, p. 173).
O CD possuía em sua composição em torno de 20 a 30 membros, sendo a metade
do RJ e a outra parte de SP, e tinha como incumbência a preparação do regimento
interno; coordenação dos projetos de ação do instituto em cada região; projetar as normas
administrativas que seriam concretizadas pelo CE, assim como analisar a contabilidade.
Formado por no mínimo 50 e no máximo 100 membros eleitos através da AGO, o CO
tinha como atribuição a elaboração das diretrizes e dar rumo as atividades; eleger o CD e
ampliar o quadro social bem como a arrecadação de recursos, alicerçando a política da
entidade e suas normas de ação. Era de competência do Conselho Fiscal (CF) a análise e
fiscalização de tudo o que fosse relativo aos assuntos patrimoniais e de contabilidade.
O CE era composto por 10 membros divididos entre Rio de Janeiro e São Paulo.
Considerada a direção administrativa, possuía a função de praticar todos os atos da
administração, que não fossem da alçada do CO e do CD. O CE tinha como obrigação a
execução das decisões do CO e do CD, assim como a análise, elaboração e submissão de
projetos de atividades para o Instituto desenvolver, além da coordenação dos grupos de
estudo e trabalho. (BORTONE, 2013)
Composto por no máximo 100 membros eleitos através da AGO, o CO possuía
como incumbência a elaboração das diretrizes e do rumo das atividades, bem como a
eleição do CD e empenhar-se no levantamento de recursos e no crescimento do quadro
social, firmando a política do Instituto e seu regime de atuação. (BORTONE, 2013)
Como exposto, o IPES era dotado de uma rebuscada capacidade estrutural
organizativa. Através de Grupos de Estudo e Ação, o Instituto elaborava relatórios anuais
sobre determinados nichos de interesses, fazendo com que ocorressem ações em várias
frentes, a fim de proporcionar não somente a desestabilização do governo de Jango, como
33

era conhecida popularmente, mas de maneira paralela a disseminação de uma nova


proposta social para o Brasil. (DREIFUSS, 1981)
Concomitantemente, o IPES formou através de suas direções centrais um
estratagema de núcleos operacionais especializados e elementares na elaboração,
realização e coordenação de suas ações político-ideológicas que atuaram em nichos
sociais para doutrinação e atração para seu projeto, como políticos, classe média,
empresários, trabalhadores, sindicatos rurais e urbanos, movimentos estudantis, clero e
militares. Os núcleos operacionais eram formados pelo Grupo de Estudo e Ação (GEA),
subdivididos em cinco grupos, e o Grupo de Integração (GI). Formou-se um grupo de
ação denominado de Grupo de Levantamento de Conjuntura (GLC) que foi responsável
para a preparação estratégica e ações táticas da elite orgânica. (BORTONE, 2013)
Através da junção de núcleos de pesquisa, o Grupo de Estudo e Doutrina (GED)
analisava os problemas brasileiros e elaboravam propostas com soluções que constituíram
a base de longo prazo para estudos e diretrizes. O grupo elaborava estudos de emendas e
projetos de lei e os remetiam para o GAP no intuito de que fossem expostos no
Congresso por parlamentares associados ao Instituto. Suas prioridades políticas eram
estabelecidas pelo CE e por diretores do IPES, em conjunto com o GLC e o GAP, que se
reunia em Brasília. O grupo estudava e opinava sobre os assuntos que seriam a base para
a formação da opinião pública e os enviava ao GOP para disseminá-las (BORTONE,
2013).
Encarregado da obtenção de informações e pelo planejamento estratégico, o
Grupo de Levantamento de Conjuntura (GLC) ou Grupo de Pesquisa, tinha a função de
“acompanhar a evolução da conjuntura, avaliar e estimar” (BORTONE, 2013. p, 43)
todos os acontecimentos políticos, econômicos e sociais. Com as informações coletadas,
O grupo avaliava e fazia estimativas por meio das informações coletadas com relação ao
seu impacto e propunha mudanças táticas para influenciar no seu processo. Cabia ao GLC
indicar as áreas de preocupação para os Grupos de Estudos (GE) e Grupos de Doutrinas
(GD), e fixava diretrizes de curto e longo prazo para as manobras dos grupos de ação que
operaram no Congresso, junto a partidos políticos, sindicatos, classes sociais, estudantes,
34

igreja, Forças Armadas e mídia. Tinha a responsabilidade de desenvolver o planejamento


estratégico e a preparação da elite para a ação. Para isto, preparava relatórios de suas
atividades toda semana. Distribuía entre os militares uma circular, sem identificação de
fonte, que descrevia e analisava a atividade “comunista”, e que incitava a opinião militar
contra o Executivo e contra a mobilização popular (DREIFUSS, 2006). Selecionava
dossiês de grupos e pessoas, e compartilhava cartilhas que identificavam indivíduos
atuantes de organizações consideradas subversivas (RAMIREZ, 2005). O GLC grampeou
cerca de 3000 (três mil) linhas telefônicas para conseguir informações (DREIFUSS,
2006) que seriam utilizadas e manipuladas a favor do grupo.
Localizado em Brasília, onde iria determinar a dinâmica da ação do IPES, o
Grupo de Assessoria Parlamentar (GAP) funcionou como uma rede entre o IPES e o
Congresso. Este grupo atuou no Senado e na Câmara para obter informes autênticos para
melhor prejulgar os rumos da política governamental e para buscar apoio dos
parlamentares para os seus projetos (BORTONE, 2013). O chefe do GAP, Jorge Oscar de
Mello Flores, auxiliado pelo IBAD, foi o responsável para fazer uma “assessoria forte e
eficiente em Brasília” (BORTONE, 2013. p, 44) e acompanhar as atividades legislativas.
De acordo com Glycon de Paiva Teixeira, o IPES “subvencionará e Flores agirá”
(BORTONE, 2013. p, 44). Segundo Flores (1998), o IPES e o IBAD criaram, em 1961, a
Ação Democrática Parlamentar (ADP), um braço parlamentar do IPES que possuía como
objetivo de elaborar uma ação unificado entre os deputados que estavam alinhados com
as pautas políticas implementadas pelo IPES. Esta frente unificada era composta por
alguns políticos como João Mendes (presidente da ADP), Herbert Levy (presidente da
UDN), Mário Gomes (PSD-PR), Amaral Peixoto (presidente do PSD), Jaime Araújo
(UDN-AM), Sérgio Marinho (senador). A ADP também possuía como intenção se
justapor à Frente Parlamentar Nacionalista (FPN), que visava a transformação estrutural
agrária e o controle lucrativo de empresas provenientes de outros países pelo controle dos
lucros das empresas estrangeiras e pela transformação da estrutura agrária (BORTONE,
2013).
35

Responsável pela manipulação da opinião pública por todos os meios existentes


para difundir o pensamento do IPES de maneira abrangente, Grupo de Opinião Pública
(GOP) é o grupo de maior importância dentro do Instituto, sendo aquele que dará a
medida do IPES. Para esta tarefa contava com o Grupo de Estudo e Doutrina do Rio de
Janeiro e o Grupo de Doutrina e Estudo de São Paulo, a partir de avaliações e sugestões
feitas pelo GLC (BORTONE, 2013).
No intuito de neutralizar a oposição por meio de um controle ideológico, o IPES
para neutralizar a oposição por meio de um o controle ideológico que impedisse a
consolidação do governo nacional-reformista, assim como difundir suas diretrizes para a
construção do Estado baseado nos seus princípios, distribuiu grande quantidade de
artigos, livros e panfletos, enviou cartas e telegramas, e utilizou-se massivamente das
telecomunicações. O instituto criou um grupo de empresários das comunicações formado
por Flávio Galvão e Ennio Pesce Ennio Pesce e Flávio Galvão (O Estado de São Paulo);
Jorge Sampaio e Alves de Castro (TV Tupi/Repórter Esso); Wilson Figueiredo (Jornal do
Brasil); Roberto Marinho (O Globo), que além de serem favoráveis, difundiam e
reforçavam à ideologia ipesiana (BORTONE, 2013).
Ligado operacionalmente ao GOP, o Grupo de Publicações/Editorial (GPE)
possuía a incumbência de emitir a mensagem ideológica adequada do IPES através da
produção audiovisual para o cinema, rádio, televisão e teatro, além da disseminação do
material em todo território nacional (DREIFUSS, 1981). O romancista José Rubem
Fonseca era o encarregado e supervisor do grupo. Empresários proprietários de gráficas,
como Assis Chateaubriand (O Cruzeiro); Gilbert Huber Jr.(Gráfica Gomes de Souza;
Editora Saraiva) ofereceram a infraestrutura de suas gráficas para que o IPES pudesse
fazer a impressão de seu material propagandístico (BORTONE, 2013).
O Grupo de Integração (GI) possuía a incubência de integrar pessoas e
corporações dentro do “espírito democrático” do IPES e ao mesmo tempo arrecadar
contribuições financeiras para as atividades do Instituto. Para alcançar seus objetivos
promovia com frequência reuniões, debates, conferências, almoços e encontros informais
com empresários (BORTONE, 2013).
36

