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2020/2021

O EQUILÍBRIO ORÇAMENTAL NO DIREITO


INTERNO, NO DIREITO DA UNIÃO
EUROPEIA E NO TRATADO ORÇAMENTAL
2021

M. MATILDE LAVOURAS
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Faculdade de Direito
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

7.4. A atualidade: qual o critério de equilíbrio orçamental vigente em Portugal?

A resposta à questão que serve de título a este ponto só pode ser dada se tivermos em
consideração quer as normas de direito interno, quer normas de Direito da União Europeia
– quer de direito originário quer de direito derivado –, bem como as normas de Direito
Internacional, como sejam as constantes do Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e
Governação na União Económica e Monetária 1 (TECG).

Optámos por analisar, separadamente, cada um dos conjuntos de normas sem esquecer
a interligação, interseção e relação hierárquica existente entre as normas internas e as
normas de direito supranacional, seja ele convencional ou de direito da União Europeia 2.

7.4.1. As normas de direito interno

Nas normas de direito interno português encontramos na Lei de Enquadramento


Orçamental (LEO) uma menção ao equilíbrio orçamental logo no art.º 10.º a propósito do
princípio da estabilidade orçamental. Deste princípio decorre a necessidade de serem
apresentados, aprovados e executados orçamentos equilibrados ou excendentários, sendo
a sua concretização feita nos termos do n.º 3 desse mesmo artigo, ou seja, no cumprimento

1
Tratado Sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária entre o Reino
da Bélgica, a República da Bulgária, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha, a República
da Estónia, a Irlanda, a República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a República
Italiana, a República de Chipre, A República da Letónia, a República da Lituânia, o Grão-Ducado do
Luxemburgo, a Hungria, Malta, o Reino dos Países Baixos, a República da Áustria, a República da Polónia,
a República Portuguesa, a Roménia, a República da Eslovénia, a República Eslovaca, a República da
Finlândia e o Reino da Suécia, celebrado em Bruxelas a 2 de março de 2012 e aprovado em Portugal no dia
13 de Abril do mesmo ano, pela Resolução da Assembleia da Republica n.º 84/2012. As suas disposições
foram transpostas para o direito interno passando a constar da Lei de Enquadramento Orçamental.
Sobre a problemática subjacente ao Tratado Orçamental e à transposição das suas disposições para o direito
interno português veja-se, por todos, José Casalta Nabais, Estabilidade financeira e o Tratado Orçamental,
JURISMAT, n.º 6, Portimão, pp. 43-68, disponível em
http://recil.grupolusofona.pt/xmlui/bitstream/handle/10437/6753/Estabilidade_financeira_Tratado_Orcam
ental.pdf?sequence=1.
2
Estamos a referir-nos, nomeadamente, ao impacto no desenho das normas de direito interno decorrente
da necessidade de transposição da transposição do TECG, da Diretiva 2011/85/UE ou do Regulamento
(UE) n.º 473/2013 operada pela Lei n.º 41/2014, de 10 de julho.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

das regras orçamentais numéricas estabelecidas no capítulo II da LEO, e nas leis de


financiamento regional e local” 3.

As regras de cálculo do saldo orçamental encontram-se previstas no art.º 20.º da LEO


que, no seu n.º 3, determina que o critério de saldo orçamental vigente em Portugal é o
do saldo estrutural, calculado de acordo com a metodologia estabelecida pelo Pacto de
Estabilidade e Crescimento. Esta remissão para a metodologia de cálculo do défice para
o Pacto de Estabilidade e Crescimento e os restantes números do art.º 20.º levam-nos,
contudo, a questionar se é efetivamente o critério de saldo estrutural que se encontra
consagrada no art.º 20.º ou se, afinal, estaremos a falar de um outro critério de equilíbrio.
Antes dessa reflexão, temos que referir que se o equilíbrio orçamental para o
orçamento geral do estado, considerado aqui na sua globalidade tem de ser calculado nos
termos do art.º 20.º, o mesmo pode não suceder para alguns subsetores do Setor
Administrações Públicas (S.13). No art.º 27.º encontramos, precisamente, essa
diferenciação.
Enquanto que os serviços e entidades integrados nas missões de base orgânica do
subsetor da administração central (S.1311) devem apresentar na elaboração, aprovação
e execução, um: (a) orçamento com saldo global nulo ou positivo e (b) com resultados
positivos antes de despesas com impostos, juros, depreciações, provisões e perdas por
imparidade. Apenas são permitidos desvios a estes dois indicadores, se a conjuntura do
período a que se refere o orçamento, justificadamente, o não permitir. No caso do subsetor
da segurança social (S.1314), exige-se apenas apresentem um orçamento com um saldo
global nulo ou positivo.
Em qualquer um dos casos, são desconsideradas as receitas e as despesas relativas a
ativos e passivos financeiros e o saldo de gerência do ano anterior.

3
Na revisão da LEO ocorrida em 2015, foi eliminada uma norma genérica, introduzida com a Lei n.º
91/2001, no art.º 9.º, com a referência expressa aos critérios de determinação do equilíbrio orçamental para
cada tipo de serviço e para o orçamento globalmente considerado. Esta norma teve que ser, posteriormente,
compatibilizada com as alterações introduzidas na LEO decorrentes da transposição para o direito nacional
das normas do TECG. O artigo 9.º da velha LEO consagrava, em primeira linha, um equilíbrio em sentido
formal – “as receitas necessárias para a cobertura de todas as despesas” – no seu n.º 1, mas, também critérios
de equilíbrio em sentido material para cada tipo de serviço, numa leitura conjunta deste artigo e dos art.os
23.º, 25.º e 28.º da velha LEO. Em certa medida, podemos dizer que a norma do art.º 20.º da LEO cumpre
funções idênticas.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Podemos assim concluir que, apesar de existirem critérios de equilíbrio diferenciados


para os vários subsetores do Setor Administrações Públicas, o orçamento globalmente
considerado tem que ser apresentado, aprovado e executado tendo por referência o critério
estabelecido no art.º 20.º da LEO.
Para estes efeitos é necessário referir, então, quais são os limites numéricos que devem
ser observados, quer para o défice orçamental quer para a dívida pública. O limite
numérico para o défice orçamental é o que resulta, desde logo, do PEC e deve permitir a
convergência a médio prazo para um défice de 0,5% do PIB a preços de mercado, mas
pode, ainda assim, ser superior a esse valor desde que não ultrapasse o valor definido para
o Objetivo de Médio Prazo (OMP) especificamente determinado para Portugal4.
Consagrou-se a necessidade de observância de um saldo estrutural primário,
deduzindo ainda o valor das despesas relativas a programas da União inteiramente
cobertas por receitas provenientes de fundos da União Europeia e o valor resultante de
alterações não discricionárias nas despesas com subsídios de desemprego, saldo
orçamental este que pode optámos por designar por saldo estrutural primário corrigido.

7.4.2. O equilíbrio orçamental face ao Direito da União Europeia

7.4.2.1. Do Tratado de Roma à atualidade: breves notas da evolução das regras


relativas à política orçamental dos Estados-Membros

A criação das Comunidades Europeias encontra-se muito ligada às questões


económicas. Apesar do Tratado de Roma (na sua versão original) não conter referências
diretas às questões monetárias, é possível encontrar disposições importantes que

4
O OMP é definido, por cada Estado-Membro, no Programa de Estabilidade e Crescimento e calculado de
acordo com a metodologia estabelecida no Código de Conduta e no Vade Mecum sobre o Pacto de
Estabilidade e Crescimento. O OMP deve permitir aos Estados garantir uma margem de segurança face ao
limite do défice de 3% do PIB estabelecido quer no art.º 126.º do TFUE quer no art.º 2.º do Regulamento
(CE) n.º 1466/97 e, no médio prazo, atingir um saldo estrutural equilibrado ou excedentário ou, quando tal
não seja possível, um défice estrutural não superior a 1% do PIB – cfr. art.º 2.º-A do Regulamento (CE) n.º
1466/97. Para alcançarem este objetivo os estados-membros devem estabelecer medidas de convergência
que permitam um ajustamento anual adequado. Note-se que, nos termos do art.º 5.º do Regulamento (CE)
n.º 1466/97, a apreciação da trajetória de ajustamento para alcançar o OMP feita pela Comissão e pelo
Conselho, ao analisarem os Programas de Estabilidade e Crescimento, tem por referência precisamente o
mesmo valor, ou seja, um défice estrutural inferior a 0,5% do PIB, mas com algumas especificidades.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

permitiram preparar a União Económica e Monetária. A despeito de logo na década de


60 do século XX terem sido criados mecanismos e instituições que se revelaram
importantes na criação da UEM – o Comité Monetário, um esquema de assistência mútua
em caso de dificuldades na balança de pagamentos (cfr. Art.º 105.º do Tratado de Roma)
e, em 1960, o Comité de Política Conjuntural5 –, apenas em inícios da década de 90 do
século XX foram adotadas medidas que permitissem avançar para a introdução da moeda
única no espaço da União.
Em 1992 foi aprovado o Tratado de Maastricht e, com a sua entrada em vigor em 1
de novembro de 19936, foram dados os primeiros passos (consolidados) no sentido da
construção efetiva de uma UEM, que passaria a ser um objetivo central para os Estados-
Membros.
O Tratado, para além de ter criado a União Europeia, transpôs para o Tratado da
Comunidade Europeia (TCE), no fundamental, algumas das propostas que tinham sido
defendidas pelo Relatório Delors, introduzindo alterações profundas no Tratado de Roma
quanto a estes aspetos. Do Tratado passaria a constar expressamente no art.º 2.º e no art.º
3.º-A do TCE a menção, entre os fins da Comunidade Europeia, à criação de uma moeda
única designada por ECU, a par de uma política monetária e de uma política cambial
únicas, mantendo-se como objetivo principal a manutenção da estabilidade dos preços.
Foi ainda constituída uma nova entidade comunitária, o Sistema Europeu de Bancos
Centrais (SEBC), que congrega atualmente quer o Banco Central Europeu quer os Bancos
Centrais dos Estados-Membros – permitindo desde logo uma colaboração e integração
das instituições que detinham responsabilidade na condução da política monetária dos
Estados-Membros e que tem tido, deste então, um papel fundamental não apenas no
domínio das políticas económica e monetária, mas também, em certa medida, da própria
política orçamental.

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A forma como as Comunidades foram criadas e a importância dada às formas de integração negativa –
com a eliminação dos obstáculos existentes (tão típica de uma União Aduaneira) –, em detrimento de uma
integração positiva – em que é necessário adotar medidas estruturadas e adequadas à prossecução dos
objetivos traçados –, permitia dar resposta às dificuldades em atingir acordos alargados em algumas áreas,
sendo que a política monetária era precisamente uma dessas áreas.
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Estava inicialmente previsto que o novo Tratado entrasse em vigor a 1 de janeiro de 1993, mas os atrasos
na ratificação do Tratado por parte de vários Estados-Membros levaram a que este só entrasse em vigor em
novembro do mesmo ano.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

O objetivo da construção da UEM, tal como previsto no Tratado de Maastricht, não


foi alcançado de imediato, nem de uma só vez, mas antes de forma faseada: (a) 1.ª fase –
até dezembro de 1993; (b) 2.ª fase – o processo de convergência: de 01.01.1994 a
31.12.1998 e (c) 3.ª fase - a partir de 01.01.19997.

A primeira fase teve início precisamente com a aprovação do Relatório Delors, a que
se seguiria a aprovação do Tratado de Maastricht a que já nos referimos. No essencial,
este período caracteriza-se pela adoção de medidas de caráter preparatório das fases
seguintes quer a nível da política económica dos Estados-Membros quer da política
monetária.

Destacam-se, dentro da política económica, a necessidade de privilegiar as políticas


ativas de emprego e as políticas de investimento público e privado, para a reabilitação ou
construção de infraestruturas de redes de transportes, educação e saúde. Ao mesmo tempo
os Estados-Membros mantêm total controlo e domínio sobre as políticas fiscal e
orçamental, embora sejam vistas como importantes instrumentos para a gestão das
economias e, no caso da política orçamental, para a correção dos choques específicos de
cada país.

Note-se que, nesta fase, os países deixaram de poder recorrer ao mecanismo das taxas
de câmbio e à balança de pagamentos para estabilizar a economia. Contudo, nos termos
do então artigo 99.º do Tratado (atual artigo 121.º TFUE), foram adotadas medidas de
coordenação da política económica que consistem maioritariamente na definição de
linhas gerais de orientação da política económica e na fiscalização do seu cumprimento
por parte dos Estados-Membros.

Em matéria de política monetária torna-se então evidente a necessidade de aprofundar


a liberdade de circulação de capitais dentro do território da União, e passa a exigir-se
ainda que os Estados-Membros comecem a adotar medidas para a convergência
monetária e, sobretudo, para a estabilidade dos preços. Ao mesmo tempo, têm também
que adotar medidas no sentido de limitar ou mesmo de eliminar o acesso do estado a
crédito junto do banco central nacional, preparando-se assim para as exigências das fases
seguintes.

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Sobre estas fases veja-se Carlos Laranjeiro, Lições de Integração Monetária, Almedina, Coimbra (2009),
pp. 197 e ss.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

A inclusão ou exclusão dos Estados-Membros na UEM foi decidida com base nas
informações constantes dos relatórios apresentados. Estes deviam conter referências
expressas e detalhadas que permitissem avaliar se as disposições da legislação nacional
transpuseram corretamente para o direito interno as proibições constantes dos arts. 130.º
e 131.º do TFUE (anteriormente, arts. 108.º e 109.º), relativas à autonomia do Banco
Central (nacional) e à compatibilidade dos seus estatutos com os estatutos do BCE, bem
como deveriam aludir o cumprimento dos critérios de convergência previstos no art.º
140.º do TFUE e densificados no Protocolo 13 anexo aos Tratados, ou seja:
(.1.) taxa de inflação: a taxa de inflação durante o ano que antecede a avaliação não pode
ultrapassar em 1,5% a média das taxas de inflação verificadas nos países com a menor subida nos
índices de preços;
(.2.) taxa de juro a longo prazo: durante o ano que antecede a avaliação, a taxa de juro
média de longo prazo, aferida pela taxa praticada nas obrigações públicas, não pode ser superior
a 2% da média das taxas praticadas nos três Estados-Membros com menores taxas de inflação;
(.3.) comportamento da moeda nacional no Mecanismo de Taxas de Câmbio (MTC) do
Sistema Monetário Europeu (SME): a moeda do país em análise deveria fazer parte da banda
normal (flutuações na banda estreita, ou seja, 2.25%) do SME durante pelo menos dois anos, sem
que o Estado analisado tivesse tomado a iniciativa de desvalorizar a sua moeda, por alteração da
taxa central, e sem que a sua moeda tenha conhecido graves pressões cambiais;
(.4.) situação das finanças públicas: no momento da avaliação, o estado em causa não
pode apresentar um défice excessivo, isto é, o défice deve ser inferior a 3% do PIB 8 e a dívida
pública não pode ser superior a 60% do PIB9;

