Você está na página 1de 21

Gasometria

Arterial
SUMÁRIO
1. Introdução.................................................................................................................... 3

2. Homeostase acidobásica .......................................................................................... 3

3. Tipos de distúrbios acidobásicos.............................................................................. 4

4. Acidose........................................................................................................................ 6
4.1. Acidose respiratória............................................................................................ 6
4.2. Acidose metabólica............................................................................................. 6
4.3. Sinais e sintomas da acidemia........................................................................... 7
4.4. Combate à acidemia........................................................................................... 8

5. Alcalose........................................................................................................................ 9
5.1. Alcalose respiratória........................................................................................... 9
5.2. Alcalose metabólica.......................................................................................... 10
5.3. Sinais e sintomas de alcalemia........................................................................ 10

6. Epidemiologia............................................................................................................ 12

7. Indicações e contraindicações da gasometria....................................................... 12

8. Técnicas na coleta da gasometria........................................................................... 14

9. Complicações............................................................................................................ 15

10. Parâmetros da gasometria....................................................................................... 15

11. Interpretação da gasometria.................................................................................... 16

Referências....................................................................................................................... 19
1. INTRODUÇÃO

A gasometria arterial é um exame de sangue coletado a partir de uma artéria, com


o objetivo de avaliar os gases apresentados na corrente sanguínea. Os principais
parâmetros que observamos no exame gasometria arterial são: pressão de oxigênio
(PaO2), pressão de dióxido de carbono (PaCO2), acidez (pH), saturação de oxigênio
(são2), concentração de bicarbonato (HCO3) e ânion GAP (AG) no sangue arterial.
Algumas análises também medem os níveis de metemoglobina, carboxiemoglobina
e hemoglobina. Essas informações são vitais ao cuidar de pacientes com doenças
críticas, doenças respiratórias ou metabólicas.

Se liga!  Lembre-se que, se o objetivo for apenas medir o pH, é pos-


sível fazer a gasometria venosa.

2. HOMEOSTASE ACIDOBÁSICA

O equilíbrio do pH sanguíneo é mantido entre 7,35 e 7,45, graças ao tamponamento


químico intra e extracelular, bem como à ação de mecanismos reguladores respiratórios
e renais. O SNC e os sistemas respiratório e renal trabalham juntos para controlar a
PaCO2 e o bicarbonato plasmático, estabilizando o pH arterial através da excreção ou
retenção adequada de ácidos ou bases. A equação de Henderson-Hasselbalch (abaixo)
descreve a regulação do pH sistêmico pelos componentes metabólico e respiratório:

HCO3
pH = 6,1 + log
(0,0303× PaCO2)

Essa fórmula demonstra que o pH é diretamente proporcional à concentração de


HCO3 sérica, de modo que, situações que envolvem o aumento de bicarbonato geram
um aumento do pH e situações que reduzem o bicarbonato também reduzem o pH.
Além disso, o pH é inversamente proporcional à PaCO2. Então, quando há aumento de
PaCO2, ocorre redução do pH e quando a PaCO2 diminui, o pH aumenta.

Gasometria Arterial   3
BICARBONATO (HCO3) PaCO2

AUMENTO REDUÇÃO AUMENTO REDUÇÃO

↑ ↓ ↓ ↑
pH pH pH pH

Figura 1. Relação pH x HCO3 e pH x PaCO2.


Fonte: Autoria própria.

Assim, a redução do pH (<7,35) configura a acidose, enquanto o aumento do pH


(>7,45) caracteriza a alcalose.

3. TIPOS DE DISTÚRBIOS ACIDOBÁSICOS

Os desequilíbrios ácido-base podem ser categorizados em simples ou mistos.


Os distúrbios clínicos mais comuns são os desequilíbrios ácido-base simples, como
acidose ou alcalose metabólica, ou acidose ou alcalose respiratória.
Os desequilíbrios ácido-base mistos, que são definidos como distúrbios indepen-
dentes coexistentes, podem ser observados em pacientes em unidades de terapia
intensiva e podem resultar em níveis perigosos de pH. Para o diagnóstico de desequi-
líbrios ácido-base mistos, é necessário levar em conta o ânion gap. Alguns exemplos
de desequilíbrios ácido-base mistos incluem acidoses e alcaloses mistas, acidose
metabólica + alcalose respiratória, ou alcalose metabólica + acidose respiratória.

