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Bronquiectasias

SUMÁRIO
1. Introdução...................................................................................................................... 3

2. Epidemiologia................................................................................................................ 5

3. Etiologia ........................................................................................................................ 5

4. Fisiopatologia................................................................................................................ 6

5. Classificação ................................................................................................................ 9

6. Diagnóstico ................................................................................................................. 10

7. Tratamento ................................................................................................................. 15
Tratamento específico ............................................................................................... 15
Tratamento antibiótico ............................................................................................... 16
Tratamento da resposta inflamatória........................................................................ 17
Promoção da higiene brônquica (aumento do clearance mucociliar) .................... 18
Controle da hemorragia brônquica............................................................................ 19
Tratamento cirúrgico .................................................................................................. 19

Referências ...................................................................................................................... 22
1. INTRODUÇÃO
O sistema respiratório começa no nariz e na boca e continua pelas vias aéreas
e pulmões. O ar entra no sistema respiratório pelo nariz e pela boca, passando pela
faringe e caixa de voz ou laringe. A entrada da laringe é coberta por uma pequena
aba de tecido, conhecida como epiglote, que se fecha automaticamente durante a
deglutição, impedindo a entrada de alimentos ou líquidos nas vias aéreas.
Os ramos da traqueia se bifurcam em duas vias aéreas menores: os brônquios
direito e esquerdo, que levam aos dois pulmões. Cada pulmão é dividido em lobos,
sendo três no pulmão direito e dois no pulmão esquerdo. Vale ressaltar que o pul-
mão esquerdo é um pouco menor que o pulmão direito, uma vez que ele divide o
espaço ao lado esquerdo do tórax com o coração.

Figura 1: Sistema respiratório


Fonte: stockshoppe/Shutterstock.com

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Os próprios brônquios se ramificam várias vezes em vias aéreas menores, termi-
nando nas vias aéreas mais estreitas, chamadas de bronquíolos, que têm apenas
meio milímetro de diâmetro. As vias aéreas se assemelham a uma árvore invertida,
fazendo com que essa parte do sistema respiratório seja também chamada de árvo-
re brônquica.
As grandes vias aéreas se mantêm abertas por um tecido conjuntivo fibroso semi-
flexível, chamado de cartilagem. As vias aéreas menores são sustentadas pelo teci-
do do pulmão, que as envolve e ao qual estão ligadas. Os músculos das vias aéreas
podem relaxar ou contrair, mudando assim o tamanho das vias aéreas.
Ainda temos a pleura que é uma membrana escorregadia que reveste os pulmões
e o interior da parede torácica. Ela permite que os pulmões se movam suavemente
durante a respiração e quando a pessoa se movimenta. Normalmente, existe apenas
uma pequena quantidade de líquido lubrificante entre as duas camadas da pleura.
Essas duas camadas deslizam suavemente uma sobre a outra quando os pulmões
sofrem alterações de tamanho e forma.
Em relação aos agravos relacionados ao sistema respiratório temos as bronquiec-
tasias, que são dilatações brônquicas irreversíveis, geralmente associadas ao es-
pessamento das paredes brônquicas.

Figura 2: Bronquiectasia
Fonte: Designua/Shutterstock.com

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2. EPIDEMIOLOGIA
A prevalência de bronquiectasias aumenta com a idade, com uma diferença de 8 a
10 vezes na prevalência após os 60 anos (300 a 500 / 100.000) em comparação com
as idades <40 a 50 (40 a 50 / 100.000). Tem diminuído progressivamente, sobretudo
nos países industrializados. Nitidamente, essa redução está associada ao surgimen-
to da antibioticoterapia, que tornou bem menos frequente as bronquiectasias de
origem pós-infecciosas. Atualmente, nos países desenvolvidos, a maior parte das
bronquiectasias é atribuída a doenças sistêmicas.
Entretanto, em países em desenvolvimento, com menos recursos de saúde, ou
em comunidades pobres, as bronquiectasias pós-infecciosas continuam sendo um
importante problema de saúde pública. Além disso, é importante ressaltar que, com
o advento de métodos radiológicos de melhor resolução, lesões incipientes estão
sendo mais precocemente diagnosticadas, principalmente em doenças de vias respi-
ratórias como asma grave e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).