A ação política dentro dos partidos políticos e no Congresso baseava-se em


transformar o parlamento num foco de propaganda pela Frente Parlamentar Nacionalista
e pela Ação Democrática Parlamentar. Essas ações tinham como objetivo promover a
oposição às propostas presidências do período. O complexo IPES/IBAD tinha como
principal objetivo levar a estrutura política a um ponto de crise, de modo que civis iriam
apoiar decisões extraconstitucionais, o que abriria espaço para a intervenção militar.
(DREIFUSS, 1981)
A ADP funcionava tanto no congresso para a ação do Grupo e Ação Parlamentar
e o Grupo de Levantamento de Conjuntura contra o Executivo, quanto servia de canal
para as atividades do Grupo de Estudo e Doutrina, visando a opinião pública. Um bloco
numeroso da ADP se fez presente no Congresso e nas assembléias estaduais. Os
candidatos eram induzidos a assinar um compromisso ideológico de comprometimento
com o IBAD acima da lealdade a seu partido, e que lutariam contra a ameaça comunista e
iriam defender o investimento estrangeiro no Brasil (BORTONE, 2013).
Os recursos financeiros destinados ao IPES proviam de inúmeras fontes tais
como: empresários nacionais, multinacionais e associados, políticos, instituições
internacionais, bancos e etc. Para colocar o seu projeto em ação, o instituto contou
inicialmente com o financiamento de Indústria e Comércio de Minério – ICOMI;
Refinaria e Exploração de Petróleo União; Listas Telefônicas Brasileiras S.A.; Serviços
de Eletricidades S.A. – LIGHT; Companhia Docas de Santos; Casa Masson do Rio de
Janeiro e Construtora Rabelo S.A (BORTONE, 2013). Além dos recursos das empresas,
o auxílio financeiro era proveniente também de outras fontes “do Fundo do Trigo,
colocado no BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, cuja conta a
Embaixada dos Estados Unidos movimentava; da “caixinha” alimentada por empresas
nacionais e estrangeiras; de auxílios externos” (BANDEIRA, 1978, p. 75).

2.3 – A atuação do IPES:


37

A obra de René Dreifuss18 nos ajuda a compreender a formação econômica,


política e social brasileira sob uma análise macroestrutural. Seu pensamento segue a
mesma base teórica que têm como gênese a Teoria das Elites, formulada por teóricos
italianos (MOSCA, 1923, PARETO, 1916) segundo a qual “existe sempre uma minoria
que se impõe à maioria que ela dirige e que procura manter seu lugar por intermédio de
diferentes meios e mecanismos” (Grynszpan, 1999 p. 27). Grynszpan, ao se referir aos
anos 20 e 30 auxilia na compreensão dessa linha de raciocínio:

A questão que então se colocava era de saber como operar a centralização do


Estado e reforçar o Executivo sem cair no totalitarismo, como reduzir o peso
da participação, da opinião pública, da vontade das massas, sem romper com a
democracia. A solução passava, em grande parte, pela elaboração de uma
noção diferente de democracia, apresentada como mais realista e que se
opunha à idéia clássica que prevalecia até então: o elitismo se constituindo
assim como um referencial teórico de base. Desprovido de seu caráter de
negação da democracia em geral, ele foi apropriado como um argumento da
impossibilidade do ideal clássico de democracia e como fundamento de uma
noção mais realista, que insistia na idéia de liberdade ao invés de igualdade,
que dava importância à representação, em detrimento da participação, que
afastava do centro de sua definição a idéia de um governo do povo, da vontade
da maioria, da soberania popular, para substituí-lo por aquele da minoria
dirigente. (Grynszpan, 1999 p. 38)

Dreifuss segue em certa medida esta vertente teórica, pois ambos compartilham
de determinada maneira que em qualquer sociedade há uma maioria comandada por uma
minoria (elite governante) que ocupam cargos políticos ou que influencia as decisões
políticas e, com base em Gramsci, elabora o conceito de elites orgânicas, a que chama de
“agente coletivos, político-ideológicos especializados no planejamento estratégico e na
implementação de ação política de classe” (DREIFUSS, 1986. p, 24) e que possui como
seu braço articulador e pensante as fundações, agências governamentais e os institutos de
pesquisa. Para Gramsci:

“Todo grupo social, nascendo no terreno originário de uma função


essencial no mundo da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo,
organicamente, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão

18
O autor é Uruguaio, com formação em Ciências Políticas e História, pela Universidade Haifa em
Israel.
38

homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo


econômico, mas também no social e político: o empresário capitalista cria
consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador
da nova cultura, de um novo direito, etc, etc” (2001, p. 15)

A legitimidade das elites orgânicas baseia-se na premissa das mesmas aparecerem


descoladas das classes dominantes no bloco de poder, pois o discurso é apresentado como
de interesse da nação como um todo, apesar de fazerem parte dele e ajudarem a viabilizá-
lo, atuando como mediadoras e possibilitando a unidade real de classe (DREIFUSS,
1986). No “caso das centrais de idéias e pesquisas”, como Dreifuss faz referência aos
think tanks, “funcionam como segmentos auxiliares e de assessoria num leque limitado
de questões, geralmente circunscritos à dimensão da formulação de políticas públicas,
que respondem às necessidades do setor privado. Servem também como celeiro de
recrutamento de quadros” (DREIFUSS, 1986 p. 28). Está menção feita por Dreifuss não
se difere das demais analisadas inicialmente neste trabalho, embora também a trate de
maneira genérica.
Dreifuss foi pioneiro na tese de que o golpe de 1964 foi articulado não somente
pelos militares e sim por esta elite orgânica, na qual estavam inseridos intelectuais
orgânicos, empresários de vanguarda e os militares, expondo que foi um golpe de classe:

Esta estrutura de poder político de classe do bloco multinacional e


associado era corporificada numa intelligentsia empresarial. Esses agentes
sociais modernizante-conservadores, todos eles verdadeiramente intelectuais
orgânicos do novo bloco em formação, eram: a) diretores de corporações
multinacionais e diretores e proprietários de interesses associados, muitos deles
com qualificação profissional; b) administradores de empresas privadas,
técnicos e executivos estatais que faziam parte da tecnoburocracia e c) oficiais
militares (DREIFUSS, 1981, p.71).

De acordo com o autor, a elite orgânica possuía a finalidade de conter as forças


populares, desagregar o bloco populista, levar os interesses multinacionais e associados
ao governo político, através de um golpe civil-militar. O movimento internacional do
capitalismo demandava a necessidade de abrir campo também para as multinacionais do
país.
39

O que ocorreu em abril de 1964 não foi um golpe militar conspirativo, mas
sim o resultado de uma campanha política, ideológica e militar travada pela
elite orgânica centrada no complexo IPES/IBAD. (DREIFUSS, 1981, p.
230).

O período entre 1962 e 1964 foi necessário para que a estratégia ideológica se
transformasse em política e que a estratégia política se convertesse em ação militar para
garantir a consolidação do poder.
Na obra de Dreifuss é relatado que a elite orgânica formulou dois grandes
movimentos doutrinários, são eles: doutrinação geral e a doutrinação específica. Na
doutrinação geral, a elite orgânica pretendia atingir o máximo possível da população
favorecendo valores e pontos de vistas tradicionais e ideológicos de vertente direitista e
estimularam determinadas percepções negativas sobre o bloco nacional reformista. Eles
desenvolviam não somente uma campanha estruturada para alcançar o poder, mas
também elaboraram um programa de governo. (DREIFUSS, 2006)
A elite orgânica produziu diversos conteúdos relacionados a sua doutrina bem
como divulgou variadas publicações (livros, panfletos, periódicos, jornais, revistas,
folhetos, cadernos e etc), além de promover palestras, simpósios, conferências com
personalidades famosas por meio da imprensa, debates públicos, filmes, peças teatrais,
desenhos animados, entrevistas, propagandas no rádio e televisão, manifestos e cartilhas.
cartoons e filmes19 eram direcionados a um público alfabetizado e considerado mais
intelectualizado pelo instituto (DREIFUSS, 2006).
No que diz respeito à doutrina específica, tencionava moldar a consciência e a
organização dos setores dominantes e envolvê-los na ação explicando que era necessária
a criação de uma “classe para si”. A consolidação política das frações multinacionais e
associadas dentro da classe dominante. Desse modo, consolidaria cada vez mais a
importância de que as multinacionais fossem inseridas no Brasil para modernizá-lo.
De acordo com o historiador Carlos Fico (2004), a relação simbiótica entre o
IPES e os militares foi o elemento que proporcionou sucesso ao golpe de 1964, embora o

19
Acerca das produções cinematográficas por Jean Manzon para o IPES, ver ASSIS, 2001;
CORRÊA, 2005.
40

autor dê um peso maior às ações militares, presumivelmente, pelo fato de possuírem o


monopólio do uso da força, já que não existia determinado planejamento nas iniciativas
militares:

Sem a desestabilização através da propaganda ideológica e


mobilização da classe média, o golpe seria bastante difícil. Sem a iniciativa
militar, impossível. Portanto, é preciso bem distinguir a atuação
desestabilizadora (a propaganda do IPES e outras agências) da conspiração
golpista civil-militar, que em muitos momentos não passou de retórica radical e
somente se consolidou às vésperas do 31 de março. Assim, creio não ser
abusivo afirmar o acerto histórico da leitura segundo a qual a "desestabilização
civil" foi bastante articulada, mas a ação militar não foi inteiramente planejada,
com segurança e sistematicidade, ficando à mercê de iniciativas de algum
modo imprevistas (FICO, 2004, p. 55).

