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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Faculdade Mineira de Direito

RELATÓRIO – SEMINÁRIO TEORIA DA SOCIEDADE E RISCO

ALUNA: Gabriela Queiroz Altino Silva

Este relatório tem por finalidade destacar os principais pontos das apresentações do Seminário
“Teoria da Sociedade e Risco” que aconteceu nos dias 19 e 22 de novembro.

1. Os paradoxos e a esfera do silêncio no Direito – Profa. Gisleule e Rane

Ao pensar na questão do paradoxo, primeiramente, percebemos que ele se faz presente –


por vezes, de maneira invisível – na prática cotidiana do Direito, a partir das indagações do
que é e o que não é Direito. Assim, quando pensamos nessas indagações, isso representa a
nossa ignorância/erro em relação justamente ao que seja o Direito. Alguns paradoxos se
fazem presentes o tempo inteiro, tais como foram pontuados: 1. Em Marx: sobre a
Constituição Francesa que elenca alguns direitos (educação, reunião, liberdade), mas
questiona-se a limitação do Direito por algumas “limitações”; 2. Hierarquização das normas:
estudos acerca do que são as fontes do Direito e sobre as inconstitucionalidades das leis –
regras que colidem com outras regras (aqui têm-se os paradoxos).
De toda forma, o paradoxo não é um defeito lógico, porque não é uma argumentação que
partimos de uma questão universal para chegarmos a uma conclusão particular (ou o contrário
– partir de enunciados particulares para chegar a uma conclusão geral). Quando partimos de
enunciados particulares, estamos diante da dedução e da indução, a conclusão que é geral,
perpassa nas questões particulares. A partir disso, surge então o que Luhmann define de “o
paradoxo e a terceira questão” – “a distinção que busca articular o paradoxo acaba sendo
transformada em um dispositivo de aprendizagem social-criativo dentro de um sistema
jurídico”. Portanto, ele insiste na ideia de que o paradoxo é extremamente criativo.
Partimos então para a tentativa de estabelecer uma relação entre paradoxo e silogismo.
Alguns termos do estudo do direito existem para contextualizar o ideário jurídico, porque há
uma hegemonia na crença de normas explícitas. A partir disso, as decisões são geralmente
tomadas através de padrões, premissas de fato, demonstrando que o direito é influenciado pela
ideia de que existem estruturas universais e permanentes aos quais ele sempre poderá recorrer.
É nessa retórica do discurso que sentimos a força persuasiva de se pensar pelas formas
silogísticas, ou seja, o silogismo para decisões de casos. Mas, na verdade, o que é silogismo?
É um raciocínio dedutivo que é estruturado formalmente a partir de duas premissas das quais
se obtém, por inferência, uma terceira (que será a conclusão). Então, frequentemente, esse
silogismo é apresentado como se fosse uma forma de decisão.
O nosso sistema jurídico é altamente codificado, mas em algumas situações encontram
ainda normas implícitas – como no caso narrado do Seguro, em que a o Tribunal cita
“estranha” a objeção da seguradora, ou seja, a norma implícita é “se a objeção parecer
estranha, o Tribunal desconsiderará”. Esse é um padrão que está presente em diversas
decisões jurídicas (padrão de não mencionar a norma, ou seja, de não mencionar a premissa
maior – implícita). Então a retórica está fundada no silêncio de não mencionar a norma e uma
esfera de explicitação verbal. Essa esfera do silêncio permite ao orador modificar o resultado
alegado da norma e adaptá-lo a cada situação. Além disso, as normas tácitas podem formar
um elo entre as regularidades emotivas ou valorações sociais e a racionalidade verbalizada.
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Pode-se também, ocultar a inconsistência de todo o sistema normativo – aproximando-se da
teoria do Rafaeli. Por fim, essa esfera de silêncio pode ser vista como uma ocultação de
paradoxos do Direito. De forma geral, a teoria do Direito busca propor soluções para os
problemas apresentados.

