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UMA POSSIBILIDADE CIBERNÉTICA NA GESTÃO DO ENSINO A DISTÂNCIA

JOÃO SÉRGIO DOS SANTOS ASSIS1

Resumo: A Cibernética é a ciência do controle, comunicação e organização. Desde seus


primórdios ela busca traçar paralelos entre o funcionamento do organismo humano e de
máquinas. Alguns cientistas foram mais além ao estender este paralelo para organizações,
países e até mesmo a economia. Sistemas complexos, como esses, têm de lidar com mudanças
imprevisíveis nas condições do ambiente e devem para isso adaptar seu funcionamento a essas
mudanças através de um processo chamado de homeostase. Este trabalho busca discutir uma
possibilidade de ajuste homeostático numa instituição de ensino superior a distância
(CEDERJ) em face de um problema que põe em cheque a sua viabilidade: a evasão de alunos.

Palavras-chave: Ensino-a-distância; cibernética; VSM; Stafford-Beer; evasão.

INTRODUÇÃO

Segundo Norbert Wiener, “cibernética é uma palavra inventada para definir um novo
campo na ciência”. Para ele, cibernética “combina, sob um único título, o estudo do que,
dentro do contexto humano, é às vezes imprecisamente descrito como pensamento e, na
engenharia, como controle e comunicação". Falando de outra maneira, "a cibernética tenta
encontrar os elementos comuns ao funcionamento de máquinas automáticas e ao sistema
nervoso de seres humanos, bem como desenvolver uma teoria que abranja todo o campo de
controle e comunicação nas máquinas e nos organismos vivos” (WIENER, 1948:14).
Um pesquisador britânico contemporâneo oferece uma definição mais compacta:
“cibernética: é a ciência da comunicação ou, como algumas pessoas dizem, a ciência da
organização” (LIBER, 2008). Oleg Liber, pesquisador da Universidade de Bolton, na
Inglaterra, retomou o trabalho do cientista cibernético britânico Stafford Beer, falecido em
2002, que passou boa parte de sua vida se dedicando ao que chamou de Gestão Cibernética
(no original, Cybernetic Management). Liber, assim como outros, tem buscado aplicar a
Gestão Cibernética à gestão do sistema de ensino.
Informação, controle, adaptação e viabilidade são palavras-chave para a gestão
cibernética. Este texto procura identificar -- a partir de um caso real ocorrido numa instituição
dedicada ao ensino a distância -- como uma melhor coleta de dados, um melhor fluxo de

1
UFRJ, HCTE/NCE, Brasil. E-mail: joao@nce.ufrj.br
2
informação e uma maior distribuição de controle podem contribuir para garantir a viabilidade
da instituição.

CIBERNÉTICA E O MODELO DE SISTEMA VIÁVEL (VSM)

Beer, em seus livros, distingue três classes de sistemas: os simples, os complexos e os


