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Vida, Obra e Trajetória Do Pensamento de Gramsci
Vida, Obra e Trajetória Do Pensamento de Gramsci
CENTRO DE HUMANIDADES
Breno Araújo1
1
Graduando em Filosofia-Licenciatura. UECE, 2022.
Com o objetivo de mobilizar e conscientizar as massas, a concepção
marxiana sofreu certas simplificações, seja por influência burguesa, com o
positivismo, seja pelo determinismo filosófico, por meio da concepção
evolucionista, e pelo revisionismo do materialismo histórico e dialético, que se
efetivava no reformismo político.
2
MAESTRI, Mário e Luigi Candreva, ANTONIO GRAMSCI: Vida e obra de um comunista revolucionário, p
43-44.
Esta convicção determinista efetivava na quietude, abdicando da práxis
revolucionária das organizações socialistas na Itália.
A situação da Itália naquele período era fruto não apenas das condições
econômicas e políticas que amadureciam, mas pela interpretação do próprio
período que os intelectuais, os sindicatos e as organizações socialistas tinham da
conjuntura. Sua compreensão social e histórica refletia em suas formas de
organização e atuação política.
É importante ressaltar, que Gramsci, nesse contexto, ainda possuía uma visão
política um tanto voluntarista e idealista, não havia amadurecido sua concepção
dialética da história, tanto pela pouca leitura em Marx, quanto pela configuração
política e ideológica da Itália, como foi demonstrado com as influências da
Segunda Internacional, que refletiram até mesmo na cultura positivista e
idealista dos intelectuais. Por isso, sua posição política ''intervencionista'' tinham
raízes históricas e ideológicas.
3
Ibidem, p 74.
4
Ibidem, p 47-48.
Gramsci, logo dissidiu de determinadas concepções e posições políticas, mas
foi um processo pela qual, em certa medida, era fruto das condições históricas
daquele período e pela sua formação basilar no PSI, provido também de
orientações oriundas do determinismo filosófico e do reformismo político, como
foi demonstrado.
5
Ibidem, p 49.
Esta concepção voluntarista em Gramsci, fazia o pensador acreditar que a
revolução poderia ser realizada sem que necessariamente houvesse um contexto
oportuno, bastando a classe operária adquirir consciência, como assinalou em
sua consideração a respeito dos bolcheviques.6
Assim como em seu texto ''A revolução contra O Capital'', escrito em 1917, no
O Grito do Povo, era parte de sua visão idealista (com grande influência do neo-
hegelianismo expresso em Benedetto Croce e Giovanni Gentile) da revolução e
da própria concepção marxiana. A revolução russa era dada como a revolução
contra O Capital de Marx, tendo em vista que era uma luta desenvolvida antes
que o sistema capitalista houvesse alcançado sua fase completa, não obtendo
estrutura suficiente para a organização e o sucesso do proletariado.7
6
Ibidem, p 58.
7
Ibidem, p 62.
internas do período de 1906, trabalhadas pela FIOM, sob uma orientação
reformista, com base em lutas com objetivos imediatos, como o aprimoramento
das condições de trabalho dos operários,8 ou das comissões atuais elaboradas
pelos sindicatos, onde elegiam estritamente os trabalhadores internos.
Por mais que o movimento de ocupação das fábricas tenham resistido por certo
período e pressionado os patrões, de modo geral, não assumia uma postura
realmente revolucionária, não ia além do pacifismo e das exigências de ajustes
salariais, da carga horária de trabalho etc. o argumento do risco de isolamento da
Itália durante a luta revolucionária era usado como uma desculpa pela direita do
PSI, e dos dirigentes da CGL que propunham alianças com o governo como
alternativa viável.
9
Ibidem, p 99.
26 de janeiro de 1926. As teses tinham como objetivo a ''bolchevização'’ dos
partidos, tendo em vista que o Partido Bolchevique fora um exemplo a ser
seguido devido a sua experiência em ''três revoluções'', e pela sua orientação
leninista, servindo como arma de combate ao fascismo.
Além disso, Gramsci temia o risco do Partido Comunista ser derrotado pela
influência burguesa, sendo submetido ''como massa de manobra eleitoral contra
o fascismo'', ou seja, uma ala esquerda da burguesia. Essa visão da luta proletária
pessimista e submetida as táticas da burguesia, gerava, segundo Mario e Luigi, a
''interpretação incorreta dos partidos socialdemocratas como 'ala direita do
movimento operário', e não como 'ala esquerda da burguesia'. (...)’’ 11.
Para isso, era necessário que mantivesse uma correlação de forças orgânicas
dos comunistas, para que o partido promovesse a formação de uma ''frente
única'', identificando e superando as organizações ‘’democrático-burguesa’’,12
reformistas, maximalistas e os republicanos, construindo assim a hegemonia
comunista. A práxis contrahegemônica do proletariado sobre a hegemonia
burguesa industrial e agrícola, fortaleceria o avanço da luta revolucionária.
