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Didática e

Metodologia
do Ensino
Religioso
Prof.ª Gabriele Greggersen

Indaial – 2023
1a Edição
Elaboração:
Prof.ª Gabriele Greggersen

Copyright © UNIASSELVI 2023

Revisão, Diagramação e Produção:


Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI

C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI.


Núcleo de Educação a Distância. GREGGERSEN, Gabriele.

Didática e Metodologia do Ensino Religioso. Gabriele Greggersen. Indaial -


SC: Arqué, 2023.

204p.

ISBN 978-85-459-2352-7
ISBN Digital 978-85-459-2346-6

“Graduação - EaD”.
1. Didática 2. Metodologia 3. Religião

CDD 371.07
Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679

Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Caro acadêmico, bem-vindo à Disciplina Didática e Metodologia do Ensino
Religioso. Esperamos que ao longo deste curso possamos nos conhecer melhor e
trabalhar juntos para a construção de conhecimentos úteis na sua formação como
professor e pesquisador de Ensino Religioso.

Imagine esse componente curricular como uma viagem de exploração em que


traçaremos rotas, planejaremos roteiros e faremos descobertas juntos, que enriquecerão
a sua vida e futuro profissional.

Na Unidade 1, vamos escavar o conceito e sentido da educação, pedagogia e


Ensino Religioso, discutindo a diferença entre aula de religião e Ensino Religioso e o
identificando como elemento por excelência da pedagogia, como foi pensada desde a
Grécia Antiga. Em seguida, vamos explorar um pouco a história do Ensino Religioso pelo
mundo e pelo Brasil, atentando para os fatos relevantes e sem a decoreba chata de nomes
e datas, como era costume nas aulas de história do ensino tradicional. Finalmente, vamos
conhecer juntos a metodologia fenomenológica e o diálogo inter-religioso, que são os
mais indicados para promover um Ensino Religioso inclusivo, pluralista e não proselitista.

Já na Unidade 2, vamos abordar o currículo, como foi idealizado por instituições


reconhecidas e pela legislação nacional, estadual e municipal. Daremos especial ênfase à
BNCC, mas também destacaremos as pesquisas e descobertas da Associação Inter-religiosa
de Educação (ASSINTEC) e do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER),
que são as entidades mais reconhecidas no campo de Ensino Religioso no Brasil.

Finalmente, na última unidade, nos dedicaremos propriamente à didática, falando


das tendências pedagógicas e seus representantes, do planejamento de ensino e suas
ferramentas, de procedimentos metodológicos e metodologias e, principalmente, das mais
recentes metodologias ativas, em especial, da teoria e prática da Aprendizagem Vivencial.

Preparado para essa aventura? Então vamos lá, sem mais delongas!

Bons estudos!
GIO
Olá, eu sou a Gio!

No livro didático, você encontrará blocos com informações


adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos


os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
produção de folhas de papel, por exemplo.

Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente,


apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Preparamos também um novo layout. Diante disso, você


verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.

QR CODE
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e
dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR Codes
completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite que você
acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar
essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só
aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos.
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!

LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conheci-


mento, construímos, além do livro que está em
suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem,
por meio dela você terá contato com o vídeo
da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa-
res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de
auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que


preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


SUMÁRIO
UNIDADE 1 - PRINCÍPIOS PEDAGÓGICOS DO ENSINO RELIGIOSO...................................... 1

TÓPICO 1 - CONCEITO DE EDUCAÇÃO, PEDAGOGIA E ENSINO RELIGIOSO.......................3


1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................3
2 ENSINO RELIGIOSO E AULA DE RELIGIÃO.........................................................................3
3 ENSINO RELIGIOSO COMO PEDAGOGIA POR EXCELÊNCIA............................................ 12
RESUMO DO TÓPICO 1.......................................................................................................... 15
AUTOATIVIDADE................................................................................................................... 16

TÓPICO 2 - HISTÓRIA DO ENSINO RELIGIOSO.................................................................... 19


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 19
2 HISTÓRIA DO ENSINO RELIGIOSO PELO MUNDO ............................................................ 19
3 PERÍODOS HISTÓRICOS DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL........................................ 26
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................... 33
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 34

TÓPICO 3 - ENSINO RELIGIOSO E FENOMENOLOGIA.........................................................37


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................37
2 DIVERSIDADE CULTURAL E RELIGIOSA ..........................................................................37
3 FENOMENOLOGIA E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO.......................................................... 42
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................. 54
RESUMO DO TÓPICO 3.......................................................................................................... 61
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 62
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 64

UNIDADE 2 — CURRÍCULO NACIONAL E ESTADUAIS DE ENSINO RELIGIOSO..................67

TÓPICO 1 — DECISÃO JUDICIAL E CURRÍCULOS ALTERNATIVOS.................................... 69


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 69
2 DECISÃO JUDICIAL E CURRÍCULOS ALTERNATIVOS.................................................... 69
2.1 CONSTITUIÇÕES E LDB ......................................................................................................................69
2.2 DEBATE SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DO ENSINO RELIGIOSO..................................... 72
3 CURRÍCULOS ALTERNATIVOS..........................................................................................74
3.1 CADERNOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA....................................................................................... 75
3.2 DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAÇÃO BÁSICA: ENSINO RELIGIOSO........................ 77
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................... 85
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 86

TÓPICO 2 - BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR......................................................... 89


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 89
2 COMPETÊNCIAS GERAIS DO ENSINO RELIGIOSO.......................................................... 89
3 COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DO ENSINO RELIGIOSO................................................ 92
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................103
AUTOATIVIDADE................................................................................................................ 104
TÓPICO 3 - INSTITUIÇÕES DE PROMOÇÃO ......................................................................107
1 INTRODUÇÃO DO ENSINO RELIGIOSO............................................................................107
2 ASSINTEC.........................................................................................................................108
3 FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO (Fonaper)........................ 113
3.1 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO RELIGIOSO – FONAPER.....116
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................123
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................129
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................130

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................132

UNIDADE 3 — ELEMENTOS DA DIDÁTICA E METODOLOGIA DO ENSINO RELIGIOSO.....135

TÓPICO 1 — PROJETO PEDAGÓGICO E ENSINO RELIGIOSO ............................................ 137


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 137
2 PLANEJAMENTO DE ENSINO E PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO............................ 137
3 AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM.................................................................................... 147
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................155
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................156

TÓPICO 2 - MÉTODOS E TÉCNICAS DO ENSINO RELIGIOSO............................................159


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................159
2 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS E SEUS MÉTODOS..........................................................160
3 METOLOGIAS ATIVAS E ENSINO RELIGIOSO.................................................................165
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................ 174
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 175

TÓPICO 3 - APRENDIZAGEM VIVENCIAL E ENSINO RELIGIOSO...................................... 177


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 177
2 TIPOS PSICOLÓGICOS E ESTILOS DE APRENDIZAGEM ............................................... 177
3 APRENDIZAGEM VIVENCIAL NO ENSINO RELIGIOSO...................................................186
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................192
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................199
AUTOATIVIDADE................................................................................................................ 200
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 202
UNIDADE 1 -

PRINCÍPIOS
PEDAGÓGICOS DO
ENSINO RELIGIOSO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• identificar os fundamentos e princípios pedagógicos do Ensino Religioso, conceituando


os termos essenciais do campo;

• compreender e discutir as ideias de educação, pedagogia e Ensino Religioso;

• conhecer os fatos históricos do mundo e do Brasil relativos ao percurso percorrido


pelo Ensino Religioso ao longo do tempo até chegar aos dias de hoje;

• aprender sobre o método filosófico da fenomenologia para a análise e estudo do


fenômeno religioso;

• promover e discutir a ideia e prática do diálogo inter-religioso como meio para um


Ensino Religioso mais inclusivo e menos proselitista.

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – CONCEITO DE EDUCAÇÃO, PEDAGOGIA E ENSINO RELIGIOSO


TÓPICO 2 – HISTÓRIA DO ENSINO RELIGIOSO
TÓPICO 3 – ENSINO RELIGIOSO E FENOMENOLOGIA

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!

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2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
CONCEITO DE EDUCAÇÃO, PEDAGOGIA
E ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, neste tema de aprendizagem, abordaremos os fundamentos


do Ensino Religioso, que são os seus conceitos principais, sua etimologia, sua história e
metodologia. Nele, vamos usar a metodologia da etimologia, ou seja, o estudo da origem
das palavras, e vamos usar também a historiografia e a filosofia.

Também vamos escavar a fundo a importância do Ensino Religioso numa


perspectiva mais baseada na ideia de criação do homem, mas que vale para todas
as religiões. Vamos nos perguntar: afinal, por que Ensino Religioso? Não seria um
desperdício de tempo? Não bastariam aulas de ética e de moral?

Estaremos nos perguntando também, em um Estado laico, qual o sentido do Ensino


Religioso, principalmente o confessional? Como se pode ensinar, principalmente na escola
pública, a religião, sendo que, no Estado laico, há uma clara separação entre a religião e o
estado, ao contrário das teocracias, em que o líder religioso também é o líder político?

Essas e outras questões serão o nosso norte nesse primeiro tema de aprendizagem.

Vem conosco!

2 ENSINO RELIGIOSO E AULA DE RELIGIÃO


A expressão “ensino religioso” é composta pela palavra “ensino” e “religioso”.
Deixando de lado o “religioso” por ora, vamos nos debruçar agora sobre o significado
do termo “ensino”. Ele vem do latim insignare, que significa literalmente “assinalar ou
inscrever dentro”, ou seja, imprimir, inculcar. Sabe aquela primeira impressão que fica?
Isso vale especialmente para o professor.

Quem ensina marca e distingue para o aluno aquilo que ele deve aprender.
Nesse sentido, ensinar nunca é um ato solitário ou de mão única, da mesma forma que
não se pode inscrever nada no vazio. É preciso ter o objeto, a contraparte do aprender,
que, além de objeto, é também sujeito de sua aprendizagem. Ensinar e aprender são

3
dois lados inseparáveis da mesma moeda. Não se pode aprender, sem que haja ensino,
observando que até coisas podem ensinar, como a natureza, por exemplo, ou um livro,
ou a vida. E não se pode dizer que houve ensino, sem que tivesse havido aprendizagem.

Por isso, ensinar é um empreendimento do mais alto risco de fracasso, quando


a aprendizagem não ocorre. Será que seria possível dizer que alguém ensinou, se
ninguém aprendeu? Por isso, o aprender é o termômetro que mede o sucesso do
ensinar. E aprender vem de apreender, que quer dizer captar, pegar, capturar, no caso, o
conhecimento, ou então, valores e costumes, que estão implícitos na cultura.

Costumo dizer que o aprendizado é o mesmo que acontece com a alimentação


molecular, que pode se dar de duas formas: a osmose e a fagocitose. Na osmose, o
conhecimento penetra na membrana da célula por um processo químico, que acontece
quando se tem a experiência do “eureca” ou do insight. Já a fagocitose ocorre quando
a membrana externa da célula forma uma espécie de braços que capturam o alimento
no ambiente externo e o trazem para dentro da célula., onde é processado. Noventa por
cento do aprendizado acontece assim, por um movimento de captação. Piaget (1896-
1980) chamava esses movimentos de assimilação e acomodação.

Ensinar e aprender são os objetos de estudo de um campo maior chamado de


“educação”. Você já parou para pensar o que significa a palavra “educação”? A primeira
coisa a fazer em caso de dúvida é consultar o dicionário. O Priberam diz que educação
é “um conjunto de normas pedagógicas tendentes ao desenvolvimento geral do corpo
e do espírito” (EDUCAÇÃO, 2023a). Melhor dizendo, ela é mais do que o conhecimento e
domínio de informações apenas, como uma enciclopédia, e diz respeito ao ser humano
como um todo.

Num segundo sentido, o dicionário diz que se trata do “conhecimento e


prática dos usos considerados corretos socialmente” (EDUCAÇÃO, 2023a) e cita como
sinônimos a “civilidade”, a “cortesia” e a “polidez”. Assim, nem todo aquele que é educado
no primeiro sentido, de ser formado e escolarizado, é educado no segundo, de polido,
um gentleman. E nem todo gentleman tem formação escolar.

Já o Dicionário on-line de português é um pouco mais completo, dizendo que


em dois primeiros sentidos, educação é:

Ação ou efeito de educar, de aperfeiçoar as capacidades intelectuais


e morais de alguém: educação formal; educação infantil.
Processo em que uma habilidade se desenvolve através de seu
exercício contínuo: educação musical.
Reunião dos métodos e teorias através das quais algo é ensinado ou
aprendido; relacionado com pedagogia; didática: teoria da educação
(EDUCAÇÃO, 2023b)

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Esse é o entendimento da educação formal ou escolar e como área do
conhecimento. Ele está relacionado a uma ciência, à pedagogia e sua área disciplinar, à
didática ou metodologia.

NOTA
Nesse material, vamos usar didática como sinônimo de metodologia,
embora alguns estabeleçam a diferença de que a primeira é mais teórica e
a segunda, mais prática.

Mas informalmente, educação também tem a ver com cultura e regras:

Capacitação ou formação das novas gerações de acordo com os


ideais culturais de cada povo.
Conhecimento e prática dos hábitos sociais; boas maneiras; Civilidade.
Expressão de gentileza, sutileza; delicadeza.
Amabilidade e polidez na maneira com que se trata alguém; cortesia
(EDUCAÇÃO, 2023b).

Nesse sentido, ser educado significa conhecer a etiqueta e as boas maneiras.


Quer dizer ser socialmente aceitável e agradável e saber como se comportar e lidar
com as pessoas.

O Dicionário on-line de Português estende o conceito ainda ao adestramento de


animais domésticos que não vamos tratar aqui, embora algumas teorias da educação,
como a tradicional e a tecnicista possam parecer defender perigosamente a noção de
educar como adestrar.

ATENÇÃO
Então a educação tem essas duas dimensões ao mesmo tempo: a de formação
e a de conduta de acordo com os ditames da cultura de um povo. Nenhuma
invalida a outra. Na verdade, ambas se complementam dialeticamente.

Junqueira e Rodrigues (2012) chamam a atenção para que a educação se dá


desde sempre a ao longo de toda a vida e que ela está relacionada com a cultura:

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Presente em todas as fases de nossa vida – pois em nosso cotidiano
educamos e somos educados –, além de perpassar os diferentes
espaços que ocupamos, a educação tem como objetivo contribuir
para o desenvolvimento integral do ser humano, seja no exercício da
cidadania, seja na sua qualificação para o trabalho.
Mas a educação também possibilita o acesso à cultura. O binômio
educação e cultura favorece a construção da identidade nacional
do brasileiro. A escola, um dos espaços privilegiados para que a
educação e a cultura possam ser aprendidas e experienciadas, pode
inserir o aluno, no dia a dia, em um universo cultural mais amplo
(JUNQUEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 14).

Mais adiante, eles alertam para o sentido original da palavra cultura, que está
relacionada ao cultivo e sua evolução ao longo da história:

A língua latina usava o termo cultura em relação ao cultivo da terra.


Para indicar o sentido de cultura utilizado atualmente, os romanos
referiam-se à frase “humanus civilisque cultus”, ou seja, humanização
de comportamento, da faculdade do espírito. No Renascimento
(século XVI), falava-se do ser humano cultivado, o ser da cultura, já
que este havia estudado as letras clássicas, música, belas artes, ou
seja, era dotado de cultura humanística. Posteriormente, ao se referir
à cultura moderna, seriam os indivíduos que teriam superado velhas
tradições (JUNQUEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 14).

Então cultura tem a ver com o cuidado e a criação. Tem a ver com os costumes e
valores que impregnam um way of life ou modo de vida específico. Com relação à cultura
de um país, nos referimos aos seus costumes e peculiaridades. E quando dizemos que
alguém é culto, significa que ele é entendido de sua cultura e que tem estudo, ou seja,
que é educado.

Vamos cavar um pouquinho mais fundo o conceito de educação? Como já


vimos, ele está relacionado à cultura, ou, em alemão, à formação, Bildung, que dá ideia
ao mesmo tempo de formação e de cultura.

INTERESSANTE
O termo alemão Bildung, que é formação, no sentido de cultura, é uma
derivação de Bild, figura, imagem ou pintura, o que nos remete à ideia
judaico-cristã de que o homem é feito à imagem e semelhança de Deus.
Somos, como o termo clássico o diz, imago dei, ou seja, imagem divina. Assim,
para ele, tudo começa no imaginário, na capacidade de refletir essa imagem,
atualizando o ser que ele foi pensado (ele foi, por assim dizer, “bolado” por
Deus) para ser, principalmente através da cultura e da educação.

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Mas, etimologicamente, o que significa educação propriamente dita? Como se
deve saber, etimologicamente a palavra educação vem de educere, no latim, que se
compõem do sufixo “e”, que significa “extrair”, “pôr para fora”, e a raiz “ducere”, que quer
dizer conduzir, guiar. Então, a educação implica em um movimento de dentro para fora,
de atualização de potencialidades que estão implícitas no ser do educando, requerendo
uma atualização ou, em termos aristotélicos, transformação de potências em ato.

Figura 1 – Educação e mundo

Fonte:https://cutt.ly/a7JXRZY. Acesso em: 23 mar. 2023.

A palavra educação significa ainda que se trata de algo dinâmico – e não parado
e estático, em que o professor fica falando e o aluno, entediado, ouvindo – que implica
em movimento, e que é guiado por alguém, o professor. Ele é que se encarrega do
ensino, mas como mediador, e não como ditador. Eis o sentido exato do pedagogo,
aquele que guia, que conduz.

Perceba que, esse “guiar” não é do professor arrastando o aluno para onde
bem ele entender, mas levando pela mão, como os pedagogos escravos gregos faziam
com os seus pupilos na época do Império Romano. Isso dá a ideia de participação, de
empatia e de inclusão.

Entre os gregos, a pedagogia também era entendida como Paideia, que significa
movimento de passagem, abrir-se e lançar-se ao novo. Ela envolve mais do que apenas
conteúdos, mas também valores, princípios para a formação do caráter, educação física
e artística e tudo o mais envolvido na educação, entendida de forma global e holística.

Nesse sentido, a Paideia se aproxima da concepção de ética, que não é um


conceito que se aplica somente ao Ensino Religioso, mas também engloba características
de toda a educação. , entendida de forma holística (relativa ao todo). Quanto à Paideia,
Junqueira e Rodrigues (2012, p. 135-136) a trazem para a atualidade, frisando sua
validade para os dias de hoje e para a escola:

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A escola se constitui em um espaço privilegiado para essa questão
da aprendizagem sistematizada, desde que seja provocadora e
compreenda, num sentido totalmente amplo, a cultura da sociedade.
Nesse momento, recorde-se a proposta grega da paideia, não como
um aspecto exterior da vida, incompreensível, fluido e anárquico, mas
como autenticidade do ser humano, que envolve aspectos físicos,
estéticos, morais, religiosos e políticos, ou seja, uma educação
integral. Todo esse processo é histórico e contextualizado e implica
no contexto cultural (JUNQUEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 135-136).

Esse contexto cultural nos faz lembrar o termo alemão para educação, Bildung,
que já destacamos e nos faz refletir sobre as circunstâncias que fazem essa Bildung
acontecer. Ora, a arte de ensinar e fazer aprender é a didática, à qual, de acordo ainda
com o dicionário, a educação está relacionada. O que se quer dizer quando, por exemplo,
se afirma que fulano é um bom professor? Não é que ele ensina efetivamente, que tem
uma boa “didática”? Ora, a didática nada mais é do que a ciência ou arte do bem-ensinar.
É a metodologia e o recurso pedagógico de que ele se vale para ensinar, portanto.

Mas será que o professor de boa didática é aquele que sabe apenas “transmitir”
ou pior, “repassar” os conhecimentos, como se costuma dizer popularmente? Ora,
transmitir é a qualidade do rádio, do telefone e da internet, que transmite ondas e
mensagens respectivamente. Será que o ensino é uma via de mão única assim?

É claro que não! Como Paulo Freire (1921-1997) bem dizia, o professor-transmissor
é aquele da educação bancária, o “dador de aula”, aquele que emite o cheque e deixa
que a burocracia bancária o “troque em miúdos”. É aquele que deposita o saber no
cérebro do aluno, pouco se importando se ele aprendeu ou não ou pouco contando com
a participação dele no processo de construção do saber.

DICA
Então, fica a dica: educar e sua ciência, a pedagogia; ensinar e a sua ciência, a
didática; são termos que significam muito mais do que parece numa primeira
mirada e demandam uma investigação e reflexão muito mais profunda.

Agora que nos estendemos sobre a primeira parte do Ensino Religioso, o


ensino e termos correlatos, vamos nos dedicar à religião. O que significa religião e
como ela nos atinge.

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ATENÇÃO
Religião vem de religio e religare, que significa religar o relacionamento entre
o ser humano e Deus ou os deuses. Tudo que é religioso serve para essa
religação do ser humano com a divindade, o sagrado e, por tabela, com o
nosso meio, que foi criado por Deus e temos a incumbência de administrar.

Mas qual a relação da religiosidade com o ser humano? Como ela se insere na
natureza humana? No entendimento de Junqueira e Rodrigues (2012, p. 15):

Os que se preocupam com os fenômenos da religião, afirmam que o


homem é naturaliter religiosus e que a religião aparece como uma
parte constante dos seres humanos, de suas vidas, em todas as
épocas. Ao se ignorar a religião, ignora-se a totalidade do homem,
pois sua relação com o Transcendente, ou a ausência dessa relação,
é tão importante quanto os seus aspectos afetivos, racionais e
comportamentais. Como diz Croatto, “Sobre a base da vivência
humana, ou melhor, em suas raízes, insere-se a experiência religiosa”
(JUNQUEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 44).

Então, estão enganados aqueles que pensam que o Ensino Religioso é uma perda
de tempo, pois a religião faz parte da natureza humana, como a razão, a imaginação, a
sensibilidade artística etc. Seria tão errado deixar de fora o Ensino Religioso do currículo
quanto a matemática, o português e a educação artística ou qualquer outra área
essencial da existência humana.

ESTUDOS FUTUROS
Como veremos mais adiante, até mesmo a nossa Constituição atual e a LDB
veem a religião como parte integrante do ser humano e como área a ser
contemplada no currículo escolar, equiparada a todas as demais áreas.

A religiosidade de um povo se manifesta pelo que ele considera sagrado como os


ritos, mitos, símbolos sagrados e festas religiosas. Destacam-se dessas manifestações
os mitos, conforme descreve Junqueira e Rodrigues (2012), que estabelecem a função
deles na comunidade:

9
Apontando causas e efeitos, relações entre seres, valores morais
e também sustentação ao poder político, a religião, na maioria das
culturas, valida uma visão de mundo única para toda a sociedade
e fornece a seus membros uma comunidade de ação e de destino.
Essa visão de mundo é transmitida e perpetuada pelo mito. E o mito
não é apenas uma narrativa fantasiosa, uma imaginação humana,
mas é a maneira de narrar para si mesmo a sua origem e a de
toda a realidade, além de apresentar respostas para os fenômenos
naturais e cósmicos. Assim o mito traz união, agrega e deixa suas
marcas na sociedade. Se assim não for, se o mito não representar o
que é humano e os valores sociais, perde seu sentido (JUNQUEIRA;
RODRIGUES, 2012, p. 64).

O mito, como todas as manifestações religiosas, é uma narrativa de explicação


transcendente dos fenômenos naturais e humanos. Tanto que os deuses são divindades
que se encarregam dos fenômenos da natureza: como Tor, deus do trovão. O mito é a
maneira que a civilização clássica encontrou de se religar ao sagrado, de se comunicar
com os deuses, que são os nossos primeiros Outros, aquela Alteridade Suprema que
nos faz abrir-nos para todos os demais “outros” da nossa vida.

Longe de ser um fenômeno ultrapassado, os mitos existem até hoje, quando


dizemos, por exemplo, que um determinado jogador de futebol, um artista de cinema
ou da música, ou um político é um mito. Mas o significado mudou consideravelmente,
querendo dizer hoje uma personalidade extraordinária que se destaca em sua área.
Perdeu-se o vínculo do mito com a religião, exceto pelo fato de os fãs venerarem os
seus mitos como uma espécie de semideuses ou até deuses.

Ou então, o que é pior, entendemos mito hoje em dia como sendo uma inverdade,
uma mentira, como os fake-news, por exemplo. Contudo, o fato é que tanto religião
quanto o mito tangem o transcendente, ou seja, aquilo que vai além do aqui e agora,
ingressando no mundo do sobrenatural e do miraculoso.

INTERESSANTE
Muitos personagens dos quadrinhos de hoje, os super-heróis, herdaram
dos mitos esse caráter sobrenatural e messiânico que aparece quando os
heróis salvam a humanidade usando poderes acima dos humanos e quando
se sacrificam e, às vezes, até morrem pela humanidade.

A religião e o mito dão sentido à vida. Você nunca viu alguém se voltar para a
religião, ou você mesmo já não se voltou para ela em busca de sentido para a vida? Ou
depois de uma crise existencial, em que você ou a pessoa começou a se perguntar a
respeito de certas coisas que parecem não ter cabimento no mundo?

10
Conforme conclui Junqueira e Rodrigues (2012, p. 65): “É certo que a religião não
é o único meio de se dar sentido à vida, muito menos a única forma dessa abertura ao
outro; contudo, ela continua um caminho deveras significativo na história da humanidade.”

As sociedades que não são mais teocêntricas (usam a Deus como referência
para compreender o mundo), mas antropocêntricas, como as sociedades modernas,
já não contam mais muito com o mito e as demais manifestações religiosas como
os rituais, que eram tão abundantes em outras épocas para perpetuar a cultura e as
tradições tão importantes para a identidade e preservação de uma sociedade. Cada dia
cresce mais a população dos “sem religião”.

DICA
Leia artigo sobre o aumento da população jovem dos “sem religião”. Acesse
em: https://cutt.ly/v7J24Ho

Veja ainda a religiosidade dos brasileiros de acordo com vários critérios


(sexo, idade, renda etc.). Acesse em: https://cutt.ly/c7J9rlL

Assim, o Ensino Religioso tem servido para preencher o gap entre religião e
formação. Mas isso muitas vezes em um sentido pernicioso, de doutrinação, pois
muita gente equipara Ensino Religioso à “aula de religião” que se tem na igreja, seja de
catequese, seja de classe de catecúmenos, seja de Escola Dominical.

IMPORTANTE
De acordo com Santos (2021), é importantíssimo traçar uma diferença
clara entre aulas de religião e Ensino Religioso. Uma das diferenças é que
o Ensino Religioso é um componente curricular, e “como tal deve estar em
diálogo de métodos e conteúdos com os outros componentes curriculares
de forma integrada. E assim como todo componente, ele possui uma
ciência de referência que lhe subsidia os conteúdos e métodos” (SANTOS,
2021, p. 10). Já as aulas de religião são uma prática catequética de
instituições religiosas.

Então, a diferença não é apenas conceitual, mas é metodológica e situacional.


Enquanto as aulas de religião são uma catequese ou doutrinação, ministrada por
sacerdotes ou líderes religiosos voluntários, o Ensino Religioso tem respaldo da

11
ciência (embora a teologia não seja propriamente uma ciência, mas, hoje, faz parte das
ciências humanas) e é ministrado por profissionais formados nas Ciências Humanas e
Ciências das Religiões.

Nas instituições religiosas que é praticada a aula de religião; e o Ensino


Religioso, nas instituições oficiais escolares, seguindo três modelos: o confessional
doutrinário, o multi- ou interconfessional e o aconfessional. Assim, o habitat natural do
Ensino Religioso é a sala de aula formal e seus pressupostos e o currículo são guiados
pela legislação governamental.

Enquanto isso, as aulas de religião são uma forma de difusão e


promoção de uma determinada doutrina religiosa. Seus pressupostos
básicos são os dogmas dessa doutrina e seu lugar naturalmente é
o espaço sagrado da religião em questão, seja a igreja, mesquita,
sinagoga, templo, terreiro ou comunidade (SANTOS, 2021, p. 10)

A diferença principal é quanto aos objetivos, que nas aulas de religião são
proselitistas, isto é, de angariar adeptos, e as “aulas de Ensino Religioso, conforme a
LDB/96, têm como objetivo um conhecimento que leve ao respeito à diversidade
cultural e religiosa” (SANTOS, 2021, p. 11).

Estabelecer essa diferença é fundamental desde o princípio, já que muitos


confundem o Ensino Religioso com aulas de religião, trazendo para a sala de aula formal
o proselitismo e a doutrinação, fazendo imperar o preconceito, a exclusão e o ódio entre
as religiões, em vez do diálogo inter-religioso, o respeito e o pluralismo.

3 ENSINO RELIGIOSO COMO PEDAGOGIA POR EXCELÊNCIA


Indo ainda mais a fundo e além, se partirmos de um pressuposto criacionista, não
aquele que faz frente à teoria da evolução, mas aquele que convive harmoniosamente
com ela e diz basicamente que somos criaturas de um Deus que não precisa ter cara,
nem nome, mas pode ser a personificação da natureza ou numa perspectiva mais
agnóstica, uma energia pessoal ou impessoal, o Ensino Religioso é a pedagogia por
excelência. Isso porque ele trata das potencialidades mais sagradas da personalidade e
das culturas humanas.

Sabendo disso, não podemos subestimar sua importância, achando que se trata
de um luxo, ou algo acessório, ou de menos importância. Pelo contrário, trazer para fora o
ser significa virar o ser humano do avesso e explorar as suas entranhas mais significativas
e essenciais. Não é para menos que a religião é um fenômeno universal (todas as culturas
têm) e arquetípico (existe desde que o ser humano se viu como ser humano).

12
NOTA
De acordo com Junqueira e Rodrigues (2012), essa noção de que somos
criaturas está intimamente ligada à atitude que temos em relação à
natureza e ao cosmo:
Na nostalgia religiosa, o homem exprime
o desejo de viver no cosmo puro e santo,
tal qual era no começo, quando ainda
estava nas mãos do Criador. Para o homem
religioso, a natureza nunca é exclusivamente
natural. Ela está sempre carregada de valor
transcendental. Ele sente necessidade de
mergulhar periodicamente no templo sagrado
para encontrar-se com o Absoluto, o que
ele faz, utilizando-se do ritual. (JUNQUEIRA;
RODRIGUES, 2012, p. 68)

Você já percebeu que muitas pessoas só começam a se questionar sobre


Deus e as coisas transcendentais quando se veem doentes ou deparadas com a
morte? É porque não há nada mais importante que a vida. A religião trata dessas
questões essenciais, como aquela sobre o sentido e origem da vida (de onde viemos,
para onde vamos, quem somos) e os valores (ética), e por isso é tão fundamental na
formação humana.

E ela surgiu precisamente quando o ser humano se conscientizou da morte e


começou a questioná-la. E cada religião dá uma explicação diferente para ela, embora
todas se pareçam em essência. Sem dizer que algumas religiões surgem, entre outras
coisas, para dar esperança de uma vida além da morte. Mas nem todas são assim. O que
todas fazem é dar um sentido para a existência humana e também para a morte.

Você já parou para se perguntar por que existem tantas religiões? Ora porque
Deus é multiforme, dando espaço até àqueles que não acreditam nele. E nós somos
tão multiformes quanto ele, pois, de acordo com a interpretação do cristianismo,
somos a sua cópia.

NOTA
Mas nem todas as religiões têm essa noção. O candomblé é uma religião
de raiz africana e nela não há qualquer desejo de encontrar a imagem do
Deus cristão do ocidente, até porque na África só vai surgir a noção do Deus
cristão após o contato com a invasão portuguesa, o mesmo acontece com
os povos mesoaméricos.

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Se Deus, de acordo com a visão cristã, é criador e nos criou a sua imagem e
semelhança, quanto mais quisermos ser nós mesmos, mais teremos que nos aproximar
dele. E quanto mais nos abrimos para ele e para a totalidade e diversidade do mundo
que ele criou, mais descobriremos a nós mesmos.

Assim, o Ensino Religioso não anda apenas de mãos dadas com o pluralismo
religioso e o diálogo inter-religioso, mas também com a educação ecológica e o respeito ao
meio ambiente, pois o mundo natural nada mais é, conforme Leonardo Boff (1999) costuma
dizer, do que a nossa “casa comum” na qual coabitamos, de preferência, em harmonia.

Não é para menos que tantas religiões se confundem com o culto à “mãe
natureza”, pois o tipo de contemplação que ela gera em nós, o tipo de espanto que
experimentamos quando a observamos é parecido com a elevação religiosa, que leva
à adoração. Assim, é importante a você, futuro ou já atuante professor, conhecer a
diversidade das religiões e seus conceitos, a fim de ensiná-la aos seus alunos, numa
abordagem respeitosa e pluralista.

14
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• A palavra educação significa que se trata de algo dinâmico e não parado e estático,
o que implica em movimento e que é guiado por alguém, o professor. Eis o sentido
exato do pedagogo, aquele que guia, que conduz.

• A didática é a ciência ou arte do bem-ensinar. É a metodologia e o recurso pedagógico


que o professor se vale para ensinar.

• Para os gregos, a pedagogia envolve mais do que apenas conteúdos, mas também
valores, princípios para a formação do caráter, educação física e artística e tudo o
mais envolvido na educação, entendida de forma global e holística.

• As aulas de religião são uma catequese ou doutrinação, ministrada por sacerdotes ou


líderes religiosos voluntários.

• Ensino Religioso tem respaldo da ciência é ministrado por profissionais formados nas
Ciências Humanas e Ciências das Religiões. É tido como pedagogia por excelência,
como forma de autoconhecimento.

• Há um relacionamento intrínseco entre Ensino Religioso e pluralismo; diálogo inter-


religioso e o respeito ao meio ambiente.

• Cultura tem a ver com o cuidado e a criação, com os costumes e valores que
impregnam um way of life ou modo de vida específico.

• Com relação à cultura de um país, nos referimos aos seus costumes e peculiaridades.
Já em relação a uma pessoa culta, significa dizermos que ele é entendido de sua
cultura e que tem estudo, ou seja, que é educado.

• A palavra educação vem de educere, no latim, que se compõem do sufixo “e”, que
significa “extrair”, “pôr para fora”, e a raiz “ducere”, que quer dizer conduzir, guiar.

• A educação implica em um movimento de dentro para fora, de atualização de


potencialidades que estão implícitas no ser do educando, requerendo uma atualização
ou, em termos aristotélicos, transformação de potências em ato.

• O ensino religioso está umbilicalmente relacionado ao próprio conceito de educação.

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AUTOATIVIDADE
1 Quanto às definições de educação e ensino vistas na unidade, assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) Educação é pôr para fora o ser e ensino é inscrever dentro.


b) ( ) Educação é transmitir conhecimentos e o ensino é inculcar informações.
c) ( ) Educação é uma ciência exata que garante o ensino que, por sua vez, é seu objeto.
d) ( ) Educação é inculcar valores na cabeça da criança e ensino é doutrinar a criança nos
preceitos cristãos.

2 A diferença entre aula de religião e ensino religioso não é apensas conceitual, mas é
metodológica e situacional. Com base nas definições e diferenciações de Santos (2022)
entre aula de religião e ensino religioso, analise as sentenças a seguir:

I - A aula de religião é dada na escola formal como meio de assegurar que os princípios
cristãos sejam preservados e respeitados, portanto não há distinção entre aula de
religião e Ensino Religioso.
II - As aulas de religião são confessionais e visam à promoção dos valores de cada religião,
enquanto o Ensino Religioso é pluralista e visa ao diálogo inter-religioso e ao respeito
entre as religiões.
III - As aulas de religião são dadas nas instituições religiosas, ministradas por clérigos e
líderes religiosos voluntários ou teólogos, enquanto o Ensino Religioso é ministrado
nas instituições de ensino formal ministradas por profissionais formados nas Ciências
Humanas ou Ciências das Religiões.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Muitos combatem o Ensino Religioso, por nos encontrarmos num Estado laico, ou acham
o Ensino Religioso uma perda de tempo. Diante disso, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

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( ) O Ensino Religioso é fundamental no currículo escolar, mesmo de um Estado laico, pois
diz respeito à essência do ser humano. É ele virado do avesso, por assim dizer.
( ) O Ensino Religioso é fundamental, pois é a salvaguarda dos valores cristãos numa
sociedade e para a preservação da moralidade, sem os quais essa sociedade sucumbe
ao mal e ao pecado.
( ) O Ensino Religioso é fundamental no currículo escolar, mesmo de um Estado laico, pois
somos criaturas e como tais, precisamos falar e refletir sobre a força que nos criou para
o autoconhecimento.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Numa situação hipotética, imagine que você é coordenador de uma escola de ensino
básico e você acabou de contratar um professor de Ensino Religioso, que era formado
em teologia por uma faculdade isolada. Um dos alunos reclamou que o professor estava
fazendo proselitismo a favor do cristianismo nas aulas e que estava ensinando apenas
a doutrina cristã e nenhuma outra. Qual seria a sua reação, sendo que vivemos num
Estado em que se promove o ensino a-confessional?

5 De acordo com os resultados e discussão e as considerações finais de uma pesquisa


de José da P.S. Neto, intitulada “O ensino religioso no ambiente escolar em relação à
laicidade do estado brasileiro”: a prática do Ensino Religioso no Brasil ainda se mostra
um desafio. Diante do estudo proposto, a pesquisa evidencia as grandes questões que
envolvem toda a formatação da disciplina escolar perante a laicidade do estado brasileiro.
O que traz sobre o Ensino Religioso a missão de levar ao aluno o conhecimento sobre
os fenômenos (sic) e expressões religiosas e como essa busca pela transcendência e
pelo divino formam o caráter humano e social do ser como cidadão. Constata-se que o
desenvolvimento escolar do Ensino Religioso parte dos princípios básicos da laicidade,
como destacados por Domingos (2009), “o estado deve manter-se neutro, a diversidade
deve ser respeitada e liberdade religiosa deve ser garantida” […]

Fonte: Adaptado de https://editorarealize.com.br/editora/


anais/conedu/2019/TRABALHO_EV127_MD4_SA2_
ID2895_03102019230828.pdf. Acesso em: 27 jan. 2023.

Disserte sobre o significado e a importância do Ensino Religioso na formação geral do aluno


de escola básica.

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UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
HISTÓRIA DO ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, A essa altura, sua pergunta pode ser: de onde, afinal de contas,
surgiu a religião? Como já dissemos, ela surgiu há muito tempo, há tempos ancestrais,
quando o ser humano começou a se distinguir dos outros animais. Os animais não têm
rito, não têm culto, não tem mitologia e nem história.

Já a religião e seu ensino têm história, tanto no Brasil como no mundo. Quais
são os seus momentos e personagens principais? Vamos ouvi-la?

Para isso, vamos nos valer de uma disciplina chamada história das religiões ou
Religiões comparadas. Pergunta-se ainda como a religião se tornou objeto de ensino e
como lidar com a contradição entre o Estado laico e o Ensino Religioso.

Busca-se, assim, através do conhecimento histórico, contextualizar o ensino


religioso e a discussão de sua legitimidade nas escolas, particularmente as públicas. É
isso que vamos discutir e descobrir nesse tema de aprendizagem.

2 HISTÓRIA DO ENSINO RELIGIOSO PELO MUNDO


A religião se formou desde que o ser humano resolveu viver em sociedade e
por quê? Por que era preciso achar explicações para os fenômenos naturais e por que
alguns tinham a necessidade de exercer poder sobre outros e invocavam a autoridade
transcendente para isso. E junto com ela, surgiu o seu ensino, que mais apropriadamente
podemos chamar de “educação religiosa”, para diferenciá-la do Ensino Religioso formal
das escolas como temos hoje.

Na antiguidade a educação religiosa se dava, além das próprias práticas religiosas,


por meio de histórias que eram contadas de pai para filho e de mãe para filha e também
pelos líderes religiosos. E os mitos de criação são os mais populares. Vamos analisar alguns
deles. De acordo com o resumo de Brito (2023), os mitos de criação são os seguintes:

• Gregos: o mundo era uma confusa massa (caos) que foi


organizada por um poder divino e se transformou no mundo
ordenado que hoje conhecemos (cosmos).
• Egito Antigo: o mundo saiu de um ovo cósmico.
• Xintoísmo: os deuses convocaram dois seres divinos à existência,
o macho Izanagi e a fêmea Izanami. Desta união nasceram seus
filhos que são as principais ilhas do Japão.

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O mito judaico-cristão de Adão e Eva e o Jardim do Éden é amplamente conhecido
não preciso repetir aqui, mas o autor destaca duas histórias interessantes, a do povo
Yorubá, cuja história de criação do homem é bem parecida com o mito de criação judaico-
cristão e a narrativa da criação do hinduísmo. Quanto ao Yorubá, relata o seguinte:

O Deus Supremo, Olorum, chamado também de Olodumare, é o


criador de tudo o que existe. Olorum criou o mundo, todas as águas e
terras. Criou plantas e animais de todas as cores e tamanhos. Até que
ordenou que Oxalá criasse o homem. Oxalá criou o homem a partir
do ferro e depois da madeira, mas ambos eram rígidos demais. Criou
o homem de pedra - era muito frio. Tentou a água, mas o ser não
tomava forma definida. Tentou o fogo, mas a criatura se consumiu no
próprio fogo. Fez um ser de ar que depois de pronto retornou ao que
era: apenas ar. Tentou, ainda, o azeite e o vinho sem êxito.
Triste pelas suas tentativas infecundas, Oxalá sentou-se à beira do
rio, de onde Nanã emergiu indagando-o sobre a sua preocupação.
Oxalá fala sobre o seu insucesso. Nanã mergulha e, ao retornar da
profundeza do rio, lhe entrega lama. Mergulha novamente e lhe traz
mais lama. Oxalá, então, cria o homem e percebe que ele é flexível,
capaz de mover os olhos, os braços, as pernas e, então, sopra-lhe a
vida (BRITO, 2023, p. 7-8).

Já o mito hindú diz que Deus era grande e solitário e um dia resolveu se dividir
em dois, criando o homem e a mulher de cada uma das metades. Como eram feitos do
mesmo Deus, a mulher resolveu se esconder e se transformou em vaca, e logo o seu
marido se transformou em touro e assim se formou o gado. Então ela se transformou
em égua, e ele, em cavalo e também em jumenta, e ele se transformou em jumento. E
assim eles procriaram e trouxeram à luz filhotes dotados de cascos.

Da mesma forma foram criados a cabra e o bode, com seus cabritinhos; a ovelha
e o carneiro e suas ovelhinhas; e todos os demais seres foram assim criados a partir do
mesmo Deus. E explica Brito (2023, p. 11):

No Hinduísmo, o sagrado se manifesta na forma feminina e masculina.


A Deusa Laksmi é considerada esposa do Deus Vishnu, aquele que
sustenta e mantém o universo. Ela representa a beleza, a riqueza e a
generosidade. Geralmente ela é representada de pé ou sentada sobre
uma flor de lótus desabrochada. Além disso, segura em duas de suas
mãos flores de lótus; e das outras duas caem moedas de ouro.

Mudando para as nossas terras, quase todos os mitos de origem das tribos
indígenas Guarani associam a criação do mundo ao Deus Tupã, o deus sol, e à deusa
Araci (ou Jaci) a deusa lua. Os dois desceram à terra numa região do atual Paraguai
chamada Arégua e a partir dessa localidade criaram tudo o que existe. Os seres humanos
foram criados a partir de estátuas de argila, misturadas a outros elementos da natureza.

E quem eram as figuras, além dos pais, que contavam essas histórias simbólicas
chamadas mitos? Quem eram os educadores? Os povos indígenas têm o seu pajé, que
orienta o cacique nas tomadas de decisões e invoca os espíritos para isso. O pajé não

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é somente o líder religioso, ele também cuida da educação dos meninos e meninas e
inclusive dos adultos para uma convivência em harmonia. Mas também na guerra, ele é
o maior conselheiro.

Um dos mais antigos registros da história, o Antigo Testamento, fala de um


povo que viveu uma teocracia, o povo judeu e que tinha primeiro nos patriarcas,
depois nos juízes e nos profetas sua liderança religiosa, política e educacional. Eles se
encarregavam de cuidar para que a Lei de Deus, entregue no Monte do Sinai a Moisés,
os Dez Mandamentos e as demais leis, fossem seguidas à risca.

Mais tarde o ensino judaico se dava nas sinagogas, onde se ensinava a Torá (Lei
mosaica) e a Mezuzá (parte dessa lei). As sinagogas abrigavam os mestres da lei, os
fariseus, que se encarregavam da educação e garantiam que toda a criança aprendesse
a Torá de cor e salteado; os saduceus, que cuidavam da manutenção do templo
(aristocratas opositores aos fariseus); e os escribas, que se dedicavam à lei escrita (liam
e interpretavam as leis).

Já os muçulmanos, com organização religiosa, política e educacional parecida


com os judeus, em vez da Torá, têm até hoje o Corão e, em vez da sinagoga, têm a
mesquita como instituição de educação, que era religiosa.

IMPORTANTE
Então, para muçulmanos e judeus, educação e religião se misturavam e se
misturam até hoje.

Outras duas civilizações antigas, a dos gregos e a dos romanos, tinham os seus
filósofos, que constituíam “escolas”, ou melhor, grupos de mestre e discípulos, em torno
de seus ensinamentos, os quais ensinavam, enquanto andavam pelos bosques. Os
sofistas, que também eram filósofos, eram mestres que cobravam honorários por seus
ensinamentos. Sócrates se opunha aos sofistas, não cobrando honorários e porque eles
tinham uma moral duvidosa. Por esses motivos ocultos e outros tantos, Sócrates era
uma figura polêmica e incômoda e acabou sendo acusado de ser corruptor dos jovens
e condenado por isso e por ser considerado herege, pois, apesar de politeísta, ele era
confidente de apenas um Deus (Apolo). Sócrates foi condenado à morte e preferiu se
matar tomando cicuta a se tornar um exilado e fugitivo da sua amada polis (cidade).

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Essa história foi registrada por Platão, discípulo de Sócrates, já que seu mestre
não quis deixar nada por escrito. Ele sistematizou o método da maiêutica (que significa
parteira) do seu mestre Sócraates, registrado nos famosos diálogos de Platão. Aristóteles,
discípulo de Platão, fez uma revisão do pensamento dualista e idealista de seu mestre e
instituiu a teologia, ao lado da filosofia, como a mãe de todas as ciências.

Ao longo do império romano, fundaram-se escolas de ensino para crianças,


que eram pequenas, restringindo-se a uma pequena sala em que se ensinava a ler
e escrever, rudimentos de aritmética e outras matérias, além de educação moral. No
ensino superior tinha-se a oratória, filosofia e direito. A educação religiosa era dada nos
templos dedicados aos deuses pagãos.

Já na Era Cristã, com a chegada de Jesus, considerado por muitos o mestre os


mestres, revisou-se a lei mosaica dos judeus e deu-se continuidade à educação pela
relação mestre-discípulo e organizaram-se as comunidades religiosas chamadas igrejas.

No período imediatamente posterior a essa primeira fase da chamada Igreja


Primitiva, em que os cristãos eram perseguidos, na Idade Média, estabeleceram-se
as ordens religiosas, como os beneditinos, os agostinianos e os franciscanos, e o
ensino era dado nos mosteiros a pessoas que falavam o latim como língua oficial da
aprendizagem e do culto.

IMPORTANTE
Nesse período (Idade Média), educação e religião continuavam misturadas
e indistintas.

Ao contrário do que pensam alguns historiadores influenciados pelo iluminismo,


que valoriza o mundo das ideias e não da religião, a Idade Média foi um longo período de
mil anos, que durou do século V até o século XV, repleto de inovações e invenções, não
de absolutas trevas, como a expressão pejorativa “Idade das Trevas” sugere.

A Santa Inquisição e a caça às bruxas, que é normalmente associada a ela, só


aconteceu na baixa Idade Média. E realmente foi um acontecimento triste da história.

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Figura 2 – Mosteiro medieval

Fonte: https://cdn.pixabay.com/photo/2021/08/20/14/53/monastery-6560623_960_720.jpg.
Acesso em: 23 mar. 2023.

A Figura 2 mostra um mosteiro medieval, onde os monges se dedicavam aos


estudos, meditação e tradução de obras clássicas por meio dos árabes.

