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COLEÇÃO DE TEXTOS DA

LÍNGUA PORTUGUESA MODERNA

LITERATURA
POPULAR EM VERSO
ANTOLOGIA
TOMO H

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA


FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE REGIONAL DO NORDESTE
LITERATURA
POPULAR EM VERSO
ANTOLOGIA
TOMO 1
FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA

Rua São Clemente, 184 — Rio de Janeiro — Brasil

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE REGIONAL DO NORDESTE

Av. Floriano Peixoto, 718 — Campina Grande — Paraíba


COLEÇÃO DE TEXTOS DA
LÍNGUA PORTUGUESA MODERNA
4 |

LITERATURA
POPULAR EM VERSO
ANTOLOGIA
TOMO IH

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA


FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE REGIONAL DO NORDESTE
PREFÁCIO

Sob o titulo genérico Literatura Popular em Verso, a


Casa de Rui Barbosa já publicou três volumes que são hoje
indispensáveis a quem quer que se proponha a conhecer a
originalissima literatura de cordel brasileira.
Queremos referir-nos ao Catálogo, aparecido em 1961,
com indicações bibliográficas e específicas de nada menos
de mil folhetos desse fascinante gênero literário; à Anto-
logia, publicada em 1964, em cuja introdução o saudoso
M. Cavalcanti Proença, que a organizou, advertia que, no
caso, “antologia” não tinha o “clássico sentido de flori-
légio', mas era antes uma apresentação geral dos poemas
populares, com amostras dos vários gêneros e tipos de
que o organizador tinha noticia pela leitura de um mate-
rial bem mais vasto e abrangente do que os mil folhetos
arrolados no Catálogo; e finalmente o volume de Estudos,
aparecido em 1973, que inclui trabalhos da mais alta ca-
tegoria sobre aspectos peculiares dessa curiosa manifestação
artística do nosso povo, florescente sobretudo na área que
se estende da Bahia ao Pará.
Ágora, dando prosseguimento às suas publicações, a
Fundação Casa de Rui Barbosa, em convênio com a Fun-
dação Universidade Regional do Nordeste, lança este vo-
lume, que reproduz, em edição fac-similar, doze folhetos
VIH
do grande poeta popular nordestino Leandro Gomes de
Barros.
O Centro de Pesquisas da Casa de Rui Barbosa possui
hoje uma das maiores coleções de poemas desse rapsodo
paraibano, cujas edições, na maioria, foram tiradas ainda
pelo próprio Autor.
Graças ao interesse manifestado pela Universidade Re-
gional do Nordeste, com sede em Campina Grande (Parai-
ba), foi possível fazer a edição deste volume, que reproduz
apenas pequena parte da coleção de obras de Leandro Go-
mes de Barros carinhosamente guardadas pela Casa, sob o
olhar vigilante e não de todo isento de ciúme de Anna
Maria Serpa Barroso, Chefe da Seção de Filologia.
Como o tratamento do texto dos folhetos de literatura
de cordel envolve problemas lingúísticos e filológicos da
maior complexidade, que hoje, depois da morte de M. Ca-
valcanti Proença, poucos especialistas patrícios teriam dis-
posição de enfrentar, preferiu-se fazer uma edição fac-
similar, sem notas nem comentários. O título de Antologia
tem ainda o mesmo sentido que Proença deu ao volume
aparecido em 1964: menos do que um florilégio organizado
de acordo com o critério de qualidade, é antes simples
amostra da poesia de Leandro, poeta que, segundo consta,
deixou mais de mil folhetos publicados. O critério adotado,
da ordem alfabética do primeiro titulo, poderá parecer
jalho e insatisfatório. Tratando-se, porém, de uma edição
fac-similar, qualquer outro revelou-se inviável, pois us fo-
lhetos de Leandro reúnem, às vezes, dois ou mais titulos,
não sendo possível, assim, tentar uma organização temática
ou de qualquer outra natureza. A idéia de reproduzir os
folhetos em ordem cronológica teve, também, de ser afas-
tada, uma vez que muitos deles não trazem data de publi-
cação.
VIII
Esta edição tem a valorizá-la a “Introdução à Obra de
Leandro Gomes de Barros”, de autoria do escritor Ho-
rácio de Almeida. Grande colecionador e estudioso da li-
teratura de cordel, além de conterrâneo do poeta, nada mais
justo do que fosse ele convidado para apresentar aos lei-
tores o autor dos folhetos aqui reproduzidos. Autodidata
de extraordinário valor, cujo esforço fora do comum no
sentido de adquirir cultura está relatado em páginas que
sobretudo os moços entediados e amolecidos pela vida fácil
deveriam ler e meditar!, a Horácio de Almeida, per-
cuciente intérprete do drama de Augusto dos Anjos, não
faltou sensibilidade para compreender a poesia de Leandro
Gomes de Barros. De resto, tivesse permanecido no meio
em que nasceu, e talvez ele próprio fosse hoje um êmulo
de Leandro, para o que não lhe faltariam imaginação
verve.
Com este volume, a Casa de Rui Barbosa e a Uni-
versidade Regional do Nordeste contribuem para a maior
divulgação, em sua feição original, de um dos mais típicos
representantes da literatura de cordel no Brasil. Desde-
nhados pelos príncipes do nosso Parnasianismo, que não
queriam sujar seus punhos engomados no manuseio de fo-
lhetos tão pobremente impressos, esses ingênuos repentis-
tas são hoje valorizados exatamente porque em suas obras
é possível surpreender traços ainda autênticos, ainda não
desvirtuados, do caráter do nosso povo.
Agradecendo à Universidade Regional do Nordeste
sua valiosa colaboração, só nos resta esperar que o seu

1 ALMEIDA, Horácio de. “Ao Redor de Mim Mesmo” in —.,


Augusto dos Anjos. Razões de Sua Angústia. Rio de Janeiro,
Gráfica Ouvidor Editora, 1962.

IX
exemplo seja seguido por outras entidades culturais, para
mais ampla difusão do precioso acervo da Casa de Rui
Barbosa, não só no campo da literatura de cordel, mas
em vários outros.

Rio de Janeiro, 25 de fevereiro de 1976.

Homero SENNA
Diretor do Centro de Pesquisas
INTRODUÇÃO À OBRA DE
LEANDRO GOMES DE BARROS

O Nordeste é a região mais rica do Brasil em poesia


popular. Ali nasceu e se desenvolveu a literatura de cor-
del. Dali se expandiu para outras partes do território na-
cional. Vem de muito longe essa manifestação da inteli-
gência brasileira, gerada pelo cruzamento das raças e fa-
vorecida pelas condições do meio. Em nenhuma outra
região jorrou com mais intensidade o estro do povo, numa
literatura que tem caracteristicas peculiares e que flutua
com a mesma autenticidade entre os mais variados temas.
A princípio, os poemas circulavam anônimos, em có-
pias manuscritas, sobre o gênero pastoril, atividade es-
sencial do sertão. Romances e xácaras enchiam de en-
cantamento a vida simples do sertanejo. O boi passou de
elemento básico da economia nordestina a tema de litera-
tura. Forneceu matéria para um cancioneiro dos mais
típicos, tantas foram as estórias rimadas em que aparece
como personagem principal. Destacam-se entre outras as
do Rabicho da Geralda, Boi Espácio, Boi Barroso, Boi Su-
rubim, Boi Pintadinho, Boi Mao-de-Pau, Boi Moleque,
Boi Adão, Boi Vitor e a Vaca do Burel.
Os bardos decoravam a versalhada para as delícias do
povo nos ajuntamentos festivos. Com ou sem acompanha-
mento de pandeiro ou viola, cantavam os poemas com
emoção, numa toada que tanto refletia o cunho lírico como
o heróico. Narra José de Alencar que as lágrimas lhe
caíam das faces, no seu tempo de menino, quando ouvia
o vaqueiro da fazenda, em tom merencório, cantar o poe-
ma do Boi Espácio. O bicho famanaz, como nas antigas
prosopopéias, contava a sua própria desventura.
Não havia ainda a chamada literatura de cordel. A
poesia brotava espontânea da boca do povo, em forma
de louvação ou de duelo verbal. Ao duelo dava-se o nome
de peleja ou desafio, espécie de combate poético.
O mais célebre de todos esses combates foi o travado
entre Inácio da Catingueira e Romano da Mãe d'Água,
em Patos, sertão da Paraiba, 1874. Fragmentos dessa pe-
leja foram repetidos por outros cantadores, com desfechos
contraditórios. E conquanto cinco versões se conheçam,
discrepantes entre si na conclusão, a vitória coube ao ge-
nial Inácio da Catingueira, escravo de Manuel Luis, con-
forme pesquisa feita pelo escritor Manuel Otaviano.
Só no final do século XIX, quase ao limiar deste, apa-
receram impressos os primeiros folhetos de cordel. O pio-
neiro desta iniciativa foi Leandro Gomes de Barros. Con-
vém insistir na afirmação a fim de dissipar as nuvens
fumarentas que pairam sobre o assunto.
Segundo Mark Curran, já havia folhetos impressos
quando Leandro iniciou a publicação de sua obra. Isso
ele escreve, um tanto vacilante, como mostra o tópico de
seu livro para aqui transcrito:

“Leandro Gomes de Barros foi, senão o primeiro, com


certeza o mais importante dos poetas populares da litera-
tura de cordel do Nordeste do Brasil. Ele foi um dos
primeiros poetas a escrever e imprimir os poemas curtos
e vendé-los nas feiras do Nordeste. Os poemas, impressos
em pequenos folhetos, já existiam no tempo em que Lean-
dro começou a publicar a sua obra, mas, em quantidade
pequena”. (4 Literatura de Cordel. Universidade Federal
de Pernambuco, 1973, p. 11).

Se é verdade que já existiam impressos folhetos de


cordel quando Leandro começou a publicar a sua obra,
cabia ao autor dar uma comprovação do que afirma.
Quem, então, antecedeu a Leandro? É sabido que no seu
tempo havia cantadores famosos, nomes de guerra, já fei-
tos na arte do desafio, como Silvino Pirauá, Josué Ro-
mano, Bernardo Nogueira, Serrador, Manuel Cabeceira,
Manuel Riachão, Luis Dantas Quesado, Preto Limão, João
Martins de Ataide e Francisco das Chagas Batista.
Destes, bem poucos publicaram folhetos e nenhum
publicou antes de Leandro. O próprio Chagas Batista, ami-
go e conterrâneo do poeta, diz que ele “foi o fundador
da popular literatura poética de cordel no Nordeste”
(Cantadores e Poetas Populares, p. 114).
Leandro Gomes de Barros não foi apenas o primei-
ro, foi o maior de todos os poetas populares do Brasil.
Desbravador de uma seara nova, a da publicação dos fo-
lhetos, nenhum outro lhe arrebatou a palma na quanti-
dade e qualidade da obra divulgada.
Nasceu no municipio de Pombal, sertão da Paraiba,
a 19 de novembro de 1865, mudando-se para Teixeira,
ainda menino, levado por seus pais. Em Teixeira, terra
paraibana de boa fama por seus poetas e valentões, co-
nheceu certamente os notáveis cantadores Ugolino Nunes
da Costa, Bernardo Nogueira, Josué Romano e Germano
da Lagoa, que ali davam dia santo. Francisco das Chagas
Batista também era de lá. Devia ser muito menino quando
Leandro, ainda adolescente, partiu de Teixeira para Per-
nambuco, com escala por Vitória de Santo Antão e Ja-
boatão, antes de fixar-se no Recife.
Caboclo entroncado, de bigode espesso, alegre, bom
contador de anedotas, este o retrato que dele faz Câmara
Cascudo em Vaqueiros e Cantadores. Foi poeta a vida
toda. Disso viveu, escrevendo e publicando folhetos so-
bre os mais variados assuntos.
Todos os temas versou. No heróico, fez poemas so-
bre cangaceiros, peleja de cantadores, os martírios de Ge-
noveva, etc. No novelesco, Branca de Neve, o Boi Miste-
rioso e o homem que subiu de aeroplano até a lua. No
satírico, a cachaça, a dor de barriga de um noivo, a mu-
lher do bicheiro. No social, o retirante, o dez-réis do
Governo, o aumento dos impostos. No religioso, o diabo
confessando um nova-seita, o milagroso do Beberibe, como
João Leso vendeu o Bispo. Nos fatos do dia, o cometa,
a hecatombe de Garanhuns, o Presidente Afonso Pena.
Na ressurreição dos romances de cavalaria, a Batalha de
Oliveiros com Ferrabrás, a Prisão de ÓOliveiros, a Donzela
Teodora.
Como poeta satírico não teve igual. Metade de sua
obra descamba para o picaresco. Ele próprio se tinha na
conta de humorista, conforme este improviso recolhido por
Luis Gil e publicado por Egidio de Oliveira no n.º 1 da
revista Áriús, 10 de outubro de 1952, Campina Grande,
Paraiba:

“Leandro Gomes de Barros,


Escritor paraibano,
No ofício de escrever
+rabalha com calma e plano,
Tem fama de repentista,
Escritor e romancista,
Tem folhetos mais de mil,
É ainda no Brasil
O seu primeiro humorista.”
A afirmação de que tem mais de mil folhetos deve
passar como força de expressão. Ninguém sabe ao certo
o montante de sua obra, porque muita coisa se perdeu,
mas orça por algumas centenas. Também não se sabe
quando saiu publicado o seu primeiro folheto de cordel.
Difícil apurar essa posição do autor em face de sua obra.
Os folhetos, em geral, não trazem a data da publicação.
É possível, contudo, situar o primeiro ao redor de 1898,
quando o autor já estava morando no Recife. Muitos
dos folhetos foram reeditados sem indicação de nova edi-
ção, o que torna mais difícil saber qual o primeiro.
A Bibliografia Prévia de Leandro Gomes de Barros,
publicada pela Biblioteca Nacional em 1971, relaciona 237
títulos de sua obra, em edições autênticas. A maior porção
pertence ao Centro de Pesquisas da Casa de Rui Barbosa.
A parte restante fica distribuída entre a própria Biblio-
teca Nacional, a Discoteca Pública Municipal de São
Paulo e alguns colecionadores particulares. Além de outros
méritos, tem o aludido trabalho o de restabelecer a auto-
ria do poeta em muitos títulos de sua obra, usurpados por
editores inescrupulosos.

Cada folheto de Leandro, tirado em vida do autor ou


logo após sua morte, edição do seu genro Pedro Ba-
tista, contém dois ou mais poemas. Era de seu sistema
deixar inacabados os poemas num folheto para dar conti-
nuidade noutro, com o que visava a manter preso o leitor.
Assim fazia porque vivia do produto de sua obra. En-
quanto lançava uma nova, reeditava outra das conheci-
das, sendo ele próprio o autor, o editor, o distribuidor,
Os agentes vendedores expunham os folhetos à venda
pendurados em cordão, como fazem os engraxates com as
revistas ou bilhetes de loteria, em suas tendas de trabalho.
O público para essa espécie de leitura era o povo,
o zé-povinho, que esgotava as edições. Era a sua única
leitura, muito gostosa, pois lia e entendia. Os mais de-
sembaraçados faziam roda de ouvintes e tanto isso acon-
tecia na bagaceira dos engenhos como no alpendre da
casa, entre os vaqueiros do sertão.
Os letrados da época menosprezavam esse tipo de li-
teratura. Nenhum devoto do classicismo ia descer do seu
pedestal para ler versos rústicos, sem gramática, escritos
por poetas semi-analfabetos. Aquilo era leitura para tro-
peiros, para versejadores de igual jaez. Deslembravam-se
ou simplesmente ignoravam que o romanceiro no Brasil
vinha tendo defensores, embora escassos, desde Silvio Ro-
mero, como tivera em Portugal na voz autorizada de Gar-
rett, seguido de Teófilo Braga.
No tempo de Leandro desconhecia-se a expressão li.
teratura de cordel.
Quem pôs então essa denominação? Ninguém aparece
como autor. O) povo é que não foi, porque o povo nunca
chamou cordão de cordel, palavra de uso restrito no Brasil.
Barbante ou ponte de linha era como se denominava o
cordão no qual se cavalgavam os folhetos.
Por incrível que pareça, a coisa veio de Portugal.
Aulete, na primeira edição do seu Dicionário Contemporá-
neo, 1881, verbete cordel, alude às farsas do cordel, que
eram expostas à venda debaixo das arcadas, penduradas
em cordéis. Antes dele, nem Vieira, nem Roquete, nem
Lacerda, nem Faria, nem Constâncio, nem Morais, nem
Bluteau, emprestaram ao vocábulo o sentido que lhe foi
atribuído.
Vê-se, portanto, que a expressão farsa de cordel e,
por extensão, literatura de cordel, não é tão antiga como
pretendem alguns estudiosos da literatura popular. Um
deles, de conceito entre os letrados do Brasil, chegou a
afirmar, em publicação recente, que a poesia de cordel
veio na bagagem dos colonos portugueses. É incrível que
isso se afirme quando o assunto começa a ser encarado
com seriedade. O que veio na bagagem dos colonos, im-
porta que se diga, foi a poesia ultramontana dos árcades,
que não germinou no solo pátrio porque é obra de imi-
tação, sem laivos de originalidade. Da literatura de cor-
del só o título veio de Portugal, importação recente, posto
não se saiba como ou quando chegou.

Conforme já foi dito, a poesia tradicional do Nor-


deste apareceu com a temática do boi. Ora, isso jamais
podia ter vindo de Portugal, porque é um reflexo da nossa
economia, diga-se melhor, da economia sertaneja do Nor-
deste, com as festas de vaquejada, a queda de rabo, as
corridas tresloucadas por dentro do mato fechado. O boi
bravio quando dispara domina-o o vaqueiro que sobre
ele se precipita, montado no seu campeiro de confiança
e só dá por finda a tarefa quando o derruba. Corre o
boi na frente e o vaqueiro no seu mocotó, como neste
passo da cpriosa rapsódia do Rabicho da Geralda:

“Tinha adiante um pau caído


Na descida do riacho,
O cabra saltou por cima,
O ruço passou por baixo.”

Leandro Gomes de Barros não podia permanecer in-


diferente ao romanceiro do boi. Contribuiu com o seu
poema — O Boi Misterioso — publicado em 1912 e ree-
ditado por João Martins de Ataíde, em 1939, o qual apa-
rece como autor da obra. O acróstico Leandro, na úl-
tima estrofe, apresenta-se alterado.
Esse boi misterioso de Leandro nasceu na grande seca
de 1825, na Fazenda Santa Rosa, filho de uma vaca feiticei-
ra. Ainda bezerro, amoitou-se no mato, confins da pastagem,
e quando o vaqueiro o viu, já boi feito, esporeou o alazão
em cima dele, mas foi trabalho perdido. Voltou derro-
tado, sem saber que história contasse ao patrão. Nunca,
em toda sua vida, tinha visto coisa igual. O bicho se fez
nos cascos e foi-se,
A fama do boi correu mundo. Quarenta vaqueiros
dos mais afamados de todo aquele sertão baixaram o to-
pete atrás dele. Ninguém chegou jamais a tocar com a
mão na vassoura do animal. Depois foi que se viu o en-
gano. Só sendo mesmo coisa do tinhozo, como ficou pro-
vado.
Um dia o boi desencantou-se, quando um vaqueiro das
bandas lá do Mato Grosso, vinha que vinha vindo em
cima do bicho preto, já a ponto de agarrá-lo pela cauda.
Todo mundo viu quando os dois iam passar pela encruzi-
lhada de dois caminhos dentro da caatinga. Pois foi aí,
num sofragante, que o bicho sumiu. Subverteu-se de terra
adentro para nunca mais. Não era boi, era a figura do
cão.
Tanto na literatura folclórica como na de cordel o
diabo costuma aparecer em forma de animal, principal
mente, na do bode, que é o seu preferido. Toma, às vezes,
a forma de boi, de cavalo, de gato, até mesmo de homem,
neste caso ocultando o rabo e os chifres, como na me:
morável peleja de Riachão com o diabo, de autoria de
Leandro.
Alguns anos depois de Leandro, outra história fabu-
losa de boi entrou para o rol das conhecidas. Foi a de
Luis da Costa Pinheiro, intitulada História do Boi Man-
dingueiro e o Cavalo Misterioso, em dois folhetos, de 32
páginas cada. Essa história o autor publicou em 1942, mas
foi reeditada sete anos depois, 1949, por José Bernardo
da Silva, que chama a si a autoria da obra.
Na poesia de cordel está a naturalização da nossa li-
teratura. Os temas são genuinamente brasileiros, como o
boi, o cangaceiro, o jogo do bicho, as lendas populares,
a cachaça, as lutas politicas, o padre Ciço, as pelejas entre
cantadores, os dramas de amor, as ações heróicas, etc.
Uma ou outra vez o poeta vai buscar assunto na li-
teratura universal, como fez Leandro Gomes de Barros ao
escrever a história de Pedro Cem. na realidade Pedro Sem,
da Donzela Teodora, da Batalha de Oliveiros com Ferra-
bras, da Prisão de ÓOliveiros, etc. Cada um desses temas
teve seu veículo de informação. Pedro Cem foi um dra-
malhão que fez sucesso nos teatros do Nordeste, histó-
ria de um homem muito rico e orgulhoso, coração duro,
que acabou pedindo esmola. A Batalha de Oliveiros e de-
mais temas do ciclo carlovingio foram tirados do livro de
Carlos Magno, que circulou nos principios deste século
por todos os lugarejos do Brasil.
Há, entre os temas legendários, um de feição particular
dos poetas populares. Trata-se de Pedro Malasartes, enti-
dade mítica, meio homem, meio diabo, que está sempre a
fazer travessuras. Aparece com nomes vários, na litera-
tura de cordel, ora Pedro Malasartes, ora Pedro Quengo,
ora João Quengo, ora Cancão de Fogo.
Leandro fez o testamento de Cancão de Fogo, ente
dotado de suprema velhacaria, natural da Paraiba, que a
todo mundo enganava. Tinha sete anos de idade quando
foi arrastado pela correnteza de um rio. Estava morre
não morre, quando viu passar um cavalo morto. Saltou
para cima dele e disse, agora estou embarcado. Ladrão
não era, mas praticava toda sorte de estradeirice. Até
delegado de polícia caia nas lábias dele.

Os folhetos de cordel, impressos em papel ordinário,


no formato de 16 X 11 cm, estavam fadados a curta du-
ração. (O matuto que os comprava metia-os no bolso da
calça, de onde saia úmido de suor. Passando de mão a
mão depressa se dilacerava.
Eis porque a obra de Leandro desapareceu quase to-
da. O que resta das edições autênticas, tiradas em vida
do autor, constitui raridade bibliográfica.
Outro prejuizo ocorreu. O desrespeito à propriedade
literária por parte de editores pouco escrupulosos. Em
vida mesmo de Leandro já se praticava a fraude na auto-
ria de sua obra, tanto que o poeta consignou em seus fo-
lhetos, mais de uma vez, esta advertência:
“Com o fim de evitar abusos constantes, resolvi dora
em diante estampar em todas as minhas obras o meu re-
trato em um clichê, sem lugar determinado”.

De fato, o retrato aparece até mesmo nas reedições


feitas por seu genro Pedro Batista, que lançou em Gua-
rabira, Paraiba, onde tinha uma tipografia, algumas das
obras deixadas pelo poeta. Numa das vezes, chegou a
ameaçar com procedimento judicial os que criminosamente
imprimiam e vendiam a produção poética de Leandro.
Em 1921, três anos após a morte de Leandro, a viúva
vendeu a João Martins de Ataíde os direitos autorais do
seu falecido marido. O comprador, paraibano de Ingá,
era estabelecido no Recife com uma tipografia para obras
de cordel. Poeta de muita imaginação, autor de centenas
de poemas que ficaram na memória do povo, foi talvez o
10
maior poeta tradicionalista do Nordeste, no dizer de Ca-
mara Cascudo.
Isso não impediu de editar como sua a obra de Lean-
dro. Inicialmente, conservou o nome do autor junto ao
seu, como editor proprietário. Não tardou, porém, a as-
sumir a paternidade da obra.
É possível que assim procedesse por uma interpretação
elástica dos direitos autorais, que os tinha por compra.
Mas essa hipótese fica muito combalida diante da adul-
teração do acróstico, que Leandro usava na última estrofe
do poema. A palavra Leandro, como se vê, tem sete letras
e neste caso a última estrofe havia de ter sete versos, mesmo
que a composição fosse em sextilhas ou versos de seis
linhas, na linguagem dos cantadores.
Muitos exemplos de adulteração podiam ser citados,
não fosse o caso de alongar esta apresentação. No poe-
ma Branca de Neve e o Soldado Guerreiro, coleção do Cen-
tro de Pesquisas da Casa de Rui Barbosa, Leandro fina-
lizou o canto com este acróstico:
“Luziu o astro troiano
Esclareceu-se a verdade
Abriu-se a porta da vida
No mundo da liberdade
Dando a conhecer que a sorte
Rolar faz por sobre a morte
O que tem felicidade.”

No mesmo poema, edição em que aparece como autor


João Martins de Ataíde, Recife, 1944, o acróstico foi
destarte adulterado:
“Luziu O astro troiano
Esclareceu-se a verdade
Abriu-se a porta da vida
No mundo da liberdade
Dando a conhecer que a sorte
É que tem felicidade.”
1
Em mais de um caso a alteração do acróstico era feita
sem redução da estrofe, que permanecia com sete versos,
como nos poemas 4 Mulher Roubada, A Filha do Pesca-
dor, Os Sofrimentos de Alzira, etc.
O furto da propriedade literária sempre foi uma prá-
tica largamente aplicada na literatura de cordel. Poetas
de mérito passam para o seu nome obras alheias, princi-
palmente quando adquirem os direitos autorais. Foi o
que fez João Martins de Ataíde com a obra de Leandro
Gomes de Barros. A mesma coisa praticou contra ele José
Bernardo da Silva. João Melquiades publicou como seu
um folheto de José Camelo Resende. Manuel Pereira So-
brinho furtou de diversos, reescrevendo até folhetos de
Leandro Gomes de Barros, apesar de ser bom poeta, dono
de um estro admirável. O desrespeito da propriedade lite-
rária continua desenfreado na área da poesia popular.

Feitas as contas, quase nada resta da obra de Lean-


dro. Muito pouca coisa circula em seu nome. Alguns ti-
tulos se perderam, outros continuam reeditados sob pseu-
do-autoria de poetas menores.
Por sorte, a Casa de Rui Barbosa possui inalterável,
isto é, em edição tirada pelo próprio autor, copioso acervo
da obra de Leandro. Diante disso, fácil será o restabele-
cimento da autoria em muitos folhetos de que o poeta
foi despojado.
A obra está planejada para sair em edição fac-similar,
por ser o processo mais autêntico de comprovar a auto-
ria. Só o que existe na Casa de Rui Barbosa está calcula-
do para uma série de oito volumes. O que há por fora
será objeto de posterior cogitação.
Não dispondo a Casa de Rui Barbosa de meios para
divulgar, em edição autêntica, a obra de Leandro Gomes

12
de Barros, entrou em entendimento com a Universidade
Regional do Nordeste, que prontamente aceitou o apelo de
custear a impressão do primeiro volume, como homenagem
prestada ao autor, que é paraibano. Para a publicação
dos outros já há entendimentos com entidades igualmente
interessadas em participar da co-edição.
Este primeiro volume da obra de Leandro, em edição
fac-similar, sai em regime de co-edição da Fundação Casa
de Rui Barbosa e Fundação Universidade Regional do
Nordeste, Campina Grande, Paraiba.
O ideal seria uma edição critica, com notas esclare-
cedoras das formas de expressão no contexto da cultura
popular do Nordeste, abrangendo inclusive os temas e sua
motivação. Nada disso, porém, será possivel numa edição
fac-similar.
Como cada folheto de Leandro reúne dois ou mais
títulos, adotou-se o critério de ordem alfabética do pri-
meiro título, porque a cronológica é inviável, em razão
da falta de data em numerosos folhetos.
Tanto a Casa de Rui Barbosa como a Universidade
Regional do Nordeste estão conscientes do serviço que
prestam à cultura nacional com esta obra, porque tudo
que é popular há de ser necessariamente nacional.
Os homens ilustres do Brasil não infundiram cultura
ao povo, principalmente aos cantadores e poetas popula-
res, que aprenderam por si mesmos, lendo o lunário per-
pétuo e ouvindo as estórias de carochinhas. Naqueles
tempos não havia Mobral. O povo fez a sua cultura, que
o letrado de hoje transforma em enredos de romances.
Os bons poetas ligam o tempo, porque permanecem
na lembrança do povo. Neste caso está Leandro Gomes
de Barros, que continua vivo, bem vivo, na graça e no

13
sabor de sua poesia, apesar de desaparecido há quase ses-
senta anos.
Importa que se diga isso de um poeta popular, cuja
magia decorre da confluência de duas vertentes; a es-
pontaneidade de suas composições e a preocupação que
sempre teve de manter e valorizar a cultura nativa de
sua terra, de sua gente. Há, portanto, mais poesia em
sua obra que em copiosos versos que se empacotam em
livros, feitos só de palavras, como produtos de cérebros
espremidos.

Horácio DE ALMEIDA

14
COLEÇÃO
LEANDRO GOMES DE BARROS
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Pip. da “POPULAR
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ks arflições de gusrra da Europa
e —— — mm —

Detonam tiros medonhos


“Je peças desmasiadas
>oam grandes estampidos
Estremecendo as quebradas
Descendo rios de sangue
Como agua em enchorradas.
Sôóam echos dolorozos
|)as pobres mães das creanças
Com olhos rasos de lagrimas
Sem forças, sem esperanças
Vendo os filhos pequeninos
Traspassados pelas lanças.
Duve-se os Som do tanns
Rompe o grande tiroís. -
Os canhões vomitam bo «bas
Formando o quadró mãis mo
As pedras descem dos monte
Roladas de meio a meio

18
em 2 um
ad

Os templos voam nas balas


O sangue enche os ribeiros
À fumaça dos canhões
Forma grossos nevoeiros
Vê-se montes ie cadaveres
Que ao longe paresse oiteiros.
As balas levam crianças
Como se fôra uma palha
Sobem mulheres e homens
puta pela metralha
à fumaça envolve o mundo
Que, nem o vento a espalha
Allemanha grita: fogo!
E a Russiagrita: avança!
A Austria raivosamente
Como uma fera se lança
Rasgando à unhas e dentes
Velho, mulber e criança.
Erguea fror e grita fogo!
A “Servia nanda avançar,
Vá em ama grita a Belvi"Ia
Não aéixo Álieanha entrar
A Uglaterra prepara-se
Fis a dessraça me mar ..t+ .

19
custo (UR msm

Os turcos guardam o Estreito,


França ataca pelo centro
A Allemanha de fóra
Grita ao tuimigo: eu entro
Porque allemão só morre
Depois que estiver de dentro
Diz Allemanha eu sou urso
Diz Russia eu sou um gigante
Diz a America d> Norte
Eu sou maior que elepnante
E todos peçam a Deus
Que um dia cu não me Jevante.

E assim oito leões


[Lutam com ferocidade
Porde-se milhões de vidas
S. acaba a bumadidade
Fica O campo tinto em sangue
O mundo cheio de orphandade.
Todo homem de bom senso
Mostra profundos p res,
Nº campo vê os can. "s
Acroplancs nos ares
Se ymaripes cnormes
Avidam debaixo dos mares.
E

Na flor d'agua as esquadras


Com enormes canhoneiras
Partindo uns para os outros
Come feras carniceiras
Como quem desenganou-se,
Estão nas horas derradeiras.

Novecentos e quatorze
Corria sem novidade
Todas nações da Europa
Contavam prosperidade
Não esperavam tão cedo
A mão da fatalidade.
A desgraça vem ao mundo
Sem avisar a ninguem
O homem está descançado
Julga que vae muito bem
Longe de seu pensamento
Está, que a desventura vem,
O arqueduque Fernando
Indo a servia asseiar
Condusinde sua esposa
Que que:.a viajar
Não s-via que uma cobra
Hav'. de os emboscar,

21
gia
Ali uma fera humana
Acabou-lhe a existencia
Matou a el'c e a esposa
Com arbitraria insolencia
Eis a causa porque hoje
Está pagando a innocencia.
O Imperador da Austria,
Tio do assassinado
jurou em nome de Deus
Que havia de ser vingado
E por causa destas mortes
Estão mundo incendiado,

A Servia na mesma hora


Mandou dar sutisfação.
Disendo que o assassino
Ella o tinha na prisão
A Austria mandou dizer-lhe
Que ia acabar-lhe a Nação.
Francisco Jose da Avstria
Um soberbo Imperaa.
Declarando logo guerra
Mandou o embaixador
Dizendo a Servia se apronte
Vamos entrar no terror.
E
cv enviou logo a Servia
O “Ultimatum” de guerra
servia valeu-se da França
A França da Inglaterra
Allemanha apresentou-se
Ahi desgraçou-se a terra.
Porque Allemanha disse
À Austria é mimha alliada
Se França acudir a Servia
Eu entro e faço zuada
Hão de saber que a Austria
Não morre dezamparada.
A Russia e a Inglaterra
Teem tratado de alliança
Inglaterra com a Russia
E a Russia com a França
Foi ahi que fodos viram
As vidas n uma balança

A Russia m? ou diser
Ao goverr; Allemão
Que a *.vor da Inglaterra
Matar4 O proprio irmão
At: ava losse em quem fosse
Fnquanto tivesse mão.