Gasometria Arterial   4
Se liga!  O que é ânion gap (AG)?

Inicialmente, é preciso relembrar que, no sangue, devemos ter a mesma quan-


tidade de ânions e cátions, para então, ter uma carga neutra. Nomeando as
substâncias, temos que o principal cátion sérico é o sódio (Na+) e os principais
ânions séricos são o HCO3 e o cloro (Cl-). No entanto, existem outros ânions no
sangue, como o lactato, proteínas aniônicas (p ex. albumina), os cetoácidos e
os sulfatos/fosfatos, por exemplo.
O AG é justamente o valor de ânions no sangue, desconsiderando o cloro e o
bicarbonato. Ele é calculado por: AG = Na+ – (HCO3– + Cl–). Adota-se como
valor de referência 6 a 12 mEq/L, com média de 10 mEq/L.
Como o AG normal de 10 mmol/L implica que a albumina sérica (que faz parte
do AG) seja normal, se houver hipoalbuminemia, o valor de AG deve ser corrigi-
do. Isso pode ser feito através da fórmula: AG corrigido = AG calculado + 2,5 x
(valor de referência da albumina – albumina mensurada).

Os distúrbios acidobásicos triplos são mais complexos e incluem acidose mista +


alcalose metabólica ou alcalose mista + acidose metabólica. Um exemplo de desequi-
líbrio ácido-base misto é quando pacientes com acidose decorrente da cetoacidose
alcoólica também podem ter uma alcalose metabólica, devido a vômitos e uma alcalose
respiratória agravada pela hiperventilação relacionada ao problema hepático ou pela
abstinência de álcool.

MAPA MENTAL 1. TIPOS DE DISTÚRBIOS ÁCIDO-BASE

Distúrbios ácido-base

Simples Misto Triplo

Acidose metabólica + Acidose mista + alcalose


Alcalose metabólica
alcalose respiratória metabólica

Acidose respiratória + Alcalose mista + acidose


Acidose metabólica
alcalose metabólica metabólica

Fonte: Autoria própria.

Gasometria Arterial   5
4. ACIDOSE

A acidose é uma condição em que o pH do sangue está abaixo do valor normal, o


que é considerado como menor que 7,35. Isso pode ser causado por diversas razões,
incluindo falhas nos sistemas de regulação dos pulmões, rins ou tampões, bem como
por uma combinação de fatores respiratórios e metabólicos.

4.1. Acidose respiratória


A acidose causada por aumento da PaCO2 recebe o nome de acidose respiratória.
Nesse distúrbio, existe uma dificuldade de ventilação do paciente, levando a uma
hipoventilação e, consequente, hipercapnia, ou seja, aumento de dióxido de carbono
no sangue. Laboratorialmente, na fase descompensada, encontra-se PaCO2 elevada
(acima de 40 mmHg).

Se liga!  Na acidose respiratória aguda, ocorre um aumento rápido


da concentração de HCO3 devido aos mecanismos de tamponamento celular.
Verifica-se uma elevação compensatória imediata de HCO3, esse aumento é de 1
mmol/L para cada aumento de 10 mmHg na PaCO2.

As causas desse distúrbio incluem sedativos, acidentes vasculares cerebrais, do-


ença pulmonar crônica, obstrução das vias aéreas, edema pulmonar grave, distúrbios
neuromusculares e parada cardiopulmonar.
As consequências clínicas da acidose respiratória variam amplamente, dependendo
da gravidade e duração da condição, bem como da doença subjacente e da presença, ou
não, de hipoxemia simultânea. Ansiedade, falta de ar, confusão, psicose e alucinações
são alguns dos sintomas que podem ser causados pelo aumento repentino da PaCO2.
Em casos graves, pode evoluir para coma. Já a disfunção crônica da hipercapnia pode
manifestar-se com distúrbios do sono, perda de memória, sonolência diurna, dificuldade
de coordenação, tremores involuntários e distúrbios motores, como asterixe.

4.2. Acidose metabólica


A acidose causada por redução de HCO3 é chamada acidose metabólica. As etiologias
comuns incluem as cetoacidoses, acidose láctica, intoxicação (salicilatos, etilenoglicol
e metanol) e insuficiência renal.