3. ETIOLOGIA
As bronquiectasias abrangem diversas doenças respiratórias e doenças sistêmi-
cas, podendo ser divididas em congênitas, adquiridas e idiopáticas. Em todo o mun-
do, cerca de 50% dos pacientes permanecem com diagnóstico de bronquiectasias
idiopáticas, a despeito de um protocolo sistemático de investigação etiológica.
Como vimos, nos países em desenvolvimento, onde a incidência de infecção res-
piratória grave na infância ainda é considerável, as causas pós-infecciosas de bron-
quiectasias são as mais frequentes. Já nos países desenvolvidos da Europa e da
América do Norte, doenças como fibrose cística, colagenoses e complicações pós-
-transplante apresentam maior importância.

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Fluxograma . Etiologias

ETIOLOGIAS

Congênitas Adquiridas Idiopáticas

Fibrose cística
Deficiência de α 1- Pós-infecciosas
antitripsina DPOC
Discinesia ciliar primária Imunodeficiências
Síndrome de Young secundárias
Imunodeficiências primárias Doenças sistêmicas
Defeitos anatômicos Pneumonite inflamatória
da árvore brônquica Processos obstrutivos
Sequestro pulmonar

4. FISIOPATOLOGIA
Macroscopicamente, as vias respiratórias envolvidas pelo processo tornam-se
dilatadas, tortuosas, flácidas e, em geral, parcialmente obstruídas por secreções pu-
rulentas. As vias respiratórias mais periféricas costumam estar inflamadas e preen-
chidas por secreções em decorrência da obstrução mais proximal. A longa duração
do processo obstrutivo pode ocasionar a substituição das pequenas vias respira-
tórias por processo fibrótico acelular. Esse conceito é de suma importância, pois,
apesar de a doença ser caracterizada pela dilatação das grandes vias respiratórias,
o comprometimento das pequenas vias respiratórias é fundamental na gênese dos
sintomas e na gravidade desses pacientes.
Microscopicamente, parte das vias respiratórias afetadas está espessada por ede-
ma e células inflamatórias, enquanto outras áreas de mucosa apresentam erosões,
úlceras e até mesmo formação de abscesso. A inflamação persistente pode levar à
metaplasia escamosa. Podem ocorrer broncomalácia, hipertrofia muscular e intensa
neovascularização de artérias brônquicas.
Embora o processo envolva primariamente as vias respiratórias, as pneumonias
recorrentes podem comprometer o parênquima pulmonar com inflamação, edema

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e fibrose, levando à distorção da arquitetura alveolar. Os três mecanismos mais im-
portantes que contribuem para a patogênese das bronquiectasias são:

FLUXOGRAMA. MECANISMOS IMPORTANTES PARA PATOGÊNESE

Infecção

Obstrução das vias respiratórias

Fibrose peribrônquica

Se liga! Em alguns casos, todos os três mecanismos estão envol-


vidos, em outros casos, um deles constitui o principal ou o único processo
patogênico. Em muitos casos, a infecção está presente em algum momento
da evolução da doença, porém não está claro em que extensão pode ser con-
siderada como causa ou efeito das bronquiectasias. Ainda que esse processo
patogenético varie conforme a origem das bronquiectasias, a dilatação anor-
mal de brônquios e bronquíolos é resultado de um círculo vicioso que envolve
infecção transmural, inflamação e liberação de mediadores inflamatórios.

A resposta inflamatória envolve o recrutamento de neutrófilos e linfócitos T.


Ocorre liberação de elastase, colagenase e outras substâncias pelos neutrófilos re-
crutados. Os macrófagos e as células epiteliais das vias respiratórias liberam subs-
tâncias químicas como interleucina-8, fator de necrose tumoral e prostanoides, que
influenciam a migração de células.
O resultado final da inflamação na parede brônquica é a destruição de suas ca-
madas elástica e muscular, levando às características dilatações das bronquiecta-
sias. A distorção brônquica originada desse processo irá proporcionar ainda maior
obstrução e retenção de secreção, aumentando o processo infeccioso.