23
io is

O Allemão respondeu
Que já estava preparado
A Russia se prevenisse
Que elle cra forte e pesado
O risco que corre o páu
Corre tambem o machado
Para minha artilharia
Não ha rochedo nem serra
Pode invistir a Allemanha
Russia, França e Inglaterra,
Para meus submurinos
Não se fez vaso de guerra,
Sou eu e a Austria, sós
t não chamo mais alguem
Se a Italia quiser vir
Eu aceitarei tambem
Tanto a favor como contra
Não recusarei ninguem.
Se a Belgica der passagem
Tenho todas garantia
Vou daqui com grande cxereito
Tomo França em I5 dia
À Russia e a Inglaterra
Ficam sem soberanias.

24
asia:

Pois Allemanha pensou


Que se tomasse Paris
Inda a Inglaterra vindo
Não podia ser feliz
à Russia dentro de um mez
Desocupava o Paiz.
Foi pedir licença a Belgica
Esta negou-lhe a licença
O imperador Guilherme
Creou uma colera immença
E disse com ar de riso
Nisso ha pouca differença
Eu quero mostrar a Belgica
Um governo especial,
Ella agora tem de ver
Uma desgraça geral
Não da passagem por bem
Eu hei ds passar por ral.
Então metleu erereito
tandou a rça passar
NA Belgi disse: isso não
Aqui +11 que respeitar
Aler.anha pessa aqui
M.s depois que me matar

25
silica:

Alle ianha disse a Belgica


Um de nós 2 se liquida
Eu passo com meu exercito
A questão está descid'da
E se eu não atravessar
Deixo aqui plantanda a vida
à Belgica então respondeu
Meu amigo fique certo
Precisa acabar commigo
Deixar meu paiz deserto
Só passará para a França
Se vencer o rei Alberto.
E travou-se o tiroteio
Alemanha sustentou
à Belgica um paiz pequeno.
esistit! não aíracou
Com mais de um mez de combate
Foi que Allemanha passou
Tambem só passou a” Polyica
Por não ter mais um S. dado.
Matou do primeiro ao ultu.n
Mas viu um braço pesado
Não houve um só que corresse
Inda estando balleiado.

26
cmi TO ca

Porque os belgas diziam


Morrer sim, curvar-se não
Antes morrer do que ser,
Escravo do allemão
A favor de minha patria
Brigo a dentes, pés, e mão.
Belga não foge de fôgo
A vida do homem é esta
Deixar a patria cativa,
E” o pezar que me resta
Tanto faz morrer aqui
Como morrer n'uma festa.
Ao desparar de uma peça
Até os montes tremiam
Casa, igreja, cimiterios,
Um sobre os outros cahiam
Viva nossa patria amada
Todos soldados diziam

Viva a Belg” idolauada


França paiz meu irmão
Isto disif um soidado
Já cor Os bofes na mão
Olhr“àa para o inimigo
Di-endo: morra alemão.

21
AN sa
Fôgo! gritava Allemanha
Deixe a cidade arrazada
À Belgica gritava avança!
Vamos ver rapaziada
Não sujemos nossa historia
Dai valor a nossa espada.
Vamos tratar na batalha
De 27 de Agosto
Quando 12 couraçados
Cada qual o mais disposto
Trez allemães 9 inglezes
Peitaram de rosto a rosto.
Disse o commondante chefe
Que vinha na armada ingleza
Qualquer um dos meus navios
Val mais que uma fortaleza
Disse a armada allemã:
Veremos, não é Certeza:
Foi q tiroteio mais forte
Que ja se viu nesse “undo
Com 5 horas de fôgo
Foram todus 12 ao fuma.
Só escapou um soldado
Mas esse ja muribindo

28
abs

De dezeseis mil pessõas


Somente um escapou
Porque um barco de pescu
Passando alli o salvou
Que antes de morrer disse
Tudo que alli se passou
Disse aquellc marinheiro
Alli ninguem de assustava
Cada um dísparo d'aquelle
Cem mortis o mar levava
Um allemão não gemia
Um só inglez não fallava
Apenas o commandante
Dizia não tenham medo
Inglez 1ão morre no mar
Nem se assusta com torpedo
Ja resta bem pouca gente
O fôgo se acaba cédo
No comnandar* eáqmio
Um estilhaço .steu
Elie vendo ae morria
Na bandsra se envolveu
Saltou à agua, e disse ao povo
Rapr siada olha eu!
acc Aa
Afundou não sahiu mais
E n'aquelle mesmo instante
Uma bala de um vaso inglez
Torou outro commandante
El'e morrendodizia
O::! que canhão importe !
E assim estão essas feras
uns aos ovtros se mordendo
Brigando a ferro e a fôgo
Como cobra se comendo
Peszando velho c creança
Ettrangulando e rompendo
Guerra! centro da miscria
Obra do genio infernal
Nodoa negra da historia
Feresa descomunal
Filha do odio de Deus
Sacrifício universal
Sô quem não te mpi ma
São estes que te idolatra
Os que devoram as vagc.sS
Das mães os filhos u:. bata.
Cospem o rosto da verdade
E nas trevas se retratam,

30
pipas
São esses que sua origem
E' da serpe feia e bruta
Vivem da desgraça humana
Como o passaro da fruta
Existencia venenosa
Mil veses mais que a cicuta.
Daus! oh! Deus dos miseraveis!
Alertai vossos ouvidos
Escuta lá desses céos
Os dolorosos gemidos
Dos miserav:is que choram
Com fome, nús e feridos.

Onde estais Jerusalem?


Patria natal de Jesus
Então pelos europeus
Elle rão iria a cruz?
Elle não ver este braço
Descarregar arcabuz?
Roma motor da dorsim
De todo pe christão
Não te le trasse da paz
| é aa obrigação?
"$9€ tuas ovelhas
Como quem cstruma um cãu?

31
Oh! grande America do Nortel
Terra de um povo ilustrado
Intervem nesta miseria
Olha o mundo derrotado
Mata o homem o seu irmão
Como um cão desesperado.
Tcdo homem de bom senso
Deve apresentar pesares
Vê os campos cheios dç ossos
Transformar-se em sangue os mares
Até os aeroplanos
Estão perseguindo nos ares,
Santo Deus! olhai de lá!
Esta triste nepra sanha
Talvez que o sol tanha nojo
Quando passa na campanha
Quem se não escarra
Da Austra da Allemanha.
As montanhas da Evrapa
Dirão d'onde nós vinhe os?
P'ra um paiz só de asst-smo:
Aonde até nôs sofremást
Esiste mais piedade
Nas serpentes que criemos,

32
atá ss
Os montes dirão meu povo
Não parece ter estudo
Porque o sabio conhece
Que a rasão é :m escudo
Aonde ha educação
EMi deve se achar tudo.
Russia avança como um tigre
Nustria se enrosca e da bote
Allcmanha faz subir
Rna, egreja e sacerdote
Jo geito que vai a cousa
Bté cu vou no pacote.
A França e a Inglaterra
Avançam para afrontar
à Servia fazo que pole
Belgica não pode brigar
Agora a Italia entrou
Iêm mais lenha para queimar.

id to o . SDCrUns dO a
Que sahirr - brevemente o folneto ue
maior sacesse que Leandro já escreveu -
"Os homer- da Nandioca”, o melhor fulio-
te de L mdro
DEL, CMERT E.

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35
AFFONSO PENNA
Fazem dezesete annos
Que o norte foi visitado
O conde d'Eu veio aqui
E foi muito festejado
Veio agora Affunso Penna,
Ninguem sebe o resultado,

O povo esperaria
Tudo por alh
Que elle vindo aqui
Tudo melhcrava
Julgue; que elle vava
Sacos de dinheiro
Fiz um mealheiro
Do tamanho de um jigo
E disse commigo :
Breve sou banqreiro.

Vendi 3 frangas que tinha


Empenhei um cinturão
Vendi meza de jantar
Empenhei mais o pilão
Comprei tudo de foguetes
Fui soltar ra estução.,

Dizia à mulher :
Vossê cuide em ir
Pode o homem vir
nai Ps E

E dar o que trouxer


Faça o que quizer
Eu levo Apollenia
Vou sem ceremonia
Para a estação
Cem o sãco de João
E qa ooité de Antonia,

E lá fui a estação
Dei tres quedas d'esta vez
Desconjuntei uma perna
Que tanto damno ire fez
negou elle: porém vinha
De cáda lado um inglez.

Em todas as villas
Que tinham estação
Via-se em cada mão
Duas, tres mochilas
Viu-se sacudi'-as
No matto de vez
Eu disse : vossês
O tempo perderam
Para que não nasceram
Em terra de inglez?
Dizia uma filha á mãe:
Minha máãi, vosmincê vai
Bote uma pedra na bocca
Se não o queixo lhe cai

37
|

o
um — ———

Não se esqueça de levar


O bisaco de meu pai.
Se elle der dinheiro
Não custe a voltar
Eu já vou matar:
O pai do terreiro
Vou lego ao chiqueiro
Mato a bacurinha
Não temos gallinha
Mas chega o dinheiro
Compra-se um carneiro
Faz-se uma festinha.

Com duas horas depois


Volta a velha em desespero
Minha mái! foi macho ou femea ?
Pergunta a filha ligeiro.
Responde a velha zangada :
Só se eu trouxe um verdadeiro.
Entrou na cosinha
Tomou um abalo
Tinham morto o gallo
E a bacurinha
Tudo quanto tinha
Nessa occasião.
A velhota então
Dizia: oh! que scena !
Fui atraz de penna
Tomei-me canhão.

38
= 4 -—

É eu avisando tudo
Fortuna não vem em kilo
O povo dizia : não !
Não tem isso nem aquillo
E quasi que vem dar tudo
Como adivinhou Joãor Grillo.

Alli só se via
Mulheres passeando
O cego apalpando
Gritar para o guia:
Está chuvoso o dia
K' grande o lameiro
Não tem atoleiro
Para me impedir
Eu hoje hei de ir
E chegar primeiro.

Foi engraçado um velhote


Ao chegar na estação
Gritou: seu Affonso Penna!
Veio em bôa occasião
Veja que imposto damnado
Cobram por milho e feijão 7

Venha aqui disposto


Afrouxe o vintem
Se saltar do trem
Cobram-lhe o imposto

39
— 6 —

Hoje é desse gosto


A cousa está feia
Isso é uma aldeia
Se acharem uma vaga
V. Mcê ou paga
Ou vai a cadeia.

Os inglezes : santaninha !
Um preparava-lhe a sôpa
Outro tangia mosquitos
Outro catava-lhe a roupa
Diziam : o que faltar, peça!
Inglez aqui não se poupa.

Dizia um inglez:
Mim vai chaleirar
Que é para ganhar
Brazil desta vez
O calculo mim fez
E ganha dinheiro
Mim é estrangeiro
Sabe andar subtil
Mim compra Brazil
E vende brazileiro.

Tudo no Norte dizia


O Brazil vai melhorar
A vinda de Affonso Penna
Faz todo mundo enricar
— ff —

Eu oreio que estes quatro annos


Não precisc trabalhar.

Atc as creanças
Mostravam alegria
Formavam harmonia
Cheios de esperanças
Batiam nas panças
Que era de mais.
Diziam-lhe os pais :
Cada qual se ripe
Ataca, Felippe !
Aproveita, Btaz '!

Às rp &
O mundo € um logegripho, —
Nirguem pode o decifrar;
A sorte é como uma vega
Que vem e torna a voltar;
A vida um dardo voluvel,
Raro é quem pode ganhar.
Alguem diz que rosa vida
Parece um sonho dourado,
Eu classifico esta vida
Um fardo muito pesado, —

44
— 7 —

O homem é nm viandante
Que nasce e morre cançado.
Mathilde era uma orphã,
O ente mais desvalido,
Por mãe conheceu a Dor,
Por distracção o Gemido,
Por abrigo o Sol ardente,
Oh ! ser desíavorecido !

Tinha apenas quatro annos,


Não podia trabalhar,
Sua mãe mcrreu a fome,
Deixou-a nesse penar,
Sem ter quem lhe desse o pão,
Sem geito de se criar.

Pedia esmolas à noute


Em mattos verdes envolvida,
Coitada ! não tinha roupa,
De dia estava escondida,
Buscando fructas no bosque
Para remissão da vida.

Então nas noutes de inverno


Sua vida era chorar,
Passar molhada uma noute,
Sem ter onde se abrigar!
Todos fechavam-lhe as portas,
Ninguem a deixava entrar.

42
— 8 —..

Uma noute ella julgcu,


Que morria resfriada,
Foi ter á porta de um rico
Pedindo-lhe uma pousada,
Esse lhe disse: —se enforque
Que já fica descançada.

Eu não ! respondeu Mathilde,


Não 'stou viva até aqui?
Deus quando quer matar um,
Mata acolá e alli,
Mata até vossa exveliencia,
Antes de erguer se dahi.

O avarento aggravou-se,
Para ver se elia morria,
Mandou que elia passasse
No quarto que o cão dormia.
Tendo já quasi a certesa
Que o cão a devoraria.
O monstro disse sorrindo :
Hoje has de me pagar,
O cachorro crocodilo
Hoje tem o que ceisr,
Se não fosses tão pequena
Ficava o que elie almoçar,

Assim que o cão vio-a ergueu-se,


De onde estava deitado,
o

Chegou festejando eila,


Mostrando -lhe tanto agrado,
Como se fosse Mathilde
Quem o tivesse criado.

Ella deitou-se na cama,


No canto que o cão dormia,
Comeu a sôpa do cão
Que sobejou-lhe do dia,
O cão dormio junto della
Como se fosse um vigia.

De manhã vei» o creedo


Com a comica co cão,
Trazendo em urna bandeja
Pedaços de carns e pão,
Vioa creança dirmindo
Que lhe chamou attenção.
O creado quando vo
Aquelle corpirho deitado,
Alvo da côr «às «urora
Mas sendo u'a «lvo corado,
Aquelles cabs'!.s louros
Fingindo um =vl esmaltado,

Aquelle resemna brando,


Como o bafejo da brisa,
Como o murmurio das aguas,
Que a meia ncute deslisa
Ou o bafejo de um anjo
Quando do céo suavisa.
O criado chamou o cão
E esse logo se ergueu,
O creado” estupefacto,
A comida do cão deu,
O cão acordou Mathilde,
Junto com ella comeu.

Nisso acorda o avarento,


Com uma voz perturbada,
Disse ao crisdo:—vá vêr,
Se nu jardim tem cssada
- De uma pobre rebugenta
Que pedio-me uma pousada,

Ahi faliou o criado:


Ella dormio com o cão,
Elle acarinhando ella
Como se fosse um christão.
Ainda & poucos momentos
Correram juntos um pão,
Mentiroso! exolamou elis :
Então queres me enganar!
Que virtudes ter aquillo
Para um cão a respeitar?
E' por ventura algum anjo
Que veio aqui me explorar?
usas 71 e

E sahio para o jardim


Com grande perturbação,
Chegou encontrou-a sentada
Pousando a fronte no cão.
Com uns dedinhos bem alvos
Fazendo letras no chão.

O avarento com isso


Ficou muito incommodado,
Pensou : será algum anjo,
Em criança transfermado,
Ou será algum demonio
Que teria se soltado !

Depois consultando a si,


Achou que era illusão,
Despedio o empregado,
Quiz mandar matar o cão...
Disse à creança : —retire-se,
Não deixe rastos no chão.

A mulher do avarento
Vendo Mathilde sahir
Fez uma supplica ao marido
Para elle consentir
Ficar ali a creanca
Mas não pude conseguir.

Olhou para ella e disse :


Vai, filha da desventura,
—- 12 —

Deus é pze de todos nós


E softreu tanta amargura
A villa é uma cadeia
E' feliz quem não atura.
Mathilde em pranto exclamava:
Ah! Deus! o que é que eu faço ?
Perdida nessa montanha
Tão pequena ? Como passo ?
Tanto pão que botam tórs
Mas não me dão um pedaço.

Mas minha mãe me dizia


Que Deus é um pai constante
Dã o pão a quem tem tome
Sciencia ao ignorante.
Consola ao triste que chora,
Mostra o porto ao navegante,

Eu neste bosque medonho


Sou triste sem esperança.
Um viajor sem destino
Que anda e nunca descança
Qual cégo que não tem guia
Que ignora onde se lança.

Nisso ouvio ladrar um cão


Esmoreceu de repente
Era o cachorro do rico
Que escapoliu da corrente

4
Andava pela montanha
Procurando-a impaciente.

Ah ! és tu, meu crocodilo,


Que andas me procurando ?
Ella dizia n'um pranto
As lagrimas ao cão banhando
O cão lambendo-lhe as lagrimas
Como quem está consolando,

Tenho agora companhia


Para viver nessas grutas
Aonde só ouço 0 silvo
Das cobras feias e brutas
Eu com o meu com:panheiro
Comemos sómente as fructas.

O avarento dormindo
Sonhou que tinha morrido
la a uma gruta escura
Ouvia um grande gemido
Via o paí delle em um carcere
Todo queimado e ferido.

O pai lhe disse por sonho:


Vê como estou desgraçado?
Eu fui como és hoje
Rico, avarento, malvado
No mundo eu só via o ouro
Por isso fui condemnado.
Habito aqui nesta cóva
Onde só consta o terror
Onde estas cnammas continuas
Augmentam sempreo calor
Não esper? ver mais nunca
A vcz de meu criadsr.

Elle por sonho corria


Soluçando horrorisado
la a uma gruta onde tinha
Muito ouro amontoado
Onde tinha um cão uivando
Junto do ciiro quitado.

Piavam umas aves pretas


Rondaundo o monte de ouro
Chorava um vsiho dizendo:
Eis aquio reu thesouro !
Ganho no mundo dos vivos
A custa de sangue e choro,

Ahi Matirilde passava


O monte de ouro vio
Pisando em uma moeda
Em cima della cuspio
Depois! limpou o sapato
Repugnada seguio,

Continta nO «Azar ca feiticeira».

49
UNS OLHOS
Teus olhos são como uns astros
Teus seios puros e cestos
Parecem o throno de Deus,
Teu riso é um céo aberto
Que nem os anjos por certo
Teem uns olhcs como as teus,
As tranças negras e finas
As faces cor de boninas
ÃO passar da viração
Teu gesto tem tanta graça
Ninguem o vê que não faça
Palpitar O coração.
Tem o perfume da flor
E's fina como c amor
Tão firme quanto amizade
O inventor da existencia
De belleza é innocencia
Te fez desta qualilade.
Teu halito é um odor
Que exalou de uma flor
Que tinha no paraiso
Teu rosto da cor de um véo
Provoca os anjos do céo
Virem beber teu sorriso.
Jaboatão, 9 de Agosto de 1906.

50
— 16 -—

O que eu não creio


Dizem que o amor é doce
Nisso eu não pcsso dar fé
Porque se elle fosse doce
Adoçaria café,

Dizem que beijando um filho


Sua mãe sente a doçura
Só se a bocca que o beijar
For de assucar ou rapadura,

Creic que a alma do coxo


Chegardo no céo é manca
Porem a alma do negro
Mil céos não põem ella branca,

Dizem que a culpa condemna


E' outra historia que arreia
Porque se assim fosse certo
Não precisava cadeia.

Eu como vivo escaldado


De protecção, de innocencia,
De dentadas de remorsos
E peso de paciencia....

21
À mega É
LEANDRO GOMES DE BARROS
CON VOCCCODCVOGGOCD9OOO

À ALMA DE UM FISCAL |
CONTINUAÇÃO DA

VINGANCA DE UM FILHO É

A” VENDA
>
Rua do Alecrim N.º 34 >
RECIFE :

PN pp
SO
EO CCOCOCCCOCEL CHELCCCEELCEEC OCCCCOCE CCCCOCCCONY

LEANDRO
e EC ECOCCCCCCCS

GOMES
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DE
DOCCEE

BARROS
va

DID DDD DD DS
DOODODODDODDOODODO :
TAMA DE Um FNLAL
Estava uv diabo um: dia
No vabmete internal
Quando um filho delle disse:
Papai lá vem um fiscal
O «iabo perguntou
E" tempo de carnaval?
Que novidade trarã
“sie animal por aqui!
Creio que não virá só
A uúesgruça vem alh
Traz a caipora de um lado
ft acha v azar alu.
Disse o tilho do diabo
Aquele é meu conhecido
Papai se lembra d'aquelle
Magro corcundo e ruido
Cocho da perna direita
E tinha um olho cusido?
ni
Disse o fiscal: disso tudo
Posso fazer-lhe presente
Quer minha sogra vou vel-a
E um presunto excelente
O diabo disse: vôte
Antes um banho de agua quente.
E lá voltou o fiscal
Sem nada alli receber
O diabo não o quiz
Nada pode resolver
Ficou junto com trez sogras
No espaça à se morder,

VINGANÇA Dk UM HIHO
Arrancaram a feichadura
De uma das portas que havia
Encontraram a baroneza
No salão já morta €e fria
Uma moça em cada lado
Banhada em sangue se via,
Duas moças bem trajadas
No assualho estendidas
Deixando vêr-se nas frontes
Duas enormes feridas
Dois revolves encostados
Com que liquidaram as vidas
Dona Lidia a baroneza
Essa morreu num estrado
Tinha uma carta no collo
E um frasco com sublimado
O veneno com que ella
Tinha se suicidado.
O chete ficou immovel
O escrivão não falou
O delogado foi ver
Chegando dentro voltou
O official de justiça
Foi quem a examinou,
O official de justiça
Abriu a carta e a leu
Logo ao principio da carta
Elle lendo estremeceu
Doutor venha ler aqui
O que toi que ella escreveu!
Na carta tinha o seguinte:
Não ponham culpa em alguem
Me envenenei por meu gosto
Pois vi que não hia bem
Na vida não achei goso
A morte a mim me convem
Minhas filhinhas dois anjos
Sonhavam com a inocencia
Sabendo do que o pai fez
1
Acharam maior prudencia
Antes de se emjuriarem
Poi em termo a existencia.
Meu miseravel marido
Nunca me disse quem era
Era por fora um cordeiro
Por dentro a mais cruel féra
Monstro semelhante a elle
A natureza não gera.
No deposito de seu crime
(Que nunca estava vasio
Foi Antão e a mulher
Que morreram a sangue frio
E um filhinho inocente
Esse se afogou no rio.
Tinha aqui um morador
Nem vista tinha sequer
Um pobre velho até cégo
Ser que não tinha mister
Elle mandou matar
A elle, um filho e a mulher.
Na Espanha elle matou
O avô e o padrinho
Trez mortes injustamente
Fez na tidade do Minho
Matou um velho em Lisbôa
Elle a mulher e um filhinho.
E
Elle contou tudo hontem
De nada disso eu sabia
E não é Italiano
Como elle aqui disia
Chama-se Valentim Angelo
E não Lauro de Maria.
Não pode haver outro homem
De intestinos mais malvados
Aquillo foi um aborto
Entre os mais seres criados
Só não era mão marido
E pagava aos impregados
O somno delle é horrivel
Cheio de tribulações
Vê esquelêto por sonho
Assassinatos e prizões
Conta dormindo o que sonha
Tem horrives discurções
Elle se evadiu no mundo
Não disse para onde hia
Disse que não esperasse-o
Pois elle só voltaria
Quando tivesse a serteza
De fazer o que queria.
No mas adeus a quem fica
Vou para a eternidade
Ninguem prantei minha morte
59
Morro por livre vontade
Não levo queixa de alguem
Tambem não deixo saudade
Posto escripto escreveu ella
Tenho a fazer um pedido
Não me sepultem em terra
Roubada por meu marido
Embora que meu cadaver
Pelos cães seja comido
Nada mais tenho a diser
Morta agora mesmo caio
Fasenda de campo verde
Em vinte e nove de Maio
De oitocento e dez
Lidia Telles de Sampaio
A carta de D. Lidia
Arrematou aquestão
O juiz deu a Arnaldo
Todos os bens do barão
Visto tudo ser provado
Que pertencia a Antão.
Disse Arnaldo inda me falta
D'aqui o excencial
E" tomar d'aquelle infame
Uma vingança fatal!
Sem a qual posso dizer
Que da questão sahir ma!
Mas onde estava o barãc
Para onde tinha ido?
Era o que ninguem sabia
Porque sahiu escondido
O maivado quando sai
Vai logo bem prevenido.
Os moradores que haviam
Na fasenda do barão
Ficaram sobsaltados
A terminar a questão
Porem Arnaldo foi lá
Fez uma declaração.
Colhesem suas lavouras
E ficasem trabalhando
Seis annos sem pagar rendas
E tudu all desfrutando
Os moradores d'alh
Ficaram todos morando
Arnaldo disse a Andresa
Tudo quanto tinha feito
Que o pessoal da fazenda
Tudo ficou satisfeito
Andreza disse: meu filho
Andasses muito direito.
Andresa lhe perguntou
Não soubesses do bandido?
Não senhora disse Arnaldo:
61
p= fa
le sahiu escondido
Só deve está na provincia
Onde não for conhecido.
Andresa disse meu filho
Auero consultar ati
Existe em Miras-Geraes
Na iasenda Bem-ti-vi
O meu compadre Herculano
Que nos troxe para aqui
E homem de confiança
Conhece bem o bandido
É daquele miserave)
Elle não é conhecido
Eu tenho toda serteza
Clle faser-me um pedido,
Parto amanha para Minas
Não quero usar da tardança
Me arrume trez portadores
Pessõas de contiança
Se meu compadre existir
Eu volto com esperança.
As seis horas da manhã
Ella arrumou-se e partiu
Fez dez leguas de viagem
Nesse dia que sahiu
Soube que o barão passou
N'um logar que ella dormiu.
62
— 16 —
Au entrar na Capital
Herculano a encontrou
Ella lhe disse a que vinha
Elle se promptificou
[E disse minha comadre
As suas ordens estou.
Disse-lhe Andresa compadre
Venho fazer-lhe um pedido
Só você pode encontrar
Novas d'aquelle bandido
Leve trez contos de réis
Sula daqui prevenido.
Com relação a família
Não tenha nada que pensar
Está mais um conto de réis
Que é para em casa deixar
Diga a comadre qne marde
Ver tudo que precisar.
Entregou-lhe a precatoria
Feita com legalidade
Com ordem do imperador
A qualquer auctoridade
Auxiliar a Herculano
Havendo necessidade.

CONTINUA NO “SOLDADO JOGADOR"


63
AGENTES
Parahvba (Capital -- Chagas Bapusta,
Irmão
Alagoas Grande —- Delfino Costa
Guarabvra -— A, Baptista Guedes
Jim Rio Branco--Manoel Vianna
Em Manais—Bemjamin Cardozo
Em Caruaru —João de Barrus
Em Pesqueira—Jo€3 Liberal
Em Pombal (Parohiba)—Camillo X
de Parias

Ro Sta Luzia.
— Poralbcha
Joze Nunes Fignerêde

Em nossa biblioteca partícular enoon


trase sempre vinte e tustás, qualidades
de folhetos deste autor,
Remete se pelo cittefr mediante a im-
portancko qualquer quantidade para qual.
Per Kstada

O utor reserva o direito de


propriedade.
BELLA

À ALMA DE UMA SOGRA


EE Ss

Em dias do mez passado —


Vi n'uma reunião,
Um trocador de cavallos,
Um velho tabellião,
Um criado de um vigario
E a avó de um sachristão.

Veio uma dessas ciganas


Que lê a mão da pessoa,
Leu a mão de um velho e disje:
Vossa mercê anda atõa, | —
De cinco sogras que teve
Não obteve uma bôa,

E' muito exacto cigana,


Disse o velho a suspirar,
A melhor de todas cinco,
Essa obrigou-me a chorar,
Depois de morta tres mezes,
Quase me faz expirar.

05
e | ás

Disse o velho, minha vida,


Dá muito bem uma scena,
Dá um romance e um drma,
F a obra não pequena,
OQ velho tabellião
Quase qu chora com pena.

O velho ali descreveu


Todas scenas que deram
Alguns daquelles ali,
Foram escutar não poderam
Foi um serviço de gancho
O que essas sogras fizeram.

Então a primeira sogra,


Foi uma tal Marianna,
Tinha os dentes arqueados
Como a cobra canninana,
Elle casou-se na quarta
Brigou no fim da semana.

À segunda era uma typa


Alta, magra e corcovada,
Damnada para passeios.
Enredadeira Exaltada
Cavilosa e feiticeira,
Intrigante e depravada.

Por felicidade delle


Chegou-lhe a fortuna um dia,

66
a À ee

Deu a munganga na velha


Chegou-lhe a hydrophobia,
Foi morta a tiro no campo
Graças ao povo que havia.

À terceira se chamava
Genovéva bota-abaixo,
Espumava pela boca
Que a baba cahia em caixo,
Um dia partiu a elle
Fez-lhe da cabeça um facho.

A quarta era fogo-vivo


Se chamava Anna-Martello
Filha de uma tal medonha,
Bala de bronze, cutello,
Parecia um jacaré
Desses do papo amarello.

Era da côr de gibóia,


O rosto muito cascudo
E tinha no céo da bocca
Um dente gracde e agudo
Essa engoliu pelas ventas
Um genro com roupa e tudo.

Meu amigo disse o velho,


Eu me casei innocente
Porque antes de me casar
À velha era tão prudente

67
— 4 —

Eu disse com os meus botões,


Tenho uma sogra excellente.

Depois que casei, um dia


Eu inda estava deitado,
Vi a velha dar um pulo
E abecar o creado,
Arrancar-lhe o coração
E disse este, eu como assado.

Veia á porta do meu quarto,


Disse: pedaço de um burro,
Inda não se levantou?
Quer se levantar a murro?
Voscê, ou cria coragem,
Ou cria cheiro de esturro!...

À derradeira de todas
Não era. muito ruim,
Me levantava algum falso,
Fallava muito de mim,
Eu teria me banhado
Se as outras fossem assim.

Sempre tinha alguns defeitos,


Mas tambem não era tanto,
Uma vez quiz obrigr-me
Passar tres dias n'um canto,
Com um defuncto nas costas,
Fazendo oração a um santo.
sas
8 rasa

Mas se ella não fosse assim


A velha fazia gosto,
Me fazia algum favor
E depois lançava em rosto
Se brigavamos Ianeiro,
Ficavamos bem em Agosto.

Ella depois de morrer,


Fez um papel temerario
Ajuntou-se co' a alma
Da avó de um boticario
E me passaram por sonho
Um dos contos de vigario.

Essa avó do boticario,


Em vida votou-me tedio
Por ter o neto botica
E eu não comprar remedio;
Morreu ella e minha sogra
Quase desgraçam meu predio.

Disse-me a velha em sonho,


Cave lá no pé do muro,
Lá achará uma jarra
Com moedas de ouro puro,
E' teu e de minha filha,
Serão ricos no futuro.

Acordei disse à mulher


Tudo que tinha sonhado

69
q

Disse ella, vá atraz


Desse thesouro enterrado,
Escavaque o pé do muro,
Só se lá tiver peccado.

Então tornei a dormir


Ellas voltaram de novo
Me disseram a jarra lá
Está cheia que só um ovo
Mulher só diz é asneira
Vá excutar este povo!

Vá cavar no pé do muro,
Aonde teve um coqueiro,
Debaixo da raiz delle
Acha uma lage primeiro
E debaixo dessa lage
Tem a jarra de dinheiro.

De manhã me levantei
E fui logo para lá
Cavei, cncontrei a lage
Disse contente oh! vem cá
Sabe o que achei? um cortiço
De bezouro mangangá.

Ah es bezouros todos
Frecharam em cima de mim,
Eu nem sei como corri,
Julgnei ali ser meu fim,
= =

Ouvi a velha gritar,


Bezouros bons, assim sim!

Passei um anno é dous mezes


Com febre sobre o chão duro,
Tinha febre todo dia
Trancado num quarto escuro
E a alma da damnada
Me esperando no monturo.

