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mur Director: Manuel Carvalho Domingo, 3 de Julho de
e22022
0 2 • Ano XXXIII • n.º 11.753 • Diário • Ed. Lisboa • Assinaturas 808 200 095 • 1,90€
02
PSD
Montenegro recupera
passismo e promove
unidade para fazer
oposição combativa
Destaque, 2 a 5
08c35700-b58d-456e-bddc-8e66b61321cd
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2 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
Luís Montenegro
une um
PSD que pede
oposição
“na rua”
Jorge Moreira da Silva, candidato derrotado nas eleições
directas de Maio, não aceitou Äcar na nova direcção
social-democrata, mas recusou-se a ser líder “de facção”
simpatia e de generosidade”, que anterior liderança de Rui Rio quan- Luís Montenegro aplaudido que deseja uma alternativa a este
Sofia Rodrigues
decidiu não aceitar em nome da do lembrou que se perdeu mais pelos congressistas, com Governo” e que o PSD está convo-
e Margarida Gomes
“unidade e da estabilidade”. Quem tempo a convidar para sair do que Assunção Esteves ao lado cado “para construir essa alternati-
J
orge Moreira da Silva deixou o apoiou “não será oposição”, a convidar outros para dentro, e a va”.
de ser director da OCDE, garantiu. criticar dentro do que a fazer opo- O líder da distrital de Braga defen-
candidatou-se à liderança Outros seus colegas no Governo sição ao Governo. E disse estar deu que essa alternativa passa por
do PSD, perdeu as eleições, de Passos Coelho, como Maria Luís “feliz” depois de ter visto “actos de um “caminho de abertura à socie-
assumiu o compromisso de Albuquerque ou Teresa Morais, sectarismo” nos últimos anos. dade civil” e de “genuinidade” para
não aceitar responsabilida- escolheram regressar à vida política Foram várias as vozes que, ao lon- alcançar credibilidade junto dos
des no novo ciclo de Luís Montene- activa. Parece que ouviram Miguel go do dia de ontem, reclamaram a eleitores.
gro, e cumpriu. Foi o protagonista Albuquerque, presidente do Gover- necessidade de uma oposição forte
que Æcou de fora, mas sem o propó- no Regional da Madeira, quando e a construção de “uma alternativa “O país está à tua espera”
sito de ser “líder de facção”. defendeu que o PSD “não tem de ter ao PS”. Uma outra vice-presidente da nova
Com um PSD marcado por divi- vergonha da sua história”, antes tem O deputado Joaquim Miranda Sar- equipa, Margarida Balseiro Lopes,
sões internas, o novo líder do PSD, de invocar o seu “passado glorioso mento, candidato a líder parlamen- sustentou que é o país que “precisa
Luís Montenegro, parece ter-se ao serviço de Portugal”. tar, chamou-lhe “oposição vigilante urgentemente do PSD”, um PSD
empenhado na missão de unir o O mesmo argumento — transmitir e Ærme”. “O momento que o país “tolerante, plural, centrado nas pes-
partido. Os seus apoiantes e os que a mensagem de unidade — que levou vive é muito difícil. Apesar de ter soas e na dignidade de cada vida”.
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agora se converteram à sua linha Moreira da Silva a excluir-se da nova todas as condições de governação, Essa mesma ideia foi enfatizada por
política reclamaram uma oposição direcção foi o que motivou Paulo o Governo já mostrou que é incapaz Carlos Moedas, presidente da Câma-
combativa, feita “na rua” e “com as Rangel a fazer a opção contrária e de resolver os problemas dos por- ra de Lisboa, que entrou na sala
pessoas”. aceitar ser o primeiro vice-presiden- tugueses, e só passaram três meses”, quando Jorge Moreira da Silva falava
No seu discurso ao 40.º Congres- te do partido. aÆrmou numa crítica que seria par- no púlpito.
so, a decorrer no Porto, o antigo Apesar da imagem de união que tilhada por muitos outros congres- “Luís, o país está à tua espera. O
ministro do Ambiente revelou que o novo líder se esforçou por trans- sistas. abstenções na votação da país está à espera do PSD”, excla-
Luís Montenegro, nas últimas sema- mitir desde o primeiro dia do con- Já o recém-nomeado vice-presi- moção estratégica apresentada mou, arrancando a maior ovação do
nas, lhe fez convites para ocupar gresso, Miguel Pinto Luz, vice-pre- dente Paulo Cunha argumentou que por Luís Montenegro. O resto congresso, à semelhança do que
cargos no partido, num “gesto de sidente, deixou escapar críticas à “fora deste congresso há um país foram votos a favor aconteceu na reunião magna de
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 3
PAULO PIMENTA
Distribuição de lugares
Novo líder dá peso
a Rangel, atrai Pinto Luz
e recupera passistas
e institucionais, todas as áreas da
Sofia Rodrigues
sociedade e todos os responsáveis
L
uís Montenegro deu os lugares públicos e privados de forma a dese-
de maior peso na sua equipa nhar a base do futuro programa de
aos dois ex-candidatos à lide- governo do PSD. Para esta sua aposta
rança do PSD que concorreram pessoal, Luís Montenegro convidou
contra Rui Rio: Paulo Rangel e Pedro Reis, antigo presidente da
Miguel Pinto Luz. Ao mesmo AICEP, que terá assento na comissão
tempo, recuperou passistas como permanente e será ouvido sobre a
Pedro Reis, Maria Luís Albuquerque estratégia global do partido, tendo
e Teresa Morais, e para o conselho também em conta os contributos do
nacional — o órgão máximo entre conselho estratégico nacional (CEN)
congressos — o novo líder do PSD e do Instituto Sá Carneiro.
escolheu uma das novas estrelas do Para liderar o CEN, que foi criado
partido: Carlos Moedas. A comissão por Rio, Pedro Duarte, antigo líder da
política nacional representa ainda JSD, foi o nome escolhido, sucedendo
uma renovação geracional ao incluir a Joaquim Miranda Sarmento, que
nomes como António Leitão Amaro agora é candidato à liderança da ban-
e Margarida Balseiro Lopes. cada parlamentar. Próximo de Mon-
Paulo Rangel, que perdeu as direc- tenegro, Pedro Duarte foi secretário
tas para Rui Rio em Novembro, acei- de Estado da Juventude no Governo
tou ser o primeiro vice-presidente de de Santana Lopes e deputado até
Luís Montenegro. O número dois da 2011. Desde então trabalhou no sector
Câmara de Cascais, Miguel Pinto Luz, privado (Microsoft) e interrompeu a
que Æcou em terceiro lugar nas direc- sua vida proÆssional para ser director
tas de 2019 contra o líder cessante e de campanha de Marcelo Rebelo de
o próprio Montenegro, torna-se tam- Sousa nas eleições presidenciais de
bém vice-presidente a par de Leitão 2016. Tornou-se um crítico de Rio
Amaro, ex-secretário de Estado da (desaÆando até a sua liderança) e em
Administração Local (42 anos), e da 2019 lançou o Movimento X, um
ex-deputada e antiga líder da JSD Mar- movimento de reÇexão, mas tem
garida Balseiro Lopes (32 anos). O estado afastado da política activa.
líder da distrital de Braga e ex-presi- Depois da saída anunciada de Pau-
dente da Câmara de Famalicão, Pau- lo Colaço da presidência do conselho
lo Cunha, e Inês Ramalho, que traba- nacional de jurisdição e do seu envol-
lhou na estrutura de acompanhamen- vimento na reforma estatutária do
to ao memorando de entendimento partido, aquele órgão terá como can-
Ærmado com a troika, completam a didato da direcção José Matos Correia,
Dezembro. Carlos Moedas, que é “Sempre fomos o partido da união Um outro membro destacado da equipa de “vices”. que foi vice-presidente de Passos Coe-
visto como um futuro candidato à — da educação pública à privada, da anterior direcção de Rui Rio, o vice- As escolhas estavam praticamente lho e chefe de gabinete de Durão Bar-
liderança do PSD, mostrou apoio saúde pública à privada — porque presidente cessante André Coelho todas em segredo e só foram anuncia- roso. Para a comissão de auditoria
incondicional ao novo líder: “Luís, sabemos que a união é que faz a for- Lima, vincou a ideia de que “o PSD das por Montenegro ao Ænal da tarde Ænanceira, Montenegro indicou
estou aqui para o que der e vier.” Ao ça”, disse, retirando a carga ideoló- não pode ser um federador das de ontem, gerando surpresa na sala. Nunes Liberato, antigo chefe da Casa
mesmo tempo, o cabeça de lista ao gica das propostas ao dizer que as direitas”, sob pena de se descarac- Sem desempenhar funções execu- Civil do Presidente Cavaco Silva e seu
conselho nacional deixou a receita pessoas não querem saber se é terizar”, afastando-se do “socialis- tivas no PSD, Carlos Moedas aceitou secretário-geral no partido, que tem
para conquistar o país. É preciso público ou privado, querem é resol- mo democrático”. Ficou, assim, o lugar simbólico de cabeça de lista estado como vogal na jurisdição.
“trazer gente nova para a política, ver a sua vida. “E o PSD é o único expressa a ideia de que o PSD deve ao conselho nacional da lista de Luís Entre os dois dos seus homens-for-
atrair talento”, e que a sociedade partido que quer resolver os proble- Æcar “ao centro” do espaço político Montenegro. O antigo secretário de tes, Montenegro ofereceu dois lugares
civil volte a sentir que “o PSD é aber- mas”, reforçou. como Rui Rio insistiu na sua lide- Estado adjunto de Passos Coelho não de destaque: o antigo líder parlamen-
to e não os limita.” O vice-presidente da bancada ces- rança. foi o único passista a ser recuperado tar Hugo Soares é secretário-geral e o
O antigo comissário europeu e sante Ricardo Baptista Leite desa- Sinal de que o partido está con- pela direcção de Montenegro: as ex- líder da distrital de Viseu e antigo
actual autarca exigiu explicações do Æou os dirigentes sociais-democra- fortável com a estratégia de Mon- ministras Maria Luís Albuquerque e coordenador de campanha autárqui-
Governo sobre o impacto da inÇa- tas a estarem todos os dias “junto tenegro é a votação da sua moção: Teresa Morais, ambas vice-presiden- ca de Passos Coelho em 2017, Pedro
ção. “Com uma inÇação entre 6% e das pessoas” para “reconquistar a foi aprovada sem votos contra e só tes do PSD na liderança de Passos Alves, Æcou incumbido de preparar
8%, se os salários não aumentarem conÆança dos portugueses”. “Pre- com duas abstenções. Coelho, Æguram na lista do conselho as eleições autárquicas de 2025.
um cidadão perde 30% do seu salá- cisamos de ter o partido na rua”, Quando Luís Montenegro subiu nacional. Para a mesa do con-
rio em cinco anos”, assinalou, defendeu. ao palco para anunciar as suas lis- Sinal de que o novo
ovo líder gresso, o novo líder
defendendo ainda a necessidade de Se houve quem criticasse a “pure- tas aos órgãos nacionais, a única quer abrir o PSD ao país do PSD quis dar peso
“baixar os impostos e melhorar os za ideológica” a que o PSD foi vota- vez durante o segundo dia de tra- é a criação já anuncia-
ncia- institucional ao esco-
serviços públicos”. do nos últimos anos, um dos apoian- balhos do congresso, apelou a que da do movimento nto lher Miguel Albuquer-
Moedas lembrou que ganhou a tes da anterior direcção, Carlos os congressistas, no momento de Acreditar, deÆnido do que, presidente
câmara há oito meses mas que o PS Eduardo Reis, subiu ao púlpito para votar (hoje de manhã), enviem um como os “estados dos do Governo
“ainda não acredita”, arrancando defender que, no quadro actual, “sinal” ao país de que “o PSD está gerais” do PSD, D, Re g i o n a l d a
gargalhadas na sala. E, numa espé- “será um erro” o partido “fugir do forte, unido, está coeso e pronto que irá ouvirr Madeira, para a
cie de aula a Montenegro, deÆniu o centro político, onde estava a captar para se entregar ao serviço de Por- todos os interlo- presidir. com
que deve ser a “marca do PSD”. eleitorado”. tugal”. cutores externos S.J.A.
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4 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
Filme do dia
Reacções
A questão dos órgãos
não interessa, interessa
PSD in vino
é a minha mensagem
política, que é muito
clara, de apoio à
veritas
liderança do partido (...).
O que interessa é o PSD Reportagem
e há muitos anos que não vemos o
PSD a viver as euforias que as
estar unido e mobilizado bebedeiras de poder costumam
Paulo Rangel produzir nos partidos.