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FLUXOGRAMA. FISIOPATOLOGIA

Pneumonias
Tuberculose
Micobacteriose não
tuberculosa
Imunodeficiência
predispondo a infecções

Infecções bacterianas

Aspergilose
broncopulmonar alérgica
Ineficiência dos Doenças do tecido
Inflamação nas
mecanismos de limpeza conjuntivo
vias aéreas
(clearance) das vias aéreas Doenças inflamatórias
intestinais
Refluxo gastroesofágico
Dano estrutural
nas vias aéreas

Defeitos anatômicos
congênitos
Doenças do tecido
conjuntivo
Doenças inflamatórias
intestinais

FLUXOGRAMA. CLASSIFICAÇÃO

Envolvem um segmento ou lobo pulmonar e, geralmente, estão


associadas a uma obstrução localizada das vias respiratórias
BRONQUIECTASIAS que pode ser ocasionada por bloqueio luminal (corpo estranho,
FOCAIS tumor de crescimento lento), compressão extrínseca por
linfonodomegalia (síndrome do lobo médio) ou distorção
brônquica (após ressecção lobar)

BRONQUIECTASIAS Envolvem significativas porções de ambos os pulmões e


DIFUSAS estão, em geral, associadas a doenças sistêmicas

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5. CLASSIFICAÇÃO
As bronquiectasias podem apresentar-se de duas formas: como um processo fo-
cal ou como um processo difuso, como podemos observar no fluxograma a seguir:
Em relação à classificação, as bronquiectasias podem ser classificadas em três
categorias, de acordo com os achados patológicos e broncográficos, em:

• Bronquiectasias cilíndricas, nas quais os brônquios estão consistentemente


alargados;
• Bronquiectasias varicosas, nas quais existem constrições em segmentos de
bronquiectasias cilíndricas, causando uma irregularidade que lembra as veias
varicosas;
• Bronquiectasias saculares ou císticas, nas quais a dilatação aumenta em dire-
ção à periferia pulmonar, o que causa uma estrutura em formato de balão.

Figura 3: Bronquiectasias císticas (seta) e varicosas (ponta de seta)


Fonte: Autoria própria

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Figura 4: Bronquiectasias císticas (seta) e cilíndricas (ponta de seta) na fibrose cística
Fonte: Autoria própria

Se liga! Embora a classificação seja útil para a descrição radioló-


gica do processo, ela apresenta baixa associação a características clínicas,
fisiopatológicas ou epidemiológicas. Entre as apresentações radiológicas das
bronquiectasias, os pacientes com maior quantidade de dilatação das vias
respiratórias de aspecto cístico estão geralmente associados a condições clí-
nicas mais graves, devido à maior destruição do parênquima pulmonar.

6. DIAGNÓSTICO
A avaliação diagnóstica envolve a identificação das bronquiectasias, a busca da
causa etiológica e a avaliação da gravidade da doença. Os pacientes com bronquiec-
tasias podem ter sintomas decorrentes do processo bronquiectásico ou da doença
subjacente.
Ao exame físico, o quadro bronquiectásico pode apresentar-se clinicamente co-
mo doença indolente, supurativa ou com hemoptise. A apresentação como doença
indolente envolve o fato de as bronquiectasias poderem ser encontradas em indi-
víduos assintomáticos ou em pacientes com apenas tosse leve. A caracterização
desse grupo de pacientes deve-se ao avanço no diagnóstico radiológico por ima-
gem ter tornado mais fácil a identificação de graus menores de bronquiectasias,
ampliando o diagnóstico da doença.

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Conceito: A expectoração de sangue ou escarro tingido de san-
gue proveniente dos pulmões ou da árvore traqueobronquial é causada por
hemorragia brônquica ou pulmonar. Em cerca de 95% dos casos, a hemorragia
provém de ramos das artérias bronquiais. As causas mais comuns são bron-
quite (inflamação dos brônquios), câncer de pulmão, pneumonia, bronquiecta-
sia, embolia pulmonar e tuberculose.

Já os pacientes com doença supurativa apresentam tosse e expectoração crô-


nicas. A expectoração pode ter aspecto variável (mucoide, mucopurulento ou puru-
lento). Podem ocorrer episódios de exacerbação, caracterizados por aumento do
volume e da purulência da expectoração, e comprometimento sistêmico como febre,
fraqueza e perda de peso.
A hemoptise é pouco frequente, podendo ocorrer em pequena quantidade (escar-
ro hemático ou estrias de sangue no escarro) nas exacerbações. A dispneia não é
um achado universal, podendo ser observada nos pacientes com doença extensa e
função pulmonar mais reduzida ou nas exacerbações. Às vezes, a dispneia está as-
sociada à sibilância.
No exame físico, podem ser auscultados ruídos adventícios, como crepitantes,
roncos ou sibilos, os quais dão pistas para o diagnóstico. O principal diagnós-
tico diferencial diante desses achados é a bronquite crônica. O baqueteamento
digital consiste em um achado variável, dependendo da causa e da gravidade do
paciente. A tosse e a expectoração não são achados clínicos dominantes. O qua-
dro clínico caracteriza-se por hemoptises recorrentes quase sempre de pequeno
volume. Entretanto, como o sangramento pode originar-se do sistema arterial
brônquico ou de anastomoses broncopulmonares, a hemoptise pode ser maciça
e ameaçadora à vida.

