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Curso de Graduação a Distância

Moral
Fundamental
(04 créditos – 80 horas)

Autores:
Orlando Knapp
Anésio Ferla

Universidade Católica Dom Bosco Virtual


www.virtual.ucdb.br | 0800 647 3335
Missão Salesiana de Mato Grosso
Universidade Católica Dom Bosco
Instituição Salesiana de Educação Superior

Chanceler: Pe. Gildásio Mendes dos Santos


Reitor: Pe. Ricardo Carlos
Pró-Reitora de Graduação e Extensão: Profª. Rubia Renata Marques
Diretor da UCDB Virtual: Prof. Jeferson Pistori
Coordenadora Pedagógica: Profª. Blanca Martín Salvago

Direitos desta edição reservados à Editora UCDB


Diretoria de Educação a Distância: (67) 3312-3335
www.virtual.ucdb.br
UCDB -Universidade Católica Dom Bosco
Av. Tamandaré, 6000 Jardim Seminário
Fone: (67) 3312-3800 Fax: (67) 3312-3302
CEP 79117-900 Campo Grande – MS

KNAPP, Orlando; FERLA, Anésio

Moral Fundamental /Orlando Knapp e Anésio Ferla. Campo Grande:


UCDB, 2018. 97 p.

Palavras-chave: 1. Moral Fundamental 2. Lei natural 3.


Dignidade 4. Liberdade 5. Consciência 6. Pecado 7. Conversão

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APRESENTAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO

Este material foi elaborado pelo professor conteudista sob a orientação da equipe
multidisciplinar da UCDB Virtual, com o objetivo de lhe fornecer um subsídio didático que
norteie os conteúdos trabalhados nesta disciplina e que compõe o Projeto Pedagógico do seu
curso.

Elementos que integram o material


Critérios de avaliação: são as informações referentes aos critérios adotados para a
avaliação (formativa e somativa) e composição da média da disciplina.
Quadro de Controle de Atividades: trata-se de um quadro para você organizar a
realização e envio das atividades virtuais. Você pode fazer seu ritmo de estudo, sem ul-
trapassar o prazo máximo indicado pelo professor.
Conteúdo Desenvolvido: é o conteúdo da disciplina, com a explanação do professor
sobre os diferentes temas objeto de estudo.
Indicações de Leituras de Aprofundamento: são sugestões para que você possa
aprofundar no conteúdo. A maioria das leituras sugeridas são links da Internet para facilitar
seu acesso aos materiais.
Atividades Virtuais: atividades propostas que marcarão um ritmo no seu estudo. As
datas de envio encontram-se no calendário do Ambiente Virtual de Aprendizagem.

Como tirar o máximo de proveito


Este material didático é mais um subsídio para seus estudos. Consulte outros
conteúdos e interaja com os outros participantes. Portanto, não se esqueça de:
· Interagir com frequência com os colegas e com o professor, usando as ferramentas
de comunicação e informação do Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA;
· Usar, além do material em mãos, os outros recursos disponíveis no AVA: aulas
audiovisuais, vídeo-aulas, fórum de discussão, fórum permanente de cada unidade, etc.;
· Recorrer à equipe de tutoria sempre que precisar orientação sobre dúvidas quanto
a calendário, atividades, ferramentas do AVA, e outros;
· Ter uma rotina que lhe permita estabelecer o ritmo de estudo adequado a suas
necessidades como estudante, organize o seu tempo;
· Ter consciência de que você deve ser sujeito ativo no processo de sua aprendizagem,
contando com a ajuda e colaboração de todos.

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Objetivo Geral

Introduzir cada estudante à disciplina de teologia moral tendo como base a Tradição,
a Bíblia e o Magistério. Partindo dos primórdios do cristianismo até chegar na atualidade,
pretendemos levá-los a identificar os elementos fundamentais da moral cristã e suas
implicações na vida do crente e de todo homem e mulher criado à imagem e semelhança de
Deus. Por fim, queremos articular os conteúdos desta disciplina com a prática pastoral.

SUMÁRIO

UNIDADE 1 – CONCEITOS BÁSICOS ................................................................... 12


1.1 Significado das palavras Moral, Ética e Fundamental ................................................ 12
1.2 Fontes da Teologia Moral ....................................................................................... 14
1.3 Destinatários ou sujeitos da síntese teológico-moral ................................................. 20

UNIDADE 2 – TEOLOGIA MORAL NA HISTÓRIA .................................................. 26


2.1 Ensinamento moral dos Santos Padres .................................................................... 26
2.2 Livros Penitenciais ................................................................................................. 27
2.3 Renascimento da Teologia Moral nos Séculos XII, XIII e XIV .................................... 28
2.4 Séculos XV, XVI, XVII e XVIII ................................................................................. 33
2.5 Moral Renovada .................................................................................................... 36

UNIDADE 3 – A BÍBLIA COMO BASE PARA A REFLEXÃO MORAL TEOLÓGICA ..... 43


3.1 Como usar a Bíblia para a reflexão moral ................................................................ 43
3.2 O ser humano criado como imagem de Deus e a sua responsabilidade moral ............. 45
3.3 Ética cristã do Antigo Testamento........................................................................... 45
3.4 A Teologia Moral e a Aliança .................................................................................. 46
3.5 A Aliança como projeto social ................................................................................. 48
3.6 Os Dez Mandamentos e a Moral Renovada .............................................................. 50
3.7 A Nova Aliança em Jesus Cristo e suas implicações morais........................................ 52
3.8 Critérios fundamentais da ética cristã bíblica ........................................................... 54

UNIDADE 4 – LIBERDADE, LEI NATURAL E O MISTÉRIO DA CONSCIÊNCIA


HUMANA ............................................................................................................. 58
4.1 A fonte da dignidade humana ................................................................................ 58
4.2 A liberdade dos filhos de Deus ............................................................................... 59
4.3 A lei natural .......................................................................................................... 61
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4.4 A consciência moral............................................................................................... 63

UNIDADE 5 – PECADO E RECONCILIAÇÃO.......................................................... 76


5.1 O mal como desafio que perpassa a história ............................................................ 76
5.2 Pecado e misericórdia de Deus na Bíblia.................................................................. 78
5.3 Pecado original e a distinção entre pecado mortal e venial, individual e social ............ 81
5.4 A experiência pascal de conversão .......................................................................... 84
5.5 A reconciliação sacramental ................................................................................... 86

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 90
EXERCÍCIOS E ATIVIDADES ............................................................................... 93

Avaliação
A UCDB Virtual acredita que avaliar é sinônimo de melhorar, isto é, a finalidade da
avaliação é propiciar oportunidades de ação-reflexão que façam com que você possa
aprofundar, refletir criticamente, relacionar ideias, etc.
A UCDB Virtual adota um sistema de avaliação continuada: além das provas no final de
cada módulo (avaliação somativa), será considerado também o desempenho do aluno ao longo
de cada disciplina (avaliação formativa), mediante a realização das atividades. Todo o processo
será avaliado, pois a aprendizagem é processual.
Para que se possa atingir o objetivo da avaliação formativa, é necessário que as
atividades sejam realizadas criteriosamente, atendendo ao que se pede e tentando sempre
exemplificar e argumentar, procurando relacionar a teoria estudada com a prática.
As atividades devem ser enviadas dentro do prazo estabelecido no calendário de cada
disciplina.

Critérios para composição da Média Semestral:

Para compor a Média Semestral da disciplina, leva-se em conta o desempenho atingido


na avaliação formativa e na avaliação somativa, isto é, as notas alcançadas nas diferentes
atividades virtuais e na(s) prova(s), da seguinte forma: Somatória das notas recebidas nas
atividades virtuais, somada à nota da prova, dividido por 2. Caso a disciplina possua mais de
uma prova, será considerada a média entre as provas.
Média Semestral: Somatória (Atividades Virtuais) + Média (Provas) / 2
Assim, se um aluno tirar 7 nas atividades e 5 na prova: MS = 7 + 5 / 2 = 6

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Antes do lançamento desta nota final, será divulgada a média de cada aluno, dando a
oportunidade de que os alunos que não tenham atingido média igual ou superior a 7,0 possam
fazer a Recuperação das Atividades Virtuais.
Se a Média Semestral for igual ou superior a 4,0 e inferior a 7,0, o aluno ainda poderá
fazer o Exame Final. A média entre a nota do Exame Final e a Média Semestral deverá ser
igual ou superior a 5,0 para considerar o aluno aprovado na disciplina.
Assim, se um aluno tirar 6 na Média Semestral e tiver 5 no Exame Final: MF = 6 + 5
/ 2 = 5,5 (Aprovado).

FAÇA O ACOMPANHAMENTO DE SUAS ATIVIDADES

O quadro abaixo visa ajudá-lo a se organizar na realização das atividades. Faça seu
cronograma e tenha um controle de suas atividades:

AVALIAÇÃO PRAZO * DATA DE ENVIO **

Atividade 1.1
Ferramenta: Tarefa

Atividade 3.1
Ferramenta: Tarefa

Atividade 4.1
Ferramenta: Tarefa

Atividade 5.1
Ferramenta: Tarefa

* Coloque na segunda coluna o prazo em que deve ser enviada a atividade (consulte o
calendário disponível no ambiente virtual de aprendizagem).
** Coloque na terceira coluna o dia em que você enviou a atividade.

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BOAS VINDAS

Damos as boas vindas a todos aqueles e aquelas que pretendem avançar no


conhecimento teológico-moral.
Este curso, com certeza exigirá o seu empenho, contudo quanto mais você se dedicar,
mais aprenderá e mais se encantará com o projeto moral cristão católico que se ocupa da
dimensão humana presente em cada um de nós e também da dimensão sobrenatural com
toda sua profundidade e riqueza.
Desejamos que os conteúdos propostos tornem a ética cristã mais compreensível e
razoável e assim possa ser praticada cada vez mais para o bem de cada pessoa humana e de
toda humanidade.
Bons estudos!!

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Pré-teste
A finalidade deste pré-teste é fazer um diagnóstico quanto aos conhecimentos
prévios que você já tem sobre os assuntos que serão desenvolvidos nesta
disciplina. Não fique preocupado com a nota, pois não será pontuado.

1. A respeito da disciplina de Teologia Moral, analise os enunciados a seguir:


I. Ela exorta os homens e as mulheres de hoje a partir das verdades reveladas e da lei natural,
porém, rechaça terminantemente as verdades científicas e os avanços tecnológicos.
II. Trata-se de uma ciência eminentemente prática que tem como matéria os atos, as
vontades e as intenções do homem e da mulher, referentes à atividade prática.
III. Tal disciplina é um estudo científico das atividades humanas, mediante os princípios da
fé e da razão, em relação à consecução do fim último sobrenatural do homem.
a) Apenas os enunciados I e III estão corretos.
b) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
c) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
d) Todos os enunciados estão corretos.

2. A Teologia Moral é tradicionalmente dividida em duas partes: Moral


Fundamental e Moral Especial. A primeira parte trata, principalmente:
a) Do matrimônio, da família e da sexualidade humana.
b) Da doutrina social da Igreja.
c) Da dignidade da pessoa humana, lei moral, consciência, liberdade e responsabilidade.
d) Da defesa e promoção da vida humana desde o seu início até o seu fim natural.

3. A dignidade da pessoa humana se fundamenta:


a) Em seu desejo de ser feliz.
b) Em sua capacidade de raciocinar.
c) Em sua possibilidade de escolher deliberadamente.
d) Em sua criação à imagem e semelhança de Deus.

4. Com o pecado original, a natureza humana fica ferida: inclinada para o mal e
para o erro, debilitada para praticar o bem e afetada pela concupiscência. Que
sacramento reverte esta situação, isto é, apaga o pecado original?
a) Eucaristia
b) Batismo
c) Crisma
d) Matrimônio

5. É pecado mortal todo pecado que tem como objeto uma matéria grave e que é
cometido com plena consciência e deliberadamente. A matéria grave é precisada:
a) Pelas bem-aventuranças.
b) Pelos profetas.
c) Pela Congregação para a doutrina da fé.
d) Pelos Dez mandamentos.

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6. No tocante à liberdade humana, analise os enunciados a seguir:
I. Ela é finita e falível.
II. Ela é, no homem, uma força de crescimento e amadurecimento na verdade e na bondade.
III. Ela alcança a sua perfeição quando está ordenada para Deus.
a) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
b) Apenas os enunciados I e III estão corretos.
c) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
d) Todos os enunciados estão corretos.

7. A imputabilidade e a responsabilidade atribuída a um indivíduo por uma ação


podem ficar diminuídas ou suprimidas:
I. Pela ignorância e inadvertência.
II. Pela violência e o medo.
III. Pelos hábitos, afeições imoderadas e outros fatores psíquicos.
a) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
b) Apenas os enunciados I e III estão corretos.
c) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
d) Todos os enunciados estão corretos.

8. Na intimidade da consciência, o homem descobre uma lei. Ele não a dá a si


mesmo. Mas a ela deve obedecer. Esta lei chama-o sempre a:
a) Praticar atos ilícitos.
b) Pedir perdão e a perdoar.
c) Amar e fazer o bem e a evitar o mal.
d) Fazer escolhas errôneas.

9. A respeito da lei moral, analise os enunciados a seguir:


I. Prescreve ao homem os caminhos, as regras de comportamento que levam à felicidade
prometida e proscreve os caminhos do mal, que desviam de Deus e de seu amor.
II. Supõe a ordem racional estabelecida entre as criaturas, para seu bem e em vista do seu
fim, pelo poder, pela sabedoria e pela bondade do Criador.
III. É obra da Sabedoria divina e encontra em Cristo sua plenitude e sua unidade.
a) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
b) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
c) Apenas os enunciados I e III estão corretos.
d) Todos os enunciados estão corretos.

10. Qual alternativa abaixo NÃO corresponde à lei natural?


a) É uma regra de comportamento promulgada por uma autoridade humana competente em
vista do bem comum.
b) Está escrita e gravada na consciência de todos e de cada um dos homens.
c) É a luz da inteligência posta em nós por Deus.
d) Permite ao homem discernir, pela razão, o que é o bem e o mal, a verdade e a mentira.

Submeta o Pré-teste por meio da ferramenta Questionário.

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INTRODUÇÃO

Na sociedade de hoje fala-se muito sobre a ética. Mas, sobretudo, se observam


queixas de falta de ética. Afinal, o que é ética? Segundo o Dicionário Aurélio “Ética é o estudo
dos juízos de apreciação que se referem à conduta humana suscetível de qualificação do
ponto de vista da moral do bem e do mal, seja relativamente à determinada sociedade, seja
de modo absoluto” (DE HOLANDA FERREIRA, 1999, 818-819).
Vários pensadores em diferentes épocas abordaram especificamente assuntos sobre
a Ética. Os pré-socráticos, Aristóteles, os Padres da Igreja, Kant, Espinosa, Nietzsche, K. Marx,
F. Engels, Lênin, Paul Tillich, etc.
Quando a pessoa humana começa a pensar ou experimentar determinadas sensações,
logo lhe surgem muitas perguntas a respeito da realidade e do mundo que a circunda. As
pessoas e a humanidade toda buscam respostas para os enigmas da condição humana que
preocupam os seus corações, o seu modo de agir e a sua existência: Quem é o homem? Qual
o sentido e a finalidade da vida? Qual é o caminho para alcançar a liberdade e a felicidade
verdadeiras? De onde provém o sofrimento e para que serve? O que é o pecado? Qual é a
arte de amar e de ser amado? De onde viemos e para onde vamos? O que é a morte? Existem
o juízo e a retribuição depois da morte? Vamos para o céu ou para o inferno? Existe a vida
eterna? Qual é a relação da liberdade com a verdade? Como discernir o bem do mal? O que
fazer de bom para alcançar a vida e a felicidade plena?
Nas relações cotidianas, surgem continuamente problemas como estes: devo cumprir
a promessa X que fiz ontem ao meu amigo Y, embora hoje perceba que o cumprimento me
causará certos prejuízos? Devo dizer sempre a verdade ou há ocasiões em que devo mentir?
Podemos considerar bom o homem que se mostra caridoso com um mendigo, mas como
patrão explora impiedosamente os operários e os empregados de sua firma ou empresa?
Posso roubar estando com fome? É permitido praticar o aborto e a eutanásia?
Em todos estes casos, trata-se de problemas práticos, isto é, de problemas que se
apresentam nas relações efetivas e reais. E para resolvê-los as pessoas recorrem a normas,
cumprem determinados atos, formulam juízos e às vezes se apoiam em determinados fatos
concretos para justificar a decisão adotada ou os passos dados. Como podemos observar, os
homens não só agem, mas também refletem sobre seu comportamento prático.
O comportamento humano e as teorias a respeito dele são objeto de várias análises
científicas. Busca-se analisá-lo, principalmente, à luz da filosofia, das ciências sociopolíticas e
da psicologia. No entanto, o agir humano pode ser analisado não somente à luz da razão,
mas também à luz da fé. E, quando analisamos o comportamento humano à luz da fé vamos

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pouco a pouco construindo um sistema de pensamento chamado Teologia Moral ou Ética
Teológica.
O esquema, a ideia básica, o fio condutor de toda a nossa Teologia Moral Fundamental
visa o surgimento do discípulo missionário de Jesus Cristo onde Jesus Cristo e o seu Evangelho
são apresentados: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (cf. Jo 14, 6).
O termo Teologia Moral “é normalmente usado para designar a ação humana
enquanto referida a um valor, a uma obrigação real, sendo o sujeito moral livre, porém,
obediente às normas, às leis que regem a sociedade” (TRASFERETTI, 1998, p.23).
Na carta encíclica Veritatis Splendor, lemos: “A teologia moral é uma ciência que
acolhe e interroga a Revelação divina e, ao mesmo tempo, responde às exigências da razão
humana. A teologia moral é uma reflexão que se refere à “moralidade”, ou seja, ao bem e ao
mal dos atos humanos e da pessoa que os realiza, e neste sentido está aberta a todos os
homens; mas é também “teologia”, enquanto reconhece o princípio e o fim do agir moral
naquele que “só é bom” e que, doando-se ao homem em Cristo, lhe oferece a bem-
aventurança da vida divina” (VERITATIS SPLENDOR, n.29).
No entanto, como veremos no decorrer do nosso curso, são muitas as dificuldades
que se erguem contra a moral. A sua rejeição se generalizou sob muitos aspectos, e hoje as
pessoas desejam uma explicação para saber não só como, mas também por que devem agir
desta forma ou de outra. As normas de comportamento não são mais aceitas por causa da
autoridade de quem as impõe. Ninguém faz as coisas porque é mandado, logo, faz-se
necessário apresentar uma justificação convincente ou ao menos razoável entre outras opções
possíveis.
A fundamentação torna-se objetivo irrenunciável, se se quer que os valores éticos
tenham poder de atração e comprometam as pessoas. Bem antes, Santo Tomás já dizia que
era preciso investir nesta dimensão persuasiva, ainda que o cristão encontre em sua fé um
ponto de apoio e esclarecimento. Por fim, o crente jamais pode se esquecer da dimensão
religiosa e sobrenatural que possui a sua conduta (AZPITARTE, 1995).

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UNIDADE 1

CONCEITOS BÁSICOS
OBJETIVO DA UNIDADE: Levar o aluno a conhecer a origem do termo que abarca
a disciplina que está sendo estudada; refletir sobre o significado das palavras: teologia,
moral e fundamental; explanar sobre suas fontes da moral cristã; qual finalidade de
estudá-la e a quem se destina.

1.1 Significado das palavras Moral, Ética e Fundamental

Durante a nossa disciplina vamos falar de “teologia moral” ou de “ética teológica”. O


termo “moral” vem do latim mos, moris (plural) e, em sentido geral, significa costume, a
maneira de comprometer-se, tudo em virtude de uma espécie de hábito. Alguns acham que
o termo moral deve ser usado somente quando vem considerada a religião (embora se fale
de ética cristã ou ética budista). Por moral se entende tanto a “moral vivida” – ethica utens
quanto a “moral formulada” – ethica docens. Como se vê o termo moral possui uma riqueza
de significados.
O termo “ética”, ethos vem do grego e significa a residência, o assentamento, a casa,
a morada, a habitação, o lar e, de maneira mais própria, significa as regras para a construção
de uma boa casa. O ethos é feito de hábitos, de costumes e de tradições, de sonhos e de
trabalhos, de desejos e de projetos, de normas e de leis, tudo ordenado e entrelaçado,
formando um verdadeiro “habitat”, um ambiente vital onde a vida humana pode nascer,
crescer, multiplicar-se. A ética, segundo alguns, é reservada mais para a aproximação racional
ou filosófica (embora se fale também de filosofia moral).
Os termos “moral” e “ética”, às vezes, são utilizados com significados diversos,
contudo, segundo Vidal “os dois grupos de termos devem ser usados com idêntico conteúdo
semântico. A diversa etimologia de ética e moral, grega e latina respectivamente, não é causa
de diversidade semântica, mas de riqueza de significância” (VIDAL, 1983, p.22).
Seguindo a orientação de Vidal, na nossa exposição vamos usar tanto o termo moral
quanto ética. Vamos recorrer aos valores religiosos, mas também a uma boa argumentação
racional ou filosófico-científica. Vamos pesquisar a moral vivida, mas também vamos
trabalhar a moral formulada. Vamos refletir sobre assuntos concretos, mas também sobre os
grandes princípios da ética teológica. Podemos concluir que etimologicamente ética e moral
são palavras sinônimas.

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O termo “fundamental” vem do latim fundus e significa a base que se coloca no terreno
para sustentar um edifício estável. A palavra fundamental tem muito a que ver com o alicerce
e com o fundamento. A segurança de um
edifício depende do alicerce. Os
fundamentos se encontram escondidos no
chão e são invisíveis. A colocação deles
exige dinheiro e tempo, porém são
indispensáveis para a sustentabilidade do
edifício e mais ainda na hora da tempestade
ou no momento do terremoto.

Fonte: http://migre.me/jf7Le
O bom arquiteto e o engenheiro sabem que não podem construir as paredes sem
colocar antes os alicerces. Jesus já mostrava esta sabedoria no Sermão da Montanha, quando
falava sobre a casa construída sobre a rocha e a casa construída sobre a areia. Algo
semelhante acontece com a Teologia Moral Fundamental: sem uma boa Moral Fundamental,
a Moral Especial ou Setorial não se vai sustentar.
O termo fundamental faz referimento não só ao alicerce da casa, mas indica também
o processo de verificação. É fundamental que o edifício esteja bem forte, seguro e seja
corretamente construído. A Teologia Moral Fundamental precisa dar as respostas a respeito
de não só como agir bem, mas também por que agir bem. Hoje em dia não é suficiente o
“imperativo moral”, mas é necessário o “indicativo moral”. A Teologia Moral Fundamental
precisa mostrar o que é necessário fazer e, ao mesmo tempo, explicar por que se deve ou
não fazer algo.
Antes do Concílio Vaticano II não havia a “Teologia Moral Fundamental” propriamente
dita. As questões fundamentais do agir moral eram abordadas pela “Teologia Moral Geral” a
qual não tinha por tarefa fundamentar criticamente a moral cristã. Dava-se por suposta a
exigência justificada da moralidade cristã no sentido de conhecimento (ética docens – moral
formulada) e no sentido de compromisso vital (ética utens – moral vivida).
O termo “Teologia Moral Fundamental” apareceu ainda antes do Concílio Vaticano II,
porém, no começo, não havia ainda muita diferença no conteúdo entre a “Teologia Moral
Fundamental” e a “Moral Geral”. Em 1955, Teodoro da Torre del Greco escreveu a obra
“Teologia Moral. Compêndio de moral católica para o clero em geral e leigos” onde dedicou
a 1ª parte à “Teologia Moral Fundamental”. Contudo, a “Teologia Moral Fundamental” escrita
por ele não se diferenciou da “Moral Geral” por causa do seu conteúdo. Mudou o título, mas

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o conteúdo praticamente ficou o mesmo. Falava-se: do fim último da vida humana, dos atos
humanos, da lei, da consciência, do pecado e das virtudes.
Na segunda metade do séc. XX a situação mudou muito, tanto da parte da sociedade
(secularismo, pluralismo, progresso tecnológico, etc.) quanto da parte da teologia mesma
(mudanças metodológicas, diálogo com o mundo, aproximação das ciências humanas,
redescoberta da Bíblia, valorização dos Padres da Igreja, renovação da liturgia, inculturação
da fé, etc.). Estes fatores fizeram deslizar o tratado tradicional da “Moral Geral” para o tratado
da “Teologia Moral Fundamental”. Na nova situação os cristãos têm a tarefa de justificar
diante deles e dos demais a coerência crítica de suas opções éticas. Esse tipo de justificação
supõe uma séria formulação da moral cristã dentro do pluralismo teórico e prático dos projetos
éticos da sociedade atual (VIDAL, 1983).

1.2 Fontes da Teologia Moral

As fontes da teologia moral são de suma importância para a justa compreensão e a


devida elaboração de todo o discurso ético-teológico. Da correta elaboração das fontes vai
depender não só a nossa conduta ética, mas também seremos preservados dos erros que os
outros já fizeram no passado. As fontes principais são compostas pela Revelação, Tradição e
Magistério da Igreja. Temos ainda as assim chamadas “outras fontes”, que são as realidades
presentes no mundo e que também contribuem para que o teólogo moralista possa dar
respostas mais adequadas a problemas atuais.

1.2.1 Sagrada Escritura


A fonte principal de toda a teologia e, por conseguinte da teologia moral, é a Sagrada
Escritura, que é como se fosse a alma da teologia. A teologia evoluiu muito em razão do seu
encontro com um pluralismo de culturas, contudo, em todas as épocas a Sagrada Escritura
manteve-se como critério decisivo no que se refere à qualidade da Teologia Moral e também,
fonte principal para a sua elaboração.
A revelação no sentido religioso significa a manifestação de Deus através das
realidades da vida e dos acontecimentos da história. Mostra o caminho que o povo deve
seguir. Exige a atenção do homem, pois Deus está continuamente se revelando. A revelação,
em primeiro lugar, significa a automanifestação de Deus. Com essa afirmação se quer
sublinhar o valor personalista das palavras, intimamente ligadas entre si e que se iluminam
mutuamente. O projeto da divina revelação realiza-se por etapas (criação, pecado, Noé,
Abraão, Povo de Israel) e culmina na Pessoa e na missão do Verbo encarnado, Jesus Cristo.

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Embora a revelação esteja terminada com Jesus Cristo, não está explicitada por completo;
cabe à fé cristã captar gradualmente todo o seu alcance ao longo dos séculos. Porém, não se
pode esperar nenhuma nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de Jesus Cristo
(cf. CICat., n.50-73).
A ética teológica toma as suas bases da moralidade cristã da revelação. As verdades
contidas na revelação devem ser recebidas com fé como Palavra de Deus. Já S. Paulo chama
a nossa atenção sobre a importância da Sagrada Escritura para conhecer a moral revelada:
“Toda a Escritura inspirada por Deus é útil para ensinar, contradizer, corrigir e educar na
justiça, para que o homem de Deus seja perfeito, capacitado para qualquer boa obra” (2 Tim
3, 16). No AT temos o Decálogo, que contém preceitos, normas morais permanentes que
obrigam também os cristãos ainda que condicionados pelo tempo. Entretanto toda a revelação
está voltada para o NT que é a plenitude da revelação e nos dá o conhecimento do nosso
destino. É no NT que encontramos os seguintes ensinamentos: a Nova Lei do Espírito, as
Bem-Aventuranças, o Reino de Deus, a Sequela Christi, o amor preferencial pelo fraco e os
outros grandes temas citados na Bíblia. A Teologia Moral espera das ciências bíblicas,
particularmente da teologia bíblica uma ajuda para compreender a moral da Sagrada Escritura
e para ter a capacidade de distinguir o que ela tem de caráter temporário e o que é vigente
em todos os tempos. A Bíblia, enquanto Palavra Revelada é a fonte clássica da teologia moral.
Na pesquisa teológico-moral, especialmente na América Latina, somos convidados a
fazer teologia a partir da realidade concreta em que vive o homem latino-americano
usufruindo da mediação socioanalítica. Porém, para fazer a teologia moral não é suficiente só
o recurso às ciências do social: Devemos confrontar a realidade com a Bíblia. Segundo Boff
“a Escritura é um recurso teórico obrigatório e constitutivo de todo o processo teológico”
(BOFF, 1982, p. 244-260).
Contemplando e estudando a Escritura percebe-se que dela parte um apelo, um
convite, uma provocação, uma interrogação. Seu texto induz à acolhida, à abertura, à
disponibilidade, e ao agir dos cristãos. Eles, à luz da fé precisam compreender que a primazia
das fontes teológicas reside na Palavra revelada, na Bíblia. E para ter a Bíblia como a fonte
principal da teologia moral as pessoas precisam ter fé.
Os aspectos que caracterizam uma leitura adequada da Sagrada Escritura são três, e
devem se complementar entre si: a práxis, a exegese e a teologia. A práxis, como lugar de
encontro com Cristo, é o lugar a partir do qual se lê a Bíblia e constitui uma primeira
aproximação que proporciona os dados para entender mais exatamente o sentido do texto
bíblico; a exegese nos ajuda a esmiuçar, a aprofundar os conteúdos da revelação; e a teologia
é o resultado das leituras e interpretações da Bíblia, dá as noções que permitem captar e
articular novas reflexões.
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Com este enfoque global, aparece claro o caráter interpelante da Palavra de Deus
tanto para o cristão quanto para a teologia. Esta maneira de ler a Bíblia permite captar
plenamente os diversos registros do texto e para uma metodologia ética oferece a
possibilidade de uma melhor integração com os elementos teológicos do universo moral
(REJÓN, 1987).

1.2.2 A Tradição
O termo Tradição para a Igreja não se resume naquilo que é tradicional com conotação
de algo velho, e sim lembrança de fatos vitais para o povo. Ainda que toda tradição vise
preservar uma memória de modo que se mantenha aceso o ideal do passado na geração do
presente, a tradição em Israel está longe de ser uma lembrança de fatos ultrapassados.
Ocorre buscar no passado perspectivas para o presente e o futuro e com isso os fatos
novos são iluminados pelos fatos antigos. A Tradição ou a Palavra oral é anterior à Palavra
escrita, mesmo com relação ao N.T., uma vez que durante decênios, antes da redação dos
evangelhos, a mensagem de Cristo foi transmitida primeiramente de viva voz, e só mais tarde
foi redigido o N.T., que, com certeza, não tem a pretensão de abarcar tudo quanto Jesus
disse e fez (cf. Jo 20,30; 21,24-25).
O depósito da fé foi confiado à Igreja e esta, por sua vez, a está transmitindo ao longo
dos séculos. Junto com a Bíblia, a Tradição da Igreja é a mais qualificada fonte da teologia
moral. Mas o que é a Tradição? Qual é o seu conteúdo semântico e teológico?
O termo “tradição” se origina do latim traditio. Para Tertuliano, “Tradição” significa a
“doutrina transmitida” ou a sua “narrativa”. Na época da Reforma, Lutero rejeitou
determinadas tradições como instituições humanas que não estariam autorizadas pela
Escritura e com isso questionou a compreensão eclesial da Tradição.
O Concílio de Trento respondeu aos desafios dos protestantes publicando, no dia 08
de abril de 1546, um decreto (cf. DENZINGER, 2003, n.1501-1505) onde se definiu a
existência da Tradição como tal: preservar o Evangelho puro, que foi primeiro pregado por
Cristo e a seguir, à sua ordem, pelos Apóstolos. O Evangelho é a fonte de todas as verdades
salvíficas e de todos os preceitos morais.
O Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática Dei Verbum, sobre a Revelação
Divina, nos ensina que Jesus Cristo ordenou aos Apóstolos que o Evangelho fosse por eles
pregado a todos os homens como fonte de toda a verdade salvífica e de toda disciplina de
costumes. “E isto foi executado tanto pelos Apóstolos que na pregação oral, por exemplos e
instituições, transmitiram aquelas coisas que, ou receberam das palavras, da convivência ou
das obras de Cristo ou aprenderam das sugestões do Espírito Santo, como também por

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aqueles Apóstolos e varões apostólicos que, sob inspiração do mesmo Espírito Santo, puseram
por escrito a mensagem da salvação” (DEI VERBUM, n.7).
Como se pode observar a transmissão do Evangelho, segundo a ordem do Senhor,
fez-se de duas maneiras: oralmente e por escrito. A pregação apostólica, que é expressa de
modo especial nos livros inspirados, deve conservar-se por uma sucessão contínua até a
consumação dos tempos. Essa transmissão viva, realizada no Espírito Santo, é chamada de
Tradição enquanto distinta da Sagrada Escritura, embora intimamente ligada a ela.
Os Apóstolos, transmitindo aquilo que eles próprios receberam, exortam os fiéis a
manter as tradições que aprenderam, seja oralmente, seja por carta (cf. 2 Tes 2,15), e a
combater pela fé que se lhes transmitiu uma vez para sempre. Através da Tradição, “a Igreja,
em sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo o que ela é,
tudo o que crê. [...] O ensinamento dos Santos Padres testemunha a presença vivificante
desta Tradição, cujas riquezas se transfundem na práxis e na vida da Igreja crente e orante”
(DEI VERBUM, n.8). Assim, a comunicação que o Pai fez de si mesmo pelo seu Verbo no
Espírito Santo permanece presente e atuante na Igreja: “O Deus que outrora falou mantém
um permanente diálogo com a esposa de seu dileto Filho, e o Espírito Santo, pelo qual a voz
viva do Evangelho ressoa na Igreja e através dela no mundo, leva os crentes à verdade toda
e faz habitar neles abundantemente a palavra de Cristo” (cf. Col 3,16; DEI VERBUM, n. 8;
CICat., n.79).
Ainda a respeito da Tradição é preciso lembrar que ela se relaciona estreitamente com
a Sagrada Escritura:

A Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura estão, portanto, entre si


estreitamente unidas e comunicantes, pois promanam ambas da mesma
fonte divina, formam de certo modo um todo e tendem para o mesmo fim.
Com efeito, a Sagrada Escritura é a Palavra de Deus enquanto é redigida sob
a moção do Espírito Santo; a Sagrada Tradição, por sua vez, transmite
integramente aos sucessores dos Apóstolos a Palavra de Deus confiada por
Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos para que, sob a luz do
Espírito da verdade, eles por sua pregação fielmente a conservem, exponham
e difundam; resulta, assim, que não é apenas através da Escritura que a
Igreja deriva sua certeza a respeito de tudo que foi revelado. Por isso ambas
(Escritura e Tradição) devem ser aceitas e veneradas com igual sentimento
de piedade e reverência (DEI VERBUM, n.9).

A Escritura tem uma grande importância para a Tradição. A Bíblia é o melhor critério
para solucionar muitos problemas da Tradição. À luz da Bíblia se torna mais fácil reconhecer
a genuína Tradição Apostólica; torna-se mais fácil encontrar o núcleo apostólico na tradição
eclesial; estabelecer, com maior segurança, a legitimidade de certas tradições puramente
eclesiais. De outro lado a Bíblia alimenta a Tradição e ajuda a Igreja no processo de
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compreender a Revelação, enquanto essa última (Revelação) está imbuída na Tradição
(PETER, 1984).

1.2.3 O Magistério
Com a palavra “Magistério” podemos indicar o seguinte: é o exercício da autoridade
de ensinar, ligado ao episcopado ou ao supremo pontificado; a distinção entre Igreja
“docente” e Igreja “discente” ou “ouvinte”; os fiéis junto com o Papa e os Bispos, todos os
bispos unidos ao Papa, o Papa falando ex-cathedra, os documentos dos concílios, as
encíclicas, os decretos dos dicastérios romanos e as cartas dos bispos nas suas dioceses
(PETER, 1984, p.513-518).
O depositum fidei contido na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição foi confiado
pelos Apóstolos à totalidade da Igreja. Porém, como lembra o Vaticano II, “o ofício de
interpretar autenticamente a Palavra de Deus escrita ou transmitida foi confiado unicamente
ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo” (DEI
VERBUM, n.10), isto é, aos bispos em comunhão com o sucessor de Pedro, o bispo de Roma
(cf. CICat., 85; 2030-2040).
O Magistério da Igreja presta um importante serviço à Teologia Moral. No campo da
moral o recorrer à Bíblia não é suficiente. Muitas afirmações do A.T. e algumas do N.T. são
frutos de determinada cultura, que o autor sagrado expressou, mas que não tem sentido
bastante claro para o nosso tempo, se bem que a ideia de fundo conserve seu valor atual.
Tudo isso exige esforço de interpretação para distinguir o que é um dado cultural e o que é
ensinamento permanente. Também é verdade que para a maioria dos problemas que hoje
nos preocupa, a revelação não oferece nenhuma resposta concreta. Seria absurdo buscar
nela uma apreciação dos sistemas econômicos, dos métodos anticoncepcionais, das técnicas
de reprodução artificial ou dos transplantes e das doações de órgãos, etc. Por tudo isso, a
Igreja levanta sua voz de alerta quando descobre que determinados comportamentos ou
técnicas se afastam do espírito evangélico e se tornam ameaça para o bem das pessoas.
A Igreja (Magistério) apresenta o testemunho de experiência tradicional, que pretende
afundar suas raízes no ethos de Jesus, para aplicá-lo às situações concretas. É uma função
que lhe compete e que lhe é garantida pela ajuda prometida pelo Espírito. O Magistério é um
elemento que forma parte da dimensão religiosa da moral, já que a sua exigência pertence
ao mundo da fé e a sua autoridade não nasce como a de qualquer outro grupo humano
(AZPITARTE, 1995).
O Magistério tem o direito de se pronunciar não somente no campo da fé, mas também
no campo da vida moral. A Lumem Gentium afirma que entre os principais deveres dos Bispos
sobressai o de pregar o Evangelho. São os mestres autênticos dotados da autoridade de Cristo
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que pregam ao povo a eles confiado a fé que deve ser crida e praticada (cf. LUMEM GENTIUM,
n.25).
No campo da Teologia Moral é preciso lembrar que, segundo o Concílio Vaticano II,
“tal Magistério evidentemente não está acima da Palavra de Deus, mas a seu serviço.
Portanto, fica claro que, segundo o sapientíssimo plano divino, a Sagrada Tradição, a Sagrada
Escritura e o Magistério da Igreja estão de tal maneira entrelaçados e unidos, que um não
tem consistência sem os outros: juntos, cada qual a seu modo, sob a ação do mesmo Espírito
Santo, contribuem eficazmente para a salvação das almas” (DEI VERBUM, n.10). A Carta
encíclica Veritatis splendor lembra-nos também que “certamente o Magistério da Igreja não
pretende impor aos fiéis nenhum sistema teológico particular nem mesmo filosófico, mas para
guardar religiosamente e expor fielmente a Palavra de Deus, ele tem o dever de declarar a
incompatibilidade com a verdade revelada de certas orientações do pensamento teológico”
(VERITATIS SPLENDOR, n.29).

1.2.4 Outras fontes


As outras fontes, denominadas também como fontes secundárias, se baseiam nos
resultados da razão humana. O Concílio Vaticano II convidou os teólogos “a buscarem
constantemente, de acordo com os métodos e exigências próprias do conhecimento teológico,
a forma mais adequada de comunicar a doutrina aos homens do seu tempo.
Nas outras fontes estão contemplados os resultados da “razão humana” e a “teologia”.
Logo, o papel dos teólogos e da teologia é de suma importância para uma síntese proveniente
desses dois resultados. E, ainda que possam ocorrer tensões com o Magistério da Igreja, a
mútua colaboração entre os teólogos e o Magistério da Igreja é muito valorosa.
Na Constituição pastoral Gaudium et Spes encontramos o seguinte: “os estudos e as
descobertas mais recentes das ciências, da história e da filosofia despertam problemas novos,
que acarretam consequências também para a vida e exigem dos teólogos novas
investigações” (GAUDIUM ET SPES, 62).
A mesma Constituição convida os teólogos a buscarem constantemente,

de acordo com os métodos e exigências próprias do conhecimento teológico,


a forma mais adequada de comunicar a doutrina aos homens do seu tempo;
porque uma coisa é o depósito da fé ou as suas verdades, outra, o modo
como elas são enunciadas, sempre, porém, conservando o mesmo sentido e
significado. Na pastoral sejam suficientemente conhecidos e usados não
somente os princípios teológicos, mas também as descobertas das ciências
profanas, sobretudo da psicologia e da sociologia, de tal modo que também
os fiéis sejam encaminhados a uma vida de fé mais pura e amadurecida”
(GAUDIUM ET SPES, 62).

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Nós estamos vivendo num mundo pluralista, multiconfessional, marcado pelo
politeísmo ético e muito fragmentalizado. A Teologia Moral precisa estar sempre em contato
com as ciências humanas (psicologia, medicina, sociologia, economia, política, antropologia,
etc.). Os resultados das ciências humanas precisam ser aproveitados pela pesquisa ético-
teológica.

1.3 Destinatários ou sujeitos da síntese teológico-moral

A abordagem de uma síntese teológico-moral depende do destinatário, das pessoas e


dos grupos aos quais ela é dedicada. A elaboração do conteúdo dependerá sempre dos
interlocutores aos quais se dirige o teólogo moralista. Analisando a história da teologia moral
podemos descobrir que ao longo dos séculos, os manuais de teologia moral tinham vários e
variados destinatários.

1.3.1 Teologia Moral para os Confessores


Durante muitos séculos a teologia moral foi destinada aos confessores para lhes ajudar
na celebração do Sacramento da Reconciliação. A principal função dos manuais de teologia
moral, naquela época, era a preparação de bons confessores. Na Idade Média, por exemplo,
era muito comum a utilização dos assim chamados “Livros Penitenciais” onde a cada pecado
correspondia uma determinada obra de penitência.
O Concílio de Trento sentiu a necessidade de elaborar os manuais de teologia moral
onde, dentre outras coisas, continham explicações sobre pecado mortal e pecado venial;
afirmou ser necessário confessar o número dos pecados, a sua maneira e a sua gravidade; e,
confiou à consciência a função de avaliação das culpas.
Pode-se afirmar que antes do Concílio Vaticano II a maioria dos manuais de teologia
moral, tinha como destinatário o confessor. Por isso mesmo o Patrono dos teólogos
moralistas, Santo Afonso Maria de Ligório (+1787), escreveu a sua Theologia Moralis para
ajudar os futuros sacerdotes Redentoristas na celebração do Sacramento da Reconciliação
(PIATEK, 1997).

1.3.2 Teologia Moral para o clero e para os leigos


Com o passar do tempo a teologia moral se deu conta de que a sua pesquisa não
podia limitar-se unicamente aos confessores. Tornava-se necessário abrir as portas do saber

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ético-teológico também aos cristãos leigos, a fim de incentivar a práxis cristã do inteiro Povo
de Deus e não apenas aqueles que escutavam confissão ou se confessavam, já que a Boa
Nova de Jesus é destinada a todos os homens e mulheres batizados. Todos são chamados
para viver conforme o Evangelho de Jesus.
No século XIX, na Alemanha, constatamos as primeiras tentativas de fazer com que o
conteúdo da teologia moral alcançasse todos os leigos. Essa situação se deveu à renovação
bíblico-teológica e à abertura das portas das universidades, onde se estudava teologia. Sendo
assim, no século XIX os professores das universidades foram obrigados a rever o conteúdo
da teologia moral, e os teólogos Johann Michael Sailer e Johann Baptist Hirscher foram os
pioneiros a escrever manuais que tinham como destinatários tanto o clero como os leigos.
Johann Michael Sailer (1751-1832) publicou um manual cujo título nos ajuda a perceber isso
que acabamos de dizer: “Manual da moral cristã, em primeiro lugar para os pastores de almas
e depois para cada cristão instruído”.
Em 1954 Bernhard Haring escreveu o mais famoso manual de teologia moral anterior
ao Concílio Vaticano II, “A Lei de Cristo”. E tinha como destinatário tanto os padres como os
leigos. O manual de Haring foi traduzido em muitíssimas línguas e tornou-se mundialmente
conhecido. Ao contrário do que aconteceu com os manuais de Sailer ou Hirscher que foram
escritos em alemão e, por isso, atingiram só as pessoas que falavam a língua alemã.
O manual tocava em várias questões relacionadas aos leigos tais como: família,
política, economia, cultura, etc. Logo, não apenas dizia no subtítulo que o livro se destinava
também aos leigos, mas o mundo dos leigos de fato entrou no conteúdo do seu manual. Isso
não aconteceu, por exemplo, com o livro de Teodoro da Torre del Greco, que dedicou o seu
compêndio “ao clero em geral e aos leigos”, mas ao desenvolver os assuntos utilizou um
esquema parecido ao de São Tomás.
O Concílio Vaticano II confirmou a preocupação de B. Haring em apontar também os
leigos como destinatários da teologia moral. Chegou-se, então, à conclusão de que a teologia
moral é útil a todo batizado que pretende viver conforme o Evangelho de Jesus Cristo e
construir o Reino de Deus. E os padres conciliares afirmaram que a teologia moral pós-
conciliar precisava evidenciar “a sublimidade da vocação dos fiéis em Cristo e sua obrigação
de produzir frutos na caridade, para a vida do mundo” (OPTATAM TOTIUS, n.16). Deste
modo, praticamente quase todos os manuais de teologia moral que foram publicados depois
do Concílio Vaticano II, têm como destinatários todo o Povo de Deus.
A ampliação dos destinatários do conteúdo da moral cristã fez com que a teologia
moral se tornasse marcada por uma dimensão mais querigmática (anúncio-evangelização) e
mais pastoral (práxis de fé). Hoje em dia já ninguém estranha vendo os leigos estudando
teologia junto com as pessoas de vida consagrada ou com os seminaristas. E é possível ver,
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não raramente, nos institutos de teologia leigos prestando o seu serviço de qualidade como
docentes (cf. CNBB, doc. 45, 1986, n.110).

1.3.3 Teologia Moral para o mundo da academia


As pesquisas ético-teológicas podem ter como destinatário o mundo da academia, a
sociedade dos cientistas. Hoje se fala muito a respeito do diálogo interdisciplinar tanto no
campo da teologia em geral com no campo das ciências humanas. O ambiente acadêmico
não pode ser descuidado pela teologia moral, sobretudo no mundo de hoje, diante das
diversidades de culturas e das formas de ethos existente. A própria situação do pluralismo
ético da sociedade contemporânea obriga a teologia moral a elaborar a sua síntese ético-
teológica baseando-se também nos padrões científicos sérios. Uma teologia moral fraca não
pode discutir com o mundo de hoje.
A encíclica Veritatis Splendor sublinha que os teólogos moralistas precisam ter o
espírito do discernimento num contexto atual onde impera a cultura prevalentemente
científica e técnica, sujeita aos perigos do relativismo, do pragmatismo e do positivismo. Do
ponto de vista teológico, os princípios morais não podem ser dependentes do momento
histórico. A afirmação dos princípios morais não é da competência dos métodos empírico-
formais. Sem negar a validade de tais métodos, a teologia moral não pode restringir-se a eles.
Ela precisa continuar fiel ao sentido sobrenatural da fé, tomando em consideração, sobretudo
a dimensão espiritual do coração humano e a sua vocação ao amor divino.
Por estes motivos os que ensinam a teologia moral nos seminários ou nas faculdades
teológicas têm o grave dever de instruir os fiéis – especialmente os futuros pastores – sobre
todos os mandamentos e as normas práticas que a Igreja declara com autoridade. O teólogo
deve esforçar-se por dispensar-lhes um ensinamento que não venha lesar, de modo algum,
a doutrina da fé (cf. VERITATIS SPRENDOR, n.110-113).

1.3.4 Teologia Moral a serviço da evangelização e da inculturação


Toda pesquisa teológica no campo da moral que pretenda prestar um bom serviço ao
Magistério precisa ter também um cunho missionário e evangelizador. A evangelização e a
inculturação constituem grandes desafios para a Igreja. À teologia moral cabe interpretar a
doutrina do Magistério para o Povo de Deus, para os fiéis e, ao mesmo tempo, interpretar as
experiências, esperanças, problemas e dúvidas dos fiéis para o Magistério.
Sobre a inculturação podemos dizer que:

refere-se a uma realidade bem comum e sempre vivida na história da Igreja:


a relação da fé com a(s) cultura(s), num diálogo de enriquecimento recíproco
– razão pela qual a Igreja, na sua missão ad gentes, há de receber das
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culturas tudo o que concorra para a edificação da vida cristã, mas tratará
também de propor o Evangelho como fator purificador de toda e qualquer
cultura. Estamos, assim, diante de uma “troca nos dois sentidos, do
Evangelho relativamente à cultura e da cultura para o Evangelho” (NUNES,
2008).

Esse feedback é muito importante. E, para clarear mais, trazemos à baila o que diz
Arrupe sobre a enculturação. Para ele, inculturação

significa encarnação da vida e mensagem cristã numa área cultural concreta,


de tal modo que esta experiência não só chegue a expressar-se com os
elementos próprios da cultura em questão (o que seria só uma adaptação
superficial), mas que se converta num princípio inspirador, normativo e
unificante, que transforma e recria esta cultura, dando origem a uma nova
criação (ARRUPE, 1978).

A nova evangelização, da qual se fala muito hoje em dia, comporta o anúncio e a


proposta moral, porém, a nova evangelização manifesta a sua força missionária quando se
realiza não só como palavra anunciada, mas também e, sobretudo, como palavra vivida.
Já São Gregório Magno, no século VI, escrevia: “Nosso Senhor e Salvador, caríssimos
irmãos, ora por palavras, ora por fatos nos adverte. Com efeito, até mesmo suas ações são
preceitos, porque, ao fazer alguma coisa em silêncio, dá-nos a conhecer aquilo que devemos
realizar. Eis que envia dois a dois discípulos a pregar, já que são dois os preceitos da caridade,
o amor de Deus e do próximo. O Senhor envia a pregar os discípulos dois a dois, indicando-
nos com isso, sem palavras, que quem não tem caridade para com o próximo de modo algum
deve receber o ofício da pregação” (SÃO GREGÓRIO MAGNO, 1995, p. 1392-1393).
Não se evangeliza somente através do querigma (pregação, anúncio ou proclamação
do conteúdo mais importante da mensagem cristã), mas também do ethos. É preciso pregar
e testemunhar a moral cristã. À sociedade hodierna importa mais a vida de santidade, de
perfeição e de diakonia cristã (serviço ao próximo). Basta lembrar a vida (o ethos) de Frei
Damião, de Madre Tereza de Calcutá, de Dom Helder Câmera, de Irmã Dulce, etc. Na
evangelização através da vida está o Espírito de Cristo e a força da convicção para o homem
de hoje. A Carta encíclica Redemptoris Missio, do Papa João Paulo II, ensina “o homem
contemporâneo acredita mais nas testemunhas do que nos mestres, mais na experiência do
que na doutrina, mais na vida e nos fatos do que nas teorias. O testemunho da vida cristã é
a primeira e insubstituível forma de missão: Cristo, cuja missão nós continuamos, é a
‘testemunha’ por excelência (Ap 1,5; 3,14) e o modelo do testemunho cristão”
(REDEMPTORIS MISSIO, n.42).
E a carta encíclica Veritatis Splendor, indo por este mesmo caminho, evidencia que a
força evangelizadora está não só na palavra anunciada, mas também na palavra vivida (cf.

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VERITATIS SPLENDOR, n.106-107). O mundo hodierno necessita de uma moral missionária.
A teologia moral precisa ser sensível à problemática da inculturação.

Evangelizar o homem significa também evangelizar a sua cultura, a sua ética,


os seus valores e os seus ideais de justiça e de paz. Por isso, um dos objetivos
mais importantes da nova evangelização consiste precisamente em
transformar a cultura a partir de dentro, enriquecendo-a com os valores
cristãos que derivam da fé e fazendo que a mensagem de Cristo penetre na
consciência das pessoas e se projete nos atos dos povos. A síntese entre
cultura e fé não é somente uma exigência da cultura, mas também da fé,
pois uma fé que não se faz cultura é uma fé que não é plenamente vivida
(INSTRUMENTUM LABORIS, 1997, n.9-10).

1.3.5 Teologia Moral para a sociedade de hoje


A reflexão ético-teológica de hoje pensa em levar em consideração os desafios e as
esperanças de cada pessoa humana, na sua peculiaridade. Os temas ligados à pessoa não
podem ser deixados de lado: a vida, a saúde, o trabalho, a morte, a religião, a urbanização,
a pobreza, a informática, a comunicação, etc. Os problemas concretos mudam conforme a
pessoa e as suas necessidades. Os desafios que encontra o homem concreto precisam ser
respondidos pela teologia moral. Por isso, a pesquisa teológico-moral não pode fugir dos
assuntos atuais que norteiam o homem e a mulher nos dias de hoje.
A teologia moral não pode se preocupar somente com a pessoa humana como sujeito
individual. O ser humano vive numa determinada sociedade, numa determinada cultura, numa
determinada comunidade. É neste contexto que o ser humano precisa ser entendido como
sujeito social e a ética teológica precisa se pronunciar sobre assuntos de cunho comunitário
tais como: política, economia, cultura, grupos sociais, organizações, meios de comunicação,
saúde e segurança pública, moradia e educação, saneamento básico e reforma agrária, meio
ambiente, distribuição dos recursos naturais, mundo do trabalho e da ciência, os principais
flagelos da sociedade e as diferentes crenças religiosas, dentre tantas outras coisas.
Enfim, a teologia moral precisa acompanhar com sua proposta ética a pessoa e a
comunidade no momento chamado hoje. Olhando para o passado, apontando para o futuro,
mas com os pés no presente. Só assim a teologia moral pode cumprir a sua função de servir
tanto ao homem como à sociedade atuais e contribuir para o crescimento da “civilização do
amor” e a implantação do Reino de Deus cada vez mais.

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Antes de continuar seu estudo, realize o Exercício 1 e a
Atividade 1.1.

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UNIDADE 2

TEOLOGIA MORAL NA HISTÓRIA


OBJETIVO DA UNIDADE: discorrer sobre o pensamento moral cristão desde os
primórdios do cristianismo até os nossos dias. Mostrar como as reflexões e as
experiências no decorrer da história ajudaram para a elaboração do conteúdo moral que
hoje é ensinado pela Igreja.

É impossível fazer teologia atualizada, sem um estudo do que se passou anteriormente


e dentro de outros contextos, logo, diante das muitas mudanças e tensões, faz-se necessário
um olhar atento para períodos semelhantes do passado. Um retrospecto histórico nos ajuda
a compreender melhor as profundas alterações que nos deixam hesitantes entre os valores
perenes e os novos valores, uma vez que a situação de crise em que vivemos não é nem a
primeira, nem será a última. E talvez também não seja a mais profunda.
Para entendermos o momento atual, é preciso levar em consideração o contexto global
de transformações profundas e hesitações igualmente profundas em todos os campos:
econômico, político, social, cultural, religioso, etc. Os impasses da teologia moral devem ser
localizados nos impasses da teologia como um todo.

2.1 Ensinamento moral dos Santos Padres

A Patrística é o período entre a Moral bíblica e a Teologia Moral da Idade Média.