Ana Sá Lopes
Eurodeputado do PSD Apesar da proximidade do vinho,
a moderação foi a marca do
O “íssimo cansaço” de que congresso. Os sociais-democratas
Quem não quer falava Pessoa é o espelho estão tensos — alguns congressistas
participar deixe deste PSD. Festival do vinho explicam esse estado de algum
aborrecimento, num conclave de
de chatear para ao lado ajudou congressistas um partido que já viveu congressos
construir esta a atingirem o ânimo possível épicos na sua história, com a
alternativa a Portugal necessidade de não contribuir
O
s partidos (e, vá lá, a vida) (ainda mais) para a derrocada. Ou
(...). O PSD tem de se são como o vinho. Nunca seja, o tempo é de unidade e a
reconciliar com o seu se sabe se vai ser boa a
colheita do ano e se, depois
unidade dá congressos mais
aborrecidos.
passado da vinha vindimada, Mas apesar de a sala se ter
Miguel Albuquerque miraculosamente surge um levantado várias vezes para apoiar
Presidente do Governo partido “intenso, distinto, vários oradores, do derrotado Jorge
Regional da Madeira encorpado e com muita vida pela Moreira da Silva ao líder eleito, Luís
frente”, como acontece quando o Montenegro — e ter recebido de pé
clima e o enólogo são bons. A o único antigo presidente que fez
Sou cavaquista, sou viticultura social-democrata tem questão de vir dar o seu apoio a
passista, até era rioísta, tido anos muito difíceis, sendo Montenegro, o “outro Luís”,
e agora sou, acrescento, impossível detectar qualquer “Ænal
de boca complexo” ou “aroma
Marques Mendes —, não existia
nenhuma crença em amanhãs que
montenegrista elegante”, descontados os ainda cantam. Podem cantar, mas
Miguel Pinto Luz recentes sucessos das vitórias também podem não cantar: a ideia
Vice-presidente da Câmara autárquicas de Carlos Moedas em do “vamos lá a ver como isto corre”
Municipal de Cascais Lisboa e de José Manuel Silva em parece prevalecer relativamente a
Coimbra. A maioria absoluta do PS qualquer “onda montenegrista”.
a 30 de Janeiro fez azedar Muitos militantes estão
Não encabeçarei deÆnitivamente as produções dos visivelmente cansados e acham
qualquer lista própria ao anos Rui Rio. que, se esta oportunidade falhar, o
“Ao menos, o vinho anima”, partido pode mesmo implodir.
conselho nacional (...). desabafa uma congressista do Apesar de os discursos no palco
Não sou líder de facção interior. O 40.º Congresso do PSD, apelarem às desejadas vitórias
Jorge Moreira da Silva no Pavilhão Rosa Mota, no Porto, é futuras com o mínimo de
Ex-ministro do Ambiente vizinho do Festival Essência, convicção, a ideia de que “está tudo
dedicado ao vinho e à música, e parado e desmobilizado” é expressa
muitos congressistas aproveitam ao PÚBLICO por um congressista.
[Montenegro,] tens fibra toda a alegria que a vizinhança “Se não lhes cai o poder nas mãos,
de líder. A tua calma, pode proporcionar — as provas de
vinho. Afinal, o congresso foi vivido
não sei como vai ser.” Elementos do
rioísmo que agora saem de cena
a tua capacidade de com o entusiasmo de uma água antevêem um PSD mais próximo do
criar pontes, a tua mineral a acompanhar peixe cozido Chega, em violência de linguagem.
capacidade de ouvir são
únicas e tenho prova
disso. E eu estou aqui
para o que der e vier
Carlos Moedas
Presidente da Câmara
Municipal de Lisboa
Luís Montenegro
surpreendeu. Na
política, o efeito
surpresa é bom
Marques Mendes
Comentador e ex-líder do PSD
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 5
Apesar de a sala se
ter levantado várias
vezes para apoiar
vários oradores,
do derrotado Jorge
Moreira da Silva ao
líder eleito, Luís
Montenegro — e ter
recebido de pé o
único antigo
presidente que fez
questão de vir dar o
seu apoio a
Montenegro, o
“outro Luís”,
Marques Mendes —,
não existia
nenhuma crença
em amanhãs
que cantam
O risco de o PSD se “acantonar à Moreira da Silva foi voltar a ser candidato a líder.
direita” é expresso no palco pelo simpático com o “amigo” Jorge Moreira da Silva, o
deputado Carlos Eduardo Reis, que vencedor, Moedas elogiou candidato derrotado, foi muito
foi director de campanha de Jorge “a fibra” de Montenegro simpático com o “amigo” vencedor,
Moreira da Silva. embora deixando claro, de uma
Quando Paulo Rangel entrou nos forma delicada, que não iria abdicar
jardins do Palácio de Cristal (o entrevistas às rádios e televisões), das suas ideias — posicionando-se
nome oÆcial agora é Super Bock mas foi a maior surpresa do desde já para a sucessão caso as
Arena — Pavilhão Rosa Mota), os congresso ao aceitar ser número 2 coisas corram mal a Montenegro.
fados do Festival Essência abafavam da direcção de Luís Montenegro. “Não estou disponível para um
a voz do eurodeputado. “Até que a Ninguém imaginava que o homem partido de pensamento único e o
voz me doa” não era uma metáfora: que perdeu (por muito pouco) para Luís dispensa totalmente esse
Paulo Rangel chegou tarde porque Rui Rio no Ænal de 2021 aceitasse ser presente envenenado.”
esteve praticamente afónico “vice” de Luís Montenegro, que o Quem falou mais claramente
durante algum tempo e acabou apoiou nessas directas — embora as como futuro candidato a sucessor
mesmo a fazer um teste à covid-19. tropas rangelistas duvidassem do foi o presidente da Câmara de
Intervir ou não intervir no empenho real de Montenegro. Mas Lisboa, Carlos Moedas, muito
congresso dependia da dor da voz — a verdade é que Rangel aceitou, aplaudido pelo congresso.
Rangel acabou por não falar aos encerrando simbolicamente desta Arrancou em tom “comicieiro” —
congressistas (falou apenas em forma qualquer possibilidade de “Que bonito está o nosso PSD” e
pediu vivas ao PSD. Elogiou o líder
eleito: “Luís, o país está à tua
espera. Eu estou contigo para o que
der e vier, Luís. Tu tens a Æbra de
um líder, a tua calma, a tua
capacidade de criar pontes, de
ouvir, são únicas.”
Mas quis deixar claro que a linha
potencialmente vitoriosa seria o seu
exemplo em Lisboa: “Se tivermos a
coragem de ouvir as pessoas, como
eu ouço em Lisboa, então vamos
ganhar. Foi assim que chegámos em
2011 a São Bento e em 2021 a
Lisboa”.
Também pode tratar-se de um
caso de muita parra e pouca uva.
Mas, como sabemos, até ao lavar
dos cestos é vindima.
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6 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
Espaço público
O
“porquê” da decisão de Para quem tem construído um quem sempre, no Ænal, preferiu
Editorial Pedro Nuno Santos percurso político com algumas dialogar à esquerda.
continuará durante mais diferenças em relação ao percurso É pouco para simbolizar uma luta
algum tempo a criar escolhido pelo líder, patentes na sua em nome do pedro-nunismo,
pontos de interrogação na moção ao congresso em 2018, e tem enquanto fonte de ideias próprias
cabeça de muitos portugueses. A cultivado paulatinamente uma base para o PS e para a governação, e
justiÆcação de um problema de de apoiantes no interior do partido, muito menos ainda quando do
David Pontes comunicação não colhe, quando em seria de esperar que a escolha do embate resultou um processo de
causa está a maior obra pública do pretexto acarretasse alguma carga humilhação do autor da rebeldia,
país em muitas décadas e alguém representativa da sua acção política. como não há memória. Até pode
com a experiência e as ambições No tema aeroporto, mesmo que se permanecer no lugar, com as
políticas do ministro. acrescente um distante Alcochete, a vantagens que advêm de estar no
Perante o facto consumado, Pedro escolha de Pedro Nuno Santos não centro do poder, mas o que cresce é a
Nuno Santos sabia que ou o anda longe do que António Costa ideia de que o pedro-nunismo não é
primeiro-ministro aceitava o gesto de apresentou em 2019 como “a muito mais do que um nome dado ao
rebeldia ou, mais provável, não o decisão”, com 50 anos de atraso. O processo de gestão da carreira
acolhia e assim abria uma polémica embate com o primeiro-ministro pode política de Pedro Nuno Santos.
com António Costa em que arriscava ser visto na questão da urgência, num Se num embate com António Costa
O que cresce é a ideia de o seu lugar no Governo, como esteve dossier que representa milhões de só há exibição de personalidades e
que o pedro-nunismo para acontecer. Quer o pano de fundo prejuízo para o país, com o ministro nenhuma de ideias, não foi neste
não é muito mais do que seja uma luta de poder no seio do a querer mostrar-se como um episódio, por muito que custe aos
um nome dado ao executivo, quer seja o futuro político fazedor, alguém que não tem medo Æéis do pedro-nunismo, que se
de Pedro Nuno Santos, foi ele quem de decidir. Já o embate com o líder do conseguiu perceber que a alternativa
processo de gestão da escolheu o pretexto para uma prova PS está claramente na escusa de de liderança socialista é construída
carreira política de de força com o primeiro-ministro e diálogo com os sociais-democratas, por causa de um ideário próprio e
Pedro Nuno Santos com o líder do PS. apesar das promessas de Costa, por não só por ambição pessoal.
CARTAS AO DIRECTOR
Aeroporto de Lisboa Revogação do despacho colo e um colega que não lhe dava última vez que fomos ao CNP, a 14 e os EUA, com imensa facilidade,
dinheiro para as rodas dos de Março deste ano, disseram-nos convenceram os aliados da UE e do
Os que discordam da construção do Perante a posição do maior partido comboios, outros a brincarem aos que dentro de 2/3 meses teríamos G7 a cerrarem Æleiras contra a
novo aeroporto em Alcochete da oposição, restava ao partido do aviões, um presidente da oposição resposta e até agora, nada. Rússia.
utilizam um argumento falacioso Governo realizar uma jogada já eleito que não se quer queimar, Pergunto, até quando deveremos É certo que não é a maioria da
para justiÆcar a sua opinião: que é política que Æzesse o PSD e todos os ainda os autarcas a boicotar o esperar? população mundial, mas vêem-se
muito mais caro e demora muito outros partidos a mudarem de trabalho já feito e um “chefe” que As nossas pensões foram como os únicos e legítimos
tempo a construir. Deste modo, posição e voltarem a participar na todos os dias adia tudo e promete solicitadas pelos respectivos detentores da “marca registada”
pretendem abrir caminho à solução discussão e contribuírem para uma tudo para “amanhã”, deu um grito serviços de Genebra e estamos democracia, reservando-se o
do Montijo, como sendo mais decisão nacional. Aí está a forma para dizer “deixem-me trabalhar”. apreensivos por tanta falta de direito a exportá-la para outras
barato e de construção mais rápida. encontrada. Alguém acredita que Não devia gritar tão alto? Quem proÆssionalismos dos respectivos paragens, nem que seja contra a
Na realidade, o aeroporto em esta tomada de decisão do ministro sabe. O tempo o dirá. funcionários ou de toda a vontade dos protegidos. Enquanto
Alcochete pode e deve ser das Infra-Estruturas não foi José Rebelo, Caparica burocracia existente. Para terem contemplam o alargamento da
construído por fases. A primeira concertada com o chefe do uma ideia, cá na Suíça, dois, três NATO, sempre a pedido dos novos
fase deveria constar apenas de uma Governo? A prova disso foi o Morosidade das pensões meses antes de nos aposentarmos, membros — a quem seria falta de
pista e uma aerogare, no fundo entendimento entre ambos sem somos obsequiados com uma carta respeito dizer não, mesmo que por
idêntica ao que se tenciona demissão. Se não fosse uma cartada Gostaria de manifestar a minha dos respectivos serviços a darem- razões prudenciais —, deleitam-se
construir no Montijo. Ou seja, os política, nada disto teria sido maior indignação pelo facto de -nos os parabéns e a desejarem-nos num interessante jogo de
fundos que se iriam delapidar nesta possível. A demissão seria a única estar a aguardar a minha pensão da a melhor sorte. Para quando algo imaginação a criar inventivas
solução, que tem merecido grandes solução numa situação destas. Caixa Geral de Aposentações (CGA) do género em Portugal? sanções a Putin. Às vezes, dizem
críticas, como seja, por exemplo, a Rafael Serrenho, Alandroal há mais de três anos (recebo só a Maurílio G. Romão, Locarno que deixam de comprar coisas à
construção de uma nova pista, com pensão da Segurança Social), Rússia, mas só no futuro. Outras
grandes problemas de engenharia O grito de Pedro apesar de já ter requerido a pensão Sol na eira vezes, dizem que vão tabelar os
no aterro no topo sul, não uniÆcada e a minha mulher estar a e chuva no nabal preços, acima dos quais não
esquecendo as questões Pedro Nuno Santos é burro? Eu receber a pensão da CGA e de lhe pagarão. O presidente do Conselho
ambientais, seriam muito mais bem acho que não. Está na cara que ele faltar a da Segurança Social, há Uma boa parte dos líderes mundiais Europeu é que sabe, como quando
aproveitados no Ænanciamento da não foi pelos caminhos mais de dois anos. Já escrevi cartas não anda boa da cabeça. Se Putin diz que “(...) o objectivo é atingir a
primeira fase de Alcochete. institucionais para dizer ao que à respectiva ministra, já fomos ao fez o que fez, espalhando metralha Rússia e não tornar a nossa vida
Esperemos que o bom senso vinha, mas eu até o compreendo. Centro Nacional de Pensões (CNP), a jorros para exercer um “direito”, mais difícil e mais complexa”. É o
prevaleça. Tinha de dar um grito de revolta. à Loja do Cidadão, telefonemas os adversários tradicionais Æzeram chamado delírio criativo.
José Augusto V.O. Simões, Oeiras Com quatro “batatas quentes” ao intermináveis e até agora nada. Da gala em se travestirem de inimigos, José A. Rodrigues, Vila Nova de Gaia
As cartas destinadas a esta secção têm de ser enviadas em exclusivo para o PÚBLICO e não devem exceder as 150 palavras (1000 caracteres). Devem indicar o nome, morada e contacto
401276
telefónico do autor. Por razões de espaço e clareza, o PÚBLICO reserva-se o direito de seleccionar e editar os textos e não prestará informação postal sobre eles cartasdirector@publico.pt
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 7
A
que pode haver: “Não pesam nada e levam
convém Miguel Esteves Cardoso
muito!” Só faltou dizer que tinham também Directora de arte
Sónia Matos
Padre António qui perto há um senhor
que, uma vez por ano, para
a virtude da transparência, revelando o
conteúdo sem necessidade de desconÆança
Directora de design de produto digital
Inês Oliveira
Vieira escoar o feijão-verde da horta,
se põe à beira da estrada.
ou desalfandegamento.
Surtiu efeito porque Æquei convencido.
Editoras executivas
Helena Pereira, Sónia Sapage
(1608-1697) Senta-se no muro da horta e, De facto, os sacos de plástico são uma
Editor de fecho
José J. Mateus
quando lhe perguntam se o maravilha. Eu é que não ouço dizer bem Subeditor de Opinião Álvaro Vieira Editor P2 Sérgio B. Gomes Online
feijão é dele, gosta de apontar para os deles desde os anos 60, quando fui à Mariana Adam, Patrícia Jesus, Pedro Rios, Ivo Neto, Pedro Esteves (editores),
feijoeiros e dizer “Como pode ver, inauguração do primeiro supermercado. Filipa Almeida Mendes, José Volta e Pinto, Inês Chaíça, Miguel Dantas, Sofia
Neves (última hora); Aline Flor, Ruben Martins (áudio); Joana Bougard (editora
O NÚMERO apanhei-os há bocado”. Para aquele camponês, era uma novidade Multimédia) Carolina Pescada, Carlos Lopes, Teresa Pacheco Miranda
14.650
Este ano, o senhor, já com os 80 à perna, a um preço atraente, permitindo-lhe (multimédia); Pedro Guerreiro (editor de redes sociais), Patrícia Campos,
Lucas Freitas; Rui Barros (jornalista de dados) Política Marta Moitinho Oliveira
está a passar o testemunho para a filha e ensacar um quilo de cada vez, enquanto (editora), David Santiago (subeditor), Ana Sá Lopes, São José Almeida
para o genro, um casal de jovens da minha esperava que parasse o próximo freguês. (redactoras principais), Leonete Botelho, Luciano Alvarez (grandes
idade que me apanhou como primeiro Ainda voltei àquela curva depois de repórteres), Liliana Borges, Margarida Gomes, Maria Lopes, Nuno Ribeiro,
Sofia Rodrigues Mundo Ana Gomes Ferreira, António Rodrigues (editores),
cliente, vigiado pelo hortelão mais velho almoço, para comprar mais um quilinho, Paulo Narigão Reis (editor adjunto), Bárbara Reis, Jorge Almeida Fernandes,
com o olhar mais crítico que eu já vi. mas já se tinham ido embora: tinha Teresa de Sousa (redactores principais), Rita Siza (correspondente em
Bruxelas), Alexandre Martins, António Saraiva Lima, Clara Barata, João Ruela
Cabe às gerações mais jovens terminado a epopeia de vendas de 2022. Ribeiro, Maria João Guimarães, Sofia Lorena Sociedade Rita Ferreira, Pedro
acompanhar a marcha da tecnologia e assim E a razão para lá voltar? Foi quando voltei Sales Dias (editores), Clara Viana (grande repórter), Alexandra Campos, Ana
foi: a grande inovação era o saco de do almoço e fui à mala do carro ver como Cristina Pereira, Ana Dias Cordeiro, Ana Henriques, Ana Maia, Joana Gorjão
Henriques, Mariana Oliveira, Natália Faria, Patrícia Carvalho, Samuel Silva,
visitantes teve o Museu do plástico. Deve ter sido ideia do homem estava o feijão-verde que me tinha Sónia Trigueirão Local Ana Fernandes (editora), Abel Coentrão, Cristiana
Tesouro Real desde que abriu ao porque foi ele quem me fez o louvor deste esquecido de libertar. Tinha sufocado, por Moreira, João Pedro Pincha, Mariana Correia Pinto Economia Pedro Ferreira
Esteves, Isabel Aveiro (editores), Cristina Ferreira, Sérgio Aníbal (grandes
público, no dia 2 de Junho apetrecho, enquanto a mulher ora virava as obra e graça dos tão venerados saquinhos. repórteres), Ana Brito, Luís Villalobos, Pedro Crisóstomo, Rafaela Burd Relvas,
Raquel Martins, Rosa Soares, Victor Ferreira Ciência e Ambiente/Azul Andrea
Cunha Freitas eTeresa Firmino (editoras), Andréia Azevedo Soares, Clara
Barata, Claudia Carvalho Silva, Daniel Dias, Gabriela Gómez (infografia),
Nicolau Ferreira, Teresa Sofia Serafim, Tiago Ramalho, Vera Moutinho
ZOOM CAMPEONATO MUNDIAL DE NATAÇÃO, BUDAPESTE, HUNGRIA (multimédia) Tecnologia Karla Pequenino Cultura/Ípsilon Paula Barreiros,
Inês Nadais (editoras), Vasco Câmara (editor Ípsilon), Isabel Coutinho
(subeditora), Nuno Pacheco (redactor principal), Isabel Salema, Sérgio C.
ANTONIO BRONIC/REUTERSFOTÓGRAFO Andrade (grandes repórteres), Joana Amaral Cardoso, Lucinda Canelas, Luís
Miguel Queirós, Mário Lopes, Vítor Belanciano Desporto Jorge Miguel Matias,
Nuno Sousa (editores), Augusto Bernardino, David Andrade, Diogo Oliveira,
Marco Vaza, Paulo Curado Fugas Sandra Silva Costa, Luís J. Santos (editores),
Alexandra Prado Coelho (grande repórter), Luís Octávio Costa, Mara
Gonçalves Guia do Lazer Sílvia Pereira (coordenadora), Cláudia Alpendre,
Sílvia Gap de Sousa Ímpar Bárbara Wong (editora), Carla B. Ribeiro P3
Amanda Ribeiro, Ana Maria Henriques, Renata Monteiro, Mariana Durães
Newsletters e Projectos digitais João Pedro Pereira (editor) Projectos
editoriais João Mestre Fotografia Miguel Manso, Manuel Roberto (editores),
Adriano Miranda, Daniel Rocha, Nelson Garrido, Nuno Ferreira Santos, Paulo
Pimenta, Rui Gaudêncio, Alexandra Domingos (digitalização), Isabel Amorim
Ferreira (documentalista) Paginação José Souto (editor de fecho), Marco
Ferreira (subeditor), Ana Carvalho, Ana Fidalgo, Joana Lima, José Soares,
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ser enviadas para leitores@publico.pt
Espaço público
1.
comum.
Dentro e fora da Igreja Católica há que
São muitas as pessoas, crentes e não construir uma sociedade mais aberta às
crentes, católicas e não católicas, margens, capaz de as trazer para o centro e de
inquietas com a saúde do Papa ver no seu sofrimento e estigmatização o
Francisco. Para muitos, é ele a Ægura fermento da mudança necessária para
pública, a nível mundial, cujos sociedades mais livres, dignas e felizes.
gestos, palavras e intervenções se Uma Igreja Católica que se abra a estes
situam sempre ao lado das vítimas das muitas desaÆos, ouça as companheiras e os
loucuras da nossa história económica, social, companheiros de jornada e acolha e integre
política, bélica e religiosa. Toma iniciativas, os que excluiu, marginalizou ou não
simples e arrojadas, destinadas a agregar procurou, fará parte de um mundo melhor e
energias e esforços para estancar a será fermento de uma mudança social,
brutalidade de todas as guerras e agora a cultural e espiritual que o melhorará para
ameaça da guerra nuclear. recolher a memória da GS e torná-la além da sua própria mudança interior. É
Não é um profeta da desgraça. É uma inspiradora para um mundo muito diferente nessa convicção que procurámos contribuir
sentinela da esperança, encorajando e do tempo conciliar (1962-1965). Um desses para este exercício, respondendo ao apelo do
apoiando todos os movimentos que contributos vem assinado pelos participantes Papa Francisco, que sentimos ser dirigido ao
desenvolvem programas para defender, na sua elaboração e apresenta-se como mundo e não apenas à sua hierarquia ou à sua
restaurar e tornar mais habitável e bela a Casa
Comum da família humana. É normal que
Dentro e fora da Igreja realização de crentes e não crentes [1]. É um
documento longo, do qual só posso dar
Igreja.
3. Neste mundo, ou nos salvamos todos
encontre resistências no mundo dos ricos e Católica há que algumas referências, mas convidando à sua juntos ou morremos todos juntos porque está
poderosos e na perversa “teologia da
prosperidade” que os apoia e justifica.
recusar um mundo leitura integral.
Este grupo manifesta, explicitamente, onde
tudo ligado. Para o físico Carlo Rovelli [2], ser
é, em essência, interagir. Mostra que o mundo
Entre todas as iniciativas deste Papa, desumanizado quer chegar: Ambicionamos produzir um que temos não é o único possível. O que
destaco a inédita auscultação, à escala
planetária, para que o Sínodo dos Bispos
e com uma ética contributo analítico e propositivo a partir de
uma interpretação exigente dos três verbos
temos, actualmente, é um jogo de poderes.
Depois da II Guerra Mundial, surgiu a noção
(2021-2023) se torne Sínodo de toda a Igreja. utilitarista que ameace assinalados pelo Papa Francisco como clara de que não podia repetir o que tinha
Já li vários contributos de resposta a este
grande desafio. Alguns já figuram no jornal
a dignidade comum condutores de reÇexão: encontrar, mas
também “estar, ser e devir com”; escutar, mas
acontecido no século XX. Guerra nunca mais!
A mecânica do pensamento a partir da qual
7Margens. No geral, deixavam-me a sensação também criar e manter espaços permanentes percebemos a realidade, em termos de
de se centrarem nas questões internas do Igreja dentro do Mundo, não à margem, de diálogo, participação e interacção; relações, deveria ajudar-nos a compreender
funcionamento da Igreja. Parecem esquecer a evitando as expressões dualistas — a Igreja e o discernir, mas também transformar a Igreja — melhor a política, a nossa vida em comum, a
Constituição Pastoral, Gaudium et Spes (GS), Mundo — como se fossem realidades “laboratório teológico” — numa Igreja organização do mundo. Isto signiÆca,
sobre a Igreja no Mundo Contemporâneo, estranhas que procuram dialogar ou universal de proximidade, nomeadamente simplesmente, que um país é mais forte se
documento que só foi aprovado em ignorar-se. Deve ser claro que não são com os excluídos, os considerados conseguir relações mais sólidas com os
Dezembro de 1965. A sua redacção foi difícil e, coincidentes, mas mesmo que certos “diferentes”, os que estão nas margens, os outros. Tudo o que a espécie humana atingiu
por três vezes, começou a partir do zero, movimentos culturais, sociais e políticos que raramente são ouvidos, e também os que, de importante foi em colaboração. Nenhuma
porque os dois primeiros textos foram procurem ignorar ou atacar a dimensão considerando-se “estar fora”, pretendem, entidade constrói algo sozinha. A humanidade
totalmente rejeitados pelos Padres religiosa das sociedades, a Igreja é que não com um olhar atento, “desaÆar” os de dentro. é um imenso esforço colaborativo.
Conciliares. pode satisfazer-se com essa ignorância ou IdentiÆca, por outro lado, os problemas e A pior perda que pode acontecer na história
Deveria ser evidente que este é um texto a rejeição. É neste mundo que vive a sua desaÆos das sociedades contemporâneas: dos povos e das nações é a perda da memória.
refazer periodicamente porque o “Mundo diferença, testemunha, se questiona a si falamos de todos os problemas e desaÆos Ao não se aprender nada com as brutalidades,
Contemporâneo” de 1965 não é, em vários mesma, interroga e deixa-se interrogar pela relacionados com obstáculos e condições de crueldades e destruições das guerras do
aspectos, o mundo que estamos a viver. O sociedade em evolução. Mesmo as suas humanização das sociedades actuais. Isto é, de passado, a vontade do poder de dominação
Papa Francisco já o tentou, em vários expressões culturais, litúrgicas, não podem problemas sociais, velhos e novos, que vão da não hesita em desencadear novos processos
documentos, a começar pelo Evangelii ignorar as complexas transformações persistência da condição de subalternidade de extermínio, com novos meios de agressão.
Gaudium (Alegria do Evangelho) e alargando culturais, como se estas nada tivessem a ver das mulheres nos processos de tomada de
cada vez mais os seus cuidados com o mundo com as suas expressões da fé. Isto exige um decisão e de todas as formas estruturais de [1] Cf. 7Margens, 23.06.2022; Cf. também o
que falta fazer. Situou sempre as suas grande exercício de imaginação (Timothy iniquidade, pobreza e exclusão, aos processos texto do Metanoia, 7Margens, 28/6/2022.
intervenções a partir da actualidade mundial. Radclièe). de transição justa nos domínios digital, [2] Revista do Expresso, 3/6/2022.
