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Apostila de
Exegese
INTRODUÇÃO
1. O que é e do que se trata a exegese bíblica
2. As ferramentas necessárias ao exegeta
3. Como fazer exegese
3.1 Cinco regras concisas
3.2 O procedimento exegético
3.3 Procedimento correto
3.4 O uso de instrumento
4. Um exame da exegese I
4.1 Dificuldades exegéticas
4.2 Hermenêutica: fusão e ultrapassamento
4.3 A fluidez hermenêutica
5. Um exame da exegese II
5.1 Intencionalmente
5.2 O lugar do intérprete
5.3 Hermenêutica como metainterpretação
6. Limites da hermenêutica
7. A letra e o Espírito
8. Historia da hermenêutica
9. Como analisar um livro bíblico
10. Conclusão
INTRODUÇÃO
Na realidade todos são exegetas dalgum tipo. A única questão real é se você vai ser um bom
exegeta. “Quantas vezes, por exemplo, você ouviu ou disse: “o que Jesus queria dizer com
aquilo foi”...” lá “naqueles tempos, tinham o costume de...”? São expressões exegéticas. São
empregadas mais frequentemente para explicar as diferenças entre eles e nós, por que não
edificamos nosso uso de um texto de uma maneira nova ou diferente, porque o aperto da mão
tomou o lugar do ósculo santo. Até mesmo quando tais idéias não são articuladas, é na
realidade praticada o tempo todo de um modo que segue o bom senso.
O problema com boa parte disto, no entanto, é que tal exegese frequentemente é seletiva
demais e, que frequentemente as fontes consultadas não são escritas por peritos verdadeiros,
ou seja, são fontes secundárias que também empregam outras fontes secundárias, ao invés
das fontes primarias. São necessárias umas poucas palavras acerca de cada um destes
problemas.
Definições:
Dicionário Teológico: Exegese: do Grego: ek + egéomai, penso, interpreto, arranco para fora
do texto. É a prática da hermenêutica sagrada que busca a real interpretação dos textos que
formam o Antigo e o Novo Testamento. Vale-se, pois, do conhecimento das línguas originais
(hebraico, aramaico e grego), da confrontação dos diversos textos bíblicos e das técnicas
aplicadas na lingüística e na filosofia.
Dicionário Teológico: Exegese Teológica: Princípio de interpretação bíblica que toma por
parâmetro as doutrinas sistematizadas pelos doutores da Igreja. Neste caso, a Bíblia é
submetida à doutrina. Mas como esta nem sempre se encontra isenta de interpretações
parcimônias e tradições meramente humanas, corre-se o disco de se valorizar mais a forma
que o conteúdo. O correto é submeter à dogmática ao crivo da infalibilidade da Palavra de
Deus.
Definição de Exegese: Guiar para fora dos pensamentos que o escritor tinha quando
escreveu um dado documento, isto é, literalmente significa "tirar de dentro para fora",
interpretar.
Exegetés = diretor, instrutor, intérprete, expositor, exegeta. É a disciplina que aplica métodos e
técnicas que ajudam na compreensão do texto.
A Bíblia é um livro difícil. Difícil porque é antigo, foi escrito por orientais, que têm uma
mentalidade bem diferente da greco-romana, da qual nós descendemos. Diversos foram os
seus escritores, que viveram entre os anos 1200 a.C. a 100 d.C. Isso, sem contar que foi
escrito em línguas hoje inexistentes ou totalmente modificado, como o hebraico, grego e o
aramaico, fato este que dificulta enormemente uma tradução, pois muitas vezes não se
encontram palavras adequadas. Outra razão para se considerar a Bíblia um livro difícil é que
ela foi escrita por muitas pessoas, ás vezes até desconhecidas e em situações concretas as
mais diversas. Por isso, para bem entendê-la é necessário colocar-se dentro das situações
vividas pelo escritor, o que é de todo impraticável. Quando muito, consegue-se uma
aproximação metodológica deste entendimento. Além do mais, a Bíblia é um livro inspirado e é
muito importante saber entender esta inspiração, para haurir com proveito a mensagem
subjacente em suas palavras. Dizer que a Bíblia é inspirada não quer dizer que o escritor
sagrado (ou hagiógrafo) foi um mero instrumento nas mãos de Deus, recebendo mensagens ao
modo psicográfico. É necessário entender o significado mais próprio da 'inspiração' bíblica,
assunto que será abordado na continuação.
Vale salientar que uma série de enganos pode advir de uma interpretação bíblica literal, orque
uma interpretação ao "pé da letra" não revela o sentido mais adequado de todas as palavras.
Para que não aconteça conosco incidir neste equívoco, devemos aprender a nos colocar na
situação histórica de cada escritor em cada livro, conhecer a situação social concreta da
sociedade em que ele viveu, procurar entender o que aquilo significou no seu tempo e só então
tentar aplicar a sua mensagem ás nossas circunstâncias atuais.
2ª - Precisamos saber primeiro o que o autor dizia aos seus ouvintes originais e por que.
A tarefa de interpretar envolve o estudante em 2 níveis:
3º - É necessário estudar a palavra que eles ouviram devendo procurar compreender o que foi
dito a eles: LA E ENTÃO.
Um dos aspectos do lado humano da Bíblia, Deus escolheu fazer quase todo tipo de
comunicações disponíveis: Exemplos:
Genealogias,
Crônicas
Leis de todo tipo
Poesia
Drama
Parábola
Para interpretar corretamente o LÁ E ENTÃO é necessário saber algumas regras gerais
aplicadas às palavras da Bíblia, como também aprender as regras especiais aplicadas a cada
uma dessas formas literárias.
Exemplo: Precisamos saber como um salmo freqüentemente dirigido a Deus funciona como
palavra de Deus para nós hoje.
Princípios Básicos:
Aqui se encontram dez princípios que devem ser seguidos na interpretação bíblica:
1° - denomina-se princípio da unidade escriturística. Sob a inspiração divina a Bíblia ensina
apenas uma teologia. Não pode haver diferença doutrinária entre um livro e outro da Bíblia.