2. A Monstruosidade (em Kafka e Coringa), racismo de Estado e Sociedade – Rane


e Renata

Uma primeira posição entre a aproximação entre Direito e Literatura é puramente


metafórica e, desta forma, não essencial. Todavia, ainda que fosse tão somente metafórica, a
aproximação já seria produtiva, porque a literatura preserva a capacidade criadora da
linguagem. A utilidade dessa aproximação é a de levar o jurista para um campo ético, não
apenas construindo imagens para entender a realidade. Além disso, o Positivismo Jurídico
permite tão somente um âmbito descritivo da realidade. Portanto, a partir da Literatura torna-
se possível uma melhor compreensão do Direito, na medida em que se utiliza do instrumento
da narração.
Para Rafaeli de Giogi, não é possível pensar o Direito fora da sociedade, porque ele é uma
produção dela – e essa sociedade moderna é tida como uma sociedade de risco. A
aproximação mais que metafórica entre o Direito e a Literatura se faz presente no momento
em que a ciência se faz poesia.
O estudo da monstruosidade permite algumas abordagens sobre as questões legais e
jurídicas que são, por vezes, difíceis e, com isso, tendo as metáforas, elas nos permitem
compreender a realidade de forma mais clara. A literatura fala muito através das imagens –
sendo consideradas imaginações, mas nunca ilusões. O monstro, nessas situações, almeja
cumprir o papel político, na manutenção de normas sociais. Então, percebemos que existe um
padrão e tudo que não o segue, é tido como monstruoso e transgressor. Fazendo-se um
paralelo com o livro de Kafka, percebe-se que o personagem principal faz diversas reflexões
acerca do que ele é e do que ele se mostra (um inseto gigante que causa estranheza às
pessoas). Então, ele é tido como um monstro porque ele não se encaixa nos padrões familiares
da sociedade, ou seja, tudo que foge do padrão, é considerado inadequado. Já em relação ao
filme Coringa, o personagem principal, tendo escolhido a profissão de palhaço, tenta lidar
com seus problemas pessoais através da sua atuação – assim, essas inadequações do
personagem principal, faz com que ele seja despersonalizado, sendo transformado em
Coringa. De forma geral, essas passagens nos colocam para refletir acerca da construção
desses monstros.
Percebe-se que a sociedade delimita os padrões e comportamentos que caracterizam os
monstros e os não monstros. Nessa perspectiva, surge o conceito de “Racismo de Estado” que
serve para definir quem é o monstro, o normal, o padrão, etc. O racismo é um mecanismo que
sustenta o biopoder, adicionando a palavra Estado a esse conceito, tem-se que significa a
ameaça de um povo por uma criação – o racismo não é uma ameaça real e sim algo inventado
– para dominar outro grupo que pertence a esse mesmo Estado. O racismo de Estado opera,
então, no sentido de criar ameaças para dividir e conquistar e, consequentemente, dominar.
Cabe à sociedade combater essa divisão e essas padronizações.
A sociedade moderna é uma sociedade de risco porque somente ela cria condições para
construir futuros diferentes – eventos e possibilidades que pode ou não acontecer. Assim, para
justificar uma pretensa segurança, a sociedade cria então os monstros, mas ela não existe, mas
os somente os riscos.

3. O Direito na Sociedade de Risco: questões de gênero


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A ideia da discussão será centrada na ideia de inclusão e exclusão. Os problemas estão
além daquilo que a sociedade nos oferece; dessa forma, os riscos causados pelo homem
podem ser mais importantes do que aqueles causados pela natureza. Atualmente, até que
ponto discutir as questões de gênero constituem uma questão de risco na sociedade? Hoje
temos a temporalização do não saber, fazendo com a inclusão e a exclusão racionalize a
incerteza.
No nosso plano de pós-modernidade, recuperamos o homem sacro-romano, seres que
possuem vida nua de Direito. A teoria do biopoder nos mostra quem são esses homens sacros:
aquele sobre o qual o corpo político dos seres seria capturado pelo Estado, ou seja, os corpos
estariam à disposição do Estado, cabendo a ele determinar o seu destino biológico. Toda a
sociedade decide quais sejam seus homens sacros. Então, a tese defendida é que as mulheres
são tratadas como esses homens sacens – porque o território político do que constitui o direito
das mulheres é o próprio corpo delas. É difícil, atualmente, fazer com que o Estado altere suas
políticas para respeitar o corpo biológico das mulheres (ex.: dificuldade em descriminalizar o
aborto).
O abuso físico dessas mulheres é um lembrete dessa dominação territorial, que ocorre de
diversas formas – o corpo feminino é capturado e condicionado a uma vida nua de direitos.
Fazendo um contraponto, Rafaeli faz uso das sociedades das montanhas: linha do leite e linha
do sangue. Para exercer o direito de reciprocidade, somente poderia ser exercido por alguém
da linha de sangue (representado por indivíduos do sexo masculino ou por mulheres que eram
autorizadas a se portarem como homens). A partir disso, nessa sociedade, de inclusão e
exclusão, percebemos que para ter direito, as mulheres precisam se “transvertir” de
masculino.