ATENÇÃO
Esse fenômeno de abuso religioso acontece sempre que alguém ou
alguma instituição ganha poder demais. E, de fato, ao longo da Idade
Média, a Igreja foi se estruturando e se tornando mais poderosa, tão
poderosa que concorria com o poder dos reis e se tornou corrupta.

A Santa Inquisição pode ser considerada um recurso da educação religiosa, pois


punia os que se desviavam dos ditames da doutrina, os chamados hereges e todas as
pessoas consideradas diferentes ou estranhas: mulheres que eram muito bonitas ou
muito feias, cegos e demais deficientes além das mulheres consideradas bruxas, na tão
famigerada “caça às bruxas”. A educação era privilégio de poucos e as comunidades de
professores e de alunos se juntaram formando as primeiras universidades.

A teologia, portanto, continuava imperando como mãe de todas as ciências. Nas


universidades, formalizou-se o currículo das artes liberais, o Trivium (lógica, gramática,
retórica) e o Quadrivium (aritmética, música, geometria, astronomia), de origem grega,
e a Questio Disputata, que era uma metodologia dialética de perguntas e respostas que
serviam de base às aulas de todas as matérias, mas principalmente de teologia.

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Na figura a seguir, temos uma representação das artes liberais, originária da
Idade Média, sendo a teologia o centro e logo abaixo a filosofia e orbitando em torno
delas, as demais ciências, entre elas, a música.

Figura 3 – Representação das Artes Liberais

Fonte: https://uploads1.wikiart.org/images/herrad-of-landsberg/seven-liberal-arts-folio-32r.jpg!Large.jpg.
Acesso em: 4 abr. 2023.

Como podemos observar na Figura 3, o currículo da Idade Média era harmônico,


completo e hierárquico, mesmo que em forma cíclica, pois vai de um centro para as
periferias. Mas será que essa forma de organizar o poder não foi questionada em
nenhum momento? Foi sim! A hierarquia foi posta em dúvida por alguns pensadores
que vieram da própria Igreja e que começaram a subverter a ordem até então aceita
por todos, os chamados “reformadores”, que contribuíram para o fim de Idade Média e
começo do Renascimento.

Com o advento da Reforma, a partir do século XVI, defendeu-se o ensino na


língua vernácula e Lutero traduziu a Bíblia, que só circulava nas versões gregas e latinas,
para o alemão. Com a invenção da imprensa, o acesso à Bíblia foi democratizado. Os
reformadores, além de se independer do império da Igreja Católica e de contribuírem
para a instauração de Estados laicos, ou seja, da separação entre Estado e Igreja,
defendiam que toda igreja fundada deveria ter, adjacente a ela, uma escola para ensinar
a ler e escrever, com o intuito principal de lerem a Bíblia.

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No século XVII sugiram também as primeiras Escolas Dominicais que visavam
ensinar a ler e escrever, inicialmente pensadas para tirar as crianças, que trabalhavam
nas minas de carvão, das ruas, mas também para ensinar a ler a Bíblia. Com o tempo,
essas escolas foram se secularizando, dando origem aos modernos sistemas escolares.

IMPORTANTE
Portanto, o Ensino Religioso está na origem de todo o sistema de ensino e
devemos a ele a democratização do ensino que temos hoje.

Infelizmente, muitos o confundem até hoje com catequese e não seguem a


mesma motivação originária de democratização e universalização da alfabetização que
era a dos pioneiros, para além da catequese. Mas há tempo de mudarmos isso.

DICA
Para uma compreensão mais profunda da história das religiões pelo mundo, recomento do
livro de Jostein Gaarder, Victor Hellern e Henry Notaker: O livro das religiões, da Editora Cia
das Letras, de 2005.

Capa – O livro das religiões

Fonte: https://cutt.ly/h7K6drX. Acesso em: 4 abr. 2023.

Então veio o Iluminismo e começaram as escolas no formato que temos hoje. No


entanto, o Ensino Religioso ainda é basilar até quando começa a ser questionado pelas
repúblicas, que separam o Estado da Igreja. Esse questionamento se intensifica com

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o modernismo e sua crítica contra a religião e, principalmente, pelo pós-modernismo
e seu pluralismo religioso, quando a Igreja Católica tem seu poder mundial reduzido e
concorrido com outras religiões e os sem-religião.

E no Brasil, como se deu esse processo histórico?

3 PERÍODOS HISTÓRICOS DO ENSINO RELIGIOSO NO


BRASIL
No Brasil, o Ensino Religioso se deu desde a época da colônia, com os jesuítas,
vindos de Portugal, fazendo o papel de catequistas dos índios e escravos, visando sua
conversão à fé cristã e também dos filhos dos colonos. Eles seguiam um documento
chamado Ratio Estudiorum, que incluía uma lista de livros proibidos, o currículo e uma
série de regras que deveriam ser seguidas nas escolas.

Para Miranda (2009), existia um caráter tipicamente humanístico no


Ratio, que se dividia basicamente em dois grandes eixos: o ensino
das humanidades era composto pela retórica e a gramática, que
eram chamados de estudos inferiores, e a filosofia e a teologia, que
eram considerados estudos superiores (SANTOS, 2021, p. 8).

DICA
Assista ao filme que se refere à lista dos livros proibidos da época da Inquisição: O Nome
da Rosa, com título original alemão Der Name der Rose (original), dirigido por Jean-Jacques
Annaud, produzido em 1986. A seguir, uma sinopse do filme:

Em 1327 William de Baskerville (Sean Connery), um monge


franciscano, e Adso von Melk (Christian Slater), um noviço que
o acompanha, chegam a um remoto mosteiro no norte da
Itália. William de Baskerville pretende participar de um conclave
para decidir se a Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas
a atenção é desviada por vários assassinatos que acontecem
no mosteiro. William de Baskerville começa a investigar o
caso, que se mostra bastante intrincando (sic), além dos mais
religiosos acreditarem que é obra do Demônio. William de
Baskerville não partilha desta opinião, mas antes que ele
conclua as investigações Bernardo Gui (F. Murray Abraham), o
Grão-Inquisidor, chega no (sic) local e está pronto para torturar
qualquer suspeito de heresia que tenha cometido assassinatos
em nome do Diabo. Considerando que ele não gosta de
Baskerville, ele é inclinado a colocá-lo no topo da lista dos que
são diabolicamente influenciados. Esta batalha, junto com uma
guerra ideológica entre franciscanos e dominicanos, é travada
enquanto o motivo dos assassinatos é lentamente solucionado.

Fonte: https://filmow.com/o-nome-da-rosa-t5722/ficha-tecnica/.
Acesso em: 27 jan 2023.

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A educação estava refém, até meados do séc. XVIII, dos jesuítas que
monopolizavam o ensino, quando houve a reforma pombalina, que acabou com a
escravidão e expulsou e prendeu por traição os jesuítas do país.

Como representante do despotismo esclarecido, o Marquês de


Pombal defendia três conceitos básicos: o direito divino do rei; a
possibilidade de interferência do Estado nas questões relativas à
Igreja (regalismo); e o Beneplácito Régio, cujo princípio afirmava que
a Igreja precisava da aprovação do monarca para suas atuações e
atividades (SANTOS, 2021, p. 8-9).

De acordo com Santos (2023), porém, o caráter de proselitismo e doutrinação


na religião católica continuou predominando no sistema de ensino, mesmo no império.
Foi só com o advento da República e da Constituição da Era Vargas que a separação
entre Estado e Igreja foi levada a sério e passou dos pressupostos católicos para os
positivistas no ensino, que têm grande influência até os dias de hoje.

Mas o que foi preciso acontecer, para que as coisas começassem a mudar? Foi
preciso mudar a forma de governo. Como comenta Junqueira:

De fato, foi com a implantação do regime republicano, a partir de 1890,


que o contexto educacional religioso assumiu uma nova perspectiva,
quando a organização política do Brasil sofreu uma forte influência
das ideias positivistas, as quais interferiram em diferentes aspectos
da vida social, especificamente no campo da escolarização, sendo o
país declarado laico. Portanto, com a proclamação da República e a
formação de um Estado laico, o aspecto cultural ganha relevância no
país, considerando-se que a população nacional é constituída por
uma cultura heterogênea, o que permite compreender a diversidade
com base no pluralismo cultural religioso (JUNQUEIRA,2015, p. 6).

Em seu livro sobre o Ensino Religioso, Junqueira e Rodrigues (2012, p. 17-


18) explicam melhor o que houve com o Ensino Religioso com a proclamação da
República: “Com a proclamação da República, o ensino passou a ser laico, público,
gratuito e obrigatório, de modo que foi rejeitado o monopólio dessa religião [a católica]
sobre as demais.”

Com relação às Constituições, Junqueira e Rodrigues (2012, p. 18) resumem:

Embora não tenha constado da Constituição de 1891, o Ensino


Religioso passou a fazer parte da Constituição de 1934 e em todas
as seguintes a partir de então. A Constituição de 1934 regulamentou
o Ensino Religioso como disciplina na escola pública, porém
com matrícula facultativa. As Constituições de 1937, 1946 e 1967
mantiveram o Ensino Religioso como disciplina do currículo, de
frequência livre para o aluno e de caráter confessional de acordo com
o credo da família.

27
Ao longo desse período discutiu-se intensamente a legitimidade do Ensino
Religioso nas escolas, mas na prática, cada professor “puxava a sardinha para o seu
lado” e predominou o caráter confessional e proselitista.

De acordo com Junqueira (2015), a Constituição de 1934 teve grande influência


dos Pioneiros da Escola Nova no Brasil, como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo,
que eram contra o Ensino Religioso nas escolas e pelo Estado laico.

Posteriormente, o artigo 133, da Constituição de 1937, assume a


seguinte concepção: “O Ensino Religioso poderá ser contemplado
como matéria do curso ordinário das escolas primárias, normais e
secundárias. Não poderá, porém, constituir objeto de obrigação dos
mestres ou professores nem de frequência compulsória por parte
dos alunos”.

Tal premissa foi fortemente influenciada pelo Manifesto dos “Pioneiros


da Escola Nova” ou “Educadores da Escola Nova”, representantes de
um grupo empenhado em reestruturar a Educação, com vistas a
modernizá-la e a orientá-la para a adaptação ao processo industrial
do país (GADOTTI, 1993). Os escolanovistas eram contra a inclusão
do Ensino Religioso, por defenderem os princípios da laicidade, da
obrigatoriedade e da gratuidade do ensino público.

Mesmo com a Constituição Cidadã de 1988, esse caráter não foi


revogado e a LDB de 1996 não o impediu. E como as licenciaturas não
previam formação para o Ensino Religioso, as instituições religiosas
continuavam se encarregando da formação dos professores voluntários.
Assim o Ensino Religioso foi submetido a dois “senhores”: as autoridades
governamentais e as eclesiásticas (JUNQUEIRA, 2015, p. 6).

Por outro lado, nesse período predominaram os pressupostos positivistas, de


modo que a teologia fosse esquecida quando se estabeleceram as ciências oficiais no
Brasil, sendo que ela foi reconhecida como área do conhecimento pelo MEC apenas em
1999, quando os cursos de teologia passaram a ser avaliados pelo INEP, sendo que até
os dias de hoje há seminários teológicos sem reconhecimento do MEC e faculdades de
teologia operando na clandestinidade.

Em 1941, a Lei Orgânica do Ensino Secundário, instituída por Capanema


responde à pressão da Igreja de fazer voltar o Ensino Religioso para as escolas, depois
que ele havia sido banido pela ditadura Vargas.

A LDB de 1961 prevê o Ensino Religioso no modelo confessional. Já com o Golpe


de Estado, o Ensino Religioso faz par com a disciplina criada especialmente para ensinar
a moral e civismo, a “Educação Moral e Cívica”:

Em 1964, no quarto período republicano, o governo militar, por meio


de um golpe armado, depôs o presidente constitucional João Goulart,
e, para programar o regime autoritário da ditadura, foi necessário
revogar e alterar dispositivos da legislação sobre a educação. Com

28
essa finalidade, nova proposta ocorreu em 1971, ocasião em que
foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º
Graus, de n.º 5.692/71, que, em seu artigo 7º (sem revogar totalmente
a LDB de 1961), repetiu o dispositivo da Carta Magna de 1968 e a
Emenda Constitucional n.º 1/69. Esta inseriu o Ensino Religioso nos
horários regulares, o que acabou por criar as áreas de estudos de
Moral e Cívica, Artes e Educação Física, com o intuito de formar
alunos voltados ao civismo e à moral, concernentes ao regime militar
(PAULY, 2004) (JUNQUEIRA, 2015, p. 7).

ESTUDOS FUTUROS
Nesse período também é criado o já mencionado Fórum Nacional Permanente
do Ensino Religioso (FONAPER), ao qual vamos nos dedicar mais adiante.

Com a democratização do país e a promulgação da Constituição de 1988, cria-


se a necessidade de uma nova LDB, a 9394/96, que já tem um tom mais liberal e prevê
um Ensino Religioso mais pluralista:

Essa lei inseriu o Ensino Religioso no contexto global da educação,


que acabou por preconizar o respeito à diversidade cultural-
religiosa do Brasil. Contudo, o ER manteve-se como disciplina e não
se reverteria em ônus para o Estado. Descartava-se, desse modo,
qualquer possibilidade de uma compreensão pedagógica, pois o
Ensino Religioso apoiava-se em uma postura de catequização e
não de disciplina escolar, fato que provocou protestos e mudanças
posteriores, como destaca o artigo 33, parágrafo 1º: “O Ensino
Religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de educação básica, sendo oferecido,
sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências
manifestas pelos alunos ou por seus responsáveis” (PAULY, 2004, p.
176) (JUNQUEIRA, 2015, p. 8).

Com a Lei 9.475 (MEC, 1997), que modificou esse artigo da LDB, foi revogado o
caráter voluntário e não remunerado da oferta de Ensino Religioso nas escolas.

Em 22 de julho de 1997, foi promulgada a Lei 9.475 (MEC, 1997),


que alterou o artigo 33 da LDB 9.394/96, retirando o enunciado
“sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos” e dando outros
direcionamentos ao texto sobre o Ensino Religioso: foi mantida a
menção à matrícula facultativa e acrescida a referência ao fato de o ER
ser parte integrante da formação básica do cidadão, constituindo-se
como disciplina dos horários normais das escolas públicas de Educação
Básica e assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do
Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Foi explicitado que
caberia aos sistemas de ensino regulamentar os procedimentos para a
definição dos conteúdos do Ensino Religioso e estabelecer as normas

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para a habilitação e a admissão dos professores. Competiria também
aos sistemas de ensino ouvirem entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do Ensino Religioso (MEC. Lei 9.475 [22 de julho de 1997, que dá
nova redação ao artigo 33 da Lei (9.394/96) de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional], 1997). (JUNQUEIRA, 2015, p. 9)

Para um quadro-geral muito útil da evolução do Ensino Religioso no Brasil,


remetemo-nos a Junqueira e Rodrigues (2012).

Tabela 1 – Linha do tempo do Ensino Religioso a partir do sistema republicano brasileiro

Fonte: Junqueira E Rodrigues (2012, p. 16-17)

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Vemos no quadro uma evolução do Ensino Religioso confessional do tipo
catequético e seguindo o método tradicional; para o democrático, dialogal e pluralista,
mais adequado a um Estado laico, como é o brasileiro, em que há separação entre
Estado e Igreja.

IMPORTANTE
Assim, a questão do Ensino Religioso nas escolas, dado que o Estado é
laico no Brasil, tornou-se pomo da discórdia para muita gente favorável e
contra esse ensino.

Os favoráveis dizem que, afinal de contas, o Ensino Religioso foi a origem de tudo
e devemos dar crédito a ele. Além do mais, ele é um direito assegurado pela Constituição
e toca em questões essenciais ao ser humano, como aquela sobre o sentido da vida, da
ética e dos valores que passam despercebidos pelas outras disciplinas.

Os que são contrários frisam a dificuldade que o professor tem de manter-se


neutro e não promover a sua própria confissão religiosa e o fato de, em um Estado
laico, o Estado não poder se meter em questões religiosas, nem mesmo relativas ao
ensino. O Estado e a Igreja devem permanecer independentes um do outro, sendo que o
governo não deve se meter em coisas de religião e as instituições religiosas não devem
se intrometer nas coisas do governo.

Isso me faz lembrar de uma história budista que diz que Siddhartha, o Buda,
e seus discípulos viveram na floresta em silêncio por seis anos. A sua prática ascética
fazia com que se alimentassem apenas do que a natureza lhes oferecesse num esforço
por fortalecer as suas mentes e esquecer os seus corpos.

Num belo dia, o Buda ouviu um músico, que passava num barco, dizer a seu aluno
as palavras que calariam fundo nele: “Se apertares esta corda demais, ela arrebenta; e
se a deixares solta demais, ela não toca." Elas o fizeram ter um insight de que ele estava
todos esses anos andando pelo caminho errado.

Então ele deixou de lado suas práticas ascéticas para escândalo de seus
discípulos, que o questionaram. Quando ele os convidou para se alimentarem com ele,
eles disseram que não poderiam mais segui-lo, pois ele teria abandonado a sua busca
pela iluminação, traindo os seus votos.

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A isso, Buda respondeu que aprender é mudar e que o caminho para a iluminação
é a linha tênue entre dois lados opostos. Em suma, o caminho da iluminação é o caminho
do meio e esse foi o ensinamento dele pelo resto de sua vida para toda a humanidade.

Gostou da história? E como ela se aplica à questão da interferência entre Estado


e religião? Como você se posiciona?

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RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• Na antiguidade a educação religiosa se dava, além das próprias práticas religiosas, por
meio de histórias que eram contadas de pai para filho e de mãe para filha e também
pelos líderes religiosos. Sendo os mais populares os mitos de criação.

• Mais tarde o ensino judaico se dava nas sinagogas, onde se ensinava a Torá (Lei
mosaica) e a Mezuzá (parte dessa lei).

• Já os muçulmanos, com organização religiosa, política e educacional parecida com os


judeus, em vez da Torá, têm até hoje o Corão e, em vez da sinagoga, têm a mesquita
como instituição de educação, que era religiosa.

• Outras duas civilizações antigas, a dos gregos e a dos romanos, tinham os seus
filósofos, que constituíam “escolas”, ou melhor, grupos de mestre e discípulos, em
torno de seus ensinamentos, os quais ensinavam, enquanto andavam pelos bosques.

• Na Era Cristã, com a chegada de Jesus, considerado por muitos o mestre os mestres,
revisou-se a lei mosaica dos judeus e deu-se continuidade à educação pela relação
mestre-discípulo e organizaram-se as comunidades religiosas chamadas igrejas.

• No Brasil, o Ensino Religioso no período colonial com os jesuítas, vindos de Portugal,


fazendo o papel de catequistas dos índios e escravos, visando sua conversão à fé
cristã e também dos filhos dos colonos.

• Os jesuítas seguiam um documento chamado Ratio Estudiorum, que incluía uma lista de
livros proibidos, o currículo e uma série de regras que deveriam ser seguidas nas escolas.

• A religiosidade de um povo se manifesta pelo que ele considera sagrado como os


ritos, mitos, símbolos sagrados e festas religiosas.

• Ao professor de Ensino Religioso cabe combater vários preconceitos e paradigmas


instalados na sociedade durante séculos, especialmente em relação à Idade Média e
aos mitos de criação diferentes dos vindos do cristianismo.

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AUTOATIVIDADE
1 O Ensino Religioso surgiu junto com a civilização. Na educação, sobre a história do
Ensino religioso no mundo, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A educação na religião surgiu junto com as escolas formais no modelo e na estrutura


que temos hoje.
b) ( ) A educação na religião surgiu junto com a religião e a ela se submete até os
dias de hoje.
c) ( ) A educação na religião surgiu junto com a religião, mas hoje segue os ditames da
legislação do MEC e dos demais órgãos competentes.
d) ( ) A educação na religião surgiu junto com a política, quando o ser humano queria
poder, inventou a religião que a tudo controla até os dias de hoje.

2 A teologia, na idade média, continuava imperando como mãe de todas as ciências. Nas
universidades, formalizou-se o currículo das artes liberais, o Trivium (lógica, gramática,
retórica) e o Quadrivium (aritmética, música, geometria, astronomia), de origem grega, e
a Questio Disputata, que era uma metodologia dialética de perguntas e respostas que
serviam de base às aulas de todas as matérias, mas principalmente de teologia. Diante
nisso, analise as sentenças a seguir:

I - A Idade Média foi um período de trevas onde nada de novo se inventou ou criou.
II - A Idade Média foi um período curto da história em que predominou a Santa Inquisição.
III - A Idade Média foi um período longo da história em que se criaram muitas coisas novas,
como por exemplo, as universidades.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) Somente a sentença III está correta.
d) ( ) Somente a sentença I está correta.

3 No Brasil, os jesuítas dominaram a educação, formal ou informalmente, até a República.


De acordo com o artigo A disciplina Ensino Religioso: história, legislação e práticas, de
Denise e José Antonio Sepulveda (2017, p. 178):
[…] O processo de colonização trouxe consigo uma estrutura de expansão católica, no
contexto da contrarreforma, elegendo a Companhia de Jesus como responsável por essa
tarefa. Assim, a base de organização da educação brasileira, que vem desde a colônia, é

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católica, basicamente jesuíta. Embora por algum tempo essa ordem religiosa tenha sido
expulsa dos domínios portugueses, isso não foi suficiente para se criar uma estrutura
razoavelmente laica de ensino (CHIZZOTI, 1996; CUNHA, 2007; SAVIANNI, 2007).

Fonte: Sepulveda, D.; Sepulveda, J. A. A disciplina Ensino


Religioso: história, legislação e práticas. . Universidade
Federal de Santa Maria, Santa Maria, Educação. Revista do
Centro de Educação, v. 42, n. 1, p. 177-190, 2017.

A respeito da história do Ensino Religioso no Brasil, classifique V para as sentenças


verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os jesuítas inauguraram um Ensino Religioso e não religioso universal, democrático e


inclusivo, nada proselitista por todo o Brasil.
( ) Os jesuítas influenciaram a educação brasileira mesmo depois de sua expulsão do
Brasil pelo Marquês de Pombal.
( ) Os jesuítas inauguraram um Ensino Religioso e não religioso elitista, ditatorial, dogmático
e proselitista.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – V – V.

4 No debate sobre o Ensino Religioso na escolas formais básicas do Brasil, cite dois
argumentos favoráveis e dois contrários.

5 A Reforma Protestante trouxe grandes novidades tanto para a religião quanto para
a educação. Tendo isso como base, avalie os avanços trazidos pela Reforma para o
Ensino Religioso.

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UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
ENSINO RELIGIOSO E FENOMENOLOGIA

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, este tema de aprendizagem pretende introduzir o campo do


Ensino Religioso no seu contexto de diversidade cultural e religiosa, fomentando o
respeito às diferenças e a tolerância religiosa. Para isso, contaremos uma história para
falar da diferença dos pontos de vista possíveis de um mesmo objeto.

Em seguida, abordaremos a fenomenologia seu conceito e utilidade para o campo


do Ensino Religioso em suas relações com a epistemologia e a hermenêutica, que são
temas da filosofia. Finalmente vamos nos dedicar a um campo de atuação e militância
mais recente que é o do diálogo inter-religioso, o qual busca o entendimento entre as
religiões, aplicando inclusive, mas não exclusivamente, o método fenomenológico.

2 DIVERSIDADE CULTURAL E RELIGIOSA


A cultura é o que diferencia o ser humano do animal e o que determina a sua
forma de viver, de se relacionar, de se vestir, de morar, de se alimentar, de trabalhar, de
rezar, de usar o seu lazer, de contemplar e criar a arte etc. A cultura também determina
a relação do ser humano com a natureza e com a sociedade. Como bem observam
Junqueira e Rodrigues (2012, p. 71):

[…] cultura não é apenas um processo de adaptação da natureza ao


desejo do ser humano, mas é também uma linguagem comunicadora
de significados e de valores. O ser humano não age somente
sobre a natureza, mas o faz igualmente sobre si mesmo. Mediante
isso, ele, que é um ser individual, transforma-se em um ser social,
estabelecendo livremente, dentro do consenso, as classificações,
os códigos de conduta, as ordenações e os princípios de relação. Os
humanos deixam de ser meros seres da natureza e se tornam, então,
pela cultura, sujeitos que têm direitos e deveres, fontes de práticas
transformadoras ou conservadoras da natureza e da sociedade.

E tal cultura varia de povo para povo e é tão peculiar quanto a identidade do
indivíduo. Tanto que cada povo tem a sua bandeira e o seu hino nacional diferenciado.

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INTERESSANTE
Você já pensou se todas as pessoas fossem iguais no mundo? Como seria
monótono, sem graça e sem avanços? Sim, porque todos fariam as mesmas
coisas, teriam as mesmas opiniões, teriam o mesmo tipo de amigos,
vestiriam as mesmas roupas e para onde iria a economia desse jeito?

Como os países, as religiões também têm os seus diversos símbolos e um em


especial que as caracteriza, como vemos na figura a seguir, que reúne diversas religiões:

Figura 4 – Diversidade das religiões e seus símbolos

Fonte: https://elements.envato.com/pt-br/religion-diversity-set-ZWAELJT. Acesso em: 28 jan. 2023.

Como se pode observar, vários símbolos são circulares, lembrando a eternidade


e o eterno retorno, outros lembram momentos históricos, como a cruz e o candelabro.
Contudo, todos eles apontam para algo além de si, para a transcendência que ninguém é
capaz de alcançar como um todo. Nesse sentido, há uma história interessante de alguns
ceguinhos apalpando um elefante que é muito contada nas escolas, e diz o seguinte:

Certo dia, um príncipe indiano mandou chamar um grupo de cegos


de nascença e os reuniu no pátio do palácio. Ao mesmo tempo,
mandou trazer um elefante e o colocou diante do grupo. Em seguida,
conduzindo-os pela mão, foi levando os cegos até o elefante para
que o apalpassem. Um apalpava a barriga, outro a cauda, outro a
orelha, outro a tromba, outro uma das pernas. Quando todos os
cegos tinham apalpado o paquiderme , o príncipe ordenou que cada
um explicasse aos outros como era o elefante, então, o que tinha
apalpado a barriga, disse que o elefante era como uma enorme
panela. O que tinha apalpado a cauda até os pelos da extremidade
discordou e disse que o elefante se parecia mais com uma vassoura.

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“Nada disso “, interrompeu o que tinha apalpado a orelha. “Se alguma
coisa se parece é com um grande leque aberto”. O que apalpara a
tromba deu uma risada e interferiu: “Vocês estão por fora. O elefante
tem a forma, as ondulações e a flexibilidade de uma mangueira de
água…”. “Essa não”, replicou o que apalpara a perna, “ele é redondo
como uma grande mangueira, mas não tem nada de ondulações nem
de flexibilidade, é rígido como um poste…”. Os cegos se envolveram
numa discussão sem fim, cada um querendo provar que os outros
estavam errados, e que o certo era o que ele dizia. Evidentemente
cada um se apoiava na sua própria experiência e não conseguia
entender como os demais podiam afirmar o que afirmavam. O príncipe
deixou-os falar para ver se chegavam a um acordo, mas quando
percebeu que eram incapazes de aceitar que os outros podiam ter
tido outras experiências, ordenou que se calassem. “O elefante é
tudo isso que vocês falaram.”, explicou. “Tudo isso que cada um de
vocês percebeu é só uma parte do elefante. Não devem negar o que
os outros perceberam. Deveriam juntar as experiência (sic) de todos
e tentar imaginar como a parte que cada um apalpou se une com as
outras para formar esse todo que é o elefante” (COSTA, 2014, s. p.).

Vale a pena conferir o que o autor diz sobre a moral da história:

A experiência das coisas que cada homem pode ter é sempre limitada.
Por isso, a sensatez obriga a levar em conta também as experiências
dos outros para se chegar a uma síntese.

A pessoa, o ser humano, apresenta muitas facetas. Existe o risco de


polarizar a atenção em algumas delas, ignorando o resto. Fazendo
isso, estaríamos repetindo os cegos da parábola. Cada um ficaria com
uma visão unilateral e parcial.

Para obtermos uma visão o mais integral possível do que é uma


pessoa, devemos reunir, numa unidade, os numerosos aspectos que
podem ser observados no ser humano (COSTA, 2014, s. p.).

Em seguida, ele faz uma aplicação à verdade. Ninguém é dono dela. Todos
temos visões parciais, baseadas na nossa própria experiência, muitas vezes incoerentes
e incompletas, e todos tendemos a absolutizar a nossa experiência na definição do que
achamos ser a verdade.

Mas o que não concordamos e que ele dá a entender é que, portanto, a verdade
não exista. Não sermos donos da verdade não significa que ela não exista “lá fora” e que
não tenhamos acesso a partes dela. (Isso seria cair no relativismo.) É o que a parábola
está dizendo também: que temos, sim acesso a certas verdades, embora sempre
limitadas e muitas vezes incoerentes e aparentemente absurdas.

Isso é uma lição de humildade para nos ensinar que não temos um conhecimento
maior ou melhor do que ninguém e que precisamos respeitar a visão do outro por
mais distinta da nossa que pareça ser e por mais absurda que nos pareça, a princípio.
Devemos deixar de ser inquisidores, como os executores da Santa Inquisição e devemos
passar a ser observadores e ouvintes da realidade.

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A parábola também nos ensina algo sobre o objeto elefante: que ele é diverso e
pode ser visto por vários ângulos e de várias perspectivas sem deixar de ser ele mesmo
e único. Essa é a moral da dialética da unidade na diversidade. Só sendo diversos,
podemos ser um; e só sendo um, podemos ser diversos.

Esse objeto pode ser aplicado ao ser humano em suas múltiplas facetas e
sua unicidade, apesar delas. O ser humano é múltiplo e uno ao mesmo tempo! Parece
loucura para a nossa cabeça dualista, excludente e maniqueísta em que uma coisa só
pode ser rígida ou flexível, peluda ou lisa etc.

O mesmo se aplica à cultura como um todo. Ela é una e diversa, como querem
nos ensinar as teorias do multiculturalismo e, ainda mais, da interculturalidade. O
multiculturalismo contempla e valoriza a diversidade e o colorido das culturas e os
aplaude. Já a interculturalidade dá um passo além, dizendo que essas culturas podem
e devem se comunicar e estabelecer trocas dialogais, pois uma não existe sem a outra:
a identidade, sem a alteridade.

A alteridade foi estudada por Buber (2001) numa perspectiva judaico-cristã, que
chamou em seu livro homônimo de “eu e tu”, como nos explica Junqueira e Rodrigues (2012):

Martin Buber (1978-1965 – sic) apresentou uma antropologia fundada


na relação “eu-tu“. O ser humano, de acordo com Buber, constitui-
se como pessoa nessa relação com o mundo material. A relação
“eu-tu” é de reciprocidade: cada pessoa nasce despertada pela
outra. E cada pessoa está imediatamente presente na outra, assim
como a outra pessoa está presente naquela que a despertou. O que
o “eu” descobre no “tu” e vice-versa não é uma subjetividade, mas
realmente o outro, que é descoberto e conhecido por meio de uma
comunicação imediata (JUNQUEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 109).

O “tu” é o espelho do “eu” e vice-versa e temos essa relação de reciprocidade e


mútuo enriquecimento e complementaridade graças à relação primordial em que Deus,
o “Outro”, com “O” maiúsculo, olhou pela primeira vez para o ser humano e disse: “Parla!”
E viu que era bom, muito bom! Esse Outro não podemos abarcar completamente, ele
é misterioso. É o Deus absconditus, Aquele que se oculta. Por isso, a religião tem a ver
com o mistério, com o inefável.

Mas o outro humano também é misterioso em grande parte e muitas vezes nos
surpreende. Muitas vezes o outro com que nos deparamos é um elefante, e nós somos os
cegos, desejosos de o explorar e descobrir. Muitas vezes o interpretamos mal e entramos
em conflito com ele, mas nada como a re-sistência para nos oferecer um respaldo para
darmos significado a nossa ex-istência e garantirmos a nossa sub-sistência. O outro,
assim, pode nos remeter às questões essenciais da vida e ao próprio Deus.

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Costa (2023) também faz uma aplicação da parábola dos cegos e do elefante à
religião: que todas elas são parciais e igualmente belas, e acrescentamos que todas elas
precisam se unir para dar conta do todo uno que todas elas representam.

IMPORTANTE
Não precisamos de uma grande religião que abarque todas as outras,
ela seria despótica e reivindicaria ser a única verdadeira. Precisamos unir
a causa da luta conjunta das religiões pela paz, harmonia, justiça e um
mundo melhor.

Nesse sentido, conforme nos alerta Santos (2021), o Ensino Religioso não pode ser
um corpo estranho dentro do currículo escolar, mas deve dialogar interdisciplinarmente
com as demais áreas do saber para abarcar uma porção maior da realidade e buscar a
união em torno da causa da paz mundial e da justiça social.

Esse componente, que não necessariamente tem que ser assumido por um
religioso, mas apenas por um profissional da área de humanas, de preferência de
Teologia ou Ciências das Religiões, deve ser o que mais valoriza a diversidade não
apenas religiosa, mostrando a riqueza de rituais, livros sagrados, festas, dogmas etc.,
mas também cultural, que no caso do Brasil é um prato cheio.

NOTA
Para efeito, neste material estamos usando Ciências das Religiões e não Ciência da
Religião ou Ciências da Religião. A diferença é explicitada por Rodrigues (2013, p. 234):

Sobre a área de pesquisa, merece destaque a discussão que


gira em torno da definição do método (ciência ou ciências) e
do objeto (religião ou religiões). A área pode ser designada
basicamente sob três nomenclaturas: Ciência da Religião,
Ciências da Religião e Ciências das Religiões. A diversidade de
títulos aponta para um debate sem consenso na atualidade que
pode ser compreendido segundo diferentes posicionamentos
(SOARES, 2010, p. 80-81; 110).
Ciência da Religião explicitaria o suposto de que se trata de uma
ciência autônoma dedicada ao estudo da religião como objeto
(GRESCHAT, 2005). Esta nomenclatura é a adota em grande parte
dos países de fala germânica e mesmo nos países baixos.

41
Ciências da Religião supõe o estudo do objeto religião a
partir de um conjunto de disciplinas (filosofia, ciências sociais
da religião, psicologia, história etc.), configurando a área como
de enfoque multidisciplinar (TERRIN, 2003).
Ciências das religiões (sic) designaria uma área multidisciplinar
cujo objeto seriam as diferentes religiões (FILORAMO, PRANDI,
1999; ). Não se admite que há um fenômeno singular
(denominado de religião), mas diversas religiões particulares
que devem ser consideradas em sua peculiaridade.

Para isso, é preciso levar em conta todas as expressões de religiosidade que


foram historicamente silenciadas em solo brasileiro, sendo extirpadas pelo colono
europeu e pela religiosidade católica e resgatar as quatro matrizes fundacionais da
diversidade cultural e religiosa do Brasil: a indígena, a africana, a oriental e a ocidental,
lembrando que a indígena é a original.

3 FENOMENOLOGIA E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO


Apesar de que a psicologia, principalmente a de Freud e de Jung, como explicitado
por Junqueira e Rodrigues (2012), possa ser usada para explicar e fundamentar a religião,
ela deixa a desejar como metodologia para tratar da religião, pois os mitos, por exemplo,
podem ser entendidos como expressões do inconsciente coletivo, como arquétipos, mas
eles não deixam de ser fenômenos. Por isso, privilegiamos neste material a abordagem
da fenomenologia para o estudo da experiência religiosa.

Essa metodologia faz frente àqueles que dizem que não se deve praticar o
Ensino Religioso na escola formal porque não é ciência. Toda ciência tem um objeto de
estudo verificável e um método de investigação. Contudo, a religião só tem o sagrado,
que não pode ser verificado. A teologia tem Deus, o que é mais difícil ainda de verificar.

Eis o traço típico das ciências relativas a fenômenos complexos que não podem
ser quantificados, nem analisados ou dissecados no laboratório. Elas não podem ser
reduzidas, a exemplo das teorias reducionistas, como as cientificistas, positivistas,
cartesianas e racionalistas querem fazer. Elas são Ciências Humanas, e como tais,
consideram toda a complexidade do ser humano em suas dimensões psicológica, social,
histórica, religiosa etc.

E a exemplo de toda ciência, como dizíamos, as Ciências das Religiões também


tinham que ter um objeto de estudo e um método. Então, de acordo com Santos (2021),
para se dar um jeito nessa história, convencionou-se dizer que as ciências das religiões

42
têm por objeto o fenômeno religioso, particularmente o sagrado, e muitos teóricos das
Ciências das Religiões adotaram a fenomenologia como o seu método de estudo, mas
isso, não sem polêmicas e controvérsias.

Principalmente no Brasil, com sua abordagem positivista da ciência, o Campo


das Ciências das Religiões se tornou confuso, em especial depois que, após um
longo período de reclusão à teologia isolada nos seminários e institutos teológicos
confessionais, elas passaram a reivindicar um lugar na esfera pública e política.

Esse “salto” que a Ciência da Religião no Brasil teria dado, em relação


ao seu procedimento de abordagem da religião, teria contribuído para
a formação de uma área internamente confusa quanto ao elemento
que lhe confere unidade. Seria o “objeto” ou o “método”?

As respostas que têm sido formuladas basicamente refletem uma


polarização de opiniões: de um lado, pensa-se a Ciência da Religião
como área cuja unidade seria garantida pela religião enquanto
objeto de interesse para investigação e, nessa perspectiva, a
peculiaridade da área seria a proposta metodológica multidisciplinar
(ou polimetodológica) e, do outro lado, propõe-se uma área cujo
interesse primordial seria o fenômeno religioso, abordado segundo
a peculiaridade do método fenomenológico. Neste último caso,
seriam também disciplinas auxiliares; a filosofia e a teologia, que
integrariam o projeto da área por caracteristicamente pensarem a
religião do ponto de vista interno e ontológico. Aqui vale lembrar a
crítica de Frank Usarski quanto a uma linhagem da fenomenologia e
sua pretensão de chegar a uma essência da religião. Basicamente,
para ele as religiões são diferentes entre si e caberia a análise
comparativa delas, conquanto, respeitando a singularidade de cada
uma (RODRIGUES, 2013, p. 236-237).

ATENÇÃO
É recente no Brasil a expressão Ciências das religiões, que surgiu da
confluência entre teologia e ciências sociais, sendo que sua metodologia
ainda não está clara.

Mas qual a contribuição da fenomenologia tanto para as Ciências das Religiões


quanto o Ensino Religioso? Para debatermos essa questão, precisamos, antes, definir o
que vem a ser fenomenologia. Sim, ela tem a ver com “fenômeno” e o sufixo “logia” quer
dizer estudo de algo.

E o que é um fenômeno? De acordo com o Dicionário on-line de português a


etimologia da palavra diz que fenômeno vem de phaenomenon, que quer dizer “aparição”.
Ele arrola ainda os seguintes significados:

43
Acontecimento passível de observação; manifestação, sinal, sintoma:
fenômeno da natureza.
[Filosofia] Tudo o que está sujeito à ação dos nossos sentidos, ou que
nos impressiona de um modo qualquer (física, moralmente etc.).
Aquilo que se consegue explicar de maneira científica...[Filosofia]
Absorção imaginativa de um objeto, através dos sentidos, sendo este
reconhecido (sem reflexão) pela consciência (FENÔMENO, 2023, s. p.).

Então, o fenômeno é a ocorrência como ela aparece, como ela se manifesta aos
sentidos conscientes. Isso exige de nós uma interpretação, portanto, a fenomenologia
sempre vem acompanhada de uma hermenêutica, que é a arte da interpretação.

Vale a pena conferir também o que diz o verbete “fenomenologia”:

Tratado dos fenômenos; análise comparativa ou estudo descritivo dos


fenômenos, de tudo que se pode observar na natureza.
[Filosofia] Descrição filosófica dos fenômenos, em sua essência aparente
e ilusória, observados a partir do contato com os sentidos individuais.
[Filosofia] William Hamilton (1788-1856). Demonstração instantânea
anterior à compreensão teórica das situações, ações ou fatos psíquicos.
[Filosofia] E. Husserl (1859-1938). Metodologia filosófica que sugere
uma descrição da experiência praticada pela consciência, sendo
suas manifestações analisadas no âmbito da generalidade essencial
(FENOMENOLOGIA, 2023,s. p.).

DICA
Veja a aula inaugural de um curso de Fenomenologia da religião. Acesse
em: https://www.youtube.com/watch?v=fGmYD3v_wqo.

Assim, fenômeno é tudo que se apresenta a nossa experiência e se manifesta


a nossa percepção e a fenomenologia é o estudo disso e sua interpretação é a
hermenêutica. Aplicado à religião, o fenômeno é tudo aquilo que se manifesta aos
sentidos e que está singularmente ligado ao sagrado. Não está relacionado ao juízo de
valor, à decisão se o fenômeno é verdadeiro ou não. Por exemplo: um rito religioso é um
fenômeno que envolve vários outros fenômenos e suas manifestações, que podem ser
resumidos na ideia do sagrado. Seu estudo, usando a fenomenologia, não diz respeito a
sua verdade ou falsidade.

Abordar a religião sob a condição de fenômeno significa conferir-lhe


status de singularidade. Isto é, tratar a religião enquanto fenômeno
autônomo de determinações histórico-sociais e ou exclusivo do reino
dos sentidos. Diferente disso, subjetividade significa uma faculdade
humana de conhecimento. A capacidade de se apreender algo por

44
meio de uma faculdade que extrapola a razão. Antes disso, interessa
reconhecer que a religião se singulariza na experiência do crente,
razão pela qual compreendê-la requer imergir no universo das ideias
e das práticas religiosas, a fim de que pelo conhecimento dos termos
dos religiosos se faça uma aproximação, mesmo que assintótica,
do que ela significa em termos de experiência do ser-no-mundo
(RODRIGUES, 2013, p. 238).

Assim, a fenomenologia, ao contrário de outras metodologias como as


dogmáticas, valoriza acima de tudo a experiência do ser no mundo, que a religião, mais
do que qualquer outro fenômeno, proporciona. No caso das religiões, ela tem por objeto
o sagrado e não a divindade ou um ou outro dogma específico, E o sagrado é um objeto
complexo, que inclui uma dimensão objetiva e outra, subjetiva, que se relacionam
dialeticamente, como continua a mesma pesquisadora:

Esse exercício nos autoriza a dizer da religião, especialmente, da


experiência religiosa, que tem dupla dimensão: subjetiva (que expressa-
se [sic] no nível ontológico, da possibilidade de conferir sentido à
existência do ser no-mundo) e outra objetiva (que expressa-se [sic] no
nível sócio-político, concedendo ao indivíduo o elã capaz de mobilizar-
lhe pragmaticamente na vivência das relações sociais). É disso que trata
a fenomenologia da religião, ilustrada aqui por Kristensen (1960): da
possibilidade de abordar a religião pela via da descrição, da comparação
e da sistematização (RODRIGUES, 2013, p. 238).

Os articuladores das Diretrizes Curriculares da Educação Básica: Ensino


Religioso do Paraná, aos quais nos dedicaremos mais adiante, escolhem o sagrado
como objeto de estudo do Ensino Religioso e o definem nos seguintes termos:

Etimologicamente, o termo Sagrado se origina do termo latino


sacratus e do ato de sagrar. Como adjetivo, refere-se ao atributo de
algo venerável, sublime, inviolável e puro. Assim, o Sagrado remete
sempre a algo que lhe sirva de suporte. Portanto, algo ou alguém
que foi consagrado está ligado invariavelmente ao campo religioso
(ESTADO DO PARANÁ, 2023, p. 47-18).

Ao contrário de como o descrevem os clássicos, Mircea Eliade e Rudolf Otto, o


Sagrado não se refere a algo meramente transcendente, mas é imanente em objetos,
ritos e tradições. É o que Santos (2021) e o material do Estado do Paraná chamam de
“paisagens religiosas” que são compostas por:

[…] lugares sagrados, e dentro deles encontramos os símbolos, o


rituais, as festas e as doutrinas. Esse conjunto de elementos presentes
no espaço social e cultural é construído historicamente pelos grupos
humanos, transformando-se numa representação da sociedade,
uma imagem social. A paisagem religiosa pode ser constituída por
elementos naturais ou por elementos arquitetônicos e muitas vezes
são entendidas como um refúgio para suportar a existência humana,
um oásis emocional (SANTOS, 2021, p. 29).

45
Assim, o Sagrado pode ser estudado nos prédios, paisagens, símbolos e objetos
sagrados dentro do espaço religioso e deve ser respeitado como tal. Entra aí o papel do
símbolo, como portador de sentidos não apenas do sagrado, mas de todos os sentidos
que cabem no imaginário humano. Não é para menos que além de religioso e social, o
ser humano é um ser simbólico.

Um último aspecto estudável e portanto ensinável no universo religioso, além


do sagrado e do símbolo, são os livros sagrados orais e escritos. Entre os orais temos
os mitos, os cantos, o folclore. Os escritos contam, entre outros, com a Bíblia, a Torá,
o Corão e outros textos. Através deles podemos compreender os ritos, as crenças, a
cosmovisão e as tradições que se perpetuam através dos textos sagrados.

Entretanto, esses devem ser estudados sem privilegiar nenhum e observando a


metodologia fenomenológica e dialógica, ou seja, que interpreta o fenômeno religioso e
o sagrado sem fazer juízo de valor e sem determinar se aquele fenômeno é verdadeiro
ou não. Nesse sentido, é preciso romper com as metodologias tradicionais da aceitação
passiva de uma verdade unívoca e avançar para o diálogo e o debate acerca de temas
ligados aos fenômenos religiosos.

ATENÇÃO
Nessa abordagem fenomenológica, o professor deixa de ser o detentor do
conteúdo e passa a ser mediador de conhecimentos, que partem do que o
aluno já sabe e voltam a sua prática social, enriquecidos de saber e de uma
nova consciência, mais respeitadora e tolerante.

E quanto mais conhecimento se tem sobre determinado fenômeno, mais se


tende a aceitá-lo, pois o ser humano teme o que ignora, e o temor muitas vezes se
manifesta na forma de violência e preconceito contra o considerado diferente.

Aplicada à escola, a fenomenologia é, portanto, uma metodologia muito


interessante. No entendimento de Rodrigues (2013):

É disso que na escola pública deve tratar uma disciplina como o


ensino religioso: do conhecimento sobre a diversidade religiosa e
da promoção do respeito ao direito de escolha do outro em viver
ou não, uma religião. Tanto para aquele que confessa uma crença,
quanto para aquele que não atribuiu à religião valor fundamental,
é preciso sinalizar que a substância da experiência religiosa – sob
diferentes modos de religiosidade, isto é, institucionalizada ou não –
traduz-se na possibilidade de atribuir sentido à existência, espiritual
e moralmente (RODRIGUES, 2013, p. 239).

46
A figura a seguir representa a felicidade que pode ser alcançada com uma
religiosidade bem resolvida e respeitosa do outro e com a diversidade.

Figura 5 – Felicidade na diversidade religiosa

Fonte: https://elements.envato.com/pt-br/happiness-in-religion-diversity-KFY4HWG.
Acesso em: 28 jan. 2023.

ESTUDOS FUTUROS
E para garantir essa felicidade é preciso que o professor tenha uma visão de neutralidade
e análise objetiva e igualitária do fenômeno religioso. É preciso que a legislação do Ensino
Religioso não siga os ditames das instituições religiosas, mas do governo, como recomendam
as leis mais recentes, sendo que este é mais objetivo na definição do
currículo, sendo que as instituições religiosas podem apenas influenciar
as leis como consultores e a formação dos professores para o Ensino
Religioso pelas faculdades de teologia e cursos de ciências das religiões
e isso, através de entidades reconhecidas e abertas ao diálogo inter-
religioso como a ASSINTEC e o FORNAPER, às quais nos dedicaremos
na Unidade 2.

Somente assim poderemos evoluir para práticas ecumênicas e de diálogo inter-


religioso, sendo ativos e engajados nesse diálogo construtivo de sociedades respeitosas
e que aprendem com a religião e visão de mundo do outro.