A mulher estava dormindo


Por sonho viu ella vir
EK lhe disse minha filha
Tu não podes resistir
Eu trago aqui um escravo
Que vem para te servir.

à mulher lhe perguntou


K lá pelo mnndo eterno
Existe tambem escravo ?'!
Filha lá tudo é moderno
Minha mãi onde achou este?
Disse a velha, no inferno.

Minha mulher disse ali,


Jesus, Maria e José,
À velha espanton-se, e disse.
Atrevida! como é?
Que chama por tres pessoas
De quem eu perdi a fé.

q
ss aca

Disse a velha se mordendo,


Eu parto senão me acabo,
Diabos carreguem meu genro,
Que nem sogra dá-lhe cabo,
Sahiram então se mordendo
À velha com o diabo.

Essa tal de bota-abaixo


No dia que ella morreu
Eu lhe mostrei uma imagem
Pois a velha inda se ergueu
Arrebatou-me a imagem
Deu um bote e me mordeu.

Depois de morta tres annos


Onde sepultaram ella
Nasceu em cima da cova
Tres toceiras de mazella
Um livro de nova seita
Achou-se no caixão della,

À cobra era nova seita


Eu conheci o mysterio
k eu pude conhecer
Que o acto não era serio,
Tanto que eu disse logo,
Desgraçou-se o cemitrio.

e. Õõíõqrra

12
DSL OCLESES SESC SCEECESCES

We

a
AS PROESAS DE UM NAMORADO MOFINO

Sempre adoptei a doutrina


Ditada pelo rifão,
De ver-se a cara do homem
Mas não ver-se o coração.
Entre a palavra e a obra
Ma enorme distincção.

Zé-pitada era um rapaz


Que em tempos idos havia
Amava muito uma moça
O pai della não queria...
O desastre é um diabo
Que persegue a sympathia.

Vivia o rapaz soffrendo


Grande contrariedade
Chorava ao romper da aurora
Gemia ao virar da tarde
A moça era como um passaro
Privado da liberdade.

13
Sae
Porque João-molle, o pai della
Era um velho perigoso,
Embora que Zé-pitada
Dizia ser revoltoso,
Adiante o leitor verá
Qual era o mais valoroso.

Marocas vivia triste


Pitada vivia em ancia,
Elle como rapaz moço
No vigor de sua infancia,
Fallar depende de folego
Porém obrar, é sustancia.

Disse pitada a Marocas,


Ku preciso lhe fallar
Já tenho toda certeza,
Que é necessario a raptar,
A" noute espere por mim
Que havemos de contractar.

Disse Marocas a Zezinho:


Papai não é de brincadeira,
Diz Zé-pitada, ora esta!
Eu sou da mesma maneira,
Voscê póde vêr-me as tripas,
Porém não verá carreira.

Diga a que hora hei de ir,


Eu dou conta do recado

74
ses Gas

Inda seu pai sendo fogo,


Por mim será apagado,
Eu juro contra minh'alma
Que seu pai corre assombrado.

Disse Marocas, meu pai


Tem tanta disposição,
Que uma vez tomou um preso
Do poder de um batalhão,
Ballas choviam nos ares,
O sangue ensopava o chão.

Disse elle, eu uma vez


Fui de encontro a mil guerreiros,
Entrei pela retaguarda,
Matei logo os artilheiros,
Em menos de dez minutos
O sangue encheu os barreiros.

Disse Morocas, pois bem


Eu espero e póde ir,
Porém encare a desgraça,
Se acaso meu pai nos vir,
Meu pai é de ferro e fogo,
F' duro de resistir.

Marocas não confiando


Querendo experimentar,
Olhou para Zé-pitada
Fingindo querer chorar,

To
E

Disse. meu pai accordou,


E nos ouviu conversar.

Valha-me Nossa Senhora!


Respondeu elle gemendo,
Que diabo eu faço agora ?!...
F cahiu no chão tremendo,
Oh! minha Noasa Senhora!
À vós eu me recommendo.

Nisso um gato derrubou


Uma lata na despença,
Elle pensou que era o velho,
Gritou, oh! que dor immensa!...
Parece qu stou ouvindo
Jesus lavrar-me a senteça.

A febre já me atacou,
Sinto frio horrivelmente,
Com muita dor de cabeça,
Uma enorme dor de dente,
Está nie dando a ervsipela,
Já sinto o corpo dormente.

Antes eu hoje estivesse


Encerrado na cadeia,
De que morrer na desgraça,
E duma morte tão feia,
Veja se póde arrastar-me,
Que minha calça está cheia.

76
— AA me

Por alma de sua mãi,


E pela sagrada paixão,
Me arraste por uma perna
E me bote no portão,
A moça quiz arrastal-o,
Não teve onde por a mão.

Ella tirou-lhe a botina,


Para ver se o arrastava,
Mas era uma fedendina,
Que a moça não supportava,
Aquella materia fina,
Já todo o chão alagava.

Disse a moça: quer um beijo?


Para ver se tem melhora?
Elle com cara de choro,
Respondeu-lhe, não, senhora,
Beijo não me salva a vida,
Eu só desejo ir-me embora.

Então lhe disse Marocas,


Desgraçado!... eu bem sabia,
Que um ente de teu calibre,
Não pode ter serventia,
Creio que fostes nascido
Em fundo de padaria.

Meu pai ainda não veio


Eu estou hoje sosinha,

fi
mp

Zé-pitada ahi se ergueu,


E disse, oh minha santinha!
A moça metteu-lhe o pé,
Dizendo: vai-te, murriuha!

E deu-lhe ali uma lata,


Dizendo: está ahi o pôço,
Voscê ou lava o quintal
Ou come um cachorro ensolso,
Se não eu metto-lhe os pés
Não lhe deixo inteiro um osso.

Disse elle, oh! meu amor!


O corpo todo me treme,
Minha cabecinha está,
Que só um barco sem leme,
Parece faltar-me o pulso,
O Anjo da Guarda geme.

Então a moça lhe disse:


O senhor lava o quintal
Olhe uma tabica aqui!...
Lava por bem ou por mal,
Covardia para mim,
E' crime descommunal.

E lá foi nosso rapaz


Se arrastando com a lata,
A moça ali ao pé delle,
Lhe ameaçando a chibata,

18
ca am

Elle exclava chorando


Por amor de Deus não bata.

Vai miseravel de porta


Quero já limpo isso tudo,
Um homem de sua marca
Pequeno, feio e pançudo,
Só tendo sido criado
Onde se vende miudo.

Disse o Zé quando sahiu:


Eu juro por Deus agora,
Ainda uma moça sendo
Filha de Nossa Senhora,
E olhar para mim, eu digo:
Desgraçada, vá embora.

79
AVISO
Com o fim de evitar os abusos
constantes, resolvi d'ora em diante es-
tampar em todas as minhas obras o
meu retrato em um cliché. sem logar
determinado.

Leandro Gomes.

a
"24
<<
Lcanóro Gomes de cRarros
EE ————— A
Antonio Silvino, no jury
Debate de seu advogado


A 262toda
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O autor ne o direitoaa
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81
Debate de seu advogado.
Era 26 de Outubro
O dia desionado
Pura o celebro cangaceiro
No tribunal ser juleado
Perante a justiça publica
bo sem advogado,
Jú na torre da igreja
Anuunciava meio dia
bntão Autonio Silvino
Cabisbaixo triste ia
Ver a ultima sentenca
Que por sorte lhe cabia.
No salão do tribunal
Entrou elle amedrontado
Porque conhecem que ali
Havia de ser julgado
Disialhe a consciencia:
— E triste teu resultado

O juiz lhe pergmton


Qual é todo nome sen
Manoel Baptista de Moraes
82
a

Silvino lhe responden


Me chamam Antonio Sivino
Porém não é nome men.

Sabe o réo porque está preso ?


O juiz lhe perguntou
Disse Silvino: por falço
Que o povo me levantou,
Servindo-se de meu nome
Não foi um só que roubou,

Mais os horrorosos crimes


Que se vê em seus prucessos?
Respondeu Silvino; muitos
Escreveram com excessos
Onde eu passava já via
Os rastos de outros perversos.

Diz o juiz você sabe


Porque está sendo julgado?
Disse Silvino: é porque
Dizem que eu sou processado
E no mais em meu logar
Está meu advogado.

Porém o senhor não sabe


Porque vem ao tribunal?
Eu vim porque me trouxeram
Disse Silvino. afinal
esses
VE cas
Sou um homem ignorante
Não conheço bem nem mal,
O juiz do tribunal
Ordenou elle a sentar-se
E disse ao advogado
Que se quizesse fallasse
E dentro da justa lei
O que tivesso allegasse
O advogado delle
Vinte minutos fallou
O que foi de attenuante
Remecheu e esgoto
Porém foi tudo debalde
Que em nada remedion,

O advogado delle
Entrou da forma seguinte:
Disse em pleno tribunal
Vejo o men constituinte
Ser condemnado em artigos
Onde so livraram vinte.

Senhores; Antonio Silvino


Não fez tudo que se diz
Todos nós estamos a pár
Do povo d'esse paiz
Que vendo o pobre com o peso
Diz carrega esse infeliz.
a

Eu ndo me refiro a isso


Porque seja interessado.
E nem adoto o svstema
De um faminto advogado
Fallo porque tenho pena
De um infeliz desgraçado,

Ku não defendo esta cansa


IEnterrossado cm dinheiro
Porque que fortuna tem
Um pobre prisioneiro
Venho pór vêr tantos lobos
Ao redor de um só cordeiro,

Ora nos temos a lei


Claramente as nossas vistas.
| essas leis foram feitas
Por crandes criminalistas
Não foi pessoas baixas
Revaltosas e anarchistas,

Por exemplo uma livpothese:


Pedro disse que fulano
Lhe disse, que lhe disseram
Que Paulo maton beltrano
Nesse processo de Panlo
Não pode dar-se um engano?
Parece que um ente desses
Cmpre u ordem do destino
Bo
as
Eu ouço fallar em crimes
Commoetidos por Silvino
Quando talvez o pai delle
Ainda fosse menino

Disse o Dr. Souza Filho


Procnrador do estado
Collega. eu enxergo em si
Razões de um advogado.
Seu cargo hoje admitte
Que se defenda o culpado,

Embora que os crimes d'elle


Enchesse o grande compeudio
Você como advogado
Procura geito e defende-o
Mas u prisão d'elle, ovita
A morte, o ronbo e o incendio.

Quantos orphãos n'esta terra


Choram koje desvallidos ?
Quantos homens arranchados
Andam hoje foragidos?
Viuvas desamparadas
Que elle matou-lhe os maridos

Um desses se vendo solto


Nunca mais se regenera
3 feliz o brazileiro
2 cms
(Que não conhesse tal féra
Um coração tão perverso
Envergonha a nossa éra.

Uullega devemos vér


Disse-lhe o Dr. Simões
Nos máos ja tem se encontrado
Magmnificos corações.
Não é só no homem honrado
Que se vê boas acções

Nós ju temos visto homens


Em momento desgraçado,
Cair as vezes n um crime
Ser por isso processado,
Mas depois que se vêr livre
Torna-se regenerado

Disse o Dr. Sonza Filho


Não é isso attenuante,
Olhe que o velho rifão
Traz um trecho interessante,
O cesteiro que faz um cesto
Faz mais cem e assim por diante

O advogado--Existe uma lenda antiga


Hoje se torna moderna
Muitas pessõas adoptão-a
Como nma verdade eterna,
a
O cavallo por um coice
Não deve cortar-se a perna
Disso o desembargador
Meus senhores venham cá
Este réo onde nasceu
Fez crimes desde lá
No logar onde elle estiver
O crime perto ha de está,
Elle deve tor processo
Em todo aquelle sertão.
Elle nunca reccuzou-se
Para qualquer aggressão
Roubo. incendio, assassinato,
Era sua profissão.
Fez elle em Caruarú
Duas mortes em Trapiá,
Quatro ou cinco em Canhotinho
Duas ou trez no Ingá
Fez mas uma scena horrenda
Na uzina Jundiá.

Passou desenove annos


O norte sem garantia,
Só morava no sertão
O povo que elle queria.
A força que fosse a elle.
Desinterada sahia.
É
Hoje por lelicidade
Aloenem pode o capturar.
Se elle se escapulir
Quem pode mais o pegar?
(Qual é mas o fazendeiro
Que pode negociar ”?

Além da terrivel secca


(Que tanto tem assolado
Solte de mais um leão
Que temos engaiolado
Veja se todo sertão
Não fica despovoado,
O advogado disse
O advirto a senhoria.
O crime figura um cégo
S dei Tivnra uma guia
A dei é como o compasso
Não sendo, do que servia?
O réo commnetten o crime
Ko processo foi feito
Mais quem tirou o inquerito
Não soube tirar direito.
Arrependeu-se depois
Agora não tem mais geito
A lei manda que se obre
O que constu na postura
89
air di

Quem foi fazer fez errado


Quem vêr e sabe sensura
Da morte para existencia
Muda muito de figura.
Porque a lei diz assim
So poderá ser punido
O crime que for provado
Como foi acontecido
Tendo uma só testemunha
Inda não está garantido

Não era Silrino só


O cangaceiro que havia
Então do nome delle
Qualquer se prevalecia
Muitos crimes foram dados
Onde Silvino nem hia

O concelho reuniu-se
E fizeram votação
Não houve um voto a favor
Não poude haver concessão
A causa estava perdida
Não havia remissão.

Tambem Antonio Silvino


De vez em quando corava
Chegava-lhe um suor frio
90
e | =
O rosto lhe desmaiava
Nem cascavel no sertão
No dia que se assanhava,
Quando chegou na cadeia
Todo corpo lhe tremia
Ulhava para a prisão
A carne lhe estremecia
Fitava todas as paredes
Como cobra, se mordia.

Arrenegava da hora
Que a mãe delle o conceben
Desconjurava do dia
E do anno em que nascen
Até da primeira papa
E do tempo em que viveu

Depois de tudo acalmava-se


Mais não podia dormir
Cinco minutos de somno
Não podia conseguir
Oras onvia-se chorar
Outro se via-o sorrir.

Elle exclamava comsigo


Ah! liberdade de outrora
(Qnanto feliz era eu
Podendo colher-te agora
91
eÉ sa
Mas tu foste como o passaro
Voaste e fostes embora
E's como as folhas que seccam
Nos frondosos laranjaes
Ou como as aves nos ninhos
Que empenam e deixam os paes
Dizem no primeiro vôo
Adeus para nunca mais.
Ah! campos da minha terra
Onde a infancia passei
Ah! sombras deliciosas
Onde dias desfrutei
Moutes cobertos de flores
Que para sempre deixei
Onde gozei mil carinhos
De uma mãe carinhosa
Os dias eram uns jardins
E cada noite uma rosa
Nasci em berços de flores
E morro em cama espinhosa.
Oh morte porque demoras
Em dar minha liberdade
Não é o men soffrimento
Vindo da eternidade
Ku te esperava tão cedo
Vinde embora seja tarde
92
<= AD
Oh ! campos de minha terra
Prazeres que desfrntei
Scenas que passei por ellits
Gloria com que eu sonhei
Montanhas encantadoras
Inda hei de verte, não sei
Talves que inda por sonho
Eu vá num daquelles montes
Do come de uma das serras
Olhe aquelles horizontes
Ou se morrer minh'alma
Vá ao pé daquellas fontes.
Quem criou-se onde eu criei-me
E nasceu onde en nasci
Estando em minhas condições
Preso como estou aqui
Chora quando se lembrar
De muitas scenas dalli
A liberdade do povo
Os encantos do sertão
Os cantos dos passarinhos
Um tempo de apartação
O homem que não chorar
Nunca teve coração.
Embora fosse infeliz
Com tando sinto saudade
93
— 13 —

Minha patria foi cruel


Mas eu lhe tenho amizade
O amor e a pessõa
Ambas são da mesma idade

Depois dizia comsigo


Ah! juiz! se eu te apanhasse
Eu sendo como já fui
Talvez tn não escapasse
Tudo quanto jà tem dito
Em dez palavras negasse

Tudo hoje é contra mim


Neste mizeravel estado
(Quatro e cinco me sensuram
Por todos son accuzado
Nove algozes de uma vez
Accuzando um condemnado

Talves que alguem aqui


Fizesse tudo que eu fiz
Porém encontrou amigo
Ou um pai como se diz
Um desses que faz sorrindo
De um desgraçado feliz.

Mas eu sou pelo contrario


Só alcanço accuzação
Não há um entre esses tantos
E
Que me procuro a razão
O que é menos contra mim
Vota por minha prizão

Hoje tenho a liberdade


Por um ditado ou pilheria
O castigo é o commum
O horror sentenca seria
Trago o carrasco a men lado
Convivo com a miseria

Minha esperança é mais negra


Do que as noites sem lua
Nas tempestades horrendas
Que nem um astro flutua
gstom nas condições do cão
+ “ -

Sem domno no meio da rua

Se hoje eu chegar na praia


As oudas vendo-me esbarram
Os proprios peixes ferozes
Se me virem não me agarram
Repugnados de mim
forcem de banda e escarram

Procuro um homem das lettras


Que procure meus direitos
Esse corre meus processos
Acha num. dous. trez defeitos
gas“RES
ca

Crimes de barbaridades
que por mim não foram feitos
Mas o homem prezo está
Sujeito a qualquer mazella
| quem compra numa tasca
Paga pelo preço della
Isso é cazo que se dá
Desde o palacio a uma sella.
So pelo o revez da sorte
inda eu possa me soltar
Aos quatro estados do norte
Bu hei de cratificar
Por uns quatro ou cinco secnlos
O póvo tem que fallar
Pernambuco tem de ver
bEmbuá tocar vióla
Morcêgo andar no cangaço
Com rifle faca e pistolla
Parahyba fica doida
O Rio Grande se amolla

Ah! se chegasse esse dia !


A que grão subia eu
Bu olhava todo norte
Disia isso aqui é men
Meu avô deu ao meu pai
Meu pai na morte me den
16 —

Tambem eu juro ao meu Deus


Se aleum dia eu me soltar
Faco cousu a cabra ruim
Que o diabo á de chorar
Até cascavel tom pena
Tapurú chega a exclamar

Dessas estradas de ferro


Desgraço todas as linhas
Familias em Pernambnco
So escaparão as minhas
Na Parahyba não fica
Quem bote agua as gallinhas

Se eu escapulir daqui
Não ha mais quem me dé fim
Porque desse dia em diante
Eu hei de faser assim
BEsmolla nem ao men pai
Confiança nem em mim

Eu quero ver se um diabo


Me acha de corpo aberto
A salvação do macaco
E' ser ligeiro e esperto
Faz muito bem o coelho
Dormir com olho aberto

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O REI DOS CANGACEIROS
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O povo me chama grande


E como facto eu sou,
Nunca governo venceu-me
Nunca civil me ganhou,
Atraz de minha existencia
Não foi um só que cançou,
Já fazem 18 annos
Que não posso descançar,
Tenho por profissão o crime
Lucro aquillo que tomar,
O governo ás vezes damna-se
Porém que geito ha de dar?!
O governo diz que paga
Ao homem que me der fim,
Porém por todo dinheiro
Quem se atreve a vir a mim?
Não ha um só que se atreva
A ganhar dinheiro assim.
Ha homens na nossa terra
Mais ligeiros do que gato,
Porém conhece meu riflee
E sabe como eu me bato,
Pucha uma onça da furna,
Mas não me tira do matto.

101]
oÀ me
Telegraphei ao governo
E elle lá recebeu,
Mandei-lhe dizer: doutor,
Cuide lá no que for seu,
À capital lhe pertence
Porém o estado é meu.
O padre José Paulino
Sabe o que elle agora fez?
Prendeu-me dous cangaceiros,
Tinha outro preso fez tres,
O governo precisou
Matou tudo de uma vez.
Porém deixe estar o padre,
Eu hei de lhe perguntar
Elle nunca cortou canna
Onde aprendeu a amarrar?
Os cangaceiros morreram,
Mas elle tem que os pagar.
Depois elle não se queixe,
Dizendo que eu lhe fiz mal,
Eu chego na casa delle,
Levo-lhe até o missal,
Faço da batina delle
Tres mochilas para sal.
Um dos cabras que mataram,
Valia tres Ferrabraz,
Eu não dava-o por cem papas,
Nem quinhentos cardeaes,
Não dava-o por dez mil padres,
Pois elle valia mais.

102
= É ss

Mas mestre padre entendeu


Que 1a acertadamente
Em pegar meus cangaceiros
E fazer delles presente,
Quem tiver pena que chore
Quem gostar fique contente
Meus cangaceiros morreram
Mas elle morre tambem,
Eu queimando os pés aqui
Nem mesmo o diabo vem,
Eu não vou criar gallinhas
Para dar capões a ninguem,
Tudo aqui já me conhece
Algum tolo inda peleja,
Eu sou bichão no governo
E sou trunfo na igreja,
Porque no lugar que passo
Todo mundo me festeja.
No norte tem quatro estados
A' minha dispasiçãa
Pernambuco e Parahyba
Dão-me toda distincção,
Rio-Grande e o Ceará
Me conhecem por patrão.
No Pilar da Parahyba
Eu fui juiz de direito,
No povoado — Sapé,
Fui intendente e prefeito,
E o pessoal d'ali
Ficou todo satisfeito.

L03
cas
1 om
Al no Entroncamento
Eu fui Vigario-Geral,
Em Santa Rita fui bispo,
Bem perto da capital,
Só'não fui nada em Monteiro,
Devido a ser federal.

Porém tirando q Monteiro,


O resto mais todo é meu,
Aquillo eu faço de conta
Que foi meu pai que me deu
() governo mesmo diz:
Zele porque tudo é seu.
Na villa de Batalhão,
Ku servi de advogado,
Já desmanchei um processo
(Que estava bem enrascado,
Jivrei tres ou quatro presos
Sem responderem jurado.
Só não pude fazer nada
Foi na tal Santa Luzia.
Perdi lá uma eleição,
À cousa que eu não queria,
Mas o velho rifãa, diz:
Roma não se fez n'tim dia.
O padre José Paulino
Pensa que angú é mingau
Entende que sapo é peixe
E barata é bacurão,
Pegue com chove e não molha,
Depois não se metta em pão.

LO4.
aee O

Fu já encontrei um padre,
Recommendado do papa,
Tinha o pescoço de um touro,
Bom cupim para uma tapa,
Fomos ás unhas e dentes,
Foi ver aquella garapa.
Quando o rechunchudo viu
Que tinha se desgraçado,
Porque meu facão é forte,
Meu braço é muito pesado,
Disse: vôte, miseravel,
Abancou logo veado.
Lu gritei-lhe: padre-mestre,
Me ouça de confissão,
Elle respondeu-me dammne-se,
Eu lhe deixo a maldição,
Em mim só tinha uma corôa,
Voscê fez outra a facão.
Ku inda o deixei correr
Por elle ser sacerbote,
Para cobra só faltava
Enroscar-se e dar o bóte,
Aonde elle foi vigario,
Quatro levaram chicote.
Foi tanto qu' eu disse a elle:
Padre não seja atrevido
Tire a peneira dos olhos,
Veja que está illudido,
Eu lhe respeito a corôa,
Porém não o pé do ouvido.

105
cad E Sa
(O) velho padre Custodio.
Usurario, interesseiro,
Amaldiçoava quem désse
Raucho a qualquer cangaceiro,
Enterrou uma fortuna,
E eu sonhei com o dinheiro!..

Então fui na casa delle,


Disse, padre eu quero entrar,
Sonhei com dinheiro aqui!...
k preciso o arrancar,
(Quero leval-o na frente
Para o senhor me ensinar.
() padre fez uma cara,
Que só um touro agastado,
Jurou por tudo que havia,
Não ter dinheiro enterrado,
Ku lhe disse, padre-mestre,
Eu cá tambem sou passado.
Lance mão do cavador,
E vamos ver logo os cobres,
Esse dinheiro enterrado
Está fazendo falta aos pobres,
Usemos de caridade |
Que são sentimentos nobres.

Dez contos de réis em ouro


Achemos lá n'um surrão,
Tres contos de réis em prata
Achou-se n'outro caixão,
Eu disse: padre não chore,
Isso é producto do chão.

106
pr

O padre ficou chorando


Eu disse a elle afinal
Padre mestre este dinheiro
Podia lhe fazer mal
Quando criasse ferrugem
he desgraçava o quintal.
Ajuntei todos os pobres
Que tingam nessecidade
Troquei ouro por papel
Haja esmola em quantidade
Não ficou pobre com fome
Ah naquella cidade
O padre José Paulino
Acha que estou descançado
Queria fazer presente
Ao cvovermno do Estado
Deu trez cangaceiros meus
Sem nada lhe ter custado
Um desses ditos rapazes,
Estava até tuberculoso,
O segundo era um asthmatico,
O terceiro era um leproso,
O urubú que o comeeu
Deve estar bem receioso.
Tive nos meus cangaceiros
Um prejuizo damnado,
Primeiro foi Rio-Preto,
Segundo Pilão-Deitado,
Os homens mais destemidos
Que tinham me acompanhado.

107
aO ra
Eu juro pelo meu rifle,
Que o Padre José Faulino
Cae sempre na ratoeira
E paga o grosso e o fino,
Não ha de casar mais homem,
Nem baptizar mais menino.
Eu sempre gostei de padre
“Tenho agora desgostado
Padre querer intervir
Em negocios do Estado?!...,
Viaja sem o missal,
Mas leva o rifle encostado.
Em vez de estudar o meio
Para nos aconselhar,
Só quer saber com accerto,
Armiar rifle e atirar,
Lá onde elle ordenou-se,
Só lhe ensinaram a brigar.
Depois elle não se queixe,
Nem diga que sou malvado,
Elle nunca assentou praça
Como póde ser snldado?
Não tem razão de queixar-se,
Se tiver mau resultado.
Quatro estados reunidos
Tratam de me perseguir,
Julgam qne não devo ter
O direito de existir,
Porém emquanto houver matto,
Éu posso me escapolir.

108
as O que

Eu ganhando essas serras,


Não temo alguem me pegar
A'nda sendo um que pegue,
Uma piaba no mar,
Um veado em matta virgem
E: uma mosca no ar.
Eu já sei como se passa
Cinco dias sem comer,
Quatro noutes scm dormir,
Um mez sem agua beber,
Conheço as furnas onde durmo
Uma noute se chover.
Uma semana de. fome,
Não me faz precipitar,
Mato cinco ou seis calangros
Bóto no sol a seccar,
Quatro ou cinco lagartixas,
Dão muito bem um jantar.
Eu passei mais de um mez
Numa montanha escondido,
Um rapaz meu companheiro
Foi. pela onça comido,
Por essa onça tambem
Eu fui muito perseguido.
Era um logar esquisito,
Nem passarinho cantava!...
Apenas á meia noute
Uma coruja piava,
Então uma grande onça,
De mim não se descuidava.

109
E

Havia muitos mocós,


Ku não podia os matar,
Andava tropa na serra
Dia e noute a mc caçar,
No estampido do tiro
Era facil alguem me achar.
Passava-se uma semana
Que nada ali eu comia,
Eu matava algum calangro
Eue por perto apparecia
Botava-os na pedra quente
Quando seccava eu comia
Quando apertava-me a sêde
Pegava crõa de frade
Tirava o miolo della
Chupava aquella humidade
Lá eu conheci o peso
Da mão da necessidade
Um dia que a tropa andava
Na serra me procurando
Viram que um grande tigre,
Estava em frente os emboscando
Um dos officiaes disse:
Estamos nos arriscando.
E o Antonio Silvino
Não anda neste logar,
Se elle andasse, aquella onça
Havia de se espantar,
Eu estava perto delles,
Ouvindo tudo fallar.

HO
nas, RIR clica
Ali desceu toda a tropa,
Não demoraram um momento,
Um soldado que trazia
Um sacco de mantimento,
Por minha felicidade
Deixou-o por esquecimento.
Eu estava dentro do matto,
Vi quando a tropa desceu
O tigre soltou um urro,
Que uv tenente estremeceu
Até a borracha d'agua
Uma das praças perdeu.
Quando eu vi que a tropa ia
Já n'uma grande lonjura,
Fui, apanhei o mochila,
Achei carne e rapadura,
Farinha, queijo e café,
Ahi chegon-me a fartura.
Achei a borracha d'agua
Matei a sêéde que tinha,
À carne ja estava assada,
Fiz um pirão da farinha,
Enchi a barriga e disse:
Deus te dê fortuna, oncinha.
Porque a tua presença
Fez toda a força ir embora,
O ronco que tu soltasses,
Encheu-me a barriga agora,
Eu com a sêde que estava,
Não durava meia hora.

111
E
E é agora o que faço,
Havendo perseguição,
Procuro uma gruta assim
E lá faço habitação,
Só levo lá, um, dous rifles
E o sacco de munição.
Me mudo para uma furna
Que ninguem sabe onde é,
À furna tem meia legua
Marcando de vante a ré,
À onça chega na bocca
Mas dentro não põe o pé.
À onça conhece a furna,
Desde a entrada á sahida
Porém qual é essa féra
Que não tem amor á vida?
Uma onça parte assim,
Se veudo quase perdida!...
Quando eu deixar de existir
Ninguem fica em meu lvgar,
Ainda que eu deixe filho,
Elle não pode ficar,
Porque a um pai como eu
Filho não póde puxar.
Pode ter muita coragem
Ser bem ligeiro e valente,
Mas vamos ver se supporta
Passar tres dias doente,
Com sêde de estalar beiço
E fome de serrar dente.

112
asa VAsas

Se não tiver natureza


De comer calangro cru,
Passe um mez sem beber agua
Chupando mandacaru,
Dormir em furna de pedra
Onde só veja tatu,
Não podendo fazer isso,
Nem pense em ser cangaceiro,
Que é como um cavallo magro
Quando cáe no atoleiro,
Ou um boi estropiado
Perseguido do vaqueiro.

Ha de ouvir como cachorro,


Ter faro como veado,
Ser muis subtil do que onça,
Maldoso e desconfiado,
Respeitar bem as familias,
Comer com muito cuidado.
Andar em qualquer lugar
Como quem está no perigo,
Se fo chefe de algum grupo,
Ninguem dormirá comsigo,
O proprio irmão que tiver,
O tenha como inimigo.
O cangaceiro sagaz
Não se confia em ninguem,
Não diz para onde vai,
Nem ao proprio pai se tem,
Se exercitar bem nas armas,
Pular muito e correr bem.

113
E,

Em meu grupo tem entrado


Cabra de muita coragem,
Mas acha logo o perigo
E encontra a desvantagem
Foge do meio do caminho,
Não bota o meio da viagem.
Porque andar vinte leguas
Isso não é brincadeira,
E romper matto fechado,
Subir por pedra e ladeira,
Como eu já tenho feito,
Não é lá cousa maneira.
Pegar cobra como eu pégo
Quando ella quer me morrder,
Cascavel com sete palmos,
Só se Deus o proteger,
Mas eu pego quatro ou cinco
E solto-a, deixo-a viver.
Que é para ella saber,
Que só eu posso ser duro,
Eu já conheço o passado,
Nelle ficarei seguro,
Penso depois no presente
Previuo logo o futuro.

14
AVISO
Com o fim de evitar os abusos
constantes, resolvi d'ora em diante es-
tampar em todas as minhas obras o
meu retrato em um cliché, sem logar
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117
O azar ea feiticeira
Andava o azar no mundo
Sem ter aonde pousar
Foi em casa de uma velha
Pediu para se arranchar
Disse-lhea velha: pois não!
Vossa mercê pede entrar.

Meu filho não esta em casa


Meu marido ja morreu
Porem minha casa O cabe
Com tudo quanto for seu
Meu filho não estã em casa
Em logar delle estcu eu,

Ássim que o azzr entrou


Cabio arua no fogão
Quebreu- se Jogo a panella
Que cousinhava feijão
Queimou-se a colher de paãu
E furouse o caldeirão.

Furou-se o pauno da cama


Aonde a velha dormia
Uma gallinha quebrou
O prato onde ella comia
Veio um rato carregou-lhe
O lençol que sc cobria.
A velha foi tomar banho
Para tirar a caipora .
Tirou a roupa que tinha

118
Lo
Deixou do lado de fora
A roupa ca pegou logo
Queimou-se em menos de um'hora.

Foi ella acudir a roupa


E cahio numa cisterna
Sahiu e com potco mais
Desconjuntou uma perna
Murmurou ella comsigo:
Esta caipora é moderna.

Voltou ella para casa


tm delirio de paixão
De longe viu a fogueira
Do incendio do pilão.
Achou o sal derramado
E a farinha velo chão.