extremamente complexos. As duas primeiras classes têm em comum serem, em princípio,
cognoscíveis e previsíveis, e, portanto, susceptíveis aos métodos das ciências tradicionais
(PICKERING, 2011:221-222). Já os extremamente complexos são “sistemas tão complicados
que são impossíveis de serem descritos em detalhe” (BEER, 1967 apud MEDINA, 2014:26),
necessitando, portanto, da cibernética, pois esta contém as ferramentas para sua compreensão
e controle, permitindo sua adaptação a problemas inesperados (MEDINA, 2014:27). O
modelo cibernético de Beer estabelece paralelo entre organismos e sistemas extremamente
complexos, como a economia, o cérebro e as empresas. Controle e adaptação são palavras
muito importantes para a cibernética. A ideia de controle, em Beer, deve ser entendida como
autorregulação ou, melhor dizendo, a capacidade de um sistema se adaptar às mudanças
internas e externas para sobreviver (MEDINA, 2014:26).
A partir do final dos anos 60, Beer começou a trabalhar num modelo cibernético para
garantir a adaptação e sobrevivência de sistemas complexos: o Modelo de Sistema Viável
(Viable System Model ou simplesmente VSM). Para ele, uma empresa (ou qualquer sistema
complexo) pode ser vista como um organismo vivo, lutando para sobreviver num ambiente
em mutação. A complexidade do sistema fica contida em caixas-pretas, onde mais importante
do que saber com precisão como funciona seu conteúdo é saber como é seu comportamento e
como se relaciona e troca informação com outras caixas-pretas.
A gestão cibernética prioriza a sobrevivência da empresa a longo prazo, utilizando a
experiência passada, aprendendo, para adaptar suas políticas e comportamentos aos desafios
do presente. Para isso é necessário recolher e acumular dados históricos e desenvolver
métodos estatísticos que mostrem a seus gestores como lidar com o presente e pensar no
futuro (MEDINA, 2014:25). O modelo de Beer visa promover a comunicação lateral (no
mesmo nível da hierarquia interna) e vertical (nos vários níveis da hierarquia), mantendo o
equilíbrio entre um controle centralizado e descentralizado. Segundo Medina, “o modelo
procura maximizar a autonomia de suas partes componentes para que possam organizar-se
como quiserem. Ao mesmo tempo, são mantidos canais de controle vertical para manter a
estabilidade de todo o sistema” (MEDINA, 2014:35).
3
O Modelo de Sistema Viável é composto por cinco camadas (ou sistemas) numeradas
de 1 a 5 (Figura 1) e há uma analogia direta com o sistema nervoso humano (detalhe da
Figura 1). Em cada camada a complexidade do sistema está embutida em caixas-pretas, e
existem canais de comunicação entre as caixas-pretas e entre as camadas, de forma que as
informações (e as decisões) possam ser compartilhadas tanto interna quanto externamente. O
sistema 1 é o mais próximo do mundo exterior e tem sensores para perceber as mudanças e
reagir de acordo com elas. Esse sistema trata de informações locais, que exigem resposta
imediata, e a ele é dada autonomia para fornecer essas respostas. A analogia na figura do
detalhe é com os órgãos do corpo humano, tais como músculos, coração e rins.
Figura 1 – VSM sistemas e canais de informação (sistema nervoso no detalhe)

Fonte: autor adaptado das imagens publicadas em (PICKERING, 2011:245).

O sistema 2 faz o transporte da informação para o sistema 3, deixando passar apenas


as informações relevantes para o próximo sistema. O sistema 3 também lida com problemas
que exigem resposta imediata, mas tem uma visão mais global desses problemas, já que
recebe as informações coletadas nos vários órgãos. Esse sistema também realiza auditorias
regulares em cada órgão (é o 3* na figura). O sistema 4 é, segundo Pickering, o mais
importante para Beer e, por receber informações de todos os órgãos e do mundo exterior, é o
mais apto a tomar decisões gerais, de curto e de longo prazo. O sistema 5 toma as decisões de
planejamento que estão além da viabilidade imediata do organismo.
4
VSM E ENSINO

O modelo de Beer pode ser aplicado a qualquer sistema complexo que tenha de se
adaptar às mudanças do meio ambiente para continuar viável. O próprio Beer coordenou uma
experiência de implantação do VSM como forma de gerir a economia de um país, no Chile do
início da década de 70 (MEDINA, 2014). Nos últimos anos, temos vários exemplos de
tentativas de aplicação desse modelo ao sistema de ensino. Para citar alguns, temos Oleg
Liber que aplicou o VSM na gestão tecnológica de instituições de ensino (LIBER, 1998) e na
avaliação de ambientes virtuais de aprendizado (BRITAIN e LIBER, 2004). No Brasil, temos
um trabalho também sobre ambientes virtuais de aprendizado (GRANITO e MIURA, 2007) e
outro sobre gestão de uma instituição municipal de ensino (MACHADO NETO et. al., 2005).
Este trabalho aborda um caso ocorrido no Curso de Computação do CEDERJ, um
consórcio que reúne as seis Universidades públicas do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ,
UERJ, UNIRIO, UFF, UENF e UFRRJ), oferecendo 12 cursos de graduação a distância para
cerca de 25 mil alunos em 32 polos regionais em todo o Estado 2. Segundo Medina, “O
Modelo de Sistema Viável funciona de forma recursiva: as partes de um sistema viável
também devem ser viáveis e seu comportamento poderia ser descrito usando o modelo”
(MEDINA, 2014:35). Isso permite uma grande liberdade de escolha na definição do que se
vai detalhar e o que se vai deixar como caixa-preta. Este trabalho se limita a abordar a recolha
de dados e a troca de informações entre um de seus cursos (o Curso de Computação) e a
direção geral.