De acordo com Faustino Teixeira (2023), vivemos numa época crivada de


conflitos religiosos:

Em todos os continentes podemos testemunhar a presença do


acirramento da violência, que se afigura hoje como uma das mais
difíceis e dramáticas questões depois do fim da guerra fria e do
confronto entre Oriente e Ocidente. Os conflitos étnicos, nacionais ou
sociais, estão em toda parte: na Ásia, na África, no Oriente Médio e na
Europa (TEIXEIRA, 2023, p. 20).

47
E paradoxalmente, a diferença entre os povos, particularmente entre as religiões,
apesar de ser o pomo da discórdia em muitos conflitos, é, ao mesmo tempo, a solução
para acabar com eles:

Embora se constate que a realidade da diferença esteja hoje


provocando uma “espiral degenerada de comunicação”, mediante
o acirramento dos etnocentrismos, antipatias e ódio, devemos
reconhecer que essa mesma diferença pode significar um espaço
para a afirmação de um novo entendimento e solidariedade mútuos.
A comunicação dialógica, como “fusão de horizontes”, é uma das reais
possibilidades que se apresentam hoje como pista alternativa para
a humanidade. Mesmo reconhecendo a dimensão utópica de uma
ordem social livre de violência, há razões plausíveis para se admitir
esforços concretos para a redução ativa dos níveis de violência nos
diversos domínios sociais (TEIXEIRA, 2023, p. 20).

Você já deve ter acompanhado nos noticiários algumas ocorrências de violência


motivada pela religião. São massacres, depredações e ataques orquestrados por seitas
religiosas e muitas vezes até pelas religiões oficiais.

Apesar de a religião ter sido o motivo para violência e exclusão em todo o mundo,
o Papa João Paulo II e o Dalai Lama são unânimes em dizer que isso é uma corrupção do
verdadeiro sentido da religião, que sempre visou à paz, harmonia e colaboração entre os
povos. Os mesmos que usam a religião para cometer violência são os que a usam como
arma política para a opressão.

IMPORTANTE
O diálogo inter-religioso serve precisamente para corrigir essas distorções:

O diálogo inter-religioso demonstra a possibilidade de uma


nova perspectiva de atuação das religiões ao reconhecer que
essas podem exercer um papel significativo na construção de
uma ética da superação da violência; que podem igualmente
dedicar-se à tarefa comum de salvaguardar a integridade dos
seres humanos e da terra ameaçada. A verdadeira relação com
o Absoluto é incompatível com toda e qualquer desumanização
ou violência. Essa relação, como tal, “não é violenta sob nenhum
aspecto, antes pelo contrário. Ela desperta a coragem inabalável
para produzir mais humanidade em todos os setores da vida”
(SCHILLEBEECKX, 1997, p. 171) (TEIXEIRA, 2023, p. 21).

48
Com o fenômeno da globalização, as fronteiras entre os países e as culturas e o
indivíduos se apagaram e mesclaram, o que se aplica à religião, cujos símbolos “passam
a circular livremente, podendo, inclusive, ser utilizados por atores religiosos distintos”
(TEIXEIRA, 2023, p. 22).

Aí a identidade cultural e religiosa é decomposta e recomposta em uma coisa una,


desprovida de tradição e, por outro lado, há uma miscigenação de crenças e identidades
religiosas. Com isso e com o fenômeno do pluralismo, há um “sério questionamento às
‘certezas’ de fé enrijecidas ou cristalizadas” (TEIXEIRA, 2023, p. 22), convidando-nos
não ao desmantelamento das tradições, mas a sua ressignificação criativa.

Nessa nova perspectiva, as tradições são colocadas diante de uma


dupla opção: a recusa do engajamento discursivo e da comunicação
ou a abertura dialogal. A escolha da primeira opção implica, muitas
vezes, a assunção do fundamentalismo, que consiste na “defesa da
tradição de forma tradicional” (GIDDENS, 1955, p. 14), em reação às
novas circunstâncias da comunicação global. A segunda opção, da
comunicação dialógica, impõe-se hoje como um dos desafios mais
fundamentais da humanidade (TEIXEIRA, 2023, p. 22-23).

Como lidar com as fronteiras é uma das questões mais importantes nesse
processo de conversação, que implica em reconhecer o outro em sua diferença na
semelhança, e aprender com ele. Implica ainda na aceitação incondicional do outro,
rompendo com o paradigma da competitividade e instaurando o domínio do amor.

Como já dizíamos, não se trata de criar uma religião única, capaz de abarcar
todas as outras e acabar com as diferenças, pelo que ela correria o risco de querer
tornar-se hegemônica; mas de criar uma nova consciência:

Assim como se mostra problemática uma perspectiva voltada para


o predomínio de uma tradição religiosa sobre as outras, revela-se
igualmente frágil e utópica a perspectiva que trabalha compactuando
com o mito de uma “religião mundial”, que apagaria todas as diferenças
e comprometeria a originalidade irredutível de cada tradição
religiosa. O que hoje se impõe como dado de maior plausibilidade é
a perspectiva de um ecumenismo planetário, que retoma o sentido
mesmo do termo “Ecumene”, ou seja, “toda a terra habitada”. Trata-
se de assumir uma nova consciência macroecumênica, da profunda
unidade de toda a família humana, capaz de pensar e trabalhar
uma perspectiva singular de entrelaçamento global, de mútuo
enriquecimento e cooperação entre as culturas e religiões em favor
da afirmação de vida no mundo (TEIXEIRA, 2023, p. 24).

Num mundo em que o islamismo está ultrapassando o cristianismo em termos de


supremacia mundial e os movimentos missionários estão se invertendo, passando a ir do
oriente para o ocidente, os fatores de resistência ao diálogo inter-religioso dizem respeito
ao esvaziamento dos esforços missionários e a promoção do relativismo religioso.

49
Para fazer frente a essas objeções, Teixeira propõe outra perspectiva de diálogo
inter-religioso, que crê ser capaz de levar à paz real:

A perspectiva apontada por nosso artigo vai em outra direção,


sendo capaz de reconhecer na dinâmica dialogal hoje em curso uma
autêntica experiência de conversão e abertura ao mundo do outro,
movida não por oportunismos táticos, mas por uma generosidade e
gratuidade efetivas (TEIXEIRA, 2023, p. 25).

ATENÇÃO
Ora, generosidade e gratuidade são qualidades em falta grave nos dias de
hoje, em que tudo se move em torno de interesses. A pergunta que fica é
como criar espaços para o efetivo diálogo, se estamos demasiadamente
ocupados em correr atrás de nossos interesses?

Então, o autor define diálogo como a abertura à dignidade do outro e a prática


da reciprocidade entre o eu e o tu, na diferença e, ao mesmo tempo, na semelhança; na
alteridade e na identidade. Ele implica na escuta ativa do outro, disposta à aprendizagem
e mudança a partir dessa interação.

O diálogo inter-religioso tem a especificidade de lidar com diferentes tradições


religiosas que têm por característica paradoxal de, na abertura para o outro, aprofundar
ainda mais a fé na própria tradição cultural.

A Igreja Católica intensificou os seus esforços pelo diálogo inter-religioso a partir


do Concílio Vaticano II (1962-1965) e sua ênfase na liberdade religiosa e de consciência e
pelo próprio exemplo de Cristo nesse sentido. Teixeira (2023) resume:

Embora possa ser exercido sob uma multiplicidade de formas, o


diálogo é, antes de tudo, um espírito, uma atitude, um estilo de ação
que deve permear todas as nossas atividades. Ele “implica atenção,
respeito e acolhimento para com o outro, a quem se reconhece
espaço para a sua identidade pessoal, para as suas expressões, os
seus valores” (Diálogo e Missão, n. 29). Não se pode compreender a
missão evangelizadora da Igreja deslocada de um espírito dialogal.
Seria contrariar não somente as exigências de humanidade, mas
igualmente as indicações do Evangelho (Teixeira, 2023, p. 26).

Nesse sentido, o diálogo inter-religioso não é um meio para um fim, que seria a
conversão das pessoas a determinada religião, mas apenas de todos para Deus.

50
NOTA
Em seguida, Teixeira (2023, p. 27) elenca e esmiúça algumas condições
para que o diálogo inter-religioso efetivamente aconteça, quais sejam:

a) a humildade;
b) o reconhecimento do valor da alteridade;
c) a fidelidade à tradição;
d) a abertura à verdade;
e) a capacidade de compaixão.

Finalmente, o autor sugere caminhos práticos do diálogo, a começar pelo


trabalho nas frentes comuns de luta; os “intercâmbios teológicos” (TEIXEIRA, 2023, p.
33), que são os debates entre os especialistas de cada religião; e o “diálogo da experiência
religiosa” (TEIXEIRA, 2023, p. 34), que é a troca de práticas de fé e espiritualidade, em
que ocorre uma “comunhão em profundidade” (TEIXEIRA, 2023, p. 34).

O autor encerra com uma convocação de todos os cristãos para uma especial
atenção ao diálogo inter-religioso, que reproduzimos na íntegra:

A opção da comunicação dialógica constitui hoje um desafio particular


para o cristianismo. A experiência da alteridade toca o que há de
mais profundo e específico na vocação original do cristianismo. Uma
experiência que haure sua razão de ser na própria experiência do Deus
de Jesus que é comunhão e não solidão, de um Deus que integra a
diferença e convoca o cristianismo a dar direito à diferença. A dinâmica
da alteridade está igualmente radicada na experiência histórica de
Jesus de Nazaré, que de forma impressionante soube acolher com
ternura e amor os excluídos e os diferentes. A capacidade de acolhida
e hospitalidade foi traço essencial de seu testemunho histórico.

Não há como entender a missão cristã senão na perspectiva dessa


trajetória de hospitalidade apontada por Jesus. Essa missão não pode
ser entendida restritivamente como difusão do império ou civilização
cristã e de implantação da Igreja. Deve, antes, no seguimento de
Jesus, ser entendida e vivida como um projeto de expansão da cultura
da vida, capaz de transmitir um novo alento vital contra as afirmações
do sofrimento e da morte, transformados em espetáculos rotineiros.
Um projeto a ser exercido em comunhão fraterna com todas as outras
tradições religiosas do planeta (TEIXEIRA, 2023, p. 35).

DICA
Assista à entrevista de Faustino Teixeira sobre o diálogo inter-religioso.
Acesse em: https://www.youtube.com/watch?v=NRqy9IRGf54.

51
E o que o diálogo inter-religioso tem a ver com o Ensino Religioso e sua didática?
Muito, diria eu. Se o Ensino Religioso não formar para o diálogo inter-religioso, conforme
explicitado aqui, para nada mais servirá. Formar religiosamente um indivíduo é prepará-
lo para abrir-se para a diversidade das religiões e dialogar com elas, engajando-se na
causa do diálogo inter-religioso, que é a metodologia por excelência para se alcançar a
paz mundial, numa sociedade globalizada e multicultural.

Para isso, é importante que não se empregue qualquer metodologia, como a


dogmática e o ensino tradicional com sua educação bancária, mas é necessário que a
metodologia, que a didática do professor reflita a sua postura de abertura ao diálogo e de
promoção da abertura ao diálogo. Não adianta nada o professor se mostrar aberto ao diálogo,
se os alunos continuam em espírito de concorrência para ver qual é a religião melhor.

Por isso é que a metodologia fenomenológica, que são todas as metodologias


que valorizam a experiência e o papel do professor como mediador, é tão interessante
não apenas para a pesquisa na área de religiões, mas também ao ensino religioso, pois
ela não se preocupa em julgar qual seja a melhor religião, quais sejam os melhores
preceitos e os melhores rituais e as melhores teologias, mas em valorizar a experiência
de ser no mundo, que a religião, que todas as religiões, proporcionam.

Assim, a aula de Ensino Religioso será esse espaço sonhado por Teixeira, do
diálogo e da parada em meio ao dia a dia corrido de cada um e da escola, para refletir
sobre coisas que nenhuma outra disciplina é capaz de parar para pensar, mas todas são
convidadas a parar para pensar em conjunto a partir do exemplo do professor de Ensino
Religioso, numa abordagem inter-, pluri- e transdisciplinar.

A respeito da interdisciplinaridade vale lembrar que ela acontece pela troca.


Vale aqui citar o exemplo da mistura de substâncias e da reação química. A mistura de
substâncias heterogênea é a pluridisciplinaridade, pela qual dois ou mais professores
resolvem dedicar-se à mesma tarefa ou atividade sem ter objetivos comuns: suas
disciplinas não se misturam. A mistura homogênea é quando há pelo menos um objetivo
em comum, pelo qual as disciplinas se tocam: a multidisciplinaridade.

Já a interdisciplinaridade se dá quando há uma reação química, ou seja, quando


duas substâncias se misturam para formar duas outras substâncias, soltando energia.
É só aí que as disciplinas efetivamente se comunicam, ou seja, há uma troca com gasto
e produção de energia.

Todavia, a interdisciplinaridade normalmente não se dá de forma espontânea,


no caso da educação, mas exige um esforço de duas ou mais cabeças pensando
(planejando) o processo educativo, pois a interdisciplinaridade não é um objeto externo,
mas ocorre interiormente. É um fenômeno nem sempre visível que acontece quando
elementos de uma disciplina trocam com elementos de outra. Há uma real interação não

52
apenas de conteúdos, mas de pessoas (professores e alunos) no que podemos chamar
de diálogo. E nunca os participantes de uma aula interdisciplinar sairão os mesmos de
como entraram na aula.

Dando um passo além, uma aula interdisciplinar pode se tornar transdisciplinar


se for aplicada a coisas que transcendem. O Ensino Religioso é um palco privilegiado
para isso, pois já fala de coisas que vão além do aqui e agora. A transdisciplinaridade
diz respeito também à transversalidade, sendo que os conteúdos e valores ensinados
perpassam todas as disciplinas de cabo a rabo.

Vamos dar um exemplo de aula interdisciplinar. Vamos supor que o professor de


história e o professor de Ensino Religioso planejem um júri simulado sobre a Reforma
Protestante. No banco dos réus estariam os Reformadores (ou a Igreja Católica,
dependendo da ênfase que os professores e alunos queiram dar).

A atividade se tornaria transdisciplinar, se ao final, os alunos debatessem, até


que ponto as desavenças entre católicos e protestantes estão superadas no mundo de
hoje e o que se poderia fazer para amenizá-las e até apaziguá-las.

Assim, através de uma experiência simulada, é possível abarcar o fenômeno da


tolerância religiosa de maneira interdisciplinar e inter-religiosa, usando a metodologia
fenomenológica do jogo dramático.

Ideias como essa não devem ser uma receita de bolo, mas convido a você,
futuro professor e pesquisador de Ensino Religioso, a usar a sua criatividade para criar
atividades interessantes que possam envolver toda a comunidade escolar trazendo as
pautas da religião para o debate coletivo.

53
LEITURA
COMPLEMENTAR
CIÊNCIA DA RELIGIÃO E ENSINO RELIGIOSO. EFEITOS DE DEFINIÇÕES E
INDEFINIÇÕES NA CONSTRUÇÃO DOS CAMPOS

Elisa Junqueira e Rodrigues

INTRODUÇÃO

[…] O presente artigo visa explanar a relação que vem se estabelecendo entre
Ciência da Religião e Ensino Religioso como alternativa para a tematização do tema
religioso nas escolas públicas laicas. Objetiva-se uma análise que problematize
as implicações de propor o Ensino Religioso como componente sob orientação
da Ciência da Religião. As perguntas que o orientam, pois, visam refletir: 1) Em
que medida avançamos ou não quando afirmamos que o Ensino Religioso nas
escolas deve proceder segundo uma abordagem fenomenológica? 2) O que dizemos
ser Fenomenologia da Religião atende à especificidade do Ensino Religioso-Laico? […]

CIÊNCIA DA RELIGIÃO NO BRASIL, UMA ÁREA EM CONSTRUÇÃO

Em 2012, Eduardo Gross discorreu a respeito do trajeto de construção da Ciência


da Religião no Brasil num artigo que elencou argumentos para justificar as diferenças
entre esta área de conhecimento no contexto brasileiro em relação à realidade
da Ciência da Religião anglo-saxã. Nele, Gross indicou espécie de afinidade entre a
reflexão teológica da libertação e a práxis fomentada pelo materialismo histórico, aqui,
compartilhados pelas Ciências Sociais brasileiras e por um ambiente favorável à
emancipação de religiosos (clérigos e leigos) dos seus círculos eclesiásticos de origem.

As implicações diretas disso para a Ciência da Religião no Brasil seriam:

• A emergência de uma área de conhecimento influenciada pelos marcos


teóricos e metodológicos das Ciências Sociais.
• A presença de muitos religiosos na fundação da área, boa parte deles
vinda da Teologia.

No presente artigo, propomos discutir um pouco mais o primeiro desses


pontos especialmente porque, em outro artigo, Gross continuou a discussão sobre
a trajetória histórica de desenvolvimento da Ciência da Religião no Brasil, resumindo
pontos importantes que dizem respeito: 1) à distinção de Teologias dogmáticas; 2) à

54
ausência da Teologia moderna e crítica nos programas de Ciência da Religião no Brasil;
3) à forte presença de estudos empíricos na Ciência da Religião brasileira e; 4) à
lacuna de estudos que aprofundem a questão da especificidade da área de Ciência
da Religião no Brasil, em relação a outras áreas, como Sociologia, Antropologia,
Psicologia, História e Geografia.

Nesse tocante, as sugestões de Gross indicam-nos como possibilidade


de reflexão alguns caminhos para questionar se o viés empírico da Ciência da Religião
no Brasil não caminharia par e passo com uma tendência compreensiva, embora
existam estudos de religião que se contentam em abordar o fenômeno religioso
apenas externamente ou descritivamente. A meu ver isso ocorre quando, primeiro,
a influência dos aportes metodológicos legam à Ciência da Religião brasileira
apenas ênfase na abordagem da religião pela via empírica ou etnográfica. Segundo,
quando essa via resulta num conjunto de trabalhos de campo, análises de caso,
pesquisas comparativas e estudos sobre religião e religiosidade cujo realce remontaria
à abordagem da religião como reflexo da História e das contingências socioculturais.

Nesses casos, observa-se que a produção científica se preocupa em


descrever a composição e as controvérsias do campo religioso brasileiro a partir das suas
dinâmicas sociopolíticas, seus processos históricos e seus arranjos e reconfigurações.
O pesquisador vai a campo para conhecer a religião “a partir de dentro”, mas mobiliza
um arsenal de teóricos que lhe iluminam a análise da religião como: 1) derivação
do sistema econômico; 2) como fruto da determinação das condições materiais da
História; e/ou 3) como instituição cuja função é conformar os corpos, discipliná-los
e fomentar a alienação.

Trata-se, portanto, de um tipo de abordagem da religião digna pelo alto


criticismo político-social, mas que prioriza uma leitura da religião que a reduz,
na medida em que identifica nela apenas o seu aspecto institucional, de agência
que tem poder, que determina as condutas sociais e que se caracteriza pelo exercício
de funções sociais. Isso nos conduz a outro ponto. De um lado, tal trajetória
justificaria alguma indefinição quanto ao que, na Ciência da Religião brasileira, se
compreende por fenomenologia da religião: método que quase sempre assume, mas
que nem sempre sabe definir.

Por outro lado, o vínculo com as Ciências Sociais, especialmente as que


possuem afinidade com a Hermenêutica, também lhe permite uma aproximação com
a fenomenologia da religião, porém, por outra via que não a da Filosofia. Refiro-me
à Sociologia Compreensiva com forte contribuição de pensadores alemães como
Weber e Simmel (do início do século XX) e à Antropologia Cultural ou Interpretativa (da
segunda metade do mesmo século) geralmente vinculada ao nome de Clifford Geertz,
conhecido pelo seu livro A interpretação das culturas.

55
Sugiro que, mesmo sob a influência da Teologia da libertação e insights do
materialismo histórico, a jovem Ciência da Religião no Brasil insere-se do campo das
Humanidades quando visa à compreensão do fenômeno religioso não exclusivamente
pelos métodos de tônica quantitativa, descritiva e ou classificatória. Uma intuição que,
em alguma medida, se alinha com o que propôs Gross ao afirmar: a Ciência da Religião
como uma área de estudos de caráter humanista e de natureza compreensiva.
Por ‘humanista’ entende-se aqui o conjunto de conhecimentos relativos ao espírito
humano que transcende a sua dimensão meramente quantitativa e explicativa.

No entanto, o autor sugere que as características que atribuem à Ciência da


Religião o perfil de ciência compreensiva estariam mais próximos dos Estudos
Literários, das Narrativas Históricas e da Psicologia Interpretativa, bem como
da Teologia moderna e, finalmente, da Filosofia. Isso, segundo entendo, como
resultado do uso da disciplina Hermenêutica, empregada por cada dessas áreas no
intuito de interpretá-los, para além de coletar as “construções do espírito humano”.
Essas importantes “construções”, portanto, pediriam mais do que explicação externa,
ordenação e classificação. Pediriam a pergunta pelo sentido que expressam.

Daí a natureza compreensiva da Ciência da Religião e sua inclinação para


o entendimento do fenômeno religioso a partir de seus discursos.O que proponho
é que, além das afinidades com as disciplinas elencadas por Gross, há igualmente
possibilidade de pensar a tendência interpretativa da Ciência da Religião no Brasil
a partir de similaridades com as abordagens da Sociologia compreensiva e/ou da
Antropologia Cultural, ambas preocupadas com a compreensão da religião a partir
dos seus termos internos e discursos.

Tal tendência interpretativa, que parece ser a vocação da Ciência da


Religião, soa interessante não apenas para o fortalecimento a área, mas também para
o componente curricular Ensino Religioso que, na atualidade, também carece de uma
elaboração metodológica mais assertiva que oriente a prática docente. Sobre esse
ponto, adiante apontamos alguns caminhos teóricos.

O QUE A FENOMENOLOGIA DA RELIGIÃO PODE FAZER PELOS ESTUDOS


DE RELIGIÃO?

Partindo do pressuposto de que o entendimento do fenômeno religioso requer


uma análise que busque os significados do que ele implica para indivíduos
religiosos em termos de orientação para a vida social (ações e relações sociais),
elaboração de códigos de usos e costumes e atribuição de sentido para a vida (no
sentido de existência) e aquilo que a religião teria de mais “religioso” (ou o que é peculiar
das manifestações religiosas) – como sugeriu Eliade (1957; 1993) –tem-se em vista
que tal abordagem caracteriza-se por ser estruturalmente enviesada por um processo
interpretativo. Pertence à alçada da fenomenologia da religião o exercício de conhecer e

56
interpretar o fenômeno religioso como se manifesta. Etimologicamente, o entendimento
de fenômeno denota qualquer objeto possível de experiência como aparece ou
como pode ser percebido.

Mas a aparência do fenômeno somente pode ser desvelada pelo discurso ou


pelo conhecimento – logia – sobre ele. Conhecimento que se obtém por meio da
interpretação do que aparece e do que está por trás do que aparece, isto é, aquilo
que subjaz à aparência. Isso significa que a fenomenologia lança luz sobre aquilo que
objetos possuem em termos de 1) índices; 2) ícones; e3) formas de apresentações,
características dos objetos que não se descolam das aparências.

O fenômeno se manifesta segundo duas variedades implícitas aos objetos,


uma que diz respeito a sua parte externa e outra que diz respeito a algo que
lhe é interno. Com base nesses pressupostos, em minha tese doutoral propus
que a abordagem fenomenológica pleiteia perceber a religião na condição de
fenômeno que tem singularidade, visto que não completamente dependente de
determinações histórico-sociais e/ou exclusivo do reino das emoções, que aventa um
forte pressuposto analítico: a religião em si.

O interessante, portanto, seria reconhecer que a religião se singulariza na


experiência do crente, razão pela qual compreendê-la requer imergir no universo das
ideias e das práticas religiosas, a fim de que pelo conhecimento dos termos dos
religiosos se faça uma aproximação, mesmo que assintótica, do que ela significa
em termos de experiência do ser-no-mundo. Esse exercício nos autoriza a dizer
da religião, especialmente da experiência religiosa, que tem dupla dimensão: uma
que é subjetiva (que se expressa no nível ontológico, da possibilidade de conferir
sentido à existência do ser-no-mundo) e outra que é objetiva (que se expressa no nível
sociopolítico) [e orienta condutas].

Sabe-se que existe certa disparidade entre abordagens definidas como


fenomenológicas. A variedade de propostas revela que não existe apenas um
modelo fenomenológico, mas vários que apresentam algumas similaridades. Assim,
seria preciso perceber ainda que existem diferenças entre o método fenomenológico
filosófico e o da fenomenologia da religião, que cada qual conhece pouco do outro.
Por isso, se justificaria o conhecimento de ambas e o exercício teórico de buscar na
fenomenologia filosófica contribuições para o fortalecimento da segunda.

Ao modo do que propôs Gerardus Van Der Leeuw (1890-1950) em


Phenomenologie der Religion, de 1933 – publicado em inglês sob o título Religion
in Essence and Manifestation, em Londres (1938) – importa nessa abordagem
compreender em que medida a religião concede ao indivíduo-religioso espécie de
ela capaz de mobilizar-lhe pragmática e subjetivamente na vivência das relações
sociais e no desenrolar das ações sociais. Alinha-se a esse entendimento outro

57
importante autor da Ciência da Religião estrangeira: W. Brede Kristensen (1867-1953).
Com ele, a Fenomenologia da Religião, na condição de possibilidade de abordagem da
religião, se robustece com uma metodologia sistemática que prevê tanto descrição
quanto comparação, mas não apenas isso.

Esses estágios antecederiam ao processo interpretativo, com vistas à


compreensão das religiões no que lhes caracteriza como específico e fronteiriço. Antes
do chamado Perspectivismo ou da Antropologia Simétrica se tornar essa conhecida
escola antropológica no Brasil, Kristensen sustentava a importância de tentar
compreender a experiência do crente a partir dos seus próprios termos, ou seja, por
uma via interna ao discurso e não apenas externa e descritiva.

Assim como nas abordagens fenomenológicas citadas, formuladas em


diálogo com a Filosofia, há nas Ciências Sociais da Religião propostas que
visam à compreensão da religião pela via hermenêutica e que, portanto, deslizam
da ênfase empírica para a análise das informações sobre o dado religioso, obtidas
etnograficamente em estudos de caso e em observações do campo religioso. Chama
a atenção, especialmente, a possibilidade de compreensão do fenômeno religioso a
partir da perspectiva sociológica de Georg Simmel, para quem o impulso primeiro da
religião seria o sentido, que se apresenta como um sistema total de compreensão
da existência, isto é, de significado ontológico, que por si somente seria suficiente para
justificar a sua relevância.

Portanto, mais importante do que ressaltar a plausibilidade empírica da


religião seria perceber que por trás dela existiria um “intenso anseio interior [...] quase
como uma forte sensação subjetiva”, que leva o ser humano “a crer na existência de
um objeto que lhe corresponda, mesmo quando se deveria duvidar logicamente
da existência desse objeto.” Resulta dessa perspectiva que religião não seria redutível
à ética ou moralidade, pois cada uma possuiria forma própria de organizar os
conteúdos da vida. A religião seria uma forma possível de organizar a vida dentre
outras, como a artística, a econômica, a política etc.

O fenômeno religioso em sua essência específica, em sua existência pura, livre de


toda “coisa” empírica, é vida; o homem religioso vive de uma maneira que lhe é própria e
seus processos psíquicos apresentam um ritmo, uma tonalidade, um arranjo e uma
proporção de energias psíquicas que são claramente distintos daqueles do homem
teórico, artístico e prático. A complementariedade do entendimento simmeliano da
religião em relação ao que foi exposto é que o sociólogo alemão entende a religião
como “algo mais” do que coisa do reino subjetivo: ele indica o caráter teleológico que
uma experiência religiosa pode constituir para um crente e acentua a eficácia social
desta experiência na ordenação de seu mundo.

58
Como consequência, as análises sobre o fenômeno religioso que atinem
apenas para a parte física da religião ou para a religião como projeção de relações
sociais acarretariam entendimentos reducionistas do fenômeno e ocultariam o real
problema, que seria o do sentido. Isso posto, o fenômeno religioso seria conhecível
porque as categorias pelas quais se comunica se constituem com base num material
sensorial bruto: a vida social, a linguagem, a cultura, o contexto histórico.

Parte importante do conhecimento sobre o religioso, portanto, seria


perseguir a continuidade entre esse material bruto e o que ele representa para quem
ostenta algum tipo de fé religiosa. Se na academia a construção desse saber
tem uma finalidade compreensiva que contenta-se na elucidação do fenômeno, para
o Ensino Religioso como componente curricular que se serve desse saber a finalidade
pode ter outro objetivo ou, para usar uma expressão weberiana, pode representar uma
outra racionalidade quanto a fins, a saber: conhecer as manifestações que compõem o
campo religioso brasileiro.

Bem como compreendê-las, teria o potencial de permitir a ampliação do debate e


do diálogo público sobre o papel, a função, o lugar, os direitos e os deveres das expressões
religiosas no âmbito do Estado e sociedade brasileiros. Assim, ampliando igualmente
para as possibilidades de entendimento entre cidadãos(ãs), sejam religiosos(as) ou
não, e contribuindo para a erradicação das violências e das intolerâncias.[…]

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Primeiro, encaminho este artigo para as considerações finais afirmando que é


possível entender como uma afinidade entre a Ciência da Religião e o Ensino Religioso
tanto o enfoque multidisciplinar (enviesado pela perspectiva hermenêutica que perpassa
áreas como a Filosofia da Religião, os Estudos Literários, a Sociologia Compreensiva e
outras) quanto a centralidade de seu objeto que é a religião, ou o fenômeno religioso. É
importante ressaltar que tal objeto seria mais bem compreendido se nos aproximássemos
dele considerando sua propriedade de sujeito dinâmico e não estático.

Segundo, a Ciência da Religião como área e o Ensino Religioso como


componente curricular se servem do diálogo com áreas de conhecimento do campo
das Humanidades, incorporando delas diferentes aportes teóricos que possam
contribuir para a descrição e a compreensão do fenômeno religioso. Essa aproximação
se constitui como fenomenológica justamente porque observa, cataloga, escuta,
traduz, analisa e promove compreensão sobre as diversas expressões da religião. Esse
processo, entretanto, ocorre conforme um movimento que necessita de idas e vindas
ao tema estudado não visando tecer julgamentos, mas a promoção de entendimento
do fenômeno religioso em seus próprios termos; o que, nas palavras de Geertz significa
operar a “transferência de sentidos”11.

59
Em terceiro lugar, entende-se aqui que a Ciência da Religião é uma ciência
interpretativa, e isso lhe confere a dignidade de não se colocar acima de nenhuma outra
ciência, tampouco acima do tema que a move: o fenômeno religioso. Mas, porque seu
tema exclusivo é a religião e as formas como se expressa, atinando para os termos
que internamente a constituem e para a experiência dela, testemunhada nas narrativas
de quem a vivencia, entendo que a Ciência da Religião tem o potencial de servir ao
Ensino Religioso teórica e metodologicamente. Mesmo que, na condição de campos
em construção, tanto uma quanto a outra possuem na perspectiva fenomenológica
um caminho dialógico, porque compreensivo, para construção de uma aprendizagem
significativa que alimente uma sociedade pluralista e mais cidadã.

Pode-se dizer, então, que a fenomenologia constitui aquilo que une as duas
pontas e estabelece ligação entre o mundo das ideias e o ambiente escolar. Logo, falar
sobre Ensino Religioso hoje pressupõe que sua prática docente requer preenchimento,
isto é, pesquisa, estudo, observação, comparação, análise e, finalmente, compreensão.
Caso contrário, as aulas de Ensino Religioso permanecerão envolvidas no imbróglio
entre ensinar sobre religião e fazer proselitismo. Algo que no momento atual não mais
tem sentido, tendo em vista a produção científica sobre Ensino Religioso publicada e
em circulação, a trajetória da Ciência da Religião no Brasil e o recente quadro histórico
e político envolvendo a penetração e atuação crescente de religiosos na arena pública
de debates.

Fonte: https://revistas.pucsp.br/index.php/rever/article/view/26184. Acesso em: 25 jan. 2023.

60
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:

• A cultura é o que diferencia o ser humano do animal e o que determina a sua forma
de viver, de se relacionar, de se vestir, de morar, de se alimentar, de trabalhar, de rezar,
de usar o seu lazer, de contemplar e criar a arte etc. E também determina a relação do
ser humano com a natureza e com a sociedade.

• Toda ciência tem um objeto de estudo verificável e um método de investigação.


Contudo, a religião só tem o sagrado, que não pode ser verificado. A teologia tem
Deus, o que é mais difícil ainda de verificar.

• O multiculturalismo contempla e valoriza a diversidade e o colorido das culturas e


os aplaude.

• A interculturalidade dá um passo além, dizendo que essas culturas podem e devem


se comunicar e estabelecer trocas dialogais, pois uma não existe sem a outra: a
identidade, sem a alteridade.

• A fenomenologia e o diálogo são as metodologias mais adequadas ao Ensino Religioso.

• Aplicado à religião, o fenômeno é tudo aquilo que se manifesta aos sentidos e que
está singularmente ligado ao sagrado.

• O diálogo inter-religioso tem a especificidade de lidar com diferentes tradições


religiosas que têm por característica paradoxal de, na abertura para o outro,
aprofundar ainda mais a fé na própria tradição cultural.

61
AUTOATIVIDADE
1 Com base na parábola dos cegos e do elefante, compreender a diversidade cultural e
religiosa é fundamental para o Ensino Religioso de qualidade. Pensando nisso, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) A diversidade é válida por ela mesma, porque é mais interessante, colorida e divertida.
b) ( ) A diversidade sempre visa uma unidade maior que está por trás da parábola dos
cegos e do elefante.
c) ( ) A moral da parábola dos cegos e do elefante é que não existe nenhuma verdade.
d) ( ) A parábola dos cegos e do elefante quer nos ensinar que somos todos iguais e por
isso precisamos respeitar uns aos outros.

2 Não sermos donos da verdade não significa que ela não exista “lá fora” e que não
tenhamos acesso a partes dela. (Isso seria cair no relativismo.) Com base, ainda, na
parábola dos cegos e do elefante, analise as sentenças a seguir:

I - Ela quer dizer que a visão do elefante é uniforme, portanto não devemos fazer distinção
entre as formas de enxergá-lo.
II - Ela quer dizer que temos que ser humildes para aceitar a verdade dos outros, por mais
que ela possa parecer absurda para nós.
III - Ela quer dizer que ninguém é dono da verdade e que podemos chegar mais perto dela,
se unirmos as nossas visões parciais.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Todas as sentenças estão corretas.

3 A fenomenologia é a metodologia mais indicada para tratar das questões envolvidas no


Ensino Religioso e para desenvolver as aulas. Com relação a essa metodologia, classifique
V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A fenomenologia é o estudo do fenômeno no sentido daquilo que se manifesta da


realidade ao nosso redor e como se manifesta.
( ) A fenomenologia não se interessa pela verdade das coisas ou por juízos de valor sobre
elas, mas apenas pelos fenômenos, no caso do Ensino Religioso, dos religiosos.
( ) A fenomenologia é o estudo das personalidades consideradas fenômenos, ou seja,
personagens extraordinários na história das religiões.

62
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:
a) ( ) F – V – V.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) V – V – F.

4 O Ensino Religioso é considerado como servo de dois senhores: a Igreja e o Estado.


Disserte sobre em que medida estas instâncias devem influenciar o currículo do Ensino
Religioso nas escolas de acordo com a legislação mais recente.

5 De acordo com o que foi estudado nesse tópico, o diálogo inter-religioso é o caminho
a ser percorrido para se promover as bases e condições para um Ensino Religioso de
qualidade. Disserte sobre qual o papel desse movimento no Ensino Religioso.

63
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Pre-
sidência [da] República, [2016]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 26 jan. 2023.

BOFF, L. Saber Cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

BRITO, M. Canal educação, c2023. Mitos e narrativas da criação. (Material didático).


Disponível em: https://www.canaleducacao.tv/images/slides/40504_8de1f104f3e-
74be01c609ec7cc778295.pdf. Acesso em: 23 mar. 2023.

BUBER, M. Eu e tu. Trad., intr. e notas Newton Aquiles Von Zuben. São Paulo: Centauro, 2001.

COSTA, I. Paralemdoagora, 2014. A parábola dos cegos e o elefante. Disponível em:


https://paralemdoagora.wordpress.com/2014/12/23/a-parabola-dos-cegos-e-o-ele-
fante/. Acesso em: 25 jan. 2023.

EDUCAÇÃO. In: Dicionário da língua portuguesa. Lisboa: Priberam, 2023a. Disponível


em: https://dicionario.priberam.org/educa%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 28 jan. 2023.

EDUCAÇÃO. In: Dicionário on-line de português. Dicio. 2023b. Disponível em: ht-
tps://www.dicio.com.br/educacao/. Acesso em 24 jan. 2023.

ESTADO DO PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED). Diretrizes


curriculares da Educação Básica: ensino religioso. Paraná: Departamento de Edu-
cação Básica, 2018. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/
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FENÔMENO. In: Dicionário on-line de português. Dicio. Disponível em: https://www.


dicio.com.br/fenomeno/. Acesso em: 4 abr. 2023.

FENOMENOLOGIA. In: Dicionário on-line de português. Dicio. Disponível em: https://


www.dicio.com.br/fenomenologia/. Acesso em: 4 abr. 2023.

GAARDER, J.;HELLERN, V.;NOTAKER, H. The book of religions (pocket). Trad.Isa Mara


Lando. São Paulo: Cia das Letras, 2005.

JUNQUEIRA, S. (org); RODRIGUES, E. M. F. Fundamentando pedagogicamente o


Ensino Religioso. Curitiba: Intersaberes, 2012.

64
JUNQUEIRA, S. Educação e História do Ensino Religioso. Pensar a Educação em Re-
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RODRIGUES, E. M. F. Questões epistemológicas do Ensino Religioso: uma proposta a


partir da Ciência da Religião. Interações – Cultura e comunidade, Belo Horizonte, v.
8, n.14, p. 230-241, jul./dez. 2013.

SANTOS, E. C. Ensino Religioso escolar. Curitiba: Intersaberes, 2021.

SEPULVEDA, D.; SEPULVEDA, J. A. A disciplina Ensino Religioso: história, legislação e


práticas. . Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Educação. Revista do
Centro de Educação, v. 42, n. 1, p. 177-190, 2017.

TEIXEIRA, F. O diálogo inter-religioso na perspectiva do terceiro milênio. Horizonte,


Belo Horizonte, v. 2, n. 3, p. 19-38, 2003. Disponível em: http://periodicos.pucminas.br/
index.php/horizonte/article/view/596/623. Acesso em: 28 jan. 2023.

65
66
UNIDADE 2 —

CURRÍCULO NACIONAL
E ESTADUAIS DE ENSINO
RELIGIOSO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• debater alguns currículos e documentos nacionais e estaduais a respeito do


Ensino Religioso;

• conhecer a decisão judicial em relação ao Ensino Religioso e seus argumentos;

• identificar e discutir os elementos de Ensino Religioso na Base Nacional Comum


Curricular (BNCC);

• reconhecer fatos a respeito da história, objetivos e realizações da Associação


Inter-religiosa de educação (Assintec) e do Fórum Nacional Permanente do Ensino
Religioso (Fonaper).

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar
o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DECISÃO JUDICIAL E CURRÍCULOS ALTERNATIVOS


TÓPICO 2 – BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR
TÓPICO 3 – INSTITUIÇÕES DE PROMOÇÃO DO ENSINO RELIGIOSO

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

67
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!

Acesse o
QR Code abaixo:

68
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
DECISÃO JUDICIAL E CURRÍCULOS
ALTERNATIVOS

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, neste tema de aprendizagem, aprenderemos sobre os
argumentos que levaram à decisão judicial do STF de permitir o Ensino Religioso nas
escolas públicas e privadas do sistema de ensino oficial.

Buscaremos, ainda, abordar os currículos já elaborados para o Ensino Religioso,


principalmente no Estado do Paraná, que é o que mais tem tradição na discussão do tema.

Finalmente, faremos uma análise dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o


Ensino Religioso (PCNER) criados pelo Fonaper para conhecer melhor seus princípios e
propostas para o Ensino Religioso no contexto atual.

2 DECISÃO JUDICIAL E CURRÍCULOS ALTERNATIVOS


Você sabe qual é a única disciplina que tem menção especial nas LDB e na
constituição? O Ensino Religioso. Antes de falarmos da decisão judicial do STF sobre o
Ensino Religioso confessional, é preciso considerar como o Ensino Religioso apareceu
na maioria de nossas constituições e em todas as LDB, até a atual.

2.1 CONSTITUIÇÕES E LDB


Você já parou para se perguntar o que a lei preconiza sobre o Ensino Religioso
desde tempos imemoriais no Brasil? Bem, a primeira Constituição, de 1891, não dizia nada
sobre o Ensino Religioso (e foi a única), mas Junqueira (2015, p. 5) nos alerta para que:

Em 1827, documentos complementares do Império mencionavam


que o ensino da doutrina religiosa era um dos propósitos da escola,
juntamente com o ensino da leitura, da escrita e das quatro operações.
Em 1931, o Ensino Religioso (ER) foi reintroduzido no currículo das
escolas públicas e se encontra sob grande discussão até o século XXI.

69
INTERESSANTE
Por mais que a Constituição de 1891 tenha levado a sério o laicismo, não
mencionando o Ensino Religioso, por irônico que pareça, nela o cidadão só
é considerado como tal se professar a fé católica.

Foi só no governo do Getúlio Vargas, que o Ensino Religioso foi oficialmente


considerado, já garantido a separação da Igreja e do Estado e a laicidade do Estado, que
foi mantida nas demais constituições.

Na Constituição de 1934 o Ensino Religioso era uma disciplina oficial do


currículo das escolas regulares e de matrícula facultativa, o que assim permaneceu nas
Constituições de 1937, 1946, 1967 e 1988.

A Constituição Cidadã de 1988 diz, no “Art. 210. § 1º- O ensino religioso, de


matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas
de ensino fundamental” (BRASIL, 2023), que é basicamente a mesma redação das
demais constituições.

O fato é que, como muito bem reforça Santos (2021), o Ensino Religioso é a
única disciplina do currículo mencionada nas Constituições e nas LDB, e sempre com o
modelo confessional católico:

Alvo histórico de polêmicas (CURY, 2004), o Ensino Religioso é o


único conteúdo curricular previsto no texto constitucional brasileiro
(BRASIL, 2017a). Sua oferta foi iniciada no período colonial e
prosseguida durante o Império, sempre sob modelo confessional
católico (SAVIANI, 2010). Com a Proclamação da República, houve
um primeiro momento de ímpeto laicista na educação, que fez com
que a disciplina fosse eliminada. Essa iniciativa, porém, não durou
muito. Logo sua oferta retornava às escolas, para permanecer até os
dias atuais (CUNHA, 2013 apud SANTOS, 2021, p. 3).

Fora isso, desde 1946, a religiosidade é garantida como direito, mas a mais
recente Carta Magna é mais explícita. Conforme seu Artigo 5º,

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo


assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na
forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência
religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa
ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para
eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir
prestação alternativa, fixada em lei;

70
Como você pode ver, a religião é um direito inviolável e esse direito reflete a
Carta dos Direitos Humanos de 1948, que diz em seu décimo oitavo artigo que:

Artigo 18° Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de


consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar
de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a
religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como
em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos (ONU,
1948, s. p.).

Podemos questionar: como a LDB se refere ao Ensino Religioso? Antes disso,


a Lei Orgânica do Ensino de Capanema, de 1941, incluiu-o como disciplina regular do
ensino secundário.

Na LDB 4024/61, o Ensino Religioso é confessional, sem ônus para os cofres


públicos. Já na LDB 5692/71 o Ensino Religioso, bem a propósito do espírito da ditadura
militar, serve à educação moral do aluno, coisa que foi abolida com a redemocratização
do Brasil e a nova LDB 9.394/96, que já valoriza a diversidade e a pluralidade e continua
promulgando a não remuneração dos professores de Ensino Religioso, o que foi
revogado com a Lei 9.475/1997. De acordo com essa lei, a redação concernente ao
Ensino Religioso na LDB atual ficou assim:

Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante


da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para


a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.

§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas


diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso (BRASIL, 1996).

NOTA
De acordo com a LDB 9.394/96, é assegurado o direito de prova
substitutiva àquele aluno que não pode comparecer à prova regular por
motivos religiosos.

71
Gonzalez e Dias (2022, p. 195) chamam a atenção para o fato de todas as LDB,
até hoje, mencionarem o Ensino Religioso, mas apenas a Lei 9.394/96, alterada pela
Lei 9.475/1997, o considera parte da formação cidadã, “reconhecendo a diversidade e
delegando a cada sistema de ensino o estabelecimento de normas para habilitação e
admissão do professor dessa disciplina (…)”.

A LDB mais recente, além de associar o Ensino Religioso à formação do cidadão,


frisa o caráter não proselitista desse ensino. Você certamente já ouviu muito falar em
proselitismo. Mas já parou para refletir sobre o que significa isso?

De acordo com o dicionário Priberam (PROSELITISMO, 2023, s. p.), proselitismo


é o “Zelo ou esforço para fazer prosélitos ou converter pessoas a uma religião, a um
partido, a uma causa ou a uma ideia.” E “prosélito” é o “Novo convertido a uma religião, a
uma seita ou a um partido. Partidário; sectário” (PROSÉLITO, 2023, s. p.).

Assim, fica terminantemente proibido promover qualquer religião ou seita na


escola, com o intuito de converter os alunos a ela. A LDB diz, ainda, que os Estados e
municípios ficam encarregados de regulamentar o currículo e os critérios de admissão
e habilitação de professores do Ensino Religioso, que acabam passando a atribuição às
instituições religiosas, ou por incompetência no assunto, ou por respeito.

IMPORTANTE
Com isso, o Ensino Religioso ficou “entre a cruz e a espada”, entre o poder
governamental e o religioso, tornando-se uma terra de ninguém, confusa e
propensa a ser tomada de assalto por algum poder religioso trasvestido de
pluralidade, mas na verdade defensor da confessionalidade. A polêmica em
torno do Ensino Religioso, particularmente o confessional em um Estado laico,
foi tanta que houve um processo, a cujo resultado nos dedicamos a seguir.

2.2 DEBATE SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DO ENSINO


RELIGIOSO
Nossa Constituição Cidadã reza em seu Artigo 19 (BRASIL, 1988):

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na
forma da lei, a colaboração de interesse público. (...)
III – criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si

72
Portanto, parece que o Ensino Religioso catequético e confessional, que
promove uma só religião, é inconstitucional. Isso gerou um processo junto ao STF, o que
deu um “bafafá” e tanto.

Vamos analisar, quanto a isso, uma notícia do site Consultor Jurídico, de


27/9/2017, intitulado: “Por maioria, Supremo permite ensino religioso confessional
nas escolas públicas”. Diz o artigo que depois de quatro sessões em que houve uma
discussão fervorosa, a constitucionalidade do Ensino Religioso confessional nas escolas
públicas foi aprovada por seis votos a cinco, e “a ação direta de inconstitucionalidade
proposta pela Procuradoria-Geral da República contra trechos da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação e do acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé (Decreto 7.107/2010)”
(TEIXEIRA, 2017, s. p.) foi declarada improcedente.

O que mais se enfatizou na discussão foi a confessionalidade, ou seja, que se


uma determinada religião poderia ser ensinada nas escolas, ela seria inconstitucional,
já que vivemos em um Estado Laico. Os argumentos a favor da inconstitucionalidade
foram que um estado laico não pode promover ou servir de aparelho ideológico para uma
religião específica, o que não implica em anular as religiões, mas simplesmente fazê-las
reconhecer as demais na escola pública. Isso impediria o avanço do fundamentalismo
no país e promoveria o respeito e a tolerância entre as religiões.

Mas a presidente, Carmem Lúcia, deu o voto de minerva dizendo que o fato de
o Ensino Religioso ser facultativo compensa qualquer confessionalidade, preservando
a liberdade do aluno que não professa a religião oferecida, de não comparecer às aulas.

A laicidade do Estado está respeitada e não vejo contrariedade que me


leve a declarar inconstitucional as normas questionadas”, concluiu. A lei
questionada não autoriza proselitismo, catequismo (sic) ou imposição
de uma religião específica, disse (TEIXEIRA, 2017, s. p.).