Gasometria Arterial   6
Existem duas categorias principais de acidose metabólica clínica: com AG elevado
e sem AG. As causas mais prevalentes de acidose com AG elevado são: acidose lác-
tica, cetoacidose, ingesta de toxinas e lesão renal aguda e doença renal crônica. Já
a acidose sem AG pode ocorrer pela perda de alcalis, a partir do trato gastrintestinal,
como resultado de diarreia; ou, a partir dos rins, devido a distúrbios tubulares renais.

4.3. Sinais e sintomas da acidemia


O acúmulo de ácido no corpo pode gerar inúmeros acometimentos. No sistema
cardiovascular, pode causar redução do débito cardíaco, maior risco de arritmias ven-
triculares, vasodilatação arterial e uma pior resposta às catecolaminas.
No sistema pulmonar, pode cursar com aumento da frequência respiratória, aumento
do esforço respiratório (podendo levar à fadiga muscular e insuficiência respiratória), re-
dução da afinidade do complexo hemoglobina-oxigênio – ou seja, dificulta o carreamento
de O2 para os órgãos – e vasoconstricção pulmonar, levando à hipertensão pulmonar.
Nos rins, a acidemia promove uma maior demanda renal de O2, hipercalemia, aumento
na produção renal de amônia (excreção de ácido) e diurese osmótica.
Por fim, podem acontecer outras manifestações, como vasodilatação cerebral,
podendo levar à hipertensão intracraniana, náuseas, vômitos, redução da perfusão
esplâncnica, coagulopatia e disfunção plaquetária.

Redução do débito
↑ Frequência respiratória ↑ Demanda de O2
cardíaco

↑ Esforço respiratório ↑ Risco de arritmias ↑ Produção de amônia

↓ Afinidade Pior resposta a


Hipercalemia
hemoglobina-O2 catecolaminas

Vasoconstrição Vasodilatação
Diurese osmótica
pulmonar arterial

Figura 4. Sinais e sintomas da acidemia.


Fonte: Illin Denis/Shutterstock.com, movinglines.studio/
Shutterstock.com e Smart Servier Medical Art.

Gasometria Arterial  7
4.4. Combate à acidemia
Em resposta à acidemia, o organismo, em busca da homeostase, inicialmente ativa
o sistema tampão. Esse sistema consiste na produção de substâncias que se ligam ao
hidrogênio (H+), que é um ácido. Por sua vez, essas substâncias promovem um balanço
adequado e rápido do pH. Apesar disso, o sistema tampão não aumenta a excreção
de H+ e, por isso, trata-se de uma resposta compensatória imediata. Os sistemas
tampões mais importantes no nosso organismo são: bicarbonato sérico, albumina e
fosfato intracelular.
Além disso, existe a resposta em médio prazo, de minuto a horas, por meio do com-
ponente pulmonar, que ocorre pelo balanço de PaCO2 através da ventilação alveolar.
Através do gráfico abaixo, podemos perceber que situações de hipoventilação alveolar
levam à queda do pH. Da mesma forma, situações de hiperventilação levam ao aumento
do pH. Assim, toda vez que estamos diante de acidemia, tende-se a hiperventilar como
mecanismo compensatório.
Alterações no pH dos líquidos corporais

Normal

Ventilação alveolar Normal = 1

Figura 5. Alteração do pH x ventilação alveolar.


Fonte: Autoria própria.

Por fim, a resposta renal, que demora horas a dias, funciona através da reabsorção
de HCO3, aumento da produção de HCO3 e pela excreção de H+.

Gasometria Arterial  8
MAPA MENTAL 2. MECANISMOS COMPENSATÓRIOS EM RESPOSTA À ACIDEMIA.

Acidemia (excesso de H+)

Resposta metabólica Resposta pulmonar Tampão intracelular Tampão extracelular

↑↑ HCO3 e excreção Hiperventilação Bicarbonato e


Fosfato inorgânico
de H+ alveolar proteínas plasmáticas

Fonte: Elaborado pelo autor.

5. ALCALOSE
A alcalose é uma excessiva alcalinidade sanguínea, ou seja, pH superior a 7,45, pro-
vocada por um excesso de bicarbonato no sangue ou pela perda de ácido no sangue.