No entanto, a GS continuará como um marco 2. Neste sentido, encontrei alguns energético e ecológico e aos desaÆos da
que não pode ser esquecido porque situa a contributos para o Sínodo que conseguiram relação entre a ética e o progresso cientíÆco e Escreve ao domingo
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 9
1.
de todos os cenários. É o cenário
“impensável”. Para a Europa e para o
Charles Kupchan publicou na mundo. Porque as democracias europeias
revista Foreign Aèairs um não estão isentas da contaminação populista
pequeno ensaio cujo título nos faz e extremista, como vemos em quase todas as
reÇectir: “O difícil caminho que a mais exigente e perigoso. eleições. Porque não têm força para,
NATO tem à sua frente — as 2. Mas a questão de Kupchan é mais vasta. sozinhas, defenderem os valores ocidentais
maiores ameaças à unidade da Os maiores desaÆos que os aliados podem vir no mundo ou proteger a sua inÇuência
Aliança virão depois da cimeira de Madrid”. a enfrentar, comuns aos dois lados do internacional. E, muito menos, num
Podemos dizer que Kupchan, investigador Atlântico, são talvez de ordem interna. ambiente de extrema incerteza e de enormes
do Council on Foreign Relations de Resumem-se a uma questão: como preservar Todas estas decisões diÆculdades económicas, propícias ao
Washington, se limita a constatar o óbvio. a estabilidade e a coesão das respectivas fechamento e à divisão. Precisamente uma
Não vai ser fácil pôr de pé as medidas de democracias. Comecemos pela Europa, que, fundamentais vão das grandes lições desta crise está em que a
natureza militar que foram aprovadas para desde o Æm da Guerra Fria, se habituou a depender do que se Europa apenas pode ter a força suÆciente
que a aliança possa enfrentar a nova contar sempre com os dividendos da paz. para pesar num mundo cada vez mais
ameaça directa à segurança dos seus Alguma coisa já tinha mudado a partir de passar nos Estados determinado pela competição entre grandes
membros, representada hoje pela Rússia de 2014, com a primeira invasão russa do Unidos nos próximos potências, se preservar uma relação
Putin. Não se aumenta de um dia para o Donbass e a anexação da Crimeia, voltando a transatlântica indestrutível.
outro uma Força de Reacção Rápida de 40 pôr em cima da mesa os gastos com a defesa. tempos. Ou do que 5. Houve, apesar de tudo, excelentes
mil homens para 300 mil. É preciso Nesse ano, numa cimeira da NATO, os acontecer à democracia notícias na sucessão de cimeiras que
substituir o armamento pesado que foi aliados Æxaram a meta dos 2% para os marcaram os últimos dias de Junho — do
enviado para a Ucrânia. respectivos orçamentos de defesa, que devia americana Conselho Europeu à cimeira da NATO,
Os aliados europeus, que pouco se ser cumprida até 2024. Foram raros os países passando pela reunião do G7. E que podem
preocuparam até hoje com a sua segurança, europeus que a levaram a sério. Com o europeus estão mesmo dispostos a alguns ser resumidas de uma maneira simples. O
vão ter de reforçar as respectivas espartilho das regras do déÆce e da dívida, sacrifícios para garantir o apoio à Ucrânia. Ocidente lançou as bases de uma estratégia
capacidades militares de forma coordenada imposto na zona euro, e com o peso Com os efeitos da inÇação no custo de vida, a para consolidar a sua inÇuência mundial,
e inteligente. Talvez por isso, na perspectiva orçamental do modelo social europeu, a perspectiva de uma recessão económica ou numa altura em que as grandes potências
da defesa dissuasora, a notícia mais última das preocupações dos governos — de uma nova vaga de refugiados da fome autocráticas estão na ofensiva à escala
importante, em termos militares, tenha sido centro-esquerda ou de centro-direita — provocada pela crise alimentar global, este global. A decisão de dedicar 600 mil milhões
o anúncio feito pelo Presidente Biden de foram os gastos militares. estado de espírito pode mudar rapidamente. de dólares para apoio ao investimento em
que, até ao Ænal do ano, os EUA vão reforçar A Alemanha foi o caso extremo. Talvez as O que se está a passar hoje na Alemanha, a infra-estruturas (físicas, tecnológicas, de
a sua presença na Europa com a instalação únicas excepções tenham sido a Suécia e a mais forte das economias europeias, é saúde pública) nos países do chamado “Sul
de um quartel-general na Polónia, uma Finlândia, justamente porque não paradigmático. “Estamos já numa crise do Global” pode ter sido tardia, mas é,
brigada na Roménia e mais dois esquadrões dispunham da protecção da NATO, que, gás, que passou a ser uma matéria-prima Ænalmente, uma resposta à “Nova Rota da
de F-35 no Reino Unido. É um sinal convém sempre lembrar, signiÆca a escassa a partir de agora. Isto vai afectar a Seda”, lançada pela China há quase 10 anos.
inequívoco do seu compromisso com a protecção americana. Se ainda é precisa uma produção industrial e tornar-se um fardo É pouco, comparado com os 2,5 biliões
defesa da Europa de que os europeus prova deÆnitiva deste estado de coisas, basta pesado para os consumidores”, acaba de investidos pela China. Pode ser importante,
precisavam. lembrar as eternas discussões europeias dizer o vice-chanceler e ministro da quando os investimentos chineses começam
Convém lembrar que, apesar das sobre a sua política de segurança e defesa, Economia de Berlim, Robert Habeck. É a ser olhados com desconÆança pelos
vicissitudes da relação transatlântica nos que nunca passaram disso mesmo: nestas circunstâncias que a Europa tem de beneÆciários.
anos de Trump, os EUA mantinham 80 mil discussões sem qualquer tradução prática fortalecer as suas capacidades de defesa. Os O convite feito por Olaf Scholz, que
homens em território europeu, boa parte sobre a “autonomia” em relação aos EUA, governos terão de explicar aos cidadãos que presidiu ao G7, aos presidentes da Índia,
dos quais estacionada na Alemanha. A que queriam traduzir numa capacidade vai ser preciso encontrar um novo equilíbrio Indonésia e África do Sul tem de ser
guerra já elevou para 100.000 este número. militar própria que nunca chegou a existir. entre segurança e benefícios sociais. Até acompanhado por uma estratégia de
Esta presença foi, durante muito tempo, Hoje, a questão coloca-se Ænalmente com hoje, têm sido muito pouco convincentes, cooperação com as grandes democracias do
tema de polémica em anteriores eleições toda a sua clareza: a NATO é a pedra-angular porque bastante pouco verdadeiros. Sul, que a Europa quase sempre descurou,
alemãs, porque uma parte do SPD e uma da segurança europeia; o fortalecimento da 4. Enquanto acompanhava os trabalhos da concentrada que estava no mercado chinês e
parte dos Verdes a contestavam. Hoje Aliança passa pelo fortalecimento do seu cimeira da NATO em Madrid, houve um nas suas vantagens económicas. Mas esse
agradecem-na. Tudo isto faz parte do pilar europeu. pensamento que nunca me abandonou: tempo parece estar a passar. A guerra de
passado, graças à invasão russa da Ucrânia. 3. Para que isso possa acontecer, Charles todas estas decisões fundamentais vão Putin também serviu para isso — as
Nesse sentido, podemos dizer que esta Kupchan recomenda à Europa que depender do que se passar nos Estados democracias ocidentais perceberam que o
cimeira da Aliança Atlântica representou “mantenha uma particular atenção à frente Unidos nos próximos tempos. Ou, em resto do mundo não as seguia, nem na
uma extraordinária demonstração de doméstica”. Até agora, o choque da guerra e palavras um pouco mais dramáticas, mas condenação da Rússia nem no apoio à
unidade das democracias ocidentais e da o sofrimento e a coragem dos ucranianos talvez não demasiado exageradas, do que Ucrânia. Têm de recuperar o tempo perdido.
sua determinação para responderem a um conseguiram mobilizar as opiniões públicas acontecer à democracia americana.
novo ambiente estratégico mundial muito europeias. As sondagens dizem que os Há meia dúzia de anos, esta questão nem Jornalista. Escreve ao domingo
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10 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
PAULO NOVAIS/LUSA
“desconvite”
trar-se com o seu homólogo, Jair esclarecido. Questionado pelo PÚBLI-
Bolsonaro, mas confessa que ainda CO se pensa ir a Brasília, Marcelo
não tem informação oÆcial sobre se respondeu que essa decisão só será
se mantém, ou não, o almoço para tomada hoje, depois de participar na
disponível para
Marcelo Rebelo de Sousa ao Brasil momento não houve, por escrito,
incluía um encontro amanhã de nenhuma comunicação”, disse aos
manhã entre os dois chefes de Esta- jornalistas. “Nós não nos podemos
do no Palácio Itamaraty, seguido de substituir, em matéria escrita, a
Não nos podemos
substituir, em
ir ao Itamaraty
um almoço privado. Mas horas antes quem escreve ou não escreve, e não
de embarcar para o Rio de Janeiro, podemos fazer disto algo dramático,
Jair Bolsonaro conÆrmou à CNN que não é”, acrescentou, sublinhan- matéria escrita, a
Brasil que não iria receber o seu do que “quem convida para sua casa quem escreve ou
homólogo, por este se encontrar na é o dono da casa”. “Desde há dois
véspera com Lula da Silva, o ante- dias que lemos as declarações na não escreve, e não
rior Presidente do Brasil e candida- comunicação social, e eu não levo podemos fazer disto
Mais de 24 horas após Bolsonaro ter dito à to às eleições presidenciais de 2 de isso como drama, até porque há um
algo dramático,
Outubro próximo. encontro inevitável em Setembro”,
CNN Brasil que não receberia o homólogo A Presidência da República portu- por altura das comemorações dos que não é
português, a Presidência portuguesa guesa não recebeu, no entanto,
nenhuma informação oÆcial desse
200 anos da independência do Bra-
sil, disse ainda. Marcelo Rebelo de Sousa
continua sem uma informação oÄcial “desconvite”. Ainda ontem à tarde, Marcelo fez questão de frisar que, Presidente da República
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 11
Lei dos
remetido à comarca de origem”, reve- tudo tem que ver com a organização
Mariana Oliveira
la fonte oÆcial daquela instância. que foi deÆnida em conjunto com os
Em vigor há pouco mais de três meses, Enquanto o TC não toma uma deci- 22 juízes da comarca. “Convoquei os
o novo regime de impedimentos pre- são, o caso Æca parado. Igualmente colegas para uma reunião, e acordou-
281 julgamentos
cando 281 adiamentos de instruções e Os dados recolhidos pelo CSM mos- bunais próximos, para que os titula-
julgamentos. Os números foram trans- tram que tanto os impedimentos res dos casos pudessem continuar a
mitidos pelo Conselho Superior da declarados como os adiamentos que fazer as respectivas instruções ou jul-
Magistratura, na sequência de um estes provocaram são muito diferen- gamentos.
e instruções
pedido de informações do PÚBLICO. tes de comarca para comarca e que “Como sabíamos que muitos actos
Em pelo menos sete situações, hou- nem sempre os distritos com mais durante o inquérito iam levar ao
ve juízes a declarar o novo regime casos de juízes impedidos são os que impedimento do juiz titular, vedando-
inconstitucional, o que obrigou o registam um maior número de julga- lhes fazerem a instrução ou o julga-
Ministério Público a recorrer para o mentos ou instruções adiadas. Tal mento, decidimos resguardar o titular
Tribunal Constitucional (TC). “Dos decorrerá principalmente da forma para as fases mais importantes do
Houve juízes que declararam novo sete processos com referência ao arti-
go 40.º do Código de Processo Penal
como cada comarca se organizou.
A juíza presidente de Vila Real,
processo. E colocámos os substitutos
logo a fazer os actos durante o inqué-
regime de impedimentos [o que prevê as situações que levam Maria Hermínia Oliveira, contabiliza rito, que são normalmente mais leves
um juiz a Æcar impedido de decidir até ao Ænal de Junho 251 situações de e menos demorados”, explica Maria
inconstitucional, estando pendentes seis um processo], seis estão a correr ter- impedimentos, o número mais eleva- Hermínia Oliveira.
mos e um teve decisão sumária de do do país, e apenas cinco julgamen- Assim, por exemplo, os inquéritos
recursos no Tribunal Constitucional ‘Não conhecimento’, tendo sido tos adiados. A responsável explica que de Vila Real são tramitados pelos juízes
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 13
RUI GAUDÊNCIO
que têm de substituir os que se decla-
Novo regime deve ser raram impedidos já terem agendas
preenchidas, o que diÆculta a marca-
aprovado até final ção de novas diligências que terão de
ser encaixadas de acordo com as dis-
deste mês ponibilidades existentes.