2° - Aprender a ler cuidadosamente o texto e fazer perguntas certas ao mesmo. Há duas
perguntas básicas que devemos fazer a cada passagem:
Existem dois tipos de contexto: 1ª - contexto histórico: época, cultura do autor e seus leitores,
fatores geográficos, políticos, ocasião do livro, carta, Salmo, etc.
Tem a ver com a ocasião e o propósito de cada livro ou partes (necessário fonte de pesquisa)
2ª - Contexto literário: As palavras só fazem sentido dentro das frases e na maior parte das
frases na Bíblia somente tem o significado em relação as frases anteriores e posteriores
A pergunta mais importante que você fará e deverá ser repetida acerca de cada frase e
parágrafo é:Qual é a razão disto? Devemos descobrir qual é a linha do pensamento do autor,
o que está dizendo aqui e por que diz exatamente isto.
No Novo Testamento existe muita exegese autêntica do Antigo Testamento, porém algumas
passagens empregam alegoria.
Idade Média, nesse período da História a opinião geral dos exegetas como Pedro Lombard e
Thomaz D´Aquino, era que a interpretação incorporava quatro modos básicos:
1- Interpretação literal
2- Interpretação fiqurada
3- Interpretação moral
4- Interpretação espiritual
Moderna Crítica Bíblica Este assunto tem lançado tanto luzes quanto sombras sobre o
conhecimento bíblico e teológico. Apesar de ser uma atividade legítima e necessária afim de
por os estudos bíblicos a para das evidências lingüísticas, literárias, históricas e científicas,
infelizmente as pessoas que são conhecidas como críticas bíblicas, geralmente tem se
mostrado dotadas de uma mentalidade cética, além de lhes faltar a experiência com a fé cristã.
Além da Exegese É inútil esperar um delineamento da verdade inteira por mais exata e
complexa que possa ser.
Ha coisas que Deus simplesmente não nos revelou - Dt. 29.29, nem por isso devemos diminuir
a importância da pesquisa bíblica séria, mediante corretos métodos exegéticos.
Deixe a Bíblia interpretar a própria Bíblia. Este princípio vem da Reforma Protestante.
O sentido mais claro e mais fácil de uma passagem explica outra com sentido mais difícil e
mais obscuro. Este princípio é uma ilação do anterior.
Jamais esquecer a Regra Áurea da Interpretação, chamada por Orígenes de Analogia da Fé. O
texto deve ser interpretado através do conjunto das Escrituras e nunca através de textos
isolados. Sempre ter em vista o contexto. Ler o que está antes e o que vem depois para
concluir aquilo que o autor tinha em mente.
Primeiro procura-se o sentido literal, a menos que as evidências demonstrem que este é
figurado.
Ler o texto em todas as traduções possíveis - antigas e modernas. Muitas vezes uma destas
traduções nos traz luz sobre o que o autor queria dizer. Apenas um sentido deve ser
procurado em cada texto.
O trabalho de interpretação é científico, por isso deve ser feito com isenção de ânimo e
desprendido de qualquer preconceito. (o que poderíamos chamar de "achismos").
Fazer algumas perguntas relacionadas com a passagem para chegar a conclusões
circunstanciais. Por exemplo:
a) - Quem escreveu?
b) - Qual o tempo e o lugar em que escreveu?
c) - Por que escreveu?
d) - A quem se dirigia o escritor?
e) - O que o autor queria dizer?
Feita a exegese, se o resultado obtido contrariar os princípios fundamentais da Bíblia, ele deve
ser colocado de lado e o trabalho exegético recomeçado novamente.
Para tal propósito são necessários Atlas, livros arqueológicos, histórias e dicionários bíblicos.
Dicionários da Bíblia são muito úteis para rápidas informações sobre um assunto, identificação
de nomes de pessoas, lugares ou coisas. O melhor dicionário da Bíblia é: The Interpreter´s
Dictionary of the Bible, quatro volumes.
Introdução:
Na atualidade a mídia, especialmente a TV e o rádio, tem sido usados como instrumentos para
espalhar a palavra de Deus, mas ao mesmo tempo tem provocado na mente de muitos cristãos
a "lerdeza do pensar". Hoje existe o "evangelho solúvel", "evangelho do shopping center", "dos
iluminados", etc. Mas pouco se estuda a fonte do evangelho do Nosso Senhor Jesus Cristo,
isto é muito mais do que uma leitura diária e muitas vezes feita as pressas para cumprir um
ritual.
5. interpretar de acordo com a analogia da Escritura. A Bíblia é sua própria intérprete. diz o
princípio hermenêutico. A bíblia deve ser usada como recurso para entender ela mesmo. Uma
interpretação bizarra que entra em choque com o ensino total da Bíblia está praticamente certa
de estar no erro. Um conhecimento acurado do ponto de vista bíblico é a melhor ajuda.
1. o procedimento errado. Ler o que muitos comentários dizem com sendo o significado da
passagem e então aceitar a interpretação que mais agradece. Este procedimento é errado
pelas seguintes razões:
* O interprete deve perguntar primeiro o que o autor diz e depois o que significa a declaração
consultar os dicionários para encontrar o significado das palavras desconhecidas ou que não
são familiares. É preciso tomar muito cuidado para não escolher o significado que convêm ao
interprete apenas
*Depois de usar bons dicionários, uma ou mais gramáticas devem ser consultadas para
entender a construção gramatical. No verbo, a voz, o modo e o tempo devem ser observados
por causa da contribuição à idéia total. O mesmo cuidado deve ser tomado com as outras
classes gramaticais.
* Tendo as análises léxicas, morfológica e sintática sido feitas, é preciso partir para análises de
contexto e história a fim de que se tenha uma boa compreensão do texto e de seu significado
primeiro e,
* Com os passos anteriores bem dados, o interprete tem condições de extrair a teologia do
texto, bem como sua aplicação às necessidade pessoais dele, em primeiro lugar, e às dos
ouvintes. Que o texto tem com a minha vida? Com os grandes desafios atuais?
1. Comentários: eles não são um fim em si mesmo. O interprete deve manter em mente o clima
teológico em que foram produzidos, porque isso afeta de maneira direta a interpretação das
Escrituras. Um comentarista pode ser capaz, em certa media, de evitar “bias" (tendências) e
permitir que o documento fale por si mesmo, mas sua ênfase nos vários pensamentos na
passagem será afetada pela corrente de pensamento de seus dias. Os comentários
principalmente os devocionais, tem a marca da desatualizarão.
4. UM EXAME DA EXEGESE I
A tarefa da exegese dos textos sagrados da Bíblia tem uma prioridade e anterioridade em
relação a outros textos. Isto é, os textos sagrados são os primeiros dos quais se ocuparam os
exegetas na tarefa de interpretar e dar seu significado.
A hermenêutica, segundo Gordon D. Fee & Douglas Stuart tem uma leve distinção entre a
exegese: descobrindo o sentido do texto para os leitores originais – o lá e então e a
hermenêutica: a atualização do texto na vida dos leitores hoje.
"Descobrir o que o texto significava originalmente, esta tarefa é chamada exegese... devemos
aprender a escutar esse mesmo significado na variedade de contextos novos ou diferentes dos
nossos próprios dias; chamamos a esta segunda tarefa de hermenêutica" (Fee & Stuart:1984,
p.11).
Nem sempre essa mensagem atualizante está de acordo com a necessidade do leitor hoje,
isso, porém, não importa. Ora, é em um desses momentos de desencontro – onde a vida do
leitor não está de acordo com o relato bíblico, sem que isto envolva algum tipo de julgamento
moral, mas existencial – que se comete alguns equívocos.
O alvo de toda leitura, seja ela feita de que modo for, é chegar a um ponto de pessoalidade
onde o leitor se vê dentro do texto. Não basta saber qual a situação do autor e seu objetivo ao
escrever o livro, nem as circunstâncias que o levaram a escrever o que escreveu. Nem basta
saber o que significou para os leitores originais. Às vezes, o que significou para o autor e para
os leitores é o que menos importa para o leitor – o princípio de se descobrir o moto originador
do escrito não é tão levado a sério pelo leitor normal – não é de admirar que as conclusões
sejam de outra natureza.
Ainda que tenhamos pessoas eruditas que se debruçaram na busca da interpretação de temas
da Bíblia, não temos chegado a conclusões seguras e finais acerca de várias passagens. Visto
que o texto bíblico é um tipo de "teologia de tarefa" – os autores não escreveram por
diletantismo, mas para edificação, correção e estímulo das comunidades. Na interpretação nem
sempre sabemos com segurança o que cremos ou dizemos saber.
A "teologia de tarefa" dos autores passa a ser para os eruditos de hoje a tarefa principal de
seus estudos. Algumas vezes dá para se saber o assunto que ocasionou o escrito, porém, ler
as escrituras, é como escutar uma conversa telefônica, podemos escutar apenas um dos lados
e então tentamos adivinhar o que o interlocutor está dizendo do outro lado. Nem sempre é
possível reconstruir essa "conversa", e aí está a tarefa do exegeta. Ele terá que fazer uma
reconstrução tentativa do que estava acontecendo. Em um texto á sempre dois contextos: o do
autor e o dos leitores.
Não é tão fácil a tarefa de reconstruir a conversa. Alguns temas só são familiares para uma
determinada comunidade – a comunidade leitora original, - e não temos pontos de contatos em
outros lugares e epístolas sobre os mesmos assuntos. Isso quer dizer que um assunto em uma
epístola nem sempre é referido em outro lugar – outra epístola – é localizado, pontual, e
ficamos sem saber qual é o problema originante do texto.
Outras vezes, alguns pontos da exegese já nos são dados a priori. O leitor já não se preocupa
mais com o ponto de vista de um determinado texto, isso porque, alguns deles, são
interpretados culturalmente, melhor denominacionalmente, tem uma interpretação "oficial" de
uma determinada denominação. Nesse caso, a tentativa de descoberta por parte do intérprete
já foi por água abaixo, está comprometido; deram-lhe um par de óculos através do qual ele vê
todo o texto.
A outra tarefa que se apresenta ao exegeta e que de forma alguma é menos trabalhosa que a
anterior, é que, para se fazer a interpretação, ou ele trabalha com o texto na língua original, ou
lidará com o texto em sua própria língua. Ora, uma e outra tarefa não são fáceis. Se ele tem
que se desdobrar para dominar uma língua estrangeira, também terá que fazer o mesmo para
dominar a sua própria língua. Se estiver trabalhando em sua língua, deve considerar que o
texto que dispõe já é um trabalho de outros. O tradutor já é um intérprete em potencial. Falarei
disso mais disso.
Essa paixão pelo eruditismo é vista nas biografias dos dois principais tradutores da Bíblia
completa em português: Almeida e Figueiredo, como nas apologias e escritos acerca das
traduções.
Entre a escrita original e as atuais traduções nota-se um grande vácuo entre as intenções na
formação do texto: o autor original, os tradutores (editores). O trabalho de tradução parece
relacionar-se indiretamente ao esforço do escritor: este procura esclarecer os leitores enquanto
escreve – basta ver as explicações lingüísticas (efatá, abba...), topográficas (aquela cidade,
antes, chamava-se Luz...) e biográficas (José, que os apóstolos chamavam de Barnabé, que
quer dizer...) – aquele consciente ou não, complica o entendimento – querendo ou não – dos
leitores. O exegeta se coloca no meio dos dois – mais do lado do escritor – para "retraduzir",
facilitando o entendimento da tradução e dos ouvintes/leitores atuais. O exegeta, ao retraduzir,
colocando o texto em palavras fáceis, não é condenado, o que não acontece com o tradutor, de
onde o exegeta tira a matéria do seu trabalho. Ao tradutor cabe críticas do tipo: "não foi feliz",
"devia ter feito de tal e tal modo", "aqui a melhor palavra seria", etc.