UMA DISCUSSÃO NO CURSO DE COMPUTAÇÃO

O ensino adotado pelo CEDERJ está numa zona intermediária entre o presencial e o a
distância, podendo ser considerado como semipresencial. Nas reuniões internas e nas aulas
inaugurais sempre é enfatizado o caráter semipresencial dos cursos, porém em diversos locais
do sítio da internet da instituição aparece a expressão “graduação a distância”, o que pode
confundir os alunos (inscritos e potenciais) sobre a modalidade adotada. A certificação é
presencial, como exige a lei brasileira (NETTO et. al., 2012), e o ensino pode ser realizado a
distância, embora existam apoios presenciais como polos, laboratórios e tutores.

2
Extraído do Curriculum Lattes de Carlos Eduardo Bielschowsky (presidente do CEDERJ):
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4783215A6 visitado em 13/01/2016
5
É fundamental para a viabilidade de uma instituição de ensino que os alunos não
desistam do curso e que se formem. Portanto, um grande problema existente no ensino
superior, tanto a distância como presencial, e que desafia a viabilidade de qualquer curso é o
da evasão. Segundo Lobo et. al., "a evasão estudantil no ensino superior é um problema
internacional que afeta o resultado dos sistemas educacionais. As perdas de estudantes que
iniciam, mas não terminam seus cursos são desperdícios sociais, acadêmicos e econômicos"
(LOBO et. al., 2007). Apesar do pouco tempo de existência da modalidade de ensino a
distância, há uma convicção de que a evasão é maior no ensino a distância que no presencial
(SILVA e MARQUES, 2012).
No início de 2011, um dos coordenadores do curso de computação enviou uma
mensagem para a lista dos professores comunicando a volta de Carlos Eduardo Bielschowsky
à presidência do CEDERJ. Na mensagem ele dizia que, numa reunião de coordenadores, o
presidente elogiou a qualidade dos cursos e falou de sua preocupação com a evasão. Afirmou
também que “nesta nova gestão pretende-se identificar os problemas e implantar técnicas para
diminuir a evasão. Uma primeira medida afeta os tutores coordenadores de polo que farão um
acompanhamento individual de cada aluno do seu curso no polo”.
A iniciativa da presidência foi promissora em termos da forma cibernética de garantir
a viabilidade dos cursos do CEDERJ. A partir de um problema existente foram mobilizados
representantes de vários níveis da hierarquia para coletar dados e buscar soluções. Uma
fraqueza desse primeiro momento é que não ficou claro em quais níveis seriam decididas e
adotadas essas medidas. Além disso, para servir como garantia da viabilidade, a coleta dos
dados e a busca de soluções não pode ser realizada de forma pontual, mas sim como uma ação
continuada, acompanhada da criação de um canal de comunicações permanente para que essa
informação possa fluir para os níveis superiores da hierarquia.
Três meses depois, novas reuniões foram realizadas entre a presidência e os
coordenadores e alguns professores dos cursos mais problemáticos (em termos de evasão). O
curso de computação foi considerado um curso problemático e sua reunião foi realizada em
maio. Alguns dias antes dessa reunião (ainda em abril), um dos coordenadores da computação
mandou uma nova mensagem à lista conclamando os professores a apresentar soluções para a
questão da evasão que seriam levadas a uma reunião de coordenadores de curso. A mensagem
foi acompanhada de um gráfico (Figura 2) mostrando "o percentual de aprovações em
disciplinas de nosso curso em 2010-2", onde "sete disciplinas de nosso curso possuem
percentual de aprovação abaixo de 20%". A mensagem prosseguia solicitando: "1. Procurar
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identificar os motivos pela baixa aprovação em disciplinas. 2. Propor soluções visando evitar
a evasão (sem baixar a qualidade)".
Essa foi a primeira de uma série de mensagens (22 no total) onde os professores (onze,
além do coordenador, responderam à mensagem inicial) deram sua opinião sobre alguns
problemas do curso, não apenas sobre evasão. A própria mensagem inicial já mostra que uma
tradução foi realizada (não está muito claro quando foi feita) mudando o foco da discussão,
pois os gráficos apresentados pelo coordenador tratam dos aprovados em cada disciplina.
A primeira mensagem embute uma afirmativa: os alunos estão abandonando o curso,
pois não estão conseguindo ser aprovados nas disciplinas. Essa tradução, embora esteja
visível no primeiro parágrafo da mensagem do coordenador, não chamou a atenção dos
professores, e estes passaram a discutir, não mais a evasão, mas sim a aprovação nas
disciplinas.
Figura 2 – Percentual de aprovações baseado no número de alunos inscritos