Marcos Corrêa corrobora com a compreensão do caráter do IPES como um


mecanismo que usufruiu das relações de natureza financeira com as corporações de
comunicação formando um canal através do qual emitia seus posicionamentos políticos
para contribuir com o processo de desestabilização do governo de Jango:

a primeira delas compreendia atividades efetivas de estudo, levantamentos,


pesquisas e realizações (financiamentos pessoais, de entidades classistas e
assessorias políticas). A segunda era destinada às ações de propaganda/
disseminação de ideias com a finalidade de difundir os ideais do Instituto
através da propaganda direta e indireta. (CORRÊA, 2004, p. 24)

Essa “guerra psicológica” (DREIFUSS, 1981, p. 194) arquitetada possuía o


objetivo de enfatizar valores como a iniciativa privada, a produtividade industrial e
comercial bem como a ideologia empresarial, além da rejeição de diretrizes políticas
socialistas e estatizantes. Além disso, buscavam a inserção de ideais de produtividade
associadas ao pensamento fordista e taylorista no Estado, além da ideia de pluralidade
política e liberdade de expressão (DREIFUSS, 1981).
A elite orgânica objetivava unir o emergente bloco de poder em torno de um
programa específico de modernização econômica e conservadorismo sócio-político.
Ainda, buscava ações voltadas para universitários, jornalistas, intelectuais, militares com
o interesse de legitimação indo em direção de uma “vontade comum”. Além disso, a
41

igreja também foi bastante visada, buscando oferecer a “resposta cristã à crise” em
oposição às soluções socialistas (DREIFUSS, 2006).
Desta maneira, a ação política ipesiana objetivava formar um novo bloco
histórico, buscar a hegemonia dentro da classe dominante, conter as classes sociais
subordinadas e excluir os interesses tradicionais. A necessidade inicial do seu projeto
hegemônico era coordenar esforços e ajustar interesses dos mais diversificados
empresários de diferentes setores e ideologias, convencê-los de que tinham uma missão
política a cumprir para representar uma força em prol da sociedade (DREIFUSS, 1981).
A conjuntura política facilitava a adesão, pois as indústrias estabelecidas desde a década
de 30 começaram a enfraquecer e a perder sua eficácia no governo de Goulart, que
mantinha o Estado no controle das iniciativas privadas.
O IPES apoiava as ações por meio de dinheiro, apoio administrativo,
envolvimento nas eleições estudantis, fundos para publicações, subsídios para atividades
diversas, inclusive patrocínio de viagens aos EUA. Também infiltraram “elementos
democráticos” na população estudantil, fomentando uma forte ação política por meio de
professores.
A classe média pode ser considerada como um braço da ação política utilizada
pelo IPES, sendo ela caracterizada como uma “massa de manobra” além de ser
compreendida como um ponto de referência para a identificação da legítima expressão
popular. A classe média seria o local de referência que legitimaria o novo movimento que
estava sendo estimulado no período anterior a abril de 1964. A estratégia de dialogar com
esta classe foi crucial para conferir a aparência de um apelo popular às Forças Armadas
para uma intervenção militar (DREIFUSS, 1981).
Não era suficiente apenas argumentos racionais para a estratégia do IPES obter
sucesso, era necessário buscar motivos emocionais. A classe média era insuflada a refletir
que estava empobrecendo e que não possuía vantagens salariais como as das classes
trabalhadoras como os ferroviários, operários marítimos e portuários (DREIFUSS, 1981)
Ao contrário do setor industrial urbano, o setor agrário não participou do esforço
de sindicalização corporativa do Estado Novo. Havia começado a se reforçar movimentos
42

como a ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), o


MASTER (Movimento dos Agricultores sem Terra). A Igreja com a intenção de
combater a movimentação que surgia no âmbito rural começou a patrocinar e organizar
sindicatos rurais em oposição às ligas que eram consideradas atéias (DREIFUSS, 1981)
Foi necessário que a elite orgânica conquistasse emocionalmente e racionalmente
os camponeses, embora mesmo uma reforma agrária limitada fosse deflagrar um conflito
com os proprietários de terra e suas associações de classe. A violenta contenção das ligas
camponesas, sobretudo no Nordeste, as quais eram consideradas um “barril de pólvora
ideológico”, por conta do fortalecimento das Ligas Camponesas, foi deixado por conta de
outras organizações e da ação individual por parte de proprietários de terra que não
mantinham ligações ostensivas com o complexo IPES/IBAD, embora o Instituto
-
juntamente com a IADESIL Instituto Americano para o Desenvolvimento do
Sindicalismo Livre (fundada em 1961, nos Estados Unidos), juntaram esforços e finanças
para frear o avanço das reformas nacionalistas e do movimento de esquerda no Brasil,
mas principalmente em Pernambuco. Entre as ações voltadas para aquela região, foi
estimulada a fundação de sindicatos que promoviam o sindicalismo livre. Outros órgãos
que participaram da contenção dos movimentos rurais: SORPE (Serviços de Orientação
Rural de Pernambuco – fundado por 26 padres), CLUSA (Liga Cooperativa dos Estados
Unidos), USAID (American Agency for International Development), AIFLD (American
Institute for Free Labour Development) (DREIFUSS, 1981).
É imprescindível também salientar a participação de investimentos estrangeiros
de agências como a Central Intelligence Agency (CIA) e o Departamento de Segurança
estadunidense, através da figura do Embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln
Gordon. O Coordenador do National Security Archives (NSA) dos Estados Unidos, Peter
Kornbluh afirma que “os arquivos não deixam dúvida de que havia tal financiamento, de
que havia operações secretas de propaganda da CIA no Brasil. Operações de Mídia, de
Sindicatos, dando suporte aos golpes, plantando informações falsas nos jornais.”20 As

20
Entrevista realizada por Camilo Tavares para o documentário O dia que durou 21 anos, entre
20min23seg e 20min43seg.
43

eleições de 1962 foram consideradas o auge de uma das maiores operações políticas
empreendidas pela Divisão Ocidental da CIA (DREIFUSS, 1981).
A ação entre as classes trabalhadores industriais se deu por meio ideológico e
político. As políticas envolviam a criação de organizações de direita ou apoio às já
existentes dentro do movimento trabalhista. Além disso, foi desenvolvido esquemas de
assistências sociais que visavam a criação de espécies de “ilhas de contentamento” entre
as classes trabalhadoras. A partir disso, foi criado o CAS (Corpo de Assistências Sociais)
que fornecia recursos humanos e materiais em favor das limitadas reivindicações
populares de serviços comunitários (DREIFUSS, 1981).
O MUD (Movimento Universitário de Desfavelamento) foi criado com o objetivo
de promover uma imagem de possibilidade de ascensão econômica individual, por meio
de serviços universitários, como uma alternativa para a luta social, evitando politizar a
condição de favelado. As ações se concentravam também em problemas socioeconômico
destinado ao consumo de massas. Essas ações desenvolveram-se através de organizações
fantoches e “pelegas” (que favorecem a empresa) e movimentos orientados pelo clero,
que competiam com sindicatos de esquerda. Também podemos destacar os círculos
operários, que forneciam amparo jurídico, médico, dentário e hospitalar, cooperativas de
consumo de créditos habitacionais, além de congressos nacionais. Este amparo visava
desestabilizar a atratividade dos sindicatos, conferindo cidadania e serviços básicos aos
operários. (DREIFUSS, 1981)
É importante salientar que a partir do pensamento de Dreifuss, a queda do
governo de João Goulart ocorreu como culminância de um movimento civil-militar e não
como um golpe das Forças Armadas contra João Goulart.
A presença do complexo IPES/IBAD nas forças armadas visava a neutralização
da política popular de João Goulart e a minimizando o apoio militar a diretrizes políticas
socialistas e populistas, além de estimular junto aos militares grupos favoráveis ao golpe.
Havia escritórios sigilosos paras as articulações civil-militares e oficiais do exército
participavam de reuniões executivas do IPES, que traçaram estratégias, quanto táticas
específicas de ação. Um dos itens principais das Forças Armadas foi algo que surgiu nos
44