O texto tem sido o mesmo, os métodos de interpretação, porém, têm mudado ao longo dos
anos. O trabalho da exegese pareceria fácil, uma vez que o texto, sendo o mesmo, o sentido
do "lá e então" seria sempre o mesmo. Acontece, entretanto, que a reconstrução da "conversa
telefônica" também depende, não do interlocutor, mas do ouvinte e do poder de criação que o
mesmo tem ou adquire com a prática. Por outro lado, o hoje do “ouvinte é fator importante no
modo como o mesmo vai “ouvir” a conversa”. Desse modo, não há como pretender, ter ou
esperar uma atemporalidade do exegeta, no sentido de uma aproximação, sem prejuízos e pré-
conceitos do texto bíblico. O tempo do hoje exegético determina muito o resultado final do
estudo.
Ora, se pretende fazer da exegese uma ciência correta da interpretação do texto e esse texto é
sempre o mesmo para os exegetas, os resultados, porém, são diferentes. Isso é outro
complicador. Mesmo que dois exegetas trabalhem seguindo uma mesmo linha de pensamento,
tendo uma mesma escola e método exegético, dá para se prever o que pode acontecer com a
interpretação final. Logo, a verdade do texto não está nele mesma, mas no exegeta.
Essa fusão dos horizontes também ocorre mediante a maior ou menor compreensão que eu
possa ter daquilo que o autor falou. Ora, é difícil uma autodeterminação de minha própria
compreensão. Seria preciso alguém fora de mim para fazer esse julgamento. Dizer maior ou
menor compreensão que tenho de um autor, leva em consideração esse outro que julga o meu
grau de entendimento. Nesse caso, ao mesmo tempo em que eu interpreto, necessito de
alguém que julgue a minha própria compreensão. Logo de início, vê-se o perigo disso tornar-se
uma metaverificação infinita.
O horizonte do intérprete leva em consideração não apenas o conhecimento do texto bíblico,
das situações originárias do mesmo, a situação do autor, aspectos sócio-geográficos e outras
características. Ele deve conhecer-se tão bem quanto conhece o texto, o autor e o contexto
dos leitores. Nesse momento, o intérprete entra com a sua pré-compreensão, fatores pessoais
como personalidade, estrutura mental e psicológica, cultura, religião e tradição, os "óculos"
falados anteriormente. Além de conhecer-se bem, deve conhecer o seu mundo e sua gente,
sua comunidade.
A primeira possibilidade é provável, pois, uma vez que se fala do texto, que se trabalhe bem
com as ferramentas da exegese, é possível que se fale aquilo que o texto falou. Porém, como é
impossível uma total compreensão daquilo que o texto disse, nunca podemos ter certeza que
se atingiu exatamente àquilo que o autor queria ou pretendia originalmente. É por isso que
sempre o mesmo texto fala diversamente pela mesma e para as mesmas pessoas em ocasiões
diferentes. Falar diversamente de um texto por uma mesma pessoa implica em uma
criatividade pessoal de quem fala da leitura do seu momento e de seus ouvintes. Nesse caso, a
palavra imutável passa pelas mutações do hermeneuta e dos ouvintes. A genialidade do
intérprete e a existencialidade da comunidade ouvidora determinam aquilo que o texto fala.
A segunda possibilidade seria falar contrariamente ao texto. Aqui reside a pedra de toque de
todos os hermeneutas mais apressados. As citações tiradas fora do contexto, citações
decoradas, textos comprobatórios de certo argumento, mas que não fala daquilo
especificamente, uma interpretação mais aprofundada, o "sensus plenior". "Sim!. O que diz é
isso", - afirma-se – "mas o que queira dizer...". Estes não apenas dão o melhor sentido, eles
sabem mais que o próprio autor. São esses os que colocam as palavras na boca dos autores.
Quem fala, com efeito, tem uma compreensão maior que o próprio autor.
Essa idéia de que o leitor entende mais que o autor provém de Heidegger, e também se insere
na discussão sobre a temporalidade do entendimento do texto. Palmer explica o entendimento
daquilo que Heidegger falou sobre uma compreensão maior que o autor:
Heidegger antes se interroga sobre o que o texto não disse... Vai para além do texto,
interrogando-se sobre o que é que o autor não disse e não podia dizer e que no entanto
aparece no texto como sendo a sua mais íntima dinâmica. O texto final, acabado, não é o único
objeto de interpretação. Preocupam-no sim, a violência e a luta que atuaram na criação do
texto. Isto traz à hermenêutica, duas conseqüências já tradicionalmente familiares: 1) violentar
o texto e 2) compreender melhor o autor do que ele se compreendeu a si próprio... toda a
interpretação tem que violentar as formulações explicitadas no texto. A recusa em ultrapassar
uma mera explicitação do texto é realmente uma forma de idolatria bem como de ingenuidade
histórica. Será que podemos compreender o autor melhor do que ele se compreender a si
próprio? Não, porque o autor estava no pleno domínio das considerações que animaram a sua
composição; não compreendemos melhor o autor; compreendêmo-lo de um modo diferente
(Palmer 152)
Esse aspecto é bem interessante psicologicamente, pois a hermenêutica faz uma interface com
essa disciplina. Saber mais que o autor não deve ser uma idéia nova para o intérprete. Isso é
fácil de acontecer e nem sempre condenável. Por exemplo, sempre que alguém esteja lendo
uma determinada passagem, ele é transportado para outros saberes que provêm de outras
aprendizagens. Ao ler essa passagem particular, começa a elaborar outros conceitos e
pensamentos que não estavam na mente do autor. Às vezes, acontece que um autor cita algo
só de passagem, essa citação de passagem chama a atenção do intérprete. A partir daí, aquilo
que era só uma citação original do autor, passa a ser o tema de pesquisa e desenvolvimento
do outro. O fim de um pensamento de um autor é sempre o início do pensamento de um outro.
Aquilo que se dá como finalizado é sempre o ponto de partida para um outro pensamento.
Quando se encerra aquele assunto, já se está muito longe daquilo que o autor original
pretendeu. É assim que se consegue saber mais do que o autor ao ler a sua obra.