10
Ibidem, p 169.
11
Ibidem, p 172.
12
Ibidem, p 171.
13
Ibidem, p 181.
Norte. A aliança entre operários e camponeses, portanto, permitia também, a
supressão desse ''bloco agrário meridional''.14
Gramsci procurava não apenas mobilizar a classe operária sob uma nova
orientação comunista, mas elevar a consciência da classe trabalhadora italiana no
aspecto político e histórico, no sentido social e filosófico. Trabalhava temas e
conceitos que abriam um novo horizonte, uma formação marxista livre do
determinismo filosófico e do reformismo político. Nos cadernos trabalhou os
conceitos de hegemonia, sociedade civil e sociedade política, sobre a formação e
o papel dos intelectuais, o Risorgimento, entre outros.
14
Ibidem, p 183.
15
Ibidem, p 239.
Vale ressaltar, que Gramsci herda o conceito de sociedade civil de Marx, onde
este afirma que as relações jurídicas e estatais, são engendradas pelas relações
materiais da vida, isto é, das relações de produção, e a Economia Política é a
base que sustenta a sociedade civil.
(...) entre a sociedade política (Estado) e a sociedade civil, não existiria uma
clara linha de demarcação. Ao contrário, o Estado penetraria profundamente
a sociedade civil e seria distinto desta última apenas por ''comodidade de
raciocínio''. Portanto, a ''sociedade civil'' seria aquela parte do Estado que
modela os comportamentos coletivos em virtude das exigências do grupo
dominante. (...) (MAESTRI, Mário e Luigi Candreva, 2007, p 240-241).
16
Ibidem, p 241.
Ao contrário, a relação hegemônica da classe operária e camponesa,
possibilitava identificar a intervenção burguesa nas formas de organização
operária, que tentava ludibriá-la por meio de sua participação no governo. A
hegemonia da classe trabalhadora permite a conscientização das massas, para
que sua autonomia e resistência contrahegemônica ao estado de coisas, seja
suficiente para a ditadura do proletariado.
Assim, o partido seria o fio condutor para a formação intelectual dos operários,
mas como intelectual orgânico, ou seja, como classe de intelectuais hegemônica,
e conscientes de si como classe revolucionária, momento em que ocorre o que
Gramsci denomina por ''catarse'', isto é, quando a classe reconhece seu papel
histórico, superando a condição de classe em si, e ascendendo como classe para
si.17
(...) Partindo da distinção entre classe em si e classe para si, ele propõe
algumas funções peculiares do partido. Antes de tudo o partido deve difundir
a concepção de mundo da classe á qual pertence. (...) O intelectual do partido
novo deve ser o vetor da cultura das classes em ascensão no processo de
construção da nova hegemonia necessária á imposição do ''bloco histórico''
das classes subalternizadas. Como materialização antecipatória da nova
sociedade, o partido político dos trabalhadores agirá no interior da sociedade
civil, construindo a nova hegemonia, através da educação e da organização
social. (MAESTRI, Mário e Luigi Candreva, 2007, p 253).
17
COUTINHO, Carlos Nelson, o leitor de GRAMSCI, p 22.
Por essa razão, a ''catarse'' seria uma necessidade da classe operária, sua
consciência e sua formação intelectual. Gramsci considerava como pressuposto
para o trabalho da formação dos ''simples'', da passagem de sua consciência
comum á consciência filosófica, a relação entre os intelectuais e as massas.
(...) distingue, por um lado, entre o "grande intelectual", aquele que cria
novas concepções do mundo, e a massa dos demais intelectuais, que
difundem tais concepções; e, por outro, faz também uma decisiva distinção
entre "intelectuais orgânicos", que são gerados diretamente por uma classe e
servem para lhe dar consciência e promover sua hegemonia, e "intelectuais
tradicionais", que se vinculam a instituições que o capitalismo herda de
formações sociais anteriores (como as Igrejas e o sistema escolar) (...) Tarefa
de uma classe que busca hegemonia é não apenas criar seus próprios
intelectuais "orgânicos", mas também assimilar aqueles "tradicionais''.
(COUTINHO, Carlos Nelson, 2011, p 30).
18
COUTINHO, Carlos Nelson, o leitor de GRAMSCI, p 29.
Sua concepção dialética da história, ainda que não provida de toda a obra de
Marx, formulou novas concepções políticas e sociais, novas relações entre
intelectuais e novas concepções de mundo para a classe trabalhadora. Sua
contribuição filosófica e educacional, abriu caminhos para novas críticas a
economia política burguesa e novas estratégias de organização política. Por mais
que o atraso da unificação da Itália, da repressão do fascismo, das concepções
burguesas e revisionistas predominassem, nenhuma foi capaz de cessar as
contribuições teóricas e políticas deste sardo revolucionário.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS