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Resumo: Este estudo apresenta uma discussão sobre o ethos dos alunos dos Colégios
Militares a partir da identidade no Exército Brasileiro. A pesquisa tem como partida a
origem histórica dos Colégios Militares, através das perspectivas assistencial e
preparatória, assim como considerando os valores, símbolos e ritos desses
estabelecimentos. Por meio da discussão sobre os conceitos de identidade militar,
sociologia das Forças Armadas e processos de socialização em ambientes escolares,
destacou-se os processos de subjetivação e produção de identidades nessas instituições.
Tal discussão parte do conceito de socialização militar através da qual o sujeito, oriundo
da sociedade civil, é apresentado a um novo mundo com destacada interação
significante no meio militar. Por meio da revisão documental sistematizada da literatura
e dos regulamentos de estabelecimentos de ensino militares, foi proposta uma análise
comparativa desses documentos a partir da descrição de direitos e deveres aplicáveis aos
militares e aos estudantes. Observamos que existe uma analogia entre as transgressões
disciplinares previstas no Regulamento Disciplinar do Exército com as faltas
disciplinares descritas no Regulamento Interno dos Colégios Militares. A pesquisa se
traz à tona a compreensão da subjetivação da identidade de um estudante do ensino
médio e fundamental que respeita normas, princípios e valores, e que estão sob regime
da hierarquia e disciplina, mas que, entretanto, não é um profissional militar.
Palavras-Chaves: identidade; ethos militar; Colégio Militar.
Abstract: This study herein introduces a discussion on the ethos of the students of the
Basic Education schools administrated by the Brazilian Army (Colégios Militares) in
relation to the Brazilian Army identity. The research has as its starting point the
historical origin of the referred schools, in accordance with the assistential and
preparatory perspectives, its values, symbols, and rites. By means of the discussion on
the concepts of military identity, sociology of the Armed Forces and the processes of
socialization in school environments, the processes of subjectivation and production of
identities in these institutions were highlighted. The discussion takes as primary concept
the one of military socialization through which the subject, coming from civil society, is
introduced to a new world with significant interaction in the military environment.
Through a systematic document review of the literature and regulations of the
educational establishments of the Brazilian Army, a comparative analysis of these
documents was proposed departing from the description of the rights and duties
applicable to military personnel and students. We observed that there is an analogy
between the disciplinary transgressions observed in the Disciplinary Regulations of the
Army with the disciplinary faults described in the Internal Regulations of the Colégios
Militares. The research brings out the understanding of the subjectivation of the identity
of a high school and elementary school student, the one who respects norms, principles,
and values, and who are under the regime of hierarchy and discipline, although,
however, is not a military professional.
Keywords: identity; military ethos; Militar School.
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Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC). E-mail: marciovx1260@gmail.com
1. Introdução
2
Organização Militar no sentido de espaço onde o profissional militar desempenha sua função laboral,
como por exemplo, um Batalhão, Regimento ou Grupo de Artilharia.
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Colégio Militar do Rio de Janeiro (CMRJ); Colégio Militar do Porto Alegre (CMPA); Colégio Militar
de Santa Maria (CMSM); Colégio Militar de Curitiba (CMC); Colégio Militar de Belo Horizonte
(CMBH); Colégio Militar de Juiz de Fora (CMJF); Colégio Militar de São Paulo (CMSP); Colégio
Militar de Brasília (CMB); Colégio Militar de Campo Grande (CMCG); Colégio Militar de Salvador
(CMS); Colégio Militar de Recife (CMR); Colégio Militar de Fortaleza (CMF); Colégio Militar de Belém
(CMB); Colégio Militar de Manaus (CMM)
Militar, que pudesse amparar a educação dos filhos dos militares que estavam a seu
comando em inúmeras campanhas. Caxias mostrava-se preocupado com a moral de seus
comandados que estiveram em batalhas em meados do século XIX, em território
brasileiro e sul-americano.
Segundo Giorgis (2011), Caxias, que esteve no comando da Guerra contra Oribe
e Rosas, percebeu a necessidade de amparar os militares incapacitados e dependentes
dos militares que se mantinham em campanha. Tal suporte não se daria apenas através
de um sistema remuneratório, mas também na educação de seus filhos e que tal medida
aumentaria a moral da tropa, elevando seu poder de combate. Ainda, de acordo com
Giorgis (2011), foi apenas após a Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870) que o
Conselheiro Thomaz Coelho desenvolveu a proposta que finalmente resultaria no que
hoje é o Colégio Militar do Rio de Janeiro.
Da primeira concepção de um estabelecimento de ensino voltado para os
dependentes dos militares (1853), até a execução de um colégio propriamente com essa
vocação, levou mais de trinta anos. A Independência do Brasil, em 1822, a Guerra do
Paraguai (1864 – 1870), o processo de abolição da escravidão que culminou na Lei
Aurea em 1888 e o processo da Proclamação da República por Marechal Deodoro da
Fonseca em 1889 estão intrínseca e politicamente ligados à criação do Imperial Colégio
Militar.
A partir da segunda metade do século XIX, a formação da oficialidade do
Exército começa a mudar. Não existiam mais apenas portugueses ocupando postos de
oficiais. Isso, porém não torna o acesso à oficialidade do Exército coisa comum e de
fácil conquista. Cunha (2006) trata do recrutamento de oficial da seguinte forma:
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Lei n° 585, de 6/09/1850 e regulamento aprovado pelo decreto n° 772, de 31/03/1851.
básica para acessar um ensino superior, aliado a um recrutamento endógeno para acesso
à Escola Militar da Praia Vermelha, atraindo os filhos dos militares (órfãos e não
órfãos), fizeram parte do cenário que levou à criação do Colégio Militar do Rio de
Janeiro.