Foi à cama do azar


Achou elle resomnando
Do quarto que elle dormia
Os caibros estavam estalando
As telhas já cai não cai,
As paredes se furando.

Amigo ! perguntou ella,


Como se chama o senhor?
Azar: respondeu q hospede
Meu pae se chama rigor,
Minha mãe d. Desdita
Minha avó chama-se Dôr.

119
va
Pois, camarada, levante-se
Faça favor de ir embora
Vosmincê chama-se azar
EÉ' conductor da caipora
Eu que sou tão feiticeira
Vosmincê chocou-me agora,

Quando ouviu isto o azar


Levantou-se na carreira
Dizendo: eu te desconjuro
Maldita ave agoureira
Me arranchei por não saber
Que tu eras feiticeira,

A velha em tudo mostrou-se


Que estava mal satisfeita
Disse ao azar: nessa casa
Você nunca mais se deita.
Vio no bolço do azar,
Um livro da nova seita.

A velha exclamou: meu Deus |


Viver assim ninguem pode
Boto a desgraça de um lado
Do outro a miseria acode
Este diabo é ovelha
Da criação de frei bode.

O azar sahio damnado


Em desmedida carreira
Dizendo: fica-te, tinha,

120
4
AA
Aaa

Brucha infeliz feiticeira


Deixo-te fome dez annos
Por um seculo tens gafeira.

A Orphá
Acordou o avarento
Mas quesi desesperado
Com horror daquelle sonho
Estava bastante suado
Exciamando entre si mesmo!
Oh ! meu paí foi condemnado.

E disse ainda: comtudo


Eu não desprezo o dinheiro
Inda que vã acinfernro
Não fui cu quem foi primeiro
Se c tiabo for quem dizem
Lã tenko por certo este herdeiro.

Vamos tratar em Mathilde


O que foi de sua vida.
Em companhia do cão
Naquelle bosque mettida
Os cabellos lhe cresceram
Com elles ficou vestida.

121
o
ALÇA
AO AA

O cão era um cão de fila


Que toda fera o temia
Os lobos viam Mathilde
Perto della nem um ia
Porque quem chegasse perto
Nas presas do cão morria.

Faziam dezesseis annos


Que ella no bosque habitava
Em uma furna de pedra
Mathilde à noute pouzava
O cão na becca da furna
Alerta se conservava.

O cão matava animaes


Para a sua alimentação
Mas Mathilde só comia
O que nascia do chãe,
Batatas, mcl das abelhas,
Fructas, folhas de agrião.

Agora nos é preciso


Tratar no rico avarento
Para ver quantas mizerias
Em quem foi tão cpulento
Vero regresso da sorte
Ver da desgraça o augmento.

O nome do avarento
Era Aquilino Vilar
Tinha vinte e oito engenhos.

122
f)

Trinta navios no mar


O que tinha no Brazil
Nãe podia calcular.

Perque só de terra tinha


Quatorze legoas cercadas
Isto tudo em uma praia
Muitas fructciras plantadas
Duas mil casas nas ruas
Por bom dinheiro arrendadas.

Fóra dinheiro dos barcos


Que ignere a quantia
A historia não ncs conta
Oue milhões clle teria
Só diz que muito cinheiro
Nos bancos elle possuia.

à mulher deile um'alma


A quem se diz caridesa
Uma espcz:: sem exemplo
Creatura virtuosa
De tudc elia tinha pena
Era docil e picdesa.

Fóra da presença delie


Soccorria os desgraçados
Ctiou muitos crphãos fora
Curou muito aleijados
Quando clle sabia disio
Ficava desesperado.

123
T
Então ella lhe dizia:
Maldito o que trabalhar
Só para ajuntar riqueza
E no mundo amontoar
Porque depois desta vida
O que pode aproveitar ?

À riqueza desta vida


E' honra, crenca e saúde
Para outra só leva
Os productos da virtude
São iguaes a catacumba,
O sollo e o ataúde.

Quando ella disse isso


O avarento aggravou-se
Mandou chamar o juiz
Com a mulher disquitou-se
Abrasado de paixão
Da esposa separou-se.

Quando foi no outro dia


Caiu orico doente
Era um mal desconhecido
Uma febre intermittente
Elle dizia comsigo:
Morro agora certamente,

Elle sô deu à mulher


Um quarto dos possuidos.
Desse, ella tirou um quarto

124
Deu de esmola aos desvalidos
Então foi ser enfermeira
No hospital dos feridos.

O rico nessa doença


Gastava sem excepção
Nos possuidos que tinha
Apresentou-se questão
Perdeu os trinta navios
Um dia de serração.

Outro desastre terrivel


Nas mil casas arrendadas
Elie não pagou imposto
Às casas foram cmbargadas
Todas quanto possuia
Foram em praca arrematadas.

Nos sitios todos «oe tinha


Apresentou-s: questão
Muitos que forem de orphãos
E sem autorisução
De juiz e de tutores
Elle lançava-lhe « mão.

Não tinha procurador


Pois sempre foi usurario
Um empregado que tinha
Tinha um misero salario
A questão achou-o doente
“Pudo correu-lhe ao contrario.

125
Perdeu a questão da terra
Os navios afundaram
As casas é como se sabe
Km praça se arremataram
Onde elle tinha dinheiro
Os bancos todos quebraram.

Quando elle soube de tudo


Baixou a face e coro
Fez mil calculos de uma vez
Em cousa alguma acertou
Já não poude mais pagar
Ao medico que o tratou,

O medico chamou-c e disse:


Dão Aquilino Villar
Disse seu procurador,
À quem eu mandei chamar,
Que V. Exc. não tem
Mais meio para pagar.

Respondeu Dã» Aquilino:


Não estou muito desgraçado
Ainda tenho um palacio
Que tem valor aynitado.
Este não! disse-lhe o medico,
A dias foi embargado.

Embargado meu palacio!


E o que devo mais eu ?
A despeza do divorcio

126
LO
De ii ii io ii

O juiz não recebeu


A mulher pagou a della
Ficou por pagar o seu.
Dá-se o caso ! exclamou elle,
De eu não ter onde morar ?
Um infeliz como eu
Deve se suicidar
Pobre, sem mulher, sem filhos,
À que mais posso chegar!

Pedir esmola ? isso não |


Morro mais não pedirei
Psrque quando eu era rico
Pediram mas eu não dei,
Muitos lançarão-me em rosto
As esmolas que cu neguei.

Nos bosques não ha quem saiba


Se fui plebeu ou fu: nobre
Ninguem me perguntará
Porque foi que fiquei pobre
Todcs nãc se importarão
Que o pão me falte ou me sobre.

Ahi fallou aos medicos


E disse: quero sahir
Não posso paga: meus debitos
Não devo aqui existir
Vou morrer onde ninguem
Veja eu me concluir.

127
1
Aa RS AO AO

Seguio ur&a estrada longa


Que hia para um deserto
Viu tudo quanto foi d'elle
Murmurou a Dens por certo:
Quem fui hontem! quem sou hoje
Meu tumulo já está aberto.
Viu no mar inda um dos mastros
De um seu navio que afundou
Sentou-se sobre uma pedra
À soluçar murmurou:
Tanto dinheiro que tive!
Hoie em que desgraça estou !

Segutu sem saber aonde


Poderia elle ficar
Ouviu o canto das aves
Espiava para o mar
Se recordava quem foi
Ahi deitava a chorar.

Perdeu-se em cima de um monte


Ja ha dous amnos vivia
Um dia que elle caçava
kructas que era o que comia
Cahio de cima de uma arvore
Passou sem sentido um dia.

Quando veio tornar em si


Jã tinha o sol se escondido
E elle só ouvia alli

128
12

Da tempestade o rugido
Elle sem poder virar-se
"Todo quebrado e ferido.

Terminarã nos martyrios de


Christo.

Sonho de illusão
Não sei o que tem a sorte
Que só quem anda a capricho
Se planto milho ou feijão
Nasce ortiga ou carrapicho
Se tenho um sonho visivel
Vou jogar erro no bicho.
Uma noite eu fui dormir
Sem ceiar por não ter pão
Disse-me a mulher : marido,
Faça ao menos uma oração
Veja se sonha com o bicho
Que tire esta precisão.

Disse a mulher : minha tia


Prometteu a S. José
Um rosario de joelhos

129
13
Ca
aa a

Resado com muita fe.


Tirou duzentos mil réis
No gato e no jacare.

Ahi me puz de joelhos


E disse: meu S. José,
Se me fizer o que fez
A' mulher do jacaré
Eu te faco dez jejuns
Tudo com pão e cafe.

Adormeci e sonhci
Que chegava um ancião
Um homem bastante velho
Apoiado em um bom bastão
E disse: anda commigo,
Ku te acabo a precisão.

Ev hia com elle a um campo


Debaixo de um ingazeiro
Disse clle: cave-aqui
Que acha muito dinheiro
Agora podes fazer
Inveja a qualquer banqueiro.

Por sonho cavava o chão


“Virava umas velhas ripas
Achava dentro da terra
Uns arcos como de pipas
A mulher gritou: oh ! homem|
Você arrancou-me as tripas.

130
14
Ei ai

Acordei, tomei um choque


A mulher estava damnada
Perguntou-me: eu como vivo
Com a barriga ilurada ?
Eu disse: minha mulher,
Ao menos não casto nada.

Ahi eu contei a clla


O que estava sonhando
Ella disse: é S. Jow
Que está velho caducando
Acertou quando era maço
Velho sempre vive crrando,

Ah: fui ver a mulher


Achei-a então nesse estado
As tripas todas de fora
O facto todo furado
E o osso do quadril
Já estava desconjuntado.
Um rim já estava arrancado,
O bofe tinha cahido,
Quatro bacias de sangue
Do corpo tinha sahido
Ku não chorava por ella
So pensava no vestido.

Felizmente um sapateiro
Disse: se o sr. quizer
Com cêra, sovela e linha,

131
15
Ma ÇÃO a A A

Se endirecita uma mulher


Eu só não boto a lingua
Boto outra peça qualquer.

Sonho de um portuguez
Um portuguez que amava
A uma sua patricia
Com muito amor e caricia
Disse a ella:

Por sonho beijei-te, donzella,


Na tua bocca de anjo
Tu eras como um archanjo
Dibino.

Tonvem quasi disatino


Sunhando que te beijava
Pois em tua bocca achava
Um patacão.

Ella perguntou-lhe: então


Dos dous o que preferias?
Bisto a crise de hoje em dias
O dinheiro.

132
16
ça
aà a a

Porque hoje o caballeiro


Aqui neste portugale
Se não tiber o reale
Morre.

Deus é um paí que soccorre


Porem é depois de morto
De Lisbôa até o Porto
Tudo é crise.
E qualquer que o volço dali
Bendo a algibeira esgutada
Não prefere nemorada
De dinheiro?

Ella dis=c: cavalheiro,


Amor não olha riqueza
Só olha para pobresa
Quem não ama.

Disse elle: u crise enfama


Como tisica pulmonar
E a quebradeira é um mal
Sem cura.

133
e! e pe Pa a e a a, e e 1À

Leandro Gomes de Barros

BATALHA |
o

Faerreraatbrraaz: ||
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com ÓOliveiros
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139
Bode ferrrvo pro

AMO sy 04.
Batalhas de Oliveiros com Ferrabraz
Eram doze cavalleiros
Homens muito valorosos,
Destemidos, animosos,
Entre todos os guerreiros,
Como bem fosse, Oliveiros
Um dos pares de fiança
Que sua perseverança
Venceu todos infiés,
Foram doze leões cruéis
Os doze pares de França.

Todos eram conhecidos


Pelos leões da igreja,
Pois nunca forani à peleja
Que nella fossem vencidos,
Eram por turcos temidos,
Pela igreja estimados
Porque. quando estavam armados
Suas espadas luziam,
E os inimigos diziam:
— Esses são endiabrados.

Tinha o duque de Nemé


Que era uma espada medonha,
136
cc ou

O grande Guy de Borgonha


Geraldo de Monde Fé.
Carlos Magno tinha fé
Em todos seus cavalleiros,
Pois entre todos guerreiros
De que nes trata a historia,
Vê-se sempre a maior gloria
De Roldão e Oliveiros.

O almirante Balão
Tinha um filho—o Ferrabraz.
Que entre os turcos, era o mais
Que tinha disposição
Mesmo em nobreza de acção
Era o maior que havia
Então em toda Turquia
Oude se ouvia fallar,
Tudo tinha de respeitar
Ferrabraz de Alexandria.

Foi Ferrabraz procurar


Sahiu com uma grande tropa
Vê se achava na Europa
Um rei para pelejar,
Pegou logo a exclamar
Com mais precipitação,
Fazendo uma exclamação,
Insultando os cavelleiros,
Fallando contra Oliveiros
Fazendo accinte a Roldão.

137
a

Quando Ferrabraz chegou


Nos campos de Mormionda,
Só um trovão quando estronda
Trôa como elle troou,
Em altas vozes gritou
Apoiado em uma lança,
Como uma féra que avança
Precipitada em furor
Dizia oh! imperador
Que dê teus pares de França?

"Stás poupando teus guerreiros


Que nem um vem pelejar?
Para que queres guardar
Esses doze cavalleiros?
Ouço dizer que Oliveiros
Tem tanta disposição,
E' propria a occasião,
Se não tens dó dos cavalleiros.
De uma vez mande Oliveiros
Guy de Borgonha e Roldão.

Ninguem ahi respondeu


E Ferrabraz se apeiou,
Numa sombra se assentou
Em vozes altas rompeu,
Carlos Magno se escondeu:
Ou está hoje sem acção?
Os pares onde é que estão?
Não ouço nem um fallar,

138
=

Já não posso acreditar


Nas façanhas de Roldão.

Sahirei daqui dizendo:


—bCarlos Magno se escondeu?
Roldão não me appareceu
Talvez ficasse tremendo...
Eston só, como está se vendo
Elles são doze guerreiros
Como 12 cavalieiros,
Não dão batalha a um só?
Porque não vem uma mó
Roldão, Ricardo, Oliveiros?

Eu sosinho nesta campanha


Contra um exercito francez,
E matal-o de uma vez,
Não digo que isto é façanha.
Um exercito não me ganha,
Ainda eu mesmo doente.
Como é que existe gente
Que se atreve a exaltar
E pelo mundo espalhar
Que Carlos Magno é valente?

Carlos Magno perguntou


Quem tanto o insultava,
Quem tão rebelde fallava.
Ricardo ahi lhe explicou
Lhe disse esse que chegou,

139
É =

E' um grande da Tarquia,


Turco de muita energia,
Impera sobre o seu throno.
E' o legitimo dono
Do reino de Alexandria.

Aquelle foi o que entrou


Dentro de Jerusalém
Não respeitando ninguem
Até apostolos matou.
No templo sagrado-achou
Balsamo que Deus foi ungido
Cousas que tinham servido
Na paixão do Redemptor.
A corôa do Senhor
Tudo elle tem conduzido.

Carlos Magno observou


Que nem um se offereceu,
Logo ahi entristeceu
Chamou Roldão e o mandou.
Disse Roldão—eu não vou
Nem eu, nem meus companheiros
Nos combatas derradeiros
Nós exgottamos os valores,
Quem foram merecedores
Foram os velhos cavalleiros.

Nessa ultima batalha


Sanguinolenta e tyrana,

140
mom:

Minha espada durindana


Não mostrou uma só falha,
Daquella bruta canalha
Arrebatei a victoria,
Me ficará de memoria
Aquelles grandes perigos
Os cavalleiros antigos
Foi a quem désses a gloria.
Carlos Magno quando ouviu
A resposta de Roldão
Se encheu de tanta paixão
Que um ferro lhe sacudiu.
Roldão quando olhou que viu
O sangue delle descer,
Não poude mais se conter,
Se armou com tal furor
Que não foi ao imperador
Por Ricardo se interver.

Carlos Magno ordenou


Que os pares o pegasse,
Depois de preso o matasse.
Roldão de novo se armou
Pela espada puxou
E disse em alta linguagem
Com destemida coragem,
Fallou a todos assim:
—(Qualquer que tocar em mim
Diga que está de viagem.

141
aO

Tudo alli ficou callado


Não fallou um cavalheiro
Roldão era o companheiro
Dentre todos mais amado,
De mais era respeitado
Pela nobreza e acção,
Tinha um leal coração
Para com seus companheiros
E mesmo dos cavalheiros
Era elle o capitão.

Carlos Magno ficou


Certo de que ninguem ia
Disse que mesmo queria
Ver quem o desafiou;
Quando .a noticia chegou
Aos ouvidos de Oliveiros
Que soube que os cavalleiros
Não tinham lhe obedecido,
Ficou bastante sentido
Desta acção dos companheiros.

Ordenou ao escudeiro
O cavallo lhe sellar
E mandou logo apromptar
Arreios de cavalleiro...
E gritou—ande ligeiro,
Me ajude logo a armar,
Pode o turco se gabar,
Matei um dos cavalleiros,

142
o

Porem não diz Oliveiros


Temeu commigo luctar.

Assim que Guarim sentiu


Seu senhor fallar em guerra,
Pôz os joelhos em terra
Até por Deus lhe pediu,
Porque imaginou e viu
Que elle não estava capaz,
Porque já era demais
O sangue que lhe sahia,
Por isse por Duus pedia
(Que não fosse a Ferrabraz.

Guarim, podes descançar,


— Qliveiros respondeu.
Um soldado como eu
Não deixa seu rei chorar,
Pois o turco ha de acreditar
Que mil féras não me comem
As minhas façanhas se somem
Mas emquanto eu não morrer
Ferrabraz ha de dizer
Em França encontrei um homem.

Quando do leito se ergueu


Pôz uma perna estendida,
Logo ahi de uma ferida
Porção de sangue desceu,
O escudeiro tremeu

143
ado a

Ássim que o sangue espanou


E elle não se importou
Como que estivesse são,
Fincou a lança no chão
E de um só pullo montou.

E foi ao imperador
Com a maior reverencia:
Disse com obediencia
— Esclarecido senhor,
Eu não sou merecedor
Que cousa alguma me dê
Por isso, senhor, bem vê
Que valor tem seu captivo
Por 10 annos que te sirvo
Vim pedir-te uma mercê...

Disse-lhe o imperador:
— Pode Oliveiros dizer
Eu juro o satisfazer
Seja que pedido fôr.
Disse-lhe Oliveiros: Senhor!
Não quero cousa de mais,
E não serei tão capaz
Para tanto te pedir
Porem, o que quero é ir
Dar batalha a Ferrabaz.

Carlos Magno quiz faltar


Devido ao seu mão estado,

144.
— 10 —

Porem já tinha ordenado


Não podia revogar.
Viu Oliveiros montar
E muito sangue sahir
Rogou-o para não ir...
Disse Oliveiros: irei
Se desfeitiando meu rei
De que me serve existir?

Não posso aqui declarar


O que era de mistér
Como ficou Regner
Vendo ÓOliveiros montar,
Ficou a se lastimar
Vendo os outros cavalleiros,
Elle com mil desesperos
Prostrado em terra se lança
Perdeu a ultima esperança
—De ver seu filho Oliveiros.

Ferrabraz estava deitado


Sentio chegar Oliveiros
Foi ver se eram os cavalleiros
A quem já tinha insultado,
Depois de ter bem olhado
Cresceu-lhe mais o furor,
Com desprezo aterrador
E raiva dos cavalleiros
Perguntou a Oliveiros:
—ô(Que fizeste ao teu senhor?

145
gene:
EE rm

Levante-se, cavalleiro,
Prepare as armas e as aprompte
Pegue o cavallo, se monte,
Trate de ser bom guerreiro
Ponha seu corpo ligeiro
Veja não dê uma falha.
A morte entre nós se espalha,
A hora de um é chegada
Lance mão de sua espada,
Vamos entrar na batalha.

Quem és tu, tão pequenino


Que vem me desafiar?
Achas que vou me occupar
Em dar batalha a menino?
E's louco, tu não tens tino,
Disse o turco com furor.
Seja por qual forma fôr,
Me diga agora, confesse,
E me diga o que fizesse
Contra a teu imperador?

Disse Oliveiros zangado:


Venha pelejar commigo,
Perante teu inimigo,
E' ser vil pôr-se deitado.
Devia ser delicado
Lhe reflectio Oliveiros
Na ordem dos cavalleiros
Encontra-se a educação,

146
— TO

Pois isso não é acção


Vinda dos grandes guerreiros.

O turco disse afinal:


Oh! cavalleiro, lhe digo,
Só pode luctar commigo
Se fôr de sangue real,
Porque se não fôr igual
Recusarei a empreza
Fallo com toda franqueza...
Fntão Oliveiros disse:
Pode crêr como que visse
Minha origem é de nobreza.

Ferrabraz lhe esclareceu:


Teu nome has de me dizer.
Primeiro eu hei de saber.
Disse Oliveiros: do teu
Disse Ferrabraz: o meu
O direi sem mais porfia,
Pois minha soberania
Não exige cousas taes,
Eu me chamo Ferrabraz,
Sou o rei de Alexandria.

Eu sou Guarim de Lorenda.


Oliveiros respondeu
Hoje foi que succedeu
Dar a primeira contenda.
E lhe digo que se renda

14%
o

Que o levarei com amor,


Fique sabendo o senhor
Hoje não pode escapar
Eu hoje tenho de o levar
Para o meu imperador.

O turco disse-lhe assim:


Teu rei é muito malvado
Pois pega um pobre soldado
Sem causa quer dar-lhe fim.
Porque em tu vires a mim
E' ser muito louco ou bôbo,
E' como fazer um roubo
À quem não possue dinheiro,
KE' atirar um cordeiro
Dentro da jaula de um lôbo.

Oliveiros já massado
Disse: turco és um louco...
Levanta-te, senão com pouco
Hei de ferilo deitado.
Que tempo tem se passado
Nessas tuas discussões
Eu não vim ouvir razões
Vim ao campo pelejar,
Tu és franco no fallar
Vamos vêr tuas acções.

Ferrabraz sem se alterar


Lhe disse: espera Guarim,

148
a TÃ so

Peço que digas a mim


O que te vou perguntar.
Então pôz-se a indagar
Com a falla muito mansa
Como quem pensa e descança.
Perguntou a Oliveiros:
— Como são os cavalleiros
Que formam os pares de França?

Oliveiros disse assim:


Roldão tem bôa estatura
Oliveiros na figura
E' mesmo que vêr a mim,
Guy de Borgonha, Bofim,
Ricardo são quasi iguaes,
Pegou num, é um voraz,
Porem emquanto a Roldão
Em coragem e coração
O mundo não terá mais.

Disse Ferrabraz: então


Porque desses cavalleiros
Não veio a mim o Oliveiros?
Guy de Borgonha ou Roldão?
Disse Oliveiros: isso não
Oliveiros está doente
Bofim tambem anda auzente,
Gui de Borgonha ficou,
Roldão nunca se occupou
Brigar com um turco somente.

149
mis a

Guarim tu tens me mentido


Disse que és novo grierreiro,
E's antigo cavalleirc
Tanto que tu estae, ferido.
Mais Oliveiros fin ido
Disse: esse sanguc é d'agora
Eu estou são; porem embora
Tenha na junta al; um callo,
O sangue é de meu cavallo
Que é muito duro de espora.

Depois de se levantar
Ferrabraz se preparou,
A Oliveiros rogou
Que o ajudasse a armar.
Oliveiros quiz faltar
Por achar que era um perigo.
Disse Ferrabraz: lhe digo
Confie em minha nobreza,
Eu não uzo da vileza
Para com meu inimigo.

Oliveiros se apeiou
Ajudou a Ferrabraz,
Com cortezias iguaes
Elle tambem o tratou.
Quando Ferrabraz se armou
Vestiu a saia de malha
Na qual não tinha uma falha
Feita por outros guerreiros,

150
aE

Montaram-se os cavalleiros
Deram começo a batalha.

Posto em ordem proseguiram


A lucta em estreitos passos,
Das grossas lanças os pedaços
De ambos ao longe cahiram,
Ambos logo se serviram
De cuas finas espadas
Cortuntes, grandes e pesadas
Que era uso dos guerreiros
Das feridas de Oliveiros
Foram tres as magoadas.
Disse Ferrabraz: Guarim,
Pela crença dos fieis
Confesses logo quem és,
Não sejas fingido «ssim,
Creio que mentisses a mim
Tu és um dos cavaleiros
Daquelles grandes guerreiros
Que a fama está espalhada,
Pelo pegar da espada
E's Roldão, ou Oliveiros.

Disse o hoste dos guerreiros:


Turco tens uma attracção
Para roubar coração
Dos mais duros cavalleiros.
Confesso, sou Óliveiros,

151
E |

Minha fama tens ouvido.


Ferrabraz ficou sentido
De seus insultos primeiros
Disse: —desculpe Oliveiros
Não tel-o bem recebido.

Ahi tornaram a partir


Em ordem de cavalleiros.
Disse o turco a Oliveiros
-—Não posso mais te ferir:
Vejo teu sangue sahir
Devido estares estragado;
Eu tenho o balsamo sagrado
Com que teu Deus foi ungido,
Bebe-o porque estás ferido,
Bebendo ficas eurado.

Turco eu não hei de acceitar


Cousa alguma que me deres,
Salvo se tu quizeres
Crêr em Deus e te baptisar
Do contrario é se cançar
Porque não acceito nada,
Estou com a vida arriscada,
Sei do poder que tem elle
Porem só me sirvo delle
Tomando-o pela espada.

Ahi ambos prevenidos


Não escutaram razões,
2

152
— 18 —

Pareciam dois leões


Numa jaula enfurecidos.
Dous golpes iguaes medidos
Todos dous descarregaram,
Com a força que botaram
Os braços ficaram bambos
E os cavallos de ambos
Em terra se ajoelharam.

Oliveiros recebeu
Um golpe tão desmarcado
Que ficou atordoado
E muito sangue desceu.
O turco ahi conheceu
Delle as forças abatidas
Com vozes compadecidas
Disse Oliveiros teimoso,
Bebe o balsamo milagroso
Que te cura essas feridas.

Ferrabraz, eu nada acceito


Assim não deves cansar-te,
Confesso de minha parte
Que toda offerta regeito.
Porque eu não me aproveito
D'uma acção acobardada
Por uma protecção dada
Pois que prefiro morrer
Que do teu balsamo beber
Sem o tomar pela espada.

153
sas O ac

Beijou a cruz da espada


Proseguio uma oração!
Oh! Virgem da Conceição!
Maria pia e sagrada,
Mãe de Deus immaculada,
Esposa casta e fiel!
Pelo vinagre e fel
Que Christo bebeu na Cruz,
Rogae por mim a Jesus,
Nessa batalha cruel.

Partiu ao seu contendor


Com tanta disposição
Que só se tivesse são
Teria tanto valor.
Deu-lhe um golpe matador
Porem pegou mal pegado,
Feriu o turco de um lado
Ferrabraz se desviou
Tirando o balsamo o tomou
Ficou de tudo curado.

Oliveiros cntristeceu
Quando viu Ferrabraz são,
E disse no coração
Quem perde a lucta sou eu...
Porem não esmoreceu
Nem deu mostração de falha
Como o homem que trabalha
Disse sem poder contcr-se,

154
sos BMqe

Falta pouco para vêr se


O fim de nossa batalha.

Disse o turco—cavalleiro:
Tu já estás muito ferido
Queira acceitar meu partido
Renda-se, prisioneiro,
Assim lhe farei o herdeiro
Do reino de Alexandria,
E tem mais a garantia
De hoje para amanhã,
Casarás com minha irmã,
A flor de toda Turquia.

Disse -Oliveiros: —Senhor


Eu não prefiro riqueza,
Quero morrer na pobreza
Mas bem com meu salvador...
Porque foi meu creador
E por minh'alma trabalha,
Um estante não se empalha
Para valer os fieis,
Turco, cuida em teus papeis,
Vamos dar fim a batalha.

Cobriu-se com seu escudo


Beijou a cruz da espada,
E deu uma cutilada
Que desceu arniés e tudo.
E dando outra a miudo,

155
a ME qua

A Ferrabraz offendeu
O cto o favoreceu
Um revez escapoliu
O balsamo delle cahiu
E Oliveiros bebeu.

Ferrabraz admirado
Por ver tanta ligeireza,
E vêr aquella destreza
Em quem já estava cunçado.
Viu Oliveiros curado
De todas suas feridas
Suas forças abatidas,
Mas estava tão renitente
Que parecia-lhe um ente
Com quinze ou dezeseis vidas.

Depois de ter apanhado


O balsamo que lhe serviu,
Dentro do rio saccudio
O que inda tinha ficado.
Ferrabraz ficou massado
Por Oliveiros botar
O que não podia achar
Ainda a peso de ouro,
Do mundo todo thesouro
Não poderia comprar.

Oliveiros respondeu:
Ferrabaz fique sabendo

156
O

Que a tudo Deus está vendo


Pois o mundo todo é seu,
Um guerreiro como eu
Não vae atraz de cilada
Com Deus não me falta nada
Me bastam os prodigios seus
Não quero mais do que Deus
Uma lança, uma espada.

E tornou o investir
Que só um leão voraz.
E disse: Senhor Ferrabraz
E' tempo de decidir,
Só se ouvia era tinir
As espadas pelo ar.
Roldão que estavo a olhar
De vez em quando dizia:
Oliveiros eu queria
Estar agora em teu lugar.

Já tinha se espedaçado
Arnéis, capecête e tudo,
Não tinha mais uimn escudo
Que não tivesse quebrado.
As lanças tinham voado
Só as viseiras existiam
Elles já mal se cobriam
Nas horriveis cutiladas.
Somente as duas espadas
Sem damno algum resistiam.

157
O,

Olíveiros se propina
E partiu ao inimigo..
O turco vio o perigo
A pé firme o esperou,
Um golpe nelle deitou
Com tanta disposição
Sem ser proposito ou traição
Nesses golpes tão ligeiros,
O cavallo de Oliveiros
Cahiu sem vida no chão.

Turco tu estás bom montado


E meu cavallo morreu.
Ferrabraz lhe respondeu:
Mas eu não fui c culpado.
Não ficarás desarmado
Que eu sei a ordem qual é
Não desanimes na fé
Eu fui quem matei o teu,
Agora monte no meu
E vou pelejar de pé.

Disse-lhe Oliveiros: não


Fico tambem desmontado
Tu não fosses o culpado
Assim era ser vilão,
Por certo eu tinha razão
Porque matasses o meu,
Foi caso que aconteceu
Era-me feio acceital-o.

158
em REua

Não brigo só a cavallo


Podes descançar o teu.

Ahi Ferrabraz atou


Num alvoredo o cavallo
E disse vou descançal-o
Sua ocasião chegou,
Para a batalha marchou
Com toda disposição.
Oliveiros forte e são
Esperava cara a cara,
Com a espada Alta Clara
Rugindo que só leão.

Eu agora me lembrei
Da falta que commetti,
Mas foi porque me esqueci,
Por isso não relatei.
Porem sempre fallarei
Para o leitor se agradar,
Quem sabe ha de se lembrar
Na lucta dos cavalleiros,
O cavallo de Oliveiros
Quando quiz desembestar.

Com a grande cutilada


Que Oliveiros recebeu,
Quando o cavallo correu
Não obedecendo a nada,
Sahiu numa desfilada.

159
ai: DON sa

Mas o turco o atalhou


Oliveiros até pensou
Que fosse alguma tragedia,
O turco pegou na redia
E o cavallo parou.

Outra parte que dizia


Quando o carallo do turco,
Foi voal-o num cavuco
Ferrabraz quasi morria.
Oliveiros com energia
Chegou nessa mesma hora,
Apeiou-se sem demora
Que só sendo daus irmãos,
Pegou elle pelas mãos
E botou Ferrabraz fóra.

E tornaram se bater
Os dous ferozes cavalleiros,
O turco com Úliveiros
Ninguem podia entender,
Nada se ouvia dizer
No jogo das cutiladas,
As armas espedaçadas,
Com esse pesado jogo
De longe via-se o fogo
Que sahiam das espadas.

Podes gabar-te Oliveiros


Disse o turco admirado:

160
sa ca

— Olhe que tenho luctado


Com mais de mil cavalleiros,
Entre todos os guerreiros
Não houve quem me ferisse
Nem quem tanto resistisse
Os golges de minha espada,
Ella por outra assignada
Nunca houve quem a visse.

Disse Oliveiros :— então


Tua espada não torasse,
E' porque não encontrasse
Com a espada de Roldão.
Elle com ella na mão
Nunca encontrou ferro duro,
Nem arnez de aço puro
Que seus golpes resistisse,
Nem metal que não rangisse,
Nem cavalheiro seguro.