anos 40, mas que com o passar do tempo se fortaleceu, que era a Escola Superior de
Guerra (ESG). A ESG formou diversos quadros que agiam em plena sincronicidade com
o complexo IPES/IBAD. (DREIFUSS, 1981)
Um dos intuitos dessas ações táticas era o desmantelamento do dispositivo militar
do governo, já que havia militares que mantinham proximidade e estavam a favor, muito
embora por terem sido nomeados pelo governo de João Goulart. Afinal, era necessário
que esses militares fizessem parte do escopo das ações da classe que se formou.
Pressionavam para oficiais agirem contra o Executivo e infiltraram grupos políticos de
escalões mais baixos envolvidos em conspirações antigovernistas. É relevante ressaltar
que diversos oficiais trabalhavam dentro do complexo IPES/IBAD e vice-versa. Desse
modo, podemos refletir que havia se formado um harmonioso relacionamento ideológico
e político entre os militares e os empresários, embora em um período mais adiante fossem
ocorrer desarmonias. (DREIFUSS, 1987).
Dentro do contexto militar não existia consenso e nem todos pensavam na mesma
direção. Havia subgrupos dentro do âmbito militar que o tornavam de certo modo
heterogêneo. A parcela que não fazia parte da articulação IPES-ESG, compusera outros
grupos como os extremistas de direita, que podem ser caracterizados como oficiais do
exército fanáticos, anticomunistas, que eram a favor da modernização industrial
conservadora. Havia também os tradicionalistas, que podem ser descritos como oficiais
que não recebiam treinamento na ESG e que não compartilhavam de todas as reformas
políticas, econômicas e sociais tão amplas quanto às propostas pelo complexo IPES-ESG.
(DREIFUSS, 1981)
O general Olympio Mourão Filho, o qual não era um militar atuante dentro do
núcleo da ESG, promoveu o que podemos caracterizar como um golpe dentro do golpe
(CHAGAS, 2015). O general Olympio começou servido no Rio Grande do Sul em 1961-
62, depois é transferido para São Paulo em março de 1963, e em agosto de 1963 é
transferido para Minas Gerais de onde desencadeia o golpe. O general e seu grupo nem
sempre tinham pontos de vista que dialogavam com os do complexo IPES-ESG, já que
possuíam ideias consideradas mais tradicionalistas naquele contexto, não lhes
45

interessando as reformas propostas pelo IPES. Devido a este fato, foi feito um esforço
para contê-lo e restringir suas atividades entre os militares. O domínio completo da ESG
na hierarquia do Exército foi derrotado e o general Costa e Silva acabou tornando-se o
ministro da Guerra, ao invés do nome esperado pela ESG. (DREIFUSS, 1981)
A elite orgânica do complexo IPES/IBAD conseguiu posicionar-se na direção do
Estado e ocupar postos estratégicos na burocracia civil e da administração tecnocrática.
Ao mesmo tempo, a ESG conseguiu controlar boa parte dos postos militares considerados
estratégicos, bem como dominar a doutrinação das forças armadas. (BORTONE, 2013)
Os novos ocupantes das posições de poder não eram exatamente “tecnocratas”,
mas sim civis, com fortes ligações industriais e bancárias, ou seja, empresários ou “tecno-
empresários”. De fato, os militares atuaram, porém suas ações e seu poder dentro do
processo foram superestimados, em contrapartida, a participação dos tecnoempresários
tem sido subestimada pela historiografia (DREIFUSS, 1981).
No pós-1964, são justamente os grupos de Estudo e Doutrina do IPES que
forneceram as diretrizes e as orientações para as tomadas de decisões e reformas
administrativas, políticas, econômicas e estruturais. Após 1964, o poder estatal direto
transformou-se na mais alta expressão do poder econômico da burguesia financeiro-
industrial multinacional e associada. Desse modo, criou-se uma nova concepção das
relações entre o Estado e as classes empresariais. (DREIFUSS, 1981)
A percepção pública do IPES contrastava com a realidade. Anos mais tarde, o
levantamento documental do instituto tornou evidentes suas relações de colaboração com
outros grupos políticos que promoviam ações de enfrentamento e violência, sendo a
principal delas o IBAD. Além disso, a documentação também revelou que o grupo
financiou a campanha de diversos candidatos nas eleições de 1962. Essas informações
que não eram públicas a época entravam em choque com o discurso promovido pelo
IPES de ser apartidário e legalista.21
Utilizando-se da hipótese de que parcelas significativas da sociedade brasileira
aceitaram uma solução autoritária para os problemas que afligiam o país, os
21
É constituída uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) em 1963 para apurar uma lista de candidatos
que teriam recebido recursos financeiros do IBAD e do IPES.
46

apontamentos elaborados por Carlos Fico (2014), identifica que a participação civil foi
crucial no processo de instauração do novo regime, assim como a participação de
parcelas dos setores militares, haja vista que diferentes âmbitos da sociedade civil
contribuíram diretamente com a deposição de Goulart da presidência, tanto no que
concerne ao apoio a instrumentos como o IPES quanto na elaboração e difusão de
anteprojetos de poder.
Embora sob outro, os apontamentos de Daniel Aarão Reis (2005) também se
destacam por abordar o papel da sociedade civil no regime autoritário deflagrado em
1964. O autor cunhou a expressão “movimento político militar” a fim de compreender a
participação civil neste evento (REIS FILHO, 1990). Aarão Reis reserva uma crítica à
narrativa dreifussiana sobre o período, expressando que ela tenha possivelmente
superdimensionado o papel conspiratório do IPES. Em sua obra Ditadura e democracia
no Brasil (2014) o autor mostra como o governo militar e a sociedade se amalgamou
muito mais do que os opositores à ditadura desejavam. Como mencionando
anteriormente, diferentes atores da sociedade civil tiveram um papel crucial na
viabilização das ações que resultaram nos acontecimentos de 1964, fazendo com o que a
participação civil venha à luz, possibilitando com que sejam identificados os atores que
contribuíram para a realização do golpe. Interpretações historiográficas que surgiram
após os 40 anos da deflagração do golpe (REIS Filho, 2005; REIS, RIDENTI e MOTTA,
2004; FERREIRA; 2003; TOLEDO, 2004) ressaltam a imprescindibilidade de refletir a
atuação da sociedade no golpe civil militar. Nesse sentido, Reis questiona:

como explicar por que a ditadura não foi simplesmente escorraçada? Ou que
tenha sido aprovada uma anistia recíproca? Como compreender que
permaneçam com tanta força lideranças e mecanismos de poder preservados
e/ou construídos no período da ditadura, pela e para a ditadura? (Reis, 2005, p.
10)

Dreifuss responde parcialmente essas indagações no posfácio da obra, A esquerda e o


golpe de 64, de Dênis de Moraes (MORAES, 1989) ao afirmar que:
47

A direita ganhou, porque soube desenvolver um conjunto de campanhas


políticas (e tinha acumulado os meios para tanto) no contexto de um projeto
estratégico viável de desestabilização do governo Goulart e de contenção das
esquerdas, desorganizadas e despreparadas para o nível da luta que teriam a
enfrentar. (DREIFUSS, 1989 p. 367)

Embora existam críticas relativas a narrativa dreifussiana22, por supostamente


superdimensionar a importância e o papel do IPES no golpe de Estado, o fato é que em
sua grande maioria são frutos de uma leitura desatenta de sua obra, pois é evidente nessas
críticas que atribuem a Dreifuss uma desconsideração de aspectos fundamentais de seu
arcabouço conceitual, especialmente a definição de que a ação da elite de classe ocorreu
em um contexto de crise orgânica, a qual de nenhum modo pode se compatibilizar com a
figuração de um cenário onde o IPES pudesse “controlar” o processo histórico (MELO;
HOEVELER, 2014).
O IPES elaborou 23 anteprojetos de reformas de base, com o objetivo de
viabilizar a “conquista” do Estado, para ao conquistá-lo, criar políticas públicas que
beneficiassem o capital internacional e a iniciativa privada (BORTONE, 2011).
Com a conquista do Estado em 1964 e o estabelecimento do governo civil-militar,
com a finalidade de defender os princípios básicos que iriam possibilitar a estabilidade
dos interesses da classe, assim como determinar os caminhos econômicos, o IPES indicou
parceiros e associados para a investidura de postos estratégicos e determinantes na nova
estrutura administrativa. Diante desta presença ipesiana na nova administração
governamental, foram absorvidos pelo Estado os projetos e anteprojetos elaborados pelo
IPES (BORTONE, 2011).
As atividades do IPES tiveram seu fim em 1972, quando o regime autoritário
tornou-se ainda mais duro, com a suspensão os direitos políticos e civis dos cidadãos,
bem como dos quadros ipesianos que apoiaram a ação golpista e centralização do Poder
Executivo. Limitados de participarem das decisões políticas e econômicas do Estado, os
empresários buscaram outras formas de se articular e novas possibilidades políticas