Saiba mais! Pelo fato de o Brasil ser uma área endêmica de estron-
giloidíase, é necessária a sua profilaxia antes do uso de corticoide com dose
equivalente a 20 mg/dia ou mais e com expectativa de uso de no mínimo 2 se-
manas.
O ideal é que seja realizado o teste sorológico (ELISA) para Strongyloides (IgG).
Se o teste for negativo não é necessário realizar a profilaxia. Entretanto, na
maioria das vezes, o corticoide deve ser introduzido rapidamente e, por isso, é
feita a profilaxia empírica, sem a realização de exames.

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Com relação aos exames complementares, o exame radiológico convencional
do tórax tem sensibilidade de 88% e especificidade de 74% para o diagnóstico de
bronquiectasias. Antigamente, em razão da maior prevalência dos casos graves da
doença, as radiografias dos pacientes que tinham bronquiectasias costumavam ser
anormais. Como resultado da diminuição da quantidade de pacientes portadores
de doença grave (pelo menos nos países desenvolvidos) e com a disponibilidade da
tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) para identificar casos relativa-
mente leves de bronquiectasias, trabalhos mais recentes mostraram que a radiogra-
fia costuma ser normal ou exibe achados inespecíficos.
Várias anormalidades radiológicas caracterizam as bronquiectasias, como:

FLUXOGRAMA. ANORMALIDADES RADIOLÓGICAS

Sinais diretos Sinais indiretos

Opacidades lineares paralelas


Aumento da trama e perda da
(em “trilho de trem”), representando
definição da trama pulmonar
paredes brônquicas espessadas

Opacidades tubulares, representando


Aglomeração de trama vascular pulmonar
brônquios cheios de muco

Opacidades em anel ou espaços císticos, Sinais de hiperinsuflação compensatória


às vezes contendo níveis hidroaéreos do pulmão remanescente

Com base nas evidências atuais, geralmente se aceita a TCAR como exame por ima-
gem de escolha na confirmação da existência de bronquiectasias, bem como na deter-
minação de sua extensão. A TC espiral pode proporcionar mais eficácia diagnóstica,
pois reduz o artefato decorrente do movimento, mas requer maior dose de radiação.
Os achados tomográficos sugestivos são:

• Diâmetro brônquico interno maior do que o diâmetro da artéria pulmonar


adjacente;
• Ausência de afunilamento brônquico, definido como um brônquio com o mes-
mo diâmetro do brônquio que o originou, por uma distância maior que 2 cm;
• Visualização de brônquio na periferia de 1 cm a partir da pleura parietal;
• Visualização de brônquios adjacentes à pleura mediastinal;
• Espessamento de paredes brônquicas;
• Constrições varicosas ao longo das vias respiratórias;
• Formação cística ao final de um brônquio.

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Saiba mais! A broncografia serviu, durante muitos anos, como
padrão na demonstração da presença e da extensão das bronquiectasias. Foi
substituída pela TCAR por causa dos riscos de reação alérgica ao contraste
broncográfico (que variava de broncospasmo secundário ao iodo até anafilaxia
e morte) e do déficit temporário da ventilação e das trocas gasosas. A fibro-
broncoscopia não tem valor para o diagnóstico direto de bronquiectasias, mas
pode ser útil na identificação de lesão obstrutiva responsável por bronquiecta-
sias segmentares localizadas, na identificação de segmentos broncopulmona-
res bronquiectásicos responsáveis por hemoptise recorrente e na obtenção de
material para estudo microbiológico.