5.1. Alcalose respiratória


A alcalose causada por diminuição da PaCO2 recebe o nome de alcalose respirató-
ria. Nesse distúrbio, o paciente está hiperventilando e, consequentemente, apresenta
hipocapnia, ou seja, uma redução de CO2 no sangue.
Os três principais mecanismos envolvidos nisso são: dor; gestação, uma vez que o
aumento abdominal da gravidez leva a um comprometimento da função diafragmática,
gerando uma alcalose respiratória compensatória; e pneumonia, pela ocupação alveolar
por secreção.
Outras etiologias consistem em distúrbios ansiosos, insuficiência cardíaca grave,
febre, hipoxemia, sepse, delirium tremens, salicilatos, insuficiência hepática, hiperven-
tilação mecânica e lesões do SNC.
A alcalose respiratória grave pode provocar tonturas, parestesias, formigamento nas
extremidades, palpitações, tremores e sudorese, além de tetania.

Saiba mais!  Terapeuticamente, a alcalose respiratória é usada para


o tratamento da pressão intracraniana elevada em traumatismo craniano ou outras
doenças do sistema nervoso central, uma vez que uma das suas repercussões é
a redução da pressão intracraniana.

Gasometria Arterial   9
5.2. Alcalose metabólica
A alcalose metabólica decorre de aumento primário de HCO3 sérico, diferente do
que ocorre na acidose respiratória crônica – onde há um aumento compensatório na
reabsorção renal de HCO3 – pelo aumento associado no pH arterial. A alcalose metabó-
lica é causada, sobretudo, pela retenção renal de HCO3 e se deve a vários mecanismos
subjacentes.

Saiba mais!  Um problema recentemente ressurgido é a “síndrome


do leite-álcali”, uma tríade de hipercalcemia, alcalose metabólica e insuficiência
renal aguda decorrente do carbonato de cálcio ingerido, em geral administrado
para tratamento ou prevenção da osteoporose ou para alívio sintomático de do-
ença ulcerosa péptica.

Comumente, os pacientes são separados em dois subtipos principais: responsivos


ao Cl- e resistentes ao Cl-. A medição do Cl- urinário permite essa separação no am-
biente clínico.
A alcalose metabólica responsiva ao cloreto envolve a perda ou secreção excessiva
de cloro, sendo, tipicamente, corrigida pela administração IV de líquidos contendo cloreto
de sódio. As causas fundamentais são induzidas pelo trato GI, a partir dos vômitos ou
da aspiração gástrica através de sonda nasogástrica, e as induzidas pelo rim, a partir
da terapia com diurético.
Já a alcalose metabólica resistente ao cloreto não é corrigida com fluídos contendo
cloreto de sódio, e, tipicamente, envolve grave deficiência de magnésio (Mg) ou potássio
(K) e/ou excesso de mineralocorticoides. Geralmente, é provocada por síndromes de
excesso, real ou aparente, de mineralocorticoides.

5.3. Sinais e sintomas de alcalemia


Sintomas relacionados diretamente à alcalemia são incomuns. No caso de alcalemia
leve, os sinais e sintomas costumam relacionar-se à etiologia de base. Já a alcalemia
mais grave causa hipocalcemia e, subsequentemente, cefaleia, letargia e excitabilidade
neuromuscular, às vezes com delirium, tetania e convulsões. Além disso, a alcalemia
reduz o limiar para sintomas de angina e arritmias, promove constrição arteriolar e reduz
o fluxo coronariano. Como mecanismo compensatório, também ocorre hipoventilação,
com hipercapnia.

Gasometria Arterial   10


Se liga!  A tetania é um distúrbio caracterizado por contrações mus-
culares tônicas intermitentes, acompanhadas de tremores, paralisias e dores
musculares. A causa mais comum de tetania é a hipocalcemia (níveis baixos de
cálcio sérico).

MAPA MENTAL 3. SINAIS E SINTOMAS DE ALCALEMIA.

ALCALEMIA

Respiratório Metabólico Cardiovascular Neurológico

HCHipoventilação ↑ Limiar para


Hipocalcemia Convulsões
compensatória arritmia

↓ Limiar para
Hipopotassemia Letargia
angina

Constrição arteriolar Delirium

Tetania

Fonte: Autoria própria.

Gasometria Arterial   11


MAPA MENTAL 4. DISTÚRBIOS ACIDOBÁSICOS SIMPLES.

Redução do pH Aumento do pH

ACIDOSE ALCALOSE

METABÓLICA RESPIRATÓRIA METABÓLICA RESPIRATÓRIA

↓ HCO3 ↑ PaCO2 ↑ HCO3 ↓ PaCO2

Fonte: Autoria própria.