Fonte: e-mail enviado a lista dos professores pelo coordenador em 18/04/11.

O principal caminho para se entender um problema e buscar uma solução é estabelecer


padrões de medida que permitam determinar seu tamanho e a eficácia das medidas que serão
adotadas para resolvê-lo. O método mais utilizado para se detectar a evasão é fazer uma
comparação entre o número de alunos que começam o curso e os que o completam ao final do
prazo esperado para a sua conclusão (LOBO et. al., 2007). Por exemplo, num curso de cinco
anos poderia ser feita uma comparação entre o número de alunos que entraram no início de
2005 e o número de alunos que se formaram no final de 2009. Mesmo este tipo de medida não
está livre de distorções. Alguns alunos podem demorar mais que cinco anos para se formar
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sem que isso signifique abandono. Portanto, os dados de um ano, tomados isoladamente,
dizem pouca coisa. Só a comparação de vários anos consecutivos produz dados significativos.
Mas a quantidade de alunos reprovada nas disciplinas do curso não está relacionada
com a evasão? A reprovação numa disciplina não significa abandono do curso e um aluno
sempre pode repetir a mesma disciplina, com sucesso, no período seguinte. Um número
significativo de alunos não completa o curso no período de tempo previsto na grade oficial de
matérias (mesmo nos cursos presenciais). A reprovação muitas vezes está associada a
questões pessoais, o que não pode ser detectado ao se olhar apenas o percentual de alunos
aprovados na disciplina.
Portanto, se escolhemos a evasão como um parâmetro para garantir a viabilidade do
curso, o percentual de reprovações, isoladamente, não é um instrumento adequado de
medição. Porém, mesmo não explicando a evasão, também é um problema que pode
comprometer a viabilidade de um curso.
A situação relatada na mensagem, agravada pela imagem do gráfico, era muito
preocupante. Nada menos que 17 das 26 disciplinas do curso reprovavam mais do que 50%
dos alunos inscritos. Os percentuais mais baixos de aprovação se encontravam nos três
primeiros períodos, que agiam assim como filtro, segurando os alunos com mais dificuldade,
melhorando as estatísticas do resto do curso.
Mas esses dados são precisos? Um professor perguntou na primeira resposta à
mensagem inicial: "os cálculos do gráfico são feitos a partir de todos os inscritos ou somente
com aqueles que realmente participaram do curso"? O professor de uma disciplina do
primeiro período (uma das problemáticas do gráfico) complementou a pergunta com a
observação que “neste semestre tive polo com 90 inscritos e apenas 30 apareceram para fazer
as provas. Assim não tem como ter uma aprovação maior que 20%”.
Os números eram calculados a partir do total de inscritos, sendo que, nos primeiros
períodos, eram inscritos automaticamente alunos cuja matricula estava ativa, mesmo que estes
não realizassem nenhuma atividade por vários períodos. Ou seja, nada impedia que alguém
que já houvesse desistido do curso continuasse inscrito nas disciplinas, o que causava uma
grande distorção na estatística. Isso compromete a busca cibernética da viabilidade, pois, além
da dificuldade para determinar qual o problema que está sendo monitorado, agora há também
dúvidas sobre os dados gerados pelo monitoramento.
A forma encontrada para purificar esses números foi retirar do total os alunos que não
iam fazer as provas. Para entender o que foi feito é necessário compreender como funciona o
sistema de avaliação do CEDERJ para o curso de computação: o aluno pode fazer até três
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avaliações presenciais (AP) e duas a distância (AD), no total de cinco avaliações (AP1, AD1,
AP2, AD2, AP3). O peso das avaliações3 presenciais (80%) é bem maior que o das avaliações
a distância (20%) e um aluno pode passar direto apenas fazendo a AP1 e a AP2.
Para melhorar a precisão dos dados, considerou-se que um aluno que não fez quatro ou
cinco avaliações abandonou a disciplina (não seria considerado entre as reprovações). No caso
do aluno que não fez três avaliações há duas possibilidades: foi aprovado fazendo apenas duas
APs (possível mas não muito comum) ou foi reprovado fazendo apenas duas avaliações e
abriu mão de tentar reverter isso (abandonou a disciplina). Um novo gráfico (Figura 3) foi
produzido mostrando, para cada disciplina, quantos alunos foram aprovados num total
excluindo os desistentes (barras azuis), mantendo os dados anteriores com os aprovados no
total de inscritos foi mantido (barras vermelhas) como forma de comparação. Um pequeno
ajuste nos dados e se constrói uma realidade totalmente diferente. Agora apenas quatro
disciplinas apresentam aprovação menor que 50%4. Esse novo gráfico, no entanto, foi enviado
para a lista só no final da série de mensagens e pouco influiu nas discussões. Os professores
continuaram o debate, alheios a esses dados, relatando problemas, buscando explicações e
sugerindo poucas soluções para resolver o problema da evasão (ou reprovação).
Figura 3 – Percentual de aprovações levando em conta alunos evadidos