Alguns achados nos exames radiológicos e tomográficos do tórax podem sugerir


a etiologia das bronquiectasias. Dessa forma, as bronquiectasias localizadas suge-
rem obstrução brônquica focal das vias respiratórias como causa etiológica. Já as
bronquiectasias difusas sugerem doença sistêmica. A distribuição das bronquiec-
tasias predominantemente nos lobos superiores sugere fibrose cística ou sequela
de tuberculose como etiologia, enquanto a distribuição no lobo médio ou língula
sugere infecção por micobactéria não tuberculosa. Bronquiectasias de predomínio
central devem levantar a possibilidade de etiologia por aspergilose broncopulmonar
alérgica ou síndrome de Mounier-Kuhn.
Alguns testes são utilizados para auxiliar na identificação etiológica e podem ser
divididos em testes de avaliação primária e testes de avaliação secundária, como
descrito a seguir:

FLUXOGRAMA. TESTES PARA AVALIAÇÃO

Avaliação primária Avaliação secundária

Testes cutâneos
Hemograma completo Fator reumatoide Fibrobroncoscopia
para Aspergillus

Exames do escarro (Gram,


Fator antinuclear Investigação do
cultura, pesquisa de bacilo Subclasses de IgG
(FAN) trato digestivo
álcool-ácido resistente)

Cultura para micobactérias,


Dosagem Dosagem de
pesquisa direta e Sorologia para HIV
sérica de IgE alfa-1-antitripsina
cultura para fungos

Dosagens séricas Precipitinas para Dosagem de Testes de


de IgG, IgM e IgA Aspergillus eletrólitos no suor função ciliar

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A investigação etiológica sistemática é fundamental no manejo do paciente com
bronquiectasias. Muitas vezes, a identificação de uma doença subjacente leva a um
tratamento específico que pode interromper a progressão das bronquiectasias e
controlar os sintomas do paciente.
A avaliação da gravidade das bronquiectasias pode ser realizada pelo quadro
clínico, pela extensão tomográfica e pela função pulmonar. Alguns dados clínicos
podem ser marcadores da atividade da doença. Os indicadores mais utilizados
são o volume de expectoração, a frequência de exacerbações e a recorrência de
hemoptise.
O volume diário de expectoração correlaciona-se com mediadores pró-inflama-
tórios in vivo e apresenta implicações na avaliação de qualidade de vida (maiores
volumes diários de expectoração implicam pior qualidade de vida). A frequência de
exacerbações correlaciona-se diretamente com a frequência de atendimentos mé-
dicos e de internações e inversamente com o escore de qualidade de vida.
Já a recorrência de hemoptise pode constituir-se em importante problema e até
trazer risco à vida nos casos de sangramento volumoso, o que exige tratamento es-
pecífico. O dano estrutural pulmonar pode ser avaliado pela TCAR, que determina a
quantidade de segmentos broncopulmonares envolvidos e a porcentagem de envol-
vimento lobar. O grau de prejuízo na avaliação funcional pulmonar depende não só
da natureza e da extensão da anormalidade morfológica causal como também de
condições clínicas associadas. Vale lembrar que o tabagismo pode piorar a função
pulmonar e acelerar o padrão obstrutivo.

Saiba mais! Geralmente, a espirometria mostra uma limitação


do fluxo aéreo com volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1)
reduzido, capacidade vital forçada (CVF) normal ou pouco reduzida e redução
da relação VEF1 /CVF. A redução na CVF pode indicar que as vias respirató-
rias estão bloqueadas por muco, colapsadas ou que há pneumonia associada.
Quanto maior a gravidade da doença, maior será a perda de parênquima em
decorrência das dilatações brônquicas e impactação mucoide. Dessa maneira,
em pacientes com doença avançada é comum a identificação de um padrão
misto no qual a CVF reduzida por um componente restritivo se associa à doen-
ça obstrutiva caracterizada pela limitação ao fluxo aéreo.

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7. TRATAMENTO
Os objetivos do tratamento das bronquiectasias são: evitar ou limitar dano adi-
cional ao parênquima pulmonar, evitar ou reduzir a frequência de exacerbações,
manter uma boa qualidade de vida e aumentar a sobrevida.
Dessa forma, a base do tratamento das bronquiectasias inclui:
Outras recomendações gerais envolvem ainda manter boa nutrição, realizar ati-
vidade física regular, evitar o tabagismo e promover a vacinação contra influenza e
pneumococo.