22
Para melhor aprofundamento, consultar em: DE MELO, Demian Bezerra; HOEVELER, Rejane
Carolina. Muito além da conspiração: uma reavaliação crítica da obra de René Dreifuss. Tempos
Históricos, v. 18, n. 1, p. 13-43.
48

através da sociedade civil no intuito de restaurar a ordem democrática, para controlar o


seu poderio econômico, numa democracia estruturada nas premissas neoliberais.
Nesse sentido, podemos observar que o IPES arquitetou uma frente civil militar,
cujo objetivo final era desestabilizar de forma ampla, diversificada e consistente o
processo democrático encabeçado pelo governo de João Goulart e propor uma nova
agenda política, governamental e administrativa ao Brasil que atendessem as suas
ambições ideológicas. Observamos também que a principal arma era os meios
propagandísticos, pois a utilização propagandística de uma ideia com respaldo
institucional culmina em sua oficialização, transfigurando e naturalizando-a
(CHOMSKY, 2002).
49

Capítulo 3

O IPES como agente das Relações Internacionais

Buscar-se-á neste capítulo ilustrar a atuação transnacional do IPES, por meio da


relação estabelecida entre o instituto com as frentes direitistas militares e civis que
atuaram no Chile, na deflagração do golpe contra o governo de Salvador Allende.
Iremos abordar alguns conceitos que irão demonstrar a relação entre a temática
dos think tanks com a àrea das Relações Internacionais. Esses conceitos serão necessários
para que possamos compreender de modo claro os fatos através da perspectiva
metodológica desta área do conhecimento. A seguir, iremos estabelecer o marco
conceitual através do qual permitirá que identifiquemos com clareza o IPES como um
think tank. Por fim, iremos identificar as evidências da cooperação do IPES ao processo
conspiratório e antidemocrático ocorrido no Chile em 1973. Posto isto, indicaremos os
seguintes questionamentos: De que forma o IPES, instituto respaldado pelo regime
ditatorial brasileiro influenciou no processo golpista ocorrido no Chile?

3.1 - Os think tanks e as Relações Internacionais:

Para compreender de que maneira os think tanks estão inseridos no na esfera


acadêmica das Relações Internacionais é necessário que façamos um retrospecto ao
surgimento do próprio fenômeno.
50

O formato desses mecanismos difundiu-se para denominar grupos de experts, que


se dedicavam à pesquisa das relações internacionais dentre outras pautas estratégicas, no
pós-Segunda Guerra. É plausível relacionar seu surgimento e massificação do modelo às
dinâmicas ocorridas na guerra fria. A partir da década de 70, a terminologia foi associada
de forma abrangente a outros institutos que se dedicavam a áreas como economia,
política e cotidiano social (TEIXEIRA, 2007).
A contribuição da cadeira das Relações Internacionais na elucidação sobre o
fenômeno dos think tanks é ainda considerada preambular. Não há uma produção
acadêmica extensa e expressiva, capaz de esclarecer decisivamente o fenômeno à luz
desta área do conhecimento. Entretanto, diversos conceitos, autores e suas respectivas
obras são capazes de contribuir para uma análise acerca desse mecanismo no que
concerne a sua concepção, campo de atuação e finalidade. Embora a escassez teórica
sobre os think tanks de modo abrangente, ser uma realidade, a possibilidade dos
internacionalistas e os scholars23 as analisarem se propõe como um interessante desafio,
quando consideramos o fato do fenômeno configurar-se como um agente relevante que
assume distintos papéis e posições nas configurações do sistema internacional.
A possibilidade de analisar estes mecanismos através deste campo é também
profícua quando consideramos seus efeitos intra e extraestatais, seu ideário e a realidade
que essas organizações constroem e endossam. Além desses aspectos, é enriquecedor
para os estudiosos, e aqui destacamos novamente os do campo das Relações
Internacionais, compreender a razão e como ocorrem as relações estabelecidas por essas
organizações com outros entes políticos.
Antes de avançarmos, cabe aqui definir com maior precisão alguns conceitos
necessários para que possamos compreender o que são por definição as relações
internacionais, embora reconhecemos que definir um campo do conhecimento através de
definições não seja um recurso sábio.

23
A pessoa que se dedica a estudar determinado assunto em detalhe, especialmente nas
universidades. (A person who studies a subject in great detail, especially at a university): Cambridge
Academic Content Dictionary, UK.
51

De acordo com Nicholson (2002) as relações internacionais são o estudo das


interações sociais que não podem ser observados exclusivamente no contexto bilateral.
Portanto, as relações internacionais seriam as relações sociais em contextos onde inexiste
um poder soberano para intrometer-se ou mediar essas interações, que se encontram,
portanto, fora de qualquer jurisdição governamental. Judith Goldstein opta por definir as
relações internacionais como aquelas que dizem respeito às relações entre os governos
dos Estados membros da ONU e que também estabelecem conexões com outros atores,
tais como as organizações internacionais, as corporações e os indivíduos, outras
estruturas sociais, economia, cultura, política interna e com influências históricas e
geográficas (GOLDSTEIN 1999 p.3, apud RESENDE 2011 p.11).
Como foi possível verificar, as definições supracitadas se diferem uma da outra,
mantendo em certa medida alguns elementos em comum. Através destas definições
mencionadas, é possível citar diversos fenômenos que se enquadram nestas propostas.
Dentre essa gama de fenômenos que podem ser tratados pelo o campo das Relações
Internacionais, os think tanks apresentassem como um tema bastante promissor.
Como foi possível observar nos capítulos anteriores, os think tanks são
mecanismos que representam o exercício do soft power24.
Joseph Nye elaborou o termo soft power em sua obra “Bound to Lead – the
changing nature of american power”. O livro foi lançado antes do fim da União
Soviética, em 1990 e possuía o objetivo de representar uma alternativa ao chamado
declinismo. Na época, muitos acadêmicos, bem como a própria nação dos Estados
Unidos apontaram o declínio hegemônico norte-americano e acreditavam que o país
perdia espaço econômico para a Alemanha e o Japão. Nye rebate esta idéia ao argumentar
que os Estados Unidos eram a nação mais forte do mundo, econômica e militarmente,
além de numa terceira dimensão, o que caracterizou como o soft power. (NYE, 2004)
O soft power, termo cunhado no campo das Relações Internacionais, trata-se da
habilidade de um corpo político influenciar e atrair outros corpos políticos por meios
culturais, ideológicos ou subornos, para alcançar seus objetivos, ao invés de dispor da

“Poder brando”, tradução livre.


24
52

força coercitiva25(NYE, 2004). O termo se refere às formas de poder fundamentadas em


mecanismos de persuasão, dos ideais, da cultura e das políticas adotadas por um país.
Quando estas características são enxergadas com legitimidade, em contraposição à
utilização de poderio bélico e instrumentos como força militar - que se caracterizam
como hard power, ocorre o enaltecimento do soft power. (NYE, 2004)
A utilização do soft power está diretamente relacionada ao exercício do poder
ideológico, que possui como principal ferramenta a palavra, bem como a expressão de
ideias através da palavra (NOGUEIRA, 2004). É por este motivo que o estudo do
universo e do papel dos think tanks destina-se ao debate sobre a posição do intelectual na
sociedade, assim como as relações entre ele e o poder - questão tácita a qualquer tentativa
de análise do tema.
Os think tanks representam um dos principais e, notoriamente eficazes,
mecanismos de propagação ideológica no que diz respeito às suas causas e interesses.
Nesse sentido, caracteriza-se como um importante aparato que viabilizaria o exercício do
soft power. Assim sendo, podemos avaliar que os think tanks auxiliam o exercício do
poder simbólico26, pois permite a conquista equivalente do que é obtido por meio da
força, graças a seu efeito específico de mobilização.
Em termos geopolíticos, os think tanks são um indicativo da capacidade de soft
power das nações. Deste modo, os think tanks são instrumentos por meio dos quais os
Estados afirmam seus interesses em assuntos internacionais e indicadores críticos da
capacidade dos países de projetar seu soft power. Por intermédio desses centros de
pesquisa são realizados seus projetos e a disseminação de sua cosmovisão. Essa dinâmica
pôde ser observada na robusta experiência norte-americana, com think tanks que
influenciam de modo expressivo nas decisões dentro da esfera estatal norte-americana e
no direcionamento da política externa de Washington. No Brasil, esta prática pode ser
observada em experiências menos recentes, como na relação entre o regime autoritário
brasileiro e as frentes direitistas chilenas, tendo como ponte o IPES e seus quadros.