Decorre um longo período de sete ou oito primeiros séculos do cristianismo. Nesse período
surgem os Santos padres e os chamados escritos patrísticos.
Sob a epígrafe da patrística se encontram os padres apostólicos (séc. I e II), os padres
apologistas (séc. II), os escritores eclesiásticos do séc. III em diante, dentre os quais, os
moralistas africanos (sobretudo Clemente de Alexandria). A Idade de ouro da Patrística situa-
se entre os séculos IV e VI. No Ocidente destacam-se: Ambrósio, Agostinho, Jerônimo,
Gregório Magno; No Oriente: Metodio, Basílio, Gregório Nazianzeno, João Crisóstomo,
Atanásio, Gregório de Nissa. Além desses, tiveram especial papel na história da moral: Leão
Magno, Cesário de Arles, Isidoro de Sevilha e outros escritores ligados ao monacato.
Os Santos padres são, portanto, os escritores eclesiásticos dos primeiros séculos. Sua
rica teologia emerge diretamente da Sagrada Escritura e da vida da Igreja de seu tempo.
Buscam enculturar a mensagem cristã na cultura greco-romana, fazendo com que a
evangelização crie raízes profundas na vida do povo. Seus tratados teológicos não conheciam

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as divisões de hoje: Dogmática, Fundamental, Moral, etc. Eram tratados mais abrangentes e
interligados. Daí, não conseguirmos identificar nenhum tratado sistemático de teologia moral
nessa época. A Moral aparece dentro do anúncio da Boa Nova, comentada e aplicada à vida
cristã.
Como característica, podemos dizer que a teologia dos Padres é substancialmente uma
teologia da perfeição, que indica o caminho das virtudes, sobretudo a caridade, como meio
para se chegar ao fim. É uma teologia inspirada em primeiro lugar nas Escrituras, mas
aproveita também dos grandes sistemas morais do estoicismo e platonismo, dando-lhes uma
coloração evangélica. Em geral, os ensinamentos dos Padres estão inseridos no quadro
litúrgico, apresentados, particularmente, nas homilias e nas catequeses, deixando, portanto,
aos indivíduos a tarefa de aplicarem as leis gerais aos casos particulares. Os papas e os bispos,
no século V e VI continuam seus esforços, seja para converterem os pagãos, seja, sobretudo,
para instruir em profundidade os cristãos (GERARDI, 2003).

2.2 Livros Penitenciais

Período que vai do século VI ao XI, e é tido como um período de decadência geral em
termos religiosos, culturais e sociais. A invasão dos bárbaros fez com que a sociedade romana
se desarticulasse totalmente. Os penitenciais se propagaram entre os séculos VI a XI. Eram
livros essencialmente práticos, sem uma teologia explícita, destinados exclusivamente aos
confessores: apresentam uma lista de pecados com as respectivas penitências.
Existiram muitos Penitenciais e todos apresentavam basicamente o mesmo esquema
bastante jurídico e formal. A cada pecado uma penitência precisa (orações, vigílias,
mortificações corporais, jejuns, abstinências de diversos tipos, esmolas), de acordo com uma
casuística particular que levava em conta as circunstâncias das ações e qualidade do penitente
(clérigo, monge, leigo, homem, mulher).
A duração dessas penitências podia ser de um dia, semanas, meses ou anos. As penas
impostas a cada pecado se somavam e assim, segundo o número e a gravidade podiam
ultrapassar a duração da vida. Por isso mesmo esses livros continham também tabelas
relativas às comutações, compensações ou redenções das penas longas por outras mais
breves e mais rígidas.
Estas penitências, chamadas “tarifas”, eram indicadas em volumes para uso dos
confessores chamados “Livros Penitenciais”. A história destes livros é muito complexa e seus
autores foram os monges e confessores zelosos que estabeleceram tarifas que lhes pareciam
as melhores e foram elaborando listas de culpas de acordo com o que escutavam dos seus

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fiéis. Os especialistas distinguem diversas “famílias” de livros penitenciais: bretões e
irlandeses até a metade do século VII e anglo-saxões e continentais da metade do século VII
até o início do século IX. O último penitencial propriamente dito foi elaborado pelo bispo de
Worms (965-1025), intitulado Corrector sive medicus (GERARDI, 2003).

2.3 Renascimento da Teologia Moral nos séculos XII, XIII e XIV

Neste período destacamos o surgimento das primeiras Universidades: Paris, Oxford,


Nápoles e o aparecimento do Evangelismo. As Ordens Religiosas fundadas por São Francisco
de Assis e São Domingos de Gusmão trouxeram grandes contribuições para a evolução da
teologia moral. Entusiasmadas e levando o estudo a sério, foram verdadeiras Escolas de
Teologia Moral.

2.3.1 Escola Franciscana


Entre os franciscanos podemos destacar, sobretudo, Alexandre de Hales (1185–1245)
e São Boaventura (1218–1274); outros como Antônio de Pádua (1195–1231) e Pedro de João
Olivi (1248–1298), e, mais tarde, João Duns Scoto (1266–1308).
- Alexandre de Hales (1170-1245): Autor principal de uma obra coletiva da família
franciscana, na qual colaboraram nos três primeiros livros outros três teólogos franciscanos,
em particular João della Rochelle e no quarto livro (incompleto) colaboraram Guilherme de
Melitona (+1257) e outros franciscanos.
Os destaques são as reflexões sobre o Criador e o Salvador no terceiro livro e a teologia
sobre a fé e os costumes no quarto livro (GIRARDI, 2003).
- São Boaventura (1218-1274): Compôs 65 obras de índole filosófico-teológica,
exegética, ascética e oratória. Para a interpretação da Sagrada Escritura ele se valeu
substancialmente do platonismo de Santo Agostinho, ainda que reservando um largo espaço
às aquisições científicas da pesquisa e ao aristotelismo. Para São Boaventura todo discurso
teológico é também um discurso ético e não aceita a divisão de uma parte especulativa e de
uma parte prática. Para ele a teologia tem uma função efetiva e espiritual e o conhecimento
dessa nos leva ao amor, com o fim de nos transformar em homens cada vez melhores
(GERARDI, 2003).
- João Duns Scoto (1266-1308): Pertence a uma geração posterior a São
Boaventura e São Tomás. E o ponto de partida da sua teologia, incluso também a moral, é o
amor infinito de Deus. Ele pede ao homem para amá-lo por si mesmo, e a resposta do homem
deve ser absolutamente livre. Para ser bom o ato humano em resposta ao amor de Deus deve

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ser aprovado pela reta razão e deve possuir as condições necessárias segundo a sua causa
eficiente, o seu objeto, o seu fim, a sua forma, as circunstâncias de tempo e de lugar. Livre
ato da vontade, que persegue o seu fim último, que para ser meritório deve ser informado da
caridade e enfim aceito por Deus.
O pecado é um ato voluntário com o qual o homem se afasta do próprio fim último,
rejeitando cumprir aquilo que lhe impõe a vontade de Deus. E como esta é sinônimo de amor,
o pecado é um desvio do amor. A lei se apresenta como um imperativo. O critério de justiça
para o homem é, definitivamente, aquele da fé: isto é, não fazer outra coisa a não ser aquilo
que Deus mostra concretamente querer que o homem faça, momento a momento.
Inicia-se assim, uma virada na formulação moral: a moralidade não radica na ordem
natural e, por conseguinte na inteligência, mas predominantemente na ordem querida por
Deus e, portanto, na vontade. A manifestação privilegiada da moral vai ser o Decálogo,
enquanto revelação positiva da ordem livre querida por Deus. Scoto, como toda a escola
franciscana, distingue os primeiros três mandamentos, ligados a Deus, como uma relação
essencial e necessária, dos outros sete, que propõem os meios úteis para se chegar ao fim.
Refletir-se-á mais sobre esta orientação no nominalismo, de Guilherme de Ockhan, no século
XIV (GERARDI, 2003).
- Guilherme de Ockham (1280-1349): Sua reflexão é a mais clara manifestação
da grave crise conhecida pelo pensamento ético cristão. Ele, de fato, põe em discussão os
pressupostos fundamentais da escolástica medieval: a harmonia entre fé e razão, a relação
entre graça e liberdade e a possibilidade da razão afrontar e resolver os grandes problemas
da metafísica e da antropologia.
Com ele teve início o “espírito laico”, já que com sua doutrina e vida afirmava de modo
incipiente os ideais da dignidade de cada homem, da potência criativa do indivíduo, da cultura
que se expande, ideias que o Renascimento acolherá e desenvolverá.
A moral, segundo ele, concretiza-se na obrigação e, portanto, no exercício da vontade
livre pela prática dos mandamentos. A norma do nosso agir é somente a vontade de Deus,
que estabelece o bem e o mal. O homem, com sua própria razão, não pode descobrir os
motivos da ordem moral estabelecida por Deus, a menos que o próprio Deus lhe revele.
A vontade de Deus, que fundamenta a obrigação, se manifesta com a lei moral, a qual
o homem, livre e, portanto, responsável, pode obedecer ou desobedecer. Sem a liberdade
não pode haver ações louváveis ou reprováveis. O homem tem a liberdade de fazer assim ou
de fazer o contrário.

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A alternativa moral está entre escutar e acatar os mandamentos de Deus ou, ao
contrário, assumir os objetivos decisivos da própria vontade como critério do agir. A moral
está sempre ligada à religião, ou melhor, à fé. Nós conhecemos a vontade de Deus, isto é, a
lei, em primeiro lugar, através da revelação e depois com a reta
razão, de onde provém o sentimento de que certas ações são
ordenadas ou então proibidas. A reta razão se impõe diretamente
ao homem, e os seus preceitos se impõem a priori, assim sendo,
devemos cumprir aquilo que foi ordenado pela reta razão porque
foi ordenado. Se pode então afirmar que a moral de Ockham é
positiva e legalista, antes de tudo é preciso estar certo que a lei
existe, e a moralidade consiste em obedecer a lei (GERARDI,
2003).
Fonte: http://migre.me/jfeAW

2.3.2 Escola Dominicana


Para a Escola Dominicana o estudo sério, assíduo e técnico da verdade sagrada
constitui uma das componentes fundamentais da vida apostólica da Ordem dos frades
pregadores, fundada por Domingos de Gusmão. Dizia São Domingos: o dominicano que não
se empenha constantemente no estudo não é fiel à sua vocação; mas quando estuda sobre
o que prega, deve antes de tudo e, sobretudo viver como vir evangelicus (varão evangélico).
A teologia da escola dominicana certamente se caracteriza pelo aristotelismo, logo é mais
racional e empírica que a escola franciscana, maiormente mística.
Os dominicanos deram à Igreja excelentes mestres, tais como Alberto Magno e,
sobretudo, o seu discípulo, São Tomás de Aquino (GERARDI, 2003).
- Santo Alberto Magno (1205-1280): A obra do doctor universalis abraça todos os
campos do saber clássico e profano: da ciência natural à filosofia, da Sagrada Escritura à
teologia. Ainda em vida foi chamado magnus por causa da grande autoridade que gozava o
seu pensamento.
Primeiramente ele abriu as portas ao pensamento aristotélico, como patrimônio a ser
assimilado e não apenas para ser conhecido e melhor combatido. O Santo também, não
somente permitiu e preparou a obra de São Tomás, mas propôs um pensamento original, até
hoje não estudado o suficiente.
Ele é o primeiro filósofo cristão em que se observa a clara consciência da distinção
entre filosofia e teologia, e da perfeita autonomia da primeira com relação à segunda.
Aristóteles e Agostinho são os principais mestres aos quais constantemente recorre, e
baseando-se neles traça a distinção entre filosofia e teologia.
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Pelo fato de que para ele a teologia é disciplina principalmente prática, a moral cristã
vem reduzida à exortação prática apoiada nos exemplos de piedade e santidade contidos na
bíblia.
Alberto afirma, em sede filosófica, a possibilidade de uma autêntica ciência moral,
enquanto sobre o plano teológico rejeita sobrepor a moral cristã a um tratamento científico.
No tratado De bono ele deduz toda a ética do conceito de bem, desenvolvendo a reflexão
sobre as virtudes cardeais.
- Santo Tomás de Aquino (1224-1274): Controvertido e acusado de heresia, trouxe
para a reflexão cristã a filosofia de Aristóteles. O encontro com tal
filosofia levava muitos ao abandono da fé. Ao invés de incorrer
numa apologética estéril, enveredou por um diálogo mais frutuoso,
elaborando uma nova síntese, sem abandonar o que havia de bom
na tradição agostiniana. Versado em Bíblia e no seu ensino moral,
profundamente integrado numa visão global da fé, teve como
verdadeiro cerne “a lei do Espírito que nos dá a vida em Cristo
Jesus”.
Fonte: http://migre.me/jfeyv
Tomás de Aquino foi inovador de uma teologia moral sistemática, distinguindo-a do
restante em matéria teológica. Dividiu a sua obra Summa Theologica em três partes:
 Deus como ser em si e princípio das coisas;
 Deus como bem, isto é, como fim das criaturas;
 Deus como via (Cristo), para reconduzir o homem decaído a Deus mesmo.
A parte da obra dedicada à Teologia Moral é a segunda, mas não a separa das duas
outras partes, pois para ele, existe apenas uma única teologia, que é a doutrina da salvação,
a qual nos ensina conhecer Deus e o homem, a amar a Deus e a servir o homem. É preciso
observar, portanto, que a segunda parte vem enquadrada numa teologia da Criação e da
Redenção.
Pela primeira vez, a moral vem enfocada como teologia. Para Santo Tomás a criação
retorna à sua origem na ação livre do homem. Nesta verdade a moral, que tem seu ponto de
partida em Deus e na criação, encontra toda a sua consistência. Contudo, ainda que a sua
moral consista essencialmente no retorno do homem a Deus (visão beatífica), não nega a
beatitude imperfeita que ele pode alcançar neste mundo. E porque o homem é criado à
imagem de Deus, ele deve realizar-se livremente a sua orientação fundamental a Deus no
Cristo. Se o discurso ético é o discurso sobre o homem caminhando para Deus,
consequentemente o fim é a categoria fundamental da ética tomista.

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A beatitude última constitui o princípio necessário e imutável que serve de norma para
cada ação concreta e unifica a elaboração de uma verdadeira ciência voltada para a ação.
Todo o resto ganha sentido e valor no seu referimento ao fim. É o fim que dá aos atos a sua
especificação seja como atos morais seja como atos humanos.
Para Santo Tomás, o homem deve realizar a sua própria vocação na história e no
mundo, corresponsável com Deus e com os outros na atuação de um desígnio fundamental
que se realiza no tempo, mas que transcende o tempo. Como toda a natureza, o homem tem
um fim que corresponde ao seu bem, porque Deus criando-o o quis assim, e, portanto, ele é
modelado segundo uma ideia divina que forçosamente deve ser realizada através de sua livre
atividade. O projeto deste plano é a Lei Eterna de Deus, na qual participa o homem. A Lei
Eterna é o plano racional de Deus, ordem do universo inteiro, através da qual a sabedoria
divina dirige todas as coisas ao seu fim. O homem, como criatura racional é partícipe do plano
da Providência divina.
Logo, a participação é uma categoria fundamental no discurso ético tomista. É ela que
desenvolve os momentos mais originais e novos. A necessidade de uma igual participação
decide a natureza, dado que o homem não se insere no plano de Deus de maneira somente
executiva; ele deve participar de modo tal que as obras realizadas por ele não sejam somente
conformes à Lei Eterna, mas brotem livremente de sua orientação interior para o bem. Esta
participação se realiza em dois momentos: na lei natural e na lei do Espírito.
A primeira e mais fundamental participação na Lei Eterna é dada pela Lei Natural (Lex
naturalis), em força da qual a pessoa humana toma consciência da sua própria vocação
radical. Essa é o sinal do próprio Deus em nós, cheio de promessas e responsabilidades; não
é imposta de fora, mas procede do mais profundo da natureza humana: “A criatura racional
participa da lei eterna mediante o intelecto e a razão, por isso, esta participação se chama lei
em senso próprio” (STh I-II, q 91, a.2, ad 3). O núcleo essencial da lei natural é o preceito
pelo qual “se deve fazer o bem e evitar o mal”.
A segunda participação se dá no dom do Espírito Santo (Lex Spiritus), em força da
qual o homem pode eficazmente tender à plena realização do plano de Deus. A “lei nova do
Evangelho” é uma lei interior, infusa no coração do fiel e tem como elemento principal a graça
do Espírito Santo, que é dada aos fiéis de Cristo. Esta presença do Espírito é luz, mas também
força que permite ao homem realizar aquilo que o Espírito lhe revela: a sua vocação.
Em virtude desta dupla participação, o homem torna capaz de cooperar pessoalmente
no projeto de Deus. Esta capacidade se realiza no juízo da consciência, participação da
verdade humana na verdade divina, do conhecimento humano no conhecimento divino.
A consciência é a terceira categoria fundamental da reflexão ética tomista. A dignidade
da consciência provém do fato que ela é um elemento insubstituível para contribuição da
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pessoa humana na realização do plano de Deus. Em síntese, o homem encontra as regras do
agir moral na sua própria natureza racional, como pessoa, como membro de uma família e
como cidadão de um Estado, já que é um ser social (GERARDI, 2003).

“A consciência é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem, onde


ele está sozinho com Deus e onde ressoa a sua voz” (Gaudium et Spes,
16)

2.4 Séculos XVI, XVII e XVIII


Inicialmente sinalizamos nos séculos XVI e XVII um fator cultural de suma importância,
o nascimento da ciência moderna (em particular com Galilei e Newton), que contribui para
que cresça sempre mais todo discurso em torno do humano. De uma concepção teocêntrica
e transcendente passa-se gradualmente a uma concepção atropocêntrica e imanentista, a
uma concentração de interesse sobre o homem e sobre a vida civil – “humanismo”.
Um período em que se afirma sempre mais o “pensamento científico”, que descreve
como relação técnica o comportamento prático do homem (homo faber) no confronto com a
realidade, e uma das características fundamentais de tal ciência é o “racionalismo”,
pressupondo que o mundo fosse “escrito com caracteres matemáticos”.
No curso do século XVII se assiste a uma amedrontadora tensão espiritual. O
iluminismo rompe com a concepção da vida humana aberta aos valores transcendentais e
tudo se interpreta em perspectiva naturalista e racionalista.
Assim, nos séculos XVII e XVIII verificou-se na Europa uma crise profunda da
“consciência humana” e também religiosa. No fundo vê-se a compreensão do homem sobre
a sua presença no mundo. A transformação civil, já iniciada no século XVI, produziu efeitos
profundos e devastadores nas formas da consciência e da conduta moral. Uma fortíssima
exaltação do indivíduo e do sujeito por parte da cultura moderna e, como resultado, temos a
multiplicação dos movimentos intelectuais, sociais e econômicos.
Incluímos ainda as duas grandes revoluções que influenciaram profundamente a forma
de vida mundial: Americana e Francesa. Nessa época acontece a separação entre religão e
política, e a consolidação da divisão entre os cristãos católicos e os cristãos protestantes. A
política e mesmo a moral tornam-se progressivamente “laicas”, cada vez menos atentas às
questões de justiça pessoal e de pecado, do direito, dos deveres sociais e dos direitos
subjetivos no quadro da vida civil.

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O pensamento moral em época moderna aparece necessariamente marcado pelo
projeto fundamental de buscar para a moral um fundamento diferente e mais seguro com
respeito àquele que vinha sendo ofertado pela autoridade e pelo costume. Mas o projeto dos
filósofos, de elaborar uma doutrina moral emancipada dos referimentos suspeitos da parte da
autoridade e do costume não obteve êxito positivo. E a filosofia do período tardio moderno,
sucessivo a Kant, ao final abandonou a questão moral. No âmbito da teologia moral, a questão
mais importante é aquela da consciência certa e, portanto, como transformá-la de tal modo
para poder agir retamente (GERARDI, 2003).

2.4.1 A Reforma e o Concílio de Trento


Para completar o quadro geral do século XVI não podemos deixar de lado Martinho
Lutero (1483-1546) e a reforma protestante. Surpreendente movimento que mesmo
fundamentado na visão dogmática da justificação, enfatiza uma ética voltada para as
realidades terrestres. A Reforma pode ser vista como uma reação contra o otimismo do
Renascimento que exalta a natureza e as forças naturais do homem, e ainda como uma forte
reação contra os muitos abusos introduzidos na Igreja.
Além de Lutero, destacamos Filippo Melatone (1497-1560) e os teólogos suíços –
particularmente Giovanni Calvino (1509-1564) – que influenciaram grandemente o mundo
ocidental e colaboraram para que a reflexão teológica da Reforma e aquela da Igreja católica
entrassem em conflito.
A Igreja, responderá e repreenderá a muitos destes questionamentos através das
resoluções do Concílio Tridentino (1545-1563). Contudo, é preciso ter presente que o
interesse do Concílio do ponto de vista dogmático supera qualquer outra coisa e, não se
destaca pelo interesse em desenvolver a teologia moral (GERARDI, 2003).
Quanto ao Catecismo do Concílio Tridentino (Catecismo Romano), no tocante à moral,
é importante destacar o seguinte:
 É destinado aos párocos, como formadores de consciência.
 O Decálogo é apresentado como a suma ou o resumo dos preceitos, daí a necessidade
de os pastores saberem explicá-lo bem.
 O Sacerdote é visto como um anjo do Senhor.
 Na confissão o sacerdote representa Cristo Juiz. Ele é quem deve dizer que coisa é
proibida e que coisa o fiel tem a obrigação de fazer.
 É uma pedagogia que ressalta profundamente o valor da autoridade. O pároco é quem
deve explicar, teorizar. Ele é aquele que sabe, logo deve ser obedecido.
 Um ensinamento prevalentemente voltado para o conhecimento das verdades da fé
que está em primeiro lugar sempre.
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 Apresenta o que as pessoas devem conhecer, o que a Igreja obriga e o que proíbe, o
que se deve fazer e o que se deve evitar.
 Diante do clima de incerteza da salvação o Catecismo tridentino visa orientar o fiel à
certeza de que ele está em paz com Deus ao acolher aquilo que a Igreja ensina.
 Sua preocupação maior é dizer o que não se deve fazer. Uma moral negativa, que
leva à obrigação, à obediência, à perfeição no obedecer no campo moral.

2.4.2 Moral dos Manuais


É a denominação da moral escolástica que vigorou desde o Concílio de Trento até o
Vaticano II.
Em 1600, por inspiração do Concílio de Trento (1545-1563), surge o primeiro volume
do manual de Moral elaborado pelo jesuíta Juan Azor – Istituzioni, uma obra de síntese, que
se caracteriza pelo equilíbrio e o respeito da tradição. Os outros volumes foram elaborados
postumamente.
As Institutiones theologiae moralis, do século XVI, compiladas, nos seus inícios,
principalmente por jesuítas, tinham como objetivo principal serem usadas nos seminários na
formação do clero.
Assim, a teologia moral tornou-se uma disciplina independente e distinta da
dogmática, ao contrário das Summae Theologiae, como a de Tomás de Aquino, onde a
teologia moral fazia parte do sistema teológico. As Sumas eram demasiadamente extensas e
especulativas, e pouco práticas para a formação do clero, logo, ficaram reservadas para as
Universidades; para a formação dos futuros confessores, foram criadas as Institutiones. A
teologia moral identificava-se com a ciência dos confessores. Compilada em manuais para o
uso em seminários, ela continuou até o Concílio Vaticano II (GERARDI, 2003).
O esquema que serviu de base para as Institutiones foram Os Dez Mandamentos; ao
contrário das Sumas, cujo conteúdo era organizado a partir das virtudes. Os Mandamentos
forneciam um esquema de fácil aplicação no momento da confissão. A moral procurava definir
o que era permitido e o que não era permitido. Sua formulação era de cunho negativista; a
partir dos Mandamentos mostrava o que não se devia fazer. Tal enfoque levou ao
minimalismo, já que se determinava o mínimo moral exigido de todos. O máximo, isto é, a
prática das virtudes, ficou reservada à espiritualidade, à mística. Houve uma separação entre
moral e espiritualidade. A moral referia-se aos leigos, que podiam contentar-se com o mínimo
moral, enquanto a mística dizia respeito aos estados de perfeição que se encontravam além
da moral.
Os mínimos morais aparecem na lei natural, fundada nas exigências permanentes e
universais da natureza humana. Perde-se a perspectiva histórico-salvífica da Bíblia. O evento
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Cristo não tem significado ético. A graça e o amor deixam de ser categorias éticas centrais.
O pecado, a culpa e a sanção ocupam maior espaço no campo da moral. As citações bíblicas
são apenas para enfeitar afirmações previamente adquiridas a partir da razão. O dever
justifica-se por si mesmo. Algo é moralmente bom ou mau porque está proibido ou ordenado.
O fato da obrigatoriedade – proibido ou ordenado – é, no fundo, a causa última da moralidade
de um ato. O mérito está no cumprimento da lei. O legalismo leva a uma moral objetivista,
ou seja, a moralidade de um ato fundamenta-se no seu objeto, definido pela lei. A situação
do sujeito não interfere na determinação do ato.
Trata-se apenas de aplicar a lei universal ao caso particular. Entra aqui a casuísta, que
realiza o trabalho de mediação entre a universalidade da lei e a particularidade da situação.
A concentração na lei determinou uma gradativa dependência da moral com relação ao direito
canônico. As duas especialidades praticamente se identificavam. As soluções moral e jurídica
de um determinado caso se igualavam.
O distanciamento da moral em relação à teologia dogmática ocasionou uma sempre
maior proximidade ao Direito Canônico. É uma moral estática, que não toma em consideração
as etapas, as idades e as situações. Esquece a pedagogia e o crescimento. É uma moral
absoluta, porque só existe o tudo ou nada moral, sem lugar para nuanças e os passos
possíveis em direção a um ideal. É uma moral atomista, que se preocupa com os atos
particulares em vista da confissão numérica dos pecados, desconsiderando as atitudes para
a avaliação de um ato. Tem uma pretensão universalista, que não admite a diversidade
(MOSER – LEERS, 1996).

2.5 Moral Renovada


Diante de tantos impasses com o passar do tempo o modelo escolástico foi esgotando
a sua capacidade de resposta aos problemas morais. Inicia-se então uma tentativa de
renovamento da moral.
A Escola de Tubinga aparece como o fermento mais eficaz do renovamento da teologia
moral na Alemanha, com Johann Michael Sailer e Johann Baptist Hirscher. O renovamento da
moral na primeira metade do século XIX na Alemanha foi determinado, sobretudo por esta
escola onde os autores tentaram uma moral inspirada nos estudos bíblicos e patrísticos. Não
devemos esquecer também o esforço que fez esta escola para elaborar excelente síntese da
vida cristã que levasse em consideração o homem no seu conjunto.
Sailer (1751-1832) idealizou uma religião que contemplasse alguns elementos que
para ele, eram tidos como essenciais: interioridade, simplicidade, humildade, cristocentrismo.

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Hirscher (1788-1865), foi discípulo de Sailer, e aprofundou sua obra e ação,
dedicando-se, sobretudo, ao renovamento da catequese. A moral cristã de Hirscher tem como
ideia central o desenvolvimento do Reino de Deus na história e no homem, não só através da
fé, mas também através do comportamento: “Moral cristã como doutrina da realização do
Reino de Deus na humanidade”, diz o título da sua obra.
Contribuíram ainda outros autores: Joseph Ambrosius Stapf, Martin Deutinger, Magnus
Jocham, Bernhard Fuchs, Karl Werner, Franz Xavier von Linsenmann e Aton Koch
Outro importante movimento do século XIX foi caracterizado pela vontade da teologia
moral retomar o discurso teológico tomista, superando o nível casuístico da moral
manualística através de um vigoroso esforço de reflexão teorética. A busca de superação da
casuística seguirá na direção teológico-dogmática e psicológico-dinâmica.