8
Este critério apesar de rigidamente estabelecido foi interpretado de forma mais flexível após o início da
terceira fase da UEM. Permitiu-se, dentro daquilo que resultava já do art.º 126.º do TFUE (ex-art.º 104.º do
TCE), que se não considerasse a existência de défice excessivo nos casos em que o défice era superior a
3% do PIB se (a) o défice tivesse baixado de forma contínua e significativa e se aproximasse do valor de
referência ou (b) se o valor de referência for apenas ligeiramente ultrapassado e se considerar tratar-se de
uma situação excecional e temporária. Permitiu-se também, precisamente nos termos do art.º 126.º, n.º 3
do Tratado, que a Comissão, no relatório que elabora, verifique se o défice orçamental excede as despesas
públicas de investimento, que deve ser compreendido por referência ao conceito avançado no art.º 2.º do
Protocolo n.º 12.
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Também relativamente à dívida há uma exceção, bastando que se verifique uma tendência para a descida
e a aproximação do valor de referência.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Com o início da segunda fase a Comissão passa a acompanhar a evolução da situação


orçamental dos Estados-Membros com base no procedimento estabelecido no art.º 126.º
do TFUE (ex-art.º 104.º do TCE) e nos protocolos anexos ao tratado – Protocolo n.º 12
e Protocolo n.º 13 –, tendo sido adotadas medidas específicas relativas ao Protocolo sobre
o Procedimento por Défices Excessivos (PDE) com a aprovação do Regulamento (CE)
n.º 3605/93 do Conselho, de 13 de dezembro de 199310.

É também nesta fase que se dão importantes passos no sentido da convergência das
economias dos vários países destacando-se, desde logo, a proibição de financiamento dos
Estados-Membros junto dos bancos centrais nacionais – cfr. art.º 123.º do TFUE (ex-art.º
101.º TCE), Regulamento (CE) n.º 3603/93 do Conselho, de 13 de dezembro de 1993, e
Regulamento (CE) n.º 3604/93 do Conselho, de 13 de dezembro de 1993. A partir de
então os Estados-Membros passariam a ter que se financiar nos mercados em condições
semelhantes às dos demais agentes económicos, ficando também proibida a emissão
monetária para financiamento da dívida pública (monetarização da dívida).

Ao nível da política monetária, verificou-se uma total liberalização nos movimentos


de capitais entre os Estados-Membros. Foi também nesta fase que surgiu o Instituto
Monetário Europeu (IME), cuja principal função era garantir que estariam reunidas as
condições para implementação da terceira fase da UEM.

No Conselho Europeu de Dublin de 13-14 de dezembro de 1996 foram aprovadas


novas e importantes medidas de convergência das economias dos Estados-Membros e,
sobretudo, da política orçamental, tendo sido pedida a preparação de um Pacto de
Estabilidade e Crescimento (PEC), processo este que viria a ser concretizado através da
Resolução do Conselho Europeu sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento, adotada a
1 de julho de 1997 em Amesterdão e dos Regulamentos (CE) n.os 1466/97 e 1467/97,
ambos do Conselho, de 7 de julho de 1997.
Este conjunto de diplomas permitiria densificar os critérios de convergência
estabelecidos no Tratado e, sobretudo, os designados critérios de Finanças Públicas.
Criou-se um sistema de alerta rápido para situações em que possa estar em causa um risco

10
Posteriormente revogado pelo Regulamento (CE) n.º 479/2009 do Conselho, de 25 de maio de 2009. As
alterações ficam a dever-se, sobretudo, às implicações decorrentes da alteração do SEC operada pelo
Regulamento (UE) n.º 549/2013.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

de défice excessivo, reforçando-se a supervisão multilateral (reforço do designado braço


preventivo do PEC).

A 1 de janeiro de 1999 inicia-se a derradeira fase da construção da UEM – 3.ª fase -


e que se caracteriza pelo nascimento de uma nova moeda – o Euro – e pela fixação de
taxas de conversão irreversíveis para cada moeda nacional (dos EM). As moedas físicas
só entrariam em circulação em 2002. As alterações ao nível da política monetária e da
política económica foram imensas e influenciaram de forma marcada as políticas
orçamentais. Estava criado um novo espaço de integração económica no continente
europeu.

Em 2005, com a revisão do PEC operada pelos Regulamento (CE) n.º 1055/2005 do
Conselho, de 27 de julho de 2005, que alterou o Regulamento (CE) n.º 1466/97 do
Conselho, de 7 de julho de 1997; e o Regulamento (CE) n.º 1056/2005 do Conselho de
27, de julho de 2005, que alterou o Regulamento (CE) n.º 1467/97 do Conselho, de 7 de
julho de 1997, assiste-se ao reforço das regras de supervisão e de coordenação, bem como
à adoção de medidas no sentido de tornar o procedimento relativo aos défices excessivos
mais claro e mais célere.

Em 2011 é feita uma reforma profunda da regulamentação do Pacto de Estabilidade


e Crescimento, tendo sido adotado um conjunto normativo composto por cinco
Regulamentos e uma Diretiva – pacote legislativo este que ficou conhecido por pacote
seis ou six pack – constituído pelos Regulamento (UE) n.º 1173/2011, pelo Regulamento
(UE) n.º 1174/2011, pelo Regulamento (UE) n.º 1175/2011, pelo Regulamento (UE) n.º
1176/2011, pelo Regulamento (UE) n.º 1177/2011 e pela Diretiva n.º 2011/85/UE, que
introduziram alterações nos Regulamentos originais do PEC11 e adotaram importantes
medidas para reforçar as vertentes preventiva e corretiva do PEC.

A par destas alterações, e tendo falhado uma outra tentativa de alterar o PEC em 2012,
foi aprovado um instrumento de direito internacional – o Tratado sobre a Estabilidade,
Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (TECG), habitualmente

11
O Regulamento (CE) n.º 1466/97 foi alterado pelo Regulamento (UE) n.º 1175/2011 e o Regulamento
(CE) n.º 1467/97 foi alterado pelo e pelo Regulamento (UE) n.º 1177/2011.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

designado por Tratado Orçamental – que vincula apenas os estados signatários. Logrou-
se por via do direito internacional o que se não tinha conseguido por via do Direito da
União12.

Já em novembro de 2013, foi aprovado um novo pacote legislativo apresentado pela


Comissão e que ficaria conhecido por pacote dois ou two pack. Este novo pacote é
constituído por dois documentos, o Regulamento (UE) n.º 472/2013 e o Regulamento
(UE) n.º 473/2013, que são aplicáveis apenas aos países da zona euro e vêm introduzir
medidas de reforço da supervisão orçamental dos países cuja moeda seja o euro, prevendo
ainda um regime especial de acompanhamento para os países que se encontrem a
beneficiar de assistência financeira, ou que tenham saído de um programa de ajustamento
no quadro do auxílio financeiro 13.
É precisamente com a adoção deste pacote que surge o designado Semestre Europeu,
destinado à coordenação ex ante das políticas económicas e orçamentais dos Estados-
Membros. Integrado ainda no contexto do Pacto de Estabilidade e Crescimento e da
Estratégia Europa 2020, no âmbito do Semestre Europeu ressalta-se a obrigatoriedade de
apresentação dos projetos de orçamento à Comissão para avaliação até ao dia 15 de
outubro do ano anterior ao que disserem respeito.