Na comarca de Braga, foram decla-
O
futuro regime de rados 124 impedimentos, que provo-
impedimentos dos juízes caram 70 adiamentos, quase todos de
previsto no Código de julgamentos. O juiz presidente, João
Processo Penal, que vai Paulo Pereira, alerta que Braga é a
encolher novamente os actos quarta maior comarca do país, com
susceptíveis de gerar 97 juízes. Confessa que pensou que os
impedimento de um magistrado, impedimentos iriam ser mais, mas
deve ser aprovado na nota que houve vários tipos de cons-
quarta-feira na Comissão trangimentos. Diferentes interpreta-
Parlamentar de Assuntos ções do artigo 40.º do CPP geraram
Constitucionais, Direitos, conÇitos negativos de competências,
Liberdades e Garantias, adiantou outros atrasaram os processos devido
ao PÚBLICO o deputado aos adiamentos ou obrigaram-nos a
socialista Pedro Delgado Alves, transitar para outros municípios. “Por
que integra aquela comissão exemplo, houve processos de Vila
onde a proposta do Governo Nova de Famalicão que tiveram de ser
está a ser discutida em conjunto transportados para Barcelos e proces-
com projectos apresentados sos de Barcelos que tiveram de ser
pelo PAN, pelo Chega e pelo remetidos para Famalicão”, detalha.
PSD. “A votação já esteve No extremo oposto está a comarca
Explicamos
prevista duas vezes mas foi de Setúbal, onde só foram declarados
adiada por pedidos potestativos cinco impedimentos e registados dois
do Chega e do PSD”, refere adiamentos. António Fialho, o juiz
Pedro Delgado Alves. O que preside à comarca, admite que o
o prazer do
deputado socialista ainda não reduzido número de processos-crime
sabe quando a proposta de lei em que os colegas consideraram não
do Governo irá a votação final poder intervir tem que ver com o fac-
global, mas assegura que a ideia to de ter dois juízes de instrução (uma
vinho
é tal acontecer até final de Julho, especialização que não existe em
antes de os trabalhos algumas comarcas) e de estes fazerem
parlamentares terminarem. A uma interpretação restritiva do actual
actual lei entrou em vigor em 21 artigo 40.º.
de Março e deve ser revogada Explica ainda que foram feitas algu-
menos de cinco meses depois, mas alterações de organização do
por insistência do Conselho serviço de forma a minimizar os
Superior de Magistratura que impedimentos. Exemplo disso é o
apresentou um projecto de facto de alguns actos menos relevan-
alteração ao Governo. O tes durante o inquérito, que antes
Conselho de Ministros aprovou eram decididos pelos juízes dos
em tempo recorde uma núcleos como Santiago do Cacém,
proposta de lei, a 12 de Abril. serem agora enviados para os magis-
trados de instrução criminal, em
Setúbal, para que os primeiros não
Mais de mil processos da Régua e os da Régua por Vila Real Æquem impedidos de realizarem o
foram afectados em apenas e Alijó. Quando os casos chegam às julgamento.
três meses secções, os funcionários já sabem que Independentemente do balanço de Terroir é o novo espaço de vinhos do PÚBLICO, no Fugas.
juiz contactar e é este que, de acordo cada comarca, todos têm uma certe- Um olhar atento sobre o sector vinícola nacional,
com a sua agenda, marca os actos, por za: quanto mais tempo este regime capaz de o fazer descobrir novas razões para apreciar
exemplo um interrogatório. vigorar, maiores serão os constrangi- uma cultura, as suas gentes e os seus produtos únicos.
“Claro que esta solução tem um mentos, especialmente se a redacção
Terroir é o novo diário de informação sobre
inconveniente para os juízes, têm de actual se mantiver até depois das
se deslocar de um lado para o outro. férias judiciais de Verão, que arran- um prazer que tem muito para revelar.
O juiz da Régua vai a Vila Real fazer o cam a 16 de Julho e se prolongam até Saiba mais em publico.pt/fugas/terroir
interrogatório e vice-versa. Mas tam- 31 de Agosto.
bém dá uma grande previsibilidade Isto porque, durante o mês e meio
Estão parados sobre o que vai acontecer”, sustenta em que decorrem as férias, os actos
a juíza presidente. Nesta solução, os urgentes são assegurados por juízes
os processos em juízes quase nunca chegam a decla- que estão organizados por turnos,
que um juiz se rar-se formalmente impedidos nos havendo, por isso, uma maior rotati-
processos, mas como agem na quali- vidade de magistrados a intervir num
declarou impedido dade de juízes substitutos, a contabi- processo, que habitualmente está
Um projecto com o apoio:
e o seu substituto lidade é feita como se houvesse essa apenas nas mãos de um só.
declaração. Por exemplo, um inquérito crimi-
não aceitou Na comarca de Porto Este foram nal que tenha escutas telefónicas —
receber o caso, por registados 69 impedimentos nestes em que a lei obriga que sejam valida-
três meses, o mesmo número de adia- das por um juiz de 15 em 15 dias —
considerar que mentos (60 relativos a julgamentos e pode passar por três juízes diferentes
não é o magistrado nove a instruções). A juíza presidente, durante as férias, impedindo todos
Helena Tavares, considera que uma esses magistrados de futuramente
competente para possível explicação para o número de fazerem uma eventual instrução ou
o tramitar adiamentos seja o facto de os juízes o julgamento do caso.
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14 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
Sociedade
“O
2019, nota o coordenador do Progra- s objectivos definidos no efeitos da covid-19, “deve ser das diÆculdades que os alunos tive- no secundário que o Ministério da
ma Nacional de Promoção do Suces- plano de recuperação de alargado” para além de 2023. ram de enfrentar devido à suspensão Educação introduziu em 2018.
so Escolar, José Verdasca. Mais do aprendizagens não terão Segundo um balanço recente, das aulas presenciais, foram algo A directora do agrupamento de
que a análise ano a ano, importa sido atingidos por os rastreios visuais e auditivos benevolentes nas avaliações”, admi- escolas de BenÆca, em Lisboa, Rosá-
“olhar para a tendência”, e essa, muitas escolas.” Com este aviso, de crianças e o apoio te. “Chumbaram” apenas os alunos ria Alves, também valoriza os efeitos
sublinha, “não sofreu uma inÇexão”. o presidente da Associação pedagógico reforçado nas “que estavam em situações-limite”, das aprendizagens essenciais, que
“Não há manifestamente um regres- Nacional de Directores de mudanças de ciclo de estudos resultando numa diminuição acima permitiram aos docentes gerir
so a uma disposição geral para a Agrupamentos e Escolas foram algumas das medidas do normal das taxas de retenção. melhor “programas muito exten-
reprovação”, salienta. Públicas, Filinto Lima, sugere ao mais adoptadas pelas escolas no No ano seguinte, os docentes “vol- sos”. Nos anos da pandemia, essa
É também essa a análise de Filin- Ministério da Educação que a âmbito do Plano de taram aos critérios de classiÆcação ferramenta foi “especialmente útil”
to Lima. “Voltámos aos valores ante- vigência do programa, lançado Recuperação lançado pelo habituais”, prossegue o dirigente. As e, conjugada com a introdução de
riores à pandemia”, aponta. Por isso há um ano para combater os Ministério da Educação. taxas subiram, mas não se afastaram perguntas opcionais nos exames
é que o presidente da Andaep suge- “do que era habitual antes”. “Penso nacionais, teve “efeitos positivos”.
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 15
Guerra na Ucrânia
A batalha por
Lisichansk está
dura e vai
intensiƊcar-se
Kiev nega que a cidade esteja cercada,
mas admite situação complicada. No
extremo oposto do país, Lviv prepara-se
para um eventual ataque bielorrusso
um pouco por toda a parte em resul-
João Pedro Pincha
tado dos ataques.
Pouco falta para as Forças Armadas “Felizmente, a cidade não está
russas e as milícias separatistas con- cercada e mantém-se sob controlo
quistarem toda a região de Lugansk, do Exército ucraniano”, assegurou
no Leste da Ucrânia. A separá-las um porta-voz militar, Ruslan Muzi-
desse objectivo estratégico está a tchuk. Segundo este responsável, a
cidade industrial de Lisichansk, na tropa russa continua focada em
margem do rio Donets oposta a dominar a estrada que liga Lisi-
Severodonetsk, que foi totalmente chansk a Bakhmut, já na região de
tomada há uma semana. Donetsk, o que permitiria de facto
Tal como naquele caso, em que cortar as vias de abastecimento aos
aguentaram o assédio durante mais ucranianos e facilitar o avanço para
de um mês, as forças ucranianas outros objectivos, como Kramatorsk
não estão dispostas a ceder Lisi- e Sloviansk.
chansk sem luta, e a batalha de arti- Desde meados de Maio que os
lharia continua intensa de parte a russos tentam controlar essa estra-
parte. Depois de ter conseguido da, cujas margens de planícies e
tomar uma reÆnaria, uma mina e bosquetes estão pejadas de buracos OLEKSANDR KLYMENKO/REUTERS
outras instalações industriais na de bombas. Na última semana, gra- Mikolaiv, no Sul, foi novamente
cidade e nos arredores, no lado rus- ças a ataques aéreos e de artilharia, alvo de bombardeamentos das
so fala-se de um cerco total à estra- as forças de Moscovo conseguiram forças russas
tégica cidade. fazer progressos para o domínio da
“Hoje, as milícias populares de via, mas ainda não conseguiram
Lugansk e as forças russas ocupa- alcançá-la por via terrestre. Os ser-
ram as colinas estratégicas que fal- viços secretos militares britânicos
tavam, o que nos permite conÆrmar descrevem os avanços das forças
que Lisichansk está completamente russas junto a Lisichansk como
cercada”, declarou um porta-voz “pequenos”.
das milícias separatistas pró-russas,
Andrei Marotchko, à agência russa Ameaça bielorrussa
Tass. Que noticia igualmente o que Cinco dias depois do ataque, os ser-
o líder tchetcheno Ramzan Kadirov viços de emergência ucranianos
Estão a
escreveu no seu Telegram: “Pode- deram por Ænalizada a operação de provocar-nos.
mos dizer que um ataque em larga busca nos escombros do centro
escala contra a cidade vai começar comercial de Kremenchuk, que foi
Houve tentativas
em breve. O inimigo não tem para alvo de um bombardeamento russo. da Ucrânia para
onde ir porque todos os caminhos Morreram 21 pessoas, 66 Æcaram
para entrar e sair estão bloquea- feridas e foram encontrados 29 frag- ir embora”, disse ao Le Monde um sofrer perdas signiÆcativas em todas
atingir alvos
dos.” mentos de corpos. dos feridos no ataque, Nikolai Izmai- as frentes”, garantiu. militares
Ainda que reconhecendo que Lisi- Na cidade do centro do país, que lov, deitado numa cama de hospital As explosões de Mikolaiv dão-se
chansk está numa situação difícil a até agora se tem mantido relativa- coberto de gaze e hematomas. um dia depois de um ataque aos
bielorrussos.
nível militar e humanitário, as auto- mente segura, reina a incredulidade Ontem soaram novamente as sire- arredores de Odessa ter atingido um Graças a Deus, os
ridades da Ucrânia negam o cerco. e a revolta. Segundo o Ministério da nes em Mikolaiv, no Sul, momentos prédio residencial, provocando a
“As casas nas zonas atacadas estão Defesa russo, o alvo do ataque não antes de se ouvirem grandes explo- morte de pelo menos 21 pessoas. No
nossos sistemas
a arder uma por uma. Com bombar- era o centro comercial mas sim um sões. Não foi divulgado quais os seu vídeo de guerra diário, antiaéreos
deamentos tão intensos só temos alegado depósito de armas nas pro- alvos atingidos nem se houve víti- Volodymyr Zelensky acusou os rus-
tempo para recolher os feridos”, ximidades — cuja existência é nega- mas. O porta-voz do Ministério da sos de cometerem “um acto cons-
bloquearam-nos
descreveu o governador de Lugansk, da por Kiev. Defesa russo, Igor Konachenkov, ciente e deliberado de terror” e
Sergii Haidai, acrescentando que “Os russos atacam todas as cida- declarou que foram atacados paióis “não qualquer tipo de erro ou aci-
também não há muitas abertas para des da Ucrânia: Kiev, Kharkiv, Miko- de armamento e centros de coman- dente”. Alexander Lukachenko
combater os fogos que deÇagram laiv. Não vejo porque é que me deva do ucranianos. “O inimigo está a Entretanto, em Lviv, a cidade Presidente da Bielorrússia
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 17
JULIE AKIMOVA/REUTERS
BIBLIOTECA DA CENSURA
Obras Apreendidas e Proibidas no Estado Novo
Mais dois britânicos acusados em Donetsk
Reino Unido condena
“exploração política” PARA QUE NÃO SE REPITA
B&B
de prisioneiros de guerra
25 livros. Colecção mensal, ao dia 25 de cada mês. Entre 25 de Abril de 2022 e 25 de Abril de 2024. PVP unitário 9€. Preço total da colecção 225€. Stock limitado.