2.5.1 Novos elementos para o renovamento


Outros impulsos para a renovação da teologia moral estão relacionados ao
“movimento litúrgico” onde temos que a celebração litúrgica deve exprimir grande influência
sobre o agir cristão e o “movimento bíblico” que evidencia o valor vital da Bíblia, que não
pode ser simplesmente objeto de estudo de especialistas, mas deve conduzir todos os fiéis a
uma vida cristã mais plena. Esse movimento vem caracterizado pela difusão do método
histórico-crítico e a tendência de não reduzir a exegese a estudo filosófico e arqueológico,
valorizando acima de tudo o aspecto religioso e teológico da mensagem cristã.
E por fim, a assim chamada “teologia kerygmática” que se orienta não em direção às
questões dogmáticas abstratas, mas em direção ao empenho da vida cristã concreta:
considerando especificamente o perfil da pregação proveniente, de modo geral, do ministério
eclesiástico, com interesse particular pela teologia moral.
Contribuíram ainda muitos outros autores, tais como:
a) Fritz Tillmann: elaborou uma teologia moral que diz respeito antes de tudo à
imitação de Cristo;
b) Émile Mersch: reflexão moral sobre a incorporação ao corpo místico de Cristo;
c) Johannes Stelzenberger: fala sobre a obrigação do homem para o advento do
Reino;
d) René Carpentier e Gérard Gilleman e R. Carpentier: ambos propõem a caridade
como fundamento da moral;
e) Benhard Häring: O primeiro manual de Häring (1954) “A lei de Cristo” (traduzido
em muitíssimas línguas e várias vezes reeditado) pode ser considerado como uma
síntese dos princípios que andavam inspirando numerosas publicações.
Seguimento e imitação de Cristo, reino de Deus, primado da caridade, estão
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simultaneamente presentes como formulações parciais que se fundem num único
princípio da ética cristã. A moral é entendida por Häring, antes de tudo, como
resposta do homem ao chamado de Deus: a vida cristã é imitação de Cristo, ou
melhor, a vida em Cristo. “A lei de Cristo” teve um significado primordial na
renovação da teologia moral e recebeu uma consagração no Concílio Vaticano II.
f) Depois do Concílio Vaticano II, Häring publicou um segundo manual em língua
inglesa, “Livres e fiéis em Cristo”, subdividido em três partes: “Cristo nos libertou
para que fôssemos livres”, “A verdade vos libertará” e “Vós sois a luz do mundo”.
Não se trata de uma edição revista da “Lei de Cristo”, mas de um novo texto que,
diga-se de passagem, era necessário depois da revolução metodológica proposta
pelo Concílio Vaticano II. O salto qualitativo entre os dois textos pode ser descrito
como a passagem da “lei” à “liberdade responsável” (GERARDI, 2003, p. 456-467).
O Concílio Vaticano II falou pouco de Teologia Moral, mas deu importantes diretrizes
metodológicas quando primeiramente, baseando-se na constituição Dei Verbum evidencia a
Bíblia como alma da teologia, depois, com o decreto Optatam Totius, fornece as diretrizes
para que se construa uma moral centrada no mistério de Cristo e sobre a história da salvação.
O uso da Bíblia deve nutrir a apresentação científica da moral, que deve ser orientada em
direção à vocação à qual são chamados os fiéis em razão da sua união a Cristo. No centro
desta moral está a caridade, na qual os cristãos são obrigados a produzir frutos para a vida
do mundo: “Consagre-se cuidado especial ao aperfeiçoamento da Teologia Moral, cuja
exposição científica, mais alimentada pela doutrina da Sagrada Escritura, evidencie a
sublimidade da vocação dos fiéis em Cristo e sua obrigação de produzir frutos de caridade
para a vida do mundo” (OPTATAM TOTIUS, n.16).
O Concílio Vaticano II, através da Constituição dogmática Lumen Gentium, n. 39-42,
elaborou uma moral da caridade integral e na Constituição pastoral Gaudium et Spes, buscou
superar a ética individualista apontando para uma moral social a nível planetário. A primeira
importância dada à Gaudium et Spes se relaciona ao modelo formal do “diálogo” que a
teologia moral assume no período pós-conciliar. É evidente, que esse “diálogo” da Igreja com
o mundo interessa antes de tudo à própria pesquisa da teologia moral, enquanto experiência
ética e espiritual e também na explicitação de que o agir cristão não pode deixar de
confrontar-se com o contexto civil no qual se exprime e se produz.
A Gaudium et Spes está dividida em duas grandes partes: Teológico doutrinal e
Pastoral. O Concílio tinha a intenção de harmonizar estas duas partes propondo que os
problemas concretos fossem iluminados pela reflexão teológica. Assim, na primeira parte, ao
desenvolver as linhas gerais da teologia cristã do homem criado como agente de
transformação histórica, a Constituição traz uma reflexão sobre a antropologia cristã. Na
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segunda parte, reflete sobre os problemas urgentes que a teologia deve iluminar, tais como:
matrimônio e família, promoção da cultura, vida econômico-social, vida política, paz e
comunhão entre os povos.
O Concílio deixa claro que uma de suas finalidades é iluminar o caminho da
humanidade hodierna: “A Igreja, guardiã do depósito da Palavra de Deus do qual tira os
princípios para a ordem religiosa e moral, ainda que nem sempre tenha a resposta imediata
para todos os problemas, deseja unir a luz da revelação com a peripécia de todos, para que
se ilumine o caminho no qual a humanidade entrou recentemente” (GAUDIUM ET SPES, n.33).
Também para usufruir dos resultados da razão humana, convida-nos ao espírito
ecumênico. Precisamos reconhecer os raios da verdade que se encontram nas outras religiões
cristãs, embora elas não tenham a plenitude da Verdade. “Então essas Comunhões
conseguem também uma colaboração mais ampla em certos serviços que toda a consciência
cristã exige em vista do bem comum... É mister que os católicos reconheçam, com alegria, e
estimem os bens verdadeiramente cristãos, oriundos de um patrimônio comum, que se
encontra entre os irmãos separados” (UNITATIS REDINTEGRATIO, n.4).
A exigência de se interessar pelos resultados do trabalho humano nasce também do
Decreto Optatam Totius, onde se fala que a Teologia Moral tem “a obrigação de produzir
frutos na caridade, para a vida do mundo” (OPTATAM TOTIUS, n.16). A Teologia Moral precisa
aproveitar também dos valores que se encontram na cultura e nos livros dos não cristãos e
dos não crentes. Deste modo, a Lumem Gentium nos orienta: “Tudo o que de bom e
verdadeiro se encontra entre eles (os não cristãos), a Igreja julga-o como uma preparação
evangélica, dada por Aquele que ilumina todo homem, para que enfim tenha a vida” (LUMEM
GENTIUM, n.16).
Neste mesmo sentido já havia se pronunciado o Apóstolo Paulo: “Quando então os
gentios, não tendo lei, fazem naturalmente o que é prescrito pela Lei, eles não tendo lei, para
si mesmos são lei; eles mostram a obra da lei gravada em seus corações, dando disto
testemunho sua consciência e seus pensamentos que alternadamente se acusam ou
defendem” (Rm 2,14).
Hoje em dia se fala muito sobre cultura, sobre os meios de comunicação social de
massa, sobre a inculturação. O teólogo moralista, o Magistério, a Igreja, devem saber
aproveitar, como uma espécie de gancho, da literatura, da poesia, das telenovelas, das
revistas, dos livros de filosofia, dos romances com enfoques éticos, dos jornais, das
publicações populares, dos filmes, das peças teatrais, etc., já que em tudo isso pode-se
encontrar e descobrir as angústias, as preocupações, a situação na qual vive o homem e a
mulher de hoje. Os desafios do mundo contemporâneo se tornam a “matéria-prima” para a
sucessiva elaboração ético-teológica.
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O próprio Cristo, ao evangelizar, toma como ponto de partida as “fontes secundárias”
e, a partir delas constrói o discurso teológico sobre o Reino de Deus: Ele se aproveita dos
dados empíricos (cf. Mc 4, 30-34), da sabedoria popular (cf. Lc 5, 36-39), dos provérbios (cf.
Lc 4, 23), dos fatos da vida social e política (cf. Lc 16, 1-13. 19-31), da problemática dos
impostos (cf. Lc 18, 9-14; 20, 20-26), etc. A metodologia de Jesus parte da realidade para só
depois passar para a reflexão tipicamente religiosa. Por isso a atitude de Jesus pode nos servir
como paradigma no correto uso das fontes da Teologia Moral.
Durante o século XX, nenhuma outra disciplina teológica sofreu mudanças tão radicais
como a teologia moral. As transformações no campo da teologia moral refletem claramente
a nova maneira de autocompreensão da Igreja, o surgimento da nova relação Igreja-mundo,
a renovação bíblico-litúrgica, a abertura ecumênica, o pluralismo sociocultural, o frutuoso e,
às vezes, defeituoso diálogo com as ciências do social e enfim o novo tipo de convivência
entre o clero e os leigos.

2.5.2 Princípios fundamentais da moral renovada


A moral renovada é totalmente cristocêntrica. Sendo assim, o modo de agir de Jesus
Cristo deve influenciar a vida de todo cristão, lembrando que o modo como Jesus age foge
aos padrões de comportamento das lideranças religiosas do seu tempo, a ponto de podermos
dizer que Cristo não é modelo moral passível de ser codificado em normas. Ele abre um novo
horizonte de sentido, que faz com que todos nós possamos compreender a religião de um
modo novo e, consequentemente, possamos agir de modo novo.
A graça vem, maiormente, acentuada em relação ao pecado. Inspirada na Sagrada
Escritura, a perspectiva cristocêntrica passa a ser o conteúdo, a alma da moral cristã. Este
novo modo colabora para que haja maior conciliação entre os conteúdos da moral cristã e os
conteúdos relacionados à dogmática e à espiritualidade.
A moral renovada aponta para o personalismo como princípio antropológico, enfatiza
o ser humano como pessoa, ser inacabado, que tem a tarefa de ir se constituindo na relação
com Deus, com os outros e com o mundo. Disso deriva que o ser humano enquanto pessoa
caracteriza-se pela liberdade fundamental, com a tarefa de realizar-se; e pela
responsabilidade fundamental em relação a Deus e aos outros e diante de Deus e dos outros.
A liberdade e a responsabilidade constituem a autonomia da consciência como
categoria básica da moral renovada. A perspectiva cristocêntrica e a personalista determinam
uma visão otimista em relação ao mundo secular, porque o próprio Verbo se encarnou neste
mundo, tornando-o lugar da manifestação de Deus, e também porque a pessoa vai se
constituindo na relação com seu próprio contexto. O mundo é referencial indispensável do ser
humano como pessoa e mediação necessária da nossa relação com Deus e com os outros.
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Os cristãos não devem fugir do mundo, mas devem inserir-se nele e produzir frutos de
caridade para o mundo.

A moral renovada se centra no amor e busca superar o legalismo. Trata, inclusive, de


captar as exigências do amor em situações
concretas não previstas pela lei Moral. A
moral renovada procura não confundir as
diferentes dimensões do agir humano:
jurídica, ética e espiritual já que cada uma
tem sua especificidade e, no
equacionamento de um ato humano, é
importante não as misturar.
Fonte: http://migre.me/jfKWd
- A dimensão jurídica (legal): preocupa-se com a ordenação da vida em
sociedade num determinado momento da história e do desenvolvimento de um
grupo social. O legal deve adaptar-se ao real e ao possível. É fruto de um consenso.
É promulgado pela autoridade competente. Tem em vista o bem comum. Impõe-
se pela sanção. O ponto de referência é a sociedade, e o objetivo é a ordenação
social.
- A dimensão ética (moral): preocupa-se com as exigências de libertação,
humanização e crescimento humano da pessoa e da sociedade. Pode estar
expressa no que é definido como legal, mas o supera. O ponto de referência é o
sujeito e não a sociedade como tal. Por isso, depende do convencimento da
consciência pessoal, não da sanção da autoridade.
- A dimensão espiritual (teologal): afirma que a ternura e o amor de Deus são
mais fortes que a fraqueza e a covardia humanas. O ponto de referência é a graça
e o amor de Deus, que superam em muito as possibilidades e os fracassos
humanos. Trata-se do princípio da misericórdia.

Alguém pode ter rompido uma norma jurídica, e, no entanto, o seu ato estar em
consonância com a exigência ética. Alguém pode incorrer em uma falta jurídica e moral e,
apesar disso, confiar na misericórdia de Deus, que é maior que o pecado. É necessário saber
conjugar a dimensão especificamente ética com as dimensões jurídica e espiritual, guardando
as respectivas proporções. O elemento moral serve de mediação entre o elemento legal e o
teologal. A autonomia da consciência passa a ser uma categoria central desse tipo de moral
renovada pós-conciliar.
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Antes de continuar seu estudo, realize o Exercício 2.

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UNIDADE 3

A BÍBLIA COMO BASE PARA A REFLEXÃO


MORAL TEOLÓGICA
OBJETIVO DA UNIDADE: abordar as Sagradas Escrituras e examinar qual a sua
contribuição para a Teologia Moral; explanar sobre o contributo que a bíblia nos dá para
um adequado comportamento moral. O capítulo coloca em evidência a aliança, os
mandamentos e as bem-aventuranças.

Como já mencionamos anteriormente, a Sagrada Tradição e as Sagradas Escrituras


sempre foram a base para a reflexão ético-teológica, e também ao mesmo tempo, a garantia
da sua autenticidade para todos os crentes.
Com o Concílio Ecumênico Vaticano II cada vez mais biblistas e moralistas buscam
uma aproximação entre a Palavra de Deus e a reflexão teológico-moral, objetivando incentivar
a práxis cristã. Várias Constituições Dogmáticas do Concílio Ecumênico trazem presentes na
sua reflexão o tema “Bíblia e a moral”.
O Decreto Optatam Totius diz: “Com particular diligência formem-se os estudantes no
estudo da Sagrada Escritura, que deve ser a alma de toda a teologia. Após conveniente
introdução, sejam iniciados cuidadosamente no método exegético, conheçam os temas
principais da Revelação Divina, recebam o incentivo e alimento na leitura e mediação diária
dos Livros Sagrados” (OPTATAM TOTIUS, n.16).

3.1 Como usar a Bíblia para a reflexão moral

A Bíblia é referencial primário e


ponto de partida para toda e qualquer
reflexão teológico-moral, mas ao
mesmo tempo, não pode ser utilizada
como o “livro” aonde se encontram as
soluções de todos os nossos problemas
de um modo pré-fabricado ou cômodo.

Fonte: http://migre.me/jzvKL
Entretanto, a Palavra de Deus, através do Espírito Santo, possui uma “força vital” de
realização daquilo que ela diz com referência à conduta moral. “Sede santos, porque eu, o

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Senhor vosso Deus, sou santo” (Lv 19,2). “Sede, portanto, perfeitos como vosso Pai celeste
é perfeito” (Mt 5,48).
O cristão deve buscar entender a Palavra de Deus, através da racionalidade ética e
chegar a uma solução concreta para as várias situações com a qual ele ou a humanidade se
depara.
Se antes do Vaticano II os leigos quase não tinham acesso à Bíblia, depois do mesmo
passou a ter um grande incentivo. As paróquias e dioceses começaram a fazer suas reflexões
mais numa linha bíblico-teológica.
A religião cristã é uma das chamadas "religiões de livro", as quais têm em algum tipo
de Escritura, algo assim como uma carta fundamental. Não obstante, por diferentes
circunstâncias históricas, nos séculos passados, e até o próprio Vaticano II, tal fato quase foi
negado. Diríamos que a Bíblia estava como que sequestrada do povo cristão. Raramente era
usada. Não se inculcava sua leitura e meditação. Durante os séculos em que se manteve
obrigatoriamente a Bíblia em latim e se proibia sua tradução em língua popular, a leitura
individual era desencorajada, por medo das interpretações "livres" e não assessoradas. O
Magistério eclesiástico ocupava na vida consciente da igreja lugar de maior envergadura que
a própria Palavra de Deus. O afã e a veneração da Bíblia entre os católicos eram coisas
"suspeitas" de "protestantismo".
Desde os fins do século XVIII, especialmente no século XIX e atualmente, os estudos
bíblicos deram uma autêntica virada à visão que temos da Bíblia, ao seu conhecimento
científico, à sua hermenêutica, à sua interpretação. Conhecemos hoje os gêneros literários,
a redação em suas diferentes formas e substratos relacionais, as implicações e os influxos
sociais, as línguas antigas, o ambiente histórico concreto, até detalhes inimagináveis, e isto
apenas há uns decênios.
Apesar disso, numerosos cristãos ainda continuam lendo a Bíblia como se nada tivesse
mudado, da mesma maneira como ela foi lida na Idade Média, mediante uma interpretação
literal, fundamentalista, "maravilhosista", ou como um prontuário de citações com a finalidade
de interpretar e de ensinar arbitrariamente.
Noentanto, vários textos conciliares destacam a importância que a Palavra de Deus
deve ter na vida eclesial. Afirmam que ela deve embeber a teologia, a pregação, a catequese,
a homilia, a oração comunitária e pessoal. O Concílio recomenda isto a todos os cristãos de
modo insistente, e ainda que se deve cuidar para não ter uma interpretação fundamentalista
da mensagem bíblica, sem ter em conta a roupagem cultural e toda a realidade em que a
mesma foi escrita.

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3.2 O ser humano criado como imagem de Deus e a sua responsabilidade
moral

É um dom que vem de Deus para o homem compreender que tudo veio Dele, do seu
modo de agir e das suas manifestações, e ao mesmo tempo, desse amor é que vem a
responsabilidade da humanidade em viver conforme os Seus projetos.
Esse Deus é “transcendente” e
não faz parte do mundo. Mas a
humanidade não existe sem o seu
Criador, e é moldada segundo as
intervenções divinas, portanto
dependemos radicalmente Dele. O
ser humano deve respeitar as
estruturas e características divinas.
Fonte: http://migre.me/jzHdR
Segundo a Pontifícia Comissão Bíblica, o homem é “imagem” de Deus por causa, ao
menos, de seis características:
1. A racionalidade, isto é, a capacidade e a obrigação de conhecer e de
compreender o mundo criado.
2. A liberdade, que implica a capacidade e o dever de decidir e a
responsabilidade pelas decisões tomadas (cf. Gn 2).
3. Uma posição de comando, porém de modo algum absoluto, e sim sob o
domínio de Deus.
4. A capacidade de agir em conformidade com Aquele do qual a pessoa
humana é imagem, ou seja, de imitar Deus.
5. A dignidade de ser uma pessoa, um ser ‘relacional’, capaz de ter relações
pessoais com Deus e com os outros seres humanos (cf. Gn 2).
6. A santidade da vida humana (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 08).

3.3 Ética cristã do Antigo Testamento

Na moral revelada no Antigo Testamento a “lei” tem grande importância desde as


tradições mais primitivas. Na vida moral de todo israelita a lei tem importância vital. Ela orienta
toda a ética moral veterotestamentária.
Encontramos uma vasta bibliografia na linha exegética do Antigo Testamento: seja no
Decálogo, no profetismo ou na linha sapiencial; todos nos dão uma visão ampla sobre a
consciência moral de Israel. Principalmente os “Dez mandamentos” são as leis, linhas mestras
condutoras que formam o conjunto de orientações éticas para o povo de Israel e para a
humanidade.

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Decálogo - Todo povo que se preze tem uma Constituição, e no caso de Israel isso
não é diferente. As “dez palavras”, mostram as leis fundamentais do Sinai.

A sua posição redacional (Ex 20,1-17), imediatamente antes do “Código da


Aliança” (Ex 20,22-23,19) e a sua repetição (Dt 5,6-21), com algumas
variantes, no início do “Código Deuteronômio” (Dt 4,44-26,19), já indicam a
sua importância preponderante no conjunto da “Torá”. Em hebraico, esta
última palavra quer dizer “instrução, ensinamento”; tem, portanto, um
sentido muito mais amplo e profundo do que a nossa palavra “lei”, a qual,
porém é utilizada por quase todos os tradutores (PONTIFÍCIA COMISSÃO
BÍBLICA, 2009, 25).

Profetismo – Todos os profetas tratam da temática do justo comportamento moral.


Em muitos textos proféticos aparecem reflexões sobre um Deus que vai libertando o povo de
Israel da escravidão e conduzindo-os para a terra prometida no monte Sinai (cf. Dt 5,1-6.28-
33).
Muitos profetas falam da aliança entre Deus e o seu povo:
O texto de Jr 31,31-34 é o único que fala explicitamente de uma “nova
aliança”: “Um dia chegará, oráculo do Senhor, quando hei de fazer uma nova
aliança [...] Não será como a aliança que fiz com seus pais [...] que eles
quebraram [...] Esta é a aliança que farei com a casa de Israel [...] Colocarei
a minha lei no seu íntimo, vou gravá-la em seu coração. Serei o seu Deus e
eles, o meu povo. Ninguém mais precisará ensinar seu irmão [...], pois todos
me conhecerão [...] Já terei perdoado as suas culpas, de seu pecado nunca
mais me lembrarei” (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 38).

Sapiencial - Grande parte dos livros foram escritos em linguagem poética, usando
metáforas, que têm por objetivo elevar o pensamento até a sabedoria de Deus Criador.

A parte da Bíblia na qual se fala mais de Deus Criador é uma série de salmos,
por exemplo: Sl 8; 19; 139; 145; 148. Os salmos manifestam uma
compreensão soteriológica da criação, porque veem uma ligação entre a
atividade de Deus na criação e a sua atividade na história da salvação. Eles
descrevem a criação não em linguagem científica, mas simbólica; não
apresentam nem mesmo reflexões pré-científicas sobre o mundo, mas
exprimem o louvor ao Criador da parte de Israel [...]Ser criatura de Deus, ter
recebido tudo da parte de Deus, ser essencial e intimamente um dom de
Deus, isso é o dado fundamental da existência humana e, portanto, também
do agir humano (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 09-10).

3.4 A Teologia Moral e a Aliança

A saída do Egito permitiu a aparição de Israel como povo constituído. E o tema da


Aliança no Antigo Testamento é um dos aspectos fundamentais para o povo de Israel. Há
uma progressiva percepção dessa realidade na história de Israel, o que nos dá a possibilidade
de chegarmos a interpretação teológica a seguir.

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A caminhada religiosa de Israel se concretiza através de quatro passos fundamentais
e bastante perceptíveis, todos relacionados a presença dinâmica de Deus em meio ao seu
povo. Ele acompanha, liberta, dá e reúne (recolhe) o seu povo:

1. Acompanha: indica o caminho no deserto, em virtude de uma presença


simbolizada, segundo as tradições, pelo anjo guia ou pela nuvem que evoca
o mistério impenetrável (Ex 14,19-20).
2. Liberta: do jugo da opressão e da morte.
3. Dá, duplamente: de uma parte, Ele dá-se a si mesmo enquanto Deus do
povo nascente; de outra parte, dá a esse povo o “caminho” ( derek), isto é,
o meio de entrar e permanecer em relação com Deus, e assim para doar-se
a Deus em resposta.
4. Recolhe o povo nascente em torno a um projeto comum, um projeto de
‘viver junto’ (de formar um qahal, a que pode corresponder em grego a
palavra ekklesía) (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 16).

A aliança bíblica apresenta elementos de uma inegável originalidade:


- A libertação da escravidão: A libertação da escravidão do povo de Israel por Javé
é o ponto central da Aliança. A iniciativa sempre é de Deus, que pede ao povo uma resposta.
A iniciativa de libertar o povo da escravidão parte de Deus: “Eu vi muito bem a miséria do
meu povo que está no Egito. Ouvi o seu clamor contra seus opressores, e conheço os seus
sofrimentos. Por isso, desci para libertá-lo do poder dos egípcios” (Ex 3,7-8). Assim, “três
meses depois de sair do Egito, os filhos de Israel chegaram no deserto” (Ex 19,1).
- A relação: Javé explica a Moisés como se dará essa libertação: “se vocês me
obedecerem e observarem a minha aliança, vocês serão minha propriedade especial [...]
Vocês serão para mim um reino de sacerdotes e uma nação santa e o povo responde
positivamente, dizendo: Faremos tudo o que Javé mandou” (Ex 19,5-8). A vida e existência
do povo de Israel formam-se à medida da presença e Aliança com Deus.

A experiência fundante da aliança verifica-se no Sinai. Ela é apresentada num


evento histórico fundador. É completamente dom de Deus, fruto da sua
iniciativa total, e empenha o próprio Deus (a Graça) e os homens (a Lei).
Confere a Israel recém-nascido o estatuto de povo com plenos direitos. Uma
vez estipulada, exige a resposta livre do homem, a ser compreendida, num
primeiro passo, como a aceitação de um “caminho de vida” (a Lei, no sentido
teológico), e depois, a seguir, como a prática de determinações precisas (as
leis). Queremos apresentar tal resposta não na sua globalidade teológica e
imutável (a Lei), mas na sua expressão plural e detalhada, eventualmente
adaptável às circunstâncias (as leis) (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009,
24).

- A conversão à Aliança: Deus Libertador do Egito encarrega a Moisés a tarefa de


preparar o povo através da transformação, conversão e purificação (santificar-se, lavar as
roupas e não ter relações sexuais com as mulheres) e fazer a delimitação do espaço
geográfico (traçar um limite ao redor da montanha) (cf. Ex 19,9-15).

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- Experiências e sinais de Deus: Os trovões, os relâmpagos, a nuvem, a trombeta
são os instrumentos ou sinais externos através dos quais a Bíblia descreve a presença de
Javé. Através destes fenômenos naturais o povo experimenta a presença de Deus. O encontro
pessoal com Deus, que é vivo e fala, é algo fundamental da Aliança (cf. Ex 19,16-25).
Javé é um Deus “vivo”, único e muito diferente das divindades elaboradas por mãos
humanas, de madeira, de metal ou de ouro. Está presente em todos os acontecimentos do
povo de Israel, principalmente com o pobre, injustiçado e oprimido.
A relação que existe entre ambas as partes, Deus e o seu povo, é única. É uma relação
fundada sobre valores, como por exemplo, respeito à vida, adoração e amor. E tudo acontece
não somente de forma individual, mas também comunitária. É grande a repercussão social
da Aliança, transformando a própria cultura do povo escolhido.

3.5 A Aliança como projeto social

Não podemos pensar a aliança somente em um modo individual, personalista, já que


ela atinge a toda a comunidade de Israel. A aliança é um projeto pessoal, mas também social,
religioso, político e comunitário.
A aliança é dom de Deus que se manifesta em um projeto histórico de transformação.
“A Aliança é dom, e a missão primeira do Povo de Deus consiste em manter viva e irradiar a
fé em Deus. Contudo, quando se olha mais de perto, a missão primeira se vincula
estreitamente com o projeto histórico. É através desse projeto histórico, da construção de
uma sociedade diferente, que o Povo de Deus poderia viver enquanto tal e manifestar aos
demais a existência de seu Deus. Assim, o dom aponta para uma tarefa” (MOSER e LEERS,
1988, 105).
Os assim chamados códigos legislativos da Aliança (Ex 21,1-23,33), da Santidade (Lv
17,1-26,46) e do Deuteronômio (Dt 4, 44-26,19) apontam para o “caminho da vida” do povo
israelita.
Esses códigos mostram especialmente três realidades:
- Os pobres e a justiça social: O Código da Aliança na maioria das vezes ajuda a
estabelecer medidas destinadas a evitar a escravidão dos mais pobres e vencer a pobreza. A
luta contra a pobreza pressupõe a realização de uma justiça honesta e imparcial (cf. Ex 23,1-
8; Dt 16,18-20). Ela se exerce em nome do próprio Deus.
Diversas linhas teológicas empenham-se para fundamentá-la: as leis apodíticas do
Código da Aliança retomam a intuição profética da proximidade de Deus em relação aos mais
pobres. O Deuteronômio, por seu lado, insiste sobre o estatuto particular da terra confiada

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por Deus aos israelitas: Israel, beneficiário da bênção divina, não é o proprietário absoluto da
terra, mas é seu usufrutuário (cf. Dt 6,10-11). Por isso, a realização da justiça social aparece
como a resposta de fé de Israel ao dom de Deus (cf. Dt 15,1-11): a lei regula o uso do dom
e recorda a soberania de Deus sobre a terra” (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 33).
- O estrangeiro: A Bíblia hebraica utiliza um vocabulário diferenciado para falar do
estrangeiro. E a Lei da Santidade busca integrar os estrangeiros cada vez mais na comunidade
dos filhos de Israel.