FLUXOGRAMA. BASE DO TRATAMENTO

Administrar antibióticos

Reduzir a excessiva
Tratar a causa específica
resposta inflamatória
Base do
tratamento
Promover a Controlar a hemorragia
higiene brônquica das vias respiratórias

Remover cirurgicamente
segmentos ou lobos
extremamente danificados

Tratamento específico
A identificação de uma causa específica das bronquiectasias tem implicações
terapêuticas e prognósticas em cerca de 15% dos pacientes. Apesar do quadro clí-
nico de pacientes com bronquiectasias estabelecidas poder ser de deterioração
progressiva, o tratamento específico pode mudar bastante a evolução natural dos
indivíduos acometidos pela doença.
A reposição de imunoglobulina é efetiva em controlar infecções nos pacientes
com hipogamaglobulinemia. Os corticosteroides sistêmicos estão indicados na
aspergilose broncopulmonar alérgica para tratar a inflamação responsável pelo de-
senvolvimento de bronquiectasias.
O diagnóstico preciso de fibrose cística é muito importante, pois possibilita im-
plementar medidas terapêuticas específicas como nutrição, uso de enzimas pan-
creáticas, antibioticoterapia, dornase-alfa e fisioterapia, que têm levado à melhora

Bronquiectasias   15
progressiva na sobrevida da doença. Além disso, novos tratamentos voltados para
recuperação da função do regulador de condutância transmembranar (CFTR) con-
forme o tipo de mutação apresentada pelo paciente já estão disponíveis e despon-
tam como uma forte esperança para tratamento.

Tratamento antibiótico
Indica-se a antibioticoterapia para tratamento da exacerbação da doença e
para tratamento preventivo na tentativa de suprimir a carga bacteriana nas vias
respiratórias.

Tratamento da exacerbação
A identificação de exacerbação do quadro respiratório pode não ser um processo
fácil, já que em pacientes com bronquiectasias supurativas a expectoração talvez
seja cronicamente purulenta. Alguns autores têm proposto que o diagnóstico de
exacerbação seja feito quando houver quatro dos seguintes achados clínicos:

• Alteração na produção de escarro ;


• Aumento da dispneia;
• Febre (temperatura > 38°C);
• Aumento de sibilância;
• Mal-estar, fadiga, letargia ou diminuição da tolerância ao exercício;
• Alterações na ausculta torácica;
• Redução na função pulmonar;
• Alterações radiográficas consistentes com um novo processo pulmonar.
O tratamento precoce da exacerbação das bronquiectasias com antibiótico,
provavelmente, limita o círculo vicioso. O exame bacterioscópico e o exame bac-
teriológico do escarro com antibiograma podem ser úteis na decisão da escolha
antibiótica.
Os germes mais frequentemente isolados na cultura do escarro durante a exacer-
bação são Haemophilus influenzae e Pseudomonas aeruginosa.

Se liga! Entretanto, o estudo bacteriológico pode não identificar


nenhum patógeno, ou a gravidade da exacerbação talvez não possibilita que a
decisão da antibioticoterapia seja postergada até que os resultados dos exa-
mes bacteriológicos do escarro sejam liberados. Nesses casos, a decisão de
qual antibiótico usar deverá ter base empírica.

Bronquiectasias   16
Alguns parâmetros clínicos como a relação VEF1 /CVF < 60% e a produção diária
de escarro > 20 ml estão independentemente associados à existência de P. aerugi-
nosa. Assim, os pacientes com menor produção de escarro e com melhor função
pulmonar podem ser manejados inicialmente com cobertura antibiótica empírica
não antipseudomonas, como amoxicilina, amoxicilina/clavulanato, macrolídeos, ce-
furoxima, ceftriaxona), conforme a gravidade do quadro clínico.
Nos pacientes com risco de P. aeruginosa, um curso empírico de ciprofloxacino ou
levofloxacino constitui-se em opção adequada. Em casos mais graves, o tratamento
hospitalar antipseudomonas pode utilizar substâncias de uso intravenoso como cef-
tazidima, ticarcilina e aminoglicosídeos, muitas vezes com a associação de um beta-
lactâmico com ação antipseudomonas com um aminoglicosídeo ou quinolona.
De qualquer modo, nos casos que não evoluem bem ao tratamento empírico ini-
cial, sempre que possível, indica-se o ajuste do tratamento de acordo com o exame
bacteriológico e o antibiograma do escarro. A duração apropriada do tratamento não
está bem estabelecida, mas tem sido prática comum utilizar a antibioticoterapia por
um período entre 10 e 14 dias.
Devido à necessidade de se conhecer a microbiota bacteriana que coloniza o pa-
ciente com bronquiectasias, é prática comum a realização de cultura de escarro de
vigilância. Dessa maneira, o médico receberá dados relacionados com pior prognós-
tico a longo prazo como a presença de P. aeruginosa no escarro e informações que
poderão auxiliar o tratamento das exacerbações de modo melhor dirigido.
De qualquer maneira, é aconselhável que uma nova cultura de escarro seja cole-
tada antes de se iniciar o tratamento de uma exacerbação com base nas culturas de
escarro de vigilância do paciente.

