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Com suas mãos nuas recolhiam da terra o comestível; imitavam ou

usavam as garras ou presas dos animais e afeiçoavam instrumentos de


marfim, osso ou pedra; faziam redes e toda sorte de armadilhas para
apanhar os animais ou pescá-los.
A caça e a pesca não foram estágios do desenvolvimento econômico, e
sim modos de atividade que iriam sobreviver mesmo nas mais altas
formas das sociedades civilizadas.
Viver da caça não era coisa original; se o homem houvesse permanecido
nessa atividade, teria sido apenas mais um animal carnívoro. Sua
humanização teve início quando, em vista das incertezas da caça, ele
passou a desenvolver a criação. Isto trazia vantagens da mais alta
importância: a domesticação dos animais, a reprodução do gado e o uso
do leite.
Enquanto isso as mulheres faziam a maior descoberta econômica de
todas as épocas – a da produção do solo. Enquanto o homem caçava, a
mulher esquadrinhava as imediações da cabana em busca de tudo quanto
fosse comestível. O segundo estágio da agricultura veio com o
surgimento da enxada: o pau pontudo recebeu na extremidade um osso
chato. Com a domesticação dos animais e a forjadura dos metais, a
enxada mudou de substância e aumentou de peso; também se
transformou em arado, e o revolvimento mais profundo do solo revelou
uma fertilidade que iria mudar o mundo. Plantas silvestres foram
domesticadas, novas variedades se desenvolveram, velhas variedades
melhoraram.
Finalmente a natureza ensinou ao homem a arte da provisão, a virtude da
prudência, o conceito do tempo. E ele descobriu meios de secar a carne à
fumaça, salgá-la ou congelá-la; e melhor ainda, de construir celeiros à
prova de chuva e umidade, de insetos e ladrões, e em tais abrigos
acumular o que pudesse para uso durante as estações de carestia. Com a
compreensão de tal fato deu o homem um dos três passos que o
levariam da bestialidade à civilização – a fala, a agricultura e a escrita.
A incerteza do alimento transformou esses homens em onívoros; comiam
de tudo – moluscos, rãs, sapos, cobras, caramujos, ratos, aranhas,
minhocas, cavalos, cães, centopéias, gafanhotos, raízes, piolhos, insetos,
ovos de répteis e aves; tudo era regalo para o homem primitivo. O menu
de certas tribos dificilmente se diferenciava do dos grandes macacos.
A descoberta do fogo veio limitar essa indiscriminada voracidade, e
cooperou com a agricultura para elevar o homem acima do estágio da
caça. O cozimento veio tornar assimiláveis a celulose e o amido de
milhares de plantas não digeríveis em estado natural e o homem voltou-se
decididamente para os cereais e vegetais.
A todos variados comestíveis que enumeramos, o homem adicionou o
mais apreciado de todos – a carne do próprio homem. O canibalismo foi
por muito tempo universalmente praticado. A carne humana se tornou
gênero de comércio entre muitas tribos; não havia funerais.
Por toda parte entre os povos naturais o sangue é considerado uma
délicatesse; nunca era visto com horror; mesmo os vegetarianos primitivos
o tomavam com prazer. O sangue humano era constantemente bebido
por tribos que no mais se tornavam generosas; às vezes como remédio; às
vezes como rito; às vezes como convicção de que transmitia ao bebedor a
força vital da vítima.

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