É a Lei de Santidade que, em relação ao estrangeiro, formula as regras mais


audazes: o ger não é mais “objeto” da lei, mas torna-se seu “sujeito”, que é
corresponsável com os habitantes do país pela sua santificação e pela sua
pureza. “Habitantes” e “estrangeiros” são assim unidos por uma
responsabilidade comum e por um vínculo descrito mediante o vocabulário
do amor (cf. Lv 19,33-34; PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 34).

- O culto e a ética: Os profetas são os primeiros que buscaram unir a religião, culto
prestado a Deus e o respeito do direito e da justiça, como por exemplo, Amós (cf. Am 5,21),
Isaías (cf. Is 1,10-20).

O Código Deuteronômico, de um lado, justapõe leis cultuais e prescrições de


ética social: as leis que concernem à unicidade do santuário dedicado a Deus
e à proibição da idolatria (cf. Dt 12,13) precedem as leis sociais de Dt 14,22-
15,18; por outro lado, une intimamente imperativos cultuais e imperativos
éticos. Assim, o dízimo trienal, imposto originariamente cultual, recebe nova
função pelo fato da centralização do culto em Jerusalém: a saber, prover ao
sustento das viúvas, dos órfãos, dos estrangeiros e dos levitas (cf. Dt 14,28-
29; 26,12-15; PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 35).

O povo de Israel buscava construir uma sociedade diferente, assim como nos nossos
dias devemos transformar a partir da Palavra de Deus as situações injustas que escravizam e
matam no nosso país e continente latino-americano milhares de pessoas.
Segundo Moser e Leers, “um dos méritos do esquema renovado, isto é, a teologia
moral renovada à luz do Vaticano II, no seu desejo de voltar às fontes, foi o de colocar
novamente em evidência a Aliança como categoria básica não só para a moral bíblica, mas
simplesmente para qualquer Teologia Moral” (MOSER e LEERS, 1988, p. 99).

3.6 Os Dez Mandamentos e a Moral Renovada

Os preceitos e os valores dos Dez Mandamentos nos conduzem ao Absoluto, à


reverência religiosa, ao tempo, à família, à vida, à estabilidade do casal, marido e esposa, à
reputação, à casa e às pessoas, que aí vivem e aos bens materiais.

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Em Êxodo 20,1-21 temos os Dez Mandamentos. Em cada mandamento podemos fazer
uma reflexão moral bem aprofundada, e traduzindo para a nossa realidade não perdemos
nada, aliás, ganhamos muito, porque são fonte de transformação.
Embora tenha muitos “nãos”, os mandamentos querem dizer “sins” à vida em todas
as suas fases desde a concepção até a morte natural e ao amor.

Três valores verticais (referindo-se às relações do ser humano com Deus):


1. Prestar culto a um único Absoluto.
2. Respeitar a presença e a missão de Deus no mundo (é o que o “nome”
simboliza).
3. Valorizar a dimensão sagrada do tempo.
Sete valores horizontais (referindo-se às relações entre as pessoas):
4. Honrar a família.
5. Promover o direito à vida.
6. Manter a união do casal marido e esposa.
7. Defender o direito de cada um de ver a própria liberdade e dignidade
respeitada por todos.
8. Preservar a reputação dos outros.
9. Respeitar as pessoas (que pertencem a uma casa, uma família, uma
empresa).
10. Deixar ao outro as suas propriedades materiais (PONTIFÍCIA COMISSÃO
BÍBLICA, 2009, 30).

Os Apologistas (dos séculos I, II, III) usaram o Decálogo na catequese e incentivavam


a vida cristã através dos mesmos como sendo a “Lei de Deus” e tiveram grandes resultados.
Santo Agostinho deu importância aos “Dez Mandamentos”, mas não de maneira
exagerada. Numa linha catequética, o santo dizia que a vida do cristão deveria girar em torno
da “caridade” para com Deus e com o próximo.
No século IX o Decálogo era usado na catequese com crianças e com adultos. Nesse
período, aumentou a população convertida. Era usado na prática do Sacramento da
Reconciliação, quando os confessores, para o exame de consciência das pessoas mais simples
e analfabetas, usavam o esquema do Decálogo.
Na sua Suma Teológica (I-II) Santo Tomás trata do Decálogo e dedica o número 100
diretamente aos Dez Mandamentos.
Martinho Lutero (em 1528), fala que para perceber o que devermos fazer ou deixar
de fazer é somente observar os Dez Mandamentos porque eles são a linha orientativa da
nossa vida, o espelho que nos guia (MOSER e LEERS, 1988).
O Catecismo Romano nasceu do espírito do Concílio de Trento e sua catequese moral
foi baseada no Decálogo. No ano de 1992 foi publicado o novo Catecismo da Igreja Católica
e a segunda sessão da terceira parte trata sobre os Dez Mandamentos (CICat., n.2052-2520).
O papa João Paulo II na sua Carta encíclica “O Esplendor da Verdade”, de 1993, também
trata sobre o Decálogo fazendo relação com a liberdade (VERITATIS SPLENDOR, n.11-13).
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Contudo, não teria sentido pensar nos Dez Mandamentos do Decálogo se não fosse
na linha de uma “resposta” amorosa a Deus, ou em um contexto de Aliança e de amor. E,
numa linha de atualização, os Mandamentos estão na base dos direitos e liberdades da
humanidade.

1. Direito a um relacionamento religioso com Deus.


2. Direito ao respeito das crenças e símbolos religiosos.
3. Direito à liberdade da prática religiosa e, em segundo lugar, ao repouso,
ao tempo livre, à qualidade de vida.
4. Direito das famílias a políticas justas e favoráveis, direito dos filhos ao
sustento por parte de seus progenitores, ao primeiro aprendizado da
socialização, direito dos progenitores anciãos ao respeito e ao sustento por
parte de seus filhos.
5. Direito à vida (a nascer), ao respeito da vida (a crescer e morrer de modo
natural), à educação.
6. Direito da pessoa à livre escolha do cônjuge, direito do casal ao respeito,
ao encorajamento e ao sustento por parte do Estado e da sociedade em
geral, direito do filho à estabilidade (emocional, afetiva, financeira) dos
progenitores.
7. Direito ao respeito das liberdades civis (integridade corporal, escolha da
vida e da carreira, liberdade de locomoção e de expressão).
8. Direito à reputação e, em segundo lugar, ao respeito da vida privada, a
uma informação não deformada.
9. Direito à segurança e à tranquilidade doméstica e profissional e, em
segundo lugar, direito à livre empresa.
10. Direito à propriedade privada (nele incluída a garantia de proteção civil
dos bens materiais) (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 31).

As Dez Palavras Sagradas devem ser vistas como conclusão do projeto da Aliança:
“Vocês são meu Povo e eu sou o vosso Deus” (Ex 19,5; Lev 26,12). A iniciativa amorosa, livre
e gratuita sempre é de Deus, mas que pede sempre uma resposta humana em cada situação
da vida em que o ser humano ou a pessoa se encontra.
No Antigo Testamento, já no livro do Gênesis, encontramos a narrativa da Aliança que
Deus faz com Noé (Gn 9,1-17) e, depois com Abraão (Gn 15; 17), mas é a Aliança narrada
no livro do Êxodo que marca a história do povo na sua busca da fidelidade e exclusividade na
relação com Deus (Ex 19-20).
Atualmente, toda reflexão referente à teologia moral bíblica tem sido feita na
perspectiva da Aliança que tem seu ápice em Jesus Cristo, “Nova e Eterna Aliança”.

3.7 A Nova Aliança em Jesus Cristo e suas implicações morais

Até o presente da exposição sobre moral e Sagrada Escritura foi refletida a questão
da Aliança no A.T., porém, o N.T. é muito mais central. O cristão como seguidor de Jesus

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Cristo e a dimensão do Reino de Deus, constitui a base fundamental da pessoa humana para
as normas de uma boa conduta e consequentemente para uma postura moral/ética.
A Ética cristã baseia-se na dinâmica do Evangelho, onde encontramos o Mistério Pascal
da vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Qualquer pessoa cristã ou não cristã,
assim como os moralistas, concorda com essa premissa. “Determinante e fundamental para
o relacionamento entre Deus e o povo de Israel e
todos os seres humanos é no Novo Testamento a
pessoa de Jesus, sua obra e seu destino. [...] Nos
principais escritos do Novo Testamento se
manifesta esse dom que Deus fez no seu Filho,
Jesus Cristo, e quais são as orientações para a
vida moral que daí derivam” (PONTIFÍCIA
COMISSÃO BÍBLICA, 2009, n.41).
Fonte: http://migre.me/jzFVT
Devemos entender que o evangelho foi escrito em um lugar e período bem diferentes
da nossa realidade latino-americana e vários aspectos ou categorias devem ser adaptadas
conforme a realidade social, econômica, política e cultural. Exemplo: as normas familiares de
Ef 5,22-23 ou as prescrições de 1 Cor 11,2-16.
A ética cristã fundamenta-se na fraternidade, na comunidade, na escatologia, no
seguimento a Jesus Cristo, no dom e na força do Espírito, na implantação do Reino de Deus.
Esses aspectos possuem pontos de vista diferentes e podem ser variados como justificados,
mas nenhum pode ser absoluto, e todos eles refletem conceitos fundamentais do A.T. ou N.T.
É uma moral que emana da história da salvação destacando principalmente os momentos de
kairós (graça).
A realidade do “Reino de Deus” foi a preocupação central em toda a vida de Jesus. A
instalação do Reino de Deus em meio à humanidade é dom e, ao mesmo tempo, tarefa de
transformação do mundo (cf. Mt 13,44-46).
Muitos ditos e ações de Jesus, como as curas e os exorcismos mostram o Reino de
Deus presente, certo, realizado no mundo temporal: “Se eu, no entanto, expulso os demônios
pelo Espírito de Deus, é porque já chegou até vós o reino de Deus” (Mt 12,28; Lc 11,20) ou
“O Reino de Deus não vem ostensivamente. Nem se poderá dizer: Está aqui ou está ali, pois
o Reino de Deus está no meio de vós” (Lc 17, 20-21); assim como outros ditos, outras ações
apontam para o Reino no futuro como, por exemplo, no pedido da oração do Senhor: “venha
a nós o vosso Reino” ou as bem-aventuranças que também apontam o Reino como uma
realidade futura.

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Nesse sentido se manifestam aspectos para uma vida moral cristã. O Reino de Deus
que se instala no seio da humanidade e que aos poucos vai orientando a história no caminho
da justiça, do bem e da fraternidade. Ele determina o presente da humanidade. Temos assim
a dimensão escatológica da vida e da ética cristã. Surge o “tempo intermediário”, tempo de
avaliação e da busca cada vez mais aprimorada da ética cristã. É a tensão do “já, mas, ainda
não”. Aquele desejo profundo de que o Reino de Deus aconteça. Aquilo que foi realizado e o
que está para acontecer (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009).
Jesus não só proclama a proximidade do reino de Deus (Mt 4,17) mas ensina
também a pedir “venha o teu reino” e “seja feita a tua vontade, como no
céu, assim também na terra” (Mt 6,10). Tal anseio de que Deus venha e que
a realidade humana seja formada pela vontade de Deus manifesta também
a base estritamente teológica da ética cristã, dimensão que ressoa em toda
a tradição bíblica: “Sede santos, porque eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo”
(Lv 19,2) (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 43).

São Paulo também nos fala de um modo muito claro, sobre a tensão entre o “já” e o
“ainda não” o indicativo e o imperativo. Para Paulo, o imperativo moral está enraizado e
baseado num indicativo: na doação de Deus em Cristo, sacramentalizada, sobretudo no
Batismo (cf. Rm 6,1-14). É precisamente neste misterioso acontecimento sacramental que
está radicado para São Paulo o imperativo moral. A formulação áurea desta realidade está
expressa em Gal 5,25: “Se vivemos pelo Espírito, caminhemos segundo o Espírito”.
Numa visão bíblica neotestamentária, o princípio da moral cristã é a transformação
que acontece a partir do Espírito. A lei cristã é a lei do Espírito, que deve iluminar, santificar
e fortalecer todo e cada cristão.
Esses aspectos gerais da moral bíblica da “história da salvação” e do “kairós” nos faz
analisar também os “sinais dos tempos”, uma vez que a moral cristã é também uma moral
dos sinais dos tempos. Os momentos históricos atuais, assim como os passados, devem ser
analisados através do Evangelho. Temos assim uma Igreja atualizada que busca ler,
interpretar e em atitude de vigilância propor uma moral não centrada em si mesma, mas
aberta a todos os sinais.

3.8 Critérios fundamentais da ética cristã bíblica

A ética cristã do A.T. tem suas bases no Decálogo, que por sua vez, retrata a Aliança
do povo de Israel feita com o seu Deus, único Senhor. Não podemos separar a moral cristã
da Aliança feita no Antigo Testamento. É uma moral quem sabe diferente daquela que
imaginamos ou que aprendemos. Ela se dá de forma dialogal, baseada na iniciativa amorosa

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de Deus e na resposta responsável e fiel do homem. Essa relação não se dá de forma
imperativa, mas em forma de doação, de entrega.

3.8.1 Primeiro critério fundamental: conformidade com a visão bíblica do ser


humano
A primeira coisa importante é a pessoa ter uma pré-disposição interior, cativada pelo
amor de Deus para cada vez mais conformar a sua vida com o Evangelho e consequentemente
com os “Dez mandamentos da Lei de Deus”.
Os exemplos a seguir nos ajudam a perceber como a Lei do Sinai pode contribuir para
uma reflexão adaptada a uma problemática moral contemporânea:
No que se refere à vida:

‘Não matarás’ (Ex 20,13; Dt 5,17). A partir da sua formulação negativa, a


proibição implica um não agir: não causar grave atentado à vida (aqui, no
contexto, a vida humana). Jesus ampliará e refinará o campo da abstenção:
não ferir o próprio irmão com a raiva ou palavras injuriosas (cf. Mt 5,21-22).
Pode-se, portanto, em certo sentido, matar o que há de mais precioso no ser
humano sem revólver, nem bombas, nem arsênico! A língua pode tornar-se
uma arma mortal (cf. Tg 3,8-10). E também o ódio (cf. 1 Jo 3,15)
(PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 96).

A respeito do casal:

‘Não cometerás adultério’ (Ex 20,14; Dt 5,18). O mandamento original visava


principalmente um objetivo social: assegurar a estabilidade do clã e da
família. Objetivo que não perdeu nada da sua atualidade e urgência. Também
nesse caso Jesus alarga o alcance da proibição, chegando a excluir todo
desejo, mesmo se ineficaz, de infidelidade conjugal, e a tornar quase
inoperante o regulamento mosaico referente ao divórcio (cf. Mt 5,27-32;
PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 97).

Dica de Aprofundamento

Para saber mais a respeito desse assunto, sugiro a leitura do documento


elaborado pela Pontifícia Comissão Bíblica: “Bíblia e Moral – Raízes bíblicas do
agir cristão”, n. 96 e 97.

3.8.2 Segundo critério fundamental: conformidade com o exemplo de Jesus


A moral cristã tem suas bases na história da salvação do povo de Israel e de todos os
povos da humanidade. O compromisso moral de um cristão está condicionado pelos fatos da
história salvífica. Está determinado, sobretudo, pelo acontecimento central: Jesus Cristo.
Logo, o coração da moral cristã encontra-se no seguimento a Jesus Cristo e no Reinado de
Deus; em buscar acima de tudo a vontade de Deus.
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Jesus é para os crentes o modelo por excelência do agir perfeito. Aquele que fez em
tudo a vontade do Pai até a morte e morte de cruz. Jesus não é somente o revelador da
justiça de Deus, mas também o cumpridor.
Contudo, o cristão vive o seu projeto voltado para as realidades últimas, à espera de
uma manifestação plena do Senhor de toda a história, da escatologia.

Desde o início, as bem-aventuranças situam a moralidade num horizonte


radical. À maneira de paradoxo, elas afirmam a dignidade fundamental do
ser humano sob os traços das pessoas mais desfavorecidas, que Deus
defende de modo preferencial: os pobres, os aflitos, os mansos, os famintos,
os perseguidos; esses são “filhos de Deus” (v. 9), herdeiros e cidadãos “do
reino dos céus” (vv. 3 e 10). Ora, Jesus representa, em toda a sua
radicalidade, o tipo do “pobre” (Mt 8,19; cf. 2 Cor 8,9; Fl 2,6-8), do “manso
e humilde” (Mt 11,29) e do “perseguido pela justiça” (PONTIFÍCIA
COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 101).

No evangelho de Mateus, Jesus amplia o discurso das bem-aventuranças (cf. Mt 5,


17-7,29):
Evidentemente, não se pode ler as bem-aventuranças fazendo abstração do
longo discurso que elas introduzem. Ele apresenta uma perspectiva de fundo
sobre a vida moral e constitui uma espécie de paralelo ao Decálogo, malgrado
a diferença de forma e de intenção. Na composição do primeiro evangelho
trata-se do primeiro, mais longo e programático discurso de Jesus, que nos
introduz imediatamente no coração do que significa ser um filho fiel de Deus
no mundo. A ideia de uma “justiça que supera” (verbo perisseuein pleion)
constitui de certa maneira o seu pano de fundo (Mt 5,20; cf. também 3,15;
5,6.10; 6,1.33; 23,23) Dessa justiça superior Jesus não só é o revelador mas
também o modelo (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009, 101).

3.8.3 Critérios específicos


Os critérios específicos vêm ajudar-nos entender os aspectos fundamentais da moral
cristã tratados neste capítulo. A sistematização desses critérios fundamenta-se sobre as
seguintes observações:
1. Convergência: a Bíblia manifesta um grande número de leis e orientações morais
que já faziam parte da vida dos povos vizinhos. Além disso, algumas questões morais
fundamentais formuladas pela tradição bíblica, foram igualmente formuladas por filósofos e
moralistas que não conheciam os conteúdos da revelação divina e muitas vezes foram
encontradas convergências nas respostas de ambos.
A “regra de ouro”: “Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam,
fazei-o vós a eles, porque isto é a Lei e os Profetas” (Mt 7,12), por exemplo, encontra-se,
quer na formulação positiva quer na negativa, em culturas muito diversificadas umas das
outras.

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2. Contraposição: a Bíblia toma posição de modo muito claro para combater os
contravalores presentes em certas normas ou costumes praticados por sociedades, grupos ou
indivíduos.
3. Progressão: a Bíblia atesta uma progressiva consciência sobre certos pontos da
moralidade, antes de tudo no próprio interior do Antigo Testamento, e após, no Novo
Testamento tomando como base o ensinamento e a vida de Jesus. Todo o sermão de Jesus
aponta para uma justiça maior, que leva a cumprimento a intenção e o espírito da Torá (cf.
Mt 5,17) mediante uma mais profunda interioridade, mediante a integridade de pensamento
e ação e mediante uma ação moral mais exigente.
4. Dimensão comunitária: a Bíblia acentua fortemente o alcance coletivo de toda a
moral. A dimensão comunitária nos faz pensar automaticamente no “amor fraterno” (agápê).
Jesus aperfeiçoa as perspectivas essencialmente coletivas da moral do Decálogo; mas
também os preceitos que concernem à pessoa e levam em definitivo a construir a
comunidade; o próprio sofrimento suportado “por causa dele” é fator de coesão comunitária
(Mt 5,11-12).
5. Finalidade: fundando a “esperança” no além sobre a expectativa do Reino (Antigo
Testamento) e sobre o mistério pascal (Novo Testamento), a Bíblia fornece ao ser humano
uma motivação insubstituível para tender para a perfeição moral. A “esperança” cristã é que
o Reino de Deus aconteça sempre mais em cada comunidade e em cada país. Jesus
acrescenta como motivação de base de todo o agir humano a esperança no além (Mt 5,3-10;
6,19-21).
6. Discernimento: enfim, a Bíblia enuncia princípios e oferece exemplos de
moralidade que não têm todos o mesmo valor: daqui a necessidade de uma abordagem
crítica. Ter “prudência” diante do discernimento de cada fato da vida fazendo um juízo moral
“objetivo” a partir de uma exegese bíblica e da
tradição da Igreja, e também subjetivo, guiado pelo
Espírito Santo e pela consciência. O cristão tem que
saber discernir. O discernimento é a faculdade
avaliativa do “kairós”.
Fonte: http://migre.me/jzwoC
A justificação divergente do sábado, em termos cultuais em um caso (Ex 20,8-11) e
em termos sócio-históricos no outro (Dt 5,12-15), abre a estrada a uma reflexão moral mais
rica e nuançada sobre o repouso dominical e sobre o tempo. De outro ponto de vista, a
invalidação do uso do divórcio (Mt 5,31-32), embora autorizado pela Torá, mostra bem a
distinção a ser feita entre as leis perenes e aquelas que estão ligadas a uma cultura, um
tempo, um espaço particular (PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA, 2009).
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Antes de continuar seu estudo, realize o Exercício 3 e a
Atividade 3.1.

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UNIDADE 4

LIBERDADE, LEI NATURAL E O MISTÉRIO DA


CONSCIÊNCIA HUMANA
OBJETIVO DA UNIDADE: Examinar nossa resposta a Deus por meio do uso
responsável da nossa liberdade, estudar a tradição da lei natural; analisar a formação e
o exercício da consciência.

4.1 A fonte da dignidade humana

A vocação de todo ser humano se realiza plenamente através do Espírito. A Salvação


é dom que vem de Deus e que provoca uma maior solidariedade humana.
Criada à imagem e semelhança de Deus, a pessoa humana fundamenta a sua
dignidade Nele. Depende de cada ser humano para a sua realização, usar cada momento para
o crescimento humano e espiritual. As pessoas se edificam e crescem à medida que seguem
sua vida deixando-se guiar pela graça de Deus. Não param no meio do caminho, quanto à
conversão, mas todos os momentos são compreendidos como ocasiões de conversão, de
transformação para uma vida nova.
Há uma consciência de pecado sempre mais aguçada, fina, capaz de perceber os
mínimos detalhes. Com a ajuda da graça crescem virtualmente (virtudes), buscando sempre
evitar o pecado. Colocam em prática a Parábola do Filho Pródigo. Sabem que o Pai
misericordioso está sempre pronto para
acolher o Filho Pródigo que quer retornar para
casa, fazendo o caminho inverso de
conversão. A atualidade está marcada pela
misericórdia, pelo perdão de Deus. Quanto
maior a experiência da graça, maior o amor
por Deus e pelos irmãos. Menos julgador e
mais aproximado. Chegando assim à perfeição
na caridade.
Fonte: http://migre.me/jzwSI
A vocação do ser humano está em descobrir-se imagem e semelhança de Deus. Novo
Adão, na mesma revelação do mistério do Pai e de seu amor, Cristo manifesta plenamente o
homem ao próprio homem e lhe revela a sua altíssima vocação.

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No livro do Gênese está escrito que: “Deus criou o homem à sua imagem, à imagem
de Deus ele os criou, homem e mulher ele os criou”. A pessoa é criada à imagem e semelhança
por um Deus que é Criador de todas as coisas, não somente do humano, mas de tudo.
Isto é evidenciado pela carta de São Paulo aos Colossenses quando lemos que em
Cristo, “imagem do Deus invisível, o Primogênito de toda criatura [...] foram criadas todas as
coisas, nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis” (Cl 1,15-16).
A imagem divina da vida está presente em todas as pessoas, por isso, ninguém tem
o direito de interferir na história pessoal de outrem, mesmo que seja das pessoas mais
próximas. A pessoa humana, dotada de alma espiritual e imortal, é a única criatura que “Deus
quis por si mesma” (GAUDIUM ET SPES, n.24). Desde a concepção é destinada, chamada
pela Trindade para a luz eterna, para a Salvação. Ela participa da luz divina, da luz do Criador.
Naturalmente ela tende para o bem, para
o amor através da força do Espírito de
Deus. Percebemos, nas culturas mais
diferentes, sinais do sagrado, do alto, de
Deus. E quem vai ao encontro do bem, vai
ao encontro da vida.

Fonte: http://migre.me/jhG7x
Podemos assim dizer que a única coisa que nos afasta de Deus é o “pecado”. Quanto
mais uma alma é de Deus, mais a consciência vai lhe mostrar o que vem de Deus e o que
não vem de Deus, buscando assim, o caminho da santidade (cf. CICat., n.1699-1708).

Quem crê em Cristo torna-se filho de Deus. Esta adoção filial o transforma,
propiciando-lhe seguir o exemplo de Cristo. Torna-se capaz de agir retamente
e de praticar o bem. Em união com o seu Salvador, o discípulo alcança a
perfeição da caridade, a santidade. Amadurecida na graça, a vida moral
desabrocha em vida eterna na glória do céu (CICat., n.1709).

4.2 A liberdade dos filhos de Deus

A liberdade é fator essencial na vida de cada pessoa. Dotado de vontade e inteligência,


o homem busca a liberdade como algo essencial, sinal da presença de Deus.
Cada pessoa portadora de dignidade humana percebe também a especificidade da
experiência moral. Cada um é original, protagonista da sua história, portanto autor de sua
caminhada de um modo individual e também comunitário. E uma das características mais
importantes para uma caminhada desse gênero é a “liberdade” do indivíduo, aliás, não pode
haver maturidade espiritual sem liberdade.
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Característica básica de toda experiência moral é a liberdade. Ainda que às
vezes, sobretudo em nível de conteúdos concretos, apareça influenciada e
marcada por condicionamentos e limites de vários tipos, permanece essencial
para a experiência moral. Não reconhecemos como totalmente nossa a
experiência de que não somos protagonistas, mas à qual somos obrigados.
Por ser expressão da liberdade, a experiência moral não é uma simples
experiência operacional. Envolve-nos como pessoas em nossa totalidade: é
uma construção de nós mesmos. Evidentemente tudo isso se passa dentro
de um conteúdo concreto: certamente estamos realizando alguma coisa, mas
em primeiro lugar e fundamentalmente estamos construindo a nós mesmos.
É sempre uma síntese entre intencionalidades e conteúdos, tanto mais feliz
quanto mais cada um dos dois polos mostra-se respeitador da especificidade
do outro. Desvirtua-se a experiência moral quando há uma opção unilateral
por um só dos dois (MAJORANO, 2002, p.24).

Três aspectos que transcendem a especificidade da experiência moral:


1. A experiência moral aparece antes de tudo assinalada pela percepção de um valor
próprio e particular, o do ser humano como indivíduo, como pessoa, em si mesmo e por si
mesmo naquilo que ele é.
2. Esse valor é algo que a própria pessoa vai construindo aos poucos ao longo da vida.
É objeto de uma escolha livre que tende dinamicamente a realizá-lo, por meio de um projeto
contínuo de vida, feito de pequenas e grandes decisões.
3. Purificada de todas as coisas externas, a experiência moral revela-se então como
correlação perene e inexaurível entre a realidade íntima do eu livre e o sentido que este
procura e pretende dar a toda a sua existência (MAJORANO, 2002).
A pessoa é chamada a tomar conta da sua vida. Ela é sujeito de sua vida, de suas
decisões, de suas ações, daquilo que ela é. E isso é muito importante para a dignidade
humana, ainda que saibamos o quanto o meio tem poder de influenciar as decisões das
pessoas. Muitas são as pessoas que se deixam influenciar pelos Meios de Comunicação Social
no Brasil e no mundo, por exemplo.
Deus confiou ao homem dotado de vontade e inteligência o cuidado do mundo, das
coisas e do seu próprio destino, para alcançar a perfeição. “Deus quis deixar o homem
entregue à sua própria decisão” (Eclo 15,14). Mas ao mesmo tempo, a verdadeira autonomia
moral por parte do ser humano está no acolhimento da lei do Senhor. A liberdade do homem
e os mandamentos de Deus andam juntos e se compenetram um com o outro. A verdadeira
liberdade encontra-se em Deus e não fora dele.
E o Salmo 1,1-2 diz: “feliz é a pessoa que põe a sua confiança na lei do Senhor”.