São estes normativos que, em conjunto, contêm o quadro a que devem obedecer a
elaboração, aprovação e execução dos orçamentos dos Estados-Membros da União
Europeia. De entre estas obrigações há que considerar aquelas que são genéricas, mas
também as obrigações específicas e relativas ao equilíbrio orçamental que deve ser
observado.

12
Os países signatários obrigaram-se a introduzir nas suas constituições ou leis de valor reforçado uma
disposição que limitasse o valor do défice orçamental a 0,5% do PIB ou a 1% do PIB, se a relação entre a
dívida pública e o PIB (p.m.) for significativamente inferior a 60% do PIB e os riscos para a sustentabilidade
a longo prazo das finanças públicas forem reduzidos – cfr. art.º 3.º, n.º 1 al. d) do TECG. A verificação da
existência de défice é feita por referência ao n.º 1, al. b), do art.º 3.º do TECG, ou seja, tendo em
consideração o critério do saldo estrutural. De realçar ainda a obrigação de coordenação dos planos de
emissão de dívida pública por parte dos estados signatários. Verifica-se assim como que uma renovação da
importância do subcritério da dívida pública, não de um modo direto, mas apenas indireto.
13
As medidas consagradas permitem suportar um aumento dos poderes da Comissão Europeia em todo o
processo orçamental, sobretudo dos países da zona euro.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

7.4.2.2. O(s) conceito(s) de défice orçamental presente(s) no(s) Tratado sobre o


Funcionamento da União Europeia (TFUE), no protocolo adicional relativo
aos défices excessivos (protocolo n.º 12), no Pacto de Estabilidade e
Crescimento (na sua redação atual)

Considerando que Portugal faz parte de um conjunto de países que têm como moeda
o euro – aqueles Estados-Membros que a legislação da União Europeia designa por
estados participantes14 –, o Governo fica obrigado a cumprir, em matéria orçamental, as
obrigações decorrentes de um conjunto alargado de normas não só de direito originário
como também de direito derivado. Algumas dessas obrigações constam já da LEO
porquanto resultam da transposição de normas de direito da União Europeia. Assumem
especial importância, como referimos supra, as normas dos arts. 121.º e 126.º do TFUE
e as normas do PEC revisto.

(a) O conceito de saldo orçamental no artigo 126.º15 do Tratado sobre o


Funcionamento da União Europeia e no protocolo adicional relativo aos
défices excessivos (protocolo n.º 12)

O n.º 1 do art.º 126.º do TFUE impõe aos Estados-Membros a obrigação de evitarem


“défices orçamentais excessivos” sem, porém, definir qual o significado de cada um dos
vocábulos que compõem esta expressão. Se percorrermos as demais normas do TFUE
não encontramos, em qualquer uma delas, a definição quer de défice quer a densificação
de “excessivo”, de “orçamental” ou sequer de “dívida pública”. Ficamos apenas a saber
que existem limites para a relação entre o valor do défice orçamental e o valor do Produto
Interno Bruto a preços de mercado, bem como para a relação entre o valor da dívida
pública e o valor do Produto Interno Bruto a preços de mercado.

14
Cfr. art.º 2.º, da Secção I – Objeto de definições, do Regulamento (CE) n.º 1466/97.
15
Corresponde ao art.º 104.º do Tratado de Roma na sua última redação vigente até à entrada em vigor do
Tratado de Lisboa.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Para compreendermos o sentido e alcance destas expressões temos que nos socorrer
do Protocolo n.º 12 sobre o procedimento relativo aos défices excessivos e das normas de
direito derivado da União Europeia 16.

Do Protocolo n.º 12 constam, de uma forma clara, várias noções. Desde logo, a
definição do âmbito de consolidação de contas a considerar, isto é, qual é o perímetro
orçamental a ter em conta, a noção de défice, a noção de dívida pública e a noção de
investimento.

O perímetro de consolidação orçamental é definido como sendo o “que diz


respeito ao governo em geral, ou seja, o governo central, o governo regional ou local e os
fundos de segurança social, com exclusão das operações comerciais tal como definidas
no Sistema Europeu de Contas Económicas Integradas”, o que equivale a dizer que se
considera aqui todo o Setor Administrações Públicas (S.13) tal como definido no SEC
2010 – cfr. no mesmo sentido o art.º 3.º do Regulamento (CE) n.º 3603/93 do Conselho,
de 13 de dezembro de 1993, e o art.º 1.º, n.º 2 do Regulamento (CE) n.º 479/2009 do
Conselho, de 25 de maio de 2009. Para efeitos do art.º 126.º TFUE são assim considerados
os orçamentos dos organismos que nos termos daquele regulamento (SEC 2010) sejam
suscetíveis de integrar o Setor Administrações Públicas (S.13) e qualquer um dos seus
subsetores.

Já no que diz respeito à noção de défice, o Protocolo n.º 12 define-o como


correspondendo aos “empréstimos líquidos contraídos, tal como definidos no Sistema
Europeu de Contas Económicas Integradas”. Mais uma vez temos que considerar aqui as
normas do SEC 2010 que, como veremos, nos levam a concluir que estamos perante a
consagração do critério clássico de equilíbrio orçamental (saldo efetivo ou global).

A dívida é definida como “a dívida global bruta, em valor nominal, existente no


final do exercício, e consolidada pelos diferentes setores do governo em geral, tal como
definido no primeiro travessão”, ou seja, trata-se do valor nominal da dívida consolidada
do Setor Administrações Públicas (S.13).

16
Note-se ainda que o conceito de ‘défices excessivos’ é, por vezes, usado com alusão à ultrapassagem dos
valores de referência relativos ao défice e à dívida. É o que sucede, nomeadamente, no Procedimento por
Défices Excessivos (PDE).

11
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Já o investimento é definido como “a formação bruta de capital fixo, tal como


definida no Sistema Europeu de Contas Económicas Integradas”.

Os valores de referência mencionados no art.º 126.º n.º 2 do TFUE são, como já


referimos, de 3 % para a relação entre o défice orçamental programado ou verificado e o
produto interno bruto a preços de mercado e de 60 % para a relação entre a dívida pública
e o produto interno bruto a preços de mercado 17.

Apesar de não encontrarmos qualquer referência a um conceito específico de


equilíbrio, a expressão “endividamento líquido” supra transcrita corresponde, nos termos
do art.º 1.º, n.º 3 do Regulamento (CE) n.º 3605/93, à capacidade (+)/necessidade (-)
líquida de financiamento (B.9) – ou seja, se existir um défice, este é representado por uma
necessidade líquida de financiamento, mas se existir um superavit estaremos perante uma
capacidade líquida de financiamento18. Ademais, estes valores terão que ser apurados
para o conjunto do sector “administrações públicas” (S.13), tal como definido no SEC
2010. Os juros incluídos no cálculo do défice orçamental são os juros (DPE D.41) tal
como definidos no SEC 2010.