O Governo britânico condenou ontem
a “exploração para Æns políticos” de
Em Maio, a emissora britânica ITV
identiÆcou um britânico chamado
CERROMAIOR Vol3
cidadãos estrangeiros detidos na
Ucrânia após a conÆrmação da acu-
sação de outros dois cidadãos britâ-
Dylan Healy, 21, de Cambridgeshire,
que foi capturado juntamente com
outro britânico, Paul Urey, num pos-
MANUEL DA FONSECA 1943
nicos por crimes que podem levar à to de controlo ao sul da cidade de
pena de morte. Zaporijjia, no Sudeste da Ucrânia. Até
“Condenamos o uso de prisionei- agora, não há conÆrmação oÆcial de
ros de guerra e civis para Æns políti- qualquer processo contra Urey.
cos. Transferimos essa questão para Healy, um chef de Huntington,
a Rússia”, disse o Ministério dos Negó- estava a tentar ajudar civis a fugir de
cios Estrangeiros do Reino Unido em áreas ocupadas pelas forças russas
comunicado. quando foi detido num posto de con-
O Governo britânico indicou que trolo militar, de acordo com a ONG
as autoridades estão em “contacto Presidium Network, para a qual
constante” com o executivo ucrania- Healy trabalhava.
no. “Apoiamos totalmente a Ucrânia
nas suas acções para conseguir a sua Trabalho humanitário
libertação”, acrescentou o Foreign A ONG conÆrmou que está ciente de
Oêce. que Healy enfrenta a acusação de ser
Londres responde assim à notícia, mercenário e acrescentou que o cida-
de sexta-feira, de que as autoridades dão britânico é um “voluntário huma-
da autoproclamada República Popu- nitário independente” sem vínculos
lar de Donetsk (RPD) acusaram os com nenhuma unidade militar ou
britânicos Dylan Healy e Andrew Hill paramilitar.
de colaborarem com as forças ucra- “As acusações feitas pela República
nianas. Dois outros britânicos e um Popular de Donetsk não são apoiadas
marroquino foram condenados à por qualquer prova e, portanto, só
morte em Junho por colaboração com podem ser explicadas como uma
o Exército ucraniano. acção politicamente motivada da RPD
“A investigação está em andamen- e do Governo russo”, indicou a Presi-
to contra os mercenários britânicos dium Network. “Condenamos a apre-
Dylan Healy e Andrew Hill. Eles são sentação de falsas acusações pela
mais importante a este que tem ser- acusados pelos mesmos artigos dos DPR com o único objectivo de obter
vido de abrigo para muitos desloca- três mercenários anteriormente con- benefícios políticos”, sublinhou.
dos internos, o autarca Andrii Sado-
vi anunciou uma mudança das
denados. Há uma investigação em
andamento, acusações foram apre-
“As hipóteses de Healy e Hill rece-
berem um julgamento justo na Repú- +9€
EM BANCA
“estratégias de defesa” para fazer sentadas”, informou na sexta-feira a blica Popular de Donetsk ou na pró-
face a um eventual ataque vindo da Agência de Notícias de Donetsk, Dan pria Rússia são muito pequenas”,
Bielorrússia. Além da criação de News. Em 9 de Junho, um tribunal da aÆrmou por sua vez Kristyan Bene-
postos defensivos em todos os bair- República Popular de Donetsk con- dict, da Amnistia Internacional do
ros, da formação militar de mais denou à morte os cidadãos britânicos Reino Unido, acrescentando: “A
voluntários e da criação de brigadas Shaun Pinner e Aiden Aslin, bem menos que as autoridades apresen-
de reservistas, as autoridades estão como o marroquino Brahim Saadoun, tem provas claras de que Healy e Hill
também a acumular alimentos e acusados de participar na guerra estão implicados em crimes de guer- Cerromai obra expœnte do neorrealismo, não escapou
Cerromaior,
outros bens essenciais. como mercenários ao serviço das ra, este falso processo judicial deve à censura
censura: «...apresenta ao leitor factos concretos que
“É necessário prepararmo-nos
para um Inverno frio em que tenha-
Forças Armadas ucranianas. ser interrompido imediatamente.”
25 LIVROS revelam profundas deficiências da estrutura social, entre
nós. A vida dura e miserável do trabalhador rural
25 MESES
REUTERS
mos de nos aquecer sem gás”, escre-
veu Sadovi na sua conta na rede alentejano, a carência ao mesmo de assistência social,
a indiferença do abastado pelo humilde que trabalha
social Telegram.
Como que conÆrmando a valida- AO DIA 25 em seu proveito...». Foi “autorizado com cortes”, mas
de dos receios, o Presidente da Bie- da capa do livro consta o carimbo “autorizado”.
lorrússia veio ao Æm do dia acusar a Das obras que a Censura autorizava com cortes ou
Ucrânia de ter lançado ataques no proibia, mostramos uma seleção desses raros
seu território.
artefactos culturais que falam do controlo da vida
“Eles estão a provocar-nos. Há
três dias, talvez mais, houve uma cultural desse período, que são reproduções dos
tentativa da Ucrânia para atingir originais censurados guardados na BNP e que incluem
alvos militares bielorrussos”, disse os relatórios de censura, carimbos, selos e rasuras.
Alexander Lukashenko à agência Uma colecção comissariada por Álvaro Seiça.
estatal Belta. “Louvado seja Deus,
os nossos sistemas antiaéreos inter-
ceptaram todos os mísseis”, acres-
centou o Presidente bielorrusso,
aliado de Vladimir Putin. Em Junho, três cidadãos estrangeiros foram condenados à morte
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18 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
Mundo
Mundo
As cartas do jogo
eleitoral em Angola
aí, pois os telhados de vidro são cidadania a perÆs do que também
Opinião muitos. chamam “laços de sangue”,
A carta da raça, expressão anulando os laços de inserção
bastante popularizada nos Estados mesmo por nascimento. Regimes
Unidos graças a importantes textos tipo patrícios da Roma antiga.
de análise, é muito jogada em As eleições angolanas de 24 de
Jonuel Gonçalves
todos os continentes. A agosto apresentam outras
O recente discurso eleitoral do extrema-direita europeia faz esse incógnitas. A primeira é como vão
chefe de Estado angolano, jogo, seja referindo a “identidade ser recebidos os resultados no caso
referindo que a UNITA tinha feito caucasiana” dos seus países, seja da muito provável vitória do MPLA.
ilusionismo passando do símbolo através das campanhas Nos pleitos anteriores, a UNITA
do galo negro ao galo branco e anti-imigrantes. Nos Estados queixou-se de discriminação no
que após as eleições o MPLA ia Unidos é abertamente usada pelos acesso aos media, do uso da
comer cabidela, comida à base do supremacistas (brancos) e máquina administrativa em favor
sangue de galináceos, causou racialistas (negros). Em países do MPLA e levantou interrogações
larga surpresa na opinião pública africanos, tanto da parte de sobre cadernos eleitorais e
de Angola. Na maior parte dos governos repressivos como de contagem de votos. Mas Æcou pelo
casos foi apenas isso — surpresa oposições racializadas, é método verbal. Agora possui mais
—, acrescido de comentários
irónicos sobre o referido prato
central da propaganda: quem
discorda só pode estar sob
capacidade de mobilização nas
ruas, podendo convergir até para SÉRIE
num momento de muitas e gerais
diÆculdades alimentares ou
inÇuência de ideologias
estrangeiras ou serve os antigos
iniciativas de grupos com alguma
experiencia na matéria. PENSAR OS
sorrisos de quem ouve uma frase
engraçada.
senhores do apartheid. Na Índia, o
extremismo hindu usa essa carta
É claro que, mesmo sendo
hipótese longínqua, tem de se TRANSPORTES
Nos setores que pretendem um em termos muito semelhantes à fazer a pergunta ao contrário, ou
debate eleitoral de alto nível, a extrema-direita europeia, o seja, como reagirá o MPLA se a A rede de infra-estruturas de transporte
surpresa foi de consternação. Pelo mesmo se constatando nos oposição vencer. Muito menos é uma alavanca privilegiada para
uso da carta da raça através do diversos fundamentalismos longínqua é a hipótese desta o desenvolvimento, o aumento
símbolo das cores do galo — até por árabo-islâmicos. oposição aumentar bastante a sua
visar o atual líder mestiço da Aliás, a extrema-direita não é representação parlamentar. da competitividade e a redução
UNITA — e pela imagem do sangue. monopólio de nenhum continente. Os níveis de abstenção tendem, de assimetrias. Nesta série de oito
Certas áreas ligadas ao MPLA Está em todos, precisamente com neste momento, a ser bastante reportagens, o PÚBLICO toma o pulso
referiram que o recurso a esse tipo as propostas racistas, a rejeição elevados. Porém, a sua avaliação ao estado dos transportes em Portugal
de linguagem, considerado como dos imigrantes e condicionando a precisa será diÆcultada em virtude
suscitando entusiasmo, não deve de parecer incompleta nos
ser feito pelo Presidente da cadernos eleitorais a exclusão das
República mas por outros escalões pessoas falecidas. No Quénia, que Saiba mais em
do partido. vota umas semanas antes de publico.pt/pensar-os-transportes
Na UNITA e seus aliados a frase Angola, auditoria feita aos registos
deu lugar a protestos localizou cerca de dois milhões de
individualizados, acusando João eleitores a mais, nuns casos por
Lourenço de ameaça pelo sangue e Mesmo sendo duplicação de inscrição mas
de racismo, dois pontos onde a
UNITA está igualmente exposta, em
hipótese sobretudo pela permanência de
falecidos.
virtude do historial durante a longínqua, tem de Este dado não signiÆca
guerra e de posições no plano racial
ou cultural que assumia até há
se fazer a necessariamente má-fé. Em geral
decorre das deÆciências dos
pouco tempo. pergunta: como serviços de registo civil, afetando
Por enquanto, o assunto está
assim e tanto pode reaparecer nas
reagirá o MPLA se desde matrículas escolares até
pagamento de impostos. Como em
próximas semanas como Æcar por a oposição vencer? quase toda a África tropical, é
RODRIGO ANTUNES/EPA
provável que quase metade da
população de Angola não possua
certidão de nascimento.
A terceira incógnita é saber qual
será a atitude dos partidários do
ex-Presidente José Eduardo dos
Santos. Partidários ou pessoas que
hoje não o consideram tão mau
como já consideraram.
Quanto às sondagens de opinião
que por vezes têm aparecido, são
apenas prognósticos. A única
certeza é que a linguagem das
campanhas vai ser a mais rude de
todas as eleições angolanas. Com COM O APOIO DE:
jogadas de várias cartas e trunfos.
630
dos últimos doze meses seria de 5,1% ses (AIL). da Reabilitação Urbana (IHRU) con- presidente da AIL, que reitera, assim,
no mês de referência; se, por outro Esta associação defende que o valor ceder empréstimos aos arrendatá- a necessidade de travar a actualização
lado, esta taxa continuasse a subir e das rendas não deverá aumentar mais rios que sofressem perdas de rendi- das rendas.
chegasse aos 10% em Julho e 11% em do que 1% a 2% no próximo ano, uma mentos e que tivessem rendas em Até porque, acrescenta, o cenário
Agosto, a taxa anual média seria de proposta que já apresentou ao Gover- atraso. de agravamento acentuado das ren-
5,6% em Agosto. Num cenário em que a taxa a no, numa reunião realizada no mês Mais tarde, o executivo optou por das poderá vir a “apanhar as pes-
Em qualquer um destes cenários, considerar para a definição do passado. permitir aos inquilinos que beneÆ# soas de surpresa”, se o Governo não
a taxa anual média apurada em Agos- coeficiente de actualização seja A resposta, contudo, foi negativa. ciaram deste empréstimo que pedis- “chamar à atenção nem implemen-
to situa-se entre os 5% e os 6%, o que de 5%, uma renda de 600 euros “Tivemos uma reunião com a Secre- sem a conversão do mesmo em apoio tar as medidas necessárias”. com
levará o coeÆciente de actualização passa em 2023 para 630 euros taria de Estado da Habitação a 8 de a fundo perdido, ou seja, sem neces- Sérgio Aníbal
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 21
Edif. Diogo Cão, Doca de Alcântara Norte, Tel. 21 011 10 10/20 Fax 21 011 10 30
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Sábado 11H às 17H
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Fundada em 1988 pelo Professor Doutor Carlos Garcia, a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer A Brisa agradece antecipadamente a compreensão e colaboração dos
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constituída há mais de 30 anos especificamente para promover a qualidade de vida das pessoas com demência e dos seus familiares e automobilistas e espera contribuir para reduzir eventuais inconvenientes
cuidadores. Tem cerca de dez mil associados em todo o país.