E cobriu-se com uma parte


Do escudo que ticou,
Gon todo orgulho gritou,
Vamos dar fim ao combate,
À nós não ha quem aparte
Disto já estou convencido
Haja o que Deus fôr servido.
Onde ha campos e espadas,
Às razões são escusadas,
Conversa é tempo perdido.

161
E

É partiu determinado
A Ferrabraz degollar,
Mas não poude aproveitar
O golpe descarregado:
O turco pulou de um lado,
Um golpe nelle mediu.
Quando Oliveiros sentiu
O braço lhe estremeceu
Do golpe que recebeu
A sua espada cahiu.

Assin mesmo inda pegou-a,


Mas tinha o braço dormente.
O turco rapidamente
Partiu a ella, apanhou-a,
Pegou nella, examinou-a
Ficou muito admirado
E disse enthusiasmado.
—Qliveiros estás vencido,
Isso ahi está decidido,
Porque já estás desarmado.

Porem pega tua espada


Não quero vencer-te assim,
Mesmo quero ver o fim
Dessa batalha encantada,
Pois que está tão dilatada
Qua já estou mal satisfeito.
Respondeu-lhe—só acceito
Por minhas armas tomadas,

162
gi SUDO sta

Tomal-a por mão beijada,


Isso não é de direito.

Com um pedaço de escudo


Que no chão tinha ficado,
Depois de o ter apanhado
Disse Oliveiros, isso é tudo,
Não fura mais é cascudo,
Mata qualquer, está provado.
Guarim tinha observado,
Foi a Carlos Magno e disse
Que a ÓOliveiros acudisse
Que já estava desarmado.

Oliveiros viu então


Que a sella de Ferrabraz.
Estava munida de mais
Com espadas no arção.
Com toda disposição
Que só quem não tem juizo.
Partiu ao turco indeciso
Sem temeridade alguma,
Puxou pelo cabo uma
Que se chamava Baptiso.

Agora sim, estou armado,


Disse elle a Ferrabraz.
Nas armas estamos eguaes
Nenhum ficará massado.
Cada qual zele seu lado

163
E

Que a batalha vai findar.


E' tempo de aproveitar
A força, a coragem, o jogo,
A batalha é ferro e fogo
Seja feliz quem ganhar.

E haja tempo, o ferro trôa


Com golpes tão destemidos,
Das espadas os tenidos
Só um trovão quando sõa
Que o estampido rebôa
Por vãos de serra e quebradas,
Como hombas dispersadas
Raios de fogo subiam,
Grossas faiscas sahiam
Daquellas duas espadas.

Ferrabraz a resistir
Estava com tanta paixão,
Oliveiros só leão
Quando alguem quer o ferir,
Disse—vamos decidir
Esta batalha comprida.
A causa está conhecida,
Um de nós hoje aqui erra,
E nesse campo de guerra
Um ha de deixar a vida.

Oliveiros ahi se ergueu


Marcou-lhe a cabeça ao meio

L64
— 90—

Que foi o golpe mais feio


Que um cavalheiro deu.
Ferrabraz estremeceu
E quasi perde o sentido,
Ficando muito abatido
Já com os golpes primeiros
Disse comsigo Oliveiros:
— Esse está quasi vencido!

E tornou a repetir
Outro golpe desmarcado,
OQ turco muito cançado
Quasi o golpe o faz cahir,
Não podendo resistir
O golpe não respondeu,
Oliveiros conheceu
A falta de ligeireza,
Mas viu que aquella fraqueza
Não era defeito seu.

Disse Oliveiros comsigo,


Meu Deus—se vós concedesse
Que esse turco conhecesse
Que é feliz viver comtigo,
Livraria-o do perigo
De su'alma se perder,
O céu havia de colher
Um'alma quasi perdida
Que depois de arrependida
Podia se converter.

165
a O

Já de Ferrabraz a vida
Se divulgaya num sopro,
Cada parte de seu corpo
Tinha uma mortal ferida.
A força muito abatida
Elle de todo mudado
Pallido e ensanguentado
Oliveiros viu com calma
Que o turco só tinha a alma,
O corpo estava acabado.

Jesus, Filho do Eterno,


Exemplo da Redempção,
Livrai a este pagão
Do abysmo do inferno,
Dai-lhe um desejo moderno,
Um intuito que o avise
Nessa miseravel crise,
Dai-lhe isso como prenda,
Que de tudo se arrependa
Creia em vós e se baptise.

Já estava Ferrebraz
Muito rendido ao cansaço,
Já o seu esquerdo braço
Não o podia erguer mais,
Porque não era capaz
De resistir mais uma hora
E Oliveiros por fóra
Conheceu-lhe a gravidade,

166
pes

Com toda amabilidade


Disse—Ferrabraz, agora.

Quero que fique sabendo


Que existe um Deus que nos cria,
Sua força e energia
E' como aqui tu estás verdo,
Vim aqui quasi morrendo,
Todo chagado e ferido
De um combate que tinha tído
Para elle defender,
Sem do teu bulsamo beber
Fui de Deus favorecido!

Se tu chegasses a crer
Na Santissima Trindade,
No Poderoso Deus Padre,
Havias de conhecer
Que ao mundo rege um poder
De grande sabedoria,
Que a tudo alimento e cria,
Fez o ceu, a terra, o mar,
E' mais puro que o ar
E mais claro que o dia.

Esse um dia descerá


Ao mundo das illusões,
E todas nossas acções
Como juiz julgará.
E como te salvará?

167
a Ruas

Tu sem lei, sem confiança,


Sem ter nelle uma esperança
Vás ao dia de juizo?
Então perde o paraiso
Esta grande e rica herança?

Deixe estes idolos que adora,


Crea na Virgem Maria,
Crea que nm Deus nos cria
Julga tudo em uma hora,
Bote estas illusões fóra,
Que o demonio não lhe pise
Peça a Jesus que o avise,
Abrace a religião
Peça das culpas perdão
Creia em Deus e se baptise.

Disse o turco—cavalheiro,
Isso eu não hei de fazer
Me sujeitarei morrer
No campo do desespero.
Tenho os louros de um guerreiro!
Brazão, honra, assim por deante,
Ainda que vá avante,
embisto assim nunca farei,
Não deixo a lei que adoptei
Por dez montes de brilhante.

Dizendo—A pollim me valha!


wBifSe levantando cançado,

168
— 34

Inda dizia animado:


—Vamos dar fim a batalha!
A morte não me empalha,
A vida é como um segredo,
O mundo um cruél degredo
Onde um mysterio se encerra,
Golpe de espada na guerra
Jámais me mata de medo.

Oliveiros pôde ver


Quando estavam descançando,
Que elle estava desmaiando
E se arriscava a morrer.
Jámais podia viver
Devido ao seu mau estado.
Muitas feridas de lado
Era enorme a sangueira,
Das armas só a vizeira
Apenas tinha ficado.

Ainda se levantou,
Disse:—Sr. Oliveiros,
Esses são os derradetros
Golpes que em guerra dou:
Oliveiros o esperou,
Mas não queria o matar;
Seu desejo era o salvar,
Não desejava mais nada
Pôz no réto sua espada
Apenas para constar.

L69
Assim que Ferrabraz viu
Se ultimando sua vida,
Pôz a mão sobre a ferida
A Oliveiros pediu
Julga-se que o turco sentiu
Uma emoção tanto ou quanto
Que disparou nesse pranto
Resentido e maguado,
Como se fosse tocado
Do Divino Espirito Santo.

—Nobre e grande cavalleiro!


Disse o turco arrependido,
Agora estou convencido
Que ten Deus é verdadeiro,
Grande, bom e justiceiro.
Ente de grande mistér,
Faz tudo quanto quizer
Nelle não ha quem pise...
Te peço que me baptise,
Depois faça o que quizer.

Oliveiros quando acabou


De ouvir o que elle dizia
Ficou com tanta alegria
Que de contente chorou.
As feridas lhe curou
Livrou elle de morrer
Então se ouvia dizer:
— Aquella alma fiel

No
ne DO) que

Bemdicto o Deus de Israel


Que foi, que é, e ha de ser.

Estando ÓOliveiros sentido


Por vêr assim Ferrabraz,
Lhe disse, —hoje serás
Pelos pares recebido;
Não por eu ter te vencido
Mas sim por seres christão...
Porque a religião
Abraça todo rebelde
Desde da hora que pede
De suas culpas perdão.

Disse o turco:—has de montar


Em meu cavallo e segwr;
Se meu exercito me vir
Ha de querer me tomar
É cuide logo em se armar
Com a maior brevidade,
Tenho arma em quantidade
De qualidades mais bellas
Pode confiar-se nellas,
Que valem sete cidades.

E por tráz daquelle oiteiro


Tem dez mil turcos esperando
E mais que ha de vir chegando
Cada Qual mais cavalleiro.
Onde tem cada guerreiro

171
casi VE SE

Que só um tigre ou leão


Homens de disposição,
Destros no jogo da kança,
Pessõas de confiança
Do almirante Balão.

Disse: has de montar


Em meu “avallo e seguir
E ajndar-me a subir
Para poder me levar,
E não deves demorar
Porque estou muito ferido.
Ficarei muito sentido
Se Morrer sem baptisar-me,
Alli tem a esperar-me
Um exercito mui crescido.

E Oliveiros andando,
Por uma estrada que havia
Viu que de um monte sahia
A força que estava esperando,
O turco foi se apeiando
E Oliveiros se armou,
Sobre uma sombra o deixou
Foi de encontro aos inimigos,
Um dos maiores perigos
Que Oliveiros encontrou.

172
O autor reserva o direito de pro-
priedade

173
ç To
4.
Leandro

aos
Gomes

alo fico han ado cd


de Barros

PREÇO 1$000 RÉIS


ma DR Era -

Aº VENDA NA

ROO DO QOLECRIM-5a-€
RECIFE—1913
Impm. ma Tyr, Da Liv, Fuancezar Recira

175
ATALMA DE OLIVEIROO COM FERRABRAL
Eram doze cavalleiros
Homens muito valorosos,
Destimidos. animosos,
Entre todos os guerreiros,
Como bem fosse, Oliveiros
Um dos pares de fiança
Que sua perseverança
Venceu todos infiés,
Foram uns leões cruéis
Os doze pares de França,

Todos eram conhecidos


Pelos leões da igreja,
Pois nunca foram á peleja
Que nella fossem vencidos,
Eram por turcos temidos,
Pela igreja estimados
Porque quando estavam armados
Suas espadas luziam,
Os inimigos diziam:
—Esses são endiabrados.
176

Tinha o duque de Nemé


Que era uma espada medonha,
O grande Guy de Borgonha
Geraldo de Monde Fé,
Carlos Magno tinha fé
Em todos seus cavalleiros,
Pois entre todos guerreiros
De que nos trata a historia,
Vê-se sempre a maior gloria
De Roldão e Oliveiros.
O almirante Balão
Tinha um filho—o Ferrabraz.
Que entre os turcos, era o mais
Que tinha disposição
Mesmo em nobreza de acção
Era o maior que havia
Então em toda Turquia
Onde se ouvia fallar,
Tudo havia respeitar
Ferrabraz de Alexandria.

Foi Ferrabraz procurar


Sahiu com uma grande tropa
Vê se achava na Europa
Um rei para pelejar,
Pegou logo a exclamar
=)
e.)
al

Com mais precipitação,


Fazendo uma exclamação,
Insultando os cavalleiros,
Fallando contra Oliveiros
Fazendo accinte a Roldão.

Quando Ferrabraz chegou


Nos campos de Mormionda,
Só um trovão quando estronda
Trôa como lhe troou,
Em altas vozes gritou
Apoiado em uma lança,
Como uma féra que avança
Precipitada em furor
Dizia oh! imperador
Que dê teus pares de França?

Estás poupando teus guerreiros


(Que nem um vem pelejar?
Para que queres guardar
Esses doze cavalleiros?
Ouço dizer que Oliveiros
Tem tanta disposição,
E” propria a. occasião;
Se tem fé em teus guerreiros
Porque não manda Oliveiros?
Para que queres Roldão?

178
cha

Ninguem ahi respondeu


E Ferrabraz se apeiou,
Numa sombra se assentou
Em vozes altas rompeu,
Carlos Magno se escondeu?
Ou está hoje sem acção?
Os pares onde é que estão?
Não ouço nenhum fallar,
Já não posso acreditar
Nas façanhas de Roldão.

Sahirei daqui dizendo:


—Carlos Magno se escondeu
Roldão não me appareceu
Talvez ficasse tremendo...
Estou só, como está se vendo
Elles são doze guerreiros
Como doze cavalleiros?
Não dão batalha a um só
Ou estão tornados em pó
Roldão, Ricardo, Oliveiros.

Eu sosinho nesta campanha


Contra um exercito francez,
Em matal-o de uma vez,
Não digo que isto é façanha.
Um exercito não me ganha,

179
ef

Ainda eu mesmo doente.


Como é que existe gente
Que se atreve a exaltar
E pelo mundo espalhar
Que Carlos Magno é Valente?

Carlos Magno perguntou


(Quem tanto o insultava,
(Quem tão rebelde fallava.
Ricardo ahi lhe explicou
Lhe disse esse que chegou,
E” um grande da Turquia,
Turco de muita energia,
Impera sobre seu throno.
E' o legitimo dono
Do reino de Alexandria.

Aquelle foi o que entrou


Dentro de Jerusalém
Não respeitando ninguem
Até apostolos matou.
No templo sagrado achou
Balsamo que Deus foi ungido
Cousas que tinham servido
Na paixão do Redemptor,
A corôa do Senhor
Tudo foi subtraido.

180
NR A

Carlos Magno observou


(Que nem um se offereceu,
Logo ahi entristeceu
Chamou Roldão e o mandou.
Disse Roldão—eu não vou
Nem eu, nem meus companheiros
Nos combates derradeiros
Nós exgottamos os valores,
Que foram merecedores
Foram os velhos cavaleiros.

Nessa ultima batalha


Sanguinolenta e tyranna,
Minha espada duridana
Não mostrou uma só falha,
Daquella bruta canalha
Arrebatei a victoria,
(Que ficará em memoria
Aquelles grandes perigos
Os cavalleiros antigos
Foi a quem désses à gloria.

Carlos Magno quando ouviu


À resposta de Roldão
Se encheu de tanta paixão
(Que um ferro lhe sacudiu.
Roldão quando olhou que viu

18]
a

O sangue delle descer,


Não poude mais se conter,
Armou-se com tal furor
Não foi ao imperador
Por Ricardo se interver.

Carlos Magno ordenou


(Que os pares o pegasse,
Depois de preso o matasse.
Roldão de novo se armou
Pela espada puchou
E disse em alta linguagem
Com destimida coragem,
Fallou a todos assim:
—(Qualquer que tocar em mim
Diga que está de viagem.

Tudo alli ficou callado


Não fallou um cavalleiro
Roldão era o companheiro
Dentre todos mais amado,
De mais era respeitado
Pela nobreza e acção,
Tinha um leal coração
Para com seus companheiros
E mesmo dos cavalheiros
Era elle o capitão.

182
milhas

Carlos Magno ficou


Certo de que ninguem ia
Disse que mesmo queria
Ver quem o desafiou;
Quando a notícia chegou
Aos ouvidos de Oliveiros
Que soube que os cavalleiros
Não tinham lhe obedecido,
Ficou bastante sentido
Desta acção dos cpmpanheiros.

Ordenou ao escudeiro
O cavallo lhe sellar
E mandou logo apromptar
Arreios de cavalleiros...
E gritou—ande lígeiro,
Me ajude logo a armar,
Pode o turco se gabar,
Matei um dos cavalleiros,
Porem não diz Oliveiros
Temeu commigo luctar.

Assim que Guarim sentiu


Seu senhor fallar em guerra,
Pôz os joelhos em terra
Até por Deus lhe pediu,
Porque imaginou e viu

183
a

Que elle não estava capaz,


Porque já era demais
O sangue que sahia,
Por isso por Deus pedia
Que não fosse a Ferrabraz.

Guarim, podes descançar,


—Oliveiros respondeu.
Um soldado como eu
Não deixa seu rei chorar,
O turco ha de acreditar
Que mil féras não me comem
Minhas façanhas se somem
Mas emquanto eu não morrer
Ferrabraz ha de dizer
Em França encontrei um homem.

(Quando do leito se ergueu


Pôz uma perna estendida,
Logo ahi de uma ferida
Porção de sangue desceu,
O escudeiro tremeu
Assim que o sangue espanou
E elle não se importou
Como que tivesse são,
Fincou a lança no chão
E de um só pullo montou.

184
=sÍtios

E foi ao imperador
Com a maior reverencia:
Disse com obediencia
—Esclarecidos senhores,
Eu não sou merecedor
Que cousa alguma me dê
Por isso, senhor, bem vê
Que valor tem seu captivo
Por 10 annos que te sirvo
Vim pedir-te uma mercê...

Disse-lhe o imperador:
— Pode Oliveiros dizer
Eu juro o satisfazer
Seja que pedido fór.
Disse-lhe Oliveiros: Senhor!
Não quero cousa de mais,
Eu não serei tão capaz
Para tanto te pedir
Porem, o que queto é ir
Dar batalha a Ferrabraz.

Carlos Magno quiz faltar


Devido ao seu mão estado,
Porem já tinha ordenado
Não podia revogar.
Viu Oliveiros montar

185
Pass

E muito sangue sahir


Rogou-o para não ir...
Disse Oliveiros: irei
Se desfeitiando meu rei
De que me serve existir?

Não posso aqui declarar


O que era de mistér
Como ficou Regner
Vendo Oliveiros montar,
Ficou a se lastimar
Vendo os outros cavaleiros,
Elle com mil desesperos
Prostrado em terra se lança
Perdeu a ultima esperança
—De ver seu filho Oliveiros

Regner eu não mandei


Disse-lhe o imperador
Seu filho é merecedor
E nada lhe negarei
E elle pediu-me: eu pensei
(Que elle quisesse era a paz
Vejo-o doente de mais
Jurei dar-lhe o que pedia
E elle disse que queria
Ir enfrentar Ferrabraz.

186
e

E Oliveiros partiu
Do meio daquelle auditorio
Carlos Magno ao oratorio
Chorando se dirigiu
Se ajoelhando pediu
A imagem de Jesus
Pelos martyrios da Cruz
Olhasse seus cavalleiros
E que guiasse Oliveiros
Com sua divina luz.

Dizendo elle foi luctar


Com o guerreiro mais forte
Noticiando sua morte
Ja me parece chegar
Se vós o não ajudar
Não tornarei vel-o mais
Muitas feridas mortaes
Se vós não o acudir
Elle tem que succumbir
Nas armas de Ferrabraz.

Antes delle terminar


A oração que fazia
Ja uma vóz lhe dizia
(Que podia descançar
Que havia de voltar

187
gue Das

O seu cavalleiro em paz


E não, se afligisse mais
Cresse na Virgem Maria
Que Oliveiros havia
Morto ou preso Ferrabraz.

O turco chegou cançado


Deitou-se p'ra discançar
Viu Oliveiros chegar
Ficou mesmo alli deitado
Não se mostrou agitado
Olhou para Oliveiros
Pensou não ser dos guerreiros
Dos 12 pares de França
Perdeu a ultima esperança,
De ver um dos cavalleiros.

Oliveiros o saudou
E elle ficou callado
E Oliveiros bem maçado
Da atção do turco ficou
Herrabraz nem o olhou
Tanto caso delle fez
Oliveiros éra francez
Guerreiro de educação
Juntou as redias na mão
Fallou-lhe a segunda vez.

Las
soil ics

Levante-se, cavaleiro.
Prepare as armas se aprompte
Pegue o cavallo, se monte,
Trate de ser bom guerreiro
Ponha seu corpo ligeiro
Veja não dê uma falha.
A morte entre nós se espalha.
A hora de um é chegada
Lance mão de sua espada,
Vamos entrar em batalha.

Quem és tú, tão pequenino


(Que vem me desafiar?
Achas que vou me occupar
Em dar batalha a menino?
E's louco, tu não tens tino,
Disse O turco com furor.
Seja por qual forma fór,
Me diga agora, confesse,
Qual foi o mal que fizeste
Contra teu imperador?

Disse Oliveiros zangado:


Venha pelejar commigo,
Perante ao inimigo,
E" ser vil pór-se deitado.
Devia ser delicado

189
aalE

Lhe reflictio Oliveiros


Na ordem dos cavalleiros
Encontra-se a educação,
Por isso não é acção
Nem nobreza dos guerreiros.

O turco disse afinal:


Oh! cavalleiro, lhe digo,
Só pode luctar commigo
Se fôr de sangue real,
Porque se não fôr igual
Recusarei a empreza
Fallou com toda franqueza...
Então Oliveiros disse:
Pode crêr como que visse
Minha origem é de nobreza.

Ferrabraz lhe esclareceu:


Teu nome has de me dizer.
Primeiro eu hei de saber.
Disse Oliveiros: do teu
Disse Ferrabraz: o meu
QU direi sem mais porfia,
Pois minha soberania
Não exige cousas taes,
Eu me chamo Ferrabraz,
Sou o rei de Alexandria,

190
Eu sou Guarim de Lorenda.
Oliveiros respondeu
Hoje foi que succedeu
Dar a primeira contenda.
E lhe digo que se renda
Que o lavarei com amor,
Fique sabendo o senhor
Hoje não pode escapar
Eu hoje tenho de o levar
Preso ou morto ao meu senhor,

O turco disse-lhe assim:


Teu rei é muito malvado
Pois pega um pobre soldado
Sem causa quer dar-lhe fim.
Porque em tu vires a mim
E ser muito louco ou bôbo,
E” como fazer um roubo
A quem não possue dinheiro,
E' atirar um cordeiro
Dentro da jaula de um lóbo.

Oliveiros já massado
Disse-lhe: turco és um louco...
Levanta-te, senão com pouco
Hei de feril-o deitado.
Que tempo tem se passado!

191
Nessas tuas discussões
Eu não vim ouvir razões
Vim ao campo pelejar,
Tu és franco no fallar
Vamos vêr tuas acções.

Ferrabraz sem se alterar


Lhe disse: espera Guarim,
Peço que digas a mim
O que te vou perguntar.
Então pôz-se a indagar
Com a falla muito mansa
Como quem pensa e descança.
Perguntou a Oliveiros:
—(Como são os cavalleiros
(Que formam os pares de França?

Oliveiros disse assim:


Roldão tem bôa estatura
Oliveiros na figura
E' mesmo que vêr. a mim,
Guy de Borgonha, Bofim,
Ricardo são quasi iguaes,
Pegou n'um, é um voraz,
Porem emquanto a Roldão
Em coragem e coração
O mundo não terá mais.

192
sl fica

Disse Ferrabraz: então


Porque desses cavalleiros
Não veio a mim o Oliveiros
Guy de Borgonha ou Roldão?
Disse Oliveiros: isso não
Oliveiros está doente
Bofim tambem anda auzente,
Guy de Borgonha ficou,
Roldão nunca se occupou
Brigar com um turco somente.

Guarim tu tens me mentido


Disse que és novo guerreiro.
E's antigo cavalleiro
Tanto que tu estás ferido.
Mais Oliveiros fingindo
Disse: esse sangue é d'agora
Eu estou são; porem embora
Tenha na junta algum callo,
O sangue é de meu cavallo
Que é muito duro de espora.

Depois de se levantar
Ferrabraz se preparou,
A Oliveiros rogou
Que o ajudasse a armar.
Oliveiros quiz faltar

193
— 19

Por achar que era um perigo.


Disse Ferrabraz: lhe digo
Confie em minha nobreza,
Eu não uzo da vileza
Para com meu inimigo.

QOliveiros se apeiou
Ajudou a Ferrabraz,
Com cortezias iguaes
Elle tambem o tratou.
(Quando Ferrabraz se armou
Vestiu a saia de malha
Na qual não tinha uma falha
Feita por outros guerreiros,
Montaram-se os cavalleiros
Deram começo a batalha

Posto sem ordem proseguiram


A lucta em estreitos passos,
Das grossas lanças os pedaços
De ambos ao longe cahiram,
Ambos logo se serviram
De duas finas espadas
Cortantes, grandes e pesadas
Que era uso dos guerreiros
Das feridas de Oliveiros
Foram tres as magoadas.

194
— 20 —

Disse Ferrabraz: Guarim,


Pela crença dos fieis
Confesses logo quem és,
Não sejas fingido assim.
Creio que mentisses a mim
Tu és um dos cavalleiros
Daquelles grandes guerreiros
Que a fama está espalhada,
Pelo pegar da espada
E's Roldão, ou Oliveiros.

Eu não dei só um combate


Conquistei todo esse mundo
Conheço o guerreiro a fundo
Sou professor desta arte
E assim quero tratar-te
Com mais apreciação
Pela sagrada paixão
De quem são crentes os fieis
Declares logo quem és
Ou Roldão ou Oliveiros.

Pois nunca achei quem pegasse


Tão bem assim numa lança
Só num dos pares de França
Pode tão destro encontrasse
Juro que tu me negasse

195
dad Lc

Sendo grande não descobre


Finje ser soldado pobre
Teus feitos estão indicando
Tuas acções estão mostrando
Que és cavalleiro nobre.

Disse a hoste dos guerreiros


Oh! turco tu me forçasse
E agora me obrigasse
A diser sou Oliveiros
Eu sou um dos cavalleiros
Conquistei muitos lugares
Ouvi tu disafiares
Meu rei para pelejar
Por isso venho provar
(Que peso tem um dos pares.

Disse o turco oh! cavalleiro


Obrasse mal não diser
Para eu te receber
Como um fidalgo guerreiro
Pois vejo que fui grosseiro
E me confesso sentido
Pois se tivesse sabido
Teria me levantado
E com outro frasiado
Eu teria o recebido.

196
Ahi tornaram a partir
Em ordem de cavalleiros.
Disse o turco a Oliveiros
— Não posso mais te ferir;
Vejo teu sangue sahir
Devido estares estragado;
Eu tenho o balsamo sagrado
Com que teu Deus foi ungido,
Bebe-o porque estás ferido,
Bebendo ficas curado.
Turco eu não hei de acceitar
Cousa alguma que me deres,
Salvo se tu quizeres
Crêr em Deus e se baptisar
Do contrario é se cançar
Porque não acceito nada,
Estou com a vida arriscada,
Sei do poder que tem elle
Porem só me sirvo delle
Tomando-o pela espada.

Ahi ambos prevenidos


Não escutaram razões,
Pareciam dois leões
Numa jaula enfurecidos.
Dous golpes iguaes medidos

197
Todos dous descarregaram,
Com a força que botaram
Os braços ficaram bambos
E os cavallos de ambos
Em terra se ajoelharam.

Oliveiros recebeu
Um golpe tão desmarcado
Que ficou atordoado
F muito sangue desceu,
O turco ahi conheceu
Delle as forças abatidas
Com vozes compadecidas
Disse Oliveiros teimoso,
Bebe o balsamo milagroso
Que te cura essas feridas.

Ferrabraz, eu nada acceito


Assim não deves cansar-te,
Confesso de minha parte
Que toda offerta regeito.
Porque eu não me aproveito
D'uma acção acobardada
Por uma protecção dada
Pois que prefiro morrer
Que do teu balsamo beber
Sem o tomar pela espada.

198
— 94 —

Beijou a cruz da espada


Proseguio uma oração!
Oh! Virgem da Conceição!
Maria pia e sagrada,
Mãe de Deus immaculada,
Esposa casta e fiel!
Pelo vinagre com fel
Que Christo bebeu na Cruz,
Rogae por mim a Jesus,
Nessa batalha cruel.

Partiu ao seu contendor


Com tanta disposição
Que só se tivesse são
Teria tanto valor.
Deu-lhe um golpe matado
Porem pegou mal pegado,
Feriu o turco de um lado
Ferrabraz se desviou
Tirando o balsamo o tomou
Ficou de tudo curado.

Oliveiros entristeceu
Quando viu Ferrabraz são,
E disse no coração
Quem perde a lucta sou eu...
Porem não esmoreceu

199
Nem deu mostração de falha
Como o homem que trabalha
Disse sem poder conter-se,
Falta pouco para ver-se
O fim de nossa batalha.

Disse o turco—cavalleiro:
Tu já estás muito ferido
(Queira acceitar meu partido
Renda-se prisioneiro,
Assim lhe farei herdeiro
Do reino de Alexandria,
E tem mais a garantia
De hoje para amanhã,
Casarás com minha irmã,
A flor de toda Turquia

Disse Oliveiros: —Senhor


Eu não prefiro riqueza,
(Quero morrer na pobreza
Mas bem com meu salvador...
Porque foi meu creador
E por minh'alma trabalha,
Um estante não se empalha
Para valer os fieis,
Turco, cuida em teus papeis,
Vamos dar fim a batalha.

200
= 6.

Cobriu-se com seu escudo


Beijou a cruz da espada,
E deu-lhe uma cutilada
Que desceu arnéis e tudo.
F dando outra a miudo,
A Ferrabraz offendeu
O céo o favoreceu
Um revez escapoliu
O balsamo. delle cahiu
E Oliveiros bebeu.

Ferrabraz admirado
Por ver tanta ligeireza,
E vêr aquella destreza
Em quem já estava cançado,
Viu Oliveiros curado
De todas suas feridas
As forças restituidas
Estava tão renitente
Que parecia-lhe um ente
Com quinze ou dezeseis vidas.

Depois de ter apanhado


O balsamo que lhe serviu,
Dentro do rio saccudio
O que ainda tinha ficado.
Ferrabraz ficou massado
201
E

Por Oliveiros botar


O que não podia achar
Ainda a peso de ouro,
Do mundo todo thesouro
Não poderia comparar.

Oliveiros respondeu:
Ferrabraz fique sabendo
Que a tudo Deus está vendo
Pois o mundo todo é seu,
Um guerreiro como ev
Não vae atraz de cilada
Com Deus não me falta nada
Me bastam os prodigios seus
Não quero mais do que Deus
Uma lança e uma espada.

E tornou a investir
Que só um leão voraz.
E disse: Senhor Ferrabraz
E' tempo de decidir,
Só se ouvia era tinir
As espadas pelo ar.
Roldão que estava a olhar
De vez em quando dizia:
Oliveiros eu queria
Estar agora em teu lugar.
202
—98—

Já tinha se espedaçado
Arnéis, capacête e tudo,
Não tinha mais um escudo
Que não tivesse quebrado.
As lanças tinham voado
Só as viseiras existiam
Elles já mal se cobriam
Nas horriveis cutiladas.
Somente as duas espadas
Sem damno algum resistiam.

Oliveiros se preparou
E partiu ao inimigo...
O turco vio o perigo
A pé firme o esperou,
Um golpe nelle deitou
Com tanta disposição
Sem ser proposito ou traição
Nesses golpes tão ligeiros,
O cavallo de Oliveiros
Cahiu sem vida no chão.

Turco tu estás bem montado


E meu cavallo morreu.
Ferrabraz lhe respondeu:
Mas eu não fui o culpado.
Não ficarás desarmado
TO

Que eu sei a ordem qual é


Não desanimes na fé
Eu fui quem matei o teu,
Agora monte no meu
E vou pelejar de pé.

Disse-lhe Oliveiros: não


Fico tambem desmontado
Tu não fosse o culpado
Assim era ser vilão,
Por certo eu tinha razão
Porque matasse o meu,
Foi caso que aconteceu
Era-me feio acceital-o.
Não brigo só a cavallo
Podes descançar o teu.

Ahi Ferrabraz atou


Num arvoredo o cavallo
E disse vou descançal-o
Sua occasião chegou,
Para a batalha marchou
Com toda disposição.
Oliveiros forte e são
Esperava-o cara a cara,
Com a espada Alta Clara
Rugindo que só leão.
is

Eu agora me lembrei
Da falta que commetti,
Mas foi porque me esqueci,
Por isso não relatei.
Porem sempre fallarei
Para o leitor se agradar,
Quem sabe ha de se lembrar
Na lucta dos cavalleiros,
O cavallo de Oliveiros
Quando quiz desembestar.
Com a grande cutilada
Que Oliveiros recebeu,
Quando o cavallo correu
Não obedecendo a nada,
Sahiu numa desfilada.
Mas o turco o atalhou
Oliveiros até pensou
Que fosse alguma tragedia,
O turco pegou na redia
E o cavallo parou.

Outra parte que dizia


Quando o cavallo do turco,
Foi voal-o num cavuco
Ferrabraz quasi morria.
Oliveiros com energia

205
Es| e

Chegou nessa mesma hora,


Apeiou-se sem demora
Que só sendo dous irmãos,
Pegou elle pela mão
E botou Ferrabraz fóra.