Não é de agora que isso acontece. Os autores do NT foram os primeiros a enfatizar essa
maneira de tratar o texto. O texto do AT realmente "sofreu" na mão de Mateus, Paulo e o autor
aos Hebreus. Foram eles os primeiros a dizer que algo no texto vétero testamentário não
queria realmente dizer o que disse, e, visto que tudo deveria ser cumprido na vida de Jesus,
teria que se dar outros significados ao texto. Logo, o sentido último do texto não era narrar o
acontecido, mas o que aconteceria em Jesus. Isso diz respeito até aos acontecimentos
reconhecidamente históricos que na vida de Israel não têm um valor real em si, mas figurativo,
prototípico. O que aconteceu pouco importa, mas a interpretação desse fato na vida de Jesus.
A relatividade hermenêutica é mais fluida que a exegese. O hermeneuta mudo, bem assim a
situação histórica, o ambiente, os ouvintes e as idéias dos falantes. Se alguma coisa é
possível, então, em termos de trabalho com o texto, essa possibilidade só existe em termos da
exegese, a descoberta do sentido do texto lá. O aqui, por sua vez, fica por conta da idéia que
se quer comunicar. A palavra imutável fala diversamente, mas não fala por si, nem de si
mesma, fala, agora, pelo falante, que há não é mais o autor, nem Deus; ela fala as palavras do
falante, do próprio falante.
Antes, para se fazer hermenêutica, pretendia-se encontrar um ponto de ligação, uma cena que
fosse comum entre os ouvintes atuais e os leitores originais, mas é difícil encontrar esse ponto.
Não é sempre que temos situações existenciais comparáveis entre os ouvintes atuais e leitores
originais. No máximo, podemos ter situações análogas.. assim, hermeneutizar as escrituras é
sempre ultrapassá-la no seu sentido original. Algumas vezes esse ultrapassamento é tanto que
a situação do autor, dos leitores e o sentido do texto servem apenas de ponto de partida para
aquilo que virá depois pela boca do falante. O ultrapassamento sempre existirá, visto que quer-
se aplicar o texto hoje. O hoje é o ultrapassamento do lá e então. É sempre diferente da
situação originadora do texto e do autor.
Toda pregação que toma como base um texto escrito de um autor, é, ao mesmo tempo,
pregação de uma pregação. A pregação atual é uma re-pregação, o que torna a hermenêutica
tanto uma continuidade apostólica – o que é negado da maioria protestante – como uma
autoapostolicidade – o que seria uma heresia – quando se toma o texto bíblico apenas como
ponto de partida. Os pregadores vão além do seu papel de apóstolos, fazem o papel do Cristo,
pois este dizia: "ouvistes o que foi dito, eu, porém, vos digo". Esse "eu, porém", é sempre dito
nas ocasiões em que vimos falando. Se os autores do NT ultrapassaram o conteúdo do Antigo,
os hermeneutas atuais vão além, pois não só ultrapassam a estes, mas àqueles também.
Acresce-se, ainda que esse ultrapassamento é diferente dos autores do Novo. Marcos, Mateus,
Lucas e os outros retraduziram o sentido do Antigo para fazer falar de Jesus. Hoje, o texto fala
para o momento existencial do ouvinte. O ouvinte e seu momento, pois, passam a ser o
determinante daquilo que o texto dirá. A genialidade do intérprete e a situação existencial da
comunidade ouvinte são as formas que forçam o intérprete a saber e dizer mais que o texto
disse.
Pelo exposto, o uso dos comentários só se torna possíveis em termos de exegese, não de
hermenêutica, pois a situação de quem escreve é irrepetível, assim como irrepetível é a
situação da comunidade leitora da pregação escrita. Se a exegese, então, é possível, ainda
que com suas dificuldades, a hermenêutica não, mesmo que esta dependa daquela, que use a
exegese como base e uma sirvam para outra.
Conclusão
Esse último parágrafo pode parecer bastante complicado, e é, com efeito. Ele aponta para
muitas coisas que nem sequer foram tocadas ao longo desse texto. Por outro lado, esse texto é
apenas um apontar para muitos temas que devem ser ampliados.
5. UM EXAME DA EXEGESE II
INTENÇÃO E INTENCIONALIDADE
João Pedro*
Introdução
Como acontece em outros saberes e práticas do homem não procuram pela origem e
fundamentos de uma ação. Outras vezes, não nos interessa saber a origem, natureza de algo
e se esse algo pode ser melhorado. Uma pessoa pode usar um aparelho durante muitos anos
e nunca se perguntou como se faziam as coisas antes desse aparelho, como as pessoas se
viravam. Ao hermeneutizar um texto, nem sempre nos damos conta de regras implícitas, e, às
vezes, nem mesmo das explícitas. Todo mundo que interpreta usa regras, conscientes ou não.
O teórico, aquele que busca o fundamento das coisas, que questiona, nem sempre é visto
como sendo útil para a sociedade, mas ele tem utilidade. Um aperfeiçoamento, novo invento ou
rejeição de algo vem pelo perguntar e aí se evidencia a utilidade do teórico. Às vezes, a única
utilidade de um teórico é explicitar ou explicar e sistematizar uma prática, um saber que
fazemos apenas por intuição.
5.1 INTENCIONALIDADE
A exegese como todo saber, tem práticas implícitas e intuitivas. Neste texto quero abordar uma
prática escondida que está por trás do procedimento interpretativo. Esta prática escondida
talvez fosse melhor dita como prática não consciente, e que consiste no desconsiderar o
momento originário do chamado "contexto original".
O alvo de toda interpretação é saber o lá e então em primeiro lugar. Isso é uma regra implícita
e explícita em nossa hermenêutica atual. É a regra básica de todo procedimento hermenêutico.
Saber como funcionou o texto para os leitores em suas necessidades em primeiro lugar, para
depois descobrir como pode funcionar no contexto temporal do ouvinte hoje, é a tarefa que se
coloca como primordial. Mas há, nessa tarefa, alguns elementos a serem considerados.
5.2 O LUGAR DO INTÉRPRETE
Se eu trabalho o texto tentando descobrir o "lá", é certo que a comunidade leitora já influenciou
no procedimento originador do texto. Isto é, o autor, ao trabalhar com seu texto, modelou-o
segundo seus leitores e suas necessidades, pois que todo texto "serve" a algum propósito:
confortar. Consolar, admoestar. Ensinar, edificar ou corrigir algo nos leitores. Essa é uma das
chaves para se descobrir porque, mesmo nos evangelhos sinóticos, um mesmo acontecido na
vida de Jesus pode ter contextos, lugares, lições e personagens diferentes em cada autor.