Da leitura destes documentos resulta que o endividamento líquido corresponde à


diferença entre receitas efetivas e despesas efetivas, o que nos permite afirmar que no art.º

17
Verifica-se, assim, que o critério de convergência relativo à situação das finanças públicas se mantém em
vigor mesmo depois de o estado-membro se encontrar já na 3.ª fase da UEM. Os valores mencionados têm
como justificação o facto de se entender que deste modo ainda se permite o funcionamento dos
denominados estabilizadores orçamentais – que são mecanismos que, por atuarem ao nível da receita ou da
despesa públicas, conseguem produzir efeitos com reflexo direto no saldo orçamental, podendo ser
utilizados para contrariar a fase do ciclo económico (descendente ou ascendente) em que a economia de um
determinado país se encontra. Existem ainda outras justificações para que tenham sido escolhidos, a par de
outros critérios, o critério do défice e da dívida pública como critérios de convergência e que têm que ser
cumpridos pelos estados que pretendam aderir à UEM. Os demais critérios de convergências são: a
estabilidade dos preços (a taxa de inflação média que não seja superior em mais de 1,5% da verificada nos
três Estados-membros com taxa de inflação mais baixa), o respeito pelas margens de flutuação normais
previstas no mecanismo de taxas de câmbio do SME e a convergência das taxas de juro. Para maiores
desenvolvimentos sobre as razões explicativas da escolha dos critérios de convergência e, em especial, dos
critérios de finanças públicas veja-se Carlos Laranjeiro, ob. cit.
18
Se preferirmos utilizar as expressões constantes do SEC 2010 então teremos que “A capacidade líquida
de financiamento é um excedente emprestado, enquanto a necessidade líquida de financiamento é o
financiamento de um défice.” – cfr. § 1.125 do SEC. A ideia de que o critério referido nas normas de direito
da U.E. é o equilíbrio efetivo fica bem clara após a leitura de outras normas do SEC.

12
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

126.º do TFUE se encontra consagrado expressamente o critério do défice efetivo do


orçamento.

(b) A noção de défice no Pacto de Estabilidade e Crescimento (na sua redação


atual – PEC revisto)

O Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) era originalmente composto por um


conjunto normativo constante da Resolução do Conselho Europeu de 17 de julho de 1997
(97/C236/01); do Regulamento (CE) n.º 1466/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997; do
Regulamento (CE) n.º 1467/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997; e das normas dos arts.
121.º, 126.º, 136.º e do Protocolo n.º 12 do TFUE. Neste sentido, continha disposições
destinadas a assegurar finanças públicas sãs, como meio de garantir as condições
adequadas à estabilidade dos preços e ao crescimento sustentável, por forma a assegurar
a criação de emprego.

No PEC podíamos encontrar, desde esta fase inicial, duas vertentes: a vertente
preventiva, constante do Regulamento (CE) n.º 1466/97, e a vertente corretiva, constante
do Regulamento (CE) n.º 1467/97. Atualmente, a redação destes dois regulamentos é a
que resulta das alterações introduzidas pelos Regulamentos (CE) n.º 1055/2005 e n.º
1056/2005 do Conselho, de 27 de junho de 2005, respetivamente, bem como pelos
Regulamentos (UE) n.º 1175/2011 e n.º 1177/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho,
de 16 de novembro de 2011.

Apesar de não ter existido uma alteração das vertentes do PEC, verificou-se um
reforço da supervisão e da coordenação das políticas económica e orçamental, bem como
à clarificação, simplificação e aceleração da aplicação do Procedimento por Défices
Excessivos (PDE). Motivadas pela grave crise financeira e económica iniciada em 2007,
às alterações introduzidas no PEC em 2011 pelo six pack, seguir-se-iam as constantes do
two pack, em 2013, relativas, estas últimas, ao processo orçamental. Não podemos
também ignorar as implicações decorrentes da assinatura do Tratado sobre Estabilidade,
Coordenação e Governação da União Económica e Monetária (TECG) e, especialmente,
as orientações constantes do Relatório do ECOFIN relativas à implementação do PEC.

Conclui-se assim que, se em 1997 quando foi adotado o PEC este apenas era
constituído pela Resolução do Conselho de 17 de junho de 1997, pelo Regulamento (CE)

13
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

n.º 1466/97 (vertente preventiva) e pelo Regulamento (CE) n.º 11467/07 (vertente
corretiva), adotados nos termos dos arts. 121.º, 126.º, 136.º e Protocolo n.º 12 do TFUE,
atualmente temos que considerar que o PEC atualmente é constituído por:

(i) Resolução do Conselho de 17 de junho de 1997;


(ii) Regulamento (CE) n.º 1466/97 (vertente preventiva19) na redação que lhe foi
dada pelo Regulamento (CE) n.º 1055/2005, de 27 de junho de 2005, e pelo
Regulamento (UE) n.º 1175/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16
de novembro de 201120;
(iii) Regulamento (CE) n.º 1467/97 (vertente corretiva21) na redação que lhe foi dada
pelo Regulamento (CE) n.º 1056/2005, de 27 de junho de 2005, e pelo
Regulamento (UE) n.º 1177/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16
de novembro de 201122. Esta vertente corretiva ficaria conhecida por
Procedimento por Défices Excessivos (PDE);
(iv) Relatório do ECOFIN relativo à implementação do PEC;

19
A vertente preventiva tem por objetivo principal a promoção da sustentabilidade das finanças públicas
dos estados-membros.
20
A vertente preventiva tem por base o art.º 121.º do TFUE e assume atualmente uma importância
crescente. Tem-se entendido que, com a imposição do cumprimento de determinadas regras e limites é
possível detetar precocemente e corrigir situações de desequilíbrio que podem levar ao incumprimento dos
critérios estabelecidos no Tratado.
21
A vertente corretiva é implementada no cumprimento do art.º 126.º do TFUE e do Protocolo n.º 12 e
operacionalizada pelo Regulamento (CE) n.º 1467/97. Esta vertente compreende diversas fases a que nos
referiremos mais adiante.
22
Na vertente corretiva assiste-se a uma obrigatoriedade de definição por parte dos estados-membros das
medidas que se comprometem a adotar no sentido de atingirem o equilíbrio orçamental (OMP) e à
introdução de obrigações de redução da dívida para os estados-membros cujas dívidas soberanas
ultrapassem 60% do PIB.
Nos casos em que a dívida pública ultrapasse os 60% do PIB, o estado-membro fica obrigado a reduzir, em
cada ano, um vigésimo do montante em excesso sobre o teto definido. Estabeleceu-se ainda uma sanção
correspondente ao depósito de 0,2% do PIB para os estados-membros que não cumpram as recomendações
que lhe são dirigidas relativamente à redução do défice. De extrema importância é também a alteração da
forma de tomada de decisão quanto à aplicação da sanção por incumprimento prevista no art.º 126.º do
TFUE: ao invés de se exigir a aprovação por maioria qualificada passa agora a considerar-se aprovada a
decisão da aplicação da sanção se o Conselho não recusar, também por maioria qualificada, a proposta
enviada pela Comissão (inversão de voto).