Tratamento da resposta inflamatória


Os corticosteroides, principalmente na forma inalatória, podem trazer grandes
benefícios sintomáticos, especialmente em casos mais avançados ou com exacer-
bações frequentes. Devido aos seus efeitos tanto broncodilatadores como antiinfla-
matórios, esses fármacos podem ser introduzidos, porém sua real eficácia no curso
da doença ainda encontra-se sob divergências em alguns artigos.
Na fibrose cística, o uso de corticosteroide oral mostrou benefício sobre a função
pulmonar, mas com muito prejuízo no crescimento, na curva glicêmica e no meta-
bolismo ósseo, de modo que os efeitos benéficos não suplantam os riscos. Os estu-
dos com os antagonistas dos leucotrienos são escassos nas bronquiectasias e não
possibilitam definição sobre seu uso nesta doença.

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Promoção da higiene brônquica (aumento do
clearance mucociliar)
Promover a remoção de secreções respiratórias acumuladas nas vias respirató-
rias alteradas traz benefícios em pacientes com bronquiectasias. São utilizados para
esse objetivo a fisioterapia respiratória, os broncodilatadores, os mucolíticos e os
agentes hiperosmolares. As técnicas tradicionais de fisioterapia respiratória, drena-
gem postural e percussão torácica têm sido utilizadas por décadas no tratamento
dos pacientes com bronquiectasias.

Saiba mais! Mais recentemente, essa forma tradicional de fisio-


terapia tem sido substituída por técnicas de fisioterapia ativa como pressão
expiratória positiva, ciclo ativo da respiração e drenagem autógena, as quais
conferem maior autonomia, em especial, para o paciente adulto. Nos países
desenvolvidos, vestes infláveis e vibradores mecânicos aplicados ao tórax têm
sido utilizados como alternativas para a fisioterapia respiratória. Entretanto, seu
custo elevado limita sua utilização em nosso meio.

Os mucolíticos têm sido utilizados com o objetivo de facilitar a higiene brônqui-


ca. A acetilcisteína administrada por nebulização reduz a viscosidade das secre-
ções, mas não há evidências de que isso melhore os desfechos clínicos, além de
apresentar pH excessivamente baixo, o qual pode causar efeitos colaterais como
broncoespasmo grave.
Já o uso da dornase-alfa diminui a viscoelasticidade da secreção respiratória,
mediante ação sobre o DNA extracelular, degradando-o em pequenas frações.
Assim, aumenta a depuração das vias respiratórias, melhora a função pulmonar e
reduz as exacerbações respiratórias em pacientes com fibrose cística. O tratamento
é administrado por nebulizador a jato, em dose de 2,5 mg 1 vez/dia. Entretanto, em
pacientes com bronquiectasias de outras causas (não pela fibrose cística), a dor-
nase-alfa pode piorar a frequência de exacerbações e o declínio do VEF1, estando,
portanto, contraindicada para tal fim.
Ainda com o intuito de aumentar a higiene brônquica, a solução salina hipertônica
(7%) acelera a depuração traqueobrônquica em muitas condições clínicas, provavel-
mente induzindo um fluxo líquido na superfície das vias respiratórias e alterando a
reologia do muco. O manitol, utilizado por via inalatória por dispositivos em pó seco,
parece ter o mesmo efeito.

Bronquiectasias   18
Controle da hemorragia brônquica
A hemoptise em pequena quantidade costuma ser encontrada durante as exacer-
bações, nessa situação, em geral o tratamento antibiótico é suficiente para deter o
processo hemorrágico. Hemoptises volumosas de repetição ou episódios hemor-
rágicos ameaçadores à vida (mais de 600 ml/dia) podem ocorrer e exigir manejo
emergencial.
O manejo inicial exige repouso e posicionamento do paciente com o lado suspei-
to de sangramento reclinado para baixo. A proteção da via respiratória pode exigir
intubação endotraqueal e ventilação mecânica. A TCAR e a fibrobroncoscopia podem
contribuir para identificar de qual lobo se origina o sangramento.