25
Ver https://hbswk.hbs.edu/archive/the-benefits-of-soft-power (Havard Bussiness School: Working
Knowledge)
26
Adotamos neste trabalho a definição elaborada por Bourdieu (2004, p 188).
53

Nesse sentido, os vínculos estabelecidos por essas organizações fazem-nas um


fenômeno importante para ser abordado por estudiosos das Relações Internacionais,
principalmente no que diz respeito à atuação transnacional estabelecida por esses
mecanismos para disseminar o ideário e as políticas de determinado Estado.
Podemos identificar que uma parcela de think tanks trabalha de maneira
transnacional e são amparadas por suas irmãs congêneres estrangeiras - ou as amparam
numa espécie de rede transnacional, pavimentando canais onde transitam suas ideias.
Essas relações simbióticas serão analisadas no capítulo a seguir através do exemplo do
vínculo criado entre o IPES e os direitistas chilenos para viabilizar a queda do governo
Allende.

3.2 - O IPES como um think tank:

Dreifuss não explora com profundidade em sua obra sobre o período autoritário o
termo “think tanks”, apenas o cita para caracterizar o IPES. Considerando isto, é
necessário neste trabalho escolher um modelo conceitual para que possamos caracterizar
e analisar o IPES através dele.
Sendo os objetivos dos think tanks, de maneira geral, o de propagar seu produto
final (idéias) e o de exercer influência na produção de políticas públicas, a eficácia dos
think tanks habita na capacidade de manter o verniz científico para auxiliar na
legitimação de escolhas e decisões que são, em última instância, políticas e, portanto,
orientadas por interesses previamente estabelecidos (NASSER, 2014).
O autor Hernán Ramirez, cuja tese de doutorado analisou comparativamente o
IPES e organizações de mesma natureza na Argentina (2005), critica a utilização do
termo “think tank” para designar o IPES, optando por usar as expressões “grupo de
interesse” ou ainda “grupo de pressão” já que delimitaria de modo mais eficaz a
amplitude das ações do IPES. De acordo com Ramirez, ao denominar o IPES como um
think tank:

(...) deixa de lado aspectos importantes, basicamente o fato de estarem


patrocinados por entidades empresárias que exercem um poder de ingerência
54

considerável. Dessa maneira, eles não são apenas reservatórios de idéias, estas
estão em relação a interesses fortemente estruturados que, por vezes, as podem
determinar. De tal forma, ainda que na realidade os institutos sejam tudo isso,
eles são algo mais, e, portanto, é necessário procurar conceitos mais
abrangentes que possam inclui-os de maneira mais conveniente. (RAMÍREZ,
2005 p.70-71)

Essa análise feita por Ramírez exerce certa coerência ao debate sobre a utilização
do termo, bem como uma plausível aplicação ao caso do IPES, pois, é necessário levar
em consideração a ampla atuação do instituto, em uma parcela na ilegalidade, na retirada
de João Goulart do poder. Entretanto, ela oferece somente uma possibilidade em um
universo variado sobre a compreensão do que representam essas organizações.
Considerando isto, optamos por utilizar neste estudo monográfico a compreensão
de think tanks concebido por Medvetz (2008), no qual o autor usufrui do conceito de
“campo social” elaborado por Pierre Bordieu (2004). Neste conceito, o campo social seria
o ambiente no qual ocorrem as disputas entre os atores em torno de objetivos específicos,
considerada por Bourdieu como sistemas sociais em que cada agente tem uma disposição
fixa primária. O campo pode ser conceituado como o locus, que seria o ambiente social
de relações objetivas (BOURDIEU, 1989).
Conceituada a noção de campo ou locus a partir da visão de Bourdieu, os think
tanks seriam instituições situadas entre o campo político, econômico, acadêmico, do
conhecimento e das comunicações, o que faz com que elas transitem e operem entre esses
ambientes (MEDVETZ, 2008, p.5), como será exposto na figura a seguir:
55

Fonte: MEDVETZ (2008)

Adotamos o conceito acima elaborado por Medvetz para o nosso trabalho, pois
ela não limita-se a taxonomia e a modelos tradicionais classificatórios engessados que
tentam em vão dar conta da complexidade posta pelo universo dos think tanks.
Ao considerar o marco conceitual acima, deixamos de lado o argumento da
“independência” da produção intelectual do fenômeno, algo que facilita a melhor
compreensão das atividades do IPES, pois reconhece as relações porosas que estas
organizações podem estabelecer, sejam elas de qualquer natureza.
Em síntese, Medvetz (2008), propõe uma mudança de foco para as conjunturas
sociais que modelam a produção dessas organizações, ao invés de elaborar uma lista com
suas características. O autor identifica os think tanks como organizações que atuam em
espaços sociais híbridos, em regra, situadas em posições sociais intermediárias e
distintas: o político; o econômico; o da mídia e; o da produção de conhecimento (DIAS
RIGOLIN, HAYASHI, 2011).
56

3.3 - A relação entre o IPES e a queda do governo de Salvador Allende:

No que diz respeito ao formato dos think tanks, como podemos observar
inicialmente neste trabalho, este não é fruto de um processo iniciado no Brasil. Ao
contrário, o mecanismo tem seu surgimento no exterior, mais especificamente nos
Estados Unidos, país no qual surgiram as bases do fenômeno, bem como de onde partiu a
expansão da fórmula para o restante no mundo, na segunda metade do XX.
Por conseguinte, os think tanks podem ser caracterizados como agentes das
relações internacionais a partir do princípio de que essas organizações não se dedicam
exclusivamente apenas a formulação de políticas públicas para a esfera interna dos
Estados, como também objetivam influenciar a política externa e as relações entre os
Estados (TEIXEIRA, 2007). Além disso, representam um importante mecanismo do soft
power, ao elaborar ideias que possuem a finalidade de influenciar segmentos e atores
sociais e políticos.
Caracterizado o marco conceitual que utilizamos para caracterizar o IPES como
um think tank, assim como a noção do que é o soft power, cabe aqui demonstrar e
exemplificar o IPES como um exemplo do mecanismo e agente das relações
internacionais. Para isso, é útil exemplificarmos as relações que esses mecanismos
estabelecem além das fronteiras nacionais.
Ao se averiguar a atuação do IPES, depreende-se que o instituto também pode ser
compreendido como um agente das relações internacionais, ao dispor do soft power,
representado por seu ideário, e ao estabelecer relações que atravessaram as fronteiras
nacionais brasileiras. Sendo assim, utilizar-se-á como exemplo a relação entre o IPES e a
as frentes golpistas chilenas que deflagraram o golpe de 1973, ocorrido no Chile.
O Golpe de Estado ocorrido no Chile em 11 de setembro de 1973, articulado
pelos militares do oficialato da marinha e do exército chileno, com o apoio financeiro e
militar dos Estados Unidos da América e da CIA e com a participação de organizações
nacionalistas e paramilitares como Patria y Libertad, arquitetou a retirada de Salvador
57

Allende do poder e a derrubada do regime democrático chileno. A ditadura liderada pela


junta militar e presidida através do Decreto nº1 pelo general Augusto Pinochet
representou uma ruptura nos projetos democráticos elaborados pela Unidad Popular
(MONIZ, 2008). Cabe ressaltar que as iniciativas para levar o Chile ao caos econômico,
político e social, começaram imediatamente após a vitória da eleição de Salvador
Allende, o primeiro governo de esquerda da República Chilena, morto no bombardeio do
Palácio de La Moneda, no transcorrer do golpe, cujos eixos programáticos
governamentais eram centrados na reforma agrária e na desapropriação das grandes
empresas privadas, através de nacionalizações reguladas pelo Estado (MONIZ, 2008).
Transcorridos dois anos após a ascensão de Pinochet ao poder através do golpe,
em contraste com as propostas econômicas do governo de Allende, foram implementadas
reformas econômicas neoliberais, formuladas por uma equipe econômica que se norteava
pelas ideias liberais de Milton Friedman e pelas pautas previstas no “El Ladrillo”,
documento que estabelecia medidas econômicas de livre mercado. A partir de 1956, este
escrito é considerado a pedra angular dessas políticas, elaborado conjuntamente com o
Centro de Estudios Socio-Económicos (CESEC), da Pontifícia Universidade Católica de
Santiago de Chile, serviu de referencial ao regime autoritário instaurado em 1973
(RAMÍREZ, 2012). Os Chicago Boys, grupo de aproximadamente 25 economistas27,
formados na Pontifícia Universidade Católica do Chile e pós-graduados na Universidade
de Chicago, elaboraram as propostas econômicas do governo autoritário de Pinochet.
Foram os pioneiros do pensamento Liberal no Chile e formularam propostas econômicas