A decisão judicial vale apenas para as escolas públicas, sendo que as particulares
seguem apenas o dito na LDB.

Veja como Gozalez e Dias (2022, p. 197) resumem o assunto, afirmando que
a Procuradoria Geral havia proposto, em sua Ação direta de Inconstitucionalidade,
que o Ensino Religioso não fosse vinculado a uma religião específica nas escolas
públicas e que fosse proibida a admissão de representantes das confissões religiosas
como professores. Sugeriu ainda “que a disciplina de ensino religioso, cuja matrícula é
facultativa, fosse voltada para a história e a doutrina das várias religiões, ensinadas sob
uma perspectiva laica […]”.

Mas a decisão judicial foi no sentido de permitir o ensino confessional nas escolas
públicas e que isso não feriria a laicidade do Estado. Acontece que na BNCC o Ensino
Religioso adquiriu todo um cunho não confessional, mesmo sendo ele facultativo.

73
DICA
Para uma crítica à decisão judicial, consulte o artigo Decisão do STF sobre
o ensino religioso: quem ganhou e quem perdeu? no site da UFF. Acesse em:
http://ole.uff.br/decisao-do-stf-sobre-o-ensino-religoso-quem-ganhou-e-
quem-perdeu/.

3 CURRÍCULOS ALTERNATIVOS
Historicamente, o Estado do Paraná e, especialmente, o município de Curitiba são
os que mais se interessaram em emitir pareceres e leis para regulamentar o Ensino Religioso.

DICA
Para o material disponibilizado pela prefeitura do município de Curitiba,
consulte:https://educacao.curitiba.pr.gov.br/conteudo/documentos-
er/113042.

E para materiais da UNESCO em parceria com o Conselho Nacional da


Educação (CNE), consulte: http://portal.mec.gov.br/docman/junho-2016-
pdf/44061-produto-1-materiais-didaticos-para-componente-curricular-
ensino-religioso-pdf.

Mas os demais Estados também já se mobilizaram. De acordo com Gonzalez e


Dias (2022), há estudos, como o de Diniz, Lionço e Carrião (2010), que, após estudos das
legislações estaduais a respeito do Ensino Religioso, identificaram três modelos desse
ensino no país: o confessional, o interconfessional e o de história das religiões.

O modelo de ensino confessional é de cunho clerical, cujo objetivo


é promover uma ou mais confissões religiosas, sendo geralmente
ministrado por seus representantes. Os Estados que adotam esse
modelo são Acre, Bahia, Ceará e Rio de Janeiro. Já no Estado de São
Paulo, o modelo predominante é o da história das religiões, de caráter
secular, devendo ser lecionado por professores de sociologia, filosofia
ou história. As demais unidades da Federação apresentam o modelo
de ensino interconfessional, o qual tem a função de promover valores
e práticas religiosos em consenso sobreposto em torno de algumas
religiões hegemônicas na sociedade brasileira, podendo ser ministrado
por representantes das comunidades religiosas ou por professores
sem filiação religiosa declarada (GONZALEZ; DIAS, 2022, p. 196).

74
Assim, podemos perceber uma ampla variedade do entendimento do Ensino
Religioso, dependendo do Estado da federação e que, portanto, o debate sobre a
laicidade do Estado ainda está longe de ser um ponto de comum acordo.

3.1 CADERNOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA


Entre os materiais disponibilizados para orientar didaticamente os professores
de Ensino Religioso no município de Curitiba, chamamos a atenção, especialmente,
para o caderno intitulado “Ensino religioso no Estado laico: um desafio para o ensino
fundamental. Orientações para o trabalho nas escolas públicas municipais de Curitiba.”

Ele começa com uma discussão de Santos (2018) sobre o “Estado Laico, a
laicidade e o Ensino Religioso”. Nele aprendemos que laicidade, laicismo e laico, longe
de significar ateu, sem religião ou contrário a ela, vem do grego laon de onde vem laicos
e que significa “o povo em sentido lato, tão abrangente ou tão universal quanto possível.

O termo laon referia-se, portanto, à entidade população, ao povo todo, a toda


a gente, sem exceção alguma” (SANTOS, 2018, p. 11-12). Daí vem a palavra leigo que
segue o princípio da autonomia e não interferência, reivindicada também pela ciência
e pela filosofia por vários filósofos. Quem é contra a laicidade tende a favorecer regimes
totalitários e ideologias ditatoriais.

Como já mencionado, na nossa constituição, no Artigo 19, ela não pode admitir
o ensino de uma só religião, que é o modelo confessional, mas deve defender um
ensino pluralista. No entanto, a mesma lei garante a liberdade religiosa, de modo que
o Ensino Religioso nas escolas é permitido. A solução para o impasse, de acordo com
Santos (2018) é que não se confunda ensino religioso com aulas de religião, conforme já
discutido na Unidade 1 desse material.

A laicidade, então, é contra a confessionalidade? De certa forma, sim. Santos (2021)


fala sobre confessionalidade, que ela é, em suma, doutrina e catequese, o que no Brasil
historicamente é muito associada à profissão católica, mas que pode se aplicar a qualquer
religião. O modelo confessional é aquele que professa e promove uma religião específica.

Já o modelo interconfessional, adotado pelo Estado do Rio de Janeiro, através da


Lei n.º 3.459, de 14 de setembro de 2000, cria um precedente de inconstitucionalidade,
conforme explica o autor:

O primeiro problema dessa orientação é sua inconstitucionalidade no


que diz respeito ao art. 19 da Constituição Federal quando afirma que:
É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada,
na forma da lei, a colaboração de interesse público;

75
II- recusar fé aos documentos públicos;
III- criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si
(BRASIL, 1988, apud SANTOS, 2018, p. 17, grifo nosso).

Alguns acham que a consulta aos pais quanto à religiosidade dos filhos resolveria
o problema. O que essas pessoas esquecem é que, com isso, cria-se uma distinção e
um constrangimento para aqueles sem religião ou de religião minoritária, o que é uma
forma de discriminação.

A lei também diz que os conteúdos e os requisitos para a seleção dos professores
vão por conta das autoridades religiosas, o que faz surgir uma relação de dependência
entre Estado e religião.

Mas os problemas não param por aí:

Uma das dificuldades é o espaço físico para separar as turmas em


grupos de estudantes de mesma religião, o que, além do mais, é um
tipo de segregação e distinção entre estudantes, como afirmamos
anteriormente. Isto se aplica aos estudantes optantes em participar
das aulas de Ensino Religioso, devido a sua facultatividade, reafirmada
em 2002, por meio do Decreto n.º 31.086/02, o que nos leva a outros
problemas: o que fazer com os estudantes não optantes? Em que
espaço deixá-los? Que conteúdos eles terão no período das aulas de
Ensino Religioso? (SANTOS, 2018, p. 18).

Além do que fazer com os alunos não optantes, também o estabelecimento


da carga horária e dos critérios de contratação de novos professores e adaptação dos
velhos, que tinham que ter uma credencial religiosa, são problemáticos e criadores de
dependência da autoridade religiosa.

Para dar conta desses obstáculos criaram-se em 2010 as figuras do “articulador


técnico-pedagógico”, um cargo burocrático que servia de elo entre a Coordenação do Ensino
Religioso e os professores; e o “articulador religioso”, que fazia a ponte entre as autoridades
religiosas e a Coordenação do Ensino Religioso. O autor cita exemplos de intolerância
religiosa e abusos cometidos sob esse modelo interconfessional no Rio de Janeiro.

Já o modelo aconfessional se alinha mais com as conquistas de pluralismo e


direitos humanos realizadas na últimas décadas pelo mundo pós-moderno e o fim das
“grandes narrativas”. Santos se coloca claramente contra o Ensino Religioso confessional:

Nesse contexto, um Ensino Religioso que vem ao encontro das


aspirações da escola de qualidade, como a formação de cidadãos
participativos e conscientes, aptos ao mundo do trabalho e à
convivência social, passa por um Ensino Religioso não confessional,
pautado no conhecimento sobre a diversidade religiosa e a importância
do respeito a diferentes formas de crer, inclusive daqueles que em
nada creem. Mas, com isso, não estamos legitimando a interferência
das igrejas e religiões no espaço público: […] (SANTOS, 2018, p. 23).

76
IMPORTANTE
O modelo aconfessional, então, é aquele que valoriza todas as religiões,
focando no que as ciências humanas: a psicologia, a sociologia, a história, a
antropologia, a filosofia etc., têm a dizer sobre elas.

O material de Curitiba é rico em artigos sobre o laicismo; a legislação dos


conteúdos de matriz africana e indígena; a BNCC e o ensino religioso; uma chamada
para leitura do Roteiro de Atuação do Ministério Público sobre Ensino Religioso; sobre
a Assintec; o que fazer com os alunos que não assistem às aulas de Ensino Religioso;
sugestão de carta de apresentação para as famílias e para os estudantes; dilemas do
profissional da Educação frente a fenômenos de intolerância religiosa, uso de símbolos
e o que pode e não pode em relação à religião na escola; propostas e projetos de
organizações religiosas, inclusive uma proposta de visita técnica e de visita de líderes
religiosos à escola; planejamento; avaliação e perfil do docente de Ensino Religioso.

E qual foi a reação de Estados e Municípios do Brasil para orientar o Ensino


Religioso, conforme previsto por lei? Muito tímida, com certeza. Além de leis locais como
as do Rio de Janeiro, que regulam o Ensino Religioso no seu Estado e município, a
Secretaria do Estado da Educação (SEE) do Paraná criou as “Diretrizes Curriculares da
Educação Básica: Ensino Religioso”, que vamos analisar a seguir.

3.2 DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAÇÃO BÁSICA:


ENSINO RELIGIOSO
Vamos, agora, analisar mais a fundo o documento das Diretrizes. Depois
de uma introdução sobre a opção pelo currículo disciplinar, inclusive uma discussão
interessante sobre interdisciplinaridade e sobre avaliação, o material da SEE aborda as
Diretrizes Curriculares da Disciplina Ensino Religioso propriamente ditas, a começar por
um histórico da disciplina no Brasil e no Estado do Paraná, que atualmente segue o
modelo aconfessional.

De acordo com isso, declara-se que é preciso um Ensino Religioso que supere o
dogmatismo do período da Colônia e do Império e que se abracem os ideais republicanos
da separação entre Estado e Igreja. E os articuladores preconizam que o Ensino Religioso
serve para a formação para a cidadania:

Assim, a disciplina de Ensino Religioso deve oferecer subsídios para


que os estudantes entendam como os grupos sociais se constituem
culturalmente e como se relacionam com o Sagrado. Essa abordagem
possibilita estabelecer relações entre as culturas e os espaços por
elas produzidos, em suas marcas de religiosidade.

77
Tratado nesta perspectiva, o Ensino Religioso contribuirá para superar
desigualdades étnico-religiosas, para garantir o direito Constitucional
de liberdade de crença e de expressão e, por consequência, o
direito à liberdade individual e política. Desta forma atenderá um
dos objetivos da educação básica que, segundo a LDB 9.394/96, é
o desenvolvimento da cidadania (ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 46)

Para tanto, as Diretrizes seguem pressupostos que relacionam a religião à cultura


e que valorizam a dúvida e a investigação ou questionamento da realidade, superando,
do ponto de vista da didática, as aulas de religião tradicionais, conteudistas, rumo a
aulas participativas, onde impere o debate sobre o fenômeno religioso. O substrato para
essas aulas são as próprias religiões:

Assim, nestas diretrizes, qualquer religião deve ser tratada como


conteúdo escolar, uma vez que o Sagrado compõe o universo
cultural humano e faz parte do modelo de organização de diferentes
sociedades. A disciplina de Ensino Religioso deve propiciar a
compreensão, comparação e análise das diferentes manifestações do
Sagrado, com vistas à interpretação dos seus múltiplos significados.
Ainda, subsidiará os educandos na compreensão de conceitos
básicos no campo religioso e na forma como as sociedades são
influenciadas pelas tradições religiosas, tanto na afirmação quanto
na negação do Sagrado (ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 47).

Em seguida, o material define o que é sagrado e o que é religião, com base


em certos autores clássicos da filosofia. Feuerbach (1804-1872), Marx (1818-1883) e
Espinosa (1632-1677), cada um a seu modo, fazem uma crítica à religião dizendo que ela
é alienante. Feuerbach diz que ela é a projeção do desejo de perfeição do ser humano e
põe em risco a sua autonomia:

Mas a crítica mais conhecida é a de Marx (1993, p. 77-78), para quem a religião
“é o ópio do povo”, que foi influenciado por Feuerbach e por Espinoza para dizer que
ela faz parte da superestrutura ou da ideologia para alienar o povo de sua condição de
opressão. A filosofia serviria para libertação do homem dessa condição subserviente
e para a sua emancipação: “A religião é o suspiro da criatura oprimida, o íntimo de um
mundo sem coração e a alma de situações sem alma. É o ópio do povo” (MARX apud
ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 52).

Mas em outro escrito, segundo os articulistas das Diretrizes, Marx defende


que não se deve acabar com a religião, que é um direito de todo cidadão, mas que se
deve criar a consciência cidadã no indivíduo e libertá-lo de seu egoísmo, rumo a uma
participação política efetiva. E Marx influenciou consideravelmente os estudos sobre o
capitalismo e a economia em geral.

78
INTERESSANTE
Você já parou para refletir sobre as relações entre a economia e a religião;
sobre o motivo por que a maioria dos países protestantes são desenvolvidos?

Pois é, Max Weber teorizou sobre isso, estabelecendo um paralelo entre o que
chamou de o “espírito” do protestantismo e o desenvolvimento econômico. Para ele, os
protestantes valorizam o trabalho e a máxima produtividade, dando-lhe valor de religião,
por isso, progridem.

Já Kant confessa que crê em um Deus de forma absoluta e que isso está
intimamente relacionado a sua ética:

Em A religião nos limites da simples razão (1793), Kant analisa o


conflito entre o sumo bem e o mal, considera suas implicações
teológico-políticas e, faz a distinção entre o “estado jurídico-civil
(político)” e o “estado ético-civil”.

Kant afirma que “o estado de natureza ética é uma luta mútua


e pública contra os princípios da virtude e uma condição de
imoralidade interior, da qual o homem natural deve esforçar-se por
sair o mais rápido possível”, e, por isso, “o homem deve sair do estado
de natureza ética para tornar-se membro de uma comunidade ética”
(KANT, 2006, p. 86-87 apud ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 55).

Para Kant, Deus é uma condição da razão prática, pois toda ética precisa de um
legislador supremo e externo ao ser humano, capaz de penetrar no íntimo da consciência
de cada um, e seus representantes, os sacerdotes, devem exercer o controle moral do povo.

As Diretrizes encerram essa parte teórica falando da tribo Guarani, para quem a
religiosidade é tudo e que, tendo poucos mitos, têm muitos pensamentos a respeito do
assunto. Como as religiões indígenas, todas as religiões devem ser levadas em conta no
Ensino Religioso.

No capítulo seguinte, são abordados os “conteúdos estruturantes” do Ensino


Religioso, que são “os conhecimentos de grande amplitude que envolvem conceitos,
teorias e práticas de uma disciplina escolar, identificam e organizam seus campos de
estudos e se vinculam ao seu objeto de estudo” (ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 57).

Os conteúdos considerados estruturantes são, de acordo com os articulistas,


os seguintes:

79
Paisagem Religiosa - à materialidade fenomênica do Sagrado, a qual
é apreendida através dos sentidos. É a exterioridade do Sagrado e
sua concretude, os espaços Sagrados.
Universo Simbólico Religioso - à apreensão conceitual através da
razão, pela qual concebe-se (sic) o Sagrado pelos seus predicados
e reconhece-se a sua lógica simbólica. É entendido como sistema
simbólico e projeção cultural.
Texto Sagrado - à tradição e à natureza do Sagrado enquanto
fenômeno. Neste sentido é reconhecido através das Escrituras
Sagradas, das Tradições Orais Sagradas e dos Mitos (ESTADO DO
PARANÁ, 2008, p. 58).

Esses conteúdos são assim representados nas Diretrizes:

Figura 1 – Conteúdos Estruturantes do Ensino Religioso

Fonte: Estado do Paraná (2023, p. 58)

Paisagem religiosa são os elementos naturais, como rios, montanhas, árvores; e


culturais, como os monumentos e construções arquitetônicas como estátuas, templos
etc., que fazem parte do ambiente e que são considerados sagrados. Esses ambientes
adquirem valor simbólico e são usados como lugar para a realização de ritos, celebrações
e cerimônias religiosas.

Já o universo simbólico religioso diz respeito aos símbolos que estão presentes
no universo humano desde que o homem se tornou civilizado e o distingue do animais,
não apenas os símbolos religiosos. Eles servem para a comunicação e, no caso dos
símbolos religiosos, para a unificação entre o universo humano e o divino.

Finalmente, os textos sagrados orais (em forma de canções, doutrinas e mitos) e


escritos servem para a preservação das crenças e para a orientação dos fiéis, individual
e coletivamente. Os textos sagrados servem à tradição, ou seja, à salvaguarda de que as
ideias do ente sagrado e suas orientações e doutrinas sejam perpetuadas e preservadas
ao longo do tempo.

80
Conforme os articulistas das Diretrizes:

Os Textos Sagrados são uma referência importante para a disciplina


de Ensino Religioso, pois permitem identificar como a tradição e a
manifestação atribuem às práticas religiosas o caráter sagrado e em
que medida orientam ou estão presentes nos ritos, nas festas, na
organização das religiões, nas explicações da vida e morte (ESTADO
DO PARANÁ, 2008, p. 60).

INTERESSANTE
A força e poder das Escrituras Sagradas cristãs na nossa cultura podem
ser mensurados pela expressão de que um documento é “uma Bíblia”
para determinado grupo, querendo dizer que ele traz toda a orientação
necessária para aquele campo.

Quanto aos conteúdos básicos da 5ª série/6º ano, as Diretrizes trazem o


seguinte quadro:

Figura 2 – Conteúdos básicos de Ensino Religioso para a 5.ª série/6º ano

Fonte: Estado do Paraná (2023, p. 61)

Observe que são contemplados todos os conteúdos estruturantes do Ensino


religioso, sendo que o tema mais complexo, a vida e a morte, é deixado para a 6ª série.
Em seguida, são propostos os conteúdos mais detalhados para a 5ª e 6ª séries do
ensino fundamental.

81
E quanto à metodologia e a didática, que é o que nos interessa aqui? O que o
documento diz? A metodologia é abordada na parte de encaminhamentos metodológicos
e recomenda-se efusivamente superar o modelo de ensino tradicional, conteudista e
que, num primeiro momento, se diagnostique o que os alunos sabem sobre o tema de
forma assistemática, levantando as primeiras questões relativas a ele.

O segundo momento é de problematização, em que o professor levanta questões


concernentes ao tema e os associa ao cotidiano dos alunos. A fase seguinte é a da
teorização, em que se atinge o conhecimento abstrato sobre o conteúdo, fazendo a sua
devida contextualização histórica, social e política. Nessa fase se põe ainda em prática
a interdisciplinaridade, pela qual se chama ao palco as diversas áreas de conhecimento,
sem perda da especificidade do campo do Ensino Religioso.

ATENÇÃO
É preciso atentar também para que o ponto de vista pelo qual se abordam
as religiões seja o laico e não o religioso, sem que se privilegie nenhuma
religião específica. Atenção também para a fonte das informações veiculadas
em sala, que sejam laicas e neutras, e para a liberdade de crença do aluno.

Finalmente, na parte final, fala-se de avaliação. Além dos critérios de aprendizado


efetivo da matéria e contribuição para a transformação social, os articulistas das
Diretrizes sugerem algumas perguntas que podem ser feitas no sentido de avaliar o
aluno de Ensino Religioso. São elas:

• o aluno expressa uma relação respeitosa com os colegas de


classe que têm opções religiosas diferentes da sua?
• o aluno aceita as diferenças de credo ou de expressão de fé?
• o aluno reconhece que o fenômeno religioso é um dado de
cultura e de identidade de cada grupo social?
• o aluno emprega conceitos adequados para referir-se às
diferentes manifestações do Sagrado? (ESTADO DO PARANÁ,
2008, p. 67).

A avaliação pode, assim, servir para medir até que ponto o conteúdo ministrado
está contribuindo para promover certas atitudes e comportamentos de respeito ao
próximo no aluno e pode servir de indicativo para o replanejamento e para a justificativa
da disciplina no currículo escolar.

82
E para encerrar, os articulistas observam:

Apesar de não haver aferição de notas ou conceitos que impliquem


aprovação ou reprovação do aluno, recomenda-se que o professor
registre o processo avaliativo por meio de instrumentos que permitam
à escola, ao aluno, aos seus pais ou responsáveis a identificação dos
progressos obtidos na disciplina (ESTADO DO PARANÁ, 2008, p. 68).

Somente assim poderemos aferir, se o Ensino Religioso está efetivamente


promovendo o pluralismo, a tolerância e o respeito mútuo entre as religiões.

ESTUDOS FUTUROS
Vamos falar mais sobre avaliação na Unidade 3 deste material.

Então, gostou desse tema de aprendizagem? Espera que vem mais por aí.

83
84
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• Somente no governo do Getúlio Vargas, que o Ensino Religioso foi oficialmente


considerado, já garantido a separação da Igreja e do Estado e a laicidade do Estado,
que foi mantida nas demais constituições. .

• A Lei 9.394/96, alterada pela Lei 9.475/1997, o considera parte da formação cidadã,
“reconhecendo a diversidade e delegando a cada sistema de ensino o estabelecimento
de normas para habilitação e admissão do professor dessa disciplina...”

• A laicidade, laicismo e laico, longe de significar ateu, sem religião ou contrário a ela,
vem do grego laon de onde vem laicos e que significa “o povo em sentido lato, tão
abrangente ou tão universal quanto possível.

• BNCC o Ensino Religioso adquiriu todo um cunho não confessional, mesmo sendo
ele facultativo.

• O Ensino Religioso está longe de ser um ponto pacífico e está rodeado de polêmicas.

85
AUTOATIVIDADE
1 O que mais se enfatizou na discussão durante o processo no STF foi a confessionalidade,
ou seja, que, se uma determinada religião poderia ser ensinada nas escolas, ela seria
inconstitucional, já que vivemos em um Estado Laico. Quanto à decisão judicial do STF
sobre o Ensino Religioso confessional, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Com a decisão judicial, o Ensino Religioso passa a ser admitido somente no modelo
confessional nas escolas públicas de Ensino Fundamental.
b) ( ) Com a decisão judicial, as aulas de Ensino Religioso são consideradas constitucionais
e podem ser ministradas, inclusive no modelo confessional.
c) ( ) Com a decisão judicial, a frequência às aulas de Ensino Religioso passa a ser
obrigatória no Ensino Fundamental.
d) ( ) Com a decisão judicial, o Ensino Religioso passa a ser admitido somente no modelo
aconfessional nas escolas públicas de Ensino Fundamental.

2 Os argumentos a favor da inconstitucionalidade foram que um estado laico não pode


promover ou servir de aparelho ideológico para uma religião específica, o que não implica
em anular as religiões, mas simplesmente fazê-las reconhecer as demais na escola
pública. Isso impediria o avanço do fundamentalismo no país e promoveria o respeito e a
tolerância entre as religiões. Com relação ao argumento usado pela presidente Carmen
Lúcia para resolver o impasse no STF sobre o Ensino Religioso, analise as sentenças:

I - Foi argumentado que o caráter facultativo do Ensino Religioso resolve a questão da


confessionalidade.
II - Foi argumentado que, como o Estado é laico, não se pode admitir o Ensino Religioso
confessional.
III - Foi argumentado que o Ensino Religioso é de todos e que, portanto, todos têm
direito a ele.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A Procuradoria Geral sugeriu “que a disciplina de ensino religioso, cuja matrícula é


facultativa, fosse voltada para a história e a doutrina das várias religiões, ensinadas sob
uma perspectiva laica […]”. Quanto ao Ensino religioso no Estado laico, classifique V para
as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

86
( ) A laicidade do Estado implica que o professor não deve impor conteúdos, mas ser uma
ponte entre os saberes religiosos e a experiência do aluno.
( ) O professor deve ser capacitado a respeitar as diferenças e a diversidade religiosa
brasileira, se quiser ser coerente com um Estado laico.
( ) O professor deve adotar o modelo tradicional de ensino, pelo qual ele pode preservar a
cultura e as tradições cristãs, como deve ser num Estado laico.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V
c) ( ) V – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 A LDB diz que Estados e municípios ficam encarregados de regulamentar o Ensino


Religioso no currículo e nos critérios de admissão dos professores. Mas eles acabam
delegando às instituições religiosas e civis essa incumbência. Disserte sobre como fica a
questão do Ensino Religioso nessas circunstâncias.

5 O Fonaper é um órgão religioso que criou os PCNER. Por mais que ele tenha por discurso
o não proselitismo, o pluralismo e o diálogo religioso, disserte sobre o argumento de
Toledo e Amaral (2005) sobre a legitimidade desse documento.

Fonte: TOLEDO, C. de A. A. de; AMARAL, T. C. I. do. Análise dos


Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso
nas escolas públicas. Revista Linhas, Florianópolis, v. 6, n. 1,
2005. Disponível em: https://www.revistas.udesc.br/index.
php/linhas/article/view/1248. Acesso em: 3 fev. 2023.

87
88
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, você pode se perguntar, o que representou a Base Nacional
Comum Curricular? Foi um esforço do governo, ouvidas as diversas entidades de classe,
professores, pais, sociedade civil, em criar uma plataforma única de currículo adotada por
todo o Brasil para unificar o ensino básico no país. Havia, na época de sua criação, até um
site do governo que permitia a participação de qualquer cidadão nos debates.

E qual é o primeiro aspecto dessa base a ser considerado? Os objetivos de


cada área do conhecimento. Então, num primeiro momento, vamos falar dos objetivos
do componente curricular Ensino Religioso e, logo em seguida, iremos abordar as
competências gerais do Ensino religioso.

Num segundo momento, vamos nos ater às competências específicas do Ensino


Religioso, e vamos ainda abordar alguns autores que as comentam.

2 COMPETÊNCIAS GERAIS DO ENSINO RELIGIOSO


Vocês se lembram da parábola dos cegos e do elefante? Imagine, agora, que os
cegos tenham que estabelecer uma base comum para o ensino sobre o elefante? Essa
base comum, para a BNCC é a ciência, sendo que o Ensino Religioso é tratado como
qualquer outra disciplina do currículo escolar.

ATENÇÃO
Essa ênfase da BNCC no Ensino Religioso como ciência é polêmica, não só
porque se pode questionar se a religião pode receber tratamento científico,
mas também porque toda a discussão demonstra um pressuposto
positivista, como se a escola só pudesse ensinar ciências. Longe disso, como
vimos na Unidade 1, o conceito de educação, no sentido de Paidéia, envolve
a formação do ser humano como um todo, não apenas nos seus aspectos
demonstráveis e estudáveis cientificamente, mas também nos éticos,
estéticos e existenciais.

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Gonzalez e Dias (2022) contam a história de como a BNCC passou por várias
versões, em que ora o Ensino Religioso era vinculado ao campo das Ciências Humanas,
ora era tratado como área do conhecimento isolada, sendo que na versão final ficou
como área do conhecimento, o que foi posteriormente revisto. Houve até uma versão
em que o Ensino Religioso não foi previsto. Nessa versão que suprimia essa disciplina
também foi subtraída, devido a pressões das bancadas evangélica e católica, os
termos “identidade de gênero” e “orientação sexual”, mostrando como a discussão da
inclusividade de religião também perpassa pela inclusividade de gênero:

A exclusão do ensino religioso fez com que várias instituições se


manifestassem favoravelmente, inclusive a Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB), a qual enviou ofício ao Ministério da
Educação (MEC) solicitando o retorno dele à BNCC (MARIZ, 2017). O
Fonaper articulou a mobilização de instituições privadas, religiosas,
secretarias de educação, além de faculdades e universidades
que possuíam cursos de graduação ou stricto sensu em Ciências
da Religião para se manifestarem ao MEC pelo retorno do ensino
religioso à BNCC (GONZALEZ; DIAS, 2022, p. 200).

NOTA
Como os autores destacam, a questão da “identidade de gênero” e
“orientação sexual” permaneceu de fora da BNCC da mesma forma que o
Ensino Religioso, como já havia sido excluído o problema racial. Isso servia à
ala mais conservadora da sociedade, que pretendia monopolizar o debate e
as decisões sobre esses assuntos.

Mas, afinal, qual versão devemos seguir? Neste material, vamos analisar a versão
final que levou cinco audiências públicas, de julho a agosto de 2017, para ser aprovada.
E, após uma breve introdução, o documento sempre começa com o estabelecimento de
objetivos para cada área. No caso do Ensino Religioso, os objetivos comuns estabelecidos
pela BNCC são:

a) Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos,


culturais e estéticos, a partir das manifestações religiosas percebidas
na realidade dos educandos;
b) Propiciar conhecimentos sobre o direito à liberdade de consciência
e de crença, no constante propósito de promoção dos direitos humanos;
c) Desenvolver competências e habilidades que contribuam para o
diálogo entre perspectivas religiosas e seculares de vida, exercitando
o respeito à liberdade de concepções e o pluralismo de ideias, de
acordo com a Constituição Federal;
d) Contribuir para que os educandos construam seus sentidos
pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania
(BRASIL, 2018, p. 436).

90
No primeiro objetivo, chama a atenção à equiparação entre conhecimentos
religiosos, culturais e estéticos, sendo que a religião não é vista como fenômeno isolado,
mas atrelado à cultura e à arte. As palavras “manifestações” e “percebidas” sugerem a
adoção do método fenomenológico para o tratamento dos assuntos religiosos.

O segundo objetivo faz a ponte entre o Ensino Religioso, com seus direitos à
liberdade de expressão, estabelecidos na Constituição, e os Direitos Humanos, definidos
na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Já o terceiro objetivo fala em competências e na Constituição Federal, que diz


que deve haver pluralismo de ideias e de concepções, além do diálogo entre o secular e
o religioso. O objetivo também inclui as concepções seculares da vida, ou seja, aquelas
que negam a religião, como as de ateus, agnósticos e sem-religião.

INTERESSANTE
Até que ponto um ateu, agnóstico ou sem religião pode se interessar pelo
Ensino Religioso? Eu conheço um agnóstico que é frequentador mais fiel
do culto do que muito crente. Se o Ensino Religioso tratar com respeito e
inclusão os secularistas, e se for ministrado sem proselitismo e dogmatismo,
pode atraí-los, sim, para os conteúdos do Ensino Religioso, já que eles, como
qualquer outro ser humano do planeta, possuem a dimensão religiosa e,
portanto, se importam com os temas concernentes à religião.

Finalmente, o último objetivo fala da ética e da cidadania que está no escopo da


disciplina, atrelada a valores e o sentido da vida. Note que cabe ao educando estabelecer
este sentido como sujeito e não ser induzido externamente pelo professor para abraçar
o sentido que ele acha o melhor.

Esses objetivos demonstram como a BNCC encara a religião e seu conhecimento.


A BNCC vê o conhecimento religioso como uma confluência entre as ciências humanas
numa tentativa de dar explicação à vida e à morte e que se expressa por mitos, tradições,
ritos, doutrinas, símbolos, princípios éticos, e outras manifestações do sagrado.

A religião é vista como parte da cultura. Seu ensino não deve privilegiar
nenhuma religião específica e deve considerar inclusive interpretações seculares da
vida, principalmente no Ensino Fundamental, onde deve predominar a pesquisa e o
diálogo como meios para impedir qualquer tipo de discriminação:

No Ensino Fundamental, o Ensino Religioso adota a pesquisa e o


diálogo como princípios mediadores e articuladores dos processos
de observação, identificação, análise, apropriação e ressignificação

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de saberes, visando o desenvolvimento de competências
específicas. Dessa maneira, busca problematizar representações
sociais preconceituosas sobre o outro, com o intuito de combater a
intolerância, a discriminação e a exclusão (BRASIL, 2018, p. 436).

A interculturalidade é vista como ferramenta para o diálogo entre os integrantes


do cotidiano escolar com o intuito de estabelecer a paz e o respeito à alteridade na escola.

O Ensino Religioso busca construir, por meio do estudo dos


conhecimentos religiosos e das filosofias de vida, atitudes de
reconhecimento e respeito às alteridades. Trata-se de um espaço de
aprendizagens, experiências pedagógicas, intercâmbios e diálogos
permanentes, que visam o acolhimento das identidades culturais,
religiosas ou não, na perspectiva da interculturalidade, direitos
humanos e cultura da paz. Tais finalidades se articulam aos elementos
da formação integral dos estudantes, na medida em que fomentam a
aprendizagem da convivência democrática e cidadã, princípio básico
à vida em sociedade (BRASIL, 2018, p. 437).

A finalidade do Ensino Religioso se reflete nos objetivos e, também, destaca


a metodologia da interculturalidade, que visa a construção, através dos estudos
proporcionados pelo Ensino Religioso, de posturas de respeito a diversidade e de
tolerância. Para tanto, deve-se promover atividades e experiências de aprendizagem: “[...]
que visam o acolhimento das identidades culturais, religiosas ou não, na perspectiva da
interculturalidade, direitos humanos e cultura da paz” (BRASIL, 2018a apud GONZALEZ;
DIAS, 2022, p. 202).

Muito bem, então essas são as competências básicas do documento. E as


específicas? Quais são? Vamos analisar agora a próxima parte da BNCC.

3 COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DO ENSINO RELIGIOSO


E você poderia me perguntar, quais são as competências específicas do Ensino
Religioso, se é que podemos chamá-las de competências? De acordo com a BNCC temos:

COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DE ENSINO RELIGIOSO PARA O


ENSINO FUNDAMENTAL
1. Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes tradições/
movimentos religiosos e filosofias de vida, a partir de pressupostos
científicos, filosóficos, estéticos e éticos.
2. Compreender, valorizar e respeitar as manifestações religiosas e
filosofias de vida, suas experiências e saberes, em diferentes tempos,
espaços e territórios.
3. Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza,
enquanto expressão de valor da vida.
4. Conviver com a diversidade de crenças, pensamentos, convicções,
modos de ser e viver.

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5. Analisar as relações entre as tradições religiosas e os campos da
cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia
e do meio ambiente.
6. Debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos e
práticas de intolerância, discriminação e violência de cunho religioso,
de modo a assegurar os direitos humanos no constante exercício da
cidadania e da cultura de paz (BRASIL, 2018, p. 437).

Vamos por partes:

• Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes tradições/


movimentos religiosos e filosofias de vida, a partir de pressupostos
científicos, filosóficos, estéticos e éticos.

Essa parte da BNCC pretende garantir que o aluno conheça as diversas religiões
e seus contextos filosóficos, científicos, éticos e estéticos. Vale aqui o conhecimento e a
habilidade de pesquisa do professor, que também pode incentivar o aluno a pesquisar. O
importante nessa competência é que nenhuma religião, em particular, seja privilegiada
e todas sejam tratadas com respeito e consideração.

• Compreender, valorizar e respeitar as manifestações religiosas


e filosofias de vida, suas experiências e saberes, em diferentes
tempos, espaços e territórios.

Vale aqui novamente a pesquisa de modos de vida e manifestações religiosas


de diferentes tempos e lugares. Cabe ao professor tornar essa pesquisa interessante,
usando ferramentas da internet e das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

• Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza,


enquanto expressão de valor da vida.

O professor deve fazer a caminhada em torno de a religiosidade ser uma jornada


de autodescoberta, de descoberta do outro, dos outros e da natureza, lembrando que o
oikos, no grego, de onde vem a ecologia, é a casa comum, ou seja, o lugar de habitação
do ser humano, que deve ser respeitado como ao outro e aos outros.

• Conviver com a diversidade de crenças, pensamentos, convicções,


modos de ser e viver.

Aqui entra o pluralismo, o diálogo e a tolerância em relação ao diferente. O


professor deve ensinar o respeito ao diverso e o amor ao próximo.

• Analisar as relações entre as tradições religiosas e os campos da


cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia
e do meio ambiente.

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O professor não deve tratar a religião como um fenômeno isolado, mas como
intimamente associada a essas demais áreas da vida humana, particularmente ao meio
ambiente, já que a natureza tem valor de sagrada para várias religiões.

• Debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos


e práticas de intolerância, discriminação e violência de cunho
religioso, de modo a assegurar os direitos humanos no constante
exercício da cidadania e da cultura de paz.

O professor deve trazer à aula dados sobre a violência e intolerância religiosa e


incentivar os alunos a denunciarem e adotarem atitudes e ações contrárias a elas.

O restante da BNCC fala dos conteúdos a serem ministrados em cada série do


Ensino Básico. Segundo Gonzalez e Dias (2022), eles são organizados da seguinte forma:

Por conseguinte, a BNCC estrutura o currículo em três unidades


temáticas: identidades e alteridades; manifestações religiosas; e
crenças e filosofias de vidas. Em cada uma delas, relaciona os objetos
do conhecimento e as habilidades que o aluno deve desenvolver nas
séries escolares, do 1.º ao 9.º ano do ensino fundamental (GONZALEZ;
DIAS, 2022, p. 203).

Na análise que os autores fazem da BNCC, eles identificam que o tema


das religiões de origem africana e indígena no Brasil é tratado numa única ocasião,
reproduzindo o descaso com que tais crenças são tratadas.

Além disso, a unidade de conhecimento “Crenças religiosas e filosofias


de vida”, é a única que menciona explicitamente o desenvolvimento
de habilidade para identificar os elementos das religiões indígenas
e afro-brasileira, ciganas entre outras, proposto para o 5.º ano
do ensino fundamental. A pouca menção às religiões de matriz
africana no currículo proposto pela BNCC, revela a persistência das
desigualdades enfrentadas por essas religiões no espaço escolar
(GONZALEZ; DIAS, 2022, p. 205-206).

Os autores constatam, também, a falta da temática da identidade de gênero,


orientação sexual e relações étnico-raciais, pelo que a BNCC ignora todas as reivindicações
das entidades de classe e ONGs atuantes no país em defesa dessas questões.

Para Costa Neto (2010) o currículo da disciplina de ensino religioso


ao não contemplar de forma específica a presença das religiões
de matriz africana, desvela as relações de poder estabelecidas no
interior da escola pública brasileira. Tal situação remonta ao período
colonial e estende-se na República, no Estado Novo, na Constituição
Cidadã e na atual formação dos docentes nos cursos de licenciatura
ou bacharelado, assim como no próprio currículo da BNCC. A pouca
menção de forma específica às religiões de matriz africana no currículo
do ensino religioso proposto pela BNCC, expressa as desigualdades que
algumas manifestações religiosas, como as afro-brasileiras e indígenas,
encontram no espaço escolar (GONZALEZ; DIAS, 2022, p. 206).

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Também a distribuição das unidades temáticas dá muito mais ênfase ao tema
das crenças religiosas e filosofias de vida, sendo que o professor é convidado a se educar
para não privilegiar nenhuma crença em particular.

Ainda bem que as Diretrizes dos cursos de Ciências das Religiões já preveem
a formação do professor de Ensino Religioso, de uma maneira plural e inclusiva. Os
autores reconhecem que a BNCC já tem um pressuposto científico que dá conta da
questão da laicidade, mas que ainda está muito preocupada com a transposição de
conteúdos e pouco com o currículo oculto, que traz implícitos os conflitos de interesse
das diferentes facções religiosas no Brasil.

NOTA
Como se sabe, o currículo oculto é tudo aquilo no currículo que representa o
não-dito, aquilo que é dito “pelas beiradas e nas entrelinhas”. Se o currículo é
um rio, o currículo oculto é o que se acumula nas suas margens.

Façanha e Stephanini (2021), que fazem um histórico do Ensino Religioso na


legislação do país, discutem seus pressupostos nas Ciências humanas, especialmente
na filosofia, na sociologia, na história, na antropologia e na psicologia, sendo que o
conhecimento religioso na BNCC é respaldado pelas Ciências das Religiões:

Ainda segundo a BNCC, as Ciências da Religião foram planejadas


para realizar atividades de investigações sobre os aspectos inerentes
aos fenômenos religiosos, abordando a relação cultural e social na
composição do simbolismo, da crença, dos enigmas e da interação
entre presente e futuro e vida e morte, e outros aspectos presentes
na investigação sobre o fenômeno religioso (BRASIL, 2018 apud
FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 486).

Adotando a linguagem da BNCC, os autores preconizam que o Ensino Religioso,


que é parte da cultura e não deve se misturar com a política, coisa que algumas instâncias
religiosas promovem no Brasil, contribui para o desenvolvimento de competências do
diálogo e da tolerância:

Nessa perspectiva, a conscientização de que nenhuma tradição


religiosa é “total” e de que não existe um status de favoritismo de
religiões contribui com o desenvolvimento de competências, tais
como a tolerância religiosa, especialmente com as matrizes religiosas
africanas, visto que são as que mais são alvos de intolerância religiosa
no Brasil (FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 487).

95
Entretanto, muitas vezes, o Ensino Religioso tem seguido diretrizes autônomas e
independentes, promovendo o proselitismo e o dogmatismo. Por isso, ele foi incorporado
à BNCC e atrelado às Ciências Humanas. Os autores discordam da decisão do STF, de
declarar como constitucional o Ensino Religioso confessional, pois, na prática, como
acontece no Estado do Rio de Janeiro, ele é oferecido nas modalidades católica e
protestantes, ignorando as demais religiões e contradizendo o pluralismo religioso que
deve haver na matéria.

Eles também questionam a falta de definição da lei a respeito dos profissionais que
devem ministrar o Ensino Religioso, sendo que são admitidos padres, pastores, religiosos
e licenciados de várias Ciências Humanas ou religiosos sem formação nenhuma. Façanha
e Stephanini questionam, ainda, por que os livros didáticos do Ensino Religioso privilegiam
a religião cristã, sem que o MEC oriente o que eles devem ensinar.

Diante do exposto, é lamentável que os livros didáticos de ER ainda


apresentem o cristianismo como a principal religião com maior enfoque
ao catolicismo, reduzindo todas as outras religiões aos valores cristãos.
Além de fomentar a intolerância à diversidade sexual e religiosa, de
apresentar os movimentos neopentecostais com preconceito, de
submeterem as religiões afro-brasileiras e indígenas e de não abordarem
com seriedade o pluralismo religioso, limitam-se, no máximo, à história
e sociologia das religiões. Dessa forma, já que a decisão está tomada,
resta sinteticamente analisar o que o texto concluído na BNCC (BRASIL,
2017; 2018) sobre o componente curricular do ER traz de novidades
(FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 490).

Segundo os autores, a BNCC busca, assim, através de suas competências


específicas, “um modelo de Ensino Religioso que possa primar pela tolerância, que
eduque para a cidadania e equanimidade, evitando confundir-se com aulas de religião,
próprias de catequeses” (FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 493).

A modo de conclusão, os autores falam sobre como colocar em prática o que


preconiza a BNCC sobre o Ensino Religioso, promovendo o diálogo entre os educandos,
com os familiares e a sociedade e projetos interdisciplinares envolvendo os temas
sugeridos pela BNCC. Deve-se estimular o debate e participação das famílias e da
sociedade através de atividades que tornem o conteúdo do Ensino Religioso atraente,
promovendo a inclusão e negando o proselitismo. E concluem:

As estratégias descritas na BNCC orientam os professores de


ER a estabelecer vínculo dialogal e harmonioso e garantir uma
reciprocidade no tratamento da diversidade em suas aulas, pois ao
respeitar a diversidade religiosa pode garantir que o proselitismo
religioso não ocorra e, assim, garante-se também que o processo
de ensino-aprendizagem se dê de forma satisfatória, independente
da imparcialidade no processo avaliativo dos conhecimentos
construídos em sala de aula (FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 494).

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Outra autora, que analisa o Ensino Religioso na BNCC, Santos (2021), pondera que
a BNCC teve várias versões e surgiu a partir de debates entre docentes e especialistas
de cada área. Ela nos faz lembrar, ainda, que a instituição de uma base curricular comum
já estava prevista na Constituição e na LDB e foi seguida dos Parâmetros Curriculares
Nacionais que não mencionam o Ensino Religioso em nenhum momento. A BNCC é
anunciada ainda no Plano Nacional de Educação.

Quanto ao processo, que, ao contrário da elaboração dos PCN, foi extremamente


democrático, ela propõe o seguinte quadro-resumo:

Figura 3 – Processo de construção e avaliação da BNCC

Fonte: Santos (2021, p. 7)

A autora faz um histórico da elaboração da BNCC e suas três etapas e versões,


e conclui que ela foi a primeira proposta curricular de ampla participação dos sujeitos
envolvidos no processo e que visava dirimir as desigualdades características da realidade
educacional brasileira.

Para além do combate às desigualdades, a BNCC também objetiva


ser um projeto de sociedade. O documento propõe um modelo de
educação integral, que oferece conhecimentos variados, mas que
também promove o autoconhecimento e a alteridade, ampliando a
visão de mundo e capacitando à leitura da realidade e reconhecimento
da própria identidade cultural. Assim, pode-se afirmar que a BNCC
auxilia na transformação da sociedade, promovendo um viés mais
democrático (NEIRA; ALVIANO JÚNIOR; ALMEIDA, 2016 apud
SANTOS, 2021, p. 7).

97
Uma característica típica da BNCC é a sua ênfase nas competências, refletindo as
pesquisas mais recentes na área de educação. Quanto ao Ensino Religioso, ele foi incluído
nas Ciências Humanas na primeira e na segunda versão da BNCC, mas é dado tratamento
especial na terceira, o que, de acordo com a autora, é problemático, já que o Ensino
Religioso não é visto como parte do campo das Ciências Humanas, mas como área de
conhecimento, contradizendo as primeiras duas versões da BNCC, conforme ela explica:

Percebe-se, portanto, que a retirada do Ensino Religioso da área de


Ciências Humanas representou uma limitação da previsão de diálogo.
Com os conteúdos unidos sob uma mesma área, e compartilhando
objetivos de aprendizagem, a influência da religião na construção de
sentidos individuais e coletivos, necessariamente, deveria colaborar
para o trabalho realizado em prol da compreensão do ser humano,
dos processos sociais e das instituições. Ao criar uma área específica
para o Ensino Religioso, a versão final da BNCC (BRASIL, 2018)
afasta a discussão sobre o fenômeno religioso desse processo. Tal
opção curricular empobrece as Ciências Humanas, ao lhe eximir da
discussão sobre a influência do fenômeno religioso na sociedade;
sobrecarrega o Ensino Religioso, ao lhe impor discussões que seriam
mais adequadas à Geografia ou História; e limita o trabalho docente,
posto que áreas distintas não compartilham objetivos específicos de
aprendizagem (SANTOS, 2021, p. 9).

A mesma resolução de 2017, que oficializa a BNCC, cria a possibilidade de o Ensino


Religioso voltar para a área de Ciências Humanas, o que foi efetivado em 2019, quando ele:

deixa de ser área de conhecimento, e passa, enquanto conteúdo


curricular, a integrar as Ciências Humanas (BRASIL, 2019a; 2019b).
Caso essa decisão tivesse sido tomada antes da homologação
da BNCC, teria sido possível adotar uma redação mais próxima
à 2ª versão da Base, mantendo os benefícios de um diálogo mais
aproximado entre o Ensino Religioso e as demais Ciências Humanas.
Resta, portanto, questionar como se dará esse intrcâmbio (sic) entre
os conteúdos nas futuras revisões da BNCC (SANTOS, 2021, p. 9).

ATENÇÃO
O fato de o Ensino Religioso ter sido considerado área de conhecimento e não
parte das Ciências Humanas tem várias implicações. Primeiro, que as decisões
em torno dele passam a ser assumidas por entidades religiosas e não, pela
ciência. Segundo, destrói as possibilidades de interdisciplinaridade com outras
disciplinas curriculares. E, finalmente, faz do Ensino Religioso um “estranho no
ninho” do qual ninguém tem motivação de participar, pois, de acordo com os
positivistas, tem pouca ou nenhuma utilidade na formação do aluno.