A dignidade do homem exige que ele proceda segundo a própria consciência


e por livre decisão, ou seja, movido e induzido pessoalmente, desde dentro
e não levado por cegos impulsos interiores ou por mera coação externa. O
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homem atinge essa dignidade quando, libertando-se da escravidão das
paixões, tende para o fim pela livre escolha do bem e procura a sério e com
diligente iniciativa os meios convenientes (VERITATIS SPLENDOR, n.42).

São significativas igualmente as palavras da Gaudium et Spes:

O homem, porém, não pode voltar-se para o bem a não ser livremente. Os
nossos contemporâneos exaltam e defendem com ardor esta liberdade. E de
fato com razão. Contudo, eles a fomentam muitas vezes de maneira viciada,
como uma licença de fazer tudo o que agrada, mesmo o mal. A verdadeira
liberdade, porém, é um sinal eminente da imagem de Deus no homem
(GAUDIUM ET SPES, n.17).

4.3 A lei natural

Adentramos num outro aspecto da nossa reflexão que é a lei natural.


Na carta de São Paulo aos Romanos temos dois textos bíblicos clássicos que tratam
da lei natural, uma na forma negativa e a outra na forma positiva:

Quando então os gentios, não tendo lei, fazem naturalmente o que é


prescrito pela Lei, eles, não tendo lei, para si mesmos são Lei, eles mostram
a obra da lei gravada em seus corações, dando disto testemunho sua
consciência e seus pensamentos que alternadamente se acusam ou
defendem (Rm 2,14-15).

E como não julgaram bom ter o conhecimento de Deus, Deus os entregou à


sua mente incapaz de julgar, para fazer o que não convém: repletos de toda
sorte de injustiça, perversidade, avidez e malícia, cheios de inveja,
assassínios, rixas, fraudes e malvadezas; detratores, caluniadores, inimigos
de Deus, insolentes, arrogantes, fanfarrões, engenhosos no mal. Rebeldes
para com os pais, insensatos, desleais, sem coração nem piedade. Apesar de
conhecerem a sentença de Deus que declara dignos de morte os que
praticam semelhantes ações, eles não só as fazem, mas ainda aprovam os
que as praticam (Rm 1,28-32).

Vemos então que São Paulo aceita que se pode chegar à vontade de Deus
independente do dado revelado e que existe uma capacidade inata, que não depende dos
conhecimentos advindos da revelação.
A lei natural é a experiência e a reflexão moral da humanidade sobre si mesma, sobre
a vocação e o significado da experiência humana. Por isso, pode-se dizer que a lei natural se
expressa num ethos cultural mutável, mas ao mesmo tempo enquanto participação na lei
eterna da vontade de Deus é imutável.
O Concílio Ecumênico Vaticano II, ao tratar deste assunto, exorta:

[...] a suprema norma da vida humana é a própria lei divina, objetiva e


universal, com a qual Deus, no desígnio de sua sabedoria e amor, ordena,
dirige e governa o universo inteiro e os caminhos da comunidade humana.

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Desta sua lei, Deus torna o homem participante, de modo que este, segundo
a suave disposição da divina providência, possa conhecer cada vez mais a
verdade imutável (DIGNITATIS HUMANAE, n.3).

Deste modo, aproveitando os ensinamentos de São João Paulo II, queremos dizer
que: “perante tal interpretação ocorre considerar atentamente a reta relação que existe entre
a liberdade e a natureza humana (VERITATIS SPLENDOR, n.48).
Certamente, a lei natural é de direito acessível à razão humana, comum a todos,
portanto não é exclusividade da Igreja ou de alguns; mas o Magistério da Igreja através
também da Bíblia interpreta e assume a lei natural.
O Catecismo da Igreja Católica (1992) e a Encíclica Veritatis Splendor (1993) nos
mostram dentro da ética cristã um lugar central quanto à lei natural e sobrenatural.

Em relação às outras criaturas – escreve São Tomás -, a criatura racional


está sujeita de um modo mais excelente à divina providência, enquanto ela
também se torna participante da providência ao cuidar de si própria e dos
outros. Por isso, ela participa da razão eterna, graças à qual tem uma
inclinação natural para o ato e o fim devidos; esta participação da lei eterna
na criatura racional é chamada lei natural (VERITATIS SPLENDOR, 1993,
n.43).

Hoje, a Igreja Católica invoca a lei natural em quatro contextos principais:


- Em primeiro lugar, em face da propagação de uma cultura que “limita” a
racionalidade às ciências positivas e abandona a vida moral ao relativismo, ela insiste sobre
a capacidade natural que os homens têm de compreender por sua razão “a mensagem ética
contida no ser” e conhecer em suas grandes linhas as normas fundamentais de um agir justo
conforme a sua natureza e a sua dignidade. A “lei natural” responde, assim, à exigência de
fundamentar na razão os direitos do homem e torna possível um diálogo intercultural e inter-
religioso, capaz de favorecer a paz universal e de evitar o “choque de civilizações”.
- Em segundo lugar, diante do “individualismo relativista”, que considera cada
indivíduo fonte de seus próprios valores e a sociedade, resultado de puro contrato feito entre
indivíduos, que escolhem constituir por eles mesmos todas as normas, ela recorda o caráter
não convencional, mas natural e objetivo, das normas fundamentais que regem a vida social
e política. Em particular, a forma democrática de governo está intrinsecamente ligada aos
valores éticos estáveis, que têm sua fonte nas exigências da lei natural e que não dependem,
portanto, das flutuações do consenso de uma maioria aritmética.
- Em terceiro lugar, ante um “laicismo agressivo”, que quer excluir as pessoas de fé
do debate público, a Igreja mostra que as intervenções dos cristãos na vida pública, sobre
temas que tocam a lei natural (defesa dos direitos dos oprimidos, justiça nas relações
internacionais, defesa da vida e da família, liberdade religiosa e liberdade de educação, etc.),
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não são, de per si, de natureza confessional, mas revelam o cuidado que cada cidadão deve
ter pelo bem comum da sociedade.
- Em quarto lugar, face às “ameaças de abuso de poder”, e mesmo do totalitarismo,
que encobre o positivismo jurídico e que algumas ideologias veiculam, a Igreja recorda que
as leis civis não obrigam à consciência quando estão em contradição com a lei natural, e ela
propõe o reconhecimento do direito à objeção de consciência, como também a desobediência
em nome da obediência a uma lei maior. A referência à lei natural, longe de engendrar o
conformismo, garante a liberdade pessoal e defende os marginalizados e aqueles que são
oprimidos pelas estruturas sociais esquecidas do bem comum. (COMISSÃO TEOLÓGICA
INTERNACIONAL, 2008, 35).

4.4 A consciência moral

O grande desafio para a consciência moral, hoje, é perfazer um itinerário de fé,


devidamente no tempo e no espaço. Ao mesmo tempo, é desafiador assumir as
responsabilidades que lhes são próprias, tendo em conta que o ser humano constitui-se
concomitantemente num ser pessoal e num ser social, com todas as instâncias intermediárias
e ou complementares aí reunidas. O objetivo é colocar-se “rumo à maturidade em Cristo”,
capaz, de “um olhar evangélico, crítico, cheio de misericórdia e esperança”, inclusive face ao
nosso “povo sofrido, que clama por libertação” (Estudos da CNBB, doc. 80, 2000).
Além disso, tocar o tema da consciência é optar para um “mais” na vida e em Deus, o
que impele o ser humano ao crescimento, às experiências profundas e comunitárias, abrindo-
o à graça de Deus que opera em sua vida.
No entanto, isto não livra o ser humano da presença de condicionamentos em vida,
bem como de muitas tentativas de manipulação. O olhar ético é especialmente crítico quando
se trata da manipulação, pois esta normalmente reduz o ser humano a objeto de sua ação,
interfere na sua capacidade de discernir e diminui a sua liberdade e consequente ação
responsável. Mesmo assim, a consciência é uma instância em constante crescimento, capaz
de uma evolução contínua. Tendo sido criado à imagem e semelhança de Deus, o ser humano
sente-se tocado em sua consciência pelo próprio Criador, que o chama a fazer o bem e evitar
o mal, dado que lhe é fundamental para o crescimento moral.

4.4.1 Condicionamentos e manipulações


A mediação da consciência é o elemento-pivô. Ela é um referencial indispensável e de
destaque nas pessoas. Quando falamos de consciência, estamos apontando tanto para a

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inteligência quanto para o discernimento e a decisão. Ela está muito ligada à liberdade e à
vontade; tende a levar as pessoas a ser sujeitos e não objetos. Ela se fundamenta na razão
e no bom julgamento.
A palavra consciência costuma ter sentidos muito diversos. Em grandes linhas, ela
pode ter um sentido mais psicológico e um sentido estritamente moral. Na prática, nem
sempre dá para distinguir, pois a pessoa é um todo no qual as diferentes dimensões
costumam agir conjuntamente ou integralmente.
No entanto, em qualquer um destes sentidos, a consciência não escapa de todo um
conjunto de condicionamentos, bem como da tentativa constante de manipulação. Mesmo
assim, notamos que ela tende a ser uma instância aberta e dinâmica, capaz de colocar o ser
humano em ligação com a própria transcendência, ou seja, Deus. (AGOSTINI, 2004).
- Os condicionamentos: Na verdade, atualmente muitas são as situações, os fatores
e as realidades que incidem na vida das pessoas, condicionando-as a tomarem certas
decisões, mesmo que elas não queiram. Essas influências em algumas pessoas são muito
fortes e profundas nas suas vidas, por isso é muito importante, para a nossa reflexão,
enumerar as principais e assim aprofundarmos o nosso conhecimento.
Vejamos alguns deles, descritos por Agostini:

Condicionamentos genéticos: Nós seres humanos nascemos marcados


geneticamente por toda a vida. O código genético, herdado dos pais, nos
diferencia das outras pessoas; nele estão inscritas características
hereditárias, às vezes até doenças que passam dos pais para os filhos ou
tendências inatas (há quem fale que podemos nascer com certas pré-
disposições, por exemplo, ao alcoolismo e mesmo algum tipo de
homossexualismo, entre outras).
Condicionamentos biológicos: Nós dizemos popularmente que “ninguém
tem sangue de barata”. Reconhecemos que giram por todo o nosso corpo
agentes químicos e físicos (hormônios, por exemplo) que suscitam mudanças
diversas na atividade neurofisiológica. Há também numerosas drogas
psicoativas que, ingeridas, podem interferir no funcionamento de nosso
próprio cérebro, bem como em todo o nosso psiquismo e atividade fisiológica;
este é o caso quando tomamos alguma substância para dormir, para
combater a depressão, etc.
Condicionamentos familiares e educacionais: Sabemos como influi
muito em nossa vida o fato de termos nascido numa determinada família,
aprendido esta ou aquela língua materna, assimilando uma cultura ou
pertencido a um povo específico. Nós tomamos consciência de nós, das
pessoas e do mundo mediados, condicionados por estes fatores, dos quais
não podemos fugir. A educação recebida depende desse quadro, marcando
a pessoa para sempre.
Condicionamentos ambientais: As condições ambientais, através do
clima, topografia e da própria alimentação, têm ressonâncias diretas em
nossa vida. Isto faz presente como nos organizamos em sociedade, como
construímos nossas casas, como planejamos o nosso trabalho, como
cuidamos da saúde, como lidamos com a natureza etc. No tocante à
alimentação, sabemos como a desnutrição, a má nutrição ou a fome estão
na origem de distúrbios que atingem as pessoas, muitas vezes não podendo
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sequer desdobrar as potencialidades que trazem geneticamente. Sabemos
também como é importante uma alimentação balanceada.
Condicionamentos sociopolíticos e econômicos: A edificação da
sociedade e a nossa realização como cidadãos dependem muito do lugar que
ocupamos na sociedade, da possibilidade real que temos de exercer a
cidadania e de usufruir dos bens econômicos. Sabemos como a atual
economia de mercado condiciona as pessoas; o mesmo vale com relação às
disparidades na distribuição das riquezas, como processo de modernização
com as mudanças no mundo do trabalho (AGOSTINI, 2004, 130-131).

- As manipulações: As manipulações são tão prejudiciais para as pessoas quanto os


condicionamentos, talvez até mais. Elas acontecem muito em nossa sociedade, e são
pensadas, planejadas e executadas. Vivemos em uma sociedade que, como diz o ditado:
“Quem pode mais chora menos”, em que o importante é tirar vantagem. As pessoas são
usadas como objetos, isto é, enquanto são úteis, são boas, e quando não servem mais, são
descartadas, “jogadas fora”.
Vejamos algumas formas muito comuns de manipulação:

Ação sobre a natureza: É bom reconhecer, inicialmente, que, através da


manipulação da natureza, conseguimos tirar muitos benefícios;
transformamos matérias-primas em produtos diversos, necessários ao ser
humano. Porém, a nossa capacidade de ação sobre a natureza é tão grande,
em nossos dias, que acabamos interferindo em seu próprio equilíbrio. O meio
ambiente já sofre alterações visíveis, fruto da nossa ação depredadora. Isto
está diminuindo a qualidade de vida em nosso planeta.
Redução do ser humano: A manipulação tende a dispor das pessoas como
objetos, reduzindo-as a esta ou aquela dimensão, segundo os interesses do
manipulador. Este processo atinge a consciência, interfere nos julgamentos
da razão e nos próprios juízos morais. Alguns programas de televisão,
publicações diversas e sites da internet dão mostras claras desse processo
manipulador.
Ocultação da verdade: A manipulação também ocorre quando se esconde
uma parte da verdade ou quando se cala diante de um fato ou de uma
realidade, dando-a por inexistente. Pode-se chegar a uma situação que
despersonaliza e degrada as pessoas, seja porque falta com a verdade, seja
porque cria rótulos ou denigre suas vidas. Isto pode se realizar com técnicas
de contato direto (pessoa-pessoa, nos pequenos grupos, etc.) ou de contato
com as massas (através dos meios de comunicação, por exemplo).
Ausência de liberdade: Aqui está como que o indicador da profundidade
da manipulação que costuma ter graus diferenciados da ausência de
liberdade. Seu alcance aumenta quando alia-se à tendência de encarar o ser
humano sob uma única dimensão apenas.
Cegueira ideológica: Na raiz de toda manipulação se encontram diferentes
graus de cegueira ideológica. É bom lembrar que a ideologia em si pode
desempenhar funções positivas quando, por exemplo, suscita a consciência
de pertença a um grupo, a uma classe e a uma nação, quando exerce a
função de integração e unificação, criando condições de uma ação comum
dentro de um determinado grupo ou sociedade. Porém, quando falamos em
cegueira ideológica, queremos apontar para o estágio em que a ideologia
simplifica o real para ordená-lo e controlá-lo a partir de um ângulo só; torna-
se inflexível e impermeável, tendendo a impor uma visão de maneira
absoluta, tendendo a fazer manipulação de toda sorte e aparelhando,

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controlando os mais diferentes campos da sociedade (educação, meios de
comunicação, economia, política, etc.) (AGOSTINI, 2004, 132-133).

4.4.2 A força das estruturas sociais


Uma atenção particular e um olhar criterioso devem ser dirigidos às estruturas sociais.
É sábio dizer que ninguém consegue viver sem estruturas sociais; esta constatação levou à
afirmação de que “a sociedade é sociologicamente definida”. Tudo está, na verdade,
previamente ordenada em padrões que independem de nós. Portanto, na sociedade, há
coordenadas objetivas que nos são dadas de antemão, o que na prática implica reconhecer
que nossa vida está cheia de objetos dotados de prévia significação.
É bom deixar claro, no entanto, que esta significação foi inicialmente tecida por nós,
em algum momento da história; portanto, por nós instituída. Não apareceu por acaso. Em
algum momento, deu-se a elaboração; este processo inicia-se normalmente nas relações “face
a face” (diretas), até chegar a “formatar” toda uma ordem cultural e social, para além do face
a face, que se torna independente de nós, mas interfere em nossa vida, queira ou não.
Vivemos permanentemente nesta correlação com o ambiente, característica própria do nosso
ser social.
Nós somos produtores de ambientes sociais. Introduzimos neles formações de ordem
sociocultural, psicológico-afetiva, com abertura ao religioso-transcendente. Isto dá
estabilidade, ordem e direção à existência humana e permite dirigir impulsos, canalizar
energias e a própria agressividade, conferir significados diversos a tudo o que passa a fazer
parte de nossa vida. Há quem fale deste processo como uma necessidade de nossa
“desprovida” natureza instintiva biológica, portanto, uma necessidade própria do ser humano.
Pensemos os hábitos de nosso dia a dia, nos padrões de vida que assumimos; eles seriam
parte desse “mundo” que foi sendo pouco a pouco construído, com suas “tipificações” próprias
(esquemas de apreensão). Isto não deixa de exercer um certo controle sobre a conduta
humana, institucionalizando o que faz parte do mundo social.
Esta institucionalização acaba por existir acima ou além do indivíduo. É como se as
institucionalizações tomassem aos poucos vida própria, transformando-se em realidades
objetivas, com uma dinâmica particular, independente das pessoas. Não adianta desejar que
não existam. Alterá-las já não é mais tão fácil. Fugir delas é impossível. Seus mecanismos de
controle atuam sobre os indivíduos e as comunidades.
Esta institucionalização chega a estipular o que é legítimo ou ilegítimo, válido ou
inválido. Ao mesmo tempo, costuma prescrever sansões e medidas coercitivas para quem não
se moldar às condutas previstas. A institucionalização tende, neste nível, a “programar” a vida
das pessoas e os canais pelos quais a própria consciência capta o “mundo”. Faz, para isso,

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uso da linguagem e do conhecimento. Pode chegar a ter o poder de “configurar” o indivíduo,
definindo e controlando o seu mundo social.
Permanece, no entanto, uma relação dialética, na qual o ser humano e seu mundo
social atuam em mão dupla, ou seja, atuam reciprocamente um sobre o outro. Mesmo assim,
damo-nos conta que a intenção entre ambos não anula a autonomia e o poder do mundo
social. Este vai além do plano individual e atua poderosamente sobre os indivíduos. Estes não
fazem exatamente o que querem; fazem suas escolhas reais dentro dos limites das condições
sociais.
Imagine, agora, tudo isso dentro do atual processo de globalização, ou seja, na
formação deste “mundo-como-um-todo”. Falamos de transnacionalização, organizações
multilaterais, práticas neoliberais, sistema global... Amplia-se a percepção dos fenômenos e
captamos que muito do que faz parte do sistema global não foi sequer gestado em processos
intrassociais; “caiu de paraquedas” sobre nossas cabeças, diríamos nós. Percebemos que o
processo de transnacionalização, hoje em curso, nem sequer toma em conta o Estado-nação;
quer, sim, ele não “se meta” na economia, por exemplo, e que seja o mercado que decida
tudo. Além disso, diminui a importância das forças sociais internas, já que cada vez mais
tudo é comandado a partir “de fora”. Basta ver como a sociedade civil organizada
(associações, sindicatos, partidos, etc.) vai perdendo terreno.
As estruturas mundiais de poder tendem a ser criadas dentro do esquema acima. Nada
mais é independente; todo este inter-relacionado, tanto no plano econômico quanto no plano
político, legal, militar e cultural. Cresce a interdependência, reduzindo a capacidade
“regulatória” do Estado moderno. Os sistemas políticos nacionais já não conseguem tomar as
decisões de maneira autônoma. Criam-se cadeias de decisões e de atuações políticas inter-
relacionadas, influindo nos sistemas políticos nacionais. Redesenham-se as identidades
culturais e políticas, diminuindo a representatividade do Estado-nação.
Se é forte a presença das multinacionais na indústria hoje e na economia em geral,
cada vez mais forte é seu controle na mídia, não só como donos dos meios de comunicação
e informação, mas como detentores do poder de selecionar e interpretar os fatos, formando
e conformando as mentes e os corações com sofisticada tecnologia de persuasão. Basta um
pouco de atenção para perceber como a publicidade incita ao consumo desenfreado e até
compulsivo, numa “indústria cultural”, gerada mais pela imagem do que pela palavra. A
cultura da imagem transforma a realidade social, econômica, política e cultural, em todas as
esferas, em realidade virtual. As técnicas do marketing influem fortemente sobre a capacidade
de o cidadão decidir. As tecnologias eletrônicas, informáticas e cibernéticas redimensionam o
nosso sentido de realidade e as nações de espaço e tempo; por exemplo, em segundos, nem
isso, nos comunicamos via internet do outro lado do planeta, etc. (AGOSTINI, 2004).
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4.4.3 Formação para o discernimento ou indispensável discernimento moral
A consciência reflete os sentidos afetivos, mais os especificamente morais. Ela
acompanha a pessoa no seu processo humano formativo, na descoberta das potencialidades
e na abertura para o transcendente, ainda que, como já dissemos, seja também ela marcada
por condicionamentos, por manipulações e pela força das grandes estruturas sociais.
Na intimidade da consciência o homem descobre uma lei. Ele não a dá a si
mesmo. Mas a ela deve obedecer. Chamando-o sempre a amar e fazer o bem
e a evitar o mal, no momento oportuno a voz dessa lei soa aos ouvidos do
coração. [...] É uma lei intrínseca por Deus no coração do homem... A
consciência é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem onde ele está
sozinho com Deus e onde ressoa uma voz (GAUDIUM ET SPES, n.16).

Toda uma gama de interação de elementos vai estabelecendo progressivamente as


bases que permitem o surgimento de uma consciência capaz de fazer escolhas, ou seja, capaz
de emitir juízos morais. Este discernimento requer um despertar progressivo até atingir o
estágio crítico e autônomo, responsável e prudente. Para isso, não se pode dispensar uma
educação da consciência. A consciência moral deve ser educada e o juízo moral esclarecido.
A educação da consciência é uma tarefa de toda a vida e uma consciência bem formada é
reta e verídica (cf. CICat., n.1783-1784).

Uma educação prudente ensina a virtude, preserva ou cura do medo, do


egoísmo e do orgulho, dos sentimentos de culpabilidade e dos movimentos
de complacência, nascidos da fraqueza e das faltas humanas. A educação da
consciência garante a liberdade e gera a paz no coração (CICat., n.1802).

Quando bem formada, a consciência emite um juízo prudente. Isto significa que ela
vai dotando a pessoa da capacidade de escolher o bem e de identificar a verdade; é, por isso,
reta e verídica. Assume o que é bom, justo e belo. Além disso, identifica os caminhos (meios)
correspondentes e as ações concretas que se apresentam como justas e apropriadas.
Estabelece com clareza a responsabilidade face aos atos praticados, às atitudes assumidas e
às opções escolhidas. A liberdade lhe é fundamental; esta é a condição das oportunas e/ou
necessárias decisões ou juízos pessoais morais.

A consciência me solicita ser honesto e me indica em que consiste a


honestidade. Mais do que seguir o que é necessário fazer, ela me diz o que
eu devo querer: diferentemente do valor técnico que se refere a um meio e
por isso relativo, o valor moral é absoluto, pois é o valor do ato enquanto
digno de ser desejado ou, ao contrário, de ser evitado. Uma calúnia pode ser
útil, satisfazendo meu desejo de vingança; no entanto, não a devo querer,
porque é um ato maldoso (MALDANIER, 1982, p.20).

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A partir da consciência, podemos afirmar que o ser humano é sujeito de si e, por isso,
distingue-se dos outros animais. Toma nas mãos a própria vida, estabelece as próprias
decisões e assume as próprias ações (MAJORANO, 1994).
Esta capacidade reflete no mundo a imagem e semelhança de Deus. Entendemos que
o divino toca o humano naquilo que ele tem de mais profundo, a consciência: aí está a sua
profundidade, a sua consistência e o seu dinamismo.
Incorpora-se, como elemento fundante, o esclarecimento da fé, que desvela a
realidade divino-humana, na qual a consciência está envolta, atravessando a pessoa por
inteiro, solicitando-a em todas as suas dimensões. Ela remete para o amor a Deus e ao
próximo como chamado fundamental para a pessoa de fé, no seguimento de Jesus Cristo, e
engaja os cristãos a se unirem uns aos outros na busca da verdade e na solução justa de
inúmeros problemas morais, seja em nível pessoal seja em nível social (GAUDIUM ET SPES,
n.16).
O Catecismo da Igreja Católica reconhece que, às vezes, há situações que tornam o
juízo moral menos seguro e a decisão difícil; aponta, entretanto, que se deve sempre procurar
o que é justo e bom e discernir a vontade de Deus, interpretando com esforço os dados da
experiência e os sinais dos tempos, graças à virtude da prudência, o testemunho e os
conselhos das pessoas e à ajuda do Espírito Santo por meio de seus dons (cf. CICat., n.1785).

4.4.4 Possíveis erros, desvios, ilusões, deslizes e bloqueios


“A dignidade da pessoa humana implica e exige a retidão da consciência moral”
(CICat., n.1780). Neste caso, a consciência chega aos valores e reenvia sempre ao amor a
ser vivido concretamente; busca o bem; orienta-se pela verdade; respeita a dignidade da
pessoa humana; “formula seus julgamentos seguindo a razão de acordo com o bem
verdadeiro, querido pela sabedoria do Criador” (CICat., n.1798). A consciência reta leva a
pessoa a agir com autenticidade; é verídica, pois corresponde com a verdade e o bem; sabe
escolher, decide-se pelos caminhos que são corretos.
No entanto, diante de uma escolha moral, “pode acontecer que a consciência moral
padeça de ignorância e faça juízos errôneos sobre atos a praticar ou atos já praticados”
(CICat., n.1790). A consciência errônea erra por ignorância invencível, sem por isso perder a
própria dignidade, quando a pessoa “se descuida de procurar a verdade e o bem” e ainda
quando “a consciência se vai progressivamente cegando, com o hábito do pecado” (GAUDIUM
ET SPES, n.16).

A ignorância a respeito de Cristo e do seu Evangelho, os maus exemplos de


outros, o servilismo às paixões, a pretensão de uma autonomia mal entendida

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da consciência, a recusa da autoridade da Igreja e de seus ensinamentos, a
falta de conversão ou de caridade podem estar na origem dos desvios do
julgamento na conduta moral (CICat., 1792).