27
Jorge Cauas (Ministro das Finanças, 1975 - 1977), Sergio de Castro (Ministro das Finanças, 1977
- 1982), Pablo Baraona (Ministro da Economia, 1976 - 1979), José Piñera (Ministro do Trabalho e
Aposentadorias, 1978-1980, Ministro das Minas, 1980-1981), Hernán Büchi (Ministro das Finanças 1985 -
1989) (Ph.D. na Columbia University), Alvaro Bardón (Ministro da Economia, 1982-1983), Juan Carlos
Méndez (Diretor do Orçamento, 1975-1981), Emilio Sanfuentes (Conselheiro Econômico do Banco
Central), Sergio de la Cuadra (Ministro das Finanças, 1982-1983), Miguel Kast (Ministro do Planejamento,
1978-1980), Martín Costabal (Diretor de Orçamento, 1987-1989), Juan Ariztía Matte (Superintendente do
Sistema de Previdência Privada 1980-1990).
58

para o governo ditatorial que só seriam incorporadas pela primeira ministra do Reino
Unido Margaretch Thatcher uma década depois. Nesse sentido, os empresários e a direita
chilena possuíam como principal objetivo reprimir e bloquear a via socialista chilena
representada pela Unidad Popular. A Unidad Popular, coalizão partidária de esquerda
formada para a eleição presidencial de 1970 no Chile, manteve-se no poder entre os anos
de 1970 e 1973 e tinha como principal liderança Salvador Allende. A coalizão sucedeu a
chamada Frente de Acción Popular, que representava uma frente democrática anti-
imperialista e anti-oligárquica, que aglutinou diversos partidos considerados de esquerda
como: Partido Comunista, Partido Socialista, Partido Social Democrata, Movimento de
Ação Popular Unitária e o Partido Radical. A principal defesa da UP era a chamada “via
chilena para o socialismo” (BORGES, 2005).
Com o golpe militar ocorrido no Brasil, diversos brasileiros se exilaram
primeiramente nos países da América do sul e, por este motivo, a ação repressiva
procurou abarcar primeiramente esses países. Inicialmente, o principal destino da
primeira geração de exilados brasileiros foi o Uruguai. Progressivamente, a atuação da
repressão tornou-se mais presente nos outros países que também possuíam uma
quantidade expressiva de exilados brasileiros, como no Chile. Após a posse de Salvador
Allende, o Chile passa a ser o maior polo de concentração de perseguidos pela ditadura
brasileira. Muitos cidadãos brasileiros se exilaram em solo chileno para fugir da
perseguição do regime autoritário que havia se instalado no Brasil, no intuito de encontrar
refúgio em um país com viés ideológico mais amistoso. Lá os exilados encontraram um
ambiente menos hostil à sua presença do que eles haviam deixado para trás no Brasil,
embora o governo chileno não tenha oferecido formalmente e de modo eficiente um
aparato para receber os exilados e inseri-los na sociedade chilena, como os perseguidos
políticos encontraram na França (MARQUES, 2011).
Para monitorar os brasileiros que viviam no exterior, foi criado o CIEX (Centro
de Informações do Exterior), órgão ligado ao Itamaraty e ao SNI (Serviço Nacional de
Inteligência) (MARQUES, 2011). O SNI monitorava através de espiões alocados no
Chile com o auxílio da polícia local os exilados políticos brasileiros. Os principais
59

objetivos dos agentes de espionagem alocados no exterior diziam respeito a um possível


retorno dos exilados; às campanhas de denúncia das violações dos direitos humanos e
pela anistia, com as reuniões dos exilados para traçarem os rumos do movimento; à
atuação dos brasileiros exilados e o monitoramento de suas viagens ao no exterior.
(MARQUES, 2011). Assim, o aparato repressivo brasileiro também buscou fazer-se
presente em território chileno, para fins de investigar e acompanhar os exilados políticos
que haviam deixado o Brasil e se estabelecido no Chile. Através de serviços de
espionagem e de mecanismos como o SNI, eram realizados o monitoramento dos
exilados políticos. A estrutura do serviço de inteligência era pequena e suas atividades
demandavam uma quantidade considerável de recursos e pessoal qualificado. A solução
para este problema foi contratar informantes dos países onde se localizavam os
perseguidos políticos, o que denota um forte indício de ligação entre os aparatos
repressivos brasileiros e chilenos e uma articulação internacional em favor dos militares
(MARQUES, 2011). Outro forte indício de ligação entre os aparatos repressivos chilenos
e brasileiros respalda-se no relato da presença de torturadores brasileiros nos episódios
ocorridos no Estadio Nacional com a deflagração do golpe de 1973. (PADRÓS, 2013).
Exilados detidos no episódio, relataram que ao serem detido no Estadio Nacional, foram
separados em subgrupos, sob o domínio de militares brasileiros consultavam arquivos e
álbuns de fotografias, a fim de identificar os presos, o que se infere que houve uma ação
prévia de monitoramento dos exilados políticos brasileiros em território chileno. A
Anistia Internacional recebeu denúncias sobre a presença de repressores brasileiros nos
fatos transcorridos no Estadio Nacional. A delegação da AI que deslocou-se a Santiago
em novembro de 1973 foi informada sobre a procura de exilados brasileiros por parte de
militares de seu país nos registros administrativos de entrada de presos políticos, assim
como de um curso de interrogatório proferido por instrutores brasileiros nas dependências
do Ministério de Defesa, assim como de casos de presos políticos brasileiros que foram
torturados por agentes compatriotas (PADRÓS, 2013). O Brasil foi o primeiro país a
reconhecer o governo da junta militar, liderado por Augusto Pinochet, antes mesmo de
consultar outros países, conforme o costume diplomático brasileiro (MARQUES, 2013,
60

p. 113). Nesse sentido, podemos inferir que o governo ditatorial de Emílio Garrastazu
Médici deu amplos apoios, antes, durante e depois do golpe chileno.
Como é possível observar, existiu uma variedade de atividades e ações conjuntas
entre a ditadura brasileira e as forças armadas chilenas e setores da direita civil dos dois
países que não se restringia apenas às atividades de espionagem e vigilância dos exilados
antes do golpe chileno. Dentre essas atividades entre aparatos repressivos e golpistas,
podemos destacar a ligação entre o IPES e a frente direitista chilena (BANDEIRA, 2008),
no que podemos denominar de transnacionalização de combate a oposição. Esta relação
entre esses dois agentes ainda permanecem, em certa medida, obscuras. Até os dias
atuais, não se dispõe de muitos dados sobre a participação do Brasil nas iniciativas que
visavam à desestabilização do governo de Allende, bem como no golpe ocorrido em onze
de setembro de 1973 (SILVA, 2011). Embora tenham sido pouco exploradas pelos
veículos de imprensa no período em que elas ocorreram (PADRÓS, 2013), existem
indícios de que os quadros ipesianos repassaram expertise aos empresários chilenos e as
frentes direitistas.
Acerca da cooperação para bloqueio das iniciativas da Unidad Popular, em artigo
do Washington Post, foi noticiado que grupos privados brasileiros teriam auxiliado e
financiado o movimento civil de resistência ao governo de Allende. A jornalista Marlise
Simmons identifica o grupo como sendo o IPES e cita o nome do engenheiro Glycon de
Paiva, que admite no artigo que teria auxiliado os adversários de Allende: “Expliquei-
lhes como os civis deveriam agir no preparo das condições para o golpe militar. A receita
existe e o bolo vai para o forno quando se desejar” (BANDEIRA, 2008).
A receita mencionada por Glycon de Paiva era a indução do caos através da
fomentação do descontentamento político e econômico, a propagação do medo do
comunismo entre os operários e os patrões e induzir atos terroristas se necessário fosse,
desestabilização econômica, política, propagação do medo relacionado ao comunismo
entre as camadas populares, organizações de manifestações de massa e o bloqueio
legislativo as medidas parlamentares de esquerda (PADRÓS, 2013) Os empresários
61