Oferece Informação sobre a doença, Formação para cuidadores formais e informais, Apoio domiciliário, Apoio Social e Psicológico e Consultas Médicas da decorrentes desta operação, estando certa de que os possíveis incómodos
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Como membro da Alzheimer Europe, a Alzheimer Portugal participa ativamente no movimento mundial e europeu sobre as demências, procurando reunir e divulgar serão largamente compensados pelo nível de qualidade, segurança
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da Nazaré, Cave do Bloco 21 - Sala E, 9000-135 Funchal, Telefone: 291 772 021 - Fax: 291 772 021 - E-mail: geral.madeira@alzheimerportugal.org
CONHEÇA A NOSSA
SELECÇÃO DE VINHOS
EM LOJA.PUBLICO.PT
Marinheiros imigrantes,
o lado invisível das
pescas portuguesas
Ao envelhecimento da frota e das tripulações portuguesas
soma-se uma dramática falta de mão-de-obra. Indonésios
e guineenses têm evitado que os barcos Äquem em terra,
mas as condições não são as melhores
a primeira experiência com trabalha- férias. “Daqui a quatro anos estare-
Vera Moutinho
dores estrangeiros, ucranianos. Há mos com o dobro de trabalhadores
Ao meio da manhã, no Porto de Peni- três recrutou os primeiros indoné- estrangeiros” nas pescas, defende o
che, são poucos os barcos que descar- sios, já que os jovens portugueses, presidente da AAPN.
regaram peixe. Mas Juan Arrazaba esses, “não querem andar ao mar”. Para Juan Arrazaba, é sobretudo a
não tem mãos a medir. O peruano de bordo que as condições de trabalho
29 anos orienta os colegas indonésios “Fonte” de mão-de-obra e habitabilidade deixam a desejar.
que içam caixas de peixe do porão “Há barcos em que a lotação é de oito
vinda Indonésia
para cima da muralha. “Faço de tudo marinheiros. Mas levam mais. E as
um pouco”, diz, “virar redes, desem- Nem Maria Sameiro nem o marido, condições para dormir não…”, conta,
barcar o peixe, ajudo na casa das também armador, quiseram que os baixando a cabeça, “não tem condi-
máquinas, faço de contramestre tam- três Ælhos seguissem a vida piscatória. ções nenhumas”. Viu barcos onde
bém”. Chegou a Portugal em 2019, O Ælho mais velho, de 27 anos, licen- “pingava óleo em cima do pessoal”,
está em Peniche há dois meses. ciou-se recentemente em Medicina, que dormia amontoado debaixo de
“Trabalhei nos barcos espanhóis os outros dois também prosseguem um tecto de madeira sem qualquer
do espadarte no PacíÆco Sul, ganhei o ensino superior. Sem descendência tipo de isolamento. “Não sei como
muita experiência. Comecei aos 19 para deixar ao mar, Maria não prevê passavam nas vistorias”, aÆrma.
anos, já são dez anos no mar.” Foi lá, investir na renovação da sua embar- Hoje, trabalha num “bom barqui-
em alto-mar, num barco de Vigo, que cação. E, por agora, os trabalhadores nho”, o Persistente, que se destaca de
conheceu a mulher, Bárbara, uma indonésios asseguram a tripulação. todos os outros que se acercam da falta de mão-de-obra. A “vida dura do a sustentabilidade dos recursos. Até
bióloga marinha portuguesa. Casa- “São muito educados, bons traba- muralha no Porto de Peniche. A ope- mar” é feita de sazonalidade e de con- porque, diz ao PÚBLICO, mais de 80%
ram em 2021. Ela, bolseira de investi- lhadores, bem-mandados”, diz. Três rar há menos de um mês, representou dições de trabalho que se deterioram das embarcações são costeiras, até
gação em microplásticos da Faculda- jovens indonésios descarregam peixe um investimento de 750 mil euros, com as próprias embarcações. dez metros, com uma actividade
de de Ciências e Tecnologia, no Mon- de uma carrinha. Não falam portu- sem recurso a apoios comunitários “Precisamos de modernizar a fro- menos consumidora de energia em
te da Caparica, esteve na Conferência guês, inglês quase nada. Chegaram ou subsídios. Também Juan é um tra- ta, até para cumprir as convenções viagens de menor duração.
dos Oceanos em Lisboa. há um ano, com contrato de 18 meses. balhador imigrante diferente: ao con- europeias e a lei do trabalho”, diz Reconhece, porém, que a susten-
São raros nas embarcações portu- Maria interrompe para lançar um trário dos restantes, ganha conforme Jerónimo Rato. “Noventa e nove por tabilidade dos recursos também tem
guesas os trabalhadores da mesma “não arrastem, não arrastem”, aos o que o barco trouxer, como os por- cento da frota não cumpre.” Esse de ser laboral e, para isso, são preci-
idade ou mais jovens do que Juan. A jovens. Têm quase a idade do Ælho tugueses. “Se pesca for boa, posso seria, acredita, o primeiro passo para sas “melhores condições de trabalho”
média de idades é de 50 anos, um mais velho. É ao armador que cabe o ganhar 1800 ou 2000 euros.” atrair jovens para o sector pesqueiro. e melhores salários. Um passo nesse
valor acima da média europeia. pagamento das viagens (que rondam Lá dentro, há um quarto para o “A maior parte da frota tem mais de sentido será cumprir a meta de reno-
Olhando para as últimas Estatísticas os 500 euros) e visto de cada traba- mestre e mais dois quartos com beli- 20 anos, não tem condições de habi- var 25% da frota activa nacional até
da Pesca, em 2021, vemos que 55,9% lhador (150 euros). Maria Sameiro ches na parte de baixo da embarca- tabilidade, nem de trabalho, nem de 2030 — um valor aquém do reclama-
dos pescadores matriculados tinham garante que esse valor não é descon- ção. No piso intermédio há uma higiene.” do pelas associações do sector, que
entre 35 e 54 anos. Só 22,7% tinham tado ao salário. “Até as roupas, os cozinha, separada da zona de refei- O plano para a próxima década falam num abate de 50% da frota.
menos de 34 anos, quase tantos como oleados, as botas, nós damos.” Quan- ções e da casa de banho, que permi- traçado pela Estratégia Nacional para Para atrair mão-de-obra jovem, a
os pescadores acima dos 55 anos. do estão no mar, dormem no barco. te também deixar todo o vestuário e o Mar (ENM2030) tem como ambição secretária de Estado promete incen-
Há pouco tempo, o mestre do bar- Em terra, os sete indonésios que calçado de trabalho fora dessas “reconverter a pesca nacional num tivar o empreendedorismo, aumen-
co onde Juan trabalha perguntou se emprega vivem numa garagem. “Têm zonas. Há soalho de madeira Çutuan- dos sectores mais sustentáveis” do tando os apoios para jovens que se
podia recrutar mais marinheiros uma garagem grande, as caminhas te, uma televisão, sistema de detec- país. Algo que os pescadores não queiram lançar ao mar, algo que tem
como ele, do Peru. “Não tenho pro- deles em beliche, roupeiro e casa de ção de incêndio. vêem no horizonte. sido motivo de críticas. O Fundo
blema nenhum, toda a família é de banho com chuveiro. No exterior têm Um luxo, e uma excepção, admite “Se querem pesca sustentável têm Europeu dos Assuntos Marítimos
pescadores”, disse. Dentro de dias a cozinha e outra casa de banho com Jerónimo Rato, presidente da CAPA de diminuir as embarcações obsole- (FEAMPA) atribui verbas para apoiar
chegam dois irmãos e um primo. máquina de lavar roupa”, descreve. — Cooperativa dos Armadores de tas”, defende Manuel Marques. Lança jovens pescadores com menos de 40
“A vida do mar não é fácil”, assegu- “Encontrámos uma fonte na Indo- Pesca Artesanal de Peniche. Na maio- críticas à economia azul da biotecno- anos que registem um navio na frota
ra Maria Sameiro, 49 anos. A armado- nésia”, diz Manuel Marques. Os últi- ria dos barcos “é tudo ao molho e fé logia e das energias renováveis que de pesca da União Europeia pela pri-
ra de Vila do Conde lava e orienta a mos quatro anos foram de aprendi- em Deus”. Mas diz ser errado pôr a deixa de fora as pescas. Precisam de meira vez, mas Teresa Coelho reco-
pescada que o seu barco apanhou zagem para a Associação de Armado- pressão nos armadores. Pagam as apoios urgentes, diz, para reestrutu- nhece que o incentivo “não é suÆcien-
nesta madrugada. Nasceu numa famí- res de Pesca do Norte (AAPN), com multas, mas a realidade não muda. rar a frota, nomeadamente com temente encorajador”. O apoio para
lia de pescadores, já perdeu um sobri- muito “Google tradutor”. Entre os “A pressão tem de ser no Estado.” motores energeticamente mais eÆ# a primeira aquisição de um navio vai
nho para o mar. “Acabando esta gera- associados empregam cerca de 300 cientes. “O futuro da pesca também aumentar, garante a secretaria de
ção, vai tudo acabar. Não vão conse- indonésios, mas a norte haverá cerca 99% da frota “não cumpre” é o futuro económico do país.” Estado, para 40% do custo de aquisi-
guir aguentar o sector.” de 600, aÆrma. Manuel é contactado Por isso, Teresa Coelho, secretária ção e com a possibilidade de pagar
Com ela trabalham sete indonésios diariamente por agentes na Indoné- Os problemas estão identiÆcados: de Estado das Pescas, está “optimista estágios proÆssionais a bordo.
e dois portugueses, um deles é o mes- sia. Oferecem ordenado mínimo, envelhecimento da frota e das tripu- quanto à perspectiva económica do Para “tapar o buraco”, diz Manuel
tre da embarcação. Há dez anos teve alojamento, alimentação, subsídio de lações, a que se soma uma dramática sector”, sem perder de vista, garante, Marques, só mesmo com estrangei-
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 23
Um espectáculo de
moradores, porque
“habitar é o primeiro
acto político”
Hoje, no Teatro São Luiz, e no dia 9 no Largo da Achada, o
busílis do direito à habitação torna-se música e palavra. Regina
Guimarães escreveu sobre horas e horas de conversas e 40
pessoas vão dar música ao poder e ao problema instituído
“Durante o processo de ensaios e a ela, Æzeram-se muitos encontros
Joana Amaral Cardoso Texto
conversas, desde Fevereiro, destes com residentes de Lisboa e arredo-
Miguel Madeira Fotografias
40 participantes deste espectáculo, res, escreveram-se cartas, e a dra-
Trepa-se a Mouraria, passa-se por deste grupo”, enfatiza Catarina Car- maturga Regina Guimarães fez o
molhinhos de turistas, chega-se à valho, “houve duas pessoas que resto. Mas é a primeira a dizer, ao
Casa da Achada — Centro Mário Dio- foram despejadas”. Numa roda à telefone com o PÚBLICO, sobre a
nísio e a rua está calma. Ao longe porta da Casa da Achada estão Maria transformação colaborativa sobre
ouve-se cantar o fado, mas a pacatez João Costa, da Associação Habita, e os seus textos: “A Kantata a quem a
deve-se também ao que o lusco- pelo menos duas “Gaulesas dos trabalha”.
fusco de Æm de Junho esconde — ou Lagares”, o nome pelo qual Æcou “Vai para dois anos que moro
revela. A casa onde se prepara o conhecida a resistência dos morado- numa carrinha/ com a minha mulher
ensaio do espectáculo comunitário res despejados da Rua dos Lagares, e dois Ælhos”, canta-se mais à frente;
Kantata do Tecto Incerto, com textos também na Mouraria, e outros cida- há títulos como Okupa ou O rimance
de Regina Guimarães a partir de tes- dãos cujas vidas são tocadas de per- das gaulesas dos Lagares, temas
temunhos reais sobre a crise da to ou na consciência cívica pelo como o da etnia, e pequenas gran-
habitação, está rodeada do proble- problema da habitação. Rapidamen- des ironias. Como nesta letra: “Des-
ma. “À nossa frente está uma casa te se gera conversa sobre como resis- cobriu um belo dia/ a pacata média
que foi esvaziada; está ali uma casa tir, o papel da polícia, as leis, e burguesia/ que a crise da habitação/
que tinha gente agora é Airbnb” depois passa-se à digestão de tudo já não tocava só a populaça.” E a que
aponta a produtora Catarina Carva- isso em arte. soa isto tudo?
lho, da Casa da Achada, de um lado Pedro Rodrigues fala da base que
para o outro da estreita rua. “Tem Palavra de intervenção são os textos de Regina Guimarães e
ali uma casa vazia”, continua, logo Com direcção musical e composição como inspiraram “canções de luta à
interceptada por Ana Paula, uma de João Caldas e Pedro Rodrigues (o antiga”, mas sobretudo “uma varie-
dos “cantantes” deste espectáculo crítico do PÚBLICO Pedro Boléo) e dade sem ser um medley, de tons e
e que ali morou mais de 40 anos, direcção e dramatograÆa de Nicolas tonalidades”. Alessandra Esposito,
que sublinha: “Uma casa que resis- Brites, a Kantata do Tecto Incerto é “gaulesa dos Lagares”, sugere que
tiu ao terramoto.” Mas que não música e é palavra de intervenção. “há um pouco uma valsa, um blues”.
resistiu às transformações vorazes “Para integrar este projecto não é E “outras são só jogos sonoros com
que a habitação em cidades com preciso saber cantar. É preciso é ter palavras. Quando toda a gente diz
potencial turístico e imobiliário vontade que a nossa palavra seja a ‘casa’ em surdina, isso cria uma coi-
como Lisboa estão a sofrer. Por isso, nossa arma”, sintetiza Nicolas Brites. sa”, remata Pedro Boléo.
eles cantam. “Os timbres são diferentes e isso é
“A Casa da Achada foi vendo os importante aqui”, diz Pedro Rodri- O direito a habitar o mundo
seus vizinhos a desaparecerem”, diz gues. “Tem sido uma construção Do seu lado da linha telefónica no
então Catarina Carvalho, explican- muito partilhada. Neste trabalho Porto, Regina Guimarães quase se
do a associação da instituição a este quero saber o que as pessoas que- desculpa pelo muito que tem a dizer
projecto, que hoje às 17h sobe ao rem dizer e fazer, toda a gente tem sobre o tema. Entusiasma-a. Recorda
palco do Jardim de Inverno do Tea- cá o seu cunho”, continua Brites. a origem de tudo isto, a falecida Mar- O espectáculo foi possível do direito à habitação”, defende.
tro São Luiz e que no domingo, dia Meia hora depois, já se ensaia, garida Guia, mobilizadora e encena- graças a crowdfunding ao qual “A habitação é um tema bastante
9, se apresenta às 19h30 na rua, no gente de todas as idades, umas dora da primeira Kantata, a Kantata aderiram 192 pessoas. mais ousado porque atira para cen-
Largo da Achada, na mesma Moura- marimbas no chão, uma viola, um de Algibeira (2013), focada na crise Apresenta-se como uma obra tro da questão se queremos um
ria. Ambas as apresentações deste órgão, ferrinhos, vozes aÆnadas. Ænanceira. Ela ainda encetou a Kan- feita por quem não tem mundo com fronteiras, se resolve-
espectáculo de palavra e música são “Dizem que a casa começa pelo tec- tata do Tecto Incerto, mas coube-lhes experiência de palco e ensaiou mos as coisas na fronteira do nosso
de entrada gratuita. A frase que lan- to/ Moléstia castiga quem casa não continuar sem ela. Agora, considera uma obra política e polifónica quintal, das nossas traseiras e da
ça esta Kantata diz tudo sobre o seu tem/ Hoje sem tecto, amanhã sem a dramaturga portuense, a parada nossa fachada, ou se vamos ser capa-
espírito: “Quando as cidades se afecto/ Sozinha é que a desgraça está ainda mais elevada. zes de fazer as coisas de outra manei-
transformam em tabuleiros de nunca vem.” É o início de Cantiga, “A má distribuição do dinheiro é ra. Para mim, foi sempre muito evi-
Monopólio, o que têm a dizer os parte desta cantata em que tantas uma coisa que gera muito rapida- dente que a Kantata do Tecto Incerto
habitantes que resistem?” A respos- mãos e vozes se juntaram. Luiz mente uma grande onda de reprova- tinha que ver evidentemente com o
ta é múltipla. Nem sempre é poéti- Rosas fez as recolhas, especialista ção, porque é muito óbvio. É muito direito à habitação tal como está
ca. em dar voz a quem não tem acesso menos evidente perceber o que é isso constitucionalmente garantido, mas
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 25
Cultura
Cultura
De cortar
a respiração.