14
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

(v) Regulamento (UE) n.º 1173/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16


de novembro de 2011, relativo ao exercício eficaz da supervisão orçamental na
área do euro;
(vi) Regulamento (UE) n.º 1174/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16
de novembro de 2011, relativo às medidas de execução destinadas a corrigir os
desequilíbrios macroeconómicos excessivos na área do euro;
(vii) Regulamento (UE) n.º 1176/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16
de novembro de 2011, sobre prevenção e correção dos desequilíbrios
macroeconómicos;
(viii) Diretiva 2011/85/UE do Conselho, de 8 de novembro de 2011, que estabelece
requisitos aplicáveis aos quadros orçamentais dos Estados-Membros;
(ix) Regulamento (UE) n.º 472/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de
maio de 2013, relativo ao reforço da supervisão económica e orçamental dos
Estados-Membros da área do euro afetados ou ameaçados por graves dificuldades
no que diz respeito à sua estabilidade financeira;
(x) Regulamento (UE) n.º 473/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de
maio de 2013, que estabelece disposições comuns para o acompanhamento e a
avaliação dos projetos de planos orçamentais e para a correção do défice excessivo
dos Estados-Membros da área do euro23.

Deste reformulado conjunto normativo resulta um Pacto de Estabilidade e


Crescimento reforçado, com um procedimento mais célere e que se espera mais adequado
ao cumprimento dos objetivos inicialmente traçados pela União Europeia.

Podemos então referir que o PEC viu robustecidas as exigências feitas aos Estados-
Membros, sobretudo depois das alterações introduzidas pelo six pack e pelo two pack,
sendo de realçar as medidas de prevenção e correção dos desequilíbrios macroeconómicos
previstas nos Regulamentos (UE) n.os 1174/2011 e 1176/2011; o reforço da supervisão das

23
Este Regulamento prevê a aplicação de um regime de supervisão reforçada, a levar a cabo pela Comissão
e pelo Banco Central Europeu, semelhante ao que se aplica aos países que tenham solicitado a ajuda
financeira, bem como um regime especial de supervisão pós-programa de assistência financeira, segundo
o qual os estados-membros ficam sujeitos a um regime apertado de supervisão enquanto não estiver
restituído pelo menos 75% do valor do financiamento recebido. Trata-se, é claro, de um regime mais
exigente e rigoroso do que o previsto no PDE.

15
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

políticas orçamentais previsto no Regulamento (UE) n.º 1173/2011; o estabelecimento de


requisitos aplicáveis aos quadros orçamentais dos Estados-Membros constantes da
Diretiva 2011/85/UE; o reforço da supervisão económica e orçamental dos Estados-
membros afetados ou ameaçados por graves dificuldades no que diz respeito à sua
estabilidade financeira, estabelecidas pelo Regulamento (UE) n.º 472/2013; e as medidas
de acompanhamento e avaliação dos projetos de planos de orçamento e correção de défices
excessivos de Estados-Membros da zona euro estabelecidas pelo Regulamento (UE) n.º
473/2013.

(b.1.) A vertente preventiva do PEC

Os Estados-Membros ficam assim obrigados a apresentar orçamentos equilibrados de


acordo com o critério do saldo global (também designado por saldo efetivo) – art.º 126.º
e Protocolo n.º 12 anexo do TFUE – ou que, sendo deficitários, permitam assegurar uma
rápida convergência para o valor de referência e para o respeito do limite dos 3% para a
relação entre o défice e o PIB a preços de mercado, não devendo a dívida pública exceder
60% do PIB a preços de mercado (cfr. o art.º 126.º do TFUE e o parágrafo 1.º, do art.º 2.º-
A da Secção 1-A – Objetivos Orçamentais de Médio Prazo, do Regulamento (CE) n.º
1466/97 (p. 7 e ss. da versão consolidada).

Dado que o objetivo principal é o de evitar situações de défices excessivos, os


Estados-Membros entenderam que deveriam ser adotadas medidas para evitar que
entrassem em situação de incumprimento. Estas medidas encontram-se na designada
vertente preventiva do PEC. No conjunto destas obrigações destacam-se, para os Estados-
Membros da zona euro24, a elaboração de um Programa de Estabilidade e Crescimento no
qual prevejam medidas orçamentais adequadas a garantir o cumprimento do OMP
traçado25. Este OMP não tem quer ser coincidente com o valor para o saldo orçamental
estabelecido pelo art.º 126.º do TFUE e pelo Protocolo n.º 12, devendo antes permitir ter
uma margem de segurança face a esta exigência. Entende-se que esse requisito se

24
As implicações nas políticas orçamentais dos Estados-Membros que não fazem parte da zona euro são
diversas. Os Estados-Membros nessas condições não estão obrigados a apresentar um Programa de
Estabilidade, mas antes um Programa de Convergência.
25
O OMP para Portugal foi fixado pela Comissão Europeia em 0,25% do PIB potencial e será atingido em
2021, depois de excluído o efeito das medidas temporárias e extraordinárias (habitualmente designadas por
medidas one-off e cláusla unusual events).

16
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

encontrará cumprido se as medidas previstas forem adequadas, permitindo apresentar e


executar orçamentos cujo OMP (específico para cada país) seja inferior a um défice
estrutural de 1% do PIB a preços de mercado. Este valor é calculado nos termos
definidos pelo PEC e pelo SEC 2010 – cfr. o art.º 121.º do TFUE e o parágrafo 2.º, do art.º
2.º-A da Secção 1-A – Objetivos Orçamentais de Médio Prazo, do Regulamento (CE) n.º
1466/97 (p. 7 e ss. da versão consolidada) 26. E, ao exigir que o cumprimento do OMP
traçado seja incluído nos quadros orçamentais de cada Estado-Membro, exige também
que esse objetivo seja cumprido em cada orçamento.

Aliás, há que referir ainda que, na avaliação feita pela Comissão e pelo Conselho no
quadro da supervisão multilateral, é tido em consideração o valor de referência para o
défice estrutural primário, excluído das despesas relativas a programas da União
totalmente financiadas por receitas provenientes de fundos da União e das alterações não
discricionárias nas despesas com subsídios de desemprego, valor estes que tem que ser
inferior a 0,5% do PIB a preços de mercado – cfr. parágrafo 4.º do n.º 1 do art.º 5.º do
Regulamento (CE) n.º 1466/97.

Há ainda que acrescer, no caso português, as implicações decorrentes de o nosso país


ser um dos signatários do TECG, mas sobre este ponto falaremos mais adiante.

(b.2.) A vertente corretiva do PEC ou o procedimento por défices excessivos – PDE:


as consequências do incumprimento das normas de Direito da União Europeia em
matéria de saldo orçamental

A vertente corretiva do PEC consiste numa sequência de etapas que convém


analisar separadamente. É desde logo necessário referir que naqueles casos em que o valor
do défice ultrapassa o valor de referência – 3% do PIB – ou o valor da dívida pública
excede também o valor estabelecido como limite – 60% do PIB – tal não significa que
seja desencadeado automaticamente o PDE, que culmina na aplicação de sanções. Este

26
Compreende-se assim a menção feita pelo art.º 12.º -C da velha LEO à necessidade de ser elaborado um
Programa de Estabilidade e Crescimento onde seja prevista uma fórmula que permita, em cada período
financeiro, apresentar e executar um orçamento cujo saldo estrutural seja inferior ao OMP estabelecido e,
permita a convergência para um saldo estrutural que não ultrapasse os 0,5% do PIB a preços de mercado.