4. As normas fundamentais do processo na perspectiva da Teoria dos Sistemas -


Carolina

A ideia principal é contrapor os dois pontos de vista: normas gerais do processo e a visão
da Teoria do Sistema. O direito, de acordo com o pensamento jurídico, é um conjunto de
normas que disciplina a vida em sociedade. O estado soluciona os conflitos sociais, por meio
da aplicação das normas aos casos concretos. O processo serve para regular o meio de solução
dos litígios – instrumento de aplicação das normas do Direito. Para que todos tenham o
tratamento adequado, as normas fundamentais do processo são dispostas.
O Estado Democrático de Direito garante o devido processo legal: contraditório e ampla
defesa – as partes participam efetivamente da parte judicial, contribuem a todo momento. Faz-
se necessário pontuar algumas normas fundamentais do processo: livre acesso ao judiciário -
nenhuma lesão será excluída, ou seja, todos os indivíduos que sentirem que os direitos foram
ameaçados, podem levar ao Judiciário; duração razoável do prazo - ele deve correr no tempo
justo; princípio da boa fé - aqueles que participam do processo devem agir com idoneidade.;
cooperação entre os sujeitos do processo - todas as pessoas que participam efetivamente do
processo, tem que trabalhar juntas e colaborar para a solução do processo; contraditório e
ampla defesa (um dos mais importantes) - direito que as partes tem de responder àquela
demanda que foi colocada (produzir provas, por exemplo).
De acordo com o pensamento jurídico, todas essas normas, são um meio de proteção dos
direitos individuais, ou seja, resguardar os direitos sociais (Art. 8º, CPC) – ao aplicar o
direito, a finalidade é resguardar os direitos individuais. Contrapondo a isso, apresenta-se o
Direito como Sistema Social. O Direito é um sistema seletivo, sendo autorreferencial,
autopoiético (apesar de existir um entorno no sistema, ele olha para si mesmo, ele cria-se a
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partir de si próprio).
A partir dessa perspectiva, as normas fundamentais do processo não seriam elaboradas
para atingir o fim social e sim manutenção e perpetuação do próprio sistema. Assim, elas
seriam criadas para assentar as expectativas e reduzir as complexidades e, então, manter o
próprio sistema. A punição do crime, para o ordenamento jurídico, é um temor para os outros.
Para o Rafaeli, isso não tem nada de realidade, porque a aplicação da pena é uma seletividade
do sistema jurídico (licito/ilícito). A finalidade primordial da aplicação da pena, seria a
manutenção do próprio sistema. Então, é o agir em prol do fortalecimento do sistema. As
normas fundamentais do processo servem ao próprio sistema, e essa redação de maneira mais
ideológica busca atender as expectativas da sociedade, mas pode ser que seja um
assentamento de expectativas. 