6. EPIDEMIOLOGIA

Cerca de 97% das gasometrias arteriais coletadas em pronto-socorro encontram-se


alteradas, sendo que 20% delas representam distúrbios simples, 70% distúrbios mistos
e 10% distúrbios triplos.
Além disso, a gasometria possui extrema importância no contexto de UTI, uma vez
que distúrbios acidobásicos são comuns nesse ambiente. Apesar da dificuldade em
avaliar prevalência, acredita-se que cerca de 64% dos pacientes internados apresentam
gasometria alterada. Sendo a acidose metabólica, inicialmente, o distúrbio mais comum.
No entanto, após o tratamento da acidose metabólica, muitos pacientes evoluem para
uma alcalose metabólica, o que a torna incidente também.

7. INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES DA
GASOMETRIA

As principais indicações para coleta de gasometria arterial são: monitorar distúrbios


acidobásicos, determinar níveis de PaO2 e PaCO2 (especialmente, em pacientes em
ventilação mecânica), avaliar resposta terapêutica, determinar hemoglobinas anormais
e em casos de incapacidade da coleta de sangue venoso.
Já com relação às contraindicações, têm-se que, quando o teste de Allen é alterado,
não é recomendada a punção nesse sítio.

Gasometria Arterial   12


Relembrando  O teste de Allen avalia a presença de circulação cola-
teral efetiva da mão, através da avaliação das artérias ulnar e radial. O teste consiste
em pedir ao paciente que eleve a mão e a mantenha fechada por 30 segundos e, em
seguida, comprime-se tanto a artéria ulnar como a radial. Solicita-se que o paciente
abra a mão, que sem o suprimento sanguíneo ficará pálida. Após isso, deve-se
soltar uma delas e verificar se, assim, toda a mão vai ser perfundida pela artéria
que foi desocluída. Como, geralmente, opta-se por fazer a gasometria na artéria
radial, o comum é soltar a pressão na artéria ulnar e manter a radial comprimida.

No teste de Allen normal, mesmo mantendo a artéria radial comprimida, observa-se


que a coloração retorna ao normal após 5-15 segundos, o que indica que a artéria
ulnar consegue suprir a irrigação de forma adequada, minimizando os riscos de
isquemia e necrose dos quirodáctilos. Já no teste alterado, não há retorno da
coloração normal, então, o recomendado é puncionar em outro sítio.

Figura 6. Teste de Allen.


Fonte: Chu KyungMin/Shutterstock.com4.

Além disso, a gasometria também é contraindicada para pacientes com infecção e


trombose no local da punção, se tiver uma doença arterial periférica grave (p ex. DAOP e
claudicação intermitente grave) ou se for um paciente com fenômeno de Raynaud ativo.

Gasometria Arterial   13


Se liga!  O fenômeno de Raynaud é identificado por eventos de con-
tração dos vasos sanguíneos nas pontas dos dedos, acompanhados de uma
coloração pálida inicial, seguida por uma coloração azulada e, posteriormente,
uma coloração avermelhada. Isso é, comumente, causado por situações de stress
ou contato prolongado com temperaturas baixas. As manifestações clínicas
do fenômeno de Raynaud são causadas pela vasoconstrição (estreitamento)
dos vasos, resultando na redução do fluxo sanguíneo para a pele (isquemia),
enquanto a cianose (arroxeamento da pele) é causada pela diminuição da
oxigenação nos pequenos vasos sanguíneos da pele.

Coagulopatia e trombólise são contraindicações relativas à coleta da gasometria,


devido ao risco de sangramento, hematoma e complicações, porém, caso haja neces-
sidade extrema, pode ser feita.

8. TÉCNICAS NA COLETA DA GASOMETRIA

Para coleta da gasometria é recomendada a punção na artéria radial, devido à facili-


dade de acesso ao vaso e à menor chance de punção venosa acidental. Também pode
ser feita a punção nas artérias braquial e femoral, apesar de que a punção de artéria
femoral deve ser a última alternativa, devido à falta de circulação colateral adequada
abaixo do ligamento inguinal.
Para coleta da gasometria na artéria radial, deve-se: explicar o procedimento ao
paciente; hiperestender o punho do paciente; limpar a pele com álcool ou outra solu-
ção antisséptica (p. ex., clorexidina) e injetar, via subcutânea, pequena quantidade de
anestésico (lidocaína) sem adrenalina e fazer o botão (opcional). Deve-se utilizar uma
seringa lubrificada com heparina e, ao introduzir a agulha, colher entre 2-3 mL e, em
seguida, fazer compressão do local da punção por 5-10 minutos.
Esse sangue deve ser enviado para análise em menos de 15 minutos após a coleta.
Sendo que o transporte do sangue deve ser feito adequadamente, através da maleta
de material biológico.