17
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

procedimento é sempre uma solução de ultima ratio27 que só é utilizado desde que se
verifiquem todos os requisitos previstos no art.º 126.º do TFUE e nos demais
regulamentos da UE. De acordo com o Tratado um défice superior a 3% ou uma dívida
pública superior a 60% do PIB não são considerados excessivos se:

(.1.) Se o valor do défice ou da dívida, apesar de superior ao valor de referência,


tiver baixado “de forma substancial e contínua” e se “aproxime do valor de referência”
(nº 2);

(.2.) Se o excesso em relação ao valor de referência resultar condições


“excecionais e temporárias” 28 e se aquela relação continuar próxima do valor de
referência (nº 2);

(.3.) Se o défice público não exceder as despesas públicas de investimento (nº 3).

Enquanto que a definição de condições excecionais e temporárias é feita no


Regulamento n.º 1467/97, nomeadamente no art.º 2.º, n. os 1 e 2, a concretização da
terceira condição resulta de uma interpretação do normativo do n.º 3 do art.º 126º do
TFUE. A possibilidade de a Comissão poder afastar a aplicação do PDE nos casos em
que um dos valores de referência é ultrapassado, desde que o valor do défice exceda o
valor das despesas públicas de investimento constitui, na verdade, o reconhecimento da
importância que o investimento público pode ter quer no crescimento económico quer na
coesão entre os Estados-Membros. Ainda que de modo indireto encontramos aqui
previsto o critério do equilíbrio do orçamento corrente, ou seja, o PDE pode ser afastado
pela Comissão quando o saldo global ou efetivo seja superior a 3% do PIB, mas, ao
mesmo tempo as despesas de investimento, ou seja, as despesas de capital, sejam
superiores a 3% do PIB29.

27
Note-se que não só o recurso ao PDE previsto no art.º 126.º é, em si mesmo, um procedimento de ultima
ratio como também o são as várias sanções previstas são gradativas, partindo-se das menos gravosas para
as mais gravosas.
28
A noção de medidas excecionais e temporárias pode ser encontrada no art.º 2.º do Regulamento (CE) n.º
1467/97.
29
Para maiores desenvolvimentos veja-se Carlos Laranjeiro, “Investimento Público e Défice Orçamental”,
Temas de Integração, 4.º vol. 1.º semestre de 1999, n.º 7, Coimbra, pp. 89 a 98, em especial pp. 94-98.
N.B: A leitura deste texto deve ter em consideração que: (a) as referências quer ao PEC quer aos artigos dos Tratados
se encontram desatualizadas; (b) quanto ao primeiro aspeto, este é tratado nas pp. 89-93 e pode ser compreendido numa

18
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Nos casos em que sejam ultrapassados os valores de referência ou em que seja de


prever que há o risco de estes serem ultrapassados, sendo de concluir que existe um défice
excessivo ou que este esteja em risco de ocorrer, inicia-se o PDE, que tem várias fases:

ótica atual se forem tidas em consideração as menções feitas a esse respeito neste sumário; (c) quanto ao segundo, basta
que se tenha em consideração que o texto do art.º 104.º do TCE passou a constar do atual artigo 126.º do TFUE.

19
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Art.º 126.º, n.º 3 TFUE: A Comissão prepara um relatório

Prazo: 3 meses
Art.º 126.º, n.º 4 do TFUE: O Comité Económico e Art.º 3.º do Reg. (UE)
Financeiro emite um parecer sobre o relatório da Comissão n.º 1466/97

Art.º 126.º, n.º 5 do TFUE: A Comissão analisa o parecer e


conclui se existe ou não um défice excessivo, envia um
parecer ao estado-membro em causa e informa o Conselho

Art.º 126.º, n.º 6 do TFUE: o Conselho, sob proposta da


Comissão e depois de analisar as observações do EM e de ter
avaliado globalmente a situação decide, por maioria
qualificada, se existe ou não um défice excessivo

Art.º 126.º. n.º 7 do TFUE: A Comissão recomenda ao


Conselho a adoção de recomendações a fazer ao EM

Art.º 126.º. n.º 7 do TFUE: O Conselho adota, por maioria


qualificada, as recomendações e notifica o EM para que as
mesmas sejam implementadas dentro de um prazo também
pré-determinado

Art.º 126.º, n.º 8 do TFUE: O EM não implementa as


recomendações e estas são tornadas públicas
Apenas para países da zona euro

Art.º 5.º do Reg. (UE) n.º 1173/2011: A Comissão


recomenda que seja ordenada a realização de um depósito (i) O EM em causa já tinha
não remunerado no valor correspondente a 0,2% do PIB do constituído um depósito
ano anterior, e Conselho adota a recomendação tal como ela remunerado nos termos do
foi feita por maioria qualificada inversa (n.º 2) ou altera a art.º 4.º (ii) Violação grave
recomendação e aprova-a como sua (n.º 3) das obrigações orçamentais

Art.º 126.º, n.º 8 do TFUE: A Comissão recomenda a adoção Apenas em caso de inação do EM
de medidas eficazes

Não aplicável ao Reino Unido

Art.º 126.º, n.º 8: Adoção, por maioria qualificada, das


medidas propostas (i) Suspensão total ou parcial
do pagamento das
transferências relacionadas
com os fundos estruturais

20
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

Art.º 6.º, n.º 1 do Reg. (UE) n.º 1173/2011: A Comissão


recomenda que seja aplicada uma multa equivalente a 0,2%
do PIB do ano anterior

Art.º 6.º, n.º 2 do Reg. (UE) n.º 1173/2011: Conselho adota


a recomendação tal como ela foi feita por maioria
qualificada inversa (n.º 2) ou altera a recomendação e
aprova-a como sua (n.º 3)

Art.º 126.º, n.º 9 do TFUE: O EM insiste em não colocar em


prática as recomendações ou cumprir as decisões: o
Conselho notifica o EM para cumprir, fixando-lhe um prazo

Art.º 126.º, n.º 11 do TFUE: A Comissão propõe o reforço


das sanções

Art.º 126.º, n.º 11 do TFUE: O Conselho aprova o reforço das


sanções

7.4.2.3.O conceito de saldo orçamental no Tratado sobre Estabilidade, Coordenação


e Governação na União Económica e Monetária (TECG)

O objetivo de convergência das políticas orçamentais e a necessidade de cumprimento


dos objetivos traçados pelo TFUE e pelo PEC, levariam a que em 2011 se iniciasse o
processo que culminaria em 2012 com a assinatura do Tratado sobre Estabilidade,
Coordenação e Governação na União Económica e Monetária. Este Tratado seria
assinado por todos os Estados-Membros exceto a República Checa, a Croácia30 e o Reino
Unido.
O TECG contém nos arts. 3.º e seguintes disposições que apenas são aplicáveis aos
Estados-Membros que façam parte da zona euro, podendo os Estados-Membros que não
pertençam a este grupo declarar a intenção de querer ser abrangido por estas
disposições31. A importância das disposições constantes do Título III do TECG – arts. 3.º

30
A Croácia não era, à data da assinatura do TECG, membro da União Europeia.
31
São disso exemplo a Dinamarca, a Bulgária e a Roménia. A Hungria, a Polónia e a Suécia ratificaram o
TECG com exclusão das normas constantes do Tratado Orçamental -
http://www.consilium.europa.eu/pt/documents-publications/treaties-agreements/agreement/?id=2012008