5. Representatividade adequada sob a perspectiva da Teoria dos Sistemas - Natália

Representativa adequada é um instituto do processo coletivo. Processo é um


meio/forma de resolução de conflitos. Ele tem diversas teorias para explicá-lo. Precisamos
saber que o processo não pode ser visto fora da constitucionalidade democrática. É uma
instituição constitucionalizada que vai assegurar os direitos fundamentais. O processo coletivo
pressupõe o processo individual - a diferença básica reside no direito a ser discutido no
âmbito do processo, depende do bem objeto de tutela no processo. O art. 81, CDC, estabelece
os direitos coletivos - inciso I trata do direito difuso (meio ambiente por excelência), o inciso
II trata do direito coletivo strito sensu - titularizado por uma categoria definida. 
O processo coletivo é estabelecido pelo microssistema (sistema reduzido), porque o
nosso processo individual é disciplinado pelo Código de Processo. Por outro lado, o coletivo é
estruturado a partir de uma coletânea de legislações – são três: lei da ação popular, lei da ação
civil pública (ACP) e Código de Defesa do Consumidor. 
O instituto da representatividade adequada significa uma
representatividade/legitimidade para propositura da ação. Significa que o nosso modelo, como
os outros do mundo, escolhe um modelo representativo para propor ações. Assim, não se
permite que o titular do direito proponha a ação. Quem propõe a ação é um representante (no
caso, adequado). Eles estão descritos no art. 5 da lei de ACP. O contrário desse modelo é o
participativo (assegura que o titular do direito participe do processo). 
A Teoria dos Sistemas objetiva explicar o funcionamento da sociedade. Apresenta
duas matrizes: teoria dos atos humanos da sociedade e teoria dos Sistemas Biológica. Todo
sistema tem uma função e estrutura próprias (capitalismo, democracia, etc). O direito funciona
como um estabilizador de expectativas, a função do direito não é promover justiça. Para isso,
ele tem uma estrutura própria (fórum, tribunais, magistratura, legislações). Então essa função
faz com que entendamos as próprias decisões do STF – auto-sobreviência do sistema. O
sistema está sempre de olho em si mesmo (autorreferencial) e visa sua auto sobrevivência.
As contingências estão presentes no sistema, então elas devem ser superadas ou se não
o sistema acaba. O funcionamento do sistema é através de códigos, através da linguagem,
sendo explícitos ou implícitos. O direito preocupa-se com si mesmo. Por fim, como o sistema
não existe de forma isolada, relaciona-se com o seu entorno, possibilitando a superação de
contingencias. 
O Processo coletivo como subsistema do direito: a representatividade adequada é um
nome diferente para esconder o que não pode ser visto, porque ela não permite a participação
do titular do direito. Então, indaga-se se o representante adequado tem a capacidade de
entender as ações que devem ser propostas.
    O capitalismo trata o cidadão como consumidor, ou seja, uniformiza cada um como
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consumidor. Então, essa teoria atua como o capitalismo, porque uniformiza as complexidades
e reduzir as expectativas. O código explicito da representatividade adequada: os entes (MP,
defensoria) são os mais bem preparados para serem representantes. Já o código implícito é
representado pela uniformização do cidadão. 

6. Jurisprudência defensiva e Teoria dos Sistemas 

Jurisprudência defensiva, pensamos em direito de recorrer e seus requisitos, previsto


na CF. Para exercer esse direito, a legislação traz alguns requisitos, relacionados ao direito de
recorrer e seu exercício: cabimento, legitimidade, interesse de recorrer, inexistência de fatos,
tempestividade, regularidade formal, custos recursais. Temos as instâncias para recursos. A
jurisprudência defensiva acontece nas instâncias dos tribunais superiores.
O papel desses tribunais: STF – guarda da Constituição, cabendo-lhe o zelo pela
observância das normas constitucionais; STJ – questões infraconstitucionais.  O problema é o
grande número de processos que chegam a essas instâncias – chega a ser um paradoxo,
porque é tribunal que busca o julgamento de recursos, mas há poucos ministros. Então nas
últimas décadas, esses tribunais observaram um crescimento vertiginoso de processos. Fez-se
necessário, então, criar empecilhos para o recolhimento de recursos: criou-se as
jurisprudências defensivas, objetivando eliminar recursos. "Eliminar processos porque eles
são um mau”. Entre as medidas utilizadas, tem-se o recurso prematuro e o não
reconhecimento por ausência de assinatura do advogado na peça defesa. 
Fazendo-se uma análise da Teoria dos Sistemas, historicamente, ela nasceu com base
na Teoria Biológica de Maturana e usou os termos autopoeiese e alopoeise. Na teoria
biológica, o sistema é construído por seus próprios componentes e a interação e transformação
seriam independentes. Já para a teoria dos Sistemas de Luhmann, a interação entre sistema e
ambiente é necessária para a reprodução autopoética.
A relação entre a jurisprudência defensiva e a Teoria dos Sistemas se dá na alopoeise.
Conforme visto, os tribunais superiores criam mecanismos para diminuir a quantidade de
processos que tramitam em suas instâncias. Ao agir dessa forma, desconsidera o texto legal,
permitindo a invasão de códigos-diferença diversos. Percebe-se, que nesse caso, há uma
corrupção sistêmica, porque o direito fica subordinado em um critério meramente
administrativo. Assim, os interesses dos tribunais buscam se impor à margem dos
procedimentos constitucionais, impedindo, dessa forma, a operacionalização do direito.

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