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Felizmente, nem todas as questões em torno do Ensino Religioso na BNCC são
tão polêmicas, mas, apesar de haver uma unanimidade entre as versões da BNCC sobre
o objeto do Ensino Religioso, que seria o conhecimento religioso, não há um consenso
sobre o significado disso, da mesma forma que acontece com as Ciências Humanas, o
que tem a vantagem de elas serem adaptáveis às diferentes realidades.

Quanto às concepções de Ensino Religioso nas diferentes versões da BNCC, a


autora propõe o seguinte:

Figura 4 – Comparação entre as versões do texto sobre Ensino Religioso


na Base Nacional Comum Curricular

Fonte: Santos (2021, p. 10)

O fato de a versão final se basear sobre pressupostos científicos e éticos pode


refletir um esforço por amenizar o caráter confessional com que a área vinha sendo
tratada ao longo dos anos e imprimir-lhe um caráter mais neutro. A autora, então, entra
numa discussão acerca da falta de menção na BNCC da questão da laicidade do Ensino
Religioso, o que ela atribui ao pressuposto não dito do Fonaper, que trabalha com ele há
décadas. Contudo, ela acredita que essa discussão deve entrar em versões futuras da
BNCC, já que nem todos compartilham dos pressupostos do Fonaper e eles precisam
ser explicitados.

Também não há uma continuidade entre os objetivos e pressupostos do Ensino


Religioso nas três versões da BNCC, sendo que a terceira o aproxima das Ciências das
Religiões, o que pode ressaltar o seu caráter científico.

99
Cabe observar que a definição apresentada pelas primeira e segunda
versões da BNCC (BRASIL, 2015a, 2016a) não consideram o Ensino
Religioso uma transposição didática das Ciências da Religião
(JUNQUEIRA, 2013), mas uma abordagem diferenciada dos temas
que serão trabalhados pelas Ciências Humanas. A terceira versão do
texto (BRASIL, 2018) demarca as Ciências da Religião como espaço
preferencial de produção do conhecimento. A definição de uma ciência
como referência pode ser considerada um ganho para o conteúdo,
uma vez que lhe demarca a identidade e a validação científica. E, em
certa medida, lhe provê um espaço de construção do conhecimento
separado dos outros conteúdos que integram as Ciências Humanas
– o que é, no mínimo, irônico, posto que para a CAPES as Ciências da
Religião integram a Grande Área de Ciências Humanas (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2018c apud SANTOS, 2021, p. 11).

Em suma, portanto, a BNCC poderia seguir a classificação de áreas científicas


da CAPES, que subordina a religião e a teologia às Ciências Humanas. Quanto às
competências específicas do Ensino Religioso, a autora faz um paralelo com os objetos
de conhecimento e habilidades por unidade temática como vemos a seguir:

Figura 5 – Objetos de conhecimento e habilidades por unidade temática

Fonte: Santos (2021, p. 13)

Analisando a frequência e uso de verbos para essas unidades temáticas ao


longo das séries do Ensino Fundamental, a autora chega à seguinte conclusão:

De fato, a escolha dos redatores quanto ao estabelecimento de uma


trajetória de desenvolvimento que parte do reconhecimento pessoal
à análise do fenômeno, bem como a adoção de um vocabulário que
denota um posicionamento crítico do educando enfatizam a opção
não-confessional (sic) dessa proposta pedagógica. Para além disso,
acrescente-se que não apenas as crenças religiosas, mas também as
filosofias de vida – como, por exemplo, o ateísmo e o agnosticismo –
são contempladas pela BNCC. Esta característica supera à (sic) antiga
crítica feita aos modelos transconfessionais e interconfessionais
do Ensino Religioso (DANTAS, 2004), que validavam o pensamento
religioso em detrimento das filosofias de vida (SANTOS, 2021, p. 14).

Esse posicionamento reflete a orientação não confessional da Constituição, da


LDB e do Plano Nacional da Educação, formando, assim, uma coerência entre a BNCC e
as demais leis que orientam o Ensino Religioso no país.

100
A autora conclui que os documentos oficiais concordam que o Ensino Religioso
contribui para a formação do indivíduo para a cidadania e para uma presença da religião
de forma mais inclusiva na sociedade, que combata toda forma de violência e que seja
diversa e respeitosa das diferenças. Assim, o Ensino Religioso se mostra benéfico desde
que seja de uma maneira não confessional, como querem as manifestações populares
em torno do Ensino Religioso:

A presença do Ensino Religioso na BNCC e na educação pública tem


por principais pontos positivos a discussão sobre a busca de sentido
(religioso ou não) para construção da identidade e projeto de vida dos
educandos, a contemplação da diversidade de possibilidades, e seu
reconhecimento como igualmente válidas. Nesses aspectos, e não
no confessionalismo, deve se embasar a oferta de Ensino Religioso
na escolarização pública (SANTOS, 2021, p. 15).

ATENÇÃO
Podemos concluir que a BNCC representa um avanço nas discussões em
torno do Ensino Religioso, pois, mesmo ele sendo ainda confessional em
vários Estados do Brasil, preconiza um ensino que vai além das aulas de
religião catequéticas, que promova o diálogo, o pluralismo e o respeito
às diferentes religiões. Entretanto, ainda não se tem um mecanismo para
garantir o não proselitismo e a efetiva inclusão de todas as religiões no
diálogo a respeito do currículo, que é uma prerrogativa dos movimentos
sociais e das entidades como a Assintec e o Fonaper de promoverem.

101
102
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• A BNCC como documento orientador das práticas pedagógicas de sala de aula.

• A BNCC busca através de suas competências específicas, “um modelo de Ensino


Religioso que possa primar pela tolerância, que eduque para a cidadania e
equanimidade, evitando confundir-se com aulas de religião, próprias de catequeses”
(FAÇANHA; STEPHANINI, 2021, p. 493).

• Os documentos oficiais concordam que o Ensino Religioso contribui para a formação


do indivíduo para a cidadania e para uma presença da religião de forma mais inclusiva
na sociedade, que combata toda forma de violência e que seja diversa e respeitosa
das diferenças.

• O currículo oculto é tudo aquilo no currículo que representa o não-dito, aquilo que é
dito “pelas beiradas e nas entrelinhas”.

• A BNCC passou por várias versões, em que ora o Ensino Religioso era vinculado ao campo
das Ciências Humanas, ora era tratado como área do conhecimento isolada, sendo que
na versão final ficou como área do conhecimento, o que foi posteriormente revisto.

• Valorizar o pluralismo e o diálogo como formas de combater o proselitismo até mesmo


no ensino confessional.

• O fato da BNCC já absorver grande parte do debate em torno do Ensino Religioso,


como a questão da diversidade e da inclusão de todas as religiões no conteúdo
programático. Todavia, ainda não se tem garantias quanto ao não proselitismo, coisa
que fica para as entidades que lutam pelo pluralismo no Ensino Religioso promoverem.

103
AUTOATIVIDADE
1 Dentre os objetivos comuns estabelecidos pela BNCC para o Ensino Religioso, o
primeiro, chama a atenção à equiparação entre conhecimentos religiosos, culturais
e estéticos, sendo que a religião não é vista como fenômeno isolado, mas atrelado à
cultura e à arte Quanto ao que a BNCC estabelece sobre o Ensino Religioso, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) A BNCC preconiza que o Ensino Religioso deve ser confessional em todo o país.
b) ( ) A BNCC diz que o Ensino Religioso deve ser de frequência obrigatória para os alunos
das escolas públicas de todo o país.
c) ( ) A BNCC diz que a avaliação da disciplina Ensino Religioso é válida e pode redundar
em aprovação ou reprovação do aluno da escola pública de todo o país.
d) ( ) A BNCC diz que o Ensino Religioso deve ser pluralista e que deve promover o diálogo
entre as alteridades e religiões de todo o país, de forma inclusiva e solidária.

2 A BNCC vê o conhecimento religioso como uma confluência entre as ciências humanas


numa tentativa de dar explicação à vida e à morte e que se expressa por mitos, tradições,
ritos, doutrinas, símbolos, princípios éticos, e outras manifestações do sagrado. Diante
disso, analise as sentenças a seguir:

I - Um dos objetivos do Ensino Religioso na BNCC é que ele seja atrelado a valores e
princípios éticos, além da cidadania, pela qual é associado aos direitos humanos.
II - Um dos objetivos do Ensino Religioso é promover o cristianismo, particularmente o
católico, como religião mais qualificada para cuidar da formação moral dos educandos.
III - Um dos objetivos do Ensino Religioso é contribuir para o diálogo entre os que creem em
diversas religiões, incluindo aqueles que não seguem nenhuma.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A interculturalidade é vista como ferramenta para o diálogo entre os integrantes do


cotidiano escolar com o intuito de estabelecer a paz e o respeito à alteridade na
escola. Diante do que preconiza a BNCC, classifique V para as sentenças verdadeiras
e F para as falsas:

104
( ) Na versão final da BNCC, a religião, que é o objeto do Ensino Religioso, não é classificada
como ciência, sendo que recebe um tratamento diferenciado no currículo que é
proposto para as escolas.
( ) É preciso que os professores sejam treinados em cursos de capacitação para que
ponham em prática o que é proposto para o Ensino Religioso na BNCC.
( ) A BNCC preconiza um Ensino Religioso emancipador, capaz de formar o cidadão crítico
consciente, que escreve sua própria história.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) V – V – V.
d) ( ) F – F – V.

4 A última versão da BNCC (2018) trata o Ensino Religioso como área de conhecimento e
não ciência humana. Disserte sobre as dificuldades que isso pode trazer para o campo e
para a legitimidade do Ensino Religioso no currículo escolar.

5 Os objetivos da BNCC falam em inclusão das visões de mundo secularistas. Disserte sobre
a possibilidade de um ateu, agnóstico ou sem-religião interessar-se pelos conteúdos do
Ensino Religioso.

105
106
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
INSTITUIÇÕES DE PROMOÇÃO
DO ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, para começar, vou contar uma história da sabedoria budista,
chamada “reconhecendo o verdadeiro valor”:

Havia dois povos divididos por um rio, que irrigava a cultura de ambas as
comunidades. Certo dia, houve uma seca e a água não dava mais para irrigar a terra de
todos. Assim, os povos começaram a brigar entre si, até declararem guerra.

O Buda resolveu, então, fazer uma visita, e perguntou para os líderes de ambos
os povos o que era mais precioso para eles: o sangue dos seus súditos ou a água do
rio. Ambos concordaram que o mais valioso era o sangue do povo. Portanto, concluiu
o Buda, não vale a pena colocar em risco uma coisa mais valiosa por uma, menos. Foi
assim que os povos resolveram fazer as pazes e dividir a água até que, no ano seguinte,
voltou a chover e houve água suficiente para todos.

Essa história mostra a importância dos valores de uma sociedade e da capacidade


de estabelecer uma hierarquia entre eles. A tomada de decisões é influenciada pelos
valores e por aquilo que valorizamos. Saber dar mais valor ao ser humano do que às
coisas materiais é outra lição da parábola.

A história também nos leva a refletir que a coletividade é mais importante do


que o indivíduo e que saber esperar e ter paciência é uma arte que pode levar ao ganho
para todos. Muitos problemas se resolvem por si mesmos, tendo paciência de aguardar
pela sua solução.

DICA
Veja essa e mais histórias budistas em: http://www.maisbelashistoriasbudistas.
com/historia.htm. Acesso em 25 mar. 2023.

107
Essa história se aplica à relação entre as religiões, que muitas vezes guerreiam
entre si, pois não vale a pena aplicar a violência em nome de um Deus justo e bondoso.
Isso é, até mesmo, contraditório. Devemos usar da solidariedade para dividir o poder até
que ele seja suficiente para todas as partes interessadas.

Essa divisão de poder acontece, nas sociedades democráticas, através das


entidades da sociedade civil, das entidades de classe e dos movimentos sociais, que
têm um importante papel de controle e equilíbrio do poder nas diversas esferas políticas.

No caso do Ensino Religioso, ele ficou por conta da Igreja Católica Apostólica
Romana desde a época da Colônia até recentes dias, em que entidades se mobilizaram
para contribuir ao debate do Ensino Religioso, como a Assintec, de origem religiosa, à
qual vamos nos dedicar no próximo item.

Já no item final, vamos falar do Fonaper, que tem um cunho mais acadêmico e
é formado por professores e especialistas da área, com várias vinculações religiosas ou
nenhuma. É importante, nesse percurso, você entender que a sociedade não é dirigida
apenas por forças políticas oficiais e externas, distantes do nosso dia a dia e que vêm
de cima para baixo, mas também por movimentos que vêm diretamente do povo e que
tentam contrabalançar as forças que tradicionalmente ditam as regras do jogo político.

Vamos lá?

2 ASSINTEC

Figura 6 – Pluralismo Religioso

Fonte: Assintec (2023, p. 3)

A Associação Inter-religiosa de Educação (Assintec), como o próprio nome


diz, visa ao intercâmbio entre as religiões em torno da educação. Seu caráter não é
confessional, mas inter-religioso, ou seja, envolve e diz respeito a todas as religiões.

108
Para se descobrir algo sobre uma instituição, nada como começar com o que
ela fala de si mesma. Segundo o site da Assintec (2023a), essa é uma “Entidade civil de
caráter educativo e cultural” com sede em Curitiba, que foi fundada oficialmente em 2
de janeiro de 1973, em decorrência dos esforços do grupo ecumênico de Curitiba, ligado
à Igreja Católica Apostólica Romana. A data comemora o convênio da entidade com
a Secretaria Estadual de Educação do Paraná e a Secretaria Municipal de Educação
de Curitiba. Ela passou por várias fases e, hoje, tem por missão promover “o Ensino
Religioso, o diálogo inter-religioso e o respeito às diferenças culturais e religiosas.” Ela

surgiu como entidade ecumênica, a fim de superar o modelo


catequético do Ensino Religioso e mais tarde passou a enfatizar o
trabalho pedagógico focado em valores humanos, isto na década
de 90. Atualmente é uma associação inter-religiosa, com foco no
trabalho sobre o conhecimento religioso acumulado e produzido
historicamente pela humanidade. A Assintec é uma entidade civil
de caráter educacional que atua em parceria como poder pública
na efetivação do Ensino Religioso nas escolas do Paraná, e no apoio
pedagógico aos professores desta área do conhecimento (ASSINTEC,
2023a, s. p.).

A entidade oferece cursos e assessorias, além de servir de consultora para os


órgãos oficiais do governo para assuntos de sua competência. Ela também participa
de materiais didáticos e de formação de professores e organiza seminários, além do
informativo semestral que ela pública sobre vários temas ligados ao Ensino Religioso.

Eis a sua “Carta de Princípios” (ASSINTEC, 2005, s. p.), que é uma declaração de
intenções e valores, os quais comentaremos a seguir:

• Existimos como entidade civil livre, aberta, equitativa e democrática.

A razão de ser da associação está atrelada aos valores da igualdade, da liberdade


e da democracia, refletindo os ideias iluministas e pós-modernos, colocando-se na
vanguarda das iniciativas sociais.

• Reconhecemos a universalidade e diversidade do fenômeno religioso.

Além de aderir à metodologia da fenomenologia, a Assintec declara a adesão a


uma concepção de religião universalista e pluralista.

• Defendemos o princípio da livre determinação da identidade religiosa


de todo o ser humano sem pressão ou coerção de qualquer espécie.

Aqui é declarada a liberdade individual para a escolha da religião e que ninguém


tem o direito de pressionar outrem a aderir a sua persuasão religiosa.

109
• Nenhum indivíduo será discriminado, constrangido ou censurado
por causa de sua Fé, de suas crenças ou práticas religiosas.

A não discriminação por motivos de religião aproxima da Carta de Princípios à


Declaração de Direitos do Homem da ONU e seu combate ao preconceito de todo tipo.

• Preconizamos o diálogo inter-religioso como meio eficaz de manter o


espírito de respeito e reverência entre todas as tradições religiosas.

Não é só o indivíduo que tem liberdade religiosa, mas também os grupos, que
devem dialogar entre si e não guerrear para chegarem a pontos comuns de luta por uma
sociedade mais igualitária e justa.

• Objetivamos o cumprimento das leis que regulam o Ensino Religioso


nas escolas públicas do Brasil.

Aqui a Carta se mostra condizente com a regulamentação da parte do Estado


no que diz respeito ao Ensino Religioso e não a esta ou aquela tradição religiosa, numa
postura claramente não confessional e laicista.

• Reconhecemos que os conteúdos do Ensino Religioso devem ser


tratados como um sistema de conhecimentos indispensáveis ao ser
humano presentes nas diferentes tradições religiosas, de origem
cultural indígena, afrodescendente, oriental e ocidental.

Nesse ponto, a Carta mostra sua consciência e valorização das diferentes


matrizes culturais e religiosas presentes no Brasil e a afirmação da relevância dos
conteúdos ministrados no Ensino Religioso para a formação do ser humano.

• Evitamos qualquer forma de proselitismo no âmbito educacional.

Mais uma vez, a Carta mostra harmonia com a legislação, que na LDB 93934/96
proíbe qualquer forma de proselitismo.

• Contribuímos para que o Ensino Religioso seja mais um instrumento na


construção de um mundo melhor, inspirando cultura de paz e justiça.

A Assintec declara a intenção e missão do Ensino Religioso que é fomentar um


mundo melhor e a paz e justiça mundial.

110
Então, claramente a instituição quer promover todos os valores até aqui
defendidos por nós quanto ao pluralismo e o diálogo inter-religioso e, por outro lado,
foca na questão do Ensino Religioso. Mas de onde surgiram esses valores? Surgiram
de atividades isoladas de cunho filantrópico e religioso. Foi nesse contexto, numa
campanha de combate à fome, que surgiu a ideia da Assintec:

A ideia desta Associação surgiu durante uma campanha de donativos


para as crianças pobres, nas escolas públicas. Esta proposta era
justificada com o argumento de que não bastava atender a criança
carente em suas necessidades de alimentação, mas também favorecer
sua dimensão religiosa. Então, desde sua fundação a Assintec se
ocupou com a elaboração de material pedagógico e com a orientação
e formação continuada dos professores (ASSINTEC, 2023b, p. 8).

Historicamente, de acordo com os articuladores das Diretrizes Curriculares da


Educação Básica: Ensino Religioso, a primeira missão da Assintec, em 1973, em parceria
com a SEE, foi a criação de um programa radiofônico e material didático para cursos de
formação continuada em parceria com a SEED e a Prefeitura de Curitiba:

O resultado desse trabalho foi o Programa Nacional de Tele Educação


(Prontel), elaborado em 1972, que propôs a instituição do Ensino
Religioso radiofonizado nas escolas municipais. […] O conteúdo
veiculado pelo sistema radiofônico teve como foco curricular as
aulas de ensino moral-religioso nas escolas oficiais de primeiro grau.
Em 1973, foi firmado um convênio entre a SEED e a Assintec, com
a proposta de implementar um Ensino Religioso interconfessional
nas escolas públicas de Curitiba. No mesmo ano, a SEED designou
a entidade como intermediária entre a Secretaria e os Núcleos
Regionais de Educação, nos quais foi instituído o Serviço de Ensino
Religioso para orientar a proposta curricular da disciplina (ESTADO DO
PARANÁ, 2008, p. 41).

Na edição comemorativa de 40 anos da Assintec, em 2013, ficamos sabendo


das atividades da instituição, com participação dos eventos periódicos: “Arte e
Espiritualidade, Diálogo Inter-religioso, Jornada de Ensino Religioso, Compartilhando
Experiências (SME), Simpósio de Ensino Religioso (SEED) e as Visitas Técnicas aos
Locais Sagrados” (ASSINTEC, 2023b, p. 3).

É uma pena que essas atividades muitas vezes são restritas ao Estado do
Paraná e à cidade de Curitiba. O informativo traz ainda o depoimento de pessoas que,
de uma forma ou de outra, usufruíram das atividades da Assintec e tiveram sucesso em
suas carreiras na área do Ensino Religioso.

Nota-se que os protagonistas associados da Assintec amadureceram em suas


ideias sobre religião junto com a instituição. No histórico elaborado pela equipe, eles
admitem que a Assintec nem sempre esteve na vanguarda da evolução do Ensino
Religioso no Brasil, tendo ela mesma, se desenvolvido de confessional para inter-
religiosa. Até a década de 60, o ensino era ministrado por leigos e voluntários, que

111
praticavam uma educação proselitista e dogmática, apesar desse modelo, na época, já
ter sido questionado pela sociedade pluralista. Contudo, a falta de regulamentação e de
cursos de licenciatura para professores de Ensino Religioso fez com que as entidades
religiosas ditassem as regras.

Em 1972, inaugura-se o já mencionado projeto de ensino religioso radiofônico


pelo Prontel e as aulas passaram a ser transmitidas por todo o Estado. O programa se
tornou uma referência nacional e até internacional. No mesmo ano, criou-se o “Centro
Interconfessional de Educação” em Curitiba para a formação de professores para o
Ensino Religioso e se conseguiu a doação de rádios que foram distribuídos nas escolas.

Em 1975 a Assintec foi declarada como instituição de utilidade pública. No ano


seguinte, foram autorizados cursos de atualização para professores, ainda no modelo
confessional cristão, para aprofundamento bíblico, bem como as apostilas “Crescer em
Cristo” com o mesmo intuito.

Com o tempo, as aulas radiofônicas foram sendo substituídas pelas dos


professores, agora devidamente treinados e, nos anos de 1980, elas passaram a não
mais servir para transmitir conteúdos religiosos, que ficariam a cargo dos professores,
mas apenas para servir de estímulo às aulas.

Em 1981 foram distribuídas gratuitamente Bíblias nas escolas. Nessa época


criaram-se vários outros programas de rádio e iniciativas de formação continuadas
como o “I Simpósio de Educação Religiosa” (8 a 11 de dezembro de 1986) no CETEPAR
(Centro de Treinamento de Professores do Estado do Paraná).

No ano de 1987 tem início o curso de Especialização em Pedagogia


Religiosa, realizado pela Assintec e oferecido aos professores de 5ª a
8ª séries e 2º grau, com carga horária de 360 h/a, numa parceria da
SEED, Assintec e PUC/PR, voltada à formação para os professores
interessados em ministrar aulas de Ensino Religioso (ASSINTEC,
2023b, p. 9).

Por ocasião da constituinte, a Assintec, junto com outras associações,


encaminhou a primeira proposta popular ao governo, contando com assinaturas e
defendendo o fim do modelo catequético e do proselitismo.

No Estado do Paraná, a Assintec esteve envolvida em todas as propostas


curriculares do Ensino Religioso daí em frente. Mas isso, ao invés de ajudar, foi um
movimento de transferência de responsabilidade do governo para as instituições
religiosas. E aí entra em cena o Fonaper:

Mais uma vez, identifica-se o esvaziamento do papel do Estado em


relação ao Ensino Religioso. Retoma-se, na prática, a compreensão
de que a definição do currículo da disciplina é responsabilidade das

112
tradições religiosas e evidencia-se ainda o distanciamento do Ensino
Religioso das demais disciplinas escolares.
Cumpre destacar que, desde 1995, os debates instaurados pelo Fórum
Nacional Permanente do Ensino Religioso – Fonaper, constituído por
um grupo de educadores ligados às escolas, entidades religiosas,
universidades e secretarias de educação, permitiam rever e avaliar
os aspectos relativos ao Ensino Religioso, trazendo para o debate
a diversidade cultural e religiosa brasileira, bem como buscando
encaminhamentos para uma nova forma curricular desta disciplina
(ASSINTEC, 2023b, p. 9-10).

Mesmo com a promulgação da Constituição Cidadã e da LDB 9.394/96, os


debates não cessaram e se encaminharam três propostas de mudanças ao Artigo 33 da
LDB, que redundaram na já analisada Lei 9.475/97.

O informativo menciona ainda os PCN para o Ensino Religioso elaborado pelo


Fonaper e não menciona a BNCC, pois é de antes de sua criação. Os articulistas do
boletim concluem que, na época, a Assintec já era pluralista, contando com membros
representantes de várias vertentes religiosas, com uma equipe formada em Ensino
Religioso, e tinha a finalidade de assessorar a “I Simpósio de Educação Religiosa” (8 a 11
de dezembro de 1986) no CETEPAR (Centro de Treinamento de Professores do Estado
do Paraná), além de várias prefeituras do Estado do Paraná.

Mas o que dizer da outra instituição, agora de caráter realmente inter-religioso e


científico, o Fonaper? Vamos analisá-lo a seguir.

3 FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO


(Fonaper)
Para entendermos melhor o Fonaper, que tal usarmos a mesma estratégia que
usamos com a Assintec, consultando o que ele diz dele mesmo no seu site? E diz o seguinte:

O Fonaper é uma associação civil de direito privado, de âmbito


nacional, sem vínculo político-partidário, confessional e sindical, sem
fins econômicos, que congrega, conforme seu estatuto, pessoas
jurídicas e pessoas naturais identificadas com o Ensino Religioso,
sem discriminação de qualquer natureza (FONAPER, 2023, s. p.).

Seu objetivo é auxiliar na efetivação do Ensino Religioso nas escolas através


da discussão e concatenação de ideias de especialistas e pessoas interessadas que
formem propostas concretas de ação. Formado em 1995, em Florianópolis/SC, o Fonaper
tem uma razão de ser bem definida:

Segundo Giumbelli (2010), o Fonaper procurou estabelecer a


compatibilidade entre a laicidade e o ensino religioso na escola
pública, com a diferenciação entre uma visão catequética,

113
entendida como princípios e condutas de religiões específicas, e o
conhecimento religioso, passível de transmissão pela escola. Em
virtude da ausência de uma legislação nacional, o Fonaper passou
a ter atuação destacada na regulamentação do conteúdo do ensino
religioso, inclusive na inclusão do ensino religioso na Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) (GONZALEZ; DIAS, 2022, p. 196).

Quanto ao seu histórico ainda, o site do Fonaper informa que a entidade foi
instalada em 1995, por ocasião da 29ª assembleia do CIER (Conselho de Igrejas para o
Ensino Religioso), uma instituição ecumênica de 25 anos de existência, que contou com
a presença de 42 instituições religiosas e educacionais. Foram colhidas sugestões para a
Carta de Princípios do Fonaper e criou-se uma comissão para redigir e aprovar a mesma.
Ela se centra no direito do aluno a um Ensino Religioso aberto para o transcendente e na
reflexão livre, sem descriminações. A Carta diz o seguinte:

1. Garantia que a Escola, seja qual for sua natureza, ofereça Ensino
Religioso ao educando, em todos os níveis de escolaridade,
respeitando as diversidades de pensamento e opção religiosa e
cultural do educando;
2. Definição junto aos Sistemas de Ensino do conteúdo
programático do Ensino Religioso, integrante e integrado às
propostas pedagógicas;
3. Contribuição para que o Ensino Religioso expresse sua vivência
ética pautada pela dignidade humana;
4. Exigência de investimento real na qualificação e capacitação de
profissional para o Ensino Religioso, preservando e ampliando
as conquistas, de todo magistério, bem como garantindo
condições de trabalho e aperfeiçoamentos necessários.
(FONAPER, 2023, s. p.)

Como se pode ver, há uma clara intenção da entidade de participar da definição


do currículo e da formação de professores para o Ensino Religioso. A Carta se caracteriza

[…] como um espaço pedagógico que visa a garantir o direito do


educando em conhecer e valorizar a diversidade do fenômeno
religioso enquanto substrato cultural e patrimônio da humanidade,
bem como dar lugar para reflexões e propostas de encaminhamentos
para a implementação do ER sem discriminação de qualquer natureza
(FONAPER, 2023, s. p.).

Além dos PCNER, a instituição escreveu Cadernos Temáticos de apoio à


implantação do Ensino Religioso nas escolas. No primeiro, que visava complementar
os PCNER, afirma-se o Ensino Religioso como parte da formação cidadã e combate-se
qualquer forma de proselitismo ou discriminação.

Os doze Cadernos Temáticos seguintes foram escritos para um curso à


distância, denominado “Ensino Religioso: capacitação para um novo milênio.” Neles
defende-se o compromisso da escola em dar acesso aos conhecimentos sociológicos,

114
epistemológicos e históricos associados ao Ensino Religioso e às práticas religiosas,
sem privilegiar nenhuma religião em particular. Neles ainda, se lançam os fundamentos
do Ensino Religioso adaptados à legislação em vigor. O texto do site conclui que:

Nessa trajetória em busca da construção de um outro paradigma para


o ER, destaca-se a ousadia do Fonaper em buscar outros olhares,
perspectivas e desafios, integrando a diversidade cultural religiosa
presente na sociedade e na escola brasileira (FONAPER, 2023, s.p.).

Com base nos seus princípios, o Fonaper foi atuante nesses mais de 25 anos
de existência, com um papel essencial, por exemplo, nos debates sobre o Acordo
Brasil-Santa Sé (2009), e na formulação da BNCC. Inclusive, ele mobilizou a sociedade
para a inclusão do Ensino Religioso na BNCC, contatando e acionando “instituições
privadas, religiosas, secretarias de educação, além de faculdades e universidades que
possuíam cursos de graduação ou stricto sensu em Ciências da Religião” (GONZALEZ;
DIAS, 2022, p. 200).

De acordo com Santos (2021, p. 3), o Fonaper surgiu da união de várias


organizações e iniciativas sociais em torno do Ensino Religioso. Especialmente a partir
dos anos de 1970,

várias entidades foram criadas para discutir o assunto, como o


Conselho de Igrejas para a Educação Religiosa – CIER, em 1970;
Ensino Religioso das Escolas Públicas – EREP, em 1972; Associação
Inter-Religiosa de Educação – Assintec, em 1973; e a Comissão
Interconfessional para o Ensino Religioso – CIERES, em 1975 […]
(JUNQUEIRA, 2002 apud SANTOS, 2019, p. 70).

A sua principal missão foi a de criar Parâmetros para o Ensino Religioso logo
após a promulgação da LDB 9.394/96, de forma a acabar com o ensino proselitista e
dogmático, transformando o Ensino Religioso em uma disciplina do currículo, como
todas as outras. Segundo Toledo e Amaral (2005), o objetivo do Fonaper foi de combater
o sentido proselitista do Ensino Religioso, desvinculando-o da Igreja Católica e assim,
solucionando o impasse da inconstitucionalidade do Estado laico oferecendo ensino
confessional e assim também o do ônus aos cofres públicos.

Esses parâmetros foram utilizados ainda para orientar a revisão da redação do


Artigo 33 da LDB, pois os articulistas do Fonaper eram contra o modelo confessional
e interconfessional que eram admitidos na lei, acreditando que eles não mais se
aplicassem à realidade do país.

De acordo com Santos (2021, p. 10-11), a existência do Fonaper pode estar ligada
à falta de discussão da questão da laicidade na BNCC, talvez porque a questão estava
resolvida para os integrantes do Fonaper, como explica o autor:

115
Conclui-se, portanto, que os redatores optaram por não levar a
discussão sobre o conceito de laicidade para o documento – embora
não tenham, em nenhum momento, feito afirmações contraditórias
sobre essa premissa. Por ocasião de futuras revisões da BNCC, seria
importante inserir essa discussão. Em primeiro lugar, porque ajuda
o leitor a compreender os objetivos do Ensino Religioso. Depois,
porque o desenvolvimento epistemológico que se espera para o
conteúdo poderá alimentar outras correntes teóricas, e as premissas
do Fonaper podem deixar de ser hegemônicas em nosso país.

Vamos analisar, agora, o documento que o Fonaper ajudou a criar: os PCN de ER.

3.1 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O


ENSINO RELIGIOSO – FONAPER
Por que houve necessidade da criação de PCNs específicos para o Ensino
Religioso? É que os PCNs das demais disciplinas simplesmente deixaram de lado pensar
os parâmetros para o Ensino Religioso. Então, as instituições civis como o Fonaper
tiveram que tomar a iniciativa.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER) formam


um marco na orientação oficial do Ensino Religioso nas escolas do Paraná e do Brasil.
Neles, em resumo, é dito que a religião é uma área que faz parte da cidadania do
indivíduo, e, portanto, é um direito.

Afirma-se ainda que não se deve ensinar práticas e regras de comportamento no Ensino
Religioso, pois elas fazem parte das religiões específicas. E que, como todo conhecimento, ele
se constrói no diálogo com outros saberes, sendo, por excelência, interdisciplinar.

A religião busca responder a questões existenciais que tangem o mistério e o


transcendente, principalmente aquelas relativas à morte:

O conhecimento resulta das respostas oferecidas às perguntas


que o ser humano faz a si mesmo e ao informante. Às vezes para
fugir à insegurança, resgatando sua liberdade, ele prefere respostas
prontas, que apaziguam a sua ansiedade. A raiz do fenômeno
religioso encontra-se no limiar dessa liberdade e dessa insegurança.
O homem finito, incluso, busca fora de si o desconhecido, o mistério:
transcende.

Esse fenômeno religioso é a busca do Ser frente à ameaça do Não-ser.


E, a humanidade tem quatro respostas possíveis como norteadoras
do sentido da vida além morte: a ressurreição, a reencarnação, o
ancestral e o nada. (VIESSER, 1997, s.p.)

As diferentes religiões organizam-se de acordo com essas respostas ao sentido


da vida e à morte e dão o colorido da diversidade religiosa ao mundo e particularmente ao
Brasil. Os PCNER estabelecem “eixos organizadores para os blocos de conteúdo [que] são:
Culturas e Religiões, Escrituras Sagradas, Teologias, Ritos, Ethos” (VIESSER, 1997, s.p.).

116
Em “culturas e tradições religiosas” são estudadas as tradições religiosas e suas
explicações para a existência humana, sua ética, sua teodiceia, tradições naturais e
reveladas, a partir da confluência entre filosofia, história, psicologia e sociologia nas
tradições religiosas, sem que se delimite “de maneira absoluta e definitiva um critério
epistemológico unívoco” (VIESSER, 1997, s.p.).

Já as “Escrituras Sagradas e/ou tradições orais” são os registros escritos e orais


de verdades reveladas sobre os vários temas ligados às religiões, como a vida e a morte,
e os dogmas que tratam dos mistérios que se respondem de forma transcendental.
Verdades essas que perfazem e se transmite através das tradições. E elas estão ligadas:

ao ensino, à pregação, à exortação e aos estudos eruditos.


Contém a elaboração dos mistérios e da vontade manifesta do
Transcendente com objetivo de buscar orientações para vida
concreta neste mundo. Essa elaboração se dá num processo de
tempo-história, num determinado contexto cultural, como fruto
próprio da caminhada religiosa de um povo, observando e respeitando
a experiência religiosa de seus ancestrais, exigindo a posteriori uma
interpretação e uma exegese (VIESSER, 1997, s.p.).

Os textos sagrados escritos e orais exigem, assim, conhecimentos advindos da


revelação; da história das narrativas sagradas; do contexto cultural; e da exegese, que é
parte da teologia que pratica a dissecação interpretativa do texto com uso de um método.

Podemos questionar sobre o que significam as teologias e qual o seu papel.


Viesser (1997, s.p.) diz que, segundo os PNCER, a teologia

É o conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados pela religião


e repassados para os fiéis sobre o Transcendente, de um modo
organizado ou sistematizado.
Como o Transcendente é a entidade ordenadora e o senhor absoluto
de todas as coisas, expressa-se (sic) esse estudo nas verdades de fé.
E, a participação na natureza do Transcendente é entendida como
graça e glorificação, respectivamente no tempo e na infinidade.
Para alcançar essa infinidade o ser humano necessita passar pela
realidade última da existência do ser, interpretada como ressurreição,
reencarnação, ancestralidade havendo espaço para a negação da
vida além morte (sic).

Seus conteúdos são formados a partir de conhecimentos sobre a(s) divindade(s)


(lembrando que “teo” significa “Deus”, e, portanto, “teologia” é o estudo sobre Deus);
sobre as verdades de fé; e sobre a vida além morte.

Já os “ritos” são práticas religiosas que, de acordo com as tradições religiosas, se


compõem dos próprios rituais, símbolos e espiritualidades. Os conteúdos constituem-
se desses mesmos elementos, a saber:

117
Rituais: a descrição de práticas religiosas significantes, elaboradas
pelos diferentes grupos religiosos;
Símbolos: a identificação dos símbolos mais importantes de cada
tradição religiosa comparando seu(s) significado(s);
Espiritualidades: o estudo dos métodos utilizados pelas diferentes
tradições religiosas no relacionamento com o Transcendente, consigo
mesmo, com os outros e o mundo (VIESSER, 1997, s.p.).

Finalmente o “ethos” é o lado de dentro da moralidade humana, que está


relacionada ao sentido da vida e do ser; aos valores, em sua percepção internalizada;
e à consciência do dever, que não se limita às ações humanas, mas tem a ver com a
personalidade e a expressão do “eu” de cada um.

Essa moral está iluminada pela ética, cujas funções são muitas,
salientando-se a crítica e a utópica. A função crítica, pelo discurso
ético, detecta, desmascara e pondera as realizações inautênticas
da realidade humana. A função utópica projeta e configura o ideal
normativo das realizações humanas (VIESSER, 1997, s.p.).

Aqui os conteúdos são determinados pela alteridade (ou relação com o outro),
valores e limites estabelecidos por cada tradição religiosa. Esse tratamento didático
dado aos conteúdos do Ensino Religioso visa, como qualquer outra disciplina curricular,
respeitar a liberdade de expressão e evitar o proselitismo, valorizando a pluralidade e a
diversidade das religiões.

É preciso observar aqui que ética se distingue da moral por se referir aos
princípios gerais e universalizáveis da conduta humana e não a práticas pontuais e
circunstanciais. Nesse sentido, o ensino da ética é muito diferente da doutrinação ou do
mero “moralismo” que caracteriza tantas aulas de catequese.

De acordo com análise de Toledo e Amaral (2005), os PCNER do Fonaper


serviram para consubstanciar a substituição do Artigo 33 da LDB 9.394/96 que versa
sobre a ausência de ônus do Ensino Religioso para os cofres públicos. Na prática, eles
são a favor da remuneração dos professores, que passam a ter um caráter profissional
e não proselitista:

Assim, a tarefa que se impôs ao Fonaper - entidade civil especialmente


criada para acompanhar o processo de tramitação legal do Ensino
Religioso e que elaborou o documento do PCNER – foi o desafio
de transformar o Ensino Religioso, até então proselitista, em uma
proposta que descaracterizasse esse perfil, desvinculando-o da
Igreja Católica, o que resolveria o problema da inconstitucionalidade,
permitindo ao governo a liberdade para a retirada da expressão
“sem ônus para os cofres públicos”. Dessa forma, desvinculou-se
o Ensino Religioso das diferentes concepções que já haviam sido
apresentadas, transformando-o em disciplina do Sistema Nacional de
Ensino com todas as características que lhes são próprias (TOLEDO;
AMARAL, 2005, p. 3).

118
Os articulistas do documento também se preocuparam em combater os
modelos confessional e interconfessional preconizados pela LDB, pois não refletem
mais a realidade brasileira e promovem o proselitismo. Para isso, foi preciso redefinir
o termo “religião” de “religação” para “releitura”. em outras palavras, não se trata mais
de uma vinculação do indivíduo à divindade específica de uma religião, mas de uma
interpretação do mundo, a partir da religião em seu sentido universalizável.

Assim, a religião passou para o âmbito secular, sendo transformada em disciplina,


como as demais, e muito atrelada à filosofia, história, sociologia e antropologia das religiões.

NOTA
O Ensino Religioso foi instituído como “disciplina escolar” pelo Resolução CNE/
CEB nº 04/2010 e a Resolução CNE/CEB nº 07/2010, que o reconheceram
como uma das cinco áreas de conhecimento do Ensino Fundamental.

O Ensino Religioso passa destarte a ser

instituído como disciplina do sistema educacional que possui


objeto de estudo específico: fenômeno religioso; conteúdo próprio:
conhecimento religioso; tratamento didático: didática do fenômeno
religioso. Além dos objetivos definidos, metodologia própria e sistema
de avaliação organizados na proposta. (TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 4)

Após uma apresentação geral, o documento das PCNER, publicado em 1997,


fala da história do ensino religioso no Brasil; como os conteúdos e seus pressupostos
didáticos são organizados, com especial atenção à avaliação; finalmente sugere
conteúdos para os quatro ciclos do Ensino Fundamental.

Toledo e Amaral (2023) chamam a atenção para o fato de os PCNER tratarem


a religião como algo imanente, para a valorização do diálogo entre as religiões, mas
questionam esse tratamento “científico” e “neutro” dado a ela. Eles questionam ainda qual
o interesse que o poder público e a igreja podem ter nesse Ensino Religioso “científico”
e como se definem os âmbitos público e privado, a sociedade civil e a sociedade política
nessa concepção.

Para se ter uma resposta é preciso investigar os conceitos de educação e religião


e suas relações, chamando como auxílio a concepção de campo de Pierre Bourdieu. Esses
campos, relativamente independentes, mas interagentes, lutam pela hegemonia e no caso
do campo da religião, ela entra em conflito com o da política, defendendo seus interesses.

Mas como se dá essa relação de poder na religião?

119
ATENÇÃO
Na religião, como em qualquer outro campo de poder, existe o grupo
que detém a supremacia, ou domínio hegemônico. O grupo político no
poder precisa do poder de persuasão hegemônico, ou, especificamente,
das instituições civis que formam a opinião pública, para criar o consenso
necessário as suas investiduras políticas. “O Estado obtém e exige
consenso, mas também educa esse consenso” (Gramsci, 1991, p.230). Isso
é feito através da sociedade civil, que representa o aparelho de criação
de consenso, enquanto a sociedade política detém o poder de coerção
(TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 6).

Entretanto, a sociedade civil não é mera legitimadora do poder político, mas


também se legitima, através das leis e do consenso em torno da religião em suas
relações com a política, sendo palco de conflitos entre o poder religioso hegemônico
e crises desse poder, que, no caso do Brasil, sempre foi da Igreja Católica, apesar da
concorrência mais recente com as igrejas evangélicas neopentecostais.

Mas qual foi e tem sido, você poderia perguntar, a reação da Igreja a essas
ameaças a sua hegemonia e poder? Com a modernidade e os desafios por ela
impostos, alguns segmentos da Igreja (excetuando os segmentos mais conservadores
e tradicionalistas) mudaram sua estratégia tradicional de combate à modernidade, para
defensores dos direitos do homem e combatente do proselitismo, coisa de que todas as
religiões podem se beneficiar.

É possível perceber, desde o início dessas diretrizes, que entre elas


e o conteúdo dos PCNER existem estreitas relações. No esforço do
Fonaper para distanciar a ideia (sic) do Ensino Religioso de Catequese,
Pastoral da Educação e Pastoral Escolar, o que comprometeria o
perfil epistemológico declarado na proposta, a primeira providência
foi tirar-lhe o caráter proselitista. Ocorre que, nas Diretrizes Gerais
da Ação Evangelizadora da Igreja Católica no Brasil (DGAE), ao tratar
do ecumenismo, já aparece essa preocupação quando afirma “o
proselitismo seria a ruína do verdadeiro espírito ecumênico”. Dessa
forma, a retirada do caráter proselitista da proposta de evangelização
não é novidade exclusiva dos PCNER, porque a mesma já está
explícita nas recomendações da Igreja Católica. E em 1992, D. Aloísio
Lorscheider já afirmava: “No momento psicológico brasileiro o melhor
diálogo por todos é o que poderíamos denominar o do desarmamento
dos espíritos, deixando de fora a polêmica e o espírito proselitista”
(LORSCHEIDER, 1992, p. 25 apud TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 9).

Apesar de evitar a ideia de pluralismo, o combate ao proselitismo e a valorização


das demais religiões nas DGAE levam a uma maior abertura da Igreja para as demais
religiões. Pode-se, portanto, verificar uma semelhança entre o documento da CNBB e os
PCNER, pois valorizam a liberdade, o respeito e o diálogo entre as religiões, combatendo
toda forma de preconceito.

120
Também é possível ver as semelhanças dos PCNER com “as diretrizes atuais
dos Jesuítas, contidas na Congregação Geral XXXIV (1995) da Companhia de Jesus”
(TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 10), que falam em “diálogo inter-religioso”, pluralismo e
promoção da justiça.

Essa interpretação guarda similaridades com os PCNER, em


particular com o Vaticano II, que reconheceu que o mundo é plural e
que, portanto, a Igreja deveria adotar uma posição que possibilitasse
uma abertura ao diálogo para com outras religiões. Tal similaridade
não significa, evidentemente, que as propostas e concepções
presentes nos PCNER tenham sido derivadas diretamente daqueles
outros documentos. Entretanto, não há como negar as relações dos
PCNER com as determinações da Igreja Católica, por mais que se
tenha tentado desvinculá-lo, o suporte da proposta para o Ensino
Religioso, ainda, guarda profundas relações com a Igreja Católica
(TOLEDO; AMARAL, 2005, p. 11).

Há, portanto, uma continuidade na influência da Igreja Católica sobre o


Ensino Religioso no Brasil. Ela reivindica para si também a determinação dos valores
existenciais do indivíduo.

Assim, a abertura ao diálogo verificada na Igreja não se deve, segundo os


autores, a nenhuma evolução ou amadurecimento, mas a uma resposta aos ditames
da realidade inalienável da globalização e do pluralismo no mundo. Ou a Igreja se
adaptava, ou morria.

Após uma discussão sobre a legitimidade científica da sociologia da religião,


sobre se ela não estaria simplesmente servindo aos interesses da Igreja, os autores
concluem sobre o Ensino Religioso:

E, dessa forma, o Ensino Religioso não empobrece em nada a


estratégia da Igreja para o confronto ou acomodação à nova realidade
que tem, na escola pública, um importante canal para sua divulgação
e sustentação. Entretanto, cabe perguntarmos se o espaço público é o
espaço legítimo para a divulgação e sustentação de lutas que deveriam
ser travadas em outras esferas (TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 13).

Os autores resolvem que a questão do Ensino Religioso não pode ser definida com
base em direitos atribuídos ao indivíduo particular, sendo que os interesses privatistas não
podem sobrepujar os públicos numa república, muito menos na Escola Pública. Então, eles
são contra o Ensino Religioso nas escolas e contra a orientação oferecida pelos PCNER,
por serem representantes de interesses particularistas católicos. E resumem:

Não há mais lugar no mundo de hoje para a simples prevalência


do interesse privado sobre o coletivo, e, portanto, não compete às
instituições religiosas elaborar propostas, principalmente quando
estas apresentam valores culturais particulares de origem dogmática
para se tornarem políticas públicas, como não compete à escola
pública ensinar religião (TOLEDO; AMARAL, 2023, p. 16).

121
Como podemos ver, o Fonaper, assim como a Assintec, contribuiu muito para o
avanço no campo do Ensino Religioso. Se quisermos comparar a Assintec ao Fonaper,
poderíamos dizer que eles têm Cartas de Princípios semelhantes e, também, uma missão
parecida, mas o Fonaper tem um pano de fundo mais isento e científico e, assim, pode
contribuir mais efetivamente para um Ensino Religioso pluralista e aberto ao diálogo.

Entretanto, ambas as instituições são de importância imprescindível para que se


garantam políticas públicas democráticas e cidadãs com respeito ao Ensino Religioso.
Elas também ajudam a combater qualquer tipo de preconceito e desigualdades como
o preconceito racial, contra os LGBTIa+ e contra todas as minorias, lutando ombro
a ombro com as ONGs e demais organizações de defesa de direitos e busca por um
mundo mais justo e melhor.

Nesse sentido, temos que lembrar aqui também dos movimentos sociais, que
assumem um papel fundamental na defesa dos interesses da sociedade contra as
políticas hegemônicas que tendem a calar as minorias e sua defesa de direitos. Sem
esses movimentos e a bandeira que eles levantam, a sociedade seria mais injusta e
excludente e com eles muito mais vozes são ouvidas, pondo em prática os princípios de
diversidade e pluralismo da sociedade democrática.

Assim, fazer parte de uma entidade como o Fonaper ou um movimento social é


participar da história, deixando a sua contribuição para as gerações futuras, sendo que
ao mesmo tempo se tange ao infinito, pois se está lidando com questões sempiternas.

Também significa ter uma mistura de sentimentos em relação à causa, desde o


orgulho por estar deixando a sua marca, até a frustração de observar a lentidão com que
as conquistas vão sendo registradas. Fazer parte de um movimento social ou entidade é
engajar-se num mundo melhor, mais justo e igualitário, mesmo tendo consciência de que
ninguém é eterno. É, ainda assim, perseverar na luta fazendo parte dessa corrente do bem.