Há casos em que a pessoa não é culpada do mal cometido. O Catecismo da Igreja


Católica tem o cuidado de esclarecer o seguinte: “Se a ignorância for invencível ou o
julgamento errôneo não for da responsabilidade do sujeito moral, o mal cometido pela pessoa
não lhe poderá ser imputado. Mas nem por isso deixa de ser um mal, uma privação, uma
desordem. É preciso trabalhar, pois, para corrigir a consciência moral de seus erros” (CICat.,
n.1793).
Devemos igualmente estar bem atentos quando a consciência chega ao estágio
doentio, originando desvios diversos (AGOSTINI, 2003, p. 27-28). Estes podem ser leves,
médios e profundos. Entre os desvios leves, podemos enumerar o perfeccionismo, o
minimalismo, o juridicismo e a confusão da consciência. Entre os desvios médios, por sua vez,
encontramos a consciência obsessiva, escrupulosa e subjetivista. No caso dos desvios mais
profundos, identificamos níveis nitidamente doentios, cuja captação da realidade é alterada e
fica comprometida a capacidade de emitir juízos prudentes e retos. Entre estes últimos casos,
chega-se, às vezes, à supressão da própria consciência e à perda do autocontrole.
Outros tipos de desvios podem ser encontrados, sobretudo com o avanço da vida
moderna e as consequentes mudanças na vida das pessoas, das famílias, das comunidades,
da sociedade e do modo como lidamos com a natureza e ante o próprio Deus. Queremos aqui
nos referir ao desvio específico daquelas pessoas que ficam se lamentando do presente, não
vendo nada de bom nele, achando que nada mais é como antes e que hoje está tudo perdido.
Outro tipo de desvio é próprio daqueles que afirmam que hoje sim – como pessoas modernas
– é que chegamos à idade adulta, racional, autônoma e livre, distante daquele obscurantismo
do passado.
São dois mitos que apontam para um desequilíbrio da própria consciência. Caem na
pretensão de possuir uma consciência esclarecida. Na verdade, estamos diante de duas
ilusões da consciência, sobretudo porque ambas se creem plenamente morais, plenamente
humanas, plenamente na (sua) verdade. Importa estar abertos a um processo de
humanização contínuo, como contínuo é o despertar da consciência e sua educação; aliás,
“uma tarefa de toda a vida” (CICat., n.1784).
A consciência pode ainda deslizar em duas armadilhas, que merecem nossa atenção.
São elas o fideísmo e o racionalismo. O fideísmo, buscando combater o racionalismo, o
agnosticismo e o liberalismo, cai no menosprezo da razão em matéria religiosa e no excesso
de fundar a fé sobre si mesma. Alia-se ao tradicionalismo, atingindo a moral ao afirmar que
“tudo, na decisão, depende de tal forma de Deus e só de Deus que a pessoa pode e deve

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renunciar a qualquer mobilização de si, para se jogar passiva e inteiramente ao poder da
graça”. O Magistério da Igreja Católica, repetidas vezes, tem denunciado os desvios dos
fideístas e dos tradicionalistas; igualmente, tem apontado os exageros dos racionalistas, que,
por sua vez, caem numa mentalidade positivista sem “qualquer alusão à visão metafísica e
moral” (FIDES ET RATIO, n.46), gerando o niilismo e propagando uma razão instrumental e
utilitarista.
O racionalismo nos faz lembrar o pelagianismo, que se traduz na afirmação e na
pretensão que o ser humano é capaz por si só de controlar o curso das coisas e dos
acontecimentos, não dependendo para isso de Deus; afirma-se, assim, uma autonomia
fechada e exclusiva, prescindindo da graça e negando o seu papel preponderante na
economia da salvação.
Como última indicação, sem querer esgotar esse assunto, aponta para possíveis
bloqueios da consciência, que paralisam seu despertar e crescimentos progressivos
(AGOSTINI, 1990, p. 205-207). Sabemos que a tendência normal é a consciência ir
amadurecendo, partindo do estágio ingênuo e primário até atingir o estágio maduro,
autônomo, crítico, capaz de discernimento e de juízos prudentes. Este não é o caso, por
exemplo, quando ela fica presa a uma visão mágica e/ou fatalista, ou quando assume uma
vertente fanatizada e/ou manipulada.
Estas situações se transformam em verdadeiros bloqueios da consciência, que
reduzem sua capacidade de emitir juízos críticos e prudentes, comprometendo o lastro
indispensável para o exercício da responsabilidade. Uma consciência mágica e/ou fatalista
costuma prender-se a uma visão ingênua e primária da realidade, captando apenas fatos
isolados, aos quais se submete a consciência, porque lhes atribui um poder superior que viria
do exterior e que a dominaria inexoravelmente; reage com resignação; cruza os braços;
sente-se vencida; “deixa como está para ver como é que fica”.
Uma consciência fanatizada e ou manipulada, mesmo num estagio pós-primário ou
até pré-crítico, sente-se inibida na sua capacidade criadora, pois está entregue a soluções
paliativas quer de puro assistencialismo tópico (de casos isolados), quer de radicalismo servil.
São bloqueios da consciência, capaz de levá-la a regredir, a deslizar em visões míopes,
distorcidas, sectárias, fundamentalistas, até enquadrá-las em verdadeiras cegueiras
ideológicas. Entendemos, então, as palavras de Paulo Freire, que comenta as distorções da
consciência nestes casos, com as seguintes palavras:

A possibilidade de diálogo se suprime ou diminui intensamente e o homem


fica vencido e dominado sem sabê-lo, ainda que se possa crer livre. Seu gosto
agora é o das fórmulas gerais, das prescrições, que ele segue como se fossem
opções suas. É um conduzido. Não se conduz a si mesmo. Perde a direção

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do amor. Prejudica seu poder criador. É objeto e não sujeito (FREIRE, 1989,
p. 63).

4.4.5 Balizas para uma consciência reta e verídica, crítica e prudente


A consciência necessita de apoio para o discernimento moral, a fim de que possa emitir
juízos retos e verídicos, críticos e prudentes. Esta é como que sua missão própria (cf. CICat.,
n.1777-1782). Por isso, enumero vários pontos, verdadeiras mediações, para que se possa,
inclusive, superar os erros, os desvios, as ilusões, os deslizes e os bloqueios, acima elencados,
nos quais a consciência pode deslizar, comprometendo o exercício da responsabilidade. À
medida que vai se dando o processo de crescimento e de formação da consciência, tarefa
que dura a vida inteira, necessitamos de recursos ou de mediações, que funcionem como
balizas. Assim, a consciência pode constituir-se num “lugar hermenêutico privilegiado em que
se revela o projeto de Deus com o homem, sacrário mais íntimo do indivíduo, seu centro mais
oculto, do qual brotam todas as decisões morais” (DEMMER, 1999, p.30).
Enquanto comunidade eclesial, oferecemos as seguintes mediações para auxiliar a
consciência moral a ser este lugar hermenêutico privilegiado:
- Saber situar-se no contexto histórico: Discerne bem a consciência que sabe
situar-se no tempo e no espaço em que vive, levando a pessoa a agir como sujeito da ação
moral, superando toda a forma de redução a mero objeto. Muitos são os dados e as discussões
que aqui entram em jogo. Neste contexto destacamos a necessidade de “um discernimento
prático das razões e dos bens”, para que possamos chegar a um “juízo feito sobre os atos
concretos a praticar ou já praticados” (CICat., n.1780).
É indispensável conhecer, no concreto de nossa existência, a matéria em questão e as
circunstâncias que a envolvem, para que se estabeleça um juízo prudente da consciência.
Isto nos leva a estar igualmente atentos às situações sociais e culturais, cujo conhecimento
“é uma exigência imprescindível para a obra da evangelização [...] Não só, mas os pedidos e
os apelos do Espírito ressoam também nos acontecimentos da história” (FAMILIARIS
CONSORTIO, n.4).
- A iluminação da fé: Ao buscar a verdade e fundar retamente a dignidade humana,
a consciência tem especial auxílio ao abrir-se à iluminação da fé. “A consciência boa e pura é
esclarecida pela fé verdadeira” (CICat., n.1794). Todos os cristãos são chamados à
cooperação nesta busca. A diversidade de dons e de carismas, presentes no Povo de Deus,
enriquece o discernimento. Tanto os pastores quanto os leigos,

Cristo constituiu-os testemunhas e ornou-os com o sentido da fé e a graça


da palavra (cf. At 21,17-18; Ap 19,10), para que brilhe a força do Evangelho
na vida cotidiana, familiar e social [...] Mas não escondam esta esperança no

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íntimo da alma, e sim [...] também a exprimam nas estruturas da vida secular
(LUMEN GENTIUM, n.35).

O Concílio Vaticano II foi claro ao afirmar que “o Povo santo de Deus participa do
múnus profético de Cristo, pela difusão do seu testemunho vivo, sobretudo através de uma
vida de fé e caridade” (LUMEN GENTIUM, n.12). Cristo “concedeu-lhe o sentido da fé” (LUMEN
GENTIUM, n.35). Entendemos, então, as palavras claras de João Paulo II, quando afirma que
os próprios “leigos, em razão de sua vocação particular, têm o dever específico de interpretar
à luz de Cristo a história deste mundo, enquanto são chamados a iluminar e dirigir as
realidades temporais segundo os desígnios de Deus Criador Redentor” (FAMILIARIS
CONSORTIO, n.5). Todo este discernimento “atinge-se pelo sentido da fé”.
- Sagrada Escritura, Tradição e Magistério: Acolhida na fé e colocada em prática,
a Palavra da Sagrada Escritura “é a luz do nosso caminho” (CICat., n.1785). Nela reside uma
das fontes constantes e principais para todo discernimento. Como pessoas de fé, engajadas
numa comunidade eclesial, colocamo-nos igualmente em atitude de escuta atenta da Tradição
e do Magistério da Igreja, fontes que colaboram para o ensinamento autorizado da Igreja.
Estas instâncias “representam uma ajuda para a consciência cristã... A mediação eclesial é
essencial para a acolhida do Espírito e o discernimento de suas inspirações autênticas”. “A
Igreja põe-se sempre e só a serviço da consciência” (VERITATIS SPLENDOR, n.64).
- As normas morais: As normas adquirem a sua consistência moral à medida que
são um auxílio à consciência, sendo um suporte para a decisão moral da pessoa. Não
substituem a pessoa que, livre e responsável, tem a tarefa do juízo concreto. “As normas
não propõem o juízo prático operativo previamente formulado, mas ajudam o sujeito a formar
o seu próprio juízo em vista da decisão”. Fica reservada à pessoa, em sua constância,
empenhar-se livre e responsavelmente à luz dos valores, dando forma à sua decisão. As
normas buscam traduzir o ethos cristão e apontam para valores; aí reside o seu caráter
normativo, sobretudo quando são expressão do Evangelho e traduzem o modo próprio de ser
de Jesus Cristo. Remetem, portanto, para o fundamento último que é Cristo, sendo portadoras
de “algo” que transcende as culturas e a própria história humana. Podem conter valores de
caráter universal e perene. Mediadas pela linguagem humana, intérprete mais ou menos fiel
a Jesus Cristo, as normas supõem um esforço de “procurar e encontrar a formulação mais
adequada aos mais diversos contextos culturais, mais capaz de lhe exprimir intrinsecamente
a atualidade histórica, de fazer compreender e interpretar autenticamente a sua verdade”
(VERITATIS SPLENDOR, n.53).
Cabe um esforço de precisá-las e determiná-las tendo em conta as circunstâncias
históricas. Enquanto portadoras de valores, as normas contêm um “conteúdo” a ser

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interiorizado na fé pelos que creem, não constituindo assim um apelo do exterior, mas do
próprio interior da consciência, um auxílio à sua liberdade.
Temos ainda outras mediações: trata-se de localizar outros caminhos que venham
somar no sentido de um bom discernimento moral. Sem absolutizar um ou outro referencial,
eis aqui outras indicações:
a) Recurso aos sinais dos tempos, como ausculta dos apelos de Deus nos
acontecimentos da história (cf. GAUDIUM ET SPES, n.11);
b) O recurso à lei natural, “presente no coração de cada homem e estabelecida pela
razão...” (CICat., n.1956), “conforme a natureza, difundida em todos os homens,...
imutável e eterna”, para captar os planos de Deus atinentes ao ser humano, o
sentido de nossa existência, bem como a missão que nos cabe frente ao que é
conforme e necessário à natureza humana.

A criação do ser humano à imagem e semelhança de Deus, criatura de Deus, dotado


inteiramente de sua dignidade enquanto criado à imagem de Deus, interlocutor de Deus,
parceiro de Deus no cuidado da criação, livre, chamado a amar a Deus e ao próximo e a ser
cocriador, isto à medida que modela e produz realidades várias, organiza os espaços por meio
da ciência, tecnologia e trabalho e administra retamente os bens da criação (AGOSTINI,
2004).

Antes de continuar seu estudo, realize os Exercícios 4 e 5 e


a Atividade 4.1.

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UNIDADE 5

PECADO E RECONCILIAÇÃO
OBJETIVO DA UNIDADE: abordar o pecado como uma das questões fundamentais
sobre o sentido da nossa vida e da nossa história; levar o estudante a compreender como
as questões relacionadas ao pecado envolvem tanto aspectos antropológicos como
teológicos da vida humana; refletir sobre o mistério do mal, sobre a misericórdia divina
e a conversão como caminho para o correto agir moral.

5.1 O mal como desafio que perpassa a história

A designação mais comum de pecado é a de Hamartia, e outras palavras com a mesma


raiz. Esta exprime o conceito de falta mais ou menos grave, quer contra uma norma ou uma
lei, quer contra uma pessoa, ou mesmo contra Deus.
Atualmente é muito comum escutarmos a pergunta: “o pecado ainda existe?” É
perceptível também certa indiferença em relação ao assunto e assim “ninguém mais fala ou
quer falar de pecado”. Isso mostra o descrédito que é dado à vida moral na sociedade. No
entanto, não podemos fazer um estudo aprofundado de Teologia Moral se não refletirmos
sobre o “pecado”, uma vez que esse tema nos faz pensar na realidade do mal, da desordem
e do desvio, mas também na conversão pessoal e comunitária, na caminhada espiritual, na
misericórdia e no amor de Deus. De outro lado, existem pessoas que buscam o Sacramento
da Reconciliação porque pecaram ou ao menos porque “perceberam ter feito coisa errada” e
querem se sentir em paz consigo mesmas, com os irmãos e com Deus.
Desde modo, queremos analisar o que significa etimologicamente o pecado, a sua
origem, o mal que envolve essa problemática para depois darmos sequência à superação
através do esforço pessoal de cada um e da graça santificante e misericordiosa do verdadeiro
Deus amor.

5.1.1 O pecado na Constituição Pastoral Gaudium et Spes


Todo o número 13 da Constituição Pastoral Gaudium et Spes faz um relato sobre o
“pecado”. Desde o início o homem, instigado pelo maligno, usou de forma errada a liberdade
caindo no pecado. Servindo e glorificando a si mesmo mais que a Deus o seu Criador. Serviram
a criatura ao invés do Criador. Olhando o seu coração o homem descobre-se também inclinado
para o mal e mergulhado em múltiplos males que não podem provir do Criador que é bom.

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Recusando reconhecer a Deus como seu princípio, o homem destruiu a devida ordem
em relação ao fim último e, ao mesmo tempo, toda a sua harmonia consigo mesmo, com os
outros homens e as coisas criadas.
O homem está dividido em si mesmo: deste modo “encontra-se incapaz, por si mesmo,
de debelar eficazmente os ataques do mal; e assim cada um se sente como que carregado
de cadeias. Mas o próprio Senhor veio para libertar e confortar o homem” (GAUDIUM ET
SPES, n.13).

5.1.2 Exortação apostólica Reconciliação e Penitência


A Exortação considera a realidade do pecado à luz do mistério salvífico, logo temos
que o mistério da iniquidade (2 Ts 2,7), do pecado, somente pode ser compreendido
plenamente se for considerado a partir do misterium pietatis da graça salvadora (cf.
RECONCILIAÇÃO E PENITÊNCIA, n.13-18).
Sobre o mistério do mal e o pecado, o referido documento assim explana:

Este, sem dúvida é obra da liberdade do homem; mas por dentro da realidade
desta experiência humana agem fatores, pelos quais ela se situa para além
do humano, na zona limite onde a consciência, a vontade e a sensibilidade
do homem estão em contato com forças obscuras que, segundo São Paulo,
agem no mundo até ao ponto de quase o senhorearem... Exclusão de Deus,
ruptura com Deus, desobediência a Deus: é isto o que tem sido, ao longo de
toda a história humana, e continua a ser, sob formas diversas, o Pecado, que
pode chegar até à negação de Deus e da sua existência - o ateísmo
(RECONCILIAÇÃO E PENITÊNCIA, n.14).

5.1.3 O pecado no Catecismo da Igreja Católica


O Catecismo da Igreja Católica define o pecado como:

uma falta contra a razão, a verdade, a consciência reta; é uma falta ao amor
verdadeiro para com Deus e para com o próximo, por causa de um apego
perverso a certos bens. Fere a natureza do homem e ofende a solidariedade
humana. Foi definido como uma palavra, um ato ou um desejo contrários à
lei eterna (CICat., n.1849).

O Catecismo da Igreja Católica elenca uma série de pecados passíveis de serem


cometidos pelos homens, a saber: a maldade (cf. CICat., n.1860), os pecados contra a fé:
heresia, apostasia, cisma (cf. CICat., n.2088-2089), contra a esperança (cf. CICat., n.2090),
contra a caridade (cf. CICat., n.2093), o sacrilégio (cf. CICat., n.2120), a simonia (cf. CICat.,
n.2121), a blasfêmia (cf. CICat., n.2148), o não cumprimento do preceito dominical (cf.
CICat., n.2181), o homicídio voluntário (cf. CICat., n.2268), o aborto (cf. CICat., n.2270), a
eutanásia (cf. CICat., n.2276), o suicídio (cf. CICat., n.2280), a cólera e a ira (cf. CICat.,
n.2302), o ódio (cf. CICat., n.2303), a luxúria (cf. CICat., n.2351), a masturbação (cf. CICat.,
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n.2352), a fornicação (cf. CICat., n.2353), a pornografia (cf. CICat., n.2354), a prostituição
(cf. CICat., n.2355), o estupro (cf. CICat., n.2356); a mentira (cf. CICat., n.2484) e a inveja
(cf. CICat., n.2539).
Estes pecados citados explicitamente no Catecismo da Igreja Católica, mesmo sendo
reincidentes, podem ser perdoados pela Igreja, como representante de Cristo. O único pecado
que não pode ser perdoado é o pecado contra o Espírito Santo (cf. CICat., n.1864). “Aquele
que blasfemar contra o Espírito Santo não terá remissão para sempre. Pelo contrário, é
culpado de um pecado eterno” (Mc 3,29).
No evangelho de São Mateus também encontramos o seguinte escrito: “Todo pecado,
toda blasfêmia será perdoada aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não será
perdoada” (Mt 12, 31); e o Catecismo da Igreja Católica assim ensina:

A misericórdia de Deus não tem limites, mas quem se recusa


deliberadamente a acolher a misericórdia de Deus pelo arrependimento
rejeita o perdão de seus pecados e a salvação oferecida pelo Espírito Santo.
Semelhante endurecimento pode levar à impenitência final e à perdição
eterna (CICat., n.1864).

5.2 Pecado e misericórdia de Deus na Bíblia

A realidade do pecado está além do círculo das religiões. O agir reto é um princípio
ético que perpassa toda a filosofia grega, por exemplo (cf. Rm 2,14-15).
Culturas primitivas manifestam certa consciência de pecado através dos tabus. O
objetivo é a preservação da vida dos clãs. Nos tabus existem também ritos mágicos, de
purificação: No hinduísmo vemos a presença de sacrifícios e ritos purificatórios; nos
Mandamentos da Babilônia (Séc. XIV a.C.) vemos obrigações para com Deus, com o próximo
e consigo mesmo.

5.2.1 No Antigo Testamento


Não temos um tratado ordenado sobre o pecado, mas ideias dispersas em textos,
épocas, contextos e gêneros literários diferentes. Os textos trazem duas realidades
indissociáveis: o pecado e a salvação. O pecado é uma realidade sempre presente na vida do
povo de Israel, assim como, a salvação vinda do Deus Libertador e Salvador. Os textos do AT
trazem uma evolução da compreensão do pecado e do amor de Deus.
Os termos mais usados para expressar o pecado são:
a) Hatá (198 vezes): Vemos aqui uma concepção extrínseca e ritualista do pecado.
Ex.: (cf. Jz 20,16; Pr 8,36; 19,2; 2 Sm 6,6-7)

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b) Awôn (231 vezes): é um dos termos muito usados pelos profetas. Muitos termos
relacionados apresentam aspectos específicos do pecado, e assumem formas diferentes. O
pecador, nesse sentido, é alguém que perdeu o caminho, e que está por isso sem forças para
reagir. A força do pecado é colocada no pecador; mais no sujeito que no objeto. A
transgressão é apresentada como uma atitude interior (Is 59,1-3; Jr 14,10; Fil 2,15; Ex 34,
9; Is 27,9).
c) Râshâ (250 vezes): é o contrário de “saddig” (justo). É o pecador que se enraizou
no mal, e por isso se confunde com o pecado cometido. É alguém que se esquece de Deus e
que confia somente em si mesmo. Não reconhece a Deus negando-o. Afronta-o e coloca-se
acima dele. Mostra que Deus é amor (Ez 16,49; Sl 9,18; Jó 21,14; Jr 13,9; Sl 10,13).
d) Peshá é a expressão menos usada, mas é a mais expressiva. É também usada pelos
profetas. Faz oposição à Aliança; manifesta-se como rejeição de Deus e seus projetos
históricos (sentido religioso). Mais que uma transgressão, é uma rebeldia profunda contra
Deus e seus planos (cf. Is 1,2; Ez 2,3; 20,38).
A Aliança antiga teve a sua culminância no Monte Sinai. Deus se coloca do lado dos
fracos e não compactua com a opressão. Manifesta-se como Deus Libertador. Pecado nesse
sentido é não querer participar da Aliança. A literatura sapiencial salienta a força destrutiva
do pecado. Pecado e desgraça caminham juntos, como também caminham juntos salvação,
justiça e paz.
Neste contexto da Aliança, pecado não é só infidelidade para com Deus, mas também
opressão dos homens. O Faraó, opositor de Deus (orgulhoso, arrogante, prepotente, que
despreza a todos) é o símbolo do pecador. Sua obstinação é a síntese de todo pecado que
sempre tem as mesmas conotações: desprezo de Deus e opressão dos fracos. Mas Deus
sempre liberta o seu povo oprimido, a exemplo da passagem do Mar Vermelho (cf. Ex 14,5-
31).
Através dos profetas do século VIII ao V a. C. presenciamos a mais bonita e profunda
teologia sobre o pecado no AT. A tradição sagrada tornou-se existencial. Os profetas
denunciavam o pecado e pregavam a penitência. Falavam sobre os graves pecados sociais,
inclusive da idolatria (cf. Is 2,7-8).
Traços comuns entre os profetas:
Aprofundam a compreensão de pecado a partir da Aliança. Vê-se uma nítida
sensibilidade para com os problemas sociais e uma incontida certeza da vitória de Deus e de
seus planos. Sua preocupação não é com a origem do pecado (pecado original), mas com o
pecado atual. A Aliança está no centro e deve ser sempre renovada. Pressupõe a Lei, mas a
entendem à luz da Aliança.

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O pecado, mais que uma violação da Lei é um atentado contra o pacto de Deus com
o seu povo; é uma ruptura com o próprio Deus. É
comum a vários o simbolismo matrimonial (Oseias;
Is 60, 15; 62,4; Jr 3,6; Jr 30-31; Ez 16,20-23). O
pecado é uma ruptura, traição ao amor de Javé.
Deus se comunica, chama, se doa totalmente,
escolhe, faz aliança; por outro lado, o povo
pecador, infiel, rival se condena à morte. Deus é
fiel e espera a volta, a reconciliação.
Fonte: http://migre.me/jryOI
É perceptível certa preocupação com o pecado social: Deste modo manifestam uma
verdadeira ira contra os pecados sociais e a violação do direito e da justiça. Como o projeto
de Javé aponta para todas as nações: Israel deve ser modelo de um novo modo de viver, em
todos os campos: religioso, social, econômico e político.
Denunciam os pecados individuais já que estes também violam o pacto divino, logo,
ajudam a desenvolver a consciência individual. Colocam-se contra a separação entre religião
e vida social, e, neste sentido os líderes religiosos sofrem as piores invectivas, pois separam
religião e justiça (Is 1,10-17; 58,6-7).
Condenam a idolatria (Is 5,8). Os que manipulam as leis em benefício próprio (Is 1,23;
5,23; 10,1-4). Condenam também os que desrespeitam os direitos dos pobres (Am 3,9-10;
4,1; 8,4-8; 3,9-10). O juízo do profeta Amós é a ruína de Israel (Am 3,11). E Miqueias condena
as injustiças dos grandes proprietários (Mq 2,1-2; 3,1-4. 9-12). Anunciam a vitória de Javé,
por isso são portadores de esperança e de convite à conversão. Falam da Nova Aliança (Os
2,16; Jr 31,31-34); que Deus dará a nova Lei (Jr 31,33); purificará (Ez 36,25-27); que é Deus
quem vencerá o pecado (Jr 31,34); e que enviará seu servo (o servo de Javé) que purificará
Israel (Is 42,6-7; 53,10-11). Nos profetas, a teologia da salvação e a teologia do pecado são
correlativas.

5.2.2 No Novo Testamento


No Novo Testamento, a realidade do pecado é mais aprofundada que no Antigo
Testamento. Nos Sinóticos, o pecado é apresentado como algo vindo do profundo do coração
do homem (Mc 7,21ss) e que impede fundamentalmente a realidade do Reino de Deus. Por
isso, é necessária a conversão (Mc 1,15), o afastamento radical da situação de decadência,
num movimento de volta ao Pai (Lc 15,11ss).
João fala do pecado como uma força hostil a Deus e a seu Reino. Jesus se defronta
com o pecado. O pecado manifesta como um amar as trevas mais que a luz (Jo 3,19), um
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deixar-se obcecar diante da luz (Jo 9,41; 3,20). É cegueira. É força de satanás que possui o
homem (Jo 8, 34; 1 Jo 3, 8-10). Na sua raiz, o pecado é ódio (Jo 3,20), homicídio e mentira
(Jo 8,44; 1 Jo 3,12-15) até se manifestar na sua mais profunda realidade no homicídio de
Cristo (Jo 15,22ss; 8,37). Fala ainda do pecado do mundo, que consiste na falta de fé em
Jesus Cristo (Jo 16,9); na incredulidade (Jo 8, 21.24.46; 15,22).
Paulo concebe o pecado como a personificação de um poder universal que domina
toda a humanidade. Os nossos pecados pessoais são a afirmação desse poder em nós. Ele
habita no nosso interior, e pode nos levar à morte. Os pecados, enquanto faltas, atos
pecaminosos, culpas, transgressões, são a exteriorização daquela força hostil a Deus e ao seu
Reino. Este poder personificado, às vezes, parece ser atribuído, confundido com Satanás, o
príncipe deste mundo. Paulo conhece bem os pecados concretos e nos fornece listas deles (1
Cor 5,10ss; 6,9ss; 2 Cor 12,20; Gl 5,19-21; Rm 1,29-31; Col 3,5-8; Ef 5,3; 1Tm 1,9; Tt 3,3;
2 Tm 3,2-5). O Apóstolo acrescenta ainda que tais pecados excluem os seus cúmplices do
Reino de Deus (1 Cor 6,9; Gl 5,21) (LIBÂNIO, 1974).

5.3 Pecado original e a distinção entre pecado mortal e venial, individual e


social

5.3.1 Pecado original


Nos mitos populares, como o de Adão e Eva,
atribui-se o surgimento do pecado e do mal a uma
infração pessoal do primeiro homem e da primeira
mulher. Por essa culpa foram expulsos do paraíso. Estes
mitos são expressão de base popular, metafórica para
expressar a limitação da natureza humana.
Fonte: http://migre.me/jzC5F
Pelo mero fato de nascer, o homem é limitado e pecador: esse é o chamado pecado
original. Está na base de todos os pecados pessoais da humanidade. “O primeiro pecado é
uma desobediência, uma revolta contra Deus, por vontade de tornar-se ‘como deuses’,
conhecendo e determinando o bem e o mal” (CICat., n.1850).
O pecado original, portanto, está na decisão do homem que frustra o plano
harmonioso de Deus. É desobediência a Deus; uma atitude livre de prepotência, de
autossuficiência, uma decisão por causa do orgulho. Ler: Gn 3,1-24; Gn 11,1-9 (soberba); e
Ex 32 (idolatria).