E tornaram a se bater
Os ferozes cavalleiros,
O turco com Oliveiros,
Ninguem podia entender,
Nada se ouvia dizer
No jogo das cutiladas.
As armas espedaçadas,
Com esse pesado jogo
De longe via-se o fogo
Que sahia das espadas.

Podes gabar-te Oliveiros


Disse o turco admirado:
— Olhe que tenho luctado
Com mais de mil cavalleiros,
Entre todos os guerreiros
Não houve quem me ferisse
Nem quem “tanto resistisse
Os golpes de minha espada,
Ella por outra assignada
Nunca houve quem a visse.

206
Disse Oliveiros: então
Tua espada não quebrasse
E” porque não encontrasse
Com a espada de Roldão.
Elle com ella na mão
Nunca encontrou ferro duro,
Nem arnez de aço puro
Que seus golpes resistisse,
Nem metal que não rangisse,
Nem cavalleiro seguro.

E cobriu-se com uma parte


Do escudo que ficou
Com todo orgulho gritou,
Vamos dar fim ao combate,
A nós não ha quem aparte
Disto já estou convencido,
Haja o que Deus fôr servido.
Onde ha campos e espadas,
As razões são escusadas,
Conversa é tempo perdido.

E partiu determinado
A Ferrabraz degollar.
Mas não poude aproveitar
O golpe descarregado.
O turco pullou de um lado,

207
fio
Um golpe nelle mediu.
Quando Oliveiros sentiu
O braço lhe estremeceu,
Do golpe que recebeu
A sua espada cahiu.

Assim mesmo inda pegou-a,


Mas tinha o braço dormente.
O turco rapidamente
Partiu a ella, apanhou-a,
Pegou nella, examine
Ficou muito admir
E disse enthusiasmauo.
—Qliveiros estás vencido,
Isso ahi está decidido,
Porque estás desarmado.

Porem pega tua espada


Não quero vencer-te assim,
Mesmo quero ver o fim
Dessa batalha encantada,
Pois que está tão dilatada
Que já estou mal satisfeito.
Respondeu-lhe só—acceito
Por minhas armas tomadas
Mas eu acceital-a dada!
Faz-me perder o conceito.
—34—

Alli no chão apanhou


[Im pedaço de um escudo
Disse deste eu faço tudo
E com aquillo se armou
O inimigo esperou
Com esse ferro que tinha
Disse quando o turco vinha
Com Deus não me falta nada
Hoje eu tomo uma espada
Ou a do turco ou a minha,

Oliveiros viu então


Que a sella de Ferrabraz.
Estava munida de mais
Com espadas no arção,
Com toda disposição
Que só quem não tem juizo.
Partiu ao turco indeciso
Sem temeridade alguma,
Puxou pelo cabo uma
Que se chamava baptiso.

Agora sim, estou armado,


Disse elle a Ferrabraz,
Nas armas estamos iguaes
Nenhum ficará massado.
Cada qual zele seu lado

209
se

Que a batalha vai findar.


E” tempo de aproveitar
A força, a coragem, o jogo,
A batalha é ferro e fogo
Seja feliz quem ganhar.
Haja tempo, o ferro trôa
Com golpes tão destemidos,
Das espadas os tenidos
Só um trovão quando sôa
Que o estampido rebôa
Por vãos de serra e quebradas,
Como bombas disparadas
Raios de fogo subiam.
Grossas faíscas sahiam
Daquellas duas espadas.
Ferrabraz a resistir
Estava com tanta paixão,
Oliveiros só leão
Quando alguem quer o ferir.
Disse—vamos decidir
Esta batalha comprida.
A causa está conhecida,
Um de nós hoje aqui erra,
E nesse campo de guerra
Um ha de deixar a vida.

210
E

Oliveiros ahi se ergueu


Marcou-lhe a cabeça ao meio
Que foi o golpe mais feio
Que um cavalleiro já deu.
Ferrabraz estremeceu
E quasi perde o sentido,
Ficando muito abatido.
Já com os golpes primeiros
Disse comsigo Oliveiros:
— Esse está quasi vencido.

E tornou a repetir
Outro golpe desmarcado,
O turco muito cançado
Quasi o golpe o faz cahir,
Não podendo resistir
O golpe não respondeu,
Oliveiros conheceu
A falta de ligeireza,
Mas viu que aquella fraqueza
Não era defeito seu.

Disse Oliveiros comsigo,


Meu Deus—se vós concedesse
Que esse turco conhecesse
(Que é feliz viver comtigo,
Livraria-o do perigo
21
RE

De su'alma se perder,
O céo tinha de colher
Uma alma quasi perdida
Que depois de arrependida
Podia se converter.

E vós oh! virgem Maria


Mãe dos tristes peccadores
Concedei vossos favores
Nestas horas de agonia
Por aquelle grande dia
Da paixão do Redemptor
Por aquella horrivel dor
De tel amado Jesus
Pelos martyrios da cruz.
Pelo frio pelo calor.

Tocai este coração


Para tornares fiel
Conheça um Deus de Israel
Como autor da criação
Que não perca a salvação
Que ao vosso filho custou
Pois seu sangue derramou
Sobre um madeiro pregado
Fazei que esse desgraçado
Seja de vós como eu sou.
212
—38—

Vós sois a gloria da terra


Do perdido a esperança
Sois vós a unica herança
Do perigrino que erra
E's o triumpho da guerra
O balsamo que cura a dor
Alívio de sofredor
Com quem tudo se aconselha
(Quem apascenta a ovelha
Perdida de seu pastor.

Isso Oliveiros dizia


Luctando com Ferrabraz
Viu que já éra de mais
O sangue que lhe sahia
Com muito amor lhe pedia
Ferrabraz estás tão ferido
E's um homem destimido
Busca a Deus elle te acode
Deus é muito bom e póde
Te fazer seu protegido.

Oliveiros os rogos teus


Me enchem de sympathia
Mais o rei de Alexandria
Não á de adorar teu Deus
Não rogo mais nem os meus

213
id =

Hoje a miseria me cobre


Sou como o Soldado pobre
Que não tenho a favor nada
Sou morto por uma espada
Que me parece a mais nobre.

Já de Ferrabraz a vida
Se divulgava num sopro,
Cada parte de seu corpo
Tinha uma mortal ferida,
A força muito abatida
Elle de todo mudado
Pallido e ensanguentado
Oliveiros viu com calma
Que o turco só tinha a alma,
O corpo estava acabado.

Jesus, Filho do Eterno,


Exemplo da Redempção,
Livrai a este pagão
Do abysmo do inferno,
Dai-lhe um desejo moderno,
Um intuito que o avise
Nessa miseravel crise,
Dai-lhe isso como prenda,
(Que de tudo se arrependa
Creia em vós e se baptise.

214
—40—

Já estava Ferrabraz
Muito rendido ao cansaço,
Já o seu esquerdo braço
Não o podia erguer mais,
Porque não era capaz
De resistir mais uma hora
E Oliveiros por fóra
Conheceu-lhe a gravidade,
Com toda amabilidade
Disse —Ferrabraz, agora.

Quero que fique sabendo


Que existe um Deus que nos cria,
Sua força e energia
E” como aqui tu estás vendo,
Vim aqui quasi morrendo.
Todo chagado e ferido
De um combate que tinha tido
Pela fé de Jesus Christo
Elle conhecendo isto
Valeu e estou garantido.

Se tu chegasse a crer
Na Santissima Trindade,
No Poderoso Deus Padre,
Havias de conhecer
Que ao mundo rege um poder

215
Eq

De grande sabedoria,
Que a tudo alimenta e cria,
"ez o ceu, a terra, o mar,
E é mais puro que o ar
Mais claro que o proprio dia.

Esse um dia descerá


Ao mundo das illusões,
E todas nossas acções
Como juiz julgará,
E como te salvará?
Tu sem lei, sem confiança,
Sem ter nelle uma esperança
Vás ao dia de juizo?
Então perde o paraizo
Esta grande erica herança?

Deixe estes idolos que adora,


Creia na Virgem Maria,
Creia que um Deus nos cria
Julga tudo em uma hora,
Bote estas illusões fóra,
Que o demonio não lhe pise
Peça a Jesus que o avise,
Abrace a religião
Peça das culpas perdão
Creia em Deus e se baptise.

216
AD

Disse o turco—cavalleiro,
Isso eu não hei de fazer
Sujeitarei-me morrer
No campo do desespero.
Tenho os louros de um guerreiro!
Brazão, honra, assim por deante,
Ainda que vá avante,
sto assim nunca farei,
Não deixo a lei que adoptei
Por dez montes de brilhante.

Dizendo —Apollim me valha!


Se levantando cançado,
nda dizia animado:
—NVamos dar fim a batalha!
A morte jamais me empalha,
A vida é como um segredo,
O mundo um cruél degredo
Onde um mysterio se encerra,
Golpe de espada na guerra
Jamais me metterá mêdo.

Oliveiros pôde ver


Quando estavam descançando,
Que elle estava desmaiando
E se arriscava a morrer.
Jamais podia viver

217
aihas

Devido ao seu mau estado.


Muitas feridas de lado
Era enorme a sangueira,
Das armas só a vizeira
Apenas tinha ficado.

Ainda se levantou,
Disse:—Sr. Oliveiros,
Esses são os derradeiros
Golpes que em guerra dou.
Oliveiros o esperou,
Mas não queria o matar;
Seu desejo era o salvar,
Não desejava mais nada
Pôz no réto sua espada
Apenas para constar.

Assim que Ferrabraz viu


Se ultimando sua vida,
Pôz a mão sobre a ferida
A Oliveiros pedio
Julga-se que o turco sentiu
Uma emoção tanto ou quanto
Que disparou nesse pranto
Sentindo e tão maguado,
Como se fosse tocado
Do Divino Espirito Santo.
218
ceifa

—Nobre e grande cavalleiro!


Disse o turco arrependido,
Agora estou convencido
Que teu Deus é verdadeiro,
Grande, bom e justiceiro
Ente de grande mistér,
Faz tudo quanto quizer
Só elle tem heroismo
Te peço dai-me o baptismo
Depois faça o que quizer.

Oliveiros quando acabou


De ouvir o que elle dizia
Ficou com tanta alegria
Que de contente chorou
As feridas lhe curou
Livrou elle de morrer
Então se ouvia dizer:
Serás uma alma fiél
Bemdicto o Deus de Israel
Que foi, que é, e ha de ser.

Estando Oliveiros sentido


Por vêr assim Ferrabraz,
Lhe disse, —hoje serás
Pelos pares recebido;
Não por eu ter te vencido
219
—45—
Mas sim por seres christão...
Porque a religião
Abraça todo rebelde
Desde da hora que pede
De suas culpas perdão.

Disse o turco:—has de montar


Em meu cavallo e seguir;
Se meu exercito me vir
Ha de querer me tomar
E cuide logo em se armar
Com a maior brevidade,
Tenho arma em quantidade
De qualidades mais bellas
Pode confiar-se nellas,
Que valem sete cidades.

E por traz daquelle oiteiro


Tem dez mil turcos esperando
E mais que ha de vir chegando
Cada qual mais cavalleiro
Onde tem cada guerreiro
Que só um tigre ou leão
Homens de disposição,
Destros no jogo da lança,
Pessôas de confiança
Do almirante Balão.
saci
E disse: has de montar
Em meu cavallo e seguir
E ajudar-me a subir
Para poder me levar,
E não deves demorar
Porque estou muito ferido...
Ficarei muito sentido
Se morrer sem baptisar-me,
Alli tem a esperar-me
Exercito muito crescido.

Estava Oliveiros montado


Pode montar Ferrabraz
Depois olhou para traz
Viu um turco admirado
Perguniou muito espantado
Aquelle é soldado seu?
O turco então respondeu
Pois muito bem conhecia
E disse aquelle é espia
E' turco e soldado meu.

Paciencia meu amigo


Vamos ver o que se faz
Não chore senhor Ferrabraz
Deus a de ficar comtigo
Ja vêjo perto o perigo

221
safa

Não posso me demorar


Ouço busina tocar
São os inimigos meus
Tenhas fé na Mãe de Deus
Um christão a de te achar.

Oliveiros se apeiou
E deitando Ferrabraz
Um dos golpes mais mortaes
Alli do turco curou
Sobre uma sombra o deixou
Apenas pôde abraçal-o
Foi obrigado deixal-o
E ir de encontro aos guerreiros
O turco disse Oliveiros
Te monta no meu cavallo.

Tu és prévilegiado
Para afrontar as bravuras
Leva minhas armaduras
Porque irás bem armado
Va munido e preparado
Porque nelles tem cobardes
Os menos de qualidades
Poderão armar ciladas
Eu trago alli 4 espadas
Que valem 4 cidades,
A

Quando Oliveiros olhou


Que viu que o turco era espia
A toda carreira ia
Oliveiros exclamou
Inda bem não se acabou
A primeira que peguei
Vem outra e aceitarei
Haja o que Deus for servido
Tudo é por Deus permitido
Por Deus eu tudo farei.

Disse ao turco o meu destino


Era fazer-te chistão
Mostrar que a religião
E' um baluarte fino
E” o protector divino
Nãó desampara ninguem
De seu grande poder vem
A felicidade humana
Daquella mão soberana
O que se deseja tem.

Meu desejo éra levar-te


Para a terra de christão
Depois de uma confissão
Na igreja baptisar-te
Sou obrigado deixar-te
223
aii a

Ferrabraz poz-se a chorar


Disse se eu podesse andar
Mas oh! que estou tão ferido
E nessa mata perdido
Morro sem me baptisar.

Disse Oliveiros me basta


Esta mesma que possuo
Porque com ella eu concluo
O que só o tempo gasta
Porque elle é quem arrasta
A vida do inimigo
Por mais que seja o perigo
Para mim perde a acção
Porque ella em minha mão
Só perde por um castigo.

Disse o hoste dos guerreiros


Não posso te falar mais
Disse em pranto Ferrabraz
Parte com Deus Oliveiros
Orgulho dos cavalleiros
Misterio da criação
Amparo de uma nação
Apostolo firme da fé
Culumna que traz em pé
Corôa, gloria e brazão.
224
—50—

E Oliveiros partindo
Disse Ferrabraz comsigo
Aquelle estando em perigo
E” dos que morre surrindo
Rios de sangue sahindo
Inda elle diz, isso é nada
A batalha está travada
Porem elle nada estranha
Joga a vida na campanha
Crer em Deus e na espada

Quando Oliveiros sahiu


Do mato para estrada
Uma grande tropelada
Já muito perto sentiu
Um rei turco, ahi o viu
E fitou bem para elle
Conheceu que havia nelle
Força e destreza de mais
Gritou, matou Ferrabraz
[E vem no cavallo delle.

É indo logo encontral-o


Lhe disse tú me darás
Noticias de Ferrabraz
O donno deste cavallo
Oliveiros para enganal-o
225
oe + a

Disse elle foi descançar


E não quer mais adorar
Um Deus falso illudidor
Está com meu imperador
Onde vai se baptisar.

O turco disse: Christão


Serás um dos cavalleiros?
Serás tu o Oliveiros
Que de Borgonha ou Roldão?
O almirante Balão
Deseja um desses pegar
Para mandal-o queimar
À elles e ao teu senhor
Esse teu imperador
De quem hei de me vingar.

Ahi logo começou


Uma batalha tremenda
Uma mortandade horrenda
Que o sangue ao campo insopou
Um grande exercito avançou
Com tanta disposição
Que feria o coração
Ver turcos feitos em pedaços
Uns sem perna outros sem braço
Rolando vivo no chão.
226
— 59 —

Era sem limite a scena


Desses feroses guerreiros
A espada de Oliveiros
Lascava turco sem penna
As pancadas mais pequenas
Lascava até a cintura
Não tinha uma criatura
De todos os cavalleiros
Que investindo Oliveiros
Tivesse a vida segura.

Chegou um gigante enorme


Trasendo uma grossa lança
Disse dos pares de França
Não deixarei nem o polme
E'ra um gigante disforme
Um aspecto horrendo e feio
Parecia um grosso esteio
Chegava a vir a gallope
Oliveiros deu-lhe um golpe
Lascou-o de meio a meio.

O rei turco enfureceu


Vendo do gigante a morte
Exclamou foi o mais forte
Que na turquia nasceu
Turco que nunca temeu

227
o:

O mais medonho embaraço


Nunca viu um só pedaço
De sua espada ou da lança
Julgo que os pares de França
O Deus delles os fez de aço.

Pois como um só paladino


Faz semelhantes estragos!
Esses desmididos rasgos
Só sendo alfange divino
Não é poder pequinino
Que ajuda esses cavalleiros
Ou elles são feiticeiros
Ou entes indiabrados
Ou foram todos gerados
Por diabos disordeiros.

O turco não acabou


A phrase que profiriu
Quando Oliveiros partiu
A um reforço que chegou
Nova lucta começou
Tornou-se um drama esquisito
Quem via ficava afílicto
Das espadas os sustinidos
Pareciam os estampidos
De trovões no infinito.

228
mis

O almirante balão
Estaya em perigos fataes
Por saber que Ferrabraz
Foi preso por um christão
Nessa desesperação
Lamentando seu estado
Mandou um reforço armado
Com ordens especiaes
(Que trouxesse Ferrabraz
Ou não voltasse soldado.

Oliveiros já estava
Sem lança, arnéz e escudo
Faltando-lhe quasi tudo
Já descoberto brigava
Apenas só lhe restava
À viseira e a espada
Por não poder ser quebrada
Devido a temperatura
Pois foi a lamina mais dura
Que por homem foi forjada.

Carlos Magno mandou


Mais 4 dos cavalleiros
Para ajudar Oliveiros
Mas nada se aproveitou
Um reforço que chegou
ita

De turcos exercitados
Na lucta foram pegados
Esses 4 cavalleiros
Onde levaram Oliveiros
Preso com os olhos tapados.

Continuará o resto da historia em


outros volumes
230
231
O QUTOR
RESERVA O DI-
REITO DE
PROPRIEDODE
es ] fo
VENDE-SE
O “Cancão de fogo” a “Donzella
Theodora” rimada,
e todos os folhêtos do autor
as =

232
LEANDRO QOOMES DE BARROS
VV CCL]

BATALHAS
“DE

Oliveiros com Ferrabraz


era +» - cem mms so o tmto comoso ceu

A Séêcca do Ceará
- ——— esa

Preço. ...... 1$000


EDITORES
Pedro Baptista & €'
117, Rua 7 de Setembro, 17-Guarabira |
Estado da Parahyba do Norte
1920

233
“O
BATALHAS

Oliveiros com Ferrabraz


Eram doze cavalleiros =
Homens muito valorosos,
Destemidos, animosos,
Entre todos os guerreiros,
Como bem fosse, Oliveiros
Um dos pares de fiança
(Que sua perseverança
Venceu todos infiés,
Foram doze leões crués
Os doze Pares de França.

Todos eram conhecidos


Pelos leões da igreja,
Pois nunca foram á peleja
Que nella fossem vencidos,
Eram por turcos temidos,
Pela igreja estimados
Porque quando estavam armados
Suas espadas luziam,
E os inimigos diziam:
—Esses são endiabrados.

234
qi sui

Tinha o duque de Nemé


Que era uma espada medonha,
O grande Guy de Borgonha
Geraldo de Monte Fé.
Carlos Magno tinha fé
Em todos seus cavalleiros,
Pois entre todos guerreiros
De que nos trata a historia,
Vê-se sempre a maior gloria
De Roldão e Oliveiros.
O almirante Balão
Tinha um filho—o Ferrabraz.
Que entre os turcos, era u mais
Que tinha disposição
Mesmo em nobreza de acção
Era o maior que havia
Então em toda Turquia
Onde se ouvia fallar,
Tudo tinha de respeitar
Ferrabraz de Alexandria.

Fol Ferrabraz procurar


Sahiu com uma grande tropa
Vê se achava na Europa
Um rei para pelejar,
Pegou logo a exclamar
Com mais precipitação,
Fazendo uma exclamação,
Insultando os cavaleiros,
Falando contra Oliveiros

235
0

Fazendo accirte u Roldão.

Quando Ferrahraz chegou


Nos campos de Mormionda,
Só um trovão quando estronda
Trôa como elle troou,
Em altas vozes gritou
Apoiado em uma lança,
Como uma féra que avança
Precipitada em furor,
Dizia oh! imperador
Que dê teus pares de França?

Stás poupando teus guerreiros


Que nem um vem pelejar?
Para que queres guardar
Esses doze cavalleiros?
Ouço dizer que Oliveiros
Tem tanta disposição,
E propria a occasião,
Se mão tens dó dos cavalleiros,
De uma vez mande Oliveiros
Guy de Borgonha e Roldão.
ap ssa ahi respondeu
E Ferrabr az se apeiou,
Numa sombra se assentou
Em vozes altas rompeu,
Carlos Magno se escondeu:
Ou está hoje sem acção?
Os pares onde é que estão?

236
ai

Não ouço nem um fallar,


Já não posso acreditar
Nas façanhas de Roldão.

Sahirei daqui dizendo:


— Carlos Magno se escondeu?
Roldão não me appareceu
Talvez ficasse tremendo...
Estou só, como se está vendo
Elles são 12 guerreiros
Como 12 cavalleiros,
Não dão batalha a um só?
Porque não vem uma mó
Roldão, Ricardo, Oliveiros?

Sosinho nesta campanha


Contra um exercito francez,
FE matal-o de um vez,
Não digo que isto é façanha.
Um exercito não me ganha,
Ainda eu mesmo doente
Como é que existe gente
Que se atreve a exaltar
E pelo mundo espalhar
Que Carlos Magno é valente?

Carlos Magno perguntou


Quem tanto o insultava,
Quem tão rebelde fallava.
Ricardo ahi lhe explicou
Lhe disse esse que chegou,

237
AR

É um grande da Turquia,
Turco de muita energia,
Impera sobre o seu throno.
E' o legitimo dono
Do reino de Alexandria,

Aquelle foi o que entrou


Dentro de Jerusalém
Não respeitando ninguem
Até apostolos matou,
No templo sagrado achou
Balsamo que Deus foi ungido
Cousas que tinham servido
Na paixão do Redemptor,
A corôa do Senhor
Tudo elle tem conduzido.

Carlos Magno observou


Que nem um se offereceu,
Logo alli entristeceu
Chamou Roldão e o mandou,
Disse Roldão—eu não vou
Nem eu, nem meus companheiros
Nos combatas derradeiros
Exgottamos os valores,
Quem foram merecedores
Foram os velhos cavalleiros,

Nessa ultima batalha


Sanguinolenta e tyrana,
Minha. espada durindana

238
nie

Não mostrou uma só falha,


Daquella bruta canalha
Arrebatei a victoria,
Me ficará de memoria
Aquelles grandes perigos
Os cavalleiros antigos
Foi a quem désses a gloria.

Carlos Magno quando ouviu


A resposta de Roldão
Se encheu de tanta paixão
Que um ferro lhe sacudiu.
Roldão quando olhou que viu
O sangue delle descer,
Não poude mais se conter,
Se armou com tal furcr
Que não foi ao imperador
Por Ricardo se interver.

Carlos Magno ordenou


Que os pares o pegasse,
Depois de prezo o matasse.
Roldão de novo se armou
Pela espada puxou
E disse em alta linguagem
Com destemida
Falou a todos assim:
—2(Jualquer que tocar em mim
Diga que está de viagem.

Tudo alli ficou calado

239
—| —

Não falou um cavalheiro


Roldão era o companheiro
Dentre todos mais amado,
De mais era respeitado
Pela nobreza e acção,
Tinha um leal coração
Para com seus companheiros
E mesmo dos cavalheiros
Era elle o capitão.

Carlos Magno ficou


Certo de que ninguem ia
Disse que mesmo queria
Ver quem o desafiou,
Quando a noticia chegou
Aos ouvidos de Oliveiros
Que soube que os cavalleiros
Não tinham lhe obedecido,
Ficou bastante sentido
Desta acção dos companheiros.

Ordenou ao escudeiro
O cavallo lhe sellar
E mandou logo apromptar
Arreios de cavalleiro...
E gritou—ande ligeiro,
Me ajude logo a armar,
Pode o turco se gabar,
Matei um dos cavalleiros,
Porem não diz Ofiveiros
Temeu commigo luctar.

24)
fios
Assim que Guarim sentiu
Seu senhor fallar em guerra,
Poz os joelhos em terra
Até por Deus lhe pediu,
Porque imaginou e viu
Que elle não estava capaz,
Porque já era demais
O sangue que lhe sahia
Por isso por Deus pedia
Que não fosse a Ferrabraz,
Quarim, podes descançar,
—Oliveiros respondeu.
Um soldado como eu
Não deixa seu rei chorar,
Pois o turco ha de acrediar
Que mil féras não me comem
As minhas façanhas se somem
Mas emquanto eu não morrer
Ferrabraz ha de dizer
Em França encontrei um homem.

Quando do leito se ergueu


Pôz uma perna estendida,
Logo ahi de uma ferida
Porção de saugue desceu,
O escudeiro tremeu
Assim que o sangue espanou
E elle não se importou
Como que eslivesse são,
Fincou a lança no chão

241
a SR

E de um pullo se montou,

Foi elle ao imperador


Com a maior reverencia,
E disse com obediencia:
—Esclarecido senhor,
Eu não sou merecedor
Que cousa alguma me dê,
Por issn, senhor, bem vê
Que valor tem seu captivo
Por 10 annos que vos sirvo
Pedir vos quero mercê...

Disse-lhe o imperador:
—Pode Oliveiros dizer,
Eu juro o satisfazer
Seja que pedido fôr.
Disse Oliveiros: Senho!!
Não quero cousa de maiís,
E não serei tão capaz
Para tanto vos pedir,
Porem o que quero é ir
Dar batalha a Ferrabraz.

Carlos Magno quiz faltar


Devido ao seu mão estado,
Porem já tinha ordenado
Não podia revogar.
Viu Oliveiros montar
E muito sangue sahir
R cgou o para não ir...

242
cs

Disse Oliveiros: irei


>> desfeiliardo meu rei |
De que me serve existir”

Não posso aqui declarar,


O que era de misltér,
Como ficou Regner
Vendo Oliveiros montar,
Ficou a se lastimar
Vendo os outros cavalleiros,
Elle com mil desesperos
Prostrado em terra se lança
Perdendo a ultima esperança
— De ver seu filho Oliveiros.

Ferrabraz estava deitado


Sentio chegar Oliveiros
Foi ver se eram os cavalleiros
A quem já tinha insultado,
Depois de ter bem olhado.
Cresceu lhe mais o furor,
Com desprezo atterrador
E raiva dos cavalleiros
P rguntou a Oliveiros:
—[(Jue fizeste ao teu senhor?

Levante-se, cavalfeiro,
Prepare as armas se aprompte
Pegue o cavallo, se monte,
Trate de ser bom guerreiro
Ponha seu corpo ligeiro

243
e,

Veja não dê uma talha,


A morte entre nós se espalha,
A hora de um é chegada
Lance mão de sua espada,
Vamos entrar na batalha.

Quem és tu, tão pequenino


Que vens me desafiar?
Achas que vou me occupar
Em dar batalha a menino?
Es louco, tu mão tens tino
Disse o turco com furor.
Seja por qual forma fôr,
Quero que agora, confesses
Se algum mal já fizestes
Contra a teu imperador?
Disse Oliveiros zangado:
Venha pelejar commigo,
Perante seu inimigo,
E' ser vil pôr-se deitado.
Devia ser delicado
Lhe reflectio Oliveiros
Na ordem dos cavalleiros
Encontra-se a educação,
Pois isso não é acção
Vinda dos grandes guerreiros.

O turco disse afinal:


Ah! cavalleiro, lhe digo,
Só pode luctar commigo

244
E

Se fôr de sangue real,


Porque se não fôr igual
Recusarei a empreza;
Fallo com toda franqueza...
Então Oliveiros disse.
Pode crer como que visse
Minha origem é de nobreza.

Ferrabraz lhe esclareceu:


Teu nome has de me dizer.
Primeiro eu hei de saber,
Disse Oliveiros:—do teu
Disse Ferrabraz: o meu
Eu direi sem mais porfia,
Pois minha soberania
Não exige cousas taes,
Eu me chamo Ferrabraz,
Sou o rei de Alexandria.

Eu sou Guarim de Lorenda.


—2()liveiros respondeu—
Hoje foi que succedeu
Dar a primeira contenda.
E lhe digo que se renda
Que o levarei com amor,
Fique sabendo o senhor
Hoje não pode escapar
Eu hoje o tenho de levar
Para o meu imperador.

O turco disse-lhe assim:

245
|

Teu rei é muito malvado


Pois pega um pobre soldado
Sem causa quer dar-lhe fim,
Porque em tu vires a mim
E* ser muito louco ou bôbo,
E' como fazer um roubo
A quem não possue dinheiro,
E" empurrar um cordeiro
Dentro da jaula de um lôbo.

Oliveiros já massado
Disse: turco és um louco...
Levanta-te, senão com pouco
Hei de ferir-te deitado,
Que tempo tem se passado
Nessas tuas discussões
Eu não vim ouvir razões
Vim ao campo pelejar,
Tu és franco no fallar
Vamos vêr tuas acções.

Ferrabraz sem alterar


Lhe disse: espera Guarim,
Peço que digas a mim
O que te vou pergutar.
Então se pôz a indagar
Com a falla muita mansa
Como quem pensa e descança
Perguntou a Oliveiros:
— (Como são os cavalleiros
Que formam os pares de França?

2%
—|
4 —

Oliveiros disse assim:


Roldão tem bôa estatura
Oliveiros na figura
E' mesmo que vêr a mim,
Guy de Borgonha, Bomfim,
Ricardo, são quasi iguaes,
Pegou n'um, é um voraz,
Porem emquanto a Roldão
Em coragem e coração
O mundo não terá mais.

Disse Ferrabraz: então


Porque desses cavalleiros
Não veio a mim c ÓOliveiros?
Guy de Borgonho ou Roldão?
Disse Oliveiros: isso não
Oliveiros está doente
Homfim tambem anda auzente,
Guy de Borgonho ficou
foldão nunca se occupou
Brigar com um turco somente.
Guarim tu tens me mentido
Pois não és novo guerreiro,
E's antigo cavalleiro
Tanto que tu estaes ferido.
Mas Oliveiros fingido
Disse: esse sangue é d' agora
Eu estou são; porem embora
Tenha na junta algum callo,
O sangue é de meu cavallo ,

24
emilio

Que é muito duro de espora

Depois de se levantar
Ferrabraz se preparou,
A Oliveiros rogou
Que o ajudasse a armar.
Oliveiros quiz faltar
Por achar que era um perigo.
Disse Ferrabraz: lhe digo
Confie em minha nóbreza,
Eu não uso da vileza
Para com meu inimigo.

Oliveiros se apeiou
Ajudou a Ferrabraz.
Com cortezias iguaes
Elle tambem o tratou,
Quando Ferrabraz se armou
Vestiu a saia de malha
Na qual não tinha uma falha
Feita por outros guerreiros,
Montaram-se os cavalleiros
Deram começo a batalha.

Posto em ordem proseguiram


A lucta em estreitos passos,
Das grossas lanças os pedaços
De ambos ao longe cahiram,
Ambos logo se serviram
De duas finas espadas
Cortantes, grandes, pesadas

248
=Ãõ=

Que era uso dos guerreiros


Das feridas de Oliveiros
Foram tres as magoadas.

Disse Ferrabraz: Guarim,


Pela crença dos fieis
Confesses logo quen és,
Não sejas fingido assim.
Creio que mentistes a mim
Tu és um dos cavalleiros
Daquelles grandes guerreiros
Que a fama está espalhada,
Pelo pegar da espada
E's Roldão, ou Oliveiros,
Disse o hoste dos guerreiros:
Turco tenho uma attracção
Para roubar coração
Dos mais duros cavalleiros.
Confesse, sou Oliveiros,
Minha fama tens ouvido,
Ferrabraz ficou sentido
De seus insultos primeiros
Disse: —-desculpe Oliveiros
Não tel-o bem recebido.

Ahi tornaram a partir


Em ordem de covalleiros
Disse o «urco a Olkiveiros,
— Não posso mais te ferir;
Vejo teu sangue sahir

249
e 17

Devido estares estragado;


Eu tenho o balsamo sagrado
Com que teu Deus foi ungido,
Bebe-o porque estáes ferido,
Bebendo ficas curado,
Turco eu não hei de accenar
Cousa alguma que me deres,
Salvo se tu quizeres
Crêr em Deus, te baptisar,
Do contrario é se
Porque não acceito nada.
Estou com a vida arriscada,
Sei do poder que tem elle
Porem só me sirvo dell
Tomando-o pela espada.
Ahi ambos prevenidos
Não escularam razões,
Pareciam dois leões
Numa jaula enfurecidos.
Deus golpes iguaes medidos
Todos dous descarregaram,
Com a força que botaram
Os braços ficaram bambos
F os cavallos de ambos
E n terra se ajoelharam

Oliveiros recebeu
Um tão desmarcado
Que ficou atordoado

250
cefiia

E muito sangue desceu.


O turco ahi conheceu
Delle as forças abatidas
Com vozes compadecidas
Disse Oliveiros teimoso,
Bebe o balsamo milagroso
Que te cura essas feridas.

Ferrabraz, eu nada acceito


Assim não deves cansar te,
Confesso de minha parte
(Que todo oflerta regeito.
Porque eu não me aproveito
D'uma acção acobardada
Por wma protecção dada
Pois que prefiro morrer
Que do teu balsamo beber
Sem o tomar pela espada.

Beijou a cruz da espada


Proseguio uma oração!
Oh! Virgem da Conceição
Maria pia e sagrado,
Mãe de Deus immaculada,
Esposa casta e fiel!
Pelo vinagre e fel
Que Christo bebeu na Curz,
Rogae por mim a Jesus,
Nessa batalha cruel,
Partiu ao seu contendor

2ol
Com tanta disposição
Que só se tivesse são
Teria tanto valor.
Deu-lhe um golpe matador
Porem pegou mal ado,
Feriu o turco de um lado
Ferrabraz se desviou
Tirando o balsamo e tomou
Ficou de tudo curado.

Oliveiros entristeceu
Quando viu Ferrabraz são,
E disse no coração
Quem perde a lucta sou eu...
Porem não esmoreceu
Nem deu mostração de falha
Como o homem que trabalha
Disse sem poder conter-se,
Falta pouco para vêr se
O fim de nossa batalha.

Disse o turco
— cavalleiros :
Tu já estás muito ferido
Queira acceitar meu partido
Renda-se, prisioneiro,
Assim lhe farei o herdeiro
Do reino de Alexandria,
E tem mais a garantia
De hoje para amanhã,
Casarás com minha irmã,
A flores de toda Turquia.

292
mm DU

Disse Oliveiros: —Sentor


Eu não prefiro riqueza,
Quero morrer na pobreza,
mas bem com meu Salvador...
Porque foi meu creador
E por minh'alma trabalha,
Um estante não se empalha
Para valer os fieis,
Turco, cuida em teus papeis,
Vamos dar fim a batalha.

Cobriu-se com seu escudo


Beijou a cruz da espada
E deu uma cutilada
Que desceu amiés e tudo,
E dando outra a miudo,
A Ferrabraz ofendeu
O céo o favoreceu
Um revez escapoliu
O balsamo delle cahiu
E Oliveiros bebeu.

Ferrabraz admirado
Por ver tanta ligeireza,
E ver aquela destreza
Em quem já estava cançado,
Viu Oliveiros curado
De todas suas feridas
Suas forças abatidas,
Mas estava tão renitente
Que parecia-lhe um emte
ani tio

Com quinze ou -dezeseis vidas.


Depois de ter apanhado
O balsamo que lhe serviu,
Dentro do rio saccudio
O que inda tinha ficado.
Ferrabraz ficou massado
Por Oliveiros botar
O que não podia achar
Ainda a peso de ouro,
Do mundo todo thesouro
Não poderia comprar.

Oliveiros respondeu:
Ferrabraz fique sabendo
Que a tudo Deus está vendo
En o mundo todo é seu,
m guerreiro como eu
Não vae atraz de cilada
Com Deus não me falta nada
Me bastam os prodigios seus
Não quero mais do que Deus
Uma lança e uma espada.

E tornou a Investir
Que só um leão voraz.
E disse: Senhor Ferrabraz
E tempo de dicidir.
Só se ouvia era timir
As espadas pelo ar.
Roldão que estava a olhar

254
E
De vez em quando dizia:
Oliveiros eu queria
Estar agora em teu logar.

Já tinha se espedaçado
Arnéis capacête e tudo,
Não tinha mais um escudo
Que não tivesse quebrado.
As lanças tinham voado
Só as viseiras existiam
Elles já mal se cobriam
Nas horriveis cutiladas.
Somente as duas espadas
Sem damno algum resistiam.
Oliveiros se preparou
E partiu ao inimigo...
O turco viu o perigo
E pé firme o esperou,
Uu golpe nelle deitou
Com tanta disposição
Sem ser proposito ou traição
Nesses golpes tão ligeiros,
O cavallo de Oliveiros
Cahiu sem vida no chão.
Turco tu estás bem montado
E meu cavallo morreu.
Ferrabraz lhe respondeu:
Mas eu não fui o culpado.
Não ficarás desarmado
|
S
O cm

Que eu sei a ordem qual é


Não desanimes na fé
Eu fui quem matei o teu,
Agora monte no meu
E vou pelejar de pé.

Disse-lhe Oliveiros: não


Fico tambem desmoniado
Tu não fosses o culpado
Assim era ser vilão,
Por certo eu tinha razão
Porque malasses o meu,
Foi caso que aconteceu
Era-me feio aceita!.o.
Não brigo só a cavallo
Podes descançar o teu,

Ahi Ferrabraz atou


Num alvoredo o cavallo
E disse vou descançal-o
Sua occasiio Enegoa:
Para batalha marchou
Com toda disposição,
Oliveiros forte e são
Esperava cara a cara,
Com a espade Alta Clara
Rugindo que só leão.

Eu agora me lembrei
Da falta que commetti,
Mas foi porque me esqueci,
to i
DÁ são
Por isso não relatei.
Porem sempre falarei
Para o leitor se agradar,
Quem sabe ha de se lembrar
Na lucta dos cavalleiros.
O cavallo de Oliveiros
Quando quiz desembestar.
Com a grande cutilada
Que Oliveiros receter,
Quando o cavallo correu
Não obedecendo a nada,
Sahiu numa desfilada.
Mas o turco o atalhou
Oliveiros até pensou
Que fosse alguma lragedia,
O turco pegou na redia
E o cavallo parou.

Outra parte que dizia


Q ando o cavallo do turco,
Foi voako num cavuco
Ferrabraz quasi mo ria.
Oliveiros com energia
Chegou nessa mesma hora,
Apeiou-se sem demora
Q re só sendo dois irmãos,
Pegou elle pelas mãos
E botou Ferrabraz fóra

E tornaram-se bater
=)
so

Os dous ferozes cavalleiros,


O turco com Oliveiros
Ninguem podia entender,
Nada se ouvia dizes
No jogo das cutiladas,
As armas espedaçadas,
Com esse pesado jogo
De longe via se o fogo
Que sahia das espadas

Podes gabar-te Ol.veiros


Disse o turco admirado:
—(Dlhe que tenho luctado
Com mais de mil cavalleiros,
Entre todos os guerreiros
Não houve quem me ferisse
Nem quem tanto resistisse
Os golpes de minha espada,
Elia por outra assignada
Nunca houve quem a visse.

Disse Oliveiros:—então
Tua espada não torasse,
E' porque não encontrasse
Com a espada de Roldão.
Elle com ella ma mão
Nunca encontrou ferro duro,
Nem arnez de aço puro
Que seus golpes resistisse,
Nem metal que não rangisse,
Nem cavalheiro seguro.

258
sm) sora

E cobriu-se com uma parte


Do escudo que ficou,
Com todo vrgulho gritou,
Vamos dar fim ao combate,
A nós não ha quem aparte
Disto ja estou convencido.
Haja o que Deus fô- servido.
iUnde ha campos e espadas,
As razões são escusadas,
Conversa é tempo perdido.

E partiu determinado
A Ferrabraz degollar,
Mas não poude aproveitar
O golpe descarregado.
O turco pulou de um lado,
Um golpe neHe mediu.
Quando ÓOliveiros sentiv
O braço ihe estremeceu,
Do golpe que recebeu
A sua espada cahiu.

Assim mesmo inda pegot-a,


Mas tinha o braço dormente.
O lurco rapidamente
Partiu a ella apanhou-a:
Chegando examinou-a,
Ficou muito admirado
E disse enthusiasmado:
— Oliveiros estás vencido,
Isso ahi es'á decidido'

299
ses ema

Porque já estás desarmado,


Porem pega tua espada
Não quero: vencer-te assim,
Mesmo quero ver o fim
Dessa batalha encantada,
Pois que está tão dilatada
Qua já estou mal satisfeito.
Respoudeu-lhe— só acceito
Por minhas armas tomadas:
Toma-la por mão be jida,
Isso não é de direito.

Com um pedaço de escudo


Qie no chão tinha ficado,
Depois de o ter apanhado
Disse Oliveiros, isso é tudo,
Não fura mais é cascudo,
Mata qualquer, está pro ado.
Guarim tinha observado,
Foi a Carlos Magno e disse
Que a Oliveiros acudisse.
Que já estava Cesarmado,

Oliveiros viu então


Que a sella de Ferrabraz:
Estava munida de mais
Com espadas no arção,
Com toda dispozisão
Que <ó quem não tem juizo,
Partiu ao turco indecizo

200
— 28 —

Sem temeridade alguma


Puxou pelo cabo uma
Que se chamava Baptiso,
Agora sim, estou armado,
Disse elle a Ferrabraz.
Nas armas estamos iguaes
Nenhum ficará massado.
Cada qual zele seu lado
Que a batalha vai findar,
É tempo de aproveitar
A força, a coragem, o jogo,
A batalha é ferro e fogo
Seja feliz quem ganhar.
E haja tempo, o ferro trõa
Com golpes tão desmedidos,
Das espadas os tinidos
Só um trovão quando sõa
Que o estampido reboa
Por vãos de serra e quebradas,
Como bombas dispersadas
Raios de fogu subiam.
Grossas faiscas sahiam
Daquellas duas espadas,

Ferrabraz a resistir
Estava com 1anta paixão,
Oliveiros só leão
Quando alguem o quer ferir,
Disse—vamos dicidir

261
cm DO ma

Esta batalha comprida,


A causa está conhecida,
Um de nôs hoje aqui erra,
E nesse campo de guerra
Um ha de deixar a vida,

Oliveiros ahi se ergueu


Marcou-lhe a cabeça ao meio
Que foi o golpe mais feio
Que um c.valleiro já deu,
Ferrabraz estremeceu
E quasi perde o sentido,
Ficando muito abatido
Já com os golpes primeiros,
Disse comsigo Oliveiros:
—Esse está quasi vencido!

E tornou a repetir
Outro golpe desmarcado,
O turco muito cançado
Quasi o golpe o faz cahir,
Não podendo resistir
O golpe não respondeu,
Oliveiros conheceu
A falta de ligeireza,
Mas viu que aquella fraqueza
Não era defeito seu.
Disse Oliveiros comsigo,
Meu Deus—-se vós concedesse
Que esse turco conhecesse

262
mis

Que é feliz viver comtigo


Livraria-o do perigo
De su'alma se perder,
O ceu havia de colher
Um'alma quasi perdida
Que depois de arrependida
Podia se converter.

Já de Ferrabraz a vida
Se divulgava num sopro,
Cada parte de seu corpo
Tinha uma mortal ferida,
A força muito abatida
Elle de todo mud:do
Pallido e ensanguentado
Oliveiros viu com calma
Que o turco só tinha a alma,
O corpo estava acabado.

Jesus, Filho do Eterno.


Exemplo de Redempção.
Livrai a este pagão
Do abysmo do inferno
Dai-lhe um desejo moderno,
Um intuito que c avise
Dessa miseravel crise,
Da'-lhe isso como prenda,
Que de tudo se arrependa
Creia em vós e se baptise.

263
it
já estava, Ferrabraz
Muito rendido ao cansaço,
já o seu esquerdo braço
não o podia erguer mais,
Porque não era capaz
De resistir mais uma hora
E Oliveiros por fóra
Conheceu-lhe a gravidade,
Com toda amabilidade
Disse —Ferr2braz, agora,

Quero que fique sabendo


Que existe um Deus que nos cria,
Sua força e energia
E" como aqui tu estás vendo,
Vim aqui quasi morrendo,
Todo chagado e ferido
De um combate que tinha tido
Para elle defender,
Sem do teu balsamo beber
Fui de Deus favorecido!

Se tu chegasses a crer
na Santissima Trindade,
No Poderoso Deus Padre,
Havias de conhecer
Que ao mundo rege um poder
De grande sabedoria,
Que a tudo alimenta e cria,
Fez o creu, a tera, o mar,
E" mais puro que o ar

204
E

E mais claro que o dia.

Esse um dia descerá


Ao mundo das ilusões,
E todas nossas acções
Como juiz julgará.
E como te salvará?
Tu sem lei, sem confiança,
Sem ter nelle uma esperança
Vás ao dia de juizo?
Então perde o paraiso
Esta grande e rica herança?
Deixe estes idolos que adora,
Creia na Virgem Maria,
Creia que um Deus que nos cria
julga tudo em uma hora,
Bote estas illusões fora,
(Que o demonio não lhe pise
Peça a Jesus que o avise,
Abrace a religião
Peça das culpas perdão
Creia em Deus e se baptise,
Disse o turco—cavalheiro,
Isso eu não hei de fazer
Me sujeitarei morrer
No campo do desespero.
Tenho os louros de um guerreiro
Brazão, honra, assim por diante.
Ainda que vá avante,

265
aà qo

Isto assim nunca farei,


Não deixo a lei que adoptei
Por dez montes de brilhante,

Dizendo—Apollim me valha!
Se levantando cançado,
inda dizia animado:
—Vamos dar fim a batalha,
A morte não me empalha,
A vida é como um segredo,
O mundo um cruél degredo
Onde um mysterio se encerra,
Golpe de espada na guerra
Jamais me mata de medo.

O iveiros pode ver


Quando estavam descançando,
(Que el'e estava desmaiando
E se arriscava a morrer.
Jamais podia viver
Devido ao seu mau estado.
Muitas feridas de lado
Era enorme a sangueira,
Das armas só a vizeira
Apenas tinha ficado.
Ainda se levantou,
Disse: —Sr. Oliveiros,
Dsses são os derradeirros
Golpes que em guerra dou.
Oliveiros q esperou,

266
Ai

Mas não queria o matar,


Seu desejo era o salvar,
Não desejava mais nada
Poz no réto sua espada
Apenas para constar.

Assim que Férrabraz viu


Se ultimando sua vida,
Poz a mão sobre a ferida
A Oliveiros pediu
Julga-se que o turco sentiu
lJma emoção tanto ou quanto
(QQie disparou nesse pranto
Resentido e maguado,
Como se fosse tocado
Do Divino Espirito Santo.

—Nobre e grande cavalleiro!


Disse o turco arrependido,
Agora estou convencido
Que teu Deus é verdadeiro,
Grande, bom e justiceiro,
Ente de grande mistér,
Faz tudo quanto quizer
Nelle não ha quem pise...
Te peço que me baptise,
Depois faça o que quizer.

Oliveiros quando acabou


De ouvir o que elle dizia
Ficou com tanta alegria

267
q a

Que de contente chorou


As feridas lhe curou
Livrou elle de morrer
Então se ouvia dizer.
— Aquella alma fiel
Bemdicto o Deus de Israel
Que foi, que é, e ha de ser.

Estando Oliveiros sentido


Por vêr assim Ferrabraz,
Lhe disse, —hoje serás
Pelos pares recebido;
Não por eu ter te vencido
Mas sim por seres christão...
Porque a religião
Abraça todo rebelde
Desde da hora que pede
De suas culpas perdão.

Disse o turco:—has de montar


Em meu cavallo e seguir;
Se meu exercito me vir
Ha de me querer tomar
E cuide logo em se armar
Com a maior brevidade,
Tenho arma em quantidade
De qualidades mais hellas
Pode confiar-se nellas,
Que valem sete cidades.

E por traz daquelie oiteiro

268
iG

Tem dez mil turcos esperando


E mais que ha de vir chegando
Cada qual mais cavalleiro,
Onde tem cada guerreiro
Que só um tigre ou leão
Homens de disposição,
Destros no jogo da lança,
Pessõas de confiança
Do almirante Balão,
Disse: has de montar
Em meu cavallo e seguir
E ajudar-me a subir
Para poder me levar,
E não deves demorar
Porque estou muito ferido...
Ficarei muito sentido
Se morrer sem baptisar-me,
Alli tem a esperar-me
Um exercito mui crescido.

E Oliveiros andando,
Por uma estrada que havia
Viu que de um monte sahia
A força que estava esperando,
O turco foi se apeiando
E Oliveiros se armou,
Sobre uma sombra o deixou
Foi de encontro aos inimigos,
Um dos maiores perigos
Que Oliveiros encontrou,

269
o,

A Secca do Ceará

Sécca a terra as folhas caem,


Morre o gado sai o povo,
O vento varre a campina,
Rebenta a secca de novo;
Cinco, seig mil emigrantes
Flagellados retirantes
Vagam mendigando o pão,
Acabam-se os animaes
Ficando limpo os curraes
Onde houve a creação.

Não se vê uma folha verde


Em todo aquelle sertão
Não ha um ente d'aquelles
Que mostre satisfação
Os touros que nas fazendas
Entravam em luctas tremendas,
Hoje nem vão mais o campo
E um sitio de amarguras
Nem mais nas noites escuras
Lampeja um só pirilampo-

Aquelles bandos de rolas

270
—38—

Que arrulavam saudosas


Gemem hoje coitadinhas
Mal satisfeitas, queichozas,
Aquelles lindos tétéos
Com penas da cor dos céos.
Onde algum hoje estiver,
Esiá triste mudo e sombrio
Não passeia mais no rio,
Não solta um canto siquer.

Tudo alli surdo aos gemidos


Visa o aspectro da morte
Como a nauta em mar estranho
Sem direcção e sem Norte
Procura a vida e não vê,
Apenas houve gemer
O filho ultimando a vida
Vai com seu pranto o banhar
Vendo esposa soluçar
Um adeus por despedida.
Foi a fome negra e crua
Nodoa preta da historia
Que trouxe-lhe o ultimatum
De uma vida provisoria
Foi o decreto terriv.l
Que a grande penna invizivel
Com energia e sciencia
Autorizou que a fome
Mandasse riscar meu nome
Do livro da existencia.

21)
aiiO ss

E a fome obdecendo
A sentença foi cumprida
Descarregando lhe o gladio
Tirou-lhe de um golpe a vida
Não olhou o seu estado
Deixando desamparado
Ao pé de si um filinho,
Dizendo já existisses
Porque da terra sahisses
Volta no mesmo camirho,

Vê se uma mãe cadaverica


Que já não pode fallar,
Estreitando o filho ao peito
Sem o voder consolar
Lança-lhe um olhar materno
Soluça implora ao Eterno
invoca da Virgem o nome
Ella debil triste e louca
Apena beija-lhe a bocca
E ambos morrem de fome,

Vê-se moças elegantes


Atravessarem as ruas
Umas com roupas em tira
Outras até quasi nuas,
Passam tristes, envergonhadas
Da cruel fome, obrigadas
Em procura de soccorros
Nas portas dos potentados,
Pedem chorando os criados
ty
ty
sido:

O que sobrou dos cachorros.

Aquelles campos que eram


Por flores alcatifados,
Hoje parecem sepulchros
Pelos dias de finados.
Os vales d'aquelles rios
Aquelles vastos sombrios
De frondozas trepadeiras,
Conserva recordação
Da cratére de um vulcão
Ou onde havia fogueiras.

O gado urra com fome,


Bérra o bizerro engeitado,
Tomba o carneiro por terra
Pela fome fulminado,
O bode procura em vão
Só acha pedras no chão
Póe-se depois a berrar,
A cabra em lastima completa
O cabrito inda penetra
Procurando o que mamar,
Ê

Grandes cavallos de selias


De muito grande valor
(Quando passam na tazenda
Provocam pena ao senhor
Como é differente agora
Aquelle animal de que outr'ora
Causava admiração,
Es
-
mia

Era russo hoje está preto


Parecendo um esqueleto
Carcomido pelo chão.

Hoje nem os passaros cantam


Nas horas do arrebol:
O jurity não suspira
Depois que se põe o sol
Tudo alli hoje é tristeza
A propria cobra se peza
De tantos que alli padecem
Os camaradas antigos
Passam pelos seus amigos
Fingem que não os conhecem.

Santo Deus! Quantas miserias


Contaminam nossa terra!
No Brazil ataca a secca
Na Europa assola a guerra
A Europa ainda diz
O governo do paiz
Trabalha para o nosso bem
O nosso em vez de nos dar
Manda logo nos tomar
O pouco que ainda se tem.

Ver-se nove, dez, num grupo


Fazendo suplicas ao Eterno
Creanças pedindo a Deus
Senho:! Mandai-nos inverno,
Vem, oh! grande natureza

274
aca

Examinar a fraqueza
Da fragil humanidade
A natureza a sorrir
Vela sem vida cahir
Responde: o tempo é debalde.

Mas tudo alli é debalde


O inverno é soberano
O tempo passa sorrindo
Por sobre o cadaver humano
Nem uma nuvem apparece
Alteia o dia o sol cresce
Deixando a terra abrazada
E tudo a fome morrendo
Amargos prantos descendo
Como uma grande enxorrada,
Os habitantes vrocuram
O governo federal
implorando que os soccorra
Naquelle terrivel mal
A creança estira a mão
Diz senhor tem compaixão
F elle nem dar-lhe ouvido
E tanto a sua fraqueza
(Que morrendo de surpreza
Não pode dar um gemido.

Alguem no Rio de Janeiro


Leu dinheiro e remetteu
Porem não sei o que houve
q

Que ca não appareceu


O dinheiro é f?o sabido
Que quiz ficar escondido
Nos cofres dos potentados
ignora se esse meio
Eu penso que elle achou feio
Os bolsos dos flagellados.

O geverno federal
Q ierendo remia o Norte
orem cresceu o imposto
Foi mesmo que dar-lhe a morte
Um mete o tacão e ro a-o
QU Estado aqui esfola-o
Vai tudo dessa maneira
O municipio acha os troços
Ajunta o resto dos ossos
Manda vendel-os na feira.

FIM

PAO
LIVRARIA
PEDRO BAPTISTA
—ÇCATALOGO—
LIVROS E ARTIGOS ESCOLARES:
10º, a menos do actual preço do
Commercio.
Arnaldo Barreto
Cartilha Analytica
ariano de Oliveira
Nova Cartilha
Cartilha das Mães.
Puiggare Barreto
|. 2. e 3. Livros
Felisberto de Carvalho
|. 2. e 3. Livros
Hilario Ribeiro
dl. 2. € 3. LIVIOS
Rocha Pombo
Nossa Patria
Historia do Brazil
Dr. ). M. Lacerda
Historia do Brasil
Pequena Geographia
Geographia curso Superior
Arthur Thiré
Geographia Elementar
Macedo Costa
Historia Biblica
Compendio de Civilidade Clhristã
Coelho Netto e Olavo Bilac
A Patria Brazileira

277
io fas

Dr. Fliciano Rodrigues Fernandes


Sciencias Phisicas e naturaes 1. grau
Sciencias Phisicas e naturaes 2. grau
Arthur Trajano
Arithmetica Primaria
é "” Elementar
,, +
Progressiva
Abilio Cezar Borges
Geometria
Dr. Carlos Dias Fernandes
Escola Piltoresca
Olavo Freire
Arithmetica Intuitiva
José Coelho
Corographia da Parahyba
Edmando Amicis
Coração
Dr. joão Ribeiro
Orammatica 1. e 2. annos
Eduardo Carlos Pereira
Orammatica Expozitiva Elementar
"Curso Superior
Historica
++ )s

J. M. Palhares
Manuscripto—Compendio dedicado
ao sexo Feminino
Carlos Silva
O Paleographo

278
— 46—

Francisco Vianna:
1. 2.3. 4. 5. 6. Caderno Calli-
graphia Americana
|. 2. 3.4.5. 6. Vertical.
Cadernos para dezenho, aquarel-
las, fuminhos fuzains.
Boletim Escolar cadernos para
dictado, para muzica; Pequena Arte
de muzica, Methodo de solfejos etc.
Completo sortimento de lousas,
crayons, lapis de cores para dezenho
pennas, canetas, borrachas, papel al-
maço, matta borrão, pegadores para
livros firradores grampos para papel
etc. etc.
ACASO ES

LIVROS DIVERSOS
O grande livro de S. Cypriano,
A Bruxa Evora, O livro completo
dos Sonhos, Os Segredos da Role-
ta, Conselheiro dos Amantes, Ma-
nual do Nomorado, Diccionario das
Flores e Fructas, Cartas de Amor;
O Medico da Familia, Medicina pa-
ra Todos; As Mil e uma Noites; Ma-
nual de Prestidigitação, Hipinotis-
mo; O Orador Popular, Secretario
Moderno, Secretario Brazileiro; Ma-
nual do Destilador, Manual do Pa-
deiro, Guia da Cozinheira; Aven-

279
TE

turas de Saturnino Farandola; O


Lunario Perpetou; O Romance com-
pleto de Rocambole, A Historia do
Imperador Carlos Magno, Historia
de Genoveva de Brabant.
Romances, Historias, e Novellas.

LIVROS e artigos RELIGIOSOS


O Escudo Admiravel, Adoremos,
Ancora de Salvação, Mez das Al-
mas, Mez do S. C. de Jesus, Mez
Mariano, Mez de S. José, Cartilha
da Doutrina Christãa, Maná, Diver-
sos manualsinhos de missa para
crianças, Historia e vida de Santos,
Novoe Velho Testamento com o
Apocalysse de S. João.
Terços brancos pretos e de cores,
Medalhas, Crucifixos, Santinhos,
Estampas, Quadros do C. de Jesus
para entronizações etc. etc.

AGRADO E PRESTEZA

Preços Resumidos
280
RETRATO DO AUCTOR

Dol
O
/

lit

LEANDRO GOMES DE BARROS


Nasceu em 1865, no Municipio da
Villa do Pombal, Estado da Para-
hyba e falleceu á 4 de Março de
1918, no Recife.

2
O editor e proprie-
tario reserva os direitos
de reprodueção deaccor-
do com o artigo 649do
Codigo Civil.

282
253
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Peleja de Antonio Baptista e Manoel Cabeceira
!: — LEANDRO GOMES DE BARROS |

———————
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R venda, Rua do Alecrim 3


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Bento, o milagroso

ÉMuohal Atliro 24
de Beberibe

Pernambuco é um Estado
Aonde tudo se apoia
E quasi todos os annos
Vem de novo uma pincia,
Este anno em Beberibe
Milagre já está de bois,

O que já morreu está morto


E quem escapou não morre,
Devemos aproveitar
Emquanto o alambique corre,
Ainda que a morte veuha
"em o Bento que soccorre.

Um dia desses, eu vindo


Da Fabrica Camaragibe,
De volta vi muita gente
No cáes de Capibaribe,
Tudo dizia a um tempo :
-—'Tem um santo em Beberibe,
e

Dirigi-me a um rapaz
E perguntei-lhe o que era ;
— Disse o rapaz—é um homem
Que o povo no cées espera,
Cura gente com milagre
E é curador de vera.

Eu indaguei como era


A cura que elle fazia,
Então o moço me disse
Que com certeza sabia
Era com almas de indios
E agua de pote, fria.

Tanto que o rapaz disse :


—Vai se fechar o hospital ;
A pharmacia, adeus viola,
A medicina vae mal.
Remedio perdeu a moda,
Se acaba tudo afinal.

Disse a pessoa—elle lá
Faz a cousa de maneira,
Que a «Saude da Mulher»
E o «Elixir de Nogueira»
Tem o valor das bananas
De tarde, no fim da feira.

Com almas de dez caboclos


E um frasco d'agua fria

259
a

Cura erysipelae lasthma


Rheumatismo e anemia,
Dôr de cabeça, enxaqueca,
Bexiga o dyspepesia.

Renova a pessõa velha,


Põe na edade que quer,
Faz cair cabellos brancos
Da pessôa que os tiver
Faz serem pretos ou louros,
Da côr que o dono quizer.

Os reporters de um jornal
Foram lá, tomaram nota.
Disse-lhe um dos curados
Que ali não tinha lorota
O homem aqui tira lingua
Endireita e depois bota.

Chegou um aleijado
Que causava até assombro,
Às pernas já estavam seccas
Tinha nas ccstellas um rombo,
Foi lá em duas molêtas
Voltou com ellas no hombro.

Aqui havia uma moça


Pobresinha, mas, honrada,
Não a queriam por pobre,
Jú estava desenganuda,
se Eq

Com 3 gottas d'agna benta


Foi pedida, está casada.

Dizem que no Amazonas


Elle ganhoa até apostas
E uma viuva lá
Foi uma das grandes mostras
Botou agua no defunto
Trouxe elle vivo nas costas.

Ella foi ao cemiterio


Viu a cora do defunto,
Tirou da acua do Bento
E passou na cova um unto,
Não tronxe dois outros vivos
Porque achei que era muito,

Eu fui um dos que fui lá


Quando elle appareceu,
Meu vigode era pequeno
Mas num instante cresceu
Tanto que minha mulher
Disse que não era eu.

(Quanão os meninos me viram


Foi sem limite o sussurro,
Um me ameaçava pau.
Outro soltava-me murro,
Gritando tudo a um tempo:
Um paiassim só p'ra burro.

2971
= Re

A mulher me perguntou
E quem é vossa mercê ?
Eu disse sou seu maridc
Ella disse--quem você ?
Disse—o caçula de todos:
Esse é lá papai o que!

Disse o menino papai


E' um velho rabugento
Tem cento e vinte janeiros
Já tem o couro cinzento
O Sr. ainda é rapaz
Robusto e bem corpulento

O Sr. diz que é papai ?


Porém, assim não se safa
O palitot de papai
Parecia uma tarrafa
À cabeça côr de neve
O queixo como garrafa.

O Sr. aqui não entra


Da calçada logo arribe
Senão eu metto-lhe o pau
Pois a lei não me prohibe
Eu disse sou teu pai mesmo
Vim hoje de Beberibe.

Na bolsa no corpo em tudo


Eu já sentia desfalque

280
e (Ds

Foi tocar nagua do Bento


Senti inteiro meu frack
Apareceu-me bigode
E nasceu-me cavangnac.

Ahi o mesino disse


Hoje eu levo mamãe lá
Ella vive muito rouca
Eu lhe disse: deixe está
Você é muito creança
Ainda não sabe o que ha,

Sogra muda e mnlher rouca


São de bem necessidade
Esses dois incommodos nellas
São de grande utilidade
Quando nada essas assim
Descançam a humanidade.

O menind perguntou-me
Papai como isso se deu?
De que forma é esse homem *
Como foi que appareceu ?
Cahiu do ceu por descuido ?
Seria trovão que deu ?

Então eu disse: nãosei


Se elle foi ou não nascigo
Só sei que ello faz milagre
E é muito concorrido.

259
as Soa

Muito breve o hospital


Será até demolido.

Mas que remedio dá elle >


O menino perguntou :
— Eu disse: agua do pote
Foi o que elle me applicou.
Bebi e com 10 minutos
O cavagnac apontou.

Muitos dizem que elle é santo


Veio do céo enviado
Assim dizem dez ou doze
A quem elle tem curado
E' cada espiritão
Que está ali encostado.

Tomara que elle não vá


Para as pandas de Santo Amuro
Às sogras no cemiterio
Só andam tomando faro
E minha sogra esta lá
Se sahir me custa caro.

Segundo o que eu tenho ouvido


Dizer o que elle está fazendo
Cego jà tem ido lá
Bebe a agua d'elle e volta vendo
Tem ido gente sem pernas.
E volta de lá correndo.

290
ms
BA o

A casa onde elle habita


Vive cheia com» um ovo
Às vezes cura 3 mil
Chega ontro tanto de novo
Com 2 ou 3 potes d'agua
Cura elle todo povo.

Aqui tem uma mulher


Que 3 linguas possuia
Admira a todo mundo
Como é que ella comia
E 3 linguas n'uma bôcca
Eu nem sei como cabia.

Tomou agua milagrosa


Não tem cicatriz alguma
Tratamento de 10 horas
Ella ficou bôa d'uma
Caliram logo 2 linguas
Quesi fica sem nenhuma,

Agora note o leitor


A que ponto ia chegar
Mulher só tendo uma lingua
Já não se pode aturar
Existindo uma com 3
Quem a podia supportar

291
- Peleja de Antonio Baptista
e Manoel Cabeceira

A. B.—Sr Manoel Cabeceira


Eu sou Antonio Baptista
Canto a 4 ou 5 annos
Mas nunca perdi conquista
Desejo cantar comsipo
Tirar-lhe o panno da vista

Cabeceira—menino quem é você ?