Então, gostou dessa unidade? Prepare-se, que tem mais na próxima!

Bons estudos!

122
LEITURA
COMPLEMENTAR
ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS

Valmir Biaca

Tradições Religiosas ou Organizações Religiosas

Na versão atual das Diretrizes Curriculares de Ensino Religioso da Secretaria


Municipal de Educação de Curitiba, foi substituído o conteúdo Tradições Religiosas por
Organizações Religiosas, constando como um dos novos conteúdos a serem estudados.
Mas por que este novo conteúdo?

Não se trata de um novo conteúdo e sim um novo olhar sobre o conteúdo


já existente. Em função do avanço nos estudos, optou-se pela mudança do termo
Tradições Religiosas, que não contemplam as novas religiões ou aquelas não vistas
como tradicionais, para Organizações Religiosas por ser um termo mais abrangente.
No Ensino Religioso deve-se contemplar a diversidade religiosa, sendo este um dos
motivos da alteração, por ser mais consistente, trata-se do mesmo conteúdo com um
olhar mais amplo sobre ele.

Além disso, o termo “Organizações Religiosas” contempla religiões que não se


consideram tradições e que sempre foram vistas como filosofias de vida e que agora se
entendem como religião. Nesse sentido, com esse nome, também pretendemos nos
remeter a estrutura hierárquica, estrutura humana, ocupações e responsabilidades dos
membros dessa determinada organização religiosa.

[…]

A organização religiosa está presente em nosso cotidiano sendo visível através


da diversidade religiosa presente no contexto em que vivemos e pode ser reconhecida,
entre outras maneiras, por meio da estrutura hierárquica do interior dessas organizações
e que convivem no contexto da comunidade dos estudantes, sendo percebidas através
das lideranças religiosas (padres, pastores, pai de santo, rabinos entre outros).

Nessas organizações percebe-se a atuação de lideranças exercidas por


homens e mulheres com funções e papéis definidos que são fundamentais para a sua
manutenção e sobrevivência das instituições religiosas.

123
Algumas organizações têm uma participação mais efetiva das mulheres e
outras menos, dependendo da sua estrutura interna, de sua doutrina e dos seus
preceitos. Existem religiões patriarcais onde o papel do homem na hierarquia religiosa
é preponderante (religião católica: Papa, Bispo, Padre) e outras em que as funções mais
importantes são próprias das mulheres e por isso são matriarcais (Religiões de matriz
africana: Mãe de Santo, Ialorixá).

Exemplos de algumas organizações religiosas: Hinduísmo, Jainismo, Sikhismo,


Taoísmo, Confucionismo, Xintoísmo, Zoroastrismo, Judaísmo, Cristianismo, Islamismo,
Fé Bahá’í, Candomblé, Umbanda e Indígenas.

Partindo das experiências dos estudantes, da descoberta de si mesmos como


seres religiosos que participam ou não de determinada religião, busca-se analisar e
compreender as diferentes organizações religiosas presentes na realidade local e global.

[...]

FEDERAÇÃO ESPIRITA DO PARANÁ - REGINALDO SILVA ARAÚJO

A organização se dá por meio de uma Associação civil religiosa, denominada


Centro Espírita, Casa Espírita, ou Grupo Espírita, agrupadas em Uniões Regionais
Espíritas (URE´S), filiadas à Federação Espírita do Paraná, sendo esta dirigida por um
Presidente, eleito, a cada dois anos, pelo Conselho Federativo Estadual, integrado por
Conselheiros efetivos e Presidentes das URE´s. No Espiritismo não possui hierarquia
sacerdotal, nem adota em suas reuniões e em suas práticas: altares, imagens, ou
quaisquer outros objetos, rituais ou formas de culto exterior.

É uma doutrina de cunho científico-filosófico, que tem consequências religiosas,


como toda a filosofia espiritualista, pelo que toca forçosamente nas bases fundamentais
de todas as religiões: Deus, alma e imortalidade. Codificado no século XIX, em Paris, pelo
pedagogo francês Hippolyte Leon Denizard Rivail, mais conhecido como Allan Kardec.
O Espiritismo respeita todas as religiões e doutrinas, valoriza todos os esforços para
a prática do bem e trabalha pela confraternização e pela paz entre todos os povos,
independentemente de sexo, raça, cor, nacionalidade, crença, nível cultural ou social.

Reconhece, ainda, que “o verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de


justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza”. A Doutrina Espírita é o conjunto
de princípios e leis naturais, revelados pelos Espíritos Superiores, sob a orientação do
Espírito Verdade, contidos nas obras de Allan Kardec, que constituem a Codificação
Espírita: O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho segundo o Espiritismo,
O Céu e o Inferno e A Gênese. Tendo, ainda, como obras complementares: A Revista
Espírita e os livros O Que é o Espiritismo, e Obras Póstumas. As funções dos membros
nas Casas Espíritas são aquelas estipuladas no Estatuto e Convenções da Entidade.
(ver: Estatuto e Convenções da Entidade das casas espíritas no Paraná)

124
Estão organizados em duas partes sendo a parte administrativa, como qualquer
Organização Não Governamental: Conselho diretor, Conselho fiscal, Presidente, Secretário
e Tesoureiro, eleitos pela assembleia de membros associados; e a parte Doutrinaria/
Religiosa: Temos um Conselho, eleito pela assembleia dos associados, dirigido por um
presidente, que por sua vez escolhe os dirigentes dos setores de estudos e práticas
Espíritas da Entidade.

A atuação de homens e mulheres na sua instituição é realizada em perfeita


condição de igualdade, sem discriminação de sexo. A prática espírita é realizada com
simplicidade, sem nenhum culto exterior, dentro do princípio cristão de que Deus deve
ser adorado em espírito e verdade. Com o Sagrado Feminino, o Espiritismo defende que
todos os Espíritos foram criados por Deus, simples e ignorantes de suas Leis, porém
todos perfectíveis, podendo, no decorrer das múltiplas existências (encarnações),
ocupar um corpo masculino ou feminino.

[…]

MATRIZ INDÍGENA - ELÓI CORREA

A primeira questão que temos que ter em mente é que o conceito de religião
adotado pela tradição judaico cristã no ocidente. As religiões nativas se organizam de
uma forma diferente da chamada religião moderna. As categorias de sagrado e profano
não se aplicam da mesma forma, pois nas religiões nativas tudo aquilo que é considerado
profano para as religiões modernas é também sagrado para as nativas, contemplando
assim todos os aspectos da vida, sendo que a vivência cotidiana e suas expressões
religiosas formam todo um sistema de representações simbólicas do qual emerge sua
espiritualidade nativa.

Da mesma forma temos que atender para o fato de que o conceito de religião
dos povos nativos se diferencia da ideia de religião como religare, ou religação, ou seja,
no sentido propriamente religioso do termo; e religião como religiosus, que remete a
uma concepção de caráter predominantemente ético-jurídico. Na primeira acepção
“religião procede de religio, vocábulo relacionado com religatio que é a substantivação
de religare (religar; vincular; atar). A condição de ser religioso é estar religado a Deus
e, portanto, subordinar-se à divindade. contempla todos os aspectos da vida, sendo
que a vivência cotidiana e suas expressões religiosas formam todo um sistema de
representações simbólicas do qual emerge sua espiritualidade.

Assim, as religiões nativas não possuem uma estrutura humana organizada nos
mesmo moldes que as demais organizações religiosas. Tratando especificamente dos
povos indígenas Guarani, eles possuem uma espécie de curandeiro chamado Xamoi (pajé),
mas que não possui autoridade sobre os membros do clã, ele é uma sábio conhecedor das

125
plantas que curam, que dá conselhos e contas (sic) histórias sobre os antepassados. Na
estrutura hierárquica de cada povo indígena possui mitos e tradições particulares, e em
algumas delas existem figuras e heróis que marcam sua espiritualidade.

Contudo, dada a forma de organização onde não há uma hierarquia


institucionalizada a representação do coletivo é mais importante que o indivíduo. As
funções de cada membro nessa estrutura variam de acordo com cada povo indígena,
mas também conforme o tipo do ritual. Com relação à organização dos diversos
níveis de autoridade, pode-se dizer que, não existe uma autoridade relacionada a (sic)
espiritualidade, os xamãs são respeitados assim como todos os mais velhos, mas por
uma questão cultural e não de autoridade.

Homens e mulheres têm e possuem a mesma importância, mas em alguns rituais


os papeis são divididos como é o caso dos Guarani, cujo as (sic) Cunhas (mulheres) é
que acendem e mantém o fogo sagrado (tatá porã) e cabem aos Avas (homens) coletar
lenha. Só as mulheres podem manipular o Kaaiu (chimarrão de erva mate), enchendo a
bomba com água e passando aos demais. O Sagrado Feminino está presente sim nas
Divindades, energias, rituais, curandeiras, Xamãs, enfim o feminino é muito importante
nas tradições religiosas indígenas.

MATRIZ AFRICANA - DORIVAL SIMÕES

As organizações religiosas afro-brasileiras ou afrodescendentes nasceram


das tradições culturais trazidas à força do continente africano para o Brasil na época
da escravatura. Os navios negreiros que chegaram entre os séculos XVI e XIX traziam
mais do que africanos para trabalhar como escravos no Brasil Colônia. Em seus porões,
viajava também toda a cultura dessas pessoas, incluindo a religião, a reguladora da vida
social de onde vinham, a qual era estranha aos colonizadores portugueses. Considerada
feitiçaria pelos colonizadores, ela se transformou, pouco mais de um século depois da
abolição da escravatura, numa das religiões mais populares do país.

Os vários grupos religiosos nascidos das tradições religiosas trazidas da África


e que aqui se mesclaram entre si, deram origem a diversos grupos ou denominações,
entre elas destacamos a Umbanda e o Candomblé. A Umbanda surgiu do sincretismo
(mistura) dos ritos africanos, crenças católicas, espíritas e pajelança indígena, entre
outros. A Umbanda é uma religião tipicamente brasileira. A palavra Umbanda possui
várias significações, sendo uma delas ‘Um’ (Deus), ‘banda’ (lado), ou seja, “do lado de
Deus”, “do lado do bem”. E, vale destacar, houve sempre entre seus seguidores a busca
por manter a pureza do culto religioso ancestral.

Os chefes religiosos na Umbanda podem ser homens (sacerdotes) e mulheres


(sacerdotisas). São também chamados de pais e mães-de-santo (sic); eles são os
intermediários para a manifestação das entidades. Há regras que devem ser observadas

126
pelos sacerdotes, na sua vida religiosa e na vida religiosa do terreiro sob a sua direção.
Atualmente, devido a expansão dessas religiões de cultos afro-brasileiros, muitos líderes
religiosos não são de origem africana.

Já no Candomblé, os babalorixás (homens) ou as ialorixás (mulheres) têm seus


herdeiros. Por sua morte, esses assumem automaticamente a chefia do culto, para que não
seja interrompido. Há uma espécie de “testamento”, que contêm uma extensa lista de filhos
classificados para a sucessão. Esses filhos, pela rigorosa ordem de classificação de seu
nome na lista, serão chamados a ocupar o cargo de cuidadores do terreiro e, uma vez morto
aquele que estiver no cargo, será substituído pelo que estiver imediatamente na sequência.

Assim, é digno de nota, nem sempre os parentes, mesmos os mais próximos, são
contemplados nesse “testamento”. Isso ocorre para provar a isenção de ânimo com que
são escolhidos os “herdeiros”, levando-se em conta, apenas, seus dotes e qualidades
dentro da lei dessa tradição religiosa. De modo geral, a hierarquia em um terreiro de
candomblé é a que se segue: Babalorixá: é o pai-de-santo (sic). Compete-lhe exercer
toda a função característica do seu cargo: presidir rituais; preparar e iniciar “filhos de
santo” dentro do ritual próprio, preparar os Orixás e “assentos” respectivos; resolver
qualquer questão surgida dentro do terreiro ou de pessoas que a ele recorram; observar
e corrigir a execução de todos os preceitos do ritual que pratica; marcar o ritmo a ser
observado e obedecido pelos tocadores de ilús (tambores), ensinar, educar e corrigir os
“filhos de santos” por ele feitos na prática e execução dos preceitos.

Alguns, ainda, praticam a cura, devido à carência de médicos nos locais em que
habitam e, também, por opção própria, o que leva seus filhos doentes a recorrerem aos
seus conhecimentos do emprego de ervas e plantas, bem como dos rituais de cura.
Ialorixá: é a mãe de santo, líder dos terreiros, com função, atribuição e direitos idênticos ao
do babalorixá. Ogã Kalofé: “padrinho” escolhido pelos Orixás, “confirmado e entronizado”,
tem deveres para com o terreiro. Recebe as mesmas homenagens e o mesmo respeito que
o babalorixá ou ialorixá. Ogã-nilu: batedor de atabaque. Ogã-alabê: chefe dos tocadores
de atabaque. Axogum: responsável pelo sacrifício de animais ofertados aos orixás. Ebômi:
filha de santo, com mais de 7 anos de feita. Equede: encarregada de organizar as festas;
cuidar dos orixás “incorporados” e de seus objetos. Iaô: noviça, “filha de santo” recém-
feita. Ialaxé: zeladora dos “axés”. Iabassé: cozinheira dos orixás.Peji-gã: organizador da
ordem geral dos preceitos. Exi de Orixá: filho de santo em geral.

A presença do sagrado feminino pode ser percebida na figura da mãe-de-


santo (sic) que exerce papel preponderante nos terreiros, a participação das mulheres é
significativa com importante papel de liderança, tanto na umbanda como no candomblé.
Na figura dos orixás também se manifesta no sagrado feminino.

[...]

Fonte: http://www.ensinoreligioso.seed.pr.gov.br/arquivos/File/boletins_informativos_assintec/informati-
vo_assintec_39.pdf. Acesso em: 13 abr. 2023.

127
128
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:

• A Associação Inter-religiosa de Educação (Assintec), como o próprio nome diz, visa ao


intercâmbio entre as religiões em torno da educação. Seu caráter não é confessional,
mas inter-religioso, ou seja, envolve e diz respeito a todas as religiões.

• O objetivo do Fonaper objetivo é auxiliar na efetivação do Ensino Religioso nas


escolas através da discussão e concatenação de ideias de especialistas e pessoas
interessadas que formem propostas concretas de ação.

• Além dos PCNER, a Fonaper escreveu Cadernos Temáticos de apoio à implantação do


Ensino Religioso nas escolas.

• A importância de a sociedade civil se mobilizar em instituições isentas e de caráter inter-


religioso para promoção do diálogo entre as religiões e das mesmas com as escolas.

• As entidades mais conhecidas de apoio ao ensino religioso existentes no Brasil,


discutimos seus princípios e missão e sua razão de ser, deixando um convite a você
de se engajar em alguma entidade ou movimento social em prol do pluralismo e do
diálogo inter-religioso, deixando a sua contribuição para esse debate.

129
AUTOATIVIDADE
1 A Associação Inter-religiosa de Educação (Assintec), como o próprio nome diz, visa ao
intercâmbio entre as religiões em torno da educação. Seu caráter não é confessional,
mas inter-religioso, ou seja, envolve e diz respeito a todas as religiões. Com relação
ao papel da Assintec na operacionalização do Ensino Religioso no Estado do Paraná,
particularmente na cidade de Curitiba, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Ela contribuiu e contribui com consultoria às SME e à SEE do Paraná e com cursos e
materiais didáticos e de formação de professores concernentes ao Ensino Religioso.
b) ( ) Ela foi a única a propor a redação da nova LDB9.394/96, que prevê o Ensino Religioso
como obrigatório para a oferta e facultativo para a participação.
c) ( ) Ela foi a única a propor a redação da BNCC quanto ao Ensino Religioso e contribui
para a sua implantação nas escolas.
d) ( ) Ela foi contratada para redigir exclusivamente os PCNER que o governo não teve
competência para redigir por si mesmo.

2 Segundo a Assintec (2005, s. p.), a “Carta de Princípios” delineia e propõe a filosofia da


ASSINTEC, com a possibilidade de traduzir-se em ações éticas, morais e de respeito, de
forma a permear as decisões, relações e atitudes dos associados desta entidade. Com
relação a esses princípios, analise as sentenças a seguir:

Fonte: ASSINTEC. Assintec, 2005. Carta de princípios.


Disponível em: http://www.assintec.org/principios-da-
assintec. Acesso em: 13 abr. 2023.

I - Em princípio, a Assintec não promove uma determinada religião em detrimento de


outras, nem mesmo a católica, que foi a de sua origem.
II - A Assintec reconhece conteúdos originários das quatro matrizes culturais brasileiras: a
africana, a indígena, a oriental e a ocidental.
III - O fenômeno religioso é reconhecido na Carta de Princípios como fenômeno isolado e
muito particular de cada um, sem que ele possa ser universalizado.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

130
3 Foram colhidas sugestões para a Carta de Princípios do Fonaper e criou-se uma comissão
para redigir e aprovar a mesma. Ela se centra no direito do aluno a um Ensino Religioso
aberto para o transcendente e na reflexão livre, sem descriminações. Quanto à Carta de
Princípios do Fonaper, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Garantia que a Escola, seja qual for sua natureza, ofereça Ensino Religioso ao educando,
em todos os níveis de escolaridade, respeitando as diversidades de pensamento e
opção religiosa e cultural do educando.
( ) Exigência de investimento real na qualificação e capacitação de profissional para o
Ensino Religioso, preservando e ampliando as conquistas, de todo magistério, bem
como garantindo condições de trabalho e aperfeiçoamentos necessários.
( ) Garantia que a Escola, seja qual for sua natureza, ofereça Ensino Religioso ao educando,
em todos os níveis de escolaridade, respeitando as diversidades de pensamento e
opção religiosa e cultural do educando.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) V – V – V.

4 De acordo com o site do Fonaper, uma das frentes de luta da instituição é o combate ao
racismo estrutural, que o Brasil tem a chance de vencer. Discorra num texto dissertativo,
como o Ensino Religioso pode ajudar a combater o racismo no Brasil, considerando a
contribuição das instituições de apoio a ele existentes no país.

5 Na obra comemorativa do Fonaper, há um hino à instituição em que se fala sobre o


que é fazer parte de uma iniciativa como o Fonaper, o que se aplica a qualquer outro
movimento social. Comente em um texto dissertativo o que significa fazer parte de um
movimento social que visa ao diálogo inter-religioso e à paz entre as religiões.

131
REFERÊNCIAS
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Intercom, 1997.

134
UNIDADE 3 —

ELEMENTOS DA DIDÁTICA
E METODOLOGIA DO
ENSINO RELIGIOSO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• Conhecer a ideia do Projeto Pedagógico, suas aplicações e objetivos.

• Identificar os elementos do Projeto Pedagógico e entender suas funções.

• Relacionar planejamento, currículo e avaliação ao Projeto Pedagógico.

• Conhecer as técnicas e métodos de aprendizagem, particularmente no Ensino Religioso.

• Reconhecer as tendências pedagógicas clássicas praticadas no Brasil e suas metodologias.

• Identificar as características e elementos dos métodos ativos e aplicá-los ao Ensino


Religioso.

• Aprender sobre os Estilos de aprendizagem, tipos psicológicos e aplicá-los à teoria da


Aprendizagem Vivencial.

• Relacionar os tipos psicológicos à religião, nos chamados tipos religiosos.

PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar
o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – PROJETO PEDAGÓGICO E ENSINO RELIGIOSO


TÓPICO 2 – MÉTODOS E TÉCNICAS DO ENSINO RELIGIOSO
TÓPICO 3 – APRENDIZAGEM VIVENCIAL E ENSINO RELIGIOSO

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

135
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!

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136
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
PROJETO PEDAGÓGICO
E ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, neste tema de aprendizagem, vamos nos dedicar à teoria do
Projeto Pedagógico, criada no contexto do Planejamento de Ensino. Vamos discutir o
seu sentido e objetivos, suas funções e elementos constituintes especificamente para
o Ensino Religioso.

No Subtema 2, abordaremos mais genericamente o Planejamento de Ensino,


sua função e razão de ser e situaremos o Projeto Pedagógico nesse contexto.

Já o Subtema 3 é dedicado à Avaliação, importante parte do Projeto Pedagógico,


aplicado ao Ensino Religioso.

2 PLANEJAMENTO DE ENSINO E PROJETO POLÍTICO


PEDAGÓGICO
Você pode estar se perguntando: o que é um Projeto Pedagógico, que está tão
na moda no campo da educação? Desde quando o educador trabalha com projetos?
Isso não é função do engenheiro e do arquiteto?

E você estará certo com sua reação de estranheza, pois a ideia não veio do meio
educacional e, sim, empresarial. Já ouviu falar de Planejamento Estratégico na área de
administração? Pois é, o Projeto Político Pedagógico (PPP) se inspira nele.

Mas calma, antes do advento do PPP, havia o que se chamava de Planejamento de


Ensino, do qual o PPP até hoje faz parte e do qual você já deve ter ouvido falar, e que envolvia
o chamado Plano Diretor da Escola. Esse era um documento guardado a sete chaves nos
arquivos do diretor da escola e ao qual ninguém tinha acesso, quanto menos participação.

O estranhamento se dá também porque nós, como educadores, não estamos


habituados a planejar em longo prazo. O Plano Diretor é o planejamento para o ano
letivo da parte administrativa da escola, o Plano de Ensino é a parte pedagógica para o
semestre, e o Plano de Aula, como o próprio termo já diz, a parte pedagógica para uma
só aula. Mas o PPP pode ser para a vida toda da escola, sendo revisto e atualizado de
tempos em tempos.

137
O Plano Diretor envolvia o calendário escolar, a infraestrutura de escola e previsões
orçamentárias, dentre outros, mas o PPP inclui muito mais do que isso, como veremos.

Mas vamos continuar falando do conhecido: O Plano de Ensino e o Plano de Aula.


Quando o primeiro é bem-feito, ele inclui uma justificativa da disciplina no semestre
(que pode ser do ano, dependendo da forma de organização do calendário escolar).

A justificativa nada mais é, como o próprio nome já diz, do que perguntar-se o


que torna justo aquela disciplina ser ofertada. Trata-se do que faz valer a pena o tempo
e esforço investidos por professores e alunos naqueles conteúdos. Não se trata de
objetivos, mas de finalidades, ou seja, o que se espera, ao final da formação do indivíduo,
que ele tenha desenvolvido e que benefícios aquele conteúdo poderá trazer para a sua
vida como um todo.

Em seguida, vamos aos objetivos, que são verbos que podem seguir a Taxonomia
de Bloom para serem elaborados e que não devem se concentrar naqueles em que o
sujeito seja o professor, o que refletiria um ensino bastante tradicional, concentrado no
professor, e não no aluno.

NOTA
A classificação proposta por Bloom dividiu as possibilidades de aprendizagem
em três grandes domínios: o cognitivo, o afetivo, e o psicomotor. Por isso a
classificação de Bloom é denominada hierarquia: cada nível é mais complexo
e mais específico que o anterior.

No site do Instituto Integer, temos representada a hierarquia dos objetivos


educacionais da Taxonomia.

Figura 1 – Taxonomia de Bloom

Fonte: https://cutt.ly/j71Nhsq. Acesso em: 13 fev. 2023.

138
Os objetivos da Taxonomia de Bloom são todos centrados no aluno. E temos um
detalhamento na figura a seguir:

Figura 2 – Objetivos educacionais da Taxonomia de Bloom

Fonte: https://www.amplifica.me/taxonomia-de-bloom/. Acesso em: 13 fev. 2023.

A seguir, temos o conteúdo, que talvez fosse a primeira coisa a ser analisada, mas
que não deve ser conteudista. Ele deve seguir as Diretrizes e Parâmetros Curriculares
Nacionais, bem como a BNCC da disciplina, conforme vimos na Unidade 2 deste material.

A metodologia deve ser especificada em sua postura metodológica e seguindo


uma das tendências pedagógicas que veremos mais adiante. A metodologia é a pergunta
sobre a forma como o professor pretende estruturar e organizar o aprendizado.

Já a avaliação deve ser sempre formativa, contínua e apreciativa, e não punitiva,


como veremos no subtema a seguir.

É bom, ainda, acrescentar uma bibliografia das obras consultadas para o Plano
de Ensino e necessárias para as aulas.

E o Plano de Aula nada mais é do que um detalhamento do Plano de Ensino,


com objetivos, atividades e avaliação, divididos por aula.

DICA
Para um exemplo de plano de ensino anual, consulte https://cutt.ly/
e719vdm. Acesso em: 30 mar. 2023.
Para dicas de como planejar no ensino religioso, veja: https://youtu.be/
m1KZf4ErSW0. Acesso em: 30 mar. 2023.

139
Mas se o Planejamento de Ensino envolvia tudo isso, porque inventar mais o
PPP? Vamos consultar os especialistas?

De acordo com Nogueira (2009), o PPP não serve apenas para cumprir o que
reza a LDB 9394/96, que o torna obrigatório nas escolas de todos os níveis e não deve
ser mais um papel na gaveta do diretor de escola e do coordenador de curso.

O autor admite que nós, educadores, muitas vezes vivemos no mundo dos
sonhos, sem estratégias para colocá-los em prática e, ao invés de aproveitar os
momentos semestrais de planejamento para isso, essas reuniões acabam sendo apenas
burocráticas e tediosas.

Quanto aos conceitos fundamentais do PPP, ele cita o Planejamento Participativo,


em que todos os envolvidos no processo de educação escolar são convidados a
contribuir com as suas ideias e pontos de vista; o Planejamento Estratégico, que se
pergunta onde estamos enquanto instituição, para onde vamos e como faremos para
chegar lá; a Visão Compartilhada, que é uma perspectiva comum, não imposta por
ninguém, mas que motiva a todos para alcançar essa visão; e a Visão Sistêmica, que
ao contrário da analítica e cartesiana, verifica as partes para atingir o todo. Essa última
significa: “enxergar as partes de um todo e suas relações e inter-relações existentes na
formação do todo” (NOGUEIRA, 2009, p. 19).

Sobre o Planejamento Estratégico, ele define:

O planejamento estratégico de uma instituição é normalmente


constituído de análise do ambiente e do contexto em que a instituição
está inserida; definição de missão, visão e valores; estabelecimento
dos objetivos e metas; elaboração dos Planos de ação para atingir as
metas e os objetivos, indicador de desempenho, avaliação e revisão
constante (NOGUEIRA, 2009, p. 18).

O erro mais comum no desenvolvimento do PPP é a falta de participação efetiva


daqueles interessados e envolvidos no processo de aprendizagem.

Muitos confundem metas com objetivos. Para esclarecer isso, vamos consultar
o dicionário Priberam. De acordo com ele, a meta vem do:

[...] (latim meta, -ae, cone, pirâmide, objeto cônico, marco, baliza) […]
1. Poste ou sinal que marca o ponto onde termina uma corrida (ex.:
o cavalo chegou à meta exausto; os dois atletas cortaram a meta
quase ao mesmo tempo).

2. [Figurado] Aquilo que se pretende alcançar ou atingir (ex.: as


metas da empresa foram cumpridas). = ALVO, FIM, MIRA, OBJETIVO,
PROPÓSITO

140
3. Aquilo que constitui um ponto ou um valor que não deve ser
ultrapassado (ex.: a meta de endividamento foi ultrapassada). =
BALIZA, LIMITE, MARCO

4. Momento final de uma extensão temporal (ex.: a meta da vida). =


FIM, LIMITE, TERMO (META, 2023, on-line)

Já um objetivo é “aquilo que se pretende alcançar, conseguir ou atingir. = ALVO,


FIM, META, PROPÓSITO” (OBJETIVO, 2023, on-line).

Embora eles possam ser usados como sinônimos, a meta é algo alcançável,
tangível; e o objetivo, nem sempre.

DICA
Nogueira (2009) dá dicas e abre o caminho das pedras para a implantação
do PPP nas escolas. Recomendamos que, se você ficou interessado em
saber mais, leia o livro inteiro, que é muito prático e funcional.

Após falar sobre a postura do professor para viabilizar uma educação participativa,
citando Paulo Freire (1996) e sua Pedagogia da Autonomia, R. A. Freire (2016) aponta para
o artigo 12 da LDB 9394/96, que torna o PPP obrigatório, nos incisos I, IV, VI e VII, que falam
da participação da família e da comunidade no seu processo de elaboração:

I.Elaborar e executar sua proposta pedagógica


IV. velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente.
VI. articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos
de integração da comunidade com a escola.
VII. informar pai e mãe sobre a frequência e rendimento dos alunos,
bem como sobre a execução da proposta pedagógica da escola
(BRASIL, apud FREIRE, 2016, p. 12).

Segundo a autora, a discussão sobre o PPP deve se unir ao debate sobre o


currículo, que tem relação com a ideologia, o já mencionado “currículo oculto”, que inclui
o não dito, como os preconceitos e as tendenciosidades políticas. Somente assim, de
forma abrangente, o trabalho com projetos pode ocasionar:

• quebra da linearidade e fragmentação curriculares;


• flexibilização de tempos e espaços escolares;
• interdisciplinaridade;
• contextualização;
• construção de competências;
• problematização como ponto de partida (FREIRE, 2016, p. 13).

141
Mas isso só acontece se o PPP servir para flexibilizar o currículo, revisando e
readaptando-o de tempos em tempos, em uma comunidade cheia de mudanças e novas
realidades e numa escola em que o professor deve ser um investigador, sempre pronto
a se atualizar e capacitar e para interagir com o aluno na construção do conhecimento.
Inspirando-se em Paulo Freire (1996), o professor não deve viver na ilusão de que detém
todo o saber pronto e acabado, e deve considerar e trazer à baila os conhecimentos
prévios e a cultura do aluno.

Assim, o currículo, segundo Coll, citado por Freire (2016) passa por uma análise
da realidade nos seus aspectos pedagógicos, socioantropológicos, psicológicos e
epistemológicos. O currículo que leva em conta a realidade nesses múltiplos aspectos é
complexo e dialético, não linear, fragmentário e simplista.

A autora finaliza citando o conceito de currículo de Sacristán, que não deve


ser estático e somente composto de conteúdos que se pretende oferecer e os que são
realmente oferecidos, mas deve ser entendido como uma série de processos voltados
para a cultura real:

as decisões prévias a cerca do que se vai fazer no ensino, as tarefas


acadêmicas reais que são desenvolvidas, as formas como a vida
interna das salas de aula e os conteúdos de ensino se vinculam com
o mundo exterior, as relações grupais, o uso e aproveitamento de
materiais, as práticas de avaliação etc.
O currículo pode seguir três eixos pedagógicos diferenciados que
interferem na produção do conhecimento. São eles:
• Multidisciplinaridade – abordagem fragmentada
• Interdisciplinaridade – articulação sem perda da identidade
disciplinar
• Transdisciplinaridade – quebra de fronteiras disciplinares
(FREIRE, 2016, p. 18-19).

O PPP privilegia os dois últimos eixos, pois promove a reversão da fragmentação


dos conhecimentos e põe as disciplinas para dialogarem. Nesse conceito, o aluno é
conscientizado e libertado de sua condição de opressão, segundo Paulo Freire (1996).

Em seguida, Freire (2016) fala sobre avaliação, a que vamos nos dedicar no
subtema a seguir. Mas vamos nos demorar mais um pouco sobre o PPP e sua importância
para o Ensino Religioso.

A autora se dedica, então, à formação visada pelo PPP que é para a cidadania,
o que envolve a religião, o que se dá, ao menos nos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN) pelos temas transversais:

No âmbito dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), a


transversalidade visa a uma educação para a cidadania, em uma
abordagem didática que acolhe a complexidade e as dinâmicas da
vida social. Como eixo norteador, propõe-se uma reflexão ética, uma
análise de causas e efeitos inseridos em suas dimensões históricas e
políticas (FREIRE, 2016, p. 27).

142
DICA
Para os PCNs de 1ª à 4ª séries, consulte: https://cutt.ly/o715IHq. Acesso em:
14 fev. 2023. Para os PCNs de 5ª a 8ª séries, acesse: https://cutt.ly/j715GHw.
Acesso em: 14 fev. 2023. E o link dos temas transversais é: http://portal.mec.
gov.br/seb/arquivos/pdf/ttransversais.pdf. Acesso em: 14 fev. 2023.

É com esses temas que se abrem as oportunidades não só para o exercício


da cidadania, mas também para a formação para ela e para o pluralismo cultural e a
tolerância numa sociedade diversa, que são tão importantes no Ensino Religioso.

É importante que essas questões sejam tratadas coletivamente e que sejam


inseridas no cotidiano escolar, para que perpassem efetivamente todas as disciplinas.

Além da ética, outros quatro temas transversais, fundamentais para o exercício


do cidadania e formação integral são o meio ambiente e seu respeito; a saúde e seu
cuidado; a orientação sexual e suas prevenções e o trabalho e consumo.

Isso indica a complexidade da realidade e da educação, que, segundo Delors


(2001, apud FREIRE, 2016), se compõe de quatro pilares:

• aprender a conhecer – adquirir os instrumentos da compreensão;


• aprender a fazer – agir sobre o meio envolvente;
• aprender a viver junto – participar e cooperar com os outros em
todas as atividades humanas;
• aprender a ser – integrar as três precedentes (FREIRE, 2016, p.
31-32).

O primeiro pilar diz respeito a saber viver na chamada “sociedade do


conhecimento”, que se caracteriza pelo fato de os bens materiais terem se tornado em
grande parte em bens informacionais e comunicacionais, em que o que importa é a
habilidade da metacognição, ou seja, “aprender a aprender”.

No Ensino Religioso, esse pilar diz respeito a identificar as múltiplas religiões e suas
práticas, bem como reconhecer e respeitar o fenômeno religioso quando deparado com ele.

Já o segundo pilar, aprender a fazer, se refere à competência produtiva de


alguém, isto é, sua capacidade de trabalho, que, numa sociedade globalizada, é cada
vez mais a habilidade no trabalho em equipe, de trabalhar colaborativamente.

No Ensino Religioso, esse aspecto significa saber se engajar na luta pela


liberdade religiosa e pela inclusão e contra toda a espécie de preconceitos que possam
surgir em seu meio.

143
Quanto ao terceiro pilar:

Aprender a conviver diz respeito às relações de cada ser humano


com os outros seres humanos e com os seus contextos (social,
cultural, afetivo). Trata-se da competência relacional. Conviver é
relacionar-se. As competências sociais são aquelas que permitem
ao adolescente/jovem desenvolver o potencial inato de se relacionar
com o outro e com a sociedade. Essa competência acontece em dois
níveis: interpessoal e social (FREIRE, 2016, p. 33).

IMPORTANTE
Esse pilar é particularmente importante no Ensino Religioso, pois o convívio
pacífico entre as religiões é o maior desafio dessa parte da educação e diz
respeito diretamente à sua razão de ser, que é a paz e a solidariedade entre
as religiões. Só pelo "com-vívio" é que esses objetivos podem ser alcançados.

Finalmente, com relação ao último pilar, trata-se da competência pessoal de


relacionar-se consigo mesmo. De saber enxergar-se para enxergar melhor o outro e a
realidade circundante.

O desenvolvimento das habilidades relativas e essa competência


deve levar o adolescente/jovem a agir com autonomia, solidariedade
e responsabilidade, bem como a desenvolver a capacidade de tomar
decisões diante de si, do outro e das questões relativas à vida, o que
requer a descoberta de sua própria identidade (FREIRE, 2016, p. 33).

Esse aspecto da aprendizagem também é fundamental para o Ensino Religioso,


pois ele ajuda o indivíduo a se conhecer melhor, e, assim, conhecer e respeitar o outro
em suas especificidades.

Os quatro pilares se relacionam entre si, sendo que o aprender a conhecer é a


teoria que se aplica à prática do saber fazer, que por sua vez, depende do saber conviver
para colaborar no trabalho de forma respeitosa e que, finalmente, se relaciona ao saber
ser por depender do autoconhecimento para respeitar o outro e atingir a plenitude de
seu ser. Os quatro pilares servem a um projeto de ser humano considerado em sua
integralidade e holismo.

144
DICA
Holismo é a doutrina que concebe o indivíduo como um todo que não se
explica apenas pela soma das suas partes, apenas podendo ser entendido
em sua integridade. Também é uma concepção, nas ciências humanas e
sociais, que defende a importância da compreensão integral dos fenômenos
e não a análise isolada dos seus constituintes (HOLISMO, 2023).

Holístico, portanto é tudo aquilo que se refere à totalidade e integralidade das coisas.

E a autora resume:

Desse modo, quando os discentes são mobilizados a explorar


suas habilidades, demonstrar o seu conhecimento, compartilhar
experiências significativas, trabalhar em grupo, produzir
coletivamente, ouvir o outro, respeitar as ideias alheias, pode-se
afirmar que os pilares da educação foram aplicados com sucesso
(FREIRE, 2016, p. 35).

Ela nos faz lembrar ainda que o grande pilar, para além de todos esses é o professor,
que precisa ser reflexivo, ou seja, precisa refletir sobre a sua prática e não há nenhuma
ferramenta melhor para isso do que o planejamento, que inclui o currículo e a avaliação
constante. Isso permite um ensino de qualidade que reflita a realidade escolar cotidiana.

Depois de abordar as famílias e a comunidade e suas relações com a escola,


Freire (2016) volta a tocar especificamente no PPP, dizendo que ele é um momento de
reflexão coletiva sobre pontos fortes e fracos, sobre “onde a escola pretende chegar,
que alunos deseja formar, quais caminhos deve percorrer, que ações aplicar, entre
outros” (FREIRE, 2016, p. 54).

O desenvolvimento do PPP é um processo de construção da identidade da


instituição, que envolve a formação e capacitação docente, a relação teoria e prática e
a ativação, na prática, de planos de ação. Ele está intimamente ligado ao planejamento,
que é um capítulo tão importante da didática.

Para que esse processo se dê na prática, é preciso que se criem espaços não
excessivamente burocráticos e controlados, mas efetivamente democráticos para
permitir a reflexão dos docentes sobre a sua prática pedagógica e criação de soluções
para os problemas enfrentados, lembrando que ninguém tem soluções definitivas e que
é preciso atentar para a necessidade de mudança constante para adaptação à realidade
diversa e mutante.

145
Para isso, o gestor tem que ser um líder efetivo, que não trabalha sozinho, mas
sabe orquestrar os esforços em torno dos objetivos, metas e princípios definidos no
PPP e que trabalhe em equipe e através de colegiados. Ele deve conhecer e investigar
as necessidades da escola e sempre estimular a reflexão dos professores sobre a sua
prática, sua formação continuada e a sua atuação como agentes de transformação.

Assim, ele fará a gestão do conhecimento e da cultura organizacional, sempre


visando a participação efetiva de todos os envolvidos no processo educacional. E ele
criará mecanismos efetivos para tal participação.

O gestor também enxergará o potencial da cada profissional de educação e


estimulará o seu pleno desenvolvimento ao longo da construção do PPP, que deve ser
compartilhado com toda a comunidade escolar.

Os gestores […] precisam deixar claro, para a sua equipe educativa e


para a comunidade escolar, qual é a situação atual na qual e escola se
encontra e como será a transição entre o que de fato a escola pratica e
o que pretende atingir no futuro, o que se espera dos alunos, dos pais
e docentes, e o que a escola irá desenvolver para atingir a situação
desejada. As funções necessitam estar bem divididas e docentes e
profissionais da educação precisam saber de que forma irão contribuir
para as mudanças desejadas no ensino (FREIRE, 2016, p. 60).

A autora nos faz lembrar ainda que o acompanhamento desse processo de


implantação do PPP é tão importante quanto a sua construção, e que deve levar em
conta, ainda:

• bases legais;
• modalidade de ensino;
• projetos;
• princípios e valores;
• plano de ações e metas (FREIRE, 2016, p. 60).

Considerando tudo isso, o PPP deve ser inclusivo, não apenas de pessoas com
necessidades especiais, mas de todas as minorias da sociedade, deve ser dialogal,
democrático, cidadão e com currículo flexível, adaptável às necessidades do indivíduo
bem como às “peculiaridades e necessidades regionais” (FREIRE, 2016, p. 62).

Por isso é que o Ensino Religioso é tão importante, pois permite a inclusão de
pessoas de convicções religiosas diferentes. A autora não menciona, mas não custa
acrescentar que o PPP deve levar em conta também a diversidade das crenças e
convicções religiosas, para que elas sejam consideradas e devidamente respeitadas.

146
Além disso, a autora frisa ainda que o PPP deve dar acesso à escolarização
regular de todos os discentes, respeitando as diferenças e a diversidade, reavaliando
sempre as suas práticas e ações para tomar providências corretivas sempre que
preciso. Por isso a avaliação deve ser constante, dando oportunidade ao feedback tão
necessário ao replanejamento.

Assim, o PPP integra todos os níveis de planejamento da escola, desde o


Planejamento Escolar anual, até o Plano de Ensino e o Plano de Aula. Ele deve refletir uma
metodologia coerente, comprometida com os princípios do PPP, que são a participação,
o diálogo, a inclusão e a cidadania.

Mas como isso se reflete no item específico da metodologia, chamado avaliação?


Vamos nos dedicar a essa assunto a seguir.

3 AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM
Como sempre fazemos, perguntamo-nos, no início dos subtemas o que os
termos significam. E qual é a da avaliação, afinal de contas?

Ao contrário da associação que logo fazemos a provas, testes, exames e notas,


que provocam tanto pavor em suas vítimas, avaliar é estabelecer o valor de algo em face
de certos objetivos que se queira atingir. É o que o ourives faz com a pedra bruta ou o
profissional de penhores, com a joia. Eles enxergam no objeto algo que vai além do que
veem as pessoas comuns, apenas o exterior. Eles fazem uma análise profunda do objeto
e projetam nele todos os seus potenciais. Veem a joia na pedra bruta.

Nesse sentido, avaliar é apreciar, ou seja, estabelecer o preço de algo, mas


também estimá-lo e, porque não dizê-lo logo, amá-lo, como Luckesi (2021) defende
com muita propriedade. Se considerarmos os pressupostos de respeito ao próximo da
religião, nada mais coerente do que isso ao processo de avaliação do Ensino Religioso.

DICA
Há palestras do especialista em avaliação de aprendizagem, Cipriano
Luckesi, no Youtube. Vale a pena conferir as seguintes:
Avaliação da aprendizagem – Cipriano Luckesi. Disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=JqSRs9Hqgtc. Acesso em: 15 fev. 2023.
SME em diálogo - Avaliação para a aprendizagem - Prof. Dr.
Cipriano Carlos Luckesi. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=OO2YscAwrqg&t=85s. Acesso em: 15 fev. 2023.

147
Isso está muito longe da má intenção que está muitas vezes por trás das
chamadas “pegadinhas” em determinadas provas, que visam “puxar o tapete” do aluno
e induzi-lo ao erro.

Está longe também do aspecto punitivo que algumas provas adquirem nas mãos
de determinados professores “linha dura” que as usam como armas ou instrumentos
de chantagem para alcançar o que desejam. Nada como ameaçar aplicar uma “prova
surpresa” para conseguir que a classe faça silêncio, por exemplo. E é assim que a mera
palavra “prova” causa tanto horror e pesadelos nos alunos.

Em Prova, provão, camisa de força da educação, Hamilton Werneck (2001)


defende o fim das provas desse estilo, punitivo, e estabelece que o momento da
avaliação tenha que ser uma hora de aprendizado e enriquecimento.

Esquecem os professores que usam a prova como camisa de força e encaram


os alunos, como suas vítimas, que a palavra avaliação tem embutida o “aval”, ou seja, a
aprovação já de antemão concedida ao aluno.

Então avaliar é aprovar, é reconhecer no aluno as suas potencialidades, como


o já mencionado ourives reconhece a joia pronta na pedra bruta. É motivar, incentivar
e valorizar todo o empenho e esforço do aluno no sentido de alcançar o aprendizado.

Em seu livro sobre avaliação, Luckesi (2021) faz um histórico de como


as tendências pedagógicas jesuítica ou tradicional, da Escola Nova e das Novas
Tecnologias de Informação e Comunicação (NTIC) veem a avaliação. No capítulo final,
sobre o presente com vistas para o futuro, ele identifica a avaliação como um processo
constante e natural ao ser humano que faz parte do seu ver, julgar e agir, principalmente
no que diz respeito à tomada de decisões e o conhecimento da realidade circundante
que ela implica. Todos querem resultados positivos desse processo, portanto ele envolve
uma avaliação consciente ou inconsciente:

Não existem, dessa forma, atos humanos, simples ou complexos, que


não sejam precedidos e acompanhados por um ato avaliativo, ocorra
ele de modo intencional, consciente e crítico ou de modo comum e
habitual. Como também não existe nada que nos cerque, que não
seja objeto de uma avaliação por parte de cada um de nós. A tudo
aquilo que nos cerca, pela via do senso comum ou pela investigação
crítica, a tudo atribuímos uma qualidade, que nos subsidia escolhas.
[…] Epistemologicamente, importa estarmos cientes de que o ato de
avaliar é constitutivo do ser humano. Emergiu no processo evolutivo
do qual fazemos parte e permanecerá conosco pelos tempos afora
enquanto 'o ser humano for ser humano' (LUCKESI, 2021, p. 360-361).

Segundo ele ainda, avaliar é “investigar a qualidade da realidade” (LUCKESI,


2021, p. 261) usando para isso o método do bom senso ou alguma metodologia racional,
e leva à tomada de decisão e, finalmente, à ação, embora essas duas últimas fases já
extrapolem a avaliação em si.

148
Assim, o ato de avaliar pode ser comparado à investigação científica, que tem um
objeto a ser analisado. O cientista se dedica com todo afinco e usando uma metodologia
ao objeto a ser investigado. No caso da avaliação, esse objeto é um ser humano, que
deve ser levado em conta com toda a sua complexidade e subjetividade.

Luckesi (2021) usa ainda outras duas metáforas para explicar o que vem a ser
avaliação, que é a da reta, em que o ponto zero é a coisa em si, o ponto da indiferença e
polo negativo e positivo como as qualidades avaliadas sobre essa realidade. Não existe
indiferença ou neutralidade na avaliação, só a coisa em si.

A outra comparação que ele faz é com a gramática da língua portuguesa,


em que o substantivo é o ponto de indiferença, a coisa em si e o "ad-jetivo", o que o
acompanha, a sua qualidade.

Sintetizando, em uma prática de investigação avaliativa,


necessitaremos de (01) um objeto a ser avaliado, (02) sua
configuração factual ou sua descritiva, (03) um padrão de qualidade,
ao qual a realidade descrita será comparada, tendo em vista atribuir-
lhe uma qualidade, em conformidade com uma escala previamente
estabelecida e assumida como válida. Ao final do percurso desses
três passos, obtém-se a 'revelação da qualidade da realidade',
objetivo final do ato de avaliar (LUCKESI, 2021, p. 365).

Em seguida, o autor estabelece os passos para se processar a avaliação, sendo


que o primeiro é estabelecer o objeto ou “o conjunto de variáveis que configura aquilo
a respeito do que se deseja conhecer sua qualidade” (LUCKESI, 2021, p. 165). Nesse
passo, ainda é preciso estabelecer os recursos de coleta de dados e o padrão de
aceitabilidade dele, o seja, os indicadores ou critérios usados para avaliá-lo. Essa última
parte diz respeito à decisão final, se o objeto preenche ou não os requisitos previamente
determinados para a sua qualificação. Para tanto, como no caso da ciência, é preciso
que se ultrapasse o senso comum, caso se queira alcançar uma avaliação efetiva.

O segundo passo é descrever a realidade de tal forma que ela possa ser
qualificada, através de uma coleta de dados criteriosa. E o autor compara a avaliação
sistemática com a avaliação que fazemos no cotidiano:

Em nossas vidas, instante a instante, praticamos atos avaliativos de


modo praticamente automático e, no caso, a coleta de dados sobre
a realidade a ser avaliada dá-se de maneira quase que imediata e
espontânea. Porém, no âmbito da investigação metodologicamente
definida, há necessidade de consciência e de cuidados para que
efetivamente o objeto de investigação seja descrito segundo os
requisitos necessários de abrangência e validade. No contexto de
projetos de ação e em situações complexas, o ato de avaliar necessita
ser conduzido de forma metodologicamente consciente, tendo em
vista garantir que a identificação da qualidade do objeto abordado
também seja consistente. Nesse contexto, a coleta de dados a
respeito do objeto submetido à investigação avaliativa deverá ser
precisa e rigorosa (LUCKESI, 2021, p. 267).