paulistas ligados ao IPES também teriam fornecido apoio financeiro aos grupos
empresariais chilenos entre eles, o maior jornal do país, El Mercurio (SILVA, 2010).
Além de transmitirem a seus pares chilenos a metodologia e expertise necessárias,
desenvolvidas pelos civis antijanguistas, para desestabilizar o governo de Allende, os
empresários ipesianos orientaram a criação no Chile do Centro para el Estudio de la
Opinión Pública (CEOP) (PADRÓS, 2013). Por iniciativa da união entre os setores
industriais e grandes proprietários de terra chilenos, esse instituto se transfigurou em
núcleo estratégico grevista e de bloqueios contra os projetos governamentais. Esse
instituto configurou-se como um importante mecanismo estratégico nos bloqueios contra
as iniciativas do governo chileno, assim como uniu setores civis anticomunistas e de
direita (BANDEIRA, 2013). Assim, podemos observar um ponto de similaridade
importante entre a trama conspiratória chilena e a brasileira: ambas possuíam em sua
esfera, tanto forças militares quanto civis.
O general Orlando Geisel, ministro da Guerra no governo Garrastazu Médici,
informou ao embaixador do Paraguai no Brasil que em breve o Chile cairia nas mãos dos
militares. Através dessa informação, podemos evidenciar o conhecimento da iniciativa
conspiratória no Chile por parte do Brasil. O Embaixador dos Estados Unidos em
Santiago, entre os anos de 1967 e 1971, Edward Korry afirmou no Comitê das Relações
Exteriores do Senado dos EUA que o “real apoio técnico e psicológico ao coup d’État
veio do governo militar do Brasil” (BANDEIRA, 2013. p, 414).
Sendo assim, se torna claro o exercício do soft power pela ditadura brasileira,
através do repasse de expertise via IPES – que a atuação na administração do governo
autoritário era notória, no auxílio direto e indireto na coibição das iniciativas comunistas
em solo chileno. Podemos inferir que além de auxiliar os adversários de Allende na
coibição das tendências comunistas representadas pela Unidad Popular, o auxílio do
IPES foi uma dentre várias iniciativas do regime autoritário brasileiro em coibir a ações
da militância brasileira em território chileno, que em sua condição de exilada, passou a
denunciar a repressão brasileira na imprensa chilena (MARQUES, 2011).
62

Por fim, podemos observar através da exposição deste trabalho, a criação de uma
frente empresarial militar, cujo principal objetivo era coibir as iniciativas de ampliação de
participação popular nos regimes democráticos, bem como de iniciativas sociais
propostas pelo governo de João Goulart. Essa frente empresarial militar ajudou a derrubar
a democracia e arquitetou um golpe de Estado, que marcaram um capítulo obscuro na
história nacional. Além de essa elite, personificada pelo IPES, ter elaborado propostas
administrativas, que foram incorporadas e postas à frente pelo governo autoritário
brasileiro, ela exportou o seu modelo e mecanismo de desestabilização que foram
utilizados em outros países em processos antidemocráticos, com legitimação do regime
ditatorial brasileiro, que forneceu apoio considerável para a viabilização de barreiras
contra os avanços socialistas no Cone Sul, como os ocorridos no Chile.
63

Conclusão

Ao longo desta monografia foi possível observar a relação estreita entre a


produção de conhecimento elaborada por estes mecanismos e a decisões políticas. Como
observamos, uma das principais características da produção elaborada pelos think tanks e
seus thinkers, é o de se posicionarem como agentes de operação de sentido, respaldados e
endossados por relatórios elaborados com dados e critérios científicos que ratifiquem a
aceitação de determinadas ideias e recomendações específicas. Embora se acredite que
desta maneira seu produto final seja respaldado pelo critério da neutralidade, é necessário
ponderá-lo à medida que determinadas experiências expõem controvérsias. Ao levar em
consideração, dentre outros fatores, as fontes financiadoras que tendem a influenciar ou
até mesmo definir a produção intelectual desses centros de pesquisa, torna-se primordial
averiguar quem são os financiadores dessas organizações, já que existe a possibilidade
dessas fontes determinarem suas atuações.
Embora profícua, a reprodução clássica do argumento de independência dos think
tanks é reducionista na medida em que negligencia os interesses em jogo na disputa pela
influência em políticas públicas. Mesmo não tendo sido um dos objetivos deste trabalho
investigar as fontes financiadoras (mas sim a atuação do IPES), podemos utilizar o caso
mencionado como exemplo da relação entre financiadores e think tanks, pois sua fonte
financiadora estava em plena consonância com a produção intelectual e os objetivos do
instituto.
64

A partir do que foi exposto ao longo deste estudo podemos afirmar que a
participação do IPES no processo que culminou nos acontecimentos de abril de 1964 foi
imprescindível, sendo uma tarefa árdua mensurar o alcance da atuação do instituto assim
como seus impactos na sociedade brasileira.
Como um think tank compromissado com suas pautas, o IPES obteve a
capacidade de intervenção na política, na sociedade e nas ações do Estado brasileiro e em
sua administração, a fim de salvaguardar seus interesses.
Averiguamos que a articulação ipesiana alcançou todo o segmento da sociedade
brasileira organizada, não se restringindo apenas às suas seccionais, organizações de
classe e grupos políticos de ação. Assim, sua fórmula organizacional, bem como sua
estratégia desestabilizadora, representou uma receita eficaz para as forças antagonistas
que articularam o golpe de estado contra o governo de Salvador Allende em 11 de
setembro de 1973.
Este caso representa um claro exemplo de como o regime autoritário brasileiro,
através de sua base ideológica, representada pelo IPES e seus quadros, repassaram a
“receita de bolo”, que havia obtido êxito no Brasil, a fim de viabilizar a repressão de
setores considerados revolucionários no Chile. Nesse sentido, averiguamos que o IPES,
por meio de seus quadros, auxiliou o processo golpista ocorrido no Chile ao exportar a
expertise necessária para a criação de um terreno fértil, onde as forças armadas e a direita
civil chilena pudessem atuar no Chile, de maneira similar ao ocorrido no Brasil.
O IPES - um think tank, representou um mecanismo bastante prolífico como o
maior orientador ideológico e responsável por fazer a ponte com ideias mais amplas e
contextualizá-las com o pensamento que estava em voga no cenário internacional do
período em que se deram suas operações.
Como observado, o produto final dos think tanks são as ideias e, como se
encontram em plano abstrato, muitas vezes, não é possível delimitar sua dimensão,
embora sejamos capazes de sentir seus efeitos.
Podemos constatar que a produção intelectual bem como o repasse de expertise
pelo IPES aos agentes contrários ao governo de Allende podem ser compreendidos como
65

um exercício do soft power, o que auxilia aos pesquisadores das Relações Internacionais
compreenderem de modo eficaz de que maneira essas organizações funcionam e qual é
sua importância para este campo do conhecimento.
Mediante o exposto neste trabalho, podemos aferir que, embora o caminho esteja
sendo pavimentado, ainda há muito que se debater sobre a temática dos think tanks e seu
papel na sociedade. Além disso, são notórias as tentativas em tentar listar as
características dessas organizações, sendo os trabalhos de Medvetz os que julgamos que
mais se aproximam de uma caracterização eficiente e menos contraditória, pois propõe
uma mudança de foco para as condições sociais que proporcionam a sobrevivência dessas
organizações, ao invés de tentar caracterizá-las. Corroboramos com o autor ao
compreender que tentar encaixar essas organizações em modelos teóricos tradicionais é
uma tarefa árdua na medida em que tais modelos não dão conta da multiplicidade das
atuações, da produção e dos meandros que são típicos desses mecanismos.
Ao abordar este tema, se torna compreensível por que uma solução autoritária foi
de algum modo aceita, pois setores significativos da sociedade, como a classe empresarial
e outros segmentos civis, apoiaram a derrubada de João Goulart. A capacidade de um
think tank de influenciar a política, os segmentos sociais e ainda exportar a sua fórmula
para que seja aplicada com objetivos similares no Chile, em um notório exemplo de
exercício do soft power, ficou clara através do exemplo do IPES. Nesse sentido,
compreendendo a importância e a magnitude destas relações estabelecidas entre o IPES e
o movimento antidemocrático chileno que resultou na retirada de Allende do poder
através de um golpe de estado, este trabalho se posiciona como um ponto de partida para
o desenvolvimento de pesquisas futuras a cerca deste tema. Enxergamos a possibilidade
de averiguar com mais detalhadamente a relação simbiótica entre estes atores, porém a
limitação natural imposta pelo formato deste trabalho monográfico nos instiga a
promover uma investigação mais profunda.
Por fim, podemos concluir que estudar os think tanks, como o caso do IPES,
significa refletir sobre o valor das ideias, do papel dos intelectuais e especialistas e sobre
sua relação com a política e o poder. Embora a relação entre política e conhecimento
66

exija reflexão e observação constantes, poder e conhecimento devem ficar juntos - por
uma questão de transparência, governabilidade e democracia.
67

Referências:
Páginas eletrônicas:
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