Tão novo e tão malcreado
Isso foi falta de couro
Seu pae era descuidado
Não o cortou em pequeno
Deixou-o precipitado.

B—Cabeceira eu aprendi
Na escola de Romano,
Que no logar que cantava
Deixava a mostra do panno
Tomei lc ão com Ugmlino
Me exercitei com Germano.

€C—Eu cantei com todos esses


Antes do senhor nascer,

292
Fiz Romano atropellar-se
E fiz Germano correr
Abocanhei Ugulino
Porem não pude o morder

B—Pode ter sido um Romano


Algum velho muito antigo
O que foi meu professor
Só sendo por um castigo
E Germano da alagôa
Nunca correu de perigo.

C—Se Germano fosse vivo


Inda fosse cantador
Eu mandaria chamal-o
Juntava-o com o senhor,
Para dar de uma vez só
Em discipulo e professor.

B—Você via nessa hora


O sol gelar e tremer
Defunto na sepultura
Erguer a fronte e gemer
O mar vomitar as aguas
As almas do céu descer,

C—no tempo que eu era moço


Que dava muito em menino
No dia qua en pegava
Um cantaçor pequenino

293
E qn

Só quem podia acudil-o


Era Germano ou Ugolino.

B—Eu podia ter 3 annos


Ainda brincava nú,
Mas um dia fiz um velho
Subir num mandacarú
Sem roupa, e até calçado
Com botas de couro crú.

C—Menino você assim


Se habilita advertir
Só sabe multiplicar.
Não sabe diminuir
O defeito foi do mestre
Que lhe ensinou a mentir.

B—Digo como José Duda:


Um cantor de Pernambuco
Respeite-se o homem velho
Quando errar que está caduco
Quem ignorar um velho
E' tido por um maluco.

C—Em moço sempre cantei


Com Romano no Teixeira
Ugulino em Sergipe
Ignacio da Catingueira
Via-se mais de 10 duzias
De cantadores crueira.

294.
ps,
O: see

B-——-Romano era professor


Germano decurião
Ugulino era vigario
Patricio era capellão
E Verissimo era rapaz
Serviaide sachristão.

C—Você fallon na igreja


Devia ir ao final
Quando se faz uma obra
Se aprompta tudo em geral
Faltou-lhe o bispo e o nuncio
O papa e o cardeal

B-—Meu velho dou-lhe conselho


Afine mais a memoria
Procure o bisaco velho
Ver se ainda acha uma historia
E se despeça da vida
Como Lucifer da gloria.

C—Não admiro Alexandre


Guerrear com tal vantagem
Napoleão luctar tanto
Só perder uma viagem,
Mas você partir a mim ?
Acho ter muita coragem.

B —Collega, vamos agora


Ver quem sustenta o rojão

295
a SAS que

Com pouco o dia amanhece


E eu tenho obrigação,
O senhor está muito velho
Não aguenta questão.

C—Baptista eu já son idoso,


Porem, meu nome inda brilha,
Eu ainda caço de noite,
Rastejo e não perco trilha.
Dou tapa em bocca de moço
Quo os dentes dançam quadrilha.

B—Eu sempre ouvia dizer


Por minha mãe e meu pas,
Carreira de velho é chôto
E não chega aonde vae
E só levanta poeira
Na occasião que case.

C—O senhor se orgulha tanto


Quando falla em mocidade
Eu nmnca tive esse orgulho
(Quando tinha sua edade,
Tem mais moços do que velhos
No chão da eternidade.

B—A velhice nesse mundo


Pode ser equiparada
Com uma fructa na feira
Depois de estar bem passada,

296
SÁ =

(Que no fim da feira o dono


Dá por pouco mais ou nada.

C—Baptista eu son cantador


(Que não aggravo a ninguem
Canto com tddos os collegas,
Porem, os tratando bem,
Nunca gostei de notar
Defeitos que os outros têm,

B—bEu vi o senhor chegar


Fallando um pouco imprudente,
Contando muitas bravuras
Dando signal de valente,
Eu disse: esse velho acode
La vae madeira p'ra frente.

C—Você é moço, eu son velho


Mas, não estou desanimado,
Barco só deve perder-se
Depois de bem carregado,
O risco que corre o pão
Corre tambem o machado.

B—Meu machado é deaço puro


Pode a tudo resistir
Só Nicrando em Pajeú
Foi quem poude o construir
Nicandro não faz machado
Para qualquer pão partir.

291
sai O

C—Essas obras de Nicandro


A mim gímais admira
Eu tenho uma fouce d'elle
Que não corta nem embira
Elle me fez um machado
Que até em sêbo se vira.

B—Vossa mercê olvidou-se


Ou quer faliar por paixão
Não vê mais aonde bate
E' essa toda a razão,
Pensa que corta a madeira
Está enganado, é o chão.

C—Você tem toda razão


De o exaltar, é parente
(Quem gaba o noivo é a noiva
Isso é cousa differente
Não ha quem taxe o que é seu
Sendo desgraçadamente.

B-—Cabeceira vamos ver


De nós quem mais força tem
Desgraça não quer conselho
Pobresa não quer vintem
Em pilão que eu pisar milho
Pinto não come xerem.

C—Baptista já estou cançado


E não sei mais o que diga

298
a ARS e

Cantador nas suas unhas


E' mesmo que ter bexigas
O senhor é raciado
Com onça ou gallo de briga.

B—Meu velho en sou raciado


Com homens de intelligencia
Homens que não estudavam,
Porem tiversm sciencia
Tiveram por mestre os livros
Nas aulas da Providencia

B—É eu fiquei no lugar


De Romano no Teixeira
De Ugaulino conhecido
Por cantador de primeira
Sou inspector dsssas zoras
Governo qualquer ribeira

B—Si ainda eu tiver um filho


Esse fica em meu lugar
Para onde eu governei
Outro não ir governar
A onde existir meu nome
Cantador não pode entrar.
O autor reserva o direito de pro-
priedade

300
LEANDRO GOMES DE BARROS
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Branca de Neve .

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e
BRANCA DE NEVE E O 30L-
DADO GUERREIRO

Um grande historiador
Narrava um facto importante
Que entre todos os factos
Foi o mais interessante
Sobre a vida de um soldado
E o reino de um gigante.

O facto é como a historia


Da lampada de Aladim
A pessoa se deleita
Lendo a obra até o fim
A historia tem que ver
O escriptor narra assim:

Havia na Ásia Maior


Um habitante 'Proyauo
Que tinha todas as famas
De um grandé republicano
Esse velho tinha um filho
Chamava-se Verdearo.

Quando Verdiano tinha


Cinco cu seis annos de idade
Sahiu a brincar no campo
Por uma casualidade
Perdeu-se no pé d'um monte
E foi ter numa cidade.

302
—2—
Veredano olhando bem
Se aproximou de um portão
De onde avistou um palacio:
E um grande pavilhão
Ao mastro de uma bandeira
Estava encostado um leão.

As clinas ou jubas da fera


Massias como o setim
Às presas grandes e groças
Porem de puro marfim
O leão era de especie
Que nunca se viu assim,

Era uma grande cidade


Muito bem edificada
Com magnificos predios
E muito bem aceiada
Alli só podia haver
Nação bem civilisada,

Havia um portão de marmore


Numa praça principal
Do portão estava se vendo
Um paço municipal
Tinha escripto numa placa
Gabinete imperial,

Logo ao passar do portão


Tinha um coreto elegante
Onde haviam 3 estatuas

503
e.
Feitas a jaspe e brilhante
Uma cobra de metal
De uma forma enteressante.

As estatuas eram de um rei


E outra de uma criança
A terceira de uma moça
Suspeudendo uma balança
A estatua do menino
Tendo na mão uma lança,

Outra estatua de um soldado


Com uma flor e um breve
Com wma espada em punho
Fingindo ferir de leve
Tinha no peito direito
Escrito Branca de Neve.

Tudo daquella cidade


Era grande e imponente
Elle embora tão pequeno
Conheceu perfeitamente
Que não pertencia a Trova
Pois tudo éra differente.

Tinha uma grande avenida


Calçada toda a cristal
Que ia desde o portão
A um torrião de metal
A onde exitia o grande
Pavilhão nacional.

304
da sus

Au leste do portão
Havia um grande jardim:
Saindo insensante aroma
De cada pé de jasmim
Como monarcha nem ur
Já possuiu outro assim.

Verdeano observou;
Por aquelle torrião
Passava uma aguia branca
E; saudava o pavilhão
|; a cobra de metal
[azia venia ao lião.,

Klle perguntava a si
isso aqui em que se enverr:
sem duvida é reino encantad:
Que há aqui nesta terra
Quando passou uma dama
Rufaram tambor de guerra

Muito ao centro da cida:


Quvia muzica tocar
Rumores de carruagem
'ombas de fogo do ar
Ouvia falla de gente
FE fortaleza salvar.

A creança estava all!


vem saber o que fize--
[4 não queria sahir

305
ia dis

Sem que primeiro soubesse


Procurou saber daquillo
Desse depois no que desse

A estatua do menino
Tinha traços do Trovanno
|: se parecia muito
Com o pae de Verdeano
so sendo feita por elle
Não havia um só engane.

€& sol ja ta alteando


Verdeano sentiu fome
HF disse destro de st
Neste logar não se come”?
Quvio gente conversar
[4 fallarem no seu nome

Hlle alertou os ouvidos


Tornou a ouvir fallar
Mas onde era a converça
Plle não poude atinar
Ouviu dentro do jardim
Tima pessõa o chamar,

i. perguntou elle em voz alta


(Quem foi que chamou-me lá?
nu eu repetiu à voz
Verdeano venha cá
Você auda aqui perdido?
Porque não sabe onde esta

306
si

Viu elle um throno na sombra


De uma roseira amarella
Nelle sentado uma jovem
Com palma véo e capella
Elle sem pedir licença
Sentou-se no collo della,

Ella perguntou menino


Quem deu-te tanta ouzadia
Para sentar-se num collo
De tanta suberania?
Disse o menino: um immundo
Nelle eu não me sentaria.

A dama disse sorrindo


Tu és um heroi menino
Porem esse collo tem
Um domno que é um ferino
Tu não te bates com elle
Por seres tão pequenino,

Altura não me intimida


Verdiano respondeu
Daqui ha uns annos eu creço
E elle pode ser meu
A javem disse sorrindo
Pois bem inda será teu,

Fila pegando uma flor


Chegou-lhe ao peito de leve
Disse a elle, a te offender

307
o Ta

Pessoa alguma se atreve


A flor dexou-lhe no peito
Escrito Branca de Neve

Voltou dalli Verdeano


É daquillo se esqueceu
Tanto que nem disse aos paes
Nada do que sucedeu
O letreiro que a flor fez
Nunca mais desappareceu,

Perdeu o pae e a mãe


Então toda populaça
Cada um que lhe dissesse
Que elle fosse sentar praça
Pois era o unico meio
Que livrava-o da desgraça.

Completou 16 annos
Não tinha de que viver
Pegou a faltar-lhe roupa
E até o que comer
Verdiano antes pensou
O que havia de fazer.

Elle tinha horor á farda


Não gostava de soldado
Não achou quem o quizesse
Iara ser seu empregado
F não tinha uma acção má
( ne tiveese praticado,

308
a co

Fallou para sentar praça


La foi muito bem aeeito
Todo corpo do exercito
Ficou muito satisfeito
Um menistro disse alli
Esse meniso tem geito

Nas feições delle se lia


Muito bom compartamento
Coragem, força e manejo
E grande adiantamento:
Aquelle executa bem
E chefia de um regimento.

O rei perguutou-lhe um dia


Voce ler bem e escreve?
Verdeano respondeu
Elrei minha lettra serve
O rei viu no peito delle
Escripto Branca de Neve.

') rei murmurou com sigo


E muito bom o soldado
Que tem um signal assim
Pois está muito bem marcado
Dizertando em qualquer tempo
Pode bem ser procurado

Então elle alli na praça


De nada quasi estranhou
Depois de cinco ou seis dias

309
um

Com tudo se acostumou


Todo manejo de arma
Ninguem a elle ensinou.

Havia uma coisa nelle


Que recomendava-o bem
Só passeiava sosinho
Não andava com ninguem
Nem a outro companheiro
Nunca tomou um vintem,

Verdeano era um soldado


Guerreiro, forte e valente
Nunca encontrou inimigo
(Que saltasse em sua frente
Porque quem partisse a elle
Morria estantaneamente.

Era a columna mais forte


Dos domicílios reaes
O rei confiava nelle
Mais do que nos generaes
E por isso era odiado
Por todos oficiaes.

Tanto que o povo dizia


Que o exercito troyanno
Desde o mais baixo soldado
Até mesmo o suberano
Só vivia emquanto houvesse
O soldado Verdeano.

310
E|

Mas eile fazendo tudo


Nunca poude ganhar nada
A vida do proprio rei
Foi por elle resgatada
F nunca ganhou ao menos
Uma fita de anspençada.

Troya uma vez stava em guerra


tJuando a Syria a combateu
O general Botemam
Cobardemente correu
Verdeano com cem praças
A dois mil homens venceu.

Esse general covarde


Voltou foi mentir ao rei
Disse; sua magestade
À guerra eu fui quem ganhei
O exercito acobardou-se
Eu quasi só sustentei.

O rei então perguntou


E o soldado Verdeano?
Respondeu o general
Em todo exercito troyano
EK' o soldado mais vil
E traz tudo no engano,

Em confiava-me nelle
(Quando o combate rompeu
Elle achava-se na frente

311
gt Tum

Foi quem primeiro correu


Deixou as armas no campo
E no inato se escandeu,

Eu calculando que a couza


Se tornaria peior
Tirei 10 oficiaes
Do meu estado maior
Seis tenentes e alferes
Um capitão um major.

Porem um juiz secreto


Que foi na expedição
Fingiudo ser um empregado
Do fiel do batalhão
Alli no campo de guerra
Fez toda cbservação

Pois minuciosamente
Espreitou tudo que viu
Disse que o general
Foi quem primeiro fugiu
De todos officines
Um só a luta não viu.

E Verdeano tirou
Cem praças do regimento
Tirou 10 cabos de esquadras
E levou mais um sargento
Fez o exercito da Syria
Deixar o acampamento.

312
|

O rei tinha confiança


Que o secreto zão mentia
Por isso deu toda crença
Em tudo que elle dizia
Sabia perfeitamente
(Que clle não levantaria.

Conheceu que o general


Era o covarde mais vil
ira um ser sem confiança
Um traiçoeiro sutil
Elle « os oficiaes
Foram todos p'ra o fuzil.

Ferem outro general


Parente do que morreu
Indignado daquillo
Outra idea concebeu
Então ao pobre soldado
Nada all: mais o valeu,

O general poz al!


O calculo em execução
Communicou ao rei
Que havia uma trahição
O soldado Verdeano
Formava conspiração

Vejam o que planeou


Aquelle vil general
Prometteu a um sargento

313
gi usos
Trez galões de oficial
Para jurar este falço
A magestade real.

(€) rei acreditou tudo


Que o general contou
Disse-lhe, mate o soldado
Elle se promtificou
Verdeano adormeceu
O sargento o argemou,

Verdeano inda dormia


Depois de estar argemado
O sargento poz-lhe a mão
Disse; levanta soldado
Venha ouvir ler a sentença
Para àr ser fuzilado.

O soldado com aquilo


(Quasi não se encomodou
Quando ouviu ler a sentença
Muito calmo pergunto:
Foi pela guerra da Syria
Que o rei me condecorou *

Eutão marchou Verdiano


Por cem praças escoltado
O general foi alli
Para vel-o fuzilado
Muito alegre por ter tido
Na ideia resultado.

314
Quando o soldado ia prezo
Ouxiu rugir uma fera
E echoar no espaço
Uma voz grossa e severa
(Que dizia: Verdiano !
Branca de Neve te espera,

O soldado conhecendo
Ser aquillo uma ambição
FE não era mais que inveja
Aquella horrivel traição
Poude soltar um dos bracos
Arrebatou um facão.

Aquella acção do soldado


Poz a força esmorecida
A mão daquelle saldado
Ja era bem conhecida
Quem partisse para elle
Não precisava da vida.

Armou-se e gritou a força


Aqui não vejo ninguem
De onde vem a desgraça
Sai a fortuna tambem
Pendeu para mim ja sabe
Mato não pergunto a quem.

Derribou o general
Arrebatou-lhe a espada
Que na mão do domno della
scEus
Não tinha valor de nada
Mas na mão de Verdeano
Era uma lamina afiada.

Com 2 horas de luta


Verdeano se evadiu
As cem praças que o levavam
À todos elle feriu
As estrellas do general
Todas elle as conduziu

Chegaram outras cem praças


E conseguiram cercal-o
Elle investiu a um major
K depois de derribal-o
Tomou-lhe todas as armas
E carregou-lhe o cavallo.

Quando o major levantou-se


Foi quasi dezesperado
Imagirando voltar
Apé e envergonhado
O general sem estrellas
S'tava desmoralizado.

Exclamava um capitão
Como chegamos ao rei?
O general soluçando
Dizia; eu que contarei ?
Se o rei perguntar-me como
Eu !!.. respondo; não sei.

316
cu E cus

Então disse o coronel


Eu estou impressionado
Sem praças todas feridas
E não morreu um soldado
Eu não duvido que aquilo
Seja um ente emdiabrado,

(Quem foi que ja viu no mundo


Brigar com tal ligeireza
Como é que o corpo humano
Obitem tanta destreza?
Se ha ente emdiabrado
Aquelle é um com certeza.

Eu nunca vi um cavallo
Como o que elle tomou
Nas redias do freio d'elle
Nunca inimigo pegou
Na guerra de Babylonia
Muitos a couce matou.

(Quando o soldado montou


À toda redea sahiu
(Quinze minutos depois
Alli ninguem mais o vin
Foi igualmente a fumaça
Que nos ares se sumiu.

Havia nesse paiz


Uma montanha encantada
[Lá não hia uma pessõa

317
cai
Que não fosse devorada.
Chegando ao pé da montanha
Era logo arrebatada.

O soldado perseguido
Pelo reforço que vinha
Seis mil praças atraz delle
Estendidas numa linha
Então aquella montanha
Era o socorro que tinha.

O soldado conhecia
De todo aquelle perigo
Mais para onde elle fosse
Emfrentava o inimigo
Disse eu. entro na montanha
Embora acabem commigo.

As seis mil praças que iam


Em sua perseguicão
Viram elle entrar na serra
Disse alli um capitão
Já temos plena certeza
De sua consumação.

Disse o general entramos


Isso a de ter um final
Quando a força entrou no mato
Um bicho descomunal
Pegou e levou nos dentes
Trez praças e o general.

«
3] «>
fintão do centro da mata
Saiam grandes rugidos
(Jue só pareciam ser
Dc bichos desconhecidos
Mais de 11) officiaes
Perderam logo os sentidos,

Dall a força voltou


Perdendo porção de gente
iMiciaes quast loucos
5 com falla diferente
(Jutros com feições mudadas
O rei viu perfeitamente,

Verdeano entrou na mata


(Quinhentos metros andou
Ao chegar numa impoeira
O cavallo recuou
Que diabo tens cavallo?
O soldado perguntou

E se firmando una sella


Viu um negro em sua frente
Perguntou quem é vocé
Que me olha horrivelmente
Se pretende qualquer couza
Eu ja estou de sangue quente.

Disse o negro renda as armas


Se entregue logo a prisão
O Senr entrou aqui

319
mt a

Sem ordem de meu patrão


Eu hei de leval-o prezo
Pois tenho autorisação.

O soldada perguntou
Que patrão é esse seu?
Não posso dizer seu nome
O negro então respondeu
K terminando essas frases
Contra elle se enfureceu.

Verdeano all tambem


Ao cavallo esporeou
Poz-se bem firme na sella
Pela espada puchou
Com toda ordem de guerra
Ao inimigo esperou,

F partiu um para o outro


O negro rangindo os dentes
Os olhos como umas brazas
Os beiços como dois pentes
Só a prezença do negro
Amedrontava os viventes

O cavallo do soldado
Duas horas rezistiu
Ficando muito cauçado
Esbaforido cahiu
Felizmente que na luta
O negro não o feriu.

320
Ficou Verdeano a pé
Parem não esmoreceu
Alli chegou uma moça
Um liquido ao cavallo deu
O cavallo ficou bom
Rapidamente se ergeu,

Agora disse o soldado


Em victoria aqui nem pensc
Ku estando nesse cavallo
Um exercito não me vence
Chegue agora o que chegar
Vindo, a lucta me pertence,

O negro empunhou o arma


K faliou a Verdeano
Entregue-me logo as armas
de não quer morrer, troyano
Eu hei de leval-o prezo
Perante ao meu suberano

"Poda sua valentia


Terminarã muito breve
Seu cavallo nada val
E nem a espada lhe serve
Hoje eu o dou de prezente
À linda Branca de Neve.

Havemos de ver depois


Disse o jovem Verdeano
Quanto desgosto terá

321
sontii

O teu senhor soberano


Quando estiver algemado
Por um soldado troyano

Ao terminar estas frazes


O uegro olhou e partiu
O soldado se firmando
Animado o investiu
Mas o cavallo do jovem
Não resistindo cahiu,

Porem o soldado heroi


Vendo o cavallo cair
E o negro ameaçal-o
Para o matar ou ferir
Fallou em vozes bem alta
Estamos prestes a concluir.

O negro partiu a elle


Numa colera desmarcada
Vibraudo nelle o alfange
Mas errou a cutilada
O soldado era um heroe
Livrou-sc dessa pancada.

E no que se desviou
Pegou o negro de geito
Descarregando-lhe um golpe
Tirou-lhe o braço direito
Depois foi que conheceu
Aquillo ser um defeito

322
E disse ao negro; desculpe
Eu o ferir desse lado
Eu firo meu inimigo
Porem o conservo armado
O negro fez-lhe continencia
Disse-lhe muito obrigado,

Estou ferido disse o negro


Não posso mais pelejar
Meu regimento prohibe
Homem ferido luctar
Pode ficar esperando
Que vem outro em meu logar.

Verdeano ficou só
Olhando para o caminho
Ouviu alguem perguntar-lhe
Guerreiro estás sosinho?
Trouxeram-lhe uma bandeja
Com fructas, pão, e com vinho.

Depois que o guerreiro fez


Uma bôa refeição
Tumou um cantaro de vinho
Com as fructas e o pão
Um indio enfrentou-o alli
E deu-lhe voz de prizão.

Foi outra lucta tremenda


Do indio com Verdeano
O indio disse em voz alta

325
Bico
Entrega as armas troyano
Esse indio que estás vendo
Resiste batalha um anno.

O guerreiro ouvindo aquillo


Levantou-se e não popou-o
Com duas horas de lucta
Verdeauo ameaçou-o
Mas o indio deu-lhe um golpe
Que com esse derribou-o.

E ia repetir outro
Porem suspendeu a mão
No peito de Verdeano
Viu um sino Salomão
Recuou cinco ou seis passos
Com grande admiração

Verdeano alli nãc deu


Signal de mal satisfeito
O indio lhe perguntou
Com muita calma e respeito
Troyano, quem foi que fez
Este signal em teu peito?

Não “digo porque não quero


O sol «do respondeu
Não é preciso eu dizer
O no:ue de quem me deú
Naque:!e momento o indio
Dili desappareu.

324
Dalli o soldado Ouviu
Vma peça detonar
E no cume da montanha
Uma corneta tocar
Ouvia pedir socorro
Uma pessãa chorar.

Vôava um passaro chorando


Muito sentido a dizer
Faz pena Branca de Neve
Sem culpa alguma morrer
Quando bater meia noite
Wa de desapparecer.

Disse o soldado comsigo


Eu vou ver se salvo ella
(Quem sabe ! até pode ser
Aguella linda donzella
Que quando eu andei perdidc:
Sentei-me no collo della,

Empunha-ndo a espada
Se enterrou de mata a dentro
Deparou com uni jardim
Mormurou consigo eu entro
Os gritos continuavam
No jardim porem ao centro.

Abriu um portão de ferro


Que dava entrada ao jardim
Quando um gigante enorme

329
cs DM

Enfrentou-o e dissse assim


Volte daqui não prosiga
Do contrario terá fim.

Elle investiu o gigante


à espada o derribou
Ameaçando-lhe a vida
Cudo alli lhe perguntou
ii o gigante com medo
O) que havia confessou.

Disse que all era um reino


De uma nação muito bôa
Existia uma herdeira
Daquella grande corôa
Uma fada com inveja
Foi alli e encantou-a.

Um genio padrinho della


A tinha patrocinado
Deu-lhe uma flor porem ella
Deu essa flor a um soldado
Vai morrer a meia noite
() termo ja foi lavrado.

Então o soldado disse


Que havia de lhe pagar
Se elle ensinasse um geito
(Que elle a pudesse salvar
Então o gigante disse
Que não podia ensinar.

326
E

Apenas disse ao chegar


Naquelle outro portão
Veja que a direita delle
Tem um sino Salomão
Passe pelo lado esquerdo
veja não ponha-lhe a mão

Verdeano fez direito


Tudo que disse o gigante
Deparou com uma moça
Num carcere repugnante
Estava alli a terminar
À vida a qualquer instante

Puchando pela espada


Botou abaixo o portão
Quebrou as grades de ferro
Mas naquella occasião
Enfrentou-o uma serpente
Uma aguia e um leão.

O guerreiro conhecendo
Que podia ficarar tarde
E se a moça falecesse
Elle seria um covarde
Partiu-lhe logo as algemas
E poz ella em liberdade

O leão com um rugido


Fez a terra estremecer
À aguia tomou um vôo

321
e
Que se ouvio o ar tremer
A serpente ficou só
Tratou logo de correr,

O soldado ficou livre


Porem muito esbaforido
A jovem se levantou
E cebrou todo sentido
Porem disse a Verdeano
Inda não está dissidido.

O soldado perguntou
Inda tenho que luctar?
Disse o jovem eu tenho medo
Não torne a fada a voltar
Ella deixou o condão
Pode ainda o procurar.

Verdeano perguntou
Pela vara de condão
Branca de Neve lhe disse
Está enterrado no chão
Sete braças de fundura
Dentro de grande caixão.

A fada tinha um projecto


Depois de 7 mil annos
Transformar em pedras negras
A todos os suberanos
E sepultar de uma vez
Todos soldados troyanos.

3206
Depois dessa operação
Coulocar-me numa furna
Então ja tinha escolhido
Uma montanha suturna
Para depois encantar-me
Numa ave feia e noturna,

Mas meu padrinho é um genio


Me disse não tenha medo
Fu criarei um menino
Que desenrola esse enredo
Deu-me uma flor e me dissc
Nesta flor está o segredo.

Meu pacrinho por si só


Não podia fazer. nada
Tem muita força tambem
Mas é mais moço que a fada
Por elle uma magica della
Não será dezencantado.

O jovem foi e cavou


Sete braças de fundura
Tirou “um caixão de ferro
Com sete paimos de altura
Trez mil chaves ocupavam
Cada uma feichadura.

Tinha umas listas de fogo


Sobre a tampa do caixão
Ali só Branca de Neve

329
— 99 —

Podia lhe por a mão


Que a flor que o genio lhe dev
Dava-lhe autorisação.

E assim que abriram o caixão


A montanha estremeceu.
Soltaram um echo tão grande
(Que todo espaço tremeu
Branca disse a Verdeano
Descança a fada morreu.

Uma grande ventania


Chegou uaquelle momento
O genio padrinho de Branca
Chegou nas azas do vento
Disse a Branca e a Verdeano
Se unam em casamento.

Disse o genio a Verdeano


Serás tu o rei agora
Será um dos teus soldados
O que foi teu rei outr'ora
O falço que levantaram-te
Foi para tua melhora.

Este reino era um paiz


Muito rico e abundante
Uma fada amou ao rei
O rei não foi-lhe constante
Ella transformou num pombo
K esse pombo em Gigante.

350
o,

O gigante era um cruel


Fegou o pombo matou-o
À fada tez uma magica
É num leão transformou-o
Esse reino era de Branca
Porem o leão tumou-o.,

Mas depois de seis mil annos


Ja estava sentenciada
[r habitar numa furna
Em morcego transformada
Com toda força que tenho
Não pude alli fazer nada.

Aquelle negro feroz


À quem você combateu
Era um principe encantado
Aquelle ao voltar morreu
Branca ia ser queimada
Pela ceia que lhe deu.

Aquelle indio Guerreiro


(Que veio do centro da serra
Antes de ser encantado
Kra um grande desta terra
Foi secretario do rei
Depois ministro.
da guerra.

O genio abraçou os dois


E fez recomendação
Que guardassem com cautella

3951
E,
A varinha de candão
E depois do casamento
Fizessem bôa união.

Cazaram e é genio foi


Ao monarcha troyanc
Esclareceu lhe o que havia
E disse que o suberano
Seria Branca de Neve
Esposa de Verdeano.

As testemunhas de Branca
Foram duas assucenas
Um nevoeiro auri-verde
Duas estrellas pequenas
Duas garças muito alvas
Com letras d'ouro nas penas.

As testemunhas do noivo
Foi a planta da estrada
Por onde elle conseguio
Entrar na serra encantada
Foram suas testemunhas
À planta e a sua espada.

musiu o' astro troyano


msclareceu-se a verdade
»briu-se a porta da vida
zo mundo da liberdade
=sando a conhecer que a sorte
molar faz por sobre a morte
O que tem felecidade.

352
Obras do Autor
ROMANCES COMPLETOS EM VER-
SOS A 1$000 RS.
e. .

A Força do Amor—H,. de Marina


e Alonso.
A Morte de Alonso e a Vingança de
Marina.
A Filha do Pescador.
O Mal em Paga do Bem=H. de
Lino e Rosa.
Historia do Cancão de Fogo.
A Mulher Roubada.
O Principe e a Fada.
Historia da Donzella Theodóra.
O Boi Misteriozo.
O Cachorro dos Mortos.
Os Soffrimentos de Alzira.
Alem destes Romances, Lean-
dro Gomes de Barros tem mais
de 500 qualidades de Folhetos de
versos a XX) rs. que vende em
grosso com grande abatimento, na
caza de sua residencia á Ria do
Motoculombó n. 28 em Afogados
arrabalde do Recite.

333
INDICE

PREFÁCIO . VII

INTRODUÇÃO A OBRA DE LEANDRO GO-


MES DE BARROS .
COLEÇÃO LEANDRO GOMES DE BARROS . 15

AS AFLIÇÕES DA GUERRA DA EUROPA ....... 17

AFONSO PENA. A ÓRFÃ. UNS OLHOS. O QUE


EU: GRRMO: gastas a ereta aca ar ed 35
ACO PEN ES ALE SATAN
ES
A. ORM causes viiEE 41
50
51

A ALMA DE UM FISCAL. CONTINUAÇÃO DA


VINGANÇA DE DM FILE sessao aomememes o vida 53
A Alma de um BIG rsss ss ese sanenseda 55
VIGA: DE UM PIO ausursreredaeopa ras 56

[EXEMPLAR SEM CAPA] sesccesesesomenmumeenesa


à Alma de Lima SOR cs ssa
As Proezas de um Namorado Mofino ........ 73

ANTÔNIO SILVINO, NO JURI — DEBATE DE


SEU ADVOGADO ne nad
qupusssissacussasssarapssz

ANTÔNIO SILVINO O REI DOS CANGACEIROS

O AZAR E A FEITICEIRA. A ÓRFÃ. SONHO DE


ILUSÃO. SONHO DE UM PORTUGUÊS ........
O a E RCE. upar so
DO EM srs A A SA a a
Sonho de Ilusão ....cccccsscsscsssirereraas 129
Sonho de um. POMUGUÊE ssa cs spsas susana 132

BATALHA DE FERRABRÁS COM OLIVEIROS .. 135

BATALHA DE OLIVEIROS COM FERRABRÁS .. 175

BATALHAS DE OLIVEIROS COM FERRABRAS


E A SECA DO CRARA usemasssrssssaresarineaara 233
Batalhas de Oliveiros com Ferrabrás ........ 234
A. Seca dO COMO squmsszzasstiri
essas cicsrãs 270
BENTO, O MILAGROSO DE BEBERIBE. PELEJA
DE ANTÔNIO BATISTA E MANUEL CABECEIRA 283
Bento, o Milagroso de Beberibe .............. 284
Peleja de Antônio Batista e Manuel Cabeceira 292

BRANCA DE NEVE E O SOLDADO GUERREIRO 301


Edição fac-similar

GRÁFICA OLÍMPICA EDITORA LTDA.


Rua da Regeneração, 475 - Bonsucesso — Rio de Janeiro
Maio de 1976

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