Dentro e fora de água.
COLECÇÃO, U-BOOT
De Jean-Yves Delitte O EM CA P A
CÇÃ D
U RA
C OL
+10,90€
QUARTA, 6 JULHO
Vol. 2: Herr Himmel COM O PÚBLICO
Mais de um século depois de o submarino U-Boot ter sido encontrado nas águas
da Amazónia, um grande segredo continua por ser descoberto em terra firme.
Todas as pistas caminham apenas numa direcção: um enigmático laboratório
farmacêutico. Um mistério cada vez mais perto de ser resolvido e um escabroso
segredo nazi, prestes a ser revelado. Descubra tudo com os seus próprios olhos
nesta colecção inédita em Portugal.
Colecção de 4 livros inéditos em português. PVP unitário: 10,90€. Preço total da colecção: 43,60€.
Periodicidade semanal à quarta-feira, entre 29 de Junho e 20 de Julho de 2022. Stock limitado.
U-Boot – Tome 02 NE : Herr Himmel © Editions Glénat 2015 by Jean-Yves Delitte for the present
comic book edition – ALL RIGHTS RESERVED. First edition published in November 2011
COMPRE AQUI
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28 • Público • Domingo, 3 de Julho de 2022
No seu “momento
mais negro”, a
Académica acredita
que em breve
regressará ao topo
A equipa de futebol do emblemático clube de Coimbra desceu
pela primeira vez à Liga 3 numa história com quase 135 anos.
Sócios e dirigentes falam de “um momento terrível”, mas
garantem estar a trabalhar para depressa reerguerem a “briosa”
conta com 64 participações na divi- A Académica venceu o Sporting, e vitória na Taça de Portugal (2011-12) e acontecia no passado”, e por haver
Luciano Alvarez Texto
são maior, contra 24 no segundo esca- a PIDE, a polícia política da altura, à conquista do Campeonato da II Divi- muitos alunos estrangeiros, a rebo-
Nelson Garrido Fotografia
lão. A melhor classiÆcação na I Liga temendo um novo protesto, proibiu são (1971-72), ao bater o V. Setúbal, em que do programa Erasmus, “para
Nas laterais do autocarro da Associa- remonta à época de 1966-67, quando a transmissão televisiva da Ænal do que também esteve presente. quem a Académica nada diz”. Porém,
ção Académica de Coimbra — Orga- conseguiu o segundo lugar. jogo com o BenÆca e inundou as ban- acrescenta, “quase nada tem sido fei-
nismo Autónomo de Futebol está No seu historial futebolístico, a cadas do Estádio de Jamor de agentes. “Uma oportunidade” to para chamar os jovens ao clube”.
escrita, em inglês, uma frase que tal- “briosa” conta com duas vitórias na Ainda assim, ao intervalo, os estudan- Hoje os dias não são de festa. “São de Mas o momento vivido pela Acadé-
vez nunca tenha feito tanto sentido Taça de Portugal, em 1938-39, frente tes conseguiram “Æntar” os agentes e tristeza”, acrescenta Carlos Melo, que mica não rouba a esperança num
como nos dias de hoje: “Never give ao BenÆca, e em 2011-12, quando exibiram diversas faixas de contesta- assiste aos jogos da “briosa” desde os futuro “muito melhor” ao sócio 2187.
up” (Nunca desistir). O clube Æcou em bateu o Sporting, para além de somar ção ao Governo. Pela primeira vez cinco anos. As razões para as constan- “Seremos como a fénix e vamos
último lugar na II Liga 2021-22 e des- vários títulos nos então campeonatos não estiveram presentes no Jamor o tes descidas e subidas de divisão — e renascer das cinzas. Ser de Coimbra
ceu, pela primeira vez na sua história, distritais da segunda divisão. Em ter- Presidente na altura, Américo Tomás, agora também para a queda até à Liga é ser da Académica e a cidade precisa
ao terceiro escalão. Os adeptos estão mos internacionais, conta com uma e o ministro da Educação, José Her- 3, pela primeira vez na história do de ter um clube na I Liga. Com os pés
revoltados e alguns falam “numa des- participação na Taça das Cidades com mano Saraiva. O BenÆca acabou por clube — são várias. bem assentes no chão, e com brio,
graça” que ainda os tem “abanana- Feira (1968-69), uma outra na Taça vencer a partida. O médico aÆrma que, “ao contrário vamos regressar rapidamente ao topo
dos”. das Taças (1969-70), na Taça UEFA Nas bancadas do Estádio Nacional, do passado”, a “briosa” “deixou de e ainda com mais força. Temos de
O novo presidente, Miguel Ribeiro, (1971-72) e na Liga Europa (2012-13). nesse dia 26 de Junho de 1969, estava ser um clube das pessoas de Coimbra fazer desta desgraça uma oportuni-
eleito há menos de um mês, assume Mas a história do clube de Coimbra o então jovem estudante de Medicina e que se mudavam para a cidade”. dade e mudar o que for necessário
“o momento mais negro” da institui- não se Æca pelo futebol. A Académica, da Faculdade de Coimbra Carlos “Houve um certo distanciamento do para Æcar de vez na I Liga”, conclui.
ção e revela ao PÚBLICO o plano que então gerida pela Associação Acadé- Aguiar de Melo. “Foi um dia impres- clube em relação à população. Alguns João Caseiro, actual presidente da
tem para fazer regressar o mais mica dos estudantes da universidade sionante, histórico e belo. É certo que dizem que a Académica é o clube dos Associação Académica de Coimbra
depressa possível o clube ao convívio da cidade, foi também uma arma usa- a Académica perdeu, mas acabou por doutores e, de alguma forma, é ver- (AAC), reconhece “alguma razão” a
com os grandes clubes de futebol do da no combate ao regime fascista de Æcar com uma grande vitória reco- dade”, salienta. Carlos Melo quando destaca o afasta-
país. “Citando um grande estadista Salazar e Caetano. nhecida por todos. Uma vitória da Fala ainda do afastamento dos estu- mento dos estudantes do clube. “Hoje
português [Mário Soares], ‘só é ven- honra”, aÆrma. dantes em relação ao clube. “No pas- a relação é meramente institucional”,
cido quem desiste de lutar’. Jamais A “vitória da honra” na Taça O médico, hoje com 72 anos, recor- sado, as bancadas viviam cheias de aÆrmou ao PÚBLICO.
seremos vencidos”, garante. O momento mais signiÆcativo leva- da “as bancadas pintadas de preto estudantes de capa e batina que puxa- Embora lembre que a AAC tem
A vida do futebol da “briosa” (assim nos até à temporada de 1968-69. Na com as capas dos estudantes”, o vam muito pelo clube, hoje, quase actualmente uma secção de futebol e
também é conhecido o clube) tem meia-Ænal da Taça de Portugal, frente “enorme entusiasmo de todos” e “os não se vêem no estádio.” um clube, reconhece a “grande
sido dividida por presenças entre a I ao Sporting, os “estudantes” apresen- pides à paisana, sempre de um lado Carlos Melo sustenta que este afas- importância da Académica para a
e a II divisões. Ainda assim, são bas- taram-se em campo não com o seu para o outro, que acabaram engana- tamento se explicará pelo facto de, universidade e para a cidade”. “É um
tante mais as disputas no escalão habitual equipamento negro, mas de dos pelos estudantes que os toparam nos dias que correm, os universitários símbolo muito importante e importa
principal. Segundo o site oÆcial do branco com um fumo preto no braço, logo desde o primeiro minuto”. “já não viverem permanentemente lembrar que a associação de estudan-
clube, a Académica, fundada em 1887, em protesto contra o regime. Um dia só comparável, aponta, à na cidade durante o curso, como tes já foi a sua casa mãe”.
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Público • Domingo, 3 de Julho de 2022 • 29
Desporto
Desporto
HANNAH MCKAY/REUTERS
P
expressar publicamente que a nenhuma deste calibre. Porém, deixar-se diminuir perante o PS e
Ana Sá Lopes
sua estratégia é diferente da de qualquer que seja o “erro de o país. Não sei se a imagem de
edro Nuno Santos Costa. Expressões como “Já comunicação”, existe aqui uma Pedro Nuno Santos de joelhos faz
anda em campanha chega, já chega, já chega! O país divergência política profunda mais pela sua carreira no PS do
para futuro anda há anos a discutir o que da forma mais absurda que uma demissão honrosa,
secretário-geral do PS aeroporto. Já é tempo demais. possível Pedro Nuno Santos fez demarcando-se politicamente de
há, pelo menos, 20 Há uma decisão tomada e vamos questão de tornar pública: de António Costa, se preciso fosse —
anos. Se a ambição lhe avançar” — que aÆrmou na um lado, o homem que queria mas ele (e Costa) é que conhece o
vem da escola secundária é uma entrevista à RTP — são despachar o assunto PS bem melhor do que eu.
hipótese não conÆrmada. Tem inequívocas. Juntemos, na considerando desnecessário o Quando às vezes amigos meus
um projecto e anda a mostrá-lo mesma entrevista, “o país não consenso com o PSD; do outro, me perguntam se o próximo
ao PS e ao país há muitos anos. pode esperar” e temos, como o primeiro-ministro, que secretário-geral do PS será
Tem o seu “povo”, uma palavra cartão de apresentação, o enunciou a “linha” do Governo. mesmo Pedro Nuno Santos,
que gosta muito de usar quando anti-Costa, que apesar da O tom do comunicado em que costumo responder: “Sim, se
se dirige, em sessões de recente maioria absoluta se Costa manda Pedro Nuno revogar não tropeçar nos próprios pés.”
campanha, aos socialistas. apresenta hoje mais cansado do o despacho só podia ter como O que se passou nesta semana
A entrevista de Mariana Vieira que há seis anos e tem estado consequência a demissão do não foi um tropeção, foi uma
da Silva ao PÚBLICO e à Rádio muito ausente do país por causa Existe aqui uma ministro. Pedro Nuno preferiu queda de um 5.º andar. Às vezes
Renascença em que a número 2 da agenda europeia. um tenebroso e humilhante sobrevive-se de uma queda, a
de Costa diz que o Governo está O sonho de Pedro Nuno Santos divergência pedido de desculpas para se memória dos socialistas é curta
disponível “para aceitar aquela é que o rótulo de “fazedor política profunda manter no Governo. Porque é e Pedro Nuno Santos continua a
que for a solução com que o PSD político” se cole à sua futura que um homem que quer ser ser o socialista que mais apoios
está confortável” não agradou a imagem de candidato a que da forma mais primeiro-ministro no futuro se reúne para suceder a Costa. O
Pedro Nuno Santos. As primeiro-ministro. E, de resto, absurda possível presta a uma Ægura que será problema é se, depois disto, a
declarações que fez nas pensa que desprezar Luís certamente incluída na lista das sua imagem perante o país e o
entrevistas que deu na Montenegro é uma boa Pedro Nuno Santos mais patéticas da história da eleitorado não levou um abanão
quarta-feira, dia em que o estratégia pessoal: aÆnal, se fez questão de política nacional? Só há uma de consequências imprevisíveis.
despacho foi publicado, foram Pedro Nuno Santos conseguir explicação possível: Pedro Nuno
inequívocas relativamente ao suceder de facto a António tornar pública Santos acha que, mesmo muito Jornalista
PÚBLICO, Comunicação Social, SA. Todos os conteúdos do jornal estão protegidos por Direitos de Autor ao abrigo da
legislação portuguesa, da União Europeia e dos Tratados Internacionais, não podendo ser utilizados fora das condições de
uso livre permitidas por lei sem o consentimento expresso e escrito da PÚBLICO, Comunicação Social, S.A.
08C35700-B58D-456E-BDDC-8E66B61321CD
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