Mas, se minha leitura começa com o "lá", meu começo não é originário, isto é, não começo
onde deveria começar, pois aí, estou desconsiderando o acontecido. Todo acontecimento
originador de um texto tem uma anterioridade e originalidade ao próprio texto. O que estou
dizendo é que o fato é anterior ao texto, e não tem relação direta com este. Tem algo antes do
"lá", do texto, que é anterior a ele e à comunidade leitora.
Agora, todo texto precisa ser lido em três contextos distintos: o meu o da igreja leitora e o
contexto de Jesus. Eu preciso levar em consideração isso também. Quem nos ajuda a ver a
interpretação desse modo são os estudiosos intérpretes das parábolas. Eles, principalmente
Dodd, Jeremias e Weissmann, chamam a atenção que as parábolas tiveram, inicialmente, um
objetivo na fala de Jesus, e, entre a fala de Jesus e a leitura da comunidade, o autor deu uma
nova interpretação ao fato. Algumas parábolas foram ditas em um determinado contexto e os
autores colocaram as parábolas em outro contexto, de acordo com a comunidade leitora.
Uma vez que o intérprete está consciente disso, achará que os autores dos evangelhos fizeram
exatamente isso. Vendo as parábolas ou qualquer outro texto no ensino de Jesus, percebemos
que os acontecimentos estão dispostos em locais diferentes e se dirigem a um público
diferente. Uma hora o ensino se dirige aos inimigos, os fariseus, outra, porém, aos discípulos.
Então, é a situação existencial da comunidade quem determina qual sentida o fenômeno em
Jesus deve tomar.
Todo texto, portanto, passa a ser uma pregação escrita baseada em uma pregação oral. Isto
quer dizer o seguinte: todo texto é pregado pelos escritores do Novo Testamento para os
leitores originais a partir de uma pregação de Jesus. O acontecimento, na vida de Jesus, no
entanto, nem sempre tem um "para quê"; esse "para quê", só acontece na vida dos escritores.
Em outras palavras, isso pode ser explicado da seguinte forma: nem sempre um acontecido foi
"provocado" por Jesus para que uma lição ou princípio fosse ensinado.
O que era mais comum na vida de Jesus era que as coisas aconteciam independentemente de
sua vontade, e, a partir desse acontecido alheio à sua vontade, aplicava um princípio ou ensino
espiritual. Considere, só a título de exemplo, a cura do paralítico em Cafarnaum que foi baixado
do teto pelos amigos (Mc 2). Até aquele momento, Jesus estava ensinando - e o texto fala isso
- qualquer coisa que nada tinha a ver com o que se segue. O novo evento lhe rouba a
importância do “assunto ensino” que ele está ministrando até àquela hora. Os amigos chegam,
causam aquele transtorno e Jesus dá a palavra, primeiro ao paralítico, depois aos fariseus ali
presentes. Nada foi provocada intencionalmente por Jesus, por isso a completa destituição de
intencionalidade no evento. Não sabemos o que Jesus estava ensinando nem antes e nem o
que ensinou depois desse evento.
Se alguma intencionalidade existe, existirá nos ensinos que eu chamaria de avulsos. São os
ensinos em forma de discursos de Jesus que acontecem em alguns momentos do seu
ministério, por exemplo, no caso do sermão inicial do seu ministério em Mateus, ou o sermão
aos discípulos acerca da parusia, no final de sua vida com os mesmos. Nesses momentos
Jesus simplesmente começa a falar algo para seus discípulos não tendo como alavanca um
acontecimento originador, é um ensino que não tem uma origem a não ser no desejo do próprio
mestre.
Quando o autor usa um fato para relacionar com o presente da comunidade, aí, sim, é dada a
esse fato uma intencionalidade. Mas entre o escrito e o fenômeno não há causação, nem
seqüência, nem seqüência entre a necessidade da comunidade leitora e o fato na vida de
Jesus. O escrito, portanto, é uma reinterpretarão do fenômeno e essa interpretação é arbitrária
- da própria vontade do autor - e condicionada, pois que um mesmo fato, que originalmente é
único e desintencional é interpretado de várias formas por autores diferentes.
É nesse sentido que o escrito é uma pregação escrita de uma pregação oral, mas que essa
pregação também foi, em algum tempo, dramatizada pelo momento. Quando interpreto o
escrito, e não o fenômeno ou a situação original, o que estou fazendo é buscando uma
intenção da intencionalidade do autor e não da intenção de Jesus. É até engraçado isso o que
acontece com os intérpretes de todos os tempos. É Jesus o centro da vida do intérprete e das
comunidades ouvintes do intérprete, mas ao se fazer a interpretação de um texto, não se está
preocupado com o contexto de Jesus inicialmente, mas com o do autor e dos leitores originais.
O contexto de Jesus é anterior ao "lá", é originário. Esse "lá" diz respeito aos leitores originais e
não ao de Jesus. Jesus sendo o personagem mais importante, fica em posição secundária
quando se começa pelo "lá" do leitores, e não pelo de Jesus.
Isso passa bem despercebido dos leitores de hoje e dos intérpretes. É uma prova de como as
regras que nos impomos e que acatamos, nem sempre nos agradariam se pensássemos o que
está por trás das mesmas.
Quando interpreto, estou fazendo uma interpretação de uma interpretação. Minha exegese,
tendo como base a comunidade leitora e não a comunidade ouvinte, está baseada na
interpretação que o autor deu, e não aquilo que Jesus falou. Jesus já não fala, senão pelo
autor. Quando prego, estou pregando uma repregação, pois que todo escrito é uma pregação
do autor para alguma comunidade. Quando interpreto ou prego, é a intencionalidade do escritor
e não a intenção de Jesus. Meu trabalho está baseado na intencionalidade do autor, e não no
fenômeno em si.