A criação do Imperial Colégio Militar está intimamente ligada à assistência de
dependentes de militares e à preparação para ensinos superiores existentes no Brasil do
final do século XIX. Para qualquer um dos cursos superiores então existentes,
necessitava de uma base teórica a fim de acompanhar as atividades escolares dos
ensinos superiores. Diferente do que é hoje, o Estado não tinha responsabilidade na
formação escolar, no que hoje podemos comparar ao ensino fundamental e ensino
médio.
Segundo Freire (2017), a ideia de um colégio para os filhos dos militares
tangenciava tanto a perspectiva filantrópica, como a ideia preparatória, numa analogia
endógena, na qual os filhos perpetuariam a carreira de seus pais.
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Portaria nº 1.357 – Cmt Ex, de 6 de novembro de 2014 - Regulamento da AMAN:
Art. 2o A AMAN é um estabelecimento de ensino superior, de formação, da linha do ensino militar
bélico, diretamente subordinado à Diretoria de Educação Superior Militar (DESMil), destinado a:
I - formar o aspirante-a-oficial das Armas, do Serviço de Intendência e do Quadro de Material Bélico,
habilitando-o para os cargos de tenente e capitão não-aperfeiçoado, previstos nos quadros de
organização, em tempo de guerra ou de paz;
II - graduar o bacharel em Ciências Militares;
III - iniciar a formação do chefe militar
A socialização militar fornece um dos principais exemplos sociológicos da
“alternação”, uma forma particularmente intensa de socialização secundária
na qual o indivíduo “muda de mundos” e em que há uma “intensa
concentração de toda interação significante dentro do grupo” (CASTRO,
2005, p.38).
Como Organização Militar (OM), os Colégios Militares são regídos por Leis
de Ensino Específicas, quando os atributos da área específica inerentes à
instrução militar podem ser aplicados de forma adicional ao ensino
aprendizagem dos alunos, sendo que a educação convencional caminha
paripassu com as atividades eminentemente militares (Ethos militar), como
por exemplo, podemos citar a ordem unida, os “gritos de guerra”, o uso de
uniformes (fardas), condecorações, sistema de escola hierárquica, atividades
físicas e competições militares e formaturas etc. (NOGUEIRA, 2014, p.85).
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A hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças
Armadas. A ordenação se faz por postos ou graduações; dentro de um mesmo posto ou graduação se faz
O Estatuto dos Militares traz os seguintes valores como obrigações por parte dos
militares: patriotismo; civismo e o culto às tradições históricas; fé na missão elevada das
Forças Armadas; espírito de corpo; amor à profissão; e aprimoramento técnico-
profissional.
O Projeto Pedagógico do SCMB 2021-2025 considera como valores
fundamentais que perpassam de forma transversal todas as práticas desenvolvidas nos
Colégios Militares: respeito; camaradagem; lealdade; patriotismo; espírito de corpo ou
sentimento de pertença, meritocracia; culto à tradição; princípio da autoridade;
disciplina; valor à família; aprimoramento técnico-pessoal; fé na missão do exército.
Para que seja possível compreender o alinhamento dos valores descritos no PP
SCMB com o Estatuto dos Militares, foi elaborado um quadro de equivalência entre o
que Instituição (Exército Brasileiro) espera dos alunos dos Colégios Militares.
Assim como em outras áreas, o regime disciplinar dos Alunos dos Colégios
Militares está intimamente ligado aos preceitos e ritos militares. Neste caso, o manual
que os Colégios Militares se ampararam para desenvolver o regime aplicado aos alunos
dos Colégios Militares é o Regulamento Disciplinar do Exército.
O Regimento Interno dos Colégios Militares (RICM-2022)10, de
responsabilidade da Diretoria de Educação Preparatória e Assistencial, traz conceitos
como regime disciplinar, falta disciplinar e, assim como no RDE que apresenta uma
lista das transgressões disciplinares, o RI/CM possui a lista das faltas disciplinares.
10
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO PREPARATÓRIA E ASSISTENCIAL. Legislação. Disponível em:
http://www.cmrj.eb.mil.br/ricm-2022. Acesso em: 23.jul. 2022
O regime disciplinar, com suas consequências na formação da criança e do
adolescente, deverá ser capaz de influenciar na conduta do aluno, dentro e
fora do universo escolar, criando condições para que o desenvolvimento de
sua personalidade se processe em consonância com os padrões éticos, da
sociedade brasileira e possibilitando que sejam internalizados os atributos
indispensáveis ao crescimento social. (grifo nosso. BRASIL, 2022. p.40)
Falta disciplinar é qualquer violação dos preceitos de ética, dos deveres e
obrigações escolares, das regras de convivência social e dos padrões de
comportamento impostos aos alunos, em função do sistema de ensino
peculiar aos colégios militares. (grifo nosso. BRASIL, 2022.AnexoE p.41)
Para verificar in loco algumas das quarenta e sete faltas disciplinares a que os
alunos dos CM estão passíveis de ocorrer, de acordo com o Apêndice “1”ao Anexo “E”
do RICM/2022, e as transgressões disciplinares previstas no RDE, foi confeccionada o
quadro abaixo:
5. Conclusão
BROCHADO, João Manoel Simch. O caráter dos soldados. Rio de Janeiro: Biblioteca
do Exército, 2001.
GIORGIS, Luiz Ernani C. O Duque de Caxias dia a dia. Porto Alegre: Evangraf,
2011.