Fonte: e-mail enviado à lista dos professores pelo coordenador em 27/04/11.

Diversas mensagens enviadas à lista encontraram nos alunos a explicação para o


grande número de abandonos e reprovações: os alunos não se importam de ser reprovados,
pois não há punição (jubilamento); os alunos vêm com graves deficiências do ensino médio;
os alunos têm pouco interesse nas ADs e em frequentar as tutorias; os alunos desconhecem
que o curso é semipresencial. Um dos professores afirma que o problema do nível dos alunos

3
O peso relativo das avaliações presenciais e a distância pode variar conforme o curso.
4
A última disciplina é um caso particular, já que um aluno pode utilizar vários semestres para concluir o TCC.
9
está no sistema educacional do país e, como uma solução temporária, propõe comparecimento
mínimo obrigatório à tutoria presencial.
Já outro professor afirma que, pela suas observações, há “polos bons e outros ruins” e
que os alunos preferem matérias práticas, sendo o mau desempenho em algumas delas devido
à pouca dedicação. Quanto ao baixo comparecimento às tutorias, ele se baseia em conversas
com os alunos para concluir que eles não vão ao polo por morar longe. Como solução propõe
“que o curso devia reforçar o conceito de SEMI-PRESENCIAL, ou pelo menos
GRADUAÇÃO SEM AULAS, e abandonar o título 'A distância'”5 para conseguir um público
mais local. Outro professor, ainda, pergunta: “Existe evasão em todos os cursos universitários.
Será que a evasão do CEDERJ é uma ordem de grandeza maior do que a dos cursos
presenciais das universidades públicas?”. Além disso, ele constata que as disciplinas de
primeiro e segundo período estão servindo de filtro, como ocorre nos cursos presenciais.
Todas essas observações se basearam na experiência pessoal dos professores e
possivelmente algumas eram bem fundamentadas. A mensagem de um professor, no terceiro
dia de discussões, parece apontar um ponto de inflexão ao fazer um apelo para que fosse feita
“uma reflexão mais robusta sobre a experiência do nosso curso”, que não ficasse apenas a
cargo dos professores e para qual “deveriam ser convocados outros saberes e experiências”.
Muitos trabalhos sobre evasão vão buscar suas causas em pesquisas com os próprios
alunos (como em NETTO et. al. 2012, SANTOS et. al. 2008, SILVA e MARQUES 2012,
LACERDA e ESPÍNDOLA 2013, para citar alguns). Logo em sua primeira mensagem o
coordenador afirmou que o CEDERJ estava realizando uma pesquisa junto aos alunos sobre
os problemas do curso. Os dados dessa pesquisa foram apresentados aos professores, em
novembro de 2011, como parte do relatório de avaliação institucional enviado à direção do
CEDERJ (ALBUQUERQUE et. al., 2011). O envio do relatório no final do ano não gerou
discussões entre os professores.
Não houve esse aparente consenso no diagnóstico dos professores. Um professor
mandou uma mensagem afirmando que concordava com a maioria dos diagnósticos “mas
[que] não colocaria na conta dos alunos os problemas”. Quanto à hipótese dos alunos não
comparecerem às tutorias presenciais por morarem longe, ele pergunta: “Mas e as tutorias a
distância?”. Há tutorias por telefone (e também pela plataforma) e o aluno mesmo assim
pouco as utiliza. Quanto aos alunos encontrarem um curso semipresencial quando desejavam
um curso a distância: “Considerando o número de faltas, o curso é de fato a distância para a

5
Os destaques são do autor da frase.
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maioria. Se era isso que queriam, então, o resultado, devido ao não comparecimento às
tutorias, deveria ser: estudar em casa, fazer as ADs, comparecer para as APs e passar”.
Houve uma oportunidade de ouvir a opinião de uma aluna, encaminhada por outro
professor. Muitas de suas críticas foram em relação à plataforma e à mídia utilizada na época
para distribuição das aulas (DVD). Também foram feitas críticas aos professores: algumas
videoaulas desatualizadas, problemas de revisão nas provas (questões anuladas) e a pouca
interação alunos x tutores x professores (problema que existe até hoje).

CONCLUSÃO

Controvérsias como a de 2011 não são muito comuns entre os professores. O correio
eletrônico é muito subutilizado como forma de troca de informação entre os professores e a
coordenação com vistas a aperfeiçoar o curso. Sem circulação de informação não é possível
haver uma gestão cibernética. Reuniões de colegiado são realizadas com frequência, mas são
voltadas mais para resolver problemas pontuais.
No final da discussão, o coordenador fez um resumo dos problemas e propostas
discutidos na lista dos professores, o qual foi apresentado na reunião na presidência do
CEDERJ. Como resultado da reunião, foi planejada a implantação de uma série de medidas de
curto e médio prazo, relacionadas com as discussões na lista de professores. Entre estas
medidas é possível destacar: desligar do curso alunos que não têm mais condições de conclui-
lo no prazo máximo (12 semestres), incluir disciplinas opcionais de matemática básica e
português instrumental, mover uma disciplina mais problemática para um período mais
adiantado na grade, regravação de aulas, melhorar a usabilidade da plataforma e realizar
reuniões regulares para avaliar a questão da evasão. Todas essas propostas, exceto pela
última, foram, de uma forma ou de outra, postas em prática. Algumas destas decisões
poderiam ter sido tomadas nos níveis mais inferiores da hierarquia, maximizando sua
autonomia conforme defendia Beer.
As discussões sobre evasão não ocorreram mais ou, se ocorreram, não chegaram até os
professores. Os levantamentos de dados têm sido feitos por iniciativa das coordenações dos
cursos ou para a produção de trabalhos acadêmicos. Não existem, dentro dos cursos,
mecanismos permanentes para monitorar indicadores vitais à sua viabilidade.
Associar o comportamento de uma instituição complexa com o corpo humano é uma
poderosa metáfora e tem sido utilizada mesmo por quem nunca ouviu falar de Stafford Beer
ou de cibernética. O trabalho de Beer, mesmo após tantos anos, continua sendo objeto de
11
estudo por parte de alguns cientistas, apesar da palavra cibernética ter caído em desuso.
Acredito que a ideia mais importante introduzida pelo VSM é a definição de canais
permanentes que permitam transmitir, de forma transparente, dados e decisões entre os
diversos órgãos componentes da instituição. Pelo tamanho de sua estrutura e os muitos níveis
de hierarquia, o curso de computação do CEDERJ pode ser definido como um sistema
extremamente complexo e, consequentemente, é um bom candidato a adotar este modelo.

REFERÊNCIAS

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