Se liga! A arteriografia de artérias brônquicas e a embolização po-


dem estar indicadas nos casos de sangramento maciço ou quando o sangra-
mento não responde ao manejo clínico. Entretanto, o procedimento tem seus
riscos inerentes e o benefício não é permanente.

As complicações desse procedimento envolvem reações alérgicas ao contras-


te, deslocamento do êmbolo e infecção da área pulmonar infartada. Pacientes que
apresentaram quadro de hemoptise maciça ou episódios recorrentes de hemoptise
devem ser avaliados para tratamento definitivo por meio de ressecção pulmonar ci-
rúrgica do segmento ou lobo fonte do sangramento.

Tratamento cirúrgico
Quando bem indicado, o tratamento cirúrgico melhora total ou parcialmente a
sintomatologia em mais de 90% dos pacientes. No entanto, não existem até o mo-
mento ensaios clínicos randomizados que comparem tratamento clínico versus ci-
rúrgico no manejo das bronquiectasias. O tratamento cirúrgico das bronquiectasias
poderá estar indicado se:

• As bronquiectasias forem localizadas, preferencialmente com comprometimen-


to de apenas um lobo;
• O paciente apresentar sintomas de difícil controle e/ou um significativo prejuízo
na sua qualidade de vida em decorrência das infecções repetidas;
• O paciente apresentar função pulmonar suficiente para uma ressecção
pulmonar;

Bronquiectasias   19
• O paciente não apresentar comorbidades significativas que impeçam uma cirur-
gia de grande porte.

O objetivo imediato da extirpação cirúrgica inclui a remoção dos segmentos ou


lobos mais envolvidos com preservação das áreas não supurativas ou não sangran-
tes. As ressecções do lobo médio e inferior são realizadas com mais frequência. O
segmento superior do lobo inferior pode estar envolvido em uma extensão menor e
frequentemente pode ser recuperado ao se considerar a ressecção do lobo inferior. 
A intervenção cirúrgica costuma ser combinada com antibióticos agressivos e
um regime de higiene brônquica para reduzir a infecção bacteriana e melhorar a dre-
nagem. As principais indicações e objetivos para a cirurgia de ressecção em bron-
quiectasias incluem:

• Remoção de pulmão destruído parcialmente obstruído por tumor ou resíduo de


corpo estranho;
• Redução de episódios infecciosos agudos em pacientes com exacerbações fre-
quentes devido à bronquiectasia localizada
• Redução da produção excessiva de expectoração purulenta e viscosa em pa-
cientes com bronquiectasia confinada a um ou dois lobos e que não respon-
dem à terapia médica;
• Eliminação das vias respiratórias bronquiectáticas sujeitas à hemorragia des-
controlada quando outras medidas falham;
• Remoção de uma área suspeita de abrigar organismos resistentes, como a tu-
berculose multirresistente. 

Já o transplante duplo de pulmão está indicado em casos de doença avançada.

Bronquiectasias   20
FLUXOGRAMA. MAPA RESUMO: BRONQUIECTASIAS

Em países desenvolvidos é
Aumenta com a idade
atribuída a doenças sistêmicas
Adquiridas Difusa
Dilatações brônquicas
irreversíveis, geralmente
Congênitas EPIDEMIOLOGIA associadas ao espessamento Localizada
das paredes brônquicas

Pode se apresentar
Idiopáticas ETIOLOGIA DEFINIÇÃO
de 2 formas:

Exame físico
DIAGNÓSTICO CLASSIFICAÇÃO Varicosas

Anamnese

TRATAMENTO FISIOPATOLOGIA Cilíndricas


Exames de
avaliação primária
Exames de Gerais Saculares ou císticas
Infecção
avaliação secundária
Antibióticos
Avaliação de gravidade Obstrução das
Anti-inflamatórias
vias respiratórias
Exames radiológicos Cirúrgico

Higiene brônquica Fibrose peribrônquica


TC é o padrão-ouro Controle de
Hemorragia brônquica

Bronquiectasias   21
REFERÊNCIAS
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2016.
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Barker AF et al. Treatment of bronchiectasis in adults. UpToDate. 2020.
Kasper DL et al. Medicina interna de Harrison. 19. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017.
Moore KL, Dalley AF, Agur AMR. Anatomia orientada para Clínica. 7. ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.
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Hospitalar da EPM-UNIFESP. Pneumologia. 2. ed. [S.l.]: Manole, 2014.
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