Gasometria Arterial   14


9. COMPLICAÇÕES

As complicações mais comuns são dor e formigamento local, presença de hematoma


e sangramento. Porém, existem complicações mais graves como laceração de vaso,
formação de pseudoaneurisma, hematoma local importante (geralmente, em pacientes
com coagulopatia ou que foram submetidos à trombólise) e lesão nervosa.

10. PARÂMETROS DA GASOMETRIA

Os valores de normalidade da gasometria incluem: pH = 7,35 a 7,45; PaCO2 = 35 a 45


mmHg; HCO3 = 22 a 26 mEq/L; PaO2 = 80 a 100 mmHg; SpO2 = 90 a 100%; ânion gap
(AG) = 6 - 12 mEq/L e bases em excesso (BE) = -3 a +3.

Quadro 1. Valores de referência da gasometria.

Parâmetros Valores de referência

pH 7,35 – 7,45

PaCO2 35 – 45 mmHg

PaO2 80 – 100 mmHg

HCO3 22 – 26 mEq/L

BE -3 a +3

SatO2 90 – 100%

AG 8 – 16 mEq/L

Legenda: PaCO2: Pressão gás carbônico; PaO2: Pressão oxigênio;


HCO3: Bicarbonato; BE: Bases em excesso; SatO2: Saturação de oxi-
gênio; AG: Ânion Gap.

Fonte: Autoria própria.

Gasometria Arterial   15


11. INTERPRETAÇÃO DA GASOMETRIA

Inicialmente, é importante avaliar o pH sérico e, então, verificar qual o distúrbio pri-


mário, ou seja, o que justifica a alteração do pH?
Para tanto, é fundamental entender que a concentração de dióxido de carbono
(PaCO2) representa o aspecto respiratório da regulação do pH corporal, enquanto que
o bicarbonato (HCO3) representa o aspecto metabólico. Quando o pH está abaixo de
7,35, ocorre uma acidose, e quando o pH está acima de 7,45, ocorre uma alcalose.
Quando o PaCO2 é menor que 35 mmHg, estamos diante de uma condição alcalótica,
e se for superior a 45 mmHg, estamos diante de uma condição acidótica. Do mesmo
modo, se o HCO3 for menor que 22 mEq/L, temos uma acidose, enquanto que se for
superior a 26 mEq/L, temos uma alcalose. Para determinar a origem do desequilíbrio
ácido-base, basta comparar o componente que está na mesma direção do desequilíbrio
do pH. Em seguida, é necessário avaliar a existência de um desequilíbrio secundário.
Todos os distúrbios ácido-base desencadeiam respostas compensatórias pelo corpo.
Por exemplo, se um paciente tem uma acidose metabólica (com um nível baixo de
HCO3), também haverá uma redução no PaCO2, o que é clinicamente identificado pela
hiperventilação do paciente. Por outro lado, se um paciente tem uma acidose respi-
ratória (com um nível elevado de PaCO2), também haverá um aumento no HCO3. Em
outras palavras, em distúrbios ácido-base simples, as mudanças no HCO3 e no PaCO2
são na mesma direção. Se as respostas apropriadas estão presentes, o desequilíbrio
ácido-base é considerado simples. Essas respostas compensatórias buscam manter a
homeostase do meio interno, geralmente através de sistemas tampão. No entanto, essa
resposta compensatória normal nunca leva o pH de volta ao normal. Se a gasometria
apresenta valores normais de pH, mesmo com alterações no PaCO2 ou HCO3, significa
que o paciente tem um desequilíbrio misto.
Para identificar distúrbios ácido-base, é importante calcular o ânion gap. Ele repre-
senta a diferença entre cátions e ânions no plasma. Deve ser calculado em casos de
suspeita de distúrbio ácido-base, mesmo que o pH esteja normal ou alcalino. O ânion
gap é calculado usando a fórmula AG = Na+ - (HCO3- + Cl-). O valor normal para o ânion
gap é entre 6 e 12 mEq/L, com uma média de 10 mEq/L.
Por último, ao lidarmos com uma acidose metabólica com aumento do ânion-GAP,
é importante realizar o cálculo do delta/delta. Este cálculo estabelece a relação entre
o aumento do ânion gap e a diminuição proporcional do HCO3:

∆AG (AG paciente – 10)


=
∆HCO3 (24-HCO3 do paciente)

Ele nos mostra que a variação do ânion gap deve ser igual à variação do HCO3. Se as
variações forem iguais, o resultado da equação será 1, significando que temos apenas
uma acidose metabólica com AG aumentado.