21
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

e ss. – é tanta que por vezes o próprio TECG é designado não pela sigla ou pela sua
designação completa, mas apenas por Pacto Orçamental (Fiscal Compact), designação
esta que corresponde à epígrafe do mencionado título III.
No capítulo dedicado ao Tratado Orçamental podemos encontrar normas relativas à
delimitação dos défices orçamentais e às metas a atingir por cada um dos Estados-
Membros a que estas disposições são aplicáveis e normas relativas ao mecanismo de
correção a instituir a nível nacional, que será supervisionado por um corpo independente
cuja função é a de monitorizar o cumprimento dos objetivos orçamentais estabelecidos
pelos Estados-Membros, mas que devem ser consistentes com os OMP previstos na
vertente preventiva do PEC.
Ademais, os objetivos orçamentais traçados pelo TECG são ainda mais austeros do
que os que constam do PEC, estando estabelecido como limite máximo para o saldo
estrutural negativo (défice) o valor de 0,5% do PIB a preços de mercado. Este valor pode,
no entanto, ser ultrapassado temporariamente quando se verifiquem circunstâncias
excecionais e, nos casos em que a relação entre a dívida pública e o PIB a preços de
mercado seja significativamente inferior a 60 % e os riscos para a sustentabilidade a longo
prazo das finanças públicas forem reduzidos o valor do limite para o saldo estrutural passa
para 1% do PIB.
O Tratado Orçamental estabelece ainda que, nos casos em que os limites estabelecidos
forem ultrapassados, sejam implementados mecanismos nacionais para a correção dos
desvios e, concomitantemente, quando a dívida tenha ultrapassado os 60% do PIB a
preços de mercado a sua redução ao ritmo de 5% ao ano do valor da dívida pública.
Estabelece ainda a necessidade de ser implementado um programa de reformas
estruturais, económicas e orçamentais, nos casos em que se verifique défice excessivo
nos termos do art.º 126.º do TFUE, bem como a apresentação dos planos de emissão de
dívida pública.
Note-se que, não obstante a complexidade destes mecanismos e a dificuldade de
articulação entre as disposições de um Tratado Intergovernamental que não vincula senão
os estados contratantes e na exata medida da ratificação que do mesmo foi feita e as
normas de Direito da União, este tem como vantagem o facto de estabelecer para os
estados-contratantes e vinculados pelas disposições do título III – Tratado Orçamental –
limites mais apertados quanto ao desempenho orçamental. Contudo, a disposição do art.º
7.º do TECG já nos levanta maiores reservas pois estabelece de modo antecipado uma
espécie de disciplina de voto para as partes contratantes.

22
o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

7.5. A flexibilização das metas orçamentais


A aplicação das regras de Direito da União Europeia a que nos referimos supra
não é inflexível. Para além das várias possibilidades de não aplicação decorrentes da
análise de casa caso concreto, admite-se a existência de um desvio face aos limites do
saldo orçamental e da trajetória de ajustamento em situações excecionais 32.
Prevê-se, no § 7 da al. c) do artigo 5.º do Regulamento (CE) n.º 1466/97 a
possibilidade de ser utilizada a cláusula de derrogação de âmbito geral33, nos casos em
que ocorra uma situação excecional não controlável pelo Estado-Membro e que tenha um
impacto significativo na situação das finanças públicas.
A mobilização desta cláusula, embora não permita a suspensão dos procedimentos
no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento, é compatível com a flexibilização das
margens de variação dos saldos orçamentais e da dívida pública estabelecidos e a
adaptação das trajetórias de ajustamento. Esta flexibilização das metas, embora possa
decorrer de um evento que afeta todos os Estados-Membros, contém medidas e metas
individualizadas.
Foi, precisamente, o que aconteceu em 2020 com a Comissão a propor ao
Conselho – COM (2020) 123, final de 20.03.2020 - a ativação da cláusula de derrogação
de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Consequentemente foram
adotadas recomendações do Conselho, específicas para cada Estado-Membro, que
contêm as especificações individualizadas. Como poderá ser constatado da análise das
várias Recomendações feitas pelo Conselho aos Estados-Membros é dado especial ênfase
ao impacto nas contas públicas decorrente das medidas de contenção da pandemia,
sobretudo as que se relacionam com a resiliência dos sistemas públicos de saúde e com o
mercado de trabalho. No caso português é ainda feita uma referência expressa à
necessidade de aumentar a eficiência dos tribunais administrativos e fiscais 34.

32
Idêntica possibilidade encontra-se estabelecida no art.º 24.º da LEO, cabendo à Assembleia da República
reconhecer a existência de uma situação de excecionalidade. Este reconhecimento é dispensável, por força
do art.º 26.º da LEO e do art.º 8.º da CRP quando idêntico reconhecimento seja efetuado pelos órgãos
competentes da União Europeia, naqueles casos em que a causa seja comum a outros Estados-Membros.
33
A cláusula de derrogação de âmbito geral foi introduzida em 2011 pela reforma operada pelo six-pack
nos artigos 5.º, n.º 1, 6.º, n.º 3, 9.º, n.º 1, e 10.º, n.º 3, do Regulamento (CE) n.º 1466/97, bem como nos
artigos 3.º, n.º 5, e 5.º, n.º 2, do Regulamento (CE) n.º 1467/97.
34
Recomendação do Conselho relativa ao Programa Nacional de Reformas de Portugal de 2020 e que emite
um parecer do Conselho sobre o Programa de Estabilidade de Portugal de 2020 - COM (2020) 522, final.

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o equilíbrio orçamental no Direito INTERNO, NO DIREITO da união Europeia e no Tratado orçamental

7.5.2. O direito da União Europeia


Do direito originário – art.º 126.º do TFUE e do Protocolo n.º 12 anexo ao Tratado
– resulta a necessidade de os Estados-Membros apresentarem orçamentos equilibrados ou
excedentários e, quando deficitários, o saldo global não pode ser superior a 3% do PIB a
preços de mercado.
Contudo, para garantir o cumprimento desse objetivo foram desenhadas normas
constantes da designada vertente preventiva do PEC segundo a qual os Estados-Membros
ficam obrigados a tomar medidas para evitar os designados défices excessivos. Essas
medidas constam dos Programas de Estabilidade e Crescimento e devem permitir obter
um saldo estrutural inferior ao OMP específico para cada EM e que não pode ser superior
a 1% do PIB a preços de mercado – cfr. Regulamento (CE) n.º 1466/97.

7.5.3. As normas de Direito Internacional


A aprovação do TECG pela generalidade dos Estados-Membros e, sobretudo,
pelos Estados-Membros cuja moeda é o Euro, trouxe novas limitações às políticas
orçamentais, exigindo agora não só que o OMP seja inferior a 0,5% do PIB – cfr. art.º 3.º
TECG –, ou seja, os Estados signatários passariam a ter que cumprir, em matéria
orçamental, obrigações ainda mais apertadas do que as decorrentes do Direito da União
Europeia. Esta obrigação não substitui, antes acresce, às já demais obrigações quer de
direito interno quer de direito da União. Note-se que, por imposição do n.º 2 do art.º 3.º
do TECG as disposições do Tratado teriam que ser transpostas para o direito interno
através de disposições vinculativas e permanentes, preferencialmente através de normas
constitucionais. Não foi o que sucedeu com o caso de Portugal, que transpôs esta
exigência para a Lei de Enquadramento Orçamental, pela Lei n.º 37/2013, de 14 de junho,
mas fê-lo de modo imperfeito ao abrir, no n.º 8 do art.º 12.º-C da velha LEO uma brecha,
densificando o conceito de saldo estrutural como saldo estrutural primário corrigido, o
que não sucede no TECG, optando antes por dar apenas cumprimento às normas constates
do Direito da União Europeia.

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