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5.3.2 Pecado mortal e venial
Estamos cientes de que quando falamos em pecado mortal a gravidade da situação é
muito maior do que do pecado venial. E em muitos casos as distorções de consciência são
maiores. Falamos no plural: em pecados mortais e veniais.
Deixando-nos guiar pelo Catecismo da Igreja Católica podemos dizer que: “O pecado
mortal destrói a caridade no coração do homem por uma inflação grave da lei de Deus; desvia
o homem de Deus, que é o seu fim último e bem-aventurança, preferindo um bem inferior”
(CIC, 1855). “Para que o pecado seja mortal requerem-se três condições ao mesmo tempo:
é pecado mortal todo pecado que tem como objeto uma matéria grave, e que é cometido
com plena consciência e deliberadamente” (CICat., n.1857); “a matéria grave é precisada
pelos 10 mandamentos...” (Mc 10,19) (CICat., n.1858).
Apresenta também uma gradualidade, ou seja, a gravidade dos pecados pode ser
maior ou menor, dependendo de inúmeros fatores. Por exemplo, um assassinato é mais grave
que um roubo (cf. CICat., n.1858). Por outro lado, o pecado mortal requer pleno
conhecimento e pleno consentimento da parte do pecador. Pressupõe o conhecimento do
caráter pecaminoso do ato, de sua oposição à lei de Deus e envolve em tal contexto um
consentimento suficientemente deliberado para ser uma escolha pessoal (cf. CICat., n.1859).
“O pecado mortal é uma possibilidade radical da liberdade humana, como o próprio amor.
Acarreta a perda da caridade e a privação da graça santificante, isto é, o estado de graça”
(CICat., n.1861).
Quanto ao pecado venial, assim está escrito no Catecismo da Igreja Católica:

Comete-se o pecado venial quando não se observa, em matéria leve, a


medida prescrita pela lei moral, ou então quando se desobedece à lei moral
em matéria grave, mas sem pleno conhecimento ou sem pleno
consentimento. O pecado venial enfraquece a caridade; traduz uma afeição
desordenada pelos bens criados; impede o progresso da alma no exercício
das virtudes e a prática do bem moral [...] O pecado venial deliberado e que
fica sem arrependimento dispõe-nos pouco a pouco a cometer o pecado
mortal. Mas o pecado venial não quebra a aliança com Deus (CICat., n.1862-
1863).

Veja também como é tratada a questão do pecado mortal e venial na exortação


Apostólica pós- sinodal Reconciliação e Penitência.

[...] Chamamos pecado mortal a este ato pelo qual o homem, com liberdade
e advertência, rejeita Deus, a sua lei, a aliança de amor que Deus lhe propõe,
preferindo voltar-se para si mesmo, para qualquer realidade criada e finita,
para algo contrário ao querer divino. Isto pode acontecer de modo direto e
formal, como nos pecados de idolatria, apostasia e ateísmo; ou de modo
equivalente, como em todas as desobediências aos mandamentos de Deus
em matéria grave. O homem sente que esta desobediência a Deus corta a

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ligação com o seu princípio vital: é um pecado mortal, ou seja, um ato que
ofende gravemente a Deus e acaba por se voltar contra o próprio homem,
com uma força obscura e potente de destruição (RECONCILIAÇÃO E
PENITÊNCIA, n.59).

5.3.3 Pecado individual e social


O pecado social é o resultado de muitas vontades, situações e decisões individuais
e/ou decisões tomadas em um determinado grupo. O Papa João Paulo II, na sua Exortação
apostólica, lembra: “todo pecado sob um aspecto é pessoal e sob outro aspecto é social,
enquanto ou porque tem também implicações sociais” (RECONCILIAÇÃO E PENITÊNCIA,
n.15).
Estruturas sociais pecaminosas podem ser identificadas como aquelas
instituições políticas que oprimem as pessoas e violam sua dignidade
humana; que sufocam a liberdade e promovem as desigualdades. São
geralmente o resultado da cobiça de alguma pessoa ou de alguns grupos, de
seu egoísmo, ambição e até mesmo de sua crueldade. As estruturas e
instituições sociais num país podem defender a discriminação por raça ou
religião, incentivar a corrupção e a prática de suborno, eliminando todas as
formas de oposição política e mantendo uma parcela da população na mais
negra miséria, praticamente em estado de escravidão (O´NEIL; BLACK, 2007,
p.107).

Devido às realidades latino-americanas de injustiças sociais, o Concílio Ecumênico


Vaticano II vai analisar a questão do pecado não somente de maneira individual, mas também
de forma social.
O Catecismo da Igreja Católica, no número 1869, trata justamente da questão do
pecado de maneira social não somente no sentido individual. Se pegarmos as Conferências
episcopais latino-americanas (Medellín, Puebla, Santo Domingos e Aparecida), todas tratam
do pecado social, ou das “estruturas sociais pecaminosas” que devem ser combatidas.
Os pecados sociais tornam-se ainda muito mais graves quando vão contra os aspectos
básicos das pessoas e das comunidades; quando o “ser humano é esmagado pela
expropriação de seus direitos fundamentais” (MOSER, 1996, p. 19). Exemplo: é muito comum,
no Brasil, ouvirmos através dos Meios de Comunicação Social, histórias de grupos que se
organizam e ficam com uma grande quantia de dinheiro que deveria ser enviada a
determinadas escolas, enquanto as crianças de tais estabelecimentos de ensino ficam
privadas de alimentação e condições de estudo adequadas.

Sempre que a Igreja fala de situações de pecado, ou quando condena como


pecados sociais certas situações ou o comportamento coletivo de alguns
grupos sociais, grandes ou pequenos, ou até mesmo de nações inteiras e
verdadeiros blocos de nações, a Igreja sabe e proclama que esses casos de
pecados sociais são o resultado do acúmulo e da concentração de muitos
pecados pessoais... A verdadeira responsabilidade, então, reside nos
indivíduos (RECONCILIAÇÃO E PENITÊNCIA, n.16).
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5.4 A experiência pascal de conversão

Jesus Cristo, Verdadeiro Filho de Deus e Filho do homem é: O Evangelho Vivo, o


sacramento da conversão, o libertador do pecado, a fonte da liberdade renovada. É o profeta
que desmascara a nossa alienação e nos conduz ao Reino da verdade e da reconciliação. É
ainda a Aliança, a encarnação da solidariedade salvífica, o caminho único da libertação da
solidariedade do pecado.
Jesus nos diz: “Eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores” (Lc 5,32) se
referindo à conversão e ao arrependimento dos pecadores. Os quatro evangelistas falam em
transformação, arrependimento, conversão, como, por exemplo, Lc 3,7, que vem do grego
“metanóia”. A expressão grega inclui arrependimento e profunda tristeza por causa dos
pecados. O seu sentido essencial é o de um novo relacionamento com Deus, de uma volta a
casa, de um estar-em-casa com ele que é o Emmanuel, o Deus conosco (cf. Lc 15,11-32).
Jesus Cristo é o sacramento original da conversão. Ele simboliza o conteúdo e o
caminho da conversão: vitória sobre o pecado e a dedicação total à vontade do Pai. Toda
conversão é renúncia de alguma coisa para se converter para Deus.
Jesus Cristo: libertador do pecado. A conversão deve ser individual e ao mesmo tempo
comunitária. Neste sentido, a doutrina sobre o pecado e a conversão deve ser apresentada
na perspectiva da aliança e nunca na de uma simples moralidade de defesa. Como o primeiro
pecado causou o seu impacto em toda a humanidade, assim também o nosso pecado nunca
fica reservado somente para nós. Em tudo o que fazemos, de bem ou de mal, há sempre uma
responsabilidade coletiva tanto para o bem, quanto para o mal.
A conversão é iniciativa espontânea e amorosa de Deus. O seu conteúdo principal é
a fé e a adesão a aquele que é o caminho, a verdade e a vida (cf. Jo 14,6) Jesus Cristo.
À luz do mistério Pascal, a conversão significa, sobretudo, o afastamento do pecado,
do egoísmo, da arrogância, do orgulho, da alienação, do individualismo e o retorno para Deus.
Que sempre é dom em graça de Deus que vem ao nosso encontro.

Essa experiência da conversão não é produto do esforço humano; ao


contrário, é o trabalho da graça divina, do amor de Deus com que o Espírito
Santo nos inundou o coração. É curioso como tantas vezes conseguimos
resistir a esse amor, usando nossa mente e vontade por uma variedade de
motivos, mas geralmente devido ao apego a outros bens, contrários ao amor
de Deus, ou porque temos um coração desobediente que insiste no que
descrevemos como “nossa liberdade”. Embora a conversão seja uma pura
dádiva de Deus, precisa que os seres humanos cooperem na qualidade de
indivíduos livres e inteligentes para que a transformação possa acontecer. É
uma dádiva e uma resposta, a superação do medo de se entregar e permitir
que Deus trabalhe em nós e nos modifique (O´NEIL; BLACK, 2007, p. 110).
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A expressão voltar (shub) é empregada cerca de 1.059 vezes no Antigo Testamento.
No cerne da conversão está a fé e a confiança em Jesus
Cristo. É a total dedicação a ele que é a nossa vida. É
muito mais que conversão a mandamentos ou códigos
completos da moralidade, é o renascimento para uma
nova vida em Cristo Jesus. Uma opção fundamental
positiva; uma opção madura para Deus.
Fonte: http://migre.me/jzDnj
O ponto central da conversão cristã é sempre Cristo. Quem se converte a Cristo sabe
que é aceito sem mérito algum. Há de ser sempre um ato de agradecimento. A conversão é
a libertação do pecado da omissão e da negligência (cf. Lc 10,29 ss).
A conversão de Paulo (cf. Atos 9,1-18) mostra o quanto Jesus Cristo foi se tornando
o centro de sua vida. Tudo na vida de Paulo após o arrependimento por estar perseguindo os
cristãos e a conversão, se centraliza no Cristo. O viver de Paulo se volta para Cristo.
A conversão de Paulo foi dessa forma, mas para muita gente pode ser, nos seus “altos
e baixos da vida”, mediando a Palavra de Deus diariamente, estudando a vida dos santos,
participando da celebração da Santa Missa diária ou semanal. Deus no seu infinito amor usa
de infinitas formas para nos amar e nos converter.
A conversão a Cristo é para os seus discípulos a participação em sua liberdade e
fidelidade criativas, o papel de coautor na obra contínua da redenção e da libertação.
Jesus Cristo é o profeta. Nele o reino de Deus é visível. Com ele, chegou o fim dos
tempos, o momento favorável. Ele insiste urgentemente na conversão e na aceitação, pela
fé, na mensagem da salvação; sua pregação supõe uma decisão (cf. Jo 12,47-48). Diante da
pregação de Jesus Cristo, todo homem necessita de conversão.
Cristo profeta convida à pureza de coração de uma forma que prescreve todas as
tentações de privatizar a religião e a conversão. A conversão ao Reino de Deus é possível pela
comunicação do Espírito Santo. É o chamado à absoluta veracidade e à libertação de todas
as formas de alienação. Cristo é aquele que reconcilia.
A conversão deve ser vista inteiramente à luz da iniciativa de Deus. Ela é a aceitação
da reconciliação concedida por Deus por meio de Jesus Cristo e das inspirações do Espírito
Santo. É a nova criação (cf. 2 Cor 5,17-19). Esta significa uma nova espécie de relacionamento
com Deus (filhos) e com as pessoas (irmãos). Aqueles que estão realmente reconciliados hão
de trabalhar juntos pelo Reino de Deus.

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Que o Espírito Santo desça sobre nós e nos purifique. Reconciliação e conversão
constituem obra do Espírito Santo, que nos dá um novo coração, sem o qual novos
relacionamentos seriam impossíveis.
Jesus Cristo cumpre as grandes profecias messiânicas enviando-nos o Espírito Santo
(Ez 36,25-27; Jr 31,31-33; Hab 8,7-12.10,16). A
vinda do Espírito Santo assinala a era escatológica
e o apelo mais urgente para a mudança e a
purificação radicais e a volta para Deus. A
conversão e a reconciliação, do princípio ao fim
são obras do Espírito Santo, mas que exigem
nossa cooperação criativa e fiel. “Santo Antônio
do Egito, fundador do monasticismo, foi tocado
pelo Espírito Santo quando ouviu o Evangelho do
jovem rico, que era lido na igreja; e muitos de nós
conhecemos a história de Santo Agostinho,
quando relata sua conversão em suas Confissões
e salienta o papel das orações de sua mãe em sua
luta pela mudança do filho” (O´NEIL; BLACK,
2007, p. 110).
Fonte: http://migre.me/jzDGm
Somente pela confiança no Espírito Santo e sendo dóceis às suas inspirações
poderemos viver a conversão permanente que nos torna cada vez mais conformes a Cristo
crucificado e ressuscitado (cf. Gl 5,24-25).
Vivemos uma mudança de época e, portanto, de valores. A vida do cosmos como um
todo deve ser respeitada e amada. Devemos buscar uma transformação do ser humano para
o bem, para Deus, para uma maior consciência do pecado e quanto ele desune e mata as
pessoas.

5.5 A reconciliação sacramental

Jesus Cristo é o sinal de redenção original e perfeito e o chamado efetivo à conversão.


Ele não só envia o Espírito Santo, como também estende a sua sacramentalidade à
Igreja, dando-lhe a graça de se tornar uma comunidade de pessoas convertidas, que
prosseguem constantes no caminho da purificação contínua. Além disso, concede à sua Igreja
os sacramentos, que são sinais e fontes de nossa conversão e de nosso esforço comunitário
de renovação. “Os sacramentos da Igreja são momentos especiais dessa conversão, pois é
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quando, como comunidade de fé, encontramos o poder da cura de Cristo. A graça do Espírito
Santo, por intermédio do batismo, tem o poder não só de nos eximir do pecado original, mas
também de nos santificar e consagrar todo o nosso ser, para que nos tornemos novas
criaturas para Deus e para os irmãos e irmãs” (O´NEIL; BLACK, 2007, p. 111).
Na Igreja, os “sete sacramentos” são sinais privilegiados da conversão básica e
permanente. Ensinam-nos que não se trata apenas de conversão moral, ou de conversão em
face de preceitos individuais, mas, antes, de conversão a uma vida na plenitude da fé,
esperança, amor, justiça e paz: na plenitude da adoração em espírito e verdade.
Tanto a conversão básica, que coincide com a opção fundamental para o bem, como
a conversão permanente, possuem a dimensão
sacramental. Elas demonstram à nossa consciência que
a conversão é sempre iniciativa de Deus, e que só pode
ser realmente eficiente quando reconhecemos o Dom
imerecido e correspondemos a ele pelo louvor à
misericórdia e à generosidade de Deus.
Como sinais privilegiados de esperança, eles nos
inserem na história da salvação, que é uma história de
conversão e renovação. A conversão significa uma volta
radical, a fim de poder dar glória a Deus em união com
Jesus Cristo, e em solidariedade salvífica com a sua
Igreja.
Fonte: http://migre.me/jzHLX
A Igreja é o grande sacramento da conversão. Pela sua união com Cristo ela é uma
espécie de sacramento ou sinal da união íntima com Deus e da unidade de toda a
humanidade.

5.5.1 Sacramento do Batismo


Enquanto todos os sacramentos incentivam e promovem a conversão permanente, os
sacramentos do Batismo e da Penitência (ou Reconciliação) estão relacionados com a
conversão básica na opção fundamental por Cristo. O batismo é o sacramento básico da
conversão. Isso já aparece na ação de João Batista, que ligava a conversão ao batismo.
Aparece a imagem do banho regenerador.
O batismo no nome de Jesus é um símbolo efetivo da volta dos pecadores à casa do
Pai. O batismo evidencia que a conversão é um encontro salvífico com Jesus Cristo, e através
dele, com o Pai celeste. O Batismo como sinal eficaz de conversão simboliza claramente a sua
meta: configuração com Cristo em sua morte e ressurreição (cf. Rm 6,3-12). A conversão
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coroada pelo batismo requer uma luta contínua contra todas as tendências pecaminosas em
nós e em torno de nós (cf. Cl 3,3-10).

5.5.2 Sacramento da Reconciliação


O sacramento da penitência, além de reconciliação para aqueles que abandonaram a
Deus, é também um evento que restaura e previne a situação, e leva à maior pureza de
coração e, assim, à união mais estreita com o Senhor. É um sacramento que cura e restaura.
Pelo sacramento da Penitência, chegamos a uma experiência cada vez mais profunda
de que Deus nos aceita com benignidade e vem ao nosso encontro onde quer que estejamos,
e nos guia no caminho do amor e da salvação. Leva-nos a alegria de saber-nos amados e
aceitos por Deus e nos estimula à conversão constante. No sacramento da reconciliação tem
a graça de Deus, o toque de Deus.
Através do sacramento da reconciliação, “podemos tomar consciência de nossas
impurezas e pecados, enquanto comunidade, e, assim, buscar a conversão e a reconciliação
com Deus e uns com os outros. Admitimos que somos pecadores, no início de cada Eucaristia,
no rito da penitência, para podermos realmente celebrar a presença do Senhor e ser nutridos
por seu corpo e por seu sangue” (O´NEIL; BLACK, 2007, p.111).

5.5.3 Participação do convertido na conversão: contrição ou arrependimento


O exame de consciência constitui-se a parte essencial da contrição. A raiz mais
profunda de todo pecado é o orgulho. A coragem de encarar a nossa realidade frágil, não
apenas as faltas individuais, é um grande passo para a liberdade interior. Enquanto o pecador
não reconhecer que não se trata apenas de uma questão de transgressões individuais, mas
do próprio pecado, da coabitação com o eu egoísta, ele não chegará a um profundo
arrependimento.
Quanto mais a pessoa deixa de lado a dimensão espiritual em sua vida com momentos
de confissão, mais ela vai ficando vulnerável e quem sabe recorre a Deus somente em
momentos de profunda necessidade.
Como é importante fazer o “exame de consciência diário”. Nos tempos de seminário,
era feito diariamente na oração da noite junto com toda a comunidade. Esse aspecto faz a
diferença na questão de uma boa caminhada espiritual. Assim a consciência cresce e
amadurece na sensibilidade das coisas para Deus, também à medida que acontece uma boa
confissão. Há uma profunda relação entre a experiência de Deus e o sentido de pecado. A
contrição é o ato central das virtudes da fé, da esperança, do amor e da adoração. À luz da
fé cristã, o arrependimento assume a forma de um encontro sacramental com Cristo.

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O chamado à conversão é, sobretudo, um apelo para viver a fé. O arrependimento é
a força mais revolucionária no mundo moral. Quando atinge todo o ser do pecador, ele supera
o seu mau passado, deixando atrás de si os seus pecados particulares e todo o seu “eu
pecador”.
O arrependimento sincero penetra a fundo a liberdade do homem... com uma dor que
caracteriza as feridas do pecado; mas revela novos horizontes ao abrir regiões totalmente
novas da liberdade espiritual, de acordo com a sua profundidade e solidez. O que resta da
liberdade depois do pecado mortal é recolhido pela contrição sob a influência da graça divina.
Conscientes do pecado, aceitamos a misericórdia de Deus e colocamo-nos no caminho da
liberdade dos filhos de Deus, louvando-o e bendizendo pelo perdão recebido gratuitamente.
Contemplando a cruz, morte e ressurreição de Jesus Cristo é que sentimos a
necessidade de conversão. Diante de tanto amor não conseguimos ficar indiferentes. A
verdadeira conversão não admite mediocridade. Ela sabe olhar as dificuldades e
potencialidades do pecador que se converte. A verdadeira conversão leva a assumir a vida
como ela é. Renovando sempre esse compromisso de fidelidade para com Deus e com os
irmãos, através dos sacramentos.
Por fim, a confissão do pecado, deve ser um louvor à misericórdia de Deus. Mediante
a confissão nos abrimos à luz divina, à transparência do amor divino que penetra todas as
coisas. A conversão é uma luta para todos. Busquemos sempre morrer para o pecado e viver
para Cristo (cf. Rm 6,11).

Para finalizar seu estudo, realize os Exercícios 6, 7 e 8 e a


Atividade 5.1.

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PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA. Bíblia e Moral – Raízes Bíblicas do agir cristão. Disponível
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EXERCÍCIOS E ATIVIDADES

EXERCÍCIO 1

Durante muitos séculos a disciplina de teologia moral ficou destinada aos


confessores, porém, com o passar do tempo a teologia moral se deu conta que a
sua pesquisa não podia limitar-se unicamente aos confessores. Pouco a pouco os
teólogos moralistas e a Igreja perceberam que:
I. A síntese de teologia moral devia ser destinada a todos os homens e mulheres batizados.
II. A situação do pluralismo ético da sociedade contemporânea obrigava a teologia moral a
elaborar a sua síntese ético-teológica baseando-se também nos padrões científicos sérios.
III. Toda pesquisa teológica no campo da moral precisava ter também um cunho missionário
e evangelizador, já que evangelizar o homem significa evangelizar a sua cultura, a sua ética,
os seus valores e os seus ideais de justiça e de paz.
IV. Tanto os Livros penitenciais como os Manuais de teologia moral deviam ser apresentados
aos cristãos leigos com o intuito de auxiliá-los em sua formação.
a) Apenas os enunciados I, II e III estão corretos.
b) Apenas os enunciados I, III e IV estão corretos.
c) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
d) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
e) Apenas os enunciados III e IV estão corretos.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

ATIVIDADE 1.1

Faça um resumo de ao menos 15 linhas a respeito do serviço, do auxílio que a teologia moral
presta aos sacerdotes, aos cristãos leigos, ao mundo acadêmico e à sociedade.

Submeta a atividade por meio da ferramenta Tarefa.

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EXERCÍCIO 2

Com relação aos princípios fundamentais da moral renovada, marque a alternativa


INCORRETA.
a) A moral renovada é totalmente cristocêntrica.
b) Na moral renovada o pecado vem, maiormente, acentuado em relação à graça.
c) A moral renovada aponta para o personalismo como princípio antropológico.
d) A moral renovada se centra no amor e busca superar o legalismo.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

EXERCÍCIO 3

Sobre a Aliança, no Antigo Testamento, assinale a alternativa INCORRETA:


a) A escravidão do povo de Israel por Deus é ponto central da Aliança.
b) Javé diz ao povo, por intermédio de Moisés: se vocês me obedecerem e observarem a
minha aliança, vocês serão minha propriedade especial.
c) Ela é completamente dom de Deus, fruto da sua iniciativa total, e empenha o próprio Deus
conceder ao povo eleito a sua Graça e estes observarem a sua Lei.
d) As “dez palavras” mostram as leis fundamentais dada ao povo no monte Sinai.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

ATIVIDADE 3.1

Leia o capítulo 5 do Evangelho de Mateus e destaque os aspectos essenciais do


ensinamento de Jesus a respeito da moral cristã.

Submeta a atividade por meio da ferramenta Tarefa.

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EXERCÍCIO 4

No tocante à liberdade e à lei, o Magistério da Igreja ensina que:


I. Não pertence ao homem o poder de decidir o bem e o mal, mas somente a Deus.
II. O homem é livre e goza de uma liberdade ilimitada, já que pode comer “de todas as
árvores do jardim”.
III. A lei de Deus não diminui e muito menos elimina a liberdade do homem, pelo contrário,
garante-a e promove-a.
IV. A liberdade do homem encontra sua verdadeira e plena realização precisamente na
aceitação de que Deus, que “só é bom”, conhece perfeitamente o que é bom para o homem,
e, devido ao seu mesmo amor, o propõe nos mandamentos.
V. A liberdade do homem pode criar valores, e, portanto, goza de uma primazia sobre a
verdade, até ao ponto de a própria verdade ser considerada uma criação da liberdade.
a) Apenas os enunciados I, II e III estão corretos.
b) Apenas os enunciados I, III e IV estão corretos.
c) Apenas os enunciados II, III e IV estão corretos.
d) Apenas os enunciados I, II e V estão corretos.
e) Apenas os enunciados IV e V estão corretos.
Antes de responder a questão, leia a Carta encíclica Veritatis Splendor, n. 35.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

EXERCÍCIO 5

Aprofunde seu conhecimento lendo a Carta encíclica Veritatis Splendor, n. 36-53 e


assinale a alternativa INCORRETA com respeito a lei natural:
I. A lei natural é a lei objetiva e universal, com a qual Deus, no desígnio da sua sabedoria e
amor, ordena, dirige e governa o universo inteiro e os caminhos da comunidade humana.
II. A lei natural não é mais do que a luz da inteligência infundida por Deus em nós. Graças a
ela, conhecemos o que se deve cumprir e o que se deve evitar. Esta luz e esta lei, Deus a
concedeu na criação.
III. A lei natural está escrita e esculpida no coração de todos e de cada um dos homens, visto
que esta não é mais do que a mesma razão humana enquanto nos ordena fazer o bem e
intima a não pecar.
IV. A lei natural exprime e prescreve as finalidades, os direitos e os deveres que se
fundamentam sobre a natureza corporal e espiritual da pessoa humana.
a) Os enunciados I e III estão incorretos.
b) Os enunciados II e IV estão incorretos.
c) Apenas o enunciado IV está incorreto.
d) Apenas o enunciado I está incorreto.
e) Todos os enunciados estão incorretos.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.
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ATIVIDADE 4.1

Comente a frase: “A consciência é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem


onde ele está sozinho com Deus e onde ressoa uma voz” (GS, 16).

Submeta a atividade por meio da ferramenta Tarefa.

EXERCÍCIO 6

Como o Catecismo da Igreja Católica define o pecado?


I. Uma falta contra a razão, a verdade, a consciência reta.
II. Uma falta ao amor verdadeiro para com Deus e para com o próximo, por causa de um
apego perverso a certos bens.
III. Uma palavra, um ato ou um desejo contrários à lei eterna.

a) Apenas os enunciados I e II estão corretos.


b) Apenas o enunciado II está correto.
c) Apenas os enunciados II e III estão corretos.
d) Nenhum dos enunciados está correto.
e) Todos os enunciados estão corretos.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

EXERCÍCIO 7

Em que consistiu o pecado de Adão e Eva ou o primeiro pecado?


I. Numa acusação mútua entre ambos, após terem comido do fruto da árvore proibida.
II. Numa leve falta de observação da medida prescrita pela lei moral.
III. Numa desobediência, uma revolta contra Deus, por vontade de tornar-se como deuses,
conhecendo e determinando o bem e o mal.
a) Apenas o enunciado I está correto.
b) Apenas o enunciado II está correto.
c) Apenas o enunciado III está correto.
d) Nenhum enunciado está correto.
e) Todos os enunciados estão corretos.

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


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EXERCÍCIO 8

O pecado é um ato pessoal. Além disso, temos responsabilidade nos pecados


cometidos por outros, quando neles cooperamos:
I. Participando neles direta e voluntariamente.
II. Mandando ou aconselhando a pecar, louvando ou aprovando o pecado.
III. Não os revelando ou não os impedindo, quando a isso somos obrigados.
IV. Protegendo os que fazem o mal.
a) Apenas os enunciados I e II estão corretos.
b) Apenas os enunciados I e IV estão corretos.
c) Os enunciados I, II e III estão corretos.
d) Os enunciados II, III e IV estão corretos.
e) Todos os enunciados estão corretos.

Para responder a questão acima, leia sobre o pecado no Catecismo da igreja


Católica (n.1868-1869).

Verifique seu aprendizado realizando o Exercício no Ambiente Virtual de


Aprendizagem.

ATIVIDADE 5.1

Como você explicaria, em uma catequese de adultos, o conceito de pecado na moral


cristã?

Submeta a atividade por meio da ferramenta Tarefa.

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