149
Já o terceiro passo é “atribuir qualidade à realidade descrita” (LUCKESI, 2021, p.
267), o que pode envolver diferentes níveis de subjetividade, coisa que uma avaliação
sistemática e rigorosa tenta evitar. E o autor resume:

Para sintetizar: uma investigação avaliativa exige do avaliador


cuidados com três passos metodológicos: (1) proposição de um
projeto de investigação; (2) produção de uma consistente descritiva
do objeto da investigação, tendo presente suas variáveis; (3) revelação
da qualidade da realidade investigada, através da comparação da
realidade descrita com os parâmetros de qualidade assumidos como
válidos (LUCKESI, 2021, p. 268).

E especificamente na escola, como se dá essa metodologia? Na escola,


a metodologia da avaliação deve ser coerente com o Plano de Ensino e Currículo
efetivamente executado, sendo que não se pode avaliar o que não foi visto, por um motivo
ou por outro. A avaliação, assim, se encaixa naturalmente no Planejamento de Ensino.

E para assegurar uma avaliação efetiva, muito depende do instrumento de


coleta de dados, que deve ser sistemático, ou seja, abrangente o suficiente para medir se
o conteúdo proposto foi aprendido; deve ter uma linguagem compreensível; deve haver
compatibilidade entre o ensinado e o aprendido, conforme o currículo e o Planejamento
de Ensino, não só em termos de conhecimentos, mas também de posturas, competências
e habilidades, e em termos de nível de dificuldade e metodologia empregada; e deve
haver precisão no que está sendo solicitado do aluno.

Finalmente, o processo de avaliação também envolve a qualificação da


aprendizagem dos alunos, que significa calcular os resultados. A tomada de decisão
que vem a seguir, se o ensino foi satisfatório, ir em frente, ou se não, aprofundar alguns
temas do conteúdo, não faz parte mais da avaliação, representando a utilização dos
resultados, que pode ser diagnóstico, probatório ou seletivo.

Quanto ao uso diagnóstico, ele é o que mais damos aos resultados de nossas
ações cotidianas, automaticamente, como explica o autor:

O uso diagnóstico dos resultados da avaliação subsidia o gestor de


um projeto, ou de uma ação, nas decisões relativas aos investimentos
necessários para a obtenção dos resultados desejados com a
qualidade previamente estabelecida, assumida como necessária. A
obtenção dos resultados desejados de uma ação está comprometida
com o uso diagnóstico dos resultados da investigação avaliativa
(LUCKESI, 2021, p. 381).

Já o uso probatório, intimamente relacionado ao diagnóstico, define se o


resultado foi pela aprovação, total ou parcial, ou pela reprovação, total ou parcial. Esse é
o resultado propriamente dito da avaliação.

150
Resumidamente, enquanto o uso diagnóstico subsidia a tomada de ação que
pode se dar durante o andamento da avaliação, o uso probatório estabelece o resultado
de aprovação ou reprovação do processo completo.

No Ensino Religioso, o uso diagnóstico é tão importante quanto o uso probatório,


pois é preciso saber onde o aluno se encontra antes do processo e também a que
resultados o processo de ensino-aprendizagem levou.

Finalmente o uso seletivo se dá, como o próprio nome diz, quando resulta numa
seleção, o que acontece em concursos públicos ou privados e em processos de seleção
dos melhores produtos de determinado ramo.

Esses usos podem se combinar dependendo da intenção da avaliação e tal


decisão cabe ao gestor, como elucida Luckesi (2021, p. 383):

Em síntese, quem decide pela forma de uso dos resultados da


investigação avaliativa – diagnóstico, probatório, seletivo ou de maneira
conjugada diagnóstico/probatória ou probatória/seletiva – é o gestor da
ação, desde que é ele quem administra tanto os recursos utilizados no
decurso da ação, como a própria ação, tendo em vista a obtenção dos
resultados desejados, traçados previamente no seu planejamento.

A combinação mais utilizada nas escolas brasileiras para a avaliação é o uso


probatório/seletivo, que é o menos útil na realidade escolar. De acordo com Luckesi,
ele tem as seguintes características típicas de uma sociedade competitiva em que
predomina a exclusão:

(1) coleta pontual dos dados do desempenho dos estudantes em


sua aprendizagem, o que significa que só valem os conhecimentos
e habilidades revelados de modo positivo, aqui e agora, no momento
em que os testes e tarefas forem realizados;

(2) coleta de dados sobre o desempenho do estudante (testes,


provas, tarefas) coloca um término no processo de ensinar e aprender
um determinado conteúdo ou uma determinada habilidade, à medida
que, ocorrendo a classificação do estudante em um determinado
nível da escala de qualidades admitida como válida, ela se torna
definitiva, isto é, não pode ser modificada, mesmo que o estudante
apresente novos e mais significativos desempenhos. As notas são
definitivas;

(3) classificação probatória dos estudantes em sua trajetória escolar,


seja nas séries escolares do Ensino Fundamental ou do Ensino Médio,
seja nas disciplinas semestrais no caso do Ensino Universitário;

(4) seleção dos estudantes, de um lado, promovendo aqueles que


obtiveram uma média de notas assumida como aceitável, e, de outro,
reprovando aqueles que não obtiveram a média de notas considerada
aceitável pela autoridade pedagógica (Luckesi, 2021, p. 383).

151
E de fato, na escola, a avaliação costuma ser no final do semestre ou do
bimestre, com resultados definitivos e classificatórios. Ela é extremamente excludente e
classificatória, valorizando a competição e a vitória dos considerados mais aptos.

No Ensino Religioso, a avaliação seletiva não se dá, porque não há reprovação,


mas é importante saber que existe tal avaliação para se preparar para tal competitividade.

IMPORTANTE
Ora, se o professor adotar uma postura diagnóstico/probatória, ele poderá
contribuir para amenizar a exclusão e promover um ensino como queria
Comênio (1592-1670), de “tudo a todos”. Uma avaliação menos probatório/
seletiva e mais diagnóstico/probatória não só permite acabar com o
afunilamento dos alunos com acesso a níveis superiores de educação,
permitindo a mais jovens ter acesso ao ensino, mas também torna o
processo avaliativo menos oneroso e penoso e mais prazeroso.

Como o próprio autor coloca:

Assumindo essa postura pedagógica, a prática da avaliação da


aprendizagem deixará de ser algo difícil e complicado, como parece
que tem sido ao longo do tempo. Os professores, de modo usual,
dizem: 'É tão difícil julgar'. De fato, na avaliação, nós não precisamos
julgar, mas sim encontrar modos de agir que tragam soluções
adequadas e satisfatórias para os impasses do cotidiano e para a
aprendizagem dos nossos estudantes. A investigação avaliativa da
aprendizagem, como já temos registrado neste capítulo, é parceira
do educador em sala de aula, subsidiando-o a tomar decisões a favor
da aprendizagem satisfatória por parte de todos os estudantes que
se encontram sob sua responsabilidade (LUCKESI, 2021, p. 388).

Mas tal ruptura de modelos não é fácil e exige do professor comprometimento,


flexibilidade e atitude adulta para com o educando, para que ele não recaia na vala
comum mais uma vez da avaliação probatório-seletiva. Se ele conseguir resistir a essa
tentação de seguir os modelos engessados ele poderá efetivamente formar alunos
cidadãos e autônomos.

A avaliação diagnóstico/probatória também pode significar uma solução para


o eterno dilema da nota de 0 a 10, que serve para quantificar o inquantificável, com
“médias” inadmissíveis e níveis de exclusão absurdos.

De acordo com Luckesi (2021), dificilmente vamos poder quebrar o esquema


das notas, mas podemos decidir o que fazer com elas, que nessa proposta é corrigir o
processo até que todos tenham resultados satisfatórios.

152
O autor nos faz lembrar ainda dos quatro elementos da boa educação: acolher,
nutrir, sustentar, e avaliar; sendo que o acolher implica em partir do pressuposto de que
todos podem aprender e são bem-vindos no processo; nutrir é alimentar o educando
com conteúdos de primeira; sustentar é realimentar o educando e demonstrar-lhe amor,
quando se percebe que ele não está acompanhando; e avaliar é “observar a qualidade
da aprendizagem dos estudantes e os consequentes resultados alcançados frente aos
atos de ensino” (LUCKESI, 2021, p. 398), sendo que a avaliação, se for negativa, não
servirá para excluir mas para corrigir o processo para que todos tenham a chance de
aprender. “E... certamente aprenderão com os nossos cuidados” (LUCKESI, 2021, p. 398).
O autor conclui que:

Os passos metodológicos do ensino-aprendizagem – exposição,


assimilação, exercitação, aplicação, recriação e elaboração de
sínteses – só serão bem utilizados se as condutas do educador
estiverem configuradas pelos cuidados de acolher, nutrir, sustentar
e avaliar. O convite é para que todos nós invistamos no sucesso dos
atos de ensinar-aprender em nossas escolas no decurso de todas
as horas, de todos os dias, semanas, meses e anos da escolaridade.
A avaliação sempre foi e sempre será a parceira do ser humano
na busca dos resultados desejados através da ação e, no caso do
ensinar-aprender, importa que seja utilizada na parceria com os
atos de acolher, nutrir e sustentar a experiência da aprendizagem de
nossos educandos (LUCKESI, 2021, p. 399-400).

Mas você pode se perguntar, objetivamente, quais as formas existentes de


avaliação? As formas são a avaliação diagnóstica, avaliação formativa e a avaliação somativa.

De acordo com Col (apud FREIRE, 2016) a avaliação, a princípio, deve ser
diagnóstica para se conhecer o aluno, para depois se dar pelo acompanhamento e
observação da evolução do aluno ao longo do processo de ensino-aprendizagem. Os
professores mais experientes desenvolvem uma intuição e sensibilidade especial para
as dificuldades e bloqueios dos alunos e são flexíveis o bastante para se adaptar às
suas necessidades.

A avaliação formativa, por sua vez, segundo Freire (2016), é contínua e leva em
conta todo o desempenho do aluno e não apenas um momento avaliativo específico. Ela
aplica os princípios do construtivismo, pelos quais os erros não são punidos, mas vistos
como parte do processo de aprendizado do aluno. Segundo a autora, a autoavaliação,
em que o indivíduo ou instituição se avalia a si mesma, inclusive a institucional, é uma
forma da avaliação formativa.

Já a avaliação somativa
[…] leva em conta, basicamente, os resultados, sendo essa a (sic)
ainda a avaliação mais comumente vista atualmente. Esse tipo de
avaliação traz números e conceitos objetivos que auxiliam os órgãos
gestores das escolas e do governo na tomada de decisões, uma vez
que estabelece uma classificação para a análise do aprendizado
(FREIRE, 2016, p. 20).

153
O IDEB, Índice de desenvolvimento da Educação Básica, é um exemplo de forma
de avaliação somativa, além das provas tradicionais. Infelizmente, esse tipo de avaliação
muitas vezes é usado para punir o aluno e como ferramenta para chantageá-lo.

E o famoso Enem? Ou o vestibular? Você já deve ter passado por algum deles.
São traumáticos, não são? E até que ponto realmente medem o desempenho e a
capacidade do candidato?

Esperamos que tenhamos esclarecido o que a avaliação realmente quer dizer e


contribuído para a sua desmistificação.

154
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• a conceituação do PPP em seu contexto e sentido;

• a utilidade e papel do PPP no cotidiano escolar;

• a avaliação e seu sentido no processo de ensino-aprendizagem.

• questões pertinentes ao Ensino Religioso que consubstanciam sua prática em sala


de aula e fundamentam a tomada de decisão principalmente quanto à sua didática,
desde o planejamento, até a sua avaliação;

• a avaliação como apreciação, e não como punição, o que é extremamente relevante


ao Ensino Religioso, já que ele não pode reprovar;

• que a avaliação tem que ser efetiva para ser atrativa.

155
AUTOATIVIDADE
1 Um projeto político-pedagógico é um documento que orienta as ações e decisões de
uma instituição de ensino, estabelecendo suas metas, objetivos e princípios pedagógicos.
Quanto ao Projeto Político Pedagógico assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Que ele veio atualizar o Plano Diretor da Escola, sendo um documento, como
aquele, que é guardado a sete chaves no arquivo da escola e ao qual só o diretor
tem acesso.
b) ( ) Que ele é a identidade da escola, envolvendo missão, visão, objetivos, comunidade
e público-alvo e muito mais.
c) ( ) Que ele é uma condição imposta pela LDB 9394/96 que deve ser seguida cega e
mecanicamente, sem maiores discussões.
d) ( ) que ele é um documento elaborado pelo diretor da escola, que afinal de contas, a
conhece melhor e tem a maior competência para elaborá-lo.

2 Quanto aos quatro pilares da educação: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender
a viver junto e aprender a ser, analise as sentenças a seguir:

I - Os quatro pilares podem ser alcançados quando a proposta pedagógica da escola


é holística.
II - Os quatro pilares são altamente específicos e especializados, não tendo nada a ver um
com o outro.
III - Os quatro pilares se relacionam entre si, um não funcionando sem a colaboração
do outro.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) Somente a sentença III está correta.
d) ( ) As sentenças I e III estão corretas.

3 A avaliação tem um conceito que vai além do dar uma nota. Com relação ao seu conceito
discutido neste tema de aprendizagem, classifique V para as sentenças verdadeiras e F
para as falsas:

156
( ) A avaliação é unicamente o momento em que se quantifica o aprendizado com notas
de 0 a 10 e se aprova ou reprova o aluno.
( ) Avaliar é dar o aval, ou seja, é aprovar de antemão o educando, considerando suas
potencialidades.
( ) Avaliar é sempre um ato de amor, que faz parte dos elementos da boa educação que
são, além de avaliar, acolher, nutrir e sustentar.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) F – V – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 De acordo com o visto nesse tema de aprendizagem, discuta, em um texto dissertativo,


qual o grande problema na implantação do PPP nas escolas. Que requisito do PPP não
está sendo efetivamente cumprido e o que isso põe em risco?

5 A avaliação deixa muita gente insone e preocupada. Há um asco generalizado contra


a palavra “prova”. Debata em uma redação argumentativa que tipo de revolução deve
haver no entendimento da avaliação para que esse quadro se reverta.

157
158
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
MÉTODOS E TÉCNICAS
DO ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO
Caro Acadêmico, neste tema de aprendizagem, vamos aprender e conceituar o
que é método, metodologia e o que, didática.

Vamos estudar, ainda, as tendências pedagógicas como base para que você
possa decidir qual delas abraçar. Falaremos principalmente de métodos e técnicas que
essas escolas utilizam e como elas se aplicam ao Ensino Religioso.

Abordaremos também os modernos métodos ativos, que são recomendáveis ao


Ensino Religioso, principalmente para prender a atenção, tendo em vista a frequência
não obrigatória.

Mas antes de começarmos, vamos contar mais uma história budista (os budistas
são bons em contar histórias) que nos diz muito em relação à metodologia. Estava, um
dia, Buda andando pela floresta com seu discípulo Ananda e ficou com muita sede.
Pediu ao discípulo que voltasse três quilômetros até um rio que eles acabaram de passar
e colhesse água na tigela dele. Quando Ananda chegou lá, um carro de boi passou e
revolveu toda a lama da água, de modo que ela ficou imprópria para ser tomada.

Quando Ananda voltou para o Buda, Ananda sugeriu que ele fosse à frente, pois
ouviu dizer que tinha um rio, três ou quatro quilômetros mais para frente. Mas Buda
ordenou para que ele voltasse atrás, pois àquela hora o rio já estaria sem lama e que
esperasse, caso ainda estivesse impróprio para tomar.

Ananda ficou revoltado, pois a sua solução lhe parecia mais razoável, mas,
assim mesmo, obedeceu. Quando chegou ao rio, esse ainda não estava completamente
sem lama, de modo que ele teve que esperar. Daí a mais alguns minutos, a água ficou
cristalina e ele a levou ao mestre.

Ao chegar lá, agradeceu ao Buda, pois tinha aprendido uma grande lição: que
não adianta avançar, quando as coisas ainda não estão assentadas na mente e que é
melhor recuar e esperar, do que ir à frente, para o desconhecido.

159
Figura 3 – O riacho e a mente de Ananda

Fonte: http://www.maisbelashistoriasbudistas.com/anandario.jpg. Acesso em: 31 mar. 2023.

O mesmo acontece com as nossas lições de Ensino Religioso: é melhor voltar


atrás e seguir um método gradual e que exige paciência do que querer avançar no
conteúdo sem que o anterior tenha sido plenamente compreendido.

DICA
Veja essa história, chamada “O Riacho e a mente de Ananda” e muitas outras
em http://www.maisbelashistoriasbudistas.com/historia.htm.
Acesso em 31 mar. 2023.

2 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS E SEUS MÉTODOS


Antes de falarmos das tendências pedagógicas e para fundamentá-las, é
preciso que consideremos a área onde elas são estudadas, que é a didática, também
chamada de metodologia. Essa disciplina intitula-se Didática e Metodologia do Ensino
Religioso. Então, nada mais sensato do que estudar o que significam esses termos.
Metodologia vem de methodos, do grego, que significa caminho, que é a via que se
utiliza para alcançar determinado objetivo. E metodologia é o estudo desse caminho.

Para compreendermos a diferença entre método e técnica vamos usar uma


ilustração: imagine que você queira viajar para os Estados Unidos. Primeiro, você tem
que escolher a via ou caminho: terrestre, aéreo ou marítimo. Essa é a metodologia.
Dentro do terrestre, você pode escolher o carro, o ônibus ou o trem e suas tecnologias.
Essa é a técnica. Assim, a técnica é a operacionalização prática do método. Todo método

160
tem várias técnicas e as ciências têm métodos e técnicas. E a ciência que estuda os
métodos é a didática. Mas essa é muito mais do que apenas isso. Ela envolve toda uma
filosofia, antropologia, sociologia e psicologia próprias.

Uma maneira de acabar com reducionismos em determinada área e sobre um


conceito é estudar o que ele não é. Greggersen (2022, p. 34) não só diz o que didática
não é, mas também esclarece o que ela vem a ser:

Então, didática não é:


• ...simples “transmissão de conhecimentos”.
• ...um conjunto de métodos e técnicas que garantem a
aprendizagem
• ...história dos pensadores da educação
• ...algo desvinculado ou descomprometido com o cotidiano e com
o meio político-social
• ...uma combinação de várias disciplinas
• ...um campo de conhecimento sem objeto próprio e sem
finalidade (diretriz) precisa, portanto, não é ciência.

Mais adiante, a autora analisa o que então vem a ser a ciência da didática:

A palavra "didática“ vem do grego didaché, que quer dizer "magistério“,


"instrução“ ou "ensino“ (“teaching”). Na Roma antiga, as crianças em
geral e, no sentido pejorativo, também os jovens delinquentes eram
chamadas de didicoi. Esse nome é sistematicamente registrado, pela
primeira vez, intitulando um manual de instruções cristão antigo,
também conhecido como "Didaquê: O Ensino dos Doze Apóstolos“. Foi
provavelmente escrito na Síria do séc. I d.C. embora alguns críticos o
atribuam a período posterior; o documento só foi descoberto em 1873,
sendo publicado em 1883 pelo grego Philotheos Bryennios. Didaquê é
um compêndio de preceitos morais, de instruções para organização de
comunidades cristãs e regras para o serviço litúrgico. Contém as mais
antigas orações e diretrizes eucarísticas (batismo, jejum, oração e do
ministério de bispos, diáconos e profetas). Os primeiros cristãos o usaram
como material de apoio à leitura e ensinamento do Novo Testamento
na instrução principalmente de novos convertidos. Esse documento
representa hoje uma importante fonte de informações sobre a fé e a
vida dos primeiros cristãos da história (GREGGERSEN, 2022, p. 35).

Didática, então, é uma ciência, mas também uma arte. Ela envolve estratégias
de ensino, procedimentos e recursos para a aprendizagem. De acordo com o dicionário
Priberam, trata-se da

1. Arte de ensinar com método os princípios de uma ciência ou as


regras e preceitos de uma arte.

2. Ciência que estuda os métodos e técnicas para ensinar.

3. Obra ou manual didático (DIDÁTICA, 2023, on-line).

161
INTERESSANTE
Há uma controvérsia, pelo fato de ser uma arte, se a didática é ciência, tanto
que ela foi banida dos currículos de formação de professores por algum
tempo. Mas hoje, quer se queira chamar de “Didática”, ou “Metodologia de
ensino”, ou ainda de “Prática de ensino”, ela não só é admitida, como vista
como fundamental nos currículos de pedagogia e licenciaturas.

E a didática no Brasil pode ser classificada em escolas, que ora valorizam mais
o educador, ora o educando. Elas também são chamadas de “tendências pedagógicas”.
É importante estudarmos as tendências pedagógicas pois, como futuros professores
de Ensino Religioso, não devemos simplesmente reproduzir as tendências que mais
se consagraram, que são as tradicionais, mas pesquisar o que outras tendência têm a
oferecer. E temos duas categorias: as liberais ou seja, que apoiam o capitalismo e sua
forma de vida; e as progressistas, que fazem a sua crítica.

Entre as liberais, temos:

Tradicional – que se centra no professor, o detentor do saber e autoridade


máxima. Ele transmite o saber de forma sistemática, abstrata e rigorosa. A disciplina
é mantida a todo o custo e o saber é enciclopédico. Não há participação do aluno e os
valores morais são cultivados. Há uma tendência para valorizar os castigos físicos. O
professor é autoritário. No Ensino Religioso é a tendência mais utilizada.

Comportamentalista – Também chamado de tecnicista e do inglês para


comportamento, behavior, behaviorista. Essa tendência é baseada nos experimentos de
Pavlov (1849-1936) com animais e nos estudos de Skinner (1972) sobre o comportamento
humano. Nela, valoriza-se os estímulos dados pelos professores e as respostas ou
reações dos alunos.

O ensino é programado, como mostram as “máquinas de ensinar” inventadas


pelos seus defensores. A ideia é que o aluno funciona como uma máquina, que dadas
algumas matérias-primas, ou inputs, irá produzir certos resultados ou outputs.

DICA
Saiba mais sobre as máquinas de ensinar no site da UFRGS, disponível em:
https://www.ufrgs.br/psicoeduc/behaviorismo/maquina-de-ensinar-de-
skinner-1/. Acesso em 20 fev. 2023.

162
Para essa tendência, o planejamento é crucial e determinante da aprendizagem.
Ela também valoriza os métodos e as técnicas que são consideradas garantias para o
sucesso do aprendizado. Daí também ser chamado de tecnicismo. No Ensino Religioso
é usado pelos cursos a distância.

Construtivista – também chamada de tendência cognitivista, pois valoriza


a cognição no processo de aprendizagem. Ela é baseada nas experiências de Piaget
(1896-1980) e seus discípulos. Sobre essa tendência, Greggersen (2022, p. 47) afirma:

Segundo essa tendência, ensinar é provocar o educando a sair de


sua zona de conforto e desafiá-lo a atingir um novo patamar no seu
desenvolvimento cognitivo. É despertar o interesse e a experiência
do aluno. O ensino é baseado no ensaio e erro, na pesquisa, na
investigação, na solução de problemas por parte do aluno e não na
aprendizagem de fórmulas, nomenclaturas, definições, etc. dadas
e acabadas. Assim, a primeira tarefa da educação consiste em
desenvolver o raciocínio. O ponto fundamental do ensino, portanto,
consiste em um processo e não em produtos de aprendizagem.
Já aprender é “aprender a aprender” de forma significativa. A
aprendizagem só se realiza realmente quando o aluno elabora seu
conhecimento. Isso porque conhecer um objeto é agir sobre ele e
transformá-lo. O mundo deve ser reinventado e construído a partir
das instâncias que cuidam da educação, não apenas a escola.

A aprendizagem, nessa tendência, é participativa e graduada, daí construtivismo,


pois há etapas na construção do conhecimento também chamadas de estágios. O
professor é o mediador do aprendizado e não simplesmente a autoridade máxima. Ele
negocia os conteúdos com os alunos.

No Ensino Religioso, essa tendência é abraçada por escolas que adotam o


método construtivista.

Quanto às tendências progressistas, temos:

Humanista – também chamada de não diretiva ou libertadora, em que a ênfase


está na liberdade e autonomia do aluno. Ele é que conduz o aprendizado e se autoavalia.
O professor é um terapeuta e o aluno, seu paciente ou cliente. Ele sempre tem razão.

Para os defensores dessa tendência, ensinar é facilitar a aprendizagem


através de uma prática terapêutica. O ensino centra-se na pessoa do
educando, o que implica orientá-lo para sua própria experiência para
que, dessa forma, construa a sua própria ação. Já aprender é interagir
com os demais participantes de modo a provocar envolvimento
pessoal e suscitar mudanças no comportamento e nas atitudes. O
conceito de educar é considerar a pessoa em sua sensibilidade e sob
o aspecto da realização pessoal e de potencialidades, que passam
a ser incluídas efetivamente na aprendizagem. É o educando que
avaliará o sucesso ou fracasso do processo de ensino-aprendizagem,
através da autoavaliação (GREGGERSEN, 2022, p. 48-49).

163
A relação professor-aluno é quase anárquica, sendo que o aluno tem autonomia
para tomada de decisão e para o seu comportamento, que não deve ser reprimido. Os
inspiradores são A.S. Neil (1883-1973), C. Rogers (1902-1987), e D. Ausubel (1918-2008).

DICA
Conheça a incrível escola de Summerhill, fundada por A.S. Neil, disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Summerhill_School. Acesso em 20 fev. 2023.

No Ensino Religioso, essa tendência é praticamente inexistente.

Libertária – também chamada de sociocultural ou crítico-social dos conteúdos.


De base marxista mais contundente, essa tendência valoriza aprendizagem entendida
como libertadora da condição de opressão do aluno. A metodologia é problematizadora
e participativa.

A educação é um constante ato de desvelamento da realidade, um


esforço permanente, através do qual os homens vão percebendo
criticamente como estão sendo no mundo. Neste processo, os
alunos deverão assumir, desde o início, o papel de sujeitos criadores.
Os conteúdos servem para dar acesso ao patrimônio cultural comum
da humanidade, tornando o educando um “cidadão do mundo”. É
responsabilidade do professor dar acesso a tais conteúdos pois
o educando tem direito a iguais oportunidades de crescimento
profissional e pessoal (GREGGERSEN, 2022, p. 49-50).

Como o objetivo é a conscientização, a tendência é inclusiva, ou seja, valoriza


a igualdade entre raças, gêneros, orientação sexual, etc. E o professor é visto como
alguém engajado na luta por uma sociedade mais justa e fraterna.

Essa tendência se inspira em pensadores como Paulo Freire (1921-1997), Sniders


(1917-2011) e Saviani (1943-).

Há os que fazem uma distinção entre a tendência Libertária e a Histórico-crítica


ou Crítico- social dos conteúdos, em que a última valoriza, além da conscientização
política, também os conteúdos do patrimônio cultural comum da humanidade aos quais
todos devem ter acesso. Mas esses conteúdos não são ministrados de forma acrítica
como no ensino fundamental, mas de forma reflexiva e em relação dialética com a
realidade cheia de contradições políticas.

164
Posso dar um exemplo de tendência libertária e crítico-social a partir da
Educação de Jovens e Adultos (EJA) em que um professor ficou dando aulas de
política, a partir de recortes de jornal aos seus alunos, mas eles fracassaram na prova
do supletivo para alcançar o seu certificado. Ele valorizou a conscientização e deixou de
lado os conteúdos.

No Ensino Religioso, essa tendência é a dos profissionais que lutam pelo


pluralismo, pela igualdade e justiça social entre as religiões e pelo diálogo inter-religioso.

Mas entre as tendências liberais e as progressistas, tem despontado uma


metodologia alternativa, que reúne o que há de melhor nas duas propensões: as
metodologias ativas, às quais vamos nos dedicar agora.

3 METOLOGIAS ATIVAS E ENSINO RELIGIOSO


As metodologias ativas estão na moda nos meios acadêmicos, mas que
também podem ser utilizados no Ensino Básico. Elas são aquelas que seguem o lema:
“Alunos passivos, nunca mais!” Basicamente elas estimularam a ação do aluno, que se
vê colocado em situações em sala de aula, reais ou simuladas, em que tem que resolver
ativamente problemas. As perguntas que o professor que adota essa metodologia tem
que se fazer são as seguintes:

Como formar estudantes ativos? O que ganharemos se nos dedicarmos


a formar estudantes ativos? Há riscos nisso? Podem ocorrer perdas?
Que tipo de dificuldades teremos que enfrentar para formar estudantes
ativos? Os ganhos compensam o esforço para a mudança? Quais novas
funções o professor e a escola devem desempenhar na formação de
alunos ativos? (GREGGERSEN, 2022, p. 60).

E tais perguntas são comprometedoras, pois o professor costuma ficar inseguro


e se perguntar: “e se o aluno perguntar algo a que não sei responder?”, ou o que é pior:
“e se a aula sair do controle?”.

À primeira pergunta, ele pode responder, conscientizando-se de que ele não


é detentor de todas as respostas e tendo humildade suficiente para responder que vai
pesquisar (e cumprir com a promessa).

À segunda pergunta, ele pode se fazer outra pergunta: o que de pior que pode
acontecer se as coisas “saírem do controle”. O que é “sair do controle” afinal de contas? É
ter uma classe mais barulhenta? Normalmente o que temos são fantasias de catástrofes
que dificilmente se realizarão na prática e o “fora de controle” em geral é mais controlável
do que parece.

165
Mas, afinal, porque essa fixação pelo controle? Será que dar aula é uma questão
de poder e nada mais? Em que “manda quem pode e obedece quem tem juízo”?

As metodologias ativas pedem para o professor deixar de lado esses medos, que
são naturais, pois todos nós temos medo da mudança e dos hábitos tradicionais, e ser
mais arrojado no seu método de ensino, arriscando deixar o aluno participar efetivamente.

ATENÇÃO
Para isso, ele precisa levar em conta que há aqueles alunos que preferem
ser deixados em paz, ou preferem o ensino tradicional, mas esses são
os mais raros hoje em dia e os restantes normalmente só precisam de
certo estímulo para passarem a participar. Nada como uma boa dinâmica
de grupo para acabar com os medos de mudança tanto de professores
quanto de alunos.

A realidade de hoje ajuda muito nessa mudança, pois as TIC estão cada vez
mais presentes e exigem autonomia do aluno. Assim, o ensino tradicional está cada vez
mais obsoleto, sendo que as demais tendências pedagógicas estão sendo mais e mais
estudadas e consideradas. E as metodologias ativas tentam extrair o que há de bom em
cada uma delas.

Mas de onde vieram as metodologias ativas? Elas se inspiraram na já


mencionada Taxonomia de Bloom; na aprendizagem significativa de D. Ausubel (1973) e
no construtivismo de Piaget (1896-1980).

Brito e Chagas (2023) aproximam a aprendizagem significativa de Ausubel do


Ensino Religioso, dizendo que essa abordagem leva em conta as experiências dos alunos.

Nesse aspecto, em considerando a teoria e a prática a partir


da experiência concreta, o educador Ausubel (1973) diz que a
aprendizagem torna-se significativa para o aluno quando ele consegue
associar aos diversos conhecimentos apreendidos às suas próprias
experiências pessoais. Isto, nas vozes de Silva e Schirlo (2014), ocorre
quando o educando consegue vivenciar, direta ou indiretamente, os
diversos saberes que lhes são ministrados em sala de aula. Nesse
sentido, nós observamos que a aprendizagem significativa seria um
processo de apreensão de novos conhecimentos e a ressignificação
daqueles já adquiridos a partir de uma interação entre os novos
conhecimentos/experiências e aqueles pré-existentes, provocando
mudanças profundas e produtivas na estrutura cognitiva do
educando (BRITO E CHAGAS, 2023, p. 76).

166
O que a aprendizagem significativa diz, em essência, é que aprendemos a
partir de conhecimentos prévios que são articulados de maneira dialética e interativa
a novos conhecimentos, principalmente aqueles com lastro na experiência concreta e
significativa, e, assim, dá-se o desenvolvimento. Isso é especialmente importante no
Ensino Religioso, que lida como o fenômeno sagrado:

Nesse caso, as inter-relações entre o ensino e a aprendizagem do


fenômeno religioso, particularmente, não devem refletir apenas os
aspectos abstratos e conceituais da sistematização da experiência
do Sagrado, mas devem estar escoradas nas experiências
interpretativas e na práxis da vida humana em face de sua maneira
peculiar de compreender e de lidar com sua espiritualidade. […] Trata-
se, portanto, de se lançar sobre a religião e religiosidade um olhar
capaz de abstrair ideias e conceitos, mas que também seja capaz
de descobrir nas estruturas da linguagem religiosa a verdadeira
essência do fenômeno religioso, proporcionando a compreensão
de suas diversas formas de expressão e de experiência (BRITO E
CHAGAS, 2023, p. 76-77).

A aprendizagem significativa é congênere do Ensino Religioso, pois ambos lidam


com o sentido, o significado e buscam um entendimento maior, uma epistemologia
engajada, de valores que constituem uma sociedade.

É a partir da ideia de um sagrado construído e de uma antropologia que o Ensino


Religioso deve se estruturar, ideia essa que se alcança pela aprendizagem significativa:

Assim, uma epistemologia do ER baseada na aprendizagem


significativa deve se estruturar no Sagrado-construído e não no
Sagrado-existente; e isso condiciona uma organização de métodos,
conteúdos e estratégias de ensino que sejam capazes de extrair, dessa
capacidade humana de criar deuses, mecanismos adequados para
se ajuizar valores sociais, éticos, políticos, econômicos e culturais.
Essa proposta epistemológica, de estruturar o fenômeno religioso
centrado no Sagrado-construído, não deve ser compreendida como
espantosa. A sua fundamentação lógica vê-se estampada no fato
de que é através do ser humano que o Sagrado ganha vida e corpo,
e se mostra ao mundo, pois é a partir das inter-relações pessoais
e interpessoais que o divino age entre os homens, criando leis,
determinando costumes e práticas que, no final das contas, afetam
toda a sociedade (BRITO E CHAGAS, 2023, p. 79).

A aprendizagem significativa permite ver a realidade em suas diferentes formas


de manifestação e permite articular o velho ao novo, coisas fundamentais para o Ensino
Religioso. E já que a religião valoriza o significado e o sentido, essa metodologia é
particularmente interessante para a área.

167
IMPORTANTE
Apesar de termos de lidar com a realidade a partir das ideias, não precisamos
ficar apenas no nível das ideias, como querem os autores, pelo que recaem
num idealismo e relativismo perigoso. Há uma realidade inabarcável mas
não menos real, toda para explorarmos aí fora.

Assim, a aprendizagem significativa não valoriza apenas as ideias, mas o reflexo


que a realidade tem em nossas mentes, uma realidade viva e concreta, que exige de
nós uma resposta. Justamente por essa realidade ter tanto sentido, por ser bolada
por um Criador, é que podemos ver sentido nas coisas que ela reflete. A religião serve
justamente para reconhecer esses sentidos transcendentes, que a ciência não enxerga,
e usá-los para o nosso aprendizado, crescimento e orientação na vida. A aprendizagem
significativa parte do concreto, da experiência, para dar sentido àquilo que parece
desconexo ou é novo para nós. É assim que ela contribui para o desvelamento da
realidade que nos circunda e assim também, da realidade religiosa, que é tão misteriosa.

E é essa realidade que as metodologias ativas, que, como dizíamos, se inspiram


na Aprendizagem Significativa, querem encarar e levar em conta com sua proposta de
considerar a experiência do aluno.

As metodologias ativas levam em conta ainda a autonomia e autogerenciamento


do indivíduo e a complexidade das relações entre o eu e o outro.

Vamos utilizar a mesma estratégia que usamos com o termo didática para nos
aproximarmos do conceito de metodologias ativas, explicitando primeiramente o que
elas não são.

metodologia ativa não é:


• ativismo irrefletido;
• simples uso mecânico de meios audiovisuais ou tecnologias de
informação e comunicação (TIC);
• mero uso do ensino programado;
• disfarce da incompetência em termos de conteúdo;
• transferência ao aluno da responsabilidade pela aula;
• negação da teoria e construção de “bolhas no ar”;
• algo que o aluno aceita com facilidade (GREGGERSEN, 2022,
p. 61-62).

Principalmente, metodologia ativa não é uma desculpa para não dar ou não
preparar aula. Já viram aquele professor que dá seminário para os alunos, para eles
darem conta da matéria que era de sua responsabilidade? Isso acontece muito no
Ensino Religioso. Pois é: as metodologias ativas não se prestam para isso.

168
Ou então a questão das “bolhas no ar”, em que você sai de uma aula em que
há muita discussão, mas você se pergunta, efetivamente, o que foi que você aprendeu.

E a autora prossegue, dizendo o que metodologia é, afinal de contas:

• trabalho com a cabeça e as mãos;


• trabalho baseado no pensamento complexo;
• uso da filosofia reflexão-ação-reflexão;
• assunção de dinamismo nas aulas;
• unidade entre pensamento e ação transformadora, que significa
construir, transformar, incorporar, modificar etc.;
• interação entre sujeito e objeto, sujeito e sujeito;
• ação interiorizada que envolve o aspecto ativo;
• resultado do pensamento produtivo e objetivo;
• uma metodologia baseada na motivação (despertamento do
interesse, provocação, desafio, desequilíbrio);
• uma metodologia baseada na mediação;
• uma metodologia dinâmica, interativa e dialógica;
• uma metodologia inter e transdisciplinar;
• uma metodologia que incentiva a autonomia e iniciativa do
sujeito na construção do saber;
• uma metodologia que nega as atividades mecânicas e rotineiras,
proporcionando experiências de vida (GREGGERSEN, 2022, p. 62).

Mas o que são as metodologias ativas do ponto de vista filosófico? Resumindo


em uma palavra:

A nível epistemológico podemos dizer que uma metodologia é ativa


quando o indivíduo interage dinamicamente com os objetos (fatos,
dados, problemas, meio social) em experiências significativas que lhe
possibilitem abstrações, operações, descentrações, coordenações e
formalizações (GREGGERSEN, 2022, p. 62).

Em termos práticos, a aprendizagem ativa consiste em propor qualquer


atividade antes da aula, também chamado de “sala de aula invertida”, como forma de
preparo para a aula propriamente dita, em que o aluno seja ativo, como uma leitura, um
brainstorming, uma enquete ou uma pesquisa prévia.

Temos, ainda, as técnicas do Project based Learning (PbL), Aprendizagem


baseada em Projetos (ABProj); o Problem based learning, a Aprendizagem baseada em
Problemas (ABP), e o Team based learning (TBL), Aprendizagem baseada em equipes.

E você pode se perguntar em termos práticos, se existe algum roteiro para essas
metodologias. Quanto à ABP, temos o seguinte esquema:

A ABP se divide nas seguintes fases:


1. apresentação do PROBLEMA;
2. DEFINIÇÕES e esclarecimentos sobre o problema;
3. ANÁLISE do problema e decomposição;
4. GERAÇÃO DE IDEIAS E HIPÓTESES explicativas;

169
5. formulação dos OBJETIVOS de aprendizagem;
6. busca de NOVOS CONHECIMENTOS (fontes de informação);
7. REVISÃO das hipóteses iniciais e SÍNTESE dos conhecimentos
atualizados (GREGGERSEN, 2022, p. 63).

A ABProj depende do tipo de projeto que se quer propor, que pode ser do tipo
explicativo, que é basicamente teórico; do tipo construtivo, que gira em torno de um
produto final; ou do tipo investigativo, que envolve uma investigação mais profunda.

Mas a metodologia ativa mais praticada, principalmente nos cursos de


administração é o Estudo de casos, que é uma situação problemática, real ou fictícia,
que é apresentada para os alunos criarem soluções para o problema.

DICA
Veja uma aula sobre o passo a passo do Estudo de Caso em https://
www.youtube.com/watch?v=k9Gv3W0MfNQ. Acesso em 24 fev. 2023. O
interessante está do começo ao oitavo minuto.

A metodologia ativa envolve a avaliação constante de seu sucesso para os


devidos ajustes a fim de se alcançar o máximo de aprendizado possível. Nesse sentido,
há alguns critérios que se pode seguir, conforme sugerido por Greggersen (2022, p. 64):

Dentre os critérios para a boa metodologia ativa podemos dizer que ela é:
• construtivista – deve se basear em aprendizagem significativa;
• colaborativa – deve favorecer a construção do conhecimento
em grupo;
• interdisciplinar – deve proporcionar atividades integradas a
outras disciplinas;
• contextualizada – deve permitir que o educando entenda a
aplicação deste conhecimento na realidade;
• reflexiva – deve fortalecer os princípios da ética e de valores morais;
• crítica – deve estimular o educando a buscar aprofundamento
de modo a entender as limitações das informações que chegam
até ele;
• investigativa – deve despertar a curiosidade e a autonomia,
possibilitando ao educando a oportunidade de aprender a aprender;
• humanista – deve ser preocupado e integrado ao contexto e
inclusão social;
• motivadora – deve trabalhar e valorizar a emoção;
• desafiadora – deve estimular o estudante a buscar soluções.

170
As metodologias ativas são tão importantes no Ensino Religioso porque
fomentam a autonomia e reflexão crítica do sujeito, a fim de que ele possa vivenciar
inteiramente a sua liberdade religiosa e conhecer as demais de forma respeitosa e
detalhada. Assim, pode-se contribuir para uma sociedade mais tolerante e solidária no
que diz respeito às religiões.

Vamos agora falar de uma das metodologias ativas para a avaliação. Segundo
Col, citado por Freire (2016) ainda, a forma de registro das observações do aluno no
sentido de avaliá-lo pode servir para tornar o processo transparente e democrático.
Um dos instrumentos de registro de atividades é o portfólio, que é muito interessante
aplicado ao Ensino Religioso.

Trata-se de um dossiê de trabalhos e produções avaliativas de todos os tipos


(pesquisas, resenhas, notas pessoais, representações visuais, etc.) realizados pelo aluno
em determinado período de tempo e em determinada disciplina, recolhidos numa pasta
ou caixa, também chamados de “continente”. Ele demonstra todo o esforço, dedicação,
evolução e necessidades do educando ao longo do seu processo de aprendizagem.
Vieira (2002) cita Sá-chaves (2000 apud Vieira 2002) referem-se:

[...] ao portfólio reflexivo como sendo instrumentos de diálogo entre


educador e educando, que não são produzidos só no término do
período para fins avaliativos. São continuamente (re)elaborados na
ação e partilhados de forma a recolherem, em tempo útil, outros
modos de ver e de interpretar, que facilitem ao aluno uma ampliação
e diversificação do seu olhar, levando-o à tomada de decisões, ao
reconhecimento da necessidade de fazer opções, de julgar, de definir
critérios, além de permitir as dúvidas e conflitos para deles poder
emergir mais consciente, mais informado, mais seguro de si e mais
tolerante quanto às hipóteses dos outros. (VIEIRA, 2002, p. 150)

Trata-se de um instrumento que estimula a reflexão e a autorreflexão que permite


documentar todo um desenvolvimento e rendimento numa determinada disciplina. Ele
permite ao professor ir além da mera nota e reavaliar a sua atuação, bem como ao aluno
visualizar toda a sua evolução e, assim, desenvolver sua autonomia no aprendizado.

Ele também oportuniza o desenvolvimento da identidade e da criatividade


do educando, promovendo a sua educação integral com uma relação natural com o
conhecimento escolar. O portfólio fomenta a cooperação entre pais, alunos e professores
no sentido de obtenção dos resultados almejados e estimula que o aluno trace os seus
próprios objetivos de aprendizado.

Vieira (2002, p. 151), inspirada em outros autores, estabelece os passos que são
necessários para o trabalho com portfólio, quais sejam:

171
o estabelecimento do objetivo do portfólio por parte do docente;
o estabelecimento das finalidades de aprendizagem por parte de
cada estudante; a integração das evidências e experiências de
aprendizagem; a seleção das fontes que comporão o portfólio e a
reflexão do estudante acerca de seu próprio desenvolvimento.

De acordo com os resultados da pesquisa de Vieira, os depoimentos dos alunos


entrevistados sugerem que o portfólio lhes tirou o temor da prova, tornando a avaliação
quase imperceptível e conscientizando-os do seu próprio processo de aprendizado por
ocasião da avaliação, sem medo de errar e de expressar seus sentimentos e percepções.

Complementarmente a isso, as autoras Cotta e Costa (2023, p. 172) comentam


que o portfólio se insere nas discussões contemporâneas sobre as competências e
fomentam um aprendizado dialógico, reflexivo e holístico:

Nessa perspectiva, o portfólio reflexivo inscreve-se no contexto


de formação por competências e de avaliação formativa, cuja
aprendizagem se pauta no feedback constante entre professor-
estudante e estudante-estudante. Os resultados devem centrar-se
no processo de construção do conhecimento de forma dialógica
e criativa, transcendendo o formato cristalizado, pontual e
classificatório utilizado nas avaliações tradicionais.

Em sua pesquisa, as autoras propõe um instrumento de avaliação de portfólios,


inspirado nos quatro pilares da educação e com espaço para a autoavaliação e a
avaliação do professor, que foi testado na pesquisa. Para julgar a metodologia avaliativa
foi feita uma avaliação de “sobe” e “desce” sobre as potencialidades do portfólio. Os
resultados foram os seguintes:

Na análise do Panorama Sobe-Desde, observou-se que o tamanho


das palavras e, ou, expressões é proporcional à frequência com que
essas são citadas pelos estudantes. Assim, aparecem como fatores
motivadores (Sobe) do uso do portfólio reflexivo mais enfaticamente:
o trabalho em equipe, o tipo de aprendizado, o conteúdo, a relação
com temas atuais e a criatividade; seguidos, em menor intensidade,
pela conexão teoria e prática, ser crítico-reflexivo, proporcionar
discussão, tipo de avaliação inovadora e uso de metodologias ativas.
Como fatores desmotivadores (Desce) aparecem mais fortemente: o
tempo (falta), a sobrecarga, a dificuldade do trabalho em equipe e o
fato de ser um método trabalhoso (COTTA E COSTA, 2023, p. 180).

172
IMPORTANTE
Apesar de ser mais trabalhoso, o método avaliativo do porfólio é extremamente
interessante para o Ensino Religioso porque não tendo reprovação, há espaço
para inovação no processo avaliativo. Além disso, o portfólio é adequado para
levar em conta a diversidade e integralidade da realidade religiosa, formando
para a autonomia, criatividade e cidadania, coisas que, como já vimos, estão
no horizonte dos objetivos do Ensino Religioso.

Para mais experiências de Ensino Religioso em sala de aula, recomendamos o


livro Práticas inclusivas no Ensino Religioso, de B. K. Liechocki (2020), que traz casos de
uso da arte no Ensino Religioso, o Projeto Famílias pelo mundo, o uso da contação de
história, o uso de bonecos no ensino, a interdisciplinaridade com história e cultura afro-
brasileira, o uso das tecnologias e muitas outras experiências práticas de um ensino
religioso inclusivo e interdisciplinar.

No mesmo sentido e com dicas para o planejamento, foi escrito o livro Ensino
Religioso na prática: sequências didáticas para a educação infantil e os anos iniciais
do Ensino Fundamental, de J.C. Souza (2022), que traz sugestões práticas voltadas
para professores de Ensino Religioso e estudantes de Ciências das Religiões que
estejam em diálogo com a educação, para a estruturação de aulas, com base nas
recomendações da BNCC.

173
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:

• Conceitos de didática, metodologia e técnica, relacionando esses termos entre si.

• As tendências pedagógicas e sua aplicação no Ensino Religioso.

• As metodologias ativas, o que são e o que não são e sua relação com o fenômeno
religioso e o Ensino Religioso.

• Os elementos do portfólio como método avaliativo adequado para o Ensino Religioso.