Gasometria Arterial   16


Se o valor do delta/delta for < 1, significa que a variação do AG foi menor que a
variação do HCO3, ou seja, o AG elevou e o HCO3 reduziu muito. O que explica isso é
o aumento do Cl. Desse modo, existe uma acidose metabólica com AG aumentado e
acidose metabólica hiperclorêmica.
Já se o ânion gap for > 2 significa que está ocorrendo um grande aumento do AG com
pouca redução do HCO3, ou seja, o HCO3 não reduziu proporcionalmente à elevação do
AG, mostrando que existe retenção de HCO3. Nesse caso, há uma alcalose metabólica
concomitante.

FLUXOGRAMA 1. PASSO A PASSO DA INTERPRETAÇÃO DA GASOMETRIA.

1 Determinar o pH

HCO3 PaCO2
2 Determinar o distúrbio primário
alterado alterado

3 Avaliar presença de distúrbio secundário

4 Calcular ânion-GAP

∆AG
5 Determinar o delta/delta
∆HCO3

Fonte: Autoria própria.

Gasometria Arterial   17


MAPA MENTAL 5. GASOMETRIA.

GASOMETRIA

Tipos de distúrbios
Punção Interpretação Contraindicações
acidobásicos

Teste de Allen
Braquial Simples Determinar o pH
alterado

Determinar o Doença arterial


Radial Misto
distúrbio primário periférica

Avaliar presença de
Femoral Triplo Trombose local
distúrbio secundário

Calcular ânion-GAP Infecção local

Determinar o Fenômeno de
delta/delta Raynaud

Alcalemia Acidose Distúrbios acidobásicos simples

Acidose
Tetania Arritmias pH + PaCO2
respiratória

Constrição Acidose
Hipercalemia pH + HCO3
arteriolar metabólica

frequência Alcalose
Convulsões pH + PaCO2
respiratória respiratória

Limiar para Esforço Alcalose


pH + HCO3
arritmia respiratório metabólica

Vasodilatação
Hipocalcemia
arterial

Hipoventilação Vasoconstrição
compensatória pulmonar

Redução do débito
cardíaco

Fonte: Autoria própria.

Gasometria Arterial   18


REFERÊNCIAS
Berend K, et al. Physhiological approach to assessment of acid-base disturbances. N
Engl J Med. 2014;371(x): 1434-45.
Chertow G, Luyckx V, Marsden P, Skorecki K, Taal M, Yu A. Brenner and Rector’s The
Kidney. 11th ed. Cidade: Editora, 2019.
Kayser C, Corrêa MJU, Andrade LEC. Fênomeno de Raynoud. Rev. Bras. Reumatol. 2009
fev.;49(1): x-y.
Jameson JL, Fauci AS, Kasper DL, Hauser SL, Loscalzo J. Harrison’s principles of internal
medicine. 20th ed. Cidade: Editora, 2018.
Rocco JR. Diagnóstico dos distúrbios do metabolismo ácido-base. Revista Brasileira
de Terapia Intensiva. 2003 out./dez.; 15(4): x-y.
Rose BD, Post TW. Clinical physiology of acid-base and electrolyte disorders. 5th ed.
New York: McGraw-Hill, 2001.
Song ZF, et al. The incidence and types of acid-base imbalance for critically ill patients
in emergency. Hong Kong Journal of Emergency Medicine. 2012 Jan.;19(1): x-y.
Theodore AC. Arterial blood gases. xxxx xxx. xx [citado em xx xxx. 2022]. In: UpToDate
[Internet]. [S.l.]: [S.n.]; 2022. Disponível em: https://www.uptodate.com.

Gasometria Arterial   19


Gasometria Arterial   20
sanarflix.com.br
Copyright © SanarFlix. Todos os direitos reservados.

Sanar
Rua Alceu Amoroso Lima, 172, 3º andar, Salvador-BA, 41820-770

Você também pode gostar