Mas isso não deve nos levar ao suicídio ou negação do nosso método de interpretação. Os
autores, não precisamos pensar que foram mal intencionados, não estão querendo trair um
fenômeno na vida de Jesus, eles queriam era apenas estender o acontecido em Jesus para a
vida de seus leitores. Portanto, podemos crer que da parte deles, houve critério e seriedade na
interpretação dos fenômenos. Eles mesmos falaram desse critério. Judas, Lucas e Paulo
falaram isso. Além disso, a 'presença do Espírito com eles, os orientou a fazer o que fizeram.
Semelhantemente, da mesma forma que o autor nem sempre respeita a intenção e o contexto
de Jesus e dos discípulos na escrita do texto, da mesma forma há como que uma
independentização do texto em relação ao autor depois que este se fixa como texto literário.
Vejamos outros autores falando sobre essa textualidade e independentização:
Assim que o texto foi escrito e saiu das mãos do autor, torna-se autônomo, inicia um caminho
próprio. Salvo raras exceções, o autor não é mais capaz de defender o seu texto de
incompreensões e equívocos... Expressões escritas tornam-se entidades autônomas, se bem
que os textos podem vir acompanhados de auxílios extratextuais para a compreensão, por
exemplo declarações do portador.
Da mesma maneira como o autor trabalhou de forma independente ao acontecido ao escrever
seu texto, esse mesmo texto, como se tivesse vida própria, trilha seu próprio caminho.
Naturalmente, isso deixa um caminho aberto para que todo intérprete possa “dizer” qualquer
coisa de qualquer texto.
Egger mesmo enfatiza que o texto não encerra um só sentido: “...os textos bíblicos não têm um
significado fixo e acabado, mas escondem uma plenitude de potencialidades” ( 210). Dessa
forma, o autor já não “pretende” algo com seu texto, a pretensão existe no intérprete, da
mesma forma como o acontecimento originário não pretendia algo, simplesmente acontecia. O
autor, se pretendeu algo, pretendeu para os leitores originais “... não se afirma que o sentido
literal é o que o autor humano inspirado pretende; é antes o que esse autor expressa”,
(Fitzmyer, 77 itálicos do autor)
Os textos têm uma duração que independe da situação, segundo Weimar, os textos pertencem
a duas situações separadas no tempo e têm duração independente da situação, são sempre
presente, são atemporais e acabados, um texto é presença coisificada de um passado, os
textos são som e fala transformados em linhas escritas, (Egger 31)
Já que o autor, como dito acima, não intenciona nada hoje, apenas expressa algo, como disse
Fitzmyer, a interpretação depende de algum tipo de genialidade do intérprete. Houve
genialidade do autor quando ele colocou um texto em um novo contexto por causa dos leitores
e não por causa de Jesus. Da mesma forma, espera-se certa performance do intérprete para
trabalhar com o texto hoje. Essa atuação performática é descrita como:
7. A LETRA E O ESPÍRITO
Paulo disse que “a letra mata, mas o espírito vivifica” (II Cor.3.6). Há quem use tal texto para
negar o sentido literal das Escrituras. Este sentido não deve ser negado nem menosprezado,
pois ele é a base do sentido espiritual. Por exemplo, se negarmos a existência real de Adão e
Eva, cairá por terra toda a doutrina bíblica do pecado e suas implicações espirituais.
Por outro lado, não devemos usar a letra contra o Espírito. Isto acontece quando, por exemplo,
usamos a letra como um limite para nossa ação a favor do próximo. Nesse caso, a letra mata.
Alguém poderia dizer: “Já entreguei meu dízimo, portanto não preciso ajudar ao meu irmão
necessitado”. Estaria assim, apegando-se ao sentido literal do dízimo e negando-se a cumprir o
amor para com o próximo.
A letra abrange um sentido limitado. O espírito vai além. Em Mateus 5, Jesus mostrou isso.
“Ouviste o que foi dito aos antigos..” (a letra). “Eu porém vos digo..” (o espírito). O Novo
Testamento veio mostrar o conteúdo espiritual que havia por trás da lei e que era ignorado por
grande parte do povo de Israel. Ao repreender os fariseus, Jesus chamou a atenção daqueles
líderes para a justiça, a misericórdia e a fé, que representavam o sentido espiritual da lei. Os
fariseus estavam apegados apenas à letra.
8. HISTÓRIA DA HERMENÊUTICA
Estudando a história da hermenêutica conheceremos vários métodos de interpretação bíblica
que se sucederam. Podemos assim compará-los, buscando, quando possível, o
aproveitamento de suas melhores características. Sobretudo, tal abordagem será útil para que
não repitamos os mesmos erros dos intérpretes do passado. Estaremos também um pouco
mais aptos para a avaliação de outros métodos que porventura surgirem. Na seqüência,
apresento resumo do relato histórico apresentado por Henry A. Virkler em sua obra
“Hermenêutica Avançada”.
Exegese judaica antiga (536 a.C ate séc. 1 d.C)
Esdras (Nee.8.8). O povo que voltava do cativeiro falava aramaico e estava bem distante da
realidade de Moisés. Esdras certamente traduzia e explicava a lei. Ele parece ter sido a
primeira figura de destaque na Hermenêutica judaica.
Rabinos posteriores: Depois de Esdras, os rabinos primaram pela supervalorização da letra.
As cópias eram feitas com extremo zelo e reverência. Detalhes de estilo literário, como as
figuras de linguagem e paralelismo, ou incidentais, como a repetição de palavras, ocorrência
de sinônimos, repetição de letras ou a forma das mesmas, eram considerados como motivos
para interpretações engenhosas. Esse comportamento recebe o nome de “letrismo” e muitas
vezes substituiu o sentido que o autor bíblico pretendia.
Rabinos no tempo de Cristo: praticavam a interpretação literal (peshat), midráshica, pesher e
alegórica. O tipo de interpretação variava de acordo com o grupo judaico e com o propósito.
Literal – é o sentido normal do texto, com base em suas palavras. Esse tipo de interpretação
era adequado para os interesses judiciais e práticos.