174
AUTOATIVIDADE
1 A didática faz parte da ciência pedagógica, sendo responsável por estudar os processos de
ensino-aprendizagem. De acordo com essa definição e o visto no tema de aprendizagem,
assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A didática limita-se a um conjunto de técnicas de aprendizado que garantem o


sucesso desse empreendimento.
b) ( ) A didática é algo desvinculado ou descomprometido com o cotidiano e com o meio
político-social
c) ( ) A didática é um campo de conhecimento sem objeto próprio e sem finalidade
precisa, portanto, não é ciência.
d) ( ) A didática é a arte e a ciência da educação, com estratégias e procedimentos de
ensino-aprendizagem.

2 Os professores devem estudar e se apropriar das tendências pedagógicas, que servem


de apoio para a sua prática. Eles devem procurar analisar cada uma de acordo com
a conveniência para seu desempenho acadêmico. De acordo com isso, analise as
sentenças a seguir:

I - As Tendências Pedagógicas seguem um cronograma que isola uma tendência da


outra, sem que haja sobreposições.
II - Cada um escolhe a Tendência Pedagógica mais adequada a cada momento .
III - Hoje em dia, há polarização das tendências, sendo que cada um escolhe a sua, sem
que haja mistura entre elas.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Metodologia ativa de aprendizagem é uma ferramenta excelente para facilitar o


aprendizado de adultos, ou seja, andragogia, impulsionada pela superação de desafios
e resolução de problemas. Atualmente, uma das formas de metodologias ativas mais
utilizadas é o ensino híbrido. De acordo com isso e as aulas do tema de aprendizagem,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

175
( ) A metodologia ativa é o uso mecânico de meios audiovisuais ou Tecnologias de
Informação e Comunicação (TICs) e do ensino programado.
( ) A metodologia ativa serve para disfarçar quando não deu tempo de preparar o conteúdo
e transferir a responsabilidade da aula para o aluno.
( ) A metodologia ativa serve para evitar aulas muito teóricas e promove a construção de
“bolhas no ar”.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) F – F – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Há resistência por parte de professores e alunos para porem em prática as metodologias


ativas. Em um texto dissertativo, coloque os motivos para essas resistências tanto da
porte de professores quanto de alunos e as formas de combatê-las.

5 Certas pessoas acham que a aprendizagem significativa é adequada para o Ensino


Religioso pois privilegia as ideias às coisas mesmas. Elas podem achar que valorizando
as ideias sobre o sagrado, não se recai na polêmica sobre a sua verdade. Disserte sobre
a visão alternativa dessa que também valoriza a aprendizagem significativa como
adequada para o Ensino Religioso.

176
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
APRENDIZAGEM VIVENCIAL
E ENSINO RELIGIOSO

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, no presente tema de aprendizagem, vamos aprender mais sobre


metodologia de ensino e didática num modelo chamado de Aprendizagem Vivencial.

Iremos abordar as suas bases que são os tipos psicológicos ou temperamentos,


em que você terá oportunidade de se testar e os estilos de aprendizagem, que formam
o fundamento para o ciclo de Aprendizagem Vivencial.

Isso tudo será aplicado ao Ensino Religioso, pois entre os objetivos da


Aprendizagem Vivencial está abarcar a multiplicidade dos estilos de aprendizado, o que
pode abranger também os estilos religiosos e, assim, a variedade de crenças religiosas.

2 TIPOS PSICOLÓGICOS E ESTILOS DE APRENDIZAGEM


Por que estudar os tipos psicológicos é tão importante quando se fala em
religião? É isso que Enio Starosky (2020) investiga em seu livro, que é a sua tese de
doutorado: Temperamentos e Religião. Em seu prefácio, o orientador da tese, Jean Luiz
Lauand diz que o estudo contribui não apenas para a identificação de tipos religiosos,
mas também para a aceitação desses tipos, para o entendimento entre eles e para o
diálogo inter-religioso. Vamos retomar essa tese no final deste tema de aprendizagem.

Mas o que são tipos psicológicos? De acordo com Ramos (2005) eles se inspiram
nas pesquisas e tipologia elaboradas por Carl Gustav Jung (1875-1961) e ampliadas por
Myers e Briggs (1995).

A tipologia de Jung parte de dois tipos essenciais: o introvertido, que se volta para
dentro e se orienta, em suas atitudes por valores internos, subjetivos; e o extrovertido,
que se volta para fora, e se orienta por fatores objetivos, externos.

Nunca um indivíduo é cem por cento extrovertido ou introvertido, sendo que, se em


nível consciente, ele é extrovertido, o nível inconsciente compensa essa tendência, sendo
introvertido; e se em nível consciente ele for introvertido, o nível inconsciente é extrovertido.

177
Figura 4 – Disposição de introvertida e extrovertida

Fonte: Ramos (2005, p. 139)

Além das disposições de introversão e extroversão, Jung definiu mais dois


pares de disposições, a sensação e a intuição, que são irracionais; e o pensamento e
o sentimento, que são de julgamento ou racionais, resultando em oito combinações
possíveis, às quais Myers e Briggs acrescentaram o par percepção e julgamento,
formando 16 combinações alternativas que caracterizam o tipo psicológico de cada um.

Ramos define dois pares dessa combinação da seguinte forma:

sensação: essa função privilegia as informações recebidas pelos


órgãos dos sentidos, constatando a presença sensorial das coisas
que nos cercam no contexto do “aqui e agora”.
intuição: essa função vai além da sensação, buscando os significados,
relações e possibilidades futuras das informações recebidas. Trata-
se de uma apreensão perceptiva dos fenômenos (pessoas, objetos
e fatos) pela via inconsciente. A intuição “vê” a natureza “oculta”
desses fenômenos. […]
pensamento: essa função discrimina, julga e classifica os fenômenos
a partir da lógica da razão, buscando avaliar objetivamente os “prós”
e “contras” da natureza desses fenômenos.
sentimento: essa função faz a avaliação dos fenômenos a partir
de uma dimensão valorativa - eles são agradáveis ou não (RAMOS,
2005, p. 140-141).

O total de quatro pares são opostos, porém complementares, e fornecem o


equilíbrio do sujeito. Eles se dividem em quatro funções psíquicas, da predominante, ou
superior, à mais rudimentar e inconsciente, ou inferior.

178
Figura 5 – Disposições da consciência

Fonte: Ramos (2005, p. 143)

O tipo psicológico de cada um pode ser determinado desde a infância, e a


estrutura essencial não se modifica ao longo da vida. Mas ele pode se modificar por
fatores externos e internos. E quando uma disposição inferior toma o controle do
indivíduo, isso é uma psicopatia que deve ser tratada.

Quanto aos oito tipos psicológicos resultantes da combinação das disposições


de Jung, temos:

ET (pensativo extrovertido) – ocorre predominantemente em homens. Esse tipo


é descrito por Ramos (2005, p. 147) da seguinte maneira:

Sua atitude tende a estabelecer uma ordem lógica e objetiva entre as


ideias (sic). O raciocínio abstrato não os atrai. Esse tipo gosta de fazer
prevalecer seus pontos de vista que coordena de maneira rígida,
tornando-se muitas vezes autoritário.
O ponto fraco desse tipo é o sentimento. Embora capaz de ter
afeições profundas, tem grande dificuldade de reconhecer seus
juízos valorativos associados às emoções e expressar seus afetos.
Não é raro que tais indivíduos sejam emocionalmente infantis e
dependentes, apresentando súbitas e violentas explosões de afeto
- por exemplo, ciúme doentio. Estes fenômenos são decorrentes
de uma função sentimental introvertida inferior e que, sendo mais
inconsciente, possui uma significativa autonomia sobre a psique.
Esse tipo é geralmente encontrado em engenheiros, trabalhadores
técnicos, inventores, políticos, comerciantes, administradores,
empresários, economistas, advogados, filósofos, sociólogos,
psicólogos e teólogos objetivistas, entre outras profissões.

EF (sentimental extrovertido) – esse tipo ocorre com mais frequência entre as


mulheres. Sobre esse tipo, Ramos (2005, p. 147-148) diz o seguinte:

179
Mantém adequada relação com os objetos exteriores. Segue as
regras gerais de convivência socialmente aceitas, tendendo a
permanecer fiel aos valores sociais que lhe são inculcados desde
a infância. É acolhedor e afável. Costuma ter um grande círculo de
amigos. Guia-se pelo julgamento valorativo do que lhe agrada ou não
no mundo exterior: pessoas, ideias e objetos. O ponto fraco desse
tipo é o pensamento. Atrás de sua aparente afabilidade, muitas
vezes esconde pensamentos sem juízos fundamentados, reflexões
preconceituosas e teimosias. Quando o controle do sentimento
falha, surgem pensamentos de autodesvalorização, principalmente
sobre sua capacidade intelectual. Estes fenômenos são decorrentes
de uma função pensativa introvertida inferior e que, sendo mais
inconsciente, possui uma significativa autonomia sobre a psique.
Esse tipo é geralmente encontrado em socialites, profissionais da
moda, modelos, publicitários, arquitetos, decoradores, donas de
casa, entre outras profissões.

ES (sensitivo extrovertido) – esse tipo aprecia as coisas objetivas sensoriais. É


prático e gosta das coisas concretas. Sabe viver a vida e desfrutar de seus prazeres.

Sua fraqueza é a intuição, mas ela aflora do nível subconsciente quando ele deve
explicar coisas misteriosas, quando ele apela para o misticismo de forma surpreendente
para quem está acostumado com o seu realismo.

Ele é um executor mais do que um planejador e geralmente torna-se empresário,


comerciante, técnico, mecânico ou engenheiro.

EN (intuitivo extrovertido) – esse é o tipo visionário, que não gosta de


situações estáveis, mas muda com frequência. Ele deixa para outros colherem os
frutos de seu trabalho.

O ponto fraco desse tipo é a sensação corpórea de si mesmo


(cinestesia). Quando o controle da intuição falha, surgem sintomas
de hipocondria, fobias e sensações físicas das mais absurdas. Estes
fenômenos são decorrentes de uma função perceptiva introvertida
inferior e que, sendo mais inconsciente, possui uma significativa
autonomia sobre a psique. Os homens de negócio são os principais
exemplos desse tipo. São pessoas mais motivadas para atividades
de planejamento do que execução de tarefas (RAMOS, 2005, p. 149).

Quanto aos tipos introvertidos, temos os seguintes:

IT (Pensativo introvertido) – é um tipo mais frequente entre homens. Gosta do


pensamento abstrato e raciocínio lógico subjetivo. O ponto fraco é o sentimento.

Embora consiga identificar seus sentimentos, não é fácil para ele expressá-los.
É considerado frio por alguns ao seu redor. Tem sentimentos profundos e extremos: ou
ama, ou odeia.

180
Fica perdido quando os sentimentos tomam conta e ele explode, o que o deixa
fora do sério. É quando as funções inferiores de extroversão tomam conta. Tem crises
de ansiedade. Normalmente abraça profissões como a de matemático, físico, filósofo,
psicólogo, teólogo, sociólogo, dentre outras.

IS (Sentimental introvertido)

Esse tipo é geralmente identificado em mulheres. Tendem a ser


calmas, retraídas e silenciosas. São pouco abordáveis e difíceis de
compreender porque, sendo dirigidas pelo sentimento introvertido,
suas verdadeiras intenções permanecem ocultas. São verdadeiros
'enigmas'. Nutrem sentimentos secretos e internos, mas dificilmente
os exprime externamente, guardando-os para si (o que pode se tornar
uma fonte de sofrimento psíquico). As relações com o objeto amado
são mantidas dentro de limites bem medidos. Toda manifestação
emocional exuberante vinda do objeto pode lhe desagradar e
provocar reações de repulsa, irritabilidade. Vista do exterior, pode
parecer fria, quando na realidade oculta grandes paixões (RAMOS,
2005, p. 150-151).

A fraqueza desse tipo psicológico está no pensamento, tendo dificuldades na


teorização e estruturação dele. Assim, pela pobreza de seus raciocínios, frequentemente
ele recai nas visões preconceituosas, se mostrando muitas vezes judicativos e teimosos.
Por se acharem sempre com a razão, essas pessoas podem ser autoritárias ou impositivas.

Esse estilo projeta o que os outros pensam dele de forma negativa, sendo
que se submete a uma função extrovertida inferior que é inconsciente e tem relativa
autonomia sobre o quadro psicológico do indivíduo.

IS (Sensitivo introvertido) – atém-se à sensação das coisas que acontecem.


Prefere a impressão subjetiva a essência da coisa. Tem uma forte sensibilidade artística.
Tem como ponto fraco a intuição.

Quando a sensação falha, torna-se vítima de neuroses obsessivas,


neurastenias e hipocondria. Esses fenômenos são decorrentes
de uma função intuitiva extrovertida inferior e que, sendo mais
inconsciente, possui uma significativa autonomia sobre a psique
(RAMOS, 2005, p. 151).

IN (Intuitivo introvertido) – vive fechado dentro de si. Prefere os mitos e contos


de fadas do que a realidade dos fatos. É um peregrino que escolhe seguir as artes. Tem
uma veia profética e visionária.

Quando a intuição sai do controle, pode sofrer de hipocondria, neuroses


obsessivas e neurastenia, isso quando o inconsciente extrovertido emerge na psique.

Com o acréscimo do julgamento e da percepção por Myers e Briggs, formaram-


se 16 tipos que seguem os seguintes elementos.

181
Tabela 1 – Elementos dos tipos psicológicos

Fonte: Ramos (2005, p. 152)

Os 16 tipos sãos os seguintes:

Quadro 1 – Quadro dos 16 tipos psicológicos segundo Myers e Briggs

Fonte: Ramos (2005, p. 154)

182
DICA
Veja a descrição completa dos 16 tipos no artigo de Ramos (2005),
disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/
view/779/794. Acesso em: 21 fev. 2023.
E veja, ainda, um site que descreve os 16 tipos psicológicos em inglês e um
teste do tipo psicológico que pode ser realizado em português: https://
keirsey.com/. Acesso em: 21 fev. 2023.

Starosky (2020, p. 260) analisa os tipos psicológicos com relação à religião e


faz uma tipologia. Citando alguns exemplos de líderes religiosos, de acordo com o seu
tipo, ele explica:

Muito líderes e inspiradores religiosos são ENFP. O site DK indica,


entre outros, Dalai Lama (e sua pregação toda centrada na
compaixão), Martin Luther King Jr, (para quem o point da luta não
era pela igualdade nem pelos direitos civis, mas porque o racismo
provocava a corrosão da alma de quem o pratica!), Nelson Mandela, a
personificação do ubuntu.

DICA
"Nas palavras do próprio Mandela, ubuntu é um espírito comunitário, que
significa 'Respeito, solicitude, compartilhar, cuidar, confiar, abertura para o
outro'” (STAROSKY, 2020, p. 227).

Quanto aos ENFJ, podemos citar Tolstói, o Papa João Paulo II e o bispo Desmond
Tutu. Trata-se de líderes muito carismáticos que dão muito valor à coletividade.

Já os INFP têm por protagonista o apóstolo João:

Analisarei agora mais detidamente o caso do INFP, na figura do


apóstolo João. Os grandes santos vivem a santidade a seu modo,
em seu temperamento, em seu tipo. Se Pedro era claramente um
SP impulsivo, se Bento de Núrsia era nitidamente um ISTJ – em
oposição a um Francisco de Assis, protótipo do ISFP, como mostra
Lauand (2018, pp.); o evangelista João aparece-nos como um INFP
(STAROSKY, 2020, p. 233).

Storosky faz uma análise minuciosa do personagem João e seu perfil religioso.

183
Entre os INFJ, podemos citar T.E.Lawrence (Lawrence da Arábia), C.S. Lewis.
Martinho Lutero e Gandhi.

Como ISTJ podemos, segundo Starosky (2020), citar Bento XVI, e Madre Teresa
de Calcutá como ISFJ.

Starosky (2020) também faz uma investigação dos quatro evangelistas quanto
aos seus tipos psicológicos.

A modo de conclusão, o autor alerta para que as diferenças dos polos I/E, S/N,
F/T e J/P nas práticas espirituais e devocionais seja levadas em conta, sendo que os
líderes religiosos que privilegiam um em detrimento de outro

[…] construirão uma igreja facciosa que absolutiza a justiça (T) e sufoca
a caridade (F); ou que favorece o rigor da lei (SJ) em detrimento da
legítima criatividade (SP); que impõe misticismos intimistas (NF) a
uma maioria de fiéis que busca apenas a orientação para o prosaico
quotidiano (S) etc. Sem falar nas particularidades mais detalhadas dos
dezesseis tipos desenhados por Keirsey. É um alerta sobretudo para os
líderes e ministros de cada comunidade, sempre tentados a criar uma
igreja à sua imagem e semelhança (STAROSKY, 2020, p. 304).

Tal alerta vale não só para o líder religioso, mas também para o professor,
que tende a dar aula apenas para o tipo psicológico e estilo de aprendizado que lhe é
congênere. Trata-se de um narcisismo daqueles que impõe como padrão e, no caso dos
religiosos, com ares de absoluto, os seus próprios valores e jeito de ser.

Starosky (2020) traça importantes implicações disso para o diálogo inter-religioso:

Um importante horizonte é o do resgate necessário do diálogo inter-


religioso, das diferentes formas de pensar dogmas e doutrinas.
Reabilitar o olhar não condenatório, não julgador […] e restabelecer um
importante aspecto do homo hermeneuticus – o esforço consciente
de compreender, de levar seriamente em consideração a situação do
outro e o modo peculiar como também ele vê e interpreta o mundo.
Compreender corresponde à ordem divina de interpretar tudo da
melhor maneira. É profundamente sugestivo o fato de Jesus não
ter ordenado que necessariamente nos entendêssemos, mas que
nos amássemos uns aos outros, pois compreender implica em estar
desnudo, desarmado, exposto, aberto a ouvir, sentir e compartilhar
as dores do outro. Compreender é concórdia, com-cordar; estar junto
do coração do outro e considerar que sempre há um modo diferente
de ver as coisas (STAROSKY, 2020, p. 305).

O autor nos faz lembrar que conversar vem de verter-se um para o outro e que
o diálogo sempre implica numa abertura para a especificidade e identidade do outro. Ele
estabelece as bases para o entendimento. Permite colocar-se no lugar do outro e ver o
mundo através de seus olhos. A falta dessa abertura bem humorada para a diversidade
é que leva à violência e até ao desejo de eliminar o outro, como faziam os gregos com
os estrangeiros bárbaros.

184
IMPORTANTE
Você deve se perguntar qual a solução para as violências cada vez mais
frequentes em relação à religião, sejam verbais e psicológicas, no discurso
de ódio, sejam físicas. Para o autor, ela se encontra no diálogo. Pois o diálogo
pode levar à cura de desvios como a vontade de violência (STAROSKY, 2020).

Como nos explica Starosky (2020, p. 308):

O diálogo tem um poder terapêutico e psicanalítico de causar o


profundo bem de curar. Afinal, todos temos alguns pontos cegos
que os outros podem ajudar a iluminar. […] Quanto bem estaríamos
trazendo à convivência e aos relacionamentos pessoais se os debates
e as boas conversas com posições divergentes não recaíssem na
velha visão dicotômica de ortodoxia X heresia? Quanto bem fariam
os líderes religiosos se o ato pastoral sempre fosse o de ajudar as
pessoas a fazerem escolhas melhores sem impor o que devem
fazer? Sem a pretensão de transformá-las em cópias de si mesmos
e deixando a direção da vida ser de responsabilidade de cada um?

Outro benefício do conhecimento dos tipos religiosos pode trazer é quanto


à pretensão dos líderes religiosos em serem bons em tudo, em agradar a todos os
gostos, o que os coloca sob um stress tão grande, que cometem abusos de poder. O
conhecimento dos tipos psicológicos de Keirsey pode combater esse tipo de situação,
tornando o líder mais tolerante e flexível consigo mesmo e com os outros.

Com esse conhecimento, finalmente, é possível que o líder religioso seja mais
um clínico geral do que um cirurgião, que sabe muito de anatomia e de cortar partes do
corpo, mas nem sempre entende a inteireza da saúde do paciente.

Recomendo, por isso, não o saber do anatomista, do cirurgião – que


busca separar peças, seccionar e remontar os cortes e recortes
temperamentais dos 16 tipos – ainda que isso não seja um mal em
si --, mas saber do clínico geral que pensa em levar em conta e
em iluminar a heterogeneidade, a singularidade e a individualidade
de cada tipo. Uma personalidade integral, pois, como sabemos,
inteireza e santidade andam de mãos dadas. […] Portanto, a busca
por objetividade na compreensão será eternamente incompleta
e permanecerá sempre em estado de rascunho e provisoriedade.
Como na brilhante intuição paulina, em 1Co 13.12, de que “o que agora
vemos é como uma imagem imperfeita num espelho embaçado,
mas depois veremos face a face. Agora o conhecimento é imperfeito;
depois conheceremos perfeitamente” (STAROSKY, 2020, p. 312-313,
grifos do autor).

O autor termina a sua tese com uma citação de C. S. Lewis que, em seu livro O
problema do Sofrimento, exalta a diferença, lembrando que não se faz uma orquestra
com um tom e um instrumento só, e que a unidade só existe graças à diversidade.

185
Mas como isso tudo se aplica ao ensino e, particularmente, à aprendizagem?

3 APRENDIZAGEM VIVENCIAL NO ENSINO RELIGIOSO


Você já deve ter notado que as pessoas não aprendem da mesma forma.
Umas preferem a exposição teórica e têm facilidade com a abstração. Outras preferem
aprender fazendo, pondo a mão na massa.

Pois é, a partir dos tipos psicológicos, um pesquisador chamado David Kolb (1984)
e sua equipe desenvolveram uma teoria que classifica os Estilos de Aprendizagem. De
acordo com Cerqueira (2008, p. 5):

A teoria de aprendizagem experiencial descreve quatro dimensões do


desenvolvimento: estrutura afetiva, estrutura perceptual, estrutura
simbólica e estrutura comportamental. Essas estruturas estão
inter-relacionadas no processo adaptativo holístico do aprendizado.
A partir da teoria de aprendizagem experiencial, Kolb (1984) define
estilo de aprendizagem como sendo: “um estado duradouro e estável
que deriva de configurações consistentes das transações entre o
indivíduo e o seu meio ambiente.

Kolb iniciou as suas pesquisas em 1971 com estudantes universitários ávidos


por alcançar o sucesso profissional e estudantil num meio cada vez mais mutante e
diversificado. Ele estudou como esses alunos aprendem e tomam decisões, resultando
em um modelo baseado na experiência, que denominou de experiencial ou vivencial.

ATENÇÃO
Para isso, Kolb (1984) inspirou-se nas pesquisas de Lewin (1890-1947) sobre
a psicologia do aprendizado, e associou o aprendizado diretamente ao
desenvolvimento, coisa que poucas teorias da sua época faziam. Ele também
bebeu da fonte de Rogers (1902-1987) e seu personalismo, Piaget (1896-1980)
e seu construtivismo e Paulo Freire (1996) e sua pedagogia da autonomia.

Esse desenvolvimento segue quatro modelos básicos. Como explica Cerqueira


(2008, p. 6)

O modo como é modelado o curso do desenvolvimento pode ser


descrito pelo nível de estrutura integrativa nos quatro modos de
aprendizagem:

186
• a estrutura afetiva na experiência concreta resulta em vivência
de sentimentos mais importantes;
• a estrutura perceptual na observação reflexiva resulta em
observações mais aguçadas;
• a estrutura simbólica na conceituação abstrata resulta na
criação de conceitos mais apurados;
• a estrutura comportamental na experimentação ativa resulta em
atos maiores e mais complexos.

Esses estágios se desenvolvem em um crescendo em forma de cone, sendo que


eles se relacionam cada vez mais dialeticamente com o avanço do desenvolvimento,
que se dá em três estágios de maturação: aquisição, especialização e integração, Isso
nos faz lembrar os movimentos de assimilação e acomodação de Piaget (1991). Vemos
influência em Kolb (1984) também da teoria de aprendizagem de Vygotsky (1896-1934).

As formas elementares de aprendizado são a acomodação e a divergência.


Quando elas se combinam:

[…] o resultado é um aumento na estrutura integrativa afetiva através


da resolução dialética entre intenção e extensão. A combinação
de formas de aprendizado divergentes e assimilativas produzem
aumento na estrutura integrativa perceptual através da resolução da
dialética entre apreensão e compreensão. A construção do modelo
indutivo de assimilação, em combinação com as observações
de divergência apreendidas pelo indivíduo, produz categorias
integrativas mais complexas de percepção (CERQUEIRA, 2008, p. 8).

Os quatro estilos de aprendizagem são: acomodador, divergente, convergente


e assimilador. Cada um deles puxa mais para uma das fases do ciclo de aprendizagem
vivencial, dividido em

Experiência Concreta: aprender através dos sentimentos e do


uso dos sentidos; Observação e Reflexão: aprender observando;
Conceituação Abstrata: aprender pensando. A aprendizagem, nessa
etapa, compreende o uso da lógica e das ideias;
Experimentação Ativa: aprender fazendo. A aprendizagem, nessa
etapa, toma uma forma ativa (CERQUEIRA, 2008, p. 8).

Transversalmente, indo da Experiência Concreta para a Conceituação


Abstrata temos a dimensão da “apreensão” e da Observação Reflexiva para a
Experimentação Ativa, temos a dimensão da “transformação”.

Observe, quanto a isso, o diagrama abaixo:

187
Figura 6 – Dimensões estruturais do processo de aprendizagem vivencial

Fonte: Rosa et al. (2019, p. 8)

O inventário de estilos de aprendizagem engloba 12 questões de quatro


alternativas cada, para a determinação do Estilo de Aprendizagem de cada um. E as
perguntas são as seguintes:

Quadro 2 – Inventário do Estilo de Aprendizagem de Kolb

Fonte: Assunção (2017, p. 6)

188
O resultado é bem estudado em profissionais da saúde, da administração e da
educação, sendo que a maioria dos estudantes universitários das áreas de humanas
é assimilador. Isso pode ser devido ao processo de seleção dos candidatos que já
pressupõem o estilo assimilador, como todo o sistema de ensino universitário privilegia.

Apostamos que os estudantes de Teologia e Ciências das religiões também


seriam assimiladores, por sua tendência à teorização e abstração.

Quanto ao modelo de Kolb (1984), temos o seguinte esquema:

Figura 7 – Modelo de Kolb

Fonte: Rosa et al. (2019, p. 10)

A descrição de Cerqueira (2008) foi resumida por Assunção (2023) no


seguinte quadro:

Quadro 3 – Estilos de aprendizado David Kolb

Fonte: Assunção (2017, p. 4)

189
O professor que segue esse modelo, além de respeitar o estilo de aprendizagem
do aluno, estrutura a sua aula de modo a ela começar com algo conhecido, que é concreto
e significativo para o aluno: uma notícia de jornal, uma música, uma ilustração com algo
concreto, problematizado. Depois, ele passa para o brainstorming da solução do problema.
Em seguida, ele passa para a teorização e para os conceitos abstratos. Finalmente, ele faz
uma aplicação prática da teoria para permitir ao aluno ver o sentido de tudo aquilo.

DICA
Conheça o conceito de brainstorming em: https://www.significados.com.br/
brainstorming/. Acesso em: 25 fev. 2023.

Para dar um exemplo do ensino técnico, numa aula de ergonometria, o instrutor


começaria com a notícia de um acidente de trabalho, ocorrido por falta de segurança.
Ele pediria aos alunos para observarem a situação para o levantamento de problemas
ocorridos e responsáveis. Depois, o instrutor passaria para a teorização sobre segurança
de trabalho daquela área específica. Finalmente, ele iria até a máquina, faria uma
demonstração e pediria aos alunos para experimentarem as normas de segurança.

Com isso, todos os estilos de aprendizagem estão contemplados e têm a


oportunidade de aprender ativamente.

No Ensino Religioso, uma aula seguindo a Teoria da Aprendizagem Vivencial


poderia começar com uma notícia de violência religiosa cometida, por exemplo, por
evangélicos contra terreiros, seguiria com um brainstorming (tempestade de ideias)
quanto à violência religiosa e uma aula teórica sobre os direitos à liberdade religiosa.
Ao final, poder-se-ia organizar a visita a um terreiro de umbanda, ou convidar um líder
religioso dessa religião a dar uma entrevista sobre as violências sofridas.

IMPORTANTE
No campo do Ensino Religioso, essa metodologia não apenas é interessante
porque leva em conta a peculiaridade do estilo de aprendizagem do
educando, mas também porque enche de significado a teoria sobre as
diversas religiões e fenômenos do sagrado. Assim é possível tratar o
fenômeno religioso em sua especificidade pragmática, sem julgar o certo e
o errado. Aplicando essa metodologia, é possível tornar as aulas de religião
mais atraentes, interessantes e significativas, levando em conta que a
frequência às aulas é voluntária.

190
Gostou desse tema de aprendizagem? Com isso, finalizamos a disciplina e
desejamos a você todo o sucesso em sua carreira, e que você seja um profissional
competente e consciente, capaz de contribuir para um mundo melhor e mais solidário.

191
LEITURA
COMPLEMENTAR
APRENDIZAGEM VIVENCIAL NO MERCADÃO MUNICIPAL DE CAMPO GRANDE/MS

Renato de Oliveira Rosa


Katianny Santana Gomes Estival
Adriane Angélica Farias Santos Lopes Queiroz

Introdução

O uso de metodologias ativas deve contribuir para a evolução do uso de tecnologias


de informação no ensino, que possui foco na participação efetiva do aluno no processo
de ensino aprendizagem. A aprendizagem vivencial considera o aprendizado como um
processo, no qual o conhecimento é produzido por meio da transformação da experiência.

No contexto dos novos desafios para o ensino, a aprendizagem da administração,


busca conhecer, interpretar e resolver problemas de gestão presentes nas diferentes
realidades sociais das organizações e regiões do Brasil torna-se um diferencial
competitivo e uma oportunidade para a agregação de valor à formação profissional dos
discentes e docentes que participam das atividades de aprendizagem vivencial.

Propiciar no acadêmico o acesso às teorias estratégicas, assim como o


detalhamento de estratégias que possam conferir vantagens competitivas às
organizações. Desenvolver a capacidade de análise de casos de comportamentos
estratégicos de empresas operadoras no agronegócio. Introdução às atividades de
pesquisa em comportamento estratégico.

Com base nessa premissa o artigo proposto visa apresentar e analisar a


experiência da aprendizagem vivencial desenvolvida pelos docentes e discentes
do curso de Administração da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, onde foi
aplicada na disciplina Estratégia Empresarial, e ambientada no ambiente organizacional
do Mercadão Municipal de Campo Grande/MS, a pesquisa tem o foco na integração
entre a teoria e a prática no ensino da Administração.

2. Referencial Teórico

2.1. Aprendizagem vivencial

192
Segundo Gresele e Cavalcanti Neto (2008), em seu artigo: Aprendizagem
Vivencial: uma análise do estilo de aprendizagem do discente de Administração do médio
oeste paranaense sob a ótica de Kolb, apresentado no V Congresso Brasileiro Virtual de
Administração (CONVIBRA), em 2008, é preciso conhecer, discutir e aplicar as práticas
vivências da melhor maneira possível, levando em consideração as características
individuais e as diferentes formas de aprender.

Durante essa busca pelo conhecimento o acadêmico atravessa várias fases,


entre as quais alguns valorizam as experiências cotidianas, a informação captada no
meio ambiente, já outros dão maior ênfase na observação e na reflexão, para formarem
suas opiniões. Ainda na mesma linha de pensamento pode-se observar que existem os
que preferem usar a lógica para resolverem os problemas apresentados. Além desses
podem ser descritos os que optam pela experimentação ativa, esse grupo interessa-se
em descobrir como as teorias e esquemas funcionam na prática (GRESELE; CAVALCANTI
NETO, 2008).

A teoria da aprendizagem vivencial está alicerçada nas obras de Lewin, Dewey


e Piaget e vem sendo aplicada na educação no contexto acadêmico e empresarial. Na
perspectiva de Kolb (1984) estas três obras compartilham as seguintes considerações
que fundamentam a aprendizagem vivencial: a) a aprendizagem é mais bem concebida
como um processo e não em termos dos resultados obtidos na forma de acúmulo de
conhecimentos ou respostas a estímulos; b) a aprendizagem é um processo contínuo
embasado na experiência; c) o processo de aprendizagem exige a resolução de conflitos
entre modos dialeticamente opostos de adaptação ao mundo; d) a aprendizagem é um
processo holístico de adaptação ao mundo; e) a aprendizagem envolve transações entre
a pessoa e o ambiente; f) a aprendizagem é o processo de criação de conhecimento.

Novos conhecimentos, habilidades ou atitudes são alcançados através do


confronto entre quatro modos de aprendizagem vivencial. Aprendizes, se devem
ser efetivos, precisam de quatro diferentes tipos de capacidades – capacidades de
experiência concreta (EC), capacidades de observação reflexiva (OR), capacidades de
concepção abstrata (CA) e capacidades de experimentação ativa (EA). Isto é, eles devem
ser capazes de envolver a si mesmos de forma completa, aberta e sem restrições em novas
experiências (EC). Eles devem ser capazes de refletir sobre suas experiências e observá-
las a partir de diversas perspectivas (OR). Eles devem ser capazes de criar conceitos que
integrem suas observações de forma lógica em teorias (CA), e eles devem ser capazes de
usar estas teorias para tomar decisões e resolver problemas (EA) (KOLB, 1984).

Com base nestas características, a “aprendizagem é o processo pelo qual o


conhecimento é criado através da transformação da experiência” (KOLB, 1984) em um
ciclo de quatro estágios (…).

193
2.2. A Construção de metodologias ativas no ensino da Administração

Segundo Marion (2007) observar-se-á que um grupo de métodos de ensino


é mais útil para desenvolver atividades das relações humanas enquanto o outro
desenvolve habilidades no emprego de conhecimentos para a solução de problemas e
tomadas de decisões. Para o autor pode-se classificar segundo os seguintes métodos:
método de aula expositiva; método de palestras; método de filmes educativos; método
de resumo de leitura (apontamentos); método de filmes educativos; método de casos;
método de jogos de empresa; método de grupo “t” (treinamento de sensibilidade);
métodos de desempenho de papéis (role-play); métodos de discussão.

A ideia para o desenvolvimento da atividade vivencial na disciplina Administração


Estratégica no curso de Administração da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS) surgiu a partir do compartilhamento das experiências entre docente da disciplina
e pós doutoranda em Administração da instituição, onde se estabeleceu o objetivo de
replicar um atividade de ensino e aprendizagem vivencial realizada na Universidade
Estadual de Santa Cruz, em Ilhéus, Bahia, onde os discentes da disciplina Administração
de Marketing aliaram os estudos teóricos e práticos através de pesquisa exploratória
sobre o comportamento.

A partir da ideia compartilhada entre os professores, foi desenvolvido um plano de


ação com o objetivo de organizar e planejar o desenvolvimento e execução das atividades
vivenciais de campo propostas. Para apoio e execução das atividades, além da docente
da disciplina, houve o apoio de um mestrando e de um pós-doutorando com foco em
orientar e acompanhar os alunos nas visitas e coleta de dados no Mercadão Municipal.

A partir do plano de ação desenvolvido, a professora da disciplina Administração


Estratégica realizou a apresentação das atividades propostas aos alunos: cronograma,
roteiro para ação, questionário para entrevistas, produto final esperado, visando informar
e capacitar os discentes para a atividade. Após a apresentação e compartilhamento
do plano de ação junto aos discentes, a docente realizou uma visita de prospecção
ao representante da Associação do Mercado Municipal de Campo Grande, com o
objetivo de compartilhar o plano de ação e realizar o levantamento de informações
primárias sobre o histórico, diagnóstico e estrutura organizacional. A ação desenvolvida
possibilitou o alinhamento de objetivos para ação, consequentemente cooperação
entre a organização e a UFMS.

Nos dias 17 e 20 de agosto de 2016 os alunos da disciplina Administração Estratégica,


sob a coordenação das Professoras Adriane Queiroz, Katianny Estival e Professor João
Pimenta, realizaram uma pesquisa de campo no Mercadão Municipal de Campo Grande/MS,
com o objetivo de analisar as estratégias de gestão adotadas pela organização e identificar
o grau de cooperação nos negócios nas percepções dos comerciantes.

194
O Mercadão Municipal de Campo Grande é um dos principais pontos turísticos
da capital, com fluxo médio de clientes/dia que varia de 5.000 a 10.000 pessoas em
períodos festivos, como Páscoa e Natal. De acordo com o gestor do mercado, Sr. Daniel
Amaral, nos últimos 5 anos houve um aumento médio de 60% no fluxo de clientes, o que
sinaliza o potencial de crescimento dos mercados de produtos regionais em coerência
com o crescimento desse mercado no Brasil e no Mundo (UNIVERSIDADE FEDERAL DO
MATO GROSSO DO SUL, 2016).

2.3. A atuação dos discentes na aprendizagem vivencial

A aprendizagem vivencial argumenta sobre os pressuposições de autoridade


no processo de aprender, contrariando o rigor. Tornou-se um movimento envolvido nos
processos políticos da educação e na explanação de processos mentais dos aprendizes.
No entanto tem sido mais usada na evolução da capacidade dos gerentes do que no
ensino universitário (REYNOLDS, 2009). (…)

O estágio da experiência concreta assume duplo significado: ocorre fora, mas


também é o processo pelo qual o indivíduo a percebe. A estrutura de processamento da
experiência concreta é a aprendizagem pela qual o indivíduo percebe os sentimentos
em relação a si mesmo, conforme a Figura 2.

O estágio de observação reflexiva reúne e organiza a informação pelo processo de


intenção de aprender, que transforma a experiência. No entendimento abstrato se ordena
e se constroem modelos e esquemas por meio da compreensão (VILARDI; VERGARA, 2011).

3. Material e Métodos

Segundo Flick (2009) a pesquisa bibliográfica constitui de procedimento


básico para os estudos acadêmicos, onde se busca o domínio do estado da arte sobre
determinado tema. Inicialmente foi realizado o levantamento bibliográfico com foco em
aprendizagem vivencial e metodologias ativas no ensino da administração.

Assim a metodologia utilizada foi a de pesquisa bibliográfica e exploratória


através de observação, brainstorming, grupos focais, questionários, entrevistas diretas
e análise de conteúdo. A pesquisa exploratória é recomendada quando há pouco
conhecimento sobre o problema a ser estudado (CERVO; BERVIAN, 1996).

3.1. A aprendizagem vivencial em Administração no mercadão municipal de


Campo Grande/MS

Como mostram Mahboubian (2010) e Roesch (2007), o método do caso foi usado
em treinamento gerencial há cerca de um século nas universidades americanas e, mais
recentemente, na Europa e na Ásia. Ferlie, McGivern e Moraes (2010) argumentam

195
que o método do caso de Harvard era "um legado passado de faculdades de direito
para escolas de negócios". No Brasil, os casos de ensino ainda são pouco utilizados
e o volume de publicações de casos brasileiros é pequeno, mas a demanda por esse
recurso pedagógico tem aumentado.

Nos estudos da estratégia organizacional é relevante o conhecimento de


diversos cenários com diferentes problemas e complexidades para proporcionar
uma formação mais abrangente do profissional Administrador. Esta dimensão é a de
processamento, que apresenta um eixo que avalia a transformação via experimentação
ativa e observação reflexiva (KOLB, 1984). (…)

Conforme o Modelo de Kolb (1984) (…), desenvolver habilidades analíticas e


decisórias nos estudantes depende da associação entre a teoria e a prática, com a
consideração e o conhecimento de cenários dos negócios não convencionais – além
dos mercados públicos e privados, como por exemplo, dos mercados de comercialização
de produtos regionais e suas especificidades.

Seguindo a tradição, os mercados e feiras municipais “adquiriram uma


importância muito grande que ultrapassa seu papel comercial, num entreposto de
trocas culturais e de aprendizado, onde pessoas de várias localidades incorporam-se
estabelecendo laços de sociabilidade” (ARAÚJO; BARBOSA, 2004). Neste contexto
justifica-se a escolha do Mercadão Municipal de Campo Grande/MS como objeto de
estudos no trabalho proposto.

4. Resultados e Discussão

Foram apresentadas quatro perguntas norteadoras para que os discentes


aplicassem o conhecimento acumulado durante a disciplina, abaixo seguem as
perguntas e as respostas mais relevantes para esta pesquisa.

1 - Como as informações coletadas podem influenciar no sucesso do negócio


de cada comerciante individualmente?

“Conhecidas as falhas e estabelecidas as metas, o sucesso de cada


banca individualmente é consequência. Por exemplo, se o nível escolar
for usado como força motriz de cada negócio individualmente (em
contraste com a atual estagnação), a visão de cada empreendedor
ficará mais ampla com relação à estratégia, de forma a otimizar o
negócio e maximizar os lucros.”
“Através da pesquisa pode-se notar que as bancas possuem produtos
diversos, os clientes encontram tudo que procuram em um só lugar e
com preços acessíveis. Os turistas também encontram várias coisas
pertencentes a cultura local como comidas típicas, artesanatos, etc.
Isso tudo agrega valor para o mercadão, influenciando para o seu
sucesso. Com essas informações os comerciantes podem fazer com
que os obstáculos sejam enfrentados visando o melhor futuro para o
sucesso individual de cada comerciante do mercadão.”

196
2 - Qual a estratégica genérica recomendada para o mercadão, justificando a resposta:

“A estratégia de preço baixo poderia ser uma opção vantajosa.


Pois diretamente passa em média 5 mil pessoas pelo mercadão, e
com o preço menor poderia aumentar a quantidade de clientes e
consequentemente o lucro. Mas para isso deveria ser desenvolvido
uma estrutura de custo exclusiva, para que os comerciantes não
tenham prejuízos. Mas o principal é o trabalho de forma eficiente.
Pois a diferenciação que o mesmo possui já é uma grande estratégia,
pois proporciona uma vantagem competitiva mediante a oferta de
produtos que oferecem. E essa diferenciação estimula com que os
consumidores sejam fiéis.”

3 - Qual a direção estratégica recomendada para o mercadão, justificando a resposta:

“Penetração no mercado e consolidação. Pois assim o mercadão


aumentaria sua participação no mercado e se concentraria de
modo ofensivo em seu mercado atual com os mesmos produtos,
aumentando suas vendas e sua quota de mercado relativa.”

4 - Qual o método recomendado para implantar a estratégia recomendada para


o mercadão, justificando a resposta:

“Utilizando uma estrutura de custo exclusiva, pois sem isso os


comerciantes poderiam ter prejuízos. Eles teriam que comprar seus
produtos, matéria prima a um valor bem menor que o de mercado e
vende-los também a um valor abaixo do mercado. Dependendo do
preço pago, eles podem até ter um lucro igual ou maior ao que teriam
se vendessem os produtos no preço de mercado.”

Perspectivas da estratégia nos mercados tradicionais, como a atividade vivencial


gerou contribuições e reflexões para o campo da estratégia.

O ciclo de aprendizagem vivencial se apresenta como método que incentiva


os participantes a se envolverem no processo de solução de um problema, desafio ou
atividade, essa relação faz parte do processo de ensino-aprendizagem no qual o saber
é construído a partir das vivências dos participantes da atividade. (…)

O objeto de estudo deste artigo trata-se da aplicação das metodologias ativas


no ensino em administração, utilizando o processo de inimitabilidade que os mercados
tradicionais possuem como estratégia de competitividade, o que torna evidente a
relevância da aproximação do uso das ferramentas da administração em diferentes
contextos organizacionais, com foco em desenvolver inovações em processos e
adequações ao uso das ferramentas de gestão, assim como qualificar os futuros
administradores para tomada de decisões em ambientes complexos, com colaboração
para o desenvolvimento regional.

197
5. Conclusões

A experiência integradora da teoria e prática da Administração desenvolvida e


executada pelos discentes e docentes representou uma prática inovadora no ensino
da Administração Estratégica na UFMS, pois possibilitou que os discentes saíssem da
“zona de conforto” da sala de aula na busca e construção coletiva do conhecimento
através de observações, entrevistas e análises sobre o Mercadão Municipal. Sair da
“zona de conforto” também fomentou o pensamento crítico sobre como é possível
adaptar e aplicar os pressupostos teóricos convencionais da administração em campos
não convencionais, como no caso dos mercados tradicionais regionais.

No contexto dos mercados tradicionais existe a atuação das associações,


feirantes, comerciantes, produtores rurais, consumidores e instituições como
Sebrae, Prefeitura, entre outras, o que torna o ambiente organizacional diferente das
organizações convencionais privadas e públicas, tornando assim um objeto atrativo
para novos estudos organizacionais.

A adesão por parte dos discentes foi positiva, já que a maioria participou das
atividades de campo à apresentação final dos resultados. A atividade também foi
proposta como avaliação final da disciplina, o que pode ter fortalecido a adesão.

Por parte dos docentes, a realização de atividades de aprendizagem vivencial


demandam esforços adicionais para o planejamento e execução das atividades:
horas adicionais de trabalho para contato com organizações externas, habilidades de
comunicação e relacionamento para lidar com atividade não convencional no ensino
aprendizagem da administração, o que tende a colaborar para a melhoria da interação
entre a Universidade e as organizações regionais.

A atividade proporcionou também a aproximação e construção de laços


cooperativos entre docentes e discentes já que ambos se posicionaram como aprendizes
frente aos problemas identificados que demandaram a construção de soluções de
forma coletiva.

Desta forma é possível concluir que a aprendizagem vivencial no ensino da


administração é uma ação que agrega valor à formação teórica e humana dos discentes
e docentes e que o uso de metodologias ativas e da aprendizagem vivencial contribui
para a melhoria da qualidade dos cursos de Administração, especificamente para a
formação de Administradores com melhor preparo para a gestão de conflitos e tomada
de decisões complexas, assim como para a atuação efetiva na resolução dos desafios
existentes nas realidades dos mercados regionais nos quais estão inseridos.

Fonte: http://www.cc.faccamp.br/ojs-2.4.8-2/index.php/RTA/article/view/1354/676. Acesso em: 21 fev. 2023.

198
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:

• Os tipos psicológicos e sua relação com a aprendizagem.

• Os estilos de aprendizagem.

• A proposta da Aprendizagem Vivencial.

• A aplicação da ideia da Aprendizagem Vivencial no Ensino Religioso.

199
AUTOATIVIDADE
1 De acordo com o visto neste tema de aprendizagem, os tipos psicológicos partem de
uma polarização essencial. Tendo isso em conta, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O par essencial é o pensamento e o sentimento.


b) ( ) O par essencial é a percepção e o julgamento.
c) ( ) O par essencial é a introversão e a extroversão.
d) ( ) O par essencial é a intuição e a sensação.

2 Myers e Briggs acrescentaram um par aos tipos psicológicos de Jung. Quanto a isso,
analise as sentenças a seguir:

I - O par acrescentado por Myers e Briggs foi o do Pensamento e do Sentimento, aumentado


de 6 para 12 as combinações possíveis.
II - O par acrescentado por Myers e Briggs é o do julgamento e da percepção, aumentando
de 8 para 16 as combinações possíveis de Jung.
III - O par acrescentado por Myers e Briggs foi o da intuição e da sensação, aumentando de
8 para 16 as combinações possíveis de Jung.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Quanto às influências da Aprendizagem Vivencial, classifique V para as sentenças


verdadeiras e F para as falsas:

( ) A Aprendizagem Vivencial teve influência da tendência tradicional com seu ensino


voltado para a competência do professor e seu talento em fazer aprender .
( ) A Aprendizagem Vivencial teve influência de Lewin e sua teoria do desenvolvimento,
Piaget e o construtivismo e de Vygostky e sua teoria de aprendizagem.
( ) A Aprendizagem Vivencial também teve influência do personalismo de Rogers e da
filosofia da educação da autonomia e não bancária de Paulo Freire.

200
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – V.
d) ( ) F – F – V.

4 Neste tema de aprendizagem, conhecemos os tipos psicológicos e os tipos religiosos.


Discuta, num texto dissertativo, porque o modelo dos tipos psicológicos é tão interessante
para debater o tema da religião, principalmente com relação aos líderes religiosos.

5 A Aprendizagem Vivencial é uma metodologia ativa que leva em conta os diferentes


estilos de aprendizagem. Num texto dissertativo, discuta porque esse modelo é tão
apropriado para o Ensino Religioso.

201
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ANOTAÇÕES

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