Midráshica - Midrash era um tipo de comentário da lei – obras desse tipo surgiram a partir do
século 4 a.C. – Os adeptos desse método determinavam o significado do texto pelo significado
das palavras, sem consideração do contexto e da idéia do autor. Comparavam palavras e
frases de textos diferentes e autores diferentes, sem levar em conta se o assunto era o mesmo.
Teciam interpretações com base em questões gramaticais (tempo verbal, etc). Somavam os
valores numéricos de uma palavra e faziam sua substituição por outra palavra do mesmo valor,
mudando assim o sentido do texto, ou tirando conclusões totalmente independentes do
mesmo. Por exemplo, o nome “Eliezer” possui valor numérico igual a 318. Relacionando-se
isso ao fato de que Abraão formou um exército de 318 homens, um intérprete concluiu que o
servo Eliezer valia por 318 homens ou tinha o valor de um exército. A interpretação midráshica,
que desconhecia qualquer regra, conduzia, quase sempre a fantasias absurdas.
Pesher – esse método, praticado pelos essênios, era semelhante à interpretação midráshica,
mas possuía ênfase escatológica. Os essênios esperavam o fim do mundo para os seus dias.
Por isso, liam as Escrituras procurando em toda parte mensagens para os últimos dias.
Alegórica – Alegorizar significa dar um sentido místico ou espiritual para um relato histórico.
Por exemplo, se tomarmos a história de Adão e Eva e falarmos sobre Jesus e a igreja,
estaremos alegorizando. Fílon de Alexandria dizia que a interpretação literal, por sua
facilidade, era própria dos imaturos. Haveria, portanto, um sentido alegórico oculto em cada
história bíblica. A alegoria é um recurso válido, mas deve ser usado com cautela. O uso da
alegoria não nos deve fazer negar, esquecer ou menosprezar o sentido literal de uma
passagem bíblica. Por exemplo, Paulo alegoriza a história de Sara e Agar, mas não nega seu
sentido histórico. É bom deixar claro que existem algumas passagens bíblicas que contém
alegoria. É o caso do texto de Paulo em Gálatas 4.24-31. Outra coisa é a nossa iniciativa de
alegorizar as passagens bíblicas, quando, de fato, trata-se de texto histórico ou de outro tipo.
Os judeus antigos costumavam alegorizar uma passagem bíblica nas seguintes situações:
- Se o significado literal fosse indigno de Deus.
- Se a declaração fosse contrária a outra declaração bíblica.
- Se o texto afirmasse tratar de alegoria.
- Se houvesse expressões dúplices ou palavras supérfluas.
- Se houvesse repetição de algo já conhecido.
- Se uma expressão fosse variada.
- Se houvesse emprego de sinônimos.
- Se fosse possível jogo de palavras.
- Se houvesse algo anormal em numero ou tempo verbal.
- Se houvesse presença de símbolos
Uso do Antigo Testamento pelo Novo Testamento
10% do conteúdo do Novo Testamento compõe-se de citações do Velho, incluindo menção a
30 de seus livros. Jesus e os autores do Novo Testamento citam o Velho Testamento quase
sempre interpretando-o de modo literal.
Jesus citou personagens do VT como pessoas reais, afirmando, inclusive o retorno das
mesmas para o juízo final. Além disso, o Mestre criticou o uso das tradições na interpretação
das Escrituras que acabavam por inutilizá-la (Mt.15.1-9).
1- A letra mostra-nos o que Deus e nossos pais fizeram. (Por exemplo, nesse sentido,
Jerusalém seria a própria cidade histórica em Israel).
2- A alegoria mostra-nos onde está oculta a nossa fé. (Jerusalém representaria, portanto, a
igreja).
3- O significado moral dá-nos as regras da vida diária. (Jerusalém significaria a alma humana).
Calvino (1509 – 1564) – Dizia que a alegorização era artimanha de Satanás. Segundo Calvino,
a Escritura interpreta a Escritura. Destacou a importância do contexto, gramática, palavras e
passagens paralelas, em lugar de trazer para o texto o significado do intérprete.
Exegese Pós-reforma (1550-1800)
Confessionalismo – Nessa época foram definidos os credos católicos e protestantes como
base da exegese. A variedade de credos e a preferência do intérprete conduziam a muitas
discrepâncias teológicas. O uso das Escrituras ficou restrito à escolha de textos para
“comprovação” de posições religiosas pré-determinadas.
Pietismo – Philipp Jakob Spener (1635-1705) – O pietismo foi um movimento contra a exegese
dogmática. Incentivou o retorno às boas obras, ao conhecimento bíblico, ao preparo espiritual
dos ministros e o trabalho missionário. Por algum tempo, houve boa utilização do método
histórico-gramatical. Depois, a tendência de espiritualizar de forma piedosa os textos,
fortaleceu a tese de uma “luz interior” para a interpretação e o desprezo ao método histórico-
gramatical, distanciando os intérpretes das intenções do autor.
Urge, portanto, que pessoas treinadas no manejo e na aplicação das escrituras saiam
pelo mundo transmitindo essa mensagem poderosa que contem em si o germe da nova vida,
da nova era, do tempo em que o reino de Deus terá sua manifestação plena. São essas as
pessoas das quais a igreja tem maior necessidade hoje. Num mundo em que tantas vozes se
ouvem e se fazem ouvir, é preciso fazer soar de novo a voz nítida e clara do evangelho de
Jesus Cristo, a única possibilidade de salvação para a humanidade. Numa época de tantas e
sutis filosofias e ideologias, urge que se ensine com toda profundidade aquela mensagem que
a todas se sobrepõe, a todas julga, a todas questiona, estabelecendo critérios últimos de
verdade e de sentido para a vida.
Esperamos a dedicação pelo conhecimento das Escrituras de todos aqueles que vivem
empenhados no ensino das sagradas Escrituras. Quanto mais conhecemos as Escrituras, mas
conhecemos a Deus.
BIBLIOGRAFIA
FEE, Gordon D. STUART, Douglas – ED. VIDA NOVA SP. 1999 – Pag. 19.
CARLOS, Antonio. (Acesso via internet. Dez. 2006). www. geociti,com.br/ exegese.